·
Estatística ·
Ciências Políticas
Send your question to AI and receive an answer instantly
Recommended for you
7
Relações Internacionais - Roteiro de Estudos e Questões Essenciais
Ciências Políticas
ESAMC
4
Exercício 2 - Neoliberalismo e Neomarxismo em Relações Internacionais
Ciências Políticas
ESAMC
13
Dissertacao Academica - Racismo Estrutural na Contemporaneidade
Ciências Políticas
ESAMC
16
Análise de Política Externa: Interlocução e Contextos Contemporâneos
Ciências Políticas
ESAMC
7
Analise de Politica Externa em Regime Especial - Roteiro de Estudo
Ciências Políticas
ESAMC
18
Politica Externa Brasileira - Roteiro Trabalho Regime Especial ESAMC
Ciências Políticas
ESAMC
22
Prospecção de Cenários: Uma Abordagem Plural para o Futuro do Brasil em 2020
Ciências Políticas
ESAMC
4
Estudos Estrategicos e Politica de Defesa - Roteiro e Respostas
Ciências Políticas
ESAMC
14
Roteiro Regime Especial - Economia Política Internacional - ESAMC
Ciências Políticas
ESAMC
25
Estudos da Paz: Origens, Desenvolvimentos e Desafios Críticos Atuais
Ciências Políticas
ESAMC
Preview text
Q P UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL Reitor Jose Carlos Ferraz Hennemann ViceReitor e Pr6Reitor de Coordenaao Acadmica Pedro Cezar Dutra Fonseca EDITORA DA UFRGS Diretora Jusamara Vieira Souza Conselho Editorial Analfgia Lia de Paula Ramos cassilda Colin Costa Comelia Eckert Flavio A de 0 Camargo lara Conceio Bitencourt Neves Jose Roberto Iglesias Llicia Sa Rebello M6nica Zielinsky Naill Farenzena SRvia Regina Ferraz Petersen Tania Mara Calli Fonseca Jusamara Vieira Souza presidente t I t f I I I t I I I Repensando as relac6es internacionais Fred Halliday segunda Ediao TRADUAo Cristina Soreanu Pecequilo CONSULTORIA TECNICA DA TRADUAo Paulo Fagundes Visentini UFRGS EDITORA II fl lllOWlflllllll de Fred Halliday 1 a ediao 1999 I J Tftulo original Rethinking international relations London Macmillan Press 1994 Direitos reservados desta ediao Universidade Federal do Rio Grande do Sui Capa Carla M Luzzatto Revisao e editoraao eletrfinica Paulo Ricardo Furaste Campos Serie Relaoes Internacionais e Integraao Coordenada por Paulo G Fagundes Visentini Fred Hlliday Academico britftnico e professor de Relacoes Internacionais na London School of Economics Publicou varios livros sobre o Oriente Medio bern como sobre a Guerra Fria e as revoluoes no Terceiro Mundo Foi membro do Transnational Institute Amsterdam e editor da New Left Review H188r Halliday Fred Repensand as relacoes internacionais I Fred Halliday traduclio de Cristina Soreanu Pecequilo consultoria tecnica da traduclio de Paulo Fagundes Visentini 2ed Porto Alegre Editora da UFRGS 2007 Serle Relacoes Internacionais e Integraclio Titulo original em inglls Rethinking international relations Inclui prefacio a ediclio brasileira e a ediclio inglesa Inclui aplndices 1 Cilncia politics 2 Direito internacional privado 3 Economia internacional 4 RelacOes internacionais 5 Hist6ria contemporiinea 6 Guerra fria 7 Fundamentalismo 8 Materialismo hist6rico 9 Marxismo 10 MulherDireitos humanos I Halliday Fred II Pecequilo Cristina Soreanu III Visentini Paulo Fagundes IV Titulo V Serle CIPBrasil Dados Internacionais de Catalogaclio na Publicaclio Ana LVcia Wagner CRB10t1396 ISBN 9788570259479 CDU327 Agradecimentos da edi9ao inglesa 0 autor e os editores agradecem aos Routledge Journals e aos editores de Economy and Society aos editores de Millennium The Journal of International Studies a Cambridge University Press aos editores de New Left Review Blackwell Publishers e aos editores de Political Studies e aos editores de Review of International Studies por permitirem a reprodu9ao do material de copyright Nota do editor Incluimos como apendices ao livro com a permissao do autor tres artigos representativos no contexto de sua obra Os dois primeiros escri tos durante a crise terminal do campo sovietico enfatizaram premonito riamente as dificuldades intemacionais que adviriam 0 segundo inclu sive inexplicavelmente foi excluido da traducao brasileira de Depois da queda 0 terceiro aborda outra area de especializacao do autor o Oriente Medio Fluente em arabe e outros idiomas da regiao Halliday analisa urn dos grandes problemas contemporaneos o fundamentalismo sumario Prefacio a ediao brasileira 9 Prefacio a ediao inglesa 13 Introduao a importancia do intemacional 15 0 internacional em perspectiva 15 As influencias formativas 18 A emergencia da teoria 20 0 realismo e o behaviorismo 24 As relaoes internacionais desde 1970 30 Os parfimetros do repensamento 33 As teorias em disputa 37 0 empirismo tradicional a hist6ria e a escola inglesa 38 0 empirismo cientffico a atraao do behaviorismo 42 0 neorealismo sistema sem conteudo 45 A hist6ria mais elevada o p6smodernism iti 51 Conclusao outro caminho 60 Urn encontro necessaria o materialismo hist6rico e as rela6es internacionais 61 Urn desafio evitado 61 0 marxismo e os tres grandes debates das RI 64 0 potencial do materialismo hist6rico 69 0 paradigma materialista hist6rico 73 As inibioes da teoria 82 0 marxismo alem da Guerra Fria 85 0 Estado e a sociedade nas rela6es internacionais 87 0 impasse sobre o Estado 87 Definioes em oposiao 91 0 Estado como a tor domestico e internacional 98 Os interesses estatais e as foras sociais 100 As sociedades e os sistemas de Estado 101 A sociedade internacional como homogeneidade Os significados de sociedade internacional 0 transnacionalismo e os seus limites 0 paradigma constitutivo e os seus protgit Bk M Fukuyama As implicaoes para as relacoes internacionais 107 107 116 120 132 1 sexta grande potencia as revoluc6es e o sistema intemacional 137 Urn caso de desatenliO mutua 137 As revolu5es e os seus efeitos 142 A formayao do sistema intemacional 146 Os padroes hist6ricos 148 As ligayoes ddrnesticas e as internacionais 153 As revolu5es e a guerra 157 Ausente das relac6es intemacionais as mulheres e a arena internacional 161 0 silncio das rela5es intemacionais 161 Uma preocupalio emergente quatro dimensoes 166 0 Estado e as mulheres o nacionalismo e os direitos humanos 175 Implicayoes e problemas 182 0 conflito intersistemico o caso da Guerra Fria 187 Uma forma distinta de conflito 187 As teorias da Guerra Fria 188 As fontes de resistncia te6rica 194 A proeminencia da heterogeneidade 197 As implica5es analfticas 201 Urn colapso singular a Uniao Sovietica e a competicao interestatal 207 Uma nova luz sobre velhas questOes 207 A transformayao desde cima 209 A transiyao do socialismo para o capitalismo 211 Os fatores internacionais e a Guerra Fria 214 Urn fracasso comparativo 222 Os tres nfveis de competilio intemacional 227 As rela6es internacionais e o fim da hist6ria 231 0 depois da Guerra Fria 232 Variedades de avalialio hist6rica 237 0 fim da hist6ria 243 As perspectivas para a democracia liberal e a paz 247 Conclusao o futuro das rela6es internacionais 251 0 desafio do normativo 251 As alternativas em pesquisa 256 Apendices 259 Urn mundo urn mito 261 Os finais da Guerra Fria 269 Fundamentalismo e o mundo contemporaneo desafios polfticos e eticos 292 Prefacio a ediao brasileira Os ensaios que formam parte deste livro foram primeiro publi cados no infcio dos anos 1990 Eles se sustentam sob a premissa de que OS eventos e processos intemacionais sao tanto quanto OS da politica e da sociedade domestica passiveis de uma analise racional e comparativa e que este conhecimento pode desempenhar urn pa pel em tomalos mais sujeitos aos controles democraticos lgualmen te eles eram uma resposta ao duplo contexto daqueles tempos por urn lado ao fim da Guerra Fria e o colapso do comunismo e por OUtrO a crescente diversidade dentro da teoria das relaOeS intema cionais que sucedeu a destituiao do realismo como a teoria uni ca ou dominante Minhas pr6prias contribuioes foram concebidas para f9mecer uma consideraao hist6rica e te6rica da conjuntura anterior a Guerra Fria e a sua conclusao e ao mesmo tempo para defender a partir do interior da teoria das relaes intemacionais uma pesquisa que estivesse aberta a analise hist6rica e sociol6gica Desde que escrevi este livro conclui mais outros dois que Ie vam adiante as discuss5es deste volume e que se ocupam do Tercei ro Mundo de uma maneira mais explicita urn Islam and the Myth of Confrontation tenta fomecer uma analise hist6rica e sociol6gica do Oriente Medio em oposiao as considera5es mistificadoras ba seadas na cultura e na religiao Portanto e uma intervenao a res peito dos debates sobre uma area especffica do Terceiro Mundo e os mitos que sao produzidos dentro e fora da regiao sobre ela Aiem dos argumentos dirigidos contra os que reivindicam uma especifici dade particular para a regiao tambem examino questoes individu ais a Revoluao Iraniana a Guerra do Golfo de 19901991 e os direitos humanos a luz de minha abordagem te6rica mais ampla 0 segundo livro que completei Revolution and World Politics de senvolve em maior extensao e mais sistematicamente as discuss5es do Capitulo 6 deste volume ao mesmo tempo em que reafrrmo que as re volues foram uma fora formativa fundamental na hist6ria intemaci onal modema examino em urn grau maior do que o indicadopor este capitulo o papel das ideias intemacionalistas na composiao das revo Iu5es e de suas polfticas extemas Pois apesar de todas as iluses que expressaram as revolues eram produto de algo material as contradi Repensando as rela6es internacionais 9 r oes da modernidade apitalista o mito da revoluao criado em 1789 pode ter morrido em 1989 mas enquanto o capitalismo conti nuar a produzir urn mundo de desigualdade e hierarquia existirao tensoes pollticas e sociais que poderao resultar em formas de con testataao de massa incluindo a revolucionaria Na verdade a glo balizaao dos anos recentes tern produzido urn mundo mais desi gual do que qualquer outro somente por esta razao o estudo das revoluoes pode ser de maior importancia historica As instabilidades e as desigualdades inerentes ao capitalismo global nao precisam ser destacadas para 0 leitor brasileiro 0 tema com o qual comeo este livro e que permeia a sua maior parte e a maneira pela qual os desenvolvimentos sociais e polfticos dentro dos Estados sao em urn grau maior do que o admitido moldados pelos processos internacionais A questao nao e se as aoes dos lideres poHticos sao resultado das instruoes traioes ou represen taoes vindas de fora mas sim qual e 0 impacto intelectual cul tural economico politico e militar da conjuntura historica mun dial sob todas as sociedades em uma determinada epoca Tive a sorte de visitar o Brasil pela primeira vez em 1973 durante 0 auge da ditadura militar e das primeiras aberturas associadas a des compressao da futura presidencia Geisel Nada poderia ilustrar mais graficamente o impacto da Guerra Fria sob os palses do Terceiro Mun do e o uso de doutrinas de segurana internacionalmente legltimas para a repressao domestica do que o Brasil dessa epoca Algumas poucs se manas depois em setembro de 1973 a ligaao entre a Guerra Fna e a repressao domestica foi confirmada para aAmerica Latina como urn todo pelos eventos no Chile a derrubada do govemo da Uniao Popular e o comeo da ditadura Pinochet As visitas ao Brasil em 1994 e 1998 foram em termos politicos a urn pals diferente em plena fluxo de debate polftico e de mobilizaao para a aao polftica o fim da Guerra Fria e o encerramento dos regimes da direita autoritaria pela pressao popular foram processos paralelos Entretanto esta democratizaao acompanhada como o foi pela reforrna economica tambem trouxe o Brasil para a zona de influencia de outro processo internacional a globalizaao Ao fazelo aumentou a sua vul nerabilidade as flutuaoes financeiras e do mercado cuj9 preo foi pago principalmente pelos pobres Enquanto escrevo este prefacio a crise fi nanceira que confronta o Brasil permanece sem soluao a medida que as foras irresponsaveis dos mercados de cambia e de capital mundiais continuam a perseguir beneffcios de curto prazo e a propagar analises alarmistas para sabotar as vidas e o emprego das populaoes de outros pafses Nada coloca mais em questao a validade do modelo presente de globalizaao do que a maneira pela qual a vida de dezenas de milhoes de pessoas esta subordinada a este sistema especulativo de prerrogati vas caprichosas e oligarquicas 10 Fred Halliday 0 maior perigo na analise como na vida real e o da complacen cia da crena que o mundo nao enfrenta grandes problemas e que as pra ticas correntes podem e irao superar quaisquer dificuldades que enfren temos Isto certamente tern sido a disposiao dominante dos anos 1990 pelo menos ate a crise financeira recente que comeou em 1997 Os pro blemas de analisar a historia enquanto ela acontece e os desafios colo cados pela propria teorizaao sugerem que precisamos de uma aborda gem mais critica e ambiciosa para questionar as ortodoxias da polftica e da pesquisa academica Aqui a analise academica e ligada a aao polfti ca em particular ao objetivo de subordinar os processos economicos e sociais ao controle democratico Este empreendimento e necessariamente intemacional pois ele deve olhar para os contextos e as estruturas intemacionais dentro das quais todos os Estados e sociedades precisam funcionar mas tambem porque e por meio do dialogo intemacional atraves das fronteiras e dos conti nentes e desafiando barreiras culturais convencionais que tal repensa mento pode ocorrer Como alguem que se beneficia e temse beneficia do por muitos anos deste dialogo internacional nao somente com cole gas e amigos brasileiros eu ofereo este livro marcado pelo seu tempo e seu Iugar de origem ao leitor brasileiro Todos nos em qualquer pals que estivermos vivendo enfrentamos urn desafio comum de combinar a analise academica com o engajamento racional e democratico aos pro blemas de nosso tempo 0 intemacional considerado por muito tempo imune a compreensao polftica e ao controle democratico requer esta reavaliaao critica Londres Fred Halliday Repensando as rela6es intemacionais 11 Prefacio a edigao inglesa Os capftulos deste livro sao uma dupla resposta aos avanos na te oria polftica na social e no estudo academico das relaoos intemacio nais e as mudanas do pr6prio sistema intemacional ao Iongo dos ulti mos anos em particular o colapso do bloco sovietico Neste sentido e no que pode ser uma reversao da pnitica convencional as reflexoos ge rais e em parte teoricas sao feitas a partir de estudos mais concretos sobre o sistema intemacional e sobre os principais conflitos em seu interior por mimja publicados mais especificamente The Making of the Second Cold War 1983 e Cold War Third World 1989 e urn numero de estudos de caso sobre o Terceiro Mundo Fazendo isso espero simplesmente nao s6 ampliar estas reflexoos sobre as relaoos intemacionais mas tambem extrair hip6teses e questoos que estao em maior ou menor grau nelas presentes As relaoos intemacionais como todas as areas do conheci mento enfrentam dois perigos ode consideraoos factuais desprovidas de reflex6es te6ricas explicativas ou eticas eo de teorizaao sem o apoio da analise hist6rica Minha esperana e que estes ensaios como respos tas a ideias e eventos contomem estes dois perigos Ao fazer algumas observaoos gerais sobre a natureza do sistema intemacional e de onde sua analise pode proceder tambem examinei algumas questoos particu lares Minha intenao e seguir esta visao geral do assunto com dois vo lumes adicionais te6ricos e hist6ricos urn sobre o papel das revoluoos no sistema intemacional e outro sobre a tensao etica entre o nacionalis mo e o intemacionalismo Na prepo destes ensaios beneficieime do estimulo e critica de muitos amigos e colegas ao Iongo da decada passada Em particular gos taria de agradecer aos meus colegas e estudantes no Departamento de Re laoos Intemacionais RI da London School of Economics LSE que atraves de contatos individuais e seminarios gerais de Rl suscitaramme tal desafio e estimulo A Martina Langer do Departamento de RelaOes lntemacionais sempre tao prestativa no auxflio da preparao do texto Tambem gostaria de agradecer aos membros do grupo de discussao de re laOes intemacionais 1990 e aoTransnational Institute por fornecercon textos intelectuais adequados para trabalhar muitas destas ideias Meus maiores agradecimentos a minha parceira Maxine Molyneux cujo apoio e ideias foram tao enriquecedores quanto indispensaveis Repensando as rela6es intemacionais 13 Muitos dos capftulos deste livro foram atualizados e desenvolvi dos a partir de ideias e argumentos contidos em urn conjunto de artigos e ensaios publicados ao Iongo dos ultimos anos em particular partes dos Capftulos 1 e 2 apareceram em Political Studies v 38 n 3 September 1990 Economy and Society v 18 n 3 August 1989 e Millennium v 22 n 2 summer 1993 uma versao previa do Capftulo 4 foi publicada em Millennium v 16 n 2 1987 do Capftulo 5 emMillennium v 21 n 3 winter 1992 do Capftulo 6 em Review of International Studies v 16 n 3 summer 1990 do Capftulo 7 em Millennium v 17 n 3 win ter 1988 do Capftulo 8 em Mike Bowker e Robin Brown eds From Cold War to Collapse Theory and World Politics in the 1980s Cambridge University Pres 1993 do Capftulo 9 em Contention n 2 winter 1992 Capftulos 10 e 11 incluem material de New Left Review n 193 May June 1992 e de Barclay Enterprise Lecture proferida na LSE 17 de maio de 1993 SleepWalking Through History The New World and its Dis contents depois publicada pelo Centro para o Estudo de Govemana Global da London School of Economics Londres Fred Halliday 14 Fred Halliday INTRODUcAo AIMPORTANCIA DO INTERNACIONAL Este capftulo possui dois objetivos primeiro examinar o sig nificado do termo intemacional e a confusao que causae segun do fomecer uiiiidrevecoiisJderaao do crescimento da disciplina e dos fatores ligados a seu desenvolvimento As relaoes intmacio nais RI tern ocupado urn Iugar desconfortavel freqlientemente marginal no estudo e no ensino das ciencias sociais Entretanto seu objeto de estudo 6 nos termos mais simples claro suficiente eAbrange tres formas de interaao as relaoes entre os Estados as aoes naoestatais ou relaoes tiansnacionais atraves das fronteiras e as operaoes do sistema como urn todo dentro do qual os Estados e as sociedades sao os principais componenteEmbora possam variar no destaque que dao a cada uma dessas formas de interaao todas as teorias do intemacional propoem alguma explicaao de cada uma delas Na verdade os principais debates dentro das I giram em tomo em maior ou menor grau dessas tres dimensoes e da pri maia de uma ou de outra 0 INTERNACIONAL EM PERSPECTIVA A diversidade te6rica 6 uma fora nao uma fraqueza das rela 9es 1iiiemaciois 1 As dificuldades experimentadasresidemiiKo em qualquer uniformidade ou paralisia te6rica mas acima de tudo em bases metodol6gicas e hist6ricas Excessivamente defensiva sobre seu pr6prio vigor metodol6gico e disciplinar as RI tern sido tratadas como urn apendice de outras disciplinas mais estabelecidas Polftica nacional economia e sociologia sao os focos principais e o 1A crena em urn paradigma unico como normal e desejavel recebeu confirmaao de The Structure of Scientific Revolution de Thomas Khun London University of Chica go 1962 0 argumento contriirio que a diversidade e desejavel foi feito em Against Method de Paul Feyerabend London NLB 1975 Repensando as rela6es intemacionais 15 intemacional e urn elerrfento excedente uma opao para os estu dantes urn penultimo capftulo para o academico Nas 6ltimas duas decadas a mudana dramatica no status do internacional somente potencializou isso Agora que se tornou moda destacar a difusao do internacional e a destituiao da es pecificidad nacional pela globalizaao esta dimensao antes ne gligenciada tornouse propriedade de todos a exclusao eu lugr i promiscuidadeAlem disso nese prcess o grau de mternacl onalizaao do mimdo atual tern stdo dtstorctdo e exagerado e lo calizado de maneira extremamente simplista em mudanas ocor ridas entre 1945 e 1960 Este reducionismo hist6rico assume vari as formas como a afirmaao injustificada da literatura transnacio nalista sobre a obsolescencia do Estadonaao e do papeda for a ou a invocaao de uma nova era de p6smodemidadei A con tinua adaptaao entre o global e o particular na polftica na cultura e na economia e subestimada assim como se escondem as diver sas hist6rias dos processos internacionais que datam das origens do sistema no seculo XVI Estas duas abordagens a negaao e o exagero nada mais sao do que dois lados da mesma moeda Os que prop5em a ultima constroem sua argumentaao contrapondo o mundo contemporaneo a urn perfodo em que supostamente os Estados as naoes e as sociedades eram se parados e isolados entre si Entretanto a intemacionalizaao nao co meou com urn ercado financeiro global ou com a CNN e sua trans missao mundial pr6prio nacionalismo a despeito de sua evoluao de seu carater aparentemente individual e de sua celebraao do especffico e urn processo intemacional urn produto da mudana intelectual social e econornica compartilhada pelas sociedades e estimulada por sua inte raao nos 6ltimos dis seculoi Na verdae podese argumentar qe Ionge do internacwnal nascer do nacwnal e de uma expansao gradual dos laos entre entidades distintas o processo real se deu de maneira in versa a hist6ria do sistema modemo e a tJJIlaCl onalizaao e da quebra em partes separadiiscrosifxos prexisten ies de pessoas reHg1o e comerdo a premdiaopara a formaao do Estdnaaorn foi 9 4senyolvimento d rima ecoomia e cllltyraintemacional dentro da qual eles s rt1111rm depms Osautores na GraBretanha e nos Estados Unidos alardeiam que durante OS ultimos 20 OU 30 anos as formas de controle polftico e soberania foram corrofdas por processos transnacionais mas esta e uma presunao gigantesca nascida das hist6rias nacionais peculiares e mui 2Este contexto intemacional para a disseminaciio do nacionalismo e reconhecido por varias teorias sejam elas a teoria politica de Elie Kedourie Nationalism London Hutchinson 1960 ou a abordagem sociol6gica de Ernest Gellner Nations and Nationalism Oxford Basil Blackwell 1983 16 Fred Halliday to excepcionais destes Estados Dos 190 Estados soberanos do mundo de hoje ou algo em torno disso somente meia sJuzia esca param de ocupaao extema nos dois seculos passadosfMesmo no caso da GraBretanha por exemplo urn pafs onde a consciencia insular e maior do que nos demais e urn dos poucos a escapar da ocupaao extema nao existe uma hist6ria puramente nacional De Julio Cesar a Santo Agostinho das invasoes anglosaxonicas a 1066 da Reforma a emergencia do Estado Modemo em conflito com os vizinhos europeus ate o tempo do imperio e da guerra mundial nadonal e o internacional sem re interagiram s Estados Unidos aaAiiieiTcaescaparariiaaocupaao es e a m pendencia em 1783 mas todo o seu desenvolvimento tern sido urn de interaao com o intemacionalDesde a aquisiao pela fora e compra da maior parte de seu territ6rio de outros Estados e povos ate o fluxo em massa de populaoes de outros pafses a expansao global de seu poder finan ceiro e industrial em 1890 o sistema polftico americana tern sido Joldado li9intrril9n 92i pafses a perP cl ilSllaridade confo QmiJ0 desenvolvimQtopJltic9 gJt eY9lo novi2t Apesar de terem adquirido legitirnidade pela disserninaao gradual da democracia o Reino Unido e os Estados Unidos foram Estados criados e mantidolaf2J em mais de uma oportunidade Alem disso mesmo a mais breve das pes quisas comparativas mostrara ou pelo menos indicara queJi disserni naao das formas democraticas e a chegada do sufnigio universal foram processos intemacionais resultado tanto de mudanas nas normas quanto 4 do impacto nas diferentes sociedades de seus fenomenos por urn lado da industrializaao e da ascensao da sociedade de mass por outro das pressoes poHticas nascidas das duas guerras mundiaiJO mesmo se aplica a hist6ria das economias nacionais as necessidades da competi ao interestatal moldaram o comercio e a intervenao estatal a planta ao de carvalhos e a construao de estradas a promao da industria da tecnologia e da educaao Igualmente urn processo como a aboliao da escravatura preservada em termos particularistas e etnicos reflete mu danas amp las no comercio internacional e na produao 3 0 que e vivido e normalmente estudado como algQgue acontece1 dentronaejiaissrYer2m9 Peprocessos intiiliI liaP19Ae mfgolfJl e 92fuicAtraves das his t6rias nacionais a competiao intemacional desempenha urn papel formativo bastante central como influencia e exemplo A taxaao para prop6sitos militares e a arrecadaao de taxas no comercio habitam o co raao do Estado modemo o departamento de alfandega e a receita bri tanica gozam de ampla autonornia dos ministerios govemamentais por 3Robin Blackburn The Overthrow of Colonial Slavery 17761848 London Verso 1988 Hfpfnsanclo as wla6es intemacionais 17 que existem ha mais tempofortanto nao pode haver uma hist6ria puramente nacional de qualquer Estado da mesma forma nao pode haver teoria da economia do Estado e das relaoes sociais ne gue o impacto formative residual ou recente do intemacionaJJPor tanto nenhuma das abordagens convencionais a negaao e o exa gero faz justia a questao comum a todos OS cientistas Sociais e que dentro da 6tica particular da disciplina das relaoes intemacionais e a sua preocupaao constitutiva a interaao do nacional e do inter nacional do intemo e do extemo AS INFLUENCIAS FORMATIVAS 0 assunto das relaoes internacionais e como em todas as dis cipJinas academicas localizado ern mais de uma dimensao Todas asjtiencias sociais devem suas origens e desenvolvimento a intera ao com o rnundo de forJ a economia nasceu como uma resposta ao comercio e a industrialhaao dos seculos XVIII e XIX a socio logia da evoluao das sociedades urbanas a antropologia do encontro colonial Ainda assim cada uma tern sua pr6pria agenda como area de estudo na universidade uma necessidade de resistir as modas do momento e as pressoes do poder para olhar com imparcialidade seu objeto urna rnissao de usar sua substancia e metodos como urn meio de aguar e treinar as mentes dos estudantes e seu pr6prio conjunto permanente de preocupaoes disciplinares Nas relaoes intemacionais como evidenciado pelo ambito comum dos cursos oferecidos estas preocupaoes possuem dois aspectos distintos urn e amplamente PJJill e se refere ao papel do Estado nas relaoes intemacionais ao problema da ordem na ausen cia de uma autoridade suprema ao relacionamento entre o poder e a se gurana a interaao da economia com a fora militar as causas do con flito e as bases da cooperaao 0 outro e normative e diz respeito a ques tao de quando e como e legftimo usar aforaAs0briga6es devidas ou nao ao nosso Estado ao Iugar da moralidade nas rela6es intemacionais e aos erros e acertos da intervenao As relaoes intemacionais entretanto sao igualmente locali zadas em uma outra dimensao aquela do mundo real ou talvez mais precisamente naoreflexivo No intemacional como em mais nenhum outro campo da ampla atividade humana o mftico eo ima ginario desempenham urn papel central no discurso cotidiano Bas tase lembrar das foras de identificaao e 6dio nacional da quase que universal incidencia de teorias de conspiraao e suspeitas sobre estrangeiros a extraordinaria ignorancia mesmo entre os mais instru fdos sobre outros pafses e a facilidade com que as paixoes publi 18 Fred Halliday cas sao provocadas pela representaao enganosa doestrangeiro do estranho do outro De todos os estudantes de ciencias sociais nas universidades os de relaoes intemacionais sao os que provavelmente irao encon trar mais incompreensao e ignorancia e os que irao se envolver em mais depuraao conceitual etica e factual Somente isto ja fomece uma relevancia distinta as RI mesmo que empreste urn certo carater laborioso a exploraao das questoes intemacionais Quando pesso as aparentemente instrufdas e experientes incluem em suas discus soes sobre o futuro internacional de outros pafses estere6tipos pri mitives como a mente alema a psicologia japonesa somos to dos lembrados de que ainda precisamos avanar muito Talvez o melhor que as relaoes intemacionais poderiam fazer em sua esfera de atividade seria aplicar o famoso ensinamento de Freud sobre a psicanalise reduzir a neurose a miseria normal de cada dia A rela9ao do estudo academico das relaoes intemacionais com o mundo de fora e certamente moldado e estimulado por outras pre ocupaoes Algumas sao evidentes outras nao A mais 6bvia e que as pessoas sentem que 0 intemacional e importante que e uma fon te de amea9a mais obviamente militar que e uma arena onde gran des beneffcios e perdas economicas podem ocorrer que aparente mente e cada vez mais intrusive nas vidas cotidianas 0 estudo aca dellico das rla9oes intemacionais comeoucomo uma teniativa de pes quisaras causas da niaior deiodasestas intiusoes qual seja guerra e de desenvolver meios para reduzir sua futura incidencia DCfcteiitao ele passou a enIobar uma genda mais ampla em particular de ativida de economica A medida que o mundo muda tambem mudam as ques t6es colocadas para o estudo academico do inteinacional A dificuldade e que a pr6pria pressao das questoes intemacionais e a demanda para sua analise e comentario podem agir nao s6 como urn estimulante e urn re gulador do pensamento mas tambem como urn desvio o resultado e que nao somente a curiosidade com rela9ao ao mundo mas o pr6prio traba lho feito nas universidades e moldado pelo que os financiadores e poli cy makers leem no jomal da manha Determinar a agenda academica das relaoes intemacionais por tais preocupaoes e entretanto perigoso nao s6 pela perda de independencia mas tambem pela perda de perspectiva hist6rica e conceitual Economistas ficam felizes em serem consultados e fazerem comentarios sobre a bolsa de val ores ou a taxa de inflaao os cientistas polfticos podem emitir vis6es sobre os resultados das pr6xi mas eleioes mas nestes casos assim como no das rela96es intemacio nais isto nao deve sera base do que se ensina na universidade Entretanto nas rlaoes intemacionais a pressao e maior por cau sa de urn fator adicional e menos evidente que pode ser definido como sua invisibilidade te6rica A exceao dos que tern como sua profissao Repensando as rela6es intemadonais 19 ensinar e estudar em uma universidade o assunto nao tern uma de finiao alem do sabio comentario sobre as noticias de ontem ou a breve apariao da hist6ria intemacional comparada e contempodi nea Parte disso nasce da confusao diaria sobre a palavra internaci onal 0 proprio termo inventado por Jeremy Bentham em 1780 para indicar OS laos legais entre OS Estados e incorreto considera do o significado subseqtiente do termo naao ja que a men or de suas preocupaoes era a relaao entre as naoes em seu sentido atu al As naoes e Estados podem ou nao coincidir mas mesmo quan do coincidem relaoes convencionalmenteQamadas interna ci9s dizem resfieifoaOte SplSltre OS govemosee as populaoes Alem disso para a maioria aosqueuSaiii o termo assufftOSTntemacionais abrange duas coisas bastante diferentes incluldas nas paginas dos jornais a politica domestica dos outros palses assuntos intemos e os assuntos internacionais propriamen te ditos as relacoes entre os Estados e as sociedades A isto tambem se acrescenta urn problema final e curioso A maio ria das pessoas genericamente interessadas em ciencias sociais esta ci ente do trabalho te6rico em varios campos mesmo que nao possam di zer o que as teorias falam Assim o leitor medio do mais serio dos jor nais ou do New York Review of Books ja tera lido os te6ricos da econo mia como Keynes ou Friedman e sabera dos debates na filosofia entre Rawls Nosick e seus seguidores ou das ideias gerais de Foucault e do p6smodemismo Nas relacoes intemacionais as coisas sao bern dife rentes pois poucos fora da area conhecem qualquer urn dos envolvidos em trabalhos te6ricos e muito menos suas questoes Supoemse que se possa fazer a magica com uma combinacao estimulante de assuntos cor rentes de senso comum e pitadas de referenda hist6rica A preserva ao de equilfurio adequado e criativo entre estas duas dimensoes das re laoes intemacionais a academica e a poHtica e portanto muito mais diffcil Especialmente pela pressao do presente e preciso deixar isto o mais claro posslvel A EMERGENCIA DA TEORIA No restante deste capitulo tentarei fomecer urn breve esboco de como a teorizacao das relacoes internacionais tern caminhado4Q desen volvimento das RI como ode todas as ciencias sociais e produto de tres e nao de dois clrculos concentricos de influencia a mudanca e 0 debate dentro da propria disciplina o impacto dos desenvolvimentos do mun do e a influencia de novas ideias de outras areas da ciencia sociallEn quanto genealogias academicas sao comuns as duas ultimas recibem menos atencao As RI tern urn autoconhecimento muito limitado e uma 20 Fred Halliday consideracao inadequada dos fatores extradisciplinares que as afe tam Entretanto isto e muito evidente OS principais eventos da his t6ria do seculo XX a Primeira e Segunda Guerras Mundiais a Guerra Fria eo seu encerramento moldaram o foco das RI tanto quanto as disputas interparadigmaticas Contudo como qualquer ciencia so cial as RI tendem a esconder estas conexoes por medo da perda de prestfgio intelectual Assirn a arregimentacao do realismo pela Guerra Fria ou o papel da Guerra do Vietna na prornocao da consci encia da interdependencia sao negligenciados Igualmente diferen as nacionais de hist6ria e sociedade tern determinado a analise e a pesquisa o que nos EUA e urn estudo de tomada de decisao pode tornarse na Alemanha a analise da relacao entre a democracia e a poHtica externa4 os palses do Terceiro Mundo estao freqtientemen te preocupados com a dominacao externa os pafses desenvolvidos com a integraao siIDD Jl lJ9JXiJLhiliiQidaQe ge cslnYi m 9txts p3rticulares e em termos anaf1ttcos a rYIScmlPIQ49e4cfficos e negada A hgaao da hist6ria intelectual coma hist6r1aei1igeral per manece intermitente e obscura assim como a das RI com as outras tendciasA nas fiencias sociais s91t deteoria internacitl cafslebsaa caiJitfif 0 tt bbes sobre a natureza do poder Gr6cio sobre o direito internacio nal Kant e Marx sobre as precondioes para o cosmopolitismo sao alguns dos antecedentes mais 6bvios Estas consideraoes sao en tretanto parte de urn empreendimento te6rico mais amplo de hist6 ria direito filosofia teoria politica e raramente emergem como re flexoes sobre urn assunto te6rico distinto o internacional Como uma disciplina acadernica separada as rela6es interna cionais tern menos de urn seculo 0 estudo das rela6es internacio IJJJis c9 1Jw grimejra 9iiiJ1iilI1l eiifocando as fatores que precipitararn a guerra e os meios para prevenir a sua re correncia Foi oeste perlodo que as primeiras cadeiras e departamen tos foram estabelecidos nas universidades britanicas em Aberystwyth LSE e Oxford enquanto na esfera naoacademica o Royal Institute of International Affairs foi fundado para elaborar a polftica publica Con 4Ulrich Albrecht Internationale Politik Munich Oldenbourg 1986 capitulo 9 Das Demokratieproblem in der intemationale Politik 5Para pesquisas disto ver Howard Williams International Relations in Political Theory Milton Keynes Open University Press 1992 Torjbom Knutsen A History of International Relations Theory Manchester Manchester University Press 1992 Teny Nardin e David Mapel eds Traditions of International Ethics Cambridge Cambridge University Press 1992 Martin Wight International Theory The Three Traditions Leicester University Press 1991 Repensando as rela6es intemacionais 21 temporaneamente e pelas mesmas raz6es os departamentos acade micos e o Council on Foreign Relations foram estabelecidos nos Estados Unidos Os tres elementos constitutivos das Rl o interestatal o trans naJqgeoIJfJlisJ prmitemuitasespeclalfzaoesevanas lJQtdagens teodcs Hoje as Rl abrangem como subcampos so mados a teoria intemacional isto e a teorizaao destes tres elemen tosps estudos estrategicos os estudos de conflito e paz a analise de politica extema a economia politica intemacional a organiza ao intemacional e urn grupo de quest6es normatlvas pertinentes a guerra obrigaao soberania e direitosA estes subcampos analiti camente distintos pode ser somado o das especializa6es regionais nos quais as abordagens teoricas sao aplicadas aos estudo de Esta dos individuais e de grupos de Estados Tais subcampos podem nao envolver diferentes perspectivas teoricas mas variam consideravel mente na enfase relativa atribufda as quest6es por exemplo de ide alogia e direito de economia ou de poder militar So nos anos 1980 varias novas quest6es intemacionais foram incorporadas ao ambito analitico da disciplina e ensinadas em curses separados uso do mar e politica dos oceanos mulheres e a arena intemacional as rela6es intemacionais no Terceiro Mundo as quest6es ecologicas as dimen s6es intemacionais da comunicaao dentre outras Os ja abordados crescimento e variaao dos assuntos dentro das RI sao paralelos a uma evoluao nas abordagens teoricas 6 Em sua fase inicial as RI buscaram distinguirse daquelas disciplinas a partir das quais se originaram Assim eram distintas da historia diplomatica intemacional em sua abordagem comparativa e teo rica Ao Iongo do tempo separaramse do direito intemacional com a adoao de uma abordagem normativa e nao positivista e na analise da interaao das dimens6es do intemacional atem do legal Distinguiramse da ciencia polftica ao buscar combinar o poHtico com o economico e o militar e em tomar como seu objeto de ana lise nao o sistema poHtico interne de urn pafs qualquer mas o sis tema internacional caracterizado pela ausencia de uma autoridade soberana e a maior importancia da violencia em seu interior Ape sar disso sua evoluao teorica envolveu emprestimos e a continua 6Para hist6rias gerais e pesquisas de RI ver entre outros Margot Light e AJR Gordon eds International Relations A Handbook of Current Theory London Frances Pinter 1985 2ed para 1994 Steve Smith ed International Relations British andAmerican Perspectives Oxford Basil Blackwell 1985 Hugh Dyer e Leon Mangassarian eds The Study of International Relations The State of the Art London Macmillan 1989 Marc Williams ed International Relations in the Twentieth Century A Reader Basingstoke Macmillan 1989 AJR Gordon e William Onuf International Relations then and now London Routledge 1992 22 Fred Halliday interaao com essas disciplinas bern como outras das ctencias sociais especialmente a economia Duas disciplinas com as quais as RI parecem ligadas apesar de nao existir qualquer relaao sao a sociologia e a geografia Embora como veremos nos Capftillos 3 e 4 as RI tenham utilizado certas ideias da sociologia especial mente sociedade e em seu perfodo formative tenham compar tilhado preocupa6es da geopoHtica nenhuma das duas discipli nas teve urn impacto importante Dentre outras coisas o resultado foi que os desenvolvimentos teoricos subseqlientes nestas discipli nas nao foram reconhecidos dentro das RI Somente recentemen te ao superarem sua fase protecionista e que as RI comearam a explicitamente aprender e contribuir com outras areas das cien cias sociais Urn exemplo relevante deste novo posicionamento e o recente interesse na sociologia historica no domfnio das preo cupa6es estrategicas da guerra e seu impacto na formaao do Es tado e do grau em que o intemacional mais do que os fatores en dogenos determinou o desenvolvimento estatal Seas Rl possussem uma 4isipJin materna esta nao seria a his toria au a denc pglt3 m qcJitito intemadona1 Na Europa con tinental estepadrao prevalece em muiiosaepartameiitos Em sua fase inicial depois da Prime ira Guerra Mundial as RI adotaram uma abor dagem predominantemente legal hoje erroneamente apresentada como utopica ou idealista Esta escola da paz atraves da lei emergiu em parte do liberalismo de Woodrow Wilson e buscou limitar ou pre venir a guerra por tratados intemacionais procedimentos de negocia ao e o crescimento das organiza6es intemacionais especialmente a Liga das Naoes Os crfticos academicos dessa abordagem freqliertte mente referemse a ela como utopismo mas esta e uma categoriza ao enganosa por tres raz6es primeiro porque confunde uma tentati vade regular e melhorar as rela6es intemacionais urn projeto perfei tamente viavel com a perseguiao de urn ideal de uma utopia se gundo porque ignora o que era para Wilson uma precondiao central a efetivaao da paz atraves da lei qual seja a disseminaao geral dai democracia lioeral algo que ele estava errado em antecipar depois da1 Primeira Guerra Mundial mas que como veremos no Capitulo 9 tern implica6es consideraveis para o internacional 7 e terceiro por que ao depreciar os utopicos estes cdticos desacreditam a par tir do proprio conceito e da analise da utopia uma parte duradou ra e valida da teoria social e poHtica Woodrow Wilson The coming age of peace de The State 1918 excerto em Evan Luard ed Basic Texts in International Relations Basingstoke Macmillan 1992 p 26771 Repensando as relac6es internacionais 23 I 0 REALISMO E 0 BEHAVIORISMO Com as crises dos anos 30 o idealismo deu Iugar ao inicialmente com o trabalho de EH Carr e depois com o de varios escritores nos Estados Unidos incluindo Hans Morgenthau Henry Kissinger e Kenneth Waltz1Ies tomam como ponto de par tida a busca do poder dos Estados a centralidade da fora militar dentro deste poder e a inevitabilidade duradoura do conflito em urn mundo de multipla soberania Mesmo nlio negando inteiramente o papel da moralidade do direito e da diplomacia os realistas dlio maior peso a fora militar como instrumento de manutenao da pazles acreditavam que o mecanisme central para rgJar o cggflito era o equilfbrio dePQg atraves do qual a fora maior de urn Estado seria eoiiiiiensada pelo aumento da for a ou pel a ex pan sao das alianas dos outros est Jtla ra dada no sistema mas tambem poderia ser promovicfiicgntnemiite Paialelamente urn grupo de realistas do lado europeu doAtlantico desenvolveu o que ficou conhecido como a escola inglesa Charles Manning Martin Wight Hedley Bull e Fred N offfiedgeefizrm o grau mggyellla intrncionl era amirqui0 isto e sem urn go vfl9xntxal 9 Eles perceberam is so nlio CClllO CS mas como urn erto tipo de sociedade isto e urn grupo de Estados que intera gjll deacoroocOm certa convenoesEstas inclufam a diplomacia o direito internacional o equilfbrio de poder o papel dos grandes poderes e mais controvertidamente a propria guerraEsta escola continua a produzir trabalhos consistentes com orientalio e quali dade como e evidente nos escritos de Alan James Michael Done lan James Mayall Adam Watson e outros 10 Depois da Segunda Guerra Mundial com o crescimento do estudo academico das rela5es intemacionais o realismo se tornou a a bordagem dominante senlio unica na area Ele possufamtXPJcalio poderosa e abrangente das rela5es internacionalse do conflito Em 8 EH Carr The Twenty Years Crisis London Macmillan 1966 Hans Morgenthau Politics Among Nations 5ed New York Alfred Knopf 1978 Henry Kissinger A World Restored Boston Houghton Mifflin 1957 Kenneth Waltz Man the State and War New York Columbia University Press 1954 Hedley Bull The Anarchical Society Oxford Oxford University Press 1977 Fred Northedge The International Political System London Faber Faber 1976 10 Alan James Sovereign Statehood London Allen Unwin 1986 e seu contraataque aos desenvolvimentos te6ricos recentes nas RI The realism of realism the state and the study of international relations Review of International Studies v15 n2 July 1989 Michael Donelan Elements of International Political Theory Oxford Clarendon 1990 James Mayall Nationalism and International Society Cambridge Cambridge University Press 1990 Adam Watson The Evolution of International Society London Routledge 1992 24 Fred Halliday muitos debates publicos nos quais os assuntos internacionais eram discutidos ele estava em harmonia com o senso comum Alem dis so os eventos dos anos 30 e suas conseq tienchis reiifiiiliaramno po derosamente e sem contestalio N ormalmente pressuposto como uma evolulio dentro do mundo de lfngua inglesa Qealismo arti clllclllikas a dNQs esprFa ciraides de os anos 20 11 Na veraade muitos dos temas centrais do realismo apirecemcomo descendentes domesticados do darwinismo soci al militarista e racista do final do seculo XIX e infcio do XX Ao mesmo tempo seria de se esperar que a crescente preocupalio da ciencia polftica com o poder e com suas formas nlio constitucionais embasassem esta tendencia de estudo da polftica de poder dentro do campo academico das rela5es internacionais 12 0 domfnio do realismo comeou a ser desafiado nos anos 1960 permanecendo sob presslio desde entao 13j partir de 1960 o beha viorismo apareceu como uma alternativa as RI ortodoxas como a outras areas das ciencias sociais nos nfveis metodol6gico e con peitualDesta maneira a nova escola cientffica das rela5es in ternacionais quase exclusivamente americana buscou afastarse dos usos tradicionalistas da hist6ria e de termos polfticos ortodo xos como Estado em direao a urn novo estudo quantificadc e do que podia ser observado isto e do comportamento que neste caso eram os processos e os relacionamentos internacionais Karl Deutsch estudou o crescimento das comunicaoes internacionais James Rosenau enfocou as intera5es informais liga5es trans nacionais entre as sociedades que passavam ao largo das rela5es ortodoxas entre EstadoEstado Morton Kaplan desenvolveu teo rizacoes mais cientificas dos sistemas internacionais 14 Nas rela 5es internacionais aconteceu urn debate variado e freqlientemente amargo entre tradicionalistas e behavioristas espelhado na substancia e nas nuances dos temaslevantados em discussoes pa ralelas dentro da ciencia polftica As crfticas severas de Bernard Cri ck o analista da polftica sobre a ciencia polftica dos Estados Uni dos tiveram equivalentes nas Rl Nesta troca na qual ambos os lados ultrapassaram suas competencias filos6ficas e metodol6gi Carl Schmitt The Concept of the Political New Brunswick NJ Rutgers University Press 1975 12Charles Merrian Political Power New York McGrawHill 1939 Harold Lasswell Who Gets What When How Cleveland Ohio The World Publishing Company 1958 13Para uma critica irrefutavel das afirmaoes realistas ver Justin Rosenberg Whats the matter with realism Review of International Studies v16 n3 October 1990 14Karl Deutsch Nationalism and Social Communications New York Wiley 1953 James Rosenau ed Linkage Politics New York Free Press 1969 Morton Kaplan System and Process in International Politics New York Wiley 1957 Repensando as rela6es intemacionais 25 I cas a escola inglesa permaneceu firme contrapondo historia e julgamento contra o que era visto como a abordagem vulgar e enganosamente cientffica da ciencia politica americana 15 A is to deveremos voltar no Capitulo 1 A tentativa completa dos behavioristas de suplantar as RI tradi cionais falhou em tres aspectoschaves Primeiro o realismo e a sua posterior variaao o neorealismo mantemse como a abordagem dominante dentro do estudo academico e de polfticas das relaoes internacionais 16 Segundo o proprio desafio teorico colocado pelo behaviorismo para suplantar o estudo precientffico do Estado e de outros conceitos historicos convencionais com uma nova teorizaao cientffica nao foi Ionge o bastante principalmente porque falhou em fornecer uma teorizaao alternativa do proprio Estado Terceiro sua promessa de teorizaao e angariamento de fundos para chegar a gran des novas conclusoes sustentada pela fora da coleta de dados nun ca foi cumprida No fim o behaviorismo tor urn acessorio ao inves de uma alternativa a abofdigerii centrada no Estado Apesar disso a partir do desafio behaviorista e das posteriores teorizaoes dos fatores transnacionais e sistemicos uma nova variedade de subcam itffs1iW5frfno economia politica internacionaliAssim se o ealtsmo eo neoreat mo continuaram predominado eles nao mats tmham o monopoho intelectual ou institucional dentro da disciplina Ramos da abordagem behaviorista da analise de polftica extema da interdependencia e da economia politica intemacional conseguiram conquistar urn Iugar per manente no conjunto da discussao A analise de politica externa o estudo de fatores determman do resultados de politica externa e decisoes em particular foi uma tentativa ambiciosa e em muitos aspectos bemsucedida de desafi ar os pilares centrais do realismoY Ao buscll1i cmg Pf tica extema e formulada ela rejeitou agumas das preiDISaS reahs tas centrais as de que o Estado pode ser tratado com umator unita rio que pode ser levado a agir racionalmente para maximizar seu poder e defender o ilttlaQrtl que o carater interne e as m Este debate e resumido em Klaus Knorr e James Rosenau eds Contending Approaches to International Politics Princeton Princeton University Press 1969 Ver tambem o debate contemporaneo entre Rosenau e Northedge emMillenium vS n1 1976 16Sou particularmente grato ao meu colega Michael Banks por sua consideraclio do deate ver por exemplo seu The interparadigm debate em Light e Groom eds lnternatwnal Relations 17Ver em particular o capitulo em Light e Groom eds International Relations de Christopher Hill e Margot Light 26 Fred Halliday fljeilUIIJJSJ9QLLratag2PllltP est do de sua polfttc tlla parttcularmente esta ultima e uma aas relvindicaao favoritas de Waltz Pelo contrario a analise de polfti ca extema examinou a composiao do processo de sua formulaao primeiro em termos de fragmentaao e rivalidade burocratica e in dividual dentro do Estado e entao em termos de demandas polfti cas mais amplas incluindo as das legislaturas da imprensa da opi niaoiublica e da ideologia Esta abordagem abriu a possibilidade para o estudo comparado da p itica extema e das formas pelas quais as diferentes caracteristi cas constitucionais hisoricas e sociais afetam sua formulaao e a im plementaao algo antes exclufdo pela negaao realista da relevancia dos fatores intemosJA conclusao alcanada por este caminho nas investigaoes intemacionais e nas domesticas foi que a premissa da racionalidad deveria dar Iugar asJqtJyrocr1if tfffi as conseqli8iiclas niioiniendonals As nusoes individuais e de grupos ao pensamento de grupo e assim por diante A suposiao de que os Estados poderiam ser tratados como maximizadores racionais de po der e calculadores do interesse nacional provouse uma base inade quada e equivocada para a analise de politica extema 0 mais importante desafio da analise de polftica foi entretan to a reivindicaao realista de que OS Estados podem ser tratados unicamente como unidades em urn ambiente sem referenda as suas estruturas intemas e as mudanas dentro deles 0 que a analise de polftica extema procurou mostrar foi nao somente que sua aborda gem incorporando fatores domesticos poderia fomecer uma con sideraao mais persuasiva da formulaao da politica extema e de suas irracionalidades mas tambem que era necessaria identificar as formas pelas quais os ambientes domesticos e os processes dos pa fses eram afetados por fatores exterilos estivesse o Estado envolvi do ou nao nesta interaao Este foi evidentemente o caso dos pro cesses economicos altetaoes no preo mundial do petroleo tinham efeitos sobre os pafses independentemente do que os govemos es colhessem fazer e tambem dentro de varies processes ideol6gicos e politicos As sociedades estavam interagindo de forma transnacio nal e estas ligaoes ao inves das interestatais estavam tendo urn impacto na politica extema Confrontados com tais desafios e influ encias extemas OS Estados dependendo das circunsdincias agiam para acomodalas ou evitalas A analise de politica extema nascida da rejeiao behaviorista de conceifosliisiiiiidoiirus no cfesenvoiveuumaieodado EstadoEia tiiinataiiioem outras Iiiiiitaoes uma preocupaaoestritfutichi cizada com decisoes e urn conceito sociologicamente ingenue do ambiente intemo Por esta razao ela falhou em aproveitar a opor Repensando as rela6es intemacionais 27 I tunidade que depois beneficiaria a literatura da sociologia hist6ri ca de uma analise abrangente e combinada dos papeis internes e externos dos Estados Mesmo assim foram as conquistas da analise de polltica extema que levantaram esta questao e tornaram possfvel examinar a relaao internoexterno sob uma nova luz Neste contexte surgiu uma abordagem diversa baseada na Jn terdenendencia urn conceito utilizado para examinar como as so 4 rr ctddes e os Estados estao e tmndo ada yJJl l mterhgaQ e as conseqiiehcias de talprocesso 0 desenvolvimento da literatura sobre interdepeiidnCla ilustra bern as oportunidades e armadilhas do rconhecimento 4a conli nt llstl e lijiijlfioriaI Apesar de fomecer urn quadro para examinar esta ligaao ela fre quentemente tern levado a simplificaao da relayiiO e a facil afirma aO de que tudo agora e interdependente A interdependencia e urn termo que tern estado intermitentemente em voga par urn seculo Em seu uso contempodineo ele se originou como urn conceito na economia onde comparativamente tinha urn sen tido mais claro de acordo com o qual duas economias sao interdepen dentes quando existe uma relativa igualdade de poder entre elas e quando sua interaao mutua e tal que cada uma e significativamente vulneravel as aoes da outra A interconexao produzia vulnerabilidade e a partir daf auava como uma restriao ao que as outras poderiam fazer Em sua fonna chssica a percepao era de fato que o aumento do comercio entre as naoes fortaleceria a paz uma ideia de sensa comum antes da Pri meira Guerra Mundial mas que desde entiio nao era ouvida Sua ree mergencia nos anos 1970 foi tanto uma resposta a eventos economicos o declfnio do d6lar a elevaao dos preos da OPEP Organizaao dos Pafses Produtores e Exportadores de Petr6le quanto ao impacto politico dentro dos EUA da Guerra do Vietnapm sua formulaao dos anos 1970 e especialmente no trabalho de Robert Keohane e Joseph Nye ela se sustentava em tres proposiyoes que o Estado estava per dendo a sua posiao dominante nas relay6es internacionais para atores e foras naoestatais como as corporaoes multinacionais que nao mais existia uma hierarquia de questoes internacionais com os assun tos mJitares e estrategicos a high politics no topo e as questoes eco nornicas e de bemestar a low politics mais abaixo e que o poder mi litar estaya perdendo sua importancia nas relaoes intemacionaisf Mesmo se a visao realista de urn mundo estrategicamente orientado e estatocentrico tivesse sido verdadeira no perfodo anterior este nao mais era o caso a medida que as antigas barreiras cafram e as foras econo micas e polfticas prestavam cada vez menos atenao ao Estado Robert Keohane e Joseph Nye eds Transnational Relations and World Politics Cambridge MA Harvard University Press 1971 28 Fred Halliday A teoria da interdependencia foi criticada a partir de vanas pers pectivas Waltz argumentou que ela era historicamente erronea ja que a interdependencia havia sido em varios aspectos muito maior no passado do que no presente 19 Waltz e outros encararam a maior interaao como estimulando o conflito boas cercas fazem bons vizinhos eles disseram Northedge e Bull contestaram a visao de que para os Estados era verdadeiro ou desejavel perder o controle sobre suas populaoes ou ceder a responsabilidade de administra ao de assuntos internacionais apesar de toda discussao sobre as questoes globais e os bens comuns universais eram os Estados que por bern ou por mal continuavam responsaveis pela resoluao destas questoes de paz fome e ecologia Os indivfduos continua vam se identificando tanto quanto antes com os Estados e os consi deravam como essenciais para o desempenho de funoes de segu rana representaao e bemestar Os marxistas apontaram que a in terdependencia aplicavase na melhor das hip6teses a urn peque no grupo de pafses ocidentais desenvolvidos e que sua utilizaylio nas rela6es NorteSui escondia assimetrias de poder e riqueza que eram causadas pelo sistema imperialista A ideia de interdependencia tambem perdeu importancia com a deterioraao das rela6es internacionais no final dos anos 1970 e infcio dos 1980 Nos contextos lesteoeste e do Terceiro Mundo parecia me nos evidente que o poder rnilitar havia perdido sua importancia as rela oes internacionais pareciam concentrarse uma vez mais e de uma for ma bastante tradicional nos Estados e nos grandes poderes em particu lar a substituiao1 ou o desprezo ao Estado assumiam em muitos casos uma forma maligna Ionge do que tinham previsto os expoentes liberais da teoria da interdependencia seja em situaoes de guerra civil Lfba no Sri Lanka como no crescimento dos processes transnacionais que nao eram bemvindos o terrorismo a poluiao e o voo de capitais dentre eles Os atores naoestatais como os novos movimentos sociais nao eram todos benignos assim como os primeiros inclufam facoes religi osas famticas e movimentos de juventude racista junto com o Oxfam o Bandaid e Anistia Intemacional a ultima categoria inclufa a Mafia e o Cartel de Medellin 19Kenneth Waltz The myth of national interdependence em Charles Kindleberger ed The International Corporation Cambridge MA MIT Press 1970 Repensando as rela6es intemacionais 29 I AS RELAOES INTERNACIONAIS DESDE 1970 Os desafios do behaviorismo da interdependencia e da eco nomia polftica internacional ao realismo minaram seu monop6lio anterior na area e produziram uma disciplina mais competitiva e diversa Isto por sua vez encorajou a emergencia de varias outras abordagens defendendo ou rejeitando o realismo A reafirmaao do realismo o ltmSFllflisni61 a qual voltarei no Capftulo Ilespondeu as preocupa6esda ecoriomia poHtica in temacional mas buscou restabelecer a primazia dos Estados e das preocupa6es polfticomilitares dentro de sua analise global Assim Stephen Krasner atribuiu o fracasso dos Estados do Terceiro Mundo em arregimentar apoio para sua Nova Ordem Economica Intemaci onal nao a sua fraqueza economica mas ao inves dis so a sua fra queza como Estados e a sua adesao a principios que se chocavam J com os dos Estados dominantes no sistema internacional 20 Robert Tucker destacou o contfnuo papel dos gran des poderes e da fora militar na manutenao do sistema internacional e imputou a pobre za dos Estados do Terceiro Mundo a fatores polfticos e economicos end6genos 21 Os pilares centrais do neorealismo foram entretanto J ostos com maior clareza em dois trabalhos do final dos anos 970 he Anarchical Society de Hedley Bull e Theory of Internatwnal e ations de Kenneth Wattilcujos argumentos sao revistos critica mente nos Capftulos 4 e 1 respectivamente 22 Ambos reconhece ram e buscaram refutar as crfticas das duas ultimas decadas Desta for ma procuraram destacar a JJjQJa d EtaQ2 J1J1Jl internaio nal e opqderPP1Por4Jlcls llorsioestatais Ao ntesmo tempo eles debateram qu os soSQnomJCOs como qutsqur outras atividades transnaciOnatsrqYQtnque osEst4s provtdenct assem a segurana earegylaijQnecessarias para a sua contiiiu1dadeEles eram ceticos quanto as reivindicaOeS de que a interdependencia estava aumentando e destacaram a contfnua importancia dos grandes poderes na administraao das rela6es intemacionais jara o bern ou pata o mal Se o neorealismo respondeu as crfticas ao realismo pela reafir maaO de seus pilares tradicionais outros levaram a analise das RI para ainda mais Ionge da ortodoxia estabelecida Em uma extensao radical do behaviorismo John Burton em seu World Society e outros trabalhos desenvolveu uma teoria de rela6es intemacionais baseada nas necessi dades individuais e no conjunto de questoes geradas por estas ne 20Stephen Krasner Structural Conflict The Third World Against Global Liberalism Berkeley University of California Press 1985 21Robert Tucker The Inequality of Nations London Martin Robertson 1977 22Kenneth Waltz Theory of International Relations New York Random House 1979 30 Fred Halliday cessidades 23 Na visao de Burton o sistema internacional era par tanto uma teia de intera6es definidas por questoes dentro das quais as estruturas especfficas do poder militar e estatal desempenhavam urn papel distinto mas nao exclusive ou predominante Enfatizan do a resoluao do conflito atraves das media6es de grupos peque nos ou individuais o trabalho de Burton rompeu e forma extrava gante com a visao das rela6es intemacionais centrada no Estado pela introduaO de uma analise e abordagem alternativa de polftica Paralelamente no Projeto de Modelagem de Ordem Mundial Richard Falk desenvolveu uma teoria de alternativas e oposi6es ao poder do Estado no nfvel intemacional baseada nas necessidades huma nas e nas intera6es transnacionais e naoestatais 0 aprofundamento da relaao entre o mJttismo e as RI cons titui outro desenvolvimento nao ortodoxo Cfos anos 1970 e 1980 e sera discutido no Capftulo 2 Como ja indicado a porta de entrada do marxismo nas RI foi a questao do subdesenvolvimento e de muitas maneiras ele permaneceu conflnadoaesta iireaAvisao marxista classica altemativa sobre o desenvolvimento foi descon siderada segundo a qual interessava ao capitalismo desenvolver o Terceiro Mundo assim como algum de seus conceitos funda mentais mais relevantes para as preocupa6es das RI referentes as causas das guerra ao papel das classes e ao carater da ideolo gia nao foram utilizados na analise internacional Ao defender a primazia de uma agenda alternativa as rela6es NorteSui e as estruturas internacionais de exploraao o marxismo deixou as rela6es intemacionais inc6lumes A separaao das RI da influen cia marxista foi maior do que nas outras areas das ciencias sociais e certamente foi causada pela predominancia dos escritos ameri canos na area que refletiam urn clima intelectual no qual o mar xismo estava totalmente ausente Somente nos anos 1980 esta situaao comeOU a mudar Dentro dos escritos da economia poHtica internacionalhouve uma aplicaaO dos conceitos marxistas para analisar as causas e as conseqliencias de urn mercado cada vez mais internacionalizado e das novas formas que ele estava assuminJeno da analise de poHtica extema tomouse pos sfvel nao somente exarhinar como os fatores burocraticos e constitucio nais afetavam resultaoos polfticos mas tambem como eles mesmos eram moldados pelos fatores hist6ricos e sociais mais amp los incluindo fato 23John Burton World Society Cambridge Cambridge University Press 1972 Para uma critica de Burton ver Christopher Hill Implications of the world society perspective for national foreign policies em Michael Banks ed Conflict in World Society A New Perspective on International Relations Brighton Wheatsheaf 1984 Repensando as rela6es intemacionais 31 I res intemos de classe 24 0 papel dos setores de produao militar na promoao e exagero da confrontaao intemacional e urn exemplo 6bvio e nao negligenchivel disto 0 crescimento da literatura de s6ciologia hist6rica sabre as questoes da competiao internacional e da formaao de Estado cri ticamente engajada com o marxismo forneceu uma oportunidade particularmente frutifera para urn novo trabalho sabre as relaoes ex6genasend6genas e sabre as formas pelas quais os Estados in teragem com o sistema mundial 25 taJitXE Pssyl diQtir o mais imprante 11egligenciaclo elelllto do realismo 9 seja sua fClP galrritQriaLde tqo urn assuno ao qual voltarei no Cap1tulo 3uase todo o debate entre o reahsmo eo marxismo tern girado efntorno do problema do Estado mas raramente se reconhece que isto envolve duas concep6es bastan te distintas de Estado que levam a conjuntos diferentes de ques t6es uma das concep6es e a legalterritorial emprestada do di t reito e da ciencia politica tradicional a outra e o conceito alterna tive emprestado do marxismo e da sociologia weberiana segun do o qual o Estado e percebido como uma entidade administrati vacoercitiva urn aparato dentro dos paises e das sociedades ao inves do pais como urn todstas concepoes incluem as inopor tunas questoes de como o iiirernacional e o domestico interagem e como as rela6es entre os Estados e as pessoas sao afetadas pelos fatores internacionais em mudana sejam estes o papel dos Esta dos na guerra ou a transformaao de padroes internacionais para o reconhecimento de urn governo legitime Uma corrente ainda mais recente e critica a surgir das RI foi a in fluenciada pelo feminismo assunto do Capitulo 6 deste livro Ate a me tade dos anos 1980 as RI pareciam ser mais indiferentes as quest6es de genera do que qualquer outra area das ciencias sociais uma situaao gerada pela aceitaao generalizada da distinao entre uma area conven cionalmente masculina da alta politica da segurana internacional e do statecraft e uma feminina de domesticidade de rela6es interpes soais e de localidade Esta indiferena mutua tern entretanto sido subs 24Para uma abordagem sociol6gica altemativa a polftica extema ver David Gibbs The Political Economy of Thirld World Intervention Mines Money and US policy in the Congo Crisis London University of Chicago Press 1991 25Exemplos desta interaao entre a sociologia hist6rica e o intemacional incluem John Hall Powers and Liberties London Pelican 1986 e Michael Mann The Sources of Social Power vol 1 Cambridge Cambridge University Press 1988 Estas questoes foram exploradas adicionalmente em urna serie de seminruios patrocinados pelo Economic and Social Research Council sob o titulo Structural Decline in the West realizados em Cambridge entre 1988 e 1991 As atas da primeira destas conferncias esHio em Michael Mann ed The Rise and Decline of the Nation State Oxford Basil Blackwell 1990 32 Fred Halliday tituida face a dois processes convergentes Urn provem da esfera da politica em varias areas da politica internacional as quest6es de genera ganharam proeminencia em anos recentes Estas incluem as quest6es referentes as mulheres nos processes de desenvolvimento ao direito internacional e as politicas da CE com relaao as mulhe res e aos impactos diferentes sabre homens e mulheres de proces ses socioeconomicos dentre eles a migraao e as politicas de ajus te estrutural A dispersao do envolvimento das mulheres em movi mentos contra a guerra e as armas nucleares gerou urn outro ponto de interseao especifica de generaEm uma area bastante diferente os escritos feministas comearam a discutir alguns conceitos cen trais da teoria das RI questionando sua neutralidade de generqlEs tes inluem os conceitos de interesse nacional segurana poder e dlreltos humanos todos aprsentiiRrsifaTilerafura dominante como netitros contudo como 0 reexame feminista tern rilostiado cada urn deles tern urn significado de genera implicito Acima de tudo o fe 1 mm1smo como as outras teonas que enfatizam os direitos individu ais e sociais questiona o nucleo da pratica convencional das rela 6es intemacionais o valor supremo da soberania Por exemplo o estabelecimento de Estados independentes levou em muitos paises a deterioraao da posiao das mulheres visavis OS homens com afirma6es de soberania e identidade nacional sendo usadas para negar a legitimidade de tais questoes Existe portanto urn espao consideravel na pratica e na teoria para os questionamentos femi nistas frente as reivindica6es do nacionalismo e a suposta autori dade do Estado soberano OS PARAMETROS DO REPENSAMENTO Este capitulo discutiu que o taacional nao e um com E2e adisioul1u recente da reah ae Qf1 e pohhcliIilaS l111 4eeJmntoscruraaourosecoiistitutivos fguafmeiiteere debateu o Iugar dasRI emseucontexioTntefetuaT e hist6rico mais amplo Antes de mais nada a parceria entre as RI e as outras cien cias sociais pode ser definida pela abordagem conjunta que estas disciplinas podem oferecer sabre temas domesticos e internacio nais na consideraao de questoes especificas ou eventos e possi vel analisar em que medida o internacional desempenha ou nao urn papel determinante 26 Tres grupos de t6picos interrelacionados se 26Dois exemplos o papel do imperialismo em mol dare distorcer as economias nacionais dos Estados do Terceiro Mundo o papel da Guerra Fria no fortalecimento do govemo centralizado nos EUA e na producao de urn estado de segurana nacional Repensando as rela6es intemacionais 33 I mostraram presentes 0 primeiro foi 0 dequestoes de odapoJif ca no sentido mais tradicional e normattvo do termo o ng ao seja Plla com a amilia o Esado ou a soctedde cosopolt ta de justia de sua tmplementaao ns nvets nawnal e mterna cional e de seu conflito com valores nvats espectalmente a segu rana da Iegitimidade da fora e da coerao dentro e entre os Estados do direito de resistir a Estados sberan 27 m segQ Iugar existe urn conjunto de questoes teoncas nontidalIruJ mais contempodineo a analise do poder a relaao etre as estru turas pollticas economicas e ideol6gics a relevacta dos mode los de escolha racional para a aao soctal e a pohttca para os Es tados as instituioes e os individuos dentro dels 28 Finalmente existe o fsscste livro a expltaao e ststeiJas politicos e sociais a ludos deteriiinants domesttcos e mternact nais ada niyl 9nact2nll e o mtemactQlllYOna arcYCTodavia como indicado acima a separaao dos dts mves udo assim como ada ciencia politic e ds relaoes ntrnact onais tern causado danos a explicaao e anahse Coo Ja arg mentado nao e possivel explicar as politicas de Estados mdtvtduats sem referencia a varios fatores intermicionats do pasado e do pe sente internacioial nao e lgo la fora uma area da pohtca que pode ser convenctonalmente tgnorada e que oaswnamente se m tromete com bombas ou pros mais altos do petroleo 0 mternactonal antecede desempenha urn papel foivo na constituiao e n emer gencia do Estado e do sistema polfticIOgdo fuEJlYl11 neameltUJQtpfvAQlltj eJlJcional e ousc maxtrmzar ss beneficios em urn domfnio para meihorar sas pos19oes no outro s necessidades da competiao interestatal exphcam mmto do desenvolvt mento do Estado moderno enquanto a mobilizaao dos recursos domes ticos e os cotistrangimentos internes dao conta do sucesso dos Esa dos nesta coinpetiao Disciplinas como a cenci politica e a soct logia por urn ado e as relaoes internaclOnats por outro estt Jt olhando para dua tneJlU IJleSJrlO fQeS sem mtru 27Para trabalhos sobre isto ver as referencias na nota 5 tarnbem hares Beitz Poliiical Theory and International Relations Princeton Princetn Umverstty Prs 1979 e Sovereignty and morality in international affairs em Davtd Held e Polztzcal Theory Today Cambridge Polity Press 1991Andrew Linklater Menand Cznens m the ThtoY of International Relations London Macmillan 1981 e Beyond Realzs and Marxzsm Critical Theory and International Relations OxfordOxford Umverstty Press 198 John Vincent Human Rights and International Relatzons Oxford Oxford Umverstty Press 1988 2sEste e dentre outras coisas o domfnio da economia intemaconal Ve m particular Susan Strange States and Markets An Introduction to Internatzonal Polztzcal Economy London Pinter 1988 34 Fred Halliday soes exageradas ou a negaao da especificidade do outro isto po deria sugerir uma relaao estavel e produtiva Contudosta relaao somente pode concretizarse se a disci plina se tornar mais consciente dos tres circulos de influencia que atuam sobre ela e em particular dos fatores externos que os afetam aceitando sua propria sociologia do conhecimentoJUm corpo de pensamento pode relacionarse de maneira efetiva e crftica como mundo real ao se distanciar destas conexoes sem eliminalas e ao estabelecer um conjunto de prioridades e ao perceber como sao afetadas pelos fatores externos A hist6ria das RI fornece muitos exemplos de como este constrangimento externo nao foi adequada mente reconhecido como o fazep a hist6ria da ciencia social e mesmo aquela da ciencia naturalfAs prioridades da area principal mente tern sido as prioridades das elites e dos Estados quando nao diretamente estabelecidas pelas demandas das agencias financiado rasso P9Pbis2nto 1fL2J9liitQdotrablb9 l2T outras duas dimensOgt6es Yitalas e naQdiGJti i oologiaJPNtQJ1tepsJJttasutilizadas 0 poder de 9etermil1ll9 d resultados depende talQJildeterminaaQ quis qllesoesngo so vantadas quanta Cia exclusao de metodos inaceitavei ou dtimRPE ao de uma anaJ2i9ular A representaao extraordinariamente en gartostrfeltapeTas RI do conflito dominante da ultima metade do seculo XX a Guerra Fria assunto discutido nos Capitulos 7 a 9 e um caso mar cante dQhlgica tnilQfgPsstiilis1miito seryfnd9 QOlttrliluminar IDlPM9JlJ1QQI2isoJ2il9ico Igualmente o dominic das superiores metodologias cientificis tas ou de seu oposto convencional os conceitos ahistoricos do siste ma internacional serviram para escbnder outras formas de discus sao dentro da disciplina especialmente sobre o papel dos valores e sobre a ligaao entre as politicas domesticas e as internacionais Como o Capitulo 3 indica na politica domestica e na internacional o ponto de partida o ator e o conceito central o Estado serve a fun 6es ideol6gicas analogas Se a recuperaao da hist6ria das RI eilJ volve a recuperaao de todos os tres niveis o da disciplina o dal ciencia social e o da propria hist6ria uma reconstituiao ou repeli samento do assunto devera simultaneamente estar consciente de sr significado em todas essas tres dimensoes Os capftulos seguintes sao uma tentativa de repensar as rela 6es internacionais ao Iongo destas linhas 0 proximo capitulo ten ta fornecer uma crftica a partir do interior da disciplina das quatro tendencias principais da literatura os outros cinco buscam ampliar a discussao para relacionar as rela6es internacionais a urn conceito mais geral de ciencia social enquanto os ultimos quatro contextua lizam o assunto historicamente e abordam as respostas dos especia Repensando as rela6es internacionais 35 I listas da area Entretanto o teste de qualquer repensamento resi dira tanto em seu compromisso disciplinar ou metodol6gico quanta nas pesquisas e nas analises das hist6rias dos Estados e das sociedades que ele prop5e e incentiva 36 Fred Halliday f i Capitulo 1 AS TEORIAS EM DISPUTA A lntroduao buscou fomecer consideraoes resumidas sabre os problemas e os desafios enfrentados pelas rela5es intemacionais Nos anos recentes face a estes desafios a disciplina tern sido rachada por uma serie de debates metodol6gicos cujos objetivos declarados sao resolver as incertezas e estabelecer uma relaao mais rigorosacom o mundo real Contudo ate agora na maioria dos casas o resultado nao teve maior clareza no metoda ou uma interaao mais equilibrada com a hist6ria Dentro das abordagens estabelecidas houve uma reafirmaao de verdades e no caso das novas teorias urn mergulho na confusio rodeios gerados pela introspecao academica e uma negaao do sig nificado e dos desafios da hist6ria Por urn lado a invocaao da hist6 ria como urn culto aos fatos serviu para negar a historicidade a mu dana e o contexto polltico ou intelectual e por outro a metateo ria solenemente anunciada os debates sabre como escrever teoria tomaramse descolados da analise substantiva A questao nao e criticar a especializaao academica ou o desen volvimento te6rico ambos sao como ja deixado clara essenciais Mas existe boa especializaao e o autoisolamento Jutil existe o trabalho te 6rico rigoroso tao clara quanta possfvel e com potencial explicativo e existe a teoria que nao e nada disso teoricista no sentido de teoria pela teoria freqUentemente cobrindo velho terreno filos6fico ao preten der dizer algo novo pretensiosa onde lhe falta substiincia e confusa mesmo indolente quando e possfvel uma formulaao altemativa Neste sentido duas diretrizes metodol6gicas sao as mais im portantes A primeira e que o se escrever sabre Rl e preciso ser metodoJogicamente consciente e explicito As RI nao sao metodo logicamente especfficas dentro das ciencias sociais Os problemas que tern de fato e de valor de racionalidade e de interpretaao sao os mesmos das outras ciencias sociais o internacional nao tern urn privilegio epistemol6gico ou qualquer outro 1 Este foi persisten 1Este e urn ponto bern desenvolvido no estimulante trabalho de Charles Reynolds The World of States An Introduction to Explanation and Theory Aldershot Edward Elgar 1992 Repensando as rela6es intemacionais 37 I temente o erro do terceiro debate que nasceu nas RI no final dos anos 19802 A tentativa de resolver estas questoes atraves da discus sao so mente do intemacional ou de escrever sabre as RI em separa do dos debates das outras ciencias sociais e presunosa Segundo dado que as RI se referem a urn determinado assun to seja este o real o concreto na hist6ria ou o que for ttstecj IUa teoria e 0 SeU poder explicativo e nao 0 seu distanciamell PJetodol6gico A abstraao pode ser necessaria mas como urn ca minho para a explicaao A altemativa a rna teoria nao e empirismo mas boa teoria em suas dimensoes conceitual e explicativaftios anos recentes as RI tern sido muito empfricas e abstratas e a maior parte da teorizaao nao possui sustentaao na explicaao historical Tomando estas diretrizes como urn ponto de partida este capi tulo examina as quatro abordagens mais substanciais que em varios momentos das decadas passadas vern sendo propostas como solu oes para os desafios enfrentados pelas relaoes intemacionais Es tas sao o empirismo tradicional o empirismo cientffico o neo realismo e o p6smodernismo 0 EMPIRISMO TRADICIONAL A HISTORIA E A ESCOLA INGLESA Todas as ciencias sociais enfrentam dentro e fora das discipli nas o debate que os fatos sao suficientes e que as teorias os con ceitos e a linguagem especializada sao desnecessarias exemplos de jargao ou de pretensao academica Nas rela6es intemacionais isto e particularmente verdadeiro como resnltado de sua invisibilida de muitos daquees preocupados com as questoes internacimais ou que tern uma opiniao sobre elas parecem nao estar consctentes de que existe uma literatura especializada conceitualmente especf fica sabre o assunto Dentro da disciplina tambem existem pressoes equivalentes os historiadores da diplomacia sao cautelosos frente a conceitos e modelos rapidamente os apontam como aberraoes pa literatura repetidamente se neg a a necssidade de tal abalho 3 Jara os estudantes tendo contato com a area pela pnmetra vez a ideia de que existe a necessidade de urn trabalho te6rico freqtit mente vern como mna surpresa nao basta conhecer os fatosfao 2Yosi Lapid The third debate On the prospects of international theory in a positivist era International Studies Quarterly September 1989 0 que a teoria precisava nlio era p6spositivismo mas urn retorno a algumas boas fundacoes prepositivistas 3Dois dentre muitos exemplos ver Michael Howard The Lessons of History Oxford Clarendon 1991 e Walter Laqueur World of Secrets The Uses andAbuses of Intelligence London Weidenfeld Nicholson 1985 38 Fred Halliday consiste o conhecimento do intemacional na observaao do maior numero possfvel de fatos4 Todavia fatos nao sao nas RI ou em qual er outra disci lina sUttctentes As en teas contra o empirismo aparecem freqtientemente em ou tros debates como nos da sociologia e se aplicam ao estudo do intema cional e de todas as outras ciencias sociais5 Primeiro e preciso ha ver alguma preconcepao de quais fatos sao significativos e quais nao sao Os fatos sao inumeraveis e nao falam por si mesmos Para qualquer urn academico ou nao e preciso haver criteria de signifi cado Segundo qualquer conjunto de fatos mesmo se aceito como verdadeiro e significativo pode levar a diferentes interpreta96es o debate sobre as lioes dos anos 1930 nao e sobre o que aconteceu nos anos 1930 mas sobre a interpreto destes eventos Omesino se aplica ao fim da Guerra Fna nos anos 1980 Terceiro nenhum agente humano academico ou nao pode contentarse som nte com os fatos toda a atividade social envolve questoes marais de certo e de errado e estas podem por definiao nao serem decididas por fatosNo terreno do intemacional tais questoes eticasestao disp a questao giiJPlllde QIl hl4yse ledecer J nQilrmuQmuni9Qrtuliorm9 9 ID111clQ JQ psmo 91 avm grYRQacirlJ7 a questao da intervenao a soberania e urn valor supremo ou outros Estados e agentes podem intervir nos assuntos intemos dos demais a questao dos direitos hu manos como definilos eles sao universais No campo das RI a linha divis6ria inicial entre os fatos e a teoria foi traada entre a abordagem hist6rica do intemacional baseada na hist6ria diplomatica e as primeiras tentativas de trazer para as rela oes intemacionais urn trabalho comparado e te6rico sobre o intema cional Em muitos aspectos esta divisao foi superada em varios traba lhos que usain OS desenvolvimentos conceituais das RI para elucidar fases ou epis6dios particulares da hist6ria intemacional6 Nos de mais urn argumento futil e simplista continua a respeito da locali zaao desta linha divis6ria entre as RI e a hist6ria internacional 4No mundo anglosaxlio em particular o empirismo tern o status de uma reHgilio secu lar a habilidade intelectual e misturada com conhecimento geral por esta razlio a competicao britanica por alguem que sabe tantos fatos quanto possivel aparecer sob o nome Cerebro da Inglaterra 5Para duas criticas poderosas do empirismo ver C Wright Mills The Sociological Imagination Oxford Oxford University Press 1959 e David e Judith Willers Systematic Empiricism Critique of a Pseudoscience Heme Hempstead Prentice Hall 1973 6Sobre isto ver o ensaio perceptivo History and Internationalelations de Christopher Hill em Steve Smith eds International Relations British anican Approaches Oxford Basil Blackwell 1985 e seu proprio Decision Making in British Foreign Policy Cambridge Cambridge University Press 1990 Repensando as relaes intemadonais 39 I Nissa a questao real sobre a importancia de uma abordagem abran gente qe relcione o factual e o especfico o copratio e o teorico e perdtda de vtsta em uma d1scussao sabre a h1st6na sem arquivos ou a analise intemacional sem conceitos Uma tentativa conjunta de se mover alem da hist6ria tradicional e para dentro de urn novo terreno te6rico embora guardando uma pers pectiva e urn metoda empfrico traicional foi representada ela es cola inglesa urn corpo de escritres que comeou a produz1r traba lhos nos anos 1950 e 1960 e que ainda hoje possui influencia nas universidades britanicas 6s foras da escola inglesa sao evidentes uma forte resistencia as modas do presentismo uma resoluta insis tencia sabre a durabilidade do constrangimento e da necessidade na esfera internacional unia enfase na repetiao dos conceitos e dos valores no estudo das relat6es internacionais e por fim uma funda ao s61ida na hist6ri Em seus trabalhos existe mais substancia ex plicativa e desafio te6rico do que na maioria da literatur supostamente mais cientffica e contemporanea que buscou substitufla Dois dos conceitos mais centrais da escola inglesa Esta QQ de sao foco dos capftulos subseqlientes Alem das difiCuldades 1evantadas por estes termok a escola inglesa como se reflete no trabalhos de Martin Wight permanece em alguns as pectos limitada por suas origens presa a sua preocupaao em igua larse aos historiadores da diplomada e as bases conceituais que as RI trouxeram consigo da hist6ria intemacional 7 Em primeiro Iugar o conceito de hist6ria com o qual Wight tra balha e curiosamente limitado reis e rainhas congresses e batalhas tra tados e leis Ao permanecer ligado aos historiadores Wight falhou em acompanhar as mudanas no pr6prio conceito de hist6ria o economico e o sociallhe permaneceram estranhos Ao se ler Martin Wight o que e mais surpreendente e qu uso da hist6ria em seli trabalho mesmo bri lhante e erudito e urn nao mais praticado em larga medida pelos pr6 prios historiadoresIgualmente enquanto Wight e seus seguidores insis tem na importancia das questoes filos6ficas e tern o seu esquema con ceitual especificamente a sociedade internacional o seu conceito de filosofia polftica e igualmente datado consistindo no exame e no reexa me de urn conjunto detemas recorrentes favoravelmente agrupados por Wight em tres categorias transfst6ricas de racionalismo realismo e re volucionismo Como urn antfdoto ao present1smo e como urn meio de trazer a tona questoes conceituais analfticas e eticas IUbjacentes a 7Para as crfticas previas da escola inglesa ver Michael Nicholson The enigma of Martin Wight Review of International Studies 1981 v 7 January 1981 Roy Jones The English school of international relations A case for closure Review of International Studies v7 n1 1981 40 Fred Halliday discussao das relaoes internacionais isto foi produtivo Entretan to ela falhou em reconhecer ate onde evolufra a filosofia polftica e como esta oferecia a possibilidade de formas mais diferentes e con vincentes de polftica incluindo a teoria internacional Em varios aspectos foi urn infortunio da escola inglesa que as suas investigaoes filos6ficas isto e a sua deduao de fundamentos te6ricos dentro do intemacional terem sido formuladas pouco antes do grande renascimento da teoria polftica nos anos 1970 e 19808 0 famoso ensaio de Wight Why is There no International Theory pressupoe urn conceito particular de teoria uma filosofia classica substantiva que foi superado por outros escritos quase ao mesmo tempo em que foi publicado 9 A estas limitaoes mais gerais deve ser somado o uso dos concei tos como sera explorado em maior extensao nos capftulos seguintes os termos centrais usados por Wight e Bull sociedade e Estado nao recebem adequada ou mesmo explfcita elaboraao conceitual As defi nioes sao introduzidas ou inferidas de uma forma que serve ao argu mento geral mas que com isso elimina outras possibilidades de expli caao e elaboraao conceitual questao mais 6bvia de todas derivada das afirmaoes ainda nao questionadas da hist6ria diplomatica e sobre o que constitui o pr6prio sistema intemacionalefinilo em termos do crescimento das relaoes entre OS Estados e valido mas isso tambem localiza a hist6ria intemacional no ambito diplomatico e interestatal e supoe que 0 intemacional e composto pelas relaoes entre OS Estados individuais As hist6rias altemativas e os conceitos do internacional po dem ser escritas considerando outros pontos de partida como o econo mico e o social dentrci dos quais o polftico e o llilitar desempenham urn papel importante Os trabalhos de Uobsbawm Wallerstein Krippendorf Wolfe mais recentemente Rosenberg sao exemplos disso o mfnimo qu pode ser dito e que eles fomecem uma hist6riaQ3tanlt diferente dQsis tema intemacional e envolvem urn CEio diferenciado de respostas etictyersao ortoctbre 0 seu jresCiltO e SQQre ensao da sociedadeiiiferilacional 10 8Para duas visoes ver Quentin Skinner ed The Return of Grand Theory in the Human Social Sciences Cambridge Cambridge University Press 1985 Perry Anderson A Zone of Engagement London Verso 1992 9Em Herbert Butterfield e Martin Wight eds Diplomatic Investigations London Allen Unwin 1996 A deferencia a definicao dos historiadores do assunto e presente mes mo no titulo do volume 10Ver Capftulo 3 p568 613 Hepensando as rela6es intemacionais 41 0 EMPIRISMO CIENTIFICO A ATRAAO DO BEHAVIORISMO Uma autoproclamada altemativa a abordagem empirista sustentada pelos fatos nasceu nos anos 1950 e 1960 da revolUao cientlfica dentro das ciencias sociais e da ascensao do behaviorismo como uma altemativa as consirlera6es hist6ricas e empfricas A escola behaviorista anunciou a possibilidade de uma nova ciencia social quantitativa ahist6rica e rosaJgpJlP ntemac enasQYtras Ao mesmo tempoen VOfveu uma critica das escolas preexistentes comoinfundadas e ultrapas sadas Contudo o debate qlle gerou entre Hedley Bulle Fred Northedge do lado tradicional e entre James Rosenau e Morton Kaplan no lade beha viorista foi em ambos os casos equivocadamente orientadoU Em primeiro Iugar este ba sobre metoda formalmente ad quiriu o caniter de confronto entre uas tradisoes nacionais uma aar dagem inglesa e uma americana Esta rna representaao alem de obs curecer as questoes filos6ficas envolvidas serviu para apresentar as rela 6es intemacionais como que de algoma f9rma agrupadas em dois cam pos implicitamente monolftidos e nacionais Ao fazelo escondeu a sua diversidade como a ascensao da econolrlia polltica inteinacional no caso britanico e a grande amplitude de abordagens te6ricas e polfticas no ame ricana Em outras palvras serviu para reforsar a ortodoxia e a polemic ultima estava particularmente evidentena forma pela qual OS escritores naoamericanos nas tradioes criticas tratavam as rela6es intemacionais americanas coino urn todo as vezes imperialita algo que estava Ionge de ser o caso politicamente malorientada e analiticamente imprecisa esta pratica continua com resultados negatives perrnanentDiferencas his t6ricas e re ionais de fato moldam OS escritos de RI rna nao necessaria mente de uma fo omoge As presun6es do behaviorismo norte amencano facilmente encontram semelhanas na complacencia de seus oponentes a historiografia inglesa ou o desafio antiimperialista 12 Segundo embora a critica do empirismo possa ser valida a altemati va oferecida por escritores como James Rosenau ou J D Singer13 foi 11Para materiais sobre este debate vera polmica entre Fred Northedge e James Rosenau em Millenium v5 nl 1976 e os capftulos em Klaus Knorr e James Rosenau eds Contending Approaches to International Politics Princeton Princeton University Press 1969 Para uma previa percepao da crltica inglesa da ciencia polftica americana tocando em muitas das mesmas questoes levantadas no debate das Rl ver Bernard Crick The American Science of Politics London Routledge Kegan Paul 1959 12Ekkehart Krippendorf The dominance of American approaches in IR em Hugh Dyer e Leon Margassaran eds The Study of International Relations The State of the Art London Macmillan 1989 James Rosenau The Scientific Study of Foreign Policy 2ed London Pinter 1980 JP Singer ed Quantitative International Politics New York Free Press 1965 42 Fred Halliday espa 22jetiygiRLintificasou de ciencias sociais em geral M lliltefundamentadas euma JIB9 igpora a necess lla tprevtlJPOImto humane aipmossibiliglflJ anahse semnteto 1Jgmfica9oQPapcidasiJlJlYMla iumana Alem dtsso a despeito de reivindicaoes de cientificismo o behaiorismo funciona dentro de urn conceito ilegftimo de iencia se fm dtto que os polfticos seutilizam de concep6es de economistis mar to muitos cietistas sociais nao poucos nas RI valemse de precon cettos dos falectdos fil6sofos da ciencia como John Stuart Mill 1806 73 Em muitas areas da ciencia natural a prediao nlio e urn criteria de vahdade Igualmente as ciencias naturais tambem funcionam com mui tos oceitos que nao podem ser quantificados ou apresentados com prectsao Iromcamente para os positivistas a ciencia natural freqtiente mente trabalha com urn conceito de analise bastante semelhante ao de julgament Sdsprezado quando usado pelos tradicionalistas Na verdade fot tromco que no auge do behaviorismo e de sua reivindica a ingenua d ciencia Kuhn tenha publicado sua Structure of Sci entific Revolutzons mostrando como fatores alheios institucionais mol dam d fi 14 0 d agen as espect teas porque os EUA em muitos aspectos uma soctedade modema terem fetto tanto espalhafato para metodologias ultrapassadas e uma curiosidade tanto quanta a falta de urn sistema nacional bancario r A este cassos metodol6gicos deve ser somado o aspecto esre nl de tal posttltsmo com em outras cincias sociais as grandesestru turas e quantlficaao e algebra geralmente produziram banalidades obscundades ou ambas na pressa de evitar categorias institucionais su postamente ultrapassadas como Estado ou guerra os academicos fieram s e interaoe cnfusas ou de excesso taxinomico na rejei ao dahtstona os behatostsproduziram conclus6es que freqtiente mente tgnoram a analogta histonca e que exageram a especificidade de fenomenos contempodineos ed a globalizaao 1 Vf s resulds d behaiorismo nas RI sao portanto pobres a re Jlla behavtonsta functonou como urn pesado desvio intelectual e r 1 dtsctplmar P la acumulaao via delados e collparaoes transist6ri 1 1Ji cas sem sentido Entanto alem de uma bemvmda sacudida no 1 batesohrepdolgulfas conseguencias f6rteis seguifam tr Como Ja dtscutldo na Introduao surgiu uma ampla exploraao do process de formulaao de poht1ca extema conhecida como analise de pohtlca extema A segunda conseqtiencia positiva foi a exploraao de novas formas de interacao intemacional agrupadas sabre o termo interdependencia Para duas outras criticas bastante diferentes da visao ortodoxa do metodo cientffico ver Rom Harre The Philosophies of Science London Cambridge University Press 1972 e Paul Feyerabend Against Method London NLB 1975 Repmsando as rela6es intemacionais 43 Se estas foram conquistas significativas da virada cientffica das RI elas fdram obtidas nao por causa da reorientaao da disciplina mas apesar dela Por todo o lado muitas das piores caracterfsticas desta revoluao iriam ser percebidas a busca louca por uma precisao e prediao enganosas a crescente absorao pela disciplina de lingua gem trivial e privada afirmaoes trabalhadas e exaltadas do obvio Urn exemplo desta abordagem foi a tentativa de fomecer uma base empiricamente precisa para as teorias sobre as causas da guerra 15 Outro foi a afirmaao sem profundidade conceitual ou historica da supera ao do Estado pelo desenvolvimento transnacional Mesmo os que nao foram sugados pelos espirais metodologicos dos behavioristas mais comprometidos apresentavam a sua propria nova abordagem em oposiao a preocupaao supostamente ultrapassada com o Estado a despeito de seus insights esta foi uma falha permanente no trabalho de James Rosenau 0 resultado final foi o fracasso em quebrar as pre missas teoricas da escola realista dominante e o seu conceito de Esta do Muitos que comearam a anunciar a superaao do Estado pelo novo fenomeno transnacional nos anos 1960 terminaram aceitando a sua continua atualidade e relevancia teorica oferecendo sugestoes para o aperfeioamento da abordagem realista Robert Keohane urn dos fundadores da abordagem transnaci onalista e urn importante exemplo disto e urn dos autores mais li dos e inovadores trabalhando com a teoria das relaoes intemacio nais Dentre os escritos influenciados pelo behaviorismo seu traba lho de 1970 estava entre os melhores e menos dogmaticos e cien tfficos Publicado em 1984 After Hegemony marcou uma impor tante mudana no gebate sobre o transnacionalo pois se utili zou de uma das suposi96es centrais do realismo a de gue nao haver ordem no sistema sem grandes poderes e sem ummento diresao e autoridade definido como hegemonial6 Apesar de sua centralidade para o desafio desta premissa realista o trabalho de Keohane continha varias 5escisggyis Talvez para estabelecer urn contexto historico adequado ele superestimou o declfnio da influencia dos Estados Unidos no mundo e o papel de suas supostas sucessoras as instituioes intemacionais neste caso a Agencia Intemacional de Energia Atomica Alem disso ele incluiu algumas 15Para uma consideracao ver James Dougherty e Robert Pfaltzgraff Contending Theories of International Relations 2ed p34750 New York Harper Row 1981 Como os autores cautelosamente colocaram Ate agora tecnicas estatfsticas niio produziram ne nhum resultado util ou conclusivo para o desenvolvimento de uma teoria coerente da guerra p347A frase ate agora contem certamente a promessa de uma ruptura mais de uma decada depois nenhuma foi reportada 16Robert Keohane After Hegemony Cooperation and Discord in the World Political Economy Princeton Princeton University Press 1987 44 Fred Halliday suposioes teoricas questionaveis a sua consideraao historica do de cHnio dos Estads Unidos estabeleceu uma divisao muito abrupta entre o poder 111ilitar e economico e falhou em reconhecer as formas pelas quais a proeminencia militar dos Estados Unidos e a sua lide rana algo que continuou depois da Guerra Fria geram beneffcios economicos e senhoriais A analise das relaoes de poder no mun do contemporaneo foi especffica aquelas entre OS pafses desenvolvi dos e nao inluiu as relaoes entre os Estados menores e menos de senvolvidosPor esta razao em uma avaliaao geral ele subestimou as hierarquias e os beneffcios oligarquicos reconhecidos abertamente pelas teorias do imperialismo e do realismo Adicionalmente Keohane somente se utilizou de uma definiao realista de Estado a partir da qual buscou definir sua propria teoria trans nacionalista e se distanciar do realismo e do marxismo percebidos como compartilhando de uma posiao comum Embora nao hostil ao marxis mo e desejando levar seus argumentos a serio em uma oportunidade ele se define como seguidor de Kautsky yo resultado foi que Keoha ne se recusou a ver que dentro do marxismo o Estado pode sig nificar algo muito diferente do que no realismoAlem disso no mar xismo este conceito e incorporado em uma teoria de poder que engloba muitos dos fatores economicos sociais e ideologicos agru pados por ele dentro da teoria da interdependencia 0 NEOREALISMO SISTEMA SEM CONTEUDO Jface a estas mudanas e da crescente importancia das questoes economicas na agenda intemacional a escola dos realistas previamente confinada a reflexao hica e filosofica gerou urn novo corpo de tra balho o neorealismoO trabalho de Krasner e Tucker ja mentiona do na Introduao teve urn papel importante Se em alguma medida o neo serviu para esconder a reafirmaao de temas tradicionais sobre o Estado o poder e o conflito ele tambem refletiu duas importantes revisoes no carater da agenda anter por urn ado uma maior atenao ao papel do econormco nas rela6es interestatais cojno urn instrumento mercantilista e competitivo de poder estatal e nao em termos de aborda gens transnacionais ou interdependentes por outro uma reviso teori ca em uma tentativa de trazer mais rigor a teoria e isentala dos ataques 17Karl Kautsky o lfder socialista alemiio foi o criador da teoria do ultraimperialismo de acordo com a qual os poderes principais reduziriam suas tensoes e colaborariam contra o resto do mundo Poucas anaIises nas ciencias sociais tiveram um destino tao infeliz no curto prazo ja que esta teoria foi enunciada no veriio de 1914 quando come rou a Primeira Guerra Mundial Ver Karl Kautsky Ultraimperialism New Left Review n59 JanuaryFebruary 1970 Repensando as rela6es intemacionais 45 metodgfS sofricIopela otra ge2 Qentre os manifestos neo realiStas talveiTheory of International Politics de Kenneth Waltz tenha sido o mais influente 18 A reputaao de Waltz no campo das relaoes intemacionais foi estabelecida em 1959 com a publicaao de Man tht Sf111UJnd War urn trabalho no qual ele comparava as tres imagens dasns 41 guerra a na 4o h9mero a constituisg QQS dos e o sistema intemacional Waltz cotiduiu que era a terce1Jma m gue fomecia abaseprua ateorla cfascaiisas da guerra Urn dos temas centrarsqiie riasceii oeste estudo e se repetiiiemseu posteri or trabalho 6 a id6ia de qu o capiter intemo dos Estados deve ser exclufdo do estudo das reHtoesmtemacionais Apesar de ser uma declaraio lucidliaaposiao realista Man the State and War alcanou suas conclusoes aparenteniente inexo niveis a custa de duas questoes Em primeiro Iugar sua distribuiao das causas do conflito em tres compartimentos separados ultrajou a maneira pela qual as demais abordagens que se distanciavam de sua teoria explicavam a questao Este foi o casoda maioria das teorias baseadas na primeira imagem ada natureza humana que ofereci am uma analise da socializaao da personalidadee do comporta mento humano e mais importante o das teorias baseadas na segun da imagem o liberalismo e o marxismo que tamb6m continham a dimensao intemacional como uma parte essencial de suas explica 1 Oes 0 liberalismo destacava a proximidade entre a democracia e a paz com a primeira determinando a segunda e como urn processo interativo A teoria do imperialismo de Lenin poderia apenas ser forada no molde da segunda imagem pela negligencia de seu exa me detalhado de como o imperialismo Ionge de ser a criaao de urn processo intemo foi o resultado da competiao economica e militar interestatal Segundo como em seu trabalho de 1979 oeoe o gCL denomineoril rduista sillica iSJo 6 9U explicam as relacges internacionais em tetQ do ineJl2QpQlas as queQlhain somente para eniaTriiemacional Para sustentar a swCanalise ele afirma que OS resultados das relaoes intemacionais sao quase sempre os mesmos a despeito das mudanas no carater dos atores 19 A conseqliencia que Waltz retira desta regularidade 6 portanto que Ifule ncessario estudar 0 carater QOS Estados n laoes intemacionais m do que sena necessaria quIdQ M 18Kenneth Waltz Theory of International Politics New York Random House 1979 poroes significativas foram republicadas em Robert Keohane ed NeoRealism and its Critics New York Columbia University Press 1986 que tambem incluiu urn texto adicional de Waltz Reflections on Theory of International Politics A response to my critics Referencias subseqtientes darao ambas estas fontes 1Waltz Theory p 66 Keohane NeoRealism p 53 46 Fred Halliday sam os mercados estudar os funcionamentos intemos das firmas Como sera discutido a segu1resta6urrta conCiioqestior Theory of International Politics inicia com uma afirmaao da ne l essidade e da possibilidade da construao de uma teoria para o estudo as relaoes intemacionais e destaca a importancia de se nalisar as es truturas nas quaire procssam J6ejntrYti Para Waltz es lP iura sigonluntog21ue nosistema 1 mt2il 6 2JJQliticadopordoisprQGeQs s tee taoll19 CQI111JtaIempl Estados e a competi9ao Na visao de Waltz a estrutura do sistema poHiicci internadonal 6 codicionada JOr trs pe pela guill pois nao existe uma au tonde supeno aos Estads pela ausencia de uma diferQiasao ds llidtferyntes fllgad todos os Estados desempenham mais ou menos as mesmas funoes e pela existencia de uma distribuisao de sigual de caeagg ha uma distinao entre os grandeseospequenos poderes Destas proposi6es gerais ele tira varias outras conclusoes a de que o mecanismocentral do sjstema politico internacional 6 o ilf brio de poder e que a natureza de urn sistema interestatal em urn dado riioment6dda pler e elo numero de seus graades EOIt Em opos1ao a multlpolartdade dos seculos XVIII e X esde 1945 o mundo tern sido constituido pela bipolaridade pelas rela9oes entre dois grandes poderes A reconsideraao do realismo 6 aproveitada por Waltz como uma oportunidade para estudar algumas questoes contemporaneas das rela 6es intemacionais com sua teoria Assim ele critica os entusiastas da teoria da ipterdendencia pela falta de perspectiva hist6rica em 1914 aTriteTdejendenciifofJemu1tasmaneiras nlaiordo que 6 hoje e por negligenciar os perigos que uma iriteraao excessiva entreos Estados roQgzJ Em oposiao aos que argurnenfamcomo parte da posl ao da interdependencia que o poder militar 6 menos util do que em 6pocas antefiores Waltz attrma que ele mant6in seus prop6sitos em urn mundo bipolar Para Waltz o sistema bipolar p6s45 foi desejavel pois re oriSQdoconmto No sistema intemacional ele defende UJStnQr Voltando a questao de administrar as relaoes intema cionais Waltz discute contra aqueles que destacam a importancia das instituioes intemacionais e da difusao de poder que a administraao rconstrutva das rlaoes intemacionais deped dos grandes poderes p Ex1stem d01s grandes problemas na analise de Waltz que imedia t amente tomamse evidentes na leitura de sua exposiao e na de seus cri ticos 0 primeiro 6 que sua analise 6 ahist6rica no sentido de que toma como transist6ricas ou permanentes caracteristicas do sistema que sao produto de fases distintas e especificas das rela6es intemacionais As 20Waltz Theory p 73 Keohane NeoRealism p 62 Repensando as rela6es intemacionais 47 palavras de Goran Therbom tern tanta relevancia Para a teoria das Rl como para as outras areas da ciencia social Mesmo o mais abstrato dos discursos te6ricos e os empreendimentos cientfficos sao produrs de sociedades parti cu lares em urn Pa rticular perfodo histo rico Invocando Tucfdides e exemplqs de ylidQ casos hist6ricos rgEm que asettJr clo tmjteJlgpnJer maneddo as inesniiiijiQi milhaces de anos22 Portanto estamos li dandocomumieoria abstrata qucIgiialao sistema de Estados con temporaneos e a sua formayaO a outros processos hist6ricos que ocorreram no perfodo entre a Grecia do seculo IV AC e a epoca p6s 45 A suposi9ao feita par ele e muitos outros escritores de rela96es intemacionais e a de que existia urn sitema intacional antes dos Estadosmpdernos ou na96es ou da emergencia do mercactD internacionl Entretanto esta e uma postura questiomivel tanto quanta a que estuda a polftica de pre9os na Roma antiga e na Ame rica contempodinea ou o comportamento eleitoral na agora grega e nas elei9oes modemas Algumas considera96es gerais podem ser le vantadas e aplicadas a todos os sistemas mas elas seriam tao banais que sua importancia seria marginal Na verdade por todo o texto Waltz faz afirma9oes que somente se sustentam em uma escala hist6rica muito limitada Assim ao discutir a durabilidade dos Estados no mundo contemporaneo ele observa A taxa de mortalidade entre OS Estados e muito baixa23 Se par Estados querse dizer Estados independentes na era modema entao Waltz esta realmente certo Se entretanto seus Estados forem colocados frente a urn registro hist6rico dos ultimos dais mil ou mesmo 150 anos entao a afirma9ao se toma ridfcula o numero de entidades distintas da Euro pa e do Terceiro Mundo que foram dominadas e elirninadas par varias formas de conquista no mfnimo pelos ataques do imperialismo devem chegar a rnilharese a afirma9ao de Waltz sabre a rara morte de Esta dos e tomada como uma caracteristica da estrutura que ele esta discu tindo entao esta estrutura e na verdade uma cria9ao bastante recente posterior a emergencia de urn sistema intemacional na Europa do secu lo XVII e ao tim do colonialismqJ Esta perspectiva ahist6rica e refor9ada pela ausencia de qual quer hist6ria sabre o proprio sistema e em particular sabre as ori gens do sistema estatal contemporaneo no perfodo pasmedieval e a sua rela9ao com a ascensao do capitalismoJa que Waltz aspira a uma analise estritamerite polftica das rela9oes intemacionais e tern 11Goran Therbom The economic theorists of capitalism New Left Review n8788 SeptemberDecember 1974 p 125 22Keohane NeoRealism p 329 13Waltz Theory p 95 Keohane NeoRealism p 90 48 Fred Halliday urn conceito nacionalterritorial de Estado nao existe espa9o em sua visao para urn conceito de capitalismo e para o estudo da rela yao entre a ascensao de Estados diferenciados e a dissemina9ao in temacional deste capitalismo Apesar de toda a sua preocupa9ao com o processo intemacio nal e mais recentemente com os processos econoinicos intemacio i nais a literatura sabre as rela9oes intemacionais e surpreendente 1 mente timida como usa em qualquer oportunidade do termo ca pitalismo Uma das conseqtiencias desta negligencia e que a teoria e a hist6ria que ela infere tern uma considera9ao distinta de I tomo OS Estados e 0 sistema internacional se interrelacionam De acordo com este mito os Estados emer iram como entidades indi viduaiJill9me tetulafiesuns CQJ os otrs or esta razao al afirma As estruturas el coextsenct entre s Est 241so ignra urn das li9es centrais il da soctologta histonca e a sua cons1dera9ao do desenvolvtmento dos Estados OS Estados no sentido de erttidades administrativascoer citivas desenvolvemse como resultados dos processos intemacio nais e nao da forma contrariaA competi9ao militar e a expansao do mercado somadas a existencia de uma cultura comum sao precon di96es e nao resultados da emergencia do sistema estatal A visao ortodoxa de que primeiro os Estados nasceram e depois come9aram a se interrelacionai para constituir o sistema intemacional tern tanta rela9ao com a realidade quanta o rnito do contrato social ou o da cegonha A confusao sabre a hist6ria e a defini9ao dos Estados e evidente na ior dificuldade da e de Waltz reivindica9ao de que as rela96es mtemacionais podem e devem ser estudadas em urn nivel puramente sistemico Os argumentos que Waltz coloca para isso sao ru dimentares que existe suficiente regularidade nas rela96es intemacio nais para desconsiderar o exame das caracterfsticas intemas dos Esta dos e a reivindica9ao mais geral de que a elegancia da teoria e deseja veJAs formula96es de Waltz sobre isso sao novamente reveladoras Seu argumento de que os fatores sisternicos devem ser levados ein conta ao analisar as relay5es intemacionais isto e que OS Estados nao sao sim iemeJiYpaQlQYrm e sgJjiP1tadosjiefiiistema como odEdePrezfylAssim ele plausivelmente coloca Nao eposstvel entender o mundo da polftica mundial simplesmente olhando para dentro dos Estados meu italico25 Entretanto isto e bastante diferente de dizer que os processos inteinos dos Estados podem ser completamente exclufdos da teoriza9ao das rela9oes intemacionais afirmar que as RI nao podem ser estudadas simplesmente pelo exa 24Waltz Theory p 91 Keohane NeoRealism p 85 2Waltz Theory p 65 Keohane NeoRealism p 52 Repensando as relacoes intemacionais 49 me do interno e diferente de considerar que 0 interno nao e impor tante e pode ser ignorado Talvez sob a influencia de outros usos do termo estrutura como aqueles da antropologia e da lingiiftic Waltz e levado para urn uso que e determinfstico e eleyancta das dtferenS ent S Unt dades indiyiduais mas ao fazelo ele mistura oOfeos ae anahs nas quats as consideraoes internas podem mesmo ser tXelevantes as da estrutura como na linglifstica com outros nos quats o externo eo interno de fato se interrelacionam Os Estados nao sao amHogos a morfemas a planetas ou a estruturas de parentesco Waltz e com cer teza auxihado em sua negaao da relevancia do interno pela con fusao padrao das relaoes internacionais sabre o significado da pala vra Estado no significado polfticolegal e estritamente impossfvel perguntar sabre o interno dao qe ele e enilobado par definiao neste conceito Entretanto ao mves de tamar tsso como uma boa ra zao para abandonar este conceito convencional e confuso Waltz uti liza 0 conceito nacionalterritorial em sua conclusao 16gica e produz uma teoria desequilibrada das relaoes internacionais Em resposta a seus crfticos no fim de NeoRealism Waltz pare ce estar disposto a cder urn pouco xnas na ate ao Pto A de abndo nar a sua preferencta par uma teona estrttamente ststemtca em oposiao a reducionista 26 Ao fazer isto entretanto pelo menos ele fornece urn exemplo aberto a interpretaao das teorias reducionista e sistemica Frana e a Alemanha ele diz provvelmete nao mais irao a guerra por causa da mudana em sua sttuaao no ststema nter nacional isto e ees nao sao mais grandes podereSJ7 a etstem muitos pafses med10s e pequenos no mundo que poieffi e rrao a guer ra Ira e Iraque ou india e Paquistao e eles ao sao maiores do que a Frana e a Alemanha 0 que determina a opao dos poderes nao e a sua posiao estrutural mas a combinaao desta com fa tares interns 0 tipo de experiencia hist6rica ue tiveram no secu XX no mfm mo as duas grandes guerras os ttpos de regtmes polttico e sociOeco nomico que mantem e as alianas 16gicas que estabeleceram Com base neste exemplo podese argumentar o contrario do que faz Waltz que as relaoes inteonais nao poQer ntendidas simplesmenreie olliando para as relatoesntre OS EstatfEs A alternattva apresentada por Waltz entre uma teona reducto nista ou sistemica nao e necessaria 0 que e preciso como varios co laboradores de NeoRealism and Its Critics sugeriram que cbine os nfveis internos e externos Como Ruggie coloa a emergencia do sistema de Estados modernos sustentase sabre hpos 26Keohane NeoRealism p 32330 271bid p 323 50 Fred Halliday bastante distintos derelaao Estadosociedade que tiveram impacto considenivel na forma a a das relaoes internacionais 28 Tambem e evidente que urn estudo das dimensoes internacio nais da revoluao pode mostrar s foJ llacionfe tam o funcionamento interno dos EstaIqF omos mudansas iij ternas provoadas comQIYsultl4tdelJllflrYlusoes podm afetar o sistema internaciQYll Waltz em comum com a matona oS reahstas tmscamrnlmizar os efeitos internacionais da revoluao e tern certo prazer em contar a hist6ria de como a Revoluao Bolche vique tinha em 1922 aceito as normas de comportamento intema cional como tinha em outras palavras sido socializada pela es trutura Como sera discutido no Capftulo 5 o fato que Chicherin usou smoking e assinou urn acordo secreta com a Alemanha em Rapallo nao significa de forma alguma que o conflito ideo16gico basico entre a Revoluao Russa e o ocidente capitalista tivesse terminado A so cializaao no sentido de aceitaao das normas prevalecentes do sis tema e da legitimidade de outros atores principais dentro dele cer tamente nao ocorreu mais do que teria ocorrido quando Chou En lai chegou em Genebra em 1954 e tomou cha com Anthony Eden Depois da Revoluao Bolchevique que adquiriu vida nova durante e depois da Segunda Guerra Mundial urn conflito de Iongo prazo co meou este conflito nao poderia ser explicado somente pelo equilfbrio de poder ou pelas abstraoes do realismo mas envoi via uma incompati Y bilidade entre sistemas sociais e polfticos Para explicar comoe porque este conflito se desenvolveu requer urn exame das caracterfsticas domes ticas da URSS e de seus adversarios ocidentais alga que a teoria realis ta nos impede de fazer A HISTORIA MAIS ELEVADA 0 