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Processo Penal
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Brasília a 46 n 183 julhoset 2009 103 Sumário 1 Os dois sistemas processuais penais 2 Por que todos os sistemas processuais são mistos 3 O sistema processual penal atual a inquisição do CPP de 41 4 O sistema proces sual penal no Projeto 15609PLS 5 O lugar constitucionalmente demarcado das partes e o projeto 15609PLS 1 Os dois sistemas processuais penais Todos os sistemas processuais penais conhecidos mundo afora são mistos Isto significa que não há mais sistemas puros ou seja na forma como foram concebidos Há de se entender porém o que se quer dizer com tal assertiva tão difundida quanto malentendida A compreensão da questão passa por uma dúplice análise em primeiro lugar da própria noção de sistema e depois da possibilidade ou impossibilidade de se ter sistemas mistos Ora temse presente que os sistemas ditos puros nasceram na forma como os conhecemos no início do século XIII embora outros tenham existido inclusive com tais nomes antes por exemplo entre os romanos Esses porém só para alusões secundárias têm alguma importância naquilo que aqui interessa ou seja a in vestigação dos modelos atuais precisos e datados inclusive para não se permitir uma maior confusão sistema acusatório Cada parte no lugar constitucionalmente demarcado Jacinto Nelson de miranda Coutinho Jacinto Nelson de miranda Coutinho é Pro fessor Titular de Direito Processual Penal na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná Especialista em Filosofia do Direito PUCPR mestre UFPR Doutor Università degli Studi di Roma La Sapienza Coorde nador do Núcleo de Direito e Psicanálise do PPGDUFPR Advogado Procurador do Estado do Paraná Conselheiro Federal da Ordem dos Advogados do Brasil pelo Paraná membro da Comissão Externa de Juristas do Senado Federal que elaborou o anteprojeto de CPP hoje Projeto no 1562009PLS Revista de Informação Legislativa 104 Os dois sistemas dos quais se fala inqui sitório e acusatório vieram a lume como se sabe por razões políticas Outras de ordem teológica econômica filosófica e jurídica entre tantas foram altamente relevantes mas decididamente secundárias ou pelo menos sempre estiveram subordinadas àquelas políticas O Sistema Inquistório aparece no âmbito da Igreja Católica e tem seu marco histórico 1215 em face do IV Concílio de Latrão Em síntese poderseia dizer que desde o século anterior século XII mais parti cularmente em seu final a Igreja Católica se debatia com um fenômeno social inte ressante pensavam alguns estar em risco o seu domínio sobre o mundo conhecido do qual era detentora da grande parte Sua doutrina era visível já não encontrava ressonância plena e portanto havia discór dia em alguns pontos capitais Pensavase que isso era fruto de doutrinas heréticas e portanto de postulados contrários àque les pregados desde Roma Sabiase por sua parte isso só ser possível em razão de ou tros fundamentos epistêmicos e assim não era tarefa fácil nem banal o seu combate Algumas medidas já haviam sido toma das Inocêncio III o papa de então havia baixado uma Bula Vergentis in senium em 1199 equiparando o crime de heresia ao de lesa majestade historicamente o mais grave dos crimes Ela como tal produziu poucos efeitos porque eventual punição ainda esta va afeta aos leigos que ademais começavam a avolumar poder em face do crescimento das nascentes cidades medievais construí das não pela decadência dos feudos mas sobretudo em função da necessidade dos senhores das caravanas melhor conduzirem e distribuírem suas mercadorias fato deter minante não só da criação dos entrepostos comerciais mas principalmente para serem eles regidos por uma outra mentalidade ligada ao comércio e portanto muito dife rente daquilo que se tinha nos feudos Os entrepostos comerciais foram trans formados em burgos vilas E tinha outra perspectiva a vida que ali se levava criase um novo sistema de trocas e já não mais cada um respondia pela sua própria so brevivência mas dependia dos outros o que se vê pelas chamadas Corporações de Ofício cada uma produzindo um tipo ou tipos de bens Era natural que se não pensasse nos burgos como se pensava nos feudos e se vivesse de outro modo embora no início tenha sido muito difícil não raro mais que antes nos feudos porque o regime das relações pessoais era em grande parte pior que aquele dos escravos À Igreja Católica ou parte dela impor tava porém não o fato de haver diferença entre o burgo e o feudo mas sim naquele que não mais tinha um domínio pleno agora eclipsado por aquele dos burgue ses senhores das caravanas do comércio e do grosso do dinheiro E sem volta pelo menos aparente Aqui então o dilema o que fazer em relação a tal ponto Por evidente e como não se duvida o movimento migratório na direção dos burgos foi acompanhado como não poderia deixar de ser pela Igreja Católica Sua presença nos burgos desde o início principalmente nos séculos X e XI não foi suficiente para aplacar o móvel do cres cimento ou seja o desejo mola mestra da propulsão de qualquer sociedade O problema assim estava em como não perder para essa nova mentalidade dado ser complicado e sempre foi lutar contra o desejo Por trás de tudo estava já haviam diag nosticado Aristóteles e um outro modo de se pensar a vida Basta ver o que se passou com os Cátaros Católicos como todos os demais essa gente não tinha aparente mente nenhum motivo para ter contra si uma Cruzada ordenada por Inocêncio III a qual se converteu em uma guerra sem tamanho Como pano de fundo estava sabese bem o pensamento de Aristóteles presumivelmente incorporado a partir do contato mediterrâneo com os comerciantes Brasília a 46 n 183 julhoset 2009 105 do norte da África e do Oriente médio Já não era contudo uma Cruzada contra os bárbaros incrédulos como se havia pas sado com tal desculpa antes Era contra iguais na fé por certo que determinada por outras razões filosóficas e econômi cas Para tanto basta ver o que fizeram a Carcassone Toulouse e outras cidades arrasadas e saqueadas Outro forte sintoma da fragilidade do domínio do pensamento da Igreja Católica se deu com a criação das Universidades quase todas produzidas como Studium Urbis justo para preparar as pessoas para a nova realidade social dos burgos O dilema assim não era simples há de se reconhecer E se sabia das causas no âmbito da Igreja Católica onde nunca se desconheceu Aristóteles mas por conve niência adotouse o pensamento de Platão a verdade em um mundo hipostasiado dado ser ajustado como uma luva aos seus interesses desde a conversão de Constan tino Por sinal Aristóteles na sua maior extensão só toca o mundo cristão verda deiramente com o gênio de São Tomás de Aquino mas no século XIV No início do século XIII então presente o problema Inocêncio III reúne a cúpula da Igreja Católica em São João de Latrão e ali em 1215 decidese fazse uma opção pela força É o nascimento de um novo modelo processual ao qual não interessava aquele que estava em vigor ou seja os chamados Juízos de Deus adotado ou domesticado dos invasores bárbaros vindos do norte para demolir o império romano No IV Concílio de Latrão decidese entre outras coisas pela confissão pessoal obrigatória pelo menos uma vez ao ano e ela é o marco histórico do novo sistema A partir daí a noção de Bulgaro actus trium personarum iudiciis actori et rei tende a de saparecer pelo menos em processo penal Tudo se consolida com uma Bula de Gregório IX Ex Excomuniamus de 1231 donde se delineia o arcabouço técnico e com a Bula Ad extirpanda de Inocêncio IV em 1252 extendida ao mundo em 1254 pela qual abriuse o espaço definitivo para os métodos utilizados na Inquisição de modo que Inquisitor e Socius se absolvessem mutuamente por eventuais demasias entre elas na tortura A Igreja Católica tocava à barbárie que tanto havia criticado no início do catolicismo romano quando os católicos foram perserguidos torturados e mortos Excluídas as partes no processo inqui sitório o réu vira um pecador logo detentor de uma verdade a ser extraída mais importante aparentemente que o próprio crime tornase ele objeto de investigação É sobre si que recaem as atenções os esforços do inquisidor Dententor da verdade dela deve dar conta Eis a razão por que a tortura ganhou a importância que ganhou e a confissão virou regina probationum Se o inquirido resistisse merecidamente poderia ser absolvido e de alguns se tem notícia Era algo um tanto difícil usando se como se usava os métodos de per quirição A verdade estava dada ex ante e o inquisidor dela tinha ciência de modo que o trabalho abjeto em realidade era um jogo de paciência e ao final confessar dentro do modelo proposto era a vitória da Inquisição mas para o consumo geral vitorioso era o inquirido que como prêmio ganhava a absolvição nem que de tanto em tanto fosse parar na fogueira para mais rápido entregar sua alma a Deus modelo hipócrita dado a decisão estar preordenada Com o resultado antecipado pelo menos ao raciocínio mais hábil o resto eram os modos de se confirmar aquilo que a razão já havia projetado Como modelo a analítica de Aristóte les pela lógica dedutiva Com o domínio pleno das premissas o inquisidor conduz o resultado para onde quiser O modelo é genial não fosse antes diabólico embora nascido como se viu no seio da Igreja Católica Em um tempo extre mamente místico não poderia ser diferente Resistiu e resiste como o mais apurado sistema jurídico do qual se tem conheci Revista de Informação Legislativa 106 mento tendo persistido por tanto tempo justo por sua simplicidade isto é porque usa o próprio modelo de pensamento por excelência da civilização ocidental Ao permitir sobremaneira que se manipule as premissas jurídicas e fáticas interessa e sempre interessou aos regimes de força às ditaduras aos senhores do poder Podendose orientar o êxito fazse o que quiser É o reino do solipsismo por excelência Daí ter durado por tanto tempo e seguir intacto em muitos pontos ainda que os novos tempos pela realidade du ramente o tenham atingido mormente por lhe desmascarar o falso discurso Ora ele interessa a quem não é atingido por seus tentáculos ou pelo menos pensa se inatingível desde que as bases estão lançadas ex ante o alvo são os outros Não é de estranhar que ele confirme a alusão dos penalistas de se tratar o Direito Penal de uma luta de classes dos que têm contra os que não têm muito menos por outro lado desafia a inteligência pelo menos em relação ao sistema adotado o re sultado no Brasil de um mundo de pobres presos quase a integralidade dos quatro centos e vinte mil ora indicados nos dados oficiais em visível afronta ao princípío da isonomia constitucional Afinal a prisão numa ordem constitucional e democrática é para culpados e de preferência condena dos sejam pobres ou ricos Temse porém uma opção preferencial pelos pobres e por certo podese desconfiar dos motivos mas não se pode ter dúvida de que o sistema processual penal adotado aquele do Siste ma Inquistório é um dos responsáveis Doutra parte o Sistema Acusatório nasce na Inglaterra após a invasão normanda levada a efeito por Guilherme o Conquis tador Na realidade a construção do novo sistema processual se dá sob o reinado de Henrique II talvez o mais importante dos reis ingleses para o Direito Plantageneta Henrique II governou de 1154 a 1189 Ajudou a implantar o sistema feudal na Grã Bretanha porque interessava aos normandos a centralização do poder Assim colocandose no lugar de senhor de todos os feudos transformou os suseranos em grandes vassalos Sua luta foi destinada à unificação