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Psicologia ·

Psicologia Social

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FACULDADES PEQUENO PRÍNCIPE CURSO DE GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE ECONÔMICA CURITIBA 2024 ANA JULIA MARQUES COELHO ANDRÉIA FERREIRA DA SILVA LEMOS LINA MARCHETTE DE OLIVEIRA NATHALIA ROTA SOLANO PATRÍCIA DE FRANÇA MATOS THAIS CRISTINA DEKKER HABINOVSKI VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE ECONÔMICA Trabalho apresentado como requisito parcial de avalição da disciplina Psicologia social e comunitária curso de Psicologia das Faculdades Pequeno Príncipe FPP Orientadora Profª Adriana Maria Bigliardi CURITIBA 2024 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO 4 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 5 21 Psicologia social comunitária e sua aplicação no contexto de violência contra a mulher em situação de vulnerabilidade econômica 5 23 Relação de poder por meio da violência e a violência doméstica 7 23 A Desigualdade de gênero e os papeis sociais 8 24 Desigualdades sociais e econômicas para mulheres 8 25 Empoderamento 9 25 Conscientização 10 26 Políticas Públicas de Proteção às mulheres em situação de violência doméstica 11 REFERÊNCIAS 15 4 1 INTRODUÇÃO A violência segundo a OMS Organização Mundial da Saúde 2002 é definida como uso intencional da força ou poder em uma forma de ameaça contra si mesmo outra pessoa ou grupo podendo ocasionar lesão morte dano psíquico alterações do desenvolvimento ou privações Está presente em todos os lugares e classes sociais considerada uma violação dos direitos humanos Hayeck 2015 Boris Moreira Venâncio 2011 Dentre as variações de violência está a violência contra a mulher caracterizada como atos de violência procedentes da diferença de gênero Franzoi Fonseca Guedes 2011 Segundo a OMS 35 das mulheres no mundo já sofreram algum tipo de violência física ou sexual No brasil segundo o estudo Mulheres Brasileiras e Gênero nos Espaços Público e Privado realizada pela Fundação Perseu Abramo e pelo Serviço Social do Comércio Sesc cinco mulheres são espancadas a cada dois minutos no país e uma em cada cinco mulheres reportaram já ter sofrido algum tipo de violência cometida por algum homem conhecido ou desconhecido Venturi e Godinho 2013 Entre as causas que possam vir a gerar a violência destacamse os sociodemográficos características domiciliares socioeconômicas culturais e institucionais como a situação conjugal escolaridade e renda destacando a pobreza Olarte e Llosa 1999 Este trabalho possui o objetivo de conscientizar a população a respeito da violência contra a mulher em vulnerabilidade socioeconômica com foco em analisar os fatores econômicos e culturais que contribuem para a vulnerabilidade de mulheres em situação de violência doméstica visando identificar os principais determinantes que intensificam o risco de violência Além disso busca avaliar a eficácia das políticas públicas e das redes de apoio existentes para mulheres em situação de violência A violência contra a mulher é um problema social que pertence ao âmbito jurídico à segurança pública aos movimentos sociais e ao SUS Minayo 2006 Franzoi et al 2011 É um assunto que abrange todos os âmbitos sociais onde o estudo desse deve mostrar a importância de falar sobre e ajudar a melhorar a assistência a essas mulheres em situações de violência não deixando que seja naturalizado e que vivam sobre opressões Contudo a Psicologia Social Comunitária pode desempenhar um papel fundamental no combate à violência contra a mulher ao promover ações educativas que conscientizem sobre a dinâmica das relações violentas iniciativas de fortalecimento e empoderamento individual que possibilitem a emancipação das mulheres além de programas de reeducação e conscientização 5 dos agressores para promover mudanças comportamentais e fortalecimento grupal que incentive o sentimento de pertencimento respeito mútuo e participação nos processos decisórios das políticas públicas como também o fortalecimento e articulação de redes de serviços e solidariedade para implementação de políticas e programas de prevenção em níveis primário secundário e terciário 2 DSENVOLVIMENTO 21 Psicologia social