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Psicologia ·
Psicanálise
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JD Nasio Édipo O complexo do qual nenhuma criança escapa O Édipo de que vou falar é uma lenda que explica a origem de nossa identidade sexual de homem e mulher e além disso a origem de nossos sofrimentos neuróticos Essa lenda envolve todas as crianças ZAHAR Édipo O complexo do qual nenhuma criança escapa JD Nasio tradução André Telles Título original LOedipe Le concept le plus crucial de la psychanalyse Tradução autorizada da primeira edição francesa publicada em 2005 por Payot Rivages de Paris França Copyright 2005 Éditions Payot Rivoges Copyright da edição em língua portuguesa 2007 Jorge Zahar Editor Ltda rua México 31 sobreloja 20031144 Rio de Janeiro RJ tel 21 21080808 fax 21 21080800 editorazaharcombr wwwzaharcombr Todos os direitos reservados A reprodução nãoautorizada desta publicação no todo ou em parte constitui violação de direitos autorais Lei 961098 Projeto gráfico e composição Victoria Rabello Capa Sérgio Campante CIPBrasil Catalogaçãonafonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros RJ Nasio JuanDavid N211e Édipo o complexo do qual nenhuma criança escapa JD Nasio tradução André Telles Rio de Janeiro Zahar 2007 Tradução de LOedipe Le concept le plus crucial de la psychanalyse Inclui bibliografia ISBN 9788571109728 1 Édipo Complexo de 2 Psicanálise I Título CDD 15424 064626 CDU 15996421 Sumário Abertura 7 1 O Édipo do menino 19 2 O Édipo da menina 45 3 Perguntas e respostas sobre o Édipo 65 4 O Édipo é a causa das neuroses ordinárias e mórbidas do homem e da mulher 91 5 Arquipélago do Édipo 107 6 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo precedidos de nossos comentários 129 Seleta bibliográfica sobre o Édipo 147 Índice geral 155 Nenhuma criança escapa ao Édipo O Édipo de que vou falar é uma lenda que explica a origem de nossa identidade sexual de homem e mulher e além disso a origem de nossos sofrimentos neuróticos Essa lenda envolve todas as crianças vivam em uma família clássica monoparental recomposta ou ainda cresçam no seio de um casal homossexual ou até mesmo sejam crian ças abandonadas órfãs e adotadas pela sociedade Nenhuma criança escapa ao Édipo Por quê Porque nenhuma criança de quatro anos menina ou menino escapa à torrente das pulsões eróticas que lhe afluem e porque nenhum adulto de seu círculo imediato pode evitar ser o alvo de suas pulsões ou tentar bloqueálas Abertura 1 O Édipo do menino 9 As relações do filho com sua mãe são para ele uma fonte contínua de excitação e satisfação sexual a qual se intensi fica quanto mais ela lhe der provas de sentimentos que derivem de sua própria vida sexual beijálo ninálo consi derálo substituto de um objeto sexual completo Seria pro vável que uma mãe ficasse bastante surpresa se lhe dissessem que assim ela desperta com suas ternuras a pulsão sexual do filho Ela acha que seus gestos demonstram um amor assexual e puro em que a sexualidade não desempenha pa pel algum uma vez que ela evita excitar os órgãos sexuais do filho mais que o exigido pelos cuidados corporais Mas a pulsão sexual como sabemos não é despertada apenas pela excitação da zona genital a ternura também pode ser muito excitante SIGMUND FREUD O menino está apaixonado pela mãe e quer afastar o pai a menina por sua vez apaixonada pelo pai quer afastar a mãe Eis em algumas palavras o mais batido clichê da psicanálise uma ilustração tradicional ingênua e enfática do célebre dra ma amoroso o complexo de Édipo E no entanto nada mais enganador que essa visão estática do complexo freudiano Por quê Porque o complexo de Édipo não é uma história de amor e ódio entre pais e filhos é uma história de sexo isto é 10 Sobre o Édipo uma história de corpos que sentem prazer em se acariciar se beijar e se morder em se exibir e se olhar em suma corpos que sentem tanto prazer em se tocar quanto em se fazer mal Não Édipo nada tem a ver com sentimento e ternura mas com corpo desejo fantasias e prazer Provavelmente pais e filhos amamse ternamente e podem se odiar mas no cora ção do amor e do ódio familiar medra o desejo sexual O Édipo é um imenso despropósito é um desejo sexual próprio de um adulto vivido na cabecinha e no corpinho de uma criança de quatro anos e cujo objeto são os pais A criança edipiana é uma criança alegre que em toda inocência se xualiza os pais introduzindoos em suas fantasias como ob jetos de desejo e imitando sem pudor nem senso moral seus gestos sexuais de adultos É a primeira vez na vida que a criança conhece um movimento erótico de todo seu corpo em direção ao corpo do outro Não se trata mais de uma boca tendendo para um seio mas de um ser integral que quer apertar o corpo inteiro da mãe Ora se é verdade que a criança edipiana fica feliz ao desejar e obter prazer com isso é mais verdade ainda que desejo e prazer a assustam pois ela os teme como um perigo Que perigo O perigo de ver seu corpo desgovernarse sob o ardor de seus impulsos o perigo de ver sua cabeça explodir em virtude de não conseguir con trolar mentalmente seu desejo e finalmente o perigo de ser punida pela Lei do interdito do incesto por ter tomado os pais como parceiros sexuais Excitada pelo desejo feliz com suas fantasias mas igualmente angustiada a criança sentese perdida e completamente desamparada A crise edipiana é um insuportável conflito entre o prazer erótico e o medo 11 Abertura entre a exaltação de desejar e o medo de se consumir nas chamas do desejo Assim a criança reage sem transigir Dividida entre a ale gria e a angústia não tem outra saída senão esquecer tudo e apagar tudo Sim a criança edipiana seja menino ou menina recalca vigorosamente fantasias e angústia pára de tomar seus parentes por parceiros sexuais e tornase com isso disponível para conquistar novos e legítimos objetos de desejo É assim que progressivamente descobre o pudor desenvolve o senti mento de culpa o senso moral e estabelece sua identidade sexual de homem ou de mulher Observemos que depois de um período de relativa acalmia pulsional digo efetivamente relativa um segundo abalo edipiano irá produzirse na pu berdade Assim como já fizera aos quatro anos o jovem ado lescente deverá ajustar o ardor de seus impulsos ao seu novo corpo em plena metamorfose da puberdade e às novas solici tações sociais Mas tal ajuste nunca é fácil para um jovem e eis por que encontramos tantas dificuldades com o adolescente em crise O jovem não sabe mais refrear seus impulsos como o fizera no fim de seu Édipo ao contrário atiça seu desejo tor nandose inibido e tímido Entretanto o vulcão edipiano não se extingue na adolescência Muito mais tarde na idade adulta por ocasião de um conflito afetivo novas erupções poderão se dar sob a forma de sofrimentos neuróticos como a fobia a histeria e a obsessão Enfim não esqueçamos que outra reativação do Édipo pode se desenvolver experimentalmente dessa vez na cena analítica central da neurose de transferência Em outras palavras a transferência entre paciente e psicanalis ta é a repetição em ato do complexo de Édipo 12 Sobre o Édipo Que é então o Édipo O Édipo é a experiência vivida por uma criança de cerca de quatro anos que absorvida por um desejo sexual incontrolável tem de aprender a limitar seu im pulso e ajustálo aos limites de seu corpo imaturo aos limites de sua consciência nascente aos limites de seu medo e final mente aos limites de uma Lei tácita que lhe ordena que pare de tomar seus pais por objetos sexuais Eis então o essencial da crise edipiana aprender a canalizar um desejo transbordante No Édipo é a primeira vez na vida que dizemos ao nosso insolente desejo Calma Fique mais tranqüilo Aprenda a vi ver em sociedade Assim concluímos que o Édipo é a dolo rosa e iniciática passagem de um desejo selvagem para um desejo socializado e a aceitação igualmente dolorosa de que nossos desejos jamais serão capazes de se satisfazer totalmente Porém o Édipo não é apenas uma crise sexual de cresci mento é também a fantasia que essa crise molda no incons ciente infantil Com efeito a experiência vivida do terremoto edipiano fica registrada no inconsciente da criança e perdura até o fim da vida como uma fantasia que definirá a identidade sexual do sujeito determinará diversos traços de sua persona lidade e fixará sua aptidão a gerir os conflitos afetivos No caso de a criança ter experimentado por ocasião da crise edi piana um prazer precoce demais intenso demais e inespera do demais isto é no caso de a experiência de um prazer excessivo ser traumática a fantasia daí resultante seria a causa certa de uma futura neurose O Édipo no entanto é mais que uma crise sexual e uma fantasia que ela modela no inconsciente é também um con ceito o mais crucial dos conceitos psicanalíticos Diria que é 13 Abertura a própria psicanálise uma vez que o conjunto dos sentimen tos que a criança experimenta durante essa experiência se xual que chamamos de complexo de Édipo é para nós psicanalistas o modelo que utilizamos para pensar o adulto que somos Assim como a criança edipiana percebemos a escalada do desejo pelo outro forjamos fantasias sentimos prazer com nosso corpo ou o corpo do outro temos medo de ser superados por nossos impulsos e aprendemos final mente a refrear nosso desejo e nosso prazer para viver em sociedade Que é a psicanálise senão uma prática sustentada por uma teoria que concebe o homem de hoje a partir da experiência edipiana vivida por todas as crianças quando têm de aprender a refrear seu desejo e moderar seu prazer Enfim o Édipo é também um mito já que essa crise real e concreta vivida por uma criança de quatro anos é uma explosiva alegoria da luta entre as forças impetuosas do dese jo sexual e as forças da civilização que se lhe opõem O melhor desfecho para essa luta é um compromisso chama do pudor e intimidade Qual é o status do Édipo Uma realidade uma fantasia um conceito ou um mito Qual é então o verdadeiro status do Édipo Consistiria ele em uma crise sexual de crescimento observável no compor tamento das crianças Uma fantasia inscrita no inconsciente Ou a mais importante construção teórica chavemestra do edifício analítico Ou ainda simplesmente um mito o mito 14 Sobre o Édipo moderno que nos revela que o interdito universal do incesto é uma resposta ao louco desejo humano de incesto Logo seria o Édipo uma realidade uma fantasia um conceito ou simplesmente um mito Pois bem responderei que o Édipo é tudo isso ao mesmo tempo realidade fantasia conceito e mito Contudo para o psicanalista que somos o Édipo permanece antes de tudo uma fantasia devo dizer até uma dupla fantasia É a fantasia infantil agindo no inconsciente do paciente duplicada pela mesma fantasia reconstruída dessa vez pelo profissional Assim só consigo compreender o sofrimento que escuto em meus pacientes adultos ao suporlhes desejos fic ções e angústias vividas na idade edipiana E penso que esses desejos ficções e angústias infantis ainda estão presentes nos dias de hoje travestidos nos múltiplos tormentos da neurose de que o paciente se queixa Quando por exemplo escuto Sarah uma anoréxica grave de 26 anos vejo mentalmente a criancinha que ela era e a imagino dividida entre o desejo de ser um menino com um corpo reto como o de seu irmão filho predileto do pai e o desejo de ser a mulher amada pelo pai Ora é ao me dirigir a essa menina de quatro anos presen te em Sarah que posso ter uma chance de influenciar o curso de sua anorexia Quando durante uma sessão sugiro uma in terpretação é Sarah minha paciente que a escuta mas é a pequena Sarah que a recebe Qual pequena Sarah A menini nha edipiana que eu fantasio em minha escuta que suponho atuante no inconsciente da Sarah adulta Mas o que prova que essa fantasia forjada na escuta com ajuda do material clínico e da teoria do Édipo seja de fato a que atua no in consciente de minha paciente Quem me garante que essa 15 Abertura fantasia em que a pequena Sarah fica dividida entre o desejo de ser menino e o de ser mulher não é uma construção erra da Em outros termos qual a validade dessa fantasia e do conceito de Édipo que lhe subjaz Pois bem esse conceito e essa fantasia são válidos fundamentalmente por duas razões Em primeiro lugar porque sempre que escuto um paciente com o a priori teórico do Édipo e da fantasia daí resultante minhas intervenções verificamse pertinentes isto é são vali dadas a posteriori pelo próprio paciente Em segundo lugar porque tenho a confirmação pela minha experiência de que a escuta enriquecida pelo conceito de Édipo é uma escuta extremamente flexível maleável capaz de harmonizar ao mesmo tempo o sofrimento atual do paciente a fantasia da criança que ele foi e o rigor de uma teoria analítica que não cesso de modelar e aperfeiçoar Se agora eu tivesse de esquematizar a crise edipiana em duas grandes etapas diria que o Édipo começa com a sexualização dos pais e termina com a dessexualização dos pais dessexuali zação que desembocará finalmente na identidade sexual adulta Portanto vou expor em detalhes passo a passo a lógica da crise edipiana no menino e na menina como uma lenda metapsicológica e romanceada que forjei à luz da teoria psi canalítica e de minha experiência clínica Preciso antes po rém indicar os principais elementos que intervêm nessa crise os desejos incestuosos as fantasias e a identificação Dos desejos 16 Sobre o Édipo incestuosos falaremos imediatamente em seguida examina remos as três fantasias mais importantes do Édipo fantasias de onipotência fálica a criança julgase onipotente fantasias de prazer que satisfazem imaginariamente o desejo incestuo so a criança é alegre fantasias de angústia no caso do menino ele é medroso e de sofrimento no caso da menina ela fica magoada e finalmente a última malha da lógica edipiana o espantoso fenômeno de identificação Desejos fantasias e iden tificação são portanto os três operadores que pontuam respec tivamente o nascimento o apogeu e o declínio do complexo de Édipo FIGURA 1 Que é então o Édipo O Édipo 1 É uma chama de sexualidade vivida por uma criança de quatro anos no cerne da relação com seus pais 2 É uma fantasia sexual forjada inocentemente pelo me nino ou pela menina para aplacar o ardor de seu desejo 3 É também a matriz de nossa identidade sexual de ho mem e de mulher pois é durante a crise edipiana que a criança sente pela primeira vez um desejo masculino ou feminino em relação ao genitor do sexo oposto 4 É ainda uma neurose infantil modelo de todas as nossas neuroses adultas 17 Abertura 5 É uma fábula simbólica que põe em cena uma criança encarnando a força do desejo e seus pais encarnando tan to o objeto desse desejo quanto o interdito que o refreia 6 É a chavemestra da psicanálise É o conceito soberano que gera e organiza todos os outros conceitos psicanalíti cos e justifica a prática da psicanálise 7 É enfim o drama infantil e o inconsciente que todo ana lisando representa na cena do tratamento ao tomar seu psicanalista como parceiro FIGURA 1 Visão geral do Édipo SEXUALIZAÇÃO DOS PAIS DESEJOS INCESTUOSOS FANTASIAS de Prazer Angústia menino ou Sofrimento menina Falo RENÚNCIA aos pais enquanto objetos sexuais e INCORPORAÇÃO dos pais como objetos de identificação SEXUALIZAÇÃO DOS PAIS DESSexualização DOS PAIS FRUTOS DO ÉDIPO IDENTIDADE SEXUAL SUPEREU NA PUBERDADE Pudor excessivo intransigência revolta NA IDADE ADULTA Neurose comum e mórbida NO TRATAMENTO ANALÍTICO Neurose de transferência REATIVAÇÃO DO ÉDIPO S E N S A Ç Õ E S No text extracted No começo era o corpo de sensações erógenas Os três desejos incestuosos As três fantasias de prazer As três fantasias de angústia de castração Resolução do Édipo do menino a dessexualização dos pais Comparado à mulher o homem é visceralmente um covarde Os frutos do Édipo o supereu e a identidade sexual Resumo da lógica do Édipo do menino 21 No começo era o corpo de sensações erógenas Por volta de três quatro anos todos os meninos focalizam seu prazer sobre o pênis vivido ao mesmo tempo como órgão objeto imaginário e emblema simbólico Nessa idade o ór gão peniano tornase a parte do corpo mais rica em sensa ções e impõese como a zona erógena dominante uma vez que o prazer por ele proporcionado à criança tornase a refe rência principal de todos os outros prazeres corporais Antes dessa idade os locais de prazer eram a boca e depois o ânus e a atividade muscular não esqueçamos que o prazer de an dar correr e agir prevalece em todos os bebês entre dois e três anos ao passo que com quatro todo prazer corporal seja qual for o lugar excitado repercute no nível de seu pequeno pênis sob a forma de um arrepio de prazer Em outras pala vras se um menino de quatro anos sente prazer em olhar o decote da mãe ou gosta de se mostrar nu em público ou ainda excitado pela brincadeira morde a coxa da irmãzinha A FIGURA 2 ver p43 acompanha a leitura deste Capítulo 1 22 Sobre o Édipo diremos que todos esse prazeres sentidos pela excitação dos olhos dos dentes ou do corpo inteiro são prazeres que reper cutem no nível de seu pequeno sexo e já lhe fazem viver uma excitação genital Porém aos quatro anos o pênis não é apenas o órgão mais rico em sensações É também o objeto mais amado e o que reclama todas as atenções Apêndice visível facilmente mani pulável erógeno e eréctil o pênis atrai a mão assim como a teta atrai os lábios e a língua o pênis convoca os olhares atiça a curiosidade dos meninos e das meninas e lhes inspira fábu las ficções e bizarras teorias infantis A pregnância imaginária do pênis é tamanha que o menino faz dele seu objeto narcísico mais precioso a coisa pela qual tem mais apego e orgulho de possuir Assim tal culto do pênis eleva o pequeno órgão ao nível de símbolo do poder absoluto e da força viril Mas aten ção É também e pelas mesmas razões vivido como um ór gão frágil excessivamente exposto aos perigos e por conseguinte símbolo não apenas do poder mas também da vulnerabilidade e da fraqueza Pois bem quando esse apêndi ce eminentemente excitável nitidamente visível eréctil ma nipulável e tão altamente valorizado tornase aos olhos de todos meninos e meninas o representante do desejo nós o chamamos de Falo O Falo não é o pênis enquanto órgão O Falo é um pênis fantasiado idealizado símbolo da onipo tência e de seu avesso a vulnerabilidade Veremos adiante quando abordarmos em detalhe o Édipo feminino que a su premacia imaginária e simbólica do pênis é tão forte nessa idade que a menininha também acreditará que possui um Falo É precisamente esse pênis fantasiado dito Falo que dá 23 O Édipo do menino nome à fase do desenvolvimento libidinal durante a qual acon tece a crise edipiana Com efeito Freud chama essa fase em que a sexualidade infantil permanece polarizada no Falo de fase fálica cf p779 Durante essa fase as crianças meninos ou meninas acham que todas as criaturas do mundo são dotadas de um Falo isto é que todas as criaturas são tão fortes quanto elas Quando por exemplo um menino considera que todos têm um Falo ele pensa Todos detêm um órgão peniano como o meu Todos experimentam as mesmas sensações que eu e todos devem se sentir tão fortes quanto eu Observo que essa fic ção infantil essa ilusão de acreditar que o pênis é um atributo universal é forjada tanto pelo menino quanto pela menina Ora eis que a idolatria da criança pelo Falo vai ser acompa nhada pela angústia de perdêlo no menino e pelo sofrimen to de havêlo perdido na menina Com efeito nessa idade a criança já fez a experiência de perder os objetos vitais bebê perdeu o seio materno que considerava uma parte de si pró prio em seguida fez a experiência de renunciar à mamadeira e se separar de seu primeiro paninho mais tarde a expe riência de defecar e constatar que seu cocô separase dele fez também a experiência de perder o status de filhorei com o nascimento de um irmãozinho ou irmãzinha e finalmente talvez já tenha chorado a morte de um parente Resumindo na idade edipiana uma criança é perfeitamente capaz de se representar a perda de um objeto que lhe era caro e temer que ela se repita Entretanto para ser mais preciso eu deveria acrescentar que desde sua vinda ao mundo ou melhor desde as primeiras palpitações de seu corpo embrionário o pequeno 24 Sobre o Édipo humano já é plenamente capaz de sentir a falta de um objeto vital e eu diria até a falta pura e simplesmente Sabemos o quanto um bebê por menor que seja sente sabe e chora de dor quando lhe falta algo essencial Eis por que eu diria que a aptidão da criança edipiana para perceber a falta é no fundo uma intuição inerente a toda a espécie humana Mas retomemos o fio Peçolhes agora que guardem a observação referente à ficção de um Falo universal e a refe rente à capacidade da jovem criança de se representar intuiti vamente uma falta pois essas duas proposições são as premissas indispensáveis para compreendermos como se formam a fan tasia de angústia de castração no menino e a fantasia de dor de privação na menina isto é para compreendermos como o menino sai do Édipo e como a menina entra nele Logo vol taremos a isso Os três desejos incestuosos Abordemos agora a dinâmica dos desejos incestuosos Excita do sexualmente e orgulhoso de seu poder o menino de quatro anos vê eclodir em si uma nova força um impulso desconhe cido o desejo de ir em direção ao Outro em direção a seus pais ou mais exatamente em direção ao corpo de seus pais para nele encontrar prazer para nele descobrir o conjunto dos diferentes prazeres erógenos conhecidos antes dessa ida de Eis a novidade do Édipo Até esse estágio a criança não conhecia tal floração dos sentidos e nunca tinha sentido dese jo tão impetuoso de se apossar do corpo inteiro do Outro e 25 O Édipo do menino nele encontrar prazer Que prazer é esse O desejo é o im pulso que nos leva a procurar prazer no enlace com nosso parceiro Desejase sempre uma pessoa em sua carne Desejar é atirarse para fora de si em busca da carne do outro é que rer atingir através da carne sobre a carne o gozo mais re quintado Eis o que é o desejo É nesse aspecto que todo desejo é um desejo sexual Sexual quer dizer mais que genital Sexual quer dizer Deixame olhar teu corpo nu Acariciá lo sentilo beijálo devorálo e até mesmo destruílo Que corpos Os corpos daqueles a quem amo me atraem e estão ao alcance da minha mão E que são eles para uma criança senão seu pai e sua mãe Como um bichinho travesso a criança edipiana põe as garras do desejo nas costas de seus pais Em suma a criança edipiana é arrastada por um impulso que a leva e pressiona a procurar prazer na troca sensual com os corpos daqueles a quem ama de quem depende e que também são criaturas desejantes criaturas que despertam e exercitam seu desejo Ora esse desejo imperioso esse impul so irresistível cuja fonte são as excitações penianas cujo alvo é o prazer e cujo objeto é o corpo de um dos genitores ou de qualquer outro adulto tutelar esse impulso é uma expressão do mítico desejo de incesto Sim o Édipo é a tentativa infan til de realizar um desejo incestuoso irrealizável Mas que é o desejo incestuoso É um desejo virtual nunca saciado cujo objeto é um dos pais e cujo objetivo seria alcançar não o prazer físico mas o gozo Que gozo O gozo prodigioso que pro porcionaria uma relação sexual plena em que os dois parcei ros criança e adulto genitor diluiriam em uma total e extática fusão Naturalmente esse desejo é um sonho irrealizável uma 26 Sobre o Édipo maravilhosa história em quadrinhos o mito grego ou a mais louca e imemorial das fábulas Esclareço imediatamente que as verdadeiras passagens ao ato incestuosas paifilha ou pai filho e mais raramente mãefilho são estupros relativamente raros e quando acontecem nunca proporcionam gozo al gum nem prodigioso nem banal Nada disso Ao contrário a clínica dos casos de incesto revela a extrema pobreza da satis fação obtida pelo adulto perverso e o forte trauma sofrido pela criança Não O desejo incestuoso de que lhes falo nada tem a ver com a desgraça do abuso sexual cometido por um pai sobre seu filho Mas então vocês me diriam por que a psicanálise precisa sacralizar o desejo incestuoso e postular que todos os desejos por ínfimos que sejam referemse a um desejo igualmente virtual Por que o desejo incestuoso é o desejo padrão Pois bem o único valor desse desejo insen sato de ir para a cama com a mãe e matar o pai é ser a alegoria do louco desejo de retorno ao estado original de beatitude intra uterina Para a psicanálise cada um de nossos desejos cotidia nos o prazer sensual de contemplar um quadro ou acariciar o corpo do amado por exemplo cada um desses desejos tenderia de um ponto de vista teórico insisto para a felicida de perfeita de que gozariam dois seres conjugados em Um O desejo incestuoso portanto não é senão uma figura mítica do absoluto o nome assumido pelo desejo louco de um herói de penetrar sua mãe para encontrar seu ponto de origem nos confins do corpo materno Para dizêlo com uma imagem o desejo incestuoso é o desejo de fusão com nossa terra nutriz Uma vez admitido o caráter mítico do desejo incestuoso distingo três variantes dele no menino Ressalvemos que os 27 O Édipo do menino desejos incestuosos não são exclusivamente eróticos mas an tes um condensado de tendências eróticas e agressivas Assim há três desejos fundamentais presentes em um menino e em todo ser humano em posição masculina seja qual for sua ida de o desejo de possuir sexualmente o corpo do Outro em parti cular o da mãe o desejo de ser possuído pelo corpo do Outro em particular o do pai e o desejo de suprimir o corpo do Outro em particular o do pai Desejo de possuir desejo de ser possuído e desejo de suprimir eis os três movimentos fundadores do dese jo masculino As três fantasias de prazer Ora sem atingir esses três objetivos incestuosos e impossí veis obter o gozo absoluto de possuir o corpo do Outro ser possuído pelo Outro isto é ser sua coisa e fazêlo gozar e finalmente obter o gozo absoluto de suprimir o Outro o menino cria fantasias que lhe dão prazer ou angústia mas que de toda forma satisfazem imaginariamente seus loucos desejos Mas em que consiste uma fantasia Em uma cena em geral consciente destinada a satisfazer de maneira imaginária o desejo incestuoso irrealizável ou melhor a satisfazer qual quer desejo uma vez que todo desejo é uma expressão do desejo incestuoso Uma fantasia é uma cena imaginária que propicia consolo à criança tome esse consolo a forma de um prazer ou como veremos de uma angústia Assim a fantasia tem como função substituir uma ação ideal que teria propor 28 Sobre o Édipo cionado um gozo nãohumano por uma ação fantasiada que baixa a tensão do desejo e suscita prazer angústia ou ainda outros sentimentos às vezes penosos Com efeito a queda da tensão psíquica obtida com a fantasia nem sempre se traduz por distúrbios ou tormentos que por penosos que sejam per mitem evitar uma fissura irreparável do psiquismo Por mais espantoso que pareça a queda da tensão psíquica também pode se traduzir por um sofrimento consciente Uma crise de choro por exemplo pode exercer a função de uma descar ga salutar ou um sintoma fóbico imporse como um mal menor que protege de outro mal muito mais grave como uma psicose Observemos também que a cena fantasiada não é obriga toriamente consciente e que ela com freqüência se traduz na vida cotidiana da criança por um sentimento um comporta mento ou uma fala Um menininho por exemplo nunca co pulará com a mãe mas compensará essa impossibilidade com uma fantasia voyeurista em que a imagina nua Essa fantasia se traduzirá então pela vontade maliciosa de espiar e surpreen der a mãe em situações íntimas Vocês têm aqui a gradação de que falamos o desejo incestuoso de possuir a mãe o desejo derivado de ver o corpo nu da mãe a fantasia de imaginálo e enfim o gesto malicioso de olhar pelo buraco da fechadura gesto que põe em ato a fantasia Eu gostaria porém de interromper um instante a fim de dissipar qualquer confusão entre os termos sensações de sejos fantasias e comportamentos Sejamos claros Co mecemos pelo começo Em primeiro lugar as sensações sentidas despertam o desejo de ir em direção ao corpo do 29 O Édipo do menino adulto Em seguida esse desejo é satisfeito com fantasias que proporcionam prazer à criança Repito que essas fantasias de prazer raramente são visualizadas mentalmente pelo sujeito Somos nós psicanalistas que as deduzimos a partir da obser vação dos comportamentos infantis e sobretudo a partir da escuta de nossos analisandos adultos Nós escutamos um pa ciente criança ou adulto e reconstruímos as cenas fantasiadas que governam suas vidas Ora subindo um degrau na abstra ção diremos que essas cenas são forjadas inconscientemente pelo sujeito para satisfazer imaginariamente seu desejo de sejo voyeurista no nosso exemplo e além disso para satisfa zer seu mítico desejo de incesto Vamos resumir Fico sabendo que um garotinho espia sua mãe e deduzo disso que está inconscientemente animado por uma cena voyeurista em que sua mãe estaria nua Considero também que essa cena satisfaz o desejo incestuoso de possuir sua mãe e mais concretamen te o desejo de devorála com os olhos Em suma as sensações despertam o desejo o desejo suscita a fantasia e a fantasia se atualiza através de um sentimento um comportamento ou uma fala Por exem plo ao nos vermos diante de uma emoção dizemos que ela exprime uma fantasia e que a fantasia satisfaz um desejo sem pre vivificado pelo corpo de sensações Estabelecidas essas premissas vejamos agora como cada um dos três desejos incestuosos se satisfaz imaginariamente graças a uma fantasia de prazer particular A cada desejo in cestuoso corresponde uma fantasia de prazer específica Qual é então a fantasia específica do desejo incestuoso de possuir o Outro Na verdade essa fantasia adota vários roteiros em que a criança desempenha sempre um papel ativo e se sente orgu 30 Sobre o Édipo lhosa de impor sua presença ao Outro A fantasia de possessão manifestase por meio dos comportamentos típicos dessa idade como por exemplo exibirse de maneira escandalosa brincar de papai e mamãe brincar de médico bancar o palhaço dizer palavrões sem conhecer sua significação ou mesmo ma caquear posições sexuais Às vezes o gesto que predomina é o de tocar o corpo de um de seus pais irmãos ou irmãs ou beijálo febrilmente e às vezes mordêlo ou maltratálo Mas de todos os roteiros de possessão o que exprime mais fiel mente o desejo incestuoso de possuir o Outro é o desejo do menino de se apoderar da mãe e têla apenas para si Gostaria de dar um exemplo Penso aqui em um menini nho de três anos Martin É um garoto vivo malicioso que só que sua mãe uma de minhas analisandas levara um dia ao meu consultório não tendo conseguido ninguém para ficar com ele Enquanto a criança brincava na sala de espera contí gua ao meu consultório a mãe me contou em tom de aparte um episódio sobre o filho que considero uma bela ilustração de uma fantasia de prazer edipiana de possuir a mãe Saibam que a mãe de Martin é uma moça divorciada muito bonita e simpática que mora sozinha com o filho Ela então me conta Adivinhe doutor o que me aconteceu com esse traquinas do Martin Eu estava no banheiro em trajes sumários me maquiando deixo sempre a porta entreaberta e de repen te dei um grito Martin entrara silenciosamente na ponta dos pés e me mordera as nádegas antes de fugir correndo todo orgulhoso e feliz com o que tinha feito Peçolhes que ima ginem esse menininho insinuandose sorrateiramente no ba nheiro e descobrindo na altura dos olhos as nádegas atraentes 31 O Édipo do menino da mãe Seu olho se acende ele se aproxima e subitamente morde com vontade É isto o Édipo O Édipo é morder as nádegas da mãe O Édipo não é acariciar ternamente a ma mãe é desejála e mordêla Isso parece evidente agora que lhes digo mas essa evidência da natureza sexual do Édipo o Édipo é uma questão de sexo e não de amor nem sempre é admitida O Édipo é o desejo sexual de um menininho que não tem nem cabeça nem corpo para assumilo Depois dessa primeira fantasia edipiana de possuir a mãe chegamos à segunda fantasia de prazer a de ser possuído pelo Outro A fantasia mais típica do desejo de ser possuído é uma cena em que o menino sente prazer em seduzir um adulto para se tornar seu objeto Essa fantasia é uma fantasia de sedu ção sexual em que o menino sedutor imaginase seduzido pela mãe por um irmão mais velho ou até mesmo ainda que isso os surpreenda pelo próprio pai Com efeito um menino pode desempenhar o papel passivo eminentemente femini no de ser a coisa do pai e fazêlo gozar Mas devemos enten der que se a criança imaginase seduzida não apenas ela é vítima passiva de um pai perverso malvado ou tarado como também uma sedutora ativa que espera ser seduzida a criança seduz para ser seduzida Observemos que se essa fantasia edi piana de sedução do menino pelo pai imobilizase e invade mais tarde a vida do adulto que a criança se tornou ela medra como um agente nocivo causa freqüente de uma forma de histeria masculina muito difícil de tratar Freqüentemente o tratamento analítico dessa histeria fracassa e esbarra em uma crise conhecida como pedra de castração ou como a cha mava Adler protesto viril Uma vez que nos referimos à 32 Sobre o Édipo clínica assinalo que a escolha de lhes apresentar o Édipo cor responde acima de tudo ao meu desejo de esclarecer a prática de vocês com seus pacientes adultos Pois como vocês perce beram o interesse do Édipo não é apenas teórico é princi palmente clínico e a fantasia de sedução é uma ilustração patente disso Sempre que recebo homens neuróticos que me demandam uma análise penso em sua fantasia inconsciente de serem a coisa do pai e fazêlo gozar A última fantasia de prazer a relativa ao desejo de suprimir o Outro em particular o pai coloca o sujeito em uma atitude sexual ativa Digo sexual porque destruir o Outro provoca tanto prazer sexual quanto qualquer fantasia edipiana Um dos comportamentos infantis que melhor traduz a fantasia de matar o pai rival é aquele muito freqüente em que o meni ninho aproveitase da ausência do pai em viagem para brin car de chefe de família e por exemplo querer partilhar o grande leito conjugal com a mãe As três fantasias de angústia de castração As fantasias de prazer seja aquela em que o menino adota uma atitude sexual ativa como morder a mãe seja aquela em que adota uma atitude sexual passiva como seduzir para ser seduzido seja enfim aquela em que adota uma atitude sexual ativa de rejeição do pai todas essas fantasias são fantasias de prazer que embora façam a criança feliz também desenca deiam nela uma profunda angústia o menininho malicioso teme ser punido por seu pecado punido com a mutilação de 33 O Édipo do menino seu órgão viril símbolo de sua potência de seu orgulho e de seu prazer Essa fantasia em que seria punido com a muti lação de seu Falo chamase fantasia de angústia de castra ção Vamos entender A ameaça de ser punido com a castração e a angústia daí resultante são uma ameaça e uma angústia fantasiadas Decerto um menino pode cometer um erro e ter medo do castigo mas a fantasia de ser punido com a cas tração e a angústia daí resultante são inconscientes Falemos claramente a angústia de castração não é sentida pelo meni no ela é inconsciente Este é um ponto importante pois muitos de vocês gostariam de verificar se um menininho de quatro anos receia efetivamente que lhe mutilem o pênis Pois bem respondolhes prontamente salvo exceção vocês não terão confirmação desse receio Claro acontece muitas vezes de de terminada mãe ao ver o filho apalpar o sexo gritar com ele Pare de se bolinar Seu passarinho não vai voar e ninguém vai comêlo Mas é uma réplica que não suscita no menini nho nenhuma angústia de ser castrado Não A angústia de castração nunca é consciente Isso posto como considerar então as angústias que observamos diariamente nos meninos sob a forma de medos ou pesadelos Eu diria que essas angústias infantis são as formas clínicas assumidas pela angústia incons ciente de castração Em suma não interessa se o menino sofre ou não uma ameaça real e se angustia o que interessa saber é que de toda forma ele é habitado pela angústia inconsciente de castração enquanto desejar e obtiver prazer ainda que mínimo ficará angustiado A angústia é o avesso do prazer Angústia e prazer são tão indissociáveis que os imagino como gêmeos paridos pelo desejo Gostaria de ser bem claro nesse 34 Sobre o Édipo ponto Da mesma forma que a psicanálise postula a premissa do desejo incestuoso ela afirma que todos os homens são essencialmente habitados por uma angústia de castração in trínseca ao desejo masculino Voltaremos a isso quando falar mos da neurose masculina mas desde já afirmo que a angústia de castração é a medula espinhal do psiquismo do homem Quanto ao psiquismo da mulher veremos mais tarde de que estofo emocional é feito Dizíamos então que a angústia masculina é o avesso do prazer de fantasiar Com efeito não existe prazer edipiano sem a contraparte a angústia de desejar e de ser punido por isso Esse par de sentimentos antagônicos prazer e medo de ser punido está na base de toda neurose Podemos desde já dizer que o próprio Édipo é uma neurose infantil ou melhor a primeira neurose de crescimento do ser humano Por quê Porque a neurose é acima de tudo a ação simultânea de sen timentos opostos e porque a criança edipiana sofre como um neurótico com o doloroso conflito entre saborear o prazer de fantasiar e ter medo de ser punido caso persevere Voltarei muitas vezes a essa idéia cardinal segundo a qual o Édipo é em si uma neurose Embora já tenhamos afirmado o status inconsciente da angústia de castração sem apresentar situações concretas para justificálo nem por isso certos incidentes da vida da criança deixam de confirmar se necessário a existência dessa angús tia Eis o acontecimento incontornável a que se referem to dos os teóricos do Édipo Um dia o menino vê o corpo nu de uma menininha ou de sua própria mãe e constata surpre so que elas não têm pênisFalo Se lembrarmos a ilusão in 35 O Édipo do menino fantil segundo a qual todo o mundo possui um Falo com preenderemos por que o menino então rumina inconscien temente Uma vez que existe um ser neste mundo que perdeu seu Falo também corro o risco de ficar privado dele É com essa descoberta que a angústia de castração é definitivamente confirmada Temos então três variantes da fantasia de angústia que devem ser compreendidas como o avesso das três fantasias de prazer Se a fantasia de prazer é morder a mãe ou ter um filho com ela isto é possuir o Outro a ameaça de castração incide sobre o objeto mais precioso o pênisFalo ou seja sobre a parte do corpo mais investida Aqui o agente da ameaça é o pai repressor que lembra ao menino a Lei do interdito do in cesto Não possuirás tua mãe nem lhe darás um filho Da mesma forma ele se dirige à mãe dizendolhe Não reinte grarás teu filho no teu seio Se a fantasia de prazer é uma fantasia de sedução isto é ser possuído pelo Outro mais exatamente oferecerse ao pai a ameaça de castração incide igualmente sobre o Falo mas des sa vez considerado menos como apêndice destacável que como símbolo da virilidade Aqui o agente da ameaça não é o pai repressor mas o pai sedutor o pai é um amante que o menino deseja mas teme que vá longe demais e abuse dele Nesse caso a angústia não é o medo de perder o pênisFalo mas de perder a virilidade tornandose a mulherobjeto do pai Te nho medo de ser assediado sexualmente pelo meu pai e de com isso perder minha virilidade Insisto em dizer que essa fantasia de sedução do menino pelo pai e a angústia de ser 36 Sobre o Édipo assediado é uma fantasia primordial que pode ser constatada no tratamento analítico dos homens neuróticos E finalmente se a fantasia de prazer é uma fantasia de afastar o pai rival a ameaça de castração incide novamente sobre o pênisFalo considerado a parte exposta do corpo Aqui o agente da ameaça é o pai odiado que intimida a criança para deter seus impulsos parricidas Eis portanto as três variantes da fantasia de angústia de castração Na primeira o pai é um repressor temido na segun da é um tarado temido e na terceira é um rival temido Em todos os casos o agente da ameaça é o pai e o objeto ameaça do o pênisFalo ou seu derivado a virilidade Resolução do Édipo do menino a dessexualização dos pais O menino desiste da mãe porque tem medo de ser punido em sua carne ao passo que a menina como veremos abandona a mãe que a decepciona e voltase para o pai A que leva à angústia de castração Pois bem é ela que preci pita o fim da crise edipiana Com efeito dilacerado entre suas fantasias de prazer e suas fantasias de angústia dividido entre a alegria e o medo o menino é finalmente tomado pelo medo A angústia mais forte que o prazer dissuade a criança de pros seguir sua busca incestuosa e a leva a desistir do objeto de seus desejos Angustiada a criança esquivase dos pais tomados como objetos sexuais para salvar seu precioso pênisFalo isto é para proteger seu corpo Com a renúncia aos pais e a submissão à 37 O Édipo do menino Lei do interdito do incesto consumase assim o momento culminante o apogeu do complexo de Édipo masculino Fi nalmente a criança consegue preservar seu Falo mas ao preço de abandonar seus pais sexualizados Em outros termos sob ameaça o menino angustiado tem de escolher entre proteger a mãe ou o pênis Pois bem é o pênis que ele protege e é a mãe que ele abandona Ao renunciar à mãe dessexualiza global mente os dois pais e recalca desejos fantasias e angústia Ali viado pode agora abrirse a outros objetos desejáveis mas dessa vez legítimos e adaptados às suas possibilidades reais Somente assim separada sexualmente dos pais a criança pode doravan te desejar outros parceiros escolhidos fora de sua família Comparado à mulher o homem é visceralmente um covarde Quanto mais o menino for amado pela mãe mais se tor nará um homem viril E quanto mais orgulhoso for de sua potência mais se preocupará em defendêla suscetível quanto à sua virilidade e ridiculamente sensível ao menor dodói Comparado à mulher o homem é visceralmente um covarde Gostaria aqui de esquematizar a seqüência da crise edipiana do menino Temos então três tempos amor pelo pênis angús tia de perdêlo renúncia à mãe Graças à angústia o narcisismo do menino isto é o amor pelo próprio corpo o amor por seu pênisFalo prevaleceu sobre o desejo pelos pais Sob ameaça o narcisismo foi mais forte que o desejo ou formulado em 38 Sobre o Édipo outras palavras as pulsões de autoconservação venceram as pulsões sexuais Insisto em dizer que essa vitória do narcisis mo sobre o desejo foi precipitada pela angústia não se esque çam de que é por medo de se prejudicar que o menino se esquiva da mãe Entretanto a angústia será recalcada e fre qüentemente mal recalcada Com efeito veremos que a neu rose na idade adulta é o retorno da angústia de castração mal recalcada na infância Porém fora desse retorno neurótico é incontestável que a angústia de castração permanece onipre sente na relação normal que um homem mantém com seus órgãos genitais e mais genericamente com sua virilidade Apesar de seu recalcamento pela criança edipiana a angústia pivô do Édipo do menino marca para sempre a condição masculina Com isso podemos deduzir o quanto a angústia está no centro da vida de um homem Ela impregna tão for temente o caráter masculino que não hesito em dizer e a clínica o comprova que o homem é uma criatura particular mente medrosa diante da dor física e preocupado em garan tir permanentemente sua virilidade e sua potência O homem é essencialmente um ser aflito com a perda do poder que julga possuir ou para dizêlo em uma síntese caricatural o homem é um covarde Sim reconheço nós homens somos visceralmente covardes e essa covardia vem do medo e o medo vem do narcisismo excessivo do corpo da atenção in quieta e febril que dirigimos ao nosso corpo Esclareçamos da atenção que dedicamos não à aparência ou à beleza do corpo mas ao seu vigor e sobretudo sua integridade A pro pósito ocorreme aqui uma imagem divertida inspirada nas partidas de futebol quando os jogadores formam a barreira 39 O Édipo do menino para bloquear um tiro direto Nesse momento por reflexo colocam as duas mãos cruzadas sobre o sexo para se protege rem da bola É uma imagem burlesca que lembra uma fileira de menininhos todos preocupados com seus corpos e é tam bém uma ilustração clara da maneira como o homem vive seu sexo como seu mais íntimo calcanhardeaquiles Porém o mais engraçado desse instantâneo futebolístico é constatar que quando o jogador da equipe adversária bate finalmente a falta os defensores da barreira sempre preservando seu sexo desequilibramse espontaneamente como se tivessem medo de ser atingidos pela bola e às vezes contra toda a expectati va saltam no lugar para evitar serem atingidos pela bola cor rendo o risco de deixála passar entre as pernas e vêla no fundo das redes Preocupados em se preservar negligen ciam sua missão que é bloquear a bola Da mesma forma quando sua virilidade está em perigo o homem fica tão preo cupado em protegêla quanto o jogador em proteger seu sexo Ele pode arriscar tudo até sua vida mas nunca seu orgulho de ser viril Ora quem são as criaturas que na vida de um homem podem fazerlhe mal tomarlhe o poder ameaçar sua virilidade ou humilhálo senão o pai admirado e temido ou a mulher isto é a mulher que rivaliza com ele Quem pode roubarlhe a potência senão o pai admirado ou a mu lher rival Em todo caso não a mãe Ao contrário a mãe alimenta sua força e o persuade sobre o destino excepcional que o espera Eis por que recomendo sempre às mães que exprimam ao filho toda a confiança que depositam nele e o apóiem em seus projetos Sobretudo que não o apóiem no que diz respeito à sua beleza ou sua imagem mas ao seu poder 40 Sobre o Édipo de fazer e criar Com efeito repetir para ele que ele é bonito e simpático antes reforçaria seu mau narcisismo o da ima gem e enfraqueceria seu eu Não decididamente não é a mãe que ameaça o homem são antes o pai idealizado e a mãe vingadora Em suma para o homem o sexo a virilidade e a força são as coisas a serem defendidas a todo custo Os frutos do Édipo o supereu e a identidade sexual Uma vez resolvido eu deveria dizer insuficientemente re solvido uma vez que a dessexualização dos pais nunca é com pleta e a angústia nunca definitivamente recalcada o complexo de Édipo masculino terá duas conseqüências deci sivas na estruturação da personalidade futura do menino por um lado o nascimento de uma nova instância psíquica o supereu por outro a confirmação de uma identidade sexual nascida por volta dos dois anos de idade e afirmada mais soli damente após a puberdade O supereu é instituído graças a um gesto psíquico surpreendente o menino abandona os pais como objetos sexuais e os mantém como objetos de identifi cação Uma vez que não pode mais têlos como objetos de seu desejo apropriase deles como objetos do seu eu na im possibilidade de têlos como parceiros sexuais promete in conscientemente ser como eles em suas ambições fraquezas e ideais Sem poder possuílos sexualmente assimila a moral deles É graças a essa incorporação que a criança integra os interditos parentais que doravante imporá a si mesma O re sultado dessa passagem da sexualidade à moral é o que desig 41 O Édipo do menino namos supereu e os sentimentos que o exprimem pudor senso de intimidade vergonha e delicadeza moral O segundo fruto do Édipo é a assunção progressiva da identidade sexual Antes do Édipo a criança tinha um conhe cimento rudimentar e intuitivo acerca da diferença dos sexos sem ainda ser capaz de se dizer menina ou menino ou afirmar que o pai é um homem e a mãe uma mulher No início do Édipo nem sempre ele consegue identificar o sexo de seu pai de sua mãe ou de seus irmãos e irmãs Não esqueçamos que aos três anos a linha divisória ainda não passa entre homem e mulher masculino e feminino mas entre aqueles que têm o Falo e os que não o têm entre os fortes e os fracos Entretanto o contexto familiar social e lingüístico bem como as sensa ções erógenas que emanam de sua região genital e a sensação de ser atraído pelo pai de sexo oposto são os fatores que insta larão progressivamente as bases de uma identidade sexual que só será realmente adquirida muito mais tarde na época da puberdade É então que o jovem adolescente integrará a idéia de que o pênis é um atributo exclusivo do homem e se já descobriu a vagina que a vagina é um atributo exclusivo da mulher Pouco a pouco ele se forjará uma identidade sexual de homem e ao mesmo tempo descobrirá que a masculinidade e a feminilidade são antes de tudo comportamentos que não correspondem necessariamente à realidade fisiológica e anatômica de um homem ou de uma mulher Aprenderá as sim que todos os seres humanos em virtude de sua constitui ção bissexual possuem ao mesmo tempo características masculinas e femininas Daí concluirá talvez que a diferença sexual permanece um enigma que não cessa de nos interrogar 42 Sobre o Édipo O leitor pode desde já se reportar à FIGURA 8 p1267 que apresenta um quadro comparativo entre o tipo viril e o tipo feminino Adianto que esse quadro deve ser lido como o con junto dos traços dominantes que caracterizam o comporta mento de um homem e o de uma mulher do ponto de vista do Édipo e não como um conjunto de traços normativos Resumo da lógica do Édipo do menino Antes de abordar o Édipo da menina gostaria de resumir as diferentes fases atravessadas pelo menino edipiano dandolhe a palavra Vamos escutálo Tenho quatro anos Sinto excitações penianas Tenho o Falo e julgome onipotente Desejo ao mesmo tempo possuir se xualmente meus pais ser possuído por eles e eliminar meu pai Sinto prazer em fantasiar meus desejos incestuosos Meu pai ameaça me punir me castrando Vejo o corpo nu de uma menina ou o de minha mãe e constato a ausência de pênis Sinto mais medo ainda de ser punido Angustiado prefiro renunciar a desejar meus pais e salvar meu pênis Esqueço tudo desejos fantasias e angústia Separome sexualmente de meus pais e adoto a moral deles Começo a compreender que meu pai é um homem e minha mãe uma mulher e a saber pou co a pouco que pertenço à linha dos machos