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ISSN 18073395 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Ano XVIII Nº 105 DezJan 2022 Repositório Autorizado de Jurisprudência Supremo Tribunal Federal nº 382007 Superior Tribunal de Justiça nº 582006 Classificação QualisCapes B1 Editor Fábio Paixão Coordenador Oswaldo Henrique Duek Marques Conselho Editorial Alice Bianchini André Vinícius Espírito Santo de Almeida Aury Lopes Júnior Carlos Eduardo Adriano Japiassú Carlos Ernani Constantino Carolina Alves de Souza Lima Celso de Magalhães Pinto César Barros Leal Cesar Luiz de Oliveira Janoti Cezar Roberto Bitencourt Claudio Brandão Édson Luís Baldan Eduardo Saad Diniz Elias Mattar Assad Eloisa de Souza Arruda Ester Kosovski Eugenio Raúl Zaffaroni Argentina Fernando Capez Fernando da Costa Tourinho Filho Fernando de Almeida Pedroso Fernando Gentil Gizzi de Almeida Pedroso Gisele Mendes de Carvalho Gustavo Octaviano Diniz Junqueira Jacinto Nelson de Miranda Coutinho João Mestieri José Carlos Teixeira Giorgis Luciano de Freitas Santoro Luiz Flávio Borges DUrso Marco Antonio Marques da Silva Marcus Alan de Melo Gomes Michele Cia Nadia Espina Argentina Orlando Faccini Neto Oswaldo Giacoia Júnior Paulo Henrique Aranda Fuller Raúl Cervini Renato Marcão Rômulo de Andrade Moreira Ryanna Pala Veras Sergio Demoro Hamilton Silvio Luís Ferreira da Rocha Tiago Caruso Torres Umberto Luiz Borges DUrso Colaboradores deste Volume Antonio Carlos da Ponte Carolina Marcondes Fraga Cláudio Iannotti da Rocha Dermeval Farias Gomes Filho Felipe Teixeira Schwan Fernando Gentil Gizzi de Almeida Pedroso Gustavo Filipe Barbosa Garcia Gustavo Octaviano Diniz Junqueira Jaques de Camargo Penteado João Henrique Imperia Martini Juliana Menescal da Silva Ziehe Mariana dos Reis Caminha Nestor Eduardo Araruna Santiago Rodrigo Augusto Costa de Oliveira Santos Rodrigo Grazinoli Garrido Victória de Oliveira Nunes D O U T R I N A Os Argumentos Vedados no Tribunal do Júri e as Necessárias Compatibilizações com a Garantia Fundamental da Plenitude da Defesa GUSTAVO OCTAVIANO DINIZ JUNQUEIRA Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas 1996 Mestre 2003 e Doutor 2009 em Direito das Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Pós Graduado em Direito Penal pela Universidade de Salamanca e PósDoutorado em Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra Professor de Direito Penal da Graduação e da PósGraduação em Sentido Estrito da PUCSP e do Curso Damásio Professor Convidado de Cursos de PósGraduação Lato Sensu no COGEAE PUCSP na Escola Paulista da Magistratura na Escola Paulista de Direito e na Unitoledo Coordenador do Departamento de Assuntos Prisionais do IBCCRIM Defensor Público do Estado de São Paulo tendo sido Diretor da Escola da Defensoria Pública EDEPE email gjunqterracombr JOÃO HENRIQUE IMPERIA MARTINI Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas 2004 PósGraduado Lato Sensu com o Título de Aperfeiçoamento em Direito Público e Privado pela Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus 2006 Participou do Diplomado Internacional sobre Direitos Humanos promovido pelo Centro de Estudos da Procuradoria Geral do Estado Instituto MaxPlanck de Derecho Público Comparado y Derecho Internacional Heidelberg Center para a América Latina e PUCSP 2009 Mestrando em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo 2019 exDefensor Público do Estado de São Paulo 20072021 Desempenhou as funções de Assessor Criminal da Defensoria PúblicaGeral 20122013 e de Coordenador do Núcleo Especializado de Segunda Instância e Tribunais Superiores 20162018 Advogado email joaohimperiagmailcom RESUMO Destinase esse estudo à análise dos argumentos vedados no Tribu nal do Júri previstos no art 478 do Código de Processo Penal e a necessidade de sua compreensão a partir da garantia fundamental à plenitude da defesa Procedeuse à leitura prévia das normas jurídicas aplicáveis e da bibliografia Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 8 assim como ao levantamento dos julgados pertinentes do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal todos referenciados Como resultado identificouse que a interpretação atualmente majoritária a respeito do tema não está de acordo com as potencialidades da garantia fundamental à plenitude de defesa A conclusão é a de que o art 478 do Código de Processo Penal para o réu é norma garantidora de direitos e consequentemente limitadora do poder estatal de modo que o seu rol é exemplificativo e deve ser interpretado extensivamente Concluiuse ainda que a mencionada norma é constitucional PALAVRASCHAVE Tribunal do Júri Argumentos Vedados Plenitude da Defesa SUMÁRIO Introdução 1 Os Limites à Argumentação em Sessão Plenária do Tribunal do Júri 11 Considerações Iniciais 12 Limites Legais 13 A Interpre tação Jurisprudencial do STJ e do STF 14 Um Breve Panorama da Doutrina Brasileira 2 O Tribunal do Júri na Constituição Federal de 1988 21 A Plenitude da Defesa 22 Plenitude da Defesa e Interpretação Extensiva dos Argumentos Vedados do Art 478 do CPP 23 Suposta Inconstitucionalidade do Art 478 do CPP Conclusão Referências Introdução O art 478 do Código de Processo Penal com redação dada pela Lei nº 1168908 passou a vedar às partes durante os debates na sessão plenária de julgamento que empreguem determinados argumentos As partes não poderão sob pena de nulidade fazer referências i à decisão de pronúncia às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudi quem o acusado e ii ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento em seu prejuízo O questionamento que o presente estudo busca responder é se o rol de argumentos vedados estabelecido pelo legislador no art 478 do Código de Processo Penal é taxativo ou exemplificativo e secundariamente se há nele alguma eiva de inconstitucionalidade material por eventual violação ao contraditório ou à liberdade de expressão A hipótese por ora é a de que a regra acima interpretada à luz da garantia fundamental da plenitude da defesa com a sua máxima efetividade consubstancia uma norma garantidora de direitos do réu em face do Estado acusação e ao mesmo tempo de contenção do poder estatal no processo penal Partindo dessa premissa a bem do devido processo penal democrático racional que respeita os direitos e garantias individuais tal regramento deve ser recebido como exemplificativo viabilizando a limitação de outros argu mentos acusatórios desconectados de fundamento jurídicos ou das provas dos autos mas com grande poder persuasivo perante o juiz leigo No mesmo DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 9 sentido por ser uma norma garantidora de direitos do acusado e que decorre essencialmente da garantia da plenitude da defesa ela é compatível com a Constituição Federal de 1988 Ainda como hipótese temse que não há viola ção à liberdade de expressão ao Estadoacusação seja porque este não é titular desse direito fundamental especialmente dentro do processo movido pelo Estado em face de uma pessoa seja porque a ele não é dada a legitimidade de postular condenações ainda mais a juízes leigos baseandose em argumentos desprovidos de base jurídica ou relação probatória ao contrário da Defesa que conforme se verá em homenagem à máxima efetividade da plenitude da defesa é possível pedir até mesmo a clemência do acusado Como metodologia procedeuse à leitura prévia das normas jurídicas aplicáveis e da bibliografia além de se ter pesquisado julgados do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal objetivando identificar basicamente quem são os atores processuais que demandam a aplicação do art 478 do CPP e quais têm sido as respostas daquelas cortes Tratase pois de uma análise teórica com reforço empírico Após essa introdução na seção seguinte tratarseá dos limites à argu mentação em sessão plenária do Tribunal do Júri de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro A análise aqui partindo do art 478 do CPP será destinada a verificar como o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal têm compreendido o dispositivo legal Na seção subsequente trataremos do instituto do Tribunal do Júri na Constituição Federal brasileira de 1988 com foco na garantia fundamental da plenitude da defesa e seus reflexos na inter pretação daquela regra Ainda na mesma seção apresentaremos o falso dilema sobre a eventual inconstitucionalidade do art 478 do CPP por suposta violação à liberdade de expressão Por fim na conclusão apresentaremos as razões pelas quais entendemos que o art 478 do Código de Processo Penal é constitucional e porque para o réu a um só tempo tratase de norma garantidora de direitos e limitadora do poder estatal de modo que o seu rol é exemplificativo e pode ser interpretado extensivamente em face do Estadoacusação 1 Os Limites à Argumentação em Sessão Plenária do Tribunal do Júri 11 Considerações Iniciais O art 478 foi incluído no Código de Processo Penal por meio da Lei nº 116892008 e de acordo Badaró1 além de não encontrar correspondente na sistemática anterior a regra objetiva evitar que argumentos não neces 1 BADARÓ Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró Tribunal do Júri In MOURA Maria Thereza Rocha de Assis Coord As reformas no processo penal as novas leis de 2008 e os projetos de reforma São Paulo RT 2009 p 190 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 10 sariamente corretos mas com fortíssimo poder de persuasão principalmente perante juízes leigos possam levar a um resultado injusto De fato é preciso muita cautela com a validade dos argumentos dedu zidos ao corpo de jurados pois este é formado por juízes leigos e não preci sam fundamentar as suas decisões O pior cenário que se pretende evitar são as condenações baseadas em argumentos desprovidos de correspondência probatória O Estado não tem interesse em condenar inocentes o que seria instrumentalização incompatível com a construção básica de dignidade da pessoa humana O Estado não tem legitimidade para postular condenação sem provas pois o poder punitivo exige o crivo racional da produção de provas nos moldes do devido processo legal não bastando a intuição do profissional que presenta o Estado sobre a culpa do réu para sustentar a atribuição de culpa A convicção intuitiva sobre a culpa sem lastro probatório materializase em poder autoritário ou decisionismo nos termos de Ferrajoli decisionismo é o efeito da falta de fundamentos empíricos precisos e da consequente sub jetividade dos pressupostos da sanção 2 A condenação só é legítima se respeita as balizas do jogo democrático que condiciona o poder punitivo ao seu estrito cumprimento Presumese que foi justamente essa cautela que acabou por pavimentar a normatização da mencionada regra O ponto agora é identificar quais fo ram as hipóteses de argumentação expressamente proibidas pelo dispositivo e como elas até aqui foram interpretadas majoritariamente pelo STJ e STF 12 Limites Legais Viuse que o art 478 do Código de Processo Penal veda às partes fazerem referência durante os debates3 à decisão de pronúncia às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado bem como no segundo inciso ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento em seu prejuízo Do primeiro inciso das vedações destacase que aquelas referências não podem se dar como argumento de autoridade o que nos dizeres de Giacomolli4 significa 2 FERRAJOLI Luigi Direito e razão Trad Ana Paula Zomer Sica et al 4 ed São Paulo RT 2014 p 46 3 Parecenos que que o termo debates deve ser interpretado lato sensu ou seja em qualquer momento do julgamento no Tribunal do Júri mesmo que seja no curso da instrução processual que antecede os efetivos debates das partes pois do contrário bastaria formular questionamentos às testemunhas e ao réu se valendo dos argumentos vedados 4 GIACOMOLLI Nereu José Reformas do processo penal considerações críticas Rio de Janeiro Lumen Juris 2008 p 100 DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 11 para aumentar expandir pois auctoritas vem do verbo augere a ar gumentação pelo simbolismo de sua existência na pronúncia o juiz dis se três desembargadores experimentados afirmaram se não fosse perigoso não estaria algemado as alegações falam por si só vg Em outras palavras entendeu o legislador com acerto que a mera referência à decisão de pronúncia às decisões posteriores que julgaram ad missível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade nada diz sobre o mérito da causa e que caso explorados em debates especialmente pela Acusação conforme se explicará poderseia atingir uma solução potencialmente equivocada pelos jurados Para nós argumento de autoridade é todo aquele que mesmo impli citamente polarizando com o acusado sugira a maior credibilidade de uma versão em razão das qualidades cargo função da qual emana temor reveren cial de quem a emite pretendendo com isso aos olhos dos juízes leigos retirar qualquer virtude da versão do polo passivo da demanda processual Em outros termos sempre que houver referência a uma decisão judicial automaticamente o argumento será de autoridade pois se sabe de quem ela emanou e qual o objetivo de sua menção ainda que não seja verbalizado O jurado juiz leigo preocupado sobre o acerto de sua conduta sempre buscará se espelhar no juiz ou tentar supor como um juiz decidiria o caso Partindo de tal premissa a leitura da pronúncia ou do acórdão que a confirma acaba por servir de norte aos jurados que desconhecendo o papel da pronúncia são inclinados a não a contrariar Do contrário se se exige mais do que leitura ou a referência à sentença para a anulação o requisito argumento de auto ridade será uma saída interpretativa para num jogo de palavras autorizar as referências àquelas decisões pela Acusação contra o réu Neste ponto desde já registramos nosso entendimento de que apesar de o art 478 do CPP sugerir que as vedações são destinadas de igual forma às partes pensamos que elas foram criadas mais para reforçar a contenção constitucional do Estadoacusação Isso porque não faz sentido lógico ou jurídico que a Defesa tenha interesse no curso dos debates do Tribunal do Júri fazer referência ainda mais como argumento de autoridade à decisão de pronúncia às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas ainda que a regra traga na parte final do inciso I a previsão beneficiem ou prejudiquem o acusado inciso I Tam pouco parece fazer sentido que a Defesa nos debates tenha interesse jurídico em fazer referência ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento em seu prejuízo de acordo com o inciso II A confirmar o que se sustenta fosse o art 478 do CPP um limite à De fesa os repertórios jurisprudenciais do STJ e do STF revelariam a existência Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 12 de pedidos da Acusação de reconhecimento de nulidades de julgamentos por violação àquela regra o que conforme se verá não se identifica5 Reiterase a Defesa não tem interesse em fazer menção àqueles argumentos vedados Entendemos em complementação que a proibição de se fazer refe rência à decisão de pronúncia e às demais que julgam admissível a acusação não é incompatível com o art 472 parágrafo único do CPP O jurado em seguida receberá cópias da pronúncia ou se for o caso das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação e do relatório do processo pois a leitura individual do texto pelo intérprete no caso os jurados não se confunde com a sua apresentação pela Acusação que ao ler as decisões coloca ênfases destaques reforços argumentativos etc As virtudes retóricas dos tribunos do júri servem para humanizar o julgamento e não para condenar inocentes ou ferir de outra maneira direitos fundamentais Notese que o dispositivo ora comentado não proibiu expressamente as referências aos antecedentes criminais do réu ao posicionamento dos poli ciais no plenário como sinônimo de periculosidade do acusado à decisão que decreta ou mantém a prisão preventiva à decisão condenatória de corréu jul gado primeiramente em autos desmembrados à vestimenta do presídio etc6 Perguntase o fato de a lei processual não ter proibido expressamente esses argumentos permite concluir que estão autorizados Seguiremos na análise 13 A Interpretação Jurisprudencial do STJ e do STF Ao pesquisar os dados 478 e debates e júri e nulidade no campo da pesquisa avançada do Superior Tribunal de Justiça7 limitandose aos órgãos julgadores da Quinta Turma Sexta Turma e Terceira Seção e ativando as fer ramentas pesquisar sinônimo e pesquisar plurais atingese o resultado de 34 acórdãos e 429 decisões monocráticas Limitandose à análise somente dos acórdãos por conta dos limites desse estudo temse que quatro8 deles não cuidam especificamente da aplicação do art 478 do CPP mas de outros temas correlatos como os arts 472 e 479 do CPP bem como excesso de 5 Na verdade ao contrário os provimentos aos recursos ministeriais nos tribunais de justiça muito mais do que os da Defesa se dão em razão do mérito ou seja na interpretação do que seria a decisão manifestamente contrária à prova dos autos art 593 III d do CPP situação que acaba por relativizar a soberania dos veredictos somente do lado da Defesa Para uma crítica acadêmica sobre a disparidade dos números acerca dos provimentos dos recursos ministeriais em relação aos recursos defensivos contra os veredictos indicase DEPINÉ Davi Eduardo O Tribunal do Júri e a soberania mitigada Dissertação Mestrado Faculdade de Direito Universidade de São Paulo São Paulo 2008 6 Defendemos conforme se verá que ao acórdão que dá provimento ao recurso da Acusação para determinar a rea lização de novo julgamento pelo Tribunal do Júri o qual exige uma cognição muito mais aprofundada das provas e assim com elevadíssimo potencial de influenciar os jurados está contemplado expressamente no inciso I do art 478 do CPP quando veda a referência às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação 7 Disponível em httpssconstjjusbrSCON Acesso em 01 set 2021 8 São eles AgInt no AREsp 209069SP REsp 1598779DF HC 288116MG e REsp 1102118SC DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 13 linguagem nas decisões confirmatórias da pronúncia Metodologicamente portanto excluímos os quatro acórdãos da análise global remanescendo assim 30 trinta acórdãos para análise Desses 27 vinte e sete são originários de provocação das defesas e apenas 03 do Ministério Público sendo que nos três recursos especiais apresentados pelos ministérios públicos estaduais todos postulavam a reforma dos acórdãos de segundo grau que anularam os julga mentos dos júris entendendo ter havido violação ao art 478 do CPP ou seja nos três recursos especiais a Acusação pedia para afastar a aplicação do dispositivo legal Por outro lado todos os achados referentes à atuação da Defesa advogados ou defensores públicos objetivavam a efetiva aplicação do art 478 do CPP para anular o julgamento realizado pelo tribunal do júri por uso de algum argumento vedado pela Acusação Os instrumentos processuais utilizados pelas defesas foram o habeas corpus 11 recurso ordinário em habeas corpus 1 agravo regimental em agravo em recurso especial 11 agravo interno no agravo em recurso especial 1 e recurso especial 3 Dos 27 vinte e sete casos levados pela Defesa ao Supe rior Tribunal de Justiça apenas dois foram acolhidos HC 193734SP e HC 1484499DF mas a bem da verdade da análise do primeiro mencionado fica a impressão de que a nulidade foi reconhecida mais pelo excesso de linguagem do acórdão confirmatório o que teria sido reforçado em razão da referência nos debates pelo Ministério Público da decisão de pronúncia e do acórdão confirmatório Por outro lado dos três recursos especiais manejados pelos ministérios públicos9 sendo dois do Estado do Rio Grande do Sul e um do Acre dois foram providos para restabelecer a condenação proferida pelo Tribunal do Júri e assim afastar a aplicação do art 478 do CPP e apenas um teve o provimento negado para se manter a nulidade REsp 1299809RS Em relação ao motivo da apontada violação ao art 478 do CPP nos casos apresentados pelas defesas e considerando que em alguns deles houve a indicação de mais de um tipo de argumentação vedada na sessão plenária do Tribunal do Júri10 temse resumidamente o seguinte quadro 12 doze menções à referência da pronúncia eou de decisões confirmatórias da pronúncia11 1 um sobre o silêncio do acusado HC 307332RS 4 quatro acerca da decisão que decreta a preventiva eou que a mantém por meio da denegação de habeas corpus12 9 nove sobre os antecedentes criminais do réu ou de outros processos ainda 9 São eles REsp 1859706RS REsp 1299809RS e REsp 1194933AC 10 O que justifica os números dos argumentos serem maiores que os números dos expedientes pesquisados 11 São eles AgInt no AREsp 971119SP AgRg no AREsp 978032MG AgRg no REsp 1346253SP HC 307332 RS HC 283718SP REsp 1402650DF AgRg no AREsp 187479DF HC 272219PI HC 193734SP REsp 1190757DF HC 148499DF e HC 195698MS 12 São eles AgRg no REsp 1638411MG REsp 1596509SC AgRg no REsp 1171968RJ e HC 153121SP Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 14 em curso13 1 um de acórdão que anulou a primeira sessão plenária para de terminar que outra fosse realizada HC 204947PE e 02 dois apontamentos que se referem à ausência do réu e ré no julgamento HC 419818SP e RHC 100002SP Outras referências feitas no curso dos debates pelos ministérios públicos também foram levadas a julgamento no STJ juntas ou isoladamente como por exemplo a menção ao cargo de promotor de justiça objetivando maior credibilidade perante o corpo de jurados e aos policiais presentes na sessão plenária para ambos REsp 1596509SC assim como a referência à decisão proferida no protesto por novo júri AgRg no REsp 1814988PR Os três julgados no STJ obtidos após provocação dos ministérios pú blicos estaduais conforme já afirmado referemse a postulações tendentes ao afastamento do art 478 do CPP aplicado nos tribunais de origem nos quais houve o reconhecimento da nulidade do julgamento realizado pelo Tribunal do Júri decorrente de algum argumento vedado utilizado pela Acusação As sim no REsp 1859706RS deuse provimento ao recurso ministerial para restabelecer a sentença condenatória afirmandose que Impedir o conheci mento pelos jurados dos fatos da vida pregressa do acusado constitui limitação indevida ao direito probatório Já o REsp 1194933AC também foi acolhido para restabelecer a sentença condenatória afastandose a nulidade reconhecida pelo Tribunal de Justiça do Estado do Acre Afirmouse No caso a mera menção feita pela Acusação ao acórdão que anulou a decisão do Conselho de Sentença que absolvera o Réu sem referirse aos seus fundamentos não configura a manifestação da Promotoria como argumento de autoridade capaz de quebrar a construção imparcial da convicção dos jurados Por fim o STJ negou provimento ao REsp 1299809RS manejado pelo Ministério Público por meio do qual se pretendia o afastamento da nulidade reconhecida pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul decorrente da utilização do silêncio do réu em seu prejuízo afirmando em síntese que houve referência de silêncio do réu durante o interrogatório policial por uma ou duas vezes tendo ele concluído pela ausência de prejuízo mas mesmo assim concitara aos jurados que desconsiderassem tal alusão ou relato do promotor a respeito Interessante observar ainda quais teriam sido os argumentos da Acu sação no curso dos debates que o Superior Tribunal de Justiça entendeu nos poucos casos serem violadores do art 478 do CPP Assim agora buscase 13 São eles AgRg no AREsp 1664028RS Agrg no AgRg no AREsp 1632413SP HC 419818SP AgRg no REsp 1815397RS AgRg no REsp 1803760RS AgRg no REsp 1717600MS HC 333390MS REsp 1596509SC e HC 241971MS DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 15 extrair dos julgados os registros constantes nas atas de julgamento dos tribunais do júri nos três casos em que o STJ reconheceu a existência de argumentos vedados dois ao acolher os pedidos da Defesa e em um negando o pedido ministerial REsp 1299809RS HC 193734SP e HC 148499DF No primeiro no qual houve o improvimento do recurso especial do Ministério Público consta O defensor requereu fosse registrado que o promotor em sua interven ção inicial aludiu ao interrogatório policial do réu em que o acusado se manteve em silêncio na forma do art 478 II do Código de Processo Penal alegando que a referência teria sido feita por três vezes inclusive mencionando que no ato policial o defensor se fazia presente No segundo caso HC 193734SP retirase do acórdão Durante os debates na fala do Dr Promotor de Justiça a Dra Defenso ra Pública requereu que se constasse data que o Dr Promotor disse que não iria comentar a decisão de pronúncia e o acórdão mas que pedia aos senhores jurados que as lessem e também que observassem a avaliação que o juiz e os desembargadores fizeram Por fim requereu que constasse que o Dr Promotor procedeu à leitura do requerimento feito pela defesa antes da instalação da sessão e que consta da ata que disse que a defesa tinha medo que os jurados procedessem à leitura do acórdão Durante a tréplica a Defesa requereu que constasse em ata que o Dr Promotor no vamente pediu aos senhores jurados que lessem a pronúncia e o acórdão Por fim no HC 148499DF extraise que a Defesa na ata da sessão plenária do tribunal do júri registrou A Defesa requer que seja consignada em ata o fato de o Ministério Público ter utilizado a pronúncia como argumento de autoridade no sentido de que se o juiz estivesse convicto da inocência do réu não o pronunciaria Partese agora para a análise dos julgados do Supremo Tribunal Federal A consulta dos mesmos argumentos 478 e debates e júri e nulidade no campo da pesquisa jurisprudencial do portal do STF14 resultou em 12 acór dãos 58 decisões monocráticas e 11 informativos Limitandose à análise dos acórdãos temse que oito15 deles não cuidam especificamente da aplicação do art 478 do CPP mas de outros temas especialmente do excesso de lingua gem nas decisões confirmatórias da pronúncia Novamente foram excluídos os oito acórdãos da análise global remanescendo assim 4 quatro acórdãos 14 Disponível em httpsjurisprudenciastfjusbrpagessearch Acesso em 01 set 2021 15 São eles RHC 118339RJ HC 122924TO HC 113293SC RHC 109068DF RHC 120268ES HC 114770 ES RHC 115982ES e HC 81890RJ Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 16 para análise RHC 137368PR Ag Reg no HC 127307PR RHC 123009 PI e RHC 118006SP Nos quatro casos foram as defesas que arguiram a nulidade decorrente da violação do art 478 do CPP mas todos foram rejeitados pelo Supremo Tribunal Federal No primeiro RHC 137368PR notase que o argumento que se pretendia vedar em debates é incomum No caso houve o reconhecimento da ilicitude de determinada prova nas instâncias anteriores com determina ção para se riscar as referências a ela das peças processuais mas de acordo com o acórdão a intenção da Defesa seria impedir que os jurados tenham conhecimento da própria realização da prova ilícita e dos debates processuais que levaram a sua exclusão Na ocasião a 2ª Turma do STF assentou que a exclusão de prova ilícita não é contemplada nas normas de restrição ao debate afirmando ainda que são normas de discutível constitucionalidade e que vêm sendo interpretadas restritivamente pelo STF Na sua manifestação o Ministro Celso de Mello afirmou Pareceme de duvidosa constitucionalidade a norma inscrita no art 478 do CPP na redação que lhe deu a Lei nº 116892008 que estabelece restri ções destinadas a limitar o debate oral entre as partes no Plenário do Júri No segundo acórdão analisado AgRg no HC 127307PR a Defesa sustentou a nulidade do julgamento realizado pelo Tribunal do Júri porque o Ministério Público na ocasião teria feito referência à pronúncia e ao acórdão que a manteve como argumento de autoridade para evitar o afastamento da qualificadora No bojo do acórdão que negou provimento ao agravo regi mental com voto vencido do Ministro Marco Aurélio afirmouse Conforme ressaltado pela Corte Estadual e pelo Superior Tribunal de Jus tiça a atuação ministerial em plenário não tinha a intenção de influenciar a íntima convicção dos jurados pois visava apenas destacar o fato de que não seria impossível a presença da qualificadora surpresa ao caso concreto vez que ela foi mantida pelo juiz que pronunciou o réu e também mantida pelos desembargadores que julgaram o recurso defensivo interposto da decisão de pronúncia Afirmouse ainda Reitero por fim que a Defesa não comprovou que as afirmações feitas pelo Ministério Público foram determinantes para o acolhimento pelos jurados da qualificadora da surpresa No terceiro RHC 123009PI a Defesa sustentou a nulidade absoluta do julgamento realizado pelo Tribunal do Júri porque o Ministério Público nos debates teria feito referência à decisão de pronúncia como argumento de autoridade Ao negar provimento ao recurso a 1ª Turma do STF afirmou DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 17 que não basta fazer alusão às decisões para que se configure a nulidade do julgamento mesmo porque seguiu aos jurados é concedido acesso aos autos e aos instrumentos do crime o que inclui a decisão de pronúncia se for previamente solicitado ao juiz presidente de acordo com o art 480 3º do Código de Processo Penal No mais também afirmou que caso houvesse nulidade esta seria relativa e que não teria havido demonstração de prejuízo No quarto acórdão RHC 118006SP a Defesa asseverou que o Mi nistério Público na sessão plenária do tribunal do júri durante os debates leu a sentença condenatória de corréu proferida em julgamento anterior Ponderouse que a leitura foi utilizada como argumento de autoridade em prejuízo do recorrente Porém a 1ª Turma do STF rechaçou o pedido afirmando que a sentença não fazia alusão ao réu e à sua eventual participa ção no crime de modo que o documento não teria aptidão para interferir no ânimo dos jurados em desfavor do recorrente No mais concluiu que a sentença condenatória do corréu não se subsume na vedação do art 478 I do Código de Processo Penal e assim poderia ser lida em plenário Por fim afirmou que não houve comprovação de que o documento de fato foi empregado como argumento de autoridade e de que houve prejuízo insanável à defesa art 563 do CPP No mais da fundamentação do acórdão extraise a seguinte compreensão Anterior sentença condenatória de corréu não se subsume no conceito de decisões posteriores que julgaram admissível a acusação o qual compre ende o acórdão confirmatório da pronúncia bem como os habeas corpus e recursos especial e extraordinário decididos respectivamente pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal Logo resumidamente vêse que as decisões do STJ e do STF que negaram os pedidos das defesas são no sentido de que as referências feitas pelo Ministério Público no curso dos debates do tribunal do júri não se deram como argumento de autoridade que não se comprovou prejuízo aos acusados decorrente daquelas referências que o rol do dispositivo legal é taxativo e por isso não contemplaria outras hipóteses que os antecedentes dos réus devem ser questionados no interrogatório e analisados na dosimetria de modo que não haveria óbice à sua referência pela Acusação e por fim que os jurados possuem a prerrogativa de acesso aos autos na íntegra e de recebimento da cópia da pronúncia motivo pelo qual não haveria prejuízo por exemplo na leitura desta decisão e do acórdão que a confirma Dentro dos limites da pesquisa assim é possível concluir que i são raríssimos os casos de reconhecimento da nulidade do julgamento pelo tribu nal do júri com base no art 478 do Código de Processo Penal ii a aplicação desse dispositivo legal foi buscada em todos os casos pela Defesa iii os Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 18 raros recursos especiais sobre a matéria manejados pelos ministérios públicos objetivaram afastar a aplicação do art 478 do CPP iv o STJ e o STF inter