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AYOUB Luiz R A Construção Jurisprudencial da Recuperação Judicial de Empresas Grupo GEN 2021 1 APRESENTAÇÃO DO PLANO PELO DEVEDOR No direito brasileiro apenas o devedor pode elaborar o plano de recuperação judicial e apresentálo aos credores concursais O procedimento da recuperação judicial de empresas converge para que os credores possam apreciar o plano de recuperação em assembleia de credores Por conta disso tanto o prazo para a verificação administrativa de créditos quanto o prazo para a apresentação do plano de recuperação nos autos começam a correr a partir da publicização editalícia da decisão interlocutória que defere o processamento da recuperação judicial e se encerram no final de 60 dias Na verificação administrativa de créditos este prazo de 60 dias resulta da soma do prazo para apresentação de pedidos que é de 15 dias art 7º 1º da LRF e do prazo para a publicação da relação de credores elaborada pelo administrador que é de 45 dias art 7º 2º da LRF Paralelamente a esse prazo correrá o prazo para a apresentação do plano que é de 60 dias da publicação da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial1 Assim como incumbe ao devedor elaborar o plano de recuperação judicial a ele incumbe apresentar o plano de recuperação judicial dentro do prazo de lei2 Se a recuperação foi postulada em litisconsórcio ativo devese apresentar um único plano de recuperação para todas as empresas litisconsortes3 Nos precisos termos do art 53 da LRF o prazo para apresentação do plano é improrrogável4 e a não apresentação tempestiva do plano caracteriza hipótese de convolação da recuperação judicial em falência art 53 cc art 73 II ambos da LRF5 A decisão que decreta a falência por esse fundamento pode ser atacada por recurso6 mas de regra é tida como incontornável7 Entretanto uma vez apresentado o plano no prazo assinalado pelo art 53 da LRF a empresa pode substituilo posteriormente Conforme consignou o Des Gilberto Guarino em voto paradigmático se a legislação de regência não veda a possibilidade de alteração do plano recuperatório mas bem ao invés expressamente a permite na AGC não é mendaz a interpretação segundo a qual antes do conclave goza a recuperanda da mesma prerrogativa impondose tão somente evitarse prejuízo aos credores que não houverem recebido ciência prévia do conteúdo das modificações sobretudo se elas lhes afetarem as condições de recebimento dos respectivos créditos Aliás a inexistência de proibição normativa a modificações nos PRJs previamente à data da AGC torna absolutamente adequada a noção e o emprego do princípio da legalidade pois de sob uma tal ampla angulação legal não é apenas o que a lei permite mas tudo que ela não veda conforme interpretação do art 5º II da Constituição da República8 É igualmente possível que uma vez aprovado o plano em assembleia ou inclusive homologado pelo juízo recuperacional que seja apresentado novo plano a modificar o plano anterior contanto que não tenha sido encerrada a recuperação judicial conforme lê se na orientação do Enunciado 77 lavrado por ocasião da II Jornada de Direito Comercial do CJF As alterações do plano de recuperação judicial devem ser submetidas à assembleia geral de credores e a aprovação obedecerá ao quorum previsto no art 45 da Lei n 1110105 tendo caráter vinculante a todos os credores submetidos à recuperação judicial observada a ressalva do art 50 1º da Lei n 1110105 ainda que propostas as alterações após dois anos da concessão da recuperação judicial e desde que ainda não encerrada por sentença Uma vez apresentado o plano aos autos dispõe o parágrafo único do art 53 da LRF que o juiz ordenará a publicação de edital contendo aviso aos credores sobre o recebimento do plano de recuperação A publicação desse edital ordenada pelo juiz será realizada pela empresa devedora A desídia da empresa devedora em providenciar a publicação desse edital não caracteriza hipótese de convolação da recuperação judicial em falência9 No entanto decorrido o período de suspensão nesse caso será retomado o curso das ações e execuções art 6º 4º da LRF pois nesse caso a demora no processamento será devida à empresa devedora e não à administração da justiça10 84CONTEÚDO DO PLANO O plano deve conter a descrição pormenorizada dos meios de recuperação11 conforme se lê no art 53 I da LRF Ademais o plano deve conter uma demonstração de sua viabilidade econômica conforme se lê no art 53 II da LRF Aqui a rigor devese ler viabilidade financeira do plano de recuperação conforme adverte Aristides Malheiros ao afirmar que o instrumento de avaliação de viabilidade econômica é o balanço patrimonial no qual se confronta o ativo com o passivo exigível Todavia num processo de recuperação mais que tratar da viabilidade econômica importa avaliar a viabilidade financeira ou seja a capacidade da empresa de gerar recursos suficientes para cobrir todos os desembolsos necessários12 Por fim o plano deve conter um laudo econômico financeiro e de avaliação dos bens e ativos do devedor subscrito por profissional legalmente habilitado ou empresa especializada art 53 III da LRF Esses três elementos contidos no plano de recuperação judicial permitem que se reduza assimetria de informações entre a empresa devedora e os seus credores de modo a que os credores possam deliberar pela aprovação modificação ou rejeição do plano Com efeito conhecidos os meios de recuperação judicial apresentados os credores terão condições de comparar a viabilidade financeira do plano mediante análise de projeção de fluxo de caixa para saber se o plano proposto é exequível e o quanto os credores receberão se aprovarem o plano Como contraponto os credores compararão essa alternativa com a informação constante do laudo de avaliação de bens e ativos do devedor para saber o quanto receberiam em caso de rejeição ao plano e convolação da recuperação judicial em falência 85INSTRUMENTO DE COOPERAÇÃO PARA PRESERVAÇÃO DO VALOR DE EMPRESAS VIÁVEIS A recuperação judicial de empresas é uma das espécies de processos concursais a que estão sujeitos os credores de empresários Por meio da recuperação judicial de empresas se busca satisfazer o maior número de credores da empresa devedora mediante a preservação da empresa e por conseguinte da sua capacidade de gerar receita Conforme observou o Min Fernando Gonçalves a recuperação judicial tem como finalidade precípua o soerguimento da empresa mediante o cumprimento do plano de recuperação salvaguardando a atividade econômica e os empregos que ela gera além de garantir em última ratio a satisfação dos credores13 Os procedimentos concursais lidam com o problema de common pool assets14 que pode ser traduzido para algo como conjunto de bens comuns Esse problema possui dois aspectos De um lado apresentase a distinção entre valor de liquidação de conjunto de ativos mediante a venda individual de cada um dos bens integrantes do conjunto e valor de going concern decorrente da geração de fluxo de caixa de um conjunto de ativos operacionais De outro lado assumindose que o valor de going concern é superior ao valor de liquidação fragmentada de ativos apresentase um desafio para que os diversos credores concursais deixem de buscar a satisfação individual de seus créditos mediante a penhora de ativos individuais da empresa devedora o que afinal conduzirá à liquidação dos ativos e passem a atuar cooperativamente de modo a manter o conjunto de ativos operacionais capazes de gerar maior valor para assim satisfazer um maior número de credores Esses dois aspectos podem ser descritos recorrendose à metáfora da criação de peixes em um açude utilizada por Thomas H Jackson em seu precursor The logic and limits of bankruptcy law15 O primeiro aspecto que essa metáfora permite observar consiste na distinção que se estabelece entre o valor de liquidação de um açude e o valor decorrente da manutenção de seu going concern Imaginese a hipótese de um açude onde seu proprietário possa pescar Suponhase que esse proprietário resolva pescar todos os peixes desse açude Se os peixes pescados forem vendidos o proprietário obterá digamos R 10000000 Entretanto o açude não terá mais peixes e no próximo ano não haverá mais o que pescar Com efeito podese afirmar que o valor de liquidação do açude decorrente da venda de todos os seus peixes é de R 10000000 Entretanto se o proprietário pescar apenas metade dos peixes do açude ele poderá vendêlos por R 5000000 e no próximo ano os peixes terão se reproduzido de modo que o proprietário poderá pescar novamente a metade dos peixes do açude obtendo mais R 5000000 e assim sucessivamente Se anualmente for pescada apenas metade dos peixes do açude o seu proprietário assegurará uma receita anual de R 5000000 o que lhe assegurará um ganho de R 50000000 nos próximos dez anos Se o valor que pode gerar o açude for descontado a valor presente o açude valerá hoje digamos R 40000000 Desse modo o valor do açude como going concern é de R 40000000 Portanto nesse exemplo o valor atual de liquidação do açude R 10000000 é muito inferior ao valor presente do açude como going concern R 40000000 Por essa razão ceteris paribus o proprietário preferirá preservar a capacidade de geração de valor do açude a liquidálo O problema de maximização do valor de common pool assets tornase mais sensível se houver diversos pescadores que podem pescar no mesmo açude Nesse caso conquanto seja evidentemente mais vantajoso preservar o valor de going concern do açude os diversos pescadores poderão enfrentar dificuldades para cooperarem entre si de modo a não pescarem de uma só vez todos os peixes do açude Assim imaginese um caso em que há cem pescadores que podem pescar no açude Se eles se esforçarem ao máximo poderão pescar cada um o equivalente a R 100000 cada Nesse caso o açude terá sido liquidado de modo a que não haverá mais peixes a serem pescados no próximo ano O ideal portanto seria que cada um dos cem pescadores pescasse apenas o equivalente a R 50000 no primeiro ano de modo a manter no açude peixes suficientes para que nos anos sucessivos cada um deles possa pescar mais R 50000 No final de dez anos cada pescador poderá ter pescado o total de R 500000 o que descontado a valor presente equivale a R 400000 por pescador O problema que se estabelece quando há vários pescadores em um mesmo açude consiste em como fazer que os pescadores cooperem entre si de modo a maximizar o valor do açude Tendo em vista que a regra que orienta a pescaria é aquela do primeiro a pescar fica com a pesca os pescadores não possuem incentivos para cooperar Assim se alguns pescadores pescarem apenas R 50000 em peixes não faltarão outros pescadores que pescarão R 150000 de modo a que no somatório terá sido liquidado o açude Portanto nesse caso tenderá a haver uma corrida entre os pescadores para ver quem consegue pescar mais na qual cada um deles buscará ser mais eficiente do que os outros para obter imediatamente a maior quantidade de peixes possível Por essa razão cada um dos pescadores possui um incentivo para pescar o máximo possível de peixes no primeiro ano de pescaria conduzindo à liquidação do açude a um valor substancialmente inferior àquele que seria obtido se fosse preservado o valor do açude como going concern O direito concursal busca evitar esse problema16 O problema de common pool assets anteriormente descrito a partir da metáfora dos pescadores em um açude constitui o problema central do direito concursal que para resolvêlo é orientado por distintas finalidades ou objetivos17 Nos casos em que o valor de liquidação da empresa é superior ao valor de going concern compete ao direito concursal a tarefa de maximizar o valor dos ativos da empresa falida realizando uma liquidação rápida para evitar a depreciação de ativos que obtenha o maior valor possível ao mesmo tempo que estabeleça uma ordem de pagamento de credores concursais Já nos casos em que a empresa possui um valor de going concern superior ao valor de liquidação dizse que essa empresa é viável As empresas viáveis são aquelas cuja recuperação vale a pena já aquelas empresas baseadas em modelos de negócio incapazes de gerar valor são empresas que vale a pena liquidar No jargão anglosaxônico empresas incapazes de gerar valor são referidas como empresas produtoras de chicotes para charretes buggy whips makers em uma alusão às empresas produtoras de chicotes do século XIX que não se adaptaram ao surgimento do automóvel Bons exemplos de empresas produtoras de buggy whips são a Kodak e a Blockbuster Aquela não conseguiu mudar o seu modelo de negócios para adaptarse à fotografia digital esta não conseguiu adaptar seu modelo de negócios para a tecnologia de distribuição digital de filmes Na literatura relativa à recuperação judicial parece convergir para o consenso que a recuperação judicial serve para recuperar empresas economicamente viáveis Uma empresa viável mas que está em crise e que possui vários credores pode enfrentar sérias dificuldades para evitar que os seus credores em execuções singulares acabem por conduzir a uma liquidação dos ativos da empresa em prejuízo ao seu valor de going concern Aqui competirá ao direito concursal evitar a dissipação desse valor viabilizando a preservação da empresa Conquanto haja praticamente um consenso teórico sobre esse aspecto muitas vezes não é fácil distinguir no caso concreto quais são as empresas viáveis e quais não são Por esse motivo a avaliação da viabilidade econômica da empresa será realizada pelo conjunto de credores que cuidarão de negociar um plano de recuperação da