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Direito ·
Direito Civil
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Notas sobre a Função Social dos Contratos*\n\nGustavo Tepedino\nProfessores Titular de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ\n\nSUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Debate atual acerca do conteúdo e alcance da função social do contrato. 3. Função social e ordem pública.\n\n1. Introdução\n\nNão foi sem polêmica que o tema da função social se desenvolveu no Brasil. Embora introduzido no ordenamento jurídico pela Constituição da República de 1946, por meio da função social da propriedade, e há mais de cinquenta anos fosse objeto de estudos por parte da doutrina italiana, por muito tempo, na experiência brasileira, o princípio permaneceu associado à ciência política ou ao plano metajurídico. Com efeito, a função social, sob a ética individualista que caracterizou as codificações ocidentais, não se configurava em princípio jurídico, mas traduzia-se em postulado metajurídico, o qual correspondia, em matéria contratual, ao papel que o contrato deveria desempenhar no embate às trocas e à prática comercial como um todo. Provavelmente por tal circunstância histórica, arraigada intensamente à cultura jurídica dominante (associada ao excessivo apego à técnica regulamentar), a função social ainda se tema até hoje enigmática e polêmica. Note-se que nem mesmo o advento do Código de Defesa do Consumidor, que deu ensaio e acalorada debate acerca da boa-fé objetiva, suscitou discussões em profundidade sobre a função social. Tampouco a inserção, na Constituição Federal de 1988, do princípio da função social da propriedade teve o condão de despertar a atenção dos estudados. De fato, o instituto somente passou a ser objeto de maior reflexão, adquirindo a feição atual, com a sua introdução no art. 421 do Código Civil de 2012, em conhecida dicção: \"A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato\".\n\nDiante do preceito – é a parte as críticas à redação do dispositivo, do que resultou antem aquilo em projeto de lei revisora –, surgiram diversas correntes de pensamento acerca do conteúdo e alcance da função social do contrato, destacando-se três principais posições, no panorama da direito privada, que buscaram delimitar o alcance do instituto.\n\n2. Debate atual acerca do conteúdo e alcance da função social do contrato\n\nA primeira delas sustenta que a função social do contrato não é dotada de eficácia jurídica autônoma, sendo uma espécie de orientação de política legislativa constitucional, que revela sua importância e eficácia não em si mesma max em diversos institutos que, como expressão da função social, autorizam ou justificam soluções normativas específicas, tais como a resolução por Excessiva onerosidade (CC, art. 157), a conversão do negócio jurídico (CC, art. 170), a simulação como causa de nulidade (CC, art. 167), e assim por diante. Nas palavras de Humberto Theodoro Júnior: \"A lei prevê a função social do contrato mas não a disciplina sistemática ou especificamente. Cabe à doutrina e à jurisprudência pesquisar sua presença difusa dentro do ordenamento jurídico e, sobretudo, dentro dos princípios informativos da ordem econômica e social traçada pela Constituição\". Como se vê, tal posição acaba por esvaziar a importância da função social, vez que esta se expressaria por meio de institutos já positivos, presentes de forma difusa no ordenamento, prescindindo, por isso mesmo, de eficácia jurídica autônoma. Assim, acabaria se interpretando a Constituição à luz do Código Civil, vale dizer, o princípio constitucional da função social à luz da disciplina dos diversos institutos codificados, reduzindo-a a pouco mais do que nada, já que os demais institutos dispensariam a sua existência.\n\nPor outro lado, a segunda corrente de pensamento afirma que a função social do contrato expressa o valor social das relações contratuais, ressaltando a importância dessas relações na ordem jurídica. Tal concepção, nesta esteira, concede a função social do contrato como forma de reforçar a proteção do contratante mesmo em face de terceiros, alcançando-a o fundamentod e tutela na lesão contratual provocada por terceiro cômplie. Dito por outras palavras, a função social do contrato implicaria aos terceiros o dever de colaborar com os contratantes, de modo a respeitar a situação jurídica creditoriamente constituída da qual têm conhecimento. Assim, o princípio da relatividade dos contratos seria tido e interpretado à luz do princípio da função social dos contratos: \"A partir de agora, o princípio da relatividade será enfocado, sempre à luz da função social do contrato, nada mais a propósito da extensão da responsabilidade em favor de um terceiro e, sim, a proposito da responsabilidade do terceiro que contribui para o descumprimento de uma obrigação originária de um contrato do qual não seja parte\". Contudo, essa posição acaba por reduzir a função social a um instrumento a mais para a garantia da posição contratual, sem se dar conta que a função social permite impor deveres aos contratantes e não, ao contrário, servir para ampliar os instrumentos de proteção contratual. Em outras palavras, deve