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43 CAPÍTULO 2 COMPLEXO EDUCATIVO E DESENVOLVIMENTO SOCIAL NOTAS SOBRE A HISTÓRIA E O CONTEXTO DA DICOTOMIA EDUCACIONAL Já sabemos como se encontra o cenário de crise aguda do capitalismo contemporâneo e algumas de suas estratégias de salvaguardar o lucro do capital quadro em que se desenvolvem as reformulações da escola pública com o intuito de destinar uma escola exclusiva à formação da classe trabalhadora Adentramos agora ao estudo do complexo educativo Nosso objetivo é analisar como e quando nasce e como se desenvolve a dicotomia educativa Ancorados no método indicado pelo marxismo clássico que considera as categorias como expressão do real que tem no mais avançado a chave de compreensão para o de menor evolução ou seja considerando a escola capitalista do alvorecer do século XXI mergulhada em uma crise profunda partiremos deste contexto até o mais remoto nascimento do complexo educativo Feito isso percorreremos a história da educação em vistas de encontrar os elementos que nos expliquem como se constitui e se desenvolve o dualismo educacional A educação é um fenômeno social imanente aos homens Ela brota das relações humanas das contradições vividas na sociabilidade A especificidade da natureza do elemento educativo 44 torna a educação como pensam por exemplo Saviani 2014 e Tonet 2005 cada um a seu termo responsável por transmitir a cada indivíduo singular a generalidade do ser social ou seja a cultura historicamente acumulada pelo conjunto da humanidade15 Contudo para que o homem possa produzir seu processo educativo ele precisa ao mesmo tempo em que cria as especificidades educacionais sobreviver Para produzir sua existência material garantir alimento vestimenta etc ele precisa da natureza visto que daí ele extrai a matéria necessária para seu sustento Portanto é transformando a natureza sob orientação teleológica com intenção que os indivíduos conseguem os subsídios necessários para sua vida material Esse processo chamado por Marx 2003 de trabalho ocorre cotidianamente nas atividades de manutenção da existência humana É por isso que esse autor afirma que o trabalho é o ato fundante do ser social Dito de outro modo é o trabalho que opera a humanidade no homem Isto é o que o diferencia dos outros animais é o trabalho pois para transformar a natureza transformandose com ela ele planeja antecipadamente suas ações Logo o ato de modificar a natureza não é inconsciente mas obedece a uma finalidade Como sintetiza a clássica reflexão de Marx 2003 p 211 15Sobre a função da educação de transmitir o legado acumulado historicamente às novas gerações conferir Saviani 2014 e Tonet 2005 Não há como apontar na presente exposição ao menos em grandes linhas as polêmicas distinções existentes entre esses dois pesquisadores Para as pretensões desta comunicação tornase suficiente indicar embora muito sinteticamente que Saviani em linhas gerais segue as indicações gramscianas sobre a natureza e função da educação ou seja defende que o complexo educativo deve trafegar para as gerações futuras o que a humanidade acumula em seu histórico o que é apropriado por Frigotto Duarte entre outros autores Já Tonet embora se utilize de Saviani em algumas ocasiões recorre a tese lukacsiana pela qual a educação deve se empenhar em garantir ao sujeito os elementos para que ele possa conviver com o novo com as novidades com as possibilidades Em uma expressão para que ele possa escolher entre alternativas Dessa posição de modo geral partilham cada uma a seu modo Lessa Lazarine entre outros estudiosos 45 Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão e a abelha envergonha mais de um arquiteto humano com a construção dos favos de suas colmeias No entanto o que distingue de antemão o pior arquiteto da melhor abelha é que ele construiu o favo em sua cabeça teleologia antes de construílo em cera MARX 2003 p 21112 O trabalho ao fundar o ser social no entanto não esgota toda a potencialidade humana Serão precisos outros complexos sociais para que o devir humano se desenvolva A educação vai ser um desses complexos potencializadores do deenvolvimento humano Com apoio em Lukács 2013 podemos apontar que a educação estabelece com o trabalho uma relação de dependência ontológica determinação recíproca e autonomia relativa ela assume lugar importante na reprodução social Em sentido lato espontâneo a educação é uma categoria universal que se ocupa em concretizar a apropriação por parte dos indivíduos das objetivações que constituem o gênero humano LUKÁCS 2013 No comunismo primitivo a educação se dava em contato direto com a natureza os mais jovens aprendiam com os mais velhos e no próprio ato de transformar a matéria Nesse momento é possível identificar que existia uma educação ligada diretamente ao cotidiano Como registra Ponce 1998 p 21 numa sociedade sem classes como a comunidade primitiva os fins da educação derivam da estrutura homogênea do ambiente social identificamse com interesses comuns do grupo e se realizam igualitariamente em todos os seus membros de modo espontâneo e integral Para esse autor a espontaneidade davase na medida em que não existia nenhuma instituição socialmente destinada a educar sendo ao mesmo tempo integral visto que cada membro da tribo incorporava mais ou menos bem tudo o que na referida comunidade era possível receber e elaborar PONCE 1998 p 21 Em largas linhas podemos considerar que quando o homem passa a dominar melhor as técnicas de plantio e de domesticação 46 de alguns animais aos poucos fixase na terra abandonando paulatinamente o nomandismo e dela se apropria Essa conjunção de fatores associada ao aparecimento de incipiente excedente de produção faz surgir na história humana o ócio Com isso uma classe se autoproclama proprietária da terra assumindo para si as benesses da descoberta do tempo livre Articulado dialeticamente a isso obriga a outra classe a trabalhar para sustentar as duas classes Os proprietários privados da terra ficam com o ócio enquanto os trabalhadores assumem a produção A divisão da sociedade em classes entre outros fatores tem aí suas raízes a apropriação privada da terra confirmada sobre a exploração do trabalho escravo possibilitou a divisão dos homens em duas distintas classes dependentes entre si Se naquele período a terra era o principal meio de produção da vida material agora os proprietários dependem do trabalho alheio enquanto a classe expropriada passou a depender daqueles que se apropriaram das terras O resultado desse contexto é que aquela classe se privilegia de tempo livre uma vez que não precisa mais se ocupar diretamente com as atividades de subsistência Como explica Lukács 2013 p 259 quando a proteção da vida passa a direcionarse primordialmente contra outras comunidades humanas e especialmente desde que a escravidão se torna uma defesa do status quo social no plano interno tão necessária quanto as guerras aflora o dilema entre obter escravos ou tornarse um Daí segundo este autor surge a distinção rigorosa na especificação das finalidades bem como nos métodos para se atingir tais fins Esse é o cenário em que no comunismo primitivo16 a educação deixa de coincidir inteiramente com o 16A expressão primitividade designa para Lukács 2013 p 341 por um lado o nível do trabalho enquanto dominação social da natureza mas que ainda não o nível da produção e por outro lado designa o nível do homem cujas relações com a realidade ainda não puderam atingir aquela multiformidade e multiplicidade que já estão na mais inicial das sociedades de classe 47 cotidiano começa a perder sua espontaneidade Com o surgimento da sociedade dividida em duas classes sociais quem detém o ócio decide ter para si um processo educacional específico restrito Engels 2004 p 123 em diálogo com Marx assim se pronuncia sobre o fim da sociedade primitiva O poder dessas comunidades primitivas tinha de ser destruído como de fato o foi Mas foi destruído contudo por influências que desde o início nos aparecem como uma degradação como uma queda da singela grandeza moral da velha sociedade gentílica São os interesses mais baixos a vil cobiça a brutal avidez de prazeres a sórdida avareza o roubo egoísta da propriedade comum que inauguram a nova sociedade civilizada a sociedade de classes Erguese por sobre a sociedade classista o que se pode chamar de processo educativo ou educação em sentido stricto para usarmos a expressão lukacsiana Ou seja uma educação para uma demanda específica da sociedade sistematizada organizada sob orientação de determinados interesses sociais Inspiradas em Lukács Lima e Jimenez 2011 p 94 indicam que a educação em sentido stricto diferentemente da lato não paira sobre a totalidade social vinculandose em sentido estrito às necessidades da sociedade de classe Pontuamos que esse contexto consagra a primeira dicotomia educativa Isto é como elabora Lukács 2013 a educação que antes era somente cotidiana ganha uma dualidade passa a ser dividida em lato e stricto A primeira continuava destinada aos trabalhadores e seus filhos e realizavase no próprio convívio cotidiano no processo diário de produção da existência e de forma assistemática A segunda por sua vez destinada aos detentores de ócio realizavase em local específico para esta finalidade sistematizava conhecimentos orientavase a resolver problemas de interesse de uma determinada classe Esta forma sistematizada de educação propiciou aos filhos dos proprietários dos meios de produção um modelo educacional afastado do cotidiano Agora esses estudantes tinham a sua disponibilidade um local exclusivo 48 apropriado e especialmente preparado para o aprendizado mais tarde veio a ser denominada de escola17 Mesmo com a dissolução do modo de produção escravo e o surgimento por sobre este do modo de produção feudal e apesar de inúmeras mudanças que ocorreram na estrutura da sociedade por milhares de anos o processo educativo mantém sua base fincada no ócio É certo que muitas diferenças existem entre o escravismo e o feudalismo Não pretendemos negar esse fato básico da história humana Não obstante inegável também é que durante esses dois modos de produção a sociedade não precisou resolver a problemática do trabalho em relação à instrução Em outras palavras tanto no modo de produção escravista como no seu sucedâneo feudalismo a relação entre as forças produtivas e a educação não necessitava de um sistema educativo que se integrasse imediatamente à produção material da vida Decorre assim que durante todo esse tempo a sociedade se resolveu com a sua histórica dicotomia a educação que atendia ao modo de produção funcionava grudada ao próprio cotidiano local onde atuavam os não proprietários de terras esta educação era carente de sistematização Do outro lado mas integrado a dialética da totalidade social estava o processo educativo escolarizado sistemático e extracotidiano este desfrutado pelos donos de terras e seus eleitos18 Sintetizando tal divisão educacional com o auxílio de Manacorda 2006 p 41 podemos compreender que na 17Saviani 1994 p 2 em texto já clássico localiza nesse ponto a origem da escola Para ele A palavra escola em grego significa o lugar do ócio Portanto a escola era o lugar a que tinham acesso as classes ociosas Nada mais natural que esse processo educacional institucionalizado fosse ocupado por uma elite por quem detinha tempo livre 18Autores como Luzuriaga 1963 Cambi 1999 Aranha 2006 Manacorda 2006 Ponce 1998 cada um de seu modo exemplificam bem os processos educacionais do modo de produção escravo e feudal 49 Antiguidade grega encontrase antes de tudo a separação dos processos educativos segundo as classes sociais O filólogo italiano esclarece que para as classes governantes uma escola isto é um processo de educação separado visando preparar para as tarefas do poder que são o pensar ou o falar isto é a política e o fazer a esta inerente isto é as armas Já para os produtores do sustento da vida material nenhuma escola inicialmente mas só um treinamento no trabalho A educação para aquela classe destinavase principalmente à retórica com a especificidade para a arte do bem falar Essa escola tinha a marca dos privilegiados dos escolhidos socialmente para administrar a burocracia social Em contraponto a esse modelo o aprendizado no próprio ambiente de trabalho no plantio na colheita na incipiente pecuária na artesania nas primeiras oficinas na observância pouco mediada cientificamente com a natureza Neste processo educativo encontrase não a escola do ofício até porque ainda não se constituía como tal mas a relação aprendizagemensino espontaneamente ligada às necessidades do dia a dia Pontuamos de forma enérgica que tais necessidades eram principalmente determinadas pela classe que detinha o poder político Mesmo havendo sérias distinções entre a natureza do trabalho escravo e do trabalho servil ainda que existindo modificações estruturais na relação social de produção assim como na forma de execução das atividades de trabalho o modo de produção feudal mantém a tradição herdada da Antiguidade Por exemplo na sociedade grega e romana a cidade mais do que o campo era o locus das ocupações produtivas enquanto os arredores urbanos desenvolviam o que era preciso inclusive a agricultura Na Idade Média de forma distinta a sociedade se resolvia no campo e do campo retirava seus suprimentos materiais SAVIANI 1994 Não obstante as características principais da sociedade antiga especialmente ao que se refere à sua produção material persistem 50 na Idade Média Como resume Saviani 1994 p 5 neste período histórico o meio dominante de produção era a terra e a forma econômica dominante era a agricultura No modelo de sociedade feudal baseado no trabalho servil bem como no da Antiguidade baseado no trabalho escravo a educação escolar destinase aos detentores do ócio filhos das classes dominantes Como aponta Aranha 2006 a cultura no medievo é um amálgama de elementos grecoromanos Por isso o ócio nesses modos de produção mantêmse como elo distintivo de quem podia ou não se ocupar com atividades consideradas nobres nesse caso a educação escolar Para além das diferenças que certamente existem entre os modos de produção escravo e feudal como registra Tonet 2013 p 17 eles guardam em comum algumas características importantes Ambos são bastante estáticos Suas estruturas sociais de longa duração parecem ter um caráter de imutabilidade e de naturalidade Isto se deve essencialmente ao fato de que a forma de produzir a riqueza terra e escravos ou terra e servos respectivamente tem uma dinâmica interna muito pequena e uma limitação insuperável Além disso em ambos o acúmulo de conhecimentos acerca da natureza e da própria sociedade é muito precário o que favorece uma elaboração teórica com poucos fundamentos empíricos Mais ainda em ambos a forma de produção da riqueza material não requer por parte dos responsáveis por ela um conhecimento sistematizado da natureza Seu aprendizado se dá na própria atividade prática De outro lado os que se apropriam da riqueza estão completamente apartados das atividades relativas à sua produção Há portanto uma separação radical entre trabalho manual e trabalho intelectual do que resultarão importantes consequências para a elaboração de uma concepção de mundo Uma importante mudança no período medieval pode ser anotada na organização escolar Perguntas como por exemplo onde se realizar a educação escolar Qual é sua forma Entre outras começaram a ser estipuladas Algumas respostas foram dadas a esse respeito e para que clérigos nobres e alguns guerreiros pudessem se dedicar aos estudos criaramse escolas paroquiais monárquicas e monásticas Em geral o modelo 51 educacional seguido no medievo acompanhou mesmo com algumas contradições as regras orientadas pela Igreja Católica A própria evolução contraditória da sociedade com seus saltos retrocessos e avanços inevitavelmente potencializa o novo A novidade atende pelo nome da acentuação do comércio e com ela o aumento do tráfego cada vez mais intenso entre comunidades distintas que por seu turno demandam outras exigências sociais Tais parâmetros exigiram dos homens medievais a aquisição de outros padrões que não se limitassem somente aos poderes da religião Essa efervescência do crescimento comercial impulsiona outra importante transformação as cidades voltam a ganhar centralidade como outrora o foram na Antiguidade clássica Dessa feita os centros urbanos passam a funcionar como os epicentros da Europa Ocidental irradiando uma cultura que pretende se vincular para além dos valores religiosos O processo educativo não podia ficar imune às transformações da totalidade social E não ficou As modificações ocorridas no tráfico entre os homens impactaram também o campo específico da educação Não podemos perder de mira que como adiantamos acima o complexo educativo guarda determinação recíproca com o complexo econômico Desse modo e não poderia ser diferente a esfera educacional apresenta suas alterações Uma delas é a transformação em meio a inúmeros outros contraditórios fatores das antigas escolas monásticas em universidades Ponce 1998 registra que as universidades em seu início destinavamse apenas a reunir homens livres ociosos interessados nas discussões das ciências Com o passar do tempo essas reuniões assumiram currículos específicos de gramática retórica e lógica denominado de trivium e aritmética geometria astronomia e música chamado de quadrivium Como documenta Aranha 2006 era a utilização do método da Escolástica que tomava como base a lectio e a disputatio em que se acreditavam inserir os estudantes no 52 exercício da dialética a partir de posições contrárias O estudante que passasse desses ensinamentos iniciais era encaminhado para o estudo das chamadas artes liberais A partir desse ponto o aprendente iniciava sua preparação para o exercício de um ofício propriamente dito que podia ainda se especializar em teologia medicina ou direito Várias concepções educativas procuram responder a esse quadro Não tendo como atender a todas contentamonos em pontuar duas propostas cujas tentativas consideramos como significativas para que possamos demonstrar qual o tipo de homem que mesmo em um mundo que se considerava renascendo pretendiase formar Não é oneroso reiterar que as duas concepções em debate guardam contraposições que aqui não poderão ser tratadas adequadamente Contudo tais contraposições indicam inclusive a marca que tais pressupostos educativos almejavam deixar nos seus educandos Com essas ressalvas adiantadas optamos em pontuar as teses de Jan Amos Coménio e JeanJacques Rousseau Nosso recorte recai sobre o pastor da Morávia por ele ser o primeiro pensador que se preocupa em apresentar uma proposta pedagógica logo após o mundo conhecer as proposições cientificamente revolucionárias de Francis Bacon Galileu Galilei entre outros cientistas que iniciaram a recondução da ciência ao patamar de desantropomorfização conforme historia Lukács 1966 v1 Já o pensador suíço merece nossa escolha por ser considerado o pai da revolução copernicana na educação MANACORDA 2006 Portanto podemos ponderar de forma razoável que o primeiro abre as propostas educacionais do período que a historiografia achou por bem denominar de Renascimento e que o segundo fecha esse ciclo já que mais tarde mesmo depois de ser perseguido pela Igreja Rousseau acaba por se tornar o eminente teórico da Revolução Burguesa 53 Coménio está centrado na luta da ciência para se libertar do poder exercido sobre o mundo pela fé religiosa Sua batalha se desenrola no ambiente de apresentar um projeto educativo que contemple a seguinte situação imanência científica versus transcendência religiosa Ele é laudatário de Santo Agostinho e de Santo Tomás de Aquino e ainda está sob fortes reverberações