comunitária e sua aplicação no contexto de violência contra a mulher em situação de vulnerabilidade econômica A Psicologia Social nasce de um pensamento comunitário de que essa ciência não deve servir mais aos interesses das elites mas sim comprometer as maiorias populares Antes de chegar no território brasileiro a Psicologia Comunitária se desenvolvia na década de 1960 nos Estados Unidos onde tinha como objetivo não só tratar as doenças psicológicas mas também prevenilas trazendo intervenções que antes se limitavam aos indivíduos mas logo passou a abranger o seu entorno e assim tornandose um tratamento comunitário Álvaro Garrido 2006 Bennet et al 1966 Em seguida no Brasil mais respectivamente na década de 1970 a Psicologia Social Comunitária veio atrelada aos movimentos sociais como as Reformas Sanitárias e Psiquiátricas e logo após as políticas sociais pósConstituição de 1988 Yamamoto Oliveira 2010 Dessa forma essa modalidade da Psicologia Social veio com o objetivo de diminuir a prevalência de psicopatologias e promover processos de adaptação das pessoas ao ambiente tendo em vista a influência que a cultura e a sociedade têm sobre elas Busnello et al 1975 Nesse sentido na atualidade a Psicologia Social Comunitária se propõe a ser uma prática voltada às necessidades da comunidade enxergando o indivíduo como parte constituinte de um todo maior que é a sociedade Analisando assim seus problemas psicológicos dentro do contexto social levando em conta seu gênero raça sexualidade status social e que papel esse indivíduo ocupa nesse meio Diante disso a Psicologia Social Comunitária traz uma preocupação também com o desenvolvimento social e econômico analisando as situações com um olhar da dialética marxista além de continuar perpetuando o apoio às mudanças sociais e 6 interdependência entre os fatores estruturais emocionais e psicológicos Álvaro e Garrido 2006 Portanto nos dias atuais a relação entre psicologia e comunidade se transforma abrangendo novas perspectivas uma vez que as mudanças intensificadas pelo avanço da globalização têm reconfigurado as formas de compreender o mundo e de vivermos em sociedade Nesse contexto essa lógica permeia as relações humanas sendo moldada pela economia e pela política o que resulta em convivências marcadas por uma racionalização excessiva pela escassez de espaços e tempos e por processos de desterritorialização que levam à impessoalidade nas interações Bauman 2001 Em suma esse cenário vivido na atualidade mostra um adoecimento que necessita não só de um tratamento individual como também social analisando todo o contexto em que o ser humano é inserido Em seguida cabe destacar que na Lei Maria da Penha Capítulo II art 7 incisos I II III IV e V estão previstos 5 tipos de violência contra a mulher física psicológica moral sexual e patrimonial Diante disso essa forma de violência é um problema complexo que se manifesta predominantemente no ambiente doméstico sendo em sua maioria perpetrado por parceiros ou exparceiros com os quais a mulher teve um relacionamento anterior Na cultura brasileira a violência contra a mulher é frequentemente tratada como um comportamento habitual e tolerado enraizado na ideologia da supremacia masculina O patriarcado se apropria do direito de decidir o que é legítimo para o outro naturalizando a imposição de limites muitas vezes pela força à mobilidade e autonomia das mulheres Bourdieu 2002 Com isso em vista a Psicologia Social Comunitária luta em conjunto ao feminismo pois é uma área da Psicologia Social que se configura como política se preocupando com problemas sociais e neste caso o problema de gênero e financeiro que resulta em violência e muitas vezes em mortes de mulheres vulneráveis economicamente No campo da Psicologia Social Comunitária essa violência é vista como um processo profundamente enraizado nas relações sociais assimétricas de poder que historicamente perpetuam os papeis de dominantes e dominados Essa naturalização afeta o autoconhecimento e a percepção de direitos levando as pessoas a se submeterem a situações de desigualdade que limitam o desenvolvimento de suas capacidades e potencialidades prejudicando tanto indivíduos quanto grupos Montero 2006 7 A ideologia da