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Filosofia

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82 vol 7 num 19 2017 ANGÚSTIA COMO CONDIÇÃO DE LIBERDADE EM KIERKEGAARD José Wilson Rodrigues de Brito Resumo Este artigo tem como objetivo central refletir sobre a questão da Angústia e da Liberdade na existência humana segundo a concepção filosófica do dinamarquês Sören Kierkegaard 18131855 A angústia é tomada como uma condição fundamental da existência humana da qual cada indivíduo por mais que deseje fugir não encontra fuga da mesma pois ela propicia ao homem a liberdade através das possibilidades que a mesma visualiza antes da concreção do que antes era mera possibilidade Assim podemos dizer que a angústia direciona o homem não para uma liberdade abstrata mas para a real liberdade que exige compromissos e responsabilidades àquele que busca ser autêntico frente sua própria determinação de personalidade que se dá pela escolha da escolha A partir daí este indivíduo já não permanece no instante da decisão mas tornase ele mesmo um ser que existe com suas diversas características e sujeito às contingências da vida A existência é devir contingência Cada homem é um ser indeterminado inacabado finito limitado angustiado que sofre enfim mas que ao mesmo tempo pode se autoconstruir ao decidir para si e tomar postura pessoal diante do que seja social Palavraschave Angústia Escolhas Existência humana Kierkegaard Liberdade Abstract This article aims to reflect on the question of Anguish and Freedom in human existence according to the philosophical conception of the Danish Soren Kierkegaard 18131855 Anguish is taken as a fundamental condition of human existence from which each individual however much he wishes to flee finds no escape from it for it gives man freedom through the possibilities which he visualizes before the concretion of what was formerly a mere possibility Thus we can say that anxiety directs man not to an abstract freedom but to the real freedom that requires commitments and responsibilities to the one who seeks to be authentic before his own determination of personality which is given by the choice of choice From then on this individual no longer remains at the moment of decision but becomes himself a being that exists with its various characteristics and subject to the contingencies of life Existence is becoming contingency Every man is an indeterminate being unfinished finite limited anguished suffering finally but at the same time it can selfbuild itself by deciding for itself and taking personal stand on what is social Keywords Anguish Choices Human existence Kierkegaard Freedom CONSIDERAÇÕES INICIAIS A partir desta pesquisa se faz uma abordagem sobre a angústia como possibilidade da liberdade humana Com a perspectiva fundamental de mostrar isto em Kierkegaard veremos a situação do homem em seu sentimento de solidão no qual se sente abandonado até mesmo por Deus frente às grandes questões pessoais a que somente ao indivíduo cabe tentar solucionar como citaremos o caso do sacrifício de Isaac por seu pai Abraão Tivemos a preocupação em retomar os mesmos caminhos que este existencialista percorreu ao exprimir seu pensamento a respeito desta condição do homem como ser Mestrando em Filosofia pela UFPI Email nosliwbritohotmailcom 83 vol 7 num 19 2017 sujeito à angústia Deste modo buscaremos explicitar como se dá o surgimento da angústia bem como a condição em que venha a se encontrar o homem diante do nada proporcionado pela angústia pela possibilidade frente à questão conceitual da liberdade humana no exercício da própria liberdade concernente à vivência do constante fazer escolhas em sua vida Também será feita uma explanação na qual teremos como fio condutor a relação entre angústia e liberdade de modo que se esclarecerá através deste estudo que para Kierkegaard a angústia é tomada como uma condição da qual o indivíduo não consegue fugir por mais que se queira pois a mesma é peculiar a cada ser humano A ANGÚSTIA COMO POSSIBILIDADE DE LIBERDADE HUMANA A angústia pode ser comparada à vertigem Quando o olhar imerge num abismo existe uma vertigem que nos chega tanto do olhar como do abismo visto que não seria impossível deixar de encarar Esta é a angústia vertigem da liberdade que surge quando ao desejar o espírito estabelecer a síntese a liberdade imerge o olhar no abismo das suas possibilidades e agarrase à finitude para não soçobrar KIERKEGAARD 1968 p 66 Com a citação acima referida iniciamos este estudo dedicado à abordagem a respeito da angústia como possibilidade de liberdade humana Isto porque ela é um dos principais assuntos trabalhos por Kierkegaard ao longo de sua carreira filosófica e por que não dizer também religiosa já que é uma certeza direta de que o autor foi e é um autor religioso KIERKEGAARD 1986 p 32 Cabe destacar que Kierkegaard tem a fama de ter sido um ferrenho crítico do sistema hegeliano por ter travado uma batalha nos anos quarenta do século XIX contra o predomínio acadêmico do idealismo hegeliano GADAMER 2002 p 247 bem como quanto à sua maneira de conceber a liberdade do ser humano Esta submissa à noção do Eu Absoluto Como argumenta Farago 2006 p 65 em sua liberdade o homem é capaz de autodeterminação em ato livre do determinismo natural sendo capaz de se libertar da essencialidade característica da natureza Neste caso se refere ao aspecto da crítica feita ao idealismo hegeliano que como o próprio Gadamer menciona não é por acaso que tanto os demais críticos do idealismo neokantiano como o próprio Heidegger acolham nesse momento um Kierkegaard procedente da crise espiritual do hegelianismo GADAMER 2008 p 386 Gadamer argumenta isto por que mesmo não sendo tão citado quanto outros pensadores da tradição filosófica Kierkegaard pode ser considerado um dos pensadores que exerceu uma influência decisiva na construção conceitual do seu projeto hermenêutico ROHDEN 2009 p 18 uma vez que é possível afirmar que Gadamer se alimentou do que 84 vol 7 num 19 2017 compreendemos por filosofia existencial e com ela teceu seu projeto filosófico ROHDEN 2005 p 