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JOHN THORNTON A ÁFRICA E OS AFRICANOS NA FORMAÇÃO DO MUNDO ATLÂNTICO 1400 1800 A ÁFRICA E OS AFRICANOS NA FORMAÇÃO DO MUNDO ATLÂNTICO 1400 1800 Coordenação Editorial Mary Del Priore Tradução Marisa Rocha Motta Revisão Técnica Márcio Scalercio Professor Titular da Universidade Candido Mendes Professor do Departamento de Economia da PUC Rio Do original Africa and Africans in the Making of the Atlantic World 14001800 Tradução autorizada do idioma inglês da edição publicada por The Press Syndicate of the University of Cambridge Copyright 1992 1998 by John Thornton 2004 Elsevier Editora Ltda Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9610 de 190298 Nenhuma parte deste livro sem autorização prévia por escrito da editora poderá ser reproduzido ou transmitida sejam quais forem os meios empregados eletrônicos mecânicos fotográficos gravação ou quaisquer outros Copidesque Ivone Teixeira Editoração Eletrônica DTPhoenix Editorial Revisão Gráfica Roberto Mauro Facce Projeto Gráfico Elsevier Editora Ltda A Qualidade da Informação Rua Sete de Setembro 111 16º andar 20050006 Rio de Janeiro RJ Brasil Telefone 21 39709300 Fax 21 25071991 Email infoelseviercombr Escritório São Paulo Rua Elvira Ferraz 198 04552040 Vila Olímpia São Paulo SP Telefone 11 38418555 ISBN 8535212841 Edição original ISBN 0521627249 CIPBrasil Catalogaçãonafonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros RJ T414a Thornton John Kelly 1949 A África e os africanos na formação do mundo Atlântico 14001800 John Thornton tradução de Marisa Rocha Mota Rio de Janeiro Elsevier 2004 il Tradução de Africa and africans in the making of the Atlantic world 14001800 2nd ed ISBN 8535212841 1 Escravidão 2 África Relações Europa 3 Europa Relaões África 4 África Relações América 5 América Relações África 6 Europa História 14921648 I Título CDD 303482 CDU 316421 031728 5 4 3 2 1 04 05 06 07 Sumário Prefácio à 2ª edição 7 Abreviações 9 Mapas 10 Notas dos mapas 13 15 Introdução 41 Parte I Os africanos na África 51 1 O nascimento do mundo atlântico 53 2 O desenvolvimento do comércio entre europeus e africanos 87 3 A escravidão e a estrutura social na África 122 4 O processo de escravidão e o comércio de escravos 153 Parte II Os africanos no Novo Mundo 187 5 Os africanos nas sociedades coloniais do Atlântico 189 6 Os africanos e os afroamericanos no mundo atlântico vida e trabalho 216 bre a América do Norte Até conhecer bem a documentação primária não me sentia confiante em alcançar meus objetivos originais Fiquei surpreso ao ver que o livro foi amplamente adotado mais como um livro didático do que uma simples obra de referência para acadêmicos como havia esperado Muitos colegas que usavam o livro em suas aulas no entanto objetavam que seu foco cronológico limitado não lhe conferia real valor como um texto instrutivo em especial nos cursos sobre os Estados Unidos Embora reconhecendo minha alegação de que não conseguiria pesquisar uma documentação tão extensa de fontes primárias até o século XVIII meus colegas me encorajaram a tentar estendêlo cronologicamente para valorizálo como material didático Ao considerar essas ponderações meus interesses de pesquisa começaram a enfocar o século XVIII e à medida que me sentia mais confortável nesse período decidi que poderia escrever um novo capítulo sobre esse século O resultado é esta edição Com o acréscimo desse capítulo substancial à edição inalterada de 1992 esperase que o livro se torne mais proveitoso como uma introdução geral sobre o papel dos africanos no mundo atlântico à época do comércio de escravos Assim como a versão final da edição de 1992 não alcançou minha meta original de utilização compreensível de fontes primárias o capítulo final desta edição também não o fez nem mesmo atingiu os padrões da 1ª edição Apóiase muito mais em material secundário para partes importantes do tema embora ainda utilizando alguma documentação primária em questões nas quais eu fizera pesquisa complementar Espero que essa solução conciliatória realce o valor do livro como uma obra de referência e instrumento didático Abreviações ANTT Arquivo Nacional da Torre do Tombo Lisboa ARSI Archivum Romanum Societatis Iesu Roma BIFAN Bulletin Institut fondamental de lAfrique Noire Dakar BM Rouen Bibliothèque Municipale de Rouen BN Colômbia Biblioteca Nacional da Colômbia BSGL Biblioteca da Sociedade de Geografia de Lisboa MMA António Brásio ed Monumenta missionaria africana series 1 15 vols Lisboa 195288 MMA² António Brásio ed Monumenta missionaria africana series 2 5 vols Lisboa 195879 PRO Public Record Office Londres UBLBPL Universitets Bibliotek Leiden Biblioteca Publica Latina Nota da editora Nesta edição ao transcrever os nomes próprios de origem africana sobretudo topônimos e gentílicos procuramos utilizar a grafia adotada pelo africanista Alberto da Costa e Silva em seu clássico A manilha e o libambo Nova fronteira 2002 consultandose ainda os principais dicionários gerais da língua portuguesa e o Vocabulário onomástico da língua portuguesa ABL 1999 Os nomes próprios não encontrados nessa bibliografia foram mantidos na forma original 9 Prefácio à 2ª edição Quando comecei a escrever este livro em 1984 imaginei que estaria realizando um trabalho com um razoável nível de especialização para acadêmicos e alguns leigos interessados na inserção da África no esquema braudeliano da história atlântica que me inspirara Para mim seria um livro de referência para historiadores nãoafricanistas e se basearia em grande parte em uma leitura minuciosa de fontes primárias Com esse objetivo originalmente ele cobrira o período até 1650 o limite no qual eu conseguiria lidar com as fontes de forma compreensível e se restringiria à África área de minha especialidade De fato o primeiro esboço do livro tinha só um breve capítulo sobre a contrapartida americana Gradativamente persuadime de que o livro seria mais útil se fosse mais ambicioso e ao tomar forma na edição publicada em 1992 acrescentei uma seção mais extensa e elaborada sobre as Américas no lugar do capítulo original Estendi também o período para 1680 em razão de ter poucos porém importantes fatos para relatar sobre os primórdios da América do Norte colonial Ao expandir os limites territoriais e temporais do livro reconheci com vagar e relutância que nunca poderia lidar com as fontes primárias de forma compreensível em especial sobre o lado americano do oceano Entretanto ainda tinha o projeto de pesquisar a fundo uma grande amostra de fontes primárias como uma meta mesmo sobre as Américas Por essa razão pus à parte sugestões de que o livro ficaria melhor se se estendesse até 1800 sobretudo porque me permitiria escrever mais so 7 ESTADOS DA ÁFRICA OCIDENTAL 1625 África área no mapa States 6 Arrinze 7 Talapo 8 Tabaco 9 Bajudo 10 Buana 11 12 13 Mansa 16 17 Map 1 Ver Notas dos mapas 13 ESCALA DE MILHAS 0 50 100 Informação insufficiente Muito pequenos estados ESTADOS ACÁ África área no mapa ESTADOS ACÁ Mapa 2 Ver Notas dos mapas 13 ESTADOS DA ÁFRICA CENTRAL 1625 África área no mapa ESCALA DE MILHAS 0 100 200 300 Mapa 3 Ver Notas dos mapas 13 DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO DE ORIGEM AFRICANA NAS AMÉRICAS 1650 Noroeste do México Nova Amsterdã Chesapeake Florida espanhola Caribe espanhol Caribe francês Barbados Tierra Firme Suriname Paraiba Bahia Ilhéus Espírito Santo São Paulo São Vicente Rio de Janeiro Buenos Aires Chile Tucumã Arequipa Pisco Lima Trujillo Potosi Peru Pernambuco Saragoça Antioquia Cartagena Panama Popoyan Guatemala Honduras PueblaOaxaca Vale do México Vera Cruz Número de escravos africanos ou de afrocrioulos 04999 500014999 superior a 15000 controle efetivo da Europa Mapa 4 GRUPOS CULTURAIS AFRICANOS Alta Guiné Berbisi Baion Falupo Cazanga Brar Bioho Biafara Jalofo Fulo Mandinga Fula Fula Mandinga Lozo Zé Mandinga Nalu Cocoti Boulon Sape Sonnigue GRUPOS CULTURAIS Oeste do oceano Atlântico grupo da região Norte Oeste do oceano Atlântico grupo da região Sul Mande Oeste de Kwa AkanEweGa Leste de Kwa IorubaEdoIgbo Oeste de Bantu fronteira dos grupos culturais África área no mapa Lucumi Arda Popo Bini Gàlabare Particular Calabare Puro Angico Congo Matamba Ndala Malemba Koromanti Guere Angola Mapa 5 Notas dos mapas 13 INFELIZMENTE MUITOS AFRICANISTAS PRODUZEM MAPAS da geografia précolonial sem referências adequadas para se estabelecer com precisão o modo pelo qual as fronteiras das unidades foram documentadas Os mapas apresentados neste livro resultaram de uma vasta pesquisa e portanto requereram uma documentação considerável aqui descrita A tarefa de definir os limites geográficos dos estados da África précolonial é difícil sobretudo em virtude da natureza da fonte documental Em algumas regiões a documentação especifica certos marcos divisórios que separam um estado de outro mas em geral a informação geográfica é bastante vaga Esse fato explica a convenção amplamente difundida de situar nomes em mapas sem tentar precisar as fronteiras convenção que tem algum mérito Por outro lado em muitos casos a tentativa de delimitar as fronteiras dá uma impressão errônea de que a precisão é possível Entretanto a determinação dos limites geográficos mesmo se de forma arbitrária ou inexata pode ajudar a estimar a área ou a população dos estados em questão As fronteiras dos mapas aqui citados são demarcadas simplesmente como uma conveniência para o leitor além de mostrar as áreas utilizadas para estimar a população dados que constam do final do livro Com o objetivo de justificar minhas decisões relacionei um conjunto de nomes de estados nos mapas com registros de entradas de fontes para cada um da cordilheira de Futa Jalom Almada Tratado breve MMA2 33445 Ao norte de acordo com Almada ele fazia limite com Fulas 3348 presumivelmente a província do sul do Fulas de Futa Jalom Sandoval descreve o governante concho como um imperador Alonso de Sandoval Naturaleza de todos Etiopes Sevilha 1627 ed atualizada Angel Valtierra Instauranda Etiopia salute El mundo del esclavitute negra em America Bogotá 1957 p 62 e Barreira observou que ele tinha setee reis abaixo dele inclusive o governante de Bena que se converteu ao cristianismo Barreira para Alvares 1º de agosto de 1606 MMA2 4169 O estado de Concho parece ter incluído os Yalunkas do sul da cordilheira de Futa Jalom chamados de jalongas por Almada 3353 porque Sandoval os intitulava Zape Yalunka chamados Zozo Instauranda p 62 o que indica que Concho também chamado Sosso tinha hegemonia sobre um grupo de Yalunka com algumas afinidades com o povo da costa Sapes 13 Mane Sapes Sumbas Este era o maior reino estabelecido em Serra Leoa pelas invasões do Mane aproximadamente em 1545 Fontes contemporâneas o descrevem como tendo uma organização hierárquica e Almada especifica que todos os reis tinham de pagar tributos marefa para um governante chefe situado em algum lugar ao sul p 164 que Hair sugeriu que poderia ser a região de cabo Mount ou o reino de Kqoja ver anotação da edição de Hair de Almada notas 164 e Adam Jones Who Were the Vai Journal of African History 22 1981 15978 Com base nessas informações defini o reino de Mane como uma só unidade Situei seus limites geográficos ao oeste do rio St Paul assim como Folgia e Manou subunidades mencionadas por Olifert Dapper Naukeurige beschrijvinge der Afrikaensche gewesten 2ª ed Amsterdã 1676 p 42 aparentemente localizadas nesta direção mas a leste das cadeias de montanhas que alcançavam quase a costa nesta região ver também o mapa em Jones Who Were the Vai pp 1601 172 Os limba mencionados por Almada como tendo resistido com sucesso aos ataques do Mane em 1594 3353 são descritos entre os reinos subordinados ao Mane por Donelha em 1625 Descrição da Serra Leoa fol 1111v Porém aqui eles são considerados independentes 14 Limba São mencionados mais especificamente no interior da costa de Bullom Almada Tratado breve MMA2 3353 Hair os identifica com o moderno limba e seu mapa orientou minha localização na edição de Donelha Descrição da Serra Leoa fig 13 Países do interior do Sudão ocidental 15 Mali Apesar de suas perdas territoriais no final do século XV e início do século XVI para Songai no norte e para Grande Fulo no final do século XVI no oeste Mali tinha ainda um poder considerável em 1600 ano após a tentativa malsucedida de Mahmud IV de dominar Jené Abd alRahman b Abd Allah alSadi Tarikh alSudan ed atualizada Olivier Houdas e E Benoist traduzido para o francês por Olivier Houdas 2 vols Paris 18981900 p 279 todas as referências são da tradução francesa volume 2 que permaneceu sob o domínio do Marrocos Suas províncias ocidentais Gabu Uli Concho e Kokoli são mostradas aqui como tendo se libertado embora Donelha ainda descreva o império com pelo menos um significado simbólico Descrição da Serra Leoa fol 16 mas essa premissa talvez tenha se baseado nas impressões iniciais de suas visitas no final do século XVI a Gâmbia A fronteira do sul de Mali é um completo mistério desenhei uma linha nos afluentes da bacia superior do Níger o suficiente para indicar que as terras produtoras de nozdecola citadas em Tarikh alFettash Muhammad b alHadjdj alMutakawakkil alKati completado por ibn alMukhtar Tarikh alFettash ed atualizada e traduzida para o francês Olivier Houdas e Maurice Delafosse Paris 191314 reimpressa em 1 vol Paris 1981 p 67 estavam sob seu domínio da metade ao final do século XVI Estendi suas fronteiras orientais até a cidade de Bigu muito em razão da referência no mapa ilustrativo de Marees supostamente desenhado em 1572 ver discussão em Ray Kea Settlements Trade and Politics on the Seventeenth Century Gold Coast Baltimore 1982 p 235 que mostra Incassa ou um país próximo como sob um cabessero do Elefante Grande nome acá do império de Mali segundo Almada Tratado breve MMA4 3278 Caso cabessero signifique um oficial designado então o controle administrativo de Mali no final do século XVI pode ser considerado plausível Wilks cita crônicas locais do início do século XVIII que sugerem uma ressurgência do domínio de Mali na área ao final do século XVI embora a exata natureza dessa evidência não seja clara e possa ser história oral variando de significado e interpretação Ivor Wilks Wangara Akan and Portuguese in the Fifteenth and Sixteenth Centuries I The Matter of Bitu Journal of African History 23 1982 3336 A demarcação do restante da fronteira oriental de Mali é arbitrária simplesmente dandolhe o controle da bacia superior do Níger 16 Masina Esse distrito compacto representa o território de Hamadi Amina um governante fula que cooperou e mais tarde foi traído no ataque de Mahmud IV em 1559 a Jenne alSadi Tarikh alSudan p 279 Apesar de ser um fula ele parece ter sido de Grande Fulo embora não seja impossível que tenha sido um simples governante do leste do império pois Wagadu fronteiriço a Masina que pode têlo dominado foi descrito no documento anônimo datado de 1600 Relacion y breve suma delas cosas del reyno del Gran Fulò em Avelino Teixeira da Mota Un document nouveau pour lhistoire des Peuls au Senegal pendant les XVème et XVIème siècles Boletim Cultural da Guiné Portuguesa 24 nº 96 1969 p 48 reimpresso Agrupamento de Estudos de Cartografia Antiga nº 56 Lisboa 1969 17 Pashalik marroquino A batalha de Tondibi em 1591 e a ocupação de Goa parecem ter dado aos marroquinos um poder indisputável na curva do Níger assimcomo sua ocupação posterior de Jené deulhes o domínio total do interior do delta do Níger Por outro lado a resistência em Dendi realizada por Askia Nuh claramente encerrou sua soberania em qualquer lugar nesta direção abaixo do Níger Presumi que eles tinham controle administrativo de todas as províncias de Songai que não contestavam seu domínio alSadi fornece detalhes das guerras à época que parecem ter definido esse limite geográfico Tarikh alSudan pp 22480 A Costa do Ouro a atual Gana mapa 2 A localização e a identificação da multidão de minúsculos estados da Costa do Ouro baseiamse em geral em duas fontes cartográficas a primeira delas o mapa ilustrativo de Marees de Luis Teixeira elaborado a partir de informações do final do século XVI e publicado em 1602 a segunda o mapa de Hans Propheet dos estados da Costa do Ouro mostrado em Mouree em 25 de dezembro de 1629 Essas fontes e outros documentos contemporâneos foram estudados cuidadosamente por Kea o qual tentou por sua vez identificar os estados e situálos em mapas elaborados por ele sem dúvida um valioso ponto de partida para a geografia política do século XVII na Costa do Ouro 18 Shabanda Xabanda No mapa de Teixeira logo abaixo de Elefante Grande ver entrada em Mali em um itinerário que conduz ao rio Tano rio Sueiro da Costa 19 Ushu Uxoo Situado no mesmo itinerário do mapa de Shabanda na curvatura do rio 20 Inkasa Igwiya Caceres Aguines Localizado no braço maior do mesmo rio e no mesmo itinerário já mencionado Provavelmente o mesmo que Incassa Iggijna do mapa de Propheet cf Kea Settlements p 74 que deu a grafia moderna 21 Aowin Famba No mesmo caminho mencionado anteriormente citado como Famba em fontes holandesas bem como portuguesas ibid 75 que fornece um nome atualizado 22 Asoka Bagno Localizado na foz e na parte leste do Tano no mapa de Teixeira Kea provê esse nome com base em fontes do século XVII ibid p 76 23 Labore Situado no lado oriental do rio Tano no mapa de Teixeira talvez costeando Famba Aowin nº 21 24 Wassa Localizado aproximadamente no meio entre os rios Tano e Ankobra no mapa de Propheet 25 Egwira Alderrada Groot Inkasser Situado próximo a Labore e Famba Aowin no itinerário do rio Tano de Teixeira a leste do rio Kea identifica dois locais no plano do rio Ankobra em Teixeira rio Mancu Parisom e Brum como subunidades desse Estado ibid p 81 26 Axim Situado por inúmeros documentos nesta localização na costa e pelo mapa de Propheet cf ibid p 26 27 Ampira Ampago A leste da foz do rio Ankobra no mapa de Teixeira As legendas no mapa indicam que ele foi confirmado com Alderrada Egwira sugerindo uma fronteira comum 28 Boennoe Segundo Propheet eles eram pessoas simples cuja terra não era florestal Citado aqui como referência aos seus vizinhos 29 Kwifero Situado de acordo com a posição de seus vizinhos no mapa de Propheet 30 Adom Semsee Situado conforme sua posição no mapa de Propheet Kea ibid p 81 cita a cidade de Semsee no itinerário de Ankobra mencionado por Teixeira como a capital do Estado 31 Ahanta Localizado na costa próximo ao cabo Three Points no mapa de Propheet 32 Cabo Three Points Descrito por Teixeira como desértico exibido sem comentários no mapa de Propheet 33 Sabeu Situado a oeste de um rio provavelmente o Pra no mapa de Propheet próximo a Comenda Commendo 34 Abrem Abramboe Localizado segundo seus vizinhos Comenda Commendo e Futu Futo na costa e Etsis Atji a leste com base no mapa de Propheet 35 Assin Acanes pequenos Akanij Kea descreveu sua localização com base em numerosas fontes entre elas os mapas de Teixeira e Propheet ver discussão em ibid pp 856 36 Etsis Atins Atij Tanto Propheet quanto Teixeira o situam no interior atrás de Futu ver também ibid pp 679 37 Comenda Comane Commendo Localização fornecida por Propheet e Teixeira 38 Futu Futo Affuto Localização fornecida por Propheet e Teixeira 39 Sabu Localização fornecida por Propheet e Teixeira 40 Fante Fantin Essa localização é indicada somente no mapa de PropheetTodos esses distritos costeiros de Comenda até Fante são descritos em numerosos documentos contemporâneos ver ibid pp 5764 41 Akwamu Abramboe Este povo descrito por Propheet como gatunos era fronteiriço a Akyem Eguafo e Acra segundo seu mapa 42 Akyem Ácanes grandes Akim Sua localização é discutida em detalhes em ibid pp 868 É mostrada nos mapas de Teixeira e Propheet 43 Acá Este território situase na parte nordeste de Akyem no mapa de Propheet Kea o identifica com Sekyere embora sem muita evidência ibid p 86 44 Tafo Tafoe Mencionado em fontes portuguesas mas não no mapa de Teixeira Aparece fazendo fronteira com Acá no mapa de Propheet ver ibid pp 1517 45 Abuna Abaans Bonoe Mencionado nas fontes portuguesas como situado na estrada para Tafo e aparece com esta localização no mapa de Propheet ibid pp 2632 46 Aguano Biambi Situado aqui nos mapas de Teixeira como Biambi e Propheet como Agwano com Biambi como uma de suas cidades fronteiriço a Acra 47 Acra Cracra Mostrado aqui nos mapas de Propheet e Teixeira além de bem descrito em fontes contemporâneas ibid pp 246 36 72 48 Latebi Latebij Situado por sua relativa localização no mapa de Propheet 49 Labidi Labidan Mostrado entre Acra e Ningo no mapa de Propheet 50 Ningo Faz fronteira com o Volta no mapa de Propheet Região do Golfo de Guiné nºs 5164 51 Popo Segundo Sandoval Instauranda p 16 Popo faz fronteira com o Volta e o Aladá Na sua época havia um pequeno Estado liberto chamado Fulao entre os dois p 77 Este mapa não o retrata pois os relatos de De Sandoval dão a impressão de que a independência fora bem recente A fronteira do interior é indeterminada De Sandoval só comenta que ele se estendia bastante para o interior embora isso não fosse indicado pela posição de sua capital um pouco afastada da costa 52 Aladá Ardra Axaraes Sandoval determina suas fronteiras entre Popo e Benim ibid p 16 as quais como veremos estendemse até a lagoa de Lagos Em outro local ele situou os Offons no território de Aladá ibid p 94 provavelmente o povo da parte ocidental ao final da lagoa de Lagos talvez aqueles associados com o que os tradicionalistas chamaram de reino de Weme ao longo do rio Weme Robin Law The Oyo Empire c 1600c 1836 Oxford 1997 p 154 156 Ele observou que o governante de Aladá residia a cerca de 336 km para o interior da região muito mais distante do que a cidade de Aladá bem localizada apenas alguns anos depois por Dapper Naukeurige beschrijvinge p 115 53 Sabe Lucumis Chabas Segundo Sandoval o território dos Lucumis fazia fronteira com Aladá na região do interior Instauranda p 16 e podemos afirmar com confiança que no século XVII os Lucumis eram falantes de iorubá cf Law Oyo Empire p 16 mas não necessariamente vassalos de Oió o maior estado iorubá Na verdade Sandoval distingue diversos tipos de Lucumis como os Lucumis Chabas evidentemente os de Sabe e os Lucumis Barbas presumivelmente de Bariba Borgu uma região de língua nãoiorubá à época mas talvez controlando algumas áreas de língua iorubá das quais escravos eram exportados para prover Sandoval de seus informantes A extensão e as fronteiras de Sabe mostradas aqui são conjecturas baseadas nas fronteiras tradicionais do país como relatadas no século XX ver Law Oyo Empire p 88 54 Ede Temnes não assinalado em mapas Sandoval menciona os Temnes como os povos que saíram de sua região costeira da África e encontrados entre aqueles de São Tomé Instauranda p 94 Isto pode referirse ao reino de Ede cujo governante tinha o título de Timi A tradição afirma que Ede era independente neste período cf Law Oyo Empire pp 358 55 Oió reino de Lucumi A extensão territorial do reino de Oió é assunto polêmico Relatos tradicionais aparentemente deste período sugerem que Oió tinha dificuldade em manter a ordem interna e sofreu invasão externa de Nupe e Borgu só emergindo no início do século XVII para se tornar o império significativo construído no final do século XVII Law Oyo Empire pp 3944 A presença de várias divisões de Lucumis no relato de Sandoval indica mas não prova uma pequena unidade com uma província sulista independente Ede e uma presença remanescente de Borgu isto é os Lucumis Barbas ver nº 53 Pode ter sido um reino de uma certa dimensão porém com pouco poder como sugere o trabalho de Ahmed Baba ao escrever em Tombuctu no início do século XVII argumentando que iorubá tinha legitimidade para escravizar O mapa tenta representar essa situação embora sem muito compromisso com as fronteiras ali desenhadas de acordo com o mapa de Law de Oió préimperial ibid p 35 mas mostrando Ede como independente e dando aos borgu presença nas cidades do norte as quais tradicionalmente eles teriam fundado cf ibid p 42 56 Benim Suas fronteiras na costa são fáceis de determinar Ulsheimer menciona em especial a ilha de Lagos como um posto de Benim e mostra seu exército ativo na região ao redor em 1601 Andreas Ulsheimer Varhaffte Beschreibung ettlicher Raysen in Europa Africa Ostindien und America 1616ed atualizada traduzida para o inglês em Adam Jones Brandenburg Sources for West African History 15591669 fols 3232b Sandoval sugere fronteiras similares ao longo da laguna no leste Instauranda p 78 enquanto assinala que pelo menos uma parte da margem norte da lagoa estava sob o domínio de Ijebu nº 57 A leste Sandoval o situa fronteiriço a Warri Instauranda p 17 mas seus limites geográficos no interior não são descritos exceto em relação a outros reinados cujas fronteiras são igualmente incertas Tracei os limites no interior com base naqueles registrados se bem que em período posterior por R E Bradbury Benin Studies Oxford 1973 pp 4475 57 Ijebu Iabu Gabu Jabboe Sandoval o situa entre Benim e Aladá na laguna de Lagos onde existe uma cidade murada circundada por um fosso Instauranda p 78 segundo outras localizações no século XVI e a de Dapper bem como a cidade moderna com o mesmo nome 58 Warri Oeri Guere Sandoval o situa a leste de Benim ibid p 17 É mostrado aqui de acordo com dados mais específicos da metade do século XVII em Dapper Naukeurige beschrijvinge p 133 e em Bonaventura da Firenze Como entrò la Fede di Giesu Christo nel Regno dOuere per la Prima Volta publicado em Vittorio Salvadorini Le missioni a Benin e Warri nel XVII secolo La relazione inedita di Bonaventura da Firenze Milão 1972 fols 8v10 1515v 59 Zarabu Um Estado que se dizia ocupado por canibais localizado além de Warri segundo Sandoval Instauranda p 17 60 Ijó Jos Este estado não foi mencionado por Sandoval um bom informante nesta área mas em razão de sua presença ter sido citada no século XVI e ao final do século XVII parece seguro continuar a situálo aqui neste período Não é impossível que ele tenha sido subjugado por Benim nessa época e assim ter desaparecido como uma entidade independente 61 Calabar Caravalies puros Uma idéia geral de sua localização é dada por Sandoval Instauranda p 17 que os descreve para além de Zarabu dados mais específicos são encontrados em Dapper Naukeurige beschrijvinge p 133 62 Igbos Caravalies particulares Sandoval descreve um grupo que vive perto dos caravalies puros mas que não o são o qual vivia em 40 a 50 vilarejos independentes aldeas eles não reconheciam um rei porém lutavam constantemente pertenciam a diferentes castas y naçiones comercializavam com os caravalies puros vendiam com freqüência suas mulheres e crianças como escravos e eram todos canibais Instauranda p 17 Em outra passagem ele fornece os nomes de 17 desses grupos alguns deles do grupo linguístico igbo abalom o bila cubai coco cola dembe done evo ibo ido mana moco oquema ormapri quereca tebo teguo ibid p 94 Não tentei localizar lugares individuais mesmo nesse grupo de 17 e os agrupei todos juntos no mapa 63 Igala Agare Segundo Sandoval um dos países que circundavam Benim e tido por Nupe e Benim como seu imperador Instauranda p 17 64 Nupe Mosiaco Lycosagou Isago Citado por Sandoval ibid sob o nome de Mosiaco que parece concordar com a denominação de Pacheco Pereira Lycosagou e de Dapper Isago como um dos reinos que circundavam Benim ao norte Suas fronteiras supostamente contatavam Oió nº 55 e Benim nº 56 mas é ainda algo muito aproximado Para mais detalhes ver John Thornton Traditions Documents and the IfeBenin Relationship History in Africa 15 198835162 Região da Nigéria central nºs 6583 65 Songai Remanescente de um grande império sob o domínio de Askia Nuh que lutou contra o Marrocos durante a invasão de 1591 alSadi Tarikh alSudan pp 22480 66 Mossi A análise de Izard sugere que os mossi conhecidos durante o século XVI nas crônicas sudanesas situavamse ao norte da zona de Mossi perto de Songai e tiveram ao menos uma certa presença ao longo do Níger em tempos mais antigos M Izard The Peoples and Kingdoms of the Niger Bend and the Volta Basin from the 12th to the 16th Century General History of Africa 421116 2259 Entretanto sua conclusão é de que o ataque de Songai aproximadamente