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58 Unidade II Unidade II 5 O ANTIRRACISMO NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA É comum no Brasil nos orgulharmos de nossas leis como sendo as mais modernas e avançadas do mundo Temos uma das constituições mais progressistas e igualitárias do planeta Promulgamos estatutos específicos de proteção a várias minorias crianças e adolescentes com o Estatuto da Criança e do Adolescente ECA o Estatuto da Pessoa Idosa Estatuto do Índio Estatuto da Igualdade Racial e a Lei Maria da Penha que combate a violência contra as mulheres Esses são exemplos de que em termos de legislação o Brasil possui um referencial de primeiro mundo O grande problema é que entre nós as leis têm uma característica diversa da dos países desenvolvidos se na Europa e nos Estados Unidos as leis sempre refletiram as demandas e aspirações sociais tornandose leis apenas para tornar de direito uma igualdade que já existia de fato em terras brasileiras deuse sempre o contrário as leis são criadas por uma elite política baseadas em interesses econômicos dessa mesma elite e nada têm de correspondência com a vida cotidiana Para que fique claro o que estamos argumentando pense nas seguintes situações por que seria necessária uma lei proibindo e punindo a discriminação racial por que temos um estatuto que obriga o Estado e a sociedade a garantirem às crianças e adolescentes direitos fundamentais como educação alimentação e lazer por que precisamos de uma lei que trate especificamente da violência contra pessoas idosas e mulheres Infelizmente as respostas a essas perguntas são desoladoras precisamos de leis que punam atitudes racistas porque o racismo está presente em nosso cotidiano de maneira dissimulada mas evidente as crianças precisam de um estatuto porque lhes são negados no Brasil seus direitos mais fundamentais como educação alimentação e o direito a brincar pessoas idosas e mulheres precisam da proteção da lei no Brasil porque são sistematicamente violentadas em números alarmantes todos os dias Conclusão o que nossas leis tentam fazer é corrigir uma realidade desigual violenta e injusta de maneira artificial como se a força da lei fosse suficiente para mudar comportamentos e mentalidades o que de fato não acontece Ao contrário sabemos que infelizmente no Brasil poucas pessoas são de 59 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA fato condenadas e punidas por crimes de racismo maustratos a pessoas idosas e crianças violência contra mulheres e indígenas apenas para mencionar alguns exemplos Exemplo de aplicação Você saberia contar algum episódio em que uma determinada lei apesar de estar no papel tenha sido descumprida em favor de grupos privilegiados Reflita sobre as possíveis explicações para fatos como esse Entretanto vivemos num país democrático e para mudar nossa realidade por mais complexa que seja precisamos sem dúvida de leis que amparem essas minorias fortalecendo assim os movimentos sociais na garantia de proteção e equidade de direitos e oportunidades No caso das relações étnicoraciais que nos interessam nesta disciplina precisamos de uma legislação antirracista que ajude a coibir atitudes discriminatórias e sirva de base para uma ampla discussão popular capaz de transformar comportamentos e mentalidades por mais profundas que sejam suas raízes e as resistências enfrentadas Leis para isso nós já temos e vamos conhecêlas agora Restanos como educadores encontrar as melhores estratégias para colocálas em prática e assim promovermos as mudanças sociais necessárias assunto que abordaremos na unidade III 51 A Carta Maior a Constituição Brasileira de 1988 No dia 5 de outubro de 1988 foi promulgada a Constituição da República Federativa do Brasil com um amplo processo de mobilização popular resultado da abertura democrática vivida a partir de 1985 que colocou fim aos vinte anos de ditadura militar no Brasil Figura 20 Disponível em httpsl1nqcommZEZt Acesso em 15 ago 2023 60 Unidade II É nessa Constituição que a prática de racismo passa a ser considerada crime segundo o seguinte artigo Brasil 1988 Art 5º XLII A prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível sujeito a pena de reclusão nos termos da lei Perceba que segundo o texto tratase de um crime que não é passível de fiança ou seja só pode ser punido por prisão além disso não prescreve quer dizer pode ser punido mesmo depois de passados muitos anos do ocorrido Isso sem dúvida foi um importante instrumento para a ampliação do alcance das ações até então desenvolvidas pelo movimento negro A esse respeito observam De Paula e Heringer 2009 p 9 A partir dos anos 1990 observouse a emergência de novos atores na luta antirracista Começam a se constituir nas favelas e periferias urbanas brasileiras grupos de jovens ligados a iniciativas de cultura e arte com um discurso de enfrentamento da violência afirmação de pertencimento a esses territórios e um indiscutível orgulho racial marca importante de suas mensagens à sociedade Para que se compreenda a profundidade dessa citação e a enorme importância que a Constituição teve na luta antirracista na ampliação do enfrentamento da violência e na afirmação do orgulho racial leia também a afirmação de Guimarães 2009 p 61 Apenas para os afrobrasileiros para aqueles que se chamam a si mesmos de negros o antirracismo deve significar antes de tudo a admissão de sua raça isto é a percepção racializada de si mesmo e do outro A partir desse momento o movimento negro se fortalecia no Brasil principalmente por sua autovalorização sua percepção racializada de si mesmo e do outro de suas raízes africanas suas influências latinoamericanas sua cultura e religião sua música e sua arte sua história e heranças deixadas A partir disso a promulgação de outras legislações específicas foi um passo rápido sobre o qual comenta Silva Após a criminalização de práticas racistas pela Constituição Federal de 1988 foi promulgada a Lei 771689 que trata dos crimes resultantes de preconceito de raça ou cor Esta lei foi posteriormente modificada em alguns artigos contidos na Lei 945997 A injúria qualificada também foi tipificada especificamente no art 140 3º do Código Penal Brasileiro Devemos salientar que o Brasil foi o primeiro país em todo o continente americano a regular práticas racistas através de legislação específica Silva 2004 O que esse autor confirma é que de fato somos um país com leis avançadas em relação a nossos vizinhos latinoamericanos Além dessas mudanças no Código Penal de 1940 tínhamos agora uma legislação específica qualificando e punindo a prática de racismo Vejamos segundo Guimarães 2004 p 19 quais são os significados de racismo cobertos pela legislação brasileira atual 61 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA a o preconceito racial expresso verbalmente através de ofensas pessoais b a discriminação racial ou seja o tratamento desigual de pessoas nos mais diversos âmbitos da vida social baseado na ideia de raça restringindo o seu amplo e líquido direito constitucional e legal à isonomia de tratamento c a expressão doutrinária do racismo ou a incitação pública do preconceito Um aspecto fica claro e ainda incomoda nessa citação toda forma de racismo manifesto publicamente merece nos termos da lei a devida punição entretanto as ações de racismo praticadas no âmbito privado não podem ser enquadradas na lei vigente Isso nos leva mais uma vez à reflexão acerca da necessidade de ações educativas na transformação das relações étnicoraciais no Brasil Exemplo de aplicação Você já presenciou algum episódio de demonstração de racismo Como se deu a situação em local público ou privado Você acha que seria possível registrar formalmente tal episódio De que maneira O que seria preciso fazer ou providenciar Percebeu como é longo o caminho entre a lei os fatos da realidade e o cumprimento da lei 52 Estatutos específicos o ECA e o Estatuto da Igualdade Racial O Brasil tem entre suas legislações uma série de estatutos específicos que visam a proteger grupos de minorias bem como a promover sua inclusão social e a garantia de acesso a direitos fundamentais desses cidadãos Segundo o Portal Brasil um estatuto é um regulamento ou código com significado e valor de lei ou de norma É o caso por exemplo do Estatuto da Pessoa Idosa do Estatuto do Índio do ECA e do Estatuto da Igualdade Racial Neste tópico trataremos desses dois últimos que mostram relação com nossa disciplina 521 Estatuto da Criança e do Adolescente Lei 806990 Após a promulgação da nova Constituição Brasileira em 1988 esta foi a legislação mais importante para crianças e adolescentes no Brasil e que trouxe reflexos também sobre as políticas de assistência social e educacionais a partir de então Sobre a questão étnicoracial o único artigo que faz alusão à discriminação é o seguinte Brasil 1990 Art 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência discriminação exploração violência crueldade e opressão punido na forma da lei qualquer atentado por ação ou omissão aos seus direitos fundamentais Dessa forma pela primeira vez crianças e adolescentes passam a ser tratados como cidadãos de direitos fruto de um intenso debate internacional em voga nas últimas décadas conforme indicam as autoras Lima e Veronese 2009 p 78 62 Unidade II Diversos instrumentos internacionais são representativos da luta por melhores condições de vida e proteção aos direitos da população infantojuvenil É oportuno registrar que além de dar uma atenção especial aos direitos de crianças e adolescentes as normativas internacionais também têm em comum a preocupação com a não discriminação fundada na raça sexo origem cor e reconhece os seres humanos como livres e iguais em atenção ao princípio da dignidade da pessoa humana A respeito dos instrumentos internacionais de que tratam elas afirmam Lima Veronese 2009 p 23 Entre os instrumentos normativos internacionais destacamos a Declaração de Genebra de 1924 a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948 a Declaração dos Direitos da Criança de 1959 ONU e a Convenção Internacional dos Direitos da Criança 1989 ONU Importante pontuar que a Declaração Universal dos Direitos Humanos aprovada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas ONU em 1948 é representativa do avanço nos direitos e liberdades individuais do ser humano e no reconhecimento do princípio da dignidade da pessoa humana reconhecendo que todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos independente de sua raça ou cor arts 1º e 2º Não restam dúvidas de que as ideias desses instrumentos internacionais influenciaram também um semnúmero de debates no Brasil principalmente entre juristas educadores sociólogos e outros profissionais interessados na questão da infância e da adolescência Podemos afirmar que há estreita relação entre o ECA aprovado em 1990 e a nova Lei de Diretrizes e Bases LDB que seria aprovada em 1996 Nesse sentido os debates desencadeados por influência do ECA acabaram norteando as diretrizes adotadas pelas políticas educacionais brasileiras a partir de então conforme veremos nas próximas páginas 522 Estatuto da Igualdade Racial Lei 122882010 Em maio de 2003 o Senador Paulo Paim PTRS apresentou o projeto de lei no Senado que instituía o Estatuto da Igualdade Racial Desde então o projeto tramitou na Câmara e no Senado até ser finalmente aprovado com emendas no dia 20 de julho de 2010 validando por meio da Lei 12288 o Estatuto da Igualdade Racial O documento versa sobre os principais direitos garantidos à população afrodescendente no Brasil bem como busca combater toda forma de discriminação e intolerância étnica 63 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA Figura 21 Disponível em httpsl1nqcomDyOr1 Acesso em 15 ago 2023 O estatuto já em seu artigo 1º faz alusão aos principais focos desta lei a saber a combater a discriminação racial ou étnicoracial b promover a igualdade racial nos campos político econômico social cultural e outros da vida pública ou privada c combater as assimetrias de gênero e raça dando condições de inclusão às mulheres negras d valorizar a autodefinição de cor ou raça às pessoas que se autodeclararem pretas e pardas conforme critérios definidos pelo IBGE e abrir caminhos para a implantação de políticas públicas adotadas pelo Estado com o objetivo da promoção da igualdade racial f incentivar as ações afirmativas adotadas pelo Estado ou pela iniciativa privada para a promoção da igualdade de oportunidades Essas definições iniciais se estendem até o artigo 5º quando o estatuto passa a definir capítulos específicos para cada direito fundamental a ser defendido saúde educação cultura esporte e lazer liberdade de consciência e de crença livre exercício dos cultos religiosos acesso à terra e à moradia adequada direito ao trabalho e valorização da herança cultural da população negra na história do país pelos meios de comunicação Por fim institui o Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial Sinapir um órgão criado para organizar e articular as estratégias para implantação do conjunto de políticas e serviços destinados a superar as desigualdades étnicas existentes no país prestados pelo poder público federal segundo seu artigo 47 Brasil 2010 entre eles a implantação de ouvidorias permanentes em defesa da igualdade racial e o investimento em financiamentos de iniciativas de promoção de igualdade racial Segundo o portal de notícias do Senado Brasil 2010b podemos destacar da seguinte forma os principais pontos deste estatuto 64 Unidade II Entre outros pontos o projeto de Paim institui pena de até três anos para quem praticar racismo pela internet incentiva a contratação de negros pelas empresas e reconhece a capoeira como esporte Resultado de mais de seis anos de discussão no Congresso o texto aprovado na Câmara faz mudanças substanciais no projeto original Reduz de 30 para 10 a proporção de candidatos negros que os partidos devem ter nas eleições atualmente só há reserva para mulheres retira a obrigatoriedade de reserva nos estabelecimentos públicos de vagas para alunos negros vindos de escolas públicas na mesma proporção dessa etnia na população e suprime a indicação igualdade do dispositivo que trata da contratação de atores negros em produções artísticas Observação Perceba que entre os pontos destacados o mais polêmico está na política de cotas nas universidades públicas cuja obrigatoriedade foi retirada do texto final da lei Conforme já havíamos discutido na unidade anterior há muito debate em torno da questão das cotas raciais e até mesmo dentro do movimento negro há grupos favoráveis e contrários às cotas para negros nas universidades como parte dos critérios de seleção de candidatos nos vestibulares talvez razão pela qual esse artigo tenha sido retirado da versão final do documento Esperamos que o aluno já tenha feito suas análises a respeito e seja capaz de argumentar com propriedade sobre os prós e contras dessa ação afirmativa 53 Leis e diretrizes educacionais Já fizemos alusão à influência que o ECA teve nos debates educacionais a partir de sua publicação em 1990 A questão étnica também passou a ocupar importante espaço na legislação brasileira como vimos no tópico anterior chegando à instituição do Estatuto da Igualdade Racial em 2010 vinte anos depois Assim é importante verificar neste tópico sobre a legislação e o antirracismo no Brasil que os processos sociais de conquistas de direitos são lentos graduais e integrados isto é uma demanda social não surge de um momento para o outro repentinamente ao contrário é fruto de um amplo e longo debate entre grupos e movimentos que se unem em defesa de seus interesses Lembrete Vale também destacar que a igualdade racial não pode ser encarada como uma necessidade apenas do movimento negro mas de todos os brasileiros que buscam encontrar suas verdadeiras raízes históricas e culturais e querem viver numa sociedade mais justa e igualitária 65 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA 531 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDB Lei 939496 O Brasil tem uma das legislações mais modernas do mundo no que diz respeito às suas diretrizes para a educação Em 1996 foi aprovada a Lei 9394 que ficou mais conhecida como nova LDB Este é sem dúvida um documento importantíssimo para a população negra no Brasil pois fornece pressupostos importantes para a ampliação do debate sobre relações étnicoraciais e afrodescendência Veja o que diz o seu artigo 26º Brasil 1996 O ensino de História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro especialmente das matrizes indígena africana e europeia Figura 22 Disponível em httpsl1nqcomxC3eZ Acesso em 15 ago 2023 Portanto aqui está o início do debate que preparou o terreno para a aprovação da Lei 106392003 dando mais um passo para a afirmação reconhecimento e valorização dos negros no quadro da diversidade da cultura brasileira Exemplo de aplicação Após a leitura do trecho dessa lei qual seria na sua opinião o papel dos professores nesse processo de mudança no sistema educacional brasileiro 66 Unidade II 532 Lei 106392003 e Lei 116452008 No dia 9 de janeiro de 2003 foi sancionada a Lei 10639 que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 e inclui no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afrobrasileira Apesar de imprescindível e de extrema relevância esta é uma lei de enunciado bastante breve que vem acrescentar à LDB somente os artigos 26A 79A e 79B reproduzidos a seguir Brasil 2003 Art 26A Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio oficiais e particulares tornase obrigatório o ensino sobre História e Cultura AfroBrasileira 1º O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos a luta dos negros no Brasil a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social econômica e política pertinentes à História do Brasil 2º Os conteúdos referentes à História e Cultura AfroBrasileira serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras 3º Vetado Art 79A Vetado Art 79B O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como