325 Desta forma seguiremos um esquema em que exporemos no primeiro momento sobre o sentimento de desamparo que o homem experiência frente ao que compete somente a ele mesmo refletir em seu silêncio interior Na sequência faremos uma abordagem concernente ao surgimento da angústia enquanto tal que nos levará ao item posterior que tratará da situação do homem diante do nada Por ser um autor religioso Kierkegaard recorre inúmeras vezes a casos relatados nas Sagradas Escrituras Bíblia como a queda pecado do homem relatada no livro do Gênesis e o Sacrifício de Isaac Deternosemos por enquanto ao segundo caso em nossa reflexão sobre o sentimento de solidão no homem observando alguns problemas decorridos no mesmo O SENTIMENTO DE SOLIDÃO NO HOMEM Ao mencionarmos sobre a questão do sentimento de solidão do ser humano frente a determinadas circunstâncias cabe aqui destacarmos que é preciso buscar uma sólida fundamentação em algumas recordações quanto a certas passagens do Gênesis primeiro livro da Bíblia nas quais se tem narrada a história da obediência de Abraão para com Deus quanto á proposta de exigência do sacrifício de Isaac seu filho como prova de fé Momento em que temos profundas reflexões feitas por Kierkegaard com relação ao paradoxo da relação do Absoluto com a Moral A outra passagem a que nos deteremos nesta pesquisa é a do confronto de Adão diante do obedecer a Deus e suas possibilidades quanto a ser dotado de liberdade momento em que se pode fazer uma análise de algumas hipóteses como a origem da angústia assim como aprofundar um estudo a respeito da liberdade e suas possibilidades Neste sentido Kierkegaard alega em sua obra Temor e Tremor que se poderia atribuir quatro hipóteses do que possa ter ocorrido no sacrifício de Isaac por seu pai Abraão Mas antes de adentrarmos a este tópico e para que possamos compreendêlo melhor acreditamos que seja necessário esclarecer um pouco do contexto desta história relacionada a Isaac e Abraão Este já era de idade muito avançada assim como sua esposa e ainda não tinham nem mesmo um filho Porém Deus através de um aviso promete a Abraão que Sara sua esposa teria um filho e que através deste filho Abraão seria pai de uma multidão a tal ponto que poderia ser comparada às estrelas do céu incontáveis em 85 vol 7 num 19 2017 quantidade Esta era a promessa de Deus para com Abraão Deus realmente lhe dá um filho Isaac Entretanto este filho é pedido forma de sacrifício onde o próprio pai Abraão deve matalo como cumprimento da exigência de Deus Aqui é onde se vê situado segundo Kierkegaard a existência de um grande dilema em que o indivíduo Abraão é colocado entre a obediência a Deus e o agir moral de um pai para com seu filho Podese destacar que neste sentido Abraão é tido pela tradição cristã como um referencial de obediência e fé em Deus que é tido como Pai e todo Amor segundo o seguinte trecho em sua obra Temor e Tremor este homem não era aliás um pensador Não sentia o mínimo desejo de ir além da sua fé Parecialhe ser destino mais belo a posteridade vir a chamarlhe o pai da fé e consideravase digno de inveja possuíla ainda ninguém de tal suspeitasse KIERKEGAARD 1979 p 255 Neste caso era exigido por Deus uma prova de fé a Abrão na qual seria provada através do sacrificar o próprio filho em nome e por motivação da fé em Deus Já neste acontecido é possível notar segundo Kierkegaard a profunda angústia assunto que trataremos melhor mais adiante não somente de Abraão mas também de Isaac de tal modo que o filho mesmo chega a expressála no momento em que Abraão o agarra para efetivar o sacrifício como podemos conferir Isaac não o compreendia Foi então que tendose afastado um pouco do filho Isaac lhe tornou a ver o rosto desta vez alterado o olhar feroz as afeições aterradoras Agarrou Isaac pelo peito deitouo por terra e disselhe estúpido Supões que sou teu pai faço o que me apetece Então Isaac fremente e com grande angústia gritou Deus do Céu Tende Piedade de mim Deus de Abraão tende piedade de mim sê meu pai por que já não tenho outro na Terra Mas Abraão ciciava Deus do Céu doute graças Vale mais que me julgue um monstro do que perca a fé em ti KIERKEGAARD 1979 p 256 Aqui temos o maior foco deste item que é o sentimento de desamparo abandono solidão que o homem experiencia Era já notável que Abraão se sentia intrinsecamente abandonado por Deus Abraão através de sua tamanha fé e contínua espera em Deus tornarseia o pai de uma multidão gerações vindouras da posteridade de Isaac Assim Abraão seria especificamente o maior exemplo de profunda fé e obediência abnegada de tudo servindo apenas ao seu Deus Porém a concretização desta promessa encontravase ameaçada já que seu filho a prova concreta da confirmação e possibilidade real de tal promessa se consolidar por inteiro era exigido como oferta sacrificial Neste sentido sendo consequentemente lançada por terra a esperança que estava sendo sustentada no âmago do ser de Abraão Agora esta promessa se tornava uma impossibilidade de 86 vol 7 num 19 2017 realização uma posteridade grande e longínqua a qual tanto esperava Abraão Também é de elevado interesse perceber que Abraão está totalmente voltado à prática de sua fiel e inabalável fé com Deus embora fazendo esta enorme exigência de sacrifício de Isaac Podemos então pontuar neste homem de tamanha fé em Deus seu sentimento de solidão diante de todos no momento em que devia abdicar de seus propósitos planos e esperanças de um ser possibilitado a realizar o grande sonho de posteridade em Isaac no entanto Abraão era o eleito de Deus era o mesmo Senhor que lhe infligia a provação Tudo então se ia perder O renome magnífico da raça futura a promessa à posteridade de Abraão Tudo isso não passara de fugitivo clarão divino que ele deveria apagar agora Esse fruto magnífico tão antigo como a fé no coração do patriarca e anterior em muitos anos a Isaac esse fruto da vida de Abraão santificado pela oração amadurecido na luta essa benção nos lábios do pai esse fruto ia serlhe arrebatado e perder todo sentido que sentido na verdade podia encerrar a promessa quando se impunha a sacrificar