em 1575 alSadi Tarikh alSudan pp 168 173 179 o destruiu parece não ser confirmada e o mapa mostra um país bem significativo reerguendose depois da queda de Songai 67 Gurma Sua localização é inferida de passagens das Chronicles Tarikh alFettash pp 1345 mas seu tamanho não pode ser definido as fronteiras são meras conjeturas e fixadas com base em estados vizinhos 68 Kabi Cabi Guangara Kabi desfrutou um breve período de superioridade militar na metade do século XVI até mesmo com ataques na maioria dos estados de Hausa e Air Giovanni Lorenzo Anania o descreveu tanto como Guangara quanto Cabi e observou que seu governante era rico e poderoso e comportavase como um imperador La universal fabrica del mondo trecho sobre a África publicado em uma edição crítica a partir de edições de 1573 1576 e 1582 por Dierick Lange e Silvio Berthoud Lintérieur de lAfrique occidentale daprès Giovanni Lorenzo Anania Journal of World History 14 1972336 e 336b ver também Mervyn Hiskett The Development of Islam in West Africa Londres e Nova York 1984 mapa p 90 69 Borgu Barba Bariba Aparentemente um estado militar ativo que devia estar próximo a Songai pois foi atacado em uma invasão a Songai em 1576 alSadi Tarikh alSudan p 179 No sul era agressivo com Oió ver nº 55 e ocupou diversos distritos ao norte no país iorubá onde Sandoval os conheceu como Lucumis Barbas Essas fronteiras mostram que ele se constituía em uma única unidade administrativa ao passo que uma geografia posterior sugere na melhor das hipóteses uma federação desagregada mas seus limites geográficos justificamse por seu poderio militar 70 Gobir Essa localização dos estados de Hausa baseiase para este período amplamente na edição de 1582 de Anania que incorporou as observações detalhadas de Vincent Matteo ver La universal fabrica del mondo p 336 71 Air Agadésnão mostrado em mapa Descrito em Anania como uma cidade ibid p 336 no deserto presumivelmente a capital do sultanato de Air por vezes sob o domínio de Songai e Kabi mas nessa época provavelmente independente 72 Zamfara Anania o situa além de Zaria ibid p 336 cf Hiskett Islam in West Africa mapa p 90 73 Katsina Anania relata que ele estava constantemente em guerra com Kano La universal fabrica del mondo p 336 como confirmado em Kano Chronicle tradução em inglês publicada em HR Palmer Sudanese Memoirs Londres 1967 p 116 Suas fronteiras foram ajustadas para aproximálo de Zamfara e Kano com quem lutara Katsina Chronicle em Sudanese Memoirs p 81 74 Kano Situado com referência à moderna cidade de Kano e descrito com alguns detalhes por Anania La universal fabrica del mondo p 336b37 Nesse período ele não sofria ataques ou pressão de Kabi ou Songai embora ainda fosse importunado por Bornu e Jucum 75 Ningi Nin Anania o situa simplesmente além de Kano ibid p 336b Seus editores modernos sugerem Ningi leste de Kano que Hiskett Islam in West Africa p 109 assinala que possa ser Nunkuro 76 Kurdi Cardi Kanakuma Anania o localiza ao sul de Zaria La universal fabrica del mondo p 336 porém Hiskett reinterpreta o itinerário de Matteo e sugere uma localização no sudoeste de Zaria Islam in West Africa p 90 77 Kalam Calon Anania La universal fabrica del mondo p 337 o situa simplesmente além de Zaria na direção geral de Doma mas ele surge como o lugar chamado Kalam em Kano Chronicle pp 112 117 ver mapa e discussão em Hiskett Islam in West Africa p 90 78 Zaria Zegzeg Situado com referência à moderna cidade mas citado em Anania entre Kano e Cardi La universal fabrica del mondo p 336 79 Yauri Anania o localiza aparentemente entre Zaria e Jucum ibid p 336 80 Jucum Doma Anania considera Doma um estado embora a região fosse só uma parte do que provavelmente era uma grande unidade ibid p 337 Uma vez que a Kano Chronicle cita guerras entre Kwararafa Jucum e Kano nesse período p 116 podemos presumir uma fronteira comum e Doma fazendo parte dela É claro que isso pressupõe uma centralização administrativa forte ou Doma como uma subregião importante o que pode não ser o caso mas delineei as fronteiras de Jucum para incluir a capital tradicional e ambas as margens de Benue no território atual de Jucum 81 Shira Scira Anania o situa simplesmente além de Zamfara La universal fabrica del mondo p 336 e Hiskett o vê como o pequeno Esta do Hausa de Shira localizado entre Kano e Bornu Islam in West Africa p 73 82 Bornu não indicado em mapa Localizado segundo Anania La universal fabrica del mondo pp 34950 mas assinalando a existência de Shira e de uma fronteira comum com Jucum 83 Aboh Gaboe Localizado de acordo com Dapper Naukeurige beschrijvinge p 132 a oito dias de viagem pelo rio em direção a Benim MAPA 3 ÁFRICA CENTRAL C 1625 EM DIREÇÃO APROXIMADA DO NORTE PARA O SUL E DO OESTE PARA O LESTE Costa norte de Gabão para o Congo nºs 116 1 Rio dAngra Este Estado não possui um nome africano nas fontes mas é descrito em Pieter de Marees Beschryvinge ende historische verhael vant Gout koninckvijck van Guinei Amsterdã 1602 p 102a como tendo um rei sem muito poder e em guerra com os estados do estuário de Gabão e portanto compartilhando uma fronteira comum em algum lugar entre os dois Entretanto de Marees acreditava que eles falavam línguas diferentes apesar de partilharem a mesma cultura 2 Kayombo Caiombo Denominado rei do gancho norte da área de Gabão em ibid p 120b 3 Mponge Pongo Reino em uma ilha do estuário de Gabão em ibid p 121a com uma montanha de altura prodigiosa guerreava com frequência com os governantes de Gabão 4 Gabão Um estado do gancho sul do estuário de Gabão em ibid p 120b Dizia ser amigo dos habitantes de Olibata nº 5 nessa fonte mas Pieter van den Broecke ed atualizada K Ratelband Reizen near WestAfrika van Pieter van den Broecke 160414 The Hague 1950 p 23 assinala que eles estavam em guerra ambas as afirmações indicando uma fronteira comum 5 Olibata Dominava o Cabo de Lopo Gonsalves segundo de Marees Beschryvinge p 120b 120b 121a e van den Broecke Reizen p 23 6 Loango Diferentemente dos estados do norte Loango era uma grande e complexa unidade Suas fronteiras mostradas aqui representam a extensão máxima do domínio efetivo de Loango mas incluem um número de Estados tributários que exerciam um controle interno considerável e que eram ligados a Loango mais em virtude de pagamentos de tributos do que por uma sanção administrativa Essas relações e os estados subordinados são descritos em Dapper Naukeurige beschrijvinge com base em dados colhidos por comerciantes holandeses entre 1620 e 1650 Não é claro o momento em que Loango dominou todas as regiões e só Dapper dá o tipo de detalhe que permite identificar as subunidades A seguir algumas dessas semiindependentes unidades usadas para estabelecer as fronteiras de Loango no mapa Komma ao norte ibid p 147 um país pantanoso logo ao sul de Cabo Lopo Gonsalves Gobby p 147 ao sul de Komma ao longo da costa norte do cabo St Catherine Sette p 147 citado como estando a 15 milhas acima de Mayumba próximo à moderna Sette Cama que ainda tem seu nome e Mayumba Majumba pp 1456 A leste situase Dingy p 148 mencionado como fronteiriço à região central de Loango Kakongo e Vungu A região central de Loango descrita em detalhes em ibid pp 143 15960 pode ser situada entre o rio Chiloango e Mayumba 7 Bukameale Um reino rico em elefantes e marfim localizado em uma área montanhosa descrito vagamente em ibid p 158 como se limitando geograficamente com Loango e Jaga Essa localização segue a lógica de Phyllis Martin defendida em The Trade of Loango in the Seventeenth and Eighteenth Centuries em Richard Gray e David Birmingham eds PreColonial African Trade Essays on Trade in Central and Eastern Africa before 1800 Londres 1970 pp 1445 8 Yaka Jaga O termo jaga nas fontes dos séculos XVI e XVII descreve em termos gerais um grupo usualmente de canibais sem raízes que atacavam em emboscadas Pelo menos três grupos podem ser identificados na África central os habitantes do vale de Niari citados aqui o povo que vivia entre os rios Kwamgo e Wamba atualmente chamado Jaga e os imbangala organizados em muitos bandos que atuavam nos planaltos centrais de Angola e regiões de Dongo ver John Thorton A Resurrection for the Jagas Cahiers détudes africaines 18 nºs 6970 19782245 O grupo do vale Niari provavelmente não se intitulava yakas ou jagas esses termos provêm das fontes de congo Eles foram mencionados pela primeira vez em 1624 como tendo destruído Vungu com o consentimento do rei de Loango Manuel Cardoso para Manuel Rodrigues 1624 MMA 7294 Dapper fornece mais informações sobre eles como fronteiriços a Loango e ao reino de Nziko em uma terra que tinha de ser atravessada para ir de Loango à região produtora de cobre do vale Niari Naukeurige beschrijvinge p 158 Ele acreditava que eles eram organizados em três exercícios separados sob diferentes comandantes chamados Singe Kobak e Kabango embora isso possa ser uma informação em segunda mão referente aos imbangala da região de Dongo 9 Reino de Nziko Suas fronteiras iniciais foram bem descritas em Filippo Pigafetta Relatione del reame di Congo editado por Georgio Cardona Milão 1978seguindo a paginação da edição de 1591 tradução para o francês Willy Bal editor e tradutor Description du royaume de Congo et des contrées environnantes Louvain 1965 também com sua paginação anterior O trabalho de Pigafetta serviu de fonte para muitas descrições posteriores Também chamado de Reino do Grande Makoko ver fontes de jesuítas citadas em Guerreiro Relaçam annual extraído em MMA 52412 e o relato de Garcia Mendes Castelobranco 16 de janeiro de 1620 MMA 6438 como fonte de vestuário junto com o reino vizinho de Ybare que não é mencionado em nenhum outro lugar Dapper Naukeurige beschrijvinge pp 143 182 fornece mais dados do que Pigafetta baseados provavelmente nas notas do viajante Herder em 16412 e nas fontes sobre Loango e ajuda a definir suas fronteiras ocidentais ao norte do rio Zaire 10 Fungeno Fungenas Localizado ao norte de Okango um distrito de Congo situado entre os rios Niquise e Kwango perto de Mpumbu o maior do Zaire chamado anteriormente de Stanley Pool atual Malebo Pool Mateus Cardoso diz que ele se separava de Okango pelo rio Enselle e estendiase até o rio Kwango ARSI Assistencia Lusitania 55 Relação do alevamento fol 116 ver também Dapper Naukeurige beschrijvinge p 182 11 Kakongo Fontes jesuíticas localizam esse reino ao norte do rio Zaire em 16067 e dão como seus vizinhos Nzibo Bungo Vungu Angoi Ngoyo e Biangá Estado desconhecido MMA 52412 ver também Dapper Naukeurige beschrijvinge p 183 12 Ngoyo Localizado na foz do rio Zaire e vizinho de Kakongo nas fontes jesuíticas MMA 52422 13 Nzari Zarry Zerry Sua localização é determinada em notas de Dapper Naukeurige beschrijvinge p 184 e pelo relato de F Capelle 1642 em Louis Jadin Rivalités lusonéerlandaise au Soyo Congo 16001675 Bulletin de lInstitut Historique Belge de Rome 37 1966137359 14 Vungu Bungo Citado como vizinho de Kakongo em Guerreiro ver MMA 52421 em 16067 Mateus Cardoso observa que ele foi destruído pelos exércitos de Jaga em 1627 e deulhe uma localização ao norte do Zaire em 1624 ver Cardoso para Rodrigues 1624 MMA 7294 e História do Reino de Congo fol 14 Dapper também assinala sua proximidade com os estados costeiros e o Jaga Naukeurige beschrijvinge p 158 15 Reino do Congo As fronteiras orientais do Congo são cuidadosamente delineadas por Cardoso ARSI Assistencia Lusitana 55 Relação do alevamento fols 116116v para o ano de 1622 Elas incluem nessa área os reinos vassalos de Ocanga entre os rios Enselle e Wamba ao sul de Fungunas e ao sul de Ocanga os estados de Congo Riamulaça Kongo dia Mulaza e Sonço Nsonso todos bordejando o Kwango incluindo por fim os pequenos estados vassalos de Ncusu Nkusu e Damba Ndamba nas montanhas onde nascem os rios Kwili e Mbrize Seu limite ao norte parece ter seguido o Zaire exceto por Masinga uma província transzairiana localizada onde o Kwilu penetra no Zaire segundo Cardoso Essa província estava sob o domínio da província Nsundi do Congo e assim era um mercado onde comerciantes baseados em Loango compravam cobre nos anos de 1630 e 1640 Dapper Naukeurige beschrijvinge p 158 que estava falando de Sondi Ao sul sua fronteira com Angola foi definida depois da batalha de Mbumbi 1662 no rio Dande Regimento do Governador de Angola 20 de março de 1624 em Heintze Fontes 1149 A leste a soberania precisa do Congo é nebulosa A região de Dembos Ndembu não assinalada em mapa que começa nas montanhas esteve em algumas ocasiões sob o domínio do Congo é mostrada aqui como independente Esses estados Dembos marcam a fronteira do sul do Congo e Wandu a província do sudeste do Congo fronteira de Matamba a última parte remanescente é determinada de forma arbitrária em algum local nas montanhas 16 Reino de Soa Jaga de Kwango Identificado por Mateus Cardoso como situado ao sul da foz do rio Wamba no vale de Kwango em 1622 ARSI Assistencia Lusitana 55 Relação do alevamento fol 116 A extensão desse reino em direção ao sul é desconhecida em 1657 contudo Matamba estava em guerra com Jaga Giagha que fazia fronteira com Matamba através de Kwango este poderia ser o mesmo reino Giovanni Antonio Cavazzi de Montecuccolo Istorica descrizione de tre regni Congo Matamba ed Angola Bolonha 1687 bk 5 nº 33 A região de Dembos Ndembu nºs 1727 A política nessa área era muito instável com muitos pequenos estados situados nos vales superiores dos rios Bengo Dande Loze Mbrize Lucala e Niquise na região montanhosa Grandes estados como Congo Angola portuguesa Dongo e Matamba fizeram reivindicações e campanhas nessa área e a maioria da região era nominalmente uma parte de uma ou de outra ou de várias ao mesmo tempo desses estados Além disso os grandes estados de Dembu estabeleceram confederações com os menores mas esses também eram com frequência não mais estáveis do que os estados maiores As fronteiras delineadas no mapa fazem uma simples suposição da configuração política em algum dado momento 17 Nambu a Ngongo Nambuangongo Citado como uma vítima de ataques portugueses em 161516 Cadornega História 178 e portanto um estado independente Uniuse a uma grande confederação que lutou contra Portugal em 1642 as notas geográficas desse embate ajudaram a determinar sua localização próximo ao lado norte do rio Dande e também dos rios Mutemo e Kavango Pedro Cesar de Meneses para João IV 9 de março de 1643 MMA 9323 Cadornega História 12912 18 Mutemo Motemo Nominalmente um vassalo da Angola portuguesa em 1629 com uma grande comunidade portuguesa um capitão e uma igreja Fernão de Sousa para filhos em Beatrix Heintze Fontes para a história de Angola do século XVII 2 vols Wiesbaden 19858 1327 Mutemo liderava uma poderosa coalizão que lutou contra Portugal durante o período holandês 16418 em Angola Relatos dessa guerra 1642 em fontes portuguesas Pedro Cesar de Meneses para João IV 9 de março de 1643 MMA 932 e Antônio de Oliveira de Cardonega História geral das guerras angolanas 168081 Lisboa 1972 1289 dão detalhes sobre as unidades subordinadas a essa coalizãoEstado incluindo os pequenos estados de Motemo Aquigongo Motemo Quingengo Dapper com base em fontes holandesas descreve a geografia dessa região em detalhes com referência à hidrografia e seus vizinhos Naukeurige beschrijvinge p 185 19 Ngombe a Mukiana Engombe a Muquiama Um estado cujas terras localizavamse a oeste de Mutemo segundo Dapper Naukeurige beschrijvinge p 185 a geografia dessa região provavelmente é resultado da guerra de 1642 porque as fontes portuguesas mencionam sua participação Pedro Cesar de Meneses para João IV 9 de março de 1643 MMA 9301 Talvez tenha se tornado independente em 1625 embora esse fato não seja mencionado em fontes contemporâneas 20 Mbwila Ambuila Boila Um Estado poderoso que formou uma coalizão incluindo os estados vizinhos de Cabonda e Cheque cerca de 1626 que concernia tanto aos portugueses em Angola como ao rei do Congo Fernão de Sousa para filhos nd em Heintze Fontes 12589 Sua localização é mencionada em Dapper Naukeurige beschrijvinge p 158 com referências ao rio Loze e os estados vizinhos Sousa observa que as terras de Mbwila estendiamse do Dande até Angola Relação da costa de Angola e Congo 21 de fevereiro de 1632 MMA 8212 21 Kahenda Caenda Localizado a sudeste de Mutemo e ao sul de Mbwila na geografia de Dapper Naukeurige beschrijvinge p 185 Envolveuse na guerra de 1642 e era provavelmente independente antes disso ver Pedro Cesar de Meneses para João IV 9 de março de 1643 MMA 932 e Cadornega História 1288 em que ele é denominado Caculo ca Caenda 22 Kavanga Cavanga Caoanga Caoganga Um estado nominalmente subordinado aos portugueses em 1629 e que foi atacado por Mbwila ao norte de Dande Formou uma coalizão com os estados vizinhos Cavanga Pequena Capele Caculo Canquy Angola Candala Cabaça para resistir ao ataque Fernão de Sousa para filhos em Heintze Fontes 1327 Em 1632 Sousa descreveu Kavanga junto com outros governantes Dembos como hostis a Portugal e formando uma coalizão liderada por Mbwila Relação MMA 8121 23 Kiluanje Ka Nkangu Quiloange Camcango Um dos estados translukalaenses relacionados por Sousa em um relatório de 16301 Heintze Fontes 1213 Em 1629 era considerado amigo de Jinga quando esta estava preparando o exército de Dongo para lutar contra Portugal junto com Mbwila Sousa para filhos ibid 1252 e então sob o domínio de Mbwila em Relação MMA 8212 24 Kitexi Quitexi Descrito como um poder hostil através do rio Lukala por Sousa em um relatório de 16301 Heintze Fontes 1213 e situado acima de Dande e sob o domínio de Mbwila em 1632 em Relação MMA 8121 Um participante da guerra de 1642 é mencionado como estando na vertente de DandeLumanha Cadornega História 12867 25 Kampangala Cambangala Mencionado como um governante hostil em Lukala por Sousa em um relatório de 16301 Heintze Fontes 1213 e como situado acima de Dande e sob o domínio de Mbwila em 1632 em Relação MMA 8121 Sua localização exata e a de seu vizinho Nsamba a Ngombe são desconhecidas 26 Nsamba a Ngombe Sambamgombe Documentado da mesma forma como no nº 25 Kampangala 27 Ndambi Dambi Angonga é mostrado no mapa em Dapper Naukeurige beschrijvinge como vizinho de Kavanga e é mencionado como um dos participantes da guerra em 1642 na vertente de DandeLumanha por Cadornega História 1286 Ele também observa que esse Estado era vizinho de Kitexi ibid 1294 28 Angola Colônia portuguesa cuja fronteira ao norte com Congo foi demarcada no rio Dande ver nº 15 e pelos estados independentes de Dembos Seu limite geográfico a leste é bem incerto fazia fronteira com Dongo na fortaleza de Embaca Ao sul sua fronteira foi mais ou menos definida pelo rio Cuanza Seus limites geográficos precisos são bem descritos no relato de Sousa de 16301 Heintze Fontes 121213 29 Dongo Em 1624 Dongo sofreu uma grande crise de sucessão que dividiu o reino entre partidários de Angola Aire e rainha Jinga Essa crise resultou em uma guerra civil que deu a Angola Aire o poder de governar Dongo mas transformouo formalmente em um vassalo de Portugal Jinga foi expulsa do país Manteve somente as ilhas de Kindonga no rio Cuanza mas em 1631 conquistou Matamba A resolução final desses eventos só foi alcançada em 1655 quando um tratado dividiu suas terras daquelas de Angola Aire e de seus sucessores no rio Lucala As fronteiras demarcadas aqui mostram que a vassalagem de Angola Aire a Portugal não corresponde à anexação que só aconteceria em 1672 Ver o relatório de Sousa de 16301 em Heintze Fontes 121213 30 Kituxela Quituchila Quituquela Estado situado nas possessões portuguesas em Lukala uma vez sob o domínio de Dongo Cadornega História 1219 Quando os exércitos portugueses o atravessaram em seu caminho para Matamba em 1629 ele era uma região independente que incluía Puto Ahango Sousa para filhos em Heintze Fontes 1324 31 Matamba Este reino foi conquistado por Jinga em aproximadamente 1631 e tornouse seu território principal O mapa de Dapper o situa entre o rio Cuanza e ao norte as províncias orientais do Congo em cerca de 1640 Ver também Cavazzi Istorica descrizione livro 1 nºs 110 fronteiras tradicionais de c 1660 32 Ndala Kisuba Andalla Quesuua Governante de uma província chamada Mbondo mencionada como um vizinho a leste das terras de Kasanje por Cavazzi em aproximadamente 1660 Istorica descrizione livro 1 nº 31 Em 1625 ele fazia fronteira com Dongo cujos subordinados mais a leste eram Dambe Angola Dungo Amoiza Kina e Matamba segundo Sousa Sousa para filhos em Heintze Fontes 1334 Ele dividiuse em três partes pelos três filhos do governante após sua morte em 1629 Ligavase a uma província chamada Bondo à época Heintze Fontes 1328 33 Akikimbo kia Nginje Aquicumbo Quianginge Governante cujas terras faziam fronteira com o rio Kwango a leste de Ndala Kisuba e com Kina Quisumo um governante de Ganguelas Sousa para filhos em Heintze Fontes 1345 34 Kina Quina Grande e Quina Pequeno ou Greater e Lesser Ganguelas Vizinho de Matamba de acordo com Sousa Sousa para filhos ibid 334 Uma certa localização geográfica é indicada em Cavazzi Istorica descrizione livro 7 nº 31 Dapper Naukeurige beschrijvinge p 185 situao a leste da província de Wandu província do Congo embora isso não seja provavelmente correto ao final de um longo itinerário Uma Ganguellas descrita junto com Malemba Songo e Ndala Kisuba por Sousa em 21 de fevereiro de 1632 MMA 8122 pode ser Kina apesar de Sousa usar também o nome Quina com frequência 35 Malemba Segundo Baltasar Rebello de Aragão este era um dos cinco grandes reinos cujos territórios circundavam o Congo e Dongo em 1618 MMA 63401 Ele é mencionado como o maior inimigo a leste no relatório de Sousa datado de 16301 ibid8122 Pigafetta situou o rio Kwari em sua região central Relazione pp 17 e 24 Ele se estende a oeste de Kina conforme Cavazzi Istorica descrizione livro 7 nº 31 Heintze ao citar numerosos documentos na coleção de Fernão de Sousa situao ao sul de Ndala Kisuba e a leste da curva de Cuanza Fontes 1212 nº 79 36 Songo Massongos Um dos cinco grandes reinos descritos por Rebello de Aragão e um dos inimigos citados por Sousa em 16301 ver nº 33 37 Ndonji Dongi Mencionado só por Cavazzi nos anos 1660 Istorica descrizione livro 7 nº 31 Nenhum documento datado de 1625 o localiza no mapa ou como um estado independente mas ele pode ter existido anteriormente Calculei sua localização com base nas referências de Cavazzi 38 Xinje Massingas Cachinga Um reino poderoso citado entre os vizinhos do Congo e Dongo em 1618 MMA 63401 Não há outra referência sobre ele mas Cadornega menciona Cachinga ao longo do rio Kwango até Kasanje na quarta parte do século XVII História 3218 Sua localização no mapa contempla a identidade de dois locais na área dos modernos Xinjes Sul do rio Cuanza a Benguela nºs 3956 As regiões montanhosas de Angola foram tradicionalmente divididas em grandes províncias Cada província era composta de numerosos pequenos Estados e usualmente um deles dominava os demais Nesse aspecto se parecia com a região de Dembos embora esta região não possuísse uma tradição de províncias Baseandose em referências até 1625 as províncias são representadas aqui como unidades soberanas e os Estados menores como subunidades Isso talvez possa não estar correto falta informação política detalhada sobre este período Ao final dos anos 1650 a descrição detalhada de Cavazzi e as notas de Cadornega fornecem uma exposição minuciosa sobre a geografia local 39 Nsonga Songa Sousa referese a Nsonga como um governante independente da província de Kisama Quissama localizado ao sul da foz do rio Cuanza na costa Sousa para filhos em Heintze Fontes 1290 localizado mais precisamente em Cadornega História 3248 40 Langere a Mbumba Langere Ambumba Segundo Sousa era um governo hostil aos portugueses cujos territórios localizavamse perto de Kafuxi Relação 21 de fevereiro de 1632 MMA 8121 ver também Sousa para filhos em Heintze Fontes 1335 344 41 Kapakasa ka Kixindo Capacaça Caquixindo Este era um território localizado ao longo de Cuanza até o forte de Cambambe Sousa para filhos em Heintze Fontes 1244 285 323 Foi a última província de Quissamã em direção ao leste segundo Cadornega História 3249 42 Kikulo kia Kimone Quiculo Quiaquimone Este governante de Quissama é citado por Sousa como senhor das minas de sal de Demba Cadornega assinalou que suas terras estendiamse ao longo do rio Cuanza até o forte português em Muxima História 3248 43 Kafuxe ka Mbare Cafuche Cambare Sousa o menciona entre os vários governantes hostis aos portugueses em Quissama e estreitamente associado ao seu vizinho Langere Relação 21 de fevereiro de 1632 MMA 8121 Cadornega observa que suas terras estendiamse ao sul da região de Quissama e incluía a costa marítima História 32489 44 Katala ka Sala Catala Casala O antigo presídio português de Demba localizavase em suas terras ao sul de Cuanza e na metade do caminho para Longa Cadornega História 3248 45 Malundu a Kambolo Malundo Acambolo Este era um governante de Quissama independente e poderoso hostil a Portugal cujas terras faziam fronteira com Lubolo nº 48 Sousa para filhos em Heintze Fontes 1285 Ele era o governante mais poderoso depois de Catala Casala segundo Cadornega que localizou seu território ao longo do rio Cuanza História 3248 46 Tunda Esta era uma província que se estendia de Cuanza a Dumbo a Pebo nas regiões orientais ocupadas pelos portugueses em Angola Sousa para filhos em Heintze Fontes 13289 47 Haku Aco Haco Esta era uma província ao sul de Cuanza antes de se atingir a curva do rio Tinha uma administração bastante centralizada sob o domínio de Ngunza a Mbande Gunsa Ambande Sousa para filhos em Heintze Fontes 1288 289 48 Lubolo Libolo Este era um território no interior de Tunda após o Cuanza Sousa para filhos em Heintze Fontes 13289 Segundo Heintze Lubolo absorveu Tunda durante a metade do século seguinte e sua região central localizavase ao longo do rio Longa 49 Mbolo Kasaxi Ambolo Casague Este governante localizavase logo ao sul da curva do rio Cuanza rio acima da província de Tunda Jinga e seu exército abandonaram esse governante após sua derrota em 1626 Sousa para filhos em Heintze Fontes 12556 50 Zungi a Moke Zungui Amoque Este governante localizavase provavelmente a leste de Mbolo Kasaxi ao longo de Cuanza Ele foi atacado por Jinga em 1626 depois que esta atravessou as terras de Mbolo Kasaxi e antes de alcançar Malemba Sousa para filhos em Heintze Fontes 12556 51 Kilembe Quilembe Este estado incluía o porto de Sumbe a Mbale Sumbe Ambale logo ao norte do rio Kuvo em 1645 Relação da viagem de Sottomaior em socorro de Angola 1645 MMA 9374 Suas terras estendiamse para o interior até a beira do platô onde controlava algumas minas de cobre Relação da viagem do Capitão Mor Antonio Teixeira de Mendonça 11 de junho de 1645 MMA 9334 52 Lulembe Lubembe Este governante do interior leste de Kilembe foi descrito como um grande jaga que governou de Quilembe a Moçambique em 1645 Relação da viagem de Sottomaior MMA 93734 Ele foi contatado e se submeteu nominalmente a Lopo Soares Lasso durante a campanha dele no norte para se apoderar das minas de Sumbi Auto de Manuel Pereira 23 de julho de 1629 em Heintze Fontes 2304 53 Kabeso Cabesso Este Estado situado no planalto central foi descrito por Cavazzi provavelmente como resultado de sua descoberta em 16589 Localizavase ao sul de Lubolo a oeste de Tamba e a noroeste de Nsele ao longo da metade do rio Longa Istorica descrizione livro 1 nº 27 Sua localização aqui em 1625 é especulativa porque não é mencionada em fontes anteriores 54 Tamba Assim como Kabeso este Estado foi conhecido primeiro por Cavazzi que o situou na parte superior do rio Ngango em montanhas e planícies ibid nº 24 55 Rimba Como Kabeso e Tamba este estado foi conhecido primeiro por Cavazzi que o localizou a leste de Nsele e nas montanhas atrás de Sumbi ibid nº 21 56 Nsele Selles Chela Este Estado foi descrito pela primeira vez por Cavazzi que relatou que seu povo vivia no topo das montanhas no interior de Sumbi ibid nº 22 57 Alto Bembe Este estado foi descrito por Cavazzi no final dos anos 1650 como situado ao sul de Tamba e Haku e bordejando o rio Cuanza ibid nº 23 Lopo Soares Lasso situou um Estado ao qual ele chamou Bambe nessa área provavelmente Bembe em 1629 58 Kikombo Mani Quicombo Este Estado