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Sociologia do Direito
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Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 O RURAL E O URBANO CONTRIBUIÇÕES PARA A COMPREENSÃO DA RELAÇÃO DO ESPAÇO RURAL E DO ESPAÇO URBANO Janério Manoel Jacinto Doutorando do Programa de PósGraduação em Geografia Ambiental e Regional da Universidade Estadual de Maringá UEM e professor de Geografia da Rede Estadual de Educação do Paraná Email manoel354hotmailcombr César Miranda Mendes Docente do Programa de PósGraduação Mestrado e Doutorado em Geografia Ambiental e Regional da Universidade Estadual de Maringá e coordenador do Grupo de Estudos Urbanos GEURUEM Email cmmendeswnetcombr Nestor Alexandre Perehouskei Doutorando do Programa de PósGraduação em Geografia Ambiental e regional Universidade Estadual de Maringá UEM Email nestorappopcombr RESUMO O presente trabalho procura tecer um diálogo com as diversas perspectivas que envolvem as relações campo e cidade em rural e urbano e aborda a questão da visão dicotômica que ainda se tem no momento de se estabelecer diferenças entre campo e cidade e rural e urbano visto que campo e rural são pensados como algo que se opõe à cidade e ao urbano Com base no referencial teórico apontase um continuum ruralurbano isto é uma relação que aproxima e integra esses dois polos rural e urbano e diante das semelhanças e continuidade não ocorre a destruição de suas particularidades justificando a negação do fim do rural Aborda se as atividades agrícolas praticadas no espaço urbano e as atividades urbanas praticadas no espaço rural objetivando destacar que o campo é espaço predominantemente rural mas não exclusivamente De forma semelhante a cidade é espaço urbano o que não significa que seja exclusivamente urbano No mesmo contexto discutese a lógica da urbanidade e ruralidade que diante do aparato tecnológico o campo e cidade e rural e urbano se aproximam onde para alguns autores é chamado de rururbano ou um espaço continuum onde as características de urbanidades estão inseridas no espaço rural e as ruralidades estão presentes no espaço urbano Palavraschave O Rural e o Urbano Relações Campo e Cidade Urbanidades e Ruralidades THE RURAL AND THE URBAN A CONTRIBUTIONS TO THE UNDERSTANDING OF RELATIONS OF RURAL SPACE AND URBAN SPACE ABSTRACT The present work research to weave a dialogue with several perspectives that involve the relationships countryside and city and rural and urban and tries to approach the 174 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 subject of the dicotomic vision that still has un establishing differences between countryside and city and rural and urban because countryside and rural they are thought as something that is opposed to the city and urban With base in the theoretical reference we pointed a ruralurban continuum that is a relationship that approximates and it integrantes these two different spaces rural and urban and before the similarities and continuity doesnt happen the destruction of the particularities of these justifying the denial of the end of the rural We approach the agricultural activities practiced in the urban space and the urban activities practiced in the rural space aiming to highlight that predominantly rural but not exclusively In a similar way the city is a urban space that doesnt mean that is exclusively urban In the same context we discussed the logic of the urbanity and rurality that before the technological apparatus the countryside and city and rural and urban approach for some authors that call rururbano or a continuum space where the urban characteristics are inserted in the rural space and the ruralities are present in the urban space Key Words The Rural and the Urban Relationships Countryside and City Urbanities and Ruralities 1 INTRODUÇÃO O desenvolvimento harmônico do tecido econômico está no centro dos trabalhos dos grupos que tratam de assuntos urbanos locais rurais e regionais Isso se traduz por ações que visam encontrar para uma determinada zona um equilíbrio entre o fortalecimento de sua capacidade concorrencial e a melhoria da qualidade de vida de seus habitantes Atingir esse objetivo exige a criação de novas formas de parcerias entre os atores envolvidos quer eles sejam públicos privados nacionais regionais ou locais Estímulos a projetos iniciativa rural ação urbana tudo isso decorre da mesma ideia segundo a qual as contribuições locais permitem operar mudanças significativas na paisagem socioeconômica territorial VEIGA 2004 O processo de industrialização da agricultura tem eliminado gradativamente a separação entre a cidade e o campo entre o rural e o urbano unificandoo dialeticamente Isto quer dizer que campo e cidade cidade e campo formam uma unidade contraditória Uma unidade onde a diferença entre os setores da atividade econômica agricultura pecuária e outros em um indústria o comércio etc em outro vai sendo soldada de um lado pela presença na cidade do trabalhador assalariado bóiafria do campo Aliás as greves dos trabalhadores do campo são feitas nas cidades De outro lado podese constatar que a industrialização dos produtos agrícolas pode ser feita no campo com os trabalhadores das cidades Tudo indica que o desenvolvimento do capitalismo está soldando a união contraditória da agricultura e da indústria do campo e da cidade que ele mesmo separou no início de sua expansão O Rural e o Urbano 175 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 A partir das leituras e releituras do rural e do urbano têmse chegado a múltiplos debates e conceitos sobre o que é o rural e o que é o urbano Porém são inúmeras as dificuldades conceituais e metodológicas impostas há tempos aos formuladores de políticas de planejamento público aos demógrafos e aos pesquisadores de diversas áreas do conhecimento que encontram inadequações existentes na definição do que seja rural e urbano no Brasil Na abordagem clássica estariam agrupados autores como Henri Lefebvre Milton Santos e Otávio Ianni que trabalham a ideia de urbanização do rural segundo a qual o rural tenderia a desaparecer tornandose urbano A segunda vertente enfoca a urbanização no rural segundo a qual existem especificidades no espaço rural mesmo quando impactado pela força do urbano RUA 2005 p 91 Nesta segunda vertente agrupamse autores como José Eli da Veiga Ricardo Abramovay Sérgio Schneider e José Graziano da Silva Estes apesar de apresentarem imensa diversidade defendem um necessário destaque no rural priorizando seus estudos na ideia de novas ruralidades Milton Santos propõe que a já clássica divisão rural e urbano no Brasil seja substituída pela divisão em dois grandes subtipos os espaços agrícolas e os espaços urbanos as regiões agrícolas e não rurais contém cidades as regiões urbanas contém atividades rurais assim teríamos áreas agrícolas contendo cidades adaptadas as suas demandas e áreas rurais adaptadas as demandas urbanas Assim avançando sobre os processos que regem a expansão da urbanização e das novas funções exercidas pelas cidades lócus da gestão da agricultura científica e do agronegócio globalizado SANTOS 2000 ELIAS 2007 denomina tais espacialidades como cidades do agronegócio No período técnicocientíficoinformacional as cidades do agronegócio multiplicamse no país e passam a desempenhar novas funções Transformamse em lugares de todas as formas de cooperação erigidas pelo agronegócio globalizado e resultam em novas territorialidades Se a cidade é a materialização das condições gerais de reprodução do capital CARLOS 2004 a cidade do agronegócio é aquela cujas funções de atendimento às demandas do agronegócio globalizado são hegemônicas sobre as demais funções ELIAS 2007 Quanto ao segundo grupo Abramovay 2007 enfatiza que haverá urbano desde que haja uma extensão de serviços públicos a certo aglomerado populacional O Brasil é um notório 176 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 exemplo de país onde é definido como urbana as sedes distritais com algumas centenas de casas O mesmo reforça a ideia de que nem toda aglomeração urbana provida de um mínimo de serviços pode ser adequadamente chamada de cidade O autor afirma que a importância de levar em consideração o critério populacional não permite uma abordagem regional da ruralidade Este critério nos diz que tal localidade ou município é ou não rural porém não é suficiente para indicar se existem territórios mais ou menos rurais Um agrupamento populacional de 40 mil habitantes cercado por pequenos povoados de distritos de dois ou três mil habitantes será caracterizado como urbano mas sem que se tenham instrumentos estatísticos que permitam perceber se ele está no meio de uma região que globalmente é rural É fato que cada país utiliza seus critérios para reconhecer e delimitar seu meio urbano e meio rural Wanderley 2000 apresenta definições de alguns países quanto à delimitação oficial de concepções do rural e do urbano As definições utilizadas nos países da comunidade européia apóiamse em uma multiplicidade de critérios conforme descreve o Quadro 1 Quadro 1 Critérios utilizados por alguns países da Comunidade Européia para delimitar o rural e o urbano Países Critérios Bélgica Dois sistemas de classificação se combinam um referindose aos municípios e levando em conta sua população e sue crescimento o outro em função do lugar Dinamarca Duas abordagens podem ser distinguidas uma procedendo da regulamentação da construção as zonas rurais são aquelas onde a agricultura tem prioridade a outra através de estatísticas são consideradas como rural toda região que conte menos de 200 habitações ou todo município que compreenda uma população entre 4000 e 10000 habitantes França A definição mais corrente retém como rurais os municípios com menos de 2500 habitantes Como esta definição não parece mais pertinente uma distinção suplementar foi acrescentada as Zonas de Povoamento Industrial ou Urbano ZPIU e o rural profundo fora das ZPIU Alemanha Existe uma tipologia de diferentes coletividades territoriais que reúne índices econômicos número de habitantes e densidade da população Nesta tipologia existem regiões definidas pela sua O Rural e o Urbano 177 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 vocação agrícola Grécia É utilizado o critério da densidade populacional 30 hab km Itália São qualificados de rurais os municípios de menos de 10000 habitantes Os municípios são classificados segundo 13 critérios Luxemburgo O rural não é distinto do urbano As zonas rurais estão incluídas na tipologia das zonas urbanas Holanda É através dos planos de utilização do solo que se opera a distinção muito clara entre zona rural e zona urbana Inglaterra O espaço rural é o espaço residual do urbano que dá lugar a uma classificação muito fina a partir da utilização dos solos Fonte WANDERLEY M D N B 2000 Quando se fala em critérios para definições de localidades rurais Abramovay 2003 ressalta que não existe critério universalmente válido para a delimitação das fronteiras entre o rural e o urbano Expõe sua posição em defesa dos critérios utilizados por outros países e cita os exemplos como da Espanha de