pretam o art 478 do CPP de forma exageradamente restrita v os acórdãos no geral não aprofundaram sobre o conceito de argumento de autoridade e nenhum deles tratou da natureza jurídica da norma do art 478 do CPP e finalmente vi o elevado número de decisões monocráticas não analisadas individualmente neste ensaio revela que ambos os tribunais consideram a matéria como sedimentada a justificar a sua não submissão aos colegiados de acordo com os respectivos regimentos internos Súmula nº 568 do STJ e art 932 V a do Código de Processo Civil Finalmente apesar das constatações acima o Superior Tribunal de Jus tiça por sua 5ª Turma em ao menos dois julgados isolados que não apareceram no nosso levantamento da pesquisa jurisprudencial com base naqueles argumentos de forma diversa sinalizou que os antecedentes do réu não podem ser explorados pela Acusação em sessão plenária do tribunal do júri sob pena de perpetuar o Direito Penal do Autor A respeito no RHC 94434RS 5ª Turma de relatoria do Ministro Reynaldo Soares da Fonseca cujo julgamento ocorreu em 13032018 a Defesa pedia que o Ministério Público fosse proibido de mencionar na futura sessão plenária os antecedentes do réu juntados nos autos na fase do art 422 do CPP Ao dar provimento ao recurso o Ministro relator invocando o outro precedente da sua relatoria assentou a 5ª Turma desta Corte Superior em caso de minha relatoria RHC n 80551RS decidiu que em se tratando do exame dos elementos de um crime em especial daqueles dolosos contra a vida o fato não se torna típico antijurídico e culpável por uma circunstância referente ao autor ou aos seus antecedentes mesmo porque se assim o fosse estaríamos perpetuando a aplicação do Direito Penal do Autor e não o Direito Penal do Fato Por consequência ao cabo determinouse que os documentos relacionados à vida pregressa do recorrente e que não guardam relação direta com o fato não sejam utilizados pela acusação na sessão plenária do Tribunal do Júri O aparente antagonismo entre o julgado ora citado e o entendimento majoritário apenas reforça a necessidade de bases sólidas para a interpretação do art 478 do CPP que pode e deve ser interpretado extensivamente sob o prisma teleológico Embora não seja o suficiente para abalar a jurisprudência consolidada em sentido oposto esse julgado é um respiro de esperança para que haja um reposicionamento jurisprudencial acerca do alcance do art 478 do CPP DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 19 14 Um Breve Panorama da Doutrina Brasileira O objetivo neste ponto é identificar na doutrina como o art 478 do CPP está sendo interpretado Não se pretende esgotar as análises dos estu diosos mas apenas apresentar um breve referencial teórico que possa situar o leitor nas controvérsias acerca daquela regra legal Nucci16 é crítico do art 478 do CPP Entende que não lhe pareceu acer tada a inserção desse artigo pela Lei nº 116892008 além de compreender que o seu rol é taxativo e pior insensato O autor ainda afirma As partes são absolutamente livres em plenário no tocante às argumen tações construídas Se o acusador se apega à periculosidade do réu para afirmar sua culpa ou se o defensor se restringe ao bom caráter do acusado para indicar sua absolvição nada disso pode ser questionado e muito menos gerar nulidade Por derradeiro a inserção do art 478 somente dará chance a quem quiser plantar nulidades permitindo a anulação de julgamentos difíceis complexos e custosos Para isso bastam algumas frases e estará lançado o vício que irá prejudicar todo o trabalho de dias e horas em plenário do Júri Esperamos que esse dispositivo caia no esquecimento e os tribunais atuem com rigor não permitindo que as nulidades sejam facilmente reconhecidas como se qualquer menção por mais tola que seja aos fatores ali enumerados possa condenar todo o procedimento exaustivo para chegar a um veredicto Na mesma linha Campos17 critica a existência de limites no conteúdo dos debates por meio do art 478 do CPP além de compreender que se trata de norma restritiva de direitos e por isso deve ser interpretada restritivamente É absolutamente incompreensível no aspecto lógico e prático proibir que as partes livremente argumentem utilizando de quaisquer estraté gias intelectuais o crivo a respeito da veracidade ou não de suas ideias ideais e concepções de vida deverá sempre ser dos jurados quando do julgamento realizado mas nunca calcada como quer a lei em um critério apriorístico abstrato e absolutamente desraigado de conceitos filosóficos os mais elementares A leitura em plenário do Júri dos antecedentes criminais do acusado não é vedada inexistindo óbice a tanto por quais quer das partes Da mesma forma qualquer outra peça processual como a decisão que decretou a prisão preventiva aquela que deferiu o pedido de liberdade provisória ou a revogou a rejeição inicial da denúncia etc podem ser livremente comentadas pelas partes inclusive como argumento de autoridade não incidindo assim na vedação prevista no art 478 I do 16 NUCCI Guilherme de Souza Direito processual penal 18 ed Rio de Janeiro Forense 2021 p 882883 17 CAMPOS Walfredo Cunha Tribunal do Júri teoria e prática 6 ed São Paulo Atlas 2018 p 298299 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 20 CPP que deve ser interpretada restritivamente isto é só se aplicando à menção à pronúncia como argumento de autoridade Isso porque as nor mas que restringem direitos inclusive as normas processuais devem ser interpretadas restritivamente Além disso Campos18 entende que o dispositivo é inconstitucional por violação à liberdade de expressão e por desrespeito à regra da competência constitucional do Júri Entendemos que essa limitação é inconstitucional pois fere o direito à livre manifestação do pensamento art 5º IV da CF e o da livre expressão da atividade intelectual independentemente de censura art 5º IX da CF Também é inconstitucional a norma em questão porque desrespeita a competência constitucional do Júri para julgar os crimes dolosos contra a vida art 5º XXXVIII d da CF Diversamente Lopes Jr19 critica a interpretação jurisprudencial que vem sendo atribuída ao art 478 do CPP afirmando que ela procura salvar uma prática que deveria ter sido abolida na reforma de 2008 É preocupante alguns debates jurisprudenciais que tentam salvar uma prática que deveria ter sido abolida na reforma de 2008 o uso em plená rio por parte do MP da decisão de pronúncia ou ao direito de silêncio É evidente que constitui argumento de autoridade pelo simples fato de ser dito por uma autoridade Não se pode esquecer que o jurado é leigo e o simbólico da autoridade do Ministério Público é evidente e inafastável Ademais não é avaliável posteriormente em grau de recurso o nível de prejuízo que tal manifestação gera pois os desembargadores não são os jurados leigos e não estavam imersos naquela realidade para avaliar É mais um exemplo do viés erro recognitivo ou seja a simplificação cognitiva que significa um desembargador analisar hoje o ocorrido há meses atrás no plenário do júri na cabeça do jurado leigo O equívoco é evidente Por isso a leitura do art 478 do CPP deve se pautar por um critério objetivo o Ministério Público fez referência a conteúdo não apenas a existência da pronúncia ou ao uso do direito de silêncio no plenário Se a resposta for afirmativa está violado o art 478 e deve ser anulado o júri Badaró20 entende que o art 478 do CPP não encerra um rol taxativo mas exemplificativo 18 CAMPOS Walfredo Cunha Tribunal do Júri teoria e prática 6 ed São Paulo Atlas 2018 p 300 19 LOPES Jr Aury Direito processual penal 18 ed São Paulo Saraiva Jur 2021 p 367 20 BADARÓ Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró Tribunal do Júri In MOURA Maria Thereza Rocha de Assis Coord As reformas no processo penal as novas leis de 2008 e os projetos de reforma São Paulo RT 2009 p 193 DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 21 Se a leitura do decreto de prisão preventiva ou da folha de antecedentes for feita com o objetivo de extrair uma presunção de culpa haverá inde vida influência do julgamento dos jurados e eventual veredicto condena tório será nulo O art 478 não constitui uma hipótese de numerus clausus Não será apenas única e exclusivamente nestes casos que os jurados serão influenciados Qualquer outra linha argumentativa com finalidade persuasiva mas que possa induzir o jurado a erro implicará nulidade de julgamento A diferença é que nas hipóteses dos incs I e II do novo art 478 demonstrada a situação de base o acusado foi pronunciado ou o acusado está algemado ou ainda o acusado permaneceu em silêncio o que indica que seja culpado haverá nulidade posto que o legislador previamente considera que neste caso haverá evidente prejuízo Porém em qualquer outra hipótese desde que se demonstre concretamente que linhas argumentativas seguidas pelas partes efetivamente influenciaram de forma indevida e falaciosa o convencimento dos jurados a nulidade também será de se reconhecer Aliás mesmo antes do novo dispositivo já era isso que a jurisprudência fazia com relação a indevido argumento de presunção de culpa a partir da periculosidade do acusado que estivesse algemado Por fim seguindo o mesmo entendimento Ditticio21 defende A taxatividade do rol proibitivo pode deixar insuficiente a proteção do livre convencimento do Conselho de Sentença eis que diversas decisões tomadas ao longo do processo têm potencial para influenciar os jurados de maneira indevida Basta pensar como mencionado anteriormente em um acórdão que nega a soltura do acusado afirmando ser indiscutível a autoria do delito ou dizendo tratarse o réu de pessoa perigosa ou então em um acórdão anulatório do veredicto anterior tido por contrário à prova dos autos fundamentando em profunda incursão e valoração do acervo probatório Portanto a compreensão acerca do alcance do art 478 do CPP está longe de atingir um consenso doutrinário Aqueles que o criticam em síntese formulam a ideia de que a regra limita o livre debate no curso do julgamento perante o corpo de jurados Também afirmam ser infundado já que por força do mesmo Código de Processo Penal art 472 parágrafo único e do art 480 os jurados recebem cópias da pronúncia ou se for o caso das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação e do relatório do processo além do que podem ter acesso integral aos autos Assim propugnam que seja interpretado restritivamente 21 DITTICIO Mário Henrique O habeas corpus no procedimento do Júri In PEDRINA Gustavo Mascarenhas Lacerda et al Org Habeas Corpus no Supremo Tribunal Federal São Paulo RT 2019 p 391 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 22 De outra banda aqueles que defendem a existência do dispositivo legal ponderam que a previsão é insuficiente perto dos argumentos que ainda se verificam nos plenários especialmente na dedução do pedido condenatório pela Acusação quando faz referência por exemplo aos antecedentes do réu eou à decisão que decretou a prisão preventiva ou àquela que a manteve Entendem dessa forma porque a rigor tais argumentos induzem os jurados leigos em erro Geram presunção de culpabilidade do réu com base em in formações estranhas ao processo que não guardam qualquer relação com os fatos apurados e com o conjunto probatório acerca da autoria e da materiali dade Logo tal segmento doutrinário defende que o seu rol é exemplificativo e pode proibir implicitamente outras hipóteses de distorção argumentativa da Acusação É a premissa do presente artigo 2 O Tribunal do Júri na Constituição Federal de 1988 De forma bastante sucinta vêse que o tribunal do júri foi insculpido na Constituição Federal de 1988 no seu art 5º XXXVIII por meio do qual se assegurou a plenitude de defesa o sigilo das votações a soberania dos veredictos e a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida Cada uma dessas garantias inerentes ao tribunal do júri exige aprofun damentos teóricos específicos Para os fins deste estudo a análise será focada apenas na plenitude da defesa 21 A Plenitude da Defesa Diferentemente do que previu a Constituição Federal de 1988 no art 5º inciso LV aos litigantes em processo judicial ou administrativo e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa com os meios e recursos a ela inerentes ao estabelecer as garantias inerentes ao tribunal do júri protegeuse a plenitude de defesa Semanticamente amplo não tem o mesmo significado que pleno porque este é mais do que aquele22 A distinção terminológica foi deliberada por parte do constituinte e deve ser respeitada com a hipertrofia das faculdades da defesa no Tribunal do Júri o que é com preensível pois o juiz leigo não terá o mesmo compromisso com as técnicas jurídicas de garantia como a legalidade a tipicidade a responsabilidade sub jetiva e as teorias de imputação A plenitude da defesa assim é ou deveria 22 A propósito Nucci comenta Lançamos a ideia hoje assimilada por vários doutrinadores e tribunais brasileiros no sentido de que a forma plena da defesa tem maior altitude que a ampla defesa visto que a primeira realizase no contexto do Tribunal Popular enquanto a segunda destinase a qualquer corte togada criminal Não foi à toa que o princípio da plenitude de defesa foi inserido dentre as específicas garantias do Júri e muito menos pode ele comportar idêntico sentido que a similar porém diversa ampla defesa NUCCI Guilherme de Souza Princípios constitucionais penais e processuais penais São Paulo RT 2010 p 281 DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 23 ser a alma do tribunal do júri Tratase de norma constitucional que veicula uma garantia fundamental do réu e por isso para além de ser paradigma de controle de constitucionalidade das leis afirmase que ela conforma todas as práticas existentes naquela instituição A decorrência lógica mais evidente da peculiar terminologia usada pelo constituinte é a de que a acusação não é plena mas sim a defesa Essa conclusão não importa inconstitucional quebra da paridade de armas entre as partes porque a uma a previsão é constitucional criada pelo Poder Constituinte Originário a duas o tribunal do júri e o processo penal servem efetivamente de contenção do poder estatal Aliás providenciar paridade de armas no conflito do Estado com o indivíduo significa dar desiguais privilégios ao indivíduo evidentemente vulnerável no conflito Ao cabo porém indagase como a plenitude de defesa se manifesta no procedimento do júri Esta é uma questão espinhosa e foi respondida em grande medida por Giacomolli23 A exigência da plenitude defensiva irradia vários efeitos a somente as provas ilícitas incriminatórias poderão ser retiradas dos autos b o que produzido sem o crivo do contraditório defensivo salvo as provas técnicas não poderá integrar os autos c a ausência e a deficiência de defesa no ple nário implicam a desconstituição do Conselho de Sentença cientificandose o réu de prazo à indicação de advogado nomeandose defensor dativo ou público na inércia ou impossibilidade de o imputado indicar d garantia da palavra ao defensor em seu horário de exposição perante os jurados e consideração da tese própria do imputado independentemente de o defensor técnico sustentála em plenário f alerta aos jurados quando houver possibilidade de respostas contraditórias aos quesitos g recurso por decisão manifestamente contrária à prova dos autos somente pro reo h necessidade urgente de ser alterada a composição ímpar dos julgadores leigos e de ser exigida a fundamentação dos votos i deslocamento dos jurados ao local dos fatos a requerimento da acusação defesa ou dos pró prios julgadores j interpretação restritiva do limite temporal dos debates da acusação k leitura dos quesitos em plenário l reconhecimento de circunstâncias agravantes quando descritas na peça incoativa afastandose a aplicação do art 492 I b do CPP Além de concordarmos com o autor pensamos ainda que a plenitude da defesa não é apenas uma exigência direcionada aos advogados e defensores públicos que atuam na defesa técnica mas igualmente e sobretudo uma garantia de determinadas ações e abstenções do Estadojuiz e do Estado acusação para permitir o hígido desenvolvimento da linha de defesa pessoal 23 GIACOMOLLI Nereu José O devido processo penal abordagem conforme a CF e o Pacto de São José da Costa Rica 3 ed São Paulo Atlas 2016 p 457 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 24 e técnica no procedimento do júri Ou seja é um comando direcionado a todos os atores do sistema de justiça Pensamos igualmente que por ser a plenitude da defesa paradigma de interpretação do art 478 do Código de Processo Penal é inevitável conforme se argumentará que este dispositivo impacte de formas distintas as duas partes do processo e daí a necessidade de releitura daquelas vedações argumentativas objetivan do um reposicionamento jurisprudencial voltado a respeitar essa garantia constitucional 22 Plenitude da Defesa e Interpretação Extensiva dos Argumentos Vedados do Art 478 do CPP É necessário interpretar o art 478 do Código de Processo Penal à luz da garantia fundamental da plenitude de defesa assegurada pela Constituição Federal brasileira art 5º XXXVIII Antes porém como premissa é preciso proceder à interpretação constitucional da própria plenitude de defesa Assim como ocorre na grande maioria das previsões textuais da Constituição no tadamente no que toca aos direitos e garantias fundamentais o Constituinte Originário elaboroua de forma aberta indeterminada porosa ao intérprete exatamente para permitir a solução de conflitos no caso concreto e a sua adequação ao contexto em que está inserida Ou seja à realidade Essa noção do processo interpretativo constitucional é extraída no estudo de Pereira24 para quem A interpretação dos direitos fundamentais é um dos campos mais férteis para a criação judicial dada a abertura a indeterminação e a forte carga valorativa dos preceitos que os consagram Esse processo tornase espe cialmente evidente quando se trata de interpretação constitucional na qual a abertura e a indeterminação normativa são mais comuns demandando que o trabalho de densificação do sentido seja feito pelo operador jurídico Como foi dito o caráter construtivo da interpretação constitucional ligase precisamente à necessidade de conciliar texto e realidade Na clássica lição de Hesse a Constituição tem o propósito de regular a vida estatal e social mas também é por estas influenciada Assim ao mesmo tempo em que as normas constitucionais conformam a realidade as relações sociais condicionam a interpretação constitucional Desse intercâmbio contínuo emergem diversos mecanismos interpretativos os quais visam a coordenar o conteúdo normativo da Constituição que jamais pode ser irrelevante e o mundo dos fatos Nesse contexto inseremse por exemplo as mutações constitucionais alteração do significado das normas constitucionais sem que seja mudado o seu texto e o reconhecimento de direitos não enumerados 24 PEREIRA Jane Reis Gonçalves Interpretação constitucional e direitos fundamentais 2 ed São Paulo Saraiva Educação 2018 p 6668 DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 25 No mesmo sentido Mendes e Branco25 pontuam A interpretação orientada à aplicação não se torna completa se o intér prete se bastar com a análise sintática do texto Como as normas têm por vocação própria ordenar a vida social os fatos que compõem a realidade e lhe desenham feição específica não podem ser relegados no trabalho do jurista Para se definir o âmbito normativo do preceito constitucional para se delinearem a extensão e intensidade dos bens circunstâncias e interesses atingidos pela norma não se prescinde da consideração de elementos da realidade mesma a ser regida Logo sinteticamente parece razoável extrair daí que o processo de interpretação constitucional considera a interação entre texto e realidade os demais preceitos e valores constitucionais e obviamente as nuances do caso concreto Neste sentido e invocando em complementação o princípio da força normativa da Constituição26 e o princípio da máxima efetividade27 assim como a previsão do art 5º 1º da CF As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata a plenitude de defesa possui eficácia e aplicabilidade imediatas não dependendo por con seguinte da interposição do legislador infraconstitucional para lhe assegurar a normatividade integral Estabelecidas tais premissas entendemos possível afirmar que mesmo na ausência do art 478 do Código de Processo Penal o qual atribuiu maior substrato a um fragmento da plenitude de defesa seria possível extrair do seu comando de forma implícita limites argumentativos acusatórios no tribunal do júri É que juntamente à plenitude da defesa o processo penal é regido pela presunção de inocência ou não culpabilidade e pelo devido processo legal o que obriga o Estado a formular acusações nos limites da de núncia e fundadas em provas de autoria e de materialidade A Acusação que deduz pedido condenatório complementando os seus argumentos na folha de antecedentes do réu no seu silêncio na pronúncia ou outras decisões nas algemas na decretação da prisão cautelar e em outros estratagemas além de certamente não possuir provas suficientes para uma condenação criminal 25 MENDES Gilmar Ferreira BRANCO Paulo Gustavo Gonet Curso de direito constitucional 16 ed São Paulo Saraiva Educação 2021 p 84 26 HESSE Konrad A força normativa da Constituição Trad Gilmar Ferreira Mendes Porto Alegre Sergio Antonio Fabris 1991 27 Para Canotilho Este princípio também designado por princípio da eficiência ou princípio da interpretação efectiva pode ser formulado da seguinte maneira a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe dê É um princípio operativo em relação a todas e quaisquer normas constitucionais e embora a sua origem esteja ligada à tese da actualidade das normas programáticas Thoma é hoje sobretudo invocado no âmbito dos direitos fundamentais no caso de dúvidas deve preferirse a interpretação que reconheça maior eficácia aos direitos fundamentais CANOTILHO J J Gomes Direito constitucional e teoria da Constituição 7 ed Coimbra Almedina 2003 p 1224 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 26 pois se as tivesse não precisaria se valer de argumentos laterais e desprovidos de vínculo com o fato viola em sentido material as regras de legitimidade da imposição do poder penal que devem ser centradas na realidade dos fatos e não nos preconceitos dos julgadores leigos28 Sob o prisma técnico viola o devido processo legal e as reverberações referidas da plenitude da defesa Tratase de uma posição jurídica que coloca ou deveria colocar a Defesa em situação de blindagem de argumentos desprovidos de nexo probatório da au toria e da materialidade de um fato delimitado na denúncia e na pronúncia No sistema penal brasileiro o controle sobre as razões da decisão é feito na fundamentação do magistrado e mesmo assim determinados fatos e argumentos devem ser retirados de sua esfera de conhecimento é o caso da prova ilícita Por mais que o juiz togado saiba que não pode julgar com base na prova ilícita esta deve ser desentranhada dos autos para evitar que o juiz caia na tentação de usála em seu convencimento apesar da proibição No caso do jurado ausente até mesmo o controle sobre a fundamentação deve ser ainda mais intensa a cautela com os argumentos acusatórios para evitar a condenação baseada no preconceito e na insegurança dados divorciados dos elementos fáticos que são os únicos legitimamente aptos a nortear uma condenação Outro ponto é que se o art 478 do CPP era dispensável para se efetivar a garantia constitucional em comento porque as vedações já eram implí citas as proibições de argumentação destinadas à Acusação são meramente exemplificativas Todos os demais argumentos que não estão presentes no rol textual mas que possuem o mesmo potencial de persuasão dos jurados estão proibidos implicitamente por força constitucional apesar do entendimento contrário da jurisprudência por ora majoritário Logo se o art 478 do CPP veda essencialmente argumentos do Estado acusação e se decorre diretamente da garantia fundamental da plenitude de defesa além da presunção da inocência entendemos que se trata de norma infraconstitucional asseguradora de direitos do cidadão em face do Estado acusação não de norma restritiva de direitos Não se trata de mera compreensão teórica do dispositivo legal Viuse no estudo acima de forma empírica que todos os casos deliberados no STJ e no STF em que se pedia a aplicação do art 478 do CPP para se anular o julgamento realizado pelo tribunal do júri foram apresentados pelas defesas 28 Na lição de Bueno lembrado por Porto pelo contrário refletido e moderado embora enérgico em sua argumentação deve produzir a acusação sem cólera sem arrebatamento jamais deve o acusador dirigirse ao acusado e sim ao júri ou ao juiz de direito expondo o fato e suas e suas circunstâncias sua demonstração e provas em digressões e menos declamações assaz impróprias da eloquência criminal PORTO Hermínio Alberto Marques FRANCO Alberto Silva STOCO Rui Teoria e prática do Júri São Paulo RT 1997 p 315 DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 27 não pela Acusação Esta nos poucos recursos especiais manejados no Superior Tribunal de Justiça pretendia o afastamento da mencionada regra que fora aplicada na segunda instância de jurisdição Isso evidencia por si só que o art 478 do CPP embora preveja que as vedações ali constantes se dirijam às partes na essência disso não se trata Reiterase não há razão alguma para a Defesa faça referências como argumento de autoridade em benefício do réu à decisão de pronúncia às decisões posteriores que julgaram admis sível a acusação ou à determinação do uso de algemas Mais é evidente que a Defesa não pode fazer referência em prejuízo do réu ao silêncio ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento Notese então que a garantia fundamental da plenitude de defesa per mite interpretar o art 478 do CPP para o réu de forma extensiva As vedações argumentativas para a Acusação não são apenas aquelas expressas mas todas que não guardem substrato probatório ou vínculo com o caso concreto e que tenham potencial para conduzir os juízes leigos a uma conclusão do mérito guiados por preconceitos como por exemplo os antecedentes criminais do acusado num claro flerte com o Direito Penal do Autor Os antecedentes criminais no máximo interessam ao Estadojuiz na eventual fixação da penabase e não faz sentido que sejam alardeados nos debates orais dirigi dos aos jurados Não são prova de autoria de materialidade tampouco de culpabilidade Não afastam causas excludentes de ilicitude e não autorizam afirmar o dolo homicida Igualmente é evidente que a Acusação além de estar vedada a fazer referência ao uso das algemas do réu não pode num jogo de palavras dizer simplesmente que ele é perigoso sem qualquer prova técnica do argumento ou que se fosse inocente não estaria sendo julgado e cercado por policiais Qual é o grau de legitimidade nas condenações obtidas com base em tais argumentos Certamente um grau não compatível com o Estado Democrático de Direito Interessante verificar ademais que o acórdão reformador do veredicto absolutório determinando novo julgamento do réu usualmente mencio nado pela Acusação em segundas sessões plenárias de julgamento no âmbito do tribunal do júri de acordo com o julgado no RHC 115982ES de relatoria do Ministro Dias Toffoli 1ª Turma já está contemplado na vedação expressa de referência às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação diante da regra atualmente prevista no art 478 do CPP que sob pena de nulidade impede qualquer alusão pela acusação durante os debates às decisões que julgaram admissível a acusação o que subsume o acórdão em questão com o qual se determinou a realização de novo julgamento grifo nosso Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 28 Neste caso vêse nem mesmo é preciso invocar a natureza exemplifi cativa do rol legal para se reconhecer a sua proibição Já está expresso Seguindo poderseia questionar então se a Defesa também estaria impedida de fazer menção à impronúncia à decisão que revoga ou nega a prisão preventiva à parte da pronúncia ou do acórdão que afasta alguma qua lificadora eou crime conexo etc Em outras palavras poderseia indagar se o rol das vedações para a Defesa também seria exemplificativo A resposta obviamente é negativa Repitase não há na Constituição Federal de 1988 um regime de plenitude de acusação mas de defesa Para além disso se é verdade que a decisão de pronúncia não autoriza por si só uma condenação criminal porque exige apenas indícios suficientes de autoria o mesmo não é possível afirmar em relação à impronúncia posteriormen te reformada que afirma a inexistência de indícios suficientes de autoria Esta em confronto com um acórdão reformador no mínimo pode indicar a existência de dúvidas sobre os tais indícios suficientes de autoria o que é argumento válido de absolvição Idêntico raciocínio se aplica à decisão que revoga a prisão preventiva por entender frágeis os indícios de autoria Tratase de argumento que atinge a interpretação da suficiência ou não dos indícios e por isso pode consubstanciar a dúvida em plenário E a dúvida por beneficiar o réu pode ser arguida Por fim a pronúncia e o acórdão que afastam uma qualificadora ou um crime conexo da mesma forma no mínimo revelam a dúvida acerca da sua configuração Daí porque tais argumentos estão abar cados pela plenitude de defesa Temse assim que o art 478 do CPP não impacta as partes da mesma forma Por se tratar essencialmente de norma garantidora de direitos do réu e ao mesmo tempo de contenção do Estadoacusação os argumentos vedados à Acusação naquele rol legal são meramente exemplificativos De outra banda em razão da natureza da norma os argumentos proibidos à Defesa devem ser interpretados taxativamente e em conformidade com a plenitude de defesa A reforçar que o art 478 do CPP não limita outros argumentos da Defesa mesmo que sejam meramente retóricos sabese que atualmente aceitase a absolvição até mesmo por clemência Isso porque por força da existência de quesito único acerca dos pedidos absolutórios e dada a ausência de fundamentação das decisões dos jurados não é possível saber a razão pela qual absolvem um réu Se este pode ser absolvido por clemência a Defesa também pode apresentar argumentos diversos como aqueles de natureza sociológica ou criminológica Ou seja são argumentos lícitos desprovidos de vinculação com as provas de autoria e da materialidade ou ainda das causas excludentes de ilicitude e culpabilidade mas ainda assim por terem o potencial de obtenção da absolvição não podem ser vedados por legislação DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 29 infraconstitucional Não há quebra da paridade de armas na presente inter pretação simplesmente porque não se pode admitir uma condenação criminal não baseada em provas O contrário de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro não é verdadeiro O poder penal é da maioria e a maioria pode abrir mão mesmo fora da técnica jurídica ou seja por opção política o que é traduzido na linguagem jurídica como indulto presidencial que é o perdão do líder da maioria Por outra banda a maioria não pode violar os direitos da minoria do réu da defesa e é por isso que existem direitos e garantias fundamentais Por fim não se está pretendendo afirmar que a plenitude de defesa é uma garantia fundamental absoluta sem qualquer contorno Sabese que é preciso proceder a ponderação de valores no caso concreto para se atingir a compatibilização de eventuais normas conflitantes Um exemplo disso é a decisão do Supremo Tribunal Federal que deliberou por impedir a sustenta ção no tribunal do júri da chamada legítima defesa da honra nos crimes de feminicídio Referendo na Medida Cautelar ADPF 779DF julgado em 15032021 A propósito extraise da sua ementa A legítima defesa da honra