Dia Nacional da Consciência Negra Em poucas linhas essa legislação consegue chamar a atenção das autoridades educadores e da sociedade para a importância da inclusão no currículo escolar da perspectiva étnicoracial instituindo inclusive o dia 20 de novembro como o Dia da Consciência Negra Alguns anos depois em 10 de março de 2008 foi aprovada a Lei 11645 que modifica o texto da Lei 106392003 e inclui no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura AfroBrasileira e Indígena passando a vigorar a seguinte redação Art 26A Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio públicos e privados tornase obrigatório o estudo da História e Cultura Afrobrasileira e Indígena 1º O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação da população 67 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA brasileira a partir desses dois grupos étnicos tais como o estudo da história da África e dos africanos a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o índio na formação da sociedade nacional resgatando as suas contribuições nas áreas social econômica e política pertinentes à história do Brasil 2º Os conteúdos referentes à História e Cultura Afrobrasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras Observação Não se esqueça que esta é a lei que determinou o estudo da disciplina Relações ÉtnicoRaciais e Afrodescendência Uma vez obrigatório o ensino da história e cultura afrobrasileira fazse necessária a formação dos professores para as transformações necessárias às práticas educativas e pedagógicas Por isso continue se aprofundando no estudo dessa temática Para incentivar e promover a implantação dessa lei no sistema de ensino brasileiro o Ministério da Educação MEC publicou no Diário Oficial da União no dia 19 de maio de 2004 as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnicoraciais e para o Ensino de História e Cultura AfroBrasileira e Africana Esse é um documento que como o próprio nome diz traz todas as diretrizes para que a Lei 106392003 possa ser finalmente colocada em prática É sobre esse parecer que trataremos a seguir 533 Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das relações étnicoraciais e para o ensino de história e cultura afrobrasileira e africana de 2004 Parecer CNE 0032004 Esse parecer é um documento que todo educador deveria conhecer na íntegra e estudar seu conteúdo a fundo pois seu texto é claro e eficaz no estímulo ao reconhecimento da importância de promovermos ações para a igualdade racial Como não é possível reproduzilo por inteiro selecionamos dois trechos que nos dão uma ideia bastante clara sobre seus propósitos O primeiro traz uma apresentação do público ao qual o texto se dirige Brasil 2004 p 2 Destinase o parecer aos administradores dos sistemas de ensino de mantenedoras de estabelecimentos de ensino aos estabelecimentos de ensino seus professores e a todos implicados na elaboração execução avaliação de programas de interesse educacional de planos institucionais pedagógicos e de ensino Destinase também às famílias dos estudantes a eles próprios e a todos os cidadãos comprometidos com a educação dos brasileiros para nele buscarem orientações quando pretenderem dialogar com os sistemas de ensino escolas e educadores no que diz respeito às relações étnicoraciais ao reconhecimento e valorização da história e 68 Unidade II cultura dos afrobrasileiros à diversidade da nação brasileira ao igual direito à educação de qualidade isto é não apenas direito ao estudo mas também à formação para a cidadania responsável pela construção de uma sociedade justa e democrática De acordo com o que temos defendido essas diretrizes interessam não somente ao poder público ou aos educadores e gestores educacionais mas a todo cidadão brasileiro que de alguma forma esteja interessado em uma educação de qualidade para todos No segundo trecho que escolhemos para demonstrar um pouco do conteúdo do parecer vemos claramente a importância que a Lei 106392003 assume no contexto de construção de uma sociedade igualitária e verdadeiramente democrática Brasil 2004 p 2 O parecer procura oferecer uma resposta entre outras na área da educação à demanda da população afrodescendente no sentido de políticas de ações afirmativas isto é de políticas de reparações e de reconhecimento e valorização de sua história cultura identidade Trata ele de política curricular fundada em dimensões históricas sociais antropológicas oriundas da realidade brasileira e busca combater o racismo e as discriminações que atingem particularmente os negros Nesta perspectiva propõe a divulgação e produção de conhecimentos a formação de atitudes posturas e valores que eduquem cidadãos orgulhosos de seu pertencimento étnicoracial descendentes de africanos povos indígenas descendentes de europeus de asiáticos para interagirem na construção de uma nação democrática em que todos igualmente tenham seus direitos garantidos e sua identidade valorizada A grande contribuição desse parecer foi portanto identificar as contribuições da Lei 10639 para o reconhecimento e a valorização da diversidade étnicoracial brasileira passo fundamental para uma sociedade de fato igualitária e livre do racismo Mas passados seis anos podemos afirmar que pouca coisa avançou na direção de colocar em prática o que determina a Lei 106392003 ou seja poucas escolas de fato incluíram em seus currículos a temática da História e Cultura AfroBrasileira e Africana Por isso mais uma vez o Ministério da Educação MEC juntamente com a Subsecretaria de Políticas de Ações Afirmativas da Seppir SubAA tomou a iniciativa de publicar em 13 de maio de 2009 o Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnicoraciais e para o Ensino de História e Cultura Afrobrasileira e Africana Esse é um documento que detalha cada uma das responsabilidades dos poderes públicos seja no âmbito federal estadual ou municipal além de enfatizar três problemáticas principais em relação à implantação da Lei 106392003 a formação dos professores para o trabalho em sala de aula na perspectiva das relações étnicoraciais a produção de material didático adequado que desfaça os estereótipos de raçacorgênero e a sensibilização de todos os agentes envolvidos nesse processo para um compromisso efetivo com a implantação da igualdade racial na escola e em nosso país 69 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA Ainda em complemento a essa lei foi promulgada em 10 de março de 2008 a Lei 11645 que insere no texto anterior também a matriz indígena estabelecendo portanto que os conteúdos referentes à história e cultura afrobrasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo currículo escolar em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras No presente livrotexto e no âmbito da disciplina Relações ÉtnicoRaciais e Afrodescendência reconhecemos a importância do estudo da cultura dos povos indígenas brasileiros mas por uma questão de limitação de tempo serão focadas primordialmente as questões raciais em relação à população afrodescendente Saiba mais Sabemos da importância de conhecermos nossas leis e diretrizes educacionais a fim de ampliarmos nossa compreensão a respeito de nossa prática educativa bem como de nosso papel no processo de promoção da igualdade racial Nesse sentido sugerimos que seja feita uma pesquisa e que se consulte na íntegra alguns desses materiais com os quais acabamos de trabalhar Procure estudar as legislações que você ainda não teve oportunidade em outras disciplinas isto é aquelas que tratam especificamente das relações étnicoraciais como o Estatuto da Igualdade Racial e a Lei 106392003 por exemplo Consulte os links BRASIL Lei n 10639 de 9 de janeiro de 2003 Ministério da Educação e Cultura Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial Disponível em httpsl1nkdev9PKcy Acesso em 14 ago 2023 Brasil Lei n 12288 de 20 de julho de 2010 Estatuto da Igualdade Racial Disponível em httpsl1nkdev6NlXx Acesso em 14 ago 2023 BRASIL Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações ÉtnicoRaciais e para o Ensino de História e Cultura AfroBrasileira e Africana Brasília mar 2004 Disponível em httpsacesseoneSQFcp Acesso em 14 ago 2023 6 AFRICANIDADES BRASILEIRAS E ALGUNS ASPECTOS DA HISTÓRIA AFRICANA DOS NEGROS NO BRASIL Começaremos trabalhando o conceito de africanidades brasileiras com sua especificidade e paradigma Em seguida faremos uma abordagem histórica fundamental para compreendermos a inserção dos negros africanos no processo de colonização brasileira as raízes de nossa construção nacional e os fundamentos de nosso racismo velado 70 Unidade II Figura 23 Disponível em httpsury1comVRQFq Acesso em 15 ago 2023 Em primeiro lugar cabenos definir o conceito de africanidades brasileiras Tratase de um processo de valorização e resgate da história e cultura africana e afrobrasileira a fim de desfazer os estereótipos raciais construídos pelos grupos dominantes brancos homens proprietários livres e ricos Assim podemos dizer que esse é um paradigma que considera a perspectiva dos negros brasileiros na formação da cultura e da sociedade brasileira Significa enxergar o mundo através de uma lente sob a perspectiva dos afrodescendentes segundo define Silva 2003 p 26 A expressão africanidades brasileiras referese às raízes da cultura brasileira que têm origem africana Dizendo de outra forma queremos nos reportar ao modo de ser de viver de organizar suas lutas próprio dos negros brasileiros e de outro lado às marcas da cultura africana que independentemente da origem étnica de cada brasileiro fazem parte do seu diaadia Então estudar africanidades brasileiras significa estudar um jeito de ver a vida o mundo o trabalho de conviver e lutar por sua dignidade próprio dos descendentes de africanos que ao participar da construção da nação brasileira vão deixando nos outros grupos étnicos com que convivem suas influências e ao mesmo tempo recebem e incorporam as daqueles A partir dessas concepções é mister que façamos essa reconstrução histórica por meio de uma perspectiva diferente daquela que temos utilizado em nossas escolas durante tanto tempo Uma perspectiva que reconheça a grande participação dos africanos na formação do Brasil que os apresente não apenas em sua condição de escravizados mas como personagens participantes da construção histórica que com suas culturas línguas formas de organização e economia participaram expressivamente da construção disso que somos hoje 71 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA 61 Pegando o fio da história a África antes de 1500 Aproveitando a expressão o fio da história presente no livro de Cunha Júnior 2010 pretendemos neste tópico chamar a atenção para a História da África antes da chegada dos portugueses à América Isso porque fomos ensinados a pensar a partir de uma série de concepções bastante deturpadas ou incompletas sobre o continente africano e sua população concepções essas em geral propagadas pelo pensamento conservador responsável em grande medida pela formulação do chamado racismo científico Cunha 2010 p 10 Esta indução errônea tem motivos e consequências e elas despolitizam a população negra tornam as identidades negras fragilizadas e permitem a realização de uma ampla desqualificação social das populações negras As ideias permitem a prática da produção de uma hierarquia social na qual nada produzido pela população negra parece ter importância tudo que é produzido pela população branca é bom e necessário É nesse sentido que toda a História da África passou a ser sistematicamente distorcida esquecida ou menosprezada nos livros de História e assim foi transmitida a nós e aos nossos alunos há tantas gerações Vamos começar a rever um pouco tudo isso primeiramente com um trecho de Salum 2005 Para compreendermos a cultura material das sociedades africanas a primeira questão que se impõe é a imagem que até hoje perdura da África como se até sua descoberta fosse esse continente perdido na obscuridade dos primórdios da civilização em plena barbárie numa luta entre Homem e Natureza De fato a história dos povos africanos é a mesma de toda humanidade a da sobrevivência material mas também espiritual intelectual e artística A impressão que temos a partir do que estudamos em nossa vida escolar é de que a África antes do início da exploração portuguesa era um território perdido no mapa com povos primitivos sem cultura escrita e com tribos selvagens que guerreavam e se escravizavam mutuamente Atualmente nosso conhecimento sobre esse continente é tão parco que chegamos a pensar nele como um único país a África Oliva 2003 p 423 inicia seu artigo intitulado A História da África nos bancos escolares representações e imprecisões na literatura didática fazendo a seguinte pergunta O que sabemos sobre a África Repare como sua resposta nos parece infelizmente bastante familiar Quantos de nós estudamos a África quando transitávamos pelos bancos das escolas Quantos tiveram a disciplina História da África nos cursos de História Quantos livros ou textos lemos sobre a questão Tirando as breves incursões pelos programas do National Geographic ou Discovery Channel ou ainda pelas imagens chocantes de um mundo africano em agonia da AIDS que se alastra da fome que esmaga das etnias que se enfrentam com grande violência ou dos safáris e animais exóticos o que sabemos sobre a África Paremos por aqui Ou melhor iniciemos tudo aqui 72 Unidade II Temos que reconhecer que sabemos nada ou quase nada sobre a África A partir dessa primeira constatação cabe a nós educadores a responsabilidade de sanar tal deficiência em nossa formação e procurar nos apropriar dos conteúdos sobre a História da África e dos negros no Brasil disponíveis na íntegra para downloads na internet conforme já indicamos no tópico 4 da unidade I Neste ponto do livrotexto a intenção é apenas sinalizar alguns elementos importantes sobre a História da África tendo em vista o volume enorme de conteúdos passíveis de serem estudados Pare por um momento e observe no mapa a seguir os países que compõem o continente africano É possível perceber a grande quantidade de países Alguns talvez você nunca tenha ouvido falar durante toda sua vida Figura 24 Disponível em httpsacesseonetRtBI Acesso em 15 ago 2023 Segundo a bibliografia indicada ao final do livrotexto o desenvolvimento do continente africano foi superior ao do europeu até praticamente o século XVI quando Portugal iniciou um dos maiores genocídios culturais também chamado de etnocídio jamais visto na história da humanidade Segundo Cunha Junior 2010 p 15 as populações africanas já dominavam inúmeras tecnologias quando foram incorporadas à empresa colonial portuguesa no Brasil a começar pela importação de mão de obra 73 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA especializada principalmente nas áreas têxteis de construção de materiais como madeira e sabão fato que influenciaria decisivamente a economia colonial brasileira em relação à África A compreensão do fio da história africana é necessária para entendimento do desenvolvimento de conhecimentos técnicos profissionais e científicos nas diversas regiões africanas que constituíram um capital cultural significativo e fundamental para a colonização do Brasil sob o domínio português na forma do escravismo criminoso da mão de obra africana O acervo de conhecimentos que possibilitou a empresa de produção colonial portuguesa no Brasil é majoritariamente africano Devemos também acrescentar que muitas regiões do continente africano foram destruídas pelos europeus durante 400 anos de guerras para imposição da dominação ocidental política cultural e econômica A imposição do comércio europeu de produtos africanos e do comércio de seres humanos cativos africanos transformados em escravizados nas Américas foi a que produziu maior devastação no continente africano Hoje existe uma desigualdade social e econômica entre a África e a Europa em razão de o europeu ter subdesenvolvido o continente africano O que queremos reafirmar aqui é a riqueza histórica e cultural dos países africanos a começar pelo Egito por exemplo que pode ser considerado uma das civilizações mais desenvolvidas e antigas do mundo Portanto a História da África não começa no ano de 1500 e não pode ser resumida ao episódio da escravidão de suas populações durante 400 anos de História do Brasil Observação Nunca é demais incentiválo a prosseguir seus estudos na área de Cultura e História da África e dos negros no Brasil Afinal esse conteúdo será necessário para colocar em prática o que dita a Lei 106392003 em suas aulas no futuro Vejamos então de forma específica como as populações africanas se inseriram no processo de formação do nosso país Esse será o assunto do próximo tópico 62 Heranças coloniais africanas e a formação de um país chamado Brasil Primeiramente acompanhe esta breve revisão histórica sabemos que o Brasil é resultado de um longo processo de exploração colonial promovido por Portugal com apoio financeiro da burguesia de então que apesar de ainda não deter o poder político no século XVI já era proprietária de boa parte das riquezas disponíveis na época reservas suficientes para servirem de investimentos às empresas colonizadoras portuguesas rumo às Américas 74 Unidade II Assim é importante ficar claro que já estávamos em pleno capitalismo moderno e que o Brasil nada mais era do que um negócio bastante interessante e promissor tanto para os monarcas portugueses que comandaram politicamente a empreitada colonizadora quanto para os burgueses e homens de negócio da Europa que patrocinavam tais empreendimentos Existe uma linha de raciocínio que já faz parte de nosso senso comum segundo a qual os problemas do Brasil estão diretamente ligados à formação de sua população uma vez que teriam sido mandados para cá os piores cidadãos portugueses indesejados na Europa quase deportados para uma terra onde poderiam fazer do seu jeito todas as coisas reprováveis que antes faziam em Portugal Daí vem também uma das explicações correntes sobre o nosso jeitinho brasileiro no sentido de que as leis não