Portugal da Itália e da Grécia considerando zonas rurais os habitantes que vivem em territórios com menos de 10 mil habitantes e que mantêm determinada distância dos núcleos metropolitanos Já na França e nos países latinoamericanos como Argentina Bolívia México Venezuela Honduras Nicarágua e Panamá adotam limite populacional entre mil e 2500 habitantes na definição de população rural Com isso se evita confundir o rural com o isolado No Chile além do patamar populacional a localidade rural deve ter menos de 50 de sua população ativa ocupada em atividades secundárias No Brasil bem como no Equador na Guatemala na República Dominicana e em El Salvador o critério tem natureza predominantemente administrativa do que propriamente geográfica ou econômica Neste caso considerável parcela das sedes dos distritos brasileiros seria classificada como rural Se o Brasil adotasse a classificação italiana ou espanhola que tem como parâmetro dez mil habitantes mais de 2200 municípios brasileiros passariam a ser contabilizados como rurais CAMARANO ABRAMOVAY 1999 Ressaltase sobre critérios adotados pela Organização para Cooperação Econômica e o Desenvolvimento OCDE que aborda uma tipologia construída em duas etapas Ela distingue num primeiro momento os espaços locais rurais e urbanos em 178 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 função da densidade populacional sendo que são considerados rurais os aglomerados que tem até 150 habkm e urbanos os que se situam acima desse limite A sociedade brasileira nas primeiras décadas do século XX apresentava a configuração amplamente rural De acordo com o crescimento populacional entre 1940 e 1980 ocorreu uma inversão da distribuição populacional entre as áreas rurais e urbanas Dessa forma o movimento de forte migração das áreas rurais para as cidades determina o crescimento desordenado de grandes aglomerações e a formação de centros metropolitanos que são reflexos dessa dinâmica Surgiram a partir da década de 1980 mudanças significativas no meio rural brasileiro Observase a emergência de um espaço rural multifuncional com a introdução de uma maior diversificação econômica em meio a novas formas de produção e subsistência em visível contraste com o que dominava no passado A expansão do tecido urbano sobre as áreas rurais e o crescimento do número de pessoas ocupadas em atividades consideradas até então como exclusivamente urbanas indicam a existência de um novo paradigma socioespacial no Brasil Em decorrência das mudanças ocorridas no campo pósmodernização da agricultura e com as novas configurações obtidas pelas cidades com a descentralização das indústrias podese encontrar em muitos discursos e relatos as acepções clássicas dos conceitos rural e urbano Para alguns o rural é visto como sinônimo de atraso e o urbano como sinônimo de moderno diante das transformações ocorridas nos últimos tempos Segundo Sorokin Zmmerman e Gapin 1981 existem nove diferenças fundamentais entre o rural e o urbano que são ocupacionais que levam a outras diferenças ocupações com atividades voltadas ao cultivo de plantas e criação de animais diferenças de ambientes trabalhadores do campo em contato com a natureza ao ar livre enquanto os trabalhadores urbanos trabalham em ambientes fechados artificiais no tamanho das comunidades onde existiria uma correlação negativa entre o tamanho da comunidade e a percentagem da população ocupada na agricultura as diferenças na densidade populacional nas quais as comunidades de agricultores teriam uma densidade populacional mais baixa do que das comunidades urbanas na homogeneidade e na heterogeneidade das populações das comunidades rurais que tenderiam a ser mais homogêneas em suas características psicosociais as divergências na diferenciação estratificação e complexidade social na qual a população do campo seria homogênea enquanto os aglomerados urbanos seriam marcados por uma complexidade maior manifesta em maior O Rural e o Urbano 179 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 diferenciação e estratificação social na mobilidade social pois a classe urbana seria mais móbil e dinâmica que a rural deslocandose mais de lugar de ocupação de posição social da riqueza para a pobreza e viceversa as diferenças na direção da migração pois correntes de população que vem do campo para a cidade são maiores que as da cidade indo para o campo no sistema de integração social pois os moradores rurais teriam contato com menor número de pessoas porém seriam mais diretos e duradouros do que os moradores da cidade Bagli 2006 traz uma análise comparativa dos municípios de Álvares Machado SP Presidente Prudente SP e Mirante do Paranapanema SP expondo as diferenças no tipo de relação estabelecida entre campo e cidade em cada um dos municípios Nesse estudo a autora apresenta as origens do processo de dicotomização entre campo e cidade e rural e urbano À princípio os critérios que definiam o que era cidade e o que era campo estavam fundamentados na localização A cidade era o lugar da reunião seja para as questões políticas seja para as questões religiosas era um tipo de localização fundamentada na aglomeração O campo era o local onde as pessoas viviam dispersamente e lugar do trabalho natural Entretanto as diferenças não ficaram apenas fundamentadas em critérios de localidade pois havia a necessidade de caracterizar os moradores de cada espaço e essa lógica ampliou a diferenciação Para demonstrar como ocorreu a construção desse processo de diferenciação BAGLI 2006 utilizou se da etimologia das palavras cidade urbano e campo rural dispondoas no Quadro 2 Quadro 2 Origem e significados das palavras cidade urbano e campo rural CIDADE URBANO CAMPO RURAL Civitas f 1 Condição de cidadão direito de cidadão 2 Conjunto de cidadãos 3 Sede do governo Estado cidade pátria 4 urbs Campus m 1 Planície terreno plano campina cultivada 2 Campo ou terreno para exercícios 3 Campo de batalha 4 Os exercícios do Campo de Marte os comícios as eleições 5Produtos da terra Civis m e f 1 Cidadão livre cidadã livre membro livre de uma cidade a que pertence por origem ou adopção 2 Concidadão concidadã 3 Habitante 4 Soldado romano 5 Companheiro Campensis adj 1 Relativo aos campos campestre 2 Epíteto de Isis que tinha um templo no Campo de Marte Urbs f 1 Cidade em opos a rus ou a arx 2 A cidade por excelência 3 Cidade população duma cidade os cidadãos Estado 4 Morada asilo Rus n 1 Campo em opos a domus casa e urbs cidade 2 Terras de lavoura 3 Casa de campo 4 Território região 5 Fig Rusticidade rudeza 6 Pl Propriedade rural o campo em geral Urbanus adj Rusticus adj 180 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 1 Da cidade em opos a rusticus da cidade de Roma urbano 2 Civil em opos a castrensis pacífico 3 Polido fino delicado urbano 4 Espirituoso engraçado engenhoso 5 Divertido folgazão gracejador 6 Elegante esmerado fal do estilo que usa linguagem apurada 7 Imprudente desavergonhado indiscreto 1 Dos campos do campo rústico campestre rural 2 Fig Rústico agreste rude inculto grosseiro tosco labrego saloio desajeitado sem elegância 3 Simples ingênuo pouco atilado estúpido 4 Inacessível ao amor esquivo bisonho 5 Camponês lavrador campônio Fonte Bagli P 2006 Conforme o quadro 2 o conceito campo se constrói como antítese do conceito cidade demarcando a existência de uma realidade adversa contrária antagônica Podendo as palavras influenciarem em idealizações no caso das que referemse a cidade urbano e depreciações no caso das palavras que referemse ao campo rural As palavras urbanus e rusticus são respectivamente adjetivos de urbs e rus que por sua vez são conceituadas sobre antagonismos de forma que as adjetivações utilizadas como sinônimos para qualificar os moradores da cidade são positivas enquanto as usadas para qualificar os habitantes do campo são negativas Assim a palavra urbanus é mencionada para definir qualidades como cortesia boa educação bom relacionamento o que legitima a superioridade de tudo que faz alusão a cidade e a palavra rusticus referese aos incultos aos rudes aos grosseiros aos simples aos desajeitados insinuando inferioridade a tudo que diz respeito ao campo Segundo Wanderley 2000 existe um continuum ruralurbano isto é uma relação que aproxima e integra esses dois pólos e diante das semelhanças e continuidade não ocorre a destruição de particularidades justificando a negação do fim do rural Ainda a vertente do continuum ressalta a mudança das relações entre dois espaços tornandoos cada vez mais próximos e deixando de ser opostos porém não preconiza o fim das áreas rurais A referida expressão tem sido utilizada para caracterizar situações em que tanto formas de vida e de trabalho rurais quanto urbanas estariam interligadas Diante de uma investigação mais contudente percebese a perspectiva de homogeneização dos aspectos socioculturais e econômicos explícitos nessa abordagem Segundo Castells 1975 o rural e o urbano apresentam polos opostos de um mesmo continuum em que se pode constatar situações completamente diferentes e matizadas mas que O Rural e o Urbano 181 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 possuem em comum dois traços essenciais situamse todas nesse continuume evoluem todas do rural para o urbano Para Abramovay 2000 o continuum ruralurbano significa que não existem diferenças fundamentais nos modos de vida na organização social e na cultura determinados por sua vinculação social As reflexões ganham importância sobre a temática ruralurbano no espaço acadêmico nacional e internacional Ressaltase as diversas acepções sobre a temática em questão porém Marques 2002 reorganiza de forma sistemática diferentes discussões acerca do conceito rural salientando que o desenvolvimento só pode ser concebido a partir do momento em que campo e cidade forem pensados como elementos constituintes de uma totalidade Nessa lógica são recorrentes estudos sobre os modos de vida das populações e a própria ruralidade Os valores os costumes a cultura rural no mundo contemporâneo se urbanizou Podese afirmar que os valores dos habitantes das áreas rurais foram eliminados Como se encaixa nesse contexto a resistência camponesa e os movimentos sociais rurais em sua luta por uma parcela de terra no espaço rural Quais são seus valores suas aspirações e suas raízes culturais Qual a diferença do rural e do urbano diante da modernidade da tecnologia e das diversas funções que podem ser desenvolvidas ora na zona rural ora na zona urbana Estas indagações serão abordadas no decorrer deste trabalho que tem por objetivo discutir as diversas perspectivas que envolvem as relações campo e cidade em rural e urbano inclusive com relação às visões dicotômicas que ressoam no momento de se estabelecer as diferenças entre esses conceitos 2 AS ATIVIDADES DO RURAL NO URBANO E AS ATIVIDADES DO URBANO NO RURAL Conforme discussão anterior atualmente é complexo definir o que é urbano e o que é rural diante do aparato tecnológico e das diversas funções que podem ser desenvolvidas ora no espaço rural ora no espaço urbano e vice e versa Destarte enfatizase a seguir as atividades agrícolas desenvolvidas no espaço urbano em alguns países Em muitas cidades