não pode ser invocada como argumento inerente à plenitude de defesa própria do tribunal do júri a qual não pode constituir instrumento de salvaguarda de práticas ilícitas Assim devem prevalecer a dignidade da pessoa humana a vedação a todas as formas de discriminação o direito à igualdade e o direito à vida tendo em vista os riscos elevados e sistêmicos decorrentes da naturalização da tolerância e do incentivo à cultura da violência doméstica e do feminicídio No caso a Corte Constitucional no exercício do controle de consti tucionalidade atribuiu interpretação conforme aos arts 23 inciso II e 25 caput e parágrafo único ambos do Código Penal bem como o art 65 do Código de Processo Penal excluindo a eventual possibilidade de se arguir a legítima defesa de honra no crime de feminicídio permitindo concluir que mesmo a plenitude de defesa pode ser limitada para impedir a proliferação do discurso de ódio e da intolerância A plenitude de defesa significa muito mas não é absoluta 23 Suposta Inconstitucionalidade do Art 478 do CPP Como se viu ao longo do estudo há entendimentos que sugerem eventual inconstitucionalidade do art 478 do CPP por violação à liberdade de expressão de modo que as partes deveriam estar em posição de argumenta rem livremente nos tribunais do júri Entendemos porém que o dispositivo é constitucional Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 30 Na mesma linha de raciocínio de que o art 478 do CPP é uma norma garantidora de direitos do réu em face do Estado seguimos a compreensão de que o Estadoacusação representado no tribunal do júri pelo Ministério Público não é titular de direitos fundamentais mas sim o indivíduo por ele processado Dimoulis e Martins29 explicam Órgãos estatais são destinatários das normas definidoras de direitos fun damentais e como tais por elas obrigados Por sua natureza não se deriva de tais normas uma faculdade recíproca de direito subjetivo tal qual ocorre com as normas privatistas dos direitos das obrigações Pessoas jurídicas de direito público exercem suas competências e adquirem direitos por deter minação constitucional legal ou contratual Podem e devem defender suas competências e direitos sem que para isso seja necessário invocar um direito fundamental A afirmação de que no Brasil reconhecese a titu laridade de direitos fundamentais a pessoas jurídicas de direito público incluindose os Estadosmembros em face da União é problemática ainda mais faltando lastro textual para tanto Assim o art 478 do CPP não viola a liberdade de expressão da Acusa ção simplesmente porque ela não é titularizada por pessoa jurídica de direito público Não é a pessoa dotada de direitos individuais fundamentais que fala mas o Estado por meio da pessoa A independência funcional do órgão do MP não faz com que a consciência pessoal absorva o poder do Estado mas o contrário É o Estado que se apresenta com os limites inerentes do Estado de Direito por meio do integrante da instituição ministerial Por outro lado não viola a liberdade de expressão do réu porque essencialmente o dispositivo veda argumentos acusatórios não de defesa Finalmente é certo as vedações expressas no art 478 do CPP possuem respaldo constitucional nas garantias da plenitude de defesa e na presunção de inocência logo são materialmente constitucionais lembrando que no nosso entendimento a plenitude de defesa implica também abstenções do Estadoacusação Conclusão A argumentação no plenário do júri pode e deve ser contida como traçou o legislador no art 478 do CPP e o STF no julgamento da ADPF 779 Se a referida ADPF traçou limites apenas à argumentação defensiva é necessário convir que é constitucional dispositivo legal endereçado prepon derantemente a racionalizar o exercício da acusação perante os juízes leigos e 29 DIMOULIS Dimitri MARTINS Leonardo Teoria geral dos direitos fundamentais 8 ed São Paulo RT 2021 p 120 DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 31 é esse o papel do art 478 do CPP que deve ser interpretado extensivamente sob prisma teleológico Se é intolerável a tese defensiva da legítima defesa da honra lastreada em discurso de ódio misógino e machista não se justifica um pedido acusatório lastreado dos preconceitos do jurado leigo relacionados ao estereótipo racial do acusado e ao seu passado com mácula criminal e ainda mais ilegítimo é o pedido condenatório que explora a insegurança do jurado e tenta influenciar o resultado simulando que sentença de pronúncia ou de cisão sobre medida cautelar concretizam a convicção de um juiz togado sobre a culpa do condenado É esperado que o jurado julgador ad hoc busque se espelhar em um julgador profissional mormente se manipulado para tanto A pesquisa de julgados permite concluir que as limitações do art 478 do CPP interessam à Defesa e importante parcela da doutrina não apenas reforça a legitimidade de tal contenção como propõe interpretação extensiva do dispositivo impedindo o Estadoacusação de formular pedido acusatório ilegítimo calcado nas já referidas fragilidades dos julgadores leigos Vale lembrar que os juízes togados também têm fragilidades que são fiscalizadas na funda mentação das decisões e em outros instrumentos como o desentranhamento de prova ilícita o que se defende aqui é o aprimoramento do controle para a decisão dos jurados que é desprovida de fundamentação A mesma Constituição que impõe o respeito ao contraditório e ampla defesa em todos os processos judiciais ou administrativos art 5º LV destaca e consagra para o júri a plenitude da defesa Plena e não apenas ampla e não se lê no art 5º XXXVIII plenitude da acusação É possível e legítimo que o corpo de jurados símbolos do poder popular aplicado diretamente no tribunal do júri possam absolver por argumentos extrajurídicos pois o poder penal é um poder da maioria que pode ser disposto Insustentável e desumano no entanto que essa mesma maioria representada pelos jurados e detentora do poder pu nitivo todo poder inclusive o penal emana do povo possa impor pena sem lastro probatório ou razão jurídica legítima manipulada pelo Estadoacusação O art 478 do CPP é constitucional e merece interpretação extensiva que depure toda irracionalidade acusatória que tente abusar do poder penal ins trumentalizando os preconceitos e a insegurança dos jurados A humanização do julgamento que deve ser exponenciada no julgamento pelos jurados deve ser a consagração de virtudes humanas como a compreensão a compaixão e a piedade e não a exploração de seus vícios TITLE The arguments prohibited in the jury trial and the necessary compatibility with the fundamental guarantee of the completeness of the defense ABSTRACT This study is intended to analyze the arguments prohibited in the jury trial provided for in art 478 of the Code of Criminal Procedure with a focus on the need for its understanding from the Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 32 fundamental guarantee to the fullness of the defense The applicable legal norms and bibliography were previously read as well as a survey of the pertinent judgments of the Superior Court of Justice and the Federal Supreme Court all indicated in the text As a result it was found that the currently majority interpretation on the subject is not in accordance with the potential of the fundamental guarantee to the fullness of defense The conclusion is that art 478 of the Criminal Procedure Code for the defendant is a norm that guarantees rights and consequently limits state power so that its list is exemplary and should be interpreted extensively Finally it was concluded that the mentioned rule is constitutional KEYWORDS Jury Trial Prohibited Arguments Fullness of Defense Referências BADARÓ Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró Tribunal do Júri In MOURA Maria Thereza Rocha de Assis Coord As reformas no processo penal as novas leis de 2008 e os projetos de reforma São Paulo RT 2009 CAMPOS Walfredo Cunha Tribunal do Júri teoria e prática 6 ed São Paulo Atlas 2018 CANOTILHO J J Gomes Direito constitucional e teoria da Constituição 7 ed Coimbra Almedina 2003 DEPINÉ Davi Eduardo O Tribunal do Júri e a soberania mitigada Dissertação Mestrado Faculdade de Direito Universidade de São Paulo São Paulo 2008 DIMOULIS Dimitri MARTINS Leonardo Teoria geral dos direitos fundamentais 8 ed São Paulo RT 2021 DITTICIO Mário Henrique O habeas corpus no procedimento do Júri In PEDRINA Gustavo Masca renhas Lacerda et al Org Habeas Corpus no Supremo Tribunal Federal São Paulo RT 2019 FERRAJOLI Luigi Direito e razão Trad Ana Paula Zomer Sica et al 4 ed São Paulo RT 2014 GIACOMOLLI Nereu José O devido processo penal abordagem conforme a CF e o Pacto de São José da Costa Rica 3 ed São Paulo Atlas 2016 GIACOMOLLI Nereu José Reformas do processo penal considerações críticas Rio de Janeiro Lumen Juris 2008 HESSE Konrad A força normativa da Constituição Trad Gilmar Ferreira Mendes Porto Alegre Sergio Antonio Fabris 1991 LOPES Jr Aury Direito processual penal 18 ed São Paulo Saraiva Jur 2021 MENDES Gilmar Ferreira BRANCO Paulo Gustavo Gonet Curso de direito constitucional 16 ed São Paulo Saraiva Educação 2021 NUCCI Guilherme de Souza Direito processual penal 18 ed Rio de Janeiro Forense 2021 NUCCI Guilherme de Souza Princípios constitucionais penais e processuais penais São Paulo RT 2010 PEREIRA Jane Reis Gonçalves Interpretação constitucional e direitos fundamentais 2 ed São Paulo Saraiva Educação 2018 PORTO Hermínio Alberto Marques FRANCO Alberto Silva STOCO Rui Teoria e prática do Júri São Paulo RT 1997 Recebido em 05012022 Aprovado em 10012022 UNIVERSIDADEFACULDADE DOCENTE DISCENTE MATÉRIA FICHAMENTO REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA JUNQUEIRA Gustavo Octaviano Diniz MARTINI João Henrique Imperia Os Argumentos Vedados no Tribunal do Júri e as Necessárias Compatibilizações com a Garantia Fundamental da Plenitude da Defesa Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal ano XVIII n 105 p 931 dezjan 2022 Introdução O Código de Processo Penal brasileiro em seu art 478 estabelece diversas vedações argumentativas a serem observadas pelas partes durante os debates orais no âmbito do Tribunal do Júri essas restrições no entanto têm sido alvo de questionamentos quanto à sua constitucionalidade especialmente no que se refere à possível violação da liberdade de expressão Diante dessa controvérsia é necessário analisar a constitucionalidade do art 478 do CPP buscando compreendêlo à luz da garantia fundamental da plenitude de defesa assegurada pela Constituição Federal tal análise envolve a interpretação da própria noção de plenitude de defesa bem como sua interação com outros princípios e valores constitucionais Portanto o presente estudo se propõe a investigar a constitucionalidade do art 478 do Código de Processo Penal examinando sua compatibilidade com a garantia da plenitude de defesa e as eventuais alegações de violação à liberdade de expressão das partes no âmbito do Tribunal do Júri Os Limites à Argumentação em Sessão Plenária do Tribunal do Júri O artigo 478 do Código de Processo Penal foi incluído por meio da Lei nº 116892008 e de acordo com o professor Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró essa regra objetiva evitar que argumentos não necessariamente corretos mas com fortíssimo poder de persuasão principalmente perante juízes leigos possam levar a um resultado injusto O texto ressalta a necessidade de extrema cautela com a validade e legitimidade dos argumentos apresentados ao corpo de jurados pois este é composto por juízes leigos que não têm a obrigação de fundamentar detalhadamente suas decisões o pior cenário a ser evitado são as condenações baseadas em argumentos desprovidos de correspondência com as provas produzidas pois o Estado não deve ter interesse em condenar pessoas inocentes o que seria uma instrumentalização incompatível com a construção básica da dignidade da pessoa humana O Estado só possui legitimidade para postular a condenação de um réu quando esta se baseia em provas produzidas regularmente no devido processo legal não bastando a mera intuição subjetiva do profissional que representa os interesses estatais sobre a culpa do acusado a condenação apenas pode ser considerada legítima se respeitar rigorosamente as balizas do jogo democrático que condiciona o exercício do poder punitivo estatal ao estrito cumprimento das regras do devido processo Nesse contexto presumese que a normatização da regra contida no artigo 478 do CPP buscou exatamente essa postura de cautela com o objetivo de identificar quais foram as hipóteses de argumentação expressamente proibidas pelo dispositivo e como elas têm sido interpretadas majoritariamente pelos Tribunais Superiores notadamente o Superior Tribunal de Justiça STJ e o Supremo Tribunal Federal STF A convicção intuitiva sobre a culpa sem o devido lastro probatório materializase em poder autoritário ou decisionismo nos termos de Luigi Ferrajoli decisionismo é o efeito da falta de fundamentos empíricos precisos e da consequente subjetividade dos pressupostos da sanção Portanto a condenação penal apenas será legítima se respeitar rigorosamente as balizas do jogo democrático que condiciona o exercício do poder punitivo estatal ao estrito cumprimento das regras do devido processo legal Limites Legais Aqui está um resumo mais detalhado e longo O artigo 478 do Código de Processo Penal veda que as partes durante os debates do Tribunal do Júri façam referência à decisão de pronúncia às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado também é proibido fazer referência ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento em seu prejuízo Segundo a doutrina o termo argumento de autoridade significa utilizar essas decisões judiciais para aumentar expandir e reforçar a credibilidade de uma determinada versão sugerindo maior confiabilidade por terem sido emitidas por figuras de autoridade como magistrados o legislador entendeu que tais referências em si mesmas nada dizem sobre o mérito da causa e se exploradas durante os debates especialmente pela Acusação poderiam levar a uma solução potencialmente equivocada pelos jurados leigos que buscam se espelhar na autoridade do julgador O autor argumenta que apesar da redação do art 478 sugerir que as vedações se aplicam de forma equivalente a ambas as partes acusação e defesa na realidade essas regras foram criadas principalmente para conter a atuação da Acusação Não faria sentido racional ou jurídico a Defesa invocar tais argumentos de autoridade pois não teria interesse algum em prejudicar o próprio acusado Ademais a análise dos repertórios jurisprudenciais dos Tribunais Superiores STJ e STF não revela a existência de pedidos da Acusação de reconhecimento de nulidades de julgamentos por violação a essa regra processual o que corroboraria essa interpretação No entanto o texto ressalta que a proibição de fazer referência à decisão de pronúncia não é incompatível com a previsão contida no art 472 parágrafo único do Código de Processo Penal que determina o fornecimento de cópias dessas decisões aos jurados a leitura individual do texto da decisão judicial pelos jurados não se confunde com a apresentação enfática retórica e argumentativa realizada pelos tribunos da Acusação durante os debates orais do julgamento na qual estes poderiam explorar tais elementos com o objetivo de aumentar a credibilidade de sua tese Por fim o texto questiona se o fato de o legislador não ter expressamente vedado outros tipos de argumentos como a menção a antecedentes criminais do réu ao posicionamento dos policiais no plenário como suposta demonstração de periculosidade do acusado à decisão que decreta ou mantém a prisão preventiva à condenação de corréu julgado anteriormente à vestimenta do presídio etc significaria que tais argumentos estariam automaticamente autorizados essa análise mais aprofundada acerca da interpretação do alcance da vedação legal será realizada na sequência do texto A Interpretação Jurisprudencial do STJ e do STF O texto se propõe a analisar a aplicação do artigo 478 do Código de Processo Penal CPP que proíbe a referência pelos órgãos da acusação a decisões posteriores que tenham julgado admissível a acusação durante os debates em plenário do Tribunal do Júri para tanto o autor realizou uma pesquisa jurisprudencial aprofundada no Superior Tribunal de Justiça STJ e no Supremo Tribunal Federal STF No âmbito do STJ foram encontrados 30 acórdãos relevantes sendo 27 provenientes de provocação da defesa e apenas 3 do Ministério Público Nos casos em que a defesa acionou o STJ o objetivo era a aplicação do art 478 do CPP para anular o julgamento realizado pelo Tribunal do Júri tendo obtido êxito em apenas 2 dessas situações Por outro lado nos 3 recursos especiais manejados pelos ministérios públicos estaduais a intenção era justamente o afastamento da aplicação do art 478 do CPP tendo sido providos 2 desses recursos Ao se analisar os motivos da apontada violação ao art 478 do CPP nos casos apresentados pelas defesas verificouse 12 menções à referência da pronúncia eou de decisões confirmatórias da pronúncia 1 sobre o silêncio do acusado 4 acerca da decisão que decreta a preventiva eou a mantém por meio da denegação de habeas corpus 9 sobre os antecedentes criminais do réu ou de outros processos ainda em curso 1 de acórdão que anulou a primeira sessão plenária para determinar outra e 2 apontamentos que se referiam à ausência do réu e ré no julgamento outras referências feitas no curso dos debates pelos ministérios públicos também foram levadas a julgamento no STJ como a menção ao cargo de promotor de justiça aos policiais presentes e à decisão proferida no protesto por novo júri Quanto aos 3 julgados do STJ obtidos após provocação dos ministérios públicos estaduais verificouse que estes tinham o objetivo de afastar o reconhecimento pelos tribunais de origem da nulidade do julgamento realizado pelo Tribunal do Júri em razão de argumento vedado utilizado pela acusação Nesse sentido no REsp 1859706RS e no REsp 1194933AC o STJ deu provimento aos recursos ministeriais para restabelecer a sentença condenatória afastando a nulidade reconhecida já no REsp 1299809RS o STJ negou provimento ao recurso do Ministério Público mantendo a nulidade decorrente da utilização do silêncio do réu em seu prejuízo Em relação aos julgados do Supremo Tribunal Federal a pesquisa resultou em 4 acórdãos relevantes todos rejeitando os pedidos das defesas de nulidade por violação do art 478 do CPP portanto nessas decisões o STF interpretou o artigo de forma restritiva entendendo que não houve uso de argumento de autoridade e que não ficou comprovado o prejuízo Contudo há um julgado isolado da 5ª Turma do STJ RHC 94434RS que proibiu a menção aos antecedentes do réu na sessão plenária do Tribunal do Júri por entender que perpetuaria o Direito Penal do Autor Diante desse aparente antagonismo jurisprudencial o autor conclui que i são raríssimos os casos de reconhecimento da nulidade com base no art 478 do CPP ii a aplicação dessa norma foi buscada apenas pela defesa iii os recursos do Ministério Público visavam afastar essa aplicação iv o STJ e STF interpretam o artigo de forma restritiva v não houve aprofundamento sobre o conceito de argumento de autoridade e a natureza jurídica da norma e vi a grande quantidade de decisões monocráticas revela a compreensão de que a matéria está sedimentada Esse julgado isolado da 5ª Turma do STJ apesar de não ser suficiente para abalar a jurisprudência consolidada em sentido oposto é visto como um respiro de esperança para que haja um reposicionamento jurisprudencial acerca do alcance do art 478 do CPP que pode e deve ser interpretado extensivamente sob o prisma teleológico Um Breve Panorama da Doutrina Brasileira Uma parcela relevante da doutrina se mostra crítica à previsão do art 478 do CPP o renomado autor Guilherme de Souza Nucci por exemplo entende que a inserção desse artigo pela Lei nº 116892008 não lhe pareceu acertada além de compreender que o seu rol de condutas vedadas é taxativo e pior insensato Para Nucci as partes devem ser absolutamente livres em plenário no tocante às argumentações construídas de modo que a menção pelo acusador à periculosidade do réu ou pelo defensor ao bom caráter do acusado não pode gerar nulidade O autor afirma que a previsão do art 478 apenas dará chance a quem quiser plantar nulidades permitindo a anulação de julgamentos difíceis complexos e custosos com base em algumas frases Na mesma linha de entendimento o professor Walfredo Cunha Campos também critica a existência de limites no conteúdo dos debates por meio do art 478 do CPP considerando essa norma como restritiva de direitos e portanto passível de interpretação restritiva Para Campos a leitura em plenário do Júri dos antecedentes criminais do acusado da decisão que decretou a prisão preventiva da rejeição inicial da denúncia dentre outras peças processuais não deve ser vedada podendo as partes livremente utilizálas como argumento de autoridade ele ainda entende que o dispositivo é inconstitucional por violar a liberdade de expressão e a competência constitucional do Júri Por outro lado em contraponto a essa posição o professor Aury Lopes Jr critica a interpretação jurisprudencial restritiva atribuída ao art 478 do CPP afirmando que ela busca salvar uma prática que deveria ter sido abolida na reforma de 2008 o uso pelo Ministério Público da decisão de pronúncia ou do direito de silêncio do acusado para Lopes Jr tais referências configuram claramente argumento de autoridade que influencia indevidamente os jurados leigos de modo que a simples constatação dessa situação deve ensejar a anulação do júri independentemente da comprovação de prejuízo efetivo Em sentido diverso os professores Gustavo Badaró e Mário Henrique Ditticio entendem que o rol previsto no art 478 do CPP não é taxativo podendo abranger outras situações em que haja indução indevida do convencimento dos jurados como a referência a acórdãos que fazem valorações sobre a culpabilidade ou periculosidade do réu Segundo essa vertente doutrinária qualquer argumento das partes que possa influenciar de forma falaciosa o convencimento dos jurados deve ser considerado vedado mesmo que não esteja expressamente previsto nos incisos do dispositivo Portanto verificase que não há unanimidade na doutrina acerca da correta interpretação do art 478 do CPP Enquanto alguns autores defendem uma leitura restritiva da norma outros propugnam uma compreensão mais ampla e protetiva do livre convencimento do Conselho de Sentença essa diversidade de posicionamentos reflete a complexidade e relevância do tema que envolve o delicado equilíbrio entre a liberdade de atuação das partes no Tribunal do Júri e a preservação da imparcialidade do julgamento pelos jurados leigos A ausência de um entendimento consolidado demonstra a necessidade de um aprofundamento do debate doutrinário e de uma interpretação sistemática e teleológica dessa importante regra processual O Tribunal do Júri na Constituição Federal de 1988 A Constituição Federal de 1988 em seu art 5º XXXVIII assegurou a plenitude de defesa como uma das garantias fundamentais do Tribunal do Júri essa garantia exige um aprofundamento teórico específico o qual será o foco da análise neste estudo A plenitude de defesa no Tribunal do Júri está diretamente relacionada à ampla liberdade de atuação das partes em especial da defesa durante os debates em plenário essa liberdade abrange a possibilidade de utilização de quaisquer argumentos e estratégias de convencimento dos jurados leigos desde que respeitados os limites éticos e legais A interpretação e a aplicação dessa garantia constitucional portanto são fundamentais para compreender os desafios e as controvérsias envolvendo o art 478 do Código de Processo Penal que busca estabelecer determinadas restrições ao conteúdo dos debates no Tribunal do Júri A Plenitude da Defesa A Constituição Federal de 1988 em seu art 5º XXXVIII assegurou a plenitude de defesa como uma das garantias fundamentais inerentes ao Tribunal do Júri essa previsão constitucional representa uma inovação em relação ao texto da Carta Magna anterior que simplesmente mencionava a ampla defesa sem qualquer distinção terminológica A diferenciação semântica entre plenitude e ampla defesa foi deliberada pelo constituinte originário e não pode ser ignorada conforme destaca a doutrina a plenitude de defesa possui um significado mais abrangente e qualificado do que a mera ampla defesa assegurada em geral nos processos judiciais e administrativos Nesse sentido o professor Guilherme de Souza Nucci observa que a plenitude de defesa tem maior altitude do que a ampla defesa justamente por se realizar no contexto do Tribunal Popular no qual o juiz leigo não está submetido às mesmas garantias técnico jurídicas exigidas dos magistrados togados Podese afirmar portanto que a plenidade de defesa é considerada a alma do Tribunal do Júri conformando e irradiando efeitos sobre todas as práticas e procedimentos inerentes a essa instituição tratase de uma garantia fundamental do acusado que serve inclusive como parâmetro de controle de constitucionalidade das normas que regem o rito do júri Nesse diapasão o professor Nereu José Giacomolli elenca diversas formas pelas quais a plenitude de defesa se manifesta no procedimento do júri tais como a retirada apenas das provas ilícitas incriminatórias a valorização da tese do réu mesmo que não sustentada pelo defensor técnico a interpretação restritiva de limites temporais dos debates o reconhecimento de circunstâncias agravantes apenas quando descritas na denúncia dentre outras Além disso é importante compreender que a plenitude de defesa não se dirige apenas aos advogados e defensores públicos que atuam tecnicamente na defesa do acusado tratase na verdade de uma garantia que impõe determinadas ações e abstenções também ao Estadojuiz e ao Estadoacusação visando permitir o pleno desenvolvimento da linha de defesa no procedimento do júri Nesse contexto a interpretação do art 478 do Código de Processo Penal que estabelece restrições argumentativas no âmbito do Tribunal do Júri deve necessariamente levar em conta a garantia constitucional da plenitude de defesa isso porque essa garantia fundamental conforma e limita a aplicação de tais vedações de modo que elas impactem de forma distinta as duas partes do processo penal Portanto a compreensão da plenitude de defesa como paradigma interpretativo do art 478 do CPP é fundamental para que haja um reposicionamento jurisprudencial voltado a respeitar essa garantia constitucional evitandose interpretações restritivas que acabem por esvaziála indevidamente Plenitude da Defesa e Interpretação Extensiva dos Argumentos Vedados do Art 478 do CPP A interpretação constitucional da plenitude de defesa deve partir do reconhecimento de que se trata de uma garantia fundamental de natureza aberta indeterminada e porosa ao intérprete conforme destaca a doutrina os direitos e garantias fundamentais notadamente quando positivados na Constituição possuem essa característica de permitir a solução de conflitos no caso concreto e a sua adequação ao contexto em que estão inseridos Nesse sentido a professora Jane Reis Gonçalves Pereira elucida que a interpretação dos direitos fundamentais é um campo fértil para a criação judicial justamente em razão dessa abertura e indeterminação normativa Essa noção se torna ainda mais evidente quando se trata de interpretação constitucional na qual a abertura e a indeterminação normativa são mais comuns demandando que o trabalho de densificação do sentido seja feito pelo operador jurídico Os doutrinadores Gilmar Ferreira Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco também destacam que a interpretação orientada à aplicação das normas constitucionais não pode se limitar à mera análise sintática do texto devendo considerar os fatos que compõem a realidade a ser regulada afinal as normas constitucionais em especial aquelas definidoras de direitos e garantias fundamentais têm por vocação ordenar a vida social Partindo dessas premissas é possível afirmar que a plenitude de defesa enquanto garantia constitucional assegurada expressamente no art 5º XXXVIII da Constituição Federal possui eficácia e aplicabilidade imediatas não dependendo de regulamentação infraconstitucional para lhe atribuir normatividade integral isso decorre da conjugação dos princípios da força normativa da Constituição da máxima efetividade e da aplicação imediata das normas definidoras de direitos e garantias fundamentais art 5º 1º da CF Estabelecidas tais premissas tornase possível analisar a relação entre a garantia da plenitude de defesa e o art 478 do Código de Processo Penal que estabelece vedações argumentativas no âmbito do Tribunal do Júri Mesmo na ausência dessa previsão legal é possível extrair de forma implícita limites argumentativos acusatórios decorrentes diretamente da plenitude de defesa da presunção de inocência e do devido processo legal Afinal o processo penal brasileiro exige que a Acusação formule suas argumentações dentro dos limites da denúncia e com base em provas de autoria e materialidade não podendo se valer de estratagemas que visem a complementar a insuficiência probatória tais como referências a antecedentes criminais ao silêncio do réu às algemas à prisão cautelar entre outros Nesse contexto o art 478 do CPP representa de forma exemplificativa algumas dessas vedações argumentativas direcionadas à Acusação tratase portanto de uma norma infraconstitucional que visa a assegurar direitos do cidadão em face do Estadoacusação e não uma norma restritiva de direitos Por outro lado para a Defesa as vedações previstas no art 478 do CPP devem ser interpretadas de forma taxativa e em conformidade com a garantia da plenitude de defesa isso porque não há na Constituição Federal um regime de plenitude de acusação mas sim de defesa Assim argumentos da Defesa que não violem a presunção de inocência e o devido processo legal ainda que meramente retóricos ou de natureza sociológica devem ser admitidos pois estão abarcados pela garantia constitucional da plenitude de defesa Essa compreensão se coaduna inclusive com a possibilidade de absolvição por clemência no Tribunal do Júri ainda que desprovida de vínculo direto com as provas de autoria e materialidade Afinal se a maioria dos jurados pode por opção política absolver o réu não se pode considerar ilícito que a Defesa apresente argumentos diversos desde que não violem garantias fundamentais Todavia é importante ressaltar que a plenitude de defesa assim como outras garantias constitucionais não é absoluta ela pode eventualmente ser ponderada com outros valores e direitos também protegidos pela Constituição tal como demonstrado no julgamento da ADPF 779 pelo Supremo Tribunal Federal que vedou a invocação da legítima defesa da honra nos crimes de feminicídio Portanto a interpretação do art 478 do CPP deve ser realizada à luz da garantia constitucional da plenitude de defesa de modo a resguardar os direitos e prerrogativas do acusado no âmbito do Tribunal do Júri Contudo essa interpretação não pode desconsiderar a necessidade de ponderação com outros valores constitucionais evitandose uma compreensão excessivamente ampla e irrestrita dessa garantia fundamental Suposta Inconstitucionalidade do Art 478 do CPP Como visto anteriormente há entendimentos que sugerem a eventual inconstitucionalidade do art 478 do CPP sob o argumento de que as partes deveriam estar em posição de argumentar livremente nos tribunais do júri sem qualquer limitação imposta pela lei No entanto o estudo realizado conduz a uma compreensão diversa no sentido de que o referido dispositivo legal é de fato constitucional para fundamentar essa posição é importante retomar a natureza do art 478 do CPP como uma norma garantidora de direitos do réu em face do Estadoacusação representado