Mais tarde na adolescência minhas fantasias edipianas ressurgirão mas meu supereu muito severo nessa idade vai se opor ferozmente a isso Essa luta entre fantasias e supereu irá se manifestar por atitudes exageradas e conflituosas próprias da adolescência pudor exa cerbado inibições medo da mulher e desprezo por ela bem como negação dos valores estabelecidos Resolução da crise edípiana Fantasias de angústia Fantasias de prazer que se manifestam por comportamentos Desejos incestuosos míticos Falo Sensações erógenas DESSSEXUALIZAÇÃO DOS PAIS Fantasia de angústia medo de ser castrado pelo pai rival Fantasia de angústia medo de ser castrado pelo pai sedutor Fantasia de angústia medo de ser castrado pelo pai repressor VISÃO DO CORPO NU FEMININO DESPROVIDO DE PÊNIS Fantasia de prazer atitude sexual ativa Fantasia de prazer atitude sexual passiva Fantasia de prazer atitude sexual ativa SEXUALIZAÇÃO DOS PAIS Desejo de suprimir o corpo do Outro o pai Desejo de ser possuído pelo corpo do Outro sobretudo pelo pai Desejo de possuir o corpo do Outro a mãe Fantasma de onipotência FALO Sensações penianas FIGURA 2 Lógica do Édipo do menino 2 O Édipo da menina Tempo préedipiano a menina é como um menino Tempo da solidão a menina sentese sozinha e humilhada Tempo do Édipo a filha deseja o pai Resolução do Édipo a mulher deseja um homem A mais feminina das mulheres tem sempre o pai dentro de si Resumo da lógica do Édipo da menina 47 Tempo préedipiano a menina é como um menino Vou dar seqüência à nossa lenda metapsicológica descreven dolhes os quatro tempos do Édipo feminino Vocês vão logo perceber que entramos em um mundo completamente dife rente daquele do Édipo masculino Ao passo que em um menino de quatro anos coexistem três desejos incestuosos possuir ser possuído e suprimir o Outro na menina da mes ma idade há apenas um desejo incestuoso no início o de possuir a mãe seguido mais tarde pelo de ser possuída pelo pai Eu disse possuir a mãe ainda que isso lhes pareça estranho para uma menina A esse propósito um esclarecimento Se respeitamos a acepção corrente da palavra Édipo como a atração erótica da criança pelo genitor do sexo oposto não podemos dizer que a menininha que deseja possuir a mãe esteja no Édipo ela vive antes um préÉdipo considerado necessário para acessar o pai e entrar efetivamente no Édipo Portanto é sexualizando inicialmente a mãe que a menina poderá em seguida sexualizar o pai Eis por que Freud chama A FIGURA 3 ver p64 acompanha a leitura deste Capítulo 2 48 Sobre o Édipo a etapa preparatória da sexualização do pai de fase préedipia na Já o menino não precisa dessa fase preliminar uma vez que deseja desde logo o genitor do sexo oposto isto é a mãe e a mãe será o único objeto de seu desejo edipiano Acabo de dizer que o menino sempre tem a mãe como objeto apesar de a propósito da fantasia de sedução do menino terlhes mostrado que o pai também pode ser objeto do desejo do filho Entretanto classicamente falando deveríamos dizer que o menino deseja apenas um único objeto sexual a mãe ao passo que a menina deseja ambos antes a mãe depois o pai Estamos na aurora do século XXI e sou obrigado a evocar as incontáveis e apaixonantes discussões travadas pelos psica nalistas nos anos 1930 acerca da importância da fase préedi piana na vida de uma mulher Com efeito essa fase é essencial para compreendermos a problemática das pacientes neuróti cas que recebemos todos os dias Quando escuto uma mulher penso sempre na relação dela com a mãe e paralelamente quando escuto um homem penso mais freqüentemente em sua relação com o pai Claro que estou em vias de expor uma teoria do Édipo mas gostaria de fazêlos perceber a incidên cia do Édipo na clínica e sobretudo fazêlos compreender que o problema das neuroses reside no difícil retorno à idade adul ta de um Édipo invertido isto é do que era na infância a atração sexual pelo genitor do mesmo sexo A menina se neurotiza portanto mais facilmente a partir de sua relação com a mãe e o homem se neurotiza mais facilmente a partir de sua relação com o pai Assim deveríamos dizer que a neurose masculina resulta de uma fixação do filho pelo pai e a feminina de uma fixação da filha pela mãe Se como analista você escuta um 49 O Édipo da menina homem neurótico pense sobretudo no pai dele e na presença de uma mulher neurótica pense antes em sua mãe Deixemos agora a clínica e consideremos por um instante a expressão consagrada entrar no Édipo Quando diremos que uma menininha entra no Édipo Nossa resposta é dife rente da relativa ao menino Este entra diretamente no Édipo porque desde logo deseja sua mãe e abandona o Édipo quan do deseja outra mulher que não sua mãe A menina por sua vez entra no Édipo isto é sexualiza seu pai após ter atraves sado a fase préedipiana durante a qual sexualiza e depois rejeita sua mãe e abandona o Édipo quando deseja outro ho mem que não seu pai Uma segunda dessimetria entre o me nino e a menina diz respeito à velocidade com que eles saem do Édipo O menino como vimos dessexualiza simultanea mente seus dois genitores de maneira rápida e brutal ao passo que a menina dessexualiza primeiro a mãe e só depois mais tarde muito lentamente separase sexualmente do pai O menino sai do Édipo em um dia a menina precisa de muitos anos Assim poderíamos dizer que o menino tornase ho mem de uma tacada só ao passo que a menina tornase mulher progressivamente Mas voltemos ao período préedipiano quando a menina deseja a mãe como objeto sexual adotando perante ela a mes ma atitude que o menino edipiano Assim como ele ela julga deter um Falo e mostra por seus comportamentos ser guiada por fantasias de onipotência fálica e prazer nas quais desem penha um papel sexual ativo em relação à mãe Exatamente como o menino ela se sente feliz forte e orgulhosa é curiosa às vezes voyeurista exibicionista e agressiva Em suma duran 50 Sobre o Édipo te esse período a menina é animada pelo desejo incestuoso de possuir a mãe regozijase por têla toda para si e adota uma posição nitidamente masculina similar à do menino Tempo da solidão a menina sentese sozinha e humilhada Ora ocorrerá um acontecimento crucial que ofuscará o ino cente e insolente orgulho da garotinha radiante por se sentir onipotente Da mesma forma que o menino descobre visual mente e angustiado a ausência de pênis no corpo feminino a menina constata a diferença de aspecto entre seu sexo e o do menino A reação da menina é imediata fica decepcionada por não ter o mesmo apêndice que o menino Ele tem algu ma coisa que eu não tenho Até então fiavase em suas sen sações de poder vaginal e clitoridiano que a confortavam em seu sentimento de onipotência Agora que viu o pênis duvi da de suas sensações e julga que a fonte do poder não está nela mas no corpo do outro no sexo do menino O impacto da visão do pênis portanto foi mais forte que a manifestada em suas sensações erógenas A imagem desconcertante do pênis prevaleceu sobre seus sentimentos íntimos o que ela viu abo liu o que ela sentia A menina vêse assim dolorosamente despossuída pois o cetro da força não é mais encarnado por suas sensações erógenas mas pelo órgão visível do menino Agora o Falo está no outro e assume doravante a forma de um pênis É então que brutalmente uma imensa ilusão des morona provocando um pungente dilaceramento interno 51 O Édipo da menina Chamo essa fantasia na qual a menina sofre com a dor de ter sido privada do precioso Falo de fantasia de privação ou mais exatamente fantasia da dor de privação Enquanto o menino vivia a angústia de ter a perder a menina vive a dor de ter perdido enquanto o menino teme uma castração a menina se ressente de uma privação Lembremse a fantasia que levou à resolução do Édipo no menino é uma fantasia de angústia Temendo perder o Falo venerado que julga deter o menino é levado a preferir o pênis à mãe Para a menina é radicalmente diferente ela não tem medo de perder uma vez que acaba de constatar que não tem pênis e que nunca o terá Ao contrário do meni no ela nada tem a perder Não ela não receia perder não sofre de angústia sofre de dor a dor de ter sido privada Ve jam a angústia prevalece no menino e a dor na menina Mas dor por quê Claro dor por ter sido privada de um objeto inestimável que ela julgara possuir mas sobretudo por ter sido enganada Sim a menininha sentese enganada Alguém todo poderoso teria mentido para ela fazendoa acreditar que ela detinha o Falo e que o conservaria eternamente Mas quem é esse alguém senão sua própria mãe Uma mãe ontem onipo tente e que agora se revela impotente para lhe dar um Falo que ela própria não tem nem nunca teve Sim sua mãe tam bém é tão desprovida quanto ela merecendo apenas desprezo e recriminações É nesse exato instante que despeitada a menina esquiva se da mãe e em sua solidão fica furiosa por ter sido privada e enganada A dor de ter sido privada e a de ter sido enganada não passam na verdade de uma única e mesma dor a qual 52 Sobre o Édipo chamo dor da humilhação isto é sentirse vítima de uma injustiça e julgar a autoimagem ferida Aqui a privação e o amorpróprio ferido confundemse em um único sentimen to o da humilhação A experiência da privação foi vivida como uma ofensa irreparável ao legítimo orgulho de pos suir o Falo como um golpe humilhante infligido em seu nar cisismo Havíamos dito que para o menino o objeto narcísico por excelência é seu precioso órgão o pênisFalo e que sua opção por salválo levao a renunciar aos pais Para a menina ao contrário o objeto narcísico por excelência não é uma parte de seu corpo é seu amorpróprio a imagem cativante de si mesma O Falo para a menina não é o pênis mas a imagem de si Ora a reação imediata ao amorpróprio ferido é reivindicar à mãe o que lhe é devido e se queixar do prejuí zo que sofreu Apenas mais tarde quando a filha desejar o pai chegará a época da reparação da pacificação e da reconcilia ção com a mãe Por ora a menininha está só pois não tem mais pais para quem se voltar rejeitou a mãe e ainda não recorreu ao pai É um período de negra solidão em que a menina chora seu narcisismo ofendido Resumindo se o menino sai do Édipo para proteger seu narcisismo eu diria que a menina entra no Édipo vai ao encon tro do pai para pedirlhe que faça um curativo em seu narci sismo ferido Formulemos de outra maneira Para o menino a salvaguarda de seu pênisFalo interrompeu o impulso inces tuoso em direção à mãe ao passo que a necessidade de con solação desperta na menina um novo desejo o de ser possuída pelo pai Ela abandona a mãe e para ser consolada procura o pai na esperança de ser possuída por ele No caso do menino o 53 O Édipo da menina narcisismo do corpo interrompe o Édipo no caso da menina o narci sismo da imagem de si abre para o Édipo A inveja ciumenta de deter o Falo Voltemos porém um pouco ao momento em que a menina descobre no menino o pênisFalo que ela não tem Ela sofre sentese lesada em seu amorpróprio e reivindica exige mes mo o que lhe cabe Quero esse Falo que me tomaram e o terei nem que tenha que arrancálo do menino ela exclama Essa reivindicação mostra muito bem que a dor da humilha ção comutouse em fúria invejosa de deter o Falo A menina é desde então presa de um sentimento que a psicanálise chama inveja do pênis e que prefiro chamar de inveja do Falo para enfatizar que a menina não inveja o órgão peniano do menino mas o símbolo de potência por ele encarnado aos olhos das crianças O pênis não a interessa e às vezes inclusive a repugna o que a interessa e apaixona é o poder que ela lhe atribui e que a deixa com inveja Mas atenção Inveja não é sinônimo de desejo A inveja não é o desejo Uma coisa é inve jar o Falo outra é desejar o pênis de um homem Vejam a menininha tem inveja do Falo mas a mulher deseja o pênis a inveja é um sentimento pueril ao passo que o desejo de pênis é um impulso próprio da maturidade Assim para que uma menina venha a desejar o pênis de um homem deve primeiro transformarse em mulher amadurecer seu Édipo isto é pri meiro sexualizar seu pai e separarse dele para mais tarde tor narse a companheira que goza do corpo e do sexo do homem amado Não a inveja do Falo é a inveja infantil e ciumenta de 54 Sobre o Édipo uma criança magoada vingativa e nostálgica que quer recu perar o símbolo do poder de que julga ter sido despossuída Observem que nesse duelo imaginário ela luta de igual para igual com o menino e adota uma posição de rivalidade viril Tempo do Édipo a filha deseja o pai Eis que agora um novo personagem entra em cena é o pai maravilhoso grande detentor do Falo É quando a menininha magoada e sempre ciumenta voltase para ele a fim de se refugiar e se consolar mas também para lhe reivindicar seu poder e sua potência Quer ser tão forte quanto seu pai e brandir o Falo que a tornaria novamente senhora dos seres e das coisas A tal pretensão o pai todopoderoso de sua fan tasia opõe uma recusa inapelável dizendolhe Não nunca lhe darei a chama da minha força uma vez que ela cabe à sua mãe Naturalmente o pai que fala assim é um personagem caricatural é o pai fantasiado por uma crian ça caprichosa e intransigente Não um pai adulto nunca fala ria dessa forma Se tivesse de responder a uma demanda tão pueril antes replicaria Não minha filha não posso lhe dar o poder absoluto que você me atribui pela simples razão de que ele não existe O Falo que você me pede é um sonho de criança ainda que esse sonho seja uma velha quimera que levou os homens a se amarem mas freqüentemente a se des truírem Não ninguém tem o Falo e ninguém nunca o terá Meu único poder minha filha meu mais dileto poder é o poder supremo de desejar viver de lutar a cada instante para fazer o que tenho de fazer de amar o que faço e tentar transmi 55 O Édipo da menina tirlhe esse desejo Cabe a você depois transformálo em de sejo feminino de amar parir e criar Essa recusa irrevogável do pai é recebida pela filha como uma bofetada que põe fim a toda esperança de um dia con quistar o mítico Falo Ela acaba de compreender que nunca o terá e não obstante não se resigna Ao contrário lançase agora com toda a fúria de seu desejo juvenil nos braços do pai não mais para lhe arrancar o poder mas para ser ela mes ma a fonte do poder Sim ela queria ter o Falo mas agora quer ir mais longe quer sêlo ser a coisa do pai Que significa isso Isso significa que a menina quer ser ela própria e por inteiro o Falo precioso Em outros termos quer se tornar a favorita do pai Em virtude do não primeira recusa pater na a inveja ciumenta de deter o Falo do pai dá lugar agora ao desejo incestuoso de ser possuída por ele ser o Falo do pai Quando a menina era invejosa adotava uma posição masculi na agora que é desejante engajase em uma posição femi nina Ao sentimento masculino de inveja sucede o desejo feminino de ser possuída pelo pai Assim ao sexualizar o pai ator principal de suas fantasias a menina entra efetivamente no Édipo Por sinal a fantasia de prazer que melhor ilustra o desejo edipiano de ser possuída pelo pai é a de ser sua mulher esperança freqüentemente manifestada por essa frase Quando ficar grande vou me ca sar com papai Essa entrada no Édipo é também o momento em que a mãe após ter sido afastada volta à cena e fascina a filha por sua graça e feminilidade Com efeito a mãe antes tão desacreditada é agora admirada como mulher amada e modelo de feminilidade Espontaneamente a menina então aproximase da mãe e identificase com ela mais exatamente 56 Sobre o Édipo com o desejo da mãe de agradar seu companheiro e ser ama da por ele O comportamento edipiano da menina inspirase plenamente no ideal feminino encarnado pela mãe a criança é toda olhos e ouvidos na observação da mãe e no aprendiza do da arte de seduzir o homem É a idade em que as filhas adoram observar a mãe se maquiando ou se embelezando ainda que a admiração pela mãe seja duplicada por uma forte rivalidade toda mãe é então para a filha tanto um ideal quanto uma temível rival Assim realizase o primeiro movimento de identificação da filha com o desejo da mãe o de ser a mulher do homem amado e darlhe um filho Resolução do Édipo a mulher deseja um homem Da mesma forma que o pai recusou o Falo à sua filha nega se agora com a mesma firmeza a tomála como objeto sexual a considerála como seu Falo isto é a possuíla inces tuosamente Depois que a primeira recusa Não lhe darei minha força permitiu à filha aproximarse da mãe e com ela identificarse a segunda Não a quero como mulher leva a filha a identificarse com a pessoa do pai Com efeito produzse um fenômeno curioso mas perfeitamente saudá vel no desenvolvimento do Édipo feminino uma vez que a menina não pode ser o objeto sexual do pai quer ser então como ele Já que não quer saber de mim como mulher en tão vou ser como você Que significa isso Que a menina aceita recalcar seu desejo de ser possuída pelo pai sem com isso renunciar à sua pessoa Enquanto o menino edipiano re signase a perder a mãe por covardia por sua vez a menina 57 O Édipo da menina que nada mais tem a perder obstinase audaciosamente a se apoderar do pai Ela queria ter o Falo recusaramlhe ela quis sêlo foi despachada agora basta quer tudo quer o pai por inteiro e o terá Eis por que digo que a dessexualização do pai é no fundo um luto a menina chora o pai sexualizado e o faz reviver dessexualizado nela Assim como o enlutado que na saída do luto acaba por se identificar com o defunto a meni na tendo renunciado ao pai fantasiado acaba por se identifi car com a pessoa do pai real Ela mata seu pai fantasiado mas o ressuscita como modelo de identificação Em outras pala vras a menina deixa de considerar o pai desejável em suas fantasias edipianas e incorpora sua pessoa no eu Assim im pregnase de atitudes gestos e até mesmo desejos e valores morais que caracterizam seu pai no real Ela é o retrato es carrado do pai Identificada com os traços masculinos do pai depois de se ter identificado com os traços femininos da mãe a menina enfim abandona a cena edipiana abrindose agora para os futuros parceiros de sua vida de mulher Notem que as duas identificações constitutivas da mulher identificação com a feminilidade da mãe e identificação com a virilidade do pai foram desencadeadas por duas recusas do pai recusa de dar o Falo à filha e recusa de tomála como Falo Mas mudemos o tom O cara a cara a que acabamos de assistir opondo a filha edipiana ao pai inspiroume esse breve e animado diálogo entre nossos dois heróis legendários Apres so a advertilos que o pai da cena seguinte é um homem saudável e apaixonado pela mulher A menina Pai dême sua força O pai Não Não farei nada disso Não lhe darei minha força Doua à sua mãe 58 Sobre o Édipo A menina Mas então eu queria ser sua força Por favor deixe me ser sua musa a fonte ardente de sua força Pai eu suplico Olhe para mim Sou seu objeto mais precioso Possuame O pai Não Está fora de questão Você não é minha mulher Já lhe recusei minha força e aceito ainda menos que você seja a fonte dela A menina Já que é assim já que você me priva de sua força e não me deixa ser sua musa então vou me apoderar de você e ser como você o que me diz disso Melhor que você Sim vou devorá lo inteirinho e me parecer com você a ponto de andar como você ter o nariz como o seu a intensidade do seu olhar o brilho da sua inteligência ou o ardor da sua ambição Então serei tão forte quanto você e você verá muito mais forte Eis a avidez juvenil a vontade pugnaz de uma menina que só terá fim quando realizar seu desejo de ser amada e chegado o momento esperar um filho Amar e transmitir a vida definitivamente é a missão mais digna que a natureza atribui à mulher Como se a natureza se de fato existe uma entidade chamada natureza a encorajasse intimandolhe Defenda o desejo com o bico e as garras proteja o amor e garanta a transmissão da vida Antes de prosseguir gostaria de lhes dizer o quanto a lite ratura analítica sobre o Édipo feminino é imensa rica e reple ta de questões Entretanto todos os autores convergem para a mesma conclusão isto é que a feminilidade permanece um enigma nãoresolvido Porém uma vez reconhecida nossa ig norância nem por isso avançamos muito Da minha parte tentei aprofundar a lenda da menina edipiana modelar sua história e propor um roteiro claro e detalhado para ela um roteiro inspi rado pela teoria psicanalítica e a escuta dos meus pacientes Quis dramatizar minha intuição de que a menina ao contrá 59 O Édipo da menina rio do menino era animada por uma sede inextinguível de amor e que o crescendo de seu Édipo Dême Pegueme e Eu o devoro não passava da escalada irresistível de um desejo que perpassa todas as fibras de sua feminilidade A mais feminina das mulheres tem sempre o pai dentro de si Meu pai deixou seu selo em mim ele impregnou meu desejo modelou a forma do meu nariz marcou o ritmo dos meus passos e apesar disso sintome a mais feminina das mulheres DECLARAÇÃO DE UMA PACIENTE Gostaria de me deter ainda por um instante na identificação da filha com a pessoa do pai Do ponto de vista clínico vocês não imaginam a importância do pai fantasiado na vida de uma mulher Ao escutarem uma mulher sofredora indaguem se duas coisas Em primeiro lugar como já disse indaguemse sobre o laço freqüentemente conflituoso que ela estabeleceu com o genitor do mesmo sexo isto é com sua mãe depois indaguemse qual é o pai que está dentro dela Sim uma mu lher tem sempre seu pai dentro de si Sempre que escuto uma paciente ocorreme a idéia de que é habitada pelo pai Segu ramente essa identificação não é válida para todas as mulheres mas quando ela se confirma e se você for um bom observa dor você descobre facilmente o pai nas expressões distraídas do rosto de sua paciente nas rugas de sua testa na rudeza de suas mãos na forma de seu nariz e sobretudo em sua maneira 60 Sobre o Édipo espontânea de se comportar e andar Não é incomum uma mulher adotar inconscientemente o mesmo meneio de cabe ça e a mesma postura do pai Incontestavelmente o pai fanta siado ocupa um lugar central na vida de uma mulher Aqui penso em uma situação familiar mais clássica Uma vez identificada com o pai a filha pode não suportar mais seu verdadeiro pai seu pai de carne e osso Freqüentemente se aborrece com ele e o critica por seus defeitos e fraquezas ou simplesmente por ser o que é Assim o pai quero dizer o verdadeiro pai o pai que somos tem diante de si na pessoa da filha a encarnação de seu próprio supereu Sua filha tornou se para ele sem que ela o saiba seu mais temível rival e ele para ela seu mais intolerável espelho Uma última observação sobre a patologia da identificação da filha com o pai Quando essa introjeção não é contraba lançada pela identificação com a mãe instalase uma das neu roses femininas mais tenazes que designo como histeria de amor que consiste em uma rejeição do laço amoroso A mu lher inteiramente tomada pelo pai fantasiado não consegue empreender uma relação amorosa duradoura todos os seus receptores de amor estão saturados pela onipresença paterna Ela não tem namorado mas continua fortemente impregnada pelo pai amado está sozinha e insatisfeita mas arrebatada por sua paixão secreta Não é nem vingativa nem odiosa a respei to do homem simplesmente aposentouse da vida amorosa e sexual Resumindo prefere preservar seu pai interior a se lan çar em uma relação afetiva sempre frágil em que se sente exposta ao risco de ser abandonada Porém salvo essa eventual deriva neurótica resultante de uma intensa identificação com o pai a menina se apropriará 61 O Édipo da menina diversamente dos traços femininos e masculinos assimilados ao mesmo tempo da mãe e do pai Este é precisamente o desfecho mais freqüente do Édipo feminino O fim do Édipo é com efeito um comprido caminho ao longo do qual a menina ao se tornar mulher adotará traços masculinos e fe mininos e transformará progressivamente seu desejo de ser possuída pelo pai em desejo de ser possuída pelo homem amado Operase assim uma lenta dessexualização da relação edipiana com o pai e correlatamente a assunção de sua iden tidade feminina Como então é resolvido o Édipo da menina Proponho lhes o que poderia ser seu desenlace ideal A fantasia dolorosa de ter sido privada de um Falo todopoderoso encerrouse definitivamente Agora a jovem em seu devir mulher esque ceuse completamente da alternativa pueril de ter ou não ter o Falo Ela não mede mais seu ser nem seu sexo com a régua de um suposto Falo masculino Ela fez o luto do Falo ilusório e constata que seu sexo é diferente da falta de um Falo desa parecido Assim supera a idéia infantil que faz da mulher uma criatura castrada e inferior e pára de recriminar a mãe e de rivalizar com o homem A menina descobre a vagina o dese jo de ser penetrada e gozar com o pênis na união sexual da mesma forma descobre o útero e seu desejo de carregar um filho do homem amado Mais uma palavrinha antes de concluir a fim de dissipar um malentendido corriqueiro que a psicanálise fundadora do conceito de Falo concebia a mulher como uma criatura castrada e inferior Isso é um absurdo A única coisa que a psicanálise fez e foi uma verdadeira revolução foi descobrir que os seres humanos são habitados por fantasias tão mórbidas 62 Sobre o Édipo quanto o mais nefasto dos vírus e que a mais virulenta dessas fantasias é representar a mulher como uma criatura castrada e inferior Essa fantasia é antes de tudo uma quimera infantil Sei muito bem que essa representação pueril está igualmente ins talada na cabeça de vários adultos neuróticos São justamente os neuróticos que acham que a mulher é uma criatura castrada quando evidentemente isso é falso O sexo de uma mulher não é de forma alguma a falta do que quer que seja A mu lher tem seu próprio sexo e tem orgulho dele quer se trate de sua vagina de seus seios de sua pele ou de todo o seu corpo erógeno a mulher é feliz por ser o que é Mas por que dizer que o neurótico homem ou mulher considera a mulher uma criatura inferior Porque é dele próprio que se trata é ele a mulher fraca Fixado em sua fantasia infantil o neurótico vive sob a ameaça de ser castrado Assim todas as suas relações afe tivas são vividas no modo defensivo está sempre de prontidão para bloquear qualquer abuso ou humilhação proveniente da queles que o cercam daqueles de quem depende e de quem ele não gostaria nem morto de depender É como se em suas fantasias o neurótico se dissesse Eles não me terão Não sou uma mulherzinha Decerto a psicanálise postula que o Falo existe e que a mulher é castrada mas vocês entenderam o Falo é uma ilusão e a mulher é castrada tãosomente na imaginação inconsciente das crianças e dos neuróticos Resumo da lógica do Édipo da menina A exemplo do menino que nos contou sua travessia edipiana escutemos agora o depoimento da menina Tenho quatro anos Sinto excitações clitoridianas Tenho o Falo tenho orgulho dele e julgome onipotente Assim como um menino desejo possuir minha mãe Na frente de um garotinho nu descubro que não tenho Falo Sofro por ser privada dele Constato que minha mãe também é desprovida dele Criticoa por terme feito acreditar que ambas o tínhamos Logo ela me enganou Despeitada abandono minha mãe Agora sintome sozinha e humilhada Estou ferida em meu amorpróprio Invejo o menino Voltome agora para o meu pai grande detentor do Falo Sempre ciu menta e invejosa peçolhe que me dê o Falo Ele me recusa o Falo Constato que nunca o terei Peço a meu pai para me consolar Minha inveja transformouse em desejo Não quero mais ter o Falo do meu pai quero sêlo quero ser a favorita do meu pai Então identificome com minha mãe enquanto mulher desejada e modelo de feminilidade Dese jo ser possuída pelo meu pai Meu pai se recusa Dessexualizo meu pai mas incorporo sua pessoa Pouco a pouco tornome mulher e me abro para o homem amado Paro de medir meu sexo pela régua de um mítico Falo e descubro a vagina o útero e o desejo de ter um filho do meu companheiro A menina é um menino A menina sentese humilhada A menina deseja o pai A mulher deseja um homem Tempo préedipiano Tempo da solidão Tempo do Édipo Resolução do Édipo IDENTIFICAÇÃO COM O PAI Renúncia ao pai fantasiado e identificação com a pessoa do pai real DESSEXUALIZAÇÃO DO PAI SEGUNDA RECUSA DO PAI RECUSA DE POSSUIR SEXUALMENTE A FILHA DESEJO INCESTUOSO MÍTICO Desejo de ser possuída por ele SEXUALIZAÇÃO DO PAI PRIMEIRA RECUSA DO PAI RECUSA DE DAR SEU FALO INVEJA CIUMENTA DO PÊNIS Inveja de ter o Falo do menino depois o do pai A MENINA SE VÊ SOZINHA FANTASIA DE DOR DE PRIVAÇÃO Fantasia de dor de ser privada do Falo que ela julgava ter VISÃO DO CORPO NU MASCULINO DOTADO DO PÊNIS FANTASIAS DE PRAZER QUE SE MANIFESTAM POR COMPORTAMENTOS Fantasia de prazer atitude sexual ativa em relação à mãe SEXUALIZAÇÃO DA MÃE DESEJO INCESTUOSO MÍTICO Desejo de possuir o corpo do Outro a mãe FALO Fantasia de onipotência FALO SENSAÇÕES ERÓGENAS Sensações clitoridianas FIGURA 3 Lógica do Édipo da menina 3 Perguntas e respostas sobre o Édipo 67 De que problema o conceito de Édipo é a solução O sr afirma com freqüência que um conceito psicanalítico é a resposta a uma questão Qual seria a questão que leva ao Édipo Perfeito Um conceito psicanalítico só tem valor caso se de monstre indispensável à coerência da teoria e à eficácia de nossa prática Princípio ainda mais verdadeiro quando se trata de noção tão capital quanto a que acabo de expor De que problema então o Édipo é a solução Para mim o Édipo responde a duas questões como se forma a identidade sexual de um homem e de uma mulher e como uma pessoa torna se neurótica Logo o problema cuja solução é o Édipo é o da origem da nossa sexualidade de adulto e mais além da ori gem dos nossos incontáveis sofrimentos neuróticos Essas duas questões sexualidade e neurose estão tão intimamente im bricadas que podemos dizer que a neurose resulta de uma sexualidade infantil perturbada interrompida em sua maturi dade hipertrofiada ou ao contrário inibida No fundo o Édipo As perguntas que respondo foram redigidas a partir das intervenções dos ouvintes que assistiram às diferentes exposições orais que realizei sobre o tema do Édipo 68 Sobre o Édipo nos serve para compreender como um prazer erótico apodera se de uma criança de quatro anos para se transformar em um sofrimento neurótico que atormenta o homem ou a mulher de quarenta anos que ela se tornou Gostaria agora de formular a mesma idéia mas lembrando a vocês o que levou Freud à descoberta do Édipo De onde ele tirou a idéia do Édipo Da observação das crianças Em absoluto Decerto estava atento a seus comportamentos mas não foi estudando a relação paisfilhos que concebeu a noção de Édipo ainda que a realidade familiar seja de ontem seja de hoje confirme cotidianamente a descoberta freudiana Não não foram as crianças que introduziram o Édipo Devemos então supor que a invenção freudiana decorre da autoanálise de Freud Efetivamente foi ao sonhar analisar seus sonhos evocar sua infância e dirigir por escrito essas reflexões ao amigo e correspondente Wilhelm Fliess que Freud elaborou o Édi po um Édipo dominado essencialmente pelo desejo parrici da e pela culpa daí resultante na medida em que a idéia do Édipo foi exposta pela primeira vez no mesmo ano 1897 da morte de Jacob Freud seu pai Entretanto não foi a partir de sua introspecção que Freud apreendeu o essencial desse con ceito nodal da psicanálise Minha hipótese é bem outra Sub metoa a vocês O Édipo é uma invenção forjada por Freud na escuta de seus pacientes adultos Deixemme agora pro porlhes uma ficção Estamos em Viena em 1896 no consultório da Berggasse 19 no momento em que Freud recebe uma paciente histéri ca que lhe fala de sua infância Ao mesmo tempo em que a escuta atentamente Freud busca confirmar a tese que elabo 69 Perguntas e respostas sobre o Édipo rara recentemente sobre a etiologia da histeria Com efeito por essa época ele acha que a histeria é provocada pela inca pacidade do paciente de recordar um trauma sexual ocorrido nos primeiros anos de sua vida Criança Freud reflete a pa ciente teria sofrido um abuso sexual cometido por um adul to E seria o esquecimento tenaz dessa cena de sedução que a teria tornado neurótica Enquanto permanecer recalcada no inconsciente a cena de sedução traduzse em sintomas que causam sofrimento mas basta tornála consciente para que perca a virulência Justamente para curar a histeria pensava Freud é preciso que as cenas de conteúdo sexual que jazem no inconsciente tornemse conscientes única condição para que se enfraqueçam e deixem de ser um foco patogênico Assim Freud escuta a jovem histérica tentando saber se na infância ela foi seduzida por um adulto e em caso afirmativo tentando fazêla relatar os detalhes do incidente e sobretudo reviver seu vivido traumático Muitos de vocês sabem que anos mais tarde Freud vai operar uma mudança capital em sua teoria admitindo que essas famosas cenas de sedução não haviam necessariamente ocorrido sendo antes fantasias ima ginadas por seus pacientes Assim os sintomas neuróticos se riam não a conseqüência de um abuso sexual realmente sofrido mas de um abuso sexual fruto da fantasia e esquecido No fundo seja um acontecimento real ou fantasiado pouco im porta pensava ele a cena de uma sedução sexual infantil co metida por um adulto perverso permanece a verdadeira causa da histeria sob a condição todavia de que tenha sido recalcada Lembremse que a histeria é principalmente uma doença do esquecimento que a histérica é histérica porque não quer se lembrar do que foi doloroso 70 Sobre o Édipo Mas que relação há entre isso e o Édipo Pois bem acho que Freud descobriu o Édipo ao refletir no roteiro e nos atores que atuam na cena de sedução No caso da neurose a menina é seduzida por um homem perverso no caso do Édipo a menina é seduzida pelo próprio pai A cena fanta siada de sedução na origem da histeria transformarase no pensamento de Freud em uma cena fantasiada na qual a criança era seduzida pelo pai sem por isso ser vítima de um abuso sexual sem por isso ficar siderada por um prazer de efeitos nocivos bastava que um dos pais fosse mais carinhoso que de costume para que a criança sentisse esse excesso de ternura como um estímulo erógeno e um prazer sexual muito intenso Mas ter pensado no pai ainda não é a plena desco berta do Édipo Falta o elemento principal Gostaria de ser muito claro neste ponto Ao escutar sua paciente relatar um incidente sexual da infância Freud imagina a cena identifica se com o personagem da criança seduzida e percebe que essa criança não é apenas passiva é habitada pelo desejo ativo de ser seduzida pelo pai Sim a chave do Édipo reside no desejo incestuoso da criança de ser possuída pelo pai Freud descobriu o Édipo ao passar de uma cena de sedução na qual uma menininha assustada é a vítima passiva de um agressor adulto para a cena edipiana em que uma menininha inocente e sensual é a instigadora inconsciente que incita o pai ou o irmão mais velho a desejála sexualmente A crian ça da cena de sedução é uma vítima ao passo que a criança da cena edipiana é atormentada entre o desejo de ser seduzida e o medo de sêlo entre o medo de sentir o prazer e o medo de experimentálo 71 Perguntas e respostas sobre o Édipo Agora que conhecemos o contexto da descoberta do Édi po podemos voltar à sua pergunta inicial de que problema o Édipo é a solução O Édipo é uma fantasia de sedução na base da identidade sexual de todo homem e toda mulher uma fantasia de prazer e de angústia Em geral essa fantasia é metabolizada pela criança mas pode ocorrer de o prazer a angústia ou a dor serem traumáticas e dificilmente recalcáveis isto é de as emoções vividas pela criança edipiana na situa ção de sedução serem tão violentas que permaneçam ativas e fomentem uma neurose na idade adulta A fantasia edipia na que não foi liquidada permanece virulenta aflora à cons ciência e se exterioriza repetitiva e compulsivamente na vida do neurótico Com que idade uma criança sente prazer sexual pela primeira vez Em primeiro lugar uma evidência o prazer sexual vivido por uma criança é de natureza diversa do que nós adultos expe rimentamos Dito isto sabemos que na vida intrauterina um feto já pode ter ereções que nos permitem atribuirlhe uma vivência se não de excitação sexual pelo menos de frêmito genital Isso mostra como não há idade para o prazer sexual sob a condição de que o corpo da criança esteja em contato com um adulto igualmente excitado desejante e sentindo prazer em se dedicar a ela ainda que o mais terna e castamen te possível A esse respeito tenho aqui algumas espantosas li nhas de Freud que gostaria de ler para vocês Freud não hesita em identificar os sentimentos de ternura com o amor se xual Afirma assim que as relações entre a criança e a mãe são para esta uma fonte contínua de excitação e satisfação 72 Sobre o Édipo sexuais intensificandose quanto mais ela demonstrar para a criança sentimentos que derivem de sua própria vida sexual beijála ninála considerála o substituto de um objeto se xual pleno É provável prossegue Freud que uma mãe fique vivamente surpresa se lhe dissermos que dessa forma com suas ternuras ela desperta a pulsão sexual da criança Ela julga que seus gestos demonstram um amor assexual e puro no qual a sexualidade não desempenha papel algum uma vez que ela evita excitar os órgãos sexuais da criança além dos cuidados corporais exigidos Mas a pulsão sexual como sabemos não é despertada apenas pela excitação da zona genital a ternura também pode ser excitante Ao lhes apresentar o Édipo afirmei que a sexualidade es tava no cerne do amor e do ódio familiares porém na passa gem que acabo de ler Freud vai muito mais longe pois não diz que o sexual jaz na ternura mas que a própria ternura é uma excitação sexual Se é verdade que um bebê pode sentir prazer sexual nos braços da mãe poderíamos deduzir que o Édipo aparece bem antes dos três ou quatro anos de idade Esta é precisamente a posição de Melanie Klein que postula um Édipo precoce no recémnascido e a de Lacan ao consi derar que não haveria idade para o Édipo uma vez que o desejo da criança não passa do prolongamento do desejo da mãe posição que é efetivamente a de Freud no trecho que acabam de ouvir Logo há uma diferença entre o Édipo kleiniano e o Édipo freudiano Para Melanie Klein as pulsões eróticas de um bebê incidem sobre a mãe percebida não como 73 Perguntas e respostas sobre o Édipo uma pessoa global mas como um objeto parcial a mãe re duzse ao seio O Édipo kleiniano pode ser um Édipo oral anal etc Para Freud é diferente O Édipo existe apenas se as pulsões eróticas da criança incidirem sobre a mãe ou o pai como pessoas globais dotadas de um corpo habitadas por um desejo e suscetíveis de sentirem prazer Enquanto para Melanie Klein o Édipo é oral ou anal para Freud o Édipo está além do prégenital e aquém do genital sendo acima de tudo fálico Como se dá o Édipo quando a mãe vive sozinha com o filho Plenamente sob a condição de que a mãe seja desejante Pouco importa que a mãe viva sozinha o que conta é que seja ape gada a alguém que deseje alguém e no caso de não ter ne nhum parceiro amoroso o que conta é que seja interessada por outra coisa que não o filho que o amor pelo filho não seja o único amor de sua vida Em suma há Édipo a partir do momento em que a mãe deseja um terceiro entre ela e o filho Eis o pai O pai é o terceiro que a mãe deseja Freud não deu explicação científica para o mundo mítico Propôs um novo mito eis o que ele fez WITTGENSTEIN Claro que Freud propôs um mito novo mas que mito Que fecundidade É graças a esse formidável instrumento teórico que os psicanalistas sabem atualmente escutar seus pacientes e os consolar 74 Sobre o Édipo Afinal o Édipo é uma realidade observável ou uma fantasia deduzida pelos psicanalistas Já lhes mostrei que o Édipo era ao mesmo tempo realidade e fantasia mas aproveito sua pergunta para abordar o problema de outro ângulo Digamos que o complexo de Édipo seja um conjunto de sentimentos contraditórios de natureza incons ciente refletindo os sentimentos conscientemente vividos pela criança na relação triangular com os pais No fundo o Édipo é um complexo intrasubjetivo engendrado por uma realidade inter subjetiva É importante conceber o Édipo como uma fantasia inconsciente em um único indivíduo ainda que seja preciso o apoio de outro indivíduo desejante acabamos de ver isso ao ler Freud para que essa fantasia se forme e subsista Por outro lado sabemos que a fantasia edipiana é uma hipótese uma construção do espírito construída a partir dos compor tamentos da criança a respeito dos pais e sobretudo a partir das recordações infantis relatadas por nossos pacientes adultos em análise De fato o Édipo nem sempre é um fenômeno observável ou uma hipótese verificável A psicanálise não é uma ciência do comportamento Não O Édipo deve ser to mado como um esquema teórico eficaz com impacto inegável na vida afetiva de um indivíduo em nossa cultura É portanto falando propriamente uma fantasia e um mito Digamos com mais clareza ainda de um ponto de vista clínico o Édipo é uma fantasia que atua desde o âmago do ser e o impregna por inteiro E do ponto de vista cultural o Édipo é um mito mito de todos uma vez que é a fábula simbólica simples e chocan te que põe em cena personagens familiares encarnando as forças do desejo humano e os interditos que se lhes opõem 75 Perguntas e respostas sobre o Édipo Ora seja fantasia ou mito o complexo edipiano também é um conceito crucial absolutamente indispensável à consistência da teoria e à eficácia da prática psicanalítica Não hesito em lhes dizer sem o conceito de Édipo a maioria das noções analíticas estaria à deriva e sem a fantasia do Édipo seríamos incapazes de esclarecer a infinita complexidade dos sofrimentos psíquicos Seguramente é graças a esse formidável instrumento conceitual que os psicanalistas sabem atualmente escutar seus pacientes compreendêlos e consolálos Penso aqui em um texto em que Lacan já assinala o valor teórico insubstituível do Édipo Eis o que ele escreve em sua Proposição de 9 de outubro de 1967 sobre o psicanalista da Escola Eu gostaria de iluminar meu ponto essencial simplesmente com o se guinte retirese o Édipo e a psicanálise tornase inteira mente da alçada do delírio Incontestavelmente o Édipo é a pedra angular do edifício analítico ele é uma crise manifesta da sexualidade infantil uma fantasia inconsciente um mito social e o conceito mais crucial da psicanálise Na tragédia de Sófocles o personagem principal é o destino sobre o qual os heróis não têm influência alguma Qual seria o lugar do destino no complexo de Édipo Não se esqueça de que Freud sempre foi obcecado pelo des tino pelo que a vida nos reserva e ignoramos O jovem Édipo termina por matar o pai ao passo que paradoxalmente Laio fizera de tudo para escapar ao oráculo que pressagiava o gesto parricida do filho Ninguém conhece seu destino ou dele escapa Assim o complexo de Édipo é a prova da qual criança alguma escapa e que a marca para sempre Mas de que prova 76 Sobre o Édipo iniciática se trata Qual é esse ritual incontornável que deno minamos Édipo É a experiência de uma perda e de um luto o dos pais fantasiados como parceiros sexuais Sim o Édipo é na vida de uma criança a primeira separação profunda e inte rior dos pais É uma separação obrigada que prenuncia a fu tura emancipação do jovem adulto Quer se trate do Édipo feminino ou masculino em ambos os casos são os pais que perdemos e isto inelutavelmente Decerto a criança já se separou da mãe ao nascer ganhou independência ao andar e rompeu seu casulo familiar ao ir para a creche mas é apenas no fim do Édipo que o menino e a menina vão perceber diferentemente os pais e amálos de outra forma Claro é de uma separação ideal que lhes falo uma vez que em nossa vida cotidiana continuamos sempre a desejar nossos pais o mais freqüentemente sob a forma sublimada da ternura e outras vezes infelizmente sob a forma de um conflito penoso devi do à persistência de um desejo sempre virulento A propósito do menino poderia voltar à expressão Édipo invertido O Édipo invertido é a atração sexual de uma criança pelo pai do mesmo sexo Em relação ao Édipo masculino colocamos geralmente a ênfase no apego erótico do menino com a mãe e na rivalidade odiosa a respeito do pai Ora muitas vezes acontece de o Édipo masculino girar não em torno da rela ção desejante do filho com sua mãe mas da relação desejante do filho com seu pai considerado um parceiro sexual Sim o pai pode ser na cabeça do filho um parceiro sexual E é isso que denominamos um Édipo invertido Em que consiste ele 77 Perguntas e respostas sobre o Édipo Para lhe responder apresentarei o Édipo do menino como uma peça em três atos É realmente divertido fazer o comple xo edipiano viver dessa forma marcados que somos pela tra gédia grega Tal artifício nos permitirá não apenas lembrar de outra maneira o essencial da dinâmica edipiana como apro fundar a idéia de que o personagem principal do Édipo mas culino é mais freqüentemente o pai que a mãe Vamos aos três atos do drama Comecemos pelo primeiro ato que inclui indiferentemente a menina e o menino O pano se abre e todos os personagens aparecem ao mesmo tempo no palco um garotinho uma garotinha uma mãe um pai e até mesmo todos os seres humanos que habitam nosso planeta Imaginem um palco cheio de gente de um mundo em que todos aos olhos das duas crianças são detentores de uma potência representada por um sinal corporal visível o pênis Na cabeça da criança menino ou menina todo mundo possui um pênis ou melhor todo mundo é investido da po tência representada pelo pênis Freud chama essa abertura do Édipo de premissa da possessão universal do Falo É o momento em que reina na criança a crença mágica em um universo inteiramente povoado por portadores de um pênis maravi lhoso Corrijome imediatamente e em vez de usar a expres são pênis maravilhoso utilizo o termo Falo Desculpe mas ainda não compreendi como se passa do pênis ao Falo O que entende exatamente por Falo Falo é o nome que damos à fantasia do pênis à interpretação subjetiva do pênis à maneira que cada um e cada uma tem de perceber o apêndice peniano Mais genericamente usamos a 78 Sobre o Édipo palavra Falo para designar a fantasia de todo objeto que se reveste a nossos olhos de crianças ainda que adultos do mais alto valor afetivo Quando digo aos nossos olhos de crianças é para fazêlos compreender que o amor apaixonado que di rigimos a uma criatura ou a um objeto é sempre um amor de criança uma vez que amar é apenas um aprimoramento da candura infantil Amar é acreditar em toda inocência e essa inocência nos é preciosa que o outro nosso amado saberá um dia nos completar Pois bem essa soberba esperança que é o amor me torna feliz me dá tranqüilidade e força Da mesma forma todo objeto amado admirado e possuído me tranqüili za e me conforta em meu sentimento de ser eu mesmo Ora esse objeto tão investido tão carregado de toda a minha afeti vidade e que me é indispensável chamase Falo Assim a pala vra Falo designa não apenas o pênis quando fantasiado isto é quando vivido como símbolo da força como também toda pessoa objeto ou ideal a que sou visceralmente ligado de que sou dependente e que sinto como a fonte de minha potência Falo é portanto o nome que damos a qualquer coisa altamen te investida tão investida e amada que não cessa de ser concre ta para ser fantasiada Uma mãe um pai nosso cônjuge o pênis o clitóris ou mesmo uma casa uma carreira uma promoção tudo são suportes concretos que podem se tornar o nosso Falo Ora qual é a coisa concreta que dá à criança edipiana o sentimento de ter um Falo Respondo seu corpo seu próprio corpo seu corpo de sensações Com efeito para o menino a base real do Falo é seu pequeno sexo enquanto apêndice erógeno ou ainda as excitações que emanam dos testículos ou do baixoventre Quanto à menina a base real de seu Falo é o 79 Perguntas e respostas sobre o Édipo conjunto das sensações erógenas provenientes de seus órgãos genitais em particular de seu clitóris Se o compreendo bem uma mãe por exemplo pode ser aos olhos do filho tanto portadora de um Falo quanto ser ela pró pria um Falo Precisamente Quando a mãe impõe sua autoridade ela tem o Falo mas quando a criança a sente toda dele ela é seu Falo Se minha mãe se zanga comigo ela é fálica e todopoderosa se em contrapartida rivalizo com meu colega para saber quem tem a mamãe mais bonita minha mãe é meu Falo mais pre cioso Vocês vêem que uma mãe pode ser duplamente fanta siada como tendo o Falo e como sendo o Falo Um menino pode então ter dois Falos seu pênis e sua mãe Claro E será justamente o problema a ser resolvido pelo me nino edipiano não podendo manter os dois Falos terá de escolher um ou outro o pênis ou a mãe Mas não antecipe mos pois essa escolha crucial só será feita no segundo ato do nosso drama edipiano Por ora permaneçamos no primeiro Eu lhes dizia então que a criança acredita que todos os seres humanos são dotados do mesmo atributo que ela tanto valo riza o Falo Menino ou menina a criança experimenta sensa ções erógenas observa seu sexo se toca se acha todopoderosa e olha em silêncio os personagens que a cercam atribuindo lhes um sentimento similar de onipotência É de fato na per cepção de si mesmo que se forja em silêncio a crença mágica em um Falo universal Ver sentir e acreditar são portanto os 80 Sobre o Édipo três primeiros gestos mudos da criança edipiana Em suma meninos e meninas inauguram seu Édipo a partir da ilusão que eleva o Falo ou seu representante corporal o pênis ao nível de atributo universal Eis o primeiro ato da nossa peça em que todos são fortes Ato essencial mas freqüentemente esquecido na literatura analítica ao passo que é o degrau obri gatório que dá acesso ao conceito de angústia de castração Por quê Porque é preciso em primeiro lugar acreditar que se é forte e rico para ver surgir o medo de ser despossuído Chegamos agora ao segundo ato do Édipo masculino o Édipo da menina segue outro roteiro É quando justificare mos nossa proposição segundo a qual é o pai e não a mãe que é o personagem principal do Édipo do menino E eis o argumento Sempre habitado pela ilusão de um Falo universal o menino estabelece duas relações afetivas essenciais uma relação de desejo com a mãe considerada