submissão por sua vez estruturase em um sistema de crenças valores e normas que definem as condições de vida da classe oprimida levando à alienação e submissão à ideologia dominante isto é o patriarcado Esse estado de alienação e submissão gradualmente atinge a crença dos indivíduos na própria capacidade de agir com consciência e autonomia Góis 2003 Assim tornase cada vez mais difícil da vítima sair do ciclo de violência 22 Relação de poder por meio da violência e a violência doméstica A violência se reproduz através das relações de poder que entrelaçam entre gênero classe e raçaetnia Historicamente ditada pela ordem patriarcal um fator fortemente ligado a violência de gênero põem o homem no direito de controlar suas mulheres Araújo 2008 onde está dominação masculina exerce uma dominação de práticas sociais e institucionais o que naturaliza a desigualdade entre homem e mulher Bourdieu 1999 apud Araújo 2008 O homem é dito como um ser totalmente oposto da mulher ele é o ser forte dominador racional chefe da família enquanto a mulher é frágil dominável domesticável e movida pela emoção o gênero e a relação de poder é algo estruturante na sociedade Saffioti 2004 apud Cunha 2014 Através dos dados da pesquisa realizada pela Fundação Perseu Abramo Venturini Recamán y Oliveira 2004 apud Lira 2019 mostram que pelo menos 68 milhões de mulheres brasileiras já foram espancadas ao menos uma vez e que o marido ou parceiro são os principais agressores pode variar entre 53 e 70 dependendo do tipo de violência sendo exmarido excompanheiro e exnamorado os outros agressores mais comuns e a residência da vítima como o local da violência totaliza 271 Em 672 dos casos o agressor era parceiro exparceiro ou parente da mulher demonstrando vulnerabilidade da mulher em suas relações domésticas afetivas e familiares Isso mostra como a violência contra a mulher é algo socialmente construído como há a relação de poder do homem sobre a mulher a dominação masculina e a submissão feminina Lira 2019 A violência doméstica é definida e descrita como todas as formas de violência física psicológica ou sexual que são cometidas dentro do ambiente doméstico de acordo com o art 5º da Lei Maria da Penha violência doméstica e familiar contra a mulher é qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte lesão sofrimento físico sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial 8 Schraiber DOliveira e Couto 2006 descrevem que a violência que ocorre dentro do domicílio a violência familiar é vista como algo normal pela sociedade não é entendida como uma forma de violência pois sempre existiu algo já construído na sociedade A partir disso a Lei 11340 Código Civil Brasileiro de 7 de agosto de 2006 foi sancionada criando forma para para diminuir a violência doméstica e familiar contra a mulher onde a partir dessa lei todo caso de violência doméstica contra a mulher é considerado crime permitindo que o agressor seja preso em flagrante ou tenham sua prisão preventiva decretada quando ameaçarem a integridade física da mulher São incluídas medidas de proteção para a mulher e o afastamento do homem do ambiente familiar Esta lei entrou em vigor em 22 de setembro de 2006 recebendo o nome de Lei Maria da Penha Também foram criados serviços específicos para esses tipos de situações como as delegacias especializadas de atendimento à mulher DEAM Nobre Barreira 2008 apud Zancan et al 2013 Porém muitas mulheres não realizam queixas quando sofrem por algum tipo de violência muitas por não perceber como uma violência ou por sentimento de vergonha e culpa pelo ocorrido Monteiro e Souza 2007 Schraiber et al 2007 23 A Desigualdade de gênero e os papeis sociais Segundo Laqueur 1994 as discussões sobre a existência de dois sexos biológicos de gênero tiveram início no século XVIII foi quando houve a diferenciação dos órgãos reprodutivos femininos e masculinos os definindo e marcando suas diferenças As mulheres sendo o sexo frágil e vulnerável tanto fisicamente moral e intelectual que seria ligada a sua sensibilidade pelo fato de serem quem geram os filhos Rohden 2003 apud Aquino 2006 Essa classificação dos sexos determinava certos papeis obrigações e privilégios dentro da sociedade independente da vontade