pelo Ministério Público no Tribunal do Júri Nesse sentido os doutrinadores Dimoulis e Martins esclarecem que os órgãos estatais por sua natureza não são titulares de direitos fundamentais eles exercem suas competências e adquirem direitos por determinação constitucional legal ou contratual mas não derivam diretamente das normas definidoras de direitos fundamentais Assim o art 478 do CPP não viola a liberdade de expressão da Acusação pois essa liberdade é uma prerrogativa individual não inerente à pessoa jurídica de direito público que é o Ministério Público É o Estado por meio do integrante da instituição ministerial que se apresenta no Tribunal do Júri e não a pessoa física dotada de direitos fundamentais individuais Além disso as vedações estabelecidas no art 478 do CPP não atingem a liberdade de expressão do réu uma vez que se direcionam especificamente aos argumentos acusatórios não aos argumentos de defesa destarte a garantia da plenitude de defesa pilar do Tribunal do Júri está precisamente voltada à proteção dos direitos e prerrogativas do acusado Ainda é importante ressaltar que o art 478 do CPP possui respaldo constitucional nas garantias da plenitude de defesa e da presunção de inocência conforme a análise desenvolvida anteriormente a plenitude de defesa implica não apenas faculdades atribuídas ao réu mas também limites e abstenções por parte do Estadoacusação Dessa forma as vedações argumentativas previstas no art 478 do CPP ao impedirem que a Acusação se valha de estratagemas e argumentos desvinculados das provas de autoria e materialidade estão em conformidade com a garantia constitucional da plenitude de defesa e da presunção de inocência tratase portanto de uma norma materialmente constitucional que visa a preservar os direitos fundamentais do acusado no âmbito do Tribunal do Júri Importante ressaltar no entanto que a própria plenitude de defesa assim como outras garantias constitucionais não pode ser compreendida de forma absoluta ela admite eventualmente ponderação com outros valores e direitos também protegidos pela Constituição Federal tal como demonstrado no julgamento da ADPF 779 pelo Supremo Tribunal Federal que vedou a invocação da legítima defesa da honra nos crimes de feminicídio Portanto a partir da análise realizada concluise que o art 478 do Código de Processo Penal não padece de inconstitucionalidade seja por violação à liberdade de expressão da Acusação seja por restrição indevida aos argumentos de Defesa Tratase na verdade de uma norma que se harmoniza com a garantia constitucional da plenitude de defesa e da presunção de inocência resguardando os direitos fundamentais do acusado no âmbito do Tribunal do Júri Essa interpretação no entanto não significa uma compreensão absolutista da plenitude de defesa devendose proceder à necessária ponderação com outros valores constitucionais sempre visando à preservação dos direitos e garantias fundamentais em sua máxima efetividade Conclusão Feita a análise detalhada podese concluir que o art 478 do Código de Processo Penal é uma norma constitucional que se harmoniza com a garantia fundamental da plenitude de defesa assegurada pela Constituição Federal Primeiramente o art 478 do CPP deve ser compreendido como uma norma que visa a proteger os direitos e garantias do acusado no âmbito do Tribunal do Júri não representando portanto uma violação à liberdade de expressão do órgão acusatório Isso porque o Estadoacusação representado pelo Ministério Público não é titular de direitos fundamentais individuais atuando em nome do interesse público e não de uma esfera de direitos próprios além disso as vedações argumentativas previstas no art 478 do CPP não atingem a liberdade de expressão do réu pois se direcionam especificamente aos argumentos acusatórios preservando assim a garantia da plenitude de defesa Por fim a constitucionalidade do dispositivo legal encontra respaldo nas próprias garantias constitucionais da plenitude de defesa e da presunção de inocência uma vez que tais vedações impedem que a Acusação se valha de estratagemas e argumentos desvinculados das provas de autoria e materialidade Portanto concluise que o art 478 do Código de Processo Penal é uma norma materialmente constitucional alinhada com a proteção dos direitos e garantias fundamentais do acusado no âmbito do Tribunal do Júri não configurando qualquer violação à liberdade de expressão essa compreensão no entanto não significa que a plenitude de defesa seja uma garantia absoluta devendo ser ponderada com outros valores e direitos constitucionais sempre visando à preservação dos direitos fundamentais em sua máxima efetividade PALAVRAS CHAVE Plenitude da Defesa Tribunal do Júri Liberdade de Expressão Constitucionalidade e Argumentação UNIVERSIDADEFACULDADE DOCENTE DISCENTE MATÉRIA FICHAMENTO REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA JUNQUEIRA Gustavo Octaviano Diniz MARTINI João Henrique Imperia Os Argumentos Vedados no Tribunal do Júri e as Necessárias Compatibilizações com a Garantia Fundamental da Plenitude da Defesa Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal ano XVIII n 105 p 931 dezjan 2022 Introdução O Código de Processo Penal brasileiro em seu art 478 estabelece diversas vedações argumentativas a serem observadas pelas partes durante os debates orais no âmbito do Tribunal do Júri essas restrições no entanto têm sido alvo de questionamentos quanto à sua constitucionalidade especialmente no que se refere à possível violação da liberdade de expressão Diante dessa controvérsia é necessário analisar a constitucionalidade do art 478 do CPP buscando compreendêlo à luz da garantia fundamental da plenitude de defesa assegurada pela Constituição Federal tal análise envolve a interpretação da própria noção de plenitude de defesa bem como sua interação com outros princípios e valores constitucionais Portanto o presente estudo se propõe a investigar a constitucionalidade do art 478 do Código de Processo Penal examinando sua compatibilidade com a garantia da plenitude de defesa e as eventuais alegações de violação à liberdade de expressão das partes no âmbito do Tribunal do Júri Os Limites à Argumentação em Sessão Plenária do Tribunal do Júri O artigo 478 do Código de Processo Penal foi incluído por meio da Lei nº 116892008 e de acordo com o professor Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró essa regra objetiva evitar que argumentos não necessariamente corretos mas com fortíssimo poder de persuasão principalmente perante juízes leigos possam levar a um resultado injusto O texto ressalta a necessidade de extrema cautela com a validade e legitimidade dos argumentos apresentados ao corpo de jurados pois este é composto por juízes leigos que não têm a obrigação de fundamentar detalhadamente suas decisões o pior cenário a ser evitado são as condenações baseadas em argumentos desprovidos de correspondência com as provas produzidas pois o Estado não deve ter interesse em condenar pessoas inocentes o que seria uma instrumentalização incompatível com a construção básica da dignidade da pessoa humana O Estado só possui legitimidade para postular a condenação de um réu quando esta se baseia em provas produzidas regularmente no devido processo legal não bastando a mera intuição subjetiva do profissional que representa os interesses estatais sobre a culpa do acusado a condenação apenas pode ser considerada legítima se respeitar rigorosamente as balizas do jogo democrático que condiciona o exercício do poder punitivo estatal ao estrito cumprimento das regras do devido processo Nesse contexto presumese que a normatização da regra contida no artigo 478 do CPP buscou exatamente essa postura de cautela com o objetivo de identificar quais foram as hipóteses de argumentação expressamente proibidas pelo dispositivo e como elas têm sido interpretadas majoritariamente pelos Tribunais Superiores notadamente o Superior Tribunal de Justiça STJ e o Supremo Tribunal Federal STF A convicção intuitiva sobre a culpa sem o devido lastro probatório materializase em poder autoritário ou decisionismo nos termos de Luigi Ferrajoli decisionismo é o efeito da falta de fundamentos empíricos precisos e da consequente subjetividade dos pressupostos da sanção Portanto a condenação penal apenas será legítima se respeitar rigorosamente as balizas do jogo democrático que condiciona o exercício do poder punitivo estatal ao estrito cumprimento das regras do devido processo legal Limites Legais Aqui está um resumo mais detalhado e longo O artigo 478 do Código de Processo Penal veda que as partes durante os debates do Tribunal do Júri façam referência à decisão de pronúncia às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado também é proibido fazer referência ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento em seu prejuízo Segundo a doutrina o termo argumento de autoridade significa utilizar essas decisões judiciais para aumentar expandir e reforçar a credibilidade de uma determinada versão sugerindo maior confiabilidade por terem sido emitidas por figuras de autoridade como magistrados o legislador entendeu que tais referências em si mesmas nada dizem sobre o mérito da causa e se exploradas durante os debates especialmente pela Acusação poderiam levar a uma solução potencialmente equivocada pelos jurados leigos que buscam se espelhar na autoridade do julgador O autor argumenta que apesar da redação do art 478 sugerir que as vedações se aplicam de forma equivalente a ambas as partes acusação e defesa na realidade essas regras foram criadas principalmente para conter a atuação da Acusação Não faria sentido racional ou jurídico a Defesa invocar tais argumentos de autoridade pois não teria interesse algum em prejudicar o próprio acusado Ademais a análise dos repertórios jurisprudenciais dos Tribunais Superiores STJ e STF não revela a existência de pedidos da Acusação de reconhecimento de nulidades de julgamentos por violação a essa regra processual o que corroboraria essa interpretação No entanto o texto ressalta que a proibição de fazer referência à decisão de pronúncia não é incompatível com a previsão contida no art 472 parágrafo único do Código de Processo Penal que determina o fornecimento de cópias dessas decisões aos jurados a leitura individual do texto da decisão judicial pelos jurados não se confunde com a apresentação enfática retórica e argumentativa realizada pelos tribunos da Acusação durante os debates orais do julgamento na qual estes poderiam explorar tais elementos com o objetivo de aumentar a credibilidade de sua tese Por fim o texto questiona se o fato de o legislador não ter expressamente vedado outros tipos de argumentos como a menção a antecedentes criminais do réu ao posicionamento dos policiais no plenário como suposta demonstração de periculosidade do acusado à decisão que decreta ou mantém a prisão preventiva à condenação de corréu julgado anteriormente à vestimenta do presídio etc significaria que tais argumentos estariam automaticamente autorizados essa análise mais aprofundada acerca da interpretação do alcance da vedação legal será realizada na sequência do texto A Interpretação Jurisprudencial do STJ e do STF O texto se propõe a analisar a aplicação do artigo 478 do Código de Processo Penal CPP que proíbe a referência pelos órgãos da acusação a decisões posteriores que tenham julgado admissível a acusação durante os debates em plenário do Tribunal do Júri para tanto o autor realizou uma pesquisa jurisprudencial aprofundada no Superior Tribunal de Justiça STJ e no Supremo Tribunal Federal STF No âmbito do STJ foram encontrados 30 acórdãos relevantes sendo 27 provenientes de provocação da defesa e apenas 3 do Ministério Público Nos casos em que a defesa acionou o STJ o objetivo era a aplicação do art 478 do CPP para anular o julgamento realizado pelo Tribunal do Júri tendo obtido êxito em apenas 2 dessas situações Por outro lado nos 3 recursos especiais manejados pelos ministérios públicos estaduais a intenção era justamente o afastamento da aplicação do art 478 do CPP tendo sido providos 2 desses recursos Ao se analisar os motivos da apontada violação ao art 478 do CPP nos casos apresentados pelas defesas verificouse 12 menções à referência da pronúncia eou de decisões confirmatórias da pronúncia 1 sobre o silêncio do acusado 4 acerca da decisão que decreta a preventiva eou a mantém por meio da denegação de habeas corpus 9 sobre os antecedentes criminais do réu ou de outros processos ainda em curso 1 de acórdão que anulou a primeira sessão plenária para determinar outra e 2 apontamentos que se referiam à ausência do réu e ré no julgamento outras referências feitas no curso dos debates pelos ministérios públicos também foram levadas a julgamento no STJ como a menção ao cargo de promotor de justiça aos policiais presentes e à decisão proferida no protesto por novo júri Quanto aos 3 julgados do STJ obtidos após provocação dos ministérios públicos estaduais verificouse que estes tinham o objetivo de afastar o reconhecimento pelos tribunais de origem da nulidade do julgamento realizado pelo Tribunal do Júri em razão de argumento vedado utilizado pela acusação Nesse sentido no REsp 1859706RS e no REsp 1194933AC o STJ deu provimento aos recursos ministeriais para restabelecer a sentença condenatória afastando a nulidade reconhecida já no REsp 1299809RS o STJ negou provimento ao recurso do Ministério Público mantendo a nulidade decorrente da utilização do silêncio do réu em seu prejuízo Em relação aos julgados do Supremo Tribunal Federal a pesquisa resultou em 4 acórdãos relevantes todos rejeitando os pedidos das defesas de nulidade por violação do art 478 do CPP portanto nessas decisões o STF interpretou o artigo de forma restritiva entendendo que não houve uso de argumento de autoridade e que não ficou comprovado o prejuízo Contudo há um julgado isolado da 5ª Turma do STJ RHC 94434RS que proibiu a menção aos antecedentes do réu na sessão plenária do Tribunal do Júri por entender que perpetuaria o Direito Penal do Autor Diante desse aparente antagonismo jurisprudencial o autor conclui que i são raríssimos os casos de reconhecimento da nulidade com base no art 478 do CPP ii a aplicação dessa norma foi buscada apenas pela defesa iii os recursos do Ministério Público visavam afastar essa aplicação iv o STJ e STF interpretam o artigo de forma restritiva v não houve aprofundamento sobre o conceito de argumento de autoridade e a natureza jurídica da norma e vi a grande quantidade de decisões monocráticas revela a compreensão de que a matéria está sedimentada Esse julgado isolado da 5ª Turma do STJ apesar de não ser suficiente para abalar a jurisprudência consolidada em sentido oposto é visto como um respiro de esperança para que haja um reposicionamento jurisprudencial acerca do alcance do art 478 do CPP que pode e deve ser interpretado extensivamente sob o prisma teleológico Um Breve Panorama da Doutrina Brasileira Uma parcela relevante da doutrina se mostra crítica à previsão do art 478 do CPP o renomado autor Guilherme de Souza Nucci por exemplo entende que a inserção desse artigo pela Lei nº 116892008 não lhe pareceu acertada além de compreender que o seu rol de condutas vedadas é taxativo e pior insensato Para Nucci as partes devem ser absolutamente livres em plenário no tocante às argumentações construídas de modo que a menção pelo acusador à periculosidade do réu ou pelo defensor ao bom caráter do acusado não pode gerar nulidade O autor afirma que a previsão do art 478 apenas dará chance a quem quiser plantar nulidades permitindo a anulação de julgamentos difíceis complexos e custosos com base em algumas frases Na mesma linha de entendimento o professor Walfredo Cunha Campos também critica a existência de limites no conteúdo dos debates por meio do art 478 do CPP considerando essa norma como restritiva de direitos e portanto passível de interpretação restritiva Para Campos a leitura em plenário do Júri dos antecedentes criminais do acusado da decisão que decretou a prisão preventiva da rejeição inicial da denúncia dentre outras peças processuais não deve ser vedada podendo as partes livremente utilizálas como argumento de autoridade ele ainda entende que o dispositivo é inconstitucional por violar a liberdade de expressão e a competência constitucional do Júri Por outro lado em contraponto a essa posição o professor Aury Lopes Jr critica a interpretação jurisprudencial restritiva atribuída ao art 478 do CPP afirmando que ela busca salvar uma prática que deveria ter sido abolida na reforma de 2008 o uso pelo Ministério Público da decisão de pronúncia ou do direito de silêncio do acusado para Lopes Jr tais referências configuram claramente argumento de autoridade que influencia indevidamente os jurados leigos de modo que a simples constatação dessa situação deve ensejar a anulação do júri independentemente da comprovação de prejuízo efetivo Em sentido diverso os professores Gustavo Badaró e Mário Henrique Ditticio entendem que o rol previsto no art 478 do CPP não é taxativo podendo abranger outras situações em que haja indução indevida do convencimento dos jurados como a referência a acórdãos que fazem valorações sobre a culpabilidade ou periculosidade do réu Segundo essa vertente doutrinária qualquer argumento das partes que possa influenciar de forma falaciosa o convencimento dos jurados deve ser considerado vedado mesmo que não esteja expressamente previsto nos incisos do dispositivo Portanto verificase que não há unanimidade na doutrina acerca da correta interpretação do art 478 do CPP Enquanto alguns autores defendem uma leitura restritiva da norma outros propugnam uma compreensão mais ampla e protetiva do livre convencimento do Conselho de Sentença essa diversidade de posicionamentos reflete a complexidade e relevância do tema que envolve o delicado equilíbrio entre a liberdade de atuação das partes no Tribunal do Júri e a preservação da imparcialidade do julgamento pelos jurados leigos A ausência de um entendimento consolidado demonstra a necessidade de um aprofundamento do debate doutrinário e de uma interpretação sistemática e teleológica dessa importante regra processual O Tribunal do Júri na Constituição Federal de 1988 A Constituição Federal de 1988 em seu art 5º XXXVIII assegurou a plenitude de defesa como uma das garantias fundamentais do Tribunal do Júri essa garantia exige um aprofundamento teórico específico o qual será o foco da análise neste estudo A plenitude de defesa no Tribunal do Júri está diretamente relacionada à ampla liberdade de atuação das partes em especial da defesa durante os debates em plenário essa liberdade abrange a possibilidade de utilização de quaisquer argumentos e estratégias de convencimento dos jurados leigos desde que respeitados os limites éticos e legais A interpretação e a aplicação dessa garantia constitucional portanto são fundamentais para compreender os desafios e as controvérsias envolvendo o art 478 do Código de Processo Penal que busca estabelecer determinadas restrições ao conteúdo dos debates no Tribunal do Júri A Plenitude da Defesa A Constituição Federal de 1988 em seu art 5º XXXVIII assegurou a plenitude de defesa como uma das garantias fundamentais inerentes ao Tribunal do Júri essa previsão constitucional representa uma inovação em relação ao texto da Carta Magna anterior que simplesmente mencionava a ampla defesa sem qualquer distinção terminológica A diferenciação semântica entre plenitude e ampla defesa foi deliberada pelo constituinte originário e não pode ser ignorada conforme destaca a doutrina a plenitude de defesa possui um significado mais abrangente e qualificado do que a mera ampla defesa assegurada em geral nos processos judiciais e administrativos Nesse sentido o professor Guilherme de Souza Nucci observa que a plenitude de defesa tem maior altitude do que a ampla defesa justamente por se realizar no contexto do Tribunal Popular no qual o juiz leigo não está submetido às mesmas garantias técnico jurídicas exigidas dos magistrados togados Podese afirmar portanto que a plenidade de defesa é considerada a alma do Tribunal do Júri conformando e irradiando efeitos sobre todas as práticas e procedimentos inerentes a essa instituição tratase de uma garantia fundamental do acusado que serve inclusive como parâmetro de controle de constitucionalidade das normas que regem o rito do júri Nesse diapasão o professor Nereu José Giacomolli elenca diversas formas pelas quais a plenitude de defesa se manifesta no procedimento do júri tais como a retirada apenas das provas ilícitas incriminatórias a valorização da tese do réu mesmo que não sustentada pelo defensor técnico a interpretação restritiva de limites temporais dos debates o reconhecimento de circunstâncias agravantes apenas quando descritas na denúncia dentre outras Além disso é importante compreender que a plenitude de defesa não se dirige apenas aos advogados e defensores públicos que atuam tecnicamente na defesa do acusado tratase na verdade de uma garantia que impõe determinadas ações e abstenções também ao Estado juiz e ao Estadoacusação visando permitir o pleno desenvolvimento da linha de defesa no procedimento do júri Nesse contexto a interpretação do art 478 do Código de Processo Penal que estabelece restrições argumentativas no âmbito do Tribunal do Júri deve necessariamente levar em conta a garantia constitucional da plenitude de defesa isso porque essa garantia fundamental conforma e limita a aplicação de tais vedações de modo que elas impactem de forma distinta as duas partes do processo penal Portanto a compreensão da plenitude de defesa como paradigma interpretativo do art 478 do CPP é fundamental para que haja um reposicionamento jurisprudencial voltado a respeitar essa garantia constitucional evitandose interpretações restritivas que acabem por esvaziála indevidamente Plenitude da Defesa e Interpretação Extensiva dos Argumentos Vedados do Art 478 do CPP A interpretação constitucional da plenitude de defesa deve partir do reconhecimento de que se trata de uma garantia fundamental de natureza aberta indeterminada e porosa ao intérprete conforme destaca a doutrina os direitos e garantias fundamentais notadamente quando positivados na Constituição possuem essa característica de permitir a solução de conflitos no caso concreto e a sua adequação ao contexto em que estão inseridos Nesse sentido a professora Jane Reis Gonçalves Pereira elucida que a interpretação dos direitos fundamentais é um campo fértil para a criação judicial justamente em razão dessa abertura e indeterminação normativa Essa noção se torna ainda mais evidente quando se trata de interpretação constitucional na qual a abertura e a indeterminação normativa são mais comuns demandando que o trabalho de densificação do sentido seja feito pelo operador jurídico Os doutrinadores Gilmar Ferreira Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco também destacam que a interpretação orientada à aplicação das normas constitucionais não pode se limitar à mera análise sintática do texto devendo considerar os fatos que compõem a realidade a ser regulada afinal as normas constitucionais em especial aquelas definidoras de direitos e garantias fundamentais têm por vocação ordenar a vida social Partindo dessas premissas é possível afirmar que a plenitude de defesa enquanto garantia constitucional assegurada expressamente no art 5º XXXVIII da Constituição Federal possui eficácia e aplicabilidade imediatas não dependendo de regulamentação infraconstitucional para lhe atribuir normatividade integral isso decorre da conjugação dos princípios da força normativa da Constituição da máxima efetividade e da aplicação imediata das normas definidoras de direitos e garantias fundamentais art 5º 1º da CF Estabelecidas tais premissas tornase possível analisar a relação entre a garantia da plenitude de defesa e o art 478 do Código de Processo Penal que estabelece vedações argumentativas no âmbito do Tribunal do Júri Mesmo na ausência dessa previsão legal é possível extrair de forma implícita limites argumentativos acusatórios decorrentes diretamente da plenitude de defesa da presunção de inocência e do devido processo legal Afinal o processo penal brasileiro exige que a Acusação formule suas argumentações dentro dos limites da denúncia e com base em provas de autoria e materialidade não podendo se valer de estratagemas que visem a complementar a insuficiência probatória tais como referências a antecedentes criminais ao silêncio do réu às algemas à prisão cautelar entre outros Nesse contexto o art 478 do CPP representa de forma exemplificativa algumas dessas vedações argumentativas direcionadas à Acusação tratase portanto de uma norma infraconstitucional que visa a assegurar direitos do cidadão em face do Estadoacusação e não uma norma restritiva de direitos Por outro lado para a Defesa as vedações previstas no art 478 do CPP devem ser interpretadas de forma taxativa e em conformidade com a garantia da plenitude de defesa isso porque não há na Constituição Federal um regime de plenitude de acusação mas sim de defesa Assim argumentos da Defesa que não violem a presunção de inocência e o devido processo legal ainda que meramente retóricos ou de natureza sociológica devem ser admitidos pois estão abarcados pela garantia constitucional da plenitude de defesa Essa compreensão se coaduna inclusive com a possibilidade de absolvição por clemência no Tribunal do Júri ainda que desprovida de vínculo direto com as provas de autoria e materialidade Afinal se a maioria dos jurados pode por opção política absolver o réu não se pode considerar ilícito que a Defesa apresente argumentos diversos desde que não violem garantias fundamentais Todavia é importante ressaltar que a plenitude de defesa assim como outras garantias constitucionais não é absoluta ela pode eventualmente ser ponderada com outros valores e direitos também protegidos pela Constituição tal como demonstrado no julgamento da ADPF 779 pelo Supremo Tribunal Federal que vedou a invocação da legítima defesa da honra nos crimes de feminicídio Portanto a interpretação do art 478 do CPP deve ser realizada à luz da garantia constitucional da plenitude de defesa de modo a resguardar os direitos e prerrogativas do acusado no âmbito do Tribunal do Júri Contudo essa interpretação não pode desconsiderar a necessidade de ponderação com outros valores constitucionais evitandose uma compreensão excessivamente ampla e irrestrita dessa garantia fundamental Suposta Inconstitucionalidade do Art 478 do CPP Como visto anteriormente há entendimentos que sugerem a eventual inconstitucionalidade do art 478 do CPP sob o argumento de que as partes deveriam estar em posição de argumentar livremente nos tribunais do júri sem qualquer limitação imposta pela lei No entanto o estudo realizado conduz a uma compreensão diversa no sentido de que o referido dispositivo legal é de fato constitucional para fundamentar essa posição é importante retomar a natureza do art 478 do CPP como uma norma garantidora de direitos do réu em face do Estadoacusação representado pelo Ministério Público no Tribunal do Júri Nesse sentido os doutrinadores Dimoulis e Martins esclarecem que os órgãos estatais por sua natureza não são titulares de direitos fundamentais eles exercem suas competências e adquirem direitos por determinação constitucional legal ou contratual mas não derivam diretamente das normas definidoras de direitos fundamentais Assim o art 478 do CPP não viola a liberdade de expressão da Acusação pois essa liberdade é uma prerrogativa individual não inerente à pessoa jurídica de direito público que é o Ministério Público É o Estado por meio do integrante da instituição ministerial que se apresenta no Tribunal do Júri e não a pessoa física dotada de direitos fundamentais individuais Além disso as vedações estabelecidas no art 478 do CPP não atingem a liberdade de expressão do réu uma vez que se direcionam especificamente aos argumentos acusatórios não aos argumentos de defesa destarte a garantia da plenitude de defesa pilar do Tribunal do Júri está precisamente voltada à proteção dos direitos e prerrogativas do acusado Ainda é importante ressaltar que o art 478 do CPP possui respaldo constitucional nas garantias da plenitude de defesa e da presunção de inocência conforme a análise desenvolvida anteriormente a plenitude de defesa implica não apenas faculdades atribuídas ao réu mas também limites e abstenções por parte do Estadoacusação Dessa forma as vedações argumentativas previstas no art 478 do CPP ao impedirem que a Acusação se valha de estratagemas e argumentos desvinculados das provas de autoria e materialidade estão em conformidade com a garantia constitucional da plenitude de defesa e da presunção de inocência tratase portanto de uma norma materialmente constitucional que visa a preservar os direitos fundamentais do acusado no âmbito do Tribunal do Júri Importante ressaltar no entanto que a própria plenitude de defesa assim como outras garantias constitucionais não pode ser compreendida de forma absoluta ela admite eventualmente ponderação com outros valores e direitos também protegidos pela Constituição Federal tal como demonstrado no julgamento da ADPF 779 pelo Supremo Tribunal Federal que vedou a invocação da legítima defesa da honra nos crimes de feminicídio Portanto a partir da análise realizada concluise que o art 478 do Código de Processo Penal não padece de inconstitucionalidade seja por violação à liberdade de expressão da Acusação seja por restrição indevida aos argumentos de Defesa Tratase na verdade de uma norma que se harmoniza com a garantia constitucional da plenitude de defesa e da presunção de inocência resguardando os direitos fundamentais do acusado no âmbito do Tribunal do Júri Essa interpretação no entanto não significa uma compreensão absolutista da plenitude de defesa devendose proceder à necessária ponderação com outros valores constitucionais sempre visando à preservação dos direitos e garantias fundamentais em sua máxima efetividade Conclusão Feita a análise detalhada podese concluir que o art 478 do Código de Processo Penal é uma norma constitucional que se harmoniza com a garantia fundamental da plenitude de defesa assegurada pela Constituição Federal Primeiramente o art 478 do CPP deve ser compreendido como uma norma que visa a proteger os direitos e garantias do acusado no âmbito do Tribunal do Júri não representando portanto uma violação à liberdade de expressão do órgão acusatório Isso porque o Estadoacusação representado pelo Ministério Público não é titular de direitos fundamentais individuais atuando em nome do interesse público e não de uma esfera de direitos próprios além disso as vedações argumentativas previstas no art 478 do CPP não atingem a liberdade de expressão do réu pois se direcionam especificamente aos argumentos acusatórios preservando assim a garantia da plenitude de defesa Por fim a constitucionalidade do dispositivo legal encontra respaldo nas próprias garantias constitucionais da plenitude de defesa e da presunção de inocência uma vez que tais vedações impedem que a Acusação se valha de estratagemas e argumentos desvinculados das provas de autoria e materialidade Portanto concluise que o art 478 do Código de Processo Penal é uma norma materialmente constitucional alinhada com a proteção dos direitos e garantias fundamentais do acusado no âmbito do Tribunal do Júri não configurando qualquer violação à liberdade de expressão essa compreensão no entanto não significa que a plenitude de defesa seja uma garantia absoluta devendo ser ponderada com outros valores e direitos constitucionais sempre visando à preservação dos direitos fundamentais em sua máxima efetividade PALAVRAS CHAVE Plenitude da Defesa Tribunal do Júri Liberdade de Expressão Constitucionalidade e Argumentação