existir a noção em sua utilização instrumentalizada a interesses patrimoniais e individuais do contratante, por medida que estes possam parecer. A função social, em última análise, importa na \"imposição aos contratantes de deveres extracontratuais, socialmente relevantes e tutelados constitucionalmente. Não deve significar, todavia, uma ampliação da proteção dos próprios contratantes, o que amesquinharía a função social do contrato, tornando-a servil a interesses individuais e patrimoniais que, posto legítimos, já se encontraram suficientemente tutelados pelo contrato\". Deste modo, verifica-se que a questão da responsabilidade do terceiro cômplie não pode encontrar fundamento no princípio da função social, vez que os interesses em questão restringem-se à esfera privada e patrimonial dos contratantes, não já aos interesses extracontratuais socialmente relevantes. A rigor, a função social do contrato deve ser entendida como princípio que, informado pelos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1°, III), do valor social da livre iniciativa (art. 1°, IV) - fundamentos da República - e da igualdade substancial (art. 3°, III) e da solidariedade social (art. 3°, I) - objetivos da República - impõe aos partes o dever de perseguir, ao lado de seus interesses individuais, a interesses extracontratuais socialmente relevantes, dignos de tutela jurídica, que se relacionam com o contrato eu não por ele atingido. Com efeito, a função social associa-se ao fenômeno conhecido como funcionalização das estruturas jurídicas: processo que atinge todos os fatos jurídicos. Como leciona o Professor Pietro Perlingieri, as situações jurídicas subjetivas apresentam dois aspectos distintos - o estrutural e o funcional. O primeiro identifica a estruturação do poderes conferida ao titular da situação jurídica subjetiva, enquanto o segundo explicita a finalidade prático-social a que se destina. O aspecto funcional condicionado, o estrutural, determina a disciplina jurídico-oportunitária que envolve as situações jurídicas subjetivas. Como ensina Pietro Perlingieri, \"as situações subjetivas podem ser consideradas ainda sob estes aspectos: a competência e a validade normativa ou regulamentar. O primeiro é particularmente pertinente para a individuação da relação, para a qualificação da situação, isto é, para a determinação da sua função no âmbito das relações sócio-jurídicas. No ordenamento, o interesse é tutelado enquanto atenda não somente ao interesse do titular, mas também aquele da coletividade.\" Deste modo, de acordo com a função que a situação jurídica desempenha, serão definidos os poderes atribuídos ao titular do direito subjetivo e das situações jurídicas subjetivas. Os legítimos interesses individuais dos titulares da atividade econômica só merecería tutela na medida em que interesses socialmente relevantes, posto que alheios à esfera individual, venham a ser igualmente tutelados. A proteção dos interesses privados. justifica-se não apenas como expressão da liberdade individual, mas em virtude da função que desempenha para a promoção de posições jurídicas externas, integrantes da ordem pública contratual. Vincula-se, assim, a proteção dos interesses privados ao atendimento de interesses sociais, a serem promovidos no âmbito da atividade econômica (socialização) dos direitos subjetivos. Nesta esteira, o princípio da função social dos contratos enseja a mitigação da relatividade dos contratos, ou a relativização da relatividade, por meio da imposição de deveres aos contratantes, não devendo ser entendido como mera ferramenta para ampliação das garantias contratuais na hipótese de lesão contratual provocada por terceiro cúmplice – o que seria um contra-senso. Tal visão costuma gerar reações de duas espécies. A primeira é a que associa esta perspectiva funcional a ideologias autoritárias – como o fascismo e o comunismo – que vinculavam, no passado, a iniciativa privada a interesses estatais ou institucionais supranidividuais. Entretanto, a noção contemporânea de função não menciona relação, nem de longe, com qualquer aceitação desse jatoz. Não instrumentaliza os interesses individuais a qualquer entidade supranidividual, mas a plena realização da pessoa humana e de suas realizações existenciais. A segunda reação à funcionalização das situações jurídicas subjetivas pretende preservar a autonomia privada como garantia pré-legislativa, apenas reconhecida pelo constituinte; como tradução das liberdades individuais. Assim sendo, os limites à liberdade de contratar jamais poderiam ser essenciais ou internos ao negócio, mas, ao contrário, seriam sempre externos, contrapondo a liberdade aos interesses de ordem pública. Nesta ética individualista, uma vez respeitados os limites externos pontuais fixados pelo Estado-legislador, a atividade contratual poderia desenvolver-se livre de qualquer restrição ou condicionamento. Ou seja, uma vez considerado válido o objeto – o jurídico – porque colidente com as normas imperativas de intervenção – os contratantes disporiam de uma espécie de salvo-conduto, que lhes daria a prerrogativa de exercer a liberdade contratual em termos qualitativamente absolutos, embora quantitativamente delimitados. Tais objetivos; contudo, referem-se