da Grã Bretanha o que conse guiu a partir de 1171 quando avança sobre a Irlanda Para manter o controle integral e de sestabilizar o poder dos suseranosgran des vassalos Henrique II seguindo um modelo visivelmente romano impõe uma lei do exército pela qual impede a manu tenção e criação de exércitos feudais em troca de proteção que a todos daria desde Westminster Eis o lugar da força enfim concentrada em suas mãos Por outro lado no campo jurídico es forçase para acabar com os Juízos de Deus presentes também na ilha desde a invasão dos nórdicos E isso faz concentrando na ju risdição de Westminster as decisões e para todos O problema é que alguns resistiram como seria natural Foi o que se passou com o bispo de Canterburry Thomas Becket morto por sicários do rei Assim todos os que se sentissem pre judicados poderiam reclamar ao rei e o faziam por meio de petições Essas em regra eram recebidas e decididas pelo Lord Chanceler e em nome do rei emitiamse ordens escritas writ aos representantes reais locais ditos sheriff a fim de que esse ordenasse que o indicado desse satisfação ao queixoso ou se fosse o caso compare cesse para dar explicações Tal modo de agir forms of action logo abarrotou a jurisdição real e mesmo que o tribunal tivesse sido decomposto dividiu se o chamado Curia regia em três tribunais a situação não encontrava solução Foi daí que Henrique II deu quem sabe o grande passo à construção de um modelo singular Por um novo writ dito novel dis seisin instituiu para Clarendon em 1166 um Trial by Jury Por ele um Grand Jury composto por 23 cidadãos boni homines indictment um acusado e se admitida a acusação seria ele julgado por um Petty Brasília a 46 n 183 julhoset 2009 107 Jury composto por 12 membros Nele o Jury dizia o direito material ao passo que as regras processuais eram ditadas pelo rei O representante real porém não in tervinha a não ser para manter a ordem e assim o julgamento se transformava num grande debate numa grande disputa entre acusador e acusado acusação e defesa Para tanto a regra era a liberdade sendo certo que o acusado era responsável pelas explicações que deveria dar Por sinal não se produziam provas no início o Jury era a prova Elas só vieram como regra nos séculos XV e XVI como evidence quando já não se tinha mais conhecimento dos fatos e portanto era necessário reconstituir o crime e seus pormenores O julgamento nesta dimensão davase normalmente em locais públicos e do pon to de vista político foi uma opção e manobra genial de Henrique II Afinal se o povo condenasse era a resposta do rei se o povo absolvesse era a resposta do rei e assim estava ele sempre do lado aparentemente correto Não é de estranhar aparecerem aforismos como The king can do no wrong Deste modo as regras de processo ou do como se deveria proceder eram gerais e geravam um sistema comum Common Law ao passo que o direito material era local e expresso muito mais como sempre foi pelos costumes que pelas leis Eis por que no Common Law remedies precede rights De qualquer maneira percebase em sendo um sistema tratase dO Common Law e não dA Common Law Ao que por ora interessa vêse que nele a disputa entre acusação e defesa aparentemente tendia e tende a ser leal e indicava uma paridade de condições entre os contendores O vital porém era que os juízes deci diam com base naquilo que sabiam como não poderia deixar de ser mas depois com base naquilo que as partes aportavam ao processo o qual se mostrava como um jogo dialético entre os argumentos delas em geral travado em local público Tal sis tema é o que se convencionou chamar mais tarde na forma como se conhece hoje de Sistema Acusatório e a partir desse padrão domina boa parte dos sistemas processuais penais do mundo Como se pode notar a construção dos sistemas processuais puros se deu por op ções políticas historicamente demarcadas embora tivessem variados os motivos que levaram a tanto 2 Por que todos os sistemas processuais penais são mistos Um sistema processual penal misto ao contrário do que comumente pensam alguns não é a simples somatória de ele mentos dos dois sistemas puros E isso porque epistemologicamente não se sustentaria uma somatória do gênero por um lado mas por outro e quiçá mais relevante porque o própria noção de sis tema não comporta algo do gênero Ora como precitado o nascimento dos sistemas processuais penais puros não se deu em função de bases filosóficas ou pelo menos não foram elas as forças motrizes das suas constituições e sim opções políticas tanto na Igreja Católica quando do nasci mento do Sistema Inquisitório embora nela se soubesse da questão ligada ao pensamento aristotélico quanto na Grã Bretanha de Henrique II onde nasce como hoje estrutu rado o Sistema Acusatório quando por certo sequer se cogitou sobre o assunto dado estar a atenção quase que integralmente voltada para outros pontos todos políticos Do ponto de vista filosófico então a preocupação com os modelos processuais penais só aparece mais tarde e como não poderia deixar de ser em face do momento histórico sempre vinculada à chamada Filosofia da Consciência Tendo por referência o pensamento cartesiano objeto e método sempre foram os núcleos da base filosófica de descoberta da verdade Assim se pensava o mundo e da mesma forma se passava então com o Revista de Informação Legislativa 108 Direito e seus ramos Com o Direito Pro cessual Penal não seria diferente Enquadrado como uma estrutura com plexa por definição o processo e a teoria toda que lhe sustentava não poderia ser pensado hilemorficamente mesmo porque integrado por elementos que por si sós eram de uma complexidade intolerável à redução à unidade necessidade inafastável no modelo aristotélico Bom exemplo era e segue sendo a audiência Eis por que dentre outros motivos com o tempo passou a ser pensado o processo pela matriz sistêmica agora vista no mode lo kantiano Ora como se sabe foi Kant que concebeu na sua Arquitetônica da Razão Pura na sua obra Crítica da Razão Pura a possibilidade de se encontrar a verdade em es truturas complexas e assim o fez imaginando a possibilidade de se conhecer os conjuntos sýstema do grego Para ele sistema era o conjunto de elementos colocados em relação sob um ideia única Ela por sua vez seria determinada pela finalidade do conjunto e estaria colocada como princípio de liga ção entre os elementos integrantes logo funcionaria como um princípio unificador reitor da conexão e como tal dado a priori Foi assim que se pode pensar em sistemas nos mais variados campos algo que vai do sistema solar ao sistema de governo ou seja matéria aparentemente de conhecimento corriqueiro no cotidiano Em todos porém há um princípio unificador Por este viés não é difícil compreeender que todas as ciências e teorias se fundam em princípios unificadores ali colocados como a representação da coisa da Verdade que se existir não pode ser dita justo por faltar linguagem para tanto Tal princípio unifica dor reitor fundante que se coloca no lugar da Verdade que se não pode dizer é um mito ou seja a verdade com minúscula que é dita como linguagem no lugar daquilo que em sendo não pode ser dito É o significante primeiro Os sistemas processuais penais por tal vereda vão pensados assim e por isso relacionados ao fim último do processo dicere ius ou iuris dictio expressão do sentire sentença do órgão jurisdicional Para decidirsentenciar todavia precisase de conhecimento e para tanto fazse mis ter como se sabe da prova tudo aquilo que é produzido introduzido no processo com o objetivo de tornar conhecido fatos pessoas ou coisas Neste momento ganha grande sig nificado o conceito de processo aventado por Canuto mendes de Almeida isto é algo como a reconstituição histórica de um fato pretérito que é o crime Não se trata do crime tenhase bem presente já existente pelo menos apa rentemente mas da sua reconstituição algo que se faz pela linguagem como não se pode negar Eis então a razão pela qual a lingua gem é tão importante no espaço do Direito Processual Penal Afinal consumado o crime teoricamente falando obviamente daí por diante tudo já é matéria processu al e assim caminhase nos labirintos da linguagem Salvo as raríssimas exceções dadas pelos chamados atos reais embora até eles sejam discutíveis enquanto tal vistos na visão de Goldschmidt tudo o mais é pura linguagem Não é de estranhar não obstante a investigação preliminar é sempre linguagem a denúncia é no que mais interessa a imputação linguagem a prova mormente aquela quantitativamente mais significativa a testemunhal é pura linguagem as razões e alegações das partes são pura linguagem as decisões máxime as sentenças da mesma forma são linguagem e assim por diante Estáse portanto no reino da linguagem Sem embargo disso não são poucos os que sustentam a necessidade e por que não a concreta possibilidade de se enten der e discutir tudo a partir da descoberta da Verdade por evidente que ignorando os giros produzidos pela linguagem Para tanto se passar como parece elementar há sem dúvida uma crença na real possibi lidade de se obter a Verdade pelo conhecimento do objeto e assim apostase nos postulados da Filosofia da Consciência como o genial Brasília a 46 n 183 julhoset 2009 109 caminho de descoberta O sujeito dá conta do objeto porque antes de tudo crê no método do qual dispõe a lógica dedutiva Não é de estranhar que tudo seja pensado por silogismos No processo penal o sujeito deve conhecer e assim ter acesso e por ele domínio ao fato criminoso objeto demarcado pelo caso penal que dele resulta com a aparente ou concreta consumação do crime o que se dá pela reconstituição precitada ou seja pelo método adotado O problema é que é o fim do sistema como referido que resignifica o princípio unificador e ele como é elementar ganha um colorido diferente nos dois sistemas co nhecidos o princípio unificador será inquisitivo se o sistema for inquisitório e será dispositivo se o sistema for acusatório Como ideia única não comporta divisão e deste modo não se pode ter um princípio misto e de conse quência um sistema misto Ora se todos os sistemas processuais penais da atualidade são mistos e desde a noção de sistema não se pode ter um sis tema misto parece óbvio que que se trata de um problema meramente conceitual e não fático Desde uma visão mais adequada os sistemas são mistos não por força da simples somatória dos elementos que os integram mas fundamentalmente porque em sendo sistemas regidos pelo princípio inquisitivo têm agregados a si elementos provenientes do sistema acusatório como vai suceder com o sistema processual penal brasileiro em vigor e que tem por base o CPP de 1941 ou em sendo regidos pelo princípio dispositivo têm agre gados a si elementos provenientes do sistema inquisitório como vai suceder com o sistema processual penal norteamericano Neste passo porém ainda não se tem uma diferença concreta entre os sistemas mistos como se pode perceber E ela a di ferença não se dá em razão do arcabouço filosófico colocado à disposição muito menos pelas regras jurídicas que podem reger a matéria Na realidade e em com patibilidade com o que se pode ler dos fundamentos históricos dos dois sistemas a opção no caso é política seja por um ou por outro sistema Ora fazse uma opção política quando se dá a função de fazer aportar as provas ao processo seja ao juiz como no Sistema Inquisitório seja às partes como no Sistema Acusatório por evidente que sem se excluir eis por que todos os sistemas são mistos as atividades secundárias de um e de outros tudo ao contrário do que se passava nos sistemas puros Daí que a gestão da