da Reforma Protestante de Lutero e Calvino Coménio apesar de sua boa intenção não tinha como pender limpidamente para o lado da ciência Mesmo assim seus escritos tentam apresentar um tratado educativoreligioso com base na natureza sendo ainda hoje lembrado com grande entusiasmo por muitos estudos contemporâneos As contribuições desse autor surgem exatamente das contradições do contexto em que as intenções de sistematizar o ato de ensinar exige da Igreja uma resposta ao avanço da reforma protestante As teses de tal pastor aparecem no momento em que a relação trabalhoinstrução mesmo que de forma ainda incipiente pela primeira vez começa a se colocar no centro do debate posicionada para além da moralidade Tal discussão brota das necessidades nascidas das contradições sociais que por seu turno precisam de determinadas aprendizagens e de certas habilidades operativas concretas para desenvolver as forças produtivas mesmo que estas ainda estejam em baixo nível de desenvolvimento Manacorda 2006 p 224 embora reconheça aquele teórico como um grande sistematizador não o considera um revolucionário pois para o italiano o intelectual da Moravia chega atrasado a um mundo em profundas mudanças Manacorda 2006 aumenta a advertência lembrando que os protagonistas de tais desejos são os senhores que jamais aspiram ser os executores do necessário aprendizado De todo modo e apesar das justas ressalvas manacordianas Coménio ganha visibilidade histórica com as teses 54 contidas no livro a Tipografia vivente Typographeum vivum sendo considerado um dos pais da pedagogia moderna As indagações de João dos Reis da Silva Jr 2006 sobre o título do principal livro de Coménio é bastante ilustrativo para as pretensões conclusivas futuras de nossa investigação Aquele autor indica que essa obramonumento inscrita no século XVII chamouse Didática Magna porque naquela época os títulos dos livros tinham a obrigação de explicar detalhadamente já na capa o seu conteúdo Por isso o título A Didática magna ou A arte universal de ensinar tudo a todos Silva Jr 2006 propõe duas perguntas para melhor mediar o debate o que levaria um autor em pleno século XVII pleitear a criação das bases da arte universal de ensinar tudo a todos E o que ou com quem ele está debatendo ao falar do tudo a todos A resposta apresentada por Silva Jr 2006 indica que Coménio trava um debate naquela quadra histórica contra as necessidades de tal sociedade comandada por uma nobreza cujo percentual de toda a população que poderia frequentar a escola não ultrapassava 1 Uma terceira pergunta ainda é lançada por Silva Jr 2006 naquele período da história quem podia se candidatar à universidade Utilizando os escritos do próprio Coménio esclarece aquele autor Os melhores engenhos Os outros têm que receber instruções e têm que ir para a charrua quer dizer têm que ir para a roça que foi para isso que nasceram Mas vejam complementa Silva Jr 2006 p 290 o que está na capa no título do livro é A arte de ensinar tudo a todos Instrução virtude ou seja honestidade de costumes e religião como piedade são os autênticos requisitos do homem e tais elementos precisam estar moldados desde os primeiros anos de vida acredita Coménio 1996 Para ele a educação é uma forma de distinção quanto mais alguém é educado mais se eleva acima dos outros COMÉNIO 1996 p 125 Se a educação universal 55 da juventude for devidamente continuada prossegue Coménio 1996 p 143 a ninguém faltará daí em diante matéria de bons pensamentos de bons desejos de boas inspirações e também de boas obras Considerando que devem ser enviados às escolas não apenas os filhos dos ricos ou dos cidadãos principais mas todos por igual nobres ricos e pobres rapazes e raparigas COMÉNIO 1996 p 139 falta definir o que o autor entende por escola Chamo escola perfeitamente correspondente ao seu fim aquela que é uma verdadeira oficina de homens isto é onde as mentes dos alunos sejam mergulhadas no fulgor da sabedoria para que penetrem prontamente em todas as coisas manifestas e ocultas COMÉNIO 1996 p 155 Para que fique mais claro quem são todos ou seja quem são os eleitos a frequentarem a escola precisaremos introduzir mais um pensador sem contudo poder aprofundar suas teses Indicaremos brevemente com o apoio de Silva Jr 2006 e Manacroda 2006 o postulado do gentil homem de Jonh Locke19 que ganhou o debate educacional justamente por sintetizar o legítimo protótipo de quem poderia estudar Vejamos como Locke define a dicotomia de quem podia ou não se candidatar à escola de um lado a formação do gentleman para a classe que ele representava por outro lado para os filhos dos servos futuros trabalhadores Locke indica o que começa a se tornar praxe no pensamento burguês ainda em solidificação a preparação para um ofício imediatamente prático 19Foi Jonh Locke quem primeiro rejeitou a doutrina das ideias inatas Em contraposição ao cartesianismo ele afirmou que todas as ideias se originavam na percepção dos sentidos Sua filosofia da mente é relacionada à origem das concepções modernas de identidade e do Eu Sua definição original sobre o si mesmo através de uma continuidade de consciência e os postulados que defendem ser a mente uma lousa em branco tábua rasa influenciaram vários filósofos posteriores como por exemplo Rousseau e Kant 56 Para Manacorda 2006 contudo Locke assim como Coménio chegou tarde na lente da história com relação à necessária articulação para a vida social do trabalho com a educação Desse modo como documenta o intelectual italiano nesse momento da história já existem na Europa uma incipiente indústria têxtil que se principia na absorção de mão de obra Sobre essa indústria in nuce Manacorda 2006 diz que as novas experiências dos protestantes na França expõem na primeira metade do século XVIII o primeiro esboço do que virá a ser a hoje chamada educação profissionalizante surgidas com o objetivo de ensinar a partir da necessidade premente da união imediata entre teoria e prática Demandada por essa conjunção social ascendente muitos outros experimentos educativos pretendentes a formar o sujeito no menor tempo possível e com aplicação colada às necessidades da produção começam a se espalhar pela Europa Em Berlim por exemplo no ano de 1747 surgem as escolas científicotécnicas No contexto de desantropomorfização da ciência de descobertas científicas importantes para a humanidade essas iniciativas escolásticas estatais como argumenta Manacorda 2006 p 235 especialmente na Alemanha são as premissas políticas do sistema moderno de instrução estatal obrigatória orientado para os estudos científicotécnicos Apesar de os enciclopedistas apresentarem algumas teses sobre o campo educativo quem vai marcar profundamente a história educacional é Rousseau As teorias do filósofo suíço ganham dos meios educacionais a insígnia de ser o pai da revolução copernicana na educação Manacorda 2006 p 240 por exemplo defineo como um gênio contraditório um dos pais da pedagogia moderna Suchodolski 1976 p 50 por seu turno aponta que Rousseau empreendeu a primeira tentativa radical e apaixonada de oposição fundamental à pedagogia da essência e de criação de perspectivas para uma pedagogia da existência 57 O livro Emílio ou Da Educação de JeanJacques Rousseau 2004 lançado em 1762 é que registra esse marcante tratado sobre uma revolucionária até então proposta educativa O texto propõe a divisão do ser em duas partes distintas a primeira ligada à natureza em que o homem é individual e a segunda coletiva e social cuja marca maior seria a civilidade humana A publicação desse livro antecede à Revolução Francesa Entretanto motivado por essa publicação Rousseau antes de se tornar um dos principais teóricos da ascensão da burguesia ao poder é perseguido pela monarquia e principalmente pela Igreja Rousseau parte da concepção naturalista do homem e da sociedade O homem natural seria a unidade absoluta total e sem fragmentação O convívio com os outros homens é fracionário apenas tem valor se relacionado com a totalidade Sua tese principal é que o homem nasceria bom e o meio social o tornaria mau Sobre essa proposta pedagógica Anibal Ponce 1998 p 128 escreve Cada vez que num regime social se vislumbra a possibilidade iminente de uma derrocada surge sempre como um sintoma infalível a necessidade de retorno à natureza Para o intelectual argentino a necessidade de esquecer tudo e começar novamente voltandose para a natureza foi admiravelmente expressa por Rousseau E assim para resolver seu desencanto com a civilização o filósofo suíço cria Emílio Esse personagem nasce e vive até completar 15 anos de idade em completo isolamento fora da civilização sua formação se processa apenas em conformidade com a natureza Para Rousseau nessa primeira fase Emílio é um homem natural em estado puro Após estar pronto pela natureza com seu desenvolvimento físico encaminhado o jovem necessitará de formação social o que o leva a entrar em contato com seus pares em busca da educação moral e política Para o preceptor de Emílio com efeito não há separação entre a ação pedagógica e a atuação política 58 Ainda que tenha sido o responsável por adiantar as bases de uma pedagogia que seria coroada no mundo moderno e embora considerado um gênio mesmo que contraditório Rousseau não consegue propor um processo educacional que relacione instrução com trabalho perante as necessidades da própria burguesia em ascensão Vejamos melhor como se processa essa genialidade contraditória para usarmos a expressão consagrada por Manacorda 2006 Escreve Rousseau Se em vez de colar uma criança aos livros eu a ocupar numa oficina suas mãos trabalharão em prol de seu espírito tornarseá filósofa acreditando ser apenas uma operária Mais nunca devemos porém reduzir uma pessoa apenas para trabalhar para viver Pois infelizmente não podemos passar todo o nosso tempo na mesa de trabalho Não somos aprendizes de trabalhadores somos aprendizes de homens e o aprendizado deste último ofício é mais difícil e mais longo do que o outro ROUSSEAU 2004 p 2312 Com essa reflexão podemos inferir que Emílio distanciase do gentil homem proposto por Locke O que prescreve o filósofo suíço sobre o processo educacional como formador de indivíduos para executar um ofício necessário à produção industrial que ascendia com a classe burguesa naquela quadra histórica começa a esclarecer suas limitações Rousseau prescreve uma formação que se baseia na utilidade da existência do homem natural mas também que possa ser proveitoso ao homem que vive em sociedade Rousseau 2004 p 262 com razão prevê que trabalhar é um dever indispensável ao homem social por isso para ele há a necessidade da aprendizagem de um ofício imediato prático Enfatiza ainda motivado por essa constatação que Emílio deve escolher uma profissão e aprendêla devendo antes experimentar tantos ofícios o quanto fossem possíveis A profissão a ser escolhida por seu alunopersonagem deve apresentar um conhecimento utilitário ao homem natural como por exemplo a que Robinson Crusoé desejaria ter em seu 59 isolamento Rousseau conclui que conhecer um ofício é importante para a formação de Emílio mesmo que não venha a exercêlo pois ao menos ele poderá superar os preconceitos em relação àqueles que exercem o trabalho manual Para que fiquem mais claros os limites da relação trabalho instrução em Rousseau precisamos perguntálo qual a profissão ideal para seu Emílio Com a ponderação sobre as escolhas de Emílio Rousseau 2004 p 270 escreve que se seu estudante pudesse escolher o ofício que eu preferiria que fosse do gosto de meu aluno é o de marceneiro Para os que não tem a opção da escolha como não é o caso do privilegiado personagem roussoniano o filósofo não apresenta resposta quanto à profissão a ser seguida No entanto o rigoroso estudo do pensador suíço fornece um elenco considerável de profissões taxadas sem dignidade ao seu bemaventurado Emílio Deixemos que as indisfarçáveis palavras carregadas de erudição e asseio vernacular respondam ou pelo menos provoquemnos uma reflexão sobre aquelas pessoas cujas escolhas são obstacularizadas pelas condições socialmente concretas Os trabalhos metalúrgicos são úteis e até mesmo os mais úteis de todos no entanto a menos que uma razão particular me leve a eles não farei de vosso filho um ferrador um serralheiro um ferreiro não gostaria de vêlo em sua forja com a aparência de um ciclope Da mesma forma não farei dele um pedreiro e ainda menos um sapateiro Todos os ofícios deverem ser feitos mas quem pode escolher deve considerar a limpeza pois aí não se trata de opinião sobre este ponto os sentidos é que nos fazem decidir Enfim não gostaria dessas estúpidas profissões cujos trabalhadores sem indústria e quase como autômatos só aplicam as mãos num mesmo trabalho os alfaiates os costureiros de meias os que talham pedras de que serve empregar nessas profissões homens de senso É uma máquina que leva a outra ROUSSEAU 2004 p 2701 grifo e negrito nosso Manacorda 2006 como já adiantado considera as teses de Rousseau à frente de seu tempo Contudo ajudanos a compreender melhor algumas das principais contradições presentes no pensamento do criador de Emílio Como aponta o 60 filólogo italiano embora Emílio não seja o homem refinado de Locke ele é um nobre senhor com poder de escolha sobre sua vocação podendo optar por um ofício asseado deixando a sujeira e o peso para os homens sem senso os ciclopes É exatamente no elo que se estabelece entre o nobre rico e sua formação que Rousseau constrói a relação entre educação e sociedade Contudo conforme aponta Manacorda 2006 é exatamente nessas relações em que se mostram com mais claridade os tensos limites da proposta de Rousseau Basta considerar o papel que ele atribui ao trabalho na instrução profundamente baseado numa concepção atrasada do desenvolvimento real das forças produtivas e dos modos de produção e da própria divisão do trabalho que fica muito aquém da realidade da revolução industrial em ato e da consciência que dela tiveram por exemplo os enciclopedistas e em que a presunção da existência de um trabalho natural se associa à suposta possibilidade de escolha que a história concede ao privilegiado Emílio MANACORDA 2006 p 2445 aspas do original Para que o criador de Emílio seguisse com coerência perante as ideias da classe que naquela quadra histórica iniciava sua ascensão ao poder cujas teses roussounianas foram muito bem aceitas ele não podia se preocupar com a educação das massas e sim como muito bem registra Ponce 1998 somente com a formação de um indivíduo possuidor de recursos suficientes que lhe possibilitasse o conforto de por intermédio de um contrato pagar um preceptor do quilate de Rousseau Para que o capitalismo possa se posicionar em condições de se afirmar definitivamente como proposta de metabolismo da sociedade todavia conforme aponta o pesquisador estadunidense Leo Houberman 1986 foi preciso a contraditória articulação de três principais eventos São eles a reforma e a contrarreforma religiosa as revoluções inglesas gloriosa industrial e a culminância do processo revolucionário da burguesia que se realiza por meio da Revolução Francesa Enfatiza aquele autor que essas revoluções fertilizam o terreno social contribuindo 61 decisivamente para a solidificação do capitalismo como sistema metabólico econômicosocial Portanto com o avanço das contradições de classe consolidação ápice e declínio do modelo da sociedade feudal há uma agudização ainda mais problemática da relação trabalhoinstrução Contrariamente ao quadro cuja negação ao processo escolar foi apresentado às classes produtoras período de produção escrava e feudal com a ascensão do capitalismo surge de forma inédita na história a necessidade de se formar sistematicamente os trabalhadores Os resultados da Revolução Francesa do ponto de vista ontológico potencializam as possibilidades humanas Os avanços da ciência por exemplo são materializados tecnologicamente e passam a ser incorporados com mais rapidez ao processo industrial e ao cotidiano em geral A descoberta da máquina a vapor pelo inglês James Watts por exemplo impulsiona a construção das primeiras indústrias nas cidades visto que a partir desse novo cenário as fábricas não precisam mais depender unicamente das condições da natureza como a água e o vento como força motriz A relação cidade campo ganha um novo ingrediente ou seja os operadores das fábricas precisam agora viver nas cidades deixando o campo o que cria a polaridade hierárquica do campesinato sob o meio urbano Esse panorama leva Ivo Tonet 1997 p 13 a argumentar que pela primeira vez na história uma classe neste caso a burguesia como carro chefe da Revolução Francesa tinha a possibilidade real de apresentar um projeto global para a sociedade capaz de unir ao seu redor todos aqueles que aspiravam por uma sociedade mais igualitária Esse autor entende que essa classe não agiu simplesmente com oportunismo Para o filósofo brasileiro o fato de a burguesia ter chamado para as trincheiras da revolução todos os oprimidos pelo sistema feudal é um fato histórico de peso ontológico Isto é uma proposta real progressista como diria 62 hoje ainda que por sua própria natureza limitada TONET 1997 p 13 Porém apesar dessa grande oportunidade de expandir as potencialidades humanas o que a história documenta é o fenômeno da burguesia acatar a propriedade privada como direito natural expandindo essa naturalidade para os demais direitos Para Tonet 1997 entretanto o egoísmo erguido como substrato da sociedade burguesa impede que qualquer direito mesmo aqueles chamados de direitos humanos possam ir além do individualismo do novo homem burguês Diferentemente das possibilidades de desenvolvimento humano em sua integralidade o que se verifica é a primazia do culto ao individualismo A partir deste momento revolucionário que possibilita à burguesia se apropriar do poder político essa classe que se emancipa politicamente opta por operar uma separação ainda maior entre o indivíduo público e o indivíduo privado Como sintetiza Tonet 1997 p 19 a emancipação política portanto é a expressão do dilaceramento vigente na esfera das relações econômicas Por isso por mais plena que seja é sempre parcial limitada e contraditória Com efeito como conclui o autor os indivíduos se tornaram formalmente iguais formalmente livres mas as bases mais profundas da desigualdade não foram destruídas TONET 1997 p 19 Diante dessas contradições a educação mais uma vez e assim ontologicamente sempre será não pode ficar imune E não fica Toma contornos de fundamental importância para as duas classes antagônicas O complexo educativo passa a ser usado de duas formas distintas mas aciculadas pela classe que detém o poder político da sociedade De um lado essa classe passa a ver a escola como o ambiente propício para formar seus líderes e com isso preservar e perpetuar o status quo oferecendo a si próprio uma educação de cunho propedêutico Do outro lado mas em articulação dialética com a primeira opção a burguesia encontra no processo escolar o locus ideal para pôr em prática seu projeto de 63 adestramento do trabalhador aos particularismos burgueses destinandolhes uma educação de caráter eminentemente profissionalizante 20 Dessa forma estaria fechada idealmente a equação cujo comando ficaria a cabo da burguesia cabendo aos trabalhadores retirar da escola os ensinamentos necessários para fazer girar essa engenhosa descoberta moderna capaz de retroalimentar com mãos espíritos e mentes o mercado reprodutor do capital Como nessa sintética linha do tempo da relação trabalho e educação o que pretendíamos era entender criticamente o papel da educação sobretudo a sua vertente escolar precisamos a partir de agora compreender como as crises políticas destacadamente as vivenciadas pelo sistema capitalista apontam