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218 Unidade II Unidade II 5 TOXICOLOGIA OCUPACIONAL E DE MEDICAMENTOS Este tópico será dividido em duas partes Na primeira abordaremos a toxicologia ocupacional ou seja você terá a oportunidade de compreender melhor como pode ocorrer a exposição e a intoxicação no ambiente de trabalho e também como é possível prevenir a intoxicação do trabalhador Na segunda abordaremos a toxicologia de medicamentos Como foi possível você compreender o medicamento é um agente exógeno e por conseguinte depende da forma pela qual o organismo se expõe a ele pode haver o rompimento da homeostase e consequentemente o aparecimento de sinais e sintomas de intoxicação Neste tópico ainda teremos a satisfação de trabalhar juntos a maneira de se realizar o diagnóstico da intoxicação por alguns medicamentos bem como apresentar e compreender a importância dos antídotos no tratamento da intoxicação 51 Toxicologia ocupacional Iremos agora expor algumas informações para que possamos compreender o raciocínio toxicológico na esfera ocupacional 511 Introdução Desde os primórdios houve exposição dos trabalhadores a substâncias químicas material biológico ou agentes físicos mas nem sempre foi dada a devida atenção à saúde do trabalhador Antes da Revolução Industrial a exposição das pessoas a substâncias potencialmente tóxicas estava associada à própria subsistência Em vários momentos da história as atividades profissionais foram realizadas por escravos ou seja pessoas que eram dominadas por outros povos e submetidas a atividades insalubres fato que perdurou até o final do século XIX Para que você tenha dimensão do que representou a exposição ocupacional a agentes potencialmente tóxicos no séc IV aC Hipócrates identificou a intoxicação pelo chumbo na produção mineradora SANTOS et al 2004 Plínio o Velho 2379 dC observou que na tentativa de reduzir a exposição ao chumbo trabalhadores utilizavam bexigas do trato urinário de animais como máscaras KATO GARCIA WÜNSCH FILHO 2007 e na Europa a partir do século XII as universidades já realizavam experimentos associados à higiene ocupacional na tentativa de compreender melhor como aconteciam as intoxicações no ambiente de trabalho e prevenilas SANTOS et al 2004 Georgius Agricola 14941555 estudou entusiasticamente doenças ocupacionais de mineradores Ele descreveu com bastante detalhe para a época os danos que aconteciam com os mineradores em diferentes situações e concluiu que durante a extração de minério quando as minas estavam mais secas que úmidas havia liberação de poeira que associada à baixa umidade do ar penetrava na traqueia e 219 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS quando corrosivas devorava os pulmões Nas minas das montanhas dos Cárpatos havia mulheres que se casaram com sete maridos todos com morte prematura pela exposição à poeira tóxica nas mineradoras HOOVER 1950 Bernardino Ramazzini 16331714 foi um médico italiano que dedicou praticamente toda sua vida profissional à medicina ocupacional Escreveu o livro sobre doenças ocupacionais e higiene industrial De morbis artificum diatriba Doenças dos trabalhadores FRANCO FRANCO 2001 Em 1767 George Baker 17221809 observou que as epidemias de cólicas saturninas ocorridas durante o século XVII estavam associadas aos efeitos gastrintestinais causados pela exposição ao chumbo presente na sidra o vinho feito de maçã RIVA 2012 Se por um lado a Revolução Industrial trouxe aspectos positivos como as transformações econômicas políticas e sociais além do aprimoramento científico e tecnológico por outro lado homens mulheres e crianças trabalhavam moravam e viviam em condições precárias nessa época Os salários eram baixos a jornada chegava a 18 horas por dia e havia inclusive castigos físicos O trabalhador não tinha direito algum Como havia muitas faltas ao trabalho com consequente baixa de produção começou a haver a intervenção governamental As leis associadas à saúde do trabalhador e à medicina do trabalho começam a surgir nesse período ou seja no início do séc XIX Mas você poderia perguntar e o Brasil como se posicionava do ponto de vista de legislação ocupacional nesse momento histórico O trabalhador era destituído de valor O trabalho índio foi substituído pelo escravo negro e apenas no início do séc XX o país conseguiu alguma projeção industrial sobretudo após as duas grandes guerras Esse breve histórico lhe foi trazido à luz para que você tenha uma dimensão temporal de quando a saúde do trabalhador começou minimamente a ser respeitada no Brasil Foi apenas durante o Estado Novo em 1943 que houve a Consolidação das Leis do Trabalho e com ela a Medicina do Trabalho e a Engenharia de Segurança passaram a ser fundamentais na prevenção das doenças ocupacionais MACHADO 2016 Saiba mais Você encontrará mais informações sobre o estudo das doenças dos trabalhadores em As doenças dos trabalhadores que é uma tradução para o português do De morbis artificum diatriba RAMAZZINI B As doenças dos trabalhadores 4 ed São Paulo Ministério do Trabalho Fundacentro 2016 O termo intoxicação exógena está associado ao rompimento da homeostasia o que é caracterizado pelo aparecimento de sinais e sintomas causados no referencial biológico que se expõe a um ou mais diferentes toxicantes Esse desequilíbrio é representado pelas manifestações clínicas ou laboratoriais 220 Unidade II Sob a perspectiva epidemiológica de todos os 695825 casos de intoxicação exógena relatados no Brasil entre os anos de 2007 a 2016 veja a figura a seguir 43736 foram de origem ocupacional ou seja 67 dos casos de intoxicação ocorreram no ambiente de trabalho CentroOeste Nordeste Norte Sudeste Sul Brasil 2007 0 40 80 120 20 60 100 140 2009 2011 Ano Coeficiente de incidência por mil habitantes 2013 2015 2008 2010 2012 2014 2016 Figura 115 Coeficiente de incidência por mil habitantes dos casos notificados de intoxicação exógena relacionada ao trabalho no Brasil por região de 2007 a 2016 Excetuandose a região Sul em todas as demais regiões houve aumento do número de casos de intoxicação ocupacional no Brasil a partir de 2013 Na região Sul esses números aumentaram a partir de 2015 BRASIL 2018a O trabalhador pode se expor no ambiente de trabalho a substâncias químicas como inseticidas metais pesados agentes metemoglobinizantes gases e vapores tóxicos e outras substâncias ou produtos potencialmente tóxicos O gênero masculino veja a tabela a seguir apresenta prevalência superior ao feminino em termos de intoxicação ocupacional no Brasil Tabela 5 Distribuição da frequência dos casos notificados de intoxicação exógena relacionada ao trabalho segundo dados sociodemográficos Brasil 20072016 Características N Sexo 43712 Masculino 28214 645 Feminino 15498 355 Raçacor da pele 42539 Branca 19809 466 Preta 2553 60 Parda 13257 312 Ignorada 6449 152 221 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Características N Outras 471 11 Escolaridade 38007 Analfabeto 525 14 Ensino fundamental completo 3102 82 Ensino fundamental incompleto 11994 316 Ensino médio completo 6668 175 Ensino médio incompleto 3213 85 Ensino superior completo 1011 27 Ensino superior incompleto 634 17 Ignorado 10860 286 Fonte Brasil 2018a Lembrete Substâncias de caráter lipofílico atravessam membranas biológicas a favor do gradiente de concentração sem gasto de energia por difusão lipídica Devese levar em consideração a crescente participação das mulheres no ambiente de trabalho com destaque para as lactantes e gestantes O lactente que é amamentado do leite de uma mãe que se expõe ocupacionalmente a substâncias químicas de caráter lipofílico pode também estar sendo exposto ao xenobiótico pelo leite materno A exposição vertical pode levar à teratogenicidade dependendo do período gestacional em que o feto tiver sido exposto da quantidade de toxicante ao qual foi exposto e do tempo de exposição Quando se avalia a faixa etária e a escolaridade dos trabalhadores devese considerar que é proibido o trabalho infantil no Brasil Ainda assim a figura a seguir nos traz um gráfico em que é possível identificar a presença de menores no mercado de trabalho com risco de intoxicação nos dias atuais risco esse aumentado quando o nível de escolaridade do trabalhador é baixo uma vez que a atividade profissional e as medidas de segurança nem sempre são claras pela dificuldade de leitura ou compreensão das informações dos que pouco estudaram Feminino Masculino 15 10 10 15 5 20 0 25 5 a 80 71 a 80 61 a 70 51 a 60 41 a 50 31 a 40 21 a 30 11 a 20 5 a 13 n 42559 Faixa etária Figura 116 Distribuição da frequência dos casos notificados de intoxicação exógena relacionada ao trabalho segundo faixa etária e sexo no Brasil 2007 a 2016 222 Unidade II Vamos agora unir os pontos da toxicologia Faremos algumas perguntas Qual é mesmo o conceito de toxicologia Você se lembrou que é a ciência que estuda os efeitos nocivos causados por uma substância química no organismo humano E o que significa ocupacional Está associado ao ambiente de trabalho também chamado de laboral Assim a toxicologia ocupacional é a área da toxicologia que estuda os efeitos nocivos causados pelas substâncias químicas produzidas ou utilizadas no ambiente de trabalho Você se recorda dos objetivos do estudo da toxicologia A toxicologia tem como objetivos o diagnóstico o tratamento e a prevenção da intoxicação Observação Nesse contexto dentro dos três objetivos da toxicologia o mais importante no âmbito ocupacional é a prevenção da intoxicação As instituições ou empresas devem garantir que a exposição do trabalhador aos xenobióticos seja dentro de limites permitidos e que não leve ao aparecimento de danos aos trabalhadores Entretanto uma pequena parte dos trabalhores pode apresentar lesão com algumas substâncias químicas mesmo quando elas estejam abaixo do limite máximo permitido de exposição Um menor percentual de trabalhadores pode inclusive apresentar agravamento de uma doença preexistente por conta da exposição ocupacional É por isso que a toxicologia leva em consideração a sensibilidade individual Assim a maioria dos trabalhadores deve estar protegida do ponto de vista de intoxicação no ambiente de trabalho Exemplo de aplicação Ocorrenos mais um questionamento como é possível prevenir a intoxicação no ambiente de trabalho Reflita Para que se previna a intoxicação do trabalhador são estabelecidas medidas seguras de exposição no ambiente de trabalho e para deixar caracterizado que elas existam realizamse a monitorização ambiental a monitorização biológica e a vigilância da saúde Vamos compreender melhor esses conceitos 223 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS O termo monitorização está associado a monitorar ou seja medir e comparar o resultado com uma referência apropriada Permitanos fazer uma analogia para que se saiba se está havendo aproveitamento submetese o aluno a avaliações Caso as notas obtidas pelo aluno sejam iguais ou superiores ao limite estabelecido pela instituição de ensino o aluno é aprovado Ficou mais claro para você o conceito de monitorização No ambiente de trabalho também se realizam monitorizações Monitoramse as substâncias presentes no ambiente de trabalho e no organismo para estimar o risco de intoxicação durante toda sua vida laboral A partir de agora detalharemos como e por que ocorrem essas monitorizações 512 Monitorização ambiental Imaginemos o seguinte cenário um jovem trabalha na refinaria de petróleo O benzeno como sabemos é um dos hidrocarbonetos presente em uma das frações de destilação do petróleo e pode causar danos pela exposição aguda ou crônica no trabalhador dependendo das condições de exposição Assim como que você imagina que seria possível prevenir a intoxicação desse jovem trabalhador da refinaria de petróleo A primeira situação que tem que ser pensada é identificar e quantificar substâncias químicas presentes no ar que o trabalhador respira no ambiente de trabalho e às quais esse trabalhador possa se expor diariamente por toda a vida laboral de trabalho sem risco de intoxicação Esse processo é denominado monitorização ambiental Observação Não confunda monitorização ambiental referente ao meio ambiente com aquela realizada no ambiente de trabalho Ambas possuem o mesmo nome mas ocorrem em ambientes diferentes Assim a monitorização ambiental é a medida ou quantificação de uma substância química no ambiente de trabalho ou seja no ar que o trabalhador respira para saber se está dentro dos limites permitidos pela legislação Isso significa monitorar medir a quantidade de um xenobiótico presente no ar e comparar os resultados obtidos com uma referência adequada OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 É possível o trabalhador se expor ao benzeno e ainda assim não apresentar efeitos tóxicos Sim é possível Para isso fazse necessário que os limites de exposição ocupacional LEO sejam respeitados O mnemônico LEO é muito utilizado na toxicologia Ele se refere à máxima quantidade de um xenobiótico presente no ar presente no ambiente de trabalho a que a maioria dos trabalhadores pode se expor diariamente por toda sua vida laboral sem risco de intoxicação 224 Unidade II Você poderia se perguntar após esse preâmbulo de onde vêm essas informações ou seja se cada substância química apresenta um LEO diferente como poderíamos saber qual é o LEO de cada uma das milhares de substâncias químicas utilizadas ou produzidas no ambiente de trabalho Esse é um dos maiores desafios associados à toxicologia ocupacional Essas informações advêm de estudos toxicológicos realizados em animais e extrapolados para humanos Esses ensaios toxicológicos demandam vários anos para serem realizados e consomem milhões de dólares para cada uma das substâncias químicas Não é qualquer um que realiza esses experimentos Há a necessidade de uma grande quantidade de experts para realizálos Após esse grande investimento financeiro conduzido por profissionais com bastante experiência na sua execução concluise qual é o LEO para cada uma das substâncias químicas presentes no ambiente de trabalho Caso o trabalhador apresente alguma lesão por conta da exposição ocupacional a empresa empregadora responde por isso legalmente Renomadas agências internacionais estabelecem os limites de exposição ocupacional Como os limites de exposição ocupacional advém dessas agências muitas vezes utilizamos o mnemônico internacional de quem publicou os resultados Assim o LEO pode ser escrito como threshold limit value em inglês consequentemete seu mnemônico é TLV Dessa forma LEO apresenta o mesmo significado que TLV o primeiro é o mnemônio na língua portuguesa e o segundo na inglesa Em instantes veremos quais são as agências internacionais que normalmente realizam esses ensaios toxicológicos Saiba mais Sugerimos entusiasticamente que você leia a obra a seguir BUSCHINELLI J T Manual de orientação sobre controle médico ocupacional da exposição a substâncias químicas São Paulo Fundacentro 2014 Como a obtenção desses limites de exposição ocupacional demandam anos para serem realizados massa crítica e milhões de dólares para cada substância química essas agências ou instituições permitem que o Brasil compile essas informações ou seja as utilize com autorização Exemplo de aplicação Há poucas décadas quando um parente amigo ou vizinho se aposentava não ficávamos muito felizes Reflita sobre isso Para muitos desses dependendo de onde trabalhava a aposentadoria significava que não viveria muito tempo diferentemente do que acontece atualmente pois a expectativa de vida do brasileiro aumentou significativamente nas últimas décadas 225 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Mas por que há essa diferença entre os que se aposentavam no Brasil há algumas poucas décadas e a realidade atual Vamos contextualizar para que você compreenda melhor a linha do tempo da aplicação da legislação trabalhista brasileira e dos princípios toxicológicos no dia a dia das pessoas Dependendo das condições de exposição o asbesto ou amianto pode causar danos ao trabalhador como o mesotelioma câncer característico da exposição a essas fibras Centenas de trabalhadores foram intoxicados pelo asbesto em uma fábrica de telhas que utilizava o amianto como matériaprima na cidade de Osasco WÜNSCH FILHO NEVES MONCAU 2001 Saiba mais Sugerimos que você leia mais sobre os danos causados pelo asbesto no organismo humano em INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER Amianto Brasília 2018 Disponível em httpswwwincagovbrexposicaonotrabalhoenoambienteamianto Acesso em 16 nov 2020 Consegue entender melhor por que é necessário haver uma legislação trabalhista vigente que aplique os conceitos toxicológicos Para evitar perda de produtividade absenteísmo ausência no trabalho e principalmente agravos à saúde e mortes prematuras do trabalhador Vamos agora entender algumas instituições que realizam ensaios toxicológicos com o cerne ocupacional A American Conference of Governmental Industrial Hygienists ACGIH é um comitê norteamericano de toxicologistas ocupacionais que recomenda que deva haver limites de exposição ocupacional denominados de threshold limit values A norteamericana Occupational Safety and Health Administration OSHA ou Administração de Segurança e Saúde do Trabalho em tradução livre adota outra terminologia para o limite de exposição ocupacional o limite de exposição permitido ou permissible exposure level PEL Isso quer dizer que a ACGIH e a OSHA possuem os mesmos propósitos mas com independência entre elas Dessa forma realizam ensaios toxicológicos e os disponibilizam para que outros países compilem seus dados ou seja utilizem essas informações mediante autorização dessas instituições Há outras instituições que também realizam os mesmos ensaios toxicológicos OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 O TLV ou o PEL utilizados por países que compilam os dados norteamericanos devem atentar à jornada ou seja à carga horária semanal e utilizar fatores de correção em relação aos números que nos são disponibilizados No Brasil o LEO também é chamado de limite de tolerância LT 226 Unidade II O Brasil compila dados da ACGIH com algumas adaptações como o fator de correção exposto anteriormente Para efeito de legislação o Ministério do Trabalho publicou a Norma Regulamentadora n 15 NR15 de 1978 Observação Como o anexo 11 da NR151978 preconiza os limites de exposição para até 48 horas semanais fazse necessário aplicar um fator de correção a 78 de seus valores Como é virtualmente impossível estabelecer o LEO para todas as substâncias potencialmente tóxicas utilizadas ou presentes em processos industriais a OMS sugere que sejam priorizadados os estudos dessas substâncias Observe que caso haja uma maior exposição ao asbesto em um dia de trabalho o funcionário da empresa não morrerá imediatamente por conta disso ou seja o problema associado ao asbesto não se relaciona à exposição aguda mas sim à crônica Dentro desse contexto dividemse os limites de exposição ocupacional TLV segundo o risco de intoxicação 5121 ACGIHTLVTWA Embora possa parecer uma sopa de letras nos permita explicar essas abreviações ACGIH como exposto anteriormente é a conferência norteamericana que estabelece limites de exposição ocupacional O termo TLV tem o mesmo significado que LEO ou seja limite de exposição ocupacional e o mnemônico TWA advém do inglês time weighted avarage ou seja média ponderada pelo tempo O que significa então a ACGIHTLVTWA É um parâmetro de monitoramento ocupacional associado à exposição crônica Significa que ao longo da jornada pode haver um ou mais picos de exposição da substância química mas ainda assim não há risco de intoxicação para o trabalhador uma vez que a média de exposição ao longo do dia não terá sido ultrapassada Esse parâmetro de monitorização ambiental está associado à média de exposição ao longo da jornada sem se preocupar se houve uma ou mais sobrexposições à substância química ao longo do dia desde que obviamente o limite denominado de TWA não seja ultrapassado no final do dia de trabalho Observação Quando se escreve jornada devese subentender trabalho ao longo de um dia 227 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Exemplo de aplicação Por que o trabalhador pode se expor a uma significativa quantidade da substância química ao longo da jornada e ainda assim não há risco de intoxicação Não há risco de intoxicação porque a substância não ultrapassou o TLVTWA e porque ela não apresenta importância na toxicidade aguda mas sim na crônica Concluise assim que quando o toxicante é monitorado pelo TWA veja a tabela a seguir significa que pode haver uma ou mais exposições relativamente elevadas ao longo da jornada mas caso a média ponderada da exposição não ultrapasse o TWA não há risco de intoxicação ao menos para a maioria dos trabalhadores Tabela 6 Limites de exposição ocupacional TWA por diferentes instituições LEO Substância Número CAS LT MTE Brasil EUA TLV ACGIH EUA PEL OSHA EU OELV UK WEL Benzeno 71432 1 ppm 05 ppm 1 ppm 1 ppma 1 ppm Chumbo inorgânico 7439921 01 mgm3 005 mgm3 005 mgm3 015 mg m3 a 010 mgm3 Clorofórmio 67663 20 ppm 10 ppm 50 ppm 2 ppm b 2 ppm nhexano 110543 50 ppm 500 ppm 20 ppm b 20 ppm Tolueno 108883 78 ppm 20 ppm 100 ppm 50 ppmb 50 ppm Limites de tolerância Ministério do Trabalho e Emprego Brasil Threshold limit values ACGIH Estados Unidos sem valor legal Permissible exposure limit OSHA Estados Unidos com valor legal Occupational exposure limits value SCOEL União Europeia Workplace exposure limits HSE Reino Unido 1 ppm não é o LT mas o valor de referência tecnológico VRT para o setor de petróleo sendo de 25 ppm o VRT para o setor siderúrgico a LEO binding ou obrigatório b LEO indicative ou indicativo Adaptada de Costa et al 2011 5122 ACGIHTLVSTEL Há outro parâmetro que é utilizado na monitorização ambiental no ambiente de trabalho o ACGIHTLVSTEL O acrônimo STEL advém do inglês short time exposure limit ou seja limite de exposição a curto prazo ou de curta duração tradução livre Esse parâmetro de monitoração ambiental é utilizado para substâncias químicas que possam manifestar narcose irritação ou dano tecidual irreversível ao trabalhador OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 Imagine o seguinte cenário uma pessoa trabalha em uma refinaria de petróleo e de repente ouve uma sirene de alerta sobre vazamento de substâncias químicas potencialmente tóxicas com risco de intoxicação aguda Esse trabalhador tem poucos minutos para evacuar a área para que não seja exposto à substância 228 Unidade II Imagine se ao procurar a rota de fuga esse trabalhador apresente um quadro de torpor ou seja redução da sensibilidade e do movimento e não consegue reciocinar rapidamente Como o trabalhador vai conseguir identificar a rota de fuga e evacuar a área com rapidez se ele não consegue raciocinar e agir de forma célere Você consegue entender a importância e complexidade de uma monitorização ambiental Se o funcionário ouve a sirene mas é hiporeativo e não consegue sair rapidamente do local pode haver uma grande intensidade de exposição em curto prazo inclusive a outras substâncias e consequentemente importante dano ao trabalhador Também é o caso do dano tecidual irreversível pode ser que a exposição a essa substância dependendo das condições de exposição possa levar a irritação ou lesão tecidual irreversível Para substâncias químicas utilizadas ou produzidas no ambiente de trabalho que possam causar esses tipos de lesão o monitoramento ocorre pelo ACGIHTLVSTEL Um substância química pode portanto ser monitorada pelo ACGIHTLVTWA e pelo ACGIHTLVSTEL ao mesmo tempo ou seja caso o trabalhador se exponha ocupacionalmente a substâncias químicas que possam trazer danos ao trabalhador em uma exposição crônica e também a substâncias que possam levar à narcose irritação ou lesão tecidual irreversível há as duas monitorizações 5123 ACGIHTLVC ceiling Há outra situação envolvendo a monitorização ocupacional há substânicas químicas que apresentam importância na toxicidade aguda ou seja dependendo da quantidade da substância a que o trabalhador se exponha mesmo que por pouco tempo pode ser fatal Para essas substâncias há um outro parâmetro de monitorização ambiental no ambiente de trabalho é o ACGIHTLVC ceiling OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 O ACGIHTLVC é o parâmetro que indica a concentração de um xenobiótico presente no ambiente de trabalho que em momento algum pode ser ultrapassado durante a jornada Em caso de acidente como vazamento de substâncias químicas no local de trabalho com importância na toxicidade aguda disparase a sirene e o trabalhador tem que se retirar imediatamente do local Você consegue visualizar que em caso de narcose além de aumentar o risco de acidente no trabalho o deslocamento desse funcionário em situação de evacuação do local pode ficar comprometido É por isso que as empresas precisam trabalhar com a monitorização ambiental para proteger seus funcionários da exposição excessiva de substâncias químicas com diferentes perfis de toxicidade VEGA 2010 5124 Nível de ação Os controles periódicos e médicos são iniciados a partir do nível de ação NA obtido quando se divide o limite de exposição ocupacional por 2 onde 229 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS NA Nível de ação TLV LEO Limite de exposição ocupacional NA LEO 2 Ao medir a concentração da substância no ar que o trabalhador respira desde que representativo da zona respiratória do trabalhador veja a figura a seguir caso o resultado seja inferior ao nível de ação dessa substância interpretase que não esteja havendo uma significativa exposição do trabalhador Figura 117 Dinâmica de amostragem pessoal no ambiente de trabalho Segundo a Norma Regulamentadora n 9 do Ministério do Trabalho de 1978 NR91978 MT valores acima do NA indicam que para que se minimizem os riscos de intoxicação ocupacional devem ser tomadas ações preventivas referentes ao Programa de Prevenção dos Riscos Ambientais PPRA BRASIL 1978 Sabemos que a monitorização ambiental monitora a exposição do funcionário no ambiente de trabalho Mas vamos refletir sobre os seguintes cenários todos os trabalhadores apresentam o mesmo metabolismo Todos os funcionários se movimentam exatamente da mesma forma ao longo da jornada ou seja todos os trabalhadores ficam sentados ou caminham no local de trabalho exatamente pelo mesmo tempo Exemplo de aplicação Continue seguindo o raciocínio e reflita sobre a pergunta se para a mesma quantidade de substância química presente no ar no ambiente de trabalho há um trabalhador que se movimenta bastante e outro que fica mais sentado realizando outra atividade sendo que se expõem à mesma atmosfera de trabalho ambos apresentam o mesmo perfil de exposição 230 Unidade II Quando a pessoa se movimenta ocorre alteração da frequência cardíaca a ventilação pulmonar aumenta e consequentemente ocorre aumento no volume de ar que a pessoa inala Se há aumento no volume de ar significa que há mais exposição à substância química presente na atmosfera de trabalho em comparação com um funcionário que fica mais tempo sentado 513 Monitorização biológica Como saber se ainda que a quantidade da substância química presente no ar esteja dentro dos limites preconizados pela legislação o trabalhador apresenta maior exposição com consequente elevação do risco de intoxicação É dentro desse contexto que se utiliza da monitorização biológica Você já sabe que monitorar significa medir algo e comparar esse resultado com uma referência apropriada No caso da monitorização biológica medese a substância química presente no organismo do trabalhador É uma forma de garantir que efetivamente o trabalhador está sendo monitorado e que após anos de trabalho não haverá lesão a esse organismo por conta da exposição ocupacional Assim caso o organismo se exponha ao benzeno tolueno ou xileno são essas as substâncias químicas que devem ser identificadas e quantificadas no organismo sendo depois comparadas com uma referência para saber se o trabalhador apresenta risco de intoxicação Como vimos anteriormente muitas substâncias às quais o organismo se expõe são rapidamente biotransformadas e consequentemente caso as procuremos no organismo não mais as encontraremos Dessa forma um artifício utilizado para saber se o organismo se expôs ao xenobiótico é determinar a substância química inalterada produtos de biotransformação ou alterações bioquímicas precoces em diferentes matrizes biológicas É por esse motivo que você dedicou grande parte de seu tempo estudando os mecanismos de biotransformação de um toxicante nos princípios da toxicologia para que você tenha condição de compreender melhor como se aplicam aqueles conceitos teóricos aprendidos anteriormente na prática Observe que até agora não lhe foi exposto o conceito de monitorização biológica Primeiro trouxemos conceitos fundamentais desse tópico e os contextualizamos Agora vamos lhe trazer à luz esse conceito Monitorização biológica MB é a medida de uma substância química inalterada produto de biotransformação ou alteração bioquímica precoce presente no sangue urina suor saliva ar exalado ou outra matriz biológica capaz de estimar o risco de intoxicação quando se comparam seus resultados com uma referência apropriada OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 Agora fica muito mais fácil a compreensão desse conceito você sabe o que é uma substância química inalterada um produto de biotransformação e em poucos instantes iremos apresentar o que é uma alteração bioquímica precoce Você sabe que eles podem estar presentes em diferentes matrizes biológicas sangue urina suor entre outros e que quando são quantificados no organismo podem ser comparados com uma referência apropriada Mas faltam ainda dois importantes conceitos bioindicador e referência apropriada 231 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Indicador biológico de exposição Bioindicador indicador biológico de exposição IBE ou em inglês biological exposure limit BEI é toda substância química inalterada produto de biotransformação ou alteração bioquímica precoce encontrada em diferentes matrizes biológicas como sangue urina suor saliva ar exalado ou outras matrizes que seja capaz de avaliar a exposição e o risco de intoxicação quando se comparam seus resultados com uma referência apropriada Observação Observe que o conceito de monitorização biológica e bioindicador são bastante próximos mas não são iguais Referência apropriada Você se recorda de que o Brasil compila dados da monitorização ambiental da ACGIH Saiba que nosso país faz o mesmo para a monitorização biológica A legislação brasileira que versa sobre a monitorização biológica é a Norma Regulamentadora n 7 do Ministério do Trabalho de 1978 NR7MT que determina que para promover e preservar a saúde dos trabalhadores toda empresa ou instituição ao admitir funcionários deve implementar e elaborar o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional PCMSO A NR71978 nos traz conceitos relevantes como valor de referência VR índice biológico máximo permitido IBMP e imediatly dangerous to life and health IDLH BRASIL 2018b O VR é o maior índice de um bioindicador para um organismo não exposto ocupacionalmente Por exemplo se você não se expõe ao benzeno no seu ambiente de trabalho ou seja se entre outras ocupações você não trabalha como frentista ou em refinaria de petróleo existe um valor máximo do biondindicador presente no seu organismo que estima a exposição ao benzeno como o ácido sfenilmercaptúrico SPMA ou o ácido transtransmucônico TTMA que é o VR OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 Caso você trabalhe em uma refinaria de petróleo ou é frentista em um posto de combustível você será monitorado pelo IBMP que é a máxima quantidade de um bioindicador presente no organismo do trabalhador em que se acredita que a maioria dos trabalhadores não apresente risco de intoxicação BUSCHINELLI 2014 5131 Tipos de bioindicadores Há três diferentes tipos de bioindicadores de exposição ou dose interna de efeito e de suscetibilidade 51311 Bioindicador de exposição ou de dose interna Quando o trabalhador se expõe a uma substância química a identificação dessa substância no organismo reflete a extensão da absorção da substância ou seja a substância química agora está no interior do organismo do trabalhador por isso se utiliza o termo dose interna AMORIM 2003 232 Unidade II Ao ser absorvida nem toda a porção da substância que agora está no organismo do trabalhador atingirá o órgãoalvo É possível observar na figura a seguir que o afunilamento dessa pirâmide invertida significa que para toda a substância a que o organismo se expõe apenas uma menor parte tende a atingir o órgãoalvo Mediação da dose interna Quantidade absorvida Quantidade alcança tecido Quantidade alcança célula Quantidade alcança macromolécula Quantidade alcança sítio crítico Dose biologicamente efetiva Ligação com efeitos Relação com exposição Exposição externa Figura 118 Representação da intensidade de absorção de uma substância e quantidade do xenobiótico que atinge órgãosalvo Alguma vez você já entrou em algum local e sentiu aquele cheiro forte de tinta Alguns inclusive podem apresentar intensa cefaleia ao acessar um local cujas paredes tenham sido pintadas recentemente Esse cheiro forte existe pelas várias substâncias presentes na tinta de parede inclusive o tolueno Para saber por exemplo se um trabalhador de uma fábrica de tintas de parede apresenta risco de intoxicação pela exposição ao tolueno substância com meia vida biológica curta determinase a presença do ácido hipúrico urinário Qual é o melhor momento para se coletar a urina do trabalhador para verificar o nível de exposição ao tolueno Pela manhã Nesse caso a coleta da urina coletada deve ser realizada no final da jornada Existe uma correlação direta entre a exposição ao tolueno e seu produto de biotransformação desde que a coleta da amostra biológica ocorra no final da jornada Caso a coleta da urina seja realizada no período da manhã por exemplo que é o que a maior parte das pessoas imagina não haverá a correlação entre a exposição da substância e o bioindicador de dose interna que é o ácido hipúrico Assim o momento da coleta é importante para que não haja erros 233 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS préanalíticos É por isso que fazse necessário conhecer a toxicocinética de cada uma das substâncias químicas a que o trabalhador se expõe A amostragem deve ser realizada no último dia da jornada semanal para a exposição ao nhexano tricloretileno ou outras substâncias químicas de meia vida prolongada que seja de alguns dias por exemplo Essa coleta apresentará uma adequada correlação entre a exposição e a absorção associadas aos últimos dias de trabalho Você poderia questionar e se a substância química à qual o trabalhador se expõe tiver uma meiavida biológica muito elevada isso afeta o momento da coleta da amostra biológica Desde que tenha havido um tempo de exposição representativo o momento da coleta da amostra biológica não é limitante É o caso do cádmio e chumbo BRASIL 2018b Para que haja a monitorização biológica do cádmio na urina o trabalhador deve ter sido exposto ao metal por ao menos seis meses BUSCHINELLI 2014 51312 Bioindicador de efeito O bioindicador de efeito está relacionado aos efeitos precoces que ocorrem no organismo do trabalhador após a exposição ao xenobiótico e a estratégia é avaliar esses efeitos no organismo na avaliação de risco do trabalhador OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 Se está havendo efeito também não está havendo dano ao organismo do trabalhador Não necessariamente Há as alterações bioquímicas precoces Vamos compreender melhor esses conceitos O termo alteração bioquímica precoce está associado a toda alteração bioquímica que ocorre no organismo causado por uma substância química mas que seja reversível e ao mesmo tempo possa auxiliar na prevenção da intoxicação Vamos dar alguns exemplos clássicos de alteração bioquímica precoce para que você compreenda melhor e possamos complementar esse conceito Comecemos pelo monóxido de carbono Essa substância é produto da queima incompleta da matéria orgânica Assim quando há casos de incêndio ou queima de combustíveis fósseis ou do cigarro o organismo se expõe ao monóxido de carbono Gostaríamos que você continuasse interagindo e que se submetesse a seguinte reflexão você acha que tem monóxido de carbono no seu sangue neste momento A resposta é sim Mais uma reflexão você está intoxicado pela quantidade de monóxido de carbono presente em seu sangue A resposta é não 234 Unidade II Lembrete Toda substância química é potencialmente tóxica ao organismo humano e de animais dependendo das condições de exposição Pequenos teores de carboxihemoglobinemia HbCO no sangue não causam danos ao organismo humano Quando o organismo se expõe ao monóxido de carbono essa substância ocupa o sítio de ligação da hemoglobina que deveria se ligar ao oxigênio Assim há uma alteração bioquímica uma vez que bioquimicamente a hemoglobina deveria estar ligada ao oxigênio e não ao monóxido de carbono Ao mesmo tempo quando os teores de carboxihemoglobina HbCO aumentam ainda que não haja intoxicação sinaliza que está havendo o aumento da exposição do organismo a esse gás ou seja inicialmente não há dano no organismo mas indica que caso a exposição aumente pode haver intoxicação Para você ter dimensão apenas após 10 de carboxihemoglobinemia é que o organismo apresenta o primeiro sintoma de intoxicação que é uma ligeira cefaleia Valores inferiores a 10 de carboxihemoglobinemia são assintomáticos Entretanto valores de 35 de HbCO ainda que não causem intoxicação indicam que o trabalhador está exposto ao gás acima do limite máximo permitido no ambiente de trabalho A HbCO é uma substância química inalterada ou produto de biotransformação Nenhuma delas é a resposta É uma alteração bioquímica precoce Sabe por quê Porque não é uma substância química inalterada como chumbo no sangue ou cocaína no cabelo e nem produto de biotransformação como o TTMA que é um dos bioindicadores de exposição ao benzeno Entretanto o CO está interagindo com a hemoglobina impedindo a ligação do oxigênio Além disso é capaz de prever a intoxicação medese o teor de HbCO e comparase com uma referência e é reversível ou seja se o trabalhador apresenta níveis de HbCO de 12 e uma ligeira cefaleia ao afastar o trabalhador da exposição os níveis de HbCO tendem a baixar e a cefaleia tende a desaparecer Ficou mais clara a diferença entre substância química inalterada produto de biotransformação e alteração bioquímica precoce Em função da importância das alterações bioquímicas precoces são necessários mais alguns exemplos clássicos Metemoglobina Vamos compreender melhor o que é a metemoglobina MeHb e quais são os principais sistemas redutores em humanos 235 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Continuamente o organismo humano é submetido ao estresse com consequente oxidação direta ou indireta da oxihemoglobina HbO2 à MeHb por oxidação do ferro ferroso Fe2 dos anéis pirrólicos do grupamento heme da hemoglobina a ferro férrico Fe3 gerando a MeHb A oxidação do ferro ferroso dos anéis pirrólicos da hemoglobina impede que o oxigênio se ligue aos eritrócitos e consequentemente se reduza o aporte de oxigênio aos tecidos distantes ou remotos Para se contrapor à oxidação da hemoglobina ou seja para reduzir a metemoglobina a oxihemoglobina o organismo humano possui sistemas redutores que irão reduzir o Fe3 da MeHb a Fe2 restaurando a capacidade de ligação e transporte de oxigênio pela hemácia Mas como ocorre essa reação de óxidoredução na hemoglobina Principais sistemas redutores Diaforase I a diaforase I também chamada de sistema NADHcitocromob5redutase é um sistema enzimático constituído pelo citocromo b5 citocromo b5redutase e o citocromo P450 Esse potente sistema enzimático capta elétrons derivados da glicólise NADH dependente Esse sistema é bem desenvolvido em adultos mas uma criança de até seis meses de vida não consegue sintetizar esse sistema redutor em sua plenitude Sendo assim as crianças são mais suscetíveis à intoxicação por agentes metemoglobinizantes Diaforase II a diaforase II também denominada de sistema MeHbredutase NADPHdependente ou DAPHflavina redutase é um sistema carreador de elétrons derivado da glicólise NADPHdependente O azul de metileno é uma substância exógena capaz de captar o elétron derivado da glicólise NADPHdependente e como tem notável afinidade com a MeHb transporta elétron a esse pigmento e a reduz à HbO2 Restaurase assim a capacidade da hemoglobina de se ligar e transportar oxigênio a tecidos remotos Agora que nos apropriamos dessas importantes informações temos condição de compreender que os agentes metemoglobinizantes são capazes de alterar o estado de oxidação da hemoglogina e impedir a transferência de oxigênio aos tecidos remotos Assim a MeHb é mais um exemplo de alteração bioquímica precoce e consequentemente um bioindicador de efeito OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 Ácido Δaminolevulínico Quando o organismo se expõe ao chumbo há algumas formas de monitorar esse trabalhador Uma delas é determinar a presença do ácido Δaminolevulínico na urina ΔALA U O chumbo pode interferir na síntese da heme na medula óssea por ser inibidor enzimático inibe a enzima ΔALA desidratase Quando isso ocorre há acúmulo do ΔALA no organismo que é excretado pela urina uma vez que o ΔALA não se transforma em porfobilinogênio Assim o ΔALA não é uma substância química inalterada nem produto de biotransformação mas uma alteração bioquímica precoce uma vez que está havendo uma inibição de enzima que atuaria 236 Unidade II sobre o ΔALA este se acumula é excretado na urina e é utilizado para prever a intoxicação À medida que se identifica e quantifica o ΔALA na urina comparase esse resultado com a literatura adequada e estimase o risco de intoxicação Ainda que eventualmente possa ter havido alguma alteração no organismo por conta da exposição ao chumbo como a anemia microcítica hipocrômica quando se retira o trabalhador do ambiente de trabalho e consequentemente deixa de haver a exposição ao chumbo o quadro de anemia tende a desaparecer Assim o ΔALA U é um bioindicador de efeito Metalotioneína Outro clássico exemplo de alteração bioquímica precoce é a presença da metalotioneína na urina Quando o organismo se expõe a metais como o cádmio para se proteger o organismo produz maior quantidade de uma enzima de baixo peso molecular denominada de metalotioneína Essa proteína se liga a metais como o cádmio forma um complexo hidrossolúvel e excreta o metal impedindo que haja a manifestação de danos renais uma vez que o cádmio é nefrotóxico Assim quando se identifica que há a presença de metalotioneína na urina significa que o organismo está se expondo a metais É mais um exemplo de alteração bioquímica precoce e consequentemente de bioindicador de efeito Acetilcolinesterase AChE Por fim a acetilcolinesterase Quando o organismo se expõe a substâncias químicas inibidoras da acetilcolinesterase como os praguicidas organofosforados essa enzima é inibida e consequentemente não consegue hidrolisar a acetilcolina induzindo ao excesso de estímulo colinérgico no organismo Atentese que a inibição da acetilcolinesterase não é uma substância química inalterada nem um produto de biotransformação mas sim uma alteração bioquímica precoce uma vez que está havendo uma alteração bioquímica inibição enzimática que é precoce porque é possível identificar a intoxicação antes de danos irreversíveis e também é capaz de prever a intoxicação já que se pode comparar os resultados com uma referência apropriada e estimar o risco de intoxicação Nesse momento utilizamos os conceitos aprendidos anteriormente associados à alteração bioquímica precoce Um bioindicador de efeito é aquele em que ocorre uma alteração bioquímica no organismo do trabalhador Essa alteração deve ser precoce e reversível ou seja quando se identifica que há uma alteração bioquímica precoce significa que foi possível prever a intoxicação antes de que houvesse um dano irreversível ao trabalhador O trabalhador deve ser submetido a uma avaliação médica pelo médico do trabalho com possível afastamento de sua atividade profissional e realizar tratamento médico caso seja constatada a correlação entre efeitos tóxicos e os níveis dos indicadores biológicos de exposição de dose interna ou de efeito ou seja caso haja significado clínico 237 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Você sabia que fatores ambientais ou até mesmo o alimento pode interferir nos resultados analíticos envolvendo a toxicologia ocupacional Sim isso pode acontecer Observe a seguir O teor de benzeno e de seus bioindicadores no organismo do trabalhador podem estar associados à exposição dessa substância que também pode estar naturalmente presente na atmosfera pela liberação em um incêndio florestal de ocorrência natural ou antropogênica Durante a prática do tabagismo há a liberação de substâncias químicas e o fumante ativo ou passivo se expõe ao benzeno liberado pela fumaça do cigarro Dessa forma os hábitos do trabalhador bem como a região em que vive podem influenciar direta e significativamente nos resultados analíticos e clínicos pela exposição de substâncias químicas presentes no ambiente de trabalho Caso uma pessoa more próximo a uma rodovia por exemplo inalará monóxido de carbono ao longo de toda a noite de sono No dia seguinte os teores de carboxihemoglobinemia estarão associados à exposição ambiental referente ao meio ambiente quando a pessoa dormiu inalando elevados teores de monóxido de carbono presente no ar atmosférico e a ocupacional trabalha se expondo a essa mesma substância química Para você ter dimensão de como é complexa a monitorização biológica ocupacional alimentos como amora ameixa morango e até groselha podem interferir no resultado dessa monitorização Vamos evoluir no raciocínio para que você tenha elementos bioquímicos para compreender por que isso acontece Quando o organismo se expõe ao tolueno essa substância é biotransformada em ácido benzoico Quando o ácido benzoico sofre reação de síntese com a glicina formase o ácido hipúrico Esse é um dos motivos pelos quais o ácido hipúrico é o bioindicador de exposição ao tolueno Entretanto o ácido benzoico está presente naturalmente nos alimentos expostos anteriormente de forma que o morango por exemplo possui ácido benzoico Isso significa que o ácido benzoico presente no morango amora ameixa ou também na forma de benzoato de sódio como conservante de alimentos é conjugado com a glicina formando o ácido hipúrico veja a figura a seguir pela mesma via metabólica que o ácido benzoico proveniente do tolueno Ingestão de alimentos Biotransformação Tolueno Ácido benzoico Ácido hipúrico Glicina O NH2 CH3 O O O OH OH HO NH Figura 119 Via metabólica da formação do ácido hipúrico a partir do tolueno 238 Unidade II Assim como saber se o ácido hipúrico presente na urina do trabalhador da fábrica de tintas é proveniente do tolueno ou do morango que o trabalhador comeu no dia anterior É muito difícil chegar a essa conclusão Ficou mais clara a complexidade quando se estuda a determinação da exposição de um organismo a uma substância química Observação Você deve conhecer e memorizar a relação entre bioindicador com seu precursor e sua respectiva via metabólica Vamos a mais uma contextualização O bioindicador de exposição ao xileno é o ácido metilhipúrico Entretanto diferentemente do tolueno outras substâncias químicas não interferem na via metabólica desse xenobiótico de forma a aumentar a quantidade de bioindicador pela exposição que não seja laboral Observe a via metabólica a seguir associada ao xileno Ingestão de alimentos Biotransformação Glicina Ácido metilbenzoico Metaxileno Ácido metilhipúrico O O O O NH2 CH3 H3C H3C H3C HO OH NH OH Figura 120 Esquema da formação do ácido metilhipúrico a partir do metaxileno Quando o trabalhador se expõe ao xileno não há uma segunda substância química presente na água ou alimento que se ingira ou que esteja no ar que o trabalhador respira que poderá interferir na análise da substância Dessa forma não há a necessidade de haver VR para o xileno e há apenas o IBMP AMORIM 2003 51313 Bioindicador de suscetibilidade Vimos anteriormente que a monitorização do trabalhador tem como objetivo prevenir a intoxicação da maioria dos trabalhadores Mas por que mesmo a maioria dos trabalhadores e não todos os trabalhadores Por causa da suscetibilidade de cada um deles Para as mesmas condições de exposição organismos diferentes respondem diferentemente E por que respondem diferentemente A condição genética é uma das possibilidades cada qual tem a sua 239 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Observação A condição genética é apenas uma condição que pode fazer com que diferentes pessoas respondam de forma distinta à mesma exposição Assim os biomarcadores de suscetibilidade podem indicar que aquele organismo poderá expressar uma resposta diferente dos demais pela sua condição genética Observação Esses bioindicadores podem refletir além dos fatores genéticos também uma condição adquirida O trabalhador que apresente por exemplo alteração na GST pode ter maior risco de intoxicação pela exposição aos compostos alifáticos halogenados e ao óxido de etileno uma vez que pode haver prejuízo da biotransformação de seus intermediários epóxidos Os que apresentam alteração na paroxonase podem ter aumentada a toxicidade dos organofosforados pela redução da atividade da acetilcolinesterase e a deficiência da glicose 6Pdesidrogenase reduz G6PD a resistência para o estresse oxidativo de compostos nitroaromáticos 514 Programa de controle médico de saúde ocupacional PCMSO O médico do trabalho deve ficar atento aos valores da monitorização biológica e realizar a vigilância da saúde Os critérios empreendidos para a interpretação dos resultados dos exames médicos e laboratoriais e o procedimento adotado perante os resultados dos exames devem estar expressos com clareza no PCMSO Para deixar os conceitos aqui apresentados mais claros serão apresentados exemplos de como elaborar um PCMSO combinando com a vigilância à saúde e a monitorização biológica de exposição BUSCHINELLI 2014 A Norma Regulamentadora n 9 do Ministério do Trabalho de 1978 está associada ao Programa de Prevenção de Riscos Ambientais PPRA que determina que para que se preserve a integridade e saúde dos trabalhadores instituições e empregadores realizem o PPRA Por meio do reconhecimento e controle dos riscos ambientais bem como de sua antecipação devese prevenir o aparecimento de doenças e preservar não apenas a saúde mas também a integridade de seus funcionários por meio do PPRA que deve estar vinculado com o PCMSO previsto na NR7 O modelo de análise utilizado para a medição e coleta de amostras deve levar em consideração quanto tempo será utilizado para a realização da medição verificar se o escopo da análise é avaliar o 240 Unidade II perfil de exposição após a atividades realizadas pelos funcionários ou apenas avaliar a característica da exposição durante a jornada e também levar em consideração qual é o volume de ar que o equipamento analítico é capaz de coletar BRASIL 2018b 515 Vantagens e desvantangens da monitorização biológica A monitorização biológica apresenta vantagens e desvantagens em relação à ambiental e é complementar a esta Uma característica fundamental da monitorização biológica é que quando se identifica e quantifica bioindicadores a estimativa do risco de intoxicação é mais adequada uma vez que há uma relação mais direta entre a relação doseefeito ou seja entre a quantidade do xenobiótico presente no organismo e seus efeitos nocivos causados à saúde do trabalhador Outra situação envolvida é que a monitorização ambiental avalia exclusivamente a exposição pelo trato respiratório Entretanto pode haver exposição ocupacional por outras vias como pelo trato gastrintestinal e pela via dérmica Há situações em que o funcionário se expõe a um xenobiótico pelo hábito de levar circunstancialmente a mão à boca em alguns momentos da jornada É o típico caso de exposição pelo chumbo que na monitorização ambiental pode apresentar baixos teores mas quando se realiza a monitorização biológica identificase sua extensa exposição Até a diferença de higiene pessoal entre os funcionários da empresa pode levar a resultados significativamente distintos entre a monitorização ambiental e a biológica 52 Toxicologia de medicamentos 521 Intoxicações por medicamentos Discutiremos neste tópico as intoxicações induzidas pelo uso de medicamentos suas causas grupos farmacológicos e manejo clínico bem como os variados tratamentos empregados nas intoxicações medicamentosas Algumas das informações iniciais você já conhece especificamente aquelas relacionadas a alguns termos e alguns conceitos introdutórios mas ainda assim faremos uma breve e direta revisão sobre algumas ocorrências Aspectos gerais das intoxicações medicamentosas Segundo o legado deixado por Paracelsus 14931541 toda substância pode ser classificada como um veneno o que irá diferenciar essa classificação é a dose Além desse clássico e importante conceito deixado por aquele que é considerado o pai da farmacologia e da toxicologia acrescemos que as condições de exposição também demonstram papel importante nesse contexto além da dose administrada 241 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Saiba mais Para conhecer um pouco mais sobre as ideias de Paracelsus ou Paracelso você pode consultar o artigo a seguir Ainda hoje suas ideias são consideradas válidas tendo sido muito importantes para a evolução da toxicologia CORREA A D SIQUEIRABATISTA R QUINTAS L E Similia Similibus Curentur notação histórica da medicina homeopática Revista da Associação Médica Brasileira São Paulo v 43 n 4 p 347351 1997 Disponivel em httpwwwscielobrpdframbv43n42026pdf Acesso em 1º mar 2020 Face a essa constatação você concluiu que a capacidade que uma substância apresenta em causar toxicidade é definida pelo perigo que cada toxicante apresenta de forma inata Esse perigo é definido como toxicidade intrínseca e pode ser aferido por valores da DL50 que representa a dose necessária para matar metade de uma população Além desse perigo que é algo inerente ao agente tóxico a toxicidade relativa também estabelece uma importância preponderante na avaliação dos compostos Essa toxicidade é determinada pelo agente tóxico especificamente tipo pela dose que foi utilizada pela susceptibilidade individual e pelas condições de exposição tempo e frequência principalmente Para recordarmos o que estudamos você deve estar lembrado de que a intoxicação é representada por um conjunto de sinais e sintomas observáveis a partir da interação de um agente tóxico com um sistema orgânico através de efeitos nocivos que ocorrem em decorrência de um desequilíbrio orgânico e são manifestados através de sinais e sintomas Esse processo depende da interação do agente tóxico ou toxicante com a parte biológica através de uma interação dele com um alvo biológico que execute mecanismos de reparo ainda que estes não sejam suficientes para sanar as alterações na homeostasia Normalmente esses processos quando exacerbados originam doenças ou até mesmo situações fatais irreversíveis demonstradas através de sinais e sintomas dependentes de dose e tempo de exposição Dividimos a intoxicação em quatro fases distintas a saber Fase de exposição está ligada ao contato do agente tóxico com a parte orgânica representando a sua disponibilidade química e condições de introdução no modelo biológico Essa exposição pode ocorrer por diferentes vias sendo as mais comuns a oral intoxicações por medicamentos venenos agrícolas etc a por via dérmica contato com praguicidas na lavoura e a pulmonar através do ar inspirado névoas de praguicidas agrícolas Fase toxicocinética consiste no movimento do AT agente tóxico no organismo compreendendo processos de absorção distribuição armazenamento e eliminação biotransformação e excreção Todos esses processos envolvem reações entre o agente tóxico e o organismo tornando o AT disponível biologicamente 242 Unidade II Fase toxicodinâmica corresponde aos efeitos propriamente ditos do AT pela interação com os alvos biológicos Isso porque na maioria das vezes não se trata de uma ação localizada do agente mas sim disseminada Observação Na fase toxicodinâmica os efeitos ocorrentes não dependem somente do agente tóxico em si mas também dos seus produtos de biotransformação metabolismo que algumas vezes são mais tóxicos do que os próprios agentes tóxicos Exemplo quando o paracetamol é utilizado em doses acima das terapêuticas ele passa por um processo de biotransformação hepática e se transforma no metabólito Nacetilpbenzoquinoneimina que é a substância hepatotóxica Fase clínica nesta fase temse as manifestações clínicas dos efeitos pela exposição a um agente tóxico É a aparição de sinais e sintomas que caracterizam o efeito tóxico propriamente dito e evidenciam a presença do fenômeno da intoxicação Na toxicologia de medicamentos estudamse as reações adversas provocadas por doses terapêuticas dos medicamentos bem como as intoxicações resultantes de doses excessivas seja por uso inadequado ou acidental ou ainda intencional Entre os variados tipos de efeitos provocados pela interação entre o medicamento e o organismo temos Efeito secundário pode surgir em alguns pacientes pelo uso de medicamentos ainda que em doses terapêuticas Exemplo diarreias induzidas por uso de antimicrobianos pela destruição de flora normal intestinal Efeito colateral são efeitos previsíveis pois estão ligados ao próprio mecanismo de ação da substância Exemplo sono em pacientes que utilizam alguns antihistamínicos Idiossincrasia são efeitos que dependem da forma como cada indivíduo responde quando mantém contato com uma substância Essas diferentes formas de efeitos demonstráveis normalmente são relacionadas a situações genéticas eou enzimáticas particularmente individualizadas e que independem da dose administrada Exemplo deficiência da aldeído desidrogenase enzima que metaboliza o álcool em orientais predispondo esses indivíduos a uma maior embriaguez quando se expõem a essa substância Alergia as alergias podem ser caracterizadas como reações idiossincrásicas pois não dependem da dose mas sim de uma resposta individualizada Elas passam a ser estudadas pela imunotoxicologia Exemplos crises alérgicas que muitos pacientes demonstram quando se expõem a antimicrobianos como penicilinas e sulfas 243 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Tolerância é a condição em que se necessita de doses maiores para se obterem os mesmos efeitos iniciais do medicamento Normalmente o aumento das doses não se faz suficiente para a resolução da situação exigindose uma substituição Essa tolerância pode ocorrer por dessensibilização de receptores ou ainda por indução enzimática Exemplos pacientes que utilizam morfina um analgésico opioide e que no mesmo período do dia exigem doses maiores para o efeito analgésico Observação Veja que o processo de tolerância poderá ocorrer em tratamentos medicamentosos de rotina e não só ela está ligada ao contexto toxicológico Dependência é ocorrente quando o medicamento já assume uma postura de uso contínuo pelos benefícios que produz e pelas sensações prazerosas que possa causar Exemplo a agitação provocada pelo uso de anfetaminas anorexígenos que são estimulantes do SNC sistema nervoso central e ativam o SNA sistema nervoso autônomo simpático Interações resultam da utilização simultânea de dois ou mais medicamentos podendo haver redução dos efeitos ou ainda uma potenciação deles levando a um quadro variável de intoxicação ou ineficácia de um dos medicamentos empregados Agora que fizemos uma revisão de conceitos previamente estudados e sedimentados falaremos sobre intoxicações com medicamentos Faremos uma introdução e depois conversaremos sobre alguns medicamentos que estão relacionados a situações de intoxicações 5211 Introdução Você sabe muito bem que os efeitos dos medicamentos já são conhecidos desde os tempos remotos quando nossos antepassados já buscavam a cura de muitas doenças através do uso de substâncias naturais Observação Os cães quando se sentem com desconforto gástrico ingerem grama para sanar esse problema Ela atua como irritante do estômago fazendoo vomitar a comida indesejada ou o veneno ingerido Segundo a Anvisa 2020b medicamento é definido como um produto farmacêutico tecnicamente obtido ou elaborado com finalidade profilática curativa paliativa ou para fins de diagnóstico É uma forma farmacêutica terminada que contém o fármaco geralmente em associação com adjuvantes farmacotécnicos ou seja com substâncias que irão se somar aos efeitos do fármaco ali presente Ainda que esses medicamentos sejam utilizáveis pretendendo efeitos benéficos quando mal empregados e indevidamente utilizados causam efeitos que podem até chegar à fatalidade A frequência de exposição a uma substância medicamentosa está relacionada à sua disponibilidade no mercado à 244 Unidade II marca comercial e ao acesso ao produto às atitudes do médico que os prescreveu ao farmacêutico que o dispensa assim como a quem regulamenta a sua produção distribuição e utilização Segundo Oga Camargo e Batistuzzo 2003 o padrão de consumo de medicamentos no Brasil é caracterizado pela elevação do uso como substâncias empregadas somente para curar sintomas ou ainda por automedicação além é claro do trabalho brilhante feito pelo marketing das indústrias farmacêuticas que induz ao uso de muitas substâncias mesmo aquelas prescritas por um médico Tal situação contribui acentuadamente com reações adversas causadas por medicamentos No Brasil embora tenhamos normas para o uso racional de medicamentos não há um sistema de registro das ocorrências tóxicas pela exposição a medicamentos devidamente implantado operante e atualizado Existem trabalhos que são feitos de forma isolada e regionalizada que permitem conclusões que seguem essas regiões e não permitem uma leitura global e dinâmica das ocorrências de intoxicação no país de forma confiável e oficial O Sistema Nacional de Informação TóxicoFarmacológica SinitoxMSFiocruz divulga estatísticas anuais referentes a casos de intoxicação registrados pelos Centros de Assistência e Informação Toxicológica Ceatox a partir de informações fornecidas espontaneamente sem padronização de conceitos formas de registro agentes tóxicos e outros critérios Quanto às reações adversas há algumas experiências locais de farmacovigilância CASTRO 2000 Os registros dos Centros de Assistência Toxicológica são sentinelas captadores de problemas sociais alguns passíveis de atuação da vigilância sanitária Se o medicamento está sendo utilizado além de sua finalidade terapêutica de forma abusiva ou indevida a sociedade e o sistema de saúde devem enxergar esses casos e encontrar formas adequadas para enfrentálos GANDOLFI ANDRADE 2006 Como já vimos o Sinitox criado em 1980 pelo Ministério da Saúde com sede na Fundação Oswaldo Cruz Fiocruz tem como principal atividade coordenar o processo de coleta compilação análise e divulgação dos casos de intoxicação humana registrados no país pela Rede Nacional de Centros de Controle de Intoxicações comumente denominada Rede Sinitox BORTOLETTO BOCHNER 1999 Esses mesmos autores em um trabalho realizado sobre o impacto dos medicamentos nas intoxicações humanas no Brasil concluíram que o medicamento é o principal agente tóxico que causa intoxicação em seres humanos no Brasil ocupando o primeiro lugar nas estatísticas do Sinitox desde 1994 Os benzodiazepínicos antigripais antidepressivos e antiinflamatórios são as classes de medicamentos que mais causam intoxicações em nosso país 44 foram classificadas como tentativas de suicídio e 40 como acidentes sendo que as crianças menores de cinco anos 33 e adultos de 20 a 29 anos 19 constituíram as faixas etárias mais acometidas pelas intoxicações por medicamentos Veja na tabela a seguir os principais agentes tóxicos em um levantamento mais atualizado o que nos mostra a mesma conclusão sobre os medicamentos ou seja eles representam o maior número de casos de intoxicações agora envolvendo não somente o homem mas também animais e solicitações de informações que os centros recebem sobre eles 245 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Tabela 7 Casos totais de intoxicações humanas de animais e de solicitações de informação de 10 dos principais agentes tóxicos Agente causador Número total de intoxicações Percentual Medicamentos 21402 2679 Animais peçonhentosescorpiões 11943 1495 Outros animais peçonhentosvenenosos 6439 806 Animais não peçonhentos 5402 676 Animais peçonhentosaranhas 6220 779 Domissanitários 4761 596 Animais peçonhentosserpentes 3290 412 Produtos químicos industriais 2992 339 Drogas de abuso 2777 348 AgrotóxicosUso agrícola 2706 339 Adaptada de Sinitox sda Conforme informado no site Milenar USO 2018 para o mesmo período um levantamento conduzido pela Unicamp no Centro de Informação e Assistência