prova caracteriza sobremaneira o princípio unificador e assim o sistema adotado Isso embora não seja por nada compli cado tem sido difícil muito difícil fazer entender a alguns que primam pela leitura óbvia da vida como linearidade como se fossem imagens de um espelho e assim seguem insistindo contra a Constituição em manter o Sistema Inquisitório que se retira antes de tudo do CPP em permanente conflito com o modelo constitucional que reclama um devido processo legal e assim in compatível com aquele no qual o juiz é o senhor do processo o senhor das provas e sobretudo como sempre se passou no Sistema In quisitório pode decidir antes naturalmente raciocinando por primário e em geral bem intencionado e depois sair à cata da prova que justifique a decisão antes tomada Nos labirintos do sistema processual penal brasileiro habita Inocêncio III e não são poucos os que gozam o lugar de um Tor quemada Nunca se terá democracia proces sual desse modo por evidente mesmo se se pensar tão só nos grandes magistrados Um sistema desse porte em que se controlam as premissas não só não é alheio ao solipsismo como lhe incentiva E o pior é que a Consti tuição da República não se faz viva 3 O sistema processual penal atual a inquisição do CPP de 41 O sistema processual penal brasileiro atual assentado no CPP de 41 cópia do Revista de Informação Legislativa 110 Codice Rocco da Itália de 1930 o fascista Vincenzo manzini na dianteira tem por base e sempre teve a estrutura inqui sitorial Por trás de todos estava o Code Napoleón de 17111808 em vigor desde 01011811 pilotado por JeanJacquesRegis de Cam bacérès homem de habilidades políticas conhecidas mas sobretudo conhecedor das maneiras de como dobrar o Imperador Foi dele depois arquichanceler do Império a ideia de mesclar a investigação preliminar colhida nos mecanimos inquisitoriais das Ordonnance Criminelle de 1760 de Luís XIV com uma fase processual no melhor estilo do Júri inglês então adotado pelos franceses mutatis mutandis por um De creto de 1629091791 e combatido desde a adoção Salvavase retoricamente pela fase processual a democracia dos julgamentos dandolhes uma aparência acusatória e assim um espetáculo com partes acusação e defesa debates orais e de certa forma tão só a intervenção do juiz para o controle da sessão Tudo era contudo só retórica de um chamado processo misto No fundo toda a prova produzida na primeira fase da persecução em regra por um juiz instrutor na investigação preli minar puramente inquisitorial era usada na fase processual por exemplo por sua leitura no chamado Jugement A sessão vi rava como era sintomático teatro não raro pantomima puro embuste e os discursos pomposos e longos inflação fonética As cartas do jogo já estavam marcadas e para desdizer isso era preciso desacreditar na figura democrática do juiz instrutor tão inquisidor quanto qualquer outro que na história ocupou aquele lugar O mister não era e segue não sendo singelo Querendose ou não a figura do juiz sem pre foi e continuará sendo muito próxima àquela do pai inclusive pelas funções que ambos exercem Natural então que se não tenha muito ânimo para dele discordar mormente quando vai coadjuvado pela acusação ou pela defesa tomandose em consideração poder pender para qualquer dos lados embora como regra tenda a prestigiar a acusação O dito processo misto com o hálito do qual Napoleão tocou o mundo a partir da Europa continental mostrouse desde sem pre uma fraude à democracia processual No fundo o sistema napoleônico nada mais era e é para quem o adota um Sistema Misto ou seja um Sistema Inquisitorial mesclado com elementos provenientes do Sistema Acusatório sobretudo partes acusação separada formalmente do órgão julgador e debates orais Por ele e para ficar em poucos exem plos nazistas fascistas soviéticos e todos os regimes totalitários chamaram de democráticos seus sistemas processuais penais em geral tratandoos como Sis temas Acusatórios Cambacérès segue desde o inferno gozando a dor da injus tiça que se perpetua pelo mundo sempre em nome da Verdade das boas intenções dos inquisidores basta estar naquele lugar para ser um deles e do chamado Sistema Misto Inquisitorial agregado com elemen tos outros apresentado como Sistema Acusatório em razão da fase processual comportar órgão de acusação diferente aparentemente daquele julgador debates orais e sobretudo partes Tais elementos como se sabe são deveras importantes para ajudar a se caracterizar um sistema processual mas sem dúvida assim como outros secundários O processo regido pelas precitadas Ordonnance Criminelle de Luís XIV tinha todos eles e foi quem sabe o maior monumento inquisitorial laico da história da humanidade No Brasil tal modelo foi adotado qua se que com a mesma conformação isto é aquela copiada do código italiano de 1930 Interessava ao ditador de plantão ainda mais porque em face dos jogos de poder do Império acabouse por adotar em 1871 Lei no 2033 de 20091871 no lugar do chamado Juizado de Instrução o Inquérito Policial No fundo não há diferença excep Brasília a 46 n 183 julhoset 2009 111 cional entre eles dado se tratar sempre de mecanismo inquisitorial onde reside o problema qualquer um que estiver naque le lugar repitase tenderá a fazer o papel de inquisidor exerça a função que exercer Por sinal o mister já esteve em mãos aos bispos e tudo deu no que deu como se sabe O diverso sem dúvida entre lá e cá é que nos modelos europeus continentais quase sempre variações do modelo primei ro do Code Napoleón o Juizado de Instrução permitiu quando do avanço democrático do século passado adaptações tanto ne cessárias quanto interessantes a ponto de se poder seguidamente colocar em causa o próprio sistema como sucedeu na Itália do pósguerra Aqui porém isso não é pos sível em função do status constitucional da investigação preliminar realizada pela Polícia Judiciária e uma evolução deve ser pensada desde outra perspectiva O certo não obstante é que o CPP configura um Sistema Misto e deste modo mantém na base o Sistema Inquisitorial e a ele agrega elementos típicos da estrutura do Sistema Acusatório Pesa nele em todos os quadrantes a sobreposição de funções do órgão jurisdicional e do órgão de acusação Quando o juiz é o senhor plenipotenciário do processo ou quase e pode buscar e produzir a prova que quiser a qualquer momento na fase de investigação e naquela processual não só tende sobremaneira para a acusação como em alguns aspectos faz pensar ser despiciendo o órgão acusatório O sério problema que surge com certo ar de naturalidade é que esse mesmo órgão jurisdicional que investiga e produz provas vai depois julgar ou seja acertar o caso penal Isso por si só faz pensar na falta de im parcialidade tomada como equidistância das partes e seus pedidos e por suposto no vilipêndio daquilo que é para alguns quase sacro na Constituição o lugar que a nação delega a quem é investido do poder jurisdicional mormente para decidir por ela contramajoritariamente O CPP e o sistema como um todo como poucos outros instrumentos legais oferece condições quase ilimitadas para o agir jurisdicional nesse âmbito de busca e produção da prova em qualquer das fases processuais agora ainda mais ressaltado pelas regras do art 156 CPP com redação da Lei no 11690 de 090608 comprovação inequívoca de ser o sistema na base in quisitorial Art 156 A prova da alegação in cumbirá a quem a fizer sendo po rém facultado ao juiz de ofício I ordenar mesmo antes de iniciada a ação penal a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes observando a necessida de adequação e proporcionalidade da medida II determinar no curso da instru ção ou antes de proferir sentença a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante Com tamanha liberdade probatória o juiz no sistema processual penal brasileiro e basta apontar em tal direção pode fazer quase tudo o que pretender Isso se dará no mais das vezes dentro daquilo que Franco Cordero chamou de lógica deforme La solitudine in cui gli inquisitori la vorano mai esposti al contraddittorio fuori da griglie dialettiche può darsi che giovi ao lavorìo poliziesco ma sviluppa quadri mentali paranoidi Chiamiamoli primato dellipotesi sui fatti chi indaga ne segue una talvol ta a occhi chiusi niente a garantisce più fondata rispetto alle alternative possibili né questo mestiere stimola cautela autocritica siccome tutte le carte del gioco sono in mano sua ed è lui che lhá intavolato punta sulla sua ipotesi Sappiamo su quali mezzi persuasivi conti alcuni irresistibili ad esempio la tortura del sonno calda mente raccomandata dal pio penalista Ippolito marsili usadoli orienta lesito dove vuole Nelle cause milanesi de Revista de Informação Legislativa 112 peste manufacta giugnoluglio 1630 vediamo come giudici nientaffatto disonesti anzi inclini a inconsueto garantismo fabbrichino delitto e de linquenti linquisito risponde docil mente linquisitore gli scova in testa i fantasmi che vi há proiettato1 Aqui quem sabe o grande motivo por que a opção política deve ser pelo Sistema Acusatório Afinal o primado das hipóteses sobre os fatos não é algo excepcional no Sis tema Inquisitório e sim mecanismo compa tível como o simples modo de pensar por sinal da civilização ocidental toda logo tende a atingir qualquer um e não porque são juízes mas porque são humanos Ora navegando com o pensamento para o futuro e para o passado tendese a acreditar nas imagens produzidas pela razão É certo não obstante que tal crença não é definitiva e assim poderseia dizer que admite prova em contrário ou seja pode se voltar atrás da posição anteriormente tomada mesmo porque se assim não fosse a imagem assumida se converteria em real e se estaria diante de uma psicose típica a paranóia Sem se poder descartar tal hi pótese a regra é que assim não seja e por isso Cordero como se vê fala em quadros 1 CORDERO Franco Guida allá procedura penale Torino UTET 1986 p 5152 A solidão na qual os inquisidores trabalham jamais expostos ao contra ditório fora dos grilhões da dialética pode ser que ajude no trabalho policial mas desenvolve quadros mentais paranóicos Chamemoos primado das hipó teses sobre os fatos quem investiga segue uma delas às vezes com os olhos fechados nada a garante mais fundada em relação às alternativas possíveis nem esse mister estimula cautelarmente a autocrítica assim como todas as cartas do jogo estão na sua mão e é ele que as coloca sobre a mesa aponta na direção da sua hipótese Sabemos com quais meios persuasivos conte alguns irresistíveis por exemplo a tortura do sono calorosamente recomendada pelo pio penalista Ippolito marsili usandoa orienta o êxito para onde quer Nos processos milaneses sobre a peste manufa turada junhojulho de 1630 vemos como juízes por nada desonestos antes inclinados a um incomum ga rantismo fabriquem delito e delinqüentes o inquirido responde docilmente o inquisidor lhe retira da cabeça os fantasmas que lhe há projetado mentais paranóicos Em suma tendem a pre valecer as hipóteses assumidas sobre os fatos e com liberdade o juiz orienta o êxito para onde quiser Duvidoso desde sempre é o acerto da decisão tomada pelas aparências Esse lugar sem embargo de iludir a muitos é na análise estupenda de Lacan por excelência o lugar do engodo da fraude do engano como não poderia deixar de ser A única esperança diante de tal quadro é o juiz desconfiar sempre e sempre das suas próprias aparênciasimagens e de consequên cia das suas decisões colocandoas à prova até quando não mais for possível em face do rito e o momento determinado para a sentença porque teoricamente nela