da Ásia e hemisfério norte o quintal e todos os espaços abertos são usados para praticar a chamada agricultura urbana produzindo verduras ervas frutas cereais 182 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 cogumelos até mesmo usando as paredes para a produção de uvas A agricultura urbana é praticada por mais de 800 milhões de pessoas revela o relatório intitulado Agricultura Urbana Alimentos e Empregos e Cidades Sustentáveis PNUD 1996 Ela acontece em todas as regiões do mundo tanto nos países desenvolvidos como nos países em desenvolvimento mas é difundida nos países asiáticos Para os mais pobres dos pobres a agricultura urbana provê acesso a alimentos e ajuda a evitar a desnutrição Para os nem tão pobres ela oferece uma fonte de renda e alimentação melhor a baixo custo E para as famílias de renda maior oferece a possibilidade de comprar alimentos frescos mais baratos ou mesmo um retorno financeiro ao permitir a utilização de lotes urbanos não edificados de sua propriedade PNUD 1996 De acordo com o relatório as famílias mais pobres do mundo tendem a gastar até 90 de sua renda com alimentos Para essas pessoas a agricultura urbana oferece oportunidade para uma alimentação melhor e uma chance de transferir seus gastos para outras necessidades como por exemplo cuidados com a saúde e habitação A agricultura urbana que está em ascensão onde as populações urbanas estão se aglomerando também está contribuindo na criação de novas oportunidades de empregos Em Calcutá Índia por exemplo cerca de 20000 pessoas encontraram trabalho e renda cultivando nas áreas próximas aos lixões da cidade A agricultura urbana cria postos de trabalho hoje cada vez mais raros para muitos habitantes das cidades Em algumas cidades chega a 15 ou até 23 a presença de famílias urbanas dedicadas à agricultura sendo que cerca de 13 delas tem na agricultura urbana seu único meio de vida Ela também oferece oportunidades de geração de renda para pessoas com baixa escolaridade e pouco capital bem como para pessoas com dificuldades para se deslocarem longe de casa incluindo as mulheres as crianças e os idosos PNUD 1996 Muitos países permitem a criação de pequenos animais peixes e abelhas para a produção de ovos carne e mel As autoridades sanitárias ditam as regras de higiene e mantém a fiscalização Além disso existem cidades como Vancouver Canadá mantendo hortas de demonstração que servem para ensinar a milhares de canadenses como fazer composto a partir do lixo doméstico e as práticas de produção e conservação de alimentos Para irrigar se usa a O Rural e o Urbano 183 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 água da chuva e pias a água é filtrada e aplicada com sistema de gotejamento para usar o mínimo da água tratada e clorada Dados da Organização da Agricultura e Alimentos FAO mostram que os agricultores urbanos abastecem 45 do consumo de vegetais em Hong Kong 50 em Karachi Paquistão 85 em Xangai Na Ásia 50 das famílias urbanas praticam a agricultura urbana no Canadá e nos Estados Unidos 25 dessas famílias Em Moscou 65 praticam agricultura urbana e em Xangai e Hong Kong 80 e 100 respectivamente dos frangos consumidos são produzidos na cidade Diante do referencial teórico e das experiências práticas na agricultura urbana perguntase quais são as principais vantagens que a agricultura urbana pode trazer para a cidade e para as pessoas Diante das análises teóricas encontramse vários itens que nos dão respostas para a referida pergunta onde podemse conferir a seguir a Geração de renda e alimentos mais baratos b Trabalho para adolescentes e desempregados c Mais segurança alimentar d Reciclagem do lixo orgânico e doméstico e Absorção da água e reciclagem das águas pluviais e menos enchentes f Atividade ocupacional proporciona ocupação de pessoas evitando o ócio contribuindo para a educação social e ambiental melhoramento do meio ambiente e estética g Prazer em cultivar e criar e outros benefícios Observase porém uma relação muito forte entre a agricultura rural e tradicional e a agricultura urbana sendo esta normalmente praticada mais intensamente em regiões ou municípios que tenham tradição agrícola no meio rural A agricultura urbana pode ser realizada em qualquer ambiente urbano ou periurbano podendo ser praticada diretamente no solo em canteiros suspensos em vasos ou onde a criatividade sugerir A prática do cultivo da agricultura urbana também pode ter grande importância como forma de equilibrar um suposto ecossistema urbano ou seja melhorar as condições econômicas sociais ambientais e até culturais dos seus habitantes Esta afirmação se justifica diante do pouco recurso financeiro que a atividade requer e por conseguinte o uso do manejo do solo é tecnologicamente acessível utilizandose principalmente das experiências adquiridas que esses moradores trouxeram como herança 184 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 cultural nos tempos que habitavam a zona rural Além disso pode ser praticada em pequenas áreas como quintais e jardins utilizando de forma racional recursos recicláveis produzidos nas cidades Nesse sentido é que a FAO enfatiza as possibilidades da Agricultura Urbana AU em promover uma situação de sustentabilidade nas cidades do mundo ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A AGRICULTURA E ALIMENTAÇÃO COAG FAO 1999 No Brasil a ênfase na agricultura urbana de acordo com a contribuição de Oliveira 2001 relaciona os principais fatores que possibilitam o desenvolvimento das atividades agrícolas na região metropolitana de Fortaleza Nesse contexto as atividades agrícolas urbanas devemse à tradição cultural dos moradores residentes na cidade oriundos da zona rural Diante das dificuldades a população mais pobre passa a cultivar áreas vazias ou em seus quintais na busca de autoabastecimentos ou para abastecimentos do mercado urbano auferindo renda ou complementação Os estudos das atividades agrícolas no interior ou próxima de áreas urbanas no Brasil são mencionados nas obras de Bicalho 1992 1996 1998 2000 que se define como referencial de grande valia para a agricultura urbana Para se compreender como a agricultura resiste na cidade mesmo diante do intenso processo de metropolização que não consegue converter toda terra agrícola em usos urbanos é preciso entender a agricultura metropolitana como parte do dinâmico processo de contínua mudança sócioespacial gerado por uma situação de permanente conflito de interesses e disputas de áreas por usos rurais e urbanos BICALHO 1992 p 285 Destacase a existência de atividades agrícolas na cidade que se relacionam às questões históricoculturais As atividades agrícolas urbanas por tradição também explicam a manutenção de atividades primárias na cidade Muitos proprietários mantêm áreas agrícolas motivados por desejos de ter uma vivência rural ou de contato com a natureza por exemplo sempre próximo ao local de trabalho e moradia sendo desnecessário o deslocamento para maiores distâncias Segundo Maia 1994 a necessidade e desejo explicam a dinâmica da AU Diante da diversidade e intensidade de suas atividades percebese que a manutenção e o crescimento de atividades rurais na cidade devemse por um lado à necessidade de sobrevivência dos setores marginais que desenvolvem estratégias de vida e trabalho configurando uma cidade muito O Rural e o Urbano 185 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 diferente da idealizada e propagada pelo discurso modernizante de suas elites E por outro lado devese ao desejo de pessoas originárias ou com forte referência com o meio rural de praticar atividades que satisfaçam ou ainda proporcionem algum tipo de ligação ou contato com a natureza O oposto também ocorre conforme pôdese constatar nas últimas décadas onde tem se destacado uma nova percepção do campo relativo a um modo de vida alternativo e ambientalmente sustentável correspondente a um resgate da natureza pelos habitantes da cidade que se dirigem ao campo BIAZZO 2008 Candiotto e Corrêa 2008 referemse a urbanização física do rural apresentada por Graziano da Silva através do conceito de rurbano com a inserção de novas atividades no campo sobretudo as nãoagrícolas As atividades nãoagrícolas fazem com que o rural assuma novas funções dentre as quais estão as atividades de lazer como o turismo em área rural segundas residências e aposentadorias rurais Portanto percebese que atualmente as atividades produtivas agrícolas tradicionais já não são mais suficientes para explicar por si sós a dinâmica da renda e das ocupações das famílias rurais Assim compreender o papel da diversificação do meio rural consiste numa tarefa onde estão envolvidos uma série de fatores que abrangem diretamente as esferas socioeconômicas ambientais e culturais do espaço onde vem sendo desenvolvidas essas atividades nãoagrícolas1 Dessa forma crescem cada vez mais atividades de lazer que buscam um resgate às tradições culturais de determinadas áreas e valorizam os costumes da vida rural Essas atividades geralmente se manifestam em rotas turísticas e em eventos festivos de pequenos municípios ocorrendo tanto em áreas rurais como urbanas 1 Nos anos 1980 assistiuse à invenção social de uma nova realidade o mundo rural não agrícola Esta perspectiva introduz elementos novos no modo de encarar os mundos rural e urbano em si e na forma como se relacionam A valorização da dimensão não agrícola do mundo rural é socialmente construída a partir da ideia de patrimônio Verificase de fato a ocorrência de três tendências que por motivos parcialmente autônomos convergem num mesmo sentido movi mento de renaturalização centrado na conservação e proteção da natureza aspectos agora hipervalorizados no âmbito do debate sobre os processos de desenvolvimento sustentável a procura de autenticidade que leva a encarar a conservação e a proteção dos patrimônios históricos e culturais como vias privilegiadas para valorizar memórias e identidades capazes de enfrentar tendências uniformizadoras desencadeadas pelos processos de mundialização a mercantilização das paisagens como resposta à rápida expansão de novas práticas de consumo decorrentes do aumento dos tempos livres da melhoria do nível de vida de importantes segmentos da população e como consequência da valorização das atividades de turismo e lazer Nota do autor 186 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 Por outro lado podese constatar a mudança na paisagem rural com a presença da tecnificação do campo as atividades industriais a presença dos complexos agroindustriais as cooperativas e a interligação campocidade por uma rede viária de transporte eficaz paralela a um sistema de comunicação eficiente As recentes manifestações no mundo rural que antes eram peculiares ao mundo urbano podem ser denominadas de urbanidades no rural que denotam a presença do urbano no campo sem que essa presença leve à eliminação das marcas próprias a cada espacialidade urbana e rural O espaço resultante dessas interações é dotado de um hibridismo que não pode ser comparado a um urbano ruralizado nem mesmo a um rural urbanizado De acordo com Bagli 2006 rural e urbano extrapolam os limites espaciais tradicionais As contradições