costeiro localizavase a nove léguas de Sumbe a Mbale Sumbe Amballa onde Lopo Soares Lasso desembarcou pela primeira vez em 1627 Fernão de Sousa para Governo 1º de junho de 1627 em Heintze Fontes 2181 Fazia fronteira com Lubolo e estava ao norte do rio Kuvo segundo Cadornega no início do século XVII História 3181 59 Sumbi Esta provavelmente não era a região unificada que o mapa mostra Era considerada uma província embora outros Estados mostrados aqui como independentes se incluíssem nela A área foi invadida e subjugada por Lopo Soares Lasso em sua expedição para o norte em direção às minas ao norte de Kuvo em 16289 Alguns governantes da área foram mencionados no relato de Manuel Pereira sobre a campanha como Nhanga Quitemo Cabmombo Conzamba Monadundo Caunguega Cabambe Gumbe e Canguanda além dos governantes de Lubembe Lulembe Catumbela e Songo Auto de Manuel Pereira 29 de julho de 1629 em Heintze Fontes 2304 60 Lukeko Luqueco Em 1629 Cambambe governou este estado ocupado pelo grupo étnico ovimbundu Lukeko enviou comerciantes para Benguela em cerca de 1626 Ele foi atacado pelas forças de Lopo Soares Lasso entre 3 de setembro a 1º de outubro de 1628 Auto de Manuel Pereira 23 de julho de 1629 em Heintze Fontes 2302 304 61 Katumbela Catumbela A jurisdição deste governante começava a nove léguas de Benguela Ele se submeteu a Manuel Cerveira Pereira em 6 de março de 1618 Representação de Manuel Cerveira Pereira 6 de março de 1618 MMA 6299 Ele não era suficientemente leal para ser considerado parte da colônia de Benguela ver Auto de Manuel Pereira 23 de julho de 1629 em Heintze Fontes 2304 62 Benguela português Posições portuguesas em volta do forte de Benguela Suas fronteiras foram definidas por estados africanos vizinhos 63 Songo Este território situavase no interior das posições portuguesas em Benguela em 1627 foi registrado como amigável porém desobediente Auto de Manuel Pereira 23 de julho de 1629 em Heintze Fontes 2303 64 Biasisongo Este território que se situava aproximadamente a 193 km a leste de Benguela foi alcançado pelas forças de Lopo Soares Lasso em sua campanha maiosetembro de 1627 contra as forças imbangala de Nguri ibid 3034 65 Kisango Quissange Território situado aproximadamente a 193 km a leste de Benguela atingido pelas forças de Lopo Soares Lasso em sua campanha contra Nguri ibid pp 3034 66 Baixo Bembe Bambe Esta área encontravase no interior de Biasisango e Kisango a mais de 40 léguas da costa ibid Sua localização foi dada por Cavazzi em relação a regiões do norte com base em informações de aproximadamente 1658 Istorica descrizione livro 1 nºs 110 67 Muzumbu a Kalunga Esta área situavase a leste do rio Kunene e foi alcançada por Lopo Soares Lasso em algum momento antes de sua morte em 1639 Cadornega assinala que seu governante era muito poderoso História 31767 218 Sua localização em 1625 é especulativa 68 Wila Huila Hila Este estado localizavase a leste do rio Kunene e fazia fronteira com Muzumbu a Kalunga ao sul do território ovimbundu Provavelmente contatado pela primeira vez nos anos 1640 Cadornega é o único que o menciona História 3159 172 69 Kulimata Este estado situavase na metade do rio Koporolo e foi atacado pelas forças de Lopo Soares Lasso entre 21 de fevereiro e 22 de março de 1628 Localizavase a 20 léguas a sudeste de Benguela Auto de Manuel Pereira 23 de julho de 1629 em Heintze Fontes 2303 Introdução A história do oceano Atlântico vem sendo objeto de atenção nestes últimos anos Antes os historiadores contentavamse em estudar continentes e países isoladamente mas hoje cada vez mais eles procuram estudar interações em uma escala intercontinental Sobretudo nos primórdios da história do Atlântico em que as intensas navegações européias no século XV subitamente levaram à interação de quatro continentes quando antes havia pouca ou nenhuma comunicação Desse modo o Atlântico tornouse um cenário de grandes migrações intercontinentais Milhares de colonizadores europeus foram para a América e ao lado deles havia ainda um grande grupo de africanos No conjunto a imigração européia e seus efeitos receberam muito mais atenção dos historiadores do que a migração africana apesar de esta ter sido maior pelo menos antes do século XIX Este livro é uma tentativa de resgatar essa pouco conhecida imigração de africanos para as Américas e de situála no campo crescente da história do Atlântico Ao publicar The Mediterranean and the Mediterranean World em 19491 Fernand Braudel foi um pioneiro em especial na França de um modo novo de olhar a história regional A abordagem de Braudel mudou a maneira pela qual as regiões eram definidas introduzindo o conceito de 1 Fernand Braudel La Méditerranée et le monde méditerranéen dans les temps de Philippe II Paris 1949 2ª ver ed 1966 trad Siân Reynolds com o título The Mediterranean and the Mediterranean World in the Age of Philip II 2 vols Nova York 19723 história integrada pelo mar Seu enfoque foi notável também ao pôr fatores econômicos e sociais mais no centro dos acontecimentos do que na retaguarda Não é surpreendente portanto que acadêmicos franceses e os que tiveram formação francesa aplicassem seu método e abordagem para outras importantes regiões marítimas Nesse sentido logo o Atlântico tornouse um objeto de estudo nas páginas de Braudel Pierre e Hugette Chaunu realizaram um vasto estudo sobre o Atlântico publicado em 195560 com base nos arquivos de Sevilha A esse trabalho seguiuse o estudo de Frédéric Mauro sobre o Atlântico português publicado em 1960 Vitorino MagalhãesGodinho publicou seu estudo sobre a economia portuguesa entre 1962 e 1968 no qual a economia atlântica teve um papel considerável Embora nenhum desses trabalhos tivesse a profundidade ou a ambição do Mediterranean de Braudel eles devem a ele sem dúvida os métodos e o enfoque Além disso cobriram extensamente o Atlântico ao menos no período anterior ao final do século XVII Uma das razões pelas quais esses estudos não tiveram a profundidade do livro de Braudel foi sua forte concentração nos esforços europeus chegando quase a excluir o papel de outras sociedades atlânticas Apesar de não esquecerem completamente que os habitantes nativos das Américas e da África também participaram da economia do Atlântico eles não deram o tipo de exame social e econômico conferido por Braudel a todas as sociedades e civilizações da bacia mediterrânea Braudel eventualmente tenta reverter esse desequilíbrio dedicando uma seção na edição final de sua pesquisa sobre o mundo Civilization and Capitalism 1979 para várias sociedades atlânticas abrangendo três décadas de seu interesse pessoal e de uma grande quantidade de pesquisa inspirada em seu exemplo original No entanto apesar de todos esses estudos o Atlântico ainda era visto sob uma perspectiva européia Isso não era simplesmente um chauvinismo eurocentrista mas sim um ponto crucial de análise Aparentemente o Atlântico ao contrário do Mediterrâneo era notado por todos esses pesquisadores como tendo sido dominado em particular pelos europeus Braudel acreditava que as sociedades mediterrâneas estavam aproximadamente no mesmo estágio de desenvolvimento econômico e assim contribuíram em um nível mais ou menos igual quando ele assinalou esse ponto em relação ao mundo mulçumano historiadores turcos se empenharam em refutálo Mas em relação ao Atlântico o enfoque parecia diferente pois a maioria dos historiadores pensava que a África e as sociedades nativas das Américas estava em um nível bem inferior de desenvolvimento Portanto o conceito do papel proeminente dos europeus na formação do mundo atlântico parece especialmente apropriado por razões científicas e não porque os autores estavam comprometidos com o eurocentrismo Pierre Chaunu fez uma defesa enérgica do eurocentrismo na escola acadêmica francesa A Europa possuía uma liderança sobre o resto do mundo argumento ele liderança originada nas mudanças complexas do final da Idade Média que deu aos europeus uma posição dominante de grande importância no mundo tão dominadora que para melhor ou pior eles se tornaram os únicos atores significativos Chaunu reproduziu um mapa desenhado por Braudel e pelo antropólogo Gordon Hewes para a primeira edição de Capitalism and Material Life em 1967 no qual as sociedades mundiais eram divididas em níveis baseados em tecnologia e densidade populacional As sociedades africanas e as sociedades nativas americanas são ali mostradas em um nível inferior e assim o desequilíbrio da interação atlântica se explicava Claro os escritores franceses iniciaram seus estudos sobre o mundo atlântico em um momento em que o eurocentrismo estava na ordem do dia nos últimos anos da dominação colonial européia na África e quando os modelos europeus de construção de uma nação e desenvolvimento eram normas esperadas pelos novos estados africanos independen tes Os nacionalistas africanos e latinoamericanos mudaram essa ênfase no final dos anos 1960 e 1970 O eurocentrismo deparouse com muitos desafios de historiadores dos novos países emergentes do mundo nãoocidental A escola histórica nacionalista procurou demonstrar que a supremacia mundial européia recente trabalhou com afinco em detrimento de vários povos nãoeuropeus na bacia atlântica e em outros lugares Seus trabalhos enfocaram em especial a exploração européia na tentativa de deflagrar o mito colonial de que a dominação européia levou ao atraso as sociedades no mundo moderno Em resposta a essas críticas Chaunu reiterou sua posição em 1969 asseverando que esses argumentos não invalidavam o eurocentrismo francês e que sua relevância havia sido confirmada por muitos historiadores desse período A dominação européia fora fundada com base em sua superioridade e se foi boa ou má para os povos dominados isso não era necessariamente um ponto importante A história do Atlântico ainda deveria ser a história dos europeus e o reto seria apenas um pano de fundo Segundo Chaunu se a história é o relato de movimento e iniciativa então a única história realmente importante é a européia Em geral a análise de Chaunu não contradiz muito o trabalho dos historiadores nacionalistas e suas mais recentes manifestações a teoria da dependência e os sistemas analíticos mundiais caracterizados pelos estudos de acadêmicos como André Gunder Frank Walter Rodney Immanuel Wallerstein e Eric Wolf Esses escritores se inspiraram no trabalho da Escola dos Anais com um enfoque neomarxista reforçando e reiterando a essência das conclusões de Chaunu Não obstante seu comprometimento com o estudo do mundo nãoocidental ou mesmo apesar de sua simpatia por seus povos eles ainda concordavam que o mundo nãoocidental inclusive a África tiveram um papel passivo no desenvolvimento do Atlântico Apesar de perspectiva radical e da defesa da problemática do Terceiro Mundo o efeito foi simplesmente de reafirmar as conclusões dos pioneiros franceses de que a África foi uma vítima uma vítima passiva pois lhe faltou o poder econômico para impor uma resistência efetiva Aliada a essas diversas linhas de pesquisa que sugerem a passividade da África em suas relações com a economia do Atlântico há uma ênfase igualmente forte em relação à passividade dos africanos que partiam da África no comércio de escravos Os escravos deixaram escassa documentação sobre suas impressões Nesse sentido grande parte da pesquisa sobre escravidão reflete o trabalho dos teóricos da dependência Assim como o surgimento dos partidários do Terceiro Mundo emergente que procuraram refutar a imagem colonialista auspiciosa de uma Europa progressiva resgatando o mundo colonial de seu atraso social e econômico os historiadores especialistas em escravidão americana na época da luta pelos direitos civis e pelo movimento pela liberdade e igualdade racial e social dos negros nos Estados Unidos procuraram demolir o retrato tradicional do escravo contente Ao sublinhar a severidade da escravidão americana eles argumentaram que o sistema privava o escravo de cultura iniciativa e até mesmo de personalidade Mas a despeito da simpatia generalizada pela difícil situação dos escravos e de seus descendentes no Novo Mundo eles reforçam a imagem dos escravos como indefesos e passivos Historiadores radicais buscaram explicar a cultura e a religião dos escravos em termos da instituição da escravidão reduzindo desse modo a identidade africana do escravo É irônico que o desenvolvimento da historiografia nacionalista sobre a África e a história afroamericana tenha produzido esses resultados Alguns dos historiadores nacionalistas precursores no estudo da África como Basil Davidson do qual tanto o entusiasmo da historiografia africanista mais recente deriva procuram refutar a noção na ideologia colonialista de que os africanos nunca tiveram uma história real própria ao contrário eles mostraram as importantes realizações das culturas africanas e as evidenciaram antes da ocupação colonial os africanos tinham um firme controle sobre o destino de seu continente Mas mesmo que a iniciativa a habilidade e o progresso da África tenham sido pesquisados os teóricos da dependência se aferraram a essa imagem de passividade e desenvolveram os conceitos da debilidade definitiva dos africanos ao passo que fazem concessões à pesquisa da reinterpretação do passado africano Alguns especialistas em história afroamericana procuraram avaliar os afroamericanos como os provedores de uma única variante da cultura africana no Novo Mundo Na verdade a AfroAmérica não deixou de ter seus historiadores nacionalistas que como seus colegas em história da África viram os afroamericanos com espírito de iniciativa preservando e criando apesar da escravidão e do racismo Alguns desses historiadores chegaram a considerar o escravo como um africano e cada vez mais buscaram os antecedentes africanos como um modo de entender as excepcionais contribuições dos afroamericanos à cultura dos Estados Unidos Embora seus trabalhos freqüentemente enfoquem o período do século XIX eles têm tentado resgatar a dimensão positiva da experiência afroamericana um programa enfatizado pelo historiador nacionalista Sterling Stuckey Assim por exemplo Sydney Mintz e Richard Price procuraram conectar os antecedentes africanos dos afroamericanos com o desenvolvimento da cultura afroamericana enquanto Albert Raboteau e Mechal Sobel e mais recentemente Margaret Washington Creel focalizaram a religião Sobel estendeu sua pesquisa para uma visão do mundo mais ampla e tentou mostrar a influência africana não somente na cultura afroamericana mas também na dos euroamericanos Eles basearamse na historiografia africanista em voga para imprimir um dinâmico e criativo pano de fundo para o povo africano na América enquanto enfatizaram o papel da África na cultura e na vida americana Esse interesse pelos antecedentes africanos na cultura americana levou muitos historiadores estudiosos das Américas a se voltarem para a África Infelizmente com muita freqüência esses especialistas não compreenderam com profundidade a dinâmica das sociedades africanas précoloniais Reiteradamente eles estudaram mais a cultura africana por meio da antropologia moderna do que pelo estudo minucioso de documentos contemporâneos Como o conhecimento dos antropólogos baseiase no trabalho de campo na África contemporânea em geral a metade do século XX até bem recentemente suas afirmações sobre épocas antigas fundamentavamse em suposição teórica ou no pressuposto de que a sociedade e a cultura africanas não haviam mudado A leitura de documentos contemporâneos ajuda a contrabalançar este viés moderno Essa última abordagem está começando a produzir resultados nos estudos africanos sobretudo no campo da história cultural e social Mesmo entre esses historiadores com sua aceitação da importância da história da África na história da América existe ainda um grande debate referente ao modo exato pelo qual os africanos influíram nas sociedades do Novo Mundo como atores culturais em oposição ao seu indiscutível papel como trabalhadores Mintz e Price por exemplo argumentam que as condições da escravidão nas Américas e a diversidade cultural dos africanos importados dificultara a transmissão direta da cultura africana para a América ao passo que Sobel foi mais além sublinhando que esses fatores são menos importantes e que uma visão do mundo africano prevalece entre os afroamericanos De certa forma esse debate continua a se ater à questão do grau em que a exploração da escravatura e o aviltamento do racismo prejudicou a habilidade dos escravos de manterem e transmitirem a cultura africana no Novo Mundo Este livro procura deslindar diversas posições contraditórias É correto ver a África em um estágio de desenvolvimento inferior do que a Europa e esse desequilíbrio como causa do comércio de escravos Os africanos participaram do comércio no Atlântico como parceiros em condições iguais ou eles foram vítimas do poder e da ambição da Europa Os escravos africanos foram tão brutalizados na América à ponto de não poderem se expressar cultural e socialmente e assim em que grau seus antecedentes específicos foram importantes na formação da cultura afroamericana Em geral a conclusão da pesquisa na qual este livro se baseou apóia a ideia de que os africanos foram participantes ativos no mundo atlântico tanto no comércio africano inclusive no comércio de escravos quanto como escravos no Novo Mundo O presente livro dividese em duas partes A primeira examina detalhadamente a natureza da interação entre a África e a Europa A segunda aborda o papel dos africanos que foram viver em outros locais do Atlântico em suas novas sociedades Analisa alguns antecedentes institucionais que configuraram sua participação do ponto de vista dos poderes dominantes do Atlântico nãoafricano mas enfoca em especial a vida econômica política e cultural dos africanos recémtransplantados Nesse sentido após um capítulo delineando as origens geográficas e históricas do mundo atlântico o livro prossegue com uma análise do comércio euroafricano e a economia produtiva africana Concluí que o comércio no Atlântico não era economicamente essencial para o bemestar ou o desenvolvimento da África visto que era em grande parte de mercadorias luxuosas que nem mesmo substituíam a indústria de produtos de luxo africana como por exemplo no caso da indústria têxtil ou para um segmento relativamente menor de indústrias existentes como as indústrias de mineração e metalurgia Por fim a análise da economia enfatiza o aspecto cada vez mais observado em pesquisas recentes sobre a produção africanaque a África possuía uma economia muito mais variada e produtiva do que antigamente se pensava Além disso meu exame das relações militares e políticas entre os africanos e europeus leva à conclusão de que os africanos controlavam o caráter de suas interações com a Europa Os europeus não possuíam o poderio militar para forçar os africanos a participarem de nenhum tipo de comércio no qual seus líderes não desejassem se engajar Portanto todo o comércio da África com o Atlântico inclusive o comércio de escravos tinha de ser voluntário Finalmente uma observação acurada sobre o comércio de escravos e do processo de compra deles assinala que os escravos eram utilizados há muito tempo nas sociedades africanas que os sistemas políticos africanos davam muita importância à relação legal da escravidão para propósitos políticos e que um número relativamente grande de pessoas havia sido escravizado em algum momento Como o processo de compra transferência e venda de escravos estava sob o controle de estados e elites africanos eles eram capazes de se protegerem do impacto demográfico e da transferência de deslocamentos sociais consideráveis de camadas mais pobres de suas próprias sociedades Na segunda parte do livro a ênfase muda para o Novo Mundo e as contribuições dos escravos africanos nas Américas Após examinar as condições que tornaram os escravos africanos tão atraentes para os colonizadores europeus no Novo Mundo e assim ironicamente os colocaram em uma boa posição como atores centrais no novo meio cultural do mundo atlântico a análise se detém na natureza da escravidão como o objetivo de mostrar os escravos africanos com um papel muito maior do que o usualmente destinado a eles no mundo cultural e social de seus escravizadores Em geral a evidência mostra o fato de que pelo menos alguns e provavelmente um número significativo deles em todas as partes do mundo atlântico possuíam suficiente liberdade de movimento e interação social para participarem ativamente na vida cultural da região Em seguida enfocase a questão da cultura e examinamse as zonas culturais da África suas interrelações e a interação com os europeus e o desenvolvimento de uma cultura afroatlântica Examinase então o papel que os africanos a cultura e as instituições africanas exerceram em muitos aspectos tais como rebeliões de escravos comunidades de fugitivos e a vida cultural e religiosa no Novo Mundo A segunda parte deste livro apoiouse em pesquisa que demonstra que as influências européias na vida africana como o cristianismo o dialeto crioulo e a moda com frequência já existiam antes na África e só mais tarde transferiramse para as Américas Nesse sentido onde os africanos se submeteram à influência dos europeus eles o fizeram de bom grado segundo seus termos e em seus territórios de origem e não obrigatoriamente sob o jugo da escravidão Analisase como a cultura africana mudou a seu modo e como ela incorporou as influências estrangeiras para mostrar um funcionamento muito dinâmico na África que seria desencadeado nas Américas A pesquisa que reforça essas conclusões tanto para a África como para o Novo Mundo precisa necessariamente envolver uma reavaliação que vai de encontro à análise de grande parte da literatura secundária Isso se deve em geral à preocupação primária de muitos pesquisadores em estudos mais locais do que internacionais Assim os africanistas nem sempre se direcionaram a questões sobre a sociedade e história da África que esclarecessem as interações africanas com o mundo atlântico em especial de como os antecedentes africanos dos escravos nas Américas afetaram sua reação ao novo ambiente Assim sendo os americanistas cujo principal interesse sobre os africanos recai no momento em que eles chegam nas Américas não têm uma literatura secundária referente à África escrita de acordo com suas preocupações Daqueles que se interessaram pelas interrelações comerciais e econômicas poucos na verdade conheceram o suficiente além do âmbito de sua especialidade para tentar realizar uma análise e sínteses independentes Por conseguinte consultei o mais possível fontes primárias É óbvio que essa estratégia é essencial caso se queira fazer um revisão significativa na historiografia existente e é particularmente importante visto que os especialistas em história do Atlântico e da África e da história dos africanos no Novo Mundo não questionaram temas que incluíssem o mundo atlântico como um todo Essa tarefa é praticamente impossível de se realizar da forma almejada mesmo que o sucesso eventual dessa análise dependa de um exame minucioso de todo o material primário O resultado da pesquisa deve ser capaz de convencer o africanista de que não se cometeu nenhuma violência contra a evidência primária sobre a história e a sociedade africanas o europeanista de que a essência dos antecedentes econômicos e políticos são respeitados e os americanistas de que uma ampla gama de sociedades de escravos foi contemplada Nenhum acadêmico pode pretender abarcar sozinho esse universo da literatura primária em sua inteireza mesmo com a ajuda de uma literatura secundária e os leitores devem estar conscientes desse fato A documentação consultada é bem completa no que se refere às sociedades africanas e às sociedades das ilhas do Atlântico e examinei uma grande amostra de material publicado e não publicado Nas Américas o material sobre os escravos é muito mais disperso e cada item da documentação é menos completo do que em relação à África e ademais consultei uma pequena porém representativa e confiável amostra De qualquer modo a documentação é incompleta e assim a análise deve ser considerada mais sugestiva do que conclusiva Só posso esperar que essa minha nova análise indique direções que outros possam achar proveitosas e que eles venham a examinar com mais detalhe e realizar estudos de caso para refutar ou apoiar os resultados alcançados aqui Parte I Os africanos na África Capítulo 1 O nascimento do mundo atlântico A CONFIGURAÇÃO DA REGIÃO DO ATLÂNTICO As navegações européias no Atlântico durante o século XV iniciaram um novo e inaudito capítulo na história da humanidade Além de os marinheiros europeus fornecerem rotas oceânicas diretas para áreas que estavam em contato com a Europa através de caminhos por terra muito mais custosos e de difícil acesso como a África ocidental e a Ásia oriental os navios alcançaram locais que não haviam anteriormente mantido contato recíproco com o mundo externo Esse fato é óbvio no caso dos continentes americanos e os historiadores focaram diretamente sua atenção para esse imenso mundo novo em suas discussões sobre o período Porém não foram só os americanos que fizeram contatos externos pois quase toda a região centrooeste da África no sul da atual República dos Camarões também não tinha comunicação com o mundo externo apesar de fazer parte geograficamente do território cujas regiões orientais e ocidentais tinham conexões de longa data com o Mediterrâneo e o oceano Índico1 Nesse sentido além de facilitar e intensifi 1 O paradoxo da região centrooeste da África é que seu isolamento nas relações comerciais e intersociais não era acompanhado por uma cultura diferente e singular Na verdade o centrooeste da África era de muitas maneiras culturalmente similar a partes da África ocidental e ainda mais da África oriental sobretudo na linguagem e na visão básica do mundo externo A explicação mais comum para a situação linguística é a hipótese da migração banto que conecta todas as línguas africanas do norte da região sul da África e ao sul do equador a uma única família Mas a divisão entre a parte ocidental e a oriental do banto é antiga refletindo talvez um isolamento de longa data Ver a discussão geral em F van Noten com Pierre de Maret e D Cohen LAfrique centrale em UNESCO histoire générale de lAfrique Paris 1980 267393 car as relações entre diversas regiões do Velho Mundo que neste caso também incluía a África ocidental a navegação europeia iniciou conexões entre o Velho Mundo e os dois novos mundos as duas seções do continente americano e a região centrooeste da África O historiador francês Pierre Chaunu argumentou que a mais importante consequência da navegação europeia tenha sido talvez o que ele chama de desenclave o fim do isolamento em algumas áreas e o aumento de contatos intersociais em muitos locais Isso levou a um crescente fluxo de idéias bem como de comércio em todo o mundo e por fim conduziu a uma economia mundial unificada e com níveis mais altos de desenvolvimento econômico2 Desse modo a abertura do Atlântico foi crucial nesse processo sobretudo porque só nele o verdadeiro isolamento foi rompido Entretanto O nascimento do mundo atlântico também envolveu uma gigantesca migração internacional de pessoas certamente sem precedentes no Velho Mundo e realizada em nenhum outro lugar no campo da expansão europeia Não somente milhares de europeus mudaramse para ilhas no Atlântico e para as Américas como milhões de africanos atravessaram as ilhas do Atlântico e do Caribe e as Américas tornandose uma população dominante em algumas áreas Essa questão demográfica não foi despercebida em residentes e visitantes nesse período Gonzalo Fernández Oviedo y Valdez descreveu a Hispaniola como a Nova Guiné3 em meados do século XVI quando a importação de escravos para trabalhar na indústria açucareira recéminiciada mudou sua demografia Ambrósio Fernandes Brandão usou exatamente o mesmo termo para descrever a rica região açucareira do nordeste do Brasil em 16184 No Atlântico o desenclave teve um significado muito mais profundo do que em qualquer outro lugar do mundo não só fomentou a comunicação como reconfigurou um conjunto de sociedades