Toxicológica Ciatox concluiu que o uso de medicamentos responde pela maioria dos casos de intoxicação 3362 das ocorrências mais que o dobro por exemplo dos atendimentos por picadas de animais peçonhentos e consumo de produtos químicos veja a figura a seguir Outros 2386 Medicamentos 3362 Produtos domissanitários 1408 Animais peçonhentos venenosos 1622 Produtos químicos residenciais ou industriais 613 Animais não peçonhentos não venenosos 609 Figura 121 Causas principais de intoxicações 5212 Grupos farmacológicos envolvidos nas intoxicações medicamentosas Embora as variadas pesquisas executadas acerca do uso de medicamentos utilizados e as classes farmacológicas envolvidas nos processos tóxicos tenham sido divulgadas não há uma pesquisa que seja incisiva e atualizada e ainda que sejam efetuadas elas acabam por refletir dados que são regionais o que pode não traduzir a real ocorrência de forma generalizada 246 Unidade II Em tempo alguns medicamentos e classes se destacam na incidência de intoxicações com medicamento como os neuropsicofármacos clonazepam carbamazepina amitriptilina os analgésicos e Aines ácido acetilsalicÌlico diclofenaco dipirona paracetamol os antialérgicos e antigripais os broncodilatadores salbutamol fenoterol e os cardiovasculares captopril propranolol Ainda que as pesquisas e trabalhos sobre intoxicação por medicamentos sejam regionalizadas e até específicas em detrimento a isso os psicofármacos como os benzodiazepínicos diazepam clonazepam bromazepam que são substâncias largamente usadas em todo o mundo e no Brasil assumem uma posição bem considerável nos casos de intoxicação induzidos por medicamentos compreendendo em quase todos os estudos metade das ocorrências Além dessa outra metade é dirigida ao tratamento de problemas diversos músculoesqueléticos antiinflamatórios e analgésicos Essas substâncias ainda que prescritas pelo médico quando de uma forma não racional passam a oferecer uma presença da substância em ambiente doméstico maior consequentemente aumentando a incidência de intoxicação por eles Estudaremos nos tópicos a seguir alguns dos medicamentos envolvidos em ocorrências de intoxicações Você poderá notar que as classes desses fármacos são muito distintas por isso tentamos agrupálas por sistema tentando assim facilitar a sua compreensão o que auxiliará muito no processo de aprendizagem 52121 Psicofármacos Veremos neste tópico os medicamentos que atuam sobre o SNC ou seja os fármacos que atuam sobre a psique Antidepressivos ISRS inibidores seletivos de recaptação de serotonina Esses medicamentos são bem empregados no tratamento da depressão de outros transtornos psiquiátricos tais como síndrome do pânico fobias e transtorno obsessivocompulsivo e de transtornos alimentares incluindo anorexia bulimia e obesidade Veja que as aplicações clínicas desses medicamentos apresentam uma abrangência vasta de situações inclusive para outras não diretamente relacionadas a doenças psiquiátricas Observação Saiba que muitos fármacos que atuam sobre o SNC podem ser empregados para torcicolos e crises de enxaqueca Estes antidepressivos inibem a recaptação de serotonina um neurotransmissor que melhora o humor no SNC sistema nervoso periférico e plaquetas estimulando os receptores serotoninérgicos Quando comparados aos antidepressivos tricíclicos são menos efetivos em bloquear a recaptação de noradrenalina e antagonizar receptores muscarínicos histaminérgicos e adrenérgicos Podem causar depressão do SNC e síndrome serotoninérgica quando usados em conjunto ou com outras substâncias que aumentam o 247 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS nível de serotonina como outros antidepressivos inibidores da monoaminoxidase iMAO tricíclicos antidepressivos duais e atípicos anfetaminas sibutramina ecstasy cocaína crack LSD e opioides Geralmente essas substâncias apresentam alto índice terapêutico Doses acima de 10 vezes a dose terapêutica são mais toleradas se comparadas aos antidepressivos tricíclicos Porém a associação com outros medicamentos ou drogas de abuso é frequente e aumenta a probabilidade de intoxicação grave Lembrete Você já estudou e deve se recordar de que substâncias que possuem alto índice terapêutico são relativamente mais seguras que aquelas que possuem um índice baixo Acentuemos essa recordação Isso ocorre porque a distância entre a dose terapêutica e a tóxica é longa o que não quer dizer que essas substâncias não possam ofertar um risco N N N H NH HN CI CI CF3 F3C NH2 d e c b a N O O O F F O O O O Figura 122 Estrutura química dos principais ISRS a fluoxetina b paroxetina c sertralina d fluvoxamina e citalopram Nível terapêutico de sinalização ATC ou ISRS Legenda ATC antidepressivos tricíclicos Figura 123 Mecanismo de ação dos ISRS a antes do tratamento b com tratamento agudo dos fármacos c com tratamento crônico com os fármacos 248 Unidade II Observação Veja que esse mecanismo descrito na figura anterior é o ocorrente em situações toxicológicas Observe que ocorre um aumento considerável nos níveis de serotonina na fenda sináptica A seguir algumas informações farmacocinéticas acerca dessa categoria de fármacos São substâncias bem absorvidas e possuem alta biodisponibilidade e o pico de concentração plasmática ocorre em média em horas Possuem um alto Vd volume de distribuição e a ligação a proteína plasmática pode variar de 56 a 99 e meia vida biológica média de 24 horas exceto a fluoxetina que possui uma T½ vida biológica que pode variar de quatro a seis dias A biotransformação é hepática e dois dos fármacos fluoxetina e paroxetina são inibidores da enzima CYP2D6 implicando alterações nos efeitos de muitos outros fármacos Observação Você já conhece a importância do complexo citocromo P450 na biotransformação de fármacos e as implicações que uma indução ou inibição enzimáticas desse sistema podem oferecer a outros fármacos Sobre as manifestações clínicas as intoxicações podem ser leves a moderadas casos em que os pacientes apresentam ataxia falta de coordenação em movimentos e letargia profunda e prolongada inconsciência ou graves em que os pacientes podem apresentar bradicardia hipotensão depressão do SNC e coma Há também o risco de síndrome serotoninérgica quando a quantidade ingerida é alta ou ocorre ingestão em associação com outras substâncias que aumentam o nível de serotonina como outros antidepressivos iMAO e drogas de abuso Esta síndrome serotoninérgica caracterizase por uma tríade alterações do estado mental agitação ansiedade e confusão mental instabilidade autonômica taquicardia hipertensão sudorese hipertermia e midríase hiperatividade neuromuscular rigidez e tremores O que poderia então se fazer para tratamento de intoxicações por essa categoria Para adoção de medidas de tratamento das intoxicações a maioria dos casos de ingestão de ISRS não desenvolvem sintomas graves necessitando apenas de medidas de suporte básico de vida como desobstrução de vias aéreas administração de oxigênio monitorização de sinais vitais colheita de amostras biológicas para 249 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS posterior envio ao contexto laboratorial ou ainda descontaminação através de lavagem gástrica com uso de carvão ativado 1 gkg por VO via oral Observação Ainda não estudamos de forma detalhada os antídotos mas o carvão ativado representa um importante agente adsorvente que pode reduzir a absorção de várias substâncias Veja que para essa categoria de agente não há antídoto específico e não se recomendam medidas para eliminação Antidepressivos tricíclicos Esses fármacos são utilizados no tratamento da depressão maior insônia e síndromes dolorosas crônicas Os antidepressivos tricíclicos inibem a recaptação de neurotransmissores principalmente noradrenalina NA serotonina 5HT e em menor proporção dopamina DA As aminas terciárias são inibidores mais potentes da recaptação de serotonina clomipramina enquanto as secundárias atuam principalmente sobre a recaptação de noradrenalina desipramina nortriptilina Veja e compare que esses fármacos apresentam um mecanismo muito parecido com os anteriores discutidos aqui porém com um efeito maior sobre outros neurotransmissores como a NA em maior grau e a DA em menor grau São estruturalmente similares às fenotiazinas e têm ações em diversos receptores no organismo gerando antagonismo colinérgico bloqueio alfa adrenérgico inibição da recaptação da noradrenalina serotonina e dopamina bloqueio de canais de sódio e potássio e depressão respiratória e do sistema nervoso central SNC Saiba mais Leia mais sobre o assunto na página a seguir RODRIGUES S A Clorpromazina C17H19N2SCl PUBLISBQ Química Nova Interativa sd Disponível em httpqnintsbqorgbrnovoindex phphashmolecula264 Acesso em 28 nov 2020 250 Unidade II S N H Figura 124 Estrutura molecular da fenotiazina CH CH2 CH2 N R1 R2 Fármaco R1 R2 Amitriptilina CH3 CH3 Nortriptilina CH3 H Figura 125 Estrutura química dos antidepressivos tricíclicos amitriptilina e nortriptilina Note a semelhança entre os ATC e as fenotiazinas Na intoxicação os efeitos mais importantes são no SNC sedação e coma por atividade anticolinérgica e convulsões por provável inibição da recaptação de catecolaminas cerebrais e cardiovasculares taquicardia e hipertensão por ação anticolinérgica e inibição da recaptação de catecolaminas hipotensão pelo bloqueio alfaadrenérgico depressão miocárdica e distúrbios da condução cardíaca por bloqueio dos canais de sódio Da mesma forma que fizemos na categoria anterior seguem algumas informações rápidas sobre a farmacocinética desses compostos São absorvidos e o início dos efeitos ocorre após uma hora da exposição com pico de concentração plasmática entre duas e oito horas Possuem um Vd de 7 a 78 lkg e se ligam em proteínas plasmáticas 90 com T½ biológica variando entre sete e 58 horas A biotransformação é hepática e a eliminação ocorre pela via renal 70 e pela via fecal 30 Na intoxicação aguda leve podem ocorrer sonolência sedação taquicardia alucinações midríase e outros efeitos anticolinérgicos e em casos de intoxicação grave convulsões coma aumento do intervalo QRS no eletrocardiograma ECG arritmias ventriculares insuficiência respiratória e hipotensão Podem ocorrer arritmias graves levando à parada cardíaca e óbito mesmo em pacientes jovens 251 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Para um tratamento na intoxicação realizamse medidas de suporte já citadas anteriormente acrescidas de verificação e correção de distúrbios hidreletrolíticos relacionados a Na K e Ca2 devido ao aumento do risco de arritmias em que o paciente dever ser mantido em observação por 72 horas ou enquanto ainda apresentar alterações no ECG Não há antídoto para tratamento Benzodiazepínicos São medicamentos utilizados em transtornos ansiosos como anticonvulsivantes na síndrome de abstinência alcoólica nos estados hiperadrenérgicos conforme ocorre nas intoxicações por drogas de abuso como relaxantes musculares e como agentes sedativos em procedimentos Todos os benzodiazepínicos em uso clínico são capazes de promover a ligação de um importante neurotransmissor inibitório o ácido γaminobutírico GABA aos receptores de GABA do subtipo GABAA que existem como canais de cloreto formados por múltiplas subunidades e controlados por ligando intensificando desse modo as correntes iônicas induzidas pelo GABA através desses canais BRUNTON CHABNER KNOLLMANN 2012 Vamos falar um pouco sobre a farmacocinética Os benzodiazepínicos são rapidamente absorvidos após a administração por via oral Pela via parenteral a distribuição no organismo se efetua de forma semelhante à observada com fármacos muito lipossolúveis A penetração no tecido cerebral é muito rápida A administração intramuscular não é sugerida para a maioria dos benzodiazepínicos excetuando os hidrossolúveis uma vez que a absorção por essa via é muito irregular A biotransformação ocorre pelo CYP o que implica às vezes interações medicamentosas significativas e a eliminação é renal C C C N R1 R2 R3 R4 R2 R7 N B 1 5 4 a 3 2 A C Figura 126 Estrutura geral dos benzodiazepínicos Nas intoxicações leves e moderadas observamse sonolência sedação e fala arrastada Você sabia que essas substâncias são amplamente utilizadas como indutoras de anestesia em cirurgias Pois bem elas são muito empregadas para esse fim e até o momento no qual o paciente fica inconsciente ele apresenta essa fala pastosa e arrastada 252 Unidade II Nas intoxicações graves ocorrem coma com depressão respiratória hipotensão e hipotermia principalmente com o uso endovenoso ou em associação com outros depressores do SNC Depressão respiratória pode ocorrer em crianças mesmo com doses terapêuticas A interação entre um benzodiazepínico e álcool pode ser fatal pela depressão do SNC Isso ocorre em detrimento ao aumento do GABA deprimindo excessivamente o SNC e incorrendo em óbito dependendo das quantidades associadas das substâncias Nas intoxicações por benzodiazepínicos existe um antídoto para tratamento chamado flumazenil Lanexat O flumazenil ligase com alta afinidade a locais específicos sobre o receptor GABAA onde antagoniza competitivamente a ligação e os efeitos alostéricos dos benzodiazepínicos Ele é raramente utilizado pois as intoxicações isoladas por benzodiazepínicos geralmente não representam risco de vida Portanto o seu uso é reservado para situações envolvendo sedações iatrogênicas ou intoxicações graves com depressão respiratória Esse flumazenil é contraindicado nas ingestões concomitantes de substâncias que diminuem o limiar para convulsão como os antidepressivos tricíclicos e em usuários crônicos de benzodiazepínicos que podem desenvolver síndrome de abstinência caracterizada por tremores ansiedade disforia e em casos graves psicose e convulsões Dessa forma raramente indicase o uso de flumazenil em usuários crônicos de benzodiazepínicos 52122 Antiinflamatórios Aines antiinflamatórios não esteroidais A aspirina considerada o protótipo dos Aines foi há até pouco tempo um dos fármacos mais utilizados sem prescrição no tratamento da inflamação Atualmente outros Aines com ação terapêutica e segurança superior vêm substituindo o papel da aspirina À semelhança de outros grupos farmacológicos os Aines são divididos em várias classes químicas denominados seletivo e não seletivo para COX Em geral os Aines são representados por ácidos fracos exceto a nabumetona e com exceção da aspirina são inibidores reversíveis da COX sendo que a duração de ação inibitória depende de suas propriedades farmacocinéticas Nesse sentido os Aines podem ser divididos em fármacos de curta 6 h e longa duração 10 h Essa família imensa de fármacos apresenta uma correlação muito grande com várias situações de intoxicação envolvendo adultos e crianças pois não são fármacos submetidos a controle especial exceto com os Aines seletivos o que passa a contribuir enormemente com casos de episódios tóxicos Agora que conhecemos um pouco sobre a importância clínica desses medicamentos iremos conversar um pouco sobre as questões toxicológicas de uma forma geral A seguir descrevemos alguns efeitos tóxicos desse grupo Gastrintestinais esses efeitos são considerados os mais comuns nas terapias com Aines embora não seja ocorrente em todos os pacientes de forma absoluta Esses efeitos decorrem pela inibição 253 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS das PGs gástricas que têm uma função gastroprotetora Além disso como a maioria dos elementos são ácido fracos passam a oferecer um efeito lesivo direto na mucosa gástrica Porém esses efeitos podem e são observados mesmo quando se emprega um Aines por via parenteral Isso ocorrente em menor escala porém presente em algumas situações Existem relatos de incidência de 15 a 30 de gastrites úlceras gástricas em usuários regulares assumindo uma postura ainda superior em pacientes infectados por Helicobacter pylori naqueles que consomem álcool ou ainda no uso de glicocorticoides Todos os inibidores seletivos de COX2 são menos propensos a oferecerem riscos com relação a lesões gástricas HILALDANDAN BRUNTON 2015 Cardiovascular os inibidores seletivos de COX2 foram desenvolvidos para serem mais seguros com relação a danos gástricos induzidos por Aines porém experimentos clínicos induzidos com celecoxiba valdecoxiba suspenso e rofecoxiba suspenso relevam uma incidência de aumento na ocorrência de infarto agudo do miocárdio acidente vascular encefálico e trombose Eventos adversos na pressão arterial renal e renovascular associamse os Aines a eventos adversos renais e renovasculares o que passa a ter maiores evidências em pacientes com cirrose hepática doença renal crônica e hipovolemia Os Aines estão associados à perda da inibição induzida por prostaglandinas na reabsorção de Cl e na ação do hormônio antidiurético ocasionando retenção de sal e água Estudos epidemiológicos sugerem que as complicações hipertensivas ocorrem mais comumente em pacientes tratados com coxibes que nos tratados com Aines não seletivos Observação O ácido acetilsalicílico AAS é protocolo no tratamento das síndromes coronarianas agudas compondo o sistema MonabC com papel antiagregante plaquetário Veja que essa aplicação é terapêutica e difere completamente das atividades dos coxibes anteriormente citados Nefropatia por analgésicos representa um estado de insuficiência renal lentamente progressiva com redução na capacidade de concentração no túbulo renal Temse como fatores de risco a associação de Aines de forma crônica em altas doses e nas situações de infecções do trato urinário Observação Antes da utilização de um Aines a um paciente com problemas renais devese certificar que os benefícios sejam realmente superiores aos riscos Hipersensibilidade os sintomas ligados à hipersensibilidade com Aines variam desde uma rinite até um edema de laringe A intolerância ao ácido acetilsalicílico representa uma contraindicação ao tratamento com qualquer Aine devido à sensibilidade cruzada O tratamento para tal ocorrência 254 Unidade II segue o protocolo convencional com a administração de adrenalina com suporte de função dos órgãos vitais Reações cutâneas após os antimicrobianos os Aines são as principais causas de reações cutâneas a drogas Essas reações podem incluir urticária angioedema eritema multiforme eritema nodoso erupções máculopapulares reações de fotossensibilidade eritema pigmentar fixo e vasculite leucocitoclástica VARALDA MOTTA 2009 Toxicidade renal a toxicidade renal pelo uso de Aines tem sido muito estudada nos últimos anos O espectro de nefrotoxicidade inclui necrose tubular aguda nefrite intersticial aguda glomerulonefrite membranosa síndrome nefrótica por doença de lesão mínima necrose de papila renal insuficiência renal crônica retenção hidrossalina hipertensão arterial sistêmica hipercalemia e hipoaldosteronismo hiperreninêmico MELGAÇO et al 2010 Os antiinflamatórios seletivos afetam menos os indivíduos com função renal normal e afetam de modo semelhante os pacientes com alterações renais prévias nestes a gravidade do quadro é diretamente proporcional ao tempo de terapia Estudos clínicos recentes mostram que o papel funcional da COX2 nos rins está principalmente associado à manutenção da homeostase hidroeletrolítica enquanto a COX1 parece estar mais relacionada à manutenção da filtração glomerular normal MICHELIN et al 2006 Melgaço et al 2010 retrataram em uma revisão de literatura o uso de Aines com danos renais O quadro a seguir resume alguns desses efeitos Quadro 9 Resumo dos efeitos dos Aines na função renal Síndrome renal Mecanismos Fatores de risco PrevençãoTratamento Retenção de sódio e edema Redução PGs Terapia com Aines efeito adverso mais comum Interromper o uso do Aine Hipercalemia Redução PGs redução na secreção de potássio para túbulo distal e redução da aldosteronarenina angiotensina Doença renal IC diabetes mieloma múltiplo e terapia com diurético poupador de K Interromper o uso do Aine evitar indometacina em paciente de alto risco Insuficiência renal aguda Redução PGs e queda do balanço hemodinâmico Doença hepática doença renal IC desidratação e idosos Interromper o uso do Aine evitar o uso em paciente de alto risco Síndrome nefrótica com nefrite intersticial Redução do recrutamento e ativação dos linfocitos Fenoprofeno Interromper o uso do Aine Necrose pupilar Toxicidade direta Abuso fenacetina combinação de aspirina e acetaminofeno Interromper o uso do Aine Evitar uso crônico de analgésico Legenda IC insuficiência cardíaca PGs prostaglandinas K potássio Adaptado de Melgaço et al 2010 255 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Como tanto a COX1 como a COX2 estão presentes nos rins todas as classes de Aines podem causar em maior ou menor grau lesão nesse órgão Até pouco tempo atrás acreditavase que a toxicidade renal estava associada apenas aos inibidores da COX1 devido à maior quantidade dessa enzima nos rins Entretanto recentemente foram descritos casos de toxicidade renal associada aos inibidores seletivos da COX2 como o celecoxibe BRICKS DA SILVA 2005 O principal mecanismo de ação dos Aines é a inibição das ciclooxigenases impedindo assim a síntese de prostaglandinas Inibindo as COXs os Aines provocam uma série de efeitos colaterais abaixo detalhados Impedem o efeito vasodilatador das prostaglandinas causando vasoconstricção renal e redução na taxa de filtração glomerular podendo evoluir para necrose tubular aguda Impedem o efeito inibitório das prostaglandinas sobre os linfócitos T permitindo a ativação dessas células com consequente liberação de citocinas próinflamatórias Deslocam o ácido araquidônico para a via das lipoxigenases aumentando a síntese de leucotrienos próinflamatórios A lipoxigenase induz um aumento da permeabilidade capilar podendo contribuir para a proteinúria por alterar a barreira de filtração glomerular Os antiinflamatórios geralmente não constituem um risco significativo aos pacientes com função renal normal Contudo em situações em que a perfusão renal encontrase diminuída volume efetivo circulante reduzido o que é relativamente comum em pacientes críticos a inibição do potencial vasodilatador das prostaglandinas com o uso do Aines pode comprometer o fluxo sanguíneo renal e provocar uma lesão isquêmica no órgão MELGAÇO et al 2010 A nefrotoxicidade dos antiinflamatórios não esteroidais é relatada em diversos estudos e está relacionada principalmente à sua ação inibitória na síntese de prostaglandinas Essa toxicidade ocorre tanto com os inibidores seletivos quanto com os não seletivos das cicloxigenases ao contrário do que se pensava antigamente podendo ocasionar desde distúrbios hidroeletrolíticos até insuficiência renal crônica MELGAÇO et al 2010 A prescrição dessa classe de drogas deve ser criteriosa especialmente para os pacientes considerados de alto risco para desenvolver lesão renal como idosos hipertensos diabéticos hipovolêmicos ou aqueles que fazem uso de diuréticos MELGAÇO et al 2010 Como já discutimos tratase de uma classe muito importante na terapêutica mas que merece uma atenção especial tanto dos profissionais prescritores como dos farmacêuticos que estão diretamente ligados ao trabalho nobre da atenção farmacêutica na dispensação desses fármacos prestando à população um papel informativo crucial 256 Unidade II Teremos agora a oportunidade de falar um pouco melhor e de uma forma mais aprofundada sobre duas categorias de fármacos pertencentes ao grupo dos Aines mas que não são empregados como antiinflamatórios mas sim como analgésicos eou antipiréticos e que estão rotineiramente envolvidos em ocorrências de intoxicações Apesar do grande número de analgésicos aos quais a população tem acesso apenas dois salicilatos e paracetamol são responsáveis por 116 das intoxicações por esse grupo de medicamentos os salicilatos por 81 46 casos e o paracetamol por 35 20 casos Além disso em casos de intoxicações por esses analgésicos o laboratório tem grande importância no diagnóstico e tratamento da intoxicação e no prognóstico do paciente intoxicado Por isso quando se fala em intoxicações por analgésicos esses são os mais estudados Ácido acetilsalicílico AAS As intoxicações por esses medicamentos têm prevalência em centros urbanos e ocorrem acidentalmente em crianças e propositalmente em adultos nas tentativas de suicídio ou pelo uso crônico abusivo Acompanhe o raciocínio pois essa substância apresenta mecanismos de ação complexos que envolvem o centro respiratório e o metabolismo Aspectos toxicológicos da intoxicação por salicilatos São usados amplamente sistemicamente como analgésicos no tratamento de vários tipos de dor como enxaqueca artrite dismenorreia nevralgias e mialgias antipiréticos e antiinflamatórios estando presentes em diversas formulações Estão presentes também em preparações para uso local sendo um exemplo o ácido salicílico usado para remoção de calos e verrugas e no tratamento de epidermofitoses e o salicilato de metila usado em formulações para dores articulares e musculares As intoxicações por salicilatos atingem populações de todas as idades sendo geralmente acidentais em crianças e propositais em adultos nas tentativas de suicídio Doses de 150 a 300 mgkg de peso produzem manifestações tóxicas e com doses de mais de 300 mgkg a intoxicação pode ser fatal Toxicocinética Os salicilatos são substâncias ácidas bem absorvidas no pH estomacal que atingem o pico plasmático em seis horas Em doses terapêuticas tem taxa de ligação a proteínas plasmáticas em torno de 90 mas em doses tóxicas ocorre uma diminuição podendo o teor de ligação decair para 50 por saturação das proteínas plasmáticas Os salicilatos em doses terapêuticas têm biotransformação que obedece a cinética de primeira ordem mas em doses tóxicas a cinética passa para ordem zero que é saturável levando a um aumento dos níveis de salicilato 257 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS O ácido acetilsalicílico por hidrólise origina o ácido salicílico que se conjuga principalmente com a glicina e é excretado na forma de ácido salicilúrico Em doses tóxicas ocorre depleção de glicina levando a um acúmulo de ácido salicílico Dessa forma todas as alterações de cinética decorrentes de doses tóxicas farão com que ocorra um aumento da biodisponibilidade e da meia vida biológica que em doses terapêuticas é de duas a quatro horas e em doses tóxicas aumenta para 25 a 30 horas GOLDFRANK et al 1994 Mecanismo de ação tóxica toxicodinâmica As manifestações tóxicas decorrentes da intoxicação aguda por salicilatos ocorrem inicialmente em função da estimulação do SNC em especial o centro respiratório que acontece também em doses terapêuticas Esse estímulo ocorre de forma direta por ação no centro respiratório no bulbo e de forma indireta pois os salicilatos promovem um aumento do metabolismo por desacoplamento da fosforilação oxidativa ocasionando um aumento no consumo de oxigênio e da produção de CO2 Com o aumento de CO2 também ocorrerá um estímulo respiratório o qual ocasiona uma maior excreção de CO2 levando à uma diminuição na pCO2 H2O CO2 H2CO3 H HCO3 A diminuição da pCO2 provocará uma diminuição de ácido carbônico H2CO3 com consequente diminuição de H ocasionando uma elevação no pH sanguíneo alcalose respiratória Para compensar a alcalose ocorre aumento da excreção de bicarbonato HCO3 acompanhada de um aumento na excreção de Na com consequente excreção de H2O provocando desidratação O aumento do metabolismo leva a uma sudorese que agrava a desidratação Em altas doses numa segunda fase da intoxicação os salicilatos produzem efeito depressor vasomotor levando a uma depressão respiratória Apesar da alcalose que deixa o salicilato na forma iônica mais hidrossolúvel como a dose é alta e os sistemas de biotransformação estão saturados a quantidade de salicilato que atravessa a barreira hematoencefálica é alta o suficiente para produzir depressão respiratória a qual levará a um aumento de CO2 com diminuição do pH sanguíneo acidose respiratória Já que os salicilatos atuam como desacopladores da fosforilação oxidativa bloqueando o ciclo de Krebs haverá uma diminuição na produção de ATP pela via aeróbica Para compensar haverá um aumento da glicólise via anaeróbica que elevará os níveis de ácido lático e pirúvico levando a uma acidose metabólica O organismo também usa as reservas de glicose muscular e de glicogênio hepático podendo ocorrer hipoglicemia Se as reservas de glicose e glicogênio se esgotarem os lipídios serão utilizados para obtenção de energia podendo ocorrer uma cetoacidose metabólica Toda essa acidose deixará o salicilato na forma molecular mais lipossolúvel atravessando mais facilmente a barreira hematoencefálica e aumentando a quantidade da substância disponível no SNC Com isso a depressão respiratória irá se agravar podendo evoluir para uma parada respiratória 258 Unidade II Além desses episódios que narramos outras duas situações podem ser observadas com o uso de AAS São elas Síndrome de Reye devido à possível associação à síndrome de Reye não se aconselha a usar salicilatos em crianças e em adultos com idade inferior a 20 anos com febre associada à origem viral Tratase de uma encefalopatia grave com evolução que pode induzir a fatalidade Ocorre uma disfunção hepática e infiltração gordurosa no fígado e outras vísceras O paracetamol não está associado à incidência de síndrome de Reye sendo portanto o fármaco preferido como antipirético em detrimento dos salicilatos Asma induzida por aspirina a asma induzida por aspirina AIA é uma doença inflamatória das vias aéreas adquirida contínua e agressiva associada à exacerbação da asma e rinite após ingestão de AAS e da maioria dos Aines Inicialmente foi descrita por Samter e denominada tríade de Samter asma pólipo nasal e reação à aspirina Atualmente a maioria das investigações clínicas inclui sinusite crônica nessa patologia sendo também denominada como asma intolerante à aspirina asma sensível à aspirina e doença respiratória exacerbada por aspirina A AIA é amplamente subdiagnosticada na população asmática e as razões são a falta de reconhecimento de reações leves induzidas pelos Aines pelos pacientes e a falta de conhecimento sobre AIA entre os profissionais da saúde Como principal causa temse uma produção de leucotrienos que são bronquioconstrictores ocasionada pela inibição do eixo das COXs conforme a figura a seguir ilustra Fosfolipídeos de membranas Fosfolipase A2 Inibidores da COX12 Ácido araquidônico 15LO5LOFLAP Lipoxina COX12 LTA4H LTA4 LTB4 LTC4S LTC4 LTD4 LTE4 TBX PGD2 PGF2a PGE2 Legenda AINH Antiinflamatórios não hormonais AA Ácido araquidônico COX Ciclooxigenase FA2 Fosfolipase A2 FLAP Proteína ativadora da 5LO5LO 5lipoxigenase 15LO 15lipoxigenase LTA B C D Leucotrieno A B C D LTA4H Leucotrieno A4 hidrolase LTC4S Leucotrieno C4 sintase LX Lipoxina PGD E F Prostaglandina D E F TBX Tromboxano Figura 127 Patogênese da asma induzida por aspirina 259 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Sinais e sintomas da intoxicação As principais manifestações tóxicas são decorrentes da estimulação do SNC e de maneira geral incluem vômitos dor de cabeça hiperpneia e anormalidades neurológicas como confusão hiperatividade incoordenação na fala e convulsões generalizadas Devido à desidratação pode ocorrer desequilíbrio eletrolítico Essas manifestações podem variar dependendo do grau da intoxicação Intoxicações leves ardor na boca esôfago ou abdome fraca ou moderada hiperpneia letargia vômitos diminuição na audição e vertigens Intoxicações moderadas hiperpneia severa letargia marcante excitabilidade delírio febre sudorese desidratação incoordenação e agitação Intoxicações severas severa hiperpneia coma convulsões cianose oliguria edema pulmonar e falência respiratória Reações severas como rinorreia constricção dos brônquios e colapso respiratório ocorrem raramente mais especialmente em asmáticos após doses de 03 a 1 g Tratamento da intoxicação O tratamento requer medidas de suporte diminuição da absorção e aumento da excreção do salicilato Medidas de suporte Diminuir a febre por meios físicos como água fria Controlar as convulsões com diazepam mas não administrar outros depressores menos seguros Reduzir o desequilíbrio eletrolítico através de hidratação Em casos de distúrbios de coagulação administrar vitamina K1 Medidas de descontaminação do trato gastrointestinal Induzir emese Proceder lavagem gástrica que remove quantidades significativas de salicilato até 12 horas após a ingestão Administrar carvão ativado seguido de catártico O carvão ativado deve ser seriado para prevenir a reabsorção do salicilato que tem circulação ênterohepática 260 Unidade II Medidas para aumentar a excreção Manter a urina alcalina com o uso de bicarbonato de sódio para deixar o salicilato na forma iônica mais hidrossolúvel Em casos graves podese proceder hemodiálise diálise peritoneal ou hemoperfusão com carvão ativado Lembrete A alteração de pH urinário embora represente uma importante ferramenta na tentativa de reversão da intoxicação por salicilatos é prática que exige critério e conhecimento pois devese pensar que nem só o pH urinário poderá se alterar incorrendo em problemas de acidose eou alcalose induzidas Observação Para que o tratamento seja efetivo confrontase o que se obtém em laboratório concentração plasmática com o nomograma de Done para avaliação da severidade da intoxicação Exames laboratoriais Em um ambiente clínico as análises toxicológicas auxiliam no diagnóstico e no tratamento das intoxicações bem como na avaliação da eficácia do tratamento empregado Informações sobre a quantidade de toxicante absorvida ou disponível somadas à avaliação clínica realizada pelo médico permitem correlacionar sinais e sintomas e direcionar o paciente para o tratamento mais adequado para a intoxicação KLAASSEN WATKINS 2012 A regra fundamental no tratamento da intoxicação é remover o material que ainda não foi absorvido limitando a absorção e facilitando sua eliminação O laboratório de análises toxicológicas auxilia no monitoramento das concentrações plasmáticas do agente tóxico ainda disponíveis Entre as análises de urgência mais requisitadas estão as dos salicilatos e paracetamol KLAASSEN WATKINS 2012 A intoxicação aguda por salicilatos é uma situação potencialmente fatal e de não tão rara ocorrência A demora no diagnóstico de uma intoxicação grave assim como o atraso na adoção de uma terapêutica adequada está associada a uma taxa de mortalidade maior do que nos casos em que o diagnóstico é mais rápido e os pacientes tratados de forma apropriada 261 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS O laboratório de toxicologia tem importante papel nas intoxicações por salicilatos e as análises mais comuns nesses casos são Teste rápido com reativo de trinder ou cloreto férrico adicionase 1 ml do reativo a 1 ml de soro plasma ou urina Usado para triagem Cromatografia em camada delgada usase como fase estacionária a sílica gel G como sistema solvente utilizase clorofórmio acetona 91 e o revelador é o cloreto férrico FeCl3 A cromatografia em camada delgada pode ser usada para triagem ou para confirmar o resultado do teste rápido Quantificação espectrofotométrica a 1 ml de amostra adicionase 1 ml de reativo de trinder ou cloreto férrico e lêse a coloração obtida em espectrofotômetro Além dos exames toxicológicos devese monitorar os níveis sanguíneos de bicarbonato cloretos potássio sódio glicose e o pH Interpretação dos resultados Teste rápido o íon férrico reagindo com o grupamento fenólico dos salicilatos produzirá um cromóforo de cor violeta ou roxa que indicará a presença de salicilatos na amostra Como pode ocorrer de os resultados darem falsopositivos devido à presença de outras substâncias com grupamento fenólico esse teste é apenas indicativo e não conclusivo da presença de salicilatos devendo assim ser confirmado por técnicas mais específicas Cromatografia em camada delgada seguindo a mesma reação do teste rápido a coloração violeta ou roxa indicará a presença de salicilatos É mais específico que o teste rápido Quantificação espectrofotométrica da mesma forma que as anteriores na presença de salicilato ocorrerá formação de coloração violeta ou roxa que será mensurada no espectrofotômetro em 540 nm Quando se souber o horário da intoxicação pode ser usada para se avaliar o grau de intoxicação e a eficácia do tratamento assim como dar o prognóstico do paciente através do nomograma de Done que relaciona a concentração plasmática com o tempo decorrente da ingestão veja a figura a seguir 262 Unidade II 120 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 24 48 12 26 60 Assintomática Horas após a ingestão Salicemia mgdl Leve Grave Moderada Intoxicação aguda 2535 mg Intoxicação crônica 1015 mg Figura 128 Nomograma de Done Veja o nomograma de Done utilizado para que a clínica saiba em qual nível de intoxicação se encontra o paciente A partir disso é possível se instituírem tratamentos adequados para a intoxicação Tabela 8 Valores classificatórios da intoxicação Tempo após a ingestão Conc sérica mg Toxicidade 12 25 Assintomático 24 25 Branda 36 25 Moderada Derivados do paminofenol Os derivados do ácido paminofenol exibem ações antitérmica e analgésica com baixa ou nenhuma ação antiinflamatória e uricosúrica por uma ação inibitória não seletiva sobre COX Compõem essa classe de fármacos a acetanilida a acetofenetidina fenacetina e seu metabólito acetaminofeno paracetamol DELUCIA et al 2014 Na overdose por paracetamol as vias de glucuronização e sulfatação tornamse saturadas e o metabolismo via citocromo P450 principalmente pela enzima CYP2E1 aumenta Dessa forma aumenta a produção do NAPQI Nacetilpbenzoquinona que rapidamente esgota a glutationa celular Quando cerca de 70 da glutationa estão esgotados o NAPQI ligase covalentemente com as macromoléculas 263 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS de proteínas nos hepatócitos causando alteração de membrana morte celular e degeneração do fígado Pode ocorrer dano renal pelo mesmo mecanismo devido ao metabolismo do CYP renal Aspectos toxicológicos da intoxicação por paracetamol A diminuição do uso de salicilatos em crianças devido à síndrome de Reye provocou um aumento no uso de paracetamol bem como uma elevação nos casos de intoxicações É o principal metabólito da fenacetina mas este não é mais usado atualmente É usado como analgésicoantipirético mas não como antiinflamatório A maior parte dos casos fatais ocorre quando da ingestão de doses maiores que 140 mgkg de peso Toxicocinética O paracetamol é absorvido rápida e completamente pelo trato gastrintestinal e o pico plasmático é atingido em 30 a 60 minutos A taxa de ligação proteica é de cerca de 26 e a meia vida biológica é de três horas É biotransformado e excretado principalmente conjugado com sulfato ou ácido glicurônico Apenas 2 são excretados inalterados Uma pequena fração cerca de 4 é biotransformada através do sistema citocromo P450 originando um produto altamente reativo e extremamente hepatotóxico mas que é inativado por conjugação com a glutationa sendo posteriormente excretado Em altas doses além de se aumentar a porcentagem de paracetamol biotransformado pela via secundária depletamse as reservas de glutationa Assim o intermediário reativo não é inativado ligandose à macromoléculas do hepatócito e produzindo necrose hepática Essa situação pode ser agravada se estiver associado um indutor enzimático ou se o indivíduo for usuário crônico de álcool Lembrete Você deve se lembrar que esse exemplo sobre a interação com álcool já foi utilizado anteriormente Sinais e sintomas da intoxicação Num primeiro estágio em 48 horas ocorrem anorexia náuseas e vômitos que são inespecíficos daí a importância do diagnóstico laboratorial A seguir ocorrem aumento de ALT AST e de bilirrubina devido à lesão hepática A intoxicação pode ser fatal em até quatro dias se o indivíduo não for tratado 264 Unidade II Tratamento da intoxicação Consiste em monitorizamento das funções vitais diminuição da absorção e administração de antídoto Monitoramento das funções vitais parâmetros bioquímicos e função hepática Diminuição da absorção Induzir emese Realizar lavagem gástrica Utilizar carvão ativado Administração de antídotos A administração de precursores da glutationa como a cisteína e a metionina pouco usada são indicadas em quatro a 24 horas após a ingestão A cisteína é degradada rapidamente quando administrada por via intravenosa e não é bem absorvida por via oral por isso o antídoto mais utilizado é a nacetilcisteína NAC Fluimucil Zambom Sua administração pode ser feita por via intravenosa mas é sugerido que sua ação é mais eficaz por via oral pois a nacetilcisteína após absorvida irá primeiramente para o fígado Você pode acompanhar esse mecanismo de forma bem detalhada na próxima figura Ocorre lesão hepática grave em 90 dos casos em pacientes tornando o carvão ativado o melhor método de descontaminação oral desde que a administração tenha sido feita em até quatro horas Exames laboratoriais Teste rápido a 1 ml de urina adicionar 1 ml de HCl conc Em seguida deixar em banhomaria a 100 C por 10 minutos Retirar 02 ml e a ele adicionar 5 ml de solução de fenol ou cresol 1 e 3 ml de hidróxido de sódio 2M Em caso positivo observase coloração azul Espectrofotometria como amostra podese usar plasma ou soro e há formação de um cromóforo que absorve luz em 430 nm Além dos exames toxicológicos devem ser realizadas dosagens de ALT AST e bilirrubina Interpretação dos resultados Através do nomograma de Rumack sabendose o horário da ingestão é possível avaliar a gravidade da intoxicação a eficáca do tratamento e o prognóstico 265 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Via UDP Glucoronil transferase Metabólitos não tóxicos na urina Cisteína e conjugados do ácido mercaptopurínico Via fenol sulfotransferase Toxicidade celular Glutationa Via renal inalterada 5 Sulfatação 2047 Conjugação4067 Paracetamol NAPQI CYP450 515PQI NAC1 NAC2 NAC3 NAC4 Figura 129 Vias de biotransformação do paracetamol e proteção feita pela NAC Nacetilcisteína Mecanismo de hepatoproteção da NAC NAC1 aumenta a sulfatação NAC2 é um precursor da glutationa NAC3 é um substituto da glutationa NAC4 melhora a função de múltiplos órgãos durante a lesão hepática e possivelmente limita a extensão do dano hepático Assim como ocorre na intoxicação por salicilatos para que o tratamento seja efetivo confrontase o que obteve em laboratório concentração plasmática com o nomograma de RumackMattew veja a figura a seguir para avaliação da severidade da intoxicação e a administração de antídoto 266 Unidade II 300 250 200 175 150 125 100 80 60 50 40 30 20 15 100 4 4 8 8 12 12 16 Paracetamol micromolL Paracetamol mgL Tempo decorrido desde a exposição 16 6 6 10 10 14 14 Provável Provável risco risco Possível risco Possível risco Fatores de risco Fatores de risco presentes presentes Baixo risco Baixo risco normalmente não normalmente não tratar tratar Alto risco tratar Alto risco tratar 150 200 250 300 400 500 600 700 800 1000 1200 1400 1600 1800 2000 Figura 130 Nomograma de RumackMattew 522 Síndromes tóxicas Nas intoxicações temos várias síndromes que passam a ser agrupadas segundo seus agentes causadores e sintomas Falaremos portanto sobre algumas dessas síndromes e a importância que elas passam a ter para o manejo de tratamento das diferentes intoxicações Segundo o Manual de Toxicologia Clínica do estado de São Paulo HERNANDEZ RODRIGUES TORRES 2017 e Schvartsman e Schvartsman 1999 a toxíndrome ou síndrome tóxica pode ser definida como um complexo de sinais e sintomas produzido por doses tóxicas de substâncias químicas que apesar de diferentes têm um efeito mais ou menos semelhante O reconhecimento da síndrome especificamente permite a identificação mais rápida do agente causador e consequentemente a realização do tratamento adequado Para tanto é preciso realizar como em qualquer outra afecção clínica atendida em serviço de emergência uma anamnese e um exame físico cuidadoso Alguns aspectos específicos devem ser enfatizados ou mais detalhados Na história quando o tóxico for conhecido devese fazer uma estimativa da quantidade em contato com o organismo do tempo decorrido desde o acidente até o atendimento da sintomatologia inicial do tipo de socorro domiciliar e dos antecedentes médicos importantes Quando o tóxico for desconhecido 267 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS são dados suspeitos início agudo da sintomatologia idade entre 1 e 5 anos pica problemas domésticos estado mental alterado quadro clínico estranho ou complexo excesso de medicamentos no domicílio e informações dos parentes ou dos companheiros O exame físico deve detalhar além dos sinais usuais características da pele e das mucosas temperatura coloração odor hidratação do hálito da boca lesões corrosivas odor hidratação dos olhos conjuntiva pupila movimentos extraoculares do sistema nervoso central nível de consciência escala do coma estado neuromuscular do sistema cardiocirculatório frequência e ritmo cardíaco pressão arterial perfusão e do sistema respiratório frequência movimentos respiratórios ausculta Destacaremos a seguir segundo Schvartsman e Schvartsman 1999 algumas dessas síndromes tóxicas consideradas como principais Síndrome anticolinérgica sintomatologia Sintomas rubor de face mucosas secas hipertermia taquicardia midríase retenção urinária agitação psicomotora alucinações e delírios Principais agentes atropina derivados e análogos antihistamínicos antiparkinsonianos antidepressivos tricíclicos antiespasmódicos midriáticos plantas da família Solanaceae particularmente do gênero Datura Síndrome anticolinesterásica Sintomas sudorese lacrimejamento salivação aumento das secreções brônquicas miose bradicardia fibrilações e fasciculações musculares Principais agentes inseticidas organofosforados inseticidas carbamatos fisostigmina algumas espécies de cogumelos Síndrome narcótica Sintomas depressão respiratória depressão neurológica miose bradicardia hipotermia hipotensão hiporreflexia Principais agentes opiáceos incluindo também elixir paregórico difenoxilato loperamida Síndrome depressiva Sintomas depressão neurológica sonolência torpor coma depressão respiratória cianose hiporreflexia hipotensão Principais agentes barbitúricos benzodiazepínicos etanol Síndrome simpatomimética Sintomas midríase hiperreflexia distúrbios psíquicos hipertensão taquicardia piloereção hipertermia sudorese Principais agentes cocaína anfetamínicos derivados e análogos descongestionantes nasais cafeína teofilina Síndrome extrapiramidal Sintomas distúrbios do equilíbrio distúrbios da movimentação hipertonia distonia orofacial mioclonias trismo opistótono parkinsonismo Principais agentes fenotiazínicos butirofenonas fenciclidina lítio Síndrome metemoglobinêmica Sintomas cianose de pele e mucosas de tonalidade e localização peculiar palidez de pele e mucosas confusão mental depressão neurológica Principais agentes acetanílida azul de metileno dapsona doxorubicina fenazopiridina furazolidona nitratos nitritos nitrofurantoína piridina sulfametoxazol 268 Unidade II O reconhecimento da síndrome tóxica agiliza a identificação do agente causal e permite um tratamento mais adequado Quadro 10 Principais síndromes tóxicas e agentes relacionados Síndromes Sintomatologia Agentes Anticolinérgica bloqueio de receptores muscarínicos da Ach Aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial midríase febre rubor mucosas e pele secas alucinações agitação psicomotora Atropina e derivados beladonas antihistamínicos Colinérgica diminuição da atividade da AchE Redução da frequência cardíaca e da pressão arterial miose fraqueza e fasciculações musculares sialorreia broncoespasmo cólicas Inseticidas organofosforados carbamatos e alguns cogumelos Depressão do SNC narcótica hipnótica sedativa Redução da frequência cardíaca e da pressão arterial miose sonolência torpor coma depressão respiratória Barbitúricos benzodiazepínicos etanol opioides antidepressivos tricíclicos carbamazepina Extrapiramidal bloqueio de receptores dopaminérgicos Distorção facial espasmos musculares mímica facial pobre choro monótono Metemoglobinemia conversão da hemoglobina em metemoglobina Cianose cinza arroxeada taquicardia astenia e convulsões Nitrito nitrato naftalina anestésicos sulfona Simpatomimética Aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial midríase febre sudorese rubor agitação Drogas de abuso cafeína descongestionantes tópicos ou sistêmicos teofilina 523 Toxicologia de emergência intoxicações agudas Uma intoxicação suspeita ou confirmada deverá ser tratada como uma situação clínica potencialmente grave pois mesmo pacientes que não apresentam sintomas inicialmente podem evoluir mal Dessa forma a abordagem inicial deve ser feita de forma rápida e criteriosa Neste tópico faremos um estudo sobre os princípios e condutas básicas para o atendimento de um paciente com suspeita de intoxicação Vamos juntos nessa Nas intoxicações de uma forma geral existem os procedimentos gerais para a manutenção e estabilização do paciente e as medidas específicas que são dependentes do agente causador e exigem uma conduta Assim segundo Schvartsman e Schvartsman 1999 para a estabilização do paciente intoxicado existe uma série de etapas que não precisam estar e ser sequenciais como avaliação clínica inicial estabilização reconhecimento da toxíndrome síndrome tóxica e identificação do agente causal 269 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS descontaminação administração de antídotos aumento da eliminação do tóxico absorvido tratamento sintomático Tais etapas embora aplicáveis e aceitas pela maioria dos autores e clínicos apresentam dependendo do local controvérsias que às vezes causam conflito nas informações acerca da sua prática ou não 5231 Avaliação inicial O primeiro passo no atendimento de um paciente intoxicado é a realização de um breve exame físico para identificar as medidas imediatas necessárias para estabilizar o indivíduo e evitar a piora clínica Portanto nesse momento é de fundamental importância checar sinais vitais nível e estado de consciência pupilas diâmetro e reatividade à luz temperatura e umidade da pele oximetria de pulso medida de glicose capilar dextro Também devese obter ECG eletrocardiograma e realizar monitorização eletrocardiográfica se necessário manter vias aéreas abertas e realizar intubação orotraqueal IOT se necessário obter acesso venoso calibroso nesse momento podem ser coletadas amostras para exames toxicológicos Observação Estudaremos neste tópico manobras clínicas as quais você deverá sempre relacionar a um profissional médico 270 Unidade II O objetivo principal da avaliação clínica inicial é o de verificar se o paciente apresenta algum distúrbio que represente risco iminente de vida Para tanto é indispensável um exame físico rápido porém rigoroso para avaliar as seguintes situações Condições respiratórias distúrbios que representam risco de vida e que exigem atenção imediata incluem obstrução das vias aéreas apneia bradipneia ou taquipneia intensa edema pulmonar e insuficiência respiratória aguda Condições circulatórias exigem atenção imediata alterações significativas de pressão arterial ou de frequência cardíaca disritmias ventriculares insuficiência cardíaca congestiva estado de choque e parada cardíaca Condições neurológicas estado de mal convulsivo pressão intracraniana aumentada coma pupilas fixas e dilatadas ou mióticas puntiformes e agitação psicomotora intensa Observe que quando as condições permitirem a avaliação poderá ser ampliada incluindo outros dados tais como pele e anexos temperatura estado de hidratação entre outras 5232 História da exposição Você já ouviu falar sobre a estratégia dos 5 Ws Utilizase a estratégia dos 5 Ws para se obterem os dados relacionados ao paciente Who Quem à substância utilizada What O quê horário da exposição When Quando local da ocorrência Where Onde e motivo da exposição Why Por quê Veja que nas emergências muitas informações podem ser distorcidas ou omitidas principalmente quando há tentativas de suicídio ou homicídio envolvidas uso de drogas ilícitas abortamento ou maustratos Dessa forma sugerese uma conduta geral em situações dessa ordem para que os vieses sejam os menores possíveis e a identificação do agente tóxico seja a mais precisa possível Observe algumas condutas que separamos como sendo de importância para um manejo clínico Paciente obter o histórico de doenças medicações em uso tentativas de suicídio anteriores ocupação acesso a substâncias uso de drogas e gravidez Agente tóxico procurar saber qual foi a substância utilizada e a quantidade Sempre que possível devese solicitar para os acompanhantes trazerem os frascos ou embalagens e questionar se pode ser um produto clandestino Tempo verificar qual foi o horário da exposição e por quanto tempo a substância foi utilizada nos casos de exposições repetidas Também devese questionar se houve algum sintoma prévio à exposição 271 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Local saber onde ocorreu a exposição e se foram encontrados frascos embalagens seringas ou cartelas de comprimidos próximos ao paciente É necessário ainda verificar quais medicamentos são utilizados pelos familiares ou pelas pessoas onde o indivíduo foi encontrado Também é útil saber se foi encontrada alguma carta ou nota de despedida em casos de tentativa de suicídio Motivo identificar a circunstância da exposição já que é de extrema importância saber se foi tentativa de suicídio homicídio acidente abuso de drogas ou outro tipo de ocorrência 5233 Exame físico É importante que o exame físico do paciente seja realizado verificando os principais sinais e sintomas descritos a seguir Odores característicos são exemplos hálito etílico uso de álcool e odor de alho organofosforados Achados cutâneos sudorese secura de mucosas vermelhidão palidez cianose desidratação e edema Temperatura hipo ou hipertermia Alterações de pupilas miose midríase anisocoria tamanho desigual da pupila e alterações de reflexo pupilar Alterações da consciência agitação sedação confusão mental alucinação delírio e desorientação Anormalidades neurológicas convulsão síncope alteração de reflexos alteração de tônus muscular fasciculações e movimentos anormais Alterações cardiovasculares bradicardia taquicardia hipertensão hipotensão e arritmias Anormalidades respiratórias bradipneia ou taquipneia e presença de ruídos adventícios pulmonares Achados do aparelho digestório sialorreia vômitos hematêmese diarreia rigidez abdominal e aumento ou diminuição de ruídos hidroaéreos Esses sinais e sintomas descritos quando agrupados podem caracterizar uma determinada síndrome tóxica Lembrete Você deve se lembrar de que o conhecimento das síndromes tóxicas que vimos há pouco auxiliam na identificação mais rápida do agente tóxico 272 Unidade II 5234 Tratamento O manejo adequado de um paciente com suspeita de intoxicação depende do agente envolvido e da sua toxicidade assim como do tempo decorrido entre a exposição e o atendimento Além do suporte o tratamento envolve medidas específicas como descontaminação administração de antídotos e técnicas de eliminação descritas a seguir 52341 Descontaminação Esse procedimento visa à remoção do agente tóxico com o intuito de diminuir a sua absorção Durante o procedimento a equipe de atendimento deverá tomar as precauções para se proteger da exposição ao agente tóxico Os seguintes procedimentos estão indicados de acordo com a via de exposição Cutânea retirar roupas impregnadas com o agente tóxico e lavar a superfície exposta com água em abundância Respiratória remover a vítima do local da exposição e administrar oxigênio umidificado suplementar Ocular instilar uma ou duas gotas de colírio anestésico no olho afetado e proceder a lavagem com SF 09 ou água filtrada sempre da região medial do olho para a região externa com as pálpebras abertas durante pelo menos cinco minutos É necessário solicitar avaliação oftalmológica Gastrintestinal GI consiste na remoção do agente tóxico do trato gastrintestinal no intuito de evitar ou diminuir sua absorção Descontaminação gastrintestinal A indicação da descontaminação GI depende da substância ingerida do tempo decorrido da ingestão dos sintomas apresentados e do potencial de gravidade do caso Recomendase avaliação criteriosa do nível de consciência do paciente antes de iniciar o procedimento e sempre considerar intubação orotraqueal caso julgar necessário para proteção de vias aéreas Os benefícios maiores desse procedimento estão nas seguintes situações na ausência de fatores de risco para complicações como torpor e sonolência na ingestão de quantidades potencialmente tóxicas das substâncias nas ingestões recentes isto é até uma a duas horas da exposição 273 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS nos casos envolvendo agentes que diminuam o trânsito intestinal anticolinérgicos fenobarbital etc ou de substâncias de liberação prolongada a indicação da descontaminação pode ser mais tardia O procedimento dividese em duas etapas a realização da lavagem gástrica seguida da administração do carvão ativado que discutiremos com você a seguir Lavagem gástrica LG consiste na infusão e posterior aspiração de soro fisiológico a 09 SF 09 através de sonda nasogástrica ou orogástrica com o objetivo de retirar a substância ingerida Devese sempre avaliar criteriosamente a relação risco x benefício antes de iniciar o procedimento pois há grande risco de aspiração É contraindicada na ingestão de cáusticos solventes e quando há risco de perfuração e sangramentos Devese evitar a infusão de volumes superiores aos indicados pois pode facilitar a passagem da substância ingerida pelo piloro e aumentar a absorção do agente tóxico Devese utilizar sonda de grande calibre adultos calibre de 18 a 22 crianças de 10 a 14 mantendo o paciente em decúbito lateral esquerdo para facilitar a retirada do agente tóxico e diminuir a velocidade do esvaziamento gástrico para o intestino É necessário infundir e retirar sucessivamente o volume de SF 09 recomendado de acordo com a faixa etária até completar o volume total recomendado ou até que se obtenha retorno límpido Carvão ativado CA é um pó obtido da pirólise de material orgânico com partículas porosas com alto poder adsorvente do agente tóxico que previne a sua absorção pelo organismo Geralmente é utilizado após a LG mas pode ser utilizado como medida única de descontaminação GI Nesses casos a administração pode ser por via oral sem necessidade da passagem de sonda nasogástrica Na maioria das vezes deverá ser utilizado em dose única porém pode ser administrado em doses múltiplas como medida de eliminação em exposições a agentes de ação prolongada ou com circulação enterohepática como fenobarbital carbamazepina dapsona clorpropramida entre outros Contraindicações ao uso do carvão ativado RN gestantes ou pacientes muito debilitados cirurgia abdominal recente administração de antídotos por VO Pacientes que ingeriram cáusticos ou solventes ou que estão com obstrução intestinal Pacientes intoxicados com substâncias que não são efetivamente adsorvidas pelo carvão como os ácidos álcalis álcoois cianeto e metais como lítio ferro entre outros 274 Unidade II Complicações que podem ocorrer com o uso do CA Constipação e impactação intestinal principalmente quando utilizado em doses múltiplas Broncoaspiração especialmente quando realizado em pacientes torporosos sem a proteção da via aérea Lavagem intestinal Consiste na administração de solução de polietilenoglicol PEG via sonda nasoenteral para induzir a eliminação do agente através do trato gastrintestinal pelas fezes É raramente utilizada salvo nos casos de ingestão de pacotes contendo drogas bodypacking ou de quantidades potencialmente tóxicas de substâncias não adsorvidas pelo carvão ativado exemplos ferro lítio etc Está contraindicada na presença de íleo paralítico perfuração gastrintestinal hemorragia gastrintestinal e instabilidade hemodinâmica Para finalizarmos este tópico demonstramos a seguir um fluxograma geral de atendimento ao paciente Sangue Suspeita de intoxicação Triagem Triagem Fluido gástrico Discussão clínico x analista Suspeita de intoxicação Anamnese Figura 131 Fluxograma do atendimento ao paciente intoxicado 275 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS 524 Toxicologia clínica Intoxicações exógenas definemse como as consequências clínicas que uma substância química pode desencadear entre elas o medicamento A toxicologia clínica representa a parte médica voltada ao tratamento do paciente exposto ao agente tóxico com a finalidade de prevenir e diagnosticar a intoxicação ou aplicar se necessário uma medida terapêutica específica para seu tratamento Lembrete Você deve se lembrar novamente de que essa parte clínica é de atribuição do profissional médico Na fase clínica o médico passa a ter acesso aos sintomas do paciente intoxicado ou mesmo a algumas alterações laboratoriais que esses agentes tóxicos possam induzir lembrando que uma mesma substância pode induzir a um quadro tóxico vários órgãos em um mesmo momento ou em momentos distintos e um único órgão pode ser atingido por várias substâncias diferentes Os efeitos tóxicos podem se dividir em Efeitos imediatos ou agudos aparecem imediatamente após uma exposição aguda ou seja exposição única ou que ocorre no máximo em 24 horas Em geral são efeitos intensamente graves e a evolução pode levar o paciente à morte ou causar lesões persistentes Efeitos crônicos são aqueles que surgem de uma exposição crônica ou seja exposição a pequenas doses durante vários meses ou anos Efeitos retardados são aqueles que só ocorrem após um período de latência mesmo quando já não mais existe a exposição Exemplo efeitos carcinogênicos que têm uma latência de 20 a 30 anos Esses efeitos podem advir de uma exposição aguda ou crônica e são dependentes do agente tóxico da dose exposta e das condições de exposição Não se pode confundir efeitos agudos e crônicos com exposição aguda e crônica pois através de uma exposição aguda é possível se ter um efeito crônico dependendo como já mencionado da substância da sua dose e das condições às quais ela foi exposta No que diz respeito às intoxicações medicamentosas é possível observar intoxicações que ocorreram por uma exposição aguda originando efeitos agudos ou mesmo crônicos Ainda é possível ter através de uma exposição crônica efeitos agudos que porventura venham também a se cronificar Na verdade nesse contexto destacase a importância da monitorização terapêutica que é aplicada em pacientes que empregam medicamentos de forma crônica principalmente Nas intoxicações exógenas especificamente voltadas aos medicamentos a toxicologia clínica se incumbe da prevenção da intoxicação do diagnóstico da intoxicação o que a causou e do tratamento 276 Unidade II Cada classe ou cada medicamento dentro de uma classe exige uma conduta específica com relação aos tratamentos ou aplicação quando possível e pertinente de antídotos para se contraporem aos efeitos nocivos dos medicamentos Destacase nesse contexto a importância do laboratório de toxicologia que muitos hospitais principalmente os de grande porte possuem os quais têm a incumbência de identificar os medicamentos e as suas classes nas mais variadas matrizes biológicas Observação Considere que o laboratório de toxicologia precisa oferecer resultados rápidos com técnicas analíticas que priorizem o tempo para que a parte clínica possa instituir tratamentos adequados Os exames laboratoriais podem ser diretos qualitativos ou quantitativos ou indiretos Exames diretos qualitativos ou semiquantitativos como o screening urinário para drogas de abuso podem ser úteis no esclarecimento do diagnóstico detectando acetona anfetaminas anticolinérgicos barbitúricos benzoilecgonina cafeína canabinoides cocaína codeína deidrocodeína etanol fenotiazínicos heroína morfina e nicotina Além disso podem detectar antidepressivos tricíclicos betabloqueadores cloroquina diquat disopiramida estricnina glicóis herbicidas fenoxiclorados isopropanol metanol metoclopramida paracetamol paraquat salicilatos e teofilina Os exames quantitativos geralmente realizados no sangue são importantes no controle da intoxicação devida principalmente aos seguintes agentes acetaminofeno 20 mgl chumbo 25 mgdl digitálicos 2 ngml etanol 100 mgdl etilenoglicol 20 mgdl fenobarbital 30mgml ferro 300 mgdl salicilato 30 mgdl e teofilina 20 mgml Os exames indiretos consistem na dosagem de marcadores sugestivos de intoxicações São exemplos a dosagem da atividade da colinesterase sanguínea e a dos níveis de metemoglobinemia No primeiro caso queda superior a 50 é altamente sugestiva de intoxicação por inseticidas organofosforados e carbamatos Metemoglobinemia superior a 15 é acompanhada por sintomatologia tóxica Convém notar que os resultados das análises toxicológicas de urgência são importantes por permitirem um diagnóstico preciso de uma intoxicação ou até mesmo a sua exclusão permitindo até uma reavaliação clínica a identificação do agente tóxico que irá auxiliar o clínico no uso de uma terapêutica mais específica e adequada ao paciente a