da pessoa Laqueur 1994 O papel do gênero dentro da sociedade institui as relações sociais dos diferentes sexos são as construções sociais a respeito do que pertence ao homem e o que pertence a mulher os comportamento os papeis dependendo da cultura Scott 1990 ja quando se fala em sexo se refere as diferenças biológicas e suas características físicas Houaiss 2001 Determinado por relações historicamente construídas as mulheres se encontram em um lugar de desigualdade onde há a subordinação e opressão destas 9 por possuírem menos poder que os homens Santos e Oliveira 2010 E essas desigualdades são encontradas em todos os âmbitos da sociedade no trabalho na questão salarial educação 24 Desigualdades sociais e econômicas para mulheres Segundo a Simone de Beauvoir 1949 ninguém nasce mulher tornase mulher Nenhum destino biológico psíquico econômico define a forma que a fêmea humana assume no seio da sociedade Demonstra uma sociedade patriarcal onde o homem é visto como mais humano do que a mulher ela possuindo a função social de gerar filhos e criar eles para o mundo Mulheres e homens desde o nascimento são socializados de formas diferentes e essa diferença pode ser vista na relação dos brinquedos destinados para as meninas e os brinquedos para meninos enquanto as mulheres brincam de boneca e casinha os homens exploram e constroem coisas brinquedos já entrelaçados com os papeis que cada gênero possui na sociedade Desde a infância as crianças são educadas de forma a haver a desigualdade e uma desigualdade tratada como algo definido biologicamente Nascimento 2016 Quando é falado sobre as desigualdades no ponto de vista econômicosocial é estabelecida através das relações históricas e também aos papeis sociais impostos e esperados pela sociedade Azeredo2010 Os padrões definidos pela sociedade é de que a mulher é a cuidadora do lar e dos filhos e nesse sentido que Vaitsman afirma que a sociedade industrial moderna constituiuse entre outras coisas pela separação do público e do privado e pela doutrina das esferas separadas por naturezas sexuais desiguais expressas na ideologia nas políticas e na legislação 1994 p 60 É visível que no âmbito econômico a desigualdade de oportunidade e salarial entre homens e mulheres Azeredo2010 Quando pensamos nos ganhos das mulheres na sociedade nos espaços públicos das possibilidades de agora saírem de casa para trabalharem fora não trouxe mudanças quando falamos dos espaços privados dentro de casa onde a desigualdade continua precisando conciliar os serviços de casa com o trabalho fora pois as tarefas domésticas continuam sendo de responsabilidade majoritariamente feminina Segundo Goldani 1997 a dupla jornada de trabalho é muito mais comum 10 entre as mulheres do que os homens principalmente quando são mulheres de baixa renda 25 Empoderamento Os dados de violência doméstica a remuneração desigual a falta de oportunidades no mercado de trabalho as responsabilidades das tarefas domésticas desiguais e a subrepresentação política e todas as outras áreas onde a desigualdade de gênero é tão evidente demonstram uma sociedade desigual e inferior para as mulheres brasileiras Diante destes fatos o empoderamento feminino é essencial sendo um processo de transformação do papel social da mulher deixando de ser subordinada aos homens e passando a ser um ser atuante capaz e com poder de tomar decisões pessoais e coletivas Rowlands 1995 Léon 2001 apud Couto e Saiani 2021 O empoderamento é fundamental para desvincular a mulher à subordinação ao homem e chegarmos à equidade de gênero Lisboa 2008 apud Couto e Saiani 2021 O empoderamento depende também de processos não somente grupais e coletivos que promovam transformações no papel social da mulher a nível estrutural mas também individuais como o processo de tomada de consciência autonomia e autoestima Rowlands 1995 Batliwala 1995 Leon 2001 Berth 2019 apud Couto e Saiani 2021 Para Friedmann 1996 há três tipos de empoderamentos voltados a mulheres vítimas de violência são eles social político e psicológico No que se refere ao empoderamento social está relacionado ao acesso à informação acesso a recursos financeiros e a participação em organizações sociais O empoderamento político está