·

Psicologia ·

Psicanálise

Send your question to AI and receive an answer instantly

Ask Question

Preview text

CENTRO UNIVERSITÁRIO DA FUNDAÇÃO HERMÍNIO OMETTO CURSO DE PSICOLOGIA ISABELLA ESMERIO DE SOUZA COMPREENSÃO PSICANALÍTICA DA HISTERIA SUA MANIFESTAÇÃO NOS DIAS ATUAIS ARARASSP 2023 ISABELLA ESMERIO DE SOUZA COMPREENSÃO PSICANALÍTICA DA HISTERIA SUA MANIFESTAÇÃO NOS DIAS ATUAIS Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à banca examinadora do curso de Psicologia do Centro Universitário da Fundação Hermínio Ometto como parte integrante da avaliação na disciplina de Orientação de Trabalho de Conclusão de Curso requisito para obtenção do título de Psicólogo Orientadora Profa Dr Henrique Guilherme Scatolin ARARASSP 2023 RESUMO A histeria é um fenômeno de interesse de estudo desde a Antiguidade no entanto sua definição e formas de expressão foram compreendidas de diferentes formas durante os anos A origem da palavra histeria vem do grego ὑστέρα hystera que significa útero Ao passar dos anos a histeria passou a ser analisada sob uma perspectiva científica sob as esferas psicológica biológica e neurológica produzindo uma nova concepção da manifestação histérica A partir dos estudos de Freud sobre histeria surge então a psicanálise que entende a histeria como uma manifestação dos traumas de origem sexuais que foram recalcados A partir deste contexto este trabalho tem como objetivo compreender a partir da psicanálise a manifestação da histeria no contexto histórico e social contemporâneo Os estudos acerca da histeria são de grande relevância para o meio social sendo necessária uma maior compreensão de suas manifestações possibilitando intervenções mais eficazes O presente trabalho tem como fundamentação metodológica a revisão bibliográfica utilizando materiais coletados em livros e artigos científicos Palavraschave Histeria Psicanálise Somatização I INTRODUÇÃO A histeria é uma manifestação que desperta interesse de estudo e compreensão desde a Antiguidade mas sua definição e formas de expressão vêm sofrendo mudanças constantemente A palavra Histeria tem sua origem do termo grego ὑστέρα hystera que significa útero Durante a Antiguidade era entendida como uma doença que acometia exclusivamente às mulheres uma patologia proveniente do útero Acreditava se que o útero era um organismo vivo e independente no qual teria o poder de se movimentar dentro do corpo feminino e controlar suas funções psíquicas Este conceito provocou grande estereótipo negativo entre as mulheres contribuindo para um olhar depreciativo e preconceituoso Neste tempo as histéricas eram vistas como ninfomaníacas privadas de relações sexuais capazes de tirar o sossego de um homem denegrir sua imagem proferir calúnias perseguilo e tomar atitudes vingativas para suprimir o orgulho ferido BIENVILLE 1999 p 278 Ao decorrer dos anos a histeria passa a ser analisada sob uma ótica científica que buscava compreender as causas em fontes neurológicas e psicológicas afastandose da fixação pelo útero causador dos distúrbios Na medicina a histeria era considerada o grande mistério da época e muitos discutiam sua validade como patologia havia o pensamento de que as pacientes histéricas eram apenas simuladoras que estavam em busca de atenção Freud se opunha a essas concepções e dedicouse a elucidar o grande problema da histeria Mezan 2019 Foi então a partir dos estudos e análise da histeria feitos essencialmente por Freud que surge então a psicanálise O tema da psicosexualidade volta a ser considerado porém é referido de outra maneira de forma a analisar a sexualidade sob as perspectivas psicológicas Freud conclui que a histeria possui suas raízes na sexualidade não mais como questões relacionadas ao útero como trazia a concepção da Antiguidade mas passa a ser compreendida como um trauma sexual ocorrido geralmente na infância ou adolescência que tem efeitos sob o âmbito psicológico e emocional sendo então recalcado pelo inconsciente que posteriormente se manifesta em sintomas histéricos Schmitz 2021 1 Freud passa então a analisar o inconsciente de suas pacientes através do método da hipnose desenvolvido pelo médico Joseph Breuer onde acreditavase que por meio da sugestionabilidade empregada na hipnose os sintomas causados pela histeria desapareciam entretanto foi constatado posteriormente que os sintomas sempre retornavam mesmo que em formas diferentes de manifestação Tempos depois Freud também assumiu que alguns pacientes não podiam ser hipnotizados Freud 19162006 p450 Ao abandonar a hipnose como método de tratamento da histeria Freud abre caminho para um novo modelo de tratamento dos sintomas através da cura analítica onde analisava o inconsciente das pacientes através da verbalização e interpretação dos sonhos A verbalização de sonhos desejos pesadelos e fantasias tornamse materiais de estudo para os analistas que ligam os fatos os gestos símbolos e sentimentos e buscam diagnosticar as causas para as neuroses e psicoses Freud encontra no feminino passivo e no masculino ativo as possíveis causas para as neuroses de origem sexual sendo compreensível que a histeria manifestasse mais entre as mulheres que vivenciam traumas ou algum tipo de repressão em sua sexualidade Relacionandose diretamente a mecanismos de defesa ou neuroses de defesa do inconsciente que eram vindos à tona durante a terapia Schmitz 2021 A psicanálise elimina os sintomas dos histéricos partindo da premissa de que tais sintomas são um substituto uma transcrição por assim dizer de uma série de processos desejos e aspirações investidos de afeto aos quais mediante um processo psíquico especial o