monitorização das intoxicações graves falaremos melhor com você a seguir sobre monitorização terapêutica como aquelas causadas por ferro e metanol o estabelecimento de um prognóstico mais previsível como ocorre nas intoxicações por paracetamol e paraquat 277 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS um seguimento mais adequado como na intoxicação por antidepressivos tricíclicos por dapsona etc Aqui fazemos um destaque ao papel relevante do analista toxicologista pois além da capacidade de realizar as análises propriamente ditas apresenta plenas condições da interpretação dos resultados Observação Assim sendo destacamos a importância do estreito relacionamento entre o clínico e o analista As solicitações pela equipe clínica de um screening toxicológico diagnóstico diferencial surgem na maioria das vezes da falsa ideia da existência de uma única e rápida análise capaz de confirmar a presença de qualquer agente tóxico determinante da intoxicação Um laboratório de análises toxicológicas de fato deve dispor de diferentes métodos orientados através de um planejamento toxicológico Dos milhares de agentes capazes de provocar intoxicação um laboratório tem habilidade para detectar somente cerca de um décimo desse total e de quantificar dezenas deles nas diversas matrizes biológicas disponíveis O método analítico inclui o conjunto de procedimentos ou técnicas desde o prétratamento da amostra até seu resultado final Pode ter finalidade qualitativa em que se verifica a presença ou ausência do agente tóxico na matriz biológica ou quantitativa na qual se realiza a determinação dos analitos podendo ser útil para evidenciar a natureza e a magnitude da exposição a um composto em particular ou a um grupo de compostos Além disso as técnicas analíticas podem ser divididas em Testes de triagem são rápidos e fornecem informações qualitativas ou semiquantitativas para uma classe de agentes tóxicos por exemplo teste positivo para benzodiazepínicos mas não necessariamente o diazepam e algumas vezes podem gerar resultados falsopositivos Assim o resultado de uma técnica de triagem pode ser confirmado por técnicas analíticas mais definitivas Testes de confirmação identificam o composto específico em vez de simplesmente sua classe Esses ensaios carecem de mais tempo horasdias e intensivo trabalho são de limitada disponibilidade além de serem caros de se realizar A técnica confirmatória de escolha para a grande maioria dos compostos é a cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massas e essa análise pode ser qualitativa ou quantitativa Se disponíveis análises confirmatórias serão necessárias quando houver possível envolvimento médicolegal ou do serviço social Devido à complexidade do diagnóstico e tratamento das intoxicações agudas os resultados toxicológicos quando disponíveis no tempo apropriado podem influenciar no diagnóstico e tratamento subsequente do paciente intoxicado Assim avaliando a abordagem emergencial da intoxicação aguda os resultados analíticos devem ser fornecidos rapidamente usualmente dentro de uma a duas horas da chegada do paciente ao hospital priorizando os casos onde o resultado terá influência na conduta a ser tomada 278 Unidade II 5241 Monitorização terapêutica Um dos instrumentos mais valiosos de que se dispõe para assegurar uma terapia com máxima eficácia e efeitos tóxicos mínimos em casos de tratamentos prolongados é a monitorização terapêutica Dessa forma tornase possível ao prescrever uma dose medir sua concentração no local de ação e consequentemente prever a intensidade do efeito A monitorização da terapêutica medicamentosa therapeutic drug monitoring TDM é a prática clínica que usa as concentrações dos fármacos os princípios farmacocinéticos PK e os critérios farmacodinâmicos PD na individualização da posologia e na otimização da terapêutica farmacológica do doente EVANS SCHENTAG JUSKO 1992 Observação Você já deve ter percebido que na monitorização terapêutica os resultados não precisam ser tão rápidos mas devem ser reproduzidos por metodologias bem específicas A TDM é uma prática instituída para um pequeno número de fármacos para os quais há uma relação direta entre a sua concentração e o efeito farmacológico no local de ação o que por sua vez se reflete de forma previsível na resposta Para esses fármacos está descrita uma margem estreita de concentrações acima das quais se observa toxicidade e abaixo ineficácia Tratandose de um intervalo de confiança a noção de margem terapêutica é um conceito probabilístico que representa uma gama de concentrações do fármaco para as quais existe uma probabilidade relativamente elevada de obter a resposta clínica desejada e uma probabilidade relativamente baixa de se observar uma toxicidade inaceitável No entanto alguns doentes respondem abaixo da margem terapêutica enquanto outros necessitam de concentrações acima dela De igual modo há doentes que manifestam reações tóxicas com concentrações dentro da margem terapêutica SCHUMACHER 1995 A TDM é uma área de farmacocinética clínica que visa a individualização posológica e a otimização dos tratamentos farmacológicos com o objetivo de alcançar a máxima eficácia terapêutica com a mínima incidência de efeitos adversos Foi proposta pela primeira vez em 1950 aplicada ao tratamento de arritmias cardíacas com quinidina A sua utilização vulgarizouse desde a segunda metade da década de 1960 com a evolução das técnicas analíticas e dos fundamentos farmacocinéticos da ação dos fármacos Atualmente a melhoria dos cuidados de saúde cria situações clínicas complexas que tornam a TDM relevante na decisão e gestão terapêutica MARTIN et al 2012 Na base do desenvolvimento da monitorização das concentrações dos fármacos no sangue estão várias razões que justificam a realização da TDM SCHUMACHER 1995 Critérios analíticos consistem na disponibilidade de um método analítico para dosear o fármaco de forma rápida sensível e precisa exemplos ELISA EMIT FPIA HPLC e que na maioria dos casos requer pequenos volumes de amostra 279 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Critérios farmacocinéticos consistem na descrição de uma elevada variabilidade inter e intraindividual na distribuição ou na eliminação do fármaco resultando em diferentes concentrações ou exposições a ele Critérios farmacológicos consistem em estar bem demonstrada a relação entre as concentrações do medicamento e a sua atividade farmacológica muitas vezes difícil de quantificar assim como em identificar uma margem terapêutica estreita ou baixo índice terapêutico Critérios clínicos consiste na necessidade de existir uma margem terapêutica bem definida e o conhecimento dos fatores que alteram o comportamento farmacocinético do fármaco de forma a permitir a correta interpretação das concentrações Alguns fatores que alteram a farmacocinética dos fármacos podem também contribuir para a necessidade da execução da TDM BURTON et al 2006 entre os quais variabilidade inter e intraindividual estados patológicos fatores genéticos interações medicamentosas e alterações na distribuição dos medicamentos na obesidade gravidez ou mesmo com a permeabilidade da barreira hematoencefálica SCHUMACHER 1995 Na prática da TDM a qualidade das informações quanto ao medicamento e ao paciente são de fundamental importância para que haja fidelidade e exatidão nas informações relacionadas às concentrações plasmáticas obtidas e correção dessa com a terapia propriamente dita Nesse contexto é fundamental que o profissional da saúde detenha informações acerca da farmacocinética e farmacodinâmica dos medicamentos envolvidos e processos que possam alterálas sempre com o intuito da otimização da terapêutica Não há necessidade e nem exigência clínica para se executar monitorização terapêutica para todos os fármacos destacandose algumas classes como antibióticos gentamicina tobramicina antiepilépticos carbamazepina fenobarbital lítio digoxina imunossupressores ciclosporina e antidepressivos amitriptilina imipramina Assim como não há uma exigência para todos os fármacos também não se faz necessário executar a monitorização para todos os pacientes As exigências são maiores para alguns grupos como as crianças recémnascidos os idosos os politraumatizados e os doentes que por sua condição diferenciada exigem um acompanhamento mais rigoroso da terapêutica para se otimizarem os efeitos e reduzirem as reações adversas Além disso a TDM aplicase muito bem a pacientes refratários a medicamentos como os antipsicóticos 5242 Antídotos Como o nosso objetivo inicial não é o de fornecer especificamente condutas e tratamentos acerca dos medicamentos envolvidos nas intoxicações trazemos aqui informações gerais sobre o uso de antídotos 280 Unidade II Ressaltamos que para cada substância pode haver uma conduta e que tais condutas serão apropriadas e aplicáveis dependendo dos níveis plasmáticos dos medicamentos no meio sistêmico sendo essa tarefa de fundamental importância na toxicologia analítica ou seja a partir da descoberta do agente causador da intoxicação qual medicamento é possível quantificálo e correlacionar esses níveis plasmáticos com valores de faixa terapêutica de normalidade MANUAL 2017 Os antídotos são substâncias que agem no organismo atenuando ou neutralizando ações ou efeitos de outras substâncias químicas A administração desses medicamentos não é a primeira conduta a ser tomada na maioria das situações A maior parte das intoxicações pode ser tratada apenas com medidas de suporte e com tratamentos sintomáticos Entretanto algumas situações exigem a administração de antídotos e às vezes de medicamentos específicos A disponibilidade dessas substâncias é estratégica do ponto de vista de saúde pública Devem estar disponíveis seja para uso imediato no primeiro atendimento em ambulâncias ou nas unidades de emergência seja em poucas horas para uso hospitalar ou em serviços de referência Apresentaremos aqui algumas medidas que podem ser empregadas para reduzir a intoxicação e logo a seguir falaremos sobre os antídotos propriamente ditos Medidas de eliminação São utilizadas para potencializar a eliminação do agente tóxico As principais medidas utilizadas são Alcalinização urinária pode potencializar a excreção urinária de alguns agentes Alcalinizar a urina favorece a conversão de ácidos fracos lipossolúveis como fenobarbital e salicilatos para a forma de sal impedindo a sua reabsorção pelo túbulo renal As contraindicações são insuficiência renal edema pulmonar ou cerebral e doenças cardíacas Hemodiálise ou hemoperfusão são técnicas raramente utilizadas São geralmente indicadas quando a velocidade de depuração da substância pode ser maior pela remoção extracorpórea do que pelo próprio clearance endógeno que ocorre nos casos de nítida deterioração do quadro clínico do paciente ou quando os níveis séricos da substância determinam mau prognóstico A hemodiálise pode ser útil em intoxicações por fenobarbital teofilina lítio salicilatos e álcoois tóxicos Hemodiálise é realizada em 90 dos casos que requerem um método de remoção extracorpórea Durante a hemodiálise até 400 ml de sangue por minuto atravessam um circuito extracorpóreo em que compostos tóxicos difundemse em uma membrana semipermeável e são retirados do organismo É mais efetiva na remoção de compostos com as seguintes características baixo peso molecular 500 daltons 281 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS pequeno volume de distribuição 1 lkg baixa ligação a proteínas plasmáticas Hemoperfusão consiste na depuração do agente tóxico fazendo o sangue passar através de uma coluna de resinas não iônicas ou de microcápsulas de carvão ativado Tem a capacidade de remover mais efetivamente as toxinas adsorvidas pelo carvão ativado quando comparada à hemodiálise porém a disponibilidade dessa técnica nos centros de emergência é limitada Antídotos comprovadamente efetivos Poderíamos aqui dispor de inúmeras tabelas contendo antígenos empregados mas preferimos elencar alguns destes que comprovadamente demonstram efetividade clínica SCHVARTSMAN SCHVARTSMAN 1999 Acetilcisteína tem um efeito poupador de glutationa prevenindo a formação de metabólitos hepatotóxicos do acetaminofeno Sua principal indicação terapêutica é a intoxicação por esse medicamento Outras indicações ainda não têm evidências suficientes As doses usuais são de 140 mgkg por via oral e a seguir 70 mgkg por via oral durante três dias Atropina é um antagonista dos estímulos colinérgicos nos receptores muscarínicos com pouco efeito nos nicotínicos Sua principal indicação sobre a qual existem evidências suficientes é o tratamento da intoxicação por inseticidas organofosforados e carbamatos As doses usuais para crianças são de 001 a 005 mgkg preferencialmente por via intravenosa repetidas em intervalos de minutos até a melhora do quadro clínico ou o aparecimento de sinais de intoxicação atropínica Azul de metileno medicamento que age como transportador de elétrons ativando a via da hexose monofosfato eritrocitária na qual a G6PD glicose 6fosfato desidrogenase é enzima básica permitindo a redução da metemoglobina em hemoglobina É indicado no tratamento das metemoglobinemias tóxicas particularmente as induzidas por derivados da anilina e nitritos Em indivíduos com deficiência de G6PD seus efeitos são menos evidentes BAL ou dimercaprol é um quelante cujos grupos sulfidrila competem com os das enzimas teciduais na ligação com metais pesados Existem evidências suficientes demonstrando sua eficácia no tratamento da intoxicação por arsênico e ouro e na encefalopatia saturnina juntamente com o EDTA Como é um medicamento de difícil manuseio que somente pode ser aplicado por via intramuscular em injeção muito dolorosa apresentando além disso importantes efeitos colaterais há atualmente uma tendência para uso de outras alternativas Deferoxamina é um agente quelante com especial afinidade pelo ferro com o qual forma um complexo hidrossolúvel rapidamente eliminado Pode ser usado na intoxicação aguda mas é mais indicado no tratamento da sobrecarga crônica de ferro As doses devem ser individualizadas utilizandose genericamente 75 mgkgdia por via intramuscular ou intravenosa 282 Unidade II EDTAcálcico EDTAcálcico ou edatamil cálcio dissódico é um agente quelador que forma complexos estáveis e hidrossolúveis com alguns metais pesados Sua principal indicação é a intoxicação por chumbo Dificuldade da administração efeitos colaterais importantes e resultados nem sempre satisfatórios justificam a tendência atual de procura de medicamentos alternativos Etanol age bloqueando a metabolização pela desidrogenase alcoólica de outros álcoois particularmente metanol e etilenoglicol impedindo a formação dos derivados que são tóxicos As doses usuais têm por objetivo manter uma alcoolemia em torno de 100 mgdL geralmente obtida com 50 g de álcool por via oral ou se necessário por via intravenosa Em virtude da incerteza sobre seus resultados estão sendo procuradas alternativas terapêuticas Flumazenil é um medicamento que antagoniza a ação de benzodiazepínicos por inibição competitiva no complexo receptor GABAbenzodiazepina Existem evidências suficientes sobre sua eficácia na reversão do coma induzido por esse grupo de drogas e relatos que ainda necessitam confirmação sobre a melhora da consciência de pacientes com intoxicação alcoólica A dose usual inicial é de 02 a 03 mg por via intravenosa em 15 segundos A seguir 01 mg em intervalos de um minuto até a melhora do paciente que geralmente ocorre com menos de 3 mg Hipossulfito o hipossulfito tiossulfato de sódio faz parte do esquema terapêutico da intoxicação cianídrica grave juntamente com os nitritos e pode ser de uso isolado na intoxicação leve Transforma o cianeto em tiocianato que é rapidamente eliminado e bem menos tóxico Sua ação é lenta e exige a presença da enzima rodanase As doses usuais são de 15 mlkg da solução a 25 para crianças e de 50 ml para adultos por via intravenosa Naloxona é considerado medicamento de primeira escolha no tratamento da intoxicação por opiáceos Atua como antagonista puro podendo ser usado mesmo quando houver dúvida diagnóstica As doses utilizadas são de 01 mgkg bem maiores que as inicialmente recomendadas para crianças com menos de 5 anos de idade e 20 mg para crianças maiores de preferência por via intravenosa Nitritos os nitritos de amila e de sódio continuam sendo os medicamentos mais utilizados no tratamento da intoxicação cianídrica grave Induzem a formação de metemoglobina que ligandose ao cianeto forma um complexo o qual apesar de dissociável é menos tóxico e facilita a ação do hipossulfito administrado a seguir As doses usuais são nitrito de amila inalação de 30 segundos a cada minuto enquanto é preparado o nitrito de sódio administrado na dose de 03 mlkg da solução a 3 por via intravenosa Pralidoxima é um reativador de colinesterase utilizado na intoxicação por inseticidas organofosforados no tratamento das manifestações nicotínicas Não deve ser usada na intoxicação por inseticidas carbamatos apesar de estes serem também inibidores da colinesterase A dose recomendada é de 20 a 40 mgkg para crianças preferencialmente por via intravenosa Vitamina K1 vitamina K1 ou fitonadiona é utilizada para restaurar o tempo de protrombina e interromper o sangramento na intoxicação por medicamentos ou pesticidas anticoagulantes A 283 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS dose usualmente recomendada para crianças é de 5 a 10 mg por via oral repetida várias vezes por dia Por via intramuscular a dose costuma ser de 1 a 5 mg Tratamentos sintomáticos Veja que além dos antídotos é possível se empregar substâncias como tratamentos sintomáticos que atenuam os episódios e sintomas agudos Tratamento das convulsões benzodiazepínicos particularmente o diazepam continuam sendo os medicamentos de escolha no controle das crises convulsivas Não havendo melhora podese administrar fenitoína em dose de carga de 15 mgkg não ultrapassando a velocidade de infusão de 50 mgminuto Tratamento da crise alérgica prometazina disponível para uso oral e parenteral deve ser usada na dose de 05 mgkg Ciproeptadina 025 mgkgd por via oral pode ser usada como alternativa Nos casos mais graves recomendase epinefrina 11000 na dose de 001 mlkg por via subcutânea repetida se necessário até três vezes e cortiscosteroides como hidrocortisona ou dexametasona Tratamento da dor o tipo de analgésico depende de sua intensidade Na leve ou moderada são recomendados acetaminofeno ácido acetilsalicílico ou dipirona Dores intensas podem exigir analgésicos narcóticos particularmente morfina na dose de 02 mgkg para crianças e 5 a 20 mg para adultos por via subcutânea intramuscular e se necessário intravenosa codeína 03 a 05 mgkg para crianças e 15 a 60 mg para adultos por via oral ou parenteral Alguns casos picada de animais peçonhentos por exemplo podem exigir anestesia local ou bloqueio anestésico Tratamento da hipertermia nas intoxicações os mecanismos de hipertermia geralmente não são mediados pelos sistemas das prostaglandinas Assim sendo os medicamentos antitérmicos usuais podem não ser eficazes e mascarar o quadro clínico As medidas físicas são mais recomendadas incluindo envoltórios úmidos e frios compressas frias bolsas de gelo e fricção com esponja úmida 6 TOXICOLOGIA SOCIAL Segundo Oga Camargo e Batistuzzo 2003 a toxicologia social é a área da toxicologia que estuda os efeitos nocivos decorrentes do uso não médico de fármacos ou drogas causando danos não somente ao indivíduo mas também à sociedade Você deve se lembrar inclusive de outras disciplinas que por fármaco entendese uma substância de estrutura química definida e que quando em contato ou introduzida em um organismo vivo consegue modificar uma ou mais funções e que possuem um emprego benéfico já droga é a matériaprima de origem mineral vegetal ou animal que contém um ou mais fármacos A partir desses conceitos entendemos que a lidocaína e benzocaína importantes anestésicos representam fármacos e que as folhas de Erythroxylon coca folhas de coca representam droga 284 Unidade II Observação Embora as palavras fármaco e droga representem substâncias diferentes e possuam características diferentes esses termos podem ser sinônimos em algumas situações definidas e específicas Atualmente entretanto a primeira ideia que a palavra droga implica é a do uso ilícito sendo este um problema social marcante na nossa sociedade e que obriga governos do mundo a gastarem valores extremamente expressivos em virtude da dependência a várias drogas e substâncias ilícitas como maconha cocaína crack anfetaminas entre outras Além disso existem gastos com consequências médicas referentes ao uso dessas substâncias perda de emprego crimes e acidentes diretamente ligados ao seu uso Você não deve deixar de considerar que muitas substâncias lícitas como álcool nicotina cigarro e cafeína café além de serem largamente consumidas em muitos países às vezes acabam por implicar efeitos tão deletérios como as substâncias ilícitas Apenas para ilustrarmos o quanto o aspecto cultural é decisivo para classificar uma substância como lícita ou não um exemplo que você pode observar é o Marrocos país islâmico que segue o que disse o Profeta aos seus seguidores que se abstivessem de libações ato ou efeito de beber bem como de tudo o que nubla ou seja deturpa a mente A história dos muçulmanos com o álcool se desenvolveu em vários relacionamentos e o Marrocos não é uma exceção pois tratase de um país onde entre os bons muçulmanos vivem e descansam muitos europeus com suas ricas tradições alcoólicas Ou seja o país não apresenta um relacionamento com as bebidas embriagantes de forma lícita como ocorre na Europa e em muitos países do mundo entre os quais o Brasil Outro exemplo que podemos usar é um país próximo do Brasil o Uruguai onde o uso e cultivo da Cannabis é estipulado como legal tanto de forma recreacional como medicinal O mesmo ocorre no Canadá Observação Falaremos com você melhor sobre as aplicações terapêuticas de derivados da Cannabis posteriormente Neste início de tópico é importante que você se familiarize com algumas terminologias que serão extremamente úteis para que possamos dar sequência e para que você siga uma linha de raciocínio bem aplicada Entendese como uso não médico de alguma substância a exposição a uma droga ou fármaco pelo uso ocasional frequente ou mesmo compulsivo aceitos ou não pelos padrões de uma sociedade 285 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS enquanto uso abusivo representa o uso de uma droga ou fármaco geralmente por autoadministração de forma tal que se desvie de padrões médicos e ou socioculturais Observação De acordo com o conceito de abuso veja que se um indivíduo utilizar um único cigarro de maconha para experimentar esse uso é considerado como abusivo pois a maconha é uma substância ilícita no Brasil Conforme já comentamos na toxicologia social estudamos os fármacos e drogas que possuem um potencial para induzir a dependência Segundo Oga Camargo e Batistuzzo 2003 há sete classes que são elencadas como principais opiáceos psicoestimulantes algumas dessas substâncias foram discutidas no tópico sobre toxicologia de medicamentos depressores do SNC também discutidas no capítulo sobre toxicologia de medicamentos inalantes tabaco Cannabis e substâncias psicodélicas alucinógenas Essa classificação representa um modelo meramente didático pois sabemos que os agentes que compõem cada classe possuem mais ações em comum 61 Farmacodependência Depois de entendermos um pouco melhor alguns conceitos iniciais falaremos sobre o fenômeno da farmacodependência Segundo Oga Camargo e Batistuzzo 2014 a farmacodependência em termos comportamentais representa uma consequência de um comportamento de consumo do fármaco de forma tão frequente e fortemente reforçado que este se transforma em resposta dominante Tratase portanto de um fenômeno biopsicossocial Antes de prosseguirmos é muito importante que você entenda bem o que significa e a representatividade do que seja reforço Reforço representa a capacidade de um fármaco gerar autoadministração repetida sem a necessidade de outros mecanismos externos de indução como a personalidade alguma doença psíquica preexistente a situação socioeconômica e até mesmo uma pressão criada por pessoas de grupos a que esses indivíduos pertençam Observação Discutiremos melhor tipos de reforço e sua representatividade na farmacodependência Falaremos um pouco melhor sobre a farmacodependência 286 Unidade II Pois bem a farmacodependência não é uma condição do tipo tudo ou nada Há graus variáveis de dependência que vão desde o grau mais leve até o mais intenso Especificamente nos casos mais intensos onde há um interesse médico e legal empregamse termos de literatura inglesa como addiction Em língua portuguesa empregávamos o termo vício para designarmos uma dependência extrema porém esse termo adquiriu um sentido pejorativo e foi eliminado do vocabulário técnico Embora não tenhamos um vocábulo equivalente a addiction temos na língua portuguesa o termo adicto que significa aficionado Na verdade o adicto vive uma condição em que as atividades relacionadas com a droga como a aquisição a administração a experimentação dos seus efeitos e a condição de suportar os efeitos negativos quando deixa de usála assumem uma superioridade sobre todas as outras atividades embora haja muitas consequências adversas que esse uso possa lhe acarretar Ocorre portanto uma completa perda do controle voluntário da autoadministração da droga ou substância A partir deste momento combinaremos de utilizar o termo farmacodependente ou dependente Dessa forma contornamos vieses literários e até preconceituosos É importante frisar que o uso de uma droga psicoativa não leva necessariamente à dependência Há uma grande maioria de pessoas que conseguem controlar o uso dessas substâncias Observação Uma situação muito comum vinculada a essa situação ocorre com o uso do álcool Embora a maioria das pessoas utilize a substância apenas cerca de 5 tornamse realmente dependentes dela Assim você pode perfeitamente entender que a ocorrência da farmacodependência depende de fatores de ordem genética psicológica e social ou seja reiteramos aqui o fenômeno biopsicossocial que já comentamos com você anteriormente Outra coisa muito importante sobre a farmacodependência é o fato de que ela não se instala de um momento para outro há diversas fases entre o início do uso até a dependência propriamente dita e extrema Para tal há uma dependência da substância droga e também uma dependência do indivíduo sendo necessário um conhecimento sobre ela para que consigamos determinar em que fase ela se encontra Saiba que os mecanismos neurobiológicos subjacentes bem como o prognóstico podem ser diferentes em cada uma das fases Os fenômenos de tolerância sensibilização retirada e desejo compulsivo craving geralmente acompanham a dependência Discutiremos com você tais fenômenos mais à frente É importante frisarmos que a aquisição da dependência se dá em geral com um dado tipo de droga mas há a tendência de expansão para outros tipos de substâncias A primeira droga geralmente é o tabaco o álcool ou até mesmo inalantes seguida da maconha de substâncias sedativohipnóticas 287 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS psicoestimulantes e finalmente opioides Claro que essa sequência não é fixa sendo ela passível das mais variadas formas dependendo de disponibilidade custo aprovação no subgrupo social e até personalidade do usuário Observação A tendência à busca de novidades de drogas e efeitos é um traço de personalidade que favorece o uso precoce de múltiplas drogas Em algumas situações uma droga é empregada para contrabalancear os efeitos negativos de outra Observação Em indivíduos que utilizam álcool observase o uso de psicoestimulantes para aumentar seu efeito Já com usuários de cocaína podese observar o uso de sedativos para atenuar seus efeitos estimulatórios 611 Papel dos fármacos ou drogas como reforçadores Como discutimos anteriormente o reforço é representado pela capacidade de uma substância em gerar a autoadministração repetida sem a necessidade de outros mecanismos externos de indução Esse potencial de reforço ou de induzir a farmacodependência como definimos e já entendemos é função da velocidade e da intensidade dos efeitos reforçadores de uma droga eou fármaco Lembrete O reforço é a probabilidade de uma ação se repetir Podemos citar a existência de dois tipos de reforço o positivo e o negativo No reforço positivo o organismo age para obter diretamente uma recompensa que gera prazer Isso não é válido apenas para drogas ou fármacos também aplicamos isso ao nosso dia a dia por exemplo no prazer que temos quando ingerimos água Já no reforço negativo o organismo age para evitar um malestar ou dor Na falta da substância ocorrem os sintomas de abstinência sensações desagradáveis que levam o indivíduo a repetir o uso da droga para aliviar esses sintomas Veja na figura a seguir a relação entre o reforço positivo e o negativo com as suas respectivas características Note que no reforço negativo o comportamento de busca ocorre em detrimento de um sinal de abstinência falta provocada pela retirada da substância e que no reforço positivo 288 Unidade II o comportamento de busca relacionase aos efeitos prazerosos Discutiremos a presença dos neurotransmissores adiante sendo o principal a dopamina Neurotransmissor Comportamento de busca Uso de drogas Efeitos prazerosos Reforço positivo Reforço negativo Síndrome de abstinência Neurotransmissor Figura 132 Correlação entre reforço positivo e negativo Trataremos agora sobre os dois pontos importantes ligados a esse potencial de indução à farmacodependência Velocidade de reforço Quanto mais rapidamente um fármaco produzir os seus efeitos reforçadores maiores serão as chances de originar um comportamento de consumo repetido em comparação com outro fármaco que apresente um início lento de ação Observação Por exemplo a cocaína e a heroína apresentam um potencial maior em induzir a dependência em comparação com o fenobarbital pois este demora mais a produzir efeitos sobre o SNC Algo parecido observamos em usuários que continuam a utilizar uma substância mesmo sabendo que ela poderia lhe causar sérios e graves prejuízos Isso porque os efeitos prazerosos ocorrem geralmente a curto prazo reforçando o comportamento de autoadministração enquanto as consequências danosas são de ocorrência tardia para terem um efeito punitivo sobre o comportamento 289 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Você deverá considerar de forma muito enfática um fator que é muito importante sobre a velocidade de reforço que é a escolha da via de administração pois de acordo com a via de uso é possível se alcançar um tipo de efeito em um determinado tempo com uma intensidade relacionada Observação A morfina tem maiores chances de induzir a farmacodependência quando administrada por via intravenosa em relação à via oral assim como a maconha fumada em relação ao seu uso oral Intensidade de reforço Um dos avanços mais importantes no estudo dos mecanismos da farmacodependência foi a descoberta de que animais de laboratório geralmente macacos e ratos são capazes de aprender a injetar drogas psicoativas em suas veias O estudo da autoadministração de fármacos ou drogas pela via intravenosa tornase útil para investigar os efeitos farmacológicos agradáveis decorrentes da ação de uma substância nos centros de recompensa do cérebro que condicionam sua autoadministração contínua reforço primário Saiba que um dos principais experimentos bem conhecidos na toxicologia acerca da farmacodependência é realizado com macacos Rhesus e ratos em que se implanta nesses animais um cateter venoso ligado a uma bomba e a um reservatório com o fármaco que se queira avaliar É dado ao animal um livre acesso a uma alavanca e estabelecese pelo número de vezes que a alavanca é pressionada uma correlação com propriedades reforçadoras primárias autoadministração contínua No experimento demonstrado pela tabela a seguir observe que os estimulantes centrais como a cocaína e as anfetaminas são as substâncias mais potentes entre as avaliadas seguidas da morfina e da heroína Um animal de laboratório consegue pressionar uma alavanca como essa até a morte em detrimento do estímulo provocado pelo pressionar da alavanca Tabela 9 Autoadministração pela via intravenosa de fármacos reforço primário Fármacos Animais de laboratório Homem Psicoestimulantes Cocaína anfetaminas Depressores do SNC Barbitúricos benzodiazepínicos Etanol Opiáceos Agonistas morfina e análogos Antagonistas naloxona 290 Unidade II Fármacos Animais de laboratório Homem Cannabis THC Psicodélicos LSD e análogos Antidepressivos e neurolépticos Analgésicos não opioides Adaptada de Oga Camargo e Batistuzzo 2003 Nos dois exemplos que demonstramos você deve ter percebido que a nicotina não pode ser avaliada nesse tipo de experimento pois outros efeitos diretos do fármaco que não estão relacionados ao reforço também afetam a frequência em que o animal pressiona a alavanca Tais evidências sobre a relação entre o pressionar da alavanca e a dependência indicam que as drogas geradoras de farmacodependência têm propriedades parecidas a reforçadores positivos naturais como alimento e sexo Assim verificase que as drogas dotadas de maior potencial de produzir dependência são aquelas cujo acesso ao SNC é rápido Em grande parte essa rapidez dos efeitos centrais depende da via de administração em que a inalação gera picos de concentrações da droga no SNC mais rapidamente do que outras vias Explicase com isso o enorme potencial de dependência do cigarro em relação à nicotina bem como do crack em relação à cocaína Logo após a via inalatória temos a via intravenosa seguida da aspiração nasal e da ingestão oral Fazemos menção aqui também a outro fator muito importante que é a duração da ação da substância Quando esta é curta requer repetição frequente para restabelecer o efeito desejado fortalecendo assim o condicionamento Isso ocorre inclusive com compostos que pertencem à mesma classe aqueles que oferecem curta duração geram mais facilmente dependência em comparação com aqueles que oferecem uma duração prolongada Observação Um exemplo dentro desse contexto pode ser observado com a heroína possuindo uma T½ biológica de 30 minutos sendo biotransformada em morfina que possui uma T½ biológica de duas horas é muito mais viciante que a metadona com T½ biológica de 35 horas e também do que o Diazepam um benzodiazepínico que possui uma T½ de 43 horas em média 612 Sistema de recompensa cerebral James Olds na década de 1950 fez um mapeamento do cérebro do rato evidenciando zonas de recompensa Ele identificou que pela estimulação de áreas específicas cerebrais há uma recompensa como aquelas que temos naturalmente como ingestão de água e alimento ou sexo conforme já citamos há pouco 291 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Em oposição a isso Olds observou que a estimulação de outras zonas do cérebro desencadeava um comportamento defensivo como a luta ou a fuga não se observando uma estimulação portanto repetida Muito pelo contrário o animal aprendia a desligar a estimulação quando era acionada pelo experimentador Essas regiões com efeitos opostos à anterior que você viu agora conosco foram caracterizadas como zonas aversivas ou zonas de punição Além de Olds outros autores da literatura especializada verificaram que a estimulação elétrica de regiões nas zonas de recompensa cerebrais induzia a sensações de prazer enquanto a estimulação das zonas de punição ou aversivas provocava sensações muito intensas de medo pavor mortal ou sofrimento Segundo Oga Camargo e Batistuzzo 2003 os fármacos e drogas que causam dependência exercem seus efeitos reforçadores atuando sobre um conjunto de regiões cerebrais que estão interligadas entre si por diversos sistemas de neurotransmissores recebendo o nome de via ou sistema de recompensa A distribuição anatômica do sistema de recompensa cerebral ainda não foi totalmente desvendada mas é objeto de muito estudos atuais sobre comportamento O principal sistema envolvido é o sistema dopaminérgico via mesocorticolímbico com corpos celulares localizados entre a área tegmental ventral ATV e núcleo accumbens NAcc tubérculo olfatório córtex frontal amígdala e área septal Propõese que os fármacos e drogas psicoativos liberam dopamina DA no NAcc o mesmo ocorrendo com a estimulação elétrica que comentamos agora há pouco Esses estímulos estão associados com eventos de reforço ou recompensa HIP PV PV NAc NAc PD PD NR NR ATV ATV LC LC MCP MCP Hipoc Hipoc CF CF Opioides álcool síndrome de retirada Opioides sensibilização a psicoestimulantes nicotina THC etanol Cocaína anfetamina opióides nicotina etanol benzodiazepínicos recompensa e síndrome de retirada Benzodiazepínicos etanol melhora da ansiedade Ectasy Figura 133 Via dopaminérgica mesolímbica da área tegmental ventral ao núcleo accumbens considerada uma via comum a muitas drogas que causam dependência 292 Unidade II Pelo que você pode observar na figura anterior nenhuma categoria de fármacos ou drogas age exclusivamente no sistema mesolímbico e diferentes classes de agentes farmacológicos ativam o sistema dopaminérgico por diferentes mecanismos Assim a maioria dos fármacos e drogas psicoativos também podem apresentar alguns efeitos desagradáveis e até de punição chamados de aversivos ainda que sejam utilizados em uma dosagem que produza reforço A intensidade desse reforço em determinado indivíduo depende portanto de um equilíbrio entre os efeitos reforçadores prazerosos e aqueles punitivos 613 Avaliação do potencial de abuso Para a avaliação do potencial de abuso de uma substância é preciso se considerar o reforço primário mencionado anteriormente que é principalmente relacionado à velocidade e intensidade do efeito assim como o reforço secundário que passa a ser composto pela neuroadaptação pela tolerância metabólica pela taquifilaxia e pelo fenômeno ou preferência condicionada por lugar Para tentar esclarecer melhor esses elementos falaremos agora sobre cada um deles de uma forma generalizada 6131 Neuroadaptação A neuroadaptação representa uma alteração no SNC devida à presença de uma droga ou fármaco que após uma exposição única ou repetida passa a se manifestar pelo aparecimento de transtornos físicos de alta intensidade quando se interrompe o uso o que se classifica como síndrome de abstinência representada por efeitos opostos àqueles ocorrentes pela substância que se dão quando se está sem usar a droga ou ainda pela resposta reduzida para uma mesma concentração no local da ação fenômeno este conhecido como tolerância farmacodinâmica Observação Afinal por que os indivíduos utilizam as drogas de abuso As substâncias químicas tanto lícitas como ilícitas que são consideradas drogas de abuso por causarem dependência são viciantes e promovem o que chamamos de efeitos hedônicos isto é um efeito agradável que leva o indivíduo a querer repetir a sensação e com o uso repetido por serem substâncias viciantes eles tornamse dependentes Mas o que leva o indivíduo a utilizar as substâncias pela primeira vez é o efeito de prazer que elas produzem já que atuam no sistema de recompensa ativando áreas como a região mesolímbica Alguns conceitos são importantes quando falamos de toxicologia social dislépticas modificadoras alucinógenas lépticas depressoras analépticas estimulantes e psicolépticas sedativos calmantes 293 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Para uma melhor compreensão vamos dividir as drogas de abuso em três grupos depressoras estimulantes e despersonalizantes Benzodiazepínicos Tranquilizantes Indutores do sono Barbitúricos Anestésicos Sedativos Anticonvulsivantes Ópio e derivados Morfina Heroína Codeína Anfetamina Inibidores do apetite Nicotina Cigarro Cafeína Café Chá Efedrina Descongestionante Atropina Euforizantes Cocaína Deprimentes Álcool Inalantes Alucinantes Maconha Haxixe Cogumelo LSD Depressoras Estimulantes Despersonalizantes A B C Figura 134 Drogas de abuso depressoras estimulantes e despersonalizantes A Papoula B Café C Cannabis sativa 614 Drogas estimulantes do SNC 6141 Tabaco Vamos compreender um pouco mais sobre o tabaco Dados epidemiológicos De acordo com o Inca o percentual de adultos fumantes no Brasil tem reduzido nos últimos anos devido às políticas nacionais de controle do tabaco No período de 1989 a 2010 a queda foi de 46 No Brasil em 1989 cerca de 35 da população acima de 18 anos era fumante já em 2013 o percentual reduziu para 15 E de acordo com dados da OMS a prevalência de fumantes no mundo em 2010 variava de 124 a 29 dependendo da região Em relação ao sexo os homens fumam mais que as mulheres Em relação à mortalidade dados apontam que no ano de 2015 156216 pessoas morreram em decorrência de complicações causadas pelo tabagismo o que corresponde a 428 mortes ao dia Esse valor corresponde a 126 do total de mortes que ocorreram no Brasil anualmente INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER 2020 Composição do tabaco O princípio ativo mais importante do tabaco é a nicotina responsável pelo efeito farmacológico viciante e efeitos adversos 294 Unidade II Um cigarro comercial de tabaco possui em média de 10 a 14 mg de nicotina o que corresponde a 15 em peso do cigarro e 95 do conteúdo total de alcaloides OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 As vias de exposição são oral dérmica ou pulmonar A DL50 para ratos é de 50 mgkg para camundongos 3 mgkg e a dose letal para um homem adulto é de 40 a 60 mg Fumaça do cigarro Em 1996 cerca de 4800 componentes tóxicos foram identificados na fumaça do cigarro de tabaco e foi detectado que entre eles 69 são carcinogênicos em animais e 11 em humanos OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 O caminho que a fumaça percorre segue o que chamamos de corrente primária e corrente secundária A corrente primária é constituída por ponta acesa do cigarro coluna do cigarro e boca durante a tragada já a corrente secundária pela mistura do composto emitido pela ponta acesa para o meio ambiente A fumaça inalada pelo fumante é um aerossol composto por duas fases de vapor ou gasosa e particulada e condensada Cerca de 989 do volume total da corrente principal de um cigarro sem filtro fase de vapor contêm nitrogênio 73 moles oxigênio 10 moles dióxido de carbono 95 moles monóxido de carbono 42 moles hidrogênio 1 mol argônio 06 mol e metano 06 mol Saiba mais Leia mais sobre o tabagismo em VIEGAS C A A et al Diretrizes para cessação do tabagismo Jornal Brasileiro de Pneumologia v 30 supl 2 p S2S76 2004 Disponível em httpswwwscielobrpdfjbpneuv30s2a02v30s2pdf Acesso em 16 out 2020 Quadro 11 Componentes do cigarro Fase Componentes Fase de vapor ou gasosa Nitrogênio Oxigênio Dióxido de carbono Monóxido de carbono Água Outros compostos amônia óxidos de nitrogênio ácido cianídrico aldeídos formaldeído acetaldeído acroleína nitrilas nitrosaminas e hidrocarbonetos voláteis benzeno estireno isopreno butadieno 295 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Fase Componentes Fase particulada ou condensada Nicotina Hidrocarbonetos aromáticos policíclicos benzopireno Fenol Nitrosaminas não voláteis Radioelementos polônio Adaptado de Instituto Nacional de Câncer sd Principais componentes do cigarro de tabaco e o que causam no organismo O alcatrão é um conjunto de partículas da fumaça do cigarro com exceção da água e dos alcaloides É uma mistura de cerca de 3500 compostos químicos formados durante a queima consequente da combustão incompleta de materiais orgânicos presentes e é constituído principalmente por hidrocarbonetos aromáticos policíclicos alguns carcinogênicos para o homem Pode ser responsável pelo desenvolvimento de câncer e doenças respiratórias graves e os componentes tóxicos do cigarro podem promover mecanismos aterogênicos isto é formação de trombos O monóxido de carbono é um dos componentes da fumaça do cigarro que promove efeito asfixiante e carcinogênico O efeito asfixiante é devido à formação de carboxiemoglobina que resulta em hipóxia tecidual A nicotina promove estimulação simpática devido à ligação aos receptores nicotínicos liberação dos neurotransmissores adrenalina e noradrenalina e ativação dopaminérgica Os efeitos da ação adrenérgica da nicotina são ação anorexígena aumento nos níveis do hormônio antidiurético redução do débito urinário taquicardia aumento da pressão arterial aumento do débito cardíaco aumento da força de contração no coração inotropismo aumento da frequência de batimentos cronotropismo vasoconstrição redução da motilidade gastrointestinal e impotência sexual A redução da ansiedade e tensão é um efeito da nicotina e conduz à dependência A tríade da inflamação causada pelo tabagismo ocorre pelos toxicantes presentes ou liberados no cigarro quando em contato com o endotélio junto com as LDL do sangue que geram um mecanismo inflamatório que resulta em formação de trombo Esses toxicantes correspondentes ao fator exógeno do tabaco associados ao LDL em maior concentração são análogos ao fator endógeno na promoção à agressão ao endotélio provocando uma resposta inflamatória e resultando em reparação tecidual para cicatrização da lesão aumento da atividade prócoagulante do sangue Para isso ocorre a formação do coágulo que forma o trombo gerando a aterosclerose Os principais efeitos tóxicos do tabagismo são intoxicação aguda desconforto gastrointestinal náuseas vômito tontura cefaleia tremor palidez e hipertensão doenças cardiovasculares aterosclerose e trombose doenças respiratórias DPOC enfisema bronquite crônica e asma e câncer 296 Unidade II Observação O uso do tabaco na gestação pode ocasionar parto prematuro complicações no parto descolamento de placenta retardo no desenvolvimento na infância morte infantil baixo peso para a idade gestacional e prejuízo no desenvolvimento nos pulmões do feto 6142 Cocaína A cocaína é um alcaloide presente nas folhas de duas espécies vegetais do gênero Erytroxylum sendo conhecida popularmente como coca O O O O N CH3 CH3 Figura 135 Estrutura química da cocaína Segundo Chasin Silva e Carvalho 2014 a cocaína é um anestésico local e tem ação simpatomimética sendo assim estimulante no SNC É considerada um dos estimulantes mais potentes de ação central e por essa razão passou a ser usada como fármaco de abuso Padrões de uso A forma mais utilizada é o pó cristalino composto por cloridrato de cocaína uma forma que não pode ser fumada pois não se volatiliza e decompõe quando em altas temperaturas é o resultado da pasta de coca purificada com ácidos clorídrico ou sulfúrico É administrada por aspiração nasal por via oral ou intravenosa sendo a melhor absorção por meio da mucosa nasal Já na forma de base livre chamada de COCbase pode ser fumada visto que pode volatizar a temperaturas mais altas cerca de 90 ºC e ao aquecimento seus vapores podem ser inalados no ato de fumar A forma fumada no Brasil é conhecida como crack merla ou oxi Toxicocinética A velocidade de absorção varia de acordo com a forma de administração quando fumada oito segundos via intravenosa de três a cinco minutos e intranasal 10 a 15 minutos Concentrações plasmáticas entre 300 a 900 ngml podem ocorrer de um a dois minutos sendo que as vias intravenosa e nasal apresentam padrões cinéticos similares diferenciando pelo fato de a via respiratória apresentar efeitos mais rápidos A biodisponibilidade da droga fumada é 70 devido a uma perda de 26 da forma básica antes de ser inalada em decorrência da decomposição que ocorre no próprio objeto utilizado 297 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS para queima e a forma intranasal apresenta uma biodisponibilidade de 60 a 80 A albumina é uma das principais proteínas responsáveis pela distribuição de toxicantes no organismo Entretanto nem sempre é assim que ocorre Há substâncias químicas que dependendo de algumas características como sua estrutura química são distribuídas por outras proteínas plasmáticas como a alfa1glicoproteínas ácidas Devido a sua alta lipossolubilidade pode atravessar as barreiras hematoencefálica e placentária Observação A cocaína em base livre crack é a forma mais lipossolúvel da droga e apresenta uma passagem pelas membranas muito alta Seu tempo de latência é muito curto dessa forma o início e o fim do efeito é rápido o que leva o usuário a repetir a administração logo em seguida visto que a droga promove um efeito hedônico intenso Isso explica por que o crack vicia mais rápido que outras drogas ou até mesmo comparado com a cocaína nas formas inaladas e intravenosa Eliminação Pequenas quantidades são excretadas na forma inalterada na urina cerca de 10 Os metabólitos excretados na urina são éster metilecgonina 32 a 49 benzoilecgonina 29 a 45 e outros em menor porcentagem como ecgonina norcocaína e benzoilnorecgonina Toxicodinâmica Elevação temporária das concentrações de norepinefrina e dopamina e subsequente redução dos níveis normais devido ao bloqueio na recaptação de dopamina na fenda sináptica o que promove os estados de euforia seguida de depressão O uso da cocaína gera um aumento na estimulação dopaminérgica em D1 e D2 o que gera a euforia e os delírios O acúmulo de neurotransmissor nos receptores resulta em um mecanismo de autorregulação que podemos também considerar uma taquifilaxia Dessa forma há depleção da dopamina nos receptores Isso resulta em redução do neurotransmissor no cérebro o que é possível verificar através das complicações psiquiátricas como sintomas de embotamento social depressão falta de libido entre outros sintomas além da síndrome de abstinência Efeitos da intoxicação Taquicardia aumento da pressão arterial vasoconstrição agitação hipertermia alucinações agressividade arritmias cardíacas infarto agudo do miocárdio atrofia e necrose do septo nasal forma inalada mal formação congênita uso na gestação e mal de Parkinson 298 Unidade II 6143 Anfetamina e correlatos O termo anfetamínico é utilizado para referirse ao grupo de substâncias compostas pela anfetamina e seus derivados Apresentam a estrutura geral betafenetilamina e atuam como aminas simpatomiméticas Alguns exemplos de derivados da betafenetilamina anfepramona femproporex e ecstasy ou MDMA metilenodioximetanfetamina NH2 Figura 136 Estrutura geral das betafenetilaminas Há também outros medicamentos com estrutura química diferente dos citados anteriormente porém promovem estimulação simpática semelhante mazindol veja a figura a seguir e metilfenidato Ritalina R1 R2 HO N N n 9 8 7 6 2 3 4 Figura 137 Estrutura geral do mazindol Padrões de uso No Brasil é frequente o uso de anfetaminas conhecidas como rebites por caminhoneiros Existe a procura pelas anfetaminas e correlatos com o objetivo de aumentar o estado de vigília e também para o emagrecimento visto que alguns são comercializados como anorexígenos Toxicocinética A anfetamina é absorvida rapidamente pelo trato gastrointestinal com pico de concentração plasmática para 10 a 15 mg de uma a duas horas e três horas para metilfenidado e menfluramina A absorção completa ocorre no período de quatro a seis horas A ligação às proteínas plasmáticas é de 15 a 16 para metilfenidato e anfetamina e 34 para fenfluramina Ela atravessa barreira hematoencefálica Além disso 30 da dose terapêutica é excretada inalterada na urina em 24 horas 299 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS mas sofre influência do pH urinário sendo assim na urina ácida pH entre 55 e 6 60 serão excretadas inalteradas e na urina alcalina pH entre 75 e 8 somente 3 a 7 A meiavida de eliminação na urina ácida é de cerca de sete a oito horas porém na urina alcalina o tempo aumenta para 18 a 33 horas Toxicodinâmica As anfetaminas atuam nos receptores alfa e betaadrenérgicos e aumentam a concentração de dopamina na sinapse Os estudos indicam que devido à similaridade das anfetaminas com dopamina e norepinefrina podem atuar como falso neurotransmissor e a hipótese mais aceita para o mecanismo seria a liberação direta dos neurotransmissores das vesículas sinápticas assim como a inibição da sua recaptação resultando em um aumento na concentração sináptica Efeitos da intoxicação Os efeitos tóxicos produzidos pelas anfetaminas e derivados são similares aos efeitos produzidos pelo uso da cocaína 615 Drogas depressoras 6151 Etanol Em 2019 o MS informou que 179 da população adulta no Brasil faz uso abusivo de bebidas alcoólicas e que o consumo abusivo aumentou em 429 em mulheres Em relação à mortalidade entre 2000 e 2017 145 dos óbitos no Brasil estavam relacionados ao uso abuso de bebidas alcoólicas BRASIL 2019 Padrões de uso De acordo com Oga Camargo e Batistuzzo 2014 as bebidas alcoólicas com teor maior que 14 são produzidas por meio de destilação No processo a bebida fermentada é aquecida até o ponto em que o álcool é evaporado e separado da água O álcool evaporado é então condensado e coletado produzindo a bebida destilada O produto varia de acordo com a bebida fermentada comparada com a de origem como o conhaque destilado do vinho e o whisky do malte A concentração de álcool varia de acordo com a bebida como pode ser visto na tabela a seguir Tabela 10 Teor alcóolico das bebidas Bebida Teor alcoólico Dose habitual Vodca whisky e cachaça 38 a 50 50 ml Cervejas com baixo teor de álcool 3 a 5 350 ml Cervejas com alto teor de álcool 5 a 8 350 ml Saquê 16 60 ml 300 Unidade II Bebida Teor alcoólico Dose habitual Vinho branco e tinto 10 a 15 150 ml Champanhe 11 220 ml Adaptada de Ferreira sd Toxicocinética O etanol é uma substância hidrossolúvel rapidamente absorvida no estômago e intestino delgado As maiores concentrações plasmáticas são atingidas entre 30 e 90 minutos após a ingestão O tempo de esvaziamento gástrico e início de absorção intestinal pode ser retardado devido à presença de alimentos Sua distribuição é rápida e ampla em praticamente todos os tecidos Ele atravessa a barreira hematoencefálica atingindo o SNC A biotransformação ocorre no fígado por oxidação Conforme já discutido o etanol é biotransformado através da enzima álcool desidrogenase que o transforma em acetaldeído o qual por sua vez é transformado em acetato através da acetaldeído desidrogenase O acetaldeído é um metabólito tóxico responsável pelos sintomas da ressaca O etanol pode promover indução ou inibição enzimática e assim potencializa o efeito de algumas drogas depressores ou estimulantes do SNC aumenta a excreção antibióticos ou aumenta a toxicidade paracetamol Toxicodinâmica O etanol atua em vários sistemas de neurotransmissores e neurorreceptores como sistema adrenérgico sistema opioide serotonina dopamina acetilcolina glutamato e cálcio Podemos destacar o efeito na elevação diminuição e ausência de alterações no sistema GABA Uso agudo Alguns dos efeitos agudos do etanol seriam sedação redução da ansiedade diminuição da capacidade e julgamento desinibição e fala pastosa A ação principal é depressora porém em doses baixas pode ocorrer um efeito estimulante Uso crônico Causa alterações em diversos sistemas como hematológico gastrintestinal neurológico cardiovascular e endócrinoreprodutivo síndrome fetal tolerância e dependência Efeitos da intoxicação São efeitos a ocorrência de alterações na coordenação motora amnésia e aumento da agressividade As enfermidades que podem ser provocadas são a neuropatia periférica anemia megaloblástica plaquetopenia e leucopenia desenvolvimento de câncer principalmente no sistema gastrointestinal esteatose hepática hepatite alcoólica cirrose gastrites e úlceras miocardiopatias hipertensão elevação 301 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS do colesterol infarto agudo no miocárdio e AVC Outros efeitos que são consequências do abuso de etanol são diminuição da libido impotência esterilidade e hipogonadismo e deficiências nutricionais Tratamento da dependência Alguns fármacos são utilizados no tratamento de pacientes dependentes de etanol como dissulfiram naltrexona e acamprosato 616 Drogas despersonalizantes e alucinógenas As drogas despersonalizantes são aquelas com potencial para causar alterações sensoriais e alucinações Já as drogas alucinógenas que fazem parte do grupo das despersonalizantes são aquelas conhecidas como psicodélicas que produzem mudanças na percepção no pensamento e no estado de ânimo São capazes de promover estados delirantes nos quais o indivíduo escuta vozes que não existem e tem visões deturpadas da realidade e sensações ilusórias Além das alterações visuais e auditivas também ocorrem sensações olfativas gustativas e táteis Algumas pessoas possuem a ideia errônea de que as alucinações sempre são imagens engraçadas divertidas relaxantes ou sensações agradáveis mas muitas vezes o que ocorre é o que é conhecido como bad trip ou seja uma viagem ruim com alucinações bizarras e aterrorizantes que provocam medo desespero e tendências suicidas ou homicidas Outro fenômeno provocado pelas drogas é o que chamamos de flashbacks que são transtornos de percepção pósalucinatórias nesse caso ocorrem episódios de curta duração em que o indivíduo pode vivenciar os sintomas da alucinação novamente As substâncias que causam alucinações são classificadas em três distintos grupos As que pertencem ao grupo 1 provocam alucinações somente quando utilizadas em altas doses como etanol metais e hidrocarbonetos Ao grupo 2 pertencem as substâncias delirantes como atropina fenciclidina e triexifenidila Já o grupo 3 engloba as substâncias alucinógenas propriamente ditas como LSD mescalina e psilocibina As substâncias alucinógenas propriamente ditas são divididas em dois grupos de acordo com sua composição química e são semelhantes ao neurotransmissor 5hidroxitriptamina ou à norepinefrina 6161 LSD25 dietilamida do ácido lisérgico Sintetizado pela primeira vez pelo químico Albert Hoffmann em 1938 no laboratório farmacêutico Sandoz Ele procurava um fármaco para enxaqueca porém ao testar a substância percebeu que ela promovia efeitos alucinógenos sendo assim uma droga sintética derivada de alcaloides do ergot principalmente ergotamina que ocorrem naturalmente no fungo Claviceps purpúrea 302 Unidade II Toxicocinética A absorção ocorre em um período de 15 a 30 minutos após a administração e a duração do efeito é de seis horas O estágio de recuperação varia de 7 a 9 horas após a administração A distribuição ocorre em maior proporção nos rins fígado e pulmões e em menor proporção no tecido adiposo e cérebro Etapas da ação do LSD 1 Período de latência de 05 a três horas 2 Sensações de frio suor midríase e dor de cabeça 3 Medo e angústia 4 Síndrome psíquica e afetiva 5 Deturpação na sensação de tempo e percepções alteradas 6 Deturpação na sensação de espaço com distorção de sons e imagens 7 Alteração na sensação do próprio corpo 8 Alterações afetivas 9 Pensamentos confusos 10 Alucinações Toxicodinâmica Interage com receptores serotoninérgicos adrenérgicos e dopaminérgicos Age como antagonista na fenda présináptica impedindo a recaptação de 5HT e agonista na fenda póssináptica aumentando 5HT na fenda 6162 Plantas alucinógenas No Brasil as plantas alucinógenas mais conhecidas são jurema Mimosa hostilis beladona Atropa belladonna saia branca trombeteira ou maxixe bravo Datura e o ayahuasca mistura da Banisteriopis caapi e Psycotria viridis A planta conhecida como jurema é utilizada na preparação de um vinho bebida típica entre os índios e nordestinos Já a beladona é conhecida nas histórias por ter sido muito utilizada em rituais de bruxaria na Idade Média e mais recentemente é empregada de forma terapêutica principalmente em preparações homeopáticas mas que por possuir os princípios ativos escopolamina e hiosciamina tem potencial entorpecente podendo promover alucinações No passado essas substâncias eram 303 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS utilizadas como soro da verdade por causar um entorpecimento e deixar o indivíduo em um estado de hipnose A planta datura possui os mesmos componentes e também é utilizada pelo seu potencial em causar alucinações O quadro a seguir pontua algumas plantas com características alucinógenas Quadro 12 Plantas alucinógenas Nome científico Nome popular Princípios ativos Atropa belladonna L Beladona Atropina escopolamina e hiosciamina Datura sp Stramonium sp Dutra sp Ceratocaulis sp e Brugmansia sp Datura Atropina escopolamina e hiosciamina Mimosa hostilis Mart Benth Jurema Dimetiltriptamina Virola calophylla Spruce Warb e Virola theiodora Spruce ex Benth Warb Epená Dimetiltriptamina Banisteriopsis caapi Spruce ex Griseb C V Morton Ayahuasca Harmina e harmalina Psychotria viridis Ruiz Pav Chacrona Dimetiltriptamina Tabernanthe iboga Baill Ibogaína Ipomoea violacea L Amida do ácido lisérgico Lophophora williamsii Lem ex SalmDyck J M Coult Cacto peiote Mescalina Myristica fragrans Houtt Nozmoscada Miristicina Salvia divinorum Epling Játiva Sálvia Salvinorina Adaptado de Oga Camargo e Batistuzzo 2014 O cipó Banisteriopis caapi nativo da Amazônia é conhecido como ayahuasca e possui em sua composição os alcaloides βcarbolinas harmina e harmalina que atuam como inibidores da MAO Dessa forma o resultado será uma maior concentração de neurotransmissores na fenda sináptica como serotonina e adrenalina Em rituais de seitas religiosas como a Santo Daime e a União do Vegetal a ayahuasca é preparada com o cipó em associação com a planta chacrona Psycotria viridis que possui em sua composição o alcaloide indólico NNdimetiltriptamina o qual atua em receptores de setoronina Os usuários dessa bebida relatam que quando estão sob seu efeito passam por uma experiência mística e esotérica na qual conseguem ver santos de sua devoção ou entidades esotéricas como gnomos e fadas Eles acreditam que realmente estão em contato com essas entidades Alguns dos efeitos tóxicos predominantes são o vômito e as cólicas abdominais o que pode ser explicado pelo fato de a NNdimetiltriptamina agir em receptores de serotonina e o seu efeito ser potencializado pelas betacarbolinas que inibem a MAO aumentando a concentração de serotonina na fenda sináptica Quando a serotonina atua nos receptores de 5HT na zona de gatilho ocorre o reflexo do vômito Porém esse efeito tóxico é visto pelos usuários das seitas como uma desintoxicação do organismo A dimetiltriptamina quando administrada por via parenteral é um potente alucinógeno porém quando administrada por via oral é inativada pela ação de desaminação sofrida pela ação da enzima 304 Unidade II MAO intestinal e hepática Assim na associação das betacarbolinas com a dimetiltriptamina a ação da MAO é inibida e ocorre o efeito entorpecente Figura 138 Preparação da bebida ayahuasca Observação A Salvia divinorum não é encontrada no Brasil Tratase de uma planta mexicana conhecida popularmente como menta mágica e não é a mesma sálvia comercializada em nosso país No Brasil a salvinorina princípio ativo da Salvia divinorum é considerada uma substância psicotrópica sob controle especial e faz parte da lista F da Portaria 344MS de acordo com a RDC 39 pela Anvisa 6163 Cogumelos alucinógenos Os fungos com potencial entorpecente mais numerosos e mais importantes pertencem ao gênero Pcilocybe O país onde ocorre o maior consumo de fungos alucinógenos é o México Os efeitos alucinógenos são produzidos pelos alcaloides psilocina e psilocibina 4fosforiloxiN Ndimetiltriptamina que possuem estrutura química semelhante à da triptamina atuando em receptores de serotonina Alguns dos cogumelos alucinógenos são encontrados nas fezes de vacas e búfalos veja o quadro a seguir Quadro 13 Fungos alucinógenos mais conhecidos Fungo alucinógeno Característica Amanita muscaria Alucinógeno mais antigo usado pelo homem Botelus manicus Relacionado à loucura dos fungos Conocybe siligineoides Fungo alucinógeno sagrado utilizado no México Conocybe cyanescens Encontrado nos EUA contém psilocibina 305 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Fungo alucinógeno Característica Copelandia cyanescens Cultivado sobre o esterco de vaca Contém mais de 12 de psilocina e 06 de psilocibina Heimiella angrieformis Não se conhece sua contribuição química Panaeolus sphinctrinus Cresce no esterco de vaca Psilocybe caerulescens Fungo alucinógeno sagrado utilizado no México Russula agglutina Relacionado à loucura dos fungos Stropharia cubensis Usado por xamãs possui psilocibina Adaptado de Oga Camargo e Batistuzzo 2014 Figura 139 Fungo Amanita muscaria Figura 140 Copelandia cyanencens Uso prolongado de alucinógenos O uso a longo prazo de substâncias alucinógenas pode levar o indivíduo a mudanças de comportamento mas parece não estar associado ao desenvolvimento de uso compulsivo ou seja as pesquisas indicam que a dependência é psicológica Quando ocorre o uso de doses altas podem ocorrer episódios psicóticos como estado confuso ou paranoico reações esquizofrênicas reações paranoicas ou delírios de perseguição alucinose persistente como feedback negativo e depressão psicótica Já as manifestações clínicas são hiperexcitabilidade descontrole hipertensão ou hipotensão convulsões coma estados psicóticos prolongados midríase tremor reflexos