empresa devedora Caso os credores entendam que a empresa devedora não é viável eles tenderão a preferir a liquidação da empresa à sua recuperação Nesse sentido por consubstanciar o acordo celebrado entre a empresa devedora e os seus credores o plano de recuperação judicial constitui o aspecto central do procedimento de recuperação judicial de empresas1819 Por conseguinte consoante a precisa dicção do Des Maldonado de Carvalho o objetivo da recuperação judicial não é a liquidação da empresa por meio de uma execução coletiva mas sim a sua reestruturação por meio de uma barganha coletiva que se estabelece com os credores Com efeito na recuperação judicial não haverá inabilitação para o exercício da atividade tampouco a arrecadação de ativos20 86 LIBERDADE DE MEIOS DE RECUPERAÇÃO Na concordata preventiva os meios eram taxativamente delimitados pelo art 156 1º do DecretoLei 76611945 possibilitando apenas uma limitada dilação de até dois anos no prazo para pagamento do passivo quirografário com abatimentos igualmente taxados pela lei O exercício da pretensão à concordata pressupunha que o devedor fizesse promessa de pagamentos21 nos restritos termos permitidos pela legislação concursal Demais disso essa promessa era apenas de pagamento sem que pudesse ser acrescida de cláusula de cessão da empresa de conversão de créditos em participação societária22 ou de cessão de bens disvestitiva segundo a qual o devedor cedendo aos credores os bens se libera das dívidas23 Já por aqui vêse por que razão a concordata consistia em um instrumento de baixíssima eficiência para recuperar empresas de um lado não possibilitava à empresa reequacionar seu fluxo de caixa de outro as restrições aos meios de concordata impossibilitavam que se maximizasse o valor dos ativos operacionais preservandose o valor de going concern da empresa devedora Disciplina muito distinta é encontrada na recuperação judicial Os meios de recuperação judicial indicados no art 50 da LRF integram um rol meramente exemplificativo24 Conforme se lê no caput do referido dispostivo constituem meios de recuperação judicial observada a legislação pertinente a cada caso dentre outros que são em seguida arrolados Por esse motivo na elaboração do plano de recuperação resta aberta à criatividade do empresário e do jurista25 Com efeito os meios de recuperação podem variar da simples reestruturação de passivos de modo a adequar os seus montantes e vencimentos à capacidade de pagamento da empresa até a reorganização societária ou à remodelação administrativa comercial e operacional da empresa medidas muitas vezes imprescindíveis para que se dê viabilidade aos compromissos assumidos perante os credores26 Compete à empresa devedora apresentar seu plano de recuperação judicial tarefa para a qual possui grande margem de liberdade que encontra como grande limitação o fato de que ele será objeto de deliberação da assembleia geral de credores Afora esse limite encontramse na Lei 111012005 alguns limites pontualmente estabelecidos27 A liberdade de dispor acerca do negócio recuperacional alcança não apenas meios de direito material uma vez que o plano de recuperação judicial pode conter em seu bojo cláusulas que disciplinem verdadeiro negócio processual nos termos do art 190 do CPC no qual se lê que versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustálo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus poderes faculdades e deveres processuais antes ou durante o processo O recurso ao negócio processual pode ser de grande utilidade para disciplinar a forma de composição de conflitos que venham a ocorrer após o encerramento da recuperação judicial embora nada obste a que o negócio processual disponha sobre a recuperação judicial em curso 87LIMITES DA LEGISLAÇÃO PERTINENTE AO MEIO DE RECUPERAÇÃO EMPREGADO O primeiro limite específico ao plano de recuperação judicial é encontrado no caput do art 50 da LRF que ao arrolar exemplificativamente os meios de recuperação judicial manda observar a legislação pertinente a cada caso Isso significa que se o plano contiver previsão de cisão incorporação ou transformação da sociedade ou transmissão de quotas ou ações inc II do art 50 da LRF bem como alteração do controle societário inc III do art 50 da LRF e substituição dos administradores da empresa devedora inc IV do art 50 da LRF a concessão de direitos políticos aos credores inc V do art 50 da LRF o aumento de capital social inc VI do art 50 da LRF a constituição de sociedade de credores inc X do art 50 da LRF ou de sociedade de propósito específico para adjudicar os ativos do devedor inc XVI do art 50 da LRF a administração compartilhada inc XIV do art 50 da LRF ou a emissão de valores mobiliários inc XV do art 50 da LRF deverá ser observada a legislação societária aplicável a cada caso Se o plano resultar em ato de concentração que deva ser analisado pelo Cade aplicase a legislação concorrencial28 Já se o plano contiver cláusula a prever redução salarial compensação de horários e redução de jornada inc VIII do art 50 da LRF deverá realizarse nos termos da legislação trabalhista acordo ou convenção coletiva O único meio de recuperação judicial arrolado no art 50 da LRF ao qual não se aplica a legislação extraconcursal consiste na alienação ou arrendamento de unidade produtiva isolada inc VII do art 50 da LRF em razão de o tema ser expressamente disciplinado pela Lei 111012005 As normas concursais contidas na Lei 111012005 também integram o conjunto da legislação a limitar o plano de recuperação judicial Com efeito conquanto determinadas regras da Lei 111012005 não sejam postas expressamente como limites ao plano é certo que elas acabam por constituir limitações a ele Assim por exemplo o plano não pode prever cláusula genérica que lhe autoriza o devedor a vender bem do ativo não circulante que não esteja indicado no plano por conta do disposto no art 66 da LRF29 Da mesma maneira será nula cláusula modificando a classificação legal de créditos que venham a ser admitidos após a aprovação do plano30 88 LIMITES AO TRATAMENTO DO CRÉDITO TRABALHISTA O segundo limite específico ao plano de recuperação é estabelecido pelo art 54 da LRF que estabelece prazo de até um ano para pagamento dos créditos derivados da legislação do trabalho sendo que em trinta dias deverão ser pagos os créditos salariais vencidos nos três meses anteriores ao pedido de recuperação judicial até o limite de cinco saláriosmínimos art 54 parágrafo único da LRF As limitações do art 54 dizem respeito à validade da cláusula não à validade do plano como um todo Com efeito por conta do disposto no art 54 da LRF o devedor não poderá propor a cláusula e se a propuser o juiz não poderá aceitála pois fere norma cogente de interesse público mesmo que os interessados estivessem dispostos a com ela concordar31 O crédito trabalhista sujeitase à recuperação judicial Portanto em caso de deferimento do processamento da recuperação judicial são suspensas as execuções trabalhistas32 Porém da mesma maneira que todos os créditos sujeitos a recuperação judicial o plano poderá não dispor acerca de seu pagamento caso em que conforme dispõe o art 49 2º da LRF o crédito conservará as suas condições originalmente contratadas ou decorrentes de sentença laboral33 É que pode haver situações em que se afigura mais vantajoso não dispor acerca do pagamento do crédito trabalhista no plano de recuperação Assim conquanto o pagamento de crédito em prestações mensais a exemplo de pensão mensal vitalícia por acidente do trabalho a ser paga mês a mês seja incompatível com a falência na recuperação judicial não o é Uma vez habilitado esse crédito o plano de recuperação judicial deverá prever seu pagamento dentro do prazo indicado no art 54 da LRF e não o fazendo o crédito conservará a suas condições originais nos termos do art 49 2º da LRF34 Se o plano de recuperação judicial silenciar acerca do pagamento do passivo trabalhista as execuções laborais poderão prosseguir após o stay period bem como a empresa devedora poderá fazer pagamentos aos credores trabalhistas35 Como crédito sujeito a recuperação judicial pode o plano de recuperação judicial estabelecer modo diverso de pagar os credores trabalhistas contanto que sejam respeitadas as limitações ditadas pelo art 54 e parágrafo único da LRF relacionadas apenas ao prazo para pagamento do passivo trabalhista Isso não significa que o plano de recuperação judicial poderá modificar o valor do crédito trabalhista Se o plano de recuperação pudesse alterar o valor do passivo trabalhista a norma do art 54 da LRF consistiria em um imenso incentivo para que o plano previsse abatimentos pois quanto menor o prazo para pagamento maior será o abatimento Ademais em razão dos limites à competência do juízo recuperacional o crédito trabalhista deve ser pago em conformidade com o valor apurado pela Justiça do Trabalho Se a sentença laboral não fixa os encargos incidentes sobre o crédito ou se o crédito trabalhista não foi judicializado nada obsta a que o plano preveja o pagamento do passivo trabalhista no prazo de lei sem fixar critérios de correção monetária36 A previsão de abatimentos do crédito trabalhista portanto escapa à competência do juízo recuperacional Porém os abatimentos poderão ser negociados perante as autoridades laborais competentes nos termos da legislação trabalhista37 A toda evidência o exíguo limite temporal previsto no art 54 da LRF para pagamento do passivo trabalhista é estabelecido com o relevante propósito de tutelar o interesse de empregados No entanto precisamente por impor prazo tão curto referida norma acaba por piorar a situação de empregados de empresas que mais empregam Empresas que possuem poucos empregados e pequena dívida trabalhista muito provavelmente terão condições de seguir operando ao mesmo tempo em que pagam em um ano os valores devidos a poucos empregados Já empresas que empregam muito estas podem não conseguir seguir operando ao mesmo tempo em que são obrigadas a fazer pesados desembolsos de parcelas laborais no exíguo prazo de um ano Como inexorável consequência empresas que empregam muito e que possuem expressivo passivo trabalhista não conseguirão se reestruturar por meio de processo de recuperação judicial de empresas e terão por destino a falência Nesse caso não apenas os empregados não terão sido pagos como também muitos postos de emprego serão perdidos Ou seja a LRF acaba por conduzir a resultado diametralmente oposto àquele que visava alcançar pela regra do art 54 da LRF Nesse sentido podese afirmar sem medo de errar que a norma contida no art 54 da LRF viola frontalmente o princípio da preservação da empresa à medida que não possibilita que empresas se reestruturem e empregados mantenham seus postos de emprego Uma das formas de superação dos limites aplicativos da LRF e da competência do juízo concursal reside precisamente na possibilidade de se negociar maior prazo de pagamento do passivo trabalhista perante a Justiça do Trabalho No Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região por exemplo adotouse pioneira iniciativa de autorizar que a empresa devedora requeira ao Presidente do Tribunal a concessão de Plano Especial de Execução PPE38 sempre que comprovar que o volume de penhoras ou ordens de bloqueio de valores mensais decorrentes do cumprimento de decisões judiciais está pondo em risco o seu regular funcionamento O Plano Especial de Execução poderá prever o pagamento do passivo trabalhista em até 10 anos e ficará a cargo de uma Vara centralizadora a ser determinada por distribuição que cuidará de arrecadar os pagamentos feitos pelo devedor e distribuir os valores entre as execuções Estas por sua vez ficarão suspensas enquanto perdurar o Plano Especial de Execução Com efeito a empresa devedora poderá requerer ao Presidente do TRT o deferimento do Plano Especial de Execução e em seu plano de recuperação judicial silenciar acerca da forma de pagamento do passivo trabalhista Nesse caso o passivo trabalhista conservará as condições originalmente contratadas art 49 2º da LRF e por isso mesmo os credores trabalhistas não terão interesse em votar na AGC que houver por deliberar acerca do plano art 45 3º da LRF Aliás mesmo que o plano de recuperação judicial tenha disciplinado a forma de pagamento do passivo trabalhista poderá a empresa devedora requerer Plano Especial de Execução que se sobreporá ao plano de recuperação na parte laboral Por fim o plano de recuperação judicial deverá prever o pagamento das parcelas estritamente salariais vencidas nos três meses anteriores ao pedido no prazo máximo de 30 dias a contar da homologação do plano conforme estabelece o parágrafo único do art 54 da LRF39 89LIMITAÇÃO À SUPRESSÃO OU SUBSTITUIÇÃO DE GARANTIA REAL O terceiro limite específico ao plano de recuperação judicial é encontrado no 1º do art 50 da LRF onde se lê na alienação de bem objeto de garantia real a supressão da garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia A limitação contida no 1º do art 50 da LRF diz respeito à eficácia da cláusula40 Com efeito o plano de recuperação judicial pode conter cláusula de substituição ou supressão de garantias reais mas essa cláusula não terá eficácia41 perante o credor titular da garantia se ele não a aprovar expressamente42 Ademais a norma do art 50 1º da LRF não impede a alienação de bem objeto de garantia real43 Contudo se o plano contiver previsão de alienação de bem gravado o gravame acompanhará o bem e o novo proprietário adquirirá um bem onerado44 Aqui devese ter o cuidado de distinguir a regra do art 50 1 da LRF