recalcamento negase a descarga através de uma atividade psíquica passível de consciência FREUD 2006 p 101 Sendo assim é possível compreender a histeria como a manifestação somática de representações recalcadas pelo inconsciente contudo o trauma recalcado nunca é de fato extinto e posteriormente ele emerge podendo ser convertido em sintomas físicos tais como gritos paralisias fobias amnésias espasmos convulsões dentre os mais diversos sintomas de conversão 2 Entretanto a partir de 1914 o termo histeria e a representação de seus sintomas foram sendo deixados de lado e substituídos pelas psicopatologias somáticas transtornos dissociativos transtornos de personalidade ou até mesmo síndromes psicóticas Desde a terceira edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais DSM a histeria não se inclui como uma categoria diagnóstica Em 1994 com o DSM IV a histeria foi dissolvida entre os Transtornos Somatoformes que integram os Transtornos Conversivos Na edição V do Manual Diagnóstico DSM os Transtornos Somatoformes foram designados Sintomas Somáticos e Transtornos Relacionados Contudo os critérios diagnósticos deste Manual não contemplam a personalidade histérica tornando um processo difícil a identificação da histeria clássica Zatti et al 2021 Com isso a histeria em si aparece dissolvida em diversas formas de transtornos como os somatoformes sexuais de personalidade histriônica e dissociativos Tal fragmentação é uma tentativa de dispersar os sintomas e desligálos tanto de sua etiologia sexual quanto do conflito psíquico VEIGA Angela 2013 p 28 Veiga 2013 compreende que o afastamento do termo histeria dos ambientes médicos e psicológicos é uma tentativa de desassociar os sintomas à esfera da sexualidade bem como satisfazer a necessidade contemporânea de classificar ou ser classificado dentro de um diagnóstico A nova maneira de lidar com as patologias proporciona uma dessubjetivação de quem adoece A medicalização e a diversa lista de categorização médica entram no lugar da escuta e objetivam o sintoma A ideia não é desconsiderar o avanço científico da medicina mas também de não deixar de considerar o tratamento como algo em que o sujeito está implicado em sua complexidade psíquica 2013 p29 É notório que as manifestações da histeria não se dão mais como nos tempos de Freud e a denominada histeria clássica na qual o sofrimento psíquico era traduzido a partir das conversões representadas pelos sintomas 3 de anestesias paralisias convulsões vômitos etc Contudo a histeria ainda permanece presente na contemporaneidade mesmo que sob a sombra de outras classificações Como aponta Veiga 2013 entendemos que o sujeito é um ser social que já nasce inserido em uma cultura assim as manifestações histéricas dos séculos passados já não acompanham mais a realidade atual na qual se transforma e acompanha o ritmo de desenvolvimento Birman 1999 propõe um debate acerca das subjetividades no mundo contemporâneo e suas novas formas de subjetivação Estas novas formas de ser são decorrentes dos novos destinos do desejo da atualidade O autor compreende como uma discussão urgente visto que vivemos em um mundo conturbado onde os recursos e ferramentas interpretativas se tornam limitados frente a velocidade dos acontecimentos Nesta perspectiva cabe uma reflexão acerca dos destinos do desejo da atualidade compreendendo o lugar do desejo é possível compreender e captar o que se passa nas novas formas de subjetivação Tratase pois de pensar nos destinos do desejo na atualidade já que esses destinos nos permitem captar o que passa nas subjetividades O rastreamento de algum destes destinos nos possibilita uma leitura acurada das subjetividades Com isso podemos nos aproximar do que há de sofrente nas novas formas de subjetivação da atualidade circunscrevendo então o campo do malestar contemporâneo BIRMAN Joel 1999 p16 Assim como as formas de subjetivação se modificam conforme o tempo histórico em que se está inserido os sintomas histéricos adquirem sentidos diferentes e manifestamse de formas diferentes Contudo a histeria ainda existe e se faz presente ao contrário do que pensam esta não desapareceu com o tempo e retorna de forma recorrente por diversos espaços e entrelinhas Costa e Lang 2016 Desta forma de acordo com os autores citados acima este estudo parte da seguinte questão Como se manifestam os sintomas histéricos em nossa sociedade atual 4 Não é de hoje que a histeria e suas formas de manifestação ocupam um lugar de interesse e questionamentos O conceito criado por Freud em seus primeiros estudos foi o pontapé inicial para a criação da psicanálise e suas teorias Contudo a sociedade e o mundo sofreram diversas modificações desde 1893 época em que Freud e Breuer desenvolveram e alinharam o conceito de histeria de forma com que os sintomas histéricos considerados clássicos se transformaram de acordo com a nova composição das subjetivações da contemporaneidade Desta forma este trabalho é de grande relevância para o meio científico e acadêmico visto que para intervenções mais eficazes e assertivas é necessário um debate sobre as novas formas de subjetividades no mundo da atualidade e a urgência de desenvolvermos novas ferramentas e instrumentos para compreendermos essas novas configurações e os desafios que delas surgem Birman 1999 Não somente para o meio acadêmico e científico este trabalho também é de grande relevância para a sociedade Os sintomas e manifestações que antes se enquadraram na histeria atualmente se dissolveram em diferentes nichos das psicopatologias tornando cada vez mais difícil sua identificação Estes realocamentos fizeram com que muitas