exagerados e febre 306 Unidade II Tratamento das intoxicações agudas por alucinógenos O tratamento de intoxicações agudas por alucinógenos consiste em administrar diazepam 01 mgkg via oral Em caso graves quando ocorre o coma realizase a intubação do paciente para eliminação das secreções mucosas da traqueia mediante aspiração A acidificação da urina pode ser útil para acelerar a excreção 6164 Cannabis De acordo com estimativas da OMS a Cannabis sativa é a droga ilícita mais consumida no mundo com 1818 milhões de usuários em 2016 NAÇÕES UNIDAS 2016 A Cannabis sativa é originária da Ásia Central e achados arqueológicos indicam que ela é cultivada desde 4000 aC Ela possui diversos metabólitos que podem promover efeitos medicinais e efeitos tóxicos Já foram identificados mais de 400 canabinoides na Cannabis sativa Entre eles foram isolados cerca de 70 fitocanabinoides como delta 9THC delta 8THC canabinol CBN canabidiol CBD canabigerol CBG canabicromeno CBC canabiciclol CBL canabielsoin CBE canabinodiol CBDL e canabitriol CBTL Entre os fitocanabinoides o delta 9THC é reconhecido como o principal responsável pelos efeitos psicoativos Toxicocinética As preparações de Cannabis são consumidas na forma de cigarros ou cachimbos assim a absorção ocorre por via pulmonar Elas também podem ser incorporadas em alimentos como doces sendo ingeridas ou em alguns casos adicionadas a bebidas Quadro 14 Diferenças toxicocinéticas entre as exposições da Cannabis por via oral e pulmonar Toxicocinética Vias de administração Oral Pulmonar Velocidade de absorção Lenta e irregular Muito rápida Biodisponibilidade sistêmica 4 a 12 8 a 24 Início 30 a 60 minutos Minutos Efeitos subjetivos máximos 25 a 35 horas 8 a 15 minutos Duração 4 a 6 horas 1 a 3 horas Adaptado de Oga Camargo e Batistuzzo 2014 As características toxicocinéticas dos fitocanabinoides são a alta lipossolubilidade e o fato de se ligarem às proteínas plasmáticas 97 a 99 a lipoproteínas e em menor proporção à albumina e assim são distribuídas em maior proporção no encéfalo coração rins fígado e pulmões e se acumula intensamente no tecido adiposo Atravessam a barreira placentária podem causar alteração no 307 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS desenvolvimento fetal e são excretadas no leite materno durante a lactação sendo que 70 são excretados em 72 horas 30 na urina e 40 nas fezes Há situações em que uma pessoa precisa realizar um exame toxicológico como em um concurso admissão em um emprego acompanhamento de usuários de drogas ou controle de dopagem no esporte Assim se essa pessoa for usuária de maconha o que aconteceria Depois de quanto tempo após o uso o delta 9THC poderia ser detectado A janela de detecção para fumantes eventuais varia de dois a quatro dias e a de fumantes frequentes pode chegar a um mês Quando ocorre a ingestão de dois brownies contendo 28 de delta 9THC ela seria de seis dias Toxicodinâmica e mecanismo de ação Os endocanabinoides apresentam seletividade variada aos receptores CB1 e CB2 sendo a anandamida mais seletiva ao CB1 e o 2AG 2araquidonilglicerol ativo em CB1 e CB2 Os receptores canabinoides são receptores metabotrópicos desse modo o delta 9THC interage com os receptores CB1 ou CB2 assim como os endocanabinoides anandamida e 2AG e desencadeiam uma variedade de eventos intracelulares característicos Observação Anandamida é uma palavra que em sânscrito quer dizer felicidade Saiba mais Para saber mais sobre a anandamida e o efeitos dos endocanabinoides veja estas referências SAITO V M WOTJAK C T MOREIRA F A Exploração farmacológica do sistema endocanabinoide novas perspectivas para o tratamento de transtornos de ansiedade e depressão Revista Brasileira de Psiquiatria v 32 supl 1 p S7S14 2010 Disponível em httpswwwscielobrpdfrbp v32s1a04v32s1pdf Acesso em 2 dez 2020 SOUZA A A F et al Cannabis sativa uso de fitocanabinoides para o tratamento de dor crônica Brazilian Journal of Natural Sciences 2 ed v 1 p 112 2019 Disponível em httpsbjnscombrindexphpBJNS articleview3026 Acesso em 2 dez 2020 308 Unidade II Efeitos tóxicos da Cannabis A toxicidade aguda da Cannabis é considerada muito baixa e não existem relatos na literatura que indiquem que possa causar morte por excesso de consumo Observação Dose fatal 15 a 70 g dose muito maior do que a inalada por usuários DL50 800 a 1900 mgkg Doses baixas de Cannabis 2 a 10 mg de delta 9THC podem causar sensação de bemestar e felicidade com risos contagiantes relaxamento diminuição da ansiedade e sedação intensificação de experiências sensoriais principalmente estímulos visuais perda de memória recente dificuldade de concentração perda da noção de tempo e espaço coordenação motora diminuída e paranoide de perseguição Os efeitos físicos mais comuns são taquicardia hipertensão ou hipotensão olhos vermelhos hiposalivação com boca seca e aumento do apetite Com o uso na forma fumada a longo prazo podem ocorrer danos à mucosa e inflamação das vias aéreas tosse catarro espirros sinusite doença pulmonar obstrutiva crônica bronquite crônica e enfisema Também existe o risco de desenvolvimento de esquizofrenia 62 Toxicologia forense e analítica 621 Introdução à toxicologia forense e à toxicologia analítica A toxicologia forense pode ser definida como a aplicação da toxicologia com finalidade legal Dessa forma a aplicação mais comum é na investigação de substâncias químicas que podem ser usadas de forma a causar intoxicação ou morte KLAASSEN WATKINS 2012 Na investigação da causa da morte seguimos três etapas começamos com o histórico da ocorrência com detalhes na sequência realizamos as análises toxicológicas das amostras coletadas e finalizamos com a interpretação dos achados analíticos O que você pensa sobre a toxicologia forense É muito comum que as pessoas se lembrem das séries investigativas em que o perito criminal vai na cena do crime coletar amostras e realiza as análises para identificação da causa da morte muitas vezes utilizando equipamentos de análises associados a métodos computacionais e acessando banco de dados com informações Nessas séries podemos ver procedimentos que são reais utilizados na vida real mas também vemos muita ficção O que será que é verdade no que vemos nelas E quais são as funções de um toxicologista forense 309 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Ele é um profissional especialista em perícia criminal que pode atuar nas várias etapas de uma investigação como realizar as análises qualitativas e quantitativas pesquisar os toxicantes presentes em fluidos biológicos postmortem durante a necropsia e interpretar os achados analíticos Podemos atrelar duas áreas da toxicologia que estão interligadas a toxicologia forense e a toxicologia analítica A toxicologia analítica utiliza as bases da química analítica para as análises quantitativas e qualitativas de substâncias químicas que possam causar efeitos adversos a organismos vivos KLAASSEN WATKINS 2012 enquanto a toxicologia forense tem como funções identificar substâncias tóxicas nos organismos vivos através de amostras de sangue urina cabelo saliva entre outras e analisa substâncias tóxicas no meio ambiente como em amostras de água ar ou solo Conforme apresentado anteriormente as substâncias químicas e os agentes tóxicos são classificados quanto à sua natureza quanto ao órgão ou sistema em que atuam ou quanto às características físicas Quanto à natureza são divididos em naturais ou sintéticos e as de origem natural podem ser minerais vegetais ou derivados de animais Exemplo de aplicação Pense em exemplos de agentes tóxicos de origem vegetal mineral e derivados de animais Quanto ao órgão ou sistema em que atuam você já viu na classificação dos agentes tóxicos alguns exemplos de órgãosalvo porém é importante destacar que uma substância é chamada de nefrotóxica quando é tóxica para os rins de hepatotóxica quando afeta o fígado de neurotóxica quando afeta o SNC e de genotóxica quando causa mutações no DNA Em uma análise toxicológica os toxicantes a serem pesquisados podem ser gases irritantes ou asfixiantes Para os irritantes contaminantes da atmosfera não há biomarcador assim devese fazer a análise do ar Mas em uma exposição a gases irritantes ou asfixiantes pode existir um biomarcador por exemplo na exposição ao monóxido de carbono em que o biomarcador será a dosagem de carboxiemoglobina que pode ser determinada através de amostras de sangue e quantificada por cromatografia espectrofotometria ou gasometria Observação O biomarcador é um indicador biológico um parâmetro fisiológico ligado a uma doença ou uma classe de doenças Podem ser feitas medidas físicas peso cor e pressão medidas químicas xenobióticos e metabólitos ou medidas biológicas alterações fisiológicas ou celulares Na exposição a solventes orgânicos voláteis como nhexano podemos investigar a presença de metabólitos na urina como o 25hexanodiona que é um produto da biotransformação do hexano No caso de metais pesados podemos avaliar a presença de contaminantes diretos em alimentos como a 310 Unidade II presença de mercúrio em peixes ou realizar a monitorização terapêutica de pacientes que fazem uso contínuo de sais de lítio Nas análises toxicológicas podemos detectar os agentes tóxicos através de várias formas como substância química inalterada produto de biotransformação forma conjugada na urina ou alterações bioquímicas e hematológicas veja os quadros a seguir Quadro 15 Substâncias químicas na forma inalterada Substâncias Amostra a ser analisada Chumbo Sangue ou urina Aflatoxina Amendoim Etanol Ar expirado bafômetro Anfetamina Urina Lidocaína Plasma Cocaína Cabelo Mercúrio Água Quadro 16 Produtos de biotransformação Fonte de intoxicação Produto de biotransformação Amostra biológica Tolueno Ácido hipúrico Urina Cocaína Benzoilecgonina Urina Heroína 6acetilmorfina Sangue Alguns agentes tóxicos são biotransformados e os metabólitos podem ser detectados na urina ou no sangue porém algumas substâncias são excretadas na forma conjugada como a morfina e a Cannabis que formam conjugados com ácido glicurônico Quadro 17 Alterações bioquímicas e hematológicas provocadas por agentes tóxicos Xenobióticos Alteração Chumbo Enzima deltaALA desidratase redução no sangue e aumento na urina Organofosforados e carbamatos Inibição da enzima acetilcolinesterase Anilina e nitrobenzeno Aumento da concentração de metemoglobina no sangue Em uma investigação forense é necessária a seleção de amostras e as considerações para a escolha são a finalidade da análise a natureza da substância e se há biomarcador Se você for realizar uma análise toxicológica postmortem ou in vivo quais amostras utilizaria 311 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Para responder a essa pergunta devemos fazer algumas considerações As análises podem ser in vivo ou postmortem Devemos levar em consideração que se temos um paciente vivo não podemos utilizar qualquer amostra pois temos algumas opções que podem ser utilizadas as quais podem ser convencionais ou não convencionais já no caso postmortem podemos utilizar qualquer tipo de amostra 622 Características das amostras Quando a análise toxicológica é realizada para avaliar intoxicações in vivo podemos utilizar amostras convencionais ou não convencionais As convencionais são as amostras de sangue e urina Porém em situações específicas pode ser vantajoso o uso de amostras não convencionais como saliva suor cabelo e unha Cada tipo de amostra apresenta vantagens e desvantagens e é utilizada para determinadas finalidades conforme apresentado no quadro a seguir Quadro 18 Vantagens e desvantagens das amostras utilizadas in vivo Amostra Vantagens Desvantagens Urina Constituída por água livre de proteínas Maior concentração de xenobióticos Usada para triagem toxicológica Dificuldade de coleta em paciente inconsciente Determina somente substâncias utilizadas a curto prazo Sangue Possibilidade de identificação do momento do uso In vivo Correlação do efeito do fármaco x Concentração no sangue Em análises postmortem alguns interferentes podem prejudicar o uso da amostra como local da coleta formação de coágulos decomposição Saliva Possibilita determinar drogas de abuso Permite paralelos com concentração no sangue Facilidade de obtenção por ser não invasivo Coleta sem constrangimento Pouca quantidade de amostra Somente determina substâncias utilizadas a curto prazo Suor Coleta não invasiva e indolor Sem constrangimento Cabelo Permite a identificação de metais pesados e drogas ilícitas Possibilita identificação de substâncias utilizadas a longo prazo Unha Permite a identificação de metais pesados e drogas ilícitas Possibilita identificação de substâncias utilizadas a longo prazo Adaptado de Moreau e Siqueira 2008 Existem algumas características da droga que permitem sua passagem para a saliva Assim podemos fazer a detecção nessa amostra por exemplo da lipossolubilidade assim como identificar se está na forma não ionizada e não ligada às proteínas plasmáticas 312 Unidade II Exemplo de aplicação Quais drogas você acredita que podem ser detectadas na saliva Vamos auxiliálo nessa resposta podem ser encontradas nessa matriz biológia os esteroides hormônios benzodiazepínicos Cannabis cocaína crack LSD ecstasy anfetamina e metanfetamina morfina e opioides Para ser detectada no suor a droga ou fármaco precisa ter as mesmas características citadas para detecção na saliva As amostras de suor são coletadas para acompanhamento de presos detentos e dependentes internados assim como ocorre com a amostra de saliva As amostras de unha são utilizadas para avaliar a intoxicação em recémnascidos com mães usuárias de drogas já as amostras de cabelo para dopagem no esporte acompanhamento de usuários de drogas ilícitas e exposição ambiental É possível avaliar o período em que ocorreu maior exposição a determinados toxicantes Quando realizamos análises toxicológicas postmortem embora possamos utilizar qualquer amostra algumas são mais convencionais e outras não são convencionais As convencionais são amostras de sangue órgãos e tecidos como cérebro pulmões e fígado conteúdo gástrico cabelo e unha Porém em alguns casos é necessária a coleta de amostras não convencionais como a bile o humor vítreo e as larvas do corpo em decomposição O quadro a seguir apresenta as vantagens e desvantagens de cada amostra Quadro 19 Vantagens e desvantagens das amostras utilizados postmortem Amostra Vantagens Desvantagens Cérebro e pulmões Permite a detecção de exposição a gases e substâncias voláteis Tecido pulmonar Permite identificar intoxicações por via intravenosa Maior concentração de fármacos em comparação com o fígado Fígado Possui maior quantidade de substâncias alcalinas em comparação com o sangue Nessa amostra os agentes tóxicos não sofrem alterações mesmo postmortem Decompõe muito rápido Bile Maior concentração de substâncias tóxicas 1000x mais comparado com o sangue Adaptado de Moreau e Siqueira 2008 Algumas amostras utilizadas possuem características peculiares como o humor vítreo fluido que se encontra na cavidade posterior do olho preenchendo o espaço entre o cristalino e a retina A quantidade total de humor vítreo obtida gira em torno de 20 a 25 ml Como esse líquido faz trocas de substâncias com o sangue pode ser usado para a identificação de etanol em corpos carbonizados ou em decomposição O conteúdo gástrico é usado para identificar substâncias administradas por via oral 313 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS na forma inalterada como o inseticida carbamato conhecido como chumbinho As larvas são utilizadas quando o corpo está em decomposição e possibilita a identificação de fármacos Outras amostras utilizadas em uma investigação criminal são os objetos encontrados na cena do crime como copos xícaras colheres frascos seringas e garrafas Exceto em situações em que a investigação é direcionada existe um padrão na coleta das amostras postmortem conforme o quadro a seguir em que algumas matrizes sempre são coletadas seja em quantidade específica ou todo o conteúdo disponível Quadro 20 Matrizes empregadas nas análises toxicológicas postmortem Em quantidade específica Todo o conteúdo disponível Encéfalo 50 g Humor vítreo Fígado 50 g Bile Rim 50 g Urina Sangue cardíaco 25 ml Conteúdo gástrico Sangue periférico 10 ml 623 Urgências no atendimento a paciente vivo com suspeita de intoxicação Em situações em que se atende um paciente vivo vítima de intoxicação quando não temos evidências nem relatos do ocorrido realizamos uma triagem através de uma amostra de urina mas também podese utilizar o líquido da lavagem gástrica ou o vômito Em caso de monitorização terapêutica coletase o sangue eou saliva No controle de dopagem as amostras mais comuns são urina ar exalado etanol e saliva A triagem é realizada quando não se conhece o agente tóxico e utilizase análise por método cromatográfico Para confirmação da intoxicação utilizase outro método analítico como a espectrofotometria de massa Métodos específicos são utilizados quando já existe forte suspeita sobre o agente tóxico 624 Procedimento nas análises postmortem As investigações médicolegais são essenciais no caso de mortes violentas como suicídios homicídios ou acidentes 6241 Cadeia de custódia A cadeia de custódia é um documento que o laboratório mantém com o propósito de rastrear todas as operações realizadas com cada amostra desde sua coleta até a completa destruição do material Tudo deve ser detalhado desde a sequência dos fatos pelos quais passou a amostra a identificação de todos 314 Unidade II que a manusearam o tempo de manuseio e como a amostra foi rearmazenada ou dispensada As etapas seguidas na cadeia de custódia são apresentadas na figura a seguir Testes realizados até a disposição final Recebimento das amostras Aliquotagem Preparação Coleta das matrizes Entrada do cadáver Figura 141 Fases registradas na cadeia de custódia 6242 Coleta de amostras Em uma análise toxicológica postmortem são muitas as opções de amostras que podem ser coletadas e a escolha está relacionada com o histórico do caso Pode ser realizada a coleta de sangue do humor vítreo ou de amostras de tecido As amostras de sangue cadavérico são obtidas por meio de punção das veias subclávia eou femoral Quando se trata de humor vítreo destacase a angulação de 45º sobre o eixo da seringa em relação ao eixo anteroposterior para a adequada punção da câmara ocular que deve ser direta As amostras de tecido são coletadas separadas pulmonar cerebral renal hepático etc 6243 Preparação das amostras Na preparação da amostra é essencial primeiro remover os interferentes endógenos e analitos ligados às proteínas por meio de precipitação de proteínas A liberação dos analitos da amostra extração pode acontecer de três formas por hidrólises ácida alcalina ou enzimática quando os analitos forem conjugados por processo de digestão em meio alcalino ou ácido para liberação de drogas de abuso do cabelo ou por mineralização da matriz orgânica para separação e complexação de metais por agentes quelantes 315 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS 625 Clínica médica legal 6251 Investigação criminal Tratase de perícias realizadas em vivos que acontecem para verificação de direção perigosa ou investigação de drogas facilitadoras de abuso sexual violência roubos extorsão de dinheiro e outros As amostras biológicas coletadas para análise são urina sangue e ar expirado As drogas de abuso mais utilizadas em casos de agressão sexual costumam ser etanol benzodiazepínicos maconha anfetamínicos e opiáceos Existem relatos do uso de uma bebida conhecida como ayahuasca preparada pelo cipó Banisteriopis caapi e pela planta Psycotria viridis usada em rituais esotéricos também para abuso sexual 6252 Monitoramento da exposição ocupacional ou terapêutica Quando o trabalhador é exposto em seu ambiente de trabalho a substâncias químicas que podem promover toxicidade ao organismo é necessária a realização de um monitoramento biológico da exposição Pode ser analisado o agente tóxico ou seu produto de biotransformação em fluidos biológicos cabelo urina ou ar exalado O uso prolongado de fármacos pode acarretar alterações na concentração média do medicamento no organismo que em alguns casos pode aumentar gerando toxicidade ou diminuir promovendo redução do efeito Assim é recomendado um monitoramento para controle terapêutico 626 Métodos de análise 6261 Métodos de análises mais utilizados Os métodos mais utilizados para identificação de drogas de abuso e xenobióticos em diversas matrizes biológicas são a cromatografia gasosa GC a espectrometria de massas MS e a cromatografia líquida de alta eficiência HPLC Porém a cromatografia em camada delgada por ser um método mais simples e barato que permite a identificação de muitas substâncias é utilizada em muitos laboratórios de análises toxicológicas Sendo assim vale a pena estudarmos um pouco mais sobre o fundamento da cromatografia e o método de cromatografia em camada delgada CCD 6262 Técnica de cromatografia A cromatografia é um método físicoquímico de separação dos componentes de uma mistura realizada através da distribuição desses componentes entre duas fases que estão em contato íntimo Uma das fases permanece estacionária enquanto a outra movese através dela Durante a passagem da fase móvel sobre a fase estacionária os componentes da mistura são distribuídos entre as duas fases de forma que cada um dos componentes é seletivamente retido pela fase estacionária resultando em migrações diferenciais desses componentes A forma física do sistema de cromatografia que define a técnica geral é formada por uma fase estacionária que pode ser composta de um tubo cilíndrico cromatografia em coluna ou uma superfície 316 Unidade II planar cromatografia planar e uma fase móvel que pode ser composta por um gás GC um líquido HPLC ou vapor pressurizado cromatografia supercrítica Na fase móvel a polaridade do sistema de eluentes deve ser aumentada lentamente com o aumento da concentração do solvente mais polar sendo que em alguns casos podese usar um único solvente para a eluição do sistema cromatográfico Em um sistema de cromatografia planar a fase móvel proveniente de um reservatório passa através dos pontos de partida da amostra e arrasta os componentes da amostra durante o processo de desenvolvimento Definese por DR a distância percorrida pelos componentes e por DM a distância percorrida pela fase móvel Os mesmos termos se aplicam a um processo cromatográfico realizado em coluna desde que os componentes permaneçam no tubo cromatográfico sem serem eluídos Contudo normalmente a cromatografia em coluna procede com fluxo contínuo da fase móvel até que todos os componentes tenham saído da coluna e as suas presenças sejam detectadas pelo detector e indicadas graficamente Alternativamente o eluato pode ser coletado em frações de volumes idênticos as suas concentrações medidas e o cromatograma construído considerando o número do tubo de cada fração equivalente a uma unidade de distância A cromatografia planar pode ser em papel ou em camada delgada A cromatografia em papel é uma técnica simples que utiliza pequena quantidade de amostra e tem uma boa capacidade de resolução É utilizada principalmente para separação e identificação de compostos polares como antibióticos hidrossolúveis ácidos orgânicos e íons metálicos Os componentes menos solúveis na fase estacionária têm uma movimentação mais rápida ao longo do papel enquanto os mais solúveis na fase estacionária serão seletivamente retidos tendo uma movimentação mais lenta Isso se explica da seguinte maneira a celulose é constituída por 2000 ou mais unidades de glicose anidra ligadas por átomos de oxigênio um líquido polar como a água que tem grande afinidade pelas hidroxilas de cada glicose formando pontes de hidrogênio ficando retido e funcionando como fase estacionária e os líquidos menos polares solventes orgânicos são repelidos por esta estrutura e funcionam como fase móvel A forma mais simples da cromatografia em papel é a cromatografia ascendente que utiliza uma tira de papel de comprimento e largura variáveis em função da cuba cromatográfica a ser utilizada Marcase com lápis o ponto de partida da amostra a 2 cm de uma das bordas do papel e marcase também a linha de chegada da fase móvel ou frente do solvente geralmente distando 10 cm do ponto de partida Dependendo da largura do papel podese colocar apenas uma alíquota do padrão ou da amostra centralizandose essa aplicação na linha de partida No caso da possibilidade de colocarse mais de uma alíquota no ponto de partida deixase 2 cm de distância das bordas laterais e um intervalo entre os pontos de aplicação de 15 a 20 cm A largura 317 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS da tira do papel acima da linha de chegada da fase móvel deve ser igual ao diâmetro interno da cuba de maneira que o papel fique suspenso na vertical impedindo de deslizarse para baixo O nível da fase móvel deve ficar abaixo do ponto de partida da substância devendo sempre haver uma boa vedação da cuba cromatográfica para que não se perca o vapor dessa fase Por capilaridade a fase móvel começa a se movimentar em fluxo ascendente rapidamente no início e diminuindo gradativamente até parar por completo quando a força ascendente da capilaridade for neutralizada pela ação da gravidade Quando a fase móvel atingir a linha de chegada geralmente a 10 cm do ponto de partida retirase o papel da cuba cromatográfica e secase a tira de papel com secador de cabelo com ar quente ou frio até eliminarse a fase móvel No caso de mistura de substâncias de componentes coloridos à medida que ocorrer a separação a cor única se desdobrará em cores distintas em função do número de substâncias que a compõem No caso de misturas de substâncias incolores podese detectar revelar esses componentes por técnicas diversas A análise qualitativa de uma substância realizase através de seu Rf determinado utilizandose a expressão Rf Distância cm mm percorrida pela substância Distância cm mm percorrida pela frente da fase móvel Medese a distância percorrida pelo soluto em um tempo determinado desde o ponto de aplicação ou ponto de partida da amostra até o centro da mancha e a distância percorrida pela fase móvel desde o ponto de partida até o ponto extremo atingido por ela Lc a linha de chegada da fase móvel O Rf é uma constante física de uma determinada substância desde que se observem as características do papel a quantidade e qualidade da fase móvel a temperatura o volume e a concentração da substância aplicada Para a visualização da mancha formada pela amostra é necessária a utilização de um agente cromogênico como revelador Ele é borrifado sobre o papel usado na cromatografia sendo cada amostra uma mistura de substâncias como íons inorgânicos e inseticidas Existem na literatura fontes que informam qual deve ser a solução reveladora agente cromogênico a ser empregada qual a técnica de preparo e modo de conservação qual a sensibilidade e quais as substâncias detectadas por certos reveladores Muitas substâncias orgânicas absorvem radiações de luz ultravioleta e tornamse fluorescentes O papel quando tratado com solução de fluoresceína frequentemente destaca as manchas tornandoas amareloesverdeadas brancas ou azuis Entretanto as substâncias que absorvem a luz UV aparecem como manchas escuras sobre um fundo fluorescente azulado normalmente apresentado pelo papel 318 Unidade II Podem ser usadas lâmpadas UV de onda curta 240260 nm e onda larga 360 nm para visualização da mancha formada pela amostra Outro método de cromatografia planar é a cromatografia em camada delgada CCD que segue a mesma técnica da cromatografia em papel porém a fase estacionária será uma placa de vidro alumínio ou outro suporte inerte tratado por uma camada fina formada por um sólido granulado geralmente sílicagel Essa técnica consiste na separação dos componentes de uma mistura através da migração diferencial sobre uma camada delgada de adsorvente retido sobre uma superfície plana Ela apresenta vantagens por ser de fácil compreensão e execução promover separações em breve espaço de tempo e ser versátil de grande reprodutibilidade e baixo custo Os adsorventes mais usados são sílica SiO2 terra diatomácea celulose ou poliamida 62621 Tipos de sílica A sílica tem caráter fracamente ácido e é empregada na separação de compostos lipofílicos como aldeídos cetonas fenóis ácidos graxos aminoácidos alcaloides terpenoides e esteroides usando o mecanismo de adsorção Existem cinco tipos de sílica sílica G contém aglutinantes como gesso e amido ou talco sílica H não contém aglutinantes sílica P para uso em camada preparativa sílica F contém substâncias fluorescentes e sílica R adsorventes extra puros sem aditivos 62622 Preparação das placas Na preparação da placa misturamse cerca de 30 g de sílica com 60 a 70 ml de água destilada Essa quantidade de suspensão é suficiente para preparar cinco placas de 20 x 20 cm com uma espessura da camada ao redor de 03 mm A terra diatomácea é adsorvente neutro amplamente empregado como suporte nas separações por partição Pode ser encontrada com ou sem aglutinante Na preparação de placas utilizamse as mesmas proporções citadas para a sílica ou seja uma parte de adsorvente para duas partes de água destilada A celulose é empregada como suporte da fase estacionária líquida em cromatografia por partição ou troca iônica Para preparação de cinco placas de 20 x 20 cm misturamse 25 g de celulose com 90 ml de água destilada agitandose em agitador por dois minutos antes de colocar na placa de vidro A poliamida é empregada com mais frequência na separação de fenóis e de ácidos carboxílicos Sua maior utilização é comprometida pela dificuldade em se preparar as cromatoplacas no laboratório em função de sua baixa aderência ao vidro Para preparação das placas recomendase fazer a suspensão de 15 g de pó em 60 ml de metanol previamente purificado Estas quantidades são suficientes para cinco placas de 20 x 20 cm e 03 mm de espessura Para a aplicação das amostras nas cromatoplacas as gotas devem ser aplicadas 15 a 2 cm acima do bordo inferior evitandose que fiquem mergulhadas na fase móvel quando a placa for colocada na cuba A distância entre cada gota é de aproximadamente 1 cm evitandose sempre que haja contato entre as gotas de soluções 319 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Em placas preparativas uma solução concentrada da amostra é aplicada na forma de faixa ou linha horizontal cerca de 2 cm acima do bordo inferior da placa A técnica de CCD é uma técnica muito utilizada para triagem em muitos centros de controle de intoxicação O mais comum é a utilização de urina como amostra biológica para triagem de fármacos e drogas de abuso visto que é uma amostra de fácil coleta disponível em grandes volumes e com concentrações altas de substâncias comparadas ao soro Na urina os fármacos drogas de abuso e xenobióticos podem ser excretados inalterados na forma de metabólitos ou conjugados com ácido glicurônico ou sulfato Quando o conteúdo gástrico é coletado nas análises postmortem é uma matriz que pode ser bem interessante já que nessa amostra podemos identificar as substâncias na sua forma inalterada Já o sangue plasma ou soro é utilizado para análises quantitativas póstriagem na urina 627 Análise de drogas no cabelo Existem matrizes que não são convencionais nas análises toxicológicas porém muito úteis e de fácil coleta para detecção de algumas substâncias como o cabelo A incorporação de xenobióticos ao cabelo ocorre por difusão passiva a partir do sangue e algumas propriedades físicoquímicas das substâncias determinam o seu acúmulo no cabelo como lipossolubilidade e se está na forma livre no plasma Outro mecanismo é a difusão por secreções corporais como sebo e suor durante a formação da haste do cabelo Estimase que o cabelo cresce cerca de 1 cm ao mês o que equivale à janela de detecção do uso de drogas no período de 30 dias Para que o exame detecte o uso de substâncias de um período de até 90 dias necessitamos de uma amostra de 4 cm de cabelo contando a partir da base do folículo Se não for possível a coleta de uma amostra nessa medida retiramos amostras de pelos corporais pois eles apresentam um crescimento mais lento O procedimento de coleta é rápido e prático É imprescindível realizar a descontaminação da amostra antes da análise para eliminar possíveis resíduos de drogas na parte externa do cabelo ou pelo E qual técnica utilizamos para essa análise Quais drogas podemos detectar através de amostras de cabelo ou pelo O teste quantitativo é realizado por cromatografia líquida ou gasosa acoplado à espectrometria de massa quando o resultado da triagem for positivo Podemos detectar uma ampla quantidade de substâncias como anfetaminas mazindol femproporex anfepramona ecstasy metilenodioxianfetamina maconha THC e metabólitos cocaína opiáceos morfina heroína hormônios e metais pesados Uma vantagem no uso de amostra de cabelo é que possibilita um histórico cronológico da exposição ao agente tóxico como em situações de acidentes ambientes É possível avaliar se no período em que ocorreu a exposição houve maior acúmulo de substâncias tóxicas Sabendo que o cabelo cresce cerca de 1 cm ao mês é possível dividilo em partes de acordo com o tempo e dosar as concentrações em cada parte 320 Unidade II Saiba mais A Lei n 1310315 determina que os motoristas devem submeterse a exame toxicológico com janela de detecção mínima de 90 dias e a programa de controle de uso de drogas e de bebida alcoólica instituído pelo empregador pelo menos a cada dois anos e seis meses Leia essa lei na íntegra em BRASIL Lei n 13103 de 2 de março de 2015 Brasília 2015 Disponível em httpwwwplanaltogovbrCCivil03Ato201520182015LeiL13103 htm Acesso em 2 dez 2020 628 Testes rápidos para identificação de drogas de abuso Na apreensão de drogas ilícitas é comum a realização de testes por reagentes cromogênicos Os testes rápidos consistem em promover reações de coloração com a utilização de reativos específicos para determinada classe de fármacos Dessa maneira é realizada uma triagem sendo possível determinar a classe farmacológica da droga suspeita Quando a droga é recebida pelo laboratório de investigação toxicológica podemos identificála inicialmente pela aparência A maconha por exemplo é comercializada na forma de tabletes prensados no formato de tijolos ou já fragmentado em porções pequenas Já a cocaína é um pó branco sendo geralmente vendida fracionada em tubos tipo Eppendorf ou em saquinhos O LSD são papéis geralmente de seda com diferentes figurinhas como desenhos coloridos As anfetaminas como o ecstasy são comprimidos Por sua vez o crack são pedrinhas amareladas como apresentado na figura a seguir Figura 142 Amostras de drogas ilícitas apreendidas 321 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Para identificação da THC principal componente da maconha é necessário primeiro fazer a extração do THC com algum solvente orgânico por exemplo uma mistura de éter clorofórmio Pingamos um pouco desse extrato em um papel de filtro e uma quantidade de reativo fast blue diluída em água e aplicada sobre a amostra A reação produz uma coloração avermelhada Solvente éter clorofórmio para extração do princípio ativo THC Reativo Fast blue Resultado coloração avermelhada Figura 143 Teste colorimétrico para identificação de THC com reativo fast blue Figura 144 Kits para teste rápido Existem kits de testes rápidos também utilizados por peritos para identificação rápida de drogas que podem ser utilizados no próprio local da apreensão Um dos testes é uma ampola como a que pode ser visualizada na foto a partir da qual é realizado o teste de DuquenoisLevine A ampola possui uma solução composta por acetaldeído e vanilina em etanol 95 Colocamos a amostra suspeita para maconha dentro da ampola e misturamos nesse reagente Logo em seguida quebramos a tampa da ampola na qual se localiza uma quantidade de ácido clorídrico fumegante que escorre pela parede do 322 Unidade II tubo e ao entrar em contato com o extrato obtido inicialmente reage promovendo uma coloração violeta que indica positivo para droga Para a identificação de cocaína ou crack é utilizada a técnica de Scott e Mayer O reagente de Scott é composto por uma solução de tiocianato de cobalto 2 e glicerina Pingamos esse reagente na amostra suspeita e observamos a mudança de cor A coloração azul indica que a amostra é cocaína ou crack porém é necessário fazer uma confirmação pois pode ocorrer falsopositivo Dessa forma pingamos uma gota de HCl 01N se continuar azul confirmamos o resultado positivo 63 Dopagem no esporte 631 Histórico O termo dopagem ou doping é utilizado quando o indivíduo usa substâncias químicas ou métodos para obter vantagens sobre os outros em determinadas competições YONAMINE ALMEIDA 2014 A finalidade da dopagem é aumentar a força resistência e tamanho assim como obter maior velocidade nas competições porém o consumo excessivo pode resultar em toxicidade gerando efeitos adversos e em alguns casos pode levar ao óbito A história apresenta vários registros sobre a prática da dopagem com finalidade estimulante e para aumentar a capacidade no trabalho e nos esportes Como podemos ver no quadro a seguir esses registros são muito antigos Quadro 21 História da prática de dopagem Tempo Lugar Dopagem Há 5000 anos China Plantas com efeitos estimulantes como a machuang para aumentar sua capacidade no trabalho 800 aC Grécia Atletas olímpicos já utilizavam ervas e cogumelos com potencial entorpecente Data desconhecida América précolombiana Incas consumiam folhas de coca cocaína misturadas com café guaraná castanha e chámate cafeína Século III dC Roma antiga Gladiadores utilizavam estimulantes misturados com álcool 1896 Atenas Uso de bolinhas contendo estimulantes como cocaína e efedrina Adaptado de Comitê Olímpico Brasileiro 2006 Em tempos mais recentes muitos atletas foram suspensos ou perderam suas medalhas por acusarem dopagem Daiane dos Santos 2009 e Cesar Cielo 2011 foram suspensos pelo uso de furosemida diurético O último alegou erro na manipulação do suplemento que utilizava Ben Johnson nas Olimpíadas de Seul 1988 venceu os 100 m rasos mas foi suspenso por dois anos perdendo sua medalha de ouro devido ao uso de estanozolol anabolizante Ele alegou que foi sabotado e que usava esteroides nos treinos mas que era orientado e estaria livre do anabolizante no período do exame de doping pois interrompia o uso antes das competições Maradona jogador de futebol argentino foi pego no exame antidoping pelo uso de cocaína 1991 sofrendo suspensão de 15 meses e efedrina na Copa de 1994 com suspensão de 18 meses O ciclista Lance Armstrong que ganhou diversos troféus 323 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS e medalhas durante sua carreira perdeu todos os títulos e foi banido do esporte após confessar em um programa americano de televisão que utilizava eritropoetina testosterona cortisona e dopagem sanguínea Nas Olimpíadas de 2016 a nadadora chinesa Chen Xinyi hidroclorotiazida a atleta búlgara Silvia Danekova eritropoetina o halterofilista quirguiz Izzat Artykov estricnina o ciclista brasileiro Kleber Ramos CERA e no levantamento de peso os irmãos Tornaz e Adrian Zulinski nandrolona foram pegos no exame de dopagem Nos esportes com torneios prolongados como futebol vôlei e basquete os exames antidopagem são realizados de forma aleatória por sorteio Já nos esportes de temporada como atletismo e natação os exames são realizados nos vencedores das provas ou quando o atleta está sob suspeita Nas grandes competições todos os vencedores realizam os exames de dopagem e as amostras ficam guardadas para novas análises futuras caso surjam técnicas de detecção de dopagem Outra análise que tem sido cogitada é a genética visto ser uma nova forma de dopagem O Comitê Olímpico Internacional COI que foi criado em 1967 elaborou uma lista de substâncias e métodos proibidos no esporte visto que o uso de substâncias estimulantes é uma prática comum entre os atletas O objetivo é proteger a vida dos atletas e garantir a igualdade entre os participantes das competições A entidade que monitora e acompanha o código mundial antidopagem é a Wada World AntiDoping Agency Agência Mundial Antidopagem Quadro 22 Substâncias e métodos proibidos no esporte Categoria Substâncias e métodos proibidos Substâncias proibidas nas competições e fora das competições S0 Substâncias não aprovadas S1 Agentes anabolizantes S2 Hormônios peptídicos fatores de crescimento substâncias correlatas e miméticos S3 Beta2agonistas S4 Moduladores hormonais e metabólitos S5 Diuréticos e mascarantes Métodos proibidos nas competições e fora das competições M1 Manipulação de sangue e componentes sanguíneos M2 Manipulação química ou física M3 Doping genético e celular Substâncias e métodos proibidos em competição S6 Estimulantes S7 Narcóticos S8 Canabinoides S9 Glicocorticoides Substâncias proibidas em alguns esportes P1 Betabloqueadores Adaptado de World AntiDoping Agency sd 324 Unidade II Saiba mais Veja a lista completa de substâncias proibidas no doping WORLD ANTIDOPING AGENCY Código mundial antidoping sd Disponível em httpswwwcoborgbrptdocumentosdownload559d2e 6f27321 Acesso em 2 dez 2020 Substâncias não aprovadas Esse item indica que substâncias que não forem aprovadas para uso humano são proibidas em todos os períodos isto é nas competições e fora delas Incluemse aqui as drogas em fase préclínica ou clínica do desenvolvimento as drogas descontinuadas designer drugs análogos estruturais e substâncias aprovadas apenas para uso veterinário As designer drugs são as drogas de abuso derivadas de opioides anfetamínicos triptamínicos piperazinas e canabinoides Saiba mais Leia mais sobre o assunto no texto a seguir BULCÃO R et al Designer drugs aspectos analíticos e biológicos Química Nova v 35 n 1 p 149158 2012 Disponível em httpswww scielobrpdfqnv35n1v35n1a27pdf Acesso em 29 nov 2020 632 Substâncias proibidas nas competições e fora delas 6321 Agentes anabolizantes A finalidade é aumentar a massa muscular em esportes que exigem força e velocidade Alguns exemplos de esteroides anabolizantes androgênicos são clostebol estanozolol testosterona Durateston metiltestosterona nandrolona Decadurabolin e Durabolin e oxandrolona Eles podem produzir alguns efeitos tóxicos como hipertensão infertilidade aumento da chance de ataque cardíaco hipertrofia cardíaca insuficiência cardíaca neoplasias hepáticas hepatite e hepatomas e efeitos feminilizantes e virilizantes 325 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS 6322 Hormônios peptídicos fatores de crescimento substâncias correlatas e miméticos Vamos agora compreender melhor como os hormônios podem agir no organismo e conduzir a um aumento na performance do atleta Eritropoietinas A eritropoietina é um hormônio sintetizado e secretado pelos rins que estimula a medula óssea a produzir eritrócitos e consequentemente aumenta a oxigenação nos músculos Aqui temos dois tipos os agonistas do receptor de eritropoietina como eritropoietinas EPO darbepoetinas dEPO e derivados da Epo como metoxipolietilenoglicol CERA e também os agentes ativadores do fator induzível por hipóxia como cobalto e daprodustat GSK1278863 Podem produzir efeitos tóxicos leves como náuseas ansiedade dores de cabeça e febre ou mais graves como hipertensão arterial infarto do miocárdio e morte súbita Observação As eritropoietinas são utilizadas principalmente por ciclistas Hormônios peptídicos e seus fatores de liberação Você saberia dizer quem são esses hormônios e qual é a finalidade do uso nas práticas esportivas E o que podem causar de efeitos adversos Esses hormônios são utilizados por estimularem a síntese de proteínas aumentando a massa muscular promoverem a hipertrofia repararem dano muscular localizado e ativarem células musculares precursoras E afinal quem são eles Você já deve conhecer a gonadotrofina coriônica CG o hormônio luteinizante LH e seus fatores de liberação no homem como busserelina deslorelina gosserelina e triptotorelina as corticotrofinas e seus fatores de liberação como corticorelina e os hormônios de crescimento GH fatores de crescimento e moduladores de fatores de crescimento Alguns dos efeitos adversos e tóxicos produzidos pelas substâncias citadas são ginecomastia CG gigantismo e acromegalia GH diabetes reações alérgicas e hipertrofia miocárdica 6323 Beta 2agonistas Sua finalidade é aumentar a resistência e diminuir a fadiga muscular São fármacos usados na terapêutica para tratamento da asma e outras complicações respiratórias como fenoterol formoterol salbutamol e terbutalina 326 Unidade II Observação Os agonistas beta2 são broncodilatadores utilizados via inalatória para o tratamento da asma O uso oral desses fármacos aumenta a resistência e diminui a fadiga Para alcançar esse efeito é necessária uma dose 10 a 20 vezes superior à usada para inalação Todos os agonistas beta2 são proibidos nos esportes e somente mediante apresentação de declaração terapêutica o salbutamol o salmeterol e o formoterol são permitidos na forma inalatória 6324 Moduladores hormonais Os modulares hormonais são agentes com atividade antiestrogênica utilizados para aumentar a concentração de testosterona plasmática e diminuir a ginecomastia e a retenção de água Alguns exemplos são os inibidores da aromatase como 2androstenol anastrozol e letrozol os moduladores seletivos do receptor de estrogênio como tamoxifeno e raloxifeno e outras substâncias antiestrogênicas como clomifeno 6325 Diuréticos e agentes mascarantes Sua finalidade no esporte é a redução do peso corpóreo mascarando o consumo de outros agentes dopantes e reduzindo a sua concentração na urina Observação Esses fármacos são utilizados no esporte principalmente para redução do peso em modalidades de esportes onde há divisão por categoria de peso como boxe judô halterofilismo e outros Alguns exemplos são a clortalidona a furosemida a indapamida e a espironolactona que podem causar efeitos adversos e tóxicos como desidratação cãimbras musculares diminuição do volume sanguíneo doenças renais hipotensão ortostática alteração do ritmo cardíaco e perda acentuada de sais minerais 633 Métodos de dopagem 6331 Manipulação de sangue e seus componentes A transfusão sanguínea é uma forma de dopagem proibida Tem como finalidade melhorar o transporte de oxigênio no organismo aumentar a capacidade de manter o pH muscular e auxiliar no controle da temperatura corpórea aumentando também a resistência do indivíduo mas pode 327 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS gerar efeitos perigosos como formação de trombose venosa flebite septicemia reações alérgicas e doenças infecciosas 6332 Manipulação química ou física É um método usado para adulterar ou tentar adulterar amostras coletadas durante o controle de dopagem Pode ser a substituição de amostras ou adição de proteases à amostra 6333 Dopagem genética ou celular São formas de dopagem modernas e que ao longo do tempo tendem a progredir Atualmente algumas técnicas já são conhecidas mas a tendência é que com o conhecimento de novas formas de modificação genética e celular novos itens sejam incorporados nesse quesito São exemplos o uso de ácidos nucleicos ou seus análogos que possam alterar a sequência genômica eou alterar a expressão genética e o uso de células normais ou geneticamente modificadas Qualquer agente farmacológico ou biológico que possa alterar a expressão gênica e melhorar o desempenho do atleta é proibido no esporte 634 Outras substâncias proibidas 6341 Estimulantes Sua finalidade é aumentar o desempenho o estado de alerta e a competitividade e reduzir o cansaço Alguns exemplos são os estimulantes não especificados como anfepramona anfetamina cocaína fenproporex e metanfetamina e os estimulantes especificados como efedrina epinefrina estricnina metilfenidato e pseudoefedrina Podem produzir efeitos adversos e tóxicos como alteração da temperatura hipertensão taquicardia e arritmias midríase ansiedade crises convulsivas aumento da agressividade delírios efeitos cardiovasculares e morte súbita Os estimulantes são utilizados por jogadores de futebol americano para aumentar a concentração doses mais baixas ou aumentar a agressividade doses mais altas em corredores e nadadores para aumentar a energia e nos jóqueis para redução do apetite e do peso 6342 Narcóticos São os analgésicos narcóticos usados para diminuir a dor utilizados principalmente por ciclistas no boxe e em outros esportes de luta Você sabe quais são os analgésicos narcóticos São a morfina e derivados como fentanil diamorfina heroína metadona oxicodona e oximorfona Podem causar depressão respiratória e cardiovascular redução da testosterona alterações gastrointestinais confusão mental e dependência 328 Unidade II 6343 Canabinoides Sua principal finalidade no esporte é a redução da ansiedade O uso de canabinoides no esporte é controversa pois há mais evidências de prejuízo ao desempenho do atleta do que benefícios 6344 Glicocorticoides Os glicocorticoides promovem efeitos neuroestimulatórios nos receptores cerebrais como atenuar sensação de fadiga e efeitos antiinflamatórios e analgésicos Alguns exemplos são betametasona budesonida cortisona dexametasona hidrocortisona e prednisolona Podem causar efeitos adversos e tóxicos como osteoporose resistência à insulina e doenças cardiovasculares o que não é desejável para um atleta 6345 Betabloqueadores Os betabloqueadores são utilizados para tratamento de doenças cardiovasculares como insuficiência cardíaca angina e hipertensão Mas então por que é utilizado no esporte Para compreender melhor isso vamos imaginar um arqueiro como Robin Hood que precisa ter precisão e tranquilidade para acertar as flechas Imagina se ele começar a tremer e sentir taquicardia como seria o final da história Da mesma forma atletas que praticam modalidades como arco e flecha golfe dardo esportes de tiro e jogos de bilhar precisam de firmeza nas mãos e tranquilidade para melhorar sua concentração e acertar seu alvo Os betabloqueadores são utilizados nesse caso por reduzirem o tremor e o estresse e aumentarem a precisão e a exatidão além de amenizarem sintomas de ansiedade como taquicardia Você conhece essa classe de fármacos São exemplos atenolol bisoprolol carvedilol e propranolol Porém essas substâncias podem provocar tontura letargia sonolência distúrbios visuais insônia e depressão 635 Controle antidopagem e métodos analíticos Os controles seguem os códigos mundiais antidopagem e os padrões nacionais O processo de controle de dopagem segue cinco etapas Seleção dos atletas Notificação dos atletas Coleta das amostras Análise das amostras Gestão dos resultados 329 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Os controles podem acontecer dentro ou fora de competição Em competição por sorteio acontecem com base na classificação obtida ou segundo outro critério específico Já os controles fora de competição podem ser realizados a todo momento em qualquer lugar e sem aviso prévio O atleta selecionado dentro de um grupoalvo deverá informar sua localização em determinado período O atleta poderá ser submetido ao controle de dopagem em casa em seu lugar de treinamento ou em outros lugares apropriados O processo de notificação é o mesmo em competição ou fora de competição Um agente mostrará suas credenciais para comprovar que está autorizado a fazer o teste Em seguida mostrará os deveres e direitos do atleta e solicitará que assine a notificação Em competição uma vez notificado o atleta deve apresentarse imediatamente à estação de controle de dopagem O atleta poderá solicitar adiamento do teste por uma razão válida como participar de uma cerimônia de entrega de medalhas realizar uma entrevista com a imprensa ou necessitar de cuidados médicos A partir da notificação o oficial de controle ou escolta permanecerá com o atleta enquanto todo o processo de controle tenha sido concluído Durante o processo o atleta tem direito ao acompanhamento de um representante que deverá cumprir também algumas responsabilidades Primeiro o agente irá pedir ao atleta um documento de identidade válido com foto e em seguida solicitar o fornecimento de amostras de urina sangue ou ambas Quando estiver pronto a fornecer a amostra o agente do mesmo sexo acompanhará todo o processo de coleta até que o atleta tenha fornecido uma amostra válida Será pedido ao atleta que divida a amostra de urina em dois frascos A e B lacrando ambos Ele será a única pessoa a manipular o kit de coleta de amostras a menos que peça ajuda Ao final o atleta deverá conferir e assinar o formulário de controle de dopagem e as amostras coletadas Uma cópia do formulário que não revela sua identidade será enviada a um laboratório acreditado pela agência mundial de antidopagem e cópias serão encaminhadas a organizações antidopagens responsáveis pelo teste e ao atleta Quando a amostra A chegar do laboratório ela será aberta e analisada A amostra B permanecerá armazenada em um lugar seguro e só será analisada a pedido do atleta A análise das amostras para controle de dopagem deve ser realizada conforme os procedimentos previstos no padrão internacional para laboratórios e as amostras somente podem ser analisadas em laboratórios credenciados e aprovados WADAAMA 2020 A amostra de urina é a mais comum nas análises antidopagem Deve ser coletada uma amostra com 75 ml sendo dividida em duas partes A primeira parte corresponde a 50 ml e é utilizada nas análises enquanto a segunda corresponde a 25 ml e fica armazenada para uma contraprova A contraprova é feita a pedido do atleta e a análise deve ser paga por ele 330 Unidade II As técnicas mais utilizadas para análise das amostras são cromatografia gasosa espectrometria de massa e ensaios imunológicos para hormônio Análises de sangue também são utilizadas principalmente para identificar EPO As análises toxicológicas na identificação de dopagem são divididas em duas etapas a triagem e a confirmatória As amostras que acusam positivo na triagem passam para as análises confirmatórias em que poderão ser realizadas técnicas mais especificas O laboratório informará os resultados para a organização antidopagem responsável por sua gestão Uma cópia será enviada a uma agência mundial antidopagem para assegurar a integridade do processo Em caso de resultado analítico adverso o atleta tem direito de solicitar a análise da amostra B nos prazos definidos apresentar defesa e apelar da decisão Os procedimentos de controle de dopagem são importantes para combater a dopagem protegendo o direito dos atletas e promovendo competições mais justas Resumo A exposição a substâncias químicas presentes no ambiente de trabalho pode ser responsável por significativos casos de intoxicação No Brasil nos últimos anos tem havido aumento no número de casos de intoxicação ocupacional Um dos principais desafios da toxicologia ocupacional é prevenir a intoxicação do trabalhador Para isso realizase a monitorização ambiental e a biológica Na monitorização ambiental verificase a intensidade de exposição do trabalhador à substância química que está presente no ambiente de trabalho e na monitorização biológica verificase a presença da substância química inalterada produtos de biotransformação ou alteração bioquímica precoce em matrizes biológicas para estimar a intensidade de exposição Os limites de exposição ocupacional no Brasil são delineados pelo Ministério do Trabalho Entretanto essas informações são compiladas de agências internacionais como a ACGIH Dependendo da toxicidade da substância química produzida ou utilizada no ambiente de trabalho o monitoramento ocorre por parâmetros distintos Dessa forma substâncias que apresentam risco de intoxicação na exposição crônica são monitoradas pelo TLVTWA substâncias químicas que apresentam risco de dano tecidual irreversível irritação ou narcose são monitoradas pelo TLVSTEL e por fim substâncias com importância na toxicidade aguda são monitoradas pelo TLVC ceiling 331 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS A escolha de bioindicador matriz biológica amostragem e técnica analítica adequados são fundamentais para que haja resposta fidedigna para os objetivos relacionados à prevenção da intoxicação A intoxicação por medicamentos assume nos dias atuais uma das grandes causas de intoxicação ocorrentes Por isso exploramos nesta unidade a incidência dessas intoxicações bem como descrevemos as principais classes de fármacos envolvidas nesses episódios Esta unidade também versou sobre alguns dos psicofármacos envolvidos em intoxicações bem como antiinflamatórios não esteroidais além do manejo de tratamento para intoxicações medicamentosas como as medidas de suporte medidas de descontaminação do TGI e medidas que possam contribuir com a eliminação desses agentes Ainda trouxemos uma discussão acerca da conduta laboratorial analítica com os principais testes realizados e sua interpretação Apresentamos uma discussão sobre as diversas síndromes tóxicas que exigem uma conduta clínica e manobras na tentativa de revertêlas em que destacamos as intoxicações de urgência intoxicações agudas com suas condutas clínicas e práticas executadas Apresentamos um conteúdo bem detalhado sobre toxicologia clínica voltado à monitorização terapêutica e suas práticas executadas na prevenção diagnóstico e tratamento das intoxicações envolvendo fármacos Encerramos com um detalhamento sobre os principais antídotos empregados no tratamento às principais intoxicações Na toxicologia social tivemos a oportunidade de compreender como diferentes substâncias químicas agem na neuroquímica de um organismo condicionando seu comportamento Também tivemos a oportunidade de verificar por que algumas substâncias químicas apresentam elevado potencial de reforço enquanto outras apresentam baixo potencial de reforço assim como as consequências dessas características a quem se expõe a essas substâncias químicas Foi possível ainda contextualizarmos os principais bioindicadores de exposição a algumas substâncias psicoativas e consequentemente caracterizar a matriz biológica de escolha para a identificação e quantificação dessas substâncias 332 Unidade II Exercícios Questão 1 Leia o texto a seguir A toxicologia forense é a aplicação da toxicologia com propósitos legais com o principal objetivo de detectar e quantificar as substâncias tóxicas eventualmente presentes em situações criminais Portanto toxicologia forense e legislação se sobrepõem A toxicologia forense ainda é uma área em desenvolvimento e está sempre incorporando as novas tecnologias disponíveis na área analítica Além do avanço tecnológico a toxicologia forense também se moderniza constantemente pois novos venenos são descobertos diariamente Observase que a princípio a confirmação de um crime baseavase apenas em suspeitas e indícios Diante da necessidade de desvendar corretamente um caso técnicas de identificação foram estudadas desenvolvidas e colocadas em prática Partiram de níveis simples de complexidade chegando nos dias atuais aos mais avançados níveis moleculares Com o dinamismo dessa ciência o aperfeiçoamento das técnicas tende a evoluir cada vez mais acompanhando a evolução tecnológica dos recursos disponíveis às pesquisas científicas Fonte AIELLO T B PEÇANHA M P Análise toxicológica forense da ficção científica à realidade Revista Eletrônica de Biologia REB v 4 n 3 2011 Disponível em httpsrevistaspucspbr rebarticleview983326gt0 Acesso em 27 set 2020 O texto mostra claramente que a toxicologia forense é uma área em constante atualização Analise as afirmativas a seguir elaboradas sobre esse tema I Os materiais disponíveis para análise forense são os mais diversos possíveis o que aumenta muito o grau de dificuldade de execução desse tipo de análise As matrizes biológicas utilizadas na caracterização da exposição humana em testes in vivo são urina plasma sangue saliva e cabelo Também podem ser usadas matrizes alternativas como suor unha mecônio tecidos e cabelos de recémnascidos II As matrizes biológicas normalmente utilizadas na caracterização da exposição humana em análises post mortem são sangue total aorta cavidade cardíaca e femoral humor vítreo e vísceras como fígado rins e cérebro III As principais técnicas de análise toxicológica aplicáveis a esse contexto incluem métodos clássicos não instrumentais como os testes colorimétricos e métodos mais sofisticados como os imunoensaios testes imonulógicos e a cromatografia cromatografia em camada delgada CCD cromatografia gasosa CG e cromatografia líquida de alta eficiência HPLC ou CLAE 333 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Assinale a alternativa correta A Apenas a afirmativa I é correta B Apenas a afirmativa II é correta C Apenas as afirmativas I e III são corretas D Todas as afirmativas são corretas E Nenhuma afirmativa é correta Resposta correta alternativa D Análise das afirmativas I Afirmativa correta Justificativa devemos ter atenção para o fato de que se trata de um material in vivo o que faz com que algumas matrizes ainda estejam disponíveis ou possam ser facilmente coletadas sendo as principais a urina o plasma o sangue a saliva e o cabelo II Afirmativa correta Justificativa devemos ter atenção para o fato de que se trata de uma análise post mortem ou seja feita a partir de um cadáver e tal situação apresenta algumas limitações Por isso as principais matrizes a serem coletadas são o sangue total aorta cavidade cardíaca e femoral o humor vítreo e as vísceras fígado rins e cérebro III Afirmativa correta Justificativa para a execução das análises toxicológicas é fundamental que o laboratório ofereça métodos analíticos simples e inequívocos e isso pode variar de acordo com a disponibilidade de recursos Há métodos que usam procedimentos manuais e outros que mecanizam o processo De qualquer forma há a requisição de técnicas de fácil execução e com respostas rápidas como os testes de triagem e de técnicas mais específicas baseadas em um princípio de detecção diferente e que concretizam uma etapa confirmatória Para que o resultado da análise seja considerado positivo o resultado da triagem e da confirmação devem ser positivos Cabe ao toxicologista forense escolher qual técnica é mais apropriada para a análise baseandose em critérios como aplicabilidade sensibilidade seletividade precisão e exatidão da técnica além da disponibilidade e do custo da análise Todos os métodos apresentados na afirmativa são válidos 334 Unidade II Questão 2 Leia o texto a seguir O consumo de drogas segue aumentando no Brasil tornandose maior a preocupação da área de segurança pública Nesse contexto a toxicologia forense utiliza cada vez mais as amostras não convencionais como o cabelo que apresenta vantagens como longa janela de detecção e viabilidade de coleta em cadáveres com estágio avançado de decomposição Assim este estudo propõe desenvolvimento validação e aplicação de uma metodologia para quantificação de benzoilecgonina em amostras de CB empregando a cromatografia líquida de alta eficiência CLAE com detector de arranjo de diodos DAD Fonte CRUZ A C H D C Quantificação de cocaína e seu produto de biotransformação benzoilecgonina em amostras de cabelo desenvolvimento validação e aplicação de método Dissertação Mestrado Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Ciências Biológicas Programa de PósGraduação em Farmacologia Florianópolis 2017 Disponível em httpsrepositorioufscbr handle123456789189745 Acesso em 27 set 2020 Com base nas informações apresentadas e nos seus conhecimentos analise as afirmativas I A droga em questão é a cocaína que apresenta marcante efeito depressor do sistema nervoso central e é quase toda eliminada em sua forma original inalterada pela urina cabendo à benzoilecgonina acumularse no cabelo II A droga em questão é uma anfetamina de uso comum por profissionais que precisam ficar acordados durante muito tempo por exemplo caminhoneiros e vigilantes o que faz dela um potente estimulante do sistema nervoso central III A droga em questão é uma potente depressora do sistema nervoso central e a intoxicação por ela tem como possíveis efeitos taquicardia aumento da pressão arterial agitação alucinações e agressividade Assinale a alternativa correta A Apenas a afirmativa I é correta B Apenas a afirmativa II é correta C Apenas as afirmativas I e III são corretas D Todas as afirmativas são corretas E Nenhuma afirmativa é correta Resposta correta alternativa E 335 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Análise das afirmativas I Afirmativa incorreta Justificativa a droga em questão é a cocaína mas ao contrário do que se afirma ela não é depressora e sim estimuladora do SNC Além disso apenas uma pequena parte cerca de 10 é eliminada na forma original inalterada pela urina II Afirmativa incorreta Justificativa o erro está em considerar a droga em questão como a anfetamina É possível identificála como cocaína por meio de seu metabólito comum a benzoilecgonina conforme mencionado no enunciado III Afirmativa incorreta Justificativa os efeitos da intoxicação por cocaína estão corretos mas a afirmativa peca ao considerar que essa droga seja depressora do SNC