daquela outra do art 29 da Lei 95141997 que trata da transmissão de bem objeto de alienação fiduciária45 Por fim a regra do art 50 1º da LRF também tem sido aplicada à hipótese de trava bancária prevista no art 49 5º da LRF que cuida do penhor de títulos de crédito direitos creditícios valores mobiliários e aplicações financeiras4647 90 LIMITAÇÃO À ALTERAÇÃO DA VARIAÇÃO CAMBIAL PARA CRÉDITOS EM MOEDA ESTRANGEIRA A quarta limitação ao plano de recuperação judicial é estabelecida pelo art 50 2º da LRF onde se lê que nos créditos em moeda estrangeira a variação cambial será conservada como parâmetro de indexação da correspondente obrigação e só poderá ser afastada se o credor titular do respectivo crédito aprovar expressamente previsão diversa no plano de recuperação judicial Cá está mais um limite ao plano de recuperação que diz respeito à eficácia da cláusula perante o credor titular de crédito em moeda estrangeira48 91LIMITAÇÃO À SUPRESSÃO DE GARANTIAS FIDEJUSSÓRIAS A quinta limitação ao plano de recuperação deflui do art 49 1º da LRF no qual se lê que os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados fiadores e obrigados de regresso Esse tema foi objeto de detalhada análise no item 16 Coobrigados com empresa em recuperação no Capítulo 2 92LIMITES AO TRATAMENTO NÃO HOMOGÊNEO ENTRE CREDORES O plano de recuperação judicial cuidará de disciplinar o pagamento dos credores de cada uma das classes individuadas no art 41 da LRF Portanto o plano tratará os credores por classe de credor não sendo possível que o plano estabeleça tratamento individualizado a cada um dos credores integrantes de uma classe49 O que o plano pode fazer é prever o tratamento diferenciado entre conjuntos de credores de uma mesma classe50 Um dos critérios mais utilizados para criar subconjuntos de credores de uma classe é o valor do crédito51 embora possa o plano contemplar outros critérios Conforme o entendimento consolidado na Primeira Jornada de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal no Enunciado 57 O plano de recuperação judicial deve prever tratamento igualitário para os membros da mesma classe de credores que possuam interesses homogêneos sejam estes delineados em função da natureza do crédito da importância do crédito ou de outro critério de similitude justificado pelo proponente do plano e homologado pelo magistrado Ademais é possível que o plano dispense tratamento favorecido a credores colaboradores da empresa em recuperação que são os credores que se dispõem a continuar a financiar a empresa durante a recuperação judicial O tratamento diferenciado justificase conforme a autorizada dicção do Des Gilberto Guarino pois é no período crítico de liquidez que normalmente se destaca a figura do credor estratégico também conhecido como amigo ou parceiro que assume risco maior e efetivamente aposta na recuperação da empresa então em conjuntura precária com o que termina por beneficiar direta e indiretamente todos os demais por isso que costuma em perfeita incidência do postulado da razoabilidade receber tratamento diferenciado e gozar de certos benefícios52 93 MEIOS QUE IMPLICAM REESTRUTURAÇÃO DO PASSIVO A reestruturação do passivo da empresa devedora é um dos modos de recuperação Assim pode o plano de recuperação judicial conter cláusula que estabeleça abatimentos e dilações ao pagamento do passivo concursal isto é cláusula pertinente ao valor e ao prazo para pagamento do passivo concursal Nessa cláusula de regra o devedor goza de grande liberdade inclusive por conta do contrapeso consistente na soberania da assembleia geral de credores para rejeitar o plano podendo o plano de recuperação judicial prever prazo para pagamento superior a dois anos53 A grande maioria dos planos de recuperação contém cláusula a prever prazo de carência de dois anos para o início do pagamento do passivo concursal Essa cláusula é devida à norma do art 61 1º da LRF que estabelece que durante a fase de cumprimento do plano que durará de regra dois anos o descumprimento de qualquer obrigação assumida no plano acarretará a convolação da recuperação judicial em falência Após esse período com o encerramento da recuperação judicial o descumprimento de obrigação assumida no plano não acarreta em convolação da recuperação judicial em falência Conquanto as empresas devedoras possuam grande liberdade para estabelecer o prazo de carência para início do pagamento desde que por óbvio haja aceitação dos credores já houve julgados limitando este prazo54 em que pese a ausência de disposição legal expressa nesse sentido Da mesma maneira a empresa devedora pode apresentar plano que contenha abatimentos no valor a ser pago aos credores Aqui consoante observa Luiz Inácio Vigil não há também a imposição para qualquer limite legal no valor a ser pago pois isso contraria o princípio da negociação que prepondera no regime recuperatório55 Com efeito já se concedeu por exemplo recuperação judicial cujo plano de recuperação que impunha a credores quirografários abatimento de 58 do valor dos créditos56 Entretanto já se cassou decisão de concessão de recuperação judicial cujo plano de recuperação aprovado pelos credores continha previsão de abatimento de 90 do valor dos créditos57 O plano de recuperação judicial também pode prever modo diverso de pagar os credores Assim credores titulares de crédito pecuniário poderão receber seus créditos por dação em pagamento de bens da empresa ou participações societárias58 Nesse caso se aprovado o plano pela assembleia geral de credores o credor não terá como insurgirse contra a dação em pagamento59 94MEIOS QUE IMPLICAM REESTRUTURAÇÃO DO ATIVO O plano de recuperação judicial poderá igualmente conter cláusulas acerca da reestruturação de seu ativo Para tanto poderá prever desde a venda parcial de bens60 até a alienação de unidades produtivas isoladas e operações societárias de fusão cisão e incorporação A alienação de bens integrantes do ativo da empresa devedora é voltada a aprimorar a operação da empresa devedora e assim pagar credores concursais Portanto o produto da alienação desses ativos não poderá ser penhorado por terceiros61 95 ALIENAÇÃO DE UNIDADE PRODUTIVA ISOLADA Um dos meios de recuperação judicial mais importantes consiste na alienação ou arrendamento de unidades produtivas isoladas previsto no art 50 VII da LRF Apesar de a Lei 111012005 referirse a esse meio de recuperação como sendo o trespasse de estabelecimento da empresa devedora devese distinguir com muita clareza a sua disciplina legal daquela outra que trata da venda de estabelecimento fora da recuperação judicial Quando da promulgação da Lei 111012005 as notas distintivas entre um e outro instituto não eram suficientemente claras o que gerou incerteza quanto à interpretação dos dispositivos legais relativos a esse meio de recuperação em importantes casos de recuperação judicial Atualmente após a consolidação jurisprudencial podese afirmar que a disciplina da alienação ou arrendamento de unidade produtiva isolada na recuperação judicial é bastante distinta daquela relativa ao contrato de trespasse Em verdade a disciplina do contrato de trespasse encontrada no Código Civil não é aplicável à venda de unidade produtiva isolada na recuperação judicial e na falência conforme bem anota Ricardo Tepedino62 Por essa razão aqui será utilizada a expressão trespasse para indicar a disciplina jurídica do contrato de trespasse e a expressão alienação de unidade produtiva isolada para designar a venda de estabelecimento empresarial em recuperação judicial de empresas O principal aspecto distintivo entre o contrato de trespasse e a alienação de unidade produtiva isolada diz respeito à disciplina da sucessão em dívidas com fornecedores com empregados e com o Fisco Em caso de trespasse de estabelecimento o adquirente responde pelas dívidas trabalhistas arts 10 e 448 da CLT pelas dívidas tributárias art 133 do CTN e pelas demais dívidas art 1146 do CC2002 relativas ao estabelecimento adquirido63 Essa disciplina legal conduz a uma grande assimetria de informações entre o alienante que possui mais informações sobre o passivo relativo ao estabelecimento alienado e o adquirente que não possui informações sobre esse endividamento Com efeito em caso de trespasse de estabelecimento a disciplina legal reforça a tendência à seleção adversa nesse mercado conforme o princípio dos limões64 formulado por George Akerlof65 Vale dizer como os potenciais compradores de estabelecimento não sabem se o estabelecimento que estão comprando possui ou não dívidas eles tenderão pagar apenas o preço equivalente a um estabelecimento altamente endividado Por conseguinte por conta das diversas normas que imputam responsabilidade ao adquirente de estabelecimento o contrato de trespasse tende a ser um mau negócio para o adquirente e para o alienante A disciplina do contrato e trespasse é um bom exemplo de como o direito pode facilitar ou dificultar transações em mercados Demais disso a disciplina do contrato de trespasse conta com duas outras características que constituem um forte desincentivo para que se utilize esse mecanismo de negociação de ativos operacionais De um lado há a regra do art 1145 do CC2002 a tratar da ineficácia da alienação de ativos operacionais perante os credores do alienante Conforme se lê nesse dispositivo se ao alienante não restarem bens suficientes para solver o seu passivo a eficácia da alienação do estabelecimento depende do pagamento de todos os credores ou do consentimento destes de modo expresso ou tácito em trinta dias a partir de sua notificação Com efeito os credores do alienante por dívidas não relacionadas ao estabelecimento alienado conquanto não estejam protegidos pelas regras de sucessão de dívidas poderão postular a penhora dos ativos operacionais alienados caso ao alienante não tenham restado bens suficientes para pagar todos os seus credores66 Essa regra somente acentua a assimetria de informações tornando o trespasse um negócio altamente arriscado De outro lado não é clara a disciplina da transmissão de posição contratual em caso de trespasse O tema é objeto da norma contida no art 1148 do CC2002 no qual se lê salvo disposição em contrário a transferência importa a subrogação do adquirente nos contratos estipulados para exploração do estabelecimento se não tiverem caráter pessoal podendo os terceiros rescindir o contrato em noventa dias a contar da publicação da transferência se ocorrer justa causa ressalvada nesse caso a responsabilidade do alienante Esse dispositivo pode ser interpretado de duas maneiras A primeira delas empresta maior importância ao papel que os contratos desempenham na organização de ativos operacionais Assim se o trespasse tem por objeto um conjunto de ativos operacionais devemse incluir nesse conjunto de ativos contratos que sejam indispensáveis para a operação a menos que o contrato de trespasse contenha cláusula em contrário indicando quais contratos não serão transferidos Essa interpretação é de aceitação generalizada se se está a tratarse de contratos de trabalho conforme a previsão dos arts 10 e 448 da CLT Em nosso entender deveria também ser a regra geral para os demais contratos que compõem o estabelecimento Entretanto essa interpretação não é objeto de consenso Pelo contrário há corrente interpretativa que prefere entrever no art 1148 do CC2002 uma regra que permite transmissão de posição contratual salvo disposição em contrário na lei que disciplina o contrato que se pretende transferir ou em cláusula contida no próprio contrato Um bom exemplo dessa interpretação encontrase nos enunciados do Conselho de Justiça Federal elaborados acerca do art 1148 do CC2002 Na Primeira Jornada de Direito Civil consolidouse o Enunciado 64 no qual se lia a alienação do estabelecimento empresarial importa como regra na manutenção do contrato de locação em que o alienante figura como locatário Entretanto na Terceira Jornada de Direito Civil preferiuse cancelar o Enunciado 64 e substituílo pelo Enunciado 234 no qual se lê Quando do trespasse do estabelecimento empresarial o contrato de locação do respectivo ponto não se transmite automaticamente ao adquirente Fica cancelado o Enunciado 64 Com efeito preferiuse emprestar maior valor ao disposto no art 13 da Lei 82451991 que proíbe ao locatário ceder o contrato de locação sem o consentimento do locador em detrimento da possibilidade de alienação de um conjunto de ativos operacionais que contenha por exemplo um contrato de locação Essa segunda linha de interpretação abre grande espaço para o oportunismo contratual por parte do locador que poderá exigir uma substancial taxa de transmissão para consentir com a transmissão Esse oportunismo é diametralmente oposto aos objetivos da recuperação judicial67 Sem esse consentimento inviabilizase a transmissão dos ativos operacionais em detrimento de todos os demais stakeholders que se relacionam com a empresa Ante a existência de duas interpretações acerca do disposto no art 1148 do CC2002 há uma grande probabilidade de determinado litígio contratual ser julgado de modo contrário à transmissão de posição contratual Com efeito no que respeita a esse aspecto há incerteza em nosso ordenamento quanto à solução que se haverá de construir no caso concreto o que desincentiva a transmissão de ativos operacionais por meio de contrato de trespasse Essas três características do contrato de trespasse sucessão em obrigações ineficácia da alienação perante credores do alienante e a disciplina da cessão de posição contratual não se aplicam ou são bastante amenizadas em caso de