POSMODERNISMO E 0 INTERNACIONAL A entrada do p6smodernismo no campo das relaoes intemaci onais pode ser localizada no final dos anos 1980 seguindo o seu de senvolvimento em outras areas de domfnio academico primeiro a estetica e as humanidades e depois a sociologia a hist6ria e a polfti ca29 A partir daf ele participou do que foi chamado de terceiro de bate nas Rl atualmente o quarto se a introduao do estruturalis 28fuid p 1278 29Para consides da emergnciadesta escola ver James DerDerian e Shapiro IntemationaV Intertextual Relations PostModern Readings of World Politics Lexington MA DCHeath 1989 Mark Hoffman Reestructuring reconstruction reinscription and rearticulation Four voices in critical international theory Millenium vl6 n2 1987 Repensando as rela6es intemacionais 51 mo e do marxismo forem considerados como o terceiro 0 terceiro debate cobriu desafios muito diferentes dois dos quais o feminis mo eo materialismo hist6rico sedio depois considerados Nos termos mais simples as reivindicaoes do p6smodemismo sao duas primeiro a de que nao existe uma racionalidade unica ou narrativa hist6rica ern termos das quais se possa compreender a hist6ria ou qualquer area das ciencias sociais segundo que as categorias aparentemente dis tintas e unitarias das ciencias sociais e outras formas de interpreta ao escondem uma diversidade de sentidos e de identiddes que or nam os objetos da vida polftica muito mais complexos e mdetenmna dos do que as abordagens mais racionais sugeririam Fortemente in fluenciado em concepao e estilo pelos escritos p6sestruturalistas franceses mas tambem previamente pela indeterminaao conceitual e moral de Nietzsche nos anos 1980 o p6smodemismo tomouse o grande novo desafio de quase todas as ciencias sociais A enfase do p6smodemismo sobre o papel do discurso em seu sentido mais amplo as palavras os significados os sfmbolos as identidades as formas de comunicaao na constituiao da soci edade e do poder tern implicaoes significativas para as relaoes in ternacionais pelo menos na maneira pela qual os Estados buscam atribuirse e projetar legitimidade Em urn mundo no qual a comu nicaao e as imagens da mfdia tern urn papel importante ha muito o que se examinar o trabalho de Robertson e Featherstone por exem plo estudando a disseminaao de varias alternativas no mundo demonstra o potencial de tal analise 30 Ao mesmo tempo a afirma ao da multiplicidade de identidades aberta a todos os sujeitos hu manos e a nega9ao das necessarias contradioes ed entre o naci onal e 0 intemacional tern importancia explicativa e etica 0 advento do p6smodemismo nas RI tern entretanto sido acom panhado por inumeras contribui5es mais discutfveis que Ionge de aju dar nas discussoes tern trazido maior confusao Em primeiro Iugar a introduao e debate do p6smodemismo nas RI vern sendo conduzido quase que em completa separaao de urn debate mais amplo sobre esta tendencia dentro das ciencias sociais aqueles que a defendiam no final dos anos 1980 tern dado pouca atenao ou respondem as muitas criti cas a abordagem desenvolvida ha quase mais de dez anos31 Resumi damente estas crfticas destacam a amoralidade subjacente ao p6smo demismo com sua negaao de quaisquer princfpios morais generica mente aplicados a sua inabilidade em fomecer uma explicaao subs 30Ver p 256 n3 31Uma exceliO confusa e Richard Ashley em Der Derian e Shapiro International lntertextual Relations p 31 719 Ashley reconhece a existencia destes criticismos e entlio recua neste conselho para ouvir grupos marginais Sim mas 52 Fred Halliday tantiva de eventos ou perfodos hist6ricos a sua exacerbaao do papel dos fatores discursivos ou ideol6gicos na sociedade e a omissao da relaao destes com outros processos mais materiais de produao com as relaoes sociais e mesmo como cotidiano32 A estas crfticas gerais podem ser acrescidas mais duas eviden tes nos escritos dentro da RI A primeira referese a dependencia de toda a abordagem de algo denominado de p6smodemidade uma suposiao de validade questionavel que estabelece que o mundo entrou em uma nova fase hist6rica Freqtientemente de aplicaao hist6rica frouxa e baseada em observaoes contingenciais sobre o espao o tempo o risco e a percep9ao esta invocaao de urn mun do p6smodemo serve como urn fetiche mais do que como uma explicaao Alem disso ela esta sujeita a outras afirmaoes sobre o novo e as suas implicaoes metodol6gicas Se as suposioes filos6 ficas e epistemo16gicas do p6smodernismo a respeito dos fracas sos do pensamento iluminista sobre a identidade sobre a distinao entre fato e valor e as demais categorias forem validas entao elas sempre foram assim nos seculos XV ou XVI ou na epoca moder na A fora do trabalho de Foucault sobre a loucura e o encarcera mento reside em sua aplicaao hist6rica atraves dos seculos Alem destes problemas substantivos existe urn aspecto adicional da literatura p6smodemista que merece e na verdade con vida as crfti cas seu tome estilo Os p6smodemistas fazem de sua preocupaao o dominado o marginal o subaltemo mesmo assim isto e acompanhado por urn vacuo prescritivo e presunao de que eles sao as primeiras ou unicas pessoas a ter esta preocupaao Uma vez e sempre os escritores desta tendencia fazem uso de mecanismo estilfsticos de tentativas arti ficiais e coloca9oes irrefutaveis quando a analise substantiva de hist6 ria e conceitos parece falhar Como nos escritos do clero islamico re petiao vtgar e ameaa conceitual sao muito facilmente utilizadas nao para reforar o argumento mas para compensar a falta de urn Palavras como mediaao sao indicativas de uma piedade produzida que e par te deste estilo como o e o uso de fragmentos de escritos literanos e his t6ricos colocados para prop6sitos omamentais da mesma maneira que os realistas gostam de temperar sua narrativa com epis6dios de Tucfdi des ou citaoes de Cfcero On Diplomacy de Der Derian e urn exemplo perfeito deste genero As tentaoes da surenchere parisienne evidentes nas previas escolas anglosaxonicas derivadas dos escritos franceses es pecificamente de Sartre e Althusser sao reproduzidas nem sempre de formas muito felizes A palavra continental e usada para dar carater espurio a estas ideias e estilo como o termo cerveja importada foi lan ado nos anos 1970 que uma ideia e continental ou insular parisi 32Der Derlan e Shapirolnternationallntertextual Relations p ixx Repensando as rela6es intemacionais 53 ense ou de Los Angeles nao diz nada a ninguem sobre a ua valida de ou o seu alcance explicativo Neste sentido o tratamento de questoes de epistemologia ou mais mundanamente de filosofia da ciencia social desempenha urn papel importante apesar disso ser realizado de uma aneira preci osista freqtientemente banal e incompetente A despetto do que esta linha te6rica possa ter representado ela nao foi uma percepao in formal dos desenvolvimentos na filosofia da ciencia ou na ciencia social Estes autores tern grande prazer em anunciar novas formas de epistemologia hermeneutica dialetica conclusao e assim por diante mas ao fazelo eles nem resolvem as questoes da filosofia da ciencia em geral ou contribuem para a teorizaao das RI Seu tra balho e neste campo pretensioso derivado e esvaziado uma imi taao anglosaxonica do que ja fora em sua forma parisiense urn debate confuso e de segunda categoria 0 trecho abaixo tirado de uma coleao pioneira de tais textos captura isto 54 As varias praticas conhecidas sob a rubrica do p6smoderno ou p6s estruturalismo de forma alguma uma escola unica ou unitaria dentre elas a desconstruao a semi6tica a genealogia a teoria psicanalftica fe minista e suas variantes compartilham de varios temas comuns apesar de suas diferenas Acima de tudo elas consideram as questOes de como o conhecimento a verdade e o significado sao constitufdos Em seu sen tido mais amplo estes trabalhos oferecem uma explicaao para a sua insatisfaao com o projeto iluminista Filos6fico em sua origem e pnitica o p6sestruturalismo desafia as suposioes intelectuais sob as quais se sustentam o racionalismo e o positivismo ocidentais Estas se revelam como as suposioes que fundaram a ciencia moderna e a sua adorada criana adotada as ciencias sociais As criticas p6sestruturais do racionalismo feitas pelos fil6sofos france ses revelaramse como imensamente atraentes a ciutros campos Por ra zoes que ninguem adequadamente explicou os primeiros interpretes en tusiastas foram os te6ricos literarios americanosAs analises p6sestrutu ralistas colocam urn desafio radical para os dois a distinao fatovalor e para a nossa concepao factual em geral urn conceito que os p6sestrutu ralistas afirmam e convencional e culturalmente construfdo mais do que fundado na natureza Seu locus especffico e trabalhar sobre a linguagem que lhes permite revelar de forma persuasiva as convenoes que fame cern ao fato sua aparencia para o convencimento Em nome da objetivi dade cientlfica os discursos criados para sustentar as poderosas foras sociais sao regimes da verdade Os metodos p6sestruturalistas de ana lise pretendem oferecer novas maneiras de criticar este condominia de poder e conhecimento e tambem metodos uteis para a consideraao das teorias sociais cientfficas Uma razao palpavel para que o p6sestruturalismo fosse tao bern recebi do pelos te6ricos da literatura e que a tolerancia nestes grupos a pluralidade na interpretaao ja os ensinara algo importante a respeito da constituiao Fred Halliday de significados Como esperado nas maos destes te6ricos tais metodos de desconstruao ou genealogia tendem a ser adaptados como ferramen tas afiadas para intrincadas analises textuais 33 Tudo esta presente aqui a invocaao preciosista do parisiense a confusa salada de abordagens te6ricas a inocente ingenuidade decla rada sobre a diferena entre os domfnios da crftica literaria e o da ci encia social Urn exemplo representativo da fora e da fraqueza desta abor dagem eo trabalho de Robert Walker InsideOutside International Relations and Political Theory 34 Urn dos aspectos mais fortes da crftica de Walker e que ele localiza as principais areas de discordan cia nao no campo do intemacional mas no da teoria polftica em geral A presunao disciplinar de autarquia estabelece que o intemacional e urn domfnio separado do real e do etico a sua reavaliaao da tra diao coloca a teoria das RI de volta em seu cohtexto intelectual e academico mais amplo Ele tern pouco tempo para as principias al ternativas apresentadas em anos recentes se o realismo classico re presenta a descuidada adoao de antagonismo ontol6gicos profun dos as abordagens cientfficas nada mais sao do que Kantianis mo kitsch o neorealismo e somente uma reificaao requentada as teorias da escolha racional sao hist6rias utilitaristas e a econo mia polftica permanece presa no tempo e no espao Para Walker amplamente influenciado pelo pensamento p6smo demista e p6sestruturalista a teoria das RI tern tres fraquezas princi pais todas derivadas da teoria polftica ela trata como etemas e dadas as categorias e os contrastes que sao historicamente produzidos e por esta razao passfveis de mudana ela falha em registrar o grau como o mundo polftico nacional e intemacional esta mudando com as trans formaoes do mundo p6smodemo e portanto ela exclui e elimi na pelo silencio a evoluao de teorias e praticas altemativas que po deriam permitir uma melhora na condiao humana nos nfveis nacio nal intemacional e local Se Martin Wight tivesse que classificar Walker ele seria urn revolucionario mas urn revolucionario cetico das categorias de Kant ou Marx Na visao de Walker eles seriam repre sentantes de suas pr6prias reificaoes Walker usa o p6smodemismo para fomecer uma crftica a ca tegorias eternas e em particular a urn conjunto de opostos que ele 33Dentre as muitas crfticas do posmodemismo ver Peter Dews Logics of Disintegration London Veros 1986 Perry Anderson In the Tracks of Historical Materialism London Verso 1983 Ernest Gellner PostModernism Reason and Religion London Routledge 1992 34Robert Walker InsideOutside International Relations and Political Theory Cambridge Cambridge University Press 1993 Rtpensando as rela6es intemacionais 55 J identifica como pilares da teoria das RI em suas formas tanto uto picaidealista como realista a identiade e a diferena Q dentro e 0 fora o espao e o tempo a comumdade e a anarquta Dentro das relaoes internacionais ele identifica o papel constitutivo das ca tegorias de tempo e de espao concretizado no conceito de sobe rania do Estado Em sua critica destas reificaoes Walker cita o filosofo frances da ciencia Gaston Bachelard para mostrar que as palavras aqui e hi tern sido elevadas ao absoluto a partir do qual estes desafortunados adverbios de Iugar sao dotados de poderes incontrolaveis de determina ao ontologica3s As categorias dentro e fora que sao procla madas no titulo se referem em primeira instancia ao argumento de que existe alguma diferena radical entre os caracteres domestico e internacional da politica e urn abismo entre as praticas apropriadas ou possfveis em cada esfera Estas praticas fornecem ua bs apa rentemente imutavel para duas concepoes de soberama dtstmtas uma que funciona dentro do pais e e democratica e outra que esa fora necessariamente competitiva e antagonica Em urn de seus mats sugestivos leitmotif ele traa a evoluao desta concepao bnaria de soberania de Hobbes a Weber uma figura freqiientemente tgnorada na teoria das RI mas central as modemas concepoes de Estado e a inevitabilidade repugnante do conflito interestatal 36 Mesmo para aqueles que nao foram convencidos pelas bases teori cas do argumento de Walker existe algo irresistfvel aqui a localizaao da teoria das RI em urn contexto mais amplo da teoria politica e do po der socialmente corporificado e urn grande avano sobre as genealogias oficiais de X leY ou mesmo pior B foi o estudante de A a afirma ao do carater historicamente constitufdo e contingente das teorias de soberania e igualmente bemvindo Existe aqui muito a sr cmsiderado pelos que vern de ouas dt oes criticas com a advertencta de que algumas destas categonas Ja fo ram levantadas e aprofundadas dentro destas mesmas tradioes haven do algumas poucas reivindicaoes de renascimento teorico a sociolo gia historica Charles Tilly Michael Mann John Halle Theda Skocpo e a historiografia marxista do Estado Perry Anderson Ellen Wood e mats recentemente Justin Rosenberg exploraram a historicidade de nossas concepoes de Estado e de soberania Neste escritos a reavaliaao criti ca das categorias polfticas centrais das Rl e representada por uma maior proximidade e interaao com os processos e os fatos historicos algo 35Walker InsideOutside International Relations and Political Theory pl 36Para uma discussao esclarecedora das visoes de Weber sobre o nacionalismo eo conflito international e o lugar destes em seu trabalho mais amplo ver Anderson A Zone of Engagement Capitulo 9 p 158 56 Fred Halliday que os posmoElemistas parecem nao ser capazes de igualar buscando freneticamente a proxima transformaao a densidade textual ou a disseminaao Aparte a questao da novidade as dificuldades com a teoria de Walker nascem precisamente onde ele em sua propria critica das RI localizou o problema primeiro nas afirmaoes amplas sobre mudana hist6rica invocadas para sustentar seu argumento segundo na coloca ao de uma altemativa de pertinencia polftica e etica para as eternidades existentesAprimeira como na maioria do pensamento e da modelagem alternativa permanece indefinida na verdade monotona lima invo caao benigna do local do cosmopolita e do desconstrufdo sem susten taao em uma realidade social ou em uma necessidade etica ou hist6ri ca mesmo Walker admite isto resumindo seu argumento como uma teia de possibilidades minimamente teorizadas e lutas tentativas A leitura de Kant como estadista e central a seu argumento com a dis cussao de Perpetual Peace e nao Universal History Desconfiase que este seja urn movimento teorico sintomatico para eliminar a discus sao de que o professor de Konigsberg alcanou ha dois seculos atras e com maior vigor intelectual o mesmo patamar em que hoje estao encalhados os posmodernistas Walker recria o problema geral com urn argumento sobre a pos modernidade sobre como o mundo esta verdadeiramente mudando e se assemelha a uma variante dos entusiastas do transnacionalismo Rose nau misturado com Giddens e Derrida 0 argumento sobre a posmoder nidade como urn fenomeno global se sustenta sob a concepao do nasci mento de uma nova fase na historia marcada por uma maior aceleraao na mudana e pelo desaparecimento de categorias passadas Walker como Giddens e outros repete a visao de que as identidades nao sao mais claras e que em geral predomina a indeterminaao onde antes havia clareza Como muitos outros posmodemistas ele e rapido em aceitar as afirma oes do transnacionalismo e ignorar outras muitas Ele tambem fica feliz em se aproveitar da frase de Marx para destacar que Tudo que e solido desmancha no ar Mesmo assim tudo que e solido nao desmancha no ar e certamente nao porque os sociologos e os pensadores altemativos nos fariam acreditar na verdade eles omitem a segunda parte da frase que passa uma mensagem muito diferente racional e teleologica e o homem e por fim compelido a enfrentar racionalmente as suas reais condiaes de vida e as suas relaoes com os de seu tipoY Para os modemistas nao pode haver uma concepao do real ou na verdade do racional Nas ciencias sociais muitas pessoas falam sobre a posmoder nidade mas em urn exame proximo ela pode ser somente outra moda 37Karl Marx e Friedrich Engels The Revolutions f 1848 London Penguin 1973 p 701 Repensando as rela6es intemacionais 57 apocalfptica junto com o fim da ideologia a morte do novo a nova ordem mundial a superaao do Estado e assim por diante Name lhor das hip6teses muitas das suposioes sabre urn novo mundo es pacial e teporal sao metaf6ricas no pior agitaoes classistas e na verdade etnocentricas Se os p6smodemistas desejarem o argumento sabre a incerteza da identidade pode ser combatido evidenciando como ela se tomou mais importante do que nunca vaporizando com a freqliencia o Estado na guerra da antiga Iugoshivia nao surpreen deu a investida de novas formas de identidade e ideologia polftica mas a vitalidade das antigas Alem de identificar algumas mudanas amplas mas 6bvias no mundo e duvidoso que qualquer fora empfrica possa ser atribufda ao conceito de p6smodemidade como sugerido a maioria dos que o utilizam possui pouca ou nenhuma qualificaao e inclinaao para discutir o real Engenhosos encantamentos sobre a alteridade a dissoluao e as estruturas e reivindicaoes exageradas sabre o que de fato mudou no mundo nao sao substitutas adequadas de uma interaao substantiva com a hist6ria ou de uma conceitualizaao plausfvel das altemativas para a mudana polftica e te6rica Fasci nados por suas pr6prias frases por urn conjunto de afirmaoes sem sustentaao e inuteis generalizaoes sejam elas sabre o equilfbrio de poder ou a teleologia progressista os p6smodemistas transfor mamse no que procuram eliminar faltandolhes tambem qualquer significado analftico ou normativo ou a percepao sabre a mudana e a representaao Como no caso de Walker nao inesperadamente existe uma afinidade marcante com Maquiavel cujo ceticismo etico e acaso hist6rico pressagiaram as modas parisienses de nosso tem po Ele certamente tambem era urn homem do p6s Apesar disso e precisamente na discussao da representaao que o livro de Walker sugere urn conjunto importante de novas consideraoes focadas nao smente no abandono do EstadoNaao mas na apresenta ao de umconteudo novo mais democnitico e polivalenteAqui tambem reside urn dos mais substantivos e possivelmente uteis insights do p6s modemismo o de que todos os individuos e instituioes polfticas pos suem varias identidades que se sobrepoem e nao uma unica e ex clusiva 0 Capitulo 7 do livro de Walker sobre a democracia analisa estes t6picos de uma forma que nao e eticamente indeterminada e que em sua abordagem mais criativa e compatfvel com tradioes de pensamento anteriores sobre como se pode aperfeioar a demo cracia nos nfveis domestico e intemacional neste ponto ele e emi 38Para uma consideraiio esclarecedora do p6smodemismo e os neg6cios internacionais ver Christopher Norris Postmodemism Intellectuals and the GulfWarLondon Lawrence Wishart 1992 58 Fred Halliday nentemente kantiano Tal posiao pode sugerir a conclusao de que existe urn argumento modemista mais substantivo rigoroso e racio nal por tras de seus excessos No passado o pensamento politico tern avanado pela remoao da semente racional de sua concha mfstica e mistificadora este pode ser urn caso no qual esta transfor maao ou incursao e apropriada Entretanto realizar este potencial envolveria ir alem das invoca6es genericas dos novas movimentos sociais das quais abusam os p6s modemistas e muitos outrosA literatura sabre os novas movimentos39 evoluiu nos anos 1970 em resposta por urn lado a crise dos velhos partidos politicos principalmente comunistas e por outro ao cres cimento real de movimentos que nao eram ligados a partidos espe cfficos ou baseados em identidades de classe os movimentos de genera a raa a ecologia e o desarmamento eram as categorias mais evidentes Ainda assim como freqlientemente ocorre no debate aca demico a literatura permaneceu presa a estas consideraoes ou se apegou a afirmaoes reconfortantes como as de que o movimento de paz encerrara a Guerra Fria40 Neste caso urn discurso crftico da esquerda acompanhou as mais ortodoxas reivindicaoes do trans nacionalismo sabre os atores naoestatais Esta literatura deixou de perceber varios e menos bemvindos fenomenos primeiro 0 papel destes movimentos era bern menor do que freqlientemente afirma do e eles eram como qualquer partido tradicional com maior ou menor intensidade marcados por suas pr6prias discordancias e fac cionalismos segundo enquanto alguns movimentos eram benignos e emancipat6rios muitos outros nao o eram Os movimentos de massa de carater racista na Alemanha e na Frana o fundamentalis mo hindu e islamico ou as multiplas manifestaoes da direita dos Esta dos Unidos eram movimentos sociais tanto quanta as tendencias de esquerda e dos verdes defendidas pelos p6smodemistas A habilidade dos p6smodemistas em responder aos seus desafios principais o da explicaao e o da identificaao do sujeito da emancipaao era na reali dade bastante limitada Como os behavioristas antes deles os p6smo dernistas nao cumpriram suas promessas 39Um corpo influente de literatura sobre os novos movimentos sociais foi aquele de Emesto Laclau e Chantal Mouffe notadamente seuHegemony and Social Classes London Verso 1985 Alem de seu bastante habilidoso uso da linguagem e mesmo da aura do debate parisiense e questionavel com compreensao tardia se sua analise tinha mais apoio sobre a realidade po1ftica das democracias industrializadas do que aquele da escola marxis ta ortodoxa que eles reivindicavam substituir Sobre isto ver o debate inspirado com NormaGeras em New Left Review n163 MayJune 1987 166 NovemberDecember 1987 e 169 MayJune 1988 40Ver meudebate com EP Thompson em Robin Blackburn ed After the Fall London verso 1991 Tam bern Paul Hirst Peace and Political Theory Economy and Society v16 n2 Repensando as relac6es intemacionais 59 CONCLUSAO OUTRO CAMINHO Qual metodo e portanto apropriado para 0 estudo das relacoes intemacionais Os capftulos seguintes sao uma tentativa de contri buir para tal empreendimento e para encontrar algum criterio amplo para o trabalho te6rico neste campo Primeiro eles desenvolvem uma abordagem que e antiempfrica conceitual e crftica em telacao aos fatos e a realidade existente Segundo eles procuram encontrar 0 criterio que e central para as ciencias sociais qual seja o da expli cacao gerando atraves dele agendas de pesquisa e programas de trabalho para a investigaao As discussoes da Guerra Fria em par ticular sao tentativas de combinar urn conjunto de preocupacoes te6ricas com a explicaao hist6rica Muitas das abordagens te6ricas do segundo e do terceiro debates nao possuem esta capacida de Terceiro estes capftulos sao hist6ricos nao no sentido de procu rar respostas somente a partir da hist6ria ou da narrativa mas por examinar e contextualizar historicamente questoes e conceitos Se o realismo toma os conceitos ahist6ricos ao aplicalos por toda a his t6ria o behaviorismo nega por completo sua relevancia e o p6s modemismo afirma a ruptura entre o modemo eo p6smodemo Em contrapaitida os capftulos seguintes reconhecem as continuidades da hist6ria e identificam as especificidades e as contingencias das ideias e dos eventos 60 Fred Halliday capitulo 2 UM ENCONTRO NECESSARIO 0 MATERIALISMO HISTORICO E AS RELA6ES INTERNACIONAIS UM DESAFIO EVITADO Durante o ultimo seculo o destino do marxismo nas ciencias sociais tern sido profundamente incerto e em alguns aspectos a ambivalencia se acentuou por causa do colapso dos movimentos e regimes comunis tas desde o final dos anos 1980 Por urn lado o desafio do marxismo a padroes estabelecidos de pensamento e ao sistema estatal existente le varam a sua exclusao da academia justificada por dogmatismos pole nUcas e simplificaoes de que os marxistas estavam buscando conquis tar e deter o poder Por outro como parte da tradiao liberal radical do iluminismo e da resposta a ascensao da sociedade industrial como a sociologia e a economia o marxismo influenciou e compartilhou preo cupaoes academicas com varias outras disciplinas Dentro de algumas areas das ciencias sociais isto levou a emergencia de uma COrrente mar xista a sua difusao e maior influencia tomando mais genericamente aceitas as abordagens associadas ao marxismo Neste sentido como in dica a frase de Gramsci o marxismo se tomou o senso comum de nos sa epoca Acentuada pelo desafio comunista e pela Guerra Fria a ambiva lencia foi certamente ampliada pelo fim deste conflito e do desafio ofi cial que o comunismo representavaAgora e facil dizer que o marxismo esta desacreditado e em alguns aspectos a serem examinados em mais detalhes neste capitulo e neste livro isto e verdadeiro qualquer teoria baseada em uma teleologia hist6rica impHcita em uma etica das con Repensando as relaoes intemacionais 61 seqtiencias ou na suposiao de que alguma sociedade radicalmente di ferente pode ser criada foi desacreditada Contudo este reconhecimen to nao leva a conclusao de que a abordagem cristalizada no materialis mo historico nao possui relevancia na verdade ela pode constituir uma contribuiao importante para a interpretaao e onde for possfvel e dese javel para a determinaao do mundo contemporaneo Se o realismo distanciouse de seus primos o datWinismo social o racismo e a Machtpolitik o marxismo interpretative tambem pode separarse de suas visoes instrumentais Tal distinao en valve principal mente urn exame do que os proprios Marx e Engels escreveram e do tra balho de marxistas independentes que ultrapassando Lenin e a domina lio comunista ortodoxa buscaram fornecer uma interpretaao alterna tiva aquela dos dogmaticosI Como na sociologia na historia e nas outras ciencias sociais esta corrente marxista ocidental independen te tern sido capaz de estabelecer urn corpo de trabalho reconhecido e analiticamente fertil mostrando que existe potencial para fazer o mesmo na esfera das Rl Tal potencial 6 explorado neste capitulo mostrando a interaao entre as RI e a tradiao marxista Apesar de rnuitas decadas de interaao potencial o estabelecirnento de uma relaao entre o materialismo historico e a disciplina das relaoes internacionais ainda esta em urn estagio inicial Em vanas etapas da his t6ria da disciplina existiram pesquisas sobre as implicaoes do marxis mo para as relaoes internacionais nas quais se identificaram os pontos de contato existentes 2 Desde os anos 1970 varios escritores defen derarn trabalhos teoricos adicionais como a elaboraao de uma a bordagern marxista generica para as relaoes internacionais ou o desenvolvimento de domfnios nos quais a disciplina das relaoes internacionais como presentemente constitufda poderia fortalecer as suas conquistas analfticas fazendo uso de elementos espedficos do materialismo historico 3 Em urn estudo inovador e criterioso 1Sobre a hist6ria do marxismo independente ver Peny Anderson Considerations on Western Marxism London NLB 1976 Para uma tradiao representativa ver Karl Korsch Marxism and Philosophy traduzido e introduzido por Fred Halliday London NLB 1970 2Ver Miklos Molnar Marx Engels et la Politique Internationale Paris Gallimard 1975 Vendulka Kubalkova e Andrew Cruickshank Marxism and International Relations Oxford Oxford University Press 1986 Tony Thorndike Marxism and International Relations in Trevor Taylor ed Approaches and Theory in International Relations London Longman 1978 Stephen Gill ed Gramsci Historical Materialism and International Relations Cambridge Cambridge University Press 1992 Robert Cox Social Forces states and world orders Beyond international relations theory Millenium v10 n2 Summer 1981 0 trabalho de Cox uma ruptura em termos te6ricos dependeu excessivamente de uma extrapolaao da malfadada campanha por uma Nova Ordem Econornica lnternacional 62 Fred Halliday Andrew Linklater examinou as implicaoes do marxisino crftico para as RI enquanto destacando os limites que o sistema intemaci onal impoe sabre qualquer projeto emancipat6rio 4 Entretanto em oposiao a outras areas das ciencias sociais como a sociologia a economia e a hist6ria o materialismo historico nunca ocu pou urn Iugar seguro dentro das rela6es internacionais Existem muitos os que buscam limitar a sua aplicaao como foi o caso dos que explici tamente negaram a sua relevancia como Martin Wight e Hans Morgen thau ou dos que implcitamente relegaramno a urn Iugar menor ou o apresentaram em uma mterpretaao seletiva cuja pertinencia e restritas Basiament isto e otio inorando as principais quest6es teoricas do smo E urn ato mdtcatlvo qe as I quase nao mencionem o capi tahsmo a categna entral da ahse soctal modema do marxismo Igual mente como dtscutldo no Capitulo 7 a maneira pela qual a Guerra Fria envolvia nao so interesses estrategicos rivais mas tambem socioecono micos tern sido ignorada na maior parte da literatura sabre RI As fonts deste fracasso residem nos dais lados da relaao Como dtsctplma as relaoes internacionais desenvolveramse prin ctpalmente em univeJsidades britanicas e americanas e como urn derivado torico de outras disciplinas das ciencias sociais Em ne nhum destes contextos institucionais ou teoricos o marxismo teve urn Iugar proeminente ou reconhecido Por outro lado o proprio materialismo historico nao desenvolveu o enfoque teorico necessaria para oferecer uma contribuiao abrangen t e inteligfvel para as rla6es internacionais Muito do que foi produ ztdo m nome do maxtsmo pelos regimes comunistas e seus seguido res nao pas sou de Plermca vulgar de uma repetiao de urn certo padrao de fonnul e de letturas do proprio marxismo visando justificar inte resses pohttcos 0 confinamento da discussao marxista do intemacio nal a questao do imperialismo e a interpretaao unilateral e banal des te fenomeno foi responsabilidade tanto de seus defensores como de seus opositores 6 Dentro das correntes independentes do materialis 4Andrew Linklater Beyond Realism and Marxism Critical Theory and International Relations London Macmillan 1990 artin Wiht em Intertional Theory The Three Traditions editado por Gabrielle Wight e Bnan Poer Leicester Leicester University Press tern quatro menoes de arx tres das qurus se revelam repetindo sua visao sobre a fora como a parteira da hist6na p 107 214 222 Em nenhum momento ele considera o caso de incluir Marx coo urn te6rico em uma de suas tres categorias de revolucionismo Politics Among Natwns de Morgenthau 5ed New York Alfred A Knopf 1978 nao e melhor tudo o que ele faz e devotar duas paginas ao que classifica de teoria diab6lica do imperialis mo nada disso vern de Marx cujo trabalho ele falha em mencionar de qualquer manei ra e o resto e uma simplificaao de Lenin 6Para uma critica espirituosa da abordagem ortodoxa ver Bill Warren Imperialism Pioneer of Capitalism London Verso 1981 Repensando as relaG6es internadonais 63 mo hist6rico os que desejaram elaborar uma abordagetmarxista para as relaoes interncionais nfrentara as mesmas dtftculdades te6ricas dos que buscaram anahsar a pohtlca e os fatores tdeol6gt cos domesticos de Estados especfficos Ao mesmo tempo a enfase do marxismo em fatores economt cos no ambito internacional enfraqueceu qualquer tentattva de ex plicar as questoes polfticas ideol6gicas e de sguranapercebtds pelas rela96es internacionais como seu domm1o exclustvo 0 po prio conceito do internacional coloca premas para os mrxts hts no qual o contraste implfcito com 0 nacinal nao e ae1t0 e imediato comeando pelo Manifesto Comunzta rna a1rmaao cosmopolita na mesma linha do melhor transc10nahsmo bea no qual se encontram inumeras invocaoes de mtrependencta o marxismo tern percebido os acontecimentos ntundtats como urn pro cesso unico 0 resultado e que 0 estudo do mteresatal e das rel oes internacionais poderia parecer irrelevante svtando atenao das foras reais e universais que moldam a pohtica mundtal A vi sao de Marx sabre o nacionalismo apesar de menos hostll 1o que a sugerida par seus criticos tambem neou qualquer postcsao cu contradiao entre a formaao das naos e a crescente mterhaao dos Estados e das sociedades com a pnmetra anteceden1o a ultima e sen do parte de urn processo teleol6gico e hist6rico mats amplo 7 0 MARXISMO E OS TREs GRANDES DEBATES DAS RI As dificuldades especfficas nesta exploraao te6rica geram a falta de cantata entre estes dois corpos intelectuais Cmo eboado na Introduao em seus pouco mis de 7 ans de ex1stenc1a como disciplina academica as relaoes mtemac10nats foam mcadas por tres grandes debates te6ricos que acabaram defimndo a heratura e os posteriores programas de pesquisa Ate agor o marxtsmo nao se encaixa confortavelmente em nenhum dos tres 0 primeiro foi o entre as aborgn ut6picas e realistas Ape sar de serem elas mesmas termos arttfictrus ambas servrr para esta lecer uma polarizaao ideol6gica Nesta estrutura o marx1smo compatt lha de elementos das duas e ut6pco ao postuar forma altemattva de oJ1lenar a polftica e ao introduztr preocupoes ettcas no nJunto a aniilise e e realista em sua enfase sabre OS mteresses matenats por tras 7Sobre isto ver a bastante perceptiva avaliacao de Erica Benner Marx nd Engels on Nationalism and National Identity A Reappraisal Oxford Oxford Umverstty Press 1994 64 Fred Halliday da aao humana sabre a hipocrisia a falsidade e o cinismo da vida poH tica Apesar de existirem paralelos swpreendentes em cada urn dos pro jetos idealistas iniciados depois da Primeira Guerra Mundial a Interna cional Comunista e a Liga das Na6es a utopia proposta pelo leninis mo estava em clara oposiao ao idealismo wilsoniano Urn problema similar nasce no segundo debate entre os tradicio nalistas e os behavioristas Entusiasta das metodologias cientfficas do seculo XIX e imbufdo da influencia da economia britanica chissica o marxismo certamente enfatiza o potencial cientffico da analise social a quantificaao e o estabelecimento de leis se encontram no nucleo da abordagem de Marx em 0 Capital Como na maior parte do pensamen to radical do seculo XIX o progressivismo foi validado cientificamen te pelas hipoteticas teorias darwinistas de evoluao 8 Alem disso o mar xismo e influenciado por outra abordagem 0 materialismo hist6rico e nao somente o materialismo de Feuerbach A hist6ria como eventos e importante para a analis marxista assirn como para qualquer estudan te das relaoes intemacionais tradicionais embora assuma urn signifi cado diferente No marxismo procurase identificar a historicidade gu seja as condi6es de origem e de reproduao de uma sociedade ou id6ia Na verdade esta e a diferena fundamental entre Feuerbach e Marx o ultimo enfatizando a necessidade de mudar o mundo9 0 marxismo pode enquadrarse com urn pouco mais de suces so no terceiro debate representado pelas abordagens centradas no Estado e nos sistemas mundiais Com certeza o marxismo enfatiza que o capitalismo criou urn mercado mundial e com ele foras de classe 9ue operrun em uma escala global Na ldeologia Alemii Marx argumentou que o proletariado somente poderia existir hist6rico mundialmente como resultado de urn process a hist6rico economico mundial a disseminaao do capitalismo e como urn agente atuan do nesta mesma escala 10 Weltklasse Weltpartei Weltrevolution o proprio programa do Comintern resumem esta visao como o an terior Manifesto ja havia feito Alem disso o marxismo devotou muito de sua energia te6rica no seculo passado e neste em urn trabalho te6rico e pratico sabre o Estado analisando sua fora e os interesses de classe nele embutidos 11 Como Valentino Gerratana Marx and DarWin New Left Review n82 NovemberDecember 1973 9Em seu de outra maneira criterioso The World of States Charles Reynolds resume a teoria de Marx como o homem eo que ele comepS29 este jogo de palavras alemao man ist was er isst e na verdade a viso de Feuerbach que Marx rejeitava 1Karl Marx e Friedrich Engels The German Ideology London Lawrence Wishart 1965 p467 11Ralph Miliband The State in Capitalist Society London Weidenfeld Nicolson 1969 Repensando as rela6es intemacionais 65 discutido no Capitulo 3 a conceitualizaao do que e o Estado e como ele se relaciona com outras foras na sociedade tern sido objeto de de bate dentro e fora da tradiao marxista Mesmo assim a premissa de toda esta literatura e que o Estado Ionge de desaparecer ou de ser transcen dido permanece como urn fator central na polftica sujeit a pressoes intemas e intemacionais 0 marxismo reconhece a tmportancta do Es tado como urn objeto de controle polltico e do EstadoNao como m princfpio organizador fundamental seja na uta dos moImntos naciO nalistas por poder ou na consolidaao de regimes revoluc10nanos em utn mundo hostil A maioria dos marxistas seria bastante cettca sobre as rei vindicaoes contempodineas liberais e transnacionalistas de que o Esta do como locus do poder de classe estava sendo erodido como urn ele mnto de polftica intemacional ou sobre a suposiao e que a fora e a coerao foram substitufdas como instrumentos centrals ou pelo menos de reserva de dominaao de classe A partir dos anos 1970 esta aparente falta de comunicaao come ou a desmoronar a literatura acadeca da RI concedeu urn certo Iu gar ao marxismo Mas com a excao de Lmklater e outros JOuos a propria forma desta concessao apresentava problemas Na essenc1a era debatido que uma abordagem te6ric urn paradg derivdo o mar xismo poderia ser usado para expbcar a relaoes nteac10na1 e que este paradigma geralmente chamado de esturahsmo Pfna lear a resultados significativos 12 Pelo menos parec1a que o tensflo us t6rico havia encontrado o seu Iugar dentro das relaoes mtemac10na1s Mas a equaao entre o materialismo hist6rico como uma abor dagem te6rica eo estruturalismo urn paraiga constiufo den tro da disciplina trouxe alguns problemas Pnmetro o propro cm ceito de estruturalismo derivado da lingtifstica e da antropoog1a dlfe ria em aspectos fundamentais do materialisTIo hist6rico E rna for ma de determinismo no sentido de negar hberdade de aao ou de representaao aos elementos dentro da estura 0 marxiso pesar de sua defesa das leis de ferro da h1stona e das determmaoes do contexto socioeconomico contem urn elemento de liberdade de von tade de possibilidade e de voluntarismo Marx no mio da longa ela boraao das leis sobre o modo de produao no Capztal afirma que em algum momento do conflito entre proprietario e expordor os trabalhadores irao rebelarse 13 0 Manifesto e uma lllJUnao a aao A posterior hist6ria o marxism Plftico nas maos de lferes revolucionarios como Lemn e Mao d1ficdmente se conforma a 1ma 12ver por exemplo as leituras que formaram a base ara o inovador curso da Open University sobre polftica mundial em Richard Little e Michael Srmth eds Perspectives on World Politics 2 ed London Routledge 1991 t3Karl Marx Capital vol 1 London Penguin Books em associacao com New Left Review 1976 p92930 66 Fred Halliday gem do homem como urn Prometeus algemado ao chao pelas estru turas de seu ser social Igualmente dentro da tradiao marxista oci dental independente nao existe unanimidade sobre isto enquanto alguns te6ricos especialmente Louis Althusser destacam o determi nismo outros identificaram uma habilidade dos indivfduos e das foras polfticas de perseguir uma emancipaao desafiadora dos cons trangimentos objetivos e de contestar atraves da aao consciente os limites da sociedade Na verdade isto gerou uma outra area fundamental de penetraao do marxismo nas RI atraves da teoria crftica associada a Escola de Frankfurt nesta perspectiva exemplificada pelo trabalho de Robert Cox a enfase e precisamente no potencial emancipat6rio dos grupos e dos indivfduos e sobre a possibilidade de uma resposta te6rica apropriada Uma das grandes contribuioes do trabalho de Habermas foi a distinao entre as tres formas de conhecimento a positivista a hermeneutica e a crftica a ultima sendo a base para urn projeto emancipat6rio 14 0 estruturalismo tambem e enganoso pois sugere em seu uso con vencional que uma multiplicidade de relaoes afeta os elementos do sis tema apesar de reconhecer uma multiplicidade de influencias como as diversas determina6es declasse naao genero Iugar cultura e contexto hist6rico o materialismo hist6rico destaca a primazia de urn destes nf veis de determinaao o que Althusser definiu como uma estrutura em controle Tal controle e dado pelo nfvel material e socioeconomico em oposiao a contingencia do estruturalismo convencional o marxismo e uma teoria da determinaao socioeconomica Exemplos da determinaao contingente dentro da literatura das RI sao a teoria de Susan Strange das quatro estruturas das rela6es in temacionais e a teoria estrutural de Galting sobre o imperialismo 15 A conceitualizaao de Michael Mann das quatro formas de poder tern uma indeterminaao similar Todas estas teorias reconhecem a importancia das formas de determinaao abordadas pelo materialismo hist6rico a produao e a exploraao economica mas destacam que estas podem ser ainda acompanhadas por outras formas de constrangimento A es trutura em contrQle e substitufda por uma determinaao a esmo Outra dificuldade e trazida pela imagem que as RI tradicionais tern do estruturalismo referente a limitaao de seu alcance Como mostrara uma pesquisa nos livros o paradigma estruturalista e asso ciado a temas limitados dentro das relaoes internacionais como a 14Sobre Cox ver Nota 3 e a discussao de Linklater em Beyond Realism and Marxism Sobre Habermas Ian Craib Modern Social Theory Brighton HarvesterWheatsheaf 1984 e Anthony Giddens Jurgen Habermas em Quentin Skinner ed The Return of Grand Theory in the Human Sciences Cambridge Cambridge University Press 1985 1Susan Strange States and Markets London Pinter 1988 Johann Gal tung A structural theory ofimperialism em Michael Smith et al eds Perspectives on World Politics Repensando as rela6es intemacionais 67 questao NorteSui Alem de fornecer uma teoria geral sobre esta questao o estruturalismo destaca a sua centralidade nas rela6es internacionais algo que nao era reconhecido Entretanto existem duas limita6es significativas a esta abordagem Em primeiro Iugar a propria teoria agrupada sob o nome de estru turalismo fomece somente urna consideraao parcial do que ja fora ob jeto de estudo dentro do rnaterialismo hist6rico Na verdade a maior par te da literatura destaca 0 carater de exploraao e de dorninaao do impe rialismo mas outra linha mais proxima as percep6es iniciais de Marx apresenta a questao de uma maneira mais complexa 0 imperialismo urn produto da disseminaao global do capitalismo possui urn impacto des trutivo e criativo duplo que desorganiza as formas sociais e econornicas estabelecidas e gera novas Presente no trabalho de Marx esta perspecti va apesar de condenar 0 sofrimento imposto a humanidade incluindo 0 mundo colonial jela disseminaao do capitalismo e a sua hipocrisia mo ralizante destaca alguns efeitos economicos e sociais positivos Nem Marx ou Lenin possuiam qualquer simpatia pelas sociedades precapitalistas do mundo Somente depois sob o impacto de uma leitura anticolonial de Marx e da teoria da dependencia e que o marxismo passou a ser domina do pela visao de que o imperialismo tinha somente impactos negativos Contudo foi somente a partir dos anos 1970 e dos evidentes sucessos da industrialao e da mudana polftica em vanos paises do Terceiro Mundo que esta velha tendencia rnarxista pooe tomarse mais evidente Aiem da limitaao das possibilidades de interpretaao do ma terialismo hist6rico existe urn problema adicional na identificaao entre o marxismo e o estruturalismo a limitaao das quest6es consi deradas relevantes Qualquer paradigma que busca algum impacto procura fazelo pela redefiniao da hierarquia de quest6es e da agen da da disciplina mas o foco sobre o estruturalismo tern liniitado o alcance do paradigma Apesar de terem se tornado importantes as rela6es NorteSui nao podem ser percebidas como contendo a chave no sentido kantiano da polftica mundial A enfase sob estas dimen s6es restringe inibe e pretende limitar o ambito do materialismo hist6rico As rela6es entre os pafses do Norte os Estados capitalis tas desenvolvidos e as entre os pafses do Sui a guerra e os proble mas relacionados assim como o papel das hist6rias nacionais espe cfficas de Estados individuais nao podem ser tratados como proble mas exclusivos Assim a maior parte da hist6ria do sistema interna cional seria exclufda 16 Ironicamente esta delimitaao sustentouse sobre uma leitura er ronea do supostamente estruturalista Imperialism de Lenin Ionge 16Sobre isto ver principalmente Bill Warren Imperialism Pioneer of Capitalism e Nigel Harris The End of the Third World London Penguin 1985 68 Fred Halliday de ser urn livro sobre as rela6es NorteSui este foi urn estudo de por que OS grandes poderes imperialistas foram a guerra em 1914 e de como os socialistas deveriam reagir a istoY Para examinar a re levancia do marxismo e preciso ampliar 0 alcance te6rico do para digma e nao abandonar a enfase e a abordagem te6rica do estrutu ralismo englobando os temas principais e centrais de sua agenda Para que o potencial do materialismo hist6rico possa ser aproveita do no campo das rela6es internacionais e necessaria urn processo duplo de redefiniao da agenda e de expansao de sua esfera te6rica para abranger todas as preocupa6es da disciplina 0 POTENCIAL DO MATERIALISMO HISTORICO Nao e possfvel afirmar que as ferramentas intelectuais para tal encontro estao disponfveis 0 marxismo continua em evoluao como abordagem te6rica muitas quest6es foram levantadas em seus 150 anos de exisrencia mas muitas ainda devem ser estudadas assim como a sua obra e contradit6ria ultrapassada e confusa Nisto ele nao e diferente das outras abordagens como o liberalismo e a economia convencional Em grande medida a tarefa de analisar as rela6es internacionais esta reservada ao futuro nao estando presente nos tra balhos atuais Que tal empreendimento seja possfvel e possa Ievar a urn novo e abrangente paradigma devese a duas raz6es gerais Primeiro como e evidente pelo seu impacto nas outras cienci as sociais o materialismo hist6rico e uma teoria geral abrangente da aao polftica social e economica capaz de considerar todos os cam pos da aao social Na verdade o materialismo hist6rico e a tentati va mais consistente de fornecer uma teoria abrangente da sociedade elaborada no seculo passado 0 seu impacto ja tern sido evidente em algumas areas da ciencia social na economia na hist6ria e na sociologia 0 fato dele nao ocupar urn Iugar semelhante nas rela 6es internacionais e de nao ter respondido adequadamente aos desafios da disciplina e urn resultado dos obstaculos te6ricos e his t6ricos especfficos ja esboados Muitos aspectos conceituais do materialismo hist6rico contem po tencial para as rela6es intemacionais e podem nelas ser aplicados como ja o foram em outras teorias Como vimos na Introduao em suas pou cas decadas de existencia a maior parte das ferramentas te6ricas das re la6es intemacionais foi emprestada de outras disciplinas comeando pelas primeiras influencias do direito e da filosofia passando pela teo 17Para uma interpretaao esclarecedora ver Georg Lukacs Lenin A Study in the Unity of his Thought London NLB 1970 cap 4 Repensando as relaoes intemacionais 69 ria de poder da escola de Chicago o behaviorismo a teoda da aao racional as teorias do conflito o funcionalismo e chegando agora ate a teoria crftica as influencias de outros ramos das ciencias sociais sao evidentes 0 pctencial do materialismo hist6rico para enriquecer a disciplina e considenivel mesmo que como na hist6 ria e na sociologia ele nao seja sustentado por trabalhos diretamen te ligados as rela6es intemacionais Segundo dentro de sua obra como presentemente construlda o materialismo hist6rico produziu trabalhos referentes a agenda conven cional das rela6es intemacionais e muito alem da interpretaao especl fica do estruturalismo algo que foi reconhecido no final dos anos 1970 sobre a guerra a violencia o Estado o conflito intemacional as ques toes economicas transnacionais e 0 desenvolvimento do proprio sistema intemacional A tentativa do marxismo no periodo de 190020 de teori zar o sistema intemacional em tomo do conceito de imperialismo entendido como a rivalidade estrategica interestatal e uma das mais ambiciosas e criativas jamais feita antes Desde 1970 outro considenivel corpo de lieratura sobre quest6es intemacionais foi produzido sob a influencia qo marxismo alem de abun dantes estudos sobre o imperialismo existiram as teorias do sistema mundial de Wallerstein OS debates da Guerra Fria e as analises das rela oes intercapitalistas Diferente das RI ortodoxas o trabalho de Wallers tein coloca uma hist6ria bastante diversa do sistema intemacional ape sar de cobrir quase o mesmo periodo de 1500 ao presente Em oposiao a analise polltica e diplomatica realista a abordagem de Wallerstein en fatiza o papel das rela6es economicas na constituiao do sistema ela destaca a criaao de uma hierarquia enquanto as demais apontam a for maao de uma sociedade intemacional juridicamente igualitana alem disso ela procura relacionar o processo do conflito intemacional e a mudana social e poHtica intema em oposiao a negaao realista da re levancia do intemacional 18 Ao mesmo tempo dentro do materialis mo hist6rico o trabalho de Wallerstein recebeu criticas substanci ais por ser uma teoria que da muita importancia a circulaao e nao a produao por atuar como uma ingenua defensora das foras anti sistemicas mesmo quando elas sao repressoras e por ser sustentada em uma explicaao do imperialismo limitada e ligada a teoria da dependencia 19 Para a afirmaao original ver Immanuel Wallerstein The Modern World System London Academic 1974 Ver Historical Capitalism London Verso 1980 para uma mais sucinta considerao de sua visao 9Peter Worsley One world or Three A Critique of the World System of Immanuel Wallerstein Socialist Register 1980 Ernest Laclau Politics and Ideology in Marxist Theory London NLB 1977 Theda Skocpol Wallersteins world capitalis system A theoretical and historical critique American Journal of Sociology v82 n5 1977 70 Fred Halliday Apesar de ter sido objeto de diversas abordagens o debate sobre a Guerra Fria devido a oposiao do realismo e de outras correntes dentro das RI sempre foi marcado pela relutancia em analisar o fe nomeno em termos te6ricos Para o realismo a Guerra Fria foi ape nas uma continuaao da competiao interestatal para as teorias da independencia e estruturais ela era urn embaraoso desenvolvimen to secundario uma distraao de suas agendas principais sobre o in terdesenvolvimento e as rela6es NorteSui As conseqtiencias des ta postura para a teoria das RI sao discutidas em maior extensao nos Capltulos 7 e 8 aqui basta registrar que praticamente o unico de bate te6rico sobre a natureza deste conflito intemacional que domi nou a segunda metade do seculo XX teve Iugar dentro do paradig ma materialista hist6rico 20 Este foi o caso da literatura sobre as rela6es intercapitalistas subs trato da literatura da interdependencia a partir dos anos 1970 e que se refletiu nos trabalhos de Keohane Gilpin e Strange escritores que tam bern participaram do debate sobre o decHnio dos Estados Unidos nos 1980 Como estes pr6prios autores reconhecem foram os mar xistas que produziram a maior parte dos escritos sobre o assunto an tes da Primeira Guerra Mundial e a ele retomaram em urn novo con texto intelectual esta contribuiao e representada pelo trabalho de van der Pijl Kolko Gill e outros 21 Dentro das rela6es intemacionais esta literatura foi acompanha da pela emergencia de escritos em uma area semelhante mas nao for malmente inserida dentro da disciplina a hist6ria intemacional Aqui a divisao disciplinar convencional somada a rivalidade de longa data en tre as duas abordagens academicas impediu as RIde adequadamente considerarem a emergencia de urn corpo substancial de literatura dentro do campo hist6rico 0 marxismo ja contribulra substancialmente com outros campos mais especlficos da hist6ria a nacional a polltica a social e a econo mica Mas a partir dos anos 1960 surgiram trabalhos de hist6ria inter nacional influenciados pelo materialismo hist6rico e muito diferentes da diplomaCia hist6rica convencional Dentre outros podese mencionar o trabalho de Eric Wolf Perry Anderson e Eric Hobsbawm 0 estudo de Wolf e uma analise abrangente e convincente da subjugaao do 20E P Thompson Fred Halliday e Rudolf Bahro Exterminism and Cold War London NLB 1982 21Kees van der Pijl The Making of American Ruling Class London Verso 1984 Outro corpo influente de trabalho em paralelo aqui e o da escola francesa de regulao de Alan Lipiers e MichelAglietta Para uma critica poderosa desta escola ver Alice Amsden Third World Industrialization Global Fordism or a New Model New Left Review nl82 JulyAugust 1990 Repensando as relaroes intemadonais 71 mundo naoeuropeu ao sistema socioeconomico europeu 22 0 tra balho de Anderson traa a evoluao do Estado ate a epoca da demo cracia abordando o desenvolvimento social e politico intemo e a competiao extema23 0 trabalho de Hobsbawm talvez o mais abran gente e com as implicaoes mais diretas para o estudo das relaoes intemacionais encontrase em urn conjunto de tres estudos compa rativos sabre a evoluao do sistema intemacional InQderno A Era das Revolufoes 17891848 A Era do Capita18481875 A Era dos lmperios 18751914 24 A obra de Hobsbawm apresentou urn trabalho de importancia direta as relaOeS intemacionais e as questoes que ela consiqera a emer gencia dos Estados das naOes dos mercados o papel dos fatores eco nomicos politicos e estrategicos nos assuntos intemacionais e as fon tes de conflito dentro e entre as sociedades Nenhum trabalho compa ravel surgiu dentro da hist6ria intemacional convencional ou das RI sabre a sociedade intemacional Apesar de empiricamente constru fdo e equilibrado o trabalho de Hobsbawm esta ligado segundo ele mesmo ao materialismo hist6rico e as suas amplas categorias de in dagaao e explicaao Par exemplo em sua dade do lmperialismo as quatro decadas anteriores a eclosao da Primeira Guerra Mundial sao examinadas no contexto do desenvolvimento da sociedade industrial e da sua expansao mesmo nos capftulos sabre a disseminaao da democracia do nacionalismo e do imperialismo ou dos eventos que levaram a guerra em 1914 este contexto materialista hist6rico geral e mantido sem qualquer reducionismo 0 que Hobsbawm retrata nao e entretanto 0 desenvolvimento de alguma sociedade intemacional abstrata ou urn outro exemplo do funcionamento do equilibria de poder mas a civilizaao e a crise de urn periodo hist6rico muito particular Estes dais fatores o potencial te6rio desta abordagem como uma teoria social abrangente e as contribuioes especfficas subs tantivas e conceituais que podem ser feitas as relaoes intemacio nais combinamse para sugerir que o materialismo hist6rico pode oferecer uma explicaao abrangente das relaoes intemacionais setn complacencia com relaao a sua adequaao frente as questoes abor dadas e as suas fraquezas intemas A seguir combinarei as implicaoes das discussoes apresenta das ate este ponto e esboarei alguns caminhos pelos quais esta ela 22Eric Wolf Erope and The People Without History Berkeley University of California Press 1982 23Perry Anderson Lineages oithe Absolutist State London NLBNerso 1974 24TheAge of Revolutions 17891848 London Weidenfeld Nicolson 1962 The Age of Capital18481875 London Weidenfeld Nicolson 1975 The Age of Imperialism I875I9I4 London Weidenfeld Nicolson 1987 72 Fred Halliday boraao pode prosseguir Inicialmente isto sera feito pela apresen taao dos parametros gerais do paradigma materialista hist6rico e depois pela discussao de certas contribuioes tematicas especfficas que o materialismo hist6rico pode fazer para as relaoes intemacio nais Assim sera possfvel identificar alguns dos problemas envolvi dos em tal trabalho te6rico 0 PARADIGMA MATERIALISTA HISTORICO Marx e Engels escreveram extensamente sabre as questoes in temacionais considerando as questoes te6ricas relativas a intema cionalizaao do capitalismo e aos eventos politicos intemacionais de seu tempo 25 Nestes escritos existe muita substancia conceitos e matizes que sao pertinentes para construir a interaao entre o mate rialismo hist6rico e as Rl Entretanto a classica ouvre marxista so bre as RI e uma base insuficiente para a sustentaao deste empreen dimento te6rico primeiro porque existem diferenas profundas entre os escritos te6ricos e conjunturais nao havendo uma reuniao das1 duas dimensoes segundo porque urn foco exclusivo sabre a in temacional reduz o alcance de como a teoria marxista como um todo pode ser capaz de contribuir para este estudo Em Marx e outros te6ricos 0 que e mais importante para as relaoes intemacionais nem sempre esta presente na analise do intemacional mas nas impli caoes mais amplas de toda a teoria Ao procurarmos ideias criati vas sabre as questoes intemacionais nao nos voltamos aos escritos de Maquiavel sabre as colOnias ou sabre os mercenarios ou para as reflexoes de Rousseau sabre as virtudes do movimento de indepen dencia da C6rsega ou as visoes de Kant sabre raa mas buscamos a sua abordagem te6rica mais ampla e os seus insights Ao Iongo de varios escritos de Marx e Engels existem quatro te mas gerais que podem ser identificados como definindo e constituindo a posiao intelectual par eles defendida 0 primeiro e 0 da determina ao material ou mais precisamente a determinaao par fatores soci oeconomicos com a palavra material possuindo este sentido particu lar Marx percebia a sociedade como uma totalidade urn composto dentro do qual cada elemento era govemado em urn sentido mais geral pelo carater e pelo funcionamento do todo Em qualquer sociedade a aividade centrale a produao economica e as principais questoes anaH 25Para as melhores pesquisas ver Molnar Marx Engels et la Politique Internationale sobre a guerra ver Bernard Semmel ed Marxism and the Science of War Oxford Oxford University Press 1981 sobre na6es e nacionalismo ver Benner Marx and Engels on Nationalism and National Identity Repensando as relaoes intemacionais 73 ticas sao consideradas a partir desta estrutura qual e o nfvel de produao ou em outros termos em que estagio de desenvolvimen to se encontram as foras da produao Segundo quais sao os sistemas de propriedade e de controle efetivo que definem a propri redade destas foras ou seja quais sao as relaoes de produao Combinadas estas foras e relaoes formam urn modo de produ ao o feudalismo o capitalismo ou o socialismo e atraves desta determina9ao estrutural uma sociedade particular ou formaao social i e constitufda As ideias as instituioes e os eventos de uma formaao societaria devem set percebidos a partir de sua relaao com a totalidade e com as formas de determinaao material definidas pelas foras e rela oes de produao e nao em urn contexto isolado ou abstrafdo do modo de produao Afirmar isto nao significa como o fazem muitos marxis tas vulgares e crfticos do marxismo dizer que tudo deve ser reduzido a atividade economica isto nao e o que Marx afirmava e as suas anali ses dos acontecimentos polfticos e dos conflitos na Frana de 1840 e 1870 ou dos eventos internacionais de sua epoca assim o demonstram Alem disso o seu conceito de capitalismo abrangia nao somente as foras es pecfficas e a apropriaao da economia mas um con junto mais amplo de instituioes polfticas legais e culturais que a elas se relacionavam26 Os conceitos gerais de modo de produao e de formaao social vinculam a analise de qualquer atividade humana ao contexto socioeco nomico e nao a partir de sua abstraao Nao existe portanto penh urn Es do1 nenhuma crena nenhum conflito nenhum poder emgerarmTe peiioente deste contexte Por extensao nao existe nenhum sistema in ternacional ou qualquer componente de sua atividade seja a guerra ou a diplomacia que possa ser abstrafdo do modo de produao Na verda de l rJaqsiJlsmlliQll4243 rS entre a csQciaiQ9slrJQl9l4 A partir do inomento em que se aplica esta percepao as quest5es do internacional uma clara mudana de foco e visfvel Assimgg1JO e mais percebido como uma corporificaao do interesse nac10nal ou da neutralidade judicial mas sim como locus dos intresses de uma sguspecfica ou deJlma fgsao socialdfinidapor suasijiisgQQ11Pmic Identificar ate queponto as dasses controlam o Estado ou estao separadas dele tern sido uma das quest5es principais de disputa dentro da area Da mesma forma a soberania se torna nao urn conceito legal generico mas a sobe rania de foras sociais especfficas a sua hist6ria e a das formas de po der social e ada sua legitimaao A segurana e removida da esfera teo rica tradicional em que foi colocada e se torna a segurana de gru pos sociais e por razoes socioeconomicas especfficas 26Derek Sayer The Violence of Abstraction Oxford Blackwell 1987 para uma inter pretalio nlioreducionista de Marx 74 Fred Halliday A hist6ria do sistema tambem e vista com outros olhos o siste ma interestatal moderno emergiu em urn contexto de disseminaao global do capitalismo e da subjugaao das sociedades precapitalis tas Simultaneamente este sistema socioeconomico sustentou o ca rater individual dos Estados e as suas relaoes nenltUIlfl analise das 1 e JQmtmcJpnat posstvel sem referencta ao capitalismo as formQgais P9Leli geradas e ao sistemamundiaJ27 0 segundo tema central presente nancmie do paradigma e 0 da it6rJ C 4UEO hcSricJl Inicialmente Marx argu mentou que a hist6ria influenciava o comportamento presente Como por exemplo na frase usada em uma ocasiao a tradiao das geraoes mortas paira como urn pesadelo sob as mentes dos viven tes Mas ele queria dizer mais do que isso Marx defendia que os eventos e as caracterfsticas de qualquer sociedade somente poderi f am ser percebidos em seu contexto hist6rico devese indagar como se constitui o objeto de estudo quais foram as influencias dos even tos passados e qual impacto teria o passado na definiao da situaao presente 28 Assim como defendia que a sociedade deve ser percebi da em seu contexto socioeconomico Marx tambem acreditava que as suas condi5es de origem e Iugar no sistema eram centrais para a analise Para compreender a sociedade capitalista contemporanea devem ser pesquisadas as suas origens e os seus condicionantes passados problemas e tendencias Tambem deve ser avaliado como estes fatores limitavam as opoes percebidas por urn povo e como o levavam a ser influenciado ou totalmente determinado por paix5es ilusaes e identificaoes inconscientemente herdadas de outras epocas Qualquer urn familiarizado com o funcionamento do sistema in ternacional ira de uma certa maneira estar consciente disso a supres sao ideol6gica das origens do sistema a propensao para negar a violen cia envolvida em sua criaao e a fora dos fatores irracionais como o nacionalismo dentro dos assuntos internacionais Assim o que Marx disse sbre o papel da hst6a se aplia a todos ospatses as polfcas domesttca e externa os mstmtos dos hderes e as respostas do pubhco l as institui5es polfticas as magoas e os medos que movem a populao I tudo isto e mais reflexo do passado do que se costuma admitir Ao lado da determinaao socioeconomica e hist6rica Marx tam bern percebia estes fatores condicionantes como destruindo a aparencia 27E este argumento que alem de formar o tema central dos trabalhos de Wolf Anderson e Hobsbawm mencionados forma a base da analise de Jus tin Rosenberg sobre as origens e os desenvolvimentos do sistema intemacional The Empire of Civil Society A Critique of The Realist Theory of International Relations London Verso 1994 Sou extremamente grato a Justin Rosenberg pelas muitas sugestoes proveitosas que ele fez sobre o material neste captulo 28Eric Hobsbawm Marx and History New Left Review n143 JanuaryFebruary 1984 Repensando as relaoes intemacionais 75 i de que todos os eventos eram naturais ou permanentes em qual quer sociedade uma das principais funoes da socializaao polftica e tamar estes eventos imutaveis e inevitaveis 0 mesmo se aplica ao terreno do intemacional e as suas formas continuas a naao o Es tado a soberania etc Localizar as caracterfstcaQruieda4f no contexto historico de sua ongetrrcflttliIzt igeiade ques sj naturaisoiietemas e pode sugeiir a existenciB 4aterttYyas Entretanto como ja admitido o Iugar da hist6ria no estudo das relaoes intemacionais e incomodo Isto ocorre por raoes terica praticas e profissionais No primeiro caso as relaoes mtemactonats buscam diferenciarse como uma esfera conceitual distinta de estudo e nos demais anseiam em definirse em oposiao a abordagem ide ol6gica da hist6ria diplomatica e do seu fetiche por arquivos e datas A questao da origem hist6rica recebe menos atenao e quando a his t6ria esta presente geralmente o e como uma ilustraao ou mais fre qlientemente ainda como uma forma de intimidar o leitor com uma avalanche de exemplos evidente tanto em James DerDerian On Diplomacy como em Martin Wight Como resultado muitas das questoes consideradas dentro das re laoes intemacionais sao perigosamente abstrafdas de seu contexto his t6rico Primeiro isto se aplica a falta de cultura hist6rica da maioria dos que escrevem e estudam o assunto de forma que a proporao e o alcance de referenda a hist6ria esta quase sempre ausente 0 behavi orismo certamente fez da rejeiao da hist6ria urn de seus pilares cen trais Da mesma maneira isto se aplica a abstraao de conceitos espe cfficos da situaao hist6rica em que nasceram A freqliente e repetida afirmaao de que os Estados contemporaneos britanico e americana sao exemplos de urn caminho pacffico e naorevolucionario de de senvolvimento e urn exemplo marcante disso A expansao da soci edade ocidental ou da sociedade intemacional foi alcanada atraves da subjugactao do saque e em alguns casas do massacre de socieda des coloniais Urn caso mais recente e a discussao da relaao dos con ceitos de interdependencia e de ingovemabilidade praticamen te isto anula a importancia do evento que provocou a emergencia desta questiio no nfvel politico a Guerra do Vietna e o seu impacto no sis tema polftico e social dos Estados Unidos 29 0 terceiro tema central da abordagem materialista hist6rica e a centralidade das classes como tres na vida pliccestica e 29 A questiio do impacto da Guerra do Vietna sobre as RI e especificamente nos escritos produzidos nos EUA poderia parecer sem resposta ja que sua principal conseqtiencia aparente foi tornar o estudo de alguns assuntos como o estudo das revoluroes e do conflito social menos atrativo Urna resposta e entretanto que o impacto deve ser en contrado no interesse pela interdependencia ja que o conflito no Sudeste da Asia foi visto como provocando irnportantes conflitos nos EUA 76 Fred Halliday internacional 30 Genericamente as classes sao definidas pela posse eemrttd5rmeios de produao e isto depois determina as outras formas de poder social que elas detem Se dentro de urn Estado par ticular as classes agem para subjugar e controlar os menos podero sos intemacionalmente elas agem para aliarse a grupos similares quando isto lhes e benefico e para competir por meios pacfficos ou militares quando se prefere a rivalidade 0 conflito entre as classes ou seja a luta de classes ocorre portanto em dois nfveis entre grupos em diferentes posioes na escala socioeconomica e entre grupos de posiao equivalente Tal luta tambem ocorre dentro e fora dos Estados com a disseminaao do capitalismo aumentou o tama nho do mundo capitalista e a rivalidade com outras classes domi nantes na esfera intemacional acompanhou as disputas intemas Cada classe dominante tern sido capaz de utilizar 0 carater intemacional do capitalismo para preservar a sua posiao dentro da sociedade ali andose com outras e para identificar na arena intemacional urn terreno para a expansao de seus interesses e poder enalidlde das classes comoferrameta alfca m uas con fsequenctas tmedtatas para as relaoes mtemactonats Primerro mveste os principais conflitos da polftica intemacional de urn carater socioeconomico Parafraseando Marx embora possa soar falso toda a hist6ria das rela5es intemacionais tern na luta de classes urn de seus componentes fundamen tais e decisivosAdisseminaao competitiva dos imperios europeus a eclo sao das duas guerras mundiais a crise do padrao ouro em 1931 a eleva ao dos pos da OPEP de 197173 as disputas sobre o comercio e as taxas de juros dentro da Aliancta Atlantica no infcio dos 1980 o conflito comercial entre os Estados Unidos eo Japao nos anos 1990 podem ser percebidos como parte do conflito entre as classes dominantes capitalis tas e entre os velhos poderes capitalistas e seus novas rivais a partir do seu desenvolvimento intemo de rela5es sociais capitalistas Muitas das disputas que marcaram a hist6ria do seculo XX se tomaram disputas inte rimperialistas e intercapitalistas indo alem de suas caracteristicas nacio nais geograficas e hist6ricas como ja notado a questao do conflito entre os grandes poderes e nao a dinamica das rela5es NorteSur era a prin cipal questao considerada por Lenin e por outros no debate sabre o impe rialismo antes da Primeira Guerra Mundial Partindo deste prisma os debates tradicionais que dominaram as re laoes intemacionais por tanto tempo parecem sustentados em algumas premissas questionaveis A percepao de que o Estado nao e uma entida de independente mas pelo contrario uma determinada pelo contexto so cioeconomico e declasse leva a uma mudana de carater no debate sobre 30Tom Bottomore Classes in Modern Society London Allen Unwin 1965 Para uma aplicaraoas Rl ver Cox Social forces states and world orders Repensando as relacoes intemacionais 77 a perda de seu poder frente aos atores naoestatais A questao nao reside em uma possfvel perda de proerninencia para os atores naoestatais no perfodo recente desde 1945 ou 1970 mas como estes atores noestatais que sempre afetaram o poder e o caniter do Estado agem atraves do Esta do ou atraves de outros canais Os atores naoestatais como as classes sempre estiveram presentes exercendo seu poder de vanas formas Alem disso a questao sabre onde estao sendo derrubadas as fronteiras entre a polftica domestica e a internacional adquire urn diferente significado no capitalismo as classes sempre tiveram uma atuaao intemacional come ando pela aao dos banqueiros e das companhias comerciais do seculo XVI ao mesmo tempo em que eram afetadas domesticamente pelas mu danas na situaao economica e polftica mundial 31 A primazia destas classes serve portanto para colocar dupla mente em questao o conceito de EstadoNaao ela mostra primei ro que o Estado em si mesmo e em uma medida considenivel uma funao de foras sociais mais amplas e segundo que a impermea bilidade da polftica domestica e uma aparencia que esconde uma permanente subjacente internacionalizaao de fatores polfticos e econornicos Nos pr6prios escritos de Marx ha uma ten sao interes sante nesta questao seus instintos polfticos o levaram a enfatizar o carater intemacional do proletariado a classe trabalhadora e a sua aspiraao e habilidade para organizar uma base intemacional con tra seus inimigos de classe Contudo esta teoria contem dentro de si outra sugestao nao e a classe trabalhadora mas a burguesia que era mais intemacional ja que a sua educaao e cultura por urn lado e os seus pr6prios interesses economicos por outro eram tais que a ela foi levada a agir cada vez mais intemacionalmente A hist6ria subseqiiente do capitalismo tern mais do que qualquer coisa sido uma hist6ria na qual a internacionalizaao da classe dorninante tern avana do tao rapido quanta ou mesmo rnais rapido do que aquela da classe trabalhadora Por esta razao como Jeff Frieden Stephen Gill Kees van der Pijl e outros mostraram a CE Comunidade Europeia a Comissao Trilateral e o 07 dentre muitos outros sao exemplos da elite de coor denaao transnacional para a melhor adrninistraao de ambas as econo mias a nacional e a intemacional 31Um exemplo 6bvio desta inteao e a industria do petr6leo onde por urn seculo ou mais as grandes corporal6es influenciaram e utilizaram os Estados em pafses produtores e consumidores para avanlar seus interesses Simon Bromley American Hegemony and World Oil Cambridge Cambridge University Press 1991 Para uma importante consi deao da inteao entre os bancos eo estado americano ver Jeffery Frieden Banking on the World New York Harper and Row 1987 Para outro estudo revelador da politica extema americana em termos de influencia de neg6cios ver David Gibbs The Political Economy of Third World Intervention 78 Fred Halliday 1 r 0 quarto conceito central do materialismo hist6rico e aquele do conflito e do seu apogeu a LY91iChA maior parte da literatura sobre o marxismo e dentro dele temse preocupado com a questao do conflito nos nfveis filos6fico e metodol6gico como refletido na questao da dialetica Esta e uma especulaao questionavel uma relfquia da influencia hegeliana sabre Marx e da visao comum do seculo XIX de que urn metoda unico para as ciencias naturais e sociais podia ser determinado 0 conflito e tornado aqui como urn conceito hist6rico e social pertencente as relaoes entre as diferen tes classes e os outros grupos sociais e gerado pelas diferenas em posioes socioeconomicas 0 materialismo hist6rico nao somente discute que tal conflito e inevitavel dadas as desigualdades de ri queza e posiao economica na sociedade contemporanea mas tam bern que e urn fator dinamico fundamental da polftica no sistema intemacional e nas sociedades individuais 0 cJaxde taiseontlitospode ocorrer de uma destas duas manei ras otfde u1llasombinaao da dllal glrra ea revolusaQ No marxis ffio as guerras representam conflitos entre duas classes sociais ri Vais de caracterfsticas similares para obter o monop61io de merca dos de recursos e de territ6rios Marx faz uma distinao entre as revoluoes polfticas que somente mudam a forma do govemo e as revoluoes sociais que alteram o sistema de dorninaao de clas se Ele esta preocupado com esta ultima As revoluoes represen tam conflitos entre classes sociais de diferentes carateres dentro de Estados particulares AsY9JlJQS sao eventos que nascendo de conflitos profundos dentro de rima estrutura socioeconomica levam a mudanas no carater soci5l dos Estados e a mudanas substanci ais no carater da polftica jtitemacional Longe de representar aber raoes colapsos ou intupoes da polftica normal elas sao difu sas e pontos de transio centrais dentro da hist6ria das naoes e da comunidade intemapional em geral Elas sao nas palavras de Marx as locomotivas dihist6ria 32 s est prlfpiodO materialismo hist6rico e estendido ao inter nacional entao ele sugere que a preocupaao central das relaoes in temacionais se tome nao a segurana f as aoes do EstadoNaao dirigidas para aumentala e defendela mas pelo contrario o conflito e as formas pelas quais ele e gerado conduzido e resolvido 0 confli to social dentro e atraves de fronteiras visando a riqueza e ao poder economico esta presente na origem de inumeros eventos internacio nais 33 Considerandose a deterrninaao hist6rica de Estados especffi 32lsto e discutido em maior extensao no Capitulo 5 33Para um exemplo esclarecedor da aplicaliiO do metodo marxista a um evento hist6rico principal ver Ernest Mandel The Meaning of World War London Verso 1986 Repensando as rela6es intemacionais 79 cos tornase necessario perguntar porque eles existem ou mais pre cisamente a partir de que conflitos hist6ricos eles emergiram 0 apa rentemente mais pacifico dos Estados pode ter nascido de passados extremamente sangrentos a hist6ria da tranqiiila Holanda e repleta de revoluoes invasaes e guerras internas No presente o funcionamen to regular da democracia na Alemanha e no Japao esconde o fato de que este sistema politico foi imposto somente ha duas geraaes JOr meio de uma intervenao militar externa Desde 1945 a repentma chegada de quase cern novos Estados no cenario mundial e freqilen temente exemplificada como uma mera adiao numerica uma expan sao complicadora e diluidora do anterior sistema continuo de Estados 0 fato de que este processo foi urn resultado dos intensos conflitos entre as colllnias e o poder colonial e como uma precondiao funda mental derivou do enfraquecimento dos imperios coloniais na Segun da Guerra Mundial recebe menos atenao do que deveria Marx tinha consciencia disso na metade do seculo XIX Escre vendo sobre o desafio ao equilibrio de poder das cinco naoes a pentarquia ele alertou sobre a presenva de uma sexta grande potencia a revoluao Assim o problema dominante da poUtica intemacional do seculo XX e percebido pela teoria das relaoos intemacionais convencionais como sendo aquele da segurana mas muito deste periodo pode tambem ser considerado como urn de contenao do conflito intercapitalista e da revoluao social Em outras palavras a administraao do conflito social e a questao que mais tern preocu pado os poHticos e os analistas academicos da poHtica extema 34 Como Amo Mayer mostrou urn evento intemacional aparentemen te neutro como a Conferencia de Paz de Versalhes em 1919 estava preocupado com a questao de agir contra a revoluao e center a desordem Marx estava enganado ao emprestar nuances misticas e 1 deterministicas a revoluao que acabaram sendo associadas a ela e igualmente errado ao acreditar que alguma sociedade radicalmen te diferente e emancipada emergiria de tais levantes Entretanto ele estava certo ao perceber o conflito social sobre a propriedade o poder e os recursos como uma caracteristica central da poHtica e ao per guntar como tal conflito sustentava o aparentemente autonomo mundo da revolta politica e do conflito intemacional Em parte Marx foi capaz de fazer isto pela introduao dos contex tos material e hist6rico Quando se diz que a politica intemacional bus ca uma ordem devese perguntar ordem para quem e com quais in teresses Similarmente quando e dito como por exemplo por Hedley 34Amo Mayer Politics and Diplomacy of Peace Making Containment and Counter Revolution at Versailles 19181919NewYork Knopf 1967 80 Fred Halliday Bull que a sociedade internacional e anarquica isto tanto reco nhece como evita a questao ha o reconhecimento quando se admi te que existe urn conflito e que ele e endemico ao sistema intemaci onal mas se evita a questao quando se nega a existencia de uma fora subjacente a este conflito alem do sistema de Estados e quando se localiza a coerencia do sistema somente no ambito de seus meca nismos ou das suas chamadas instituiyoes desenvolvidas para administrar este conflito A afirmaao da anarquia esconde o fato de que este conflito incoerente na superficie e produto de fatores que podem ser definidos e percebidos mesmo se eles nao podem ser controlados como gostariam os principais atores Alem disso para xiJllomfis impqrtJJ QtmHnlte no e a anarquiiao stemQ ladosmasa do merag e d pr9ptiocapitalismo 35 0 tema do conflito possibilita a avaliaao da importancia da questao da vontade e da atividade humana consciente dentro do pen samento marxista Marx enfatizou a importancia da determinava so cioeconomica e hist6rica estas foras agem profundamente sobre os atores humanos e definem os limites do que eles podem atingir e as tendencias de suas aoes Outro tema central do materialismo hist6rico e o reconhecimento da esfera da necessidade e do poder de influencia de fatores nao re conhecidos em nosso comportamento Neste sentido Marx afirmou a importancia de fatores sociais e hist6ricos naoreconheciveis ou de algumas formas tao poderosas quanto o inconsciente individual de Freud Mas como Freud ele acreditava que a vontade humana e o objetivo de tornar o inconsciente explicito e consciente eram pos siveis dentro de certos limites Alem disso tal reconhecimento era urn caminho nao para a celebraao do inevitavel do renderse face ao determinado mas pelo contrario uma precondiao para o exer cicio da liberdade que as circunstancias permitem Os grupos soci ais poderiam mais facilmente mudar sua posiyao se percebessem a extensao dos fatores que determinavam a sua situaao Similarmente a possibilidade de que a aao alterasse o sistema existente de relaaes intemacionais ou promovesse urn conflito com al gum sucesso dependia de urn reconhecimento comparavel da necessi dade Os conflitos sao em larga medida promovidos por atores que sao cegos ou por aqueles que nao podem atingir os objetivos que racional mente colocam para si mesmos Nas relaoes intemacionais esta habi lidade na hist6ria em termos hegelianos encoraja o aparecimento de urn sistema intemacional que e imprevisivel e anarquico ou urn que e imu tavel para ambos o materialismo hist6rico fomeceu uma explicaao 35Ver Rosenberg The Empire of Civil Society cap 5 Repensando as rela6es intemacionais 81 altemativa e uma prescricrao Ele indicou urn sistema intemacional altemativo mas que somente poderia ser atingido atraves de urn esforcro sustentado e de uma tentativa inexonivel de reconhecer ate que ponto os atores humanos permanecem prisioneiros das forcras sociais e hist6ricas que atuam sobre eles Mais do que as outras teo rias foi o materialismo hi2ricsjB1firmQtLq acrao huma11a criou e esteit ra capitalista k AS INIBIOES DA TEORIA Os quatro temas gerais considerados anteriormente fornecem urn resumo urn tanto breve e inadequado de uma possfvel aborda gem materialista historica para as relacroes intemacionais e as suas implicacroes Esse paradigma ainda nao produziu o trabalho empfri co em relacroes intemacionais que seu potencial sugere pois con tern dificuldades maiores que inibem o seu desenvolvimento e inti midam os seus praticantes 0 mais poderoso fator inibidor do marxismo e 0 tom de sua abor dagem geral algo que dificultou seu desenvolvimento te6rico e tomou seu entendimento pelos outros obscuro Tal situacrao reflete o dogmatis mo e a intolerancia de parte da amilise que aparece sob seu nome e como uma parte dominante deste dogmatismo a imanencia de uma teleologia historica a crencra de que a historia estavaesta movendose em uma di recrao particular derradeiramente emancipatoria Este dogmatismo foi urn produto de consideracroes polfticas de muitos de seus praticantes e em particular dos govemantes dos Estados comunistas e dos que os apoi aram Ironicamente ele iria fomecer 0 unico conceito intemacional de fensavel de validade geral produzido pelo comunismo o da correlaao de forcras A correlacrao de forcras era uma concepcrao dinamica am pia das relacroes entre os blocos que combinava o militar com os fatores culturais polfticos e economicos e era mais elaborado do que a altema tiva do equilfbrio de poder Entretanto ele estava errado a respeito da direcrao para a qual estava se movendo esta correlacrao36 Porem o dogmatismo da maior parte do marxismo reflete algo mais do que a sua associacrao com o poder estatal ditatorial Ele tambem e produto de fatores entranhados no proprio marxismo chissico e que nascem da crencra na inevitabilidade da crise capitalista e do advento do socialismo A consciencia do determinismo produz urn senso de retitude e por esta razao de intolerancia Tal atitude presente como era 36Julian Linder Correlation of Forces An Analysis of MarxistLeninist Concepts Aldershot Gowerm 1988 Margot Light The Soviet Theory of International Relations Brighton Wheatsheaf 1988 82 Fred Halliday em Marx e em urn certo sentido completamente naomarxista pois fomece as ideias uma permanencia negada por sua propria contingen cia historica e socioecortomica Este dogmatismo uma reafirmacrao in flexfvel de argumentos dentro de urn certo paradigma de forma algu ma e especffico ao marxismo como bern o sabem os estudantes das relacr5es intemacionais e das outras ciencias sociais Contudo ele e uma forcra poderosa e envolvente dentro do proprio materialismo historico e que retardou seu crescimento tomando mais facil para os seus inimi gos desconsideralo ou distorcelo e ainda esta Ionge de desaparecer Nao existe evidencia maior disto do que as ultimas reflex5es sobre o imperialismo nas quais urn conjunto de arrrmacroes absolutas sobre 0 impacto dos pafses industrializados sob o Terceiro Mundo bloqueou a analise do que estava realmente acontecendo nestas sociedades e de suas possibilidades intemas de mudancras A primeira das limitacroes das preocupacroes do marxismo re ferese ao proprio conceito de determinaao o grau em que os eventos polfticos ou atores ou mesmo o proprio Estado podem ser vistos como meras express5es da estrutura socioeconomica de uma sociedade Este problema e tao relevante para as relacroes intemaci onais quanto e para qualquer outra area da atividade humana a arte a psicologia o comportamento social a filosofia Enquanto os es critos dos marxistas ocidentais independentes foram capazes de escapar disto a tendencia em direao ao reducionismo deformou quase toda a analise marxista no ultimo seculo E mais produtivo e empiricamente plausfvel perceber a determinacrao como o fizeram os marxistas ocidentais como urn conjunto de limites e significados e nao como algo absoluto que retira de todos os fenomenos nao materiais 0 seu significado ou elimina a capacidade de acrao indivi dual para a mudancra Perceber tais componentes sejam eles os in divfduos os partidos os govemos ou as ideologias fora de seu con texte socioeconomico e abstraflos dos fatores que OS fazem existir e lhes conferem vigor Outra area de inibicrao da teoria e ainda mais afetada por e problema geral da determinacrao socioeconomica a autonomia re lativa da polftica Embora Marx Engels Lenin e seus sucessores tenham escrito copiosamente sobre a polftica como eles eram avi dos praticantes seus escritos sempre refletiam urn problema profundo e naoresolvido sobre como analisala Esse problema e pertinente tanto na analise da polftica domestica como na da intemacional A despeito de identificar as formas pelas quais os fatores socioecono micos influenciam a polftica os materialistas historicos freqliente mente nao sao bern sucedidos em explicar adequadamente o seu funcionamento ou seja o funcionamento da dimensao da polftica que naci e simplesmente uma expressao do socioeconomico Repensando as rela6es intemacionals 83 Os pr6prios escritos de Marx sabre a politica de seu tempo re velam este problema em meio a astucia tatica de sua observaao Em nenhuma parte isso e mais evidente do que em seus escritos sabre os conflitos de grandes poderes em sua epoca nos quais uma profunda hostilidade com a Russia czarista o levou a uma teoria moralizadora e conspirat6ria que nao possufa nenhuma relaao subs tantiva com sua abordagem te6rica mais geral A ingenuidade de Lenin sabre o Estado revolucionario no infcio de 1917 e a sua des consideraao dos perigos de uma nova ditadura depois de 1918 ilus tram a mesma fraqueza A ilusao de que o Estado definharia em sua dimensao interna is to e visavis a sociedade e reproduzida na ilu sao de que a divisao entre OS Estados sera superada pela interdepen dencia capitalista ou pela revoluao socialista Talvez o maior e mais eloqtiente exemplo desta subestimaao do Estado seja a dificuldade permanente que os marxistas ortodoxos tern em explicar duas das mias duradouras caracterfsticas da politica do se culo XX o nacionalismo e a democracia capitalista Pais apesar de toda a ret6rica sabre a falsa consciencia a mistificaao e a traiao de lideran ca estes fenomenos fundamentais representam urn problema te6rico para 0 marxismo 0 primeiro persistentemente temse provado superior as lealdades de classe como urn meio de mobilizar o apoio das massas sem diferenas entre os oprimidos e os opressores 0 ultimo assegura a leal dade ou pelo menos a aquiescencia da massa da populaao nos pafses capitalistas mais desenvolvidos par mais de meio seculo com urn uso limitado da coercao e da intimidaao por parte das classes dominantes Estas dificuldades tern implica6es importantes para o estudo das rela5es intemacionais Dentro das rela5es intemacionais existem varias subdisciplinas que se reunem para compor a disciplina Estas incluem o direito intemacional as institui5es a segurana a tomada de decisao as relacoes economicas e a filosofia Urn reconhecimento te6rico e pratico equilibrado das determina5es do socioeconomico e do hist6rico sem abstraflas de seu contexto e totalidade passa pela percepcao de que elas sao como na polftica domestica govemadas por regras e tendencias pr6prias que nem sempre pode ser reduzi das ao socioeconomico Par exemplo perceber a OTAN Organiza cao do Tratado do AtHintico Norte somente como uma alianca entre os Estados capitalistas sem qualquer especificidade geografica cul tural e hist6rica seria tao enganoso quanta percebela em termos de relacoes intemacionais como uma aliana em geral sem referenda aos interesses socioeconomicos ofensivos e defensivos dos gover nos que a criaram e a sustentam Similarmente e possfvel analisar os Estados da OPEP como Estados produtores de petr6leo inseguros a maioria de Estados arabes do Oriente Media e como resultado de urn desenvolvimento combinado e desigual do capitalismo na epoca do 84 Fred Halliday p6sguerra com comportamento correspondente aos de fomecedo res de mercadorias em uma posicao monopolfstica 0 MARXISMO ALEM DA GUERRA FRIA terialismo hist6rico prtanto e urn Ce conceitos 9e elVllialtsar a total extencompQJaffil11Qsocia1 incht dass relacoes mternacwna1s Escritores trabalhando com sua abor dagem teonca Ja produz1ram algumas anahses espec1ficas de quest5es e de eventos dentro das rela5es intemacionais e criaram conceitos gerais que tern potencial para serem aplicados sistematicamente a dis ciplina 0 materialismo hist6rico pode apresentar uma altemativa te 6rica e empfrica para se trabalhar dentro da disciplina das relacoes intemacionais como ate aqui convencionalmente constitufda Mas somente pode fazelo pelo reconhecimento do desafio que as pr6pri as rela5es intemacionais lpe colocam como pelo necessaria desen volvimento de seu potencial analitico em resposta aos eventos e a al gumas teorias altemativas do mundo contemporaneo Defender a relevancia do materialismo hist6rico no encerramento da Guerra Fria e com o colapso do sistema comunista pode a primeira vista parecer perverso se nao desesperado Tal empreendimento e pas sf vel par causa destas mudanas e nao apesar delas Aimportancia do materialismo hist6rico como urn sistema explicativo nunca foi depen dente do sucesso dos movimentos ditatoriais que diziam estar falando em seu nome mais do que o capitalismo pode dizer que o seu sucesso dependeu dos regimes autoritarios racistas e beligerantes que produziu A evoluao separada e conflitante de urn comunismo oficial e de urn mar xismo independente ao Iongo da maior parte do seculo XX e evidencia suficiente distoAlem destas considera5es existe a possibilidade de que o materialismo hist6rico se tome mais relevante ainda como urn sistema explicativo pais em sua origem e desenvolvimento toma como ponto de partida e foco de analise o fenomeno que hoje mais do que nunca domina o mundo o capitalismo 0 marxismo estava errado em declarar a iminencia da altemativa revolucionaria a sociedade capitalista e subestimou o potencial para a mudana e para a melhora dentro do capitalismo Como iremos ver no Capitulo 9 a afirmaao de que o capitalismo inevitavelmente leva a guerra podese tamar ela mesma hist6rica uma reflexao sabre Estados que ainda nao eram completamente democraticos Entretanto a dupla constataao de que o modo de producao fomece o contexto para a analise dos feno menos polfticos nacionais e intemacionais e de que o sistema capitalis ta e marcado por conflitos perigos e fracassos enraizados nestes fato res socioeconomicos e tao valida hoje como o foi no passado Repensando as relacoes intemacionais 85 Os capftulos que concluem este livro fornecem urn cojunto de respostas a isso explorando como uma abordage matenahsta hist6rica pode oferecer explicayoes para a Guerra Fna e o seu des confortavel resultado Como fim da longa confrontayao como co munismo e da continua compulsao de esconder as questoes socioe conomicas as RI podem agora admitir em que medida os interess pollticos e sociais espedficos determinaram a sua agenda e a pohu ca externa dos Estados Em tal contexto o materialismo hist6rico Iiberto do dogmatismo e 6a conformidade pode tornarse mais e nao menos significative dentro do estudo do internacional 86 Fred Halliday capitulo 3 OESTADOEA SOCIEDADE NAS RELAOES INTERNACIONAIS 0 IMPASSE SOBRE 0 ESTADO Desde o infcio dos anQSlZO a maior parte do debate te6rico den tro daSiefayaes internacionais enfocou a questao do Estado Algumas cuss5es foram sobre a sprtmazia anaJltica 99 o aQ coQPJYO rel5es intemacwnais enquanto outras enfocaram as quest6es normati b 1 r a a rfi vas so re o grau em que ee puue ser cons1 era o como o pnnctpa a aor do que e born dentro e entre OS Estados O zyalm9 Estaocntri co reafirmou posic6es tradicionais sobre o stado e tem atraves da emergencia do neorealismo afirmado novas ideias especialmente nn campo das relacoes economicas intemacionais Outros paradigmas de safiaramaprimazia do Estado seJa pela a do papel dos atores naciestataiS como as teonasillfiiiferaepeiiaeDcia e do transnacionalis IilQSeJafirmacaoClil primazia dos sistemas globais e das estruturas sooieatofes especffkorestataisotrnoestataisftxtrur essas tres aborda gerisforam1nflueiiCiadas porfunderieias mais amplas dentro da ciencia polltica o realismo pela teoria polltica dominante o transnacionalismo pela rejeiyao pluralista e behaviorista do Estado em favor do estudo das ac6es e o estruturalismo pelas teorias de determinacao socioeconomica No final dos anos 1980 entretanto pareceria que este debate den tro das relayoes intemacionais havia chegado a urn impasse Os tres paradigmas com suas muitas variayoes e reformulay6es permanece ram vigorosos e a quantidade de seus partidarios aumentou e dimi nuiu com o desenvolvimento profissional e o modismo intelectua1 Contudo nao havia nenhum sinal de que qualquer urn deles poderia 1 A defesa da diversidade de paradigmas e energeticamente feita emAgainst Method London Repensando as relat6es intemadonais 87 iJJM ou iria prevalecer sobre 0 outros Os que desafiavam o realismo ain da buscavam refutalo e substituflo enquanto os seus partidarios pro curavam demonstrar a inadequaao de tal contestaaol A procura por uro paradigma unico para a normalidade definida em termos huh nianos produziu uma situaao de pluralismo esteril e insatisfat6rio Todavia podese considerar que a pluralidade de paradigmas e na verdade uma indicaao de ue a disciplina e saudavel e nao urn bloco mono ttlco o qu sao exc ufdosoiitras perspecllvas pr6giilmas de pes quisa conceiros e fato PouCOsestud1ososcrasruecras6utrasciei1CiaS SOClaisoeseJam voltar para o mundo exclusivo e clorof6rmico de mui tas ciencias sociais dos anos 50 no qual um paradigma reinava com autoconfiana institucionalizada Alem disso podese discutir que bus car refutar utn paradigma com base em uma visao intelectual estreita e uma aventura inutil ja que as razoes de atraao e vigor de uma deter minada abordagem sao multiplas e incluem a sua coerencia intelectual o seu apoio institucional e as influencias das tendencias e do senso co mum das ciencias sociais e de sua epoca 2 Entretanto Ceitar a legitimidade e a inevitabilidade do pluralismo eradigmatico nao elimia a jgd exLs razes a vfll mesmo que nem todos os paradigmas possam igual mente ser tratados como validos no caso do debate sobre o Estado e pertinente indagar por que ele avanou tao pouco nas ultimas tres deca das nao houve qualquer resultado ou abertura de terreno Uma das ra z6es para isso presente no trabalho de Kuhn e de seus seguidores e a percepao de qtJe os paradigmas e seus argumentos nao podem ser com parados porque empregam diferentes conceitos e sistemas coriceituais perguntam diferentes questoes e selecionam diferentes fatos3 As expli ca6es que urn paradigma irrefutavel oferece para as anomalias ou para as outras tendencias no mundo real podem ser vistas por outros paradig mas como ameaas a sua validade assim os realistas podem incorporar Verso 1975 de Paul Feyerabend A teoria anarquista de Feyerabend de que qualquer paradigma e valido e implausfvel mas a sua demonstrao dos beneffcios da competiiio entre paradigmas e dos muitos fatores niiocientfficos que atuam no desenvolvimento cientffico e na aceitaiio de paradigmas e convincente 2Uma discussiio notavel e aquela de Stanley Hoffman An American Social Science International Relations Daedalus vl06 n3 October 1977 Hoffman evita a tendencia de alguns outros que criticaram a maneira como uma certa ortodoxia norteamericana tern dominado as reloes intemacionais colocar a questiio em termos nacionais como uma abordagem americana 0 que ambos os expoentes ortodoxos das relaoes intemacio nais e os seus crfticos nacionalistas escondem e a existencia de uma imensa di versidade dentro da Iiteratura americana e que e a negaiio desta diversidade que constitui o problema real com a apresentaiio americana ortodoxa 3Sobre a incomensurabilidade verTS Kuhn The Structure of Scientific Revolutions Chi cago University of Chicago 1970 pl48ff 88 Fred Halliday as corporaoes multinacionais CMNs os te6ricos da interdependencia a contfnua importancia do papel das quest6es de segurana e os estrutu ralistas a ascensao dos novos pafses industrializados NPis Como Kuhn escreveu Todas as teorias historicamente significativas concordaram com os fatos mas somente mais ou menos Portanto o impasse sobreQ Estado m arte uto de urn impasse te6rico muito mais profundo ue determina a ausencia de dis utas so re a uestao rna segun ra zao que POde ser i entifica a em parte da literatura sobre a economia polftica internacional e que 0 desenvolviJtlltO de perspectivas sobre 0 Iugar s sdo lEoLJlas intmiplas tern sido urn proresso con no que nem confrrma e nem refuta a mais simples das aiialiiSes re ahstas ou naorealistas Neste sentido se sao identificadas inUmeras ma neiras s guais E lPeiicjJfuirimoaQ9 taas varus outras que EOV ltenso fJtaliento ou seja a posuao do Estado rot enrraquec1da e fortalecida e neiifitiifia ieso lucao ernpfrica Ou te6rica desta questao e QQrv Se OS realistas pare cern excessivamente complacentes ao afrrmar que pouco ou nada real mente mudou seus opositores freqlientemente superestimam o grau em que os Estados nao sao mais os atores centrais isso aparece tanto em suas analises do presente curso das rela6es internacionais como em suas ten dencias de extrapolar as tendencias atuais para prever um futuro deseja vel aparentemente proximo no qual onde nao existiria o Estado Porem a compreensao te6rica deste processo contradit6rio de fortalecimento enfraquecimento do Estado pode levarnos alem da atual polarizaao Contudo existe uma terceira razao para o impasse que penetra no amago das relaoes intemacionais nos conceitos que a susten tam nos programas de pesquisa por elas gerados e na sua relaao com as outras disciplinas dentro das ciencias sociais a questao da definiao de Estado que e utilizada Algumas vezes parece que OS te6ricos das relaoes intemacionais estao trabalhando com os con ceitos dos antigos te6ricos polfticos Apesar de nao reconhecidos pelas relaoes internacionais nos ultimos 20 anos tambem existiram debates paralelos sobre o funcionamento do Estado dentro da soci ologia e do marxismo Mais relevante ainda ao mesmo tempo em que os inovadores e defensores de novos paradigmas para as rela oes intemacionais buscaram rejeitar ou reduzir a importancia do Estado sem definilo na sociologia as mesmas correntes inova doras buscaram reexaminar o Estado e reafirmar sua centralidade nos contextos hist6rico e contemporaneo enquanto o debate mar xista abordou nao o desaparecimento do Estado mas a sua relaao com as classes sociais 4 Esta ocorrendo uma mudana fundamental 4Ralph iliband The State in Capitalist Society London Weidenfeld Nicolson 1969 e a analise classica desta questiio Para uma visiio dos debates subseqUentes ver Bob Jessup The Capitalist State Oxford Martin Robertson 1982 Hepensando as rela6es intemacionais 89 em favor do Estado 0 titulo de uma coleao de ensaios sociol6gi cos sobre esta questao Bringing the State Back In 5 resume o deba te e contem artigos de muitos de seus principals analistas sugere urn desenvolviinento contnirio mas extremamente relevante para a dis ciplina das relaoes internacionais que tern consideniveis implica oes para a discussao sobre esta questao involuntariamente auto centrada lgualmente o debate marxista desconsidera qualquer con traposiao entre os atores estatais e naoestatais Ylm tos sugerem que o debate sobre o Estado dentro das relaoes inter nacwrialsGevesei teconsiderado por meio dO estudo destas discus soe lirietae Pelo qltofueio da 4ei1ii19iio excIYCI taro aprtircla qpa1a maiorprte do debatenesta area tern girado Niiodevemos discutir se somos ou nao EstatocentriCos mas so bre o que queremos dizer com Estado 0 renascimento da teoria do Estado e particularmente relevante para os que afirmaram que o termo deveria ser abandonado Em uma sucessao de livros e artigos publicados a partir da metade dos 1980 Yale Ferguson e Richard Mansbach debateram que o conceito de Es tado e tao confuso e inapropriado que nao pode fornecer uma base para trabalho te6rico sobre as rela6es intemacionais Apesar de esta rem certos ao chamar a atenao para a multiplicidade de significados associados ao Estado eles nao se justificam em muitos de seus outros argumentos ou conclusoes Por urn lado nao ha nada inerente ao conceito de Estado como definido abaixo que impea a discussao das varias formas de poder estatal e de alocaao de valor por eles destacadas Por outro eles passam ao largo na verdade falham seri amente em engajarse com a literatura sobre o Estado que se desen volveu dentro da literatura sociol6gica e produziu inumeros trabalhos exatamente quando eles estavam declarando que o conceito nao po deria ser utilizado reivindica9ao de queJrm9cJQqgA Eamente tern COnstasesnormatiyas e bstIIlal Sua tenta tlva ae relacionar a inutilidade acicoiiceilo de Estado a uma crise mais ampla na teoria das RI e igualmente rrada por ser sustentada 5Jeter Evans Dietrich Rueschemeyer and Theda Skocpol eds Bringing the State Back In Cambridge Cambridge University Press 1985 Dentre outras contribuiy6es ver John Hall e John Ikenberry The State Milton Keynes Open University Press 1989 John Hall Power and Liberties Harmondsworth Penguin 1986 John Hall ed States in History Oxford Basil Blackwell 1986 e sua participayao State em Joel Krieger ed The Oxford Companion to Politics of the World Oxford Oxford University Press 1993 Michael Banks e Martin Shaw eds State and Society in International Relations London HarvesterWheatsheaf 1991 e Anthony Giddens The Nation State and Violence Cambridge Cambridge University Press 1985 Giddens p17 distingue os dois significados de Estado mas nao ve isto como colocando urn problema central Uma discussao recente das implicayoes do trabalho de Giddens para as relayoes intemacio nais e encontrada em Linklater Beyond Realism and Marxism passim 90 Fred Halliday I no questionamento da escolha do metodo e na indeterminaao do conceito A eliminaao do conceito de Estado segundo as conclu soes encaminhadas por estes trabalhos nao acarretaria o surgimento de novas relaoes internacionais mas somente mais confusao 6 DEFINIOES EM OPOSIAO A primeira vista nao e 6bvio que existe urn problema sobre a de finiao do Estado nas rela6es intemacionais pela simples razao de que a distinao operacional e implicita e nao convencionalmente sujeita a extensa amilise te6rica ou empirica Na verdadee paradoxa que urn conceito tao central a toda disciplina tenha escapado de uma discussao como esse o fez Podem ser encontradas muitas discussoes sobre a guerra a soberania as institui6es e assim por diante mas podese pro curar em vao nos livros por discussoes semelhantes sobre o Estado Os te6ricos das relaoes intemacionais supoem que n6s sabemos o que eie e Bull que e uma comunidade politica Waltz que e na pnitica uma coextensao da naao 7 Como urn todo as relaoes intemacionais con sideram como dada uma definictaQcifica o gue se pOd classtticai de totalidade nacionalterrit9ri Assim o EstadoGraBretanha Rus sia Americietc abrange em forma conceitual o que e percebido visualmente no mapa politico o pais como urn todo e tudo o que esta dentro dele o territ6rio o govemo o povo e a sociedade A melhor sin tese desta percepao e encontrada no capitulo introdt6rio de The In ternational Political System de Northedge Urn Estado no sentido utilizado neste livro e wna associa9iio territorial de pessoas reconhecida para os prop6sitos do direito e da diplomacia como wn membro legalmente igual do sistema deEstados Na realidade e uma forma de organizar as pessoas com o prop6sito de participar do sistema intemacional 8 6Yale Ferguson e Richard Mansbach The Elusive Quest Theory and International Politics Columbia SC University of South Carolina Press 1988 Capitulo 5 The state as an obstacle to international theory Ferguson e Mansbach The State Conceptual Chaos and the Future of International Relations London Lynne Reiner 1989 Ferguson e Mansbach Between celebration and despair Constructive suggestions for future international theory International Studies Quarterly v35 n4 December 1991 As sugest6es construtivas revelamse como ideias gerais ser historicamente consciente etc e sao pouco mais do que uma lista de prescriyes ao acaso Hedley Bull The Anarchical Society London Macmillan 1977 p 8 Kenneth Waltz Man The State and War New York Columbia University Press 1954 p1728 8FS Northedge The International Political System London Faber Faber 1976 p 15 Uma considerayao mais recente desta posiyiio classica pode ser encontrada em Alan James Sovereign Statehood London Allen Unwin 1986 James apresenta o conceito de Estado ditetamente usandoo para abrangerterrit6rio pessoas e urn governo p 13 Repensando as relac6es intemacionais 91 Nao e discutido pelos que defendem este conceito especial mente pelos ue tal Estado existe empiricamente mas so mente 9ue esta abstraao flri Ylifla tpria PftCl e lo internacional e heuristicamente a mais apropriada para as relacoes irirniicioriais 9 Em outras palavrasa teonasustentiaa sabre este conceito e a que explica mais sabre as relaoes internacionais e deve portanto ser mantida Esta e uma razao vHida para manter a abstra ao a questao nao e se ela fornece uma base para a explicaao mas ao inves disso quao adequada e a explicaao que ela fornece De veria ser evidente que uma vez aceito este conceito por definiao a questao dos atores naoestatais e prejudicada 0 conceito altemativo de Estadoautilizado em muitos escritos s1 giQs rccerites e no gJti mIiiijpo Ele rerena nao a totalidade soctaltemtonal mas urn conJunto espectfico de mslY saes coercitivas e administrativas distinto do contexto politico social e oiiLIJIo iirnnueticiaaa Jeia triifiloalInr de MaX Weber e Otto Hintze Skocpol defme o Estado como urn conJun to de organiza5es administrativas poHticas e militares encaadas e mais ou menos bern coordenadas por uma autoridade executiva10 Muitas 4 finic5es alternativas do EQ2po flegs dptro E abor dem socio1gifa Entretanto este conceito de instituioes coerctttvas e administrativas serve para apresentar urn conceito bastante diferente de Estado e para sugerir uma maneira altemativa pela qual o conceito pode ser incorporado dentro da discussao das relaoes intemacionais Dentro da discussao sociol6gica do Estado que emergiu ao Iongo das ultimas decadas muitos problemas contllll Olio Urn L a questao de como delimitaEfei1fl92ta9q se o Estado e perce rudo como urn mecanismo para dominar regular e reproduzir uma so ciedade sob dadas relaoes sociais entao emerge a questao de onde lo calizar as institui5es que sao formalmente independentes mas que tam bern sao influenciadas pelo Estado e acompanham as suas funoes re gulat6rias e reprodutivas as escolas as universidades as igrejas e em alguns de seus papeis a famt1ia 0 debate sabre a concepao de Althusser dos estabelecimentos educacionais como Aparatos Ideol6gicos do Es tado foi urn exemplo disso 11 Urn segundo QeQ bem representado em Bringing the State Back In 9iz respeitQJfllQJlQOEado uma vez gue o Estado e vista como institucionalmente distinto da soci 9Este e o argumento de Cornelia Navari em sua introduao a The Condition of States Milton Keynes Open University Press 1991 pll15 Sua percepao dos diferentes significados do Estado nao e repetida nos cap1tulos de seus outros contribuidores 1Theda Skocpol States and Social Revolutions Cambridge Cambridge University Press 1979 p 29 HLouisAlthusser Ideology and ideological state apparatuses em Lenin and Philosophy London New Left 1971 92 Fred Halliday edade nasce a questao dos limites dentro dos quais ele pode agir auto nomajetesentarytles separad dqull sociedade iries 0 que no final seja por ela constrarigido 0 conceito institucional de Estado e em parte uma foima de resistir aquelas teorias marxistas que veem o Estado como em maior ou menor medida uma expressao do interesse de classe ou economico 0 grau em que aqueles no poder podem perseguir polfticas contra os aparentes desejos da maioria da sociedade pela imposiao de reformas ou fazendo guerras que sao impopulares e destrutivas coloca esta questao da autonomia bastante claramente Uma explicaao e que 0 Estado tern OS interesses estrategi cos de Iongo prazo da sociedade em mente Para alguns como Sko cpol existe uma area distinta de autonomia que e bastante fortalecida pelo papel internacional do Estado Urn marxista como Fred Block tam bern tern esta posiao 12 Para muitos como Robert Brenner uma clivi sao de trabalho entre a administracao societaria e a apropriaao privada nao deveria ser confundida com qualquer autonomia real e a teoria marxista do Estado como instrumento declasse permanece valida 13 Urn terceiro debate localizado especificamente dentro da tradiao socf016 gica marxiStareferiuse a reiSCg4Q99lllllPl1eo CIIP pitalismo e as cfasSesliidoalem da visao marxistaleninlsta inicial do Estado coiiiOUmmero instrumento de dominaao declasse este deba te gerou vcirias teses altemativas a esta abordagem saindo da 16gica do capital para chegar aquela que destaca a administraao dos conflitos interelite a abordagem influenciada por uma leitura de Gramsci de acordo com a qual a funao do Estado e manter a hegemonia de classe em to das as suas dimens5es a coercitiva a administrativa a regulat6ria e a ideol6gica E ri ti y8Jlellte dctjt etrut al atribJL9Estado lliDgJAlJDPiQmiQLfle ayton A diferena entre estas duas concepoes de Estado refletese na linguagem do diaadia Nas discussoes sabre o territ6rio faze mas uma distinao entre o territ6rio do Estado em seu sentido mais geral e as areas de terra que sao propriedade do Estado em seu sentido institucional Similarmente diferenciamos a populaao e a populaao trabalhadora de urn Estado da porcentagem daquela po pulaao que esta diretamente empregada pelo Estado Em revolu oes o Estado institucional e derrubado mas o Estado total perma nece Todavia muito do debate das relaoes internacionais parece envolver uma fl1flsa destes iific92 Assim quando os criticos do marxism a dizeque ele e uma forma de realism a por 12Fred Block Beyond relative autonomy State managers as historical subjects Socialist Register 1980 13Robert Brenner The Autonomy of the State Isaac Deutscher Memorial Lecture London School of Economics 21 de Novembro de 1986 Repensando as rela6es intemacionais 93 ser Estatocentrico isto mistura os dois conceitos de Estado os marxistas usam o termo Estado de uma forma muito diferente da realista 0 resultado e o domfnio do conceito de totalidade porque a propria definiao envolvida impede outras areas de investigaao teorica Isto e 0 que urn paradigma deve fazer OS realistas defendem e podem fazelo que as