colocam a realidade plural do desenvolvimento da sociedade uma vez que o campo é espaço predominantemente rural mas não exclusivamente De forma semelhante a cidade é espaço urbano o que não significa que seja exclusivamente urbano Nem tudo o que existe no campo é rural nem tudo o que há na cidade é urbano Tanto os que se aproximam do urbano quanto os que se aproximam do rural tendem a adquirir características específicas de cada espaço Porém nem sempre a aquisição de tais características leva o indivíduo a se urbanizar ou a ruralizarse diante das atividades de caráter rural praticada no espaço urbano e das atividades de caráter urbano desenvolvidas no espaço rural 3 URBANIDADES E RURALIDADES Segundo Moreira 2005 ao invés de apontar para uma nova ruralidade melhor falar em ruralidades globais e locais As ruralidades seriam compostas por objetos ações e representações peculiares do rural com destaque para as representações e identidades rurais dos indivíduos e grupos sociais As ruralidades apresentam uma visão ampla entendendoas como manifestações representativas do espaço rural traduzidas em políticas públicas instituições legislações interesses objetos técnicos e identidades características do rural quando presentes na Organização Mundial do Comércio no mercado de commodities nos transgênicos no Ministério O Rural e o Urbano 187 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 da Agricultura e Ministério do Desenvolvimento Agrário na bancada ruralista no Movimento dos SemTerras nos ambientalistas etc Nesse sentido as ruralidades apresentam diferentes interpretações de grupos sociais e instituições sobre o rural bem como o território de atuação e influência a hinterland de cada uma dessas instituições Segundo Marques 2002 as possibilidades de desenvolvimento de qualquer comunidade rural dependem dos laços que ela mantém com centros urbanos particularmente com as cidades de sua própria região É preciso portanto além do consumo simbólico e material do campo por parte dos habitantes das cidades aterse a outras relações econômicas e políticas estabelecidas entre o rural e o urbano Destacase que a superação da divisão entre cidade e campo não deve ser confundida com o desaparecimento do campo e das atividades agrárias como nos lembra Sobarzo 2006 considerando que essa superação está ligada às relações de produção Contudo nessa dialética o campo não se perde no meio da cidade nem a cidade absorvendo o campo se perde nele Nesse sentido urbano e rural permanecem como conteúdos sociais diferenciados urbanidades e ruralidades mas a oposição cidade e campo atenuase Corroborando com tais reflexões Biazzo 2008 afirma que campo e cidade são materialidades concretizandose como paisagens que se contrastam Porém ruralidades e urbanidades são racionalidades ou lógicas São vários os exemplos das novas identidades rurais ou manifestações de ruralidades encontradas tanto no campo quanto na cidade Associados à economia seriam a revitalização de práticas de produção orgânica nas atividades agrárias o turismo rural em espaços campestres e os mercados futuros de commodities em espaços citadinos Associados à política seriam o personalismo e o clientelismo os embates na OMC acerca de subsídios agrícolas as disputas no âmbito dos Ministérios da Agricultura e do Desenvolvimento Agrário no Brasil os movimentos sociais como o MST Associados à cultura envolvem a busca de uma reaproximação da natureza pela população citadina os hábitos de origem country o sucesso de músicas sertanejas entre muitos outros Por outro lado as urbanidades associadas à economia se manifestam através da complexa divisão social do trabalho redes técnicas de transporte e comunicação tanto no campo quanto na cidade Associadas à política se revelam no planejamento e nos planos de gestão do território na crescente densidade normativa dos espaços citadinos e campestres Por fim associadas à 188 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 cultura as urbanidades se manifestam com a emancipação feminina e a redução da divisão sexual do trabalho com a fluidez de informação a estetização de comportamentos de acordo com as mídias entre outros exemplos Biazzo 2008 conclui seu pensamento afirmando que campo e cidade são formas concretas materializamse e compõem as paisagens produzidas pelo homem Já o urbano e o rural são representações sociais conteúdos das práticas de cada sujeito cada instituição cada agente da sociedade Por isso urbanidades e ruralidades se combinam em cada recorte do espaço seja um local seja uma micro meso ou macro região Segundo Rua 2005 tanto a urbanização física como a urbanização ideológica no campo levam ao estabelecimento de urbanidades no espaço rural Não podese compreender a ruralidade somente a partir da penetração do mundo urbanoindustrial no rural urbanização física mas também a partir do consumo pela sociedade urbanoindustrial de bens simbólicos e materiais e de práticas culturais que são reconhecidas como próprias do mundo rural As urbanidades segundo Rua 2002 são constituídas por uma enorme gama de manifestações que vão desde a melhoria da infraestrutura e dos meios de comunicação até a aposentadoria e novas formas de lazer A proposta de urbanidades busca abarcar o pluralismo de modo que o turismo e o veraneio a pluriatividade os movimentos organizados e as reivindicações dos habitantes rurais vão confirmar a expansão das urbanidades nas áreas rurais Conforme as atividades não agrícolas no campo vão se expandindo ocorre o processo de intensificação das relações e a interdependência entre o urbano e o rural e por conseguinte as urbanidades e as ruralidades Esta nova dinâmica do espaço rural leva ao crescimento de famílias rurais pluriativas ou seja que combinam atividades agrícolas e não agrícolas autônomas eou assalariadas Portanto os conceitos de ruralidades e urbanidades inseridos no debate em torno do rural contemporâneo procuram incorporar as novas dinâmicas presentes na configuração do espaço geográfico 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS O objetivo desta contribuição num primeiro momento foi tecer considerações teóricas acerca das categorias do Rural e do Urbano e suas relações entre si O Rural e o Urbano 189 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 O estudo da relação entre campo e cidade e rural e urbano necessita de uma visão dialética e abrangente que incorpore as potencialidades e os atores sociais presentes tanto no campo quanto na cidade Outro ponto a ser considerado verificase na realidade urbana e na realidade rural que não são estanques e ultimamente têm passado por rápidas e intensas transformações as quais ressoam de forma direta na reorganização do espaço na redefinição de relações e na constituição de novas territorialidades Por isso acreditase ser um equívoco pensar a extinção dos espaços rurais em função do avanço do processo de urbanização e consequentemente de haver um continnum rural urbano visto que campo e cidade são espaços que se diferenciam frente ao fortalecimento de suas peculiaridades É fato que a revolução técnicocientífica comprometeu as relações entre o rural e o urbano A preocupação maior nesse início de século é compreender as modificações que os atores sociais imprimem a essas categorias que se mesclam dialeticamente num continuum rural urbano Destarte consideramse fundamentais essas categorias pois auxiliam no desenvolvimento territorial dos espaços onde esses atores sociais o modelam de uma forma ou de outra onde estão inseridos construindo des construindo e re construindo territórios A análise da relação campo e cidade e rural e urbano tem avançado onde acreditase ser essencial entender o rural para além do campo e o urbano para além da cidade pois campo e cidade são partes integrantes do todo mesmo que às vezes o campo não seja tão rural e a cidade nem tão urbana eles não se opõem excluindose mutuamente ao contrário se complementam justamente pelas diferenças Em suma desaparece todo o sentido em tratar o rural exclusivamente como o oposto do urbano em proclamar seu desaparecimento ou em resumilo a apenas uma de suas dimensões atuais o agrário REFERÊNCIAS ABRAMOVAY R Funções e medidas da ruralidade no desenvolvimento contemporâneo Rio de Janeiro IPEA 2000 O futuro das regiões rurais Porto Alegre Editora UFRGS 2003 190 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 BAGLI P Rural e urbano nos municípios de Presidente Prudente Álvares Machado e Mirante do Paranapanema dos mitos pretéritos às recentes transformações 2006 207 f Dissertação Mestrado em Geografia Faculdade de Ciências e Tecnologia Universidade Estadual Paulista Presidente Prudente 2006 BIAZZO P P Campo e Rural Cidade e Urbano Distinções necessárias para uma perspectiva crítica em geografia agrária 4º Encontro nacional de grupos de pesquisa ENGRUP São Paulo p 132150 2008 BICALHO A M S M Agricultura e meio ambiente no município do Rio de Janeiro In ABREU M A Org Sociedade e natureza no Rio de Janeiro Rio de Janeiro Prefeitura do Rio de Janeiro 1992 p 285316 A agricultura metropolitana In CONFERÊNCIA NACIONAL DE GEOGRAFIA E CARTOGRAFIA 1996 Rio de Janeiro Anais da Conferência Nacional de Geografia e Cartografia Rio de janeiro IBGE 1996 Desenvolvimento rural sustentável e geografia agrária In XII Encontro Nacional de Geografia Agrária 8 1998 Uberlândia Anais do XII Encontro Nacional de Geografia Agrária Uberlândia 1998 Sustainable metropolitan agriculture in Brazil In BOWLER I R BRYANT C R HUIGEN P P P Editors Dimensions of Sustainable rural Systems UtrechtGroningen Koninklijk Nederlands Ardrijk skundig Genootschap Faculteit der Ruimtelijke WeteschappenRijksuniversiteit Groningen 1998 p 97104 Economics sustainability in vegetable farming in Rio de Janeiro state Brasil In IGU COMMISSION ON THE SUSTAINABILITY OF RURAL SYSTEMS CONFERENCE Columbia Simon Fraser University 2000 p 3947 CAMARANO A A ABRAMOVAY R Êxodo rural envelhecimento e masculinização no Brasil panorama dos últimos 50 anos Rio de Janeiro IPEA 1999 Texto para Discussão no 621 CANDIOTTO L Z P CORRÊA W K Ruralidades urbanidades e a tecnicização do rural no contexto do debate cidadecampo Campoterritório revista de geografia agrária v 3 n 5 p 214242 2008 CARLOS A F A O espaço urbano São Paulo Contexto 2004 CASTELLS M Problemas de investigação em Sociologia Urbana São Paulo Martins Fontes 1975 ELIAS D Agricultura e produção de espaços urbanos não metropolitanos notas teórico metodológicas In SPOSITO M E B Org Cidades Médias espaços em transição São Paulo Editora Moderna 2007 p 113138 O Rural e o Urbano 191 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 LEFEBVRE H La production de lspace Paris Anthropos 1974 MAIA D S O campo na cidade necessidade e desejo um estudo sobre os subespaços rurais em João PessoaPB 1994 208 f Dissertação Mestrado em Geografia Universidade Federal de Santa Catarina Departamento de Geociências Curso de Mestrado em Geografia Florianópolis 1994 MARQUES M I M O conceito de espaço rural em questão Terra Livre v 2 n 19 p 95 112 2002 MOREIRA R J Org Identidades sociais ruralidades no Brasil contemporâneo Rio de Janeiro DPA 2005 p 1541 OLIVEIRA A M Agricultura em áreas metropolitanas In MENEZES A V C PINTO J E S S Linhas geográficas Aracaju Programa Editorial NPGEO UFS 2001 p 33183 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A AGRICULTURA E ALIMENTAÇÃO COAGFAO Urban and periurban agriculture COAG9910 Presented at 15th Session of the COAG FAO Rome p 2529 jan 1999 PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO PNUD Agricultura urbana alimentos e empregos e cidades sustentáveis Lisboa PNUDUNDP 1996 RUA J A resignificação do rural e as relações cidadecampo uma contribuição geográfica Revista da ANPEGE n 2 p 4566 2005 SANTOS M Org Território Globalização e Fragmentação São Paulo HUTICEC 2000 SOBARZO O O urbano e o rural em Henri Lefebvre In SPOSITO M E B WHITACKER A M Org Cidade e campo relações e contradições entre urbano e rural São Paulo Expressão Popular 2006 p 5364 SOROKIN P ZIMMERMAN C GALPIN C Diferenças fundamentais entre o mundo rural e o urbano In SOUZA MARTINS J Org Introdução crítica à sociologia rural São Paulo Hucitec 1981 VEIGA J E A dimensão rural do Brasil São Paulo FEAUSP 2004 WANDERLEY M D N B A emergência de uma nova ruralidade nas sociedades modernas avançadas o rural como espaço singular e ator coletivo Estudos Sociedade e Agricultura n 15 p 87145 2000