funcionam aqui porque desde a formação do Brasil foram trazidos para cá somente ladrões bandidos vagabundos prostitutas e desocupados de todo tipo Isso não é verdade e a explicação fundamental está no fato de sermos naquela época a empresa mais rentável de Portugal Exemplo de aplicação Pense alguém mandaria para o comando de sua empresa pessoas desqualificadas desonestas e incapazes de fazer aquela empresa crescer e ser ainda mais lucrativa Ou algum empresário em sã consciência seria leviano o bastante para entregar um projeto tão ambicioso como a colonização do Brasil a bandidos e vagabundos que levariam tudo a perder Portanto tínhamos aqui uma base importante para o sustento da monarquia portuguesa que já enfrentava problemas sérios tanto políticos quanto econômicos para se manter nas relações capitalistas europeias daquele momento É nesse sentido que homens e mulheres passam a ser enviados ao Brasil com a incumbência de fazer esse paíscontinente fornecer riquezas suficientes para sustentar os luxos e extravagâncias da família real e sua aristocracia e ao mesmo tempo para pagar os investimentos feitos pela burguesia de então elite econômica durante aquele período Foi com essa mentalidade que os portugueses começaram a explorar de todas as formas o território brasileiro retirando de nossos solos e florestas todas as matériasprimas que tivessem algum valor no mercado capitalista europeu A primeira matériaprima a ser transformada em mercadoria valiosa foi o paubrasil Para isso os portugueses fizeram nas três primeiras décadas de colonização uma interessada aliança com povos indígenas Por estarem em pequeno número os portugueses podiam ser incorporados às aldeias sem causar grandes problemas ao cotidiano das tribos sujeitandose à vontade dos nativos Não que tenha havido uma convivência pacífica entre brancos e índios Ao contrário como afirma Olivieri 2014 75 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA O caráter beligerante das sociedades indígenas brasileiras desmente a versão da história segundo a qual os índios se limitaram a assistir à ocupação da terra pelos europeus sofrendo os efeitos da colonização passivamente Ao contrário nos limites das suas possibilidades resistiram à ocupação territorial lutando bravamente por sua segurança e liberdade Entretanto o contato inicial entre índios e brancos não chegou a ser predominantemente conflituoso Como os europeus estavam em pequeno número podiam ser incorporados à vida social do índio sem afetar a unidade e a autonomia das sociedades tribais Muito cedo entretanto os portugueses perceberam que um dos grandes problemas que teriam em sua missão de exploração brasileira seria a escassez de mão de obra para realizar um trabalho de tão grande monta como o que precisava ser feito por aqui A esse respeito Olivieri 2014 continua Posteriormente quando o processo de colonização promoveu a substituição do extrativismo pela agricultura como principal atividade econômica o padrão de convivência entre os dois grupos raciais sofreu uma profunda alteração o índio passou a ser encarado pelo branco como um obstáculo à posse da terra e uma fonte de mão de obra barata A necessidade de terras e de trabalhadores para a lavoura levou os portugueses a promoverem a expulsão dos índios de seu território bem como a sua escravização Assim a nova sociedade que se erguia no Brasil impunha ao índio uma posição subordinada e dependente Apesar de serem aproximadamente cinco milhões no século XVI população reduzida a cerca de 700 mil hoje no início da exploração portuguesa os índios não foram uma boa fonte de mão de obra escrava conforme pretendiam os colonizadores devido principalmente às guerras que se travaram a partir de 1530 entre brancos e índios e ao extermínio em massa que praticamente dizimou milhões de indígenas nos primeiros séculos de colonização do Brasil Uma solução encontrada foi a de trazer negros africanos vindos de Angola e do Congo para trabalharem na agricultura Como os portugueses já dominavam a arte das navegações não foi difícil forçar populações africanas a se transferirem para o Brasil submetendoos as uma das condições de vida e trabalho mais desumanas que a história já assistiu É interessante que mais uma vez o que aprendemos em nossos bancos escolares a respeito das justificativas sobre o tráfico negreiro aponta os índios como seres acostumados à liberdade e que se recusaram ao trabalho escravo já os negros por estarem acostumados à escravidão já existente no continente africano teriam se submetido mais passivamente à condição de objeto coisa Novamente essas são explicações que não fazem qualquer sentido lógico Assim comentam Munanga e Gomes 2006 p 24 76 Unidade II Dizer que o colonizador português foi para a África buscar escravos que ele adquiria comprandoos pela troca de fumo da Bahia e de outras mercadorias graças à cumplicidade dos reis e príncipes africanos não deixa dúvida sobre a crença na existência dos escravos como categoria natural ou seja na existência de seres humanos que nasceram escravos na África A partir dessa crença podemos já suscitar uma dúvida e fazer uma primeira indagação Algumas pessoas podem nascer escravos ou todos nascem livres até que algum sistema os escravize no decorrer de suas vidas Exemplo de aplicação Você se lembra do tópico em que tratamos do racismo científico que procurou relacionar características naturais às diferentes raças Você consegue enxergar a correspondência entre aquela teoria do racismo científico e o que estamos abordando aqui Mais uma vez podemos verificar como esse processo cujas raízes são profundas perdura até os dias de hoje sendo que tais representações ainda aparecem na maioria dos livros didáticos disponíveis para nossos alunos e professores 63 Diáspora travessia dos escravizados e o constrangimento de seres humanos à condição de objetos A partir de 1550 começam a chegar ao Brasil os primeiros africanos escravizados Tratase de uma recriação da escravidão antiga já extinta na história europeia há séculos agora a serviço de um capitalismo moderno baseado na exploração colonial na economia monopolistamercantil e no trabalho não assalariado dos escravizados Durante mais de três séculos estimase que tenham sido trazidos para o Brasil cerca de 36 milhões de pessoas provocando uma verdadeira diáspora entre os povoados africanos Segundo Schwarcz 2001 p 3839 No Brasil país de larga convivência com a escravidão o cativeiro vigorou durante mais de três séculos e sabese que a diáspora foi de tal vulto que um terço da população africana deixou compulsoriamente seu continente de origem rumo às Américas Um deslocamento dessa monta acabou alterando cores costumes e a própria estrutura da sociedade local A escravidão em primeiro lugar enquanto regime que supõe a posse de um homem por outro legitimou com sua vigência a hierarquia social naturalizou o arbítrio e inibiu toda discussão sobre cidadania A intenção aqui não é apenas recontar nosso passado mas mostrar outras explicações para o nosso presente ainda autoritário hierarquizado e com tantas dificuldades para a efetivação da cidadania plena de sua população Notase que numa sociedade que viveu tantos séculos de escravidão a ideia de servidão e senhorio acabou se naturalizando em nossa mentalidade como se fossem relações normais 77 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA aceitas socialmente reforçando a ideia sugerida por DaMatta 1987 p 76 sobre a formação do Brasil segundo a qual cada coisa tem um lugar e cada lugar tem uma coisa O que isso significa Numa palavra a ausência de valores igualitários Num meio social como o nosso onde cada coisa tem um lugar demarcado e como corolário cada lugar tem sua coisa índios e negros têm uma posição demarcada num sistema de relações sociais concretas sistema que é orientado de modo vertical para cima e para baixo nunca para os lados Fazendo uma pesquisa no site Domínio Público encontramse algumas fotografias de famílias da elite do século XIX registrando alguns de seus escravos É possível perceber nessas imagens esse lugar naturalizado do negro como escravizado conforme observase nas fotos a seguir uma mulher negra somente identificada como ama de leite Mônica ao lado do menino de nome composto Artur Gomes Leal e um homem negro denominado simplesmente de escravo Belisário Figura 25 Disponível em httpsl1nkdevgZDKa Acesso em 15 ago 2023 78 Unidade II Figura 26 Disponível em httpsacesseonegd9TS Acesso em 15 ago 2023 Observação Percebeu onde está a raiz da nossa sociedade extremamente hierarquizada Justamente nessa estratégia de transformar seres humanos em simples objetos coisas a serem usadas exploradas e depois descartadas Você já deve ter ouvido falar dessas questões das tristes condições dos navios negreiros das situações deploráveis às quais africanos eram submetidos já em terras brasileiras para se alimentar dormir trabalhar e viver e aos castigos e suplícios que sofriam por qualquer motivo que fosse ou até sem motivo algum Evidentemente tanto sofrimento é capaz de acabar com qualquer resquício de humanidade e dignidade que possa restar em um ser humano Entretanto outra forma de transformar seres humanos em coisas é apagar definitivamente toda sua herança cultural e histórica o bem mais precioso que temos em nossa construção como pessoa como afirma Schwarcz 2001 p 39 Desterrados de seu continente separados de seus laços de relação pessoal ignorantes da língua e dos costumes os recémchegados se transformavam em boçais na época boçal queria dizer aquele que não conhece a língua e era o termo oposto a ladino que se referia aos cativos já ambientados ou nascidos no país Entendido como propriedade uma peça ou coisa o escravo perdia sua origem e sua personalidade Servus non habent personam o escravo não tem pessoa é um sujeito sem corpo sem antepassados nomes ou bens próprios 79 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA É nesse sentido que toda a história da África foi sendo apagada da vida dos negros agora escravizados no Brasil e também futuramente dos livros que passaram a contar a história apenas sob a perspectiva do branco colonizador E é nesse sentido também que a instituição de uma lei que obrigue as escolas a inserirem em seus currículos a temática da História e Cultura Afrobrasileira e Africana como a Lei 106392003 tornase um fator de tanta relevância para a promoção da igualdade racial em nosso país ainda tão marcado pelas desigualdades e relações hierarquizadas entre as diferentes raçasetnias Conforme já foi dito há pouco foram quase quatro milhões de negros africanos trazidos ao Brasil e escravizados por mais de três séculos Com base nesses dois dados não se pode negar as muitas influências que a cultura brasileira em formação recebeu como herança africana Observação Há uma variedade de livros sobre a história dos negros do Brasil que podem nos demonstrar com detalhes quais foram esses aspectos da cultura e história africanas que ajudaram na formação do país Alguns já foram citados neste livrotexto e estão disponíveis na íntegra para consulta na internet Figura 27 Disponível em httpsl1nqcomijSg5 Acesso em 15 ago 2023 Para o momento basta destacarmos três aspectos da forte presença africana na formação do Brasil segundo Munanga e Gomes 2006 p 2021 no campo econômico os negros serviram como força de trabalho não remunerado ajudando a construir as riquezas que deram sustentação econômica à empresa colonial da época no campo demográfico sem dúvida esse elevado número de africanos agora fazia parte da população brasileira colaborando no trabalho de povoamento desse novo país e 80 Unidade II no campo cultural podemos destacar a influência linguística por meio de inúmeras palavras africanas incorporadas à língua portuguesa falada no Brasil as religiões de matriz africana entre as quais o candomblé e a umbanda e que hoje compõem o campo religioso brasileiro além das inúmeras heranças deixadas no campo das artes por meio de instrumentos musicais ritmos danças entre tantos outros elementos que ajudaram a construir parte da identidade cultural brasileira A esse respeito afirma Narloch 2009 p 71 Esses fenômenos certificam uma boa metáfora que Joaquim Nabuco usa no livro O Abolicionismo clássico do movimento brasileiro pelo fim da escravidão Nabuco dizia que o tráfico negreiro provocou uma união das fronteiras brasileiras e africanas como se a África tivesse aumentado seu território alguns milhares de quilômetros Lançouse por assim dizer uma ponte entre a África e o Brasil pela qual passaram milhões de africanos e estendeuse o hábitat da raça negra das margens do Congo e do Zambeze às do São Francisco e do Paraíba do Sul É preciso que se lembre entretanto que durante toda a história do Brasil essa união de fronteiras foi relegada ao descaso e tudo o que se associasse ao povo africano era considerado ruim inferior e até demoníaco É recente o movimento de valorização e resgate da cultura e da história dos negros sejam africanos sejam afrobrasileiros como parte de um projeto de igualdade racial para o Brasil conforme foi possível perceber por meio das legislações antirracistas vigentes atualmente no país e expostas anteriormente 64 Resistência negra e o movimento abolicionista antes e depois da Lei Áurea Uma primeira pergunta que trazemos do livro de Olivier PétréGrenouilleau A história da escravidão é a seguinte os escravos contribuíram para a sua libertação A resposta do autor é bastante direta Sem dúvida nenhuma Sabemos hoje que sempre e por toda parte os escravos tentaram resistir PétréGrenouilleau 2009 p 130 Alguns historiadores entretanto fazem uma distinção entre dois tipos de resistência a passiva cujas ações não utilizam violência direta como recusa a trabalhar trabalhos malfeitos fugas e faltas e a ativa que remete a movimentos mais coletivos e violentos seja com a organização dos quilombos seja por meio das insurreições guerrilhas entres outros movimentos realizados durante todo o regime escravista no Brasil Já para PétréGrenouilleau 2009 p 130 essa distinção não parece pertinente violenta ou não individual ou coletiva qualquer forma deliberada de resistência por parte de um escravo é digna de ser reconhecida Ela revela na verdade a capacidade do escravo de escapar do tacão ideológico que o senhor tenta lhe impor Dizer que algumas formas de resistência são passivas e outras são ativas leva forçosamente à desvalorização das passivas 81 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA É nesse sentido que queremos enfatizar o caráter extremamente conflituoso da relação escravizador escravizado Durante toda a história da escravidão no Brasil os negros se colocaram de maneiras diversas na luta contra sua condição desumana de escravo e portanto de objeto Segundo Munanga e Gomes 2006 p 98 Podemos dizer que a escravidão sempre foi acompanhada de um forte movimento de resistência e várias revoltas tiveram a presença negra como personagem central na luta pelo fim deste regime desumano e cruel Exemplos dessas ações e reações foram a revolta dos Alfaiates Bahia 1798 a Cabanagem Pará 18351840 a Sabinada Bahia 18371838 e a Balaiada Maranhão 18381841 conhecidas como revoltas urbanas Além das revoltas a organização dos quilombos também contribuiu como força de resistência negra durante esse período Já trabalhamos um pouco sobre temas relativos ao que eram os quilombos naquele contexto de escravidão e resistência Vamos acrescentar o seguinte de acordo com a visão de Moura 1992 p 2425 O quilombo foi incontestavelmente a unidade básica de resistência do escravo Pequeno ou grande estável ou de vida precária em qualquer região onde existia a escravidão lá se encontrava ele como elemento de desgaste do regime servil O fenômeno não era atomizado circunscrito a determinada área geográfica Muitas vezes surpreende pela capacidade de organização pela resistência que oferece Nele se incluem não apenas negros fugitivos mas também índios perseguidos mulatos pessoas perseguidas pela polícia em geral devedores do fisco brancos pobres mulheres sem profissão ou prostitutas Era um cadinho de perseguidos pelo sistema colonial Foram centenas de quilombos espalhados por todos os estados e regiões do país que tiveram duração mais curta ou continuam ativos até os dias de hoje Conforme já havíamos citado Munanga e Gomes 2006 p 71 afirmam na África a palavra quilombo referese a uma associação de homens abertas a todos Sendo assim os quilombos brasileiros podem ser considerados como uma inspiração africana Seu principal objetivo era a implantação de uma nova forma de vida e organização social diferente daquelas próprias da estrutura política colonial e escravista É nesse sentido que fariam parte dos quilombos todas as pessoas consideradas oprimidas pelo sistema colonial e imperial reinantes na época Mas todo esse movimento de resistência negra pouco se relaciona com o movimento abolicionista organizado a partir do século XIX em prol da abolição oficial da escravidão no Brasil Isso porque o abolicionismo foi um movimento considerado conservador pelos historiadores sendo organizado pela classe política da ocasião que procurou trazer pouco ou nenhum prejuízo aos senhores de escravo nesse processo de libertação A preocupação da elite da época era que a abolição se desse de forma pacífica sem sustos nem revoluções Daí as três grandes leis abolicionistas Ventre Livre 1871 Sexagenários 1885 e Áurea 1888 terem oferecido muito mais benefícios aos próprios senhores do que uma nova condição à população negra 82 Unidade II Não houve qualquer planejamento do poder público no sentido de incorporar a mão de obra negra recémliberta ao novo mercado de trabalho nacional naquele momento tampouco se pensou em qualquer forma de indenização aos escravos pelos anos e séculos de exploração sem qualquer tipo de remuneração Ao contrário as leis abolicionistas garantiam aos senhores donos dos escravos altas indenizações quando da libertação de cada um de seus trabalhadores Sobre isso comenta Schwarcz 2001 p 46 O resultado imediato dessa versão organizada