propiciando a criação de um Novo Mundo Além disso essa nova configuração envolveu a África por completo pois em 1650 os africanos representavam a maioria dos novos colons no mundo atlântico contemporâneo A compreensão da origem e do direcionamento desse admirável episódio nas relações intersociais requer um conhecimento da geografia básica das áreas envolvidas áreas onde o transporte através da água definia em muitos aspectos a totalidade da região É preciso sempre lembrar que na época anterior às viagens ferroviárias ou aéreas as viagens fluviais ou marítimas eram muitíssimo mais baratas e práticas a despeito dos riscos de tempestades e naufrágios do que as viagens terrestres Não somente os barcos e navios conseguiam fazer travessias em um tempo médio razoável como também eram eficazes em uma época de recursos escassos e podiam além disso carregar mercadorias pesadas e volumosas com facilidade Assim a criação da geografia do Atlântico deveria priorizar áreas acessíveis de transporte por água pois isso alteraria outras considerações sobre espaço e distância ligando regiões distantes com mais facilidade do que regiões situadas próximas uma das outras A primeira dessas rotas marítimas foi o Atlântico aberta para fins práticos no século XV e início do século XVI Mas o Atlântico também se conectava a rotas fluviais tanto na África como nas Américas que constituíam um complemento vital para o oceano reunindo sociedades e estados que com frequência situavamse a quilômetros da costa em contato com o mar e por conseguinte com outras sociedades e estados Mesmo os rios que não permitiam a navegação de barcos oceânicos para regiões no interior em razão de quedas dágua passagens estreitas ou bancos de areia serviam de conexões para grandes redes de viagem e comércio no interior A combinação de rotas marítimas e fluviais definiu a configuração da zona atlântica Porém não se pode olhar o mapa do Atlântico e imaginar que todos os locais eram igualmente acessíveis nem que os navegadores tiveram o mesmo acesso a todas as regiões Em geral nessa época de navios feitos de madeira a travessia do oceano era canalizada como se fosse um rio cuja direção do fluxo era claramente definida Nenhum navegador poderia ignorar os padrões dos ventos e correntes no oceano Isso foi crucial para o desenvolvimento da navegação no Atlântico pois os ventos e correntes criaram barreiras para o tráfego durante milhões de anos Esse fato limitou o contato entre o Mediterrâneo e a África por muito tempo e impediu que os africanos realizassem uma navegação eficaz no Atlântico além de suas águas costeiras assim como conteve expedições americanas para a África e a Europa Raymond Mauny mostrou que o constante fluxo nortesul da corrente das Canárias ao longo da costa do Saara possibilitou aos navios do Mediterrâneo navegar em direção ao sul até a África Ocidental mas impediu uma viagem de retorno5 Para os navegantes mediterrâneos o cabo Bojador logo ao sul das ilhas Canárias representou um ponto do qual não havia possibilidade de retorno e mesmo se viagens intencionais ou não foram mais além elas não abriram nenhuma rota prática significativa Relatos árabes citam diversas viagens realizadas acidentalmente além desse ponto alIdrisi 1154 menciona uma que partiu de Lisboa6 ibn Said soube por um viajante marroquino chamado Ibn Fatima de uma viagem similar feita antes de 12707 e alUmari tomou conhecimento por intermédio de Almeira na Espanha de outra realizada por Muhammad b Raghanuh no início do século XIV todos os navegantes foram forçados a retornar ao Mediterrâneo por vias terrestres8 Só no século XV utilizando rotas que atravessavam as Canárias Madeira e os Açores e arriscando uma viagem no altomar é que os europeus puderam finalmente superar as dificuldades de Bojador Se os problemas com ventos e correntes da costa do Saara impediram os mediterrâneos de penetrar na região atlântica da África um problema similar ocorreu com navegadores africanos É claro que os interesses dos africanos de alcançar o norte da África e a península Ibérica por mar eram os mesmos dos povos do Mediterrâneo de chegar à África dado o conhecimento recíproco por meio do comércio feito por terra mas a corrente constante que impossibilitou as viagens de retorno para o Mediterrâneo também logo de início frustrou os esforços dos africanos de atingir o Mediterrâneo A extensão da navegação para o norte de navios africanos parece ter sido até as usinas de sal de Ijil na costa mauritânia ao menos de acordo com o relato do século XII de alIdrisi Por outro lado os africanos enfrentaram o forte fluxo da corrente equatorial em direção ao oeste da região de Senegâmbia à bacia do Caribe Embora essa corrente possa ter possibilitado as viagens da África para as Américas isso requereu técnicas especializadas para iniciar a navegação em altomar e os africanos não podiam desenvolver essa tecnologia em viagens curtas em mares calmos Nesse sentido Ivan van Sertima que defendeu a idéia de que os africanos fizeram viagens freqüentes para as Américas desde cerca de 800 d C teve de reconhecer que essas viagens caso realmente tenham ocorrido foram acidentais e não iniciaram um comércio transatlântico Embora esses navegadores africanos possam ter realizado longas travessias em embarcações nãoplanejadas para navegar em altomar eles enfrentaram barreiras insuperáveis para fazer viagens de retorno a qualquer ponto familiar da costa africana Alguns povos caribenhos construíram embarcações suficientemente grandes para navegar no Caribe e esses navios podem ter viajado para o Velho Mundo O historiador Aurelio Tió mostrou a importância dos povos nativos do Caribe em guiar as primeiras viagens européias da Flórida para o Orinoco e como eles conheciam bem o regime dos ventos e das correntes em toda a bacia Ele sugere que eles também conheciam muito bem a geografia oceânica do Atlântico ocidental Mas também para eles o problema do retorno era similar aos que os europeus se depararam em navegações iniciais no Atlântico Na verdade só no final do século XV quando todo o sistema dos ventos e correntes no Atlântico foi compreendido e os navegantes europeus passaram a conhecer todos os possíveis pontos de escala na terra de cada lado do Atlântico é que uma real circunavegação foi alcançada Porém mesmo quando o sistema foi controlado e os navios europeus puderam navegar pelo menos em teoria para cada ponto do Atlântico eles foram não obstante obrigados a respeitar o vento e as correntes Pierre e Hugette Chaunu ao examinarem as viagens usuais dos navios espanhóis de Sevilha para o Atlântico e Fréderic Mauro ao considerar a navegação portuguesa nessa mesma área mostraram que as rotas cação da importância do sistema fluvial para a geografia do Sudão occidental é revelada pelo fato de muitos escritores islâmicos considerarem os rios um único sistema complexo o Nilo do Sudão uma visão que era compartilhada pelos habitantes do norte da África que não exerciam atividades comerciais como também por comerciantes da África ocidental Além de o complexo NígerSenegalGâmbia unir uma grande parte da África ocidental o Níger era uma via que agregava os reinos de Hausa os estados iorubá e os reinos de Nupe Igala e Benim a um sistema hidrográfico que por fim se conectava ao Atlântico Ao considerar o rio Benue como um prolongamento podese então perceber quão profundamente o sistema fluvial penetrava no interior da África ocidental A concepção geográfica partilhada por africanos e estrangeiros no século XVI funde todos esses rios Senegal Gâmbia Níger e Benue em um único Nilo dos negros que ao final se ligava ao Nilo do Egito Embora isso seja um erro na geografia local reflete as possibilidades de transporte dos percursos fluviais A região central da África ocidental também se orientava por seus rios em especial pelo Zaire e o Cuanza Do mesmo modo Antônio de Oliveira de Cadornega usou os rios para orientar sua geografia da África central seu conhecimento estendeuse bem longe no interior e combinou isso com uma extensa rota para o rio Cuanza Esses rios proporcionaram um comércio significativo Não somente o Cuanza foi utilizado pelos portugueses em sua conquista de Angola como também ele era a maior artéria de comércio para os africanos como afirmou Paulo Dias de Novais o primeiro português a descrever a região na metade do século XVI O comércio fluvial conectavase com o comércio costeiro e embarcações africanas percorriam com regularidade as águas litorâneas entre o Zaire e o Cuanza Para muitos africanos em outros locais a costa também era um sistema fluvial que ligava pontos longínquos fomentando um comércio que antecedeu e com frequência complementou o dos europeus em altomar JeanPierre Chauveau examinou o papel das sociedades costeiras e a navegação na África ocidental demonstrando que a navegação marítima provê uma comunicação costeira entre regiões importantes fato frequentemente inobservado em declarações anteriores Em Loango Senegâmbia Serra Leoa e Libéria estuários costeiros enseadas e lagoas formavam um sistema protegido e interconectado de percursos por água que facilitavam o movimento de mercadorias em larga escala Esses caminhos costeiros também permitiam uma fácil comunicação com os estuários de Senegal e de Gâmbia Analogamente a costa da atual Costa do Marfim possuía um sistema de lagoas e lagos costeiros no entanto era menos ativa no comércio atlântico e assim menos conhecida nos meios acadêmicos modernos Por fim é claro havia a rede de percursos por água que se estendia da foz do rio Volta através do delta do Níger até a atual República dos Camarões que começava a ser visto como um eixo político e econômico Nesse caso assim como em Senegâmbia a extensão da costa ligavase a rios que fluíam para o interior O Níger certamente é um desses rios mas ainda existem outros Padres capuchinhos que visitaram Aladá na África ocidental em 166062 observaram que diversos rios que fluíam para a lagoa costeira eram navegados por grandes canoas construídas no local que permitiam às pessoas viajar para o interior Os rios americanos também se estendiam ao longo da região atlântica Assim os geógrafos que estudaram a colonização norteamericana observaram que os grandes rios como Saint Lawrence a bacia hidrográfica da baía de Chesapeake o Connecticut e o Hudson constituíam rotas importantes para o interior em grande parte por serem facilmente navegáveis por pequenos navios marítimos e foram amplamente utilizados pelos europeus como eixo para a colonização O rio Amazonas navegável do Atlântico até os Andes e o Orinoco que também fluía para o interior conectavamse com o comércio no Atlântico O controle dos sistemas fluviais de ambos os rios era exercido pelas sociedades americanas nativas cuja sofisticação cultural só há pouco tempo foi reconhecida Desde os primórdios do contato europeu os visitantes do Amazonas e do Orinoco observaram um tráfego local intenso e comerciantes nas desembocaduras dos rios eram os pontos finais de um comércio fluvial equivalente ao corredor do SenegalNíger na África ocidental onde mercadorias de metal européias eram comercializadas por ouro escravos e redes de algodão exportadas aos milhares Visto que os nativos dessas regiões como os habitantes do vale do Mississipi na América do Norte controlavam o comércio e mantinham os europeus acuados conhecemos muito menos sobre essas áreas do que daquelas que se constituíam em artérias de comunicação entre os colonizadores do Velho Mundo Nesse sentido os caminhos por água definiram a região atlântica e os rios a estenderam muito além do litoral O domínio sobre o mar no entanto possibilitou a comunicação entre todas essas rotas continentais Houve problemas consideráveis a superar antes que essas conexões fossem feitas apesar das viagens transatlânticas ocasionais que possam ter precedido as viagens de Cristóvão Colombo e as viagens portuguesas ao longo do litoral africano Esses problemas foram praticamente intransponíveis para os africanos os americanos e o povo mediterrâneo até 1400 Portanto vale explorar as circunstâncias que permitiram aos europeus realizar viagens transatlânticas ORIGENS DA NAVEGAÇÃO ATLÂNTICA A experiência européia de viagens por água foi provavelmente o fator mais importante em sua conquista do Atlântico As dificuldades de lidar com a navegação ao sul do oceano explica por que os africanos por sua vez focalizaram seus talentos para a construção naval em embarcações de navegação costeira e fluvial e como resultado fizeram pouca navegação oceânica deixando até mesmo ilhas relativamente próximas como Cabo Verde e São Tomé descolonizadas e inabitadas Na verdade eles se abstiveram de navegar longas distâncias no Golfo da Guiné além da colonização da ilha de Bioko visível da terra por ser economicamente factível embora dificultada pelos mesmos problemas de correntes que impediram a navegação transatlântica O povo das Américas era um pouco mais afortunado do que os africanos porque o Caribe havia sido completamente explorado pelos nativos muito antes da chegada dos europeus Assim os barcos dos caribenhos e dos índios arawaks eram vistos com frequência no mar e ao contrário das embarcações africanas podiam realizar longas viagens marítimas Mas assim como a previsibilidade das monções na Ásia inibiu certos avanços na tecnologia de construção naval por apresentar poucos desafios talvez também a navegação no Caribe com sua longa cadeia de ilhas fosse muito fácil Entretanto os europeus tinham dois grandes mares internos o Mediterrâneo ao sul e o mar do Norte e o mar Báltico ao norte com um pedaço de costa de acesso difícil mas acessível entre eles Nesse sentido tradições isoladas de navegação podem ter se desenvolvido para solucionar problemas específicos em cada área e então fundilas por meio da intercomunicação para apresentar soluções para problemas futuros Aproximadamente nos séculos XIV e XV esses grandes mares eram regularmente navegados e os navios eram itens correntes em cada inventário europeu Assim como Pierre Chaunu argumentou isso foi a abertu ra ou a reabertura pois essas conexões eram frequentes na época clássica de um comércio regular entre o Mediterrâneo e os mares do norte ao final do século XIII o que por fim levou a navegação européia ao Atlântico Esse comércio indicado pelo registro da primeira viagem de um navio genovês ao norte da Europa em 1277 foi em grande escala conectado com o comércio de grãos e o movimento de outras mercadorias volumosas que não podiam arcar com os custos de uma viagem por terra Essas viagens iniciais não somente deram impulso como veremos à conquista européia do Atlântico como também uniram os diversos mares da Europa e em última instância auxiliaram a estabelecer as fronteiras européias no mundo atlântico Fernand Braudel defendeu com veemência a importância da conexão entre os mares do norte e o Mediterrâneo e de seus navegantes familiares com cada uma dessas grandes regiões marítimas e com as áreas fluviais anexas como na Alemanha ao longo do Reno e mesmo na Polônia ao longo do Vístula que participaram da grande economia oceânica do Atlântico Embora os europeus do norte tenham entrado mais tarde no comércio ao sul do Atlântico que unia a África às Américas os vikings foram os desbravadores das rotas do norte em direção ao oeste colonizaram pelo menos a Groelândia e proveram as primeiras conexões importantes entre os mares do norte e o Mediterrâneo Os ingleses e os holandeses começaram a explorar o Atlântico razoavelmente cedo os suecos estabeleceramse na América do Norte no início do século XVII e também possuíam postos na costa da África e aí foram acompanhados pelos dinamarqueses e bálticos como Kurland e Brandenburg Não apenas as necessidades desse comércio marítimo entre o Mediterrâneo e a Europa do norte serviram como estímulo para a construção naval ibérica e o interesse no comércio interregional mas o número relativo de grandes navios envolvidos aumentou o potencial de viagens de descobertas acidentais A carreira de Lanzaroto Malocello é um exemplo desse fato Malocello era um mercador genovês que tinha relações comerciais com Cherbourg no norte da França e com Ceuta no Marrocos e assim fazia frequentes viagens pelo Atlântico tanto ao norte como ao sul de Gibraltar Em uma dessas viagens ele descobriu ou redescobriu pois já eram conhecidas na época clássica provavelmente por acidente as ilhas Canárias em cerca de 1312 As Canárias foram as primeiras ilhas do Atlântico redescobertas pelos europeus e sua colonização realizada por Malocello em torno de 1335 representou um passo precoce e importante na exploração do Atlântico Além de multiplicar as oportunidades de viagens acidentais de descoberta a navegação marítima entre o Mediterrâneo e o norte do Atlântico em especial porque envolvia navios de grande porte propiciou a difusão de técnicas de construção naval Assim os navios robustos e de formas arredondadas do mar do Norte e do Báltico mesclaramse com as longas embarcações de fácil manejo do Mediterrâneo Isso resultou na criação de navios capazes de carregar mais carga e de navegar sob as mais variadas condições que podiam ser encontradas tanto no Mediterrâneo como no norte do Atlântico A essas descobertas foram acrescidas técnicas de velejar e navegar dos muçulmanos com os quais os genoveses e os povos ibéricos mantinham constante comércio Entretanto o fato de possuir os meios para fazer viagens oceânicas e descobrir novas terras não significava necessariamente que essas viagens ou explorações extensas se realizariam Precisaria também existir um conjunto razoável de motivos e os financiadores tinham de estar razoavelmente confiantes de que essas viagens valeriam a pena considerando os grandes riscos que sua realização implicava AS MOTIVAÇÕES DOS EUROPEUS OS OBJETIVOS GEOPOLÍTICOS E ECONÔMICOS A LONGO PRAZO Diversos fatores técnicos e geográficos fizeram com que os europeus fossem os mais apropriados para explorar o Atlântico e desenvolver seu comércio Mas a tarefa requeria também fortes justificativas polí ticas e econômicas antes de ser realizada Uma escola antiga e romântica de historiadores afirma que os europeus fizeram essa exploração pela mera alegria da descoberta ou para quebrar o monopólio comercial dos muçulmanos no oriente Essas razões eram suficientes em sua interpretação para permitir que visionários como o infante D Henrique príncipe Henrique o Navegador de Portugal ou a rainha Isabel da Espanha financiassem as viagens36 Essa visão romântica foi reduzida a dimensões mais mundanas pelos trabalhos de historiadores portugueses sobretudo Duarte Leite e Vitorino MagalhãesGodinho Eles enfatizaram que a exploração e as viagens realizaramse gradualmente durante um longo período de tempo e foram estimuladas pela perspectiva de lucros imediatos que podiam ser facilmente obtidos usando a existente ou só ligeiramente modificada tecnologia37 Sob essas condições os custos básicos eram baixos os lucros e retornos garantidos e a possibilidade de grandes descobertas limitada Mesmo as maiores expedições a viagem transatlântica de Colombo em 1492 e a circunavegação de Vasco da Gama em 1498 foram alicerçadas em muitos anos de profícua exploração do Atlântico e em excelentes informações sobre os retornos financeiros no caso de Vasco da Gama ou a esperança de encontrar novas ilhas no Atlântico potencialmente rentáveis como no caso de Colombo Nesse cenário é possível perceber os avanços tecnológicos nos métodos de navegação mais como consequência do que um elemento condutor das descobertas A tecnologia era desenvolvida quando havia certeza de que se poderia lucrar com o aperfeiçoamento das técnicas No entanto existem evidências para apoiar ambos os argumentos e é arriscado aceitar com precipitação a pesquisa de acadêmicos recentes com suas interpretações menos românticas Afinal muitos daqueles que descreveram as viagens escreviam com sua visão romântica Por exemplo o cronista do século XV Gomes Eannes de Zurara destaca sobretudo motivos geopolíticos ao mencionar uma lista de razões que impeliram o infante D Henrique a enviar navios precursores em viagens diretas entre a África ocidental e a Europa Esses motivos resultavam da luta secular entre cristãos e muçulmanos para controlar o mundo mediterrâneo O desejo principal de D Henrique de acordo com Zurara era de derrotar os muçulmanos do norte da África e as considerações econômicas ficavam em segundo plano Ele esperava que seus marinheiros pudessem contatar uma potência cristã ao sul do Marrocos para formar uma aliança antiislâmica ou estabelecer comércio com vizinhos não muçulmanos que poderiam ser convertidos ao cristianismo e que concordassem com essa aliança ou que ao menos poderiam ser persuadidos a cessar o comércio com o Marrocos38 Zurara expressava uma esperança longamente acalentada pelos cristãos ibéricos Escritores e visionários que viveram no período anterior às viagens patrocinadas pelo infante D Henrique propuseram diversos planos para afastar os muçulmanos de uma forma ou de outra Em 1285 por exemplo um teólogo de Maiorca chamado Ramon Llull sonhava em converter o rei de Gana ao cristianismo e assim criar um estado cristão na hinterlândia islâmica do norte da África39 Desde 1306 quando uma delegação da Etiópia chegou à Europa em busca de uma aliança cristã com o rei dos espanhóis para oferecerlhe ajuda contra os infiéis40 a idéia de uma conexão entre a Península Ibérica e a Etiópia foi considerada Na verdade o rei Anfós IV de Aragão quase conseguiu um duplo casamento com o Negus da Etiópia em 142841 e a Coroa portuguesa enviou Pedro de Corvilhão à Etiópia em 1487 para preparar alianças similares42 36 Resumido em ibid pp 23340 37 Resumido em ibid pp 2435 38 Gomes Eannes de Zurara Crónica dos feitos de Guiné cap 8 Existem muitas edições mas a melhor é a de Torquado de Sousa Soares 2 vols Lisboa 1978 A tradução francesa Leon Bourdon Chronique de Guinée Dakar 1960 contém uma importante introdução sobre a história e discussão de problemas textuais Uma tradução inglesa feita com base em uma edição menos meticulosa e com notas datadas é a de C R Beazley e E Prestage 2 vols Londres 18969 39 Ramon Llull Libre dEvast e dAloma e de Blanquerna c 12835 cap 84 ed Joan Pons i Marquès em Ramon Llull Obres essencials 2 vols Barcelona 1957 12412 Sobre a filosofia geopolítica de Llul ver Armand Llinares Raymond Lulle philosophe de laction Paris 1963 40 Registrado em Jacopo Filippo Foresti da Bergamo Supplementum Chronicarum 1483 com base em notas de Giovanni da Carignano na época que a missão passou por Gênova Publicado a partir da edição de 1492 em Youssouf Kamal Monumenta Cartographica Africae et Egypti Leiden 192653 vol 4 fol 1139 Uma tradução com base na edição de 1483 e uma discussão de R A Skelton foram publicadas em O G S Crawford Ethiopian Itineraries circa 14001524 Cambridge 1958 pp 21215 Como resultado dessa visita o geógrafo Giovanni da Carignano concluiu que a Etiópia era o lar do lendário Preste João afastando quase permanentemente a hipótese de que ele vivia na Ásia Ver Enrico Cerulli Giovanni da Carignano e la cartografia dei paesi a Sud dellEgitto agli inizi del secolo XIV Atti del XIV Congresso geografico italiano Bolonha 1949 p 507 41 Ver a discussão à luz da atividade catalã e dos planos no Mediterrâneo oriental em Lluís Nicolau dOlwer Lexpansió de Catalunya en la Mediterrània oriental 3a ed Barcelona 1974 pp 1715 42 Mordechai Abir Ethiopia and the Red Sea The Rise and Decline of the Solomonic Dynasty and MuslimEuropean Rivalry in the Region Londres 1980 pp 1940 Acadêmicos modernos estão mais convictos da relevância dos objetivos econômicos do que dos grandes planos geopolíticos de natureza religiosa e militar e por conseguinte alguns enfatizam a fabulosa fortuna que circularia através do comércio oceânico com as ilhas ricas em especiarias da Índia e do sudeste da Ásia ou com a África ocidental sobretudo pelo seu ouro Essa interpretação se apóia na correlação entre a exploração do Atlântico e o declínio de Acra o último posto avançado das relações comerciais diretas com o leste do Mediterrâneo que passou para o domínio islâmico em 1291 No mesmo ano da queda de Acra os irmãos Vivaldi iniciaram uma viagem de Veneza para achar uma rota para as Índias através do Atlântico mas nunca retornaram43 A cartografia dessa época na verdade muito especulativa encorajava essas tentativas por representar a África de tal modo que sugeria uma fácil circunavegação44 Um frade franciscano de Castela registrou sua viagem de circunavegação na África em 1360 porém seu livro era uma ficção baseada em especulação e no tipo de conhecimento que os franciscanos beminformados poderiam inferir dos mapas contemporâneos cosmografias e comentários sobre o Mediterrâneo ocidental45 No entanto de todas as possibilidades econômicas que poderiam ter motivado a navegação no Atlântico a expectativa de um caminho mais curto para as minas de ouro da África ocidental é a mais provável As Índias estavam muito distantes da concepção geográfica da época ao passo que a África ocidental conhecida por sua riqueza em ouro estava muito mais perto e mais acessível por mar A África ocidental fora uma fonte de ouro para os países mediterrâneos durante séculos talvez mesmo desde o império bizantino46 Escritores muçulmanos pelo menos desde o século IX mencionavam as áreas produtoras de ouro e um fluxo constante de descrições em árabe sobre a África ocidental incluindo uma realizada pelo famoso norteafricano alIdrisi para o rei cristão Rogério II da Sicília em 115447 Esses relatos reuniamse aos do mundo cristão sobretudo àqueles das comunidades de comerciantes catalães e italianos do norte da África os quais comercializavam ouro chamado ouro de Palolus nessas fontes desde o século XII48 Uma rota marítima para as minas de ouro parecia factível pois não envolvia a circunavegação da África Muitos mapas dessa época mostram o Rio do Ouro provavelmente o rio Senegal e de acordo com a legenda do mapa de Mecia de Villadestes 1413 onde se podia obter o ouro de Palolus Embora a área atual localizese mais acima a foz do rio é larga e profunda o suficiente para o maior navio no rio49 Os cristãos pensavam que os muçulmanos navegavam com regularidade nesse rio o anônimo frade franciscano até mesmo afirmou falsamente têlo navegado em aproximadamente 1360 em um navio islâmico50 e antes em 1346 Jacme Ferrer um comerciante catalão tentou alcançálo51 AS MOTIVAÇÕES DOS EUROPEUS A PREVALÊNCIA DAS METAS A CURTO PRAZO Se os planos a longo prazo eram sonhos ou fantasias ou se tinham como objetivo circundar e isolar os muçulmanos obter as especiarias da Ásia ou o ouro da África ocidental eles se limitavam aos reis e intelectuais e nenhum desses grupos demonstrou especial empenho em financiar essas viagens e os empreendimentos privados ou de pequeno porte como os dos Vivaldi e Ferrer não tiveram êxito Nesse sentido apesar dos comentários de autores contemporâneos sobre os motivos ou expectativas dos governantes dos resultados desses projetos o progresso da exploração do Atlântico em última instância dependeu de conside 43 De la Roncière Découverte 1501 44 Ver Jaime Cortesão Os descobrimentos portugueses 2 vols Lisboa 1960 13045 45 Libro del consçimiento de todos las tierras y señorios que son por el mundo y de las señales y armas que han cada tierra y señorío em Kamal Monumenta 4 fol 12599v notese que as páginas eram numeradas consecutivamente de volume a volume Isso inclui uma tradução para o inglês 46 Timothy Garrad Myth and Metrology Trans Saharan Gold Trade Journal of African History 23 1982 44361 47 Ver como exemplo as descrições antigas de Abu alQasim ibn Hawqal Kitab Surat alard em Levtzion e Hopkins Corpus p 49 Abu Ubayd Abd Allah b Abd alAziz alBakri Kitab almasalik wa1mamalik em ibid pp 7785 e alIdrisi Nuzhat ibid pp 1101 48 Essas fontes refletemse com frequência nos mapas da época ver a discussão em de la Roncière Découverte 112141 A maioria desses mapas foi reproduzida em Kamal Monumenta Para uma discussão detalhada das fontes do grupo de Maiorca ver Yoro K Fall LAfrique a la naissance de la cartographie moderne Les cartes majorquines XIVeXVe siècles Paris 1982 pp 55120 A