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Direito Processual Civil

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O NEOPRIVATISMO NO PROCESSO CIVIL JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA 1. Ao longo dos últimos anos, reformas processuais em vários países têm tratado de reforçar os poderes do juiz na direção do feito e na atividade de instrução. A ideia subjacente a essas reformas, ocioso ressaltar, é a de que o processo deve chegar a um resultado justo, de preferência com dispêndio mínimo de tempo e energias. Ora, o que normalmente quer cada uma das partes é sair vitoriosa, tenha ou não razão: pouco lhe importa, em regra, que se mostre justo o resultado, desde que lhe seja favorável; e, quando não tem razão, importa-lhe de ordinário retardar o desfecho do pleito. Há de existir alguém que atue imparcialmente no sentido de que o processo tenha marcha regular e venham aos autos todos os elementos necessários para que o julgamento corresponda, na medida do possível, à realidade. Esse alguém não pode ser outro senão o órgão judicial; por conseguinte, é mister provê-lo dos meios indispensáveis para que ele possa desincumbir-se cabalmente de sua função. Como é natural, têm variado com o tempo e com o lugar os efeitos práticos das aludidas reformas. É um dado da experiência que, infelizmente, não basta editar normas para alcançar o objetivo que as inspira. Numerosos fatores influem na transfusão dos textos legais para o mundo dos fatos: alguns contribuem para torná-la efetiva, ao passo que outros, ao contrário, a dificultam ou impedem. Será grande ingenuidade supor que, para assegurar o exercício eficaz dos poderes pelos juízes, basta que as leis lhos atribuam. Por outro lado, com frequência se reconhece que atribuir-lhes é condição necessária, embora não suficiente, para concretizar aquele propósito. Há, porém, um setor da doutrina ao qual desagrada profundamente a ideia mesma da concessão de muitos poderes ao órgão judicial. Enxerga-se nela uma exacerbação indevida do elemento publicístico do processo e uma intolerável manifestação de autoritarismo. Para os que assim pensam, as coisas andarão tanto melhor quanto mais forem deixadas aos cuidados dos próprios litigantes: nenhum juiz, afirma-se, pode saber mais do que os titulares dos interesses em conflito e o que convém fazer (ou não fazer) para resolvê-lo. O incremento dos poderes do órgão judicial, assevera-se, é típico de legislações autoritárias, emanadas de governos antidemocráticos e indiferentes às garantias dos jurisdicionados. De acordo com esse pensamento, um modelo “garantístico” do processo repele juízes que não se contenham no estrito âmbito da passividade e, por exemplo, se aventurem a buscar, por sua iniciativa, dados capazes de propiciar-lhes conhecimento mais completo dos fatos relevantes para a decisão. 2. Antes de mais nada, cumpre esclarecer um aspecto importante das relações entre regime político e ordenamento processual. Afigura-se óbvio que a disciplina legal do processo (e não só do processo) sofre a influência das características do regime político sob o qual é editada. Mas, à luz da experiência histórica, também deveria ser óbvio que constitui exagero de simplificação conceber essa relação à guisa de vínculo rígido, automático e inflexível, para considerar que, se determinada lei (processual ou qualquer outra) surge sob governo autoritário, essa contingência cronológica fatalmente lhe imprime o mesmo caráter e a torna incompatível com o respeito às garantias democráticas. A realidade é sempre algo mais complexa do que a imagem de que lhe propõem interpretações assim lineares, para não dizer simplórias. O direito brasileiro oferece exemplos sugestivos. Leis processuais insuspeitas de autoritarismo foram editadas ou preparadas sob governos militares: v.g., respectivamente, a de nº 4.717, de 29.6.1965, que regula a ação popular, e a de nº 7.347, de 24.7.1985, que disciplina a ação civil pública. Ambas são diplomas de corte manifestamente democrático, onde nada se encontra que fira, de leve sequer, as garantias das partes. Nem foi autoritário, no (mau) sentido político da palavra, o Código de Processo Civil de 1939, editado sob o Estado Novo. Fenômenos semelhantes ocorreram na Alemanha. Já se demonstrou quão equivocada é a suposição de que refletiriam a ideologia nacional-socialista todas as reformas introduzidas na ZPO após a subida dos nazistas ao poder. Uma delas, levada a cabo em 1933, cuidou, significativamente, de reforçar os poderes judiciais de esclarecimento e direção do processo; pois bem, as raízes dessa reforma mergulhavam em trabalhos preparatórios desenvolvidos sob a Constituição de Weimar, e a respectiva orientação permaneceu inalterada mesmo depois de 1945, o que evidencia a sua perfeita compatibilidade com a redemocratização do país. De outra parte, é oportuno registrar que