a educação sistematizada como saída para suas mazelas Para que essa questão ganhe um pouco mais de claridade temos que retomar a problemática de como a indústria ganha centralidade sobre um cotidiano cada vez mais urbano Isto é associada à aplicação crescente da maquinaria como mola propulsora da evolução do capitalismo as fábricas se complexificam e passam a exigir um outro tipo de formação dos que vão operar o aparato industrial urbano Dito de outro modo são exigidas determinadas destrezas antes inexistentes aos responsáveis diretos pelo funcionamento da fábrica os operários Essa nova demanda citadinafabril pôs para a burguesia a interessante indagação qual caminho escolher para o processo educativo Mesmo que essa classe tivesse o puro bom discernimento de oferecer educação bancada pelo Estado burguês laica gratuita e de qualidade para todos os trabalhadores a 20O surgimento das primeiras escolas técnicoprofissionalizantes por exemplo foi anunciado pelos defensores da ordem como a solução para a problemática da relação trabalhoinstrução bem como saída para os problemas do desenvolvimento da produção e consequentemente para os seus produtores os trabalhadores e seus filhos 64 natureza ontológica do capitalismo impediria que o suposto bom senso da burguesia assim agisse A opção portanto da classe detentora dos meios de produção para atender às necessidades do capitalismo é possibilitar para os trabalhadores apenas instrução minimamente necessária mas que seja carregada com a exclusividade dos imperativos imediatos da produção capitalista No entanto há no horizonte da refinada retórica da intelectualidade burguesa o discurso de que o capitalismo foi o primeiro sistema que pôs em marcha a universalização da educação Isso de fato é verdade se olharmos somente a aparência enganosa dos fatos Com efeito ao aprofundarmos a análise conseguimos iluminar que a universalização proposta pela burguesia fica apenas circunscrita ao creme do bolo O que faz a burguesia ao necessitar do processo educativo como elemento de realimentação para a estrutura econômica capitalista que se monta após a Revolução Francesa Universaliza o que lhe é particular O padrão propedêutico educativo é guardado para si Já para resolver os problemas demandados pelos imperativos da produção a burguesia apresenta a generalização dos seus interesses mas apresentaos como se fossem necessidades universais a todos Ou seja particulariza seus interesses educacionais mas afirma que os universaliza A burguesia sabe demasiado bem o que faz menciona Ponce 1998 p 150 sobre a forma burguesa de particularizar seu interesse educativo quando diz que universaliza a educação O autor argentino aponta que a contradição burguesa se torna clara quando se observam suas opções pedagógicas distintamente apresentadas para solucionar a questão trabalhoinstrução Se por um lado lembra esse autor a burguesia apresenta a necessidade de instruir as massas para eleválas até o nível das técnicas da nova produção por outro lado teme que essa mesma instrução torne as massas cada dia menos assustadiças e menos humildes 65 Para sintetizar a solução encontrada pela burguesia para tal dilema esse autor escreve o seguinte dosando com parcimônia o ensino primário e impregnandoo de um cerrado espírito de classe como para não comprometer com pretexto das luzes a exploração do operário que constitui a própria base da sua existência PONCE 1998 p 150 aspas do original É dentro desse quadro que brotam os dois modelos paralelos e distintos de educação sistematizada mas articulados entre si em que a burguesia retira sua solução para o dilema trabalhoinstrução Isto é a partir do complexo educativo em sua vertente stricto surge um modelo destinado à classe senhorial que preferimos denominálo de ensino propedêutico clássico e científico cuja organização curricular carrega ensinamentos das ciências das letras das artes da oratória entre outras disciplinas voltadas para a formação dos dirigentes e seus prepostos e um outro modelo destinado aos indivíduos que ocuparão os postos da produção material da sociedade propriamente dita os trabalhadores A esse restrito ramo de uma educação específica que por sua vez se desprende da educação voltada para resolver demandas próprias de uma sociedade de classes antagônicas consideramos conveniente chamála de ensino profissionalizante direcionado para os imperativos práticos cujo conteúdo curricular prioriza as técnicas quase artesanais apreendidas nas oficinas Entre esses dois modelos de escola instalase uma espécie de cunha nunca meafisicamente separada que divide definitivamente a educação em dois lados consagrando o que a história da educação denomina de dicotomia educacional ou seja propedêutica de um lado e profissionalizante de outro Do lado da elite burguesa com efeito consolidase o preconceito em relação às atividades manuais vistas como impuras podendo ser frequentadas apenas pela classe trabalhadora à qual caberia um ensino imediatamente voltado aos imperativos da produção 66 Para que possamos adiantar um pouco mais nossa análise o que nos permitirá um exame mais profundo no próximo item enfrentamos a tarefa de aprofundar qual o caminho que as dicotomias educativas tomam no capitalismo desenvolvido pós século XIX 21 Desenvolvimento capitalista e a consagração pública da dicotomia educativa O ambiente fabril se automatiza de modo crescente exigindo reorganização de determinadas funções entre os operários Entra em cena o especialista Essa nova figura precisa ser encontrada entre os trabalhadores que operam diretamente o processo produtivo Portanto passa a existir uma divisão entre os próprios trabalhadores de chão de fábrica Em outras palavras de um lado encontramse os operários manuais os que operam diretamente os equipamentos de outro surge a figura dos técnicos supervisores os que são envolvidos com o monitoramento e fiscalização entre outras funções intermediárias do controle da produção Tal divisão impõe ao modo de produção capitalista um outro interessante dilema As forças produtivas determinadas pelo capitalismo precisam agora apresentar uma proposta para a questão da formação individual em contraponto à qualificação exigida pela profissionalização da indústria moderna automatizada Para que possamos desenvolver o tema acompanhado do rigor conceitual que lhe impõe a ontometodologia e para garantir uma exposição com clareza suficientemente adequada às pretensões de seus leitores precisamos a partir de agora debater mais esse dilema existente na educação capitalista Após aclararmos melhor tal questão estaremos em condições privilegiadas para dar o devido tratamento à questão da chamada qualificação profissional versus formação omnilateral 67 Antes de avançarmos em busca de um maior aprofundamento sobre a dicotômica história da educação no capitalismo precisamos alertar que o dualismo proposto pelo sistema capitalista após a Revolução Francesa configurase em uma dicotomia que se realiza dentro de um processo já dual Esse processo apenas foi possível pelo fato de a burguesia ser a proprietária dos meios de produção Consequentemente pode adequar a escola do trabalhador às suas necessidades particularismos Já para os jovens filhos da classe burguesa a burguesia escolhe o ensino que lhe convém aquele que pode mais facilmente cristalizar a posição de classe a escola que vai contribuir com a consolidação do histórico dualismo social educacional Contudo não há repetimos cristalização plena O caráter de dependência ontológica da educação conjugase a sua natureza de autonomia relativa e determinação recíproca com relação ao complexo do trabalho não permitindo que esse quadro se consolide sem as contradições inerentes ao processo de luta de classes mesmo que em seu viés dicotômico subdividido no capitalismo Um outro fator que contribui com a solidificação da dicotomia educativa dentro do dualismo histórico presente na educação capitalista são os anseios da classe trabalhadora Nesse momento da história a classe dos produtores carrega no complexo educacional a capacidade de atender as expectativas de sua instrumentalização intelectual e em consequência disso como capaz de oportunizar aos trabalhadores e seus filhos a tão esperada e desejada ascensão social dentro do capitalismo A classe burguesa sabedora desses anseios carrega na escola a responsabilidade de como já dissemos conservar o estado de dominação oferecendo àquela classe apenas o necessário para reproduzir o capital Podemos ainda escrever que em momento determinado da história uma classe precisa que determinado tipo 68 de conhecimento seja mais e melhor elaborado intelectualmente pela outra classe visto que aquela classe precisa do trabalho desta para tocar o aparato produtivo que se complexifica de forma crescente A burguesia entretanto não pode ofertar formações ontologicamente integrais transformadoras sob o risco de perder a posição de comando políticosocial Para melhor se livrar do problema portanto oferta instrução profissionalizante para formar seus operadores e supervisores com conteúdos parciais fragmentados aligeirados e de qualidade duvidosa que apenas possam atender no limite ao pêndulo da fábrica capitalista Assim no desenvolvimento da sociedade sob a égide capitalista no contexto das inúmeras conquistas postas em prova pela burguesia revolucionária muitas propostas tentam responder a um dos maiores dilemas da pedagogia moderna articular formação humana com uma instrução que forme operadores profissionais Segundo ponderação de Manacorda 2006 a fábrica não responde a esse problema ao contrário o seu sucesso é sinônimo de ignorância para o trabalhador mas apesar dessa constatação continua como a grande inspiradora dos experimentos educativos modernos Decerto ainda conforme o intelectual italiano as preocupações da pedagogia com as questões biológicas antropológicas e sobretudo psicológicas apontam para a evolução da educação como locus da ciência Esse é o cenário que faz Ponce indicar ser natural a existência de certa evolução na pedagogia capitalista No entanto escreve o pensador argentino a Didática Magna tentou responder a uma época em que o trabalho atendia a um capitalismo em germe ainda manufatureiro ao passo que os novos métodos pedagógicos principalmente didáticos correspondem diretamente às necessidades do capitalismo imperialista Na base da nova técnica do trabalho escolar conclui Ponce 1998 p 1612 está Ford e não Comênio 69 Muitas proposições educacionais como já adiantado tentaram atender ao dilema trabalhoinstrução que no capitalismo desenvolvido ganha o ingrediente da qualificação profissional A chamada educação ativa no início do século XX que no Brasil serve de inspiração para a escola nova talvez seja a proposta educacional que mais adquire visibilidade no mundo ao tentar equacionar a problemática da formação humana considerando o ensino para a fábrica No entanto essa proposta bem como algumas outras priorizam o caminho da atividade para a produção e não para a formação do ser humano genérico21 Somente as teses de Karl Marx apresentam de fato alternativas de superação da submissão de uma classe à outra Apesar de não ter um tratado específico sobre o complexo educativo é o pensador alemão quem consegue defender com clareza pela primeira vez na história humana uma proposta de formação que tenha como base a educação omnilateral Para Manacorda 2006 p 269 somente as teses de Marx pressupõem a união entre trabalho produtivo remunerado instrução intelectual exercício físico e treinamento politécnico como condição para elevar as classes trabalhadoras acima das classes superiores e médias Em texto bastante utilizado por quem tematiza a educação marxista retirado das Instruções para os delegados do Conselho Geral Provisório da Associação Internacional dos Trabalhadores datado de agosto de 1866 Marx apresenta de forma límpida sua defesa da articulação entre educação e trabalho produtivo Nas clássicas palavras do filósofo alemão por educação entendemos três coisas Primeiramente Educação mental intelectual Segundo Educação física tal como é dada em escolas de ginástica e pelo exército militar Terceiro Instrução tecnológica que transmite os princípios gerais de 21O humano genérico aqui quer expressar vale reforçar o indivíduo partícipe do gênero 70 todos os processos de produção e simultaneamente inicia a criança e o jovem no uso prático e manejo dos instrumentos elementares de todos os ofícios MARX 1982 p 422 O século XX nasce com a escola pública como realidade na Europa e nos Estados Unidos e em boa parte do mundo Não existem mais empecilhos para que o desenvolvimento da produção ocupe a universidade Ao contrário a universidade apesar de suas contradições agora é forte aliada do desenvolvimento capitalista O mundo está preparado para conhecer as orientações da gerência científica de Friedrich Taylor boa parte dela desenvolvida nas cátedras das universidades Os experimentos deste pesquisador ajustamse perfeitamente às necessidades fabris de Henry Ford Assim o capitalismo se articula em torno de uma das suas mais poderosas ferramentas o binômio taylorismofordismo Para Netto e Braz 2008 p 108 a descoberta da administração científica e sua articulação com o fordismo possibilita ao capitalismo uma forma específica de proceder à extração da mais valia absoluta Ainda na fase clássica do imperialismo a gerência científica de Taylor foi objeto de um desenvolvimento significativo graças às adaptações que sofreu nas mãos de Henry Ford 18631947 que se tornaria o chefe de um dos maiores monopólios da indústria automobilística Inicialmente implementada na produção de veículos automotivos essa forma de organização o chamado taylorismo fordismo acabou por se tornar o padrão para toda a produção industrial e universalizouse nos anos dourados do imperialismo NETTO BRAZ 2008 p 1978 itálicos e aspas do original Da primeira metade da década de 1940 até aproximadamente o início dos anos de 1970 apoiado no modelo industrial denominado de padrão tayloristafordista o modo produção capitalista acredita ter encontrado seu paradigma de 22Em pesquisa recente Moura et ali 2015 escrevem o seguinte Em sua essência essa proposição vai ao encontro da discussão sobre educação feita por Marx nO capital cujo volume I foi publicado em 1867 assim como em A ideologia alemã de 1846 e na Crítica ao Programa de Gotha de 1875 Está presente ainda no Manifesto comunista de 1848 de Marx e Engels 71 desenvolvimento Esse período marcado por grande acumulação apresentase ao mundo para usarmos os termos de Hobsbawm 2001 como a era de ouro do capitalismo Agora o que se pleiteia são políticas públicas intervencionistas keynesianas que possam dar garantias às condições gerais de acúmulo do lucro capitalista É assim que as ideias de Keynes corroboram para legitimar a suposta universalização proposta pelo padrão tayloristafordista Contudo como esse panorama não se desenvolve sem contradições o capitalismo em seu estágio imperialista 23 para gerir tais contradições requer a presença de um Estado interventor embora diversificado Como explicam Netto e Braz 2008 p 203 a natureza da ordem monopólica exige um Estado diverso que vá além da garantia das condições externas da reprodução e da acumulação capitalista De fato o imperialismo levou a refuncionalização do Estado sua intervenção na economia direcionada para assegurar os superlucros dos monopólios visa preservar as condições externas da produção e da acumulação capitalista mas implica ainda uma intervenção direta e contínua na dinâmica econômica desde o seu próprio interior através de funções econômicas diretas e indiretas NETTO BRAZ 2008 p 203 itálicos do original Com um relativo desenvolvimento social que acompanha o crescimento econômico proporcionado por esse tipo de concepção estatal a expansão do mercado capitalista passa a absorver cada vez mais mão de obra fenômeno que gera nas lúcidas palavras de Sérgio Grácio 1986 uma procura otimista 23Se pudéssemos estabelecer uma linha histórica da evolução periódica do capitalismo com base na tradição marxiana como nos indica Netto e Braz 2008 1709 teríamos que iniciála na acumulação primitiva que vai do século XVI até meados do século XVIII denominado de capitalismo comercial ou mercantil O período posterior chamado de capitalismo concorrencial ou liberalclássico iniciase por volta 1780 e segue até aproximadamente o último terço do século XIX Já o estágio atual conhecido como capitalismo imperialista tem seu início ainda nas três últimas décadas do século XIX e se caracteriza principalmente pela fusão de capitais monopolistas com os capitais financeiros administrados pelos conglomerados bancários 72 propositiva por emprego Para os que já estavam empregados todavia essa aura de oportunidades demanda uma outra procura desta vez por uma melhor colocação na roleta do capitalismo O idealismo de que a sociedade é aberta e oferece oportunidade para todos subjaz contudo à ideologia dominante que nesse contexto de otimismo associa o aparecimento de oportunidades de emprego à necessidade individual da qualificação A rápida expansão escolar portanto articulase à ideia da qualificação Essa palavra com efeito poderia traduzir a síntese do interesse da escola para o período de glória do capitalismo Esse é o pano de fundo das propostas de reformas sobre as políticas públicas burguesas propagadas como universais para a expansão capitalista durante o Estado Providência Em outros termos com a produção da materialidade humana exigindo formação para atender algumas demandas específicas defendese a partir do conglomerado educativo uma relação direta e linear sem contradições entre a educação e o desenvolvimento econômico24 Se logo após a Revolução Francesa a palavra de ordem do discurso educacional burguês era a profissionalização agora essa defesa se refina e passa a ser de qualificação profissional ou qualificação profissionalizante como querem alguns dos mais exigentes intelectuais defensores de tais preceitos Desse modo diversas propostas de formação profissionalizante que se voltam para a chamada qualificação são difundidas Esse cenário reputa às escolas técnicas que já vinham ganhando centralidade desde fins da Idade Média destaque mundial como sendo uma grande senão a única alternativa para os filhos da classe trabalhadora apesar de algumas exceções somente para os filhos dos produtores Ora o idealismo burguês que acredita no progresso linear não tem por sua natureza limitada metodologicamente como enxergar 24Ver por exemplo a esse respeito a chamada teoria do capital humano de Theodore Schultz 1973 73 a essência contraditória da realidade em uma sociedade que se move no terreno da luta de classes Destarte aquela falaciosa liberdade e a falsa expansão das oportunidades para todos associada ao caráter ontológico da sociedade capitalista em que só pode haver acúmulo para alguns em detrimento da miséria para a imensa maioria não poderia servir de exemplo ao desenvolvimento humano integral pleno de significados universais Como já havia apontado Marx 2003 é inerente ao próprio capitalismo a alternância de crises Esse sistema sofre estruturalmente da incapacidade de expandir as forças produtivas ao mesmo tempo em que distribui a riqueza O longo ciclo expansivo do pós II Guerra Mundial teve seu esgotamento quando o excedente da produção transformouse em capital financeiro Com isso entre alguns outros fatores cerca de 90 dos movimentos econômicos passaram da esfera da produção comércio para a compravenda de papéis nas Bolsas de Valores mundo afora Esse processo consuma como já enfatizado a chamada financeirização da economia visto que cria o compromisso para que o Estado tenha que assumir maciça e sistematicamente o pagamento das dívidas