questoes e dados identificados como relevantes por outros paradigmas sao relativamente insignificantes Se o conceito sociologico tern maior poteCiJtlicJlj cativo doqueoaetotalidadtnniclOiialterrftoiial e uma questao a ser discutidaMesmo ass1m seJa qual foro JUlgamento fmal sobre este as sunto duas oposioes sao imediatamente evidentes A primeira e que eara uma displina preadJlJrela drlllidau conceito sociologico e uma abstraiqlSa attaJtda aeilaCional terntodalOCoiiCeitci normalmente utilizaoo nas relaoes lnternacionais nioe simplesmente uma conveniencia analitica e pos sui varias suposioes legais e de valor isto e que OS Estados sao iguais que eles controlam seu territorio que eles coincidem com as naoes e que eles representam suas proprias populaos teccei cQnleflcionaLdeEstago olerttli reles tefl1 agP feria ser menos realista Unia segunda oposi ao relevante 6 ue a a tf1Jiafiiitsri1earo6zas partCiaionaesferatntemacfonafauinenta e fortalece OS Estados e em particular por que lhes da condiao de agir mais independentemente das sociedades que governamEstaf8Elilal d ffilJdo moderno que os Estados podem ser menos uscet1ve1s a e represena ttysde slia sJechides precisalliIPi34scUntJla cional e desconslderada ab initio peias SUQosiOes do conceito naci anaJterritodaY 0 lilinimoque pode ser dito portanto e que uma conceitualizaao alternativa do Estado permite questoes analiticas e caminhos de pesqui sa muito diferentes daqueles possfveis dcntro da abordagem da totalida de Em primeiro Iugar esta definiao altemativa de Estado abre urn con junto de distin6es conceituais que estao confusas e misturadas na lite ratura das relaoes intemacionais mas que precisam ser identificadas para se perceber com maior clareza a relaao Estadosociedade 0 pro prio conceito de intemacional tern como muitos crfticos apontaram dificultado a questao ao confundir as relaoes entre as naoes como que usualmente sao as rela6es entre Estados Sintomaticamente o classico de Morgenthau Politics Among Nations como as proprias Naoes Uni das possui o nome errado Uma iistinqlyta entt o Estado lls lti9o scl co ea sociedade isto e asimQlruiosindivfduos e pr4ti cquexrsiema1em Cfocontrole diretefinanciamento da enti 94 Fred Halliday ade centrJ 14 A propria sociedade nao e homogenea abrangen do diferentes classes sociais grupos etnicos e de interesse cujo acesso ao Estado e determinado pelo seu poder riqueza e habili dade polftica A relaao Estadosociedade e portanto variavel e aqui que o debate marxista tern sido mais pontual e onde muitos marxistas criticaram a abordagem institucional 15 Uma eg4Lill9eiste Cne o Esta5 EY9DJuntodapaQJtdPristrattvoeopessoal JCcutivofonnaL em posiaa de control uprm9 0 discurso polftico convencional con sidera que estes sao identicos assim como o par Estadogovemo e con siderado como representando a sociedade como urn todoAssim emseu uso ortodoxo as indicaoes primeiroministro ou presidente de urn pafs sao prontamente substitufdas pelo nome do proprio pais A posi ao da GraBretanha sobre o desarmamento e etc Entretanto a dis tinao Estadogovemo pode em algumas situaoes tomarse de consi deravel relevancia a medida que elementos dentro de urn Estado resis tem ou ativamente se opoem as polfticas do govemo Isto pode assumir formas relativamente inocuas vazamentos para a imprensa atraso de medidas arranjos na agenda ou crfticas culminando na mais extrema das contradioes Estadogovemo o coup detat militar Qma terceira distiQaO central e1tfQ gggQCEa00 termo Estadonaao baseado em uma suposiao de homogeneidade etnica e representatividade polftica e em termos empfricos inapropriado ao mundo modemo Os Estados coercitivos podem nao representar a naao a sociedade que eles govemam onde existe diversidade etnica como na maioria dos Estados do mundo o Estado pode representar mais os interesses de urn grupo nacional do que de outros Portanto esta aberta a questao de ate que ponto o Estado representa a naao Apesar da anali se de polftica extema ter desafiado esta fusao realista dos termos ela nao apresentou uma conceitualizaao alternativa de Estado 16 Alem disso19igPlciQlqgift Slr uma visao altroati CJlI1SlJEiqtjgIlS stados Afltesde maJStada SUa enfase e sobre o Estado como urn instrumento de coerao e exploraao das populaoes sujeitadas e rivais Como Tilly mostrou com base na investigaao historica os Estados europeus comaram como instrumen 14Qualquer conceito de sociedade intemacional pressupoe urn conceito de sociedade domestica Sobre isto ver Capitulo 4 15Paul Cammack Bringing the State Back In British Journal of Political Science vl9 Aprill989 16 As implicaoes de l9ngo prazo da analise de politica extema podem desafiar a totalidade prevalecente do conceito de Estado mas muito da literatura tern operado dentro de uma estrutura pehaviorista que ignora a relevfulcia do escrito sociol6gico sobre o Estado ou que se tomou iestrita pelo fetichismo da tomada de decisao como urn fim em si mesma Repensando as relac6es intemacionais 95 tos de subjugaao como redes de proteao 17 Ao Iongo dos seculos pode ser que estas redes tenham desenvolvido uma funao mais repre sentativa mas isto e contingente algo que varia de pafs para pafs e urn processo que pode nao estar completo Devese lembrar que o princf pio de uma pessoaum voto s6 foi introduzido nos principais Estados ocidentais a partir da Segunda Guerra Mundial 18 Nas discussoes sobre a ascensao do sistema modemo negligenciar o fato de que em suas origens as principais funoes dos Estados eram a conquista de bens e territ6rios a subjugaao de populaoes e a guerra contra rivais implica afirmar que os Estados ja eram representativos desde 1648 Urn terceiro tema central levantado na Introduao e que OS Es tados e a sua organizaao inteina desenvolyCrlLllSQJltexto mundilhist9riQJsto e emiriterao eiE glQado Longe da constituiao intemaaasEstaaos e das sociedades ser imu ne pelo menos ate recentemente aos fenomenos do intemacional esta dimensao fomeceu o seu contexto e a sua influencia fom1ativa igualmente isto se aplica a maior parte dos Estados p6scoloniais e portanto moldados por esta experiencia previa mas tambem aos Es tados europeus A economia mundial a reforma os valores da legiti midade e acima de tudo as pressoes da competiao economica e militar indicam isto 19 lsso e tao importante ntca marxlsfibcomo em Giddens e Mann quanto em uma teoria iniernacioriaTalternativa ao realismo que deriva o sistema dos Estados 0 quarto tema constitutivo referese ao pesQEdqpa f ao das sociedades da co11sciencia nacional dasidqlqgilS ncilSgue fSfoiijtos de Jessoas em 11a9oes em eOJ1Qnlll mti9ruUs bs Estados sempre desempenharam papeis em moldar as econormas nao somente atraves do planejamento da taxaao e da promao dos setores t7Charles Tilly War making and state making as organised crime em Evans et al eds Bringing the State Back In e Charles Tilly ed The Formation of National States in Europe Princeton NJ Princeton University Press 1975 Para urna exposiiio brilhan te do papel da violencia na constituiiio dos Estados modemos ver J B Barrington Moore The Social Origins of Dictatorship and Democracy London Allen Lane 1966 18Goran Therbom What Does the Ruling Class do When it Rules London New Left 1978 fomece uma pesquisa esclarecedora sobre o relacionamento entre os fatores ex temos e o funcionamento do aparato estatal 19Felix Gilbert ed The Historical Essays of Otto Hintze New York Oxford University Press 1975 nos Capitulos 4 a 8 fomece uma analise bist6rica detalhada da relaiio entre a formaiio individual do Estado e a competiiio internacional entre os Estados na bist6 ria europeia moderna Para urn estudo esclarecedor do impacto dos fatores polfticos internacionais sobre as politicas econCrnicas dos Estados ver Gautam Sem The Military Origins of Industrialization and International Trade Rivalry London Frances Pinter 1984 Karl Polany The Great Transformation The Political and Economic Origins of Our Time Boston Beacon Press 1957 fomece uma visiio da bist6ria dos seculos XIX e XX com uma inclinaiio similar 96 Fred Halliday ligados ao interesse nacional especificamente o militar mas tambem pela sua regulaao atraves da legislaao sobre 0 que e ou nao legftimo e por meio dos mecanismos financeiros dos bancos centrais Independentemen te de sua origem e natureza o capital intemacional no rmal do seculo XX reconhece os poderes regulat6rios dos Estados Em nenhum Iugar isto e mais evidente do que nas flutua6es dos mercados de capitais provoca das pelos resultados eleitorais dos principais Estados ocidentais e pelas mudanas em poderes regulat6rios e do que no nervosismo das bolsas de valores com a indicao de urn novo presidente de banco central Seria facil ignorar pesquisas preeleitorais ou novas fom1as de regulamenao se as polfticas dos Estados britanico japones e americana nao afetassem os mercados de capitais Ao considerar que o papel dos Estados na eco nomia e limitado a sua propriedade formal de servios produtivos e fi nanceiros a maior parte da literatura comete uma falacia e ignora os po deres muito mais amplos que historicamente estes Estados tern mantido e mantem visavis suas economias Finalmente existe urn importante coljunto de quest5es ligado a composiao interna do Estado e a sua relaao com a sociedade que e levantado pela sociologia hist6rica Como Michael Mann mostrou a questao da capacidade dos Estados de como os Estados administram suas popula6es e seus territ6rios e dos muitos mecanismos para impor e estender controle e uma das que mais produz resultados na investiga ao comparada e hist6rica 20 llJQQfQg liberta o estudo do Esta do do conceito de soberania da suposicrao de queo Estado tein ci ino no6h eaaongo q uiJ territ6io dITiiiitado e ao mves dtsso egltgQo te q11e pntoecom quais mudanas eSEtfosedeenylyeu A premissa de vanos traballiosaerela 5es internacionais e a de que o Estado e soberano ao controlar efetiva mente o territ6rio e a populaao sob seu governo Entretanto isto e uma simplificaao empfrica mesmo para o mais eficiente dos Estados Ela impede a analise de como o controle e exercido e desenvolvido e como outros fatores incluindo os intemacionais podem modificar e afetar a capacidade de controle de urn Estado Estes temas amplos recorrentes em grande parte da literatura sociol6gica e hist6ricosociol6gica recente sugerem areas nas quais o conceito altemativo de Estado pode afetar o estudo das relaoes intemacionais Abaixo seguem algumas sugestoes mais especfficas de como dado este paradigma alternativo o estudo das relaoes intemacionais pode ser desenvolvido 20Michael Mann The Sources of Social Power vol 1 Cambridge Cambridge University Press 1976 The autonomous power of the state Its origins mechanisms and results em John Hall edates in History Oxford Basil Blackwell 1988 especialmente Capitulo 1 Repensando as rela6es intemacionais 97 0 ESTADO COMO ATOR DOMESTICO E INTERNACIONAL Dentro desta literatura o tema mais significative para as rela coes internacionais e a percepcao da acao do Estado em duas dimen soes a domestica e a internacional 0 Estado compee com os ou tros Estados para mobilizar recurel11ll2eu Rapel internaiLPfiEa soidall s1Ja J29Slotlf111e Por exemplo urn Estado poae apropnarse de temtono tr a guerra bus car urn cordo de controle de armamentos para ganhar vantagem domestica enquanto pode prornover a industrializacao introduzir a mudanca educacional aumentar impostos ou tratar melhor uma minoria etnica para atingir objetivos internacionis Conduzida c sucesso esta poHtica em duas frentes pode func10nar par benefct ar 0 Estado e e evidente que os que controlam o poder tern mmtas vantagens perseguindoa Entretanto esta dpla diensao envolve grandes riscos Urn Estado que coloca pressao metd sobre sua sociedade para mobilizar recursos para a compettcao 1nteac10nal pode provocar uma reacao intensa e ser derrubado 21 Alternattvamen te a busca de uma polftica domesticamente vantajosa pode levar o Estado a conflitos destrutivos com outros Estados Contudo bem sucedida ou nao esta perspectiva bidirnensiI1Jt bre Pelitic kit11titpa4to e pOJifie PECPl9Soc S9Efht9 Aqlees ue cnrlam o poder nostado e aqueles a ele assoctados trao dtspombthzar recursos internacionais para conter ameacas domesticas Estes recursos po dem ser militares incluindo tropas aliadas economicos fornecidos por uma corporacao multinacional ou pelas instituicoes itrnacio nais como ajuda aos detentores do poder estatal ou pohttcos na forma de apoio moral tratados ou aliancas com Estados amigos Muito nas relac5es intemacionais pode ser percebj9opQJ1to como jJ9it 0it4iiiatEJici 6em buscam tais contatos internacionais e tern atraves da hist6ria moderna feito bastante uso desta dimensao Certamente existe es paco para o estudo das forcas antisistemicas nas relacoes internaci onais e para urn estudo substancial de como os que se opoem aos Estados estabelecidos tern condicoes e poder de internacionalizar apoios Entretanto a realidade parece ser que assim como nos con flitos puramente domesticos o Estado e os seus defensores tern uma vantagem distinta e podem mobilizar recursos dentro e alem das 21Skocpol States and Social Revolutions Capitulo 1 98 Fred Halliday I I fronteiras muito mais do que OS seus desafiadores Aos ultimos fre qlientemente faltam recursos e acesso aos mecanismos para uma apropriada e suficientemente poderosa integracao internacional a atividade antisistemica22 0 Capitulo 2 sugere que a teoria da inter nacionalizacao das classes de Marx pode ser aplicada tanto ou mais tis cll iiiiiiaiites dque as dominadas A perspectiva sociol6gica sobre o Estado indica a necessidade de estudar em urn contexto comparative e hist6rico como o funcionamen to internacional do Estado afetou os mecanismos intemos do proprio aparato estatal Nos estudos de Hintze este tema sobre a formacao do Estado envolve o exame de como as suas atividades intemacionais a guerra a apropriacao territorial e a diplomacia afetaram a origem soci al do funciomirio do Estado o predomfnio de alguns ramos administra tivos em seu interior os valores destes funciomirios o tamanho eo fi nanciamento do Estado 0 papel dos elementos militares do exercito como urn todo ou de comandarites individuais dentt6de Estados e so ciedade mplo mais eloqliente da deterniiiiaffo iliteinacional ria f0fffi29e EstadoA manutencao da influeiicia aristocnitica dentro dos Estados europeus mesmo com a eliminacao do poder baseado na terra em algumas sociedades e urn indicador de como a diplomacia afetou o Estado como urn todo A adocao de urn papel global pelo Estado ameri cana no p6s45 levou alguns criticos liberais a sugerir a existencia de urn Estado de seguranca nacional nos Estados Unidos Em termos gerais este e urn argumento unilateral ja que a Guerra Fria coincidiu com a extensao e nao com a reducao da democracia nos EUA 23 mas o au mento do poder do presidente o fluxo e refluxo dos controles con gressionais a ascensao de novas burocracias com funcoes interna cionais a Agenda Central de Inteligencia o Conselho de Seguran ca Nacional eo novo carater do Departamento de Estado sao todos exemplos do impacto da esfera intemacional no aparato estatal Alem QiS9 JJjplleessariamente as ideologias e os funciomirios do Esta gQ reOtem s9riteiiemiidanas no miuido exteriio a petfuarieriie nUuenda do JiSSaq de gra114e pqdr colonial mesmo nPdfJ5 sob EstaQ britanico e os seus funcioriaiios eeviilenCla Sirficiente EmEstados revolucionanos sitiados onde a sobrevivencia e incerta a cada mes para os que estao no poder garantir a protecao contra a invasao e a subversao e urn enorme peso na alocacao de tempo e de recursos e afeta a concepcao do que e a discordancia legftima 22Uma pesquisa pioneira dos acessos intemacionais relativos das classes begem6nicas e dominadas e a de Carolyn Vogler The Nation State Aldersbot Gower 1985 23Goran Tberbom The rule of capital and the rise of democracy New Left Review nl 03 MayJunel977 Como Therbom aponta o princfpio de uma pessoaum voto nao foi efeti vo nos Estados Unidos ou na GraBretanba ate 1960 Repensando as relaoes internacionais 99 OS INTERESSES ESTATAIS E AS FORcAS SOCIAlS Igualmente elaQlgpstclE a ociedade e ptl ment afetada pelo intemacional Isto aparece claramente em todas asquatro dimensoes que Michael Mann viu como constitutivas do poder estatal a ideol6gica a militar a administrativa e a poHtica Os beneficios economicos do imperialismo para o Estado brWinico fo ram muito debatidos mas poucos podem duvidar dos beneffcios ideol6gicos que resultaram e ainda resultam para o Estado por causa da afirmaao de seu poder em lugares distantes A necessidade de manter foras armadas na paz assim como na guerra deu ao Esta do um interesse fundamental na intervenao na economia e no esta belecimento de relaoes pr6ximas com os que decidem estas ques toes na sociedade Isto foi verdadeiro na nascente Europa moderna assim como e hoje 0 papel de apoio dos lobbies militares nos Esta dos Unidos e os mecanismos de interaao pessoais institucionais financeiros entre os fornecedores de defesa o Congresso eo Pen tagono foram bern documentados assim como a ligaao entre as operaoes secretas no exterior e os interesses pri vados em cas a e a implementaao de poHticas estatais 0 stado recruta seoes da sociedade dolTIillPra as 511as a vi dadeSlniemacfonisA9 JiigJfgP ec9iuocwdia biisamha9iPat sl1c9ns iJE fIsJl donais Previamente foi apontado que 0 conceito institucional de Esta dotoma possfvel distinguir entre os tennos Estado sociedade govemo e naao Muito da relaao entre estes e constitufda dentro de sociedades especfficas mas existem muitas maneiras pelas quais estas relaoes ad quirem uma dimensao intemacional os Estados buscam regular sua pro pria posiao pela obtenao de apoio intemacional os govemos os gru pos sociais e os grupos etnicos tentam melhorar sua posiao visavis seus pr6prios Estados obtendo auxflio intemacional como a ajuda eco nomica e militar e os atores extemos buscam avanar contra os Estados competidores estabelecendo ligaoes diretas com elementos dentro de suas sociedades Urn caso 6bvio de tal interaao eo patrocfnio de gol pes militares em Estados independentes a promoao de conflitos de govemoEstado Outro e a promoao de agitaao social ou levante etni co em pafses rivais atraves de dinheiro armas transmissoes de radio e apoio diplomatico Por toda a parte a existencia da relaao Estgosoci edade permite meios altematlvos de conduztr as rela9oes1iitemacionais iicorajiioiEstaifQie s r91sapersegu1r poHticasiit cionais que irao increJI1enJarrelativamente as suai posioes domesticas 100 Fred Halliday AS SOCIEDADES E OS SISTEMAS DE ESTADO A interaao recfproca entre ociei4yJltemacional e as socieda des especffiQiin9mfefii9 fetiyctYPiamentJrYHhLm aao doEstado ou como prop6sito de influenchilo Existem outros pro cessosdentro da sociedade que sao influenciados e que podem influen ciar a relaao de urn Estado particular com o sistema intemacional mas que refletem processos bastante distintos da atividade estatal no nfvel intemacional Por urn lado existem mudanas de Iongo prazo dentro de uma sociedade especffica que em urn momenta de impacto crescente sobre o Estado e a polftica do govemo ou do executivo tern grande in fluencia sobre as atividades intemacionais daquele Estado Longe de le v antes revolucionarios estas podem ser mudanas de equiHbrio entre diferentes grupos sociais mudanas de ideologia e atitude e transforma oes geograficas refletindo mudanas economicas A ascensao de uma burguesia mercantil na Europa ocidental no nascente periodo modemo acto sabre a poHtica estatal e a orientaao religiosaideol6gi ca foi a das influencias constitutivas da emergencia de urn sistema intern cional As transforma6es nas prioridades americanas provoca d s pelo declfnio do bloco hegemonico nordeste em favor do sun belt podem explicar as mudanas acentuadas de polfticas entre 1970 e 1980 Ao mesmo tempo9 intemacional pode ter impacto fundamental na com posisao social de uaggedaQ de forma fl tambem poder moldar e ilJ iUenciar o Estado A conquista e a dominaao colonial sao o exemplo mats extrema russo no qual novos sistemas de Estados podem simples mente ser impastos a sociedades subjugadas Na ausencia de tais impo sioes dramaticas do intemacional sobre a sociedade individual existem muitas outras maneiras atraves das quais as mudanas economicas e so ciais iritemacionais podem afetar uma sociedade particular fortalecen do a posiao de alguns grupos sociais e reduzindo a influencia de ou tros A incomorasao no sistema mundial afeta giIEF9 de poder militar intemacionai maSiaiiil5em o eguiHbrio de poder so ciai dentroaassoCieaaaes Este foco narefEstadosociedade tambem pode ajudar a ree xarninar e reteorizar a maneira pela qual os grupos sociais com inte resse intemacional relacionamse com o poder estatal Algo disto esta presente no trabalho empfrico sabre os lobbies as campanhas para ex cluir bens estrangeiros para ajudar empreendimentos associados no ex terior e para demandar concessoes de Estados estrangeiros Contudo le soQritinfJJenciatclatiYad alortiniost gIEII11Pri9ade a este rspitP como se acorporliq mul tinaciollCMJD gpnmdo no exterim desJllSegrr illlePtlldenteellte aosEstados IstJ91lQJre aqustQJlQJespJyi a autonoIDilcloEs dooEst alguns aspectos e mais emcertos peri S j 1 Repensando as rela6es intemacionais I 0 I J t1 4 f r lf odos mais especificamente em tempos de guerra mas Eim9Ipo seufitotqJmroJJitres Jstadg ll1ubcrdilla e sob o comando de interesss influentes dentro dlLQade Ntsto re y side a forla da teona estrutura uo Estado Aqui novamentea tradidonal abordagem caixapreta do Estado toma diffcil responder a questao da relaao CMNEstadoja que somente nos permite examinar o relacionamento intemacionalmente Uma vez que se toma possfvel entretanto examinar a relalao dentro de uma socieda de e identificar o grau de colaboralao na simbiose relativa do Estado e de alguns setores ou classes da sociedade en tao a natureza da clabora lao intemacional e a aparente divisao de trabalho tomase mats clara Existem casos nos quais as CMNs desafiam os Estados como na eca da de 80 comercializando com pafses como Nicaragua Angola Africa do Sul e Russia sob OS quais se desejavam impor pressoes economicas Em muitos outros casos os Estados agem para promover e defender as CMNs Quando a International Telephone and Telegraph ITT teve problemas no Chile em 1970 Harold Geneen presidente da firma li gou para a Casa Branca 0 Congresso impos condil6es para a ajuda a pafses que nacionalizavam as firmas americanas sem a compensa9ao adequada Se o relacionamento entre o Estado e algumas partes da soci edade e visto como constitufdo domesticamente e as atividades intema cionais de cada urn sao vistas sob esta luz entao pode ficar mais facil resolver a inoportuna questao de ate que ponto os atores estatais e nao estatais agem independentemente nos neg6cios mundiais Como veremos em maiores detalhes no Capitulo 5 a rela9ao soci edadeEstado e central para outra dimensao das relal6es intemacionais a do levante social e das revolu96es e em particular a questiio de como as revolu96es tern efeitos internacionais Em geral a literatura de rela96es intemacionais relegou as revolu96es a uma posi9ao marginal enquanto a maioria da literatura sociol6gica sobre as revolu96es tende a negligen ciar as suas implical6es intfilisj0 grande merito do frabalho pde Skocpol e quebusca interrelacionar os dois mostrando o grau em que t as revolu96es sao em wtm medida consideravel um produto de fatores j interestatais e intemacionais e por sugerir como a consolida9ao de Esta i dos p6srevolucionarios e a extensa9 lJfr ea ii influencilgas pelas Jress6es intemacionllisrNao pode existir demonstra9ao mais clara Tallgaioentrea politica intema e a intemacional do que as maneiras pelas quais as revolu96es podem ser estimuladas por fatores intemacio nais sejam a mobiliza9ao de grupos dorninados ou o enfraquecimento 24A mais breve olhada nos livrospadroes de relacoes intemacionais pode mostrar quao pouco as implicacoes te6ricas e empfricas das revolucoes foram consideradas com as excecoes parciais da discussao da intervencao e da subversao Para uma omissao com para vel da dimensao intemacional dentro da literatura sociol6gica mais convencional ver Stan Taylor Social Sciences and Revolutions London MacMillan 1985 102 Fred Halliday de dorninadores previamente seguros Da mesma foIllattmnto as conseqQfu9i igtemacionais das revol1196e1 sugriiionsQJICas lld cionals para a rela9ao Estadosociedade a coroptJlsac Jrvollcion osem promoverl se niio exportar a reyoltJlaQ para 0 exterior a mtsedade earesposta contrarevoluconaria que as rvol1J9 11lm91Qrnais fraco 05soos podem provocar nos poderes hegemonicos A resposta para as dtias qifesloes pooe residir suostandalinenteiii reiaao Estadosocie dade Os Estadolli9Ero VIl1 rpa intemacionaliza9ao de sa luta como parte da consolidaao domestica rnilitarmente ganhando ali ados com mesriiopensaiiierito econorriicamente conquistando a cola boralaO de tais aliados e ideologicamente na promQ9ao em nfvel inter nacional de ideias sirnilares aquelas que legitinlam o seu proprio regime Do lado daqueles contraries a revolulaO preocupa96es similares podem existir perder uma sociedade igual para urn sistema rival enfraquece o Estado intemacionalmente e a sua legitirnidade domestica Como Ray mond Aron indicou e sera discutido no capftulo 4 e aprfrencJtmla homogeneidade nos arranjpoS9JOforwa qep9Verllit lgiti ln1daae e esJde llemacionasle infld de fre nlente subestimadiaepencmnciados arranjos doms1ico4R fa tores iniernaCionafseogiaU em que os TatmesCJCriicos i11luinQoJ relactonariiento EStaCtosociedade fiiflueiiCfama polftica extema 2S 0 re giSfiOTiiSIOnco dosauiiitosCioiss6Culossugerequeoii iois projetos da promQ9aO de revolulao em outros Estados e da derrubada de regimes revolucionanos normalmente falham em seus objetivos declarados Entretanto como as san96es econornicas estas aventuras pooem ter pro p6sitos mUltiples e refletir objetivos ideo16gicos e domesticamente orien tados mais amplos do que aqueles especificamente declarados 0 estudo das dimensoes intemacionais das revolu96es pode portanto fomecer insights sobre as areas das rela96es intemacionais que sao afetadas por tais abalos e sobre as causas e influencias transnacionais que influenciam as mudan9as domesticas 26 Es1Jeoriza9ao darela9ao sociedadeEstado tambem tern implica 96es para a quesio gers91Jrlftattlieza do sisteniliintemaCionaJ Como dtscutido naIiitroCluiio dentro da presente ieoria o terffio sistema e usado de vanas formas comando pela concepao realista de urn sis tema de Estados na qual o termo e usado em seu sentido mais frouxo ate chegar as aplica96es da teoria dos sistemas as rela96es intemacio nais com resultados bastante modestos e as afirma96es de urn sis tema intemacional capitalista pelos escritos marxistas ou influenci 25RaymondAron Peace and War London Weidenfeld Nicolson 1966 p 37381 26Ver Martin Wight Power Politics Harmondsworth Pelican 1979 p92 Em uma nota de rodape esclarecedora Wight sugere que para a maioria dos anos entre 1942 e 1960 as relacoes intemacionais foram revolucioniirias ao inves de normais As implicacoes disto enttetanto nao tern sido convencionalmente reconhecidas Repensando as rela6es intemacionais 1 03 ados pelo marxismo 0 problema com o2JiCrealiglg1l evitam relacionar osfiltoressoooeconomicos dentro e fora dos Es taaosaotunCionamentodos1stemaeste ultimosendov1sioesii1ia menie em terni6s p6Tfticos 0 probma de rtgsievel d tq IDSs 911sslsHmamopapeJ eiBqa disl ta dos Estados Neste ultimo paradigma a grande questao e par que os Estadas precisam existir se ja existe uma economia mundial na qual os interesses de classe funcionam mundialmente EgtQUfas palavras qual e a especificidade e efetividade de Estaaos diint ctenmfaeiimatofilTiladeeconomicarnicaEstes enigmas a deterl iiiiria6 do socioeconomiCo a especificidade do politico nao po dem ser respondidos dentro de urn contexto unicamente domestico ou intemacional pelo contrario eles sugerem a necessidade de iden tificar ate que ponto cada nfvel determina o sistema e como os Esta dos funcionam nao somente como atores independentes no sistema mas tambem como mediadores e reguladores de urn con junto de intera oes que tomadas como uma totalidade constituem a sociedade inter nacional apesar desta sociedade ser idealizada Alem de sugerir uma base altemativa para o conceito de sistema no ambito intemacional e de como ele afeta a analise do mundo contempo raneo esta teorizaao tambem indica uma outra abordagem das rela6es internacionais convencionais uma hist6ria alterntiYUL 3iQIill Are agora nos tern sido oferecida uma visao predominantemente realista atraves da qual o sistema intemacional constituido par Estados desenvolvese cresce e se expande atraves da multiplicao de Estados e de sua aceitaao do que Bull em The Anarchical Society definiu como as institui6es das relaOeS interestatais Nao e necessaria destacar que esta visao tern urn fundo implicitamente evolucionista e difusionista como se tudo fosse facil Apesar de todo o pessimism a da visao relisW elllci sugerifooiJjst6 itetiSffafimaia em discre pancta com o processo sangumano de rmpostao reststencta e reafrrma ao de controle que e caracteristico das rela6es internacionais no mun do colonial ou no Terceiro Mundo ao Iongo dos ultirnos quatro seculos Como discutido no Capitulo 2 a visao alternativa e ate o momenta mi noritaria do sistema e esbada par escritores como Wallerstein e Wolf cujas pesquisas sabre a expansao do capitalismo desde 1450 ofereceram uma hist6ria intemacional bastante distinta retratando urn sistema base ado nas rela6es de mercado capitalistas 27 0 pressuposto te6rico da abor dagem de Wallerstein de que o desenvolvimento da sociedade intemacional e constituido pela disseminaao de urn sistema social na esfera intemaci onal e muito distinto do realista sabre o crescimento das relaoes entre 271mmanuel Wallerstein The Modern World System London Academic 1974 e Eric Wolf Europe and the People Without History Berkeley CA University of California Press 1982 104 Fred Halliday Estados unitarios e analiticamente primaries e semelhante a da sociolo gia hist6rica com seu destaque do contexto hist6ricomimdial dos desen volvimentos intemacionais e dos multiplos conflitos intra e internacionais que o marcaram Entretanto como ja indicado podese questionar esta hist6ria da sociedade mundial par sua negligencia do polftico e pela sua suposiao com enfase no Estado da homogeneidade capitalista do mundo da Guerra Fria pesacr o carter ClRitajsJa mi geral dgjemaipJJli nal nao emficallfirllage asxelQ Qji g siJplsUiente transnalmiaiMarx no seculo XIX e mais claramente o pensamen to sociol6gico contemporaneo cometem o mesmo erro ao supor que o Estado e simplesmente assolado pelos processes transnacionais Esta visao pelo contrario considera o Estado seriamente mas ques tiona mais precisamente o seu papel dentro do contexto socioeco nomico Em outras palavras ela examina a funao de Estados dis tintos dentro de tal contexto socioeconomico se e representar dife rentes grupos dominantes ou interesses estatais distintos e autono mos ou se e regular e manter urn sistema de hierarquia intemacio nal Existe a questao adicional referente as implicaoes de urn mun do como ode 1945 a 1989 composto par dais sistemas socioeco nomicos genericamente urn capitalista e outro planejado central mente As funoes dos Estados e nao somente os aspectos milita res de administrar continuar e controlar esta rivalidade entre siste mas sociais competitivos e opostos sao mais discutidas no Capitulo 7 Many e o escritor em relaoes internacionais que nos disse com base em dados comparatives exaustivos que existe pouca 6u ne nhuma correlaao entre o resultado da polftica externa e o sistema socioeconomico sob o risco de blasfemia os estudantes da hist6ria p6s1945 podem ser perdoados par questionar esta conclusao Levara urn certo tempo para que as implicaoes desta concei tualizaao altemativa de Estado sejam absorvidas pelas relaoes in temacionais e isto envolvera urn rnaior reconhecimento das tenden cias em outras ciencias sociais como a sociologia e a sociologia hist6rica que ate agora receberam pouca atenao Nao existe qual quer duvida de que tal evoluao envolvera incertezas e desaponta mentos sera diffcil traar urn mundo no qual o Estado nao lnais pode ser tornado como representante da totalidade e no qual o Estado naao a soberania e o interesse nacional nao sao mais marcos seguros Par outro lado em muitas areas substanciais das relaoes intemacionais como a analise de polftica externa e a economia po lftica internacional muitos trabalhos significativos ja vern sendo produzidos ao Iongo destas linhas No final das contas ja que o sig nificado e a validade de qualquer abordagem conceitual residem na relevancia de suas conclusoes e no seu poder explicative a maneira lYPIlr yresente imolJilidade das relaoes intemacionaisar peito do Estado sera pela redefiniao dOproprio Estado e Repensando as relac6es intemacionais 1 05 lllliiiliillll capitulo 4 ASOCIEDADE INTERNACIONAL COMO HOMOGENEIDADE OS SIGNIFICADOS DE SOCIEDADE INTERNACIONAe 0 conceito de sociedade intemacional ocupa urn Iugar signifi cativo ao mesmo tempo constitutivo e fantasmag6rico no estudo das relaoes intemacionais Algumas raz6es para a ambivalencia desta po siao serao discutidas abaixo mas talvez a mais importante de todas e a diferena de sentidos que sao atribufdos ao termo Dentro do realiQ sociedade intemacional referese a relaao entre os Estaos baseada emiioiiiiaScompartilliadase eritendimeiifos este eo sentido no qual e usaooporMiirtiii WfgliHectley lJUIJ James Mayall e outros te6ricos da escola inglesa Dentro do transnacionalismo referese a emergencia de laos naoestatais dEQImtJ21iSoeiaa6qe cul e de ideologia gue transe11cll frlteirs dsiafos e constitl em maior ou menoririedida uma socedde qle vafJfmcrs mes mas frQntirasorigirialirieiite descoberto por escrliOres influenciados peiObehaviorismo e pela abordagem transnacionalista John Burton Robert Keohane e Joseph Nye dentro das relaoes intemacionais o con ceito tambem foi desenvolvido em trabalhos mais recentes desta litera tura Evan Luard e da literatura sobre a globalizaao da sociologia Mi chael Featherstone Roland Robertson Leslie Sklair John Urry Os dois usos o interestatal e 6 transnacional possuem urn importante pooerx plicadvo deniro de suas estruturas te6ricas Entretanto existe umttirceiro uso possfvel do termo socieda Repensando as relat6es intemacionais I 07 de intemacional que indica urn conjunto de normas compartilha lpsiiJifererites sociedades qJe e promovido pela fornpifiI19 1nterestatal Este uso nao e sustentado por nenhum dos dms mode Tos o 1nterestatal e o transnacional mas pela suposi9ao de uma igualdade intersocietal e interestatal que se refere a semelhan9a de valores domesticos e de organiza9ao entendida como a homoge neidade das formas de organiza9ao societarias Este terceiro conceito de sociedade intemacional tern implica oes fisffntaspara o estudo das rela9oes intemacionais1 ja que indica uma relasiC stilltura ntnt ctas sociedades e inteJ11acimal Resumidamente esta abordagem investiga de qu maneira como urn resultado das press5es intemacionais os Est3aossocompelidos acoll formar seus arranjos intemos aos dos demais Diferentemente do con ceito realista a ideia de homogeneidadepresta atenao considera vel ao que acontece dentro dos Estados e das sociedades e examina a interaao da atividade intemacional com a legitimidade domestica e a estabilidade Em qposiao ao transnacionalista ele confere uma im eYfstJ1fe efid coino uma parte importante de seu processo formativo e considera a competiao comoum fator tao importante desta formaao quanta os laos transnacionais intersocietarios E coClcJ9 4uma sociedade intemacional hompea abrange parte do material inclufdo nos otitios dois conceitos aorgnj reifistadossistemaspolfticose as Iigas tninsnacionais Por6m seupont6departida6bastante diferente ja que comea pela necessida de das sociedades e das polfticas de permanecerem distintas a despeito das pressoes para se conformar a urn modelo intemacionalmente defini do Portanto e urn conceito que se refere tanto ao desenvolviniento in temo quanta as rela95es intemacionais A ideia da homogeneidade e evidente mesmo que iniplicitamen te na JllaiOr parte ilifteoria socialepolfica Apercepaodo desenvOf viriiento economico encontrada ein historhidores economicos como Gerschenkron e outros enfatizando a necessidade dos Estados de se equiparar e baSeada nesta ideia de homogeneizaao competitiva 2 Neste capftulo iremos explorar como o conceito de homogeneidade e uti lizado por tres diferentes pensadores em tres diferentes perfodos hist6 ricos Burke Marx e Fukuyama Tal conceito nao se sustenta em rela 5es internacionais sociais entre OS EstadostruiS na anliilse de CCl1TIO 1Para uma discussao previa do conceito de homogeneidade ver RaymondAron Peace and War London Weidenfeld Nicolson 1966 p37381 2 Alexander Gerschenkron Economic Backwardness in Historical Perspective Cambridge Harvard University Press 1962 1 08 Fred Halliday as relaos sociais polfticas e economicas dentro dos Estados sao afe tadaeJg intinacional A aplicaao destes resultados pernutlni que as relacoes intmacionais se tomem nao somente o estudo dos Estados apesar de sua importancia hoje e sempre mas tambem o estudo te6ri coEt6i dQCsos iteJ1anais e de suas CflES o Iuncionamento mtemo dos Estados tanto irifluenda como e influenci ado pelos processos intemacionais Aqui e este conceito de sociedade intemacional indicando uma forma9ao transnacional da sociedade que sera caracterizado como sendo parte da tradiao constitutiva Discutiremos a seguir que o conceito de homoll9e m rece maior atenao porq lll S9HmltiYisiCa5 te6rics7 aiiahbcas e noilfultivas para 0 estudo das relaOes internaciOniiisenao somente por causa da importiincia do internacional na formaao das so ciedades Apesar de sua fora e de aparecer ao Iongo da hist6ria do pen samento sabre o sistema intemacional em escolas consideradas muito diferentes este conceito ainda nao achou o seu lugar real Alem das recompensas trazidas pela recuperaao das tradi96es classicas existem raz5es especfficas que justificam a necessidade de se examinar mais de perto estas ideias no mundo contempodineo Por urn lado os desenvolvimentos em areas cognatas especial mente na sociologia hist6rica e na sociologia das relaoes globais tern indicadp novas formas pelas quais os conceitos interestatal do in temacional eo da sociedade internacional podem ser limitados3 Mesmo que somente como reaoes a intrusoes extradisciplinares estes desen volvimentos vern instigando a necessidade de uma definiao mais especffica do assunto para os estudantes de relaoes internacionais Por outro nvolviment mundo conteoriill sentam esafios a rtasmajgpais IDPodem ser eluci aados pefituliliZacao deste conceito altmativo d QPjaaeTntemacio t Os estudaiitesde globalizaao e da crescente transmtcionillzaao das sociedades pelo menos na Comunidade Europeia podem valerse de muitas destas quest5es Contudo tambem pode ser discutido que o conceito e pertinente ao assunto dos Capitulos 79 as mudanas recentes no sistema intemacional ou seja a Guerra Fria a forma pela qual ela ter rninou e as perspectivas para o fim do conflito militar entre os grandes poderes cujas implicaoes te6ricas podem nao parecer tao evidentes Como discutirei em maior extensao nos Capftulos 7 e 8 e em outras partes 4 9zaxl a Glrra fi Ill aC1UPat O 3Ver por exemplo Leslie Sklair Sociology of the Global System Hemel Hempstead HarvesterWheatsheaf 1991 e ensaios por Featherstone Urry Robertson e Apparudai em Michael Featherstone ed Global Culture Nationalism Globalization and Modernization ediao especial de Theory Culture and Society London Sage 1990 4 The ends of Cold War em Robin Blackburn edAftertheFall London Verso 1991 p 7899 Repensando as rela6es internacionais 1 09 htQriQttfJ 111 sido dominada por reflexoes de curta prazo e bastaCJnsruentais sabre a estrategia pode sei que somente agora como fim do conflito tomese poss1vel urn exame dos pro blemas te6ricos por ele levantados Nossa alegaQgll a pressao lm92lll para a mnogeneaao destiihia Uniao Sovitica a iuenaFriafoiiiOnnal das contas uiriconflito eritre dois conceitos diversos de sociedade intemad6nal e que terminou por9ue Cievido a ra6es intersoCiefais internacioriais e nao ipJIai 11111 lQQ piyjlsore 0 QUtro Foi a tshirt e 0 supermercado nao a ca nhoneira ou as manufaturas mais baratas que destrufram a legitimi dade e a estabilidade do sistema sovietico No final do seculo XX Bruce Springsteen teve o mesmo efeito que as Guerras do Opio 0 realismclYDfiQlil nopode explicaro fim do comunis JEQo te6rica colocada peta Guerra Fria eo seu encerramento e precisamente aquela de olhar para OS mecanismos da competiao intemacional e para o tipo de interao que a teoria interestatal orto doxa esconde isto inclui o conceito como aqui definido de soci edade intemacionar Em resumo estamos levantando a hip6tese de que nao somente esta concepao de sociedade internacional me rece reconhecimento por seu pr6prio merito mas tambem que ela tern implicaoes fundamentais na forma pela qual olhamos os Esta dos as sociedades individuais e o sistema intemacional Esta ava lanche de outras conceitualizaoes da sociedade intemacional tern ajudado a esconder o poder explicative que ela poderia ter para es tudar o passado e o presente e sem qualquer pretensoes cientificis tas para prever o futuro do sistemaJifua QQ pSSsQuerra Fria a questaodahomqgnggolQla de 9lfmJtioatfui gir uma nova era das relaoes intemacionais baseadumllJIDfl sQci edade interiiaCiorialfiorii eiieiiseliouveracoiisoHda ao dafOJ ms dCicas libers nos Estados mais IlPtn3 Dado que o termo sociedade intemacional e normalmente reco nhecido como sendo urn conceito de parte da tradiao realista das rela 6es intemacionais pareceria apropriado comar aqui a discussao do conceito A parte e importante porque embora nao confinado aos es critores da escola inglesa o termo e encontrado com muito menos fre qtiencia na escola realista germaneamericana predominante no lado ocidental do Atliintico dificilmente ele merece uma menao no traba lho de Hans Morgenthau Henry Kissinger e Kenneth Waltz em oposi ao a sua centralidade em Martin Wight Hedley Bulle James Mayall Waltz por exemplo apesar de toda a sua simpatia pelas tradioes filo s6ficas britanicas nao demonstra qualquer interesse no suposto criador da escola inglesa Hugo Gr6cio Nos escritos que fazem uso do termo a sgde intemacional exerce sua funao constitutiva em tres imPortantes CiimetisoescoillQ 110 Fred Halliday urna expli99JJra fllCIlE citeIl ixtlacional alerp do corifliiQhopleiano como uma rspotatericctpara ausencia ae uma autoridade tinica na esfera intemaional e como uma cate go flit central parl lldr a difumij io istmaeUropel oc1oenfalsNo realismo britanico apesar do conceito exercer estas roesede ter sua importancia formalmente reconhecida ele ain da permanece bastante vago podendo ser percebido tanto quanta urn anjo da guarda como urn conceito hegemonico Alem de ocor rer por razoes internas ao pr6prio conceito relativas a exclusao do significado real do termo sociedade esta situaao e produzida porque ao estar afirmando urn conceito de sociedade intemacional ou seja as relaoes entre os Estados esta categoria realista conven cional impede a discussao de outras teorizaoes igualmente suges tivas a respeito do sistema internacional e de sua interaao com outras formas de relaao A formulaao do conceito de sociedade intemacional pelos realis tas ingleses foi melhor resumida por Bull que destaca Uma sociedade de Estados ou sociedade intemacional existe quando urn grupo de Estados conscientes de certos interesses comuns e valores comuns forma uma sociedade no sentido de que eles concebem a si mes mos como determinados por urn con junto comum de regras em suas rela oes uns com os outros e compartilham o funcionamento de instituioes comuns6 Mais adiante o princfpio da sociedade tern estado e sempre es teve presente no sistema intemacional modemo embora somente como urn de seus elementos cuja sobrevivencia e as vezes precaria7 Com algumas variaoes a enumeraao de Bull do que abrange uma sociedade os interesses os valores as regras as instituioes e a sua interpretaao hist6rica concebida para provar que pelo menos al guns de seus principios existiram por urn certo tempo aplicase a toda a escola realista Na extensao postumamente publicada deste argumento Wight passeando pela hist6ria com sua tranqtiilidade taxionomica habitu al nos apresenta tres variantes sabre a questao da sociedade intemaci 5Ver entre outros James Mayall International society and international theory em Michael Donelan ed The Reason of States LondonAllen Unwin 1978 p122141 e Hedley Bull eAdam Watson The Expansion oflnternationol SocietyLondon Oxford University Press 194 6Hedley Bull The Anarchical Society A Study of Order in World Politics Basingstoke Macmillan 1977 Enfase no original 71bid p 41 e de fato todo o Capftulo 2 Repensando as rela6es intemacionais 111 onal que correspondem as escolas do realismo do racionalismo e do revolucionismo Tais abordagens diferem em seu foco anaHtico co meando pela guerra hobbesiana passando pela comunidade grocia nasuareziana e chegando a civitas maxima kantiana A primeira cor responde ao que na terminologia da escola inglesa pode ser classifi cado como urn sistema sem qualquer atributos sociais adicionais A terceira variante a de Kant corresponde em alguns aspectos a perspectiva transnacionalista com urn programa moral mais aberto e uma teleologia pacifista implicita ja que a paz segue da gradual que brada autoridade e das barreiras entre os Estados Todas as tres vari antes de Wight sao baseadas em concepoes de relaoes interestatais ou intersociais e evitam a questao da constituiao domestica ou ho mogeneizaao A segunda corresponde mais proximamente a concep ao de WightBull da sociedade intemacional urn sistema mais ele mentos adicionais Eo conceito realista difundido atraves da teoria e da historia e servindo as tres funoes mencionadas que os estudantes da intemacional devem principalmente enfrentar 8 0 conceito de sociedade e supostamente emprestado da soci ologia e emergiu em seu uso mais corrente que as relaoes intemaci onais dizem compartilhar durante o seculo XIX9 Enquanto as varia oes no seu uso teorico pelas disciplinas nao causam qualquer sur presa para mencionar apenas duas bastase pensar nas peregrinaoes de estrutura e realismo e valido comear apontando algumas diferenas obvias entre as formas do termo sociedade que sao usa das nas duas disciplinas 10 Primeiro dentro da sociologia assim como dentro da teoria politica o conceito de sociedade adquire seu sen tide primariamente em oposiao ao Estado visto como uma auto ridade suprema cuja ausencia foi enfatizada pelos teoricos realistas na esfera intemacional Como conseqliencia na teoria das relaoes intemacionais falta ao termo sociedade sua contraparte dada esta definiao de sociedade nao pode haver equivalente realista ao con ceito sociedade civil ja que por definiao e aquela area da ativi dade poHtica ou social nao controlada pelo Estado Uma segunda conseqiiencia desta definiao e que seu uso nas rela5es intemacionais parece esconder uma das mais centrais distin oes da sociologia exposta por Tennies em 1887 aquela entre uma sociedade frouxa mais informal Gesellschaft e uma comunidade 8Martin Wight International Theory The Three Traditions editado por Gabrielle Wight e Brian Porter Leicester Leicester University Press London The Royal Institute of International Affairs Capitulo 3 9Sobre o desenvolvimento do uso ingls do termo sociedade ver Raymond Williams Keywords London Fontana 1976 10Para uma consideriio do termo no pensamento classico e modemo ver David Frisby e Derek Sayer Society Chichester Elis Horwood London Tavistock 1986 112 Fred Halliday mais fechada mais moralmente coesa Gemeinschajt Na verdade no uso de BullWight as duas sao intercambhiveis e esta socieda de independentemente do que ela realmente seja devido a enfase em val ores compartilhados e mais proxima de Gemeinschaft Terceiro a principal preocupaao da teorizaao da sociedade den tro da sociologia e observar as formas de constrangimento ou em ou tras palavras escapar da ideia do indivlduo como livre e desimpedi do Os fatos sociais de Durkheim por exemplo eram limites sobre o indivlduo Dentro das relaoes intemacionais esta funao e desem penhada pelo conceito de sistema urn termo que na sociologia nao e oposto a sociedade mas serve como base para teorizaoes altema tivas das relaoes sociais como a de Parsons Nas relaoes intemaci onais realistas o uso do termo sociedade corresponde mais direta mente a antigas expressoes do termo e nao tanto ao seu conceito so ciologico seja para indicar urn clube ou urn grupo autoselecionado como em construindo ou debatendo ou simplesmente para in dicar uma elite social freqiientemente na moda 11 0 carater elitista exclusivista da sociedade de Estados e certa mente a base sobre a qual toda a historia se desenvolveu e a expan sao ocorreu Na origem a sociedade europeia de Estados era urn clube de monarcas cristaos ocidentais e produziu suas primeiras for mas de organizaao contra os muulmanos os turcos infieis Na verda de este era o sentido dado ao termo pelo proprio Wight que definiu a sociedade como urn numero de indivlduos agregados em urn sistema de rela5es para certos propositos comuns 12 A medida que a condi ao central de pertencimento a soberania evoluiu ela passou a ser reservada para os Estados que podiam e consideravam apropriado sujeitar o resto do mundo a sua regra hegemonica amplamente coloni al A soeiedade educada de Jane Austen ou a alta sociedade de Cole Porter aproximamse das concepoes das rela5es intemacionais tanto quanto as reflexoes de Auguste Comte ou Ferdinand Tennies Outras tres quest5es mais amplas levantadas por este uso do ter mo sociedade intemacional precisam ser discutidas A primeira nasce da perspectiva interestatal particularmente nas areas nas quais a in fluencia de Hobbes e forte Este uso realista negaria que o termo so ciedade pode ser usado para definir urn agrupamento no qual a guerra 11Um interessante exemplo adiciopal deste uso elitista e encontrado no vocabulario po litico russo do infcio do seculo XX onde a palavraobshchestvo tendia a significar soci edade educada urbana nobre e proprietiiria de terra 0 termo descrevia aqueles mem bros da populaiio que por virtu de de educaiio riqueza ou servios publicos tinham urn direito implicito de participar na politica mas eram impedidos pelo Estado David McLaren Macdonald United Government and Foreign Policy in Russia 190014 London Harvard University Press 1992 p 222 nota 5 12Martin Wight Power Politics Harmondsworth Pelican 1979 p 105 Repensando as rela6es intemacionais 113 e a ameaca de guerra permaneceram tao centrais Seria mais defensa vel urn uso do termo que nao o confinasse aos Estados que nao ame acassem os demais no sistema mas esta restricao nao e observada pelos que 0 utilizam na tradicao de Bulle Wight Normalmente os que pro poem este conceito sao cuiddosos o no definir quais Estados so e quais nao sao parte da SOCledade lStO e OS que segundo SUa VlSaO estao no sistema mas nao na sociedade Entretanto uma leitura da literatura sugeriria que para a maior par te dos que usam 0 termo todos OS Estados soberanos do seculo XX sao parte desta sociedade por causa de sua participacao na pnitica diplomati ca A resposta como no Capitulo 8 de The Anarchical Society usando a palavra instituicao no sentido funcional que e picIru a abordgem pode ou nao ser convincente certamente ela ampha e ddm o conce1to de sociedade muito mais do que permitiria urn uso mais rigoroso Uma critica adicional ao termo nasce da defmicao de qual concei to de sociedade esta sendo usado e nao do exame da corresponden cia entre o sistema interestatal e urn modelo de sociedade Aqui como em quase toda teoria das relacoes intemacionais tende a existir urn ele mento de absolutismo definicional alcancado nao por decreto mas por elipse assim como ocorre com Estado poder e nacao isto tam bern acontece com sociedade 0 argumento em favor de uma con ceitualizacao particular do intemacional e reforcado pelo mais simples de todos os mecanisinos qual seja a relutancia em reconhecer que existem altemativas neste caso conceitos altemativos de sociedade Como apresentado inicialmente por Bull sociedade quer dizer normas interesses regras e valores a unica questao que permanece e ate onde este modelo vai ou nao corresponder a realidade intemacional 0 uso de Bull de seu conceito de sociedade e certamente consis tente e constr6i a base para urn retrato irrefutavel do sistema intemaci onal Todavia assim como com o termo Estado e precisamente aqui que interessantes quest5es sao ignoradas A questao nao e se as rela c5es intemacionais definidas como relac5es interestatais correspondem a uma definicao de sociedade mas pelo contnirio a qual defmicao elas podem corresponder Como ja destacado dentro da teoria socio16gica o proprio conceito de sociedade evoluiu ao Iongo dos dois ultimos seculos para englobar vanos significados todos aqueles dentro de uma comunidade a elite daquela comunidade ou o elemento de uma nacao que e distinto do Estado como na recuperacao da sociedade civil Nao existe conseqtientemente uma definicao unica de sociedade A consideracao de Bull pode ser definida como comunitaria ja que implica que uma sociedade e urn agrupamento com valores compar tilhados esta ideia pode ser oposta a outras percepcoes como as inspi radas no marxismo que destacam as estruturas e o poder algo como urn sistema hienirquico formal Podese aplicar ao intemacional os mesmos argumentos que foram aplicados a sociedades espedficas per 114 Fred Halliday guntandose ate que ponto o funcionamento de uma sociedade e a trans missao de yalores dentro dela reflete a aceitacao de urn interesse co mum ou a coercao Em nenhuma sociedade a resposta e unica entre tanto a apresentacao desta questao levanta importantes preocupac5es evitadas pelo modelo comunitario de Bull sobre o que constitui uma sociedade e o grau de desigualdade e forca dentro dela As relac5es interestatais podem portanto constituir uma sociedade nao tanto por causa da existencia dos valores compartilhados mas por que sao uin agrupamento estabelecido pela coercao de alguns Estados sobre outros e mantido por meio de varios mecanismos ideol6gicos e militares utilizados pelos membros mais poderosos Nesta linha tanlbem mudam de significado os outros termos que os realistas usando a abor dagem da sociedade invocam assim a socializacao tomase nao a inculcacao e a difusao de valores compartilhados mas a imposicao de urn conjunto de val ores pelos Estados as escolas a familia o clero a mfdia e outros acreditem ou nao neles aqueles que na verdade os imp5em Os mecanismos identificados no conceito de hegemonia de Gramsci por meio dos quais os subjugados aceitam os valores de seus dominadores tambem se aplicariam a arena intemacional a tese de Gramsci levanta algumas ambigtiidades te6ricas aqueles que sao subordinados aceitam os valores acreditam neles fingem ou sao mesmo subjugados por sua adesao a urn sistema de valor diferente e subaltemo 13 Bull ao reconhecer este problema com seu conceito de socieda de produziu uma tensao dentro de seu pensamento entre a sua defi nicao de sociedade intemacional e a sua real exposicao por esta ra zao 0 papel dos grandes poderes e da guerra e apresentado como duas de suas cinco instituicoes Entretanto ele nao desenvolve as implica coes desta tensao para questionar a definicao explicita e implfcita de sociedade que ele mesmo fomece no infcio da exposicao Uma soci edade intemacional criada e mantida pelos grandes poderes pode ser o melhor que a raca humana pode fazer mas esta Ionge de ser uma sociedade baseada unicamente em valores compartilhados A terceira critica do conceito de sociedade internacional surge da variacao das teorias da sociedade e particularmente daquelas ja sugeridas no Capitulo 2 que derivam do materialismo hist6rico Dois 13Sobre estas tres interpret3oes do conceito de hegemonia ver Brian Turner Paul Abercrombie e Stephen Hill The Dominant Ideology Thesis London Allen Unwin 1981 Sobre a teoria de hegemonia de Gramsci mais complexa e especffica do que sugeriria a sua recente ocorrencia dentro da literatura das rel30es intemacionais ver Antonio Gramsci Selectionsarm Prison Notebooks editado e traduzido por Quintin Hoare e Geoffrey Nowell Smith London Lawrence Wishart 1971 John Cammet Antonio Gramsci and the Origins of Italian Communism Stanford CA Stanford University Press 1967 Capftulo 10 e Perry Anderson The antinomies of Antonio GramsciNewLeft Review n100 NovemberDecember 1976 pS78 Repensando as rela6es intemacionais 115 componentes do que poderia ser uma crftica materialista hist6rica ja foram sugeridos o papel da coenao em manter uma sociedade e a natureza particularista especifica de classe de valores supostamen te comuns ou universais Porem existe uma crftica ainda mais fundamental baseada nos prin clpios que agrupam e constituem as sociedades Ao inves de afrrmar que sao as normas ou as instituioes polfticas que desempenham esta fun ao de ligaao a tese oposta considera que a econornia tern este papel Isto acarreta uma definiao do sistema intemacional como primariamente constitufdo pela atividade econornica e pela disserninaao das rela6es sociais e economicas capitalistas em uma escala mundial Como ja indicado no Capitulo 3 a teoria altemativa permite hist6ri as altemativas Immanuel Wallerstein Eric Wolfe Eric Hobsbawm que trazem formulaoes contrarias a expansao da sociedade intemacional 14 Estas hist6rias altemativas nao devem excluir a importancia das normas e da transmissao de valores pelo sistema Coercitivos ou nao as normas e os valores sao uma parte essencial do funcionamento de qualquer soci edade Alem de ser hierarquica esta difusao de normas reside em outra parcela da atividade humana que sustenta e forma a propria sociedade A disseminaao da cristandade teve muito pouco a ver com a fora A ques tao portanto tomase nao como e ate que ponto estas normas espalham se o problema historiografico das teorias ortodoxas de sociedade in temacional mas sim o estudo de como o capitalismo como urn siste ma socioeconomico disseminouse o papel que os valores e as normas incluindo o conceito de soberania desempenharam dentro dele e o equi libria em mudana entre a coerao e o consentimento envolvidos na re produao desta sociedade Desta forma a teoria altemativa sugere a his t6ria altemativa a subjugaao dos povos precapitalistas a unificaao do mundo atraves de processes economicos e a formaao de urn bloco de palses economicamente desenvolvidos e liberais democraticos 15 0 TRANSNACIONALISMO E OS SEUS LIMITES A definiao transnacional de sociedade intemacional e as suas implicaoes para a teoria das relaoes intemacionais tambem nao ne cessitam de uma extensa recapitulaao aqui Como vimos na Introdu ao comeando pela preocupaao behaviorista de evitar a paralisia 14lmmanuel Wallertsein The Modern World System London Academic Press 1979 Eric Wolf Europe and the People Without History Berkeley CA University of California Press 1982 e Eric Hobsbawm The Age of Empire London Weidenfeld Nicolson 1987 15Sou particularmente grato a Justin Rosenberg por seus muitos insights sobre este proble ma ver seu Whats the matter with realism Review of International Studies vol 16 n4 Ocotber 1990 p 285303 116 Fred Halliday do institucionalismo e uma consciencia de uma perspectiva emplri ca de que muitos processos que cruzam as fronteiras nao eram con duzidos ou controlados pelos Estados os escritores transnacionalis tas buscaram a partir de 1970 apresentar urn retrato altemativo do sistema intemacional no qual as relaoes interestatais estavam cada vez mais superadas ou influenciadas por estes processos naoestatais Desta mudana intelectual surgiram as teorias da interdependen cia de Robert Keohane e Joseph Nye o paradigma da sociedade mundial de John Burton e grande parte da economia polltica intema cional 16 As quatro estruturas de poder de Susan Strange foram uma tentativa extraordinaria de preservar a importancia da dimensao mili tar e de segurana enquanto identificando a emergencia o crescimento e em muitos casos o predomlnio de processos naoestatais Em ou tro estudo Evan Luard discutiu que existe uma crescente convergen cia entre a sociedade domestica e a intemacional assim como as so ciedades individuais estao ficando cada vez menos homogeneas e centralizadas tambem as relaoes intemacionais estao englobando diversas intera6es algumas organizadas pelo Estado muitas nao que produzem relaoes semelhantes aquelas dentro da sociedade 17 Em urn desenvolvimento paralelo dentro da sociologia inumeros escritores passaram a identificar o que consideram como sendo uma glo balizaao ou uma intemacionalizaao das relaoes sociais e a quebra de entidades sociais antes distintas a sociedade no sentido tradicional Leslie Sklair identifica tres conjuntos de PTNs praticas transnacionais o econornico o poHtico e o culturalideol6gico 18 0 primeiro abrange as atividades das corpora6es transnacionais no mlnimo o seu impacto em pafses do Terceiro Mundo e socialistas o segundo as liga6es entre as foras poHticas principalmente aquelas no poder e o ultimo a dissemi naao de praticas consurnistas e de outras crenas pelo mundo Em urn campo semelhante de analise fomente influenciado pelo trabalho de Roland Robertson e pelos insights p6smodemistas sobre a possibilidade de multiplas estruturas desconstruldas e de significados dentro do sistema intemacional Arjun Appadurai identificou cinco di mensoes de fluxo cultural global as etnicas da mldia as tecnol6gicas as financeiras e as ideol6gicas 19 Dentro de cada uma destas dimensoes diferentes atores cruzam as fronteiras turistas irnigrantes refugiados trabalhadores migrantes ativistas poHticos modelos ou astros pop Fe 16Robert 0 Keohane e Joseph Nye Power and Interdependence Boston Little Borwn 1977 John Burton World Society e Susan Strange States and Markets London Pinter 1988 17Evan LuardInternational Society Basingstoke Macmillam 1990 18Sklair Sociology of the Global System 19Featherstone ed Global Culture Repensando as rela6es intemacionais 117 l f chando o cfrculo te6rico o conceito de sociedade intemacional re tomou a disciplina da qual supostamente se originou20 Apesar de ricas em insights as varias teorias do transnacionalismo deixam sem resposta varias questoes quatro das quais podem ser aqui resumidas Primeiro a questao da determinaao e do significado nao e resolvida nao esta claro se devemos considerar todos os processos trans nacionais como igualmente importantes ou autonomos Os realistas orto doxos sugeririam que o papel do Estado nao pode ser inteiramente dis solvido em uma mescla de interaoes globais e que isto e urn problema para as teorias da globalizaao e para a abordagem da sociedade mundial Os marxistas e os representantes da economia polftica intemacional po deriam sugerir que o papel da economia e de suas estruturas hienirqui cas e central para a hist6ria do desenvolvimento da sociedade intemaci onal Uma proliferaao de nfveis de camadas ou de significados pode nos dizer muito pouco Uma consideraao equilibrada a respeito do cani ter da totalidade social global e substitufda por repentinas descobertas de tirar o folego a respeito de novas areas de interaao num dia a aldeia global ou os mercados financeiros que funcionam 24 horas no outro o jlaneur transnacional ou as comunica6es via satelite Segundo e em oposiao a uma consideraao mais s6bria a respeito da localizaao da mudana real existe na maior parte da literatura trans nacionalista urn elemento de reducionismo hist6rico Muitos dos proces sos economicos polfticos e religiosos que caracterizaram o transnacio nalismo contemporaneo estavam presentes se nao em intensidade seme lhante decadas e mesmo seculos atras A Reforma a Revoluao fudustri al a disseminaao do sufnigio universal para indicar tres processos trans nacionais predatam a obsessao com o imediatismo e com uma estrutura hist6rica reducionista A migraao foi u fenomeno importante no secu lo XIX e na verdade tambem nos seculos XVIII e XX em alguns pafses Dificilmente podese dizer que os Estados estao menos envolvidos neste processo agora do que estavam no passado Em nenhum Iugar este redu cionismo hist6rico e mais enganoso do que na maior parte da literatura sobre a p6smodemidade como algo especffico a era p6s1945 isto implica rupturas na sociedade ou no mundo que sao exageros urn pro duto de capricho ahist6rico Nao se pode duvidar que certos fenomenos sao especfficos a era contemporanea mas a atraao da p6smodemida de como urn conceito explicativo ou como uma categoria hist6rica fre qiientemente obscurece onde a mudana ocorreu ou nao Terceiro existe uma teleologia implfcita nestes trabalhos seja o entusiasmo pela integraao europeia encontrado nos escritos sobre a 20Para uma visao hist6rica da precoupaao sociol6gica duradoura com a formao intema cional de sociedades individuais ver o ensaio de Brian Turner The two faces of sociology Global or national em Michael Featherstone ed Global Culture 118 Fred Halliday I Comunidade Europeia ou na crena de que uma cultura global base adana juventude na TV via satelite no esporte ou na religiao esta engolindo a humanidade como urn todo Em particular isto se aplica a velocidade com que o proprio Estado e desconsiderado A trajet6ria de Keohane transcendendo o Estado nos anos 1970 acomodandoo e reabilitandoo em After Hegemony de 1980 e uma indicaao das dificuldades encontradas por aqueles que buscam marginalizar o seu papel21 Sinistramente existem muitas semelhanas entre o otimismo e a teleologia dos escritos liberais intemacionalistas e a anterior litera lura sobre a transiao para o socialismo recuos e atrasos podem acontecer mas no tim tudo esta destinado a acontecer Finalmente a teorizaao de uma globalizaao ou transnacionaliza ao da cultura muito freqlientemente ignora o processo simuWineo de fragmentaao e divisao dos nfveis sociais global e domestico como re sultado direto da intemacionalizaao Certamente este e o paradoxa do nacionalismo urn fenomeno global e uma resposta a press6es intemaci onais que gera o particularismo e a fragmentaao Em nenhum Iugar isto foi percebido com maior clareza do que na brutalmente dividida Europa de 1992 no ocidente a uniao alfandegana Maastricht e as Olimpfadas de Barcelona nos Balcas o genocfdio a guerra etnica feroz e o 6dio as sassino Os transnacionalistas freqlientemente apontam para fenomenos que em sua visao justificam a reivindicaao de uma crescente socieda de comum atraves das fronteiras Entretanto dentro dos muitos fluxos que eles identificam novas formas de divisao chauvinismo ou hegemonia particularista podem estar emergindo a religiao o esporte a TV via sarelite sendo casos em questao Qualquer teoria a respeito do impacto dos pro cessos intemacionais sabre o mundo tern que abarcar as duas dimens6es deste processo a integraao e a fragmentaao Alem disso esta teoria tern que identificar as continuidades e as descontinuidades do papel duradouro e em mudana do Estado nos processos intemacionais e transnacionais 22 A maior dificuldade com o conceito transnacional de sociedade intemacional gira em tomo de seu tratamento do Estado a precipita da superaao behaviorista em alguns casos em outros a ecletic mul tiplicaao de estruturas e nfveis ou urn comodo recuo para urn Es tatocentrismo modificado23 Como discuti no Capftulo 3 parte desta confusao e resultado de dois diferentes significados de Estado que levam a uma falsa contraposiao do Estado aos processos transna 21Ver Capitulo p 301 22Para uma excelente discus sao ver Joseph Camilleru e Jim Falk The End of Sovereignty Aldershot Edward Elgar 1992 23Para criticas das teorias sobre uma crescente economia transnacional ver David Gordon The global economy new edifice or crumbling New Left Review n168 Marchpril 1988 p 2464 e Paul Hirst e Graeme Thompson The problem of Globalisation Economy and Society v21 n4 November 1992 p 35796 Repensando as relac6es intemacionais 119 cionais e sociais e a preocupasao com 0 que e de muitas maneiras uma falsa questao aquela do grau em que o Estado esta sendo ou nao tornado pelos processos transnacionais Neste capitulo o argu mento e centrado em outra conseqliencia desta polaridade estatalnao estatal qual seja o modo pelo qual esta falsa oposisao torna diffcil perceber como os processos transnacionais ou internacionais Ionge de enfraquecer o Estado o desenvolvem eo alteram como em ou tras palavras os pr6prios processos de mudansa poHtica e social den tro dos pafses sao resultado de processos externos e como por sua vez a divergencia ou convergencia dos Estados com relasao as nor mas de homogeneidade afeta o curso das relasoes internacionais 0 PARADIGMA CONSTITUTIVO E OS SEUS PROTAGONISTAS BURKE MARX E FUKUYAMA Ate aqui a discussao foi sabre as duas variantes de sociedade in ternacional a realista interestatal reprodutiva e a transnacionalista Agora e possfvel atentar para uma outra reinterpretasao do conceito de sociedade internacional uma que nao procura interpretas6es variantes do interestatal ou das dimensoes de interasao transnacional este concei to busca enquanto nao negando as forsas destas dimensoes localizar a discussao em outra dimensao na qual o termo sociedade intemacional pode ser mais apropriadamente aplicado Neste contexto as relas6es in terestatais e os seus conflitos incluindo a guerra nao sao dissolvidas mas sao Iocalizadas dentro de uma estrutura mais ampla A primeira vista isto pode parecer ser outra variante do usa soci o16gico do termo sociedade internacional no sentido de sociedade transnacional Entretanto este ultimo conceito aponta para uma socie dade internacional unica uma entidade transnacional ligada por inu meros processos e instituisoes e que gradualmente substitui a intera sao dos Estados Com isso ela esta pouco interessada nas questoes ortodoxas das relas6es internacionais concebidas como as relas6es entre OS Estados 0 conceito homogeneo oferecido aqui e bastante dife rente atribuindo urn papel permanente e continuamente adaptativo aos Estados e buscando explicar seu comportamento pela identificasao de urn contexto maJs amplo de relasoes transnacionais e os meios pelos quais estes dais nfveis de atividade internacional interagem com o do mestico Os elementos desta teoria ficarao mais claros com a analise de tres escritores te6rica e historicamente diferentes em cujos trabalhos e poss1ve1 discernir esta terceira concepsao de sociedade internacional A ideia de sociedades separadas sendo ligadas par caracteristicas comuns e de suas poHticas externas como sendo positivamente afetadas par tal similitude foi amplamente empregada no pensamento do secu1o 120 Fred Halliday XVill Os anos que vao do Tratado de Utrecht em 1713 a Revolusao Fran cesa de 1789 pareceram naquela epoca e em retrospecto relativamente harmoniosos entre os grandes poderes europeus Uma explicasao muito utilizada e que a paz residia no equilfbrio de poder mas naquele perfodo e depois outras explicasoes tambem invocaram os princfpios comparti lhados de legitimidade polftica e social domestica de que gozavam os Es tados europeus Assim Voltaire falou da Europa crista com ou sem a Russia como urn tipo de grande comunidade na qual as mesmas cren sas religiosas basicas e os mesmos princfpios de lei publica e polftica desconhecidos em outras partes do mundo prevaleceram Heeren o ana lista hanoveriano do sistema de Estados cujo trabalho muito influenciou Wight Bulle seus parceiros na escola inglesa definiu o sistema de Es tados em termos interestatal e domestico como a uniao de varios Esta dos contfguos parecendose uns com os outros em seus costumes reli giao e condisao social e colocados juntos por uma reciprocidade de inte resses 24 Lugar comum nas relativamente pacfficas decadas antes de 1789 esta ideia somente recebeu urn tratamento mais elaborado quando as su posis6es nas quais se sustentava foram colocadas em questao foi neste contexto que a ideia de uma sociedade internacional baseada em idei as polfticas e sociais compartilhadas foi exposta por Burke As linhas gerais da teoria polftica de Burke sao bern conhecidas e necessitam de pouca explicasao aqui Similarmente o tear geral de suas visoes sabre as questoes internacionais tambem foi bern descri to25 Burke possufa a visao de que a sociedade e os sistemas polfti cos eram mantidos por fatores intangfveis os sentimentos os valo res as praticas herdadas os costumes e que se estes sofressem in terferencias abruptas ou racionais sucederia o caos Apesar de ser urn 24Como citado em Adam Watson The Evolution of International Society London Routledge 1992 p2068 Watson p8 tambem cita Gibbon como afmnando que a urn fil6sofo pode ser pennitido considerar a Europa como uma grande republica unica A despeito de sua afili a Escola Inglesa Watson parece pouco preocupado com a distin ao entre sistemas e sociedades de Estados Sobre a pratica do seculo XVIII e as suas implicaoes para as ideias de urn conjunto comum de valores ver Felix Gilbert The new diplomacy oftheeighteenthcentury World Politics 1951p 45 25Para uma visao geral das teorias de Burle para as rel6es intemacionais ver John Vincent Edmund Burke and the theory of international relations Review of International Studies v10 n3 July 1984 p 20518 e HansGerd Schumann Edmund Burkes Anschauungen von Gleichgewicht in Staat und Staatensystem Meisenheim Gain 1964 Para discussao de seus escritos posteriores sobre a Frana com fragmentos extensos e comentarios ver Conor Cruise OBrien The Great Melody A Thenuztic Biography and Commented Anthology of Edmund Burke London SinclairStevenson 1992 p 54269 Ele discute que apesar de Burke estar errado em perceber o regime p6s1794 como revolucionano ele estava certo em prever a busca de Napoleao por honra gl6ria e riquezas atraves da expansao p 555 Uma discussao da teoria de Burke que se assemelha a esta e encontrada em Edmund Burke and the Commonwealth of Europe de Jennifer Welsh paper apresentado na conferencia anual da British International Studies Association Dezembro 1992 Repensando as relabes intemacionais 121 conservador Burke nao era contra a mudan9a e sua reflexao sobre a America a India e a Irlanda mostravam is to 26 Sua metodologia era genericamente falando presociologica desprovida de uma preocu pa9ao com a industrializa9ao ou a sociedade moderna empregan do todavia sem usar o termo urn conceito de ideologia como o pre cipitador do desenvolvimento social e o principal garantidor da paz e da estabilidade Sua oposi9ao a Revolu9ao Francesa devese a isto ele nao somente abominava os atuais feitos dos jacobinos as Reflec tions foram escritas em 1790 bern antes do pior terror ou das expan s5es napoleonicas como tambem a propria aplica9ao da razao are jei9ao da tradi9ao e a persegui9ao do progresso e da perfei9ao Ao inves dos tres pilares da estabilidade a monarquia a aristocracia e a igreja existia urn novo trio perigoso regicida atelsta e jacobinista A implica96es disto indicadas em uma ou duas passagens de Reflections de 179027 sao expressas em maior extensao em suas Let ters on a Regicide Peace escritas em 17956 Fragmentados e mal humorados como sao estes textos eles contem uma teoria bastante distinta da homogeneidade na sociedade intemacional e as conclu s5es anaHticas e normativas que delas provem Em essencia a teo ria de Burke sobre a sociedade internacional pode ser resumida segundo as formula96es dos panigrafos seguintes Primeiro urna sociedade internacional existe em virtude de normas politicas e sociais comuns que vigoram dentro da sociedade Burke con sidera que as rela96es estaveis entre os Estados residem na semelhan9a de ordens polfticas e sociais em aspectos fundamentais eles sao homo gneos Aplicando ao internacional esta concep9ao de coesao social que desenvolveu internamente Burke discute como Os homens nao sao ligados uns aos outros por papeis e selos Eles sa9 levados a se associar por semelhanas e conformidades por simpatias E assim com as naoes e com os indivfduos Nada e mais forte como urn lao de amizade entre as naoes do que a semelhana de leis costumes maneiras e habitos de vida Eles tern mais foras do que os tratados Eles sao obrigaoes escritas no coraao28 Adiante ele se refere a conformidade a analogia e a si militude entre as na96es da Europa seus costumes e praticas 26Para uma interpreiio de Burke como de certa forma urn radical ver Conor Cruise 0 Brien Introduction to Reflections on the Revolution in France Hannondsworth Penguin 1968 27Burke Reflections p 1256 2625 e 3767 Todas as outras citaoes sao de The Works and Correspondence of Edmund Burke voL 5 London Francis and John Rivington 1852 28Burke Works and Correspondence p 3056 122 Fred Halliday J I No fundo todos estes sao os mesmos FUentemente os autores do direito publico chamavam este agregado de naoes de uma comunidade Eles tinham motivos Virtualmente ele e urn grande Estado possuindo a mesma base de direito geral com alguma diversidade de costumes pro vinciais e estabelecimentos locais Por esta semelhana nas formas de intercurso e no modo de vida nenhum cidadao da Europa podeni estar em completo exmo em qualquer parte dela Nada mais existe alem de uma varia9ao agradavelpara recriar e instruir a mente para enriquecer a imagina9ao e melhorar o coraao Daf segue que a amea9a representada pela Revolu9ao France sa reside nao somente nas polfticas especfficas que ela possa perse guir mas no proprio fato dela ser uma revolu9ao Por seu exemplo ela desafia toda a ordem sobre a qual reside a sociedade britanica Nas palavras de Burke a Revolu9ao Francesa constitui uma fac 9ao que simplesmente por continuar a existir minara os outros Es tados na Europa nos quais outras fac96es comparaveis existem ou podem vir a existir como tal a Fran9a revolucionaria e urn tipo de perigo bastante distinto do que antes existia Burke escreve Uma destruiao certa paira sabre estes prfncipes apaixonados que no conflito com este poder novo e jamais vista agem como se estivessem engajados em uma guerra que tern uma semelhana com disputas passa das Sempre fui da opiniao que esta desordem nao era em sua natureza intermitente Concebi que esta disputa uma vez iniciada nao poderia repetirse e deveria ser encerrada por nossa pr6pria prudencia nossa pri meira briga com este mal seria tambem a nossa ultima Nunca penseique poderfamos estar em paz com o sistema nao era por causa de urn objeto que a rivalidade continuava estavamos em guerra como pr6prio sistema Como compreendi o problema nao estavamos em guerra com a sua con duta mas com a sua existencia estavamos convencidos de que a sua existencia e a sua hostilidade eram a mesmil coisa29 Nesta frase final a essencia da teoria da homogeneidade e re sumida a Fran9a revolucionaria era urn perigo mortal somente pelo fato de existir A estabilidade das outras sociedades na Europa de pendia de que a Fran9a fosse como elas Sem homogeneidade nao poderia haver paz interna ou intemacional Para Burke a Revolu9ao Francesa representava uma amea9a tao grande nao somente por causa do desafio que colocava para a semelhan 9a e a similitude termos por ele utilizados para definir a homoge neidade dos pafses do ancien regime mas tambem para o que ele cha mava de vizinhan9a Existe uma lei de vizinhanfa que nao perrnite que urn homem seja o senhor perfeito de seu proprio domfnio Quando urn 291bid p320I Repensando as rela6es intemacionais 123 vizinho ve a sua porta uma nova construriio uma perturbaao ele tern o direito de representaao frente ao juiz que por sua parte tern o direito de ordenar a paralisaao do trabalho ou se construido a sua remoao Nenhuma inovariio e permitida que possa resultar mesmo secundariamente em prejuizo de urn vizinho Burke entao aplica isso a arena intemacional Este princfpio que como o resto 6 verdadeiro para as nacoes e os homens conferiu aos maiores arredores da Europa urn dever de saber e urn direito de prevenir qualquer inovasao capital que possa resultar na construcao de uma perigosa perturbasao A vizinhansa da Europa olio tinha somen te urn direito mas uma tarefa indispensavel e urn interesse exigente de denunciar este novo trabalho antes que ele produzisse o perigo que sen timos agora com dor e que sentirfamos por muito tempo Ele viola os direitos sobre os quais riao somente a comunidade da Franca mas todas as comunidades sao fundadas Os princfpios que as sustentam sao gerais e sao tlio verdadeiros na Inglaterra como em qualquer outro pais30 Destes princfpios segue uma teoria de segurana polftica e social eo programa de intervenao contrarevoluciomiria pelo qual Burke e me thor conhecido Uma vez que os princfpios da homogeneidade e da vizi nhana sao aceitos segue entao que nenhum pafs ou Estado pode de fender seus interesses ou seu modo de vida por si mesmo Refletindo sobre a GraBretanha no final do seculo XVIIT Burke discute que em bora ela parea forte intemamente a Revoluao Francesa s6 por seu exemplo ja constitui uma ameaa Se nao olharmos para nada alem de nossa condicao domestica o Estado da naclio 6 mesmo cheio de abundftncia mas se imaginarmos que este pais pode longamente preservar seu sangue e sua comida separado da comunidade humana tal opinilio nao merece refutaclio como absurda mas piedade como insana 31 Burke defende de fato uma guerra preventiva contra a Frana re volucionaria para eliminala antes que engula o resto da Europa A es cola da humanidade e 0 exemplo e eles nao vao aprender em nenhuma outra Esta guerra e uma guerra contra aquele exemplo 32 Em Let ter II Burke discute que apesar de alguns perceberem o conflito com a Frana como uma guerra externa encorajados pelos pr6prios ja cobinos eles estao enganados Na verdade ela e uma guerra civil 301bid p 3079 311bid p 259 321bid p 313 124 Fred Halliday E uma guerra entre os partidarios da antiga ordem civil morale politica da Europa contra uma seita de ateus fanaticos e ambiciosos que buscam mudar tudo Nao e a Franca estendendo urn imperio externo sobre as outras naoes e uma seita objetivando urn imprio universal comean do com a conquista da Fransa 33 A analise de Burke das conseqliencias internacionais da Revo luao Francesa e das respostas adequadas normalmente tern sido lida a luz de sua teoria da intervenao OU mais amplamente a partir de suas visoes sabre as formas de mudanas apropriadas e inapropria das dentro da sociedade Contudo presente etn suas Letters estao OS elementOS de OUtra teoria pertinente a toda discussao das rela oes internacionais Burke esta argumentando que as relaoes entre os Estados residem nao sabre a conduta de polftica extema em seu sentido mais estreito mas principalmente na convergencia e na si militude de seus arranjos domesticos ou em outras palavras sobre a prevalencia de uma sociedade intemacional homogenea A con clusao alcanada e que para a manutenao da paz em uma ordem internacional qualquer e preciso que ela desenvolva normas de com portamento interestatal e tambem produza uma comunidade de Es tados com constituioes internas bastante similares Poucos te6ricos poderiam ter urn ponto de partida e conclusoes mais diversas de Burke do que Karl Marx que duas geraoes de pais produziu uma teoria alternativa das implicaoes da Revoluao Francesa e do que constituia a coesao social e poHtica Se Burke opunhase a Revoluao Francesa Marx a considerou como o como de urn processo de emancipaao humana global se Burke invocou a tradiao e o costume Marx os denunciou como ideologia e invo cou a razao se Burke percebia as ideias como constitutivas da soci edade Marx percebia o processo produtivo em suas formas materi al e social como a sua base Contudo alem ou dentro destas enormes diferenas existem tres pontos de convergencia de particular relevancia para esta discus sao Primeiro ambos dao importancia em sua analise da sociedade ao que hoje definiriamos como ideologia isto e urn conjunto de valo res sabre o que e desejavel nas relaoes sociais e poHticas ate onde e possfvel mudalas e quais poderiam ser os agentes apropriados de mudana e estabilidade Burke nao deriva seu conceito de ideologia das rela5es socioeconomicas como o faz Marx mas ele percebe que elas sao proximamente ligadas aos interesses dos que detem o poder dentro da sociedade a monarquia a aristocracia e a igreja e a acei taao pela massa da populaao de que estes valores constitufam uma importante forma de poder politico e social a teoria de Burke era pro 33Ibid p322 Repensando as relac6es intemacionais 125 WPt3 tomarxista ou mais precisamente protogramsciana fomecendo um conceito de hegemonia sem o conceito de dominaao Segundo a crena na importancia da ideologia dentro de qual quer sociedade produziu uma perspectiva intemacional compartilha da Burke e Marx perceberam a estabilidade e o desenvolvimento das sociedades individuais e dos Estados como sendo detenninadas pe los processos intemacionais Isto os levou a sua terceira posiao co mum de que as revoluoes sao eventos internacionais em suas cau sas e conseqtiencias e que impoem necessidades eticas As conclu soes normativas das duas teorias mostram um atraente contraponto para Burke a obrigaao era intrvir para esmagar a revoluao antes que ela se consolidasse e se disseminasse para Marx a obrigaao era agir para apoiala sustentando a continuidade dos processos intema cionais por elas libertados A tarefa de intervir era comum para am bos mas alcanada a partir de pontos de vista totalmente opostos A maioria das analises dos escritos de Marx trata suas ideias sabre questoes polfticas especfficas como derivadas de sua teoria geral e tais deriva5es sao sem duvida validas mas em muitos casas ao inves de colocar alguma derivaao de urn tipo vertical pode ser igualmente per tinente olhar para a influencia de outros pensadores e para o clima inte lectual da epoca 0 que se pode denominar de influencias horizontais No caso das visoes de Marx sabre o nacionalismo isto pode ser bastan te recomendavel a ideia de Marx pode ser bemexplicada pelo que ou tros como John Stuart Mill estavam falando como por suas teorias de valor excedente e de desenvolvimento capitalista34 Uma ligaao se melhante horizontal pode ser feita com relaao a suas visoes sabre a sociedade intemacional como fica evidente ao se examinar urn de seus precursores na tradiao socialista SaintSimon SaintSimon acreditava que a sociedade europeia estava se tomando cada vez mais homogenea e na verdade nenhuma grande mudana era possfvel em um s6 pafs De forma alguma a Frana possui uma vida moral s6 sua Ela e somente um membro da sociedade europeia e existe uma pro ximidade forada entre os seus princfpios polfticos e os de seus vizinhos Invertendo Burke SaintSimon defende que o resto da Europa deveria con formarse as mudanas pelas quais a Frana estava passando A naao francesa nao pode ser tratada e curada em isolamento os remedios que podem curala precisam ser aplicados par toda a Europa Esta solidarie dade nasce em parte da necessidade moral de que eles renunciem a guer ra mas tern uma raiz mais profunda no continuo processo de industriali zaao que sujeita estas sociedades a urn destino comum e produz urn conjunto novo e compartilhado de interesses na paz No fim argu 34Sobre estasimilaridade entre Marx e os outros contemporllneos ver meu Bringing the economic back in The case of nationalism Economy and Society v21 n4 November 1992 126 Fred Halliday menta SaintSimon a sociedade industrial alem de criar a homoge neidade tambem cria um interesse intemacional na paz A homoge neizaao e portanto tanto um procsso objetivo como urn prop6sito etico e politico 35 A visao de uma sociedade intemacional e afirmada com maior clareza no Manifesto Comunista no qual Marx apresenta a forma pela qual o modo capitalista de produao com a burguesia como agente transforma todas as sociedades por todo o mundo Tanto quanta qualquer pensador liberal de sua epoca Marx acreditava no triunfo inevitavel de um modelo de sociedade sabre os outros e em uma crescente convergencia e homogeneizaao da sociedade En quanta Burke refletindo sobre a comunidade da Europa do secu lo XVIII considerava a homogeneidade da sociedade intemacional como uma realidade estabelecida embora sob a ameaa da Revolu ao Francesa Marx percebia a sociedade intemacional como uma ordem global emergerite sendo criada pela disseminaao do capita lismo na qual as sociedades individuais estavam tomandose cada vez mais parecidas umas com as outras A necessidade de urn mercado em constante expansao para seus produtos persegue a burguesia par toda a face do globo Ela tern que abrigarse por todo o lado fixarse por todo o lado estabelecer conex5es por todo o lado A burguesia pelo nipido aperfeioamento de todos os instrumentos de produ ao pelos imensamente facilitados meios de comunicaao traz todas mes mo a mais barbara das naOes para dentro da civilizaao Os baixos pos das mercadorias sao a pesada artilharia com que derruba todas as muralhas da China com as quais fora a capitular o 6dio intenso e obstinado dos barbaros aos estrangeiros Ela compele todas as na5es sob o risco de extinao a adotar o modo burgues de produao compeleas a introduzir o que chama de Civilizaao em seu meio para que se tornem elas mesmas burguesas Em uma palavra ela cria urn mundo a sua pr6priaimagem36 A primeira vista a concepao de Marx de sociedade intemacional pode parecer ter mais em comum com a conceao transnacional do que com a constitutiva Certamente ele compartilha a visao dos liberais inter nacionalistas como Adam Smith e Richard Cobden cujos herdeiros de direito sao os transnacionalistas dos anos 1970 e 1980 de que o crescen te cantata entre as sociedades produz uma maior integraao e unidade nos neg6cios mundiais Porem o foco da analise de Marx nao reside 35Cioes de SaintSimon e a discussao em Emile Durkheim Socialism and SaintSimon editado por Alvin Gouldner London Routledge Kegan Paul 1959 p 1705 36Manifesto of the Communist Party em Karl Marx The Revolutions of 1848 Political Writings d David Fembach vol 1 Harmondsworth Penguin Books em associaao com New Left Review 1973 p 71 Repensando as rela6es intemacionais 127 somente nos crescentes laos entre sociedades e no problema do trans nacionalismo mas tambem no grau em que atraves do globo as socie dades cada vez mais esHio se conformando umas com as outras Marx reconheceu o processo de homogeneizaao intemacional e a centralida de desci confonnidade intema para as rela5es intemacionais Para Marx a questiio central nas relaoes intemacionais e como esta crescente ho mogeneiza9ao urn resultado da disseminaao do capitalismo afeta nao somente a polftica domestica e intemacional de diferentes paises mas tambem a sua estrutura social Este e o principia que perpassa seu mais importante trabalho de todos 0 Capital que considera uma sociedade a GraBretanha como a exemplificaao do desenvolvimento capitalista como urn todo e procura examinando a sua estrutura e desenvolvimen to colocar urn modelo universal A premissa implfcita no Capital e de que uma sociedade intemacional esta sendo criada pela disseminaao global do capitalismo Para Marx os mecanismos da economia e os pa dr5es de propriedade associados a eles desempenham as mesmas fun 5es que as praticas e os costumes tinham em Burke Existem como discutido no Capitulo 2 fraquezas manifestas na teoria de Marx com implica96es para esta concepao de sociedade intemacional e das relaoes intemacionais como urn todo Primeiro a perspectiva historica fundamental a teleologia sabre a qual esta teo ria sustentavase era falsa o capitalismo enquanto tornado pela irra cionalidade a desigualdade e as revoltas cfclicas nao estava inevita velmente criando urn conjunto de contradioes que entao iria des truilo Alem disso como ele proprio comeou a reconhecer depois o capitalismo nao estava criando urn mundo homogeneo no qual uma economia comparavel aquela dos paises mais desenvolvidos seria reproduzida atraves do globoY 0 capitalismo estava unificando o mundo e criando seu proprio sistema mundial mas isto era na base de multiplas desigualdades e hierarquias e nao da homogeneizaao como ele supunha com livre despreocupaao no Manifesto Marx tambem estava enganado a respeito das implica5es polf ticas e intemacionais desta homogeneizaao Pais Ionge de levar a criaao de uma unica burguesia pelo mundo ou a cooperaao entre as burguesias para urn beneficio economico mutua esta crescente unificaao do mundo e a homogeneizaao de sociedade foi acompa nhada por crescentes antagonismos entre as burguesias de diferentes paises Poi legada a geraao teorica que o sucedeu Karl Kautsky Rudolf Hilferding Rosa Luxemburgo VI Lenin e Nikolai B ukharin a tarefa de produzir dentro de uma estrutura marxista uma teoria de como o capitalismo em urn mundo que se unifica tambem criou 37Sobre o foco em mudana no trabalho de Marx ver Teodor Shanin ed Late Marx and the Russian Road London Routledge 1983 128 Fred Halliday urn desenvolvimento desigual que levou as classes dominantes dos paises mais avanados a se enfrentar na guerra Na verdade este era o contexto no qual o debate marxista sabre o imperialismo ocorreu nas duas primeiras decadas deste seculo Depois isto seria formaliza do como a teoria do desenvolvimento combinado e desigual 38 Contudo se Marx estava enganado em seu entendimento da concepao inerente ao desenvolvimento hist6rico e do grau em que a homogeneiza9ao ou a harmonizaao ocorreram de fato ele estava certo em identificar a dissemina9iio do capitalismo e o seu impacto sabre as economias os sistemas politicos e as culturas de todos os paises 0 reexame de onde ele estava certo e onde estava errado ficou muito mais facil pouco mais de urn seculo depois de sua morte como fim nao somente do grande interludio da homogeneizaao capitalista representada pelo colonialismo mas tambem pela no fi nal das contas infrutifera tentativa de seus seguidores de buscar urn caminho de desenvolvimento alternativo e heterogeneo 0 capita lismo derrubou as muralhas da China nao somente dos imperios e das sociedades precapitalistas mas tambem daqueles que quiseram erigir urn bloco p6scapitalista Como veremos nos Capitulos 7 9 este nada mais e do que urn exemplo dos mecanismos da socie dade intemacional Poderia parecer inapropriado incluir nesta discussao uma conside raao do trabalho de Francis Fukuyama o cientista politico americana cujo ensaio 0 fun da historia e depois o livro 0 Fim da Hist6ria e o Ultimo Homem flzeram dele uma das mais controversas flguras intelec tuais do inicio dos anos1990 39 Fukuyama tern sido desconsiderado por muitos comentadores academicos e na verdade ha muito em seu traba lho que e questionavel ou impreciso Entretanto como sera discutido em maior extensao no Capitulo 9 seu trabalho eo momenta no qual ele apareceu colocam urn importante conjunto de quest5es Tal conjunto permite nao somente analisar o fim da Guerra Fria mas tambem o curso das rela5es intemacionais nem que seja so por causa de sua idiossincra tica mas reveladora invocaao de vanos pensadores classicos mais es pecificamente Kant Hegel e Nietzsche para restabelecer uma conexao entre os debates contemporaneos e a tradiao do pensamento politico Fukuyama propoese examinar se e possivel escrever no sen tido kantiano uma historia universal de urn ponto de vista cosmo polita Sua resposta e sim que e possivel que a historia tern uma 38Ver Tom Kemp Imperialism London Dennis Dobson 1967 e Bill Warren Imperialism Pioneer of Capitalism London Verso 1980 Michael LOwi The Politics of Combined and Uneven DevelopmentLondon Verso 1981 39Francis Fukuyama The end of history The National Enquirer Summer 1989 e The End of History and the Last Man London Hamish Hamilton 1992 Repensando as rela6es intemacionais 129 direcao Esta direcao e determinada por dais processos a dinamica da ciencia modema eo avanco em direcao a democracia liberal Ele percebe a dinamica da ciencia modema como urn processo inces sante que determina como e por que o desenvolvimento economico e social ocorre e evolui e explica porque cada vez mais este proces so produz sociedades similares 0 primeiro fator identificado por Fukuyama e o impacto da com peticao militar que ele argumenta encoraja a racionalizacao das socie dades e a formacao de estruturas sociais uniformes uma consideracao muito mais pontual do que uma baseada somente no benigno transnaci onalismo naoestatal Fukuyama fomece muitos exemplos de modemi zacao defensiva forcando os pafses a se conformar terminando com a Russia no final dos anos 1980 A ciencia natural moderna impoese ao homem quer ele se importe com isso ou niio a maioria das naaes niio tern a opiio de rejeitar o racionalismo tecnol6gicO da modernidade se quiser preservar a sua autonomia nacio nal Vemos aqui uma demonstraiio da verdade da observaiio de Kant de que a mudana hist6rica acontece como urn resultado da sociabilidade asocial do homem e o conflito ao inves da cooperaiio que primeiro induz o homem a viver em sociedades e entiio desenvolver o potencial destas sociedades mais completamente40 0 segundo fator que leva a crescente convergencia das socie dades atraves da ciencia e 0 desenvolvimento economico e as ne cessidades que cria para a organizacao do trabalho do Estado e da educacao Todos os pafses passando por uma modernizaiio econ6mica devem crescentemente assemelharse eles precisam unificarse nacionalmente com base em urn Estado centralizado urbanizarse substituir formas tra dicionais de organizaiio social como a tribo as seitas e a familia por formas economicamente racionais baseadas na funcionalidade e na efici encia e fornecer educaiio universal para seus cidadiios Tais sociedades tornaramse cada vez mais ligadas umas com as outras atraves dos mer carlos globais e da expansiio de uma cultura de consumidor universal41 Fukuyama nao considera que este imperativo cientfficodesenvol vimentista necessariamente traga a democracia e a sua grande adver tencia hist6rica e que uma sociedade autoritaria pode ter sucesso em termos economicos como por exemplo no leste asiatica Contudo ele afirma que em alguns aspectos como na liberdade de informacao e na 4Fukuyama End of History p 76 411bid p xivxv 130 Fred Halliday tomada de decisao a democracia liberal contribui para tal desenvolvi mento Ele tambem discute em terreno bastante distinto que a demo cracia liberal apesar de todos os seus fracassos e melhor do que qual quer outro sistema para atender o que ele percebe como as mais funda mentais das necessidades humanas o reconhecimento e o respeito A combinacao destas duas necessidades eventual mas que se reforca fomece a base para duas de suas afirmac6es mais abrangentes primei ro que uma hist6ria universal pode ser escrita repleta com teleologia e segundo ja que uma resposta para os principais problemas do desen volvimento humano foi encontrada na teoria e em alguma medida implementada na pratica pelos Estados mais fortes e influentes do mun do a hist6ria no sentido de urn conflito entre modelos globais acabou Existem duas importantes implicac5es da teoria de Fukuyama para esta discussao de sociedade internacional ambas sao em al guma medida trabalhadas ao Iongo de seu livro A primeira e que como urn resultado dos processos que ele identifica do conflito e da rivalidade dos Estados os pafses sao cada vez mais forcados a se conformar a produzir a semelhanca identificada por Burke Fukuya ma nao atribui a ideologia ao costume ou a pratica a importancia dada por Burke mas percebe a cultura como uma importante parte da modemidade para a qual todas as sociedades sao forcadas a se dirigir Alem disso a cultura e urn dos mecanismos atraves dos quais as so ciedades sao forcadas por outras a se conformar a sua analise do fim da Guerra Fria baseada na transmissao para uma populacao educada dentro dos pafses comunistas de uma imagem de urn mais bemsuce dido mundo ocidental faz uso considera vel de fa totes ideol6gicos Segundo Fukuyama trabalhando o argumento de Michael Doyle e outros desenvolve a tese de que a democracia liberal significara o tun do conflito interestatal como o conhecemos por raz5es significativas ja que as democracias liberais nao vao a guerra umas com as outras a dis seminacao da democracia liberal reduz a probabilidade do conflito e da rivalidade militar entre os Estados desenvolvidos e progressivamente confina a guerra as relac6es com ou entre OS Estados naodemocrati cos42 A medida que a democracia liberal se difunde tambem se reduz o domfnio da guerra No fmal das contas o tim da hist6ria significara o fim das relac5es intemacionais como ate aqui as conhecemos A criacao pela primeira vez de uma sociedade intemacional significa que a visao de Kant de paz universal sera realizada Marx encontraria uma vinganca perver sa nao atraves da criacao de uma sociedade comunista em escala mun dial mas atraves da completa realizacao urn seculo e meio depois da publicacao do Manifesto de urn mundo criado a imagem capitalista A 42Michael Doyle Liberalism and world politics American Political Science Review v80 n4 December 1986 p 11569 Repensando as rela6es internacionais 13 1 Revoluao Bolchevique desafiou o mundo capitalista ameaado pela extinao43 no fim ela foi extinta As disputas levantadas pela teoria de Fukuyama sao muitas e tocam em quest5es distantes da amilise da sociedade internacional Tres em particular merecem atenao cdtica a representaaO a de mocracia e o desenvolvimento Voltarei a elas no capitulo final no contexto de uma consideraao geral de seu trabalho Aqui basta dizer que s dificuldaes com a ua toria assim como com a sua pers pectlva geral dtzem respetto dtretamente a questao da sociedade iternacional e aos proprios significados de sociedade que sao vtstos como funcionando no nivel internacional AS IMPLICACOES PARA AS RELACOES INTERNACIONAIS Em resumo estes sao os elementos do que pode ser identificado como o terceiro modelo de sociedade internacional o constitutivo Como qual quer mdana teoric a sua inoduao e dirigida nao tanto para negar a coerencta e o potenctal exphcativo dos outros dois conceitos embora te os identificado algumas dificuldades neles mas para apon uma outra terptaao q pode em seu proprio contexto sugerir urn programa de mvestigao adtctalPeber a soci intemacional como os processos representados pel 1de1a de omgenete pode ajudarnos a olhar para as areas das relaoes mtemactonats que ate agora tern sido subreconheci que por meio de recentes desenvolvimentos sejam eles teoricos ou histoncos foram colocadas em uma nova perspectiva Em primeiro Iugar qualquer abordagem baseada no conceito de homgenidade con vida a uma his tori a alternativa das rela5es in ternacwnats e do desenvolvtmento das sociedades individuais Para a us a ud9a e evident que antes podia ser percebido como htstonas nacwnats tsoladas e dtstlntas agora aparece muito mais cla rament omo o resultad de processos internacionais de imitaao de compettao e de moderntzaao defensiva e de influencia Como o tra balho dos ociologs historicos sobre o Estado discutido no Capitulo 3 Otto Hmtze Mtchael Mann mostrou atraves da historia o cres ctmento das institui5es administrativas e coercitivas tern sido influ encado pel cpeiao co outros Estados Esta perspectiva da scctologta htstonca mteacwnal pode ser empregada para explicar nao somente o desenvolvtmento economico mas tambem a mudan a politia ocial e onmia deno dos pafses As implica5es para as relaoes tnternacwnats sao muttas Se perguntarmos como o in 43Manifesto p 71 132 Fred Halliday ternacional importa e por extensao quais SaO OS processos interna cionais que merecem maior atensao entao este processo de imitaao homogeneizaao e resistencia a ele se torna central 0 conflito entre os Estados e a atividade diplomatica ortodoxa nao sao exclufdos mas formam parte de urn padrao mais amplo de interasao internacional Urn fenomeno que esta abordagem conceitual ajuda a identificar e explicar e urn que pode ser chamado em retrospecto de pathos da fuga semiperiferica Por isto querse dizer a tentativa ao Iongo do ultimo se culo de vanos pafses que nao estavam na linha de frente do desenvolvi mento capitalista ocidental de escolher as vias de desenvolvimento que desafiaram o modelo de organizasao polftica e economica estabelecido Em Uiil sentido estes eram exemplos do alcanar gerschenkro niano mas 0 que e pertinente aqui e como no fim eles tiveram de abandonar os meios excepcionais de tentar fazelo 0 que e marcante nestas tentativas e que enquanto bemsucedidas por algumas deca das elas no final das contas foram destrufdas pelas press5es interna cionais da guerra da competisao naomilitar ou da influencia cultural ideologica Os mais obvios exemplos disso sao os Estados comunis tas que por urn razmivel perfodo de tempo de Outubro de 1917 a Agosto de 1991 para ser preciso buscaram mapear tal caminho alter nativo Destes o mais significativo foi a URSS que embora extrema mente antibeligerante pelos padr5es da maioria dos Estados moder nos envolveuse apesar disso em conflitos militares prolongados com os grandes poderes capitalistas rivais ela venceu seu primeiro grande desafio o do autoritarismo capitalista na Alemanha mas sucumbiu frente ao segundo o do capitalismo liberal no periodo pos1945 0 pathos da fuga semiperiferica entretanto nao se aplica somente aos regimes de esquerda Na direita varios pafses especificamente a Alemanha a ltalia e o Japao buscaram seu proprio caminho alterna tivo nos anos 1920 e 1930 somente para serem colocados na linha pelo mais firme de todos os instrumentos de homogeneizaao a der rota JUilitar e a ocupaao 0 que a Segunda Guerra Mundial trouxe para estes tres pafses a atrasao do mercado e as press5es da classe media para a modernizaaO cultural e polftica tambem trouxe para OS menores e menos beligerantes Estados europeus de direita Espanha Portugal e lrlanda44 Cada urn deles adotou regimes conservadores 44Pareceria a primeira vista injusto incluir a lrlanda nesta categoria ja que em oposilio aos pafses fascistas ela permitiu o pluralismo politico e uma medida de liberdade constitu cional desde a independencia em 1922 Em alguns aspectos entretanto particularmente sob os governos de Fianna Fail de 1930 e 1940 ela esteve envolvida em uma verslio branda de fuga semiperiferica a represslio ideol6gica atraves da censura e do controle clerical da educalio de desligamento econ6mico atraves da substituilio de importalio e de controles comerciais tudo isto tambem coberto pela linguagem nacionalista sobre o excepcionalismo hibemiano na economia e aos olhos de Deus Repensando as rela6es intemacionais 133 depois das guerras civis no periodo entreguerras que criteriosamente prolongaram a sua existencia ficando de fora do conflito global dos anos 1940 Embora a sua exclusao estrategica atrasasse a sua homo geneizacao a partir do final dos anos 1950 eles comecaram a experi mentar as atraoes do Mercado Comum e estavam no final da deca da de 1970 integrados na CEE e apropriadamente homogeneizados45 0 mesmo se aplica com alguma variaao a Grecia Mesmo os EUA eo Reino Unido sem duvida os casos mais puros de desenvolvimento capitalista nao escaparam de intrusoes abruptas externamente alimentadas os EUA tentaram ate 1860 manter o caso mais extrema de oligarquia capitalista o sui escravo crata enquanto o Reino Unido atrasou a extensao do sufragio a classe trabalhadora e as mulheres ate ser forado pela Primeira Guerra Mundial Perceber como os fatores externos em particular a pres sao para conformarse contribufram para estes resultados nao sig nifica negar a impordincia de fatores end6genos e especfficos Este entendimento da sociedade internacional como homoge nea tern consideraveis implica5es para a questao discutida nos Ca pftulos 79 a analise da Guerra Fria e do seu fim primeiro na explica cao que sugere sobre como e por que o sistema sovietico entrou em colapso urn caso unico de urn bloco hegemonico desaparecendo na ausencia de uma guerra interestatal e segundo nasimplicaoes que levanta para o padrao das relacoes internacionais no p6sGuerra Fria Qualquer teoria de relaoes internacionais que se sustente pode presumivelmente elaborar uma explicacao de por que a Guerra Fria ter minou 0 carater particular do co lap so sovietico entretanto sugere que alguns mecanismos de pressao internacional separados tanto do confli to interestatal como da interacao economica transnacional estavam agin do que em outras palavras os mecanismos de homogeneidade no fim cobraram seus direitos Urn exemplo adicional disto aparece na ret6rica da campanha eleitoral americana em 1992 Enquanto na era da Guerra Fria a principal dimensao e leitmotif da competicao inter nacional como retletido nos discursos eleitorais era a rivalidade militar com a URSS em 1992 ela havia mudado para a arena da competicao economica como Japao e a Comunidade Europeia As soluoes oferecidas por Bush e mais ainda por Clinton residiam explicitamente em comparacoes internacionais sobre a educaao os gastos sociais a polftica de investimentos e os nfveis salariais Os 45Para uma breve analise do caso portugus ver meu Whatever happened to the Portuguese Revolution New Statesman 15 April 1992 A discussiio aqui ever sea Revoluiio Portuguesa de 19745 tendo sido trafda ou perdida desligouse das inten6es da maioria daqueles que a organizaram e a apoiaram que era precisamente cumprir a agenda incompleta da revoluiio constitucionalliberal de 1910 integrar como resto da Europa e liberarse do onus anacronico das colonias africanas 134 Fred Halliday dois principais candidatos defenderam que somente se tornando mais parecidos com os seus competidores os Estados Unidos poderiam manter ou recuperar a sua posicao internacional46 Para o futuro se a suposiao de que as democracias liberais nao vao a guerra sustentarse e se este sistema polftico prevalecer em uma significativa parte do mundo mais especificamente estabelecerse e manterse na Russia eritao o estabelecimento de uma sociedade inter nacional no sentido mais forte mais homogeneo da palavra signifi cara que uma nova era nas relacoes internacionais comecou 0 fim da hist6ria se traduziria no fim das relaoes internacionais como ate aqui entendidas Estas consideracoes analfticas e hist6ricas deixam sem solu cao a questao te6rica de como a homogeneizacao funciona E pre ciso ainda especificar uma terceira dimensao dos relacionamentos internacionais interligados com mas separados dos dais nfveis identificados pelas outras concepoes de sociedade internacional a interestatal e a transnacional Isto seria legitimamente chamado de socializacao mas indicaria nao a socializaao de que fala o realismo ou seja de fazer com que os outros Estados soberanos aceitem certas normas em seu comportamento internacional mas sim a reproducao dentro das sociedades de normas estabelecidas em outro Iugar do sistema47 Esta terceira dimensao aquela da in fluencia social poHtica e ideo16gica e da homogeneizacao pode em urn dado momenta estar subordinada as outras duas mas pode em outros prevalecer sabre elas 0 mfnimo que se pode dizer e que independentemente de qual for a estrutura seja a evolucao do sistema ao Iongo dos ultimos cinco seculos e o papel dentro dela da evoluao do capitalismo ou o destino dos pafses semiperiferi cos no seculo XX a relevancia deste processo de homogeneiza cao parece ser consideravel 0 fim da hist6ria pode significar o fim das relacoes internacionais como polftica de poder Tambem pode ser o pressagio do comeco das relacoes internacionais como uma interpretacao te6rica abrangente e adequada das multiplas dimen soes da sociedade internacional 46Tais compara6es eram muito menos evidentes no ambiente politico mais reservado do Reino Unido onde os apelos nacionalistas sobre a especificidade britaruca especialmente em questiies de reforma constitucional dominavam a agenda Uma exceiio marcante foi a manchete de primeira pagina sobre os baixos padroes educacionais na lnglaterra Bottom of the Class Only Brazil Mozambique and the old Soviet Union have WORSE schools The Daily Mirror 13 March 1992 47Para uma tentativa de teorizarprecisamente tal processo ver G John Ikenberry e Charles A Kupchan Socialization and hegemonic power International Organization v44 n3 Summer1990 p 283315 Repensando as rrla6es internncionais 1 3 5 Capitulo s 1 SEXTA GRANDE POTENCii AS REVOWOES E 0 SISTEMA INTERNACIONAL UM CASO DE DESATENAo MUTUA A disciplina das relaes intemacionais tern uma relaao descon fortavel com a revoluao A afmnaao de Hannah Arendt de que o secu lo XX tern sido moldado pelas guerras e as revoluOes e freqUentemente citada mas e surpreendente como dentro da pesquisa institucionaliza da e do ensino