a ZPO de 1877, de origem claramente liberal-individualista, após a divisão da Alemanha continuou em vigor por muitos anos, na socialista DDR, que só em 1975 viria a adotar código novo. O codice di procedura civile de 1940 tem sido alvo de críticas que o apontam como produto típico do fascismo. Melhores razões, todavia, parecem as invocadas pelos que lhe negam tal feição. Nem se afigura exato, aliás, entender que esse código haja pretendido intensificar em grau sensível o exercício de poderes pelo juiz, notadamente no que concerne à atividade instrutória: o art. 115, 1ª alínea (“Salvi i casi previsti dalla legge (...) il giudice deve porre a fondamento della decisione le prove proposte dalle parti o dal pubblico ministero”), decerto não soa como estímulo, na matéria, à iniciativa judicial ex officio. Last but not least: quanto ao Código austríaco, marco histórico da evolução para um processo civil social, se não se pode afirmar que haja nascido em berço democrático? ou, caso se prefira estouta expressão, politicamente liberal? tampouco se pode ignorar que resistiu à fragmentação do Império e sobrevive até hoje na Áustria democrática de nossos dias, onde se comemorou festivamente, há poucos anos, o seu centenário. 3. Convém pôr em evidência o equívoco fundamental da suposição de que governos autoritários costumem inclinar-se ao fortalecimento de juízes. Os poderes que eles se empenham em fortalecer são, geralmente, os do Executivo, não os do Judiciário. Veja-se o que sucedeu no Brasil, após a chamada revolução de 1964. Logo no Ato Institucional nº 1, de 9 de abril daquele ano, autorizando-se o “Comando Supremo da Revolução” e, em seguida, o Presidente da República a demitir ou dispensar, “mediante investigação sumária”, os titulares das garantias de vitaliciedade e estabilidade, cuidou-se de estatuir que o controle jurisdicional desses atos se limitaria “ao exame de formalidades extrínsecas, vedada a apreciação dos fatos que o motivaram, bem como da sua conveniência ou oportunidade” (art. 7º e § 4º). Mais radical foi o Ato Institucional nº 3, de 5.2.1966, que simplesmente excluiu da apreciação judicial os atos praticados com fundamento nele próprio e nos respectivos atos complementares (art. 6º). Aos juízes, portanto, os governos militares não concederam poderes novos muito ao contrário. Para interessar a regimes autoritários o exercício, por juízes, de poderes extensos, é preciso, em regra, que o Judiciário esteja inteiramente privado de autonomia e reduzido à mera posição de instrumento do Executivo. Não precisamos cogitar aqui desse caso extremo, do qual terá havido exemplos históricos, inclusive no mundo ocidental, mas que hoje será exceção raríssima. 4. O próximo passo de nosso itinerário consiste em pôr à prova a afirmação de que é peculiar a regimes autoritários, imbuídos de desprezo pelas garantias dos jurisdicionados, a concessão ao juiz de poderes instrutórios exercitáveis de ofício. Vamos aplicar o teste a cinco casos: o suíço, o francês, o inglês, o alemão e o brasileiro. A lei federal suíça que regula o processo civil federal, de 4.12.1947, dispõe no art. 37: “Le juge n’est pas lié par les offres de preuve des parties; il ne retient que les preuves nécessaires. Il peut ordonner des preuves que les parties n'ont pas offertes”. A ninguém de juízo são, acudirá pensar que, a Suíça vivia em 1947 sob regime despótico, ou que a autorização dada ao juiz para ordenar provas ex officio fosse eco de uma política autoritária. A imagem tradicional do processo civil francês era fortemente marcada pelo domínio das partes sobre a iniciativa na instrução probatória. Em 1975, contudo, adotou-se novo code de procédure civile, cujo caráter inovador, no particular, se patenteia à vista dos arts. 16: (“Le juge a le pouvoir d’ordonner d’office toutes les mesures d’instruction légalement admissibles”) e 143 (“Les faits dont dépend la solution du litige peuvent, à la demande des parties ou d'office, être l’objet de toute mesure d’instruction légalement admissible”). Consoante frisa doutrina, assim se erigiu em princípio geral um poder outrora limitado a casos excepcionais. Já não cabe falar, como noutros tempos, do “papel passivo” do órgão judicial nesse campo. Suporá alguém que a alteração de rumo haja refletido a opção da França por um regime político autoritário? Evolução ainda mais impressionante foi a que se produziu na Inglaterra, berço do chamado adversary system, que tradicionalmente confiava às partes, em termos exclusivos, a atividade probatória. Há algum tempo vinha-se notando, naquele país, sinais de mudança, nesse e noutros terrenos. Ela culminou na adoção, em 1998, das Civil Procedure Rules, que, se não chegaram a conferir ao juiz, expressis verbis, poderes instrutórios exercitáveis de ofício, sem dúvida lhe outorgaram amplas faculdades de controle da atividade probatória? por exemplo: a