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ISSN 18073395 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Ano XVIII Nº 105 DezJan 2022 Repositório Autorizado de Jurisprudência Supremo Tribunal Federal nº 382007 Superior Tribunal de Justiça nº 582006 Classificação QualisCapes B1 Editor Fábio Paixão Coordenador Oswaldo Henrique Duek Marques Conselho Editorial Alice Bianchini André Vinícius Espírito Santo de Almeida Aury Lopes Júnior Carlos Eduardo Adriano Japiassú Carlos Ernani Constantino Carolina Alves de Souza Lima Celso de Magalhães Pinto César Barros Leal Cesar Luiz de Oliveira Janoti Cezar Roberto Bitencourt Claudio Brandão Édson Luís Baldan Eduardo Saad Diniz Elias Mattar Assad Eloisa de Souza Arruda Ester Kosovski Eugenio Raúl Zaffaroni Argentina Fernando Capez Fernando da Costa Tourinho Filho Fernando de Almeida Pedroso Fernando Gentil Gizzi de Almeida Pedroso Gisele Mendes de Carvalho Gustavo Octaviano Diniz Junqueira Jacinto Nelson de Miranda Coutinho João Mestieri José Carlos Teixeira Giorgis Luciano de Freitas Santoro Luiz Flávio Borges DUrso Marco Antonio Marques da Silva Marcus Alan de Melo Gomes Michele Cia Nadia Espina Argentina Orlando Faccini Neto Oswaldo Giacoia Júnior Paulo Henrique Aranda Fuller Raúl Cervini Renato Marcão Rômulo de Andrade Moreira Ryanna Pala Veras Sergio Demoro Hamilton Silvio Luís Ferreira da Rocha Tiago Caruso Torres Umberto Luiz Borges DUrso Colaboradores deste Volume Antonio Carlos da Ponte Carolina Marcondes Fraga Cláudio Iannotti da Rocha Dermeval Farias Gomes Filho Felipe Teixeira Schwan Fernando Gentil Gizzi de Almeida Pedroso Gustavo Filipe Barbosa Garcia Gustavo Octaviano Diniz Junqueira Jaques de Camargo Penteado João Henrique Imperia Martini Juliana Menescal da Silva Ziehe Mariana dos Reis Caminha Nestor Eduardo Araruna Santiago Rodrigo Augusto Costa de Oliveira Santos Rodrigo Grazinoli Garrido Victória de Oliveira Nunes D O U T R I N A Os Argumentos Vedados no Tribunal do Júri e as Necessárias Compatibilizações com a Garantia Fundamental da Plenitude da Defesa GUSTAVO OCTAVIANO DINIZ JUNQUEIRA Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas 1996 Mestre 2003 e Doutor 2009 em Direito das Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Pós Graduado em Direito Penal pela Universidade de Salamanca e PósDoutorado em Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra Professor de Direito Penal da Graduação e da PósGraduação em Sentido Estrito da PUCSP e do Curso Damásio Professor Convidado de Cursos de PósGraduação Lato Sensu no COGEAE PUCSP na Escola Paulista da Magistratura na Escola Paulista de Direito e na Unitoledo Coordenador do Departamento de Assuntos Prisionais do IBCCRIM Defensor Público do Estado de São Paulo tendo sido Diretor da Escola da Defensoria Pública EDEPE email gjunqterracombr JOÃO HENRIQUE IMPERIA MARTINI Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas 2004 PósGraduado Lato Sensu com o Título de Aperfeiçoamento em Direito Público e Privado pela Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus 2006 Participou do Diplomado Internacional sobre Direitos Humanos promovido pelo Centro de Estudos da Procuradoria Geral do Estado Instituto MaxPlanck de Derecho Público Comparado y Derecho Internacional Heidelberg Center para a América Latina e PUCSP 2009 Mestrando em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo 2019 exDefensor Público do Estado de São Paulo 20072021 Desempenhou as funções de Assessor Criminal da Defensoria PúblicaGeral 20122013 e de Coordenador do Núcleo Especializado de Segunda Instância e Tribunais Superiores 20162018 Advogado email joaohimperiagmailcom RESUMO Destinase esse estudo à análise dos argumentos vedados no Tribu nal do Júri previstos no art 478 do Código de Processo Penal e a necessidade de sua compreensão a partir da garantia fundamental à plenitude da defesa Procedeuse à leitura prévia das normas jurídicas aplicáveis e da bibliografia Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 8 assim como ao levantamento dos julgados pertinentes do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal todos referenciados Como resultado identificouse que a interpretação atualmente majoritária a respeito do tema não está de acordo com as potencialidades da garantia fundamental à plenitude de defesa A conclusão é a de que o art 478 do Código de Processo Penal para o réu é norma garantidora de direitos e consequentemente limitadora do poder estatal de modo que o seu rol é exemplificativo e deve ser interpretado extensivamente Concluiuse ainda que a mencionada norma é constitucional PALAVRASCHAVE Tribunal do Júri Argumentos Vedados Plenitude da Defesa SUMÁRIO Introdução 1 Os Limites à Argumentação em Sessão Plenária do Tribunal do Júri 11 Considerações Iniciais 12 Limites Legais 13 A Interpre tação Jurisprudencial do STJ e do STF 14 Um Breve Panorama da Doutrina Brasileira 2 O Tribunal do Júri na Constituição Federal de 1988 21 A Plenitude da Defesa 22 Plenitude da Defesa e Interpretação Extensiva dos Argumentos Vedados do Art 478 do CPP 23 Suposta Inconstitucionalidade do Art 478 do CPP Conclusão Referências Introdução O art 478 do Código de Processo Penal com redação dada pela Lei nº 1168908 passou a vedar às partes durante os debates na sessão plenária de julgamento que empreguem determinados argumentos As partes não poderão sob pena de nulidade fazer referências i à decisão de pronúncia às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudi quem o acusado e ii ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento em seu prejuízo O questionamento que o presente estudo busca responder é se o rol de argumentos vedados estabelecido pelo legislador no art 478 do Código de Processo Penal é taxativo ou exemplificativo e secundariamente se há nele alguma eiva de inconstitucionalidade material por eventual violação ao contraditório ou à liberdade de expressão A hipótese por ora é a de que a regra acima interpretada à luz da garantia fundamental da plenitude da defesa com a sua máxima efetividade consubstancia uma norma garantidora de direitos do réu em face do Estado acusação e ao mesmo tempo de contenção do poder estatal no processo penal Partindo dessa premissa a bem do devido processo penal democrático racional que respeita os direitos e garantias individuais tal regramento deve ser recebido como exemplificativo viabilizando a limitação de outros argu mentos acusatórios desconectados de fundamento jurídicos ou das provas dos autos mas com grande poder persuasivo perante o juiz leigo No mesmo DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 9 sentido por ser uma norma garantidora de direitos do acusado e que decorre essencialmente da garantia da plenitude da defesa ela é compatível com a Constituição Federal de 1988 Ainda como hipótese temse que não há viola ção à liberdade de expressão ao Estadoacusação seja porque este não é titular desse direito fundamental especialmente dentro do processo movido pelo Estado em face de uma pessoa seja porque a ele não é dada a legitimidade de postular condenações ainda mais a juízes leigos baseandose em argumentos desprovidos de base jurídica ou relação probatória ao contrário da Defesa que conforme se verá em homenagem à máxima efetividade da plenitude da defesa é possível pedir até mesmo a clemência do acusado Como metodologia procedeuse à leitura prévia das normas jurídicas aplicáveis e da bibliografia além de se ter pesquisado julgados do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal objetivando identificar basicamente quem são os atores processuais que demandam a aplicação do art 478 do CPP e quais têm sido as respostas daquelas cortes Tratase pois de uma análise teórica com reforço empírico Após essa introdução na seção seguinte tratarseá dos limites à argu mentação em sessão plenária do Tribunal do Júri de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro A análise aqui partindo do art 478 do CPP será destinada a verificar como o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal têm compreendido o dispositivo legal Na seção subsequente trataremos do instituto do Tribunal do Júri na Constituição Federal brasileira de 1988 com foco na garantia fundamental da plenitude da defesa e seus reflexos na inter pretação daquela regra Ainda na mesma seção apresentaremos o falso dilema sobre a eventual inconstitucionalidade do art 478 do CPP por suposta violação à liberdade de expressão Por fim na conclusão apresentaremos as razões pelas quais entendemos que o art 478 do Código de Processo Penal é constitucional e porque para o réu a um só tempo tratase de norma garantidora de direitos e limitadora do poder estatal de modo que o seu rol é exemplificativo e pode ser interpretado extensivamente em face do Estadoacusação 1 Os Limites à Argumentação em Sessão Plenária do Tribunal do Júri 11 Considerações Iniciais O art 478 foi incluído no Código de Processo Penal por meio da Lei nº 116892008 e de acordo Badaró1 além de não encontrar correspondente na sistemática anterior a regra objetiva evitar que argumentos não neces 1 BADARÓ Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró Tribunal do Júri In MOURA Maria Thereza Rocha de Assis Coord As reformas no processo penal as novas leis de 2008 e os projetos de reforma São Paulo RT 2009 p 190 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 10 sariamente corretos mas com fortíssimo poder de persuasão principalmente perante juízes leigos possam levar a um resultado injusto De fato é preciso muita cautela com a validade dos argumentos dedu zidos ao corpo de jurados pois este é formado por juízes leigos e não preci sam fundamentar as suas decisões O pior cenário que se pretende evitar são as condenações baseadas em argumentos desprovidos de correspondência probatória O Estado não tem interesse em condenar inocentes o que seria instrumentalização incompatível com a construção básica de dignidade da pessoa humana O Estado não tem legitimidade para postular condenação sem provas pois o poder punitivo exige o crivo racional da produção de provas nos moldes do devido processo legal não bastando a intuição do profissional que presenta o Estado sobre a culpa do réu para sustentar a atribuição de culpa A convicção intuitiva sobre a culpa sem lastro probatório materializase em poder autoritário ou decisionismo nos termos de Ferrajoli decisionismo é o efeito da falta de fundamentos empíricos precisos e da consequente sub jetividade dos pressupostos da sanção 2 A condenação só é legítima se respeita as balizas do jogo democrático que condiciona o poder punitivo ao seu estrito cumprimento Presumese que foi justamente essa cautela que acabou por pavimentar a normatização da mencionada regra O ponto agora é identificar quais fo ram as hipóteses de argumentação expressamente proibidas pelo dispositivo e como elas até aqui foram interpretadas majoritariamente pelo STJ e STF 12 Limites Legais Viuse que o art 478 do Código de Processo Penal veda às partes fazerem referência durante os debates3 à decisão de pronúncia às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado bem como no segundo inciso ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento em seu prejuízo Do primeiro inciso das vedações destacase que aquelas referências não podem se dar como argumento de autoridade o que nos dizeres de Giacomolli4 significa 2 FERRAJOLI Luigi Direito e razão Trad Ana Paula Zomer Sica et al 4 ed São Paulo RT 2014 p 46 3 Parecenos que que o termo debates deve ser interpretado lato sensu ou seja em qualquer momento do julgamento no Tribunal do Júri mesmo que seja no curso da instrução processual que antecede os efetivos debates das partes pois do contrário bastaria formular questionamentos às testemunhas e ao réu se valendo dos argumentos vedados 4 GIACOMOLLI Nereu José Reformas do processo penal considerações críticas Rio de Janeiro Lumen Juris 2008 p 100 DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 11 para aumentar expandir pois auctoritas vem do verbo augere a ar gumentação pelo simbolismo de sua existência na pronúncia o juiz dis se três desembargadores experimentados afirmaram se não fosse perigoso não estaria algemado as alegações falam por si só vg Em outras palavras entendeu o legislador com acerto que a mera referência à decisão de pronúncia às decisões posteriores que julgaram ad missível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade nada diz sobre o mérito da causa e que caso explorados em debates especialmente pela Acusação conforme se explicará poderseia atingir uma solução potencialmente equivocada pelos jurados Para nós argumento de autoridade é todo aquele que mesmo impli citamente polarizando com o acusado sugira a maior credibilidade de uma versão em razão das qualidades cargo função da qual emana temor reveren cial de quem a emite pretendendo com isso aos olhos dos juízes leigos retirar qualquer virtude da versão do polo passivo da demanda processual Em outros termos sempre que houver referência a uma decisão judicial automaticamente o argumento será de autoridade pois se sabe de quem ela emanou e qual o objetivo de sua menção ainda que não seja verbalizado O jurado juiz leigo preocupado sobre o acerto de sua conduta sempre buscará se espelhar no juiz ou tentar supor como um juiz decidiria o caso Partindo de tal premissa a leitura da pronúncia ou do acórdão que a confirma acaba por servir de norte aos jurados que desconhecendo o papel da pronúncia são inclinados a não a contrariar Do contrário se se exige mais do que leitura ou a referência à sentença para a anulação o requisito argumento de auto ridade será uma saída interpretativa para num jogo de palavras autorizar as referências àquelas decisões pela Acusação contra o réu Neste ponto desde já registramos nosso entendimento de que apesar de o art 478 do CPP sugerir que as vedações são destinadas de igual forma às partes pensamos que elas foram criadas mais para reforçar a contenção constitucional do Estadoacusação Isso porque não faz sentido lógico ou jurídico que a Defesa tenha interesse no curso dos debates do Tribunal do Júri fazer referência ainda mais como argumento de autoridade à decisão de pronúncia às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas ainda que a regra traga na parte final do inciso I a previsão beneficiem ou prejudiquem o acusado inciso I Tam pouco parece fazer sentido que a Defesa nos debates tenha interesse jurídico em fazer referência ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento em seu prejuízo de acordo com o inciso II A confirmar o que se sustenta fosse o art 478 do CPP um limite à De fesa os repertórios jurisprudenciais do STJ e do STF revelariam a existência Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 12 de pedidos da Acusação de reconhecimento de nulidades de julgamentos por violação àquela regra o que conforme se verá não se identifica5 Reiterase a Defesa não tem interesse em fazer menção àqueles argumentos vedados Entendemos em complementação que a proibição de se fazer refe rência à decisão de pronúncia e às demais que julgam admissível a acusação não é incompatível com o art 472 parágrafo único do CPP O jurado em seguida receberá cópias da pronúncia ou se for o caso das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação e do relatório do processo pois a leitura individual do texto pelo intérprete no caso os jurados não se confunde com a sua apresentação pela Acusação que ao ler as decisões coloca ênfases destaques reforços argumentativos etc As virtudes retóricas dos tribunos do júri servem para humanizar o julgamento e não para condenar inocentes ou ferir de outra maneira direitos fundamentais Notese que o dispositivo ora comentado não proibiu expressamente as referências aos antecedentes criminais do réu ao posicionamento dos poli ciais no plenário como sinônimo de periculosidade do acusado à decisão que decreta ou mantém a prisão preventiva à decisão condenatória de corréu jul gado primeiramente em autos desmembrados à vestimenta do presídio etc6 Perguntase o fato de a lei processual não ter proibido expressamente esses argumentos permite concluir que estão autorizados Seguiremos na análise 13 A Interpretação Jurisprudencial do STJ e do STF Ao pesquisar os dados 478 e debates e júri e nulidade no campo da pesquisa avançada do Superior Tribunal de Justiça7 limitandose aos órgãos julgadores da Quinta Turma Sexta Turma e Terceira Seção e ativando as fer ramentas pesquisar sinônimo e pesquisar plurais atingese o resultado de 34 acórdãos e 429 decisões monocráticas Limitandose à análise somente dos acórdãos por conta dos limites desse estudo temse que quatro8 deles não cuidam especificamente da aplicação do art 478 do CPP mas de outros temas correlatos como os arts 472 e 479 do CPP bem como excesso de 5 Na verdade ao contrário os provimentos aos recursos ministeriais nos tribunais de justiça muito mais do que os da Defesa se dão em razão do mérito ou seja na interpretação do que seria a decisão manifestamente contrária à prova dos autos art 593 III d do CPP situação que acaba por relativizar a soberania dos veredictos somente do lado da Defesa Para uma crítica acadêmica sobre a disparidade dos números acerca dos provimentos dos recursos ministeriais em relação aos recursos defensivos contra os veredictos indicase DEPINÉ Davi Eduardo O Tribunal do Júri e a soberania mitigada Dissertação Mestrado Faculdade de Direito Universidade de São Paulo São Paulo 2008 6 Defendemos conforme se verá que ao acórdão que dá provimento ao recurso da Acusação para determinar a rea lização de novo julgamento pelo Tribunal do Júri o qual exige uma cognição muito mais aprofundada das provas e assim com elevadíssimo potencial de influenciar os jurados está contemplado expressamente no inciso I do art 478 do CPP quando veda a referência às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação 7 Disponível em httpssconstjjusbrSCON Acesso em 01 set 2021 8 São eles AgInt no AREsp 209069SP REsp 1598779DF HC 288116MG e REsp 1102118SC DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 13 linguagem nas decisões confirmatórias da pronúncia Metodologicamente portanto excluímos os quatro acórdãos da análise global remanescendo assim 30 trinta acórdãos para análise Desses 27 vinte e sete são originários de provocação das defesas e apenas 03 do Ministério Público sendo que nos três recursos especiais apresentados pelos ministérios públicos estaduais todos postulavam a reforma dos acórdãos de segundo grau que anularam os julga mentos dos júris entendendo ter havido violação ao art 478 do CPP ou seja nos três recursos especiais a Acusação pedia para afastar a aplicação do dispositivo legal Por outro lado todos os achados referentes à atuação da Defesa advogados ou defensores públicos objetivavam a efetiva aplicação do art 478 do CPP para anular o julgamento realizado pelo tribunal do júri por uso de algum argumento vedado pela Acusação Os instrumentos processuais utilizados pelas defesas foram o habeas corpus 11 recurso ordinário em habeas corpus 1 agravo regimental em agravo em recurso especial 11 agravo interno no agravo em recurso especial 1 e recurso especial 3 Dos 27 vinte e sete casos levados pela Defesa ao Supe rior Tribunal de Justiça apenas dois foram acolhidos HC 193734SP e HC 1484499DF mas a bem da verdade da análise do primeiro mencionado fica a impressão de que a nulidade foi reconhecida mais pelo excesso de linguagem do acórdão confirmatório o que teria sido reforçado em razão da referência nos debates pelo Ministério Público da decisão de pronúncia e do acórdão confirmatório Por outro lado dos três recursos especiais manejados pelos ministérios públicos9 sendo dois do Estado do Rio Grande do Sul e um do Acre dois foram providos para restabelecer a condenação proferida pelo Tribunal do Júri e assim afastar a aplicação do art 478 do CPP e apenas um teve o provimento negado para se manter a nulidade REsp 1299809RS Em relação ao motivo da apontada violação ao art 478 do CPP nos casos apresentados pelas defesas e considerando que em alguns deles houve a indicação de mais de um tipo de argumentação vedada na sessão plenária do Tribunal do Júri10 temse resumidamente o seguinte quadro 12 doze menções à referência da pronúncia eou de decisões confirmatórias da pronúncia11 1 um sobre o silêncio do acusado HC 307332RS 4 quatro acerca da decisão que decreta a preventiva eou que a mantém por meio da denegação de habeas corpus12 9 nove sobre os antecedentes criminais do réu ou de outros processos ainda 9 São eles REsp 1859706RS REsp 1299809RS e REsp 1194933AC 10 O que justifica os números dos argumentos serem maiores que os números dos expedientes pesquisados 11 São eles AgInt no AREsp 971119SP AgRg no AREsp 978032MG AgRg no REsp 1346253SP HC 307332 RS HC 283718SP REsp 1402650DF AgRg no AREsp 187479DF HC 272219PI HC 193734SP REsp 1190757DF HC 148499DF e HC 195698MS 12 São eles AgRg no REsp 1638411MG REsp 1596509SC AgRg no REsp 1171968RJ e HC 153121SP Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 14 em curso13 1 um de acórdão que anulou a primeira sessão plenária para de terminar que outra fosse realizada HC 204947PE e 02 dois apontamentos que se referem à ausência do réu e ré no julgamento HC 419818SP e RHC 100002SP Outras referências feitas no curso dos debates pelos ministérios públicos também foram levadas a julgamento no STJ juntas ou isoladamente como por exemplo a menção ao cargo de promotor de justiça objetivando maior credibilidade perante o corpo de jurados e aos policiais presentes na sessão plenária para ambos REsp 1596509SC assim como a referência à decisão proferida no protesto por novo júri AgRg no REsp 1814988PR Os três julgados no STJ obtidos após provocação dos ministérios pú blicos estaduais conforme já afirmado referemse a postulações tendentes ao afastamento do art 478 do CPP aplicado nos tribunais de origem nos quais houve o reconhecimento da nulidade do julgamento realizado pelo Tribunal do Júri decorrente de algum argumento vedado utilizado pela Acusação As sim no REsp 1859706RS deuse provimento ao recurso ministerial para restabelecer a sentença condenatória afirmandose que Impedir o conheci mento pelos jurados dos fatos da vida pregressa do acusado constitui limitação indevida ao direito probatório Já o REsp 1194933AC também foi acolhido para restabelecer a sentença condenatória afastandose a nulidade reconhecida pelo Tribunal de Justiça do Estado do Acre Afirmouse No caso a mera menção feita pela Acusação ao acórdão que anulou a decisão do Conselho de Sentença que absolvera o Réu sem referirse aos seus fundamentos não configura a manifestação da Promotoria como argumento de autoridade capaz de quebrar a construção imparcial da convicção dos jurados Por fim o STJ negou provimento ao REsp 1299809RS manejado pelo Ministério Público por meio do qual se pretendia o afastamento da nulidade reconhecida pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul decorrente da utilização do silêncio do réu em seu prejuízo afirmando em síntese que houve referência de silêncio do réu durante o interrogatório policial por uma ou duas vezes tendo ele concluído pela ausência de prejuízo mas mesmo assim concitara aos jurados que desconsiderassem tal alusão ou relato do promotor a respeito Interessante observar ainda quais teriam sido os argumentos da Acu sação no curso dos debates que o Superior Tribunal de Justiça entendeu nos poucos casos serem violadores do art 478 do CPP Assim agora buscase 13 São eles AgRg no AREsp 1664028RS Agrg no AgRg no AREsp 1632413SP HC 419818SP AgRg no REsp 1815397RS AgRg no REsp 1803760RS AgRg no REsp 1717600MS HC 333390MS REsp 1596509SC e HC 241971MS DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 15 extrair dos julgados os registros constantes nas atas de julgamento dos tribunais do júri nos três casos em que o STJ reconheceu a existência de argumentos vedados dois ao acolher os pedidos da Defesa e em um negando o pedido ministerial REsp 1299809RS HC 193734SP e HC 148499DF No primeiro no qual houve o improvimento do recurso especial do Ministério Público consta O defensor requereu fosse registrado que o promotor em sua interven ção inicial aludiu ao interrogatório policial do réu em que o acusado se manteve em silêncio na forma do art 478 II do Código de Processo Penal alegando que a referência teria sido feita por três vezes inclusive mencionando que no ato policial o defensor se fazia presente No segundo caso HC 193734SP retirase do acórdão Durante os debates na fala do Dr Promotor de Justiça a Dra Defenso ra Pública requereu que se constasse data que o Dr Promotor disse que não iria comentar a decisão de pronúncia e o acórdão mas que pedia aos senhores jurados que as lessem e também que observassem a avaliação que o juiz e os desembargadores fizeram Por fim requereu que constasse que o Dr Promotor procedeu à leitura do requerimento feito pela defesa antes da instalação da sessão e que consta da ata que disse que a defesa tinha medo que os jurados procedessem à leitura do acórdão Durante a tréplica a Defesa requereu que constasse em ata que o Dr Promotor no vamente pediu aos senhores jurados que lessem a pronúncia e o acórdão Por fim no HC 148499DF extraise que a Defesa na ata da sessão plenária do tribunal do júri registrou A Defesa requer que seja consignada em ata o fato de o Ministério Público ter utilizado a pronúncia como argumento de autoridade no sentido de que se o juiz estivesse convicto da inocência do réu não o pronunciaria Partese agora para a análise dos julgados do Supremo Tribunal Federal A consulta dos mesmos argumentos 478 e debates e júri e nulidade no campo da pesquisa jurisprudencial do portal do STF14 resultou em 12 acór dãos 58 decisões monocráticas e 11 informativos Limitandose à análise dos acórdãos temse que oito15 deles não cuidam especificamente da aplicação do art 478 do CPP mas de outros temas especialmente do excesso de lingua gem nas decisões confirmatórias da pronúncia Novamente foram excluídos os oito acórdãos da análise global remanescendo assim 4 quatro acórdãos 14 Disponível em httpsjurisprudenciastfjusbrpagessearch Acesso em 01 set 2021 15 São eles RHC 118339RJ HC 122924TO HC 113293SC RHC 109068DF RHC 120268ES HC 114770 ES RHC 115982ES e HC 81890RJ Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 16 para análise RHC 137368PR Ag Reg no HC 127307PR RHC 123009 PI e RHC 118006SP Nos quatro casos foram as defesas que arguiram a nulidade decorrente da violação do art 478 do CPP mas todos foram rejeitados pelo Supremo Tribunal Federal No primeiro RHC 137368PR notase que o argumento que se pretendia vedar em debates é incomum No caso houve o reconhecimento da ilicitude de determinada prova nas instâncias anteriores com determina ção para se riscar as referências a ela das peças processuais mas de acordo com o acórdão a intenção da Defesa seria impedir que os jurados tenham conhecimento da própria realização da prova ilícita e dos debates processuais que levaram a sua exclusão Na ocasião a 2ª Turma do STF assentou que a exclusão de prova ilícita não é contemplada nas normas de restrição ao debate afirmando ainda que são normas de discutível constitucionalidade e que vêm sendo interpretadas restritivamente pelo STF Na sua manifestação o Ministro Celso de Mello afirmou Pareceme de duvidosa constitucionalidade a norma inscrita no art 478 do CPP na redação que lhe deu a Lei nº 116892008 que estabelece restri ções destinadas a limitar o debate oral entre as partes no Plenário do Júri No segundo acórdão analisado AgRg no HC 127307PR a Defesa sustentou a nulidade do julgamento realizado pelo Tribunal do Júri porque o Ministério Público na ocasião teria feito referência à pronúncia e ao acórdão que a manteve como argumento de autoridade para evitar o afastamento da qualificadora No bojo do acórdão que negou provimento ao agravo regi mental com voto vencido do Ministro Marco Aurélio afirmouse Conforme ressaltado pela Corte Estadual e pelo Superior Tribunal de Jus tiça a atuação ministerial em plenário não tinha a intenção de influenciar a íntima convicção dos jurados pois visava apenas destacar o fato de que não seria impossível a presença da qualificadora surpresa ao caso concreto vez que ela foi mantida pelo juiz que pronunciou o réu e também mantida pelos desembargadores que julgaram o recurso defensivo interposto da decisão de pronúncia Afirmouse ainda Reitero por fim que a Defesa não comprovou que as afirmações feitas pelo Ministério Público foram determinantes para o acolhimento pelos jurados da qualificadora da surpresa No terceiro RHC 123009PI a Defesa sustentou a nulidade absoluta do julgamento realizado pelo Tribunal do Júri porque o Ministério Público nos debates teria feito referência à decisão de pronúncia como argumento de autoridade Ao negar provimento ao recurso a 1ª Turma do STF afirmou DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 17 que não basta fazer alusão às decisões para que se configure a nulidade do julgamento mesmo porque seguiu aos jurados é concedido acesso aos autos e aos instrumentos do crime o que inclui a decisão de pronúncia se for previamente solicitado ao juiz presidente de acordo com o art 480 3º do Código de Processo Penal No mais também afirmou que caso houvesse nulidade esta seria relativa e que não teria havido demonstração de prejuízo No quarto acórdão RHC 118006SP a Defesa asseverou que o Mi nistério Público na sessão plenária do tribunal do júri durante os debates leu a sentença condenatória de corréu proferida em julgamento anterior Ponderouse que a leitura foi utilizada como argumento de autoridade em prejuízo do recorrente Porém a 1ª Turma do STF rechaçou o pedido afirmando que a sentença não fazia alusão ao réu e à sua eventual participa ção no crime de modo que o documento não teria aptidão para interferir no ânimo dos jurados em desfavor do recorrente No mais concluiu que a sentença condenatória do corréu não se subsume na vedação do art 478 I do Código de Processo Penal e assim poderia ser lida em plenário Por fim afirmou que não houve comprovação de que o documento de fato foi empregado como argumento de autoridade e de que houve prejuízo insanável à defesa art 563 do CPP No mais da fundamentação do acórdão extraise a seguinte compreensão Anterior sentença condenatória de corréu não se subsume no conceito de decisões posteriores que julgaram admissível a acusação o qual compre ende o acórdão confirmatório da pronúncia bem como os habeas corpus e recursos especial e extraordinário decididos respectivamente pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal Logo resumidamente vêse que as decisões do STJ e do STF que negaram os pedidos das defesas são no sentido de que as referências feitas pelo Ministério Público no curso dos debates do tribunal do júri não se deram como argumento de autoridade que não se comprovou prejuízo aos acusados decorrente daquelas referências que o rol do dispositivo legal é taxativo e por isso não contemplaria outras hipóteses que os antecedentes dos réus devem ser questionados no interrogatório e analisados na dosimetria de modo que não haveria óbice à sua referência pela Acusação e por fim que os jurados possuem a prerrogativa de acesso aos autos na íntegra e de recebimento da cópia da pronúncia motivo pelo qual não haveria prejuízo por exemplo na leitura desta decisão e do acórdão que a confirma Dentro dos limites da pesquisa assim é possível concluir que i são raríssimos os casos de reconhecimento da nulidade do julgamento pelo tribu nal do júri com base no art 478 do Código de Processo Penal ii a aplicação desse dispositivo legal foi buscada em todos os casos pela Defesa iii os Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 18 raros recursos especiais sobre a matéria manejados pelos ministérios públicos objetivaram afastar a aplicação do art 478 do CPP iv o STJ e o STF inter pretam o art 478 do CPP de forma exageradamente