Isaac KIERKEGAARD 1979 p 262 Mesmo assim vêse em Abraão sua contínua esperança pois acreditou sem jamais duvidar Como Kierkegaard menciona ele não se abalou em momento algum diante da prova que Deus lhe exigia a tal ponto que se afirma que por todo esse tempo conservou a fé acreditou que Deus não lhe queria exigir Isaac estando no entanto disposto a sacrificálo se tal fosse indispensável Acreditou no absurdo por que tal não faz parte do humano cálculo O absurdo consiste em que Deus pedindolhe o sacrifício devia revogar a sua exigência no instante seguinte Trepou a montanha e no momento em que a faca faiscava acreditou que Deus não lhe exigiria Isaac Então seguramente surpreendeuo o desenlace mas já então também havia por um duplo movimento recobrado o seu primitivo estado e foi por isso que recebeu Isaac com a mesma alegria que sentira pela primeira vez KIERKEGAARD 1979 p 270 Com isto podese reforçar mais ainda tamanha certeza de Abraão diante da fé em Deus um Deus de promessas e cumprimento das mesmas conforme seus planos a tal ponto de se despojar por inteiro de sua vontade da solicitação que Aquele lhe faz sacrificar o melhor que possuía KIERKEGAARD 1979 p 266 o próprio filho que por tanto tempo foi esperado e acolhido ao nascer com tanto afeto por Abraão Aqui surge uma pergunta chave como conciliar este sentimento de atitude de obediência a Deus e a renegação em sacrifício do próprio filho a um Deus que é segundo o autor Amor Neste episódio Kierkegaard destaca o indivíduo sendo o sujeito que vivencia de tal modo sua fé que é capaz de se encontrar no estado de solidão abandono ou melhor se encontrar desamparado em sua humanidade por um Deus que lhe faz a mais cruel exigência isto no âmbito da fé mas que tem repercussão em toda a sua vida tanto em 87 vol 7 num 19 2017 âmbito moral quanto espiritual Em sua dimensão moral e espiritual acontece este conflito no qual se tem o paradoxo existencial Abraão pai amável para com seu filho deve entregar seu único e amado filho a Deus em sacrifício como prova de fé Por outro lado este mesmo Abraão se sente abandonado por Deus já que aquilo que para ele era de maior valor o filho e a promessa de posteridade a Abraão são tomados neste momento como nada é desvalorizado já não tem sentido algum numa dimensão do vivenciar a fé em Deus por parte deste indivíduo O paradoxo aqui se dá no concernente à fé e à moral No caso de Abrão este é movido pela vivência de sua crença e fé em Deus ao optar pela obediência quanto ao que lhe é solicitado por Deus Mesmo sabendo da consequência que poderia trazer esta sua opção pela fé impossibilidade das gerações pósIsaac Abraão decide preferencialmente lançarse no propósito que Deus lhe coloca sacrificar Isaac dando sentido ao que é considerado pelos homens e sua Ética moral como um assassinato ainda mais contra o próprio filho Cabe ressaltarmos a distinção clara quanto ao sacrifício tanto no aspecto da fé como no da moral Isto tendo em vista que no referente à fé este mandato de Deus é simplesmente visto como um holocausto no qual é ofertado uma vida humana a de Isaac para que possa agradar à vontade de Deus Já no concernente à Ética este episódio é considerado um assassinato onde o pai é convidado a matar seu filho sem sequer haver um critério legítimo que possa provar se é realmente Deus que faz tal pedido para provar a fé de Abraão ou se não seria na prática uma forma de alucinação individual Outro ponto muito importante é que embora ele cresse que era Deus quem fazia isto era impossível compreender tal situação pois segundo Kierkegaard Deus é amor e este amor é incomensurável com toda a realidade KIERKEGAARD 1979 p 269 Daí é que a Ética dos homens não entende tal feito pois se Deus é amor incomensurável com toda a realidade não deveria submeter Abraão à tamanha brutalidade que era matar o seu filho que tanto amava por causa de sua fé Isto é absurdo e desumano segundo a visão dos homens sendo qualificada como uma atitude inaceitável frente aos aspectos axiológicos cultivados em prol da preservação da vida humana Portanto ao partir da narração bíblica que estamos refletindo juntamente com Kierkegaard este pretende mostrar a existência do conflito formado entre a fé e a ética humana bem como o sentimento de abandono do indivíduo voltado apenas à constante vivência da fé de modo que o sacrifício se torna inadmissível na concepção e relação de amor entre pai e filho Observando ainda este iminente confronto que se mostra 88 vol 7 num 19 2017 momentâneo entre fé e ética percebese que Abraão é arremessado numa situação na qual não se trata necessariamente de ter que decidir entre digamos assim dois códigos de ética ou sistemas de valores Apenas ele está só e diante do que é incompreensível e infinito não possuindo outra coisa a não ser a sua relação com Deus Assim ele está incapacitado racionalmente para avaliar qual deveria ser sua conduta naquele instante Nesta solidão é que Abraão com a força de sua fé acaba optando pelo infinito sendo que como menciona Kierkegaard em sua obra aquele paga os favores do tempo cada instante da sua vida pelo preço mais elevado porque a mínima coisa é sempre realizada em função do absurdo porque este homem efetuou e completou a todo momento o movimento do infinito Converte em resignação infinita a profunda melancolia da vida conhece a felicidade do infinito a experiência da dor da total renúncia àquilo que mais ama no mundo KIERKEGAARD 1979 p 274 Utilizando esta metáfora Kierkegaard alega que Abraão pela fé não hesitou a saltar imediatamente da razão e da ética para o plano do absoluto onde ser humano com suas faculdades racionais já não consegue enxergar pois a fé é um salto ausência de meditação humana não podendo entre o finito e o infinito haver transição racional Desta forma Abraão se consolida como representante radical do homem religioso de maneira que passa a ser visto como um homem a ser imitado quanto ao seu exemplo de total despojo de si para realização da vontade de Deus acima de toda e qualquer circunstância pela obediência No item seguinte trataremos mais especificamente da