alienação de unidade produtiva isolada em recuperação judicial de empresas Em primeiro lugar não há fraude a credores nem fraude à execução no caso de alienação de unidade produtiva isolada em conformidade com o plano homologado68 Esses atos aliás mesmo em caso de convolação em falência serão preservados conforme estabelece o art 61 2º da LRF Em segundo lugar em caso de alienação de unidade produtiva isolada deverá incidir a norma do art 140 3º que prevê a alienação de conjunto de determinados bens necessários à operação rentável da unidade de produção que poderá compreender a transferência de contratos específicos Por fim em terceiro lugar em caso de o plano prever alienação de unidades produtivas isoladas o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor inclusive as de natureza tributária conforme dispõe o art 60 parágrafo único da LRF Quando da promulgação da Lei 111012005 houve dúvida a respeito do conteúdo normativo desse dispositivo por conta de uma diferença em sua redação em comparação com o art 141 II da LRF relativo à alienação de unidades produtivas isoladas na falência Conforme se lê neste último dispositivo o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor inclusive as de natureza tributária as derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de acidentes de trabalho A diferença na redação dos dois dispositivos consiste em que o art 60 parágrafo único da LRF diferentemente do art 141 II da LRF não menciona expressamente a ausência de sucessão em obrigações trabalhistas e decorrentes de acidente de trabalho Competiu à jurisprudência sanar as dúvidas acerca da interpretação do art 60 parágrafo único da LRF nos primeiros casos de recuperação judicial O caso da Varig foi um dos primeiros grandes casos de recuperação judicial no Brasil a enfrentarem a interpretação do art 60 parágrafo único da LRF Em seu plano havia a previsão de alienação de unidades produtivas isoladas Os potenciais compradores dos ativos operacionais da Varig entretanto encontravamse em um cenário de incerteza institucional ante o fato de que não sabiam se haveria ou não sucessão no passivo trabalhista caso adquirissem unidades produtivas da Varig Em entrevista concedida à Folha de S Paulo em maio de 200669 o presidente da TAM sr Marco Antônio Bologna indagado se havia interesse em participar da compra de unidades produtivas isoladas da Varig respondeu o que posso garantir é a TAM não fará nada que tenha risco sucessório Você entrar em um risco quarto escuro é complicado Mas se houver um risco quantificável e dentro da precificação é outra a análise Referiase o presidente da TAM ao fato de que naquele momento ainda não havia uma definição jurisprudencial acerca da interpretação do art 60 parágrafo único da LRF especificando se haveria ou não sucessão no passivo trabalhista em caso de alienação de unidade produtiva isolada O panorama portanto era de incerteza institucional70 Em razão disso diversos players importantes no mercado de aviação que teriam condições de participar do leilão para a compra de ativos abstiveramse de dar lances Por conseguinte o valor de alienação dos ativos da Varig foi muito inferior ao que se esperava obter Quase um ano após a Gol adquiriu os ativos operacionais que haviam sido arrematados na recuperação judicial da Varig pagando um valor de quase 220 a mais Em entrevista concedida à revista Veja em abril de 200771 indagouse ao presidente da Gol sr Constantino Júnior Por que a Gol não participou do leilão da Varig no ano passado tendo tido anteriormente uma aproximação com a Fundação Rubem Berta a ex controladora para comprar a empresa Em resposta o presidente da Gol afirmou que havia dúvidas em relação à Lei de Recuperação Judicial que é nova Hoje sabemos que ela tem eficácia Essas dúvidas eram relativas à sucessão do passivo trabalhista Conforme afirmou na mesma entrevista nós entendemos que a transação compreende a compra de uma empresa VRG que opera a marca Varig livre de qualquer passivo É dessa forma que concluímos a negociação e entendemos que o risco é mínimo na medida em que os trabalhadores fizeram parte desse plano de recuperação e concordaram com a venda da unidade produtiva isolada nas condições previstas no leilão Esse princípio contido na lei de que os credores decidem o futuro da empresa foi o que norteou o leilão E nós acreditamos que ele será preservado Ante as distintas respostas oferecidas pelos presidentes da TAM e da Gol cumpre indagar o que mudou de meados de 2006 a meados de 2007 Nesse meiotempo consolidouse na jurisprudência o entendimento acerca da suspensão do curso das execuções trabalhistas72 e também acerca de conflitos de competência entre a Justiça Estadual e a Justiça do Trabalho de que o juízo do trabalho possui competência para apurar o valor do passivo trabalhista de empresa em recuperação judicial mas que compete ao juízo da recuperação fiscalizar o plano de pagamentos inclusive a credores trabalhistas73 Con forme consignou o Min Ari Pargendler em voto vencedor a Lei 11101 de 2005 não teria operacionalidade alguma se sua aplicação pudesse ser partilhada por juízes de direito e juízes do trabalho74 Posteriormente definiuse no STF a orientação segundo a qual o juízo laboral é competente para definir o crédito trabalhista enquanto seu pagamento deverá ser realizado no juízo recuperacional75 Para além da definição da regra de competência para o pagamento de crédito trabalhista de empresa em recuperação judicial o STF afirmou a constitucionalidade do art 60 parágrafo único da LRF ao julgar a ADI 393476 Dois dos aspectos centrais do voto vencedor de lavra do Min Ricardo Lewandowski assentavam no parecer da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal elaborado pelo Senador Ramez Tebet relator do projeto de lei que resultou na Lei 111012005 De acordo com o referido parecer o fato de o adquirente da empresa em processo de falência não suceder o falido nas obrigações trabalhistas não implica prejuízo aos trabalhadores Muito ao contrário a exclusão da sucessão torna mais interessante a compra da empresa e tende a estimular maiores ofertas pelos interessados na aquisição o que aumenta a garantia dos trabalhadores já que o valor pago ficará à disposição do juízo da falência e será utilizado para pagar prioritariamente os créditos trabalhistas Além do mais a venda em bloco da empresa possibilita a continuação da atividade empresarial e preserva empregos Nada pode ser pior para os trabalhadores que o fracasso na tentativa de vender a empresa pois se esta não é vendida os trabalhadores não recebem seus créditos e ainda perdem seus empregos Com base na decisão proferida pelo STF o STJ tem reconhecido a não sucessão no passivo trabalhista em caso de alienação de unidade produtiva isolada77 e conforme registram Luis Felipe Salomão e Paulo Penalva Santos o TST também afasta a sucessão trabalhista nas alienações judiciais no processo de recuperação judicial7879 A ausência de sucessão no passivo tributário conquanto referida no art 60 parágrafo único da LRF resulta de alteração na redação do art 133 do CTN decorrente da LC 1182005 Esse dispositivo trata em seu caput da sucessão no passivo tributário em caso de alienação de estabelecimento Já o 1º do art 133 do CTN incluído pela LC 1182005 dispõe que o disposto no caput deste artigo não se aplica na hipótese de alienação judicial II de filial ou unidade produtiva isolada em processo de recuperação judicial80 Essa regra consoante a dicção de Luis Felipe Salomão e Paulo Penalva Santos constitui um dos grandes avanços do novo sistema concursal81 Por fim em caso de alienação de unidade produtiva isolada não haverá sucessão do arrematante nas demais obrigações próprias da unidade alienada afastandose a incidência do art 1146 do CC2002 por conta de expressa disposição do art 60 parágrafo único da LRF A ausência de sucessão em obrigações sejam elas trabalhistas tributárias ou com demais credores foi objeto do Enunciado 47 do CJF elaborado por ocasião da Primeira Jornada de Direito Comercial Consoante se lê no referido enunciado nas alienações realizadas nos termos do art 60 da Lei 111012005 não há sucessão do adquirente nas dívidas do devedor inclusive nas de natureza tributária trabalhista e decorrentes de acidentes de trabalho A ausência de sucessão em dívidas aplicase em caso de alienação de unidade produtiva isolada a terceiros bem como em caso de drop down82 em que a unidade produtiva é transmitida a uma nova companhia constituída pela empresa em recuperação judicial cujas ações serão entregues a seus credores ou terceiros Porém nos termos do art 133 2º I do CTN haverá sucessão caso o adquirente do estabelecimento for sócio da sociedade em recuperação judicial ou sociedade controlada pelo devedor em recuperação judicial AYOUB Luiz R A Construção Jurisprudencial da Recuperação Judicial de Empresas Grupo GEN 2021 Tratase de discussão sobre a possibilidade de apresentação de plano de credores pela empresa recuperanda e posteriormente modificalo no prazo de 60 sessenta dias o que acaba por acarretar demora na avaliação em AGC assembleia geral de credores Nem sempre os credores tem condições de avaliar a viabilidade da empresa o que acarreta a importância de um bom plano de recuperação A empresa possui grande margem de liberdade para propor PRJ embora deva seguir a legislação pertinente a cada caso de acordo com a natureza das cláusulas estabelecidas Há limites específicos para se formular um plano de recuperação O primeiro deles é observar a legislação pertinente em cada caso art 50 O segundo é o limite imposto pelos créditos trabalhistas art 54 O terceiro é a supressão da garantia ou sua substituição somente mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia O quarto limite pelo art 50 2º determina que nos créditos em moeda estrangeira a variação cambial será conservada como parâmetro de indexação e só poderá ser afastada se o credor titular o aprovar expressamente A quinta limitação do art 49 1º da LRF os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados fiadores e obrigados de regresso Outra limitação é a igualdade entre credores da mesma classe não podendo haver discriminação de pagamento Para a reestruturação do passivo e do ativo o plano pode prever cláusula que estabeleça abatimentos e dilações ao pagamento do passivo para viabilizar a reestruturação da empresa bem como venda parcial de bens alienação de unidades produtivas isoladas e operações societárias de fusão cisão e incorporação para reestruturar o ativo A lei também prevê a alienação ou arrendamento de unidades produtivas isoladas previsto no art 50 VII da LRF também conhecida por venda de estabelecimento empresarial em recuperação judicial de empresas diferenciando do trespasse art 1148 do Código Civil Em caso de trespasse de estabelecimento o adquirente responde pelas dívidas trabalhistas arts 10 e 448 da CLT pelas dívidas tributárias art 133 do CTN e pelas demais dívidas art 1146 do CC2002 relativas ao estabelecimento adquirido e por isso é um mau negócio O autor exemplifica o caso da VARIG e da GOL em que havia dúvidas sobre a interpretação do dispositivo já que importava em transferência ou não do passivo da empresa recuperanda 1ª Pergunta Se somente o devedor é quem pode elaborar o plano de recuperação e só depois os credores aprovam em AGC porque o prazo de 60 dias seria curto O prazo não seria uma garantia aos credores Parece que o autor queria se pudesse estender esse prazo Resposta Discordo do autor pois o prazo não é curto AGC nunca decide em tempo hábil não pelo prazo mas porque em regra a maioria dos credores se forma conforme os seus interesses para aprovar o plano sempre visando o que é melhor para a sua classe Não fosse assim não haveria pedidos de prorrogações pag 2 e 3 No caso da Oi está acontecendo isso Houve prorrogação O plano nunca é feito para os credores O devedor faz o plano conforme lhe interessa e apresenta e dali o máximo que conseguir prorrogar é melhor Para empresas grandes multinacionais é sempre assim Milhares de credores se habilitam após o plano e demoram anos para receber A Justiça no Brasil só favorece o empresário 2ª Pergunta Se os credores já se habilitaram e são eles quem sabem o que é melhor para a viabilidade da empresa metáfora do açude porque não elaboram o plano de acordo com o laudo econômico e financeiro antes Resposta o autor admite que esse laudo é necessário até porque a lei impõe mas indica que os credores só aprovam o plano depois de saber se é exequível o plano Logo eles os credores não sabem o que é melhor eles aguardam até que os seus interesses em aprovar o plano sejam garantidos Portanto a metáfora do açude é furada Todos buscam o máximo de peixes que conseguirem pag 4 3ª Pergunta Sobre a diferenciação do trespasse e a alienação de unidade produtiva isolada e a garantia das negociações quanto à responsabilidade pelo passivo da empresa compradora Se há dúvida quanto a estabelecer o trespasse como mau negócio e a própria lei se refere a trespasse onde se encontra a interpretação de que a alienação produtiva isolada é melhor Resposta Ele disse que competiu à jurisprudência sanar as dúvidas acerca da interpretação do art 60 parágrafo único da LRF nos primeiros casos de recuperação judicial em relação a alienação isolada Ocorre que no caso da VARIG e GOL ele se refere a apenas as dívidas do passivo trabalhista o que parece não ter nada a ver com alienação de unidade produtiva isolada porque ele sequer explica como elas adquiriram e o que foi adquirido para ter segurança pag14