questão sobre Palolus foi discutida em detalhes por Susan K Macintosh em A Reconstruction of Wangara Palolus Island of gold Journal of African History 22 1981 14558 Esse ouro era tão conhecido em Barcelona a ponto de uma portaria daquela cidade baixada em 1271 referirse a ele como o ouro de Palolus de la Roncière Découverte 1114 49 Kamal Monumenta 4 fol 1370 50 Libro del consçimiento ibid fol 1258v 51 Monumenta 4 fol 1235 rações econômicas Essas considerações nos levam por fim a concordar com os historiadores portugueses sobre a prevalência da exploração de curto prazo nãoromântica gradual como o principal método expansionista europeu É importante também observar que outra fantasia romântica de que os povos ibéricos eram os únicos líderes dessa exploração é incorreta A exploração do Atlântico era um verdadeiro exercício internacional mesmo que as maiores descobertas tivessem sido feitas com o patrocínio dos monarcas ibéricos As pessoas que realizaram as viagens reuniam recursos humanos e materiais onde estivessem disponíveis Ingleses franceses poloneses italianos navios e capital uniramse aos ibéricos em seu esforço Seu eventual pioneirismo deveuse à rapidez dos monarcas dos países da Península Ibérica em reivindicar soberania ou oferecer proteção aos primeiros colonizadores e a fazer o esforço necessário para reforçar esses pleitos em geral depois que os benefícios econômicos eram claramente revelados por um grupo internacional de desbravadores Podese dividir a expansão em duas asas ou duas direções A primeira foi a asa da África que explorava seus principais produtos como escravos e depois o ouro como uma forma de financiar viagens curtas ao longo da costa e cujos líderes esperavam encontrar habitantes para atacar ou comercializar nos locais percorridos A segunda direção foi o Atlântico que buscava terras exploráveis mas não necessariamente habitadas onde se poderiam encontrar produtos naturais valiosos ou começar a produção agrícola de produtos cultivados com alta demanda na Europa A colonização dessas terras iniciouse com o corte de madeira ou a colheita de mel silvestre porém sua verdadeira rentabilidade decorreu por fim da produção de trigo açúcar ou vinho em ricos solos tropicais e vulcânicos Sob muitos aspectos as ilhas Canárias redescobertas por Malocello no início do século XIV foram o ponto de partida comum para ambas as asas e propiciaram fontes de lucros As ilhas eram povoadas e assim foram invadidas e se anteviram possibilidades comerciais pois tinham produtos naturais de interesse e ao final tornaramse um centro para a produção de vinho e açúcar Além disso em virtude de as viagens serem razoavelmente fáceis e lucrativas elas forneceram segurança financeira para aqueles que procuravam mais lucros na costa adjacente do Saara ou em ilhas habitadas do Atlântico mais distantes Malocello e aqueles que o seguiram no início da metade do século XIV rapidamente descobriram que as Canárias produziam muitos produtos úteis Talvez o mais proveitoso tenha sido a urzela matéria corante originada dos liquens que cresciam nas rochas das ilhas e o sanguededragão uma resina também utilizada como corante As ilhas ainda podiam ser ocupadas lucrativamente para gado e pessoas havia uma demanda constante de escravos no mundo mediterrâneo52 Em 1341 uma viagem às Canárias realizada sob os auspícios de Portugal mas com uma tripulação de diversas procedências e um capitão italiano teve como objetivo tanto comercializar como invadir comprando peles de animais corantes e produtos de madeira Essa expedição também carregava armas para ações ofensivas e o rei Afonso IV de Portugal relatou que emboscadas para capturar escravos já se realizavam antes de 134653 Mercadores catalães uniramse aos portugueses nos primórdios da exploração atacando e comercializando com os nativos das ilhas54 As tentativas de colonização emergiram dessas iniciativas A primeira colonização de diversas partes das ilhas feita por Malocello em torno de 1339 depois por um grupo de aragoneses em 1342 e outra sob os auspícios dos franceses em 1344 provavelmente foram simples tentativas para estabelecer um entreposto comercial e edificar um forte para emboscadas a escravos e nenhuma delas resultou em povoamentos produtivos e de longa duração O povo de Castela parece ter sempre fomentado simples ações ofensivas e comércio para a Espanha55 Castela no entanto apoiou a primeira colonização permanente embora tenham sido os nobres normandos Gadifer de la Salle e Jean de Bethencourt que na realidade organizaram e levaram a termo a empreitada em 14025 Assim como seus predecessores eles parecem ter se 52 Uma excelente pesquisa recente sobre a escravidão nessa época encontrase em Jacques Heers Esclaves et domestiques dans le monde méditerranéen Paris 1981 em especial as pp 2364 nas quais se relata o longo contexto de ações ofensivas a escravos e seus prolongamentos no Atlântico 53 Crônica atribuída a Giovanni Boccacio De Canaria et insulla reliquis ultra Ispanian in oceano nouiter repertis Monumenta Henricina 14 vols Lisboa 196074 12026 sobre a expedição de 1341 Afonso IV para Clemente VI 12 de fevereiro de 1345 Monumenta Henricina 1230 54 Charles Verlinden Lesclavage dans lEurope médiéval I Péninsule ibériqueFrance Burgos 1955 pp 628 55 Sobre Malocello e os aragoneses ver Charles Verlinden Lanzarotto Malocello et la découverte portugaise des Canaries Revue belge de philologie et dhistoire 1958 117390 sobre a tentativa francesa ver Clemente VI Tue deuotionis sinceritas 15 de novembro de 1344 Monumenta Henricina 120714 e sobre as táticas de Castilha B Bonnet Reverón Las expediciones a las Canarias em el siglo XIV Revista de Indias 6 1945 21518 interessado mais pelos corantes ambos eram oriundos de áreas de produção têxtil utilizando os nativos para recolhêlos Eles também trouxeram colonos normandos e fizeram uma divisão territorial apesar de a exportação rentável das colheitas ter demorado um século para se efetuar Uma colonização posterior de Castela e da Espanha prosseguiu com a expansão da agricultura e em aproximadamente 1520 as ilhas produziam açúcar vinhos e produtos à base de carneiro e gado Mas se as ilhas eram visitadas para serem conquistadas atacadas ou para comercializar elas eram vistas ainda como uma fonte rentável e as viagens foram intensas durante o século XIV Essa atividade trouxe mais navios na área ao sul do Estreito de Gibraltar estendendo os ataques e o comércio dos cristãos para o sul e os familiarizando com a área e as regiões vizinhas da costa africana Desse modo as Canárias tanto como colônias quanto pontos de escala convenientes serviram como bases para operações posteriores ao longo da costa da África ou a ilhas desabitadas mais distantes no Atlântico como Madeira e Açores as quais eram provavelmente conhecidas dos europeus desde as viagens de Recco em 1341 A EXPANSÃO EM DIREÇÃO À ÁFRICA As ações ofensivas e o comércio das Canárias serviram de base e motivaram os europeus a expandir suas atividades mais abaixo da costa da África Em consequência Jacme Ferrer iniciou sua malsucedida viagem para Rio do Ouro em 1346 com uma parada nas Canárias Analogamente Jean de Bethencourt conquistador do grupo de ilhas a leste tentou atingir a costa atlântica da África embora não tenha feito viagens além dos limites habituais de navegação Quando Bethencourt prestou homenagem ao rei de Castela em 1405 Portugal reivindicou seus direitos às ilhas solicitados com firmeza pelo menos desde 1341 e suas conexões comerciais diminuíram no local Nesse contexto o infante D Henrique esforçouse para conquistar as ilhas remanescentes e enviou uma expedição para dominálas em 1415 Em 1424 ele lançou uma expedição muito maior envolvendo cerca de 2500 soldados de infantaria e 120 de cavalaria Esse aumento da atividade dos portugueses nas Canárias resultou na bula papal Romanus Pontifex de 1436 renovando os pleitos de Portugal sobre as ilhas ainda nãoconquistadas e uma correspondente ampliação da atividade ao longo da costa do Saara Esses ataques redobrados contra as ilhas Canárias remanescentes e a costa do Saara tiveram como consequência a descoberta do cabo Bojador embora ele tenha continuado um pouco mais adiante pelo navegador português Gil Eanes em 1434 Um ano antes Eanes conduziria uma expedição de captura de escravos na ilha de GrãCanária e a expedição a Bojador foi uma excursão natural do mesmo teor Na verdade as embarcações da época poderiam evitar algumas das dificuldades advindas das correntes navegando pelas Canárias atenuando dessa forma o antigo problema do retorno além de Bojador No entanto apesar do potencial dessa rota alternativa os portugueses não alcançaram logo o Senegal embora expedições para o Rio do Ouro tivessem sido enviadas quase imediatamente elas não chegaram tão longe Algumas delas trouxeram de volta mercadorias como azeite e peles tal como uma realizada em 1436 mas a maioria era só de captura de escravos e raramente se aventuravam mais além do litoral do que era necessário para assegurar uma carga lucrativa Os portugueses só alcançaram o Senegal em 1444 embora tenham atacado e interceptado caravanas que faziam trajetos em direção ao norte em anos anteriores Por conseguinte a real motivação da expansão européia e de abertura de novas rotas marítimas não era simplesmente explorar a oportunidade de lucros imediatos por meio de emboscadas e da apreensão ou compra de mercadorias comercializáveis Foram esses objetivos mais limitados que por fim propiciaram a viagem para o Senegal com a qual 60 Relatado em Zurara Crónica cap 79 ver detalhes adicionais em Barros Décadas de Asia I livro 1 cap 12 Barros foi um escritor do século XVI que examinou documentos sobre essa expedição nos arquivos de Portugal Sobre a situação como um todo ver Florentino Perez Embid Los descubrimientos em el Atlantico y la rivalidad castellanoportuguesa hasta el Tratado de Tordesillas Sevilha 1948 61 Ver Luiz Suárez Fernández Relaciones entre Portugal y Castilla em la epoca del Infante D Henrique Valadoli 1960 pp 24472 62 Zurara Crónica cap 8 63 Ibid cap 11 64 Ibid caps 816 geógrafos e pensadores que almejavam planos comerciais e geopolíticos a longo prazo haviam sonhado desde o século XIV Outros motivos semelhantes permitiram aos portugueses atingir posteriormente esse objetivo de longo prazo importante tanto para o cenário comercial quanto para o geopolítico de circundar a África e descobrir uma rota marítima para a Índia e a Etiópia A predominância de alvos limitados nas viagens de reconhecimento e expansão explica por que a necessária exploração demorou tanto tempo a se concretizar de 1434 quando o maior obstáculo à navegação foi superado até 1488 quando Dias mostrou que o cabo da Boa Esperança situavase no extremo sul do continente africano Na região do Senegal os lucros foram obtidos do ouro e de escravos capturados inicialmente em emboscadas depois comprados Encontravase ouro em muitos pontos do litoral e os navegantes logo estenderam suas viagens em direção ao sul até alcançarem a costa da atual Serra Leoa em torno de 1460 Entretanto muito do entusiasmo desses empreendimentos mesmo durante esses anos visava à consolidação e exploração dos recursos de áreas já conhecidas ou para estabelecer bases O desabitado arquipélago de Cabo Verde era crucial para ampliar a expansão e foi colonizado nos anos 1460 Porém havia outras possibilidades mais além e talvez a perspectiva de descobrimento de uma nova extensão costeira para produzir a pimenta conhecida como pimentamalageta fosse conhecida por Fernão Gomes quando ele fez uma petição à Coroa por direitos exclusivos de comércio na África ocidental menos das áreas anteriormente concedidas aos colonizadores de Cabo Verde em 1469 De qualquer modo sua concessão incluía uma cláusula de exploração de outras partes da costa e suas expedições começaram rapidamente a exportar pimenta Logo depois talvez em torno de 1471 para sua extrema sorte os marinheiros de Gomes atingiram a região produtora de ouro da Costa do Ouro atual Gana uma descoberta inesperada que recompensou largamente Gomes e a Coroa Seus marinheiros localizaram uma nova região produtora de pimenta em Benim no ano seguinte embora o comércio regular só tenha começado nesse local em 14856 Eles também descobriram na ilha de São Tomé outra base potencial para operações na região Desse modo por um longo período de tempo entre 1340 e 1470 a expansão européia procedeu com vagar ao longo da costa africana Os grupos privados que haviam apoiado a maioria dessas iniciativas foram generosamente recompensados e em 1482 pela primeira vez a Coroa de Portugal decidiu custear sua primeira expedição no Atlântico em vez de conceder esse privilégio a outras pessoas que levantavam seu próprio capital Ao contrário das viagens iniciais a viagem real de Diogo Cão tinha um objetivo geopolítico claro Segundo João de Barros informações recebidas de Benim sugeriram à Corte que os navegantes portugueses estavam perto das terras de Preste João e que uma circunavegação da África era agora possível Assim Cão fez a primeira tentativa de expansão imbúida do espírito romântico mas ele só descobriu que o continente africano voltavase para o sul estendendose por milhares de quilómetros mais Mas para sorte da Coroa Cão chegou ao reino de Congo cujos produtos de exportação ajudaram a ressarcir os custos das viagens além de contribuírem para o sucesso da colônia em São Tomé Sem se intimidar com a extensão territorial da África a Coroa portuguesa continuou a custear a exploração primeiro com Bartolomeu Dias e por fim com Vasco da Gama cujas viagens substituíram em geral os relatos prosaicos das primeiras viagens nos livros didáticos e a história romântica da busca pelas Índias O LADO DO ATLÂNTICO E A DESCOBERTA DA AMÉRICA Assim como o lado africano a exploração em direção ao Atlântico começou nas Canárias mas foi estimulada pela esperança de encontrar produtos naturais valiosos e colonizar terras inabitadas Mas como os resultados ficaram aquém das expectativas o processo foi lento Madeira por exemplo provavelmente era conhecida devido à exploração das ilhas Canárias sem dúvida já em 1339 mas sua colonização só foi iniciada em torno de 1425 No entanto seu povoamento foi um precedente importante pois os Açores alcançados por Diogo de Silves só em 1427 estavam sendo colonizados em 1440 Em virtude de serem inabitadas ilhas como Madeira e Açores não ofereciam atrativos comerciais mas podiam ser exploradas por seus produtos naturais Com toda certeza seus primeiros colonizadores João Gonçalves Zarco Tristão Vaz Teixeira e Bartolomeu Perestrello investiram muito na exportação de produtos naturais disponíveis tais como cera mel madeira e corantes ou criaram gado que podia ser mantido com facilidade nas ilhas não arborizadas de Porto Santo e Deserta Os primórdios da colonização dos Açores foi similar A ordem para iniciar o povoamento datada de 1439 já mencionava esses produtos e Zurara referindose a 1446 indicava que alguns já haviam sido exportados Por outro lado os Açores nunca foram particularmente ricos e serviram mais como uma base de operações no Atlântico do que um grande centro de produção O processo repetiuse em outras ilhas desabitadas do Atlântico A carta régia outorgando as ilhas de Cabo Verde ao infante D Henrique em 1462 indicava com clareza que ele esperava obter lucros rápidos na exploração dos produtos naturais ou daqueles que requeriam pouco investimento Do mesmo modo os primeiros colonizadores de São Tomé em 1485 tinham uma carta em que também se especificavam taxas de exportação de produtos naturais que deveriam ser encontrados nessas ilhas tropicais Em cada caso o rei ao conceder a carta especificava termos simples para a exportação de uma variedade de produtos tanto cultivados como naturais que deveriam florescer nos trópicos A colheita de produtos naturais o primeiro incentivo para visitar essas ilhas seguiuse o cultivo de produtos agrícolas de fácil exportação quando o solo e as condições climáticas fossem razoavelmente conhecidos Na ilha da Madeira o desflorestamento e o plantio de trigo o primeiro produto cultivado a ser exportado requereu trabalho extra alguns trabalhadores foram trazidos como empregados da Europa e outros foram provavelmente conseguidos em ataques às Canárias Na verdade os colonizadores da Madeira participaram do ataque de 1424 bem no início da colonização e então as duas operações foram realizadas em conjunto Madeira e as ilhas Canárias começaram rapidamente a exportar trigo em grande quantidade e o solo virgem produziu segundo o testemunho entusiasta de Zurara em 1446 na proporção de 50 para 1 Mosto mais comedido mencionou que a produção de 6070 para 1 declinou para 3040 para 1 em 1455 mesmo assim um proveito ex pressivo para os padrões da época O trigo era exportado para Portugal e para os destacamentos militares portugueses no Marrocos na costa do Saara e na África ocidental a maior parte já transformada em pão91 Mas os lucros reais vieram do vinho descrito como excelente por Mosto já em 145592 e sobretudo pela produção de açúcar na qual era utilizada mãodeobra escrava em especial de nativos das Canárias93 As exportações de açúcar eram significativas em 1455 e cresceram rapidamente até tornar a Madeira um dos principais produtores de açúcar na economia européia94 O sucesso do empreendimento na Madeira encorajou outros e demonstrou que até mesmo ilhas inhabitadas em particular as situadas em zonas tropicais ou subtropicais poderiam ser rentáveis economicamente e ressarcir com razoável rapidez os custos para povoálas Nem todas as ilhas foram tão bem exploradas como a Madeira embora algumas a exemplo de São Tomé tenham se tornado muito lucrativas Mas elas serviram de base para explorações ao longo da costa da África como Cabo Verde e São Tomé ou para navegações mais distantes no Atlântico como Açores para o Brasil e à Índia Mais ainda contudo a expectativa de encontrar ilhas desconhecidas e inhabitadas aparentemente numerosas no Atlântico encorajou os navegantes a olharem para o ocidente do oceano e para o sul da África em busca de fortuna Na realidade poucos anos antes da jornada de Colombo em 1486 a Coroa concedeu a Fernão Dulmo capitão da ilha de Terceira no arquipélago de Açores o direito a todas as terras que ele porventura descobrisse no Atlântico inclusive uma grande ilha ou ilhas ou zonas costeiras de um continente95 Foi a combinação da possibilidade de encontrar novas ilhas e do sonho de alcançar a Índia que inspirou a viagem de Cristóvão Colombo em 1492 embora ele possa ter pensado que essa viagem o levaria às terras de Gengis Khan sua carta especificava também ilhas96 Colombo é claro descobriu muitas ilhas e logo depois um grande continente o qual mesmo que Colombo tenha morrido pensando que estava na Ásia foi logo reconhecido como uma nova e inesperada extensão de terra Por conseguinte a navegação européia no sul do Atlântico não foi resultado de planos visionários de longo prazo de deflagração de uma atividade comercial reprimida ou mesmo a resposta a uma nova tecnologia Foi em vez disso um avanço cauteloso em direção a uma nova fronteira utilizando ou modificando um pouco a tecnologia existente e apoiandose em recursos financeiros relativamente pequenos de capital privado Só nas últimas grandes viagens ao redor da África ou na travessia do Atlântico o patrocínio dos reis um capital vultoso e a visão geopolítica dominaram a atividade Por exemplo somente depois que os navegantes portugueses que visitaram Benim relataram a possibilidade de contatos com Preste João na Etiópia a Coroa portuguesa decidiu financiar sua própria viagem a tentativa de Diogo Cão de circunavegar a África97 Durante todo o século precedente a expansão foi custeada com capital privado embora apoiada pela realeza Analogamente só a conquista das ilhas remanescentes das Canárias e as viagens de Colombo tiveram apoio financeiro da Espanha98 Esse modelo continuaria a dominar a atividade dos europeus Os comerciantes mais ricos os funcionários do governo e os grandes projetos seriam preservados até que as pessoas politicamente mais fracas demonstrassem a certeza do sucesso e então os ricos e poderosos as seguiriam absorvendo as atividades e lucros dos pioneiros invertendo a exploração das novas descobertas para aqueles que dominavam toda a sociedade Assim ao final do século XV os desbravadores haviam testado todo o sistema de ventos e correntes que controlava a navegação no Atlântico99 Ao descobrir essa chave os europeus puderam descerrar o comércio do Atlântico e porque eles o haviam desenvolvido sozinhos seu domínio do altomar no Atlântico era total fato que não ocorreria em nenhuma outra área de navegação européia Nem em técnicas ou expe riência eles dominaram o oceano Índico e o mar da China meridional como fizeram com o Atlântico100 A NAVEGAÇÃO OCEÂNICA E A DOMINAÇÃO POLÍTICA Os acadêmicos têm argumentado que essa dominação marítima conferiu aos europeus vantagens políticas e comerciais insuperáveis sobre os povos locais da África e das Américas101 Essa asserção embora possua algum mérito não investiga a complexidade da situação em especial nas zonas costeiras dos continentes e ao ser examinada em detalhes não é tão convincente como parece à primeira vista Apesar de os europeus terem feito algumas conquistas na África e nas Américas não foi o poder naval que assegurou essas conquistas O fracasso em dominar o comércio local costeiro ou subjugar as sociedades do litoral mais acentuado na África mas que também ocorreu em algumas partes das Américas significa que devemos ampliar nossa estimativa do papel exercido por essas sociedades na formação do mundo atlântico O controle sobre o comércio em altomar era significativo porém talvez não tão determinante como o domínio territorial Combates navais e o comércio afroeuropeu Os europeus confiavam que suas habilidades marítimas lhes dariam vantagens militares resultando em grandes lucros e talvez conquistas Eles estavam preparados para se apossar de territórios e escravizar pessoas e suas ações nas ilhas Canárias foram relatadas por testemunhos Embora alguns visitantes das Canárias tenham desejado encetar um comércio pacífico em última instância foram as emboscadas para capturar escravos e os conquistadores que prevaleceram O controle marítimo permitiu aos europeus desembarcar com liberdade nas ilhas repondo o contingente de suas forças sempre que necessário e concentrando grandes tropas para suas batalhas finais e desse modo a superioridade marítima foi sem dúvida a causa de seu sucesso Os primeiros navegantes que alcançaram a costa da África no século XV esperavam continuar essa tradição como aparentemente fizeram os navegantes espanhóis ao conquistar as grandes ilhas do Caribe no final do século XV e início do século XVI Mas pelo menos na África sua abordagem confiante foi repelida Ao contrário dos nativos das Canárias que não possuíam barcos os povos da África ocidental tinham uma cultura marítima muito bem desenvolvida e especializada capaz de proteger suas águas Uma das expedições ao rio Senegal liderada por Lançarote de Lagos em 1444 atacou brutalmente os moradores de diversas ilhas ao largo Os habitantes embora tenham conseguido infligir algumas baixas em seus agressores não tiveram outro recurso do que tentar fugir para áreas de difícil acesso Outras expedições subsequentes comportaramse mais ou menos da mesma forma mas logo as forças navais africanas foram alertadas desses novos perigos e os navios portugueses começaram a enfrentar uma forte e efetiva resistência Por exemplo em 1446 um navio sob o comando de Nuno Tristão tentou desembarcar uma tropa armada na região de Senegâmbia mas foi atacado por navios africanos e os africanos conseguiram matar quase todos os invasores Do mesmo modo em 1447 Valarte um navegador dinamarquês a serviço de Portugal foi assassinado junto com a maioria de sua tripulação quando embarcações locais o atacou perto da ilha de Gorée102 Embora os navios africanos não fossem projetados para navegar em altomar eles eram capazes de repelir ataques nas costa Eram embarcações especialmente projetadas para enfrentar os problemas da navegação costeira dos sistemas fluviais adjacentes Da costa da Angola até o Senegal as embarcações militares e comerciais tendiam a ser construídas de modo similar Em geral elas eram feitas de um só tronco de árvores tropicais e só ocasionalmente tinham partes laterais Por conseguinte eram longas e baixas Quase sempre eram movidas por remos ou pás e portanto suas manobras independiam dos ventos Deslocavam pouca água e podiam operar na costa rios enseadas e em estuários e lagoas no interior As embarcações projetadas para carregar soldados podiam segundo testemunhas da época carregar de 50 a cem homens103 Esses barcos especiais constituíam alvos pequenos rápidos e difíceis para as armas européias e carregavam forte carga de material de ataque em seus arqueiros e em suas azagaias No entanto eles não podiam se aventurar em altomar e os navios portugueses grandes e de costado alto eram difíceis de tomar de assalto Alvise da Mosto um mercador veneziano que comercializava na África com uma licença portuguesa registrou um embate seu com uma flotilha africana em Gâmbia em 1456 Mosto foi confundido com justiça como um novo invasor de Portugal e foi imediatamente atacado por 17 grandes barcos que carregavam cerca de 150 homens armados Eles exibiram os navios armados com arcos e flechas ao se aproximarem e Mosto disparou sua artilharia contra eles sem contudo atingilos Embora os atacantes tenham ficado temporariamente surpresos com esse bombardeio inesperado não obstante intensificaram o ataque e nesse momento a tripulação no cordame superior do navio veneziano abriu fogo causando algumas mortes De novo apesar de impressionados com essas armas os africanos continuaram a lutar até que Mosto conseguiu por fim comunicarlhes que não tinha intenção de atacálos e aí houve um cessarfogo104 Os africanos eram incapazes na maioria das circunstâncias de tomar de assalto um navio europeu e os europeus por sua vez tinham pouco sucesso em seus ataques por mar no continente Por conseguinte os europeus abandonaram a longa tradição de comercializar e atacar e a substituíram por uma relação quase pacífica no comércio regular Mosto tentou isso em sua viagem e a Coroa portuguesa por fim enviou Diogo Gomes em 1456 para negociar tratados de paz e comércio com os governantes da costa105 Como resultado Portugal estabeleceu e manteve relações diplomáticas com estados africanos Já em 1494 Hieronymous Münzer um visitante alemão em Lisboa observou que o rei enviava com freqüência presentes aos governantes de estados africanos para obter favores e assim os portugueses podiam viajar com liberdade na África sob a proteção desses governantes106 Essas relações diplomáticas e comerciais substituíram com facilidade as atividades de ataque e comércio ou de ataque e conquista em outras partes do Atlântico sobretudo porque os portugueses descobriram com prazer que também havia uma economia comercial bem desenvolvida na África a qual o comércio marítimo poderia explorar sem hostilidades A presença da frota africana em quase toda a costa parece ter inibido a recorrência das ações regulares de ataque e comércio de muitas viagens subseqüentes dos portugueses embora é claro a política de reprimir agressões aos africanos nem sempre fosse seguida Recémchegados ou poderes menos estruturados ainda pensavam nas vantagens a curto prazo das invasões como assim fez uma expedição de Castela enviada em 1475 para comercializar ouro na Costa do Ouro mas que também realizou muitas emboscadas107 Do mesmo modo as primeiras viagens inglesas no final do século XVI em especial a áreas pouco estáveis como Serra Leoa com seus diversos estados também fizeram ações ofensivas ou pelo menos deixaram a violência e a captura de pessoas predominar sobre o comércio pacífico108 Mas essa violência prejudicou o comércio na área e muitos países que tinham uma participação comercial constante tomaram medidas para prevenir hostilidades Uma das primeiras viagens norteamericanas vindas de Boston em 1645 envolveuse em uma emboscada