e pretensamente cordata de nossa libertação dos escravos foi jogar uma imensa população despreparada e pouco instruída num processo de competição desigual sobretudo com a mãodeobra imigrante que afluía ao país desde os anos de 1870 De toda maneira atrasada ou não o certo é que a abolição era vendida como um presente e enquanto tal uma dádiva nãonegociada O problema foi que se dissimulou um processo de confronto para se investir numa imagem de superação lenta ordenada gradual e controlada pelo Estado Observação Vale destacar que essa foi uma das bases para a sustentação do mito da democracia racial no Brasil como se o processo abolicionista tivesse sido capaz de acabar com todos os conflitos anteriores existentes entre senhores e escravos e a partir da abolição o país passasse a experimentar o estabelecimento de uma relação cordial e amistosa entre esses segmentos Aliás o que a ideologia construída a partir de então procurou fortalecer foi o fato de que todos agora seriam pertencentes a um mesmo grupo a uma mesma classe a de homens e mulheres livres portanto com as mesmas condições de competição e inserção no mercado de trabalho em relação aos recémchegados imigrantes brancos Mas sobre isso vamos precisar nos aprofundar um pouco principalmente sobre essas novas relações e suas principais consequências O fato é que o processo de abolição da escravidão teve no Brasil características muito singulares Primeiramente como já mencionamos antes porque não preparou nenhuma condição para que os negros recém libertos estivessem em igualdade de direitos e oportunidades no mercado de trabalho Ao contrário milhares de imigrantes brancos foram trazidos a partir principalmente do início do século XX a fim de promover o chamado projeto nacional de branqueamento Na citação de Moura 1992 p 57 esse momento histórico fica bastante claro A crise do sistema escravista irá culminar com a Guerra do Paraguai na qual os negros serão envolvidos na sua grande maioria compulsoriamente nela morrendo cerca de 90000 Essa grande sucção de mão de obra negra provocada pela Guerra do Paraguai abriu espaços ainda maiores para 83 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA que o imigrante fosse aproveitado como trabalhador Essa tática de enviar negros à guerra serviu de um lado para branquear a população brasileira e de outro para justificar a política imigrantista que era patrocinada por parcelas significativas do capitalismo nativo e pelo governo de D Pedro II Em segundo lugar tal situação trouxe como consequência a marginalização social das populações negras uma vez que sem possibilidade de trabalho remunerado elas acabaram se instalando nas periferias das cidades nas regiões mais pobres do Brasil dados que ainda são confirmados pelos levantamentos estatísticos atuais conforme pudemos comprovar no tópico sobre as condições de vida dos afrodescendentes na atualidade Um último aspecto que queremos destacar sobre o ideal de branqueamento é que por meio desse processo desenvolveramse as chamadas ideologias raciais do negro e mulato e do branco segundo argumenta Ianni 2004 p 322323 A ideologia racial do branco atua no sentido de promover ou facilitar o ajustamento e o predomínio dos brancos às situações sociais em que se apresentam também negros e mulatos A ideologia do branco só é inteligível como componente de uma consciência social de dominação em que o próprio branco se representa superior aos outros isto é com direito de dispor dos outros As avaliações estereotipadas sobre o negro e o mulato com base em supostos atributos morais ou intelectuais inferiores em comparação com o branco refletem aspectos de uma consciência de dominação que concebe de modo abstrato e absurdo as relações entre as pessoas A ideologia racial do negro por seu lado fundada numa relação de inferioridade em face do branco que detém presumivelmente o poder exprime uma consciência de submissão Nela o negro se imagina em especial a partir dos termos em que é concebido pelo branco Nesse sentido a alienação do negro é mais acentuada pois que ele se vê a partir das abstrações falsas engendradas na mente do branco Essa citação é elucidativa no sentido de percebermos o alcance que tiveram as políticas de branqueamento no Brasil O professor Octavio Ianni realizou suas pesquisas no período de 1955 a 1984 e conseguiu mostrar que o preconceito continuava arraigado na sociedade brasileira com entrevistas que trazem algumas das abstrações sobre os estereótipos construídos por brancos negros e mulatos a respeito das diferenças de cor e de raça Suas pesquisas são minuciosas e conseguem demonstrar com clareza como essas abstrações foram sendo formuladas sustentando até hoje tais estereótipos 84 Unidade II Saiba mais Sugerimos a seguir uma relação de filmes para que você possa aprofundar seu olhar sobre as relações étnicoraciais Após assistir cada filme você pode desenvolver atividades como debater os conteúdos com seus colegas em grupos de discussão escrever resenhas críticas criar fóruns de discussão na internet preparar planos de aulas e atividades para serem desenvolvidas futuramente com seus alunos etc O importante é exercitar e estimular o olhar para a questão étnica e transformar a prática educativa ALÉM da lousa culturas juvenis presente Dir Denise Martha Brasil 2000 14 minutos ENCONTRANDO Forrester Dir Gus Van Sant EUA Sean Connery Laurence Mark 2000 KIRIKU e a feiticeira Dir Michel Ocelot FrançaBélgicaLuxemburgo Les AmateursOdec Kid Cartoons1998 74 minutos LIXO extraordinário Dir Lucy Walker João Jardim Karen Harley BrasilReino Unido Angus Aynsley Hank Levine 2010 99 minutos MARCHA Zumbi dos Palmares contra o racismo pela cidadania e a vida 16951995 Dir Edna Cristina Brasil 1995 115 minutos O FIO da memória Dir Eduardo Coutinho Brasil Cinefilmes Funarte1991 115 minutos O RAP do pequeno príncipe contra as almas sebosas Direção Paulo Caldas e Marcelo Luna Brasil Luis Vidal 2000 75 minutos OLHOS Azuis Dir Bertram Verhaag e Jane Elliott EUA Denkmal Filmgesellschaft 1996 90 minutos 85 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA QUANDO crioulo dança Dir Dilma Lóes Brasil Ministério da Educação e do Desporto Secretaria de Educação Fundamental 1989 28 minutos SEGREDOS e mentiras Dir Mike Leigh GrãBretanha Simon Channing Williams 1996 142 minutos VISTA a minha pele Dir Joel Zito Araújo Brasil Centro de Estudos e Relações de Trabalho e Desigualdades Ceert 2004 15 minutos Na última unidade começaremos nossa abordagem retomando a questão dos estereótipos raciais passando à análise de imagens e representações do negro na literatura e na mídia trazendo a discussão para o campo da educação a fim de pensarmos estratégias para uma educação que promova a igualdade racial 86 Unidade II Resumo No tópico sobre a legislação antirracista brasileira vimos que detemos uma das leis mais modernas do mundo em relação às relações étnicoraciais Entretanto nosso grande desafio está em fazer com que tais direitos sejam cumpridos de fato na vida de cada brasileiro e brasileira Conhecer as nossas diretrizes legais é uma das demonstrações possíveis de nosso exercício de cidadania e no caso dos educadores uma necessidade na prática educativa Por isso convidamos você a retomar suas consultas aos textos originais da Constituição dos Estatutos da Criança e do Adolescente e da Igualdade Racial e de nossas Leis de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional bem como a Lei 106392003 e seus planos de implementação já publicados Em relação aos fundamentos históricos necessários para que sejamos capazes de exercer a profissão de professores segundo as exigências da Lei 106392003 gostaríamos apenas de enfatizar mais uma vez a enorme deficiência nessa área Portanto é imperativo que tenhamos o compromisso com a busca do conhecimento em primeiro lugar sabendo que inúmeras são as fontes disponíveis de consulta e estudo sobre a História da África e das populações africanas e seus descendentes no Brasil Em segundo lugar importa posicionarmonos enquanto coprodutores de africanidades brasileiras promovendo em sala de aula as experiências necessárias para a valorização e resgate das heranças africanas no processo de construção da identidade e da cultura brasileiras Por fim a partir desse novo paradigma é possível enxergar a História da África e suas implicações para a História do Brasil de maneira bastante diferente daquela utilizada nos bancos escolares Assim a apropriação que fazemos de cada fato histórico recontextualizado segundo a perspectiva das africanidades brasileiras abrirá possibilidades e potencialidades na açãorelação educativa capazes de refazer nossas raízes autoritárias e racistas e promover por fim uma realidade de igualdade entre todos e todas 87 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA Exercícios Questão 1 O Parecer CNE 0032004 relativo às Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações ÉtnicoRaciais e para o Ensino de História e Cultura Afrobrasileira e Africana elaborado especialmente para bem informar os educadores e as agências educacionais é um documento útil a toda e qualquer ação profissional e a todo cidadão Isso porque o mito da democracia racial e a ideologia do branqueamento favoreceram a construção e a manutenção de um imaginário coletivo carregado de estereótipos negativos no que tange à África aos africanos e a tudo o que lhes diz respeito Assim sendo não compete exclusivamente aos agentes da educação formal a tarefa de reconstrução desse imaginário e a constituição de uma sociedade verdadeiramente democrática Além de propor a adoção de políticas de ação afirmativa o Parecer busca estimular a formação de identidades positivamente afirmadas Busca estimular a passagem da vergonha ao orgulho de ser negro Certamente uma proposta de renovação dessa natureza produziria resistências a implementação da Lei 106392003 não vem ocorrendo com facilidade A resistência à mudança é verificável nas mais diversas instâncias na ação de professores de administradores escolares e de gestores do poder público e privado entre outras A Lei Federal 106392003 determina a inclusão da temática História e Cultura Afrobrasileira no currículo oficial da rede de ensino O Parecer CNE 0032004 detalha as responsabilidades que competem aos poderes públicos federal estadual e municipal e prioriza algumas ações relativas à implementação da referida lei A seguir apresentamos algumas ações imprescindíveis nos estabelecimentos de ensino Dentre elas assinale a afirmativa que não é verdadeira A Formar professores para o trabalho em sala de aula na perspectiva das relações étnicoraciais B Produzir material didático adequado que desfaça os estereótipos de raçacorgênero C Servirse abundantemente de recursos analógicos que favoreçam o processo de elevação da autoestima de alunos afrodescendentes D Não admitir a abordagem dessa temática fora da sala de aula E Sensibilizar todos os agentes envolvidos nesse processo para um compromisso efetivo com a implantação da igualdade racial na escola e em nosso país Resposta correta alternativa D 88 Unidade II Análise das alternativas A Afirmativa verdadeira Justificativa a formação de professores para o trabalho em sala de aula na perspectiva das relações étnicoraciais constitui uma das ações prioritárias Uma longa história de silêncio a respeito de tudo o que diz respeito à África e aos africanos e seus descendentes impossibilitou a adequada formação identitária e profissional dos cidadãos em geral e dos educadores em particular Tratase agora de preencher lacunas formidáveis nos currículos dos cursos de Pedagogia e na formação continuada de professores B Afirmativa verdadeira Justificativa a produção de material didático que favoreça a desconstrução de estereótipos negativos de raça e etnia é outra prioridade à qual é preciso atender com urgência A análise de livros didáticos e paradidáticos que vêm sendo adotados nas escolas brasileiras permite identificar facilmente boa parte da raiz de problemas nas relações interraciais textos e ilustrações colaboram para gerar e manter estereótipos negativos que por sua vez determinam atitudes e comportamentos preconceituosos e discriminatórios C Afirmativa verdadeira Justificativa os recursos analógicos que podem ser utilizados no ensino contos poemas e representações gráficas entre outros favorecem muito o processo de elevação da autoestima de alunos afrodescendentes A linguagem analógica ao servirse de abundantes expressões metafóricas atinge dimensões afetivas que dificilmente seriam mobilizadas por recursos da linguagem lógicocausal Daí a importância da narrativa oral contos fábulas lendas e mitos para que se atinjam os objetivos educacionais desejados quando tratamos das questões étnicoraciais D Afirmativa falsa Justificativa é preciso que todos os agentes educacionais estejam mobilizados para a tarefa em questão e não apenas os professores em sala de aula Não admitir a abordagem dessa temática fora da sala de aula seria uma conduta absolutamente inapropriada Pelo contrário todo tempo e lugar podem oferecer oportunidade para que se trabalhem essas questões E Afirmativa verdadeira Justificativa conforme assinalado no comentário relativo à afirmativa D a tarefa de superação do racismo é coletiva e demanda a ação de todos Para que isso ocorra no espaço escolar é preciso sensibilizar a todos Somente assim se poderá contar com um compromisso efetivamente assumido com o projeto geral de conquista de igualdade étnicoracial 89 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA Questão 2 Leia o texto apresentado a seguir Ribeiro 1996 ao tratar da presença da etnia iorubá no Brasil lembra que esse grupo étnico oriundo da Nigéria do Togo e do Benin é muitas vezes aqui identificado como nagô Durante o último período da escravidão os iorubás foram concentrados em zonas urbanas e em regiões suburbanas ricas e desenvolvidas do Norte e do Nordeste particularmente em Salvador e Recife Como ocorre com todas as etnias africanas é impossível dissociarmos sua organização sociocultural de suas práticas religiosas No caso dos iorubás o panteão de suas divindades é em nosso país o mais conhecido e difundido pois embora muitos de nós nunca tenhamos ouvido a palavra iorubá dificilmente encontramos alguém que nunca tenha ouvido a palavra orixás designativa dessas divindades Permaneceram na constituição de nossa vida sociocultural muitas africanidades de origem iorubá o sentido de comunidade os valores relativos à solidariedade e à hospitalidade inúmeros elementos do idioma que segundo o filólogo João Ribeiro foram alterações profundas do idioma português no que diz respeito tanto ao vocabulário quanto ao sistema gramatical Além disso muitos elementos da Religião Tradicional Iorubá constituíram diversas religiões brasileiras de matriz africana e achamse presentes em muitas expressões literárias artísticas e musicais Assim sendo concluise sem dificuldades que a identidade e a cidadania não apenas dos afrodescendentes mas de todos os brasileiros constroemse a partir de importantes elementos de cosmovisões africanas RIBEIRO R I Alma africana no Brasil Os iorubás São Paulo Oduduwa 1996 O texto anterior trata de africanidades brasileiras Leia as afirmativas apresentadas a seguir e assinale a alternativa correta A Considerando que o conceito de africanidades brasileiras inclui o reconhecimento da relevância da presenca negra na formação de nossa sociedade é correto utilizarmos essa expressão quando nos referimos à presença de elementos iorubás em nossa composição sociocultural B Mesmo considerando que o conceito de africanidades brasileiras inclui o reconhecimento da relevância da presença negra na formação de nossa sociedade é incorreto utilizarmos essa expressão quando nos referimos à presença de elementos iorubás em nossa composição sociocultural C A História da África foi sistematicamente distorcida esquecida ou menosprezada nos livros didáticos e paradidáticos A ignorância sobre o povo iorubá por exemplo é justificável dada a grande relevância da história e da mitologia dos povos gregos e romanos na construção da sociedade brasileira D Antes do início da exploração portuguesa a África era habitada por povos primitivos que se escravizavam mutuamente Entre esses povos achavamse incluídos os iorubás E A herança iorubá não é suficientemente expressiva na constituição da identidade nacional brasileira principalmente quando a comparamos com a herança italiana Resposta correta alternativa A 90 Unidade II Análise das alternativas A Afirmativa correta Justificativa como os iorubás integram um dos grupos étnicos da África é correto utilizarmos a expressão africanidades brasileiras ao nos referimos à herança brasileira de elementos dessa etnia B Afirmativa incorreta Justificativa vide justificativa apresentada para a afirmativa A C Afirmativa incorreta Justificativa a construção da sociedade brasileira foi realizada através da participação de africanos europeus e dos povos originários dessa região geográfica Assim sendo não se justifica veicular conhecimentos sobre os europeus e menosprezar conhecimentos sobre a África D Alternativa incorreta Justificativa um grave estereótipo negativo sobre a África é justamente esse que afirma ter sido a África era habitada por povos primitivos que se escravizavam mutuamente e ser de responsabilidade da exploração portuguesa o movimento civilizador naquele continente De fato civilizações bastante desenvolvidas ocupavam o território africano por ocasião da chegada dos europeus e entre esses povos incluemse os iorubás E Alternativa incorreta Justificativa a afirmação de ser a herança iorubá pouco expressiva na constituição da identidade nacional brasileira é incorreta e isso é fato de fácil constatação basta atentar para os vocábulos iorubás no idioma português para as manifestações culturais e religiosas Se comparamos a herança iorubá com a italiana constatamos que ambas se fazem presentes em nossa constituição sociocultural havendo expressivas variações regionais