pessoas obtivessem diagnósticos equivocados consequentemente tratamentos equivocados Este trabalho permite a compreensão das manifestações da histeria na atualidade possibilitando a compreensão das novas formas de subjetivação contemporânea Para a autora este é um tema de grande relevância e interesse por este motivo foi escolhido As psicopatologias psicanalíticas despertam curiosidades nos meios acadêmicos e a histeria foi o tema escolhido pela autora para aprofundamento Neste sentido o presente trabalho tem por objetivo compreender a histeria sob a óptica da psicanálise a partir do contexto social histórico atual Como objetivo secundário esta pesquisa visa A conceituar o fenômeno da histeria a partir do viés psicanalítico B Discutir como a histeria é compreendida na atualidade uma vez que a manifestação e expressão de sofrimento acompanham a conjuntura históricocultural de sua época sendo necessário que acompanhemos tais transformações Essa pesquisa se estrutura nos seguintes capítulos 5 II MÉTODO A fundamentação metodológica de um trabalho tratase da maneira como o pesquisador irá conduzir sua pesquisa Gil 1999 afirma que o método científico tratase do caminho que percorremos para alcançar um determinado fim referese ao conjunto de processos técnicos e intelectuais necessários para se atingir o conhecimento sobre um determinado tema Para que um conhecimento possa ser considerado científico tornase necessário identificar as operações mentais e técnicas que possibilitam a sua verificação Ou em outras palavras determinar o método que possibilitou chegar a esse conhecimento 1999 p8 Entendemos que em todos os estudos de forma direta ou indireta utilizam de fontes bibliográficas ou usam a revisão bibliográfica como etapa de construção Contudo existem estudos que definem como delineamento da pesquisa materiais disponíveis exclusivamente na literatura estes recebem o título de Pesquisa Bibliográfica ou Revisão de literatura Gil 2002 Para Rother 2007 a revisão de literatura é uma forma de estruturação de pesquisa que se utiliza de materiais bibliográficos e eletrônicos com o objetivo de obter dados e pautarse teoricamente nas pesquisas de outros autores Essa categoria de artigos têm um papel fundamental para a educação continuada pois permitem ao leitor adquirir e atualizar o conhecimento sobre uma temática específica em um curto espaço de tempo porém não possuem metodologia que permitam a reprodução dos dados e nem fornecem respostas quantitativas para questões específicas São considerados artigos de revisão narrativa e são qualitativos 2007 p5 A partir do que foi colocado acima a metodologia utilizada neste trabalho é de Revisão Bibliográfica Narrativa A revisão narrativa constituise na análise da literatura publicada em livros e artigos a busca das fontes não é padronizada e cabe ao autor escolher quais referências utilizar O trabalho constituise sob a interpretação e análise crítica pessoal do autor diante a literatura selecionada Cordeiro Magno et al 2007 6 Batista e Kamuda 2021 compreendem que a Revisão Narrativa é um método mais amplo na coleta e análise dos dados encontrados em produções científicas Tratase de um método abrangente de consulta às produções científicas principalmente quando se compara à revisão sistemática Este tipo de revisão preocupase em fornecer sínteses narrativas que permitem selecionar materiais teóricos de diferentes obras apresentandoas ao leitor de maneira compreensiva e sem o dever de descrever os critérios de coleta e seleção das produções incluídas Neste sentido alguns autores podem se posicionar de forma crítica diante do tema enquanto outros preferem a neutralidade de descrever as informações encontradas A revisão narrativa é a abordagem metodológica que mais se adequa a esta pesquisa visto que para produzila se faz necessário recorrer a materiais teóricos já existentes estabelecidos de forma pessoal não utilizando de critérios explícitos e sistemáticos para busca do material bibliográfico e acrescida da concepção subjetiva da autora perante o tema em questão Desta forma o conceito de histeria será abordado de forma analítica sob o viés da psicanálise pautado em artigos e livros selecionados de forma não sistematizada organizados de forma a estabelecer sua concepção históricocultural ao longo dos anos de forma crítica respeitando a problemática deste estudo A maneira como o conteúdo será apresentado e explorado é singular possibilitando ao leitor uma percepção crítica enviesada sobre a compreensão psicanalítica da histeria em sua manifestação nos dias atuais Para a coleta de dados foram utilizados os descritores Histeria Psicologia e Psicanálise nas plataformas SciElo CAPES e Pepsic tendo como critério serem escritos no idioma português analisando o fenômeno da histeria a partir dos conceitos da psicanálise de forma histórica e crítica bem como uma análise sobre a manifestação em psicopatologias inscritas nos atuais CID e DSM Na plataforma Scielo foram encontrados 7 resultados na plataforma Pepsic foram encontrados 17 resultados e na plataforma CAPES foram encontrados 29 resultados A partir dos resultados encontrados os critérios de seleção foram baseados a partir da leitura do título e resumo selecionados a partir dos materiais que se enquadram na problemática da pesquisa 7 Os livros selecionados para a composição desta pesquisa foram escolhidos pelo critério teórico visando a definição de histeria para a psicanálise e a concepção histórica sobre o fenômeno utilizando os conceitos de Freud em suas obras clássicas e os autores pós freudianos que estudaram a manifestação da histeria tais