das relaes intemacionais estes dois processos histori camente formativos recebem tratamento diferencial Sao muitos os cur sos as revistas e os departamentos sobre a guerra 0 estudo da guerra em sua8 dimenses hist6ricas estrategicas eticas e pollticas e central para o estudo academico das RI Em oposiao as revolues tiveram uma existencia marginal Livros e explicaOes te6ricas lhe devotam pouco espao Nao existe nenhuma revista especializada na questaoAlgum dia ainda iremos encontrar o professor de Estudos Revolucionarios Oliver Cromwell nao ha convites para palestras no Instituto Intemacional Tho mas Paine para o Estudo Coparado da Mudana Revolucionana Nao existe uma raziio unica para esta marginalao V arios fatores dentro da tradiao intelectual e do contexto institucional das RI convergi ralll para produzir esta situaao As pr6prias RI coaram como um es tudo da guerra e das causas da guerra e permanecem guiadas como os documentos para a prevenao da guerra na Carta da ONU pela crena de que a guerra entre os Estados deve ser percebida como uma agressao raci onalmente decidida e nao a intemacionalizaao do conflito social 0 desenvolvimento te6rico posterior das RI tern confmnado isto de muitas maneiras Na incorporaao da ciencia polltica americana e Repensando as rela6es intemacionais 13 7 britanica as RI existe urn adicional desprezo e desatencao com as re volucoes percebidas como quebras dos processes regulars a soci edade nacional e internaciona1 Com a ascensao do behav10nsmo o conceito de revolucao junto com aquele de Estado foi dissolvido em tim espectro de violencia e de guerra interna que nega a sua especificidade anaHtica e historical 0 neorealismo em sua versao waltziana classificando todas as referencias a processes internes e transnacionais como reducionista tern por sua vez impedido a consideracao da interacao entre a mudanca internacional e a interna 2 Outros fatores podem ser levantados no contexte mais geral das ciencias sociais 0 estudo da revolucao nao se sente em casa em qual quer das ciencias sociais embora tenha recebido mais atenao dentro da sociologia e da hist6ria Nestas disciplinas entretanto ex1stem poucas referencias as dimens6es intemacionais do fenomeno A maioria dos tra balhos sociol6gicos ate States and Social Revolutions de Skocpol tra tou as revolucoes como se elas tivessem acontecido dentro de entidades polfticonacionais distintas 3 Outra importante contribuicao recente aoestudo comparado e te6rico das revolucoes o trabalho de Jack Goldstone e associados chamou a atencao para certos fatores inter nacionais que levam ao enfraquecimento dos Estados especialmente as pressoes econ6micofiscais e as polfticas de alianca desestabili zadoras entretanto foilhes atribuido urn Iugar secundario no que ainda permanece predominantemente como a analise de entidades nacionais e pollticas autonomas A mais importante dimensao com parativa do trabalho de Goldstone aquela da pressao demografica ver Harry Eckstein Internal War New York Free Press 1964 e James Rosenau Internal War as an International Event em Rosenau ed nota 9 2Este e urn princfpio m1cleo do realismo e do neorealimo a despeito de concessoes de muitos realistas de que a exclusao dos fatores internos e simplesmente uma convenien cia analftica 0 argumento de Waltz e claramente expresso em Theory of International Politics Capitulo 4 Discuti esta suposicao e as mudancas no argumento envolvidas no Capitulo 1 Sao varios os exemplos da supressao convencional das dimensoes inteTaci onais da revolucao dentro dasRI Por exemplo Jack Plano e Roy Olton The Internatzonal Relations Dictionary 4ed Santa Barbara Longman 1988 nao tern nenhuma discus sao da interrelacao geral entre os dois assuntos um item naoindexado sobre a revo lucao e a guerra discute somente aspectos internos A literatura das RI esta repleta de discussoes de alianca mesmo assim raramente e deixado claro que a muitas aliancas tern como seu prop6sito original a supressao da revolucao dentro dos Estados membros e b que uma das razoes principais para o colapso ou o tim das aliancas e que revolu coes ocorrem dentro de alguns dos membros os destinos da OTASE CENTO e o Pacto de Vars6via deveriam deixar este ultimo ponto suficientemente evidente vftimas res pectivamente dos levantes vietnamita iraniano e leste europeu De fato a CENTO foi vftima da revolucao por duas vezes sua forma inicial o Pacto de Bagda teve que ser abandonado em favor do CENTO depois da Revolucao Iraquiana de 1958 3Ver por exemplo uma visao da literatura sociol6gica em Stan Taylor Social Science and Revolutions London Macmillan 1984 13 8 Fred Halliday J possui uma origem incerta no internacional e como ele mesmo in dica os fatores internacionais tern impactos ambfguos sob os Esta dos com potencial para fortalecelos e enfraquecelos 4 Dentro das abordagens teoricas das RI o realismo discute as re volucoes mas elas sao normalmente invocadas nao como objetos de estudo em si mesmas mas para provar as pressoes da conformidade e da socializacao que os constrangimentos do sistema impoem mes mo sobre o mais diferente e revisionista dos Estados Nenhum livro realista e complete sem a afirmacao de validade dubia de que os Bolcheviques haviam se enquadrado no sistema em 1922 A licao ti rada e que mesmo as revolucoes nao podem escapar do sistema5 A discussao mais extensa das revolucoes em uma perspectiva realista e a de David Armstrong em Revolution and World Order The Revolutionary State in International Society Armstrong afastase de alguma forma da concepcao convencional de sociedade intemacio nal de WightBull primeiro pela inclusao nas normas das questoes societarias relacionadas a constituicao interna dos Estados como a escravidao ou a conduta democratica e segundo pela aceitacao de que mesmo quando sao socializados os Estados revolucionarios podem forcar os poderes do status quo a revisar as normas de relaci onamento estatal como demonstra o sucesso da Uniao Sovietica em levar ao estabelecimento da Organizacao Internacional do Trabalho nos anos 20 e o fim do colonialismo depois da Segunda Guerra mun dial6 Entretanto mesmo que isto rompa os canones realistas pela acei tacao da importancia das estruturas polfticas e sociais internas na melhor das hip6teses este e urn ajuste parcial por urn lado evita a questao de investigar o que intemamente constitui a norma do Esta do no mfnimo as suas relacoes de propriedade por outro negligen Jack Goldstone Ted Robert Gurr e Farrokh Moshiri eds Revolutions of the Late Twentieth Century Boulder and Oxford Westview 1991 p 41 Ver tambem Jack Goldstone Revolution and Rebellion in the Early Modern World Berkeley and Oxford California University Press 1991 Jack Goldstone ed Revolutions Theoretical Comparative and Historical Studies London Harcourt Brace Jovanovitch 1986 Para uma discussao extensa de e por Goldstone ver Contention Debates in Society Culture and Science Winter 1993 n5 particularmente o artigo de John Foran Revolutionising theoryffheorising revolutions que considera Revolution and Rebellion de Goldstone Foran p 73 coloca a intrigante questao de ate que ponto o crescimento demografico pode ser tratado como uma varia vel independente pelo qual ele significa externamente deterrninada e de ate que ponto ele e resultado de diferentes processos nacionais 5 Fred Northedge The International Political System London Faber Faberm 1976 p 2830 Waltz Theory of International Politics p 1278 A despeito da naoconforrnidade em outras questoes James DerDerian chega a conclusoes similares On Diplomacy The Revolutionary State in International Society A Genealogy of Western Estrangement Oxford Basil Blackwell 1989 p 198 6Revolution and World Order Oxford Clarendon Press 1993 p 811 401 758 155 7242330710 Repensando as rela6es internacionais 13 9 cia as operaoes da sociedade internacional no sentido amplo identi ficado no Capitulo 4 e que vao muito alem das aoes de governos Outras tendencias dos anos 1970 e 1980 igualmente dedicam um espao pequeno aos levantes revoluciomirios a economia polftica inter nacional e a interdependencia estao preocupadas com as relaoes dentro do mundo capitalista e principalmente com as suas partes desenvolvidas sem muita necessidade de olhar para os Estados mais pobres e revoluci omirios 0 papel da Guerra do Vietna para provocar a conscientizaao da interdependencia e esquecido Os estudos estrategicos do periodo da Guerra Fria muito distante de suas amarras hist6ricas clausewitzianas examinaram a corrida armamentista LesteOeste em quase completa abs traao das composis socioeconomicas conflitantes dos sistemas sovi etico e americana Pouca atenao foi dada aos conflitos sociais e politicos do Terceiro Mundo que Ionge de constitufrem uma dimensao secunda ria da Guerra Fria eramlhe centrais e catalisadores da propria corrida armamentista7 Em termos de moldar o mundo do p6sguerra a guerra de guerrilha em suas formas revolucionarias e contrarevolucionarias foi pelo menos tao influente como as armas nucleares contudo dificilmente ela figura no currfculo ortodoxo de estudos estrategicos Alem de fatores de clima academico e intelectual outras influ encias que Kuhn educamente chama de institucionais tambem de sempenharam a sua parte com a breve exceao dos anos 1950 e 1960 houve o distanciamento de urn t6pico dificil e controverso 0 custo da maior integraao academica com o mundo real foi uma crescen te concentraao naqueles aspectos da realidade considerados como adequados pelos financiadores nos nfveis corporativo e estatal 8 Apesar disso existem tres aspectos nos quais estes elementos de desatenao mutua nao tern sido absolutos ou nos quais elemen 7Desenvolvi este argumento em meu The Making of the Second Cold War London Verso 1983 Alguns escritores em estudos estrategicos incluindo Alexander Goerge Raymond Garthoff e Michael Mandelbaum discutiram estainterrel mas na maior parte falharam em encontrar lugar suficiente para ela na analise da corrida annamentista p6sguerra e com peticao estrategica Por exemplo Garthoff em Reflections on the Cuban Missile Ctisis Washington Brookings Institution 1987 menciona os temores sovieticos de uma invasao americana em Cuba mas amplamente subestima a importllncia desta preocupruao na decisao sovietica eminentemente racional de colocar misseis na ilha A confirmruao de que isto era uma possibilidade e feita por Pierre Salinger nesta epoca secretario de imprensa de Kennedy ver Kennedy and Cuba the pressure to invade was fierce International Herald Tribune 6 February 1989 Nos estudos academicos britllnicos convencionais da corrida arrnamentista nuclear o impacto das revolucoes do Terceiro Mundo dificilmente merece mencao 8 A cronologia do financiamento e da publicacao de trabalhos americanos sobre as guerras intemas e as suas dimensoes intemacionais conta a sua pr6pria hist6ria urn acumulo de interesse motivado pela preocupacao no despertar da Revolucao Cubana no infcio de 1960 seguido por urn tenso silencio uma vez que as dificuldades da Guerra do Vietna se tomaram evidentes 0 impacto explicito e tacito da Guerra do Vietna sobre o estudo academico das relacoes intemacionais ainda esta por ser analisado 140 Fred Halliday tos de uma interaao das RI com a revoluao podem ser identifica dos Antes de mais nada ha urn corpo de literatura dentro das RI que explicitamente abordou as questoes analfticas e comparativas apresentadas pelas revoluoes os trabalhos de Kissinger Rosecrance Wight Rosenau Kim Calvert eo ja mencionado de Armstrong9 A compensaao e que apesar de sua exfgua quantidade a qualidade e a perspicacia com que estas importantes questoes sao colocadas e normalmente muito boa Mesmo os trabalhos produzidos antes da pesquisa sociol6gica mais recente sobre as revoluoes tern urn alto padrao as questoes que eles colocam passaram no teste do tempo Segundo as revoluoes tern estado presentes dentro das RI de forma disfarada dentro dos t6picos que apresentam pontos de par tida alternativos e nos quais uma releitura e reconstituiao da litera tura existente pode tornala relevante para o estudo desta questao isto e verdadeiro para alguns dos trabalhos de Rosenau sobre as li gaoes transnacionais para a literatura sobre a intervenao suas causas elementos praticos e etica e embora de uma maneira mais abstrata para parte da literatura sobre o terrorismo 10 Terceiro existe alguma literatura em ciencias sociais cognatas que e acessivel e relevante para a construao de uma discussao das RI sobre as revolu5es se isto e verdade em trabalhos hist6ricos que destacam os aspectos internacionais da revoluao Palmer Rude Hobsbawm sobre o seculo XVIII Carr Liebman Deutscher Harding sobre a Revoluao Bolchevique11 o e ainda mais na terceira onda de escritos socio 9Henry Kissinger A World Restored Gloucester MA Peter Smith 1973 Richard Rosecrance Action and Reaction in International Politics Boston Little Brown 1963 Martin Wight Power Politics London Penguin 1966 Capftulo 7 James Rosenau ed International Aspects of Civil Strife Princeton Princeton University Press 1964 Kim Kyongwon Revolutions and International System London University of London Press 1970 e Peter Cal vert Revolution and International Politics London Frances Pinter 1984 10No escrito acadmico sobre as RI a superestimruao do termo terrorismo para cobrir muito mais ac5es do que as do pr6prio terror tern sido urn dos capitulos mais escorregadios da disciplina 0 terrorismo no sentido sensacional em que a palavra vern sendo normalmente usada e uma caracterfstica subaltema das relacoes intemacionais Para uma perspectiva hist6rica e alguma etica ver Walter Lacqueur Terrorism 2ed London Weidenfeld Nicolson 1989 Conor Gearty Terror London Faber Faber 1991 Fred Halliday Terrorism in historical perspective Arab Studies Quarterly v9 n2 Spring 1987 11RR Palmer The world revolution of the West Political Science Quarterly v69 n1 March 1954 RR Palmer The Age of the Democratic Revolution 17601800 2 vols Princeton Princeton University Press 1959 e 1964 George Rude Revolutionary Europe I 7 I 3I 8 I 5 London Fontana 1964 Jacques Godechot La Grande Nation Paris Aubier 1956 Eric Hobsbawm The Age of Revolution Europe 17891948 London Weidenfeld Nicolson 1962 EH Carr The Bolshevik Revolution v3 London Penguin 1973 Marcel Liebman Leninism under Lenin London Merlin press 1973 parte 4 Isaac Deutscher Marxism Wars and Revolution London Verso 1984 e suas biografias de Stalin e Trotsky Neil Harding Lenin S Political Thought v2 London Macmillan 1981 Repensando as rela6es internacionais 141 16gicos sobre a revoluao especialmente os de Skocpol e Goldsto ne concentrando seu interesse no enfraquecimento e no desmoro namento dos Estados eles destacam o papel da competiao interes tatal nas causas das revoluoes e na formaao dos Estados p6sre voluciomirios Da mesma maneira que os escritos de RI sobre o as sunto estes textos sociol6gicos nao sao numerosos e podem como ja notado tender a enfatizar os sistemas nacionais entretanto as suas implica6es anaHticas e te6ricas sao consideniveis 12 A analise do Iugar das revoluoes nas RI parecena englobar tres grandes areas de investigaao A primeira e hist6rica para deter minar o Iugar e a influencia das revoluoes na hist6ria do sistema intemacional e na formaao do ambiente intemacional do seculo XX 0 mfnirno que pode ser dito aqui e que o papel das revoluoes a la Hannah Arendt tern sido sistematicamente subestimado A segunda area de investigaao e descritiva propondo o exame das pr6prias dimens6es intemacionais das revolu6es e deterrninando ate qe ponto podem ser identificadas regularidades no cornportamento politt co A consideraao realista dominante do sistema intemacional supoe ja haver identificado quais sao estas regularidades e as conrtrma por suas afirmaoes entretanto pode haver muito ainda a ser desvendado A terceira e mais fundamental area de investigaao diz respeito a teoria is to e quais sao as questoes te6ricas que 0 estudo das revoluoes coloca para as RI Isto leva a urn exame de ate que ponto cada urn dos paradigrnas estabelecidos pode ou nao lidar com urn reconhecimento adequado da importancia das revolu6es e ate que ponto artrma6es apa rentemente centrais da disciplina precisam ser reexaminadas a luz de tal investigaao Esta sondagem te6rica todavia nos leva alem do domfnio das RI envolve urn processo duplo urn que deve examinar nao somente como as revoluoes afetam as RI mas ate que ponto uma consideraao apropriada do contexto intemacional pode colocar questoes para as ex plicaoes socio16gicas e polfticas estabelecidas sobre a revoluao AS REVOLUOES E OS SEUS EFEITOS 0 uso dos conceitos dentro das RI depende em urn grau nao reconhecido pela disciplina das definioes emprestadas de outras areas A revoluao assim como os conceitos de Estado poder e sis tema nao e uma exceao Como todos os conceitos da ciencia soci al o conceito de revoluao evoluiu ao Iongo do tempo e contem varios significados Na discussao abaixo utilizamos urn sentido do 12Estes pontos sao bern Ievantados por Jack Goldstone Theories of Revolution the third generation World PoliticsAprill980 142 Fred Halliday termo restrito e discriminat6rio definido por Skocpol e outros as revoluoes sociais e polfticas fundamentais Em particular a discus sao se sustenta em tres contribuioes importantes ao estudo das re voluoes que servem para delimitalas como eventos hist6ricos se parados e comparativamente raros mas que Ionge de serem margi nais ou atfpicos para a hist6ria dos Estados e do sistema intemacio nal sao pontos de transiao e de formaao sem os quais o mundo modemo nao seria como e A prime ira destas contribuioes publicada em 1979 e States and Social Revolutions de Theda Skocpol As revoluoes foram identifica das como uma categoria distinta de evento hist6rico com base no grau de transformaao da sociedade e da destruiao do velho Estado As revolucoes sociais sao transformacoes nipidas e basicas do Estado de uma sociedade e de suas estruturas de classe elas sao acompanhadas e em parte realizadas pelas revoltas de classe vindas de baixo As revolu coes sociais sao separadas de outros tipos de conflito e processos transformativos acima de tudo pela combinacao de duas coincidencias a coincidencia da mudanca estrutural societaria com o levante de classe e a coincidencia da transformacao polftica com a social13 Apesar de considerar a mobilizaao de massa e a aspiraao demo cnitica Skocpol priorizou a relaao entre as revoluoes e os Estados ambos buscaram derrubar os Estados existentes e consolidar novos Ao fazelo destacou como a competiao interestatal nos terrenos economi cos militares e politicos serviu para enfraquecer os Estados e preparou o caminho para a revoluao algo evidente nos tres casos que conside ra Frana Russia e China 0 segundo alicerce deste estudo sobre as revoluoes e The Social Origins of Dictatorship and Democracy de JB BarringtonMoore pu blicado em 1967 Moore examinou os caminhos opostos para a indus trializaao e a democracia liberal de vanos importantes Estados e mos trou como estas trajet6rias dependiam consideravelmente dos padr6es de poder agnirio presentes no perfodo preindustrial Contudo o traba lho de BarringtonMoore tambern desenvolveu dois argumentos que con trariaram grande parte do pensamento convencional sobre a revoluao Em oposiao a ideia dominante de urn caminho pacffico naorevolu cionario perseguido pela Inglaterra e os EUA ele apontou para os capf tulos extremamente violentos atraves dos quais estes pafses fizeram a transiao para a modemidade Incluindo nos EUA a primeira guerra industrializada da hist6ria modema 1861 a 1865 por ele considerada uma revoluao Ao mesmo tempo ao analisar os pafses que aparente 13Theda Skocpol States and Social Revolutions Cambridge Cambridge University Press 1979 p 4 Repensando as rela6es intemacionais 143 mente evitaram as transicoes por nao ter revolucoes a Alemanha e o Japao ele mostrou a violencia que acompanhou as suas transicoes com a repressao intema e a agressao extema Em resumo ele argu mentou que nao existia uma escolha entre urn caminho violento e urn naoviolento e que ambos os caminhos o revoluciomirio e o nao revoluciomirio possufam custos humanos As revolucoes eram portanto nao aberracoes a uma alternativa naoviolenta mas uma forma de transicao inevitavelmente violenta para uma sociedade moderna e freqlientemente uma forma que em escala internacio nal foi menos violenta do que a altemativa germanoniponica 0 terceiro componente da concepcao de revolucao social aqui uti lizado eo dissico ainda naotraduzido do escritor alemao Karl Griewank Der Neuzeitliche Revolutions be griff Entstehung und Entwicklung 14 Gri ewank tracou o desenvolvimento do conceito de revoluyao atraves de suas previas fontes astronomicas e constitucionais ate o conceito rna demo que nasceu da Revolucao Francesa 15 Isto Ihe permitiu nao somente identificar diferentes sentidos do termo mas tambem dis cemir mais claramente os componentes do seu uso modemo as re volucoes nao abrangem somente a mudanca polftica ou a constitu cional mas tambem a participacao da massa neste processo o alva central das revolucoes era o controle do Estado e por esta razao nenhum conceito de revolucao era possfvel antes da emergencia do Estado modemo casualmente o mesmo se aplica a qualquer con ceito do sistema interestatal ou internacional agora as revolucoes sao encaradas como momentos de transicao para urn mundo novo melhor ou mesmo perfeito o comeco de uma nova era na qual tudo seria diferente E esta concepcao modema de revolucao analisa da por Griewank e herdada da Revolucao Francesa que tern perme ado a maior parte da discussao posterior As questoes da definicao e do papel hist6rico das revolucoes sao com certeza centrais para qualquer discussao destes lev antes no contexto intemacional Quase toda a discussao sabre as revolucoes na literatura das RI as percebe em urn sentido muito mais frouxo para incluir os golpes e as explosoes de violencia o que nao as dissolve simples mente em urn espectro behaviorista A maior parte da literatura das RI supoe tambem que as revolucoes sao momentos de colapso ao inves de transicao e que estes momentos sao diferenciados pela vi olencia em oposicao a regimes estaveis e repressores mas que nao 14Der Neuzeilitche Revolutionsbegriff Entstehung und Entwicklung Weimar Hermann Bohlaus Nachfolgerm 1955 Uma se91i0 foi traduzida em Heinz Lubacs Revolution London Macmillan 1968 urn artigo chissico que cobre o mesmo terreno que Griewank eAT Hatto Revolution an enquiry into the uselfuness of an historical term Mind October 1949 144 Fred Halliday seram violentos Na verdade enqunto cada urn dos principais pa radtgma contemporaneos as I hda com as revolucoes em algo ma med1da as bases concettuats de suas consideracoes variam em tal extensao que os seus achados se aproximam do incomensuravel Ito ocorre nao somente por causa de diferencas de conceitualiza yao geral mas porque cada urn se utiliza de um conceito diferente de revoluyio Uma visao condensada necessariamente resumida de como cada um dos tres principais paradigmas trata as revoluyoes pode tamar isto mais clara Para os ealistas a tndencia e perceber as revoluy6es como mu dancas em estils de pohttca externa e de prioridades dos Estados tanto que estas constttuem um fator revisionista insatisfeito ou desequi librador no sistema internacional e devem ser adequadamente domadas as reoluy6es sao urn colapso em urn mundo de outra forma ordenado Em st mesmas elas nao requerem nem explicacao ou contextualizayao hist6rica Mesmo uma analise realista perceptiva como aquela de Ro srance opera com este modelo A World Restored de Kissinger 0 exem phfica Armstrong como ja discutido vai de algum modo localizar as revoluc6es mais centralmente dentro do curso da hist6ria intemacional de certa maneira violando o paradigma realista Para os beaioristas como Rosenau as revolucoos sao parte do espectro de v10lencta e podem espalharse transnacionalmente como um vfrus contudo esta violencia e vista em termos psicol6gicos abstraida de sua casa socal ou do contexto intemacional e de novo ela e oposta a altemauva estavel e supostamente naoviolenta 0 materialismo hist6rico presente nas RI em sua variante estru tlista doma presta muito mais atenyio as revoluy6es e as ve con dtciOnando prectsamente o papel formativo e transicional identificado por kocpol e BngtonMOre e envolvendo uma mudanya social e pohtica substanctal Em opostyao aos realistas e aos behavioristas os materialistas hist6ricos consideram as revolucees positivamente e m bem comecam a olhar para os fatores internacionais definidos pelo ca pitliso e pelo imperialiso como o contexto no qual qualquer revo luyao mdtvtdual sera localtzada De forma sagaz Marx criticou as afir mac6es de rna teoria baseada nos grandes poderes atrrmando que a ordem pentarqutca do seculo XIX aquela dos cinco poderes seria var nda pela sexta grande potencia a revoluyao Entretanto por causa de sua enfase sabre a dimensao intemacio nal da revolu9ao o materialismo hist6rico tern dificuldade em explicar porq as revolus pareccm etar confinadas a Estados especificos e a extbrr caractensttcas nactonats e nacionalistas tao distintas Aiem disso concepyao materialista hist6rica de revolucio na pratica e na teona reside sobre uma visio da hist6ria como se movendo atra ves de estagios em direcio a urn alvo hist6rico determinado tele ologicamfmte supunhase que as revolucoes eram de algoma for Repensando as rela6es intemadonais 145 rna transioes ou pedagios de uma evoluao unilinear da socieda de humana Apesar de poder haver espao para algum conceito de progresso na sociedade humana esta visao determinista era uma ilu sao e constituiu uma grande falha de toda a abordagem marxista Ao estar presente mesmo de forma disfarada nos escritos influen ciados pelo marxismo incluindo BarringtonMoore e Skocpol esta visao e tambem uma fonte de debilidade destes trabalhos Urn exame resumido das tres areas de analise ja identificadas a hist6rica a descritiva e a te6rica pode enfatizar melhor estas res pectivas anomalias A FORMAAO DO SISTEMA INTERNACIONAL Em uma surpreendente passagem no Capitulo 6 de seu Power Politics intitulado Revoluoes Internacionais Martin Wight ob serva Podese muito bern perguntar par que a polftica intemacio nal naorevolucionaria deveria ser considerada como mais normal do que a revolucionaria ja que a historia da sociedade intemacional temse dividido quase que igualmente entre as duas 16 Em uma nota de rodape ele desenvolve este ponto Se tomando datas convenci onais consideramos 14921517 16431792 e 18711914 como anos naorevolucionarios e 15171648 17921871 e 191660 como revolucionarios entao sao 256 anos de revoluao internacional para 212 nao revolucionarios Aqui ou ali pode haver alguma discus sao sabre datas ou fases mas o ponto levantado par Wight e con vincente na maior parte da historia do sistema intemacional as re laoes entre OS Estados nao tern sido determinadas pelos fatores normais Wight cita o direito o costume e a polftica de poder mas pelos anormais os revolucionarios Nestes fatores as divisoes ide ol6gicas desempenham urn papel importante e os Estados objetivam alterar de uma forma substancial as ordens polfticas e sociais dos demais Wight argumenta que no fim a doutrina da Iugar a polftica de poder mas o seu reconhecimento da importancia da revoluao no sistema intemacional dominante par mais da metade da hist6ria do sistema e marcante A anarquia e produto tanto da ideologia como do sistema de Estados sem soberania Os primeiros exemplos desta diversidade ideologica podem ser mencionados brevemente no seculo XVI os levantes ideologicos e po Hticos da Reforma em si mesma urn caso de ligaao transnacional e de interaao ideologica no seculo XVII as guerras e as revoluoes em 1640 quando nao menos do que seis Estados europeus enfrentaram le 16Wight Power Politics p 92 146 Fred Halliday vantes no mesmo ana 164817 e no final do seculo XVIII comeo do XIX a Revoluao Atlantica de 17601800 18 A imporHincia da revoluao no seculo XX tern sido imensa ARe voluao Bolchevique de 1917 estabeleceu a fissura fundamental das re laes intemacionais deste seculo uma que baseada em dais sistemas soc10polfticos competitivos e distintos respectivamente contribuiu e depois donou as fricses do perido etreguerras e do mundo pos guerra Ate qe ponto fat o antagomsmo a Revolusao Bolchevique e 0 medo deseu tmpato na Europa central que fomeceram o impulse para a ascensao do naztsmo e uma questao em aberto o proprio Hitler tinha outras preocupasoes mas a disposisao das classes medias alemas e do exercito em apoialo pode ter sido consideravelmente afetada pelo de safio comumsta Tal duvida nao se aplica ao curso da historia mundial nas quatro decadas depois de 1945 a divisao ja constitufda entre os Es tados capitalistas e os comunistas era composta par e em interaao com urn avalanche de revolus6es no Terceiro Mundo cuja propria enume rasa corresponde a das crises mais importantes do posguerra China Corea uba e Vtetn e no final dos anos 1970 e 1980 Camboja Ango la Ettopta Ira Ntcaragua eAfeganistao Como discutido em mais detalhes no Capitulo 7 a Guerra Fria foi urn conflito intersistemico entre dais sistemas sociais e polfticos e a sua etensao para e influenciando os conflitos do Terceiro Mundo produ zm os mats pengosos e violentos epis6dios da segunda metade do secu lo XX De 1945 a 1989 foram os conflitos no Terce ira Mundo que mais ahmentaram as ens6es inteacionais urn indicador disto foi a polftica para as revolusoes do Tercerro Mundo que levou os presidentes ameri canos a dar seusnomes para douttinas 19 Igualmente foram os pro bIemas do Tererro Mundo que mats desafiaram as posisoes dos pre stdentes amencanos como bern souberam Truman Johnson e Car ter Nos anos 1960 o declfnio parcial da hegemonia dos Estados Unidos foi em grande parte urn resultado do Vietna A historia do mundo do tim da Segunda Guerra Mundial ate o final dos anos 1980 foi quase toda embora nao exclusivamente uma de resposta do sis 17Sobre as revoluoes dos anos 1640 ver Geoffrey Parker e Lesley Smith eds The General Crisis of the Seventeenth Century London Routledge Kegan Paul 1978 18Ver Palmer World Revolution e Democratic Revolution 9Dos oito presidentes americanos entre 1945 e 1988 nada menos do que seis deram seus noe a doutrtna de segurana formuladas para conter o comunismo e outros desafios radicrus no Terce1ro Mundo Truman Eisenhower Kennedy Nixon Carter e Reagan Iyndon Johnson lode nao ter tido nenhuma doutrina com seu nome mas certamente ele tmha uma napratica como mostram o Vietna e a Republica Dominicana So mente Gerald Frd o substitute qe ocupou a Cas a Branca por do is anos depois da renuncia de Richard N1xcn em 194 fm uma exceao Ver Fred Halliday Cold War Third World London RadmsHutchmson 1989 Capftulo 3 para discussao adicional Repensando as rela6es intemacionais 14 7 tema internacional a revoluao Durante as quatro decadas de Guer ra Fria a revoluao forneceu o alicerce hist6rico para o sistema bi polar alimentando a corrida armamentista nuclear fornecendo mo tivos para a competiao dos grandes poderes e ameaando a estabi lidade politica domestica dos principais pafses 20 0 conflito intersistemico da Guerra Fria foi seguido pelos le vantes na Europa oriental de 1989 que desferiram urn golpe mortal no mundo bipolar que sobrevivera desde 1945 Em certo sentido estas revolucoes pareceram ir contra 0 padrao dos levantes dos ulti mos 200 anos a concepcao de revolucao identificada por Griewank elas aconteceram com relativamente pouca violencia e nao foram feitas em nome de alguma alternativa heterogenea mas para ou pelo menos assim era esperado alinhar estes pafses as normas sociais polfticas e economicas dominantes do ocidente Na polftica exter na como na domestica elas nao buscaram desafiar as normas inter nacionais dominantes nao somente elas aceitaram as pniticas gerais da diplomacia e do direito mas quiseram ser incorporadas nas prin cipais instituicoes do ocidente incluindo a OTAN e a Comunidade Europeia CE Como discutido depois nos Capftulos 8 e 9 estas revolucoes sao originais em varios aspectos e nao se pode questionar sua importancia para a polftica internacional A Guerra Fria terminou nao por causa do entendimento ou detente entre os grandes poderes mas pela superiori dade de urn lado sobre ou outro em outras palavras foi a revolucao nao o mutuo entendimento que quebrou o molde do mundo pos1945 e anun ciou urn novo periodo hist6rico Alem dis so foram estas revolucoes que colocaram em movimento uma serie de conflitos inooitos ou praticamente esquecidos dentro e entre os Estados isto os ameacou e em alguns ca sos os levou a guerras por territ6rios Pode ser muito cedo para consi derar por inteiro o impacto destes levantes que eles sao revolucoes e que eles alteraram 0 curso da hist6ria intemacional ja e evidente OS PADROES HISTORICOS As revolucoes sao eventos internacionais em suas causas e efei tos e com a excecao parcial daquelas de 1989 elas revelam urn grau surpreendente de uniformidade A generalizacao com base em exem 2Fui mais a fundo nesta relaao entre o conflito LesteOeste e a revoluao no Terceiro Mundo em meu The Making of the Second Cold War London Verso 1983 e em Cold War Third World Urn reconhecimento interessante mesmo que atrasado da ligaao e encontrado no relat6rio do PentagonoDiscriminate Deterrence Washington Department of Defense 1989 148 Fred Halliday plos hist6ricos nao pode fornecer urn substituto para a investigacao te6rica mas pode fornecer materiaprima para identificar inumeros problemas que afetam o trabalho te6rico No caso das revolucoes existem pelo menos quatro areas nas quais tais generalizacoes podem ser examinadas a causa ate que ponto os fatores intemacionais pro duzem revolucoes a polftica externa como os Estados revoluciona rios conduzem as suas relacoes externas as respostas as reacoes dos outros Estados a formacao como em urn periodo de tempo mais Iongo os fatores internacionais e o sistema como urn todo constran gem o desenvolvimento interno p6srevolucionario dos Estados e determinam as suas evolucoes polfticas sociais e economicas Como ja observado as revolucoes ocorrem quando existem duas condicoes gerais a revolta dos dominados e a impossibilidade dos governantes continuarem governando Uma discussao mais in tuitiva das causas da revolucao aborda o primeiro destes dois fatos o estfmulo a revolta Os crfticos sao nipidos em identificar ou in ventar uma mao externa na subversao e na agitacao e em alguns casos na promocao das revolucoes Contudo como mostraram os trabalhos de Skocpol Goldstone e outros da terceira onda e quase sempre atraves da outra dimen sao a do enfraquecimento dos Estados que OS fatores internacionais promovem a revolucao Os fatores internacionais desempenham urn papel multiplo em trazer a tona revolucoes mas e fundamentalmente pelo enfraquecimento dos Estados que eles contribuem para a mudan ca atraves da derrota ou da crise na guerra atraves das mudancas economicas internacionais que destroem as ordens tradicionais atra ves de confrontos entre os Estados e as sociedades provocados pela mobilizacao de recursos para a competicao intemacional atraves da remocao das garantias do poder hegemonico Em outras palavras enquanto os Estados podem usar a dimensao intemacional e os recur sos que ela fornece para consolidar a sua posicao em casa eles tam bern podemse descobrir enfraquecidos internamente como urn resul tado de suas atividades e aliancas internacionais Isto se aplica a mui tos casos anteriores pelo menos a Franca a Russia e a China e igual mente a 1989 Como discutido nos Capftulos 8 e 9 o colapso dos regimes comunistas europeus orientais em 1989 foi no contexto ime diato urn resultado da remocao da garantia sovietica de intervir mili tarmente em seu favor e no Iongo prazo uma conseqliencia da perda de legitimidade destes regimes nas esferas economica e polftica 0 outro tipo de causa o encorajamento dos revolucionarios evi dentemente e importante armas sustentaao polftica e acima de tudo o encorajamento ideol6gico e a forca do exemplo Entretanto sem o concomitante enfraquecimento dos Estados tal estimulo extemo tern efeitos limitados testemunhese o exemplo da Africa do Sui no qual Repensando as rela6es intemacionais 149 apesar de imensa pressao de baixo o Estado reteve seu poder por muitos anos e somente mudou no final da decada de 1980 quando as pressoes economicas externas especialmente o boicote de inves timentos dos Estados Vnidos ameaaram o regime A polftica externa dos Estados revolucionarios do perfodo pre 1989 e uma area ampla e extremamente pouco estudada Parte da literatura enfatiza a questao da nova diplomacia isto e 0 papel da ideologia revolucionaria e da aao naoconvencional na polftica ex terna dos Estados revolucionarios 21 Contudo este desafio ideol6 gico as normas de comportamento internacional e no maximo uma questao secundaria a ideologia e a interferencia tambem desempe nham urn papel nas polfticas externas dos poderes do status quo e os Estados revolucionarios tern polfticas externas distintas principal mente por causa dos diferentes objetivos que eles perseguem nao tanto pelos metodos que utilizam Este ultimo ponto e significative porque na maior parte da litera tura na realista e na liberal existe uma suposiao de que os objetivos dos Estados revolucionarios sao semelhantes aos dos outros Estados Os liberais por sua parte argumentam que caso os Estados revolucionarios fossem melhor tratados eles nao buscariam exportar a revoluao para alterar as rela6es dentro dos outros Estados 0 registro hist6rico e mui to diferente todos os Estados revolucionarios quase sem nenhuma ex ceao buscaram promover a revoluao em outros Estados 0 desafio que eles colocam para o sistema internacional nao reside em uma nova for ma de diplomacia ou de relacionamento interestatal mas no conteudo de sua polftica externa que tern como prioridade percebida quase que como urn direito ou uma obrigaao a transformaad das rela6es soci ais e polfticas dos outros Estados Isto e subestimado pela maior parte da literatura realista e trans nacional assim como por quase todas as politicas concebidas para re solver as diferenas entre os EVA e as revoluoes do Terceiro Mundo na epoca do p6sguerra com relaao a China Cuba Ira ou Nicara gua Dado o compromisso internacionalista presente nas polfticas externas destes Estados nenhuma soluao foi possivel estas polfti cas refletiram os componentes ideol6gicos das revolu6es e as pres soes domesticas para a realizaao de tal polftica externa22 Ao Iongo 21Por exemplo Andrew Scott The Revolution in Statecraft Informal Penetration New York Random Housem 1965 DerDerian On Diplomacy tern uma discus sao semelhante 22Um exemplo de tal argumento com relacao a Revolucao Iraniana e encontrado nas conclusoes a The Eagle and the Lion New Haven and London Yale University Press 1988 de James Bill Bill propoe 12 maneiras pelas quais a polftica americana em situacoes revolucionanas pode ser melhorada para reduzir o conflito com o Estado revolucionano Estes sao em sua maioria conselhos para aperfeicoamento 15 0 Fred Halliday do tempo tais compromissos foram sendo moderados mas continu aram se repetindo nas revoluoes modernas comeando pelos giron dinos passando pelo Comintern Lin Piao e Che Guevara ate chegar aos apelos panisHimicos de Khomeini e ao seu patrocinio do sudur i inqilab ou a exportaao da revoluao na verdade neste assim como em muitos outros aspectos e surpreendente como a Revoluao Iraniana apesar de sua forma religiosa particular foi fiel aos parame tres e convencional 23 De uma perspectiva hist6rica a discussao sobre quem provoca quem a revoluao internacional a contrarevoluao ou viceversa esta fora de Iugar os dois processes podem comear de forma auto noma por raz6es internas e sistemicas e alimentandose urn do ou tro levam a confrontaao Se o internacionalismo revolucionario e urn resultado quase que universal das revoluoes isso tambem vale para seu oposto o intemacionalismo contrarevolucionario a tentativa dos poderes do status quo de impedir a disseminaao das revoluoes de promover a sua reforma e onde possfvel a sua derrubada Esta interaao coloca mais duas outras questoes que talvez sao mais recompensadoras e que nos levam ao nucleo do sistema internaci onal Vma e a questao da tendencia do sistema internacional a homoge neizaao isto e em direao a uma organizaao similar das relas6es en tre os Estados e de seus sistemas politicos e sociais internos levantada por Richard Rosecrance e RaymondAron e depois desenvolvida por Stan ley Hoffmann e discutida nos Capftulos 4 e 7 24 Os internaciona lismos revolucionario e contrarevolucionario derivam desta tenden chi a homogeneizasao que vai alem das consideraoes especificas de segurana internacional sobre a ameaa militar de urn Estado a outro a questao nao era se o regime sandinista na Nicaragua nos anos 1980 desafiava ou poderia desafiar os EVA militarmente A segunda questao para qual a hist6ria destes dois internacionalis mos aponta a despeito das suposioes de intervenao e ada durabilida de do sistema de Estados Todos os Estados revolucionarios tentaram promover a revoluao no exterior exportala no sentido direto do termo nenhum jamais teve sucesso 0 fracasso de Khomeini em promover a revoluao no Iraque no infcio dos anos 1980 ou dos 23Fred Halliday Iranian foreign policy since 1979 Internationalism and nationalism in the Islamic Revolution em Juan Colee Nikki Keddie eds Shiism and Social Protest New Haven and London Yale University Press 1986 24Raymond Aron Peace and War London Weidenfeld Nicolson 1966 pp 37381 Como discutido no Capitulo 4 este pressuposto de homogeneidade nos arranjos politi cos e sociais intemos e diferente do encontrado no conceito de sociedade intemacional da escola inglesa a Ultima se preocupa somente com a homogeneidade dos valores e das praticas intemacionais Repensando as relac6es intemacionais 151 sandinistas em garantir uma vit6ria da guerrilha em El Salvador no mesmo perfodo sao urn exemplo perfeito poucas imagens sao mais incorretas nas relaoes intemacionais do que as da teoria do domi no A criaao de regimes companiveis em Estados vizinhos ocorre somente por meio de guerras interestatais que no contexto de guer ras mais amplas entao permitem a implantaao de regimes hom6lo gos as republiques soeurs dos anos 1790 as democracias do povo no final dos anos 1940 Na mesma linha a contrarevoluao dirigi da pelo Estado quase sempre falha exceto em casos raros como os das guerras interestatais Frana 1815 Hungria 1919 ou de uma severa divisao intema dentro do proprio regime revoluciomirio Fin landia 1918 Ira 1953 Republica Dominicana 1965 Granada 1983 Apesar de todo o bombardeio dos periodos de conflito revo luciomirio o sistema de Estados tende a manterse no curto prazo Contudo este curto prazo e significativo pois a maior parte da discussao realista sobre a socializaao dos Estados aborda o periodo imediatamente p6srevoluciomirio e a aparente domestica ao dos Estados 0 fato de q11e eles introduzem treguas abandonam a ret6rica intemacionalista e participam da diplomacia nao signifi ca entretanto que os Estados revolucionarios tenham sido sociali zados Uma nipida olhada na hist6ria de Iongo prazo dos Estados revoluciomirios mostra que enquanto as suas ordens internas p6s revoluciomirias permanecerem intactas eles continuam a represen tar urn desafio ao sistema dos outros Estados A URSS promoveu efetivamente a revoluao no exterior nos anos 1940 no encerramen to da Segunda Guerra Mundial e na decada de 1970 quando os EUA enfrentavam uma onda de revoluoes no Terceiro Mundo e nao nos anos 1920 quando ainda estava enfraquecida A onda revoluciona ria cubana fracassou na America Latina nos anos 1960 mas em 1975 foras cubanas intervieram para consolidar a ala de esquerda do MLPA Movimento para a Libertaao Popular de Angola em Ango la ein 1977 elas ajudaram a expulsar a invasao somali que ameaa va com certa ajuda extema a Revoluao Etfope e em 1979 os san dinistas em larga medida armados e encorajados por Cuba chega ram ao poder na Nicaragua Em Janeiro de 1989 a maioria dos ex perts estava debatendo se a Revoluao Iraniana fragilizada pela guerra e pela crise economica agora faria a paz com o ocidente Urn velho homem pensou diferente sucedeu a crise de Rushdie Esta perspectiva de Iongo prazo sugere que a socializaao da revoluao e menos facil do que a ortodoxia realista nos faz acreditar e tambem sugere que este desafio recorrente mesmo que normalmente frustrado das revoluoes 6 urn produto tanto de fatores intemos como de extemos Isto leva a seguinte conclusao ate que ocorra uma re imposiao da homogeneidade isto e ate que as ordens intemas dos Estados revolucionarios divergentes voltem para as ordens convenci 152 Fred Halliday onais dos outros poderes os poderes revolucionarios e os naorevo lucionarios permanecerao em conflito Nao poderia existir exemplo mais 6bvio disto que o declinio da URSS a partir de 1985 uma nova e mais conciliat6ria politica extema evoluiu pari passu com uma re forma da polftica e da economia sovieticas A expectativa era que com base em urn maior entendimento mutuo poderseia chegar a detente e a urn arranjo das disputas intemacionais Todavia na analise final esta reconciliaao na esfera intemacional tomouse possfvel somente quando o sistema sociopolitico dentro da propria URSS mudou Nao foi a acomodaao pelos tratados ou pela diplomacia que encerrou a Guerra Fria mas o fim da heterogeneidade dos dois sistemas A interaao entre as revolu6es e o sistema intemacional portan to levanta quest6es nao somente para o estudo da revoluao mas para o das pr6prias RI Urn amplo repensamento te6rico pode ser produzido a partir da descoberta destas implica6es e da identificaao de cinco areas nas quais as revoluoes ocupam urn Iugar central dentro das RI AS LIGAOES DOMEsTICAS E AS INTERNACIONAIS As revoluoes nos foram a questionar uma das principais afir ma6es realistas a de que as estruturas intemasdomesticas podem ser exclufdas do estudo das relaoes intemacionais Dentro das Rl os maiores interpretes dos efeitos intemacionais das revoluoes como Rosecrance e Rosenau reconheceram isto defendendo a inclusao de fatores domesticos no estudo da formulaao de polftica extema e de seus efeitos nao e urn acidente que Waltz em sua reafirmaao do realismo em 1979 argumentaria tao pesadamente contra isto A ua divisao de teorias em sistemica e reducionista embora possa ser muito elegante nao se sustenta o mais breve exame de como as revoluoes contribufram para o conflito intemacional para a guerra em seu sentido estrito mostra como a cadeia interativa sistema in temacionallsistema domesticosistema intemacional 6 uma caracte ristica central de como as guerras aconteceram 25 As guerras de 1760 contribufram para a Revoluao Francesa que levou as Guerras Napoleonicas A pressao sobre o Imperio Oto mano levou a Revoluao dos Jovens Turcos de 1908 que precipi tou as Guerras dos Balcas e daf estimulou a Primeira Guerra Mundi al A Primeira Guerra Mundial levou a Revoluao Bolchevique que determinou o papel da Russia na Segunda Guerra Mundial e alem 250 conceito de Rosenau de ligaao soldada captura bern esta interrelaao Sobre a recusa de Waltz em aceitar isto como uma parte legftima da teoria das Rl ver nota 2 Repensando as rela6es intemacionais 153 o conflito interestatal e mais amplamente o conflito intersodetal levou ao colapso do comunismo no final dos anos 1980 Enfocan do somente o sistemico o modelo de Waltz paradoxalmente mi nimiza a forya do internacional Depois da competiyao interestatal e do seu impacto dentro da sociedade ocorrem mudanyas que entao levam a mais conflito interestatal Como discutido em maiores deta lhes no Capitulo 4 esta e a interayao formativa que tanto moldou a hist6ria intemacional 0 Capitulo 3 ja esboyou uma discussao sobre as diferentes impli cay6es do conceito de Estado para as relac6es intemacionais aqui e possivel somente resumilas para o estudo da revolucao As revolucoes se referem aos Estados todavia as RI operam com urn conceito proprio e cada vez mais problematico de Estado Tanto quanto outros desenvol vimentos nas RI e nas ciencias sociais as revoluy6es obrigam a introdu yao de urn novo conceito de Estado alem da categoria polfticolegal nor malmente usada nas RI uma categoria sociol6gica que o perceba como uma entidade administrativacoercitiva 0 conceito de Estado convencionalmente usado mesmo que rara mente definido nas RI impede precisamente uma analise dos proces ses que tornam as revolucoes internacionais os efeitos da competiyao interestatal nas relacoes Estadosociedade o enfraquecimento das liga y6es Estadosociedade pelo impacto das revolucoes em outros Es tados e a determinacao da politica extema revoluciom1ria pelos con flitos Estadosociedade de periodos p6srevolucionarios 0 segundo conceito de Estado e mais restrito e nos permite ver sua personalidade de Janus como uma entidade de duas faces que olha para dentro em direcao a sociedade que busca dominar e para fora em dire yliO aos outros Estados eou sociedades com as quais interage com o ob jetivo de fortalecer a sua propria posicao intema Com este conceito de Estado de duas faces tambem tornase possivel reexaminar uma carac terfstica do sistema internacional que a teoria convencional considera como dada e para a qual fornece respostas tautol6gicas ou axiomaticas por que os Estados competem Especificamente podese perguntar por que como os pr6prios realistas freqiientemente percebem a competicao entre OS Estados ideologicamente antagonicos heterogeneos e mais duradoura e abrangente do que aquela entre os Estados de orientaclio semelhante As respostas convencionais em termos de maximizaclio de poder na arena intemacional deixam de fora os determinantes domesti cos de tais conflitos intersistemicos 0 fa tor dornestico na atividade interestatallevanos a questlio ain da nao respondida colocada por Rosecrance Aron e Hoffmann e discu tida em maior extensao no Capitulo 4 ada homogeneidade e a da hete rogeneidade Em urn certo nivel poderia parecer excessivo identificar uma tendencia a homogeneidade das ordens internas dentro do sis tema intemacional Afinal Estados com diferentes ordens podem co 154 Fred Halliday mercializar e trocar embaixadores Se eles respeitam a nliointerfe rencia e concordam com a diversidade do sistema interno isto e se coexistem pacificamente entao a heterogeneidade nlio deveria ser a causa do conflito Kim por exemplo com base em seu estudo da Revoluylio Francesa ve isto como uma solucao viavel 26 Alem disso urn elemento de heterogeneidade pode ser percebido como benefice para os Estados ja que fomece urn outro urn estran geiro e urn objeto ameacador no mundo extemo a partir do qual os Esta dos podem mobilizar apoio social e polftico intemo Estas nao sao consi deray6es imagimirias existem muitos casos nos quais a tolerancia ou o fortalecimento atraves da diversidade funcionaram Entretanto a eviden cia hist6rica indica que o equihbrio esta em outra direcao isto e a hetero geneidade promove o conflito Em outras palavras existe uma suposi yao de homogeneidade dentro do sistema Isto e obviamente real em urn sentido negativo se os Estados slio organizados em diferentes bases entlio provavelmente eles se sentem mais ameacados uns pelos outros 0 mais importante impacto intemacional e internacionaiista das revoluy6es reside nao nas acoes deliberadas dos Estados mas na forca do exemplo a Revoluclio Francesa proclamou os direitos do homem confiscou as terras dos aristocratas e decapitou o rei e a rainha A Revolucao Bolchevique derrubou a monarquia naciona lizou a propriedade e proclamou urn Estado da classe trabalhadora 0 impacto do Ira tern sido exemplar e ideol6gico muito alem do alcance identificavel da Republica Islamica Mesmo quando os Estados nao buscam promover o seu mode lo como a maioria o faz a caridade maligna denunciada por Burke o conhecimento do que fizeram ou do que se acredita que tenham feito age como urn catalisador ele perturba as ordens estabeleci das 0 colapso serial dos regimes comunistas na Europa oriental em 1989 foi uma instancia extraordinaria de tal efeito de demonstraclio Uma vez que se tornou evidente em junho daquele ano que urn governo naocomunista seria capaz de chegar ao poder na Polonia o destino dos outros regimes estava selado 0 problema da homogeneidade vai entretanto alem desta questao de exemplos alternatives no que obscurece algo que talvez seja uma questao mais fundamental o papel positivo da homogeneidade fortale cendo os Estados is toe fortalecendo a interaclio normal e estavel entre os Estados Os Estados nlio sao unidades isoladas eles existem em urn contexto internacional e suas praticas constituicoes ordens sociais e economicas retiram sua forca do fato de que outros Estados com portamse como eles Este tambem nao e urn desenvolvimento re 26Kim Kyongwon Revolution and International System New York New York University Press 1970 Repensando as relacoes intemacionais 155 cente como a literatura sobre a interdependencia facilmente de duz 0 capitalismo e o Estado moderno nasceram em urn contexte internacional nio o caminho inverse lsto aponta para a ideia de que a dimensio intemacional e cen tral a explicaao da instabilidade e da estabilidade das ordens polfti cas e sociais dos Estados respectivamente em situa6es de heteroge neidade e de homogeneidade A maior parte da literatura sociol6gica sobre isto subestima a dimensio intemacional seja no debate durkhei miano sobre a cultura comum e seu papel na coesio social ou no de bate marxista sobre a ideologia dominante existe urn reconhecimen to inadequado de como a fora do exemplo intemacional atraves da similaridade e do fortalecimento serve para consolidar ordens sociais especlficas27 Contudo 0 fundamento mais importante de qualquer ideologia a reivindicaio de que os componentes de uma dada or dem social e polftica sao etemos naturais e imutaveis depende de tal fortalecimento para a sua confirmaio Uma vez que se toma eviden te que podem existir diferentes ordens em outros Estados que po dem existir republicas ou paises nos quais as mulheres votam ou onde as casas podem ser adequadamente separadas entio a naturalida de de qualquer ordem dada entra em colapso Em outras palavras a chave para o entendimento do desafio ide ol6gico da heterogeneidade reside na identificaio do papel ideol6gi co preexistente da homogeneidade e de seu fortalecimento Pelo me nos isto serve para ressaltar a importancia do intemacional na anali se de qualquer ordem social ou politica o intemacional nio somente se toma relevante quando as coisas desmoronam quando existe uma ameaya polftica de fora uma invasio urn poder economico rival mas e igualmente importante na constituiyio e na reprodu9io de Estados estaveis aparentemente autosustentados e autonomos 0 intemacio nal como a saude importa quando as coisas dao certo tanto quanto quando elas dio errado Como os soci6logos hist6ricos nos lembra ram o intemacional criou o Estado e nao viceversa28 27Sobre os poderes contnirios das teses da ideologia dominante e da cultura comum ver Nicholas Abercrombie Stephen Hille Brian Turner The Dominant Ideology Thesis London Unwin Hyman 1980 Estes escritores nao discutem como os fatores intema cionais ideol6gicos e materiais podem contribuir para a formacao o fortalecimento e o enfraquecimento de ideologias especfficas dominantes ou subordinadas dentro de qual quer sociedade mas nao e dificil ver como o seu argumento pode ser estendido para mostrar como estes fatores externos silo importantes e como podem agir sob uma soci edade especffica como confirmadores e desafiadores A forca do exemplo sozinha de sempenha urn papel importante Somente devese mapear a disseminacao global de urn f8nomeno como o sufnigio universal ou o respeito pelos direitos humanos ou de ten d8ncias religiosas sejam estas a reforma ou as sociedades islfunicas contemporfuleas para ver como as forcas extemas podem moldar cs sistemas ideol6gicos internos 28ContribuicCies recentes ao campo incluemJohn Hall Power and Liberties London Penguin 1986 e Michael Mann States War and Capitalism Oxford Basil Blackwell 1988 156 Fred Halliday AS REVOLUOES E A GUERRA Como indicado na discussao sobre a ligayio domesticain temacional a rela9ao das revoluyoes com as guerras dificilmente precisa ser destacada no sentido de que as guerras causam revolu y6es e viceversa Freqlientemente tern sido percebido como as guer ras minando OS Estados levam as revoluoes mas tambem e im portante notar como as revoluyoes levaram a guerras 1789 levou as Guerras Napoleonicas e a eclosao da Primeira Guerra Mundial convencionalmente entendida como urn resultado do colapso do equilibria de poder foi precedida por uma enchente de revoluyoes no mundo semiperiferico da China ao Mexico e com conseqlien cias mais diretas para o sistema interestatal europeu na Turquia Esta conexao esteve vivamente presente nos conflitos do inicio dos anos 1980 no Camboja Afeganistao Ira Angola e Nicaragua Somente o registro hist6rico sugere que qualquer estudo sobre as causas da guerra e dos meios de prevela ou prevenila dependem da identificayao do co meyo e do impacto das revolu6es Todavia fazer isso envolve recuperar uma dificil mas recorrente caracteristica do debate sobre as relay6es in temacionais qual seja a relayao de seguranya entre os Estados a segu rana vertical e a segurana dentro de Estados a seguranya horizon tal A maior parte da literatura e a Carta da ONU sup6em que e possivel discutir a seguranya vertical sem considerar a segunda o que acontece dentro dos Estados A razao para evitala e evidente com a proximidade da relaao podem surgir conclus6es polfticas e morais indesejaveis e os que se dedicam a prevenir as guerras e os conflitos entre os Estados de veriam tamb6m passar a prevenir as mudanas radicais em seu interior A seguranya en tao requer estabilidade e contrarevoluao Aqueles que estabelecem uma ligayio pr6xima entre estes dois tipos de seguranya tendem a set contrarevolucionarios consisten tes e radicais ou a defender urn processo revolucionario mundial permanente justificandoo segundo a ideia de que o conflito entre os Estados revolucionarios e contrarevolucionarios e inevitavel e que portanto nao pode haver seguranya para os Estados revoluci onarios enquanto os seus oponentes continuarem existindo Dentre os que fizeram a primeira conexao Mettemich e Kissinger em seu A World Restored foram talvez os mais proeminentes e mais lucidos mas a Doutrina Brejnev insistindo na soberania limitada dos pa ises comunistas expressava uma perspectiva similar Lenin Stalin e Mao com sua teoria da inevitabilidade da guerra entre o socialismo e o capitalismo representaram a segunda conclusio Mesmo antes das armas nucleares entretanto era evidente que a despeito da pr6xima ligayao entre as duas dimensoes de seguranya a sua combinaio nao era inevitavel 0 consenso tern sido evitar o Repensando as relacoes intemacionais 157 problema e negar que as revolucoes levam a guerra o resultado foi que a comunidade intemacional estava despreparada para a eclosao das guerras que se seguiriam as revolucoes do Terceiro Mundo nos anos 1970 Alem de uma consciencia mais realista e historicamente informada de como o conflito interestatal pode seguirse a revolucao social esta ligacao recorrente tambem sugere que deve ser dada mai or atencao as formas de flexibilizar 0 sistema intemacional para que OS desafios a seguransa dentro dos Estados nao levem a guerra inte restatal 0 maier erro seria manter a ideia de que o conflito na esfera intemacional pode ser isolado do conflito interne aos Estados Dentro do contexte geral da teoria das RI estas quatro ques toes apontam para uma quinta presente na maneira pela qual os principais paradigmas das RI tratam a questao das dimensoes inter nacionais da revolucao o proprio caniter do sistema intemacional Para o conceito de revolucao assim como para o de sistema inter nacional cada urn dos paradigmas apresenta suposicoes que dife rem significativamente entre si Para OS realistas 0 sistema e constitufdo por Estados interagin do Para os pluralistas e behavioristas os Estados permanecem im portantes mas o sistema permite outras interacoes que nao passam pelos Estados categorizadas como as ligasoes a interdependencia ou os processes transnacionais Para OS materialistas historicos 0 sistema intemacional e consti tufdo por urn sistema socioeconomico global o capitalista sobrepos to no qual as estruturas polfticas existem desempenhando varies pa peis importantes mas no final das contas secundarios derivados ou superestruturais Durante a Guerra Fria esta visao ampla englobava as duas abordagens para a escola ortodoxa dos materialistas histori cos os pafses comunistas tinham se separado deste sistema para ou tros como Wallerstein nenhuma fuga parcial havia ocorrido Nos dois cases existia urn sistema intemacional nao por causa da interacao entre as unidades separadas como no caso dos realistas e dos transnacio nalistas mas por causa da unidade de urn nfvel determinante o soci oeconomico Para os estruturalistas a formacao e o desenvolvimento de Estados depois Estadosnacao ocorrem dentro de urn sistema ja estabelecido A polftica intemacional nao e a polftica entre OS Esta dos mas a guerra civil dentro de urn sistema social intemacional As implicacoes das revolucoes para estes tres modelos de sis tema sao consideniveis e acompanham as conclusoes dos Capftu los 24 Por urn lado os teoricos realistas e transnacionais subesti mam o grau em que os Estados e as sociedades distintas foram for madas e continuam a existir dentro de urn contexte intemacional definido por caracterfsticas sociais economicas e ideologicas co muns Em outras palavras o seu modele de sistema toma diffcil discemir porque as revolucoes tern efeitos intemacionais 15 8 Fred Halliday 0 modelo marxista convencional sofre do problema contnirio o do exagero com base nos fatores socioeconomicos na unidade do sistema intemacional e na subestimacao de como os Estados se jam eles artificiais arbitrarios e interativos e as suas ideologias na cionalistas agem para fragmentar e amortecer os impactos das revo lucoes em Estados especfficos sob o sistema intemacional como urn todo A discussao leva portanto a urn exame de como o carater in temacional geral da economia da sociedade e da cultura capitalista interagem com a divisao do mundo em Estados e com a resultante fragmentacao de territories populacoes capacidades coercitivas e ideologias particularistas A escolha se resume a uma teoria que ve as relacoes intemacionais como no fim dominadas por Estados e uma altemativa que olha para este sistema como urn de conflito so cial em escala mundial mediado e fragmentado pelos Estados Pode ser discutido depois do colapso e do fim do comunismo e depois da diminuicao da perspectiva revolucionaria herdada da Revo lucao Francesa que a questao da revolucffo deixara de ser central para o curse das relacoes intemacionais Mesmo se este fosse o caso isto nao eliminaria a necessidade de olhar novamente para a historia do sis tema intemacional nos ultimos 500 anos e de examinar as possfveis con seqliencias teoricas e historicas das revolucoes Entretanto existem ra z5es para sugerir que a despeito do que o futuro imediato possa trazer uma certeza de Iongo prazo com relacao a esta questao e imprudente29 Inicialmente se aceitamos que as revolucoes sao improvaveis ou impossfveis em Estados democraticos estamos somente falando de algo em tomo de tres duzias de Estados entre os quase 200 no mundo como o Capitulo 9 sugere pode existir urn intervale muito grande entre as conseqliencias ideologicas de 1989 o fim da his t6ria e a realizacao do potencial associado a disseminacao da de mocracia atraves do globe Aiem disso se considerarmos seriamen te as implicacoes do argumento de Goldstone de que uma crise do poder estatal combinada com o crescimento demografico provavel mente leva a revolucao e combinalo com projecoes de crescimen to da populacao global podemos entao estar definindo o padrao predominante de crise para 0 proximo seculo 30 29Para amilises materialistas hist6ricas das dimensoes intemacionais da revoluao ver Giovanni Arrighi Terence Hopkins e Immanuel Wallerstein Anti Systemic Movements London verso 1989 Michael L6wi The Politics of Combined and Uneven Development The Theory of Permanent Revolution London Verso 1981 Jan Pieterse Empire and Emancipation Power and Liberation on a World Scale London Pluto 1990 Franz Schurmann The Logic of World Power An Inquiry into the Origins Currents and Contradicitions of World Politics New York Pantheon 1974 30Este e um dos principais argumentos de Paul Kennedy Preparing for the TwentyFirst Century London Harper Collins 1993 Repensando as rela6es intemacionais 159 Os soci6ogos hist6ricos os economistas politicos intemacio nats os anhstas da revoluao enfrentam todos a questao do que cmstlm o stsema a questao central nas RI 0 mfnimo que se pode dtzer e que ate agora nao se chegou a nenhuma resposta adequada com sutentao hist6rca e te6rica 0 estudo das revoluoes com urn fenomeno Itemac10nal alem de sua validade intrfnseca pode frnecer u me10 de abordar a questao e alguns poucos outros Alem tsso e mtto cdo para sugerir 9ue este e somente urn problema de mteresse htstotco ou retrospecttvo levara urn seculo ou dois para que est questao se resolva Caso acontea das revoluoes nao se rem mats relvantes parao estudo das relaoes internacionais terf amos que revtsar o resumo hist6rico de Wight urn tero ao inves da metae da hist6ria do sistema intemacional teria entao que ser ca raccnzada como dominda pelo conflito entre os Estados revoluci nanos e ontrarevoluciOnarios Mesmo assim isto ainda investi na a questao de uma certa importancia 160 Fred Halliday Capitulo 6 AUSENTEDASRELAOES INTERNACIONAIS AS MULHERES E A ARENA INTERNACIONAL 0 SILENCIO DAS RELAQOES INTERNACIONAIS Nos Ultimos 25 anos as quest6es de genero e particularmente aque las referentes ao Iugar e ao papel das mulheres tern adquirido uma im portancia muito maior dentro das ciencias sociais como urn todo Em resposta a ascensao dos movimentos de mulheres em algumas socieda des ocidentais e a produao de urn corpo crescente de literatura analfti ca com relaao a posiao da mulher tern havido urn desenvolvimento significativo na agenda e nos conceitos estudados em varias disciplinas academicas Se isto tern sido especialmente percebido na hist6ria e na sociologia tambem tern sido evidente na ciencia polftica na economia e na antropologia e vern adquirindo maior importancia na literatura de humanidades mais ideologicamente constitufda 1 Ate o final dos anos 1980 existia entretanto uma exceao marcante nesta crescente cons cientizaao de quest6es de genero as relaoes internacionais Uma pesquisa em artigos publicados e em livros resenhados pe las principais revistas inglesas e americanas de rela6es intemacionais Dentre muitas outras contribuiy6es a campos individuais das ciencias sociais ver para estudos de desenvolvimento Ester Boserup Women and Ecomic Development London Allen Unwin 1970 talvez a primeira grande irrupyao do feminismo nas ciencias sociais e Kate Young Carol Wolkowitz e Rosalyn McCullaugh eds Of Marriage and the Market London CSE 1981 para teoria poHtica Anne Philips Engendering Democracy Cambridge Polity 1991 e Carole Pateman The Sexual Contract Cambridge Polity 1988 para antroplogia Henrietta Moore Feminism and Anthropology Cambridge Polity 1988 para hist6ria Sheila Rowbotham ver nota 3 Repensando as rela6es intemacionais 161 durante as decadas de 1970 e 1980 revelani pouco ou nada de ques t6es de genero e poucas que reflitam uma percepao da expansao desse interesse em areas relacionadas das ciencias sociais 2 Examinandose 0 conteudo dos cursos introdut6riospadrao nas relacoes intemacio nais dos principais livros de estudo das prateleiras de livrarias aca demicas relevantes uma ausencia similar foi evidente N a enxurrada de livros publicados sobre a estrategia nuclear o terrorismo a dfvida do Terceiro Mundo e as outras preocupacoes dos anos 1980 parece nao haver nada nem urn s6 livro dedicado a esta questao Tomando emprestada a imagem popularizada no estudo sobre as mulheres e a hist6ria de Sheila Rowbotham as mulheres foram escondidas das re la6es intemacionais 3 E como se as questoes levantadas pelo femi nismo fossem simplesmente consideradas nao relevantes para a esfe ra intemacional e nao precisassem formar parte da agenda academica do estudo das relacoes intemacionais Superar a invisibilidade das mulheres requer analise de por que ocorre este ocultamento e das varias razoes que se combinam para for talecelo Uma explicacao e a inercia institucional dentro da disciplina das Rl A medida que existe urn silencio virtualmente completo sobre a questao aqueles preocupados com ela sao desencorajados de trabalhar ou escolhem fazelo em outras disciplinas academicas mais receptivas ou em contextos extraacademicos Em seu veneravel papel de prote toras as revistas indexadas freqlientemente desempenham o equiva lente academico do seculo XX da Inquisicao excluindo tal material Urn segundo fator e a separacao seletiva das relacoes intemacio nais dos desenvolvimentos em outras ciencias sociais As relacoes in temacionais sao em alguns aspectos importadoras entusiasmadas podese sugerir compradoras de conceitos de outras disciplinas En tretanto existem varias areas de teoria de ciencia social que parecem nao ser reconhecidas dentro das relac6es intemacionais como discuti do nos Capftulos 3 e 4 os conceitos sociol6gicos exceto quando em prestados de uma maneira instrumental como ode sociedade sao quase totalmente ignorados a economia polftica intemacional enquanto sutil em prover as RI de alguns fatores de producao como dinheiro e tecnologia quase nao se manifesta a respeito de outro fator das rela 6es intemacionais o trabalho 0 crescimento dos estudos sobre mu lheres foi igualmente por muito tempo ignorado no campo das RI 2Dentre as raras exceoes de discus sao relevante da literatura de relacoes internacionais estao Georgina Ashworth The UN Womens Conference and international linkages in the womens movement em Peter Willets ed Pressure Groups in the Global System London Farnces Pinterm 1982 e Ellen Bonepath ed Women Power and Polity New York and Oxford Pergamon 1982 parte 4 Sheila Rowbotham Hidden from History Three Hundred Years ofWomen s Oppression and the Fight Against It London Pluto 1973 162 Fred Halliday Aiem disso existe a definicao convencional do que constitui o objeto de estudo das relaoes intemacionais a high politics as ques toes de polftica estatal especialmente aquelas referentes a seguran ca e a administracao macroeconomica As questoes de genera tern urn Iugar pouco aparente nesta hierarquia Mesmo o alargamento das relacoes intemacionais para abranger mais questoes transnacionais distintas da seguranca e nao necessariamente mediadas alraves dos Estados pouco tern feito para corrigir esta situacao A literatura so bre o transnacionalismo e a sociedade mundial mantem o silencio sobre as questoes de genero tanto quanto ada high politics A reserva academica e composta pelo fato de que o terreno da pratica intemacional em ministerios exteriores ministerios de defesa e 6rgaos polfticos relacionados e ele proprio urn domfnio especial mas culino distante inclusive das normas prevalecentes em outros cor pos de formulaaO de polfticas como indicado pelo numero fnfimo de mulheres em ministerios exteriores ou de embaixadoras pelo mun do Na ideologia convencional as mulheres nao sao preparadas para tais responsabilidades e nao se pode contar com elas em ques toes de seguranca e crise Nada poderia estar parece mais distante da esfera tradicional das preocupacoes das mulheres do que a segurana intemacional e as outras questoes globais4 Existe uma razao mais fundamental para a cegueira de genera na maior parte das rela6es intemacionais uma suposiao de separaao entre as duas esferas a de genera e a das relac6es intemacionais Aiem do mais esta suposicao e compartilhada pelas RI e pela maior parte da literatura feminista Por urn lado presumese no escrito academico que as relaoes intemacionais como tais sao pouco afetadas se o sao de alguma maneira pelas questoes relacionadas as mulheres Colocando isso em termos simplistas a suposicao e de que se pode estudar o curso das relaOeS entre OS Estadossem referenda as quest6es de genera Alem disso ao negligenciar a dimensao de genera as relaoes intemacionais implicitamente ap6iam a tese de que OS procesSOS intemacionais sao eles mesmos neutros em genero isto e que eles nao tern nenhum efeito sobre a posicao e o papel das mulheres na sociedade e sobre o posicionamen to relativo de mulheres e de homens De sua parte o feminismo preo cupado acima de tudo com o interpessoal o subjetivo o privado ana lisa as formas de dominaao a ideologia e a divisao do trabalho a partir da estrutura classica da sociologia e da psicologia ortodoxa a socieda de em separado a famflia ou individual Portanto ambas contribufram para fortalecer o abismo entre as RI e o feminismoJ 4Para a discussiio desta questiio ver Edward Crapo I ed Women and American Foreign Policy Westport CT Greenwood 1987 Na metade dos anos 1980 urn conselho de mulheres de polftica extema foi estabelecido por urn grupo de mulheres americanas incluindo Bella Abzug e Mim Kelber pedindo uma maior alocaiio de mass a crftica de mulheres em posioes senior de polftica extema e defesa Repensando as rela6es intemacionais 163 0 fato 6 que como em outras pniticas sociais os processos inter nacionais possuem efeitos de genero dos militares e economicos aos de formaao e difusao de imagens sobre as mulheres e de modismos feministasJA hist6ria da politica estatal sobre o que pode a primeira vista parecer ser a mais privada e individual questao de todas qual seja a reproduao humana esta repleta de casos nos quais os Estados bus caram influenciar a taxa de natalidade ate muito recentemente para aumentar o numero de nascimentos como parte da competiao inte restatal No seculo XIX varios pafses a GraBretanha e a Frana inclu fdas perceberam estes nascimentos no sentido biol6gico e social como uma parte central da nova ordem imperial e militarista nas palavras de urn dos eugenistas imperiais Caleb Saleeby A hist6ria das naoes 6 determinada nao no campo de batalha mas no berario e os batalhoes que dao a vit6ria final sao os batalh5es dos bebes A polftica do futuro sera domestica Ou em termos mais graficos Nao existe urn utero estatal nao existem seios estatais nao existe nenhum substituto real para a beleza da matemidade individual5 Na Frana eram concedidos pre mios estatais as mulheres que tinham dez crianas lsto estabeleceu uma ligaao entre a competiao interestatal e a taxa de natalidade uma ideologia e politica estatal de natalidade que misturava estere6tipos sobre as mulheres e os seus papeis re produtivo e socializador com concepoes de grandeza nacional e de dever patri6tico Ecos de ideias estatais similares podem ser encon trados em muitos Estados nacionalistas do seculo XX da Nicaragua dos sandinistas ao Iraque de Saddam Hussein 6 t linguagem da politica intemacional tambem sugere urn forte conteudo convencional masculino e freqlientemente homof6bico com sua enfase sobre a obstinaao e a competiao Se isto era explfcito na ret6rica imperial do fim do seculo XIX comeo do seculo XX com o culto social darwinista das naoes viris e seu direito de conquistar os mais fracos presumivelmente menos viris tern permanecido presente no discurso e no imaginario do conflito entre os grandes poderesJ 5Citado emAnna Davin Imperialism and motherhood History Workshop Journal n5 Spring 1978 p 29 6Sobre os sandinistas ver Maxine Molyneux The politics of abortion in Nicaragua Revolutionary pragmatismor feminism in the realm of necessity Feminist Review n29 spring 1988 p 123 Sobre Saddam Hussein ver Saddam Hussein awards medals to women says their role more important than mens BBC Summary of World Broadcasts parte 4 March 7 1992 ME1323N47 7Sem reivindicar que esta atitude era universal ou constitufa a verdade profunda da expan sao hegemonica na epoca do p6sguerra e vaIido relembrar a rendicao ficcional da rnissao americana como trazida pela consideracao de Norman Mailer da CIA na Guerra Fria Harlots Ghost London Abacus 1992 p7345 Rurninando sobre as visitas de seu colega Sherman aos bordeis de Montevideu o narrador especula Ele se via como urn born legionario do imperio americano possuindo as femeas nos pafses 164 Fred Halliday Na teoria e linguagem polftica classica as virtudes masculinas sao consideradas como as mais desejaveis nas rela5es intemacionais na verdade como a analise de Maquiavel mostrou o proprio termo virtu a qualidade do vir ou do masculino opoese a inconstancia de sua altemativa feminina a fortuna 8 Dentre muitas possfveis cita5es as prescrioes de Edmund Burke podem servir para ilustrar ainda mais o ponto9 Escrevendo em 1796 sobre a necessidade de confrontar a ameaa da Frana revoluciomiria Burke repreende os ingleses por suas crenas em sua pr6prias fraquezas e por aceitar o argumento que uma feminilidade frfvola tomouse o carater nacional Ao inves disso ele argumenta os ingleses superaram suas fraquezas Emergimos do golfo de desalento especulativo e fomos levados ao mais alto ponto do vigor pnitico Nunca o espirito masculine da Inglaterra se mostrou com mais energia nem o seu genio se levantou com maior orgu lhosa proeminencia sobre a Frana do que no periodo quando a trivoli dade e a feminilidade desta tinham sido consideradas como o seu caniter nacional pelo menos tacitamente pelas boas pessoas deste reino Dificilmente precisase ser urn p6smodemista para desconstruir as camadas do simbolismo de genero aqui No debate politico contemporaneo a linguagem polftica marcada pelo genero 6 freqliente 6 insultante ser chamada de uma Poliana uma chorona ou uma molenga As mulheres que vieram a ocupar posioes polfticas no topo tinham em sua maioria buscado assegurar a sua con traparte masculina e as opini5es publica masculina e feminina que poderiam ser tao fortes quanto os homens Golda Meir Margaret Tha tcher Jean Kirkpatrick todas se enquadram nisto 0 ditado Tudo vale no amor e na guerra sugeriria uma conexao entre estes dois domfnios hobbesianos Na verdade a analise da linguagem da estrategia militar e particularmente de sua variante nuclear revelou uma surpreendente pelos quais viajava Ou estava eu diferencas regionais a parte perto de descrever tambem a rnim mesmo Mesmo quando eu estava comprando uma bora de uma garota aquela noite e uma segunda mulher para uma segunda bora eu me sentia mais livre com aquelas estranhas do que jahavia me sentido em todos meus vinte e cinco anos talvez a raiz onde rninha ganancia estivesse guardada finalmente estivesse se derramando sobre o Seculo Americano e eu tambem estivesse Ia fora copulando pela bandeira A propria ganancia tinhase transfonnado em uma emocao mais nobre e senti o brilho do poder interior como se eu estivesse finalmente ligado a grande mecanicadas coisas sobre Maquiavel Hanna Fenickel Pitkin Fortune is a Woman Gender and Politics in the Thought of Niccolo Machiavelli Berkeley University of California Press 1984 Sobre teoria ocidental mais genericamente Susan Moeller Okin Women in Western Political Thought Princeton Princeton University Press 1979 Diana Coole Women in Political Theory Brighton Wheatsheaf 1988 9Letters on a Regicide Peace Letter 1 em The Works and Correspondence of Edmund Burke v5 p 257 Repensando as rela6es intemacionais 165 incidencia de linguagem com genera na analise dos armamentos e 1 1 10 de sua posstve co ocacao LA emergencia das questoes sobre as mulheres dentro das rela coes internacionais envolve urn desafio duplo para qualquer supos ta separacao dos dois domfnios e urn desafio para ambas as RI e o feminismo se a primeira deveria ter que reconhecer em que grau a disciplina esta sujeita a percepcao de genera 0 ultimo teria que su perar a sua negacao da relacao entre as relacoes de genera e os pro cesses intemacionais e formular a sua analise e sugestoes para apre sentar uma alternativa em termos menos abstratos ou ret6ricos Urn aspecto do desafio e revelar como as questoes de genera e valores poderiam desempenhar e desempenham urn papel nas rela coes internacionais o segundo e analisar as conseqtiencias especffi cas de genera dos processos intemacionais sejam estes militares eco nomicos polfticos ou ideol6gicos Esta ultima modificacao teria im plicacoes para o estudo das relacoes intemacionais como urn todo ja que reside sobre o argumento desenvolvido em maior extensao nos capftulos anteriores de que as relacoes intemacionais deveriam estu dar as conseqtiencias domesticas dos processos internacionais o im pacto resultante destas mudancas intemas sobre as relacoes intemaci onais e a esfera dos processos internacionais tout court UMA PREOCUPAcAo EMERGENTE QUATRO DIMENSOES Vinte anos depois da emergencia do feminismo dentro das ci encias sociais alguma percepcao dentro das relacoes internacionais da relevancia deste t6pico temse tornado evidente Pode set valio so identificar OS fatores que levaram a mudanca Tern ocorrido al guma interacao entre as relacoes intemacionais e as outras ciencias sociais sobre as questoes de genera de forma que as questoes e os conceitos levantados em disciplinas cognatas podem ser vistas como relevantes para o terreno internacional 0 Genero e a Teoria 0 crescimento de uma corrente feminista dentro da teoria polftica e social produziu analises com evidentes implicac5es para a teoria das 10 A classica e bastante engracada considerayao dis to e Carol Cohn Sex and death in the rational world of defense intellectuals Signs v12 n4 Summer 1987 0 voyeurismo sugerido pelos vfdeos do Pentagono de mfsseis de cuzeiro atingindo seus al vos na Guerra do Kuwait nao deve ter escapado aos telespectadores 166 Fred Halliday relacoes internacionais11 Estas incluem as crfticas do poder e de sua simbolizacao em termos de genera assim como discussoes das defmi coes especfficas de genera da seguranca dos direitos e a autcridad 9s direitos humanos por exemplo tomaramse uma questao mwto mats relevante nas relac5es intemacionais e a medida que adquiriram uma dimensao de genero sao diretamente relevantes para a analise do papel dos Estados e dos outros atores em promover ou negar os direitos para mulheres lsto ocorre na arena polftica mais ampla assim como em are as de maior disputa como o casamento e a lei de farm1ia a contracep cao e o aborto as polfticas para o emprego feminino e as respostas para o estupro e as outras formas de violencia contra a mulherJ As discuss5es envolvendo os problemas associados ao conceito de interesse nacional tern tornado mais evidente 0 seu carater freqtientemente partidario e especffico de grupo Enquanto muito da crftica ore o interes se nacional enfatiza as diferencas envolvendo grupos soctais mteresses burocraticos ou etnicos e grupos religiosos esta crftica evidentemnte po deria ser estendida sabre a questao de se as definicoos de interesse nacional SaO especfficas de genero e se beneficiam OS homens mais do que as IDU lheres em circunstancias particularesO mfnirno que pode ser dito e que polfticas diferentes sejam ela militares ou economicas podem ter efeitos variados sobre os homens e as mulheres e que qualquer suposico de neu tralidade de genero e discutfveD Se esta crftica das categorias das RI em termos das teorias feministas tern tambem irnplicacoos epistemol6gicas mais am plas como algumas feministas sugeriram que ela possa levar a formas al temativas de racionalidade conceitualizao e expressao e uma outra ques tao a qual retomarei mais tarde neste capitulo Os Processos Transnacionais segunda dimensao da interacao entre as mulheres e a esfra intemacional e em que medida as polfticas e OS proceSSOS mtemaciO nais Ionge de serem neutros de genera na pnhica desempenham urn importante papel na determinacao do Iugar das mulheres na socieda de e na estruturacao das relacoes economicas sociais e polfticas entre os sexosIsto e mais claro e com freqtiencia brutalmente evidente na Para umtrabalho geral sobre teoria polfticae genero verAnne Philips Engendering Democracy Cambridge Polity 19 e Carol Pateman The Sexual ContractCambridge Polity 1988 e Okin e Coole nota 7 Para uma visao crftica do escrito feminista nas Rl ver MacysiaZalewski Feminist theory and international relations em From Cold War to Collapse Theory Wold Politics in the 1980s Cambridge Cambridge University Press 1993 Sobre teonapolftica intemacional ver o capitulo de JAnn Tickner em Rebecca Grant e Kathlee Newland Gender and International Relations Milton Keynes Open University Press 1991 e seu Gender and lntematioiWl Relations Oxford Columbia University Press 1992 Repensando as rela6es intemacionais 167 atividade que e a quintessencia das RI e do conflito interestatal a guerra Deixando de lado a questao sobre se existe ou nao uma posiao especffica das mulheres a respeito da propria guerra nao pode haver duvida de que a guerra tern multiplas implicaaes para as mulheres as mulheres vieram a simbolizar muito os motivos da guerra o pafs ou a patria a sua proteao de ataques e elas tambem sao mobilizadas ere alocadas pelo Estado em varias novas atividades reprodutivas produti vas e mais limitadamente militares Uma das mais reveladoras dimen soes desta realocaao e 0 emprego de mulheres em areas de trabalho que em tempos de paz sao reservadas aos homeQSLfQIQ Qharia e as fabricas de muniao das quais como o filmBqlh Rivetebem mostrou sao retiradas assim que retoma a normalidade fKs mulheres tambem sao as principais vftimas da guerra nao somente como civis sem genera mas como objetos de estupro As guerras na exJugoslavia que comearam em 1991 chamaram es pecial atenao para o papel do estupro como urn sfmbolo de subju gaao e humilhaao urn meio de propagar a raa superior e urn tema para mobilizar a furia etnica 12 0 estupro tern sido recorrente nas guerras modemas como efeito secundario e como instrumento de politica a hist6ria da guerra mundial como urn conflito de genero indo do estupro japones em ambos os sentidos de Nanking em 1937 ate a legitimaao do estupro pelo Exercito Vermelho quando avanava para o oeste ainda permanece para ser escrita3 Em contextos nao militares o impacto dos processos intema cionais sobre as mulheres e talvez mais 6bvio na economia nas decadas recentes os processos economicos intemacionais tern afe tado profundamente as mulheres nos pafses desenvolvidos e menos desenvolvidos Os novos pafses industrializados assistiram ao recru tamento em massa de mulheres em industrias de alta tecnologia 14 12Sobre is to ver os relat6rios de Dame Anne Warburton EC Investigative Mission into the Treatment of Muslim Women in the Former Yugoslavia Report to the EC Foreign Ministers February 1993Amnesty International BosniaHerzegovina Rape and SexualAbuse by Armed Forces January 1993 13Sobre o Exercito Vermelho vera troca sintornatica entre Stalin e seus interlocutores iugoslavos sobre o assunto em Milovan Djilas Conversations With Stalin London Penguin 1962 p 87 8 Depois p 132 descobrimos que Marshal Zhukov foi despedido de seu posto como roman dante das f sovieticas porroubar j6ias naBerlimocupada VOce sabe o camaradaStalin nao agUenta a imoralidade urn de seus assessores confidenciou ao autor 14Para uma visao da literatura sobre isto ver Ruth Pearson Latin American women and the new international division of labour a reassessment Bulletin of Latin American Research v5 n2 1986 e para uma analise previa Diane Elson e Ruth Pearson The subordination of women and the internalisation of factory production em Kate Young Carol Wolkowitz e Rosalyn McCullagh Of Marriage and the Market Womens Subordination in International Perspective London CSE 1981 168 Fred Halliday I Em pafses do Terceiro Mundo as mudanas no emprego agricola assim como os altos indices de migraao masculina para os Estados mais ricos do Terceiro Mundo ou para os pafses mais desenvolvidos tern tido grande impacto nos papeis e nas responsabilidades das mu lheres As poHticas de ajuste estrutural buscadas por inumeros go vemos do Terceiro Mundo nos anos 1980 freqlientemente sob os auspfcios do FMI e Banco Mundial tiveram conseqUencias especf ficas de genera a medida que OS nfveis salariais deterioramse as mulheres sao freqlientemente compelidas a trabalhar nas areas me nos remuneradas enquanto os servios publicos financiados dos quais mulheres e crianas sao particularmente dependentes depreciam se Assim as mulheres parecem sofrer urn onus desproporcional nas es trategias de refinanciamento da dfvida Nos pafses desenvolvidos a mudana industrial promoveu o em prego de mulheres em algumas areas e o reduziu em outras 13 0 cres cimento em alguns pafses desenvolvidos de uma classe baixa com pasta largamente de mulheres e crianas e em parte urn produto das novas formas de competiao intemacional a esfera poHtica a entrada das mulheres na vida poHtica como votantes e sujeitos polfticos urn fenomeno intemacional norrnalmente experimentado e subseqlientemente apresentado como urn puramente nacional foi uma das mudanas mais marcantes do seculo XXJ Mesmo a mais separada de todas as arenas as relaoes familiares tern sido afetada de muitas maneiras pelas transforrna96es intemacio nais neste seculo pelas mudan9as na medicina especialmente na con tracepao pela disseminaao de tecnologias domesticas pela difusao de novos papeis e ideologias das relaoes homemmulher pafscriana pelas como ja notado polfticas estatais motivadas pelas supostas ne cessidades da competiao interestatal nas taxas de natalidade A forma ao da posiao das mulheres na sociedade na economia e em casa con siderado tudo que e privado e sujeito a varia5es nacionais deve muito as transforma5es e tendencias que sao intemacionais e transnacionais Nao existe dimensao das rela5es transnacionais mais controver tida e de longa duraao do que a religiosa Nao e diffcil ver como as mudanas na polftica e modismos religiosos tiveram em anos recentes como tambem antes conseqliencias diretas para as mulheres Isto e ver dadeiro para as mulheres nos pafses islamicos nos quais a ascensao dos movimentos islamicos nos anos 1970 e 1980 afetou muitos aspec tos de suas vidas e tambem se aplica as comunidades cat6licas nas quais a reafirmaao da doutrina tradicional sabre a reproduao tern s Haleh Afshar e Carolynne Dews eds Women and Adjustment Policies in the Third World London Macmillan 1992 Jeanne Vickers Women and the World Economic Crisis London Zed 1991 Repensando as relaoes intemacionais 169 provocado resistencia disseminada Com o risco de algum exagero e possel estender 0 slogan do movimento das mulheres que 0 pessoal e politico para afirmar que 0 pessoal e intemacional no sentido de que as relaoes interpessoais e micropoliticas sao bastan te influenciadas pelos processos transnacionais Se isto nao se apli ca de muitas maneiras existem muitas outras nas quais e real mais do que o sensa comum nos faria acreditar Os processos intemacio nais freqlientemente nao sao neutros de genera e as relaoes de ge nera apesar de toda a sua autonomia nao sao separadas dos fatores intemacionais Muitos destes fatores juntaramse em urn processo intemacional que comeou nos anos 1980 e que marcou todas as mulheres que esta vam vivendo nos pafses afetados o colapso do comunismo Este foi em muitos aspectos urn fenomeno intemacional e transnacional os regimes comunistas entraram em colapso principalmente por causa de sua ina bilidade em sustentar a competiao interestatal as mudanas que entao ocorreram dentro deles envolveram a gradual intromissao e em alguns casas a imposiao de modos ocidentais de comportamento social poli tico e economico e da emergencia de formas nacionalistas e religiosas nativas de ideologiaQs efeitos nas relaoes de genera foram multiplos o fim dos con troles comunistas levou a urn aumento na prostituiao e na pomografia esta ultima associada a liberdade e a modemidade ociden tal ao desemprego de milh5es de mulheres e ao colapso dos sistemas de bemestar incluindo alguns especificamente projetados para ajudar as maes que trabalham 0 novo chauvinismo destacou o retorno das mu lheres para casa e a necessidade do respeito a valores familiares tradi cionais contra os valores impastos ou cosmopolitas do comunismoJ As mulheres nao experimentaram a transiao do p6scomunismo unicamente como vftimas e em muitos aspectos se beneficiaram mais obviamente em termos de liberdades polfticasositivas ou negativas as mudanas as quais foram submetidas originaramse de uma crise inter nacional e tiveram amplos impactos semelhantes em diferentes pafses As Mulheres como A to res Internacionais Terceiro a despeito da subordinaao que as mulheres tern ex perimentado e experimentam em anos recentes elas adquiriram maior proeminencia como atores internacionais Isto tern sido ver dadeiro em questoes sobre a guerra e a paz o desenvolvimento eco 16Maxine Molyneux Marxism feminism and the demise of the Soviet model em Grant e Newland eds Gender and International Relations e seu The women question in the age ofperestrbikaNew Left Review 183 SpetemberOctober 1990 Peggy Watson The new masculinism in Eastern Europe New Left Review nl98 MarchApril1993 170 Fred Halliday nomico e social e no crescimento do proprio movimento de mulhe res que em sua preocupaao em alterar a posiao eo pensamento em varias questoes sociais e pessoais disseminouse atraves do mundo desenvolvid e tern tido consideravel ressonncia tambem no Terceiro Mundo A disseminaao das organiza5es de mulheres e campanhas atra ves de fronteiras desde o final dos anos 1960 e urn exemplo marcante de transnacionalismo Este e urn dos mais claros casas de atores niio estatais ja que seguramente pode ser estabelecido que as mulheres como urn grupo nao detem poder estatal em qualquer urn dos 190 pafses independentes do mundo Este desenvolvimento e caracteriza do por ambos o crescente transnacionalismo de organizaao e de debate sabre as questoes de mulheres e pela combinaao da mobili zaao sabre as questoes de mulheres com a aao em questoes inter nacionais mais convencionais Assim como em muitos aspectos do transnacionalismo e do feminismo esta combinaao e menos recente do que freqlientemente se supoe Urn dos mais marcantes movimen tos transnacionais dos tempos modemos foi o de apoio ao sufragio feminino nas duas primeiras decadas deste seculo Enquanto questoes de genera sao vistas como questoes pesso ais ou unicas por muito tempo elas formaram parte de uma visao politica e ideol6gica mais ampla como e evidente nas campanhas para promover a igualdade das mulheres e nas que a elas se opunham ligaao entre as questoes de mulheres e a mudana politica e intema cional estava evidente no tempo da Revoluao Francesa nos escritos de Mary Wollstonecraft dentre outrUma das fundadoras do inter nacionalismo socialista nos anos 1840 foi a feminista Flora TristanY Similarmente oposiao a igualdade das mulheres pode freqlientemente ser correlacionada com certas atitudes sabre as questoes intemacio nais No infcio dos anos 1980 uma das mais ativas opositoras a Emenda de Direitos Iguais a Constituiao dos Estados Unidos era Phyllis Schla fly uma Hder da ala da direita que tambem tinha escrito tres livros sabre a estrategia nuclear nos quais ela exigia que os EUA tivessem a capa cidade nuclear do firststrike contra a URSS e acusava Nixon e Kis singer de serem marionetes de Moscou As Mulheres e a Politica Externa Muitas areas da polftica extema tern urn componente especffi co de genera Comeando com a questao da guerra o nucleo con 17Ela foi uma das fundadoras da teoria do intemacionalismo proletiirio Dominique Desanti Flora Tristan Vie Ouvre Melees Paris Union generale deditions 1973 Repensando as relac6es intemacionais 171 vencional do assunto existe lima riqueza de discussao sobre a con tribui9ao especffica das mulheres na preven9ao da guerraTFreqtien temente existe uma ambigtiidade conceitual aqui ja que cdmo Ruth Roach Pierson demonstrou existe uma distin9ao entre derivar uma posi9ao feminista sobre a paz do papel da mulher como mae e de bater esta posiao partindo da constata9ao que as mulheres sao pes soas normalmente separadas do acesso aos meios da guerr A despeito disso a discussao sobre as mulheres e a paz tern uma lon ga tradi9ao analitica e militante Se esta conexao foi evidente na decada de 1980 em campanhas contra as armas nucleares foi igual mente uma caracteristica das campanhas de paz antes e durante a Primeira Guerra mundial 19 Adicionalmente existe discussao substancial sobre o papel das mulheres na guerra como combatentes em situa9ao de resistencia a ocupayao e apoiando politicas militarista Nos anos recentes a dis semina9ao dentro dos pafses da OTAN de recrutamento feminino em exercitos regulares em tempos de paz gerou urn debate amplo sobre como as mulheres podem se integrar e se integram as estruturas mi litares 21 A disputa sobre o papel das mulheres em servi9o na invasao dos EUA do Panama e na Guerra do Golfo na qual 30 mil mulheres estavam entre os 500 mil soldados americanos enviados serviu para destacar quanta resistencia a mudan9a ainda existe sobre esta questao 18Para a discussiio destas questoes ver Sharon Macdonald Pat Holden e Shirley Ardener eds Images of Women in Peace and War London Macmillan 1987 especialmente o ensaio de Ruth Pearson que elabora a distiniio entre uma critica feminista baseada sobre as ideias de matemidade e uma derivando da separiio das mulheres nos meios da guerra Uma discussiio excelente das quest6es envolvidas e Micaela di Leonardo Morals mothers and militarism antimilitarism and feminist theory Feminist Studies v11 n3 Fall 1985 19Ver Anne Wiltsher Most Dangerous Women Feminist Peace Campaigners of the Great War London Pandora 1985 e Lela Costin Feminism pacifism internationalism and the 1915 International Congress of Women em Judith Stiehm ed Women and Mens War Oxford Pergamon 1983 Urn estudo fascinante da relaiio entre o movimento das sufragetes OS sindicatOS e 0 movimento de independncia irlandesa as vesperas da Primeira Guerra Mundial e apresentado por George Dangerfield em The Strange Death of Liberal Eng lang New York Capricorn 1961 A tese de Dangerfield e que a combi naao destas tres foras de oposijiio ameaava a derrubada 9o Estado britfulico e que seu desafio somente foi eliminado pela eclosiio da guerra 20Stiehm ed Women and Men S War Jean Bethke Elshtain Women and War New York Basic 1987 0 trabalho previo de Elshtain tern sido objeto de debate considera vel como em Judith Stacey The new conservative feminism Feminist Studies 21Judith Stiehm Bring Me Men and Women Mandated Change at the US Air Force Academy Berkeley CA University of California Press 1972 Cynthia Enloe Does Khaki Become You The Militarisation ofWomenS Lives London Pluto Press 1983 Wendy Chapkis ed Loaded Questions Women in the Military Amsterdam Transnational Institute 1981 172 Fred Halliday no aparato militar e publico assim como a complexidade de questoes subjacentes pelo menos de uma perspectiva feminista 22 Poi por aca so que em 1993 em seu primeiro ano no cargo como Secretario de Defesa dos Estados lnidos Les Aspn efrento tres questoes crfti cas cada uma corponficando uma questao de genera mulheres em combate direitos homossexuais e assedio sexual Se existe uma dimensao significativa de genera no que suposta mente e 0 nucleo t6pico das rela95es intemacionais dimensoes com paraveis podem ser encontradas em outras areas da disciplina As ins tituiy5es intemacionais devotam muito mais aten9a0 a posi9a0 das mulheres dentro das sociedades assim como nas rela9oes entre elas e a Decada da ONU para as Mulheres 19761985 gerou interesse disseminado em quest5es de direito intemacional poHticas de desen volvimento e politicas nacionais sobre as mulheres23 Tanto a ONU como a CE produziram urn corpo substantivo de politica e analise sobre a posi9ao das mulheres 24 Inumeras organiza9oes naogovemamen tais sao ativas em questoes femininas variando do geral como por exemplo a Unidade de Genera e Desenvolvimento da Oxfam ao especffico como a francesa Mulheres Vivendo Sobre Leis IsHimicas As dimensoes de genera da politica economica intemacional sejam estas com rela9ao ao emprego as divisoes sexuais do traba lho ao desenvolvimento OU a migra9a0 tambem estao COIDO ja des tacado recebendo muito mais aten9ao A ajuda extema urn dos aspectos mais proeminentes da poHtica economica intemacional dos Estados desenvolvidos adquiriu urn componente claro de genero Desde a metade dos anos 1970 urn compromisso em ajudar as mu lheres atraves de programas de desenvolvimento temse dissemina do nos paises da OCDE Organiza9ao para o Desenvolvimento Eco nomico e Cooperayao Diversos pafses europeus mais especifica mente a Suecia incluiram beneficios para as mulheres entre as con di9oes para o envio de seus programas de ajuda A Emenda Percy aprovada pelo Congresso dos EUA em 1973 estipulava que os pro 22Sobre o uso militar americano de mulheres no Golfo e em outros lugares ver inter alia Helen Vozelinker Women in the military deceptive feminist gain In These Times 1723 April 1991 Discutindo o caso da Capitiio Linda Bray que coinandou uma tropa de soldados no Panama ela escreve Gostaria que uma mulher que mata urn conjuge abusivo tivesse tanta publicidade e orgulho quanto a Capita Bray e as mulheres que serviram no Golfo 23Sobre a Decada da ONU para as Mulheres ver Carolyn Stephenson em Stiehm ed Women and Men S War 0 estudo classico das mulheres e desenvolvimento permanece o de Ester Boserup Women S Role in Economic Development Tambem Gita Sem e Caren Grown Development Crises andAltemative Visions Third World Women S Perspectives New York Monthly Review 1987 24Sobre mulheres e a CEE ver Catherine Hoskyns Women European law and transnational politics lnternationalJoumal of the Sociology of Law v14 n3 4 winter 1986 e The community of women Marxism Today January 1987 Repensando as rela6es intemacionais 1 73 gramas da USAID deveriam gastar anualmente pelo menos 10 mi lhoes de d6lares em projetos especialmente concebidos para bene ficiar as mulheres Particularmente genero e mulheres desempenham urn papel adicional na polftica extema como sfmbolos ou instrumentos de com petiao interestatal e de superioridade de uma sociedade sobre a outra Que isto tern pouco ou nada a ver com a preocupaao com as pr6prias mulheres deveria ser evidente assim como a revelaao de que estes discursos de genero nao significam que a polftica extema ou as relaoes intemacionais sao normalmente ou em algum senti do ultimo unicamente preocupadas com mulheres Mesmo assim ilustra a intercessao adicional de genero com a polftica extema de maneiras que ate agora tern sido subestimadas Enquanto os Estados ocidentais em oposiao a urn numero de or ganizaoes naogovemamentais tern sido cautelosos em fazer declara oes oficiais sobre os direitos das mulheres em outros pafses os Esta dos do Terceiro Mundo em oposiao ao que percebem como valores im perialistas nao tern sido tao reticentes A Republica IsHimica do Ira por exemplo freqtientemente tern atacado o que considera como o tratamento ocidental erroneo das mulheres Oaf o relat6rio de urn discurso do pre sidente iraniano Khamenei em 1989 A condiao das mulheres na sociedade ocidental e aterrorizante disse o Presidente Khamenei e continuou para detalhar a sua opressao hist6rica como meros objetos de prazer a despeito das reivindicaaes enganosas do ocidente de liberdade para as mulheres e de seus papeis na sociedade Em oposiao marcante com a honra e o respeito acordado as mulheres no Isla a sociedade ocidental degradouas ao nfvel mais baixo disse o Presi dente e deplorava a cultura da permissividade e nudez que da ao homem livre controle para explorar e insultar a sua personalidade25 Urn exemplo marcante desta exploraao estatal das questoes de genero vern de urn dos mais famosos epis6dios da Guerra Fria quando Nixon e Kruschev se encontraram em 1959 na cozinha modelo de uma exposiao americana em Moscou Este Debate da Cozinha conhecido como uma discussao sobre qual sistema era superior ao outro na verdade girou em tomo das questoes mais domesticas e de genero as mulheres e o trabalho de casa Isso nao significou que a Guerra Fria foi totalmente ou mesmo principalmente a respeito da subjugaao das mulheres ou da reorganizaao do tra balho domestico mas mostrou como sfmbolos de genero foram urn dos recursos ideol6gicos usados nesta competiao interestatal 25BBC Summary of World Broadcasts part 4 January 1989 ME0372 N5 1 7 4 Fred Halliday Urn historiador da Guerra Fria fomece os dois ados da hist6 ria comeando com a consideraao de Nixon Eles deixaram o estudio e com urn grande contingente de imprensa bri gando para colocar seus gravadores entre os dois homens eles entraram em urn modelo de cozinha americana A discussao continuou a medida que Nixon apontava as ultimas inovaoes Qualquer coisa que faa as mulhe res trabalharem menos e born Kruschev balanou a sua cabea Nao pensamos nas mulheres em termos de capitalismo Pensamos melhor de las Nixon disse que uma casa prefabricada como esta custaria somente 14 mil d6lares na America bern ao alcance do trabalhador medio A versao de Kruschev do famoso debate com Nixon e urn pouco diferente Completamente desconsiderando qualquer coisa dita no estu dio de televisao ele afirmou que quando chegou na cozinha pegou urn espremedor de limao e resmungou que coisa idiota aquilo era Tudo o que se precisa para o eM sao duas gotas de suco de limao Acho que demoraria mais para uma dona de casa usar esta invenlio do que levaria para ela fazer o que fazem as nossas donas de casa que e cortar urn ode limao colocalo em urn copo de cha entlio espremer algumas poucas gotas com uma collier Este e o modo como sempre fizemos desde que eu era criana e nlio acho que este utensflio de voces e uma melhora em qualquer sentido26 Sejam quais fossem as suas outras diferenas com certeza ambos supuseram que seriam as mulheres que fariam o cha Resumindo existem pelo menos quatro maneiras distintas pe las quais as questoes relacionadas as mulheres e a arena intemacio nal tern atraves de varios processos recebido maior reconhecimen to nos anos recentes atraves do encontro do feminismo com a teo ria das relaoes internacionais atraves do reconhecimento crescen te das conseqtiencias especfficas de genero de varios processos transnacionais atraves da emergencia das mulheres como atores distintos na cena intemacional e atraves de uma crescente conscien tizaao do componente de genero nas questoes de polftica extema 0 ESTADO E AS MULHERES 0 NACIONALISMO E OS DIREITOS HUMANOS Muitas das questoes levantadas nestes quatro aspectos amplos da dimensao de genero nas relaoes intemacionais podem ser ilus 26Jeffrey Robinson The End of the American Century Hidden Agendas of the Cold War London Hutchinson 1992 p 2901 Repensando as rela6es intemadonais 1 7 5 tradas pelo exame de areas nas quais as questoes de genero fazem intercessao com valores e polfticas estabelecidas Dentre todos os t6picos urn dos mais disputados e relevantes e aquele referente as mulheres e ao nacionalismo outro igualmente diffcil e o Iugar dos direitos das mulheres na formulasao das relasoes interestatais Am bos levam ao que sao em termos convencionais conclus5es inacei taveis Isto somente poderia sugerir que eles colocam questoes que sao importantes em seu proprio direito e que tambem sao relevantes para a identificasao e a discussao de suposisoes subjacentes das relasoes intemacionais como urn todo A mudansa no sentido da palavra mae patria pelo menos dentro da lingua inglesa e ela mesmo reveladora em seu sentido original do seculo XVlli significava a terra como mae isto e fonte de algo se jam minerais ou artes e este foi o sentido ate 1840 Entretanto com a ascensao do nacionalismo no meio do seculo XIX ela adquiriu urn sen tido novo ideol6gico qual seja o do pafs de origem de uma pessoa Esta fusao de uma imagem de matemidade com a identidade nacio nal serviu a seus prop6sitos se existe uma suposisao de que a indepen dencia e o interesse nacional tern precedencia sobre as reivindicasoes de qualquer grupo especffico dentro da nasao tainbem existe uma suposisao de que em geral a disseminasao do nacionalismo e benefica para as mu lheres ja que elas sao uma parte da nasao 0 nacionalismo mobiliza as mu lheres na vida polftica exalta as tradis5es nacionais particulares com re Iasao as mulheres e por lhes dar direitos politicos como cidada fornece uma fundasao para superar as desigualdades especfficas de genero 27 Existe entretanto urn outro lado da hist6ria Os movimentos na cionalistas subordinam as mulheres em uma definisao particular de seus papeis e lugares na sociedade reforsam a conformidade com valores que sao freqiientemente definidos pelos homens e tomam possfvel deslegi timar pollticas altemativas sob a justificativa de que sao estrangeiras Como o fundador da moderna teoria nacionalista Mazzini deixou cla ro o nacionalismo era acima de tudo obediencia 28 0 uso de argu mentos nacionalistas e antiimperialistas para desacreditar e silenciar movimentos feministas nos anos recentes e indicador suficiente dis to Os Estados nao somente os novos Estados independentes exis tem para reforar hierarquias Por todo o mundo os homens tern visto 27Para uma visao abrangente ver Kumari Jayawardena Feminism and Nationalism in the Third World London Zed 1986 Para consideraoes crfticas ver Jan Pettiman Living in the Margins Racism Sexism and Feminism in Australia Sydney Allen Unwin 1992 e Deniz Kandiyoti Identity and its Discontents Women and the Nation Millenium v20 n3 1991 Nira Yuval Davis e FloyaAnthias eds Woman Nation State London Macmillan 1989 e Deniz Kandiyoti Women Islam and the State London Macmillan 1991 28 Norberto Bobbio Liberalism and Democracy London Verso 1990 p6872 1 7 6 Fred Halliday no Estado e nas ideologias que o legitimam das quais o naciona lismo e a mais potente urn meio de reforsar seus controles sobre as mulheres que este controle e freqiientemente exercido via uma ret6rica de exaltasao e respeito ou atraves de polfticas estatais que melhoram a posisao das mulheres nao elimina o caniter instru mental e subordinador desta pratica 0 nacionalismo esta Ionge de ser neutro de genero Ele busca mo bilizar as mulheres para apoiar seus objetivos a independencia e a con solidasao de urn regime p6sindependencia especificamente definido Os seus efeitos para as mulheres sao contradit6rios Como nacionalismos particulares tern afetado as mulheres em determinados pafses e urn im portante t6pico para a pesquisa e a analise assim como a mais ampla questao te6rica de ate onde uma percepsao da posisao das mulheres pode levar ao questionamento dos valores predominantes nas relas5es inter nacionais como os de soberania estatal e da primazia da independencia nacional Aqui certamente a longa tradisao da associasao entre o femi nismo e 0 intemacionalismo pode ser pertinente enquanto 0 ultimo e visto nao somente como uma fe na solidariedade intemacional mas como uma posisao morale polftica a partir da qual podem ser criticadas as rei vindicasoes nacionalistas e a autoridade dos govemos J a foi feita mensao do intemacionalismo de Flora Tristan e talvez a mais famosa de todas as declaras5es do intemacionalismo das mulhe res seja a de Virginia Woolf Escrevendo sobre uma mulher que e cha mada a apoiar o esforso de guerra ela responde Ela ira achar que niio tern nenhuma boa raziio para pedir a seu irmiio para lutar em seu nome para proteger nosso pais Nosso pais ela dira ao Iongo da maior parte de sua hist6ria tern me tratado como uma escrava te me negado educaiio ou qualquer parcela de suas possessaes Nos so pafs ainda deixa de ser meu se eu casar com urn estrangeiro Nosso pais me nega os meios de me proteger forlame a pagar a outro largas somas anualmente para protegerme e e tao pouco capaz de protegerme que precauloes contra urn ataque aereo estiio escritas em minha parede Portanto se voce insistir em lutar para me proteger ou a nosso pais deve ser entendido sobriamente e racionalmente entre n6s que voce esta lutando para satisfazer urn instinto sexual que eu niio posso compartilhar para encontrar beneffcios que eu niio compartilhei e que provavelmente niio irei copartilhar mas niio para satisfazer os meus instintos ou prote ger a mim mesma e a meu pafs Pois urn forasteiro ira dizer de fato como uma mulher eu niio tenho pafs Como uina mulher niio quero pafs Como uma mulher meu pafs eo mundo todo29 29Virginia Woolf A Room of Ones Own Three Guineas Oxford Oxford University Press 1992 p 313 A discussao de Woolf sobre a mulher e a guerra op5ese ao quadro muito diferente