transferidas do setor produtivo para o capital financeiro De modo geral o processo de financeirização da economia ganha impulso com o fim do acordo da Conferência de Breton Woods 25 o que provoca graves 25Essa Conferência ocorrida na Inglaterra em 22 de julho de 1944 almejava como principal ponto de pauta instrumentalizar o mundo para ajudar na reconstrução dos países derrotados na segunda guerra mundial Era também intenção dos congressistas criar mecanismos que garantissem a paz mundial e a estabilidade econômica Em tal reunião a tese que sai derrotada é a do economista austríaco Friedrich Hayek que na mesma época do Encontro lançava o livro O caminho da servidão As teses do livro preconizavam que se todo o mundo incluindo a Rússia não adotassem as receitas do Estado mínimo adoeceriam terminalmente até a mais brutal servidão Com efeito o que monopolizou por assim dizer as atenções econômicas no período do pós 74 implicações sobre o quadro econômico geral visto que causou relativo recuo da produção industrial frente aos investimentos financeiros O declínio das taxas de lucro servemnos como um bom exemplo do esgotamento do padrão de acumulação taylorista fordista Tabela com demonstrativos da queda da taxa de lucro do período de 1968 a 1973 País Taxa de lucro inicial Taxa de lucro final Alemanha Ocidental 163 142 GrãBretanha 119 12 Itália 142 121 Estados Unidos 182 171 Japão 262 03 Fonte Netto Braz 2008 p 2013 Como documentado na tabela acima no período que vai de 1968 a 1973 a taxa de lucro nos principais países capitalistas começa a declinar o que deixa claro o esgotamento da onda longa expansionista do capitalismo Também o crescimento econômico se reduziu nenhum país capitalista central conseguiu manter as taxas do período anterior Entre 1971 e 1973 dois detonadores anunciaram que a ilusão do capitalismo democrático chegava ao fim o colapso do ordenamento financeiro mundial com a decisão norteamericana de desvincular o dólar do ouro rompendo pois com os acordos de Bretton Woods que após a Segunda Guerra Mundial convencionaram o padrão ouro como lastro para o comércio internacional e a conversibilidade do dólar em ouro e o choque do petróleo com a alta dos preços guerra sobretudo nos países de capitalismo avançado foi o Estado de Bem Estar Social Três décadas mais tarde no entanto a tese do Estado mínimo de Hayek volta à cena e com toda força batizando definitivamente o que a história denomina neoliberalismo 75 determinada pela Organização dos países Exportadores de PetróleoOPEP NETTO BRAZ 2008 p 213 itálicos e aspas do original Com o fracasso do Estado de Bem Estar Social Estado Providência Welfare State e a falência das medidas keynesianas o capitalismo não consegue evitar sua entrada definitiva em uma crise sem precedentes na história humana Não obstante busca de forma frenética um novo ancoradouro Não tendo onde melhor se ancorar o capital emprega todas as suas apostas na chamada reestruturação produtiva É aqui que o capitalismo decide ser o padrão tayloristafordista ineficiente para atender a contento as prerrogativas do capital Esse contexto faz aparecer da gerência científica a descoberta de uma outra e remodelada forma para extrair mais valia Escondida portanto nos escombros das mais velhas experiências capitalistas entulhada em decompostas bases teóricas ressignificadas ao gosto de Friedman eis que surge brilhante e reluzente no horizonte do capital uma tábua de salvação para sua crise uma nova ferramenta a flexibilização no interior da indústria é a ascensão do toyotismo O esgotamento de um padrão e a consequente inauguração de um novo na interpretação de Ricardo Antunes 2002 p 53 é a mais pura expressão fenomênica da crise estrutural que se inicia nessa quadra histórica no interior do capital como aponta este autor Reengenharia lean production team work eliminação de postos de trabalho aumento da produtividade qualidade total fazem parte do ideário e da prática cotidiana da fábrica moderna aspas do original Antunes 2002 p 53 complementa suas argumentações escrevendo que Se no apogeu do taylorismofordismo a pujança de uma empresa mensuravase pelo número de operários que nela exerciam sua atividade de trabalho podese dizer que na era da acumulação flexível e da empresa enxuta merecem destaque e são citadas como exemplos a ser seguidos aquelas empresas que dispõe de menor contingente de força de trabalho e que apesar disso têm maiores índices de produtividade aspas do original 76 Para fazer eco ao ditado popular alegria de pobre dura pouco as modificações ocorridas no âmbito da produção como escreve Souza Junior 2006 p 6 deramse através da intensificação dos desenvolvimentos científicos e tecnológicos aplicados à produção e de novos métodos de controle e gestão da força de trabalho Esse quadro dispara um novo e profundo câmbio nas relações capitalistas detonando o início de alterações que impactam o conjunto da produção da circulação e do consumo Por conseguinte esse cenário modifica decisivamente o quadro das ocupações dos empregos e dos desempregados demandando um novo formato na educação e na qualificação dos trabalhadores sobretudo desta última com a finalidade de que eles possam retornar o mais rápido possível para a roleta do mercado de trabalho capitalista É esse o cenário em que as atuais propostas de educação profissionalizante são defendidas largamente por diversos setores da sociedade com a principal quase a única alternativa aos filhos da classe trabalhadora No Brasil alastrase de modo acrítico a chamada educação em tempo integral que pretende misturar o nível médio com a modalidade profissionalizante Resta saber até que ponto e por quais mediações essa suposta integração distancia se da educação necessária para que os trabalhadores possam conhecer o mundo e com esse conhecimento se instrumentalizar para mudar a realidade hodierna Para que possamos dar um passo a mais na direção de nossos objetivos consideramos relevante apresentar uma síntese sobre o debate que cerca a dicotomia educativa Desse modo relembramos que o trabalho funda o ser social no entanto não o esgota precisando de outros complexos sociais para dar continuidade ao processo de humanização do homem Erguese sobre a base do trabalho assim outros complexos que pleiteiam responder às demandas humanas cada vez mais refinadas Esses complexos 77 sociais por sua vez acabam servindo de enriquecimento para o próprio trabalho Justamente nessa dialética surgem outros complexos sociais a exemplo da linguagem da ciência da arte e da educação para ficarmos apenas nesses O complexo educativo na sociedade primitiva se processa no próprio cotidiano da produção da existência ou seja no processo de trabalho A esse ponto vale salientar que concordam cada um a seu termo pesquisadores como Saviani 1994 Ponce 1998 entre outros Nesse momento da história em que não há divisão de classes inexiste também divisão rígida entre cotidiano e extracotidiano26 tampouco há a presença de divisão no processo formativo a educação somente se realiza articulada às tarefas sociais de uma totalidade precária em termos da produção da materialidade humana O contexto social do comunismo primitivo em que a educação é ligada diretamente à cotidianidade leva Lukács 2013 a denominar a forma da educação cotidiana de lato geral assistemática informal Para Lukács 1966 v1 uma das principais características desse tipo de educação é que as experiências imprescindíveis para a vida da espécie se consumam por meio da imitação conversão de um reflexo de um fenômeno da realidade na prática de um sujeito Como a eficácia dos procedimento para a adaptação e domínio do homem ao ambiente no mundo primitivo não necessita de maneira geral de elaborações mais profundas extracotidianas um processo educativo lato atende satisfatoriamente à missão de garantir às novas gerações o legado construído pelas gerações anteriores Por isso o filósofo húngaro indica que a educação lato é universal o que aponta sua inexorável necessidade no processo de reprodução humana LUKÁCS 2013 26 A antropologia registra a existência já na sociedade primitiva de determinadas comunidades em que a magia privilegia alguns indivíduos atribuindolhes determinadas condições extracotidianas Ver Lukács 1966 v1 78 Com o progressivo e contraditório afastamento do homem das barreiras naturais com o avanço das forças produtivas que permite a consequente produção de excedente entre diversos outros fatores a humanidade conhece o ócio O tempo livre é para Marx segundo relata Lukács 1966 v1 tanto tempo de ócio quanto tempo para as atividades superiores Esse novo fator transforma o sujeito em outro sujeito A partir de tal alteridade sustenta o filósofo húngaro o homem entra no processo de trabalho disciplinando seu tempo bem como sua exercitação para realizar esta atividade o que lhe permite experimentar a ciência como força materialmente criadora objetivadora de si mesma Portanto a produção do ócio que se dá fora do processo de trabalho se relaciona dialeticamente com a própria atividade de trabalho LUKÁCS 1966 v1 A divisão da sociedade em duas distintas classes surgida do desenvolvimento do trabalho traz em sua natureza a necessidade de um outro arranjo educacional que também se separa em duas partes diferentes e em certa medida contrapostas Aquele processo educativo que atendia plenamente ao cotidiano primitivo lato não tem mais como atender plenamente ao novo contexto social O novo arranjo social faz emergir uma outra educação que atenda aos interesses sociais que possa responder às novas demandas da sociedade Nessa cena histórica a classe dominante cria para si um processo educacional que possa atender aos seus anseios É assim que nasce o processo educativo denominado por Lukács 201327 de stricto específico restrito escolar sistemático não universal entre outros adjetivos que asseguram a alguns pesquisadores a exemplo de Saviani 1994 como fora lembrado 27Marteana Lima 2014 ao pesquisar o capítulo da Reprodução de Lukács 2013 aponta que não há separação rígida entre a educação em sentido lato e em sentido stricto 79 acima relacionar semanticamente a palavra escola à expressão ócio O desenvolvimento das forças produtivas durante a dissolução da sociedade primitiva permite a solidificação do modo de produção escravista o declínio deste e a assunção do modo de produção feudal sobre o escravismo não demanda como comentamos novidades radicais no processo educativo Portanto da sociedade escravista até a feudal de forma geral podemos indicar que o arranjo educativo permanece o mesmo De um lado o processo educativo lato não sistemático para as classes produtoras e do outro um complexo educacional stricto sistemático para as classes ociosas Vai ser apenas com a ascensão definitiva do capitalismo que ocorrerá o desequilíbrio definitivo desse quadro O modo de produção capitalista para seu desenvolvimento necessita de outro arranjo educacional Surge assim outra divisão ou a consagração da divisão de classes na educação Isto é a burguesia para solidificar universalmente seus particularismos escolares cinde a educação stricto em duas outras partes paralelas mas não metafisicamente separadas e em larga medida contrapostas para a burguesia o ensino propedêutico para os produtores e seus filhos a educação profissionalizante Em resumo podemos dizer que com o alvorecer da Revolução Francesa a burguesia divide o que já era dividido Isto é propõe uma dicotomia dentro de um dualismo cria a partir da especificidade do complexo da educação de caráter stricto dois novos ramos educacionais Para si e seus filhos os burgueses elegem o processo educativo propedêutico já para a classe trabalhadora e os filhos destes separam um gomo específico e restrito de escola o chamado ensino profissionalizante Durante todo o desenvolvimento capitalista propostas de diversas matrizes teóricas procuram equacionar a problemática do trabalho 80 instrução Com preponderância da instrução sobre o trabalho tais tentativas de maneira geral quando não naufragam completamente apenas servem para fomentar a retórica da necessidade inexorável de alimentar o mercado de trabalho capitalista com a profissionalização precoce de jovens das camadas dos produtores Nesse desenvolvimento dependendo de cada momento determinado da história as demandas do capitalismo agudizam o que os teóricos de tais tentativas chamam de formação para o trabalho 28 criando ao paladar das prerrogativas circunstanciais remodelamentos ressignificações para aprofundar ainda mais aquela dicotomia Nessa esteira assistimos o capitalismo quando precisa diferenciar os operadores de chão de fábrica de alguns prepostos para a supervisão e monitoramento da produção solicitar da escola a chamada qualificação profissional Ao historiarmos a dicotomia educativa procurando revelar seu caráter ontológico mesmo que de modo abreviado pretendemos fornecer melhores subsídios para que se possa analisar com maior profundidade os contemporâneos projetos educacionais voltados especificamente para a classe trabalhadora denominados acriticamente de educação integral As atuais propostas que tentam unificar o nível médio com a modalidade profissionalizante necessitam ser examinadas com mais rigor crítico visto que embora haja uma produção relevante sobre a problemática de maneira geral tais análises quando não afiançam acriticamente a suposta integração apontam para a necessidade desse modelo educativo como suporte formativo aos trabalhadores na perspectiva de uma sociedade mais justa e igualitária 28Recusamonos a usar tal expressão visto que educação para o trabalho é a proposta marxiana que pretende unir indissociavelmente intelecto corpo e espírito como orientação para uma formação verdadeiramente omnilateral A nosso ver o uso do termo educação para o trabalho na atual conjuntura mais confunde do que aclara visto que é utilizado para designar um processo educativo voltado para o mercado de trabalho capitalista 81 NOSELLA 2011 p 1062 As investigações alinhadas a tais pesquisas no limite das mais críticas acreditam que tal proposta educacional guarda os germes da politecnia defendida nos clássicos do marxismo Por esse motivo devem ser defendidas no plano político pedagógico como alternativa para a construção de conhecimentos preparatórios para uma sociedade emancipada Em torno dessa crença perguntamos se seria possível a um processo educativo dicotomizado em duas partes elaborado no centro do capitalismo monopolista guardar algum elemento mesmo que em germe da politecnia defendida nos clássicos do marxismo Para tentarmos tematizar de modo adequado essa indagação estudaremos o que propõe a clássica proposta maxiana de formação omnilateral O que faremos logo a seguir RESUMO O arquivo em questão trata basicamente do dualismo educacional também caracterizada como dicotomia educacional Para compreender melhor esse dualismo é preciso analisar alguns aspectos conceituais e históricos do desenvolvimento humano Um deles citado ao longo do texto é a interação social que ao mesmo tempo que ensina promove o aprendizado entre os seres que ali estão presentes e convivendo Outro ponto de suma importância que enaltece o desenvolvimento humano é o trabalho uma vez que o ato de trabalhar gera diversas alterações no ambiente social bem como no mundo A partir do cenário apresentado torna se essencial citar a educação como um dos segmentos ligados ao desenvolvimento humano e social já que em anos mais primitivos o aprendizado estava relacionado ao ato de experienciar a natureza como um todo e conversar com os mais velhos em busca de sabedoria Ou seja aprendiase a partir da convivência da observação e da experimentação em um nicho específico podemos concluir que as trocas de aprendizado eram homogêneas uma vez que os grupos sociais eram separados em nichos específicos e limitados Dessa forma as classes humanas se dividem em duas Proprietário e Operador Temos assim uma dependência em que um fornece a mão de obra e o outro fornece a função para o ato de trabalhar E temos assim o primeiro exemplo de dicotomia educacional em que para alcançar determinados níveis de estudo é preciso pertencer a determinados nichos específicos Em outras palavras para os nichos trabalhistas o estudo era experenciado no dia a dia do trabalho para o nicho de proprietários o estudo era direcionado e aplicado de forma mais específica visando fins específicos Tais fins específicos tempos após seriam denominadas instituições de ensino ou escolas Então temos que um complementa o outro uma vez que para o bem social e humano é preciso uma troca e interação entre mão de obra e função de trabalho ou seja alguns exercem melhor função aprendendo o ato de fazer propriamente dito e outros aprendem melhor o ato de e ensinar e de explicar Anos após então as instituições de ensino não concentravam apenas Proprietários mas operadores cujo objetivo era aprender aquilo que não era aprendido ao longo do seu cotidiano como por exemplo música geometria aritmética e assim por diante E a partir do conhecimento básico aprendido todos sem exceção poderiam aprender assuntos mais específicos como medicina direito e teologia Assim iniciam alguns contrapontos entre o avanço da ciência e suas comprovações e o pensamento teológico com seus ideais Em complemento começou a se acreditar que quanto mais estudo um indivíduo tivesse em anos iniciais e ao longo de sua vida melhor seria seu comportamento E a partir disso começou a haver estímulo para que todos os indivíduos frequentassem o ambiente escolar Escola tornouse sinônimo de sabedoria Sendo assim a educação começou a ser incorporada como eixo principal no que diz respeito ao trabalho e ao posicionamento social um dos formatos educacionais que permeiam esse pensamento é o ato educacional profissionalizante e posteriormente escolas científico técnicas Como aponta Rousseau o homem embora aprenda diversos segmentos trabalhando aprende prioritariamente com o próprio homem E a partir de tal concepção é importante e imprescindível permitir a oportunidade para todos os homens independente de sua classe social ao poder de escolha de aprendizado seja ele mais físico ou mais mental E para tal conhecimento as interações sociais são de extrema importância Anos passados a tecnologia começa a ganhar força e mostrar ao homem que não é necessário de forma única a utilização da natureza em prol do desenvolvimento mas que é preciso ordenar e organizar a tecnologia em prol do que se almeja no caso do capitalismo por exemplo Esse processo caracteriza muito bem outras duas classes sociais relacionadas a empresas públicas e privadas A escola por sua vez caminha junto com as demandas tecnologias em que instituições escolares privadas buscam manter o status social já alcançado e instituições escolares públicas promovem a manutenção do indivíduo no trabalho operário Ou seja os formatos pedagógicos de ensino aplicados nessas duas vertentes escolares já possuem um direcionamento e fim específico Se seguirmos essa linha de pensamento podemos concluir que então o indivíduo dependendo de sua classe social e nicho presente já possui um delineamento de qual posicionamento terá na margem social Temos então novamente o dualismo educacional em que são incorporados dois formatos educacionais o profissionalizante e o propedêutico Isso sugere um formato capitalista entre quem manda e quem obedece Em conclusão é preciso que o homem possa e deva escolher o que pretende alcançar e qual direcionamento pretende ter enquanto trabalhador independente de sua classe social Para tal precisa ter pensamentos críticos e um direcionamento não tendencioso que o auxilie a decidir aquilo que busca Sendo assim diversos contextos devem ser explorados e não limitados