restrita v os acórdãos no geral não aprofundaram sobre o conceito de argumento de autoridade e nenhum deles tratou da natureza jurídica da norma do art 478 do CPP e finalmente vi o elevado número de decisões monocráticas não analisadas individualmente neste ensaio revela que ambos os tribunais consideram a matéria como sedimentada a justificar a sua não submissão aos colegiados de acordo com os respectivos regimentos internos Súmula nº 568 do STJ e art 932 V a do Código de Processo Civil Finalmente apesar das constatações acima o Superior Tribunal de Jus tiça por sua 5ª Turma em ao menos dois julgados isolados que não apareceram no nosso levantamento da pesquisa jurisprudencial com base naqueles argumentos de forma diversa sinalizou que os antecedentes do réu não podem ser explorados pela Acusação em sessão plenária do tribunal do júri sob pena de perpetuar o Direito Penal do Autor A respeito no RHC 94434RS 5ª Turma de relatoria do Ministro Reynaldo Soares da Fonseca cujo julgamento ocorreu em 13032018 a Defesa pedia que o Ministério Público fosse proibido de mencionar na futura sessão plenária os antecedentes do réu juntados nos autos na fase do art 422 do CPP Ao dar provimento ao recurso o Ministro relator invocando o outro precedente da sua relatoria assentou a 5ª Turma desta Corte Superior em caso de minha relatoria RHC n 80551RS decidiu que em se tratando do exame dos elementos de um crime em especial daqueles dolosos contra a vida o fato não se torna típico antijurídico e culpável por uma circunstância referente ao autor ou aos seus antecedentes mesmo porque se assim o fosse estaríamos perpetuando a aplicação do Direito Penal do Autor e não o Direito Penal do Fato Por consequência ao cabo determinouse que os documentos relacionados à vida pregressa do recorrente e que não guardam relação direta com o fato não sejam utilizados pela acusação na sessão plenária do Tribunal do Júri O aparente antagonismo entre o julgado ora citado e o entendimento majoritário apenas reforça a necessidade de bases sólidas para a interpretação do art 478 do CPP que pode e deve ser interpretado extensivamente sob o prisma teleológico Embora não seja o suficiente para abalar a jurisprudência consolidada em sentido oposto esse julgado é um respiro de esperança para que haja um reposicionamento jurisprudencial acerca do alcance do art 478 do CPP DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 19 14 Um Breve Panorama da Doutrina Brasileira O objetivo neste ponto é identificar na doutrina como o art 478 do CPP está sendo interpretado Não se pretende esgotar as análises dos estu diosos mas apenas apresentar um breve referencial teórico que possa situar o leitor nas controvérsias acerca daquela regra legal Nucci16 é crítico do art 478 do CPP Entende que não lhe pareceu acer tada a inserção desse artigo pela Lei nº 116892008 além de compreender que o seu rol é taxativo e pior insensato O autor ainda afirma As partes são absolutamente livres em plenário no tocante às argumen tações construídas Se o acusador se apega à periculosidade do réu para afirmar sua culpa ou se o defensor se restringe ao bom caráter do acusado para indicar sua absolvição nada disso pode ser questionado e muito menos gerar nulidade Por derradeiro a inserção do art 478 somente dará chance a quem quiser plantar nulidades permitindo a anulação de julgamentos difíceis complexos e custosos Para isso bastam algumas frases e estará lançado o vício que irá prejudicar todo o trabalho de dias e horas em plenário do Júri Esperamos que esse dispositivo caia no esquecimento e os tribunais atuem com rigor não permitindo que as nulidades sejam facilmente reconhecidas como se qualquer menção por mais tola que seja aos fatores ali enumerados possa condenar todo o procedimento exaustivo para chegar a um veredicto Na mesma linha Campos17 critica a existência de limites no conteúdo dos debates por meio do art 478 do CPP além de compreender que se trata de norma restritiva de direitos e por isso deve ser interpretada restritivamente É absolutamente incompreensível no aspecto lógico e prático proibir que as partes livremente argumentem utilizando de quaisquer estraté gias intelectuais o crivo a respeito da veracidade ou não de suas ideias ideais e concepções de vida deverá sempre ser dos jurados quando do julgamento realizado mas nunca calcada como quer a lei em um critério apriorístico abstrato e absolutamente desraigado de conceitos filosóficos os mais elementares A leitura em plenário do Júri dos antecedentes criminais do acusado não é vedada inexistindo óbice a tanto por quais quer das partes Da mesma forma qualquer outra peça processual como a decisão que decretou a prisão preventiva aquela que deferiu o pedido de liberdade provisória ou a revogou a rejeição inicial da denúncia etc podem ser livremente comentadas pelas partes inclusive como argumento de autoridade não incidindo assim na vedação prevista no art 478 I do 16 NUCCI Guilherme de Souza Direito processual penal 18 ed Rio de Janeiro Forense 2021 p 882883 17 CAMPOS Walfredo Cunha Tribunal do Júri teoria e prática 6 ed São Paulo Atlas 2018 p 298299 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 20 CPP que deve ser interpretada restritivamente isto é só se aplicando à menção à pronúncia como argumento de autoridade Isso porque as nor mas que restringem direitos inclusive as normas processuais devem ser interpretadas restritivamente Além disso Campos18 entende que o dispositivo é inconstitucional por violação à liberdade de expressão e por desrespeito à regra da competência constitucional do Júri Entendemos que essa limitação é inconstitucional pois fere o direito à livre manifestação do pensamento art 5º IV da CF e o da livre expressão da atividade intelectual independentemente de censura art 5º IX da CF Também é inconstitucional a norma em questão porque desrespeita a competência constitucional do Júri para julgar os crimes dolosos contra a vida art 5º XXXVIII d da CF Diversamente Lopes Jr19 critica a interpretação jurisprudencial que vem sendo atribuída ao art 478 do CPP afirmando que ela procura salvar uma prática que deveria ter sido abolida na reforma de 2008 É preocupante alguns debates jurisprudenciais que tentam salvar uma prática que deveria ter sido abolida na reforma de 2008 o uso em plená rio por parte do MP da decisão de pronúncia ou ao direito de silêncio É evidente que constitui argumento de autoridade pelo simples fato de ser dito por uma autoridade Não se pode esquecer que o jurado é leigo e o simbólico da autoridade do Ministério Público é evidente e inafastável Ademais não é avaliável posteriormente em grau de recurso o nível de prejuízo que tal manifestação gera pois os desembargadores não são os jurados leigos e não estavam imersos naquela realidade para avaliar É mais um exemplo do viés erro recognitivo ou seja a simplificação cognitiva que significa um desembargador analisar hoje o ocorrido há meses atrás no plenário do júri na cabeça do jurado leigo O equívoco é evidente Por isso a leitura do art 478 do CPP deve se pautar por um critério objetivo o Ministério Público fez referência a conteúdo não apenas a existência da pronúncia ou ao uso do direito de silêncio no plenário Se a resposta for afirmativa está violado o art 478 e deve ser anulado o júri Badaró20 entende que o art 478 do CPP não encerra um rol taxativo mas exemplificativo 18 CAMPOS Walfredo Cunha Tribunal do Júri teoria e prática 6 ed São Paulo Atlas 2018 p 300 19 LOPES Jr Aury Direito processual penal 18 ed São Paulo Saraiva Jur 2021 p 367 20 BADARÓ Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró Tribunal do Júri In MOURA Maria Thereza Rocha de Assis Coord As reformas no processo penal as novas leis de 2008 e os projetos de reforma São Paulo RT 2009 p 193 DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 21 Se a leitura do decreto de prisão preventiva ou da folha de antecedentes for feita com o objetivo de extrair uma presunção de culpa haverá inde vida influência do julgamento dos jurados e eventual veredicto condena tório será nulo O art 478 não constitui uma hipótese de numerus clausus Não será apenas única e exclusivamente nestes casos que os jurados serão influenciados Qualquer outra linha argumentativa com finalidade persuasiva mas que possa induzir o jurado a erro implicará nulidade de julgamento A diferença é que nas hipóteses dos incs I e II do novo art 478 demonstrada a situação de base o acusado foi pronunciado ou o acusado está algemado ou ainda o acusado permaneceu em silêncio o que indica que seja culpado haverá nulidade posto que o legislador previamente considera que neste caso haverá evidente prejuízo Porém em qualquer outra hipótese desde que se demonstre concretamente que linhas argumentativas seguidas pelas partes efetivamente influenciaram de forma indevida e falaciosa o convencimento dos jurados a nulidade também será de se reconhecer Aliás mesmo antes do novo dispositivo já era isso que a jurisprudência fazia com relação a indevido argumento de presunção de culpa a partir da periculosidade do acusado que estivesse algemado Por fim seguindo o mesmo entendimento Ditticio21 defende A taxatividade do rol proibitivo pode deixar insuficiente a proteção do livre convencimento do Conselho de Sentença eis que diversas decisões tomadas ao longo do processo têm potencial para influenciar os jurados de maneira indevida Basta pensar como mencionado anteriormente em um acórdão que nega a soltura do acusado afirmando ser indiscutível a autoria do delito ou dizendo tratarse o réu de pessoa perigosa ou então em um acórdão anulatório do veredicto anterior tido por contrário à prova dos autos fundamentando em profunda incursão e valoração do acervo probatório Portanto a compreensão acerca do alcance do art 478 do CPP está longe de atingir um consenso doutrinário Aqueles que o criticam em síntese formulam a ideia de que a regra limita o livre debate no curso do julgamento perante o corpo de jurados Também afirmam ser infundado já que por força do mesmo Código de Processo Penal art 472 parágrafo único e do art 480 os jurados recebem cópias da pronúncia ou se for o caso das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação e do relatório do processo além do que podem ter acesso integral aos autos Assim propugnam que seja interpretado restritivamente 21 DITTICIO Mário Henrique O habeas corpus no procedimento do Júri In PEDRINA Gustavo Mascarenhas Lacerda et al Org Habeas Corpus no Supremo Tribunal Federal São Paulo RT 2019 p 391 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 22 De outra banda aqueles que defendem a existência do dispositivo legal ponderam que a previsão é insuficiente perto dos argumentos que ainda se verificam nos plenários especialmente na dedução do pedido condenatório pela Acusação quando faz referência por exemplo aos antecedentes do réu eou à decisão que decretou a prisão preventiva ou àquela que a manteve Entendem dessa forma porque a rigor tais argumentos induzem os jurados leigos em erro Geram presunção de culpabilidade do réu com base em in formações estranhas ao processo que não guardam qualquer relação com os fatos apurados e com o conjunto probatório acerca da autoria e da materiali dade Logo tal segmento doutrinário defende que o seu rol é exemplificativo e pode proibir implicitamente outras hipóteses de distorção argumentativa da Acusação É a premissa do presente artigo 2 O Tribunal do Júri na Constituição Federal de 1988 De forma bastante sucinta vêse que o tribunal do júri foi insculpido na Constituição Federal de 1988 no seu art 5º XXXVIII por meio do qual se assegurou a plenitude de defesa o sigilo das votações a soberania dos veredictos e a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida Cada uma dessas garantias inerentes ao tribunal do júri exige aprofun damentos teóricos específicos Para os fins deste estudo a análise será focada apenas na plenitude da defesa 21 A Plenitude da Defesa Diferentemente do que previu a Constituição Federal de 1988 no art 5º inciso LV aos litigantes em processo judicial ou administrativo e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa com os meios e recursos a ela inerentes ao estabelecer as garantias inerentes ao tribunal do júri protegeuse a plenitude de defesa Semanticamente amplo não tem o mesmo significado que pleno porque este é mais do que aquele22 A distinção terminológica foi deliberada por parte do constituinte e deve ser respeitada com a hipertrofia das faculdades da defesa no Tribunal do Júri o que é com preensível pois o juiz leigo não terá o mesmo compromisso com as técnicas jurídicas de garantia como a legalidade a tipicidade a responsabilidade sub jetiva e as teorias de imputação A plenitude da defesa assim é ou deveria 22 A propósito Nucci comenta Lançamos a ideia hoje assimilada por vários doutrinadores e tribunais brasileiros no sentido de que a forma plena da defesa tem maior altitude que a ampla defesa visto que a primeira realizase no contexto do Tribunal Popular enquanto a segunda destinase a qualquer corte togada criminal Não foi à toa que o princípio da plenitude de defesa foi inserido dentre as específicas garantias do Júri e muito menos pode ele comportar idêntico sentido que a similar porém diversa ampla defesa NUCCI Guilherme de Souza Princípios constitucionais penais e processuais penais São Paulo RT 2010 p 281 DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 23 ser a alma do tribunal do júri Tratase de norma constitucional que veicula uma garantia fundamental do réu e por isso para além de ser paradigma de controle de constitucionalidade das leis afirmase que ela conforma todas as práticas existentes naquela instituição A decorrência lógica mais evidente da peculiar terminologia usada pelo constituinte é a de que a acusação não é plena mas sim a defesa Essa conclusão não importa inconstitucional quebra da paridade de armas entre as partes porque a uma a previsão é constitucional criada pelo Poder Constituinte Originário a duas o tribunal do júri e o processo penal servem efetivamente de contenção do poder estatal Aliás providenciar paridade de armas no conflito do Estado com o indivíduo significa dar desiguais privilégios ao indivíduo evidentemente vulnerável no conflito Ao cabo porém indagase como a plenitude de defesa se manifesta no procedimento do júri Esta é uma questão espinhosa e foi respondida em grande medida por Giacomolli23 A exigência da plenitude defensiva irradia vários efeitos a somente as provas ilícitas incriminatórias poderão ser retiradas dos autos b o que produzido sem o crivo do contraditório defensivo salvo as provas técnicas não poderá integrar os autos c a ausência e a deficiência de defesa no ple nário implicam a desconstituição do Conselho de Sentença cientificandose o réu de prazo à indicação de advogado nomeandose defensor dativo ou público na inércia ou impossibilidade de o imputado indicar d garantia da palavra ao defensor em seu horário de exposição perante os jurados e consideração da tese própria do imputado independentemente de o defensor técnico sustentála em plenário f alerta aos jurados quando houver possibilidade de respostas contraditórias aos quesitos g recurso por decisão manifestamente contrária à prova dos autos somente pro reo h necessidade urgente de ser alterada a composição ímpar dos julgadores leigos e de ser exigida a fundamentação dos votos i deslocamento dos jurados ao local dos fatos a requerimento da acusação defesa ou dos pró prios julgadores j interpretação restritiva do limite temporal dos debates da acusação k leitura dos quesitos em plenário l reconhecimento de circunstâncias agravantes quando descritas na peça incoativa afastandose a aplicação do art 492 I b do CPP Além de concordarmos com o autor pensamos ainda que a plenitude da defesa não é apenas uma exigência direcionada aos advogados e defensores públicos que atuam na defesa técnica mas igualmente e sobretudo uma garantia de determinadas ações e abstenções do Estadojuiz e do Estado acusação para permitir o hígido desenvolvimento da linha de defesa pessoal 23 GIACOMOLLI Nereu José O devido processo penal abordagem conforme a CF e o Pacto de São José da Costa Rica 3 ed São Paulo Atlas 2016 p 457 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 24 e técnica no procedimento do júri Ou seja é um comando direcionado a todos os atores do sistema de justiça Pensamos igualmente que por ser a plenitude da defesa paradigma de interpretação do art 478 do Código de Processo Penal é inevitável conforme se argumentará que este dispositivo impacte de formas distintas as duas partes do processo e daí a necessidade de releitura daquelas vedações argumentativas objetivan do um reposicionamento jurisprudencial voltado a respeitar essa garantia constitucional 22 Plenitude da Defesa e Interpretação Extensiva dos Argumentos Vedados do Art 478 do CPP É necessário interpretar o art 478 do Código de Processo Penal à luz da garantia fundamental da plenitude de defesa assegurada pela Constituição Federal brasileira art 5º XXXVIII Antes porém como premissa é preciso proceder à interpretação constitucional da própria plenitude de defesa Assim como ocorre na grande maioria das previsões textuais da Constituição no tadamente no que toca aos direitos e garantias fundamentais o Constituinte Originário elaboroua de forma aberta indeterminada porosa ao intérprete exatamente para permitir a solução de conflitos no caso concreto e a sua adequação ao contexto em que está inserida Ou seja à realidade Essa noção do processo interpretativo constitucional é extraída no estudo de Pereira24 para quem A interpretação dos direitos fundamentais é um dos campos mais férteis para a criação judicial dada a abertura a indeterminação e a forte carga valorativa dos preceitos que os consagram Esse processo tornase espe cialmente evidente quando se trata de interpretação constitucional na qual a abertura e a indeterminação normativa são mais comuns demandando que o trabalho de densificação do sentido seja feito pelo operador jurídico Como foi dito o caráter construtivo da interpretação constitucional ligase precisamente à necessidade de conciliar texto e realidade Na clássica lição de Hesse a Constituição tem o propósito de regular a vida estatal e social mas também é por estas influenciada Assim ao mesmo tempo em que as normas constitucionais conformam a realidade as relações sociais condicionam a interpretação constitucional Desse intercâmbio contínuo emergem diversos mecanismos interpretativos os quais visam a coordenar o conteúdo normativo da Constituição que jamais pode ser irrelevante e o mundo dos fatos Nesse contexto inseremse por exemplo as mutações constitucionais alteração do significado das normas constitucionais sem que seja mudado o seu texto e o reconhecimento de direitos não enumerados 24 PEREIRA Jane Reis Gonçalves Interpretação constitucional e direitos fundamentais 2 ed São Paulo Saraiva Educação 2018 p 6668 DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 25 No mesmo sentido Mendes e Branco25 pontuam A interpretação orientada à aplicação não se torna completa se o intér prete se bastar com a análise sintática do texto Como as normas têm por vocação própria ordenar a vida social os fatos que compõem a realidade e lhe desenham feição específica não podem ser relegados no trabalho do jurista Para se definir o âmbito normativo do preceito constitucional para se delinearem a extensão e intensidade dos bens circunstâncias e interesses atingidos pela norma não se prescinde da consideração de elementos da realidade mesma a ser regida Logo sinteticamente parece razoável extrair daí que o processo de interpretação constitucional considera a interação entre texto e realidade os demais preceitos e valores constitucionais e obviamente as nuances do caso concreto Neste sentido e invocando em complementação o princípio da força normativa da Constituição26 e o princípio da máxima efetividade27 assim como a previsão do art 5º 1º da CF As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata a plenitude de defesa possui eficácia e aplicabilidade imediatas não dependendo por con seguinte da interposição do legislador infraconstitucional para lhe assegurar a normatividade integral Estabelecidas tais premissas entendemos possível afirmar que mesmo na ausência do art 478 do Código de Processo Penal o qual atribuiu maior substrato a um fragmento da plenitude de defesa seria possível extrair do seu comando de forma implícita limites argumentativos acusatórios no tribunal do júri É que juntamente à plenitude da defesa o processo penal é regido pela presunção de inocência ou não culpabilidade e pelo devido processo legal o que obriga o Estado a formular acusações nos limites da de núncia e fundadas em provas de autoria e de materialidade A Acusação que deduz pedido condenatório complementando os seus argumentos na folha de antecedentes do réu no seu silêncio na pronúncia ou outras decisões nas algemas na decretação da prisão cautelar e em outros estratagemas além de certamente não possuir provas suficientes para uma condenação criminal 25 MENDES Gilmar Ferreira BRANCO Paulo Gustavo Gonet Curso de direito constitucional 16 ed São Paulo Saraiva Educação 2021 p 84 26 HESSE Konrad A força normativa da Constituição Trad Gilmar Ferreira Mendes Porto Alegre Sergio Antonio Fabris 1991 27 Para Canotilho Este princípio também designado por princípio da eficiência ou princípio da interpretação efectiva pode ser formulado da seguinte maneira a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe dê É um princípio operativo em relação a todas e quaisquer normas constitucionais e embora a sua origem esteja ligada à tese da actualidade das normas programáticas Thoma é hoje sobretudo invocado no âmbito dos direitos fundamentais no caso de dúvidas deve preferirse a interpretação que reconheça maior eficácia aos direitos fundamentais CANOTILHO J J Gomes Direito constitucional e teoria da Constituição 7 ed Coimbra Almedina 2003 p 1224 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 26 pois se as tivesse não precisaria se valer de argumentos laterais e desprovidos de vínculo com o fato viola em sentido material as regras de legitimidade da imposição do poder penal que devem ser centradas na realidade dos fatos e não nos preconceitos dos julgadores leigos28 Sob o prisma técnico viola o devido processo legal e as reverberações referidas da plenitude da defesa Tratase de uma posição jurídica que coloca ou deveria colocar a Defesa em situação de blindagem de argumentos desprovidos de nexo probatório da au toria e da materialidade de um fato delimitado na denúncia e na pronúncia No sistema penal brasileiro o controle sobre as razões da decisão é feito na fundamentação do magistrado e mesmo assim determinados fatos e argumentos devem ser retirados de sua esfera de conhecimento é o caso da prova ilícita Por mais que o juiz togado saiba que não pode julgar com base na prova ilícita esta deve ser desentranhada dos autos para evitar que o juiz caia na tentação de usála em seu convencimento apesar da proibição No caso do jurado ausente até mesmo o controle sobre a fundamentação deve ser ainda mais intensa a cautela com os argumentos acusatórios para evitar a condenação baseada no preconceito e na insegurança dados divorciados dos elementos fáticos que são os únicos legitimamente aptos a nortear uma condenação Outro ponto é que se o art 478 do CPP era dispensável para se efetivar a garantia constitucional em comento porque as vedações já eram implí citas as proibições de argumentação destinadas à Acusação são meramente exemplificativas Todos os demais argumentos que não estão presentes no rol textual mas que possuem o mesmo potencial de persuasão dos jurados estão proibidos implicitamente por força constitucional apesar do entendimento contrário da jurisprudência por ora majoritário Logo se o art 478 do CPP veda essencialmente argumentos do Estado acusação e se decorre diretamente da garantia fundamental da plenitude de defesa além da presunção da inocência entendemos que se trata de norma infraconstitucional asseguradora de direitos do cidadão em face do Estado acusação não de norma restritiva de direitos Não se trata de mera compreensão teórica do dispositivo legal Viuse no estudo acima de forma empírica que todos os casos deliberados no STJ e no STF em que se pedia a aplicação do art 478 do CPP para se anular o julgamento realizado pelo tribunal do júri foram apresentados pelas defesas 28 Na lição de Bueno lembrado por Porto pelo contrário refletido e moderado embora enérgico em sua argumentação deve produzir a acusação sem cólera sem arrebatamento jamais deve o acusador dirigirse ao acusado e sim ao júri ou ao juiz de direito expondo o fato e suas e suas circunstâncias sua demonstração e provas em digressões e menos declamações assaz impróprias da eloquência criminal PORTO Hermínio Alberto Marques FRANCO Alberto Silva STOCO Rui Teoria e prática do Júri São Paulo RT 1997 p 315 DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 27 não pela Acusação Esta nos poucos recursos especiais manejados no Superior Tribunal de Justiça pretendia o afastamento da mencionada regra que fora aplicada na segunda instância de jurisdição Isso evidencia por si só que o art 478 do CPP embora preveja que as vedações ali constantes se dirijam às partes na essência disso não se trata Reiterase não há razão alguma para a Defesa faça referências como argumento de autoridade em benefício do réu à decisão de pronúncia às decisões posteriores que julgaram admis sível a acusação ou à determinação do uso de algemas Mais é evidente que a Defesa não pode fazer referência em prejuízo do réu ao silêncio ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento Notese então que a garantia fundamental da plenitude de defesa per mite interpretar o art 478 do CPP para o réu de forma extensiva As vedações argumentativas para a Acusação não são apenas aquelas expressas mas todas que não guardem substrato probatório ou vínculo com o caso concreto e que tenham potencial para conduzir os juízes leigos a uma conclusão do mérito guiados por preconceitos como por exemplo os antecedentes criminais do acusado num claro flerte com o Direito Penal do Autor Os antecedentes criminais no máximo interessam ao Estadojuiz na eventual fixação da penabase e não faz sentido que sejam alardeados nos debates orais dirigi dos aos jurados Não são prova de autoria de materialidade tampouco de culpabilidade Não afastam causas excludentes de ilicitude e não autorizam afirmar o dolo homicida Igualmente é evidente que a Acusação além de estar vedada a fazer referência ao uso das algemas do réu não pode num jogo de palavras dizer simplesmente que ele é perigoso sem qualquer prova técnica do argumento ou que se fosse inocente não estaria sendo julgado e cercado por policiais Qual é o grau de legitimidade nas condenações obtidas com base em tais argumentos Certamente um grau não compatível com o Estado Democrático de Direito Interessante verificar ademais que o acórdão reformador do veredicto absolutório determinando novo julgamento do réu usualmente mencio nado pela Acusação em segundas sessões plenárias de julgamento no âmbito do tribunal do júri de acordo com o julgado no RHC 115982ES de relatoria do Ministro Dias Toffoli 1ª Turma já está contemplado na vedação expressa de referência às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação diante da regra atualmente prevista no art 478 do CPP que sob pena de nulidade impede qualquer alusão pela acusação durante os debates às decisões que julgaram admissível a acusação o que subsume o acórdão em questão com o qual se determinou a realização de novo julgamento grifo nosso Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 28 Neste caso vêse nem mesmo é preciso invocar a natureza exemplifi cativa do rol legal para se reconhecer a sua proibição Já está expresso Seguindo poderseia questionar então se a Defesa também estaria impedida de fazer menção à impronúncia à decisão que revoga ou nega a prisão preventiva à parte da pronúncia ou do acórdão que afasta alguma qua lificadora eou crime conexo etc Em outras palavras poderseia indagar se o rol das vedações para a Defesa também seria exemplificativo A resposta obviamente é negativa Repitase não há na Constituição Federal de 1988 um regime de plenitude de acusação mas de defesa Para além disso se é verdade que a decisão de pronúncia não autoriza por si só uma condenação criminal porque exige apenas indícios suficientes de autoria o mesmo não é possível afirmar em relação à impronúncia posteriormen te reformada que afirma a inexistência de indícios suficientes de autoria Esta em confronto com um acórdão reformador no mínimo pode indicar a existência de dúvidas sobre os tais indícios suficientes de autoria o que é argumento válido de absolvição Idêntico raciocínio se aplica à decisão que revoga a prisão preventiva por entender frágeis os indícios de autoria Tratase de argumento que atinge a interpretação da suficiência ou não dos indícios e por isso pode consubstanciar a dúvida em plenário E a dúvida por beneficiar o réu pode ser arguida Por fim a pronúncia e o acórdão que afastam uma qualificadora ou um crime conexo da mesma forma no mínimo revelam a dúvida acerca da sua configuração Daí porque tais argumentos estão abar cados pela plenitude de defesa Temse assim que o art 478 do CPP não impacta as partes da mesma forma Por se tratar essencialmente de norma garantidora de direitos do réu e ao mesmo tempo de contenção do Estadoacusação os argumentos vedados à Acusação naquele rol legal são meramente exemplificativos De outra banda em razão da natureza da norma os argumentos proibidos à Defesa devem ser interpretados taxativamente e em conformidade com a plenitude de defesa A reforçar que o art 478 do CPP não limita outros argumentos da Defesa mesmo que sejam meramente retóricos sabese que atualmente aceitase a absolvição até mesmo por clemência Isso porque por força da existência de quesito único acerca dos pedidos absolutórios e dada a ausência de fundamentação das decisões dos jurados não é possível saber a razão pela qual absolvem um réu Se este pode ser absolvido por clemência a Defesa também pode apresentar argumentos diversos como aqueles de natureza sociológica ou criminológica Ou seja são argumentos lícitos desprovidos de vinculação com as provas de autoria e da materialidade ou ainda das causas excludentes de ilicitude e culpabilidade mas ainda assim por terem o potencial de obtenção da absolvição não podem ser vedados por legislação DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 29 infraconstitucional Não há quebra da paridade de armas na presente inter pretação simplesmente porque não se pode admitir uma condenação criminal não baseada em provas O contrário de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro não é verdadeiro O poder penal é da maioria e a maioria pode abrir mão mesmo fora da técnica jurídica ou seja por opção política o que é traduzido na linguagem jurídica como indulto presidencial que é o perdão do líder da maioria Por outra banda a maioria não pode violar os direitos da minoria do réu da defesa e é por isso que existem direitos e garantias fundamentais Por fim não se está pretendendo afirmar que a plenitude de defesa é uma garantia fundamental absoluta sem qualquer contorno Sabese que é preciso proceder a ponderação de valores no caso concreto para se atingir a compatibilização de eventuais normas conflitantes Um exemplo disso é a decisão do Supremo Tribunal Federal que deliberou por impedir a sustenta ção no tribunal do júri da chamada legítima defesa da honra nos crimes de feminicídio Referendo na Medida Cautelar ADPF 779DF julgado em 15032021 A propósito extraise da sua ementa A legítima defesa da honra não pode ser invocada como argumento inerente