objeto sexual e principalmen te uma relação de amor com o pai tomado como modelo a ser imitado o menininho faz assim do pai um ideal ao qual gostaria de se assemelhar Em suma o laço com a mãe obje to sexual não passa para o menino do apetite de um desejo ao passo que seu laço com o pai objeto ideal repousa em um sentimento de amor Essas duas moções desejo pela mãe e amor pelo pai diznos Freud aproximamse uma da outra acabam por se encontrar e é desse encontro de sentimentos que resulta o complexo de Édipo normal Traduzo dizendo que para um menino o complexo de Édipo normal significa desejar a mãe e assemelharse ao pai Mas entremos agora no terceiro ato De repente o meni ninho sentese incomodado pela presença imponente de um 81 Perguntas e respostas sobre o Édipo rival que lhe barra o caminho em direção à mãe A criança vêse então ameaçada por um concorrente mais forte que ela Sob o efeito da angústia de ter perdido angústia de castração o menininho vai finalmente renunciar ao desejo de possuir a mãe e de eliminar o pai Que reviravolta cênica Eis que se opera uma inversão inesperada da situação Amea çado de castração e sem objeto a almejar o menino voltase subitamente para o pai e se pergunta Mas por que não mu dar de parceiro Por que não ele Em vez de saciar meu dese jo de possuir uma mulher pensa poderia saciálo com o mesmo prazer deixandome possuir por um homem forte e viril Que aconteceu Tudo estremeceu De ideal que susci tava admiração e de rival que inspirava medo o pai tornouse uma criatura que excita o desejo do menino Antes o pai era o que queríamos ser um ideal agora o pai é aquele que que ríamos ter oferecendonos a ele Com efeito é muito fre qüente um menino pequeno reagir à ameaça de castração de um pai excessivamente severo retraindose em uma posição feminina e colocandose no lugar de uma mulher submissa objeto do desejo paterno Eis como concebo o Édipo inverti do expressão desgastada e raramente bem compreendida O Édipo invertido tão importante para compreendermos a origem da neurose masculina consiste em uma reviravolta radical dos sentimentos do menino em relação ao pai o pai objeto admirado odiado e temido aparece aos olhos da criança como um possível parceiro sexual ao qual ele gostaria de se entregar O desejo de possuir a mãe transformouse em desejo de ser possuído pelo pai e o desejo de afastar o pai transformouse em desejo de o atrair para si Eis a dupla in 82 Sobre o Édipo versão da configuração clássica do Édipo masculino Assim o pai apresentase aos olhos do menino sob quatro aspectos distintos amado como um ideal odiado e temido como um rival e desejado como um parceiro sexual a quem se oferece Dessas quatro moções amor ódio medo e desejo pelo pai é sobretudo o desejo que eu queria enfatizar em razão de sua importância na formação da identidade do futuro rapaz Mas atenção Não é porque o menino deseja o pai que se tornará obrigatoriamente homossexual ou neurótico Possivelmente uma vez adulto será arrebatado por uma estranha ternura e uma delicada sensibilidade mas sem por isso sofrer de dis túrbios neuróticos Em suma eis o essencial da minha propo sição a neurose masculina é em geral provocada por um Édipo invertido congelado em uma fantasia intrusiva o problema do neurótico é sempre uma relação conflituosa com o genitor do mesmo sexo Um corolário finalmente para o Édipo do menino os traços marcantes do pai amado como ideal odiado e temi do como rival e desejado como objeto sexual definirão o supereu normal do rapaz Com efeito o supereu é o resultado da incorporação no eu desses quatro rostos do pai É graças a essa introjeção que a criança começa enfim a se separar de seu pai real uma vez que o percebe diversamente algo mu dou na disposição interior do menino em relação ao pai Ele se separa do pai real mas o preserva em seu eu sob a forma de um supereu ora estimulante para se atingir um ideal ora cruel e temível para sancionar uma conduta ora excitante para rea lizar um desejo mas sempre mantendo a sensação de pudor necessária à vida em sociedade 83 Perguntas e respostas sobre o Édipo Mas como o senhor situa o complexo de castração nesse drama O complexo de castração situase precisamente no terceiro ato Castração sempre quer dizer angústia pois não há castra ção senão sob a ameaça angustiante que pesa sobre o sujeito Se deixarmos de lado o caso do Édipo invertido e permane cermos na configuração edipiana clássica segundo a qual o filho deseja incestuosamente a mãe podemos deduzir três causas que provocam a angústia de castração Em primeiro lugar simplesmente a presença da pessoa do pai na realidade tratase como vimos de uma presença angustiante Em se guida a voz imperiosa do pai intimando o menino Você não pode Você não tem o direito de perseverar em seu desejo Em outras palavras Você vai se haver comigo Ob servem que essa ameaça pode ser proferida pela mãe ou por uma tia tanto faz ela exprime invariavelmente uma lei social marcada pela autoridade paterna Pouco importa a pessoa que evoca o interdito o essencial reside no caráter paterno de uma lei incontestável Vejam bem é porque a lei é incontes tável que é paterna Com efeito a lei do interdito do incesto e todas as leis em geral permanecem marcadas pelo sinete da autoridade paterna porque não são negociáveis Portanto é indiferente que a voz que evoca o interdito seja masculina ou feminina o essencial é a firmeza do tom para dizêlo É pre ciso que a ameaça seja proferida por uma firme e calma auto ridade que sabe julgar condenar e punir Você não deve ir para cama com sua mãe e a tomar como objeto sexual senão será punido Punido como Punido com a castração do seu pênis ou melhor punido com a castração do que anima sua arrogância todopoderosa Enfim a terceira causa de angús 84 Sobre o Édipo tia tampouco consiste em uma ameaça verbal proferida pela voz de um censor mas em uma ameaça sugerida por ocasião de uma experiência visual O menino pois continuamos no Édipo masculino descobre um dia no corpo nu da mãe ou de uma garotinha a sombra escura de uma ausência Ao ob servar a falta de pênis na região pubiana sente medo e se angustia Uma vez que ela não tem pênis pensa então não tem poder Ora se existe uma criatura sem pênis isso signifi ca que eu também corro o risco de ficar privado dele Em suma esmagado pela presença imponente da pessoa do pai ameaçado pela lei punitiva e chocado com a constata ção visual de que existem seres castrados o menino angustia se recalca seus desejos e fantasias incestuosas e modera seu prazer Freqüentemente é a tese do Édipo invertido o menino angustiado refugiase covardemente em uma posi ção de submissão feminina a respeito do pai situação em que viverá uma nova angústia de castração despertada pelo risco de perder a virilidade Enquanto no Édipo masculino em que a mãe é o objeto incestuoso a ameaça de castração incide sobre o Falopênis no Édipo invertido em que o pai é o objeto incestuoso a ameaça de castração incide sobre o Falo virilidade É a angústia que faz a criança recuar e se separar dos pais Exatamente Voltemos ao caso da mãe O garoto sente medo e se separa da mãe Eis por que eu diria que sua angústia é uma angústia saudável pois graças a ela a criança vêse obri gada a se separar da criatura até então mais próxima da qual devia necessariamente segundo a ordem das coisas huma 85 Perguntas e respostas sobre o Édipo nas se afastar Pela primeira vez na história da evolução de sua libido a criança vêse confrontada com a prova decisiva de uma escolha Ou você pára de desejar sua mãe ou perde a força É uma escolha crucial Ou escolho o objeto inces tuoso ou me preservo narcisicamente Ou conservo minha mãe ou conservo meu pênis Claro é meu pênis que vou conservar Observem que esse tipo de alternativa radical evoca as escolhas eminentes às quais somos freqüentemente con frontados em nossa vida de adultos A partir do momento que queremos realizar nosso desejo constatamos o surgimento da angústia Será que sou capaz disso Não vou pôr tudo a per der No momento de decidir e agir surge a angústia Ora de acordo com a experiência do Édipo tal como a interpreto nós escolhemos sempre o objeto narcísico isto é escolhemos sempre nos preservar a nós e a nosso corpo Decididamente o ser humano é essencialmente medroso e narcísico diante do perigo com freqüência deixa o objeto de seu desejo cair julgando salvar a pele Ouço aqui um hipotético supereu ana lítico que tranqüilizaria o homem trêmulo diante dos riscos inerentes à afirmação de seu desejo Ele lhe diria Não tenha medo Deixese carregar pelo desejo Siga seu caminho Vá aonde o destino o espera Ocorre porém outro fenômeno notável Uma outra per da terá lugar perda muito mais importante que a da mãe O menino pode perder a mãe e conservar o pênis mas logo descobre que sem o objeto do desejo a mãe o pênis acaba por perder seu valor de Falo De que serve me sentir forte se não há um outro que me deseje Decerto o pênis é útil mas sob a condição de que haja um outro desejante e desejável 86 Sobre o Édipo O menino perde a mãe e simultaneamente o valor fálico de seu pênis No fundo essa perda de valor é mil vezes mais importante que a perda da mãe que já é sem dúvida uma experiência fundamental Melhor ainda o drama edipiano é a mais bela lição sobre o valor relativo de nossas árduas con quistas O mito de Édipo é de um alcance ético extraordiná rio Podem continuar me dizendo Mas o Édipo o complexo de castração de cem anos para cá as coisas evoluíram a cultura a sexualidade não são mais as mesmas poderíamos muito bem viver sem o Édipo etc Claro que quero prescin dir da lenda edipiana mas criem outra que consiga explicar tão bem o sentido profundo das provas vitais que nós adultos atravessamos incessantemente A primeira prova é aceitar que diante de uma escolha difícil nunca perderei tudo e se ga nhar nunca ganharei sem perda O senhor acaba de nos mostrar como a peça se desenvolve para o menino e para a menina O roteiro do Édipo feminino é bem diferente Lembremos que durante o primeiro ato do drama edipiano reina como para o menino a premissa da possessão universal do Falo to dos são portadores do Falo e por conseguinte todos são for tes Na menina porém diferentemente do menino há uma préhistória do Édipo e uma espécie de póshistória au sentes do Édipo masculino A préhistória do Édipo femini no associase à relação estreitíssima da mãe com a filha Antes do advento da fase fálica no momento de aleitamento no seio a mãe apresentase à filha como objeto de desejo mas sobretudo como objeto que abastece seu narcisismo e ali 87 Perguntas e respostas sobre o Édipo menta sua potência Em uma palavra a mãe desempenha fun ção de Falo para a menina Na aurora do Édipo feminino o objeto do desejo da menina assim como no caso do menino é em primeiro lugar o seio e logo depois com o desmame a pessoa da mãe a zona erógena dominante é a boca Durante a fase oral o seio materno representa o mais terno Falo Com pletemos acrescentando um outro elemento essencial do Édipo feminino Com o desmame a menina já sente um amargo ressentimento contra uma mãe que acaba de privála do pra zer de mamar A perda do seio suscita no bebê menina uma hostilidade que será reativada mais tarde durante a fase fálica em si Observemos que essa amargura provocada pelo desma me é segundo Freud mais moderada no menino Mais tarde o Falo da menina não será mais representado pela mãe como objeto incestuoso mas pela força atribuída ao pai O Édipo feminino culmina no momento em que a menina já tendo feito a experiência da separação da mãe está preparada para desejar o pai renunciarlhe introjetar os traços de sua pessoa e seus valores e finalmente substituílo uma vez jovem mu lher por um parceiro masculino Por que afirmar que a filha odeia a mãe por ocasião do desmame O que isso tem a ver com o complexo de castração na mulher Muitos malentendidos circulam sobre o conceito do com plexo de castração na mulher Julgase equivocadamente que não há castração na mulher porque seu corpo é desprovido de pênis e que ela não teria nenhum órgão suscetível de ser castrado Ora não se trata disso Segundo Freud o complexo de castração na mulher existe efetivamente mas prefiro após 88 Sobre o Édipo ter estabelecido a lógica do Édipo feminino darlhe o nome de complexo de privação Esse complexo é inaugurado com uma impressão visual a menina vê o corpo nu de um menino e constata comparandose com ele que não apenas é despro vida de pênis como desprovida da potência que o pênis signi fica isto é o Falo A ausência de pênis a leva a perder a ilusão da premissa universal do Falo e sentir vontade de têlo Ter o quê Não tanto o pênis em si mas a ilusão de potência susci tada pelo órgão Chamo essa sede de poder de inveja do Falo e não inveja do pênis Acredito profundamente no interesse clí nico de apresentar dessa forma o conceito da inveja feminina do Falo pois na clínica das mulheres histéricas é sempre o problema do poder que se coloca bem como do medo neu rótico de ser dominada Com a constatação de ser despossuída surge então na menina uma série de sentimentos Em pri meiro lugar a desilusão em seguida a nostalgia desse poder ilusório e depois e sobretudo um ressentimento a respeito da mãe que não lhe a frase clássica seria que não lhe deu mas prefiro falar de ressentimento a respeito da mãe que não sou be preparála para essa constatação nem lhe poupar o mo mento em que ela descobriria a perda de sua ilusão É como se ela dissesse Mamãe você já sabia que eu ia me decepcio nar Por que não me avisou É portanto um ressentimento a respeito da mãe ressentimento que atualiza o antigo ódio provo cado pelo desmame do primeiro período préedipiano Então não é a angústia que prevalece na menina Não Nesses momentos não observamos nenhuma angústia Se os principais sentimentos do Édipo masculino são o dese 89 Perguntas e respostas sobre o Édipo jo e a angústia os do Édipo feminino são sobretudo o desejo o sofrimento e a inveja Contudo reconhecemos uma angús tia típica na mulher adulta Tratase de uma angústia bem particular que Freud desvenda apenas no fim de sua obra A angústia feminina é com freqüência esquecida nos trabalhos analíticos pois tendese a pensar que a angústia permanece o traço distintivo do menino enquanto a menina seria afetada pela inveja ou o ódio Na clínica observamos muito uma angústia própria da mulher a angústia de perder o amor que lhe dedica o amado Em uma mulher o medo não é tanto de nunca encontrar o amor mas de perder o amor conquistado Para a mulher o Falo é o próprio amor a coisa inestimável que nunca se deve perder 4 O Édipo é a causa das neuroses ordinárias e mórbidas do homem e da mulher blank image 93 A neurose ordinária resulta de um Édipo mal recalcado a neurose mórbida de um Édipo traumático Cada recémchegado ao mundo está imbuído do dever de consumar o complexo de Édipo quem não consegue está fadado à neurose Na raiz de todo sintoma encontramos impressões traumá ticas que têm origem na vida sexual infantil SIGMUND FREUD Antes de tudo o que é uma neurose É um sofrimento psí quico provocado pela coexistência de sentimentos contradi tórios de amor ódio medo e desejos incestuosos para com quem se ama e de quem se depende Seguindo essa definição diremos então que o Édipo não apenas está como veremos na origem das neuroses de adultos como ele próprio é uma neurose a primeira neurose saudável na vida de um indiví duo a segunda sendo a crise da adolescência Mas em que o Édipo é uma neurose Tudo reside na defasagem entre um eu infantil em formação e um afluxo pulsional transbordante O eu da criança ainda não dispõe de meios para conter a escala 94 Sobre o Édipo da impetuosa de seus desejos Esse esforço do eu para conter e assimilar o arrebatamento do desejo traduzse na criancinha por sentimentos palavras e comportamentos contraditórios em relação aos pais Essa atitude ambivalente até mesmo in coerente da criança vai instalarse duradouramente na per sonalidade do sujeito como um modelo de todas as atitudes que ele adotará adulto diante daqueles que despertarem nele o desejo de possuir o outro ser possuído por ele ou destruí lo Eis por que podemos dizer que nossos conflitos mais coti dianos e sempre inevitáveis com quem nos cerca não passam dos prolongamentos naturais quase reflexos de nossa neuro se infantil conhecida como complexo de Édipo Em outros termos nossos conflitos cotidianos provêm do fato de que no seio de nossos sentimentos mais nobres e mais castos a respeito daqueles que amamos agitamse desejos sexuais in cestuosos A crispação da nossa neurose atual é portanto pro vocada pela impossibilidade de realizar plenamente ou ao contrário evitar totalmente nossos impulsos incestuosos As sim diremos que o Édipo primeira neurose saudável da vida está na origem de nossa penosa neurose ordinária de adulto neurose penosa decerto mas pesando tudo tolerável e por que não uma defesa contra a loucura pulsional que sempre ameaça irromper em cada um de nós Isto posto pode acontecer e é freqüente de durante o período edipiano a criança ser arrebatada por sensações de prazer ou dor muito intensas e que essas sensações a marquem para sempre como traumas indeléveis Pois bem esses traumas infantis serão a causa não de uma neurose ordinária mas de uma neurose mórbida que se instala na adolescência e persiste 95 O Édipo é a causa das neuroses na idade adulta Em suma distingo duas grandes variantes do retorno neurótico do Édipo na idade adulta a neurose ordi nária e a neurose mórbida A neurose ordinária portanto con siste no conflito com as criaturas que amamos intimamente porque continuamos sempre a desejálas com ardor Essa neu rose de todos os dias perfeitamente compatível com uma vida social aberta e criativa é resultado da dessexualização insufi ciente dos pais edipianos As fantasias infantis de prazer e an gústia mal recalcadas preservaram toda sua virulência e geraram essa neurose cotidiana presente em todos nós O outro tipo de distúrbio neurótico é a neurose mórbida e patológica que ao contrário manifestase por sintomas recor rentes que encerram o sujeito em uma solidão narcísica e doentia Esse sofrimento seja fóbico obsessivo ou histérico é provocado por um fator mais grave que o recalcamento insu ficiente das fantasias edipianas Tratase dos traumas singulares advindos em pleno período do Édipo Que traumas Em pri meiro lugar o de um abandono real ou imaginário que provo ca imensa aflição na criança Essa fantasia infantil de abandono resultará na fobia do adulto Outro trauma possível é o dos maustratos reais ou imaginários que infligem uma dolorosa humilhação à criança Essa fantasia de maustratos e de humi lhação resultará na obsessão Terceiro trauma enfim o mais espantoso aquele em que a criança experimenta durante um contato excessivamente sensual com o adulto de quem de pende um intenso e sufocante prazer Essa fantasia de sedução resultará na histeria Quer se trate da aflição do abandono da humilhação por maustratos ou da sufocação ligada à sedu ção estamos sempre na presença da angústia de castração sob 96 Sobre o Édipo a forma mais mórbida que confina com um terror de castração Diremos portanto que a fobia a obsessão e a histeria são os diferentes modos de retorno do Édipo traumático à idade adulta Acrescento que essas três categorias de neuroses nunca aparecem isoladas e puras e sim imbricamse à maneira de uma neurose mista de predominância fóbica histérica ou obsessiva Observemos também que esses traumas edipianos foram às vezes sofridos não pela própria criança mas por um ascendente que lhe transmitiu inconscientemente a angústia de um choque traumático Uma mulher sofrendo de agorafobia crônica por exemplo declara nunca ter sido abandonada em sua infância mas descobre ao longo da análise que sua mãe fora ainda pequena vítima de um abandono brutal durante a guerra Eis um caso de transmissão transgeracional de uma fantasia de abandono geradora de uma fobia Dizíamos então que a neurose patológica tanto no ho mem quanto na mulher é o retorno na idade adulta da an gústia de castração traumatizante vivida durante a infância Segundo o modo de retorno dessa angústia surgirá um sofri mento neurótico específico ver FIGURA 4 p103 Clinica mente falando se estivermos em presença de um paciente fóbico deveremos interrogar sua infância para nela descobrir um eventual incidente em que ele teria ficado angustiado por um brutal abandono seja este abandono real ou imaginá rio Se nosso paciente for histérico é outra recordação traumá tica que deveremos procurar Dessa vez o analisando lembrase de ter se assustado não mais com um abandono mas com outra violência bem mais sutil e insidiosa Lembrase de ter sido cativado e excitado por um adulto sedutor pai mãe 97 O Édipo é a causa das neuroses irmão mais velho ou amigo da família A propósito desse trau ma na origem da histeria o leitor pode se reportar às páginas 11820 e em particular à FIGURA 6 Enfim se escutarmos um paciente obsessivo será sempre uma recordação que devere mos descobrir mas cuja cena mostra uma criança impotente e furiosa temendo as represálias do pai por um erro que ig nora Em suma quer se trate de fobia histeria ou obsessão o sofrimento de um neurótico é explicado por sua necessidade de repetir compulsivamente a mesma situação na qual sofreu o impacto de uma angústia traumática Em outras palavras a neurose é o retorno compulsivo de uma fantasia infantil de angústia de castração Assim concluiremos que no caso da neurose masculina a fobia é o retorno na idade adulta da fantasia de angústia de ser abandonado pelo pai repressor que a histeria é o retorno da fan tasia de angústia de ser assediado pelo pai sedutor e a obsessão finalmente é o retorno da fantasia de angústia de ser maltrata do e humilhado pelo pai rival FIGURA 4 Vemos claramente que é sempre o pai o personagem principal das fantasias trau máticas na origem das três neuroses masculinas Com efeito a neurose do homem e como veremos da mulher resultam da fixação de uma cena em que o personagem principal é fre qüentemente o genitor do mesmo sexo Seja o Édipo mal re solvido ou traumático o conflito infantil causa da neurose é mais freqüentemente travado entre o menino e o pai ou en tre a menina e a mãe Em suma o que gera a doença não é tanto viver uma experiência intensa com o outro diferente mas vivêla com o outro semelhante o outro si mesmo A neurose do adulto é sempre uma patologia do mesmo uma 98 Sobre o Édipo doença do narcisismo Um jovem paciente por exemplo me contou Sofro por ficar dividido entre o amor pelo meu pai a vontade de me parecer com ele o desejo de agradálo o medo de me tornar desprezível o ódio que sinto por ele e finalmente minha revolta contra sua autoridade Eis o grito de um filho neurótico que sofre por ficar fascinado e horro rizado com a imagem do pai tão próxima da sua A reativação do Édipo traumático sob a forma da neurose feminina repulsa sexual complexo de masculinidade e angústia de ser abandonada Passemos agora ao caso da mulher neurótica Uma vez supe rada a crise edipiana deveríamos concluir que a menina tor nouse uma criatura pacificada sem sombra de uma neurose ilesa das seqüelas do sofrimento passado e da inveja ciumen ta Claro que não A vida de uma mulher permanece geral mente agitada pela persistência de antigos conflitos edipianos Afirmo desde já que de todas as paixões infantis que subsis tem na vida de uma mulher a mais perturbadora é sem dúvi da alguma a inveja ciumenta do Falo Quando vivida de forma excessivamente febril na infância essa inveja infantil pode res surgir violentamente na idade adulta manifestandose seja por uma repulsa sexual histérica seja por uma atitude carac teriológica denominada complexo de masculinidade No 99 O Édipo é a causa das neuroses caso da histeria a mulher continua a achar como uma meni ninha que não é digna de interesse nem de amor e se resigna à sua sorte com amargor e tristeza Instalase então nessa mulher despeitada uma viva repulsa pela sexualidade duplicada por uma grande solidão No caso do complexo de masculinidade ao contrário a mulher substitui a crença de ser castrada e inferior pela crença oposta e igualmente infundada ser mu nida do Falo Em vez de se julgar castrada julgase onipoten te brande o Falo exibeo em uma atitude de desafio e acentua os traços masculinos a ponto de se tornar mais viril que o homem Uma das variantes desse complexo de masculinida de assume a forma da homossexualidade manifesta Observe mos de passagem que a hipertrofia da masculinidade na mulher pode revelarse além disso como uma das resistências mais tenazes ao trabalho terapêutico e tornarse o rochedo contra o qual freqüentemente naufraga o tratamento analítico A ri validade odiosa dirigida ao homem pode transformarse na analisanda em uma revolta contra a arbitrária autoridade mas culina atribuída ao psicanalista Gostaria finalmente de acrescentar outra variante edipia na da neurose feminina variante próxima da normalidade Tratase da angústia de uma angústia propriamente feminina Afirmei até aqui que a angústia prevalecia na posição mascu lina e que a dor de privação caracterizava em contrapartida a posição feminina Entretanto há uma angústia tipicamente feminina que considero um exemplo da angústia de castra ção a saber o medo na mulher de ser abandonada pelo homem amado O desejo de ser amada e protegida é tão poderoso no inconsciente feminino que a jovem mulher não obstante so 100 Sobre o Édipo lidamente envolvida em sua relação tem sempre medo de ser privada do amor de seu companheiro Ao menor conflito lança suspeitas sobre seu parceiro querer deixála Criancinha já fora enganada pela mãe agora adulta desconfia dos ho mens Teme perder a coisa que preza acima de tudo o amor a alegria de amar ser amada e sentirse protegida Se para o homem o Falo é a força para a mulher ele é a felicidade de ser amorosa e ser amada por aquele a quem ama Para o ho mem o Falo é a força para a mulher é o amor Da mesma forma que havíamos dito que o homem era uma criatura preocupada em salvaguardar sua virilidade diremos que a mulher vive na obsessão de ser abandonada Assim para a mulher angustiada o amor permanece uma conquista frágil a ser reconquistada incessantemente e sempre confirmada ver FIGURA 5 p105 e FIGURA 8 p1267 Imagino agora o que seria a união do homem e da mu lher neuróticos um em posição masculina temendo que a mulher roube seu sexo angústia de castração o outro em po sição feminina temendo que o homem a abandone angústia de ser abandonada Será a isso que se reduziria o par homem mulher a um recrudescimento das angústias edipianas O homem preocupado com a perda de sua virilidade e a mu lher com a perda do amor Provavelmente não pois cada um por sua presença demonstra ao outro que sua angústia não é justificada O homem sinceramente envolvido em sua relação tranqüilizará sua companheira pela autenticidade de suas pa lavras e seus atos e a mulher igualmente engajada saberá garantir ao companheiro que apesar das provas difíceis en contrará sempre junto a ela a confirmação de sua virilidade 101 O Édipo é a causa das neuroses É assim que a relação entre um homem e uma mulher deve ria poder se estabelecer E no entanto a experiência nos en sina que entre essa configuração ideal e o fracasso retumbante de um casal todas as nuances são possíveis Agora vou lhes propor a vinheta clínica de uma paciente histérica que sofre de anorexia e cuja inveja inconsciente do Falo consome o corpo Como escutar uma anoréxica através da teoria do Édipo Eis a minha hipótese a anorexia resulta da identificação da jovem doente com seu irmão idealizado como filho predileto do pai Volto a pensar em Sarah nossa paciente anoréxica de quem falei há pouco Desafiando a razão ela quer alcançar o limiar quase fatal dos 41 quilos O senhor verá ela me diz brava mente sou capaz de continuar a viver sem voltar para o hospi tal É a minha aposta Preciso provar a mim mesma que posso atravessar o abismo Eis a loucura de Sarah Um desafio in sensato aos limites da vida e uma vontade cega de dominar e controlar o corpo Ora onde está aqui a presença do Édipo De que forma a teoria do Édipo tal como a concebo nos permite compreender o sofrimento dessa jovem Pois bem quando recebo essa paciente acho sempre que ela quer se 102 Sobre o Édipo tornar pura e leve até a transparência apagando todas as curvas e arredondamentos femininos de seu corpo Queria não ter mais seios nem nádegas menos ainda barriga Nenhum relevo Nada que evocasse a mulher Seu sonho tornarse um meni no imberbe sem pênis nem sinal de virilidade Esse ideal de homem assexuado esguio e frágil que ela queria ser não é outro em sua fantasia senão o filho maravilhoso que seu pai sonha seduzir e possuir sexualmente Sim ela queria ser o jo vem amante do pai isto é assumir o lugar de seu irmão adorado predileto do pai Sarah identificase assim com a masculinida de do irmão e se recusa a ser uma mulher porque acha como uma menininha de quatro anos que ser mulher equivale a ser castrada fraca e desprezada por um pai que só teria olhos para o filho Sarah parte do princípio do falso princípio de que a mulher é castrada e que por conseguinte deve fazer de tudo até mesmo arriscar a vida para mostrar a si mesma e ao mun do que é forte e que seu corpo pode ser moldado até atingir a silhueta de um efebo sem órgãos genitais Nossa paciente está sob a influência da inveja do Falo que traduzi aqui por sua inveja louca e ciumenta de ser ao mesmo tempo um menino com o desejo masculino de possuir e dominar e uma menina com o desejo feminino de ser possuída pelo pai Sua anorexia é a expressão do compromisso entre esses dois impulsos incons cientes Gostaria de dizêlo de outra forma formulando mi nha hipótese segundo a qual a anorexia é na maioria das vezes resultado de uma identificação inconsciente da adolescente com o irmão idealizado como o favorito do pai Naturalmente nes sa hipótese pode tratarse de um irmão virtual de um alter ego masculino uma vez que evidentemente nem todas as anoréxicas têm irmão Fantasia de angústia de castração A neurose é o ressurgimento compulsivo da fantasia de angústia traumática de castração na idade adulta Angústia de ser castrado abandonado pelo pai repressor Neurose fóbica Angústia de ser castrado assediado pelo pai sedutor Neurose histérica Angústia de ser castrado maltratado pelo pai rival Neurose obsessiva FIGURA 4 A neurose mórbida no homem é o ressurgimento compulsivo do Édipo traumático na idade adulta Comentário da Figura 4 Duas considerações A primeira diz respeito aos atores presentes É indiferente que a criança angustiada seja um menino ou uma menina e que o adulto que ameace repressor sedutor ou rival seja o pai a mãe o irmão mais velho a irmã mais velha ou qualquer outro adulto tutelar Entretanto a fantasia de angústia de castração mais freqüentemente encontrada nos tratamentos analíticos dos homens neuróticos é a de uma cena em que a criança é um menino e o adulto seu pai No caso das mulheres neuróticas encontramos o mesmo tipo de fantasia em que a filha tem medo das represálias da mãe Assim o conteúdo dessas fantasias é freqüentemente uma cena em que a criança está às voltas com o genitor do mesmo sexo Gostaria de dar o exemplo de uma fobia Penso no caso daquela mulher que tinha fobia dos transportes públicos cuja análise revelou que a causa de sua neurose remontava a um acontecimento trágico de sua infância a morte acidental da mãe Em vez de viver o sofrimento do luto como teria feito qualquer criança ela fantasiou essa morte como um castigo inesperado infligido pela mãe amada e falecida Foi então que sentiu a aflição de ser entregue a novos abandonos aflição hoje conhecida como fobia dos espaços fechados A outra consideração diz respeito a uma leitura cruzada entre as duas colunas da tabela É possível por exemplo que a angústia de ser abandonada pelo pai repressor reapareça sob a forma de uma neurose obsessiva e não mais fóbica ou que a angústia de haver sido seduzido por um genitor excessivamente carinhoso esteja na origem de uma neurose fóbica e não mais histérica A neurose é o ressurgimento compulsivo da fantasia da inveja ciumenta do Falo na idade adulta Fantasia da inveja ciumenta do Falo Inveja ciumenta de ter o Falo Repulsa sexual histérica Não tenho o Falo e estou muito bem assim Complexo de masculinidade Tenho o Falo e o exib0 Angústia de ser abandonada Tenho o FaloAmor mas sinto muito medo de perdêlo Desejo de ser possuída pelo pai FIGURA 5 A neurose mórbida na mulher é o ressurgimento compulsivo do Édipo traumático na idade adulta 5 Arquipélago do Édipo NEUROSE DO ADULTO COMPULSÃO DE REPETIÇÃO Adulto o sujeito sente a necessidade compulsiva de reviver a mesma sensação desse prazer que causa mal e voltar a representar a mesma cena traumática incluindo dessa vez não mais seus pais mas os parceiros de seu círculo atual FIXAÇÃO DO TRAUMA EM UMA CENA FANTASIADA QUE SE TORNA PATOGÊNICA Qual uma placa sensível o inconsciente da criança registra o impacto brutal do prazer erógeno associado à presença sensual do adulto É então que se imprime no inconsciente o clichê de uma cena fantasiada de sedução por um dos pais TRAUMA PSÍQUICO PRAZER SEXUAL TRAUMATIZANTE NA CRIANÇA EDIPIANA DEFASAGEM ENTRE O PRAZER SEXUAL E O EU INFANTIL De um lado um prazer erógeno intenso fulgurante desencadeado na criança por um adulto em estado de desejo e de quem a criança depende do outro um eu infantil siderado e incapaz de integrar mentalmente esse prazer transbordante É um problema de excesso e de defasagem temporal o prazer é forte demais e chega cedo demais FIGURA 6 A histeria sofrida por um adulto foi provocada por uma relação sensual demais entre a criança que ele era e seus pais O vivido prematuro de um prazer erógeno pode ser para a criança tão traumático quanto uma dor Não existe castração As figuras do pai no Édipo masculino As figuras da mãe no Édipo feminino As figuras do Falo no Édipo feminino O supereu e os três papéis do pai no Édipo masculino A brincadeira de boneca A fantasia da onipotência fálica A fobia é uma projeção a histeria uma rebelião e a obsessão um deslocamento A significação bissexual de um sintoma neurótico Que é histeria A histeria sofrida por um adulto foi provocada por uma relação excessivamente sensual entre a criança que ele era e seus pais A mulher histérica e seu medo de amar As três figuras lacanianas do pai no Édipo simbólico real e imaginário Os três tipos de falta no Édipo castração privação e frustração Uma leitura da tríade lacaniana Quadro comparativo entre as posições masculina e feminina 109 Não existe castração há apenas ameaças de castração Eis por que a castração não passa no fundo do nome de uma angústia jamais de uma realidade Desde o início empregamos constantemente a palavra castra ção sem havermos encontrado oportunidade de dissipar um possível malentendido quanto à sua significação Comece mos por dizer bem secamente que deixando de lado certos atos isolados de barbárie a castração não existe e que nin guém foi castrado para ser punido Decerto conhecemos to das as castrações ditas químicas destinadas a tratar como último recurso determinados doentes perversos como estu pradores ou pedófilos e sabemos também que doentes de caráter psicótico podem se automutilar sexualmente ou cas trar uma vítima Mas afora essas aberrações psicopatológicas insisto em dizer que a castração propriamente dita não existe Se Freud serviuse desse vocábulo tão sugestivo foi a fim de dramatizar até mesmo histericizar o perigo imaginário que ameaça todo homem e toda mulher desejantes isto é todo homem e toda mulher que buscam ardentemente o prazer corporal e mais além a felicidade Que perigo os ameaça O perigo de perder sua vitalidade sua vida a fonte íntima de 110 Sobre o Édipo seu desejo Em que consiste então a castração Ela é acima de tudo a idéia de um perigo o perigo imaginário inventado por um neurótico e que ele deve imperiosamente afastar É ao querer salvaguardar seu ser vital e estar sempre de pronti dão que o neurótico sofre por ser neurótico Por conseguinte é sempre o medo da castração e nunca a castração em si que está na origem dessa crispação que é o sofrimento neurótico Cada sintoma neurótico portanto deve ser compreendido como uma defesa crispada contra um medo essencial no ho mem o medo de perder a potência na mulher o medo de perder o amor Assim o vocábulo castração é uma incom parável alegoria psicanalítica que simboliza a hipotética perda de um hipotético objeto supremo Com isso compreendemos que para Freud cada um de nós é em última instância uma criança desejante e voraz me drosa diante das conseqüências de sua avidez guardião cioso de seu Falo e sentindose culpado de desejar Voraz medroso ciumento e culpado eis nosso retrato mais íntimo esboçado por Freud nas cores do Édipo As figuras do pai no Édipo masculino O pai é amado como um modelo ideal O pai é temido como repressor e censor O pai é desejado e temido como sedutor O pai é odiado e temido como um rival O amor do menino pelo pai admirado já existia bem antes da entrada na crise edipiana Os sentimentos de ternura e admi ração filiais persistem ao longo de toda a travessia do Édipo e encontram os sentimentos opostos que são o desejo a angús 111 Arquipélago do Édipo tia e o ódio É justamente o vivido simultâneo de todos esses sentimentos contraditórios que divide a criança e fomenta sua neurose O neurótico seja criança ou adulto é aquele que ao mesmo tempo ama teme deseja e odeia o pai As figuras da mãe no Édipo feminino No Tempo préedipiano A mãe todopoderosa provida do Falo mãe fálica é amada como uma figura ideal A mãe é desejada como um objeto sexual que a filha quer possuir Para a criança não apenas a mãe tem o Falo como é o Falo No Tempo da solidão A mãe é culpada pela filha por ter sido incapaz de dotá la do Falo símbolo da potência A mãe é então destituída de sua onipotência e abandonada No Tempo do Édipo A mãe como mulher que deseja um homem é um modelo de identificação A mulher é novamente amada mas dessa vez como um ideal feminino A mãe é odiada como uma rival As figuras do Falo no Édipo feminino Aos olhos da menina o Falo revestese de diferentes formas ao longo das sucessivas fases de seu Édipo 112 Sobre o Édipo No Tempo préedipiano a menina reconhece o Falo em suas sensações clitoridianas e na pessoa de sua mãe considera da o objeto eleito de seu desejo O Falo é portanto encarna do pelo clitóris como órgão de sensações erógenas e pela mãe como objeto do desejo incestuoso No Tempo da solidão ela reconhece o Falo no pênis fasci nante do menino e consciente de sua privação reconheceo também dolorosamente na autoimagem ferida O Falo é então encarnado pelo pênis invejado do menino e pela imagem de si No Tempo do Édipo o Falo é encarnado pela força do pai que a menina cobiça e mais tarde depois da primeira recusa paterna pelo elamesma como objeto que se oferece ao desejo do pai Finalmente após a segunda recusa paterna o Falo é para a filha seu pai introjetado Superado seu Édipo a menina agora mulher reconhece rá o Falo no pênis ereto do homem amado no amor que este homem lhe dirige e finalmente na criança fruto desse amor As sensações erógenas a mãe o pênis do menino a ima gem de si a força do pai o si mesmo a pessoa do pai o pênis ereto do homem amado o amor e depois a criança eis todos os avatares do Falo no Édipo feminino Cada um desses avatares corresponde exatamente à definição do Falo como sendo não apenas a coisa mais inestimável mas o regulador vital e insubstituível do nosso equilíbrio psíquico O supereu e os três papéis do pai no Édipo masculino O supereu essa parte autocrítica de mim mesmo essa parte do eu censor do eu é uma instância que faz reviver no psi 113 Arquipélago do Édipo quismo as três atitudes contraditórias do pai fantasiado Assim o supereu é um coro de três vozes a voz severa do interdito presentificado pelo pai repressor a voz cativante da tentação pre sentificada pelo pai sedutor e a voz denegridora da autocrítica presentificada pelo pai odioso e rival A brincadeira de boneca A menininha edipiana faz a boneca desempenhar dois papéis distintos No Tempo préedipiano ela repete com a boneca a relação com a mãe identificase com a boneca e simultanea mente identificase com a mãe acariciandoa Uma vez no Édipo propriamente dito a menina muda de papel agora ela é a mãe e sua boneca é o filho maravilhoso que o pai lhe deu A fantasia da onipotência fálica No espírito das crianças edipianas aqueles que detêm o Falo são criaturas fortes e os que não o detêm fracas Com toda a evidência tal ficção que considera pênis sinônimo de potên cia e falta de pênis sinônimo de fraqueza é um mangá imagi nado por crianças de quatro anos e de forma alguma um pensamento de adulto Contudo essa ficção infantil pode per sistir na idade madura como uma miragem que torna confli tuosa a relação do neurótico com seus próximos e consigo mesmo Assim o neurótico percebe aqueles que contam para ele segundo sua visão maniqueísta de fortes e fracos domi nantes e dominados 114 Sobre o Édipo A fobia é uma projeção a histeria uma rebelião e a obsessão um deslocamento Agora mudemos de perspectiva e expliquemos a presença do Édipo nas três neuroses apoiandonos na metapsicologia As sim diremos que a fobia resulta da projeção da angústia de castração sobre o mundo exterior A angústia inconsciente tornase medo consciente o perigo interior representado pelo pai repressor é projetado para fora para se tornar um perigo exterior encarnado por exemplo pelos animais Freud forne ceu uma eloqüente demonstração disso em seu célebre caso do Pequeno Hans O cavalo assustador é o pai e o medo dos cavalos traduz o medo de ser mutilado e abandonado pelo pai Em resumo a fobia pode ser definida como a projeção para fora de um perigo interno tornado assim um perigo externo como a substituição do pai ameaçador da fantasia por um ani mal assustador na realidade e como a transformação enfim de uma angústia inconsciente em um medo consciente Deixando de lado a histeria de conversão que resulta da concentração de toda a carga de angústia inconsciente no corpo provocando assim uma disfunção somática enxaqueca verti gens dores etc identifico outra forma de histeria muito mais insidiosa e muito freqüente que qualifico como histeria de rebelião Essa neurose é ocasionada pelo retorno na idade adulta da angústia infantil de ser seduzido por um dos genito res em particular o do mesmo sexo Entre as fantasias infantis de angústia a mais patogênica é a de uma cena em que o menino seduzido mas igualmente assustado desempenha o papel de uma mulher possuída pelo pai Se tal fantasia per siste ativa no inconsciente do homem histérico ela se exterio 115 Arquipélago do Édipo rizará então por um comportamento reativo de revolta per manente Por exemplo assim que se vê em uma relação nor mal de dependência em relação a um outro admirado ou a uma autoridade o histérico sentese oprimido submisso e a rigor sempre segundo suas fantasias rebaixado ao nível de uma mulherzinha castrada e tiranizada Ser dependente signi fica para ele ser uma mulher pois a mulher em sua fantasia é uma criatura fraca inferior ao homem e em todo caso dis pensável Assim depender de uma autoridade será vivido pelo neurótico como a pior das submissões e conseqüentemente será tomado pela mais urgente necessidade de se rebelar e proteger seu amorpróprio É então que a pessoa que encarna a autoridade tornase a seus olhos um déspota a ser abatido Quando um paciente adota tal posição histérica é extre mamente difícil para nós analistas revelar ao analisando sua fantasia de sedução inconsciente e sobretudo diluíla Por quê Porque o psicanalista a exemplo do pai tornase para esse paciente um temível sedutor e logo uma autoridade a ser destituída Se essa figura transferencial prevalece o trata mento corre o risco de ser brutalmente interrompido A fan tasia infantil de sedução pode invadir de tal forma a relação analítica que qualquer intervenção do terapeuta será sistema ticamente interpretada pelo analisando como um intolerável abuso de poder Freud o primeiro naufragou nesse destroço insuperável que qualificou como rochedo da castração Eu diria rochedo da angústia de castração uma vez que o que alimenta a rebelião veemente do neurótico contra o psicana lista não é outra coisa senão a angústia de ser escravo do pai e perder sua dignidade de homem Ao se revoltar o histérico 116 Sobre o Édipo julga salvar seu Falo que ele nunca teve das mãos de um tirano que o analista nunca foi Acrescentemos de passagem que podemos sofrer o mes mo fracasso no tratamento de uma mulher quando a analisanda amargurada recrimina seu psicanalista por sua arrogância e machismo Esse gênero de reação provém de uma inveja ciu menta a respeito do terapeuta que ela supõe portador do Falo isto é poderoso sempre feliz amado e admirado por todos Despeitada e furiosa ela também gostaria de ser dotada da mesma força mágica que ele até quem sabe maior percebê lo fraco e se tornar seu único recurso Ao passo que o homem interrompe o tratamento com medo de ser uma mulherzi nha a mulher por sua vez pára por raiva e despeito Assim como o rochedo da castração no homem é marcado pela angústia o da mulher é marcado pela inveja ciumenta Em ambos os casos homem e mulher neuróticos têm uma imagem subestimada da mulher e uma imagem superestimada do Falo O homem neurótico não compreende que o Falo por ele salvaguardado tão ciosamente é um objeto inexistente e que portanto ele não corre risco algum de perder algo que não existe não tem razão para ter medo uma vez que nenhum perigo o ameaça A mulher neurótica tampouco compreen de que o Falo é um embuste e que ela não tem razão alguma para disputar com o homem um objeto que ele não tem A obsessão resulta do deslocamento da angústia de castra ção que passa do inconsciente para a consciência e se crista liza como um sentimento de culpa A angústia inconsciente de ser espancado pelo pai rival transformase em angústia de ser punido pelo próprio supereu Essa angústia de se sentir 117 Arquipélago do Édipo em erro e passível de castigo chamase sentimento de culpa Acontece muitas vezes de o obsessivo comprazerse em seu papel de culpado e ter necessidade de ser punido exaurindo se em um gozo estéril conhecido como masoquismo moral A significação bissexual de um sintoma neurótico Diante de um sintoma neurótico o psicanalista busca trazer à tona a cena fantasiada forjada na infância edipiana e que go verna a neurose de hoje Nesse quadro o sujeito desempenha um papel duplo ativo e passivo ou para ser mais preciso ence na um conflito entre dois personagens que ele representa um personagem dominador mais masculino e outro dominado mais feminino Assim quando você está confrontado com um paciente que sofre de uma fobia de avião por exemplo lembrese de que a cena fantasiada que fomenta a angústia é representada por um pai opressor o espaço do avião e por um filho ameaçado o próprio fóbico Assinalo ainda que na fantasia o sujeito interpreta os dois papéis simultaneamente é tanto o carrasco viril quanto a vítima efeminada tanto o pai opressor quanto a criança impotente Naturalmente é sobre tudo nesse último papel que o neurótico se compraz Que é histeria Eu disse que o Édipo é um excesso um desejo sexual evocador do desejo sexual adulto vivido na cabecinha e no pequeno 118 Sobre o Édipo corpo de uma criança de quatro anos e cujo objeto são os pais Inversamente direi que a histeria é um desejo sexual infantil vivido na cabeça de um adulto e cujo objeto não é um homem ou uma mulher mas uma criatura forte ou fraca O histérico vive seu parceiro não como um homem ou uma mulher mas como uma criatura castrada e onipotente A histeria sofrida por um adulto foi provocada por uma relação excessivamente sensual entre a criança que ele era e seus pais Eis o que nos ensina o Édipo a histeria sofrida por um adulto foi provocada outrora por um violento abalo ocorrido em sua sexualidade de criança Com efeito é um distúrbio da vida sexual infantil que está na origem dos tormentos neuró ticos atuais Que distúrbio O que aconteceu na pequena in fância edipiana para que uma neurose se instalasse na idade adulta Pois bem deuse uma derrapagem sim a criança edi piana sofreu por ter sido submergida por um prazer erógeno intenso demais que se apoderou dela Seu eu ainda inexpe riente não soube conter a impetuosidade de um desejo en louquecido e assimilar o prazer transbordante daí resultante Desejo ou prazer vocês me perguntarão Isso é totalmente equivalente como vimos sensações desejo fantasias e prazer são vividos pela criança como uma única e mesma coisa so mos nós quem separamos seus elementos Dito isto quando o prazer erógeno é excessivo o eu infantil fica traumatizado Em outras palavras e esta será a grande lição clínica do Édipo quando o eu da criança é incapaz de assimilar um impacto 119 Arquipélago do Édipo tão forte de prazer sexual fica desamparado e condenado a reviver o mesmo trauma mil e uma vezes Gostaria de insistir mais tão espantoso é esse fenômeno é o prazer e não o sofri mento como poderíamos acreditar que faz a criança edipiana futura histérica sofrer Não apenas o sofrimento é traumático um prazer sexual excessivo também pode sêlo É então que a defasagem traumatizante entre um eu ima turo e um prazer intenso e precoce fica gravada na cera do inconsciente infantil Qual uma placa sensível o inconsciente guarda na memória o choque brutal do prazer erógeno e seu contexto isto é a presença sexual e desejante do adulto Não existe prazer sexual traumático que não seja desencadeado pela excitação inocente ou não proveniente de um dos pais É assim que se molda no inconsciente virginal da criança o protótipo de uma cena fantasiada em que ela se vê seduzida por um dos pais Muito mais tarde adulto o sujeito experi menta e eis a neurose a necessidade compulsiva de reviver a mesma sensação desse prazer que causa mal e representar novamente a mesma cena traumática incluindo dessa vez não mais seus pais mas os parceiros de seu círculo atual É preciso dizer com clareza