de emitir instruções no sentido de especificar as questões para as quais deseja prova, a natureza da prova de que carece e a maneira por que ela deve ser apresentada em juízo (rule 32.1); a de ordenar à parte, a qualquer momento, que esclareça matéria discutida no processo, ou ministre informação adicional a respeito (rule 18.1 (10)); a de determinar que a perícia seja feita por um único expert, bem como de dar-lhe instruções sobre inspeção, exame ou experiência que tenha de realizar (rules 35.7 e 35.8 (3) (b)); a de nomear assessores para assistir o órgão judicial em assuntos de sua especialidade, inclusive preparando relatórios sobre questões discutidas e aconselhando. o tribunal no trial (rule 35.15). Ampliou-se, por outro lado, o controle do juiz sobre a disclosure (nova denominação dada à discovery), isto é, sobre o mecanismo pelo qual cada uma das partes pode exigir do adversário elementos probatórios (principalmente documentos) a que de outro modo não teria acesso. Generalizando o discurso, é possível resumir o sentido da transformação do direito processual inglês nesta fórmula: deslocamento, das partes para o juiz, do comando do processo. Correspondará porventura tal fenômeno a algum surto autoritário no regime político britânico? Também a reforma da ZPO alemã, de 2001, ampliou a atuação do órgão judicial na esfera probatória. Antes, podia o juiz ordenar à parte a apresentação de documentos em seu poder, aos quais ela se houvesse referido. Agora, semelhante possibilidade vê-se alargada em duplo sentido: de um lado, a ordem de apresentação pode dizer respeito aos documentos que o litigante adverso se refira; de outro, ela pode dirigir-se igualmente a terceiros, desde que isso lhes seja exigível e não ocorra qualquer dos casos de recusa legítima a depor como testemunha (§ 142, 1ª e 2ª alíneas). Não consta que a Alemanha vivesse, na época da reforma, sob regime político autoritário. Enfim, no Brasil, a Lei n° 9.099, de 26.9.1995, estatui no art. 5°: “o juiz dirigirá o processo com liberdade para determinar as provas a serem produzidas, para apreciá-las e para dar especial valor às regras de experiência comum ou técnica”. Observe-se que o art. 130 do Código de Processo Civil já autorizava o órgão judicial, “de ofício ou a requerimento da parte”, a ordenar “as provas necessárias à instrução do processo”. O Código, porém, foi editado sob um dos governos militares, e poderia incorrer por isso na suspeita de autoritarismo. Em 1995, vivia o país em pleno regime democrático, politicamente liberal. É verdade que a História aponta exemplos de Estados autoritários cujas legislações processuais investiam o juiz de poderes amplos, na disciplina da prova e alhures. Isso demonstra somente que nenhum regime político, autoritário ou não, tem exclusividade absoluta nesse âmbito. O reforço dos poderes do órgão judicial é suscetível de conviver com estruturas políticas de cores variáveis, situadas em posições diferentes, quiçá opostas, no espectro político: arbitrário extrair daquele dado ilações categóricas sobre a índole do regime, como se um fosse consequência direta e inexorável do outro. Recorde-se aqui o que ficou dito acima (n° 2) sobre a dose de fluidez que caracteriza a relação entre regime político e ordenamento processual; confirmação inequívoca, na matéria de que estamos cuidando, ministra a experiência histórica. Só fechando os olhos a ela será possível sustentar que poderes maiores para os juízes constituem sinal certo de autoritarismo político. 5. É hora de passar a outra ordem de argumentos, ao nosso ver mais sérios. Um deles respeita à definição precisa da função (rectius: das funções) que o órgão judicial é chamado a exercer no processo. Desnecessário sublinhar que lhe compete, acima de tudo, julgar o litígio submetido a seu exame. Igualmente óbvio é que, para julgar, lida o juiz com duas espécies de materiais: os fatos e o direito. Em última análise, reduzido o fenômeno à expressão mais simples, o que em substância faz o julgador é aplicar a fatos as normas jurídicas contidas no ordenamento (jurisdição de legalidade) ou, quando e na medida em que lho permita a lei, formuladas por ele próprio (jurisdição de equidade). Deixando de lado este segundo caso, que é excepcional, não há quem não reconheça ao juiz, ademais, a possibilidade de determinar as normas aplicáveis à causa, independentemente de qualquer colaboração das partes, e até em desacordo com as indicações que estas porventura façam (iura novit curia). Resta verificar como se põe o juiz diante dos fatos. Na tradição jurídica ocidental, fica reservado à parte que toma a iniciativa da instauração do processo o encargo de especificar o(s) fato(s) a seu ver capaz(es) de fundamentar o pedido para usar expressão clássica, a causa petendi. Ao órgão judicial incumbe averiguar se se deve ou não acolher o pedido à luz desse(s) fato(s). Não