angústia e de sua origem Angústia esta que se fez presente constantemente nos diversos momentos em que Abraão experienciou sua solidão desamparo e desespero diante da situação na qual Deus o colocou como provação de sua fé Daí nos deteremos à angústia que terá seu espaço especial a partir do próximo tópico deixando desde já claro que crença e angústia segundo Kierkegaard são inseparáveis bem como o temor de Deus é inseparável do tremor O SURGIMENTO DA ANGÚSTIA A angústia é um dos temas chaves da filosofia existencialista a tal ponto que outros pensadores após Kierkegaard trabalharam em suas reflexões sobre este sentimento enquanto condição intrínseca ao ser humano Precisamente foi Kierkegaard quem primeiro introduziu este conceito na filosofia tendo como propósito mostrála enquanto atitude imanente à própria situação do indivíduo no mundo atitude esta que o indivíduo pode compreender Para que tenhamos um melhor embasamento neste tópico recorremos 89 vol 7 num 19 2017 ao próprio Kierkegaard em sua argumentação na qual afirma que para se chegar ao verdadeiro conceito de angústia é preciso percorrer um caminho árduo de reflexão acerca de tal assunto sobre o qual se tem várias hipóteses Somos advertidos da necessidade de cautela quanto ao não tomar logo por corretas determinadas teorias sem primeiro analisá las bem não se deixando levar pelo comodismo frente à dificuldade em tal meditação sobre o assunto em questão Em sua reflexão acerca do conceito de angústia Kierkegaard faz menção à questão da sua origem a partir de outros conceitos para que se tenha em vista que a angústia não é simplesmente criada de ideias mirabolantes mas que existe sim toda uma articulação que dá sentido à sua existência no homem Daí Kierkegaard destaca a importância de alguns conceitos como por exemplo defender que a inocência é a ignorância Inocente o homem ainda não está determinado como espírito ainda que a alma conserve uma unidade imediata com o seu ser natural Nele ainda o espírito sonha Tal interpretação está inteiramente de acordo com a Bíblia que não concedendo ao homem em estado de inocência a capacidade de discernir entre o bem e o mal condena todas as meritórias fantasias católicas KIERKEGAARD 1968 p 45 Percebemos que Kierkegaard explicita importantes considerações sobre a angústia tendo como suporte primordial para a sua tese a Bíblia Nesta obra desenvolve esta questão no âmbito da narração genesíaca onde se tem a história mito de Adão como primeiro homem e representante da humanidade a experimentála pois frente à proibição de comer o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal Adão ficou angustiado REBLIN 2008 p 110 e através dela chega à queda pecado Neste sentido é que se deve destacar o conceito de inocência no qual o indivíduo Adão se encontra primitivamente e que não se deve colocar neste instante antes do pecado o homem como já reconhecedor do bem e do mal como bem enfatiza Kierkegaard É neste momento porém que se deve ter uma atenção apurada para notar que já aqui se vislumbra algo ou melhor outra coisa como bem afirma literalmente nosso filósofo Em tal estado existe calma e descanso porém existe ao mesmo tempo outra coisa que entretanto não é perturbação nem luta porque não existe nada contra que lutar O que existe então Nada Que efeito produz porém este nada Este nada dá nascimento à angústia Aí está o mistério profundo da vida é ao mesmo tempo angústia KIERKEGAARD 1968 p 45 Esta outra coisa a qual se refere Kierkegaard é o que ele denomina como nada Este nada é propriamente o que dá origem à angústia pois no mesmo nada se manifesta Portanto há uma imanente relação entre o nada e a angústia e ambos até se tornam equivalentes como destaca Kierkegaard na frase acima corresponde a dizer que ali no nada está situada ao mesmo tempo a angústia Concernente à questão da inocência no 90 vol 7 num 19 2017 indivíduo é interessante percebermos que o mesmo ainda não tem reais condições de fazer o confronto ou seja discernir entre o bem e o mal pois não é capaz de visualizar o que se tem no porvir já que a inocência vê sempre e sempre diante de si este nada KIERKEGAARD 1968 p 45 Um aspecto importante que não podemos olvidar é que ao tentar explicar o surgimento da angústia Kierkegaard enfatiza bem que o homem enquanto inocente não é determinado como espírito pois esta síntese é consolidada no próprio homem somente quando acontece a queda onde neste momento o indivíduo se dá conta de que há uma relação feita entre o corpo e a alma que tem necessidade de uma síntese através deste terceiro elemento que é o espírito Assim a unidade é firmada entre corpo e alma Kierkegaard assinala como de elevada importância a determinação espiritual pertencente somente ao homem pois através dela é que o homem faz a experiência da angústia Esta é a realidade da liberdade como puro possível KIERKEGAARD 1968 p 45 que se difere à do animal que não tem esta condição por ser um ser desprovido da categoria espiritual por essa razão é que não a achamos no animal cuja natureza não tem precisamente a determinação espiritual KIERKEGAARD 1968 p 45 Kierkegaard defende em seus argumentos que no momento em que há a angústia no ser inocente ela não deve ser vista como sentimento que cause culpa sofrimento ou fardo para o indivíduo mas que seja entendida primeiramente como uma suave inquietação e que o ser humano em sua existência e sua subjetividade não pode deixar a angústia tomar conta de sua vida na mesma medida em que não pode viver sem ela REBLIN 2008 p 126 Deste modo é possível observar sua importância em uma criança Como Kierkegaard argumenta nas seguintes palavras observai a infância achareis aí esta angústia mais exatamente desenhada como uma procura de aventura do monstruoso do mistério A angústia é de tal modo fundamental na criança que ela não deseja dispensála até quando inquietada pela angústia a criança mostrase encantada com sua suave inquietação KIERKEGAARD 1968 p 46 Diante do que já foi dito mais precisamente na dimensão psicológica Kierkegaard continua sua reflexão sobre o surgimento da angústia e para tentar