poderia encerrar sua ativida de judicante no caso concreto Estarseia por elementar no oposto da lógica deformada e por certo seria o ideal Tratase como se pode perceber de tarefa impossível ou quase Seria como pedir ao humano que deixasse de pensar ou por outro lado que resistisse sempre às pulsões inconscientes Em realidade não é possível nem uma nem outra e se assim é a solução no plano da normalidade está em outro lugar 4 O sistema processual penal no Projeto 15609PLS A Comissão que elaborou o anteprojeto de lei de reforma global do CPP agora convertido no Projeto no 15609PLS ao meditar sobre a questão e como não po deria deixar de ser diante das regras cons titucionais optou pela adoção da base do Sistema Acusatório e assim estabeleceuse um câmbio epistemológico sem preceden tes no país se aprovado o precitado projeto se terá um Sistema Misto e deste modo à base do Sistema Acusatório se agregará elementos provenientes em menor escala do Sistema Inquisitório mas o sistema de re gência será o acusatório e isso abre novas e melhores perspectivas para a democracia processual Depois de mais de oitocentos anos de domínio inquisiorial chegase à conclu Brasília a 46 n 183 julhoset 2009 113 são óbvia que o problema é ele o Sistema Inquisitório e que não vale o investimento na certeza de que os homens vencerão a batalha contra sua consciência e inconsci ência O Direito por certo como sempre demonstrado tem um papel vital na socie dade mas não o condão de lhe ditar com proeminência os passos Neste caso a opção pela base do Sistema Acusatório é uma prestação de contas com a realidade principalmente porque depois de 1988 não mais faz sentido começan do pela inconstitucionalidade nenhum ordenamento que se coloque de forma incompatível com a Constituição Desde este ponto de vista o princípio republicano o princípio da isonomia o princípio do devido processo legal e o princípio da fundamentação de todas as decisões dentre outros formam um qua dro onde não há espaço para o predomínio da base do Sistema Inquisitório Eis por que a opção da supracitada Comissão foi com precisão pelo Sistema Acusatório No Projeto no 15609PLS aparece a ma téria antes de tudo na regra do art 4o Art 4o O processo terá estrutura acusatória nos limites definidos neste Código vedada a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação O texto merece alguma reflexão sem embargo da sua precisão linguística mes mo porque em tal matéria e em tantas ou tras nada se concluiu sem discordância Neste aspecto o anteprojeto hoje Projeto no 15609PLS foi um exemplo de democracia e contou com o comando do ministro Hamilton Carvalhido o Coorde nador da Comissão sem o qual por certo não teria vindo à lume Da mesma forma foi imprescindível o esforço do Relator Prof Dr Eugênio Pacelli de Oliveira autor inclusive de grande parte da Exposição de motivos Decisivo não obstante foi a tolerância e compreensão de todos os mem bros Com diferenças tão marcantes nada teria andado e muito menos o resultado teria ocorrido se não fosse o ambiente de respeito mútuo e amizade Em definitivo a democracia só se perfaz onde houver respeito pela diferença Isso de qualquer forma não retirou acirradas disputas por pontos capitais e dentre eles este referente ao sistema pro cessual a ser adotado A resistência tenaz e acompanhada de um discurso inteligente fez presente um lugar comum naqueles que apostam nas possibilidades de câmbio do Sistema Inquisitório Para eles podese mudar sem mudar a estrutura o que do ponto de vista epistemológico como antes anotado não parece ser possível Por elementar não se precisa saber muito de Bachelard para se ter presente que a evolução científica se dá a partir de rompimentos epistemológicos daí o cor te de que ele falava justo para se negar um passado de erros Esses sabem todos traduzemse nas verdades que se carrega as quais precisam ser abandonadas para se poder evoluir cientificamente Afinal como disse Warat em certa passagem as verdades consolidadas nos escravizam àquilo que é eternamente ontem Tratase de uma escravidão sem dú vida mas arregimenta para o vivente um gozo traquilizador aquele mesmo que lhe dá a sensação de segurança Romper desta maneira é superar a disputa entre a razão e o desejo sendo certo que dele não se tem domínio algum Falou mais forte no caso concreto a exigência que a Comissão se impôs de elaborar um anteprojeto que estivesse em plena compatibilidade com a Constituição da República motivo pelo qual daqui por diante será difícil sair de tal via em consonância com os ditamos regentes da vida atual Eis então por que a opção foi pelo texto do art 4o precitado Nele resta patente que a gestão da prova escapa do comando direto do juiz e assim passa ele a ter em sua plenitude ou quase a função que a Constituição lhe Revista de Informação Legislativa 114 reserva garante de ordem constitucional e por isso do cidadão Procurase acabar deste modo e de vez com a sobreposição de funções entre o órgão ju risdicional e aquele acusador Daí a criação de um Juiz das Garantias para a Investigação Preliminar na qual não atua senão para controlar eventual invasão indevida na es fera dos direitos e garantias individuais O juiz das garantias é responsável pelo con trole da legalidae da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia tenha sido reservada à auto rização prévia do Poder Judiciário art 15 Não tem competência assim para sair à cata da prova que em tal momento não lhe interessa eis que buscada para propiciar ao ministério Público exercer a ação penal e obter se for o caso a tutela jurisdicional para o processamento do caso penal Na fase processual da persecução por seu turno o juiz do processo e não mais aquele Juiz das Garantias terá uma par ticipação decisiva mas não em matéria probatória À acusação cabe provar os fatos imputados como deve ser de fato sem a interveção direta do magistrado a não ser para sanar dúvida pontual em algumas hipóteses por exemplo complementando com perguntas as inquirições das testemu nhas Daí o veto à iniciativa do juiz no sen tido da substituição da atuação probatória do órgão da acusação Dúvida maior porém veio com a inter venção dele quanto à produção da prova de defesa Parte da Comissão entendeu que isso não se deveria passar dentre ou tros motivos pelo fato de que ao final se houver dúvida deve o réu ser absolvido em face do in dubio pro reo Ademais à intervenção probatória do magistrado não se tem pela lei qualquer mecanismo de garantia que não atuará ele contra o réu e sim a seu favor mais que jurídica por tanto a questão se demostrará ética e os riscos da sobrevivência inquisitorial serão concretos dado se continuar a depender dos próprios juízes e assim da construção de uma cultura que os coloque para sempre no seu devido lugar algo aparentemente muito difícil no início enquanto não houver contra o sistema atual uma mentalidade constitucional arraigada 5 O lugar constitucionalmente demarcado das partes e o Projeto 15609PLS À guisa de conclusão parece relevante ressalvar um dos maiores efeitos da ado ção no Projeto no 15609PLS da base do Sistema Acusatório ou seja o lugar das partes no processo em face das regras constitucionais Ninguém desconhece que um processo de cariz acustório faz sobressair os direitos e garantias individuais e diante dos casos penais acaba por salientar a proibição de excesso art 5o Estáse em consonância com a CR88 A cultura acusatória do seu lado impõe aos juízes o lugar que a Constituição lhes reservou e de importância fundamental a função de garan te Contra tudo e todos se constitucional devem os magistrados assegurar a ordem posta e de consequência os cidadãos individualmente tomados À ordem de prevalência nesta dimensão não se tem muito o que discutir mormente porque não há direito coletivo mais relevante que aqueles fundamentais dos cidadãos Devese ver com parcimônia portanto toda a grande disputa que se levou à ribalta entre os direitos individuais e os coletivos da sociedade como um todo mormente porque em um Estado de democracia tar dia a figura do juiz é imprescindível para o cidadão com frequência vilipendiado em seus direitos e infinitamente mais fraco por sinal como projetado pelos contratualistas embora não se possa ingenuamente asse verar sem restrições em relação a todos coisa do gênero A isonomia porém não faz distinção entre os cidadãos e isso é imprescindível para se deitar a luz consti tucional sobre todos Brasília a 46 n 183 julhoset 2009 115 Da sua parte o Ministério Público tam bém vai ganhar o lugar que a Constituição lhe assegura muito mais relevante que aquele do Sistema Inquisitório algumas vezes secundário outras de coadjuvante mas também em constante conflito com a CR88 A noção do dominus litis agora poderá enfim calharlhe como devido Afinal é para ele que se produzem as provas na investigação preliminar e por isso serlhe primário o controle externo dela Ganha por outro lado uma mitigação o princípio da obrigatoriedade da ação e por isso em muitos casos poderá optar entre outras coisas por uma forma peculiar de bargaining embora ainda seja acanhada a proposta do Projeto Da mesma maneira embora tenha havido evolução na aplicação do princípio da dispo nibilidade do conteúdo do processo ela ainda foi tímida num processo penal de matriz acusatória o mP deve ter a mais ampla liberdade neste sentido porque valendo quase que tão só a prova da instrução processual a ressalva são aquelas reais é mais coerente poder retirar a acusação que ser forçado a levar os pedidos até o final e vêlos improcedentes com trânsito em julgado material da sentença logo sem a menor possibilidade de renovação da ação Pouco razoável neste contexto a manutenção da regra atual do art 385 no art 409 do Projeto Ora o juiz poder condenar contra o pedido do mP vertido no texto como mera opinião O juiz poderá proferir sentença condenatória nos estritos limites da denúncia ainda que o ministério Público tenha opinado pela absolvição não podendo porém reconhecer qualquer agravante não alegada ou causa de aumen to não imputada Em suma espraiada pelo Projeto inteiro vêse uma grande evolução das atribuições do mP mas sem dúvida ainda foi acanhada e fruto de um aparente medo já não mais cabível nos tempos atuais A maior liberdade sabese bem é sempre acompanhada da responsabilidade se em questão está a ordem constitucional Por fim a defesa ganha mecanismos para se efetivar corretamente Autodefesa e de fesa técnica como previsões legais podem não ser nada se as pessoas que as agitam não têm o devido domínio do lugar ocupa do Fala forte neste espaço a diferença eco nômica dos réus e a consciência necessária sobre o assunto Daí ser inarredável a exi gência do Estado construir como é de sua obrigação em todos os níveis competentes Defensorias Públicas que respondam den tro do devido padrão de qualidade exigido pelas funções que lhes foram atribuídas na Constituição Assim sem o correto acesso à Justiça aos menos favorecidos não haverá nunca democracia processual Não se trata há de se entender de pregar e impor um sistema processual em favor dos criminosos como sem qualquer procedência têm pregado os menos avisa dos sempre adeptos à força em geral à Lei e Ordem desde que seja contra os outros obviamente O Sistema Acusatório não é e nunca foi sinônimo da impunidade algo por sinal por que se reclama tanto do sistema atual Tratase isso sim de um sistema que realça o papel das partes a começar por aquele do juiz não só por compatibilizá los com os ditames constitucionais mas sobretudo em razão de permitir que se caminhe na direção de uma maior demo cracia processual