lhe é lícito acolhê-lo invocando outro(s) fato(s), ainda que porventura esteja convencido da respectiva ocorrência (e da respectiva suficiência para produzir o resultado jurídico pretendido pelo autor). Quanto a fatos suscetíveis de justificar a rejeição do pedido, há os que podem (e devem) ser levados em conta ex officio (v.g., no direito brasileiro, a decadência prevista em lei: Código Civil, art. 210) e os que somente podem ser considerados mediante alegação do interessado (exceções materiais ou substanciais; v.g., sempre no direito brasileiro, a prescrição, salvo quando aproveite a pessoa absolutamente incapaz: Código Civil, art. 194). Resta saber como agirá o juiz para certificar-se da ocorrência (ou não ocorrência) do fato invocado ou conhecível de ofício. Postas de lado hipóteses especiais, que não interessam aqui (por exemplo: a da notoriedade), constitui princípio assente que ao órgão judicial não é lícito valer-se do conhecimento privado que porventura tenha do fato. De maneira alguma poderia, v.g., fundamentar sentença condenatória dizendo que assistira da janela de casa ao acidente de trânsito e sabia, por isso, que o réu o causara por sua imprudência. Os fatos precisam estar provados nos autos. Pois bem, não há dúvida de que, no comum dos casos, a prova é produzida pela parte a quem o fato aproveita. Bem se compreende que as partes que se envolveram pessoalmente nos fatos, supondo-se que tenham documentos a eles relativos, saibam quem está em condições de testemunhá-los, e assim por diante. Falta enfrentar esta questão: quid iuris, se não vem aos autos a prova de algum fato relevante? Um modo de lidar com tal situação é lançar as consequências desfavoráveis da carência probatória sobre o litigante a quem aproveitaria o fato não provado. Nessa perspectiva, as leis costumam estabelecer regras sobre o chamado onus probandi: v.g., no Código de Processo Civil brasileiro, o art. 333, cujo caput distribui o ônus entre o autor, para o fato constitutivo do alegado direito, e o réu, para os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos dele. É essa a única possível solução? Não poderá o juiz, por sua própria iniciativa, ordenar a realização de prova destinada a suprir a lacuna? Sempre nos pareceu, e parece a muitos outros, que a semelhante pergunta se há de responder afirmativamente. Julgar, segundo as regras de distribuição do ônus, não é atitude que tranquilize de todo o juiz consciente de sua responsabilidade: ele atira no escuro; pode acertar o alvo, mas pode igualmente errar, e sua sentença, injusta, produzirá na vida dos litigantes efeitos diversos dos queridos pelo ordenamento, quando não diametralmente opostos. Não será preferível que ele proceda fazer jorrar alguma luz sobre os desvãos escuros da causa? e, se possível, baseie o julgamento numa ciência mais exata e completa do que realmente aconteceu? 6. Em sentido contrário soem brandir-se dois argumentos principais. Um deles é o de que, ao agir assim, estaria o juiz invadindo o campo de atuação reservado às partes. Não se afigura procedente a objeção. Se, conforme dito acima, para julgar precisa o órgão judicial utilizar duas espécies de materiais: o direito e os fatos, então a apuração destes, nos lindes oportunamente indicados, entra por força na zona de competência do órgão judicial, como pressuposto do desempenho cabal de sua missão. Quem quer o fim, quer os meios. Se a lei quer que o juiz julgue, não pode deixar de querer que ele julgue, tanto quanto possível, bem informado; logo, não deve impedi-lo de informar-se, pelos meios que tenha à mão. Quando o juiz determina a realização de prova para melhor esclarecimentos dos fatos relevantes, não está, em absoluto, usurpando função da parte; não está agindo no lugar dela, fazendo algo que a ela, e só a ela, incumbia fazer. Sua iniciativa não é, a rigor, um sucedâneo da iniciativa da parte: é qualquer coisa de inerente à sua missão de julgador. Ele não atua como substituto da parte, atua como juiz, como juiz empenhado em julgar bem. De outra banda, se levássemos às últimas consequências a separação entre direito e fatos, para excluir toda e qualquer participação do órgão judicial na colheita de dados relativos a estes, por igual razão teríamos de excluir toda e qualquer participação dos litigantes no que concerne àquele. Seria o caso de proibir as partes de invocar disposições legais e de expor argumentações jurídicas... Se o 'bloqueio' vale para um lado, há de valer também para o outro! O segundo argumento é o de que, ao determinar de ofício a realização de prova, o órgão judicial abandona a posição, que lhe é característica, de terceiro imparcial, toma partido por um dos litigantes por aquele a quem a prova irá favorecer. Mas, primo, o juiz não é adivinho; não pode saber de antemão a qual dos litigantes será favorável o êxito da diligência probatória. Pense-se, por