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218 Unidade II Unidade II 5 TOXICOLOGIA OCUPACIONAL E DE MEDICAMENTOS Este tópico será dividido em duas partes Na primeira abordaremos a toxicologia ocupacional ou seja você terá a oportunidade de compreender melhor como pode ocorrer a exposição e a intoxicação no ambiente de trabalho e também como é possível prevenir a intoxicação do trabalhador Na segunda abordaremos a toxicologia de medicamentos Como foi possível você compreender o medicamento é um agente exógeno e por conseguinte depende da forma pela qual o organismo se expõe a ele pode haver o rompimento da homeostase e consequentemente o aparecimento de sinais e sintomas de intoxicação Neste tópico ainda teremos a satisfação de trabalhar juntos a maneira de se realizar o diagnóstico da intoxicação por alguns medicamentos bem como apresentar e compreender a importância dos antídotos no tratamento da intoxicação 51 Toxicologia ocupacional Iremos agora expor algumas informações para que possamos compreender o raciocínio toxicológico na esfera ocupacional 511 Introdução Desde os primórdios houve exposição dos trabalhadores a substâncias químicas material biológico ou agentes físicos mas nem sempre foi dada a devida atenção à saúde do trabalhador Antes da Revolução Industrial a exposição das pessoas a substâncias potencialmente tóxicas estava associada à própria subsistência Em vários momentos da história as atividades profissionais foram realizadas por escravos ou seja pessoas que eram dominadas por outros povos e submetidas a atividades insalubres fato que perdurou até o final do século XIX Para que você tenha dimensão do que representou a exposição ocupacional a agentes potencialmente tóxicos no séc IV aC Hipócrates identificou a intoxicação pelo chumbo na produção mineradora SANTOS et al 2004 Plínio o Velho 2379 dC observou que na tentativa de reduzir a exposição ao chumbo trabalhadores utilizavam bexigas do trato urinário de animais como máscaras KATO GARCIA WÜNSCH FILHO 2007 e na Europa a partir do século XII as universidades já realizavam experimentos associados à higiene ocupacional na tentativa de compreender melhor como aconteciam as intoxicações no ambiente de trabalho e prevenilas SANTOS et al 2004 Georgius Agricola 14941555 estudou entusiasticamente doenças ocupacionais de mineradores Ele descreveu com bastante detalhe para a época os danos que aconteciam com os mineradores em diferentes situações e concluiu que durante a extração de minério quando as minas estavam mais secas que úmidas havia liberação de poeira que associada à baixa umidade do ar penetrava na traqueia e 219 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS quando corrosivas devorava os pulmões Nas minas das montanhas dos Cárpatos havia mulheres que se casaram com sete maridos todos com morte prematura pela exposição à poeira tóxica nas mineradoras HOOVER 1950 Bernardino Ramazzini 16331714 foi um médico italiano que dedicou praticamente toda sua vida profissional à medicina ocupacional Escreveu o livro sobre doenças ocupacionais e higiene industrial De morbis artificum diatriba Doenças dos trabalhadores FRANCO FRANCO 2001 Em 1767 George Baker 17221809 observou que as epidemias de cólicas saturninas ocorridas durante o século XVII estavam associadas aos efeitos gastrintestinais causados pela exposição ao chumbo presente na sidra o vinho feito de maçã RIVA 2012 Se por um lado a Revolução Industrial trouxe aspectos positivos como as transformações econômicas políticas e sociais além do aprimoramento científico e tecnológico por outro lado homens mulheres e crianças trabalhavam moravam e viviam em condições precárias nessa época Os salários eram baixos a jornada chegava a 18 horas por dia e havia inclusive castigos físicos O trabalhador não tinha direito algum Como havia muitas faltas ao trabalho com consequente baixa de produção começou a haver a intervenção governamental As leis associadas à saúde do trabalhador e à medicina do trabalho começam a surgir nesse período ou seja no início do séc XIX Mas você poderia perguntar e o Brasil como se posicionava do ponto de vista de legislação ocupacional nesse momento histórico O trabalhador era destituído de valor O trabalho índio foi substituído pelo escravo negro e apenas no início do séc XX o país conseguiu alguma projeção industrial sobretudo após as duas grandes guerras Esse breve histórico lhe foi trazido à luz para que você tenha uma dimensão temporal de quando a saúde do trabalhador começou minimamente a ser respeitada no Brasil Foi apenas durante o Estado Novo em 1943 que houve a Consolidação das Leis do Trabalho e com ela a Medicina do Trabalho e a Engenharia de Segurança passaram a ser fundamentais na prevenção das doenças ocupacionais MACHADO 2016 Saiba mais Você encontrará mais informações sobre o estudo das doenças dos trabalhadores em As doenças dos trabalhadores que é uma tradução para o português do De morbis artificum diatriba RAMAZZINI B As doenças dos trabalhadores 4 ed São Paulo Ministério do Trabalho Fundacentro 2016 O termo intoxicação exógena está associado ao rompimento da homeostasia o que é caracterizado pelo aparecimento de sinais e sintomas causados no referencial biológico que se expõe a um ou mais diferentes toxicantes Esse desequilíbrio é representado pelas manifestações clínicas ou laboratoriais 220 Unidade II Sob a perspectiva epidemiológica de todos os 695825 casos de intoxicação exógena relatados no Brasil entre os anos de 2007 a 2016 veja a figura a seguir 43736 foram de origem ocupacional ou seja 67 dos casos de intoxicação ocorreram no ambiente de trabalho CentroOeste Nordeste Norte Sudeste Sul Brasil 2007 0 40 80 120 20 60 100 140 2009 2011 Ano Coeficiente de incidência por mil habitantes 2013 2015 2008 2010 2012 2014 2016 Figura 115 Coeficiente de incidência por mil habitantes dos casos notificados de intoxicação exógena relacionada ao trabalho no Brasil por região de 2007 a 2016 Excetuandose a região Sul em todas as demais regiões houve aumento do número de casos de intoxicação ocupacional no Brasil a partir de 2013 Na região Sul esses números aumentaram a partir de 2015 BRASIL 2018a O trabalhador pode se expor no ambiente de trabalho a substâncias químicas como inseticidas metais pesados agentes metemoglobinizantes gases e vapores tóxicos e outras substâncias ou produtos potencialmente tóxicos O gênero masculino veja a tabela a seguir apresenta prevalência superior ao feminino em termos de intoxicação ocupacional no Brasil Tabela 5 Distribuição da frequência dos casos notificados de intoxicação exógena relacionada ao trabalho segundo dados sociodemográficos Brasil 20072016 Características N Sexo 43712 Masculino 28214 645 Feminino 15498 355 Raçacor da pele 42539 Branca 19809 466 Preta 2553 60 Parda 13257 312 Ignorada 6449 152 221 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Características N Outras 471 11 Escolaridade 38007 Analfabeto 525 14 Ensino fundamental completo 3102 82 Ensino fundamental incompleto 11994 316 Ensino médio completo 6668 175 Ensino médio incompleto 3213 85 Ensino superior completo 1011 27 Ensino superior incompleto 634 17 Ignorado 10860 286 Fonte Brasil 2018a Lembrete Substâncias de caráter lipofílico atravessam membranas biológicas a favor do gradiente de concentração sem gasto de energia por difusão lipídica Devese levar em consideração a crescente participação das mulheres no ambiente de trabalho com destaque para as lactantes e gestantes O lactente que é amamentado do leite de uma mãe que se expõe ocupacionalmente a substâncias químicas de caráter lipofílico pode também estar sendo exposto ao xenobiótico pelo leite materno A exposição vertical pode levar à teratogenicidade dependendo do período gestacional em que o feto tiver sido exposto da quantidade de toxicante ao qual foi exposto e do tempo de exposição Quando se avalia a faixa etária e a escolaridade dos trabalhadores devese considerar que é proibido o trabalho infantil no Brasil Ainda assim a figura a seguir nos traz um gráfico em que é possível identificar a presença de menores no mercado de trabalho com risco de intoxicação nos dias atuais risco esse aumentado quando o nível de escolaridade do trabalhador é baixo uma vez que a atividade profissional e as medidas de segurança nem sempre são claras pela dificuldade de leitura ou compreensão das informações dos que pouco estudaram Feminino Masculino 15 10 10 15 5 20 0 25 5 a 80 71 a 80 61 a 70 51 a 60 41 a 50 31 a 40 21 a 30 11 a 20 5 a 13 n 42559 Faixa etária Figura 116 Distribuição da frequência dos casos notificados de intoxicação exógena relacionada ao trabalho segundo faixa etária e sexo no Brasil 2007 a 2016 222 Unidade II Vamos agora unir os pontos da toxicologia Faremos algumas perguntas Qual é mesmo o conceito de toxicologia Você se lembrou que é a ciência que estuda os efeitos nocivos causados por uma substância química no organismo humano E o que significa ocupacional Está associado ao ambiente de trabalho também chamado de laboral Assim a toxicologia ocupacional é a área da toxicologia que estuda os efeitos nocivos causados pelas substâncias químicas produzidas ou utilizadas no ambiente de trabalho Você se recorda dos objetivos do estudo da toxicologia A toxicologia tem como objetivos o diagnóstico o tratamento e a prevenção da intoxicação Observação Nesse contexto dentro dos três objetivos da toxicologia o mais importante no âmbito ocupacional é a prevenção da intoxicação As instituições ou empresas devem garantir que a exposição do trabalhador aos xenobióticos seja dentro de limites permitidos e que não leve ao aparecimento de danos aos trabalhadores Entretanto uma pequena parte dos trabalhores pode apresentar lesão com algumas substâncias químicas mesmo quando elas estejam abaixo do limite máximo permitido de exposição Um menor percentual de trabalhadores pode inclusive apresentar agravamento de uma doença preexistente por conta da exposição ocupacional É por isso que a toxicologia leva em consideração a sensibilidade individual Assim a maioria dos trabalhadores deve estar protegida do ponto de vista de intoxicação no ambiente de trabalho Exemplo de aplicação Ocorrenos mais um questionamento como é possível prevenir a intoxicação no ambiente de trabalho Reflita Para que se previna a intoxicação do trabalhador são estabelecidas medidas seguras de exposição no ambiente de trabalho e para deixar caracterizado que elas existam realizamse a monitorização ambiental a monitorização biológica e a vigilância da saúde Vamos compreender melhor esses conceitos 223 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS O termo monitorização está associado a monitorar ou seja medir e comparar o resultado com uma referência apropriada Permitanos fazer uma analogia para que se saiba se está havendo aproveitamento submetese o aluno a avaliações Caso as notas obtidas pelo aluno sejam iguais ou superiores ao limite estabelecido pela instituição de ensino o aluno é aprovado Ficou mais claro para você o conceito de monitorização No ambiente de trabalho também se realizam monitorizações Monitoramse as substâncias presentes no ambiente de trabalho e no organismo para estimar o risco de intoxicação durante toda sua vida laboral A partir de agora detalharemos como e por que ocorrem essas monitorizações 512 Monitorização ambiental Imaginemos o seguinte cenário um jovem trabalha na refinaria de petróleo O benzeno como sabemos é um dos hidrocarbonetos presente em uma das frações de destilação do petróleo e pode causar danos pela exposição aguda ou crônica no trabalhador dependendo das condições de exposição Assim como que você imagina que seria possível prevenir a intoxicação desse jovem trabalhador da refinaria de petróleo A primeira situação que tem que ser pensada é identificar e quantificar substâncias químicas presentes no ar que o trabalhador respira no ambiente de trabalho e às quais esse trabalhador possa se expor diariamente por toda a vida laboral de trabalho sem risco de intoxicação Esse processo é denominado monitorização ambiental Observação Não confunda monitorização ambiental referente ao meio ambiente com aquela realizada no ambiente de trabalho Ambas possuem o mesmo nome mas ocorrem em ambientes diferentes Assim a monitorização ambiental é a medida ou quantificação de uma substância química no ambiente de trabalho ou seja no ar que o trabalhador respira para saber se está dentro dos limites permitidos pela legislação Isso significa monitorar medir a quantidade de um xenobiótico presente no ar e comparar os resultados obtidos com uma referência adequada OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 É possível o trabalhador se expor ao benzeno e ainda assim não apresentar efeitos tóxicos Sim é possível Para isso fazse necessário que os limites de exposição ocupacional LEO sejam respeitados O mnemônico LEO é muito utilizado na toxicologia Ele se refere à máxima quantidade de um xenobiótico presente no ar presente no ambiente de trabalho a que a maioria dos trabalhadores pode se expor diariamente por toda sua vida laboral sem risco de intoxicação 224 Unidade II Você poderia se perguntar após esse preâmbulo de onde vêm essas informações ou seja se cada substância química apresenta um LEO diferente como poderíamos saber qual é o LEO de cada uma das milhares de substâncias químicas utilizadas ou produzidas no ambiente de trabalho Esse é um dos maiores desafios associados à toxicologia ocupacional Essas informações advêm de estudos toxicológicos realizados em animais e extrapolados para humanos Esses ensaios toxicológicos demandam vários anos para serem realizados e consomem milhões de dólares para cada uma das substâncias químicas Não é qualquer um que realiza esses experimentos Há a necessidade de uma grande quantidade de experts para realizálos Após esse grande investimento financeiro conduzido por profissionais com bastante experiência na sua execução concluise qual é o LEO para cada uma das substâncias químicas presentes no ambiente de trabalho Caso o trabalhador apresente alguma lesão por conta da exposição ocupacional a empresa empregadora responde por isso legalmente Renomadas agências internacionais estabelecem os limites de exposição ocupacional Como os limites de exposição ocupacional advém dessas agências muitas vezes utilizamos o mnemônico internacional de quem publicou os resultados Assim o LEO pode ser escrito como threshold limit value em inglês consequentemete seu mnemônico é TLV Dessa forma LEO apresenta o mesmo significado que TLV o primeiro é o mnemônio na língua portuguesa e o segundo na inglesa Em instantes veremos quais são as agências internacionais que normalmente realizam esses ensaios toxicológicos Saiba mais Sugerimos entusiasticamente que você leia a obra a seguir BUSCHINELLI J T Manual de orientação sobre controle médico ocupacional da exposição a substâncias químicas São Paulo Fundacentro 2014 Como a obtenção desses limites de exposição ocupacional demandam anos para serem realizados massa crítica e milhões de dólares para cada substância química essas agências ou instituições permitem que o Brasil compile essas informações ou seja as utilize com autorização Exemplo de aplicação Há poucas décadas quando um parente amigo ou vizinho se aposentava não ficávamos muito felizes Reflita sobre isso Para muitos desses dependendo de onde trabalhava a aposentadoria significava que não viveria muito tempo diferentemente do que acontece atualmente pois a expectativa de vida do brasileiro aumentou significativamente nas últimas décadas 225 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Mas por que há essa diferença entre os que se aposentavam no Brasil há algumas poucas décadas e a realidade atual Vamos contextualizar para que você compreenda melhor a linha do tempo da aplicação da legislação trabalhista brasileira e dos princípios toxicológicos no dia a dia das pessoas Dependendo das condições de exposição o asbesto ou amianto pode causar danos ao trabalhador como o mesotelioma câncer característico da exposição a essas fibras Centenas de trabalhadores foram intoxicados pelo asbesto em uma fábrica de telhas que utilizava o amianto como matériaprima na cidade de Osasco WÜNSCH FILHO NEVES MONCAU 2001 Saiba mais Sugerimos que você leia mais sobre os danos causados pelo asbesto no organismo humano em INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER Amianto Brasília 2018 Disponível em httpswwwincagovbrexposicaonotrabalhoenoambienteamianto Acesso em 16 nov 2020 Consegue entender melhor por que é necessário haver uma legislação trabalhista vigente que aplique os conceitos toxicológicos Para evitar perda de produtividade absenteísmo ausência no trabalho e principalmente agravos à saúde e mortes prematuras do trabalhador Vamos agora entender algumas instituições que realizam ensaios toxicológicos com o cerne ocupacional A American Conference of Governmental Industrial Hygienists ACGIH é um comitê norteamericano de toxicologistas ocupacionais que recomenda que deva haver limites de exposição ocupacional denominados de threshold limit values A norteamericana Occupational Safety and Health Administration OSHA ou Administração de Segurança e Saúde do Trabalho em tradução livre adota outra terminologia para o limite de exposição ocupacional o limite de exposição permitido ou permissible exposure level PEL Isso quer dizer que a ACGIH e a OSHA possuem os mesmos propósitos mas com independência entre elas Dessa forma realizam ensaios toxicológicos e os disponibilizam para que outros países compilem seus dados ou seja utilizem essas informações mediante autorização dessas instituições Há outras instituições que também realizam os mesmos ensaios toxicológicos OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 O TLV ou o PEL utilizados por países que compilam os dados norteamericanos devem atentar à jornada ou seja à carga horária semanal e utilizar fatores de correção em relação aos números que nos são disponibilizados No Brasil o LEO também é chamado de limite de tolerância LT 226 Unidade II O Brasil compila dados da ACGIH com algumas adaptações como o fator de correção exposto anteriormente Para efeito de legislação o Ministério do Trabalho publicou a Norma Regulamentadora n 15 NR15 de 1978 Observação Como o anexo 11 da NR151978 preconiza os limites de exposição para até 48 horas semanais fazse necessário aplicar um fator de correção a 78 de seus valores Como é virtualmente impossível estabelecer o LEO para todas as substâncias potencialmente tóxicas utilizadas ou presentes em processos industriais a OMS sugere que sejam priorizadados os estudos dessas substâncias Observe que caso haja uma maior exposição ao asbesto em um dia de trabalho o funcionário da empresa não morrerá imediatamente por conta disso ou seja o problema associado ao asbesto não se relaciona à exposição aguda mas sim à crônica Dentro desse contexto dividemse os limites de exposição ocupacional TLV segundo o risco de intoxicação 5121 ACGIHTLVTWA Embora possa parecer uma sopa de letras nos permita explicar essas abreviações ACGIH como exposto anteriormente é a conferência norteamericana que estabelece limites de exposição ocupacional O termo TLV tem o mesmo significado que LEO ou seja limite de exposição ocupacional e o mnemônico TWA advém do inglês time weighted avarage ou seja média ponderada pelo tempo O que significa então a ACGIHTLVTWA É um parâmetro de monitoramento ocupacional associado à exposição crônica Significa que ao longo da jornada pode haver um ou mais picos de exposição da substância química mas ainda assim não há risco de intoxicação para o trabalhador uma vez que a média de exposição ao longo do dia não terá sido ultrapassada Esse parâmetro de monitorização ambiental está associado à média de exposição ao longo da jornada sem se preocupar se houve uma ou mais sobrexposições à substância química ao longo do dia desde que obviamente o limite denominado de TWA não seja ultrapassado no final do dia de trabalho Observação Quando se escreve jornada devese subentender trabalho ao longo de um dia 227 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Exemplo de aplicação Por que o trabalhador pode se expor a uma significativa quantidade da substância química ao longo da jornada e ainda assim não há risco de intoxicação Não há risco de intoxicação porque a substância não ultrapassou o TLVTWA e porque ela não apresenta importância na toxicidade aguda mas sim na crônica Concluise assim que quando o toxicante é monitorado pelo TWA veja a tabela a seguir significa que pode haver uma ou mais exposições relativamente elevadas ao longo da jornada mas caso a média ponderada da exposição não ultrapasse o TWA não há risco de intoxicação ao menos para a maioria dos trabalhadores Tabela 6 Limites de exposição ocupacional TWA por diferentes instituições LEO Substância Número CAS LT MTE Brasil EUA TLV ACGIH EUA PEL OSHA EU OELV UK WEL Benzeno 71432 1 ppm 05 ppm 1 ppm 1 ppma 1 ppm Chumbo inorgânico 7439921 01 mgm3 005 mgm3 005 mgm3 015 mg m3 a 010 mgm3 Clorofórmio 67663 20 ppm 10 ppm 50 ppm 2 ppm b 2 ppm nhexano 110543 50 ppm 500 ppm 20 ppm b 20 ppm Tolueno 108883 78 ppm 20 ppm 100 ppm 50 ppmb 50 ppm Limites de tolerância Ministério do Trabalho e Emprego Brasil Threshold limit values ACGIH Estados Unidos sem valor legal Permissible exposure limit OSHA Estados Unidos com valor legal Occupational exposure limits value SCOEL União Europeia Workplace exposure limits HSE Reino Unido 1 ppm não é o LT mas o valor de referência tecnológico VRT para o setor de petróleo sendo de 25 ppm o VRT para o setor siderúrgico a LEO binding ou obrigatório b LEO indicative ou indicativo Adaptada de Costa et al 2011 5122 ACGIHTLVSTEL Há outro parâmetro que é utilizado na monitorização ambiental no ambiente de trabalho o ACGIHTLVSTEL O acrônimo STEL advém do inglês short time exposure limit ou seja limite de exposição a curto prazo ou de curta duração tradução livre Esse parâmetro de monitoração ambiental é utilizado para substâncias químicas que possam manifestar narcose irritação ou dano tecidual irreversível ao trabalhador OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 Imagine o seguinte cenário uma pessoa trabalha em uma refinaria de petróleo e de repente ouve uma sirene de alerta sobre vazamento de substâncias químicas potencialmente tóxicas com risco de intoxicação aguda Esse trabalhador tem poucos minutos para evacuar a área para que não seja exposto à substância 228 Unidade II Imagine se ao procurar a rota de fuga esse trabalhador apresente um quadro de torpor ou seja redução da sensibilidade e do movimento e não consegue reciocinar rapidamente Como o trabalhador vai conseguir identificar a rota de fuga e evacuar a área com rapidez se ele não consegue raciocinar e agir de forma célere Você consegue entender a importância e complexidade de uma monitorização ambiental Se o funcionário ouve a sirene mas é hiporeativo e não consegue sair rapidamente do local pode haver uma grande intensidade de exposição em curto prazo inclusive a outras substâncias e consequentemente importante dano ao trabalhador Também é o caso do dano tecidual irreversível pode ser que a exposição a essa substância dependendo das condições de exposição possa levar a irritação ou lesão tecidual irreversível Para substâncias químicas utilizadas ou produzidas no ambiente de trabalho que possam causar esses tipos de lesão o monitoramento ocorre pelo ACGIHTLVSTEL Um substância química pode portanto ser monitorada pelo ACGIHTLVTWA e pelo ACGIHTLVSTEL ao mesmo tempo ou seja caso o trabalhador se exponha ocupacionalmente a substâncias químicas que possam trazer danos ao trabalhador em uma exposição crônica e também a substâncias que possam levar à narcose irritação ou lesão tecidual irreversível há as duas monitorizações 5123 ACGIHTLVC ceiling Há outra situação envolvendo a monitorização ocupacional há substânicas químicas que apresentam importância na toxicidade aguda ou seja dependendo da quantidade da substância a que o trabalhador se exponha mesmo que por pouco tempo pode ser fatal Para essas substâncias há um outro parâmetro de monitorização ambiental no ambiente de trabalho é o ACGIHTLVC ceiling OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 O ACGIHTLVC é o parâmetro que indica a concentração de um xenobiótico presente no ambiente de trabalho que em momento algum pode ser ultrapassado durante a jornada Em caso de acidente como vazamento de substâncias químicas no local de trabalho com importância na toxicidade aguda disparase a sirene e o trabalhador tem que se retirar imediatamente do local Você consegue visualizar que em caso de narcose além de aumentar o risco de acidente no trabalho o deslocamento desse funcionário em situação de evacuação do local pode ficar comprometido É por isso que as empresas precisam trabalhar com a monitorização ambiental para proteger seus funcionários da exposição excessiva de substâncias químicas com diferentes perfis de toxicidade VEGA 2010 5124 Nível de ação Os controles periódicos e médicos são iniciados a partir do nível de ação NA obtido quando se divide o limite de exposição ocupacional por 2 onde 229 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS NA Nível de ação TLV LEO Limite de exposição ocupacional NA LEO 2 Ao medir a concentração da substância no ar que o trabalhador respira desde que representativo da zona respiratória do trabalhador veja a figura a seguir caso o resultado seja inferior ao nível de ação dessa substância interpretase que não esteja havendo uma significativa exposição do trabalhador Figura 117 Dinâmica de amostragem pessoal no ambiente de trabalho Segundo a Norma Regulamentadora n 9 do Ministério do Trabalho de 1978 NR91978 MT valores acima do NA indicam que para que se minimizem os riscos de intoxicação ocupacional devem ser tomadas ações preventivas referentes ao Programa de Prevenção dos Riscos Ambientais PPRA BRASIL 1978 Sabemos que a monitorização ambiental monitora a exposição do funcionário no ambiente de trabalho Mas vamos refletir sobre os seguintes cenários todos os trabalhadores apresentam o mesmo metabolismo Todos os funcionários se movimentam exatamente da mesma forma ao longo da jornada ou seja todos os trabalhadores ficam sentados ou caminham no local de trabalho exatamente pelo mesmo tempo Exemplo de aplicação Continue seguindo o raciocínio e reflita sobre a pergunta se para a mesma quantidade de substância química presente no ar no ambiente de trabalho há um trabalhador que se movimenta bastante e outro que fica mais sentado realizando outra atividade sendo que se expõem à mesma atmosfera de trabalho ambos apresentam o mesmo perfil de exposição 230 Unidade II Quando a pessoa se movimenta ocorre alteração da frequência cardíaca a ventilação pulmonar aumenta e consequentemente ocorre aumento no volume de ar que a pessoa inala Se há aumento no volume de ar significa que há mais exposição à substância química presente na atmosfera de trabalho em comparação com um funcionário que fica mais tempo sentado 513 Monitorização biológica Como saber se ainda que a quantidade da substância química presente no ar esteja dentro dos limites preconizados pela legislação o trabalhador apresenta maior exposição com consequente elevação do risco de intoxicação É dentro desse contexto que se utiliza da monitorização biológica Você já sabe que monitorar significa medir algo e comparar esse resultado com uma referência apropriada No caso da monitorização biológica medese a substância química presente no organismo do trabalhador É uma forma de garantir que efetivamente o trabalhador está sendo monitorado e que após anos de trabalho não haverá lesão a esse organismo por conta da exposição ocupacional Assim caso o organismo se exponha ao benzeno tolueno ou xileno são essas as substâncias químicas que devem ser identificadas e quantificadas no organismo sendo depois comparadas com uma referência para saber se o trabalhador apresenta risco de intoxicação Como vimos anteriormente muitas substâncias às quais o organismo se expõe são rapidamente biotransformadas e consequentemente caso as procuremos no organismo não mais as encontraremos Dessa forma um artifício utilizado para saber se o organismo se expôs ao xenobiótico é determinar a substância química inalterada produtos de biotransformação ou alterações bioquímicas precoces em diferentes matrizes biológicas É por esse motivo que você dedicou grande parte de seu tempo estudando os mecanismos de biotransformação de um toxicante nos princípios da toxicologia para que você tenha condição de compreender melhor como se aplicam aqueles conceitos teóricos aprendidos anteriormente na prática Observe que até agora não lhe foi exposto o conceito de monitorização biológica Primeiro trouxemos conceitos fundamentais desse tópico e os contextualizamos Agora vamos lhe trazer à luz esse conceito Monitorização biológica MB é a medida de uma substância química inalterada produto de biotransformação ou alteração bioquímica precoce presente no sangue urina suor saliva ar exalado ou outra matriz biológica capaz de estimar o risco de intoxicação quando se comparam seus resultados com uma referência apropriada OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 Agora fica muito mais fácil a compreensão desse conceito você sabe o que é uma substância química inalterada um produto de biotransformação e em poucos instantes iremos apresentar o que é uma alteração bioquímica precoce Você sabe que eles podem estar presentes em diferentes matrizes biológicas sangue urina suor entre outros e que quando são quantificados no organismo podem ser comparados com uma referência apropriada Mas faltam ainda dois importantes conceitos bioindicador e referência apropriada 231 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Indicador biológico de exposição Bioindicador indicador biológico de exposição IBE ou em inglês biological exposure limit BEI é toda substância química inalterada produto de biotransformação ou alteração bioquímica precoce encontrada em diferentes matrizes biológicas como sangue urina suor saliva ar exalado ou outras matrizes que seja capaz de avaliar a exposição e o risco de intoxicação quando se comparam seus resultados com uma referência apropriada Observação Observe que o conceito de monitorização biológica e bioindicador são bastante próximos mas não são iguais Referência apropriada Você se recorda de que o Brasil compila dados da monitorização ambiental da ACGIH Saiba que nosso país faz o mesmo para a monitorização biológica A legislação brasileira que versa sobre a monitorização biológica é a Norma Regulamentadora n 7 do Ministério do Trabalho de 1978 NR7MT que determina que para promover e preservar a saúde dos trabalhadores toda empresa ou instituição ao admitir funcionários deve implementar e elaborar o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional PCMSO A NR71978 nos traz conceitos relevantes como valor de referência VR índice biológico máximo permitido IBMP e imediatly dangerous to life and health IDLH BRASIL 2018b O VR é o maior índice de um bioindicador para um organismo não exposto ocupacionalmente Por exemplo se você não se expõe ao benzeno no seu ambiente de trabalho ou seja se entre outras ocupações você não trabalha como frentista ou em refinaria de petróleo existe um valor máximo do biondindicador presente no seu organismo que estima a exposição ao benzeno como o ácido sfenilmercaptúrico SPMA ou o ácido transtransmucônico TTMA que é o VR OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 Caso você trabalhe em uma refinaria de petróleo ou é frentista em um posto de combustível você será monitorado pelo IBMP que é a máxima quantidade de um bioindicador presente no organismo do trabalhador em que se acredita que a maioria dos trabalhadores não apresente risco de intoxicação BUSCHINELLI 2014 5131 Tipos de bioindicadores Há três diferentes tipos de bioindicadores de exposição ou dose interna de efeito e de suscetibilidade 51311 Bioindicador de exposição ou de dose interna Quando o trabalhador se expõe a uma substância química a identificação dessa substância no organismo reflete a extensão da absorção da substância ou seja a substância química agora está no interior do organismo do trabalhador por isso se utiliza o termo dose interna AMORIM 2003 232 Unidade II Ao ser absorvida nem toda a porção da substância que agora está no organismo do trabalhador atingirá o órgãoalvo É possível observar na figura a seguir que o afunilamento dessa pirâmide invertida significa que para toda a substância a que o organismo se expõe apenas uma menor parte tende a atingir o órgãoalvo Mediação da dose interna Quantidade absorvida Quantidade alcança tecido Quantidade alcança célula Quantidade alcança macromolécula Quantidade alcança sítio crítico Dose biologicamente efetiva Ligação com efeitos Relação com exposição Exposição externa Figura 118 Representação da intensidade de absorção de uma substância e quantidade do xenobiótico que atinge órgãosalvo Alguma vez você já entrou em algum local e sentiu aquele cheiro forte de tinta Alguns inclusive podem apresentar intensa cefaleia ao acessar um local cujas paredes tenham sido pintadas recentemente Esse cheiro forte existe pelas várias substâncias presentes na tinta de parede inclusive o tolueno Para saber por exemplo se um trabalhador de uma fábrica de tintas de parede apresenta risco de intoxicação pela exposição ao tolueno substância com meia vida biológica curta determinase a presença do ácido hipúrico urinário Qual é o melhor momento para se coletar a urina do trabalhador para verificar o nível de exposição ao tolueno Pela manhã Nesse caso a coleta da urina coletada deve ser realizada no final da jornada Existe uma correlação direta entre a exposição ao tolueno e seu produto de biotransformação desde que a coleta da amostra biológica ocorra no final da jornada Caso a coleta da urina seja realizada no período da manhã por exemplo que é o que a maior parte das pessoas imagina não haverá a correlação entre a exposição da substância e o bioindicador de dose interna que é o ácido hipúrico Assim o momento da coleta é importante para que não haja erros 233 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS préanalíticos É por isso que fazse necessário conhecer a toxicocinética de cada uma das substâncias químicas a que o trabalhador se expõe A amostragem deve ser realizada no último dia da jornada semanal para a exposição ao nhexano tricloretileno ou outras substâncias químicas de meia vida prolongada que seja de alguns dias por exemplo Essa coleta apresentará uma adequada correlação entre a exposição e a absorção associadas aos últimos dias de trabalho Você poderia questionar e se a substância química à qual o trabalhador se expõe tiver uma meiavida biológica muito elevada isso afeta o momento da coleta da amostra biológica Desde que tenha havido um tempo de exposição representativo o momento da coleta da amostra biológica não é limitante É o caso do cádmio e chumbo BRASIL 2018b Para que haja a monitorização biológica do cádmio na urina o trabalhador deve ter sido exposto ao metal por ao menos seis meses BUSCHINELLI 2014 51312 Bioindicador de efeito O bioindicador de efeito está relacionado aos efeitos precoces que ocorrem no organismo do trabalhador após a exposição ao xenobiótico e a estratégia é avaliar esses efeitos no organismo na avaliação de risco do trabalhador OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 Se está havendo efeito também não está havendo dano ao organismo do trabalhador Não necessariamente Há as alterações bioquímicas precoces Vamos compreender melhor esses conceitos O termo alteração bioquímica precoce está associado a toda alteração bioquímica que ocorre no organismo causado por uma substância química mas que seja reversível e ao mesmo tempo possa auxiliar na prevenção da intoxicação Vamos dar alguns exemplos clássicos de alteração bioquímica precoce para que você compreenda melhor e possamos complementar esse conceito Comecemos pelo monóxido de carbono Essa substância é produto da queima incompleta da matéria orgânica Assim quando há casos de incêndio ou queima de combustíveis fósseis ou do cigarro o organismo se expõe ao monóxido de carbono Gostaríamos que você continuasse interagindo e que se submetesse a seguinte reflexão você acha que tem monóxido de carbono no seu sangue neste momento A resposta é sim Mais uma reflexão você está intoxicado pela quantidade de monóxido de carbono presente em seu sangue A resposta é não 234 Unidade II Lembrete Toda substância química é potencialmente tóxica ao organismo humano e de animais dependendo das condições de exposição Pequenos teores de carboxihemoglobinemia HbCO no sangue não causam danos ao organismo humano Quando o organismo se expõe ao monóxido de carbono essa substância ocupa o sítio de ligação da hemoglobina que deveria se ligar ao oxigênio Assim há uma alteração bioquímica uma vez que bioquimicamente a hemoglobina deveria estar ligada ao oxigênio e não ao monóxido de carbono Ao mesmo tempo quando os teores de carboxihemoglobina HbCO aumentam ainda que não haja intoxicação sinaliza que está havendo o aumento da exposição do organismo a esse gás ou seja inicialmente não há dano no organismo mas indica que caso a exposição aumente pode haver intoxicação Para você ter dimensão apenas após 10 de carboxihemoglobinemia é que o organismo apresenta o primeiro sintoma de intoxicação que é uma ligeira cefaleia Valores inferiores a 10 de carboxihemoglobinemia são assintomáticos Entretanto valores de 35 de HbCO ainda que não causem intoxicação indicam que o trabalhador está exposto ao gás acima do limite máximo permitido no ambiente de trabalho A HbCO é uma substância química inalterada ou produto de biotransformação Nenhuma delas é a resposta É uma alteração bioquímica precoce Sabe por quê Porque não é uma substância química inalterada como chumbo no sangue ou cocaína no cabelo e nem produto de biotransformação como o TTMA que é um dos bioindicadores de exposição ao benzeno Entretanto o CO está interagindo com a hemoglobina impedindo a ligação do oxigênio Além disso é capaz de prever a intoxicação medese o teor de HbCO e comparase com uma referência e é reversível ou seja se o trabalhador apresenta níveis de HbCO de 12 e uma ligeira cefaleia ao afastar o trabalhador da exposição os níveis de HbCO tendem a baixar e a cefaleia tende a desaparecer Ficou mais clara a diferença entre substância química inalterada produto de biotransformação e alteração bioquímica precoce Em função da importância das alterações bioquímicas precoces são necessários mais alguns exemplos clássicos Metemoglobina Vamos compreender melhor o que é a metemoglobina MeHb e quais são os principais sistemas redutores em humanos 235 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Continuamente o organismo humano é submetido ao estresse com consequente oxidação direta ou indireta da oxihemoglobina HbO2 à MeHb por oxidação do ferro ferroso Fe2 dos anéis pirrólicos do grupamento heme da hemoglobina a ferro férrico Fe3 gerando a MeHb A oxidação do ferro ferroso dos anéis pirrólicos da hemoglobina impede que o oxigênio se ligue aos eritrócitos e consequentemente se reduza o aporte de oxigênio aos tecidos distantes ou remotos Para se contrapor à oxidação da hemoglobina ou seja para reduzir a metemoglobina a oxihemoglobina o organismo humano possui sistemas redutores que irão reduzir o Fe3 da MeHb a Fe2 restaurando a capacidade de ligação e transporte de oxigênio pela hemácia Mas como ocorre essa reação de óxidoredução na hemoglobina Principais sistemas redutores Diaforase I a diaforase I também chamada de sistema NADHcitocromob5redutase é um sistema enzimático constituído pelo citocromo b5 citocromo b5redutase e o citocromo P450 Esse potente sistema enzimático capta elétrons derivados da glicólise NADH dependente Esse sistema é bem desenvolvido em adultos mas uma criança de até seis meses de vida não consegue sintetizar esse sistema redutor em sua plenitude Sendo assim as crianças são mais suscetíveis à intoxicação por agentes metemoglobinizantes Diaforase II a diaforase II também denominada de sistema MeHbredutase NADPHdependente ou DAPHflavina redutase é um sistema carreador de elétrons derivado da glicólise NADPHdependente O azul de metileno é uma substância exógena capaz de captar o elétron derivado da glicólise NADPHdependente e como tem notável afinidade com a MeHb transporta elétron a esse pigmento e a reduz à HbO2 Restaurase assim a capacidade da hemoglobina de se ligar e transportar oxigênio a tecidos remotos Agora que nos apropriamos dessas importantes informações temos condição de compreender que os agentes metemoglobinizantes são capazes de alterar o estado de oxidação da hemoglogina e impedir a transferência de oxigênio aos tecidos remotos Assim a MeHb é mais um exemplo de alteração bioquímica precoce e consequentemente um bioindicador de efeito OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 Ácido Δaminolevulínico Quando o organismo se expõe ao chumbo há algumas formas de monitorar esse trabalhador Uma delas é determinar a presença do ácido Δaminolevulínico na urina ΔALA U O chumbo pode interferir na síntese da heme na medula óssea por ser inibidor enzimático inibe a enzima ΔALA desidratase Quando isso ocorre há acúmulo do ΔALA no organismo que é excretado pela urina uma vez que o ΔALA não se transforma em porfobilinogênio Assim o ΔALA não é uma substância química inalterada nem produto de biotransformação mas uma alteração bioquímica precoce uma vez que está havendo uma inibição de enzima que atuaria 236 Unidade II sobre o ΔALA este se acumula é excretado na urina e é utilizado para prever a intoxicação À medida que se identifica e quantifica o ΔALA na urina comparase esse resultado com a literatura adequada e estimase o risco de intoxicação Ainda que eventualmente possa ter havido alguma alteração no organismo por conta da exposição ao chumbo como a anemia microcítica hipocrômica quando se retira o trabalhador do ambiente de trabalho e consequentemente deixa de haver a exposição ao chumbo o quadro de anemia tende a desaparecer Assim o ΔALA U é um bioindicador de efeito Metalotioneína Outro clássico exemplo de alteração bioquímica precoce é a presença da metalotioneína na urina Quando o organismo se expõe a metais como o cádmio para se proteger o organismo produz maior quantidade de uma enzima de baixo peso molecular denominada de metalotioneína Essa proteína se liga a metais como o cádmio forma um complexo hidrossolúvel e excreta o metal impedindo que haja a manifestação de danos renais uma vez que o cádmio é nefrotóxico Assim quando se identifica que há a presença de metalotioneína na urina significa que o organismo está se expondo a metais É mais um exemplo de alteração bioquímica precoce e consequentemente de bioindicador de efeito Acetilcolinesterase AChE Por fim a acetilcolinesterase Quando o organismo se expõe a substâncias químicas inibidoras da acetilcolinesterase como os praguicidas organofosforados essa enzima é inibida e consequentemente não consegue hidrolisar a acetilcolina induzindo ao excesso de estímulo colinérgico no organismo Atentese que a inibição da acetilcolinesterase não é uma substância química inalterada nem um produto de biotransformação mas sim uma alteração bioquímica precoce uma vez que está havendo uma alteração bioquímica inibição enzimática que é precoce porque é possível identificar a intoxicação antes de danos irreversíveis e também é capaz de prever a intoxicação já que se pode comparar os resultados com uma referência apropriada e estimar o risco de intoxicação Nesse momento utilizamos os conceitos aprendidos anteriormente associados à alteração bioquímica precoce Um bioindicador de efeito é aquele em que ocorre uma alteração bioquímica no organismo do trabalhador Essa alteração deve ser precoce e reversível ou seja quando se identifica que há uma alteração bioquímica precoce significa que foi possível prever a intoxicação antes de que houvesse um dano irreversível ao trabalhador O trabalhador deve ser submetido a uma avaliação médica pelo médico do trabalho com possível afastamento de sua atividade profissional e realizar tratamento médico caso seja constatada a correlação entre efeitos tóxicos e os níveis dos indicadores biológicos de exposição de dose interna ou de efeito ou seja caso haja significado clínico 237 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Você sabia que fatores ambientais ou até mesmo o alimento pode interferir nos resultados analíticos envolvendo a toxicologia ocupacional Sim isso pode acontecer Observe a seguir O teor de benzeno e de seus bioindicadores no organismo do trabalhador podem estar associados à exposição dessa substância que também pode estar naturalmente presente na atmosfera pela liberação em um incêndio florestal de ocorrência natural ou antropogênica Durante a prática do tabagismo há a liberação de substâncias químicas e o fumante ativo ou passivo se expõe ao benzeno liberado pela fumaça do cigarro Dessa forma os hábitos do trabalhador bem como a região em que vive podem influenciar direta e significativamente nos resultados analíticos e clínicos pela exposição de substâncias químicas presentes no ambiente de trabalho Caso uma pessoa more próximo a uma rodovia por exemplo inalará monóxido de carbono ao longo de toda a noite de sono No dia seguinte os teores de carboxihemoglobinemia estarão associados à exposição ambiental referente ao meio ambiente quando a pessoa dormiu inalando elevados teores de monóxido de carbono presente no ar atmosférico e a ocupacional trabalha se expondo a essa mesma substância química Para você ter dimensão de como é complexa a monitorização biológica ocupacional alimentos como amora ameixa morango e até groselha podem interferir no resultado dessa monitorização Vamos evoluir no raciocínio para que você tenha elementos bioquímicos para compreender por que isso acontece Quando o organismo se expõe ao tolueno essa substância é biotransformada em ácido benzoico Quando o ácido benzoico sofre reação de síntese com a glicina formase o ácido hipúrico Esse é um dos motivos pelos quais o ácido hipúrico é o bioindicador de exposição ao tolueno Entretanto o ácido benzoico está presente naturalmente nos alimentos expostos anteriormente de forma que o morango por exemplo possui ácido benzoico Isso significa que o ácido benzoico presente no morango amora ameixa ou também na forma de benzoato de sódio como conservante de alimentos é conjugado com a glicina formando o ácido hipúrico veja a figura a seguir pela mesma via metabólica que o ácido benzoico proveniente do tolueno Ingestão de alimentos Biotransformação Tolueno Ácido benzoico Ácido hipúrico Glicina O NH2 CH3 O O O OH OH HO NH Figura 119 Via metabólica da formação do ácido hipúrico a partir do tolueno 238 Unidade II Assim como saber se o ácido hipúrico presente na urina do trabalhador da fábrica de tintas é proveniente do tolueno ou do morango que o trabalhador comeu no dia anterior É muito difícil chegar a essa conclusão Ficou mais clara a complexidade quando se estuda a determinação da exposição de um organismo a uma substância química Observação Você deve conhecer e memorizar a relação entre bioindicador com seu precursor e sua respectiva via metabólica Vamos a mais uma contextualização O bioindicador de exposição ao xileno é o ácido metilhipúrico Entretanto diferentemente do tolueno outras substâncias químicas não interferem na via metabólica desse xenobiótico de forma a aumentar a quantidade de bioindicador pela exposição que não seja laboral Observe a via metabólica a seguir associada ao xileno Ingestão de alimentos Biotransformação Glicina Ácido metilbenzoico Metaxileno Ácido metilhipúrico O O O O NH2 CH3 H3C H3C H3C HO OH NH OH Figura 120 Esquema da formação do ácido metilhipúrico a partir do metaxileno Quando o trabalhador se expõe ao xileno não há uma segunda substância química presente na água ou alimento que se ingira ou que esteja no ar que o trabalhador respira que poderá interferir na análise da substância Dessa forma não há a necessidade de haver VR para o xileno e há apenas o IBMP AMORIM 2003 51313 Bioindicador de suscetibilidade Vimos anteriormente que a monitorização do trabalhador tem como objetivo prevenir a intoxicação da maioria dos trabalhadores Mas por que mesmo a maioria dos trabalhadores e não todos os trabalhadores Por causa da suscetibilidade de cada um deles Para as mesmas condições de exposição organismos diferentes respondem diferentemente E por que respondem diferentemente A condição genética é uma das possibilidades cada qual tem a sua 239 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Observação A condição genética é apenas uma condição que pode fazer com que diferentes pessoas respondam de forma distinta à mesma exposição Assim os biomarcadores de suscetibilidade podem indicar que aquele organismo poderá expressar uma resposta diferente dos demais pela sua condição genética Observação Esses bioindicadores podem refletir além dos fatores genéticos também uma condição adquirida O trabalhador que apresente por exemplo alteração na GST pode ter maior risco de intoxicação pela exposição aos compostos alifáticos halogenados e ao óxido de etileno uma vez que pode haver prejuízo da biotransformação de seus intermediários epóxidos Os que apresentam alteração na paroxonase podem ter aumentada a toxicidade dos organofosforados pela redução da atividade da acetilcolinesterase e a deficiência da glicose 6Pdesidrogenase reduz G6PD a resistência para o estresse oxidativo de compostos nitroaromáticos 514 Programa de controle médico de saúde ocupacional PCMSO O médico do trabalho deve ficar atento aos valores da monitorização biológica e realizar a vigilância da saúde Os critérios empreendidos para a interpretação dos resultados dos exames médicos e laboratoriais e o procedimento adotado perante os resultados dos exames devem estar expressos com clareza no PCMSO Para deixar os conceitos aqui apresentados mais claros serão apresentados exemplos de como elaborar um PCMSO combinando com a vigilância à saúde e a monitorização biológica de exposição BUSCHINELLI 2014 A Norma Regulamentadora n 9 do Ministério do Trabalho de 1978 está associada ao Programa de Prevenção de Riscos Ambientais PPRA que determina que para que se preserve a integridade e saúde dos trabalhadores instituições e empregadores realizem o PPRA Por meio do reconhecimento e controle dos riscos ambientais bem como de sua antecipação devese prevenir o aparecimento de doenças e preservar não apenas a saúde mas também a integridade de seus funcionários por meio do PPRA que deve estar vinculado com o PCMSO previsto na NR7 O modelo de análise utilizado para a medição e coleta de amostras deve levar em consideração quanto tempo será utilizado para a realização da medição verificar se o escopo da análise é avaliar o 240 Unidade II perfil de exposição após a atividades realizadas pelos funcionários ou apenas avaliar a característica da exposição durante a jornada e também levar em consideração qual é o volume de ar que o equipamento analítico é capaz de coletar BRASIL 2018b 515 Vantagens e desvantangens da monitorização biológica A monitorização biológica apresenta vantagens e desvantagens em relação à ambiental e é complementar a esta Uma característica fundamental da monitorização biológica é que quando se identifica e quantifica bioindicadores a estimativa do risco de intoxicação é mais adequada uma vez que há uma relação mais direta entre a relação doseefeito ou seja entre a quantidade do xenobiótico presente no organismo e seus efeitos nocivos causados à saúde do trabalhador Outra situação envolvida é que a monitorização ambiental avalia exclusivamente a exposição pelo trato respiratório Entretanto pode haver exposição ocupacional por outras vias como pelo trato gastrintestinal e pela via dérmica Há situações em que o funcionário se expõe a um xenobiótico pelo hábito de levar circunstancialmente a mão à boca em alguns momentos da jornada É o típico caso de exposição pelo chumbo que na monitorização ambiental pode apresentar baixos teores mas quando se realiza a monitorização biológica identificase sua extensa exposição Até a diferença de higiene pessoal entre os funcionários da empresa pode levar a resultados significativamente distintos entre a monitorização ambiental e a biológica 52 Toxicologia de medicamentos 521 Intoxicações por medicamentos Discutiremos neste tópico as intoxicações induzidas pelo uso de medicamentos suas causas grupos farmacológicos e manejo clínico bem como os variados tratamentos empregados nas intoxicações medicamentosas Algumas das informações iniciais você já conhece especificamente aquelas relacionadas a alguns termos e alguns conceitos introdutórios mas ainda assim faremos uma breve e direta revisão sobre algumas ocorrências Aspectos gerais das intoxicações medicamentosas Segundo o legado deixado por Paracelsus 14931541 toda substância pode ser classificada como um veneno o que irá diferenciar essa classificação é a dose Além desse clássico e importante conceito deixado por aquele que é considerado o pai da farmacologia e da toxicologia acrescemos que as condições de exposição também demonstram papel importante nesse contexto além da dose administrada 241 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Saiba mais Para conhecer um pouco mais sobre as ideias de Paracelsus ou Paracelso você pode consultar o artigo a seguir Ainda hoje suas ideias são consideradas válidas tendo sido muito importantes para a evolução da toxicologia CORREA A D SIQUEIRABATISTA R QUINTAS L E Similia Similibus Curentur notação histórica da medicina homeopática Revista da Associação Médica Brasileira São Paulo v 43 n 4 p 347351 1997 Disponivel em httpwwwscielobrpdframbv43n42026pdf Acesso em 1º mar 2020 Face a essa constatação você concluiu que a capacidade que uma substância apresenta em causar toxicidade é definida pelo perigo que cada toxicante apresenta de forma inata Esse perigo é definido como toxicidade intrínseca e pode ser aferido por valores da DL50 que representa a dose necessária para matar metade de uma população Além desse perigo que é algo inerente ao agente tóxico a toxicidade relativa também estabelece uma importância preponderante na avaliação dos compostos Essa toxicidade é determinada pelo agente tóxico especificamente tipo pela dose que foi utilizada pela susceptibilidade individual e pelas condições de exposição tempo e frequência principalmente Para recordarmos o que estudamos você deve estar lembrado de que a intoxicação é representada por um conjunto de sinais e sintomas observáveis a partir da interação de um agente tóxico com um sistema orgânico através de efeitos nocivos que ocorrem em decorrência de um desequilíbrio orgânico e são manifestados através de sinais e sintomas Esse processo depende da interação do agente tóxico ou toxicante com a parte biológica através de uma interação dele com um alvo biológico que execute mecanismos de reparo ainda que estes não sejam suficientes para sanar as alterações na homeostasia Normalmente esses processos quando exacerbados originam doenças ou até mesmo situações fatais irreversíveis demonstradas através de sinais e sintomas dependentes de dose e tempo de exposição Dividimos a intoxicação em quatro fases distintas a saber Fase de exposição está ligada ao contato do agente tóxico com a parte orgânica representando a sua disponibilidade química e condições de introdução no modelo biológico Essa exposição pode ocorrer por diferentes vias sendo as mais comuns a oral intoxicações por medicamentos venenos agrícolas etc a por via dérmica contato com praguicidas na lavoura e a pulmonar através do ar inspirado névoas de praguicidas agrícolas Fase toxicocinética consiste no movimento do AT agente tóxico no organismo compreendendo processos de absorção distribuição armazenamento e eliminação biotransformação e excreção Todos esses processos envolvem reações entre o agente tóxico e o organismo tornando o AT disponível biologicamente 242 Unidade II Fase toxicodinâmica corresponde aos efeitos propriamente ditos do AT pela interação com os alvos biológicos Isso porque na maioria das vezes não se trata de uma ação localizada do agente mas sim disseminada Observação Na fase toxicodinâmica os efeitos ocorrentes não dependem somente do agente tóxico em si mas também dos seus produtos de biotransformação metabolismo que algumas vezes são mais tóxicos do que os próprios agentes tóxicos Exemplo quando o paracetamol é utilizado em doses acima das terapêuticas ele passa por um processo de biotransformação hepática e se transforma no metabólito Nacetilpbenzoquinoneimina que é a substância hepatotóxica Fase clínica nesta fase temse as manifestações clínicas dos efeitos pela exposição a um agente tóxico É a aparição de sinais e sintomas que caracterizam o efeito tóxico propriamente dito e evidenciam a presença do fenômeno da intoxicação Na toxicologia de medicamentos estudamse as reações adversas provocadas por doses terapêuticas dos medicamentos bem como as intoxicações resultantes de doses excessivas seja por uso inadequado ou acidental ou ainda intencional Entre os variados tipos de efeitos provocados pela interação entre o medicamento e o organismo temos Efeito secundário pode surgir em alguns pacientes pelo uso de medicamentos ainda que em doses terapêuticas Exemplo diarreias induzidas por uso de antimicrobianos pela destruição de flora normal intestinal Efeito colateral são efeitos previsíveis pois estão ligados ao próprio mecanismo de ação da substância Exemplo sono em pacientes que utilizam alguns antihistamínicos Idiossincrasia são efeitos que dependem da forma como cada indivíduo responde quando mantém contato com uma substância Essas diferentes formas de efeitos demonstráveis normalmente são relacionadas a situações genéticas eou enzimáticas particularmente individualizadas e que independem da dose administrada Exemplo deficiência da aldeído desidrogenase enzima que metaboliza o álcool em orientais predispondo esses indivíduos a uma maior embriaguez quando se expõem a essa substância Alergia as alergias podem ser caracterizadas como reações idiossincrásicas pois não dependem da dose mas sim de uma resposta individualizada Elas passam a ser estudadas pela imunotoxicologia Exemplos crises alérgicas que muitos pacientes demonstram quando se expõem a antimicrobianos como penicilinas e sulfas 243 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Tolerância é a condição em que se necessita de doses maiores para se obterem os mesmos efeitos iniciais do medicamento Normalmente o aumento das doses não se faz suficiente para a resolução da situação exigindose uma substituição Essa tolerância pode ocorrer por dessensibilização de receptores ou ainda por indução enzimática Exemplos pacientes que utilizam morfina um analgésico opioide e que no mesmo período do dia exigem doses maiores para o efeito analgésico Observação Veja que o processo de tolerância poderá ocorrer em tratamentos medicamentosos de rotina e não só ela está ligada ao contexto toxicológico Dependência é ocorrente quando o medicamento já assume uma postura de uso contínuo pelos benefícios que produz e pelas sensações prazerosas que possa causar Exemplo a agitação provocada pelo uso de anfetaminas anorexígenos que são estimulantes do SNC sistema nervoso central e ativam o SNA sistema nervoso autônomo simpático Interações resultam da utilização simultânea de dois ou mais medicamentos podendo haver redução dos efeitos ou ainda uma potenciação deles levando a um quadro variável de intoxicação ou ineficácia de um dos medicamentos empregados Agora que fizemos uma revisão de conceitos previamente estudados e sedimentados falaremos sobre intoxicações com medicamentos Faremos uma introdução e depois conversaremos sobre alguns medicamentos que estão relacionados a situações de intoxicações 5211 Introdução Você sabe muito bem que os efeitos dos medicamentos já são conhecidos desde os tempos remotos quando nossos antepassados já buscavam a cura de muitas doenças através do uso de substâncias naturais Observação Os cães quando se sentem com desconforto gástrico ingerem grama para sanar esse problema Ela atua como irritante do estômago fazendoo vomitar a comida indesejada ou o veneno ingerido Segundo a Anvisa 2020b medicamento é definido como um produto farmacêutico tecnicamente obtido ou elaborado com finalidade profilática curativa paliativa ou para fins de diagnóstico É uma forma farmacêutica terminada que contém o fármaco geralmente em associação com adjuvantes farmacotécnicos ou seja com substâncias que irão se somar aos efeitos do fármaco ali presente Ainda que esses medicamentos sejam utilizáveis pretendendo efeitos benéficos quando mal empregados e indevidamente utilizados causam efeitos que podem até chegar à fatalidade A frequência de exposição a uma substância medicamentosa está relacionada à sua disponibilidade no mercado à 244 Unidade II marca comercial e ao acesso ao produto às atitudes do médico que os prescreveu ao farmacêutico que o dispensa assim como a quem regulamenta a sua produção distribuição e utilização Segundo Oga Camargo e Batistuzzo 2003 o padrão de consumo de medicamentos no Brasil é caracterizado pela elevação do uso como substâncias empregadas somente para curar sintomas ou ainda por automedicação além é claro do trabalho brilhante feito pelo marketing das indústrias farmacêuticas que induz ao uso de muitas substâncias mesmo aquelas prescritas por um médico Tal situação contribui acentuadamente com reações adversas causadas por medicamentos No Brasil embora tenhamos normas para o uso racional de medicamentos não há um sistema de registro das ocorrências tóxicas pela exposição a medicamentos devidamente implantado operante e atualizado Existem trabalhos que são feitos de forma isolada e regionalizada que permitem conclusões que seguem essas regiões e não permitem uma leitura global e dinâmica das ocorrências de intoxicação no país de forma confiável e oficial O Sistema Nacional de Informação TóxicoFarmacológica SinitoxMSFiocruz divulga estatísticas anuais referentes a casos de intoxicação registrados pelos Centros de Assistência e Informação Toxicológica Ceatox a partir de informações fornecidas espontaneamente sem padronização de conceitos formas de registro agentes tóxicos e outros critérios Quanto às reações adversas há algumas experiências locais de farmacovigilância CASTRO 2000 Os registros dos Centros de Assistência Toxicológica são sentinelas captadores de problemas sociais alguns passíveis de atuação da vigilância sanitária Se o medicamento está sendo utilizado além de sua finalidade terapêutica de forma abusiva ou indevida a sociedade e o sistema de saúde devem enxergar esses casos e encontrar formas adequadas para enfrentálos GANDOLFI ANDRADE 2006 Como já vimos o Sinitox criado em 1980 pelo Ministério da Saúde com sede na Fundação Oswaldo Cruz Fiocruz tem como principal atividade coordenar o processo de coleta compilação análise e divulgação dos casos de intoxicação humana registrados no país pela Rede Nacional de Centros de Controle de Intoxicações comumente denominada Rede Sinitox BORTOLETTO BOCHNER 1999 Esses mesmos autores em um trabalho realizado sobre o impacto dos medicamentos nas intoxicações humanas no Brasil concluíram que o medicamento é o principal agente tóxico que causa intoxicação em seres humanos no Brasil ocupando o primeiro lugar nas estatísticas do Sinitox desde 1994 Os benzodiazepínicos antigripais antidepressivos e antiinflamatórios são as classes de medicamentos que mais causam intoxicações em nosso país 44 foram classificadas como tentativas de suicídio e 40 como acidentes sendo que as crianças menores de cinco anos 33 e adultos de 20 a 29 anos 19 constituíram as faixas etárias mais acometidas pelas intoxicações por medicamentos Veja na tabela a seguir os principais agentes tóxicos em um levantamento mais atualizado o que nos mostra a mesma conclusão sobre os medicamentos ou seja eles representam o maior número de casos de intoxicações agora envolvendo não somente o homem mas também animais e solicitações de informações que os centros recebem sobre eles 245 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Tabela 7 Casos totais de intoxicações humanas de animais e de solicitações de informação de 10 dos principais agentes tóxicos Agente causador Número total de intoxicações Percentual Medicamentos 21402 2679 Animais peçonhentosescorpiões 11943 1495 Outros animais peçonhentosvenenosos 6439 806 Animais não peçonhentos 5402 676 Animais peçonhentosaranhas 6220 779 Domissanitários 4761 596 Animais peçonhentosserpentes 3290 412 Produtos químicos industriais 2992 339 Drogas de abuso 2777 348 AgrotóxicosUso agrícola 2706 339 Adaptada de Sinitox sda Conforme informado no site Milenar USO 2018 para o mesmo período um levantamento conduzido pela Unicamp no Centro de Informação e Assistência