como Trillat Bienville Mezan e Birman Não serão incluídos nesta pesquisa materiais que não estavam traduzidos para o idioma português não se utilizavam de perspectivas históricas para caracterizar a histeria bem como aqueles que não incluíam os dados dos manuais médicos de diagnósticos relacionados a representação da histeria na concepção psicanalítica também foram critérios de exclusão artigos baseados em estudos de caso 8 III FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Ao longo da história a histeria tem sido objeto de interesse e investigação que desperta curiosidade pelas formas de expressão atribuídas a ela Desde os tempos antigos até os dias atuais a compreensão da histeria tem evoluído constantemente refletindo a complexidade dessa manifestação psicossomática Para pensarmos na histeria sob o contexto contemporâneo se faz necessário um delineamento histórico do conceito e sua evolução no decorrer dos anos tendo em vista que sua história atravessa os períodos com diferentes significados e concepções Ao contrário do que se pensa o termo histeria já era utilizado antes mesmo das descobertas de Charcot e da criação da psicanálise este é um fenômeno pensado desde os tempos de Hipócrates período da Antiguidade Desta forma o primeiro capítulo desta pesquisa destinase a fazer uma contextualização histórica sobre o fenômeno da histeria e suas representações no transcorrer dos anos 9 Capítulo I A origem da palavra histeria advém do termo grego hystera que significa útero No século IV aC período da Antiguidade época de Hipócrates pressupunhase que a histeria era uma doença que acometia as mulheres especificamente no útero Nesta concepção os homens estavam resguardados dos acidentes histéricos o útero era considerado um organismo vivo e independente que possuía vapores que se deslocavam até os órgãos sexuais durante as relações sexuais Caso da mulher estivesse em abstinência sexual seja de forma voluntária ou não os vapores advindos do útero subiam ao cérebro através dos nervos e provocavam as convulsões histéricas o delírio confusão a mania ou possessão demoníaca TRILLAT 1991 O homem estaria portanto ao abrigo de acidentes histéricos Em compensação a semente da mulher contém além de fermentos voláteis como no homem fermentos fixos pesados muito pouco voláteis Isso freia o transporte dos vapores para os lugares que a natureza lhes destinaos órgãos sexuais As coisas se agravam com a abstinência voluntária ou forçada A semente se acumula e não encontrando exutório no exercício da sexualidade os vapores nascidos dessa fermentação sobem para o cérebro pelo canal dos nervos e provocam a convulsão histérica a confusão delírio inchação do ventre a mania ou a possessão diabólica 1991 p 64 Na Idade Média período marcado pela ascensão da igreja católica o papel social da mulher não sofreu grandes transformações sendo vista pela cultura patriarcal como submissa de forma com que a mulher histérica na manifestação de seus sintomas fosse considerada pela sociedade como uma bruxa ou que estivesse possuída pelo demônio Neste período centenas de mulheres tidas como bruxas ou possessas foram condenadas e jogadas na fogueira TRILLAT 1991 É a partir dessas concepções sobre o fenômeno da histeria construídos nos tempos antigos que se estabelece um estereótipo negativo lançado sobre as mulheres acometidas pela histeria Sendo estigmatizadas como ninfomaníacas e atreladas a figuras malignas Schmitz 2021 Tempos depois no período do Renascentismo caracterizado pelo momento de quebra de paradigmas e rompimento com os pensamentos da igreja 10 11 Capítulo I Segundo os registros históricos a palavra histeria não foi usada por Hipócrates para descrever a condição que mais tarde seria conhecida como histeria Na verdade Hipócrates se referia a essa condição como sufocação da matriz Foi apenas em 1839 que a palavra histeria foi introduzida na literatura por Littré que traduziu as obras de Hipócrates para o francês SHORTER 2005 A origem da palavra histeria advém do termo grego hystera que significa útero No século IV aC período da Antiguidade época de Hipócrates pressupunhase que a histeria era uma doença que acometia as mulheres especificamente no útero Nesta concepção os homens estavam resguardados dos acidentes histéricos o útero era considerado um organismo vivo e independente que possuía vapores que se deslocavam até os órgãos sexuais durante as relações sexuais Caso da mulher estivesse em abstinência sexual seja de forma voluntária ou não os vapores advindos do útero subiam ao cérebro através dos nervos e provocavam as convulsões histéricas o delírio confusão a mania ou possessão demoníaca TRILLAT 1991 De acordo com Foucault 1972 Platão em O Timeu o útero ou matriz da mulher é como um ser vivo que deseja ter filhos Se a matriz permanece estéril por muito tempo mesmo durante a estação favorável ela pode ficar perigosamente irritada Isso pode causar agitação em todo o corpo obstruir as passagens de ar impedir a respiração e causar angústia e outras doenças de vários tipos O homem estaria portanto ao abrigo de acidentes histéricos Em compensação a semente da mulher contém além de fermentos voláteis como no homem fermentos fixos pesados muito pouco voláteis Isso freia o transporte dos vapores para os lugares que a natureza lhes destina os órgãos sexuais As coisas se agravam com a abstinência voluntária ou forçada A semente se acumula e não encontrando exultório no exercício da sexualidade os vapores nascidos dessa fermentação sobem para o cérebro pelo canal dos nervos e provocam a convulsão histérica a confusão delírio inchação do ventre a mania ou