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58 Unidade II Unidade II 5 O ANTIRRACISMO NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA É comum no Brasil nos orgulharmos de nossas leis como sendo as mais modernas e avançadas do mundo Temos uma das constituições mais progressistas e igualitárias do planeta Promulgamos estatutos específicos de proteção a várias minorias crianças e adolescentes com o Estatuto da Criança e do Adolescente ECA o Estatuto da Pessoa Idosa Estatuto do Índio Estatuto da Igualdade Racial e a Lei Maria da Penha que combate a violência contra as mulheres Esses são exemplos de que em termos de legislação o Brasil possui um referencial de primeiro mundo O grande problema é que entre nós as leis têm uma característica diversa da dos países desenvolvidos se na Europa e nos Estados Unidos as leis sempre refletiram as demandas e aspirações sociais tornandose leis apenas para tornar de direito uma igualdade que já existia de fato em terras brasileiras deuse sempre o contrário as leis são criadas por uma elite política baseadas em interesses econômicos dessa mesma elite e nada têm de correspondência com a vida cotidiana Para que fique claro o que estamos argumentando pense nas seguintes situações por que seria necessária uma lei proibindo e punindo a discriminação racial por que temos um estatuto que obriga o Estado e a sociedade a garantirem às crianças e adolescentes direitos fundamentais como educação alimentação e lazer por que precisamos de uma lei que trate especificamente da violência contra pessoas idosas e mulheres Infelizmente as respostas a essas perguntas são desoladoras precisamos de leis que punam atitudes racistas porque o racismo está presente em nosso cotidiano de maneira dissimulada mas evidente as crianças precisam de um estatuto porque lhes são negados no Brasil seus direitos mais fundamentais como educação alimentação e o direito a brincar pessoas idosas e mulheres precisam da proteção da lei no Brasil porque são sistematicamente violentadas em números alarmantes todos os dias Conclusão o que nossas leis tentam fazer é corrigir uma realidade desigual violenta e injusta de maneira artificial como se a força da lei fosse suficiente para mudar comportamentos e mentalidades o que de fato não acontece Ao contrário sabemos que infelizmente no Brasil poucas pessoas são de 59 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA fato condenadas e punidas por crimes de racismo maustratos a pessoas idosas e crianças violência contra mulheres e indígenas apenas para mencionar alguns exemplos Exemplo de aplicação Você saberia contar algum episódio em que uma determinada lei apesar de estar no papel tenha sido descumprida em favor de grupos privilegiados Reflita sobre as possíveis explicações para fatos como esse Entretanto vivemos num país democrático e para mudar nossa realidade por mais complexa que seja precisamos sem dúvida de leis que amparem essas minorias fortalecendo assim os movimentos sociais na garantia de proteção e equidade de direitos e oportunidades No caso das relações étnicoraciais que nos interessam nesta disciplina precisamos de uma legislação antirracista que ajude a coibir atitudes discriminatórias e sirva de base para uma ampla discussão popular capaz de transformar comportamentos e mentalidades por mais profundas que sejam suas raízes e as resistências enfrentadas Leis para isso nós já temos e vamos conhecêlas agora Restanos como educadores encontrar as melhores estratégias para colocálas em prática e assim promovermos as mudanças sociais necessárias assunto que abordaremos na unidade III 51 A Carta Maior a Constituição Brasileira de 1988 No dia 5 de outubro de 1988 foi promulgada a Constituição da República Federativa do Brasil com um amplo processo de mobilização popular resultado da abertura democrática vivida a partir de 1985 que colocou fim aos vinte anos de ditadura militar no Brasil Figura 20 Disponível em httpsl1nqcommZEZt Acesso em 15 ago 2023 60 Unidade II É nessa Constituição que a prática de racismo passa a ser considerada crime segundo o seguinte artigo Brasil 1988 Art 5º XLII A prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível sujeito a pena de reclusão nos termos da lei Perceba que segundo o texto tratase de um crime que não é passível de fiança ou seja só pode ser punido por prisão além disso não prescreve quer dizer pode ser punido mesmo depois de passados muitos anos do ocorrido Isso sem dúvida foi um importante instrumento para a ampliação do alcance das ações até então desenvolvidas pelo movimento negro A esse respeito observam De Paula e Heringer 2009 p 9 A partir dos anos 1990 observouse a emergência de novos atores na luta antirracista Começam a se constituir nas favelas e periferias urbanas brasileiras grupos de jovens ligados a iniciativas de cultura e arte com um discurso de enfrentamento da violência afirmação de pertencimento a esses territórios e um indiscutível orgulho racial marca importante de suas mensagens à sociedade Para que se compreenda a profundidade dessa citação e a enorme importância que a Constituição teve na luta antirracista na ampliação do enfrentamento da violência e na afirmação do orgulho racial leia também a afirmação de Guimarães 2009 p 61 Apenas para os afrobrasileiros para aqueles que se chamam a si mesmos de negros o antirracismo deve significar antes de tudo a admissão de sua raça isto é a percepção racializada de si mesmo e do outro A partir desse momento o movimento negro se fortalecia no Brasil principalmente por sua autovalorização sua percepção racializada de si mesmo e do outro de suas raízes africanas suas influências latinoamericanas sua cultura e religião sua música e sua arte sua história e heranças deixadas A partir disso a promulgação de outras legislações específicas foi um passo rápido sobre o qual comenta Silva Após a criminalização de práticas racistas pela Constituição Federal de 1988 foi promulgada a Lei 771689 que trata dos crimes resultantes de preconceito de raça ou cor Esta lei foi posteriormente modificada em alguns artigos contidos na Lei 945997 A injúria qualificada também foi tipificada especificamente no art 140 3º do Código Penal Brasileiro Devemos salientar que o Brasil foi o primeiro país em todo o continente americano a regular práticas racistas através de legislação específica Silva 2004 O que esse autor confirma é que de fato somos um país com leis avançadas em relação a nossos vizinhos latinoamericanos Além dessas mudanças no Código Penal de 1940 tínhamos agora uma legislação específica qualificando e punindo a prática de racismo Vejamos segundo Guimarães 2004 p 19 quais são os significados de racismo cobertos pela legislação brasileira atual 61 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA a o preconceito racial expresso verbalmente através de ofensas pessoais b a discriminação racial ou seja o tratamento desigual de pessoas nos mais diversos âmbitos da vida social baseado na ideia de raça restringindo o seu amplo e líquido direito constitucional e legal à isonomia de tratamento c a expressão doutrinária do racismo ou a incitação pública do preconceito Um aspecto fica claro e ainda incomoda nessa citação toda forma de racismo manifesto publicamente merece nos termos da lei a devida punição entretanto as ações de racismo praticadas no âmbito privado não podem ser enquadradas na lei vigente Isso nos leva mais uma vez à reflexão acerca da necessidade de ações educativas na transformação das relações étnicoraciais no Brasil Exemplo de aplicação Você já presenciou algum episódio de demonstração de racismo Como se deu a situação em local público ou privado Você acha que seria possível registrar formalmente tal episódio De que maneira O que seria preciso fazer ou providenciar Percebeu como é longo o caminho entre a lei os fatos da realidade e o cumprimento da lei 52 Estatutos específicos o ECA e o Estatuto da Igualdade Racial O Brasil tem entre suas legislações uma série de estatutos específicos que visam a proteger grupos de minorias bem como a promover sua inclusão social e a garantia de acesso a direitos fundamentais desses cidadãos Segundo o Portal Brasil um estatuto é um regulamento ou código com significado e valor de lei ou de norma É o caso por exemplo do Estatuto da Pessoa Idosa do Estatuto do Índio do ECA e do Estatuto da Igualdade Racial Neste tópico trataremos desses dois últimos que mostram relação com nossa disciplina 521 Estatuto da Criança e do Adolescente Lei 806990 Após a promulgação da nova Constituição Brasileira em 1988 esta foi a legislação mais importante para crianças e adolescentes no Brasil e que trouxe reflexos também sobre as políticas de assistência social e educacionais a partir de então Sobre a questão étnicoracial o único artigo que faz alusão à discriminação é o seguinte Brasil 1990 Art 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência discriminação exploração violência crueldade e opressão punido na forma da lei qualquer atentado por ação ou omissão aos seus direitos fundamentais Dessa forma pela primeira vez crianças e adolescentes passam a ser tratados como cidadãos de direitos fruto de um intenso debate internacional em voga nas últimas décadas conforme indicam as autoras Lima e Veronese 2009 p 78 62 Unidade II Diversos instrumentos internacionais são representativos da luta por melhores condições de vida e proteção aos direitos da população infantojuvenil É oportuno registrar que além de dar uma atenção especial aos direitos de crianças e adolescentes as normativas internacionais também têm em comum a preocupação com a não discriminação fundada na raça sexo origem cor e reconhece os seres humanos como livres e iguais em atenção ao princípio da dignidade da pessoa humana A respeito dos instrumentos internacionais de que tratam elas afirmam Lima Veronese 2009 p 23 Entre os instrumentos normativos internacionais destacamos a Declaração de Genebra de 1924 a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948 a Declaração dos Direitos da Criança de 1959 ONU e a Convenção Internacional dos Direitos da Criança 1989 ONU Importante pontuar que a Declaração Universal dos Direitos Humanos aprovada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas ONU em 1948 é representativa do avanço nos direitos e liberdades individuais do ser humano e no reconhecimento do princípio da dignidade da pessoa humana reconhecendo que todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos independente de sua raça ou cor arts 1º e 2º Não restam dúvidas de que as ideias desses instrumentos internacionais influenciaram também um semnúmero de debates no Brasil principalmente entre juristas educadores sociólogos e outros profissionais interessados na questão da infância e da adolescência Podemos afirmar que há estreita relação entre o ECA aprovado em 1990 e a nova Lei de Diretrizes e Bases LDB que seria aprovada em 1996 Nesse sentido os debates desencadeados por influência do ECA acabaram norteando as diretrizes adotadas pelas políticas educacionais brasileiras a partir de então conforme veremos nas próximas páginas 522 Estatuto da Igualdade Racial Lei 122882010 Em maio de 2003 o Senador Paulo Paim PTRS apresentou o projeto de lei no Senado que instituía o Estatuto da Igualdade Racial Desde então o projeto tramitou na Câmara e no Senado até ser finalmente aprovado com emendas no dia 20 de julho de 2010 validando por meio da Lei 12288 o Estatuto da Igualdade Racial O documento versa sobre os principais direitos garantidos à população afrodescendente no Brasil bem como busca combater toda forma de discriminação e intolerância étnica 63 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA Figura 21 Disponível em httpsl1nqcomDyOr1 Acesso em 15 ago 2023 O estatuto já em seu artigo 1º faz alusão aos principais focos desta lei a saber a combater a discriminação racial ou étnicoracial b promover a igualdade racial nos campos político econômico social cultural e outros da vida pública ou privada c combater as assimetrias de gênero e raça dando condições de inclusão às mulheres negras d valorizar a autodefinição de cor ou raça às pessoas que se autodeclararem pretas e pardas conforme critérios definidos pelo IBGE e abrir caminhos para a implantação de políticas públicas adotadas pelo Estado com o objetivo da promoção da igualdade racial f incentivar as ações afirmativas adotadas pelo Estado ou pela iniciativa privada para a promoção da igualdade de oportunidades Essas definições iniciais se estendem até o artigo 5º quando o estatuto passa a definir capítulos específicos para cada direito fundamental a ser defendido saúde educação cultura esporte e lazer liberdade de consciência e de crença livre exercício dos cultos religiosos acesso à terra e à moradia adequada direito ao trabalho e valorização da herança cultural da população negra na história do país pelos meios de comunicação Por fim institui o Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial Sinapir um órgão criado para organizar e articular as estratégias para implantação do conjunto de políticas e serviços destinados a superar as desigualdades étnicas existentes no país prestados pelo poder público federal segundo seu artigo 47 Brasil 2010 entre eles a implantação de ouvidorias permanentes em defesa da igualdade racial e o investimento em financiamentos de iniciativas de promoção de igualdade racial Segundo o portal de notícias do Senado Brasil 2010b podemos destacar da seguinte forma os principais pontos deste estatuto 64 Unidade II Entre outros pontos o projeto de Paim institui pena de até três anos para quem praticar racismo pela internet incentiva a contratação de negros pelas empresas e reconhece a capoeira como esporte Resultado de mais de seis anos de discussão no Congresso o texto aprovado na Câmara faz mudanças substanciais no projeto original Reduz de 30 para 10 a proporção de candidatos negros que os partidos devem ter nas eleições atualmente só há reserva para mulheres retira a obrigatoriedade de reserva nos estabelecimentos públicos de vagas para alunos negros vindos de escolas públicas na mesma proporção dessa etnia na população e suprime a indicação igualdade do dispositivo que trata da contratação de atores negros em produções artísticas Observação Perceba que entre os pontos destacados o mais polêmico está na política de cotas nas universidades públicas cuja obrigatoriedade foi retirada do texto final da lei Conforme já havíamos discutido na unidade anterior há muito debate em torno da questão das cotas raciais e até mesmo dentro do movimento negro há grupos favoráveis e contrários às cotas para negros nas universidades como parte dos critérios de seleção de candidatos nos vestibulares talvez razão pela qual esse artigo tenha sido retirado da versão final do documento Esperamos que o aluno já tenha feito suas análises a respeito e seja capaz de argumentar com propriedade sobre os prós e contras dessa ação afirmativa 53 Leis e diretrizes educacionais Já fizemos alusão à influência que o ECA teve nos debates educacionais a partir de sua publicação em 1990 A questão étnica também passou a ocupar importante espaço na legislação brasileira como vimos no tópico anterior chegando à instituição do Estatuto da Igualdade Racial em 2010 vinte anos depois Assim é importante verificar neste tópico sobre a legislação e o antirracismo no Brasil que os processos sociais de conquistas de direitos são lentos graduais e integrados isto é uma demanda social não surge de um momento para o outro repentinamente ao contrário é fruto de um amplo e longo debate entre grupos e movimentos que se unem em defesa de seus interesses Lembrete Vale também destacar que a igualdade racial não pode ser encarada como uma necessidade apenas do movimento negro mas de todos os brasileiros que buscam encontrar suas verdadeiras raízes históricas e culturais e querem viver numa sociedade mais justa e igualitária 65 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA 531 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDB Lei 939496 O Brasil tem uma das legislações mais modernas do mundo no que diz respeito às suas diretrizes para a educação Em 1996 foi aprovada a Lei 9394 que ficou mais conhecida como nova LDB Este é sem dúvida um documento importantíssimo para a população negra no Brasil pois fornece pressupostos importantes para a ampliação do debate sobre relações étnicoraciais e afrodescendência Veja o que diz o seu artigo 26º Brasil 1996 O ensino de História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro especialmente das matrizes indígena africana e europeia Figura 22 Disponível em httpsl1nqcomxC3eZ Acesso em 15 ago 2023 Portanto aqui está o início do debate que preparou o terreno para a aprovação da Lei 106392003 dando mais um passo para a afirmação reconhecimento e valorização dos negros no quadro da diversidade da cultura brasileira Exemplo de aplicação Após a leitura do trecho dessa lei qual seria na sua opinião o papel dos professores nesse processo de mudança no sistema educacional brasileiro 66 Unidade II 532 Lei 106392003 e Lei 116452008 No dia 9 de janeiro de 2003 foi sancionada a Lei 10639 que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 e inclui no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afrobrasileira Apesar de imprescindível e de extrema relevância esta é uma lei de enunciado bastante breve que vem acrescentar à LDB somente os artigos 26A 79A e 79B reproduzidos a seguir Brasil 2003 Art 26A Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio oficiais e particulares tornase obrigatório o ensino sobre História e Cultura AfroBrasileira 1º O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos a luta dos negros no Brasil a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social econômica e política pertinentes à História do Brasil 2º Os conteúdos referentes à História e Cultura AfroBrasileira serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras 3º Vetado Art 79A Vetado Art 79B O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como Dia Nacional da Consciência