Toxicológica Ciatox concluiu que o uso de medicamentos responde pela maioria dos casos de intoxicação 3362 das ocorrências mais que o dobro por exemplo dos atendimentos por picadas de animais peçonhentos e consumo de produtos químicos veja a figura a seguir Outros 2386 Medicamentos 3362 Produtos domissanitários 1408 Animais peçonhentos venenosos 1622 Produtos químicos residenciais ou industriais 613 Animais não peçonhentos não venenosos 609 Figura 121 Causas principais de intoxicações 5212 Grupos farmacológicos envolvidos nas intoxicações medicamentosas Embora as variadas pesquisas executadas acerca do uso de medicamentos utilizados e as classes farmacológicas envolvidas nos processos tóxicos tenham sido divulgadas não há uma pesquisa que seja incisiva e atualizada e ainda que sejam efetuadas elas acabam por refletir dados que são regionais o que pode não traduzir a real ocorrência de forma generalizada 246 Unidade II Em tempo alguns medicamentos e classes se destacam na incidência de intoxicações com medicamento como os neuropsicofármacos clonazepam carbamazepina amitriptilina os analgésicos e Aines ácido acetilsalicÌlico diclofenaco dipirona paracetamol os antialérgicos e antigripais os broncodilatadores salbutamol fenoterol e os cardiovasculares captopril propranolol Ainda que as pesquisas e trabalhos sobre intoxicação por medicamentos sejam regionalizadas e até específicas em detrimento a isso os psicofármacos como os benzodiazepínicos diazepam clonazepam bromazepam que são substâncias largamente usadas em todo o mundo e no Brasil assumem uma posição bem considerável nos casos de intoxicação induzidos por medicamentos compreendendo em quase todos os estudos metade das ocorrências Além dessa outra metade é dirigida ao tratamento de problemas diversos músculoesqueléticos antiinflamatórios e analgésicos Essas substâncias ainda que prescritas pelo médico quando de uma forma não racional passam a oferecer uma presença da substância em ambiente doméstico maior consequentemente aumentando a incidência de intoxicação por eles Estudaremos nos tópicos a seguir alguns dos medicamentos envolvidos em ocorrências de intoxicações Você poderá notar que as classes desses fármacos são muito distintas por isso tentamos agrupálas por sistema tentando assim facilitar a sua compreensão o que auxiliará muito no processo de aprendizagem 52121 Psicofármacos Veremos neste tópico os medicamentos que atuam sobre o SNC ou seja os fármacos que atuam sobre a psique Antidepressivos ISRS inibidores seletivos de recaptação de serotonina Esses medicamentos são bem empregados no tratamento da depressão de outros transtornos psiquiátricos tais como síndrome do pânico fobias e transtorno obsessivocompulsivo e de transtornos alimentares incluindo anorexia bulimia e obesidade Veja que as aplicações clínicas desses medicamentos apresentam uma abrangência vasta de situações inclusive para outras não diretamente relacionadas a doenças psiquiátricas Observação Saiba que muitos fármacos que atuam sobre o SNC podem ser empregados para torcicolos e crises de enxaqueca Estes antidepressivos inibem a recaptação de serotonina um neurotransmissor que melhora o humor no SNC sistema nervoso periférico e plaquetas estimulando os receptores serotoninérgicos Quando comparados aos antidepressivos tricíclicos são menos efetivos em bloquear a recaptação de noradrenalina e antagonizar receptores muscarínicos histaminérgicos e adrenérgicos Podem causar depressão do SNC e síndrome serotoninérgica quando usados em conjunto ou com outras substâncias que aumentam o 247 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS nível de serotonina como outros antidepressivos inibidores da monoaminoxidase iMAO tricíclicos antidepressivos duais e atípicos anfetaminas sibutramina ecstasy cocaína crack LSD e opioides Geralmente essas substâncias apresentam alto índice terapêutico Doses acima de 10 vezes a dose terapêutica são mais toleradas se comparadas aos antidepressivos tricíclicos Porém a associação com outros medicamentos ou drogas de abuso é frequente e aumenta a probabilidade de intoxicação grave Lembrete Você já estudou e deve se recordar de que substâncias que possuem alto índice terapêutico são relativamente mais seguras que aquelas que possuem um índice baixo Acentuemos essa recordação Isso ocorre porque a distância entre a dose terapêutica e a tóxica é longa o que não quer dizer que essas substâncias não possam ofertar um risco N N N H NH HN CI CI CF3 F3C NH2 d e c b a N O O O F F O O O O Figura 122 Estrutura química dos principais ISRS a fluoxetina b paroxetina c sertralina d fluvoxamina e citalopram Nível terapêutico de sinalização ATC ou ISRS Legenda ATC antidepressivos tricíclicos Figura 123 Mecanismo de ação dos ISRS a antes do tratamento b com tratamento agudo dos fármacos c com tratamento crônico com os fármacos 248 Unidade II Observação Veja que esse mecanismo descrito na figura anterior é o ocorrente em situações toxicológicas Observe que ocorre um aumento considerável nos níveis de serotonina na fenda sináptica A seguir algumas informações farmacocinéticas acerca dessa categoria de fármacos São substâncias bem absorvidas e possuem alta biodisponibilidade e o pico de concentração plasmática ocorre em média em horas Possuem um alto Vd volume de distribuição e a ligação a proteína plasmática pode variar de 56 a 99 e meia vida biológica média de 24 horas exceto a fluoxetina que possui uma T½ vida biológica que pode variar de quatro a seis dias A biotransformação é hepática e dois dos fármacos fluoxetina e paroxetina são inibidores da enzima CYP2D6 implicando alterações nos efeitos de muitos outros fármacos Observação Você já conhece a importância do complexo citocromo P450 na biotransformação de fármacos e as implicações que uma indução ou inibição enzimáticas desse sistema podem oferecer a outros fármacos Sobre as manifestações clínicas as intoxicações podem ser leves a moderadas casos em que os pacientes apresentam ataxia falta de coordenação em movimentos e letargia profunda e prolongada inconsciência ou graves em que os pacientes podem apresentar bradicardia hipotensão depressão do SNC e coma Há também o risco de síndrome serotoninérgica quando a quantidade ingerida é alta ou ocorre ingestão em associação com outras substâncias que aumentam o nível de serotonina como outros antidepressivos iMAO e drogas de abuso Esta síndrome serotoninérgica caracterizase por uma tríade alterações do estado mental agitação ansiedade e confusão mental instabilidade autonômica taquicardia hipertensão sudorese hipertermia e midríase hiperatividade neuromuscular rigidez e tremores O que poderia então se fazer para tratamento de intoxicações por essa categoria Para adoção de medidas de tratamento das intoxicações a maioria dos casos de ingestão de ISRS não desenvolvem sintomas graves necessitando apenas de medidas de suporte básico de vida como desobstrução de vias aéreas administração de oxigênio monitorização de sinais vitais colheita de amostras biológicas para 249 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS posterior envio ao contexto laboratorial ou ainda descontaminação através de lavagem gástrica com uso de carvão ativado 1 gkg por VO via oral Observação Ainda não estudamos de forma detalhada os antídotos mas o carvão ativado representa um importante agente adsorvente que pode reduzir a absorção de várias substâncias Veja que para essa categoria de agente não há antídoto específico e não se recomendam medidas para eliminação Antidepressivos tricíclicos Esses fármacos são utilizados no tratamento da depressão maior insônia e síndromes dolorosas crônicas Os antidepressivos tricíclicos inibem a recaptação de neurotransmissores principalmente noradrenalina NA serotonina 5HT e em menor proporção dopamina DA As aminas terciárias são inibidores mais potentes da recaptação de serotonina clomipramina enquanto as secundárias atuam principalmente sobre a recaptação de noradrenalina desipramina nortriptilina Veja e compare que esses fármacos apresentam um mecanismo muito parecido com os anteriores discutidos aqui porém com um efeito maior sobre outros neurotransmissores como a NA em maior grau e a DA em menor grau São estruturalmente similares às fenotiazinas e têm ações em diversos receptores no organismo gerando antagonismo colinérgico bloqueio alfa adrenérgico inibição da recaptação da noradrenalina serotonina e dopamina bloqueio de canais de sódio e potássio e depressão respiratória e do sistema nervoso central SNC Saiba mais Leia mais sobre o assunto na página a seguir RODRIGUES S A Clorpromazina C17H19N2SCl PUBLISBQ Química Nova Interativa sd Disponível em httpqnintsbqorgbrnovoindex phphashmolecula264 Acesso em 28 nov 2020 250 Unidade II S N H Figura 124 Estrutura molecular da fenotiazina CH CH2 CH2 N R1 R2 Fármaco R1 R2 Amitriptilina CH3 CH3 Nortriptilina CH3 H Figura 125 Estrutura química dos antidepressivos tricíclicos amitriptilina e nortriptilina Note a semelhança entre os ATC e as fenotiazinas Na intoxicação os efeitos mais importantes são no SNC sedação e coma por atividade anticolinérgica e convulsões por provável inibição da recaptação de catecolaminas cerebrais e cardiovasculares taquicardia e hipertensão por ação anticolinérgica e inibição da recaptação de catecolaminas hipotensão pelo bloqueio alfaadrenérgico depressão miocárdica e distúrbios da condução cardíaca por bloqueio dos canais de sódio Da mesma forma que fizemos na categoria anterior seguem algumas informações rápidas sobre a farmacocinética desses compostos São absorvidos e o início dos efeitos ocorre após uma hora da exposição com pico de concentração plasmática entre duas e oito horas Possuem um Vd de 7 a 78 lkg e se ligam em proteínas plasmáticas 90 com T½ biológica variando entre sete e 58 horas A biotransformação é hepática e a eliminação ocorre pela via renal 70 e pela via fecal 30 Na intoxicação aguda leve podem ocorrer sonolência sedação taquicardia alucinações midríase e outros efeitos anticolinérgicos e em casos de intoxicação grave convulsões coma aumento do intervalo QRS no eletrocardiograma ECG arritmias ventriculares insuficiência respiratória e hipotensão Podem ocorrer arritmias graves levando à parada cardíaca e óbito mesmo em pacientes jovens 251 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Para um tratamento na intoxicação realizamse medidas de suporte já citadas anteriormente acrescidas de verificação e correção de distúrbios hidreletrolíticos relacionados a Na K e Ca2 devido ao aumento do risco de arritmias em que o paciente dever ser mantido em observação por 72 horas ou enquanto ainda apresentar alterações no ECG Não há antídoto para tratamento Benzodiazepínicos São medicamentos utilizados em transtornos ansiosos como anticonvulsivantes na síndrome de abstinência alcoólica nos estados hiperadrenérgicos conforme ocorre nas intoxicações por drogas de abuso como relaxantes musculares e como agentes sedativos em procedimentos Todos os benzodiazepínicos em uso clínico são capazes de promover a ligação de um importante neurotransmissor inibitório o ácido γaminobutírico GABA aos receptores de GABA do subtipo GABAA que existem como canais de cloreto formados por múltiplas subunidades e controlados por ligando intensificando desse modo as correntes iônicas induzidas pelo GABA através desses canais BRUNTON CHABNER KNOLLMANN 2012 Vamos falar um pouco sobre a farmacocinética Os benzodiazepínicos são rapidamente absorvidos após a administração por via oral Pela via parenteral a distribuição no organismo se efetua de forma semelhante à observada com fármacos muito lipossolúveis A penetração no tecido cerebral é muito rápida A administração intramuscular não é sugerida para a maioria dos benzodiazepínicos excetuando os hidrossolúveis uma vez que a absorção por essa via é muito irregular A biotransformação ocorre pelo CYP o que implica às vezes interações medicamentosas significativas e a eliminação é renal C C C N R1 R2 R3 R4 R2 R7 N B 1 5 4 a 3 2 A C Figura 126 Estrutura geral dos benzodiazepínicos Nas intoxicações leves e moderadas observamse sonolência sedação e fala arrastada Você sabia que essas substâncias são amplamente utilizadas como indutoras de anestesia em cirurgias Pois bem elas são muito empregadas para esse fim e até o momento no qual o paciente fica inconsciente ele apresenta essa fala pastosa e arrastada 252 Unidade II Nas intoxicações graves ocorrem coma com depressão respiratória hipotensão e hipotermia principalmente com o uso endovenoso ou em associação com outros depressores do SNC Depressão respiratória pode ocorrer em crianças mesmo com doses terapêuticas A interação entre um benzodiazepínico e álcool pode ser fatal pela depressão do SNC Isso ocorre em detrimento ao aumento do GABA deprimindo excessivamente o SNC e incorrendo em óbito dependendo das quantidades associadas das substâncias Nas intoxicações por benzodiazepínicos existe um antídoto para tratamento chamado flumazenil Lanexat O flumazenil ligase com alta afinidade a locais específicos sobre o receptor GABAA onde antagoniza competitivamente a ligação e os efeitos alostéricos dos benzodiazepínicos Ele é raramente utilizado pois as intoxicações isoladas por benzodiazepínicos geralmente não representam risco de vida Portanto o seu uso é reservado para situações envolvendo sedações iatrogênicas ou intoxicações graves com depressão respiratória Esse flumazenil é contraindicado nas ingestões concomitantes de substâncias que diminuem o limiar para convulsão como os antidepressivos tricíclicos e em usuários crônicos de benzodiazepínicos que podem desenvolver síndrome de abstinência caracterizada por tremores ansiedade disforia e em casos graves psicose e convulsões Dessa forma raramente indicase o uso de flumazenil em usuários crônicos de benzodiazepínicos 52122 Antiinflamatórios Aines antiinflamatórios não esteroidais A aspirina considerada o protótipo dos Aines foi há até pouco tempo um dos fármacos mais utilizados sem prescrição no tratamento da inflamação Atualmente outros Aines com ação terapêutica e segurança superior vêm substituindo o papel da aspirina À semelhança de outros grupos farmacológicos os Aines são divididos em várias classes químicas denominados seletivo e não seletivo para COX Em geral os Aines são representados por ácidos fracos exceto a nabumetona e com exceção da aspirina são inibidores reversíveis da COX sendo que a duração de ação inibitória depende de suas propriedades farmacocinéticas Nesse sentido os Aines podem ser divididos em fármacos de curta 6 h e longa duração 10 h Essa família imensa de fármacos apresenta uma correlação muito grande com várias situações de intoxicação envolvendo adultos e crianças pois não são fármacos submetidos a controle especial exceto com os Aines seletivos o que passa a contribuir enormemente com casos de episódios tóxicos Agora que conhecemos um pouco sobre a importância clínica desses medicamentos iremos conversar um pouco sobre as questões toxicológicas de uma forma geral A seguir descrevemos alguns efeitos tóxicos desse grupo Gastrintestinais esses efeitos são considerados os mais comuns nas terapias com Aines embora não seja ocorrente em todos os pacientes de forma absoluta Esses efeitos decorrem pela inibição 253 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS das PGs gástricas que têm uma função gastroprotetora Além disso como a maioria dos elementos são ácido fracos passam a oferecer um efeito lesivo direto na mucosa gástrica Porém esses efeitos podem e são observados mesmo quando se emprega um Aines por via parenteral Isso ocorrente em menor escala porém presente em algumas situações Existem relatos de incidência de 15 a 30 de gastrites úlceras gástricas em usuários regulares assumindo uma postura ainda superior em pacientes infectados por Helicobacter pylori naqueles que consomem álcool ou ainda no uso de glicocorticoides Todos os inibidores seletivos de COX2 são menos propensos a oferecerem riscos com relação a lesões gástricas HILALDANDAN BRUNTON 2015 Cardiovascular os inibidores seletivos de COX2 foram desenvolvidos para serem mais seguros com relação a danos gástricos induzidos por Aines porém experimentos clínicos induzidos com celecoxiba valdecoxiba suspenso e rofecoxiba suspenso relevam uma incidência de aumento na ocorrência de infarto agudo do miocárdio acidente vascular encefálico e trombose Eventos adversos na pressão arterial renal e renovascular associamse os Aines a eventos adversos renais e renovasculares o que passa a ter maiores evidências em pacientes com cirrose hepática doença renal crônica e hipovolemia Os Aines estão associados à perda da inibição induzida por prostaglandinas na reabsorção de Cl e na ação do hormônio antidiurético ocasionando retenção de sal e água Estudos epidemiológicos sugerem que as complicações hipertensivas ocorrem mais comumente em pacientes tratados com coxibes que nos tratados com Aines não seletivos Observação O ácido acetilsalicílico AAS é protocolo no tratamento das síndromes coronarianas agudas compondo o sistema MonabC com papel antiagregante plaquetário Veja que essa aplicação é terapêutica e difere completamente das atividades dos coxibes anteriormente citados Nefropatia por analgésicos representa um estado de insuficiência renal lentamente progressiva com redução na capacidade de concentração no túbulo renal Temse como fatores de risco a associação de Aines de forma crônica em altas doses e nas situações de infecções do trato urinário Observação Antes da utilização de um Aines a um paciente com problemas renais devese certificar que os benefícios sejam realmente superiores aos riscos Hipersensibilidade os sintomas ligados à hipersensibilidade com Aines variam desde uma rinite até um edema de laringe A intolerância ao ácido acetilsalicílico representa uma contraindicação ao tratamento com qualquer Aine devido à sensibilidade cruzada O tratamento para tal ocorrência 254 Unidade II segue o protocolo convencional com a administração de adrenalina com suporte de função dos órgãos vitais Reações cutâneas após os antimicrobianos os Aines são as principais causas de reações cutâneas a drogas Essas reações podem incluir urticária angioedema eritema multiforme eritema nodoso erupções máculopapulares reações de fotossensibilidade eritema pigmentar fixo e vasculite leucocitoclástica VARALDA MOTTA 2009 Toxicidade renal a toxicidade renal pelo uso de Aines tem sido muito estudada nos últimos anos O espectro de nefrotoxicidade inclui necrose tubular aguda nefrite intersticial aguda glomerulonefrite membranosa síndrome nefrótica por doença de lesão mínima necrose de papila renal insuficiência renal crônica retenção hidrossalina hipertensão arterial sistêmica hipercalemia e hipoaldosteronismo hiperreninêmico MELGAÇO et al 2010 Os antiinflamatórios seletivos afetam menos os indivíduos com função renal normal e afetam de modo semelhante os pacientes com alterações renais prévias nestes a gravidade do quadro é diretamente proporcional ao tempo de terapia Estudos clínicos recentes mostram que o papel funcional da COX2 nos rins está principalmente associado à manutenção da homeostase hidroeletrolítica enquanto a COX1 parece estar mais relacionada à manutenção da filtração glomerular normal MICHELIN et al 2006 Melgaço et al 2010 retrataram em uma revisão de literatura o uso de Aines com danos renais O quadro a seguir resume alguns desses efeitos Quadro 9 Resumo dos efeitos dos Aines na função renal Síndrome renal Mecanismos Fatores de risco PrevençãoTratamento Retenção de sódio e edema Redução PGs Terapia com Aines efeito adverso mais comum Interromper o uso do Aine Hipercalemia Redução PGs redução na secreção de potássio para túbulo distal e redução da aldosteronarenina angiotensina Doença renal IC diabetes mieloma múltiplo e terapia com diurético poupador de K Interromper o uso do Aine evitar indometacina em paciente de alto risco Insuficiência renal aguda Redução PGs e queda do balanço hemodinâmico Doença hepática doença renal IC desidratação e idosos Interromper o uso do Aine evitar o uso em paciente de alto risco Síndrome nefrótica com nefrite intersticial Redução do recrutamento e ativação dos linfocitos Fenoprofeno Interromper o uso do Aine Necrose pupilar Toxicidade direta Abuso fenacetina combinação de aspirina e acetaminofeno Interromper o uso do Aine Evitar uso crônico de analgésico Legenda IC insuficiência cardíaca PGs prostaglandinas K potássio Adaptado de Melgaço et al 2010 255 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Como tanto a COX1 como a COX2 estão presentes nos rins todas as classes de Aines podem causar em maior ou menor grau lesão nesse órgão Até pouco tempo atrás acreditavase que a toxicidade renal estava associada apenas aos inibidores da COX1 devido à maior quantidade dessa enzima nos rins Entretanto recentemente foram descritos casos de toxicidade renal associada aos inibidores seletivos da COX2 como o celecoxibe BRICKS DA SILVA 2005 O principal mecanismo de ação dos Aines é a inibição das ciclooxigenases impedindo assim a síntese de prostaglandinas Inibindo as COXs os Aines provocam uma série de efeitos colaterais abaixo detalhados Impedem o efeito vasodilatador das prostaglandinas causando vasoconstricção renal e redução na taxa de filtração glomerular podendo evoluir para necrose tubular aguda Impedem o efeito inibitório das prostaglandinas sobre os linfócitos T permitindo a ativação dessas células com consequente liberação de citocinas próinflamatórias Deslocam o ácido araquidônico para a via das lipoxigenases aumentando a síntese de leucotrienos próinflamatórios A lipoxigenase induz um aumento da permeabilidade capilar podendo contribuir para a proteinúria por alterar a barreira de filtração glomerular Os antiinflamatórios geralmente não constituem um risco significativo aos pacientes com função renal normal Contudo em situações em que a perfusão renal encontrase diminuída volume efetivo circulante reduzido o que é relativamente comum em pacientes críticos a inibição do potencial vasodilatador das prostaglandinas com o uso do Aines pode comprometer o fluxo sanguíneo renal e provocar uma lesão isquêmica no órgão MELGAÇO et al 2010 A nefrotoxicidade dos antiinflamatórios não esteroidais é relatada em diversos estudos e está relacionada principalmente à sua ação inibitória na síntese de prostaglandinas Essa toxicidade ocorre tanto com os inibidores seletivos quanto com os não seletivos das cicloxigenases ao contrário do que se pensava antigamente podendo ocasionar desde distúrbios hidroeletrolíticos até insuficiência renal crônica MELGAÇO et al 2010 A prescrição dessa classe de drogas deve ser criteriosa especialmente para os pacientes considerados de alto risco para desenvolver lesão renal como idosos hipertensos diabéticos hipovolêmicos ou aqueles que fazem uso de diuréticos MELGAÇO et al 2010 Como já discutimos tratase de uma classe muito importante na terapêutica mas que merece uma atenção especial tanto dos profissionais prescritores como dos farmacêuticos que estão diretamente ligados ao trabalho nobre da atenção farmacêutica na dispensação desses fármacos prestando à população um papel informativo crucial 256 Unidade II Teremos agora a oportunidade de falar um pouco melhor e de uma forma mais aprofundada sobre duas categorias de fármacos pertencentes ao grupo dos Aines mas que não são empregados como antiinflamatórios mas sim como analgésicos eou antipiréticos e que estão rotineiramente envolvidos em ocorrências de intoxicações Apesar do grande número de analgésicos aos quais a população tem acesso apenas dois salicilatos e paracetamol são responsáveis por 116 das intoxicações por esse grupo de medicamentos os salicilatos por 81 46 casos e o paracetamol por 35 20 casos Além disso em casos de intoxicações por esses analgésicos o laboratório tem grande importância no diagnóstico e tratamento da intoxicação e no prognóstico do paciente intoxicado Por isso quando se fala em intoxicações por analgésicos esses são os mais estudados Ácido acetilsalicílico AAS As intoxicações por esses medicamentos têm prevalência em centros urbanos e ocorrem acidentalmente em crianças e propositalmente em adultos nas tentativas de suicídio ou pelo uso crônico abusivo Acompanhe o raciocínio pois essa substância apresenta mecanismos de ação complexos que envolvem o centro respiratório e o metabolismo Aspectos toxicológicos da intoxicação por salicilatos São usados amplamente sistemicamente como analgésicos no tratamento de vários tipos de dor como enxaqueca artrite dismenorreia nevralgias e mialgias antipiréticos e antiinflamatórios estando presentes em diversas formulações Estão presentes também em preparações para uso local sendo um exemplo o ácido salicílico usado para remoção de calos e verrugas e no tratamento de epidermofitoses e o salicilato de metila usado em formulações para dores articulares e musculares As intoxicações por salicilatos atingem populações de todas as idades sendo geralmente acidentais em crianças e propositais em adultos nas tentativas de suicídio Doses de 150 a 300 mgkg de peso produzem manifestações tóxicas e com doses de mais de 300 mgkg a intoxicação pode ser fatal Toxicocinética Os salicilatos são substâncias ácidas bem absorvidas no pH estomacal que atingem o pico plasmático em seis horas Em doses terapêuticas tem taxa de ligação a proteínas plasmáticas em torno de 90 mas em doses tóxicas ocorre uma diminuição podendo o teor de ligação decair para 50 por saturação das proteínas plasmáticas Os salicilatos em doses terapêuticas têm biotransformação que obedece a cinética de primeira ordem mas em doses tóxicas a cinética passa para ordem zero que é saturável levando a um aumento dos níveis de salicilato 257 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS O ácido acetilsalicílico por hidrólise origina o ácido salicílico que se conjuga principalmente com a glicina e é excretado na forma de ácido salicilúrico Em doses tóxicas ocorre depleção de glicina levando a um acúmulo de ácido salicílico Dessa forma todas as alterações de cinética decorrentes de doses tóxicas farão com que ocorra um aumento da biodisponibilidade e da meia vida biológica que em doses terapêuticas é de duas a quatro horas e em doses tóxicas aumenta para 25 a 30 horas GOLDFRANK et al 1994 Mecanismo de ação tóxica toxicodinâmica As manifestações tóxicas decorrentes da intoxicação aguda por salicilatos ocorrem inicialmente em função da estimulação do SNC em especial o centro respiratório que acontece também em doses terapêuticas Esse estímulo ocorre de forma direta por ação no centro respiratório no bulbo e de forma indireta pois os salicilatos promovem um aumento do metabolismo por desacoplamento da fosforilação oxidativa ocasionando um aumento no consumo de oxigênio e da produção de CO2 Com o aumento de CO2 também ocorrerá um estímulo respiratório o qual ocasiona uma maior excreção de CO2 levando à uma diminuição na pCO2 H2O CO2 H2CO3 H HCO3 A diminuição da pCO2 provocará uma diminuição de ácido carbônico H2CO3 com consequente diminuição de H ocasionando uma elevação no pH sanguíneo alcalose respiratória Para compensar a alcalose ocorre aumento da excreção de bicarbonato HCO3 acompanhada de um aumento na excreção de Na com consequente excreção de H2O provocando desidratação O aumento do metabolismo leva a uma sudorese que agrava a desidratação Em altas doses numa segunda fase da intoxicação os salicilatos produzem efeito depressor vasomotor levando a uma depressão respiratória Apesar da alcalose que deixa o salicilato na forma iônica mais hidrossolúvel como a dose é alta e os sistemas de biotransformação estão saturados a quantidade de salicilato que atravessa a barreira hematoencefálica é alta o suficiente para produzir depressão respiratória a qual levará a um aumento de CO2 com diminuição do pH sanguíneo acidose respiratória Já que os salicilatos atuam como desacopladores da fosforilação oxidativa bloqueando o ciclo de Krebs haverá uma diminuição na produção de ATP pela via aeróbica Para compensar haverá um aumento da glicólise via anaeróbica que elevará os níveis de ácido lático e pirúvico levando a uma acidose metabólica O organismo também usa as reservas de glicose muscular e de glicogênio hepático podendo ocorrer hipoglicemia Se as reservas de glicose e glicogênio se esgotarem os lipídios serão utilizados para obtenção de energia podendo ocorrer uma cetoacidose metabólica Toda essa acidose deixará o salicilato na forma molecular mais lipossolúvel atravessando mais facilmente a barreira hematoencefálica e aumentando a quantidade da substância disponível no SNC Com isso a depressão respiratória irá se agravar podendo evoluir para uma parada respiratória 258 Unidade II Além desses episódios que narramos outras duas situações podem ser observadas com o uso de AAS São elas Síndrome de Reye devido à possível associação à síndrome de Reye não se aconselha a usar salicilatos em crianças e em adultos com idade inferior a 20 anos com febre associada à origem viral Tratase de uma encefalopatia grave com evolução que pode induzir a fatalidade Ocorre uma disfunção hepática e infiltração gordurosa no fígado e outras vísceras O paracetamol não está associado à incidência de síndrome de Reye sendo portanto o fármaco preferido como antipirético em detrimento dos salicilatos Asma induzida por aspirina a asma induzida por aspirina AIA é uma doença inflamatória das vias aéreas adquirida contínua e agressiva associada à exacerbação da asma e rinite após ingestão de AAS e da maioria dos Aines Inicialmente foi descrita por Samter e denominada tríade de Samter asma pólipo nasal e reação à aspirina Atualmente a maioria das investigações clínicas inclui sinusite crônica nessa patologia sendo também denominada como asma intolerante à aspirina asma sensível à aspirina e doença respiratória exacerbada por aspirina A AIA é amplamente subdiagnosticada na população asmática e as razões são a falta de reconhecimento de reações leves induzidas pelos Aines pelos pacientes e a falta de conhecimento sobre AIA entre os profissionais da saúde Como principal causa temse uma produção de leucotrienos que são bronquioconstrictores ocasionada pela inibição do eixo das COXs conforme a figura a seguir ilustra Fosfolipídeos de membranas Fosfolipase A2 Inibidores da COX12 Ácido araquidônico 15LO5LOFLAP Lipoxina COX12 LTA4H LTA4 LTB4 LTC4S LTC4 LTD4 LTE4 TBX PGD2 PGF2a PGE2 Legenda AINH Antiinflamatórios não hormonais AA Ácido araquidônico COX Ciclooxigenase FA2 Fosfolipase A2 FLAP Proteína ativadora da 5LO5LO 5lipoxigenase 15LO 15lipoxigenase LTA B C D Leucotrieno A B C D LTA4H Leucotrieno A4 hidrolase LTC4S Leucotrieno C4 sintase LX Lipoxina PGD E F Prostaglandina D E F TBX Tromboxano Figura 127 Patogênese da asma induzida por aspirina 259 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Sinais e sintomas da intoxicação As principais manifestações tóxicas são decorrentes da estimulação do SNC e de maneira geral incluem vômitos dor de cabeça hiperpneia e anormalidades neurológicas como confusão hiperatividade incoordenação na fala e convulsões generalizadas Devido à desidratação pode ocorrer desequilíbrio eletrolítico Essas manifestações podem variar dependendo do grau da intoxicação Intoxicações leves ardor na boca esôfago ou abdome fraca ou moderada hiperpneia letargia vômitos diminuição na audição e vertigens Intoxicações moderadas hiperpneia severa letargia marcante excitabilidade delírio febre sudorese desidratação incoordenação e agitação Intoxicações severas severa hiperpneia coma convulsões cianose oliguria edema pulmonar e falência respiratória Reações severas como rinorreia constricção dos brônquios e colapso respiratório ocorrem raramente mais especialmente em asmáticos após doses de 03 a 1 g Tratamento da intoxicação O tratamento requer medidas de suporte diminuição da absorção e aumento da excreção do salicilato Medidas de suporte Diminuir a febre por meios físicos como água fria Controlar as convulsões com diazepam mas não administrar outros depressores menos seguros Reduzir o desequilíbrio eletrolítico através de hidratação Em casos de distúrbios de coagulação administrar vitamina K1 Medidas de descontaminação do trato gastrointestinal Induzir emese Proceder lavagem gástrica que remove quantidades significativas de salicilato até 12 horas após a ingestão Administrar carvão ativado seguido de catártico O carvão ativado deve ser seriado para prevenir a reabsorção do salicilato que tem circulação ênterohepática 260 Unidade II Medidas para aumentar a excreção Manter a urina alcalina com o uso de bicarbonato de sódio para deixar o salicilato na forma iônica mais hidrossolúvel Em casos graves podese proceder hemodiálise diálise peritoneal ou hemoperfusão com carvão ativado Lembrete A alteração de pH urinário embora represente uma importante ferramenta na tentativa de reversão da intoxicação por salicilatos é prática que exige critério e conhecimento pois devese pensar que nem só o pH urinário poderá se alterar incorrendo em problemas de acidose eou alcalose induzidas Observação Para que o tratamento seja efetivo confrontase o que se obtém em laboratório concentração plasmática com o nomograma de Done para avaliação da severidade da intoxicação Exames laboratoriais Em um ambiente clínico as análises toxicológicas auxiliam no diagnóstico e no tratamento das intoxicações bem como na avaliação da eficácia do tratamento empregado Informações sobre a quantidade de toxicante absorvida ou disponível somadas à avaliação clínica realizada pelo médico permitem correlacionar sinais e sintomas e direcionar o paciente para o tratamento mais adequado para a intoxicação KLAASSEN WATKINS 2012 A regra fundamental no tratamento da intoxicação é remover o material que ainda não foi absorvido limitando a absorção e facilitando sua eliminação O laboratório de análises toxicológicas auxilia no monitoramento das concentrações plasmáticas do agente tóxico ainda disponíveis Entre as análises de urgência mais requisitadas estão as dos salicilatos e paracetamol KLAASSEN WATKINS 2012 A intoxicação aguda por salicilatos é uma situação potencialmente fatal e de não tão rara ocorrência A demora no diagnóstico de uma intoxicação grave assim como o atraso na adoção de uma terapêutica adequada está associada a uma taxa de mortalidade maior do que nos casos em que o diagnóstico é mais rápido e os pacientes tratados de forma apropriada 261 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS O laboratório de toxicologia tem importante papel nas intoxicações por salicilatos e as análises mais comuns nesses casos são Teste rápido com reativo de trinder ou cloreto férrico adicionase 1 ml do reativo a 1 ml de soro plasma ou urina Usado para triagem Cromatografia em camada delgada usase como fase estacionária a sílica gel G como sistema solvente utilizase clorofórmio acetona 91 e o revelador é o cloreto férrico FeCl3 A cromatografia em camada delgada pode ser usada para triagem ou para confirmar o resultado do teste rápido Quantificação espectrofotométrica a 1 ml de amostra adicionase 1 ml de reativo de trinder ou cloreto férrico e lêse a coloração obtida em espectrofotômetro Além dos exames toxicológicos devese monitorar os níveis sanguíneos de bicarbonato cloretos potássio sódio glicose e o pH Interpretação dos resultados Teste rápido o íon férrico reagindo com o grupamento fenólico dos salicilatos produzirá um cromóforo de cor violeta ou roxa que indicará a presença de salicilatos na amostra Como pode ocorrer de os resultados darem falsopositivos devido à presença de outras substâncias com grupamento fenólico esse teste é apenas indicativo e não conclusivo da presença de salicilatos devendo assim ser confirmado por técnicas mais específicas Cromatografia em camada delgada seguindo a mesma reação do teste rápido a coloração violeta ou roxa indicará a presença de salicilatos É mais específico que o teste rápido Quantificação espectrofotométrica da mesma forma que as anteriores na presença de salicilato ocorrerá formação de coloração violeta ou roxa que será mensurada no espectrofotômetro em 540 nm Quando se souber o horário da intoxicação pode ser usada para se avaliar o grau de intoxicação e a eficácia do tratamento assim como dar o prognóstico do paciente através do nomograma de Done que relaciona a concentração plasmática com o tempo decorrente da ingestão veja a figura a seguir 262 Unidade II 120 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 24 48 12 26 60 Assintomática Horas após a ingestão Salicemia mgdl Leve Grave Moderada Intoxicação aguda 2535 mg Intoxicação crônica 1015 mg Figura 128 Nomograma de Done Veja o nomograma de Done utilizado para que a clínica saiba em qual nível de intoxicação se encontra o paciente A partir disso é possível se instituírem tratamentos adequados para a intoxicação Tabela 8 Valores classificatórios da intoxicação Tempo após a ingestão Conc sérica mg Toxicidade 12 25 Assintomático 24 25 Branda 36 25 Moderada Derivados do paminofenol Os derivados do ácido paminofenol exibem ações antitérmica e analgésica com baixa ou nenhuma ação antiinflamatória e uricosúrica por uma ação inibitória não seletiva sobre COX Compõem essa classe de fármacos a acetanilida a acetofenetidina fenacetina e seu metabólito acetaminofeno paracetamol DELUCIA et al 2014 Na overdose por paracetamol as vias de glucuronização e sulfatação tornamse saturadas e o metabolismo via citocromo P450 principalmente pela enzima CYP2E1 aumenta Dessa forma aumenta a produção do NAPQI Nacetilpbenzoquinona que rapidamente esgota a glutationa celular Quando cerca de 70 da glutationa estão esgotados o NAPQI ligase covalentemente com as macromoléculas 263 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS de proteínas nos hepatócitos causando alteração de membrana morte celular e degeneração do fígado Pode ocorrer dano renal pelo mesmo mecanismo devido ao metabolismo do CYP renal Aspectos toxicológicos da intoxicação por paracetamol A diminuição do uso de salicilatos em crianças devido à síndrome de Reye provocou um aumento no uso de paracetamol bem como uma elevação nos casos de intoxicações É o principal metabólito da fenacetina mas este não é mais usado atualmente É usado como analgésicoantipirético mas não como antiinflamatório A maior parte dos casos fatais ocorre quando da ingestão de doses maiores que 140 mgkg de peso Toxicocinética O paracetamol é absorvido rápida e completamente pelo trato gastrintestinal e o pico plasmático é atingido em 30 a 60 minutos A taxa de ligação proteica é de cerca de 26 e a meia vida biológica é de três horas É biotransformado e excretado principalmente conjugado com sulfato ou ácido glicurônico Apenas 2 são excretados inalterados Uma pequena fração cerca de 4 é biotransformada através do sistema citocromo P450 originando um produto altamente reativo e extremamente hepatotóxico mas que é inativado por conjugação com a glutationa sendo posteriormente excretado Em altas doses além de se aumentar a porcentagem de paracetamol biotransformado pela via secundária depletamse as reservas de glutationa Assim o intermediário reativo não é inativado ligandose à macromoléculas do hepatócito e produzindo necrose hepática Essa situação pode ser agravada se estiver associado um indutor enzimático ou se o indivíduo for usuário crônico de álcool Lembrete Você deve se lembrar que esse exemplo sobre a interação com álcool já foi utilizado anteriormente Sinais e sintomas da intoxicação Num primeiro estágio em 48 horas ocorrem anorexia náuseas e vômitos que são inespecíficos daí a importância do diagnóstico laboratorial A seguir ocorrem aumento de ALT AST e de bilirrubina devido à lesão hepática A intoxicação pode ser fatal em até quatro dias se o indivíduo não for tratado 264 Unidade II Tratamento da intoxicação Consiste em monitorizamento das funções vitais diminuição da absorção e administração de antídoto Monitoramento das funções vitais parâmetros bioquímicos e função hepática Diminuição da absorção Induzir emese Realizar lavagem gástrica Utilizar carvão ativado Administração de antídotos A administração de precursores da glutationa como a cisteína e a metionina pouco usada são indicadas em quatro a 24 horas após a ingestão A cisteína é degradada rapidamente quando administrada por via intravenosa e não é bem absorvida por via oral por isso o antídoto mais utilizado é a nacetilcisteína NAC Fluimucil Zambom Sua administração pode ser feita por via intravenosa mas é sugerido que sua ação é mais eficaz por via oral pois a nacetilcisteína após absorvida irá primeiramente para o fígado Você pode acompanhar esse mecanismo de forma bem detalhada na próxima figura Ocorre lesão hepática grave em 90 dos casos em pacientes tornando o carvão ativado o melhor método de descontaminação oral desde que a administração tenha sido feita em até quatro horas Exames laboratoriais Teste rápido a 1 ml de urina adicionar 1 ml de HCl conc Em seguida deixar em banhomaria a 100 C por 10 minutos Retirar 02 ml e a ele adicionar 5 ml de solução de fenol ou cresol 1 e 3 ml de hidróxido de sódio 2M Em caso positivo observase coloração azul Espectrofotometria como amostra podese usar plasma ou soro e há formação de um cromóforo que absorve luz em 430 nm Além dos exames toxicológicos devem ser realizadas dosagens de ALT AST e bilirrubina Interpretação dos resultados Através do nomograma de Rumack sabendose o horário da ingestão é possível avaliar a gravidade da intoxicação a eficáca do tratamento e o prognóstico 265 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Via UDP Glucoronil transferase Metabólitos não tóxicos na urina Cisteína e conjugados do ácido mercaptopurínico Via fenol sulfotransferase Toxicidade celular Glutationa Via renal inalterada 5 Sulfatação 2047 Conjugação4067 Paracetamol NAPQI CYP450 515PQI NAC1 NAC2 NAC3 NAC4 Figura 129 Vias de biotransformação do paracetamol e proteção feita pela NAC Nacetilcisteína Mecanismo de hepatoproteção da NAC NAC1 aumenta a sulfatação NAC2 é um precursor da glutationa NAC3 é um substituto da glutationa NAC4 melhora a função de múltiplos órgãos durante a lesão hepática e possivelmente limita a extensão do dano hepático Assim como ocorre na intoxicação por salicilatos para que o tratamento seja efetivo confrontase o que obteve em laboratório concentração plasmática com o nomograma de RumackMattew veja a figura a seguir para avaliação da severidade da intoxicação e a administração de antídoto 266 Unidade II 300 250 200 175 150 125 100 80 60 50 40 30 20 15 100 4 4 8 8 12 12 16 Paracetamol micromolL Paracetamol mgL Tempo decorrido desde a exposição 16 6 6 10 10 14 14 Provável Provável risco risco Possível risco Possível risco Fatores de risco Fatores de risco presentes presentes Baixo risco Baixo risco normalmente não normalmente não tratar tratar Alto risco tratar Alto risco tratar 150 200 250 300 400 500 600 700 800 1000 1200 1400 1600 1800 2000 Figura 130 Nomograma de RumackMattew 522 Síndromes tóxicas Nas intoxicações temos várias síndromes que passam a ser agrupadas segundo seus agentes causadores e sintomas Falaremos portanto sobre algumas dessas síndromes e a importância que elas passam a ter para o manejo de tratamento das diferentes intoxicações Segundo o Manual de Toxicologia Clínica do estado de São Paulo HERNANDEZ RODRIGUES TORRES 2017 e Schvartsman e Schvartsman 1999 a toxíndrome ou síndrome tóxica pode ser definida como um complexo de sinais e sintomas produzido por doses tóxicas de substâncias químicas que apesar de diferentes têm um efeito mais ou menos semelhante O reconhecimento da síndrome especificamente permite a identificação mais rápida do agente causador e consequentemente a realização do tratamento adequado Para tanto é preciso realizar como em qualquer outra afecção clínica atendida em serviço de emergência uma anamnese e um exame físico cuidadoso Alguns aspectos específicos devem ser enfatizados ou mais detalhados Na história quando o tóxico for conhecido devese fazer uma estimativa da quantidade em contato com o organismo do tempo decorrido desde o acidente até o atendimento da sintomatologia inicial do tipo de socorro domiciliar e dos antecedentes médicos importantes Quando o tóxico for desconhecido 267 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS são dados suspeitos início agudo da sintomatologia idade entre 1 e 5 anos pica problemas domésticos estado mental alterado quadro clínico estranho ou complexo excesso de medicamentos no domicílio e informações dos parentes ou dos companheiros O exame físico deve detalhar além dos sinais usuais características da pele e das mucosas temperatura coloração odor hidratação do hálito da boca lesões corrosivas odor hidratação dos olhos conjuntiva pupila movimentos extraoculares do sistema nervoso central nível de consciência escala do coma estado neuromuscular do sistema cardiocirculatório frequência e ritmo cardíaco pressão arterial perfusão e do sistema respiratório frequência movimentos respiratórios ausculta Destacaremos a seguir segundo Schvartsman e Schvartsman 1999 algumas dessas síndromes tóxicas consideradas como principais Síndrome anticolinérgica sintomatologia Sintomas rubor de face mucosas secas hipertermia taquicardia midríase retenção urinária agitação psicomotora alucinações e delírios Principais agentes atropina derivados e análogos antihistamínicos antiparkinsonianos antidepressivos tricíclicos antiespasmódicos midriáticos plantas da família Solanaceae particularmente do gênero Datura Síndrome anticolinesterásica Sintomas sudorese lacrimejamento salivação aumento das secreções brônquicas miose bradicardia fibrilações e fasciculações musculares Principais agentes inseticidas organofosforados inseticidas carbamatos fisostigmina algumas espécies de cogumelos Síndrome narcótica Sintomas depressão respiratória depressão neurológica miose bradicardia hipotermia hipotensão hiporreflexia Principais agentes opiáceos incluindo também elixir paregórico difenoxilato loperamida Síndrome depressiva Sintomas depressão neurológica sonolência torpor coma depressão respiratória cianose hiporreflexia hipotensão Principais agentes barbitúricos benzodiazepínicos etanol Síndrome simpatomimética Sintomas midríase hiperreflexia distúrbios psíquicos hipertensão taquicardia piloereção hipertermia sudorese Principais agentes cocaína anfetamínicos derivados e análogos descongestionantes nasais cafeína teofilina Síndrome extrapiramidal Sintomas distúrbios do equilíbrio distúrbios da movimentação hipertonia distonia orofacial mioclonias trismo opistótono parkinsonismo Principais agentes fenotiazínicos butirofenonas fenciclidina lítio Síndrome metemoglobinêmica Sintomas cianose de pele e mucosas de tonalidade e localização peculiar palidez de pele e mucosas confusão mental depressão neurológica Principais agentes acetanílida azul de metileno dapsona doxorubicina fenazopiridina furazolidona nitratos nitritos nitrofurantoína piridina sulfametoxazol 268 Unidade II O reconhecimento da síndrome tóxica agiliza a identificação do agente causal e permite um tratamento mais adequado Quadro 10 Principais síndromes tóxicas e agentes relacionados Síndromes Sintomatologia Agentes Anticolinérgica bloqueio de receptores muscarínicos da Ach Aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial midríase febre rubor mucosas e pele secas alucinações agitação psicomotora Atropina e derivados beladonas antihistamínicos Colinérgica diminuição da atividade da AchE Redução da frequência cardíaca e da pressão arterial miose fraqueza e fasciculações musculares sialorreia broncoespasmo cólicas Inseticidas organofosforados carbamatos e alguns cogumelos Depressão do SNC narcótica hipnótica sedativa Redução da frequência cardíaca e da pressão arterial miose sonolência torpor coma depressão respiratória Barbitúricos benzodiazepínicos etanol opioides antidepressivos tricíclicos carbamazepina Extrapiramidal bloqueio de receptores dopaminérgicos Distorção facial espasmos musculares mímica facial pobre choro monótono Metemoglobinemia conversão da hemoglobina em metemoglobina Cianose cinza arroxeada taquicardia astenia e convulsões Nitrito nitrato naftalina anestésicos sulfona Simpatomimética Aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial midríase febre sudorese rubor agitação Drogas de abuso cafeína descongestionantes tópicos ou sistêmicos teofilina 523 Toxicologia de emergência intoxicações agudas Uma intoxicação suspeita ou confirmada deverá ser tratada como uma situação clínica potencialmente grave pois mesmo pacientes que não apresentam sintomas inicialmente podem evoluir mal Dessa forma a abordagem inicial deve ser feita de forma rápida e criteriosa Neste tópico faremos um estudo sobre os princípios e condutas básicas para o atendimento de um paciente com suspeita de intoxicação Vamos juntos nessa Nas intoxicações de uma forma geral existem os procedimentos gerais para a manutenção e estabilização do paciente e as medidas específicas que são dependentes do agente causador e exigem uma conduta Assim segundo Schvartsman e Schvartsman 1999 para a estabilização do paciente intoxicado existe uma série de etapas que não precisam estar e ser sequenciais como avaliação clínica inicial estabilização reconhecimento da toxíndrome síndrome tóxica e identificação do agente causal 269 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS descontaminação administração de antídotos aumento da eliminação do tóxico absorvido tratamento sintomático Tais etapas embora aplicáveis e aceitas pela maioria dos autores e clínicos apresentam dependendo do local controvérsias que às vezes causam conflito nas informações acerca da sua prática ou não 5231 Avaliação inicial O primeiro passo no atendimento de um paciente intoxicado é a realização de um breve exame físico para identificar as medidas imediatas necessárias para estabilizar o indivíduo e evitar a piora clínica Portanto nesse momento é de fundamental importância checar sinais vitais nível e estado de consciência pupilas diâmetro e reatividade à luz temperatura e umidade da pele oximetria de pulso medida de glicose capilar dextro Também devese obter ECG eletrocardiograma e realizar monitorização eletrocardiográfica se necessário manter vias aéreas abertas e realizar intubação orotraqueal IOT se necessário obter acesso venoso calibroso nesse momento podem ser coletadas amostras para exames toxicológicos Observação Estudaremos neste tópico manobras clínicas as quais você deverá sempre relacionar a um profissional médico 270 Unidade II O objetivo principal da avaliação clínica inicial é o de verificar se o paciente apresenta algum distúrbio que represente risco iminente de vida Para tanto é indispensável um exame físico rápido porém rigoroso para avaliar as seguintes situações Condições respiratórias distúrbios que representam risco de vida e que exigem atenção imediata incluem obstrução das vias aéreas apneia bradipneia ou taquipneia intensa edema pulmonar e insuficiência respiratória aguda Condições circulatórias exigem atenção imediata alterações significativas de pressão arterial ou de frequência cardíaca disritmias ventriculares insuficiência cardíaca congestiva estado de choque e parada cardíaca Condições neurológicas estado de mal convulsivo pressão intracraniana aumentada coma pupilas fixas e dilatadas ou mióticas puntiformes e agitação psicomotora intensa Observe que quando as condições permitirem a avaliação poderá ser ampliada incluindo outros dados tais como pele e anexos temperatura estado de hidratação entre outras 5232 História da exposição Você já ouviu falar sobre a estratégia dos 5 Ws Utilizase a estratégia dos 5 Ws para se obterem os dados relacionados ao paciente Who Quem à substância utilizada What O quê horário da exposição When Quando local da ocorrência Where Onde e motivo da exposição Why Por quê Veja que nas emergências muitas informações podem ser distorcidas ou omitidas principalmente quando há tentativas de suicídio ou homicídio envolvidas uso de drogas ilícitas abortamento ou maustratos Dessa forma sugerese uma conduta geral em situações dessa ordem para que os vieses sejam os menores possíveis e a identificação do agente tóxico seja a mais precisa possível Observe algumas condutas que separamos como sendo de importância para um manejo clínico Paciente obter o histórico de doenças medicações em uso tentativas de suicídio anteriores ocupação acesso a substâncias uso de drogas e gravidez Agente tóxico procurar saber qual foi a substância utilizada e a quantidade Sempre que possível devese solicitar para os acompanhantes trazerem os frascos ou embalagens e questionar se pode ser um produto clandestino Tempo verificar qual foi o horário da exposição e por quanto tempo a substância foi utilizada nos casos de exposições repetidas Também devese questionar se houve algum sintoma prévio à exposição 271 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Local saber onde ocorreu a exposição e se foram encontrados frascos embalagens seringas ou cartelas de comprimidos próximos ao paciente É necessário ainda verificar quais medicamentos são utilizados pelos familiares ou pelas pessoas onde o indivíduo foi encontrado Também é útil saber se foi encontrada alguma carta ou nota de despedida em casos de tentativa de suicídio Motivo identificar a circunstância da exposição já que é de extrema importância saber se foi tentativa de suicídio homicídio acidente abuso de drogas ou outro tipo de ocorrência 5233 Exame físico É importante que o exame físico do paciente seja realizado verificando os principais sinais e sintomas descritos a seguir Odores característicos são exemplos hálito etílico uso de álcool e odor de alho organofosforados Achados cutâneos sudorese secura de mucosas vermelhidão palidez cianose desidratação e edema Temperatura hipo ou hipertermia Alterações de pupilas miose midríase anisocoria tamanho desigual da pupila e alterações de reflexo pupilar Alterações da consciência agitação sedação confusão mental alucinação delírio e desorientação Anormalidades neurológicas convulsão síncope alteração de reflexos alteração de tônus muscular fasciculações e movimentos anormais Alterações cardiovasculares bradicardia taquicardia hipertensão hipotensão e arritmias Anormalidades respiratórias bradipneia ou taquipneia e presença de ruídos adventícios pulmonares Achados do aparelho digestório sialorreia vômitos hematêmese diarreia rigidez abdominal e aumento ou diminuição de ruídos hidroaéreos Esses sinais e sintomas descritos quando agrupados podem caracterizar uma determinada síndrome tóxica Lembrete Você deve se lembrar de que o conhecimento das síndromes tóxicas que vimos há pouco auxiliam na identificação mais rápida do agente tóxico 272 Unidade II 5234 Tratamento O manejo adequado de um paciente com suspeita de intoxicação depende do agente envolvido e da sua toxicidade assim como do tempo decorrido entre a exposição e o atendimento Além do suporte o tratamento envolve medidas específicas como descontaminação administração de antídotos e técnicas de eliminação descritas a seguir 52341 Descontaminação Esse procedimento visa à remoção do agente tóxico com o intuito de diminuir a sua absorção Durante o procedimento a equipe de atendimento deverá tomar as precauções para se proteger da exposição ao agente tóxico Os seguintes procedimentos estão indicados de acordo com a via de exposição Cutânea retirar roupas impregnadas com o agente tóxico e lavar a superfície exposta com água em abundância Respiratória remover a vítima do local da exposição e administrar oxigênio umidificado suplementar Ocular instilar uma ou duas gotas de colírio anestésico no olho afetado e proceder a lavagem com SF 09 ou água filtrada sempre da região medial do olho para a região externa com as pálpebras abertas durante pelo menos cinco minutos É necessário solicitar avaliação oftalmológica Gastrintestinal GI consiste na remoção do agente tóxico do trato gastrintestinal no intuito de evitar ou diminuir sua absorção Descontaminação gastrintestinal A indicação da descontaminação GI depende da substância ingerida do tempo decorrido da ingestão dos sintomas apresentados e do potencial de gravidade do caso Recomendase avaliação criteriosa do nível de consciência do paciente antes de iniciar o procedimento e sempre considerar intubação orotraqueal caso julgar necessário para proteção de vias aéreas Os benefícios maiores desse procedimento estão nas seguintes situações na ausência de fatores de risco para complicações como torpor e sonolência na ingestão de quantidades potencialmente tóxicas das substâncias nas ingestões recentes isto é até uma a duas horas da exposição 273 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS nos casos envolvendo agentes que diminuam o trânsito intestinal anticolinérgicos fenobarbital etc ou de substâncias de liberação prolongada a indicação da descontaminação pode ser mais tardia O procedimento dividese em duas etapas a realização da lavagem gástrica seguida da administração do carvão ativado que discutiremos com você a seguir Lavagem gástrica LG consiste na infusão e posterior aspiração de soro fisiológico a 09 SF 09 através de sonda nasogástrica ou orogástrica com o objetivo de retirar a substância ingerida Devese sempre avaliar criteriosamente a relação risco x benefício antes de iniciar o procedimento pois há grande risco de aspiração É contraindicada na ingestão de cáusticos solventes e quando há risco de perfuração e sangramentos Devese evitar a infusão de volumes superiores aos indicados pois pode facilitar a passagem da substância ingerida pelo piloro e aumentar a absorção do agente tóxico Devese utilizar sonda de grande calibre adultos calibre de 18 a 22 crianças de 10 a 14 mantendo o paciente em decúbito lateral esquerdo para facilitar a retirada do agente tóxico e diminuir a velocidade do esvaziamento gástrico para o intestino É necessário infundir e retirar sucessivamente o volume de SF 09 recomendado de acordo com a faixa etária até completar o volume total recomendado ou até que se obtenha retorno límpido Carvão ativado CA é um pó obtido da pirólise de material orgânico com partículas porosas com alto poder adsorvente do agente tóxico que previne a sua absorção pelo organismo Geralmente é utilizado após a LG mas pode ser utilizado como medida única de descontaminação GI Nesses casos a administração pode ser por via oral sem necessidade da passagem de sonda nasogástrica Na maioria das vezes deverá ser utilizado em dose única porém pode ser administrado em doses múltiplas como medida de eliminação em exposições a agentes de ação prolongada ou com circulação enterohepática como fenobarbital carbamazepina dapsona clorpropramida entre outros Contraindicações ao uso do carvão ativado RN gestantes ou pacientes muito debilitados cirurgia abdominal recente administração de antídotos por VO Pacientes que ingeriram cáusticos ou solventes ou que estão com obstrução intestinal Pacientes intoxicados com substâncias que não são efetivamente adsorvidas pelo carvão como os ácidos álcalis álcoois cianeto e metais como lítio ferro entre outros 274 Unidade II Complicações que podem ocorrer com o uso do CA Constipação e impactação intestinal principalmente quando utilizado em doses múltiplas Broncoaspiração especialmente quando realizado em pacientes torporosos sem a proteção da via aérea Lavagem intestinal Consiste na administração de solução de polietilenoglicol PEG via sonda nasoenteral para induzir a eliminação do agente através do trato gastrintestinal pelas fezes É raramente utilizada salvo nos casos de ingestão de pacotes contendo drogas bodypacking ou de quantidades potencialmente tóxicas de substâncias não adsorvidas pelo carvão ativado exemplos ferro lítio etc Está contraindicada na presença de íleo paralítico perfuração gastrintestinal hemorragia gastrintestinal e instabilidade hemodinâmica Para finalizarmos este tópico demonstramos a seguir um fluxograma geral de atendimento ao paciente Sangue Suspeita de intoxicação Triagem Triagem Fluido gástrico Discussão clínico x analista Suspeita de intoxicação Anamnese Figura 131 Fluxograma do atendimento ao paciente intoxicado 275 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS 524 Toxicologia clínica Intoxicações exógenas definemse como as consequências clínicas que uma substância química pode desencadear entre elas o medicamento A toxicologia clínica representa a parte médica voltada ao tratamento do paciente exposto ao agente tóxico com a finalidade de prevenir e diagnosticar a intoxicação ou aplicar se necessário uma medida terapêutica específica para seu tratamento Lembrete Você deve se lembrar novamente de que essa parte clínica é de atribuição do profissional médico Na fase clínica o médico passa a ter acesso aos sintomas do paciente intoxicado ou mesmo a algumas alterações laboratoriais que esses agentes tóxicos possam induzir lembrando que uma mesma substância pode induzir a um quadro tóxico vários órgãos em um mesmo momento ou em momentos distintos e um único órgão pode ser atingido por várias substâncias diferentes Os efeitos tóxicos podem se dividir em Efeitos imediatos ou agudos aparecem imediatamente após uma exposição aguda ou seja exposição única ou que ocorre no máximo em 24 horas Em geral são efeitos intensamente graves e a evolução pode levar o paciente à morte ou causar lesões persistentes Efeitos crônicos são aqueles que surgem de uma exposição crônica ou seja exposição a pequenas doses durante vários meses ou anos Efeitos retardados são aqueles que só ocorrem após um período de latência mesmo quando já não mais existe a exposição Exemplo efeitos carcinogênicos que têm uma latência de 20 a 30 anos Esses efeitos podem advir de uma exposição aguda ou crônica e são dependentes do agente tóxico da dose exposta e das condições de exposição Não se pode confundir efeitos agudos e crônicos com exposição aguda e crônica pois através de uma exposição aguda é possível se ter um efeito crônico dependendo como já mencionado da substância da sua dose e das condições às quais ela foi exposta No que diz respeito às intoxicações medicamentosas é possível observar intoxicações que ocorreram por uma exposição aguda originando efeitos agudos ou mesmo crônicos Ainda é possível ter através de uma exposição crônica efeitos agudos que porventura venham também a se cronificar Na verdade nesse contexto destacase a importância da monitorização terapêutica que é aplicada em pacientes que empregam medicamentos de forma crônica principalmente Nas intoxicações exógenas especificamente voltadas aos medicamentos a toxicologia clínica se incumbe da prevenção da intoxicação do diagnóstico da intoxicação o que a causou e do tratamento 276 Unidade II Cada classe ou cada medicamento dentro de uma classe exige uma conduta específica com relação aos tratamentos ou aplicação quando possível e pertinente de antídotos para se contraporem aos efeitos nocivos dos medicamentos Destacase nesse contexto a importância do laboratório de toxicologia que muitos hospitais principalmente os de grande porte possuem os quais têm a incumbência de identificar os medicamentos e as suas classes nas mais variadas matrizes biológicas Observação Considere que o laboratório de toxicologia precisa oferecer resultados rápidos com técnicas analíticas que priorizem o tempo para que a parte clínica possa instituir tratamentos adequados Os exames laboratoriais podem ser diretos qualitativos ou quantitativos ou indiretos Exames diretos qualitativos ou semiquantitativos como o screening urinário para drogas de abuso podem ser úteis no esclarecimento do diagnóstico detectando acetona anfetaminas anticolinérgicos barbitúricos benzoilecgonina cafeína canabinoides cocaína codeína deidrocodeína etanol fenotiazínicos heroína morfina e nicotina Além disso podem detectar antidepressivos tricíclicos betabloqueadores cloroquina diquat disopiramida estricnina glicóis herbicidas fenoxiclorados isopropanol metanol metoclopramida paracetamol paraquat salicilatos e teofilina Os exames quantitativos geralmente realizados no sangue são importantes no controle da intoxicação devida principalmente aos seguintes agentes acetaminofeno 20 mgl chumbo 25 mgdl digitálicos 2 ngml etanol 100 mgdl etilenoglicol 20 mgdl fenobarbital 30mgml ferro 300 mgdl salicilato 30 mgdl e teofilina 20 mgml Os exames indiretos consistem na dosagem de marcadores sugestivos de intoxicações São exemplos a dosagem da atividade da colinesterase sanguínea e a dos níveis de metemoglobinemia No primeiro caso queda superior a 50 é altamente sugestiva de intoxicação por inseticidas organofosforados e carbamatos Metemoglobinemia superior a 15 é acompanhada por sintomatologia tóxica Convém notar que os resultados das análises toxicológicas de urgência são importantes por permitirem um diagnóstico preciso de uma intoxicação ou até mesmo a sua exclusão permitindo até uma reavaliação clínica a identificação do agente tóxico que irá auxiliar o clínico no uso de uma terapêutica mais específica e adequada ao paciente