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Texto de pré-visualização
AYOUB Luiz R A Construção Jurisprudencial da Recuperação Judicial de Empresas Grupo GEN 2021 1 APRESENTAÇÃO DO PLANO PELO DEVEDOR No direito brasileiro apenas o devedor pode elaborar o plano de recuperação judicial e apresentálo aos credores concursais O procedimento da recuperação judicial de empresas converge para que os credores possam apreciar o plano de recuperação em assembleia de credores Por conta disso tanto o prazo para a verificação administrativa de créditos quanto o prazo para a apresentação do plano de recuperação nos autos começam a correr a partir da publicização editalícia da decisão interlocutória que defere o processamento da recuperação judicial e se encerram no final de 60 dias Na verificação administrativa de créditos este prazo de 60 dias resulta da soma do prazo para apresentação de pedidos que é de 15 dias art 7º 1º da LRF e do prazo para a publicação da relação de credores elaborada pelo administrador que é de 45 dias art 7º 2º da LRF Paralelamente a esse prazo correrá o prazo para a apresentação do plano que é de 60 dias da publicação da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial1 Assim como incumbe ao devedor elaborar o plano de recuperação judicial a ele incumbe apresentar o plano de recuperação judicial dentro do prazo de lei2 Se a recuperação foi postulada em litisconsórcio ativo devese apresentar um único plano de recuperação para todas as empresas litisconsortes3 Nos precisos termos do art 53 da LRF o prazo para apresentação do plano é improrrogável4 e a não apresentação tempestiva do plano caracteriza hipótese de convolação da recuperação judicial em falência art 53 cc art 73 II ambos da LRF5 A decisão que decreta a falência por esse fundamento pode ser atacada por recurso6 mas de regra é tida como incontornável7 Entretanto uma vez apresentado o plano no prazo assinalado pelo art 53 da LRF a empresa pode substituilo posteriormente Conforme consignou o Des Gilberto Guarino em voto paradigmático se a legislação de regência não veda a possibilidade de alteração do plano recuperatório mas bem ao invés expressamente a permite na AGC não é mendaz a interpretação segundo a qual antes do conclave goza a recuperanda da mesma prerrogativa impondose tão somente evitarse prejuízo aos credores que não houverem recebido ciência prévia do conteúdo das modificações sobretudo se elas lhes afetarem as condições de recebimento dos respectivos créditos Aliás a inexistência de proibição normativa a modificações nos PRJs previamente à data da AGC torna absolutamente adequada a noção e o emprego do princípio da legalidade pois de sob uma tal ampla angulação legal não é apenas o que a lei permite mas tudo que ela não veda conforme interpretação do art 5º II da Constituição da República8 É igualmente possível que uma vez aprovado o plano em assembleia ou inclusive homologado pelo juízo recuperacional que seja apresentado novo plano a modificar o plano anterior contanto que não tenha sido encerrada a recuperação judicial conforme lê se na orientação do Enunciado 77 lavrado por ocasião da II Jornada de Direito Comercial do CJF As alterações do plano de recuperação judicial devem ser submetidas à assembleia geral de credores e a aprovação obedecerá ao quorum previsto no art 45 da Lei n 1110105 tendo caráter vinculante a todos os credores submetidos à recuperação judicial observada a ressalva do art 50 1º da Lei n 1110105 ainda que propostas as alterações após dois anos da concessão da recuperação judicial e desde que ainda não encerrada por sentença Uma vez apresentado o plano aos autos dispõe o parágrafo único do art 53 da LRF que o juiz ordenará a publicação de edital contendo aviso aos credores sobre o recebimento do plano de recuperação A publicação desse edital ordenada pelo juiz será realizada pela empresa devedora A desídia da empresa devedora em providenciar a publicação desse edital não caracteriza hipótese de convolação da recuperação judicial em falência9 No entanto decorrido o período de suspensão nesse caso será retomado o curso das ações e execuções art 6º 4º da LRF pois nesse caso a demora no processamento será devida à empresa devedora e não à administração da justiça10 84CONTEÚDO DO PLANO O plano deve conter a descrição pormenorizada dos meios de recuperação11 conforme se lê no art 53 I da LRF Ademais o plano deve conter uma demonstração de sua viabilidade econômica conforme se lê no art 53 II da LRF Aqui a rigor devese ler viabilidade financeira do plano de recuperação conforme adverte Aristides Malheiros ao afirmar que o instrumento de avaliação de viabilidade econômica é o balanço patrimonial no qual se confronta o ativo com o passivo exigível Todavia num processo de recuperação mais que tratar da viabilidade econômica importa avaliar a viabilidade financeira ou seja a capacidade da empresa de gerar recursos suficientes para cobrir todos os desembolsos necessários12 Por fim o plano deve conter um laudo econômico financeiro e de avaliação dos bens e ativos do devedor subscrito por profissional legalmente habilitado ou empresa especializada art 53 III da LRF Esses três elementos contidos no plano de recuperação judicial permitem que se reduza assimetria de informações entre a empresa devedora e os seus credores de modo a que os credores possam deliberar pela aprovação modificação ou rejeição do plano Com efeito conhecidos os meios de recuperação judicial apresentados os credores terão condições de comparar a viabilidade financeira do plano mediante análise de projeção de fluxo de caixa para saber se o plano proposto é exequível e o quanto os credores receberão se aprovarem o plano Como contraponto os credores compararão essa alternativa com a informação constante do laudo de avaliação de bens e ativos do devedor para saber o quanto receberiam em caso de rejeição ao plano e convolação da recuperação judicial em falência 85INSTRUMENTO DE COOPERAÇÃO PARA PRESERVAÇÃO DO VALOR DE EMPRESAS VIÁVEIS A recuperação judicial de empresas é uma das espécies de processos concursais a que estão sujeitos os credores de empresários Por meio da recuperação judicial de empresas se busca satisfazer o maior número de credores da empresa devedora mediante a preservação da empresa e por conseguinte da sua capacidade de gerar receita Conforme observou o Min Fernando Gonçalves a recuperação judicial tem como finalidade precípua o soerguimento da empresa mediante o cumprimento do plano de recuperação salvaguardando a atividade econômica e os empregos que ela gera além de garantir em última ratio a satisfação dos credores13 Os procedimentos concursais lidam com o problema de common pool assets14 que pode ser traduzido para algo como conjunto de bens comuns Esse problema possui dois aspectos De um lado apresentase a distinção entre valor de liquidação de conjunto de ativos mediante a venda individual de cada um dos bens integrantes do conjunto e valor de going concern decorrente da geração de fluxo de caixa de um conjunto de ativos operacionais De outro lado assumindose que o valor de going concern é superior ao valor de liquidação fragmentada de ativos apresentase um desafio para que os diversos credores concursais deixem de buscar a satisfação individual de seus créditos mediante a penhora de ativos individuais da empresa devedora o que afinal conduzirá à liquidação dos ativos e passem a atuar cooperativamente de modo a manter o conjunto de ativos operacionais capazes de gerar maior valor para assim satisfazer um maior número de credores Esses dois aspectos podem ser descritos recorrendose à metáfora da criação de peixes em um açude utilizada por Thomas H Jackson em seu precursor The logic and limits of bankruptcy law15 O primeiro aspecto que essa metáfora permite observar consiste na distinção que se estabelece entre o valor de liquidação de um açude e o valor decorrente da manutenção de seu going concern Imaginese a hipótese de um açude onde seu proprietário possa pescar Suponhase que esse proprietário resolva pescar todos os peixes desse açude Se os peixes pescados forem vendidos o proprietário obterá digamos R 10000000 Entretanto o açude não terá mais peixes e no próximo ano não haverá mais o que pescar Com efeito podese afirmar que o valor de liquidação do açude decorrente da venda de todos os seus peixes é de R 10000000 Entretanto se o proprietário pescar apenas metade dos peixes do açude ele poderá vendêlos por R 5000000 e no próximo ano os peixes terão se reproduzido de modo que o proprietário poderá pescar novamente a metade dos peixes do açude obtendo mais R 5000000 e assim sucessivamente Se anualmente for pescada apenas metade dos peixes do açude o seu proprietário assegurará uma receita anual de R 5000000 o que lhe assegurará um ganho de R 50000000 nos próximos dez anos Se o valor que pode gerar o açude for descontado a valor presente o açude valerá hoje digamos R 40000000 Desse modo o valor do açude como going concern é de R 40000000 Portanto nesse exemplo o valor atual de liquidação do açude R 10000000 é muito inferior ao valor presente do açude como going concern R 40000000 Por essa razão ceteris paribus o proprietário preferirá preservar a capacidade de geração de valor do açude a liquidálo O problema de maximização do valor de common pool assets tornase mais sensível se houver diversos pescadores que podem pescar no mesmo açude Nesse caso conquanto seja evidentemente mais vantajoso preservar o valor de going concern do açude os diversos pescadores poderão enfrentar dificuldades para cooperarem entre si de modo a não pescarem de uma só vez todos os peixes do açude Assim imaginese um caso em que há cem pescadores que podem pescar no açude Se eles se esforçarem ao máximo poderão pescar cada um o equivalente a R 100000 cada Nesse caso o açude terá sido liquidado de modo a que não haverá mais peixes a serem pescados no próximo ano O ideal portanto seria que cada um dos cem pescadores pescasse apenas o equivalente a R 50000 no primeiro ano de modo a manter no açude peixes suficientes para que nos anos sucessivos cada um deles possa pescar mais R 50000 No final de dez anos cada pescador poderá ter pescado o total de R 500000 o que descontado a valor presente equivale a R 400000 por pescador O problema que se estabelece quando há vários pescadores em um mesmo açude consiste em como fazer que os pescadores cooperem entre si de modo a maximizar o valor do açude Tendo em vista que a regra que orienta a pescaria é aquela do primeiro a pescar fica com a pesca os pescadores não possuem incentivos para cooperar Assim se alguns pescadores pescarem apenas R 50000 em peixes não faltarão outros pescadores que pescarão R 150000 de modo a que no somatório terá sido liquidado o açude Portanto nesse caso tenderá a haver uma corrida entre os pescadores para ver quem consegue pescar mais na qual cada um deles buscará ser mais eficiente do que os outros para obter imediatamente a maior quantidade de peixes possível Por essa razão cada um dos pescadores possui um incentivo para pescar o máximo possível de peixes no primeiro ano de pescaria conduzindo à liquidação do açude a um valor substancialmente inferior àquele que seria obtido se fosse preservado o valor do açude como going concern O direito concursal busca evitar esse problema16 O problema de common pool assets anteriormente descrito a partir da metáfora dos pescadores em um açude constitui o problema central do direito concursal que para resolvêlo é orientado por distintas finalidades ou objetivos17 Nos casos em que o valor de liquidação da empresa é superior ao valor de going concern compete ao direito concursal a tarefa de maximizar o valor dos ativos da empresa falida realizando uma liquidação rápida para evitar a depreciação de ativos que obtenha o maior valor possível ao mesmo tempo que estabeleça uma ordem de pagamento de credores concursais Já nos casos em que a empresa possui um valor de going concern superior ao valor de liquidação dizse que essa empresa é viável As empresas viáveis são aquelas cuja recuperação vale a pena já aquelas empresas baseadas em modelos de negócio incapazes de gerar valor são empresas que vale a pena liquidar No jargão anglosaxônico empresas incapazes de gerar valor são referidas como empresas produtoras de chicotes para charretes buggy whips makers em uma alusão às empresas produtoras de chicotes do século XIX que não se adaptaram ao surgimento do automóvel Bons exemplos de empresas produtoras de buggy whips são a Kodak e a Blockbuster Aquela não conseguiu mudar o seu modelo de negócios para adaptarse à fotografia digital esta não conseguiu adaptar seu modelo de negócios para a tecnologia de distribuição digital de filmes Na literatura relativa à recuperação judicial parece convergir para o consenso que a recuperação judicial serve para recuperar empresas economicamente viáveis Uma empresa viável mas que está em crise e que possui vários credores pode enfrentar sérias dificuldades para evitar que os seus credores em execuções singulares acabem por conduzir a uma liquidação dos ativos da empresa em prejuízo ao seu valor de going concern Aqui competirá ao direito concursal evitar a dissipação desse valor viabilizando a preservação da empresa Conquanto haja praticamente um consenso teórico sobre esse aspecto muitas vezes não é fácil distinguir no caso concreto quais são as empresas viáveis e quais não são Por esse motivo a avaliação da viabilidade econômica da empresa será realizada pelo conjunto de credores que cuidarão de negociar um plano de