a experiência traumática de viver sensações sexuais fortes demais pode estar para uma criança na origem de uma futura neurose Para concluir gostaria de esquematizar a seqüência da formação de uma neurose Temos um preâm bulo e três tempos O preâmbulo é a imaturidade da criança o anacronismo de um prazer sexual intenso demais para uma criaturazinha de quatro anos É então que o trauma 1o tempo fixase em uma cena fantasiada de prazer e dor 2o tempo Essa cena que eterniza o trauma é representada incessantemente pelo sujeito em sua vida adulta 3o tempo Eis a neurose No text present on this page 121 Arquipélago do Édipo A mulher histérica e seu medo de amar A cena fantasiada na qual a criança se vê atraída depois exci tada e finalmente assediada por um adulto sedutor constitui uma das fantasias mais freqüentemente encontradas no trata mento dos pacientes histéricos homens e mulheres No que se refere à mulher a fantasia de sedução é freqüentemente a causa das dificuldades de sua vida amorosa Ela deseja ser amada por um homem e ao mesmo tempo teme que ele a sufoque ou ao contrário que a abandone Para uma histérica qual quer pretendente é percebido através da neblina deformadora de uma fantasia infantil de sedução São todos iguais Con versa fiada Quando ele tiver o que quer vai me abandonar A angústia infantil de ser submetida ao pai transformouse na histérica em uma rebelião contra qualquer homem de quem ela poderia depender e a angústia de ser abandonada trans formouse em fobia de amar As três figuras lacanianas do pai no Édipo simbólico real e imaginário Segundo minha leitura Lacan decompõe o processo do Édi po de acordo com um critério importante os diferentes pa péis que a criança faz o pai representar nas fantasias edipianas Durante o primeiro tempo do Édipo o pai não é encarnado é a figura abstrata da Lei que preserva o mundo do caos que teria provocado se porventura o incesto fosse cometido Esse pai eminentemente abstrato muralha contra a loucura dos ho 122 Sobre o Édipo mens e representado pela linguagem humana chamase pai simbólico Nesse primeiro tempo o pai é a Lei tácita ignorada pela criança Sem contenção e sem temor a criança seduz impudentemente a mãe e se oferece a ela como seu Falo No segundo tempo é o personagem real do pai que conta O pai é aqui o pai real agente separador que dissocia mãe e filho ao proibir a um de considerar o outro como objeto de seu dese jo É então terceiro tempo que a criança confrontase com o pai separador e frustrador respeitandoo como todopodero so odiandoo como rival e invejandoo como detentor do Falo isto é como o único possuidor da mãe de todas as mu lheres e do poder Esse pai respeitado odiado e invejado é o pai imaginário É a ele que a criança pedirá em vão o Falo Naturalmente o pai recusa e essa recusa logo acarreta a iden tificação do filho com o pai síntese então das três figuras paternas simbólica real e imaginária Uma vez que a criança não pode ter o objeto identificase com o detentor do objeto Em suma a criança edipiana faz a experiência de encon trar três personagens paternos Em primeiro lugar o pai é o âmbito da Lei que rege a sociedade na qual ela nasceu em seguida o pai é o policial que faz essa Lei ser respeitada final mente o pai é também o policial mas dessa vez temido como autoridade contestado como poder e invejado como deten tor da onipotência É como se no primeiro tempo desse tea tro de marionetes que é o Édipo o garotinho insolente tentasse perverter a mãe sussurrandolhe Abraceme Não tem nin guém olhando E no segundo quadro víssemos repentina mente o policial sair de sua cabine e berrar O que você dois estão fazendo aí Parem imediatamente E enfim no tercei 123 Arquipélago do Édipo ro tempo o menino envergonhado e fascinado perguntasse respeitosamente ao representante da ordem se podia lhe em prestar seu cassetete para se tornar um dia tão forte quanto ele Diante da recusa deste último o menino inclinase in corpora a figura da autoridade e ao se desdobrar tornase ora o rebelde ora o policial que reprime o rebelde Doravante essa cenazinha de dois personagens um que transgride e ou tro que sanciona dominará toda a vida afetiva atos e situa ções cruciais que pontuam a existência de um sujeito Em suma a travessia do Édipo pode ser lida como o encontro de uma criança com as três figuras do pai simbólico real e imaginário um pai que representa a Lei outro que a faz ser respeitada e finalmente aquele invejado e contestado que detém o Poder Eis as três figuras paternas introjetadas que con jugadas formarão o supereu do menino DESEJO INCESTUOSO DESDEJO EDIPIANO DO MENINO DE POSSUIR A MÃE Tenho medo de perder um objeto que julgo ter o Falo imaginário A falta é uma idéia a castração é simbólica O agente da castração é o pai repressor sedutor e rival Angústia de perder meu Falopênis meu Falovirilidade ou meu Falopotência Dor de privação A menina não se resigna luta para se tornar mulher e mãe DESEJO PRÉEDIPIANO DA MENINA DE POSSUIR A MÃE Perdi um objeto que julgava ter o Falo simbólico A falta é um fato a privação é real O agente da privação é a mãe vacilante DESEJO EDIPIANO DA MENINA DE SER POSSUÍDA PELO PAI Quero ser o objeto precioso do meu pai o Falo real A falta é uma decepção a frustração é imaginária O agente da frustração é o pai que se recusa a considerar a filha como Falo FIGURA 7 Os três tipos de falta no Édipo castração privação e frustração Uma leitura da tríade lacaniana Comentário sobre o quadro dos três tipos de falta no Édipo A castração é uma idéia a privação um fato e a frustração uma demanda recusada Para o menino a castração é uma idéia angustiante a idéia de que o essencial pode lhe faltar ao passo que para a menina a privação é uma constatação dolorosa constatação de que lhe falta o essencial que ela julgava ter Quanto à frustração é para a menina a decepção que sucede a recusa do pai em tomála como Falo Decepcionada ela não obstante luta para obter os dois Falos importantes na vida de uma mulher o amor e a criança concebida com o homem amado DOMÍNIOS Desejo edipiano Sexualidade Comportamento em relação ao parceiro amoroso POSIÇÃO FEMININA Desejo de ser possuída Ao contrário do homem a mulher é particularmente sensível à qualidade da relação sexual Num tropismo centrípeto a mulher quer ser protegida contida e receber o sexo do homem amado Oferecer se para uma mulher não quer dizer ser passiva nem submissa A sensibilidade erógena é mais rica e diversa na mu lher que no homem que permanece polarizado em torno de seu pênis A mulher integral ama o homem que a satisfaz se xualmente Amor e sexo são indissociáveis A mulher prefere ser amada pelo homem que ela ama Precisa ser permanentemente tranqüilizada POSIÇÃO MASCULINA Desejo de possuir O homem é sexualmente hiperativo tem orgulho de seu sexo e deseja fazer a mulher gozar Num tropismo centrífugo o homem quer proteger con ter e penetrar a mulher amada O homem pode amar uma mulher e sem renunciar a esse amor desejar outra Amor e sexo são dissociados O homem prefere amar que ser amado Ele idealiza a mulher amada e apagase diante dela Humildade do homem amoroso Na experiência do Édipo a criança sente pela primeira vez os desejos que estão na base de sua futura identidade sexual o desejo masculino de possuir e o desejo feminino de ser possuída Eis um quadro comparativo entre as posições masculina e feminina Naturalmente essas duas posições podem ser ocupadas indiferentemente por um homem ou uma mulher Existem inúmeras mulheres que desejam segundo o tipo masculino e inúmeros homem que desejam segundo o tipo feminino Masculino e feminino são palavras que designam posições psíquicas dominantes é impossível e está muito bem assim definir psicanaliticamente o retratotipo do homem e da mulher tão infinitas são suas singularidades Narcisismo de se sentir bela maior que de se mostrar bela Para uma mulher é mais importante ser indis pensável que poderosa Ela quer ser a única Ser forte ou fraca não é seu problema o desafio da mulher é ser amada e não ser abandonada Uma vez resolvida a se comprometer a mulher dá provas de coragem e de inabalável determinação A mulher prefere ignorar sua potência e ocuparse de seu ressentimento íntimo Obsessão de conquistar o amor e proteger o filho Em seu imaginário a mulher não possui apêndice nem para manipular nem para salvaguardar mas um obje to invisível que é preciso preservar seu tesouro mais caro amar e ser amada Ela nada tem a perder exceto o amor Ora o amor para ela é uma conquista perma nente um patrimônio a ser incessantemente recon quistado Portanto ela não tem pertences a defender Toda ação até mesmo a que põe sua vida em jogo é uma ação que decerto lhe provoca medo mas que ela aborda com muito mais segurança que o homem Ela sabe o que o homem esquece as aquisições defi nitivas não existem Narcisismo de fazer bem prevalece sobre ser bonito Para um homem é mais importante ser forte que belo A alternativa de ser forte ou fraco é o problema vital de um homem O homem covarde por essência demora a se com prometer avalia os riscos hesita e recua diante do ato O homem tende a exibir sua potência Grande vontade previsão e perseverança na ação O homem é dotado de um apêndice destacável o pênis que simboliza tudo o que ele tem medo de perder a potência e a virilidade O medo de perder a força está tão instalado no espírito do homem que qualquer ato é um risco para ele e qualquer fracasso uma humilhação Os perigos supremos para um homem são a mulher vingativa e o pai admirado Narcisismo Potênciaimpotência Determinação e coragem Atitude social Vontade Por que as posições masculinas e femininas são diferentes FIGURA 8 Quadro comparativo entre as posições masculina e feminina 6 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo precedidos de nossos comentários 131 Os subtítulos e os trechos em destaque que apresentam os excertos de Freud e Lacan são de autoria de JDNasio FREUD A universalidade do complexo de Édipo Todas as crianças sejam quais forem suas condições familiares e socioculturais vivem essa fantasia universal que é o complexo de Édipo Seja abandonada órfã ou adotada pela sociedade nenhuma criança escapa ao Édipo Por quê Porque nenhuma criança escapa à torrente das pulsões nela desencadeadas entre os três ou quatro anos de idade e porque nenhum adulto de seu círculo imediato consegue evitar desempenhar o papel de alvo das pulsões e de canal para drenálas É uma situação que toda criança é chamada a viver e que resulta inevitavelmente de sua longa dependência e de sua vida na casa dos pais quero falar do complexo de Édipo as sim denominado porque seu conteúdo essencial está na lenda grega do rei Édipo O herói grego mata o pai e casase com a mãe sem saber 1 132 Sobre o Édipo O menino aqui tem um esquema filogenético a realizar e o consegue ainda que as experiências de vida pessoal possam não coincidir com ele2 Os esquemas filogenéticos que a criança carrega ao nascer são precipitados da história da civilização humana O com plexo de Édipo é um deles3 ela se viu sob a dominação do complexo de Édipo mes mo sem saber que essa fantasia universal em seu caso tornara se realidade4 A descoberta do complexo de Édipo É a partir das recordações de infância de caráter sexual evocadas por nossos pacientes adultos que deduzimos a existência do complexo de Édipo Não nos esqueçamos de que a recordação é sempre uma reinterpretação muito subjetiva do passado As surpreendentes descobertas sobre a sexualidade da crian ça complexo de Édipo foram a princípio proporcionadas pela análise de adultos 5 Foi por trás dessas fantasias evocadas por pacientes adultos que surgiu então o material que permitiu fazer a descrição do de senvolvimento da função sexual fases libidinais da infância6 O Édipo foi descoberto por Freud a partir do relato de cenas de sedução que seus pacientes adultos acreditavam ter vivido na infância O complexo de Édipo não é uma realidade observável mas uma fantasia sexual forjada pela criança sob a pressão de seu 133 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo desejo incestuoso O conteúdo dessa fantasia é freqüentemente uma cena de sedução sexual exercida pelo adulto Observemos ainda que a fantasia edipiana embora criada na infância e sempre em ação no adulto neurótico deverá ser reconstruída pelo analista ao longo do tratamento Este a reconstrói no calor da hora uma vez que a relação analistapaciente re produz em ato a relação edipiana fui obrigado a reconhecer que as cenas de sedução jamais haviam acontecido e que não passavam de fantasias forjadas por meus pacientes7 A recordação de ter sido seduzido sexualmente pelo pai é uma das formas pelas quais o complexo de Édipo pode ser apresen tado A fantasia de sedução não é senão uma variante da fan tasia edipiana Basta um gesto excessivamente carinhoso da parte de um genitor em geral o pai para que a criança forje a recordação de um gesto equívoco de sedução sexual Diante das cenas de sedução forjadas por meus pacientes vime confrontado pela primeira vez ao complexo de Édipo 8 O desejo incestuoso está na origem de todos os desejos humanos O desejo incestuoso não só é irrealizável como inconcebível por uma criança de quatro anos Entretanto é esse desejo mítico além e aquém de toda genitalidade que nós analistas supo mos na origem de todos os desejos e fantasias humanos O desejo de ter um filho com a mãe nunca falta no menino o desejo de ter um filho do pai é constante na menina e isso 134 Sobre o Édipo quando são totalmente incapazes de fazer uma idéia clara do caminho que pode levar à realização desses desejos9 O desejo incestuoso é parcialmente satisfeito em uma fantasia Ser espancado pelo pai é uma fantasia que satisfaz parcial mente o desejo incestuoso de um menino de ser possuído se xualmente pelo pai A dor física tornase então prazer sexual A propósito observemos que um incidente traumático de gran de violência física ocorrido na infância ou na adolescência pode determinar em um homem a posição sexual passiva maso quismo em relação a um parceiro masculino ou feminino que o domina e degrada A fantasia de fustigação do menino é portanto uma fan tasia passiva oriunda da posição feminina a respeito do pai10 O Édipo do menino e da menina O menino renuncia à mãe porque tem medo enquanto a me nina abandona a mãe que a decepciona e se volta para o pai O complexo de Édipo do menino no qual cobiça a mãe e gostaria de eliminar o pai como rival desenvolvese natural mente a partir da fase de sua sexualidade fálica Mas a amea ça de castração obrigao a abandonar essa posição Sob a 135 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo impressão do perigo de perder o pênis o complexo de Édi po é abandonado recalcado destruído radicalmente no caso mais normal e um supereu severo é instituído como seu herdeiro O que acontece na menina é quase o contrário O com plexo de castração prepara o complexo de Édipo em vez de o destruir sob a influência da inveja do pênis a menina é ex pulsa da ligação com a mãe e apressase a entrar como em um porto na situação edipiana11 As três fases do Édipo da menina A nosso ver o Édipo feminino dividese em três fases A fase préedipiana na qual a menina em posição masculina deseja a mãe como objeto sexual a fase que designo como dor da privação durante a qual a menina fica sozinha mortificada e com inveja do menino e finalmente a fase propriamente edipiana na qual a menina é arrebatada pelo desejo feminino de ser possuída pelo pai A vida sexual da mulher dividese em duas fases sendo que a primeira tem um caráter masculino enquanto a segunda é especificamente feminina12 Entre a primeira e a segunda fase propostas por Freud inter calo portanto um tempo intermediário em que a menina só e mortificada adota uma posição masculina de rivalidade 136 Sobre o Édipo O supereu é nosso pai psíquico Nosso supereu pode ser muito severo ou muito tolerante se gundo a velocidade e a violência do recalcamento do complexo de Édipo O supereu tentará reproduzir e conservar o caráter do pai e quanto mais intenso for o complexo de Édipo mais rapida mente se dará o recalcamento e mais intenso também será o rigor com que o supereu reinará sobre o eu enquanto encar nação dos escrúpulos de consciência talvez igualmente de um sentimento de culpa inconsciente13 A neurose é a reativação do Édipo na idade adulta O complexo de Édipo é a causa da neurose porque as fantasias edipianas mal recalcadas na infância reaparecem na idade adulta sob a forma de sintomas neuróticos Em outras pala vras a neurose de um adulto é explicada pela intensidade com que ele viveu seu prazer sexual de criança e pela violência ou labilidade com que o recalcou Eis por que a sexualidade infantil submetida ao recalcamento é a forçamotriz principal da formação do sintoma e que o elemento essencial de seu conteúdo o complexo de Édipo é o complexo nuclear da neurose14 Acreditamos que o complexo de Édipo seja o verdadeiro núcleo da neurose que a sexualidade infantil que nele cul mina seja sua condição efetiva e que o que subsiste desse 137 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo complexo inconsciente represente a disposição do adulto em contrair posteriormente uma neurose15 Aprendi a ver que os sintomas histéricos derivam de fanta sias edipianas e não de fatos reais16 LACAN O Édipo é uma teoria da família A teoria do Édipo é uma teoria da família e em particular a do declínio social da imagem paterna É justamente esse declí nio do papel do pai que estaria na origem das neuroses Descobrir que a repressão sexual e o sexo psíquico estavam sujeitos à regulação e aos acidentes de um drama psíquico da família era fornecer a mais preciosa contribuição para a antro pologia do grupo familiar Por isso mesmo Freud veio rapi damente a formular uma teoria da família Ela se baseava numa dessimetria na situação dos dois sexos em relação ao Édipo 17 Não estamos entre os que se afligem com um pretenso afrou xamento dos laços de família Mas um grande número de efeitos psicológicos parecenos decorrer de um declínio so cial da imagem paterna Esse declínio constitui uma crise psicológica Talvez seja com esse declínio que convenha re lacionar o aparecimento da própria psicanálise O sublime 138 Sobre o Édipo acaso da genialidade talvez não explique por si só que tenha sido em Viena que um filho do patriarcado judaico imagi nou o complexo de Édipo Como quer que seja foram as formas de neuroses predominantes do século passado que re velaram que elas eram intimamente dependentes das condi ções da família18 A fase fálica Na fase fálica a criança deseja sexualmente um de seus pais sem consumar naturalmente nenhum ato sexual Em vez de uma genitalidade inexistente desenvolvese na criança a fan tasia de possuir um Falo todopoderoso Logo antes do período de latência o sujeito infantil mascu lino ou feminino chega à fase fálica que indica o ponto de realização do genital Tudo está ali até e inclusive a escolha do objeto Existe no entanto alguma coisa que não está ali a saber a plena realização da função genital Resta com efeito um elemento fantasístico essencialmente imaginário que é a prevalência do Falo mediante o que há para o sujeito dois tipos de seres no mundo os seres que têm o Falo e os que não o têm isto é que são castrados19 A onipotência da mãe Lacan opõese à idéia de que a criança seja habitada por um sentimento de onipotência Apenas a mãe pode dispor da oni 139 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo potência uma vez que a criança a supõe nela Só há onipotên cia do Outro e a primeira castração vivida pela criança é a cons tatação angustiante de que sua mãe é tão vulnerável quanto ela É errado que a criança tenha a noção de sua onipotência Não apenas nada indica em seu desenvolvimento que ela a tenha mas sua pretensa onipotência e os fracassos que esta encontraria não valem nada nessa questão O que conta são as carências as decepções que afetam a onipotência materna20 O pai é uma metáfora Para Lacan o pai é o personagem principal do drama edipiano seja no Édipo masculino seja no feminino Não existe a questão do Édipo quando não existe o pai e inversamente falar do Édipo é introduzir como essencial a função do pai21 No complexo de Édipo o status do pai é o de uma metáfora ele é o significante que vem no lugar de outro significante O signi ficante pai vem no lugar do significante desejo da mãe O pai significa o desejo da mãe Em outras palavras para a crian ça seu pai é também um homem o homem que a mãe deseja Que é o pai Não digo na família A questão toda é saber o que ele é no complexo de Édipo É isto o pai é uma metáfora O pai é um significante que substitui um outro significante Nisso está o pilar o pilar essencial o pilar único da intervenção do pai no complexo de Édipo A função do 140 Sobre o Édipo pai no complexo de Édipo é ser um significante que substitui o primeiro significante introduzido na simbolização o signi ficante materno Segundo a fórmula da metáfora o pai vem no lugar da mãe22 Tríade imaginária quator simbólico Para Lacan o triângulo mãefilhoFalo é uma tríade imagi nária préedipiana O Édipo só aparece com a introdução do quarto elemento o pai A tríade imaginária tornase então quator simbólico A passagem de uma a outra é feita através de uma decepção a criança fica decepcionada ao saber que não é o Falo de sua mãe Descobre que o objeto do desejo da mãe está no pai não nela Assim é para o pai detentor do Falo que a criança se volta a dialética dos três objetos primeiros mãecriançaFalo e do quarto termo que os abrange a todos ligandoos na relação simbólica a saber o pai Esse termo introduz a rela ção simbólica 23 a tríade imaginária como prelúdio à posta em jogo da relação simbólica que se faz com a quarta função a do pai introduzida pela dimensão do Édipo O triângulo é em si mesmo préedipiano o quator constituise com a entrada em jogo da função paterna a partir da decepção funda mental da criança ela reconhece não apenas que não é o objeto único da mãe mas que o interesse da mãe é o Falo A partir desse reconhecimento resta perceber em segundo 141 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo lugar que a mãe é justamente privada que falta a ela mesma este objeto24 Lacan e a simbólica do dom Lacan põe a ênfase na simbólica do dom seja o dom no sentido de demandar o objeto ao outro seja o dom no sentido de dar o objeto ao outro A menina entra no Édipo quando demanda o Falo ao seu pai o menino sai do Édipo quando para salvar seu pênis aceita largar o objeto a que se apega tanto isto é sua mãe ele renuncia à mãe como objeto de desejo É na medida em que não possui o Falo que a criança femi nina se introduz na simbólica do dom É na medida em que se trata de ter ou não o Falo que ela entra no complexo de Édipo O menino não é por aí que ele entra é por aí que ele sai No fim do complexo de Édipo é preciso que ele faça dom daquilo que tem25 Castração e privação A castração é uma idéia a privação é um fato Ao olhar o corpo nu da menina o menino pensa Ela foi castrada a menina examinandose constata Fui privada dele Para o menino a castração é uma idéia angustiante a idéia de que o essencial pode lhe faltar ao passo que para a menina a privação é uma constatação dolorosa a constatação de que lhe falta o essencial que ela julgava ter 142 Sobre o Édipo A privação é em especial o fato de que a mulher não tem pênis que é privada dele Esse fato a assunção desse fato tem uma incidência constante na evolução de quase todos os casos que Freud nos expõe A castração toma por base a apreensão no real da ausência de pênis na mulher As cria turas femininas são castradas na subjetividade do sujeito No real na realidade naquilo que é invocado como expe riência real são privadas A própria noção de privação implica a simbolização do objeto no real Indicar que alguma coisa não está ali é supor sua presença possível isto é introduzir no real a simples ordem simbólica Quanto à castração na medida em que ela é eficaz expe rimentada presente na gênese de uma neurose incide so bre um objeto imaginário Nenhuma castração é jamais uma castração real26 O supereu fruto do Édipo O supereu herdeiro do complexo de Édipo é uma figura da lei introjetada no inconsciente infantil e que dita como um mes tre interior as escolhas decisivas e cotidianas da existência O fim do complexo de Édipo é correlativo da instauração da lei como recalcada no inconsciente mas permanente A lei é baseada no real sob forma desse núcleo deixado atrás de si pelo complexo de Édipo núcleo que sabemos se encarnar em cada sujeito sob as formas mais diversas mais extravagantes mais caricatas que se chama o supereu27 143 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo O Édipo uma figura do Ideal do eu Para Lacan o Édipo é uma via normativa uma das figuras possíveis do Ideal do eu O Ideal do eu é o tipo viril ou o tipo feminino que o menino e a menina estão destinados a assumir há no Édipo a assunção do próprio sexo pelo sujeito isto é para darmos os nomes às coisas aquilo que faz com que o homem assuma o tipo viril e com que a mulher assuma um certo tipo feminino A virilidade e a feminização são os dois termos que traduzem o que é essencialmente a função do Édipo Encontramonos aí no nível em que o Édipo está diretamente ligado à função do Ideal do eu28 Logo não basta que o sujeito depois do Édipo desemboque na heterossexualidade é preciso que o sujeito menino ou menina desemboque nela de uma maneira tal que se situe corretamente em relação à função do pai Eis o centro de toda a problemática do Édipo29 A castração é transmitida de pai para filho Que é ser castrado senão constatar dolorosamente que nosso corpo e nossos desejos são limitados O pai que tive o pai que sou e o filho que me sucede todos devem assumir as castrações impostas a castração que atinge o filho não será também o que o faz ter acesso pela via justa ao que corresponde à função do pai E não é isto mostrar que é de pai para filho que a castração se transmite30 144 Sobre o Édipo Dolto e o interdito do incesto Dolto pede aos pais que assumam a castração de não conside rar seus filhos como prolongamento de si próprios Os pais gostariam de manter o domínio sobre seu filho e de inscrever os frutos da experiência deles em seu pensamento Isso é trapacear com o interdito do incesto Ele deve livrarse de tudo que lhe foi inculcado pelos pais Abandona pai e mãe o que não quer dizer que ele não descobrirá sua herança de outra forma ele próprio engendrando a partir do que ouviu não de seus pais mas de sua experiência de outras pessoas na vida sob a condição de que isso não seja obrigatório não esteja na corrente de uma aliança amorosa31 Dolto 145 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo Referências dos excertos citados Freud 1 Abrégé de psychanalyse Paris PUF 14a ed 1997 p58 ed bras Esbo ço de psicanálise in ESB vol23 2 À partir de lhistoire dune névrose infantile in Œuvres complètes de Freud volXIII Paris PUF 3a ed 2005 p84 ed bras Da história de uma neurose infantil in ESB vol17 3 Cinq psychanalyses Paris PUF 23a ed 1999 p418 ed bras Da his tória de uma neurose infantil in ESB vol17 4 Quelques types de caractères in LInquiétante étrangeté et autres essais Paris Gallimard 1985 p166 ed bras Alguns tipos característicos encontrados na psicanálise in ESB vol14 5 Ma vie et la psychanalyse Paris Gallimard 1949 p65 ed bras Pós escrito a Um estudo autobiográfico in ESB vol20 6 Psychanalyse e Théorie de la libido in Résultats idées problèmes Paris PUF 6aed 1988 p62 ed bras Dois verbetes de enciclopé dia in ESB vol18 7 Freud présenté par luimême Paris Gallimard 1984 p57 ed bras Um estudo autobiográfico in ESB vol20 8 Ibid p58 9 Un enfant est battu in Névrose psychose et perversion Paris PUF 12a ed 1997 p227 ed bras Uma criança é espancada in ESB vol17 10 Ibid p238 11 La féminité in Nouvelles conferences dintroduction à la psychanalyse Paris Gallimard 1984 p173 ed bras Feminilidade in Novas con ferências introdutórias à psicanálise conf33 ESB vol22 Os excertos de Freud foram traduzidos a partir das versões francesas e seguidos da indicação dos volumes em que se encontram na Edição Standard Brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud Rio de Janeiro Imago As citações de Lacan reproduzem as traduções publicadas em O Seminário de Jacques Lacan Rio de Janeiro Jorge Zahar Editor vários volumes NEB 146 Sobre o Édipo 12 Sur la sexualité feminine in La vie sexuelle Paris PUF 13a ed 1997 p142 ed bras A sexualidade feminina in ESB vol21 13 Essais de psychanalyse Paris Payot 1981 p2034 ed bras O eu e o isso in ESB vol19 14 Un enfant est battu in Névrose psychose et perversion opcit p243 15 Ibid p233 16 La féminité in Nouvelles conferences dintroduction à la psychanalyse opcit p161 Lacan 17 Os complexos familiares na formação do indivíduo in Outros escri tos Rio de Janeiro Jorge Zahar 2003 p534 18 Ibid p667 19 O Seminário livro 4 A relação de objeto 195657 texto estabelecido por JacquesAlain Miller Rio de Janeiro Jorge Zahar 1995 p124 20 Ibid p70 21 O Seminário livro 5 As formações do inconsciente 195758 texto esta belecido por JacquesAlain Miller Rio de Janeiro Jorge Zahar p171 22 Ibid p180 23 O Seminário livro 4 A relação de objeto opcit p834 24 Ibid p81 25 Ibid p125 26 Ibid p2234 27 Ibid p216 28 O Seminário livro 5 As formações do inconsciente opcit p171 29 O Seminário livro 4 A relação de objeto opcit 30 O Seminário livro 17 O avesso da psicanálise 196970 texto estabele cido por JacquesAlain Miller Rio de Janeiro Jorge Zahar 1992 p114 31 Françoise Dolto revista Approches 40 1980 Seleta bibliográfica sobre o Édipo 149 Freud La naissance de la psychanalyse PUF 1979 p198 Projeto para uma psico logia científica in ESB vol1 LHérédité et létiologie des névroses in Névrose psychose et perversion PUF 12a ed 1997 p559 A hereditariedade e a etiologia das neu roses in ESB vol3 Nouvelles remarques sur les psychoses de défense in Névrose psychose et perversion PUF 12a ed 1997 p667 Novos comentários sobre as psiconeuroses de defesa in ESB vol3 LÉtiologie de lhistérie in Névrose psychose et perversion PUF 12a ed 1997 p1035 A etiologia da histeria in ESB vol3 Analyse dune phobie chez un petit garçon de cinq ans Le petit Hans in Cinq psichanalyses PUF 23a ed 1999 p172 1949 Análise de uma fobia em um menino de cinco anos in ESB vol10 Remarques sur un cas de névrose obsessionnelle LHomme aux rats in Cinq psichanalyses PUF 23a ed 1999 p2345 Notas sobre um caso de neurose obsessiva in ESB vol10 Les explications sexuelles données aux enfants in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p912 O esclarecimento sexual das crianças in ESB vol9 Les theories sexuelles infantiles in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p1427 Sobre as teorias sexuais das crianças in ESB vol9 Cinq leçons sur la psychanalyse Payot col Petite Bibliothèque Payot 1966 p547 Cinco lições de psicanálise in ESB vol11 150 Sobre o Édipo Un type particulier de choix dobjet chez lhomme in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p515 Um tipo especial de escolha de objeto feita pelos homens in ESB vol11 Sur le plus général des rabaissements de la vie amourese in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p57 64 Sobre a tendência universal à deprecia ção na esfera do amor in ESB vol11 Totem et tabou Payot col Petite Bibliothèque Payot 1965 p1929 21417 234 Totem e tabu ESB vol13 Extrait de lhistoire dune névrose infantile LHomme aux loups in Cinq psychanalyses PUF 23a ed 1999 p3901 418 Da história de uma neurose infantil in ESB vol 17 Le tabou de la virginité in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p758 O tabu da virgindade ESB vol11 Un enfant est battu in Névrose psychose et perversion PUF 12a ed 1997 p2289 2423 Uma criança é espancada in ESB vol17 Psychologie de masse et analyse du moi in Essais de psychanalyse Payot col Petite Bibliothèque Payot 1981 p1674 Psicologia das massas e análise do eu ESB vol18 Le moi et le ça in Essais de psychanalyse Payot col Petite Bibliothèque Payot 1981 p24052 26275 O eu e o isso in ESB vol19 LOrganisation génitale infantile in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p758 A organização genital infantil da libido in ESB vol19 La disparition du complexe dŒdipe in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p11722 A dissolução do complexo de Édipo in ESB vol19 Le problème économique du masochisme in Névrose psychose et perversion PUF 12a ed 1997 p2927 O problema econômico do masoquis mo in ESB vol19 Quelques conséquences psychologiques de la différence anatomique entre les sexes in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p12332 Algumas diferenças psíquicas das diferenças anatômicas entre os sexos in ESB vol19 Autoprésentation in Sigmund Freud présenté par luimême Gallimard 1984 p578 Um estudo autobiográfico in ESB vol20 151 Seleta bibliográfica sobre o Édipo Inhibition symptôme et angoisse PUF 1971 p1929 Inibição sintoma angústia in ESB vol20 Dostoievski et le parricide in Résultats idées problèmes II PUF 6a ed 1998 p1735 Dostoievski e o parricídio in ESB vol21 Le président Wilson Payot 1990 p77 7980 889 116 Thomas Woodrow Wilson um estudo psicológico Rio de Janeiro Graal 1984 Malaise dans la civilisation PUF 1989 p91 Malestar na civilização ESB vol21 Sur la sexualité féminine in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p13953 A sexualidade feminina in ESB vol21 Lacan Os complexos familiares na formação do indivíduo in Outros escritos Rio de Janeiro Jorge Zahar 2003 p2990 O Seminário livro 3 As psicoses Rio de Janeiro Jorge Zahar 1983 p1957 O Seminário livro 4 A relação de objeto 195657 texto estabelecido por JacquesAlain Miller Rio de Janeiro Jorge Zahar 1995 O Seminário livro 5 As formações do inconsciente 195758 texto estabele cido por JacquesAlain Miller Rio de Janeiro Jorge Zahar p166 220 Le mythe individuel du névrosé in Ornicar 1979 n178 p289307 O Seminário livro 7 A ética da psicanálise Rio de Janeiro Jorge Zahar p33646 36572 O Seminário livro 17 O avesso da psicanálise Rio de Janeiro Jorge Zahar p10223 Escritos Rio de Janeiro Jorge Zahar 1998 p17989 2501 2789 3634 4623 5602 608 685703 83740 152 Sobre o Édipo Abraham K Œuvres completes tomos I e II Paris Payot 1965 Deleuze G e F Guattari LAntiŒdipe Paris Minuti 1971 O antiÉdipo Rio de Janeiro Imago 1976 esgotado Dolto F LÉvangile au risque de la psychanalyse tomo II Paris Seuil 1977 p716 LImage inconsciente du corps Paris Seuil 1984 p18699 A imagem inconsciente do corpo São Paulo Perspectiva 2001 Au jeu du désir Paris Seuil 1981 194244 No jogo do desejo São Paulo Ática 1996 Graves R Os mitos gregos São Paulo Madras 2004 Heimann P A contribution to the reevaluation of Œdipus complex The early stages Int J Psychoanal 1921 Jones E Théorie et pratique de la psychanalyse Paris Payot col DésirPayot 1997 coletânea em francês de artigos publicados entre 1910 e 1947 Klein M Early stages of the Œdipus conflict Int J Psychoanal 9 p167 80 e The Œdipus complex in the light of early anxieties Int J Psychoanal 26 p1133 Lampl de Groot J Reevaluation of the role of the Œdipus complex Int J Psychoanal 1952 The preœdipal phase in the development of the lame child Int J Psychoanal 1946 The evolution of Œdipus complex in women Int J Psychoan 1928 Laplanche J e JB Pontalis Vocabulário de psicanálise São Paulo Martins Fontes 2001 verbete Édipo complexo de Mijolla A de e S de Mijolla Mellor sob a direção de Psychanalyse Paris PUF 1996 p72 294 506 5212 Mullahy R Œdipe du mythe au complexe Paris Payot 1951 Nasio JD O conceito de castração O conceito de Falo e O con ceito de supereu in Lições sobre os 7 conceitos cruciais da psicanálise Rio de Janeiro Jorge Zahar 2001 p1330 3741 12945 Odier C Une névrose sans complexe dŒdipe Revue Française de Psychanalyse 1933 Ortigues MC e E Ortigues O Édipo africano São Paulo Escuta 1989 Rosolato G Du père in Études sur le symbolique Paris Gallimard 1970 153 Seleta bibliográfica sobre o Édipo Roudinesco E e M Plon Dicionário de psicanálise Rio de Janeiro Jorge Zahar verbete Édipo complexo de Rufo M Œdipe toimême Consultation dum pédopsychiatre Anne Carrière 2000 Sófocles Édipo rei in A trilogia tebana Rio de Janeiro Jorge Zahar 11a ed 2004 This B Pai o ato de nascimento Porto Alegre Artmed 1987 Índice geral Abertura 7 1 O Édipo do menino 19 No começo era o corpo de sensações erógenas 21 Os três desejos incestuosos 24 As três fantasias de prazer 27 As três fantasias de angústia de castração 32 Resolução do Édipo do menino a dessexualização dos pais 36 Comparado à mulher o homem é visceralmente um covarde 37 Os frutos do Édipo o supereu e a identidade sexual 40 Resumo da lógica do Édipo do menino 42 2 O Édipo da menina 45 Tempo préedipiano a menina é como um menino 47 Tempo da solidão a menina sentese sozinha e humilhada 50 A inveja ciumenta de deter o Falo 53 Tempo do Édipo a filha deseja o pai 54 Resolução do Édipo a mulher deseja um homem 56 A mais feminina das mulheres tem sempre o pai dentro de si 59 Resumo da lógica do Édipo da menina 62 3 Perguntas e respostas sobre o Édipo 65 4 O Édipo é a causa das neuroses ordinárias e mórbidas do homem e da mulher 91 A neurose ordinária e a neurose mórbida 93 A reativação do Édipo sob a forma da neurose feminina 98 Como escutar uma anoréxica através da teoria do Édipo 101 5 Arquipélago do Édipo 107 Não existe castração 109 As figuras do pai no Édipo masculino 110 As figuras da mãe no Édipo feminino 111 As figuras do Falo no Édipo feminino 111 O supereu e os três papéis do pai no Édipo masculino 112 A brincadeira de boneca 113 A fantasia da onipotência fálica 113 A fobia é uma projeção a histeria uma rebelião e a obsessão um deslocamento 114 A significação bissexual de um sintoma neurótico 117 Que é a histeria 117 A histeria sofrida por um adulto foi provocada por uma relação excessivamente sensual entre a criança que ele era e seus pais 118 A mulher histérica e seu medo de amar 121 As três figuras lacanianas do pai no Édipo simbólico real e imaginário 121 Os três tipos de falta no Édipo castração privação e frustração Uma leitura da tríade lacaniana 124 Quadro comparativo entre as posições masculina e feminina 126 6 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo precedidos de nossos comentários 129 Seleta bibliográfica sobre o Édipo 147 Índice geral 155 COMPLEXO DE ÉDIPO INTRODUÇÃO O complexo de Édipo ainda hoje permanece como um tópico central nas discussões sobre o desenvolvimento infantil especialmente quando consideramos as conexões entre a formação psíquica da criança e suas posteriores resoluções na adolescência e idade adulta Desde os primeiros trabalhos de Sigmund Freud o tema tem sido objeto de intensa análise tanto em um nível pessoal quando Freud 1996 confrontou sua própria condição edipiana quanto em um plano teórico mais amplo como evidenciado em seus Três ensaios sobre a sexualidade Freud 1996 concebe o complexo de Édipo como o momento em que o filho se sente atraído pela mãe e a filha pelo pai marcando o início das investigações sobre os movimentos do inconsciente No entanto perspectivas divergentes como a de Melanie Klein conforme discutido por Segal 1975 oferecem nuances diferentes sugerindo que esse processo começa em uma idade ainda mais precoce do que proposto por Freud 1996 Atualmente o conceito de complexo de Édipo passou por revisões e refinamentos mantendose relevante mas evitando simplificações teóricas No livro Édipo O complexo do qual nenhuma criança escapa Juan David Nasio aborda de forma didática os aspectos deste fenômeno psíquico Nasio um palestrante e clínico aborda este conceito tanto na psique masculina quanto na feminina O ponto central da obra reside na análise do papel do Édipo na gênese das neuroses comuns e patológicas tanto em homens quanto em mulheres Nasio 2007 explora temas essenciais como a castração o simbolismo do Falo e a influência do pai nesse processo de desenvolvimento psicossexual Nasio 2007 adota uma abordagem clara e objetiva pontuando suas exposições com seções curtas esquemas e quadros comparativos para facilitar a compreensão do leitor Além disso a obra apresenta citaçõeschave de Freud e Lacan enriquecendo ainda mais o debate em torno do Complexo de Édipo Ao longo dos capítulos Nasio 2007 distingue as experiências do menino e da menina durante o desenvolvimento do Complexo destacando as fantasias desejos e angústias peculiares a cada gênero O livro também aborda a reativação do Édipo em diferentes fases da vida como na puberdade e na idade adulta manifestandose como pudor excessivo revolta e neuroses diversas Nasio 2007 destaca a importância do tratamento analítico na abordagem das questões relacionadas ao Complexo de Édipo enfatizando a necessidade de reconstruir as fantasias infantis e auxiliar o paciente na elaboração de seus conflitos Ao final Nasio 2007 destaca a inevitabilidade do Complexo de Édipo e sua influência decisiva na estruturação do sujeito deixando marcas profundas que se manifestam em traços neuróticos ao longo da vida adulta O livro se destaca como uma importante contribuição para estudantes e profissionais da psicanálise oferecendo uma análise das vicissitudes deste complexo tão fundamental para a compreensão da psique humana Nasio 2007 se preocupa em evitar uma visão estática do complexo freudiano enfatizando que o Édipo não é apenas uma narrativa de amor e ódio entre pais e filhos mas sim uma história de desejo fantasia e prazer corporal Isso nos leva a indagar como as crianças resolvem o complexo de Édipo e lidam com as fantasias desejos e angústias associadas a ele ao longo de seu desenvolvimento até a idade adulta Nesse sentido para explorar essa questão foi realizado uma revisão bibliográfica sobre o tema consultando livros artigos dissertações e teses em bibliotecas físicas e virtuais bem como as produções das principais associações psicanalíticas do Brasil Nosso objetivo foi compreender mais profundamente um tema que impacta nossas vidas e explorar sua relação com o inconsciente DESENVOLVIMENTO Na época em que Freud estava emergindo com suas ideias revolucionárias a ciência estava apenas começando a explorar os recessos mais profundos da psique humana Questões que antes nem mesmo eram claras por estarem enterradas no inconsciente começaram a receber atenção influenciando significativamente o desenvolvimento psicológico dos indivíduos Através de suas descobertas Freud desenvolveu técnicas para lidar com casos que o intrigravam profundamente Especificamente ele se aventurou na hipnose uma ferramenta que lhe permitia penetrar no inconsciente dos pacientes e desvendar os enigmas de suas mentes PERA CORREA 2015 Por um longo período Freud recorreu à hipnose como retratado no filme Freud além da alma onde uma cena emblemática revela um jovem expressando impulsos sexuais em relação à mãe durante uma sessão hipnótica ao mesmo tempo em que demonstra sentimentos de proteção em relação a ela enquanto direciona sua negatividade e raiva ao pai Diante dessa situação Freud se viu confrontado com seu próprio inconsciente Durante o sono ele teve sonhos relacionados ao caso do jovem mas esses sonhos se desenrolaram com personagens de sua própria vida Ele projetou memórias de sua infância conectandoas aos eventos atuais Na psicanálise isso é conhecido como contratransferência onde o analista se vê fortemente influenciado pelos sentimentos e situações do paciente tendo que lidar consigo mesmo como foi o caso de Freud Em um desses sonhos Freud se viu escalando um penhasco segurando uma corda que o ligava à sua mãe Ao chegar ao topo viu sua mãe em um trono cercada de afeto mas antes que pudesse se aproximar seu pai cortou a corda fazendo Freud cair do penhasco e acordar do sonho Essa cena onírica foi cuidadosamente analisada pelo autor que conseguiu recuperar memórias de sua infância que ressoavam com os símbolos presentes no sonho Essas experiências o levaram a escrever sua obraprima fundadora da psicanálise A interpretação dos sonhos explorando os estudos sobre o mundo onírico e suas conexões com a vida desperta É evidente a determinação de Freud 2001 em explorar as possibilidades que se apresentavam criando hipóteses que conectavam os sonhos com suas próprias memórias de infância desvendando assim os primeiros passos que o levariam à teoria primordial do Complexo de Édipo A mitologia oferece uma representação vívida do conceito trazendo à tona paralelos intrigantes com os temas explorados nos sonhos de Freud Contudo a relação entre mito e psicanálise é frequentemente objeto de questionamentos quanto à veracidade dos eventos associados e à sua tradução em conceitos psicanalíticos Azevedo 2004 discute a dicotomia entre mito e verdade destacando a crítica de Platão às narrativas mitológicas como fictícias e prejudiciais em contraste com a busca pela verdade na filosofia Ele sugere que a psicanálise desde seu início questiona essa oposição intrigada pelo fascínio que os mitos exercem apesar das controvérsias em relação à sua veracidade A reflexão de Azevedo 2004 evidencia a desconfiança em relação às fontes mitológicas por parte daqueles influenciados pela filosofia clássica que rejeitavam os mitos por considerálos fictícios e fantasiosos A psicanálise não encara os mitos como eventos concretos mas sim como narrativas que refletem aspectos da realidade humana servindo como instrumento para ilustrar situações contextos e dinâmicas psicológicas No caso do Complexo de Édipo a mitologia oferece uma representação simbólica do inconsciente que foi analisada por Freud É possível que ele tenha se inspirado no mito ao trabalhar com pacientes utilizandoo como uma metáfora poderosa para compreender os conflitos e desejos subjacentes No entendimento de Násio 2007b p 10 a fantasia é descrita como um um teatro mental catártico que encena a satisfação do desejo e descarrega sua tensão Nesse contexto a criança no estágio do complexo de Édipo elabora hipóteses sobre sentimentos inexplicáveis que experimenta recorrendo à imaginação para lidar com eles Assim como a mitologia atua na vida adulta a fantasia tem importância na infância servindo como meio de resolver desafios cotidianos e de experimentar papéis de superheróis e personagens mágicos Essa capacidade de imaginação ajuda as crianças a superarem obstáculos e a preservarem sua inocência enquanto se desenvolvem Násio 2007 descreve a fantasia como uma breve cena dramática quase imperceptível pela consciência mas que causa impacto emocional Ela pode ser acionada para lidar com desejos sexuais ou agressivos influenciando nossas emoções sem que estejamos conscientes disso Na infância repleta de novidades as histórias e contos ajudando as crianças a lidarem com suas experiências e conflitos internos Elas se identificam com as histórias que refletem suas próprias questões como as confusões causadas pelo complexo de Édipo ou as dificuldades familiares Tanto Násio 2007 quanto Klein 1975 destacam a relação entre fantasias e o princípio do prazersofrimento na infância No entanto muitas pessoas alheias ao campo psicanalítico se surpreendem ao falar sobre o desenvolvimento da sexualidade infantil alimentando preconceitos e tabus sociais religiosos e éticos A teoria freudiana que destaca a atração dos meninos pela mãe e das meninas pelo pai muitas vezes é mal interpretada ou rejeitada por esses preconceitos arraigados na sociedade Nesse contexto o Édipo surge como uma novidade na vida da criança É um período marcado por desejos intensos direcionados principalmente aos pais Esse desejo incestuoso é fantasioso representado pela figura do falo que detém todo o poder na imaginação infantil A descoberta da genitália marca uma fase de intensos sentimentos de prazer e sofrimento especialmente quando o menino confirma ter o poder fálico enquanto a menina se sente lesada por não possuílo SOUZA 2006 A fantasia da criança conforme descrita por Násio 2007 é uma representação simbólica de desejos e anseios muitas vezes incompreendidos pelos adultos Enquanto os desejos infantis se realizam na imaginação os adultos os concretizam fisicamente embora os desejos verdadeiros possam ser muito diferentes A fantasia do Édipo embora fantasiosa tem raízes profundas na psique infantil influenciando seu desenvolvimento emocional e sexual É importante reconhecer que na atualidade os novos formatos familiares podem influenciar significativamente no desenvolvimento da sexualidade infantil A ausência dos genitores biológicos pode levar as crianças a projetarem seus desejos e fantasias em terceiros como professores ou figuras de autoridade Como educadores é fundamental estarmos cientes dessas dinâmicas para lidar com sensibilidade e compreensão com as questões que surgem em sala de aula durante o período do Complexo de Édipo PERA CORREA 2015 CONSIDERAÇÕES FINAIS O Complexo de Édipo é marcada por fantasias medos e angústias que moldam a formação psíquica da criança Essa experiência não apenas influencia a sexualidade mas também estabelece padrões para a personalidade adulta por meio das definições objetais identificações e projeções A pesquisa nos leva a refletir sobre os tabus sociais e sexuais enfrentados diariamente destacando a necessidade de reconhecermos que o desenvolvimento da sexualidade humana começa na infância sem que isso comprometa a inocência e pureza das crianças REFERÊNCIAS AZEVEDO Ana Alves Mito e Psicanálise Rio de Janeiro Zahar 2004 FREUD Sigmund A Interpretação dos Sonhos Rio de Janeiro Imago 2001 FREUD Sigmund Um caso de histeria Três ensaios sobre a sexualidade e outros trabalhos Rio de Janeiro Imago 1996 NÁSIO JuanDavid A Fantasia O prazer de ler Lacan Rio de Janeiro Zahar 2007 NÁSIO JuanDavid Édipo o complexo do qual nenhuma criança escapa Rio de Janeiro Zahar 2007 PERA Rubens Alberto CORREA João Jorge O Complexo de Édipo no Contexto da Psicanálise Revista Pleiade v 9 n 18 p 2331 2015 SOUZA Mauricio Rodrigues de A psicanálise e o complexo de Édiponovas observações a partir de Hamlet Psicologia USP v 17 p 135155 2006 SEGAL Hanna Introdução à obra de Melanie Klein Rio de Janeiro Imago 1975 SÓFOCLES Édipo ReiAntígona 2ª Revisão ed São Paulo Martin Claret 2014