a um conceito de função inteiramente ultrapassado. Nos dias de hoje, ao contrário, o recurso à função revela o mecanismo dinâmico de vinculação das estruturas do direito, em especial dos fatores jurídicos, dos centros de interesse privado e de todos as relações jurídicas, aos valores da sociedade consagrados pelo ordenamento, a partir de seu vértice hierárquico, o Texto Constitucional. É a função que permite que o controle social não se limite ao exame de estruturas ou tipos abstratamente considerados – segundo o qual, por exemplo, uma locação cujo objeto fosse ilícito seria sempre legítima – dando lugar ao exame do merecimento de tutela do tipo concreto – a verificar qual a função econômico-individual que desempenha aquela locação no caso concreto. Para isso, a função consiste em elemento interno e razão justificativa da autonomia privada. Não para subjugar a iniciativa privada a unidades ou elementos institucionais supra individuais – repita-se ainda uma vez – mas para instrumentalizar as estruturas jurídicas aos valores do ordenamento, permitindo controle dinâmico e concreto da atividade privada. Tal metodologia só será possível com a aplicação das normas constitucionais como núcleo normativo precedente, hierarquicamente superior e prevalente para a unificação do sistema, evitando-se que os princípios constitucionais, por possuírem menos densidade, percam sua força normativa na prática da atividade interpretativa, diante das regras, dotadas de maior densidade e detalhamento regulatório. Torna-se fundamental, por isso mesmo, a releitura dos conceitos civilísticos a partir dos preceitos constitucionais, pois \"as normas constitucionais aliforam-se parte integrante da dogmática do direito civil, remodelando e revitalizando seus institutos, em torno de sua força reunificadora do sistema.\" A função social, assim, definirá a estrutura dos poderes dos contratantes no caso concreto, e será relevante para se verificar a legitimidade de certas cláusulas contratuais que, embora ilícitas, atingam diretamente interesses externos à estrutura contratual - cláusulas de sigilo, de exclusividade e de não concorrência, dentre outras. Se assim é, nos termos do art. 421 do Código Civil, toda situação jurídica patrimonial, integrada a uma relação contratual, deve ser considerada organizadamente justificável e estruturada em razão de sua função social. Como ocorreu em relação à propriedade, opera-se a transformação qualitativa do contrato, que passa a constituir instrumento para a concretização das finalidades constitucionais. Em definitivo, a função social - elemento interno do contrato - impõe aos contratantes a obrigação de perseguir, ao lado de seus interesses privados, interesses extracontratuais socialmente relevantes, assim considerados pelo legislador constitucional, sob pena de não merecimento de tutela do exercício da liberdade de contratar. Busca-se, nesta direção, tutelar com o contrato não apenas os interesses dos contratantes mas, também, o interesse da coletividade. Como leciona o Professor Perlingieri, ao discorrer sobre o princípio da função social da propriedade, \"em um sistema inspirado na solidariedade política, econômica e social e no pleno desenvolvimento da pessoa, o conteúdo da função social assume um papel de tipo promocional, no sentido de que a disciplina das formas de propriedade e suas interpretações deveriam ser atuadas para garantir e promover os valores sobre os quais se funda o ordenamento.\" \n\nNo campo das relações de consumo, a função intrínseca é a distinção dos bens e sua utilização por seu destinatário final, o consumidor, que se encontra em posição de vulnerabilidade, a qual define a disciplina jurídica a ser aplicada, diferentemente da normativa aplicável às relações paritárias.\n\nA partir da análise funcional do contrato e dos direitos subjetivos, a grande dicotomia do direito privado deixa de ser baseada na estrutura desses mesmos direitos subjetivos — como ocorre na distinção entre direitos reais e obrigacionais — dando lugar à distinção funcional entre as relações patrimoniais e existenciais. Tais relações são dicotomias porque desempenham funções dispares, atraindo, por consequência, disciplinas diferenciadas.\n\nA adoção desta perspectiva funcional enseja, igualmente, a necessidade de revisão de diversos cânones do direito privado. Primeiramente, impõe-se a superação da\n\n12 \"No ordenamento moderno, o interesse é talhado se e engajado por conferir não apenas no interesse do titular, mas também aquele da coletividade\" (Urfy do Direito Civil: Introdução ao Direito Civil Constitucional, ed., p. 121). \n\n13 \"Piero Perlingieri, 'Princípios do Direito Civil: Introdução ao Direito Civil Constitucional', ed., p. 226. \n\n14 \"De um ponto de vista objetivo, a situação é um interesse que, eventualmente na exteriorização, assume seu único vital e característica. Interesse que pode ter um caráter patrimonial, ora de natureza pessoal e existencial, ora de um status civil\" (S. No ordenamento da privatização encontram espaço suas relações patrimoniais e de valores, aquele papel primário)\" (Piero Perlingieri, 'Princípios do Direito Civil: Introdução ao Direito Civil Constitucional', ed., p. 116).