Negra Em poucas linhas essa legislação consegue chamar a atenção das autoridades educadores e da sociedade para a importância da inclusão no currículo escolar da perspectiva étnicoracial instituindo inclusive o dia 20 de novembro como o Dia da Consciência Negra Alguns anos depois em 10 de março de 2008 foi aprovada a Lei 11645 que modifica o texto da Lei 106392003 e inclui no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura AfroBrasileira e Indígena passando a vigorar a seguinte redação Art 26A Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio públicos e privados tornase obrigatório o estudo da História e Cultura Afrobrasileira e Indígena 1º O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação da população 67 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA brasileira a partir desses dois grupos étnicos tais como o estudo da história da África e dos africanos a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o índio na formação da sociedade nacional resgatando as suas contribuições nas áreas social econômica e política pertinentes à história do Brasil 2º Os conteúdos referentes à História e Cultura Afrobrasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras Observação Não se esqueça que esta é a lei que determinou o estudo da disciplina Relações ÉtnicoRaciais e Afrodescendência Uma vez obrigatório o ensino da história e cultura afrobrasileira fazse necessária a formação dos professores para as transformações necessárias às práticas educativas e pedagógicas Por isso continue se aprofundando no estudo dessa temática Para incentivar e promover a implantação dessa lei no sistema de ensino brasileiro o Ministério da Educação MEC publicou no Diário Oficial da União no dia 19 de maio de 2004 as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnicoraciais e para o Ensino de História e Cultura AfroBrasileira e Africana Esse é um documento que como o próprio nome diz traz todas as diretrizes para que a Lei 106392003 possa ser finalmente colocada em prática É sobre esse parecer que trataremos a seguir 533 Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das relações étnicoraciais e para o ensino de história e cultura afrobrasileira e africana de 2004 Parecer CNE 0032004 Esse parecer é um documento que todo educador deveria conhecer na íntegra e estudar seu conteúdo a fundo pois seu texto é claro e eficaz no estímulo ao reconhecimento da importância de promovermos ações para a igualdade racial Como não é possível reproduzilo por inteiro selecionamos dois trechos que nos dão uma ideia bastante clara sobre seus propósitos O primeiro traz uma apresentação do público ao qual o texto se dirige Brasil 2004 p 2 Destinase o parecer aos administradores dos sistemas de ensino de mantenedoras de estabelecimentos de ensino aos estabelecimentos de ensino seus professores e a todos implicados na elaboração execução avaliação de programas de interesse educacional de planos institucionais pedagógicos e de ensino Destinase também às famílias dos estudantes a eles próprios e a todos os cidadãos comprometidos com a educação dos brasileiros para nele buscarem orientações quando pretenderem dialogar com os sistemas de ensino escolas e educadores no que diz respeito às relações étnicoraciais ao reconhecimento e valorização da história e 68 Unidade II cultura dos afrobrasileiros à diversidade da nação brasileira ao igual direito à educação de qualidade isto é não apenas direito ao estudo mas também à formação para a cidadania responsável pela construção de uma sociedade justa e democrática De acordo com o que temos defendido essas diretrizes interessam não somente ao poder público ou aos educadores e gestores educacionais mas a todo cidadão brasileiro que de alguma forma esteja interessado em uma educação de qualidade para todos No segundo trecho que escolhemos para demonstrar um pouco do conteúdo do parecer vemos claramente a importância que a Lei 106392003 assume no contexto de construção de uma sociedade igualitária e verdadeiramente democrática Brasil 2004 p 2 O parecer procura oferecer uma resposta entre outras na área da educação à demanda da população afrodescendente no sentido de políticas de ações afirmativas isto é de políticas de reparações e de reconhecimento e valorização de sua história cultura identidade Trata ele de política curricular fundada em dimensões históricas sociais antropológicas oriundas da realidade brasileira e busca combater o racismo e as discriminações que atingem particularmente os negros Nesta perspectiva propõe a divulgação e produção de conhecimentos a formação de atitudes posturas e valores que eduquem cidadãos orgulhosos de seu pertencimento étnicoracial descendentes de africanos povos indígenas descendentes de europeus de asiáticos para interagirem na construção de uma nação democrática em que todos igualmente tenham seus direitos garantidos e sua identidade valorizada A grande contribuição desse parecer foi portanto identificar as contribuições da Lei 10639 para o reconhecimento e a valorização da diversidade étnicoracial brasileira passo fundamental para uma sociedade de fato igualitária e livre do racismo Mas passados seis anos podemos afirmar que pouca coisa avançou na direção de colocar em prática o que determina a Lei 106392003 ou seja poucas escolas de fato incluíram em seus currículos a temática da História e Cultura AfroBrasileira e Africana Por isso mais uma vez o Ministério da Educação MEC juntamente com a Subsecretaria de Políticas de Ações Afirmativas da Seppir SubAA tomou a iniciativa de publicar em 13 de maio de 2009 o Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnicoraciais e para o Ensino de História e Cultura Afrobrasileira e Africana Esse é um documento que detalha cada uma das responsabilidades dos poderes públicos seja no âmbito federal estadual ou municipal além de enfatizar três problemáticas principais em relação à implantação da Lei 106392003 a formação dos professores para o trabalho em sala de aula na perspectiva das relações étnicoraciais a produção de material didático adequado que desfaça os estereótipos de raçacorgênero e a sensibilização de todos os agentes envolvidos nesse processo para um compromisso efetivo com a implantação da igualdade racial na escola e em nosso país 69 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA Ainda em complemento a essa lei foi promulgada em 10 de março de 2008 a Lei 11645 que insere no texto anterior também a matriz indígena estabelecendo portanto que os conteúdos referentes à história e cultura afrobrasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo currículo escolar em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras No presente livrotexto e no âmbito da disciplina Relações ÉtnicoRaciais e Afrodescendência reconhecemos a importância do estudo da cultura dos povos indígenas brasileiros mas por uma questão de limitação de tempo serão focadas primordialmente as questões raciais em relação à população afrodescendente Saiba mais Sabemos da importância de conhecermos nossas leis e diretrizes educacionais a fim de ampliarmos nossa compreensão a respeito de nossa prática educativa bem como de nosso papel no processo de promoção da igualdade racial Nesse sentido sugerimos que seja feita uma pesquisa e que se consulte na íntegra alguns desses materiais com os quais acabamos de trabalhar Procure estudar as legislações que você ainda não teve oportunidade em outras disciplinas isto é aquelas que tratam especificamente das relações étnicoraciais como o Estatuto da Igualdade Racial e a Lei 106392003 por exemplo Consulte os links BRASIL Lei n 10639 de 9 de janeiro de 2003 Ministério da Educação e Cultura Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial Disponível em httpsl1nkdev9PKcy Acesso em 14 ago 2023 Brasil Lei n 12288 de 20 de julho de 2010 Estatuto da Igualdade Racial Disponível em httpsl1nkdev6NlXx Acesso em 14 ago 2023 BRASIL Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações ÉtnicoRaciais e para o Ensino de História e Cultura AfroBrasileira e Africana Brasília mar 2004 Disponível em httpsacesseoneSQFcp Acesso em 14 ago 2023 6 AFRICANIDADES BRASILEIRAS E ALGUNS ASPECTOS DA HISTÓRIA AFRICANA DOS NEGROS NO BRASIL Começaremos trabalhando o conceito de africanidades brasileiras com sua especificidade e paradigma Em seguida faremos uma abordagem histórica fundamental para compreendermos a inserção dos negros africanos no processo de colonização brasileira as raízes de nossa construção nacional e os fundamentos de nosso racismo velado 70 Unidade II Figura 23 Disponível em httpsury1comVRQFq Acesso em 15 ago 2023 Em primeiro lugar cabenos definir o conceito de africanidades brasileiras Tratase de um processo de valorização e resgate da história e cultura africana e afrobrasileira a fim de desfazer os estereótipos raciais construídos pelos grupos dominantes brancos homens proprietários livres e ricos Assim podemos dizer que esse é um paradigma que considera a perspectiva dos negros brasileiros na formação da cultura e da sociedade brasileira Significa enxergar o mundo através de uma lente sob a perspectiva dos afrodescendentes segundo define Silva 2003 p 26 A expressão africanidades brasileiras referese às raízes da cultura brasileira que têm origem africana Dizendo de outra forma queremos nos reportar ao modo de ser de viver de organizar suas lutas próprio dos negros brasileiros e de outro lado às marcas da cultura africana que independentemente da origem étnica de cada brasileiro fazem parte do seu diaadia Então estudar africanidades brasileiras significa estudar um jeito de ver a vida o mundo o trabalho de conviver e lutar por sua dignidade próprio dos descendentes de africanos que ao participar da construção da nação brasileira vão deixando nos outros grupos étnicos com que convivem suas influências e ao mesmo tempo recebem e incorporam as daqueles A partir dessas concepções é mister que façamos essa reconstrução histórica por meio de uma perspectiva diferente daquela que temos utilizado em nossas escolas durante tanto tempo Uma perspectiva que reconheça a grande participação dos africanos na formação do Brasil que os apresente não apenas em sua condição de escravizados mas como personagens participantes da construção histórica que com suas culturas línguas formas de organização e economia participaram expressivamente da construção disso que somos hoje 71 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA 61 Pegando o fio da história a África antes de 1500 Aproveitando a expressão o fio da história presente no livro de Cunha Júnior 2010 pretendemos neste tópico chamar a atenção para a História da África antes da chegada dos portugueses à América Isso porque fomos ensinados a pensar a partir de uma série de concepções bastante deturpadas ou incompletas sobre o continente africano e sua população concepções essas em geral propagadas pelo pensamento conservador responsável em grande medida pela formulação do chamado racismo científico Cunha 2010 p 10 Esta indução errônea tem motivos e consequências e elas despolitizam a população negra tornam as identidades negras fragilizadas e permitem a realização de uma ampla desqualificação social das populações negras As ideias permitem a prática da produção de uma hierarquia social na qual nada produzido pela população negra parece ter importância tudo que é produzido pela população branca é bom e necessário É nesse sentido que toda a História da África passou a ser sistematicamente distorcida esquecida ou menosprezada nos livros de História e assim foi transmitida a nós e aos nossos alunos há tantas gerações Vamos começar a rever um pouco tudo isso primeiramente com um trecho de Salum 2005 Para compreendermos a cultura material das sociedades africanas a primeira questão que se impõe é a imagem que até hoje perdura da África como se até sua descoberta fosse esse continente perdido na obscuridade dos primórdios da civilização em plena barbárie numa luta entre Homem e Natureza De fato a história dos povos africanos é a mesma de toda humanidade a da sobrevivência material mas também espiritual intelectual e artística A impressão que temos a partir do que estudamos em nossa vida escolar é de que a África antes do início da exploração portuguesa era um território perdido no mapa com povos primitivos sem cultura escrita e com tribos selvagens que guerreavam e se escravizavam mutuamente Atualmente nosso conhecimento sobre esse continente é tão parco que chegamos a pensar nele como um único país a África Oliva 2003 p 423 inicia seu artigo intitulado A História da África nos bancos escolares representações e imprecisões na literatura didática fazendo a seguinte pergunta O que sabemos sobre a África Repare como sua resposta nos parece infelizmente bastante familiar Quantos de nós estudamos a África quando transitávamos pelos bancos das escolas Quantos tiveram a disciplina História da África nos cursos de História Quantos livros ou textos lemos sobre a questão Tirando as breves incursões pelos programas do National Geographic ou Discovery Channel ou ainda pelas imagens chocantes de um mundo africano em agonia da AIDS que se alastra da fome que esmaga das etnias que se enfrentam com grande violência ou dos safáris e animais exóticos o que sabemos sobre a África Paremos por aqui Ou melhor iniciemos tudo aqui 72 Unidade II Temos que reconhecer que sabemos nada ou quase nada sobre a África A partir dessa primeira constatação cabe a nós educadores a responsabilidade de sanar tal deficiência em nossa formação e procurar nos apropriar dos conteúdos sobre a História da África e dos negros no Brasil disponíveis na íntegra para downloads na internet conforme já indicamos no tópico 4 da unidade I Neste ponto do livrotexto a intenção é apenas sinalizar alguns elementos importantes sobre a História da África tendo em vista o volume enorme de conteúdos passíveis de serem estudados Pare por um momento e observe no mapa a seguir os países que compõem o continente africano É possível perceber a grande quantidade de países Alguns talvez você nunca tenha ouvido falar durante toda sua vida Figura 24 Disponível em httpsacesseonetRtBI Acesso em 15 ago 2023 Segundo a bibliografia indicada ao final do livrotexto o desenvolvimento do continente africano foi superior ao do europeu até praticamente o século XVI quando Portugal iniciou um dos maiores genocídios culturais também chamado de etnocídio jamais visto na história da humanidade Segundo Cunha Junior 2010 p 15 as populações africanas já dominavam inúmeras tecnologias quando foram incorporadas à empresa colonial portuguesa no Brasil a começar pela importação de mão de obra 73 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA especializada principalmente nas áreas têxteis de construção de materiais como madeira e sabão fato que influenciaria decisivamente a economia colonial brasileira em relação à África A compreensão do fio da história africana é necessária para entendimento do desenvolvimento de conhecimentos técnicos profissionais e científicos nas diversas regiões africanas que constituíram um capital cultural significativo e fundamental para a colonização do Brasil sob o domínio português na forma do escravismo criminoso da mão de obra africana O acervo de conhecimentos que possibilitou a empresa de produção colonial portuguesa no Brasil é majoritariamente africano Devemos também acrescentar que muitas regiões do continente africano foram destruídas pelos europeus durante 400 anos de guerras para imposição da dominação ocidental política cultural e econômica A imposição do comércio europeu de produtos africanos e do comércio de seres humanos cativos africanos transformados em escravizados nas Américas foi a que produziu maior devastação no continente africano Hoje existe uma desigualdade social e econômica entre a África e a Europa em razão de o europeu ter subdesenvolvido o continente africano O que queremos reafirmar aqui é a riqueza histórica e cultural dos países africanos a começar pelo Egito por exemplo que pode ser considerado uma das civilizações mais desenvolvidas e antigas do mundo Portanto a História da África não começa no ano de 1500 e não pode ser resumida ao episódio da escravidão de suas populações durante 400 anos de História do Brasil Observação Nunca é demais incentiválo a prosseguir seus estudos na área de Cultura e História da África e dos negros no Brasil Afinal esse conteúdo será necessário para colocar em prática o que dita a Lei 106392003 em suas aulas no futuro Vejamos então de forma específica como as populações africanas se inseriram no processo de formação do nosso país Esse será o assunto do próximo tópico 62 Heranças coloniais africanas e a formação de um país chamado Brasil Primeiramente acompanhe esta breve revisão histórica sabemos que o Brasil é resultado de um longo processo de exploração colonial promovido por Portugal com apoio financeiro da burguesia de então que apesar de ainda não deter o poder político no século XVI já era proprietária de boa parte das riquezas disponíveis na época reservas suficientes para servirem de investimentos às empresas colonizadoras portuguesas rumo às Américas 74 Unidade II Assim é importante ficar claro que já estávamos em pleno capitalismo moderno e que o Brasil nada mais era do que um negócio bastante interessante e promissor tanto para os monarcas portugueses que comandaram politicamente a empreitada colonizadora quanto para os burgueses e homens de negócio da Europa que patrocinavam tais empreendimentos Existe uma linha de raciocínio que já faz parte de nosso senso comum segundo a qual os problemas do Brasil estão diretamente ligados à formação de sua população uma vez que teriam sido mandados para cá os piores cidadãos portugueses indesejados na Europa quase deportados para uma terra onde poderiam fazer do seu jeito todas as coisas reprováveis que antes faziam em Portugal Daí vem também uma das explicações correntes sobre o nosso jeitinho brasileiro no sentido de que as leis não funcionam aqui porque desde a formação