a monitorização das intoxicações graves falaremos melhor com você a seguir sobre monitorização terapêutica como aquelas causadas por ferro e metanol o estabelecimento de um prognóstico mais previsível como ocorre nas intoxicações por paracetamol e paraquat 277 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS um seguimento mais adequado como na intoxicação por antidepressivos tricíclicos por dapsona etc Aqui fazemos um destaque ao papel relevante do analista toxicologista pois além da capacidade de realizar as análises propriamente ditas apresenta plenas condições da interpretação dos resultados Observação Assim sendo destacamos a importância do estreito relacionamento entre o clínico e o analista As solicitações pela equipe clínica de um screening toxicológico diagnóstico diferencial surgem na maioria das vezes da falsa ideia da existência de uma única e rápida análise capaz de confirmar a presença de qualquer agente tóxico determinante da intoxicação Um laboratório de análises toxicológicas de fato deve dispor de diferentes métodos orientados através de um planejamento toxicológico Dos milhares de agentes capazes de provocar intoxicação um laboratório tem habilidade para detectar somente cerca de um décimo desse total e de quantificar dezenas deles nas diversas matrizes biológicas disponíveis O método analítico inclui o conjunto de procedimentos ou técnicas desde o prétratamento da amostra até seu resultado final Pode ter finalidade qualitativa em que se verifica a presença ou ausência do agente tóxico na matriz biológica ou quantitativa na qual se realiza a determinação dos analitos podendo ser útil para evidenciar a natureza e a magnitude da exposição a um composto em particular ou a um grupo de compostos Além disso as técnicas analíticas podem ser divididas em Testes de triagem são rápidos e fornecem informações qualitativas ou semiquantitativas para uma classe de agentes tóxicos por exemplo teste positivo para benzodiazepínicos mas não necessariamente o diazepam e algumas vezes podem gerar resultados falsopositivos Assim o resultado de uma técnica de triagem pode ser confirmado por técnicas analíticas mais definitivas Testes de confirmação identificam o composto específico em vez de simplesmente sua classe Esses ensaios carecem de mais tempo horasdias e intensivo trabalho são de limitada disponibilidade além de serem caros de se realizar A técnica confirmatória de escolha para a grande maioria dos compostos é a cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massas e essa análise pode ser qualitativa ou quantitativa Se disponíveis análises confirmatórias serão necessárias quando houver possível envolvimento médicolegal ou do serviço social Devido à complexidade do diagnóstico e tratamento das intoxicações agudas os resultados toxicológicos quando disponíveis no tempo apropriado podem influenciar no diagnóstico e tratamento subsequente do paciente intoxicado Assim avaliando a abordagem emergencial da intoxicação aguda os resultados analíticos devem ser fornecidos rapidamente usualmente dentro de uma a duas horas da chegada do paciente ao hospital priorizando os casos onde o resultado terá influência na conduta a ser tomada 278 Unidade II 5241 Monitorização terapêutica Um dos instrumentos mais valiosos de que se dispõe para assegurar uma terapia com máxima eficácia e efeitos tóxicos mínimos em casos de tratamentos prolongados é a monitorização terapêutica Dessa forma tornase possível ao prescrever uma dose medir sua concentração no local de ação e consequentemente prever a intensidade do efeito A monitorização da terapêutica medicamentosa therapeutic drug monitoring TDM é a prática clínica que usa as concentrações dos fármacos os princípios farmacocinéticos PK e os critérios farmacodinâmicos PD na individualização da posologia e na otimização da terapêutica farmacológica do doente EVANS SCHENTAG JUSKO 1992 Observação Você já deve ter percebido que na monitorização terapêutica os resultados não precisam ser tão rápidos mas devem ser reproduzidos por metodologias bem específicas A TDM é uma prática instituída para um pequeno número de fármacos para os quais há uma relação direta entre a sua concentração e o efeito farmacológico no local de ação o que por sua vez se reflete de forma previsível na resposta Para esses fármacos está descrita uma margem estreita de concentrações acima das quais se observa toxicidade e abaixo ineficácia Tratandose de um intervalo de confiança a noção de margem terapêutica é um conceito probabilístico que representa uma gama de concentrações do fármaco para as quais existe uma probabilidade relativamente elevada de obter a resposta clínica desejada e uma probabilidade relativamente baixa de se observar uma toxicidade inaceitável No entanto alguns doentes respondem abaixo da margem terapêutica enquanto outros necessitam de concentrações acima dela De igual modo há doentes que manifestam reações tóxicas com concentrações dentro da margem terapêutica SCHUMACHER 1995 A TDM é uma área de farmacocinética clínica que visa a individualização posológica e a otimização dos tratamentos farmacológicos com o objetivo de alcançar a máxima eficácia terapêutica com a mínima incidência de efeitos adversos Foi proposta pela primeira vez em 1950 aplicada ao tratamento de arritmias cardíacas com quinidina A sua utilização vulgarizouse desde a segunda metade da década de 1960 com a evolução das técnicas analíticas e dos fundamentos farmacocinéticos da ação dos fármacos Atualmente a melhoria dos cuidados de saúde cria situações clínicas complexas que tornam a TDM relevante na decisão e gestão terapêutica MARTIN et al 2012 Na base do desenvolvimento da monitorização das concentrações dos fármacos no sangue estão várias razões que justificam a realização da TDM SCHUMACHER 1995 Critérios analíticos consistem na disponibilidade de um método analítico para dosear o fármaco de forma rápida sensível e precisa exemplos ELISA EMIT FPIA HPLC e que na maioria dos casos requer pequenos volumes de amostra 279 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Critérios farmacocinéticos consistem na descrição de uma elevada variabilidade inter e intraindividual na distribuição ou na eliminação do fármaco resultando em diferentes concentrações ou exposições a ele Critérios farmacológicos consistem em estar bem demonstrada a relação entre as concentrações do medicamento e a sua atividade farmacológica muitas vezes difícil de quantificar assim como em identificar uma margem terapêutica estreita ou baixo índice terapêutico Critérios clínicos consiste na necessidade de existir uma margem terapêutica bem definida e o conhecimento dos fatores que alteram o comportamento farmacocinético do fármaco de forma a permitir a correta interpretação das concentrações Alguns fatores que alteram a farmacocinética dos fármacos podem também contribuir para a necessidade da execução da TDM BURTON et al 2006 entre os quais variabilidade inter e intraindividual estados patológicos fatores genéticos interações medicamentosas e alterações na distribuição dos medicamentos na obesidade gravidez ou mesmo com a permeabilidade da barreira hematoencefálica SCHUMACHER 1995 Na prática da TDM a qualidade das informações quanto ao medicamento e ao paciente são de fundamental importância para que haja fidelidade e exatidão nas informações relacionadas às concentrações plasmáticas obtidas e correção dessa com a terapia propriamente dita Nesse contexto é fundamental que o profissional da saúde detenha informações acerca da farmacocinética e farmacodinâmica dos medicamentos envolvidos e processos que possam alterálas sempre com o intuito da otimização da terapêutica Não há necessidade e nem exigência clínica para se executar monitorização terapêutica para todos os fármacos destacandose algumas classes como antibióticos gentamicina tobramicina antiepilépticos carbamazepina fenobarbital lítio digoxina imunossupressores ciclosporina e antidepressivos amitriptilina imipramina Assim como não há uma exigência para todos os fármacos também não se faz necessário executar a monitorização para todos os pacientes As exigências são maiores para alguns grupos como as crianças recémnascidos os idosos os politraumatizados e os doentes que por sua condição diferenciada exigem um acompanhamento mais rigoroso da terapêutica para se otimizarem os efeitos e reduzirem as reações adversas Além disso a TDM aplicase muito bem a pacientes refratários a medicamentos como os antipsicóticos 5242 Antídotos Como o nosso objetivo inicial não é o de fornecer especificamente condutas e tratamentos acerca dos medicamentos envolvidos nas intoxicações trazemos aqui informações gerais sobre o uso de antídotos 280 Unidade II Ressaltamos que para cada substância pode haver uma conduta e que tais condutas serão apropriadas e aplicáveis dependendo dos níveis plasmáticos dos medicamentos no meio sistêmico sendo essa tarefa de fundamental importância na toxicologia analítica ou seja a partir da descoberta do agente causador da intoxicação qual medicamento é possível quantificálo e correlacionar esses níveis plasmáticos com valores de faixa terapêutica de normalidade MANUAL 2017 Os antídotos são substâncias que agem no organismo atenuando ou neutralizando ações ou efeitos de outras substâncias químicas A administração desses medicamentos não é a primeira conduta a ser tomada na maioria das situações A maior parte das intoxicações pode ser tratada apenas com medidas de suporte e com tratamentos sintomáticos Entretanto algumas situações exigem a administração de antídotos e às vezes de medicamentos específicos A disponibilidade dessas substâncias é estratégica do ponto de vista de saúde pública Devem estar disponíveis seja para uso imediato no primeiro atendimento em ambulâncias ou nas unidades de emergência seja em poucas horas para uso hospitalar ou em serviços de referência Apresentaremos aqui algumas medidas que podem ser empregadas para reduzir a intoxicação e logo a seguir falaremos sobre os antídotos propriamente ditos Medidas de eliminação São utilizadas para potencializar a eliminação do agente tóxico As principais medidas utilizadas são Alcalinização urinária pode potencializar a excreção urinária de alguns agentes Alcalinizar a urina favorece a conversão de ácidos fracos lipossolúveis como fenobarbital e salicilatos para a forma de sal impedindo a sua reabsorção pelo túbulo renal As contraindicações são insuficiência renal edema pulmonar ou cerebral e doenças cardíacas Hemodiálise ou hemoperfusão são técnicas raramente utilizadas São geralmente indicadas quando a velocidade de depuração da substância pode ser maior pela remoção extracorpórea do que pelo próprio clearance endógeno que ocorre nos casos de nítida deterioração do quadro clínico do paciente ou quando os níveis séricos da substância determinam mau prognóstico A hemodiálise pode ser útil em intoxicações por fenobarbital teofilina lítio salicilatos e álcoois tóxicos Hemodiálise é realizada em 90 dos casos que requerem um método de remoção extracorpórea Durante a hemodiálise até 400 ml de sangue por minuto atravessam um circuito extracorpóreo em que compostos tóxicos difundemse em uma membrana semipermeável e são retirados do organismo É mais efetiva na remoção de compostos com as seguintes características baixo peso molecular 500 daltons 281 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS pequeno volume de distribuição 1 lkg baixa ligação a proteínas plasmáticas Hemoperfusão consiste na depuração do agente tóxico fazendo o sangue passar através de uma coluna de resinas não iônicas ou de microcápsulas de carvão ativado Tem a capacidade de remover mais efetivamente as toxinas adsorvidas pelo carvão ativado quando comparada à hemodiálise porém a disponibilidade dessa técnica nos centros de emergência é limitada Antídotos comprovadamente efetivos Poderíamos aqui dispor de inúmeras tabelas contendo antígenos empregados mas preferimos elencar alguns destes que comprovadamente demonstram efetividade clínica SCHVARTSMAN SCHVARTSMAN 1999 Acetilcisteína tem um efeito poupador de glutationa prevenindo a formação de metabólitos hepatotóxicos do acetaminofeno Sua principal indicação terapêutica é a intoxicação por esse medicamento Outras indicações ainda não têm evidências suficientes As doses usuais são de 140 mgkg por via oral e a seguir 70 mgkg por via oral durante três dias Atropina é um antagonista dos estímulos colinérgicos nos receptores muscarínicos com pouco efeito nos nicotínicos Sua principal indicação sobre a qual existem evidências suficientes é o tratamento da intoxicação por inseticidas organofosforados e carbamatos As doses usuais para crianças são de 001 a 005 mgkg preferencialmente por via intravenosa repetidas em intervalos de minutos até a melhora do quadro clínico ou o aparecimento de sinais de intoxicação atropínica Azul de metileno medicamento que age como transportador de elétrons ativando a via da hexose monofosfato eritrocitária na qual a G6PD glicose 6fosfato desidrogenase é enzima básica permitindo a redução da metemoglobina em hemoglobina É indicado no tratamento das metemoglobinemias tóxicas particularmente as induzidas por derivados da anilina e nitritos Em indivíduos com deficiência de G6PD seus efeitos são menos evidentes BAL ou dimercaprol é um quelante cujos grupos sulfidrila competem com os das enzimas teciduais na ligação com metais pesados Existem evidências suficientes demonstrando sua eficácia no tratamento da intoxicação por arsênico e ouro e na encefalopatia saturnina juntamente com o EDTA Como é um medicamento de difícil manuseio que somente pode ser aplicado por via intramuscular em injeção muito dolorosa apresentando além disso importantes efeitos colaterais há atualmente uma tendência para uso de outras alternativas Deferoxamina é um agente quelante com especial afinidade pelo ferro com o qual forma um complexo hidrossolúvel rapidamente eliminado Pode ser usado na intoxicação aguda mas é mais indicado no tratamento da sobrecarga crônica de ferro As doses devem ser individualizadas utilizandose genericamente 75 mgkgdia por via intramuscular ou intravenosa 282 Unidade II EDTAcálcico EDTAcálcico ou edatamil cálcio dissódico é um agente quelador que forma complexos estáveis e hidrossolúveis com alguns metais pesados Sua principal indicação é a intoxicação por chumbo Dificuldade da administração efeitos colaterais importantes e resultados nem sempre satisfatórios justificam a tendência atual de procura de medicamentos alternativos Etanol age bloqueando a metabolização pela desidrogenase alcoólica de outros álcoois particularmente metanol e etilenoglicol impedindo a formação dos derivados que são tóxicos As doses usuais têm por objetivo manter uma alcoolemia em torno de 100 mgdL geralmente obtida com 50 g de álcool por via oral ou se necessário por via intravenosa Em virtude da incerteza sobre seus resultados estão sendo procuradas alternativas terapêuticas Flumazenil é um medicamento que antagoniza a ação de benzodiazepínicos por inibição competitiva no complexo receptor GABAbenzodiazepina Existem evidências suficientes sobre sua eficácia na reversão do coma induzido por esse grupo de drogas e relatos que ainda necessitam confirmação sobre a melhora da consciência de pacientes com intoxicação alcoólica A dose usual inicial é de 02 a 03 mg por via intravenosa em 15 segundos A seguir 01 mg em intervalos de um minuto até a melhora do paciente que geralmente ocorre com menos de 3 mg Hipossulfito o hipossulfito tiossulfato de sódio faz parte do esquema terapêutico da intoxicação cianídrica grave juntamente com os nitritos e pode ser de uso isolado na intoxicação leve Transforma o cianeto em tiocianato que é rapidamente eliminado e bem menos tóxico Sua ação é lenta e exige a presença da enzima rodanase As doses usuais são de 15 mlkg da solução a 25 para crianças e de 50 ml para adultos por via intravenosa Naloxona é considerado medicamento de primeira escolha no tratamento da intoxicação por opiáceos Atua como antagonista puro podendo ser usado mesmo quando houver dúvida diagnóstica As doses utilizadas são de 01 mgkg bem maiores que as inicialmente recomendadas para crianças com menos de 5 anos de idade e 20 mg para crianças maiores de preferência por via intravenosa Nitritos os nitritos de amila e de sódio continuam sendo os medicamentos mais utilizados no tratamento da intoxicação cianídrica grave Induzem a formação de metemoglobina que ligandose ao cianeto forma um complexo o qual apesar de dissociável é menos tóxico e facilita a ação do hipossulfito administrado a seguir As doses usuais são nitrito de amila inalação de 30 segundos a cada minuto enquanto é preparado o nitrito de sódio administrado na dose de 03 mlkg da solução a 3 por via intravenosa Pralidoxima é um reativador de colinesterase utilizado na intoxicação por inseticidas organofosforados no tratamento das manifestações nicotínicas Não deve ser usada na intoxicação por inseticidas carbamatos apesar de estes serem também inibidores da colinesterase A dose recomendada é de 20 a 40 mgkg para crianças preferencialmente por via intravenosa Vitamina K1 vitamina K1 ou fitonadiona é utilizada para restaurar o tempo de protrombina e interromper o sangramento na intoxicação por medicamentos ou pesticidas anticoagulantes A 283 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS dose usualmente recomendada para crianças é de 5 a 10 mg por via oral repetida várias vezes por dia Por via intramuscular a dose costuma ser de 1 a 5 mg Tratamentos sintomáticos Veja que além dos antídotos é possível se empregar substâncias como tratamentos sintomáticos que atenuam os episódios e sintomas agudos Tratamento das convulsões benzodiazepínicos particularmente o diazepam continuam sendo os medicamentos de escolha no controle das crises convulsivas Não havendo melhora podese administrar fenitoína em dose de carga de 15 mgkg não ultrapassando a velocidade de infusão de 50 mgminuto Tratamento da crise alérgica prometazina disponível para uso oral e parenteral deve ser usada na dose de 05 mgkg Ciproeptadina 025 mgkgd por via oral pode ser usada como alternativa Nos casos mais graves recomendase epinefrina 11000 na dose de 001 mlkg por via subcutânea repetida se necessário até três vezes e cortiscosteroides como hidrocortisona ou dexametasona Tratamento da dor o tipo de analgésico depende de sua intensidade Na leve ou moderada são recomendados acetaminofeno ácido acetilsalicílico ou dipirona Dores intensas podem exigir analgésicos narcóticos particularmente morfina na dose de 02 mgkg para crianças e 5 a 20 mg para adultos por via subcutânea intramuscular e se necessário intravenosa codeína 03 a 05 mgkg para crianças e 15 a 60 mg para adultos por via oral ou parenteral Alguns casos picada de animais peçonhentos por exemplo podem exigir anestesia local ou bloqueio anestésico Tratamento da hipertermia nas intoxicações os mecanismos de hipertermia geralmente não são mediados pelos sistemas das prostaglandinas Assim sendo os medicamentos antitérmicos usuais podem não ser eficazes e mascarar o quadro clínico As medidas físicas são mais recomendadas incluindo envoltórios úmidos e frios compressas frias bolsas de gelo e fricção com esponja úmida 6 TOXICOLOGIA SOCIAL Segundo Oga Camargo e Batistuzzo 2003 a toxicologia social é a área da toxicologia que estuda os efeitos nocivos decorrentes do uso não médico de fármacos ou drogas causando danos não somente ao indivíduo mas também à sociedade Você deve se lembrar inclusive de outras disciplinas que por fármaco entendese uma substância de estrutura química definida e que quando em contato ou introduzida em um organismo vivo consegue modificar uma ou mais funções e que possuem um emprego benéfico já droga é a matériaprima de origem mineral vegetal ou animal que contém um ou mais fármacos A partir desses conceitos entendemos que a lidocaína e benzocaína importantes anestésicos representam fármacos e que as folhas de Erythroxylon coca folhas de coca representam droga 284 Unidade II Observação Embora as palavras fármaco e droga representem substâncias diferentes e possuam características diferentes esses termos podem ser sinônimos em algumas situações definidas e específicas Atualmente entretanto a primeira ideia que a palavra droga implica é a do uso ilícito sendo este um problema social marcante na nossa sociedade e que obriga governos do mundo a gastarem valores extremamente expressivos em virtude da dependência a várias drogas e substâncias ilícitas como maconha cocaína crack anfetaminas entre outras Além disso existem gastos com consequências médicas referentes ao uso dessas substâncias perda de emprego crimes e acidentes diretamente ligados ao seu uso Você não deve deixar de considerar que muitas substâncias lícitas como álcool nicotina cigarro e cafeína café além de serem largamente consumidas em muitos países às vezes acabam por implicar efeitos tão deletérios como as substâncias ilícitas Apenas para ilustrarmos o quanto o aspecto cultural é decisivo para classificar uma substância como lícita ou não um exemplo que você pode observar é o Marrocos país islâmico que segue o que disse o Profeta aos seus seguidores que se abstivessem de libações ato ou efeito de beber bem como de tudo o que nubla ou seja deturpa a mente A história dos muçulmanos com o álcool se desenvolveu em vários relacionamentos e o Marrocos não é uma exceção pois tratase de um país onde entre os bons muçulmanos vivem e descansam muitos europeus com suas ricas tradições alcoólicas Ou seja o país não apresenta um relacionamento com as bebidas embriagantes de forma lícita como ocorre na Europa e em muitos países do mundo entre os quais o Brasil Outro exemplo que podemos usar é um país próximo do Brasil o Uruguai onde o uso e cultivo da Cannabis é estipulado como legal tanto de forma recreacional como medicinal O mesmo ocorre no Canadá Observação Falaremos com você melhor sobre as aplicações terapêuticas de derivados da Cannabis posteriormente Neste início de tópico é importante que você se familiarize com algumas terminologias que serão extremamente úteis para que possamos dar sequência e para que você siga uma linha de raciocínio bem aplicada Entendese como uso não médico de alguma substância a exposição a uma droga ou fármaco pelo uso ocasional frequente ou mesmo compulsivo aceitos ou não pelos padrões de uma sociedade 285 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS enquanto uso abusivo representa o uso de uma droga ou fármaco geralmente por autoadministração de forma tal que se desvie de padrões médicos e ou socioculturais Observação De acordo com o conceito de abuso veja que se um indivíduo utilizar um único cigarro de maconha para experimentar esse uso é considerado como abusivo pois a maconha é uma substância ilícita no Brasil Conforme já comentamos na toxicologia social estudamos os fármacos e drogas que possuem um potencial para induzir a dependência Segundo Oga Camargo e Batistuzzo 2003 há sete classes que são elencadas como principais opiáceos psicoestimulantes algumas dessas substâncias foram discutidas no tópico sobre toxicologia de medicamentos depressores do SNC também discutidas no capítulo sobre toxicologia de medicamentos inalantes tabaco Cannabis e substâncias psicodélicas alucinógenas Essa classificação representa um modelo meramente didático pois sabemos que os agentes que compõem cada classe possuem mais ações em comum 61 Farmacodependência Depois de entendermos um pouco melhor alguns conceitos iniciais falaremos sobre o fenômeno da farmacodependência Segundo Oga Camargo e Batistuzzo 2014 a farmacodependência em termos comportamentais representa uma consequência de um comportamento de consumo do fármaco de forma tão frequente e fortemente reforçado que este se transforma em resposta dominante Tratase portanto de um fenômeno biopsicossocial Antes de prosseguirmos é muito importante que você entenda bem o que significa e a representatividade do que seja reforço Reforço representa a capacidade de um fármaco gerar autoadministração repetida sem a necessidade de outros mecanismos externos de indução como a personalidade alguma doença psíquica preexistente a situação socioeconômica e até mesmo uma pressão criada por pessoas de grupos a que esses indivíduos pertençam Observação Discutiremos melhor tipos de reforço e sua representatividade na farmacodependência Falaremos um pouco melhor sobre a farmacodependência 286 Unidade II Pois bem a farmacodependência não é uma condição do tipo tudo ou nada Há graus variáveis de dependência que vão desde o grau mais leve até o mais intenso Especificamente nos casos mais intensos onde há um interesse médico e legal empregamse termos de literatura inglesa como addiction Em língua portuguesa empregávamos o termo vício para designarmos uma dependência extrema porém esse termo adquiriu um sentido pejorativo e foi eliminado do vocabulário técnico Embora não tenhamos um vocábulo equivalente a addiction temos na língua portuguesa o termo adicto que significa aficionado Na verdade o adicto vive uma condição em que as atividades relacionadas com a droga como a aquisição a administração a experimentação dos seus efeitos e a condição de suportar os efeitos negativos quando deixa de usála assumem uma superioridade sobre todas as outras atividades embora haja muitas consequências adversas que esse uso possa lhe acarretar Ocorre portanto uma completa perda do controle voluntário da autoadministração da droga ou substância A partir deste momento combinaremos de utilizar o termo farmacodependente ou dependente Dessa forma contornamos vieses literários e até preconceituosos É importante frisar que o uso de uma droga psicoativa não leva necessariamente à dependência Há uma grande maioria de pessoas que conseguem controlar o uso dessas substâncias Observação Uma situação muito comum vinculada a essa situação ocorre com o uso do álcool Embora a maioria das pessoas utilize a substância apenas cerca de 5 tornamse realmente dependentes dela Assim você pode perfeitamente entender que a ocorrência da farmacodependência depende de fatores de ordem genética psicológica e social ou seja reiteramos aqui o fenômeno biopsicossocial que já comentamos com você anteriormente Outra coisa muito importante sobre a farmacodependência é o fato de que ela não se instala de um momento para outro há diversas fases entre o início do uso até a dependência propriamente dita e extrema Para tal há uma dependência da substância droga e também uma dependência do indivíduo sendo necessário um conhecimento sobre ela para que consigamos determinar em que fase ela se encontra Saiba que os mecanismos neurobiológicos subjacentes bem como o prognóstico podem ser diferentes em cada uma das fases Os fenômenos de tolerância sensibilização retirada e desejo compulsivo craving geralmente acompanham a dependência Discutiremos com você tais fenômenos mais à frente É importante frisarmos que a aquisição da dependência se dá em geral com um dado tipo de droga mas há a tendência de expansão para outros tipos de substâncias A primeira droga geralmente é o tabaco o álcool ou até mesmo inalantes seguida da maconha de substâncias sedativohipnóticas 287 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS psicoestimulantes e finalmente opioides Claro que essa sequência não é fixa sendo ela passível das mais variadas formas dependendo de disponibilidade custo aprovação no subgrupo social e até personalidade do usuário Observação A tendência à busca de novidades de drogas e efeitos é um traço de personalidade que favorece o uso precoce de múltiplas drogas Em algumas situações uma droga é empregada para contrabalancear os efeitos negativos de outra Observação Em indivíduos que utilizam álcool observase o uso de psicoestimulantes para aumentar seu efeito Já com usuários de cocaína podese observar o uso de sedativos para atenuar seus efeitos estimulatórios 611 Papel dos fármacos ou drogas como reforçadores Como discutimos anteriormente o reforço é representado pela capacidade de uma substância em gerar a autoadministração repetida sem a necessidade de outros mecanismos externos de indução Esse potencial de reforço ou de induzir a farmacodependência como definimos e já entendemos é função da velocidade e da intensidade dos efeitos reforçadores de uma droga eou fármaco Lembrete O reforço é a probabilidade de uma ação se repetir Podemos citar a existência de dois tipos de reforço o positivo e o negativo No reforço positivo o organismo age para obter diretamente uma recompensa que gera prazer Isso não é válido apenas para drogas ou fármacos também aplicamos isso ao nosso dia a dia por exemplo no prazer que temos quando ingerimos água Já no reforço negativo o organismo age para evitar um malestar ou dor Na falta da substância ocorrem os sintomas de abstinência sensações desagradáveis que levam o indivíduo a repetir o uso da droga para aliviar esses sintomas Veja na figura a seguir a relação entre o reforço positivo e o negativo com as suas respectivas características Note que no reforço negativo o comportamento de busca ocorre em detrimento de um sinal de abstinência falta provocada pela retirada da substância e que no reforço positivo 288 Unidade II o comportamento de busca relacionase aos efeitos prazerosos Discutiremos a presença dos neurotransmissores adiante sendo o principal a dopamina Neurotransmissor Comportamento de busca Uso de drogas Efeitos prazerosos Reforço positivo Reforço negativo Síndrome de abstinência Neurotransmissor Figura 132 Correlação entre reforço positivo e negativo Trataremos agora sobre os dois pontos importantes ligados a esse potencial de indução à farmacodependência Velocidade de reforço Quanto mais rapidamente um fármaco produzir os seus efeitos reforçadores maiores serão as chances de originar um comportamento de consumo repetido em comparação com outro fármaco que apresente um início lento de ação Observação Por exemplo a cocaína e a heroína apresentam um potencial maior em induzir a dependência em comparação com o fenobarbital pois este demora mais a produzir efeitos sobre o SNC Algo parecido observamos em usuários que continuam a utilizar uma substância mesmo sabendo que ela poderia lhe causar sérios e graves prejuízos Isso porque os efeitos prazerosos ocorrem geralmente a curto prazo reforçando o comportamento de autoadministração enquanto as consequências danosas são de ocorrência tardia para terem um efeito punitivo sobre o comportamento 289 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Você deverá considerar de forma muito enfática um fator que é muito importante sobre a velocidade de reforço que é a escolha da via de administração pois de acordo com a via de uso é possível se alcançar um tipo de efeito em um determinado tempo com uma intensidade relacionada Observação A morfina tem maiores chances de induzir a farmacodependência quando administrada por via intravenosa em relação à via oral assim como a maconha fumada em relação ao seu uso oral Intensidade de reforço Um dos avanços mais importantes no estudo dos mecanismos da farmacodependência foi a descoberta de que animais de laboratório geralmente macacos e ratos são capazes de aprender a injetar drogas psicoativas em suas veias O estudo da autoadministração de fármacos ou drogas pela via intravenosa tornase útil para investigar os efeitos farmacológicos agradáveis decorrentes da ação de uma substância nos centros de recompensa do cérebro que condicionam sua autoadministração contínua reforço primário Saiba que um dos principais experimentos bem conhecidos na toxicologia acerca da farmacodependência é realizado com macacos Rhesus e ratos em que se implanta nesses animais um cateter venoso ligado a uma bomba e a um reservatório com o fármaco que se queira avaliar É dado ao animal um livre acesso a uma alavanca e estabelecese pelo número de vezes que a alavanca é pressionada uma correlação com propriedades reforçadoras primárias autoadministração contínua No experimento demonstrado pela tabela a seguir observe que os estimulantes centrais como a cocaína e as anfetaminas são as substâncias mais potentes entre as avaliadas seguidas da morfina e da heroína Um animal de laboratório consegue pressionar uma alavanca como essa até a morte em detrimento do estímulo provocado pelo pressionar da alavanca Tabela 9 Autoadministração pela via intravenosa de fármacos reforço primário Fármacos Animais de laboratório Homem Psicoestimulantes Cocaína anfetaminas Depressores do SNC Barbitúricos benzodiazepínicos Etanol Opiáceos Agonistas morfina e análogos Antagonistas naloxona 290 Unidade II Fármacos Animais de laboratório Homem Cannabis THC Psicodélicos LSD e análogos Antidepressivos e neurolépticos Analgésicos não opioides Adaptada de Oga Camargo e Batistuzzo 2003 Nos dois exemplos que demonstramos você deve ter percebido que a nicotina não pode ser avaliada nesse tipo de experimento pois outros efeitos diretos do fármaco que não estão relacionados ao reforço também afetam a frequência em que o animal pressiona a alavanca Tais evidências sobre a relação entre o pressionar da alavanca e a dependência indicam que as drogas geradoras de farmacodependência têm propriedades parecidas a reforçadores positivos naturais como alimento e sexo Assim verificase que as drogas dotadas de maior potencial de produzir dependência são aquelas cujo acesso ao SNC é rápido Em grande parte essa rapidez dos efeitos centrais depende da via de administração em que a inalação gera picos de concentrações da droga no SNC mais rapidamente do que outras vias Explicase com isso o enorme potencial de dependência do cigarro em relação à nicotina bem como do crack em relação à cocaína Logo após a via inalatória temos a via intravenosa seguida da aspiração nasal e da ingestão oral Fazemos menção aqui também a outro fator muito importante que é a duração da ação da substância Quando esta é curta requer repetição frequente para restabelecer o efeito desejado fortalecendo assim o condicionamento Isso ocorre inclusive com compostos que pertencem à mesma classe aqueles que oferecem curta duração geram mais facilmente dependência em comparação com aqueles que oferecem uma duração prolongada Observação Um exemplo dentro desse contexto pode ser observado com a heroína possuindo uma T½ biológica de 30 minutos sendo biotransformada em morfina que possui uma T½ biológica de duas horas é muito mais viciante que a metadona com T½ biológica de 35 horas e também do que o Diazepam um benzodiazepínico que possui uma T½ de 43 horas em média 612 Sistema de recompensa cerebral James Olds na década de 1950 fez um mapeamento do cérebro do rato evidenciando zonas de recompensa Ele identificou que pela estimulação de áreas específicas cerebrais há uma recompensa como aquelas que temos naturalmente como ingestão de água e alimento ou sexo conforme já citamos há pouco 291 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Em oposição a isso Olds observou que a estimulação de outras zonas do cérebro desencadeava um comportamento defensivo como a luta ou a fuga não se observando uma estimulação portanto repetida Muito pelo contrário o animal aprendia a desligar a estimulação quando era acionada pelo experimentador Essas regiões com efeitos opostos à anterior que você viu agora conosco foram caracterizadas como zonas aversivas ou zonas de punição Além de Olds outros autores da literatura especializada verificaram que a estimulação elétrica de regiões nas zonas de recompensa cerebrais induzia a sensações de prazer enquanto a estimulação das zonas de punição ou aversivas provocava sensações muito intensas de medo pavor mortal ou sofrimento Segundo Oga Camargo e Batistuzzo 2003 os fármacos e drogas que causam dependência exercem seus efeitos reforçadores atuando sobre um conjunto de regiões cerebrais que estão interligadas entre si por diversos sistemas de neurotransmissores recebendo o nome de via ou sistema de recompensa A distribuição anatômica do sistema de recompensa cerebral ainda não foi totalmente desvendada mas é objeto de muito estudos atuais sobre comportamento O principal sistema envolvido é o sistema dopaminérgico via mesocorticolímbico com corpos celulares localizados entre a área tegmental ventral ATV e núcleo accumbens NAcc tubérculo olfatório córtex frontal amígdala e área septal Propõese que os fármacos e drogas psicoativos liberam dopamina DA no NAcc o mesmo ocorrendo com a estimulação elétrica que comentamos agora há pouco Esses estímulos estão associados com eventos de reforço ou recompensa HIP PV PV NAc NAc PD PD NR NR ATV ATV LC LC MCP MCP Hipoc Hipoc CF CF Opioides álcool síndrome de retirada Opioides sensibilização a psicoestimulantes nicotina THC etanol Cocaína anfetamina opióides nicotina etanol benzodiazepínicos recompensa e síndrome de retirada Benzodiazepínicos etanol melhora da ansiedade Ectasy Figura 133 Via dopaminérgica mesolímbica da área tegmental ventral ao núcleo accumbens considerada uma via comum a muitas drogas que causam dependência 292 Unidade II Pelo que você pode observar na figura anterior nenhuma categoria de fármacos ou drogas age exclusivamente no sistema mesolímbico e diferentes classes de agentes farmacológicos ativam o sistema dopaminérgico por diferentes mecanismos Assim a maioria dos fármacos e drogas psicoativos também podem apresentar alguns efeitos desagradáveis e até de punição chamados de aversivos ainda que sejam utilizados em uma dosagem que produza reforço A intensidade desse reforço em determinado indivíduo depende portanto de um equilíbrio entre os efeitos reforçadores prazerosos e aqueles punitivos 613 Avaliação do potencial de abuso Para a avaliação do potencial de abuso de uma substância é preciso se considerar o reforço primário mencionado anteriormente que é principalmente relacionado à velocidade e intensidade do efeito assim como o reforço secundário que passa a ser composto pela neuroadaptação pela tolerância metabólica pela taquifilaxia e pelo fenômeno ou preferência condicionada por lugar Para tentar esclarecer melhor esses elementos falaremos agora sobre cada um deles de uma forma generalizada 6131 Neuroadaptação A neuroadaptação representa uma alteração no SNC devida à presença de uma droga ou fármaco que após uma exposição única ou repetida passa a se manifestar pelo aparecimento de transtornos físicos de alta intensidade quando se interrompe o uso o que se classifica como síndrome de abstinência representada por efeitos opostos àqueles ocorrentes pela substância que se dão quando se está sem usar a droga ou ainda pela resposta reduzida para uma mesma concentração no local da ação fenômeno este conhecido como tolerância farmacodinâmica Observação Afinal por que os indivíduos utilizam as drogas de abuso As substâncias químicas tanto lícitas como ilícitas que são consideradas drogas de abuso por causarem dependência são viciantes e promovem o que chamamos de efeitos hedônicos isto é um efeito agradável que leva o indivíduo a querer repetir a sensação e com o uso repetido por serem substâncias viciantes eles tornamse dependentes Mas o que leva o indivíduo a utilizar as substâncias pela primeira vez é o efeito de prazer que elas produzem já que atuam no sistema de recompensa ativando áreas como a região mesolímbica Alguns conceitos são importantes quando falamos de toxicologia social dislépticas modificadoras alucinógenas lépticas depressoras analépticas estimulantes e psicolépticas sedativos calmantes 293 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Para uma melhor compreensão vamos dividir as drogas de abuso em três grupos depressoras estimulantes e despersonalizantes Benzodiazepínicos Tranquilizantes Indutores do sono Barbitúricos Anestésicos Sedativos Anticonvulsivantes Ópio e derivados Morfina Heroína Codeína Anfetamina Inibidores do apetite Nicotina Cigarro Cafeína Café Chá Efedrina Descongestionante Atropina Euforizantes Cocaína Deprimentes Álcool Inalantes Alucinantes Maconha Haxixe Cogumelo LSD Depressoras Estimulantes Despersonalizantes A B C Figura 134 Drogas de abuso depressoras estimulantes e despersonalizantes A Papoula B Café C Cannabis sativa 614 Drogas estimulantes do SNC 6141 Tabaco Vamos compreender um pouco mais sobre o tabaco Dados epidemiológicos De acordo com o Inca o percentual de adultos fumantes no Brasil tem reduzido nos últimos anos devido às políticas nacionais de controle do tabaco No período de 1989 a 2010 a queda foi de 46 No Brasil em 1989 cerca de 35 da população acima de 18 anos era fumante já em 2013 o percentual reduziu para 15 E de acordo com dados da OMS a prevalência de fumantes no mundo em 2010 variava de 124 a 29 dependendo da região Em relação ao sexo os homens fumam mais que as mulheres Em relação à mortalidade dados apontam que no ano de 2015 156216 pessoas morreram em decorrência de complicações causadas pelo tabagismo o que corresponde a 428 mortes ao dia Esse valor corresponde a 126 do total de mortes que ocorreram no Brasil anualmente INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER 2020 Composição do tabaco O princípio ativo mais importante do tabaco é a nicotina responsável pelo efeito farmacológico viciante e efeitos adversos 294 Unidade II Um cigarro comercial de tabaco possui em média de 10 a 14 mg de nicotina o que corresponde a 15 em peso do cigarro e 95 do conteúdo total de alcaloides OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 As vias de exposição são oral dérmica ou pulmonar A DL50 para ratos é de 50 mgkg para camundongos 3 mgkg e a dose letal para um homem adulto é de 40 a 60 mg Fumaça do cigarro Em 1996 cerca de 4800 componentes tóxicos foram identificados na fumaça do cigarro de tabaco e foi detectado que entre eles 69 são carcinogênicos em animais e 11 em humanos OGA CAMARGO BATISTUZZO 2014 O caminho que a fumaça percorre segue o que chamamos de corrente primária e corrente secundária A corrente primária é constituída por ponta acesa do cigarro coluna do cigarro e boca durante a tragada já a corrente secundária pela mistura do composto emitido pela ponta acesa para o meio ambiente A fumaça inalada pelo fumante é um aerossol composto por duas fases de vapor ou gasosa e particulada e condensada Cerca de 989 do volume total da corrente principal de um cigarro sem filtro fase de vapor contêm nitrogênio 73 moles oxigênio 10 moles dióxido de carbono 95 moles monóxido de carbono 42 moles hidrogênio 1 mol argônio 06 mol e metano 06 mol Saiba mais Leia mais sobre o tabagismo em VIEGAS C A A et al Diretrizes para cessação do tabagismo Jornal Brasileiro de Pneumologia v 30 supl 2 p S2S76 2004 Disponível em httpswwwscielobrpdfjbpneuv30s2a02v30s2pdf Acesso em 16 out 2020 Quadro 11 Componentes do cigarro Fase Componentes Fase de vapor ou gasosa Nitrogênio Oxigênio Dióxido de carbono Monóxido de carbono Água Outros compostos amônia óxidos de nitrogênio ácido cianídrico aldeídos formaldeído acetaldeído acroleína nitrilas nitrosaminas e hidrocarbonetos voláteis benzeno estireno isopreno butadieno 295 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Fase Componentes Fase particulada ou condensada Nicotina Hidrocarbonetos aromáticos policíclicos benzopireno Fenol Nitrosaminas não voláteis Radioelementos polônio Adaptado de Instituto Nacional de Câncer sd Principais componentes do cigarro de tabaco e o que causam no organismo O alcatrão é um conjunto de partículas da fumaça do cigarro com exceção da água e dos alcaloides É uma mistura de cerca de 3500 compostos químicos formados durante a queima consequente da combustão incompleta de materiais orgânicos presentes e é constituído principalmente por hidrocarbonetos aromáticos policíclicos alguns carcinogênicos para o homem Pode ser responsável pelo desenvolvimento de câncer e doenças respiratórias graves e os componentes tóxicos do cigarro podem promover mecanismos aterogênicos isto é formação de trombos O monóxido de carbono é um dos componentes da fumaça do cigarro que promove efeito asfixiante e carcinogênico O efeito asfixiante é devido à formação de carboxiemoglobina que resulta em hipóxia tecidual A nicotina promove estimulação simpática devido à ligação aos receptores nicotínicos liberação dos neurotransmissores adrenalina e noradrenalina e ativação dopaminérgica Os efeitos da ação adrenérgica da nicotina são ação anorexígena aumento nos níveis do hormônio antidiurético redução do débito urinário taquicardia aumento da pressão arterial aumento do débito cardíaco aumento da força de contração no coração inotropismo aumento da frequência de batimentos cronotropismo vasoconstrição redução da motilidade gastrointestinal e impotência sexual A redução da ansiedade e tensão é um efeito da nicotina e conduz à dependência A tríade da inflamação causada pelo tabagismo ocorre pelos toxicantes presentes ou liberados no cigarro quando em contato com o endotélio junto com as LDL do sangue que geram um mecanismo inflamatório que resulta em formação de trombo Esses toxicantes correspondentes ao fator exógeno do tabaco associados ao LDL em maior concentração são análogos ao fator endógeno na promoção à agressão ao endotélio provocando uma resposta inflamatória e resultando em reparação tecidual para cicatrização da lesão aumento da atividade prócoagulante do sangue Para isso ocorre a formação do coágulo que forma o trombo gerando a aterosclerose Os principais efeitos tóxicos do tabagismo são intoxicação aguda desconforto gastrointestinal náuseas vômito tontura cefaleia tremor palidez e hipertensão doenças cardiovasculares aterosclerose e trombose doenças respiratórias DPOC enfisema bronquite crônica e asma e câncer 296 Unidade II Observação O uso do tabaco na gestação pode ocasionar parto prematuro complicações no parto descolamento de placenta retardo no desenvolvimento na infância morte infantil baixo peso para a idade gestacional e prejuízo no desenvolvimento nos pulmões do feto 6142 Cocaína A cocaína é um alcaloide presente nas folhas de duas espécies vegetais do gênero Erytroxylum sendo conhecida popularmente como coca O O O O N CH3 CH3 Figura 135 Estrutura química da cocaína Segundo Chasin Silva e Carvalho 2014 a cocaína é um anestésico local e tem ação simpatomimética sendo assim estimulante no SNC É considerada um dos estimulantes mais potentes de ação central e por essa razão passou a ser usada como fármaco de abuso Padrões de uso A forma mais utilizada é o pó cristalino composto por cloridrato de cocaína uma forma que não pode ser fumada pois não se volatiliza e decompõe quando em altas temperaturas é o resultado da pasta de coca purificada com ácidos clorídrico ou sulfúrico É administrada por aspiração nasal por via oral ou intravenosa sendo a melhor absorção por meio da mucosa nasal Já na forma de base livre chamada de COCbase pode ser fumada visto que pode volatizar a temperaturas mais altas cerca de 90 ºC e ao aquecimento seus vapores podem ser inalados no ato de fumar A forma fumada no Brasil é conhecida como crack merla ou oxi Toxicocinética A velocidade de absorção varia de acordo com a forma de administração quando fumada oito segundos via intravenosa de três a cinco minutos e intranasal 10 a 15 minutos Concentrações plasmáticas entre 300 a 900 ngml podem ocorrer de um a dois minutos sendo que as vias intravenosa e nasal apresentam padrões cinéticos similares diferenciando pelo fato de a via respiratória apresentar efeitos mais rápidos A biodisponibilidade da droga fumada é 70 devido a uma perda de 26 da forma básica antes de ser inalada em decorrência da decomposição que ocorre no próprio objeto utilizado 297 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS para queima e a forma intranasal apresenta uma biodisponibilidade de 60 a 80 A albumina é uma das principais proteínas responsáveis pela distribuição de toxicantes no organismo Entretanto nem sempre é assim que ocorre Há substâncias químicas que dependendo de algumas características como sua estrutura química são distribuídas por outras proteínas plasmáticas como a alfa1glicoproteínas ácidas Devido a sua alta lipossolubilidade pode atravessar as barreiras hematoencefálica e placentária Observação A cocaína em base livre crack é a forma mais lipossolúvel da droga e apresenta uma passagem pelas membranas muito alta Seu tempo de latência é muito curto dessa forma o início e o fim do efeito é rápido o que leva o usuário a repetir a administração logo em seguida visto que a droga promove um efeito hedônico intenso Isso explica por que o crack vicia mais rápido que outras drogas ou até mesmo comparado com a cocaína nas formas inaladas e intravenosa Eliminação Pequenas quantidades são excretadas na forma inalterada na urina cerca de 10 Os metabólitos excretados na urina são éster metilecgonina 32 a 49 benzoilecgonina 29 a 45 e outros em menor porcentagem como ecgonina norcocaína e benzoilnorecgonina Toxicodinâmica Elevação temporária das concentrações de norepinefrina e dopamina e subsequente redução dos níveis normais devido ao bloqueio na recaptação de dopamina na fenda sináptica o que promove os estados de euforia seguida de depressão O uso da cocaína gera um aumento na estimulação dopaminérgica em D1 e D2 o que gera a euforia e os delírios O acúmulo de neurotransmissor nos receptores resulta em um mecanismo de autorregulação que podemos também considerar uma taquifilaxia Dessa forma há depleção da dopamina nos receptores Isso resulta em redução do neurotransmissor no cérebro o que é possível verificar através das complicações psiquiátricas como sintomas de embotamento social depressão falta de libido entre outros sintomas além da síndrome de abstinência Efeitos da intoxicação Taquicardia aumento da pressão arterial vasoconstrição agitação hipertermia alucinações agressividade arritmias cardíacas infarto agudo do miocárdio atrofia e necrose do septo nasal forma inalada mal formação congênita uso na gestação e mal de Parkinson 298 Unidade II 6143 Anfetamina e correlatos O termo anfetamínico é utilizado para referirse ao grupo de substâncias compostas pela anfetamina e seus derivados Apresentam a estrutura geral betafenetilamina e atuam como aminas simpatomiméticas Alguns exemplos de derivados da betafenetilamina anfepramona femproporex e ecstasy ou MDMA metilenodioximetanfetamina NH2 Figura 136 Estrutura geral das betafenetilaminas Há também outros medicamentos com estrutura química diferente dos citados anteriormente porém promovem estimulação simpática semelhante mazindol veja a figura a seguir e metilfenidato Ritalina R1 R2 HO N N n 9 8 7 6 2 3 4 Figura 137 Estrutura geral do mazindol Padrões de uso No Brasil é frequente o uso de anfetaminas conhecidas como rebites por caminhoneiros Existe a procura pelas anfetaminas e correlatos com o objetivo de aumentar o estado de vigília e também para o emagrecimento visto que alguns são comercializados como anorexígenos Toxicocinética A anfetamina é absorvida rapidamente pelo trato gastrointestinal com pico de concentração plasmática para 10 a 15 mg de uma a duas horas e três horas para metilfenidado e menfluramina A absorção completa ocorre no período de quatro a seis horas A ligação às proteínas plasmáticas é de 15 a 16 para metilfenidato e anfetamina e 34 para fenfluramina Ela atravessa barreira hematoencefálica Além disso 30 da dose terapêutica é excretada inalterada na urina em 24 horas 299 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS mas sofre influência do pH urinário sendo assim na urina ácida pH entre 55 e 6 60 serão excretadas inalteradas e na urina alcalina pH entre 75 e 8 somente 3 a 7 A meiavida de eliminação na urina ácida é de cerca de sete a oito horas porém na urina alcalina o tempo aumenta para 18 a 33 horas Toxicodinâmica As anfetaminas atuam nos receptores alfa e betaadrenérgicos e aumentam a concentração de dopamina na sinapse Os estudos indicam que devido à similaridade das anfetaminas com dopamina e norepinefrina podem atuar como falso neurotransmissor e a hipótese mais aceita para o mecanismo seria a liberação direta dos neurotransmissores das vesículas sinápticas assim como a inibição da sua recaptação resultando em um aumento na concentração sináptica Efeitos da intoxicação Os efeitos tóxicos produzidos pelas anfetaminas e derivados são similares aos efeitos produzidos pelo uso da cocaína 615 Drogas depressoras 6151 Etanol Em 2019 o MS informou que 179 da população adulta no Brasil faz uso abusivo de bebidas alcoólicas e que o consumo abusivo aumentou em 429 em mulheres Em relação à mortalidade entre 2000 e 2017 145 dos óbitos no Brasil estavam relacionados ao uso abuso de bebidas alcoólicas BRASIL 2019 Padrões de uso De acordo com Oga Camargo e Batistuzzo 2014 as bebidas alcoólicas com teor maior que 14 são produzidas por meio de destilação No processo a bebida fermentada é aquecida até o ponto em que o álcool é evaporado e separado da água O álcool evaporado é então condensado e coletado produzindo a bebida destilada O produto varia de acordo com a bebida fermentada comparada com a de origem como o conhaque destilado do vinho e o whisky do malte A concentração de álcool varia de acordo com a bebida como pode ser visto na tabela a seguir Tabela 10 Teor alcóolico das bebidas Bebida Teor alcoólico Dose habitual Vodca whisky e cachaça 38 a 50 50 ml Cervejas com baixo teor de álcool 3 a 5 350 ml Cervejas com alto teor de álcool 5 a 8 350 ml Saquê 16 60 ml 300 Unidade II Bebida Teor alcoólico Dose habitual Vinho branco e tinto 10 a 15 150 ml Champanhe 11 220 ml Adaptada de Ferreira sd Toxicocinética O etanol é uma substância hidrossolúvel rapidamente absorvida no estômago e intestino delgado As maiores concentrações plasmáticas são atingidas entre 30 e 90 minutos após a ingestão O tempo de esvaziamento gástrico e início de absorção intestinal pode ser retardado devido à presença de alimentos Sua distribuição é rápida e ampla em praticamente todos os tecidos Ele atravessa a barreira hematoencefálica atingindo o SNC A biotransformação ocorre no fígado por oxidação Conforme já discutido o etanol é biotransformado através da enzima álcool desidrogenase que o transforma em acetaldeído o qual por sua vez é transformado em acetato através da acetaldeído desidrogenase O acetaldeído é um metabólito tóxico responsável pelos sintomas da ressaca O etanol pode promover indução ou inibição enzimática e assim potencializa o efeito de algumas drogas depressores ou estimulantes do SNC aumenta a excreção antibióticos ou aumenta a toxicidade paracetamol Toxicodinâmica O etanol atua em vários sistemas de neurotransmissores e neurorreceptores como sistema adrenérgico sistema opioide serotonina dopamina acetilcolina glutamato e cálcio Podemos destacar o efeito na elevação diminuição e ausência de alterações no sistema GABA Uso agudo Alguns dos efeitos agudos do etanol seriam sedação redução da ansiedade diminuição da capacidade e julgamento desinibição e fala pastosa A ação principal é depressora porém em doses baixas pode ocorrer um efeito estimulante Uso crônico Causa alterações em diversos sistemas como hematológico gastrintestinal neurológico cardiovascular e endócrinoreprodutivo síndrome fetal tolerância e dependência Efeitos da intoxicação São efeitos a ocorrência de alterações na coordenação motora amnésia e aumento da agressividade As enfermidades que podem ser provocadas são a neuropatia periférica anemia megaloblástica plaquetopenia e leucopenia desenvolvimento de câncer principalmente no sistema gastrointestinal esteatose hepática hepatite alcoólica cirrose gastrites e úlceras miocardiopatias hipertensão elevação 301 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS do colesterol infarto agudo no miocárdio e AVC Outros efeitos que são consequências do abuso de etanol são diminuição da libido impotência esterilidade e hipogonadismo e deficiências nutricionais Tratamento da dependência Alguns fármacos são utilizados no tratamento de pacientes dependentes de etanol como dissulfiram naltrexona e acamprosato 616 Drogas despersonalizantes e alucinógenas As drogas despersonalizantes são aquelas com potencial para causar alterações sensoriais e alucinações Já as drogas alucinógenas que fazem parte do grupo das despersonalizantes são aquelas conhecidas como psicodélicas que produzem mudanças na percepção no pensamento e no estado de ânimo São capazes de promover estados delirantes nos quais o indivíduo escuta vozes que não existem e tem visões deturpadas da realidade e sensações ilusórias Além das alterações visuais e auditivas também ocorrem sensações olfativas gustativas e táteis Algumas pessoas possuem a ideia errônea de que as alucinações sempre são imagens engraçadas divertidas relaxantes ou sensações agradáveis mas muitas vezes o que ocorre é o que é conhecido como bad trip ou seja uma viagem ruim com alucinações bizarras e aterrorizantes que provocam medo desespero e tendências suicidas ou homicidas Outro fenômeno provocado pelas drogas é o que chamamos de flashbacks que são transtornos de percepção pósalucinatórias nesse caso ocorrem episódios de curta duração em que o indivíduo pode vivenciar os sintomas da alucinação novamente As substâncias que causam alucinações são classificadas em três distintos grupos As que pertencem ao grupo 1 provocam alucinações somente quando utilizadas em altas doses como etanol metais e hidrocarbonetos Ao grupo 2 pertencem as substâncias delirantes como atropina fenciclidina e triexifenidila Já o grupo 3 engloba as substâncias alucinógenas propriamente ditas como LSD mescalina e psilocibina As substâncias alucinógenas propriamente ditas são divididas em dois grupos de acordo com sua composição química e são semelhantes ao neurotransmissor 5hidroxitriptamina ou à norepinefrina 6161 LSD25 dietilamida do ácido lisérgico Sintetizado pela primeira vez pelo químico Albert Hoffmann em 1938 no laboratório farmacêutico Sandoz Ele procurava um fármaco para enxaqueca porém ao testar a substância percebeu que ela promovia efeitos alucinógenos sendo assim uma droga sintética derivada de alcaloides do ergot principalmente ergotamina que ocorrem naturalmente no fungo Claviceps purpúrea 302 Unidade II Toxicocinética A absorção ocorre em um período de 15 a 30 minutos após a administração e a duração do efeito é de seis horas O estágio de recuperação varia de 7 a 9 horas após a administração A distribuição ocorre em maior proporção nos rins fígado e pulmões e em menor proporção no tecido adiposo e cérebro Etapas da ação do LSD 1 Período de latência de 05 a três horas 2 Sensações de frio suor midríase e dor de cabeça 3 Medo e angústia 4 Síndrome psíquica e afetiva 5 Deturpação na sensação de tempo e percepções alteradas 6 Deturpação na sensação de espaço com distorção de sons e imagens 7 Alteração na sensação do próprio corpo 8 Alterações afetivas 9 Pensamentos confusos 10 Alucinações Toxicodinâmica Interage com receptores serotoninérgicos adrenérgicos e dopaminérgicos Age como antagonista na fenda présináptica impedindo a recaptação de 5HT e agonista na fenda póssináptica aumentando 5HT na fenda 6162 Plantas alucinógenas No Brasil as plantas alucinógenas mais conhecidas são jurema Mimosa hostilis beladona Atropa belladonna saia branca trombeteira ou maxixe bravo Datura e o ayahuasca mistura da Banisteriopis caapi e Psycotria viridis A planta conhecida como jurema é utilizada na preparação de um vinho bebida típica entre os índios e nordestinos Já a beladona é conhecida nas histórias por ter sido muito utilizada em rituais de bruxaria na Idade Média e mais recentemente é empregada de forma terapêutica principalmente em preparações homeopáticas mas que por possuir os princípios ativos escopolamina e hiosciamina tem potencial entorpecente podendo promover alucinações No passado essas substâncias eram 303 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS utilizadas como soro da verdade por causar um entorpecimento e deixar o indivíduo em um estado de hipnose A planta datura possui os mesmos componentes e também é utilizada pelo seu potencial em causar alucinações O quadro a seguir pontua algumas plantas com características alucinógenas Quadro 12 Plantas alucinógenas Nome científico Nome popular Princípios ativos Atropa belladonna L Beladona Atropina escopolamina e hiosciamina Datura sp Stramonium sp Dutra sp Ceratocaulis sp e Brugmansia sp Datura Atropina escopolamina e hiosciamina Mimosa hostilis Mart Benth Jurema Dimetiltriptamina Virola calophylla Spruce Warb e Virola theiodora Spruce ex Benth Warb Epená Dimetiltriptamina Banisteriopsis caapi Spruce ex Griseb C V Morton Ayahuasca Harmina e harmalina Psychotria viridis Ruiz Pav Chacrona Dimetiltriptamina Tabernanthe iboga Baill Ibogaína Ipomoea violacea L Amida do ácido lisérgico Lophophora williamsii Lem ex SalmDyck J M Coult Cacto peiote Mescalina Myristica fragrans Houtt Nozmoscada Miristicina Salvia divinorum Epling Játiva Sálvia Salvinorina Adaptado de Oga Camargo e Batistuzzo 2014 O cipó Banisteriopis caapi nativo da Amazônia é conhecido como ayahuasca e possui em sua composição os alcaloides βcarbolinas harmina e harmalina que atuam como inibidores da MAO Dessa forma o resultado será uma maior concentração de neurotransmissores na fenda sináptica como serotonina e adrenalina Em rituais de seitas religiosas como a Santo Daime e a União do Vegetal a ayahuasca é preparada com o cipó em associação com a planta chacrona Psycotria viridis que possui em sua composição o alcaloide indólico NNdimetiltriptamina o qual atua em receptores de setoronina Os usuários dessa bebida relatam que quando estão sob seu efeito passam por uma experiência mística e esotérica na qual conseguem ver santos de sua devoção ou entidades esotéricas como gnomos e fadas Eles acreditam que realmente estão em contato com essas entidades Alguns dos efeitos tóxicos predominantes são o vômito e as cólicas abdominais o que pode ser explicado pelo fato de a NNdimetiltriptamina agir em receptores de serotonina e o seu efeito ser potencializado pelas betacarbolinas que inibem a MAO aumentando a concentração de serotonina na fenda sináptica Quando a serotonina atua nos receptores de 5HT na zona de gatilho ocorre o reflexo do vômito Porém esse efeito tóxico é visto pelos usuários das seitas como uma desintoxicação do organismo A dimetiltriptamina quando administrada por via parenteral é um potente alucinógeno porém quando administrada por via oral é inativada pela ação de desaminação sofrida pela ação da enzima 304 Unidade II MAO intestinal e hepática Assim na associação das betacarbolinas com a dimetiltriptamina a ação da MAO é inibida e ocorre o efeito entorpecente Figura 138 Preparação da bebida ayahuasca Observação A Salvia divinorum não é encontrada no Brasil Tratase de uma planta mexicana conhecida popularmente como menta mágica e não é a mesma sálvia comercializada em nosso país No Brasil a salvinorina princípio ativo da Salvia divinorum é considerada uma substância psicotrópica sob controle especial e faz parte da lista F da Portaria 344MS de acordo com a RDC 39 pela Anvisa 6163 Cogumelos alucinógenos Os fungos com potencial entorpecente mais numerosos e mais importantes pertencem ao gênero Pcilocybe O país onde ocorre o maior consumo de fungos alucinógenos é o México Os efeitos alucinógenos são produzidos pelos alcaloides psilocina e psilocibina 4fosforiloxiN Ndimetiltriptamina que possuem estrutura química semelhante à da triptamina atuando em receptores de serotonina Alguns dos cogumelos alucinógenos são encontrados nas fezes de vacas e búfalos veja o quadro a seguir Quadro 13 Fungos alucinógenos mais conhecidos Fungo alucinógeno Característica Amanita muscaria Alucinógeno mais antigo usado pelo homem Botelus manicus Relacionado à loucura dos fungos Conocybe siligineoides Fungo alucinógeno sagrado utilizado no México Conocybe cyanescens Encontrado nos EUA contém psilocibina 305 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Fungo alucinógeno Característica Copelandia cyanescens Cultivado sobre o esterco de vaca Contém mais de 12 de psilocina e 06 de psilocibina Heimiella angrieformis Não se conhece sua contribuição química Panaeolus sphinctrinus Cresce no esterco de vaca Psilocybe caerulescens Fungo alucinógeno sagrado utilizado no México Russula agglutina Relacionado à loucura dos fungos Stropharia cubensis Usado por xamãs possui psilocibina Adaptado de Oga Camargo e Batistuzzo 2014 Figura 139 Fungo Amanita muscaria Figura 140 Copelandia cyanencens Uso prolongado de alucinógenos O uso a longo prazo de substâncias alucinógenas pode levar o indivíduo a mudanças de comportamento mas parece não estar associado ao desenvolvimento de uso compulsivo ou seja as pesquisas indicam que a dependência é psicológica Quando ocorre o uso de doses altas podem ocorrer episódios psicóticos como estado confuso ou paranoico reações esquizofrênicas reações paranoicas ou delírios de perseguição alucinose persistente como feedback negativo e depressão psicótica Já as manifestações clínicas são hiperexcitabilidade descontrole hipertensão ou hipotensão convulsões coma estados psicóticos prolongados midríase tremor reflexos exagerados e febre 306 