a possessão diabólica TRILLAT 1991 p 64 Passados seiscentos anos desde Hipócrates ainda persistia a crença de que o útero tinha a capacidade de se deslocar pelo corpo causando sintomas Uma explicação foi formulada baseada em algumas analogias que relacionavam a posição anatômica do útero e suas estruturas adjacentes ao movimento de um veleiro SAÚRI 2000 Na Idade Média período marcado pela ascensão da igreja católica o papel social da mulher não sofreu grandes transformações sendo vista pela cultura patriarcal como submissa de forma com que a mulher histérica na manifestação de seus sintomas fosse considerada pela sociedade como uma bruxa ou que estivesse possuída pelo demônio Neste período centenas de mulheres tidas como bruxas ou possessas foram condenadas e jogadas na fogueira TRILLAT 1991 É a partir dessas concepções sobre o fenômeno da histeria construídos nos tempos antigos que se estabelece um estereótipo negativo lançado sobre as mulheres acometidas pela histeria Sendo estigmatizadas como ninfomaníacas e atreladas a figuras malignas SCHMITZ 2021 Tempos depois no período do Renascentismo caracterizado pelo momento de quebra de paradigmas e rompimento com os pensamentos da igreja Durante diversos séculos desde a Idade Clássica até o século XIX a histeria permaneceu como uma enfermidade enigmática suscitando especulações surpreendentes No livro intitulado Trois livres des maladies et infirmités des femmes de 1609 Libaud alega que embora o útero esteja intimamente conectado às partes previamente descritas e seja incapaz de se deslocar frequentemente ele realiza movimentos bruscos e peculiares dentro do corpo feminino Esses movimentos variam e incluem elevação descida convulsões errância e prolapso O útero ascende até o fígado baço diafragma estômago peito coração pulmão faringe e cabeça Após cento e cinquenta anos a histeria ainda desafiava a compreensão dos médicos De acordo com Whitt em seu livro Traité des maladies des nerfs de 1779 as pacientes apresentavam uma série de sintomas incluindo sensações extremas de frio e calor dores em várias partes do corpo desmaios e convulsões leves rigidez muscular distúrbios gastrointestinais como acúmulo de gases no estômago e nos intestinos apetite insaciável vômitos com matéria escura aumento repentino e abundante da produção de urina clara e pálida perda de peso ou atrofia nervosa crises de asma ou espasmos nervosos tosse nervosa palpitações cardíacas flutuações no pulso dores de cabeça recorrentes tonturas e vertigens diminuição e enfraquecimento da visão além de sentimentos de desânimo abatimento melancolia e até casos de insanidade FOUCAULT 1972 Raulin em seu trabalho de 1758 conforme mencionado por Ávila 2010 levantou a possibilidade de contágio da histeria contribuindo para fortalecer a histórica associação entre essa doença e a feminilidade Segundo ele essa enfermidade na qual as mulheres inventam exageram e reproduzem todos os tipos de absurdos que uma imaginação descontrolada é capaz às vezes tornavase epidêmica e contagiosa Por sua vez Sydenham declarou que a histeria tem a capacidade de imitar praticamente todas as doenças humanas Independentemente da região do corpo em que se manifeste a histeria prontamente produz os sintomas característicos dessa área específica A menos que o médico possua grande discernimento e experiência é fácil se enganar e atribuir sintomas que são exclusivamente resultado da condição histérica a uma doença essencial e específica dessa parte em particular e essa observação mantém sua relevância até os dias atuais Com os avanços das ciências naturais os sintomas diversos da histeria passaram a desempenhar um papel relevante sendo inicialmente classificados como distúrbios nervosos e posteriormente como neuroses Isso despertou o interesse de inúmeros estudiosos que se dedicaram a desvendar os enigmas da histeria Janet definiu a histeria como uma deficiência cerebral na capacidade de síntese psicológica resultando em alterações na percepção e memorização de imagens MELEIROS 1992 No entanto essa perspectiva organicista foi posteriormente modificada por Bernheim 1884 que restringiu o uso desse diagnóstico às crises de nervos relatadas pelos clínicos mais antigos A concepção organicista contestada por Bernheim foi novamente abordada nos trabalhos de Babinski que eventualmente concluiu que os fenômenos histéricos eram exclusivamente causados por sugestão Babinski acreditava na cura da histeria por meio da persuasão e cunhou o termo pitiatismo que etimologicamente significa cura por persuasão No entanto nenhuma formulação subsequente conseguiu desenvolver suas ideias originais ÁVILA 2010 Em 1859 Pierre Briquet escreveu o Tratado Clínico e Terapêutico em Histeria com base em uma análise quantitativa de mais de 400 pacientes No século XIX a histeria ocupava o primeiro lugar entre as condições que levavam à hospitalização De acordo com registros históricos cerca de 50 dos leitos hospitalares eram ocupados por pacientes diagnosticados com histeria O livro de Briquet questionava alguns mitos comuns sobre o transtorno como sua suposta relação com frustrações sexuais e lançava luz sobre o papel das emoções na origem dos sintomas físicos O conceito de trauma aplicado ao sistema nervoso mesmo na ausência de trauma físico foi gradualmente desmantelado ao longo do século XIX Charcot retomou diretamente esse conceito a partir da obra de Briquet sobre a histeria O trauma passou a desempenhar um papel cada vez mais importante como desencadeador de episódios graves de histeria A busca por antecedentes de trauma tornouse um elemento comum em todos os estudos clínicos