relacionado ao processo de tomada de decisão relacionadas ao futuro participação em atividades coletivas que envolvam questões comunitárias rompendo o ciclo do isolamento e entendendo que a violência também é uma preocupação coletiva e que ela não está sozinha E por fim o empoderamento psicológico que diz respeito à percepção que a mulher possui de si mesma envolvendo a capacidade de tomar suas próprias decisões entendendose como protagonista de sua história desenvolvendo assim a autoconfiança e a autoestima Friedmann 1996 apud Morais Rodrigues 2016 Morais e Rodrigues 2016 destacam que para alcançar a igualdade é necessário que as mulheres também tenham acesso ao poder sendo o 11 empoderamento um dos caminhos para que essa igualdade se concretize rompendo assim o ciclo de violências 26 Conscientização Por se tratar de uma violência causada no ambiente familiar muitas mulheres enfrentam dificuldades em denunciar seus agressores e podem passar anos em situação de vulnerabilidade Em muitas vezes as pessoas e as autoridades não conseguem agir efetivamente pois essas mulheres por alguma razão ou não denunciam ou retiram a queixa após denunciarem Santos Zarpellon 2017 Apesar das inúmeras campanhas de conscientização sobre a violência as estatísticas continuam a aumentar revelando um cenário que soma cada vez mais vítimas A presença da violência contra as mulheres é frequentemente destacada em jornais rádio TV e internet e com isso é possivel evidenciar a presença da violencia no cotidiano das mulheres Woitowicz 2008 Para tentar mudar essa realidade no Brasil cada vez mais propostas e iniciativas têm surgido incluindo a Lei Maria da Penha as redes de enfrentamento à violência propostas regionalizadas projetos de extensão campanhas publicitárias entre outros projetos que visam promover a prevenção da violência através da conscientização da população Santos Zarpellon 2017 Uma dessas campanhas é o Agosto Lilás que foi instituído pelo Senado Federal como um mês dedicado à conscientização e ao enfrentamento da violência contra as mulheres O Agosto Lilás visa promover a informação sobre os direitos das mulheres fortalecer a rede de apoio e incentivar que as vítimas denunciem casos de violência Durante esse mês diversas ações são realizadas em todo o país incluindo palestras eventos e atividades de sensibilização para mobilizar a sociedade e apoiar as vítimas de violência Senado 2023 27 Políticas Públicas de Proteção às mulheres em situação de violência doméstica Políticas Públicas são ações e programas que são desenvolvidos pelo Estado para garantir e colocar em prática direitos que são previstos na Constituição Federal e em outras leis São medidas e programas criados pelos governos dedicados a garantir o bem estar da população Souza 2006 12 Para Höfling 2001 as políticas públicas constituem o Estado em ação por meio de programas pensados para setores específicos da sociedade As políticas públicas são aqui compreendidas como as de responsabilidade do Estado quanto à implementação e manutenção a partir de um processo de tomada de decisões que envolve órgãos públicos e diferentes organismos e agentes da sociedade relacionados à política implementada Neste sentido políticas públicas não podem ser reduzidas a políticas estatais Hõfling 2001 p 31 apud Vigano Laffinn 2019 Do ponto de vista teóricoconceitual a política pública e a política social são campos multidisciplinares que se concentram em explicar a natureza da política pública e seus processos E essas políticas possuem impacto direto na economia e na sociedade Souza 2006 No que se refere às políticas voltadas para a proteção de mulheres vítimas de violência é importante relembrarmos um pouco do contexto histórico As mulheres foram historicamente privadas de direitos e excluídas devido a aspectos relacionados ao gênero Proibidas de gerenciar suas próprias vidas e corpos as mulheres se uniram por meio de movimentos sociais buscando a garantia de seus direitos Rodrigues 2005 Em 1992 a Organização das Nações Unidas ONU compreendeu a gravidade da violência contra a mulher exigindo que os países membros adotassem medidas para criar e implementar políticas sociais a fim de enfrentar esse problema Em 1996 a Organização