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JD Nasio Édipo O complexo do qual nenhuma criança escapa O Édipo de que vou falar é uma lenda que explica a origem de nossa identidade sexual de homem e mulher e além disso a origem de nossos sofrimentos neuróticos Essa lenda envolve todas as crianças ZAHAR Édipo O complexo do qual nenhuma criança escapa JD Nasio tradução André Telles Título original LOedipe Le concept le plus crucial de la psychanalyse Tradução autorizada da primeira edição francesa publicada em 2005 por Payot Rivages de Paris França Copyright 2005 Éditions Payot Rivoges Copyright da edição em língua portuguesa 2007 Jorge Zahar Editor Ltda rua México 31 sobreloja 20031144 Rio de Janeiro RJ tel 21 21080808 fax 21 21080800 editorazaharcombr wwwzaharcombr Todos os direitos reservados A reprodução nãoautorizada desta publicação no todo ou em parte constitui violação de direitos autorais Lei 961098 Projeto gráfico e composição Victoria Rabello Capa Sérgio Campante CIPBrasil Catalogaçãonafonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros RJ Nasio JuanDavid N211e Édipo o complexo do qual nenhuma criança escapa JD Nasio tradução André Telles Rio de Janeiro Zahar 2007 Tradução de LOedipe Le concept le plus crucial de la psychanalyse Inclui bibliografia ISBN 9788571109728 1 Édipo Complexo de 2 Psicanálise I Título CDD 15424 064626 CDU 15996421 Sumário Abertura 7 1 O Édipo do menino 19 2 O Édipo da menina 45 3 Perguntas e respostas sobre o Édipo 65 4 O Édipo é a causa das neuroses ordinárias e mórbidas do homem e da mulher 91 5 Arquipélago do Édipo 107 6 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo precedidos de nossos comentários 129 Seleta bibliográfica sobre o Édipo 147 Índice geral 155 Nenhuma criança escapa ao Édipo O Édipo de que vou falar é uma lenda que explica a origem de nossa identidade sexual de homem e mulher e além disso a origem de nossos sofrimentos neuróticos Essa lenda envolve todas as crianças vivam em uma família clássica monoparental recomposta ou ainda cresçam no seio de um casal homossexual ou até mesmo sejam crian ças abandonadas órfãs e adotadas pela sociedade Nenhuma criança escapa ao Édipo Por quê Porque nenhuma criança de quatro anos menina ou menino escapa à torrente das pulsões eróticas que lhe afluem e porque nenhum adulto de seu círculo imediato pode evitar ser o alvo de suas pulsões ou tentar bloqueálas Abertura 1 O Édipo do menino 9 As relações do filho com sua mãe são para ele uma fonte contínua de excitação e satisfação sexual a qual se intensi fica quanto mais ela lhe der provas de sentimentos que derivem de sua própria vida sexual beijálo ninálo consi derálo substituto de um objeto sexual completo Seria pro vável que uma mãe ficasse bastante surpresa se lhe dissessem que assim ela desperta com suas ternuras a pulsão sexual do filho Ela acha que seus gestos demonstram um amor assexual e puro em que a sexualidade não desempenha pa pel algum uma vez que ela evita excitar os órgãos sexuais do filho mais que o exigido pelos cuidados corporais Mas a pulsão sexual como sabemos não é despertada apenas pela excitação da zona genital a ternura também pode ser muito excitante SIGMUND FREUD O menino está apaixonado pela mãe e quer afastar o pai a menina por sua vez apaixonada pelo pai quer afastar a mãe Eis em algumas palavras o mais batido clichê da psicanálise uma ilustração tradicional ingênua e enfática do célebre dra ma amoroso o complexo de Édipo E no entanto nada mais enganador que essa visão estática do complexo freudiano Por quê Porque o complexo de Édipo não é uma história de amor e ódio entre pais e filhos é uma história de sexo isto é 10 Sobre o Édipo uma história de corpos que sentem prazer em se acariciar se beijar e se morder em se exibir e se olhar em suma corpos que sentem tanto prazer em se tocar quanto em se fazer mal Não Édipo nada tem a ver com sentimento e ternura mas com corpo desejo fantasias e prazer Provavelmente pais e filhos amamse ternamente e podem se odiar mas no cora ção do amor e do ódio familiar medra o desejo sexual O Édipo é um imenso despropósito é um desejo sexual próprio de um adulto vivido na cabecinha e no corpinho de uma criança de quatro anos e cujo objeto são os pais A criança edipiana é uma criança alegre que em toda inocência se xualiza os pais introduzindoos em suas fantasias como ob jetos de desejo e imitando sem pudor nem senso moral seus gestos sexuais de adultos É a primeira vez na vida que a criança conhece um movimento erótico de todo seu corpo em direção ao corpo do outro Não se trata mais de uma boca tendendo para um seio mas de um ser integral que quer apertar o corpo inteiro da mãe Ora se é verdade que a criança edipiana fica feliz ao desejar e obter prazer com isso é mais verdade ainda que desejo e prazer a assustam pois ela os teme como um perigo Que perigo O perigo de ver seu corpo desgovernarse sob o ardor de seus impulsos o perigo de ver sua cabeça explodir em virtude de não conseguir con trolar mentalmente seu desejo e finalmente o perigo de ser punida pela Lei do interdito do incesto por ter tomado os pais como parceiros sexuais Excitada pelo desejo feliz com suas fantasias mas igualmente angustiada a criança sentese perdida e completamente desamparada A crise edipiana é um insuportável conflito entre o prazer erótico e o medo 11 Abertura entre a exaltação de desejar e o medo de se consumir nas chamas do desejo Assim a criança reage sem transigir Dividida entre a ale gria e a angústia não tem outra saída senão esquecer tudo e apagar tudo Sim a criança edipiana seja menino ou menina recalca vigorosamente fantasias e angústia pára de tomar seus parentes por parceiros sexuais e tornase com isso disponível para conquistar novos e legítimos objetos de desejo É assim que progressivamente descobre o pudor desenvolve o senti mento de culpa o senso moral e estabelece sua identidade sexual de homem ou de mulher Observemos que depois de um período de relativa acalmia pulsional digo efetivamente relativa um segundo abalo edipiano irá produzirse na pu berdade Assim como já fizera aos quatro anos o jovem ado lescente deverá ajustar o ardor de seus impulsos ao seu novo corpo em plena metamorfose da puberdade e às novas solici tações sociais Mas tal ajuste nunca é fácil para um jovem e eis por que encontramos tantas dificuldades com o adolescente em crise O jovem não sabe mais refrear seus impulsos como o fizera no fim de seu Édipo ao contrário atiça seu desejo tor nandose inibido e tímido Entretanto o vulcão edipiano não se extingue na adolescência Muito mais tarde na idade adulta por ocasião de um conflito afetivo novas erupções poderão se dar sob a forma de sofrimentos neuróticos como a fobia a histeria e a obsessão Enfim não esqueçamos que outra reativação do Édipo pode se desenvolver experimentalmente dessa vez na cena analítica central da neurose de transferência Em outras palavras a transferência entre paciente e psicanalis ta é a repetição em ato do complexo de Édipo 12 Sobre o Édipo Que é então o Édipo O Édipo é a experiência vivida por uma criança de cerca de quatro anos que absorvida por um desejo sexual incontrolável tem de aprender a limitar seu im pulso e ajustálo aos limites de seu corpo imaturo aos limites de sua consciência nascente aos limites de seu medo e final mente aos limites de uma Lei tácita que lhe ordena que pare de tomar seus pais por objetos sexuais Eis então o essencial da crise edipiana aprender a canalizar um desejo transbordante No Édipo é a primeira vez na vida que dizemos ao nosso insolente desejo Calma Fique mais tranqüilo Aprenda a vi ver em sociedade Assim concluímos que o Édipo é a dolo rosa e iniciática passagem de um desejo selvagem para um desejo socializado e a aceitação igualmente dolorosa de que nossos desejos jamais serão capazes de se satisfazer totalmente Porém o Édipo não é apenas uma crise sexual de cresci mento é também a fantasia que essa crise molda no incons ciente infantil Com efeito a experiência vivida do terremoto edipiano fica registrada no inconsciente da criança e perdura até o fim da vida como uma fantasia que definirá a identidade sexual do sujeito determinará diversos traços de sua persona lidade e fixará sua aptidão a gerir os conflitos afetivos No caso de a criança ter experimentado por ocasião da crise edi piana um prazer precoce demais intenso demais e inespera do demais isto é no caso de a experiência de um prazer excessivo ser traumática a fantasia daí resultante seria a causa certa de uma futura neurose O Édipo no entanto é mais que uma crise sexual e uma fantasia que ela modela no inconsciente é também um con ceito o mais crucial dos conceitos psicanalíticos Diria que é 13 Abertura a própria psicanálise uma vez que o conjunto dos sentimen tos que a criança experimenta durante essa experiência se xual que chamamos de complexo de Édipo é para nós psicanalistas o modelo que utilizamos para pensar o adulto que somos Assim como a criança edipiana percebemos a escalada do desejo pelo outro forjamos fantasias sentimos prazer com nosso corpo ou o corpo do outro temos medo de ser superados por nossos impulsos e aprendemos final mente a refrear nosso desejo e nosso prazer para viver em sociedade Que é a psicanálise senão uma prática sustentada por uma teoria que concebe o homem de hoje a partir da experiência edipiana vivida por todas as crianças quando têm de aprender a refrear seu desejo e moderar seu prazer Enfim o Édipo é também um mito já que essa crise real e concreta vivida por uma criança de quatro anos é uma explosiva alegoria da luta entre as forças impetuosas do dese jo sexual e as forças da civilização que se lhe opõem O melhor desfecho para essa luta é um compromisso chama do pudor e intimidade Qual é o status do Édipo Uma realidade uma fantasia um conceito ou um mito Qual é então o verdadeiro status do Édipo Consistiria ele em uma crise sexual de crescimento observável no compor tamento das crianças Uma fantasia inscrita no inconsciente Ou a mais importante construção teórica chavemestra do edifício analítico Ou ainda simplesmente um mito o mito 14 Sobre o Édipo moderno que nos revela que o interdito universal do incesto é uma resposta ao louco desejo humano de incesto Logo seria o Édipo uma realidade uma fantasia um conceito ou simplesmente um mito Pois bem responderei que o Édipo é tudo isso ao mesmo tempo realidade fantasia conceito e mito Contudo para o psicanalista que somos o Édipo permanece antes de tudo uma fantasia devo dizer até uma dupla fantasia É a fantasia infantil agindo no inconsciente do paciente duplicada pela mesma fantasia reconstruída dessa vez pelo profissional Assim só consigo compreender o sofrimento que escuto em meus pacientes adultos ao suporlhes desejos fic ções e angústias vividas na idade edipiana E penso que esses desejos ficções e angústias infantis ainda estão presentes nos dias de hoje travestidos nos múltiplos tormentos da neurose de que o paciente se queixa Quando por exemplo escuto Sarah uma anoréxica grave de 26 anos vejo mentalmente a criancinha que ela era e a imagino dividida entre o desejo de ser um menino com um corpo reto como o de seu irmão filho predileto do pai e o desejo de ser a mulher amada pelo pai Ora é ao me dirigir a essa menina de quatro anos presen te em Sarah que posso ter uma chance de influenciar o curso de sua anorexia Quando durante uma sessão sugiro uma in terpretação é Sarah minha paciente que a escuta mas é a pequena Sarah que a recebe Qual pequena Sarah A menini nha edipiana que eu fantasio em minha escuta que suponho atuante no inconsciente da Sarah adulta Mas o que prova que essa fantasia forjada na escuta com ajuda do material clínico e da teoria do Édipo seja de fato a que atua no in consciente de minha paciente Quem me garante que essa 15 Abertura fantasia em que a pequena Sarah fica dividida entre o desejo de ser menino e o de ser mulher não é uma construção erra da Em outros termos qual a validade dessa fantasia e do conceito de Édipo que lhe subjaz Pois bem esse conceito e essa fantasia são válidos fundamentalmente por duas razões Em primeiro lugar porque sempre que escuto um paciente com o a priori teórico do Édipo e da fantasia daí resultante minhas intervenções verificamse pertinentes isto é são vali dadas a posteriori pelo próprio paciente Em segundo lugar porque tenho a confirmação pela minha experiência de que a escuta enriquecida pelo conceito de Édipo é uma escuta extremamente flexível maleável capaz de harmonizar ao mesmo tempo o sofrimento atual do paciente a fantasia da criança que ele foi e o rigor de uma teoria analítica que não cesso de modelar e aperfeiçoar Se agora eu tivesse de esquematizar a crise edipiana em duas grandes etapas diria que o Édipo começa com a sexualização dos pais e termina com a dessexualização dos pais dessexuali zação que desembocará finalmente na identidade sexual adulta Portanto vou expor em detalhes passo a passo a lógica da crise edipiana no menino e na menina como uma lenda metapsicológica e romanceada que forjei à luz da teoria psi canalítica e de minha experiência clínica Preciso antes po rém indicar os principais elementos que intervêm nessa crise os desejos incestuosos as fantasias e a identificação Dos desejos 16 Sobre o Édipo incestuosos falaremos imediatamente em seguida examina remos as três fantasias mais importantes do Édipo fantasias de onipotência fálica a criança julgase onipotente fantasias de prazer que satisfazem imaginariamente o desejo incestuo so a criança é alegre fantasias de angústia no caso do menino ele é medroso e de sofrimento no caso da menina ela fica magoada e finalmente a última malha da lógica edipiana o espantoso fenômeno de identificação Desejos fantasias e iden tificação são portanto os três operadores que pontuam respec tivamente o nascimento o apogeu e o declínio do complexo de Édipo FIGURA 1 Que é então o Édipo O Édipo 1 É uma chama de sexualidade vivida por uma criança de quatro anos no cerne da relação com seus pais 2 É uma fantasia sexual forjada inocentemente pelo me nino ou pela menina para aplacar o ardor de seu desejo 3 É também a matriz de nossa identidade sexual de ho mem e de mulher pois é durante a crise edipiana que a criança sente pela primeira vez um desejo masculino ou feminino em relação ao genitor do sexo oposto 4 É ainda uma neurose infantil modelo de todas as nossas neuroses adultas 17 Abertura 5 É uma fábula simbólica que põe em cena uma criança encarnando a força do desejo e seus pais encarnando tan to o objeto desse desejo quanto o interdito que o refreia 6 É a chavemestra da psicanálise É o conceito soberano que gera e organiza todos os outros conceitos psicanalíti cos e justifica a prática da psicanálise 7 É enfim o drama infantil e o inconsciente que todo ana lisando representa na cena do tratamento ao tomar seu psicanalista como parceiro FIGURA 1 Visão geral do Édipo SEXUALIZAÇÃO DOS PAIS DESEJOS INCESTUOSOS FANTASIAS de Prazer Angústia menino ou Sofrimento menina Falo RENÚNCIA aos pais enquanto objetos sexuais e INCORPORAÇÃO dos pais como objetos de identificação SEXUALIZAÇÃO DOS PAIS DESSexualização DOS PAIS FRUTOS DO ÉDIPO IDENTIDADE SEXUAL SUPEREU NA PUBERDADE Pudor excessivo intransigência revolta NA IDADE ADULTA Neurose comum e mórbida NO TRATAMENTO ANALÍTICO Neurose de transferência REATIVAÇÃO DO ÉDIPO S E N S A Ç Õ E S No text extracted No começo era o corpo de sensações erógenas Os três desejos incestuosos As três fantasias de prazer As três fantasias de angústia de castração Resolução do Édipo do menino a dessexualização dos pais Comparado à mulher o homem é visceralmente um covarde Os frutos do Édipo o supereu e a identidade sexual Resumo da lógica do Édipo do menino 21 No começo era o corpo de sensações erógenas Por volta de três quatro anos todos os meninos focalizam seu prazer sobre o pênis vivido ao mesmo tempo como órgão objeto imaginário e emblema simbólico Nessa idade o ór gão peniano tornase a parte do corpo mais rica em sensa ções e impõese como a zona erógena dominante uma vez que o prazer por ele proporcionado à criança tornase a refe rência principal de todos os outros prazeres corporais Antes dessa idade os locais de prazer eram a boca e depois o ânus e a atividade muscular não esqueçamos que o prazer de an dar correr e agir prevalece em todos os bebês entre dois e três anos ao passo que com quatro todo prazer corporal seja qual for o lugar excitado repercute no nível de seu pequeno pênis sob a forma de um arrepio de prazer Em outras pala vras se um menino de quatro anos sente prazer em olhar o decote da mãe ou gosta de se mostrar nu em público ou ainda excitado pela brincadeira morde a coxa da irmãzinha A FIGURA 2 ver p43 acompanha a leitura deste Capítulo 1 22 Sobre o Édipo diremos que todos esse prazeres sentidos pela excitação dos olhos dos dentes ou do corpo inteiro são prazeres que reper cutem no nível de seu pequeno sexo e já lhe fazem viver uma excitação genital Porém aos quatro anos o pênis não é apenas o órgão mais rico em sensações É também o objeto mais amado e o que reclama todas as atenções Apêndice visível facilmente mani pulável erógeno e eréctil o pênis atrai a mão assim como a teta atrai os lábios e a língua o pênis convoca os olhares atiça a curiosidade dos meninos e das meninas e lhes inspira fábu las ficções e bizarras teorias infantis A pregnância imaginária do pênis é tamanha que o menino faz dele seu objeto narcísico mais precioso a coisa pela qual tem mais apego e orgulho de possuir Assim tal culto do pênis eleva o pequeno órgão ao nível de símbolo do poder absoluto e da força viril Mas aten ção É também e pelas mesmas razões vivido como um ór gão frágil excessivamente exposto aos perigos e por conseguinte símbolo não apenas do poder mas também da vulnerabilidade e da fraqueza Pois bem quando esse apêndi ce eminentemente excitável nitidamente visível eréctil ma nipulável e tão altamente valorizado tornase aos olhos de todos meninos e meninas o representante do desejo nós o chamamos de Falo O Falo não é o pênis enquanto órgão O Falo é um pênis fantasiado idealizado símbolo da onipo tência e de seu avesso a vulnerabilidade Veremos adiante quando abordarmos em detalhe o Édipo feminino que a su premacia imaginária e simbólica do pênis é tão forte nessa idade que a menininha também acreditará que possui um Falo É precisamente esse pênis fantasiado dito Falo que dá 23 O Édipo do menino nome à fase do desenvolvimento libidinal durante a qual acon tece a crise edipiana Com efeito Freud chama essa fase em que a sexualidade infantil permanece polarizada no Falo de fase fálica cf p779 Durante essa fase as crianças meninos ou meninas acham que todas as criaturas do mundo são dotadas de um Falo isto é que todas as criaturas são tão fortes quanto elas Quando por exemplo um menino considera que todos têm um Falo ele pensa Todos detêm um órgão peniano como o meu Todos experimentam as mesmas sensações que eu e todos devem se sentir tão fortes quanto eu Observo que essa fic ção infantil essa ilusão de acreditar que o pênis é um atributo universal é forjada tanto pelo menino quanto pela menina Ora eis que a idolatria da criança pelo Falo vai ser acompa nhada pela angústia de perdêlo no menino e pelo sofrimen to de havêlo perdido na menina Com efeito nessa idade a criança já fez a experiência de perder os objetos vitais bebê perdeu o seio materno que considerava uma parte de si pró prio em seguida fez a experiência de renunciar à mamadeira e se separar de seu primeiro paninho mais tarde a expe riência de defecar e constatar que seu cocô separase dele fez também a experiência de perder o status de filhorei com o nascimento de um irmãozinho ou irmãzinha e finalmente talvez já tenha chorado a morte de um parente Resumindo na idade edipiana uma criança é perfeitamente capaz de se representar a perda de um objeto que lhe era caro e temer que ela se repita Entretanto para ser mais preciso eu deveria acrescentar que desde sua vinda ao mundo ou melhor desde as primeiras palpitações de seu corpo embrionário o pequeno 24 Sobre o Édipo humano já é plenamente capaz de sentir a falta de um objeto vital e eu diria até a falta pura e simplesmente Sabemos o quanto um bebê por menor que seja sente sabe e chora de dor quando lhe falta algo essencial Eis por que eu diria que a aptidão da criança edipiana para perceber a falta é no fundo uma intuição inerente a toda a espécie humana Mas retomemos o fio Peçolhes agora que guardem a observação referente à ficção de um Falo universal e a refe rente à capacidade da jovem criança de se representar intuiti vamente uma falta pois essas duas proposições são as premissas indispensáveis para compreendermos como se formam a fan tasia de angústia de castração no menino e a fantasia de dor de privação na menina isto é para compreendermos como o menino sai do Édipo e como a menina entra nele Logo vol taremos a isso Os três desejos incestuosos Abordemos agora a dinâmica dos desejos incestuosos Excita do sexualmente e orgulhoso de seu poder o menino de quatro anos vê eclodir em si uma nova força um impulso desconhe cido o desejo de ir em direção ao Outro em direção a seus pais ou mais exatamente em direção ao corpo de seus pais para nele encontrar prazer para nele descobrir o conjunto dos diferentes prazeres erógenos conhecidos antes dessa ida de Eis a novidade do Édipo Até esse estágio a criança não conhecia tal floração dos sentidos e nunca tinha sentido dese jo tão impetuoso de se apossar do corpo inteiro do Outro e 25 O Édipo do menino nele encontrar prazer Que prazer é esse O desejo é o im pulso que nos leva a procurar prazer no enlace com nosso parceiro Desejase sempre uma pessoa em sua carne Desejar é atirarse para fora de si em busca da carne do outro é que rer atingir através da carne sobre a carne o gozo mais re quintado Eis o que é o desejo É nesse aspecto que todo desejo é um desejo sexual Sexual quer dizer mais que genital Sexual quer dizer Deixame olhar teu corpo nu Acariciá lo sentilo beijálo devorálo e até mesmo destruílo Que corpos Os corpos daqueles a quem amo me atraem e estão ao alcance da minha mão E que são eles para uma criança senão seu pai e sua mãe Como um bichinho travesso a criança edipiana põe as garras do desejo nas costas de seus pais Em suma a criança edipiana é arrastada por um impulso que a leva e pressiona a procurar prazer na troca sensual com os corpos daqueles a quem ama de quem depende e que também são criaturas desejantes criaturas que despertam e exercitam seu desejo Ora esse desejo imperioso esse impul so irresistível cuja fonte são as excitações penianas cujo alvo é o prazer e cujo objeto é o corpo de um dos genitores ou de qualquer outro adulto tutelar esse impulso é uma expressão do mítico desejo de incesto Sim o Édipo é a tentativa infan til de realizar um desejo incestuoso irrealizável Mas que é o desejo incestuoso É um desejo virtual nunca saciado cujo objeto é um dos pais e cujo objetivo seria alcançar não o prazer físico mas o gozo Que gozo O gozo prodigioso que pro porcionaria uma relação sexual plena em que os dois parcei ros criança e adulto genitor diluiriam em uma total e extática fusão Naturalmente esse desejo é um sonho irrealizável uma 26 Sobre o Édipo maravilhosa história em quadrinhos o mito grego ou a mais louca e imemorial das fábulas Esclareço imediatamente que as verdadeiras passagens ao ato incestuosas paifilha ou pai filho e mais raramente mãefilho são estupros relativamente raros e quando acontecem nunca proporcionam gozo al gum nem prodigioso nem banal Nada disso Ao contrário a clínica dos casos de incesto revela a extrema pobreza da satis fação obtida pelo adulto perverso e o forte trauma sofrido pela criança Não O desejo incestuoso de que lhes falo nada tem a ver com a desgraça do abuso sexual cometido por um pai sobre seu filho Mas então vocês me diriam por que a psicanálise precisa sacralizar o desejo incestuoso e postular que todos os desejos por ínfimos que sejam referemse a um desejo igualmente virtual Por que o desejo incestuoso é o desejo padrão Pois bem o único valor desse desejo insen sato de ir para a cama com a mãe e matar o pai é ser a alegoria do louco desejo de retorno ao estado original de beatitude intra uterina Para a psicanálise cada um de nossos desejos cotidia nos o prazer sensual de contemplar um quadro ou acariciar o corpo do amado por exemplo cada um desses desejos tenderia de um ponto de vista teórico insisto para a felicida de perfeita de que gozariam dois seres conjugados em Um O desejo incestuoso portanto não é senão uma figura mítica do absoluto o nome assumido pelo desejo louco de um herói de penetrar sua mãe para encontrar seu ponto de origem nos confins do corpo materno Para dizêlo com uma imagem o desejo incestuoso é o desejo de fusão com nossa terra nutriz Uma vez admitido o caráter mítico do desejo incestuoso distingo três variantes dele no menino Ressalvemos que os 27 O Édipo do menino desejos incestuosos não são exclusivamente eróticos mas an tes um condensado de tendências eróticas e agressivas Assim há três desejos fundamentais presentes em um menino e em todo ser humano em posição masculina seja qual for sua ida de o desejo de possuir sexualmente o corpo do Outro em parti cular o da mãe o desejo de ser possuído pelo corpo do Outro em particular o do pai e o desejo de suprimir o corpo do Outro em particular o do pai Desejo de possuir desejo de ser possuído e desejo de suprimir eis os três movimentos fundadores do dese jo masculino As três fantasias de prazer Ora sem atingir esses três objetivos incestuosos e impossí veis obter o gozo absoluto de possuir o corpo do Outro ser possuído pelo Outro isto é ser sua coisa e fazêlo gozar e finalmente obter o gozo absoluto de suprimir o Outro o menino cria fantasias que lhe dão prazer ou angústia mas que de toda forma satisfazem imaginariamente seus loucos desejos Mas em que consiste uma fantasia Em uma cena em geral consciente destinada a satisfazer de maneira imaginária o desejo incestuoso irrealizável ou melhor a satisfazer qual quer desejo uma vez que todo desejo é uma expressão do desejo incestuoso Uma fantasia é uma cena imaginária que propicia consolo à criança tome esse consolo a forma de um prazer ou como veremos de uma angústia Assim a fantasia tem como função substituir uma ação ideal que teria propor 28 Sobre o Édipo cionado um gozo nãohumano por uma ação fantasiada que baixa a tensão do desejo e suscita prazer angústia ou ainda outros sentimentos às vezes penosos Com efeito a queda da tensão psíquica obtida com a fantasia nem sempre se traduz por distúrbios ou tormentos que por penosos que sejam per mitem evitar uma fissura irreparável do psiquismo Por mais espantoso que pareça a queda da tensão psíquica também pode se traduzir por um sofrimento consciente Uma crise de choro por exemplo pode exercer a função de uma descar ga salutar ou um sintoma fóbico imporse como um mal menor que protege de outro mal muito mais grave como uma psicose Observemos também que a cena fantasiada não é obriga toriamente consciente e que ela com freqüência se traduz na vida cotidiana da criança por um sentimento um comporta mento ou uma fala Um menininho por exemplo nunca co pulará com a mãe mas compensará essa impossibilidade com uma fantasia voyeurista em que a imagina nua Essa fantasia se traduzirá então pela vontade maliciosa de espiar e surpreen der a mãe em situações íntimas Vocês têm aqui a gradação de que falamos o desejo incestuoso de possuir a mãe o desejo derivado de ver o corpo nu da mãe a fantasia de imaginálo e enfim o gesto malicioso de olhar pelo buraco da fechadura gesto que põe em ato a fantasia Eu gostaria porém de interromper um instante a fim de dissipar qualquer confusão entre os termos sensações de sejos fantasias e comportamentos Sejamos claros Co mecemos pelo começo Em primeiro lugar as sensações sentidas despertam o desejo de ir em direção ao corpo do 29 O Édipo do menino adulto Em seguida esse desejo é satisfeito com fantasias que proporcionam prazer à criança Repito que essas fantasias de prazer raramente são visualizadas mentalmente pelo sujeito Somos nós psicanalistas que as deduzimos a partir da obser vação dos comportamentos infantis e sobretudo a partir da escuta de nossos analisandos adultos Nós escutamos um pa ciente criança ou adulto e reconstruímos as cenas fantasiadas que governam suas vidas Ora subindo um degrau na abstra ção diremos que essas cenas são forjadas inconscientemente pelo sujeito para satisfazer imaginariamente seu desejo de sejo voyeurista no nosso exemplo e além disso para satisfa zer seu mítico desejo de incesto Vamos resumir Fico sabendo que um garotinho espia sua mãe e deduzo disso que está inconscientemente animado por uma cena voyeurista em que sua mãe estaria nua Considero também que essa cena satisfaz o desejo incestuoso de possuir sua mãe e mais concretamen te o desejo de devorála com os olhos Em suma as sensações despertam o desejo o desejo suscita a fantasia e a fantasia se atualiza através de um sentimento um comportamento ou uma fala Por exem plo ao nos vermos diante de uma emoção dizemos que ela exprime uma fantasia e que a fantasia satisfaz um desejo sem pre vivificado pelo corpo de sensações Estabelecidas essas premissas vejamos agora como cada um dos três desejos incestuosos se satisfaz imaginariamente graças a uma fantasia de prazer particular A cada desejo in cestuoso corresponde uma fantasia de prazer específica Qual é então a fantasia específica do desejo incestuoso de possuir o Outro Na verdade essa fantasia adota vários roteiros em que a criança desempenha sempre um papel ativo e se sente orgu 30 Sobre o Édipo lhosa de impor sua presença ao Outro A fantasia de possessão manifestase por meio dos comportamentos típicos dessa idade como por exemplo exibirse de maneira escandalosa brincar de papai e mamãe brincar de médico bancar o palhaço dizer palavrões sem conhecer sua significação ou mesmo ma caquear posições sexuais Às vezes o gesto que predomina é o de tocar o corpo de um de seus pais irmãos ou irmãs ou beijálo febrilmente e às vezes mordêlo ou maltratálo Mas de todos os roteiros de possessão o que exprime mais fiel mente o desejo incestuoso de possuir o Outro é o desejo do menino de se apoderar da mãe e têla apenas para si Gostaria de dar um exemplo Penso aqui em um menini nho de três anos Martin É um garoto vivo malicioso que só que sua mãe uma de minhas analisandas levara um dia ao meu consultório não tendo conseguido ninguém para ficar com ele Enquanto a criança brincava na sala de espera contí gua ao meu consultório a mãe me contou em tom de aparte um episódio sobre o filho que considero uma bela ilustração de uma fantasia de prazer edipiana de possuir a mãe Saibam que a mãe de Martin é uma moça divorciada muito bonita e simpática que mora sozinha com o filho Ela então me conta Adivinhe doutor o que me aconteceu com esse traquinas do Martin Eu estava no banheiro em trajes sumários me maquiando deixo sempre a porta entreaberta e de repen te dei um grito Martin entrara silenciosamente na ponta dos pés e me mordera as nádegas antes de fugir correndo todo orgulhoso e feliz com o que tinha feito Peçolhes que ima ginem esse menininho insinuandose sorrateiramente no ba nheiro e descobrindo na altura dos olhos as nádegas atraentes 31 O Édipo do menino da mãe Seu olho se acende ele se aproxima e subitamente morde com vontade É isto o Édipo O Édipo é morder as nádegas da mãe O Édipo não é acariciar ternamente a ma mãe é desejála e mordêla Isso parece evidente agora que lhes digo mas essa evidência da natureza sexual do Édipo o Édipo é uma questão de sexo e não de amor nem sempre é admitida O Édipo é o desejo sexual de um menininho que não tem nem cabeça nem corpo para assumilo Depois dessa primeira fantasia edipiana de possuir a mãe chegamos à segunda fantasia de prazer a de ser possuído pelo Outro A fantasia mais típica do desejo de ser possuído é uma cena em que o menino sente prazer em seduzir um adulto para se tornar seu objeto Essa fantasia é uma fantasia de sedu ção sexual em que o menino sedutor imaginase seduzido pela mãe por um irmão mais velho ou até mesmo ainda que isso os surpreenda pelo próprio pai Com efeito um menino pode desempenhar o papel passivo eminentemente femini no de ser a coisa do pai e fazêlo gozar Mas devemos enten der que se a criança imaginase seduzida não apenas ela é vítima passiva de um pai perverso malvado ou tarado como também uma sedutora ativa que espera ser seduzida a criança seduz para ser seduzida Observemos que se essa fantasia edi piana de sedução do menino pelo pai imobilizase e invade mais tarde a vida do adulto que a criança se tornou ela medra como um agente nocivo causa freqüente de uma forma de histeria masculina muito difícil de tratar Freqüentemente o tratamento analítico dessa histeria fracassa e esbarra em uma crise conhecida como pedra de castração ou como a cha mava Adler protesto viril Uma vez que nos referimos à 32 Sobre o Édipo clínica assinalo que a escolha de lhes apresentar o Édipo cor responde acima de tudo ao meu desejo de esclarecer a prática de vocês com seus pacientes adultos Pois como vocês perce beram o interesse do Édipo não é apenas teórico é princi palmente clínico e a fantasia de sedução é uma ilustração patente disso Sempre que recebo homens neuróticos que me demandam uma análise penso em sua fantasia inconsciente de serem a coisa do pai e fazêlo gozar A última fantasia de prazer a relativa ao desejo de suprimir o Outro em particular o pai coloca o sujeito em uma atitude sexual ativa Digo sexual porque destruir o Outro provoca tanto prazer sexual quanto qualquer fantasia edipiana Um dos comportamentos infantis que melhor traduz a fantasia de matar o pai rival é aquele muito freqüente em que o meni ninho aproveitase da ausência do pai em viagem para brin car de chefe de família e por exemplo querer partilhar o grande leito conjugal com a mãe As três fantasias de angústia de castração As fantasias de prazer seja aquela em que o menino adota uma atitude sexual ativa como morder a mãe seja aquela em que adota uma atitude sexual passiva como seduzir para ser seduzido seja enfim aquela em que adota uma atitude sexual ativa de rejeição do pai todas essas fantasias são fantasias de prazer que embora façam a criança feliz também desenca deiam nela uma profunda angústia o menininho malicioso teme ser punido por seu pecado punido com a mutilação de 33 O Édipo do menino seu órgão viril símbolo de sua potência de seu orgulho e de seu prazer Essa fantasia em que seria punido com a muti lação de seu Falo chamase fantasia de angústia de castra ção Vamos entender A ameaça de ser punido com a castração e a angústia daí resultante são uma ameaça e uma angústia fantasiadas Decerto um menino pode cometer um erro e ter medo do castigo mas a fantasia de ser punido com a cas tração e a angústia daí resultante são inconscientes Falemos claramente a angústia de castração não é sentida pelo meni no ela é inconsciente Este é um ponto importante pois muitos de vocês gostariam de verificar se um menininho de quatro anos receia efetivamente que lhe mutilem o pênis Pois bem respondolhes prontamente salvo exceção vocês não terão confirmação desse receio Claro acontece muitas vezes de de terminada mãe ao ver o filho apalpar o sexo gritar com ele Pare de se bolinar Seu passarinho não vai voar e ninguém vai comêlo Mas é uma réplica que não suscita no menini nho nenhuma angústia de ser castrado Não A angústia de castração nunca é consciente Isso posto como considerar então as angústias que observamos diariamente nos meninos sob a forma de medos ou pesadelos Eu diria que essas angústias infantis são as formas clínicas assumidas pela angústia incons ciente de castração Em suma não interessa se o menino sofre ou não uma ameaça real e se angustia o que interessa saber é que de toda forma ele é habitado pela angústia inconsciente de castração enquanto desejar e obtiver prazer ainda que mínimo ficará angustiado A angústia é o avesso do prazer Angústia e prazer são tão indissociáveis que os imagino como gêmeos paridos pelo desejo Gostaria de ser bem claro nesse 34 Sobre o Édipo ponto Da mesma forma que a psicanálise postula a premissa do desejo incestuoso ela afirma que todos os homens são essencialmente habitados por uma angústia de castração in trínseca ao desejo masculino Voltaremos a isso quando falar mos da neurose masculina mas desde já afirmo que a angústia de castração é a medula espinhal do psiquismo do homem Quanto ao psiquismo da mulher veremos mais tarde de que estofo emocional é feito Dizíamos então que a angústia masculina é o avesso do prazer de fantasiar Com efeito não existe prazer edipiano sem a contraparte a angústia de desejar e de ser punido por isso Esse par de sentimentos antagônicos prazer e medo de ser punido está na base de toda neurose Podemos desde já dizer que o próprio Édipo é uma neurose infantil ou melhor a primeira neurose de crescimento do ser humano Por quê Porque a neurose é acima de tudo a ação simultânea de sen timentos opostos e porque a criança edipiana sofre como um neurótico com o doloroso conflito entre saborear o prazer de fantasiar e ter medo de ser punido caso persevere Voltarei muitas vezes a essa idéia cardinal segundo a qual o Édipo é em si uma neurose Embora já tenhamos afirmado o status inconsciente da angústia de castração sem apresentar situações concretas para justificálo nem por isso certos incidentes da vida da criança deixam de confirmar se necessário a existência dessa angús tia Eis o acontecimento incontornável a que se referem to dos os teóricos do Édipo Um dia o menino vê o corpo nu de uma menininha ou de sua própria mãe e constata surpre so que elas não têm pênisFalo Se lembrarmos a ilusão in 35 O Édipo do menino fantil segundo a qual todo o mundo possui um Falo com preenderemos por que o menino então rumina inconscien temente Uma vez que existe um ser neste mundo que perdeu seu Falo também corro o risco de ficar privado dele É com essa descoberta que a angústia de castração é definitivamente confirmada Temos então três variantes da fantasia de angústia que devem ser compreendidas como o avesso das três fantasias de prazer Se a fantasia de prazer é morder a mãe ou ter um filho com ela isto é possuir o Outro a ameaça de castração incide sobre o objeto mais precioso o pênisFalo ou seja sobre a parte do corpo mais investida Aqui o agente da ameaça é o pai repressor que lembra ao menino a Lei do interdito do in cesto Não possuirás tua mãe nem lhe darás um filho Da mesma forma ele se dirige à mãe dizendolhe Não reinte grarás teu filho no teu seio Se a fantasia de prazer é uma fantasia de sedução isto é ser possuído pelo Outro mais exatamente oferecerse ao pai a ameaça de castração incide igualmente sobre o Falo mas des sa vez considerado menos como apêndice destacável que como símbolo da virilidade Aqui o agente da ameaça não é o pai repressor mas o pai sedutor o pai é um amante que o menino deseja mas teme que vá longe demais e abuse dele Nesse caso a angústia não é o medo de perder o pênisFalo mas de perder a virilidade tornandose a mulherobjeto do pai Te nho medo de ser assediado sexualmente pelo meu pai e de com isso perder minha virilidade Insisto em dizer que essa fantasia de sedução do menino pelo pai e a angústia de ser 36 Sobre o Édipo assediado é uma fantasia primordial que pode ser constatada no tratamento analítico dos homens neuróticos E finalmente se a fantasia de prazer é uma fantasia de afastar o pai rival a ameaça de castração incide novamente sobre o pênisFalo considerado a parte exposta do corpo Aqui o agente da ameaça é o pai odiado que intimida a criança para deter seus impulsos parricidas Eis portanto as três variantes da fantasia de angústia de castração Na primeira o pai é um repressor temido na segun da é um tarado temido e na terceira é um rival temido Em todos os casos o agente da ameaça é o pai e o objeto ameaça do o pênisFalo ou seu derivado a virilidade Resolução do Édipo do menino a dessexualização dos pais O menino desiste da mãe porque tem medo de ser punido em sua carne ao passo que a menina como veremos abandona a mãe que a decepciona e voltase para o pai A que leva à angústia de castração Pois bem é ela que preci pita o fim da crise edipiana Com efeito dilacerado entre suas fantasias de prazer e suas fantasias de angústia dividido entre a alegria e o medo o menino é finalmente tomado pelo medo A angústia mais forte que o prazer dissuade a criança de pros seguir sua busca incestuosa e a leva a desistir do objeto de seus desejos Angustiada a criança esquivase dos pais tomados como objetos sexuais para salvar seu precioso pênisFalo isto é para proteger seu corpo Com a renúncia aos pais e a submissão à 37 O Édipo do menino Lei do interdito do incesto consumase assim o momento culminante o apogeu do complexo de Édipo masculino Fi nalmente a criança consegue preservar seu Falo mas ao preço de abandonar seus pais sexualizados Em outros termos sob ameaça o menino angustiado tem de escolher entre proteger a mãe ou o pênis Pois bem é o pênis que ele protege e é a mãe que ele abandona Ao renunciar à mãe dessexualiza global mente os dois pais e recalca desejos fantasias e angústia Ali viado pode agora abrirse a outros objetos desejáveis mas dessa vez legítimos e adaptados às suas possibilidades reais Somente assim separada sexualmente dos pais a criança pode doravan te desejar outros parceiros escolhidos fora de sua família Comparado à mulher o homem é visceralmente um covarde Quanto mais o menino for amado pela mãe mais se tor nará um homem viril E quanto mais orgulhoso for de sua potência mais se preocupará em defendêla suscetível quanto à sua virilidade e ridiculamente sensível ao menor dodói Comparado à mulher o homem é visceralmente um covarde Gostaria aqui de esquematizar a seqüência da crise edipiana do menino Temos então três tempos amor pelo pênis angús tia de perdêlo renúncia à mãe Graças à angústia o narcisismo do menino isto é o amor pelo próprio corpo o amor por seu pênisFalo prevaleceu sobre o desejo pelos pais Sob ameaça o narcisismo foi mais forte que o desejo ou formulado em 38 Sobre o Édipo outras palavras as pulsões de autoconservação venceram as pulsões sexuais Insisto em dizer que essa vitória do narcisis mo sobre o desejo foi precipitada pela angústia não se esque çam de que é por medo de se prejudicar que o menino se esquiva da mãe Entretanto a angústia será recalcada e fre qüentemente mal recalcada Com efeito veremos que a neu rose na idade adulta é o retorno da angústia de castração mal recalcada na infância Porém fora desse retorno neurótico é incontestável que a angústia de castração permanece onipre sente na relação normal que um homem mantém com seus órgãos genitais e mais genericamente com sua virilidade Apesar de seu recalcamento pela criança edipiana a angústia pivô do Édipo do menino marca para sempre a condição masculina Com isso podemos deduzir o quanto a angústia está no centro da vida de um homem Ela impregna tão for temente o caráter masculino que não hesito em dizer e a clínica o comprova que o homem é uma criatura particular mente medrosa diante da dor física e preocupado em garan tir permanentemente sua virilidade e sua potência O homem é essencialmente um ser aflito com a perda do poder que julga possuir ou para dizêlo em uma síntese caricatural o homem é um covarde Sim reconheço nós homens somos visceralmente covardes e essa covardia vem do medo e o medo vem do narcisismo excessivo do corpo da atenção in quieta e febril que dirigimos ao nosso corpo Esclareçamos da atenção que dedicamos não à aparência ou à beleza do corpo mas ao seu vigor e sobretudo sua integridade A pro pósito ocorreme aqui uma imagem divertida inspirada nas partidas de futebol quando os jogadores formam a barreira 39 O Édipo do menino para bloquear um tiro direto Nesse momento por reflexo colocam as duas mãos cruzadas sobre o sexo para se protege rem da bola É uma imagem burlesca que lembra uma fileira de menininhos todos preocupados com seus corpos e é tam bém uma ilustração clara da maneira como o homem vive seu sexo como seu mais íntimo calcanhardeaquiles Porém o mais engraçado desse instantâneo futebolístico é constatar que quando o jogador da equipe adversária bate finalmente a falta os defensores da barreira sempre preservando seu sexo desequilibramse espontaneamente como se tivessem medo de ser atingidos pela bola e às vezes contra toda a expectati va saltam no lugar para evitar serem atingidos pela bola cor rendo o risco de deixála passar entre as pernas e vêla no fundo das redes Preocupados em se preservar negligen ciam sua missão que é bloquear a bola Da mesma forma quando sua virilidade está em perigo o homem fica tão preo cupado em protegêla quanto o jogador em proteger seu sexo Ele pode arriscar tudo até sua vida mas nunca seu orgulho de ser viril Ora quem são as criaturas que na vida de um homem podem fazerlhe mal tomarlhe o poder ameaçar sua virilidade ou humilhálo senão o pai admirado e temido ou a mulher isto é a mulher que rivaliza com ele Quem pode roubarlhe a potência senão o pai admirado ou a mu lher rival Em todo caso não a mãe Ao contrário a mãe alimenta sua força e o persuade sobre o destino excepcional que o espera Eis por que recomendo sempre às mães que exprimam ao filho toda a confiança que depositam nele e o apóiem em seus projetos Sobretudo que não o apóiem no que diz respeito à sua beleza ou sua imagem mas ao seu poder 40 Sobre o Édipo de fazer e criar Com efeito repetir para ele que ele é bonito e simpático antes reforçaria seu mau narcisismo o da ima gem e enfraqueceria seu eu Não decididamente não é a mãe que ameaça o homem são antes o pai idealizado e a mãe vingadora Em suma para o homem o sexo a virilidade e a força são as coisas a serem defendidas a todo custo Os frutos do Édipo o supereu e a identidade sexual Uma vez resolvido eu deveria dizer insuficientemente re solvido uma vez que a dessexualização dos pais nunca é com pleta e a angústia nunca definitivamente recalcada o complexo de Édipo masculino terá duas conseqüências deci sivas na estruturação da personalidade futura do menino por um lado o nascimento de uma nova instância psíquica o supereu por outro a confirmação de uma identidade sexual nascida por volta dos dois anos de idade e afirmada mais soli damente após a puberdade O supereu é instituído graças a um gesto psíquico surpreendente o menino abandona os pais como objetos sexuais e os mantém como objetos de identifi cação Uma vez que não pode mais têlos como objetos de seu desejo apropriase deles como objetos do seu eu na im possibilidade de têlos como parceiros sexuais promete in conscientemente ser como eles em suas ambições fraquezas e ideais Sem poder possuílos sexualmente assimila a moral deles É graças a essa incorporação que a criança integra os interditos parentais que doravante imporá a si mesma O re sultado dessa passagem da sexualidade à moral é o que desig 41 O Édipo do menino namos supereu e os sentimentos que o exprimem pudor senso de intimidade vergonha e delicadeza moral O segundo fruto do Édipo é a assunção progressiva da identidade sexual Antes do Édipo a criança tinha um conhe cimento rudimentar e intuitivo acerca da diferença dos sexos sem ainda ser capaz de se dizer menina ou menino ou afirmar que o pai é um homem e a mãe uma mulher No início do Édipo nem sempre ele consegue identificar o sexo de seu pai de sua mãe ou de seus irmãos e irmãs Não esqueçamos que aos três anos a linha divisória ainda não passa entre homem e mulher masculino e feminino mas entre aqueles que têm o Falo e os que não o têm entre os fortes e os fracos Entretanto o contexto familiar social e lingüístico bem como as sensa ções erógenas que emanam de sua região genital e a sensação de ser atraído pelo pai de sexo oposto são os fatores que insta larão progressivamente as bases de uma identidade sexual que só será realmente adquirida muito mais tarde na época da puberdade É então que o jovem adolescente integrará a idéia de que o pênis é um atributo exclusivo do homem e se já descobriu a vagina que a vagina é um atributo exclusivo da mulher Pouco a pouco ele se forjará uma identidade sexual de homem e ao mesmo tempo descobrirá que a masculinidade e a feminilidade são antes de tudo comportamentos que não correspondem necessariamente à realidade fisiológica e anatômica de um homem ou de uma mulher Aprenderá as sim que todos os seres humanos em virtude de sua constitui ção bissexual possuem ao mesmo tempo características masculinas e femininas Daí concluirá talvez que a diferença sexual permanece um enigma que não cessa de nos interrogar 42 Sobre o Édipo O leitor pode desde já se reportar à FIGURA 8 p1267 que apresenta um quadro comparativo entre o tipo viril e o tipo feminino Adianto que esse quadro deve ser lido como o con junto dos traços dominantes que caracterizam o comporta mento de um homem e o de uma mulher do ponto de vista do Édipo e não como um conjunto de traços normativos Resumo da lógica do Édipo do menino Antes de abordar o Édipo da menina gostaria de resumir as diferentes fases atravessadas pelo menino edipiano dandolhe a palavra Vamos escutálo Tenho quatro anos Sinto excitações penianas Tenho o Falo e julgome onipotente Desejo ao mesmo tempo possuir se xualmente meus pais ser possuído por eles e eliminar meu pai Sinto prazer em fantasiar meus desejos incestuosos Meu pai ameaça me punir me castrando Vejo o corpo nu de uma menina ou o de minha mãe e constato a ausência de pênis Sinto mais medo ainda de ser punido Angustiado prefiro renunciar a desejar meus pais e salvar meu pênis Esqueço tudo desejos fantasias e angústia Separome sexualmente de meus pais e adoto a moral deles Começo a compreender que meu pai é um homem e minha mãe uma mulher e a saber pou co a pouco que pertenço à linha dos machos Mais tarde na adolescência