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Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 O RURAL E O URBANO CONTRIBUIÇÕES PARA A COMPREENSÃO DA RELAÇÃO DO ESPAÇO RURAL E DO ESPAÇO URBANO Janério Manoel Jacinto Doutorando do Programa de PósGraduação em Geografia Ambiental e Regional da Universidade Estadual de Maringá UEM e professor de Geografia da Rede Estadual de Educação do Paraná Email manoel354hotmailcombr César Miranda Mendes Docente do Programa de PósGraduação Mestrado e Doutorado em Geografia Ambiental e Regional da Universidade Estadual de Maringá e coordenador do Grupo de Estudos Urbanos GEURUEM Email cmmendeswnetcombr Nestor Alexandre Perehouskei Doutorando do Programa de PósGraduação em Geografia Ambiental e regional Universidade Estadual de Maringá UEM Email nestorappopcombr RESUMO O presente trabalho procura tecer um diálogo com as diversas perspectivas que envolvem as relações campo e cidade em rural e urbano e aborda a questão da visão dicotômica que ainda se tem no momento de se estabelecer diferenças entre campo e cidade e rural e urbano visto que campo e rural são pensados como algo que se opõe à cidade e ao urbano Com base no referencial teórico apontase um continuum ruralurbano isto é uma relação que aproxima e integra esses dois polos rural e urbano e diante das semelhanças e continuidade não ocorre a destruição de suas particularidades justificando a negação do fim do rural Aborda se as atividades agrícolas praticadas no espaço urbano e as atividades urbanas praticadas no espaço rural objetivando destacar que o campo é espaço predominantemente rural mas não exclusivamente De forma semelhante a cidade é espaço urbano o que não significa que seja exclusivamente urbano No mesmo contexto discutese a lógica da urbanidade e ruralidade que diante do aparato tecnológico o campo e cidade e rural e urbano se aproximam onde para alguns autores é chamado de rururbano ou um espaço continuum onde as características de urbanidades estão inseridas no espaço rural e as ruralidades estão presentes no espaço urbano Palavraschave O Rural e o Urbano Relações Campo e Cidade Urbanidades e Ruralidades THE RURAL AND THE URBAN A CONTRIBUTIONS TO THE UNDERSTANDING OF RELATIONS OF RURAL SPACE AND URBAN SPACE ABSTRACT The present work research to weave a dialogue with several perspectives that involve the relationships countryside and city and rural and urban and tries to approach the 174 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 subject of the dicotomic vision that still has un establishing differences between countryside and city and rural and urban because countryside and rural they are thought as something that is opposed to the city and urban With base in the theoretical reference we pointed a ruralurban continuum that is a relationship that approximates and it integrantes these two different spaces rural and urban and before the similarities and continuity doesnt happen the destruction of the particularities of these justifying the denial of the end of the rural We approach the agricultural activities practiced in the urban space and the urban activities practiced in the rural space aiming to highlight that predominantly rural but not exclusively In a similar way the city is a urban space that doesnt mean that is exclusively urban In the same context we discussed the logic of the urbanity and rurality that before the technological apparatus the countryside and city and rural and urban approach for some authors that call rururbano or a continuum space where the urban characteristics are inserted in the rural space and the ruralities are present in the urban space Key Words The Rural and the Urban Relationships Countryside and City Urbanities and Ruralities 1 INTRODUÇÃO O desenvolvimento harmônico do tecido econômico está no centro dos trabalhos dos grupos que tratam de assuntos urbanos locais rurais e regionais Isso se traduz por ações que visam encontrar para uma determinada zona um equilíbrio entre o fortalecimento de sua capacidade concorrencial e a melhoria da qualidade de vida de seus habitantes Atingir esse objetivo exige a criação de novas formas de parcerias entre os atores envolvidos quer eles sejam públicos privados nacionais regionais ou locais Estímulos a projetos iniciativa rural ação urbana tudo isso decorre da mesma ideia segundo a qual as contribuições locais permitem operar mudanças significativas na paisagem socioeconômica territorial VEIGA 2004 O processo de industrialização da agricultura tem eliminado gradativamente a separação entre a cidade e o campo entre o rural e o urbano unificandoo dialeticamente Isto quer dizer que campo e cidade cidade e campo formam uma unidade contraditória Uma unidade onde a diferença entre os setores da atividade econômica agricultura pecuária e outros em um indústria o comércio etc em outro vai sendo soldada de um lado pela presença na cidade do trabalhador assalariado bóiafria do campo Aliás as greves dos trabalhadores do campo são feitas nas cidades De outro lado podese constatar que a industrialização dos produtos agrícolas pode ser feita no campo com os trabalhadores das cidades Tudo indica que o desenvolvimento do capitalismo está soldando a união contraditória da agricultura e da indústria do campo e da cidade que ele mesmo separou no início de sua expansão O Rural e o Urbano 175 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 A partir das leituras e releituras do rural e do urbano têmse chegado a múltiplos debates e conceitos sobre o que é o rural e o que é o urbano Porém são inúmeras as dificuldades conceituais e metodológicas impostas há tempos aos formuladores de políticas de planejamento público aos demógrafos e aos pesquisadores de diversas áreas do conhecimento que encontram inadequações existentes na definição do que seja rural e urbano no Brasil Na abordagem clássica estariam agrupados autores como Henri Lefebvre Milton Santos e Otávio Ianni que trabalham a ideia de urbanização do rural segundo a qual o rural tenderia a desaparecer tornandose urbano A segunda vertente enfoca a urbanização no rural segundo a qual existem especificidades no espaço rural mesmo quando impactado pela força do urbano RUA 2005 p 91 Nesta segunda vertente agrupamse autores como José Eli da Veiga Ricardo Abramovay Sérgio Schneider e José Graziano da Silva Estes apesar de apresentarem imensa diversidade defendem um necessário destaque no rural priorizando seus estudos na ideia de novas ruralidades Milton Santos propõe que a já clássica divisão rural e urbano no Brasil seja substituída pela divisão em dois grandes subtipos os espaços agrícolas e os espaços urbanos as regiões agrícolas e não rurais contém cidades as regiões urbanas contém atividades rurais assim teríamos áreas agrícolas contendo cidades adaptadas as suas demandas e áreas rurais adaptadas as demandas urbanas Assim avançando sobre os processos que regem a expansão da urbanização e das novas funções exercidas pelas cidades lócus da gestão da agricultura científica e do agronegócio globalizado SANTOS 2000 ELIAS 2007 denomina tais espacialidades como cidades do agronegócio No período técnicocientíficoinformacional as cidades do agronegócio multiplicamse no país e passam a desempenhar novas funções Transformamse em lugares de todas as formas de cooperação erigidas pelo agronegócio globalizado e resultam em novas territorialidades Se a cidade é a materialização das condições gerais de reprodução do capital CARLOS 2004 a cidade do agronegócio é aquela cujas funções de atendimento às demandas do agronegócio globalizado são hegemônicas sobre as demais funções ELIAS 2007 Quanto ao segundo grupo Abramovay 2007 enfatiza que haverá urbano desde que haja uma extensão de serviços públicos a certo aglomerado populacional O Brasil é um notório 176 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 exemplo de país onde é definido como urbana as sedes distritais com algumas centenas de casas O mesmo reforça a ideia de que nem toda aglomeração urbana provida de um mínimo de serviços pode ser adequadamente chamada de cidade O autor afirma que a importância de levar em consideração o critério populacional não permite uma abordagem regional da ruralidade Este critério nos diz que tal localidade ou município é ou não rural porém não é suficiente para indicar se existem territórios mais ou menos rurais Um agrupamento populacional de 40 mil habitantes cercado por pequenos povoados de distritos de dois ou três mil habitantes será caracterizado como urbano mas sem que se tenham instrumentos estatísticos que permitam perceber se ele está no meio de uma região que globalmente é rural É fato que cada país utiliza seus critérios para reconhecer e delimitar seu meio urbano e meio rural Wanderley 2000 apresenta definições de alguns países quanto à delimitação oficial de concepções do rural e do urbano As definições utilizadas nos países da comunidade européia apóiamse em uma multiplicidade de critérios conforme descreve o Quadro 1 Quadro 1 Critérios utilizados por alguns países da Comunidade Européia para delimitar o rural e o urbano Países Critérios Bélgica Dois sistemas de classificação se combinam um referindose aos municípios e levando em conta sua população e sue crescimento o outro em função do lugar Dinamarca Duas abordagens podem ser distinguidas uma procedendo da regulamentação da construção as zonas rurais são aquelas onde a agricultura tem prioridade a outra através de estatísticas são consideradas como rural toda região que conte menos de 200 habitações ou todo município que compreenda uma população entre 4000 e 10000 habitantes França A definição mais corrente retém como rurais os municípios com menos de 2500 habitantes Como esta definição não parece mais pertinente uma distinção suplementar foi acrescentada as Zonas de Povoamento Industrial ou Urbano ZPIU e o rural profundo fora