esclarecer esta questão recorreremos especificamente ao ser humano como uma síntese síntese de alma e do corpo importando observar pequenos detalhes que muitas vezes podem passar por despercebidos àqueles que buscam repostas rápidas ou até mesmo errôneas a respeito de determinados detalhes como este Em Kierkegaard notase insistentemente que o 91 vol 7 num 19 2017 homem é um ser espiritual pela existência da alma e do corpo de tal forma que essa síntese não seria imaginável se não existisse a possibilidade da reunião de tais elementos em um terceiro que é o espírito Portanto mesmo em seu estado de inocência o homem não deve ser considerado apenas um animal pois se alguma vez o fosse em qualquer instante de sua existência nunca se tornaria homem KIERKEGAARD 1968 p 47 Cabe ressaltar então que Kierkegaard alega a presença do espírito no ser humano mesmo que este esteja em seu estado de inocência pois para que o homem se constitua é preciso que se tenha esta relação entre corpo e alma Com isto Kierkegaard se preocupa em solucionar a problemática gerada no que concerne à presença do espírito que mostra se por um lado como um poder inimigo KIERKEGAARD 1968 p 47 por confundir a relação ente alma e corpo e por outro como ser enquanto potência amiga que deseja constituir a relação Daí Kierkegaard pergunta Qual é portanto a relação do homem com esta potência ambígua Qual a relação do espírito com ele mesmo e com a sua condição A relação é a angústia O espírito não pode estar contente com ele mesmo nem apreenderse enquanto o seu eu se conservar exterior a si mesmo KIERKEGAARD 1968 p 47 Aqui se pode notar que Kierkegaard faz referência à constituição do próprio eu de cada indivíduo onde se deve vivenciar experienciar sua individualidade em sua condição de existência humana isto tendo em vista a compreensão de que o homem é constituído pela angústia relação intrínseca e constituinte do indivíduo e da qual não é possível fugir pois ele a ama embora tente fugir da mesma como veremos em outro momento A inocência neste sentido atinge seu cume e a ignorância é determinada pelo espírito Mesmo assim podese dizer que não deixa de existir como angústia tendo como pressuposto que a ignorância aqui referida se abre ao nada pois até este momento ainda não há reconhecimento do bem e do mal já que a realidade completa do saber projetase na angústia como infindável nada da ignorância A respeito do homem do eu como relação síntese interessanos dizer que Kierkegaard levanta a tese de que através da subjetividade como relação podese obter o reconhecimento de uma formação exclusa de tudo o que seja tido estável a ponto de que assim o indivíduo se sujeita à angústia à falta ao desespero bem como àquilo que seja fragilidade própria conforme podemos notar no seguinte trecho O homem é espírito Mas o que é o espírito É o eu Mas nesse caso o eu O eu é uma relação que não se estabelece com qualquer coisa de alheio a si mas consigo própria Mas e melhor do que a relação propriamente dita ele consiste no orientarse dessa relação para a própria interioridade O eu não 92 vol 7 num 19 2017 é a relação em si mas sim o seu voltarse sobre si própria o conhecimento que ela tem de si própria depois de estabelecida O homem é uma síntese de infinito e de finito de temporal e de eterno de liberdade e de necessidade é em suma uma síntese Uma síntese é uma relação de dois termos KIERKEGAARD 1979 p 337 Como podemos observar nas palavras de Kierkegaard esta relação não é tão simples quanto possa parecer no primeiro momento pois a mesma consiste em que o eu não seja tomado simplesmente como relação em si mas que voltese sobre si própria tendo em vista que o eu é a relação voltada sobre si própria Kierkegaard usando o relato bíblico que narra o pecado original em que Adão está no Jardim do Éden alega que basta apenas uma palavra para que caia por terra a ignorância existente em seu momento de inocência Exatamente neste instante é que a angústia recebeu sua primeira presa e em lugar do nada tem uma palavra misteriosa KIERKEGAARD 1968 p 48 As palavras proferidas por Deus a Adão são na verdade constituintes de uma ordem que diz porém os frutos da Árvore do Bem e do Mal não comerás KIERKEGAARD 1968 p 48 Segundo Kierkegaard em uma de suas hipóteses relacionadas a esta narrativa fica estampado que no mais profundo de sua inocência Adão não entendia o real sentido desta frase já que o mesmo só poderia compreender a diferenciação entre o bem e o mal após o saborear do fruto Assim Kierkegaard reflete condicionalmente a respeito da possibilidade de se admitir que com a proibição em Adão tenha nascido o desejo e que daí no lugar da ignorância se tenha o saber Porém para que se confirme isto seria necessário que Adão já conhecesse a liberdade pois seu desejo deveria fazer uso da liberdade Fica claro então que após a proibição Adão é submetido a uma tamanha inquietude que nele então desperta a possibilidade da liberdade Assim o que se ofertava à inocência como um nada da angústia adentrouse e conserva ainda aqui um nada a aflitiva possibilidade de poder KIERKEGAARD 1968 p 48 assunto que desenvolveremos em nosso próximo tópico O HOMEM DIANTE DO NADA Agora nos deparamos com a questão do homem que se encontra diante do nada que segundo Kierkegaard é relatado como exemplo claro disso a narração bíblica em que Adão é alcançado pela voz externa Deus que lhe ordena algo como já mencionado anteriormente Este algo é causador de uma grande estranheza em Adão pois este ainda não conhecia ou melhor não tinha consciência enquanto indivíduo do que lhe poderia ocorrer dependendo de sua atitude frente a tal expressão de Deus em seu ordenamento 93 vol 7 num 19 2017 Temos então o homem lançado no âmbito do nada da possibilidade de poder como uma forma superior da ignorância como expressão elevada da angústia KIERKEGAARD 1968 p 48 Deste modo Kierkegaard menciona que é através da angústia que ocorre no homem o despertar para a possibilidade de ser livre e que nesta possibilidade é que o homem se dá conta de que não sabe a que se refere especificamente suas possibilidades O nada