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43 CAPÍTULO 2 COMPLEXO EDUCATIVO E DESENVOLVIMENTO SOCIAL NOTAS SOBRE A HISTÓRIA E O CONTEXTO DA DICOTOMIA EDUCACIONAL Já sabemos como se encontra o cenário de crise aguda do capitalismo contemporâneo e algumas de suas estratégias de salvaguardar o lucro do capital quadro em que se desenvolvem as reformulações da escola pública com o intuito de destinar uma escola exclusiva à formação da classe trabalhadora Adentramos agora ao estudo do complexo educativo Nosso objetivo é analisar como e quando nasce e como se desenvolve a dicotomia educativa Ancorados no método indicado pelo marxismo clássico que considera as categorias como expressão do real que tem no mais avançado a chave de compreensão para o de menor evolução ou seja considerando a escola capitalista do alvorecer do século XXI mergulhada em uma crise profunda partiremos deste contexto até o mais remoto nascimento do complexo educativo Feito isso percorreremos a história da educação em vistas de encontrar os elementos que nos expliquem como se constitui e se desenvolve o dualismo educacional A educação é um fenômeno social imanente aos homens Ela brota das relações humanas das contradições vividas na sociabilidade A especificidade da natureza do elemento educativo 44 torna a educação como pensam por exemplo Saviani 2014 e Tonet 2005 cada um a seu termo responsável por transmitir a cada indivíduo singular a generalidade do ser social ou seja a cultura historicamente acumulada pelo conjunto da humanidade15 Contudo para que o homem possa produzir seu processo educativo ele precisa ao mesmo tempo em que cria as especificidades educacionais sobreviver Para produzir sua existência material garantir alimento vestimenta etc ele precisa da natureza visto que daí ele extrai a matéria necessária para seu sustento Portanto é transformando a natureza sob orientação teleológica com intenção que os indivíduos conseguem os subsídios necessários para sua vida material Esse processo chamado por Marx 2003 de trabalho ocorre cotidianamente nas atividades de manutenção da existência humana É por isso que esse autor afirma que o trabalho é o ato fundante do ser social Dito de outro modo é o trabalho que opera a humanidade no homem Isto é o que o diferencia dos outros animais é o trabalho pois para transformar a natureza transformandose com ela ele planeja antecipadamente suas ações Logo o ato de modificar a natureza não é inconsciente mas obedece a uma finalidade Como sintetiza a clássica reflexão de Marx 2003 p 211 15Sobre a função da educação de transmitir o legado acumulado historicamente às novas gerações conferir Saviani 2014 e Tonet 2005 Não há como apontar na presente exposição ao menos em grandes linhas as polêmicas distinções existentes entre esses dois pesquisadores Para as pretensões desta comunicação tornase suficiente indicar embora muito sinteticamente que Saviani em linhas gerais segue as indicações gramscianas sobre a natureza e função da educação ou seja defende que o complexo educativo deve trafegar para as gerações futuras o que a humanidade acumula em seu histórico o que é apropriado por Frigotto Duarte entre outros autores Já Tonet embora se utilize de Saviani em algumas ocasiões recorre a tese lukacsiana pela qual a educação deve se empenhar em garantir ao sujeito os elementos para que ele possa conviver com o novo com as novidades com as possibilidades Em uma expressão para que ele possa escolher entre alternativas Dessa posição de modo geral partilham cada uma a seu modo Lessa Lazarine entre outros estudiosos 45 Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão e a abelha envergonha mais de um arquiteto humano com a construção dos favos de suas colmeias No entanto o que distingue de antemão o pior arquiteto da melhor abelha é que ele construiu o favo em sua cabeça teleologia antes de construílo em cera MARX 2003 p 21112 O trabalho ao fundar o ser social no entanto não esgota toda a potencialidade humana Serão precisos outros complexos sociais para que o devir humano se desenvolva A educação vai ser um desses complexos potencializadores do deenvolvimento humano Com apoio em Lukács 2013 podemos apontar que a educação estabelece com o trabalho uma relação de dependência ontológica determinação recíproca e autonomia relativa ela assume lugar importante na reprodução social Em sentido lato espontâneo a educação é uma categoria universal que se ocupa em concretizar a apropriação por parte dos indivíduos das objetivações que constituem o gênero humano LUKÁCS 2013 No comunismo primitivo a educação se dava em contato direto com a natureza os mais jovens aprendiam com os mais velhos e no próprio ato de transformar a matéria Nesse momento é possível identificar que existia uma educação ligada diretamente ao cotidiano Como registra Ponce 1998 p 21 numa sociedade sem classes como a comunidade primitiva os fins da educação derivam da estrutura homogênea do ambiente social identificamse com interesses comuns do grupo e se realizam igualitariamente em todos os seus membros de modo espontâneo e integral Para esse autor a espontaneidade davase na medida em que não existia nenhuma instituição socialmente destinada a educar sendo ao mesmo tempo integral visto que cada membro da tribo incorporava mais ou menos bem tudo o que na referida comunidade era possível receber e elaborar PONCE 1998 p 21 Em largas linhas podemos considerar que quando o homem passa a dominar melhor as técnicas de plantio e de domesticação 46 de alguns animais aos poucos fixase na terra abandonando paulatinamente o nomandismo e dela se apropria Essa conjunção de fatores associada ao aparecimento de incipiente excedente de produção faz surgir na história humana o ócio Com isso uma classe se autoproclama proprietária da terra assumindo para si as benesses da descoberta do tempo livre Articulado dialeticamente a isso obriga a outra classe a trabalhar para sustentar as duas classes Os proprietários privados da terra ficam com o ócio enquanto os trabalhadores assumem a produção A divisão da sociedade em classes entre outros fatores tem aí suas raízes a apropriação privada da terra confirmada sobre a exploração do trabalho escravo possibilitou a divisão dos homens em duas distintas classes dependentes entre si Se naquele período a terra era o principal meio de produção da vida material agora os proprietários dependem do trabalho alheio enquanto a classe expropriada passou a depender daqueles que se apropriaram das terras O resultado desse contexto é que aquela classe se privilegia de tempo livre uma vez que não precisa mais se ocupar diretamente com as atividades de subsistência Como explica Lukács 2013 p 259 quando a proteção da vida passa a direcionarse primordialmente contra outras comunidades humanas e especialmente desde que a escravidão se torna uma defesa do status quo social no plano interno tão necessária quanto as guerras aflora o dilema entre obter escravos ou tornarse um Daí segundo este autor surge a distinção rigorosa na especificação das finalidades bem como nos métodos para se atingir tais fins Esse é o cenário em que no comunismo primitivo16 a educação deixa de coincidir inteiramente com o 16A expressão primitividade designa para Lukács 2013 p 341 por um lado o nível do trabalho enquanto dominação social da natureza mas que ainda não o nível da produção e por outro lado designa o nível do homem cujas relações com a realidade ainda não puderam atingir aquela multiformidade e multiplicidade que já estão na mais inicial das sociedades de classe 47 cotidiano começa a perder sua espontaneidade Com o surgimento da sociedade dividida em duas classes sociais quem detém o ócio decide ter para si um processo educacional específico restrito Engels 2004 p 123 em diálogo com Marx assim se pronuncia sobre o fim da sociedade primitiva O poder dessas comunidades primitivas tinha de ser destruído como de fato o foi Mas foi destruído contudo por influências que desde o início nos aparecem como uma degradação como uma queda da singela grandeza moral da velha sociedade gentílica São os interesses mais baixos a vil cobiça a brutal avidez de prazeres a sórdida avareza o roubo egoísta da propriedade comum que inauguram a nova sociedade civilizada a sociedade de classes Erguese por sobre a sociedade classista o que se pode chamar de processo educativo ou educação em sentido stricto para usarmos a expressão lukacsiana Ou seja uma educação para uma demanda específica da sociedade sistematizada organizada sob orientação de determinados interesses sociais Inspiradas em Lukács Lima e Jimenez 2011 p 94 indicam que a educação em sentido stricto diferentemente da lato não paira sobre a totalidade social vinculandose em sentido estrito às necessidades da sociedade de classe Pontuamos que esse contexto consagra a primeira dicotomia educativa Isto é como elabora Lukács 2013 a educação que antes era somente cotidiana ganha uma dualidade passa a ser dividida em lato e stricto A primeira continuava destinada aos trabalhadores e seus filhos e realizavase no próprio convívio cotidiano no processo diário de produção da existência e de forma assistemática A segunda por sua vez destinada aos detentores de ócio realizavase em local específico para esta finalidade sistematizava conhecimentos orientavase a resolver problemas de interesse de uma determinada classe Esta forma sistematizada de educação propiciou aos filhos dos proprietários dos meios de produção um modelo educacional afastado do cotidiano Agora esses estudantes tinham a sua disponibilidade um local exclusivo 48 apropriado e especialmente preparado para o aprendizado mais tarde veio a ser denominada de escola17 Mesmo com a dissolução do modo de produção escravo e o surgimento por sobre este do modo de produção feudal e apesar de inúmeras mudanças que ocorreram na estrutura da sociedade por milhares de anos o processo educativo mantém sua base fincada no ócio É certo que muitas diferenças existem entre o escravismo e o feudalismo Não pretendemos negar esse fato básico da história humana Não obstante inegável também é que durante esses dois modos de produção a sociedade não precisou resolver a problemática do trabalho em relação à instrução Em outras palavras tanto no modo de produção escravista como no seu sucedâneo feudalismo a relação entre as forças produtivas e a educação não necessitava de um sistema educativo que se integrasse imediatamente à produção material da vida Decorre assim que durante todo esse tempo a sociedade se resolveu com a sua histórica dicotomia a educação que atendia ao modo de produção funcionava grudada ao próprio cotidiano local onde atuavam os não proprietários de terras esta educação era carente de sistematização Do outro lado mas integrado a dialética da totalidade social estava o processo educativo escolarizado sistemático e extracotidiano este desfrutado pelos donos de terras e seus eleitos18 Sintetizando tal divisão educacional com o auxílio de Manacorda 2006 p 41 podemos compreender que na 17Saviani 1994 p 2 em texto já clássico localiza nesse ponto a origem da escola Para ele A palavra escola em grego significa o lugar do ócio Portanto a escola era o lugar a que tinham acesso as classes ociosas Nada mais natural que esse processo educacional institucionalizado fosse ocupado por uma elite por quem detinha tempo livre 18Autores como Luzuriaga 1963 Cambi 1999 Aranha 2006 Manacorda 2006 Ponce 1998 cada um de seu modo exemplificam bem os processos educacionais do modo de produção escravo e feudal 49 Antiguidade grega encontrase antes de tudo a separação dos processos educativos segundo as classes sociais O filólogo italiano esclarece que para as classes governantes uma escola isto é um processo de educação separado visando preparar para as tarefas do poder que são o pensar ou o falar isto é a política e o fazer a esta inerente isto é as armas Já para os produtores do sustento da vida material nenhuma escola inicialmente mas só um treinamento no trabalho A educação para aquela classe destinavase principalmente à retórica com a especificidade para a arte do bem falar Essa escola tinha a marca dos privilegiados dos escolhidos socialmente para administrar a burocracia social Em contraponto a esse modelo o aprendizado no próprio ambiente de trabalho no plantio na colheita na incipiente pecuária na artesania nas primeiras oficinas na observância pouco mediada cientificamente com a natureza Neste processo educativo encontrase não a escola do ofício até porque ainda não se constituía como tal mas a relação aprendizagemensino espontaneamente ligada às necessidades do dia a dia Pontuamos de forma enérgica que tais necessidades eram principalmente determinadas pela classe que detinha o poder político Mesmo havendo sérias distinções entre a natureza do trabalho escravo e do trabalho servil ainda que existindo modificações estruturais na relação social de produção assim como na forma de execução das atividades de trabalho o modo de produção feudal mantém a tradição herdada da Antiguidade Por exemplo na sociedade grega e romana a cidade mais do que o campo era o locus das ocupações produtivas enquanto os arredores urbanos desenvolviam o que era preciso inclusive a agricultura Na Idade Média de forma distinta a sociedade se resolvia no campo e do campo retirava seus suprimentos materiais SAVIANI 1994 Não obstante as características principais da sociedade antiga especialmente ao que se refere à sua produção material persistem 50 na Idade Média Como resume Saviani 1994 p 5 neste período histórico o meio dominante de produção era a terra e a forma econômica dominante era a agricultura No modelo de sociedade feudal baseado no trabalho servil bem como no da Antiguidade baseado no trabalho escravo a educação escolar destinase aos detentores do ócio filhos das classes dominantes Como aponta Aranha 2006 a cultura no medievo é um amálgama de elementos grecoromanos Por isso o ócio nesses modos de produção mantêmse como elo distintivo de quem podia ou não se ocupar com atividades consideradas nobres nesse caso a educação escolar Para além das diferenças que certamente existem entre os modos de produção escravo e feudal como registra Tonet 2013 p 17 eles guardam em comum algumas características importantes Ambos são bastante estáticos Suas estruturas sociais de longa duração parecem ter um caráter de imutabilidade e de naturalidade Isto se deve essencialmente ao fato de que a forma de produzir a riqueza terra e escravos ou terra e servos respectivamente tem uma dinâmica interna muito pequena e uma limitação insuperável Além disso em ambos o acúmulo de conhecimentos acerca da natureza e da própria sociedade é muito precário o que favorece uma elaboração teórica com poucos fundamentos empíricos Mais ainda em ambos a forma de produção da riqueza material não requer por parte dos responsáveis por ela um conhecimento sistematizado da natureza Seu aprendizado se dá na própria atividade prática De outro lado os que se apropriam da riqueza estão completamente apartados das atividades relativas à sua produção Há portanto uma separação radical entre trabalho manual e trabalho intelectual do que resultarão importantes consequências para a elaboração de uma concepção de mundo Uma importante mudança no período medieval pode ser anotada na organização escolar Perguntas como por exemplo onde se realizar a educação escolar Qual é sua forma Entre outras começaram a ser estipuladas Algumas respostas foram dadas a esse respeito e para que clérigos nobres e alguns guerreiros pudessem se dedicar aos estudos criaramse escolas paroquiais monárquicas e monásticas Em geral o modelo 51 educacional seguido no medievo acompanhou mesmo com algumas contradições as regras orientadas pela Igreja Católica A própria evolução contraditória da sociedade com seus saltos retrocessos e avanços inevitavelmente potencializa o novo A novidade atende pelo nome da acentuação do comércio e com ela o aumento do tráfego cada vez mais intenso entre comunidades distintas que por seu turno demandam outras exigências sociais Tais parâmetros exigiram dos homens medievais a aquisição de outros padrões que não se limitassem somente aos poderes da religião Essa efervescência do crescimento comercial impulsiona outra importante transformação as cidades voltam a ganhar centralidade como outrora o foram na Antiguidade clássica Dessa feita os centros urbanos passam a funcionar como os epicentros da Europa Ocidental irradiando uma cultura que pretende se vincular para além dos valores religiosos O processo educativo não podia ficar imune às transformações da totalidade social E não ficou As modificações ocorridas no tráfico entre os homens impactaram também o campo específico da educação Não podemos perder de mira que como adiantamos acima o complexo educativo guarda determinação recíproca com o complexo econômico Desse modo e não poderia ser diferente a esfera educacional apresenta suas alterações Uma delas é a transformação em meio a inúmeros outros contraditórios fatores das antigas escolas monásticas em universidades Ponce 1998 registra que as universidades em seu início destinavamse apenas a reunir homens livres ociosos interessados nas discussões das ciências Com o passar do tempo essas reuniões assumiram currículos específicos de gramática retórica e lógica denominado de trivium e aritmética geometria astronomia e música chamado de quadrivium Como documenta Aranha 2006 era a utilização do método da Escolástica que tomava como base a lectio e a disputatio em que se acreditavam inserir os estudantes no 52 exercício da dialética a partir de posições contrárias O estudante que passasse desses ensinamentos iniciais era encaminhado para o estudo das chamadas artes liberais A partir desse ponto o aprendente iniciava sua preparação para o exercício de um ofício propriamente dito que podia ainda se especializar em teologia medicina ou direito Várias concepções educativas procuram responder a esse quadro Não tendo como atender a todas contentamonos em pontuar duas propostas cujas tentativas consideramos como significativas para que possamos demonstrar qual o tipo de homem que mesmo em um mundo que se considerava renascendo pretendiase formar Não é oneroso reiterar que as duas concepções em debate guardam contraposições que aqui não poderão ser tratadas adequadamente Contudo tais contraposições indicam inclusive a marca que tais pressupostos educativos almejavam deixar nos seus educandos Com essas ressalvas adiantadas optamos em pontuar as teses de Jan Amos Coménio e JeanJacques Rousseau Nosso recorte recai sobre o pastor da Morávia por ele ser o primeiro pensador que se preocupa em apresentar uma proposta pedagógica logo após o mundo conhecer as proposições cientificamente revolucionárias de Francis Bacon Galileu Galilei entre outros cientistas que iniciaram a recondução da ciência ao patamar de desantropomorfização conforme historia Lukács 1966 v1 Já o pensador suíço merece nossa escolha por ser considerado o pai da revolução copernicana na educação MANACORDA 2006 Portanto podemos ponderar de forma razoável que o primeiro abre as propostas educacionais do período que a historiografia achou por bem denominar de Renascimento e que o segundo fecha esse ciclo já que mais tarde mesmo depois de ser perseguido pela Igreja Rousseau acaba por se tornar o eminente teórico da Revolução Burguesa 53 Coménio está centrado na luta da ciência para se libertar do poder exercido sobre o mundo pela fé religiosa Sua batalha se desenrola no ambiente de apresentar um projeto educativo que contemple a seguinte situação imanência científica versus transcendência religiosa Ele é laudatário de Santo Agostinho e de Santo Tomás de Aquino e ainda está sob fortes reverberações da Reforma Protestante