das ZPIU Alemanha Existe uma tipologia de diferentes coletividades territoriais que reúne índices econômicos número de habitantes e densidade da população Nesta tipologia existem regiões definidas pela sua O Rural e o Urbano 177 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 vocação agrícola Grécia É utilizado o critério da densidade populacional 30 hab km Itália São qualificados de rurais os municípios de menos de 10000 habitantes Os municípios são classificados segundo 13 critérios Luxemburgo O rural não é distinto do urbano As zonas rurais estão incluídas na tipologia das zonas urbanas Holanda É através dos planos de utilização do solo que se opera a distinção muito clara entre zona rural e zona urbana Inglaterra O espaço rural é o espaço residual do urbano que dá lugar a uma classificação muito fina a partir da utilização dos solos Fonte WANDERLEY M D N B 2000 Quando se fala em critérios para definições de localidades rurais Abramovay 2003 ressalta que não existe critério universalmente válido para a delimitação das fronteiras entre o rural e o urbano Expõe sua posição em defesa dos critérios utilizados por outros países e cita os exemplos como da Espanha de Portugal da Itália e da Grécia considerando zonas rurais os habitantes que vivem em territórios com menos de 10 mil habitantes e que mantêm determinada distância dos núcleos metropolitanos Já na França e nos países latinoamericanos como Argentina Bolívia México Venezuela Honduras Nicarágua e Panamá adotam limite populacional entre mil e 2500 habitantes na definição de população rural Com isso se evita confundir o rural com o isolado No Chile além do patamar populacional a localidade rural deve ter menos de 50 de sua população ativa ocupada em atividades secundárias No Brasil bem como no Equador na Guatemala na República Dominicana e em El Salvador o critério tem natureza predominantemente administrativa do que propriamente geográfica ou econômica Neste caso considerável parcela das sedes dos distritos brasileiros seria classificada como rural Se o Brasil adotasse a classificação italiana ou espanhola que tem como parâmetro dez mil habitantes mais de 2200 municípios brasileiros passariam a ser contabilizados como rurais CAMARANO ABRAMOVAY 1999 Ressaltase sobre critérios adotados pela Organização para Cooperação Econômica e o Desenvolvimento OCDE que aborda uma tipologia construída em duas etapas Ela distingue num primeiro momento os espaços locais rurais e urbanos em 178 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 função da densidade populacional sendo que são considerados rurais os aglomerados que tem até 150 habkm e urbanos os que se situam acima desse limite A sociedade brasileira nas primeiras décadas do século XX apresentava a configuração amplamente rural De acordo com o crescimento populacional entre 1940 e 1980 ocorreu uma inversão da distribuição populacional entre as áreas rurais e urbanas Dessa forma o movimento de forte migração das áreas rurais para as cidades determina o crescimento desordenado de grandes aglomerações e a formação de centros metropolitanos que são reflexos dessa dinâmica Surgiram a partir da década de 1980 mudanças significativas no meio rural brasileiro Observase a emergência de um espaço rural multifuncional com a introdução de uma maior diversificação econômica em meio a novas formas de produção e subsistência em visível contraste com o que dominava no passado A expansão do tecido urbano sobre as áreas rurais e o crescimento do número de pessoas ocupadas em atividades consideradas até então como exclusivamente urbanas indicam a existência de um novo paradigma socioespacial no Brasil Em decorrência das mudanças ocorridas no campo pósmodernização da agricultura e com as novas configurações obtidas pelas cidades com a descentralização das indústrias podese encontrar em muitos discursos e relatos as acepções clássicas dos conceitos rural e urbano Para alguns o rural é visto como sinônimo de atraso e o urbano como sinônimo de moderno diante das transformações ocorridas nos últimos tempos Segundo Sorokin Zmmerman e Gapin 1981 existem nove diferenças fundamentais entre o rural e o urbano que são ocupacionais que levam a outras diferenças ocupações com atividades voltadas ao cultivo de plantas e criação de animais diferenças de ambientes trabalhadores do campo em contato com a natureza ao ar livre enquanto os trabalhadores urbanos trabalham em ambientes fechados artificiais no tamanho das comunidades onde existiria uma correlação negativa entre o tamanho da comunidade e a percentagem da população ocupada na agricultura as diferenças na densidade populacional nas quais as comunidades de agricultores teriam uma densidade populacional mais baixa do que das comunidades urbanas na homogeneidade e na heterogeneidade das populações das comunidades rurais que tenderiam a ser mais homogêneas em suas características psicosociais as divergências na diferenciação estratificação e complexidade social na qual a população do campo seria homogênea enquanto os aglomerados urbanos seriam marcados por uma complexidade maior manifesta em maior O Rural e o Urbano 179 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 diferenciação e estratificação social na mobilidade social pois a classe urbana seria mais móbil e dinâmica que a rural deslocandose mais de lugar de ocupação de posição social da riqueza para a pobreza e viceversa as diferenças na direção da migração pois correntes de população que vem do campo para a cidade são maiores que as da cidade indo para o campo no sistema de integração social pois os moradores rurais teriam contato com menor número de pessoas porém seriam mais diretos e duradouros do que os moradores da cidade Bagli 2006 traz uma análise comparativa dos municípios de Álvares Machado SP Presidente Prudente SP e Mirante do Paranapanema SP expondo as diferenças no tipo de relação estabelecida entre campo e cidade em cada um dos municípios Nesse estudo a autora apresenta as origens do processo de dicotomização entre campo e cidade e rural e urbano À princípio os critérios que definiam o que era cidade e o que era campo estavam fundamentados na localização A cidade era o lugar da reunião seja para as questões políticas seja para as questões religiosas era um tipo de localização fundamentada na aglomeração O campo era o local onde as pessoas viviam dispersamente e lugar do trabalho natural Entretanto as diferenças não ficaram apenas fundamentadas em critérios de localidade pois havia a necessidade de caracterizar os moradores de cada espaço e essa lógica ampliou a diferenciação Para demonstrar como ocorreu a construção desse processo de diferenciação BAGLI 2006 utilizou se da etimologia das palavras cidade urbano e campo rural dispondoas no Quadro 2 Quadro 2 Origem e significados das palavras cidade urbano e campo rural CIDADE URBANO CAMPO RURAL Civitas f 1 Condição de cidadão direito de cidadão 2 Conjunto de cidadãos 3 Sede do governo Estado cidade pátria 4 urbs Campus m 1 Planície terreno plano campina cultivada 2 Campo ou terreno para exercícios 3 Campo de batalha 4 Os exercícios do Campo de Marte os comícios as eleições 5Produtos da terra Civis m e f 1 Cidadão livre cidadã livre membro livre de uma cidade a que pertence por origem ou adopção 2 Concidadão concidadã 3 Habitante 4 Soldado romano 5 Companheiro Campensis adj 1 Relativo aos campos campestre 2 Epíteto de Isis que tinha um templo no Campo de Marte Urbs f 1 Cidade em opos a rus ou a arx 2 A cidade por excelência 3 Cidade população duma cidade os cidadãos Estado 4 Morada asilo Rus n 1 Campo em opos a domus casa e urbs cidade 2 Terras de lavoura 3 Casa de campo 4 Território região 5 Fig Rusticidade rudeza 6 Pl Propriedade rural o campo em geral Urbanus adj Rusticus adj 180 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 1 Da cidade em opos a rusticus da cidade de Roma urbano 2 Civil em opos a castrensis pacífico 3 Polido fino delicado urbano 4 Espirituoso engraçado engenhoso 5 Divertido folgazão gracejador 6 Elegante esmerado fal do estilo que usa linguagem apurada 7 Imprudente desavergonhado indiscreto 1 Dos campos do campo rústico campestre rural 2 Fig Rústico agreste rude inculto grosseiro tosco labrego saloio desajeitado sem elegância 3 Simples ingênuo pouco atilado estúpido 4 Inacessível ao amor esquivo bisonho 5 Camponês lavrador campônio Fonte Bagli P 2006 Conforme o quadro 2 o conceito campo se constrói como antítese do conceito cidade demarcando a existência de uma realidade adversa contrária antagônica Podendo as palavras influenciarem em idealizações no caso das que referemse a cidade urbano e depreciações no caso das palavras que referemse ao campo rural As palavras urbanus e rusticus são respectivamente adjetivos de urbs e rus que por sua vez são conceituadas sobre antagonismos de forma que as adjetivações utilizadas como sinônimos para qualificar os moradores da cidade são positivas enquanto as usadas para qualificar os habitantes do campo são negativas Assim a palavra urbanus é mencionada para definir qualidades como cortesia boa educação bom relacionamento o que legitima a superioridade de tudo que faz alusão a cidade e a palavra rusticus referese aos incultos aos rudes aos grosseiros aos simples aos desajeitados insinuando inferioridade a tudo que diz respeito ao campo Segundo Wanderley 2000 existe um continuum ruralurbano isto é uma relação que aproxima e integra esses dois pólos e diante das semelhanças e continuidade não ocorre a destruição de particularidades justificando a negação do fim do rural Ainda a vertente do continuum ressalta a mudança das relações entre dois espaços tornandoos cada vez mais próximos e deixando de ser opostos porém não preconiza o fim das áreas rurais A referida expressão tem sido utilizada para caracterizar situações em que tanto formas de vida e de trabalho rurais quanto urbanas estariam interligadas Diante de uma investigação mais contudente percebese a perspectiva de homogeneização dos aspectos socioculturais e econômicos explícitos nessa abordagem Segundo Castells 1975 o rural e o urbano apresentam polos opostos de um mesmo continuum em que se pode constatar situações completamente diferentes e matizadas mas que O Rural e o Urbano 181 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 possuem em comum dois traços essenciais situamse todas nesse continuume evoluem todas do rural para o urbano Para Abramovay 2000 o continuum ruralurbano significa que não existem diferenças fundamentais nos modos de vida na organização social e na cultura determinados por sua vinculação social As reflexões ganham importância sobre a temática ruralurbano no espaço acadêmico nacional e internacional Ressaltase as diversas acepções sobre a temática em questão porém Marques 2002 reorganiza de forma sistemática diferentes discussões acerca do conceito rural salientando que o desenvolvimento só pode ser concebido a partir do momento em que campo e cidade forem pensados como elementos constituintes de uma totalidade Nessa lógica são recorrentes estudos sobre os modos de vida das populações e a própria ruralidade Os valores os costumes a cultura