Mundial da Saúde OMS classificou a violência contra a mulher como uma questão global de saúde pública devido ao seu impacto negativo no bemestar saúde e integridade física e emocional das mulheres e suas famílias aumentando os riscos de doenças e transtornos mentais como depressão e suicídio Bigliardi et al 2016 Foi a partir da década de 1980 que as políticas públicas com perspectivas de gênero começaram a ser implementadas no Brasil como resultado das conferências internacionais sobre as mulheres e do movimento feminista Bastos 2011 apud Cavalcanti e Oliveira 2017 Políticas essas que são desenvolvidas a nível federal estadual e municipal e possuem o objetivo de prevenir a violência proteger as vítimas e punir os agressores Cavalcanti Oliveira 2017 A primeira iniciativa de implantação de uma política pública de combate à violência contra as mulheres no Brasil ocorreu em 1985 com a criação do Conselho 13 Nacional dos Direitos da Mulher CNDM instituído pela Lei nº 73531985 BRASIL 1985 Ainda em 1985 foi inaugurada a primeira Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher DEAM E no ano seguinte em 1986 foi criada a primeira CasaAbrigo para mulheres em situação de risco de morte localizada na cidade de São Paulo Silveira 2006 apud Bigliardi et al 2016 Por meio da criação da Secretaria de Estado de Direitos da Mulher SEDIM em 2003 foi instituído o Programa Nacional de Combate à Violência contra a Mulher que recebeu orçamento próprio poderes e autonomia administrativa para desenvolver e implementar políticas públicas voltadas à ampliação e garantia dos direitos das mulheres Vigano Laffin 2019 Em 2004 foi elaborado o Plano Nacional de Políticas para Mulheres reforçando o enfrentamento à violência contra as mulheres como algo prioritário Assim a Rede de Enfrentamento busca efetivar os quatro eixos previstos na Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres combate prevenção assistência e garantia de direitos e lidar com a complexidade do fenômeno da violência contra as mulheres BRASIL 2011 apud Cavalcanti Oliveira 2017 A Rede de Enfrentamento e Atendimento à Mulher em Situação de Violência é composta por diversas instituições tanto governamentais quanto não governamentais que desenvolvem fiscalizam e implementam políticas específicas para a proteção e defesa dos direitos das mulheres Entre essas instituições estão ONGs feministas movimentos de mulheres conselhos de direitos das mulheres outros conselhos de controle social além de núcleos de enfrentamento ao tráfico de mulheres entre outros BRASIL 2011 No que diz respeito ao atendimento direto destacase a Central de Atendimento à Mulher Ligue 180 um serviço nacional que oferece orientação apoio e encaminhamento para serviços especializados em casos de violência contra a mulher Além disso existem os Centros de Referência que oferecem acolhimento e orientam as mulheres para assistência jurídica e outros serviços necessários às CasasAbrigo que funcionam como moradias temporárias e as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher DEAMs BRASIL 2004 apud Bigliardi et al 2016 Além disso a Rede de Enfrentamento e Atendimento à Mulher possui a Ouvidoria da Mulher e também oferece serviços de saúde especializados no atendimento aos casos de violência sexual Essas ações têm como objetivo assegurar 14 a proteção o atendimento e o apoio às mulheres em situação de violência garantindo seus direitos e proporcionando um ambiente seguro e acolhedor Bigliardi et al 2016 Em 7 de agosto de 2006 foi aprovada a Lei Maria da Penha Lei nº 1134006 que deve ser apoiada por delegacias especializadas no atendimento e proteção às mulheres vítimas de violência A lei atua na redução das desigualdades de gênero e define o que configura violência doméstica contra a mulher incluindo violência física sexual e psicológica Vigano Laffin 2019 Recentemente a Lei 146742023 alterou a Lei Maria da Penha Lei 113402006 para criar e conceder um auxílioaluguel para mulheres vítimas de violência doméstica seu objetivo é oferecer suporte financeiro e garantir a segurança das vítimas durante o período de transição para um ambiente seguro Esta medida proporciona uma alternativa segura para que a vítima consiga reconstruir