exemplo, numa perícia: se a ordena ex officio o órgão judicial, tanto pode acontecer que o laudo pericial favoreça o autor quanto pode acontecer que favoreça o réu. Conta-se, naturalmente, que a perícia, sob pena de frustrar-se, acabe por favorecer alguém, na medida em que esclareça o ponto obscuro; quem será esse alguém, no entanto, só depois de concluída a perícia é que se vai saber. Há mais. A supor-se que o juiz se torna parcial por ordenar ex officio a realização de prova, assim beneficiando à parte a que ela resultare favorável, ter-se-á logicamente de entender que também a omissão em determinar a prova compromete a imparcialidade do juiz. É evidente, com efeito, que a falta da prova beneficiará à parte a quem ela resultaria desfavorável, caso se realizasse. Estaria o juiz, então, condenado em qualquer hipótese à perda de parcialidade? O absurdo da consequência põe a nu a falsidade da premissa. O resultado da prova determinada de ofício, quando não se frustra, tem um efeito essencial: dar acesso a mais substanciosa porção da verdade. Não é ganho desprezível, desde que se parta da ideia de que interessa tentar descobri-la. Já se sabe, e talvez seja ocioso repetir, a esta altura, que é sempre imperfeito e incompleto o conhecimento humano da verdade. Mas os ordenamentos jurídicos nem por isso a afastam de sua cogitação, nem renunciam a utilizar quanto dela seja possível aprender; se do contrário, nem sequer cuidariam de disciplinar as provas, e adotariam com certeza maneiras mais simples e rápidas de decidir litígios, v.g. o sorteio... 7. Alega-se ainda que a atribuição de poderes instrutórios ao órgão judicial é incompatível com a preservação das garantias processuais das partes. O argumento teria alguma consistência se o juiz, ao exercer tais poderes, comprimisse indevidamente o exercício dos direitos conferidos àquelas pela lei. Pode ser que em algum caso específico se incorra nesse grave erro; mas é claro que se tratará de um desvio, não de fenômeno inerente à existência dos aludidos poderes: acidente, nunca substância. Determinar ex officio que se ouça o depoimento de alguém não significa necessariamente cercear o direito da parte de nomear e fazer ouvir suas teste- munhas. Não fica tolhida a parte em seus direitos referentes à prova pericial pelo mero fato de ordenar o órgão judicial, motu proprio, a realização de perícia. Raciocinam alguns como se cada gesto do juiz houvesse de erguer obstáculo à atuação da parte: se ele se move, impede-a com isso de mover-se. O raciocínio é evidentemente ilógico. O exercício de poderes instrutórios pelo órgão judicial perfeitamente se compadece com a preservação das garantias processuais das partes. Pressupondo-se que, como cumpre, elas sejam devidamente cientificadas das iniciativas oficiais, e que se lhes abra a possibilidade de participar das diligências, de impugná-las, caso lhes pareçam descabidas, e de manifestar-se sobre os respectivos resultados, não se descobre que garantia terá sido desrespeitada. Dir-se-á que os litigantes hão de conservar o poder de dispor de seus direitos. Ora, ninguém é forçado a invocar um direito em juízo, nem, por conseguinte, a alegar o fato de que ele se originaria. Mas aí cessa o poder de disposição. Se a parte alega o fato, é porque quer que dele se extraia esta ou aquela consequência jurídica. Impedir o juiz de fazer o possível, observados sempre os limites do pedido e da causa de pedir, para certificar-se de que o fato alegado realmente ocorreu (ou não ocorreu), será atitude manifestamente contraditória. Caso lhe resulte inconveniente, por tal ou qual motivo, a averiguação, têm ainda o litigante, no âmbito das relações jurídicas disponíveis, a opção de renunciar ao direito postulado, e com isso barrar o caminho à cognição judicial. O que de jeito algum se afigura razoável é pretender a tutela jurisdicional e, ao mesmo tempo, objetar a que o juiz se muna dos elementos necessários para verificar se deve ou não prestá-la nos termos requeridos. 8. Continua o mantra todavia: 'as partes, e não o órgão judicial, é que sabem o que melhor lhes convém'. A esse argumento já se deu resposta em parte, no item anterior; mas há mais que dizer a esse respeito. Ponha-se de lado, aqui, o juiz, que em todo caso deve ter interesse em que seja justo o resultado do pleito, já que fazer justiça é uma das funções principais do Estado, do qual ele é órgão. E considere-se que: a) em hipóteses cada vez mais numerosas, ficam sujeitas aos efeitos do julgamento e à própria autoridade da coisa julgada pessoas estranhas ao feito, não raro vastos setores da população; e o que se dá, v.g., no Brasil, nos chamados processos coletivos (exemplo: ação civil pública? Lei nº 7.347, art. 16); b) em certos casos, isso acontece com a totalidade dos jurisdicionados, como nas ações diretas de declaração da constitucionalidade (ou inconstitucionalidade) de