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Brasília a 46 n 183 julhoset 2009 103 Sumário 1 Os dois sistemas processuais penais 2 Por que todos os sistemas processuais são mistos 3 O sistema processual penal atual a inquisição do CPP de 41 4 O sistema proces sual penal no Projeto 15609PLS 5 O lugar constitucionalmente demarcado das partes e o projeto 15609PLS 1 Os dois sistemas processuais penais Todos os sistemas processuais penais conhecidos mundo afora são mistos Isto significa que não há mais sistemas puros ou seja na forma como foram concebidos Há de se entender porém o que se quer dizer com tal assertiva tão difundida quanto malentendida A compreensão da questão passa por uma dúplice análise em primeiro lugar da própria noção de sistema e depois da possibilidade ou impossibilidade de se ter sistemas mistos Ora temse presente que os sistemas ditos puros nasceram na forma como os conhecemos no início do século XIII embora outros tenham existido inclusive com tais nomes antes por exemplo entre os romanos Esses porém só para alusões secundárias têm alguma importância naquilo que aqui interessa ou seja a in vestigação dos modelos atuais precisos e datados inclusive para não se permitir uma maior confusão sistema acusatório Cada parte no lugar constitucionalmente demarcado Jacinto Nelson de miranda Coutinho Jacinto Nelson de miranda Coutinho é Pro fessor Titular de Direito Processual Penal na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná Especialista em Filosofia do Direito PUCPR mestre UFPR Doutor Università degli Studi di Roma La Sapienza Coorde nador do Núcleo de Direito e Psicanálise do PPGDUFPR Advogado Procurador do Estado do Paraná Conselheiro Federal da Ordem dos Advogados do Brasil pelo Paraná membro da Comissão Externa de Juristas do Senado Federal que elaborou o anteprojeto de CPP hoje Projeto no 1562009PLS Revista de Informação Legislativa 104 Os dois sistemas dos quais se fala inqui sitório e acusatório vieram a lume como se sabe por razões políticas Outras de ordem teológica econômica filosófica e jurídica entre tantas foram altamente relevantes mas decididamente secundárias ou pelo menos sempre estiveram subordinadas àquelas políticas O Sistema Inquistório aparece no âmbito da Igreja Católica e tem seu marco histórico 1215 em face do IV Concílio de Latrão Em síntese poderseia dizer que desde o século anterior século XII mais parti cularmente em seu final a Igreja Católica se debatia com um fenômeno social inte ressante pensavam alguns estar em risco o seu domínio sobre o mundo conhecido do qual era detentora da grande parte Sua doutrina era visível já não encontrava ressonância plena e portanto havia discór dia em alguns pontos capitais Pensavase que isso era fruto de doutrinas heréticas e portanto de postulados contrários àque les pregados desde Roma Sabiase por sua parte isso só ser possível em razão de ou tros fundamentos epistêmicos e assim não era tarefa fácil nem banal o seu combate Algumas medidas já haviam sido toma das Inocêncio III o papa de então havia baixado uma Bula Vergentis in senium em 1199 equiparando o crime de heresia ao de lesa majestade historicamente o mais grave dos crimes Ela como tal produziu poucos efeitos porque eventual punição ainda esta va afeta aos leigos que ademais começavam a avolumar poder em face do crescimento das nascentes cidades medievais construí das não pela decadência dos feudos mas sobretudo em função da necessidade dos senhores das caravanas melhor conduzirem e distribuírem suas mercadorias fato deter minante não só da criação dos entrepostos comerciais mas principalmente para serem eles regidos por uma outra mentalidade ligada ao comércio e portanto muito dife rente daquilo que se tinha nos feudos Os entrepostos comerciais foram trans formados em burgos vilas E tinha outra perspectiva a vida que ali se levava criase um novo sistema de trocas e já não mais cada um respondia pela sua própria so brevivência mas dependia dos outros o que se vê pelas chamadas Corporações de Ofício cada uma produzindo um tipo ou tipos de bens Era natural que se não pensasse nos burgos como se pensava nos feudos e se vivesse de outro modo embora no início tenha sido muito difícil não raro mais que antes nos feudos porque o regime das relações pessoais era em grande parte pior que aquele dos escravos À Igreja Católica ou parte dela impor tava porém não o fato de haver diferença entre o burgo e o feudo mas sim naquele que não mais tinha um domínio pleno agora eclipsado por aquele dos burgue ses senhores das caravanas do comércio e do grosso do dinheiro E sem volta pelo menos aparente Aqui então o dilema o que fazer em relação a tal ponto Por evidente e como não se duvida o movimento migratório na direção dos burgos foi acompanhado como não poderia deixar de ser pela Igreja Católica Sua presença nos burgos desde o início principalmente nos séculos X e XI não foi suficiente para aplacar o móvel do cres cimento ou seja o desejo mola mestra da propulsão de qualquer sociedade O problema assim estava em como não perder para essa nova mentalidade dado ser complicado e sempre foi lutar contra o desejo Por trás de tudo estava já haviam diag nosticado Aristóteles e um outro modo de se pensar a vida Basta ver o que se passou com os Cátaros Católicos como todos os demais essa gente não tinha aparente mente nenhum motivo para ter contra si uma Cruzada ordenada por Inocêncio III a qual se converteu em uma guerra sem tamanho Como pano de fundo estava sabese bem o pensamento de Aristóteles presumivelmente incorporado a partir do contato mediterrâneo com os comerciantes Brasília a 46 n 183 julhoset 2009 105 do norte da África e do Oriente médio Já não era contudo uma Cruzada contra os bárbaros incrédulos como se havia pas sado com tal desculpa antes Era contra iguais na fé por certo que determinada por outras razões filosóficas e econômi cas Para tanto basta ver o que fizeram a Carcassone Toulouse e outras cidades arrasadas e saqueadas Outro forte sintoma da fragilidade do domínio do pensamento da Igreja Católica se deu com a criação das Universidades quase todas produzidas como Studium Urbis justo para preparar as pessoas para a nova realidade social dos burgos O dilema assim não era simples há de se reconhecer E se sabia das causas no âmbito da Igreja Católica onde nunca se desconheceu Aristóteles mas por conve niência adotouse o pensamento de Platão a verdade em um mundo hipostasiado dado ser ajustado como uma luva aos seus interesses desde a conversão de Constan tino Por sinal Aristóteles na sua maior extensão só toca o mundo cristão verda deiramente com o gênio de São Tomás de Aquino mas no século XIV No início do século XIII então presente o problema Inocêncio III reúne a cúpula da Igreja Católica em São João de Latrão e ali em 1215 decidese fazse uma opção pela força É o nascimento de um novo modelo processual ao qual não interessava aquele que estava em vigor ou seja os chamados Juízos de Deus adotado ou domesticado dos invasores bárbaros vindos do norte para demolir o império romano No IV Concílio de Latrão decidese entre outras coisas pela confissão pessoal obrigatória pelo menos uma vez ao ano e ela é o marco histórico do novo sistema A partir daí a noção de Bulgaro actus trium personarum iudiciis actori et rei tende a de saparecer pelo menos em processo penal Tudo se consolida com uma Bula de Gregório IX Ex Excomuniamus de 1231 donde se delineia o arcabouço técnico e com a Bula Ad extirpanda de Inocêncio IV em 1252 extendida ao mundo em 1254 pela qual abriuse o espaço definitivo para os métodos utilizados na Inquisição de modo que Inquisitor e Socius se absolvessem mutuamente por eventuais demasias entre elas na tortura A Igreja Católica tocava à barbárie que tanto havia criticado no início do catolicismo romano quando os católicos foram perserguidos torturados e mortos Excluídas as partes no processo inqui sitório o réu vira um pecador logo detentor de uma verdade a ser extraída mais importante aparentemente que o próprio crime tornase ele objeto de investigação É sobre si que recaem as atenções os esforços do inquisidor Dententor da verdade dela deve dar conta Eis a razão por que a tortura ganhou a importância que ganhou e a confissão virou regina probationum Se o inquirido resistisse merecidamente poderia ser absolvido e de alguns se tem notícia Era algo um tanto difícil usando se como se usava os métodos de per quirição A verdade estava dada ex ante e o inquisidor dela tinha ciência de modo que o trabalho abjeto em realidade era um jogo de paciência e ao final confessar dentro do modelo proposto era a vitória da Inquisição mas para o consumo geral vitorioso era o inquirido que como prêmio ganhava a absolvição nem que de tanto em tanto fosse parar na fogueira para mais rápido entregar sua alma a Deus modelo hipócrita dado a decisão estar preordenada Com o resultado antecipado pelo menos ao raciocínio mais hábil o resto eram os modos de se confirmar aquilo que a razão já havia projetado Como modelo a analítica de Aristóte les pela lógica dedutiva Com o domínio pleno das premissas o inquisidor conduz o resultado para onde quiser O modelo é genial não fosse antes diabólico embora nascido como se viu no seio da Igreja Católica Em um tempo extre mamente místico não poderia ser diferente Resistiu e resiste como o mais apurado sistema jurídico do qual se tem conheci Revista de Informação Legislativa 106 mento tendo persistido por tanto tempo justo por sua simplicidade isto é porque usa o próprio modelo de pensamento por excelência da civilização ocidental Ao permitir sobremaneira que se manipule as premissas jurídicas e fáticas interessa e sempre interessou aos regimes de força às ditaduras aos senhores do poder Podendose orientar o êxito fazse o que quiser É o reino do solipsismo por excelência Daí ter durado por tanto tempo e seguir intacto em muitos pontos ainda que os novos tempos pela realidade du ramente o tenham atingido mormente por lhe desmascarar o falso discurso Ora ele interessa a quem não é atingido por seus tentáculos ou pelo menos pensa se inatingível desde que as bases estão lançadas ex ante o alvo são os outros Não é de estranhar que ele confirme a alusão dos penalistas de se tratar o Direito Penal de uma luta de classes dos que têm contra os que não têm muito menos por outro lado desafia a inteligência pelo menos em relação ao sistema adotado o re sultado no Brasil de um mundo de pobres presos quase a integralidade dos quatro centos e vinte mil ora indicados nos dados oficiais em visível afronta ao princípío da isonomia constitucional Afinal a prisão numa ordem constitucional e democrática é para culpados e de preferência condena dos sejam pobres ou ricos Temse porém uma opção preferencial pelos pobres e por certo podese desconfiar dos motivos mas não se pode ter dúvida de que o sistema processual penal adotado aquele do Siste ma Inquistório é um dos responsáveis Doutra parte o Sistema Acusatório nasce na Inglaterra após a invasão normanda levada a efeito por Guilherme o Conquis tador Na realidade a construção do novo sistema processual se dá sob o reinado de Henrique II talvez o mais importante dos reis ingleses para o Direito Plantageneta Henrique II governou de 1154 a 1189 Ajudou a implantar o sistema feudal na Grã Bretanha porque interessava aos normandos a centralização do poder Assim colocandose no lugar de senhor de todos os feudos transformou os suseranos em grandes vassalos Sua luta foi destinada à unificação da Grã Bretanha o que conse