à plenitude de defesa própria do tribunal do júri a qual não pode constituir instrumento de salvaguarda de práticas ilícitas Assim devem prevalecer a dignidade da pessoa humana a vedação a todas as formas de discriminação o direito à igualdade e o direito à vida tendo em vista os riscos elevados e sistêmicos decorrentes da naturalização da tolerância e do incentivo à cultura da violência doméstica e do feminicídio No caso a Corte Constitucional no exercício do controle de consti tucionalidade atribuiu interpretação conforme aos arts 23 inciso II e 25 caput e parágrafo único ambos do Código Penal bem como o art 65 do Código de Processo Penal excluindo a eventual possibilidade de se arguir a legítima defesa de honra no crime de feminicídio permitindo concluir que mesmo a plenitude de defesa pode ser limitada para impedir a proliferação do discurso de ódio e da intolerância A plenitude de defesa significa muito mas não é absoluta 23 Suposta Inconstitucionalidade do Art 478 do CPP Como se viu ao longo do estudo há entendimentos que sugerem eventual inconstitucionalidade do art 478 do CPP por violação à liberdade de expressão de modo que as partes deveriam estar em posição de argumenta rem livremente nos tribunais do júri Entendemos porém que o dispositivo é constitucional Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 30 Na mesma linha de raciocínio de que o art 478 do CPP é uma norma garantidora de direitos do réu em face do Estado seguimos a compreensão de que o Estadoacusação representado no tribunal do júri pelo Ministério Público não é titular de direitos fundamentais mas sim o indivíduo por ele processado Dimoulis e Martins29 explicam Órgãos estatais são destinatários das normas definidoras de direitos fun damentais e como tais por elas obrigados Por sua natureza não se deriva de tais normas uma faculdade recíproca de direito subjetivo tal qual ocorre com as normas privatistas dos direitos das obrigações Pessoas jurídicas de direito público exercem suas competências e adquirem direitos por deter minação constitucional legal ou contratual Podem e devem defender suas competências e direitos sem que para isso seja necessário invocar um direito fundamental A afirmação de que no Brasil reconhecese a titu laridade de direitos fundamentais a pessoas jurídicas de direito público incluindose os Estadosmembros em face da União é problemática ainda mais faltando lastro textual para tanto Assim o art 478 do CPP não viola a liberdade de expressão da Acusa ção simplesmente porque ela não é titularizada por pessoa jurídica de direito público Não é a pessoa dotada de direitos individuais fundamentais que fala mas o Estado por meio da pessoa A independência funcional do órgão do MP não faz com que a consciência pessoal absorva o poder do Estado mas o contrário É o Estado que se apresenta com os limites inerentes do Estado de Direito por meio do integrante da instituição ministerial Por outro lado não viola a liberdade de expressão do réu porque essencialmente o dispositivo veda argumentos acusatórios não de defesa Finalmente é certo as vedações expressas no art 478 do CPP possuem respaldo constitucional nas garantias da plenitude de defesa e na presunção de inocência logo são materialmente constitucionais lembrando que no nosso entendimento a plenitude de defesa implica também abstenções do Estadoacusação Conclusão A argumentação no plenário do júri pode e deve ser contida como traçou o legislador no art 478 do CPP e o STF no julgamento da ADPF 779 Se a referida ADPF traçou limites apenas à argumentação defensiva é necessário convir que é constitucional dispositivo legal endereçado prepon derantemente a racionalizar o exercício da acusação perante os juízes leigos e 29 DIMOULIS Dimitri MARTINS Leonardo Teoria geral dos direitos fundamentais 8 ed São Paulo RT 2021 p 120 DOUTRINA Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 31 é esse o papel do art 478 do CPP que deve ser interpretado extensivamente sob prisma teleológico Se é intolerável a tese defensiva da legítima defesa da honra lastreada em discurso de ódio misógino e machista não se justifica um pedido acusatório lastreado dos preconceitos do jurado leigo relacionados ao estereótipo racial do acusado e ao seu passado com mácula criminal e ainda mais ilegítimo é o pedido condenatório que explora a insegurança do jurado e tenta influenciar o resultado simulando que sentença de pronúncia ou de cisão sobre medida cautelar concretizam a convicção de um juiz togado sobre a culpa do condenado É esperado que o jurado julgador ad hoc busque se espelhar em um julgador profissional mormente se manipulado para tanto A pesquisa de julgados permite concluir que as limitações do art 478 do CPP interessam à Defesa e importante parcela da doutrina não apenas reforça a legitimidade de tal contenção como propõe interpretação extensiva do dispositivo impedindo o Estadoacusação de formular pedido acusatório ilegítimo calcado nas já referidas fragilidades dos julgadores leigos Vale lembrar que os juízes togados também têm fragilidades que são fiscalizadas na funda mentação das decisões e em outros instrumentos como o desentranhamento de prova ilícita o que se defende aqui é o aprimoramento do controle para a decisão dos jurados que é desprovida de fundamentação A mesma Constituição que impõe o respeito ao contraditório e ampla defesa em todos os processos judiciais ou administrativos art 5º LV destaca e consagra para o júri a plenitude da defesa Plena e não apenas ampla e não se lê no art 5º XXXVIII plenitude da acusação É possível e legítimo que o corpo de jurados símbolos do poder popular aplicado diretamente no tribunal do júri possam absolver por argumentos extrajurídicos pois o poder penal é um poder da maioria que pode ser disposto Insustentável e desumano no entanto que essa mesma maioria representada pelos jurados e detentora do poder pu nitivo todo poder inclusive o penal emana do povo possa impor pena sem lastro probatório ou razão jurídica legítima manipulada pelo Estadoacusação O art 478 do CPP é constitucional e merece interpretação extensiva que depure toda irracionalidade acusatória que tente abusar do poder penal ins trumentalizando os preconceitos e a insegurança dos jurados A humanização do julgamento que deve ser exponenciada no julgamento pelos jurados deve ser a consagração de virtudes humanas como a compreensão a compaixão e a piedade e não a exploração de seus vícios TITLE The arguments prohibited in the jury trial and the necessary compatibility with the fundamental guarantee of the completeness of the defense ABSTRACT This study is intended to analyze the arguments prohibited in the jury trial provided for in art 478 of the Code of Criminal Procedure with a focus on the need for its understanding from the Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal Nº 105 DezJan2022 DOUTRINA 32 fundamental guarantee to the fullness of the defense The applicable legal norms and bibliography were previously read as well as a survey of the pertinent judgments of the Superior Court of Justice and the Federal Supreme Court all indicated in the text As a result it was found that the currently majority interpretation on the subject is not in accordance with the potential of the fundamental guarantee to the fullness of defense The conclusion is that art 478 of the Criminal Procedure Code for the defendant is a norm that guarantees rights and consequently limits state power so that its list is exemplary and should be interpreted extensively Finally it was concluded that the mentioned rule is constitutional KEYWORDS Jury Trial Prohibited Arguments Fullness of Defense Referências BADARÓ Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró Tribunal do Júri In MOURA Maria Thereza Rocha de Assis Coord As reformas no processo penal as novas leis de 2008 e os projetos de reforma São Paulo RT 2009 CAMPOS Walfredo Cunha Tribunal do Júri teoria e prática 6 ed São Paulo Atlas 2018 CANOTILHO J J Gomes Direito constitucional e teoria da Constituição 7 ed Coimbra Almedina 2003 DEPINÉ Davi Eduardo O Tribunal do Júri e a soberania mitigada Dissertação Mestrado Faculdade de Direito Universidade de São Paulo São Paulo 2008 DIMOULIS Dimitri MARTINS Leonardo Teoria geral dos direitos fundamentais 8 ed São Paulo RT 2021 DITTICIO Mário Henrique O habeas corpus no procedimento do Júri In PEDRINA Gustavo Masca renhas Lacerda et al Org Habeas Corpus no Supremo Tribunal Federal São Paulo RT 2019 FERRAJOLI Luigi Direito e razão Trad Ana Paula Zomer Sica et al 4 ed São Paulo RT 2014 GIACOMOLLI Nereu José O devido processo penal abordagem conforme a CF e o Pacto de São José da Costa Rica 3 ed São Paulo Atlas 2016 GIACOMOLLI Nereu José Reformas do processo penal considerações críticas Rio de Janeiro Lumen Juris 2008 HESSE Konrad A força normativa da Constituição Trad Gilmar Ferreira Mendes Porto Alegre Sergio Antonio Fabris 1991 LOPES Jr Aury Direito processual penal 18 ed São Paulo Saraiva Jur 2021 MENDES Gilmar Ferreira BRANCO Paulo Gustavo Gonet Curso de direito constitucional 16 ed São Paulo Saraiva Educação 2021 NUCCI Guilherme de Souza Direito processual penal 18 ed Rio de Janeiro Forense 2021 NUCCI Guilherme de Souza Princípios constitucionais penais e processuais penais São Paulo RT 2010 PEREIRA Jane Reis Gonçalves Interpretação constitucional e direitos fundamentais 2 ed São Paulo Saraiva Educação 2018 PORTO Hermínio Alberto Marques FRANCO Alberto Silva STOCO Rui Teoria e prática do Júri São Paulo RT 1997 Recebido em 05012022 Aprovado em 10012022 UNIVERSIDADEFACULDADE DOCENTE DISCENTE MATÉRIA FICHAMENTO REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA JUNQUEIRA Gustavo Octaviano Diniz MARTINI João Henrique Imperia Os Argumentos Vedados no Tribunal do Júri e as Necessárias Compatibilizações com a Garantia Fundamental da Plenitude da Defesa Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal ano XVIII n 105 p 931 dezjan 2022 Introdução O Código de Processo Penal brasileiro em seu art 478 estabelece diversas vedações argumentativas a serem observadas pelas partes durante os debates orais no âmbito do Tribunal do Júri essas restrições no entanto têm sido alvo de questionamentos quanto à sua constitucionalidade especialmente no que se refere à possível violação da liberdade de expressão Diante dessa controvérsia é necessário analisar a constitucionalidade do art 478 do CPP buscando compreendêlo à luz da garantia fundamental da plenitude de defesa assegurada pela Constituição Federal tal análise envolve a interpretação da própria noção de plenitude de defesa bem como sua interação com outros princípios e valores constitucionais Portanto o presente estudo se propõe a investigar a constitucionalidade do art 478 do Código de Processo Penal examinando sua compatibilidade com a garantia da plenitude de defesa e as eventuais alegações de violação à liberdade de expressão das partes no âmbito do Tribunal do Júri Os Limites à Argumentação em Sessão Plenária do Tribunal do Júri O artigo 478 do Código de Processo Penal foi incluído por meio da Lei nº 116892008 e de acordo com o professor Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró essa regra objetiva evitar que argumentos não necessariamente corretos mas com fortíssimo poder de persuasão principalmente perante juízes leigos possam levar a um resultado injusto O texto ressalta a necessidade de extrema cautela com a validade e legitimidade dos argumentos apresentados ao corpo de jurados pois este é composto por juízes leigos que não têm a obrigação de fundamentar detalhadamente suas decisões o pior cenário a ser evitado são as condenações baseadas em argumentos desprovidos de correspondência com as provas produzidas pois o Estado não deve ter interesse em condenar pessoas inocentes o que seria uma instrumentalização incompatível com a construção básica da dignidade da pessoa humana O Estado só possui legitimidade para postular a condenação de um réu quando esta se baseia em provas produzidas regularmente no devido processo legal não bastando a mera intuição subjetiva do profissional que representa os interesses estatais sobre a culpa do acusado a condenação apenas pode ser considerada legítima se respeitar rigorosamente as balizas do jogo democrático que condiciona o exercício do poder punitivo estatal ao estrito cumprimento das regras do devido processo Nesse contexto presumese que a normatização da regra contida no artigo 478 do CPP buscou exatamente essa postura de cautela com o objetivo de identificar quais foram as hipóteses de argumentação expressamente proibidas pelo dispositivo e como elas têm sido interpretadas majoritariamente pelos Tribunais Superiores notadamente o Superior Tribunal de Justiça STJ e o Supremo Tribunal Federal STF A convicção intuitiva sobre a culpa sem o devido lastro probatório materializase em poder autoritário ou decisionismo nos termos de Luigi Ferrajoli decisionismo é o efeito da falta de fundamentos empíricos precisos e da consequente subjetividade dos pressupostos da sanção Portanto a condenação penal apenas será legítima se respeitar rigorosamente as balizas do jogo democrático que condiciona o exercício do poder punitivo estatal ao estrito cumprimento das regras do devido processo legal Limites Legais Aqui está um resumo mais detalhado e longo O artigo 478 do Código de Processo Penal veda que as partes durante os debates do Tribunal do Júri façam referência à decisão de pronúncia às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado também é proibido fazer referência ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento em seu prejuízo Segundo a doutrina o termo argumento de autoridade significa utilizar essas decisões judiciais para aumentar expandir e reforçar a credibilidade de uma determinada versão sugerindo maior confiabilidade por terem sido emitidas por figuras de autoridade como magistrados o legislador entendeu que tais referências em si mesmas nada dizem sobre o mérito da causa e se exploradas durante os debates especialmente pela Acusação poderiam levar a uma solução potencialmente equivocada pelos jurados leigos que buscam se espelhar na autoridade do julgador O autor argumenta que apesar da redação do art 478 sugerir que as vedações se aplicam de forma equivalente a ambas as partes acusação e defesa na realidade essas regras foram criadas principalmente para conter a atuação da Acusação Não faria sentido racional ou jurídico a Defesa invocar tais argumentos de autoridade pois não teria interesse algum em prejudicar o próprio acusado Ademais a análise dos repertórios jurisprudenciais dos Tribunais Superiores STJ e STF não revela a existência de pedidos da Acusação de reconhecimento de nulidades de julgamentos por violação a essa regra processual o que corroboraria essa interpretação No entanto o texto ressalta que a proibição de fazer referência à decisão de pronúncia não é incompatível com a previsão contida no art 472 parágrafo único do Código de Processo Penal que determina o fornecimento de cópias dessas decisões aos jurados a leitura individual do texto da decisão judicial pelos jurados não se confunde com a apresentação enfática retórica e argumentativa realizada pelos tribunos da Acusação durante os debates orais do julgamento na qual estes poderiam explorar tais elementos com o objetivo de aumentar a credibilidade de sua tese Por fim o texto questiona se o fato de o legislador não ter expressamente vedado outros tipos de argumentos como a menção a antecedentes criminais do réu ao posicionamento dos policiais no plenário como suposta demonstração de periculosidade do acusado à decisão que decreta ou mantém a prisão preventiva à condenação de corréu julgado anteriormente à vestimenta do presídio etc significaria que tais argumentos estariam automaticamente autorizados essa análise mais aprofundada acerca da interpretação do alcance da vedação legal será realizada na sequência do texto A Interpretação Jurisprudencial do STJ e do STF O texto se propõe a analisar a aplicação do artigo 478 do Código de Processo Penal CPP que proíbe a referência pelos órgãos da acusação a decisões posteriores que tenham julgado admissível a acusação durante os debates em plenário do Tribunal do Júri para tanto o autor realizou uma pesquisa jurisprudencial aprofundada no Superior Tribunal de Justiça STJ e no Supremo Tribunal Federal STF No âmbito do STJ foram encontrados 30 acórdãos relevantes sendo 27 provenientes de provocação da defesa e apenas 3 do Ministério Público Nos casos em que a defesa acionou o STJ o objetivo era a aplicação do art 478 do CPP para anular o julgamento realizado pelo Tribunal do Júri tendo obtido êxito em apenas 2 dessas situações Por outro lado nos 3 recursos especiais manejados pelos ministérios públicos estaduais a intenção era justamente o afastamento da aplicação do art 478 do CPP tendo sido providos 2 desses recursos Ao se analisar os motivos da apontada violação ao art 478 do CPP nos casos apresentados pelas defesas verificouse 12 menções à referência da pronúncia eou de decisões confirmatórias da pronúncia 1 sobre o silêncio do acusado 4 acerca da decisão que decreta a preventiva eou a mantém por meio da denegação de habeas corpus 9 sobre os antecedentes criminais do réu ou de outros processos ainda em curso 1 de acórdão que anulou a primeira sessão plenária para determinar outra e 2 apontamentos que se referiam à ausência do réu e ré no julgamento outras referências feitas no curso dos debates pelos ministérios públicos também foram levadas a julgamento no STJ como a menção ao cargo de promotor de justiça aos policiais presentes e à decisão proferida no protesto por novo júri Quanto aos 3 julgados do STJ obtidos após provocação dos ministérios públicos estaduais verificouse que estes tinham o objetivo de afastar o reconhecimento pelos tribunais de origem da nulidade do julgamento realizado pelo Tribunal do Júri em razão de argumento vedado utilizado pela acusação Nesse sentido no REsp 1859706RS e no REsp 1194933AC o STJ deu provimento aos recursos ministeriais para restabelecer a sentença condenatória afastando a nulidade reconhecida já no REsp 1299809RS o STJ negou provimento ao recurso do Ministério Público mantendo a nulidade decorrente da utilização do silêncio do réu em seu prejuízo Em relação aos julgados do Supremo Tribunal Federal a pesquisa resultou em 4 acórdãos relevantes todos rejeitando os pedidos das defesas de nulidade por violação do art 478 do CPP portanto nessas decisões o STF interpretou o artigo de forma restritiva entendendo que não houve uso de argumento de autoridade e que não ficou comprovado o prejuízo Contudo há um julgado isolado da 5ª Turma do STJ RHC 94434RS que proibiu a menção aos antecedentes do réu na sessão plenária do Tribunal do Júri por entender que perpetuaria o Direito Penal do Autor Diante desse aparente antagonismo jurisprudencial o autor conclui que i são raríssimos os casos de reconhecimento da nulidade com base no art 478 do CPP ii a aplicação dessa norma foi buscada apenas pela defesa iii os recursos do Ministério Público visavam afastar essa aplicação iv o STJ e STF interpretam o artigo de forma restritiva v não houve aprofundamento sobre o conceito de argumento de autoridade e a natureza jurídica da norma e vi a grande quantidade de decisões monocráticas revela a compreensão de que a matéria está sedimentada Esse julgado isolado da 5ª Turma do STJ apesar de não ser suficiente para abalar a jurisprudência consolidada em sentido oposto é visto como um respiro de esperança para que haja um reposicionamento jurisprudencial acerca do alcance do art 478 do CPP que pode e deve ser interpretado extensivamente sob o prisma teleológico Um Breve Panorama da Doutrina Brasileira Uma parcela relevante da doutrina se mostra crítica à previsão do art 478 do CPP o renomado autor Guilherme de Souza Nucci por exemplo entende que a inserção desse artigo pela Lei nº 116892008 não lhe pareceu acertada além de compreender que o seu rol de condutas vedadas é taxativo e pior insensato Para Nucci as partes devem ser absolutamente livres em plenário no tocante às argumentações construídas de modo que a menção pelo acusador à periculosidade do réu ou pelo defensor ao bom caráter do acusado não pode gerar nulidade O autor afirma que a previsão do art 478 apenas dará chance a quem quiser plantar nulidades permitindo a anulação de julgamentos difíceis complexos e custosos com base em algumas frases Na mesma linha de entendimento o professor Walfredo Cunha Campos também critica a existência de limites no conteúdo dos debates por meio do art 478 do CPP considerando essa norma como restritiva de direitos e portanto passível de interpretação restritiva Para Campos a leitura em plenário do Júri dos antecedentes criminais do acusado da decisão que decretou a prisão preventiva da rejeição inicial da denúncia dentre outras peças processuais não deve ser vedada podendo as partes livremente utilizálas como argumento de autoridade ele ainda entende que o dispositivo é inconstitucional por violar a liberdade de expressão e a competência constitucional do Júri Por outro lado em contraponto a essa posição o professor Aury Lopes Jr critica a interpretação jurisprudencial restritiva atribuída ao art 478 do CPP afirmando que ela busca salvar uma prática que deveria ter sido abolida na reforma de 2008 o uso pelo Ministério Público da decisão de pronúncia ou do direito de silêncio do acusado para Lopes Jr tais referências configuram claramente argumento de autoridade que influencia indevidamente os jurados leigos de modo que a simples constatação dessa situação deve ensejar a anulação do júri independentemente da comprovação de prejuízo efetivo Em sentido diverso os professores Gustavo Badaró e Mário Henrique Ditticio entendem que o rol previsto no art 478 do CPP não é taxativo podendo abranger outras situações em que haja indução indevida do convencimento dos jurados como a referência a acórdãos que fazem valorações sobre a culpabilidade ou periculosidade do réu Segundo essa vertente doutrinária qualquer argumento das partes que possa influenciar de forma falaciosa o convencimento dos jurados deve ser considerado vedado mesmo que não esteja expressamente previsto nos incisos do dispositivo Portanto verificase que não há unanimidade na doutrina acerca da correta interpretação do art 478 do CPP Enquanto alguns autores defendem uma leitura restritiva da norma outros propugnam uma compreensão mais ampla e protetiva do livre convencimento do Conselho de Sentença essa diversidade de posicionamentos reflete a complexidade e relevância do tema que envolve o delicado equilíbrio entre a liberdade de atuação das partes no Tribunal do Júri e a preservação da imparcialidade do julgamento pelos jurados leigos A ausência de um entendimento consolidado demonstra a necessidade de um aprofundamento do debate doutrinário e de uma interpretação sistemática e teleológica dessa importante regra processual O Tribunal do Júri na Constituição Federal de 1988 A Constituição Federal de 1988 em seu art 5º XXXVIII assegurou a plenitude de defesa como uma das garantias fundamentais do Tribunal do Júri essa garantia exige um aprofundamento teórico específico o qual será o foco da análise neste estudo A plenitude de defesa no Tribunal do Júri está diretamente relacionada à ampla liberdade de atuação das partes em especial da defesa durante os debates em plenário essa liberdade abrange a possibilidade de utilização de quaisquer argumentos e estratégias de convencimento dos jurados leigos desde que respeitados os limites éticos e legais A interpretação e a aplicação dessa garantia constitucional portanto são fundamentais para compreender os desafios e as controvérsias envolvendo o art 478 do Código de Processo Penal que busca estabelecer determinadas restrições ao conteúdo dos debates no Tribunal do Júri A Plenitude da Defesa A Constituição Federal de 1988 em seu art 5º XXXVIII assegurou a plenitude de defesa como uma das garantias fundamentais inerentes ao Tribunal do Júri essa previsão constitucional representa uma inovação em relação ao texto da Carta Magna anterior que simplesmente mencionava a ampla defesa sem qualquer distinção terminológica A diferenciação semântica entre plenitude e ampla defesa foi deliberada pelo constituinte originário e não pode ser ignorada conforme destaca a doutrina a plenitude de defesa possui um significado mais abrangente e qualificado do que a mera ampla defesa assegurada em geral nos processos judiciais e administrativos Nesse sentido o professor Guilherme de Souza Nucci observa que a plenitude de defesa tem maior altitude do que a ampla defesa justamente por se realizar no contexto do Tribunal Popular no qual o juiz leigo não está submetido às mesmas garantias técnico jurídicas exigidas dos magistrados togados Podese afirmar portanto que a plenidade de defesa é considerada a alma do Tribunal do Júri conformando e irradiando efeitos sobre todas as práticas e procedimentos inerentes a essa instituição tratase de uma garantia fundamental do acusado que serve inclusive como parâmetro de controle de constitucionalidade das normas que regem o rito do júri Nesse diapasão o professor Nereu José Giacomolli elenca diversas formas pelas quais a plenitude de defesa se manifesta no procedimento do júri tais como a retirada apenas das provas ilícitas incriminatórias a valorização da tese do réu mesmo que não sustentada pelo defensor técnico a interpretação restritiva de limites temporais dos debates o reconhecimento de circunstâncias agravantes apenas quando descritas na denúncia dentre outras Além disso é importante compreender que a plenitude de defesa não se dirige apenas aos advogados e defensores públicos que atuam tecnicamente na defesa do acusado tratase na verdade de uma garantia que impõe determinadas ações e abstenções também ao Estadojuiz e ao Estadoacusação visando permitir o pleno desenvolvimento da linha de defesa no procedimento do júri Nesse contexto a interpretação do art 478 do Código de Processo Penal que estabelece restrições argumentativas no âmbito do Tribunal do Júri deve necessariamente levar em conta a garantia constitucional da plenitude de defesa isso porque essa garantia fundamental conforma e limita a aplicação de tais vedações de modo que elas impactem de forma distinta as duas partes do processo penal Portanto a compreensão da plenitude de defesa como paradigma interpretativo do art 478 do CPP é fundamental para que haja um reposicionamento jurisprudencial voltado a respeitar essa garantia constitucional evitandose interpretações restritivas que acabem por esvaziála indevidamente Plenitude da Defesa e Interpretação Extensiva dos Argumentos Vedados do Art 478 do CPP A interpretação constitucional da plenitude de defesa deve partir do reconhecimento de que se trata de uma garantia fundamental de natureza aberta indeterminada e porosa ao intérprete conforme destaca a doutrina os direitos e garantias fundamentais notadamente quando positivados na Constituição possuem essa característica de permitir a solução de conflitos no caso concreto e a sua adequação ao contexto em que estão inseridos Nesse sentido a professora Jane Reis Gonçalves Pereira elucida que a interpretação dos direitos fundamentais é um campo fértil para a criação judicial justamente em razão dessa abertura e indeterminação normativa Essa noção se torna ainda mais evidente quando se trata de interpretação constitucional na qual a abertura e a indeterminação normativa são mais comuns demandando que o trabalho de densificação do sentido seja feito pelo operador jurídico Os doutrinadores Gilmar Ferreira Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco também destacam que a interpretação orientada à aplicação das normas constitucionais não pode se limitar à mera análise sintática do texto devendo considerar os fatos que compõem a realidade a ser regulada afinal as normas constitucionais em especial aquelas definidoras de direitos e garantias fundamentais têm por vocação ordenar a vida social Partindo dessas premissas é possível afirmar que a plenitude de defesa enquanto garantia constitucional assegurada expressamente no art 5º XXXVIII da Constituição Federal possui eficácia e aplicabilidade imediatas não dependendo de regulamentação infraconstitucional para lhe atribuir normatividade integral isso decorre da conjugação dos princípios da força normativa da Constituição da máxima efetividade e da aplicação imediata das normas definidoras de direitos e garantias fundamentais art 5º 1º da CF Estabelecidas tais premissas tornase possível analisar a relação entre a garantia da plenitude de defesa e o art 478 do Código de Processo Penal que estabelece vedações argumentativas no âmbito do Tribunal do Júri Mesmo na ausência dessa previsão legal é possível extrair de forma implícita limites argumentativos acusatórios decorrentes diretamente da plenitude de defesa da presunção de inocência e do devido processo legal Afinal o processo penal brasileiro exige que a Acusação formule suas argumentações dentro dos limites da denúncia e com base em provas de autoria e materialidade não podendo se valer de estratagemas que visem a complementar a insuficiência probatória tais como referências a antecedentes criminais ao silêncio do réu às algemas à prisão cautelar entre outros Nesse contexto o art 478 do CPP representa de forma exemplificativa algumas dessas vedações argumentativas direcionadas à Acusação tratase portanto de uma norma infraconstitucional que visa a assegurar direitos do cidadão em face do Estadoacusação e não uma norma restritiva de direitos Por outro lado para a Defesa as vedações previstas no art 478 do CPP devem ser interpretadas de forma taxativa e em conformidade com a garantia da plenitude de defesa isso porque não há na Constituição Federal um regime de plenitude de acusação mas sim de defesa Assim argumentos da Defesa que não violem a presunção de inocência e o devido processo legal ainda que meramente retóricos ou de natureza sociológica devem ser admitidos pois estão abarcados pela garantia constitucional da plenitude de defesa Essa compreensão se coaduna inclusive com a possibilidade de absolvição por clemência no Tribunal do Júri ainda que desprovida de vínculo direto com as provas de autoria e materialidade Afinal se a maioria dos jurados pode por opção política absolver o réu não se pode considerar ilícito que a Defesa apresente argumentos diversos desde que não violem garantias fundamentais Todavia é importante ressaltar que a plenitude de defesa assim como outras garantias constitucionais não é absoluta ela pode eventualmente ser ponderada com outros valores e direitos também protegidos pela Constituição tal como demonstrado no julgamento da ADPF 779 pelo Supremo Tribunal Federal que vedou a invocação da legítima defesa da honra nos crimes de feminicídio Portanto a interpretação do art 478 do CPP deve ser realizada à luz da garantia constitucional da plenitude de defesa de modo a resguardar os direitos e prerrogativas do acusado no âmbito do Tribunal do Júri Contudo essa interpretação não pode desconsiderar a necessidade de ponderação com outros valores constitucionais evitandose uma compreensão excessivamente ampla e irrestrita dessa garantia fundamental Suposta Inconstitucionalidade do Art 478 do CPP Como visto anteriormente há entendimentos que sugerem a eventual inconstitucionalidade do art 478 do CPP sob o argumento de que as partes deveriam estar em posição de argumentar livremente nos tribunais do júri sem qualquer limitação imposta pela lei No entanto o estudo realizado conduz a uma compreensão diversa no sentido de que o referido dispositivo legal é de fato constitucional para fundamentar essa posição é importante retomar a natureza do art 478 do CPP como uma norma garantidora de direitos do réu em face do Estadoacusação representado pelo