lei ou de outro ato normativo (Carta da República, art. 102, § 2º; Lei nº 9.868, de 10.11.1999, art. 28, parágrafo único; c) com bastante frequência, são atingidos reflexamente pelos efeitos da sentença terceiros titulares de relações jurídicas conexas com a deduzida em juízo, os quais, por isso mesmo, se vêem autorizados (mas não obrigados) a ingressar no processo, na qualidade de assistentes da parte em cuja vitória têm interesse (Código de Processo Civil, arts. 50 e segs.), e bem assim a recorrer das decisões a ela desfavoráveis (art. 499); d) visto que sucessivas decisões no mesmo sentido vão formando um corpo de jurisprudência capaz de influir no julgamento de futuros casos análogos, o resultado do processo é capaz de afetar todos quantos se encontrem em situação semelhante à apreciada pelo juiz; o fenômeno alcança intensidade máxima, é óbvio, nos sistemas jurídicos que atribuem eficácia vinculativa a precedentes judiciais, mas não deixa de manifestar-se nos outros, conforme atesta, por exemplo, a proteção dada no Brasil à concubina, por criação jurisprudencial, muito antes que o legislador consagrasse a figura da "união estável"; e) mesmo fora desse âmbito, o fato de um julgamento adotar esta ou aquela tese jurídica pode produzir consequências relevantes para o ordenamento processual, na medida em que dá margem, v.g., ao cabimento de recursos circunscritos a quaestiones iuris e a incidentes como o da uniformização da jurisprudência (Código de Processo Civil, arts. 476 e segs., 555, § 1º). Tudo isso justifica amplamente a convicção de que a simples dedução em juízo basta para cobrir de nova tonalidade qualquer conflito de interesses entre pessoas, seja qual for a natureza da relação jurídica que as liga. Litígio submetido ao exame e decisão do juiz deixa de ser, ipso facto, litígio cuja repercussão fique restrita ao âmbito puramente privado.12 E o que explica que, salvo casos excepcionais, o julgamento — ao contrário do que sucede, por exemplo, na arbitragem — haja de realizar-se publicamente (Constituição da República, art. 93, n° IX; Código de Processo Civil, art.155). É o que explica, também, que a imprensa divulgue decisões dos tribunais, que revistas especializadas lhes reproduzam os textos, que a doutrina as comente e discuta, que advogados, noutros pleitos, as invoquem — e assim por diante. Não surpreende, a essa luz, ouvir de vozes autorizadas que hoje o papel primacial do processo civil se está deslocando da simples solução de litígios para a geração de benefícios sociais — numerosos e variados, inclusive o desenvolvimento do direito per meio de decisões judiciais.13 9. Até agora, aludimos sempre a “partes”, conformando-os a um generalizado modo de dizer. É hora de ressalvar que esse tipo de discurso raia muitas vezes pelo irrealismo e pode resolver-se em perversa hipocrisia. Com efeito, na maioria dos ordenamentos processuais contemporâneos, as partes são, em regra, representadas em juízo por advogados. Quase todas as proposições em que a parte figura como sujeito referem-se, na verdade, a ações ou omissões do advogado. Sem dúvida, no rigor da técnica, este atua em nome da parte, e seu comportamento é havido, na maioria dos casos, como comportamento a ela imputável. Por trás desse biombo técnico, entretanto, abre-se profundo abismo. O advogado pratica (ou deixa de praticar) no processo boa quantidade de atos de que a parte por ele representada nem sequer tomou conhecimento pessoal; e, ainda quando o tome, nem sempre estará em condições de valorizá-los de maneira adequada. Erros profissionais são capazes de repercutir com grande intensidade na sorte do pleito; vão influir na vida do litigante, apesar da nenhuma participação direta deste no episódio respectivo. Até ações impostas pela chamada “litigância de má-fé” gravam a parte, não o advogado, embora seja este, as mais das vezes, o único verdadeiro responsável, como ocorre — para nos cingirmos a um exemplo — no oferecimento de embargos de declaração protelatórios (Código de Processo Civil, art. 538, parágrafo único). Ora, se a atuação dos advogados é, por assim dizer, decisiva para o desfecho do pleito, não há de desprezar a possibilidade de que a diferença qualitativa entre o serviço prestado por um deles e o prestado por outro redunde numa distorção de perspectiva que tem muito pouco que ver com a situação real das partes no que tange à matéria litigiosa. O litigante munido de maiores recursos, apto a contratar melhor advogado, goza desde logo de vantagem que desequilibra os pratos da famosa balança da Justiça. Nessas condições, sistema que confie plenamente no confronto de lutadores, ao jeito de competição desportiva, com suposto fundamento na idéia de que “as partes” sabem cuidar melhor que ninguém dos próprios interesses, reduzido o juiz ao papel de mero “árbitro” competente apenas para assegurar a observância