de Charcot e se tornou um dos conceitos de maior sucesso na medicina até mesmo incorporado à linguagem cotidiana VIESCA 1990 Charcot distinguiu entre duas formas de histeria uma forma menor caracterizada por sintomas como visão em túnel anestesia cutânea e hipnotizabilidade e uma forma maior com explosões emocionais dramáticas na qual os pacientes supostamente passavam por fases de ataques completos No entanto a teoria de Charcot entrou em declínio logo após sua morte em 1893 VIESCA 1990 Havia poucos estudos de neuroimagem aplicados à histeria e os estudos existentes são limitados devido a amostras pequenas populações heterogêneas diferenças na duração dos sintomas e presença de comorbidades No entanto esses estudos sugerem alterações variáveis na atividade de regiões corticais e subcorticais específicas principalmente nos córtices pré frontal e parietal no tálamo e nos núcleos da base que podem estar relacionadas aos transtornos conversivos VEGA 1997 De acordo com Black et al 2004 nos transtornos conversivos é importante ressaltar que os testes eletrofisiológicos indicam vias motoras e sensoriais inalteradas Isso significa que não há evidências de disfunção ou alteração nas vias neurais responsáveis pelo controle motor e pela percepção sensorial Essa descoberta sugere que os sintomas observados nesses transtornos não são decorrentes de problemas estruturais ou funcionais nas vias neurais mas sim têm origem psicogênica Portanto embora haja alterações na atividade de certas regiões cerebrais como os córtices préfrontal e parietal o tálamo e os núcleos da base as vias motoras e sensoriais parecem permanecer intactas Mai 1996 afirma que uma proporção significativa de pacientes com histeria apresenta danos cerebrais como epilepsia e esclerose múltipla especialmente em casos com comorbidades neurológicas Alguns especialistas conforme mencionado por Ávila 2010 consideram a histeria como uma disfunção da memória ou da atenção com lesões nos lobos frontais especialmente no hemisfério não dominante Essas teorias sugerem que alterações nos processos de memória e atenção podem desempenhar um papel na manifestação dos sintomas histéricos Pesquisadores identificaram que há uma maior incidência de distúrbios sensitivos e motores no lado esquerdo de pacientes histéricos sugerindo o envolvimento do hemisfério direito do cérebro na origem desses sintomas BLACK 2004 Essa observação indica que o hemisfério direito pode desempenhar um papel importante nos mecanismos subjacentes aos sintomas histéricos relacionados à sensibilidade e ao controle motor Embora seja difícil apresentar evidências científicas concretas de que a somatização possa ser um evento aprendido é razoável inferir que uma criança possa adquirir e desenvolver esse comportamento ao observar um membro da família doente O sucesso da terapia comportamental no tratamento desses distúrbios também sugere que o aprendizado mal adaptativo possa desempenhar um papel importante em sua etiologia MAI 1996 Embora não haja confirmação definitiva a observação de padrões comportamentais e a resposta positiva à terapia comportamental sugerem que fatores de aprendizado e condicionamento podem influenciar a manifestação da somatização Ao contrário da psiquiatria que passou a desvalorizar a histeria na psicanálise ela continuou sendo um tema de grande importância Importantes estudiosos contemporâneos como Nasio 1991 e Bollas 2000 dedicaram atenção significativa à histeria mesmo quando ela foi renomeada e ampliada dentro do contexto psicanalítico Isso ressalta a relevância contínua da histeria na compreensão psicanalítica do funcionamento psíquico e na exploração dos complexos processos inconscientes associados a ela A histeria acompanhou Freud ao longo de sua carreira representando sintomas físicos relacionados a causas psicológicas No entanto sua compreensão desses mecanismos variou consideravelmente ao longo dos anos Em 1895 em colaboração com Breuer Freud propôs nos Estudos sobre a Histeria que a histeria traumática era causada por eventos traumáticos vivenciados precocemente exercendo uma influência remota na vida do indivíduo Foi nesse contexto que Freud formulou a famosa frase O histérico sofre de reminiscências FREUD 1995 Essa concepção inicial enfatizava a importância dos traumas passados na etiologia da histeria Durante as primeiras investigações de Freud e Breuer surgiram divergências sutis de opiniões Breuer postulava a existência de um estado hipnoide prévio à manifestação dos sintomas histéricos enquanto Freud já sustentava a importância da repressão como essencial para a existência dos fenômenos inconscientes Para Freud 1995 a histeria era caracterizada como uma histeria de defesa na qual ideias e afetos conflitantes e perigosos para a unidade psíquica eram afastados da consciência Após um ano da publicação dos Estudos sobre a Histeria Freud e Breuer já apresentavam divergências significativas em suas visões Freud cada vez mais investigava o papel da repressão dos impulsos como fator primário nas neuroses enquanto Breuer discordava do crescente enfoque dado à sexualidade nas investigações psicanalíticas À medida que suas observações avançavam Freud descartou o papel do estado hipnoide na produção dos sintomas e reconheceu que as manobras defensivas poderiam dar origem a outras enfermidades neuróticas Como resultado Breuer preferiu encerrar sua colaboração científica com Freud De acordo com Gottlieb 2003 é fascinante observar a história dessas transformações considerando dois grandes movimentos um iniciado com as formulações de Freud sobre os sintomas histéricos conversivos e outro