minhas fantasias edipianas ressurgirão mas meu supereu muito severo nessa idade vai se opor ferozmente a isso Essa luta entre fantasias e supereu irá se manifestar por atitudes exageradas e conflituosas próprias da adolescência pudor exa cerbado inibições medo da mulher e desprezo por ela bem como negação dos valores estabelecidos Resolução da crise edípiana Fantasias de angústia Fantasias de prazer que se manifestam por comportamentos Desejos incestuosos míticos Falo Sensações erógenas DESSSEXUALIZAÇÃO DOS PAIS Fantasia de angústia medo de ser castrado pelo pai rival Fantasia de angústia medo de ser castrado pelo pai sedutor Fantasia de angústia medo de ser castrado pelo pai repressor VISÃO DO CORPO NU FEMININO DESPROVIDO DE PÊNIS Fantasia de prazer atitude sexual ativa Fantasia de prazer atitude sexual passiva Fantasia de prazer atitude sexual ativa SEXUALIZAÇÃO DOS PAIS Desejo de suprimir o corpo do Outro o pai Desejo de ser possuído pelo corpo do Outro sobretudo pelo pai Desejo de possuir o corpo do Outro a mãe Fantasma de onipotência FALO Sensações penianas FIGURA 2 Lógica do Édipo do menino 2 O Édipo da menina Tempo préedipiano a menina é como um menino Tempo da solidão a menina sentese sozinha e humilhada Tempo do Édipo a filha deseja o pai Resolução do Édipo a mulher deseja um homem A mais feminina das mulheres tem sempre o pai dentro de si Resumo da lógica do Édipo da menina 47 Tempo préedipiano a menina é como um menino Vou dar seqüência à nossa lenda metapsicológica descreven dolhes os quatro tempos do Édipo feminino Vocês vão logo perceber que entramos em um mundo completamente dife rente daquele do Édipo masculino Ao passo que em um menino de quatro anos coexistem três desejos incestuosos possuir ser possuído e suprimir o Outro na menina da mes ma idade há apenas um desejo incestuoso no início o de possuir a mãe seguido mais tarde pelo de ser possuída pelo pai Eu disse possuir a mãe ainda que isso lhes pareça estranho para uma menina A esse propósito um esclarecimento Se respeitamos a acepção corrente da palavra Édipo como a atração erótica da criança pelo genitor do sexo oposto não podemos dizer que a menininha que deseja possuir a mãe esteja no Édipo ela vive antes um préÉdipo considerado necessário para acessar o pai e entrar efetivamente no Édipo Portanto é sexualizando inicialmente a mãe que a menina poderá em seguida sexualizar o pai Eis por que Freud chama A FIGURA 3 ver p64 acompanha a leitura deste Capítulo 2 48 Sobre o Édipo a etapa preparatória da sexualização do pai de fase préedipia na Já o menino não precisa dessa fase preliminar uma vez que deseja desde logo o genitor do sexo oposto isto é a mãe e a mãe será o único objeto de seu desejo edipiano Acabo de dizer que o menino sempre tem a mãe como objeto apesar de a propósito da fantasia de sedução do menino terlhes mostrado que o pai também pode ser objeto do desejo do filho Entretanto classicamente falando deveríamos dizer que o menino deseja apenas um único objeto sexual a mãe ao passo que a menina deseja ambos antes a mãe depois o pai Estamos na aurora do século XXI e sou obrigado a evocar as incontáveis e apaixonantes discussões travadas pelos psica nalistas nos anos 1930 acerca da importância da fase préedi piana na vida de uma mulher Com efeito essa fase é essencial para compreendermos a problemática das pacientes neuróti cas que recebemos todos os dias Quando escuto uma mulher penso sempre na relação dela com a mãe e paralelamente quando escuto um homem penso mais freqüentemente em sua relação com o pai Claro que estou em vias de expor uma teoria do Édipo mas gostaria de fazêlos perceber a incidên cia do Édipo na clínica e sobretudo fazêlos compreender que o problema das neuroses reside no difícil retorno à idade adul ta de um Édipo invertido isto é do que era na infância a atração sexual pelo genitor do mesmo sexo A menina se neurotiza portanto mais facilmente a partir de sua relação com a mãe e o homem se neurotiza mais facilmente a partir de sua relação com o pai Assim deveríamos dizer que a neurose masculina resulta de uma fixação do filho pelo pai e a feminina de uma fixação da filha pela mãe Se como analista você escuta um 49 O Édipo da menina homem neurótico pense sobretudo no pai dele e na presença de uma mulher neurótica pense antes em sua mãe Deixemos agora a clínica e consideremos por um instante a expressão consagrada entrar no Édipo Quando diremos que uma menininha entra no Édipo Nossa resposta é dife rente da relativa ao menino Este entra diretamente no Édipo porque desde logo deseja sua mãe e abandona o Édipo quan do deseja outra mulher que não sua mãe A menina por sua vez entra no Édipo isto é sexualiza seu pai após ter atraves sado a fase préedipiana durante a qual sexualiza e depois rejeita sua mãe e abandona o Édipo quando deseja outro ho mem que não seu pai Uma segunda dessimetria entre o me nino e a menina diz respeito à velocidade com que eles saem do Édipo O menino como vimos dessexualiza simultanea mente seus dois genitores de maneira rápida e brutal ao passo que a menina dessexualiza primeiro a mãe e só depois mais tarde muito lentamente separase sexualmente do pai O menino sai do Édipo em um dia a menina precisa de muitos anos Assim poderíamos dizer que o menino tornase ho mem de uma tacada só ao passo que a menina tornase mulher progressivamente Mas voltemos ao período préedipiano quando a menina deseja a mãe como objeto sexual adotando perante ela a mes ma atitude que o menino edipiano Assim como ele ela julga deter um Falo e mostra por seus comportamentos ser guiada por fantasias de onipotência fálica e prazer nas quais desem penha um papel sexual ativo em relação à mãe Exatamente como o menino ela se sente feliz forte e orgulhosa é curiosa às vezes voyeurista exibicionista e agressiva Em suma duran 50 Sobre o Édipo te esse período a menina é animada pelo desejo incestuoso de possuir a mãe regozijase por têla toda para si e adota uma posição nitidamente masculina similar à do menino Tempo da solidão a menina sentese sozinha e humilhada Ora ocorrerá um acontecimento crucial que ofuscará o ino cente e insolente orgulho da garotinha radiante por se sentir onipotente Da mesma forma que o menino descobre visual mente e angustiado a ausência de pênis no corpo feminino a menina constata a diferença de aspecto entre seu sexo e o do menino A reação da menina é imediata fica decepcionada por não ter o mesmo apêndice que o menino Ele tem algu ma coisa que eu não tenho Até então fiavase em suas sen sações de poder vaginal e clitoridiano que a confortavam em seu sentimento de onipotência Agora que viu o pênis duvi da de suas sensações e julga que a fonte do poder não está nela mas no corpo do outro no sexo do menino O impacto da visão do pênis portanto foi mais forte que a manifestada em suas sensações erógenas A imagem desconcertante do pênis prevaleceu sobre seus sentimentos íntimos o que ela viu abo liu o que ela sentia A menina vêse assim dolorosamente despossuída pois o cetro da força não é mais encarnado por suas sensações erógenas mas pelo órgão visível do menino Agora o Falo está no outro e assume doravante a forma de um pênis É então que brutalmente uma imensa ilusão des morona provocando um pungente dilaceramento interno 51 O Édipo da menina Chamo essa fantasia na qual a menina sofre com a dor de ter sido privada do precioso Falo de fantasia de privação ou mais exatamente fantasia da dor de privação Enquanto o menino vivia a angústia de ter a perder a menina vive a dor de ter perdido enquanto o menino teme uma castração a menina se ressente de uma privação Lembremse a fantasia que levou à resolução do Édipo no menino é uma fantasia de angústia Temendo perder o Falo venerado que julga deter o menino é levado a preferir o pênis à mãe Para a menina é radicalmente diferente ela não tem medo de perder uma vez que acaba de constatar que não tem pênis e que nunca o terá Ao contrário do meni no ela nada tem a perder Não ela não receia perder não sofre de angústia sofre de dor a dor de ter sido privada Ve jam a angústia prevalece no menino e a dor na menina Mas dor por quê Claro dor por ter sido privada de um objeto inestimável que ela julgara possuir mas sobretudo por ter sido enganada Sim a menininha sentese enganada Alguém todo poderoso teria mentido para ela fazendoa acreditar que ela detinha o Falo e que o conservaria eternamente Mas quem é esse alguém senão sua própria mãe Uma mãe ontem onipo tente e que agora se revela impotente para lhe dar um Falo que ela própria não tem nem nunca teve Sim sua mãe tam bém é tão desprovida quanto ela merecendo apenas desprezo e recriminações É nesse exato instante que despeitada a menina esquiva se da mãe e em sua solidão fica furiosa por ter sido privada e enganada A dor de ter sido privada e a de ter sido enganada não passam na verdade de uma única e mesma dor a qual 52 Sobre o Édipo chamo dor da humilhação isto é sentirse vítima de uma injustiça e julgar a autoimagem ferida Aqui a privação e o amorpróprio ferido confundemse em um único sentimen to o da humilhação A experiência da privação foi vivida como uma ofensa irreparável ao legítimo orgulho de pos suir o Falo como um golpe humilhante infligido em seu nar cisismo Havíamos dito que para o menino o objeto narcísico por excelência é seu precioso órgão o pênisFalo e que sua opção por salválo levao a renunciar aos pais Para a menina ao contrário o objeto narcísico por excelência não é uma parte de seu corpo é seu amorpróprio a imagem cativante de si mesma O Falo para a menina não é o pênis mas a imagem de si Ora a reação imediata ao amorpróprio ferido é reivindicar à mãe o que lhe é devido e se queixar do prejuí zo que sofreu Apenas mais tarde quando a filha desejar o pai chegará a época da reparação da pacificação e da reconcilia ção com a mãe Por ora a menininha está só pois não tem mais pais para quem se voltar rejeitou a mãe e ainda não recorreu ao pai É um período de negra solidão em que a menina chora seu narcisismo ofendido Resumindo se o menino sai do Édipo para proteger seu narcisismo eu diria que a menina entra no Édipo vai ao encon tro do pai para pedirlhe que faça um curativo em seu narci sismo ferido Formulemos de outra maneira Para o menino a salvaguarda de seu pênisFalo interrompeu o impulso inces tuoso em direção à mãe ao passo que a necessidade de con solação desperta na menina um novo desejo o de ser possuída pelo pai Ela abandona a mãe e para ser consolada procura o pai na esperança de ser possuída por ele No caso do menino o 53 O Édipo da menina narcisismo do corpo interrompe o Édipo no caso da menina o narci sismo da imagem de si abre para o Édipo A inveja ciumenta de deter o Falo Voltemos porém um pouco ao momento em que a menina descobre no menino o pênisFalo que ela não tem Ela sofre sentese lesada em seu amorpróprio e reivindica exige mes mo o que lhe cabe Quero esse Falo que me tomaram e o terei nem que tenha que arrancálo do menino ela exclama Essa reivindicação mostra muito bem que a dor da humilha ção comutouse em fúria invejosa de deter o Falo A menina é desde então presa de um sentimento que a psicanálise chama inveja do pênis e que prefiro chamar de inveja do Falo para enfatizar que a menina não inveja o órgão peniano do menino mas o símbolo de potência por ele encarnado aos olhos das crianças O pênis não a interessa e às vezes inclusive a repugna o que a interessa e apaixona é o poder que ela lhe atribui e que a deixa com inveja Mas atenção Inveja não é sinônimo de desejo A inveja não é o desejo Uma coisa é inve jar o Falo outra é desejar o pênis de um homem Vejam a menininha tem inveja do Falo mas a mulher deseja o pênis a inveja é um sentimento pueril ao passo que o desejo de pênis é um impulso próprio da maturidade Assim para que uma menina venha a desejar o pênis de um homem deve primeiro transformarse em mulher amadurecer seu Édipo isto é pri meiro sexualizar seu pai e separarse dele para mais tarde tor narse a companheira que goza do corpo e do sexo do homem amado Não a inveja do Falo é a inveja infantil e ciumenta de 54 Sobre o Édipo uma criança magoada vingativa e nostálgica que quer recu perar o símbolo do poder de que julga ter sido despossuída Observem que nesse duelo imaginário ela luta de igual para igual com o menino e adota uma posição de rivalidade viril Tempo do Édipo a filha deseja o pai Eis que agora um novo personagem entra em cena é o pai maravilhoso grande detentor do Falo É quando a menininha magoada e sempre ciumenta voltase para ele a fim de se refugiar e se consolar mas também para lhe reivindicar seu poder e sua potência Quer ser tão forte quanto seu pai e brandir o Falo que a tornaria novamente senhora dos seres e das coisas A tal pretensão o pai todopoderoso de sua fan tasia opõe uma recusa inapelável dizendolhe Não nunca lhe darei a chama da minha força uma vez que ela cabe à sua mãe Naturalmente o pai que fala assim é um personagem caricatural é o pai fantasiado por uma crian ça caprichosa e intransigente Não um pai adulto nunca fala ria dessa forma Se tivesse de responder a uma demanda tão pueril antes replicaria Não minha filha não posso lhe dar o poder absoluto que você me atribui pela simples razão de que ele não existe O Falo que você me pede é um sonho de criança ainda que esse sonho seja uma velha quimera que levou os homens a se amarem mas freqüentemente a se des truírem Não ninguém tem o Falo e ninguém nunca o terá Meu único poder minha filha meu mais dileto poder é o poder supremo de desejar viver de lutar a cada instante para fazer o que tenho de fazer de amar o que faço e tentar transmi 55 O Édipo da menina tirlhe esse desejo Cabe a você depois transformálo em de sejo feminino de amar parir e criar Essa recusa irrevogável do pai é recebida pela filha como uma bofetada que põe fim a toda esperança de um dia con quistar o mítico Falo Ela acaba de compreender que nunca o terá e não obstante não se resigna Ao contrário lançase agora com toda a fúria de seu desejo juvenil nos braços do pai não mais para lhe arrancar o poder mas para ser ela mes ma a fonte do poder Sim ela queria ter o Falo mas agora quer ir mais longe quer sêlo ser a coisa do pai Que significa isso Isso significa que a menina quer ser ela própria e por inteiro o Falo precioso Em outros termos quer se tornar a favorita do pai Em virtude do não primeira recusa pater na a inveja ciumenta de deter o Falo do pai dá lugar agora ao desejo incestuoso de ser possuída por ele ser o Falo do pai Quando a menina era invejosa adotava uma posição masculi na agora que é desejante engajase em uma posição femi nina Ao sentimento masculino de inveja sucede o desejo feminino de ser possuída pelo pai Assim ao sexualizar o pai ator principal de suas fantasias a menina entra efetivamente no Édipo Por sinal a fantasia de prazer que melhor ilustra o desejo edipiano de ser possuída pelo pai é a de ser sua mulher esperança freqüentemente manifestada por essa frase Quando ficar grande vou me ca sar com papai Essa entrada no Édipo é também o momento em que a mãe após ter sido afastada volta à cena e fascina a filha por sua graça e feminilidade Com efeito a mãe antes tão desacreditada é agora admirada como mulher amada e modelo de feminilidade Espontaneamente a menina então aproximase da mãe e identificase com ela mais exatamente 56 Sobre o Édipo com o desejo da mãe de agradar seu companheiro e ser ama da por ele O comportamento edipiano da menina inspirase plenamente no ideal feminino encarnado pela mãe a criança é toda olhos e ouvidos na observação da mãe e no aprendiza do da arte de seduzir o homem É a idade em que as filhas adoram observar a mãe se maquiando ou se embelezando ainda que a admiração pela mãe seja duplicada por uma forte rivalidade toda mãe é então para a filha tanto um ideal quanto uma temível rival Assim realizase o primeiro movimento de identificação da filha com o desejo da mãe o de ser a mulher do homem amado e darlhe um filho Resolução do Édipo a mulher deseja um homem Da mesma forma que o pai recusou o Falo à sua filha nega se agora com a mesma firmeza a tomála como objeto sexual a considerála como seu Falo isto é a possuíla inces tuosamente Depois que a primeira recusa Não lhe darei minha força permitiu à filha aproximarse da mãe e com ela identificarse a segunda Não a quero como mulher leva a filha a identificarse com a pessoa do pai Com efeito produzse um fenômeno curioso mas perfeitamente saudá vel no desenvolvimento do Édipo feminino uma vez que a menina não pode ser o objeto sexual do pai quer ser então como ele Já que não quer saber de mim como mulher en tão vou ser como você Que significa isso Que a menina aceita recalcar seu desejo de ser possuída pelo pai sem com isso renunciar à sua pessoa Enquanto o menino edipiano re signase a perder a mãe por covardia por sua vez a menina 57 O Édipo da menina que nada mais tem a perder obstinase audaciosamente a se apoderar do pai Ela queria ter o Falo recusaramlhe ela quis sêlo foi despachada agora basta quer tudo quer o pai por inteiro e o terá Eis por que digo que a dessexualização do pai é no fundo um luto a menina chora o pai sexualizado e o faz reviver dessexualizado nela Assim como o enlutado que na saída do luto acaba por se identificar com o defunto a meni na tendo renunciado ao pai fantasiado acaba por se identifi car com a pessoa do pai real Ela mata seu pai fantasiado mas o ressuscita como modelo de identificação Em outras pala vras a menina deixa de considerar o pai desejável em suas fantasias edipianas e incorpora sua pessoa no eu Assim im pregnase de atitudes gestos e até mesmo desejos e valores morais que caracterizam seu pai no real Ela é o retrato es carrado do pai Identificada com os traços masculinos do pai depois de se ter identificado com os traços femininos da mãe a menina enfim abandona a cena edipiana abrindose agora para os futuros parceiros de sua vida de mulher Notem que as duas identificações constitutivas da mulher identificação com a feminilidade da mãe e identificação com a virilidade do pai foram desencadeadas por duas recusas do pai recusa de dar o Falo à filha e recusa de tomála como Falo Mas mudemos o tom O cara a cara a que acabamos de assistir opondo a filha edipiana ao pai inspiroume esse breve e animado diálogo entre nossos dois heróis legendários Apres so a advertilos que o pai da cena seguinte é um homem saudável e apaixonado pela mulher A menina Pai dême sua força O pai Não Não farei nada disso Não lhe darei minha força Doua à sua mãe 58 Sobre o Édipo A menina Mas então eu queria ser sua força Por favor deixe me ser sua musa a fonte ardente de sua força Pai eu suplico Olhe para mim Sou seu objeto mais precioso Possuame O pai Não Está fora de questão Você não é minha mulher Já lhe recusei minha força e aceito ainda menos que você seja a fonte dela A menina Já que é assim já que você me priva de sua força e não me deixa ser sua musa então vou me apoderar de você e ser como você o que me diz disso Melhor que você Sim vou devorá lo inteirinho e me parecer com você a ponto de andar como você ter o nariz como o seu a intensidade do seu olhar o brilho da sua inteligência ou o ardor da sua ambição Então serei tão forte quanto você e você verá muito mais forte Eis a avidez juvenil a vontade pugnaz de uma menina que só terá fim quando realizar seu desejo de ser amada e chegado o momento esperar um filho Amar e transmitir a vida definitivamente é a missão mais digna que a natureza atribui à mulher Como se a natureza se de fato existe uma entidade chamada natureza a encorajasse intimandolhe Defenda o desejo com o bico e as garras proteja o amor e garanta a transmissão da vida Antes de prosseguir gostaria de lhes dizer o quanto a lite ratura analítica sobre o Édipo feminino é imensa rica e reple ta de questões Entretanto todos os autores convergem para a mesma conclusão isto é que a feminilidade permanece um enigma nãoresolvido Porém uma vez reconhecida nossa ig norância nem por isso avançamos muito Da minha parte tentei aprofundar a lenda da menina edipiana modelar sua história e propor um roteiro claro e detalhado para ela um roteiro inspi rado pela teoria psicanalítica e a escuta dos meus pacientes Quis dramatizar minha intuição de que a menina ao contrá 59 O Édipo da menina rio do menino era animada por uma sede inextinguível de amor e que o crescendo de seu Édipo Dême Pegueme e Eu o devoro não passava da escalada irresistível de um desejo que perpassa todas as fibras de sua feminilidade A mais feminina das mulheres tem sempre o pai dentro de si Meu pai deixou seu selo em mim ele impregnou meu desejo modelou a forma do meu nariz marcou o ritmo dos meus passos e apesar disso sintome a mais feminina das mulheres DECLARAÇÃO DE UMA PACIENTE Gostaria de me deter ainda por um instante na identificação da filha com a pessoa do pai Do ponto de vista clínico vocês não imaginam a importância do pai fantasiado na vida de uma mulher Ao escutarem uma mulher sofredora indaguem se duas coisas Em primeiro lugar como já disse indaguemse sobre o laço freqüentemente conflituoso que ela estabeleceu com o genitor do mesmo sexo isto é com sua mãe depois indaguemse qual é o pai que está dentro dela Sim uma mu lher tem sempre seu pai dentro de si Sempre que escuto uma paciente ocorreme a idéia de que é habitada pelo pai Segu ramente essa identificação não é válida para todas as mulheres mas quando ela se confirma e se você for um bom observa dor você descobre facilmente o pai nas expressões distraídas do rosto de sua paciente nas rugas de sua testa na rudeza de suas mãos na forma de seu nariz e sobretudo em sua maneira 60 Sobre o Édipo espontânea de se comportar e andar Não é incomum uma mulher adotar inconscientemente o mesmo meneio de cabe ça e a mesma postura do pai Incontestavelmente o pai fanta siado ocupa um lugar central na vida de uma mulher Aqui penso em uma situação familiar mais clássica Uma vez identificada com o pai a filha pode não suportar mais seu verdadeiro pai seu pai de carne e osso Freqüentemente se aborrece com ele e o critica por seus defeitos e fraquezas ou simplesmente por ser o que é Assim o pai quero dizer o verdadeiro pai o pai que somos tem diante de si na pessoa da filha a encarnação de seu próprio supereu Sua filha tornou se para ele sem que ela o saiba seu mais temível rival e ele para ela seu mais intolerável espelho Uma última observação sobre a patologia da identificação da filha com o pai Quando essa introjeção não é contraba lançada pela identificação com a mãe instalase uma das neu roses femininas mais tenazes que designo como histeria de amor que consiste em uma rejeição do laço amoroso A mu lher inteiramente tomada pelo pai fantasiado não consegue empreender uma relação amorosa duradoura todos os seus receptores de amor estão saturados pela onipresença paterna Ela não tem namorado mas continua fortemente impregnada pelo pai amado está sozinha e insatisfeita mas arrebatada por sua paixão secreta Não é nem vingativa nem odiosa a respei to do homem simplesmente aposentouse da vida amorosa e sexual Resumindo prefere preservar seu pai interior a se lan çar em uma relação afetiva sempre frágil em que se sente exposta ao risco de ser abandonada Porém salvo essa eventual deriva neurótica resultante de uma intensa identificação com o pai a menina se apropriará 61 O Édipo da menina diversamente dos traços femininos e masculinos assimilados ao mesmo tempo da mãe e do pai Este é precisamente o desfecho mais freqüente do Édipo feminino O fim do Édipo é com efeito um comprido caminho ao longo do qual a menina ao se tornar mulher adotará traços masculinos e fe mininos e transformará progressivamente seu desejo de ser possuída pelo pai em desejo de ser possuída pelo homem amado Operase assim uma lenta dessexualização da relação edipiana com o pai e correlatamente a assunção de sua iden tidade feminina Como então é resolvido o Édipo da menina Proponho lhes o que poderia ser seu desenlace ideal A fantasia dolorosa de ter sido privada de um Falo todopoderoso encerrouse definitivamente Agora a jovem em seu devir mulher esque ceuse completamente da alternativa pueril de ter ou não ter o Falo Ela não mede mais seu ser nem seu sexo com a régua de um suposto Falo masculino Ela fez o luto do Falo ilusório e constata que seu sexo é diferente da falta de um Falo desa parecido Assim supera a idéia infantil que faz da mulher uma criatura castrada e inferior e pára de recriminar a mãe e de rivalizar com o homem A menina descobre a vagina o dese jo de ser penetrada e gozar com o pênis na união sexual da mesma forma descobre o útero e seu desejo de carregar um filho do homem amado Mais uma palavrinha antes de concluir a fim de dissipar um malentendido corriqueiro que a psicanálise fundadora do conceito de Falo concebia a mulher como uma criatura castrada e inferior Isso é um absurdo A única coisa que a psicanálise fez e foi uma verdadeira revolução foi descobrir que os seres humanos são habitados por fantasias tão mórbidas 62 Sobre o Édipo quanto o mais nefasto dos vírus e que a mais virulenta dessas fantasias é representar a mulher como uma criatura castrada e inferior Essa fantasia é antes de tudo uma quimera infantil Sei muito bem que essa representação pueril está igualmente ins talada na cabeça de vários adultos neuróticos São justamente os neuróticos que acham que a mulher é uma criatura castrada quando evidentemente isso é falso O sexo de uma mulher não é de forma alguma a falta do que quer que seja A mu lher tem seu próprio sexo e tem orgulho dele quer se trate de sua vagina de seus seios de sua pele ou de todo o seu corpo erógeno a mulher é feliz por ser o que é Mas por que dizer que o neurótico homem ou mulher considera a mulher uma criatura inferior Porque é dele próprio que se trata é ele a mulher fraca Fixado em sua fantasia infantil o neurótico vive sob a ameaça de ser castrado Assim todas as suas relações afe tivas são vividas no modo defensivo está sempre de prontidão para bloquear qualquer abuso ou humilhação proveniente da queles que o cercam daqueles de quem depende e de quem ele não gostaria nem morto de depender É como se em suas fantasias o neurótico se dissesse Eles não me terão Não sou uma mulherzinha Decerto a psicanálise postula que o Falo existe e que a mulher é castrada mas vocês entenderam o Falo é uma ilusão e a mulher é castrada tãosomente na imaginação inconsciente das crianças e dos neuróticos Resumo da lógica do Édipo da menina A exemplo do menino que nos contou sua travessia edipiana escutemos agora o depoimento da menina Tenho quatro anos Sinto excitações clitoridianas Tenho o Falo tenho orgulho dele e julgome onipotente Assim como um menino desejo possuir minha mãe Na frente de um garotinho nu descubro que não tenho Falo Sofro por ser privada dele Constato que minha mãe também é desprovida dele Criticoa por terme feito acreditar que ambas o tínhamos Logo ela me enganou Despeitada abandono minha mãe Agora sintome sozinha e humilhada Estou ferida em meu amorpróprio Invejo o menino Voltome agora para o meu pai grande detentor do Falo Sempre ciu menta e invejosa peçolhe que me dê o Falo Ele me recusa o Falo Constato que nunca o terei Peço a meu pai para me consolar Minha inveja transformouse em desejo Não quero mais ter o Falo do meu pai quero sêlo quero ser a favorita do meu pai Então identificome com minha mãe enquanto mulher desejada e modelo de feminilidade Dese jo ser possuída pelo meu pai Meu pai se recusa Dessexualizo meu pai mas incorporo sua pessoa Pouco a pouco tornome mulher e me abro para o homem amado Paro de medir meu sexo pela régua de um mítico Falo e descubro a vagina o útero e o desejo de ter um filho do meu companheiro A menina é um menino A menina sentese humilhada A menina deseja o pai A mulher deseja um homem Tempo préedipiano Tempo da solidão Tempo do Édipo Resolução do Édipo IDENTIFICAÇÃO COM O PAI Renúncia ao pai fantasiado e identificação com a pessoa do pai real DESSEXUALIZAÇÃO DO PAI SEGUNDA RECUSA DO PAI RECUSA DE POSSUIR SEXUALMENTE A FILHA DESEJO INCESTUOSO MÍTICO Desejo de ser possuída por ele SEXUALIZAÇÃO DO PAI PRIMEIRA RECUSA DO PAI RECUSA DE DAR SEU FALO INVEJA CIUMENTA DO PÊNIS Inveja de ter o Falo do menino depois o do pai A MENINA SE VÊ SOZINHA FANTASIA DE DOR DE PRIVAÇÃO Fantasia de dor de ser privada do Falo que ela julgava ter VISÃO DO CORPO NU MASCULINO DOTADO DO PÊNIS FANTASIAS DE PRAZER QUE SE MANIFESTAM POR COMPORTAMENTOS Fantasia de prazer atitude sexual ativa em relação à mãe SEXUALIZAÇÃO DA MÃE DESEJO INCESTUOSO MÍTICO Desejo de possuir o corpo do Outro a mãe FALO Fantasia de onipotência FALO SENSAÇÕES ERÓGENAS Sensações clitoridianas FIGURA 3 Lógica do Édipo da menina 3 Perguntas e respostas sobre o Édipo 67 De que problema o conceito de Édipo é a solução O sr afirma com freqüência que um conceito psicanalítico é a resposta a uma questão Qual seria a questão que leva ao Édipo Perfeito Um conceito psicanalítico só tem valor caso se de monstre indispensável à coerência da teoria e à eficácia de nossa prática Princípio ainda mais verdadeiro quando se trata de noção tão capital quanto a que acabo de expor De que problema então o Édipo é a solução Para mim o Édipo responde a duas questões como se forma a identidade sexual de um homem e de uma mulher e como uma pessoa torna se neurótica Logo o problema cuja solução é o Édipo é o da origem da nossa sexualidade de adulto e mais além da ori gem dos nossos incontáveis sofrimentos neuróticos Essas duas questões sexualidade e neurose estão tão intimamente im bricadas que podemos dizer que a neurose resulta de uma sexualidade infantil perturbada interrompida em sua maturi dade hipertrofiada ou ao contrário inibida No fundo o Édipo As perguntas que respondo foram redigidas a partir das intervenções dos ouvintes que assistiram às diferentes exposições orais que realizei sobre o tema do Édipo 68 Sobre o Édipo nos serve para compreender como um prazer erótico apodera se de uma criança de quatro anos para se transformar em um sofrimento neurótico que atormenta o homem ou a mulher de quarenta anos que ela se tornou Gostaria agora de formular a mesma idéia mas lembrando a vocês o que levou Freud à descoberta do Édipo De onde ele tirou a idéia do Édipo Da observação das crianças Em absoluto Decerto estava atento a seus comportamentos mas não foi estudando a relação paisfilhos que concebeu a noção de Édipo ainda que a realidade familiar seja de ontem seja de hoje confirme cotidianamente a descoberta freudiana Não não foram as crianças que introduziram o Édipo Devemos então supor que a invenção freudiana decorre da autoanálise de Freud Efetivamente foi ao sonhar analisar seus sonhos evocar sua infância e dirigir por escrito essas reflexões ao amigo e correspondente Wilhelm Fliess que Freud elaborou o Édi po um Édipo dominado essencialmente pelo desejo parrici da e pela culpa daí resultante na medida em que a idéia do Édipo foi exposta pela primeira vez no mesmo ano 1897 da morte de Jacob Freud seu pai Entretanto não foi a partir de sua introspecção que Freud apreendeu o essencial desse con ceito nodal da psicanálise Minha hipótese é bem outra Sub metoa a vocês O Édipo é uma invenção forjada por Freud na escuta de seus pacientes adultos Deixemme agora pro porlhes uma ficção Estamos em Viena em 1896 no consultório da Berggasse 19 no momento em que Freud recebe uma paciente histéri ca que lhe fala de sua infância Ao mesmo tempo em que a escuta atentamente Freud busca confirmar a tese que elabo 69 Perguntas e respostas sobre o Édipo rara recentemente sobre a etiologia da histeria Com efeito por essa época ele acha que a histeria é provocada pela inca pacidade do paciente de recordar um trauma sexual ocorrido nos primeiros anos de sua vida Criança Freud reflete a pa ciente teria sofrido um abuso sexual cometido por um adul to E seria o esquecimento tenaz dessa cena de sedução que a teria tornado neurótica Enquanto permanecer recalcada no inconsciente a cena de sedução traduzse em sintomas que causam sofrimento mas basta tornála consciente para que perca a virulência Justamente para curar a histeria pensava Freud é preciso que as cenas de conteúdo sexual que jazem no inconsciente tornemse conscientes única condição para que se enfraqueçam e deixem de ser um foco patogênico Assim Freud escuta a jovem histérica tentando saber se na infância ela foi seduzida por um adulto e em caso afirmativo tentando fazêla relatar os detalhes do incidente e sobretudo reviver seu vivido traumático Muitos de vocês sabem que anos mais tarde Freud vai operar uma mudança capital em sua teoria admitindo que essas famosas cenas de sedução não haviam necessariamente ocorrido sendo antes fantasias ima ginadas por seus pacientes Assim os sintomas neuróticos se riam não a conseqüência de um abuso sexual realmente sofrido mas de um abuso sexual fruto da fantasia e esquecido No fundo seja um acontecimento real ou fantasiado pouco im porta pensava ele a cena de uma sedução sexual infantil co metida por um adulto perverso permanece a verdadeira causa da histeria sob a condição todavia de que tenha sido recalcada Lembremse que a histeria é principalmente uma doença do esquecimento que a histérica é histérica porque não quer se lembrar do que foi doloroso 70 Sobre o Édipo Mas que relação há entre isso e o Édipo Pois bem acho que Freud descobriu o Édipo ao refletir no roteiro e nos atores que atuam na cena de sedução No caso da neurose a menina é seduzida por um homem perverso no caso do Édipo a menina é seduzida pelo próprio pai A cena fanta siada de sedução na origem da histeria transformarase no pensamento de Freud em uma cena fantasiada na qual a criança era seduzida pelo pai sem por isso ser vítima de um abuso sexual sem por isso ficar siderada por um prazer de efeitos nocivos bastava que um dos pais fosse mais carinhoso que de costume para que a criança sentisse esse excesso de ternura como um estímulo erógeno e um prazer sexual muito intenso Mas ter pensado no pai ainda não é a plena desco berta do Édipo Falta o elemento principal Gostaria de ser muito claro neste ponto Ao escutar sua paciente relatar um incidente sexual da infância Freud imagina a cena identifica se com o personagem da criança seduzida e percebe que essa criança não é apenas passiva é habitada pelo desejo ativo de ser seduzida pelo pai Sim a chave do Édipo reside no desejo incestuoso da criança de ser possuída pelo pai Freud descobriu o Édipo ao passar de uma cena de sedução na qual uma menininha assustada é a vítima passiva de um agressor adulto para a cena edipiana em que uma menininha inocente e sensual é a instigadora inconsciente que incita o pai ou o irmão mais velho a desejála sexualmente A crian ça da cena de sedução é uma vítima ao passo que a criança da cena edipiana é atormentada entre o desejo de ser seduzida e o medo de sêlo entre o medo de sentir o prazer e o medo de experimentálo 71 Perguntas e respostas sobre o Édipo Agora que conhecemos o contexto da descoberta do Édi po podemos voltar à sua pergunta inicial de que problema o Édipo é a solução O Édipo é uma fantasia de sedução na base da identidade sexual de todo homem e toda mulher uma fantasia de prazer e de angústia Em geral essa fantasia é metabolizada pela criança mas pode ocorrer de o prazer a angústia ou a dor serem traumáticas e dificilmente recalcáveis isto é de as emoções vividas pela criança edipiana na situa ção de sedução serem tão violentas que permaneçam ativas e fomentem uma neurose na idade adulta A fantasia edipia na que não foi liquidada permanece virulenta aflora à cons ciência e se exterioriza repetitiva e compulsivamente na vida do neurótico Com que idade uma criança sente prazer sexual pela primeira vez Em primeiro lugar uma evidência o prazer sexual vivido por uma criança é de natureza diversa do que nós adultos expe rimentamos Dito isto sabemos que na vida intrauterina um feto já pode ter ereções que nos permitem atribuirlhe uma vivência se não de excitação sexual pelo menos de frêmito genital Isso mostra como não há idade para o prazer sexual sob a condição de que o corpo da criança esteja em contato com um adulto igualmente excitado desejante e sentindo prazer em se dedicar a ela ainda que o mais terna e castamen te possível A esse respeito tenho aqui algumas espantosas li nhas de Freud que gostaria de ler para vocês Freud não hesita em identificar os sentimentos de ternura com o amor se xual Afirma assim que as relações entre a criança e a mãe são para esta uma fonte contínua de excitação e satisfação 72 Sobre o Édipo sexuais intensificandose quanto mais ela demonstrar para a criança sentimentos que derivem de sua própria vida sexual beijála ninála considerála o substituto de um objeto se xual pleno É provável prossegue Freud que uma mãe fique vivamente surpresa se lhe dissermos que dessa forma com suas ternuras ela desperta a pulsão sexual da criança Ela julga que seus gestos demonstram um amor assexual e puro no qual a sexualidade não desempenha papel algum uma vez que ela evita excitar os órgãos sexuais da criança além dos cuidados corporais exigidos Mas a pulsão sexual como sabemos não é despertada apenas pela excitação da zona genital a ternura também pode ser excitante Ao lhes apresentar o Édipo afirmei que a sexualidade es tava no cerne do amor e do ódio familiares porém na passa gem que acabo de ler Freud vai muito mais longe pois não diz que o sexual jaz na ternura mas que a própria ternura é uma excitação sexual Se é verdade que um bebê pode sentir prazer sexual nos braços da mãe poderíamos deduzir que o Édipo aparece bem antes dos três ou quatro anos de idade Esta é precisamente a posição de Melanie Klein que postula um Édipo precoce no recémnascido e a de Lacan ao consi derar que não haveria idade para o Édipo uma vez que o desejo da criança não passa do prolongamento do desejo da mãe posição que é efetivamente a de Freud no trecho que acabam de ouvir Logo há uma diferença entre o Édipo kleiniano e o Édipo freudiano Para Melanie Klein as pulsões eróticas de um bebê incidem sobre a mãe percebida não como 73 Perguntas e respostas sobre o Édipo uma pessoa global mas como um objeto parcial a mãe re duzse ao seio O Édipo kleiniano pode ser um Édipo oral anal etc Para Freud é diferente O Édipo existe apenas se as pulsões eróticas da criança incidirem sobre a mãe ou o pai como pessoas globais dotadas de um corpo habitadas por um desejo e suscetíveis de sentirem prazer Enquanto para Melanie Klein o Édipo é oral ou anal para Freud o Édipo está além do prégenital e aquém do genital sendo acima de tudo fálico Como se dá o Édipo quando a mãe vive sozinha com o filho Plenamente sob a condição de que a mãe seja desejante Pouco importa que a mãe viva sozinha o que conta é que seja ape gada a alguém que deseje alguém e no caso de não ter ne nhum parceiro amoroso o que conta é que seja interessada por outra coisa que não o filho que o amor pelo filho não seja o único amor de sua vida Em suma há Édipo a partir do momento em que a mãe deseja um terceiro entre ela e o filho Eis o pai O pai é o terceiro que a mãe deseja Freud não deu explicação científica para o mundo mítico Propôs um novo mito eis o que ele fez WITTGENSTEIN Claro que Freud propôs um mito novo mas que mito Que fecundidade É graças a esse formidável instrumento teórico que os psicanalistas sabem atualmente escutar seus pacientes e os consolar 74 Sobre o Édipo Afinal o Édipo é uma realidade observável ou uma fantasia deduzida pelos psicanalistas Já lhes mostrei que o Édipo era ao mesmo tempo realidade e fantasia mas aproveito sua pergunta para abordar o problema de outro ângulo Digamos que o complexo de Édipo seja um conjunto de sentimentos contraditórios de natureza incons ciente refletindo os sentimentos conscientemente vividos pela criança na relação triangular com os pais No fundo o Édipo é um complexo intrasubjetivo engendrado por uma realidade inter subjetiva É importante conceber o Édipo como uma fantasia inconsciente em um único indivíduo ainda que seja preciso o apoio de outro indivíduo desejante acabamos de ver isso ao ler Freud para que essa fantasia se forme e subsista Por outro lado sabemos que a fantasia edipiana é uma hipótese uma construção do espírito construída a partir dos compor tamentos da criança a respeito dos pais e sobretudo a partir das recordações infantis relatadas por nossos pacientes adultos em análise De fato o Édipo nem sempre é um fenômeno observável ou uma hipótese verificável A psicanálise não é uma ciência do comportamento Não O Édipo deve ser to mado como um esquema teórico eficaz com impacto inegável na vida afetiva de um indivíduo em nossa cultura É portanto falando propriamente uma fantasia e um mito Digamos com mais clareza ainda de um ponto de vista clínico o Édipo é uma fantasia que atua desde o âmago do ser e o impregna por inteiro E do ponto de vista cultural o Édipo é um mito mito de todos uma vez que é a fábula simbólica simples e chocan te que põe em cena personagens familiares encarnando as forças do desejo humano e os interditos que se lhes opõem 75 Perguntas e respostas sobre o Édipo Ora seja fantasia ou mito o complexo edipiano também é um conceito crucial absolutamente indispensável à consistência da teoria e à eficácia da prática psicanalítica Não hesito em lhes dizer sem o conceito de Édipo a maioria das noções analíticas estaria à deriva e sem a fantasia do Édipo seríamos incapazes de esclarecer a infinita complexidade dos sofrimentos psíquicos Seguramente é graças a esse formidável instrumento conceitual que os psicanalistas sabem atualmente escutar seus pacientes compreendêlos e consolálos Penso aqui em um texto em que Lacan já assinala o valor teórico insubstituível do Édipo Eis o que ele escreve em sua Proposição de 9 de outubro de 1967 sobre o psicanalista da Escola Eu gostaria de iluminar meu ponto essencial simplesmente com o se guinte retirese o Édipo e a psicanálise tornase inteira mente da alçada do delírio Incontestavelmente o Édipo é a pedra angular do edifício analítico ele é uma crise manifesta da sexualidade infantil uma fantasia inconsciente um mito social e o conceito mais crucial da psicanálise Na tragédia de Sófocles o personagem principal é o destino sobre o qual os heróis não têm influência alguma Qual seria o lugar do destino no complexo de Édipo Não se esqueça de que Freud sempre foi obcecado pelo des tino pelo que a vida nos reserva e ignoramos O jovem Édipo termina por matar o pai ao passo que paradoxalmente Laio fizera de tudo para escapar ao oráculo que pressagiava o gesto parricida do filho Ninguém conhece seu destino ou dele escapa Assim o complexo de Édipo é a prova da qual criança alguma escapa e que a marca para sempre Mas de que prova 76 Sobre o Édipo iniciática se trata Qual é esse ritual incontornável que deno minamos Édipo É a experiência de uma perda e de um luto o dos pais fantasiados como parceiros sexuais Sim o Édipo é na vida de uma criança a primeira separação profunda e inte rior dos pais É uma separação obrigada que prenuncia a fu tura emancipação do jovem adulto Quer se trate do Édipo feminino ou masculino em ambos os casos são os pais que perdemos e isto inelutavelmente Decerto a criança já se separou da mãe ao nascer ganhou independência ao andar e rompeu seu casulo familiar ao ir para a creche mas é apenas no fim do Édipo que o menino e a menina vão perceber diferentemente os pais e amálos de outra forma Claro é de uma separação ideal que lhes falo uma vez que em nossa vida cotidiana continuamos sempre a desejar nossos pais o mais freqüentemente sob a forma sublimada da ternura e outras vezes infelizmente sob a forma de um conflito penoso devi do à persistência de um desejo sempre virulento A propósito do menino poderia voltar à expressão Édipo invertido O Édipo invertido é a atração sexual de uma criança pelo pai do mesmo sexo Em relação ao Édipo masculino colocamos geralmente a ênfase no apego erótico do menino com a mãe e na rivalidade odiosa a respeito do pai Ora muitas vezes acontece de o Édipo masculino girar não em torno da rela ção desejante do filho com sua mãe mas da relação desejante do filho com seu pai considerado um parceiro sexual Sim o pai pode ser na cabeça do filho um parceiro sexual E é isso que denominamos um Édipo invertido Em que consiste ele 77 Perguntas e respostas sobre o Édipo Para lhe responder apresentarei o Édipo do menino como uma peça em três atos É realmente divertido fazer o comple xo edipiano viver dessa forma marcados que somos pela tra gédia grega Tal artifício nos permitirá não apenas lembrar de outra maneira o essencial da dinâmica edipiana como apro fundar a idéia de que o personagem principal do Édipo mas culino é mais freqüentemente o pai que a mãe Vamos aos três atos do drama Comecemos pelo primeiro ato que inclui indiferentemente a menina e o menino O pano se abre e todos os personagens aparecem ao mesmo tempo no palco um garotinho uma garotinha uma mãe um pai e até mesmo todos os seres humanos que habitam nosso planeta Imaginem um palco cheio de gente de um mundo em que todos aos olhos das duas crianças são detentores de uma potência representada por um sinal corporal visível o pênis Na cabeça da criança menino ou menina todo mundo possui um pênis ou melhor todo mundo é investido da po tência representada pelo pênis Freud chama essa abertura do Édipo de premissa da possessão universal do Falo É o momento em que reina na criança a crença mágica em um universo inteiramente povoado por portadores de um pênis maravi lhoso Corrijome imediatamente e em vez de usar a expres são pênis maravilhoso utilizo o termo Falo Desculpe mas ainda não compreendi como se passa do pênis ao Falo O que entende exatamente por Falo Falo é o nome que damos à fantasia do pênis à interpretação subjetiva do pênis à maneira que cada um e cada uma tem de perceber o apêndice peniano Mais genericamente usamos a 78 Sobre o Édipo palavra Falo para designar a fantasia de todo objeto que se reveste a nossos olhos de crianças ainda que adultos do mais alto valor afetivo Quando digo aos nossos olhos de crianças é para fazêlos compreender que o amor apaixonado que di rigimos a uma criatura ou a um objeto é sempre um amor de criança uma vez que amar é apenas um aprimoramento da candura infantil Amar é acreditar em toda inocência e essa inocência nos é preciosa que o outro nosso amado saberá um dia nos completar Pois bem essa soberba esperança que é o amor me torna feliz me dá tranqüilidade e força Da mesma forma todo objeto amado admirado e possuído me tranqüili za e me conforta em meu sentimento de ser eu mesmo Ora esse objeto tão investido tão carregado de toda a minha afeti vidade e que me é indispensável chamase Falo Assim a pala vra Falo designa não apenas o pênis quando fantasiado isto é quando vivido como símbolo da força como também toda pessoa objeto ou ideal a que sou visceralmente ligado de que sou dependente e que sinto como a fonte de minha potência Falo é portanto o nome que damos a qualquer coisa altamen te investida tão investida e amada que não cessa de ser concre ta para ser fantasiada Uma mãe um pai nosso cônjuge o pênis o clitóris ou mesmo uma casa uma carreira uma promoção tudo são suportes concretos que podem se tornar o nosso Falo Ora qual é a coisa concreta que dá à criança edipiana o sentimento de ter um Falo Respondo seu corpo seu próprio corpo seu corpo de sensações Com efeito para o menino a base real do Falo é seu pequeno sexo enquanto apêndice erógeno ou ainda as excitações que emanam dos testículos ou do baixoventre Quanto à menina a base real de seu Falo é o 79 Perguntas e respostas sobre o Édipo conjunto das sensações erógenas provenientes de seus órgãos genitais em particular de seu clitóris Se o compreendo bem uma mãe por exemplo pode ser aos olhos do filho tanto portadora de um Falo quanto ser ela pró pria um Falo Precisamente Quando a mãe impõe sua autoridade ela tem o Falo mas quando a criança a sente toda dele ela é seu Falo Se minha mãe se zanga comigo ela é fálica e todopoderosa se em contrapartida rivalizo com meu colega para saber quem tem a mamãe mais bonita minha mãe é meu Falo mais pre cioso Vocês vêem que uma mãe pode ser duplamente fanta siada como tendo o Falo e como sendo o Falo Um menino pode então ter dois Falos seu pênis e sua mãe Claro E será justamente o problema a ser resolvido pelo me nino edipiano não podendo manter os dois Falos terá de escolher um ou outro o pênis ou a mãe Mas não antecipe mos pois essa escolha crucial só será feita no segundo ato do nosso drama edipiano Por ora permaneçamos no primeiro Eu lhes dizia então que a criança acredita que todos os seres humanos são dotados do mesmo atributo que ela tanto valo riza o Falo Menino ou menina a criança experimenta sensa ções erógenas observa seu sexo se toca se acha todopoderosa e olha em silêncio os personagens que a cercam atribuindo lhes um sentimento similar de onipotência É de fato na per cepção de si mesmo que se forja em silêncio a crença mágica em um Falo universal Ver sentir e acreditar são portanto os 80 Sobre o Édipo três primeiros gestos mudos da criança edipiana Em suma meninos e meninas inauguram seu Édipo a partir da ilusão que eleva o Falo ou seu representante corporal o pênis ao nível de atributo universal Eis o primeiro ato da nossa peça em que todos são fortes Ato essencial mas freqüentemente esquecido na literatura analítica ao passo que é o degrau obri gatório que dá acesso ao conceito de angústia de castração Por quê Porque é preciso em primeiro lugar acreditar que se é forte e rico para ver surgir o medo de ser despossuído Chegamos agora ao segundo ato do Édipo masculino o Édipo da menina segue outro roteiro É quando justificare mos nossa proposição segundo a qual é o pai e não a mãe que é o personagem principal do Édipo do menino E eis o argumento Sempre habitado pela ilusão de um Falo universal o menino estabelece duas relações afetivas essenciais uma relação de desejo com a mãe considerada objeto sexual e principalmen