como categoria constitutiva da compreensão do eu sujeito em Kierkegaard tornase então intrínseco ao ser humano pois o mesmo se depara com o que lhe é de mais próprio como ser sujeito ao imprevisível ou melhor está no nível do possível e ao mesmo tempo de incerteza do bom ou mau êxito quanto à sua concreção possível no real Kierkegaard enfatiza que sendo admitido que da proibição nasce o desejo daí realmente surge a hipótese de que Adão conhecesse a liberdade cabendo por conseguinte uma análise minuciosa a respeito do que Deus lhe adverte com a frase por certo morrerás tendo em vista que Adão ainda não tinha elementos suficientes para discernir o que significaria morrer Portanto uma vez levando afinco esta hipótese precisamos dizer que deste modo pela angústia o homem é colocado consequentemente diante de duas instâncias ao mesmo tempo a coisa proibida e o castigo Isto principalmente pelo fato de o homem estar anteriormente imerso na profundidade do nada pertencente a si mesmo como nos afirma Kierkegaard 1968 p 48 A possibilidade incomensurável de poder originada pela proibição cresceu pelo fato de esta possibilidade recordar uma outra como sua consequência Deste modo a inocência é empurrada até a derradeira extremidade A angústia em que ela imerge colocase em relação com a coisa proibida e com o castigo Ela não é culpada e contudo a angústia existe como se já estivesse perdida Assim podemos notar que nesta reflexão sobre o nada frente ao qual o homem se encontra acrescentase a angústia como fator primordial a lançar o homem diante de si mesmo como um ser finito mas que é dotado de possibilidades inúmeras através de sua liberdade Também no trecho citado acima da obra kierkegaardiana é necessário ressaltar desde já a questão que mais adiante trataremos com mais precisão que é a de que podendo visualizar em sua angústia as possibilidades de efetivação de sua decisão o homem é conduzido a meditar imediatamente sobre as possíveis consequências de suas deliberações para o futuro pois a partir da tomada de posicionamento para com suas opções sãolhe dadas também as responsabilidades de assumir para si suas consequências advindas de tais efetivações Portanto a angústia é vista como já frisado como aquela que confronta o homem consigo mesmo de modo que esteja preparando e anunciando ao 94 vol 7 num 19 2017 indivíduo a escolha pela qual ele possa concretizar realizar o seu próprio eu Isto por que a angústia é pessoal de modo que o sujeito deve constantemente se dar conta disso não fugindo mas sim aprendendo a conviver com a mesma para que se concretizem a partir da escolha suas mais variadas possibilidades na vivência como podemos conferir que Concomitantemente a angústia é a coisa mais profundamente pessoal e nenhuma manifestação real da liberdade mostrase tão zelosa do Eu como a possibilidade de concreção contudo enfeitiçanos com a sua suave inquietude KIERKEGAARD 1968 p 66 Partindo da consciência do nada de sua vida o homem pode construir a si mesmo pois a partir daí é que como um ser que tem em si possibilidade de liberdade o mesmo pode decidir e sair da inércia na qual se encontra o seu nada na angústia pois o nada que era objeto da angústia como se torna sempre mais alguma coisa KIERKEGAARD 1968 p 66 Podemos dizer aqui que já há uma diferenciação entre o nada que era tido simplesmente como objeto da angústia antes do salto qualitativo e o nada existente após este salto Veremos na citação abaixo que enquanto nada da angústia este pode ser tomado como que imanente à angústia a ponto de ser visto como pressentimento Assim nos diz Kierkegaard O nada da angústia portanto representa nesta conjuntura uma espécie de complexo de pressentimentos refletidos sobre si próprios e aproximandose cada vez mais do homem ainda que no fundo ainda não representem nada na angústia contudo vejase bem não um nada que seja indiferente ao indivíduo porém um nada em comunicação viva com a ignorância da inocência Aquela meditação equivale a uma predisposição que antes de ser praticada a falta significa fundamentalmente nada KIERKEGAARD 1968 p 67 Segundo Kierkegaard é claramente notável que antes do salto qualitativo este nada está continuamente relacionado com a ignorância da inocência em seu sentido de poder ser para o homem aquela categoria na qual se tem uma diversidade de reflexões sobre si mesmo e que pouco a pouco se achega ao indivíduo A reflexão neste momento dáse no âmbito de si mesmo entendendo os pressentimentos em si mesmos e não fora de si Um pouco mais a frente nesta problemática do nada da angústia anterior ao salto qualitativo e do nada após este salto Kierkegaard defende que no segundo caso o homem já não é mais contido apenas por meditações sobre si mesmo mas que agora a reflexão adquire outro sentido o de ir bem mais além Já a partir do instante em que com o salto qualitativo o homem se torna culpado a meditação aparece como a condição prévia em que o homem se baseia para remontar além de si próprio visto que o pecado se 95 vol 7 num 19 2017 autopressupõe não antes de ser estabelecido porém antes que o foi KIERKEGAARD 1968 p 67 Deste modo vemos que nosso filósofo aponta para o sentido de que o ser humano em sua vida é profundamente marcado pela permanência da falta pois o mesmo é um ser inacabado e possuidor de uma busca do que está para além de si mesmo como poderemos constatar na etapa posterior de nossa pesquisa a partir do estudo da relação existente entre possibilidade angústia e liberdade A RELAÇÃO ENTRE ANGÚSTIA E LIBERDADE Após termos perpassado pelas questões do sentimento de abandono no homem assim como pelo surgimento da angústia e pela do homem diante do nada podemos compreender que há necessidade de refletirmos neste estudo sobre uma forte concepção no pensamento kierkegaardiano que é o da relação entre angústia e liberdade sendo que não se pode separar aleatoriamente esses conceitos já que são interligados entre si Buscaremos então explanar nesta etapa de estudos sobre a condição da qual o indivíduo não consegue fugir que segundo Kierkegaard é a angústia Neste sentido no tocante a este