e os encarregados dessa missão devolveram os escravos aprisionados no navio com um bilhete de desculpas provavelmente para manter ou retornar boas relações com seus sócios comerciais em potencial109 Mesmo a Coroa portuguesa algumas vezes precisou reaprender essas lições Em 1535 a tentativa de Portugal de conquistar as ilhas Bissagos sede de alguns dos mais renomados navegadores e invasores da costa da Guiné teve resultados desastrosos110 Mas em geral essas exceções eram esporádicas e o comércio pacífico tornouse uma norma em toda a costa da África Porém em virtude do grande número de participantes e da incerta natureza da factibilidade desse comércio em distâncias tão lon araucanos do Chile120 ou os chichimecas do México 121 os quais resistiram aos colonizadores europeus e conquistadores com tanto sucesso que a colonização foi lenta e realizada sem sua colaboração ou assistência e só depois de uma longa luta Os tupinambás e os tupis no Brasil aceitaram a colonização portuguesa com muito vagar e em 1680 muitas regiões da América do Sul estavam ou inteiramente nas mãos dos nativos ou eram governadas em conjunto com os nativos americanos e os colonizadores europeus em uma incómoda codominação122 Portanto não se pode conceber as Américas sob a soberania total dos europeus Em muitos lugares ocorreu uma longa luta pelo controle em outros locais as fronteiras permaneceram sem o domínio firme dos europeus por muito tempo Quando os africanos foram trazidos para as Américas como escravos essa situação com frequência os favoreceu e para eles a natureza instável das Américas propiciou oportunidades para escapar mediar partidos rivais ou usar o potencial de deserção ou fuga para melhorar sua situação Assim na metade do século XVI o mundo atlântico começou a tomar forma Os navegadores europeus que haviam começado a compreender os ventos e as correntes do Atlântico estabeleceram um sistema de navegação que uniu a Europa a África e as Américas em um sistema único de comércio Os governantes europeus e seus súditos mais poderosos perceberam que esse sistema era muito importante e que possuía um grande potencial de riqueza e estavam determinados a retirar o controle político e econômico das mãos dos pioneiros Mas se os poderosos da Europa controlavam o comércio marítimo na África foram incapazes de dominar a costa e a navegação costeira e nas Américas as regiões conquistadas eram circundadas por povos não conquistados hostis e algumas vezes agressivos Na África eram eles que determinavam seu papel comercial e na América com frequência constituíam o grupo mais importante entre os primeiros colonizadores Mesmo quando não exerciam um papel político especial eles constantemente conseguiam tirar partido da dominação incompleta da Europa 120 Louis de Armond Frontier Warfare in Colonial Chile Pacific Historical Review 23 1954 12532 Robert C Padden Cultural Change and Military Resistance in Araucanian Chile 15501730 Southwestern Journal of Anthropology 1957 10321 121 Ver a admirável discussão em Philip Powell Soldiers Indians and Silver The Northward Advance of New Spain 15501600 Berkeley 1952 122 O livro de John Hemming Red Gold The Conquest of the Brazilian Indians 15001760 Cambridge Mass 1978 é a melhor pesquisa para outras regiões como o Paraguai ver James Lockhart e Stuart Schwartz Early Latin America A History of Colonial Spanish America and Brazil Cambridge 1983 pp 253304 Capítulo 2 O desenvolvimento do comércio entre europeus e africanos O SUCESSO DA ÁFRICA DE RESISTIR ÀS PRIMEIRAS tentativas de ataque da Europa ao seu litoral demonstrou que as interações que se seguiriam seriam muito pacíficas e comerciais pois só em 1579 ocorreria uma grande guerra em Angola mas logo reprimida sem uma conclusão precisa Não houve mais nenhuma importante conquista européia na África e até mesmo os escravos que cruzaram o sul do Atlântico para ajudar na colonização da América foram com frequência mais comprados do que capturados Esse cenário fora preparado pelas expedições de Diogo Gomes em 145662 e caracterizaria as relações entre os europeus e os africanos nos séculos subseqüentes As vitórias navais africanas não significaram necessariamente que o comércio que floresceu em substituição aos ataques invasores estava na verdade sob controle da África ou se servia aos seus interesses ou aos interesses da sociedade rica e poderosa africana De fato muitos especialistas nestes últimos anos consideram o comércio da África atlântica com a Europa destrutivo e desigual com os europeus colhendo a maior parte dos lucros de longo prazo e os africanos incapazes de se beneficiarem ou sendo forçados em virtude da debilidade comercial a aceitar um comércio que por fim levou a África à sua situação atual de dependência e subdesenvolvimento Walter Rodney talvez o mais influente especialista na defesa dessa posição concluiu em seu trabalho sobre as relações comerciais na África atlântica que o comércio com a Europa foi o primeiro e decisivo passo 87 91 MagalhãesGodinho Descobrimentos 12826 92 Mosto Mondo Novo ed GasparriniLeporace p 17 93 Ibid p 22 Greenfield Madeira 94 MagalhãesGodinho Descobrimentos 142650 95 Doação a Fernão Dulmo 3 de março de 1486 em José Ramos Coelho ed Alguns documentos do Archivo Nacional da Torre do Tombo acerca das navegações e conquistas portuguezas Lisboa 1892 pp 589 96 Ver as observações de Samuel Elliot Morrison Journals and Other Documents on the Life of Admiral Christopher Columbus Nova York 1963 pp 2630 idem Admiral of the Ocean Sea A Life of Christopher Columbus Boston 1942 pp 13845 97 Barros Decadas de Asia I livro 3 cap 4 98 Rumeu de Armas España en el África Atlántida Madri 1956 99 Avelino Teixeira da Mota As rotas marítimas portuguesas no Atlântico de meados do século XV ao penúltimo quartel do século XVI Do Tempo e da História 3 1970 1333 100 Ver o importante trabalho de K N Chaudhuri Trade and Civilization in the Indian Ocean An Economic History from the Rise of Islam to 1750 Londres 1985 pp 13859 101 Essa questão foi resumida e examinada em Chauveau Histoire maritime africaine pp 17690 102 Zurara Crónica caps 245 306 86 e 94 103 Sobre os barcos da África ocidental em especial suas características militares ver Chauveau Histoire maritime africain pp 1917 104 Mosto Mondo Novo ed GasparriniLeporace pp 824 105 Gomes relatou sua missão em De prima inuentione Gujnee em Fernandes Descriça fols 27283 esta é a numeração do texto original 106 Hieronymous Münzer Itinerarium 23 de novembro de 1494 MMA2 12478 Muitos desses diplomatas eram conhecidos existem registros de missões ao Congo Benim Labida e Jalofo todas de Lisboa 107 Alonso Fernández de Palencia Cronica de Enrique IV 5 vols Madri 19049 4127 108 Como exemplo o ataque de Cavendish em agosto de 1586 e de Cumberland em outubro de 1586 com base em vários relatos reunidos e editados em P E H Hair Early European Sources for Sierra Leone Africana Research Bulletin 13 1974 712 767 109 Richard Saltonstall para o general Court de Massachusetts 7 de outubro de 1645 em Robert Moody ed The Saltonstall Papers 16071815 2 vols Boston 19724 11389 minutas das reuniões do Boston Council sessões de 1 a 14 de outubro de 1645 e de 4 de setembro 1 de outubro e 4 de novembro de 1646 em Nathaniel B Shurtleff ed Records of the Governor and Company of the Massachusetts Bay in New England 5 vols Boston 18534 reeditado Nova York 1968 284 129 136 e 168 110 Ver o relato retrospectivo de André Alvares de Almada Tratado breve dos Rios da Guiné 1594 MMA2 3319 e a documentação contemporânea Donation to Infante Luís 27 de março de 1532 e 5 de setembro de 1534 MMA2 22269 e 2635 gas no período préindustrial não é surpreendente que tais transgressões tenham ocorrido Além do poderio naval africano ter dificultado os ataques ele também permitiu que os africanos comercializassem com os europeus segundo seus próprios termos coletando direitos aduaneiros e taxas como queriam Por exemplo Afonso I rei do Congo capturou um navio francês e sua tripulação em 1525 porque estava fazendo comércio ilegal em sua costa111 Talvez em razão de incidentes como esse João Afonso um navegador português a serviço da França ao escrever na época aconselhava potenciais viajantes da França para o Congo de gerir o comércio corretamente explicando que quando um navio entrava no Zaire ele tinha de esperar até que os funcionários na costa enviassem um dos seus barcos e que não fizessem nada sem a real permissão do rei do Congo112 Uma excursão militar portuguesa na África atlântica a conquista de Angola foi mais o resultado de uma controvérsia econômica do que de aspirações territoriais A colônia foi originalmente planejada para abrigar uma feitoria comercial a fim de regular o comércio de Dongo e durante quatro anos funcionou como tal113 Quando uma disputa comercial provocou uma guerra em 1579 a posição portuguesa foi salva pela intervenção de um exército do Congo e apesar de o Congo terse unido a uma coalizão contra Portugal em 1571 Portugal havia conseguido uma base sólida e aliados locais para se manter114 Conflitos navais e a conquista das Américas Embora nosso objetivo principal seja mostrar o papel da África na formação do mundo atlântico vale observar mesmo superficialmente que em algumas partes das Américas a superioridade naval dos europeus não era tão significativa A maioria das conquistas espetaculares dos europeus na América envolveu impérios no interior do continente onde o poderio naval era relativamente insignificante com exceção do conhecido papel das fragatas hispânicas no cerco de Tenochtitlán por Cortez115 Entretanto o mais dramático foi o fracasso da Espanha no Caribe A Espanha sem dúvida conquistou com uma ajuda considerável dos povos locais as maiores ilhas Porém muitas vezes suas conquistas foram rechaçadas pelos habitantes militaristas do sul e do leste do Caribe O povo kulinago das Pequenas Antilhas os carib e os arawak que habitavam a Venezuela e as Guianas com frequência mas nem sempre de modo acurado designados caribs em documentos espanhóis116 não só resistiram às tentativas de ataque dos espanhóis como conseguiram atacar as possessões espanholas durante os séculos XVI e XVII O povo da bacia oriental do Caribe possuía uma boa tecnologia naval nos moldes da africana com embarcações relativamente pequenas e de fácil manobra117 para derrotar os navios espanhóis pois eles navegavam em altomar118 A ocupação posterior dos franceses ingleses e holandeses nas Índias Ocidentais resultou na primeira codominação e depois em um longo embate militar que só foi decidido pela força numérica superior dos colonizadores Mesmo em terras continentais a conquista européia das Américas ficou muito aquém da plenitude Fora das áreas centrais do México e do Peru houve muitos nativos americanos que resistiram a incursões dos europeus ou se renderam gradualmente após uma longa pressão militar Entre eles podese citar os indígenas da Flórida que não só venceram o célebre ataque de Ponce de Leon como perseguiram seus homens em suas canoas capturando diversos dos seus navios119 Mesmo em terra firme os europeus não conseguiram derrotar com facilidade nem os 115 Existem várias pesquisas sobre esse período a melhor talvez sendo a de Carl Sauer The Early Spanish Main Berkeley e Los Angeles 1996 e Troy Floyd The Columbus Dynasty in the Caribbean 14921526 Albuquerque 1973 116 Sobre a complexidade das situações etnológicas históricas e arqueológicas na bacia meridional do Caribe incluindo as Guianas e a bacia do Orinoco ver Marc de Civrieux Los Caribes y la conquista de la Guayana española Montalbán 5 1976 8751201 117 Para um relato sobre a batalha naval entre as canoas caribenhas e os navios europeus parecidos de algum modo com o relato de Mosto na África ver o testemunho de Jean Baptiste du Terte Histoire générale des Antilles habitée s par les Français 4 vols Paris 1667 150812 118 Para uma boa pesquisa sobre as relações da Espanha com os habitantes da atual República Dominicana e as proezas militares dos caribenhos em geral ver Joseph Baromé Spain and Dominica 14931647 Caribbean Quaterly 12 1966 3047 119 Antonio Herrera y Tordesillas Historia general de los hechos de los castellanos 1724 diversas edições modernas década 7 livro 7 caps 5 810 para o atraso da África Como Rodney afirmou em razão de a África estar em um nível inferior de desenvolvimento econômico em relação à Europa ela foi forçada a compactuar com uma espécie de comércio colonial no qual os africanos cedi am matériaprima e recursos humanos na forma de escravos em troca de bens manufaturados uma forma de dependência que certamente caracteriza o comércio moderno africano¹ Embora nem todos os estudiosos tenham compartilhado de sua visão radical sobre muitos aspectos desse relacionamento interpretações recentes continuaram a enfatizar que o subdesenvolvimento da África a conduziu inevitavelmente a um tipo de comércio que prejudicou seu potencial para progredir Nesse sentido Ralph Austen cujas opiniões são muito mais conservadoras do que as de Rodney também concordava que o comércio iniciado no século XVI levou à África a uma grande marginalidade na economia mundial além de refre ar o desenvolviment o tecnológico e algumas estratégias para o crescimento econômico² Entretanto um exame sobre o desenvolvimento econômico da África em torno de 1500 e a natureza precisa do comércio no Atlântico não endossa essa posição pessimista Os africanos tiveram um papel muito ativo no desenvolvimento comercial e o fizeram por sua própria iniciativa Por sua vez o comércio no Atlântico não era tão crucial para a economia africana como pensam os estudiosos e por outro lado seus produtos manufaturados tinham as qualidades necessárias para competir com a Europa préindustrial Para compreender o papel da economia da África no comércio do Atlântico é preciso examinar duas questões interrelacionadas ambas oriundas de trabalhos de acadêmicos que vêem a África como associados comerciais subalternos e dependentes Primeiro a premissa sobre o atraso da África na produção de bens manufaturados baseada em grande parte na analogia com a sua atual incapacidade de produção e seu impacto na moderna economia da África Segundo o pressuposto da dominação comercial em que os europeus de alguma forma foram capazes de controlar o mercado africano por meio do monopólio ou pela manipulação comercial 1 Rodney How Europe Underdeveloped Africa pp 95113 idem A History of the Upper Guinea Coast 15451800 Londres 1970 pp 17199 2 Ralph Austen African Economy History Londres 1987 pp 81108 A INDÚSTRIA E OS TERMOS COMERCIAIS As comparações entre o comércio dos séculos XVI e XVII e o dos dias atuais relacionando países industrializados com os menos desenvolvidos não têm embasamento Embora muitos produtos importados pela África antes de 1650 fossem bens manufaturados como ferro ou tecido e que muitas de suas exportações fossem na maioria de produtos semimanufaturados couro cobre e ouro borracha marfim e escravos um exame mais minucioso revela que a antiga manufatura africana era em muitos casos capaz de prover as necessidades do continente Talvez um dos mais interessantes aspectos dos primórdios do comércio atlântico tenha sido o fato de a Europa só ter oferecido à África artigos que ela já produzia fato com frequência negligenciado nas análises comerciais Isso diferencia de imediato o período inicial com os dias de hoje pois agora a indústria doméstica africana não produz nenhum dos produtos manufaturados importados dos países desenvolvidos A Europa exportava uma ampla gama de mercadorias para a África antes de 1650 e de diversas categorias Em primeiro lugar em termos de volume vinham os tecidos uma grande quantidade de vários tipos de tecidos no século XVII Depois as mercadorias em metal sobretudo ferro e cobre como matériaprima barras de ferro e manillas de cobre³ e peças trabalhadas facas espadas bacias e tigelas de cobre etc Em seguida moeda corrente consistindo em toneladas de cauri Esse comércio era muito importante em Benim e na Costa dos Escravos embora essas moedas fossem também importadas pela África central Por fim havia o que se pode descrever como itens não utilitários como jóias em geral contas brinquedos mecânicos e curiosidades e bebidas alcoólicas É importante notar que nenhum desses artigos era mercadoria essencial A África possuía indústrias bem desenvolvidas que produziam cada item dessa lista e embora nem todos fossem produzidos em cada distrito um número significativo era importado por regiões em que claramente não havia uma necessidade premente deles e essa importação tinha um caráter estritamente funcional 3 Uma manilla era um lingote em forma de ferradura a maneira mais comum como o cobre era transportado e vendido Nota da Tradutora Cowrie moneta usado como dinheiro em algumas partes da Á sia e da África Em resumo o comércio não se desenvolveu para atender às carências da África ou mesmo para suprir uma produção deficiente ou problemas de qualidade dos produtos africanos manufaturados Mais exatamente o comércio da África com a Europa foi em grande parte motivado pelo prestígio modismo gostos diferentes e um desejo de variar e essas motivações extravagantes apoiavamse em uma economia produtiva razoavelmente bem desenvolvida e um poder de compra considerável O comércio atlântico da África não foi um simples anseio para preencher necessidades básicas e da parte dos africanos o interesse em importar mercadorias não representou um critério de valor de suas carências ou ineficiência mas em vez disso foi uma medida da extensão de seu mercado doméstico Começase a perceber as complexidades comerciais ao observar o comércio de metais sobretudo ferro pois este era o melhor exemplo de uma mercadoria que era importada e poderia ser utilizada em ferramentas e em que a técnica era essencial para produzir artefatos de qualidade Os portugueses exportavam pouco ferro para a África talvez porque se sentissem obrigados a honrar as injunções do papa contra a venda de materiais com potencial militar para os infiéis No entanto o Congo cristão também recebeu pouco ferro de Portugal o que faz crer que sua produção era pequena e o lucro de exportálo seria medíocre Os holandeses que tinham acesso a boas fontes alemãs e escandinavas e os ingleses que possuíam seu próprio ferro foram os pioneiros na venda de ferro na África e as barras de ferro já predominavam nos presentes ofertados por van den Broecke em 1605 O ferro surgiu nas listas de produtos comercializáveis holandeses no século XVII como útil em toda a África e grande quantidade era levada para lá todos os anos Com base em estatísticas de companhias comerciais francesas e inglesas Curtin estimou que a Senegâmbia importou cerca de 150 toneladas de ferro da Europa por ano na segunda metade do século XVII embora esse montante seja provavelmente mais elevado do que as quantidades importadas anteriormente Mas a África era uma produtora de ferro e a Senegâmbia já era suprida por produtores em Futa Jalom e talvez também por uma produção local de má qualidade à época da chegada dos portugueses Na verdade os portugueses compraram ferro em Serra Leoa para vendêlo em Senegâmbia e em outros locais como mostram claramente os livros de registro do navio Santiago que fez a travessia dessa rota em 1526 Porém o comércio europeu posterior de ferro com a Senegâmbia não foi simplesmente uma tentativa de competir com outros produtores da África ocidental para suprir as necessidades de uma região pobre desse metal Na realidade o comércio de ferro foi algo mais complexo As peculiaridades da produção africana desse metal que levaram o ferro da Europa a ser atrativo vêm é provável de longa data Segundo trabalho recente sobre a produção antiga de ferro na África a tecnologia foi desenvolvida em torno de 600 aC ou mesmo antes na orla do Sudão no início do deserto do Saara talvez como resultado de descobertas realizadas em áreas produtoras de cobre no deserto ao norte da atual Nigéria Em virtude de haver recursos escassos de combustível desse local os trabalhadores africanos desenvolveram métodos para conserválo dos quais o mais importante foi o projeto de um sistema para préaquecer o jato de ar que entrava na fornalha o qual prefigura técnicas usadas na Europa só no século XIX Esse método não só economizava combustível como também propiciou a fabricação de aço de excelente qualidade talvez o melhor aço do mundo na época e com certeza igual ou mesmo melhor do que o aço produzido nos primórdios da Europa moderna De fato a pesquisa sobre a qualidade do metal produzido nas fundições da África ocidental e os estudos arqueológicos recentes indicam que o aço africano equivalia a qualquer um produzido em outros lugares no século XV Mas a fabricação do aço ainda requeria grande quantidade de madeira o que nem sempre estava disponível e assim a melhor produção de aço era feita na margem norte da floresta tropical onde havia uma associação de suprimentos de madeira e minério de ferro bem como abundante transporte por água Isso encareceu algumas vezes o ferro em regiões distantes dos centros de produção como a Senegâmbia Em decorrência o ferro europeu mesmo de qualidade in ferior era competitivo no preço e podia ser utilizado em artefatos que não necessitavam da qualidade do aço Mas apesar de seu preço ser competitivo a importação de ferro não conseguiu suprir as necessidades da Senegâmbia antes de 1680 De acordo com as estimativas de Curtin suas importações anuais de ferro em 1680 chegavam a 150 toneladas e provavelmente eram inferiores na metade do século anterior Esse ferro atenderia às carências de uma população restrita situada ao longo da costa norte de Gâmbia e do interior do Senegal até aproximadamente Futa Tooro onde uma indústria local reduzia a necessidade de importações Curtin observa que os comerciantes encontraram um mercado muito limitado para a importação de ferro nas regiões acima de ambos os rios antes da metade do século XVIII Caso se presuma que cada família tivesse um conjunto mínimo de utensílios composto de uma enxada um machado uma grande faca machete ou foice para desmatar os campos pequenas facas para cortar e alguns arcos e flechas e lanças para cacar excluindo artefatos para usos militares podemos estimar que cada família possuía dois quilos de ferro em um dado momento o qual necessitava de reposição a cada dois anos para o ferro produzido no local o ferro de baixa qualidade ou importado necessitava de reposição duas ou três vezes por ano e por conseguinte cada família tinha um consumo anual de um quilo de ferro por ano Se em 1650 essa região costeira limitada possuísse uma população total de cerca de 15 milhão de pessoas organizadas talvez em 300 mil unidades familiares então essas famílias necessitavam de 300 toneladas de ferro local por ano Mas se elas usassem ferro importado com uma taxa de reposição mais alta seria preciso no mínimo 1200 toneladas para suprir suas carências Assim as importações provavelmente só atendiam a cerca de 10 a 15 de suas necessidades Essa estimativa de consumo é baixa presumindo um consumo mínimo de uma família e exclui usos militares uma das mais importantes utilizações do ferro Por exemplo em geral os cavaleiros na Senegâmbia segundo descrições do final do século XVI carregavam uma espada uma lança com uma lâmina larga e sete ou oito lanças de arremesso menores e seu cavalo e sela também utilizavam uma pequena quantidade de ferro tudo isso somando talvez dois quilos Sendo assim uma unidade de 500 cavalos usava uma tonelada de ferro com uma taxa de reposição alta pois alguns artefatos eram consumidos antes de se desgastarem como as lanças de arremesso as quais por essa razão podiam ser feitas de um ferro importado de qualidade inferior e mesmo de acordo com uma estimativa moderada das tropas de cavalaria é provável que os 15 mil cavaleiros do litoral e os da região mais abaixo dos rios necessitassem de 30 toneladas de ferro sem mencionar a infantaria numerosa em que algumas de suas armas consumiriam a estimativa mencionada de consumo familiar mas que provavelmente demandariam no total 10 ou 20 toneladas a mais Se o ferro da Europa não supria as necessidades de uma região carente desse metal e com certeza não substituía o ferro de má qualidade por um melhor pois como vimos o relacionamento era inverso então o ferro importado dos países europeus tinha um papel muito mais complexo Os africanos da Senegâmbia e de outros locais compravam o ferro barato europeu em barras talvez a forma mais comum de compra mas eles também compravam espadas de aço de ótima qualidade as quais eram com certeza utilizadas já com seu acabamento final Os africanos podiam é claro fazer suas próprias espadas pois possuíam habilidades e metal de qualidade porém sem dúvida a espada importada era também um item prestigioso cujo valor não era estimado só por sua utilidade como arma Isso explica por que os arqueólogos encontraram uma espada européia em um cemitério em Rao que deve ter sido comprada através do comércio transaariano nos séculos XII ou XIII A distância que essa espada deve ter percorrido não é só um mero indício de sua utilidade não excedia a 150 mil pessoas situa o Congo oriental no mesmo nível dos grandes centros têxteis da Holanda na mesma época como Leiden cuja produção total por ano chegava a 100 mil metros e cuja população total urbana e rural era talvez equivalente Constatase ainda que as importações européias não se destinavam simplesmente ao vestuário pessoal quando se considera o consumo da Costa do Ouro um grande importador de tecido europeu que absorvia uma quantidade de cerca de 20 mil metros de tecido da Europa e da Ásia por ano no início da metade do século XVII Esse comércio fornecia tecido para uma população composta em um cálculo estimativo por 1500000 pessoas das quais cerca de 750 mil adultos e um número aproximadamente igual de homens e mulheres Podese calcular com base em descrições do vestuário do povo comum de Acã feitas em relatos de viajantes tais como o de Marees 1601 e de Müller 1688 que cada homem adulto vestia de três a quatro metros de tecido e cada mulher talvez de quatro a cinco metros incluindo o pano para carregar crianças a maior parte um único pedaço de tecido enrolado em volta do corpo Se fizermos uma suposição mínima contemplando os es cravos mais pobres e determinando uma duração de dois anos para esse suprimento de roupa então em média um adulto precisava de pelo menos um metro de tecido por ano e por conseguinte o consumo anual da Costa do Ouro seria de cerca de 750 mil metros de tecido Os tecidos que vinham da Europa e da Asia representavam assim 2 do consumo total mesmo que isso não pressuponha o consumo da elite com frequência muito maior que a média nenhum consumo de crianças e o uso de tecido para outros fins De fato o consumo de tecido muito mais do que o do ferro era uma maneira de demonstrar prestígio pois seu uso principal era mais para enfeitar o corpo do que para protegêlo A acumulação de grande quantidade de tecido e a exibição desse acúmulo simbolizavam o consumo explícito o qual dado o preço razoavelmente baixo de alguns tecidos era acessível tanto para os ricos e poderosos como também para os camponeses e artistas ambiciosos e bemsucedidos ou mercadores insignificantes Na aquisição de tecidos luxuosos estrangeiros e de cores pouco comuns desenhos texturas e formas também tinham seu papel nesse consumo Nesse sentido Müller ao descrever o consumo de tecido da Costa do Ouro critica o povo por sua vaidade em armazenar e exibir vestuários e pela grande exibição pública que membros ricos e mesmo pessoas comuns da sociedade faziam quando saíam Assim podese entender melhor a dinâmica de demanda pelo tecido europeu O povo acá é tão vaidoso em relação ao vestuário e quando se depara com um tecido ele tem de adquirilo mesmo que tenha de pagar duas vezes mais por ele Por isso ele observa que o preço pago pelos tecidos era com frequência determinado mais pelo valor de seu prestígio do que pela sua utilização É importante notar que o tecido mais caro e mais procurado não era o da Europa mas o de Mandinga importado das regiões norte da Costa do Ouro Podese fazer observações