sua vida e se afastar do agressor sem precisar depender financeiramente dele Lei 14674 2023 O auxílio será disponibilizado por meio de um programa específico coordenado pelos órgãos de assistência social e deve ser destinado para cobrir o aluguel de moradias temporárias ajudando a assegurar que as vítimas tenham acesso a um espaço seguro longe do ambiente de violência O programa também inclui orientações e encaminhamentos para outros serviços essenciais como suporte psicológico e jurídico Senado 2023 15 REFERÊNCIAS AGÊNCIA SENADO Lei concede auxílioaluguel para mulheres vítimas de violência Disponível em httpswww12senadolegbrnoticiasmaterias20240830leiconcede auxilioaluguelparamulheresvitimasdeviolencia Acesso em 30 ago 2024 ARAÚJO Maria de Fátima Gênero e violência contra a mulher o perigoso jogo de poder e dominação Psicol Am Lat n 14 México out 2007 ÁLVARO J L GARRIDO A Psicologia social perspectivas psicológicas e sociológicas São Paulo McGrawHill 2006 AQUINO Estella Gênero e saúde perfil e tendências da produção científica no Brasil Rev Saúde Pública v 40 ed esp p s1s16 ago 2006 AZEREDO Verônica Gonçalves Entre paredes e redes o lugar da mulher nas famílias pobres SciELO 2010 BAUMAN Zygmunt Modernidade líquida Rio de Janeiro Jorge Zahar 2001 BIGLIARDI A M ANTUNES M C CLAUDIA A O impacto das políticas públicas no enfrentamento à violência contra a mulher implicações para a Psicologia Social Comunitária Boletim Academia Paulista de Psicologia v 36 n 91 p 262285 2016 BOURDIEU Pierre A dominação masculina 2 ed Tradução de Maria Helena Kühner Rio de Janeiro Bertrand Brasil 2002 BRASIL Constituição da República Federativa do Brasil Brasília DF Senado 1998 BRASIL Lei n 7353 de 29 de agosto de 1985 Cria o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher Diário Oficial da União Disponível em httpswwwplanaltogovbrccivil03leisl7353htm Acesso em 30 ago 2024 BRASIL Lei n 11340 de 7 de agosto de 2006 Diário Oficial da União Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03Ato200420062006LeiL11340htm Acesso em 30 ago 2024 BRASIL Lei n 14674 de 13 de julho de 2023 Dispõe sobre a concessão de auxílioaluguel para mulheres vítimas de violência doméstica e dá outras providências Diário Oficial da União seção 1 Brasília DF 14 jul 2023 Disponível em httpswwwplanaltogovbrCCIVIL03Ato202320262023LeiL14674htm Acesso em 31 ago 2024 BRASIL Rede de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres Brasília Secretaria de Políticas para as Mulheres 2011 BUSNELLO E LEWIN I RUSCHEL S BRADLEY P Projeto de um Sistema Comunitário de Saúde Porto Alegre RS Secretaria da Saúde do Rio Grande do Sul 1975 CAVALCANTI E C T DE OLIVEIRA R C Políticas Públicas de combate à violência de gênero A rede de enfrentamento à violência contra as mulheres Revista de Pesquisa Interdisciplinar v 2 n 2 15 ago 2019 16 CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA MULHER CNDM Disponível em httpswwwgovbrmdhptbrnavegueportemaspoliticaspara mulheresarquivoassuntosconselho Acesso em 30 ago 2024 COUTO Carolina do Amaral SAIANI Cesar Santejo Dimensões do empoderamento feminino no Brasil índices e caracterização por atributos locacionais e individuais e participação no Programa Bolsa Família Revista Brasileira de Estudos de População v 38 p 122 2021 GÓIS C W L Psicologia comunitária no Ceará Uma caminhada Fortaleza Instituto Paulo Freire de Estudos Psicossociais 2003 HÖFLING E D M Estado e políticas públicas sociais Cadernos CEDES v 21 n 55 p 3041 nov 2001 HOUAISS Antonio Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa Rio de Janeiro Editora Objetiva 2001 LEITE Franciéle Marabotti Costa et al Associação entre a violência e as características socioeconômicas e reprodutivas da mulher Cad saúde colet v 29 n 2 Rio de Janeiro setout 2021 LIRA Kalline Flávia Silva de Relações de gênero poder e violência contra as mulheres um estudo sobre o Sertão brasileiro La ventana v 6 n 50 Guadalajara juldez 2019 MONTERO Maritza Teoría y práctica de la psicología comunitaria la tensión entre comunidad y sociedad Buenos Aires Paidós 2006 MORAIS Milene Oliveira RODRIGUES Thais Ferreira Empoderamento feminino como rompimento do ciclo de violência doméstica Fortaleza Observatório da Mulher