rural no mundo contemporâneo se urbanizou Podese afirmar que os valores dos habitantes das áreas rurais foram eliminados Como se encaixa nesse contexto a resistência camponesa e os movimentos sociais rurais em sua luta por uma parcela de terra no espaço rural Quais são seus valores suas aspirações e suas raízes culturais Qual a diferença do rural e do urbano diante da modernidade da tecnologia e das diversas funções que podem ser desenvolvidas ora na zona rural ora na zona urbana Estas indagações serão abordadas no decorrer deste trabalho que tem por objetivo discutir as diversas perspectivas que envolvem as relações campo e cidade em rural e urbano inclusive com relação às visões dicotômicas que ressoam no momento de se estabelecer as diferenças entre esses conceitos 2 AS ATIVIDADES DO RURAL NO URBANO E AS ATIVIDADES DO URBANO NO RURAL Conforme discussão anterior atualmente é complexo definir o que é urbano e o que é rural diante do aparato tecnológico e das diversas funções que podem ser desenvolvidas ora no espaço rural ora no espaço urbano e vice e versa Destarte enfatizase a seguir as atividades agrícolas desenvolvidas no espaço urbano em alguns países Em muitas cidades da Ásia e hemisfério norte o quintal e todos os espaços abertos são usados para praticar a chamada agricultura urbana produzindo verduras ervas frutas cereais 182 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 cogumelos até mesmo usando as paredes para a produção de uvas A agricultura urbana é praticada por mais de 800 milhões de pessoas revela o relatório intitulado Agricultura Urbana Alimentos e Empregos e Cidades Sustentáveis PNUD 1996 Ela acontece em todas as regiões do mundo tanto nos países desenvolvidos como nos países em desenvolvimento mas é difundida nos países asiáticos Para os mais pobres dos pobres a agricultura urbana provê acesso a alimentos e ajuda a evitar a desnutrição Para os nem tão pobres ela oferece uma fonte de renda e alimentação melhor a baixo custo E para as famílias de renda maior oferece a possibilidade de comprar alimentos frescos mais baratos ou mesmo um retorno financeiro ao permitir a utilização de lotes urbanos não edificados de sua propriedade PNUD 1996 De acordo com o relatório as famílias mais pobres do mundo tendem a gastar até 90 de sua renda com alimentos Para essas pessoas a agricultura urbana oferece oportunidade para uma alimentação melhor e uma chance de transferir seus gastos para outras necessidades como por exemplo cuidados com a saúde e habitação A agricultura urbana que está em ascensão onde as populações urbanas estão se aglomerando também está contribuindo na criação de novas oportunidades de empregos Em Calcutá Índia por exemplo cerca de 20000 pessoas encontraram trabalho e renda cultivando nas áreas próximas aos lixões da cidade A agricultura urbana cria postos de trabalho hoje cada vez mais raros para muitos habitantes das cidades Em algumas cidades chega a 15 ou até 23 a presença de famílias urbanas dedicadas à agricultura sendo que cerca de 13 delas tem na agricultura urbana seu único meio de vida Ela também oferece oportunidades de geração de renda para pessoas com baixa escolaridade e pouco capital bem como para pessoas com dificuldades para se deslocarem longe de casa incluindo as mulheres as crianças e os idosos PNUD 1996 Muitos países permitem a criação de pequenos animais peixes e abelhas para a produção de ovos carne e mel As autoridades sanitárias ditam as regras de higiene e mantém a fiscalização Além disso existem cidades como Vancouver Canadá mantendo hortas de demonstração que servem para ensinar a milhares de canadenses como fazer composto a partir do lixo doméstico e as práticas de produção e conservação de alimentos Para irrigar se usa a O Rural e o Urbano 183 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 água da chuva e pias a água é filtrada e aplicada com sistema de gotejamento para usar o mínimo da água tratada e clorada Dados da Organização da Agricultura e Alimentos FAO mostram que os agricultores urbanos abastecem 45 do consumo de vegetais em Hong Kong 50 em Karachi Paquistão 85 em Xangai Na Ásia 50 das famílias urbanas praticam a agricultura urbana no Canadá e nos Estados Unidos 25 dessas famílias Em Moscou 65 praticam agricultura urbana e em Xangai e Hong Kong 80 e 100 respectivamente dos frangos consumidos são produzidos na cidade Diante do referencial teórico e das experiências práticas na agricultura urbana perguntase quais são as principais vantagens que a agricultura urbana pode trazer para a cidade e para as pessoas Diante das análises teóricas encontramse vários itens que nos dão respostas para a referida pergunta onde podemse conferir a seguir a Geração de renda e alimentos mais baratos b Trabalho para adolescentes e desempregados c Mais segurança alimentar d Reciclagem do lixo orgânico e doméstico e Absorção da água e reciclagem das águas pluviais e menos enchentes f Atividade ocupacional proporciona ocupação de pessoas evitando o ócio contribuindo para a educação social e ambiental melhoramento do meio ambiente e estética g Prazer em cultivar e criar e outros benefícios Observase porém uma relação muito forte entre a agricultura rural e tradicional e a agricultura urbana sendo esta normalmente praticada mais intensamente em regiões ou municípios que tenham tradição agrícola no meio rural A agricultura urbana pode ser realizada em qualquer ambiente urbano ou periurbano podendo ser praticada diretamente no solo em canteiros suspensos em vasos ou onde a criatividade sugerir A prática do cultivo da agricultura urbana também pode ter grande importância como forma de equilibrar um suposto ecossistema urbano ou seja melhorar as condições econômicas sociais ambientais e até culturais dos seus habitantes Esta afirmação se justifica diante do pouco recurso financeiro que a atividade requer e por conseguinte o uso do manejo do solo é tecnologicamente acessível utilizandose principalmente das experiências adquiridas que esses moradores trouxeram como herança 184 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 cultural nos tempos que habitavam a zona rural Além disso pode ser praticada em pequenas áreas como quintais e jardins utilizando de forma racional recursos recicláveis produzidos nas cidades Nesse sentido é que a FAO enfatiza as possibilidades da Agricultura Urbana AU em promover uma situação de sustentabilidade nas cidades do mundo ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A AGRICULTURA E ALIMENTAÇÃO COAG FAO 1999 No Brasil a ênfase na agricultura urbana de acordo com a contribuição de Oliveira 2001 relaciona os principais fatores que possibilitam o desenvolvimento das atividades agrícolas na região metropolitana de Fortaleza Nesse contexto as atividades agrícolas urbanas devemse à tradição cultural dos moradores residentes na cidade oriundos da zona rural Diante das dificuldades a população mais pobre passa a cultivar áreas vazias ou em seus quintais na busca de autoabastecimentos ou para abastecimentos do mercado urbano auferindo renda ou complementação Os estudos das atividades agrícolas no interior ou próxima de áreas urbanas no Brasil são mencionados nas obras de Bicalho 1992 1996 1998 2000 que se define como referencial de grande valia para a agricultura urbana Para se compreender como a agricultura resiste na cidade mesmo diante do intenso processo de metropolização que não consegue converter toda terra agrícola em usos urbanos é preciso entender a agricultura metropolitana como parte do dinâmico processo de contínua mudança sócioespacial gerado por uma situação de permanente conflito de interesses e disputas de áreas por usos rurais e urbanos BICALHO 1992 p 285 Destacase a existência de atividades agrícolas na cidade que se relacionam às questões históricoculturais As atividades agrícolas urbanas por tradição também explicam a manutenção de atividades primárias na cidade Muitos proprietários mantêm áreas agrícolas motivados por desejos de ter uma vivência rural ou de contato com a natureza por exemplo sempre próximo ao local de trabalho e moradia sendo desnecessário o deslocamento para maiores distâncias Segundo Maia 1994 a necessidade e desejo explicam a dinâmica da AU Diante da diversidade e intensidade de suas atividades percebese que a manutenção e o crescimento de atividades rurais na cidade devemse por um lado à necessidade de sobrevivência dos setores marginais que desenvolvem estratégias de vida e trabalho configurando uma cidade muito O Rural e o Urbano 185 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 diferente da idealizada e propagada pelo discurso modernizante de suas elites E por outro lado devese ao desejo de pessoas originárias ou com forte referência com o meio rural de praticar atividades que satisfaçam ou ainda proporcionem algum tipo de ligação ou contato com a natureza O oposto também ocorre conforme pôdese constatar nas últimas décadas onde tem se destacado uma nova percepção do campo relativo a um modo de vida alternativo e ambientalmente sustentável correspondente a um resgate da natureza pelos habitantes da cidade que se dirigem ao campo BIAZZO 2008 Candiotto e Corrêa 2008 referemse a urbanização física do rural apresentada por Graziano da Silva através do conceito de rurbano com a inserção de novas atividades no campo sobretudo as nãoagrícolas As atividades nãoagrícolas fazem com que o rural assuma novas funções dentre as quais estão as atividades de lazer como o turismo em área rural segundas residências e aposentadorias rurais Portanto percebese que atualmente as atividades produtivas agrícolas tradicionais já não são mais suficientes para explicar por si sós a dinâmica da renda e das ocupações das famílias rurais Assim compreender o papel da diversificação do meio rural consiste numa tarefa onde estão envolvidos uma série de fatores que abrangem diretamente as esferas socioeconômicas ambientais e culturais do espaço onde vem sendo desenvolvidas essas atividades nãoagrícolas1 Dessa forma crescem cada vez mais atividades de lazer que buscam um resgate às tradições culturais de determinadas áreas e valorizam os costumes da vida rural Essas atividades geralmente se manifestam em rotas turísticas e em eventos festivos de pequenos municípios ocorrendo tanto em áreas rurais como urbanas 1 Nos anos 1980 assistiuse à invenção social de uma nova realidade o mundo rural não agrícola Esta perspectiva introduz elementos novos no modo de encarar os mundos rural e urbano em si e na forma como se relacionam A valorização da dimensão não agrícola do mundo rural é socialmente construída a partir da ideia de patrimônio Verificase de fato a ocorrência de três tendências que por motivos parcialmente autônomos convergem num mesmo sentido movi mento de renaturalização centrado na conservação e proteção da natureza aspectos agora hipervalorizados no âmbito do debate sobre os processos de desenvolvimento sustentável a procura de autenticidade que leva a encarar a conservação e a proteção dos patrimônios históricos e culturais como vias privilegiadas para valorizar memórias e identidades capazes de enfrentar tendências uniformizadoras