de certas “regras do jogo”. É sistema que anui de bom grado em sacrificar as expectativas de equanimidade no altar de uma quimera.14 Claro está que semelhante risco só impressionará quem atribua algum valor às noções de verdade e de justiça como ingredientes necessários da composição judicial dos litígios. Para aqueles a quem seja indiferente que se colha ou não a porção de verdade acessível ao espírito humano, e portanto que se faça ou não a justiça possível no plano terreno, tudo quanto ficou dito soará qual mero flatus vocis. Mas, se assim for, que necessidade haverá de movimentar — com o inevitável dispêndio de tempo, energias e recursos financeiros — a máquina judiciária? Será preferível confiar a sorte do pleito a algo mais simples, barato e rápido, como uma rinha de galos... 10. É duvidosa a designação que melhor convém ao pensamento criticado neste trabalho. Visto que seus representantes aludem, com aspas manifestamente depreciativas, a processo civil “social”, talvez se pudesse cogitar de designá-la, com análogas aspas, como processo civil “anti-social”. Mas não desejamos ferir, com tão antipático rótulo, as suscetibilidades de juristas ilustres, que nos merecem todo o respeito. Outra opção, menos áspera, pode basear-se na pecha, que se lança, de exacerbação do elemento publicístico no processo civil. Pois bem: a orientação contrária não cairá mal, nessa perspectiva, a denominação de privatismo. Sejamos, porém, mais exatos: já que semelhante orientação nos remete à mentalidade dominante em tempos idos, e infelizmente, ao que tudo indica, requeriduda da sepultura em que parecia jazer, numa época em que o processo civil era tido e havido como “coisa das partes” (Sache der Parteien, segundo a conhecida expressão alemã), tomamos a liberdade de chamar-lhe neoprivatismo, na esperança de que isso não desagrade aos seus ardorosos propagandistas. NOTAS 1. De tal corrente doutrinária são representantes autorizados e notórios CIPRIANI, na Itália, e MONTERO AROCA, na Espanha. Para poupar ao leitor uma tediosa multiplicação de citações, a cada passo do presente escrito, indicamos aqui, de ambos os autores, alguns dos principais trabalhos dedicados ao assunto: do italiano, Nel centenario del Regolamento di Kleln (Il processo civile tra libertà e autorità), in Ideologie e modelli del processo civile, Nápoles, 1997, págs. 27 e segs.; Il processo civile italiano tra efficienza e garanzie, in Riv. di dir. e proc. civ., vol. LVI (2002), págs. 1.243 e segs.; Il processo civile tra vecchie ideologie e nuovi slogan, in Riv. dir. proc., vol. LVIII (2003), págs. 455 e segs.; do espanhol, La Ley de Enjuiciamiento Civil española y la oralidad, conferência pronunciada nas XVII Jornadas Ibero-americanas de Direito Processual, no vol. de relatorios y ponencias, San José, 2000, no, págs. 285 e segs.; I principi politici del nuovo processo civile spagnolo, trad. ital. de Vittorio Bratelli e Nicoletta Magrino, Nápoles, 2002; El proceso civil llamado “social” como instrumento de “justicia” autoritária, in Rev. Iberoamericana de Der. Proc., n° 6, págs. 15 e segs. Tentaremos discutir os argumentos mais importantes expostos e reiterados nesses trabalhos, sem especificar, por desnecessário, os lances em que aparecem. A fim de prevenir equívocos, deixamos claro que se trata de dois processualistas ilustres, em cuja produção científica há muito que admirar e louvar, e cuja amizade pessoal — superior a qualquer divergência — extremamente nos honra. 2. Cf. POPP, Die nazionalsozialistische Sicht einiger Institute des Zivilprozess-und Gerichtsverfassungsrechts, Frankfurt-am-Main? Berna? Nova lorque, 1986, pág. 7. 3. POPP, ob.cit., pág. 11; BöHM, Processo civile e ideologia nello stato na- zionalsocialista, trad. ital. de Marinelli, in Riv. trim. di dir. e proc. civ., vol. LVIII (2004), pág. 639. 4. Assim, v.g., um escritor absolutamente insuspeito de qualquer simpatia pelo ideário fascista: TARUFFO, La giustizia civile in Italia dal ‘700 a oggi, Bolonha, 1980, págs. 255, 281 e segs., espec. 286/8. A exemplo desse autor, não nos deixamos impressionar por determinadas passagens da Relazione do Ministro Grandi, que não passam de "clausole di stile apposte per esigenze politiche contingenti" (pág. 287). 5. Como já se comemorara, em meados do século XX, o seu cinquentenário: vide o vol. coletivo Festschrift zur Funfzigjahrfeier der Ósterreichischen Zivilprozeß- ordnung, Viena, 1948. A contribuição de LEONHARD, sob o título Zur Geschichte der österreichischen Justizreform vom 1898, terminava justamente por lembrar que o código austriaco subsistiu a duas guerras mundiais e a convulsões de inimaginável extensão na vida política e econômica, mas seus fundamentos e princípios deter- nantes continuaram a representar uma realidade incontrov versa na vida jurídica aus- ca. (No original: “Zwei Weltkriege hat Österreichs Zivilprozeß uberdauert. Erschüt- terungen des politischen und wirtschaftlichen Lebens von unvorstellbarem Ausmasse sind an ihm vorübergagaen und die Grundgedanken und neen wesenhaften Inhalte des Reformwerkes auch heute noch unbestritten und reale Wirklichkeit unseres Rechtslebens”. 