guiu a partir de 1171 quando avança sobre a Irlanda Para manter o controle integral e de sestabilizar o poder dos suseranosgran des vassalos Henrique II seguindo um modelo visivelmente romano impõe uma lei do exército pela qual impede a manu tenção e criação de exércitos feudais em troca de proteção que a todos daria desde Westminster Eis o lugar da força enfim concentrada em suas mãos Por outro lado no campo jurídico es forçase para acabar com os Juízos de Deus presentes também na ilha desde a invasão dos nórdicos E isso faz concentrando na ju risdição de Westminster as decisões e para todos O problema é que alguns resistiram como seria natural Foi o que se passou com o bispo de Canterburry Thomas Becket morto por sicários do rei Assim todos os que se sentissem pre judicados poderiam reclamar ao rei e o faziam por meio de petições Essas em regra eram recebidas e decididas pelo Lord Chanceler e em nome do rei emitiamse ordens escritas writ aos representantes reais locais ditos sheriff a fim de que esse ordenasse que o indicado desse satisfação ao queixoso ou se fosse o caso compare cesse para dar explicações Tal modo de agir forms of action logo abarrotou a jurisdição real e mesmo que o tribunal tivesse sido decomposto dividiu se o chamado Curia regia em três tribunais a situação não encontrava solução Foi daí que Henrique II deu quem sabe o grande passo à construção de um modelo singular Por um novo writ dito novel dis seisin instituiu para Clarendon em 1166 um Trial by Jury Por ele um Grand Jury composto por 23 cidadãos boni homines indictment um acusado e se admitida a acusação seria ele julgado por um Petty Brasília a 46 n 183 julhoset 2009 107 Jury composto por 12 membros Nele o Jury dizia o direito material ao passo que as regras processuais eram ditadas pelo rei O representante real porém não in tervinha a não ser para manter a ordem e assim o julgamento se transformava num grande debate numa grande disputa entre acusador e acusado acusação e defesa Para tanto a regra era a liberdade sendo certo que o acusado era responsável pelas explicações que deveria dar Por sinal não se produziam provas no início o Jury era a prova Elas só vieram como regra nos séculos XV e XVI como evidence quando já não se tinha mais conhecimento dos fatos e portanto era necessário reconstituir o crime e seus pormenores O julgamento nesta dimensão davase normalmente em locais públicos e do pon to de vista político foi uma opção e manobra genial de Henrique II Afinal se o povo condenasse era a resposta do rei se o povo absolvesse era a resposta do rei e assim estava ele sempre do lado aparentemente correto Não é de estranhar aparecerem aforismos como The king can do no wrong Deste modo as regras de processo ou do como se deveria proceder eram gerais e geravam um sistema comum Common Law ao passo que o direito material era local e expresso muito mais como sempre foi pelos costumes que pelas leis Eis por que no Common Law remedies precede rights De qualquer maneira percebase em sendo um sistema tratase dO Common Law e não dA Common Law Ao que por ora interessa vêse que nele a disputa entre acusação e defesa aparentemente tendia e tende a ser leal e indicava uma paridade de condições entre os contendores O vital porém era que os juízes deci diam com base naquilo que sabiam como não poderia deixar de ser mas depois com base naquilo que as partes aportavam ao processo o qual se mostrava como um jogo dialético entre os argumentos delas em geral travado em local público Tal sis tema é o que se convencionou chamar mais tarde na forma como se conhece hoje de Sistema Acusatório e a partir desse padrão domina boa parte dos sistemas processuais penais do mundo Como se pode notar a construção dos sistemas processuais puros se deu por op ções políticas historicamente demarcadas embora tivessem variados os motivos que levaram a tanto 2 Por que todos os sistemas processuais penais são mistos Um sistema processual penal misto ao contrário do que comumente pensam alguns não é a simples somatória de ele mentos dos dois sistemas puros E isso porque epistemologicamente não se sustentaria uma somatória do gênero por um lado mas por outro e quiçá mais relevante porque o própria noção de sis tema não comporta algo do gênero Ora como precitado o nascimento dos sistemas processuais penais puros não se deu em função de bases filosóficas ou pelo menos não foram elas as forças motrizes das suas constituições e sim opções políticas tanto na Igreja Católica quando do nasci mento do Sistema Inquisitório embora nela se soubesse da questão ligada ao pensamento aristotélico quanto na Grã Bretanha de Henrique II onde nasce como hoje estrutu rado o Sistema Acusatório quando por certo sequer se cogitou sobre o assunto dado estar a atenção quase que integralmente voltada para outros pontos todos políticos Do ponto de vista filosófico então a preocupação com os modelos processuais penais só aparece mais tarde e como não poderia deixar de ser em face do momento histórico sempre vinculada à chamada Filosofia da Consciência Tendo por referência o pensamento cartesiano objeto e método sempre foram os núcleos da base filosófica de descoberta da verdade Assim se pensava o mundo e da mesma forma se passava então com o Revista de Informação Legislativa 108 Direito e seus ramos Com o Direito Pro cessual Penal não seria diferente Enquadrado como uma estrutura com plexa por definição o processo e a teoria toda que lhe sustentava não poderia ser pensado hilemorficamente mesmo porque integrado por elementos que por si sós eram de uma complexidade intolerável à redução à unidade necessidade inafastável no modelo aristotélico Bom exemplo era e segue sendo a audiência Eis por que dentre outros motivos com o tempo passou a ser pensado o processo pela matriz sistêmica agora vista no mode lo kantiano Ora como se sabe foi Kant que concebeu na sua Arquitetônica da Razão Pura na sua obra Crítica da Razão Pura a possibilidade de se encontrar a verdade em es truturas complexas e assim o fez imaginando a possibilidade de se conhecer os conjuntos sýstema do grego Para ele sistema era o conjunto de elementos colocados em relação sob um ideia única Ela por sua vez seria determinada pela finalidade do conjunto e estaria colocada como princípio de liga ção entre os elementos integrantes logo funcionaria como um princípio unificador reitor da conexão e como tal dado a priori Foi assim que se pode pensar em sistemas nos mais variados campos algo que vai do sistema solar ao sistema de governo ou seja matéria aparentemente de conhecimento corriqueiro no cotidiano Em todos porém há um princípio unificador Por este viés não é difícil compreeender que todas as ciências e teorias se fundam em princípios unificadores ali colocados como a representação da coisa da Verdade que se existir não pode ser dita justo por faltar linguagem para tanto Tal princípio unifica dor reitor fundante que se coloca no lugar da Verdade que se não pode dizer é um mito ou seja a verdade com minúscula que é dita como linguagem no lugar daquilo que em sendo não pode ser dito É o significante primeiro Os sistemas processuais penais por tal vereda vão pensados assim e por isso relacionados ao fim último do processo dicere ius ou iuris dictio expressão do sentire sentença do órgão jurisdicional Para decidirsentenciar todavia precisase de conhecimento e para tanto fazse mis ter como se sabe da prova tudo aquilo que é produzido introduzido no processo com o objetivo de tornar conhecido fatos pessoas ou coisas Neste momento ganha grande sig nificado o conceito de processo aventado por Canuto mendes de Almeida isto é algo como a reconstituição histórica de um fato pretérito que é o crime Não se trata do crime tenhase bem presente já existente pelo menos apa rentemente mas da sua reconstituição algo que se faz pela linguagem como não se pode negar Eis então a razão pela qual a lingua gem é tão importante no espaço do Direito Processual Penal Afinal consumado o crime teoricamente falando obviamente daí por diante tudo já é matéria processu al e assim caminhase nos labirintos da linguagem Salvo as raríssimas exceções dadas pelos chamados atos reais embora até eles sejam discutíveis enquanto tal vistos na visão de Goldschmidt tudo o mais é pura linguagem Não é de estranhar não obstante a investigação preliminar é sempre linguagem a denúncia é no que mais interessa a imputação linguagem a prova mormente aquela quantitativamente mais significativa a testemunhal é pura linguagem as razões e alegações das partes são pura linguagem as decisões máxime as sentenças da mesma forma são linguagem e assim por diante Estáse portanto no reino da linguagem Sem embargo disso não são poucos os que sustentam a necessidade e por que não a concreta possibilidade de se enten der e discutir tudo a partir da descoberta da Verdade por evidente que ignorando os giros produzidos pela linguagem Para tanto se passar como parece elementar há sem dúvida uma crença na real possibi lidade de se obter a Verdade pelo conhecimento do objeto e assim apostase nos postulados da Filosofia da Consciência como o genial Brasília a 46 n 183 julhoset 2009 109 caminho de descoberta O sujeito dá conta do objeto porque antes de tudo crê no método do qual dispõe a lógica dedutiva Não é de estranhar que tudo seja pensado por silogismos No processo penal o sujeito deve conhecer e assim ter acesso e por ele domínio ao fato criminoso objeto demarcado pelo caso penal que dele resulta com a aparente ou concreta consumação do crime o que se dá pela reconstituição precitada ou seja pelo método adotado O problema é que é o fim do sistema como referido que resignifica o princípio unificador e ele como é elementar ganha um colorido diferente nos dois sistemas co nhecidos o princípio unificador será inquisitivo se o sistema for inquisitório e será dispositivo se o sistema for acusatório Como ideia única não comporta divisão e deste modo não se pode ter um princípio misto e de conse quência um sistema misto Ora se todos os sistemas processuais penais da atualidade são mistos e desde a noção de sistema não se pode ter um sis tema misto parece óbvio que que se trata de um problema meramente conceitual e não fático Desde uma visão mais adequada os sistemas são mistos não por força da simples somatória dos elementos que os integram mas fundamentalmente porque em sendo sistemas regidos pelo princípio inquisitivo têm agregados a si elementos provenientes do sistema acusatório como vai suceder com o sistema processual penal brasileiro em vigor e que tem por base o CPP de 1941 ou em sendo regidos pelo princípio dispositivo têm agre gados a si elementos provenientes do sistema inquisitório como vai suceder com o sistema processual penal norteamericano Neste passo porém ainda não se tem uma diferença concreta entre os sistemas mistos como se pode perceber E ela a di ferença não se dá em razão do arcabouço filosófico colocado à disposição muito menos pelas regras jurídicas que podem reger a matéria Na realidade e em com patibilidade com o que se pode ler dos fundamentos históricos dos dois sistemas a opção no caso é política seja por um ou por outro sistema Ora fazse uma opção política quando se dá a função de fazer aportar as provas ao processo seja ao juiz como no Sistema Inquisitório seja às partes como no Sistema Acusatório por evidente que sem se excluir eis por que todos os sistemas são mistos as atividades secundárias de um e de outros tudo ao contrário do que se passava nos sistemas puros Daí que a gestão da prova caracteriza sobremaneira o