recuperação da empresa devedora Caso os credores entendam que a empresa devedora não é viável eles tenderão a preferir a liquidação da empresa à sua recuperação Nesse sentido por consubstanciar o acordo celebrado entre a empresa devedora e os seus credores o plano de recuperação judicial constitui o aspecto central do procedimento de recuperação judicial de empresas1819 Por conseguinte consoante a precisa dicção do Des Maldonado de Carvalho o objetivo da recuperação judicial não é a liquidação da empresa por meio de uma execução coletiva mas sim a sua reestruturação por meio de uma barganha coletiva que se estabelece com os credores Com efeito na recuperação judicial não haverá inabilitação para o exercício da atividade tampouco a arrecadação de ativos20 86 LIBERDADE DE MEIOS DE RECUPERAÇÃO Na concordata preventiva os meios eram taxativamente delimitados pelo art 156 1º do DecretoLei 76611945 possibilitando apenas uma limitada dilação de até dois anos no prazo para pagamento do passivo quirografário com abatimentos igualmente taxados pela lei O exercício da pretensão à concordata pressupunha que o devedor fizesse promessa de pagamentos21 nos restritos termos permitidos pela legislação concursal Demais disso essa promessa era apenas de pagamento sem que pudesse ser acrescida de cláusula de cessão da empresa de conversão de créditos em participação societária22 ou de cessão de bens disvestitiva segundo a qual o devedor cedendo aos credores os bens se libera das dívidas23 Já por aqui vêse por que razão a concordata consistia em um instrumento de baixíssima eficiência para recuperar empresas de um lado não possibilitava à empresa reequacionar seu fluxo de caixa de outro as restrições aos meios de concordata impossibilitavam que se maximizasse o valor dos ativos operacionais preservandose o valor de going concern da empresa devedora Disciplina muito distinta é encontrada na recuperação judicial Os meios de recuperação judicial indicados no art 50 da LRF integram um rol meramente exemplificativo24 Conforme se lê no caput do referido dispostivo constituem meios de recuperação judicial observada a legislação pertinente a cada caso dentre outros que são em seguida arrolados Por esse motivo na elaboração do plano de recuperação resta aberta à criatividade do empresário e do jurista25 Com efeito os meios de recuperação podem variar da simples reestruturação de passivos de modo a adequar os seus montantes e vencimentos à capacidade de pagamento da empresa até a reorganização societária ou à remodelação administrativa comercial e operacional da empresa medidas muitas vezes imprescindíveis para que se dê viabilidade aos compromissos assumidos perante os credores26 Compete à empresa devedora apresentar seu plano de recuperação judicial tarefa para a qual possui grande margem de liberdade que encontra como grande limitação o fato de que ele será objeto de deliberação da assembleia geral de credores Afora esse limite encontramse na Lei 111012005 alguns limites pontualmente estabelecidos27 A liberdade de dispor acerca do negócio recuperacional alcança não apenas meios de direito material uma vez que o plano de recuperação judicial pode conter em seu bojo cláusulas que disciplinem verdadeiro negócio processual nos termos do art 190 do CPC no qual se lê que versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustálo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus poderes faculdades e deveres processuais antes ou durante o processo O recurso ao negócio processual pode ser de grande utilidade para disciplinar a forma de composição de conflitos que venham a ocorrer após o encerramento da recuperação judicial embora nada obste a que o negócio processual disponha sobre a recuperação judicial em curso 87LIMITES DA LEGISLAÇÃO PERTINENTE AO MEIO DE RECUPERAÇÃO EMPREGADO O primeiro limite específico ao plano de recuperação judicial é encontrado no caput do art 50 da LRF que ao arrolar exemplificativamente os meios de recuperação judicial manda observar a legislação pertinente a cada caso Isso significa que se o plano contiver previsão de cisão incorporação ou transformação da sociedade ou transmissão de quotas ou ações inc II do art 50 da LRF bem como alteração do controle societário inc III do art 50 da LRF e substituição dos administradores da empresa devedora inc IV do art 50 da LRF a concessão de direitos políticos aos credores inc V do art 50 da LRF o aumento de capital social inc VI do art 50 da LRF a constituição de sociedade de credores inc X do art 50 da LRF ou de sociedade de propósito específico para adjudicar os ativos do devedor inc XVI do art 50 da LRF a administração compartilhada inc XIV do art 50 da LRF ou a emissão de valores mobiliários inc XV do art 50 da LRF deverá ser observada a legislação societária aplicável a cada caso Se o plano resultar em ato de concentração que deva ser analisado pelo Cade aplicase a legislação concorrencial28 Já se o plano contiver cláusula a prever redução salarial compensação de horários e redução de jornada inc VIII do art 50 da LRF deverá realizarse nos termos da legislação trabalhista acordo ou convenção coletiva O único meio de recuperação judicial arrolado no art 50 da LRF ao qual não se aplica a legislação extraconcursal consiste na alienação ou arrendamento de unidade produtiva isolada inc VII do art 50 da LRF em razão de o tema ser expressamente disciplinado pela Lei 111012005 As normas concursais contidas na Lei 111012005 também integram o conjunto da legislação a limitar o plano de recuperação judicial Com efeito conquanto determinadas regras da Lei 111012005 não sejam postas expressamente como limites ao plano é certo que elas acabam por constituir limitações a ele Assim por exemplo o plano não pode prever cláusula genérica que lhe autoriza o devedor a vender bem do ativo não circulante que não esteja indicado no plano por conta do disposto no art 66 da LRF29 Da mesma maneira será nula cláusula modificando a classificação legal de créditos que venham a ser admitidos após a aprovação do plano30 88 LIMITES AO TRATAMENTO DO CRÉDITO TRABALHISTA O segundo limite específico ao plano de recuperação é estabelecido pelo art 54 da LRF que estabelece prazo de até um ano para pagamento dos créditos derivados da legislação do trabalho sendo que em trinta dias deverão ser pagos os créditos salariais vencidos nos três meses anteriores ao pedido de recuperação judicial até o limite de cinco saláriosmínimos art 54 parágrafo único da LRF As limitações do art 54 dizem respeito à validade da cláusula não à validade do plano como um todo Com efeito por conta do disposto no art 54 da LRF o devedor não poderá propor a cláusula e se a propuser o juiz não poderá aceitála pois fere norma cogente de interesse público mesmo que os interessados estivessem dispostos a com ela concordar31 O crédito trabalhista sujeitase à recuperação judicial Portanto em caso de deferimento do processamento da recuperação judicial são suspensas as execuções trabalhistas32 Porém da mesma maneira que todos os créditos sujeitos a recuperação judicial o plano poderá não dispor acerca de seu pagamento caso em que conforme dispõe o art 49 2º da LRF o crédito conservará as suas condições originalmente contratadas ou decorrentes de sentença laboral33 É que pode haver situações em que se afigura mais vantajoso não dispor acerca do pagamento do crédito trabalhista no plano de recuperação Assim conquanto o pagamento de crédito em prestações mensais a exemplo de pensão mensal vitalícia por acidente do trabalho a ser paga mês a mês seja incompatível com a falência na recuperação judicial não o é Uma vez habilitado esse crédito o plano de recuperação judicial deverá prever seu pagamento dentro do prazo indicado no art 54 da LRF e não o fazendo o crédito conservará a suas condições originais nos termos do art 49 2º da LRF34 Se o plano de recuperação judicial silenciar acerca do pagamento do passivo trabalhista as execuções laborais poderão prosseguir após o stay period bem como a empresa devedora poderá fazer pagamentos aos credores trabalhistas35 Como crédito sujeito a recuperação judicial pode o plano de recuperação judicial estabelecer modo diverso de pagar os credores trabalhistas contanto que sejam respeitadas as limitações ditadas pelo art 54 e parágrafo único da LRF relacionadas apenas ao prazo para pagamento do passivo trabalhista Isso não significa que o plano de recuperação judicial poderá modificar o valor do crédito trabalhista Se o plano de recuperação pudesse alterar o valor do passivo trabalhista a norma do art 54 da LRF consistiria em um imenso incentivo para que o plano previsse abatimentos pois quanto menor o prazo para pagamento maior será o abatimento Ademais em razão dos limites à competência do juízo recuperacional o crédito trabalhista deve ser pago em conformidade com o valor apurado pela Justiça do Trabalho Se a sentença laboral não fixa os encargos incidentes sobre o crédito ou se o crédito trabalhista não foi judicializado nada obsta a que o plano preveja o pagamento do passivo trabalhista no prazo de lei sem fixar critérios de correção monetária36 A previsão de abatimentos do crédito trabalhista portanto escapa à competência do juízo recuperacional Porém os abatimentos poderão ser negociados perante as autoridades laborais competentes nos termos da legislação trabalhista37 A toda evidência o exíguo limite temporal previsto no art 54 da LRF para pagamento do passivo trabalhista é estabelecido com o relevante propósito de tutelar o interesse de empregados No entanto precisamente por impor prazo tão curto referida norma acaba por piorar a situação de empregados de empresas que mais empregam Empresas que possuem poucos empregados e pequena dívida trabalhista muito provavelmente terão condições de seguir operando ao mesmo tempo em que pagam em um ano os valores devidos a poucos empregados Já empresas que empregam muito estas podem não conseguir seguir operando ao mesmo tempo em que são obrigadas a fazer pesados desembolsos de parcelas laborais no exíguo prazo de um ano Como inexorável consequência empresas que empregam muito e que possuem expressivo passivo trabalhista não conseguirão se reestruturar por meio de processo de recuperação judicial de empresas e terão por destino a falência Nesse caso não apenas os empregados não terão sido pagos como também muitos postos de emprego serão perdidos Ou seja a LRF acaba por conduzir a resultado diametralmente oposto àquele que visava alcançar pela regra do art 54 da LRF Nesse sentido podese afirmar sem medo de errar que a norma contida no art 54 da LRF viola frontalmente o princípio da preservação da empresa à medida que não possibilita que empresas se reestruturem e empregados mantenham seus postos de emprego Uma das formas de superação dos limites aplicativos da LRF e da competência do juízo concursal reside precisamente na possibilidade de se negociar maior prazo de pagamento do passivo trabalhista perante a Justiça do Trabalho No Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região por exemplo adotouse pioneira iniciativa de autorizar que a empresa devedora requeira ao Presidente do Tribunal a concessão de Plano Especial de Execução PPE38 sempre que comprovar que o volume de penhoras ou ordens de bloqueio de valores mensais decorrentes do cumprimento de decisões judiciais está pondo em risco o seu regular funcionamento O Plano Especial de Execução poderá prever o pagamento do passivo trabalhista em até 10 anos e ficará a cargo de uma Vara centralizadora a ser determinada por distribuição que cuidará de arrecadar os pagamentos feitos pelo devedor e distribuir os valores entre as execuções Estas por sua vez ficarão suspensas enquanto perdurar o Plano Especial de Execução Com efeito a empresa devedora poderá requerer ao Presidente do TRT o deferimento do Plano Especial de Execução e em seu plano de recuperação judicial silenciar acerca da forma de pagamento do passivo trabalhista Nesse caso o passivo trabalhista conservará as condições originalmente contratadas art 49 2º da LRF e por isso mesmo os credores trabalhistas não terão interesse em votar na AGC que houver por deliberar acerca do plano art 45 3º da LRF Aliás mesmo que o plano de recuperação judicial tenha disciplinado a forma de pagamento do passivo trabalhista poderá a empresa devedora requerer Plano Especial de Execução que se sobreporá ao plano de recuperação na parte laboral Por fim o plano de recuperação judicial deverá prever o pagamento das parcelas estritamente salariais vencidas nos três meses anteriores ao pedido no prazo máximo de 30 dias a contar da homologação do plano conforme estabelece o parágrafo único do art 54 da LRF39 89LIMITAÇÃO À SUPRESSÃO OU SUBSTITUIÇÃO DE GARANTIA REAL O terceiro limite específico ao plano de recuperação judicial é encontrado no 1º do art 50 da LRF onde se lê na alienação de bem objeto de garantia real a supressão da garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia A limitação contida no 1º do art 50 da LRF diz respeito à eficácia da cláusula40 Com efeito o plano de recuperação judicial pode conter cláusula de substituição ou supressão de garantias reais mas essa cláusula não terá eficácia41 perante o credor titular da garantia se ele não a aprovar expressamente42 Ademais a norma do art 50 1º da LRF não impede a alienação de bem objeto de garantia real43 Contudo se o plano contiver previsão de alienação de bem gravado o gravame acompanhará o bem e o novo proprietário adquirirá um bem onerado44 Aqui devese ter o cuidado de distinguir a regra do art 