6. CADIET, Droit judiciaire privé, 2a ed., Paris, 1998, pág. 483. 7. Assim falava MOREL, Traité élémentaire de procédure civile, Paris, 1932, pág. 463. 8. Sobre a mudança de rota do processo civil inglês, permitimo-nos remeter o leitor a nossos artigos Uma novidade: o código de processo civil inglês, in Temas de Direito Processual, Sé tima Série, S. Paulo, 2001, págs. 179 e segs., e A revolução processual inglesa, in Rev. Síntese de Direito Civil e Processo Civil, vol. 31, págs. e segs., onde tratamos do assunto com algum desenvolvimento. 9. Expressivos os títulos de dois artigos um anterior, outro posterior ao advento das Civil Procedure Rules? de eminentes processualistas ingleses: ZUCKERMAN, English Civil Procedure? The Shift Away from Party Control and Orality, in Zeits- chrift für Zivilprozess International, vol. 1 (1996), págs. 65 e segs.; ANDREWS, A New Civil Procedural Code for England: Party-Control “Going, Going, Gone”, in Civil Justice Quarterly, vol. 19 (2000), págs. 19 e segs. Especificamente quanto à matéria probatória, vide, na literatura mais recente, JOLOWICZ, Civil Procedure in the Common and Civil Law, no vol. col. Law, Legal Culture and Politics in the Twenty First Century, ed. Guenther Doeker-Mach e Klaus A. Ziegert, Stuttgart, 2004, pág. 77: “under the new rules of civil procedure in England, the parties have lost to the judge much of their power to control the evidence brought before the court”. 10. Nos itens que se seguem retomamos (e, em parte, reproduzimos) argumen- tação já exposta em vários trabalhos. Pela mesma razão indicada em a nota 1, supra, vamos limitar-nos a enumerar os principais, omitindo citações particularesadas que tornariam ainda mais pesada a leitura: A função social do processo civil e o papel do juiz e das partes na direção e na instrução do processo e Breves reflexiones sobre la iniciativa oficial en materia de prueba, ambos in Temas de Dir. Proc., Terceira Série, S. Paulo, 1984, págs. 43 e segs. e 79 e segs., respectivamente: Os poderes do juiz na direção e na instrução do processo, in Temas, Quarta Série, S. Paulo, 1989, págs. 45 e segs.; O processo, as partes e a sociedade e Reformas processuais e poderes do juiz, ambos in Temas, Oitava Série, S. Paulo, 2004, págs. 29 e segs. e 53 e segs., respectivamente. 11. Conforme averba ZUCKERMAN, Justice in Crisis: Comparative Dimen- sions of Civil Procedure, no vol. col. Civil Justice in Crisis, ed. Zuckerman, Oxford, 1999, pág. 5, “at thefoundation of procedure lies the objective of getting at the truth. This objective lies behind the entire procedural organization”. Nossa impotência para captar a verdade toda não desmerece a busca da parte da verdade que está ao nosso alcance, da mesma sorte que nossa impossibilidade de vencer por inteiro a escuridão da noite não torna menos importante o ato de acender uma lâmpada para iluminar o texto que desejamos ler. 12. Vejam-se estes dois passos de BERNHARDT, Die Aufklärung des Sachver- halts im Zivilprozess, in Beiträge zum Zivilprozessrecht (Festgabe zum siebzigsten Geburtstag von Leo Rosenberg), Munique — Berlim, 1949, pág. 306. Observa o autor a propósito: “eine Streitsache, die der staatlichen Gerichtsbarkeit unterbreitet ist, keine Privatsache mehr ist (uma lide submetida à Justiça estatal deixa de ser matéria puramente privada”); e “Durch die Anrufung des Gerichts ist die Streitsache aus dem privaten Bereich gezogen und zu einer öffentlichen Angelegenheit geworden (por força do recurso ao juiz, a lide afastou-se do terreno privado e converteu-se em assunto publico”). 13. Assim, recentissimamente, JOLOWICZ, art. cit., pág. 76. No original: “its [do processo civil] primary role has become the provision of the benefits to society that come from the operation of an effective system of civil litigation. These benefits are many and various — not only but including the development of the law through judicial decisions”. 14. Vale a pena transcrever estas palavras de DAMAKA, Evidence Law Adrift, New Haven? Londres, 1997, pág. 101: “Finally, it is important to keep in mind that a competitively organized fact-finding enterprise requires a rough equality of the two sides in dispute in order to be fair. Two one-sided accounts can be expected somehow to cancel out and expose the truth only on condition that the contestants can disburse roughly equal resources in readying their cases for trial. Absent this condition, the resultant force of the two partisan vectors, so to speak, is likely to deviate from the correct view Io! reality. A weak case brought by a resourceful litigant can appear unduly strong”.