Unidade II Tratamento das intoxicações agudas por alucinógenos O tratamento de intoxicações agudas por alucinógenos consiste em administrar diazepam 01 mgkg via oral Em caso graves quando ocorre o coma realizase a intubação do paciente para eliminação das secreções mucosas da traqueia mediante aspiração A acidificação da urina pode ser útil para acelerar a excreção 6164 Cannabis De acordo com estimativas da OMS a Cannabis sativa é a droga ilícita mais consumida no mundo com 1818 milhões de usuários em 2016 NAÇÕES UNIDAS 2016 A Cannabis sativa é originária da Ásia Central e achados arqueológicos indicam que ela é cultivada desde 4000 aC Ela possui diversos metabólitos que podem promover efeitos medicinais e efeitos tóxicos Já foram identificados mais de 400 canabinoides na Cannabis sativa Entre eles foram isolados cerca de 70 fitocanabinoides como delta 9THC delta 8THC canabinol CBN canabidiol CBD canabigerol CBG canabicromeno CBC canabiciclol CBL canabielsoin CBE canabinodiol CBDL e canabitriol CBTL Entre os fitocanabinoides o delta 9THC é reconhecido como o principal responsável pelos efeitos psicoativos Toxicocinética As preparações de Cannabis são consumidas na forma de cigarros ou cachimbos assim a absorção ocorre por via pulmonar Elas também podem ser incorporadas em alimentos como doces sendo ingeridas ou em alguns casos adicionadas a bebidas Quadro 14 Diferenças toxicocinéticas entre as exposições da Cannabis por via oral e pulmonar Toxicocinética Vias de administração Oral Pulmonar Velocidade de absorção Lenta e irregular Muito rápida Biodisponibilidade sistêmica 4 a 12 8 a 24 Início 30 a 60 minutos Minutos Efeitos subjetivos máximos 25 a 35 horas 8 a 15 minutos Duração 4 a 6 horas 1 a 3 horas Adaptado de Oga Camargo e Batistuzzo 2014 As características toxicocinéticas dos fitocanabinoides são a alta lipossolubilidade e o fato de se ligarem às proteínas plasmáticas 97 a 99 a lipoproteínas e em menor proporção à albumina e assim são distribuídas em maior proporção no encéfalo coração rins fígado e pulmões e se acumula intensamente no tecido adiposo Atravessam a barreira placentária podem causar alteração no 307 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS desenvolvimento fetal e são excretadas no leite materno durante a lactação sendo que 70 são excretados em 72 horas 30 na urina e 40 nas fezes Há situações em que uma pessoa precisa realizar um exame toxicológico como em um concurso admissão em um emprego acompanhamento de usuários de drogas ou controle de dopagem no esporte Assim se essa pessoa for usuária de maconha o que aconteceria Depois de quanto tempo após o uso o delta 9THC poderia ser detectado A janela de detecção para fumantes eventuais varia de dois a quatro dias e a de fumantes frequentes pode chegar a um mês Quando ocorre a ingestão de dois brownies contendo 28 de delta 9THC ela seria de seis dias Toxicodinâmica e mecanismo de ação Os endocanabinoides apresentam seletividade variada aos receptores CB1 e CB2 sendo a anandamida mais seletiva ao CB1 e o 2AG 2araquidonilglicerol ativo em CB1 e CB2 Os receptores canabinoides são receptores metabotrópicos desse modo o delta 9THC interage com os receptores CB1 ou CB2 assim como os endocanabinoides anandamida e 2AG e desencadeiam uma variedade de eventos intracelulares característicos Observação Anandamida é uma palavra que em sânscrito quer dizer felicidade Saiba mais Para saber mais sobre a anandamida e o efeitos dos endocanabinoides veja estas referências SAITO V M WOTJAK C T MOREIRA F A Exploração farmacológica do sistema endocanabinoide novas perspectivas para o tratamento de transtornos de ansiedade e depressão Revista Brasileira de Psiquiatria v 32 supl 1 p S7S14 2010 Disponível em httpswwwscielobrpdfrbp v32s1a04v32s1pdf Acesso em 2 dez 2020 SOUZA A A F et al Cannabis sativa uso de fitocanabinoides para o tratamento de dor crônica Brazilian Journal of Natural Sciences 2 ed v 1 p 112 2019 Disponível em httpsbjnscombrindexphpBJNS articleview3026 Acesso em 2 dez 2020 308 Unidade II Efeitos tóxicos da Cannabis A toxicidade aguda da Cannabis é considerada muito baixa e não existem relatos na literatura que indiquem que possa causar morte por excesso de consumo Observação Dose fatal 15 a 70 g dose muito maior do que a inalada por usuários DL50 800 a 1900 mgkg Doses baixas de Cannabis 2 a 10 mg de delta 9THC podem causar sensação de bemestar e felicidade com risos contagiantes relaxamento diminuição da ansiedade e sedação intensificação de experiências sensoriais principalmente estímulos visuais perda de memória recente dificuldade de concentração perda da noção de tempo e espaço coordenação motora diminuída e paranoide de perseguição Os efeitos físicos mais comuns são taquicardia hipertensão ou hipotensão olhos vermelhos hiposalivação com boca seca e aumento do apetite Com o uso na forma fumada a longo prazo podem ocorrer danos à mucosa e inflamação das vias aéreas tosse catarro espirros sinusite doença pulmonar obstrutiva crônica bronquite crônica e enfisema Também existe o risco de desenvolvimento de esquizofrenia 62 Toxicologia forense e analítica 621 Introdução à toxicologia forense e à toxicologia analítica A toxicologia forense pode ser definida como a aplicação da toxicologia com finalidade legal Dessa forma a aplicação mais comum é na investigação de substâncias químicas que podem ser usadas de forma a causar intoxicação ou morte KLAASSEN WATKINS 2012 Na investigação da causa da morte seguimos três etapas começamos com o histórico da ocorrência com detalhes na sequência realizamos as análises toxicológicas das amostras coletadas e finalizamos com a interpretação dos achados analíticos O que você pensa sobre a toxicologia forense É muito comum que as pessoas se lembrem das séries investigativas em que o perito criminal vai na cena do crime coletar amostras e realiza as análises para identificação da causa da morte muitas vezes utilizando equipamentos de análises associados a métodos computacionais e acessando banco de dados com informações Nessas séries podemos ver procedimentos que são reais utilizados na vida real mas também vemos muita ficção O que será que é verdade no que vemos nelas E quais são as funções de um toxicologista forense 309 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Ele é um profissional especialista em perícia criminal que pode atuar nas várias etapas de uma investigação como realizar as análises qualitativas e quantitativas pesquisar os toxicantes presentes em fluidos biológicos postmortem durante a necropsia e interpretar os achados analíticos Podemos atrelar duas áreas da toxicologia que estão interligadas a toxicologia forense e a toxicologia analítica A toxicologia analítica utiliza as bases da química analítica para as análises quantitativas e qualitativas de substâncias químicas que possam causar efeitos adversos a organismos vivos KLAASSEN WATKINS 2012 enquanto a toxicologia forense tem como funções identificar substâncias tóxicas nos organismos vivos através de amostras de sangue urina cabelo saliva entre outras e analisa substâncias tóxicas no meio ambiente como em amostras de água ar ou solo Conforme apresentado anteriormente as substâncias químicas e os agentes tóxicos são classificados quanto à sua natureza quanto ao órgão ou sistema em que atuam ou quanto às características físicas Quanto à natureza são divididos em naturais ou sintéticos e as de origem natural podem ser minerais vegetais ou derivados de animais Exemplo de aplicação Pense em exemplos de agentes tóxicos de origem vegetal mineral e derivados de animais Quanto ao órgão ou sistema em que atuam você já viu na classificação dos agentes tóxicos alguns exemplos de órgãosalvo porém é importante destacar que uma substância é chamada de nefrotóxica quando é tóxica para os rins de hepatotóxica quando afeta o fígado de neurotóxica quando afeta o SNC e de genotóxica quando causa mutações no DNA Em uma análise toxicológica os toxicantes a serem pesquisados podem ser gases irritantes ou asfixiantes Para os irritantes contaminantes da atmosfera não há biomarcador assim devese fazer a análise do ar Mas em uma exposição a gases irritantes ou asfixiantes pode existir um biomarcador por exemplo na exposição ao monóxido de carbono em que o biomarcador será a dosagem de carboxiemoglobina que pode ser determinada através de amostras de sangue e quantificada por cromatografia espectrofotometria ou gasometria Observação O biomarcador é um indicador biológico um parâmetro fisiológico ligado a uma doença ou uma classe de doenças Podem ser feitas medidas físicas peso cor e pressão medidas químicas xenobióticos e metabólitos ou medidas biológicas alterações fisiológicas ou celulares Na exposição a solventes orgânicos voláteis como nhexano podemos investigar a presença de metabólitos na urina como o 25hexanodiona que é um produto da biotransformação do hexano No caso de metais pesados podemos avaliar a presença de contaminantes diretos em alimentos como a 310 Unidade II presença de mercúrio em peixes ou realizar a monitorização terapêutica de pacientes que fazem uso contínuo de sais de lítio Nas análises toxicológicas podemos detectar os agentes tóxicos através de várias formas como substância química inalterada produto de biotransformação forma conjugada na urina ou alterações bioquímicas e hematológicas veja os quadros a seguir Quadro 15 Substâncias químicas na forma inalterada Substâncias Amostra a ser analisada Chumbo Sangue ou urina Aflatoxina Amendoim Etanol Ar expirado bafômetro Anfetamina Urina Lidocaína Plasma Cocaína Cabelo Mercúrio Água Quadro 16 Produtos de biotransformação Fonte de intoxicação Produto de biotransformação Amostra biológica Tolueno Ácido hipúrico Urina Cocaína Benzoilecgonina Urina Heroína 6acetilmorfina Sangue Alguns agentes tóxicos são biotransformados e os metabólitos podem ser detectados na urina ou no sangue porém algumas substâncias são excretadas na forma conjugada como a morfina e a Cannabis que formam conjugados com ácido glicurônico Quadro 17 Alterações bioquímicas e hematológicas provocadas por agentes tóxicos Xenobióticos Alteração Chumbo Enzima deltaALA desidratase redução no sangue e aumento na urina Organofosforados e carbamatos Inibição da enzima acetilcolinesterase Anilina e nitrobenzeno Aumento da concentração de metemoglobina no sangue Em uma investigação forense é necessária a seleção de amostras e as considerações para a escolha são a finalidade da análise a natureza da substância e se há biomarcador Se você for realizar uma análise toxicológica postmortem ou in vivo quais amostras utilizaria 311 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Para responder a essa pergunta devemos fazer algumas considerações As análises podem ser in vivo ou postmortem Devemos levar em consideração que se temos um paciente vivo não podemos utilizar qualquer amostra pois temos algumas opções que podem ser utilizadas as quais podem ser convencionais ou não convencionais já no caso postmortem podemos utilizar qualquer tipo de amostra 622 Características das amostras Quando a análise toxicológica é realizada para avaliar intoxicações in vivo podemos utilizar amostras convencionais ou não convencionais As convencionais são as amostras de sangue e urina Porém em situações específicas pode ser vantajoso o uso de amostras não convencionais como saliva suor cabelo e unha Cada tipo de amostra apresenta vantagens e desvantagens e é utilizada para determinadas finalidades conforme apresentado no quadro a seguir Quadro 18 Vantagens e desvantagens das amostras utilizadas in vivo Amostra Vantagens Desvantagens Urina Constituída por água livre de proteínas Maior concentração de xenobióticos Usada para triagem toxicológica Dificuldade de coleta em paciente inconsciente Determina somente substâncias utilizadas a curto prazo Sangue Possibilidade de identificação do momento do uso In vivo Correlação do efeito do fármaco x Concentração no sangue Em análises postmortem alguns interferentes podem prejudicar o uso da amostra como local da coleta formação de coágulos decomposição Saliva Possibilita determinar drogas de abuso Permite paralelos com concentração no sangue Facilidade de obtenção por ser não invasivo Coleta sem constrangimento Pouca quantidade de amostra Somente determina substâncias utilizadas a curto prazo Suor Coleta não invasiva e indolor Sem constrangimento Cabelo Permite a identificação de metais pesados e drogas ilícitas Possibilita identificação de substâncias utilizadas a longo prazo Unha Permite a identificação de metais pesados e drogas ilícitas Possibilita identificação de substâncias utilizadas a longo prazo Adaptado de Moreau e Siqueira 2008 Existem algumas características da droga que permitem sua passagem para a saliva Assim podemos fazer a detecção nessa amostra por exemplo da lipossolubilidade assim como identificar se está na forma não ionizada e não ligada às proteínas plasmáticas 312 Unidade II Exemplo de aplicação Quais drogas você acredita que podem ser detectadas na saliva Vamos auxiliálo nessa resposta podem ser encontradas nessa matriz biológia os esteroides hormônios benzodiazepínicos Cannabis cocaína crack LSD ecstasy anfetamina e metanfetamina morfina e opioides Para ser detectada no suor a droga ou fármaco precisa ter as mesmas características citadas para detecção na saliva As amostras de suor são coletadas para acompanhamento de presos detentos e dependentes internados assim como ocorre com a amostra de saliva As amostras de unha são utilizadas para avaliar a intoxicação em recémnascidos com mães usuárias de drogas já as amostras de cabelo para dopagem no esporte acompanhamento de usuários de drogas ilícitas e exposição ambiental É possível avaliar o período em que ocorreu maior exposição a determinados toxicantes Quando realizamos análises toxicológicas postmortem embora possamos utilizar qualquer amostra algumas são mais convencionais e outras não são convencionais As convencionais são amostras de sangue órgãos e tecidos como cérebro pulmões e fígado conteúdo gástrico cabelo e unha Porém em alguns casos é necessária a coleta de amostras não convencionais como a bile o humor vítreo e as larvas do corpo em decomposição O quadro a seguir apresenta as vantagens e desvantagens de cada amostra Quadro 19 Vantagens e desvantagens das amostras utilizados postmortem Amostra Vantagens Desvantagens Cérebro e pulmões Permite a detecção de exposição a gases e substâncias voláteis Tecido pulmonar Permite identificar intoxicações por via intravenosa Maior concentração de fármacos em comparação com o fígado Fígado Possui maior quantidade de substâncias alcalinas em comparação com o sangue Nessa amostra os agentes tóxicos não sofrem alterações mesmo postmortem Decompõe muito rápido Bile Maior concentração de substâncias tóxicas 1000x mais comparado com o sangue Adaptado de Moreau e Siqueira 2008 Algumas amostras utilizadas possuem características peculiares como o humor vítreo fluido que se encontra na cavidade posterior do olho preenchendo o espaço entre o cristalino e a retina A quantidade total de humor vítreo obtida gira em torno de 20 a 25 ml Como esse líquido faz trocas de substâncias com o sangue pode ser usado para a identificação de etanol em corpos carbonizados ou em decomposição O conteúdo gástrico é usado para identificar substâncias administradas por via oral 313 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS na forma inalterada como o inseticida carbamato conhecido como chumbinho As larvas são utilizadas quando o corpo está em decomposição e possibilita a identificação de fármacos Outras amostras utilizadas em uma investigação criminal são os objetos encontrados na cena do crime como copos xícaras colheres frascos seringas e garrafas Exceto em situações em que a investigação é direcionada existe um padrão na coleta das amostras postmortem conforme o quadro a seguir em que algumas matrizes sempre são coletadas seja em quantidade específica ou todo o conteúdo disponível Quadro 20 Matrizes empregadas nas análises toxicológicas postmortem Em quantidade específica Todo o conteúdo disponível Encéfalo 50 g Humor vítreo Fígado 50 g Bile Rim 50 g Urina Sangue cardíaco 25 ml Conteúdo gástrico Sangue periférico 10 ml 623 Urgências no atendimento a paciente vivo com suspeita de intoxicação Em situações em que se atende um paciente vivo vítima de intoxicação quando não temos evidências nem relatos do ocorrido realizamos uma triagem através de uma amostra de urina mas também podese utilizar o líquido da lavagem gástrica ou o vômito Em caso de monitorização terapêutica coletase o sangue eou saliva No controle de dopagem as amostras mais comuns são urina ar exalado etanol e saliva A triagem é realizada quando não se conhece o agente tóxico e utilizase análise por método cromatográfico Para confirmação da intoxicação utilizase outro método analítico como a espectrofotometria de massa Métodos específicos são utilizados quando já existe forte suspeita sobre o agente tóxico 624 Procedimento nas análises postmortem As investigações médicolegais são essenciais no caso de mortes violentas como suicídios homicídios ou acidentes 6241 Cadeia de custódia A cadeia de custódia é um documento que o laboratório mantém com o propósito de rastrear todas as operações realizadas com cada amostra desde sua coleta até a completa destruição do material Tudo deve ser detalhado desde a sequência dos fatos pelos quais passou a amostra a identificação de todos 314 Unidade II que a manusearam o tempo de manuseio e como a amostra foi rearmazenada ou dispensada As etapas seguidas na cadeia de custódia são apresentadas na figura a seguir Testes realizados até a disposição final Recebimento das amostras Aliquotagem Preparação Coleta das matrizes Entrada do cadáver Figura 141 Fases registradas na cadeia de custódia 6242 Coleta de amostras Em uma análise toxicológica postmortem são muitas as opções de amostras que podem ser coletadas e a escolha está relacionada com o histórico do caso Pode ser realizada a coleta de sangue do humor vítreo ou de amostras de tecido As amostras de sangue cadavérico são obtidas por meio de punção das veias subclávia eou femoral Quando se trata de humor vítreo destacase a angulação de 45º sobre o eixo da seringa em relação ao eixo anteroposterior para a adequada punção da câmara ocular que deve ser direta As amostras de tecido são coletadas separadas pulmonar cerebral renal hepático etc 6243 Preparação das amostras Na preparação da amostra é essencial primeiro remover os interferentes endógenos e analitos ligados às proteínas por meio de precipitação de proteínas A liberação dos analitos da amostra extração pode acontecer de três formas por hidrólises ácida alcalina ou enzimática quando os analitos forem conjugados por processo de digestão em meio alcalino ou ácido para liberação de drogas de abuso do cabelo ou por mineralização da matriz orgânica para separação e complexação de metais por agentes quelantes 315 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS 625 Clínica médica legal 6251 Investigação criminal Tratase de perícias realizadas em vivos que acontecem para verificação de direção perigosa ou investigação de drogas facilitadoras de abuso sexual violência roubos extorsão de dinheiro e outros As amostras biológicas coletadas para análise são urina sangue e ar expirado As drogas de abuso mais utilizadas em casos de agressão sexual costumam ser etanol benzodiazepínicos maconha anfetamínicos e opiáceos Existem relatos do uso de uma bebida conhecida como ayahuasca preparada pelo cipó Banisteriopis caapi e pela planta Psycotria viridis usada em rituais esotéricos também para abuso sexual 6252 Monitoramento da exposição ocupacional ou terapêutica Quando o trabalhador é exposto em seu ambiente de trabalho a substâncias químicas que podem promover toxicidade ao organismo é necessária a realização de um monitoramento biológico da exposição Pode ser analisado o agente tóxico ou seu produto de biotransformação em fluidos biológicos cabelo urina ou ar exalado O uso prolongado de fármacos pode acarretar alterações na concentração média do medicamento no organismo que em alguns casos pode aumentar gerando toxicidade ou diminuir promovendo redução do efeito Assim é recomendado um monitoramento para controle terapêutico 626 Métodos de análise 6261 Métodos de análises mais utilizados Os métodos mais utilizados para identificação de drogas de abuso e xenobióticos em diversas matrizes biológicas são a cromatografia gasosa GC a espectrometria de massas MS e a cromatografia líquida de alta eficiência HPLC Porém a cromatografia em camada delgada por ser um método mais simples e barato que permite a identificação de muitas substâncias é utilizada em muitos laboratórios de análises toxicológicas Sendo assim vale a pena estudarmos um pouco mais sobre o fundamento da cromatografia e o método de cromatografia em camada delgada CCD 6262 Técnica de cromatografia A cromatografia é um método físicoquímico de separação dos componentes de uma mistura realizada através da distribuição desses componentes entre duas fases que estão em contato íntimo Uma das fases permanece estacionária enquanto a outra movese através dela Durante a passagem da fase móvel sobre a fase estacionária os componentes da mistura são distribuídos entre as duas fases de forma que cada um dos componentes é seletivamente retido pela fase estacionária resultando em migrações diferenciais desses componentes A forma física do sistema de cromatografia que define a técnica geral é formada por uma fase estacionária que pode ser composta de um tubo cilíndrico cromatografia em coluna ou uma superfície 316 Unidade II planar cromatografia planar e uma fase móvel que pode ser composta por um gás GC um líquido HPLC ou vapor pressurizado cromatografia supercrítica Na fase móvel a polaridade do sistema de eluentes deve ser aumentada lentamente com o aumento da concentração do solvente mais polar sendo que em alguns casos podese usar um único solvente para a eluição do sistema cromatográfico Em um sistema de cromatografia planar a fase móvel proveniente de um reservatório passa através dos pontos de partida da amostra e arrasta os componentes da amostra durante o processo de desenvolvimento Definese por DR a distância percorrida pelos componentes e por DM a distância percorrida pela fase móvel Os mesmos termos se aplicam a um processo cromatográfico realizado em coluna desde que os componentes permaneçam no tubo cromatográfico sem serem eluídos Contudo normalmente a cromatografia em coluna procede com fluxo contínuo da fase móvel até que todos os componentes tenham saído da coluna e as suas presenças sejam detectadas pelo detector e indicadas graficamente Alternativamente o eluato pode ser coletado em frações de volumes idênticos as suas concentrações medidas e o cromatograma construído considerando o número do tubo de cada fração equivalente a uma unidade de distância A cromatografia planar pode ser em papel ou em camada delgada A cromatografia em papel é uma técnica simples que utiliza pequena quantidade de amostra e tem uma boa capacidade de resolução É utilizada principalmente para separação e identificação de compostos polares como antibióticos hidrossolúveis ácidos orgânicos e íons metálicos Os componentes menos solúveis na fase estacionária têm uma movimentação mais rápida ao longo do papel enquanto os mais solúveis na fase estacionária serão seletivamente retidos tendo uma movimentação mais lenta Isso se explica da seguinte maneira a celulose é constituída por 2000 ou mais unidades de glicose anidra ligadas por átomos de oxigênio um líquido polar como a água que tem grande afinidade pelas hidroxilas de cada glicose formando pontes de hidrogênio ficando retido e funcionando como fase estacionária e os líquidos menos polares solventes orgânicos são repelidos por esta estrutura e funcionam como fase móvel A forma mais simples da cromatografia em papel é a cromatografia ascendente que utiliza uma tira de papel de comprimento e largura variáveis em função da cuba cromatográfica a ser utilizada Marcase com lápis o ponto de partida da amostra a 2 cm de uma das bordas do papel e marcase também a linha de chegada da fase móvel ou frente do solvente geralmente distando 10 cm do ponto de partida Dependendo da largura do papel podese colocar apenas uma alíquota do padrão ou da amostra centralizandose essa aplicação na linha de partida No caso da possibilidade de colocarse mais de uma alíquota no ponto de partida deixase 2 cm de distância das bordas laterais e um intervalo entre os pontos de aplicação de 15 a 20 cm A largura 317 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS da tira do papel acima da linha de chegada da fase móvel deve ser igual ao diâmetro interno da cuba de maneira que o papel fique suspenso na vertical impedindo de deslizarse para baixo O nível da fase móvel deve ficar abaixo do ponto de partida da substância devendo sempre haver uma boa vedação da cuba cromatográfica para que não se perca o vapor dessa fase Por capilaridade a fase móvel começa a se movimentar em fluxo ascendente rapidamente no início e diminuindo gradativamente até parar por completo quando a força ascendente da capilaridade for neutralizada pela ação da gravidade Quando a fase móvel atingir a linha de chegada geralmente a 10 cm do ponto de partida retirase o papel da cuba cromatográfica e secase a tira de papel com secador de cabelo com ar quente ou frio até eliminarse a fase móvel No caso de mistura de substâncias de componentes coloridos à medida que ocorrer a separação a cor única se desdobrará em cores distintas em função do número de substâncias que a compõem No caso de misturas de substâncias incolores podese detectar revelar esses componentes por técnicas diversas A análise qualitativa de uma substância realizase através de seu Rf determinado utilizandose a expressão Rf Distância cm mm percorrida pela substância Distância cm mm percorrida pela frente da fase móvel Medese a distância percorrida pelo soluto em um tempo determinado desde o ponto de aplicação ou ponto de partida da amostra até o centro da mancha e a distância percorrida pela fase móvel desde o ponto de partida até o ponto extremo atingido por ela Lc a linha de chegada da fase móvel O Rf é uma constante física de uma determinada substância desde que se observem as características do papel a quantidade e qualidade da fase móvel a temperatura o volume e a concentração da substância aplicada Para a visualização da mancha formada pela amostra é necessária a utilização de um agente cromogênico como revelador Ele é borrifado sobre o papel usado na cromatografia sendo cada amostra uma mistura de substâncias como íons inorgânicos e inseticidas Existem na literatura fontes que informam qual deve ser a solução reveladora agente cromogênico a ser empregada qual a técnica de preparo e modo de conservação qual a sensibilidade e quais as substâncias detectadas por certos reveladores Muitas substâncias orgânicas absorvem radiações de luz ultravioleta e tornamse fluorescentes O papel quando tratado com solução de fluoresceína frequentemente destaca as manchas tornandoas amareloesverdeadas brancas ou azuis Entretanto as substâncias que absorvem a luz UV aparecem como manchas escuras sobre um fundo fluorescente azulado normalmente apresentado pelo papel 318 Unidade II Podem ser usadas lâmpadas UV de onda curta 240260 nm e onda larga 360 nm para visualização da mancha formada pela amostra Outro método de cromatografia planar é a cromatografia em camada delgada CCD que segue a mesma técnica da cromatografia em papel porém a fase estacionária será uma placa de vidro alumínio ou outro suporte inerte tratado por uma camada fina formada por um sólido granulado geralmente sílicagel Essa técnica consiste na separação dos componentes de uma mistura através da migração diferencial sobre uma camada delgada de adsorvente retido sobre uma superfície plana Ela apresenta vantagens por ser de fácil compreensão e execução promover separações em breve espaço de tempo e ser versátil de grande reprodutibilidade e baixo custo Os adsorventes mais usados são sílica SiO2 terra diatomácea celulose ou poliamida 62621 Tipos de sílica A sílica tem caráter fracamente ácido e é empregada na separação de compostos lipofílicos como aldeídos cetonas fenóis ácidos graxos aminoácidos alcaloides terpenoides e esteroides usando o mecanismo de adsorção Existem cinco tipos de sílica sílica G contém aglutinantes como gesso e amido ou talco sílica H não contém aglutinantes sílica P para uso em camada preparativa sílica F contém substâncias fluorescentes e sílica R adsorventes extra puros sem aditivos 62622 Preparação das placas Na preparação da placa misturamse cerca de 30 g de sílica com 60 a 70 ml de água destilada Essa quantidade de suspensão é suficiente para preparar cinco placas de 20 x 20 cm com uma espessura da camada ao redor de 03 mm A terra diatomácea é adsorvente neutro amplamente empregado como suporte nas separações por partição Pode ser encontrada com ou sem aglutinante Na preparação de placas utilizamse as mesmas proporções citadas para a sílica ou seja uma parte de adsorvente para duas partes de água destilada A celulose é empregada como suporte da fase estacionária líquida em cromatografia por partição ou troca iônica Para preparação de cinco placas de 20 x 20 cm misturamse 25 g de celulose com 90 ml de água destilada agitandose em agitador por dois minutos antes de colocar na placa de vidro A poliamida é empregada com mais frequência na separação de fenóis e de ácidos carboxílicos Sua maior utilização é comprometida pela dificuldade em se preparar as cromatoplacas no laboratório em função de sua baixa aderência ao vidro Para preparação das placas recomendase fazer a suspensão de 15 g de pó em 60 ml de metanol previamente purificado Estas quantidades são suficientes para cinco placas de 20 x 20 cm e 03 mm de espessura Para a aplicação das amostras nas cromatoplacas as gotas devem ser aplicadas 15 a 2 cm acima do bordo inferior evitandose que fiquem mergulhadas na fase móvel quando a placa for colocada na cuba A distância entre cada gota é de aproximadamente 1 cm evitandose sempre que haja contato entre as gotas de soluções 319 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Em placas preparativas uma solução concentrada da amostra é aplicada na forma de faixa ou linha horizontal cerca de 2 cm acima do bordo inferior da placa A técnica de CCD é uma técnica muito utilizada para triagem em muitos centros de controle de intoxicação O mais comum é a utilização de urina como amostra biológica para triagem de fármacos e drogas de abuso visto que é uma amostra de fácil coleta disponível em grandes volumes e com concentrações altas de substâncias comparadas ao soro Na urina os fármacos drogas de abuso e xenobióticos podem ser excretados inalterados na forma de metabólitos ou conjugados com ácido glicurônico ou sulfato Quando o conteúdo gástrico é coletado nas análises postmortem é uma matriz que pode ser bem interessante já que nessa amostra podemos identificar as substâncias na sua forma inalterada Já o sangue plasma ou soro é utilizado para análises quantitativas póstriagem na urina 627 Análise de drogas no cabelo Existem matrizes que não são convencionais nas análises toxicológicas porém muito úteis e de fácil coleta para detecção de algumas substâncias como o cabelo A incorporação de xenobióticos ao cabelo ocorre por difusão passiva a partir do sangue e algumas propriedades físicoquímicas das substâncias determinam o seu acúmulo no cabelo como lipossolubilidade e se está na forma livre no plasma Outro mecanismo é a difusão por secreções corporais como sebo e suor durante a formação da haste do cabelo Estimase que o cabelo cresce cerca de 1 cm ao mês o que equivale à janela de detecção do uso de drogas no período de 30 dias Para que o exame detecte o uso de substâncias de um período de até 90 dias necessitamos de uma amostra de 4 cm de cabelo contando a partir da base do folículo Se não for possível a coleta de uma amostra nessa medida retiramos amostras de pelos corporais pois eles apresentam um crescimento mais lento O procedimento de coleta é rápido e prático É imprescindível realizar a descontaminação da amostra antes da análise para eliminar possíveis resíduos de drogas na parte externa do cabelo ou pelo E qual técnica utilizamos para essa análise Quais drogas podemos detectar através de amostras de cabelo ou pelo O teste quantitativo é realizado por cromatografia líquida ou gasosa acoplado à espectrometria de massa quando o resultado da triagem for positivo Podemos detectar uma ampla quantidade de substâncias como anfetaminas mazindol femproporex anfepramona ecstasy metilenodioxianfetamina maconha THC e metabólitos cocaína opiáceos morfina heroína hormônios e metais pesados Uma vantagem no uso de amostra de cabelo é que possibilita um histórico cronológico da exposição ao agente tóxico como em situações de acidentes ambientes É possível avaliar se no período em que ocorreu a exposição houve maior acúmulo de substâncias tóxicas Sabendo que o cabelo cresce cerca de 1 cm ao mês é possível dividilo em partes de acordo com o tempo e dosar as concentrações em cada parte 320 Unidade II Saiba mais A Lei n 1310315 determina que os motoristas devem submeterse a exame toxicológico com janela de detecção mínima de 90 dias e a programa de controle de uso de drogas e de bebida alcoólica instituído pelo empregador pelo menos a cada dois anos e seis meses Leia essa lei na íntegra em BRASIL Lei n 13103 de 2 de março de 2015 Brasília 2015 Disponível em httpwwwplanaltogovbrCCivil03Ato201520182015LeiL13103 htm Acesso em 2 dez 2020 628 Testes rápidos para identificação de drogas de abuso Na apreensão de drogas ilícitas é comum a realização de testes por reagentes cromogênicos Os testes rápidos consistem em promover reações de coloração com a utilização de reativos específicos para determinada classe de fármacos Dessa maneira é realizada uma triagem sendo possível determinar a classe farmacológica da droga suspeita Quando a droga é recebida pelo laboratório de investigação toxicológica podemos identificála inicialmente pela aparência A maconha por exemplo é comercializada na forma de tabletes prensados no formato de tijolos ou já fragmentado em porções pequenas Já a cocaína é um pó branco sendo geralmente vendida fracionada em tubos tipo Eppendorf ou em saquinhos O LSD são papéis geralmente de seda com diferentes figurinhas como desenhos coloridos As anfetaminas como o ecstasy são comprimidos Por sua vez o crack são pedrinhas amareladas como apresentado na figura a seguir Figura 142 Amostras de drogas ilícitas apreendidas 321 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Para identificação da THC principal componente da maconha é necessário primeiro fazer a extração do THC com algum solvente orgânico por exemplo uma mistura de éter clorofórmio Pingamos um pouco desse extrato em um papel de filtro e uma quantidade de reativo fast blue diluída em água e aplicada sobre a amostra A reação produz uma coloração avermelhada Solvente éter clorofórmio para extração do princípio ativo THC Reativo Fast blue Resultado coloração avermelhada Figura 143 Teste colorimétrico para identificação de THC com reativo fast blue Figura 144 Kits para teste rápido Existem kits de testes rápidos também utilizados por peritos para identificação rápida de drogas que podem ser utilizados no próprio local da apreensão Um dos testes é uma ampola como a que pode ser visualizada na foto a partir da qual é realizado o teste de DuquenoisLevine A ampola possui uma solução composta por acetaldeído e vanilina em etanol 95 Colocamos a amostra suspeita para maconha dentro da ampola e misturamos nesse reagente Logo em seguida quebramos a tampa da ampola na qual se localiza uma quantidade de ácido clorídrico fumegante que escorre pela parede do 322 Unidade II tubo e ao entrar em contato com o extrato obtido inicialmente reage promovendo uma coloração violeta que indica positivo para droga Para a identificação de cocaína ou crack é utilizada a técnica de Scott e Mayer O reagente de Scott é composto por uma solução de tiocianato de cobalto 2 e glicerina Pingamos esse reagente na amostra suspeita e observamos a mudança de cor A coloração azul indica que a amostra é cocaína ou crack porém é necessário fazer uma confirmação pois pode ocorrer falsopositivo Dessa forma pingamos uma gota de HCl 01N se continuar azul confirmamos o resultado positivo 63 Dopagem no esporte 631 Histórico O termo dopagem ou doping é utilizado quando o indivíduo usa substâncias químicas ou métodos para obter vantagens sobre os outros em determinadas competições YONAMINE ALMEIDA 2014 A finalidade da dopagem é aumentar a força resistência e tamanho assim como obter maior velocidade nas competições porém o consumo excessivo pode resultar em toxicidade gerando efeitos adversos e em alguns casos pode levar ao óbito A história apresenta vários registros sobre a prática da dopagem com finalidade estimulante e para aumentar a capacidade no trabalho e nos esportes Como podemos ver no quadro a seguir esses registros são muito antigos Quadro 21 História da prática de dopagem Tempo Lugar Dopagem Há 5000 anos China Plantas com efeitos estimulantes como a machuang para aumentar sua capacidade no trabalho 800 aC Grécia Atletas olímpicos já utilizavam ervas e cogumelos com potencial entorpecente Data desconhecida América précolombiana Incas consumiam folhas de coca cocaína misturadas com café guaraná castanha e chámate cafeína Século III dC Roma antiga Gladiadores utilizavam estimulantes misturados com álcool 1896 Atenas Uso de bolinhas contendo estimulantes como cocaína e efedrina Adaptado de Comitê Olímpico Brasileiro 2006 Em tempos mais recentes muitos atletas foram suspensos ou perderam suas medalhas por acusarem dopagem Daiane dos Santos 2009 e Cesar Cielo 2011 foram suspensos pelo uso de furosemida diurético O último alegou erro na manipulação do suplemento que utilizava Ben Johnson nas Olimpíadas de Seul 1988 venceu os 100 m rasos mas foi suspenso por dois anos perdendo sua medalha de ouro devido ao uso de estanozolol anabolizante Ele alegou que foi sabotado e que usava esteroides nos treinos mas que era orientado e estaria livre do anabolizante no período do exame de doping pois interrompia o uso antes das competições Maradona jogador de futebol argentino foi pego no exame antidoping pelo uso de cocaína 1991 sofrendo suspensão de 15 meses e efedrina na Copa de 1994 com suspensão de 18 meses O ciclista Lance Armstrong que ganhou diversos troféus 323 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS e medalhas durante sua carreira perdeu todos os títulos e foi banido do esporte após confessar em um programa americano de televisão que utilizava eritropoetina testosterona cortisona e dopagem sanguínea Nas Olimpíadas de 2016 a nadadora chinesa Chen Xinyi hidroclorotiazida a atleta búlgara Silvia Danekova eritropoetina o halterofilista quirguiz Izzat Artykov estricnina o ciclista brasileiro Kleber Ramos CERA e no levantamento de peso os irmãos Tornaz e Adrian Zulinski nandrolona foram pegos no exame de dopagem Nos esportes com torneios prolongados como futebol vôlei e basquete os exames antidopagem são realizados de forma aleatória por sorteio Já nos esportes de temporada como atletismo e natação os exames são realizados nos vencedores das provas ou quando o atleta está sob suspeita Nas grandes competições todos os vencedores realizam os exames de dopagem e as amostras ficam guardadas para novas análises futuras caso surjam técnicas de detecção de dopagem Outra análise que tem sido cogitada é a genética visto ser uma nova forma de dopagem O Comitê Olímpico Internacional COI que foi criado em 1967 elaborou uma lista de substâncias e métodos proibidos no esporte visto que o uso de substâncias estimulantes é uma prática comum entre os atletas O objetivo é proteger a vida dos atletas e garantir a igualdade entre os participantes das competições A entidade que monitora e acompanha o código mundial antidopagem é a Wada World AntiDoping Agency Agência Mundial Antidopagem Quadro 22 Substâncias e métodos proibidos no esporte Categoria Substâncias e métodos proibidos Substâncias proibidas nas competições e fora das competições S0 Substâncias não aprovadas S1 Agentes anabolizantes S2 Hormônios peptídicos fatores de crescimento substâncias correlatas e miméticos S3 Beta2agonistas S4 Moduladores hormonais e metabólitos S5 Diuréticos e mascarantes Métodos proibidos nas competições e fora das competições M1 Manipulação de sangue e componentes sanguíneos M2 Manipulação química ou física M3 Doping genético e celular Substâncias e métodos proibidos em competição S6 Estimulantes S7 Narcóticos S8 Canabinoides S9 Glicocorticoides Substâncias proibidas em alguns esportes P1 Betabloqueadores Adaptado de World AntiDoping Agency sd 324 Unidade II Saiba mais Veja a lista completa de substâncias proibidas no doping WORLD ANTIDOPING AGENCY Código mundial antidoping sd Disponível em httpswwwcoborgbrptdocumentosdownload559d2e 6f27321 Acesso em 2 dez 2020 Substâncias não aprovadas Esse item indica que substâncias que não forem aprovadas para uso humano são proibidas em todos os períodos isto é nas competições e fora delas Incluemse aqui as drogas em fase préclínica ou clínica do desenvolvimento as drogas descontinuadas designer drugs análogos estruturais e substâncias aprovadas apenas para uso veterinário As designer drugs são as drogas de abuso derivadas de opioides anfetamínicos triptamínicos piperazinas e canabinoides Saiba mais Leia mais sobre o assunto no texto a seguir BULCÃO R et al Designer drugs aspectos analíticos e biológicos Química Nova v 35 n 1 p 149158 2012 Disponível em httpswww scielobrpdfqnv35n1v35n1a27pdf Acesso em 29 nov 2020 632 Substâncias proibidas nas competições e fora delas 6321 Agentes anabolizantes A finalidade é aumentar a massa muscular em esportes que exigem força e velocidade Alguns exemplos de esteroides anabolizantes androgênicos são clostebol estanozolol testosterona Durateston metiltestosterona nandrolona Decadurabolin e Durabolin e oxandrolona Eles podem produzir alguns efeitos tóxicos como hipertensão infertilidade aumento da chance de ataque cardíaco hipertrofia cardíaca insuficiência cardíaca neoplasias hepáticas hepatite e hepatomas e efeitos feminilizantes e virilizantes 325 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS 6322 Hormônios peptídicos fatores de crescimento substâncias correlatas e miméticos Vamos agora compreender melhor como os hormônios podem agir no organismo e conduzir a um aumento na performance do atleta Eritropoietinas A eritropoietina é um hormônio sintetizado e secretado pelos rins que estimula a medula óssea a produzir eritrócitos e consequentemente aumenta a oxigenação nos músculos Aqui temos dois tipos os agonistas do receptor de eritropoietina como eritropoietinas EPO darbepoetinas dEPO e derivados da Epo como metoxipolietilenoglicol CERA e também os agentes ativadores do fator induzível por hipóxia como cobalto e daprodustat GSK1278863 Podem produzir efeitos tóxicos leves como náuseas ansiedade dores de cabeça e febre ou mais graves como hipertensão arterial infarto do miocárdio e morte súbita Observação As eritropoietinas são utilizadas principalmente por ciclistas Hormônios peptídicos e seus fatores de liberação Você saberia dizer quem são esses hormônios e qual é a finalidade do uso nas práticas esportivas E o que podem causar de efeitos adversos Esses hormônios são utilizados por estimularem a síntese de proteínas aumentando a massa muscular promoverem a hipertrofia repararem dano muscular localizado e ativarem células musculares precursoras E afinal quem são eles Você já deve conhecer a gonadotrofina coriônica CG o hormônio luteinizante LH e seus fatores de liberação no homem como busserelina deslorelina gosserelina e triptotorelina as corticotrofinas e seus fatores de liberação como corticorelina e os hormônios de crescimento GH fatores de crescimento e moduladores de fatores de crescimento Alguns dos efeitos adversos e tóxicos produzidos pelas substâncias citadas são ginecomastia CG gigantismo e acromegalia GH diabetes reações alérgicas e hipertrofia miocárdica 6323 Beta 2agonistas Sua finalidade é aumentar a resistência e diminuir a fadiga muscular São fármacos usados na terapêutica para tratamento da asma e outras complicações respiratórias como fenoterol formoterol salbutamol e terbutalina 326 Unidade II Observação Os agonistas beta2 são broncodilatadores utilizados via inalatória para o tratamento da asma O uso oral desses fármacos aumenta a resistência e diminui a fadiga Para alcançar esse efeito é necessária uma dose 10 a 20 vezes superior à usada para inalação Todos os agonistas beta2 são proibidos nos esportes e somente mediante apresentação de declaração terapêutica o salbutamol o salmeterol e o formoterol são permitidos na forma inalatória 6324 Moduladores hormonais Os modulares hormonais são agentes com atividade antiestrogênica utilizados para aumentar a concentração de testosterona plasmática e diminuir a ginecomastia e a retenção de água Alguns exemplos são os inibidores da aromatase como 2androstenol anastrozol e letrozol os moduladores seletivos do receptor de estrogênio como tamoxifeno e raloxifeno e outras substâncias antiestrogênicas como clomifeno 6325 Diuréticos e agentes mascarantes Sua finalidade no esporte é a redução do peso corpóreo mascarando o consumo de outros agentes dopantes e reduzindo a sua concentração na urina Observação Esses fármacos são utilizados no esporte principalmente para redução do peso em modalidades de esportes onde há divisão por categoria de peso como boxe judô halterofilismo e outros Alguns exemplos são a clortalidona a furosemida a indapamida e a espironolactona que podem causar efeitos adversos e tóxicos como desidratação cãimbras musculares diminuição do volume sanguíneo doenças renais hipotensão ortostática alteração do ritmo cardíaco e perda acentuada de sais minerais 633 Métodos de dopagem 6331 Manipulação de sangue e seus componentes A transfusão sanguínea é uma forma de dopagem proibida Tem como finalidade melhorar o transporte de oxigênio no organismo aumentar a capacidade de manter o pH muscular e auxiliar no controle da temperatura corpórea aumentando também a resistência do indivíduo mas pode 327 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS gerar efeitos perigosos como formação de trombose venosa flebite septicemia reações alérgicas e doenças infecciosas 6332 Manipulação química ou física É um método usado para adulterar ou tentar adulterar amostras coletadas durante o controle de dopagem Pode ser a substituição de amostras ou adição de proteases à amostra 6333 Dopagem genética ou celular São formas de dopagem modernas e que ao longo do tempo tendem a progredir Atualmente algumas técnicas já são conhecidas mas a tendência é que com o conhecimento de novas formas de modificação genética e celular novos itens sejam incorporados nesse quesito São exemplos o uso de ácidos nucleicos ou seus análogos que possam alterar a sequência genômica eou alterar a expressão genética e o uso de células normais ou geneticamente modificadas Qualquer agente farmacológico ou biológico que possa alterar a expressão gênica e melhorar o desempenho do atleta é proibido no esporte 634 Outras substâncias proibidas 6341 Estimulantes Sua finalidade é aumentar o desempenho o estado de alerta e a competitividade e reduzir o cansaço Alguns exemplos são os estimulantes não especificados como anfepramona anfetamina cocaína fenproporex e metanfetamina e os estimulantes especificados como efedrina epinefrina estricnina metilfenidato e pseudoefedrina Podem produzir efeitos adversos e tóxicos como alteração da temperatura hipertensão taquicardia e arritmias midríase ansiedade crises convulsivas aumento da agressividade delírios efeitos cardiovasculares e morte súbita Os estimulantes são utilizados por jogadores de futebol americano para aumentar a concentração doses mais baixas ou aumentar a agressividade doses mais altas em corredores e nadadores para aumentar a energia e nos jóqueis para redução do apetite e do peso 6342 Narcóticos São os analgésicos narcóticos usados para diminuir a dor utilizados principalmente por ciclistas no boxe e em outros esportes de luta Você sabe quais são os analgésicos narcóticos São a morfina e derivados como fentanil diamorfina heroína metadona oxicodona e oximorfona Podem causar depressão respiratória e cardiovascular redução da testosterona alterações gastrointestinais confusão mental e dependência 328 Unidade II 6343 Canabinoides Sua principal finalidade no esporte é a redução da ansiedade O uso de canabinoides no esporte é controversa pois há mais evidências de prejuízo ao desempenho do atleta do que benefícios 6344 Glicocorticoides Os glicocorticoides promovem efeitos neuroestimulatórios nos receptores cerebrais como atenuar sensação de fadiga e efeitos antiinflamatórios e analgésicos Alguns exemplos são betametasona budesonida cortisona dexametasona hidrocortisona e prednisolona Podem causar efeitos adversos e tóxicos como osteoporose resistência à insulina e doenças cardiovasculares o que não é desejável para um atleta 6345 Betabloqueadores Os betabloqueadores são utilizados para tratamento de doenças cardiovasculares como insuficiência cardíaca angina e hipertensão Mas então por que é utilizado no esporte Para compreender melhor isso vamos imaginar um arqueiro como Robin Hood que precisa ter precisão e tranquilidade para acertar as flechas Imagina se ele começar a tremer e sentir taquicardia como seria o final da história Da mesma forma atletas que praticam modalidades como arco e flecha golfe dardo esportes de tiro e jogos de bilhar precisam de firmeza nas mãos e tranquilidade para melhorar sua concentração e acertar seu alvo Os betabloqueadores são utilizados nesse caso por reduzirem o tremor e o estresse e aumentarem a precisão e a exatidão além de amenizarem sintomas de ansiedade como taquicardia Você conhece essa classe de fármacos São exemplos atenolol bisoprolol carvedilol e propranolol Porém essas substâncias podem provocar tontura letargia sonolência distúrbios visuais insônia e depressão 635 Controle antidopagem e métodos analíticos Os controles seguem os códigos mundiais antidopagem e os padrões nacionais O processo de controle de dopagem segue cinco etapas Seleção dos atletas Notificação dos atletas Coleta das amostras Análise das amostras Gestão dos resultados 329 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Os controles podem acontecer dentro ou fora de competição Em competição por sorteio acontecem com base na classificação obtida ou segundo outro critério específico Já os controles fora de competição podem ser realizados a todo momento em qualquer lugar e sem aviso prévio O atleta selecionado dentro de um grupoalvo deverá informar sua localização em determinado período O atleta poderá ser submetido ao controle de dopagem em casa em seu lugar de treinamento ou em outros lugares apropriados O processo de notificação é o mesmo em competição ou fora de competição Um agente mostrará suas credenciais para comprovar que está autorizado a fazer o teste Em seguida mostrará os deveres e direitos do atleta e solicitará que assine a notificação Em competição uma vez notificado o atleta deve apresentarse imediatamente à estação de controle de dopagem O atleta poderá solicitar adiamento do teste por uma razão válida como participar de uma cerimônia de entrega de medalhas realizar uma entrevista com a imprensa ou necessitar de cuidados médicos A partir da notificação o oficial de controle ou escolta permanecerá com o atleta enquanto todo o processo de controle tenha sido concluído Durante o processo o atleta tem direito ao acompanhamento de um representante que deverá cumprir também algumas responsabilidades Primeiro o agente irá pedir ao atleta um documento de identidade válido com foto e em seguida solicitar o fornecimento de amostras de urina sangue ou ambas Quando estiver pronto a fornecer a amostra o agente do mesmo sexo acompanhará todo o processo de coleta até que o atleta tenha fornecido uma amostra válida Será pedido ao atleta que divida a amostra de urina em dois frascos A e B lacrando ambos Ele será a única pessoa a manipular o kit de coleta de amostras a menos que peça ajuda Ao final o atleta deverá conferir e assinar o formulário de controle de dopagem e as amostras coletadas Uma cópia do formulário que não revela sua identidade será enviada a um laboratório acreditado pela agência mundial de antidopagem e cópias serão encaminhadas a organizações antidopagens responsáveis pelo teste e ao atleta Quando a amostra A chegar do laboratório ela será aberta e analisada A amostra B permanecerá armazenada em um lugar seguro e só será analisada a pedido do atleta A análise das amostras para controle de dopagem deve ser realizada conforme os procedimentos previstos no padrão internacional para laboratórios e as amostras somente podem ser analisadas em laboratórios credenciados e aprovados WADAAMA 2020 A amostra de urina é a mais comum nas análises antidopagem Deve ser coletada uma amostra com 75 ml sendo dividida em duas partes A primeira parte corresponde a 50 ml e é utilizada nas análises enquanto a segunda corresponde a 25 ml e fica armazenada para uma contraprova A contraprova é feita a pedido do atleta e a análise deve ser paga por ele 330 Unidade II As técnicas mais utilizadas para análise das amostras são cromatografia gasosa espectrometria de massa e ensaios imunológicos para hormônio Análises de sangue também são utilizadas principalmente para identificar EPO As análises toxicológicas na identificação de dopagem são divididas em duas etapas a triagem e a confirmatória As amostras que acusam positivo na triagem passam para as análises confirmatórias em que poderão ser realizadas técnicas mais especificas O laboratório informará os resultados para a organização antidopagem responsável por sua gestão Uma cópia será enviada a uma agência mundial antidopagem para assegurar a integridade do processo Em caso de resultado analítico adverso o atleta tem direito de solicitar a análise da amostra B nos prazos definidos apresentar defesa e apelar da decisão Os procedimentos de controle de dopagem são importantes para combater a dopagem protegendo o direito dos atletas e promovendo competições mais justas Resumo A exposição a substâncias químicas presentes no ambiente de trabalho pode ser responsável por significativos casos de intoxicação No Brasil nos últimos anos tem havido aumento no número de casos de intoxicação ocupacional Um dos principais desafios da toxicologia ocupacional é prevenir a intoxicação do trabalhador Para isso realizase a monitorização ambiental e a biológica Na monitorização ambiental verificase a intensidade de exposição do trabalhador à substância química que está presente no ambiente de trabalho e na monitorização biológica verificase a presença da substância química inalterada produtos de biotransformação ou alteração bioquímica precoce em matrizes biológicas para estimar a intensidade de exposição Os limites de exposição ocupacional no Brasil são delineados pelo Ministério do Trabalho Entretanto essas informações são compiladas de agências internacionais como a ACGIH Dependendo da toxicidade da substância química produzida ou utilizada no ambiente de trabalho o monitoramento ocorre por parâmetros distintos Dessa forma substâncias que apresentam risco de intoxicação na exposição crônica são monitoradas pelo TLVTWA substâncias químicas que apresentam risco de dano tecidual irreversível irritação ou narcose são monitoradas pelo TLVSTEL e por fim substâncias com importância na toxicidade aguda são monitoradas pelo TLVC ceiling 331 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS A escolha de bioindicador matriz biológica amostragem e técnica analítica adequados são fundamentais para que haja resposta fidedigna para os objetivos relacionados à prevenção da intoxicação A intoxicação por medicamentos assume nos dias atuais uma das grandes causas de intoxicação ocorrentes Por isso exploramos nesta unidade a incidência dessas intoxicações bem como descrevemos as principais classes de fármacos envolvidas nesses episódios Esta unidade também versou sobre alguns dos psicofármacos envolvidos em intoxicações bem como antiinflamatórios não esteroidais além do manejo de tratamento para intoxicações medicamentosas como as medidas de suporte medidas de descontaminação do TGI e medidas que possam contribuir com a eliminação desses agentes Ainda trouxemos uma discussão acerca da conduta laboratorial analítica com os principais testes realizados e sua interpretação Apresentamos uma discussão sobre as diversas síndromes tóxicas que exigem uma conduta clínica e manobras na tentativa de revertêlas em que destacamos as intoxicações de urgência intoxicações agudas com suas condutas clínicas e práticas executadas Apresentamos um conteúdo bem detalhado sobre toxicologia clínica voltado à monitorização terapêutica e suas práticas executadas na prevenção diagnóstico e tratamento das intoxicações envolvendo fármacos Encerramos com um detalhamento sobre os principais antídotos empregados no tratamento às principais intoxicações Na toxicologia social tivemos a oportunidade de compreender como diferentes substâncias químicas agem na neuroquímica de um organismo condicionando seu comportamento Também tivemos a oportunidade de verificar por que algumas substâncias químicas apresentam elevado potencial de reforço enquanto outras apresentam baixo potencial de reforço assim como as consequências dessas características a quem se expõe a essas substâncias químicas Foi possível ainda contextualizarmos os principais bioindicadores de exposição a algumas substâncias psicoativas e consequentemente caracterizar a matriz biológica de escolha para a identificação e quantificação dessas substâncias 332 Unidade II Exercícios Questão 1 Leia o texto a seguir A toxicologia forense é a aplicação da toxicologia com propósitos legais com o principal objetivo de detectar e quantificar as substâncias tóxicas eventualmente presentes em situações criminais Portanto toxicologia forense e legislação se sobrepõem A toxicologia forense ainda é uma área em desenvolvimento e está sempre incorporando as novas tecnologias disponíveis na área analítica Além do avanço tecnológico a toxicologia forense também se moderniza constantemente pois novos venenos são descobertos diariamente Observase que a princípio a confirmação de um crime baseavase apenas em suspeitas e indícios Diante da necessidade de desvendar corretamente um caso técnicas de identificação foram estudadas desenvolvidas e colocadas em prática Partiram de níveis simples de complexidade chegando nos dias atuais aos mais avançados níveis moleculares Com o dinamismo dessa ciência o aperfeiçoamento das técnicas tende a evoluir cada vez mais acompanhando a evolução tecnológica dos recursos disponíveis às pesquisas científicas Fonte AIELLO T B PEÇANHA M P Análise toxicológica forense da ficção científica à realidade Revista Eletrônica de Biologia REB v 4 n 3 2011 Disponível em httpsrevistaspucspbr rebarticleview983326gt0 Acesso em 27 set 2020 O texto mostra claramente que a toxicologia forense é uma área em constante atualização Analise as afirmativas a seguir elaboradas sobre esse tema I Os materiais disponíveis para análise forense são os mais diversos possíveis o que aumenta muito o grau de dificuldade de execução desse tipo de análise As matrizes biológicas utilizadas na caracterização da exposição humana em testes in vivo são urina plasma sangue saliva e cabelo Também podem ser usadas matrizes alternativas como suor unha mecônio tecidos e cabelos de recémnascidos II As matrizes biológicas normalmente utilizadas na caracterização da exposição humana em análises post mortem são sangue total aorta cavidade cardíaca e femoral humor vítreo e vísceras como fígado rins e cérebro III As principais técnicas de análise toxicológica aplicáveis a esse contexto incluem métodos clássicos não instrumentais como os testes colorimétricos e métodos mais sofisticados como os imunoensaios testes imonulógicos e a cromatografia cromatografia em camada delgada CCD cromatografia gasosa CG e cromatografia líquida de alta eficiência HPLC ou CLAE 333 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Assinale a alternativa correta A Apenas a afirmativa I é correta B Apenas a afirmativa II é correta C Apenas as afirmativas I e III são corretas D Todas as afirmativas são corretas E Nenhuma afirmativa é correta Resposta correta alternativa D Análise das afirmativas I Afirmativa correta Justificativa devemos ter atenção para o fato de que se trata de um material in vivo o que faz com que algumas matrizes ainda estejam disponíveis ou possam ser facilmente coletadas sendo as principais a urina o plasma o sangue a saliva e o cabelo II Afirmativa correta Justificativa devemos ter atenção para o fato de que se trata de uma análise post mortem ou seja feita a partir de um cadáver e tal situação apresenta algumas limitações Por isso as principais matrizes a serem coletadas são o sangue total aorta cavidade cardíaca e femoral o humor vítreo e as vísceras fígado rins e cérebro III Afirmativa correta Justificativa para a execução das análises toxicológicas é fundamental que o laboratório ofereça métodos analíticos simples e inequívocos e isso pode variar de acordo com a disponibilidade de recursos Há métodos que usam procedimentos manuais e outros que mecanizam o processo De qualquer forma há a requisição de técnicas de fácil execução e com respostas rápidas como os testes de triagem e de técnicas mais específicas baseadas em um princípio de detecção diferente e que concretizam uma etapa confirmatória Para que o resultado da análise seja considerado positivo o resultado da triagem e da confirmação devem ser positivos Cabe ao toxicologista forense escolher qual técnica é mais apropriada para a análise baseandose em critérios como aplicabilidade sensibilidade seletividade precisão e exatidão da técnica além da disponibilidade e do custo da análise Todos os métodos apresentados na afirmativa são válidos 334 Unidade II Questão 2 Leia o texto a seguir O consumo de drogas segue aumentando no Brasil tornandose maior a preocupação da área de segurança pública Nesse contexto a toxicologia forense utiliza cada vez mais as amostras não convencionais como o cabelo que apresenta vantagens como longa janela de detecção e viabilidade de coleta em cadáveres com estágio avançado de decomposição Assim este estudo propõe desenvolvimento validação e aplicação de uma metodologia para quantificação de benzoilecgonina em amostras de CB empregando a cromatografia líquida de alta eficiência CLAE com detector de arranjo de diodos DAD Fonte CRUZ A C H D C Quantificação de cocaína e seu produto de biotransformação benzoilecgonina em amostras de cabelo desenvolvimento validação e aplicação de método Dissertação Mestrado Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Ciências Biológicas Programa de PósGraduação em Farmacologia Florianópolis 2017 Disponível em httpsrepositorioufscbr handle123456789189745 Acesso em 27 set 2020 Com base nas informações apresentadas e nos seus conhecimentos analise as afirmativas I A droga em questão é a cocaína que apresenta marcante efeito depressor do sistema nervoso central e é quase toda eliminada em sua forma original inalterada pela urina cabendo à benzoilecgonina acumularse no cabelo II A droga em questão é uma anfetamina de uso comum por profissionais que precisam ficar acordados durante muito tempo por exemplo caminhoneiros e vigilantes o que faz dela um potente estimulante do sistema nervoso central III A droga em questão é uma potente depressora do sistema nervoso central e a intoxicação por ela tem como possíveis efeitos taquicardia aumento da pressão arterial agitação alucinações e agressividade Assinale a alternativa correta A Apenas a afirmativa I é correta B Apenas a afirmativa II é correta C Apenas as afirmativas I e III são corretas D Todas as afirmativas são corretas E Nenhuma afirmativa é correta Resposta correta alternativa E 335 TOXICOLOGIA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS Análise das afirmativas I Afirmativa incorreta Justificativa a droga em questão é a cocaína mas ao contrário do que se afirma ela não é depressora e sim estimuladora do SNC Além disso apenas uma pequena parte cerca de 10 é eliminada na forma original inalterada pela urina II Afirmativa incorreta Justificativa o erro está em considerar a droga em questão como a anfetamina É possível identificála como cocaína por meio de seu metabólito comum a benzoilecgonina conforme mencionado no enunciado III Afirmativa incorreta Justificativa os efeitos da intoxicação por cocaína estão corretos mas a afirmativa peca ao considerar que essa droga seja depressora do SNC