similares sobre a exibição do estoque de tecidos após a morte do rei de Loango em 1624 Embora Loango fosse auf der guineischen Gold Cost gelegene Landschaft Fetu Hamburgo 1673 facsímile reeditado Graz 1968 tradução para o inglês com a numeração de páginas original em Adam Jones ed e trad German Sources for West African History 15991669 Wiesbaden 1983 pp 1509 Müller Afrikansche pp 1515 Ibid p 152 Ibid p 158 o tecido de Mandinga era vendido a 15 libra de ouro ao passo que os tecidos caros trazidos pelos europeus valiam até mais de dois florins p 156 uma região produtora de um excelente tecido e tivesse exportado cerca de 20 mil metros para Angola em 1611 os herdeiros do rei mostraram com orgulho um estoque que incluía uma grande variedade de tecidos europeus e asiáticos e quase 700 metros de tecido do Congo oriental Essa mostra pretendia exibir a riqueza e o prestígio do governante o orgulho representado pelo tecido estrangeiro e luxuoso Essa característica da produção têxtil explica por que tantas regiões africanas exportavam seus tecidos para a Europa e os importavam de lá algumas vezes na mesma transação Por conseguinte o guia de João Afonso para os comerciantes franceses em 1530 relaciona o tecido como item a ser comprado e vendido ao longo da costa do Congo Mesmo Benim que exportava 510 mil metros de tecido por ano através de seus portos para outras partes da África sobretudo para a Costa do Ouro também importava linho da Holanda e tecido da Índia Possivelmente o fato de as regiões produtoras de grande quantidade de tecidos serem as mesmas que importavam devese a um mercado têxtil bem desenvolvido por uma extensa produção local O tecido europeu era importado para atender às demandas sempre em mutação de um tipo de consumidor diferenciado que já havia se acostumado a usar grande quantidade de fazenda e se dispunha a comprar mais sobretudo se fosse diferente e nova Assim algumas das importações de regiões produtoras de tecidos como Loango destinavamse ao consumo exibicionista e tinham uma conotação de prestígio mas outras como o tecido vendido em Aladá sofreriam ainda outra transformação Segundo o capitão inglês John Phillips que visitou Aladá em 1694 a maioria das sarjas e perpetuans que ele vendeu foi desfiada e entrelaçada em seus próprios tecidos e revendida em outras partes da África Alguns desses tecidos de Aladá até mesmo cruzaram o Atlântico pois Phillips observou que cada um deles foi vendido por uma coroa em Barbados 28 Pero Sardinha c 1611 MMA 6534 29 Nicholas van Wassenaer Historisch verhael aller gedenckwaerdiger geschiedenissen die en Europa parte oito outubro de 1624 a abril de 1625 Amsterdã 20 de maio de 1625 fol 28v 30 Alphonse de Saintonge Voyages advandureux fol 55 31 Kea Settlement p 210 32 Ryder Benin and the Europeans pp 86 938 Nota da Tradutora Tipo de lã fabricado na Inglaterra no século XVI 33 John Phillips A Journal of the Voyage in the Hannibal of London Ann 1693 1694 em Awnsham Churchill e John Churchill eds A Collection of Voyages and Travels 5 vols Londres 1732 5236 veitamento do tecido europeu com certeza antecedeu a visita de Phillips e talvez milhares de tecido de Aladá vendidos pelos holandeses na Costa do Ouro nos anos 1640 tivessem uma composição similar Todos esses fatos demonstram que o comércio afroeuropeu não pode ser visto como uma simples troca de produtos essenciais para suprir as carências de uma economia deficitária Nesse contexto é fácil entender a demanda dos africanos por uma ampla variedade de jóias baratas e contas como as ubíquas alaquequas uma pedra amarela do norte da África que Pacheco Pereira viu sendo vendida ao longo da costa da Senegâmbia Diversas contas eram há muito tempo manufaturadas na África as contas akori por exemplo tinham uma antiga reputação na região da atual Nigéria Mas ainda mais que o tecido as contas eram valorizadas pelo seu prestígio e pela sua procedência do exterior e talvez até mesmo pelo seu preço exorbitante No caso dessas mercadorias a idéia funcional de uso deveria corresponder às preferências dos consumidores Essas preferências explicam sem dúvida por que os africanos demandavam tanta variedade de mercadorias da Europa Após examinar as listas de importações holandesas para a Costa do Ouro Kea avaliou que 150 diferentes produtos eram procurados incluindo 40 tipos diferentes de tecido Além disso a procura por determinado artigo mudava drasticamente para a consternação dos mercadores que traziam milhares de produtos e não encontravam interesse por eles Essas mudanças eram indicações claras de que os compradores estavam respondendo muito mais a modismos de produtos não essenciais do que à real necessidade de comercializar para satisfazer desejos básicos Como Müller observou sobre o consumidor da Costa do Ouro em um momento eles gostam dessa nova moda depois se interessam por outra e tudo que lhes atraia eles querem ter Essa é a razão pela qual tantas mercadorias não sao vendidas e retornam para a Europa com grandes perdas Por fim muitos especialistas que estudam o comércio afroeuropeu esquecem com frequência que a África também exportava produtos manufaturados para a Europa inclusive têxteis Já se mencionou os famosos tecidos mesclados de Aladá que o capitão Phillips viu serem vendidos por um preço elevado em Barbados demonstrando que alguém poderia ter sido escravos africanos estava disposto a pagar caro pela mercadoria As esteiras de palha da Senegâmbia eram exportadas para o mercado europeu em grande quantidade Esse comércio é mencionado em fontes antigas e essas esteiras eram frequentemente usadas na Europa como cobertas de cama Elas devem ter sido produzidas e exportadas em grande número pois no início do século XVIII um agente inglês em Serra Leoa foi instruído a comprar nada menos que um milhão de esteiras se puderem ser obtidas Os africanos também produziam outros artigos para clientes europeus O mais famoso deles foi o marfim afroportuguês na maioria em forma de colheres mas também cornetas e saleiros Esses artigos eram elaborados artisticamente em um estilo híbrido e se destinavam ao consumo da elite mas eram numerosos o suficiente para ir além de uma simples produção pitoresca Concluise então que o comércio da Europa com a África não pode ser visto como algo destrutivo pois ele não espoliou nenhuma linha de produção africana nem impediu o desenvolvimento fornecendo produtos que poderiam ter sido manufaturados na África mesmo quando se faz a diferença entre tecidos ou aço de boa ou má qualidade Portanto não havia razão para que os africanos desejassem cessar o comércio ou que o desejo de continuar se baseasse na necessidade 34 Kea Settlements p 210 35 Pacheco Pereira Esmeraldo livro 1 caps 26 27 29 31 ed Silva Dias pp 7991 passim 36 J D Fage Some Remarks on Beads and Trade in Lower Guinea in the Sixteenth and Seventeenth Centuries Journal of African History 3 1962 3437 37 Kea Settlements pp 20712 38 Müller Afrikansche p 152 O desenvolvimento do comércio entre europeus e africanos Por conseguinte os mercadores europeus que pretendiam negociar com os mercados africanos tinham de fazer diversas negociações complexas antes de iniciar a troca comercial Mosto ao chegar no rio Senegal em 1455 e um dos primeiros a registrar essas transações nos dá um exemplo interessante Podese designar esse mercador veneziano como um comerciante privado e sua primeira ação foi de negociar com Portugal para obter a licença para navegar na Guiné Esse requerimento fezse necessário porque o rei de Portugal reivindicou soberania sobre as rotas comerciais do oceano Atlântico e por meio desse pleito que os papas mas nem todas as potências da Europa reconheciam também reivindicou o direito de limitar o acesso fixar itinerários e impor tributos aos que comercializavam nessa área Ao obter sua licença do Estado que controlava o término do ponto comercial europeu Mosto partiu para o local onde teria de se submeter a outras séries de negociações com o governante de Kayor chefe do Estado que controlava o ponto final do lado africano Embora ele não revele todas as complexidades em um cenário que estava começando a se delinear é bem claro que suas discussões com o governante e sua longa estadia com um nobre local fizeram parte da transação pela qual ele conseguiu por fim obter um carregamento Os comerciantes particulares com quem Mosto negociou tiveram sem dúvida de fazer seus próprios arranjos em Kayor porém ele não revela quais foram Visitantes posteriores mostraram a natureza imprecisa desses relacionamentos Quando Pieter van den Broecke um mercador holandês que agia sem muita interferência estatal da Europa realizou uma viagem a essa mesma área em 1605 ele não pediu permissão de Portugal embora soubesse que os navios portugueses poderiam atacálo por violar suas reivindicações de soberania que já vinham sendo violadas impunemente por navios ingleses e franceses Mas os comerciantes holandeses assim como os de outros países europeus que visitaram a África em sua época logo perceberam que eles sofriam restrições em seus países de origem pois em 1621 a Dutch West Company ou Companhia Holandesa das Índias Ocidentais licenciouse e fez os mesmos pleitos que os de Portugal em relação aos comerciantes holandeses desejo de negociar com a África Essa companhia serviu de modelo para muitas outras companhias licenciadas que atuavam fora da França e da Inglaterra e funcionou como hospedeira para outros países do norte da Europa como Dinamarca Brandenburgo Suécia e Curlândia Entretanto para van den Broecke bem como para todos os outros que se seguiram os Estados africanos ainda exerciam vários mecanismos de controle estatal Embora ele não tenha feito visitas demoradas aos governantes de Kayor foi obrigado a fazer uma visita de cortesia a um alcaide do governante a quem pagou um tributo provavelmente em troca do direito de comércio privado Por outro lado quando van den Broecke visitou outras partes da África sua experiência assemelhouse à de Mosto Em Loango aonde ele foi três vezes entre 1606 e 1612 visitava com regularidade o governante pagava impostos e negociava condições comerciais tal como em Ngoyo e Nsoyo outros Estados africanos na região central da África Apesar do fato de que esses Estados atuassem no comércio atlântico há cerca de um século quando van den Broecke os visitou a necessidade de controle estatal ainda requeria negociações havia impostos em forma de presentes e visitas de cortesia aos governantes Esses dois visitantes revelaram algumas das complexidades do comércio africano Por sua vez havia uma série de pleitos das potências européias referentes à navegação ou reivindicações das companhias licenciadas como mais tarde comerciantes holandeses franceses e ingleses mostrariam que incluíam tributação controle sobre rotas e itinerários ou especificações relativas a produtos a serem vendidos ou comprados Por outro lado existiam outros procedimentos solicitados pelos africanos quanto aos produtos a serem comprados impostos ou tarifas aduaneiras preços diferenciados para pessoas de status diverso e assim por diante que se originavam das necessidades e solicitações dos vários Estados africanos46 Ibid pp 6 22 301 59 MONOPÓLIO E COMPETIÇÃO NO COMÉRCIO DO ATLÂNTICO Embora o controle estrito sobre as atividades dos europeus fosse em grande parte uma questão de assegurar que o comércio se concluiria segundo as regras do Estado e em benefício do governante e do erário existia também uma tentativa subjacente de obter monopólio em face dos parceiros comerciais africanos Assim pelo menos uma parte do sistema de controle de garantia de retornos financeiros tinha também como objetivo conseguir melhores preços por meio do controle sobre o suprimento de mercadorias Em resumo o comércio europeu na África tentou distorcer o mercado a seu favor e contra seus parceiros africanos O grau de sucesso dessa política pode indicar se os europeus foram os parceiros mais desenvolvidos ou dinâmicos nessa relação comercial A esse respeito Pacheco Pereira em sua pesquisa sobre o comércio de Portugal no início do século XVII reclamava com frequência que em virtude de o comércio não ser bem administrado as condições comerciais para a venda de cavalos em troca de escravos pendiam em favor dos africanos47 É evidente que isso significava que enquanto a Coroa controlasse os estoques e a oferta de preços para os africanos estes teriam de aceitar esse preço cujo valor máximo seria atribuído pelo preço mais elevado do comércio transaariano de cavalos ou por outras fontes de suprimento Como Pacheco Pereira percebeu muito bem e sem dúvida também a Coroa portuguesa a criação de um monopólio de suprimento de produtos europeus nas mãos da Coroa ou das pessoas designadas por ela asseguraria rendimentos mais elevados e um aumento da receita da Coroa Porém na verdade a Coroa portuguesa e todos os agentes que tentaram isso falharam Com esse fracasso adveio o insucesso da exploração da comunidade comercial africana Existiram dois fatores contrários à política européia e devemos admitir a hostilidade da África a esse respeito Primeiro havia a possibilidade de que as potências estrangeiras cientes da recompensa dos ganhos a serem obtidos no comércio local procurassem comercializar na costa da África e suplantar os preços fixados pelos portugueses por meio da competição Segundo havia o perigo de que agentes portugueses fossem funcionários do governo ou comerciantes particulares agindo com ou sem licença reduzissem o controle estatal ou competissem entre eles Para enfrentar a primeira eventualidade a Coroa de Portugal procurou obter o reconhecimento de outras potências européias sobre suas reivindicações de comércio na Guiné Ela conseguiu o apoio papal e buscou ganhar a aceitação dessa soberania por parte de outros países europeus Apesar do reconhecimento desses pleitos pelos papas essa legitimidade não era totalmente segura ou amplamente respeitada Desde o início das navegações portuguesas existiram os competidores de Castela Só em 1479 como parte do acordo geral entre Portugal e Castela este reino aceitou com relutância a soberania de Portugal sobre as rotas marítimas ao largo das Canárias embora os registros portugueses revelem que os navios particulares continuassem a comercializar na área e até mesmo a pagar impostos pelo dinheiro apurado em suas transações48 Os castelhanos não estavam sós pois nesse mesmo ano Eustace de la Fosse realizou uma viagem de Flandres para a Costa do Ouro mas acabou sendo capturado pelos navios portugueses49 Os projetos de viagens da Inglaterra se seguiram logo após e no início do século XVI navios franceses cruzavam regularmente o sul do Atlântico violando as reivindicações portuguesas e os ditames papais50 Como era típico da natureza desses pleitos da Coroa de Portugal o governo português tentou cessar essas viagens capturando os navios e suas cargas uma ameaça ainda mais atemorizante porque os portugueses anunciavam que jogariam a tripulação no mar bem como encaminhando petições diplomáticas formais aos países de origem dos comerciantes europeus rivais Os embaixadores portugueses enviados à Espanha França e Inglaterra tentaram com regularidade que os governantes desses países ordenassem a seus súditos de desistirem de seus planos de navegar pelo Atlântico eles alcançaram diversos níveis de sucesso51 O apelo aos governantes para controlar o comércio revela a 47 Pacheco Pereira Esmeraldo livro 1 caps 26 28 ed Silva Dias pp 79 82 48 Ver Elbl Portuguese Trade pp 24651 para uma discussão interessante sobre o assunto Os arquivos espanhóis que Elbl pesquisou revelaram que muitos navios de Castela comercializavam nessa área e pagaram o quinto após seu retorno pp 3401 49 Ver esse relato em MMA2 146479 50 John Blake Europeans in West Africa 14501560 2 vols Londres 1942 2107 Teixeira da Mota As rotas marítimas pp 2733 51 Muitas dessas atividades diplomáticas podem ser vistas nas diversas cartas do início do século XVI em ANTT Coleção São Vicente vol 2 fols 25860 vol 5 fols 15662 45762 463 471 519 Ver também M E Gomes de Carvalho D João III e os Franceses Lisboa 1909 postura generalizada dos europeus em relação ao papel do Estado em promover o comércio obtendo concessões para exercêlo ou algo semelhante mesmo que todas as partes reconhecessem que haveria algumas viagens ilegais particulares a despeito da desaprovação real Ao mesmo tempo que procurava encerrar a participação estrangeira a Coroa também tentava controlar a participação de seus próprios cidadãos Nesse caso os custos de supervisionar o comércio tinham de ser ponderados contra os benefícios do monopólio e a dinâmica desses dois fatores configurou a política de Portugal nos primeiros anos Em geral a Coroa algumas vezes buscou participar do comércio diretamente e em outros evitou a sua participação pois o comércio de longas distâncias era sempre arriscado Portanto à época das primeiras viagens o rei de Portugal decidiu permitir que comerciantes particulares portugueses ou estrangeiros como Mosto obtivessem licenças em troca de uma remuneração52 Dessa forma a Coroa conseguia algum rendimento do comércio mas não corria riscos pois as viagens malsucedidas pagavam a remuneração do mesmo modo que as bemsucedidas No entanto como a utilidade e o valor de alguns produtos foram demonstrados os governantes ficaram descontentes com um simples pagamento dos mercadores e começaram a insistir em um monopólio real para negociar uma extensa lista de produtos começando com ouro e escravos mas logo se estendendo a diversos tipos de tecidos moedas e outras mercadorias que eram utilizadas na troca comercial do Atlântico53 Em breve navios reais foram preparados para navegar no Atlântico em 1504 havia 14 navios a serviço da Coroa no comércio com a África54 Por outro lado os monopólios reais e a participação comercial direta não significavam que a Coroa se assenhoreara do comércio Em geral a Coroa ainda preferia negociar trocando a receita garantida paga adiantada pelas incertezas que sempre acompanhavam um comércio que envolvia longas viagens marítimas enfrentando piratas e comerciantes particulares de toda sorte carregando mercadorias que poderiam perecer ou estragar antes de chegar ao mercado Nesse sentido a Coroa decidiu agenciar seu poder de monopólio a particulares dando a cada um deles uma parte do monopólio real em troca de uma renda fixa O monopólio assegurava ao detentor da concessão mais certeza de lucro e um volume maior se outros fatores nãoeconômicos permitissem embora na prática a Coroa não se empenhasse muito no cumprimento dos acordos e com frequência violava o monopólio do concessionário Por fim a Coroa negociava praticamente todos os seus direitos exceto aqueles que incidiam sobre o comércio do ouro Um grande problema que a Coroa de Portugal enfrentou em relação aos seus pleitos de monopólio sobre o comércio europeu foi o custo do cumprimento da lei Com o objetivo de garantir que o sistema se guiaria segundo seus interesses a Coroa começou a enviar agentes para a África para Arguim em 1469 para supervisionar o comércio de ouro e escravos da costa do deserto para Cabo Verde para inspecionar os interesses reais para Mina para supervisionar o comércio real de ouro para São Tomé e depois para pontos ao longo do litoral africano para Cacheu nos Rios da Guiné uma passagem rápida para verificar o comércio na área de Benim para Mpinda e Mbanza Kongo no Congo e posteriormente para a colônia de Angola Esses agentes e os funcionários do governo associados a eles tinham a responsabilidade de inspecionar se o comércio real das mercadorias consideradas como monopólio estava sendo gerido de acordo com um conjunto de regras incluindo uma série de salvaguardas bem elaboradas contra a máfé de seus funcionários e que comerciantes particulares estrangeiros e outros estavam seguindo as regras de Portugal referentes ao licenciamento e ao controle de mercadorias Ao final entretanto tanto os cidadãos como os funcionários do governo os quais eram em geral ricos mercadores que haviam comprado suas posições que participavam do comércio colaboraram para indeterminar a eficácia de qualquer monopólio comercial Para um fun 55 O cuidadoso exame que Elbl realizou nos documentos revela que as realidades eram menos bem definidas Portuguese Trade caps 6 e 7 56 John Vogt Portuguese Rule on the Gold Coast 14691682 Atenas Georgia 1979 pp 5892 Esse comércio parece ter permanecido rentável para a Coroa até a metade do século XVI Elbl Portuguese Trade pp 61819 57 Avelino Teixeira da Mota Alguns aspectos da colonização e do comércio marítimo dos portugueses na África ocidental nos séculos XV e XVI Anais do Clube Militar Naval 101 1976 68792 58 Ibid pp 6902 para uma análise dos regimentos sobreviventes ou instruções para os agentes 52 Para detalhes sobre esse período ver Elbl Portuguese Trade pp 2539 31218 53 Ibid pp 15966 54 ANTT núcleo antigo vol 799 fols 11558 como analisado em Elbl Portuguese Trade p 619 cionamento adequado o comércio precisava ser realizado totalmente sob a supervisão governamental porém isso era impossível na costa da África sobretudo porque os comerciantes particulares europeus e alguns funcionários logo descobriram que os governantes africanos dispunhamse a ceder suas próprias concessões privadas permitindolhes lucrar com o comércio em vez de serem simples agentes Comerciantes particulares e funcionários de segundo escalão a serviço de Portugal agastados com os regulamentos portugueses perceberam também que sua posição no sistema de remuneração do comércio controlado faria com que seus rendimentos permanecessem sempre baixos e então passaram para o lado dos africanos ou ao menos ofereceram seus serviços para eles em troca de uma posição mais elevada no sistema do que Portugal poderia oferecer Nos anos 1520 havia alguns colonizadores independentes chamados com frequência de lançados distribuídos em diversos lugares na África aliados às autoridades africanas O navio real Santiago comprava mercadorias deles em Serra Leoa em 1526 e viajantes ao longo de toda a costa notaram sua presença Ao final do século XVI alguns ocuparam postos importantes em estados da Senegâmbia e a maioria que habitava na região dos rios da Guiné casouse com mulheres locais e lhes foi permitido criar seus próprios núcleos de povoamento Muitos desses colonizadores eram provenientes das ilhas de Cabo Verde e suas conexões com o comércio privado proviam essa área não é surpreendente que alguns fossem cristãosnovos judeus portugueses convertidos cujas chances de prosperar a serviço de Portugal eram limitadas Embora a presença da feitoria real e de uma supervisão escrupulosa limitasse o crescimento desse tipo de comunidade na Costa do Ouro grupos de portugueses de São Tomé e Príncipe estabeleceramse na maioria dos Estados do Golfo da Guiné Portugueses de São Tomé estavam bem em evidência em lugares como Aladá na metade do século XVII eocupavam uma posição de honra no sistema de governo o guia comercial holandês de 1655 até mesmo anotou os presentes que deveriam ser dados ao português Do mesmo modo Villault ao navegar pela costa em direção ao sul em 1667 observou que os mulatos portugueses que viviam ao longo do litoral de Serra Leoa a cabo Mount dominavam totalmente o comércio os quais supostamente haviam ido para o interior sob pressão real em 1604 Apesar dessa data ser questionável é claro que esses trânsfugas tinham também conexões políticas caso contrário não teriam dominado o comércio Na África central onde a inexistência do comércio de ouro não atraía diretamente os interesses da Coroa essa tendência era ainda mais evidenciada Colonizadores portugueses de São Tomé logo se tornaram uma comunidade favorecida no Congo e depois também em Dongo cujos governantes os apoiavam contra as reivindicações do governo de Portugal Os navios portugueses que visitaram o Congo entre 1525 e 1535 registraram a compra de escravos de colonos portugueses locais alguns como Manuel Varela eram funcionários do governo no Congo e desfrutavam do favor real Como os desertores da África ocidental muitos dos desertores da África central eram cristãosnovos Uma investigação realizada em Luanda em 15967 pelo tribunal da Inquisição de Lisboa revelou uma cadeia de povoamentos estabelecida em toda a área pelos cristãosnovos que ocupavam postos no Congo e com frequência postos na Igreja e na administração do Congo e em seus vizinhos a leste bem como em Estados da região de Dembos e Dongo Para refrear o potencial desses trânsfugas de expandiremse a expensas do Estado português a Coroa tentou agrupar todos os portugueses em povoamentos supervisionados sob controle de um agente 59 Ibid p 687 60 Ibid pp 68991 61 UBLBPL MS 927 Aenwijsingse van diversche Beschrijvingen van de NoortCust van Africa fol 12v 62 Nicholas Villault Sieur de Bellefond Relation des costes dAfrique appelée Guinée Paris 1669 a tradução inglesa A Relation of the Coasts of Africa called Guinea Londres 1670 p 84 é citada 63 John Thornton Early KongoPortuguese RelationsA New InterpretationHistory in Africa 8 1981 1934 64 Os livros dos quatro navios que visitaram o Congo nesse período encontramse em ANTT CC sec II Todos registram a compra de escravos de moradores do Congo ver 1283 Livro do Conceição 28 de agosto de 1535 com a data errônea de 1525 na folha da capa do arquivo 192727 Livro do Santo Espírito 30 de janeiro de 1535 MMA 1598102 20316 Livro do Urbano 11 de agosto de 1535 MMA 1511518 e 20439 Livro do Conceição 6 de outubro de 1535 MMA 1512430 Manuel Varela é mencionado como vendedor de escravos em ambas as visitas do Conceição em 1535 ANTT CC II1283 II20439 MMA 15125 Outras fontes o citam como portador de uma carta para Afonso I de Portugal Afonso para João III 25 de julho de 1526 MMA 1480 Ele também é citado como tendo perdido mais de 70 cruzados correspondentes ao valor do dinheiro nzimbu porque os navios não foram apanhar seus escravos no porto de Mpinda inquérito conduzido por Diogo L 12 de outubro de 1458 MMA 22001 65 ANTT Inquisição de Lisboa 1597877 Visita a Angola 15967 fols 2323v 54v55v 58 63 6488v designado pelo rei embora a maioria dessas tentativas não tenha dado o resultado esperado mesmo para a Coroa O fato de que elas não prosseguiram revela que a Coroa decidiu encarar o projeto como um fracasso Isso parece ter ocorrido quando o governo de Portugal tentou basear todas as operações da costa da Alta Guiné em um único ponto justificando que poderia proteger melhor seus cidadãos contra a agressão da população local e rechaçar piratas estrangeiros Um forte foi edificado em 1591 e logo depois foi atacado pelo povo local e embora Almada que relatou todo o episódio fosse claramente a favor do movimento esse fato foi danoso para o comércio do governo e talvez para os lançados que se haviam reinstalados no local Analogamente os planos feitos em 1606 para uma conquista de Serra Leoa semelhantes aos realizados antes em Angola também incluíam um grupo de mercadores e moradores portugueses em um mesmo local sob o controle de um capitão Essas ideias também estavam subjacentes a numerosas tentativas de governantes portugueses de indicar um capitão para a comunidade portuguesa no Congo apoiadas algumas vezes pelos governantes do Congo desde que isso não interferisse com seus clientes entre a comunidade portuguesa Por exemplo em 1574 o rei Sebastião de Portugal procurou reagrupar novamente a comunidade portuguesa no Congo depois de ter ajudado o rei do Congo a expulsar os jagas do país Por fim a Coroa esperou que o estabelecimento de uma colônia em Angola realizaria o que a diplomacia no Congo falhara Embora a colônia tenha com certeza ajudado a manter o controle ao redor da foz do rio Cuanza os portugueses instalados mais além continuaram a fazer alianças locais e assim não sofriam supervisão Para reprimir isso a política adotada pelo governantes no século XVII foi uma variante das iniciais Eles forçaram a realização do comércio em feiras mercados dirigidos por um funcionário português nos locais mais importantes dos maiores parceiros comerciais de Angola Mercados do governo similares parecem ter sido organizados ao final do século XVI mas o sistema só 66 Almada Tratado breveMMA2 