de Lutero e Calvino Coménio apesar de sua boa intenção não tinha como pender limpidamente para o lado da ciência Mesmo assim seus escritos tentam apresentar um tratado educativoreligioso com base na natureza sendo ainda hoje lembrado com grande entusiasmo por muitos estudos contemporâneos As contribuições desse autor surgem exatamente das contradições do contexto em que as intenções de sistematizar o ato de ensinar exige da Igreja uma resposta ao avanço da reforma protestante As teses de tal pastor aparecem no momento em que a relação trabalhoinstrução mesmo que de forma ainda incipiente pela primeira vez começa a se colocar no centro do debate posicionada para além da moralidade Tal discussão brota das necessidades nascidas das contradições sociais que por seu turno precisam de determinadas aprendizagens e de certas habilidades operativas concretas para desenvolver as forças produtivas mesmo que estas ainda estejam em baixo nível de desenvolvimento Manacorda 2006 p 224 embora reconheça aquele teórico como um grande sistematizador não o considera um revolucionário pois para o italiano o intelectual da Moravia chega atrasado a um mundo em profundas mudanças Manacorda 2006 aumenta a advertência lembrando que os protagonistas de tais desejos são os senhores que jamais aspiram ser os executores do necessário aprendizado De todo modo e apesar das justas ressalvas manacordianas Coménio ganha visibilidade histórica com as teses 54 contidas no livro a Tipografia vivente Typographeum vivum sendo considerado um dos pais da pedagogia moderna As indagações de João dos Reis da Silva Jr 2006 sobre o título do principal livro de Coménio é bastante ilustrativo para as pretensões conclusivas futuras de nossa investigação Aquele autor indica que essa obramonumento inscrita no século XVII chamouse Didática Magna porque naquela época os títulos dos livros tinham a obrigação de explicar detalhadamente já na capa o seu conteúdo Por isso o título A Didática magna ou A arte universal de ensinar tudo a todos Silva Jr 2006 propõe duas perguntas para melhor mediar o debate o que levaria um autor em pleno século XVII pleitear a criação das bases da arte universal de ensinar tudo a todos E o que ou com quem ele está debatendo ao falar do tudo a todos A resposta apresentada por Silva Jr 2006 indica que Coménio trava um debate naquela quadra histórica contra as necessidades de tal sociedade comandada por uma nobreza cujo percentual de toda a população que poderia frequentar a escola não ultrapassava 1 Uma terceira pergunta ainda é lançada por Silva Jr 2006 naquele período da história quem podia se candidatar à universidade Utilizando os escritos do próprio Coménio esclarece aquele autor Os melhores engenhos Os outros têm que receber instruções e têm que ir para a charrua quer dizer têm que ir para a roça que foi para isso que nasceram Mas vejam complementa Silva Jr 2006 p 290 o que está na capa no título do livro é A arte de ensinar tudo a todos Instrução virtude ou seja honestidade de costumes e religião como piedade são os autênticos requisitos do homem e tais elementos precisam estar moldados desde os primeiros anos de vida acredita Coménio 1996 Para ele a educação é uma forma de distinção quanto mais alguém é educado mais se eleva acima dos outros COMÉNIO 1996 p 125 Se a educação universal 55 da juventude for devidamente continuada prossegue Coménio 1996 p 143 a ninguém faltará daí em diante matéria de bons pensamentos de bons desejos de boas inspirações e também de boas obras Considerando que devem ser enviados às escolas não apenas os filhos dos ricos ou dos cidadãos principais mas todos por igual nobres ricos e pobres rapazes e raparigas COMÉNIO 1996 p 139 falta definir o que o autor entende por escola Chamo escola perfeitamente correspondente ao seu fim aquela que é uma verdadeira oficina de homens isto é onde as mentes dos alunos sejam mergulhadas no fulgor da sabedoria para que penetrem prontamente em todas as coisas manifestas e ocultas COMÉNIO 1996 p 155 Para que fique mais claro quem são todos ou seja quem são os eleitos a frequentarem a escola precisaremos introduzir mais um pensador sem contudo poder aprofundar suas teses Indicaremos brevemente com o apoio de Silva Jr 2006 e Manacroda 2006 o postulado do gentil homem de Jonh Locke19 que ganhou o debate educacional justamente por sintetizar o legítimo protótipo de quem poderia estudar Vejamos como Locke define a dicotomia de quem podia ou não se candidatar à escola de um lado a formação do gentleman para a classe que ele representava por outro lado para os filhos dos servos futuros trabalhadores Locke indica o que começa a se tornar praxe no pensamento burguês ainda em solidificação a preparação para um ofício imediatamente prático 19Foi Jonh Locke quem primeiro rejeitou a doutrina das ideias inatas Em contraposição ao cartesianismo ele afirmou que todas as ideias se originavam na percepção dos sentidos Sua filosofia da mente é relacionada à origem das concepções modernas de identidade e do Eu Sua definição original sobre o si mesmo através de uma continuidade de consciência e os postulados que defendem ser a mente uma lousa em branco tábua rasa influenciaram vários filósofos posteriores como por exemplo Rousseau e Kant 56 Para Manacorda 2006 contudo Locke assim como Coménio chegou tarde na lente da história com relação à necessária articulação para a vida social do trabalho com a educação Desse modo como documenta o intelectual italiano nesse momento da história já existem na Europa uma incipiente indústria têxtil que se principia na absorção de mão de obra Sobre essa indústria in nuce Manacorda 2006 diz que as novas experiências dos protestantes na França expõem na primeira metade do século XVIII o primeiro esboço do que virá a ser a hoje chamada educação profissionalizante surgidas com o objetivo de ensinar a partir da necessidade premente da união imediata entre teoria e prática Demandada por essa conjunção social ascendente muitos outros experimentos educativos pretendentes a formar o sujeito no menor tempo possível e com aplicação colada às necessidades da produção começam a se espalhar pela Europa Em Berlim por exemplo no ano de 1747 surgem as escolas científicotécnicas No contexto de desantropomorfização da ciência de descobertas científicas importantes para a humanidade essas iniciativas escolásticas estatais como argumenta Manacorda 2006 p 235 especialmente na Alemanha são as premissas políticas do sistema moderno de instrução estatal obrigatória orientado para os estudos científicotécnicos Apesar de os enciclopedistas apresentarem algumas teses sobre o campo educativo quem vai marcar profundamente a história educacional é Rousseau As teorias do filósofo suíço ganham dos meios educacionais a insígnia de ser o pai da revolução copernicana na educação Manacorda 2006 p 240 por exemplo defineo como um gênio contraditório um dos pais da pedagogia moderna Suchodolski 1976 p 50 por seu turno aponta que Rousseau empreendeu a primeira tentativa radical e apaixonada de oposição fundamental à pedagogia da essência e de criação de perspectivas para uma pedagogia da existência 57 O livro Emílio ou Da Educação de JeanJacques Rousseau 2004 lançado em 1762 é que registra esse marcante tratado sobre uma revolucionária até então proposta educativa O texto propõe a divisão do ser em duas partes distintas a primeira ligada à natureza em que o homem é individual e a segunda coletiva e social cuja marca maior seria a civilidade humana A publicação desse livro antecede à Revolução Francesa Entretanto motivado por essa publicação Rousseau antes de se tornar um dos principais teóricos da ascensão da burguesia ao poder é perseguido pela monarquia e principalmente pela Igreja Rousseau parte da concepção naturalista do homem e da sociedade O homem natural seria a unidade absoluta total e sem fragmentação O convívio com os outros homens é fracionário apenas tem valor se relacionado com a totalidade Sua tese principal é que o homem nasceria bom e o meio social o tornaria mau Sobre essa proposta pedagógica Anibal Ponce 1998 p 128 escreve Cada vez que num regime social se vislumbra a possibilidade iminente de uma derrocada surge sempre como um sintoma infalível a necessidade de retorno à natureza Para o intelectual argentino a necessidade de esquecer tudo e começar novamente voltandose para a natureza foi admiravelmente expressa por Rousseau E assim para resolver seu desencanto com a civilização o filósofo suíço cria Emílio Esse personagem nasce e vive até completar 15 anos de idade em completo isolamento fora da civilização sua formação se processa apenas em conformidade com a natureza Para Rousseau nessa primeira fase Emílio é um homem natural em estado puro Após estar pronto pela natureza com seu desenvolvimento físico encaminhado o jovem necessitará de formação social o que o leva a entrar em contato com seus pares em busca da educação moral e política Para o preceptor de Emílio com efeito não há separação entre a ação pedagógica e a atuação política 58 Ainda que tenha sido o responsável por adiantar as bases de uma pedagogia que seria coroada no mundo moderno e embora considerado um gênio mesmo que contraditório Rousseau não consegue propor um processo educacional que relacione instrução com trabalho perante as necessidades da própria burguesia em ascensão Vejamos melhor como se processa essa genialidade contraditória para usarmos a expressão consagrada por Manacorda 2006 Escreve Rousseau Se em vez de colar uma criança aos livros eu a ocupar numa oficina suas mãos trabalharão em prol de seu espírito tornarseá filósofa acreditando ser apenas uma operária Mais nunca devemos porém reduzir uma pessoa apenas para trabalhar para viver Pois infelizmente não podemos passar todo o nosso tempo na mesa de trabalho Não somos aprendizes de trabalhadores somos aprendizes de homens e o aprendizado deste último ofício é mais difícil e mais longo do que o outro ROUSSEAU 2004 p 2312 Com essa reflexão podemos inferir que Emílio distanciase do gentil homem proposto por Locke O que prescreve o filósofo suíço sobre o processo educacional como formador de indivíduos para executar um ofício necessário à produção industrial que ascendia com a classe burguesa naquela quadra histórica começa a esclarecer suas limitações Rousseau prescreve uma formação que se baseia na utilidade da existência do homem natural mas também que possa ser proveitoso ao homem que vive em sociedade Rousseau 2004 p 262 com razão prevê que trabalhar é um dever indispensável ao homem social por isso para ele há a necessidade da aprendizagem de um ofício imediato prático Enfatiza ainda motivado por essa constatação que Emílio deve escolher uma profissão e aprendêla devendo antes experimentar tantos ofícios o quanto fossem possíveis A profissão a ser escolhida por seu alunopersonagem deve apresentar um conhecimento utilitário ao homem natural como por exemplo a que Robinson Crusoé desejaria ter em seu 59 isolamento Rousseau conclui que conhecer um ofício é importante para a formação de Emílio mesmo que não venha a exercêlo pois ao menos ele poderá superar os preconceitos em relação àqueles que exercem o trabalho manual Para que fiquem mais claros os limites da relação trabalho instrução em Rousseau precisamos perguntálo qual a profissão ideal para seu Emílio Com a ponderação sobre as escolhas de Emílio Rousseau 2004 p 270 escreve que se seu estudante pudesse escolher o ofício que eu preferiria que fosse do gosto de meu aluno é o de marceneiro Para os que não tem a opção da escolha como não é o caso do privilegiado personagem roussoniano o filósofo não apresenta resposta quanto à profissão a ser seguida No entanto o rigoroso estudo do pensador suíço fornece um elenco considerável de profissões taxadas sem dignidade ao seu bemaventurado Emílio Deixemos que as indisfarçáveis palavras carregadas de erudição e asseio vernacular respondam ou pelo menos provoquemnos uma reflexão sobre aquelas pessoas cujas escolhas são obstacularizadas pelas condições socialmente concretas Os trabalhos metalúrgicos são úteis e até mesmo os mais úteis de todos no entanto a menos que uma razão particular me leve a eles não farei de vosso filho um ferrador um serralheiro um ferreiro não gostaria de vêlo em sua forja com a aparência de um ciclope Da mesma forma não farei dele um pedreiro e ainda menos um sapateiro Todos os ofícios deverem ser feitos mas quem pode escolher deve considerar a limpeza pois aí não se trata de opinião sobre este ponto os sentidos é que nos fazem decidir Enfim não gostaria dessas estúpidas profissões cujos trabalhadores sem indústria e quase como autômatos só aplicam as mãos num mesmo trabalho os alfaiates os costureiros de meias os que talham pedras de que serve empregar nessas profissões homens de senso É uma máquina que leva a outra ROUSSEAU 2004 p 2701 grifo e negrito nosso Manacorda 2006 como já adiantado considera as teses de Rousseau à frente de seu tempo Contudo ajudanos a compreender melhor algumas das principais contradições presentes no pensamento do criador de Emílio Como aponta o 60 filólogo italiano embora Emílio não seja o homem refinado de Locke ele é um nobre senhor com poder de escolha sobre sua vocação podendo optar por um ofício asseado deixando a sujeira e o peso para os homens sem senso os ciclopes É exatamente no elo que se estabelece entre o nobre rico e sua formação que Rousseau constrói a relação entre educação e sociedade Contudo conforme aponta Manacorda 2006 é exatamente nessas relações em que se mostram com mais claridade os tensos limites da proposta de Rousseau Basta considerar o papel que ele atribui ao trabalho na instrução profundamente baseado numa concepção atrasada do desenvolvimento real das forças produtivas e dos modos de produção e da própria divisão do trabalho que fica muito aquém da realidade da revolução industrial em ato e da consciência que dela tiveram por exemplo os enciclopedistas e em que a presunção da existência de um trabalho natural se associa à suposta possibilidade de escolha que a história concede ao privilegiado Emílio MANACORDA 2006 p 2445 aspas do original Para que o criador de Emílio seguisse com coerência perante as ideias da classe que naquela quadra histórica iniciava sua ascensão ao poder cujas teses roussounianas foram muito bem aceitas ele não podia se preocupar com a educação das massas e sim como muito bem registra Ponce 1998 somente com a formação de um indivíduo possuidor de recursos suficientes que lhe possibilitasse o conforto de por intermédio de um contrato pagar um preceptor do quilate de Rousseau Para que o capitalismo possa se posicionar em condições de se afirmar definitivamente como proposta de metabolismo da sociedade todavia conforme aponta o pesquisador estadunidense Leo Houberman 1986 foi preciso a contraditória articulação de três principais eventos São eles a reforma e a contrarreforma religiosa as revoluções inglesas gloriosa industrial e a culminância do processo revolucionário da burguesia que se realiza por meio da Revolução Francesa Enfatiza aquele autor que essas revoluções fertilizam o terreno social contribuindo 61 decisivamente para a solidificação do capitalismo como sistema metabólico econômicosocial Portanto com o avanço das contradições de classe consolidação ápice e declínio do modelo da sociedade feudal há uma agudização ainda mais problemática da relação trabalhoinstrução Contrariamente ao quadro cuja negação ao processo escolar foi apresentado às classes produtoras período de produção escrava e feudal com a ascensão do capitalismo surge de forma inédita na história a necessidade de se formar sistematicamente os trabalhadores Os resultados da Revolução Francesa do ponto de vista ontológico potencializam as possibilidades humanas Os avanços da ciência por exemplo são materializados tecnologicamente e passam a ser incorporados com mais rapidez ao processo industrial e ao cotidiano em geral A descoberta da máquina a vapor pelo inglês James Watts por exemplo impulsiona a construção das primeiras indústrias nas cidades visto que a partir desse novo cenário as fábricas não precisam mais depender unicamente das condições da natureza como a água e o vento como força motriz A relação cidade campo ganha um novo ingrediente ou seja os operadores das fábricas precisam agora viver nas cidades deixando o campo o que cria a polaridade hierárquica do campesinato sob o meio urbano Esse panorama leva Ivo Tonet 1997 p 13 a argumentar que pela primeira vez na história uma classe neste caso a burguesia como carro chefe da Revolução Francesa tinha a possibilidade real de apresentar um projeto global para a sociedade capaz de unir ao seu redor todos aqueles que aspiravam por uma sociedade mais igualitária Esse autor entende que essa classe não agiu simplesmente com oportunismo Para o filósofo brasileiro o fato de a burguesia ter chamado para as trincheiras da revolução todos os oprimidos pelo sistema feudal é um fato histórico de peso ontológico Isto é uma proposta real progressista como diria 62 hoje ainda que por sua própria natureza limitada TONET 1997 p 13 Porém apesar dessa grande oportunidade de expandir as potencialidades humanas o que a história documenta é o fenômeno da burguesia acatar a propriedade privada como direito natural expandindo essa naturalidade para os demais direitos Para Tonet 1997 entretanto o egoísmo erguido como substrato da sociedade burguesa impede que qualquer direito mesmo aqueles chamados de direitos humanos possam ir além do individualismo do novo homem burguês Diferentemente das possibilidades de desenvolvimento humano em sua integralidade o que se verifica é a primazia do culto ao individualismo A partir deste momento revolucionário que possibilita à burguesia se apropriar do poder político essa classe que se emancipa politicamente opta por operar uma separação ainda maior entre o indivíduo público e o indivíduo privado Como sintetiza Tonet 1997 p 19 a emancipação política portanto é a expressão do dilaceramento vigente na esfera das relações econômicas Por isso por mais plena que seja é sempre parcial limitada e contraditória Com efeito como conclui o autor os indivíduos se tornaram formalmente iguais formalmente livres mas as bases mais profundas da desigualdade não foram destruídas TONET 1997 p 19 Diante dessas contradições a educação mais uma vez e assim ontologicamente sempre será não pode ficar imune E não fica Toma contornos de fundamental importância para as duas classes antagônicas O complexo educativo passa a ser usado de duas formas distintas mas aciculadas pela classe que detém o poder político da sociedade De um lado essa classe passa a ver a escola como o ambiente propício para formar seus líderes e com isso preservar e perpetuar o status quo oferecendo a si próprio uma educação de cunho propedêutico Do outro lado mas em articulação dialética com a primeira opção a burguesia encontra no processo escolar o locus ideal para pôr em prática seu projeto de 63 adestramento do trabalhador aos particularismos burgueses destinandolhes uma educação de caráter eminentemente profissionalizante 20 Dessa forma estaria fechada idealmente a equação cujo comando ficaria a cabo da burguesia cabendo aos trabalhadores retirar da escola os ensinamentos necessários para fazer girar essa engenhosa descoberta moderna capaz de retroalimentar com mãos espíritos e mentes o mercado reprodutor do capital Como nessa sintética linha do tempo da relação trabalho e educação o que pretendíamos era entender criticamente o papel da educação sobretudo a sua vertente escolar precisamos a partir de agora compreender como as crises políticas destacadamente as vivenciadas pelo sistema capitalista apontam a educação sistematizada