de trabalho de literatura produzido no mesmo ano Mother Courage and Repensando as rela6es intemacionais 1 77 Poderoso como e o argumento de Woolf levanta tantas dificul dades quanto resolve A sua formulaao das razoes de por que as mu lheres nao querem ter pais ou nao tern e baseada em tres diferentes considera6es instinto exclusao da igualdade em relaao aos homens e a proteao inadequada pelos homens A implicaao e portanto que nos dois ultimos casos pelo menos a posiao das mulheres mudaria se estas dificuldades fossem resolvidas A sua atraao moral tambem se choca com a hist6ria das mulheres no seculo XX alem do simbo lismo feminine do patriotismo possivelmente desconsiderado como o trabalho de homens esta o proprio modo ativo pelo qual as mulhe res se mobilizaram para apoiar os esforos de guerra e os movimen tos nacionalistas As aoes de massa de mulheres no conflito iugosla vo de 19913 agindo como mulheres para bloquear os suprimentos de comida para outras comunidades e uma ilustraao grafica disto Podese sempre fazer uso do conceito de falsa consciencia mas isto certamente nao sugere a identificaao polftica automatica das mulhe res com o intemacionalismo ou das mulheres com outros grupos na cionais Seja esta relaao nacionalista patri6tica ou antinacionalista ela certamente sugere urn numero de conex6es significativas e recor rentes entre as mulheres e a esfera intemacional Uma maneira possfvel de abordar a questao mais ampla e pela via do que pode ser classificado de femiilismo luxemburguista Rosa Lu xemburgo argumentou que a independencia das naoes deveria ser vista como condicional ate o ponto em que avanasse os interesses da clas se trabalhadora no caso da Polonia pre1914 ela debateu que a Polo nia deveria nestes termos permanecer como uma parte do Estado rus so 30 Urn argumento semelhante poderia ser levantado em relaao as mulheres e a independencia nacional a independencia de Estados es pecfficos deveria ser julgada por varios criterios incluindo ate em que medida a idependencia avanou a posiao das mulheres Em urn cer Her Children de Brecht London Methuen Drama 1990 no ultimo a mae nao e contra a guerra pois ela lhe peimite ganhar dinheiro e na verdade ela coloca as suas preocupa oes comerciais simbolizadas em sua carroa acima de suas supostamente matemais incorporadas em suas crianas ou em qualquer compromisso feminista com a a paz Em urn ponto quando existem rumores de paz Mae Coragem diz A paz ira apertar meu pescoo Fui e segui o conselho de Chaplain ate outro dia estava estocando mantimentos frescos E agora eles estao desmobilizandose e eu serei deixada sentada em minhas mercorias p 63 sua resposta a morte de sua ftlha e continuar como seu neg6cio lucrattvo p 87 Ambos os trabalhos foram escritos em 1938 a sombra da guerra mundial que chegava e continham ressonlincias estranhas do trabalho classico de RI de E H Carr The Twenty Years Crisis escrito ao mesmo tempo 30JP Nettl Rosa Luxemburg ediiio revisada Oxford Oxford University Press 1969 p50019 e Horace B Davis ed The National Question Selected Writings by Rosa Luxemburg New York Monthly Review 1976 178 Fred Halliday to sentido OS argumentos luxemburguistas nao SaO mais relevantes urn mundo de Estados independentes foi criado e a questao do apoio qua lificado ou nao para a sua criaao nao mais se aplica Porem e conce bfvel que em casos nos quais as ideologias nacional e nacionalreligi osa subordinem mais as mulheres do que a anterior dominaao exter na a autoridade dos Estados independentes e suas culturas oficialmen te sancionadas nao deveriam ser tomadas como autoevidentes as mu lheres tern o direito de desafiar a autoridade do Estado que supostamente representa a naao ou mesmo rejeitar totalmente e desde o princpio as suas reivindicaoes Em pafses como lrlanda e Malta onde o dtv6r cio ainda e banido a identificaao da naao com a autoridade do clero tern efeitos especialmente pemiciosos Como no caso do argumento luxemburguista original existem muitos contraargumentos 6bvios que a posiao das mulheres como membros de uma naao tern precedencia sobre a sua posiao como mem bros de urn genera subordinado que a independencia nacional e urn ob jetivo superior aos direitos dos membros individuais da naao que nao e possfvel superar as desigualdades setoriais de classe etnia e genera dentro de uma naao ate que a independencia seja alcanada Todos es tes sao argumentos poderosos e provavelmente iriam ganhar a discus sao em qualquer contexte Entretanto a crftica feminista do nacionalis mo e da soberania nacional iria pelo menos abrir estas quest6es para a discussao de uma forma que nao permitisse a suposiao da primazia au tomatica da independencia nacional e da soberania Virtualmente em to dos os casos nos quais o nacionalismo tern conseqliencias pemiciosas para as mulheres a discussao de suas implicaoes tern sido silenciada ou marginalizada pelo apelo a valores supostamente mais elevados Dado o predominio de uma estrutura nacionalista para a discussao as mulhe res que se opoem as formas de opressao legitimadas como tradicionais autenticas e populares e assim por diante tiveram que discutir que tais polfticas nao sao de fato aquelas da naao ou que sao historicamente jus tificadas Desta maneira os nacionalistas tern forado o argumento para seu terrene negando a legitimidade de uma discussao especifica sobre os direitos das mulheres Deveria ser possfvel rejeitar em termos uni versalistas ideias e praticas repugnantes sejam elas tradicionais ou qual quer outra coisa Certamente similar distorao nacionalista e evidente com referenda a outras questoes polfticas como os direitos das minori as etnicas dos trabalhadores e dos intelectuais31 3Estas questoes sobre os direitos das mulheres e a autenticidade nacionalista t8m sido colocadas de forma contundente especialmente em pafses nos quais a religilio define a posiao nacional sobre as mulheres IrlandaArgelia e Ira slio exemplos disto Uma critica dura ao etnocentrismo reverso e ao uso da ideologia nacionalreligiosa para subordinar as mulheres no Ira e oferecida por Azar Tabari The womens movement in Iran A hopeful prognosis Feminist Studies vl2 n2 Summer 1986 Questoes Repensando as rela6es intemadonais 1 79 A Are o moento tern havido pouca discussao de uma area na qual o genero podena desempenhar urn papel significativo na polftica exter a os direits humanos Mesmo assim o alcance para tal modificaao e enorme Vtmos espectalmente nos anos 1980 os Estados condicio narem o futuro de sus relaoes com outros pafses a sua performance domestica com relaao a algumas formas de direitos humanos e impo rem ou amea9arem impor san90es de variados tipos seas expectativas nao fossem cumpridas Tais demandas nao tern ate o momento englo bado OS direitos das mulheres A princfpio nao existe nenhuma razao para que nao possam ser levantados argumentos comparaveis Os paf ses com urn compromisso com a igualdade de genero poderiam mol dar suas politicas extemas de acordo e poderiam tentar mobilizar coali zoes na ONU como o fazem em outras questoes para colocar pressao sobre os Estados delinqfientes responsaveis por apartheids de genero No tina ds anos 1980 come9ou a haver uma mudan9a na de fim9ao dos due1tos humanos para englobar as preocupa90es feminis tas uma mudan9a que foi mais evidente como e freqlientemente o caso no trabalho das organiza9oes nao govemamentais32 Na Confe rencia Mundial das Naoos Unidas sobre Direitos Humanos em 1992 realzada em yiea houve uma consideravel participa9ao de grupo apmando os dtrettos das mulheres e a declara9ao final incluiu nove paragrafos sobre o status igual e os direitos humanos das mulheres Inumeros cass Podem entretanto ser observados nos quais os Estados ou a atlvtdade estatal come9aram a fazer dos direitos das mulheres urn elemento de polftica extema Urn caso marcante foi o da Republica da Coreia que buscou compensa9ao do Japao pelo tratamento das mulheres coreanas como mulheres de conforto as prostitutas para o exercito durante a Segunda Guerra mundial etre 100 e 200 mil mulheres foram envolvidas segundo noticiado33 Subseqlientemente as prostitutas que trabalhavam nas bases ameri canas na Filipinas tambem come9aram a exigir compensaoes pelas doenas sexuais que contrafram similares comrelaifcio ao Irli sao colocadas por Kate Millett Going to Iran New Ymk Coward McCann and Geohegan 1992 Para urn debate sobre o orientalismo feminista ver Mai Ghoussou Feminismor the eemal masculinein theArab world New Left ReviW n161 JanuaryFebruary 1981 e os artigos em The New Left Review n170 JulyAugust 1988 Ver por exemplo duas instrucoes Focus daAmnesty International Women and human nghts March 1990 Against their will Rape and sexual abuse in custody Febraury 1992 0 trabalho da rede Change e de sua organizadora Georgina Ashworth tambem foi importante para influenciar a atividade naogovernamental e estatal 33lntemational Herald Tribune Seoul tells Japan Compensate women January 22 1992 Of sex and lies apse teacher debunks comfort women myths IHT 29 JIu 1992 George Htcks They wont allow Japan to push the comfort women astde lHT 10 February 1993 Depois em 1993 o governo japons chegou a urn acordo como govemo coreano sobre a quesHio da compensacao 180 Fred Halliday Urn segundo exemplo diz respeito a uma importante mudan9a na polftica de imigraao do govemo canadense em 1993 pela pri meira vez permitiuse que uma mulher da Arabia Saudita reivin dicasse asilo polftico nos termos que como uma mulher a ela eram negados seus direitos humanos em seu pais de origem Urn terceiro caso se refere a pressao sobre o govemo irlandes para alterar seu banimento total sobre o aborto devido ao estupro seguido de gra videz de uma garota de 14 anos Aiem de ameaar a associaao da Irlanda a CE isto tambem gerou consideravel animosidade entre a populaao unionista da Irlanda do Norte que via no banimento uma polftica medieval confirmando o medo de que a incorporaao ao Sui levasse a dominaao da Igreja Cat6lica 34 A mais comum de todas as disputas interestatais com relaao aos direitos das mulheres e aquela em tomo de disputas maritais sobre 0 di reito de domicflio de mulheres e mais explosivamente em tomo da cus t6dia de crianas quando ocorre o div6rcio A GraBretanha a Frana e a Australia estiveram todos envolvidos em disputas com os pafses mu ulmanos quando os pais vindos destes Estados tinham em desafio aberto as instruoes da corte destes pafses lev ado as crianas de volta aos seus pafses de origem e negado acesso razoavel as maes Em nfvel popular estas questoes manipuladas pela imprensa demonstraram mais do que nenhuma outra a importancia do genero e das relaes intemacionais 0 desenvolvimento de uma polftica intemacional sobre os direitos das mulheres nao e uma questao simplesmente de reconhecimento do tema como a Conferencia de Viena em 1993 provou existem grandes diferenas de abordagem dentro de qualquer compromisso geral espe cificamente entre uma abordagem baseada nos direitos humanos e outra que enfatiza o status igual preocupada com a pobreza o emprego e ou tras formas de discriminayao Alem disso existem muitos problemas praticos em relaao a esta opao de tomar o8 direitos das mulheres uma questao de polftica extema no mfnimo os problemas de funcionalidade e de retribuiao Estes peri gos comuns a todas as campanhas de direitos humanos nao deveriam esconder o que provavelmente e a fonte mais profunda de resistencia a tais campanhas a crena de que enquanto algumas formas de violaao dos direitos humanos sao assuntos apropriados para a polftica extema aquelas pertinentes as mulheres nao o sao Em termos convencionais e ridfculo que as questoes de genero devam desempenhar este papel nas relaes entre os Estados soberanos Havera inevitavelmente muita dis cussao sobre as diferentes tradioes nacionais e portavozes oficiais ho mens e mulheres serao produzidos nos pafses preocupados em denunci ar a interferencia extema nos assuntos intemos de sua sociedade Os sen 34Rape victims case stirs unionist fears The Guardian 20 February 1992 Repensando as rela6es intemacionais 181 timentos nacionais e onde relevante os antiimperialistas serao mobiliza dos para confrontar qualquer desafio extemo a dominaao masculina e aos poderes estatais que os reforam e incorporam Aqui existem questoes diffceis tanto para a polftica como para a teoria o fracasso da emergencia de tais polfticas e as provaveis respostas a elas ilustram claramente quao importantes sao as ques toes da subordinacsao das mulheres na constituiao total das ideolo gias nacionais Tambem demonstra como urn compromisso para com a igualdade de genero alem de quaisquer conseqtiencias do mesticas ou de polfticas intemas coloca urn desafio para as concep 6es dominantes de autoridade e soberania nas pr6prias relaoes internacionais 35 IMPLICAQOES E PROBLEMAS 0 escopo do que convencionalmente e percebido como a discipli na das relaoes intemacionais temse expandido consideravelmente nos anos recentes para abranger novas areas tematicas e conceituais Somente nos anos 1980 a ascensao da economia polftica intemacional alterou muito do conteudo academico do ensino e da pesquisa No caso das mu lheres foi argumentado aqui com base em quatro consideraoes gerais que a disciplina pode e deve ajustarse a urn conjunto de questoes que ate o momento tern recebido pouca atenao Nao e como se a consideraao de genero fosse alterar o ensino e a pesquisa das relacsoes intemacionais como urn todo Ira entretanto fazer mais do que simplesmente adicionar outro assunto a lista de t6 picos considerados ja que em somat6ria as questoes especfficas que levanta e as altemativas a val ores estabelecidos que sugere a questao de genero nas relacsoes intemacionais ira reforar uma mudana ja presente na maior parte da literatura sobre o transnacionalismo e a economia polftica intemacional Esta envolve nao somente perguntar como os Estados e as sociedades relacionamse uns com os outros mas tambem como os processes intemacionais sejam estes intergo vemamentais ou nao fazem sentirse dentro das sociedades A fora da literatura da sodologia hist6rica reside em sua demonstracsao de como processos considerados como intemos aos Estados e economi as sao em grau considenivel produto de fatores intemacionais36 Uma das muitas contribuicsoes potenciais de uma abordagem de genero e relacsoes intemacionais poderia mostrar como as relacsoes de 3SOeorginaAshworth A Feminist Foreign Policy palestra dada no Serninano Geral do Departamento de Reloes Intemacionais LSE February 1987 36Ver Capitulo 4 182 Fred Halliday genero na economia na polftica e na famflia sao moldada e modi ficadas por processos externos a sociedade A questao podeiia ser portanto parte de uma reorientacsao ampla das relacsoes intemacio nais em direcsao ao estudo olio somente do comportamento interes tatal mas tambem de como os Estados e as sociedades interagem Que tal desenvolvimento colocara dificuldades consideraveis para o ensino e a pesquisa e evidente A foote mais geral de resistencia sera a relutancia em aceitar uma reorientacsao geral das relaoes intemacionais uma rejeicsao mesquinha das implicacsoes do feminismo para o in temacional 37 Mas tambem existem problemas mais especfficos e pode ser valido identificar alguns deles brevemente A producsao de uma literatura sobre o assunto comeou mas levara tempo para se consolidar apesar disso alguns materiais estao disponfveis de are as relacionadas a sociologia os estudos de desenvolvimento a hist6ria e podem ser usados como base para urn trabalho inicial Tambem existe a questao recorrente nos estudos sobre as mulhe res do equilfbrio entre a autonomia e a integracsao Deveria ser esta belecido urn programa distinto de ensino e pesquisa ou este traba lho deveria ser integrado na estrutura academica mais ampla Uma resposta inicial pragmatica seria que as duas abordagens sao neces sarias com opcsoes de especializacsao e pesquisa reforando a inclu slio do genero como urn item regular em qualquer curso ou livro abrangente de relaoes internacionais 38 Outros problemas te6ricos podem ser vistos como relevantes para este t6pico e sao pontos bemestabelecidos do debate em outras areas da ciencia social Urn eo problema do relativismo cultural a suposi csao de que valores referentes as mulheres e aos outros atores sociais va riam entre as sociedades e que portanto e dificil ou impossfvel fazer afirmaoes gerais sobre o que constitui discriminacsao ou dominaao em diferentes sociedades Isto emergiu diretamente das consideracsoes da posilio das mulheres em contextos nacionais e religiosos Com todos os riscos de incompreensao extema pooe ter havido muita concessao 37Para uma variante caracterfstica disto ver Christopher Coker Women and International Relations The Salisbury Review June 1990 38 Alguns dos que estao preocupados com isso tambem o estao com a questao do titulo os argumentos para a defesa de mulheres e as relaoes intemacionais assim como para gnero e relaoes intemacionais foram bern ensaiados com o primeiro sugerindo uma marginalizaao da corrente dorninante da disciplina e o ultimo comprometendose com a consideraao da constituiao de gnero alem de urn exame das pr6prias mulheres Na pratica pode existir menos diferena nos cursos e programas de pesquisa destes dois tftulos do que parece a primeira vista Urn programa intitulado Mulheres e Relaoes Intemacionais talvez prometa urn programa menos ambicioso do que urn curso reivin dicando abranger a ampla variedade de questoes levantadas pela analise de gnero a ultima englobando as construoes e os usos da masculinidade e das sexualidades alter nativas dimtro da esfera intemacional Repensando as rela6es intemacionais 183 1M ii4ilM 5 y sobre isso ao custo de nao serem consideradas e criticadas ideolo gias e pnlticas que em nome de tradioes nacionais e da autentici dade oprimem as mulheres Uma tendencia similar funciona com outras formas de poder ao Iongo de linhas de ra9a classe ou idade Enquanto uma percepao da relatividade e da diferen9a e essencial para uma explicaao de como e por que os sistemas de dominaao originamse e sao mantidos tal reconhecimento nao necessariamente leva a nao ser a partir de uma malcolocada generosidade antropo 16gica a negar que as formas de opressao existem e ocorrem em uma grande variedade de sociedades e de contextos hist6ricos 0 outro problema te6rico eo que poderia ser definido como totali zaao precipitada esta e a tendencia uma vez que foram estabelecidas conex6es entre os diferentes nfveis de pnitica social e polftica de ver tudo como expressao de urn mecanisme ou processo unico Neste contexto a considera9ao da rela9ao entre o genero e as rela96es intemacionais nao necessariamente leva a afirma9ao de que as questoes de genero consti tuem 0 nucleo dos neg6cios intemacionais como se fosse necessaria haver urn ou a chave para o entendimento da arena intemacional como urn todo Alem disso tambem nao se pode afirmar que todos os aspec tos da localiza9ao e da experiencia das triulheres podem ser derivados do intemacional as guerras quentes ou a guerra fria a soberania ou o nacionalismo podem ser mostrados como tendo componentes significa tivos de genero sem que isto implique que o genero os determine ou a todos os aspectos de qualquer evento ou processo intemacional relacio nados Defender is to em algum retrabalho ferninista do conceito de to talidade hegeliano seria distorcer o caso Ao mesmo tempo muito tern sido feito para mostrar que seja quais forem as distin96es que prevale9am as questoes relacionadas as mulhe res tern urn Iugar no estudo das rela96es intemacionais Grande parte da resistencia a esta ligaao provem nao de uma visao em particular das rela96es intemacionais mas de uma recusa em aceitar a validade das preocupa96es ferninistas em geral Assim como em outras disputas so bre as rela96es intemacionais e o metodo poderia ser melhor deslocar a discussao para este terreno geral ao inves de tentar resolveIa no contex te necessariamente restrito das rela9oes intemacionais Uma terceira questao que diz respeito aos debates metodol6gicos mais amplos dentro das RI envolve a rela9ao entre este t6pico eo debate sobre a epistemologia e o metodo levantado pelas RI 0 p6smodemis mo e as abordagens associadas tern como indicado no Capitulo 1 urn significado contradit6rio enquanto fomecem ferramentas para urn exa me inovador dos discursos e das identidades elas tambem introduzem uma etica e uma explicaao fortuita que sao igualmente inirnigas da ami lise substantiva e do engajamento normative No contexte de urn inte resse disseminado pelo p6smodernismo a teoria feminista tern sido cres centemente influenciada pelo ultimo e isto tern urn impacto nas RI com 184 Fred Halliday resultados previsfveis Enquanto a autoridade das abordagens tradi cionais tern sido enfraquecida a altemativa proposta tomouse uma nova ortodoxia de urn tipo vago e freqtientemente autoderrotista As questoes metodol6gicas de ampla relevancia sao disputadas den tro do contexte das RI epistemologias altemativas sao oferecidas mas tudo que se traz e confusao a propria suposi9a0 etica a partir da qual o t6pico come9a e sobre a qual se iniciou o ferninismo a de urn compromisso com algoma forma de emancipa9ao atraves da igualdade e rejeitada em urn frenesi de prolixidade e de rodeios Aqui alem de tambem considerar as criticas gerais do p6smo dernismo como uma funda9ao analftica ou posi9ao polftica e rele vante lembrar das crfticas particulares feitas a qualquer tentativa de promover o p6smodernismo como uma abordagem geral para as feministas 39 Aqueles facilmente desprezados como apoiando epis temologias de genero ou remedios parciais podem no fim ter mais a oferecer do que os protagonistas de uma loquacidade hermeneuti ca A sua acusaao de que tudo o que tern sido feito e adicionar mulheres e mexer pode ser respondido que a sua abordagem abran ge urn menu menos produtivo ainda adicionar epistemologia e mexer Seria de fato catastr6fico se ao integrarse nas RI o femi nismo como explica9ao e prescriao fosse desprovido de impacto e conteudo pela submissao as banalidades da moda intelectual o resultado seria que tendo superado a nega9ao das RI convencional ele estaria escondido de novo sob uma nova monotonia Se estes perigos sao reconhecidos de nenhuma forma eles impe dem urn possfvel ou desejavel engajamento ferninista nas RI Sem qual quer exagero parece que existe bastante trabalho a ser feito sobre as mu lheres e as relaoes internacionais Esperase que esta questao encontre reconhecimento como urn t6pico importante e distinto dentro do progra ma total da disciplina e que se tome urn elemento estabelecido da agen da de ensino Este reconhecimento ha muito lhe e devido 39Sobre a critica feminista do p6smodernismo e com especial referencia as Rl ver os comentarios vigorosos de MarysiaZalewski em Feminist theocy and international relations Mike Bowker e Robin Brown eds From Cold War to Collapse Theory and World Politics in the 1980s Cambridge Cambridge University Press 1993 Mais genericamen te Sabine Lovibond Feminism and postmodernismNew Left Review n178 November December 1989 Feminism and Pragmatism A reply to Richard RortyNew Left Review n193 MayJuen 1992 e Kate Soper Postmodernism subjectivity and the question of valueNew Left Review n186 MarchApri11991 Repensando as rela6es intemacionais 185 Capitulo 7 0 CONFLITO INTERSISTEMICO 0 CASO DA GUERRA FRIA UMA FORMA DISTINTA DE CONFLITO A discussao do Capitulo 4 foi baseada na afirmacao de que as rela coes internacionais abrangem mais do que as relac5es entre os Estados e mesmo mais do que o transnacionalismo a interacao e a reuniao das sociedades A variante constitutiva do conceito de sociedade intema cional discutida aqui indica a maneira pela qual as sociedades sao afe tadas pela pr6pria estrutura interna de outros Estados e sao levadas a for mas particulares de conflito quando estes sistemas divergem quando em outras palavras a sociedade internacional e caracterizada pela hetero geneidade 0 prop6sito deste capitulo e examinar em maiores detalhes o funcionamento de tal conflito intersistemico no sentido de que ocorre entre duas sociedades ou grupos de sociedade baseados em formas de organizacao polftica e social radicalmente diferentes e incompatfveis 0 foco principal sera sobre a Guerra Fria do periodo p6s1945 mas as im plicac5es sao mais amp las e vao ao nucleo do debate sobre a pr6pria so ciedade internacional e as relac5es internacionais 0 conflito intersistemico e uma forma especifica de conflito interes tatal e intersocietal no qual formas convencionais de rivalidade a mill tar a economica e a politica sao compostas por e freqiientemente legi timadas em termos de uma total divergencia de normas polfticas e soci ais As formas convencionais de competicao incluindo a guerra podem desempenhar urn papel mas a competicao de valores e igualmente im portante e pode repetidas vezes ser a principal dimensao em que urn lado do conflito prevalece sobre 0 outro Que tal conflito nao e especffico a rivalidade sovieticaocidental da epoca p6s1945 e evidente em casos previos como a rivalidade entre os imperios otomano e manchu em rela cao ao ocidente e em exemplos adicionais de rivalidades prolongadas em que o militar e o estraregico foram revestidos pelo desafio que era coloca do a urn sistema de organizacao social e polftica Mesmo nestes periodos Repensando as rela6es intemacionais 187 mais antigos OS conflitos entre OS poderes estrategicos OU blOCOS defini dos em termos religiosos tinham algumas das mesmas caracterfsticas 0 retrato do conflito entre o ocidente e o isla no final do seculo XX e urn mito ja que a despeito de reivindicacoes diversas do contrario a religiao nao mais desempenha este papel mas a maior parte do perfodo entre os seculos VII e XVI assumiu a forma de urn conflito intersistemico triangular estruturado em termos religiosos nao somente entre a cristandade e o isla mas entre as duas areas ri vais do mundo cristao o romano e o ortodoxo e uma sucessao de imperios islamicos baseados no leste do Mediterraneo As instan cias otomana e manchu a serem examinadas no fim deste capitulo fomecem urn exemplo para a comparacao mas tambem contrastes significativos com o colapso do bloco sovietico AS TEORIAS DA GUERRA FRIA A primeira vista a questao do conflito intersistemico e quase totalmente ausente da discus sao da Guerra Fria N a literatura acade mica e relacionada a polftica sobre a Guerra Fria e a rivalidade Leste Oeste desde 1945 tern havido dois debates principais o primeiro e uma argumentacao historica referente as causas e a responsabilida de pela Guerra Fria e o segundo e parcialmente estruturado na lin guagem do movimento de paz e parcialmente dentro das proprias RI com relayao a dinamica subjacente ao conflito 0 primeiro debate se encaixa em tres grandes fases o consenso anticomunista inicial o desafio revisionista e o novo consenso p6srevisionista 1 Embo ra desenvolvido em tomo da Primeira Guerra Fria de 194753 o mes mo debate sobre as causas e a responsabilidade elaborado simulta neamente e nao seqliencialmente pode ser identificado comrelayao a Segunda Guerra Fria de 197919852 Apesar de rico em detalhe his t6rico este debate sobre a Guerra Fria sofreu duas limitacoes 6bvias JL Gaddis The emerging postrevolutionist synthesis on the origins of the cold war Diplomatic History v 7 1983 Para uma vi sao da literatura critica ver Michael Cox Radical theory and the new Cold War em Mike Bower e Robin Brown eds From Cold War to Collapse Theory and World Politics in the 1980s Cambridge Cambridge University Press 1993 Cox tern muitas coisas pertinentes a dizer sobre as pesquisas dos escritores radicais sobre a Guerra Fria mas ele considera erroneamente duas questoes em meus trabalhos primeiro apesar deter discutido as responsabilidades hist6ricas distintas do Leste e do Oeste meu trabalho foi precisamente uma tentativa de analisar a rela9ao dinfunica entre os dois blocos e a contribui9ao de cada urn segundo ele parece aceitar de uma maneira naocritica as afirmoes sobre o expansionismo sovietico no Terceiro Mundo Mais importante Cox parece pensar que no fim a Guerra Fria terminou atraves da acomoda9ao mutua perdendo o fato hist6rico bastante amplo de que urn lado capitulou e que o 188 Fred Halliday por urn lado nasceu de uma conjuntura polftica especffica e foi do minado pelas preocupacoes desta situayao tanto para os revisio nistas como para os anticomunistas segundo foi conduzido em quase total inocencia das quest5es teoricas refletindo o empirismo da historiografia anglosaxa e do proprio debate polftico fora do centro 0 segundo debate sobre a dinamica do conflito LesteOeste con tinha uma percepcao urn pouco maior das quest5es teoricas mas em nenhum de seus dois contextos o do movimento de paz e o da literatura das RI o fundamento teorico foi substancialmente desenvolvido alguns aspectos especfficos do conflito o papel da ideologia a corrida arma mentista a administracao das crises receberam tratamento te6rico den tro das RI mas nao a Guerra Fria como urn todo A amilise do que foi a Guerra Fria permaneceu quase toda no nfvel preteorico no sentido de ter posic5es teoricas implfcitas ao inves de explfcitas e de falhar em per guntar quais poderiam ser as implicac5es da Guerra Fria para a teoria das Rl Abstraindose desta literatura entretanto podese dizer que este se gundo debate abrangeu quatro abordagens principais A titulo de conve niencia e com o risco de limitayao da visao estas podem ser categoriza das como a realista a subjetivista a intemalista e a intersistemica3 Para o realismo e para os sociologos hist6ricos que recentemente o adotaram a Guerra Fria foi uma continuayao da polftica dos Gran des Poderes embora com certos acrescimos como as armas nuclea res a corrida armamentista e a rivalidade ideologica entre o capitalis mocomunismo A suposiyao desta continuidade dentro do conflito intemacional foi facilitada pelo foco na polftica extema da propria URSS que foi percebida como mantendo os objetivos extemos do regime pre1917 eou dos EUA que foi percebido como simplesmente urn outro poder imperial4 nao somente visaviso Terceiro Mundo ou os europeus e os japoneses mas tambem visavis a URSS Por subjetivista fazse referencia aquelas teorias que anali saram a Guerra Fria em termos de percepcao e de percepcao erro seu sistema sociopolftico entrou em colapso Sua propria teoria largamente implfcita traz tra9os de urn trotskysmoresidual afinal existem s6 duas gangues do capilalismo eviden te em seu trabalho anterior ver nota 8 Nestes escritos ainda sob a influencia de uma abordagem trotskysta estatal capitalista Cox apresentamuitos dos gumentos que depois ele ridiculariza em outros escritos incluindo a tese de que somente a renov socialista no Leste e Oeste poderia trazer paz ao continente Entretanto mais oportunamente ele argumen ta que a Uniao Sovietica nao apresentava nenhum desafio ao oeste ou vice versa Para uma discussao previa desta literatura ver meu The Making of the Second Cold War London Verso 1983 Capftulo 2 e Vigilantism in international relations Kubalkova Cruickshank and Marxist theoryReview of international Studies vl3 n3 1987 4Assim em seu livro de teoria realista The Anarchical Society Hedley Bull trata o conflito LesteOeste no perido p6sguerra como uma ilustrao e confirma9ao deste argumento mais ample Muitos outrosMorgenthau Waltz etcfizeram o mesmo Para os realistaS nao existia urn problema conceitual Repensando as rela6es intemadonais 189 nea A Iiteratura de RI sobre a percepao desenvolveuse nos anos 1960 e 1970 nos escritos de pessoas como Janis e Jervis Ela suge ria que a politica externa em geral e erros em polftica extema em particular poderiam ser em grande medida atribuidos as percepoes possufdas individual e coletivamente por aqueles que formulam a politica extema e pelas populaoes que a influenciavam e constran giam Este argumento nao foi especificamente dirigido para a dis cussao da Guerra Fria mas teve implicaoes para ela Fosse o argu mento explicitamente estendido desta forma ou de outra ele era paralelo e reforava uma posiao comum entre OS escritores liberais sobre a Guerra Fria e as revoluoes em geral o conflito poderia ter sido evitado se somente cada urn dos lados tivesse sido melhor in formado sobre o outro uma poHtica diferente para a Russia de pois de 1917 China depois de 1949 Cuba depois de 1959 ou oeste sentido Frana depois de 1789 5 Tais discussoes tendem a nao dar enfase a necessidade dos compromissos ideol6gicos em cada urn dos lados com a revoluao mundial a solidariedaderecuo a interven ao e assim por diante e a destacar a importancia de melhor infor maao e de contato entre os Estados supostamente mas nao real mente comprometidos com a transformaao mutua 0 termo intemalista indica as abordagens que localizam a di namica da Guerra Fria dentro ao inves de entre dos blocos conten dores Esta abordagem tern diversas variantes pode localizar a foo te do conflito dentro da politica domestica e da estrutura socioeco nomica dos pr6prios dois Estados principais e por extensao dentro de outros Estados constituintes ou dentro de urn proprio bloco in temacionalmente constitufdo percebido como uma totalidade na qual a Guerra Fria e funcional para a manutenao da coesao do bloco e da hegemonia dos Estados dominantes dentro dele A versao mais direta disso e a tese das duas masmorras de Chomsky de acordo com a qual os EUA e a URSS buscaram a Guerra Fria para disciplinar suas pr6prias sociedades e seus respectivosjunior partners A Guerra Fria e urn sistema altamente funcional pelo qual as superpotencias controlaram seus pr6prios domfnios e por isso que ela continua e ini continuar6 0 trabalho de Mary Kaldor tern urn im pulso similar Argumentos como aqueles de Alan Wolfe que relaci onam a Guerra Fria ao funcionamento da polltica domestica dos 5Como discutido no Capftulo 5 o debate sobre a inevitabilidade do conflito entre os poderes revoluciomirios e os do status quo e encontrado inter alia com relacao a Revo luciio Francesa em Kim Kyongwon Revolution and International System New York New York University Press 1970 e ao Ira em James Bill The Eagle and the Lion 6Como citado em Cox Radical theory and the new Cold War p 44 Para uma tentativa de incluir Chomsky nestas quesroes ver nos so debate em Bill Bourne Udi Eichler e David Herman eds Writers and Politics Nottingham Russell Press 1987 190 Fred Halliday Estados Unidos sao uma versao altemativa7 Em varios artigos Mi chael Cox tern desenvolvido uma analise que e rica em detalhe di plomatico mas que igualmente nega que a Guerra Fria seja sobre qualquer coisa alem da rivalidade convencional entre dois blocos amplamente similares 8 Muitas exposioes da tese intemalista enfatizam a pressao para a confrontaao defendida pelos setores economicos caracte risticamente pelo complexo industrialmilitar A teoria de EP Thompson do exterminismo e uma das mais elaboradas variantes desta tese ja que percebe a corrida armamentista nao somente como urn resultado do que os produtores de armas desejam mas como uma dinamica que veio a caracterizar genericamente as sociedades em questao Argumentos intemalistas tendem a negar a eficacia do conflito LesteOeste em si mesmo e implicar urn grau de homologia entre as polfticas extemas e as estruturas intemas dos dois blocos9 Embora formulado principalmente nos anos 1980 este trabalho teve antecedentes significativos dentro da abordagem critica da socie dade e das relaoes intemacionais utna instancia classica disto foi o trabalho do soci6logo americano C Wright Mills cujo The Origins of the Third World War publicado em 1957 argumentava que uma guerra nuclear era cada vez mais inevitavel nao por causa das rela6es entre os blocos ou dos desenvolvimentos no Terceiro Mundo mas por causa das estruturas de poder dentro de cada pafs Desenvolvendo insights primeiro enunciados por Max Weber sobre o desenvolvimento do Es tado burocratico e militarista como urn resultado do conflito intemaci onal Mills cuja principal contribuiao a sociologia foi a teoria da elite do poder e do complexo industrialmilitar discutia que ambos os campos eram govemados por tais elites o que inevitavelmente levaria o tnundo a guerra 0 que era sintomatico no trabalho de Mills era que como Weber ele percebia o intemacional como a fonte da degenera ao dos Estados e da perda do controle democratico Segundo ao to roar uma definiao sociol6gica abstrata das elites do poder Mills dis solveu quaisquer diferenas substantivas entre os dois sistemas Assim Mills como Thompson embora lanando urn aviso oportuno sobre os perigos da guerra e da influencia militar sem controle falhou em fome cer qualquer analise substantiva sobre por que ou como os dois blocos estavam competindo na esfera intemacional e tambem de quais eram as diferenas pollticas e sociais essenciais entre eles 7Mary Kaldor The Disintegrating West London Penguin 1978 e The Imaginary War Understanding EastWest Conflict Oxford Basil Blackwell 1990 Alan Wolfe The Rise and the Fall of the Soviet Threat Washington Institute for Policy Studies 1979 Western Capitalism and the Cold War System em Martin Shaw ed War State and Society London Macmillan 1984 The Cold War as a System Critique n 17 1986 9EP Thompson Fred Halliday e Rudolf Bahro Exterminism and Cold War London Verso 1982 Repensando as rela6es intemacionais 191 0 argumento intersistemico pode ser rapidamente distinto de todas as outras tres abordagens 10 em oposiao ao realismo ele nega que a rivalidade LesteOeste seja somente uma continuaao da politica tradicional dos Grandes Poderes nao somente pelo questio namento da validade deste modelo supostamente universal e classi co mas pela atribuiao de urn Iugar central no conflito ao carater diverso e heterogeneo dos Estados competidores nas esferas nacio nal e intemacional em oposiao as teorias da percepao erronea ele afirma que os programas polfticos em disputa e as perspectivas ide ol6gicas dos dois blocos devem ser consideradas seriamente em bora nao unicamente e que os Estados formando os blocos eram em termos amplos comprometidos com a sua realizaao contra os intemalistas a abordagem intersistemica afirma que o conflito in ternacional tinha uma realidade em outras palavras que os dais blocos estavam preocupados nao somente com questoes internas Iueras hierarquia oil ordem mas tambem em melhorar sua posi ao relativa visavis urn ao outro e em prevalecer sobre o outro A teoria intersistemica pode ser resumida em tres proposioesnu cleo a a rivalidade lesteoeste foi urn produto do conflito entre dais sis temas sociais distintos b esta competiao envolve uma dinfunica com petitiva e universalizadora e c somente poderia ser conclufda com urn dos blocos prevalecendo sabre 0 outro 0 termo sistema nao e usado aqui para indicar o sistema intemacional em geral como designado na teoria convencional das RI nem a Guerra Fria como sistema no senti do de urn refoo mutua caracterfstico dos intemalistas mas para indicar a organizaao intema das sociedades e polfticas de cada bloco Existiu conseqiientemente alga especffico e necessaria uma contradiao subjacente e universalizante na dinamica das relaoes LesteOeste A Guerra Fria foi acima de tudo urn produto da hete rogeneidade no sistema intemacional para repetir da heterogenei dade da organizaao intema e da pnitica intemacional e somente poderia ser encerrada pela obtenao de uma nova homogeneidade 0 resultado disto foi que enquanto os dois sistemas distintos existi ram o conflito da Guerra Fria estava destinado a continuar a Guer ra Fria nao poderia terminar como compromisso ou a convergen cia mas somente com a prevalencia de urn destes sistemas sabre o outro Somente quando o capitalismo prevalecesse sabre o comu nismo ou viceversa o conflito intersistemico se encerraria Embora suprimida da maior parte da discussao hist6rica e ne gada pela inclinaao realista esta concepao de Guerra Fria foi re 10Para urn reconhecimento desta dimensiio intersistmica ver Oyrind Osterud Intersystemic rivalry and international order Understanding the end of the Cold War em Pierre Allan e Kjell Goldmann eds The End of the Cold War London Martinus Njhoff 1992 p4789 192 Fred Halliday conhecida por alguns dos que nela participaram Do lado sovietico ela assumiu varias formas a visao leninista original de urn processo continuo de revoluao mundial a teoria dos dais campos de Sta lin e a teoria brejneviana da correlaao de foras a sua maneira mais diversa e bastante perceptiva Do lado ocidental os polfticos nao tiveram dificuldades em arti cular a teoria da disputa entre os mundos comunista e livre cuja tendencia foi levar a urn conjunto de implica6es mais imediatas usu almente militares e a urn repetido exagero das capacidades sovieticas e da ameaa que elas representavam Uma exceao e a amHise de Geor ge Kennan primeiro formulada em seu Iongo telegrama de Fevereiro de 1946 e entao publicada em forma revisada em 1947 na revista Fo reign Affairs11 esta analise e melhor conhecida pela polftica de con tenao militar elaborada para impedir os avanos estrategicos soveti cos na Europa ou no Terceiro Mundo Mas talvez em retrospecttva seu mais importante argumento e o de como uma vez que a contenao fosse alcanada trabalharseia em dirao a erosao de Iongo prazo da confiana sovietica e daf do bloco sovietico Na analise de Kennan este objetivo e bastante claro a contenao estrategica e precondiao para 0 fracasso final do sistema comunista devendo este objetivo final ser atin gido pela fora do exemplo e pela confusao do idealismo revoluciona rio Ele destaca que o conflito levara urn Iongo tempo 0 Kremlin nao esta sob nenhuma compulsao ideo16gica para alcansar os seus prop6sitos com pressa Como a Igreja ele esta Iidando com concei tos ideol6gicos que tern uma validade de Iongo prazo e podese dar ao luxo de ser paciente Nao tern nenhum direito de arriscar as conquistas existentes da revolusao em troca de vas ninharias do futuro Em resposta ele propoe uma estrategia igualmente de Iongo prazo e paciente mas dermitiva em seu resultado Na realidade as possibilidades para a polftica americana nao sao de nenhu ma forma limitadas em manter a posisao e esperar pelo melhor E inteiramen te possivel para os Estados Unidos influenciar por suas asaes os desenvol vimentos intemos dentro da Riissia e atraves do movimento comunista in ternacional pelo qual a politica russa e amplamente determinada Isto nao e somente uma questiio da modesta medida da atividade intemacional que este governo pode conduzir na Uniao Sovietica enos outros lugares embora isto tambem seja importante Pelo contrano e uma questiio da medida em que os Estados Unidos podem criar entre as pessoas do mundo em geral a impressao de urn pais que sabe o quer que esta lidando com sucesso com os problemas de sua vida intema e com as responsabilidades de urn poder 11The sources of soviet conduct ForeignAffairs July 1947 Repensando as relac6es intemadonais 193 mundial e que tern uma vitalidade espiritual capaz de sustentarse entre as princpais correnes ideol6gicas do temlo A medida que tal impressao pode ser cnada e mantida os alvos do comumsmo russo precisam parecer estereis e quixotescos as esperanas e o entusiasmo dos que ap6iam Moscou preci sam desaparecer e adicionar pressao as polfticas externas do Kremlin Pois a decrepitude paralisante do mundo capitalista e a pa central da filosofia comunista Mesmo o fracasso dos Estados Unidos em experimentar a preco ce depressao economica que as aves de rapina da Praa Vermelha preveem com confiana complacente desde que as hostilidades comaram teria re percuss5es profundas e importantes atraves do mundo comunista nenhum movimento mfstico messianico e particularrnente nao aquele do Kremlin pode encarar a frustraao indefinidamente sem eventualmente ajustarse de uma forma ou outra a 16gica deste estado de coisas Assim a decisii rsidini e larga medida neste pr6prio pals A questao das relaoes soIeticoamencanas e em essencia urn teste do valor geral dos Estados Umdos como uma naao entre as naoes Para evitar a des truitiio os Estados Unidos precisam somente estar a altura de suas pr6prias melhores traditlies e provaremse dignos de preservatiio como uma grande natiio italicos adicionados2 Despojado de suas referencias especfficas aos EUA e de seu tom vanglorioso isto apresentou urn programa claro para a conduta de urn coflio intersistemic aseado acima de tudo na competicao entre dots sistemas e no obJetlvo nao da paz ou do compromisso mas de finalmente prevalecer sobre 0 outro 0 que e impressionante e como eta formulacao eplicitada em uma das afirmacoes estrategicas cllis sicas da Guerra Fna enconttou tao pouca reflexao na teoria das RI ou em subseqtientes reflex6es sobre o carater essencial do conflito AS FONTES DE RESISTENCIA TEORICA Enquanto presente de uma forma implfcita em alguma discus sao da Guerra Fria teoria do conflito intersistemico foi pouco re presentada seJa na hteratura das RI ou nos escritos do movimento de paz Se extrai sua inspiracao mais 6bvia do marxismo tambem pde ser vista como uma continuacao de uma linha de arumenta cao dentro das RI que tern pouco ou nada a ver com o marxismo e que destaca a importancia da diferenca ideol6gica no conflito inter nacional I3 Sao varias as raz6es funcionado contra a sua aceitacao EmEw Luard edBsic Texts in International Relations Macmillan 1992 p4789 Duas discuss0es classicas sobre a heterogeneidade dentro da corrente dominante da hteratura d RI sao Richard Rosecrance Action and Reaction in International Politics oston Little Brown 1963 e RaymondAron Peace and WarLondon Weidenfeld Nicolson 1966 194 Fred Halliday Colocalas em itens poderia ajudar nao somente a deixar mais cla ras as suposicoes da abordagem intersistemica mas tambem iden tificar quais podem ser dentro da teoria das Rl alguns dos proble mas fundamentais levantados por esta questao Para a teoria realista convencional como em Bull e Waltz a questao da determinacao sistemica da poHtica extema e irrelevante na verdade tecnicamente inconcebivel ja que tudo o que importa sao as relacoes entre os Estados nenhuma admissao da relevancia dos processos intemos suas causas ou conseqtiencias e permitida dentro de tal teoria As relacoes entre os Estados podem ser anali sadas sem a consideracao de seus correlatos internos Alem disso ao colocar urn sistema intemacional abstrato que determina o com portamento dos Estados e imp6e certas regras aos membros compo nentes o realismo nega a possibilidade de formas de conflito inter nacional fundamentalmente variadas Discutir a teoria intersistemica em sua forma completa requer ter urn conceito adequado da diferenca entre os sistemas nao so mente em termos de alguns slogans e objetivos intemacionais mas em termos da constituicao das pr6prias sociedades e da base de seus desacordos Aqui a forte resistencia da teoria das RI a identifica cao das caracteristicas internas e ao conceito de capitalismo tor nase relevante urn visitante ingenuo do campo do internacional poderia pensar que se alguma coisa caracterizou o sistema inter nacional ao Iongo dos ultimos 500 anos foi este fenomeno No mfnimo ele e tao importante quanto a guerra 0 nacionalismo 0 Estado e outros termos familiares apesar disso quase nunca e mencionado exceto em formulacoes abafadas sobre o desenvol vimento da economia intemacional e da sociedade industrial e agora da interdependencia Desenvolver urn conceito de teoria intersistemica envolve entretanto ter alguma ideia do que consti tui o ocidente em ambos os niveis o intemo eo internacional o capitalismo e o seu desafiador de comparativamente curtadura cao seja qual for o seu nome Isto e algo que pode ser fornecido pela sociologia weberiana ou pela teoria marxista precisamente porque por ora com o silencio das RI e quase que impossfvel fazelo dentro da corrente dominante da teoria internacional Mesmo quando o intemo e considerado relevante como na ana lise de politica extema existe pouca sustentacao para a abordagem in tersisternica por urn lado as ligacoes que sao percebidas como ttans nacionais sao formas lirnitadas e especfficas de interacao baseadas em urn conceito de sociedade freqtientemente debil e comportamental bas tante diferente da visao abrangente da interacao intersisternica aqui con siderada por outto as correlac6es empfricas realizadas dentto da ana lise de poHtica extema nao confirmam quaisquer correlacoes distintas Repensando as rela6es intemacionais 195 entre 0 tipo de sistema politico momirquicorepublicano totalitariode mocratico eo resultado de polftica extema Ja que sociedades totalita rias podem ser agressivas ou defensivas a questiio da determinaao sis temica nao emerge A explicaao altemativa seria certamente que es tao sendo perguntadas as questoes erradas Uma teoria baseada no conflito intersistemico e menos atrativa ainda por causa do que pode aparentar ela pode facilmente ser as similada por urn ou por ambos os paradigmas do velho pensamen to sabre a pr6pria Guerra Fria as concep6es sovieticas dogmaticas dos dois campos e de urn conflito capitalismosocialismo ou as formulaoes ocidentais de urn conflito entre dois sistemas polfticos e econ6micos rivais moralmente opostos urn mundo livre con tra uma ditadura comunista A compulsao para o distanciamento dos dois estere6tipos explica porque os escritores liberais e do movimen to de paz apoiaram abordagens envolvendo urn grau de simetria causal e etica a subjetivista e a intemalista Uma preocupaao simi lar pode ser identificada nos escritos liberais que acompanharam o fim da Guerra Fria no final dos anos 1980 quando foi sugerido face a toda a evidencia que de alguma forma ambos os lados tinham sido exauridos pela Guerra Fria e que portanto eram perdedores certamente os EVA pagaram urn preo mas nao foram os banquei ros sovieticos que chegavam para supervisionar a transiao dos Es tados Unidos para o socialismo Os que se utilizavam de categorias marxistas para explicar a Guerra Fria foram quase que inevitavel mente assimilados pelas analises ortodoxas sovieticas pre1985 14 isto aconteceu nao somente par causa da inclinaao dos que fizeram a assimilaao mas tambem porque OS fundamentos te6ricos da anali se marxista nao foram deixados suficientemente claros Urn fator inibidor inicial e que urn dos temas centrais da teoria in tersistemica que a Guerra Fria e urn produto da heterogeneidade nao necessariamente gera consenso Contrana a visao intuitiva de que supos tamente a heterogeneidade leva a instabilidade e a homogeneidade a es tabilidade existe uma outra visao igualmente intuitiva de que a hetero geneidade leva a estabilidade Na teoria realista isto informa a visao defendida por Waltz e ou tros da estabilidade da bipolaridade A heterogeneidade sistemica e a suposiao implfcita da teoria das duas masmorras ela nao e explf cita na maior parte da teoria das RI ja que tal teoria somente esta pre ocupada com as rela6es entre os Estados mas esta presente no res 14 Vendulka Kubalkova e Albert A Cruickshank The new Cold War em Critical international relations studies Review of International Studies v12 n3 July 1986 e Fred Halliday Vigilantism in International Relations Kubalkova Cruickshank and Marxist Theory Review of International Studies v 13 n2April 1987 196 Fred Halliday I I suscitado te6rico alemao Carl Schmitt agora em moda que defendeu a necessidade de urn adversario na vida polftica domestica e por extensao intemacional e anteriormente na tese geral popularizada par Arnold Toynbee de desafio e resposta 15 Schmitt como a teoria intersistemica sofreu por associaao neste caso com o nazismo mas como a presena desta tese dentro dos escritos benignos liberais e do movimento de paz indica este argumento tern relevancia mais ampla ou no mfnimo seguidores nao conhecidos Ela refora a visao inicia da pela negaao de que o capitalismo ou comunismo tiveram qual quer dinamica universal que o conflito lesteoeste foi uma miragem e que era funcional para os grupos dominantes dos dais Iadas Colocando de lado as diferentes abordagens te6ricas existem razoes hist6ricas comuns na verdade de sensa comum para negar a validade da abordagem intersistemica Par urn lado parece haver pouca razao para estabelecer uma relaao entre o conflito e a reali dade intersistemica quando a hist6ria modema esta repleta de con flitos entre Estados homogeneos das explosoes intercapitalistas de 1914 e 1939 as disputas e as guerras do bloco socialista Por outro o padrao das alianas do p6sguerra e dos alinhamentos estrategi cos informais sugere que a heterogeneidade nao e urn obstaculo a colaboraao assim uma india capitalista colaborou com uma URSS socialista enquanto uma China socialista se alinhou com os EVA A PROEMINENCIA DA HETEROGENEIDADE As dificuldades com a abordagem intersistemica sao portanto consideraveis existem pelo menos outras tres altemativas principais para analisar a Guerra Fria existem fortes raz6es te6ricas e empfri cas para rejeitala ela possui associa6es polfticas pouco agradaveis Acima de tudo entretanto ela e subdesenvolvida em seus pr6prios termos aqueles que a patrocinaram lanaram argumentos ocasionais quanta a sua validade e a de seus componentes ou fizeram implica 6es de que existe uma leitura ultrapassada dentro do marxismo para explicar tal fen6meno Uma vez que e feita a tentativa de explicitar quais sao as reivindica6es da teoria intersistemica entao tomase evidente que em seu interior existem maiores complexidades te6ricas que inibem a sua adoao Contudo e somente atraves desta constru ao e identificaao de suas implica6es te6ricas mais amplas que o argumento pode ser levado adiante A luz desta discussao o argumento intersistemico pareceria residir em cinco proposioesnucleo 1Carl Schmitt The Concept of the Political New Brunswick Rutgers University Press 1976 Paul Hirst Carl Schmitts deciosinism Telos n72 Summer 1987 Repensando as relac6es intemacionais 197 i A heterogeneidade socioeconomica do Leste e do Oes te isto e das sociedades comunistas e capitalistas Isto faz refe rencia no minimo aos niveis economicos e politicos dentro de cada Estado e bloco 0 ponto de partida para o argumento intersistemico e esta diferena em termos fundamentais e constitutivos entre os dois tipos de sociedade e politica Esta diferena pode ser formu lada em termos weberianos ou marxistas mas envolve alguma con cepao do sistema social e polftico como urn todo As abordagens constitucional burocnitica e behaviorista da ciencia polftica as teo rias baseadas na convergencia ou aqueles que veem a URSS somente como outra forma de sociedade capitalista negam esta heteroge neidade e necessariamente impedirao a analise a partir de linhas in tersistemicas assim como o fazem aqueles que por raz6es diplo maticas OU por justia tratam OS dois sistemas simetricamente Se nao e admitido que os blocos sovietico e americano eram funda mentalmente diferentes em sua constituiao interna entao o argu mento nao pode continuar ii Esta compositiio socioeconomica e politica precisa ser mos trada como detenninante da polftica externa e das relatoes internacio nais em um sentido amplo e generico Nao existe a politica externa como tal mas somente a politica externa de tipos especificos de Esta dos e de sociedades Esta tese da determinaao de algumas formas so brep6ese e e teoricamente distinta da encontrada na analise da politica externa e no seu exame dos determinantes domesticos no resultado de politica externa A diferena reside na concepao do que constituem os determinantes domesticos relevantes e nas nao declaradas diferenas do que constitui a relaao Estadosociedade como na discussao da he terogeneidade a discussao inevitavelmente leva de volta a concepao geral de sociedade e de politica iii A tese do conflito intersistemico implica uma dinamica inter nacionalista e na verdade universalista dentro de cada bloco e siste ma em outras palavras implica que cada bloco e levado nao somente a proteger seu proprio Estado e economia a maximizar sua vantagem den tro dos constrangimentos de urn equilibria de poder e parecer desafiar o outro por raz6es de credibilidade ideol6gica interna mas tambem a dominar tanto o quanto for possfvel do mundo para minar e com espe rana abolir o sistema alternativo Tal argumento vai contra a concep ao ortodoxa das RI sobre a tendencia de preservaao por objetivo ou por necessidade de urn equilibria de poder e tambem contra a afir maao liberal de que nenhum lado tern quaisquer aspira6es ideol6gi cas e que o conflito foi todo em torno da maximizaao de poder Ate o momento alem de uma quantidade consideravel de evidencia hist6rica sobre as motiva6es do capitalismo os elementos desta dinamica uni versal sao reconhecidos nas teorias existentes a ambiao do capitalis mo em maximizar mercados e o acesso a materiasprimas os com 198 Fred Halliday T I promissos da URSS com a revoluao mundial e a competiao pr aliados no Terceiro Mundo para melhorar a segurana a fora poh tica e a militar Como ja notado o Iongo telegrama de Kennan reco nhecia que os dois lados tinham tal aspiraao e potencial Mas estes sao na melhor das hip6teses fragmentos de uma teoria mais ampla da universalizaao que ainda esta obscura 16 Por exemplo a motivaao do capitalismo nao e somente economica e outra forma ele estaria bastante feliz em deixar os Estados comums tas com seus sistemas politicos intactos dado que se realizasse co mercio entre eles Este desejo para a universalizaao e ligado ao da heterogeneidade cada sistema alem de quaisquer compromissos imediatos ou obstaculos estava comprometido com a transforma sao do outro 0 minimo que pode ser dito sobre o resultado dos anos 1980 e que ele valida isso a primeira vista e urn pouco mais adiante Urn lado prevaleceu e subordinou o outro iv 0 conflito intersistemico opera em multiplas dimenoes niio somente naquela das relatoes interestatais como convencionalmente concebidas a questiio de qual polftica externa os Estados perseguem abrange somente uma parte de como os do is sistemas socioeconomicos operavam internacionalmente A competiao intersistemica ocorreu em tres niveis principais 0 das rela6es interestatais como tal isto e a po Htica extema convencionalmente concebida o da interaao socioeco nomica mais amplamente interpretada para incluir as a6es de outras entidades que nao os Estadosgovernos mais especificamente os empre endimentos rmanceiros e industriais e o da interaao ideol6gica e em particular do impacto do exemplo do efeito demonstrativo sob uma sociedade comunista de outras capitalistas Um exemplo claro desta interasao tripla com o reforo mutuo de cada um dos nfveis foi o das rela6es RFARDA Alemanha Ocidental Alemanha Oriental no final dos anos 1980 atraves e ate o colapso do regime alemao oriental em 1980 como urn todo o projet da foi no sentido clausewitziano classtco de luta o de derrotar e nao amqm 1 isto e de ogar para baixo niederweifen a RDA Este foi Aumco flito intersistemico em sua forma mais crua e operou em todos os tres mvets as polfticas de Bonn minar a RDA a mobilizaao de uma maioria pr6 unificaao dentro dela e o descredito de qualquer opao socialista ou Uma consideraiio hist6rica poderosa da ambiiio universalizante do capitalismo pode ser encontrada em Eric Hobsbawm The Age of Empire London Weidenfeld Nicolson 1987 E surpreendente que esta tese hist6rica genericamente aceita e a eloqliente do Communist Manifesto tivessem tido tao pouco impacto na maior parte dos escritos so bre a Guerra Fria nos anos 1980 as afirmaoes de que o capitalismo possuia uma ten dencia para ambos para prevalecer sobre outras altemativas e para estabelecer a hegemonia global foram manipuladas pela politica sovietica ao inves disso tivemos a simetria discutfvel dos intemalistas Repensando as rela6es intemacionais 199 neutra foram obtidas pela pressao sobre a RDA nos tres nfveis Em oposiao ao que a teoria realista convencional com sua enfase no confli to interestatal poderia sugerir o papel do govemo de Bonn foi talvez o menos importante e o dos neg6cios alemaes secundano o nfvel mais influente foi o impacto sobre milh5es de alemaes orientais da imagem que eles tinham do ocidente e entao uma vez que a fronteira foi aberta ao visitar o ocidente houve o Reiseschok choque de viagem Este efeito demonstrative foi certamente composto pelas press5es dos bancos e empresas alemaes ocidentais sob a economia da RDA fosse ou nao esta pressao formalmente coordenada com Bonn e pelas aoes especfficas do proprio govemo de Bonn a condicionalidade para a ajuda economi ca o encotajamento atraves da cidadania automatica e dos beneffcios do bemestar para a populaao da RDA migrar o incentive a rumores sobre o iminente colapso da economia da RDA e assim por diante Teria sido bastante diffcil interpretar esta instncia do conflito intersistemico sem alguma referenda a tendencia do capitalismo em se expandir uma ten dencia tealizada nao somente atraves das a5es dos Estados mas tam bern atraves das intera5es sociais e ideol6gicas mais amp las 17 v A heterogeneidade do sistema socioeconomico interno im plica a heterogeneidade das relaoes internacionais concebidas em termos de objetivos amplos e de mecanismos de internacionaliza fiiO Os intersses dos dois blocos eram fundamentalmente opostos e os tipos de mundo que eles objetivavam criar divergiam como indicado Disto seguiuse que existiriam outras diferenas na polf tica externa e na extensao internacional destes sistemas Isto nao necessariamente significava que eles perseguiam tipos ou estilos diferentes de polftica externa isto e que OS instrumentos as con venoeS os procedimentos operacionais de polftica externa fossem eles mesnios heterogeneos Isto e deixado em aberto OS Estados envolvidos no conflito podem ou nao ter sido socializados no sen tide realista do termo 0 argumento nao pode ser resolvido anali sando a socializaao no sentido formal se eles tinham os mesmos tipos de convenoes diplomaticas ou se respeitavam soberania 0 argumento realista sobre a sociedade intemacional e os efeitos so cializadores do sistema e relevante em termos limitados mas nao responde a esta questao mais ampla Por outro lado a heterogeneidade de objetivos em geral ja que emerge da heterogeneidade do sistema e acompanhadapor uma hetero geneidade em pelo menos tres outros nfveis Primeiro a heteroge neidade de causa as razoes subjacentes para a dinamica universa 17Para consideraes da subjugaao da RDA ver o diario do assessor politico de Kohl Horst Teltschik 329 Tage lnnenansichten der lWedervereinigung Berlin SiedlerVerlag 1991 e Ulrich Albrecht Die Abwicklung der DDR Opladen Westdeutscher Verlag 1992 200 Fred Halliday Iizadora podem ser diferentes em sistemas socioecnomicos difer tes sendo mais ou menos economicas em urn mats ou menos mtlt tars e polfticas em outro Segundo os mecanismos para e o com promisso Om a criaao de urn blCO internacioal homogneo em tomo de urn Estadonucleo hegemomco podem dtvergtr asstm como esta evidente pelo menos nas bastante diferentes polfticas e polfti cas economicas dos EUA e da URSS dentro de seus respecttvos blo cos as formas de integraao e os mecanismos de hierarquia eram muito diferentes Terceiro os mecanismos para a competiao com o outro bloco tambem podem ser assimetricos esta assimetria refle tindo nao somente as diferenas de poder em sua concepao generica mas a importncia variada dos componentes do modus operandi do sistema o economico o ideol6gico eo militar como refletidos no nfvel intemacional 0 equilibria relativo de poder eco nomico e militar na composiao da influencia da Uniao Sovietica e dos EUA era muito diferente assim como o era o grau de controle poli tico direto exercido por cada urn deles sobre os seus respectivos clientes de bloco A competiao dos blocos pode portanto envolver nao smen te urn conflito de objetivos mas urn conflito de raz5es e de mecamsmos pelos quais as rela5es inteinacionais sao conduzidas AS IMPLICAOES ANALITICAS Apresentar este resurno dos componentes da teoria tersistemia inevitavelmente levanta mais quest5es do que responde Dots pontos sao imediatamente evidentes Primeiro sejam quais forem as suas foras ana lfticas e te6ricas a teoria intersistemica esta Ionge deter alcanado urn desenvolvimento adequado o aparecimento de tal desenvolvimento no previo dogma sovietico escondeu mais o qurevelou no mfnim pela teleologia imanente dentro de seu concetto d correlaao de foas qe implicava que a hist6ria estava se rnovendo mexoravelmente em drrao ao triunfo do bloco sovietico sobre o ocidental 18 Segundo qualquer elaboraao de urna teoria de conflito in tersisternico leva a uma estrutura te6rica rnais ampla ligeirarnente 10 termo sovietico correlao de foras uma alternativa supostamente mais dinfunica e materialista ao equilfbrio de poder nunca foi levado a serio no ocidente e foi abandonado nos anos 1980 na URSS na verdade ele provou sua validade precisamente porque levou os fatores socioeconomicos e ideol6gicos em consideraao na competiao intemacional e viu a possibilidade de uma mudana decisiva em favor de urn bloco 0 se engano sore qual bloco iria beneficiarse da mudana na correlaao foi talvez urn descutdo secundario Para uma analise Iucida do conceito ver Margot Light The Soviet Theory of International Relations Brighton Wheatsheaf 1988 eJulianLider Correlation of Forces AnAnalysis of Marxist Leninist Concepts Aldershot Gower 1988 Repensando as relaoes intemacionais 20 I derivada da sociologia weberiana ou do materialismo hist6dco con ceitos como Estado sistema o intemacional enquanto apa rentemente moeda comum dentro da corrente dominante das RI e do materalismo sociol6gicohist6rico nao o sao ao serem exami nados de perto Mais importante ainda como o resumo acima deixa clara e nao por raz5es de deferencia canonica o ponto de partida de qualquer teoria do conflito intersistemico nao e a diferena generica entre OS objetiVOS ou os estilos de polftica extema ou a divergencia derivada da assimetria geoestrategica mas a diferen9a na constituiao da propria sociedade em ambas as variantes domestica e intemacional 0 ponto de partida de qual quer teoria relacionada das RI e portanto o conceito do que e na teoria marxista o modo de produ9ao e as rela96es entre estas e o Estado sem estas a teoria do conflito intersistemico e impensavel Uma mistu ra ecumenica das diferen9as entre as RI dominante que impede tais con ceitos e estas outras teorias socioeconomicas leva a confusao Nao pode existir uma analise do conflito intersistemico que nao admita a catego ria capitalismo e as suas varias antiteses de names diferentes Se este argumento e valido neste caso somadas ao desenvolvimen to de uma teoria do conflito intemacional e d3 rela96es intemacionais genericamente baseadas no sistema social existem pelo menos tres ou tras areas de deserivolvimento te6rico sugeridas pela teoria do conflito intersistemico i Dimensoes e Mecanismos de lnterafiio lntemacional Se como ja indicado o conflito intersistemico pode ser vis to como operando em tres niveis o interestatal o socioeconomico eo ideologi co entao se toma necessaria analisar como estes interagem e como o equilibria relativo muda de tempos em tempos para urn Estado especifi co e entre os diferentes tipos de Estado 0 que esta impllcito aqui e nada mais do que uma sociologia ade quada das rela96es intemacionais nao no sentido de apresentar alguma teoria ultrapassada das RI a partir da sociologia existente ou de fazer al gumas generalizaoes amplas e possivelmente nao apropriadas sabre como as rela96es intemacionais tern aspectos sociais lei ideologia con ven9ao etc mas sim para examinar como dentro de urn sistema inter nacional constituido por diferentes Estados o socioeconomico determina duplamente os Estados individuais e transcendendo os Estados o siste ma como urn todo A luz da hist6riados Ultimos 500 anos e do resulta do da propria Guerra Fria existe uma especial necessidade de reexami nar e elucidar a motivaao universalista do capitalismo tanto em termos do porque ele busca moldar o mundo a sua imagem como dos varios mecanismos utilizados para isso se a musica pop e as tshirts sao as ca nhoneiras do final do seculo XX existe uma continuidade subjacente a motiva9ao multifacetada e agressiva do capitalismo em destruir e incor Plar todosS sisteJlSsocioeconomicos rivais 202 Fred Halliday ii 0 Conjlito Jntersistemico e Os Movimentos AntiSistemicos 0 conflito entre os sistemas sociais incorporado e mediado atra ves dos Estados EUA URSS etc na Guerra Fria tern sido alllpanhado por movimentos mais amplos dentro e entre os Estados dtngtdos con tra os Estados e as ordens intemacionais que eles representam Ao lon godeste seculo estes assumiram varias formas revAolu9es gevs guer ras de guerrilha mudan9as ideol6gicas etc e tern stdo dtrectonados contra as ordens hegemonicas nos dois blocos Tres analisespadrao destes movimentos antisistemicos estao dis ponfveis a abordagem convencional das RI que os subrdma aos Esta dos e nega a sua relevancia para as rea5es mtemac10nats exceo uan do recebem 0 apoio dos Estados veJase o quase completo stlencto da literatura das RI sabre as revolu5es e os sindicatos19 a abordagem sovietica ortodoxa que assimilava os movimentos antisistemicos naoestatais aos interesses de Estado da propria URSS assim dissol vendo as questoes de autonomia e de contradiao envolvidas neta rela9ao e a abordagem dos sistetIas mundiai a e Wallerstem Arrighi e outros20 que ve os movtmentos anttststemtcos como o motor da hist6ria intemacional e como capazes de superar os pode res e a fragmenta9ao dos Estados No caso o ultimo e dos sctos analogos do movimento de paz estes novtentos attststemtccs sao vistas como dirigidos contra o que e urn ststema amda homoge neo com a nega9ao da divergencia entre o capitalisno e o cptJu nismo Assim os movimentos de trabalhadores na Paloma e Afrtca do Sui sao parte de uma dinamica antisistemicA iii 0 Estudo Comparativo do Confltto lntertstmtco A 0 foco desta analise tern sido sabre o confltto mterststermco do periodo p6sguerra aquele nTe os bloos conunista e cpitalista Tal conflito tern certas caractensttcas espectficas nao encontradas em ep cas anteriores as dimens5es tecnologica e economica de sua compett ao militar as formas ideol6gicas especfficas de hegemonia reividica das pelos dais lados a mobiliza9ao de grandes massas da opla9a e atividade sistemica e antisistemica Este parttcular confltto mtestst mico pareceria ter uma outra caracterfsica uni urn resutado htstn co contrario ao dos ciclos no qual urn ststema Ja estabelectdo o captta lismo gerou e depois sufocou o seu novo rival emergente Alem dis so em outros aspectos o conflito intersisteco nao e e forma alguma espedfico a epoca da Gurr Fria OS coflttos as socte dades baseadas no feudalismo e no capttaltsmo a parttr do seculo XIV na Europa e os ultimos redutos do precapitalismo no Terceiro Mundo 19Capftulo 5 20QiovanniArrighi Terence Hopkins e Immanuel Wallerstem AntlSystemzc Movements LondonVerso 1989 Repensando as relac6es intemacionais 203 no final do seculo XX poderiam merecer uma analise comparativa assim como os conflitos mais especfficos entre as sociedades escra vocratas e as que exploravam o trabalho livre Os meios pelos quais o capitalismo cercou minou e entao destruiu o bloco sovietico tern algo em comum com os primeiros ataques capitalistas aos imperios chines e otomano pelo menos na maneira pela qual os reformistas alarmados dos blocos sitiados ao tentar alterar seu proprio sistema para competir melhor aceleraram a decomposicao de seus sistemas sociais e politicos Igualmente os historiadores da economia mostraram como a inte racao do mundo mais desenvolvido como menos desenvolvido pode afora a conquista e a derrota direta na guerra minar os Estados mais ira cos este foi o impacto do imperialismo mesmo quando ele nao se enga jou em conquista colonial direta Os destinos dos imperios otomano e chines da Ultima metade do seculo XIX ate o seu desaparecimento final durante a Primeira Guerra Mundial sao dois casos classicos disso Cer tamente houve uma derrota na guerra mas esta nao foi em si mesma uma explicacao para o declinio embora no caso do Imperio Otomano a Primeira Guerra Mundial tenha trazido o coup de grace 0 processo foi mais complexo a derrota na guerra as margens do territorio imperial trou xe pressoes para a reforma administrativa e economica uma oscilacao entre a reforma e a reafirmacao tradicionalista marcou a politica estatal nas decadas anteriores a morte final o processo de reforma entao pro vocou maior dissensao interna dentro do Estado e nas relacoes Estado sociedade a gradual intrusao do comercio extemo via concessoes e for cas do mercado tambem enfraqueceu o poder estatal e promoveu o des contentamento social regioes remotas provaramse mais dificeis de go vemar e gradualmente separaramse insurreicoes Taiping os Boxers os Joens Turcos desafiaram a autoridade estabelecida21 E evidente que algumas destas caracteristicas do declinio otoma no e manchu estao presentes no colapso do comunismo 0 sistema sovi etico enfrentou o desafio de urn rival que era a organizado segundo principios socioeconomicos e politicos fundamentalmente diferentes e b claramente superior e mais forte que ele em todos os aspectoscha ves exceto por algumas dimensoes do militar 0 conflito foi portanto duplamente heterogeneo e desigual o fato de que a URSS era diferen temente da Turquia e da China capaz de competir com o ocidente em algumas areas selecionadas de atividade estrategica militar espaco ar ms nucleares e que como o oeste tinha aspiracoes globais nao dimi num a sua fraqueza global Como nos conflitos otomano e manchu o processo de erosao foi gradual nao cataclismico e envolveu varias di 21Roer Owen The Middle East in the World Economy 18001914 2ed London IB Tauns 1993 204 Fred Halliday mensoes a militar a economica e a diplomatica Como os antigos imperios o sistema sovietico tentou sustentar a competicao militar por meio de uma mobilizacao mais intensiva mas permanentemen te ineficiente e da concentracao de recursos intemos enquanto ao mesmo tempo separava a sua propria economia dos bens e das pra ticas de seu competidor Entretanto apesar de todas as similaridades as diferencas sao ain da maiores Em primeiro Iugar a competicao militar e o seu impacto no sistema sovietico foi de urn tipo diferente estrategico e tecnologico As politicas militares otomana e manchu foram construidas para prevenir a gradual erosao de seu imperio territorial por poderes coloniais hostis e de nenhuma maneira representaram uma ameaca a eles mesmos No caso sovietico nao houve o equivalente das anexac6es e das conquistas so fridas pelos otomanos em 1770 e pelos chineses em 1840 A maior perda do sistema sovietico ada China em 1963 apesar de ser em algoma medida urn resultado das politicas diplomatcas oci dentais que OS separaram nao levou a imediata anexacao da China ao ocidente e foi seguida por outros avancos militares e estrategicos do poder sovietico no Terceiro Mundo Os aliados sovieticos sobreviveram aos dois maiores desafios enfrentados a Coreia e o Vietna e neste ulti mo eles tiveram uma vitoria clara No final dos anos 1970 e inicio dos 1980 os estrategistas america nos comecaram a discutir a erosao do poder sovietico pelas beiradas isto e encorajar a revolta nos aliados sovieticos do Terceiro Mundo es pecialmente CambojaAfeganistao Nicaragua eAngola Mas apesar de terem sido exaustivos nao foram nestes conflitos que as fissuras apare ceram no final da decada de 1980 Em termos militarestecnologicos o conflito foi igualmente diferente aqui em maior intensidade do que em qualquer outra esfera da competicao a disputa foi igual em alguns as pectos mesmo com os EUA sendo mais capazes de em quase todos os pontos atingir superioridade tecnica sobre a Uniao Sovietica 0 mais relevante e que em termos economicos as diferencas entre os modelos otomanomanchu e o da URSS foram substanciais Alem de perder os territories para seus rivais estrategicos a posicao dos imperios manchu e otomano mesmo no territorio sobre o qual retinham controle foi erodida pela intrusao de bens vindos do mundo de fora que minaram os grupos sociais existentes e os sistemas economicos logo ambos os imperios acumularam dfvidas extemas que tiveram que honrar por meio de concess6es e a supervisao de suas alfandegas por oficiais ocidentais Nenhum destes processes ocorreu no contexto sovietico Dado o controle do Estado da atividade economica nestes paises a intro ducao de bens externos foi mediada pelo Estado e virtualmente nao teve nenhum impacto sobre o emprego e o status dos grupos sociais dentrodestes paises 0 papel do comercio externo no sistema sovi etico ea maneira pela qual ele afetou 0 sistema foram fundamental Repensando as rela6es intemacionais 205 mente diferentes dos casas otomano e manchu 0 fornecimento de credito e de tecnologia ocidentais Ionge de enfraquecer o poder da liderana comunista serviu para fortalecela e como o ocidente acreditou melhorar a sua capacidade militar 0 controle exercido pelos partidos comunistas foi tal que nao existiu a questao de ofici ais externos monitorando ou afetando a coleta de receita e outras funoes Considerandose os ganhos de exportaao nos anos 1970 eles foram elevados pelo aumento dos preos no mercado mundial dos principais produtos de exportaao sovieticos o petr6leo e o gas Sea interaao e a competiaoeconomica como ocidente desempe nharam urn papel em minar o sistema comunista nao foi atraves do enfraquecimento do controle do Estado da economia por permitir maior espao para os atores economicos ocidentais operarem dentro des tas sociedades ou pela alteraao de padroes domesticos de produao e de distribuiao 0 mercado nao fez isso de forma alguma Aqui o resultado da Guerra Fria com a rapida morte do poder so vietico no final dos anos 1980 mereceu somente menoes ocasionais Isto sera examinado em maiores detalhes nos Capftulos 8 e 9 Contudo pareceria plausfvel argumentar que em alguns importantes aspectos isto sugere uma teoria do conflito intersistemico primeiro o colapso do co munismo nao ocorreu por causa do mecanismo convencional de confli to interestatal a guerra nem atraves da erosao do territ6rio do bloco so vietico por pressao militar e comercial ocidental mas pelo contrano pela corrosao do sistema pelo efeito demonstrativo do sucesso do ocidente nos campos social economico e polftico22 segundo a Guerra Fria nao terminou por causa do equilibria de poder ou de uma exaustao mutua mas pela prevalencia de urn bloco sabre o outro em outras palavras por causa de uma vit6ria sistemica Certamente outras interpretaoes sabre este resultado e sabre o carater essencial da Guer ra Fria sao possfveis entretanto precisamos ter esperanas de que pelo menos algum dia sejam examinadas as suposioes e as impli caoes te6ricas fundamentais da dimensao dominante do conflito intemacional p6s45 22Para aplicacoes destas ideias ao colapso do bloco sovietico ver tambem meu The ends of Cold War New Left Review n180 MarchApril 1990 206 Fred Halliday Capitulo 8 UM COLAPSO SINGULAR A UNIAO SOVIETICA E A COMPETicAo INTERESTATAL UMA NOVA LUZ SOBRE VELHAS QUESTOES 0 Capitulo 7 apresentou uma discussao sabre a Guerra Fria e a sua dinamica subjacente No final dos anos 1980 o colapso do sis tema sovietico dentro da URSS e intemacionalmente somado as suas muitas implicaoes para as polfticas individuais e globais levantou varias questoes adicionais estimulantes e nao resolvidas dentro da teoria social e internacional que serao examinadas aqui A primeira questao a ser enfrentada por qualquer analise deste fenomeno e a da explicaao fomecendo uma consideraao que aponte as razoes ava liadas e interrelacionadas do porque urn sistema politico e socioe conomico especffico praticamente igual a seu rival no campo mili tar desmoronou desta forma rapida e inequfvoca e na ausencia de qualquer conflito militar internacional 1 Inexoravelmente esta questao analftica levanta pelo menos mais outras duas A prime ira pouco ex pres sa nestes tempos mas que vai alem da curiosidade referese a inevitabilidade ou nao deste colapso Neste 1E surpreendente que ofim da Guerra Fria tenha provocado mais reflexao te6rica do que a pr6pria Guerra Fria Ver Pierre Allan e Kjell Goldmann eds The End of the Cold War London Martinus Nijhoff 1992 JL Gaddis International relations theory and the end of the Cold War International Security v17 n3 19923 Lynn Eden The end of US Cold War History A review essay International Security v18 n2 1993 Ver tambem meu The ends of the Cold War New Left Review n180 MarchApril 1990 George Schopflin Why communism collapsed International Affairs January 1990 Gale Stokes The lessons of 1989 Problems of Communism v XL n5 SeptemberOcotober 1991 Daniel Deudney e John Ikenberry Soviet Reform and the end of the Cold War Explaining largescale historical change Review of International Studies v17 n3 July 1991 Repensando as rela6es intemacionais 207 sentido podese indagar se o comunismo em sua variante sovietica es tava destinado a falhar mais cedo ou mais tarde ou se com uma sorte politicas ou liderana diferentes ele poderia ter continuado expandido ou prevalecido em uma escala mundial este foi sempre urn beco sem safda ou uma altemativa possfvel de se criar urn sistema nao capitalis ta2 A outra pertinente para ambas para a explicaao e a avaliaao da hist6ria geral do comunismo e quando e como esta crise terminal se ini ciou se ela pode ser datada a partir de decis6es espec1ficas principal mente aquelas da liderana p6s1985 na URSS ou se este declfnio foi mais prolongado derivado digamos do visfvel comeo de estagnaao economica no meio da decada de 1970 ou do fracasso em democratizar e reformar a economia no infcio dos anos 1960 ou se foi na verdade uma conseqliencia de Iongo prazo do sistema de comando e terror cria do por Stalin em 1930 Mesmo se argumentado que no Iongo prazo o comunismo nunca poderia ter funcionado e que ele estava necessaria mente condenado o timing e a forma de sua morte nao estavam deter minados e requerem uma analise especffica Desafiadoras e precisando ser sustentadas por suposi6es concei tuais e te6ricas explfcitas ou nao estas quest6es hist6ricas sao neces sariamente distintas de outro conjunto de preocupaoes levantado pelo colapso comunista A pr6pria variedade a surpreendente velocidade das recentes mudanas e a luz que elas jogam sobre o que acontecera previ amente nestas sociedades constituem urn laborat6rio de processos soci ais e politicos nao controlados relevantes para a avaliaao de teorias conflitantes Dentre varios e possfvel mencionar quatro processos que dizem respeito a interaao dos Estados no sistema intemacional eles sao ao mesmo tempo relevantes para a avaliaao dos Estados das intera6es sociedadeEstado e das formas e limites das capacidades de Estados Urn destes processos a natureza da Guerra Fria eo seu carater intersistemi co ja foi considerado no Capitulo 7 Aqui e possfvel examinar tres ou tras destas quest6es amplas os padroes de transformaao vindos desde cima e o papel dos fatores intemacionais em moldalos e limitalos as possibilidades e as perspectivas para uma transiao ate aqui linica aquela do comunismo para o capitalismo e as varias dimensoes da competiao intemacional e o seu papel no colapso sovietico 2Para o argumento do porque na economia o modelo do Estado socialista nao poderia funcionar a despeito de seus sucessos iniciais e de uma margem para a reforma ver Wlodzimierz Brus e Kazimierz Laski From Marx to Market Oxford Clarendon Press 1989 e Daniel Deudney e John Ikenberry Soviet Reform 208 Fred Halliday A TRANSFORMAAO DESDE CIMA 0 destino do comunismo e urn caso importante para a avaliaao da tese de que a constituiao de Estados revolucionanos envolveu urn fortalecimento do controle estatal de uma intervenao na sociedade realizado em urn grau consideravel como uma resposta as pres sees internacionais 3 Apesar de em certa medida os regimes comu nistas terem sido produzidos por movimentos revolucionarios e de terem pelo menos em seus perfodos iniciais sido baseados em mo biliza6es de massa e em algum consentimento popular todos eles se tomaram sistemas nos quais a poHtica era decidida por uma pequena elite As capacidades metodos e objetivos destas elites eram em par te resultado de seus pr6prios objetivos teleologicamente concebidos mas tambem eram bastante condicionados por fatores intemacionais o objetivo de rivalizar e supostamente superar o capitalismo a imita ao e a colaboraao com outras lideranas de partidos comunistas o apoio e o controle da URSS dos partidos locais na Europa oriental depois da Segunda Guerra Mundial e a orientaao e a mobilizaao de recursos domesticos para defender o campo socialista contra a ameaa externa fosse ela real ou inventada As lideranas comunistas estiveram portanto engajadas em urn projeto que era tanto nacional como intemacional era intemacional como urn resultado da pressao sistemica de outros Estados mas tamb6m ideo 16gico em seu pr6prio direito como uma tentativa de constituir uma sociedade que era exemplar em uma escala intemacional e de promover movimentos similares em outros pafses Alem disso se o fracasso total do comunismo precisa incluir a discussao de como ele falhou em se dis seminar em escala mundial o ponto de partida para analisar por que os regimes desmoronaram no final dos anos 1980 precisa sera hist6ria das transforma6es intemas desde cima por eles ptomovidas Estas elites presentes nos comites centrais e politburos dos parti dos govemantes buscaram transformar as suas sociedades de acordo com urn mapa te6rico de para onde deveria moverse a sociedade socialista Sabemos agora que este projeto e urn fracasso o objetivo para o qual supostamente caminhavam estas sociedades nunca foi alcanado e qua se tudo que tinha sido aparentemente conquistado era superficial e pou co duradouro Se as reivindica6es de que o socialismo desenvolvido ou de que algum outro tipo de sociedade mais perfeita tinham sido al canadas eram falsas tambem o eram as menos apologeticas reivindi ca6es de que estas sociedades com todas as suas imperfei6es es 3Theda Skocpol States and Social Revolutions Cambridge Cambrige University ss 1979 Ellen KayTrimberger Revolution from Above New Brunswick NJ Transaction 1978 Repensando as rela6es intemacionais 209 tavam em algum sentido hist6rico e implicitamente teleol6gico em transiao para algum novo modelo socioeconomico e representa vam algum movimento permanente alem do que o capitalismo ofe recera ou poderia oferecer Esta falta de permanencia se aplica tanto as tentativas de criar uma economia planificada viavel e autosustentada como as de forjar urn sistema unipartidario politicamente factfvel e para as tentativas de reformar as atitudes em areas fundamentais de importancia ideo 16gica especialmente o trabalho o genera a religiao e a etnia A explicaao mais simples do colapso e dizer que tal projeto foi em urn sentido absoluto urn fracasso esta e a conclusao a que mui tos chegam agora nos pafses comunistas assim como sempre o fi zeram aqueles que negavam a eficacia da engenharia social Exis tem entretanto razoes para resistir a tal conclusao Em termos de avaliar as capacidades dos Estados para transformar as sociedades desde cima 0 registro nao e tao absoluto Primeiro ainda e muito cedo para prever quanta permanecera do legado comunista de govemo e se na verdade algo dele podera ainda sobreviver Segundo seria errado tamar como evidencia do fracasso do comunismo a emergencia de foras que parecem marcar urn retorno a formas precomunistas de comportamento ja que muitas destas tern urn carater que esta sendo moldado pelo proprio impacto desta mesma trans formaao o conflito etnico e urn caso 6bvio Similarmente assim como muitos dos que analisaram a emergencia de Gorbachev mostraram a mudana na sociedade sovietica foi em alguns aspectos produto das pr6prias conquistas do comunismo sendo a expansao em educaao e urbanizaao os fatores que mais obviamente contribuiram4 Terceiro mesmo se muito ou tudo do que esta sendo associado ao govemo co munista desaparecer digamos no espao de 10 ou 20 anos o fato his t6rico da conquista comunista ao Iongo das ultimas decadas permane cera isto e evidente na transformaao socioeconomica na elevaao dos padr6es de vida e na implementaao de urn sistema de bemestar disse minado na sustentaqao e na reproduao de urn sistema polftico e nao menos importante no relativo sucesso na mais importante e diffcil de todas as areas a da competiao interestatal Pode ser que o sucesso nesta ultima a vit6ria sovietica na Se gunda Guerra Mundial e depois disso mais quatro decadas de riva lidade com o oeste tenha alimentado a ilusao da eficacia total do comunismo em casa e no exterior Entretanto somente a hist6ria da competiao interestatal sugeriria que a caracterizaao do registro comunista como urn fracasso e simplista Tal veredicto chegaria 4Moshe Lewin The Gorbachev Phenomenon London Radius 1988 e uma visiio h1cida das precondioes sociais e economicas para a ruptura da ordem brejneviana nos anos 1980 210 Fred Halliday como uma surpresa para por exemplo os 250 mil alemaes captura dos em Stalingrado assim como para os planejadores militares do Pentagono que enfrentaram os avanos sovieticos no espao no fi nal de 1950 e os desenvolvimentos de mfsseis durante 1970 e no infcio de 1980 A consideraao de por que o comunismo falhou envolve portan to olhar para os seus dois registros o intemo e o externo mesmo quan do e avaliada a performance e a capacidade do Estado lsto envolve uma separaao dos diferentes tipos de competiao interestatal e intersocie tal na dimensao mais convencional da competiao internacional ami litar o comunismo foi razoavelmente bemsucedido nao somente na Se gunda Guerra Mundial mas na subseqtiente corrida armamentista entre os grandes poderes e na competiao estrategica no Terceiro Mundo en tretanto o seu fracasso no nfvel socioeconomico tambem foi internaci onal ja que envolveu nao somente urn fracasso absoluto mas urn com parative percebido na impossibilidade de acompanhar a performance da competiao Sera sugerido que uma questao central para a analise do colapso do sistema sovietico e como e quando esta percepao de fra casso socioeconomico comparative comeou a ocorrer na liderana e na massa Dada a compulsao de competir inerente a ideologia comunista e dada a impossibilidade de guerra o registro domestico comparative do comunismo frente as suas principais altemativas capitalistas tornouse a dimensaochave da rivalidade e da sua morte final A TRANSIAO DO SOCIALISMO PARA 0 CAPITALISMO 0 colapso do comunismo como urn sistema socioeconomico envolve o que e na verdade a transiao de urn sistema socioecono mico em termos marxistas a transiao de urn modo de produao para outro5 0 que o modo naocapitalista foi co quanta ele rca lizou de seu potencial e assunto para muito debate tudo o que po demos fazer aqui e usar definioes de trabalho mas se as agonias da presente transiao tomaram algo mais clara e que pelo menos este sistema foi em seus aspectos fundamentais diferente do capi 5Muito temse falado a respeito do conceito de economia mista no contexto de ambos os sistemas nos anos 1980 Contudo em urn exame mais preciso dois tipos de economia mista sao indicados uma variante socialista e uma capitalista ed uma Jugoslavia e uma Suecia Uma distinliio clara ainda funcionava entre as economias nas quais o Estado desempenhava o papel dominante com ou sem setores de mercado em algumas areas da produliiO e aquelas nas quais o mercado prevalecia na produliiO e no capital com ou sem urn papel significativo do Estado em termos de propriedade emprego regulaliio fiscal e coordenaao politica Repensando as rela6es intemacionais 211 talismo Aiem disso e evidente que como no caso de outras transi soes a forma o ritmo e o resultado da transisao nao podem ser decididos unicamente por fatores intemos e que em cada pafs e no mundo p6scomunista como urn todo os fatores internacionais de sempenham urn papel central 0 fim do comunismo envolveu uma desilusao dupla primeiro a percepsao de que a economia centralmente planificada e dominada pelo Estado nao poderia permanecer funcionando dadas as suas crescentes dificuldades o que eram estas dificuldades e algoa que retomaremos mais tarde segundo ficou claro que este sistema nao poderia ser pre servado nem em uma versao reformista ou liberalizada o destino da lugoshivia eo novo mecanismo economico na Hungria foram uma indi casao disto6 Se a liderana sovietica sob Brejnev prendeuse a primeira ilu sao Gorbachev parece ter acolhido a segunda nos primeiros anos de seu mandato no gabiriete antes de aceitar em 1990 a impossibilida de de urn sistema centralizado reformado urn mercado regulado no sentido comunista do termo Assim como assumiu acreditando em urn sistema de partido unico no papel de lideransa do PCUS Partido Comunista da Uniao Sovietica e no sucesso da polftica leninista de nacionalidades tambem levou tempo para Gorbachev perceber que o sistema economico como urn todo precisava de transformasao e demorou ainda mais tempo para os muitos membros do PCUS chega rem tambem a esta conclusao 7 A mera aceitasao desta inevitabilidade nao e entretanto suficien te para garantir que tal transisao ocorreria como seus formuladores gos tariam Nao faltam na hist6ria casos da transisao de urn sistema econo mico para outro mas ate agora nao houve nenhuma deste tipo de urn sistema centralmente planificado para urn de livre mercado Certos fa tores favorecem tal processo as forsas educacionais e sociais das socie dades em questao a relativa vontade dos pafses capitalistas em fomecer assistencia atraves de canais privados e estatais o provavel decrescimo da competisao interestatal e a disponibilidade de urn modelo altemativo e comparativamente via vel As dificuldades sao entretanto evidentes falta de capital contexto legal e administrativo pessoal empreendedor e outros assim como as pressoes conflitantes da acomodasao polftica e da mudansa economi 6Sobre o fracasso das reformas iugoslava e hungara ver Bros e Laski From Marx to Market 7 As declar5es de Gorbachev ate o final de 1987 pelo menos endossavam a vi sao tradicional de que o socialismo tinha urn potencial superior ao do capitalismo Niio mais tardar do que no outono de 1989 ele pareceu acreditar que os paises da Europa Oriental manteriam o socialismo mesmo depois da retirada dos tanques sovieticos con versa com Georgi Shakhnazarov conselheiro de Gorbachev Moscou 10 de Junho de 1993 212 Fred Halliday ca 0 fim do govemo comunista introduziu urn novo perfodo de diver sidade polftica social e etnica nestas sociedades produzindo lutas qe afetarao como e em que medida sera criado urn sistema p6scomums ta somente os conflitos sociais na Polonia e na RDA na primeira meta de dos anos 1990 indicam que nenhuma transisao simples planeja da ou administrada pode ocorrer De urn ponto de vista limitado a competisao interestatal pode diminuir mas nao o conflito intersocial Se a hist6ria tern alguma lisao a oferecer e que alem do caniter e da forsa relativa ds forcas sociais domesticas destas sociedades 0 caniter intemacional desta transisao tambem e de grande impor tancia Em uma escala hist6rica ampla e possfvel distinguir entre o que se pode genericamente chamar de transisoes autodeterminadas isto e como a do feudalismo para o capitalismo na Europa que teve seu ritmo e processos consideravelmente gerados dentro das socie dades em questao e as transisoes impostas resultado do impacto sob as sociedades menos desenvolvidas e mais fracas de outras mais fortes como aconteceu no encontro colonial Dificilmente precisamos lembrar que as primeiras tiveram urn ca rater freqtientemente prolongado e sanguinaria comesando pelas guer ras da antiga Europa medieval ate ao que Amo Mayer habilmente de nominou de guerra dos trinta anos entre 1914458 meso assit as transisoes impostas foram ainda mais custosas e destrUidoras Ja que envolveram o genocfdio a escravidao dos povos subjugados o extermfnio de sociedades nativas e nao por fim a aparentemente cronica senao etema prisao dos povos subjugados em uma posi sao de inferioridade dentro do sistema mundial9 0 desejo de muitos na Europa Oriental e na URSS e que eles se tomem como a Europa Ocidental em urn relativamente curto perfodo e tempo de 5 ou 10 anos Mtiitos na URSS agora expressam as suas aspl rasoes como sendo as de que seu pafs se tome em algum sentido gene rico civilizado A realidade pode ser uma de conflito duradouro nos terrenos sociais e etnicos e de urn ciclo de instabilidade ao estilo da America Latina nos nfveis polftico e economico Se o intemacional im pede a heterogeneidade no Iongo prazo ele simulmeamente inibe uma imitasao bemsucedida Como resultado dos regimes marx1stas estas sociedades pareceriam vingar a teoria marxista sobre o desenvolvimen to capitalista como duplamente combinado e desigual E aqui que se toma possfvel considerar uma questao de impor tancia hist6rica e te6rica em que medida e de que maneiras a compe 8 Amo Mayer Why Did the Heavens Not Darken London Verso 1990 Capftulo 1 no qual a crise generalizada do seculo vinte e descrita 9 Immanqel Wallerstein Historical Capitalism London Verso 1986 para uma pesqmsa irrefutavel deste processo Repensando as rela6es intemacionais 213 ti9ao extema contribuiu para a evolu9ao e o colapso final do sistema comunista 0 sistema nao foi destrufdo pela guerra e nem seu colapso foi somente ex6geno Nem o resultado pode ser entendido somente se olhando para os Estados Entretanto de formas que requerem mai or exame as for9as extemas incluindo as economicas contribufram para o colapso final em 1989 Varios fatores na competi9ao interesta tal serao examinados a conclusao sera que acima de tudo nao foi a competi9ao em nenhum destes campos mas a percep9ao da perfor mance economica e ideol6gica que determinou o resultado No Capitulo 7 janos referimos a hist6ria da competi9ao esta tal entre os Estados comunistas e capitalistas e da necessidade de se distinguir entre as diferentes dimensoes desta competi9ao para de terminar por que o sistema comunista falhou 10 A luz do que os so ci6logos hist6ricos tern escrito existem certos pontos de partida 6bvios a propria guerra a pressao sobre as rela96es Estadosocie dade devido a necessidade de mobilizar recursos domesticos na pre para9ao para uma possfvel guerra e a forma9ao e a deforma9ao das institui96es domesticas como urn resultado da competi9ao externa Nao necessariamente e s6 a guerra mas tambem os custos das guer ras passadas e as pressoes das perspectivas de novas que podem como na Fran9a de 1763 aumentar as tensoes dentro de urn sistema polftico e social levandoo ao colapso final 11 OS FATORES INTERNACIONAIS E A GUERRA FRIA Ja foram mencionados os fatores intemacionais envolvidos no colapso do comunismo e os associados ao destino dos imperios oto mano e manchu isto e OS derivados da hist6ria anterior de intera96es entre sistemas heterogeneos e desiguais 0 outro conjunto de fatores intemacionais freqlientemente citado em conexao com a queda do comunismo e mais recente e singular sendo comumente considerado como o responsavel pelo colapso dos regimes comunistas e em par ticular pela crise da URSS no final dos anos 1980 Estes giram em too da discussao de que de alguma forma ou outra a pressao que o oc1dente colocou sobre o sistema comunista a partir da segunda me tade de 1970 corporificado nas polfticas da Segunda Guerra Fria foi tal que o sistema sovietico nao poderia sobreviver Quebrando em partes este argumento geral tres fatores espe cfficos sao quase sempre destacados o onus da corrida armamen tista os embargos economicos e tecnol6gicos da OTAN e os movi 10Ver nota 1 para discussiio adicional sobre este tema 11Skocpol States and Social Revolutions pennanece uma exposiciio classica desta tese 214 Fred Halliday mentos de guerrilha anticomunista nos aliados sovieticos do Tercei ro Mundo Em si mesmos ou em algum tipo de combina9ao estas foram como se afirma com freqliencia as formas de competi9ao intemacional e de pressao que colocaram a URSS de joelhos A Corrida Armamentista Agora sabemos o suficiente para sermos capazes de mapear a hist6ria e o significado da corrida armamentista LesteOeste de uma forma razoavelmente satisfat6ria Resumidamente ela caminhou da seguinte forma i A partir do final de 1940 a URSS e os EUAestiveram engaja dos em uma corrida armamentista convencional e nuclear envolvendo crescentes gastos e uma corrida tecno16gica Nesta corrida em todas as dimensoes principais exceto na espacial nos anos 50 os EUAestiveram na lideran9a no campo tecnol6gico e mantiveram na maioria das dimen soes a lideran9a em termos quantitativos 12 ii A despeito desta lideran9a o onus relativo sobre os EUA foi significativamente menor representando entre 5 e 10 do PIB Produto Intemo Bruto enquanto para a URSS os gastos com armas represen taram entre 10 e 20 ao Iongo deste perfodo alguns oficiais russos agora dizem que este percentual chegou ate 25 iii A despeito da ausencia de confronta9ao militar direta ameri canasovietica convencional ou nuclear esta corrida armamentista re presentou em urn sntido clausewitziano uma continua9ao da poHtica por outros meios refletiu uma busca por uma ilus6ria mas estrategica mente significativa superioridade incorporou a busca dos dois lados de prestfgio e status na arena intemacional e constituiu urn meio de pres sao sobre o or9amento e daf sobre a rela9ao domestica entre o Estado e a sociedade 13 Dado o onus sabre a URSS esta inabilidade em competir com os EUA e a evidente racionalidade clausewitziana da cotrida armamentis ta freqlientemente se defende que foi esta corrida que for9ou a URSS ao recuo estrategico na metade dos anos 1980 Pelo menos tres variantes deste argumento podem ser percebidas a economica o nivel de despesas com arrilamentos e o desvio de recur sos para o setor militar foram tais que a URSS nao poderia continuar a competir e precisava de uma drastica redu9ao de gastos militares para 12Sobre a corrida armamentista ver Fred Halliday The Making of the Second Cold War London Verso 1989 Capftulo 3 13Esta foi convencionalmente conhecida como a teoria de controle de armas da corrida armamentista Repensando as rela6es intemacionais 215 poder redirecionar recursos para a reorganizaao economica domes tica a tecnologica a continuidade da liderana dos EUA acentua damente representada no infcio dos anos 1980 por dais desenvolvi mentos a IDE Iniciativa de Defesa Estrategica eo mfssil continen tal foraram a Iiderana sovietica a perceber que nao poderia con tinuar a competir e a polftica os perigos e os custos envolvidos na guerra nuclear foraram 0 PCUS a abandonar a ideia de urn mundo dividido em dais campos preso ao conflito social em favor dos valores universais e dos interesses comuns da humanidade Em diferentes medidas todas estas tres variantes sao encontra das nos trabalhos dos escritores sovieticos e ocidentais e cada uma seguramente deve ter desempenhado urn papel 0 proprio Gorba chev conseqtientemente invocava o terceiro argumento o polftico enquanto o apelo a valores universais tern uma 1onga historia no pensamento sovietico e antes disso no russo o poder das armas nucleares eo acidente de Chernobyl em 1986 certamente serviram para reforar esta percepao dos perigos da energia nuclear e por extensao das armas nucleares Apesar deter sido muito importante existem raz5es significativas para qualificar a importancia da corrida armamentista como o fator prin cipal por tnis do colapso sovietico Sem duvida o argumento economico deve ter uma fora considemvel na verdade a propria figura quantitativa de 10 ou 20 do PIB sendo gasta em defesa subestima o seu impacto qualitativo e distorcido havendo tambem a alocaao do melhor pessoal administrativo e cientffico e de recursos materiais chaves para este setor Por outro lado gastos militares de 10 ou mais do PIB estao Ion ge de ser uma explicaao adequada para os fracassos da economia sovi etica Israel e Taiwan tiveram alocaoes de defesa compaiaveis no mes mo perfodo de tempo mas experimentaram padr5es de vida mais a os e maiores taxas de crescirriento 14 Alem disso este alto nfvel de gas tos militares como uma percentagem do PIB e uma outra forma de dizer que o proprio PIB era bastante baixo os niimeros do gasto total dos EUA e da URSS mostram que em termos absolutos os EUA estavam gastando mais do que a URSSY 4No infcio dos 1970 Taiwan gastou 10 do PIB em despesas militares Israel 20 International Institute of Security Studies The Military Balance 19721973 London 15A despesa americana em 1971 foi de 120 bilhoes de d6lares contra 94 bilhoes sovie ticos em 1980 111 bilhoes contra 107 A despesa total da UnHio Sovietica e de seus aliados foi somente metade daquela de seus oponentes a OTAN e os seus aliados do Extremo Oriente China J apao em 1980 120 bilhoes para o Pacto de Vars6via contra 243 bilhoes Todos os dados SIPR Yearbook 1981 mimeros fixos de 1978 Convencio nalmente a despesa americana foi subestimada por vanos mecanismos de calculo urn ds 3lclos era que o mimero de 1980 127 bilhoes deveria ser ajustado para cima 223 bilhoes Ie de 52 a 95 do PIB James Cypher em Monthly Review November 1981 216 Fred Halliday A enfase precisa portanto ser tanto na eficiencia e nos meca nismos de alocaao do setor civil como no peso dos gastos militares sabre o PIB fosse o PIB sovietico relativamente rnais alto e se os res tantes 80 da economia sovietica tivessem sido mais eficientemente organizados o onus do gasto militar teria sido menor e teria dada uma certa eficiencia e nfveis razoaveis de crescimento representado de qualquer forma uma percentagem mais baixa do PIB Problemas similares surgem com a variante tecnologica a su posiao da maior parte da analise sabre a corrida armamentista e da abordagem sovietica convencional antes disso foi que mais ou menos a URSS foi compelida pelas necessidades da competiao interestatal a se equiparar aos EUA em termos qualitativos e quanti tativos Previamente a URSS imitou os avanos americanos como no desenvolvimento dos mfsseis com multiplas ogivas depois de 1972 e na capacidade de Ianamento intercontinental de submari nos o desafio da IDE e dos mfsseis continentais foram tais que a URSS nao tinha replica companivel e nao havia antfdoto evidente que fosse capaz de produzir Apesar disso a URSS poderia sem uma rivalidade imitadora ter produzido contramedidas a estes desafios americanos mfsseis estrate gicos de voo em baixa altitude somados a urn sistema de chamarizes poderiam ter invalidado a IDE mesmo que ela se mostrasse via vel Uma polftica que foi definida como de mfnima dissuasao teria feito subs tancial diferena e dado condi6es a URSS de escapar de sua autoderro tista busca de paridade bruta 0 terceiro argumento relevante para a corrida arrnamentista o po lftico sabre a ameaa representada a humanidade pelas armas nucleares teve grande validade em si mesmo e e credito de Gorbachev telo articu lado rnais claramente do que qualquer outro contudo ele nao leva a todo o processo de mudana polftica e social dentro da URSS que acompa nhou a adoao destes valores universais associados ao novo pensamen to E concebfvel que a URSS tivesse optado pela retirada da corrida ar mamentista como anteriormente perseguida mas ela insistiu em preser var seu sistema polftico e socioeconomico distinto Explicar este ultimo envolve olhar alem da esfera da corrida armamentista e de seus custos economicos tecnicos e poHticos As Pressoes Economicas 0 segundo conjunto de questoes comumente citado para explicar o recuo sovietico eo economico e em particular o impacto sabre a URSS dos embargos ocidentais e das restrioes no campo de tecnologia de pon ta Aqui e valido repetir que esta linha de argumentaao e contraria ao que ate aqui e percebido como 0 impacto do comercio intemacional Repensando as rela6es intemacionais 21 7 poder redirecionar recursos para a reorganizaao economica domes tica a tecnol6gica a continuidade da liderana dos EUA acentua damente representada no inicio dos anos 1980 por dois desenvolvi mentos a IDE Iniciativa de Defesa Estrategica e o missil continen tal foraram a liderana sovietica a perceber que nao poderia con tinuar a competir e a polftica os perigos e os custos envolvidos na guerra nuclear foraram o PCUS a abandonar a ideia de urn mundo dividido em dois campos preso ao conflito social em favor dos valores universais e dos interesses comuns da humanidade Em diferentes medidas todas estas tres variantes sao encontra das nos trabalhos dos escritores sovieticos e ocidentais ecada uma seguramente deve ter desempenhado urn papel 0 proprio Gorba chev conseqtientemente invocava o terceiro argumento o politico enquanto o apelo a valores universais tern uma longa historia no pensamento sovietico e antes disso no russo o poder das armas nucleares eo acidente de Chemobyl em 1986 certamente serviram para reforar esta percepao dos perigos da energia nuclear e por extensao das armas nucleares Apesar deter sido muito importante existem razoes significativas para qualificar a importancia da corrida annamentista como o fator prin cipal por tnls do colapso sovietico Sem duvida o argumento economico deve ter uma foa considenivel na verdade a propria figura quantitativa de 10 ou 20 do PIB sendo gasta em defesa subestima o seu impacto qualitative e distorcido havendo tambem a alocaao do melhor pessoal administrative e cientifico e de recursos materiais chaves para este setor Por outro lado gastos militares de 10 ou mais do PIB estao Ion ge de ser uma explicaao adequada para os fracassos da economia sovi etica Israel e Taiwan tiveram alocaoes de defesa comparaveis no mes mo perfodo de tempo mas experimentaram padr5es de vida mais attos e maiores taxas de crescimento 14 Alem disso este alto nfvel de gas tos militares como uma percentagem do PIB e uma outra forma de dizer que o proprio PIB era bastante baixo os numeros do gasto total dos EUA e da URSS mostram que em termos absolutos os EUA estavam gastando mais do que a URSS 1s 14No infcio dos 1970 Taiwan gastou 10 do PIB em despesas militares Israel 20 International Institute of Security Studies The Military Balance 19721973 London 15A despesa americana em 1971 foi de 120 bilhoes de d6lares contra 94 bilhoes sovie ticos em 1980 111 bilhoes contra 107 A despesa total da Uniao Sovietica e de seus aliados foi somente metade daquela de seus oponentes a OTAN e os seus aliados do Extrema Oriente China Japao em 1980 120 bilh5es para o Pacto de Vars6via contra 243 bilhoes Todos os dados SIPRI Yearbook 1981 m1meros fixos de 1978 Convencio nalmente a despesa americana foi subestimada por vanos mecanismos de calculo urn dos calculos era que o numero de 1980 127 bilhoes deveria ser ajustado para cima 223 bilhoes ie de 52a 95 do PIR James Cypher em Monthly Review November 1981 216 Fred Halliday A enfase precisa portanto ser tanto na eficiencia e nos meca nismos de alocaao do setor civil como no peso dos gastos militares sobre o PIB fosse o PIB sovietico relativamente mais alto e se os res tantes 80 da economia sovietica tivessem sido mais eficientemente organizados o onus do gasto militar teria sido menor e teria dada uma certa eficiencia e nfveis razoaveis de crescimento representado de qualquer forma uma percentagem mais baixa do PIB Problemas similares surgem com a variante tecnol6gica a su posiao da maior parte da analise sobre a corrida armamentista e da abordagem sovietica convencional antes disso foi que mais ou menos a URSS foi compelida pelas necessidades da competiao interestatal a se equiparar aos EUA em termos qualitativos e quanti tativos Previaniente a URSS imitou os avanos americanos como no desenvolvimento dos mfsseis com multiplas ogivas depois de 1972 e na capacidade de lanamento intercontinental de submari nes o desafio da IDE e dos mfsseis continentais foram tais que a URSS nao tinha replica comparavel e nao havia antfdoto evidente que fosse capaz de produzir Apesar disso a URSS poderia sem uma rivalidade imitadora ter produzido contramedidas a estes desafios americanos misseis estrate gicos de voo em baixa altitude somados a urn sistema de chamarizes poderiam ter invalidado a IDE mesmo que ela se mostrasse via vel Uma polftica que foi definida como de minima dissuasao teria feito subs tancial diferena e dado condioes a URSS de escapar de sua autoderro tista busca de paridade bruta 0 terceiro argumento relevante para a corrida armamentista o po lftico sobre a ameaa representada a humanidade pelas armas nucleares teve grande validadeem si mesmo e e credito de Gorbachev telo articu lado mais claramente do que qualquer outro contudo ele nao leva a todo o processo de mudana polftica e social dentro da URSS que acompa nhou a adoao destes valores universais associados ao novo pensamen to E concebfvel que a URSS tivesse optado pela