32856 3004 67 Doação da capitania de Serra Leoa para Pedro Alvares Pereira 4 de março de 1606 MMA2 412939 68 Thornton Early KongoPortuguese Relationspp 1957 69 Sebastião I para Francisco de Gouveia 19 de março de 1574 MMA 31201 70 Como indicado nas declarações a respeito de resgates e feiras em ANTT Inquisição de Lisboa 1597877 Visita a Angola por exemplo fol 23 Cabonda terra de Angola em q os portugueses residé e passim foi formalizado no início do século XVII Esse sistema provavelmente também falhou em controlar os sertanejos os portugueses que continuavam a fazer seus próprios acordos com as autoridades africanas Essas políticas implementadas para assegurar o controle e a participação da Corte no comércio africano segundo suas normas resultaram na conquista de Angola nos anos 1570 e motivaram projetos de outras conquistas sobretudo as dos rios da Guiné e de Serra Leoa Na verdade essas tentativas eram em última instância consequências do plano da Coroa portuguesa de centralizar e monopolizar o comércio provavelmente para obter um preço monopolista contra os africanos e para garantir seu próprio rendimento ou o de seus licenciados Mas ao final enquanto os Estados africanos preservavam sua soberania a Coroa portuguesa nunca conseguiu dominar completamente o comércio Ao longo do século XVI os portugueses fizeram sérias e frequentes tentativas temporariamente bemsucedidas de manter potências estrangeiras fora do comércio africano embora a longo prazo eles tenham fracassado até mesmo na Costa do Ouro onde se encontrava sua posição mais sólida Em parte esse fracasso deveuse à impossibilidade de manter um poderio marítimo capaz de afastar os navios estrangeiros mas principalmente porque os africanos não estavam submetidos a Portugal e não podiam ser impedidos de negociar com estrangeiros ou com agentes e funcionários subalternos da Coroa portuguesa Esses comerciantes estrangeiros do século XVI eram em geral mercadores particulares e os governos de seus países de origem nem sempre os apoiavam contra os pleitos dos portugueses embora eles raramente tenham aceitado as demandas de Portugal de cessar sua atividade Mas no século XVII os holandeses fizeram uma importante investida contra as reivindicações monopolistas de Portugal Eles argumentaram que isso era uma extensão da guerra espanhola nos Países Baixos e como a Espanha absorvera a Coroa portuguesa em 1580 os holandeses também estavam em guerra com Portugal Os holandeses não fizeram essa investida simplesmente enviando comerciantes particulares apesar de os mercadores holandeses frequentarem a costa da África desde 1590 71 Beatrix Heintze Das Ende des Unabhängigen Staates Ndongo Angola Neue Chronologie und Reinterpretation161730Paideuma 27 1981 2001 72 Para uma discussão racional e atualizada da política de Portugal na Costa do Ouro e o sucesso dos ingleses em frustrála ver Avelino Teixeira da Mota eP E H HairEast of Mina AfroEuropean Relations on the Gold Coast in the 1550s and 1560s Madison 1988 mas em vez disso eles licenciaram uma companhia a primeira Companhia Holandesa das Índias Ocidentais em 1621 Essa companhia um reflexo do sistema de governo discrepante e descoordenado da república holandesa combinava capital de cada cidade que constituía o Estado e em troca do pagamento de dividendos para os conselhos das cidades participantes das rendas advindas de seu comércio ou seja uma espécie de imposto lhe foram concedidos os poderes de um Estado Em resumo era em si uma espécie de Estado e logo começou a operar no comércio nessa qualidade No início de sua carreira a Companhia Holandesa das Índias Ocidentais tentou retirar o controle do sul do Atlântico de Portugal conquistando partes do Brasil e depois atacando sistematicamente as possessões portuguesas na África o posto de Mina caiu em 1637 os de Príncipe e Angola em 1641 e o de São Tomé em 1647 Embora os holandeses tenham justificado a investida contra os pleitos monopolistas portugueses pela defesa dos direitos de liberdade marítima eles rápidamente reivindicaram a soberania quase da mesma forma Assim quando companhias inglesas dinamarquesas suecas e alemãs organizadas segundo os moldes da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais tentaram comercializar com a Costa do Ouro os holandeses afirmaram sua hegemonia e procuraram capturar navios e carregamentos Por conseguinte nos anos 1660 os ingleses e holandeses guerrearam pela supremacia da Costa do Ouro Mas essas reivindicações não atingiam os habitantes da costa Na melhor das hipóteses como os pleitos dos portugueses de que eles agora haviam se apropriado a companhia holandesa esperava dominar as importações marítimas na África de modo a conseguir um monopólio comercial Assim como seus predecessores portugueses os diretores da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais confiavam que poderiam usar sua capacidade militar para limitar a competição a fim de aumentar seu lucro Entretanto os holandeses foram menos bemsucedidos do que os portugueses como é claramente demostrado em um relatório retros pectivo escrito por Heerman Abramsz para os diretores da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais após seu retorno para a Holanda depois de um longo serviço como diretor de operações da companhia na África ocidental em 1679 O relatório mostra o quanto os holandeses foram incapazes de manter o monopólio que eles haviam usurpado dos portugueses e como as companhias inglesas suecas e dinamarquesas tinham penetrado no comércio estabelecendo edificações e postos e fazendo seus próprios acordos com os governantes africanos rejeitando com firmeza as reivindicações dos holandeses até mesmo em áreas nas quais eles tinham postos Mesmo nos locais nos quais elas haviam desistido de seus planos grandiosos de controlar todo o comércio marítimo essas companhias ainda esperavam formar uma relação exclusiva em geral por um tratado formal com um único Estado africano na esperança de estabilizar os preços e eliminar a competição As reclamações constantes nos relatórios das companhias sobre as tentativas de suplantar os preços pagos pelos rivais europeus e a inconstância dos africanos que se recusavam a firmar tratados comerciais revelam claramente tanto as tentativas quanto os resultados Os aspectos da fixação de preços desses tratados não tiveram êxito mas eles garantiram que os suprimentos de mercadorias encontrariam um mercado Por conseguinte mesmo que não tivessem conseguido impor um preço monopolista a seus compradores africanos os europeus poderiam pelo menos ter certeza de que seus navios teriam a permissão de vender suas cargas antes de outras nações ou companhias em troca de produtos africanos Isso diminuiu os riscos do comércio nenhum comerciante queria fazer uma longa e perigosa viagem para se deparar com a inexistência de mercadorias à venda A expectativa de que o risco comercial se reduziria levou os europeus a persistirem nos tratados comerciais com os africanos e talvez a mesma razão motivou os africanos a continuar concordando com eles Mas esses acordos claramente não superaram as distorções monopolistas do comércio Se os problemas para manter suas prováveis reivindicações retóricas de supremacia não fossem suficientes as companhias licenciadas como acontecera antes com Portugal não podiam sempre impedir seus empregados os agentes da costa de servirem aos africanos ou de serem coniventes com eles As instruções enfatizavam com regularidade a necessidade de evitar que os agentes das companhias negociassem diretamente com os africanos ou desertassem para o lado deles Do mesmo modo embora os holandeses e outras potências estrangeiras tenham achado conveniente negociar com o antigo grupo de desertores as já bem estabelecidas comunidades de portugueses ou de seus muitos descendentes africanos eles também não esperavam confiar neles essas comunidades exemplificavam o fracasso de suas tentativas para controlar o comércio Os empregados das companhias podiam ser facilmente assimilados em comunidades comerciais sob o domínio africano Os empregados desertores em algumas ocasiões faziam seus próprios negócios às vezes por meio de um casamento afortunado com uma mulher nativa Assim quando o funcionário prussiano Otto Friedrich von der Gröben visitou o posto inglês na ilha Bence Serra Leoa em 1682 ele observou que muitos funcionários inclusive o governador tinham concubinas que lhes haviam dado filhos Essas concubinas forneciam as conexões locais Um relatório sobre a situação para a Royal African Company para a qual todos os funcionários tinham de se reportar mencionou que cada homem tem sua prostituta para quem eles roubam c Dessas comunidades surgiu um grupo de raças miscigenadas de comerciantes simpatizante dos ingleses que agia em toda a Serra Leoa com conexões com as companhias e os governantes africanos No século XVIII esses grupos foram especialmente benéficos para o comércio britânico OS ESTADOS AFRICANOS E O COMÉRCIO É evidente então que os mercadores europeus atuando sob a direção de estados ou companhias foram incapazes de monopolizar o comércio na África É também patente que os estados africanos embora tenham tentado fazer o mesmo ao final não tiveram êxito Nenhum estado africano realmente dominou o comércio de qualquer parte da costa da África A soberania africana era tão fragmentada quanto a teórica soberania que os europeus tentaram manter sobre o comércio No entanto os estados africanos ajudaram a equilibrar as economias de escala que os mercadores europeus ou companhias possam ter tido Assim poderseia argumentar se um mercador europeu com um bom capital teria obtido vantagem financeira pelo menos a curto prazo da intensa competição entre centenas de comerciantes africanos O papel exercido pelos estados africanos limitou contudo esse efeito compensando qualquer escala de vantagens que o expedidor poderia dispor As exigências estatais impunham um grande número de obstáculos legais e técnicos entre os mercadores europeus e os compradores africanos bem como propiciavam ao Estado ser um participante regular no comércio Um guia comercial holandês de cerca de 1655 por exemplo registra os presentes e impostos a serem pagos em diversos países ao longo da área da Costa dos Escravos do Volta a Camarões Os de Aladá pareciam mais complicados mas isso talvez porque o escritor do guia aparentemente um habitante de São Tomé os conhecia melhor Em Aladá o potencial comprador de escravos e tecido tinha de oferecer uma complexa série de presentes para dançarinos vendedores de comida intérpretes agentes nobres e até mesmo para o rei tanto na chegada quanto na partida O guia mostra que esse sistema não era exclusivo de Aladá ao descrever diversos costumes em Benim Calabar no delta do Níger e na região do Gabão Apesar de poucos serem tão complicados como os de Aladá todos envolviam presentes para governantes ou conselheiros cujos montantes variavam em relação ao status ou posição Na Costa do Ouro onde havia um posto e um forte portugueses desde 1482 as longas visitas pessoais dos comerciantes foram substituídas por presentes regulares ofertados por Portugal a todos os potentados locais Documentos do início do século XVI são repletos de notas desses presentes que se relacionavam só indiretamente ao comércio Ao realizar o comércio os portugueses tinham ainda de negociar e pagar o xarife assim chamado por analogia ao seu próprio sistema um funcionário encarregado de negócios comerciais tão importante em Efuto que poderia até mesmo se tornar rei Em algumas ocasiões os acordos variaram segundo a época Em Benim por exemplo os primeiros livros de navios portugueses dos anos 1520 descrevem uma extensa série de presentes dados a funcionários do governo e uma visita ao governante que então abriu o mercado para cada uma das mercadorias a serem comercializadas inclusive mercados separados para escravos masculinos e femininos Visitantes ingleses meio século depois por sua vez só negociavam com o governante talvez porque seu maior interesse era a pimenta da qual o rei era o único produtor ou talvez em virtude de o sistema político em Benim ter mudado Visitantes subsequentes no século XVII encontraram de novo funcionários encarregados do comércio e além disso os comerciantes não eram mais levados à capital para negociar e faziam seus negócios no porto de Ughoton Do mesmo modo na Costa do Ouro os presentes ofertados pelos portugueses aos governantes locais tornaramse gradualmente uma taxa anual de aluguel embora sempre com conotação de presente Por outro lado qualquer comerciante atuando na região ainda precisava negociar com os funcionários mesmo que esses funcionários ocasionalmente se aproveitassem das complexidades da política local para se estabelecerem como governantes de estados aparentemente independentes Até o que parecia comércio privado tal como caravanas de mercadores a exemplo dos comerciantes akani era sancionado pelo Estado e portanto cuidadosamente controlado Essas negociações que com frequência eram demoradas e das quais muitos visitantes europeus se queixavam eram na essência uma manifestação da insistência por parte das autoridades dos Estados africanos de serem os primeiros beneficiados pela atividade comercial Eles estavam sempre dispostos a retribuir os presentes algumas vezes com algo de muito valor depois que os impostos eram pagos como observou van den Broecke em Loango para assim estabelecer uma conexão especial entre eles e os europeus com quem estavam negociando Mas em geral seu desejo era de garantir o privilégio de serem os primeiros a escolher as melhores mercadorias e obter o melhor preço o que talvez constituísse um segundo imposto pago junto com os presentes habituais Por conseguinte os governantes insistiam em obter um preço especial pelas suas próprias mercadorias e pela compra de artigos europeus Mosto observou que o governante de Kayor com quem ele negociou reiterou seu direito de escolher as mercadorias e a expectativa de que o comércio fosse uma extensão de sua amizade provavelmente significava que ele conseguiria um preço especial Ainda mais específico o guia holandês de comércio em Aladá enfatizava que o rei e seus funcionários deveriam obter um melhor preço nas mercadorias vendidas ou compradas do que as outras pessoas no momento de discutir preços máximos e mínimos para atribuir aos produtos Analogamente André Donelha observou que Gaspar Vaz um intérprete e alfaiate mandinga o qual foi escravo de um amigo de Donelha e tinha uma relação muito próxima com o Duque de Cassanga em Gâmbia poderia obter para ele o preço usual para seus artigos em vez do normalmente cobrado aos fornecedores estrangeiros de mercadorias européias Richard Jobson um mercador inglês que estava em Gâmbia nessa mesma época relatou como esse preço especial foi conseguido Ao negociar com o rei as barras de ferro tinham 30cm de comprimento ao passo que as comercializadas com pessoas comuns tinham apenas 20cm Assim só utilizandose de uma conexão com o Estado um mer Nome completo FICHAMENTO THORNTON Jhon A África e os Africanos na formação do mundo atlântico Rio de Janeiro Editora Campus 2004 O livro intitulado A África e os Africanos na formação do mundo atlântico escrito pelo historiador Jhon Thortnon tem como objetivo adensar o debate acerca do papel das sociedades africanas na formação do mundo atlântico com enfoque no período histórico antes durante e após o período da escravidão de 1400 à 1800 O texto destaca a influência e o impacto da escravidão nas sociedades africanas e no desenvolvimento econômico político e cultural das Américas e da Europa visto que as relações intercontinentais passaram a intensificarse a partir do comércio de escravizados Os principais conceitos utilizados pelo autor a partir do capítulo 3 são Escravidão estrutura social trabalho diversidade étnica mobilidade social comércio transaariano sociedades segmentadas e raça De acordo com o pensamento do autor a escravidão tratava se de uma prática de exploração de trabalho humano prática da qual variavamse os métodos conforme as regiões e épocas na África précolonial Já no que se refere ao conceito de estrutura social esta é apresentada enquanto a organização das sociedades africanas diferenciada conforme a etnia de cada povoado e com diferentes tipos de hierarquias políticas e níveis de poder O trabalho também é um conceito muito utilizado visto como uma atividade necessária para a produção de bens e serviços através da transformação da natureza incluindo o trabalho da agricultura mineração etc A diversidade étnica muito citada trata dos diferentes grupos que conservam e cultuam línguas crenças e culturas diferentes Já sobre a dita mobilidade social abordase a capacidade de um indivíduo ou grupo mudar sua posição na estrutura social o que em alguns casos podia incluir a libertação de escravizados Ademais o dito Comércio transaariano era tido como a rede de rotas comerciais que ligavam o norte da África ao sul do Saara envolvendo o comércio de sal ouro escravos e outros produtos Já a utilização do conceito de Raça muito presente no decorrer do texto faz parte da principal argumentação do autor o qual refletia sobre o modo com que a escravidão na África não era um sistema baseado em raça conforme as teorias biologizantes de raça incluindo fenótipos e cores como o que se desenvolveu na América O sistema de escravização no continente africano era muito mais complexo Posto isso as principais hipóteses levantadas pelo autor dãose justamente na complexidade e diferenciação do sistema da escravidão na África em detrimento do sistema escravista utilizado na américa e em outros continentes Na África a escravização era uma prática variada com diferentes métodos e regras onde diferentes grupos participaram independente da época ou região A escravidão era um processo comum de exploração de trabalho e desenvolvimento social em diferentes momentos e regiões Logo a escravidão não baseavase em raça fenótipo ou origem o que desvela uma disparidade muito grande com a escravidão vivenciada no Brasil Colônia por exemplo Isso se vê a partir da questão da mobilidade social a qual de acordo com o autor era possível na sociedade africana inclusive para os escravos libertos Além disso a competição entre diferentes grupos étnicos e políticos era um fator importante na manutenção da estabilidade social e política na África Logo a rede de comércio transaariano e a difusão do Islã tiveram um grande impacto na sociedade africana incluindo a formação de impérios africanos e a disseminação de conhecimento e tecnologia O método de pesquisa utilizado por John Thornton pode ser dito interdisciplinar visto que o referido defende a multidisciplinaridade para uma compreensão mais abrangente da complexa história da África e sua relação com o Atlântico Desse modo Thornton utiliza fontes históricas variadas incluindo crônicas diários relatórios de viajantes registros de comércio e arquivos de igrejas e governos Além disso ele faz uso de fontes arqueológicas e antropológicas bem como de estudos de linguística e tradições orais Thornton também se baseia em teorias e conceitos de diferentes disciplinas incluindo história antropologia sociologia e linguística para analisar os dados coletados e construir sua narrativa Em resumo capítulo 3 intitulado A escravidão e a estrutura social na África aborda a como se deu a escravidão na África précolonial e sua relação com a estrutura social e política das sociedades africanas De acordo com o autor a escravidão era um processo de exploração de trabalho comum no continente africano O capítulo começa com uma análise das formas de escravidão que existiam na África antes do contato com o mundo atlântico Thornton argumenta que a escravidão era comum em muitas sociedades africanas e podia assumir diferentes formas desde a escravidão por dívida até a escravidão como resultado de conflitos entre grupos étnicos Ele também afirma que a escravidão na África não era um sistema hereditário e que a mobilidade social era possível mesmo para os escravos libertos Thornton ainda examina a estrutura social das sociedades africanas précoloniais enfatizando que elas eram organizadas de forma segmentada e que os indivíduos pertenciam a grupos étnicos distintos cada um com funções específicas na sociedade Ele argumenta que a competição entre esses grupos étnicos e políticos era um fator importante na manutenção da estabilidade social e política na África A existência de diferentes grupos étnicos e políticos também contribuiu para a diversidade da escravidão na África com diferentes formas de escravidão praticadas por diferentes grupos O autor destaca que a escravidão na África não era um sistema baseado em raça como o que se desenvolveu na América mas sim um sistema de exploração de trabalho que podia afetar pessoas de diferentes etnias e origens Além disso a escravidão não era uma condição permanente e os escravos podiam em certas ocasiões se tornar membros da comunidade e ter acesso a direitos e privilégios tendo em vista que a escravidão estava associada a uma estrutura social complexa que incluía diferentes grupos étnicos e políticos com diferentes níveis de poder e prestígio Ele argumenta que a escravidão era uma forma de manter a estabilidade e o controle social Em seguimento o capítulo discute o impacto da entrada dos europeus no comércio atlântico de escravos na África Thornton argumenta que os europeus mudaram o equilíbrio de poder entre diferentes grupos étnicos e políticos na África enfraquecendo alguns grupos e fortalecendo outros Os europeus também incentivaram a captura de escravos para atender às demandas do mercado atlântico levando a uma expansão da escravidão em algumas áreas Assim Thornton conclui o capítulo enfatizando a importância de entender a complexidade e a diversidade da escravidão na África antes de examinar seu papel no comércio atlântico de escravos Ele argumenta que a escravidão na África não era simplesmente um reflexo das demandas do mercado atlântico mas sim uma prática variada e multifacetada que foi incorporada a essa rede comercial em uma forma modificada Ele também enfatiza a necessidade de entender a história africana a partir da perspectiva dos próprios africanos em vez de uma visão eurocêntrica a fim de compreender a complexidade e a riqueza da história e das culturas africanas Já no capítulo 4 do livro intitulado As redes de comércio de escravos africanas é abordada a estrutura e a organização das redes africanas de comércio de escravos que foram incorporadas ao comércio atlântico de escravos Thornton argumenta que essas redes foram criadas e mantidas por africanos e que as demandas do comércio atlântico de escravos foram apenas um dos fatores que contribuíram para sua expansão apesar dos métodos utilizados para a captura e manutenção serem muito diferentes tendo como principais diferenciações a racialização e a falta de mobilidade social para os escravizados fora do continente O capítulo é iniciado com uma reflexão acerca das rotas e os meios utilizados pelas redes africanas de comércio de escravos para capturar e transportar escravizados Thornton argumenta que a captura de escravos não era uma atividade aleatória e desorganizada mas sim um processo complexo que envolvia várias etapas incluindo a identificação de grupos vulneráveis a negociação de acordos com chefes e a escolta de escravos até os pontos de compra e venda Ademais também discutese a importância do comércio interno de escravos na África e como ele contribuiu para o desenvolvimento das redes africanas de comércio de escravos Ele argumenta que o comércio interno de escravos era uma prática comum na África précolonial e que as redes africanas de comércio de escravos usaram essa prática para expandir seus negócios e atender às demandas do mercado atlântico Logo o comércio de escravos era vista como um negócio um trabalho comum como os demais necessário para a manutenção das sociedades africanas Ainda levase em consideração que como não havia a ideia de raça no continente africano o processo não era uma sentença ao escravizado mas sim um trabalho do qual após liberto este poderia ascender socialmente e trabalhar livremente o que não ocorria no comércio atlântico O texto também examina a organização social e política das sociedades africanas envolvidas no comércio de escravos Thornton argumenta que as redes africanas de comércio de escravos eram formadas por vários grupos étnicos e políticos que cooperavam e competiam entre si para controlar o comércio de escravos em determinadas áreas dada a rentabilidade e lucratividade do meio Ele também discute a importância dos intermediários africanos no comércio atlântico de escravos que atuavam como intermediários entre os comerciantes europeus e as redes africanas de comércio de escravos O capítulo é finalizado com uma discussão sobre as consequências do comércio atlântico de escravos na África Thornton argumenta que o comércio de escravos contribuiu para o enfraquecimento gradual da economia e organização política africana e argumenta que o comércio de escravos teve um impacto negativo na economia e na sociedade da África mas que sua influência não foi uniforme em toda a região Em resumo o capítulo 4 enfatiza a importância das redes africanas de comércio de escravos na formação do comércio atlântico de escravos e destaca a complexidade e a diversidade dessas redes Thornton argumenta que as redes africanas de comércio de escravos foram formadas por africanos e que as demandas do mercado atlântico de escravos foram apenas um dos fatores que contribuíram para sua expansão Por fim vêse a importância de tal estudo para a compreensão das diferenciações entre o processo de escravização ocorrido entre os diferentes povos do continente africano e a escravidão ocorrida fora do continente visto que mesmo com a ligação intercontinental e as contribuições de alguns povos africanos para a expansão de tal comércio os métodos e princípios eram muito diferentes e diversificados conforme trazido pelo autor a ideia de raça e a sentença de que aquele que uma vez fora escravizado sempre carregaria tal estigma não eram existentes nas sociedades africanas Parágrafos importantes Página 124 Assim como veremos neste capítulo e no próximo o comércio de escravos e o comércio atlântico em geral não deve ser visto como um impacto externo e funcionando como uma espécie de fator autônomo na história da África Em vez disso ele desenvolveuse e foi organizado de forma racional pelas sociedades africanas que dele participaram as quais tinham completo controle sobre o mesmo até que os escravos embarcavam nos navios europeus para leválos para as sociedades do Atlântico Página 127 O sistema social africano não era então retrógrado ou igualitário mas somente legalmente divergente Embora as origens e a importância determinante dessa divergência sejam um tema para uma pesquisa ulterior um resultado importante foi que ele permitiu às elites políticas e econômicas da África vender um grande número de escravos e assim fomentar o comércio atlântico de escravos Essa característica legal expandiu a escravidão o seu comércio e o seu papel em produzir uma riqueza estável aliada ao desenvolvimento econômico Página 164 A expansão da riqueza por meio da guerra e da escravização era claro uma forma barata para aumentar o poder Os escravos poderiam ser capturados nas guerras e em emboscadas e levados ao território natal de seus captores para trabalhar sem que os exércitos invasores tivessem de conquistar ou ocupar território Para um pequeno estado com pequenos exércitos esse era um modo lógico de enriquecer Mas em outros estados de porte médio ou impérios a expansão territorial também ocorreu Para o império em expansão a escravização da população conquistada permitia aos seus governantes aumentar sua riqueza pessoal e constituir exércitos e grupos administrativos de dependentes diretos assim como os rendimentos dos territórios conquistados forneciam continuamente uma nova renda Assim a expansão externa poderia também aumentar a riqueza e os escravos que eram um subproduto das guerras expansionistas poderiam fortalecer o processo de centralização interna