como saída para suas mazelas Para que essa questão ganhe um pouco mais de claridade temos que retomar a problemática de como a indústria ganha centralidade sobre um cotidiano cada vez mais urbano Isto é associada à aplicação crescente da maquinaria como mola propulsora da evolução do capitalismo as fábricas se complexificam e passam a exigir um outro tipo de formação dos que vão operar o aparato industrial urbano Dito de outro modo são exigidas determinadas destrezas antes inexistentes aos responsáveis diretos pelo funcionamento da fábrica os operários Essa nova demanda citadinafabril pôs para a burguesia a interessante indagação qual caminho escolher para o processo educativo Mesmo que essa classe tivesse o puro bom discernimento de oferecer educação bancada pelo Estado burguês laica gratuita e de qualidade para todos os trabalhadores a 20O surgimento das primeiras escolas técnicoprofissionalizantes por exemplo foi anunciado pelos defensores da ordem como a solução para a problemática da relação trabalhoinstrução bem como saída para os problemas do desenvolvimento da produção e consequentemente para os seus produtores os trabalhadores e seus filhos 64 natureza ontológica do capitalismo impediria que o suposto bom senso da burguesia assim agisse A opção portanto da classe detentora dos meios de produção para atender às necessidades do capitalismo é possibilitar para os trabalhadores apenas instrução minimamente necessária mas que seja carregada com a exclusividade dos imperativos imediatos da produção capitalista No entanto há no horizonte da refinada retórica da intelectualidade burguesa o discurso de que o capitalismo foi o primeiro sistema que pôs em marcha a universalização da educação Isso de fato é verdade se olharmos somente a aparência enganosa dos fatos Com efeito ao aprofundarmos a análise conseguimos iluminar que a universalização proposta pela burguesia fica apenas circunscrita ao creme do bolo O que faz a burguesia ao necessitar do processo educativo como elemento de realimentação para a estrutura econômica capitalista que se monta após a Revolução Francesa Universaliza o que lhe é particular O padrão propedêutico educativo é guardado para si Já para resolver os problemas demandados pelos imperativos da produção a burguesia apresenta a generalização dos seus interesses mas apresentaos como se fossem necessidades universais a todos Ou seja particulariza seus interesses educacionais mas afirma que os universaliza A burguesia sabe demasiado bem o que faz menciona Ponce 1998 p 150 sobre a forma burguesa de particularizar seu interesse educativo quando diz que universaliza a educação O autor argentino aponta que a contradição burguesa se torna clara quando se observam suas opções pedagógicas distintamente apresentadas para solucionar a questão trabalhoinstrução Se por um lado lembra esse autor a burguesia apresenta a necessidade de instruir as massas para eleválas até o nível das técnicas da nova produção por outro lado teme que essa mesma instrução torne as massas cada dia menos assustadiças e menos humildes 65 Para sintetizar a solução encontrada pela burguesia para tal dilema esse autor escreve o seguinte dosando com parcimônia o ensino primário e impregnandoo de um cerrado espírito de classe como para não comprometer com pretexto das luzes a exploração do operário que constitui a própria base da sua existência PONCE 1998 p 150 aspas do original É dentro desse quadro que brotam os dois modelos paralelos e distintos de educação sistematizada mas articulados entre si em que a burguesia retira sua solução para o dilema trabalhoinstrução Isto é a partir do complexo educativo em sua vertente stricto surge um modelo destinado à classe senhorial que preferimos denominálo de ensino propedêutico clássico e científico cuja organização curricular carrega ensinamentos das ciências das letras das artes da oratória entre outras disciplinas voltadas para a formação dos dirigentes e seus prepostos e um outro modelo destinado aos indivíduos que ocuparão os postos da produção material da sociedade propriamente dita os trabalhadores A esse restrito ramo de uma educação específica que por sua vez se desprende da educação voltada para resolver demandas próprias de uma sociedade de classes antagônicas consideramos conveniente chamála de ensino profissionalizante direcionado para os imperativos práticos cujo conteúdo curricular prioriza as técnicas quase artesanais apreendidas nas oficinas Entre esses dois modelos de escola instalase uma espécie de cunha nunca meafisicamente separada que divide definitivamente a educação em dois lados consagrando o que a história da educação denomina de dicotomia educacional ou seja propedêutica de um lado e profissionalizante de outro Do lado da elite burguesa com efeito consolidase o preconceito em relação às atividades manuais vistas como impuras podendo ser frequentadas apenas pela classe trabalhadora à qual caberia um ensino imediatamente voltado aos imperativos da produção 66 Para que possamos adiantar um pouco mais nossa análise o que nos permitirá um exame mais profundo no próximo item enfrentamos a tarefa de aprofundar qual o caminho que as dicotomias educativas tomam no capitalismo desenvolvido pós século XIX 21 Desenvolvimento capitalista e a consagração pública da dicotomia educativa O ambiente fabril se automatiza de modo crescente exigindo reorganização de determinadas funções entre os operários Entra em cena o especialista Essa nova figura precisa ser encontrada entre os trabalhadores que operam diretamente o processo produtivo Portanto passa a existir uma divisão entre os próprios trabalhadores de chão de fábrica Em outras palavras de um lado encontramse os operários manuais os que operam diretamente os equipamentos de outro surge a figura dos técnicos supervisores os que são envolvidos com o monitoramento e fiscalização entre outras funções intermediárias do controle da produção Tal divisão impõe ao modo de produção capitalista um outro interessante dilema As forças produtivas determinadas pelo capitalismo precisam agora apresentar uma proposta para a questão da formação individual em contraponto à qualificação exigida pela profissionalização da indústria moderna automatizada Para que possamos desenvolver o tema acompanhado do rigor conceitual que lhe impõe a ontometodologia e para garantir uma exposição com clareza suficientemente adequada às pretensões de seus leitores precisamos a partir de agora debater mais esse dilema existente na educação capitalista Após aclararmos melhor tal questão estaremos em condições privilegiadas para dar o devido tratamento à questão da chamada qualificação profissional versus formação omnilateral 67 Antes de avançarmos em busca de um maior aprofundamento sobre a dicotômica história da educação no capitalismo precisamos alertar que o dualismo proposto pelo sistema capitalista após a Revolução Francesa configurase em uma dicotomia que se realiza dentro de um processo já dual Esse processo apenas foi possível pelo fato de a burguesia ser a proprietária dos meios de produção Consequentemente pode adequar a escola do trabalhador às suas necessidades particularismos Já para os jovens filhos da classe burguesa a burguesia escolhe o ensino que lhe convém aquele que pode mais facilmente cristalizar a posição de classe a escola que vai contribuir com a consolidação do histórico dualismo social educacional Contudo não há repetimos cristalização plena O caráter de dependência ontológica da educação conjugase a sua natureza de autonomia relativa e determinação recíproca com relação ao complexo do trabalho não permitindo que esse quadro se consolide sem as contradições inerentes ao processo de luta de classes mesmo que em seu viés dicotômico subdividido no capitalismo Um outro fator que contribui com a solidificação da dicotomia educativa dentro do dualismo histórico presente na educação capitalista são os anseios da classe trabalhadora Nesse momento da história a classe dos produtores carrega no complexo educacional a capacidade de atender as expectativas de sua instrumentalização intelectual e em consequência disso como capaz de oportunizar aos trabalhadores e seus filhos a tão esperada e desejada ascensão social dentro do capitalismo A classe burguesa sabedora desses anseios carrega na escola a responsabilidade de como já dissemos conservar o estado de dominação oferecendo àquela classe apenas o necessário para reproduzir o capital Podemos ainda escrever que em momento determinado da história uma classe precisa que determinado tipo 68 de conhecimento seja mais e melhor elaborado intelectualmente pela outra classe visto que aquela classe precisa do trabalho desta para tocar o aparato produtivo que se complexifica de forma crescente A burguesia entretanto não pode ofertar formações ontologicamente integrais transformadoras sob o risco de perder a posição de comando políticosocial Para melhor se livrar do problema portanto oferta instrução profissionalizante para formar seus operadores e supervisores com conteúdos parciais fragmentados aligeirados e de qualidade duvidosa que apenas possam atender no limite ao pêndulo da fábrica capitalista Assim no desenvolvimento da sociedade sob a égide capitalista no contexto das inúmeras conquistas postas em prova pela burguesia revolucionária muitas propostas tentam responder a um dos maiores dilemas da pedagogia moderna articular formação humana com uma instrução que forme operadores profissionais Segundo ponderação de Manacorda 2006 a fábrica não responde a esse problema ao contrário o seu sucesso é sinônimo de ignorância para o trabalhador mas apesar dessa constatação continua como a grande inspiradora dos experimentos educativos modernos Decerto ainda conforme o intelectual italiano as preocupações da pedagogia com as questões biológicas antropológicas e sobretudo psicológicas apontam para a evolução da educação como locus da ciência Esse é o cenário que faz Ponce indicar ser natural a existência de certa evolução na pedagogia capitalista No entanto escreve o pensador argentino a Didática Magna tentou responder a uma época em que o trabalho atendia a um capitalismo em germe ainda manufatureiro ao passo que os novos métodos pedagógicos principalmente didáticos correspondem diretamente às necessidades do capitalismo imperialista Na base da nova técnica do trabalho escolar conclui Ponce 1998 p 1612 está Ford e não Comênio 69 Muitas proposições educacionais como já adiantado tentaram atender ao dilema trabalhoinstrução que no capitalismo desenvolvido ganha o ingrediente da qualificação profissional A chamada educação ativa no início do século XX que no Brasil serve de inspiração para a escola nova talvez seja a proposta educacional que mais adquire visibilidade no mundo ao tentar equacionar a problemática da formação humana considerando o ensino para a fábrica No entanto essa proposta bem como algumas outras priorizam o caminho da atividade para a produção e não para a formação do ser humano genérico21 Somente as teses de Karl Marx apresentam de fato alternativas de superação da submissão de uma classe à outra Apesar de não ter um tratado específico sobre o complexo educativo é o pensador alemão quem consegue defender com clareza pela primeira vez na história humana uma proposta de formação que tenha como base a educação omnilateral Para Manacorda 2006 p 269 somente as teses de Marx pressupõem a união entre trabalho produtivo remunerado instrução intelectual exercício físico e treinamento politécnico como condição para elevar as classes trabalhadoras acima das classes superiores e médias Em texto bastante utilizado por quem tematiza a educação marxista retirado das Instruções para os delegados do Conselho Geral Provisório da Associação Internacional dos Trabalhadores datado de agosto de 1866 Marx apresenta de forma límpida sua defesa da articulação entre educação e trabalho produtivo Nas clássicas palavras do filósofo alemão por educação entendemos três coisas Primeiramente Educação mental intelectual Segundo Educação física tal como é dada em escolas de ginástica e pelo exército militar Terceiro Instrução tecnológica que transmite os princípios gerais de 21O humano genérico aqui quer expressar vale reforçar o indivíduo partícipe do gênero 70 todos os processos de produção e simultaneamente inicia a criança e o jovem no uso prático e manejo dos instrumentos elementares de todos os ofícios MARX 1982 p 422 O século XX nasce com a escola pública como realidade na Europa e nos Estados Unidos e em boa parte do mundo Não existem mais empecilhos para que o desenvolvimento da produção ocupe a universidade Ao contrário a universidade apesar de suas contradições agora é forte aliada do desenvolvimento capitalista O mundo está preparado para conhecer as orientações da gerência científica de Friedrich Taylor boa parte dela desenvolvida nas cátedras das universidades Os experimentos deste pesquisador ajustamse perfeitamente às necessidades fabris de Henry Ford Assim o capitalismo se articula em torno de uma das suas mais poderosas ferramentas o binômio taylorismofordismo Para Netto e Braz 2008 p 108 a descoberta da administração científica e sua articulação com o fordismo possibilita ao capitalismo uma forma específica de proceder à extração da mais valia absoluta Ainda na fase clássica do imperialismo a gerência científica de Taylor foi objeto de um desenvolvimento significativo graças às adaptações que sofreu nas mãos de Henry Ford 18631947 que se tornaria o chefe de um dos maiores monopólios da indústria automobilística Inicialmente implementada na produção de veículos automotivos essa forma de organização o chamado taylorismo fordismo acabou por se tornar o padrão para toda a produção industrial e universalizouse nos anos dourados do imperialismo NETTO BRAZ 2008 p 1978 itálicos e aspas do original Da primeira metade da década de 1940 até aproximadamente o início dos anos de 1970 apoiado no modelo industrial denominado de padrão tayloristafordista o modo produção capitalista acredita ter encontrado seu paradigma de 22Em pesquisa recente Moura et ali 2015 escrevem o seguinte Em sua essência essa proposição vai ao encontro da discussão sobre educação feita por Marx nO capital cujo volume I foi publicado em 1867 assim como em A ideologia alemã de 1846 e na Crítica ao Programa de Gotha de 1875 Está presente ainda no Manifesto comunista de 1848 de Marx e Engels 71 desenvolvimento Esse período marcado por grande acumulação apresentase ao mundo para usarmos os termos de Hobsbawm 2001 como a era de ouro do capitalismo Agora o que se pleiteia são políticas públicas intervencionistas keynesianas que possam dar garantias às condições gerais de acúmulo do lucro capitalista É assim que as ideias de Keynes corroboram para legitimar a suposta universalização proposta pelo padrão tayloristafordista Contudo como esse panorama não se desenvolve sem contradições o capitalismo em seu estágio imperialista 23 para gerir tais contradições requer a presença de um Estado interventor embora diversificado Como explicam Netto e Braz 2008 p 203 a natureza da ordem monopólica exige um Estado diverso que vá além da garantia das condições externas da reprodução e da acumulação capitalista De fato o imperialismo levou a refuncionalização do Estado sua intervenção na economia direcionada para assegurar os superlucros dos monopólios visa preservar as condições externas da produção e da acumulação capitalista mas implica ainda uma intervenção direta e contínua na dinâmica econômica desde o seu próprio interior através de funções econômicas diretas e indiretas NETTO BRAZ 2008 p 203 itálicos do original Com um relativo desenvolvimento social que acompanha o crescimento econômico proporcionado por esse tipo de concepção estatal a expansão do mercado capitalista passa a absorver cada vez mais mão de obra fenômeno que gera nas lúcidas palavras de Sérgio Grácio 1986 uma procura otimista 23Se pudéssemos estabelecer uma linha histórica da evolução periódica do capitalismo com base na tradição marxiana como nos indica Netto e Braz 2008 1709 teríamos que iniciála na acumulação primitiva que vai do século XVI até meados do século XVIII denominado de capitalismo comercial ou mercantil O período posterior chamado de capitalismo concorrencial ou liberalclássico iniciase por volta 1780 e segue até aproximadamente o último terço do século XIX Já o estágio atual conhecido como capitalismo imperialista tem seu início ainda nas três últimas décadas do século XIX e se caracteriza principalmente pela fusão de capitais monopolistas com os capitais financeiros administrados pelos conglomerados bancários 72 propositiva por emprego Para os que já estavam empregados todavia essa aura de oportunidades demanda uma outra procura desta vez por uma melhor colocação na roleta do capitalismo O idealismo de que a sociedade é aberta e oferece oportunidade para todos subjaz contudo à ideologia dominante que nesse contexto de otimismo associa o aparecimento de oportunidades de emprego à necessidade individual da qualificação A rápida expansão escolar portanto articulase à ideia da qualificação Essa palavra com efeito poderia traduzir a síntese do interesse da escola para o período de glória do capitalismo Esse é o pano de fundo das propostas de reformas sobre as políticas públicas burguesas propagadas como universais para a expansão capitalista durante o Estado Providência Em outros termos com a produção da materialidade humana exigindo formação para atender algumas demandas específicas defendese a partir do conglomerado educativo uma relação direta e linear sem contradições entre a educação e o desenvolvimento econômico24 Se logo após a Revolução Francesa a palavra de ordem do discurso educacional burguês era a profissionalização agora essa defesa se refina e passa a ser de qualificação profissional ou qualificação profissionalizante como querem alguns dos mais exigentes intelectuais defensores de tais preceitos Desse modo diversas propostas de formação profissionalizante que se voltam para a chamada qualificação são difundidas Esse cenário reputa às escolas técnicas que já vinham ganhando centralidade desde fins da Idade Média destaque mundial como sendo uma grande senão a única alternativa para os filhos da classe trabalhadora apesar de algumas exceções somente para os filhos dos produtores Ora o idealismo burguês que acredita no progresso linear não tem por sua natureza limitada metodologicamente como enxergar 24Ver por exemplo a esse respeito a chamada teoria do capital humano de Theodore Schultz 1973 73 a essência contraditória da realidade em uma sociedade que se move no terreno da luta de classes Destarte aquela falaciosa liberdade e a falsa expansão das oportunidades para todos associada ao caráter ontológico da sociedade capitalista em que só pode haver acúmulo para alguns em detrimento da miséria para a imensa maioria não poderia servir de exemplo ao desenvolvimento humano integral pleno de significados universais Como já havia apontado Marx 2003 é inerente ao próprio capitalismo a alternância de crises Esse sistema sofre estruturalmente da incapacidade de expandir as forças produtivas ao mesmo tempo em que distribui a riqueza O longo ciclo expansivo do pós II Guerra Mundial teve seu esgotamento quando o excedente da produção transformouse em capital financeiro Com isso entre alguns outros fatores cerca de 90 dos movimentos econômicos passaram da esfera da produção comércio para a compravenda de papéis nas Bolsas de Valores mundo afora Esse processo consuma como já enfatizado a chamada financeirização da economia visto que cria o compromisso para que o Estado tenha que assumir maciça e sistematicamente o pagamento das dívidas transferidas do setor