retirada da corrida ar mamentista como anteriormente perseguida mas ela insistiu em preser var seu sistema polftico e socioeconomico distinto Explicar este ultimo envolve olhar alem da esfera da corrida armamentista e de seus custos economicos tecnicos e polfticos As Pressoes Economicas 0 segundo conjunto de questoes comumente citado para explicar o recuo sovietico e o economico e em particular o impacto sobre a URSS dos embargos ocidentais e das restrioes no campo de tecnologia de pon ta Aqui e valido repetir que esta linha de argumentaao e contraria ao que ate aqui e percebido como 0 impacto do comercio intemacional Repensando as relac6es intemacionais 21 7 sobre urn sistema distinto no ultimo caso suporseia que o crescente comercio minaria o outro sistema e entao contribuiria para a sua der rubada na disputa LesteOeste consideravase que o comercio be neficiaria o bloco rival e que a sua morte seria apressada pela nega ao de tal interaao A maior parte da discussao do posguerra sobre a relaao entre o comercio e a segurana no contexto LesteOeste funcionou dentro da suposiao de que a maior interaao comercial entre os dois blocos contribuiria para a estabilidade do bloco sovie tico a discussao desenvolvida nos anos 1970 foi entre os que acre ditavam que maior comercio ao tornar a Uniao Sovietica mais se gura reduziria as areas de conflito entre ela e o ocidente e os que pensaram que isto encorajaria urn comportamento combativo Se a primeira visao fazendo uso das teorias da interdependencia do minou o inicio dos anos 1970 foi a ultima que prevaleceu no peri ado da Segunda Guerra Fria Com base na evidencia parcial disponivel pareceria que a intera ao econornica e as pressoes de varios tipos contribuiram duplamente para o colapso do sistema comunista Entretanto o mais importante fa tor nao foi a vulnerabilidade do sistema centralmente planificado mas a sua inabilidade em fazer uso das vantagens que o comercio como mun do capitalista proporcionou No caso de certos pafses europeus orientais a Polonia eo exem plo mais marcante a abertura para o ocidente no inlcio de 1970 teve ganhos de curto prazo em termos de disponibilidade de hens de consu mo e de investimento mas levou a uma crise de Iongo prazo com a df vida extema e a pres sao crescente sobre os ganhos domesticos uma vez que 0 refinanciamento da divida tomouse necessario 0 sistema econo mico centralmente planificado nao pode fazer uso do apoio extemo ade quadamente para desenvolver a sua propria economia e terrninou aprisi onado por seus compromissos intemacionais No caso da URSS toda a evidencia sugere que a interaao co mercia direta com o mundo capitalista teve como efeito fortalecer o sistema existente no curto prazo mais obviamente os altos preos do petroleo ganharamlhe tempo nos anos 1970 e as importasoes de trigo fomeceram o meio de apagar os fracassos na agricultura A elevasao do preo do petroleo em 1970 deu a URSS lucros inespe rados na maior parte da decada entretanto como os escritores sovi eticos recentemente apontaram as conseqUencias de Iongo prazo destes lucros foram inibidoras ja que permitiram aos planejadores centrais e aos administradores adiar mudansas que de outra forma poderiam ter sido introduzidas mais rapidamente 0 mesmo se aplicou ao caso da tecnologia o registro da inovaao tecnologica na URSS nao e de nenhuma maneira tao desanimador como freqtientemente e sugerido mas nao ha duvida de que a maioria das ino vaoes tecnologicas em decadas recentes originaramse no ocidente 218 Fred Halliday Aqui a URSS esteve em desvantagem em dois aspectos e o sgun do deles provavelmente foi mais importante do que o pnmetro E evidente para a propria URSS que ela nao prooveu nenhuma gade inovaao tecnologica e foi portanto compehda nas esferas tvll e militar a copiar ou simplesmente a roubar as vas tecnologtas do mundo capitalista 0 grau de isolamento sov1et1co d mercado m ternacional nunca foi tao grande quanto sugerem as 1magens con vencionais a industrializaao em 1930 dependeu pesadamente da importaao de hens de capital da GraBretanha e da Alemanha a historia aeroespacial sovietica e uma de reproduao das aeronaves e das tecnologias ocidentais Mesmo assim a URSS esteve sempre atnis na busca deste desenvolvimento tecnologico Mais importante ainda ela nao fi apaz de fazer uso apropnado das tecnologias das quais dispunha ex1stm pouca 1teraao entre s se tores militar e civil era inerente ao sistema de plamficaa centrahzada a falta de incentivo para a inovaao alem de serem encoraJados uso de metodos de produao ineficientes e tradicionais OS CnstrangientOS politicos e ideologicos inibiram o uso da tecnolog1a da mfxmao atra ves do sistema 0 padrao de modernizaao conservora 1dentrfcado como endemico as economias centralmente plamf1cadas funciOna va neste sentidoI6 Acima de tudo foi por isso qe a terceua evolu ao industrial do inicio dos anos 170 ada mcotecnologia e da precisao da engenharia computadonzada permitiU ao oc1dente ul trapassar a URSS mais do qe unca 0 papel da pressao econormca e do seu 1mpato politico tern d01s lados quando se consideram os embargos Aqu1 defendese que o comportamento sovietico na arena intemacioal foi afetado pelas rs trioes ocidentais sustentadas P preocupasoes de segurn9a naciO nal atraves do CoCom o Com1te Coordenador do Comercio Lese Oeste e dos embargos politicos mais amlos nuJcdos na esteua do Afeganistao primeira diziase tona s dificil para a URSS competir na cornda armamentlsta a ultima ana como retlrad o incentivo para aoes nao bemvindas da poht1ca exte sovtetlca Dado 0 grau em que a URSS protestou sobre estas restrioes parece c d Jl7 ria que seu tmpacto Jora cons1 erave Contudo em si mesmas estas pressoes d1fictlmente podem exph car a mudama na orientaao sovietica a partr da metade da eada de 80 a URSS face a urn terrivel atraso tecnologtco na esfera mtbtar po tver Bros e Laski From Marx to Market t7Para vislio sovietica do embargo ocidental ver Igor Artemiev International Economic Security em International Economic Security Soviet and BritishApproaches Chatham House Discussion Paper n7 1988 Repensando as rela6es intemacionais 219 deria ter feito concessoes substanciais tais como a retirada dos SS 20 ou o cancelamento dos mfsseis estrategicos SS18 sem colocar a sua estrategia global em questiio no curta prazo pelo menos eles nao responderam as sanoes polfticas do ocidente fazendo grandes concessoes de polftica externa e na verdade ate 1985 eles foram muito mais intransigentes do que antes Os mesmos fatores que di minufram a importancia do impacto comercial e tecnologico ocidental serviram para diminuir o impacto de sua retirada o sistema polftico e econCmico centralizado poderia absorver os choques assim como poderia inibir a difusao de novas tecnologias A Erosio do Bloco Urn terceiro fator adicional citado para explicar o recuo do poder sovietico foi o custo de apoiar econCmica e militarmente os seus aliados no Terceiro Mundo Inumeras razoes sugeremse para tal explicaao os proprios escritores sovieticos reclamaram aberta mente sabre os custos econCmicos e diplomaticos deste apoio e revrteram a sua previa visao kruschevitziana de que a libertaao nacwnal e os movtme11tos revolucionarios do Terceiro Mundo tinham uma contribuiao positiva para o poder da URSS 18 o conceito de superetensao imperial pareceria se aplicar aqui e fornecer uma perspectiva comparada sabre o recuo sovietico o proprio carater das relaoes sovieticas como Terceiro Mundo residindo em substanci ais subsfdios econCmicos em troca de recompensas polfticas e es trategicas tornou este conjunto de relacionamentos especialmente custoso para os estrategistas americanos no infcio de 1980 o elo mais fragil do sistema sovietico residia no Terceiro Mundo e por isso formulouse a Doutrina Reagan de apoio aos movimentos de guer rilha anticomunista Entretanto urn exame mais detalhado revela que a pres sao dos com promissos do Terceiro Mundo pode ter sido diferente e em alguns as pectos men or do que parece a prime ira vista 0 maior custo destes com promissos para a URSS foi no campo diplomatico o apoio sovietico aos alados e movimentos revoluciomirios piorou as relaoes com os EUA e a mvaso doAfeganistao criou condioes para que o ocidente rompesse os relac10namentos entre a URSS e o Terceiro Mundo como urn todo Galia Golan The Soviet Union and the National Liberation Movements in the Third Word London Unwin Hyman 1988 Jerry Hough The Struggle for the Third World Sov1t Debate and American Options Washington Brookings Institution 1986 Fred Halhay Cold War Third World Capftulo 4 para o repensamento da polftica sovietica em direlliO ao terceiro mundo 220 Fred Halliday Os outros fatores normalmente citados o econCmico e o mili tar podem tambem ter sido menos significatios Em primeiro Iu gar os numeros da ajuda sovietica ao Tercetro Mundo englobam varias formas de apoio incluindo no caso do mawr compromtso Cuba grandes acordos comerciais de Iongo przo que garanttarn termos comerciais muito melhores do que podenam ser consegut dos no mercado mundial preos mais altos para o aucar baixos para o petroleo Porem estas nao eram transferencas totais d e cursos no sentido comum No caso de Cuba extsttram beneftctos para a URSS obter aucar e nfquel que poderiam ser pagos em rublos ao inves de moeda real em outros casas o aliado do Tercei ro Mundo foi capaz de abastecer a URSS com importa9oes de valor gas afegao sendo urn exemplo Segundo e a despetto das sule restimativas sovieticas de seu registro de ajuda o montante de aJ da mesmo em uma definiao ampliada foi em termos comparat vos muito baixo 0 25 do PIB bastante distante do valor amen cano 19 Apesar de Terse tornado politicamente conveniente dentro da URSS culpar os aliados do Terceiro Mundo que certamente a ministraram mal as suas economias devido aos atrativos econCmt cos da URSS este dificilmente foi urn fator central na crise econC mica do sistema sovietico Da mesma forma que no caso dos gastos militares o foco da criti ca precisa avanar por todo sistema de planejamento e produao e por suas ineficiencias que eram incidentalmente reproduztdas pelos progra mas de ajuda sovieticos dentro dos Estados do Teceiro Mundo Em 1980 0 custo estrategico de sustentar aliados no Tercerro Mundo estava certa mente subindo como urn resultado da Doutrina Reagan mas se o pro pos ito dos movimentos anticomunistas foi ode enfraquecer a URSS m seu ponto mais vulneravel ste acabou o send o caso Uma das pn cipais razoes para o envolvtmento sovtetlco e octental noAegantstao foi o efeito demonstrativo da derrubada de urn parttdo comumsta gover nante 0 impacto da queda de Kabul na Europa Oriental seria acredita vam os dois lados potencialmente enorme Mesmo asstm no fim nao foi na Nicaragua nem no Afeganistao que os aliados sovieticos foram primeiro derrubados mas na propria Europa Oriental Foam os aconte cimentos de Varsovia Bedim e Praga que afetaram constderavelmente Managua Aden e Kabul e nao o in verso 19De acoroo com ndmeros da OECD DAC Repensando as rela6es intemacionais 221 UM FRACASSO COMPARATIVO Ate este nto discssao identificou duas categorias de fator externo a tradtctonaltmpenal discutida no Capitulo 7 e cente fi L a mats re e espect ca esteOeste da Guerra Fria aqui abordada u Pdem ser conteradas como tendo desempenhado urn papel na o sao e na destruao do poder sovietico Apesar de ambas terem algum poder exphcattvo foram sugeridas razoes que podem tom I dequadas Desta maneira o argumento e entao empurrad aa lvad a reexaC das razoes do co lap so do poder sovietico no mvts tstonco e teonco a urn reexame duplo do que aconteceu na reahdade e de como a nossa concepao de competi9ao interestatal pode prectar de modifica9ao a luz do caso sovietico 1 nomeno que requer explica9ao e como urn sistema internaci a e d stados entru ent colapso na ausencia da mais evidente das as e ameaa nao fot derrado na guerra mesmo no Afe anis tao nao enfrentou desafios pohttcos vindos de batxo q fi g de t p 1 A ue 01 mcapaz con er a o om sndo a umca excao parcial a despeito de van os PTbemas econoucos e sociais ele foi capaz de atingir os nfveis efonos aos quais a sua populaao estava acostumada Portanto e e nao entrou em colapso falhou ou desmontou em 1 sentido aboluto 0 que ocorreu pelo contrano foi que a lidei Edo mats poderos no sistema decidiu introduzir urn conjunto radi c nte novo de pohttcas dentro da URSS e do sistema como urn todo nao Ot o caso deque os ovemados nao pudessem continuar send govrnados d anttga manetra OU de que OS governantes nao pudessem contmuar asstm governando Devese perguntar 0 que foi que levou estes govemantes que nao podem ser acusados de nao terem dese ado o per no pssado ou de terem sido defensores disfarados do ocien te a Intrrlzrr as mudan9as da fonna como 0 fizeram Dots ttpos de razoes uma end6gena e outra ex6 ter leado a este rsultad Bias podem ser denominaaa esumtd de parahsta soctoeconomica e de falta de competitividade mternc10nal paralisia foi evidente em muitas esferas variadas as xas t e esctmeno em queda os problemas sociais crescente 0 ume o crrup2ao e da destlusao e a crise ecol6gica Nao somen Iste nao pode contmuar reproduzindo as taxas de crescimen me ora no fornectmento do bemestar caracterfsticas de suas anmetras fass 1930 195 como tambem parecia ter perdido 0 as e uma manetra geral Na llteratura sovietica dos anos 1980 fe g temente fa fi A quen zse re erencta a estes fenomenos como a estag Porem este e de muitas maneiras urn termo simplista2o ele 6i 20Sobre a estagn Mkh ao ver 1 rul Gorbachev Perestroika New Think fi 0 and the World London Collins 1987 Capfulo 1 mg or ur Country 222 Fred Halliday I I l mou o grau em que houve progresso continuo em algumas esferas pelo menos na polftica e ainda continha a suposi9ao teleol6gica de que o sistema poderia sob outras circunstancias ter continuado a cres cer ease desenvolver Mais importante a estagnaao deixou de fora o fator vital que foi de muitas maneiras o mais importante para forar a lideran9a so vietica a introduzir mudan9as ao ser confrontada com esta tendencia a percep9ao do fracasso comparative do sistema visaviso ocidente Acima de tudo foi na percepao da falta de habilidade do sistema sovietico em acompanhar quanto mais superar o oeste que pode ser percebido o aspecto central do colapso do sistema sovietico Poi o fracasso em competir internacionalmente que levou as mudan9as p6s 1985 na URSS uma vez iniciada a tentativa de refonnar o sistema para melhor sobreviver e competir rapidamente afundou no insucesso de salvar o Estado como tal Dentre os varios estagios da perda de esperana o ultimo foi a per cep9ao da inabilidade do sistema em competir em 1980 0 primeiro de sapontamento hist6rico ocorreu imediatamente depois de 1917 quan do os Bolcheviques perceberam que a sua revolu9ao nao seria repro duzida na Alemanha Esta percepao levou a uma dupla redefini9ao de estrategia o abandono temporario do objetivo de uma revoluao mun dial e a proclamaao da ideia de que urn regime socialista poderia ser construfdo na URSS Com as vit6rias na Segunda Guerra Mundial e o aumento no numero de aliados pr6sovieticos no Terceiro Mundo em 1950 e 1960 parecia que este isolamento inicial poderia ser superado junto como desenvolvimento do socialismo dentro da pr6pria URSS Os sucessos da reconstru9ao do p6sguerra e da tecnologia espacial em 1950 pareciam confirmar isto daf o novo programa de Kruschev se cularmente otimista que combinava a rivalidade duradoura com o oci dente no Terceiro Mundo com uma politica de desenvolvimento social planejada para alcan9ar e superar o oeste em duas decadas Apesar de ser dificil de acreditar nisto agora parece que esta perspectiva mo dificada por Brejnev dominou o pensamento sovietico are o infcio dos anos 1980 houve avan9os continuos no Terceiro Mundo a URSS al canou a paridade estrategica com os EUA na corrida armamentista e em casa a polftica oficial era afirmar que a URSS atingira urn novo patamar de Estado urn estagio de socialismo desenvolvido Entretanto a realidade era bastante diferente como cada uma das principais areas de competiao interestatal e entre os blocos mostrou Na mais publicae privilegiada area de competi9ao a militar a URSS foi como vimos sempre inferior em numeros e qualidade exceto por sua fora convencional na Europa Oriental No infcio dos anos 1980 ela enfrentou novos desafios aos quais foi forada a aceitar e ineren temente incapaz de responder e faltoulhe algo parecido as capacida Repensando as rela6es intemadonais 223 des de projeao de poder global dos EUA e de seus aliados Se era nesta area que a Uniao Sovietica podia melhor competir evidentemente ela nao o estava fazendo bern o suficiente Em segundo Iugar o sistema internacional criado pela URSS era marcantemente mais fraco quantitativa e qualitativamente do que o ocidental 0 mercado capitalista nao somente era muito mais forte em termos de resultados economicos e de numero de pafses incluf dos dentro dele como tambem era maior o seu nfvel de integraao urn dos paradoxos do planejamento dentro da URSS e do sistema intemacional sovietico mais genericamente era a sua inabilidade para integrar setores alem de fornecerlhes alvos de produao separados supostamente coordenados Na esfera militar uma disparidade si milar e inferioridade qualitativa prevaleceu na comparaaO entre a OTAN e o Pacto de Vars6via Apesar de toda a ret6rica de constru iio de uma nova ordem mundial a ordem sovietica era menos inte grada e muito mais fraca no todo 21 Em muitos aspectos no mfnimo nos da inovaao e de preO ela permaneceu dependente do sistema capitalista e como sua imitadora ineficaz Em si mesmo este fracasso em competir internacionalmente seria urn problema central ja que a rivalidade LesteOeste e a Guerra Fria eram uma tentativa dos dois lados de fornecer uma nova base para a ordem intemacional e de demonstrar a superioridade de urn sobre o outro Mas este bloqueio externo que data desde 1917 e que somente foi escondido pelos triunfos internacionais subseqlientes era composto pelos limites intemos do sistema em muitas esferas o fracasso em igualar os nfveis de produao do ocidente o crescente gap nos padroes de vida entre os Estados socialistas e capitalistas desenvolvidos e a oposiao entre o grau substancial de sucesso democratico no oeste e o controle politico cen tralizado do leste obscurecido pela ret6rica da democracia socialista Tivesse sido a URSS capaz de rivalizar com sucesso como ocidente em outras esferas estas deficiencias internas indicadas pela estagnaao poderiam ter sido escondidas por mais tempo mas foi o fracasso no nf vel internacional que fowou a liderana a enfrentalas Aqui chegamos a uma caracterfstica central do colapso embora possa ser quase impossfvel acreditar nisso agora ate o infcio de 1980 parecia que esta diferena entre as conquistas internas estava escon dida ou pelo menos nao reconhecida pela maioria dos observado res sovieticos dentro da liderana ou em qualquer parte A autocon fiana inerente ao sistema sovietico urn produto das reivindica6es 21 obre a comparaao OTAN Pacto de Vars6via ver nota 15 0 grau de integraiio econ6 rmca entre os membros do Comecon do leste europeu era muito menor do que aquele dentro da CEE a maioria do comercio era em uma base bilateral entre os sovieticos eo 1esteeuropeu 224 Fred Halliday hist6ricas da revoluiio e da vit6ria na Segunda Guerra Mundial parece ter durado ate este momenta mas em algum ponto no inicio da decada de 1980 ela comeOU a desmoronar primeiro entre ali derana e depois entre a populaao como urn todo A percepiio de como a maioria das pessoas vivia no oeste e do enorme gap ntre os padroes de vida produziu uma situaiio na qual a autoconftana que havia durado desde 1917 evaporou Ano espao e algns po cos anos Nao e possfvel separar o economtco das dtmensoes poh ticas mas a evidencia sugere que foi o economico que desempenhou urn papel principal no encaminhento do rocessDJa vez qu ogap dos padroes de vida tornouse evtdente entao a egtttrmdde do ststema politico foi varrida e aquela do sistema alternattvo a vanante octdental de pluralismo foi aumentada Neste ponto e valido notar o mecanismo pel qual esta mdan de atitude parece ter ocorrido A separaiio da soctedade sovtettca fot tanto ffsica falta de comuniCaiiO interferencia no radio ausencia de viagem puniiio daqueles que buscavam o contato cm o mundo ex terno quanto psicol6gica uma crena que a despetto do que desse errado u nas luchse as coisas sao melhores conosco 22 Aqueles que viajaram para o exterior ou tiveram acesso a ados comparados eram condenados ao silencio mesmo quando percebtam a verdade Nestas circunstiincias a mudana nas ideias da liderana foi de crucial impor tancia e abriu as comportas do descontentamento popular a quebra da autoconfiana secular no topo da lideaa dev crtamene ter stdo encorajada pelos fracassos na compettao economtca e htar as parece que a propria percepiio dos contrastes nos padroes de vtda destacando a realidade da paralisia interna no final dos anos 1970 de sempenhou o papel crucial No caso de Gorbachev or exemplo are ce que suas visitas ao Canada forneceram tal oastao bastar cmco minutos em urn supermercado canadense medto para a questao fie clara e para que a experiencia das deficiencias e dos problemas espect ficos que ele tivera governando a regHo de Stavropol fossem coloca dos em seu contexto decisivo e internacionalizado Uma vez que esta mudana ocorreu seguiu entao urn processo de conscientizaiio mais ampla A liberalizaiio do sistema politico so mente dentro da URSS permitiu uma maior quantidade de informa iiO sobre o mundo capitalista quase toda ela favoravel quando nao sem crfticas e uma consideraiio mais negativa do registro da URSS Tambtim e visfvel como em discursos feitos depois de 1985 Gorbachev fazia ele mesmo compara6es com o mundo capitalista no campo dos indicadores sociais a mortalidade infantil as condi 22Hedrick Smith The Russians London Sphere Books 1976 fomec evocaao poderosa desta atitude no perfodo anterior ao colapso da confiana sovutica Repensando as relac6es intemadonais 225 oes hospitalares o alcoolismo e a disponibilidade de alimentos basicos assim como no dos indicadores macroeconomicos e poli ticos gerais 23 Seu proprio processo de autoeducaao parece ter seguido tal caminho ja insatisfeito com a performance socialista ele assumiu em 1985 aparentemente acreditando que o sistema socia Iista poderia reformarse pela aplicaao de tecnologia de urn modo mais intensivo percebida como a melhor maneira de acelerar a produao mas em 1989 ele havia avancsado muito mais nas fren tes economica e politica face a inabilidade do sistema em se refor mar dentro dos parametros politicos e economicos socialistas orto doxos Em outras palavras a comparacsao internacional que o leva ra ao ponto de iniciar as principais reformas em 1985 o empurrou depois de 1985 a vislumbrar uma reforma muito mais radical do sis tema 0 fato dele ter forcsado esta comparacsao ao povo sovietico liberando uma insatisfaao adicional e disseminada somente serviu para confirmar esta tendencia Como indicado acima ainda esta em aberto a questao se este projeto poderia ter sido ou nao bemsucedido dadas as dificuldades internas da transiao e da posiao internacional subordinada ocupa da pela URSS Entretanto esta clara que a decisao da Iiderancsa para a mudancsa foi produto desta combinacsao de pressoes internacionais e especificamente da percepcsao do gap entre os padroes de vida Aqui e possfvel fazer uma distincsao entre as duas fases amplas do colapso a primeira consciente e controlada de 1985 a 1989 e a segunda descontrolada quando a situacsao na Europa Oriental e na propria URSS ficou fora de controle culminando no golpe fracassa do de Agosto de 1991 e na subseqtiente dissolucsao da propria URSS A primeira fase levou a segunda nao porque Gorbachev e seus associados previram que ela aconteceria mas precisamente porque nao o fizeram eles acreditaram que algum sistema socialista modi ficado reformado humanizado e acelerado poderia funcionar e a16m disso que os regimes da Europa Oriental poderiam resistir depois da remoao da garantia militar sovietica Tivessem eles per cebido a fragilidade do sistema comunista na propria URSS assim como na Europa Oriental e mais ainda se as elites militares e polf ticas tivessem percebido a impossibilidade de sustentar tais regimes entao e possfvel que OS acontecimentos nao tivessem tornado 0 rumo que tomaram os regimes comunistas poderiam com crescente des moralizaao e entropia ter sobrevivido por mais alguns anos ou mesmo uma ou duas decadas 23 A Perestroika de Gorbachev esta repleta de chamados para a economia sovietica elevar se aos padr5es mundiais ie aos do ocidente 226 Fred Halliday I I I Uma vez que as gatantias militares foram removidas os regi mes da Europa Oriental desmoronaram Dentro da URSS uma vez que as restrioes a informacsao e ao cantata com o mudo exte10r foram removidas e uma vez que o papel da confrotacsao e da nva lidade com 0 oeste terminou a coesao poHttca do ststem desmoo nou Em ambos os casas a remocsao dos componentes mternacto 1 d f I nais da estabilidade do sistema levou ao resu ta o ma A tudo isto precisa ser somado urn outro fator atctonl os calculos polfticos e as iniciativas seletivas de Hderes octdentats par ticularmente este foi o caso d Alemanha no qa Helmut Kohl percebendo a sua oportunidade fist6rica de reumfcar o pats e de abolir 0 sistema comunista na Alemanha Onenta phcou u mescla de pressao e de seduao para atingir o seu objettvo Esta mtrven ao polftica consciente foi decisiva no curso dos eventos depos que 0 Muro de Berlim veio abaixo em Novembro de 189 mas ft pos sfvel somente no contexto criado par urn outro conjunto de ctrcuns tancias internacionaiS 24 OS TREs NlVEIS DE COMPETIQAO INTERNACIONAL Esta analise da competiao LesteOeste ate o finll de 180 e do subseqtiente colapso da URSS e do sistema cmumsta mts e nericamente tern algumas implicacsoes para a teonl as relaoes m ternacionais em geral e para as teorias da competlo mterestatl e intersocietal em particular que retomam as conclusoes dos Capttu los 3 4 e 7 Ninguem estudando o conflito Lesteeste pd negar a relevancia dentro dele de preocupacsoe que senam 5lemtdas na linguagem das RI como realistas o eJa co rla as form interestatais convencionats de compettao nos niVe uhtar ecno mica e polftico A rivalidade entre os sistemas sovtettco e amenca no no perfodo p6sguerra envolveu uma competiao abrangene a qual 0 fator de inovaao nao foi o papldo Estados mas ao mves disso a maneira pela qual esta compettao mterestatal desenvolveu se e novas terrenos par urn lado a corrida armantentisa nuclear e por outro a mobilizacsao abrangente de reAcusos teologtcos Dada a sua forte posicsao no campo econormco fm ntural que o ocidente buscasse usar a sua fora economic par por raoes de segu rana pressionar a URSS a economia pohttca mtrnac10nal das re Iacsoes LesteOeste foi em essencia a do uso de mstrumentos eco 24S b alia5es de Kohl neste periodo ver o diario de seu conselheiro politico Horst Tesi j9 Tage nnenansichten der Einigung Berlin SiedlerVerlag 1991 Repensando as rela6es intemacionais 22 7 nomicos para fins politicos e militares pelo bloco mais forte 0 dos Estados ocidentais Na fase final do conflito e uma vez que os Esta dos comunistas abriram as portas para a influencia ocidental em suas politicas e demais areas a pressao entao foi muito mais clara com prescrioes gerais sobre a liberdade economica sendo ligadas a con dioes especfficas sobre o papel do Estado na economia Isto esteve mais evidente no programa de dez pontos anuncia do por Kohl depois da queda do muro de Bedim apesar de apresen tado como urn conJunto de acordos entre os dois pafses ele foi na verdade urn programa para a subjugaao da Republica Democrati ca Alema Os pontos urn e dois falavam da cooperaao entre os dois Estados mas o ponto tres tomava tudo isso condicional a mudan a undaental no sisemapolfticc e economico da RDA que de vena ser trreverstvel tsto e a capttulaao Como seu assessor dei xou claro Kohl usou o termo estruturas confederativas nao con federaao de forma a impedir que a relaao entre os dois Estados adquirisse urn carater duradouro 25 A despeito de sua abrangencia esta competiao interestatal nao e suficiente para explicar como porque e quando o sistema comunista desmoronou como o oeste teve sucesso em prevalecer sobre o leste Casos previos de conflito intersistemico os casos otomano e man chu fomecem na melhor das hip6teses pontos parciais de com paraao apesar de algumas similaridades as hist6rias foram funda mentalmente diferentes Os instrumentos de competiao interestatal espcficos a Gurra Fria a crrida rmamentista os embargos o ssediO ao Tercetro undo nao exphcam porque a liderana sovi etica tomou as dectsoes que tomou depois de 1985 Para analisar a rivalidade e necessaria tomar a percepao LesteOeste como urn todo abrangendo a competiao de sistemas dentro da qual a competiao estatal desempenha urn papel importante mas nao exclusive Nesta perspectiva tornase possfvel aplicar as tres dimensoes de comletio interrelacionadas mas analiticamente distintas que foram dtscutidas no Capitulo 7 os nfveis de atividade dos Estados das entidaes sociais e economicas especialmente das firmas os da tdeologta e os da cultura ou seja as dimensoes interestatal socioeconomica e ideol6gica Ao se considerar a questao de como o oeste pressionou o leste esta distinao pode ser util Atuando no primeiro nfvel a aao estatal ocidental teve efeitos mas nao foi somente esta a hist6ria A habilidade dos Estados ocidentais em pressionar diretamente tomouse maior do que nmica como mostrou a ligaao entre a assistencia economica e a mudana socioeconomica den tro da URSS e da Europa Oriental a perestroika criou condioes para e 25Teltschik 329 Tage p 546 228 Fred Halliday nao resultou da intervenao socioeconomica o G7 No caso da Europa Oriental as firmas ocidentais as mdustnas os bncs tam bern desempenharam urn papel especialmente nas negoctaoes c a Polonia no infcio de 1970 e na administraao da produao sovte tica de petr6leo Na abertura que aconeceu a partir do final d 1989 as empresas alemas ocidentais assumtram urn papel e uma ltdra a de alguma forma coordenada com mas seprada o propro governo de Bonn Uma vez que mro veio abatxo fot a pressao do Estado alemao ocidental mats o tmpacto detas firmas que se combinaram para tomar impossfvel qualquer regtme reformado no leste Seria analiticamente enganoso reduzir a polftica estata nas relaoes LesteOeste aos desejos das corporaoes multmac10nats ou ver as ultimas agindo somente dentro dos parametres colocados por ou em nome dos Estados ocidentais Suas aoes sao paralelas e normalmente embora nem sempre convergente a resposta dos set ores da comunidade de neg6cios aos embaros Phtcos sobre os s tados comunistas foi evidencia suficiente da dtvrgencta a est repetto Porem a dimensao ideol6gica e cultural fot amda de matr tpor tancia 0 seu papel no colapso do comunsmo e la antenor nvahdade LesteOeste foi decisive de algumas manetrasActma de tdo o qe for ou a liderana do PCUS a mudar de curso e 6 que destrum o apmo ou a aquiescencia dos povos da Europa Oriental e da SS ao cmumsmo foi 0 contraste percebido entre os padroes e condtoes de vtda entre o leste e 0 oeste Esta dimensao ideol6gica certamente e algo 9ue OS Esta dos ajudam a promover e a regular que seus 6rgaos de mfoaao e propaganda disseminam e que restde na performane economtca nos resultados e nas politicas de vendas das corpora9oes Durante a Guerra Fria as estaoes de radio ocidentais transmttmdo para o les te estavam de uma forma geral conscietes de qu os programas sobre a cultura e o estilo de vida ocidentats destrmnam gota a gota a confiana e a legitimidade dos regimes do leste 26 Contudo este processo e de alguma forma distinto do govemamenta abrangen do a cultura popular a midia a moda e em termo mats ampls a imagem do que constitui uma boa vida ele cobma o tradtctOal conceito de ideologia com o de consumtsmo Alem dtsso esta dt seminaao de imagens nao resulta simplesmente da aao e d deI sao do Estado ou das empresas ela acontece de uma maeua nao coordenada mas penetrante Atraves da telvisao e dos ftlmes da musica popular de impressoes obtidas vtagns e enconros pes soais Ela e informal e difusa mas constltUl a mats poderosa mterface entre as duas sociedades 0 abandono de qualquer crena em urn modo 26Seminrrio de Gerald Mansell antigo chefe da BBC Overseas Broadcasting LSE Novembro 1992 Repensando as rela6es intemacionais 229 ou entidade socialista separada pela maioria dos habitantes da Ale manha Oriental e acima de tudo urn produto deste encontro anos de exposiejaO as imagens da Alemanha Ocidental na televisao se guido pelo proprio encontro direto o Reiseshock A medida que esta distinejao e va1ida e a importancia dos fatores ideol6gicoculturais nas relaej6es internacionais e aceita entao sugere se urn outra intrpretaejo da Guerra Fria de seu fim e das relaejoes in temactoats mats genencamente e que envolve as pressoes para a ho mogenetdade e a foreja do exemplo ja discutidas no Capitulo 4 As rela CjOes entre os Estados retem a sua importancia e os mecanismos particu lare de cnflito e de mobilizaCjo de recursos permanecem sempre aber tos a analtse em uma base contmgente A negaCjao da eficacia do Estado e a prematura reduCjao de seu papel e enganosa assim como a insisten cia realista de que todas as relaCj6es internacionais podem ser vistas ou consideradas como ocorrendo entre os Estados Ao mesmo tempo a competiCjao internacional envolve duas outras dimensoes principais a nao oficial socioeconomica e a ide ol6ic A ultiiiIa tern sempre funcionado seria impossivl seguir a htstona da cnstandade de sua difusao e divisao sem ela Mas a dimensao ideol6gica tern uma importancia consideravel em urn mundo no qual o bemestar material a moda e o consumismo ocu pam urn Iapel eslecial n constitui9ao de sociedades especificas e em uma sttua9ao mtemacwnal caracterizada pela transmissao ime diata de sons e imagens Existe claramente uma rela9ao entre 0 po der e o poder ieo6gico concretizado pelo controle da imagem e dos mews de dtfusao Nunca a concep9ao de hegemonia de Grams ci no sentido de fatores ideol6gicos e culturais como instrumentos de dominaCjaO foi tao relevante como e hoje na analise do sistema intemaional Se o counismo se rendeu quase sem disparar ne nhum ttro fot porque o mstrumento de competi9ao internacional no final do seculo XX foi tanto a tshirt como a canhoneira 230 Fred Halliday capitulo 9 AS RELAOES INTERNACIONAIS E 0 FIM DA HISTORI Os dois capitulos anteriores examinaram a Guerra Fria e o seu re sultado a luz de dois dos temas que atravessam este livro 0 papel da he terogeneidade dos valores no conflito internacional e a contribui9ao e fatores socioeconomicos e ideol6gicos para o colapso do modelo sovte tico Este capitulo parte de uma visao mais ampla da evolu9ao do siste ma internacional incluindo o colapso do comunismo para sugerir algu mas maneiras pelas quais estes eventos p0dem iluminar as questoes le vantadas nos capitulos precedentes eo grau em que estas novas ques t6es e prioridades sao por eles levantadas No final dos anos 1980 inicio dos 1990 o mundo passou por urn terremoto estrategico e intelectual cujos efeitos sao compTeis aos causados pela Primeira e Segunda Guerras mas pelo menos mtctalmen te nao ao seu sofrimento humano Urn sistema hegemonico e a sua cor repondente distribui9ao de poder desmoronaram 0 mapa dos Etados foi redesenhado e cerca de 20 novos Estados soberanos foram cnados Urn grau de incerteza sem paralelos desde a decada de 1930 prevaleceu na arena internacional 0 mundo criado por este con junto de mudan9as nao correspondeu a nenhum modelo simples e certamente provocou consideravel confusao Neste capitulo depois de algumas observaCj6es gerais sobre o que ocorreu no periodo sao examinadas diferentes Ainter pretaCj6es sobre estes eventos e algumas ds respostas contemporanas Se evita a predi9ao ele espera mesmo assu oferecer algmas analtscs sobre para onde esta indo o sistema internactonal e a respetto das possi bilidades para o futuro Repensando as relaes intemacionais 23 1 0 DEPOIS DA GUERRA FRIA Os contoos hist6rcos e por esta razao a originalidade do que aconteceu no fmal da decada de 1980 podem ser resumidos breve mente 1 Urn bloco de Estados dominado pela URSS que desde 1940 estava engajado na competiao dos grandes poderes com o ocident e que na forma da pr6pria URSS vinha desafiando o mundo ociden tal deste 1917 desmoronou A origin ali dade do colapso deste siste ma precisa ser reconhecida como discutido no Capitulo 8 ele ocor reu sem uma guerra interestatal em urn espao muito curta de tempo sen a presena de formas evtdentes de vanguarda ou de organizaao poht1ca e sem derramamento de sangue significativo Alem disso em oposiao a outras revolues desde 1789 que em algum grau reivin dtcaram desafiar a norma mtemacional ou propor alga novo os que propnham a mudana neste contexto nao queriam como ate aqui tern stdo quase sempre o caso a criaao de algoma coisa nova uma altemativa a orem mndial dominante mas pelo contnlrio eles que n a onftdade aquela ordem urn recrutamento e uma incorpo raao tao raptda e sem dor quanta possfvel no que foi considerado como sendo a norma prevalecente seja ela a civilizaao a demo cracia o ocidente ou a modemidade 2 Algms importantes qualificaoes sao necessarias neste qua dro a mawna dos que eram govemados pelos partidos comunistas em 1988 17 bilhoes ainda o sao 14 bilhoes nao existe certeza sabre quais tipos de govemos aparecerao na antiga Uniao Sovietica ou em muitos de seus antigos aliados o futuro padrao da polftica externa russa e obscuro Apesar disso urn cataclisma de grandes proporoes ocorreu e trouxe urn fim nao somente a Guerra Fria e ao desafio da evoluao olchevique mas tambem a urn Iongci perfo do da htston mernacwnal n qua m movimento de contestaao da forma capttahsta hegemomca f01 tdentificavel 1Para breves avaliaoes er ike Bowkere Robi Brown edsFrom Cold War to Collapse Thery and World Polztzcs zn the 1980s Cambndge Cambridge University Press 1993 Rbm Blackburn ed After the Fall The Failure of Communism London Verso 1991 Mtchal Hog ed The End of the Cold ar its Meanings and Implications Cambridge Cambndge Umvers1ty Press 1992 Gabnel Partos The World that Came inform the Cold London BBCWorld ServiceRoyal Institute oflntemationaAffairs 1993 HorstTeltschik 329 TageJnneinansichten der Einigung Berlin Seidler Verlag 2Coo no teo us ado po Juren Habermas die fachholende Revolution o alcanar ou recuperar a revoluao What does socialism mean today The revolutions of recuperation and the need for new thinking em Blackburn edAfter the Fall Habennas pode ter tido a intenao de oferecer uma oposiao a visao comunista ortodoxa anterior sobre a revoluao socialista como uberholden superando o ocidente capitalista 232 Fred Halliday Como risco do que alguem poderia chamar de megalopre sentismo poderseda sugerir que 1989 trouxe urn fim ao periodo da hist6ria que comeou em 1789 com a Revoluao rancesa es te sentido o argumento de Fukuyama de que a novtdde na sttua ao contemporanea era a existenia e urn unico coJunto e res pastas aceitavel em escala undtal e en ert dtda vahdo E nisso acima de tudo que restde a 1rnportanc1a htstonca de 1989 urn ano que produziu tantas surpresas ou o que Hegel teria chamado de habilidade da razao quanta qualquer outro perfodo dramatico da hist6ria humana mas que se havia iniciado em meio as opinioes nervosas da elite de pollticos e jomalistas ocidentais que as vespe ras do bicentenario da Revoluao Francesa anunciavam que os le vantes e as rnudanas revolucionarias nao poderiam ocorrer e que as rnassas nao mais faziam hist6ria se algum dia o tinham feito 3 Nesta perspectiva o fim da Guerra Fria foi urn fenomeno com pasta envolvendo varias tendencias hist6ricas amplas que seguno s probabilidades demorariam urn Iongo tempo para funcwnar Em pnmet ro Iugar e de rnuitas maneiras o fato rnais importante o fim da Guerra Fria rnarcou o firn do conflito interestatal que dominara o mundo desde 1945 e o fim da confrontaao nuclear sovieticoamericana Duas ques toes futuras 6bvias foram primeiro se isto rnarcara o fim da rivalidade rnilitar entre OS grandes poderes COIDO urn todo pelo rneOS por Ua geraao ou rnais e segundo se urn novo padrao de blocos mterestatats e de hegemonia emergiria para substituir o velho 0 argurnento para sustentar a prirneira parceri ter consideravel fora hist6rica por urn seculo desde a guerra smoJaponesa de 184 os grandes poderesestiveram envolvidos em uma cofrontao rmhtar fundamental ou na ameaa de uma Agora a perspecttva para tsto pare ce ter definitivarnente diminufdo apesar de existirem os que preveem novas conflitos entre os grandes poderes para urn futuro pr6ximo pare ceria que 0 padrao do seculo passado fora uebrado 4 Existirarn especulaoes sobre novas conflttos emergmdo em tomo de blocos comerciais urn bloco de d6lar urn bloco de yen e urn bloco de ecu Apesar destes blocos comerciais em urn sentido frouxo stern claramente se formando e de ocorrerern fncoes sabre o comercto o mundo estava rnuito lange das guerras cornerciais ou dos sistemas clusivos que prevaleceram antes da Segunda Gue Mundtal e ea dtft cil velos se formando Alem disso mesmo se extsttsse urn confltto sa bre o comercio e urn fluxo de nacionalismo dirigido contra os competi 3Para uma perspectiva interssante ver Gale Stokes The lessons of 1989 Problems of Communism vol 40 n5 SeptemberOctober 1991 4 Richard Rosecrance A new concert of powers Foreign Policy vol 71 n2 Spnng 1992 John Mearsheimer Back to the future Instability in Europe after the Cold War International Security vl5 n summer 1990 Repensando as rela6es intemacionais 233 dares comerciais nao havia a inevitabilidade ou inicialmente mui ta probabilidade de que isto levasse a uma confrontaao militar Quanta a hegemonia e aos perigos de urn novo imperialismo existe agora uma situaao de grande fluidez em que nenhum bloco de Estados pareceria emergir para se equiparar aos EUA mas onde os proprios EUA pareceriam relutantes em desempenhar o papel romano que o colapso da URSS lhes atribuiu A ideia de que a guerra entre os Estados e quase sempre evitada quando existem os Estados democniticos liberais bemexplicada nos escritos de Michael Doyle e bastante interessante embora venha sendo utilizada como uma apologia para esconder como os Estados democniticos decla raram guerra contra os nao democniticos 5 apesar de verdadeiro em urn sentido pontual ele deslocaria nossa atenao para o renascimento de regimes autoritarios em alguns grandes Estados e para a questao da possibilidade de que alguns poderes tenham divergido deste modelo no Iongo prazo como a Russia ou o Japao ou os EUA a GraBretanha e a Alemanha tornados pela depressao A segunda dimensao do tim da Guerra Fria foi o tim do comunis mo como uma fora polftica Como ja indicado isto foi inicialmente urn fenomeno continado as regioes europeias e asiaticas da antiga URSS entretanto a tendencia dentro da China pareceria indicar uma mudana em direao ao capitalismo se nao ao liberalismo e os Esta dos comunistas remanescentes seriam incapazes de fomecer uma alter nativa intemacional Cuba Vietna e Coreia do Norte Duas questoes amplas surgem aqui primeiro qual futuro existiria agora para uma al temativa ao capitalismo ou se pelo menos haveria alguma e segun do qual fora a importancia historica de toda a experiencia comunista Com relaao a primeira parece que nenhum programa de desatio poitico revolucionario ao capitalismo liberal vindo da esquerda teria hoJe qualquer credito ou apoio serio 0 desatio comunista esta agora esgotado 0 que permaneceu foram as variantes de adaptaao social democrata dentro do capitalismo avanado mas que sao cada vez mais restritas pelas condioes intemacionais e pelas contiguraoes sociais e polfticas em mudana dentro dos pafses individuais Convencionalmente se afirma que o colapso da social democracia foi em parte urn resulta do o fracasso do comunismo o reverse pode entretanto ser o caso a dmamica da democracia social e de suas equivalentes foi quebrada nos pafses mais avanados em 1970 GraBretanha EUA Australia e Alemanha A propria falta de uma terceira via mediana e facti vel signi 5Liberalism and world politics American Political Science Review v80 n4 December 198 e em duas partes Kant liberal legacies and foreign affaris em Philosophy and Public ffatrs vol 12 summer 1983 e autumn 1983 Para uma crftica profunda dos maus usos ldeol6gicos ver o argumento de Doyle mas nao o m1cleo do proprio argumento ver Benedict Anderson The new world disorder New Left Review n193 MayJune 1992 234 Fred Halliday ticou que as escolhas disponfveis para os reformadores comunistas no final dos anos 1980 estavam completamente fechadas A questao do que foi o comunismo ainda muito proxima para permitir uma perspectiva confortavel tern varias candiatas a res pasta uma tendencia ditatorial na qual as elites revoluc10nanas to maram o controle das sociedades urn movimento fracassado de auto emancipaao de uma classe trabalhadora uma expressao de messi anismo judeucristao urn produto de despotismo oriental urn pro jete desenvolvimentista fracassado 6 Urn autor criterioso sugeiu que o comunismo poderia terminar sendo comparado ao expenmento jesufta no Paraguai uma tenativ racional de separar ua parte do mundo das pressoes intemac10nats de sustentar urn cammho de de senvolvimento alternative muito idealizada pelos intelectuais de seu d 7 tempo mas que no fim desapareceu sem etxar traos Alguma explicaao envolvendo diferentes elenos esta hsta acima pode ser muito apropriada em retrospeto e facll dtzer que comunismo nunca funcionou mas esta tentattva de escapar ao camt nho convencional de desenvolvimento capitalista foi bastante bemsu cedida por algum tempo no mfnimo no desatio ideologico e militar colocado para o oeste mesmo que no tim ele tenha sido forado a ca pitular e a fazelo quase sem qualquer resistencia Embra o seu fracs so agora para inevitavel o experimento comuntsta ao fot percebtdo assim durante muitas decadas tanto entre os que o apmaram como entre os que o temiam havia uma crena na eticacia da intervenao do Esta do socialista desmentida pelos eventos subseqlientes Pelo menos cmo sugerido no Capitulo 8 o colapso comunis merece urn estudocutda doso a partir da perspectiva dos que acredttavam no desenvolvtmento socialeconomico dirigido pelas elites ou ditado pelo Estado 0 terceiro elemento do tim da Guerra Fria foi a quebra da URSS e de seu sistema de alianas Nofinal de 1991 ainda nao era muito clara se o processo estava completo nao somente na Europa ental como tambem na propria Russia a Federaao Russa esteve suJetta a substan ciais foras centrifugas e ate mesmo poderia terse quebrada em tres partes sob pres sao intemacional e intema Mesmo se este processo de fragmentaao ja estivesse completo ele hberou mudanas poderosas na arena intemacional Ele criou uma situaao na qual com a quebra da ordem preexistente novas alianas regionais e novas paise hege monicos potenciais emergiram na Europa a Alemanh no Caucas Mar Negro e Asia Central a Turquia No Extrema Onente os reah 6Para uma localizaao percepti va ficcional do comunismo na corrent mais ampla do pensamento racionalista e messianico cristao e judruco ver George Stemer Proofs and Three Parables London Faber Faber 1992 7Perry Arderson A Zone of Engagement London Verso 1992 pp 3679 Repensando as rela6es intemacionais 23 5 nhamentos foram menores o poder sovietico ja estava mais fraco mas isto incentivou e coincidiu com o aumento dos poderes chines e japo nes Na verdade o Extremo Oriente foi a area com maior margem de manobra polftica e economica e prometia ser o sustentaculo do secu lo XXI se ela podera cooter estas mudanas sem urn grande conflito militar nao ficou ainda evidente 0 impacto sobre a Indochina com a remoao do papel sovietico no Camboja e no Vietna e no nordeste da regiao asiatica foi todavia substancial e contfnuo Algumas destas mudanas regionais levaram o mundo de volta a uma situaao anterior a 1914 sendo o padrao das alianas nos Balcas e no Bitico os casosem questao Outros padr5es foram novos a disputa turcotramana na Asia Central descendendo apenas remotamente das antriores Pareceria provavel que alguns destes poderes assumiriam ma10res responsabilidades e papeis intemacionais no seculo seguinte a Alemanha eo Japao politicamente muito diferentes do que eram antes da Segunda Guerra Mundial estavam relutantes em desempenhar tal pael especialmente no campo militar mas no fim seriam forados a fazelo Alguns viram esta reticencia somente como urn reconhecimento justo de seus passados criminosos mas nao era na polftica extema con temporanea que estavam os seus problemas com o passado 0 rnais pre ocupante sobre estes pafses nao era o perigo proximo de se tomarem novamente poderes militares agressivos mas sim a evasao e o eufemis mo que ainda prevaleciam em suas vidas domesticas Urn reconhecimento mais saudavel do passado lhes teria permitido urn papel intemacional mais adequado nas dimens5es economica e de segurana A quarta conseqliencia ampla do colapso do comunismo foi a que bra de u regime que prevalecera desde o fim da Segunda Guerra Mundtal e a parttr do qual mantinhase o existente mapa do mundo com suas desigualdades e arbitrariedades A despeito de toda ret6rica sobre a cisao e a unificaao que marcaram a epoca p6s1945 e surpreendente como ate 1989 este mapa mais ou menos se mante ve stdos tomaramse iependentes alguns perderam partes de seu terrtt6no mas a atual dtvtsao em 170 Estados foi mais ou menos con gelada A unificaao ou a fusao ocorreram somente pela fora e em mmentos d mcerteza nascendo da descolonizaao Palestina Saara octdental Ttmor e pode ser discutido Tibet ou atraves de fusoes volunaias novamente no momento da independencia de entidades colomats formalmente separadas Camaroes Somalia A secessao sonente ocorreu no caso de Bangladesh em 1971 mas ele ja era uma enttdade geograficamente separada do res to do Paquistao 8 obre secesso vr James Mayall Nationalism and International SocietyCambridge 3lllbnd7 Umverstty Press 1990 e Alexis Heraclides The SelfDetermination of Natzonaltzes and International Politics London Frank Cass 1991 236 Fred Halliday Depois de 1989 ambas a fusao e a divisao reapareceram na ordem do dia era esperado que a fusao dos Yemens e das Alema nhas fosse seguida embora com algum atraso pela das Coretas e provavelmente de uma forma ou de outra pela das te hinas Por outro lado a divisao foi o destino dos Estados multletmcos do an tigo sistema comunista URSS Jugoslavia Eti6pia Checoslovaquia Como resultado no espao de dois anos mais de vinte novos Esta dos soberanos passaram a existir Ninguem ainda podia dizer quais seriam os efettos demonstrattos deste processo mas nao deve haver duvida de que a queba do regme p6s1945 encorajaria muitos outros a pensar que ees tambem penam alcanar urn status separado de Estado Algumas aras foram mats afe tadas do que outras e aparentemente a fragmentaao somene ocorre ria em Estados nos quais os regimes comunistas foram desaloJados en tretanto partes da Europa e da Africa assim como da india provavel mente tambem estavam sujeitas a tensoes crescentes agora que s mos trou que a secessao era permitida Por sta razo pncipalmertte foi essencial que os Estados e os orgamsmos mtemac10nats desenvolvessem alguns meios mais adequados para avaliar e regular estc processo com portamento da comunidade intemacional sobr a questao a secessao tern sido urn exemplo marcante da lacuna entre o tdeal e a prattca enquanto 0 sistema e fundado sobre a suposiao de que OS poVOS sao SOberanOS e de que tern direito a seus pr6prios Estados a pratica tern sido a de oor a secessao ate o ultimo momento exceto quando prevalece urn automte resse direto freqlientemente de urn tipo expansionista A quebra da URSS e de seus tres Estados multietnicos associados no perfodo de 1989 93 ocorreu a despeito de nao por causa do encorajamento intemacio nal A resposta intemacional foi uma aceitaa relutante atrasad bern resumida na observaao informal do Secretano do Extenor da GraBre tanha Douglas Hurd em Junho de 1993 Espero que nao vejamos a cri aao de mais nenhum Estadonaao VARIEDADES DE AVALIAAO HISTORICA Eni termos amp los existiram tres tipos e resposta a esa muda as Uma foi o pessimismo secular uma sobttedade melanchca da dt reita que via a que bra da ordem da Guerra Fna coo em mmtos aspec tos urn retorno ao mundo anterior ao de 1914 ou aquele entre as duas gurras mundiais levando a urn maior conflito interesatal a roi feraao nuclear e ao hipernacionalism A segunda fot o pesstmts mo da esquerda que afirmava que estavanos em uma nova poca imperialista que o Norte era incapaz de ajudar n desenvolvtmen to do Sul que a destruiao ecol6gica estava contmuando e que os Repensando as rela6es intemacionais 23 7 EUA iriam sozinhos ou em associaao com seus antigos aliados usar as novas oportunidades para dominar o mundo A terceira abor dagem foi a otimista que viu o mundo como se tendo movido deci sivamen aiante e como sendo urn periodo no qual certos objeti vos deseJavets a paz a democracia e a maior prosperidade esta riam agora disponiveis para todos Embora estas abordagens tenham tid o merito de fornecer interpreta6es abrangentes elas eram de fictentes em alguns aspectos 6bvios A perspectiva pessimista de urn retorno a 1914 parecia sustentar se nas novas formas de conflito interestatal e na ascensao do nacionalis mo mas Ievou a analogia muito Ionge os principais poderes nao esta vam se atracando em urn nacionalismo dirigido urn contra o outro e es tavam relativamente desinteressados em prepararse para a ao militar houve uma torrente de nacionalismo mas ela tomou uma forma comu nal e interetnica muito distinta da estrategica 9 Muito foi dito sobre o destino cruel de Saravejo com a piada de humor negro de que somete as gurras mundiais que se iniciam em anos pares come am Ia Mas apesar de todo o horror e sofrimento e das diferenas de postao entre os membros do Conselho de Segurana este nao fot urn confltto que ameaou provocar uma guerra entre os grandes poderes Os pr6prios Estados envolvidos na arena internacional ti nhm mdad dramaticamente desde 1914 principalmente pela umversaltzaao d deocracia nenhum dos Estados mais impor tanes tmha suato umversal em 1914 e pelo crescimento da pros pendade econormca A Alemanha por exemplo nao era o Estado que fora em 1914 ou em 1939 a juventude neonazista era repug nante mas ainda nao era perigosa para os outros Estados como o foram o Kaiser ou Adolf Hitler oespirito d analogia hist6rica alguns compararam este periodo da htstoa ao a belle ePoque as decadas anteriores a 1914 quando a Europa mdustrtal parecena estar em urn novo pico de sucesso economi c politico e cultural somente para depois mergulhar nas guerras do seculo XX Extstem semelhanas com a belle epoque pelo menos na crena complacente de que os Estados ricos do ocidente haviam resolvi do os seus problemas e na elegancia das varias formas de irracionalismo Contudo existm difernas marcantes no minima tudo o que aconteceu no seculo mtervemente Poucos nos paises industrializados aora acreditavam como muitos o faziam seculos atras com graus va nados de presunao social darwinista que a guerra era urn meio via vel quanto mais desejavel de resolver os conflitos entre os principais para uma corrao davisao prevalecente sobre o nacionalismo como a ideologia domi nante a epoc ver Enc Hobsbawm Nations and Nationalism Since 1870 Cambridge Cambndge Uruversity Press 1990 23 8 Fred Halliday I I I I Estados Igualmente importante o mundo nao estava em urn periodo no qual estavam emergindo novos desafios ideol6gicos em situa6es de conflito social e politico uma das mais marcantes e em sua ma neira deprimentes caracteristicas do conflito internacional p6s1989 era que ninguem estava falando nada novo e que muitos estavam fa zenda os mesmos tipos de suposi6es que haviam sido escutadas urn seculo antes As verdades do nacionalismo nos Balcas ou a conflitan te aspiraao em torno de NagomoKarabagh nao eram sejam quais fossem os outros problemas o comunismo ou o fascismo do dia Na verdade o que foi de muitas formas desanimador a respeito de todo este fracionamento e clamor estridente e como ele era extremamente familiar Sabemos que o Sr Karadzic o Hder b6snioservio terapeuta de grupo para urn time da segunda divisao de futebol tornouse urn demagogo o encontramos muitas vezes antes Pcrtano m mmos aspectos o mundo se encontrava em uma nova sttuaao mtemacto nal tanto com relaao ao periodo do p6s45 como no geral A posiao contraria a do pessimismo da esquerda fortaleceuse com a Guerra do Golfo e existiram muitos que buscaram tirar li6es ge rais sobre o mundo p6scomunista a partir daquele evento 10 Deixando de lado a freqtientemente autocentrada analise de por que a guerra ocor reu os seus criticos estiveram em muitos aspectos e nao somente na cosideraao do significado de Iongo prazo do conflito errados Pri meiro e por toda a destruiao feita no Iraque o custo foi muit menor do que sugerido na epoca o total de iraquianos mortos 10 rml era 11 20 do que fora suposto e a despeito de toda a ret6rica do Iraque sendo bombardeado de volta a dade da Pedra quase todo o estrago da guerra tinha sido reparado em pouco mais de urn ano 11 A despeito do sonho imperial da direita e da especulaao sobre o carater de uma nova o dem mundial na esquerda os EUA nao foram capazes de usar a vtt6ria para colocar pressao sob seus rivais economicos ou ob outro pases do Terceiro Mundo nao ocorreu urn aumento no sentrmento mihtansta nos EUA como George Bush para seu desapontamento descobriu existiram movimentac6es em varias quest6es do Oriente Medio inclu indo a arabeisraelense e a liberdade de expressao pelo menos para os kuwaitianos no Kuwait A Guerra do Golfo foi urn capitulo importan te mas essencialmente diversivo nos assuntos mundiais A critica dos pessimistas da esquerda teve mais forca em outras partes primeiro com relacao a marginalizacao da discordancia orga 10Ver Capitulo 10 nota 3 11Para uma visao geral da guerra ver Lawrence Freedman e Efraim Karsh The Gulf Conflict 19901991 Diplomacy and War in the New World Order London Faber Faber 1992 Sobre mortes ver John Heindrich The GulfWar How many Iraqis died Foreign Policy n90 Spring 1993 Repensando as rela6es intemacionais 23 9 nizada e da crftica radical dentro do mundo desenvolvido e subdesen volvido e segundo sobre o problema das relacoes economicas inter nacionais e como a riqueza dos pafses mais ricos pode dados cons trangimentos hist6ricos e novos ser difundida de uma maneira razo avel para o resto da humanidade Esta questao sera discutida mais adiante neste capitulo e se trata de uma na qual as certezas convenci onais da direita e da esquerda parecem nao mais prevalecer Os dois pessimismos o da esquerda e o da direita comparti lham uma visao comum sobre o papel reduzido do Estado e sobre a crescente globalizacao do mundo nos nfveis economico politico e cultural No nfvel te6rico a questao mais desafiadora a ser enfrenta da e a de produzir uma resposta as mudancas no mundo de fora mudanca que tern se refletido em urn corpo crescente de literatura academica ou seja como conceber a crescente intemacionalizacao do mundo Aparentemente a intemacionalizacao pode ser vista por todos no comercio intemacional no crescimento das comunicacoes no encurtamento das distancias na criacao de urn sistema financei ro global e no decrescimo das localizacoes nacionais de empreendi mentos especfficos 12 Dentro da Europa temos urn processo de cres cente transferencia de poderes para as instituicoes da Uniao Econo mica e a introducao de urn mercado unico em 1992 Este quadro de crescente intemacionalizacao e normalmente acompanhado por duas outras preocupacoes as crencas de que a posicao do Estado como previamente estabelecida esta desmoronando e de que a natureza do poder no mundo contemporaneo esta mudando deixando de ser con finada ao poder militar paraser mais baseada em fatores economi cos e mesmo culturais 0 mundo esta somos levados a acreditar tomandose mais e mais internacional Ao mesmo tempo existe urn forte argumento pessimista a ser fei to sobre as tendencias globais a demognifica a tecnol6gica e a ecol6gi ca e as suas diferentes implicacoes nacionais urn exemplo contunden te desta abordagem e a de Paul Kennedy em seuPreparingfor the Twenty First Century 13 Ele e urn profeta qualificado e pouco entusiasta da rufna em oposicao a Fukuyama ele negligencia a polftica e o papel das ideias quase que completamente enfocando somente a mudan ca economica e cientffica Por outro lado seu pessimismo e de urn tipo nocivo e resignado Iiberto do peso nietzscheniano ou do da rwinismo social encontrado em escritores anteriores 12Para uma excelente visao das questOes envolvidas ver Joseph Camilleri e Jim Falk The End ofSovereingty The Politics of a Shrinking and Fragmenting world Aldershot Elgar 1992 Sobre a intemacionalizaiio das finanas ver Susan Strange Casino Capitalism Oxford Basil Blackwell 1986 13Preparing for the TwentyFirst Century London Harper Collins 1993 240 Fred Halliday Kennedy comeca com a analise de Thomas Malthus rimeiro publicada em 1798 segundo a qual o aumento da populacao mun dial iria superar o crescimento na producao de comida Ele argumenta que em sua epoca Malthus estava enganado por pelo mnos tres razoes a imigracao retirou o excedente populacwnal dos patses com as taxas mais rapidas de crescimento a produtividade agricola au mentou mais rapidamente do que esperado a industrializacao for neceu novas formas de emprego Sua suposicao agora e que dois seculos depois urn pessimismo comparavel ao de Malthus e muito mais valido a populacao mundial esta crescendo mais rapidamente do que nunca as pressoes demograficas economicas e sociais es tao criando maiores tensoes ainda no Terceiro Mundo a mudanca tecnol6gica atraves da robotizacao e da revolucao da biotecnolo gia esta reduzindo o numero de empregos disponfveis e promovendo maiores desigualdades de riqueza e produtividade Portanto ele nao esta dizendo como Malthus o fez que o mun do ficara sem comida mas ao inves disso que urn conjunto de outras contradicoes ira provocar conflito intemo e intemacional a popula cao esta crescendo onde a crise ecol6gica e mais extrema a mudanca tecnol6gica e separada da explosao demografica 0 numero de em pregos disponfveis esta sendo reduzido Apesar de destacar em urn conjunto de analises sobre pafses e regioes que a performance eo potencial variam enormemente entre os pafses ele alerta contra qual quer ideia de que os Estads mais ricos do mundo possam ser pro gidos das tensoes no Terceuo Mundo a mtgracao os levantes politi cos e militares os conflitos economicos e acima de tudo a degrada cao ambiental garantem que este seja urn conflito global Kennedy nao e fatalista sobre estas tendencias mas destaca que a maioria delas nao podera ser evitada ao Iongo das pr6ximas deca das e que o Estado apesar de permanecer como o instrumento princi pal para administralas e cada vez mais inadequado para a tarefa de confrontar os problemas globais Ele nao tern nada a dizer sobre a solucao freqiientemente proposta a governanca global e as institui coes intemacionais e el consegue pintar urn quadro horrivel sem discutir o renascimento dos nacionalismos e dos conflitos etnicos Kennedy nao diz que o mundo esta fadado a se deteriorar da foa que ele indica e ele sugere como Malthus o fez antes dele que extste algo que os Estados podem fazer Mas ele esta Ionge de saber se to dos ou se de fato quaisquer Estados irao responder ou se mesmo se eles fizerem tudo que estiver a seu alcance is to sera suficiente Existe portanto uma consideravel quantidade de verdade nesta suposicao da globalizacao mas ela precisa ser qualificada Primeiro varios temas aos quais as pessoas se referem a migracao e os movi mentos religiosos transnacionais por exemplo ameacam o mundo con temporaneo ha muito tempo Segundo as tendencias indiscutfveis em Repensando as rela6es intemacionais 241 direlio a globalizalio em alguns terrenos mais do que em outros coincidem e na verdade estimulam maiores divisoes a politica da etnia e uma resposta 6bvia Mais importante ainda ambos sugerem para o melhor e para o pior freqtientemente para o pior que o poder dos Estados esta sendo erodido por estas foras transnacionais e que cada vez existem menos governos eleitos ou de fato nlioeleitos capazes de administrar os neg6cios de seus pafses Aqui deve ha ver cautela consideravel Primeiro como discutido no Capitulo 3 a propria globalizalio e em uma medida consideravel trabalho dos Estados que dirigem estimulam e ajudam as companhias a fazer o que eles querem que elas faam ninguem acredita que os neg6cios japoneses ou alemlies operem independentemente dos Estados nem isso se aplica a seus competidores franceses e anglosaxlios Aiem disso existe muito que os Estados podem fazer para estimular a competilio no plano interno mesmo quando eles perderam parte de seu controle dos fluxos de capital e das taxas de juro Na verdade podemos ter de fazer uma distinao entre duas ques toes primeiro pode qualquer forma de representalio humana ba seada no Estado ou em alguma outra instancia dar conta dos pro blemas que enfrentamos segundo caso seja possfvel alguma resposta estrategica intencional a estas questoes estas precisam ser baseadas no Estado ou em algum organismo intemacional Recentemente o conceito de govemana global tern ganho importancia e despoja do de aspiraoes nao realistas pode ser visto como tendo vanos com ponentes o fortalecimento das instituioes globais e regionais exis tentes a evolulio da lei e das normas prevalecendo sobre o compor tamento internacional a protelio e a promolio internacional dos hens publicos sejam estes o meio ambiente o espao os minerais ou os oceanos A despeito do quanto ainda podemos avanar e avan aremos nesta estrada os componentes da estrutura de governana serlio fundamentalmente os Estados e as consideraoes que movem os poHticos ou o publico a aceitala deverlio abranger urn interesse baseado tanto no Estado Cnacional quanto no global 14 0 mesmo se aplica ao terreno da competilio internacionallegfti ma e das principais tendencias globais ameaando a sociedade Pesqui sadas por Paul Kennedy Se tomarmos os tres fatores que ele considera como sendo as chaves da competitividade intemacional de Iongo prazo a qualidade da educalio o status das mulheres e a qualidade de lide rana politica entlio os Estados e as sociedades retem uma larga me dida de liberdade em todas estas e somente tern a si mesmos para culpar ou as press6es extemas se falharem em agir 0 mesmo sea plica as gran 4Sou grato a Meghnad Desai e a outros colegas no Centre for the Study of Global Governance na LSE por estimular a discusslio sobre esta questlio 242 Fred Halliday des ameaas ecol6gicas e demograficas que Kennedy corretamente aponta como pairando sobre o proximo seculo ests nao serao cn sidetadas contidas ou resolvidas por uma comumdade mternacto nal ou por foras transnacionais Os Estados e somente os Estados embora impelidos e ajudados por 6rglios nlio oficiais tern o poder de fazer algo sobre isso No minimo os desafios identificados por Kennedy e outros tornam ainda maior a necessidade por Estados as disciplinas e os custos das politicas de ajuste somente podem ser impastos por eles Portanto a crescente importancia do internacional tanto real como aparente e urn processo historicamente mais complexo e de dupla face muito alem do que nos levaria a suspeitar a afirmalio de que o mundo estase tornando mais internacionalizado Simultaneamente o mundo esta se movendo em pelo menos duas direoes contradit6rias Isto ja es tava evidente no processo amplo de mudana que esta ocorrendo e ain da mais claro no mundo no qual entramos recentemente como m re sultado das mudanas da ultima metade dos anos 1980 A Isto nos leva a ultima das perspectivas sobre o mundo contempora neo a otimista de que de alguma maneira encontramos uma resposta tanto internacional como domestica e que as coisas serao melhores Se concor darmos que a competilio militar entre os grandes Estado e pelo meos por urn tempo improvavel isto nlio signific que o confl1to nas relaoes internacionais declinara ou que qualquer cotsa se aproxtmando de uma nova ordem mundial foi ou podera ser criada Por urn breve perlodo entre 1988 e 1989 quando os EUAe a URSS estavam trabalhandojuntos para reduzir os pontos de tenslio o termo nova ordem ntundial tia m sentido real mesmo que limitado 0 colapso da URSS tiroulhe o stgnlfi cado e a proliferaao dos conflitos nao somente no Terceiro Mundo como tambem nos Balclis mostra como esta vislio onirica era infundada Mes mo em sua forma liberal intemacionalista de acordo com a qual os gran des poderes farao o seu melhor para ajudar o mundo ea e enganosa ja que superestima a vontade dos govemos das populaoes do mundo de senvolvido de assumir as suas responsab1hdades globa1s 0 FIM DA HISTORI 0 colapso do comunismo e a aparente disseminaao das formas poHticas liberais democraticas a varios paises p6scomunistas e doTe ceiro Mundo levou alguns a sugenr que uma nova era de democraca global estava proxima Este e em essencia o argument de FranciS Fukuyama apesar dele ser cuidadoso em afirmar que dtstme en tre a suposilio de que nlio existe nenhum outro modelo v1avel a disposilio e a ideia de que a consolidalio deste modelo em todos Repensando as relac6es internadonais 243 OS pafses e iminente ou mesmo plausfvel A discussao do fim da Guerra Fria pode portanto servir como uma introduao ao ultimo dos temas levantados por esta pesquisa a questao de se agora nos confrontamos com o que Fukuyama chama de o fim da hist6ria 15 Por hist6ria Fukuyama denomina urn perfodo no qual a humanida de esta em conflito em torno de valores fundamentais e orienta as suas foras na arena internacional para tal competiao Tern estado na moda denegrir Fukuyama mas existem inumeras partes de seu argumento que merecem atenao mais seria A primeira e a sua afirmaao sobre a importancia do progresso na hist6ria contemporanea Fukuyama nao esta dizendo que o progresso e sem custo nem que esta destinado a continuar mas afirma que a hu manidade como urn todo tern feito progressos de urn tipo significative ao Iongo dos seculos recentes e que tern a capacidade deixando de lado os desastres ecol6gicos e nucleares de assim prosseguir Desta forma ele rejeita os dois pessimismos o da direita que considera que a hist6 ria e circular ininteligfvel ou diretamente decadente e 0 da esquerda baseado nas varias formas de romanticismo hist6rico ou no caso de Wal lerstein em uma afirmaao combativa a respeito do declfnio global hu mano desde 140016 Esta nota cautelosa embora confidentemente oti mista e vHida nao somente porque existe algo reconhecido como pro gresso pela maioria das pessoas urn conceito que como os de impe rialismo e de patriarcado deixa muito a desejar mas que faute de mieux precisamos continuar usando mas tambem porque para que possamos discutir sobre o progresso e aceitemos isso ou nao ele ocor reu precisamos de alguns criterios analfticos e morais universais No clima intelectual contemporaneo do paticularismo nacionalista e reli gioso e da confusao p6smodemista generalizada esta afirmaao her dada do seculo XVIII sobre a possibilidade da existencia de criterios universais sejam quais forem as suas origens hist6ricas sociais ou ge ograficas deve ser bern recebida Neste sentido os que negam a exis tencia de qualquer progresso Wallerstein inclufdo sao eles mesmos aliados dos que dizem que nada podemos conhecer Segundo Fukuyama tern algo importante a dizer sobre a Guerra Fria Sua avaliaao de porque e como o comunismo desmoronou 6 contestavel mas seu julgamento do fim que urn lado ganhou e ou 15Sobre Fukuyama ver Perry Anderson The ends of history emA Zone of Engagement Workshop de Hist6ria After the End of History London Collins Brown 1992 Gregory Elliott The cards of confusion Reflections on historical communism and the end of history Radical Philosophy n64 summer 1993 161mmanuel Wallerstein Historical Capitalism London verso 1983 p 98 Simplesmen te nao e verdade que o capitalismo como urn sistema hist6rico representou urn progresso com relao aos vanos sistemas hist6ricos anteriores que destruiu ou transformou 244 Fred Halliday tro perdeu precisa ser considerado Isto pode parecer bastante 6b vio e sem duvida o 6 para os que estavam no lado perdedor e que estao lutando para tirar do capitalismo tanto quando puderem Mas devese ressaltar que o mesmo nao se aplica a maior parte dos dis curses da esquerda e dos liberais ocidentais Como foi discutido no Capitulo 7 antes de 1989 a visao domnaite era e que a Guea Fria nao era de forma alguma urn confhto tdeologtco ou mterstste mico este era urn mito do Pentagono da KGB e de pessoas estra nhas como eu que tentaram dizelo mas sim urn pa de deux de dois sistemas hegemonicos Cada urn deles pretendta nvahzar com o outro mas na verdade usavam a ideia do conflito para subjugar os seus pr6prios povos para lucrar com uma produao militar set utilidade e assim por diante Tal analise partiu de suposi6es perfet tamente justificaveis de que algumas pessoas como os fabricantes de armas beneficiaramse da Guerra Fria e da continua corrida ar mamentista e de que muitas das reivindicaoes ideol6gicas dos mundos livres e das democracias socialistas eram falsas Alem dis so segundo este ponto de vista a Guerra Fria permitiu que fosse preservadas outras formas de hegemonia intrabloco chegandse a bastante diferente e injustificada conclusao de que o confltto mter sistemico fora uma ilusao Mesmo depois de 1989 houve urn debate isolado considerando que enquanto o antigo sistema sovietico des moronou e fracassou o mesmo aconteceu de muitas maneiras no ocidente citandose a crise social e economica nos EUA como se fosse possfvel imaginar que qualquer urn pudesse lutar e ganhar uma guerra sem algumas perdas ou que no fim de urn conflito de titas seja ele a Segunda Guerra Mundial ou a Guerra Fria nao mais resta riam conflitos futuros 17 A realidade como destaca Fukuyama 6 que o mundo capitalista avanado ocidental ganhou a Guerra Fria 18 A terceira questao de interesse em Fukuyama 6 a da democracta liberal Certamente sua invocaao deste conceito e seletiva e hist6rica Ele nao reconhece que a maioria dos liberais classicos nao acreditava no sufragio universal ou na igualdade das naoes e defendia urn Esta 11um exemplo disto pode ser encontrado na de outra forma comedida consideraiiO de Martin Walker The Cold War and the Making of the Modem World London Fo Estate 1993 Capitulo 14 The Superlosers Urn critico liberal da politicaamericana Stopher Lasch pade escrever International Herald Tribune 13 July 1990 Apesar do octdente ter ganho a Guerra Fria os Esos Udos dificilmente poderiam ar qe compartilharam os frutos da vit6ria Seria mrus pr6x1mo da verdade dizer que a Umao Sovutica e os Estados Unidos destruframse mutuamente como grandes poderes Sobre 0 debate como movimento socialista a respeito do significado da Guerra Fria ver as contribui5es de Mike Davis e minha a Exterminism and Cold War London Vers 1983 Capitulo 2 do meu The Making of the Second Cold Ware as trocas em Robm Blackburn edAjier the Fall London Verso 1991 Repensando as rela6es intemacionais 245 do intervencionista Ele parece aderir a visao de que OS mercados podem de algoma maneira produzir a mudansa social negligenci ando o fato de que os mercados assim como as casas e as lingtiisas sao feitos pelo homem nao pode haver uma hist6ria dirigida pelo mercado tanto quanta pode haver uma dirigida por uma casa ou neste sentido uma teoria dirigida por uma lingtiisa Alem disso o principal motor de seu argumentasao se inclina em diresao a complacencia uma solusao foi encontrada na demo cracia liberal e ela ira mais ou menos durar para sempre Mas existe outra leitura possfvel de Fukuyama pelo menos nesta epoca do au tor destronado apesar da democracia liberal manterse como a so lusao dominante para a polftica no mundo contemporaneo ela sera intemamente instavel e passive de autodestruisao Esta discussao eminentemente hegeliana e premarxista sustentase sobre os efei tos desestabilizadores do thymos considerado por ele como o dese jo humano por reconhecimento e respeito nas relacoes dentro e fora do Estado As raz6es que Fukuyama apresenta para justificar por que talvez este modelo nao venha a marcar o fim da hist6ria devem ser questionadas mas elas sao menos importantes do que esta afirma cao convincente a respeito dos limites inerentes e do futuro proble matico desta forma politica agora percebida como a solucao dos problemas da humanidade Mesmo os marxistas que ainda acredi tam na inevitabilidade da revolucao socialista a medida que o capi talismo cava o seu proprio tumulo precisam ser lembrados de que existe urn caminho altemativo que pode ser seguido pela democra cia liberal a regressao a varias formas de barbarismo nacional e intemacional caso se concretize a reincidencia de tendencias capi talistasautoritarias nucleares ecol6gicas e racistas A quarta area em que a argumentacao de Fukuyama deve ser bern recebida diz respeito a sua analise da tendencia em direcao a universali zacao no mundo contemporaneo o tema do Capitulo 4 Aqui de novo sua tese pode parecer autoevidente nao fosse o fato de que substancial resistencia te6rica a ela pode ser detectada em varias vertentes Uma fonte desta resistencia ja mencionada com relacao a discus sao da Guerra Fria vern da parte dos que negam que o comunismo sovietico eo capitalismo ocidental buscaram prevalecer urn sobre o outro Presente nesta visao esta uma crenca que sobrevive mesmo em uma situasao de p6sGuerra Fria de algoma maneira o capitalismo precisa de urn inimigo A importancia te6rica desta ideia foi discutida no Capitulo 7 Aqui e valido detalhar suas conseqtiencias praticas com o fim do comunis mo sugerese que algum outro mal como as minorias etnicas ou o Isla precisa ser invocado Em alguns casos isto e usado para explicar a ge nese da Guerra do Golfo Na verdade como Marx e Engels destacaram tao bern na secao 2 do Manifesto Comunista o capitalismo nao precisa de nenhum inimigo ele busca tomar o mundo como ele a beira de ex 246 Fred Halliday tincao mais ou mens o que aconteceu com a olsao Bol chevique Raramente arttculado este argumento do tmmtgo neccs sario sustenta a maior parte da literatura critica sabre a Guerra Fna em sua relutancia em ver por que e como o capitalismo desenvol veu uma dinamica universalista nao somente na esfera do mercado e das relacoes produtivas mas tambem na das formas politicas e dos padroes culturais Tambem podese encontrar resistencia a esta ideia em uma es cola te6rica que Fukuyama critica insuficientemente o realismo da teoria Estatocentrica das relacoes intemacionais epitomizada por Waltz e discutida no Capitulo l de acordo com a qual tudo o que importa sao as relasoes entre os Estados devendose desconsiderar o seu carater intemo como reducionista Fukuyama critica o realismo como sendo irrelevante em uma situacao de p6sGuerra Fria na qual a interdependencia esta crescendo 19 Aqui entretanto ele falha em perceber a importancia da totalidade desta disussao reaismo nun ca foi uma explicasao adequada das relacoes mtemactonats Sempre existiu tim elemento universalizador no sistema desde que o captta lismo comecou a se desenvolver transnacionalmente no seculo XVI AS PERSPECTIVAS PARA A DEMOCRACIA LIBERAL E A PAZ Os problemas com a argumentasao de Fukuyama sao muitos mas sugerem por sua parte o que poderia ser urn programa de fu turo trabalho te6rico e hist6rico Ausente do artigo de 1989 extste aqui urn componente psicol6gico poderoso baseado no termo gre go thymos a sua interpretacao disto tanto pode levantar quanta re solver problemas20 Muito tern sido dito sabre como as extrapola soes confiantes de Fukuyama estao supostamente erradas as guer tCapftulo 23 The Unreality of realism 2Para Fukuyama os homens demandam reconhecimento de seu valor e se revoltam ou Iutam quando nao o conseguem Por isto eles nao estiio satisfeitos soente como bemetar economico que uma ditadura pr6spera pode fomecer mas necess1 de emocrac1a e tambem de uma certa medida de igualdadeAqui ele toea em alguma cmsa nmguem pode negar que este e urn fator na atividade politica dos homens nas esferas interpessoal nacional e internacional Entretanto como examinada em seu livro esta suposifiio de thymos e forca da Primeiro mesmo considerando a existencia de urn instinto de thymos como descrito similar aos dmais instintos sorrir comer tocar etc ele somente adquire urn senti do em urn contexto social Alem disso o que constitui a dignidade aceitavel ou o reconhecimento varia de urn periodo hist6rico para o outro e entre as sociedades o que e toleravel em urn Iugar e tempo niio 0 e em outros sem considerar as variacQes de genero Thymos e uma cons ciio sociai niio pode existir a invocaciio dethymoscom sentido se estanao levar em cons1de Repensando as rela6es intemacionais 24 7 ras irao continuar o sUi e uma ameasa que 14 bilhoes de pessoas ainda vivem sob o governo comunista em oposisao aos 17 bilhoes de antes de 1989 e assim por diante Estes nao desafiam o seu tema central ja que nem a modernizasao p6smaofsta nem o fundamen talismo islamico sao desafios em urn palco global a ameasa isla mica nada mais e do que uma combinasao maligna de clero bom bastico e de paranoia ocidental 0 desafio real do ocidente uma abstrasao da qual podemos prescindir e o Japao e nao o Ira ou a Argelia onde podese perguntar esta o desafio tecnol6gico ou o investimento destes dois ultimos Estados Em termos empfricos Fukuyama e mais fragil em outros dois as pectos primeiro em sua crensa de que o capitalismo pode elevar todo o mundo aos presentes nfveis de desenvolvimento segundo no grau em que ele acredita que a democracia liberal esta agora se dissemi nando No primeiro uma reafirmasao em termos da Rand Corpora tion da convincente visao expressa por Bill Warren ele esta certo em criticar os mitos da teoria da dependencia mas ignora os fatos que todos os anos nos chamam a atensao na Tabela 1 do World Bank Re raiio a socializaiio de pessoas em grupos e coleti vidades e infelizmente podemos denomimilo so mente como o antithymos q v Dostoievsky A aparente autoridade do conceito dethymose derivada da leitura da Republica de Platiio de Fukuyama via Allan Bloom mas esta parte da opeiio e na verdade deficiente Para o marxista ela niio lembra nada alem do que uma tentativa de espremer uma teoria geral da polftica socialista de algumas passagens descontextualizadas de Marx Lenin ou Mao No grego chissico a palavrathymos significa fUria ou luxuria por comida ou bebida e e uma qualidade associada aos animais e aos cavalos vivazes De maneira interessante em seu sentido original ela se aproxima da palavra arabe thawra iirabe contempodlneo para revolu iio mas em sua origem e uma palavra indicando a falta de espfrito dos touros e outros animais No proprio Platiio ela tern urn senti do mais especffico proximo ao autorespeitoa parte que ama a honra e a vit6ria Mas mesmo o uso de Platiio niio se equipara ao de Bloom Fukuyama como a leitura de outros comentadores indica Alem disso ele esta lendo errone amente Platiio ao implicar que a alma tenha partes de alguma forma o que Platiio quis dizer com partes da alma foi que as pessoas sao complexa Para diferentes consideroes do thymos em Platiio ver RC Cross e AD Woozley Plato s Republic A Philosophical Commentary London Macmillan 1964 pl20l e J uliaAnnas An Introduction to Plato s Republic Oxford Clarendon Press 1981 p1i68 Thymose identificado como irracional ja que e a morada da raiva e da fUria similar ao espfrito ou ao coraiio e e algo que se aproxima embora Fukuyama evidentemente niio perceba isto como apropriado do conceito psicanalftico de idA historiachave que Fukuyama invoca de Platiio para ilustrar o conceito aponta em outra direiio referese a Leontius o filho deAglaion que ao carninhar proximo as paredes deAtenas ve alguns corpos deitados sob a parede primeiro ele desvia seus olhos e entiio por curiosidade olha Ele depois se envergonha e se enfurece consigo mesmo sofrendo urn ataque de thymos Qualquer urn pode entender esta hist6ria mas ela dificilmente ilustra o conceito de thymos de Fukuyama que e tanto relacional envolvendo o que os outros pensam de nos como ligado ao reconhecimento e niio a raiva Independentemente da valida de os insights obre o papel do reconhecimento na polftica tudo sugere que derivalo a partir de uma agttiio de fun do textual e inconclusivo 248 Fred Halliday port apesar de poucos pafses fora da Africa estarem ficando mais pobres o gap entre os Estados ricos e os pobres esta auentando Alem disso como Giovani Arrrighi bern apontou 21 a assoctasao ao clube dos Estados ricos permaneceu constante ao Iongo do ultimo seculo ninguem saiu e embora os membros tenham trocado d Iugar na or dem dos mais fortes somente urn Estado entrou o Japao A crensa na democracia liberal subestima o grau em que a de mocracia capitalista e precaria ela precisa dura por pelo meno uma gerasao antes de suporse que ela permanecera Somente pectsase pensar na Republica de Weimar ou em Estados como Sn anka Liberia Argentina Lfbano nos anos 1960 para ver como a dttadura pode ser restabelecida A partir desta perspectiva mais hisoricmene cautelosa existem somente duas dezenas de democractas hberats estabelecidas no mundo de hoje em urn total de quase 180 Estados independentes Esta visao historicamente superficial da democracia e ligada a uma considerasao idealista e bastante enganosa de como a democracia se concretizou As datas que ele apresenta para o estabelecimento da de mocracia liberal 1790 para os EUA 1848 para a GraBretanha etc sao as do mito constitucional A realidade que Goran Therborn bern mostrou e a de que a democracia completa incluindo dentre outros cri terios uma pessoa urn voto e somente urn voto por pesa chegou a estes dois Estados em 1960 e como resultado da asao pohttca da luta e nao de uma evolusao idealista do sistema22 Aqui chegamos ao problema te6rico central do trabalho de ukuya ma 0 que constitui a hist6ria e mais especificamente a asao htst6nca e nao a questao de se a hist6ria chegou ao fim Por tras de tas estas teorias do fim da hist6ria reside tima teoria da asao Que a mawna das pessoas tenha algoma resposta funcional a esta questao e evidente se somente listarmos alguns dos candidatos a motor da hist6ria que apare ceram nos ultimos seculos Deus os deuses as estrelas a Razao o equi lfbrio de poder a classe trabalhadora a burguesia o campesinato a in telligentsia as teorias da conspirasao em todas as formas e tamanhos a economia e como vimos mais recentemente o mercado na verdade virtualmente todas as classes foram consideradas a excesao de uma que pode ter feito mais do que qualquer outra para moldar o seculo XX a pequena burguesia Sem duvida mais estao por vir A resposta de Fukuyama e idealista Para ele o motor da htst6na ou como ele define o Mecanismo e uma combinasao do desenvol 21Giovanni Arrighi World income inequalities and the future of socialism New Left Review nl89 SeptemberOctober 1989 22Goran Therbom The rule of capitalism and the rise of democracy New Left Review n103 MayJune 1977 Repensando as rela6es intemacionais 249 vimento economico cientffico e da evoluao da liberdade humana Aqui existe muito a discordar A sua consideraao da evoluao da ciencia sin gularmente ignora os estudos kuhnianos e outros institucionais de como as relaoos de poder determinam os progresses cientfficos compare a quantidade de dinheiro gasta em armas com a das pesquisas da AIDS Ele parece atribuirlhe uma direao independente da intenao e do inte resse humano Mais especificamente ele ignora aquele que e o princi pal motor da hist6ria humana neste e no seculo passado a aao politi ca coletiva a aao dos grupos sejam estes classes naoes ou Estados 0 tempo percorrido pela hist6ria mundial desde Hegel e Marx e no mf nimo ate o colapso do comunismo encorajanos a repensar como a aao coletiva funciona a aumentar o numero de tais possfveis atores e tambem a reavaliar a prioridade eo papel hist6rico designado pela te oria socialista com muita facilidade ao proletariado Na verdade e a reteorizaao desta questao que constitui o maior desafio do livro de Fukuyama Ao nos confrontarmos com o evidente descredito da teleologia e da aao na maior parte teoria marxista nao e necessario reverter simplesmente a afirmaao idealista de um espfrito mundial agora apresentado como a ciencia e o thymos moldando o curso dos eventos ou nos abandonarmos na vacuidade e frivolidade p6s modemista 0 problema com a teoria de Fukuyama e com a sua consi derao da hist6ria e fundamentalmente o mesmo de Hegel Existe cer tamente uma soluao classica para este problema fazer com Fukuya rna o que Feuerbach fez com Hegel viralo de cabea para baixo Nas rela6es intemaciohais temos sido muito cavalheiros com esta questao movendonos entre os Estados e o sistema ignorando outros caildidatos Temos sido particularmente recatados com a palavra capi talismo urn termo que nao provoca timidez entre os soci6logos e que sup6ese possa caracterizar 0 sistema intemacional dos ultimos seen los tao bern quanto qualquer outro Na verdade as relaoes inteinacio nais se comportam como se a aao fosse uma categoria marginal com parada as vanas determinaoes do sistema interestatal ou da hierarquia global que normalmente sao percebidas como os seus objetos adequa dos de estudo Responder a Fukuyama envolve entretanto uma res posta a esta parte de seu argumento com a apresentacao de uma teoria altemativa da aao nos neg6cios intemacionais e por esta razao de uma altemativa passada e de uma altemativa presente Face a hist6ria urn tanto deploravel da maior parte do seculo XX e aos assustadores pro blemas que confrontam o mundo a medida que ele caminha para o fim deste seculo esta pareceria ser uma tarefa com certa urgencia normati va e analftica Tambem e uma tarefa que insere as relaoes intemacio nais na 6rbita das outras ciencias sociais Abstraoes exculpat6rias so bre a hist6ria o sistema a estrutura e coisas afins tern tao 5ouca valida de quanto a invocaao do divino ou do astrol6gico Somos todos parti cipantes da construcao do futuro 250 Fred Halliday capfruloIo CONCLUSAO 0 FUTURO DAS RELAOES INTERNACIONAIS Este livro preocupouse com ideias de como o intemacional tern sido ou pode ser mudado e tambem ugeu processo e mecanisios par esta mudana sejam eles o transnac10nahsmo da soctedade e da tdeologta as forcas emancipat6rias de classe e de grupo ou a construcao de formas de govemanca global Qualquer empreendimento deste tipo levanta ques t6es nao somente de eficacia mas tambem de origem etica Os capftulos anteriores enfatizaram outras dimensoes a relacao entre a polftica domes tica e a intemacional e as SUaS implicaOeS para a analise do funcionamento do sistema intemacional Na conclusao entretanto parece apropriado voltar as quest6es morais levantadas pela mudana nos eventos intemacionais do final de 1980 e oferecer o que qualquer abordagem te6rica deveria ofere cer urn programa para trabalho futuro 0 DESAFIO DO NORMATIVO Os neg6cios intemacionais sao notoriamente a atea n qual as co sideracoes morais menos se aplicam e chegamos a acettar dtferentes cn terios morais para os Estados e para os indivfduos Mas ao mesmo tem po 0 intemacional e um terreno repleto de reivindicacoes e contrareivin diaOeS morais no mfnimo dos nacionalistas e inclusive a aceitacao de uma suposta realidade e assumir uma posiao moral Tambem e valido notar que em anos recentes algumas quest6es morais separadas das rei vindica6es das na6es e dos Estados passaram a desempenhar urn papel cada vez maior na discussao e na justificaao publica a justia economi ca os direitos humanos e a responsabilidade ecol6gica 0 deve nao ira ebora 0 que se revela menos desenvolvido e o conjunto de crirerios e discriminaoes que somos capazes de construir neste terreno 1 Para uma discussao das questoes eticas no terreno internacional ver inter alia Janna Repensando as rela6es intemacionais 251 Duas quest6es nonnativas levantadas mais diretamente pela recen te crise intemacional e indiretamente pela queda do comunismo refe remse ao nacionalismo e a intervenao Recentemente a maior parte do trabalho dedicada ao nacionalismo vern sendo sobre os seus aspec tos hist6ricos e sociol6gicos Ate agora as suas reivindica6es norma tivas vern atraindo muito menos atenao todos pertencemos a uma naao e a naao corporificada em seus lfderes tern uma reivindicaao sobre n6s e nos da identidade Proximamente relacionada e brutalmente pre sente nas Guerras dos Balcas no infcio de 1990 e a suposiao normati va adicional de que as naoes definidas por seus lfderes tern direitos sob urn territ6rio dado por Deus por deuses ou pela hist6ria E ut6pico no mau sentido vislumbrar urn mundo no qual os direitos das naoes sobre as pessoas ou sobre o territ6rio nao te nham nenhuma importancia Todavia e importante notar como es tas duas reivindicaoes sao triviais existe pouco alem de urn utilita rismo casual para justificar porque alguem deve ter lealdade a uma coleao heterogenea de pessoas no meio da qual aconteceu de nas cer ou porque se pode afirmar uma reivindicaao particular por ter rit6rio quando toda parte da superffcie da terra comporta reivindica 6es multiplas se nao dos vivos entao dos mortos Aqui existe uma fora consideravel nas visoes de Ernest Gellner que destacou a con tingencia da identidade nacional e da existencia das naoes e do finado Elie Kedourie que viu na disseminaao destes princfpios a reivindicaao da comunidade sobre o individual e das comunida des autodefinidas sobre o territ6rio a rufna do mundo moderno 2 Contudo estes princfpios agora prevalecem e temos de encon trar maneiras de moderalos e reduzilos Porem muito do que aspi ramos introduzir no sistema internacional ainda reside na aceitaao de ambos como caracterfsticas validas e permanentes das relaoes internacionais As pessoas tern o direito de viver em comunidades e de uma forma compatfvel com os seus desejos normalmente isto significa viver em comunidades nacionais e esperanosamente com urn Estado e urn territ6rio para refletilas Mas fomos muito Ionge ao aceitar quaisquer urn destes princfpios como supremos dada a irraci onalidade etnica e as conseqliencias nefastas que os acompanham A questao da intervenao ap6iase nao tanto na questao da et nia e dos direitos nacionais mas na da soberania estatal e foi direta ThompsonJustice and World Order A Philosophical Enquiry London Routledge 1992 Teny Nardin e David Mapel eds Traditions of International Ethics Cambridge Cambridge ipr 1992 Charles Beitz Political Theory and International Relations Guildford Surrey Princeton University Press 1979 Mervyn Frost Towards a Normative Theory of International Relations Cambridge Cambridge University Press 1986 2Brnest Gellner Nations and Nationalism Oxford Blackwell 1983 Elie Kedouri Nationalism London Hutchinson 1960 252 Fred Halliday mente Ievantada pelo fim da Guerra do Golfo e pelos demais even tos da Bosnia e da Somalia Indiscutivelmente esta e a ma10r mu dana na agenda internacional nos anos recentes e coloca urn con junto de questoes morais assim como praticas para todos nos 3 No caso da Guerra do Golfo ela foi colocada nao tanto pelo Kuwait como pelas decisoes tomadas depois da guerra e do levan te da ppulaao iraquiana para estabelecer urn refugio seguro no norte do Iraque4 Na situaao do pasguerra os EUA a GB e a Fran a intervieram para estabelecer m forma dC Estado seprado den tro do norte do Iraque e em ap01o a populaao curda nattva Nao existe precedente para isto na hist6ria do pasguerra e a aao foi percebida em algumas partes do mundo arabe como uma form de colonizaao ou da antiga politica imperialista de partiao Apesar dtsso ela estava de acordo com a vontade dos pr6prios curdos cujos fderes eleitos subseqlientemente manifestaram abertamelte o eu deseJO pea manutenao da polftica do refugio seguro Esta f01 u tpimeltaao pratica e inovadora da polftica de inerven5ao hurIamtana nao stgm cando com isto que os poderes que mtervmham ttnham soente motl vos humanitarios urn requisito que seria impossfvel cumpnr mas que em parte eles tinharn uma motivaao hanitaria e que as conseqlien cias de suas aoes possufam urn benef11 claro e substalctal para as populaoes envolvidas sta aiio consttum urn desafio dtret sobe rania do Iraque e uma movaao dramattca no campo da Pohttca dos direitos humanos As questoes morais levantadas o mutas e eram colocadas em sua fornJa classica por John Stuart Mill pnmerro que grau de tirania ou opressao justifica ou obriga a intervenao segundo a que custo a intervenao deve ser promovida terceiro se ela pode se pro movida somente em apoio a urn grupo etnico identificavel ou mats ge nericamente UnJa vez que o princfpio e adrnitido como razoavel e geral podem ser elaboradas respostas a estas indaga6es 5 Em unJa certa escala a intervenao nao envolve nornJaS mas pru dencia Apesar disso existe aqui urna questiio nonnativl refente so berimia e as obrigaoes dos Estados A air parte a tscussao Ctden tal nao se preocupou com a conseqlienctas da naomrvena mesmas considera6es de carater moral nJas com a questao de se nos a GraBretanha e os outros Estados devemos intervir De onde vern este JPara discussiio adicional ver Fred Halliday The GulfWar and the study of International Relations Review of International Studies v20 n1 January 1994 sob 0 levante e o seu resultado ver Kanan Makiya Cruelty and Silence London Century Hutchinson 1993 SJames Mayall Nonintervention selfdetermination and the n world oder International Affairs v67 n3 July 1991 Christopher Greenwood Is there a nght of humanitarian intervention The World Today v49 n2 Febraury 1993 Hedley Bull ed Intervention i World Politics Oxford Clarendon Press 1984 Repensando as rela6es intemacionais 253 deve De onde na verdade vern este deve com relaao a pobreza do Terceiro Mundo ou aos casos individuais de direitos humanos A res pos e em primeira instancia vern da Carta da ONU panigrafo 24 que obnga os membros do Conselho de Segurana a assurnir responsabili dade primma pela manutenao da paz intemacional e da segurana Aqm chegamos a uma questao que e muito discutida na litera tura das relaoes intemacionais mas que o debate publico esconde por raz5es compreensiveis o papel dos grandes poderes Juridicamen te todos os Estados sao soberanos e iguais porem na realidade eles nao 0 Sao e Sao muito mais desiguais do que OS individuos deno de urn Estado N a maior parte do seculo passado o sistema intemacio nal foi dirigido pelos grandes poderes atraves dos mecanismos do im perialismo que sujeitaram os povos e que os levaram a discutir e a brigar uns om os outros por vanos motivos 0 imperialismo no sentido de dormna fonnl ou de colonialismo mesmo na muito peculiar for ma sovtetlca esta acabado e da mesma maneira poderseia pensar qualquer papel proeminente para os grandes poderes Como argumentei 0 conflito entre OS grandes poderes pode nao ser mms o tor da politica intemacional e as opinioes publicas dos taos mats tmpntes relutam em correr riscos que antes eram acei taves Entretanto 1sto somente coloca de forma mais aguda o dilema da dtplomacia intemacional ja que estes poderes nao irao assumir a li derana quem ira 0 registro da crise do Golfo e claro e desacredita esta postura sem os EVA liderando nada teria acontecido No caso dos Balcas urn ds motivos pelo qual quase nada aconteceu e pelo qual os servtos acredttavam corretamente que poderiam continuar com suas campanhas e que os EVA pareciam considerar este como urn proble euopeu U das raz5es usadas pelo Congresso para recusar a ra tificaao do apoto d Woodrow Wilson a Liga das Naoes foi precisa mente a preocupaao como envolvimento nas Guerras dos Balcas Contdo algum papel de liderana dos grandes poderes parece na srmevttavel e na verdade desejavel assim como e desejavel e ne cessano urn papel dos principais poderes economicos e financeiros na cnduao da economia intemacional A questao nao e se eles irao ou nao desempena urn papel mas ao inves disso se este papel sera uni later compettttvo e de curto prazo ou se sera multilateral mais coo perativo ou de Iongo prazo A altemativa ao artigo 24 nao e a harmonia mtemactoa mas urn mundo no qual ninguem assuma a responsabili dad pnmarta pela manutenao da paz intemacional e segurana Os habtantes dos Balcas passaram muito por isto em 19914 podese duvtdar se eles o recomendariam para o mundo como urn todo Esas duas questoes a do nacionalismo e a da intervenao e s reaciOnadas aos ganes poderes tocam em algo que talvez seja mats penetrante e dtftctl de todas as questoes normativas confron 1 tando o mundo no momento a disputa entre os valores universais e 254 Fred Halliday os particulares Desde o seculo XVIII existe uma corrente no pensa mento ocidental que afirrriou a validade de certos principios morais universais e racionais para a vida polftica os direitos do individuo o secularismo e a democracia em alguma de suasformas Nos anos recentes tais principios foram ampliados para incluir urn reconhe cimento mais explicito da igualdade de genero e de raa De forma alguma estes valores sao apoiados universalmente ou permitem interpretaoes inequivocas Entretanto hoje eles estao conservados em documentos polfticos nacionais e intemacionais e fazem parte de uma visao de mundo otimista do p6sGuerra Fria parecendo que agora eles estariam destinados a prevalecer Ja foi sugerido no Ca pitulo 7 que em nenhum sentido imediato eles estao destinados a prevalecer porque as condioes nas quais digamos a democracia pode sustentarse nao estao dadas na maioria dos paises do mundo Alem disso cada vez mais existem outros desafios estes valores sao questionaveis em si mesmos e outros sistemas de valores de outras procedencias tern igual ou mesmo maior valor Os proponentes do fun damentalismo religioso estao na linha de frente com relaao a isto mas existe uma corrente mais ampla evidente no Leste Asiatico que con testa o que e dito como sendo urn sistema de valores ocidental e etno centrico Por simpatia ou por apoio a uma posiao frouxamente deno minada de p6smodemista muitos no ocidente tambem aderiram a este desafio relativista a qualquer c6digo nonnativo unico Historicamente existe muita validade ilesta critica estes c6digos foram produzidos em paises particulares refletindo o seu passado e os seus valores e nao foi por acidente que estes paises sao em larga me dida os mesmos que ocuparam e dominaram uma grande parcela do resto do mundo6 0 aumento da liberdade em casa coirtcidia com mai or espoliaao no exterior Tambem tern havido urn alto grau de hipocri sia nas reivindicaoes de integridade nonnativa feitas pelos poderes ocidentais dominantes eles fizeram mais do que quaisquer outros para violar a soberania ao Iongo dos dois Ultimos seculos OS maiores crimes contra a humanidade foram cometidos neste seculo em solo europeu Contudo estas reservas nao invalidam a reivindicao mais ampla de que em questoes primarias de prepcupaao normativa e politica existe urn certo consenso intemacional em tomo de urn conjunto de valores que independentemente de sua origem podem ser baseados na razao e que retem por motivos que os cientistas sociais podem ani madamente discutir alguma relaao com a prosperidade economica e a paz domestica e intemacional E uma pena e de fato e muito pe 6Para o debate no mundo iirabe ver Kevin Dwyer Arab Voices London Routledge 1991 e Anne Mayer Islam and Human Rights Tradition and Politics London Pinter 1991 Mayer e particularmente intrigante a respeito da manipulaao da critica doTer ceiro Mundo por grupos interessados dentro dos Estados islfunicos Repensando as relaoes intemacionais 255 rigoso que justamente no momento em que emerge uma nova situ aao intemacional exista falta de vontade polftica nos pafses com maior influencia intemacional para definir o que constitui ou nao urn sistema polftico desejavel Isto pode agradar os mais crfticos nestas sociedades mas podemos duvidar que isto ajudara o restante do mundo que quando perguntado deseja mais e nao menos destes princfpios universais tornados como certos nos paises mais felizes No debate internacional freqtientemente os que estao no poder e os que se be neficiam das varia96es correntes na norma internacional sao os pri meiros a nos dizer que os criterios universais nao se aplicam os go vernos os cleros na verdade os homens em geral proclamam o ex cepcionalismo normativo Entretanto a independencia o secularis mo a igualdade a regra da lei e varios privilegios economicos e soci ais constituem uma boa vida como internacionalmente definida Aqui voltamos a questao da interven9iiO dos limites e das for mas que estiio a disposiao da comunidade intemacional para buscar o cumprimento destas normas nas rela96es entre e dentro dos Estados Nao podemos explicar as rela9oes intemacionais ou o papel dos gran des poderes primeiramente em termos de uma polftica de for9a norma tiva todavia podemos perceber que quaisquer polfticas realistas e co operativas concebidas para aumentar o respeito a estes princfpios sao desejaveis e devemos desenvolvelas Se nao o fIZermos isto represen tara uma grande abdicaao mesmo se for defendida em nome da indi vidualidade da antihegemonia ou do capricho p6smodemista AS ALTERNATIVAS EM PESQUISA A negligencia do normativo na maior parte da literatura das rela 96es intemacionais da epoca pos1945 seja em suas variantes norte americana OU brltanica e parcialmente atribufda ao medo de repetir OS eiTOS dos ut6picos do entreguerras e tambem devido a identifica9ii0 entre a disciplina as prioridades e a disposi9ao dos Estados A orienta9ao me todol6gica neste caso uma complacencia de valor e tao subordinada quanto uma explica9ao apologetica do poder Alem disso mais do que ququer outra a omissao do normativo e favorecida pela incerteza que ve10 a prevalecer na discussao publica academica ou nao no encerra mento da Guerra Fria havendo o cruzamento entre as preocupaoes a resito da dirao geral da vida polftica com as vacuidades do p6smo demtsmo eo relativismo etico A unica resposta adequada a esta crise dupla da analise intemacional e dos meandros eticos e oferecer urn con junto alternative de temas para sustentar a pesquisa e a analise 0 que esta pesquisa particular de relaoes intemacionais suge re e esta agenda para o estudo das rela96es intemacionais sustenta 256 Fred Halliday da em uma maior percep9iio de varios conceitos que ate aqui tern ocupado urn Iugar secundario e marginal na disciplina e em uma orientaao metodol6gica que abandone o culto da quantificaao da predi9iio e da cientificidade em favor de urn compromisso com a explica9ao te6rica e hist6rica Sob esta luz os capftulos anteriores podem ser resumidos para sugerir o seguinte programa de pesquisa 1 as formas de expansao do sistema capitalista a partir do seculo XV seu impacto contradit6rio no mundo precapitalista a evolu9ao das formas de rela9ao intercapitalista e o conflito do capitalismo com o blo co transit6rio naocapitalista do comunismo do seculo XX 2 o exame de como o capitalismo opera como urn sistema inter nacional e das formas polfticas especfficas que produziu e manteve no presente o Estado soberano e a ideologia do nacionalismo e no atual contexto uma consideraao equilibrada das formas de intera9iio em mudan9a entre os Estados e os processos globais 3 a forma pela qual a a9ao incluindo a de classe s6 que nao ex clusivamente opera transnacionalmente na constitui9ao e na influen cia do sistema considerandose o impacto de atores naoestatais infor mados e ativos ecologia direitos humanos na organiza9ao intemacio nal dos grupos sociais hegemonicos e nas fragmentadas nms recorren tes a9oes intemacionais de grupos subordinados 4 o estudo do conflito em seu contexto social e poHtico e a anali se da guerra alem do fetichismo da corrida armamentista e dos equilf brios de poder e o papel de ambas da mobiliza9ao etnica e da revolu 9iio social em fraturar e constituir o sistema intemacional 5 a formula9ao e a potencial implementa9ao de princfpios mo rais e nos casos em que o acordo nao for possfvel uma forma con sensual mfnima de debate morallegftimo em questoes pertinentes ao intemacional dentre outras a lealdade a identidade a seguran a a igualdade e a liberdade Dada a combina9ao de disturbio polftico e confusao te6rica que parece estar acompanhando o fim do seculo XX o desafio e as respon sabilidades de uma disciplina preocupada como intemacional parece riam maiores do que antes 0 maior dos perigos seria o agnosticismo analftico ou moral ou uma recafda as conformidades dos dois lados do Atlantico Agora estas conformidades parecem estar esgotadas tanto quanto o contexto intemacional em que se originaram Entretanto seria igualmente errado confundir o que e sem duvida urn ponto de mudan 9a fundamental na hist6ria mundial com uma suposta necessidade de derrubar todos os sistemas conceituais estabelecidos 0 presentis mo dos neg6cios intemacionais nao precisa embora possa levar a uma revisao das abordagens te6ricas analfticas ou morais 0 mfni mo que pode ser dito e que as duas quest6es a de mudan9a na his t6ria mundial e a de mudan9a na orienta9iio filos6fica e te6rica pre cisam ser mantidas separadas o colapso do Muro de Bedim ou a Repensando as rela6es intemacionais 25 7 internacionalizaao do capital e do trabalho nao implicam que nao existe mais uma distinao entre o deve e o e ou que as formas basicas de racionalismo estao agora invalidadas mais do que isso significaria que a terra e chata ou que a Iua e feita de queijo 0 pro grama de pesquisa aqui esboado e desenvolvido atraves dos capf tulos crfticos deste Iivro sugeriria que existem muitas ferramentas conceituais disponfveis para analisar e fornecer orientaao moral no mundo p6sGuerra Fria Se existe validade na reivindicaao de que como cidadaos como politicos como academicos temos sonambulado atraves da historia entao a conclusao evidente o suficiente e que precisamos estar urn pou comais alertas e acordados Ouviremos e na verdade ja estamos ouvin do muita reflexao sabre o fim do seculo e o comeo de urn novo mile nio Tudo isto pode ser de uma irrelevancia solene pelo menos porque para a maior parte do mundo o milenio corresponde a urn diferente sis tema cronologico ate agora podem ser encontrados pelo menos seis outros sistemas de contar os anos o judaico o muulmano o persa zoroastriano o etfope o chines e o japones e seus milenios verne vao em tempos diferentes Nao existe nada mais etnocentrico do que o ano 2000 Mas se a ideia do milenio como a dos exames nos ajuda a pen sar melhor Os lideres politicos eleitos e nao eleitos tern uma performance bastante pobre ao Iongo dos ultimos cern anos mas os cientistas natu rais ou sociais tambem possuem registros confusos 0 perigo dos cien tistas sociais nao e 0 de estar muito afastados das preocupa6es do po der politico ou empreendedor mas o da falta de urn distanciamento su ficiente eles nao se empenharam para estar acima do sensa comum de sua epoca e se consolam com o vazio e o insignificante daf o esforo das ciencias naturais dedicado as armas de destruiao em massa e o fra casso ate o ultimo momenta de prever o impacto da humanidade sob o meio ambiente distoroes amplamente reproduzidas nas ciencias soci ais incluindo as relaoes intemacionais Neste ponto mais do que em qualquer outro os cientistas sociais vern freqlientemente falhando em mostrar independencia e empreendimento intelectual 0 mfnimo que pode ser dito de todos dos politicos e dos academicos dos cientistas naturais e dos sociais e que 0 registro dos seculos passados nao tern sido muito borne que o enorme sofrimento que se abate sabre a humanidade pode nos ensinar a melhor considerar as questoes que enfrentamos Mui tas das foras que irao moldar o pr6ximo seculo e o proximo milenio e que tambem irao moldar a agenda dos politicos e dos cientistas sociais ja foram liberadas e melhor analisalas agora Talvez nao seria muito irreal esperar que urn trabalho melhor do que aquele feito neste ultimo seculo possa ser feito no proximo 25 8 Fred Halliday rl APENDICES j I UM MUNDO UM MITO Este e urn ensaio explorat6rio sabre o mais crucial aspecto da seguranca internacional contempodlnea a rivalidade sovieticoame ricana no Terceiro Mundo Ele enfoca as varias politicas e ideolo gias produzidas por cada urn dos grandes poderes para conduzir esta rivalidade e as ilusoes por elas geradas Os capftulos seguin tes examinarao estas polfticas em seu pr6prio direito entretanto elas foram desenvolvidas e sao percebidas dentro de