do Brasil foram trazidos para cá somente ladrões bandidos vagabundos prostitutas e desocupados de todo tipo Isso não é verdade e a explicação fundamental está no fato de sermos naquela época a empresa mais rentável de Portugal Exemplo de aplicação Pense alguém mandaria para o comando de sua empresa pessoas desqualificadas desonestas e incapazes de fazer aquela empresa crescer e ser ainda mais lucrativa Ou algum empresário em sã consciência seria leviano o bastante para entregar um projeto tão ambicioso como a colonização do Brasil a bandidos e vagabundos que levariam tudo a perder Portanto tínhamos aqui uma base importante para o sustento da monarquia portuguesa que já enfrentava problemas sérios tanto políticos quanto econômicos para se manter nas relações capitalistas europeias daquele momento É nesse sentido que homens e mulheres passam a ser enviados ao Brasil com a incumbência de fazer esse paíscontinente fornecer riquezas suficientes para sustentar os luxos e extravagâncias da família real e sua aristocracia e ao mesmo tempo para pagar os investimentos feitos pela burguesia de então elite econômica durante aquele período Foi com essa mentalidade que os portugueses começaram a explorar de todas as formas o território brasileiro retirando de nossos solos e florestas todas as matériasprimas que tivessem algum valor no mercado capitalista europeu A primeira matériaprima a ser transformada em mercadoria valiosa foi o paubrasil Para isso os portugueses fizeram nas três primeiras décadas de colonização uma interessada aliança com povos indígenas Por estarem em pequeno número os portugueses podiam ser incorporados às aldeias sem causar grandes problemas ao cotidiano das tribos sujeitandose à vontade dos nativos Não que tenha havido uma convivência pacífica entre brancos e índios Ao contrário como afirma Olivieri 2014 75 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA O caráter beligerante das sociedades indígenas brasileiras desmente a versão da história segundo a qual os índios se limitaram a assistir à ocupação da terra pelos europeus sofrendo os efeitos da colonização passivamente Ao contrário nos limites das suas possibilidades resistiram à ocupação territorial lutando bravamente por sua segurança e liberdade Entretanto o contato inicial entre índios e brancos não chegou a ser predominantemente conflituoso Como os europeus estavam em pequeno número podiam ser incorporados à vida social do índio sem afetar a unidade e a autonomia das sociedades tribais Muito cedo entretanto os portugueses perceberam que um dos grandes problemas que teriam em sua missão de exploração brasileira seria a escassez de mão de obra para realizar um trabalho de tão grande monta como o que precisava ser feito por aqui A esse respeito Olivieri 2014 continua Posteriormente quando o processo de colonização promoveu a substituição do extrativismo pela agricultura como principal atividade econômica o padrão de convivência entre os dois grupos raciais sofreu uma profunda alteração o índio passou a ser encarado pelo branco como um obstáculo à posse da terra e uma fonte de mão de obra barata A necessidade de terras e de trabalhadores para a lavoura levou os portugueses a promoverem a expulsão dos índios de seu território bem como a sua escravização Assim a nova sociedade que se erguia no Brasil impunha ao índio uma posição subordinada e dependente Apesar de serem aproximadamente cinco milhões no século XVI população reduzida a cerca de 700 mil hoje no início da exploração portuguesa os índios não foram uma boa fonte de mão de obra escrava conforme pretendiam os colonizadores devido principalmente às guerras que se travaram a partir de 1530 entre brancos e índios e ao extermínio em massa que praticamente dizimou milhões de indígenas nos primeiros séculos de colonização do Brasil Uma solução encontrada foi a de trazer negros africanos vindos de Angola e do Congo para trabalharem na agricultura Como os portugueses já dominavam a arte das navegações não foi difícil forçar populações africanas a se transferirem para o Brasil submetendoos as uma das condições de vida e trabalho mais desumanas que a história já assistiu É interessante que mais uma vez o que aprendemos em nossos bancos escolares a respeito das justificativas sobre o tráfico negreiro aponta os índios como seres acostumados à liberdade e que se recusaram ao trabalho escravo já os negros por estarem acostumados à escravidão já existente no continente africano teriam se submetido mais passivamente à condição de objeto coisa Novamente essas são explicações que não fazem qualquer sentido lógico Assim comentam Munanga e Gomes 2006 p 24 76 Unidade II Dizer que o colonizador português foi para a África buscar escravos que ele adquiria comprandoos pela troca de fumo da Bahia e de outras mercadorias graças à cumplicidade dos reis e príncipes africanos não deixa dúvida sobre a crença na existência dos escravos como categoria natural ou seja na existência de seres humanos que nasceram escravos na África A partir dessa crença podemos já suscitar uma dúvida e fazer uma primeira indagação Algumas pessoas podem nascer escravos ou todos nascem livres até que algum sistema os escravize no decorrer de suas vidas Exemplo de aplicação Você se lembra do tópico em que tratamos do racismo científico que procurou relacionar características naturais às diferentes raças Você consegue enxergar a correspondência entre aquela teoria do racismo científico e o que estamos abordando aqui Mais uma vez podemos verificar como esse processo cujas raízes são profundas perdura até os dias de hoje sendo que tais representações ainda aparecem na maioria dos livros didáticos disponíveis para nossos alunos e professores 63 Diáspora travessia dos escravizados e o constrangimento de seres humanos à condição de objetos A partir de 1550 começam a chegar ao Brasil os primeiros africanos escravizados Tratase de uma recriação da escravidão antiga já extinta na história europeia há séculos agora a serviço de um capitalismo moderno baseado na exploração colonial na economia monopolistamercantil e no trabalho não assalariado dos escravizados Durante mais de três séculos estimase que tenham sido trazidos para o Brasil cerca de 36 milhões de pessoas provocando uma verdadeira diáspora entre os povoados africanos Segundo Schwarcz 2001 p 3839 No Brasil país de larga convivência com a escravidão o cativeiro vigorou durante mais de três séculos e sabese que a diáspora foi de tal vulto que um terço da população africana deixou compulsoriamente seu continente de origem rumo às Américas Um deslocamento dessa monta acabou alterando cores costumes e a própria estrutura da sociedade local A escravidão em primeiro lugar enquanto regime que supõe a posse de um homem por outro legitimou com sua vigência a hierarquia social naturalizou o arbítrio e inibiu toda discussão sobre cidadania A intenção aqui não é apenas recontar nosso passado mas mostrar outras explicações para o nosso presente ainda autoritário hierarquizado e com tantas dificuldades para a efetivação da cidadania plena de sua população Notase que numa sociedade que viveu tantos séculos de escravidão a ideia de servidão e senhorio acabou se naturalizando em nossa mentalidade como se fossem relações normais 77 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA aceitas socialmente reforçando a ideia sugerida por DaMatta 1987 p 76 sobre a formação do Brasil segundo a qual cada coisa tem um lugar e cada lugar tem uma coisa O que isso significa Numa palavra a ausência de valores igualitários Num meio social como o nosso onde cada coisa tem um lugar demarcado e como corolário cada lugar tem sua coisa índios e negros têm uma posição demarcada num sistema de relações sociais concretas sistema que é orientado de modo vertical para cima e para baixo nunca para os lados Fazendo uma pesquisa no site Domínio Público encontramse algumas fotografias de famílias da elite do século XIX registrando alguns de seus escravos É possível perceber nessas imagens esse lugar naturalizado do negro como escravizado conforme observase nas fotos a seguir uma mulher negra somente identificada como ama de leite Mônica ao lado do menino de nome composto Artur Gomes Leal e um homem negro denominado simplesmente de escravo Belisário Figura 25 Disponível em httpsl1nkdevgZDKa Acesso em 15 ago 2023 78 Unidade II Figura 26 Disponível em httpsacesseonegd9TS Acesso em 15 ago 2023 Observação Percebeu onde está a raiz da nossa sociedade extremamente hierarquizada Justamente nessa estratégia de transformar seres humanos em simples objetos coisas a serem usadas exploradas e depois descartadas Você já deve ter ouvido falar dessas questões das tristes condições dos navios negreiros das situações deploráveis às quais africanos eram submetidos já em terras brasileiras para se alimentar dormir trabalhar e viver e aos castigos e suplícios que sofriam por qualquer motivo que fosse ou até sem motivo algum Evidentemente tanto sofrimento é capaz de acabar com qualquer resquício de humanidade e dignidade que possa restar em um ser humano Entretanto outra forma de transformar seres humanos em coisas é apagar definitivamente toda sua herança cultural e histórica o bem mais precioso que temos em nossa construção como pessoa como afirma Schwarcz 2001 p 39 Desterrados de seu continente separados de seus laços de relação pessoal ignorantes da língua e dos costumes os recémchegados se transformavam em boçais na época boçal queria dizer aquele que não conhece a língua e era o termo oposto a ladino que se referia aos cativos já ambientados ou nascidos no país Entendido como propriedade uma peça ou coisa o escravo perdia sua origem e sua personalidade Servus non habent personam o escravo não tem pessoa é um sujeito sem corpo sem antepassados nomes ou bens próprios 79 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA É nesse sentido que toda a história da África foi sendo apagada da vida dos negros agora escravizados no Brasil e também futuramente dos livros que passaram a contar a história apenas sob a perspectiva do branco colonizador E é nesse sentido também que a instituição de uma lei que obrigue as escolas a inserirem em seus currículos a temática da História e Cultura Afrobrasileira e Africana como a Lei 106392003 tornase um fator de tanta relevância para a promoção da igualdade racial em nosso país ainda tão marcado pelas desigualdades e relações hierarquizadas entre as diferentes raçasetnias Conforme já foi dito há pouco foram quase quatro milhões de negros africanos trazidos ao Brasil e escravizados por mais de três séculos Com base nesses dois dados não se pode negar as muitas influências que a cultura brasileira em formação recebeu como herança africana Observação Há uma variedade de livros sobre a história dos negros do Brasil que podem nos demonstrar com detalhes quais foram esses aspectos da cultura e história africanas que ajudaram na formação do país Alguns já foram citados neste livrotexto e estão disponíveis na íntegra para consulta na internet Figura 27 Disponível em httpsl1nqcomijSg5 Acesso em 15 ago 2023 Para o momento basta destacarmos três aspectos da forte presença africana na formação do Brasil segundo Munanga e Gomes 2006 p 2021 no campo econômico os negros serviram como força de trabalho não remunerado ajudando a construir as riquezas que deram sustentação econômica à empresa colonial da época no campo demográfico sem dúvida esse elevado número de africanos agora fazia parte da população brasileira colaborando no trabalho de povoamento desse novo país e 80 Unidade II no campo cultural podemos destacar a influência linguística por meio de inúmeras palavras africanas incorporadas à língua portuguesa falada no Brasil as religiões de matriz africana entre as quais o candomblé e a umbanda e que hoje compõem o campo religioso brasileiro além das inúmeras heranças deixadas no campo das artes por meio de instrumentos musicais ritmos danças entre tantos outros elementos que ajudaram a construir parte da identidade cultural brasileira A esse respeito afirma Narloch 2009 p 71 Esses fenômenos certificam uma boa metáfora que Joaquim Nabuco usa no livro O Abolicionismo clássico do movimento brasileiro pelo fim da escravidão Nabuco dizia que o tráfico negreiro provocou uma união das fronteiras brasileiras e africanas como se a África tivesse aumentado seu território alguns milhares de quilômetros Lançouse por assim dizer uma ponte entre a África e o Brasil pela qual passaram milhões de africanos e estendeuse o hábitat da raça negra das margens do Congo e do Zambeze às do São Francisco e do Paraíba do Sul É preciso que se lembre entretanto que durante toda a história do Brasil essa união de fronteiras foi relegada ao descaso e tudo o que se associasse ao povo africano era considerado ruim inferior e até demoníaco É recente o movimento de valorização e resgate da cultura e da história dos negros sejam africanos sejam afrobrasileiros como parte de um projeto de igualdade racial para o Brasil conforme foi possível perceber por meio das legislações antirracistas vigentes atualmente no país e expostas anteriormente 64 Resistência negra e o movimento abolicionista antes e depois da Lei Áurea Uma primeira pergunta que trazemos do livro de Olivier PétréGrenouilleau A história da escravidão é a seguinte os escravos contribuíram para a sua libertação A resposta do autor é bastante direta Sem dúvida nenhuma Sabemos hoje que sempre e por toda parte os escravos tentaram resistir PétréGrenouilleau 2009 p 130 Alguns historiadores entretanto fazem uma distinção entre dois tipos de resistência a passiva cujas ações não utilizam violência direta como recusa a trabalhar trabalhos malfeitos fugas e faltas e a ativa que remete a movimentos mais coletivos e violentos seja com a organização dos quilombos seja por meio das insurreições guerrilhas entres outros movimentos realizados durante todo o regime escravista no Brasil Já para PétréGrenouilleau 2009 p 130 essa distinção não parece pertinente violenta ou não individual ou coletiva qualquer forma deliberada de resistência por parte de um escravo é digna de ser reconhecida Ela revela na verdade a capacidade do escravo de escapar do tacão ideológico que o senhor tenta lhe impor Dizer que algumas formas de resistência são passivas e outras são ativas leva forçosamente à desvalorização das passivas 81 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA É nesse sentido que queremos enfatizar o caráter extremamente conflituoso da relação escravizador escravizado Durante toda a história da escravidão no Brasil os negros se colocaram de maneiras diversas na luta contra sua condição desumana de escravo e portanto de objeto Segundo Munanga e Gomes 2006 p 98 Podemos dizer que a escravidão sempre foi acompanhada de um forte movimento de resistência e várias revoltas tiveram a presença negra como personagem central na luta pelo fim deste regime desumano e cruel Exemplos dessas ações e reações foram a revolta dos Alfaiates Bahia 1798 a Cabanagem Pará 18351840 a Sabinada Bahia 18371838 e a Balaiada Maranhão 18381841 conhecidas como revoltas urbanas Além das revoltas a organização dos quilombos também contribuiu como força de resistência negra durante esse período Já trabalhamos um pouco sobre temas relativos ao que eram os quilombos naquele contexto de escravidão e resistência Vamos acrescentar o seguinte de acordo com a visão de Moura 1992 p 2425 O quilombo foi incontestavelmente a unidade básica de resistência do escravo Pequeno ou grande estável ou de vida precária em qualquer região onde existia a escravidão lá se encontrava ele como elemento de desgaste do regime servil O fenômeno não era atomizado circunscrito a determinada área geográfica Muitas vezes surpreende pela capacidade de organização pela resistência que oferece Nele se incluem não apenas negros fugitivos mas também índios perseguidos mulatos pessoas perseguidas pela polícia em geral devedores do fisco brancos pobres mulheres sem profissão ou prostitutas Era um cadinho de perseguidos pelo sistema colonial Foram centenas de quilombos espalhados por todos os estados e regiões do país que tiveram duração mais curta ou continuam ativos até os dias de hoje Conforme já havíamos citado Munanga e Gomes 2006 p 71 afirmam na África a palavra quilombo referese a uma associação de homens abertas a todos Sendo assim os quilombos brasileiros podem ser considerados como uma inspiração africana Seu principal objetivo era a implantação de uma nova forma de vida e organização social diferente daquelas próprias da estrutura política colonial e escravista É nesse sentido que fariam parte dos quilombos todas as pessoas consideradas oprimidas pelo sistema colonial e imperial reinantes na época Mas todo esse movimento de resistência negra pouco se relaciona com o movimento abolicionista organizado a partir do século XIX em prol da abolição oficial da escravidão no Brasil Isso porque o abolicionismo foi um movimento considerado conservador pelos historiadores sendo organizado pela classe política da ocasião que procurou trazer pouco ou nenhum prejuízo aos senhores de escravo nesse processo de libertação A preocupação da elite da época era que a abolição se desse de forma pacífica sem sustos nem revoluções Daí as três grandes leis abolicionistas Ventre Livre 1871 Sexagenários 1885 e Áurea 1888 terem oferecido muito mais benefícios aos próprios senhores do que uma nova condição à população negra 82 Unidade II Não houve qualquer planejamento do poder público no sentido de incorporar a mão de obra negra recémliberta ao novo mercado de trabalho nacional naquele momento tampouco se pensou em qualquer forma de indenização aos escravos pelos anos e séculos de exploração sem qualquer tipo de remuneração Ao contrário as leis abolicionistas garantiam aos senhores donos dos escravos altas indenizações quando da libertação de cada um de seus trabalhadores Sobre isso comenta Schwarcz 2001 p 46 O resultado imediato dessa versão organizada e pretensamente cordata de nossa