50 1 da LRF daquela outra do art 29 da Lei 95141997 que trata da transmissão de bem objeto de alienação fiduciária45 Por fim a regra do art 50 1º da LRF também tem sido aplicada à hipótese de trava bancária prevista no art 49 5º da LRF que cuida do penhor de títulos de crédito direitos creditícios valores mobiliários e aplicações financeiras4647 90 LIMITAÇÃO À ALTERAÇÃO DA VARIAÇÃO CAMBIAL PARA CRÉDITOS EM MOEDA ESTRANGEIRA A quarta limitação ao plano de recuperação judicial é estabelecida pelo art 50 2º da LRF onde se lê que nos créditos em moeda estrangeira a variação cambial será conservada como parâmetro de indexação da correspondente obrigação e só poderá ser afastada se o credor titular do respectivo crédito aprovar expressamente previsão diversa no plano de recuperação judicial Cá está mais um limite ao plano de recuperação que diz respeito à eficácia da cláusula perante o credor titular de crédito em moeda estrangeira48 91LIMITAÇÃO À SUPRESSÃO DE GARANTIAS FIDEJUSSÓRIAS A quinta limitação ao plano de recuperação deflui do art 49 1º da LRF no qual se lê que os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados fiadores e obrigados de regresso Esse tema foi objeto de detalhada análise no item 16 Coobrigados com empresa em recuperação no Capítulo 2 92LIMITES AO TRATAMENTO NÃO HOMOGÊNEO ENTRE CREDORES O plano de recuperação judicial cuidará de disciplinar o pagamento dos credores de cada uma das classes individuadas no art 41 da LRF Portanto o plano tratará os credores por classe de credor não sendo possível que o plano estabeleça tratamento individualizado a cada um dos credores integrantes de uma classe49 O que o plano pode fazer é prever o tratamento diferenciado entre conjuntos de credores de uma mesma classe50 Um dos critérios mais utilizados para criar subconjuntos de credores de uma classe é o valor do crédito51 embora possa o plano contemplar outros critérios Conforme o entendimento consolidado na Primeira Jornada de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal no Enunciado 57 O plano de recuperação judicial deve prever tratamento igualitário para os membros da mesma classe de credores que possuam interesses homogêneos sejam estes delineados em função da natureza do crédito da importância do crédito ou de outro critério de similitude justificado pelo proponente do plano e homologado pelo magistrado Ademais é possível que o plano dispense tratamento favorecido a credores colaboradores da empresa em recuperação que são os credores que se dispõem a continuar a financiar a empresa durante a recuperação judicial O tratamento diferenciado justificase conforme a autorizada dicção do Des Gilberto Guarino pois é no período crítico de liquidez que normalmente se destaca a figura do credor estratégico também conhecido como amigo ou parceiro que assume risco maior e efetivamente aposta na recuperação da empresa então em conjuntura precária com o que termina por beneficiar direta e indiretamente todos os demais por isso que costuma em perfeita incidência do postulado da razoabilidade receber tratamento diferenciado e gozar de certos benefícios52 93 MEIOS QUE IMPLICAM REESTRUTURAÇÃO DO PASSIVO A reestruturação do passivo da empresa devedora é um dos modos de recuperação Assim pode o plano de recuperação judicial conter cláusula que estabeleça abatimentos e dilações ao pagamento do passivo concursal isto é cláusula pertinente ao valor e ao prazo para pagamento do passivo concursal Nessa cláusula de regra o devedor goza de grande liberdade inclusive por conta do contrapeso consistente na soberania da assembleia geral de credores para rejeitar o plano podendo o plano de recuperação judicial prever prazo para pagamento superior a dois anos53 A grande maioria dos planos de recuperação contém cláusula a prever prazo de carência de dois anos para o início do pagamento do passivo concursal Essa cláusula é devida à norma do art 61 1º da LRF que estabelece que durante a fase de cumprimento do plano que durará de regra dois anos o descumprimento de qualquer obrigação assumida no plano acarretará a convolação da recuperação judicial em falência Após esse período com o encerramento da recuperação judicial o descumprimento de obrigação assumida no plano não acarreta em convolação da recuperação judicial em falência Conquanto as empresas devedoras possuam grande liberdade para estabelecer o prazo de carência para início do pagamento desde que por óbvio haja aceitação dos credores já houve julgados limitando este prazo54 em que pese a ausência de disposição legal expressa nesse sentido Da mesma maneira a empresa devedora pode apresentar plano que contenha abatimentos no valor a ser pago aos credores Aqui consoante observa Luiz Inácio Vigil não há também a imposição para qualquer limite legal no valor a ser pago pois isso contraria o princípio da negociação que prepondera no regime recuperatório55 Com efeito já se concedeu por exemplo recuperação judicial cujo plano de recuperação que impunha a credores quirografários abatimento de 58 do valor dos créditos56 Entretanto já se cassou decisão de concessão de recuperação judicial cujo plano de recuperação aprovado pelos credores continha previsão de abatimento de 90 do valor dos créditos57 O plano de recuperação judicial também pode prever modo diverso de pagar os credores Assim credores titulares de crédito pecuniário poderão receber seus créditos por dação em pagamento de bens da empresa ou participações societárias58 Nesse caso se aprovado o plano pela assembleia geral de credores o credor não terá como insurgirse contra a dação em pagamento59 94MEIOS QUE IMPLICAM REESTRUTURAÇÃO DO ATIVO O plano de recuperação judicial poderá igualmente conter cláusulas acerca da reestruturação de seu ativo Para tanto poderá prever desde a venda parcial de bens60 até a alienação de unidades produtivas isoladas e operações societárias de fusão cisão e incorporação A alienação de bens integrantes do ativo da empresa devedora é voltada a aprimorar a operação da empresa devedora e assim pagar credores concursais Portanto o produto da alienação desses ativos não poderá ser penhorado por terceiros61 95 ALIENAÇÃO DE UNIDADE PRODUTIVA ISOLADA Um dos meios de recuperação judicial mais importantes consiste na alienação ou arrendamento de unidades produtivas isoladas previsto no art 50 VII da LRF Apesar de a Lei 111012005 referirse a esse meio de recuperação como sendo o trespasse de estabelecimento da empresa devedora devese distinguir com muita clareza a sua disciplina legal daquela outra que trata da venda de estabelecimento fora da recuperação judicial Quando da promulgação da Lei 111012005 as notas distintivas entre um e outro instituto não eram suficientemente claras o que gerou incerteza quanto à interpretação dos dispositivos legais relativos a esse meio de recuperação em importantes casos de recuperação judicial Atualmente após a consolidação jurisprudencial podese afirmar que a disciplina da alienação ou arrendamento de unidade produtiva isolada na recuperação judicial é bastante distinta daquela relativa ao contrato de trespasse Em verdade a disciplina do contrato de trespasse encontrada no Código Civil não é aplicável à venda de unidade produtiva isolada na recuperação judicial e na falência conforme bem anota Ricardo Tepedino62 Por essa razão aqui será utilizada a expressão trespasse para indicar a disciplina jurídica do contrato de trespasse e a expressão alienação de unidade produtiva isolada para designar a venda de estabelecimento empresarial em recuperação judicial de empresas O principal aspecto distintivo entre o contrato de trespasse e a alienação de unidade produtiva isolada diz respeito à disciplina da sucessão em dívidas com fornecedores com empregados e com o Fisco Em caso de trespasse de estabelecimento o adquirente responde pelas dívidas trabalhistas arts 10 e 448 da CLT pelas dívidas tributárias art 133 do CTN e pelas demais dívidas art 1146 do CC2002 relativas ao estabelecimento adquirido63 Essa disciplina legal conduz a uma grande assimetria de informações entre o alienante que possui mais informações sobre o passivo relativo ao estabelecimento alienado e o adquirente que não possui informações sobre esse endividamento Com efeito em caso de trespasse de estabelecimento a disciplina legal reforça a tendência à seleção adversa nesse mercado conforme o princípio dos limões64 formulado por George Akerlof65 Vale dizer como os potenciais compradores de estabelecimento não sabem se o estabelecimento que estão comprando possui ou não dívidas eles tenderão pagar apenas o preço equivalente a um estabelecimento altamente endividado Por conseguinte por conta das diversas normas que imputam responsabilidade ao adquirente de estabelecimento o contrato de trespasse tende a ser um mau negócio para o adquirente e para o alienante A disciplina do contrato e trespasse é um bom exemplo de como o direito pode facilitar ou dificultar transações em mercados Demais disso a disciplina do contrato de trespasse conta com duas outras características que constituem um forte desincentivo para que se utilize esse mecanismo de negociação de ativos operacionais De um lado há a regra do art 1145 do CC2002 a tratar da ineficácia da alienação de ativos operacionais perante os credores do alienante Conforme se lê nesse dispositivo se ao alienante não restarem bens suficientes para solver o seu passivo a eficácia da alienação do estabelecimento depende do pagamento de todos os credores ou do consentimento destes de modo expresso ou tácito em trinta dias a partir de sua notificação Com efeito os credores do alienante por dívidas não relacionadas ao estabelecimento alienado conquanto não estejam protegidos pelas regras de sucessão de dívidas poderão postular a penhora dos ativos operacionais alienados caso ao alienante não tenham restado bens suficientes para pagar todos os seus credores66 Essa regra somente acentua a assimetria de informações tornando o trespasse um negócio altamente arriscado De outro lado não é clara a disciplina da transmissão de posição contratual em caso de trespasse O tema é objeto da norma contida no art 1148 do CC2002 no qual se lê salvo disposição em contrário a transferência importa a subrogação do adquirente nos contratos estipulados para exploração do estabelecimento se não tiverem caráter pessoal podendo os terceiros rescindir o contrato em noventa dias a contar da publicação da transferência se ocorrer justa causa ressalvada nesse caso a responsabilidade do alienante Esse dispositivo pode ser interpretado de duas maneiras A primeira delas empresta maior importância ao papel que os contratos desempenham na organização de ativos operacionais Assim se o trespasse tem por objeto um conjunto de ativos operacionais devemse incluir nesse conjunto de ativos contratos que sejam indispensáveis para a operação a menos que o contrato de trespasse contenha cláusula em contrário indicando quais contratos não serão transferidos Essa interpretação é de aceitação generalizada se se está a tratarse de contratos de trabalho conforme a previsão dos arts 10 e 448 da CLT Em nosso entender deveria também ser a regra geral para os demais contratos que compõem o estabelecimento Entretanto essa interpretação não é objeto de consenso Pelo contrário há corrente interpretativa que prefere entrever no art 1148 do CC2002 uma regra que permite transmissão de posição contratual salvo disposição em contrário na lei que disciplina o contrato que se pretende transferir ou em cláusula contida no próprio contrato Um bom exemplo dessa interpretação encontrase nos enunciados do Conselho de Justiça Federal elaborados acerca do art 1148 do CC2002 Na Primeira Jornada de Direito Civil consolidouse o Enunciado 64 no qual se lia a alienação do estabelecimento empresarial importa como regra na manutenção do contrato de locação em que o alienante figura como locatário Entretanto na Terceira Jornada de Direito Civil preferiuse cancelar o Enunciado 64 e substituílo pelo Enunciado 234 no qual se lê Quando do trespasse do estabelecimento empresarial o contrato de locação do respectivo ponto não se transmite automaticamente ao adquirente Fica cancelado o Enunciado 64 Com efeito preferiuse emprestar maior valor ao disposto no art 13 da Lei 82451991 que proíbe ao locatário ceder o contrato de locação sem o consentimento do locador em detrimento da possibilidade de alienação de um conjunto de ativos operacionais que contenha por exemplo um contrato de locação Essa segunda linha de interpretação abre grande espaço para o oportunismo contratual por parte do locador que poderá exigir uma substancial taxa de transmissão para consentir com a transmissão Esse oportunismo é diametralmente oposto aos objetivos da recuperação judicial67 Sem esse consentimento inviabilizase a transmissão dos ativos operacionais em detrimento de todos os demais stakeholders que se relacionam com a empresa Ante a existência de duas interpretações acerca do disposto no art 1148 do CC2002 há uma grande probabilidade de determinado litígio contratual ser julgado de modo contrário à transmissão de posição contratual Com efeito no que respeita a esse aspecto há incerteza em nosso ordenamento quanto à solução que se haverá de construir no caso concreto o que desincentiva a transmissão de ativos operacionais por meio de contrato de trespasse Essas três características do contrato de trespasse sucessão em obrigações ineficácia da alienação perante credores do alienante e a disciplina da cessão de posição contratual não se aplicam ou são bastante amenizadas