urn contex te mais ample de mudanca cultural e polftica Ja que este e urn tra balho dirigido a urn publico geral nao confinado a especialistas em relacoes internacionais pode ser apropriado comecar pqr al gumas observasoes resumidas de como este contexte se relaCiona com o assunto desta investigasao Os anos 1980 foram urn perfodo de profunda deterioraao nas relacoes internacionais a Guerra Fria entre os grandes pede res o desemprego internacionalizado no mundo capitalista de senvolvido a miseria no Sui e no campo ideol6gico o renasci mento e a reelaboracao do darwinismo social disfarcado sob os names de empreendimento e liberdade 0 clima cultural no mundo desenvolvido foi marcado pelo narcisismo de massa e pela am nesia hist6rica isso nunca esteve mais clara do que na crimca de que estavamos vivendo em urn mundo de cultura politica mo derna e universal cada vez mais livre e de urn sistema polftico unificado e melhor Sob o pretexto de fomecer uma cultura mais realista e atualizada esta ideologia suprime e rejeita alternativas especialmente aquelas de natureza critica ou radical Se existem razoes para aceitar que o mundo tomouse mais integrado durante estes anos e as tendencias nas comunicacoes na economia e na administraao dos problemas globais fornecem alguma eviden cia disso tambem existem razoes poderosas para reconhecer as desigualdades dentro desta unificacao e os processes contnirios de fragmentaao Durante esta decada a distancia entre os paf ses mais rices e mais pobres do mundo aumentou uma divisao que em termos estritamente economicos resulta dos novas meta des de aperfeicoamento desenvolvidos pelo capitalismo avansa do havendo a inovasao sempre as custas de outre alguem estes incluem a internacionalizasao do turismo sexual o dep6sito de lixo t6xico no Terceiro Mundo e a destruicao para o uso do Nor te de vastas areas ambientais do Sui Repensando as rela6es intemacionais 261 Dentro das pr6prias economias capitalistas desenvolvidas houve muita ret6rica sabre a derrubada de barreiras e a integraao economica Nao cabe discutir se este processo e ou nao uma ilu sao mas sim que ele esta ocorrendo por meio de uma crescente concentraao de poder e de uma epidemia de monop6lios em cada vez menos maos Alem disso se esta intemacionalizaao e mobi lidade se aplicam a alguns dos fatores de produao principalmen te o capital e a tecnologia elas sao totalmente contrarias a cres cente imobilidade de outro fator o trabalho As economias avan adas que durante seculos e sem convite ocuparam e saquearam o Terceiro Mundo percebem como apropriado em sua retitude p6s imperial dificultar o quanta possfvel os fluxos de trabalho Sui Norte a liberdade de movimento para uns se opoe a restriao para outros A alternativa de uma alocaao planejada de recursos com base em necessidades internacionalmente determinadas e assim exclufda Se isto e 6bvio na Europa onde o mercado metapatri6ti co voltado para dentro de 1992 esta chegando e igualmente evi dente no abandono pelos EUA do compromisso de fomecer refu gio para os pobres do mundo em uma epoca onde os mercados financeiros americanos se tornaram mais internacionais do que nunca a Estatua da Liberdade poderia com alguma justia ser transportada para as margens do Rio Grande 0 Japao nunca per mitiu a imigraao com exceao da comunidade da Coreia subju gada odiosamente mas ele tern como qualquer outro poder capi talista feito uso da violencia e da interferencia para a exploraao de seus vizinhos a pilhagem da China e da Coreia e mais recen temente a bordelizaao da maior parte da Asia do sudeste Na esfera da cultura em suas dimensoes polftica e estetica tern havido urn desabrochamento de particularismos muitos dos quais do tipo rna is mesquinho e historicamente limitado Nos pa fses capitalistas desenvolvidos isto tern envolvido os palavrea dos da herana da industria de massa freqiientemente gaban dose do quase totalitario conceito de comunidade o racismo penetrante e o chauvinismo em direao aos novas grupos de imi grantes os excesses dipsomanfacos e a violencia populista em eventos esportivos internacionais e nos EUA e no Japao a into xicaao religiosanacionalista em varias formas cristaos renas cidos xintofsmo Mesmo o Terceiro Mundo tern sido inundado por seus pr6prios conflitos natives e regressoes nacionalistas das autodestrutivas proclamaoes do fundamentalismo islamico que tern dividido mais o mundo muulmano do que qualquer ataque imperialista ao crescimento do chauvinismo hindu e budista no sui da Asia a hedionda disseminaao do comunalismo e dos conflitos etnicos atraves da Asia e da Africa Libano Punjab Sri Lanka Filipinas Sudao e Burundi 262 Fred Halliday 0 segundo mundo socialista certamente nao se tern safdo muito melhor urn dos aspectos mais louvaveis do agora desacre ditado velho pensamento era a importancia atribufda ao intema cionalismo a fratemidade entre Estados semelhantes a igualdade entre OS grupos etnicos dentro das naoes e ao imperative herda do da melhor parte do iluminismo de adotar uma atitude crftica e onde apropriado corrosiva frente as presunoes de superioridade de uma determinada cultura e hist6ria nacional A maior abertura eo pluralismo libertaram as aguas represadas em uma onda de fre nesi nacionalista e 6dio tanto dentro dos Estados URSS China Romenia Iugoslavia como entre eles Ao lado de varios outros aspectos mais recomendaveis apesar de inadequadamente imple mentados do programa de modernizaao dos partidos comunistas tradicionais a exclusao da religiao da vida publica e polftica a emancipaao das mulheres a limitaao da apropriaao privada o desenvolvimento economico planejado e a solidariedade com o Ter ceiro Mundo este compromisso como entendimento intemacio nalista parece ameaado no presente repensamento em muitos outros aspectos positive se atrasado do modelo socialista que vern sendo realizado na URSS na Europa Orientale na China Como revelou a liberaao dos controles polfticos nada nestes pafses es teve mais estagnado do que o mito nacionalista Este camaval de divisao e preconceito enquanto se alimentando de uma hist6ria artificial e formado por uma negaao da hist6ria real das causas passadas e dos problemas e tendencias presentes Os pafses desenvolvidos esqueceram muito facilmente que durante a pri meira metade deste seculo e antes eles atacaram ou ocuparam a maior parte do Terceiro Mundo quase que a vontade escravizando povos inteiros e violando direitos nacionais e humanos em uma es cala global a indignaao justificada do publico britanico frente a ameaa de morte do Aiatola Khomeini contra o escritor Salman Rushdie precisa ser complementada pela percepao da indignaao iraniana ao fato de que em duas ocasioes neste seculo a GraBreta nha interferiu no pafs Primeiro em associaao com sua aliada Rus sia ela invadiu o Ira e depois no infcio dos anos 50 conspirou com os EUA para assassinar oficiais iranianos e derrubar o govemo elei to do pafs E parte da cultura polftica dos anos 1980 perderse em uma negaao em urn tipo de autovirtuosidade p6simperial quan do tais questoes sao levantadas isto e evidente na autoindulgente discussao americana sabre o Vietna no encobrimento europeu do imperio e de sua cultura racista no eufemismo japones sabre ques toes controversas em urn grau que envergonharia mesmo a classe governante britanica e no caso de seus livros escolares a falsifica ao diret da hist6ria A embriaguez militarista que fascinou a Gra Bretanha durante a guerra do Atlantica do Sui foi uma expressao Repensando as rela6es intemacionais 263 adequada deste virus globalizado assim como o foi a exultaao nos EUA dos bombardeios repentinos sabre a Lfbia nos quais dezenas de civis foram mortos A morte do criminoso de guerra Hiroito em 1989 forneceu aos japoneses que temporariamente haviam repudi ado o militarismo a oportunidade de se deliciar com suas proprias fantasiais imperiais Em uma epoca na qual existe forte apoio popu lar na URSS para a construao de urn memorial para as vitimas da repressao de Stalin podese perguntar quanto tempo demerara se algum dia para que sejam erguidos monumentos as vitimas do co lonialismo nas capitais que o comandaram em Paris Londres Bru xelas Haia Berlim Roma Madrid Lisboa Washington e Toquio Urn acompanhamento essencial desta cultura polftica autocen trada tern sido a crena em uma modernidade nova e cosmopo lita Esta ideologia Ionge de ser universal reflete valores selecio nados de alguns dos Estados mais ricos do mundo e apresenta varias opoes que sao especfficas e exclusivas Muito do que e born no passado e rejeitado no minima a propria percepao da histo ria Definioes alternativas sabre o que a modernidade poderia constituir sabre as opoes etnicas tecnicas e polfticas disponfveis sao eliminadas da discussao Os componentes da modernidade podem ser organizados tanto para a hierarquia como para a de mocracia como esta mais evidente no campo do controle da mf dia Ao mesmo tempo a disseminaao da tecnologia da informa ao o fetiche da epoca envolve uma confirmaao adicional do domfnio do ingles as custas das outras 4 mil lfnguas do globo Em paises como a Espanha e a Frana e tambem a GraBretanha o culto da modemidade e saturado par uma reverencia a competi ao e ao empreendimento uma ganancia oficialmente sancio nada que tern exacerbado as distancias entre os ricos e os pobres e reintroduzido a mendicancia de massa nas ruas das capitais euro peias ocidentais em uma escala nao vista desde 1940 Alem de ostentar uma rejeiao do carinho e da compaixao em casa a cultu ra polftica da modernidade envolve urn abandono da preocupa ao com o Terceiro Mundo e de varias questoes que marcaram quase toda a cultura da esquerda em 1970 a ajuda para o desenvolvi mento o subdesenvolvimento a solidariedade a transformaao social intencional A exceao mais notavel a esta tendencia foi o sucesso do Bandaid a mobilizaao para fornecer ajuda ao Tercei ro Mundo organizada par Bob Geldof em 1985 mesmo assim a despeito de seu enorme sucesso humanitario o resultado material do Bandaid 70 milhoes de dolares foi uma esmola comparada ao declfnio em termos reais das transferencias de ajuda NorteSui e ao que os pafses desenvolvidos e as suas corporaoes estavam ti rando do Terceiro Mundo de inumeras maneiras no mfnimo atra ves do reembolso da dfvida e dos termos declinantes de comercio 264 Fred Halliday Similarmente o amplo apoio para campanhas ecol6gicas como as do Greenpeace pouco tern feito para impedir a destruiao dos rios das florestas dos mares e da atmosfera do planeta 0 antiterceiro mundismo tornouse urn marco caracterfstico des ta versao do modernismo similar ao realismo da antiga intelli gentsia de esquerda nos pafses desenvolvidos Na Europa os anti gas defensores dos movimentos revolueionarios vietnamita e chile no agora entoam os louvores dos EUA e denunciam antigos aliados em uma atitude comparavel ao recurso a irracionalidade e ao arcafs mo na crftica artfstica e literana a admiraao pelo imperio e os valo res cristaos e uma reverencia a Edward Elgar e John Betjeman Nos EUA existe uma disposiao esqualida epitomizada pelos anti gas escritores da Nova Esquerda e apoiada por Wall Street que zomba de seus antigos aliados e que valida retrospectivamente a Guerra do Vietna Em uma questao acima de todas na qual o gover no americana tern urn papel central a desempenhar a da Palestina a maioria da intelligentsia americana adotou urn conformismo timi do oferecendo compreensao aos israelenses os dominadores que tiveram seu proprio estado nacional e ultraje aos palestinos as vftimas que nao tiveram Mais do que em qualquer outro pais de senvolvido esta tendencia foi associada a uma adesao arrependida a ideologia nacional a urn americanismo fabricado que nega a rica historia eo potencial radical do pafs Esta traiao polftica tern sido fortalecida par uma aspereza di fusa de atitudes culturais como Terceiro Mundo Tanto com rela ao aos pafses do Sui como com os pobres em casa tornouse comum culpar as vftimas par sua falta de iniciativa e empreendi mento Novas modelos estao em aao agora Nos EUA esta dege neraao alcanou a sua apoteose na figura de Rambo urn catalep tico assassino de massa elevado a heroi nacional Na GraBreta nha existiu uma tendencia cultural paralela urn ressurgimento da nostalgia colonial em nenhum Iugar mais evidente do que na re cafda insidiosa da nomenclatura dos restaurantes indianos o Moti Mahal 0 Palacio da Perala eo Nuri Jahan Luz do Mundo de duas decadas atras se tornaram Bengals Bertie e The Last Days of the Rajah Nenhum drama erotica agora parece legftimo a nao ser que tenha Iugar em uma plantaao ou culmine sob urn punkah Os lfderes politicos japoneses menos constrangidos em expressar ati tudes racistas tern abertamente proclamado a inferioridade de ou tros povos especialmente dos negros Talvez se estes processos continuem possamos aguardar ansiosos par novelas sabre os agen tes do genoddio colonial par restaurantes chamados Coolies Pe tit Colon Le Pied Noir e Banzai e bares de vinhos lembrando o ambiente do trafico de escravos Houseboy The Middle Passage ou simplesmente Chains Repensando as relaoes intemadonais 265 Esta embalagem de modemidade e a hostilidade correspondente ao Terceiro Mundo sao urn cenario essencial ao que pode em si mesmo parecer ser urn desenvolvimento separado e bemvindo a torrente de nego ciaOeS entre os grandes poderes sobre as quest6es do Terceiro Mundo E tentador mas prematuro discutir que estas trouxeram urn tim a rivalidade entre os sistemas socialista e capitalista e conseqlientemente de sua rivali dade no Terceiro Mundo A impressiio geral no tim dos anos 1980 era de que uma nova era de reconciliaao havia comado 0 ano de 1988 foi com justia consideravel saudado como urn ano em que a paz irrompeu por quase todo o mundo 0 perfodo de negociaiio e do novo pensamen to que se seguiu a emergencia de Gorbachev levantou muitas esperanas tambem conteve incertezas principalmente para o Terceiro Mundo Muitos afirmaram de Gorbachev a Thatcher que esta mudana de eventos marcou o tim da Guerra Fria Como discuti em outro tra balho o termo Guerra Fria pode significar duas coisas diferentes Como urn perfodo de conflito intenso entre o lesteoeste que envol veu a confrontaao e uma intensiva corrida armamentista entiio cer tamente eo caso que a Segunda Guerra Fria terminou em 19851987 No outro sentido mais amplo o da rivalidade entre dois sistemas so ciais e politicos opostos a competiao hist6rica foi o sustentacula da polftica mundial desde 1945 a Guerra Fria permanece bastante pre sente Em nenhum Iugar isto e mais evidente do que no Afeganistiio No final dos anos 1980 a URSS e os EUA argumentaram que estavam encorajando o compromisso nos conflitos do Terceiro Mundo e urn desengajamento das foras extemas incluindo as suas pr6prias Escritores sovieticos falaram com carinho de niio haver perdedores nos arranjos regionais Em realidade tais garantias niio foram confirmadas pelos pafses envolvidos No Afeganistao o acor do de Genebra de Abril de 1988 levou a implementaao de urn s6 lado os russos retiraram suas foras em 15 de Fevereiro de 1989 o ocidente particularmente os EUA e a GB eo Paquistao niio leva ram a acordo em consideraao e continuaram a suprir os contrare volucionarios isHimicos com armas 0 resultado foi que quando as foras sovieticas se retiraram uma nova fase na guerra afegii uma guerra civil intensa comeou ninguem no Afeganistiio duvidou de que existia uma continua busca pela vit6ria da parte da guerrilha e de seus defensores externos Na verdade foi ironico que no meio de Fevereiro de 1989 quando o mundo ocidental estava unido em indignacao contra os chamados do fundamentalismo isHimico para a morte do escritor Salman Rushdie que os protagonistas deste mesmo fundamentalis mo devessem disfarados de defensores da liberdade estar se reunindo nos portoes de Cabul incitados pela totalidade do mundo ocidental e brandindo seus mfsseis fomecidos por Ronald Reagan e Margaret Thatcher Poucos se preocuparam em perguntar o que o 266 Fred Halliday Estado islamico proposto por estes mujahidin traria Os defenso res deste movimento estavam por todos os lados normalmente jornalistas presos a suas mesas posando para aars em chapeus da swat e xales patiis garotos de uma escola pubhca mglesa amma dos por urn mundo sem mulheres do tipo de John Buchan aventu reiros americanos e veteranos da Indochina alegres em vingarse da URSS e talvez tambem cativados pela pratica afega de mutilar os corpos de suas vftimas como os soldados fazalll no Vietna Se a m plementacao ocidental do acordo da ONU stgmticou alguma c01sa foi mostrar que nao havia tregua e nenhum terreno comum nos con flitos do Terceiro Mundo 0 papel dos Estados europeus ocidentais neste processo oi m seu todo conspirat6rio Na Europa o novo e menos provocattvo m tervencionismo americana foi muito bern recebido assim como o distanciamento da poHtica americana das serias preocupacoes com o Terceiro Mundo E valido notar por exemplo que quando no poder os partidos socialdemocrata da Europa ocidental pouco fi zeram de concreto para ajudar a Nicaragua a resistir a pressao ame ricana Miterrand e Gonzalez rapidamente se encaixaram a etiqueta do clube atlantica A invasao americana de Granada em 1983 gerou alguma crftica da GraBretanha mas esta em parte motivada pela preocupacao com as propriedades da Comunidade passou rapida mente Na verdade houve considenivel colaboracao entre os EUA e os seus aliados europeus em acoes secretas no Terceiro Mundo e na polftica pr6insurreicao entre os EUA e a Franca contra a L1 bia no Chade entre a Holanda e os EUA na organizaao da revolta no Suriname entre os EUA e a GraBretanh31 no fornecimento de armas aos mujahidin afegaos assim como na Asia do sudeste existiu colaboracao sinoamericana no Camboja Quando os EUA envaram forcas navais ao Golfo Persico em 1987 navios europeus se Junta ram em uma operacao de manutenao da paz espuria reminis cente do Libano e da Coreia contribuindo para uma escalada na guerra e para o seu prolongamento por mais varios meses Quando a marinha americana derrubou urn aviao civil iraniano em Julho de 1988 matando todos os seus passageiros e a tripulaao os europeus ticaram mudos Os paises da CEE desejavam muito desenvolver uma polftica externa comum sua tentativa mais destacada de fazelo a declaraao de Veneza sobre a disputa arabeisraelense esgotous e nenhum dos principais Estados da CEE estava preparado para arrts car urn confronto com Washington nesta questao A despeito das modas passageiras do final dos 1980 nero a ri validade lesteoeste nem o desafio polftico do Terceiro Mundo po dem ir embora Como foi demonstrado tao claramente no Afeganis tao existirao vencedores e perdedores nos conflitos do Terceiro Repensando as rela6es intemacionais 267 Mundo no Camboja em Angola e na Nicaragua e o rumo destas disputas e em grande medida ainda definido pela rivalidade teste oeste Este livro foi escrito como uma contribuiao preliminar ao entendimento desta interrelaao e para determinar como os EUA e a URSS chegaram ao poilto de mudana no final de 1980 Fred Halliday Londres 12 de Maro 1989 Traduzido de HALLIDAY Fred One World One Myth Introdwao a Cold War Third World An Essay on SovietUS Relations London Hutchinson Radius 1989 por Cristina Soreanu Pecequilo 268 Fred Halliday OS FINAlS DA GUERRA FRIA Os eventos da segunda metade de 1989 representam urn pro funda abalo na politica mundial Eles restabeleceram de forma dra matica a faceta mais negligenciada da vida politica tanto no leste como no oeste caracterizada pela capacidade da massa da popu laao de atuar em politica de forma subita rapida e original depois de urn Iongo perfodo de algo que parecia ser indiferena Por sua velocidade importancia e pelas incertezas que liberaram eles po dem ser comparados a uma guerra na qual todas as expectativas e pianos estabelecidos sao varridos perante novas e irrefutaveis rea lidades Nem a esquerda nem a direita podem reclamar creditos por esses eventos ainda que ambas pretendam reivindicalos A direita comeou em 1989 o ano dos aniversarios revolucionari os proclamando que as revoluoes eram coisa do passado A es querda confundiuse pela rejeiao popular ao socialismo e pela adoao do nacionalismo nos estados do leste Esta e nao s6 uma epoca propicia as grandes mudanas na situaao mundial mas tam bern para que o movimento socialista reexamine seus muitas ve zes implfcitos fundamentos Neste contexto incerto e confuso ouvemse vozes dos dois Ia das proclamando que a Guerra Fria acabou e que estamos entrando em uma epoca de grande segurana e usando o termo em voga de interdependencia Maior atenao tern sido prestada na Europa onde inicialmente separados os processos de integraao a oeste conclu fdos em 1992 e de desintegraao no bloco sovietico a leste agora uniramse ligados pela geografia na busca de uma nova arquitetura de segurana e vinculados pelo tema da unidade alema Qualquer que seja 0 significado de Guerra Fria OS acontecimentos dos ulti mos meses sublinharam o fato de que ao Iongo das quatro decadas congeladas que se passaram o tema fundamental o terreno cen tral da rivalidade tern sido a Europa e o seu sistema sociopolftico Apesar de toda a enfase atual em temas europeus este proces so envolve mais do que a Europa ainda que na sua forma mais sim plista a constataao do fim da Guerra Fria envolve mais do que o colapso do sistema polftico da Europa do leste e das expectativas geradas pela perestroika 0 1989 europeu foi precedido por outro ano de transiao talvez de igual importancia o 1988 do Terceiro Mundo Neste ano em uma dezena de conflitos na Asia Africa e America Latina os processos de negociaoes encorajados pelos Repensando as relac6es intemacionais 269 l grandes poderes comecaram l fazer efeito no Camboja Afeganis tao Golfo Persico norte da Africa Angola Saara Nicaragua e ou tros A importancia do Terceiro Mundo nesse processo e nas pers pectivas para as relacoes lesteoeste nos anos 90 e 6bvia enquanto a Europa desfruta de paz desde 1945 mais de 140 conflitos antico loniais intraestatais de classe ou etnicos eclodiram no Terceiro Mundo Trieste e Berlim a parte as maiores crises lesteoeste deram se no Terceiro Mundo comecando como Azerbaijao em 1946 pas sando por China Coreia Indochina Suez Congo Cuba ate os con flitos regionais da decada de 1980 0 numero de vftiinas fala por si mesmo Acreditase que mais de 20 milhoes de pessoas morreram nesses conflitos Na Europa o unico enfrentamento violento nos mesmos moldes foi a guerra civil grega na qual cerca de 80 mil pes soas pereceram Os Significados da Guerra Fria Antes de examinar essas mudancas seu Iugar na hist6ria mo dema e a questao do fim da Guerra Fria pode ser esclarecedor colo car duas quest5es anteriores qual o significado do termo Guerra Fria e qual foi a sua dinamica subjacente Apesar de sua proveniencia moderna academica e jornalfstica o termo tern uma curiosa pre hist6ria Criado por Don Juan Manuel urn escritor espanhol dose culo XVI para caracterizar a interminavel rivalidade entre cristaos e arabes na Espanha ele foi reinventado pelo financista e diplomata Bernard Baruch que declarou telo ouvido de urn mendigo sentadd num banco do Central Park em algum momenta do anode 1946 Esta origem casual nao favorece a precisao e o termo Guerra Fria pode ser usado pelo menos em duas acepcoes Uma para referirse aos perfodos de intensa confrontacao entre os dois maiores blocos do p6sguerra e em particular aos anos entre o final da decada de 1940 e o infcio da decada de 1950 a Primeira Guerra Fria e o final da decada de 1970 ate 1988 a Segunda Guerra Fria 0 outro uso do termo Guerra Fria referese a rivalidade essencial entre o co munismo eo capitalismo que comecou em 1917 e que como resul tado da Segunda Guerra converteuse na divisao dominante e cons titutiva dos assuntos mundiais Este segundo uso do termo sugere questoes mais amplas de interpretacao e de analise nas relacoes internacionais De forma geral podese dizer que na literatura sobre a Guerra Fria eo con flito lesteoeste existem quatro explicacoes gerais sabre por que os dois blocos se confrontaram como o fizeram Para uma escola associada ao realismo convencional e ao pensamento estrategico 270 Fred Halliday a rivalidade lesteoeste e apenas outra versao do conflito entre os grandes poderes a ser explicado pelo equilfbrio de poder e por outras consideracoes A ideologia e vista apenas como uma expres sao desta interacao estrategica e diferencas nas composicoes intemas destas sociedades sao analiticamente irrelevantes Uma segunda orientacao comum entre os escritores liberais atribui o conflito aos erros poHticos as oportunidades perdidas e as percepcoes inade quadas de ambos os lados Desse ponto de vista o conflito era evitavel uma melhor comunicacao no perfodo p6s1945 e no fi nal da decada de 1970 poderia ter evitado tanto a Primeira quanto a Segunda Guerra Fria Uma terceira escola argumenta que sob a aparencia de rivalidades internacionais ocultamse fatores inerentes a estas sociedades ou seja fatores poHticos e economicos levam os Estados em questao a competir urn com outro Particularmente muitas analises da Segunda Guerra Fria enfatizam o alcance dos fatores poHticos nos Estados Unidos e na URSS e a dinamica nao controlada da corrida armamentista como causadores da matura cao desse conflito A aparencia de conflito interbloco ou intersis temico mascarou uma homologia que as duas partes usaram e da qual se beneficiaram dentro de seus pr6prios domfnios Esse argu mento em suas variantes e comum entre os escritores de esquer da tanto nos Estados Unidos quanta na URSS como E P Thomp son Mary Kaldor Michael Cox Noam Chomsky e Andre Gunder Frank Para eles a Guerra Fria e em si mesma urn sistema mais do que uma competicao entre dois sistemas Nao se pode negar que cada uma destas tres explicacoes ilu mina o andamento das relacoes lesteoeste havia elementos de ri validade tradicional entre os grandes poderes erros de percepcao e determinantes domesticos 0 argumento da rivalidade intersiste mica foi enfraquecido por sua percepcao como uma mera diferen ca ideol6gica a direita sob a forma da rivalidade anticomunista liberdade versus totalitarismo e no bloco sovietico a dogmatica concepcao dos dois campos Urn dos incentives poderosos para os crfticos da Guerra Fria negarem seu carater intersistemico tern sido o desejo de romper com essas simplificacoes rivais mas ho m6logas Mas o argumento sugerido aqui e de que estas tres expli cacoes por si mesmas nao sao suficientes para explicar o carater a duracao e a profundidade da Guerra Fria 0 que lhe deu forca peculiar para alem das formas convencionais de conflito interna cional foi 0 seu carater intersistemico 0 fato de expressar a riva lidade entre dois sistemas social economica e politicamente dife rentes Cada urn pretendia prevalecer em escala mundial produzir uma ordem intraestatal homogenea e cada urn negava a legitimi dade do outro ainda que fossem compelidos a entrar em negocia Repensando as rela6es intemadonais 271 oes diplomaticas ou outras em grande parte pela ameaa das ar mas nucleares E necessaria mencionar que se no infcio dos anos 1980 esse argumento poderia ser apresentado em nfvel abstrato ou imanente os acontecimentos dos ultimos anos o confirmaram na pratica 0 que se segue e a afirmaao de que 1989 foi 0 anode teste das teorias da Guerra Pria ja nao se trata mais de julgar Em urn sentido amplo o fim da Guerra Pria representou a homogeneidade sistemica e o seu objetivo fora definido pela natureza socioeconomica e polftica dos Estados centrais de cada bloco que buscaram prevalecer urn sobre o outro durante o conflito Urn Triplo Contexto Hist6rico Considerar que a Guerra Pria terminou portanto e uma ideia ambfgua que depende da acepao em que o termo e utilizado Para responder se e em que sentido a Guerra Pria acabou e necessa ria o exame dos tres contextos hist6ricos dentro dos quais ocorre ram as mudanas de 1988 e 1989 0 primeiro mais evidente para os conflitos do Terceiro Mundo e da corrida armamentista com preende a detente do final dos anos 1980 que marca o termino do que vern sendo denominado de Segunda Guerra Pria ou seja o perfodo de intensa rivalidade e hostilidade entre os Estados Uni dos e a URSS que se iniciou por volta de 1979 e que durou ate a ascensao de Gorbachev em 1985 mais precisamente ate a cupula da IsHindia em 1986 0 termo Guerra Pria foi usado nesse contex to por analogi a com a Prime ira Guerra Fria do final dos anos 1940 e infcio dos anos 1950 para denotar urn perfodo sem uma guerra quente e sem uma paz normal mas de confrontaao e alerta proxi mo a urn enfrentamento militar total Ha varios pontos em disputa no que diz respeito a Segunda Guerra Fria Mas ela e razoavelmente comparavel a Primeira Guerra Pria e como esta envolveu a con frontaao nao violenta na Europa e multiples conflitos sangrentos no Terceiro Mundo 0 segundo significado do final de decada de 1980 e de que ele marca o termino do sistema p6sguerra prevalecente na Europa Isso se aplica mais obviamente a divisao da Europa e por extensao da Alemanha 0 Pacto de Vars6via e mesmo a OTAN reduziram consi derave1mente as suas funoes Com razoavel confiana pode ser afirmado que no curso dos anos 1990 as revoltas correntes produzi dio uma nova ordem a oeste da fronteira sovietica A Alemanha sera reunificada provavelmente em questao de meses e sistemas multi partidarios e economias capitalistas irao se desenvolver na Europa 272 Fred Halliday do leste Sejam quais forem as incertezas intemas que esses pafses possam enfrentar as pressoes internacionais diplomaticas finan ceiras irao impulsionalos nessa direao e conduzilos a transiao A transiao sera mais complicada do que nas anomalias da Europa ociderital da decada de 1970 Espanha e Portugal As alteraoes no sistema polftico sao obviamente mais faceis do que na estrutura so cioeconomica e ideol6gica Mas ha poucas duvidas de que essa tran siao possa e va ocorrer A mudana na Europa oriental e acompanhada e em si mesma integra outra alteraao no sistema p6sguerra que compreende o fim do sistema bipolar e em particular do sistema dominado pelas duas superpotencias 0 resultado de 1989 simbolizado na cupula de Malta realizada em meio ao naufragio dos regimes comunistas da Europa do leste e 0 da existencia de uma s6 superpotencia OS Estados Unidos A URSS perdeu sua margem de manobra na Europa com o colapso do Pacto de Vars6via Alem disso encontrase enfraqueci da e preocupada com a crise economica e social e nao mais apta a competir com os Estados Unidos ou com o ocidente nas esferas militar e economica A URSS e agora pouco mais do que uma po tencia continental sem o suporte do sistema de aliimas A ilusao da paridade como denominava Brezhnev nao e mais sustentavel 0 sistema percebido como 0 do p6sguerra e em geral 0 de Yalta estabelecido na cupula da Crimeia em fevereiro de 1945 Poi a partir deste referendal que os que rejeitaram este sistema respon sabilizaram as potencias ocidentais por concordarem com as de mandas sovieticas Na realidade contudo o modelo de uma Euro pa pacificada fora estabelecido dois anos antes e mais a noroeste nas batalhas de Stalingrado e Kursk quando o Exercito Vermelho final mente rompeu a formaao das foras de Hitler Nao houve nenhu ma discussao com Stalingrado Yalta simplesmente reconheceu o equilfbrio de foras entao na Europa Roosevelt e Churchill nao poderiam alterar a situaao mais do que o atual governo britanico poderia garantir o sistema de govemo em Hong Kong p6s1997 Os crfticos de Yalta tendem tambem a ignorar o significado do poder militar sovietico de uma outra perspectiva a derrota de Hitler nao s6 garantiu o controle sovietico da Europa oriental mas tambem possibilitou o restabelecimento de govemos democraticos na Euro pa ocidental Em urn tempo em que todo o passado sovietico e visto com desprezo dentro e fora da URSS e preciso recordar precisa mente o que refletia a aritmetica estrategica de 19441945 as 80 divisoes alemas na frente oriental contra apenas 20 na ocidental para nao mencionar as cifras comparativas de vftirnas dos exercitos sovi eticos e ocidentais Poi a partir desta base hist6rica que ambas as partes da modema Europa foram estabelecidas Sem Stalingrado urn regi Repensando as relacoes intemacionais 273 f me nazista poderia ainda estar no poder nao apenas em Berlim e vars6via mas tambem ern Paris e Amsterda Todas as coisas boas que podern seguirse a 1992 o Mercado Comum Europeu o mun do onirico dos festivais da cansao do Eurovision estao sendo cons truidas sobre as bases deixadas pelo Exercito Vermelho 0 Modelo de Versalhes Nao sao entretanto apenas os sistemas e os conflitos pas1945 que parecem estar em questao Os eventos de 1989 colocaram em questao nao apenas Yalta e Potsdam mas tambern o que fora esta belecido em uma conferencia anterior a de Versalhes Mais do que qualquer coisa a explosao na Europa nos leva de volta ao periodo da Primeira Guerra e em alguns aspectos a epocas anteriores Ha pelo rnenos tres aspectos de Versalhes que estao agora em ques tao 0 primeiro em geral negligenciado hoje em dia e o que diz respeito a realocasao de territarios coloniais Pelo rnenos dois des tes permanecem areas de conflito a Namibia e a Palestina ANa mibia parece agora ter alcansado uma resoluao ao tornarse o 170o Estado soberano no mundo contemporaneo A questao da Palestina permanece em aberto apesar das mudanas nas opini oes tanto dos israelenses quanto dos palestinos 0 segundo aspecto significativo de Versalhes foi o estabelecimento de uma ordem pas imperial na Europa Quatro imperios perderam seus dominios eu ropeus o Otornano o Russo o AustroHungaro e em urn proces so separado mas relacionado aos outros e freqtientemente esque cido nas ilhas o Britanico 0 resultado foi a independencia de di versas novas naoes europeias dentre elas os tres paises balticos a Finlandia a Polonia a Hungria a Tchecoslovaquia a Iugosla via a Albania a Irlanda A Alemanha foi subjugada e em parte desmilitarizada Em meados dos anos 1980 parecia que muito deste sistema permanecia a Alemanha que temporariamente havia que brada suas amarras na decada de 1930 perrnanecia subjugada e OS Estados nacionais que sobreviveram a Segunda Guerra com a excesao dos tres balticos estavam seguros Os acontecimentos do final da decada de 1980 alteraram esse panorama Como em outras ocasioes a Irlanda foi a primeira na ao a desafiar as fronteiras pas1918 com a reemergencia da ques tao de Ulster no final da decada de 1970 0 que Ulster representa numa perspectiva comparada e a falencia do arranjo p6sPrimeira Guerra e o ressurgimento em novas bases de dificuldades econo micas e perspectivas politicas das inimizades que eclodiram naque le periodo Hoje outras questoes alcanaram Ulster no desafio as decisoes de 19181920 e com conseqtiencias que prometem ser 274 Fred Halliday ainda mais violentas Kosovo Bulgaria Caucaso esse ultimo apesar de sua localizasao longinqua ainda faz parte da Europa geografica Quem sabe quanto tempo ha de passar antes que os habitantes de Fermanagh ou do Tyro do leste e centro da Europa sejarri novamente notfcia Macedonia Epiro do Norte Silesia e leste da Ucrania De Fall Roads a Rosenheirn e alem os solenes corn promissos de Helsinki de respeito as fronteiras pas1918 e pas1945 estao cada vez mais debeis Versalhes nao esteve contudo relacionado sornente a realoca sao de colonias e a nova divisao do mapa europeu Como Arno Mayer muito bern demonstrou em The Politics and Diplomacy of Peacemaking Versalhes esteve tambem relacionado com urn ou tro Iegado da Primeira Guerra Mundial a Revoluao Bolchevique Grande parre da estrategia ocidental anticomunista para a URSS desde a primeira intervensao passando pelas doutrinas de Riga ate a contensao pasguerra foi prenunciada nesse primeiro enfrenta mento das potencias imperialistas A colisao entre os dois sistemas mundiais que rnais tarde resultaria no conflito bipolar da decada de 1940 em diante tern suas origens em 1919 Entre as ruinas da guerra para terminar corn todas as guerras 1919 assistiu a constitui ao de dois sistemas politicos internacionais rivais cada qual base ado num misto de idealismo e calculo a Liga das Naoes e a Inter nacional Comunista Ao construir urn sistema politico e social total mente diferente e militante contra o capitalismo ocidental Lenin es tabeleceu os parametros de uma divisao do mundo e de seus confli tos inerentes 0 fato desse modelo nao ter adquirido relevancia mundial antes de 1945 devese a debilidade da URSS ate a Segunda Guerra 0 periodo entreguerras foi ainda dorninado pelo conflito intercapitalista Mas a rivalidade subjacente entre o capitalismo e o socialismo ja existia e perdurou ate os anos 1980 Stalin dissolveu o Comintern em 1943 para apaziguar os lideres ocidentais Mas ele o fez somente quanto possuia urn instrumento rnais eficiente para ampliar a influencia sovietica o Exercito Vermelho As mudanas dos ultimos cinco anos parecem todavia ter en cerrado essa fundamental assimetria entre capitalismo e cornunismo 0 recuo da URSS como potencia mundial foi acornpanhado por urn crescente questionamento de sua organizaao interna e ideologia 0 futuro da URSS e mais incerto do que o da Europa orientaL Con tudo uma fissura maior e provavelmente irreparavel produziuse no sistema economico e politico vigente na URSS desde a decada de 1920 Em politica internacional Gorbachev abandonou o com promisso de competir e oporse ao capitalismo ocidental renunci ando a luta de classes em nome de valores humanos universais Os sovieticos hoje negam qualquer conflito entre os dois sistemas ou a Repensando as relac6es intemacionais 2 7 5 validade de qualquer conceito tradicional de imperialism Nao ha mais como lamenta Fidel Castro urn campo scialita 0 espetro de sistema comunista intemacional que sobrevtveu a dtsputa smo sovietica da decada de 1960 nao mais se sustenta A politica sovie tica no Terceiro Mundo sem descartar compromissos previos tor nouse cada vez mais conciliat6ria ao ocidente As autoridades so vieticas agora dizem aos aliados do Terceiro Mundo que o termo so lidariedade foi substitufdo por interesses recfprocos Mas as mudan9as intemas sao ainda mais importantes nao s6 por que anun ciam uma inexoravel aproxima9ao sovietica das praticas e dos va lores ocidentais e em termos ocidentais tambem por que inserem mais completamente a sociedade e a economia sovieticas dentro da ocidental Em suma o novo caminho trilhado por Gorbachev por mais incerto que seja o seu futuro representa uma ruptura com o legado da Revolu9ao Bolchevique intema e extemamente Signifi ca nada menos do que a reorganiza9ao da URSS em parametres capitalistas tanto socioeconomicos quanto polfticos Dentro do es pa9o de uma gera9ao pouco restou do impacto de 1917 fora uma difusa nostalgia popular por distribui9ao igualitaria e urn papel in temacional residual 0 PCUS ainda que permane9a o partido go vemante assemelhase mais ao PRI mexicano do que a seu mode lo anterior A Luta de Classes em Escala Internacional Agorae possfvel retornar a questao Cffi a qual come9amos ou seja sea Guerra Fria terminou ou nao E evidente que isso de pende de qual significado de Guerra Fria se esta usando No primei ro sentido e plausfvel afirmar que a Guerra Fria acabou Desde rrieados da decada de 1980 as rela96es entre a URSS eo ocidente melhoraram a tal ponto e em uma variedade tao ampla de temas que e diffcil prever urn regresso ao clima de 1950 ou de 1983 Poderia haver uma mudan9a consideravel de polfticas se Gorbachev fosse deposto por urn grupo nacionalista pr6Brezhnev ou se urn Dankwor th Quayle por alguma desventura pessoal ou eleitoral viesse a ocu par o Salao Oval Poderia tambem eclodir uma crise muito mais perigosa por nao poder ser antecipada envolvendo urn tema regio nal uma repeti9ao de Suez em 1956 ou Cuba em 1962 Mas o grau de relacionamento diplomatico ou de outras ordens e confian9a entre os dois lados e tal que mesmo se uma crise desse tipo ocorresse talvez nos Balcas ou no Ira as chances de conten9ao seriam altas E a pos sibilidade de minar a detente atual desencadeando uma Terceira Guerra Fria seria remota 276 Fred Halliday Quando examinamos o segundo significado da Guerra Fria a situa9ao e bastante diferente Ha uma tenta9ao difusa em reconhe cer que a Guerra Fria esta acabando mas que esse e urn processo simetrico convergente Os dois blocos enfrentaram dificuldades na Segunda Guerra Fria e foram incapazes de prevalecer como deseja vam os Estados Unidos procurando sobrepujar a URSS na corrida armamentista incorreram no maior deficit or9amentario da hist6ria tornandose a maior na9ao devedora do mundo e perdendo conti nuamente competitividade para os japoneses e alemaes Ha os que sugerem no ocidente e na URSS que tendo diminufdo as diferen yas entre o capitalismo e o comunismo as mudan9as internas no bloco sovietico que acompanharam a detente sao urn processo evo lutivo 0 capitalismo mudou e continuara mudando Mas seria ilu s6rio considerar que ambos os sistemas foram igualmente debilita dos ou que as mudan9as em curso foram simetricas 0 final da Guerra Fria na primeira acep9ao e o clima prevalecente de detente na Eu ropa e no Terceiro Mundo foi alcan9ado nao pela convergencia dos dois sistemas ou de uma tregua negociada entre eles mas pelo co lapso de urn lado perante o outro lsso significa nada menos do que a derrota do projeto comunista tal como foi conhecido no seculo XX e o triunfo do capitalismo 0 caso e tao evidente que parece uma valida9ao retrospectiva da interpreta9ao intersistemica da Guerra Fria A liga9ao entre a mudan9a intemacional e o relaxamento de tens6es com o colapso interne do comunismo e a expansao de rela96es ca pitalistas no antigo bloco do leste ilustram justamente como a dina mica da realidade interestatal relacionase com as diferen9as inter nas e sistemicas Mais ainda a dire9ao dos recentes acontecimentos deveria sublinhar para os que duvidaram que existiu nos pafses co munistas urn sistema baseado em criterios sociais e economicos di ferentes Se tudo tivesse sido capitalismo ou estivesse sujeito ao mercado capitalista intemacional nao teria havido necessidade de urn conflito lesteoeste e da reorganiza9ao radical das sociedades p6s comunistas Este processo nao esta de forma alguma conclufdo Ainda nao sabemos como sera o mapa p6seleitoral do leste Mas poucos ere em que os partidos comunistas existentes permanecerao no poder ou sobreviverao como uma das principais for9as politicas Uma marginaliza9ao eleitoral com 5 a 10 dos votos pareceria o mais provavel A situa9ao da URSS ainda esta evoluindo mas o espanto so e nao s6 a sua inabilidade em manter seu sistema de alian9as intemacionais o outro campo socialista mas tambem a falta de qualquer futuro plausfvel para o socialismo sovietico Que o desen lace dure 5 ou 50 anos que ocorra na base da uniao com a sus tenta9ao da URSS ou com a separa9ao das republicas constituintes Repensando as rela6es intemacionais 277 f que seja pacifica ou sangrento tudo isso nao podemo saber Ms nao seria imprudente temer 0 pwr A reahdade e que 0 SIStema SOV1 6tito perdeu sua autoconfian9a qualquer sensa de dire9aoe os fun damentos hist6ricos e eticos de seu papel internacional A URSS esta engajada num saudavel por muito tempo adiado e publico exame de seu passado e dos problemas atuais da sociedade sovietica Mas isto nao e tudo A presente polftica sovietica tambem se caracteriza por uma abjeta negaao das conquistas passadas mesmo na Segun da Guerra Mundial por urn exagero ingenuo das virtudes do capita lismo ocidental pela capitulaao a todo o tipo de ideologias retr6 gradas de carater nacionalista familiar e religioso e pelo abandono de compromissos internacionais que foram urn dos aspectos mais luminosos da Era Brezhnev Gorbachev esta com muita habilidade e convicao conduzindo o barco para urn porto cuja localiza9ao nao conhece Esta fazendo o melhor que pode para proporcionar aRe volu9ao Bolchevique uma aterrissagem suave As alternativas o dgido retrocesso de Ligachev e a insfpida demagogia de Yeltsin sao menos do que uma resposta No Terceiro Mundo muitos Estados que na decada de 1970 eram considerados socialistas ou pelo menos de orientaao so cialista estao agora imitando a URSS em economia e politica Gor bachev forneceulhes uma contradit6ria prescriao seguir seu pr6 prio caminho em direao ao socialismo e ao mesmo tempo apren der com o significado internacional da perestroika Hoje a sua con di9ao pode ser descrita como de Estados de desorientaao socialis ta Num calculo recente apenas cinco pafses no mundo ainda pro fessam na vida polftica urn modelo ortodoxo Cuba Albania Viet na Coreia do Norte e China Todos OS cincos e clara distinguem se pelo fato de terem abrigado movimentos revolucionarios nativos com bases sociais e carater nacionalista devendo pouco ao Exerci to Vermelho Os quatro menores estao cada vez mais na defensiva incapazes de tamar iniciativa frente a crescente pressao externa Cuba Albania e Coreia do Norte estao em paralisia polftica de tipo per verso 0 Vietna esta se ajustando e com uma soluao no Camboja poderia acertarse 0 ultimo dos cinco a China suscita os maiores problemas especialmente depois da Pra9a da Paz Celestial E facil culpar pelo massacre os velhos dirigentes que logo morrerao A or ganiza9ao fuzilamento e a repressao p6smassacre foram promovi dos pelos novos quadros que se apegaram a manuten9ao do siste ma Mas sera duro para a China resistir a pressao internacional a Iongo prazo especialmente quando seu modelo parece cada vez mais inadequado pelos desenvolvimentos na URSS No que diz respeito aos partidos do Terceiro Mundo comprometidos com o comunismo ortodoxo que ainda nao estao no poder eles estao condenados a 278 Fred Halliday fracassar ou ajustarse 0 Novo Exercito do Povo das Filipinas o Sendero Luminoso esse ultimo adorando as virtudes imaginarias de urn Mao dos primeiros anos e uma idealizaao de Enver Hoxha parecem estar fadados ao fracasso Ja o Partido Comunista Sul Afri cano e talvez a Frente de Libertaao Tigre parecem ter optado pelo ajustamento Na india a maior democracia burguesa do mundo o Partido Comunista indio Maofsta PCIM inicialmente baluarte da linha independente revolucionaria selou seu desaparecimento ce lebrando o massacre em Pequim 0 fracasso do modelo comunista em constituir urn bloco inter nacioilal distinto e viavel e o reverso hist6rico do processo que se iniciou em 1917 nao parece estar em duvida A Guerra Fria em sentido amplo COIJtinua mas com o colapso de urn de seus dois protagonistas Nesse sentido a aparente generosidade com que se proclama no ocidente o fim do antagonismo entre os dois oculta uma atitude triunfalista Para falar na linguagem do velho pensamento o que agora estamos presenciando e uma luta de classes em escala internacional na qual as for9as superiores do capitalismo ocidental abriram sociedades parcialmente fechadas a sua influencia por qua troou mais decadas Basta observar o rapido decisivo e met6dico estrangulamento da Republica Democratica Alema pela serpente do capitalismo da Alemanha Ocidental para perceber como funciona esse processo ou as compras de fabricas hungaras e polonesas que o empresariado ocidental realizou a preos irris6rios As Complexidades da Estagnaao 0 reconhecimento desse fato nao facilita muito entretanto as respostas a outras questoes o que produziu essa virada na Guerra Fria e em particular par que aconteceu nesse momenta A resposta convencional e de que o sistema comunista faliu que a sua econo mia perdeu qualquer dinamica que perdeu seu apelo polftico par nao ser democratico que nao poderia igualarse ao ocidente nas areas de competiao intemacional Ha alga de verdadeiro nisso Mas e preciso situar esta falencia em urn contexto Em primeiro Iugar ha numa perspectiva hist6rica pouca correlaao entre o apelo polftico do comunismo e o seu carater democratico 0 perfodo de maior re pressao na URSS nao foi a decada de 1980 e sima decada de 1930 Foi quando Stalin assassinou milhoes diretamente ou par negligen cia 0 sucesso militar e industrial do sistema sovietico foi tambem alcanado nesse momenta pela mobilizaao e apoio do povo sovie tico E foi tambem nesse momenta que o comunismo sovietico go zou de maior prestfgio no ocidente Isso tambem e valido para o Repensando as rela6es intemadonais 279 Terceiro Mundo como provam as revolu6es na China e no Vietna nos anos 1940 Mesmo na decada de 1970 quando a estagnaao haviase instalado na URSS o modelo sovietico gozou de amplo apoio nos recemindependentes Estados revoluciomlrios africanos A ironia hist6rica e que o comunismo perdeu seu apelo justamente no momenta em que demonstrou urn novo potencial politico uma habilidade para a mudan9a que fora posta em duvida pelos te6ricos do totalitarismo e por muitos outros na URSS Na esfera economica surgiu urn problema similar E conven cional agora afirmar que as economias de tipo sovietico sao urn fra casso e os escritores sovieticos absorveram isso com termos como estagnaao zastoi e desaceleraao zamedlenie empregados para a Era Brezhnev para cobrir uma gama de temas interrelacio nados taxas de crescimento decrescente inferioridade tecnol6gica paralisia industrial deterioraao social desastre ecol6gico De to das as formas essa caracterizaao e exagerada o fato e que no pe riodo p6sguerra em seu conjunto as taxas de crescimento na URSS e a provisao de uma gama de serviOS sociais incluindo moradia saude e educaaO melhoraram substancialmente Em termos glo bais os nfveis de vida na URSS duplicaram entre o fim da Segunda Guerra e meados da decada de 1970 Considerando o nfvel de vida da maior parte da populaao mundial a populaao sovietica vi ve comparativamente bern tern habitaao calado vestmirio transpor te saude lazer em nfveis maiores do que OS da maioria da popula ao latinaamericana sem mencionar a Asia e Africa As popula96es do leste europeu viviam ainda melhor em parte e claro pelo subsf dio sistematico de suas economias pela URSS Em nfvel intemacional a situaaO e tambem ambivalente Eva lido recordar que quando a Segunda Guerra Fria comeOU no final dos anos 1970 havia uma opiniao generalizada no ocidente de que ela era resultado de urn novo poder sovietico no mundo manifesta do sobretudo num fortalecido poder estrategicomilitar e numa posiao refor9ada no Terceiro Mundo Os mfsseis sovieticos os es trategicos SS19 e os de alcance intermediario SS20 fizeram a ba lana pender para o lado de Moscou No Terceiro Mundo a onda de revoluoes da segunda metade da decada de 1970 marcou o fim da pax americana e uma nova presen9a sovietica intemacional 0 Afe ganistao foi visto como o apogeu desse novo poder sovietico 0 fato de muitas autoridades sovieticas incluindo Brezhnev acreditarem nessa for9a conferialhe credibilidade adicional A America estava fraca 0 ocidente encontravase no mesmo caminho Ravia muita discussao a direita e A esquerda sobre o fim da hegemonia norte amricana Uma mudan9a parcial na posiao relativa dos Estadps Un1dos em algumas esferas foi convertida em uma perda absoluta 280 Fred Halliday de poder tanto em relaao a outros competidores capitalistas como o Japao quanto em relaao a URSS Muito disso era nonsense urn exagero deliberado do poder so vietico e uma representaaO distorcida dos desenvolvimentos do Terceiro Mundo e no campo nuclear Isto serviu tanto para difundir 0 alarmismo quanto para a esquerda obscurecer a continuidade da dominaaO americana e a direita para justificar a ofensiva ociden tal contra a URSS De qualquer forma a imagem de uma fora in temacional sovietica crescente na decada de 1970 nao era totalmente mftica ou imaginaria Correspondia a avanOS reais nas capacida des sovieticas Numa perspectiva hist6rica nao foi Khrushchev Lenin ou mesmo Stalin que causaram as maiores dificuldades ao ocidente fora da Europa o mais maligno foi Brezhnev Foram as armas e o apoio sovietico que permitiram o triunfo dos vietnamits e que muito facilitaram as vit6rias em Moambique Angola e via Cuba na Nicaragua Mesmo no final da decada de 1980 as conse qtiencias desses compromissos intemacionais eram visfveis apesar das tentativas dos govemos ocidentais de reivindicar 0 credito pelo acontecido a dramatica virada na Africa do Sul em 1990 muito deve ao apoio militar de Iongo prazo dado aos govemos nacionalistas contra Lisboa e Pretoria durante a decada de 1960 e infcio de 1970 E de Brezhnev mais do que de qualquer outra figura fora da Africa do Sul o credito pela ruptura com o bloco racista A Crise Terminal A questao que surge portanto e por que foi na decada de 1980 quando o sistema sovietico estava em uma posiaO aparentemee sustentavel que a crise eclodiu Esse e urn tema que afeta as anah ses da Segunda Guerra Fria produzidas ha uma decada uma vez que era muito raro perceber o quao vulneravel a posiao da URSS tor narase Em retrospecto e essa na minha visao a maior falha de minha propria analise em The making of the Second Cold War A hip6tese era de que mesmo se as afirma6es ocidentais de urn novo e agressivo poderio sovietico fossem infundadas o sistema sovieti co como urn todo era suficientemente vhivel para continuar a repro duzirse tanto na URSS quanto em outros pafses do bloco Em par te esse julgamento era acertado 0 sistema sovietico nao fliu em termos absolutos nao houve revolta popular sua econom1a pro porcionava uma oferta de bens adequada embora restrita Os niveis de desigualdade economica e de crime eram menores do que os dos pafses desenvolvidos Seu registro hist6rico era razoavel Estava mostrando consideravel habilidade de adaptaaO polftica Sua for9a Repensando as rela6es intemadonais 281 intemacional era maior do que nunca Mesmo assim o fato e que no final da decada de 1980 a URSS parece afetada por uma crise terminal incapaz de desafiar o capitalismo intemacionalmente ou de reproduzirse intemamente Como em qualquer processo desse tipo e ainda mais com a fa lencia de Estados depois de uma longa guerra e possivel voltarse para o que parecem ter sido anos de estagnaao e prognosticar a origem do colapso Ha duas razoes 6bvias para o colapso A primei ra a marxista classica facilmente esquecida nos tempos atuais foi de que no infcio da decada de 1980 o ocidente lanou uma ofensiva para debilitar e paralisar a URSS No campo nuclear os Estados Unidos buscaram explicitamente a superioridade sobre a URSS 0 ocidente investiu em novos programas eufemisticamente descritos como modemizaao e Reagan pressionou propondo e ameaan do como desenvolvimento de urn sistema estrategico defensivo que encerraria a politica de dissuasao ate entao em vigor No Terceiro Mundo a intervenao norteamericana em diversos nfveis encer rou a onda de revoluoes depois do Zimbabwe em 1980 nao hou ve mais revoltas seja em funao de repressao direta como em El Salvador ou atraves da dispetisao dos processos revolucionarios com candidatos reformistas como no caso nas Filipinas Haiti e Coreia do Sui Ao mesmo tempo a doutrina Reagan foi desenvolvida para justificar as pressoes sobre os Estados revolucionarios do Terceiro Mundo havia venda de armas para guerrilhas opositoras a regimes pr6sovieticos em quatro Estados Camboja Afeganistao Angola e Nicaragua Washington desenvolveu a politica de promover a era sao do poder sovietico nas margens referindose aos aliados so cialistas do Terceiro Mundo Centenas de milhares de pessoas mor reram e milh6es foram deslocadas de seus lares como resultado des sas guerras contrarevolucionarias dos anos 1980 0 resultado das elei6es de 1990 na Nicaragua foi acima de tudo urn resultado desse tipo de pressao representou a exaustao do povo depois de 30000 mortes nas maos dos contras Essa contrarevoluliao diferiu claque las do Chile Guatemala e Indonesia nao s6 porque foi pacifica mas porque os massacres ocorreram antes e nao depois da derrota do regime revolucionario 0 segundo argumento encontrado tanto em analises sovieti cas quanta ocidentais enfatiza o processo intemo a entropia Isso quer dizer que de alguma forma o modelo se esgotou na decada de 1980 exaurido depois de quatro a oito decadas de dinamismo Os sinais mais evidentes disto foram o estrangulamento economi co que parecia haver debilitado a URSS e outros paises do COME CON e os problemas sociais e ecol6gicos concomitantes As fon tes de crescimento previamente disponfveis foram consumidas o 282 Fred Halliday excedente de populalioes rurais as formas iniciais de industriali zaao os emprestimos ocidentais e a aplicaao seletiva de tecno logia Concomitantemente com essa estagnaao economica os problemas ecol6gicos produzidos por decadas de pilhagem in ten siva da natureza manifestaramse da poluiao dos rios no sudeste da Republica Democratica Alema ate a inexoravel contraao do Mar de Aral Problemas sociais tambem emergiram depois de de cadas de negligencia taxas de natalidade decrescente expectati va de vida declinante criminalidade crescente Acima de tudo houve urn esgotamento de credito politico historicamente 0 mo vimento comunista extraiu seu fmpeto de eventos especificos a Revoluao Bolchevique e a derrota do fascismo Sucessos poste riores a lideranlja inicial na exploraao espacial depois de 1957 a expansao dos ideais comunistas e socialistas no Terceiro Mundo pareciam confirmar a marcha para adiante A partir da decada de 1960 contudo essa perspectiva de avano hist6rico foi freada A construao do Muro de Berlim em 1961 o esmagamento da Tche coslovaquia em 1968 marcaram o fim do otimismo Foram necessarias talvez duas decadas ou mais para que ficas se evidente nao apenas que o sistema comunista perdera a sua di namica mas e esse e o ponto crucial que ele nao iria recuperala A ultima grande expressao do otimismo comunista deuse com Khrushchev com suas perspectivas triunfalistas de coexistencia pacifica proclamadas no 22o Congresso do Partido em 1961 Tres decadas depois aquela visao parece vazia baseada no exagero do potencial da sociedade sovietica e na crena infundada no determi nismo hist6rico A transia9 nao s6 fracassou como foi incapaz de reter o territ6rio conquistado Um Fracasso lnternacional Somente esses fatores impHcitos no termo estagnaao de Gorbachev nao explicam adequadamente o colapso do comunis mo no final da decada de 1980 Estagnaao e urn termo simplis ta que implica urn grau de homogeneidade dos Estados comunis tas que nao e aceitavel 0 grau de estagnaao nao era tao grande ou tao abrangente para ter gerado esse resultado De fato com base em criterios internos era muito plausfvel imaginar que o sistema sovietico na URSS e no bloco poderia ter continuado por anos e decadas liberalizando ate urn certo grau mas mantendo as carac teristicas essenciais da ortodoxia domestica e internacional Em outras palavras fatores end6genos nao podem explicar o colapso final 0 que foi determinante e coloca a estagnaao num outro Repensando as rela6es intemadonais 283 patamar foi o contexto global e em particular o desenvolvimen to relativo do comunismo em comparaao como seu competidor o capitalismo avanado Isso acima de tudo determinou os even tos do final dos anos 1980 Em termos te6ricos os partidos comunistas operaram com duas hip6teses que provaram ser falhas uma foi a inevitavel crise e o declf nio secular do capitalismo a outra foi a habilidade dos pafses co munistas em constituir uma alternativa rival e autosuficiente inde pendente do mundo capitalista Foi nestas bases que muitos comu nistas que reconheciam a aparente superioridade do capitalismo no p6sguerra mantinham seu otimismo original na crena de que o sucesso capitalista era uma miragem urn resultado da manipulaao que certamente existe ou urn boom temporario em processo de esgotamento Se o campo socialista pudesse sustentarse por tempo suficiente eles argumentavam o mundo capitalista entraria em cri se uma nova dinamica socialista eclodiria e o cenario inicial atra sado e distorcido desempenharia seu papeL Com efeito o perfodo p6sguerra refutou ambas as hip6teses e assim expos a falha central do marxismo E lugarcomum afir mar que o grande erro do marxismo foi subestimar o nacionalismo E uma consideraao duvidosa ja que o liberalismo tambem o fez e depreciciu o justificado ceticismo sobre o nacionalismo que corre junto com a tradiao socialista 0 menosprezo de Marx pelas ilusoes nacionalistas e a deniincia de Lenin das contendas nacionalistas parecem bern mais oportunos hoje 0 grande erro do marxismo e do pensamento socialista nao foi o de subestimar o nacionalisnio nem de superestimar o socialismo e seu potencial mas o de subes timar o capitalismo tanto em termos de seu potencial para a expan sao continua como em termos de sua carencia de uma teleologia catastrofista Nas palavras muito apropriadas de Bill Warren capi talismo tardio tarde para que Em termos de desempenho econo mico os pafses capitalistas avancados gozaram urn perfodo de cres cimento sem paralelo no p6sguerra e as quedas foram curtas e rela tivamente superficiais Embora as desigualdades de renda continu assem e crescessem a maioria da populaao nesses pafses teve seu padrao de vida elevado 0 sucesso economico combinouse com o sucesso polftico a extensao do sufragio universal nos pafses capita Iistas avanados a aceitaao da grande maioria da populaaO da legitimidade da democracia capitalista e o desaparecimento em urn perfodo muito curto do controle colonial formal sobre a Asia a Africa eo Caribe Enquanto o capitalismo visivelmente falhava na contenao da miseria de parte da populaao do Terceiro Mundo especialmente da Africa e do subcontinente asiatico a expansao da democracia para a maior parte do Terceiro Mundoconstruiu outra 284 Fred Halliday dimensao de sua fora Alem das limitaoes dos regimes revolucio narios do Terceiro Mundo a capacidade evidente da econcimia e da polftica capitalistas reduziu o apelo do socialismo mesmo naquelas regioes que no p6sguerra haviam gozado de maior exito 0 vfnculo entre o politico e o economico foi consolidado por uma mudana no carater da hegemonia capitalista como nos meca nismos pelos quais o domfnio do capital foi mantido e produzido e em particular nos valores e instituioes que incorporavam a legiti midade do sistema A medida que velhas barreiras sociais e identi dades pulverizavamse urn papel crescente foi assumido por formas de atividades associadas com as comunicaoes e cultura de consu ino o poder da TV da miisica pop e da moda sempre foram depen dentes de outras formas de poder mas mesmo assim adquiriram grande peso relativo nas sociedades ocidentais em conjunto Essa foi uma combinaao economicopolftica na qual a massa das neces sidades do diaadia satisfaziase pelo sistema e na qual prevlecia urn grau de liberdade de escolha que era de todo modo exagerado e manipulado A imagem do socialismo alcanando e ultrapassan do o capitalismo estava duplamente equivocada Em primeiro Iu gar ele nao foi capaz de alcanalo mesmo nos mais estreitos e tra dicionais parametros quantitativos como a produao industrial e de alimentos Alem disso os termos da competiao os criterios pelos quais seria julgado pelas populaoes governadas por partidos comu nistas estavam mudando Esse sucesso do capitalismo foi portanto de urn tipo ao qual a sociedade comunista estava especialmente vulneravel Ela nao pode competir economicamente em termos de produto e mudana tec nol6gica Pode competir menos ainda nos novos domfnios do con sumismo e da cultura popular A maior preocupacao dos lfderes so vieticos foi com a area mais vital de competicao a competicao mi litar Igualarse ao ocidente na quantidade deixando de lado a qua lidade tecnica foi cada vez mais diffcil 0 comunismo nao pode competir politicamente uma vez que seu sucesso revolucionario inicial falhou no desenvolvimento de sistemas funcionais e alterna tives de democracia A ditadura da politburocracia para usar a expressao de Bahro prevaleceu sobre o sistema Pode competir menos ainda nos novos campos pioneiros do capitalismo avanca do a cultura de consumo por urn lado a terceira revoluao indus trial e a expansao da tecnologia de informaao por outro As socie dades comunistas tampouco puderam constituir urn bloco interna cional alternative e esse foi o ponto crucial Em termos de atividade economica o bloco sovietico nunca constituiu urn bloco comercial dinamico capaz de rivalizar como ocidente Ele sempre ocupou urn espao defensivo subalterno na economia internacional Acossado Repensando as relacoes intemacionais 285 estava condenado a copiar no campo tecnol6gico 0 bloco sovieti co era muito fraco e seus mecanismos internos muito rigidos para pennitir tal desenvolvimento Ao mesmo tempo os pafses do bloco nao podiam isolarse do mundo capitalista No campo mais 6bvio de todos o das comunica oes tornouse cada vez mais possfvel para os povos dos pafses socialistas ver e ouvir o que estava acontecendo no mundo 0 im pacto da TV da Alemanha Ocidental na maior parte da Republica Democnitica Alema e na Tchecoslovaquia ou da TV da FinHindia na Estonia sao exemplos disso A musica pop tornouse urn meio direto de alcanar os jovens do mundo comunista Com altos nfveis de educaao e crescentes oportunidades de viajar a comparaao entre o padrao de vida e as condioes polfticas nos pafses comunistas e nos pafses capitalistas avanados tornouse mais evidente Poi essa diferena comparativa muito mais que absoluta que proporcionou as bases para o colapso do final da decada de 1980 Nao apenas fomentou o descontentamento com urn sistema falido mas tambem destruiu a crena de que em algum sentido secular mais amplo o comunismo poderia igualarse se nao ultrapassar o ocidente 0 resultado intemacional da crise nao foi contudo somente o produto da falencia do bloco sovietico em competir a propria crise teve dimensoes internacionais chaves Em primeiro Iugar a derro cada dos partidos comunistas govemantes na Europa oriental mes mo com todo o movimento des de baixo nao teria sido possfvel sem a mudana na politica sovietica proposta no final de 1988 de acordo com a qual a URSS nao interviria para manter esses regimes no poder Os velhos politburos nao poderiam continuar goveman do no velho estilo a mudana na polftica realizada por Gorbachev foi a condiao indispensavel para as mudanas que iriam ocorrer Em segundo Iugar como em outras situaoes revolucionarias o efei to demonstrativo de casos bemsucedidos foi de grande imporHin cia com cada pafs levando o processo mais adiante Primeiro ali beralizaao hungara pelo alto depois a eleiao do govemo do Soli dariedade na Polonia depois a lenta comparativamente erosao da Republica Democratica Alema atraves da emigraao em massa no verao e as posteriores manifestaoes mais tarde o rapido Ievante na Tchecoslovaquia e finalmente a subita e sangrenta mudana na Romenia A dimensao intemacional foi mais ainda significativa numa terceira e distinta maneira no estfmulo que as revoltas rece beram do bloco capitalista A maioria das revoluoes do p6sguerra foram contra o ocidente e pagaram o preo de desafiar o bloco he gemonico As revoltas de 1989 foram contra os govemos dos parti dos comunistas e foram facilitadas no seu andamento e posterior estabilizaao pelo apoio e boasvindas diplomaticas militares e fi 286 Fred Halliday nanceiras que receberam ou que as populaoes pensaram que iriam receber do ocidente Alternativas Reais e Imagimirias Esse fracasso comparativo do experimento comunista teve muitas conseqiiencias A primeira foi que a altemativa convencio nal a ortodoxia brezhnevista denominada de socialismo com face humana no sentido utilizado por Dubeck em 1968 nao e e nunca foi plausfvel 0 que o socialismo com face humana pretendia era a manutenao do partido comunista no poder mas seguindo politi cas mais humanas e democraticas A crena na democracia com controle partidario e uma constante nas polfticas comunistas liberais de Khrushchev a Primavera de Praga na decada de 1960 a altema tiva de Bahro na decada de 1970 as formulaoes iniciais da pres troika depois de 1985 Em urn mundo onde existe a atraao altema tiva do sistema capitalista com seu sistema multipartidario e com a possibilidade do partido comunista ser expulso do poder pelo voto essa opao e insustentavel Todas as consideraoes sabre economia mista e similares no ocidente obscurecem o fato de que a alteman cia polftica ocorre num sistema socioeconomico relativamente imu tavel e possfvel variar uma vez a cada quatro ou cinco anos nao e possfvel alterar urn sistema socioeconomico da mesma forma 0 par tido comunista com face humana ou nao humana teve de insistir em govemar sozinho ou permitir sua remoao do poder para sem pre Isso implica que os argumentos de que o sistema poderia ter sido salvo na decada de 1960 sao de validade duvidosa Bntretanto mesmo que Khrushchev tivesse prosseguido e sido mais consisten te mesmo que Brezhnev nao tivesse invadido a Tchecoslovaquia o istema ainda estaria sujeito as pressoes do exterior que teriam im pedido uma trajet6ria comunista estavel e reformada A segunda conseqiiencia diz respeito ao comunismo fora do bloco sovietico e em particular na Europa do leste Ha muito tem po os partidarios do comunismo liberal ou reformista proclamam que a imposiao de uma ditadura polftica em nome do socialismo no leste teria impedido o desenvolvimento do comunismo no oci dente Uma abertura politica no leste afirmavase facilitaria a ex pansao do Eurocomunismo e de outras correntes 0 registro hist6ri co contradiz isso como ja foi afirmado os partidos comunistas es tiveram no auge de sua influencia no ocidente na epoca de Stalin e sofreram esvaziamento desde entao pari passu as liberaliza5es de Khrushchev e Gorbachev De qualquer forma a crise final da orto doxia comunista no leste europeu em 1989 parece ter reeditado a Repensando as rela6es intemacionais 287 crise dos partidos comunistas na Europa ocidental As razoes para esse paradoxa nao sao diffceis de compreender Nao e tanto pelo fato do comunismo no ocidente estar baseado na admiraao oculta ou aberta pelas ditaduras beligerantes no leste urn frisson provocado pela identificaao autoritaria embora poucos possam negar que isso desempenhou urn papel mas sim pela permanencia da crena numa altemativa viavel e historicamente progressista Foi a destruiao dessa crena na decada de 1980 que minou a credibilidade do comunis mo no ocidente A outra razao para o aparente paradoxa dos parti dos comunistas e mais diffcil de especificar esta relacionado ao fato de que a precondiao essencial para qualquer socialismo viavel no pcidente eo seu grau de combatividade contra o sistema que desa fia o capitalismo Qualquer que fossem seus outros defeitos os partidos comunistas tradicionais possufam essa qualidade 0 mais marcante nos partidos comunistas da Europa Ocidental hoje nao e a sua postura crftica com relaao ao passado sovietico mas a falta de qualquer tipo de hostilidade radical em relaao ao capitalismo Nova Era Velhos Problemas Esse ponto de inflexao na hist6ria moderna derivado das con seqtiencias da Primeira e da Segunda Guerra Mundiais tern sido recebido com regozijo tanto no leste quanto no oeste 0 fim da Guerra Fria o inicio de urn nova era de harmonia intemacional e mesmo em urn sentido neohegeliano o fim da hist6ria esta sendo prometi do 0 1ninimo que pode ser dito e que se vamos retomar ao mundo pre1914 existem alguns perigos 6bvios Este mundo foi aquele do conflito intercapitalista nao barrado pela existencia de urn rival so cialismo que originou decadas de pilhagem colonial e a Grande Guerra Ele introduziu o que alguns denominaram de guerra civil europeia de 19141945 mas que foi como muitos vietnamitas e chineses assinalaram mais do que isso As ansiedades manifestadas em torno do poder alemao e japones dificilmente pressagiam urn seculo XXI tranqtiilo Em termos mais imediatos ha urn outro desa fio a paz internacional menos evitavel ainda denominado de con flito etnico e comunal 0 colapso do poder sovietico foi acompa nhado pela explosao do nacionalismo e dos conflitos etnicos na Europa do leste e na URSS Simultaneamente a maior parte do Ter ceiro Mundo p6scolonial tambem esta mergulhada na mesma vio lencia etnica que nao mostra sinais de esgotamento De fato se uma das marcas registradas dos fim dos anos 1980 foi o final da Guerra Fria a outra e o ressurgimento do sentimento nacionalista tanto no mundo desenvolvido quanta no mundo em desenvolvimento os 288 Fred Halliday excessos chauvinistas em eventos esportivos na Inglaterra ate ore nascimento da arrogancia de grande potencia nos Estados Unis Japao e Alemanha converteramse em lugares comuns da pohttca do mundo desenvolvido Tambem causa apreensao em outros con textos a indulgencia descabida pela intolerancia religiosa que se dis fara de antiracismo em alguns setores da intllgntsia liberl e a busca das tradioes nacionais por parte de parttdanos do movtmen to comunista internacional Subjacente a esses conflitos e tendencias poHticas reJousa o as pecto mais importante de todos aquele pelo qual o movtmento co munista foi fundado para combater e esta agora amelado pelo fim da Guerra Fria e pela extinao do bloco comunista E a questo as possibilidades poHticas e em particular o grau em que o capttahs mo avanado agora em ascensao esta aberto a crfticas em nome de uma alternativa desejavel e plausivel A cdtica ao capitalismo foi o ponto de partida do marxismo e socialismo e e o ponto ao qual uito apropriadamente essa tradiao pode regressar E surpreendente que em meio ao triunfo do capitalismo consumista e do colapso do co munismo a possibilidade de desvios esta sendo agora submersa em nome de uma nova conformidade internacional polftica e cultural todos aspiram e supostamente endossam uma utopia transnacional composta e definida pelos estilos de vida da Calif6rnia do Reno Westfalia e de Surrey Que essa nova utopia contem profundas es truturas de desigualdade definidas segundo classe sexo e regioes e evidente mas isso se encontra reprirnido na maior parte dos ds cursos publicos A determinaao com a qual essa utopia e anuncta da e defendida desde o relata de sucessos ate a apresentaao de estatfsticas s6 sugere que e uma construao artificial e vulneravel Sua prevalencia significa de todas as maneiras que as alternativas estao excluidas e desprestigiadas Nesse retrocesso precipitado desde o comunismo ortodoxo muito do que era positivo e necessaria foi abandonado urn com promisso com a justia social a insistencia na exclusao da religiao da vida publica a promoao pelo Estado da igualdade do homem e da mulher o intemacionalismo e a solidariedade para citar somente quatro elementos A necessidade de intervir para planejar e dirigir a atividade economica e agora quase que universalmente rejeitada num momenta em que a destrutividade c6srnica da produao e mais evidente do quenunca Nos paises comunistas o que esta ocorren do nessas frentes nao e urn avano mas urn retrocesso de propor oes de uma epoca E possivel percorrer as colunas do em outros aspectos refrescante Notfcias de Moscou sem encontrar menao e algo digno de merito na tradiao bolchevique No mundo capttahs ta avanado tern desaparecido a credibilidade social e poHtica de Repensando as relacoes intemacionais 289 promover mudanas A classe trabalhadora encontrase marginali zada e fragmentada tendose reduzido seus poderes organizacionais e legais Os novos movimentos sociais foras que identificaram e denunciaram diversas formas de opressao mas cuja coerencia e potencial foram superestimadas dispersaramse Novas for as so dais da direita radical tanto polftica quanto religiosa sao marcan tes na maioria desses Estados Igualmente ha uma escassez de idei as sobre como a sociedade contemporanea deveria e poderia ser organizada em bases sociais e polfticas diferentes Nao surge uma critica clara e plausfvel ao capitalismo nem da parte dos partidos sociaisdemocratas ocidentais nero da parte do leste reformado 0 triunfo da simplificaao ideol6gica e urn desenvolvimento curiosa e perverso No final das contas foi o capitalismo que nos trouxe o massacre das populaoes indfgenas de tres continentes no seculo XIX duas guerras mundiais nesse seculo 0 capitalismo fran camente fracassou em difundir a sua riqueza para reduzir a lacuna entre os ricos e os pobres em escala mundial e ainda conduz seus neg6cios num mercado baseado no frenesi adolescente que agora chega o tempo todo ate n6s na forma das notfcias financeiras 0 movimento comunista constituiu uma tentativa de desafio a esse sis tema para construir uma alternativa mais desejavel e viavel que substituiria a anarquia e a perversidade do capitalismo por uma for ma mais humana de gestao das atividades economicas Por sete de cadas o comunismo representou esse desafio mas ao final parece ter se esgotado A forma que emetgiu nao e aos olhos das popula oes do leste e do oeste nem mais desejavel nem mais viavel do que a do capitalismo avanado A implacavel fuga de jovens da Republica Democratica Alema para o ocidente rechaando a opres sao identificada ao socialismo contem uma liao hist6rica transcen dental Mesmo na area dos maiores exitos a competiao militar o comunismo s6 foi capaz de competir parcial e intermitentemente Talvez seja prematuro fazer a partir do materialismo hist6rico urn balano acerca do que representou o experimento comunista Poi urn desafio parcial e impaciente ao sistema dominante de nossa epo ca cujo desenvolvimento e desapariao s6 confirmam a tese inicial de Marx de que urn desafio ao capitalismo para ter exito devia ir romper e consolidarse em nivel global Em nome de urn potencial economico e polftico exagerado e de uma teleologia erronea as sociedades comunistas apresentavamse como uma forma social superior e historicamente mais adiantada do que as capitalistas Cer tamente elas foram naocapitalistas mas certamente tambem nao foram p6scapitalistas Em muitos aspectos estas sociedades pare dam formas imaturas de capitalismo com a sua confiana no poder militar e repressivo seu insucesso em gerar mudana tecnol6gica e 290 Fred Halliday l I I a sua falta de mecanismos funcionais de integraao economica in temacional Depois de decadas de sucesso parcial ela hoje parece haer sucmbido a urn modo de produao e a urn sistema polftico mutto mats forte e que nao parece estar fadado a nenhuma crise ou esgotmento predeterminado E necessaria e devese aproveitar a oportunidade para uma reavaliaao e para o realinhamento nao s6 do marxismo e dos movimentos socialistas mas tambem das tradioes revolucionari as e radicais da sociedade ocidental em sua totalidade Sendo urn estudioso entusiasta das revoltas da Alemanha e urn crente na de terminaao dos fatores socioeconomicos Marx nao se surpreenderia frente aos fatos dos ultimos meses Depois de seu Iongo e doloroso desvio hist6rico a tradiao comunista pode hoje retomar a seu ponto de origem a critica e o desafio a economia polftica capitalista A 9uestao e se existe uma altemativa ao modelo capitalista predomi nante e nesse caso que instituioes sociais podem ser mobiliza das democraticamente para criala e mantela A maior parte das reelaboraoes do marxismo classico tomou a forma de construao ou restabelecimento de vfnculos com formas contemporaneas de resistencia ate agora separadas da tradiao marxista a socialde mocracia marginalizada em 1914 e as correntes pos1945 entre outras o feminismo a ecologia eo antiracismo De igual impor tancia entretanto e o reconhecimento de quao relevantes as cor rentes premarxistas radicais podem ser especialmente em face dos ressurgimentos dos desafios daquela epoca 0 clericalismo 0 naci onalismo o irracionalismo E preciso recuperar tanto os esqueci dos primos do seculo XX quanto os ancestrais Aufgehobene do seclo XVIII Se o fim da Guerra Fria iluminar essa questao e li bertar o socialismo das respostas falsas e deterministas e das leal clades condenadas ao fracasso ele tera preparado uma importante agenda para o seculo XXI A tarefa de reflexao te6rica e polftica sobre os acontecimentos dos finais dos anos 1980 recemcome ou e e provis6ria A unica coisa que nao pode ser subestimada e o desafio que esses acontecimentos sugerem Traduzido de HALLIDAY Fred The ends of Cold War fu BLACKBURN Robin ed After the Fall the failure of comunism and the future of socia lism LondonNew York Verso 1991 p 7899 por Cfntia Vieira Souto Repensando as relaoes intemacionais 2 91 FUNDAMENTALISMO E 0 MUNDO coNTEMPOAANEO DESAFIOS POLITICOS E ETICOS 0 fundamentalismo e uma das questoes mais controversas na atual discussao das relaoes entre o Oriente Medio e a Europa Nes te texto espero jogar alguma luz explicativa e comparativa sobre esta questao e sugerir algumas respostas possfveis Esta discussao do fundamentalismo pretende examinar criticamente e de uma pers pectiva secular democratica e racional urn fenomeno poHtico cen tral de nossos tempos e nao confinado aos pafses isHimicos o fun damentalismo requer compreensao mas tambem coloca desafios a paz e a liberdade de muitas sociedades 0 proprio termo fundamen talismo originouse como uma resposta a ciencia e a razao em particular ao trabalho de Darwin Se a reaao deveuse especialmente a descoberta da origem e da evoluao das especies ela respondeu mais genericamente a reivindicaao da ciencia naturale do pnsa mento critico de reinterpretar e na verdade de desafiar as escnturas sagradas esta batalha que explodiu nos anos 1920 dentro dos EUA e que resultou no termo fundamentalismo e em sua doutrina associ ada do criacionismo ainda esta conosco Este conflito permanece tanto em sua forma particular visavis as origens da raa humana mas tambem visavis as quest5es intelectuais mais amplas em jogo 0 fundamentalismo islamico nao menos do que os outros desafia a ciencia e a razao Abordoa questao do que e definido como fundamentalismo em forma comparativa Quero oferecer algumas consideraoes so bre porque e como este fenomeno e tao importante no mundo roo demo e tambem destacar a sua contemporaneidade em dois outros aspectos urn e discutir que apesar de toda a sua invocaao de tradi ao e de seus chamados para o retorno a algum passado os funda mentalismos sao respostas ao mundo contemporaneo e sao em gran de medida estruturados em termos de ideias e preocupaoes con temporaneas segundo quero examinar alguns aspectos de como o inundo contemporaneo que habitamos a Europa Ocidental pode e precisa responder a este fenomeno e algumas das escolhas polfticas e morais levantadas pelo fundamentalismo se passamos com atra so a reconhecer a necessidade e o direito a uma poHtica da dife rena este direito a diferena deve se aplicar tanto dentro como entre as culturas as religioes e as comunidades etnicas 292 Fred Halliday Mesmo que vivamos fora de sociedades que sao governadas ou significativamente afetadas por movimentos fundamentalistas a sua ascensao portanto coloca diffceis questoes para a polftica externa e a avaliaao etica Na verdade uma das coisas que eu gos taria de sugerir aqui e que se nossas respostas polfticas foram incer tas as morais o foram ainda mais 0 fundamentalismo promete ter urn impacto central sobre o mundo nos anos a frente e certamente nao ini embora ou se apaziguani Poderiamos fazer pior do que co mear agora a nos engajar em uma discussao mais extensa deste fenomenoe reconhecer ate que ponto nao estamos preparados para ele Os fundamentalistas tern uma visao bastante clara e determina da do que sao Esta na hora para aqueles de n6s que nao somos fundamentalistas de produzir uma resposta que seja igualmente clara e determinada Em meio a todos os outros este e urn fenomeno que nao deve ser subestimado A Ascensao do Fundamentalismo Programa e Explicaao Quando falamos de fundamentalismo no mundo contempo raneo referimonos a uma variedade de movimentos em diferen tes pafses que compartilham certas caracterfsticas comuns e que sao em particular caracterizados por uma combinaao de dois ele mentos sem relaao necessaria urn com o outro mas que sao no caso dos fundamentalismos eventualmente relacionados Urn e a invocaao de urn retorno aos textos sagrados lidos de uma manei ra literal o outro e o chamado para a aplicaao destas doutrinas na vida social e poHtica Estes dois elementos estao presentes no fun damentalismo eo distinguem de outros dois movimentos de poH tica autoritaria e de casos nos quais movimentos naofundamenta listas ou naoliterarios buscam aplicar as doutrinas religiosas a poHtica como na influencia do catolicismo sobre o nacionalismo polones e irlandes ou da Igreja Radical na America Latina Esta definiao inacabada tern aplicaoes amplas o suficiente podemos pensar primeiro no movimento islamico no Ira que chegou ao poder em 1979 e que tern governado opals desde entao Mas tam bern podemos pensar nos movimentos fundamentalistas em outros pafses muulmanos no Egito e na Argelia em particular que similarmente buscam estabelecer o que eles definem como urn Estado islamico Eles nao fazem referenda a si mesmos como fun damentalistas embora a traduao do arabe do termo usuliyya seja usada ao lado de outros termos na linguagem polftica de hoje respectivamente mujiihidun e defensores do jihad por seus alia des e mutatarrifon e extremistas por seus opositores No caso dos Repensando as relac6es intemadonais 293 movirnentos isHimicos a Frana integriste sugerindo uma reivin dicayao para legislar por toda a atividade social e o termo ingles isHirnico indicando a aplicaao do isla a polftica sao no mfnimo igualrnente apropriados Apear de tda a enfse sore o mundo islamico o termo fundamentahsmo apltcase mmto ma1s amplamen te Ele engloba a tendencia ja mencionada na cristandade das fac oes protestantes evangelicas que emergiram nos 1920 e pediarn urn retorno a uma leitura literal da Bfulia Como qualquer outro termo fundamentalismo pode ser parci almente entendido examinandose o seu oposto neste caso a mo dernidade crista com referenda a leitura dos textos sagrados Na terceira das grandes religioes monotefstas o judafsmo tambem exis tem tendencias que sao convencionalmente categorizadas como fun damentalistas Tais tendencias envolvem em algum grau uma com binayao similar mas nao identica de lealdade as escrituras e urn prograrna sociopolftico ja presentes no isla e no cristianismo Isto e mais evidente entre os partidos da direita religiosa em Israel os ha redim e tambem entre os mais novos militantes religiosos especial mente Gush Emumin e outros por varios caminhos eles buscam estender a autoridade da lei judaica dentro de Israel e estabelecer urn Estado baseado nos textos legais apropriados neste caso o Halakha Apesar do fundamentalismo ser em sua origem urn produto das re ligioes monotefstas no mfrtimo porque elas tern a ideia mais clara do escrio sagrado para o qual retornar ele nao e peculiar a elas Nas ultirnas duas decadas emergiu na india urn forte fundamentalismo hindu que busca estabelecer Hindutva urn Estado hindu e Ramra ja urn Estado baseado nos ensinamentos do deus Ram o objetivo declarado e reviver o Estado sagrado de Bharat que por seculos tern sido aviltado pelos inimigos dos muejulmanosBharat judeus sikhs e bern no ultimo lugar OS britanicos Nem 0 budismo tern sido imu ne a tal fenomenos como mostrou a polftica de Sri Lanka Como com qualquer termo polftico comunismo fascismo po pulisrno nacionalismo nao estamos lidando com urn objeto uni co estes rnovimentos nao se assemelham em todos os aspectos Na verdade alem das diferenas teol6gicas pelas quais eles se definem existern outras fundamentais de contexto conteudo e objetivo 0 cristianismo por exemplo tern menos a dizer sobre os problemas de higiene e dieta pessoal o que os antrop6logos chamam ortopra xia do que tern o judafsmo o islamismo ou o hindufsmo 0 alcance da lei sagrada tambem e bastante diferente o Torah e o Sharia ten do rnais a dizer sobre Lei Canonica 0 cristianismo e o isla tern se culos de poder polftico e de conquista imperial para invocar enquanto o judafsmo nunca gozou de tais sucessos temporais Em alguns con textos e 0 clero que desempenha urn papel de liderana isto se 294 Fred Halliday aplica ao judafsmo ao protestantismo e ao islamismo xiita iraniano enquanto em outros e rnuitas vezes uma liderana espiritul na verdade uma lideranya polftica invocando a religiao qe subm ao poder como nos movimentos isHimicos do Norte da Afnca e ns hindus Desnecessario dizer os protagonistas de todos estes movi mentos teriam fortes objeej6es a quaisquer compara6es entre os seus pr6prios retornos a valores verdadeiros supostamente unicos e 0 fanatismo dos demais Neste sentido a questao da comparaao depende em alguma medida das questoes sendo perguntadas assim ja que estamos olhan do para estes movimentos como movimentos sociais e polfticos no mundo contemporaneo e valido destacar algumas de suas caracte rfsticas compartilhadas Aqui mencionaria quatro Em primeiro Iu gar todos estes movimentos buscam derivar sua autoridade de urn chamado para o retorno aos textos sagrados para escntos uposta mente derivados de Deus Este e em seu senttdo literal o s1gp1fica do do termo fundamentalismo Para os cristaos judeus e muulma nos estes textos sao claros o bastante a Bfblia o Torah e Talmud o Corao Hadith e fiqh ou textos legais Para os hindus a quem falta tal texto e urn deus monotefsta o trabalho tern sido mais diffcil mas agora comea a estar disponfvel o hindufsmo esta passando por uma reforma concebida para tornalo mais como as religioes monotefs tas com urn deus unico Ram cuja identidade sexual ate aqui an dr6gina foi masculinizada urn conjunto de textos sagrados a len das de Ram a adoraeja6 em congregaao e uma parte essenc1al do conceito monotefsta de uma religiao adequada a subjugaao das mu lheres 0 argumento de todos estes movimentos e que estes textos fornecem em si mesmos a base para definir uma vida apropriada e 0 que e mais pertinente nas presentes circunstancias pra definir a forma como a sociedade eo Estado devein ser orgamzados Nao obstante que ocorre na pratica e uma leitura por autoridades on temporaneas e para usos contemporaneos destes textos Da1 os debates interminaveis sobre interpretaao o que no Isla e chamado de tafsir como se a erudiao renovada e a autoridade pudessem de qualquer forma nos dizer o que estes textos verdadeira ou auten ticamente prescrevem sobre a posiao das mulheres ou a forma correta de governo ou o que comer ou heber quando o mundo chegara a urn fim ou quando comeou A segunda caracterfstica relacionada desta volta aos funda mentais e a reivindicaejao de que dentro deles pode ser identificada a constitui9ao de urn Estado perfeito no mundo contemporaneo Os fundamentalistas muulmanos fazem muito uso do shari a a des peito do fato de que sharia no sentido estrito das prescri96es 1 gais contidas no Corao representa somente algo em torno de 80 h Repensando as rela6es intemacionais 295 nhas e cobre alguns poucos topicos de legislasao potencial o pro prio termo literalmente a mane ira certa e mencionado poucas vezes A invocasao dos musulmanos do previa govemo IsHimico do Profeta e igualmente forsada mesmo supondo que urn sistema de govemo que se desenvolveu para as cidades arabes do seculo seti mo fosse apropriado para hoje e preciso perguntar quao valido ele era dado que tres dos quatro sucessores iniciais de Muhammad tive ram mortes inconstitucionais e violentas A invocasao judaica do passado bfblico e urn pouco mais substancial OS reinos de Saul Da vid e Salomao duraram no todo alga em tomo de 80 anos antes de dar Iugar as guerras entre Israel e a Judeia Dificilmente esta e a autoridade historica para reivindicar urn territorio pela etemidade ou uma base suficiente sabre a qual legitimar urn Estado restabelecido mais de dais mil anos depois A terceira caracteristica comum e que apesar de toda a sua apa rente prolixidade sabre outros assuntos eles aspiram a uma coisa acima de todas o poder politico e social No caso do judafsmo nao esta clara ate que ponto os haredim aspiram controlar o Estado dire tamente mas atraves de sua participasao na arena politica atraves do usa do sistema de representasao proporcional dos partidos e de outras atividades eles buscam estender o controle do poder dos ra binos par quase toda a sociedade assim como Gush Emumum bus ca marcar a sua posisao em algumas questoeschaves especialmente a terra No caso das outras tres cristianismo islamismo hinduis mo esta reivindicasao politica e muito mais clara eles nao sao movimentos de conversao nem movimentos de inovasao teologi ca mas sim movimentos que objetivam ganhar poder atraves das eleisoes da forsa ou da insurreisao e estabelecer Estados apropria dos Fundamentalismo e neste sentido urn meio de obter e uma vez obtido de manter o poder politico com certeza e par esta razao que ele preocupa a todos nos Isto me leva a dimensao final compartilhada por estes movi mentos qual seja a sua intolerancia e em uma medida considera vel o seu carater antidemocratico Embora eles digam falar em nome do povo e que perseguem seus objetivos atraves de meios democra ticos eles sao grupos politicos par ideologia e por organizasao autoritarios e potencialmente ditatoriais Eles rejeitam as premissas da politica democratica incluindo a tolerancia e os direitos indivi duais e reivindicam uma autoridade que nao e derivada daquela dos povos e derivada da vontade de Deus herdada das escrituras e in terpretada pelos lideres autoindicados exclusivamente homens sejam eles do clero ou nao Todos incluem como uma importante parte de sua ideologia a hostilidade para os que nao sao de sua fe e quase mais importante para os de sua fe que nao compartilham sua 296 Fred Halliday orientasao particular Todos sao felizes em condenar o resto de nos como descrentes e similares a dar horrfvel e sem fim Dada a maneira pela qual a identidade religiosa se entrelasou com a etnici dade no seculo XX OS movimentos fundamentalistas tambem pas saram a incluir visoes racistas dentro do todo de suas ideologias contra os judeus da parte de musulmanos e cristaos contra os ara bes da parte dos judeus contra os musulmanos da parte dos hin dus e assim par diante N a sociedade que eles imaginam normalmente existe urn Iu gar para aqueles que nao aceitam suas visoes mas este e na melhor das hipoteses urn status ambfguo e subordinado e a imposisao das praticas sociais defendidas par estes fundamentalistas e considera da legftima sabre todos os que vivem naquela sociedade Ao lado das afirmasoes sabre a tolerancia existe freqlientemente em sua Ii teratura a agressao e o desprezo para com aqueles que sao diferen tes seja o 6dio dos cristaos fundamentalistas par seus cidadaos seculares contemporaneos a critica dos islamicos contra a corrup sao do ocidente as conspirasoes dos judeus a jahiliyya ou a ig norancia do mundo contemporaneo 0 acido derramado pelos fun damentalistas hindus sabre os musulmanos na India como traido res imigrantes ilegais perpetradores de uma violasao historica do Bharat e assim por diante ou a hostilidade dos fundamentalistas judeus para os assimiladores os judeus seculares os cristaos os arabes e semelhantes Todos estes movimentos fazemmuito barulho sabre a agres si vi dade e as conspirasoes de seus inimigos e como eles proprios sao vitimas Mas freqlientemente existe uma forte dose de proje sao em tudo isso No momenta o mundo ocidental cristao e pos cdstao esta dizendo muito sabre quao agressivo o IsHi e e como ele ameasa o ocidente mas o estudo mais elementar da historia do mundo ao Iongo dos ultimos tres seculos sugeriria que a bota pelo contrario esta no outro pe permanecendo assim em muitas partes do mundo Na Bosnia foram OS antimusulmanos OS servios orto doxos e os catolicos croatas que mais fizeram para envenenar as relasoes intercomunais Mas os islamicos tern sua propria parcela de culpa A retorica islamica sabre os judeus e freqlientemente racista Recentemente os musulmanos tern praticado sabre a ques tao da blasfemia mas talvez todos os preocupados com esta ques tao deveriam estudar o Corao mais cuidadosamente ele nos diz que Cristo nao foi o filho de Deus que nao foi crucificado e que nao se levantou dos mortos todas proposisoes que se constituiriam em blasfemias no mundo cristao convencional Na India os chau vinistas hindus extravasando sabre o que os musulmanos fizeram com a India cunharam sua propria retorica intolerante Muslma Repensando as rela6es internacionais 297 nan ke dohi shtan pakistan aur kabristan para os muulmanos s6 existem dois lugares o Paquistao ou o tumulo Este chamado para os muulmanos serem expulsos para o PaquisHio se enquadra muito facilmente com a demanda de que o Paquistao seja abolido e reincorporado a India Tambem existe algo estranhamente nao nativo no argumento hindu de que os muulmanos sao bastante livres para Viver em seu Estado desde que eles aceitem a cultura a religiao hindu o caniter de Bharat e o seu sistema politico Todos acusam o outro de fanatismo e extremismo quando nao de terro rismo no presente e no passado todos os fundamentalismos men cionados podem ser urn born exemplo disso ExplicaoesAlternativas Escritura e Contingente Se agora pudermos nos voltar a questao da explicaao exis tem em termos amplos duas abordagens possiveis as que eu defi niria de escritura e contingente Por escritura refirome as abor dagens que olham para os fundamentalismos principalmente em termos de sua relaao com os textos sagrados e com os argumentos religiosos que seguem da interpretaao e da organizaao de urn movimento religioso Esta abordagem pode ser encontrada dentro da teologia mas tambem emerge nos debates de ciencias sociais sobre o significado e a influencia determinante das crenas religio sas no comportamento social e politico Max Weber por exemplo tinha muito a dizer sobre isto Assim examinar estes movimentos em termos do impacto digamos da jurisprudencia ou de uma visao de mundo islamica ou de uma etica protestante ou tradiao judaica ou hindu seria adotar esta abordagem 0 fundamentalismo deve portanto ser visto como urn retorno urn renascimento de algo que ja estava Iii Tal retorno e explicado pelo interesse renovado nos tex tos sagrados freqlientemente provocado pelo medo da corrupao ou da inovaao dentro de uma dada comunidade religiosa De mui tas maneiras esta abordagem fundamentalista da escritura equipa rase a abordagem tradicionalista ou perrnanente do nacionalismo as ideias a doutrina e o passado determinam o presente Desneces sario dizer esta e explicaao dos pr6prios fundamentalistas todos eles reivindicam estar retornando a uma interpretaao verdadeira e ao passado que sempre foi em urn sentido quase que arqueol6gi co o la esperando para ser redescoberto Dai tambem segue que o fundamentalismo nao e especffico ao mundo contemporaneo alem dos periodos e doutrinas originais e autoritarias invocadas pelos fun damentalistas existiram muitos movimentos atraves da hist6ria das principais religioes nos quais aconteceram o retorno as escrituras e 298 Fred Halliday as doutrinas o wahhabismo no isla e o metodismo no cristianismo para mencionar pelo menos dois A abordagem alternativa que classifiquei de contingente enfatiza a modernidade e a contingencia destes movimentos Pri meiro ela chama a atenao para as suas causas contemporaneas que embora variem de pais a pais e de religiao a religiao sao ca racterfsticas do mundo moderno Assim a ascensao dos fundamen talismos em muitos paises do Terceiro Mundo originase como uma reaao aos fracassos do Estado modernizador secular percebido como corrupto e incapaz de resolver os problemas economicos e sociais e que freqlientemente e ditatorial Isto vale tanto para o Xa do Ira como para a FLN na Argelia ou para o Partido do Congres so na india Igualmente estes movimentos sao respostas a ques toes muito reais que confrontam estes paises a urbanizaao em massa o desemprego e a percepao da continuidade da domina ao estrangeira Muitos surgem em paises que experimentaram ou continuam a experimentar a dominaao externa alem disso eles podem incluir elementos de nacionalismo e antiimperialismo no Terceiro Mundo Eles oferecem urna soluao simples aparentemen te clara para os problemas do mundo modemo Tambem emergem em urn contexto pr6prio de modernidade o EstadoNaao o apa rato modemizado do Estado as reivindicaoes sociais e legais do Estado sobre os seus cidadaos Em alguns casos o fundamentalis mo e associado a grupos sociais que estao em decadencia em outros as novas massas urbanas ou como no caso do Afeganistao depois de 1978 as populaoes rurais ameaadas reagindo as cres centes imposioes do Estado centralizado No caso de Israel o fun damentalismo para todos os que questionaram a possibilidade de urn Estado judeu antes da chegada do Messias envolve uma cam panha para determinar certas politicas deste Estado e para moldar o carater de sua nova populaao composta de imigrantes Esta modemidade e bastante evidente na linguagem e na ideo logia dos fundamentalistas A despeito de toda a invocaao do pas sado e dos simbolos tradicionais a linguagem e as politicas dos fun damentalismos podem ser vistas como urna forma de ideologia con temporanea que ecleticamente faz uso de temas tradicionais ou clas sicos para prop6sitos contemporaneos e de emprestimos das ideo logias seculares moderhas dai minha designaao desta abordagem como contingente As funoes gerais das ideologias politicas sao bern conhecidas estabelecer uma identidade quem n6s o povo ou a comunidade somos e igualmente importante quem nao e 0 oferecimento de uma hist6ria legitimadora incluindo atos her6icos traioes e opressoes uma moralidade de luta e freqlientemente de sacriflcio urn programa para mobilizar e assumir poder e como Repensando as rela6es intemacionais 299 estagio final fomecer urn modele de como contruir uma ov P ciedade dentro da qual sao colocados urn conJunto de pnnc1p1os concebidos para legitimar a negasao do poder aos que deseJam de safiar a nova ordem Por volta do seculo passado vimos muitos casas disso o liberalismo o fascismo e o comunismo em suas varias formas mas talvez a abordagem mais apropriada como aponta ram varies escritores dentre eles Sami Zubeida e Ervand Abrahami an seja a do populismo 0 populismo 6 uma ideologia transclasse abrangente destacan do a virtude do povo e a corrupsao financeira e moral dos opres sores Igualmente central ao populismo 6 uma forma de nacionalis mo e de hostilidade aos estrangeiros definida de varias formas e uma simpatia por teorias da conspirasao A sociedade secular modema e niio somente a sua ideologia constitutiva o liberalismo sao objetos de escamio particular Tudo isto e mais 6 encontrado nas ideologias do fundamentalismo Tais ideologias sao particularen te em suas variantes isHimica e hindu programas para a mobihza sao de apoio politico para a conquista e a manutensao do poder polftico No caso do judaismo e do cristianismo a enfase 6 menos sabre a dominasao extema e mais sabre a necessidade de lutar con tra os elementos perigosos corruptos e seculares dentro de suas pr6 prias sociedades Nao obstante estas duas tendencias tambem tern urn elemento nacionalista muito forte os movimentos cristaos e ju deus estao entre os mais patri6ticos e intransigentes e os que de monstrando virtuosidade religiosa estiveram entre os mais fortes defensores do uso da forsa e da destruisao de seus inimigos Nao 6 atoa que ao contemplar a guerra nuclear tantos escritores ameri canos durante a Guerra Fria fizeram uso da ideia religiosamente san cionada do Armageddon Nenhuma ideia moderna ou contexte 6 mais influente que a da nasao e dci nacionalismo em muitos casas uma identificasao apa rentemente religiosa representa uma etica uma mobilizasao de reli giosidade de ideia adorasao vestimenta e identidade em urn con texte de conflito nacional lsto se aplica tanto aos musulmanos da Palestina e da Bosnia como aos hindus na India Mesmo assim 6 o nacional que define e mobiliza a religiao e nao viceversa Na ver dade no caso indiana o que temos vista claramente a partir de 1920 com a fundasao da RSS 6 a elaborasao de urn programa baseado nas ideias europeias de status nacional para a criasao da nasao hin du e de uma rasa e cultura arianas derivadas do sanscrito que resga tarao Bharat das corrupsoes dos seculos Isto me leva a questao da interpretasao e do uso da escritura Talvez haja maior divergencia entre as abordagens escritura e con tiilgente na analise de como estes movimentos usam os textos Para 300 Fred Halliday a primeira o fundamentalismo constitui urn retorno aos textos para a ultima significa usar os textos e moldar a interpretasao para servir a necessidades contemporaneas Mesmo o mais devote con cederia que os textos sagrados contem muitas ambigtiidades e pos sibilidades para interpretasao altemativa o que os mais seculares dentre n6s chamariam de contradisoes A maior parte dos grandes trabalhos do pensamento e da literatura humana as possuem En tre os cristaos dar a outra face olho por olho dente por den te e assim por diante 0 Corao ordena que nao deva existir com pulsao na religiao Iii ikriihii fi aldin mas tambem deixa clara em termos bern punitivos o que acontecera aos descrentes 0 judais mo 6 ambivalente nas atitudes com o gentio 0 hinduismo contem muito que pode ser usado para ordenar uma naoviolencia etica e tolerancia como Gandhi percebeu tambem tern uma mitologia e linguagem repleta com a guerra e a sede de sangue como os mili tantes de hoje sao rapidos em nos dizer 0 que a interpretasao ideol6gica sugeriria 6 que a terminolo gia as injunsoes o proprio conteudo destes textos sao urn recurso que os movimentos populistas conscientemente ou nao usam para prop6sitos contemporaneos Nao existe nest sentido nem urn ver dadeiro isla ou cristianismo ou judaismo E possivel no Isla justi ficar por exemplo qualquer forma de sociedade nao s o capita lismo ou socialismo mas o feudalismo e a escravidao E possivel citar partes do Corao que favorecem a igualdade de homens e mu lheres tambem 6 possivel citar varias passagens que favprecem a supremacia masculina Muita energia tern sido gasta dentro do ju daismo com a interpretasao do termo Zion seja ele urn Estado mental ou de espirito ou se urn Iugar uma parte de ou o todo de Jerusalem ou do EstadoNasao com fronteiras particulares 0 impor tante e que nas circunstancias modemas sao OS desejos contempo raneos que determinam 0 uso dos textos e nao alguma interpretasao imanente da verdade por esta razao Zion veio a significar para os judeus alga que nao 6 de forma alguma especifico a eles o Estado Nasao com urn territ6rio clara populasao e lfngua lgualmente podese analisar os textos religiosos e ver como palavras de proce dencia aparentemente antiga sao usadas para prop6sitos contempo raneos Elas nao significam o que significaram no uso dos homens de mil ou 2 mil anos atras mas sim o que os ide61ogos de hoje que rem que elas signifiquem Deveria estar evislente que entre estas duas formas de inter pretasao a escritura e a contingente eu prefiro a ultima Elas nao sao necessariamente exclusivas mesmo o mais ardente defensor da escola contingencial deveria conceder que parte da energia e cara ter destes movimentos deriva de seu carater teo16gico A energia eo Repensando as rela6es intemacionais 301 dinheiro investidos na educaao religiosa em madras yeshivas classes de bfblia e encontros no templo sao evidencia suficiente Nao obstante nem as causas nem o conteudo quanto menos os programas e as conseqiiencias dos fundamentalismos podem ser adequadamente explicadas por isto Estamos olhando para movimen tos poHticos bern organizados modernos determinados para os quais 0 todo poderoso e uma legitimaao adequada e possivelmen te adorada com bastante sinceridade 0 Caso Iraniano Neste ponto gostaria de abandonar a discussao comparativa geral dos fundamentalismos para examinar em maiores detalhes o caso do Ira o mais proeminente de movimento fundamentalista e o pafs no qual este movimento radical esta no poder desde 1979 Es tive no Ira antes e depois da revoluao e entrevistei muitos de seus lfderes Fiquei parado nas ruas de Teedi e vi dezenas de milhares de pessoas marchando gritando Marg bar liberalizm Marte ao Libe ralistno Nao foi uma visao feliz Nao ha necessidade de repetir longamente a originalidade des ta revoluao comparada a outras na tradiao que comeou na Fran a em 1789 Nao somente ela foi feita por uma liderana do clero que clamou por urn retorno a urn modelo de governo derivado do seculo setimo mas em outros aspectos tambem parecia rejeitar as suposioes de todas as outras revoluoes p6s1789 rejeitava o de senvolvimento material Khomeini uma vez disse que a economia era uma preocupaao de ignorantes negou a soberania do povo esta vinha de Ala e rejeitou qualquer legitimaao em termos de antecedentes corruptos decadentes jiihil ou ignorantes somente o Profeta e seus sucessores imediatos importavam e tudo que havia acontecido antes deveria ser renunciado com algumas pequenas exceoes Nao poderia haver exemplo mais dramatico da que bra aparente entre o fundamentalismo e a modernidade Entretanto em urn exame pr6ximo nao e bern assim As cau sas da revoluao iraniana incluem varios fatores mais ou menos se culares e na verdade materiais que levaram a queda do regime do Xa o crescimento de uma situaao explosiva nas cidades com mi graao em massa corrupao desmedida e inflaao o fracasso do regime em permitir formas legftimas de descontentamento politico e a anterior supressao das foras de massa seculares a nacionalista e a comunista que dominaram a cena polftica do Ira na decada de pois da Segunda Guerra Mundial o sucesso de Khomeini em lide rar e organizar urn movimento polftico de massa sustentado em urn 302 Fred Halliday conjunto de objetivos simples amplamente apoiados a derrubada do Xa e o encerramento da influencia ocidental particularmente da americana no pafs Mesmo com toda a aparencia de que o Ira so freu uma volta ao passado e de que sua revoluao era tradicional em alguns aspectos ela foi moderna na verdade a mais moderna re voluao social vista em qualquer pafs Ela ocorreu nao entre os cam poneses mas entre as classes urbanas pobres e medias e atingiu os seus objetivos nao atraves da violencia principalmente mas por meios polfticos o protesto de massa da oposiao e uma greve polf tica geral Paradoxalmente a Revoluao Iraniana foi ambas a mais tradicional e a mais moderna das revoluoes sociais Isto e evidente tambem nas pr6prias ideias na ideologia polfti ca que Khomeini defendia A visao religiosa de Khomeini nao era baseada somente em uma leitura literal do Corao mas em certas ten dencias deritro do xifsmo iraniano por urn lado irfiin ou misticis mo que trazia urn certo desprezo pelo imediato e o material e por outro a interpretaao do xifsmo historicamente a seita dds que se opoem ao governo para significar nao tanto a abstenao do mundo e da polftica mas urn engajamento contestador com eles Isto inclufa algo que a maioria dos te6logos rejeitara previamente a ideia de que pudesse haver urn governo isHimico sobre a terra mesmo antes do retorno do 12 Imam A teoria de Khomeini do hokumati islami ou governo islamico repousava sobre o que era na pratica uma solu ao inovadora do problema de como o muulmano sincero podia afetar a polftica na ausencia do Imam a teoria da viceregencia da autoridade legal ou jurisconsulto velayati faqih Nesta teoria o interprete legal em primeira instancia Khomeini era autorizado a exercer a autoridade religiosa e a estabelecer urn governo islamico com uma autoridade vinda de Deus Puramente teol6gica na aparencia esta soluao devia certa mente ser entendida nao somente como uma revelaao mas como algo que servia a uma preocupaao muito mais imediata e materi al como adquirir e manter o poder politico ela justificava a to mada do Estado iraniano pelo clero e a depreciaao ou a negaao de outras formas de autoridade Se observamos a hist6ria subse qiiente da revoluao iraniana nao como uma de retorno as escritu ras mas de urn ponto de vista poHticopragmatico com a ideolo gia sendo usada para justificar o objetivo mundano e universal de manter o poder estatal muitas coisas ficam claras Os mulas con quistaram e mantiveram o controle atraves de mecanismos pree xistentes a mobilizaao para a guerra o uso arbitrario do bem estar a repressao de oponentes internos a demagogia sobre as ameaas e as conspiraoes externas Aoes dramaticas como o seqiiestro do pessoal diplomatico americano em 1979 ou a conde Repensando as rela6es intemacionais 303 nacao de Salman Rushdie em 1989 nao devem ser vistas como aberracoes ou irracionalidades mas como atos calculados de urn regime dirigido para maximizar apoio A logica poHtica da ques tao Rushdie pode ser mais evidente se colocada no contexto da historia de tais condenacoes vale lembrar que talvez os mais im portantes julgamentos da historia ocidental foram todos por acu sacoes de blasfemia Socrates Jesus Cristo Galileu e Spinoza Este conjunto de preocupacoes material e modemo tambem esta presente na propria ideologia do regime Se observamos a termino logia e as poHticas enunciadas por Khomeini tudo comeca a pare cer mais familiar particularmente a luz dos movimentos populistas do Terceiro Mundo da epoca do posguerra 0 conjunto central de conceitos de Khomeini mustakbarin e mustaz a fin literalmente o arrogante e o fraco correspondem a dupla povoelite encontrada em outros populismos Todos os termos populistas usados para desacre ditar a elite podem ser encontrados em Khomeini corrupta ligada aos estrangeiros decadente parasita Os slogans pollticos principais de Khomeini republica islamica revolucao independencia auto suficiencia economica sao os objetivospadroes do nacionalismo terceiromundista Seu termo para imperialismo istikbari jahani arrogancia mundial e imediatamente reconhecido por todos e nao e uma rna descricao A denuncia dos oponentes como liberais foi tirada dos comunistas Podese supor que estes emprestimos seriam subordinados a uma perspectiva teologica mas o que Khomeini de fato disse e fez uma vez que chegou ao poder ilustrou se nada mais a primazia da Realpolitik Assim embora ele comecasse renuncian do ao patriotismo e a identidade iraniana ele comecou invocando 0 Ira eo conceito de terra patria uma vez que a invasao do Iraque comecou em 1980 Mais interessante de tudo nos ultimos meses de sua vida ele enunciou urn novo prindpio de comportamento politi co baseado na primazia do maslaha ou do interesse o que importa va eram os interesses do povo e do Estado nao as prescricoes for mais da religiao Em situacoes de conflito entre os dais eram os interesses do Estado que prevaleciam nao poderia ser dada nenhu ma manifestacao mais clara do aparentemente impllcito principia secular da raison detat Respostas e Questoes Ate aqui esta discussao buscou analisar a disseminacao do fun damentalismo e sugerir certas causas e caracterfsticas comuns deste fenomeno Seria errado exagerar a importiincia destes movimentos A maioria dos pafses muculmanos nao esta em vias de ser assolado 304 Fred Halliday pelo fundamentalismo e a onda de fundamentalismo cristao tern tido uma historia intermitente nos EUA perdeu na grande questao da escolha no perfodo entre guerras a da proibicao do aborto e a in fluencia atual da chamada Moral Majority dos 1980 e menor do que muitos temiam no mfnimo por que seu Hder urn septuagemirio ca sado pela segunda vez somente tinha interesses eleitorais e logo fez a paz com o AntiCristo Na Europa Oriental o movimento de pro testa mais influenciado pela religiao o Solidariedade de forma al guma urn movimento fundamentalista segundo a definicao usada aqui chegou ao poder na Polonia somente para perdelo de novo para os comunistas reformados e para ver a sua legislacao sabre reproducao ser largamente ignorada pela populacao Entretanto al guns destes movimentos devido a crise dos pafses em que se origi naram e a sua propria determinacao podem ficar conosco por urn born tempo No Ira e no Sudao fundamentalistas isHimicos estao no poder Eles bern podem chegar ao poder na Argelia e poderiam faze lo no Egito Na India ninguem pode ter certeza se o BJP e os seus aliados fascistas podem ser mantidos Ionge do poder embora as coisas parecam urn pouco melhores do que estavam ha urn ano atras Em Israel o fundamentalismo judaico certamente pode ter urn im pacto nefasto Nas sociedades ocidentais o fundamentalismo ainda tern sua presenca mais forte nos EUA onde em sua forma evangeli ca supostamente comanda a lealdade de cerca de 40 milhoes de pessoas ele pode nao estar proximo de chegar ao poder mas conti nua a fazer bastante barulho tentando legislar sabre o que as mulhe res podem e nao podem fazer e em questoes especificas relacio nadas Na Europa ate aqui a direita radical e os movimentos de esquerda vern sendo seculares na verdade anticristaos mas pou cos podem prever como as coisas irao se desenvolver no leste daqui ha alguns anos Aqui chegafnos a questao da resposta em dais nfveis no po lftico e no filosofico Politicamente nao e possfvel ignorar a ameaca que estes movimentos colocam aos cidadaos dos paises em que vi vern e por extensao ao mundo A revolucao no Ira e a ascensao do fundamentalismo por todos OS lados levou a morte de muitas pesso as assim como talvez em maior escala a vitoria do FIS na Argelia Uma resposta poHtica precisa ser desenvolvida com base em pelo menos tres principios Primeiro temos que reconhecer as fontes do protesto na verdade a legitimidade destes movimentos e considerar as questoes sociais economicas e pollticas as quais eles respondem Nao pode haver uma solucao para a crise na Argelia sem a mudanca na economia para gerar empregos e a reforma do Estado cada vez mais corrupto Igualmente precisamos reconhecer como inumeras questoes agucam a militancia nacional e religiosa dos povos no casd Repensando as relac6es intemacionais 305 do mundo islamico a negligencia do ocidente sobre as questoes da Palestina e da Bosnia para mencionar duas estimulou o antiimperi alimo religioso Em muitos casos a ascensao do fundamentalismo seja em Gaza ou na Bosnia ou entre as comunidades muulmanas na Europa Ocidental e uma resposta as opressoes sentidas por estas comunidades e a aparentemente inadequada atenao dedicada pe las foras seculares dentro e fora dos pafses envolvidos Os racistas e OS alarmistas referemse constantemente a quinta couna fundamen talista dentro da Europa Ocidental primeiro devemos olhar como e porque estas pessoas que foram encorajadas e convidadas a se des locar e a trabalhar na Europa se voltaram para uma definiao mais religiosa e militante de sua identidade face aos problemas que en contraram 0 problema do Isla na Europa ocidental e acima de tudo urn problema de seus companheiros cidadaos cristaos e go vemos e nao de uma ameaa muulmana a sociedade existem cer ca de 6 milhoes de muulmanos em uma Europa Ocidental de mais de 250 milhoes Segundo precisamos em nossa propria amilise e abordagem escapar da simplificaao e do estereotipo que equaciona os muul manos aos islamicos a maioria dos muulmanos nao e islamica mais do que os hindus judeus ou cristaos sao fundamentalistas 0 Isla nao 6 em nenhum sentido serio uma ameaa ao ocidente militar ou economicamente Os Estados islamicos nao tern sido uma amea a militar desde o seculo XVII e se existe algum desafio economico hoje ele vern do Extremo Oriente e nao do Oriente Medio Nao exis te urn Isla ou nao por isso urn cristianismo nem o termo mu ulmano deve ser usado para indicar etnicidade Na discussao con temporanea freqiientemente perdese a propria diversidade e a va riedade existente entre estas religioes em suas possfveis leituras dos textos sagrados e em suas culturas literaturas e significados Se a civilizaao islamica por exemplo tern uma vertente dogmatica or todoxa severa algo que compartilha com outras religioes ela tam bern pode ser bastante cetica hedonista cosmopolita ironica e hu mana Os patriarcas de cada religiao conspiram com os seus inimi gos estereotipados para confundir isso tanto quanto os dogmaticos do passado discutiram que o scialismo real era s6 ode Joseph Stalin ou o de Enver Hoxha Somente quando e se esta diversidade e multiculturalismo forem reconhecidos dentro e entre as comuni dades 6 que as reivindicaoes dos fundamentalismos como expres soes autenticas da cultura nacional poderao ser rejeitadas Entretanto alem das questoes poHticas existem outras filoso ficas e morais que sao dignas de nota e preocupaao pois no mo menta da emergencia de urn novo conjunto de movimentos dogma ticos autoafirmativos existe confusao no campo dos que eles nao 306 Fred Halliday abrangem Por isto quero dizer em termos amplos o campo dos que estao comprometidos com urn conjunto de valores individualistas crfticos democraticos de necessidade e seculares Esta confusao assume pelo menos tres formas uma derivada da crftica da domi naao ocidental e do etnocentrismo pode amplamente definir a crf tica baseada no relativismo cultural que direito temos de impor nossos valores sobre outros povos a segunda muito ala mode no momento mas esperanosamente desaparecendo e a posmo demista dos que argumentam que nao podemos estar certos de quais quer valores racionais do iluminismo eles advogam a descons truao sem descanso a indeterminaao da analise e da etica a po Htica da diferena finalmente dentro do campo da filosofia moral contemporanea ouvimos o argumento de que nao podemos estar certos sobre quaisquer prindpios morais gerais quanto menos so bre os que deveriam ser universalmente defendidos entre as tradi 5es e as comunidades e tudo o que podemos fazer e recorrer a pro cedimentos para julgar disputas este 6 o argumento de Alasdair Macintyre Stuart Hampshire Raymond Plant todos nomes de peso No contexto do que esta acontecendo nas sociedades e comu nidades ameaadas pelo fundamentalismo ou nesta linha pela di tadura ou pelo nacionalismo militante estas ruminaoes incitam urn grau de perplexidade e irritaao Se voce esta definhando nas cadei as da guarda islamica no Ira ou sendo for ado a usar roupas medie vais nas mas de Teera ou tendo seus genitais mutilados por algum bando de matriarcas e parentes homens no Sudao ou sendo alveja do por seu comprometimento ao secularismo no Egito e Argelia ou sendo tirado de sua casa e possivelmente morto em Bombaim ou tendo a sua terra roubada por pessoas que dizem que ela lhes foi dada por Deus trazlhe pouco consolo enquanto voce protesta em nome de valores universais serlhe dito que voce e etnocentrico ou nao suficientemente engajado no posmodemismo ou que infelizmen te no final das contas nao podemos estar certos de que os direitos que voce pede que sejam defendidos estejam adequadamente fun damentados Existe nesta atmosfera de agnosticismo urn fracasso em compreender as questoes em jogo na maior parte do mundo e uma irresponsabilidade que se aproxima de uma versao de final do seculo XX do trahison des clercs Certamente e evidente que o projeto modemista de iluminis mo como elaborado antes neste seculo foi com freqiiencia realiza do de maneira pobre e inadequada Nao estamos vivendo em mun do no qual nao seja inevitavel algum progresso diferenciado ou no qual a secularizaao e o desencantamento sao universais Muitas das reivindicaoes da razao sao superestimadas quando nao impostas repressivamente Os maiores crimes do seculo XX nao foram come Repensando as rela6es intemadonais 307 tidos por fundametalistas religiosos 0 proprio termo que se encontra no amago deste debate 0 secularismo tam bern pode beneficiar se de urn reexame originalmente formulado nos anos 1840 como uma altemativa a autoridade religiosa e eclesiastica ele deixou muito de barato dentro das sociedades democniticas Porem estes concei tos do iluminismo permanecem uma fundaao sabre a qual e possf vel e eu defenderia necessaria construir tanto quanta e possfvel tambem fazlo a partir de nossos conceitos de democracia indivi dualismo direitos e tolerancia Deverfamos estar preparados para redefinilos e defendelos Sejamos bastante claros sabre isto os fundamentalismos de todos OS matizes sao inflexfveis e determina dos na perseguiao de seus objetivos e estao bastante preparados para silenciar em alguns casas matar os que estiverem em seu caminho assim como tambem para seja la o que isso importa mandarnos todos para o inferno Do lado daqueles que nao sao fundamentalis tas deveria existir maior elemento de clareza intransigencia e na verdade de combatividade antes que seja muito tarde Na Europa deverfamos ser autocriticos frente ao nosso proprio passado imperi al a nossa relaao com o mundo naoeuropeu e aos crimes cometi dos em nome da ciencia e da razao Mesmo assim a ciencia a ra zao a tolerancia e a universalidade sao valores comuns a sociedade democratica moderna e devemos desenvolvelos e defendelos 0 maior erro seria se no curso da autoavaliaao apropriada falhas semos em reconhecer e avaliar o inimigo Traduzido de HALLIDAY Fred Fundamentalism and the contempora ry world political and ethical challenges in WESSELING Henk etalli Is lam and Europe in Past and Present Wassenaar Netherlands Institute for Ad vanced Study in the Humanities and Social Science 1997 por Cristina Sore anu Pecequilo 308 Fred Halliday TITULOS PUBLICADOS Esta sene esta voltada a publi de obras destinadas ao estudo do ceruirio intemacional contemporiineo do sistema mundial da politica extema brasileira dos processos de inte particularmente o Mercosul Sua abrangmcia tern o carater multidisciplinar abarcando estudos te6ricos empiricos ou hist6ricos VISa contribuir para a retomada da discussao sobre urn projeto nacional para o Brasil no plano da arullise de opes estrategicas para a insao internacional do Pais repensando o tema a partir de uma perspectiva do Sui Relaoes internacionais e polftica externa do Brasil led Paulo Roberto de Almeida A polftica externa do regime militar brasileiro led Paulo Fagundes Vizentini Repensando as relaoes internacionais led Fred Halliday Quinhentos anos de periferia 4ed Samuel Pinheiro Guimariies El Mercosur y su contexto regional e internacional Jacques Ginesta 0 Brasil e a Liga das Naoes 19191926 led Eugenio Vargas Garcia A China e o Sudeste Asiatico Paulo Antonio Pereira Pinto A politica externa dos Estados Unidos led Cristina Soreanu Pecequilo Da substituiio de importaoes a substituiio de exportaoes Heloisa Conceiiio Machado da Silva