com Janet que concebia alguns sintomas como consequências de falhas da mente Ambas as ideias surgiram no mesmo contexto histórico e ambas buscaram explicar o fenômeno da histeria Ao longo do tempo essas ideias estão sendo gradualmente retomadas à medida que se reconhecem suas bases filosóficas comuns A abordagem de Freud articulada na psicanálise tornouse parte fundamental dessa disciplina Já a abordagem de Janet que havia sido excluída da psicanálise por 75 anos está gradualmente sendo reintegrada Esse processo demonstra a evolução do pensamento e a reavaliação de abordagens diferentes para a compreensão da histeria ÁVILA 2010 Freud 1995 questionou se seria possível estabelecer uma relação causal direta entre uma causa específica e um efeito neurótico específico de modo que cada uma das neuroses maiores pudesse ser atribuída a uma etiologia particular A resposta que ele encontrou foi que cada neurose tem como causa imediata um distúrbio específico na economia do sistema nervoso especialmente relacionado a distúrbios da vida sexual do indivíduo Esses distúrbios podem ser baseados em desordens da vida sexual atual ou em eventos significativos do passado Essas suposições desenvolvidas por Freud em dois trabalhos publicados entre 1896 e 1898 foram a base da concepção das neuroses atuais CARTER 1980 Freud foi capaz de se afastar dos fatores concretos sejam eles traumáticos ou relacionados à estagnação libidinal e abordar as neuroses como formações complexas de compromisso entre os impulsos reprimidos principalmente de natureza sexual e as forças da consciência que se opõem à sua realização Em 1914 e 1915 Freud 1995 modificou ainda mais sua compreensão da dinâmica psíquica introduzindo a questão das pulsões direcionadas ao ego Essas pulsões do ego passaram a ser consideradas como forças motivadoras que buscam a satisfação do indivíduo além das pulsões sexuais e contribuíram para uma compreensão mais ampla e complexa das neuroses na psicanálise Com a introdução da metapsicologia freudiana todo o sistema conceitual de Freud foi reestruturado e a compreensão da histeria passou a ser articulada em relação à hierarquia das pulsões parciais e à resolução do complexo de Édipo Posteriormente com a segunda tópica apresentada em 1923 ocorreu uma nova caracterização da dinâmica psíquica na qual a histeria passou a ser considerada no contexto da vida psíquica como um todo como uma defesa necessária contra as demandas libidinais do complexo de Édipo SHORTER 2005 Essas transformações conceituais proporcionaram uma compreensão mais abrangente da histeria e de seu papel na estruturação da vida psíquica levando em conta não apenas os aspectos sexuais mas também as dinâmicas e defesas psicológicas presentes no indivíduo Na visão de Freud a histeria é caracterizada por uma fixação no estágio primitivo do desenvolvimento psicossexual especificamente no complexo de Édipo Isso resulta em uma desvinculação malsucedida e incestuosa com o genitor amado o que gera conflitos na vida adulta relacionados à esfera do impulso sexual e à organização da personalidade do indivíduo O impulso sexual fica constantemente sujeito à repressão e a energia derivada desse impulso é convertida em sintomas histéricos Esses sintomas atuam como uma proteção contra o conhecimento consciente desse impulso ao mesmo tempo em que proporcionam uma realização disfarçada do que está reprimido ALMEIDA 1983 Após Breuer e sua paciente Anna O houve uma diminuição no interesse pela exibição pública dos doentes e de seus sintomas e a abordagem passou a buscar a cura por meio da recordação de possíveis eventos traumáticos significativos para eles Um autor psicanalítico que contribuiu para a distinção entre a histeria e os sintomas físicos presentes em outras condições médicas foi Otto Fenichel 1981 Em sua obra Teoria Psicanalítica das Neuroses Fenichel 1981 descreveu quatro categorias de sintomas funcionais que ajudaram a diferenciar a histeria de outras condições médicas e a compreender a complexidade dos sintomas funcionais na psicanálise Essas categorias incluem sintomas que se manifestam como expressões físicas das emoções desregulação da secreção hormonal alterações somáticas causadas por comportamentos específicos repetitivos e disfunções no sistema vegetativo Em 1924 o termo somatização foi introduzido na psiquiatria por Wilhelm Stekel excolaborador de Freud Essa expressão surgiu devido a um erro de tradução de uma palavra alemã usada por Stekel nos anos 1920 O termo original organsprache significava literalmente discurso do órgão mas foi mal traduzido como somatização resultando em uma descrição inadequada do conceito que Stekel pretendia expressar SHORTER 2005 Apesar do equívoco na tradução o termo somatização passou a ser amplamente utilizado para descrever a manifestação de sintomas físicos decorrentes de problemas emocionais ou psicológicos Sua adoção ocorreu em parte devido à sua conotação neutra e ao reconhecimento do sistema classificatório do DSM Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais O termo substituiu a antiga denominação histeria considerada insatisfatória devido a seus múltiplos significados e à carga pejorativa associada a ela A inclusão do termo somatização no DSM proporcionou uma forma padronizada de classificar e compreender os transtornos em que os sintomas físicos são manifestações de problemas emocionais ou psicológicos contribuindo para uma maior compreensão e abordagem clínica desses transtornos MAI 2004 Em 1938 James Lorimer Halliday propôs o termo doença psicossomática no British Medical Journal para descrever como o sofrimento de natureza