desencadeadas pelos processos de mundialização a mercantilização das paisagens como resposta à rápida expansão de novas práticas de consumo decorrentes do aumento dos tempos livres da melhoria do nível de vida de importantes segmentos da população e como consequência da valorização das atividades de turismo e lazer Nota do autor 186 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 Por outro lado podese constatar a mudança na paisagem rural com a presença da tecnificação do campo as atividades industriais a presença dos complexos agroindustriais as cooperativas e a interligação campocidade por uma rede viária de transporte eficaz paralela a um sistema de comunicação eficiente As recentes manifestações no mundo rural que antes eram peculiares ao mundo urbano podem ser denominadas de urbanidades no rural que denotam a presença do urbano no campo sem que essa presença leve à eliminação das marcas próprias a cada espacialidade urbana e rural O espaço resultante dessas interações é dotado de um hibridismo que não pode ser comparado a um urbano ruralizado nem mesmo a um rural urbanizado De acordo com Bagli 2006 rural e urbano extrapolam os limites espaciais tradicionais As contradições colocam a realidade plural do desenvolvimento da sociedade uma vez que o campo é espaço predominantemente rural mas não exclusivamente De forma semelhante a cidade é espaço urbano o que não significa que seja exclusivamente urbano Nem tudo o que existe no campo é rural nem tudo o que há na cidade é urbano Tanto os que se aproximam do urbano quanto os que se aproximam do rural tendem a adquirir características específicas de cada espaço Porém nem sempre a aquisição de tais características leva o indivíduo a se urbanizar ou a ruralizarse diante das atividades de caráter rural praticada no espaço urbano e das atividades de caráter urbano desenvolvidas no espaço rural 3 URBANIDADES E RURALIDADES Segundo Moreira 2005 ao invés de apontar para uma nova ruralidade melhor falar em ruralidades globais e locais As ruralidades seriam compostas por objetos ações e representações peculiares do rural com destaque para as representações e identidades rurais dos indivíduos e grupos sociais As ruralidades apresentam uma visão ampla entendendoas como manifestações representativas do espaço rural traduzidas em políticas públicas instituições legislações interesses objetos técnicos e identidades características do rural quando presentes na Organização Mundial do Comércio no mercado de commodities nos transgênicos no Ministério O Rural e o Urbano 187 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 da Agricultura e Ministério do Desenvolvimento Agrário na bancada ruralista no Movimento dos SemTerras nos ambientalistas etc Nesse sentido as ruralidades apresentam diferentes interpretações de grupos sociais e instituições sobre o rural bem como o território de atuação e influência a hinterland de cada uma dessas instituições Segundo Marques 2002 as possibilidades de desenvolvimento de qualquer comunidade rural dependem dos laços que ela mantém com centros urbanos particularmente com as cidades de sua própria região É preciso portanto além do consumo simbólico e material do campo por parte dos habitantes das cidades aterse a outras relações econômicas e políticas estabelecidas entre o rural e o urbano Destacase que a superação da divisão entre cidade e campo não deve ser confundida com o desaparecimento do campo e das atividades agrárias como nos lembra Sobarzo 2006 considerando que essa superação está ligada às relações de produção Contudo nessa dialética o campo não se perde no meio da cidade nem a cidade absorvendo o campo se perde nele Nesse sentido urbano e rural permanecem como conteúdos sociais diferenciados urbanidades e ruralidades mas a oposição cidade e campo atenuase Corroborando com tais reflexões Biazzo 2008 afirma que campo e cidade são materialidades concretizandose como paisagens que se contrastam Porém ruralidades e urbanidades são racionalidades ou lógicas São vários os exemplos das novas identidades rurais ou manifestações de ruralidades encontradas tanto no campo quanto na cidade Associados à economia seriam a revitalização de práticas de produção orgânica nas atividades agrárias o turismo rural em espaços campestres e os mercados futuros de commodities em espaços citadinos Associados à política seriam o personalismo e o clientelismo os embates na OMC acerca de subsídios agrícolas as disputas no âmbito dos Ministérios da Agricultura e do Desenvolvimento Agrário no Brasil os movimentos sociais como o MST Associados à cultura envolvem a busca de uma reaproximação da natureza pela população citadina os hábitos de origem country o sucesso de músicas sertanejas entre muitos outros Por outro lado as urbanidades associadas à economia se manifestam através da complexa divisão social do trabalho redes técnicas de transporte e comunicação tanto no campo quanto na cidade Associadas à política se revelam no planejamento e nos planos de gestão do território na crescente densidade normativa dos espaços citadinos e campestres Por fim associadas à 188 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 cultura as urbanidades se manifestam com a emancipação feminina e a redução da divisão sexual do trabalho com a fluidez de informação a estetização de comportamentos de acordo com as mídias entre outros exemplos Biazzo 2008 conclui seu pensamento afirmando que campo e cidade são formas concretas materializamse e compõem as paisagens produzidas pelo homem Já o urbano e o rural são representações sociais conteúdos das práticas de cada sujeito cada instituição cada agente da sociedade Por isso urbanidades e ruralidades se combinam em cada recorte do espaço seja um local seja uma micro meso ou macro região Segundo Rua 2005 tanto a urbanização física como a urbanização ideológica no campo levam ao estabelecimento de urbanidades no espaço rural Não podese compreender a ruralidade somente a partir da penetração do mundo urbanoindustrial no rural urbanização física mas também a partir do consumo pela sociedade urbanoindustrial de bens simbólicos e materiais e de práticas culturais que são reconhecidas como próprias do mundo rural As urbanidades segundo Rua 2002 são constituídas por uma enorme gama de manifestações que vão desde a melhoria da infraestrutura e dos meios de comunicação até a aposentadoria e novas formas de lazer A proposta de urbanidades busca abarcar o pluralismo de modo que o turismo e o veraneio a pluriatividade os movimentos organizados e as reivindicações dos habitantes rurais vão confirmar a expansão das urbanidades nas áreas rurais Conforme as atividades não agrícolas no campo vão se expandindo ocorre o processo de intensificação das relações e a interdependência entre o urbano e o rural e por conseguinte as urbanidades e as ruralidades Esta nova dinâmica do espaço rural leva ao crescimento de famílias rurais pluriativas ou seja que combinam atividades agrícolas e não agrícolas autônomas eou assalariadas Portanto os conceitos de ruralidades e urbanidades inseridos no debate em torno do rural contemporâneo procuram incorporar as novas dinâmicas presentes na configuração do espaço geográfico 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS O objetivo desta contribuição num primeiro momento foi tecer considerações teóricas acerca das categorias do Rural e do Urbano e suas relações entre si O Rural e o Urbano 189 Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 O estudo da relação entre campo e cidade e rural e urbano necessita de uma visão dialética e abrangente que incorpore as potencialidades e os atores sociais presentes tanto no campo quanto na cidade Outro ponto a ser considerado verificase na realidade urbana e na realidade rural que não são estanques e ultimamente têm passado por rápidas e intensas transformações as quais ressoam de forma direta na reorganização do espaço na redefinição de relações e na constituição de novas territorialidades Por isso acreditase ser um equívoco pensar a extinção dos espaços rurais em função do avanço do processo de urbanização e consequentemente de haver um continnum rural urbano visto que campo e cidade são espaços que se diferenciam frente ao fortalecimento de suas peculiaridades É fato que a revolução técnicocientífica comprometeu as relações entre o rural e o urbano A preocupação maior nesse início de século é compreender as modificações que os atores sociais imprimem a essas categorias que se mesclam dialeticamente num continuum rural urbano Destarte consideramse fundamentais essas categorias pois auxiliam no desenvolvimento territorial dos espaços onde esses atores sociais o modelam de uma forma ou de outra onde estão inseridos construindo des construindo e re construindo territórios A análise da relação campo e cidade e rural e urbano tem avançado onde acreditase ser essencial entender o rural para além do campo e o urbano para além da cidade pois campo e cidade são partes integrantes do todo mesmo que às vezes o campo não seja tão rural e a cidade nem tão urbana eles não se opõem excluindose mutuamente ao contrário se complementam justamente pelas diferenças Em suma desaparece todo o sentido em tratar o rural exclusivamente como o oposto do urbano em proclamar seu desaparecimento ou em resumilo a apenas uma de suas dimensões atuais o agrário REFERÊNCIAS ABRAMOVAY R Funções e medidas da ruralidade no desenvolvimento contemporâneo Rio de Janeiro IPEA 2000 O futuro das regiões rurais Porto Alegre Editora UFRGS 2003 190 JACINTO Janério M Mendes César M PEREHOUSKEI Nestor A Revista Percurso NEMO Maringá v 4 n 2 p 173 191 2012 ISSN 2177 3300 BAGLI P Rural e urbano nos municípios de Presidente Prudente Álvares Machado e Mirante do Paranapanema dos mitos pretéritos às recentes transformações 2006 207 f Dissertação Mestrado em Geografia Faculdade de Ciências e Tecnologia Universidade Estadual Paulista Presidente Prudente 2006 BIAZZO P P Campo e Rural Cidade e Urbano Distinções necessárias para uma perspectiva crítica em geografia agrária 4º Encontro nacional de grupos de pesquisa ENGRUP São Paulo p 132150 2008 BICALHO A M S M Agricultura e meio ambiente no município do Rio de Janeiro In ABREU M A Org Sociedade e natureza no Rio de Janeiro Rio de Janeiro Prefeitura do Rio de Janeiro 1992 p 285316 A agricultura metropolitana In CONFERÊNCIA NACIONAL DE GEOGRAFIA E CARTOGRAFIA 1996 Rio de Janeiro Anais da Conferência Nacional de Geografia e Cartografia Rio de janeiro IBGE 1996 Desenvolvimento rural sustentável e geografia agrária In XII Encontro Nacional de Geografia Agrária 8 1998 Uberlândia Anais do XII Encontro Nacional de Geografia Agrária Uberlândia 1998 Sustainable metropolitan agriculture in Brazil In BOWLER I R BRYANT C R HUIGEN P P P Editors Dimensions of Sustainable rural Systems UtrechtGroningen Koninklijk Nederlands Ardrijk skundig Genootschap Faculteit der Ruimtelijke WeteschappenRijksuniversiteit Groningen 1998 p 97104 Economics sustainability in vegetable farming in Rio de Janeiro state Brasil In IGU COMMISSION ON THE SUSTAINABILITY OF RURAL SYSTEMS CONFERENCE 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