assunto Kierkegaard deixa suficientemente claro que a angústia é própria do ser individual em toda a sua vida mas ao mesmo tempo embora o homem admita esta sua condição tenta fugir da mesma É importante observar que quando o homem se determina como ser espiritual o fugir da angústia não é possível por que a ama porém amála realmente do mesmo modo não pois foge dela KIERKEGAARD 1968 p 47 O pensador dinamarquês mostra que a angústia é consubstancial consolidada no indivíduo levandoo a ser participante do espírito isto no sentido de que pela síntese entre alma e corpo se tem o espírito Referente a isto o homem não pode escapar Importanos elucidar que Se o homem não tivesse consciência da possibilidade se não tivesse espírito e inteligência ele não conheceria a angústia de onde se conclui que a angústia está ligada à espiritualidade do homem Em consequência disso é então impossível libertarse da angústia quanto de si mesmo LE BLANC 2003 p 83 Ainda para confirmar esta dimensão espiritual a que pertence o homem vemos em um trecho da obra O Conceito de Angústia uma passagem na qual se tem uma 96 vol 7 num 19 2017 comparação muito interessante que destaca a elevada importância do espírito da consciência como aquilo a que não se pode enganar Um sujeito caloteiro pode perfeitamente livrase de seus credores e conseguir acalmálos com palavras macias porém existe um credor pelo menos que jamais alguém conseguiu permanece sempre no homem ainda que escondida e disfarçada KIERKEGAARD 1968 p 100 Assim o homem por ser dotado de espírito e por sua capacidade inteligível reflete sobre si mesmo e sua condição de maneira que se vê incapaz de ter uma vida animal do mesmo modo que não pode viver isento da angústia pois o indivíduo é uma síntese e anjo ou animal jamais o homem poderia sentir a angústia Contudo considerando que é uma síntese pode sentila e tanto mais intimamente a sente mais aumenta a sua grandeza humana KIERKEGAARD 1968 p 157 Conforme aponta Kierkegaard a angústia é muitas vezes entendida como presente no individuo predominantemente nos momentos de pecado isto para os que ainda não levaram a fundo a reflexão sobre este estado pois na realidade a angústia está presente tanto com relação ao que seja prazeroso quanto ao que não o seja A angústia assim como se coloca no pudor deve estar presente em qualquer erótico ainda que de modo algum tal prazer seja um pecado KIERKEGAARD 1968 p 76 Isto nos faz assimilar que realmente a angústia não é existente somente diante do pecado mas também nas variadas situações da vida do indivíduo Um exemplo claro é quando Kierkegaard faz a colocação de que no erotismo por mais que se exprima como elevada e total pureza moralidade e beleza possíveis nem mesmo por isso a angústia se faz ausente não que esta angústia queira produzir perturbação mas se apresenta como parte integradora da relação Portanto mesmo não existindo elementos que denotem necessariamente pecado no indivíduo esta condição angústia se faz presente Como afirma o autor Mais de um casamento já se viu profanado sem qualquer contribuição de outrem Entretanto quando o erotismo é sem mácula inocente e belo mostrase graciosa e suave e aos poetas estão cheios de razão quando cantam sua suave inquietação KIERKEGAARD 1968 p 77 Baseandose nesta passagem vemos que mesmo no erotismo inocente e belo ou seja que em si não contenha maldade alguma a angústia se apresenta Porém acima notamos as palavras suave inquietação expressão em que nosso filósofo identifica a angústia assim como quando se observa na criança o encantamento com esta inquietação da angústia Da mesma maneira dáse esta suave inquietação no que seja inocente e belo neste caso relacionado ao erotismo sem ser tomado como algo pecaminoso e que venha 97 vol 7 num 19 2017 prejudicar macular o homem Usando as palavras de Kierkegaard poderíamos dizer neste caso que mesmo exterior a um tal ser a angústia continua nas proximidades KIERKEGAARD 1968 p 118 e aí se tem suave inquietação que não gera perturbação no indivíduo pois como já ressaltamos anteriormente a angústia continua a ser medida da grandeza aos seres humanos em vista que quanto mais se sente angústia mais se aumenta esta grandeza no homem Em outro trecho Kierkegaard faz uma alusão estética à angústia do ponto de vista dos poetas que quando se referem à descrição do amor aí também a angústia se manifesta como podemos observar em todo caso está mais ou menos certo que os poetas jamais descrevem o amor por mais pureza e inocência que exista em seu quadro sem que aí coloquem a angústia KIERKEGAARD 1968 p 76 ponto que Kierkegaard não aprofundou em O Conceito de Angústia mas que aqui fazemos menção para destacarmos tamanha importância a que ele dá a esta temática em seu vasto campo bibliográfico Até agora vemos que a angústia é relacionada com a possibilidade a ponto de dizermos segundo Kierkegaard que o homem tem sua constituição elaborada a partir da dela implicandolhe condição fundamental do homem diante do mundo diante do possível e este possível é fruto de sua liberdade Aqui cabe fazermos alusão ao que o próprio filósofo nos diz sobre o homem constituído pela angústia pois o homem constituído pela angústia é constituído pela possibilidade e apenas aquele a que a possibilidade forma está formado em infinitude KIERKEGAARD 1968 p 158 É imprescindível ao falar da angústia não olvidar a possibilidade a categoria de possibilidade relacionada precisamente à dimensão da liberdade ou seja no que toca às escolhas que o indivíduo deve fazer no decorrer de suas mais diversificadas circunstâncias às quais são colocadas em sua vida Neste sentido cabe destacar que a angústia é um tema chave na teoria filosófica de Kierkegaard Isto implicando salientar que no momento em que se reconhece a angústia como um estado próprio a si mesmo o indivíduo se expande para o infinito pela possibilidade pela angústia Quanto a isto Kierkegaard especifica que é dado este reconhecimento através da consciência de si mesmo por ser dotado do terceiro elemento constituinte da síntese no homem que é o espírito Este pode ser entendido como