produtivo para o capital financeiro De modo geral o processo de financeirização da economia ganha impulso com o fim do acordo da Conferência de Breton Woods 25 o que provoca graves 25Essa Conferência ocorrida na Inglaterra em 22 de julho de 1944 almejava como principal ponto de pauta instrumentalizar o mundo para ajudar na reconstrução dos países derrotados na segunda guerra mundial Era também intenção dos congressistas criar mecanismos que garantissem a paz mundial e a estabilidade econômica Em tal reunião a tese que sai derrotada é a do economista austríaco Friedrich Hayek que na mesma época do Encontro lançava o livro O caminho da servidão As teses do livro preconizavam que se todo o mundo incluindo a Rússia não adotassem as receitas do Estado mínimo adoeceriam terminalmente até a mais brutal servidão Com efeito o que monopolizou por assim dizer as atenções econômicas no período do pós 74 implicações sobre o quadro econômico geral visto que causou relativo recuo da produção industrial frente aos investimentos financeiros O declínio das taxas de lucro servemnos como um bom exemplo do esgotamento do padrão de acumulação taylorista fordista Tabela com demonstrativos da queda da taxa de lucro do período de 1968 a 1973 País Taxa de lucro inicial Taxa de lucro final Alemanha Ocidental 163 142 GrãBretanha 119 12 Itália 142 121 Estados Unidos 182 171 Japão 262 03 Fonte Netto Braz 2008 p 2013 Como documentado na tabela acima no período que vai de 1968 a 1973 a taxa de lucro nos principais países capitalistas começa a declinar o que deixa claro o esgotamento da onda longa expansionista do capitalismo Também o crescimento econômico se reduziu nenhum país capitalista central conseguiu manter as taxas do período anterior Entre 1971 e 1973 dois detonadores anunciaram que a ilusão do capitalismo democrático chegava ao fim o colapso do ordenamento financeiro mundial com a decisão norteamericana de desvincular o dólar do ouro rompendo pois com os acordos de Bretton Woods que após a Segunda Guerra Mundial convencionaram o padrão ouro como lastro para o comércio internacional e a conversibilidade do dólar em ouro e o choque do petróleo com a alta dos preços guerra sobretudo nos países de capitalismo avançado foi o Estado de Bem Estar Social Três décadas mais tarde no entanto a tese do Estado mínimo de Hayek volta à cena e com toda força batizando definitivamente o que a história denomina neoliberalismo 75 determinada pela Organização dos países Exportadores de PetróleoOPEP NETTO BRAZ 2008 p 213 itálicos e aspas do original Com o fracasso do Estado de Bem Estar Social Estado Providência Welfare State e a falência das medidas keynesianas o capitalismo não consegue evitar sua entrada definitiva em uma crise sem precedentes na história humana Não obstante busca de forma frenética um novo ancoradouro Não tendo onde melhor se ancorar o capital emprega todas as suas apostas na chamada reestruturação produtiva É aqui que o capitalismo decide ser o padrão tayloristafordista ineficiente para atender a contento as prerrogativas do capital Esse contexto faz aparecer da gerência científica a descoberta de uma outra e remodelada forma para extrair mais valia Escondida portanto nos escombros das mais velhas experiências capitalistas entulhada em decompostas bases teóricas ressignificadas ao gosto de Friedman eis que surge brilhante e reluzente no horizonte do capital uma tábua de salvação para sua crise uma nova ferramenta a flexibilização no interior da indústria é a ascensão do toyotismo O esgotamento de um padrão e a consequente inauguração de um novo na interpretação de Ricardo Antunes 2002 p 53 é a mais pura expressão fenomênica da crise estrutural que se inicia nessa quadra histórica no interior do capital como aponta este autor Reengenharia lean production team work eliminação de postos de trabalho aumento da produtividade qualidade total fazem parte do ideário e da prática cotidiana da fábrica moderna aspas do original Antunes 2002 p 53 complementa suas argumentações escrevendo que Se no apogeu do taylorismofordismo a pujança de uma empresa mensuravase pelo número de operários que nela exerciam sua atividade de trabalho podese dizer que na era da acumulação flexível e da empresa enxuta merecem destaque e são citadas como exemplos a ser seguidos aquelas empresas que dispõe de menor contingente de força de trabalho e que apesar disso têm maiores índices de produtividade aspas do original 76 Para fazer eco ao ditado popular alegria de pobre dura pouco as modificações ocorridas no âmbito da produção como escreve Souza Junior 2006 p 6 deramse através da intensificação dos desenvolvimentos científicos e tecnológicos aplicados à produção e de novos métodos de controle e gestão da força de trabalho Esse quadro dispara um novo e profundo câmbio nas relações capitalistas detonando o início de alterações que impactam o conjunto da produção da circulação e do consumo Por conseguinte esse cenário modifica decisivamente o quadro das ocupações dos empregos e dos desempregados demandando um novo formato na educação e na qualificação dos trabalhadores sobretudo desta última com a finalidade de que eles possam retornar o mais rápido possível para a roleta do mercado de trabalho capitalista É esse o cenário em que as atuais propostas de educação profissionalizante são defendidas largamente por diversos setores da sociedade com a principal quase a única alternativa aos filhos da classe trabalhadora No Brasil alastrase de modo acrítico a chamada educação em tempo integral que pretende misturar o nível médio com a modalidade profissionalizante Resta saber até que ponto e por quais mediações essa suposta integração distancia se da educação necessária para que os trabalhadores possam conhecer o mundo e com esse conhecimento se instrumentalizar para mudar a realidade hodierna Para que possamos dar um passo a mais na direção de nossos objetivos consideramos relevante apresentar uma síntese sobre o debate que cerca a dicotomia educativa Desse modo relembramos que o trabalho funda o ser social no entanto não o esgota precisando de outros complexos sociais para dar continuidade ao processo de humanização do homem Erguese sobre a base do trabalho assim outros complexos que pleiteiam responder às demandas humanas cada vez mais refinadas Esses complexos 77 sociais por sua vez acabam servindo de enriquecimento para o próprio trabalho Justamente nessa dialética surgem outros complexos sociais a exemplo da linguagem da ciência da arte e da educação para ficarmos apenas nesses O complexo educativo na sociedade primitiva se processa no próprio cotidiano da produção da existência ou seja no processo de trabalho A esse ponto vale salientar que concordam cada um a seu termo pesquisadores como Saviani 1994 Ponce 1998 entre outros Nesse momento da história em que não há divisão de classes inexiste também divisão rígida entre cotidiano e extracotidiano26 tampouco há a presença de divisão no processo formativo a educação somente se realiza articulada às tarefas sociais de uma totalidade precária em termos da produção da materialidade humana O contexto social do comunismo primitivo em que a educação é ligada diretamente à cotidianidade leva Lukács 2013 a denominar a forma da educação cotidiana de lato geral assistemática informal Para Lukács 1966 v1 uma das principais características desse tipo de educação é que as experiências imprescindíveis para a vida da espécie se consumam por meio da imitação conversão de um reflexo de um fenômeno da realidade na prática de um sujeito Como a eficácia dos procedimento para a adaptação e domínio do homem ao ambiente no mundo primitivo não necessita de maneira geral de elaborações mais profundas extracotidianas um processo educativo lato atende satisfatoriamente à missão de garantir às novas gerações o legado construído pelas gerações anteriores Por isso o filósofo húngaro indica que a educação lato é universal o que aponta sua inexorável necessidade no processo de reprodução humana LUKÁCS 2013 26 A antropologia registra a existência já na sociedade primitiva de determinadas comunidades em que a magia privilegia alguns indivíduos atribuindolhes determinadas condições extracotidianas Ver Lukács 1966 v1 78 Com o progressivo e contraditório afastamento do homem das barreiras naturais com o avanço das forças produtivas que permite a consequente produção de excedente entre diversos outros fatores a humanidade conhece o ócio O tempo livre é para Marx segundo relata Lukács 1966 v1 tanto tempo de ócio quanto tempo para as atividades superiores Esse novo fator transforma o sujeito em outro sujeito A partir de tal alteridade sustenta o filósofo húngaro o homem entra no processo de trabalho disciplinando seu tempo bem como sua exercitação para realizar esta atividade o que lhe permite experimentar a ciência como força materialmente criadora objetivadora de si mesma Portanto a produção do ócio que se dá fora do processo de trabalho se relaciona dialeticamente com a própria atividade de trabalho LUKÁCS 1966 v1 A divisão da sociedade em duas distintas classes surgida do desenvolvimento do trabalho traz em sua natureza a necessidade de um outro arranjo educacional que também se separa em duas partes diferentes e em certa medida contrapostas Aquele processo educativo que atendia plenamente ao cotidiano primitivo lato não tem mais como atender plenamente ao novo contexto social O novo arranjo social faz emergir uma outra educação que atenda aos interesses sociais que possa responder às novas demandas da sociedade Nessa cena histórica a classe dominante cria para si um processo educacional que possa atender aos seus anseios É assim que nasce o processo educativo denominado por Lukács 201327 de stricto específico restrito escolar sistemático não universal entre outros adjetivos que asseguram a alguns pesquisadores a exemplo de Saviani 1994 como fora lembrado 27Marteana Lima 2014 ao pesquisar o capítulo da Reprodução de Lukács 2013 aponta que não há separação rígida entre a educação em sentido lato e em sentido stricto 79 acima relacionar semanticamente a palavra escola à expressão ócio O desenvolvimento das forças produtivas durante a dissolução da sociedade primitiva permite a solidificação do modo de produção escravista o declínio deste e a assunção do modo de produção feudal sobre o escravismo não demanda como comentamos novidades radicais no processo educativo Portanto da sociedade escravista até a feudal de forma geral podemos indicar que o arranjo educativo permanece o mesmo De um lado o processo educativo lato não sistemático para as classes produtoras e do outro um complexo educacional stricto sistemático para as classes ociosas Vai ser apenas com a ascensão definitiva do capitalismo que ocorrerá o desequilíbrio definitivo desse quadro O modo de produção capitalista para seu desenvolvimento necessita de outro arranjo educacional Surge assim outra divisão ou a consagração da divisão de classes na educação Isto é a burguesia para solidificar universalmente seus particularismos escolares cinde a educação stricto em duas outras partes paralelas mas não metafisicamente separadas e em larga medida contrapostas para a burguesia o ensino propedêutico para os produtores e seus filhos a educação profissionalizante Em resumo podemos dizer que com o alvorecer da Revolução Francesa a burguesia divide o que já era dividido Isto é propõe uma dicotomia dentro de um dualismo cria a partir da especificidade do complexo da educação de caráter stricto dois novos ramos educacionais Para si e seus filhos os burgueses elegem o processo educativo propedêutico já para a classe trabalhadora e os filhos destes separam um gomo específico e restrito de escola o chamado ensino profissionalizante Durante todo o desenvolvimento capitalista propostas de diversas matrizes teóricas procuram equacionar a problemática do trabalho 80 instrução Com preponderância da instrução sobre o trabalho tais tentativas de maneira geral quando não naufragam completamente apenas servem para fomentar a retórica da necessidade inexorável de alimentar o mercado de trabalho capitalista com a profissionalização precoce de jovens das camadas dos produtores Nesse desenvolvimento dependendo de cada momento determinado da história as demandas do capitalismo agudizam o que os teóricos de tais tentativas chamam de formação para o trabalho 28 criando ao paladar das prerrogativas circunstanciais remodelamentos ressignificações para aprofundar ainda mais aquela dicotomia Nessa esteira assistimos o capitalismo quando precisa diferenciar os operadores de chão de fábrica de alguns prepostos para a supervisão e monitoramento da produção solicitar da escola a chamada qualificação profissional Ao historiarmos a dicotomia educativa procurando revelar seu caráter ontológico mesmo que de modo abreviado pretendemos fornecer melhores subsídios para que se possa analisar com maior profundidade os contemporâneos projetos educacionais voltados especificamente para a classe trabalhadora denominados acriticamente de educação integral As atuais propostas que tentam unificar o nível médio com a modalidade profissionalizante necessitam ser examinadas com mais rigor crítico visto que embora haja uma produção relevante sobre a problemática de maneira geral tais análises quando não afiançam acriticamente a suposta integração apontam para a necessidade desse modelo educativo como suporte formativo aos trabalhadores na perspectiva de uma sociedade mais justa e igualitária 28Recusamonos a usar tal expressão visto que educação para o trabalho é a proposta marxiana que pretende unir indissociavelmente intelecto corpo e espírito como orientação para uma formação verdadeiramente omnilateral A nosso ver o uso do termo educação para o trabalho na atual conjuntura mais confunde do que aclara visto que é utilizado para designar um processo educativo voltado para o mercado de trabalho capitalista 81 NOSELLA 2011 p 1062 As investigações alinhadas a tais pesquisas no limite das mais críticas acreditam que tal proposta educacional guarda os germes da politecnia defendida nos clássicos do marxismo Por esse motivo devem ser defendidas no plano político pedagógico como alternativa para a construção de conhecimentos preparatórios para uma sociedade emancipada Em torno dessa crença perguntamos se seria possível a um processo educativo dicotomizado em duas partes elaborado no centro do capitalismo monopolista guardar algum elemento mesmo que em germe da politecnia defendida nos clássicos do marxismo Para tentarmos tematizar de modo adequado essa indagação estudaremos o que propõe a clássica proposta maxiana de formação omnilateral O que faremos logo a seguir RESUMO O arquivo em questão trata basicamente do dualismo educacional também caracterizada como dicotomia educacional Para compreender melhor esse dualismo é preciso analisar alguns aspectos conceituais e históricos do desenvolvimento humano Um deles citado ao longo do texto é a interação social que ao mesmo tempo que ensina promove o aprendizado entre os seres que ali estão presentes e convivendo Outro ponto de suma importância que enaltece o desenvolvimento humano é o trabalho uma vez que o ato de trabalhar gera diversas alterações no ambiente social bem como no mundo A partir do cenário apresentado torna se essencial citar a educação como um dos segmentos ligados ao desenvolvimento humano e social já que em anos mais primitivos o aprendizado estava relacionado ao ato de experienciar a natureza como um todo e conversar com os mais velhos em busca de sabedoria Ou seja aprendiase a partir da convivência da observação e da experimentação em um nicho específico podemos concluir que as trocas de aprendizado eram homogêneas uma vez que os grupos sociais eram separados em nichos específicos e limitados Dessa forma as classes humanas se dividem em duas Proprietário e Operador Temos assim uma dependência em que um fornece a mão de obra e o outro fornece a função para o ato de trabalhar E temos assim o primeiro exemplo de dicotomia educacional em que para alcançar determinados níveis de estudo é preciso pertencer a determinados nichos específicos Em outras palavras para os nichos trabalhistas o estudo era experenciado no dia a dia do trabalho para o nicho de proprietários o estudo era direcionado e aplicado de forma mais específica visando fins específicos Tais fins específicos tempos após seriam denominadas instituições de ensino ou escolas Então temos que um complementa o outro uma vez que para o bem social e humano é preciso uma troca e interação entre mão de obra e função de trabalho ou seja alguns exercem melhor função aprendendo o ato de fazer propriamente dito e outros aprendem melhor o ato de e ensinar e de explicar Anos após então as instituições de ensino não concentravam apenas Proprietários mas operadores cujo objetivo era aprender aquilo que não era aprendido ao longo do seu cotidiano como por exemplo música geometria aritmética e assim por diante E a partir do conhecimento básico aprendido todos sem exceção poderiam aprender assuntos mais específicos como medicina direito e teologia Assim iniciam alguns contrapontos entre o avanço da ciência e suas comprovações e o pensamento teológico com seus ideais Em complemento começou a se acreditar que quanto mais estudo um indivíduo tivesse em anos iniciais e ao longo de sua vida melhor seria seu comportamento E a partir disso começou a haver estímulo para que todos os indivíduos frequentassem o ambiente escolar Escola tornouse sinônimo de sabedoria Sendo assim a educação começou a ser incorporada como eixo principal no que diz respeito ao trabalho e ao posicionamento social um dos formatos educacionais que permeiam esse pensamento é o ato educacional profissionalizante e posteriormente escolas científico técnicas Como aponta Rousseau o homem embora aprenda diversos segmentos trabalhando aprende prioritariamente com o próprio homem E a partir de tal concepção é importante e imprescindível permitir a oportunidade para todos os homens independente de sua classe social ao poder de escolha de aprendizado seja ele mais físico ou mais mental E para tal conhecimento as interações sociais são de extrema importância Anos passados a tecnologia começa a ganhar força e mostrar ao homem que não é necessário de forma única a utilização da natureza em prol do desenvolvimento mas que é preciso ordenar e organizar a tecnologia em prol do que se almeja no caso do capitalismo por exemplo Esse processo caracteriza muito bem outras duas classes sociais relacionadas a empresas públicas e privadas A escola por sua vez caminha junto com as demandas tecnologias em que instituições escolares privadas buscam manter o status social já alcançado e instituições escolares públicas promovem a manutenção do indivíduo no trabalho operário Ou seja os formatos pedagógicos de ensino aplicados nessas duas vertentes escolares já possuem um direcionamento e fim específico Se seguirmos essa linha de pensamento podemos concluir que então o indivíduo dependendo de sua classe social e nicho presente já possui um delineamento de qual posicionamento terá na margem social Temos então novamente o dualismo educacional em que são incorporados dois formatos educacionais o profissionalizante e o propedêutico Isso sugere um formato capitalista entre quem manda e quem obedece Em conclusão é preciso que o homem possa e deva escolher o que pretende alcançar e qual direcionamento pretende ter enquanto trabalhador independente de sua classe social Para tal precisa ter pensamentos críticos e um direcionamento não tendencioso que o auxilie a decidir aquilo que busca Sendo assim diversos contextos devem ser explorados e não limitados

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