princípio unificador e assim o sistema adotado Isso embora não seja por nada compli cado tem sido difícil muito difícil fazer entender a alguns que primam pela leitura óbvia da vida como linearidade como se fossem imagens de um espelho e assim seguem insistindo contra a Constituição em manter o Sistema Inquisitório que se retira antes de tudo do CPP em permanente conflito com o modelo constitucional que reclama um devido processo legal e assim in compatível com aquele no qual o juiz é o senhor do processo o senhor das provas e sobretudo como sempre se passou no Sistema In quisitório pode decidir antes naturalmente raciocinando por primário e em geral bem intencionado e depois sair à cata da prova que justifique a decisão antes tomada Nos labirintos do sistema processual penal brasileiro habita Inocêncio III e não são poucos os que gozam o lugar de um Tor quemada Nunca se terá democracia proces sual desse modo por evidente mesmo se se pensar tão só nos grandes magistrados Um sistema desse porte em que se controlam as premissas não só não é alheio ao solipsismo como lhe incentiva E o pior é que a Consti tuição da República não se faz viva 3 O sistema processual penal atual a inquisição do CPP de 41 O sistema processual penal brasileiro atual assentado no CPP de 41 cópia do Revista de Informação Legislativa 110 Codice Rocco da Itália de 1930 o fascista Vincenzo manzini na dianteira tem por base e sempre teve a estrutura inqui sitorial Por trás de todos estava o Code Napoleón de 17111808 em vigor desde 01011811 pilotado por JeanJacquesRegis de Cam bacérès homem de habilidades políticas conhecidas mas sobretudo conhecedor das maneiras de como dobrar o Imperador Foi dele depois arquichanceler do Império a ideia de mesclar a investigação preliminar colhida nos mecanimos inquisitoriais das Ordonnance Criminelle de 1760 de Luís XIV com uma fase processual no melhor estilo do Júri inglês então adotado pelos franceses mutatis mutandis por um De creto de 1629091791 e combatido desde a adoção Salvavase retoricamente pela fase processual a democracia dos julgamentos dandolhes uma aparência acusatória e assim um espetáculo com partes acusação e defesa debates orais e de certa forma tão só a intervenção do juiz para o controle da sessão Tudo era contudo só retórica de um chamado processo misto No fundo toda a prova produzida na primeira fase da persecução em regra por um juiz instrutor na investigação preli minar puramente inquisitorial era usada na fase processual por exemplo por sua leitura no chamado Jugement A sessão vi rava como era sintomático teatro não raro pantomima puro embuste e os discursos pomposos e longos inflação fonética As cartas do jogo já estavam marcadas e para desdizer isso era preciso desacreditar na figura democrática do juiz instrutor tão inquisidor quanto qualquer outro que na história ocupou aquele lugar O mister não era e segue não sendo singelo Querendose ou não a figura do juiz sem pre foi e continuará sendo muito próxima àquela do pai inclusive pelas funções que ambos exercem Natural então que se não tenha muito ânimo para dele discordar mormente quando vai coadjuvado pela acusação ou pela defesa tomandose em consideração poder pender para qualquer dos lados embora como regra tenda a prestigiar a acusação O dito processo misto com o hálito do qual Napoleão tocou o mundo a partir da Europa continental mostrouse desde sem pre uma fraude à democracia processual No fundo o sistema napoleônico nada mais era e é para quem o adota um Sistema Misto ou seja um Sistema Inquisitorial mesclado com elementos provenientes do Sistema Acusatório sobretudo partes acusação separada formalmente do órgão julgador e debates orais Por ele e para ficar em poucos exem plos nazistas fascistas soviéticos e todos os regimes totalitários chamaram de democráticos seus sistemas processuais penais em geral tratandoos como Sis temas Acusatórios Cambacérès segue desde o inferno gozando a dor da injus tiça que se perpetua pelo mundo sempre em nome da Verdade das boas intenções dos inquisidores basta estar naquele lugar para ser um deles e do chamado Sistema Misto Inquisitorial agregado com elemen tos outros apresentado como Sistema Acusatório em razão da fase processual comportar órgão de acusação diferente aparentemente daquele julgador debates orais e sobretudo partes Tais elementos como se sabe são deveras importantes para ajudar a se caracterizar um sistema processual mas sem dúvida assim como outros secundários O processo regido pelas precitadas Ordonnance Criminelle de Luís XIV tinha todos eles e foi quem sabe o maior monumento inquisitorial laico da história da humanidade No Brasil tal modelo foi adotado qua se que com a mesma conformação isto é aquela copiada do código italiano de 1930 Interessava ao ditador de plantão ainda mais porque em face dos jogos de poder do Império acabouse por adotar em 1871 Lei no 2033 de 20091871 no lugar do chamado Juizado de Instrução o Inquérito Policial No fundo não há diferença excep Brasília a 46 n 183 julhoset 2009 111 cional entre eles dado se tratar sempre de mecanismo inquisitorial onde reside o problema qualquer um que estiver naque le lugar repitase tenderá a fazer o papel de inquisidor exerça a função que exercer Por sinal o mister já esteve em mãos aos bispos e tudo deu no que deu como se sabe O diverso sem dúvida entre lá e cá é que nos modelos europeus continentais quase sempre variações do modelo primei ro do Code Napoleón o Juizado de Instrução permitiu quando do avanço democrático do século passado adaptações tanto ne cessárias quanto interessantes a ponto de se poder seguidamente colocar em causa o próprio sistema como sucedeu na Itália do pósguerra Aqui porém isso não é pos sível em função do status constitucional da investigação preliminar realizada pela Polícia Judiciária e uma evolução deve ser pensada desde outra perspectiva O certo não obstante é que o CPP configura um Sistema Misto e deste modo mantém na base o Sistema Inquisitorial e a ele agrega elementos típicos da estrutura do Sistema Acusatório Pesa nele em todos os quadrantes a sobreposição de funções do órgão jurisdicional e do órgão de acusação Quando o juiz é o senhor plenipotenciário do processo ou quase e pode buscar e produzir a prova que quiser a qualquer momento na fase de investigação e naquela processual não só tende sobremaneira para a acusação como em alguns aspectos faz pensar ser despiciendo o órgão acusatório O sério problema que surge com certo ar de naturalidade é que esse mesmo órgão jurisdicional que investiga e produz provas vai depois julgar ou seja acertar o caso penal Isso por si só faz pensar na falta de im parcialidade tomada como equidistância das partes e seus pedidos e por suposto no vilipêndio daquilo que é para alguns quase sacro na Constituição o lugar que a nação delega a quem é investido do poder jurisdicional mormente para decidir por ela contramajoritariamente O CPP e o sistema como um todo como poucos outros instrumentos legais oferece condições quase ilimitadas para o agir jurisdicional nesse âmbito de busca e produção da prova em qualquer das fases processuais agora ainda mais ressaltado pelas regras do art 156 CPP com redação da Lei no 11690 de 090608 comprovação inequívoca de ser o sistema na base in quisitorial Art 156 A prova da alegação in cumbirá a quem a fizer sendo po rém facultado ao juiz de ofício I ordenar mesmo antes de iniciada a ação penal a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes observando a necessida de adequação e proporcionalidade da medida II determinar no curso da instru ção ou antes de proferir sentença a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante Com tamanha liberdade probatória o juiz no sistema processual penal brasileiro e basta apontar em tal direção pode fazer quase tudo o que pretender Isso se dará no mais das vezes dentro daquilo que Franco Cordero chamou de lógica deforme La solitudine in cui gli inquisitori la vorano mai esposti al contraddittorio fuori da griglie dialettiche può darsi che giovi ao lavorìo poliziesco ma sviluppa quadri mentali paranoidi Chiamiamoli primato dellipotesi sui fatti chi indaga ne segue una talvol ta a occhi chiusi niente a garantisce più fondata rispetto alle alternative possibili né questo mestiere stimola cautela autocritica siccome tutte le carte del gioco sono in mano sua ed è lui che lhá intavolato punta sulla sua ipotesi Sappiamo su quali mezzi persuasivi conti alcuni irresistibili ad esempio la tortura del sonno calda mente raccomandata dal pio penalista Ippolito marsili usadoli orienta lesito dove vuole Nelle cause milanesi de Revista de Informação Legislativa 112 peste manufacta giugnoluglio 1630 vediamo come giudici nientaffatto disonesti anzi inclini a inconsueto garantismo fabbrichino delitto e de linquenti linquisito risponde docil mente linquisitore gli scova in testa i fantasmi che vi há proiettato1 Aqui quem sabe o grande motivo por que a opção política deve ser pelo Sistema Acusatório Afinal o primado das hipóteses sobre os fatos não é algo excepcional no Sis tema Inquisitório e sim mecanismo compa tível como o simples modo de pensar por sinal da civilização ocidental toda logo tende a atingir qualquer um e não porque são juízes mas porque são humanos Ora navegando com o pensamento para o futuro e para o passado tendese a acreditar nas imagens produzidas pela razão É certo não obstante que tal crença não é definitiva e assim poderseia dizer que admite prova em contrário ou seja pode se voltar atrás da posição anteriormente tomada mesmo porque se assim não fosse a imagem assumida se converteria em real e se estaria diante de uma psicose típica a paranóia Sem se poder descartar tal hi pótese a regra é que assim não seja e por isso Cordero como se vê fala em quadros 1 CORDERO Franco Guida allá procedura penale Torino UTET 1986 p 5152 A solidão na qual os inquisidores trabalham jamais expostos ao contra ditório fora dos grilhões da dialética pode ser que ajude no trabalho policial mas desenvolve quadros mentais paranóicos Chamemoos primado das hipó teses sobre os fatos quem investiga segue uma delas às vezes com os olhos fechados nada a garante mais fundada em relação às alternativas possíveis nem esse mister estimula cautelarmente a autocrítica assim como todas as cartas do jogo estão na sua mão e é ele que as coloca sobre a mesa aponta na direção da sua hipótese Sabemos com quais meios persuasivos conte alguns irresistíveis por exemplo a tortura do sono calorosamente recomendada pelo pio penalista Ippolito marsili usandoa orienta o êxito para onde quer Nos processos milaneses sobre a peste manufa turada junhojulho de 1630 vemos como juízes por nada desonestos antes inclinados a um incomum ga rantismo fabriquem delito e delinqüentes o inquirido responde docilmente o inquisidor lhe retira da cabeça os fantasmas que lhe há projetado mentais paranóicos Em suma tendem a pre valecer as hipóteses assumidas sobre os fatos e com liberdade o juiz orienta o êxito para onde quiser Duvidoso desde sempre é o acerto da decisão tomada pelas aparências Esse lugar sem embargo de iludir a muitos é na análise estupenda de Lacan por excelência o lugar do engodo da fraude do engano como não poderia deixar de ser A única esperança diante de tal quadro é o juiz desconfiar sempre e sempre das suas próprias aparênciasimagens e de consequên cia das suas decisões colocandoas à prova até quando não mais for possível em face do rito e o momento determinado para a sentença porque teoricamente nela poderia encerrar sua ativida de judicante