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Com efeito, a função social, sob a ética individualista que caracterizou as codificações ocidentais, não se configurava em princípio jurídico, mas traduzia-se em postulado metajurídico, o qual correspondia, em matéria contratual, ao papel que o contrato deveria desempenhar no embate às trocas e à prática comercial como um todo. Provavelmente por tal circunstância histórica, arraigada intensamente à cultura jurídica dominante (associada ao excessivo apego à técnica regulamentar), a função social ainda se tema até hoje enigmática e polêmica. Note-se que nem mesmo o advento do Código de Defesa do Consumidor, que deu ensaio e acalorada debate acerca da boa-fé objetiva, suscitou discussões em profundidade sobre a função social. Tampouco a inserção, na Constituição Federal de 1988, do princípio da função social da propriedade teve o condão de despertar a atenção dos estudados. De fato, o instituto somente passou a ser objeto de maior reflexão, adquirindo a feição atual, com a sua introdução no art. 421 do Código Civil de 2012, em conhecida dicção: \"A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato\".\n\nDiante do preceito – é a parte as críticas à redação do dispositivo, do que resultou antem aquilo em projeto de lei revisora –, surgiram diversas correntes de pensamento acerca do conteúdo e alcance da função social do contrato, destacando-se três principais posições, no panorama da direito privada, que buscaram delimitar o alcance do instituto.\n\n2. 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Como se vê, tal posição acaba por esvaziar a importância da função social, vez que esta se expressaria por meio de institutos já positivos, presentes de forma difusa no ordenamento, prescindindo, por isso mesmo, de eficácia jurídica autônoma. Assim, acabaria se interpretando a Constituição à luz do Código Civil, vale dizer, o princípio constitucional da função social à luz da disciplina dos diversos institutos codificados, reduzindo-a a pouco mais do que nada, já que os demais institutos dispensariam a sua existência.\n\nPor outro lado, a segunda corrente de pensamento afirma que a função social do contrato expressa o valor social das relações contratuais, ressaltando a importância dessas relações na ordem jurídica. Tal concepção, nesta esteira, concede a função social do contrato como forma de reforçar a proteção do contratante mesmo em face de terceiros, alcançando-a o fundamentod e tutela na lesão contratual provocada por terceiro cômplie. Dito por outras palavras, a função social do contrato implicaria aos terceiros o dever de colaborar com os contratantes, de modo a respeitar a situação jurídica creditoriamente constituída da qual têm conhecimento. Assim, o princípio da relatividade dos contratos seria tido e interpretado à luz do princípio da função social dos contratos: \"A partir de agora, o princípio da relatividade será enfocado, sempre à luz da função social do contrato, nada mais a propósito da extensão da responsabilidade em favor de um terceiro e, sim, a proposito da responsabilidade do terceiro que contribui para o descumprimento de uma obrigação originária de um contrato do qual não seja parte\". Contudo, essa posição acaba por reduzir a função social a um instrumento a mais para a garantia da posição contratual, sem se dar conta que a função social permite impor deveres aos contratantes e não, ao contrário, servir para ampliar os instrumentos de proteção contratual. Em outras palavras, deve existir a noção em sua utilização instrumentalizada a interesses patrimoniais e individuais do contratante, por medida que estes possam parecer. A função social, em última análise, importa na \"imposição aos contratantes de deveres extracontratuais, socialmente relevantes e tutelados constitucionalmente. Não deve significar, todavia, uma ampliação da proteção dos próprios contratantes, o que amesquinharía a função social do contrato, tornando-a servil a interesses individuais e patrimoniais que, posto legítimos, já se encontraram suficientemente tutelados pelo contrato\". Deste modo, verifica-se que a questão da responsabilidade do terceiro cômplie não pode encontrar fundamento no princípio da função social, vez que os interesses em questão restringem-se à esfera privada e patrimonial dos contratantes, não já aos interesses extracontratuais socialmente relevantes. 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Os legítimos interesses individuais dos titulares da atividade econômica só merecería tutela na medida em que interesses socialmente relevantes, posto que alheios à esfera individual, venham a ser igualmente tutelados. A proteção dos interesses privados. justifica-se não apenas como expressão da liberdade individual, mas em virtude da função que desempenha para a promoção de posições jurídicas externas, integrantes da ordem pública contratual. Vincula-se, assim, a proteção dos interesses privados ao atendimento de interesses sociais, a serem promovidos no âmbito da atividade econômica (socialização) dos direitos subjetivos. 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No ordenamento da privatização encontram espaço suas relações patrimoniais e de valores, aquele papel primário)\" (Piero Perlingieri, 'Princípios do Direito Civil: Introdução ao Direito Civil Constitucional', ed., p. 116).