em caso de alienação de unidade produtiva isolada em recuperação judicial de empresas Em primeiro lugar não há fraude a credores nem fraude à execução no caso de alienação de unidade produtiva isolada em conformidade com o plano homologado68 Esses atos aliás mesmo em caso de convolação em falência serão preservados conforme estabelece o art 61 2º da LRF Em segundo lugar em caso de alienação de unidade produtiva isolada deverá incidir a norma do art 140 3º que prevê a alienação de conjunto de determinados bens necessários à operação rentável da unidade de produção que poderá compreender a transferência de contratos específicos Por fim em terceiro lugar em caso de o plano prever alienação de unidades produtivas isoladas o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor inclusive as de natureza tributária conforme dispõe o art 60 parágrafo único da LRF Quando da promulgação da Lei 111012005 houve dúvida a respeito do conteúdo normativo desse dispositivo por conta de uma diferença em sua redação em comparação com o art 141 II da LRF relativo à alienação de unidades produtivas isoladas na falência Conforme se lê neste último dispositivo o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor inclusive as de natureza tributária as derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de acidentes de trabalho A diferença na redação dos dois dispositivos consiste em que o art 60 parágrafo único da LRF diferentemente do art 141 II da LRF não menciona expressamente a ausência de sucessão em obrigações trabalhistas e decorrentes de acidente de trabalho Competiu à jurisprudência sanar as dúvidas acerca da interpretação do art 60 parágrafo único da LRF nos primeiros casos de recuperação judicial O caso da Varig foi um dos primeiros grandes casos de recuperação judicial no Brasil a enfrentarem a interpretação do art 60 parágrafo único da LRF Em seu plano havia a previsão de alienação de unidades produtivas isoladas Os potenciais compradores dos ativos operacionais da Varig entretanto encontravamse em um cenário de incerteza institucional ante o fato de que não sabiam se haveria ou não sucessão no passivo trabalhista caso adquirissem unidades produtivas da Varig Em entrevista concedida à Folha de S Paulo em maio de 200669 o presidente da TAM sr Marco Antônio Bologna indagado se havia interesse em participar da compra de unidades produtivas isoladas da Varig respondeu o que posso garantir é a TAM não fará nada que tenha risco sucessório Você entrar em um risco quarto escuro é complicado Mas se houver um risco quantificável e dentro da precificação é outra a análise Referiase o presidente da TAM ao fato de que naquele momento ainda não havia uma definição jurisprudencial acerca da interpretação do art 60 parágrafo único da LRF especificando se haveria ou não sucessão no passivo trabalhista em caso de alienação de unidade produtiva isolada O panorama portanto era de incerteza institucional70 Em razão disso diversos players importantes no mercado de aviação que teriam condições de participar do leilão para a compra de ativos abstiveramse de dar lances Por conseguinte o valor de alienação dos ativos da Varig foi muito inferior ao que se esperava obter Quase um ano após a Gol adquiriu os ativos operacionais que haviam sido arrematados na recuperação judicial da Varig pagando um valor de quase 220 a mais Em entrevista concedida à revista Veja em abril de 200771 indagouse ao presidente da Gol sr Constantino Júnior Por que a Gol não participou do leilão da Varig no ano passado tendo tido anteriormente uma aproximação com a Fundação Rubem Berta a ex controladora para comprar a empresa Em resposta o presidente da Gol afirmou que havia dúvidas em relação à Lei de Recuperação Judicial que é nova Hoje sabemos que ela tem eficácia Essas dúvidas eram relativas à sucessão do passivo trabalhista Conforme afirmou na mesma entrevista nós entendemos que a transação compreende a compra de uma empresa VRG que opera a marca Varig livre de qualquer passivo É dessa forma que concluímos a negociação e entendemos que o risco é mínimo na medida em que os trabalhadores fizeram parte desse plano de recuperação e concordaram com a venda da unidade produtiva isolada nas condições previstas no leilão Esse princípio contido na lei de que os credores decidem o futuro da empresa foi o que norteou o leilão E nós acreditamos que ele será preservado Ante as distintas respostas oferecidas pelos presidentes da TAM e da Gol cumpre indagar o que mudou de meados de 2006 a meados de 2007 Nesse meiotempo consolidouse na jurisprudência o entendimento acerca da suspensão do curso das execuções trabalhistas72 e também acerca de conflitos de competência entre a Justiça Estadual e a Justiça do Trabalho de que o juízo do trabalho possui competência para apurar o valor do passivo trabalhista de empresa em recuperação judicial mas que compete ao juízo da recuperação fiscalizar o plano de pagamentos inclusive a credores trabalhistas73 Con forme consignou o Min Ari Pargendler em voto vencedor a Lei 11101 de 2005 não teria operacionalidade alguma se sua aplicação pudesse ser partilhada por juízes de direito e juízes do trabalho74 Posteriormente definiuse no STF a orientação segundo a qual o juízo laboral é competente para definir o crédito trabalhista enquanto seu pagamento deverá ser realizado no juízo recuperacional75 Para além da definição da regra de competência para o pagamento de crédito trabalhista de empresa em recuperação judicial o STF afirmou a constitucionalidade do art 60 parágrafo único da LRF ao julgar a ADI 393476 Dois dos aspectos centrais do voto vencedor de lavra do Min Ricardo Lewandowski assentavam no parecer da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal elaborado pelo Senador Ramez Tebet relator do projeto de lei que resultou na Lei 111012005 De acordo com o referido parecer o fato de o adquirente da empresa em processo de falência não suceder o falido nas obrigações trabalhistas não implica prejuízo aos trabalhadores Muito ao contrário a exclusão da sucessão torna mais interessante a compra da empresa e tende a estimular maiores ofertas pelos interessados na aquisição o que aumenta a garantia dos trabalhadores já que o valor pago ficará à disposição do juízo da falência e será utilizado para pagar prioritariamente os créditos trabalhistas Além do mais a venda em bloco da empresa possibilita a continuação da atividade empresarial e preserva empregos Nada pode ser pior para os trabalhadores que o fracasso na tentativa de vender a empresa pois se esta não é vendida os trabalhadores não recebem seus créditos e ainda perdem seus empregos Com base na decisão proferida pelo STF o STJ tem reconhecido a não sucessão no passivo trabalhista em caso de alienação de unidade produtiva isolada77 e conforme registram Luis Felipe Salomão e Paulo Penalva Santos o TST também afasta a sucessão trabalhista nas alienações judiciais no processo de recuperação judicial7879 A ausência de sucessão no passivo tributário conquanto referida no art 60 parágrafo único da LRF resulta de alteração na redação do art 133 do CTN decorrente da LC 1182005 Esse dispositivo trata em seu caput da sucessão no passivo tributário em caso de alienação de estabelecimento Já o 1º do art 133 do CTN incluído pela LC 1182005 dispõe que o disposto no caput deste artigo não se aplica na hipótese de alienação judicial II de filial ou unidade produtiva isolada em processo de recuperação judicial80 Essa regra consoante a dicção de Luis Felipe Salomão e Paulo Penalva Santos constitui um dos grandes avanços do novo sistema concursal81 Por fim em caso de alienação de unidade produtiva isolada não haverá sucessão do arrematante nas demais obrigações próprias da unidade alienada afastandose a incidência do art 1146 do CC2002 por conta de expressa disposição do art 60 parágrafo único da LRF A ausência de sucessão em obrigações sejam elas trabalhistas tributárias ou com demais credores foi objeto do Enunciado 47 do CJF elaborado por ocasião da Primeira Jornada de Direito Comercial Consoante se lê no referido enunciado nas alienações realizadas nos termos do art 60 da Lei 111012005 não há sucessão do adquirente nas dívidas do devedor inclusive nas de natureza tributária trabalhista e decorrentes de acidentes de trabalho A ausência de sucessão em dívidas aplicase em caso de alienação de unidade produtiva isolada a terceiros bem como em caso de drop down82 em que a unidade produtiva é transmitida a uma nova companhia constituída pela empresa em recuperação judicial cujas ações serão entregues a seus credores ou terceiros Porém nos termos do art 133 2º I do CTN haverá sucessão caso o adquirente do estabelecimento for sócio da sociedade em recuperação judicial ou sociedade controlada pelo devedor em recuperação judicial AYOUB Luiz R A Construção Jurisprudencial da Recuperação Judicial de Empresas Grupo GEN 2021 Tratase de discussão sobre a possibilidade de apresentação de plano de credores pela empresa recuperanda e posteriormente modificalo no prazo de 60 sessenta dias o que acaba por acarretar demora na avaliação em AGC assembleia geral de credores Nem sempre os credores tem condições de avaliar a viabilidade da empresa o que acarreta a importância de um bom plano de recuperação A empresa possui grande margem de liberdade para propor PRJ embora deva seguir a legislação pertinente a cada caso de acordo com a natureza das cláusulas estabelecidas Há limites específicos para se formular um plano de recuperação O primeiro deles é observar a legislação pertinente em cada caso art 50 O segundo é o limite imposto pelos créditos trabalhistas art 54 O terceiro é a supressão da garantia ou sua substituição somente mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia O quarto limite pelo art 50 2º determina que nos créditos em moeda estrangeira a variação cambial será conservada como parâmetro de indexação e só poderá ser afastada se o credor titular o aprovar expressamente A quinta limitação do art 49 1º da LRF os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados fiadores e obrigados de regresso Outra limitação é a igualdade entre credores da mesma classe não podendo haver discriminação de pagamento Para a reestruturação do passivo e do ativo o plano pode prever cláusula que estabeleça abatimentos e dilações ao pagamento do passivo para viabilizar a reestruturação da empresa bem como venda parcial de bens alienação de unidades produtivas isoladas e operações societárias de fusão cisão e incorporação para reestruturar o ativo A lei também prevê a alienação ou arrendamento de unidades produtivas isoladas previsto no art 50 VII da LRF também conhecida por venda de estabelecimento empresarial em recuperação judicial de empresas diferenciando do trespasse art 1148 do Código Civil Em caso de trespasse de estabelecimento o adquirente responde pelas dívidas trabalhistas arts 10 e 448 da CLT pelas dívidas tributárias art 133 do CTN e pelas demais dívidas art 1146 do CC2002 relativas ao estabelecimento adquirido e por isso é um mau negócio O autor exemplifica o caso da VARIG e da GOL em que havia dúvidas sobre a interpretação do dispositivo já que importava em transferência ou não do passivo da empresa recuperanda 1ª Pergunta Se somente o devedor é quem pode elaborar o plano de recuperação e só depois os credores aprovam em AGC porque o prazo de 60 dias seria curto O prazo não seria uma garantia aos credores Parece que o autor queria se pudesse estender esse prazo Resposta Discordo do autor pois o prazo não é curto AGC nunca decide em tempo hábil não pelo prazo mas porque em regra a maioria dos credores se forma conforme os seus interesses para aprovar o plano sempre visando o que é melhor para a sua classe Não fosse assim não haveria pedidos de prorrogações pag 2 e 3 No caso da Oi está acontecendo isso Houve prorrogação O plano nunca é feito para os credores O devedor faz o plano conforme lhe interessa e apresenta e dali o máximo que conseguir prorrogar é melhor Para empresas grandes multinacionais é sempre assim Milhares de credores se habilitam após o plano e demoram anos para receber A Justiça no Brasil só favorece o empresário 2ª Pergunta Se os credores já se habilitaram e são eles quem sabem o que é melhor para a viabilidade da empresa metáfora do açude porque não elaboram o plano de acordo com o laudo econômico e financeiro antes Resposta o autor admite que esse laudo é necessário até porque a lei impõe mas indica que os credores só aprovam o plano depois de saber se é exequível o plano Logo eles os credores não sabem o que é melhor eles aguardam até que os seus interesses em aprovar o plano sejam garantidos Portanto a metáfora do açude é furada Todos buscam o máximo de peixes que conseguirem pag 4 3ª Pergunta Sobre a diferenciação do trespasse e a alienação de unidade produtiva isolada e a garantia das negociações quanto à responsabilidade pelo passivo da empresa compradora Se há dúvida quanto a estabelecer o trespasse como mau negócio e a própria lei se refere a trespasse onde se encontra a interpretação de que a alienação produtiva isolada é melhor Resposta Ele disse que competiu à jurisprudência sanar as dúvidas acerca da interpretação do art 60 parágrafo único da LRF nos primeiros casos de recuperação judicial em relação a alienação isolada Ocorre que no caso da VARIG e GOL ele se refere a apenas as dívidas do passivo trabalhista o que parece não ter nada a ver com alienação de unidade produtiva isolada porque ele sequer explica como elas adquiriram e o que foi adquirido para ter segurança pag14