psicológica pode ter repercussões no sistema nervoso autônomo e endócrino levando a várias disfunções no corpo humano O médico Franz Alexander desenvolveu ainda mais essa ideia argumentando que certos tipos de conflitos intrapsíquicos se manifestam no sistema nervoso autônomo simpático ou parassimpático ÁVILA 2020 A histeria que permaneceu desconhecida e misteriosa para a medicina foi incorporada à compreensão mais ampla dos processos psicossomáticos e suas relações com fatores psicológicos e emocionais na medicina psicossomática A primeira edição do DSM evitou o uso do termo histeria e rejeitou explicitamente o termo transtornos psicossomáticos considerandoos mais como uma perspectiva médica do que uma patologia específica em si ÁVILA 2002 Na segunda edição do DSM que tinha uma abordagem mais psicanalítica a histeria retornou como neuroses e neuroses histéricas sendo subdividida em tipos conversivos e dissociativos Além disso ao contrário da primeira edição a segunda edição também incluiu a histeria como um transtorno de personalidade conhecido como personalidade histérica hoje conhecido como transtorno de personalidade histriônica Essas mudanças refletiram a evolução do entendimento e da classificação dos transtornos relacionados à histeria ao longo do tempo SHORTER 2005 No DSMIII o termo síndrome de Briquet foi utilizado como um sinônimo para transtorno de somatização No entanto no DSMIV esse termo foi removido A equipe responsável pela elaboração do DSMIII optou por acomodar a histeria em diferentes categorias devido à pressão da opinião pública que considerava a palavra histeria estigmatizante resultando em sua exclusão da nomenclatura psiquiátrica Nessa edição os sintomas psicossomáticos historicamente associados à histeria foram excluídos e substituídos por um grupo de diagnósticos chamados transtornos somatoformes que envolvem sintomas físicos que sugerem uma desordem física Esses transtornos incluíam o transtorno de somatização e os transtornos conversivos Por outro lado os transtornos dissociativos permaneceram essencialmente inalterados MAI 2004 De maneira similar a CID10 Classificação Internacional de Doenças também utilizou o termo somatização e eliminou a síndrome de Briquet como sinônimo para transtorno de somatização Essas mudanças refletem as revisões e atualizações realizadas nas classificações diagnósticas buscando representar e descrever de forma mais precisa os transtornos relacionados a sintomas físicos e psicossomáticos Independentemente das possíveis anormalidades neurológicas envolvidas na etiopsicogênese da histeria parece improvável que um mapeamento mais preciso da topografia cerebral nos fenômenos histéricos resulte em uma compreensão mais detalhada das diversas conexões psicodinâmicas relacionadas à histeria Isso ocorre porque a compreensão da histeria vai além da detecção de uma determinada patologia por meio de exames complementares e da aplicação de tratamentos cirúrgicos ou medicamentosos como é comum em outras especialidades médicas REFERÊNCIAS USADAS Almeida KF Histeria uma revisão bibliográfica Inform Psiq 198343638 ÁVILA Lazslo Antônio TERRA João Ricardo Histeria e somatização o que mudou Jornal Brasileiro de Psiquiatria v 59 p 333340 2010 Disponível em httpswwwscielobrjjbpsiqahH68rMvG9GqSbb6Q6DKLctwlangpt Ávila LA Doenças do corpo e doenças da alma investigação psicossomática psicanalítica 3 ed São Paulo Editora Escuta Ltda 2002 BERNHEIM Hippolyte De la suggestion dans létat hypnotique réponse à Paul Janet Doin 1884 Black DN Seritan AL Taber KH Hurley RA Windows to the brain conversion hysteria lessons from functional imaging J Neuropsychiatry Clin Neurosci 2004 1624551 Bollas C Hysteria São Paulo Escuta 2000 BRIQUET Pierre Tratado Clínico e Terapêutico em Histeria 1859 Carter KC Germ theory hysteria and Freuds early work in psychopathology Med Hist 1980 2425974 Fenichel O Teoria psicanalítica das neuroses Rio de Janeiro Atheneu 1981 Freud S A hereditariedade e etiologia das neuroses 1896 In Salomão J trad Obras psicológicas completas de Sigmund Freud Rio de Janeiro Imago 1995 27 Freud S Sobre o narcismo uma introdução 1914 In Salomão J trad Obras psicológicas completas de Sigmund Freud Rio de Janeiro Imago 1995 Freud S Breuer J Estudos sobre a histeria 1895 In Salomão J trad Obras psicológicas completas de Sigmund Freud Rio de Janeiro Imago 1995 Freud S As neuropsicoses de defesa 1896 In Salomão J trad Obras psicológicas completas de Sigmund Freud Rio de Janeiro Imago 1995 Foucault M História da loucura na idade clássica Tradução de José Teixeira Coelho Netto São Paulo Perspectiva 1972 Gottlieb RM Psychosomatic medicine the divergent legacies of Freud and Janet J AM Psychoanal Assoc 200351385781 LIBAUD Trois livres des maladies et infirmités des femmes 1609 Mai FM The psychobiology of hysteria J Psychiatry Neurosci 1996215 3134 Mai F Somatization disorder a practical review Can J Psychiatry 2004491065262 Meleiro AMAS Wang YP A concepção da histeria ao longo do tempo psiquiatria e psicanálise Revista ABPAPAL 19921424550 Nasio JD A histeria teoria e clínica psicanalítica Tradução de Vera Ribeiro Rio de Janeiro Jorge Zahar Editor 1991 23 Saurí JJ Los nombres metafóricos de la histeria Acta Psiquiát Psicol Am Lat 200046436371 Shorter E A historical dictionary of psychiatry Oxford NY Oxford University Press 2005 Trillat E História da histeria São Paulo Escuta 1991 Vega LMC Madariaga AA GarcíaCampayo La Complejidad de los fenómenos de somatización Cartas ao Director Aten Primaria 1997203154 Viesca TC Charcot y la histeria Salud Ment 1990131911 Whitt Traité des maladies des nerfs 1779