libertação dos escravos foi jogar uma imensa população despreparada e pouco instruída num processo de competição desigual sobretudo com a mãodeobra imigrante que afluía ao país desde os anos de 1870 De toda maneira atrasada ou não o certo é que a abolição era vendida como um presente e enquanto tal uma dádiva nãonegociada O problema foi que se dissimulou um processo de confronto para se investir numa imagem de superação lenta ordenada gradual e controlada pelo Estado Observação Vale destacar que essa foi uma das bases para a sustentação do mito da democracia racial no Brasil como se o processo abolicionista tivesse sido capaz de acabar com todos os conflitos anteriores existentes entre senhores e escravos e a partir da abolição o país passasse a experimentar o estabelecimento de uma relação cordial e amistosa entre esses segmentos Aliás o que a ideologia construída a partir de então procurou fortalecer foi o fato de que todos agora seriam pertencentes a um mesmo grupo a uma mesma classe a de homens e mulheres livres portanto com as mesmas condições de competição e inserção no mercado de trabalho em relação aos recémchegados imigrantes brancos Mas sobre isso vamos precisar nos aprofundar um pouco principalmente sobre essas novas relações e suas principais consequências O fato é que o processo de abolição da escravidão teve no Brasil características muito singulares Primeiramente como já mencionamos antes porque não preparou nenhuma condição para que os negros recém libertos estivessem em igualdade de direitos e oportunidades no mercado de trabalho Ao contrário milhares de imigrantes brancos foram trazidos a partir principalmente do início do século XX a fim de promover o chamado projeto nacional de branqueamento Na citação de Moura 1992 p 57 esse momento histórico fica bastante claro A crise do sistema escravista irá culminar com a Guerra do Paraguai na qual os negros serão envolvidos na sua grande maioria compulsoriamente nela morrendo cerca de 90000 Essa grande sucção de mão de obra negra provocada pela Guerra do Paraguai abriu espaços ainda maiores para 83 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA que o imigrante fosse aproveitado como trabalhador Essa tática de enviar negros à guerra serviu de um lado para branquear a população brasileira e de outro para justificar a política imigrantista que era patrocinada por parcelas significativas do capitalismo nativo e pelo governo de D Pedro II Em segundo lugar tal situação trouxe como consequência a marginalização social das populações negras uma vez que sem possibilidade de trabalho remunerado elas acabaram se instalando nas periferias das cidades nas regiões mais pobres do Brasil dados que ainda são confirmados pelos levantamentos estatísticos atuais conforme pudemos comprovar no tópico sobre as condições de vida dos afrodescendentes na atualidade Um último aspecto que queremos destacar sobre o ideal de branqueamento é que por meio desse processo desenvolveramse as chamadas ideologias raciais do negro e mulato e do branco segundo argumenta Ianni 2004 p 322323 A ideologia racial do branco atua no sentido de promover ou facilitar o ajustamento e o predomínio dos brancos às situações sociais em que se apresentam também negros e mulatos A ideologia do branco só é inteligível como componente de uma consciência social de dominação em que o próprio branco se representa superior aos outros isto é com direito de dispor dos outros As avaliações estereotipadas sobre o negro e o mulato com base em supostos atributos morais ou intelectuais inferiores em comparação com o branco refletem aspectos de uma consciência de dominação que concebe de modo abstrato e absurdo as relações entre as pessoas A ideologia racial do negro por seu lado fundada numa relação de inferioridade em face do branco que detém presumivelmente o poder exprime uma consciência de submissão Nela o negro se imagina em especial a partir dos termos em que é concebido pelo branco Nesse sentido a alienação do negro é mais acentuada pois que ele se vê a partir das abstrações falsas engendradas na mente do branco Essa citação é elucidativa no sentido de percebermos o alcance que tiveram as políticas de branqueamento no Brasil O professor Octavio Ianni realizou suas pesquisas no período de 1955 a 1984 e conseguiu mostrar que o preconceito continuava arraigado na sociedade brasileira com entrevistas que trazem algumas das abstrações sobre os estereótipos construídos por brancos negros e mulatos a respeito das diferenças de cor e de raça Suas pesquisas são minuciosas e conseguem demonstrar com clareza como essas abstrações foram sendo formuladas sustentando até hoje tais estereótipos 84 Unidade II Saiba mais Sugerimos a seguir uma relação de filmes para que você possa aprofundar seu olhar sobre as relações étnicoraciais Após assistir cada filme você pode desenvolver atividades como debater os conteúdos com seus colegas em grupos de discussão escrever resenhas críticas criar fóruns de discussão na internet preparar planos de aulas e atividades para serem desenvolvidas futuramente com seus alunos etc O importante é exercitar e estimular o olhar para a questão étnica e transformar a prática educativa ALÉM da lousa culturas juvenis presente Dir Denise Martha Brasil 2000 14 minutos ENCONTRANDO Forrester Dir Gus Van Sant EUA Sean Connery Laurence Mark 2000 KIRIKU e a feiticeira Dir Michel Ocelot FrançaBélgicaLuxemburgo Les AmateursOdec Kid Cartoons1998 74 minutos LIXO extraordinário Dir Lucy Walker João Jardim Karen Harley BrasilReino Unido Angus Aynsley Hank Levine 2010 99 minutos MARCHA Zumbi dos Palmares contra o racismo pela cidadania e a vida 16951995 Dir Edna Cristina Brasil 1995 115 minutos O FIO da memória Dir Eduardo Coutinho Brasil Cinefilmes Funarte1991 115 minutos O RAP do pequeno príncipe contra as almas sebosas Direção Paulo Caldas e Marcelo Luna Brasil Luis Vidal 2000 75 minutos OLHOS Azuis Dir Bertram Verhaag e Jane Elliott EUA Denkmal Filmgesellschaft 1996 90 minutos 85 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA QUANDO crioulo dança Dir Dilma Lóes Brasil Ministério da Educação e do Desporto Secretaria de Educação Fundamental 1989 28 minutos SEGREDOS e mentiras Dir Mike Leigh GrãBretanha Simon Channing Williams 1996 142 minutos VISTA a minha pele Dir Joel Zito Araújo Brasil Centro de Estudos e Relações de Trabalho e Desigualdades Ceert 2004 15 minutos Na última unidade começaremos nossa abordagem retomando a questão dos estereótipos raciais passando à análise de imagens e representações do negro na literatura e na mídia trazendo a discussão para o campo da educação a fim de pensarmos estratégias para uma educação que promova a igualdade racial 86 Unidade II Resumo No tópico sobre a legislação antirracista brasileira vimos que detemos uma das leis mais modernas do mundo em relação às relações étnicoraciais Entretanto nosso grande desafio está em fazer com que tais direitos sejam cumpridos de fato na vida de cada brasileiro e brasileira Conhecer as nossas diretrizes legais é uma das demonstrações possíveis de nosso exercício de cidadania e no caso dos educadores uma necessidade na prática educativa Por isso convidamos você a retomar suas consultas aos textos originais da Constituição dos Estatutos da Criança e do Adolescente e da Igualdade Racial e de nossas Leis de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional bem como a Lei 106392003 e seus planos de implementação já publicados Em relação aos fundamentos históricos necessários para que sejamos capazes de exercer a profissão de professores segundo as exigências da Lei 106392003 gostaríamos apenas de enfatizar mais uma vez a enorme deficiência nessa área Portanto é imperativo que tenhamos o compromisso com a busca do conhecimento em primeiro lugar sabendo que inúmeras são as fontes disponíveis de consulta e estudo sobre a História da África e das populações africanas e seus descendentes no Brasil Em segundo lugar importa posicionarmonos enquanto coprodutores de africanidades brasileiras promovendo em sala de aula as experiências necessárias para a valorização e resgate das heranças africanas no processo de construção da identidade e da cultura brasileiras Por fim a partir desse novo paradigma é possível enxergar a História da África e suas implicações para a História do Brasil de maneira bastante diferente daquela utilizada nos bancos escolares Assim a apropriação que fazemos de cada fato histórico recontextualizado segundo a perspectiva das africanidades brasileiras abrirá possibilidades e potencialidades na açãorelação educativa capazes de refazer nossas raízes autoritárias e racistas e promover por fim uma realidade de igualdade entre todos e todas 87 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA Exercícios Questão 1 O Parecer CNE 0032004 relativo às Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações ÉtnicoRaciais e para o Ensino de História e Cultura Afrobrasileira e Africana elaborado especialmente para bem informar os educadores e as agências educacionais é um documento útil a toda e qualquer ação profissional e a todo cidadão Isso porque o mito da democracia racial e a ideologia do branqueamento favoreceram a construção e a manutenção de um imaginário coletivo carregado de estereótipos negativos no que tange à África aos africanos e a tudo o que lhes diz respeito Assim sendo não compete exclusivamente aos agentes da educação formal a tarefa de reconstrução desse imaginário e a constituição de uma sociedade verdadeiramente democrática Além de propor a adoção de políticas de ação afirmativa o Parecer busca estimular a formação de identidades positivamente afirmadas Busca estimular a passagem da vergonha ao orgulho de ser negro Certamente uma proposta de renovação dessa natureza produziria resistências a implementação da Lei 106392003 não vem ocorrendo com facilidade A resistência à mudança é verificável nas mais diversas instâncias na ação de professores de administradores escolares e de gestores do poder público e privado entre outras A Lei Federal 106392003 determina a inclusão da temática História e Cultura Afrobrasileira no currículo oficial da rede de ensino O Parecer CNE 0032004 detalha as responsabilidades que competem aos poderes públicos federal estadual e municipal e prioriza algumas ações relativas à implementação da referida lei A seguir apresentamos algumas ações imprescindíveis nos estabelecimentos de ensino Dentre elas assinale a afirmativa que não é verdadeira A Formar professores para o trabalho em sala de aula na perspectiva das relações étnicoraciais B Produzir material didático adequado que desfaça os estereótipos de raçacorgênero C Servirse abundantemente de recursos analógicos que favoreçam o processo de elevação da autoestima de alunos afrodescendentes D Não admitir a abordagem dessa temática fora da sala de aula E Sensibilizar todos os agentes envolvidos nesse processo para um compromisso efetivo com a implantação da igualdade racial na escola e em nosso país Resposta correta alternativa D 88 Unidade II Análise das alternativas A Afirmativa verdadeira Justificativa a formação de professores para o trabalho em sala de aula na perspectiva das relações étnicoraciais constitui uma das ações prioritárias Uma longa história de silêncio a respeito de tudo o que diz respeito à África e aos africanos e seus descendentes impossibilitou a adequada formação identitária e profissional dos cidadãos em geral e dos educadores em particular Tratase agora de preencher lacunas formidáveis nos currículos dos cursos de Pedagogia e na formação continuada de professores B Afirmativa verdadeira Justificativa a produção de material didático que favoreça a desconstrução de estereótipos negativos de raça e etnia é outra prioridade à qual é preciso atender com urgência A análise de livros didáticos e paradidáticos que vêm sendo adotados nas escolas brasileiras permite identificar facilmente boa parte da raiz de problemas nas relações interraciais textos e ilustrações colaboram para gerar e manter estereótipos negativos que por sua vez determinam atitudes e comportamentos preconceituosos e discriminatórios C Afirmativa verdadeira Justificativa os recursos analógicos que podem ser utilizados no ensino contos poemas e representações gráficas entre outros favorecem muito o processo de elevação da autoestima de alunos afrodescendentes A linguagem analógica ao servirse de abundantes expressões metafóricas atinge dimensões afetivas que dificilmente seriam mobilizadas por recursos da linguagem lógicocausal Daí a importância da narrativa oral contos fábulas lendas e mitos para que se atinjam os objetivos educacionais desejados quando tratamos das questões étnicoraciais D Afirmativa falsa Justificativa é preciso que todos os agentes educacionais estejam mobilizados para a tarefa em questão e não apenas os professores em sala de aula Não admitir a abordagem dessa temática fora da sala de aula seria uma conduta absolutamente inapropriada Pelo contrário todo tempo e lugar podem oferecer oportunidade para que se trabalhem essas questões E Afirmativa verdadeira Justificativa conforme assinalado no comentário relativo à afirmativa D a tarefa de superação do racismo é coletiva e demanda a ação de todos Para que isso ocorra no espaço escolar é preciso sensibilizar a todos Somente assim se poderá contar com um compromisso efetivamente assumido com o projeto geral de conquista de igualdade étnicoracial 89 RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS E AFRODESCENDÊNCIA Questão 2 Leia o texto apresentado a seguir Ribeiro 1996 ao tratar da presença da etnia iorubá no Brasil lembra que esse grupo étnico oriundo da Nigéria do Togo e do Benin é muitas vezes aqui identificado como nagô Durante o último período da escravidão os iorubás foram concentrados em zonas urbanas e em regiões suburbanas ricas e desenvolvidas do Norte e do Nordeste particularmente em Salvador e Recife Como ocorre com todas as etnias africanas é impossível dissociarmos sua organização sociocultural de suas práticas religiosas No caso dos iorubás o panteão de suas divindades é em nosso país o mais conhecido e difundido pois embora muitos de nós nunca tenhamos ouvido a palavra iorubá dificilmente encontramos alguém que nunca tenha ouvido a palavra orixás designativa dessas divindades Permaneceram na constituição de nossa vida sociocultural muitas africanidades de origem iorubá o sentido de comunidade os valores relativos à solidariedade e à hospitalidade inúmeros elementos do idioma que segundo o filólogo João Ribeiro foram alterações profundas do idioma português no que diz respeito tanto ao vocabulário quanto ao sistema gramatical Além disso muitos elementos da Religião Tradicional Iorubá constituíram diversas religiões brasileiras de matriz africana e achamse presentes em muitas expressões literárias artísticas e musicais Assim sendo concluise sem dificuldades que a identidade e a cidadania não apenas dos afrodescendentes mas de todos os brasileiros constroemse a partir de importantes elementos de cosmovisões africanas RIBEIRO R I Alma africana no Brasil Os iorubás São Paulo Oduduwa 1996 O texto anterior trata de africanidades brasileiras Leia as afirmativas apresentadas a seguir e assinale a alternativa correta A Considerando que o conceito de africanidades brasileiras inclui o reconhecimento da relevância da presenca negra na formação de nossa sociedade é correto utilizarmos essa expressão quando nos referimos à presença de elementos iorubás em nossa composição sociocultural B Mesmo considerando que o conceito de africanidades brasileiras inclui o reconhecimento da relevância da presença negra na formação de nossa sociedade é incorreto utilizarmos essa expressão quando nos referimos à presença de elementos iorubás em nossa composição sociocultural C A História da África foi sistematicamente distorcida esquecida ou menosprezada nos livros didáticos e paradidáticos A ignorância sobre o povo iorubá por exemplo é justificável dada a grande relevância da história e da mitologia dos povos gregos e romanos na construção da sociedade brasileira D Antes do início da exploração portuguesa a África era habitada por povos primitivos que se escravizavam mutuamente Entre esses povos achavamse incluídos os iorubás E A herança iorubá não é suficientemente expressiva na constituição da identidade nacional brasileira principalmente quando a comparamos com a herança italiana Resposta correta alternativa A 90 Unidade II Análise das alternativas A Afirmativa correta Justificativa como os iorubás integram um dos grupos étnicos da África é correto utilizarmos a expressão africanidades brasileiras ao nos referimos à herança brasileira de elementos dessa etnia B Afirmativa incorreta Justificativa vide justificativa apresentada para a afirmativa A C Afirmativa incorreta Justificativa a construção da sociedade brasileira foi realizada através da participação de africanos europeus e dos povos originários dessa região geográfica Assim sendo não se justifica veicular conhecimentos sobre os europeus e menosprezar conhecimentos sobre a África D Alternativa incorreta Justificativa um grave estereótipo negativo sobre a África é justamente esse que afirma ter sido a África era habitada por povos primitivos que se escravizavam mutuamente e ser de responsabilidade da exploração portuguesa o movimento civilizador naquele continente De fato civilizações bastante desenvolvidas ocupavam o território africano por ocasião da chegada dos europeus e entre esses povos incluemse os iorubás E Alternativa incorreta Justificativa a afirmação de ser a herança iorubá pouco expressiva na constituição da identidade nacional brasileira é incorreta e isso é fato de fácil constatação basta atentar para os vocábulos iorubás no idioma português para as manifestações culturais e religiosas Se comparamos a herança iorubá com a italiana constatamos que ambas se fazem presentes em nossa constituição sociocultural havendo expressivas variações regionais

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