no caso concreto Estarseia por elementar no oposto da lógica deformada e por certo seria o ideal Tratase como se pode perceber de tarefa impossível ou quase Seria como pedir ao humano que deixasse de pensar ou por outro lado que resistisse sempre às pulsões inconscientes Em realidade não é possível nem uma nem outra e se assim é a solução no plano da normalidade está em outro lugar 4 O sistema processual penal no Projeto 15609PLS A Comissão que elaborou o anteprojeto de lei de reforma global do CPP agora convertido no Projeto no 15609PLS ao meditar sobre a questão e como não po deria deixar de ser diante das regras cons titucionais optou pela adoção da base do Sistema Acusatório e assim estabeleceuse um câmbio epistemológico sem preceden tes no país se aprovado o precitado projeto se terá um Sistema Misto e deste modo à base do Sistema Acusatório se agregará elementos provenientes em menor escala do Sistema Inquisitório mas o sistema de re gência será o acusatório e isso abre novas e melhores perspectivas para a democracia processual Depois de mais de oitocentos anos de domínio inquisiorial chegase à conclu Brasília a 46 n 183 julhoset 2009 113 são óbvia que o problema é ele o Sistema Inquisitório e que não vale o investimento na certeza de que os homens vencerão a batalha contra sua consciência e inconsci ência O Direito por certo como sempre demonstrado tem um papel vital na socie dade mas não o condão de lhe ditar com proeminência os passos Neste caso a opção pela base do Sistema Acusatório é uma prestação de contas com a realidade principalmente porque depois de 1988 não mais faz sentido começan do pela inconstitucionalidade nenhum ordenamento que se coloque de forma incompatível com a Constituição Desde este ponto de vista o princípio republicano o princípio da isonomia o princípio do devido processo legal e o princípio da fundamentação de todas as decisões dentre outros formam um qua dro onde não há espaço para o predomínio da base do Sistema Inquisitório Eis por que a opção da supracitada Comissão foi com precisão pelo Sistema Acusatório No Projeto no 15609PLS aparece a ma téria antes de tudo na regra do art 4o Art 4o O processo terá estrutura acusatória nos limites definidos neste Código vedada a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação O texto merece alguma reflexão sem embargo da sua precisão linguística mes mo porque em tal matéria e em tantas ou tras nada se concluiu sem discordância Neste aspecto o anteprojeto hoje Projeto no 15609PLS foi um exemplo de democracia e contou com o comando do ministro Hamilton Carvalhido o Coorde nador da Comissão sem o qual por certo não teria vindo à lume Da mesma forma foi imprescindível o esforço do Relator Prof Dr Eugênio Pacelli de Oliveira autor inclusive de grande parte da Exposição de motivos Decisivo não obstante foi a tolerância e compreensão de todos os mem bros Com diferenças tão marcantes nada teria andado e muito menos o resultado teria ocorrido se não fosse o ambiente de respeito mútuo e amizade Em definitivo a democracia só se perfaz onde houver respeito pela diferença Isso de qualquer forma não retirou acirradas disputas por pontos capitais e dentre eles este referente ao sistema pro cessual a ser adotado A resistência tenaz e acompanhada de um discurso inteligente fez presente um lugar comum naqueles que apostam nas possibilidades de câmbio do Sistema Inquisitório Para eles podese mudar sem mudar a estrutura o que do ponto de vista epistemológico como antes anotado não parece ser possível Por elementar não se precisa saber muito de Bachelard para se ter presente que a evolução científica se dá a partir de rompimentos epistemológicos daí o cor te de que ele falava justo para se negar um passado de erros Esses sabem todos traduzemse nas verdades que se carrega as quais precisam ser abandonadas para se poder evoluir cientificamente Afinal como disse Warat em certa passagem as verdades consolidadas nos escravizam àquilo que é eternamente ontem Tratase de uma escravidão sem dú vida mas arregimenta para o vivente um gozo traquilizador aquele mesmo que lhe dá a sensação de segurança Romper desta maneira é superar a disputa entre a razão e o desejo sendo certo que dele não se tem domínio algum Falou mais forte no caso concreto a exigência que a Comissão se impôs de elaborar um anteprojeto que estivesse em plena compatibilidade com a Constituição da República motivo pelo qual daqui por diante será difícil sair de tal via em consonância com os ditamos regentes da vida atual Eis então por que a opção foi pelo texto do art 4o precitado Nele resta patente que a gestão da prova escapa do comando direto do juiz e assim passa ele a ter em sua plenitude ou quase a função que a Constituição lhe Revista de Informação Legislativa 114 reserva garante de ordem constitucional e por isso do cidadão Procurase acabar deste modo e de vez com a sobreposição de funções entre o órgão ju risdicional e aquele acusador Daí a criação de um Juiz das Garantias para a Investigação Preliminar na qual não atua senão para controlar eventual invasão indevida na es fera dos direitos e garantias individuais O juiz das garantias é responsável pelo con trole da legalidae da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia tenha sido reservada à auto rização prévia do Poder Judiciário art 15 Não tem competência assim para sair à cata da prova que em tal momento não lhe interessa eis que buscada para propiciar ao ministério Público exercer a ação penal e obter se for o caso a tutela jurisdicional para o processamento do caso penal Na fase processual da persecução por seu turno o juiz do processo e não mais aquele Juiz das Garantias terá uma par ticipação decisiva mas não em matéria probatória À acusação cabe provar os fatos imputados como deve ser de fato sem a interveção direta do magistrado a não ser para sanar dúvida pontual em algumas hipóteses por exemplo complementando com perguntas as inquirições das testemu nhas Daí o veto à iniciativa do juiz no sen tido da substituição da atuação probatória do órgão da acusação Dúvida maior porém veio com a inter venção dele quanto à produção da prova de defesa Parte da Comissão entendeu que isso não se deveria passar dentre ou tros motivos pelo fato de que ao final se houver dúvida deve o réu ser absolvido em face do in dubio pro reo Ademais à intervenção probatória do magistrado não se tem pela lei qualquer mecanismo de garantia que não atuará ele contra o réu e sim a seu favor mais que jurídica por tanto a questão se demostrará ética e os riscos da sobrevivência inquisitorial serão concretos dado se continuar a depender dos próprios juízes e assim da construção de uma cultura que os coloque para sempre no seu devido lugar algo aparentemente muito difícil no início enquanto não houver contra o sistema atual uma mentalidade constitucional arraigada 5 O lugar constitucionalmente demarcado das partes e o Projeto 15609PLS À guisa de conclusão parece relevante ressalvar um dos maiores efeitos da ado ção no Projeto no 15609PLS da base do Sistema Acusatório ou seja o lugar das partes no processo em face das regras constitucionais Ninguém desconhece que um processo de cariz acustório faz sobressair os direitos e garantias individuais e diante dos casos penais acaba por salientar a proibição de excesso art 5o Estáse em consonância com a CR88 A cultura acusatória do seu lado impõe aos juízes o lugar que a Constituição lhes reservou e de importância fundamental a função de garan te Contra tudo e todos se constitucional devem os magistrados assegurar a ordem posta e de consequência os cidadãos individualmente tomados À ordem de prevalência nesta dimensão não se tem muito o que discutir mormente porque não há direito coletivo mais relevante que aqueles fundamentais dos cidadãos Devese ver com parcimônia portanto toda a grande disputa que se levou à ribalta entre os direitos individuais e os coletivos da sociedade como um todo mormente porque em um Estado de democracia tar dia a figura do juiz é imprescindível para o cidadão com frequência vilipendiado em seus direitos e infinitamente mais fraco por sinal como projetado pelos contratualistas embora não se possa ingenuamente asse verar sem restrições em relação a todos coisa do gênero A isonomia porém não faz distinção entre os cidadãos e isso é imprescindível para se deitar a luz consti tucional sobre todos Brasília a 46 n 183 julhoset 2009 115 Da sua parte o Ministério Público tam bém vai ganhar o lugar que a Constituição lhe assegura muito mais relevante que aquele do Sistema Inquisitório algumas vezes secundário outras de coadjuvante mas também em constante conflito com a CR88 A noção do dominus litis agora poderá enfim calharlhe como devido Afinal é para ele que se produzem as provas na investigação preliminar e por isso serlhe primário o controle externo dela Ganha por outro lado uma mitigação o princípio da obrigatoriedade da ação e por isso em muitos casos poderá optar entre outras coisas por uma forma peculiar de bargaining embora ainda seja acanhada a proposta do Projeto Da mesma maneira embora tenha havido evolução na aplicação do princípio da dispo nibilidade do conteúdo do processo ela ainda foi tímida num processo penal de matriz acusatória o mP deve ter a mais ampla liberdade neste sentido porque valendo quase que tão só a prova da instrução processual a ressalva são aquelas reais é mais coerente poder retirar a acusação que ser forçado a levar os pedidos até o final e vêlos improcedentes com trânsito em julgado material da sentença logo sem a menor possibilidade de renovação da ação Pouco razoável neste contexto a manutenção da regra atual do art 385 no art 409 do Projeto Ora o juiz poder condenar contra o pedido do mP vertido no texto como mera opinião O juiz poderá proferir sentença condenatória nos estritos limites da denúncia ainda que o ministério Público tenha opinado pela absolvição não podendo porém reconhecer qualquer agravante não alegada ou causa de aumen to não imputada Em suma espraiada pelo Projeto inteiro vêse uma grande evolução das atribuições do mP mas sem dúvida ainda foi acanhada e fruto de um aparente medo já não mais cabível nos tempos atuais A maior liberdade sabese bem é sempre acompanhada da responsabilidade se em questão está a ordem constitucional Por fim a defesa ganha mecanismos para se efetivar corretamente Autodefesa e de fesa técnica como previsões legais podem não ser nada se as pessoas que as agitam não têm o devido domínio do lugar ocupa do Fala forte neste espaço a diferença eco nômica dos réus e a consciência necessária sobre o assunto Daí ser inarredável a exi gência do Estado construir como é de sua obrigação em todos os níveis competentes Defensorias Públicas que respondam den tro do devido padrão de qualidade exigido pelas funções que lhes foram atribuídas na Constituição Assim sem o correto acesso à Justiça aos menos favorecidos não haverá nunca democracia processual Não se trata há de se entender de pregar e impor um sistema processual em favor dos criminosos como sem qualquer procedência têm pregado os menos avisa dos sempre adeptos à força em geral à Lei e Ordem desde que seja contra os outros obviamente O Sistema Acusatório não é e nunca foi sinônimo da impunidade algo por sinal por que se reclama tanto do sistema atual Tratase isso sim de um sistema que realça o papel das partes a começar por aquele do juiz não só por compatibilizá los com os ditames constitucionais mas sobretudo em razão de permitir que se caminhe na direção de uma maior demo cracia processual