te uma relação de amor com o pai tomado como modelo a ser imitado o menininho faz assim do pai um ideal ao qual gostaria de se assemelhar Em suma o laço com a mãe obje to sexual não passa para o menino do apetite de um desejo ao passo que seu laço com o pai objeto ideal repousa em um sentimento de amor Essas duas moções desejo pela mãe e amor pelo pai diznos Freud aproximamse uma da outra acabam por se encontrar e é desse encontro de sentimentos que resulta o complexo de Édipo normal Traduzo dizendo que para um menino o complexo de Édipo normal significa desejar a mãe e assemelharse ao pai Mas entremos agora no terceiro ato De repente o meni ninho sentese incomodado pela presença imponente de um 81 Perguntas e respostas sobre o Édipo rival que lhe barra o caminho em direção à mãe A criança vêse então ameaçada por um concorrente mais forte que ela Sob o efeito da angústia de ter perdido angústia de castração o menininho vai finalmente renunciar ao desejo de possuir a mãe e de eliminar o pai Que reviravolta cênica Eis que se opera uma inversão inesperada da situação Amea çado de castração e sem objeto a almejar o menino voltase subitamente para o pai e se pergunta Mas por que não mu dar de parceiro Por que não ele Em vez de saciar meu dese jo de possuir uma mulher pensa poderia saciálo com o mesmo prazer deixandome possuir por um homem forte e viril Que aconteceu Tudo estremeceu De ideal que susci tava admiração e de rival que inspirava medo o pai tornouse uma criatura que excita o desejo do menino Antes o pai era o que queríamos ser um ideal agora o pai é aquele que que ríamos ter oferecendonos a ele Com efeito é muito fre qüente um menino pequeno reagir à ameaça de castração de um pai excessivamente severo retraindose em uma posição feminina e colocandose no lugar de uma mulher submissa objeto do desejo paterno Eis como concebo o Édipo inverti do expressão desgastada e raramente bem compreendida O Édipo invertido tão importante para compreendermos a origem da neurose masculina consiste em uma reviravolta radical dos sentimentos do menino em relação ao pai o pai objeto admirado odiado e temido aparece aos olhos da criança como um possível parceiro sexual ao qual ele gostaria de se entregar O desejo de possuir a mãe transformouse em desejo de ser possuído pelo pai e o desejo de afastar o pai transformouse em desejo de o atrair para si Eis a dupla in 82 Sobre o Édipo versão da configuração clássica do Édipo masculino Assim o pai apresentase aos olhos do menino sob quatro aspectos distintos amado como um ideal odiado e temido como um rival e desejado como um parceiro sexual a quem se oferece Dessas quatro moções amor ódio medo e desejo pelo pai é sobretudo o desejo que eu queria enfatizar em razão de sua importância na formação da identidade do futuro rapaz Mas atenção Não é porque o menino deseja o pai que se tornará obrigatoriamente homossexual ou neurótico Possivelmente uma vez adulto será arrebatado por uma estranha ternura e uma delicada sensibilidade mas sem por isso sofrer de dis túrbios neuróticos Em suma eis o essencial da minha propo sição a neurose masculina é em geral provocada por um Édipo invertido congelado em uma fantasia intrusiva o problema do neurótico é sempre uma relação conflituosa com o genitor do mesmo sexo Um corolário finalmente para o Édipo do menino os traços marcantes do pai amado como ideal odiado e temi do como rival e desejado como objeto sexual definirão o supereu normal do rapaz Com efeito o supereu é o resultado da incorporação no eu desses quatro rostos do pai É graças a essa introjeção que a criança começa enfim a se separar de seu pai real uma vez que o percebe diversamente algo mu dou na disposição interior do menino em relação ao pai Ele se separa do pai real mas o preserva em seu eu sob a forma de um supereu ora estimulante para se atingir um ideal ora cruel e temível para sancionar uma conduta ora excitante para rea lizar um desejo mas sempre mantendo a sensação de pudor necessária à vida em sociedade 83 Perguntas e respostas sobre o Édipo Mas como o senhor situa o complexo de castração nesse drama O complexo de castração situase precisamente no terceiro ato Castração sempre quer dizer angústia pois não há castra ção senão sob a ameaça angustiante que pesa sobre o sujeito Se deixarmos de lado o caso do Édipo invertido e permane cermos na configuração edipiana clássica segundo a qual o filho deseja incestuosamente a mãe podemos deduzir três causas que provocam a angústia de castração Em primeiro lugar simplesmente a presença da pessoa do pai na realidade tratase como vimos de uma presença angustiante Em se guida a voz imperiosa do pai intimando o menino Você não pode Você não tem o direito de perseverar em seu desejo Em outras palavras Você vai se haver comigo Ob servem que essa ameaça pode ser proferida pela mãe ou por uma tia tanto faz ela exprime invariavelmente uma lei social marcada pela autoridade paterna Pouco importa a pessoa que evoca o interdito o essencial reside no caráter paterno de uma lei incontestável Vejam bem é porque a lei é incontes tável que é paterna Com efeito a lei do interdito do incesto e todas as leis em geral permanecem marcadas pelo sinete da autoridade paterna porque não são negociáveis Portanto é indiferente que a voz que evoca o interdito seja masculina ou feminina o essencial é a firmeza do tom para dizêlo É pre ciso que a ameaça seja proferida por uma firme e calma auto ridade que sabe julgar condenar e punir Você não deve ir para cama com sua mãe e a tomar como objeto sexual senão será punido Punido como Punido com a castração do seu pênis ou melhor punido com a castração do que anima sua arrogância todopoderosa Enfim a terceira causa de angús 84 Sobre o Édipo tia tampouco consiste em uma ameaça verbal proferida pela voz de um censor mas em uma ameaça sugerida por ocasião de uma experiência visual O menino pois continuamos no Édipo masculino descobre um dia no corpo nu da mãe ou de uma garotinha a sombra escura de uma ausência Ao ob servar a falta de pênis na região pubiana sente medo e se angustia Uma vez que ela não tem pênis pensa então não tem poder Ora se existe uma criatura sem pênis isso signifi ca que eu também corro o risco de ficar privado dele Em suma esmagado pela presença imponente da pessoa do pai ameaçado pela lei punitiva e chocado com a constata ção visual de que existem seres castrados o menino angustia se recalca seus desejos e fantasias incestuosas e modera seu prazer Freqüentemente é a tese do Édipo invertido o menino angustiado refugiase covardemente em uma posi ção de submissão feminina a respeito do pai situação em que viverá uma nova angústia de castração despertada pelo risco de perder a virilidade Enquanto no Édipo masculino em que a mãe é o objeto incestuoso a ameaça de castração incide sobre o Falopênis no Édipo invertido em que o pai é o objeto incestuoso a ameaça de castração incide sobre o Falo virilidade É a angústia que faz a criança recuar e se separar dos pais Exatamente Voltemos ao caso da mãe O garoto sente medo e se separa da mãe Eis por que eu diria que sua angústia é uma angústia saudável pois graças a ela a criança vêse obri gada a se separar da criatura até então mais próxima da qual devia necessariamente segundo a ordem das coisas huma 85 Perguntas e respostas sobre o Édipo nas se afastar Pela primeira vez na história da evolução de sua libido a criança vêse confrontada com a prova decisiva de uma escolha Ou você pára de desejar sua mãe ou perde a força É uma escolha crucial Ou escolho o objeto inces tuoso ou me preservo narcisicamente Ou conservo minha mãe ou conservo meu pênis Claro é meu pênis que vou conservar Observem que esse tipo de alternativa radical evoca as escolhas eminentes às quais somos freqüentemente con frontados em nossa vida de adultos A partir do momento que queremos realizar nosso desejo constatamos o surgimento da angústia Será que sou capaz disso Não vou pôr tudo a per der No momento de decidir e agir surge a angústia Ora de acordo com a experiência do Édipo tal como a interpreto nós escolhemos sempre o objeto narcísico isto é escolhemos sempre nos preservar a nós e a nosso corpo Decididamente o ser humano é essencialmente medroso e narcísico diante do perigo com freqüência deixa o objeto de seu desejo cair julgando salvar a pele Ouço aqui um hipotético supereu ana lítico que tranqüilizaria o homem trêmulo diante dos riscos inerentes à afirmação de seu desejo Ele lhe diria Não tenha medo Deixese carregar pelo desejo Siga seu caminho Vá aonde o destino o espera Ocorre porém outro fenômeno notável Uma outra per da terá lugar perda muito mais importante que a da mãe O menino pode perder a mãe e conservar o pênis mas logo descobre que sem o objeto do desejo a mãe o pênis acaba por perder seu valor de Falo De que serve me sentir forte se não há um outro que me deseje Decerto o pênis é útil mas sob a condição de que haja um outro desejante e desejável 86 Sobre o Édipo O menino perde a mãe e simultaneamente o valor fálico de seu pênis No fundo essa perda de valor é mil vezes mais importante que a perda da mãe que já é sem dúvida uma experiência fundamental Melhor ainda o drama edipiano é a mais bela lição sobre o valor relativo de nossas árduas con quistas O mito de Édipo é de um alcance ético extraordiná rio Podem continuar me dizendo Mas o Édipo o complexo de castração de cem anos para cá as coisas evoluíram a cultura a sexualidade não são mais as mesmas poderíamos muito bem viver sem o Édipo etc Claro que quero prescin dir da lenda edipiana mas criem outra que consiga explicar tão bem o sentido profundo das provas vitais que nós adultos atravessamos incessantemente A primeira prova é aceitar que diante de uma escolha difícil nunca perderei tudo e se ga nhar nunca ganharei sem perda O senhor acaba de nos mostrar como a peça se desenvolve para o menino e para a menina O roteiro do Édipo feminino é bem diferente Lembremos que durante o primeiro ato do drama edipiano reina como para o menino a premissa da possessão universal do Falo to dos são portadores do Falo e por conseguinte todos são for tes Na menina porém diferentemente do menino há uma préhistória do Édipo e uma espécie de póshistória au sentes do Édipo masculino A préhistória do Édipo femini no associase à relação estreitíssima da mãe com a filha Antes do advento da fase fálica no momento de aleitamento no seio a mãe apresentase à filha como objeto de desejo mas sobretudo como objeto que abastece seu narcisismo e ali 87 Perguntas e respostas sobre o Édipo menta sua potência Em uma palavra a mãe desempenha fun ção de Falo para a menina Na aurora do Édipo feminino o objeto do desejo da menina assim como no caso do menino é em primeiro lugar o seio e logo depois com o desmame a pessoa da mãe a zona erógena dominante é a boca Durante a fase oral o seio materno representa o mais terno Falo Com pletemos acrescentando um outro elemento essencial do Édipo feminino Com o desmame a menina já sente um amargo ressentimento contra uma mãe que acaba de privála do pra zer de mamar A perda do seio suscita no bebê menina uma hostilidade que será reativada mais tarde durante a fase fálica em si Observemos que essa amargura provocada pelo desma me é segundo Freud mais moderada no menino Mais tarde o Falo da menina não será mais representado pela mãe como objeto incestuoso mas pela força atribuída ao pai O Édipo feminino culmina no momento em que a menina já tendo feito a experiência da separação da mãe está preparada para desejar o pai renunciarlhe introjetar os traços de sua pessoa e seus valores e finalmente substituílo uma vez jovem mu lher por um parceiro masculino Por que afirmar que a filha odeia a mãe por ocasião do desmame O que isso tem a ver com o complexo de castração na mulher Muitos malentendidos circulam sobre o conceito do com plexo de castração na mulher Julgase equivocadamente que não há castração na mulher porque seu corpo é desprovido de pênis e que ela não teria nenhum órgão suscetível de ser castrado Ora não se trata disso Segundo Freud o complexo de castração na mulher existe efetivamente mas prefiro após 88 Sobre o Édipo ter estabelecido a lógica do Édipo feminino darlhe o nome de complexo de privação Esse complexo é inaugurado com uma impressão visual a menina vê o corpo nu de um menino e constata comparandose com ele que não apenas é despro vida de pênis como desprovida da potência que o pênis signi fica isto é o Falo A ausência de pênis a leva a perder a ilusão da premissa universal do Falo e sentir vontade de têlo Ter o quê Não tanto o pênis em si mas a ilusão de potência susci tada pelo órgão Chamo essa sede de poder de inveja do Falo e não inveja do pênis Acredito profundamente no interesse clí nico de apresentar dessa forma o conceito da inveja feminina do Falo pois na clínica das mulheres histéricas é sempre o problema do poder que se coloca bem como do medo neu rótico de ser dominada Com a constatação de ser despossuída surge então na menina uma série de sentimentos Em pri meiro lugar a desilusão em seguida a nostalgia desse poder ilusório e depois e sobretudo um ressentimento a respeito da mãe que não lhe a frase clássica seria que não lhe deu mas prefiro falar de ressentimento a respeito da mãe que não sou be preparála para essa constatação nem lhe poupar o mo mento em que ela descobriria a perda de sua ilusão É como se ela dissesse Mamãe você já sabia que eu ia me decepcio nar Por que não me avisou É portanto um ressentimento a respeito da mãe ressentimento que atualiza o antigo ódio provo cado pelo desmame do primeiro período préedipiano Então não é a angústia que prevalece na menina Não Nesses momentos não observamos nenhuma angústia Se os principais sentimentos do Édipo masculino são o dese 89 Perguntas e respostas sobre o Édipo jo e a angústia os do Édipo feminino são sobretudo o desejo o sofrimento e a inveja Contudo reconhecemos uma angús tia típica na mulher adulta Tratase de uma angústia bem particular que Freud desvenda apenas no fim de sua obra A angústia feminina é com freqüência esquecida nos trabalhos analíticos pois tendese a pensar que a angústia permanece o traço distintivo do menino enquanto a menina seria afetada pela inveja ou o ódio Na clínica observamos muito uma angústia própria da mulher a angústia de perder o amor que lhe dedica o amado Em uma mulher o medo não é tanto de nunca encontrar o amor mas de perder o amor conquistado Para a mulher o Falo é o próprio amor a coisa inestimável que nunca se deve perder 4 O Édipo é a causa das neuroses ordinárias e mórbidas do homem e da mulher blank image 93 A neurose ordinária resulta de um Édipo mal recalcado a neurose mórbida de um Édipo traumático Cada recémchegado ao mundo está imbuído do dever de consumar o complexo de Édipo quem não consegue está fadado à neurose Na raiz de todo sintoma encontramos impressões traumá ticas que têm origem na vida sexual infantil SIGMUND FREUD Antes de tudo o que é uma neurose É um sofrimento psí quico provocado pela coexistência de sentimentos contradi tórios de amor ódio medo e desejos incestuosos para com quem se ama e de quem se depende Seguindo essa definição diremos então que o Édipo não apenas está como veremos na origem das neuroses de adultos como ele próprio é uma neurose a primeira neurose saudável na vida de um indiví duo a segunda sendo a crise da adolescência Mas em que o Édipo é uma neurose Tudo reside na defasagem entre um eu infantil em formação e um afluxo pulsional transbordante O eu da criança ainda não dispõe de meios para conter a escala 94 Sobre o Édipo da impetuosa de seus desejos Esse esforço do eu para conter e assimilar o arrebatamento do desejo traduzse na criancinha por sentimentos palavras e comportamentos contraditórios em relação aos pais Essa atitude ambivalente até mesmo in coerente da criança vai instalarse duradouramente na per sonalidade do sujeito como um modelo de todas as atitudes que ele adotará adulto diante daqueles que despertarem nele o desejo de possuir o outro ser possuído por ele ou destruí lo Eis por que podemos dizer que nossos conflitos mais coti dianos e sempre inevitáveis com quem nos cerca não passam dos prolongamentos naturais quase reflexos de nossa neuro se infantil conhecida como complexo de Édipo Em outros termos nossos conflitos cotidianos provêm do fato de que no seio de nossos sentimentos mais nobres e mais castos a respeito daqueles que amamos agitamse desejos sexuais in cestuosos A crispação da nossa neurose atual é portanto pro vocada pela impossibilidade de realizar plenamente ou ao contrário evitar totalmente nossos impulsos incestuosos As sim diremos que o Édipo primeira neurose saudável da vida está na origem de nossa penosa neurose ordinária de adulto neurose penosa decerto mas pesando tudo tolerável e por que não uma defesa contra a loucura pulsional que sempre ameaça irromper em cada um de nós Isto posto pode acontecer e é freqüente de durante o período edipiano a criança ser arrebatada por sensações de prazer ou dor muito intensas e que essas sensações a marquem para sempre como traumas indeléveis Pois bem esses traumas infantis serão a causa não de uma neurose ordinária mas de uma neurose mórbida que se instala na adolescência e persiste 95 O Édipo é a causa das neuroses na idade adulta Em suma distingo duas grandes variantes do retorno neurótico do Édipo na idade adulta a neurose ordi nária e a neurose mórbida A neurose ordinária portanto con siste no conflito com as criaturas que amamos intimamente porque continuamos sempre a desejálas com ardor Essa neu rose de todos os dias perfeitamente compatível com uma vida social aberta e criativa é resultado da dessexualização insufi ciente dos pais edipianos As fantasias infantis de prazer e an gústia mal recalcadas preservaram toda sua virulência e geraram essa neurose cotidiana presente em todos nós O outro tipo de distúrbio neurótico é a neurose mórbida e patológica que ao contrário manifestase por sintomas recor rentes que encerram o sujeito em uma solidão narcísica e doentia Esse sofrimento seja fóbico obsessivo ou histérico é provocado por um fator mais grave que o recalcamento insu ficiente das fantasias edipianas Tratase dos traumas singulares advindos em pleno período do Édipo Que traumas Em pri meiro lugar o de um abandono real ou imaginário que provo ca imensa aflição na criança Essa fantasia infantil de abandono resultará na fobia do adulto Outro trauma possível é o dos maustratos reais ou imaginários que infligem uma dolorosa humilhação à criança Essa fantasia de maustratos e de humi lhação resultará na obsessão Terceiro trauma enfim o mais espantoso aquele em que a criança experimenta durante um contato excessivamente sensual com o adulto de quem de pende um intenso e sufocante prazer Essa fantasia de sedução resultará na histeria Quer se trate da aflição do abandono da humilhação por maustratos ou da sufocação ligada à sedu ção estamos sempre na presença da angústia de castração sob 96 Sobre o Édipo a forma mais mórbida que confina com um terror de castração Diremos portanto que a fobia a obsessão e a histeria são os diferentes modos de retorno do Édipo traumático à idade adulta Acrescento que essas três categorias de neuroses nunca aparecem isoladas e puras e sim imbricamse à maneira de uma neurose mista de predominância fóbica histérica ou obsessiva Observemos também que esses traumas edipianos foram às vezes sofridos não pela própria criança mas por um ascendente que lhe transmitiu inconscientemente a angústia de um choque traumático Uma mulher sofrendo de agorafobia crônica por exemplo declara nunca ter sido abandonada em sua infância mas descobre ao longo da análise que sua mãe fora ainda pequena vítima de um abandono brutal durante a guerra Eis um caso de transmissão transgeracional de uma fantasia de abandono geradora de uma fobia Dizíamos então que a neurose patológica tanto no ho mem quanto na mulher é o retorno na idade adulta da an gústia de castração traumatizante vivida durante a infância Segundo o modo de retorno dessa angústia surgirá um sofri mento neurótico específico ver FIGURA 4 p103 Clinica mente falando se estivermos em presença de um paciente fóbico deveremos interrogar sua infância para nela descobrir um eventual incidente em que ele teria ficado angustiado por um brutal abandono seja este abandono real ou imaginá rio Se nosso paciente for histérico é outra recordação traumá tica que deveremos procurar Dessa vez o analisando lembrase de ter se assustado não mais com um abandono mas com outra violência bem mais sutil e insidiosa Lembrase de ter sido cativado e excitado por um adulto sedutor pai mãe 97 O Édipo é a causa das neuroses irmão mais velho ou amigo da família A propósito desse trau ma na origem da histeria o leitor pode se reportar às páginas 11820 e em particular à FIGURA 6 Enfim se escutarmos um paciente obsessivo será sempre uma recordação que devere mos descobrir mas cuja cena mostra uma criança impotente e furiosa temendo as represálias do pai por um erro que ig nora Em suma quer se trate de fobia histeria ou obsessão o sofrimento de um neurótico é explicado por sua necessidade de repetir compulsivamente a mesma situação na qual sofreu o impacto de uma angústia traumática Em outras palavras a neurose é o retorno compulsivo de uma fantasia infantil de angústia de castração Assim concluiremos que no caso da neurose masculina a fobia é o retorno na idade adulta da fantasia de angústia de ser abandonado pelo pai repressor que a histeria é o retorno da fan tasia de angústia de ser assediado pelo pai sedutor e a obsessão finalmente é o retorno da fantasia de angústia de ser maltrata do e humilhado pelo pai rival FIGURA 4 Vemos claramente que é sempre o pai o personagem principal das fantasias trau máticas na origem das três neuroses masculinas Com efeito a neurose do homem e como veremos da mulher resultam da fixação de uma cena em que o personagem principal é fre qüentemente o genitor do mesmo sexo Seja o Édipo mal re solvido ou traumático o conflito infantil causa da neurose é mais freqüentemente travado entre o menino e o pai ou en tre a menina e a mãe Em suma o que gera a doença não é tanto viver uma experiência intensa com o outro diferente mas vivêla com o outro semelhante o outro si mesmo A neurose do adulto é sempre uma patologia do mesmo uma 98 Sobre o Édipo doença do narcisismo Um jovem paciente por exemplo me contou Sofro por ficar dividido entre o amor pelo meu pai a vontade de me parecer com ele o desejo de agradálo o medo de me tornar desprezível o ódio que sinto por ele e finalmente minha revolta contra sua autoridade Eis o grito de um filho neurótico que sofre por ficar fascinado e horro rizado com a imagem do pai tão próxima da sua A reativação do Édipo traumático sob a forma da neurose feminina repulsa sexual complexo de masculinidade e angústia de ser abandonada Passemos agora ao caso da mulher neurótica Uma vez supe rada a crise edipiana deveríamos concluir que a menina tor nouse uma criatura pacificada sem sombra de uma neurose ilesa das seqüelas do sofrimento passado e da inveja ciumen ta Claro que não A vida de uma mulher permanece geral mente agitada pela persistência de antigos conflitos edipianos Afirmo desde já que de todas as paixões infantis que subsis tem na vida de uma mulher a mais perturbadora é sem dúvi da alguma a inveja ciumenta do Falo Quando vivida de forma excessivamente febril na infância essa inveja infantil pode res surgir violentamente na idade adulta manifestandose seja por uma repulsa sexual histérica seja por uma atitude carac teriológica denominada complexo de masculinidade No 99 O Édipo é a causa das neuroses caso da histeria a mulher continua a achar como uma meni ninha que não é digna de interesse nem de amor e se resigna à sua sorte com amargor e tristeza Instalase então nessa mulher despeitada uma viva repulsa pela sexualidade duplicada por uma grande solidão No caso do complexo de masculinidade ao contrário a mulher substitui a crença de ser castrada e inferior pela crença oposta e igualmente infundada ser mu nida do Falo Em vez de se julgar castrada julgase onipoten te brande o Falo exibeo em uma atitude de desafio e acentua os traços masculinos a ponto de se tornar mais viril que o homem Uma das variantes desse complexo de masculinida de assume a forma da homossexualidade manifesta Observe mos de passagem que a hipertrofia da masculinidade na mulher pode revelarse além disso como uma das resistências mais tenazes ao trabalho terapêutico e tornarse o rochedo contra o qual freqüentemente naufraga o tratamento analítico A ri validade odiosa dirigida ao homem pode transformarse na analisanda em uma revolta contra a arbitrária autoridade mas culina atribuída ao psicanalista Gostaria finalmente de acrescentar outra variante edipia na da neurose feminina variante próxima da normalidade Tratase da angústia de uma angústia propriamente feminina Afirmei até aqui que a angústia prevalecia na posição mascu lina e que a dor de privação caracterizava em contrapartida a posição feminina Entretanto há uma angústia tipicamente feminina que considero um exemplo da angústia de castra ção a saber o medo na mulher de ser abandonada pelo homem amado O desejo de ser amada e protegida é tão poderoso no inconsciente feminino que a jovem mulher não obstante so 100 Sobre o Édipo lidamente envolvida em sua relação tem sempre medo de ser privada do amor de seu companheiro Ao menor conflito lança suspeitas sobre seu parceiro querer deixála Criancinha já fora enganada pela mãe agora adulta desconfia dos ho mens Teme perder a coisa que preza acima de tudo o amor a alegria de amar ser amada e sentirse protegida Se para o homem o Falo é a força para a mulher ele é a felicidade de ser amorosa e ser amada por aquele a quem ama Para o ho mem o Falo é a força para a mulher é o amor Da mesma forma que havíamos dito que o homem era uma criatura preocupada em salvaguardar sua virilidade diremos que a mulher vive na obsessão de ser abandonada Assim para a mulher angustiada o amor permanece uma conquista frágil a ser reconquistada incessantemente e sempre confirmada ver FIGURA 5 p105 e FIGURA 8 p1267 Imagino agora o que seria a união do homem e da mu lher neuróticos um em posição masculina temendo que a mulher roube seu sexo angústia de castração o outro em po sição feminina temendo que o homem a abandone angústia de ser abandonada Será a isso que se reduziria o par homem mulher a um recrudescimento das angústias edipianas O homem preocupado com a perda de sua virilidade e a mu lher com a perda do amor Provavelmente não pois cada um por sua presença demonstra ao outro que sua angústia não é justificada O homem sinceramente envolvido em sua relação tranqüilizará sua companheira pela autenticidade de suas pa lavras e seus atos e a mulher igualmente engajada saberá garantir ao companheiro que apesar das provas difíceis en contrará sempre junto a ela a confirmação de sua virilidade 101 O Édipo é a causa das neuroses É assim que a relação entre um homem e uma mulher deve ria poder se estabelecer E no entanto a experiência nos en sina que entre essa configuração ideal e o fracasso retumbante de um casal todas as nuances são possíveis Agora vou lhes propor a vinheta clínica de uma paciente histérica que sofre de anorexia e cuja inveja inconsciente do Falo consome o corpo Como escutar uma anoréxica através da teoria do Édipo Eis a minha hipótese a anorexia resulta da identificação da jovem doente com seu irmão idealizado como filho predileto do pai Volto a pensar em Sarah nossa paciente anoréxica de quem falei há pouco Desafiando a razão ela quer alcançar o limiar quase fatal dos 41 quilos O senhor verá ela me diz brava mente sou capaz de continuar a viver sem voltar para o hospi tal É a minha aposta Preciso provar a mim mesma que posso atravessar o abismo Eis a loucura de Sarah Um desafio in sensato aos limites da vida e uma vontade cega de dominar e controlar o corpo Ora onde está aqui a presença do Édipo De que forma a teoria do Édipo tal como a concebo nos permite compreender o sofrimento dessa jovem Pois bem quando recebo essa paciente acho sempre que ela quer se 102 Sobre o Édipo tornar pura e leve até a transparência apagando todas as curvas e arredondamentos femininos de seu corpo Queria não ter mais seios nem nádegas menos ainda barriga Nenhum relevo Nada que evocasse a mulher Seu sonho tornarse um meni no imberbe sem pênis nem sinal de virilidade Esse ideal de homem assexuado esguio e frágil que ela queria ser não é outro em sua fantasia senão o filho maravilhoso que seu pai sonha seduzir e possuir sexualmente Sim ela queria ser o jo vem amante do pai isto é assumir o lugar de seu irmão adorado predileto do pai Sarah identificase assim com a masculinida de do irmão e se recusa a ser uma mulher porque acha como uma menininha de quatro anos que ser mulher equivale a ser castrada fraca e desprezada por um pai que só teria olhos para o filho Sarah parte do princípio do falso princípio de que a mulher é castrada e que por conseguinte deve fazer de tudo até mesmo arriscar a vida para mostrar a si mesma e ao mun do que é forte e que seu corpo pode ser moldado até atingir a silhueta de um efebo sem órgãos genitais Nossa paciente está sob a influência da inveja do Falo que traduzi aqui por sua inveja louca e ciumenta de ser ao mesmo tempo um menino com o desejo masculino de possuir e dominar e uma menina com o desejo feminino de ser possuída pelo pai Sua anorexia é a expressão do compromisso entre esses dois impulsos incons cientes Gostaria de dizêlo de outra forma formulando mi nha hipótese segundo a qual a anorexia é na maioria das vezes resultado de uma identificação inconsciente da adolescente com o irmão idealizado como o favorito do pai Naturalmente nes sa hipótese pode tratarse de um irmão virtual de um alter ego masculino uma vez que evidentemente nem todas as anoréxicas têm irmão Fantasia de angústia de castração A neurose é o ressurgimento compulsivo da fantasia de angústia traumática de castração na idade adulta Angústia de ser castrado abandonado pelo pai repressor Neurose fóbica Angústia de ser castrado assediado pelo pai sedutor Neurose histérica Angústia de ser castrado maltratado pelo pai rival Neurose obsessiva FIGURA 4 A neurose mórbida no homem é o ressurgimento compulsivo do Édipo traumático na idade adulta Comentário da Figura 4 Duas considerações A primeira diz respeito aos atores presentes É indiferente que a criança angustiada seja um menino ou uma menina e que o adulto que ameace repressor sedutor ou rival seja o pai a mãe o irmão mais velho a irmã mais velha ou qualquer outro adulto tutelar Entretanto a fantasia de angústia de castração mais freqüentemente encontrada nos tratamentos analíticos dos homens neuróticos é a de uma cena em que a criança é um menino e o adulto seu pai No caso das mulheres neuróticas encontramos o mesmo tipo de fantasia em que a filha tem medo das represálias da mãe Assim o conteúdo dessas fantasias é freqüentemente uma cena em que a criança está às voltas com o genitor do mesmo sexo Gostaria de dar o exemplo de uma fobia Penso no caso daquela mulher que tinha fobia dos transportes públicos cuja análise revelou que a causa de sua neurose remontava a um acontecimento trágico de sua infância a morte acidental da mãe Em vez de viver o sofrimento do luto como teria feito qualquer criança ela fantasiou essa morte como um castigo inesperado infligido pela mãe amada e falecida Foi então que sentiu a aflição de ser entregue a novos abandonos aflição hoje conhecida como fobia dos espaços fechados A outra consideração diz respeito a uma leitura cruzada entre as duas colunas da tabela É possível por exemplo que a angústia de ser abandonada pelo pai repressor reapareça sob a forma de uma neurose obsessiva e não mais fóbica ou que a angústia de haver sido seduzido por um genitor excessivamente carinhoso esteja na origem de uma neurose fóbica e não mais histérica A neurose é o ressurgimento compulsivo da fantasia da inveja ciumenta do Falo na idade adulta Fantasia da inveja ciumenta do Falo Inveja ciumenta de ter o Falo Repulsa sexual histérica Não tenho o Falo e estou muito bem assim Complexo de masculinidade Tenho o Falo e o exib0 Angústia de ser abandonada Tenho o FaloAmor mas sinto muito medo de perdêlo Desejo de ser possuída pelo pai FIGURA 5 A neurose mórbida na mulher é o ressurgimento compulsivo do Édipo traumático na idade adulta 5 Arquipélago do Édipo NEUROSE DO ADULTO COMPULSÃO DE REPETIÇÃO Adulto o sujeito sente a necessidade compulsiva de reviver a mesma sensação desse prazer que causa mal e voltar a representar a mesma cena traumática incluindo dessa vez não mais seus pais mas os parceiros de seu círculo atual FIXAÇÃO DO TRAUMA EM UMA CENA FANTASIADA QUE SE TORNA PATOGÊNICA Qual uma placa sensível o inconsciente da criança registra o impacto brutal do prazer erógeno associado à presença sensual do adulto É então que se imprime no inconsciente o clichê de uma cena fantasiada de sedução por um dos pais TRAUMA PSÍQUICO PRAZER SEXUAL TRAUMATIZANTE NA CRIANÇA EDIPIANA DEFASAGEM ENTRE O PRAZER SEXUAL E O EU INFANTIL De um lado um prazer erógeno intenso fulgurante desencadeado na criança por um adulto em estado de desejo e de quem a criança depende do outro um eu infantil siderado e incapaz de integrar mentalmente esse prazer transbordante É um problema de excesso e de defasagem temporal o prazer é forte demais e chega cedo demais FIGURA 6 A histeria sofrida por um adulto foi provocada por uma relação sensual demais entre a criança que ele era e seus pais O vivido prematuro de um prazer erógeno pode ser para a criança tão traumático quanto uma dor Não existe castração As figuras do pai no Édipo masculino As figuras da mãe no Édipo feminino As figuras do Falo no Édipo feminino O supereu e os três papéis do pai no Édipo masculino A brincadeira de boneca A fantasia da onipotência fálica A fobia é uma projeção a histeria uma rebelião e a obsessão um deslocamento A significação bissexual de um sintoma neurótico Que é histeria A histeria sofrida por um adulto foi provocada por uma relação excessivamente sensual entre a criança que ele era e seus pais A mulher histérica e seu medo de amar As três figuras lacanianas do pai no Édipo simbólico real e imaginário Os três tipos de falta no Édipo castração privação e frustração Uma leitura da tríade lacaniana Quadro comparativo entre as posições masculina e feminina 109 Não existe castração há apenas ameaças de castração Eis por que a castração não passa no fundo do nome de uma angústia jamais de uma realidade Desde o início empregamos constantemente a palavra castra ção sem havermos encontrado oportunidade de dissipar um possível malentendido quanto à sua significação Comece mos por dizer bem secamente que deixando de lado certos atos isolados de barbárie a castração não existe e que nin guém foi castrado para ser punido Decerto conhecemos to das as castrações ditas químicas destinadas a tratar como último recurso determinados doentes perversos como estu pradores ou pedófilos e sabemos também que doentes de caráter psicótico podem se automutilar sexualmente ou cas trar uma vítima Mas afora essas aberrações psicopatológicas insisto em dizer que a castração propriamente dita não existe Se Freud serviuse desse vocábulo tão sugestivo foi a fim de dramatizar até mesmo histericizar o perigo imaginário que ameaça todo homem e toda mulher desejantes isto é todo homem e toda mulher que buscam ardentemente o prazer corporal e mais além a felicidade Que perigo os ameaça O perigo de perder sua vitalidade sua vida a fonte íntima de 110 Sobre o Édipo seu desejo Em que consiste então a castração Ela é acima de tudo a idéia de um perigo o perigo imaginário inventado por um neurótico e que ele deve imperiosamente afastar É ao querer salvaguardar seu ser vital e estar sempre de pronti dão que o neurótico sofre por ser neurótico Por conseguinte é sempre o medo da castração e nunca a castração em si que está na origem dessa crispação que é o sofrimento neurótico Cada sintoma neurótico portanto deve ser compreendido como uma defesa crispada contra um medo essencial no ho mem o medo de perder a potência na mulher o medo de perder o amor Assim o vocábulo castração é uma incom parável alegoria psicanalítica que simboliza a hipotética perda de um hipotético objeto supremo Com isso compreendemos que para Freud cada um de nós é em última instância uma criança desejante e voraz me drosa diante das conseqüências de sua avidez guardião cioso de seu Falo e sentindose culpado de desejar Voraz medroso ciumento e culpado eis nosso retrato mais íntimo esboçado por Freud nas cores do Édipo As figuras do pai no Édipo masculino O pai é amado como um modelo ideal O pai é temido como repressor e censor O pai é desejado e temido como sedutor O pai é odiado e temido como um rival O amor do menino pelo pai admirado já existia bem antes da entrada na crise edipiana Os sentimentos de ternura e admi ração filiais persistem ao longo de toda a travessia do Édipo e encontram os sentimentos opostos que são o desejo a angús 111 Arquipélago do Édipo tia e o ódio É justamente o vivido simultâneo de todos esses sentimentos contraditórios que divide a criança e fomenta sua neurose O neurótico seja criança ou adulto é aquele que ao mesmo tempo ama teme deseja e odeia o pai As figuras da mãe no Édipo feminino No Tempo préedipiano A mãe todopoderosa provida do Falo mãe fálica é amada como uma figura ideal A mãe é desejada como um objeto sexual que a filha quer possuir Para a criança não apenas a mãe tem o Falo como é o Falo No Tempo da solidão A mãe é culpada pela filha por ter sido incapaz de dotá la do Falo símbolo da potência A mãe é então destituída de sua onipotência e abandonada No Tempo do Édipo A mãe como mulher que deseja um homem é um modelo de identificação A mulher é novamente amada mas dessa vez como um ideal feminino A mãe é odiada como uma rival As figuras do Falo no Édipo feminino Aos olhos da menina o Falo revestese de diferentes formas ao longo das sucessivas fases de seu Édipo 112 Sobre o Édipo No Tempo préedipiano a menina reconhece o Falo em suas sensações clitoridianas e na pessoa de sua mãe considera da o objeto eleito de seu desejo O Falo é portanto encarna do pelo clitóris como órgão de sensações erógenas e pela mãe como objeto do desejo incestuoso No Tempo da solidão ela reconhece o Falo no pênis fasci nante do menino e consciente de sua privação reconheceo também dolorosamente na autoimagem ferida O Falo é então encarnado pelo pênis invejado do menino e pela imagem de si No Tempo do Édipo o Falo é encarnado pela força do pai que a menina cobiça e mais tarde depois da primeira recusa paterna pelo elamesma como objeto que se oferece ao desejo do pai Finalmente após a segunda recusa paterna o Falo é para a filha seu pai introjetado Superado seu Édipo a menina agora mulher reconhece rá o Falo no pênis ereto do homem amado no amor que este homem lhe dirige e finalmente na criança fruto desse amor As sensações erógenas a mãe o pênis do menino a ima gem de si a força do pai o si mesmo a pessoa do pai o pênis ereto do homem amado o amor e depois a criança eis todos os avatares do Falo no Édipo feminino Cada um desses avatares corresponde exatamente à definição do Falo como sendo não apenas a coisa mais inestimável mas o regulador vital e insubstituível do nosso equilíbrio psíquico O supereu e os três papéis do pai no Édipo masculino O supereu essa parte autocrítica de mim mesmo essa parte do eu censor do eu é uma instância que faz reviver no psi 113 Arquipélago do Édipo quismo as três atitudes contraditórias do pai fantasiado Assim o supereu é um coro de três vozes a voz severa do interdito presentificado pelo pai repressor a voz cativante da tentação pre sentificada pelo pai sedutor e a voz denegridora da autocrítica presentificada pelo pai odioso e rival A brincadeira de boneca A menininha edipiana faz a boneca desempenhar dois papéis distintos No Tempo préedipiano ela repete com a boneca a relação com a mãe identificase com a boneca e simultanea mente identificase com a mãe acariciandoa Uma vez no Édipo propriamente dito a menina muda de papel agora ela é a mãe e sua boneca é o filho maravilhoso que o pai lhe deu A fantasia da onipotência fálica No espírito das crianças edipianas aqueles que detêm o Falo são criaturas fortes e os que não o detêm fracas Com toda a evidência tal ficção que considera pênis sinônimo de potên cia e falta de pênis sinônimo de fraqueza é um mangá imagi nado por crianças de quatro anos e de forma alguma um pensamento de adulto Contudo essa ficção infantil pode per sistir na idade madura como uma miragem que torna confli tuosa a relação do neurótico com seus próximos e consigo mesmo Assim o neurótico percebe aqueles que contam para ele segundo sua visão maniqueísta de fortes e fracos domi nantes e dominados 114 Sobre o Édipo A fobia é uma projeção a histeria uma rebelião e a obsessão um deslocamento Agora mudemos de perspectiva e expliquemos a presença do Édipo nas três neuroses apoiandonos na metapsicologia As sim diremos que a fobia resulta da projeção da angústia de castração sobre o mundo exterior A angústia inconsciente tornase medo consciente o perigo interior representado pelo pai repressor é projetado para fora para se tornar um perigo exterior encarnado por exemplo pelos animais Freud forne ceu uma eloqüente demonstração disso em seu célebre caso do Pequeno Hans O cavalo assustador é o pai e o medo dos cavalos traduz o medo de ser mutilado e abandonado pelo pai Em resumo a fobia pode ser definida como a projeção para fora de um perigo interno tornado assim um perigo externo como a substituição do pai ameaçador da fantasia por um ani mal assustador na realidade e como a transformação enfim de uma angústia inconsciente em um medo consciente Deixando de lado a histeria de conversão que resulta da concentração de toda a carga de angústia inconsciente no corpo provocando assim uma disfunção somática enxaqueca verti gens dores etc identifico outra forma de histeria muito mais insidiosa e muito freqüente que qualifico como histeria de rebelião Essa neurose é ocasionada pelo retorno na idade adulta da angústia infantil de ser seduzido por um dos genito res em particular o do mesmo sexo Entre as fantasias infantis de angústia a mais patogênica é a de uma cena em que o menino seduzido mas igualmente assustado desempenha o papel de uma mulher possuída pelo pai Se tal fantasia per siste ativa no inconsciente do homem histérico ela se exterio 115 Arquipélago do Édipo rizará então por um comportamento reativo de revolta per manente Por exemplo assim que se vê em uma relação nor mal de dependência em relação a um outro admirado ou a uma autoridade o histérico sentese oprimido submisso e a rigor sempre segundo suas fantasias rebaixado ao nível de uma mulherzinha castrada e tiranizada Ser dependente signi fica para ele ser uma mulher pois a mulher em sua fantasia é uma criatura fraca inferior ao homem e em todo caso dis pensável Assim depender de uma autoridade será vivido pelo neurótico como a pior das submissões e conseqüentemente será tomado pela mais urgente necessidade de se rebelar e proteger seu amorpróprio É então que a pessoa que encarna a autoridade tornase a seus olhos um déspota a ser abatido Quando um paciente adota tal posição histérica é extre mamente difícil para nós analistas revelar ao analisando sua fantasia de sedução inconsciente e sobretudo diluíla Por quê Porque o psicanalista a exemplo do pai tornase para esse paciente um temível sedutor e logo uma autoridade a ser destituída Se essa figura transferencial prevalece o trata mento corre o risco de ser brutalmente interrompido A fan tasia infantil de sedução pode invadir de tal forma a relação analítica que qualquer intervenção do terapeuta será sistema ticamente interpretada pelo analisando como um intolerável abuso de poder Freud o primeiro naufragou nesse destroço insuperável que qualificou como rochedo da castração Eu diria rochedo da angústia de castração uma vez que o que alimenta a rebelião veemente do neurótico contra o psicana lista não é outra coisa senão a angústia de ser escravo do pai e perder sua dignidade de homem Ao se revoltar o histérico 116 Sobre o Édipo julga salvar seu Falo que ele nunca teve das mãos de um tirano que o analista nunca foi Acrescentemos de passagem que podemos sofrer o mes mo fracasso no tratamento de uma mulher quando a analisanda amargurada recrimina seu psicanalista por sua arrogância e machismo Esse gênero de reação provém de uma inveja ciu menta a respeito do terapeuta que ela supõe portador do Falo isto é poderoso sempre feliz amado e admirado por todos Despeitada e furiosa ela também gostaria de ser dotada da mesma força mágica que ele até quem sabe maior percebê lo fraco e se tornar seu único recurso Ao passo que o homem interrompe o tratamento com medo de ser uma mulherzi nha a mulher por sua vez pára por raiva e despeito Assim como o rochedo da castração no homem é marcado pela angústia o da mulher é marcado pela inveja ciumenta Em ambos os casos homem e mulher neuróticos têm uma imagem subestimada da mulher e uma imagem superestimada do Falo O homem neurótico não compreende que o Falo por ele salvaguardado tão ciosamente é um objeto inexistente e que portanto ele não corre risco algum de perder algo que não existe não tem razão para ter medo uma vez que nenhum perigo o ameaça A mulher neurótica tampouco compreen de que o Falo é um embuste e que ela não tem razão alguma para disputar com o homem um objeto que ele não tem A obsessão resulta do deslocamento da angústia de castra ção que passa do inconsciente para a consciência e se crista liza como um sentimento de culpa A angústia inconsciente de ser espancado pelo pai rival transformase em angústia de ser punido pelo próprio supereu Essa angústia de se sentir 117 Arquipélago do Édipo em erro e passível de castigo chamase sentimento de culpa Acontece muitas vezes de o obsessivo comprazerse em seu papel de culpado e ter necessidade de ser punido exaurindo se em um gozo estéril conhecido como masoquismo moral A significação bissexual de um sintoma neurótico Diante de um sintoma neurótico o psicanalista busca trazer à tona a cena fantasiada forjada na infância edipiana e que go verna a neurose de hoje Nesse quadro o sujeito desempenha um papel duplo ativo e passivo ou para ser mais preciso ence na um conflito entre dois personagens que ele representa um personagem dominador mais masculino e outro dominado mais feminino Assim quando você está confrontado com um paciente que sofre de uma fobia de avião por exemplo lembrese de que a cena fantasiada que fomenta a angústia é representada por um pai opressor o espaço do avião e por um filho ameaçado o próprio fóbico Assinalo ainda que na fantasia o sujeito interpreta os dois papéis simultaneamente é tanto o carrasco viril quanto a vítima efeminada tanto o pai opressor quanto a criança impotente Naturalmente é sobre tudo nesse último papel que o neurótico se compraz Que é histeria Eu disse que o Édipo é um excesso um desejo sexual evocador do desejo sexual adulto vivido na cabecinha e no pequeno 118 Sobre o Édipo corpo de uma criança de quatro anos e cujo objeto são os pais Inversamente direi que a histeria é um desejo sexual infantil vivido na cabeça de um adulto e cujo objeto não é um homem ou uma mulher mas uma criatura forte ou fraca O histérico vive seu parceiro não como um homem ou uma mulher mas como uma criatura castrada e onipotente A histeria sofrida por um adulto foi provocada por uma relação excessivamente sensual entre a criança que ele era e seus pais Eis o que nos ensina o Édipo a histeria sofrida por um adulto foi provocada outrora por um violento abalo ocorrido em sua sexualidade de criança Com efeito é um distúrbio da vida sexual infantil que está na origem dos tormentos neuró ticos atuais Que distúrbio O que aconteceu na pequena in fância edipiana para que uma neurose se instalasse na idade adulta Pois bem deuse uma derrapagem sim a criança edi piana sofreu por ter sido submergida por um prazer erógeno intenso demais que se apoderou dela Seu eu ainda inexpe riente não soube conter a impetuosidade de um desejo en louquecido e assimilar o prazer transbordante daí resultante Desejo ou prazer vocês me perguntarão Isso é totalmente equivalente como vimos sensações desejo fantasias e prazer são vividos pela criança como uma única e mesma coisa so mos nós quem separamos seus elementos Dito isto quando o prazer erógeno é excessivo o eu infantil fica traumatizado Em outras palavras e esta será a grande lição clínica do Édipo quando o eu da criança é incapaz de assimilar um impacto 119 Arquipélago do Édipo tão forte de prazer sexual fica desamparado e condenado a reviver o mesmo trauma mil e uma vezes Gostaria de insistir mais tão espantoso é esse fenômeno é o prazer e não o sofri mento como poderíamos acreditar que faz a criança edipiana futura histérica sofrer Não apenas o sofrimento é traumático um prazer sexual excessivo também pode sêlo É então que a defasagem traumatizante entre um eu ima turo e um prazer intenso e precoce fica gravada na cera do inconsciente infantil Qual uma placa sensível o inconsciente guarda na memória o choque brutal do prazer erógeno e seu contexto isto é a presença sexual e desejante do adulto Não existe prazer sexual traumático que não seja desencadeado pela excitação inocente ou não proveniente de um dos pais É assim que se molda no inconsciente virginal da criança o protótipo de uma cena fantasiada em que ela se vê seduzida por um dos pais Muito mais tarde adulto o sujeito experi menta e eis a neurose a necessidade compulsiva de reviver a mesma sensação desse prazer que causa mal e representar novamente a mesma cena traumática incluindo dessa vez não mais seus pais mas os parceiros de seu círculo atual É preciso dizer com clareza a experiência traumática