o conceito de consciência do eu existente como síntese entre alma e corpo A angústia não faz distinção entre grandes ou pequenas facticidades voltadas ao ser humano conforme conferiremos no próximo trecho da obra aqui dotada como primária A angústia rompe inúmeros limites em sua 98 vol 7 num 19 2017 potencialidade de forma a triunfar até sobre a categoria finitude visto que comprovaremos no mencionado abaixo A angústia jamais deixa de estar presente até nas coisas mais insignificantes sempre que por aí desejemos fugir ou entrar de modo furtivo Em si mesma a coisa é insignificância e do exterior por meio da finitude nada nos informa a respeito porém a angústia não escolhe caminhos tortuosos e abate logo o triunfo da finitude da categoria contra isso nosso ser não pode coisa alguma KIERKEGAARD 1968 p 162 Com isso percebemos que para Kierkegaard a categoria de finito é superada pela de possibilidade de infinitude e mesmo que o indivíduo busque fugir de uma forma ou outra por meio da categoria de finitude não há como escapar tendo em vista que o indivíduo deve recorrer à de infinitude como nos diz Kierkegaard A finitude pode ensinarnos muita coisa porém sobre a angústia apenas nos confere o conhecimento de um aspecto bem inferior e degradante Quando ao invés se faz a real aprendizagem da angústia temse a convicção de poder avançar dançando quando as angústias da finitude principiam a soar sua música e percam a cabeça e a vontade os aprendizes do finito KIERKEGAARD 1968 p 163 Pertencente ainda a esta questão Kierkegaard sustenta constantemente esta ausência de escapula inerente ao homem quanto à angústia como o autor defende Até mesmo no que diga respeito a uma insignificância sempre que o ser tente uma manobra hábil e que é apenas hábil desde que deseje esconder se e com todas as possibilidades de êxito por que a realidade não é um examinador tão rigoroso como a angústia a angústia está presente KIERKEGAARD 1968 p 162 Por conseguinte o indivíduo não tem como escapar da angústia enquanto ser humano visto que lhe é imanente em sua condição de existência no mundo O pensador dinamarquês expõe uma comparação interrogativa muito interessante sobre o perscrutar da permanente presença da angústia no indivíduo E menciona a seguinte questão E qual juiz esperto que sabe acertar no interrogatório que sabe revistar o réu com perguntas como a angústia que jamais deixa nem nos prazeres nem no íntimo da confusão nem durante o serviço nem de dia nem de noite KIERKEGAARD 1968 p 157 Neste sentido vimos que Kierkegaard defende a angústia como condição fundamental do indivíduo enquanto homem diante do mundo do possível Também observamos que por mais que se deseje fugir desta condição não se consegue pois a 99 vol 7 num 19 2017 angústia se faz presente em todos os momentos da vida de cada ser humano cabendo ao mesmo ser aprendiz do possível a ponto de simplesmente saber conviver com a mesma e ao mesmo tempo dela tirar proveito constantemente Isto é o que veremos em nosso próximo tópico tendo em vista que a possibilidade está intimamente relacionada à liberdade na existência humana CONSIDERAÇÕES FINAIS Kierkegaard vai à raiz da questão a respeito da angústia e da liberdade humana onde notamos que a angústia é tomada pelo autor como esta condição fundamental da existência humana no que se refere ao uso da liberdade A angústia é tomada como um sentimento que não tem objeto preciso mas que simplesmente é alimentada pelo indeterminado pelo nada Neste nada a angústia mostra seu vasto campo de possibilidades onde o possível é equivalente à angústia Por sua vez a angústia nos direciona à liberdade Ficanos a ideia de que em Kierkegaard temos de modo interligado os conceitos de angústia liberdade e possibilidade na existência humana E isto nos conduz à compreensão de que este filósofo aponta um outro conceito primordial tanto à sua filosofia quanto a toda a corrente filosófica existencialista que é a categoria da escolha em que o indivíduo tem como que uma imposição a si mesmo de que deve fazer escolhas durante toda sua existência como ser consciente A existência em si é pura contingência É aqui onde o indivíduo se angustia profundamente ao não saber se suas reais opções conduzirlheão àquilo que antes era pura possibilidade mas que agora se faz concretude pela escolha Deste modo podemos dizer que a angústia aponta não para uma liberdade abstrata identificada com o livrearbítrio mas a uma real liberdade que é concreta Nota se em Kierkegaard a defesa de uma filosofia voltada ao existencial consolidando uma vivência prática daquilo que se chega a compreender na defesa da individualidade da interioridade contraposta ao universalismo abstrato éticoreligioso político ou epistemológico PAULA 2009 p 13 O indivíduo a partir desta consciência de si mesmo como ser espiritual que tem em si a síntese entre corpo e alma voltase para o infinito como ser finito e inacabado em busca de sua infinitude ao escolher 100 vol 7 num 19 2017 REFERÈNCIAS FARAGO France Compreender Kierkegaard Tradução de Ephraim F Alves Petrópolis RJ Vozes 2006 GADAMER HansGeorg Verdade e Método traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica Trad Flávio Paulo Meurer 10 Ed Petrópolis Rj Editora Vozes 2008 Verdade e Método II complementos e índices Trad Marcia Sá CavalcanteSchuback Petrópolis RJ Vozes 2002 KIERKEGAARD Sören Aabye O conceito de angústia São Paulo Hemus Liv Ed 1968 Ponto de vista explicativo da minha obra como escritor Lisboa Edições 70 1986 Diário de um sedutor Temor e tremor O desespero humano In Os Pensadores São Paulo Abril Cultural 1979 LE BLANC Charles Kierkegaard Tradução de Marina Appenzeller São Paulo Estação Liberdade 2003 PAULA Marcio Gimenes de Indivíduo e comunidade na filosofia de Kierkegaard São Paulo Paulus 2009 REBLIN Iuri Andréas A angústia kierkegaardiana Protestantismo em Revista v 16 p 105 127 2008 ROHDEN Luiz A atualidade de Sören Kierkegaard In Revista do Instituto Humanitas Unisinos São Leopoldo Edição 314 09112009 ROHDEN Luiz Simultaneidades kierkegaardianas em HG Gadamer In Filosofia Unisinos 63 322329 setdez 2005