Secretaria dos Direitos Humanos e Desenvolvimento Social de Fortaleza 2018 NASCIMENTO Antonia Camila de Oliveira A influência da ideologia patriarcal na definição dos brinquedos infantis Revista em Puta n 37 v 14 p 296318 1 sem 2016 OLIVEIRA Antonio Flávio de FERREIRA Thalia Patricia A conscientização da não violência contra a mulher em campanhas publicitárias uma análise sob o viés da Teoria Dialógica da Linguagem Ícone Revista de Letras v 20 n 1 p 115 2020 SANTOS Katia A dos ZARPELLON Bianca C O Núcleo Maria da Penha Desafios no Enfrentamento à Violência Contra a Mulher Psicologia Ensino Formação v 8 n 1 p 97 106 30 jun 2017 SANTOS Silvana Mara de Moraes OLIVEIRA Leidiane Igualdade nas relações de gênero na sociedade do capital limites contradições e avanços Rev Katál v 13 n 1 p 1119 janjun 2010 SENADO FEDERAL Agosto Lilás campanha de conscientização e enfrentamento da violência contra a mulher Disponível em httpswww12senadolegbrnoticiasmaterias20230801agostolilascampanhade conscientizacaoeenfrentamentodaviolenciacontraamulher Acesso em 1 set 2024 17 SOUZA C Políticas públicas uma revisão da literatura Sociologias n 16 p 2045 dez 2006 SOUZA Tatiana Machiavelli Carmo REZENDE Fernanda Ferreira Violência contra mulher concepções e práticas de profissionais de serviços públicos Est Inter Psicol v 9 n 2 Londrina maioago 2018 TEIXEIRA Daniel Viana Desigualdade de gênero sobre garantias e responsabilidades sociais de homens e mulheres Revista Direito GV v 6 n 1 p 253274 janjun 2010 VIGANO S de M M LAFFIN M H L F Mulheres políticas públicas e combate à violência de gênero História São Paulo v 38 2019 WOITOWICZ Karina Janz A imprensa feminista na luta contra o silenciamento e a impunidade páginas do movimento de mulheres brasileiras pelo fim da violência sexual e doméstica entre os anos 197080 Revista de Economia Política de las Tecnologías de la Información y Comunicación v X n 2 ago 2008 YAMAMOTO O OLIVEIRA I Política social e psicologia uma trajetória de 25 Anos Psicologia Teoria e Pesquisa v 26 ed esp A violência contra a mulher em situação de vulnerabilidade econômica é um problema social significativo e uma grave violação dos direitos humanos Segundo a Organização Mundial da Saúde OMS 35 das mulheres no mundo já sofreram algum tipo de violência física ou sexual No Brasil os índices de violência são alarmantes com dados da Fundação Perseu Abramo mostrando que cinco mulheres são espancadas a cada dois minutos no país A pobreza é um fator que agrava a vulnerabilidade das mulheres aumentando o risco de violência doméstica que é enraizada em relações de poder desiguais entre homens e mulheres Essa violência é muitas vezes justificada por uma cultura patriarcal que atribui ao homem o papel de dominador e à mulher o de submissa No entanto mesmo com a existência de legislações como a Lei Maria da Penha que tipifica cinco tipos de violência física psicológica moral sexual e patrimonial muitas mulheres não denunciam seus agressores por medo vergonha ou dependência financeira A Psicologia Social Comunitária desempenha um papel fundamental no enfrentamento da violência de gênero promovendo ações que conscientizam as mulheres sobre seus direitos e sobre a dinâmica das relações violentas Além disso essa abordagem se preocupa em oferecer apoio psicológico e social buscando o empoderamento das vítimas O empoderamento feminino é crucial para que as mulheres possam romper com o ciclo de violência e conquistar autonomia sobre suas vidas Esse processo de empoderamento ocorre em níveis social político e psicológico permitindo que as mulheres acessem recursos participem de decisões coletivas e desenvolvam autoestima e autoconfiança Por fim políticas públicas são fundamentais para garantir a proteção das mulheres em situação de violência Um exemplo recente é a Lei 146742023 que institui o auxílioaluguel para mulheres vítimas de violência doméstica permitindo que elas possam se afastar dos agressores e reconstruir suas vidas em segurança Essa lei demonstra o compromisso do Estado em proporcionar um suporte financeiro e assegurar a dignidade das vítimas evidenciando que o enfrentamento à violência contra a mulher deve ser tratado como uma questão de responsabilidade coletiva