de viver sensações sexuais fortes demais pode estar para uma criança na origem de uma futura neurose Para concluir gostaria de esquematizar a seqüência da formação de uma neurose Temos um preâm bulo e três tempos O preâmbulo é a imaturidade da criança o anacronismo de um prazer sexual intenso demais para uma criaturazinha de quatro anos É então que o trauma 1o tempo fixase em uma cena fantasiada de prazer e dor 2o tempo Essa cena que eterniza o trauma é representada incessantemente pelo sujeito em sua vida adulta 3o tempo Eis a neurose No text present on this page 121 Arquipélago do Édipo A mulher histérica e seu medo de amar A cena fantasiada na qual a criança se vê atraída depois exci tada e finalmente assediada por um adulto sedutor constitui uma das fantasias mais freqüentemente encontradas no trata mento dos pacientes histéricos homens e mulheres No que se refere à mulher a fantasia de sedução é freqüentemente a causa das dificuldades de sua vida amorosa Ela deseja ser amada por um homem e ao mesmo tempo teme que ele a sufoque ou ao contrário que a abandone Para uma histérica qual quer pretendente é percebido através da neblina deformadora de uma fantasia infantil de sedução São todos iguais Con versa fiada Quando ele tiver o que quer vai me abandonar A angústia infantil de ser submetida ao pai transformouse na histérica em uma rebelião contra qualquer homem de quem ela poderia depender e a angústia de ser abandonada trans formouse em fobia de amar As três figuras lacanianas do pai no Édipo simbólico real e imaginário Segundo minha leitura Lacan decompõe o processo do Édi po de acordo com um critério importante os diferentes pa péis que a criança faz o pai representar nas fantasias edipianas Durante o primeiro tempo do Édipo o pai não é encarnado é a figura abstrata da Lei que preserva o mundo do caos que teria provocado se porventura o incesto fosse cometido Esse pai eminentemente abstrato muralha contra a loucura dos ho 122 Sobre o Édipo mens e representado pela linguagem humana chamase pai simbólico Nesse primeiro tempo o pai é a Lei tácita ignorada pela criança Sem contenção e sem temor a criança seduz impudentemente a mãe e se oferece a ela como seu Falo No segundo tempo é o personagem real do pai que conta O pai é aqui o pai real agente separador que dissocia mãe e filho ao proibir a um de considerar o outro como objeto de seu dese jo É então terceiro tempo que a criança confrontase com o pai separador e frustrador respeitandoo como todopodero so odiandoo como rival e invejandoo como detentor do Falo isto é como o único possuidor da mãe de todas as mu lheres e do poder Esse pai respeitado odiado e invejado é o pai imaginário É a ele que a criança pedirá em vão o Falo Naturalmente o pai recusa e essa recusa logo acarreta a iden tificação do filho com o pai síntese então das três figuras paternas simbólica real e imaginária Uma vez que a criança não pode ter o objeto identificase com o detentor do objeto Em suma a criança edipiana faz a experiência de encon trar três personagens paternos Em primeiro lugar o pai é o âmbito da Lei que rege a sociedade na qual ela nasceu em seguida o pai é o policial que faz essa Lei ser respeitada final mente o pai é também o policial mas dessa vez temido como autoridade contestado como poder e invejado como deten tor da onipotência É como se no primeiro tempo desse tea tro de marionetes que é o Édipo o garotinho insolente tentasse perverter a mãe sussurrandolhe Abraceme Não tem nin guém olhando E no segundo quadro víssemos repentina mente o policial sair de sua cabine e berrar O que você dois estão fazendo aí Parem imediatamente E enfim no tercei 123 Arquipélago do Édipo ro tempo o menino envergonhado e fascinado perguntasse respeitosamente ao representante da ordem se podia lhe em prestar seu cassetete para se tornar um dia tão forte quanto ele Diante da recusa deste último o menino inclinase in corpora a figura da autoridade e ao se desdobrar tornase ora o rebelde ora o policial que reprime o rebelde Doravante essa cenazinha de dois personagens um que transgride e ou tro que sanciona dominará toda a vida afetiva atos e situa ções cruciais que pontuam a existência de um sujeito Em suma a travessia do Édipo pode ser lida como o encontro de uma criança com as três figuras do pai simbólico real e imaginário um pai que representa a Lei outro que a faz ser respeitada e finalmente aquele invejado e contestado que detém o Poder Eis as três figuras paternas introjetadas que con jugadas formarão o supereu do menino DESEJO INCESTUOSO DESDEJO EDIPIANO DO MENINO DE POSSUIR A MÃE Tenho medo de perder um objeto que julgo ter o Falo imaginário A falta é uma idéia a castração é simbólica O agente da castração é o pai repressor sedutor e rival Angústia de perder meu Falopênis meu Falovirilidade ou meu Falopotência Dor de privação A menina não se resigna luta para se tornar mulher e mãe DESEJO PRÉEDIPIANO DA MENINA DE POSSUIR A MÃE Perdi um objeto que julgava ter o Falo simbólico A falta é um fato a privação é real O agente da privação é a mãe vacilante DESEJO EDIPIANO DA MENINA DE SER POSSUÍDA PELO PAI Quero ser o objeto precioso do meu pai o Falo real A falta é uma decepção a frustração é imaginária O agente da frustração é o pai que se recusa a considerar a filha como Falo FIGURA 7 Os três tipos de falta no Édipo castração privação e frustração Uma leitura da tríade lacaniana Comentário sobre o quadro dos três tipos de falta no Édipo A castração é uma idéia a privação um fato e a frustração uma demanda recusada Para o menino a castração é uma idéia angustiante a idéia de que o essencial pode lhe faltar ao passo que para a menina a privação é uma constatação dolorosa constatação de que lhe falta o essencial que ela julgava ter Quanto à frustração é para a menina a decepção que sucede a recusa do pai em tomála como Falo Decepcionada ela não obstante luta para obter os dois Falos importantes na vida de uma mulher o amor e a criança concebida com o homem amado DOMÍNIOS Desejo edipiano Sexualidade Comportamento em relação ao parceiro amoroso POSIÇÃO FEMININA Desejo de ser possuída Ao contrário do homem a mulher é particularmente sensível à qualidade da relação sexual Num tropismo centrípeto a mulher quer ser protegida contida e receber o sexo do homem amado Oferecer se para uma mulher não quer dizer ser passiva nem submissa A sensibilidade erógena é mais rica e diversa na mu lher que no homem que permanece polarizado em torno de seu pênis A mulher integral ama o homem que a satisfaz se xualmente Amor e sexo são indissociáveis A mulher prefere ser amada pelo homem que ela ama Precisa ser permanentemente tranqüilizada POSIÇÃO MASCULINA Desejo de possuir O homem é sexualmente hiperativo tem orgulho de seu sexo e deseja fazer a mulher gozar Num tropismo centrífugo o homem quer proteger con ter e penetrar a mulher amada O homem pode amar uma mulher e sem renunciar a esse amor desejar outra Amor e sexo são dissociados O homem prefere amar que ser amado Ele idealiza a mulher amada e apagase diante dela Humildade do homem amoroso Na experiência do Édipo a criança sente pela primeira vez os desejos que estão na base de sua futura identidade sexual o desejo masculino de possuir e o desejo feminino de ser possuída Eis um quadro comparativo entre as posições masculina e feminina Naturalmente essas duas posições podem ser ocupadas indiferentemente por um homem ou uma mulher Existem inúmeras mulheres que desejam segundo o tipo masculino e inúmeros homem que desejam segundo o tipo feminino Masculino e feminino são palavras que designam posições psíquicas dominantes é impossível e está muito bem assim definir psicanaliticamente o retratotipo do homem e da mulher tão infinitas são suas singularidades Narcisismo de se sentir bela maior que de se mostrar bela Para uma mulher é mais importante ser indis pensável que poderosa Ela quer ser a única Ser forte ou fraca não é seu problema o desafio da mulher é ser amada e não ser abandonada Uma vez resolvida a se comprometer a mulher dá provas de coragem e de inabalável determinação A mulher prefere ignorar sua potência e ocuparse de seu ressentimento íntimo Obsessão de conquistar o amor e proteger o filho Em seu imaginário a mulher não possui apêndice nem para manipular nem para salvaguardar mas um obje to invisível que é preciso preservar seu tesouro mais caro amar e ser amada Ela nada tem a perder exceto o amor Ora o amor para ela é uma conquista perma nente um patrimônio a ser incessantemente recon quistado Portanto ela não tem pertences a defender Toda ação até mesmo a que põe sua vida em jogo é uma ação que decerto lhe provoca medo mas que ela aborda com muito mais segurança que o homem Ela sabe o que o homem esquece as aquisições defi nitivas não existem Narcisismo de fazer bem prevalece sobre ser bonito Para um homem é mais importante ser forte que belo A alternativa de ser forte ou fraco é o problema vital de um homem O homem covarde por essência demora a se com prometer avalia os riscos hesita e recua diante do ato O homem tende a exibir sua potência Grande vontade previsão e perseverança na ação O homem é dotado de um apêndice destacável o pênis que simboliza tudo o que ele tem medo de perder a potência e a virilidade O medo de perder a força está tão instalado no espírito do homem que qualquer ato é um risco para ele e qualquer fracasso uma humilhação Os perigos supremos para um homem são a mulher vingativa e o pai admirado Narcisismo Potênciaimpotência Determinação e coragem Atitude social Vontade Por que as posições masculinas e femininas são diferentes FIGURA 8 Quadro comparativo entre as posições masculina e feminina 6 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo precedidos de nossos comentários 131 Os subtítulos e os trechos em destaque que apresentam os excertos de Freud e Lacan são de autoria de JDNasio FREUD A universalidade do complexo de Édipo Todas as crianças sejam quais forem suas condições familiares e socioculturais vivem essa fantasia universal que é o complexo de Édipo Seja abandonada órfã ou adotada pela sociedade nenhuma criança escapa ao Édipo Por quê Porque nenhuma criança escapa à torrente das pulsões nela desencadeadas entre os três ou quatro anos de idade e porque nenhum adulto de seu círculo imediato consegue evitar desempenhar o papel de alvo das pulsões e de canal para drenálas É uma situação que toda criança é chamada a viver e que resulta inevitavelmente de sua longa dependência e de sua vida na casa dos pais quero falar do complexo de Édipo as sim denominado porque seu conteúdo essencial está na lenda grega do rei Édipo O herói grego mata o pai e casase com a mãe sem saber 1 132 Sobre o Édipo O menino aqui tem um esquema filogenético a realizar e o consegue ainda que as experiências de vida pessoal possam não coincidir com ele2 Os esquemas filogenéticos que a criança carrega ao nascer são precipitados da história da civilização humana O com plexo de Édipo é um deles3 ela se viu sob a dominação do complexo de Édipo mes mo sem saber que essa fantasia universal em seu caso tornara se realidade4 A descoberta do complexo de Édipo É a partir das recordações de infância de caráter sexual evocadas por nossos pacientes adultos que deduzimos a existência do complexo de Édipo Não nos esqueçamos de que a recordação é sempre uma reinterpretação muito subjetiva do passado As surpreendentes descobertas sobre a sexualidade da crian ça complexo de Édipo foram a princípio proporcionadas pela análise de adultos 5 Foi por trás dessas fantasias evocadas por pacientes adultos que surgiu então o material que permitiu fazer a descrição do de senvolvimento da função sexual fases libidinais da infância6 O Édipo foi descoberto por Freud a partir do relato de cenas de sedução que seus pacientes adultos acreditavam ter vivido na infância O complexo de Édipo não é uma realidade observável mas uma fantasia sexual forjada pela criança sob a pressão de seu 133 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo desejo incestuoso O conteúdo dessa fantasia é freqüentemente uma cena de sedução sexual exercida pelo adulto Observemos ainda que a fantasia edipiana embora criada na infância e sempre em ação no adulto neurótico deverá ser reconstruída pelo analista ao longo do tratamento Este a reconstrói no calor da hora uma vez que a relação analistapaciente re produz em ato a relação edipiana fui obrigado a reconhecer que as cenas de sedução jamais haviam acontecido e que não passavam de fantasias forjadas por meus pacientes7 A recordação de ter sido seduzido sexualmente pelo pai é uma das formas pelas quais o complexo de Édipo pode ser apresen tado A fantasia de sedução não é senão uma variante da fan tasia edipiana Basta um gesto excessivamente carinhoso da parte de um genitor em geral o pai para que a criança forje a recordação de um gesto equívoco de sedução sexual Diante das cenas de sedução forjadas por meus pacientes vime confrontado pela primeira vez ao complexo de Édipo 8 O desejo incestuoso está na origem de todos os desejos humanos O desejo incestuoso não só é irrealizável como inconcebível por uma criança de quatro anos Entretanto é esse desejo mítico além e aquém de toda genitalidade que nós analistas supo mos na origem de todos os desejos e fantasias humanos O desejo de ter um filho com a mãe nunca falta no menino o desejo de ter um filho do pai é constante na menina e isso 134 Sobre o Édipo quando são totalmente incapazes de fazer uma idéia clara do caminho que pode levar à realização desses desejos9 O desejo incestuoso é parcialmente satisfeito em uma fantasia Ser espancado pelo pai é uma fantasia que satisfaz parcial mente o desejo incestuoso de um menino de ser possuído se xualmente pelo pai A dor física tornase então prazer sexual A propósito observemos que um incidente traumático de gran de violência física ocorrido na infância ou na adolescência pode determinar em um homem a posição sexual passiva maso quismo em relação a um parceiro masculino ou feminino que o domina e degrada A fantasia de fustigação do menino é portanto uma fan tasia passiva oriunda da posição feminina a respeito do pai10 O Édipo do menino e da menina O menino renuncia à mãe porque tem medo enquanto a me nina abandona a mãe que a decepciona e se volta para o pai O complexo de Édipo do menino no qual cobiça a mãe e gostaria de eliminar o pai como rival desenvolvese natural mente a partir da fase de sua sexualidade fálica Mas a amea ça de castração obrigao a abandonar essa posição Sob a 135 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo impressão do perigo de perder o pênis o complexo de Édi po é abandonado recalcado destruído radicalmente no caso mais normal e um supereu severo é instituído como seu herdeiro O que acontece na menina é quase o contrário O com plexo de castração prepara o complexo de Édipo em vez de o destruir sob a influência da inveja do pênis a menina é ex pulsa da ligação com a mãe e apressase a entrar como em um porto na situação edipiana11 As três fases do Édipo da menina A nosso ver o Édipo feminino dividese em três fases A fase préedipiana na qual a menina em posição masculina deseja a mãe como objeto sexual a fase que designo como dor da privação durante a qual a menina fica sozinha mortificada e com inveja do menino e finalmente a fase propriamente edipiana na qual a menina é arrebatada pelo desejo feminino de ser possuída pelo pai A vida sexual da mulher dividese em duas fases sendo que a primeira tem um caráter masculino enquanto a segunda é especificamente feminina12 Entre a primeira e a segunda fase propostas por Freud inter calo portanto um tempo intermediário em que a menina só e mortificada adota uma posição masculina de rivalidade 136 Sobre o Édipo O supereu é nosso pai psíquico Nosso supereu pode ser muito severo ou muito tolerante se gundo a velocidade e a violência do recalcamento do complexo de Édipo O supereu tentará reproduzir e conservar o caráter do pai e quanto mais intenso for o complexo de Édipo mais rapida mente se dará o recalcamento e mais intenso também será o rigor com que o supereu reinará sobre o eu enquanto encar nação dos escrúpulos de consciência talvez igualmente de um sentimento de culpa inconsciente13 A neurose é a reativação do Édipo na idade adulta O complexo de Édipo é a causa da neurose porque as fantasias edipianas mal recalcadas na infância reaparecem na idade adulta sob a forma de sintomas neuróticos Em outras pala vras a neurose de um adulto é explicada pela intensidade com que ele viveu seu prazer sexual de criança e pela violência ou labilidade com que o recalcou Eis por que a sexualidade infantil submetida ao recalcamento é a forçamotriz principal da formação do sintoma e que o elemento essencial de seu conteúdo o complexo de Édipo é o complexo nuclear da neurose14 Acreditamos que o complexo de Édipo seja o verdadeiro núcleo da neurose que a sexualidade infantil que nele cul mina seja sua condição efetiva e que o que subsiste desse 137 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo complexo inconsciente represente a disposição do adulto em contrair posteriormente uma neurose15 Aprendi a ver que os sintomas histéricos derivam de fanta sias edipianas e não de fatos reais16 LACAN O Édipo é uma teoria da família A teoria do Édipo é uma teoria da família e em particular a do declínio social da imagem paterna É justamente esse declí nio do papel do pai que estaria na origem das neuroses Descobrir que a repressão sexual e o sexo psíquico estavam sujeitos à regulação e aos acidentes de um drama psíquico da família era fornecer a mais preciosa contribuição para a antro pologia do grupo familiar Por isso mesmo Freud veio rapi damente a formular uma teoria da família Ela se baseava numa dessimetria na situação dos dois sexos em relação ao Édipo 17 Não estamos entre os que se afligem com um pretenso afrou xamento dos laços de família Mas um grande número de efeitos psicológicos parecenos decorrer de um declínio so cial da imagem paterna Esse declínio constitui uma crise psicológica Talvez seja com esse declínio que convenha re lacionar o aparecimento da própria psicanálise O sublime 138 Sobre o Édipo acaso da genialidade talvez não explique por si só que tenha sido em Viena que um filho do patriarcado judaico imagi nou o complexo de Édipo Como quer que seja foram as formas de neuroses predominantes do século passado que re velaram que elas eram intimamente dependentes das condi ções da família18 A fase fálica Na fase fálica a criança deseja sexualmente um de seus pais sem consumar naturalmente nenhum ato sexual Em vez de uma genitalidade inexistente desenvolvese na criança a fan tasia de possuir um Falo todopoderoso Logo antes do período de latência o sujeito infantil mascu lino ou feminino chega à fase fálica que indica o ponto de realização do genital Tudo está ali até e inclusive a escolha do objeto Existe no entanto alguma coisa que não está ali a saber a plena realização da função genital Resta com efeito um elemento fantasístico essencialmente imaginário que é a prevalência do Falo mediante o que há para o sujeito dois tipos de seres no mundo os seres que têm o Falo e os que não o têm isto é que são castrados19 A onipotência da mãe Lacan opõese à idéia de que a criança seja habitada por um sentimento de onipotência Apenas a mãe pode dispor da oni 139 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo potência uma vez que a criança a supõe nela Só há onipotên cia do Outro e a primeira castração vivida pela criança é a cons tatação angustiante de que sua mãe é tão vulnerável quanto ela É errado que a criança tenha a noção de sua onipotência Não apenas nada indica em seu desenvolvimento que ela a tenha mas sua pretensa onipotência e os fracassos que esta encontraria não valem nada nessa questão O que conta são as carências as decepções que afetam a onipotência materna20 O pai é uma metáfora Para Lacan o pai é o personagem principal do drama edipiano seja no Édipo masculino seja no feminino Não existe a questão do Édipo quando não existe o pai e inversamente falar do Édipo é introduzir como essencial a função do pai21 No complexo de Édipo o status do pai é o de uma metáfora ele é o significante que vem no lugar de outro significante O signi ficante pai vem no lugar do significante desejo da mãe O pai significa o desejo da mãe Em outras palavras para a crian ça seu pai é também um homem o homem que a mãe deseja Que é o pai Não digo na família A questão toda é saber o que ele é no complexo de Édipo É isto o pai é uma metáfora O pai é um significante que substitui um outro significante Nisso está o pilar o pilar essencial o pilar único da intervenção do pai no complexo de Édipo A função do 140 Sobre o Édipo pai no complexo de Édipo é ser um significante que substitui o primeiro significante introduzido na simbolização o signi ficante materno Segundo a fórmula da metáfora o pai vem no lugar da mãe22 Tríade imaginária quator simbólico Para Lacan o triângulo mãefilhoFalo é uma tríade imagi nária préedipiana O Édipo só aparece com a introdução do quarto elemento o pai A tríade imaginária tornase então quator simbólico A passagem de uma a outra é feita através de uma decepção a criança fica decepcionada ao saber que não é o Falo de sua mãe Descobre que o objeto do desejo da mãe está no pai não nela Assim é para o pai detentor do Falo que a criança se volta a dialética dos três objetos primeiros mãecriançaFalo e do quarto termo que os abrange a todos ligandoos na relação simbólica a saber o pai Esse termo introduz a rela ção simbólica 23 a tríade imaginária como prelúdio à posta em jogo da relação simbólica que se faz com a quarta função a do pai introduzida pela dimensão do Édipo O triângulo é em si mesmo préedipiano o quator constituise com a entrada em jogo da função paterna a partir da decepção funda mental da criança ela reconhece não apenas que não é o objeto único da mãe mas que o interesse da mãe é o Falo A partir desse reconhecimento resta perceber em segundo 141 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo lugar que a mãe é justamente privada que falta a ela mesma este objeto24 Lacan e a simbólica do dom Lacan põe a ênfase na simbólica do dom seja o dom no sentido de demandar o objeto ao outro seja o dom no sentido de dar o objeto ao outro A menina entra no Édipo quando demanda o Falo ao seu pai o menino sai do Édipo quando para salvar seu pênis aceita largar o objeto a que se apega tanto isto é sua mãe ele renuncia à mãe como objeto de desejo É na medida em que não possui o Falo que a criança femi nina se introduz na simbólica do dom É na medida em que se trata de ter ou não o Falo que ela entra no complexo de Édipo O menino não é por aí que ele entra é por aí que ele sai No fim do complexo de Édipo é preciso que ele faça dom daquilo que tem25 Castração e privação A castração é uma idéia a privação é um fato Ao olhar o corpo nu da menina o menino pensa Ela foi castrada a menina examinandose constata Fui privada dele Para o menino a castração é uma idéia angustiante a idéia de que o essencial pode lhe faltar ao passo que para a menina a privação é uma constatação dolorosa a constatação de que lhe falta o essencial que ela julgava ter 142 Sobre o Édipo A privação é em especial o fato de que a mulher não tem pênis que é privada dele Esse fato a assunção desse fato tem uma incidência constante na evolução de quase todos os casos que Freud nos expõe A castração toma por base a apreensão no real da ausência de pênis na mulher As cria turas femininas são castradas na subjetividade do sujeito No real na realidade naquilo que é invocado como expe riência real são privadas A própria noção de privação implica a simbolização do objeto no real Indicar que alguma coisa não está ali é supor sua presença possível isto é introduzir no real a simples ordem simbólica Quanto à castração na medida em que ela é eficaz expe rimentada presente na gênese de uma neurose incide so bre um objeto imaginário Nenhuma castração é jamais uma castração real26 O supereu fruto do Édipo O supereu herdeiro do complexo de Édipo é uma figura da lei introjetada no inconsciente infantil e que dita como um mes tre interior as escolhas decisivas e cotidianas da existência O fim do complexo de Édipo é correlativo da instauração da lei como recalcada no inconsciente mas permanente A lei é baseada no real sob forma desse núcleo deixado atrás de si pelo complexo de Édipo núcleo que sabemos se encarnar em cada sujeito sob as formas mais diversas mais extravagantes mais caricatas que se chama o supereu27 143 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo O Édipo uma figura do Ideal do eu Para Lacan o Édipo é uma via normativa uma das figuras possíveis do Ideal do eu O Ideal do eu é o tipo viril ou o tipo feminino que o menino e a menina estão destinados a assumir há no Édipo a assunção do próprio sexo pelo sujeito isto é para darmos os nomes às coisas aquilo que faz com que o homem assuma o tipo viril e com que a mulher assuma um certo tipo feminino A virilidade e a feminização são os dois termos que traduzem o que é essencialmente a função do Édipo Encontramonos aí no nível em que o Édipo está diretamente ligado à função do Ideal do eu28 Logo não basta que o sujeito depois do Édipo desemboque na heterossexualidade é preciso que o sujeito menino ou menina desemboque nela de uma maneira tal que se situe corretamente em relação à função do pai Eis o centro de toda a problemática do Édipo29 A castração é transmitida de pai para filho Que é ser castrado senão constatar dolorosamente que nosso corpo e nossos desejos são limitados O pai que tive o pai que sou e o filho que me sucede todos devem assumir as castrações impostas a castração que atinge o filho não será também o que o faz ter acesso pela via justa ao que corresponde à função do pai E não é isto mostrar que é de pai para filho que a castração se transmite30 144 Sobre o Édipo Dolto e o interdito do incesto Dolto pede aos pais que assumam a castração de não conside rar seus filhos como prolongamento de si próprios Os pais gostariam de manter o domínio sobre seu filho e de inscrever os frutos da experiência deles em seu pensamento Isso é trapacear com o interdito do incesto Ele deve livrarse de tudo que lhe foi inculcado pelos pais Abandona pai e mãe o que não quer dizer que ele não descobrirá sua herança de outra forma ele próprio engendrando a partir do que ouviu não de seus pais mas de sua experiência de outras pessoas na vida sob a condição de que isso não seja obrigatório não esteja na corrente de uma aliança amorosa31 Dolto 145 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo Referências dos excertos citados Freud 1 Abrégé de psychanalyse Paris PUF 14a ed 1997 p58 ed bras Esbo ço de psicanálise in ESB vol23 2 À partir de lhistoire dune névrose infantile in Œuvres complètes de Freud volXIII Paris PUF 3a ed 2005 p84 ed bras Da história de uma neurose infantil in ESB vol17 3 Cinq psychanalyses Paris PUF 23a ed 1999 p418 ed bras Da his tória de uma neurose infantil in ESB vol17 4 Quelques types de caractères in LInquiétante étrangeté et autres essais Paris Gallimard 1985 p166 ed bras Alguns tipos característicos encontrados na psicanálise in ESB vol14 5 Ma vie et la psychanalyse Paris Gallimard 1949 p65 ed bras Pós escrito a Um estudo autobiográfico in ESB vol20 6 Psychanalyse e Théorie de la libido in Résultats idées problèmes Paris PUF 6aed 1988 p62 ed bras Dois verbetes de enciclopé dia in ESB vol18 7 Freud présenté par luimême Paris Gallimard 1984 p57 ed bras Um estudo autobiográfico in ESB vol20 8 Ibid p58 9 Un enfant est battu in Névrose psychose et perversion Paris PUF 12a ed 1997 p227 ed bras Uma criança é espancada in ESB vol17 10 Ibid p238 11 La féminité in Nouvelles conferences dintroduction à la psychanalyse Paris Gallimard 1984 p173 ed bras Feminilidade in Novas con ferências introdutórias à psicanálise conf33 ESB vol22 Os excertos de Freud foram traduzidos a partir das versões francesas e seguidos da indicação dos volumes em que se encontram na Edição Standard Brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud Rio de Janeiro Imago As citações de Lacan reproduzem as traduções publicadas em O Seminário de Jacques Lacan Rio de Janeiro Jorge Zahar Editor vários volumes NEB 146 Sobre o Édipo 12 Sur la sexualité feminine in La vie sexuelle Paris PUF 13a ed 1997 p142 ed bras A sexualidade feminina in ESB vol21 13 Essais de psychanalyse Paris Payot 1981 p2034 ed bras O eu e o isso in ESB vol19 14 Un enfant est battu in Névrose psychose et perversion opcit p243 15 Ibid p233 16 La féminité in Nouvelles conferences dintroduction à la psychanalyse opcit p161 Lacan 17 Os complexos familiares na formação do indivíduo in Outros escri tos Rio de Janeiro Jorge Zahar 2003 p534 18 Ibid p667 19 O Seminário livro 4 A relação de objeto 195657 texto estabelecido por JacquesAlain Miller Rio de Janeiro Jorge Zahar 1995 p124 20 Ibid p70 21 O Seminário livro 5 As formações do inconsciente 195758 texto esta belecido por JacquesAlain Miller Rio de Janeiro Jorge Zahar p171 22 Ibid p180 23 O Seminário livro 4 A relação de objeto opcit p834 24 Ibid p81 25 Ibid p125 26 Ibid p2234 27 Ibid p216 28 O Seminário livro 5 As formações do inconsciente opcit p171 29 O Seminário livro 4 A relação de objeto opcit 30 O Seminário livro 17 O avesso da psicanálise 196970 texto estabele cido por JacquesAlain Miller Rio de Janeiro Jorge Zahar 1992 p114 31 Françoise Dolto revista Approches 40 1980 Seleta bibliográfica sobre o Édipo 149 Freud La naissance de la psychanalyse PUF 1979 p198 Projeto para uma psico logia científica in ESB vol1 LHérédité et létiologie des névroses in Névrose psychose et perversion PUF 12a ed 1997 p559 A hereditariedade e a etiologia das neu roses in ESB vol3 Nouvelles remarques sur les psychoses de défense in Névrose psychose et perversion PUF 12a ed 1997 p667 Novos comentários sobre as psiconeuroses de defesa in ESB vol3 LÉtiologie de lhistérie in Névrose psychose et perversion PUF 12a ed 1997 p1035 A etiologia da histeria in ESB vol3 Analyse dune phobie chez un petit garçon de cinq ans Le petit Hans in Cinq psichanalyses PUF 23a ed 1999 p172 1949 Análise de uma fobia em um menino de cinco anos in ESB vol10 Remarques sur un cas de névrose obsessionnelle LHomme aux rats in Cinq psichanalyses PUF 23a ed 1999 p2345 Notas sobre um caso de neurose obsessiva in ESB vol10 Les explications sexuelles données aux enfants in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p912 O esclarecimento sexual das crianças in ESB vol9 Les theories sexuelles infantiles in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p1427 Sobre as teorias sexuais das crianças in ESB vol9 Cinq leçons sur la psychanalyse Payot col Petite Bibliothèque Payot 1966 p547 Cinco lições de psicanálise in ESB vol11 150 Sobre o Édipo Un type particulier de choix dobjet chez lhomme in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p515 Um tipo especial de escolha de objeto feita pelos homens in ESB vol11 Sur le plus général des rabaissements de la vie amourese in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p57 64 Sobre a tendência universal à deprecia ção na esfera do amor in ESB vol11 Totem et tabou Payot col Petite Bibliothèque Payot 1965 p1929 21417 234 Totem e tabu ESB vol13 Extrait de lhistoire dune névrose infantile LHomme aux loups in Cinq psychanalyses PUF 23a ed 1999 p3901 418 Da história de uma neurose infantil in ESB vol 17 Le tabou de la virginité in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p758 O tabu da virgindade ESB vol11 Un enfant est battu in Névrose psychose et perversion PUF 12a ed 1997 p2289 2423 Uma criança é espancada in ESB vol17 Psychologie de masse et analyse du moi in Essais de psychanalyse Payot col Petite Bibliothèque Payot 1981 p1674 Psicologia das massas e análise do eu ESB vol18 Le moi et le ça in Essais de psychanalyse Payot col Petite Bibliothèque Payot 1981 p24052 26275 O eu e o isso in ESB vol19 LOrganisation génitale infantile in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p758 A organização genital infantil da libido in ESB vol19 La disparition du complexe dŒdipe in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p11722 A dissolução do complexo de Édipo in ESB vol19 Le problème économique du masochisme in Névrose psychose et perversion PUF 12a ed 1997 p2927 O problema econômico do masoquis mo in ESB vol19 Quelques conséquences psychologiques de la différence anatomique entre les sexes in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p12332 Algumas diferenças psíquicas das diferenças anatômicas entre os sexos in ESB vol19 Autoprésentation in Sigmund Freud présenté par luimême Gallimard 1984 p578 Um estudo autobiográfico in ESB vol20 151 Seleta bibliográfica sobre o Édipo Inhibition symptôme et angoisse PUF 1971 p1929 Inibição sintoma angústia in ESB vol20 Dostoievski et le parricide in Résultats idées problèmes II PUF 6a ed 1998 p1735 Dostoievski e o parricídio in ESB vol21 Le président Wilson Payot 1990 p77 7980 889 116 Thomas Woodrow Wilson um estudo psicológico Rio de Janeiro Graal 1984 Malaise dans la civilisation PUF 1989 p91 Malestar na civilização ESB vol21 Sur la sexualité féminine in La vie sexuelle PUF 13a ed 1996 p13953 A sexualidade feminina in ESB vol21 Lacan Os complexos familiares na formação do indivíduo in Outros escritos Rio de Janeiro Jorge Zahar 2003 p2990 O Seminário livro 3 As psicoses Rio de Janeiro Jorge Zahar 1983 p1957 O Seminário livro 4 A relação de objeto 195657 texto estabelecido por JacquesAlain Miller Rio de Janeiro Jorge Zahar 1995 O Seminário livro 5 As formações do inconsciente 195758 texto estabele cido por JacquesAlain Miller Rio de Janeiro Jorge Zahar p166 220 Le mythe individuel du névrosé in Ornicar 1979 n178 p289307 O Seminário livro 7 A ética da psicanálise Rio de Janeiro Jorge Zahar p33646 36572 O Seminário livro 17 O avesso da psicanálise Rio de Janeiro Jorge Zahar p10223 Escritos Rio de Janeiro Jorge Zahar 1998 p17989 2501 2789 3634 4623 5602 608 685703 83740 152 Sobre o Édipo Abraham K Œuvres completes tomos I e II Paris Payot 1965 Deleuze G e F Guattari LAntiŒdipe Paris Minuti 1971 O antiÉdipo Rio de Janeiro Imago 1976 esgotado Dolto F LÉvangile au risque de la psychanalyse tomo II Paris Seuil 1977 p716 LImage inconsciente du corps Paris Seuil 1984 p18699 A imagem inconsciente do corpo São Paulo Perspectiva 2001 Au jeu du désir Paris Seuil 1981 194244 No jogo do desejo São Paulo Ática 1996 Graves R Os mitos gregos São Paulo Madras 2004 Heimann P A contribution to the reevaluation of Œdipus complex The early stages Int J Psychoanal 1921 Jones E Théorie et pratique de la psychanalyse Paris Payot col DésirPayot 1997 coletânea em francês de artigos publicados entre 1910 e 1947 Klein M Early stages of the Œdipus conflict Int J Psychoanal 9 p167 80 e The Œdipus complex in the light of early anxieties Int J Psychoanal 26 p1133 Lampl de Groot J Reevaluation of the role of the Œdipus complex Int J Psychoanal 1952 The preœdipal phase in the development of the lame child Int J Psychoanal 1946 The evolution of Œdipus complex in women Int J Psychoan 1928 Laplanche J e JB Pontalis Vocabulário de psicanálise São Paulo Martins Fontes 2001 verbete Édipo complexo de Mijolla A de e S de Mijolla Mellor sob a direção de Psychanalyse Paris PUF 1996 p72 294 506 5212 Mullahy R Œdipe du mythe au complexe Paris Payot 1951 Nasio JD O conceito de castração O conceito de Falo e O con ceito de supereu in Lições sobre os 7 conceitos cruciais da psicanálise Rio de Janeiro Jorge Zahar 2001 p1330 3741 12945 Odier C Une névrose sans complexe dŒdipe Revue Française de Psychanalyse 1933 Ortigues MC e E Ortigues O Édipo africano São Paulo Escuta 1989 Rosolato G Du père in Études sur le symbolique Paris Gallimard 1970 153 Seleta bibliográfica sobre o Édipo Roudinesco E e M Plon Dicionário de psicanálise Rio de Janeiro Jorge Zahar verbete Édipo complexo de Rufo M Œdipe toimême Consultation dum pédopsychiatre Anne Carrière 2000 Sófocles Édipo rei in A trilogia tebana Rio de Janeiro Jorge Zahar 11a ed 2004 This B Pai o ato de nascimento Porto Alegre Artmed 1987 Índice geral Abertura 7 1 O Édipo do menino 19 No começo era o corpo de sensações erógenas 21 Os três desejos incestuosos 24 As três fantasias de prazer 27 As três fantasias de angústia de castração 32 Resolução do Édipo do menino a dessexualização dos pais 36 Comparado à mulher o homem é visceralmente um covarde 37 Os frutos do Édipo o supereu e a identidade sexual 40 Resumo da lógica do Édipo do menino 42 2 O Édipo da menina 45 Tempo préedipiano a menina é como um menino 47 Tempo da solidão a menina sentese sozinha e humilhada 50 A inveja ciumenta de deter o Falo 53 Tempo do Édipo a filha deseja o pai 54 Resolução do Édipo a mulher deseja um homem 56 A mais feminina das mulheres tem sempre o pai dentro de si 59 Resumo da lógica do Édipo da menina 62 3 Perguntas e respostas sobre o Édipo 65 4 O Édipo é a causa das neuroses ordinárias e mórbidas do homem e da mulher 91 A neurose ordinária e a neurose mórbida 93 A reativação do Édipo sob a forma da neurose feminina 98 Como escutar uma anoréxica através da teoria do Édipo 101 5 Arquipélago do Édipo 107 Não existe castração 109 As figuras do pai no Édipo masculino 110 As figuras da mãe no Édipo feminino 111 As figuras do Falo no Édipo feminino 111 O supereu e os três papéis do pai no Édipo masculino 112 A brincadeira de boneca 113 A fantasia da onipotência fálica 113 A fobia é uma projeção a histeria uma rebelião e a obsessão um deslocamento 114 A significação bissexual de um sintoma neurótico 117 Que é a histeria 117 A histeria sofrida por um adulto foi provocada por uma relação excessivamente sensual entre a criança que ele era e seus pais 118 A mulher histérica e seu medo de amar 121 As três figuras lacanianas do pai no Édipo simbólico real e imaginário 121 Os três tipos de falta no Édipo castração privação e frustração Uma leitura da tríade lacaniana 124 Quadro comparativo entre as posições masculina e feminina 126 6 Excertos das obras de Freud e Lacan sobre o Édipo precedidos de nossos comentários 129 Seleta bibliográfica sobre o Édipo 147 Índice geral 155 COMPLEXO DE ÉDIPO INTRODUÇÃO O complexo de Édipo ainda hoje permanece como um tópico central nas discussões sobre o desenvolvimento infantil especialmente quando consideramos as conexões entre a formação psíquica da criança e suas posteriores resoluções na adolescência e idade adulta Desde os primeiros trabalhos de Sigmund Freud o tema tem sido objeto de intensa análise tanto em um nível pessoal quando Freud 1996 confrontou sua própria condição edipiana quanto em um plano teórico mais amplo como evidenciado em seus Três ensaios sobre a sexualidade Freud 1996 concebe o complexo de Édipo como o momento em que o filho se sente atraído pela mãe e a filha pelo pai marcando o início das investigações sobre os movimentos do inconsciente No entanto perspectivas divergentes como a de Melanie Klein conforme discutido por Segal 1975 oferecem nuances diferentes sugerindo que esse processo começa em uma idade ainda mais precoce do que proposto por Freud 1996 Atualmente o conceito de complexo de Édipo passou por revisões e refinamentos mantendose relevante mas evitando simplificações teóricas No livro Édipo O complexo do qual nenhuma criança escapa Juan David Nasio aborda de forma didática os aspectos deste fenômeno psíquico Nasio um palestrante e clínico aborda este conceito tanto na psique masculina quanto na feminina O ponto central da obra reside na análise do papel do Édipo na gênese das neuroses comuns e patológicas tanto em homens quanto em mulheres Nasio 2007 explora temas essenciais como a castração o simbolismo do Falo e a influência do pai nesse processo de desenvolvimento psicossexual Nasio 2007 adota uma abordagem clara e objetiva pontuando suas exposições com seções curtas esquemas e quadros comparativos para facilitar a compreensão do leitor Além disso a obra apresenta citaçõeschave de Freud e Lacan enriquecendo ainda mais o debate em torno do Complexo de Édipo Ao longo dos capítulos Nasio 2007 distingue as experiências do menino e da menina durante o desenvolvimento do Complexo destacando as fantasias desejos e angústias peculiares a cada gênero O livro também aborda a reativação do Édipo em diferentes fases da vida como na puberdade e na idade adulta manifestandose como pudor excessivo revolta e neuroses diversas Nasio 2007 destaca a importância do tratamento analítico na abordagem das questões relacionadas ao Complexo de Édipo enfatizando a necessidade de reconstruir as fantasias infantis e auxiliar o paciente na elaboração de seus conflitos Ao final Nasio 2007 destaca a inevitabilidade do Complexo de Édipo e sua influência decisiva na estruturação do sujeito deixando marcas profundas que se manifestam em traços neuróticos ao longo da vida adulta O livro se destaca como uma importante contribuição para estudantes e profissionais da psicanálise oferecendo uma análise das vicissitudes deste complexo tão fundamental para a compreensão da psique humana Nasio 2007 se preocupa em evitar uma visão estática do complexo freudiano enfatizando que o Édipo não é apenas uma narrativa de amor e ódio entre pais e filhos mas sim uma história de desejo fantasia e prazer corporal Isso nos leva a indagar como as crianças resolvem o complexo de Édipo e lidam com as fantasias desejos e angústias associadas a ele ao longo de seu desenvolvimento até a idade adulta Nesse sentido para explorar essa questão foi realizado uma revisão bibliográfica sobre o tema consultando livros artigos dissertações e teses em bibliotecas físicas e virtuais bem como as produções das principais associações psicanalíticas do Brasil Nosso objetivo foi compreender mais profundamente um tema que impacta nossas vidas e explorar sua relação com o inconsciente DESENVOLVIMENTO Na época em que Freud estava emergindo com suas ideias revolucionárias a ciência estava apenas começando a explorar os recessos mais profundos da psique humana Questões que antes nem mesmo eram claras por estarem enterradas no inconsciente começaram a receber atenção influenciando significativamente o desenvolvimento psicológico dos indivíduos Através de suas descobertas Freud desenvolveu técnicas para lidar com casos que o intrigravam profundamente Especificamente ele se aventurou na hipnose uma ferramenta que lhe permitia penetrar no inconsciente dos pacientes e desvendar os enigmas de suas mentes PERA CORREA 2015 Por um longo período Freud recorreu à hipnose como retratado no filme Freud além da alma onde uma cena emblemática revela um jovem expressando impulsos sexuais em relação à mãe durante uma sessão hipnótica ao mesmo tempo em que demonstra sentimentos de proteção em relação a ela enquanto direciona sua negatividade e raiva ao pai Diante dessa situação Freud se viu confrontado com seu próprio inconsciente Durante o sono ele teve sonhos relacionados ao caso do jovem mas esses sonhos se desenrolaram com personagens de sua própria vida Ele projetou memórias de sua infância conectandoas aos eventos atuais Na psicanálise isso é conhecido como contratransferência onde o analista se vê fortemente influenciado pelos sentimentos e situações do paciente tendo que lidar consigo mesmo como foi o caso de Freud Em um desses sonhos Freud se viu escalando um penhasco segurando uma corda que o ligava à sua mãe Ao chegar ao topo viu sua mãe em um trono cercada de afeto mas antes que pudesse se aproximar seu pai cortou a corda fazendo Freud cair do penhasco e acordar do sonho Essa cena onírica foi cuidadosamente analisada pelo autor que conseguiu recuperar memórias de sua infância que ressoavam com os símbolos presentes no sonho Essas experiências o levaram a escrever sua obraprima fundadora da psicanálise A interpretação dos sonhos explorando os estudos sobre o mundo onírico e suas conexões com a vida desperta É evidente a determinação de Freud 2001 em explorar as possibilidades que se apresentavam criando hipóteses que conectavam os sonhos com suas próprias memórias de infância desvendando assim os primeiros passos que o levariam à teoria primordial do Complexo de Édipo A mitologia oferece uma representação vívida do conceito trazendo à tona paralelos intrigantes com os temas explorados nos sonhos de Freud Contudo a relação entre mito e psicanálise é frequentemente objeto de questionamentos quanto à veracidade dos eventos associados e à sua tradução em conceitos psicanalíticos Azevedo 2004 discute a dicotomia entre mito e verdade destacando a crítica de Platão às narrativas mitológicas como fictícias e prejudiciais em contraste com a busca pela verdade na filosofia Ele sugere que a psicanálise desde seu início questiona essa oposição intrigada pelo fascínio que os mitos exercem apesar das controvérsias em relação à sua veracidade A reflexão de Azevedo 2004 evidencia a desconfiança em relação às fontes mitológicas por parte daqueles influenciados pela filosofia clássica que rejeitavam os mitos por considerálos fictícios e fantasiosos A psicanálise não encara os mitos como eventos concretos mas sim como narrativas que refletem aspectos da realidade humana servindo como instrumento para ilustrar situações contextos e dinâmicas psicológicas No caso do Complexo de Édipo a mitologia oferece uma representação simbólica do inconsciente que foi analisada por Freud É possível que ele tenha se inspirado no mito ao trabalhar com pacientes utilizandoo como uma metáfora poderosa para compreender os conflitos e desejos subjacentes No entendimento de Násio 2007b p 10 a fantasia é descrita como um um teatro mental catártico que encena a satisfação do desejo e descarrega sua tensão Nesse contexto a criança no estágio do complexo de Édipo elabora hipóteses sobre sentimentos inexplicáveis que experimenta recorrendo à imaginação para lidar com eles Assim como a mitologia atua na vida adulta a fantasia tem importância na infância servindo como meio de resolver desafios cotidianos e de experimentar papéis de superheróis e personagens mágicos Essa capacidade de imaginação ajuda as crianças a superarem obstáculos e a preservarem sua inocência enquanto se desenvolvem Násio 2007 descreve a fantasia como uma breve cena dramática quase imperceptível pela consciência mas que causa impacto emocional Ela pode ser acionada para lidar com desejos sexuais ou agressivos influenciando nossas emoções sem que estejamos conscientes disso Na infância repleta de novidades as histórias e contos ajudando as crianças a lidarem com suas experiências e conflitos internos Elas se identificam com as histórias que refletem suas próprias questões como as confusões causadas pelo complexo de Édipo ou as dificuldades familiares Tanto Násio 2007 quanto Klein 1975 destacam a relação entre fantasias e o princípio do prazersofrimento na infância No entanto muitas pessoas alheias ao campo psicanalítico se surpreendem ao falar sobre o desenvolvimento da sexualidade infantil alimentando preconceitos e tabus sociais religiosos e éticos A teoria freudiana que destaca a atração dos meninos pela mãe e das meninas pelo pai muitas vezes é mal interpretada ou rejeitada por esses preconceitos arraigados na sociedade Nesse contexto o Édipo surge como uma novidade na vida da criança É um período marcado por desejos intensos direcionados principalmente aos pais Esse desejo incestuoso é fantasioso representado pela figura do falo que detém todo o poder na imaginação infantil A descoberta da genitália marca uma fase de intensos sentimentos de prazer e sofrimento especialmente quando o menino confirma ter o poder fálico enquanto a menina se sente lesada por não possuílo SOUZA 2006 A fantasia da criança conforme descrita por Násio 2007 é uma representação simbólica de desejos e anseios muitas vezes incompreendidos pelos adultos Enquanto os desejos infantis se realizam na imaginação os adultos os concretizam fisicamente embora os desejos verdadeiros possam ser muito diferentes A fantasia do Édipo embora fantasiosa tem raízes profundas na psique infantil influenciando seu desenvolvimento emocional e sexual É importante reconhecer que na atualidade os novos formatos familiares podem influenciar significativamente no desenvolvimento da sexualidade infantil A ausência dos genitores biológicos pode levar as crianças a projetarem seus desejos e fantasias em terceiros como professores ou figuras de autoridade Como educadores é fundamental estarmos cientes dessas dinâmicas para lidar com sensibilidade e compreensão com as questões que surgem em sala de aula durante o período do Complexo de Édipo PERA CORREA 2015 CONSIDERAÇÕES FINAIS O Complexo de Édipo é marcada por fantasias medos e angústias que moldam a formação psíquica da criança Essa experiência não apenas influencia a sexualidade mas também estabelece padrões para a personalidade adulta por meio das definições objetais identificações e projeções A pesquisa nos leva a refletir sobre os tabus sociais e sexuais enfrentados diariamente destacando a necessidade de reconhecermos que o desenvolvimento da sexualidade humana começa na infância sem que isso comprometa a inocência e pureza das crianças REFERÊNCIAS AZEVEDO Ana Alves Mito e Psicanálise Rio de Janeiro Zahar 2004 FREUD Sigmund A Interpretação dos Sonhos Rio de Janeiro Imago 2001 FREUD Sigmund Um caso de histeria Três ensaios sobre a sexualidade e outros trabalhos Rio de Janeiro Imago 1996 NÁSIO JuanDavid A Fantasia O prazer de ler Lacan Rio de Janeiro Zahar 2007 NÁSIO JuanDavid Édipo o complexo do qual nenhuma criança escapa Rio de Janeiro Zahar 2007 PERA Rubens Alberto CORREA João Jorge O Complexo de Édipo no Contexto da Psicanálise Revista Pleiade v 9 n 18 p 2331 2015 SOUZA Mauricio Rodrigues de A psicanálise e o complexo de Édiponovas observações a partir de Hamlet Psicologia USP v 17 p 135155 2006 SEGAL Hanna Introdução à obra de Melanie Klein Rio de Janeiro Imago 1975 SÓFOCLES Édipo ReiAntígona 2ª Revisão ed São Paulo Martin Claret 2014