Ministério Público no Tribunal do Júri Nesse sentido os doutrinadores Dimoulis e Martins esclarecem que os órgãos estatais por sua natureza não são titulares de direitos fundamentais eles exercem suas competências e adquirem direitos por determinação constitucional legal ou contratual mas não derivam diretamente das normas definidoras de direitos fundamentais Assim o art 478 do CPP não viola a liberdade de expressão da Acusação pois essa liberdade é uma prerrogativa individual não inerente à pessoa jurídica de direito público que é o Ministério Público É o Estado por meio do integrante da instituição ministerial que se apresenta no Tribunal do Júri e não a pessoa física dotada de direitos fundamentais individuais Além disso as vedações estabelecidas no art 478 do CPP não atingem a liberdade de expressão do réu uma vez que se direcionam especificamente aos argumentos acusatórios não aos argumentos de defesa destarte a garantia da plenitude de defesa pilar do Tribunal do Júri está precisamente voltada à proteção dos direitos e prerrogativas do acusado Ainda é importante ressaltar que o art 478 do CPP possui respaldo constitucional nas garantias da plenitude de defesa e da presunção de inocência conforme a análise desenvolvida anteriormente a plenitude de defesa implica não apenas faculdades atribuídas ao réu mas também limites e abstenções por parte do Estadoacusação Dessa forma as vedações argumentativas previstas no art 478 do CPP ao impedirem que a Acusação se valha de estratagemas e argumentos desvinculados das provas de autoria e materialidade estão em conformidade com a garantia constitucional da plenitude de defesa e da presunção de inocência tratase portanto de uma norma materialmente constitucional que visa a preservar os direitos fundamentais do acusado no âmbito do Tribunal do Júri Importante ressaltar no entanto que a própria plenitude de defesa assim como outras garantias constitucionais não pode ser compreendida de forma absoluta ela admite eventualmente ponderação com outros valores e direitos também protegidos pela Constituição Federal tal como demonstrado no julgamento da ADPF 779 pelo Supremo Tribunal Federal que vedou a invocação da legítima defesa da honra nos crimes de feminicídio Portanto a partir da análise realizada concluise que o art 478 do Código de Processo Penal não padece de inconstitucionalidade seja por violação à liberdade de expressão da Acusação seja por restrição indevida aos argumentos de Defesa Tratase na verdade de uma norma que se harmoniza com a garantia constitucional da plenitude de defesa e da presunção de inocência resguardando os direitos fundamentais do acusado no âmbito do Tribunal do Júri Essa interpretação no entanto não significa uma compreensão absolutista da plenitude de defesa devendose proceder à necessária ponderação com outros valores constitucionais sempre visando à preservação dos direitos e garantias fundamentais em sua máxima efetividade Conclusão Feita a análise detalhada podese concluir que o art 478 do Código de Processo Penal é uma norma constitucional que se harmoniza com a garantia fundamental da plenitude de defesa assegurada pela Constituição Federal Primeiramente o art 478 do CPP deve ser compreendido como uma norma que visa a proteger os direitos e garantias do acusado no âmbito do Tribunal do Júri não representando portanto uma violação à liberdade de expressão do órgão acusatório Isso porque o Estadoacusação representado pelo Ministério Público não é titular de direitos fundamentais individuais atuando em nome do interesse público e não de uma esfera de direitos próprios além disso as vedações argumentativas previstas no art 478 do CPP não atingem a liberdade de expressão do réu pois se direcionam especificamente aos argumentos acusatórios preservando assim a garantia da plenitude de defesa Por fim a constitucionalidade do dispositivo legal encontra respaldo nas próprias garantias constitucionais da plenitude de defesa e da presunção de inocência uma vez que tais vedações impedem que a Acusação se valha de estratagemas e argumentos desvinculados das provas de autoria e materialidade Portanto concluise que o art 478 do Código de Processo Penal é uma norma materialmente constitucional alinhada com a proteção dos direitos e garantias fundamentais do acusado no âmbito do Tribunal do Júri não configurando qualquer violação à liberdade de expressão essa compreensão no entanto não significa que a plenitude de defesa seja uma garantia absoluta devendo ser ponderada com outros valores e direitos constitucionais sempre visando à preservação dos direitos fundamentais em sua máxima efetividade PALAVRAS CHAVE Plenitude da Defesa Tribunal do Júri Liberdade de Expressão Constitucionalidade e Argumentação UNIVERSIDADEFACULDADE DOCENTE DISCENTE MATÉRIA FICHAMENTO REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA JUNQUEIRA Gustavo Octaviano Diniz MARTINI João Henrique Imperia Os Argumentos Vedados no Tribunal do Júri e as Necessárias Compatibilizações com a Garantia Fundamental da Plenitude da Defesa Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal ano XVIII n 105 p 931 dezjan 2022 Introdução O Código de Processo Penal brasileiro em seu art 478 estabelece diversas vedações argumentativas a serem observadas pelas partes durante os debates orais no âmbito do Tribunal do Júri essas restrições no entanto têm sido alvo de questionamentos quanto à sua constitucionalidade especialmente no que se refere à possível violação da liberdade de expressão Diante dessa controvérsia é necessário analisar a constitucionalidade do art 478 do CPP buscando compreendêlo à luz da garantia fundamental da plenitude de defesa assegurada pela Constituição Federal tal análise envolve a interpretação da própria noção de plenitude de defesa bem como sua interação com outros princípios e valores constitucionais Portanto o presente estudo se propõe a investigar a constitucionalidade do art 478 do Código de Processo Penal examinando sua compatibilidade com a garantia da plenitude de defesa e as eventuais alegações de violação à liberdade de expressão das partes no âmbito do Tribunal do Júri Os Limites à Argumentação em Sessão Plenária do Tribunal do Júri O artigo 478 do Código de Processo Penal foi incluído por meio da Lei nº 116892008 e de acordo com o professor Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró essa regra objetiva evitar que argumentos não necessariamente corretos mas com fortíssimo poder de persuasão principalmente perante juízes leigos possam levar a um resultado injusto O texto ressalta a necessidade de extrema cautela com a validade e legitimidade dos argumentos apresentados ao corpo de jurados pois este é composto por juízes leigos que não têm a obrigação de fundamentar detalhadamente suas decisões o pior cenário a ser evitado são as condenações baseadas em argumentos desprovidos de correspondência com as provas produzidas pois o Estado não deve ter interesse em condenar pessoas inocentes o que seria uma instrumentalização incompatível com a construção básica da dignidade da pessoa humana O Estado só possui legitimidade para postular a condenação de um réu quando esta se baseia em provas produzidas regularmente no devido processo legal não bastando a mera intuição subjetiva do profissional que representa os interesses estatais sobre a culpa do acusado a condenação apenas pode ser considerada legítima se respeitar rigorosamente as balizas do jogo democrático que condiciona o exercício do poder punitivo estatal ao estrito cumprimento das regras do devido processo Nesse contexto presumese que a normatização da regra contida no artigo 478 do CPP buscou exatamente essa postura de cautela com o objetivo de identificar quais foram as hipóteses de argumentação expressamente proibidas pelo dispositivo e como elas têm sido interpretadas majoritariamente pelos Tribunais Superiores notadamente o Superior Tribunal de Justiça STJ e o Supremo Tribunal Federal STF A convicção intuitiva sobre a culpa sem o devido lastro probatório materializase em poder autoritário ou decisionismo nos termos de Luigi Ferrajoli decisionismo é o efeito da falta de fundamentos empíricos precisos e da consequente subjetividade dos pressupostos da sanção Portanto a condenação penal apenas será legítima se respeitar rigorosamente as balizas do jogo democrático que condiciona o exercício do poder punitivo estatal ao estrito cumprimento das regras do devido processo legal Limites Legais Aqui está um resumo mais detalhado e longo O artigo 478 do Código de Processo Penal veda que as partes durante os debates do Tribunal do Júri façam referência à decisão de pronúncia às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado também é proibido fazer referência ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento em seu prejuízo Segundo a doutrina o termo argumento de autoridade significa utilizar essas decisões judiciais para aumentar expandir e reforçar a credibilidade de uma determinada versão sugerindo maior confiabilidade por terem sido emitidas por figuras de autoridade como magistrados o legislador entendeu que tais referências em si mesmas nada dizem sobre o mérito da causa e se exploradas durante os debates especialmente pela Acusação poderiam levar a uma solução potencialmente equivocada pelos jurados leigos que buscam se espelhar na autoridade do julgador O autor argumenta que apesar da redação do art 478 sugerir que as vedações se aplicam de forma equivalente a ambas as partes acusação e defesa na realidade essas regras foram criadas principalmente para conter a atuação da Acusação Não faria sentido racional ou jurídico a Defesa invocar tais argumentos de autoridade pois não teria interesse algum em prejudicar o próprio acusado Ademais a análise dos repertórios jurisprudenciais dos Tribunais Superiores STJ e STF não revela a existência de pedidos da Acusação de reconhecimento de nulidades de julgamentos por violação a essa regra processual o que corroboraria essa interpretação No entanto o texto ressalta que a proibição de fazer referência à decisão de pronúncia não é incompatível com a previsão contida no art 472 parágrafo único do Código de Processo Penal que determina o fornecimento de cópias dessas decisões aos jurados a leitura individual do texto da decisão judicial pelos jurados não se confunde com a apresentação enfática retórica e argumentativa realizada pelos tribunos da Acusação durante os debates orais do julgamento na qual estes poderiam explorar tais elementos com o objetivo de aumentar a credibilidade de sua tese Por fim o texto questiona se o fato de o legislador não ter expressamente vedado outros tipos de argumentos como a menção a antecedentes criminais do réu ao posicionamento dos policiais no plenário como suposta demonstração de periculosidade do acusado à decisão que decreta ou mantém a prisão preventiva à condenação de corréu julgado anteriormente à vestimenta do presídio etc significaria que tais argumentos estariam automaticamente autorizados essa análise mais aprofundada acerca da interpretação do alcance da vedação legal será realizada na sequência do texto A Interpretação Jurisprudencial do STJ e do STF O texto se propõe a analisar a aplicação do artigo 478 do Código de Processo Penal CPP que proíbe a referência pelos órgãos da acusação a decisões posteriores que tenham julgado admissível a acusação durante os debates em plenário do Tribunal do Júri para tanto o autor realizou uma pesquisa jurisprudencial aprofundada no Superior Tribunal de Justiça STJ e no Supremo Tribunal Federal STF No âmbito do STJ foram encontrados 30 acórdãos relevantes sendo 27 provenientes de provocação da defesa e apenas 3 do Ministério Público Nos casos em que a defesa acionou o STJ o objetivo era a aplicação do art 478 do CPP para anular o julgamento realizado pelo Tribunal do Júri tendo obtido êxito em apenas 2 dessas situações Por outro lado nos 3 recursos especiais manejados pelos ministérios públicos estaduais a intenção era justamente o afastamento da aplicação do art 478 do CPP tendo sido providos 2 desses recursos Ao se analisar os motivos da apontada violação ao art 478 do CPP nos casos apresentados pelas defesas verificouse 12 menções à referência da pronúncia eou de decisões confirmatórias da pronúncia 1 sobre o silêncio do acusado 4 acerca da decisão que decreta a preventiva eou a mantém por meio da denegação de habeas corpus 9 sobre os antecedentes criminais do réu ou de outros processos ainda em curso 1 de acórdão que anulou a primeira sessão plenária para determinar outra e 2 apontamentos que se referiam à ausência do réu e ré no julgamento outras referências feitas no curso dos debates pelos ministérios públicos também foram levadas a julgamento no STJ como a menção ao cargo de promotor de justiça aos policiais presentes e à decisão proferida no protesto por novo júri Quanto aos 3 julgados do STJ obtidos após provocação dos ministérios públicos estaduais verificouse que estes tinham o objetivo de afastar o reconhecimento pelos tribunais de origem da nulidade do julgamento realizado pelo Tribunal do Júri em razão de argumento vedado utilizado pela acusação Nesse sentido no REsp 1859706RS e no REsp 1194933AC o STJ deu provimento aos recursos ministeriais para restabelecer a sentença condenatória afastando a nulidade reconhecida já no REsp 1299809RS o STJ negou provimento ao recurso do Ministério Público mantendo a nulidade decorrente da utilização do silêncio do réu em seu prejuízo Em relação aos julgados do Supremo Tribunal Federal a pesquisa resultou em 4 acórdãos relevantes todos rejeitando os pedidos das defesas de nulidade por violação do art 478 do CPP portanto nessas decisões o STF interpretou o artigo de forma restritiva entendendo que não houve uso de argumento de autoridade e que não ficou comprovado o prejuízo Contudo há um julgado isolado da 5ª Turma do STJ RHC 94434RS que proibiu a menção aos antecedentes do réu na sessão plenária do Tribunal do Júri por entender que perpetuaria o Direito Penal do Autor Diante desse aparente antagonismo jurisprudencial o autor conclui que i são raríssimos os casos de reconhecimento da nulidade com base no art 478 do CPP ii a aplicação dessa norma foi buscada apenas pela defesa iii os recursos do Ministério Público visavam afastar essa aplicação iv o STJ e STF interpretam o artigo de forma restritiva v não houve aprofundamento sobre o conceito de argumento de autoridade e a natureza jurídica da norma e vi a grande quantidade de decisões monocráticas revela a compreensão de que a matéria está sedimentada Esse julgado isolado da 5ª Turma do STJ apesar de não ser suficiente para abalar a jurisprudência consolidada em sentido oposto é visto como um respiro de esperança para que haja um reposicionamento jurisprudencial acerca do alcance do art 478 do CPP que pode e deve ser interpretado extensivamente sob o prisma teleológico Um Breve Panorama da Doutrina Brasileira Uma parcela relevante da doutrina se mostra crítica à previsão do art 478 do CPP o renomado autor Guilherme de Souza Nucci por exemplo entende que a inserção desse artigo pela Lei nº 116892008 não lhe pareceu acertada além de compreender que o seu rol de condutas vedadas é taxativo e pior insensato Para Nucci as partes devem ser absolutamente livres em plenário no tocante às argumentações construídas de modo que a menção pelo acusador à periculosidade do réu ou pelo defensor ao bom caráter do acusado não pode gerar nulidade O autor afirma que a previsão do art 478 apenas dará chance a quem quiser plantar nulidades permitindo a anulação de julgamentos difíceis complexos e custosos com base em algumas frases Na mesma linha de entendimento o professor Walfredo Cunha Campos também critica a existência de limites no conteúdo dos debates por meio do art 478 do CPP considerando essa norma como restritiva de direitos e portanto passível de interpretação restritiva Para Campos a leitura em plenário do Júri dos antecedentes criminais do acusado da decisão que decretou a prisão preventiva da rejeição inicial da denúncia dentre outras peças processuais não deve ser vedada podendo as partes livremente utilizálas como argumento de autoridade ele ainda entende que o dispositivo é inconstitucional por violar a liberdade de expressão e a competência constitucional do Júri Por outro lado em contraponto a essa posição o professor Aury Lopes Jr critica a interpretação jurisprudencial restritiva atribuída ao art 478 do CPP afirmando que ela busca salvar uma prática que deveria ter sido abolida na reforma de 2008 o uso pelo Ministério Público da decisão de pronúncia ou do direito de silêncio do acusado para Lopes Jr tais referências configuram claramente argumento de autoridade que influencia indevidamente os jurados leigos de modo que a simples constatação dessa situação deve ensejar a anulação do júri independentemente da comprovação de prejuízo efetivo Em sentido diverso os professores Gustavo Badaró e Mário Henrique Ditticio entendem que o rol previsto no art 478 do CPP não é taxativo podendo abranger outras situações em que haja indução indevida do convencimento dos jurados como a referência a acórdãos que fazem valorações sobre a culpabilidade ou periculosidade do réu Segundo essa vertente doutrinária qualquer argumento das partes que possa influenciar de forma falaciosa o convencimento dos jurados deve ser considerado vedado mesmo que não esteja expressamente previsto nos incisos do dispositivo Portanto verificase que não há unanimidade na doutrina acerca da correta interpretação do art 478 do CPP Enquanto alguns autores defendem uma leitura restritiva da norma outros propugnam uma compreensão mais ampla e protetiva do livre convencimento do Conselho de Sentença essa diversidade de posicionamentos reflete a complexidade e relevância do tema que envolve o delicado equilíbrio entre a liberdade de atuação das partes no Tribunal do Júri e a preservação da imparcialidade do julgamento pelos jurados leigos A ausência de um entendimento consolidado demonstra a necessidade de um aprofundamento do debate doutrinário e de uma interpretação sistemática e teleológica dessa importante regra processual O Tribunal do Júri na Constituição Federal de 1988 A Constituição Federal de 1988 em seu art 5º XXXVIII assegurou a plenitude de defesa como uma das garantias fundamentais do Tribunal do Júri essa garantia exige um aprofundamento teórico específico o qual será o foco da análise neste estudo A plenitude de defesa no Tribunal do Júri está diretamente relacionada à ampla liberdade de atuação das partes em especial da defesa durante os debates em plenário essa liberdade abrange a possibilidade de utilização de quaisquer argumentos e estratégias de convencimento dos jurados leigos desde que respeitados os limites éticos e legais A interpretação e a aplicação dessa garantia constitucional portanto são fundamentais para compreender os desafios e as controvérsias envolvendo o art 478 do Código de Processo Penal que busca estabelecer determinadas restrições ao conteúdo dos debates no Tribunal do Júri A Plenitude da Defesa A Constituição Federal de 1988 em seu art 5º XXXVIII assegurou a plenitude de defesa como uma das garantias fundamentais inerentes ao Tribunal do Júri essa previsão constitucional representa uma inovação em relação ao texto da Carta Magna anterior que simplesmente mencionava a ampla defesa sem qualquer distinção terminológica A diferenciação semântica entre plenitude e ampla defesa foi deliberada pelo constituinte originário e não pode ser ignorada conforme destaca a doutrina a plenitude de defesa possui um significado mais abrangente e qualificado do que a mera ampla defesa assegurada em geral nos processos judiciais e administrativos Nesse sentido o professor Guilherme de Souza Nucci observa que a plenitude de defesa tem maior altitude do que a ampla defesa justamente por se realizar no contexto do Tribunal Popular no qual o juiz leigo não está submetido às mesmas garantias técnico jurídicas exigidas dos magistrados togados Podese afirmar portanto que a plenidade de defesa é considerada a alma do Tribunal do Júri conformando e irradiando efeitos sobre todas as práticas e procedimentos inerentes a essa instituição tratase de uma garantia fundamental do acusado que serve inclusive como parâmetro de controle de constitucionalidade das normas que regem o rito do júri Nesse diapasão o professor Nereu José Giacomolli elenca diversas formas pelas quais a plenitude de defesa se manifesta no procedimento do júri tais como a retirada apenas das provas ilícitas incriminatórias a valorização da tese do réu mesmo que não sustentada pelo defensor técnico a interpretação restritiva de limites temporais dos debates o reconhecimento de circunstâncias agravantes apenas quando descritas na denúncia dentre outras Além disso é importante compreender que a plenitude de defesa não se dirige apenas aos advogados e defensores públicos que atuam tecnicamente na defesa do acusado tratase na verdade de uma garantia que impõe determinadas ações e abstenções também ao Estado juiz e ao Estadoacusação visando permitir o pleno desenvolvimento da linha de defesa no procedimento do júri Nesse contexto a interpretação do art 478 do Código de Processo Penal que estabelece restrições argumentativas no âmbito do Tribunal do Júri deve necessariamente levar em conta a garantia constitucional da plenitude de defesa isso porque essa garantia fundamental conforma e limita a aplicação de tais vedações de modo que elas impactem de forma distinta as duas partes do processo penal Portanto a compreensão da plenitude de defesa como paradigma interpretativo do art 478 do CPP é fundamental para que haja um reposicionamento jurisprudencial voltado a respeitar essa garantia constitucional evitandose interpretações restritivas que acabem por esvaziála indevidamente Plenitude da Defesa e Interpretação Extensiva dos Argumentos Vedados do Art 478 do CPP A interpretação constitucional da plenitude de defesa deve partir do reconhecimento de que se trata de uma garantia fundamental de natureza aberta indeterminada e porosa ao intérprete conforme destaca a doutrina os direitos e garantias fundamentais notadamente quando positivados na Constituição possuem essa característica de permitir a solução de conflitos no caso concreto e a sua adequação ao contexto em que estão inseridos Nesse sentido a professora Jane Reis Gonçalves Pereira elucida que a interpretação dos direitos fundamentais é um campo fértil para a criação judicial justamente em razão dessa abertura e indeterminação normativa Essa noção se torna ainda mais evidente quando se trata de interpretação constitucional na qual a abertura e a indeterminação normativa são mais comuns demandando que o trabalho de densificação do sentido seja feito pelo operador jurídico Os doutrinadores Gilmar Ferreira Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco também destacam que a interpretação orientada à aplicação das normas constitucionais não pode se limitar à mera análise sintática do texto devendo considerar os fatos que compõem a realidade a ser regulada afinal as normas constitucionais em especial aquelas definidoras de direitos e garantias fundamentais têm por vocação ordenar a vida social Partindo dessas premissas é possível afirmar que a plenitude de defesa enquanto garantia constitucional assegurada expressamente no art 5º XXXVIII da Constituição Federal possui eficácia e aplicabilidade imediatas não dependendo de regulamentação infraconstitucional para lhe atribuir normatividade integral isso decorre da conjugação dos princípios da força normativa da Constituição da máxima efetividade e da aplicação imediata das normas definidoras de direitos e garantias fundamentais art 5º 1º da CF Estabelecidas tais premissas tornase possível analisar a relação entre a garantia da plenitude de defesa e o art 478 do Código de Processo Penal que estabelece vedações argumentativas no âmbito do Tribunal do Júri Mesmo na ausência dessa previsão legal é possível extrair de forma implícita limites argumentativos acusatórios decorrentes diretamente da plenitude de defesa da presunção de inocência e do devido processo legal Afinal o processo penal brasileiro exige que a Acusação formule suas argumentações dentro dos limites da denúncia e com base em provas de autoria e materialidade não podendo se valer de estratagemas que visem a complementar a insuficiência probatória tais como referências a antecedentes criminais ao silêncio do réu às algemas à prisão cautelar entre outros Nesse contexto o art 478 do CPP representa de forma exemplificativa algumas dessas vedações argumentativas direcionadas à Acusação tratase portanto de uma norma infraconstitucional que visa a assegurar direitos do cidadão em face do Estadoacusação e não uma norma restritiva de direitos Por outro lado para a Defesa as vedações previstas no art 478 do CPP devem ser interpretadas de forma taxativa e em conformidade com a garantia da plenitude de defesa isso porque não há na Constituição Federal um regime de plenitude de acusação mas sim de defesa Assim argumentos da Defesa que não violem a presunção de inocência e o devido processo legal ainda que meramente retóricos ou de natureza sociológica devem ser admitidos pois estão abarcados pela garantia constitucional da plenitude de defesa Essa compreensão se coaduna inclusive com a possibilidade de absolvição por clemência no Tribunal do Júri ainda que desprovida de vínculo direto com as provas de autoria e materialidade Afinal se a maioria dos jurados pode por opção política absolver o réu não se pode considerar ilícito que a Defesa apresente argumentos diversos desde que não violem garantias fundamentais Todavia é importante ressaltar que a plenitude de defesa assim como outras garantias constitucionais não é absoluta ela pode eventualmente ser ponderada com outros valores e direitos também protegidos pela Constituição tal como demonstrado no julgamento da ADPF 779 pelo Supremo Tribunal Federal que vedou a invocação da legítima defesa da honra nos crimes de feminicídio Portanto a interpretação do art 478 do CPP deve ser realizada à luz da garantia constitucional da plenitude de defesa de modo a resguardar os direitos e prerrogativas do acusado no âmbito do Tribunal do Júri Contudo essa interpretação não pode desconsiderar a necessidade de ponderação com outros valores constitucionais evitandose uma compreensão excessivamente ampla e irrestrita dessa garantia fundamental Suposta Inconstitucionalidade do Art 478 do CPP Como visto anteriormente há entendimentos que sugerem a eventual inconstitucionalidade do art 478 do CPP sob o argumento de que as partes deveriam estar em posição de argumentar livremente nos tribunais do júri sem qualquer limitação imposta pela lei No entanto o estudo realizado conduz a uma compreensão diversa no sentido de que o referido dispositivo legal é de fato constitucional para fundamentar essa posição é importante retomar a natureza do art 478 do CPP como uma norma garantidora de direitos do réu em face do Estadoacusação representado pelo Ministério Público no Tribunal do Júri Nesse sentido os doutrinadores Dimoulis e Martins esclarecem que os órgãos estatais por sua natureza não são titulares de direitos fundamentais eles exercem suas competências e adquirem direitos por determinação constitucional legal ou contratual mas não derivam diretamente das normas definidoras de direitos fundamentais Assim o art 478 do CPP não viola a liberdade de expressão da Acusação pois essa liberdade é uma prerrogativa individual não inerente à pessoa jurídica de direito público que é o Ministério Público É o Estado por meio do integrante da instituição ministerial que se apresenta no Tribunal do Júri e não a pessoa física dotada de direitos fundamentais individuais Além disso as vedações estabelecidas no art 478 do CPP não atingem a liberdade de expressão do réu uma vez que se direcionam especificamente aos argumentos acusatórios não aos argumentos de defesa destarte a garantia da plenitude de defesa pilar do Tribunal do Júri está precisamente voltada à proteção dos direitos e prerrogativas do acusado Ainda é importante ressaltar que o art 478 do CPP possui respaldo constitucional nas garantias da plenitude de defesa e da presunção de inocência conforme a análise desenvolvida anteriormente a plenitude de defesa implica não apenas faculdades atribuídas ao réu mas também limites e abstenções por parte do Estadoacusação Dessa forma as vedações argumentativas previstas no art 478 do CPP ao impedirem que a Acusação se valha de estratagemas e argumentos desvinculados das provas de autoria e materialidade estão em conformidade com a garantia constitucional da plenitude de defesa e da presunção de inocência tratase portanto de uma norma materialmente constitucional que visa a preservar os direitos fundamentais do acusado no âmbito do Tribunal do Júri Importante ressaltar no entanto que a própria plenitude de defesa assim como outras garantias constitucionais não pode ser compreendida de forma absoluta ela admite eventualmente ponderação com outros valores e direitos também protegidos pela Constituição Federal tal como demonstrado no julgamento da ADPF 779 pelo Supremo Tribunal Federal que vedou a invocação da legítima defesa da honra nos crimes de feminicídio Portanto a partir da análise realizada concluise que o art 478 do Código de Processo Penal não padece de inconstitucionalidade seja por violação à liberdade de expressão da Acusação seja por restrição indevida aos argumentos de Defesa Tratase na verdade de uma norma que se harmoniza com a garantia constitucional da plenitude de defesa e da presunção de inocência resguardando os direitos fundamentais do acusado no âmbito do Tribunal do Júri Essa interpretação no entanto não significa uma compreensão absolutista da plenitude de defesa devendose proceder à necessária ponderação com outros valores constitucionais sempre visando à preservação dos direitos e garantias fundamentais em sua máxima efetividade Conclusão Feita a análise detalhada podese concluir que o art 478 do Código de Processo Penal é uma norma constitucional que se harmoniza com a garantia fundamental da plenitude de defesa assegurada pela Constituição Federal Primeiramente o art 478 do CPP deve ser compreendido como uma norma que visa a proteger os direitos e garantias do acusado no âmbito do Tribunal do Júri não representando portanto uma violação à liberdade de expressão do órgão acusatório Isso porque o Estadoacusação representado pelo Ministério Público não é titular de direitos fundamentais individuais atuando em nome do interesse público e não de uma esfera de direitos próprios além disso as vedações argumentativas previstas no art 478 do CPP não atingem a liberdade de expressão do réu pois se direcionam especificamente aos argumentos acusatórios preservando assim a garantia da plenitude de defesa Por fim a constitucionalidade do dispositivo legal encontra respaldo nas próprias garantias constitucionais da plenitude de defesa e da presunção de inocência uma vez que tais vedações impedem que a Acusação se valha de estratagemas e argumentos desvinculados das provas de autoria e materialidade Portanto concluise que o art 478 do Código de Processo Penal é uma norma materialmente constitucional alinhada com a proteção dos direitos e garantias fundamentais do acusado no âmbito do Tribunal do Júri não configurando qualquer violação à liberdade de expressão essa compreensão no entanto não significa que a plenitude de defesa seja uma garantia absoluta devendo ser ponderada com outros valores e direitos constitucionais sempre visando à preservação dos direitos fundamentais em sua máxima efetividade PALAVRAS CHAVE Plenitude da Defesa Tribunal do Júri Liberdade de Expressão Constitucionalidade e Argumentação

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