Send your question to AI and receive an answer instantly
Recommended for you
7
Relações Internacionais - Roteiro de Estudos e Questões Essenciais
Ciências Políticas
ESAMC
4
Exercício 2 - Neoliberalismo e Neomarxismo em Relações Internacionais
Ciências Políticas
ESAMC
13
Dissertacao Academica - Racismo Estrutural na Contemporaneidade
Ciências Políticas
ESAMC
16
Análise de Política Externa: Interlocução e Contextos Contemporâneos
Ciências Políticas
ESAMC
7
Analise de Politica Externa em Regime Especial - Roteiro de Estudo
Ciências Políticas
ESAMC
18
Politica Externa Brasileira - Roteiro Trabalho Regime Especial ESAMC
Ciências Políticas
ESAMC
22
Prospecção de Cenários: Uma Abordagem Plural para o Futuro do Brasil em 2020
Ciências Políticas
ESAMC
4
Estudos Estrategicos e Politica de Defesa - Roteiro e Respostas
Ciências Políticas
ESAMC
14
Roteiro Regime Especial - Economia Política Internacional - ESAMC
Ciências Políticas
ESAMC
25
Estudos da Paz: Origens, Desenvolvimentos e Desafios Críticos Atuais
Ciências Políticas
ESAMC
Preview text
Q P UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL Reitor Jose Carlos Ferraz Hennemann ViceReitor e Pr6Reitor de Coordenaao Acadmica Pedro Cezar Dutra Fonseca EDITORA DA UFRGS Diretora Jusamara Vieira Souza Conselho Editorial Analfgia Lia de Paula Ramos cassilda Colin Costa Comelia Eckert Flavio A de 0 Camargo lara Conceio Bitencourt Neves Jose Roberto Iglesias Llicia Sa Rebello M6nica Zielinsky Naill Farenzena SRvia Regina Ferraz Petersen Tania Mara Calli Fonseca Jusamara Vieira Souza presidente t I t f I I I t I I I Repensando as relac6es internacionais Fred Halliday segunda Ediao TRADUAo Cristina Soreanu Pecequilo CONSULTORIA TECNICA DA TRADUAo Paulo Fagundes Visentini UFRGS EDITORA II fl lllOWlflllllll de Fred Halliday 1 a ediao 1999 I J Tftulo original Rethinking international relations London Macmillan Press 1994 Direitos reservados desta ediao Universidade Federal do Rio Grande do Sui Capa Carla M Luzzatto Revisao e editoraao eletrfinica Paulo Ricardo Furaste Campos Serie Relaoes Internacionais e Integraao Coordenada por Paulo G Fagundes Visentini Fred Hlliday Academico britftnico e professor de Relacoes Internacionais na London School of Economics Publicou varios livros sobre o Oriente Medio bern como sobre a Guerra Fria e as revoluoes no Terceiro Mundo Foi membro do Transnational Institute Amsterdam e editor da New Left Review H188r Halliday Fred Repensand as relacoes internacionais I Fred Halliday traduclio de Cristina Soreanu Pecequilo consultoria tecnica da traduclio de Paulo Fagundes Visentini 2ed Porto Alegre Editora da UFRGS 2007 Serle Relacoes Internacionais e Integraclio Titulo original em inglls Rethinking international relations Inclui prefacio a ediclio brasileira e a ediclio inglesa Inclui aplndices 1 Cilncia politics 2 Direito internacional privado 3 Economia internacional 4 RelacOes internacionais 5 Hist6ria contemporiinea 6 Guerra fria 7 Fundamentalismo 8 Materialismo hist6rico 9 Marxismo 10 MulherDireitos humanos I Halliday Fred II Pecequilo Cristina Soreanu III Visentini Paulo Fagundes IV Titulo V Serle CIPBrasil Dados Internacionais de Catalogaclio na Publicaclio Ana LVcia Wagner CRB10t1396 ISBN 9788570259479 CDU327 Agradecimentos da edi9ao inglesa 0 autor e os editores agradecem aos Routledge Journals e aos editores de Economy and Society aos editores de Millennium The Journal of International Studies a Cambridge University Press aos editores de New Left Review Blackwell Publishers e aos editores de Political Studies e aos editores de Review of International Studies por permitirem a reprodu9ao do material de copyright Nota do editor Incluimos como apendices ao livro com a permissao do autor tres artigos representativos no contexto de sua obra Os dois primeiros escri tos durante a crise terminal do campo sovietico enfatizaram premonito riamente as dificuldades intemacionais que adviriam 0 segundo inclu sive inexplicavelmente foi excluido da traducao brasileira de Depois da queda 0 terceiro aborda outra area de especializacao do autor o Oriente Medio Fluente em arabe e outros idiomas da regiao Halliday analisa urn dos grandes problemas contemporaneos o fundamentalismo sumario Prefacio a ediao brasileira 9 Prefacio a ediao inglesa 13 Introduao a importancia do intemacional 15 0 internacional em perspectiva 15 As influencias formativas 18 A emergencia da teoria 20 0 realismo e o behaviorismo 24 As relaoes internacionais desde 1970 30 Os parfimetros do repensamento 33 As teorias em disputa 37 0 empirismo tradicional a hist6ria e a escola inglesa 38 0 empirismo cientffico a atraao do behaviorismo 42 0 neorealismo sistema sem conteudo 45 A hist6ria mais elevada o p6smodernism iti 51 Conclusao outro caminho 60 Urn encontro necessaria o materialismo hist6rico e as rela6es internacionais 61 Urn desafio evitado 61 0 marxismo e os tres grandes debates das RI 64 0 potencial do materialismo hist6rico 69 0 paradigma materialista hist6rico 73 As inibioes da teoria 82 0 marxismo alem da Guerra Fria 85 0 Estado e a sociedade nas rela6es internacionais 87 0 impasse sobre o Estado 87 Definioes em oposiao 91 0 Estado como a tor domestico e internacional 98 Os interesses estatais e as foras sociais 100 As sociedades e os sistemas de Estado 101 A sociedade internacional como homogeneidade Os significados de sociedade internacional 0 transnacionalismo e os seus limites 0 paradigma constitutivo e os seus protgit Bk M Fukuyama As implicaoes para as relacoes internacionais 107 107 116 120 132 1 sexta grande potencia as revoluc6es e o sistema intemacional 137 Urn caso de desatenliO mutua 137 As revolu5es e os seus efeitos 142 A formayao do sistema intemacional 146 Os padroes hist6ricos 148 As ligayoes ddrnesticas e as internacionais 153 As revolu5es e a guerra 157 Ausente das relac6es intemacionais as mulheres e a arena internacional 161 0 silncio das rela5es intemacionais 161 Uma preocupalio emergente quatro dimensoes 166 0 Estado e as mulheres o nacionalismo e os direitos humanos 175 Implicayoes e problemas 182 0 conflito intersistemico o caso da Guerra Fria 187 Uma forma distinta de conflito 187 As teorias da Guerra Fria 188 As fontes de resistncia te6rica 194 A proeminencia da heterogeneidade 197 As implica5es analfticas 201 Urn colapso singular a Uniao Sovietica e a competicao interestatal 207 Uma nova luz sobre velhas questOes 207 A transformayao desde cima 209 A transiyao do socialismo para o capitalismo 211 Os fatores internacionais e a Guerra Fria 214 Urn fracasso comparativo 222 Os tres nfveis de competilio intemacional 227 As rela6es internacionais e o fim da hist6ria 231 0 depois da Guerra Fria 232 Variedades de avalialio hist6rica 237 0 fim da hist6ria 243 As perspectivas para a democracia liberal e a paz 247 Conclusao o futuro das rela6es internacionais 251 0 desafio do normativo 251 As alternativas em pesquisa 256 Apendices 259 Urn mundo urn mito 261 Os finais da Guerra Fria 269 Fundamentalismo e o mundo contemporaneo desafios polfticos e eticos 292 Prefacio a ediao brasileira Os ensaios que formam parte deste livro foram primeiro publi cados no infcio dos anos 1990 Eles se sustentam sob a premissa de que OS eventos e processos intemacionais sao tanto quanto OS da politica e da sociedade domestica passiveis de uma analise racional e comparativa e que este conhecimento pode desempenhar urn pa pel em tomalos mais sujeitos aos controles democraticos lgualmen te eles eram uma resposta ao duplo contexto daqueles tempos por urn lado ao fim da Guerra Fria e o colapso do comunismo e por OUtrO a crescente diversidade dentro da teoria das relaOeS intema cionais que sucedeu a destituiao do realismo como a teoria uni ca ou dominante Minhas pr6prias contribuioes foram concebidas para f9mecer uma consideraao hist6rica e te6rica da conjuntura anterior a Guerra Fria e a sua conclusao e ao mesmo tempo para defender a partir do interior da teoria das relaes intemacionais uma pesquisa que estivesse aberta a analise hist6rica e sociol6gica Desde que escrevi este livro conclui mais outros dois que Ie vam adiante as discuss5es deste volume e que se ocupam do Tercei ro Mundo de uma maneira mais explicita urn Islam and the Myth of Confrontation tenta fomecer uma analise hist6rica e sociol6gica do Oriente Medio em oposiao as considera5es mistificadoras ba seadas na cultura e na religiao Portanto e uma intervenao a res peito dos debates sobre uma area especffica do Terceiro Mundo e os mitos que sao produzidos dentro e fora da regiao sobre ela Aiem dos argumentos dirigidos contra os que reivindicam uma especifici dade particular para a regiao tambem examino questoes individu ais a Revoluao Iraniana a Guerra do Golfo de 19901991 e os direitos humanos a luz de minha abordagem te6rica mais ampla 0 segundo livro que completei Revolution and World Politics de senvolve em maior extensao e mais sistematicamente as discuss5es do Capitulo 6 deste volume ao mesmo tempo em que reafrrmo que as re volues foram uma fora formativa fundamental na hist6ria intemaci onal modema examino em urn grau maior do que o indicadopor este capitulo o papel das ideias intemacionalistas na composiao das revo Iu5es e de suas polfticas extemas Pois apesar de todas as iluses que expressaram as revolues eram produto de algo material as contradi Repensando as rela6es internacionais 9 r oes da modernidade apitalista o mito da revoluao criado em 1789 pode ter morrido em 1989 mas enquanto o capitalismo conti nuar a produzir urn mundo de desigualdade e hierarquia existirao tensoes pollticas e sociais que poderao resultar em formas de con testataao de massa incluindo a revolucionaria Na verdade a glo balizaao dos anos recentes tern produzido urn mundo mais desi gual do que qualquer outro somente por esta razao o estudo das revoluoes pode ser de maior importancia historica As instabilidades e as desigualdades inerentes ao capitalismo global nao precisam ser destacadas para 0 leitor brasileiro 0 tema com o qual comeo este livro e que permeia a sua maior parte e a maneira pela qual os desenvolvimentos sociais e polfticos dentro dos Estados sao em urn grau maior do que o admitido moldados pelos processos internacionais A questao nao e se as aoes dos lideres poHticos sao resultado das instruoes traioes ou represen taoes vindas de fora mas sim qual e 0 impacto intelectual cul tural economico politico e militar da conjuntura historica mun dial sob todas as sociedades em uma determinada epoca Tive a sorte de visitar o Brasil pela primeira vez em 1973 durante 0 auge da ditadura militar e das primeiras aberturas associadas a des compressao da futura presidencia Geisel Nada poderia ilustrar mais graficamente o impacto da Guerra Fria sob os palses do Terceiro Mun do e o uso de doutrinas de segurana internacionalmente legltimas para a repressao domestica do que o Brasil dessa epoca Algumas poucs se manas depois em setembro de 1973 a ligaao entre a Guerra Fna e a repressao domestica foi confirmada para aAmerica Latina como urn todo pelos eventos no Chile a derrubada do govemo da Uniao Popular e o comeo da ditadura Pinochet As visitas ao Brasil em 1994 e 1998 foram em termos politicos a urn pals diferente em plena fluxo de debate polftico e de mobilizaao para a aao polftica o fim da Guerra Fria e o encerramento dos regimes da direita autoritaria pela pressao popular foram processos paralelos Entretanto esta democratizaao acompanhada como o foi pela reforrna economica tambem trouxe o Brasil para a zona de influencia de outro processo internacional a globalizaao Ao fazelo aumentou a sua vul nerabilidade as flutuaoes financeiras e do mercado cuj9 preo foi pago principalmente pelos pobres Enquanto escrevo este prefacio a crise fi nanceira que confronta o Brasil permanece sem soluao a medida que as foras irresponsaveis dos mercados de cambia e de capital mundiais continuam a perseguir beneffcios de curto prazo e a propagar analises alarmistas para sabotar as vidas e o emprego das populaoes de outros pafses Nada coloca mais em questao a validade do modelo presente de globalizaao do que a maneira pela qual a vida de dezenas de milhoes de pessoas esta subordinada a este sistema especulativo de prerrogati vas caprichosas e oligarquicas 10 Fred Halliday 0 maior perigo na analise como na vida real e o da complacen cia da crena que o mundo nao enfrenta grandes problemas e que as pra ticas correntes podem e irao superar quaisquer dificuldades que enfren temos Isto certamente tern sido a disposiao dominante dos anos 1990 pelo menos ate a crise financeira recente que comeou em 1997 Os pro blemas de analisar a historia enquanto ela acontece e os desafios colo cados pela propria teorizaao sugerem que precisamos de uma aborda gem mais critica e ambiciosa para questionar as ortodoxias da polftica e da pesquisa academica Aqui a analise academica e ligada a aao polfti ca em particular ao objetivo de subordinar os processos economicos e sociais ao controle democratico Este empreendimento e necessariamente intemacional pois ele deve olhar para os contextos e as estruturas intemacionais dentro das quais todos os Estados e sociedades precisam funcionar mas tambem porque e por meio do dialogo intemacional atraves das fronteiras e dos conti nentes e desafiando barreiras culturais convencionais que tal repensa mento pode ocorrer Como alguem que se beneficia e temse beneficia do por muitos anos deste dialogo internacional nao somente com cole gas e amigos brasileiros eu ofereo este livro marcado pelo seu tempo e seu Iugar de origem ao leitor brasileiro Todos nos em qualquer pals que estivermos vivendo enfrentamos urn desafio comum de combinar a analise academica com o engajamento racional e democratico aos pro blemas de nosso tempo 0 intemacional considerado por muito tempo imune a compreensao polftica e ao controle democratico requer esta reavaliaao critica Londres Fred Halliday Repensando as rela6es intemacionais 11 Prefacio a edigao inglesa Os capftulos deste livro sao uma dupla resposta aos avanos na te oria polftica na social e no estudo academico das relaoos intemacio nais e as mudanas do pr6prio sistema intemacional ao Iongo dos ulti mos anos em particular o colapso do bloco sovietico Neste sentido e no que pode ser uma reversao da pnitica convencional as reflexoos ge rais e em parte teoricas sao feitas a partir de estudos mais concretos sobre o sistema intemacional e sobre os principais conflitos em seu interior por mimja publicados mais especificamente The Making of the Second Cold War 1983 e Cold War Third World 1989 e urn numero de estudos de caso sobre o Terceiro Mundo Fazendo isso espero simplesmente nao s6 ampliar estas reflexoos sobre as relaoos intemacionais mas tambem extrair hip6teses e questoos que estao em maior ou menor grau nelas presentes As relaoos intemacionais como todas as areas do conheci mento enfrentam dois perigos ode consideraoos factuais desprovidas de reflex6es te6ricas explicativas ou eticas eo de teorizaao sem o apoio da analise hist6rica Minha esperana e que estes ensaios como respos tas a ideias e eventos contomem estes dois perigos Ao fazer algumas observaoos gerais sobre a natureza do sistema intemacional e de onde sua analise pode proceder tambem examinei algumas questoos particu lares Minha intenao e seguir esta visao geral do assunto com dois vo lumes adicionais te6ricos e hist6ricos urn sobre o papel das revoluoos no sistema intemacional e outro sobre a tensao etica entre o nacionalis mo e o intemacionalismo Na prepo destes ensaios beneficieime do estimulo e critica de muitos amigos e colegas ao Iongo da decada passada Em particular gos taria de agradecer aos meus colegas e estudantes no Departamento de Re laoos Intemacionais RI da London School of Economics LSE que atraves de contatos individuais e seminarios gerais de Rl suscitaramme tal desafio e estimulo A Martina Langer do Departamento de RelaOes lntemacionais sempre tao prestativa no auxflio da preparao do texto Tambem gostaria de agradecer aos membros do grupo de discussao de re laOes intemacionais 1990 e aoTransnational Institute por fornecercon textos intelectuais adequados para trabalhar muitas destas ideias Meus maiores agradecimentos a minha parceira Maxine Molyneux cujo apoio e ideias foram tao enriquecedores quanto indispensaveis Repensando as rela6es intemacionais 13 Muitos dos capftulos deste livro foram atualizados e desenvolvi dos a partir de ideias e argumentos contidos em urn conjunto de artigos e ensaios publicados ao Iongo dos ultimos anos em particular partes dos Capftulos 1 e 2 apareceram em Political Studies v 38 n 3 September 1990 Economy and Society v 18 n 3 August 1989 e Millennium v 22 n 2 summer 1993 uma versao previa do Capftulo 4 foi publicada em Millennium v 16 n 2 1987 do Capftulo 5 emMillennium v 21 n 3 winter 1992 do Capftulo 6 em Review of International Studies v 16 n 3 summer 1990 do Capftulo 7 em Millennium v 17 n 3 win ter 1988 do Capftulo 8 em Mike Bowker e Robin Brown eds From Cold War to Collapse Theory and World Politics in the 1980s Cambridge University Pres 1993 do Capftulo 9 em Contention n 2 winter 1992 Capftulos 10 e 11 incluem material de New Left Review n 193 May June 1992 e de Barclay Enterprise Lecture proferida na LSE 17 de maio de 1993 SleepWalking Through History The New World and its Dis contents depois publicada pelo Centro para o Estudo de Govemana Global da London School of Economics Londres Fred Halliday 14 Fred Halliday INTRODUcAo AIMPORTANCIA DO INTERNACIONAL Este capftulo possui dois objetivos primeiro examinar o sig nificado do termo intemacional e a confusao que causae segun do fomecer uiiiidrevecoiisJderaao do crescimento da disciplina e dos fatores ligados a seu desenvolvimento As relaoes intmacio nais RI tern ocupado urn Iugar desconfortavel freqlientemente marginal no estudo e no ensino das ciencias sociais Entretanto seu objeto de estudo 6 nos termos mais simples claro suficiente eAbrange tres formas de interaao as relaoes entre os Estados as aoes naoestatais ou relaoes tiansnacionais atraves das fronteiras e as operaoes do sistema como urn todo dentro do qual os Estados e as sociedades sao os principais componenteEmbora possam variar no destaque que dao a cada uma dessas formas de interaao todas as teorias do intemacional propoem alguma explicaao de cada uma delas Na verdade os principais debates dentro das I giram em tomo em maior ou menor grau dessas tres dimensoes e da pri maia de uma ou de outra 0 INTERNACIONAL EM PERSPECTIVA A diversidade te6rica 6 uma fora nao uma fraqueza das rela 9es 1iiiemaciois 1 As dificuldades experimentadasresidemiiKo em qualquer uniformidade ou paralisia te6rica mas acima de tudo em bases metodol6gicas e hist6ricas Excessivamente defensiva sobre seu pr6prio vigor metodol6gico e disciplinar as RI tern sido tratadas como urn apendice de outras disciplinas mais estabelecidas Polftica nacional economia e sociologia sao os focos principais e o 1A crena em urn paradigma unico como normal e desejavel recebeu confirmaao de The Structure of Scientific Revolution de Thomas Khun London University of Chica go 1962 0 argumento contriirio que a diversidade e desejavel foi feito em Against Method de Paul Feyerabend London NLB 1975 Repensando as rela6es intemacionais 15 intemacional e urn elerrfento excedente uma opao para os estu dantes urn penultimo capftulo para o academico Nas 6ltimas duas decadas a mudana dramatica no status do internacional somente potencializou isso Agora que se tornou moda destacar a difusao do internacional e a destituiao da es pecificidad nacional pela globalizaao esta dimensao antes ne gligenciada tornouse propriedade de todos a exclusao eu lugr i promiscuidadeAlem disso nese prcess o grau de mternacl onalizaao do mimdo atual tern stdo dtstorctdo e exagerado e lo calizado de maneira extremamente simplista em mudanas ocor ridas entre 1945 e 1960 Este reducionismo hist6rico assume vari as formas como a afirmaao injustificada da literatura transnacio nalista sobre a obsolescencia do Estadonaao e do papeda for a ou a invocaao de uma nova era de p6smodemidadei A con tinua adaptaao entre o global e o particular na polftica na cultura e na economia e subestimada assim como se escondem as diver sas hist6rias dos processos internacionais que datam das origens do sistema no seculo XVI Estas duas abordagens a negaao e o exagero nada mais sao do que dois lados da mesma moeda Os que prop5em a ultima constroem sua argumentaao contrapondo o mundo contemporaneo a urn perfodo em que supostamente os Estados as naoes e as sociedades eram se parados e isolados entre si Entretanto a intemacionalizaao nao co meou com urn ercado financeiro global ou com a CNN e sua trans missao mundial pr6prio nacionalismo a despeito de sua evoluao de seu carater aparentemente individual e de sua celebraao do especffico e urn processo intemacional urn produto da mudana intelectual social e econornica compartilhada pelas sociedades e estimulada por sua inte raao nos 6ltimos dis seculoi Na verdae podese argumentar qe Ionge do internacwnal nascer do nacwnal e de uma expansao gradual dos laos entre entidades distintas o processo real se deu de maneira in versa a hist6ria do sistema modemo e a tJJIlaCl onalizaao e da quebra em partes separadiiscrosifxos prexisten ies de pessoas reHg1o e comerdo a premdiaopara a formaao do Estdnaaorn foi 9 4senyolvimento d rima ecoomia e cllltyraintemacional dentro da qual eles s rt1111rm depms Osautores na GraBretanha e nos Estados Unidos alardeiam que durante OS ultimos 20 OU 30 anos as formas de controle polftico e soberania foram corrofdas por processos transnacionais mas esta e uma presunao gigantesca nascida das hist6rias nacionais peculiares e mui 2Este contexto intemacional para a disseminaciio do nacionalismo e reconhecido por varias teorias sejam elas a teoria politica de Elie Kedourie Nationalism London Hutchinson 1960 ou a abordagem sociol6gica de Ernest Gellner Nations and Nationalism Oxford Basil Blackwell 1983 16 Fred Halliday to excepcionais destes Estados Dos 190 Estados soberanos do mundo de hoje ou algo em torno disso somente meia sJuzia esca param de ocupaao extema nos dois seculos passadosfMesmo no caso da GraBretanha por exemplo urn pafs onde a consciencia insular e maior do que nos demais e urn dos poucos a escapar da ocupaao extema nao existe uma hist6ria puramente nacional De Julio Cesar a Santo Agostinho das invasoes anglosaxonicas a 1066 da Reforma a emergencia do Estado Modemo em conflito com os vizinhos europeus ate o tempo do imperio e da guerra mundial nadonal e o internacional sem re interagiram s Estados Unidos aaAiiieiTcaescaparariiaaocupaao es e a m pendencia em 1783 mas todo o seu desenvolvimento tern sido urn de interaao com o intemacionalDesde a aquisiao pela fora e compra da maior parte de seu territ6rio de outros Estados e povos ate o fluxo em massa de populaoes de outros pafses a expansao global de seu poder finan ceiro e industrial em 1890 o sistema polftico americana tern sido Joldado li9intrril9n 92i pafses a perP cl ilSllaridade confo QmiJ0 desenvolvimQtopJltic9 gJt eY9lo novi2t Apesar de terem adquirido legitirnidade pela disserninaao gradual da democracia o Reino Unido e os Estados Unidos foram Estados criados e mantidolaf2J em mais de uma oportunidade Alem disso mesmo a mais breve das pes quisas comparativas mostrara ou pelo menos indicara queJi disserni naao das formas democraticas e a chegada do sufnigio universal foram processos intemacionais resultado tanto de mudanas nas normas quanto 4 do impacto nas diferentes sociedades de seus fenomenos por urn lado da industrializaao e da ascensao da sociedade de mass por outro das pressoes poHticas nascidas das duas guerras mundiaiJO mesmo se aplica a hist6ria das economias nacionais as necessidades da competi ao interestatal moldaram o comercio e a intervenao estatal a planta ao de carvalhos e a construao de estradas a promao da industria da tecnologia e da educaao Igualmente urn processo como a aboliao da escravatura preservada em termos particularistas e etnicos reflete mu danas amp las no comercio internacional e na produao 3 0 que e vivido e normalmente estudado como algQgue acontece1 dentronaejiaissrYer2m9 Peprocessos intiiliI liaP19Ae mfgolfJl e 92fuicAtraves das his t6rias nacionais a competiao intemacional desempenha urn papel formativo bastante central como influencia e exemplo A taxaao para prop6sitos militares e a arrecadaao de taxas no comercio habitam o co raao do Estado modemo o departamento de alfandega e a receita bri tanica gozam de ampla autonornia dos ministerios govemamentais por 3Robin Blackburn The Overthrow of Colonial Slavery 17761848 London Verso 1988 Hfpfnsanclo as wla6es intemacionais 17 que existem ha mais tempofortanto nao pode haver uma hist6ria puramente nacional de qualquer Estado da mesma forma nao pode haver teoria da economia do Estado e das relaoes sociais ne gue o impacto formative residual ou recente do intemacionaJJPor tanto nenhuma das abordagens convencionais a negaao e o exa gero faz justia a questao comum a todos OS cientistas Sociais e que dentro da 6tica particular da disciplina das relaoes intemacionais e a sua preocupaao constitutiva a interaao do nacional e do inter nacional do intemo e do extemo AS INFLUENCIAS FORMATIVAS 0 assunto das relaoes internacionais e como em todas as dis cipJinas academicas localizado ern mais de uma dimensao Todas asjtiencias sociais devem suas origens e desenvolvimento a intera ao com o rnundo de forJ a economia nasceu como uma resposta ao comercio e a industrialhaao dos seculos XVIII e XIX a socio logia da evoluao das sociedades urbanas a antropologia do encontro colonial Ainda assim cada uma tern sua pr6pria agenda como area de estudo na universidade uma necessidade de resistir as modas do momento e as pressoes do poder para olhar com imparcialidade seu objeto urna rnissao de usar sua substancia e metodos como urn meio de aguar e treinar as mentes dos estudantes e seu pr6prio conjunto permanente de preocupaoes disciplinares Nas relaoes intemacionais como evidenciado pelo ambito comum dos cursos oferecidos estas preocupaoes possuem dois aspectos distintos urn e amplamente PJJill e se refere ao papel do Estado nas relaoes intemacionais ao problema da ordem na ausen cia de uma autoridade suprema ao relacionamento entre o poder e a se gurana a interaao da economia com a fora militar as causas do con flito e as bases da cooperaao 0 outro e normative e diz respeito a ques tao de quando e como e legftimo usar aforaAs0briga6es devidas ou nao ao nosso Estado ao Iugar da moralidade nas rela6es intemacionais e aos erros e acertos da intervenao As relaoes intemacionais entretanto sao igualmente locali zadas em uma outra dimensao aquela do mundo real ou talvez mais precisamente naoreflexivo No intemacional como em mais nenhum outro campo da ampla atividade humana o mftico eo ima ginario desempenham urn papel central no discurso cotidiano Bas tase lembrar das foras de identificaao e 6dio nacional da quase que universal incidencia de teorias de conspiraao e suspeitas sobre estrangeiros a extraordinaria ignorancia mesmo entre os mais instru fdos sobre outros pafses e a facilidade com que as paixoes publi 18 Fred Halliday cas sao provocadas pela representaao enganosa doestrangeiro do estranho do outro De todos os estudantes de ciencias sociais nas universidades os de relaoes intemacionais sao os que provavelmente irao encon trar mais incompreensao e ignorancia e os que irao se envolver em mais depuraao conceitual etica e factual Somente isto ja fomece uma relevancia distinta as RI mesmo que empreste urn certo carater laborioso a exploraao das questoes intemacionais Quando pesso as aparentemente instrufdas e experientes incluem em suas discus soes sobre o futuro internacional de outros pafses estere6tipos pri mitives como a mente alema a psicologia japonesa somos to dos lembrados de que ainda precisamos avanar muito Talvez o melhor que as relaoes intemacionais poderiam fazer em sua esfera de atividade seria aplicar o famoso ensinamento de Freud sobre a psicanalise reduzir a neurose a miseria normal de cada dia A rela9ao do estudo academico das relaoes intemacionais com o mundo de fora e certamente moldado e estimulado por outras pre ocupaoes Algumas sao evidentes outras nao A mais 6bvia e que as pessoas sentem que 0 intemacional e importante que e uma fon te de amea9a mais obviamente militar que e uma arena onde gran des beneffcios e perdas economicas podem ocorrer que aparente mente e cada vez mais intrusive nas vidas cotidianas 0 estudo aca dellico das rla9oes intemacionais comeoucomo uma teniativa de pes quisaras causas da niaior deiodasestas intiusoes qual seja guerra e de desenvolver meios para reduzir sua futura incidencia DCfcteiitao ele passou a enIobar uma genda mais ampla em particular de ativida de economica A medida que o mundo muda tambem mudam as ques t6es colocadas para o estudo academico do inteinacional A dificuldade e que a pr6pria pressao das questoes intemacionais e a demanda para sua analise e comentario podem agir nao s6 como urn estimulante e urn re gulador do pensamento mas tambem como urn desvio o resultado e que nao somente a curiosidade com rela9ao ao mundo mas o pr6prio traba lho feito nas universidades e moldado pelo que os financiadores e poli cy makers leem no jomal da manha Determinar a agenda academica das relaoes intemacionais por tais preocupaoes e entretanto perigoso nao s6 pela perda de independencia mas tambem pela perda de perspectiva hist6rica e conceitual Economistas ficam felizes em serem consultados e fazerem comentarios sobre a bolsa de val ores ou a taxa de inflaao os cientistas polfticos podem emitir vis6es sobre os resultados das pr6xi mas eleioes mas nestes casos assim como no das rela96es intemacio nais isto nao deve sera base do que se ensina na universidade Entretanto nas rlaoes intemacionais a pressao e maior por cau sa de urn fator adicional e menos evidente que pode ser definido como sua invisibilidade te6rica A exceao dos que tern como sua profissao Repensando as rela6es intemadonais 19 ensinar e estudar em uma universidade o assunto nao tern uma de finiao alem do sabio comentario sobre as noticias de ontem ou a breve apariao da hist6ria intemacional comparada e contempodi nea Parte disso nasce da confusao diaria sobre a palavra internaci onal 0 proprio termo inventado por Jeremy Bentham em 1780 para indicar OS laos legais entre OS Estados e incorreto considera do o significado subseqtiente do termo naao ja que a men or de suas preocupaoes era a relaao entre as naoes em seu sentido atu al As naoes e Estados podem ou nao coincidir mas mesmo quan do coincidem relaoes convencionalmenteQamadas interna ci9s dizem resfieifoaOte SplSltre OS govemosee as populaoes Alem disso para a maioria aosqueuSaiii o termo assufftOSTntemacionais abrange duas coisas bastante diferentes incluldas nas paginas dos jornais a politica domestica dos outros palses assuntos intemos e os assuntos internacionais propriamen te ditos as relacoes entre os Estados e as sociedades A isto tambem se acrescenta urn problema final e curioso A maio ria das pessoas genericamente interessadas em ciencias sociais esta ci ente do trabalho te6rico em varios campos mesmo que nao possam di zer o que as teorias falam Assim o leitor medio do mais serio dos jor nais ou do New York Review of Books ja tera lido os te6ricos da econo mia como Keynes ou Friedman e sabera dos debates na filosofia entre Rawls Nosick e seus seguidores ou das ideias gerais de Foucault e do p6smodemismo Nas relacoes intemacionais as coisas sao bern dife rentes pois poucos fora da area conhecem qualquer urn dos envolvidos em trabalhos te6ricos e muito menos suas questoes Supoemse que se possa fazer a magica com uma combinacao estimulante de assuntos cor rentes de senso comum e pitadas de referenda hist6rica A preserva ao de equilfurio adequado e criativo entre estas duas dimensoes das re laoes intemacionais a academica e a poHtica e portanto muito mais diffcil Especialmente pela pressao do presente e preciso deixar isto o mais claro posslvel A EMERGENCIA DA TEORIA No restante deste capitulo tentarei fomecer urn breve esboco de como a teorizacao das relacoes internacionais tern caminhado4Q desen volvimento das RI como ode todas as ciencias sociais e produto de tres e nao de dois clrculos concentricos de influencia a mudanca e 0 debate dentro da propria disciplina o impacto dos desenvolvimentos do mun do e a influencia de novas ideias de outras areas da ciencia sociallEn quanto genealogias academicas sao comuns as duas ultimas recibem menos atencao As RI tern urn autoconhecimento muito limitado e uma 20 Fred Halliday consideracao inadequada dos fatores extradisciplinares que as afe tam Entretanto isto e muito evidente OS principais eventos da his t6ria do seculo XX a Primeira e Segunda Guerras Mundiais a Guerra Fria eo seu encerramento moldaram o foco das RI tanto quanto as disputas interparadigmaticas Contudo como qualquer ciencia so cial as RI tendem a esconder estas conexoes por medo da perda de prestfgio intelectual Assirn a arregimentacao do realismo pela Guerra Fria ou o papel da Guerra do Vietna na prornocao da consci encia da interdependencia sao negligenciados Igualmente diferen as nacionais de hist6ria e sociedade tern determinado a analise e a pesquisa o que nos EUA e urn estudo de tomada de decisao pode tornarse na Alemanha a analise da relacao entre a democracia e a poHtica externa4 os palses do Terceiro Mundo estao freqtientemen te preocupados com a dominacao externa os pafses desenvolvidos com a integraao siIDD Jl lJ9JXiJLhiliiQidaQe ge cslnYi m 9txts p3rticulares e em termos anaf1ttcos a rYIScmlPIQ49e4cfficos e negada A hgaao da hist6ria intelectual coma hist6r1aei1igeral per manece intermitente e obscura assim como a das RI com as outras tendciasA nas fiencias sociais s91t deteoria internacitl cafslebsaa caiJitfif 0 tt bbes sobre a natureza do poder Gr6cio sobre o direito internacio nal Kant e Marx sobre as precondioes para o cosmopolitismo sao alguns dos antecedentes mais 6bvios Estas consideraoes sao en tretanto parte de urn empreendimento te6rico mais amplo de hist6 ria direito filosofia teoria politica e raramente emergem como re flexoes sobre urn assunto te6rico distinto o internacional Como uma disciplina acadernica separada as rela6es interna cionais tern menos de urn seculo 0 estudo das rela6es internacio IJJJis c9 1Jw grimejra 9iiiJ1iilI1l eiifocando as fatores que precipitararn a guerra e os meios para prevenir a sua re correncia Foi oeste perlodo que as primeiras cadeiras e departamen tos foram estabelecidos nas universidades britanicas em Aberystwyth LSE e Oxford enquanto na esfera naoacademica o Royal Institute of International Affairs foi fundado para elaborar a polftica publica Con 4Ulrich Albrecht Internationale Politik Munich Oldenbourg 1986 capitulo 9 Das Demokratieproblem in der intemationale Politik 5Para pesquisas disto ver Howard Williams International Relations in Political Theory Milton Keynes Open University Press 1992 Torjbom Knutsen A History of International Relations Theory Manchester Manchester University Press 1992 Teny Nardin e David Mapel eds Traditions of International Ethics Cambridge Cambridge University Press 1992 Martin Wight International Theory The Three Traditions Leicester University Press 1991 Repensando as rela6es intemacionais 21 temporaneamente e pelas mesmas raz6es os departamentos acade micos e o Council on Foreign Relations foram estabelecidos nos Estados Unidos Os tres elementos constitutivos das Rl o interestatal o trans naJqgeoIJfJlisJ prmitemuitasespeclalfzaoesevanas lJQtdagens teodcs Hoje as Rl abrangem como subcampos so mados a teoria intemacional isto e a teorizaao destes tres elemen tosps estudos estrategicos os estudos de conflito e paz a analise de politica extema a economia politica intemacional a organiza ao intemacional e urn grupo de quest6es normatlvas pertinentes a guerra obrigaao soberania e direitosA estes subcampos analiti camente distintos pode ser somado o das especializa6es regionais nos quais as abordagens teoricas sao aplicadas aos estudo de Esta dos individuais e de grupos de Estados Tais subcampos podem nao envolver diferentes perspectivas teoricas mas variam consideravel mente na enfase relativa atribufda as quest6es por exemplo de ide alogia e direito de economia ou de poder militar So nos anos 1980 varias novas quest6es intemacionais foram incorporadas ao ambito analitico da disciplina e ensinadas em curses separados uso do mar e politica dos oceanos mulheres e a arena intemacional as rela6es intemacionais no Terceiro Mundo as quest6es ecologicas as dimen s6es intemacionais da comunicaao dentre outras Os ja abordados crescimento e variaao dos assuntos dentro das RI sao paralelos a uma evoluao nas abordagens teoricas 6 Em sua fase inicial as RI buscaram distinguirse daquelas disciplinas a partir das quais se originaram Assim eram distintas da historia diplomatica intemacional em sua abordagem comparativa e teo rica Ao Iongo do tempo separaramse do direito intemacional com a adoao de uma abordagem normativa e nao positivista e na analise da interaao das dimens6es do intemacional atem do legal Distinguiramse da ciencia polftica ao buscar combinar o poHtico com o economico e o militar e em tomar como seu objeto de ana lise nao o sistema poHtico interne de urn pafs qualquer mas o sis tema internacional caracterizado pela ausencia de uma autoridade soberana e a maior importancia da violencia em seu interior Ape sar disso sua evoluao teorica envolveu emprestimos e a continua 6Para hist6rias gerais e pesquisas de RI ver entre outros Margot Light e AJR Gordon eds International Relations A Handbook of Current Theory London Frances Pinter 1985 2ed para 1994 Steve Smith ed International Relations British andAmerican Perspectives Oxford Basil Blackwell 1985 Hugh Dyer e Leon Mangassarian eds The Study of International Relations The State of the Art London Macmillan 1989 Marc Williams ed International Relations in the Twentieth Century A Reader Basingstoke Macmillan 1989 AJR Gordon e William Onuf International Relations then and now London Routledge 1992 22 Fred Halliday interaao com essas disciplinas bern como outras das ctencias sociais especialmente a economia Duas disciplinas com as quais as RI parecem ligadas apesar de nao existir qualquer relaao sao a sociologia e a geografia Embora como veremos nos Capftillos 3 e 4 as RI tenham utilizado certas ideias da sociologia especial mente sociedade e em seu perfodo formative tenham compar tilhado preocupa6es da geopoHtica nenhuma das duas discipli nas teve urn impacto importante Dentre outras coisas o resultado foi que os desenvolvimentos teoricos subseqlientes nestas discipli nas nao foram reconhecidos dentro das RI Somente recentemen te ao superarem sua fase protecionista e que as RI comearam a explicitamente aprender e contribuir com outras areas das cien cias sociais Urn exemplo relevante deste novo posicionamento e o recente interesse na sociologia historica no domfnio das preo cupa6es estrategicas da guerra e seu impacto na formaao do Es tado e do grau em que o intemacional mais do que os fatores en dogenos determinou o desenvolvimento estatal Seas Rl possussem uma 4isipJin materna esta nao seria a his toria au a denc pglt3 m qcJitito intemadona1 Na Europa con tinental estepadrao prevalece em muiiosaepartameiitos Em sua fase inicial depois da Prime ira Guerra Mundial as RI adotaram uma abor dagem predominantemente legal hoje erroneamente apresentada como utopica ou idealista Esta escola da paz atraves da lei emergiu em parte do liberalismo de Woodrow Wilson e buscou limitar ou pre venir a guerra por tratados intemacionais procedimentos de negocia ao e o crescimento das organiza6es intemacionais especialmente a Liga das Naoes Os crfticos academicos dessa abordagem freqliertte mente referemse a ela como utopismo mas esta e uma categoriza ao enganosa por tres raz6es primeiro porque confunde uma tentati vade regular e melhorar as rela6es intemacionais urn projeto perfei tamente viavel com a perseguiao de urn ideal de uma utopia se gundo porque ignora o que era para Wilson uma precondiao central a efetivaao da paz atraves da lei qual seja a disseminaao geral dai democracia lioeral algo que ele estava errado em antecipar depois da1 Primeira Guerra Mundial mas que como veremos no Capitulo 9 tern implica6es consideraveis para o internacional 7 e terceiro por que ao depreciar os utopicos estes cdticos desacreditam a par tir do proprio conceito e da analise da utopia uma parte duradou ra e valida da teoria social e poHtica Woodrow Wilson The coming age of peace de The State 1918 excerto em Evan Luard ed Basic Texts in International Relations Basingstoke Macmillan 1992 p 26771 Repensando as relac6es internacionais 23 I 0 REALISMO E 0 BEHAVIORISMO Com as crises dos anos 30 o idealismo deu Iugar ao inicialmente com o trabalho de EH Carr e depois com o de varios escritores nos Estados Unidos incluindo Hans Morgenthau Henry Kissinger e Kenneth Waltz1Ies tomam como ponto de par tida a busca do poder dos Estados a centralidade da fora militar dentro deste poder e a inevitabilidade duradoura do conflito em urn mundo de multipla soberania Mesmo nlio negando inteiramente o papel da moralidade do direito e da diplomacia os realistas dlio maior peso a fora militar como instrumento de manutenao da pazles acreditavam que o mecanisme central para rgJar o cggflito era o equilfbrio dePQg atraves do qual a fora maior de urn Estado seria eoiiiiiensada pelo aumento da for a ou pel a ex pan sao das alianas dos outros est Jtla ra dada no sistema mas tambem poderia ser promovicfiicgntnemiite Paialelamente urn grupo de realistas do lado europeu doAtlantico desenvolveu o que ficou conhecido como a escola inglesa Charles Manning Martin Wight Hedley Bull e Fred N offfiedgeefizrm o grau mggyellla intrncionl era amirqui0 isto e sem urn go vfl9xntxal 9 Eles perceberam is so nlio CClllO CS mas como urn erto tipo de sociedade isto e urn grupo de Estados que intera gjll deacoroocOm certa convenoesEstas inclufam a diplomacia o direito internacional o equilfbrio de poder o papel dos grandes poderes e mais controvertidamente a propria guerraEsta escola continua a produzir trabalhos consistentes com orientalio e quali dade como e evidente nos escritos de Alan James Michael Done lan James Mayall Adam Watson e outros 10 Depois da Segunda Guerra Mundial com o crescimento do estudo academico das rela5es intemacionais o realismo se tornou a a bordagem dominante senlio unica na area Ele possufamtXPJcalio poderosa e abrangente das rela5es internacionalse do conflito Em 8 EH Carr The Twenty Years Crisis London Macmillan 1966 Hans Morgenthau Politics Among Nations 5ed New York Alfred Knopf 1978 Henry Kissinger A World Restored Boston Houghton Mifflin 1957 Kenneth Waltz Man the State and War New York Columbia University Press 1954 Hedley Bull The Anarchical Society Oxford Oxford University Press 1977 Fred Northedge The International Political System London Faber Faber 1976 10 Alan James Sovereign Statehood London Allen Unwin 1986 e seu contraataque aos desenvolvimentos te6ricos recentes nas RI The realism of realism the state and the study of international relations Review of International Studies v15 n2 July 1989 Michael Donelan Elements of International Political Theory Oxford Clarendon 1990 James Mayall Nationalism and International Society Cambridge Cambridge University Press 1990 Adam Watson The Evolution of International Society London Routledge 1992 24 Fred Halliday muitos debates publicos nos quais os assuntos internacionais eram discutidos ele estava em harmonia com o senso comum Alem dis so os eventos dos anos 30 e suas conseq tienchis reiifiiiliaramno po derosamente e sem contestalio N ormalmente pressuposto como uma evolulio dentro do mundo de lfngua inglesa Qealismo arti clllclllikas a dNQs esprFa ciraides de os anos 20 11 Na veraade muitos dos temas centrais do realismo apirecemcomo descendentes domesticados do darwinismo soci al militarista e racista do final do seculo XIX e infcio do XX Ao mesmo tempo seria de se esperar que a crescente preocupalio da ciencia polftica com o poder e com suas formas nlio constitucionais embasassem esta tendencia de estudo da polftica de poder dentro do campo academico das rela5es internacionais 12 0 domfnio do realismo comeou a ser desafiado nos anos 1960 permanecendo sob presslio desde entao 13j partir de 1960 o beha viorismo apareceu como uma alternativa as RI ortodoxas como a outras areas das ciencias sociais nos nfveis metodol6gico e con peitualDesta maneira a nova escola cientffica das rela5es in ternacionais quase exclusivamente americana buscou afastarse dos usos tradicionalistas da hist6ria e de termos polfticos ortodo xos como Estado em direao a urn novo estudo quantificadc e do que podia ser observado isto e do comportamento que neste caso eram os processos e os relacionamentos internacionais Karl Deutsch estudou o crescimento das comunicaoes internacionais James Rosenau enfocou as intera5es informais liga5es trans nacionais entre as sociedades que passavam ao largo das rela5es ortodoxas entre EstadoEstado Morton Kaplan desenvolveu teo rizacoes mais cientificas dos sistemas internacionais 14 Nas rela 5es internacionais aconteceu urn debate variado e freqlientemente amargo entre tradicionalistas e behavioristas espelhado na substancia e nas nuances dos temaslevantados em discussoes pa ralelas dentro da ciencia polftica As crfticas severas de Bernard Cri ck o analista da polftica sobre a ciencia polftica dos Estados Uni dos tiveram equivalentes nas Rl Nesta troca na qual ambos os lados ultrapassaram suas competencias filos6ficas e metodol6gi Carl Schmitt The Concept of the Political New Brunswick NJ Rutgers University Press 1975 12Charles Merrian Political Power New York McGrawHill 1939 Harold Lasswell Who Gets What When How Cleveland Ohio The World Publishing Company 1958 13Para uma critica irrefutavel das afirmaoes realistas ver Justin Rosenberg Whats the matter with realism Review of International Studies v16 n3 October 1990 14Karl Deutsch Nationalism and Social Communications New York Wiley 1953 James Rosenau ed Linkage Politics New York Free Press 1969 Morton Kaplan System and Process in International Politics New York Wiley 1957 Repensando as rela6es intemacionais 25 I cas a escola inglesa permaneceu firme contrapondo historia e julgamento contra o que era visto como a abordagem vulgar e enganosamente cientffica da ciencia politica americana 15 A is to deveremos voltar no Capitulo 1 A tentativa completa dos behavioristas de suplantar as RI tradi cionais falhou em tres aspectoschaves Primeiro o realismo e a sua posterior variaao o neorealismo mantemse como a abordagem dominante dentro do estudo academico e de polfticas das relaoes internacionais 16 Segundo o proprio desafio teorico colocado pelo behaviorismo para suplantar o estudo precientffico do Estado e de outros conceitos historicos convencionais com uma nova teorizaao cientffica nao foi Ionge o bastante principalmente porque falhou em fornecer uma teorizaao alternativa do proprio Estado Terceiro sua promessa de teorizaao e angariamento de fundos para chegar a gran des novas conclusoes sustentada pela fora da coleta de dados nun ca foi cumprida No fim o behaviorismo tor urn acessorio ao inves de uma alternativa a abofdigerii centrada no Estado Apesar disso a partir do desafio behaviorista e das posteriores teorizaoes dos fatores transnacionais e sistemicos uma nova variedade de subcam itffs1iW5frfno economia politica internacionaliAssim se o ealtsmo eo neoreat mo continuaram predominado eles nao mats tmham o monopoho intelectual ou institucional dentro da disciplina Ramos da abordagem behaviorista da analise de polftica extema da interdependencia e da economia politica intemacional conseguiram conquistar urn Iugar per manente no conjunto da discussao A analise de politica externa o estudo de fatores determman do resultados de politica externa e decisoes em particular foi uma tentativa ambiciosa e em muitos aspectos bemsucedida de desafi ar os pilares centrais do realismoY Ao buscll1i cmg Pf tica extema e formulada ela rejeitou agumas das preiDISaS reahs tas centrais as de que o Estado pode ser tratado com umator unita rio que pode ser levado a agir racionalmente para maximizar seu poder e defender o ilttlaQrtl que o carater interne e as m Este debate e resumido em Klaus Knorr e James Rosenau eds Contending Approaches to International Politics Princeton Princeton University Press 1969 Ver tambem o debate contemporaneo entre Rosenau e Northedge emMillenium vS n1 1976 16Sou particularmente grato ao meu colega Michael Banks por sua consideraclio do deate ver por exemplo seu The interparadigm debate em Light e Groom eds lnternatwnal Relations 17Ver em particular o capitulo em Light e Groom eds International Relations de Christopher Hill e Margot Light 26 Fred Halliday fljeilUIIJJSJ9QLLratag2PllltP est do de sua polfttc tlla parttcularmente esta ultima e uma aas relvindicaao favoritas de Waltz Pelo contrario a analise de polfti ca extema examinou a composiao do processo de sua formulaao primeiro em termos de fragmentaao e rivalidade burocratica e in dividual dentro do Estado e entao em termos de demandas polfti cas mais amplas incluindo as das legislaturas da imprensa da opi niaoiublica e da ideologia Esta abordagem abriu a possibilidade para o estudo comparado da p itica extema e das formas pelas quais as diferentes caracteristi cas constitucionais hisoricas e sociais afetam sua formulaao e a im plementaao algo antes exclufdo pela negaao realista da relevancia dos fatores intemosJA conclusao alcanada por este caminho nas investigaoes intemacionais e nas domesticas foi que a premissa da racionalidad deveria dar Iugar asJqtJyrocr1if tfffi as conseqli8iiclas niioiniendonals As nusoes individuais e de grupos ao pensamento de grupo e assim por diante A suposiao de que os Estados poderiam ser tratados como maximizadores racionais de po der e calculadores do interesse nacional provouse uma base inade quada e equivocada para a analise de politica extema 0 mais importante desafio da analise de polftica foi entretan to a reivindicaao realista de que OS Estados podem ser tratados unicamente como unidades em urn ambiente sem referenda as suas estruturas intemas e as mudanas dentro deles 0 que a analise de polftica extema procurou mostrar foi nao somente que sua aborda gem incorporando fatores domesticos poderia fomecer uma con sideraao mais persuasiva da formulaao da politica extema e de suas irracionalidades mas tambem que era necessaria identificar as formas pelas quais os ambientes domesticos e os processes dos pa fses eram afetados por fatores exterilos estivesse o Estado envolvi do ou nao nesta interaao Este foi evidentemente o caso dos pro cesses economicos altetaoes no preo mundial do petroleo tinham efeitos sobre os pafses independentemente do que os govemos es colhessem fazer e tambem dentro de varies processes ideol6gicos e politicos As sociedades estavam interagindo de forma transnacio nal e estas ligaoes ao inves das interestatais estavam tendo urn impacto na politica extema Confrontados com tais desafios e influ encias extemas OS Estados dependendo das circunsdincias agiam para acomodalas ou evitalas A analise de politica extema nascida da rejeiao behaviorista de conceifosliisiiiiidoiirus no cfesenvoiveuumaieodado EstadoEia tiiinataiiioem outras Iiiiiitaoes uma preocupaaoestritfutichi cizada com decisoes e urn conceito sociologicamente ingenue do ambiente intemo Por esta razao ela falhou em aproveitar a opor Repensando as rela6es intemacionais 27 I tunidade que depois beneficiaria a literatura da sociologia hist6ri ca de uma analise abrangente e combinada dos papeis internes e externos dos Estados Mesmo assim foram as conquistas da analise de polltica extema que levantaram esta questao e tornaram possfvel examinar a relaao internoexterno sob uma nova luz Neste contexte surgiu uma abordagem diversa baseada na Jn terdenendencia urn conceito utilizado para examinar como as so 4 rr ctddes e os Estados estao e tmndo ada yJJl l mterhgaQ e as conseqiiehcias de talprocesso 0 desenvolvimento da literatura sobre interdepeiidnCla ilustra bern as oportunidades e armadilhas do rconhecimento 4a conli nt llstl e lijiijlfioriaI Apesar de fomecer urn quadro para examinar esta ligaao ela fre quentemente tern levado a simplificaao da relayiiO e a facil afirma aO de que tudo agora e interdependente A interdependencia e urn termo que tern estado intermitentemente em voga par urn seculo Em seu uso contempodineo ele se originou como urn conceito na economia onde comparativamente tinha urn sen tido mais claro de acordo com o qual duas economias sao interdepen dentes quando existe uma relativa igualdade de poder entre elas e quando sua interaao mutua e tal que cada uma e significativamente vulneravel as aoes da outra A interconexao produzia vulnerabilidade e a partir daf auava como uma restriao ao que as outras poderiam fazer Em sua fonna chssica a percepao era de fato que o aumento do comercio entre as naoes fortaleceria a paz uma ideia de sensa comum antes da Pri meira Guerra Mundial mas que desde entiio nao era ouvida Sua ree mergencia nos anos 1970 foi tanto uma resposta a eventos economicos o declfnio do d6lar a elevaao dos preos da OPEP Organizaao dos Pafses Produtores e Exportadores de Petr6le quanto ao impacto politico dentro dos EUA da Guerra do Vietnapm sua formulaao dos anos 1970 e especialmente no trabalho de Robert Keohane e Joseph Nye ela se sustentava em tres proposiyoes que o Estado estava per dendo a sua posiao dominante nas relay6es internacionais para atores e foras naoestatais como as corporaoes multinacionais que nao mais existia uma hierarquia de questoes internacionais com os assun tos mJitares e estrategicos a high politics no topo e as questoes eco nornicas e de bemestar a low politics mais abaixo e que o poder mi litar estaya perdendo sua importancia nas relaoes intemacionaisf Mesmo se a visao realista de urn mundo estrategicamente orientado e estatocentrico tivesse sido verdadeira no perfodo anterior este nao mais era o caso a medida que as antigas barreiras cafram e as foras econo micas e polfticas prestavam cada vez menos atenao ao Estado Robert Keohane e Joseph Nye eds Transnational Relations and World Politics Cambridge MA Harvard University Press 1971 28 Fred Halliday A teoria da interdependencia foi criticada a partir de vanas pers pectivas Waltz argumentou que ela era historicamente erronea ja que a interdependencia havia sido em varios aspectos muito maior no passado do que no presente 19 Waltz e outros encararam a maior interaao como estimulando o conflito boas cercas fazem bons vizinhos eles disseram Northedge e Bull contestaram a visao de que para os Estados era verdadeiro ou desejavel perder o controle sobre suas populaoes ou ceder a responsabilidade de administra ao de assuntos internacionais apesar de toda discussao sobre as questoes globais e os bens comuns universais eram os Estados que por bern ou por mal continuavam responsaveis pela resoluao destas questoes de paz fome e ecologia Os indivfduos continua vam se identificando tanto quanto antes com os Estados e os consi deravam como essenciais para o desempenho de funoes de segu rana representaao e bemestar Os marxistas apontaram que a in terdependencia aplicavase na melhor das hip6teses a urn peque no grupo de pafses ocidentais desenvolvidos e que sua utilizaylio nas rela6es NorteSui escondia assimetrias de poder e riqueza que eram causadas pelo sistema imperialista A ideia de interdependencia tambem perdeu importancia com a deterioraao das rela6es internacionais no final dos anos 1970 e infcio dos 1980 Nos contextos lesteoeste e do Terceiro Mundo parecia me nos evidente que o poder rnilitar havia perdido sua importancia as rela oes internacionais pareciam concentrarse uma vez mais e de uma for ma bastante tradicional nos Estados e nos grandes poderes em particu lar a substituiao1 ou o desprezo ao Estado assumiam em muitos casos uma forma maligna Ionge do que tinham previsto os expoentes liberais da teoria da interdependencia seja em situaoes de guerra civil Lfba no Sri Lanka como no crescimento dos processes transnacionais que nao eram bemvindos o terrorismo a poluiao e o voo de capitais dentre eles Os atores naoestatais como os novos movimentos sociais nao eram todos benignos assim como os primeiros inclufam facoes religi osas famticas e movimentos de juventude racista junto com o Oxfam o Bandaid e Anistia Intemacional a ultima categoria inclufa a Mafia e o Cartel de Medellin 19Kenneth Waltz The myth of national interdependence em Charles Kindleberger ed The International Corporation Cambridge MA MIT Press 1970 Repensando as rela6es intemacionais 29 I AS RELAOES INTERNACIONAIS DESDE 1970 Os desafios do behaviorismo da interdependencia e da eco nomia polftica internacional ao realismo minaram seu monop6lio anterior na area e produziram uma disciplina mais competitiva e diversa Isto por sua vez encorajou a emergencia de varias outras abordagens defendendo ou rejeitando o realismo A reafirmaao do realismo o ltmSFllflisni61 a qual voltarei no Capftulo Ilespondeu as preocupa6esda ecoriomia poHtica in temacional mas buscou restabelecer a primazia dos Estados e das preocupa6es polfticomilitares dentro de sua analise global Assim Stephen Krasner atribuiu o fracasso dos Estados do Terceiro Mundo em arregimentar apoio para sua Nova Ordem Economica Intemaci onal nao a sua fraqueza economica mas ao inves dis so a sua fra queza como Estados e a sua adesao a principios que se chocavam J com os dos Estados dominantes no sistema internacional 20 Robert Tucker destacou o contfnuo papel dos gran des poderes e da fora militar na manutenao do sistema internacional e imputou a pobre za dos Estados do Terceiro Mundo a fatores polfticos e economicos end6genos 21 Os pilares centrais do neorealismo foram entretanto J ostos com maior clareza em dois trabalhos do final dos anos 970 he Anarchical Society de Hedley Bull e Theory of Internatwnal e ations de Kenneth Wattilcujos argumentos sao revistos critica mente nos Capftulos 4 e 1 respectivamente 22 Ambos reconhece ram e buscaram refutar as crfticas das duas ultimas decadas Desta for ma procuraram destacar a JJjQJa d EtaQ2 J1J1Jl internaio nal e opqderPP1Por4Jlcls llorsioestatais Ao ntesmo tempo eles debateram qu os soSQnomJCOs como qutsqur outras atividades transnaciOnatsrqYQtnque osEst4s provtdenct assem a segurana earegylaijQnecessarias para a sua contiiiu1dadeEles eram ceticos quanto as reivindicaOeS de que a interdependencia estava aumentando e destacaram a contfnua importancia dos grandes poderes na administraao das rela6es intemacionais jara o bern ou pata o mal Se o neorealismo respondeu as crfticas ao realismo pela reafir maaO de seus pilares tradicionais outros levaram a analise das RI para ainda mais Ionge da ortodoxia estabelecida Em uma extensao radical do behaviorismo John Burton em seu World Society e outros trabalhos desenvolveu uma teoria de rela6es intemacionais baseada nas necessi dades individuais e no conjunto de questoes geradas por estas ne 20Stephen Krasner Structural Conflict The Third World Against Global Liberalism Berkeley University of California Press 1985 21Robert Tucker The Inequality of Nations London Martin Robertson 1977 22Kenneth Waltz Theory of International Relations New York Random House 1979 30 Fred Halliday cessidades 23 Na visao de Burton o sistema internacional era par tanto uma teia de intera6es definidas por questoes dentro das quais as estruturas especfficas do poder militar e estatal desempenhavam urn papel distinto mas nao exclusive ou predominante Enfatizan do a resoluao do conflito atraves das media6es de grupos peque nos ou individuais o trabalho de Burton rompeu e forma extrava gante com a visao das rela6es intemacionais centrada no Estado pela introduaO de uma analise e abordagem alternativa de polftica Paralelamente no Projeto de Modelagem de Ordem Mundial Richard Falk desenvolveu uma teoria de alternativas e oposi6es ao poder do Estado no nfvel intemacional baseada nas necessidades huma nas e nas intera6es transnacionais e naoestatais 0 aprofundamento da relaao entre o mJttismo e as RI cons titui outro desenvolvimento nao ortodoxo Cfos anos 1970 e 1980 e sera discutido no Capftulo 2 Como ja indicado a porta de entrada do marxismo nas RI foi a questao do subdesenvolvimento e de muitas maneiras ele permaneceu conflnadoaesta iireaAvisao marxista classica altemativa sobre o desenvolvimento foi descon siderada segundo a qual interessava ao capitalismo desenvolver o Terceiro Mundo assim como algum de seus conceitos funda mentais mais relevantes para as preocupa6es das RI referentes as causas das guerra ao papel das classes e ao carater da ideolo gia nao foram utilizados na analise internacional Ao defender a primazia de uma agenda alternativa as rela6es NorteSui e as estruturas internacionais de exploraao o marxismo deixou as rela6es intemacionais inc6lumes A separaao das RI da influen cia marxista foi maior do que nas outras areas das ciencias sociais e certamente foi causada pela predominancia dos escritos ameri canos na area que refletiam urn clima intelectual no qual o mar xismo estava totalmente ausente Somente nos anos 1980 esta situaao comeOU a mudar Dentro dos escritos da economia poHtica internacionalhouve uma aplicaaO dos conceitos marxistas para analisar as causas e as conseqliencias de urn mercado cada vez mais internacionalizado e das novas formas que ele estava assuminJeno da analise de poHtica extema tomouse pos sfvel nao somente exarhinar como os fatores burocraticos e constitucio nais afetavam resultaoos polfticos mas tambem como eles mesmos eram moldados pelos fatores hist6ricos e sociais mais amp los incluindo fato 23John Burton World Society Cambridge Cambridge University Press 1972 Para uma critica de Burton ver Christopher Hill Implications of the world society perspective for national foreign policies em Michael Banks ed Conflict in World Society A New Perspective on International Relations Brighton Wheatsheaf 1984 Repensando as rela6es intemacionais 31 I res intemos de classe 24 0 papel dos setores de produao militar na promoao e exagero da confrontaao intemacional e urn exemplo 6bvio e nao negligenchivel disto 0 crescimento da literatura de s6ciologia hist6rica sabre as questoes da competiao internacional e da formaao de Estado cri ticamente engajada com o marxismo forneceu uma oportunidade particularmente frutifera para urn novo trabalho sabre as relaoes ex6genasend6genas e sabre as formas pelas quais os Estados in teragem com o sistema mundial 25 taJitXE Pssyl diQtir o mais imprante 11egligenciaclo elelllto do realismo 9 seja sua fClP galrritQriaLde tqo urn assuno ao qual voltarei no Cap1tulo 3uase todo o debate entre o reahsmo eo marxismo tern girado efntorno do problema do Estado mas raramente se reconhece que isto envolve duas concep6es bastan te distintas de Estado que levam a conjuntos diferentes de ques t6es uma das concep6es e a legalterritorial emprestada do di t reito e da ciencia politica tradicional a outra e o conceito alterna tive emprestado do marxismo e da sociologia weberiana segun do o qual o Estado e percebido como uma entidade administrati vacoercitiva urn aparato dentro dos paises e das sociedades ao inves do pais como urn todstas concepoes incluem as inopor tunas questoes de como o iiirernacional e o domestico interagem e como as rela6es entre os Estados e as pessoas sao afetadas pelos fatores internacionais em mudana sejam estes o papel dos Esta dos na guerra ou a transformaao de padroes internacionais para o reconhecimento de urn governo legitime Uma corrente ainda mais recente e critica a surgir das RI foi a in fluenciada pelo feminismo assunto do Capitulo 6 deste livro Ate a me tade dos anos 1980 as RI pareciam ser mais indiferentes as quest6es de genera do que qualquer outra area das ciencias sociais uma situaao gerada pela aceitaao generalizada da distinao entre uma area conven cionalmente masculina da alta politica da segurana internacional e do statecraft e uma feminina de domesticidade de rela6es interpes soais e de localidade Esta indiferena mutua tern entretanto sido subs 24Para uma abordagem sociol6gica altemativa a polftica extema ver David Gibbs The Political Economy of Thirld World Intervention Mines Money and US policy in the Congo Crisis London University of Chicago Press 1991 25Exemplos desta interaao entre a sociologia hist6rica e o intemacional incluem John Hall Powers and Liberties London Pelican 1986 e Michael Mann The Sources of Social Power vol 1 Cambridge Cambridge University Press 1988 Estas questoes foram exploradas adicionalmente em urna serie de seminruios patrocinados pelo Economic and Social Research Council sob o titulo Structural Decline in the West realizados em Cambridge entre 1988 e 1991 As atas da primeira destas conferncias esHio em Michael Mann ed The Rise and Decline of the Nation State Oxford Basil Blackwell 1990 32 Fred Halliday tituida face a dois processes convergentes Urn provem da esfera da politica em varias areas da politica internacional as quest6es de genera ganharam proeminencia em anos recentes Estas incluem as quest6es referentes as mulheres nos processes de desenvolvimento ao direito internacional e as politicas da CE com relaao as mulhe res e aos impactos diferentes sabre homens e mulheres de proces ses socioeconomicos dentre eles a migraao e as politicas de ajus te estrutural A dispersao do envolvimento das mulheres em movi mentos contra a guerra e as armas nucleares gerou urn outro ponto de interseao especifica de generaEm uma area bastante diferente os escritos feministas comearam a discutir alguns conceitos cen trais da teoria das RI questionando sua neutralidade de generqlEs tes inluem os conceitos de interesse nacional segurana poder e dlreltos humanos todos aprsentiiRrsifaTilerafura dominante como netitros contudo como 0 reexame feminista tern rilostiado cada urn deles tern urn significado de genera implicito Acima de tudo o fe 1 mm1smo como as outras teonas que enfatizam os direitos individu ais e sociais questiona o nucleo da pratica convencional das rela 6es intemacionais o valor supremo da soberania Por exemplo o estabelecimento de Estados independentes levou em muitos paises a deterioraao da posiao das mulheres visavis OS homens com afirma6es de soberania e identidade nacional sendo usadas para negar a legitimidade de tais questoes Existe portanto urn espao consideravel na pratica e na teoria para os questionamentos femi nistas frente as reivindica6es do nacionalismo e a suposta autori dade do Estado soberano OS PARAMETROS DO REPENSAMENTO Este capitulo discutiu que o taacional nao e um com E2e adisioul1u recente da reah ae Qf1 e pohhcliIilaS l111 4eeJmntoscruraaourosecoiistitutivos fguafmeiiteere debateu o Iugar dasRI emseucontexioTntefetuaT e hist6rico mais amplo Antes de mais nada a parceria entre as RI e as outras cien cias sociais pode ser definida pela abordagem conjunta que estas disciplinas podem oferecer sabre temas domesticos e internacio nais na consideraao de questoes especificas ou eventos e possi vel analisar em que medida o internacional desempenha ou nao urn papel determinante 26 Tres grupos de t6picos interrelacionados se 26Dois exemplos o papel do imperialismo em mol dare distorcer as economias nacionais dos Estados do Terceiro Mundo o papel da Guerra Fria no fortalecimento do govemo centralizado nos EUA e na producao de urn estado de segurana nacional Repensando as rela6es intemacionais 33 I mostraram presentes 0 primeiro foi 0 dequestoes de odapoJif ca no sentido mais tradicional e normattvo do termo o ng ao seja Plla com a amilia o Esado ou a soctedde cosopolt ta de justia de sua tmplementaao ns nvets nawnal e mterna cional e de seu conflito com valores nvats espectalmente a segu rana da Iegitimidade da fora e da coerao dentro e entre os Estados do direito de resistir a Estados sberan 27 m segQ Iugar existe urn conjunto de questoes teoncas nontidalIruJ mais contempodineo a analise do poder a relaao etre as estru turas pollticas economicas e ideol6gics a relevacta dos mode los de escolha racional para a aao soctal e a pohttca para os Es tados as instituioes e os individuos dentro dels 28 Finalmente existe o fsscste livro a expltaao e ststeiJas politicos e sociais a ludos deteriiinants domesttcos e mternact nais ada niyl 9nact2nll e o mtemactQlllYOna arcYCTodavia como indicado acima a separaao dos dts mves udo assim como ada ciencia politic e ds relaoes ntrnact onais tern causado danos a explicaao e anahse Coo Ja arg mentado nao e possivel explicar as politicas de Estados mdtvtduats sem referencia a varios fatores intermicionats do pasado e do pe sente internacioial nao e lgo la fora uma area da pohtca que pode ser convenctonalmente tgnorada e que oaswnamente se m tromete com bombas ou pros mais altos do petroleo 0 mternactonal antecede desempenha urn papel foivo na constituiao e n emer gencia do Estado e do sistema polfticIOgdo fuEJlYl11 neameltUJQtpfvAQlltj eJlJcional e ousc maxtrmzar ss beneficios em urn domfnio para meihorar sas pos19oes no outro s necessidades da competiao interestatal exphcam mmto do desenvolvt mento do Estado moderno enquanto a mobilizaao dos recursos domes ticos e os cotistrangimentos internes dao conta do sucesso dos Esa dos nesta coinpetiao Disciplinas como a cenci politica e a soct logia por urn ado e as relaoes internaclOnats por outro estt Jt olhando para dua tneJlU IJleSJrlO fQeS sem mtru 27Para trabalhos sobre isto ver as referencias na nota 5 tarnbem hares Beitz Poliiical Theory and International Relations Princeton Princetn Umverstty Prs 1979 e Sovereignty and morality in international affairs em Davtd Held e Polztzcal Theory Today Cambridge Polity Press 1991Andrew Linklater Menand Cznens m the ThtoY of International Relations London Macmillan 1981 e Beyond Realzs and Marxzsm Critical Theory and International Relations OxfordOxford Umverstty Press 198 John Vincent Human Rights and International Relatzons Oxford Oxford Umverstty Press 1988 2sEste e dentre outras coisas o domfnio da economia intemaconal Ve m particular Susan Strange States and Markets An Introduction to Internatzonal Polztzcal Economy London Pinter 1988 34 Fred Halliday soes exageradas ou a negaao da especificidade do outro isto po deria sugerir uma relaao estavel e produtiva Contudosta relaao somente pode concretizarse se a disci plina se tornar mais consciente dos tres circulos de influencia que atuam sobre ela e em particular dos fatores externos que os afetam aceitando sua propria sociologia do conhecimentoJUm corpo de pensamento pode relacionarse de maneira efetiva e crftica como mundo real ao se distanciar destas conexoes sem eliminalas e ao estabelecer um conjunto de prioridades e ao perceber como sao afetadas pelos fatores externos A hist6ria das RI fornece muitos exemplos de como este constrangimento externo nao foi adequada mente reconhecido como o fazep a hist6ria da ciencia social e mesmo aquela da ciencia naturalfAs prioridades da area principal mente tern sido as prioridades das elites e dos Estados quando nao diretamente estabelecidas pelas demandas das agencias financiado rasso P9Pbis2nto 1fL2J9liitQdotrablb9 l2T outras duas dimensOgt6es Yitalas e naQdiGJti i oologiaJPNtQJ1tepsJJttasutilizadas 0 poder de 9etermil1ll9 d resultados depende talQJildeterminaaQ quis qllesoesngo so vantadas quanta Cia exclusao de metodos inaceitavei ou dtimRPE ao de uma anaJ2i9ular A representaao extraordinariamente en gartostrfeltapeTas RI do conflito dominante da ultima metade do seculo XX a Guerra Fria assunto discutido nos Capitulos 7 a 9 e um caso mar cante dQhlgica tnilQfgPsstiilis1miito seryfnd9 QOlttrliluminar IDlPM9JlJ1QQI2isoJ2il9ico Igualmente o dominic das superiores metodologias cientificis tas ou de seu oposto convencional os conceitos ahistoricos do siste ma internacional serviram para escbnder outras formas de discus sao dentro da disciplina especialmente sobre o papel dos valores e sobre a ligaao entre as politicas domesticas e as internacionais Como o Capitulo 3 indica na politica domestica e na internacional o ponto de partida o ator e o conceito central o Estado serve a fun 6es ideol6gicas analogas Se a recuperaao da hist6ria das RI eilJ volve a recuperaao de todos os tres niveis o da disciplina o dal ciencia social e o da propria hist6ria uma reconstituiao ou repeli samento do assunto devera simultaneamente estar consciente de sr significado em todas essas tres dimensoes Os capftulos seguintes sao uma tentativa de repensar as rela 6es internacionais ao Iongo destas linhas 0 proximo capitulo ten ta fornecer uma crftica a partir do interior da disciplina das quatro tendencias principais da literatura os outros cinco buscam ampliar a discussao para relacionar as rela6es internacionais a urn conceito mais geral de ciencia social enquanto os ultimos quatro contextua lizam o assunto historicamente e abordam as respostas dos especia Repensando as rela6es internacionais 35 I listas da area Entretanto o teste de qualquer repensamento resi dira tanto em seu compromisso disciplinar ou metodol6gico quanta nas pesquisas e nas analises das hist6rias dos Estados e das sociedades que ele prop5e e incentiva 36 Fred Halliday f i Capitulo 1 AS TEORIAS EM DISPUTA A lntroduao buscou fomecer consideraoes resumidas sabre os problemas e os desafios enfrentados pelas rela5es intemacionais Nos anos recentes face a estes desafios a disciplina tern sido rachada por uma serie de debates metodol6gicos cujos objetivos declarados sao resolver as incertezas e estabelecer uma relaao mais rigorosacom o mundo real Contudo ate agora na maioria dos casas o resultado nao teve maior clareza no metoda ou uma interaao mais equilibrada com a hist6ria Dentro das abordagens estabelecidas houve uma reafirmaao de verdades e no caso das novas teorias urn mergulho na confusio rodeios gerados pela introspecao academica e uma negaao do sig nificado e dos desafios da hist6ria Por urn lado a invocaao da hist6 ria como urn culto aos fatos serviu para negar a historicidade a mu dana e o contexto polltico ou intelectual e por outro a metateo ria solenemente anunciada os debates sabre como escrever teoria tomaramse descolados da analise substantiva A questao nao e criticar a especializaao academica ou o desen volvimento te6rico ambos sao como ja deixado clara essenciais Mas existe boa especializaao e o autoisolamento Jutil existe o trabalho te 6rico rigoroso tao clara quanta possfvel e com potencial explicativo e existe a teoria que nao e nada disso teoricista no sentido de teoria pela teoria freqUentemente cobrindo velho terreno filos6fico ao preten der dizer algo novo pretensiosa onde lhe falta substiincia e confusa mesmo indolente quando e possfvel uma formulaao altemativa Neste sentido duas diretrizes metodol6gicas sao as mais im portantes A primeira e que o se escrever sabre Rl e preciso ser metodoJogicamente consciente e explicito As RI nao sao metodo logicamente especfficas dentro das ciencias sociais Os problemas que tern de fato e de valor de racionalidade e de interpretaao sao os mesmos das outras ciencias sociais o internacional nao tern urn privilegio epistemol6gico ou qualquer outro 1 Este foi persisten 1Este e urn ponto bern desenvolvido no estimulante trabalho de Charles Reynolds The World of States An Introduction to Explanation and Theory Aldershot Edward Elgar 1992 Repensando as rela6es intemacionais 37 I temente o erro do terceiro debate que nasceu nas RI no final dos anos 19802 A tentativa de resolver estas questoes atraves da discus sao so mente do intemacional ou de escrever sabre as RI em separa do dos debates das outras ciencias sociais e presunosa Segundo dado que as RI se referem a urn determinado assun to seja este o real o concreto na hist6ria ou o que for ttstecj IUa teoria e 0 SeU poder explicativo e nao 0 seu distanciamell PJetodol6gico A abstraao pode ser necessaria mas como urn ca minho para a explicaao A altemativa a rna teoria nao e empirismo mas boa teoria em suas dimensoes conceitual e explicativaftios anos recentes as RI tern sido muito empfricas e abstratas e a maior parte da teorizaao nao possui sustentaao na explicaao historical Tomando estas diretrizes como urn ponto de partida este capi tulo examina as quatro abordagens mais substanciais que em varios momentos das decadas passadas vern sendo propostas como solu oes para os desafios enfrentados pelas relaoes intemacionais Es tas sao o empirismo tradicional o empirismo cientffico o neo realismo e o p6smodernismo 0 EMPIRISMO TRADICIONAL A HISTORIA E A ESCOLA INGLESA Todas as ciencias sociais enfrentam dentro e fora das discipli nas o debate que os fatos sao suficientes e que as teorias os con ceitos e a linguagem especializada sao desnecessarias exemplos de jargao ou de pretensao academica Nas rela6es intemacionais isto e particularmente verdadeiro como resnltado de sua invisibilida de muitos daquees preocupados com as questoes internacimais ou que tern uma opiniao sobre elas parecem nao estar consctentes de que existe uma literatura especializada conceitualmente especf fica sabre o assunto Dentro da disciplina tambem existem pressoes equivalentes os historiadores da diplomacia sao cautelosos frente a conceitos e modelos rapidamente os apontam como aberraoes pa literatura repetidamente se neg a a necssidade de tal abalho 3 Jara os estudantes tendo contato com a area pela pnmetra vez a ideia de que existe a necessidade de urn trabalho te6rico freqtit mente vern como mna surpresa nao basta conhecer os fatosfao 2Yosi Lapid The third debate On the prospects of international theory in a positivist era International Studies Quarterly September 1989 0 que a teoria precisava nlio era p6spositivismo mas urn retorno a algumas boas fundacoes prepositivistas 3Dois dentre muitos exemplos ver Michael Howard The Lessons of History Oxford Clarendon 1991 e Walter Laqueur World of Secrets The Uses andAbuses of Intelligence London Weidenfeld Nicholson 1985 38 Fred Halliday consiste o conhecimento do intemacional na observaao do maior numero possfvel de fatos4 Todavia fatos nao sao nas RI ou em qual er outra disci lina sUttctentes As en teas contra o empirismo aparecem freqtientemente em ou tros debates como nos da sociologia e se aplicam ao estudo do intema cional e de todas as outras ciencias sociais5 Primeiro e preciso ha ver alguma preconcepao de quais fatos sao significativos e quais nao sao Os fatos sao inumeraveis e nao falam por si mesmos Para qualquer urn academico ou nao e preciso haver criteria de signifi cado Segundo qualquer conjunto de fatos mesmo se aceito como verdadeiro e significativo pode levar a diferentes interpreta96es o debate sobre as lioes dos anos 1930 nao e sobre o que aconteceu nos anos 1930 mas sobre a interpreto destes eventos Omesino se aplica ao fim da Guerra Fna nos anos 1980 Terceiro nenhum agente humano academico ou nao pode contentarse som nte com os fatos toda a atividade social envolve questoes marais de certo e de errado e estas podem por definiao nao serem decididas por fatosNo terreno do intemacional tais questoes eticasestao disp a questao giiJPlllde QIl hl4yse ledecer J nQilrmuQmuni9Qrtuliorm9 9 ID111clQ JQ psmo 91 avm grYRQacirlJ7 a questao da intervenao a soberania e urn valor supremo ou outros Estados e agentes podem intervir nos assuntos intemos dos demais a questao dos direitos hu manos como definilos eles sao universais No campo das RI a linha divis6ria inicial entre os fatos e a teoria foi traada entre a abordagem hist6rica do intemacional baseada na hist6ria diplomatica e as primeiras tentativas de trazer para as rela oes intemacionais urn trabalho comparado e te6rico sobre o intema cional Em muitos aspectos esta divisao foi superada em varios traba lhos que usain OS desenvolvimentos conceituais das RI para elucidar fases ou epis6dios particulares da hist6ria intemacional6 Nos de mais urn argumento futil e simplista continua a respeito da locali zaao desta linha divis6ria entre as RI e a hist6ria internacional 4No mundo anglosaxlio em particular o empirismo tern o status de uma reHgilio secu lar a habilidade intelectual e misturada com conhecimento geral por esta razlio a competicao britanica por alguem que sabe tantos fatos quanto possivel aparecer sob o nome Cerebro da Inglaterra 5Para duas criticas poderosas do empirismo ver C Wright Mills The Sociological Imagination Oxford Oxford University Press 1959 e David e Judith Willers Systematic Empiricism Critique of a Pseudoscience Heme Hempstead Prentice Hall 1973 6Sobre isto ver o ensaio perceptivo History and Internationalelations de Christopher Hill em Steve Smith eds International Relations British anican Approaches Oxford Basil Blackwell 1985 e seu proprio Decision Making in British Foreign Policy Cambridge Cambridge University Press 1990 Repensando as relaes intemadonais 39 I Nissa a questao real sobre a importancia de uma abordagem abran gente qe relcione o factual e o especfico o copratio e o teorico e perdtda de vtsta em uma d1scussao sabre a h1st6na sem arquivos ou a analise intemacional sem conceitos Uma tentativa conjunta de se mover alem da hist6ria tradicional e para dentro de urn novo terreno te6rico embora guardando uma pers pectiva e urn metoda empfrico traicional foi representada ela es cola inglesa urn corpo de escritres que comeou a produz1r traba lhos nos anos 1950 e 1960 e que ainda hoje possui influencia nas universidades britanicas 6s foras da escola inglesa sao evidentes uma forte resistencia as modas do presentismo uma resoluta insis tencia sabre a durabilidade do constrangimento e da necessidade na esfera internacional unia enfase na repetiao dos conceitos e dos valores no estudo das relat6es internacionais e por fim uma funda ao s61ida na hist6ri Em seus trabalhos existe mais substancia ex plicativa e desafio te6rico do que na maioria da literatur supostamente mais cientffica e contemporanea que buscou substitufla Dois dos conceitos mais centrais da escola inglesa Esta QQ de sao foco dos capftulos subseqlientes Alem das difiCuldades 1evantadas por estes termok a escola inglesa como se reflete no trabalhos de Martin Wight permanece em alguns as pectos limitada por suas origens presa a sua preocupaao em igua larse aos historiadores da diplomada e as bases conceituais que as RI trouxeram consigo da hist6ria intemacional 7 Em primeiro Iugar o conceito de hist6ria com o qual Wight tra balha e curiosamente limitado reis e rainhas congresses e batalhas tra tados e leis Ao permanecer ligado aos historiadores Wight falhou em acompanhar as mudanas no pr6prio conceito de hist6ria o economico e o sociallhe permaneceram estranhos Ao se ler Martin Wight o que e mais surpreendente e qu uso da hist6ria em seli trabalho mesmo bri lhante e erudito e urn nao mais praticado em larga medida pelos pr6 prios historiadoresIgualmente enquanto Wight e seus seguidores insis tem na importancia das questoes filos6ficas e tern o seu esquema con ceitual especificamente a sociedade internacional o seu conceito de filosofia polftica e igualmente datado consistindo no exame e no reexa me de urn conjunto detemas recorrentes favoravelmente agrupados por Wight em tres categorias transfst6ricas de racionalismo realismo e re volucionismo Como urn antfdoto ao present1smo e como urn meio de trazer a tona questoes conceituais analfticas e eticas IUbjacentes a 7Para as crfticas previas da escola inglesa ver Michael Nicholson The enigma of Martin Wight Review of International Studies 1981 v 7 January 1981 Roy Jones The English school of international relations A case for closure Review of International Studies v7 n1 1981 40 Fred Halliday discussao das relaoes internacionais isto foi produtivo Entretan to ela falhou em reconhecer ate onde evolufra a filosofia polftica e como esta oferecia a possibilidade de formas mais diferentes e con vincentes de polftica incluindo a teoria internacional Em varios aspectos foi urn infortunio da escola inglesa que as suas investigaoes filos6ficas isto e a sua deduao de fundamentos te6ricos dentro do intemacional terem sido formuladas pouco antes do grande renascimento da teoria polftica nos anos 1970 e 19808 0 famoso ensaio de Wight Why is There no International Theory pressupoe urn conceito particular de teoria uma filosofia classica substantiva que foi superado por outros escritos quase ao mesmo tempo em que foi publicado 9 A estas limitaoes mais gerais deve ser somado o uso dos concei tos como sera explorado em maior extensao nos capftulos seguintes os termos centrais usados por Wight e Bull sociedade e Estado nao recebem adequada ou mesmo explfcita elaboraao conceitual As defi nioes sao introduzidas ou inferidas de uma forma que serve ao argu mento geral mas que com isso elimina outras possibilidades de expli caao e elaboraao conceitual questao mais 6bvia de todas derivada das afirmaoes ainda nao questionadas da hist6ria diplomatica e sobre o que constitui o pr6prio sistema intemacionalefinilo em termos do crescimento das relaoes entre OS Estados e valido mas isso tambem localiza a hist6ria intemacional no ambito diplomatico e interestatal e supoe que 0 intemacional e composto pelas relaoes entre OS Estados individuais As hist6rias altemativas e os conceitos do internacional po dem ser escritas considerando outros pontos de partida como o econo mico e o social dentrci dos quais o polftico e o llilitar desempenham urn papel importante Os trabalhos de Uobsbawm Wallerstein Krippendorf Wolfe mais recentemente Rosenberg sao exemplos disso o mfnimo qu pode ser dito e que eles fomecem uma hist6riaQ3tanlt diferente dQsis tema intemacional e envolvem urn CEio diferenciado de respostas etictyersao ortoctbre 0 seu jresCiltO e SQQre ensao da sociedadeiiiferilacional 10 8Para duas visoes ver Quentin Skinner ed The Return of Grand Theory in the Human Social Sciences Cambridge Cambridge University Press 1985 Perry Anderson A Zone of Engagement London Verso 1992 9Em Herbert Butterfield e Martin Wight eds Diplomatic Investigations London Allen Unwin 1996 A deferencia a definicao dos historiadores do assunto e presente mes mo no titulo do volume 10Ver Capftulo 3 p568 613 Hepensando as rela6es intemacionais 41 0 EMPIRISMO CIENTIFICO A ATRAAO DO BEHAVIORISMO Uma autoproclamada altemativa a abordagem empirista sustentada pelos fatos nasceu nos anos 1950 e 1960 da revolUao cientlfica dentro das ciencias sociais e da ascensao do behaviorismo como uma altemativa as consirlera6es hist6ricas e empfricas A escola behaviorista anunciou a possibilidade de uma nova ciencia social quantitativa ahist6rica e rosaJgpJlP ntemac enasQYtras Ao mesmo tempoen VOfveu uma critica das escolas preexistentes comoinfundadas e ultrapas sadas Contudo o debate qlle gerou entre Hedley Bulle Fred Northedge do lado tradicional e entre James Rosenau e Morton Kaplan no lade beha viorista foi em ambos os casos equivocadamente orientadoU Em primeiro Iugar este ba sobre metoda formalmente ad quiriu o caniter de confronto entre uas tradisoes nacionais uma aar dagem inglesa e uma americana Esta rna representaao alem de obs curecer as questoes filos6ficas envolvidas serviu para apresentar as rela 6es intemacionais como que de algoma f9rma agrupadas em dois cam pos implicitamente monolftidos e nacionais Ao fazelo escondeu a sua diversidade como a ascensao da econolrlia polltica inteinacional no caso britanico e a grande amplitude de abordagens te6ricas e polfticas no ame ricana Em outras palvras serviu para reforsar a ortodoxia e a polemic ultima estava particularmente evidentena forma pela qual OS escritores naoamericanos nas tradioes criticas tratavam as rela6es intemacionais americanas coino urn todo as vezes imperialita algo que estava Ionge de ser o caso politicamente malorientada e analiticamente imprecisa esta pratica continua com resultados negatives perrnanentDiferencas his t6ricas e re ionais de fato moldam OS escritos de RI rna nao necessaria mente de uma fo omoge As presun6es do behaviorismo norte amencano facilmente encontram semelhanas na complacencia de seus oponentes a historiografia inglesa ou o desafio antiimperialista 12 Segundo embora a critica do empirismo possa ser valida a altemati va oferecida por escritores como James Rosenau ou J D Singer13 foi 11Para materiais sobre este debate vera polmica entre Fred Northedge e James Rosenau em Millenium v5 nl 1976 e os capftulos em Klaus Knorr e James Rosenau eds Contending Approaches to International Politics Princeton Princeton University Press 1969 Para uma previa percepao da crltica inglesa da ciencia polftica americana tocando em muitas das mesmas questoes levantadas no debate das Rl ver Bernard Crick The American Science of Politics London Routledge Kegan Paul 1959 12Ekkehart Krippendorf The dominance of American approaches in IR em Hugh Dyer e Leon Margassaran eds The Study of International Relations The State of the Art London Macmillan 1989 James Rosenau The Scientific Study of Foreign Policy 2ed London Pinter 1980 JP Singer ed Quantitative International Politics New York Free Press 1965 42 Fred Halliday espa 22jetiygiRLintificasou de ciencias sociais em geral M lliltefundamentadas euma JIB9 igpora a necess lla tprevtlJPOImto humane aipmossibiliglflJ anahse semnteto 1Jgmfica9oQPapcidasiJlJlYMla iumana Alem dtsso a despeito de reivindicaoes de cientificismo o behaiorismo funciona dentro de urn conceito ilegftimo de iencia se fm dtto que os polfticos seutilizam de concep6es de economistis mar to muitos cietistas sociais nao poucos nas RI valemse de precon cettos dos falectdos fil6sofos da ciencia como John Stuart Mill 1806 73 Em muitas areas da ciencia natural a prediao nlio e urn criteria de vahdade Igualmente as ciencias naturais tambem funcionam com mui tos oceitos que nao podem ser quantificados ou apresentados com prectsao Iromcamente para os positivistas a ciencia natural freqtiente mente trabalha com urn conceito de analise bastante semelhante ao de julgament Sdsprezado quando usado pelos tradicionalistas Na verdade fot tromco que no auge do behaviorismo e de sua reivindica a ingenua d ciencia Kuhn tenha publicado sua Structure of Sci entific Revolutzons mostrando como fatores alheios institucionais mol dam d fi 14 0 d agen as espect teas porque os EUA em muitos aspectos uma soctedade modema terem fetto tanto espalhafato para metodologias ultrapassadas e uma curiosidade tanto quanta a falta de urn sistema nacional bancario r A este cassos metodol6gicos deve ser somado o aspecto esre nl de tal posttltsmo com em outras cincias sociais as grandesestru turas e quantlficaao e algebra geralmente produziram banalidades obscundades ou ambas na pressa de evitar categorias institucionais su postamente ultrapassadas como Estado ou guerra os academicos fieram s e interaoe cnfusas ou de excesso taxinomico na rejei ao dahtstona os behatostsproduziram conclus6es que freqtiente mente tgnoram a analogta histonca e que exageram a especificidade de fenomenos contempodineos ed a globalizaao 1 Vf s resulds d behaiorismo nas RI sao portanto pobres a re Jlla behavtonsta functonou como urn pesado desvio intelectual e r 1 dtsctplmar P la acumulaao via delados e collparaoes transist6ri 1 1Ji cas sem sentido Entanto alem de uma bemvmda sacudida no 1 batesohrepdolgulfas conseguencias f6rteis seguifam tr Como Ja dtscutldo na Introduao surgiu uma ampla exploraao do process de formulaao de poht1ca extema conhecida como analise de pohtlca extema A segunda conseqtiencia positiva foi a exploraao de novas formas de interacao intemacional agrupadas sabre o termo interdependencia Para duas outras criticas bastante diferentes da visao ortodoxa do metodo cientffico ver Rom Harre The Philosophies of Science London Cambridge University Press 1972 e Paul Feyerabend Against Method London NLB 1975 Repmsando as rela6es intemacionais 43 Se estas foram conquistas significativas da virada cientffica das RI elas fdram obtidas nao por causa da reorientaao da disciplina mas apesar dela Por todo o lado muitas das piores caracterfsticas desta revoluao iriam ser percebidas a busca louca por uma precisao e prediao enganosas a crescente absorao pela disciplina de lingua gem trivial e privada afirmaoes trabalhadas e exaltadas do obvio Urn exemplo desta abordagem foi a tentativa de fomecer uma base empiricamente precisa para as teorias sobre as causas da guerra 15 Outro foi a afirmaao sem profundidade conceitual ou historica da supera ao do Estado pelo desenvolvimento transnacional Mesmo os que nao foram sugados pelos espirais metodologicos dos behavioristas mais comprometidos apresentavam a sua propria nova abordagem em oposiao a preocupaao supostamente ultrapassada com o Estado a despeito de seus insights esta foi uma falha permanente no trabalho de James Rosenau 0 resultado final foi o fracasso em quebrar as pre missas teoricas da escola realista dominante e o seu conceito de Esta do Muitos que comearam a anunciar a superaao do Estado pelo novo fenomeno transnacional nos anos 1960 terminaram aceitando a sua continua atualidade e relevancia teorica oferecendo sugestoes para o aperfeioamento da abordagem realista Robert Keohane urn dos fundadores da abordagem transnaci onalista e urn importante exemplo disto e urn dos autores mais li dos e inovadores trabalhando com a teoria das relaoes intemacio nais Dentre os escritos influenciados pelo behaviorismo seu traba lho de 1970 estava entre os melhores e menos dogmaticos e cien tfficos Publicado em 1984 After Hegemony marcou uma impor tante mudana no gebate sobre o transnacionalo pois se utili zou de uma das suposi96es centrais do realismo a de gue nao haver ordem no sistema sem grandes poderes e sem ummento diresao e autoridade definido como hegemonial6 Apesar de sua centralidade para o desafio desta premissa realista o trabalho de Keohane continha varias 5escisggyis Talvez para estabelecer urn contexto historico adequado ele superestimou o declfnio da influencia dos Estados Unidos no mundo e o papel de suas supostas sucessoras as instituioes intemacionais neste caso a Agencia Intemacional de Energia Atomica Alem disso ele incluiu algumas 15Para uma consideracao ver James Dougherty e Robert Pfaltzgraff Contending Theories of International Relations 2ed p34750 New York Harper Row 1981 Como os autores cautelosamente colocaram Ate agora tecnicas estatfsticas niio produziram ne nhum resultado util ou conclusivo para o desenvolvimento de uma teoria coerente da guerra p347A frase ate agora contem certamente a promessa de uma ruptura mais de uma decada depois nenhuma foi reportada 16Robert Keohane After Hegemony Cooperation and Discord in the World Political Economy Princeton Princeton University Press 1987 44 Fred Halliday suposioes teoricas questionaveis a sua consideraao historica do de cHnio dos Estads Unidos estabeleceu uma divisao muito abrupta entre o poder 111ilitar e economico e falhou em reconhecer as formas pelas quais a proeminencia militar dos Estados Unidos e a sua lide rana algo que continuou depois da Guerra Fria geram beneffcios economicos e senhoriais A analise das relaoes de poder no mun do contemporaneo foi especffica aquelas entre OS pafses desenvolvi dos e nao inluiu as relaoes entre os Estados menores e menos de senvolvidosPor esta razao em uma avaliaao geral ele subestimou as hierarquias e os beneffcios oligarquicos reconhecidos abertamente pelas teorias do imperialismo e do realismo Adicionalmente Keohane somente se utilizou de uma definiao realista de Estado a partir da qual buscou definir sua propria teoria trans nacionalista e se distanciar do realismo e do marxismo percebidos como compartilhando de uma posiao comum Embora nao hostil ao marxis mo e desejando levar seus argumentos a serio em uma oportunidade ele se define como seguidor de Kautsky yo resultado foi que Keoha ne se recusou a ver que dentro do marxismo o Estado pode sig nificar algo muito diferente do que no realismoAlem disso no mar xismo este conceito e incorporado em uma teoria de poder que engloba muitos dos fatores economicos sociais e ideologicos agru pados por ele dentro da teoria da interdependencia 0 NEOREALISMO SISTEMA SEM CONTEUDO Jface a estas mudanas e da crescente importancia das questoes economicas na agenda intemacional a escola dos realistas previamente confinada a reflexao hica e filosofica gerou urn novo corpo de tra balho o neorealismoO trabalho de Krasner e Tucker ja mentiona do na Introduao teve urn papel importante Se em alguma medida o neo serviu para esconder a reafirmaao de temas tradicionais sobre o Estado o poder e o conflito ele tambem refletiu duas importantes revisoes no carater da agenda anter por urn ado uma maior atenao ao papel do econormco nas rela6es interestatais cojno urn instrumento mercantilista e competitivo de poder estatal e nao em termos de aborda gens transnacionais ou interdependentes por outro uma reviso teori ca em uma tentativa de trazer mais rigor a teoria e isentala dos ataques 17Karl Kautsky o lfder socialista alemiio foi o criador da teoria do ultraimperialismo de acordo com a qual os poderes principais reduziriam suas tensoes e colaborariam contra o resto do mundo Poucas anaIises nas ciencias sociais tiveram um destino tao infeliz no curto prazo ja que esta teoria foi enunciada no veriio de 1914 quando come rou a Primeira Guerra Mundial Ver Karl Kautsky Ultraimperialism New Left Review n59 JanuaryFebruary 1970 Repensando as rela6es intemacionais 45 metodgfS sofricIopela otra ge2 Qentre os manifestos neo realiStas talveiTheory of International Politics de Kenneth Waltz tenha sido o mais influente 18 A reputaao de Waltz no campo das relaoes intemacionais foi estabelecida em 1959 com a publicaao de Man tht Sf111UJnd War urn trabalho no qual ele comparava as tres imagens dasns 41 guerra a na 4o h9mero a constituisg QQS dos e o sistema intemacional Waltz cotiduiu que era a terce1Jma m gue fomecia abaseprua ateorla cfascaiisas da guerra Urn dos temas centrarsqiie riasceii oeste estudo e se repetiiiemseu posteri or trabalho 6 a id6ia de qu o capiter intemo dos Estados deve ser exclufdo do estudo das reHtoesmtemacionais Apesar de ser uma declaraio lucidliaaposiao realista Man the State and War alcanou suas conclusoes aparenteniente inexo niveis a custa de duas questoes Em primeiro Iugar sua distribuiao das causas do conflito em tres compartimentos separados ultrajou a maneira pela qual as demais abordagens que se distanciavam de sua teoria explicavam a questao Este foi o casoda maioria das teorias baseadas na primeira imagem ada natureza humana que ofereci am uma analise da socializaao da personalidadee do comporta mento humano e mais importante o das teorias baseadas na segun da imagem o liberalismo e o marxismo que tamb6m continham a dimensao intemacional como uma parte essencial de suas explica 1 Oes 0 liberalismo destacava a proximidade entre a democracia e a paz com a primeira determinando a segunda e como urn processo interativo A teoria do imperialismo de Lenin poderia apenas ser forada no molde da segunda imagem pela negligencia de seu exa me detalhado de como o imperialismo Ionge de ser a criaao de urn processo intemo foi o resultado da competiao economica e militar interestatal Segundo como em seu trabalho de 1979 oeoe o gCL denomineoril rduista sillica iSJo 6 9U explicam as relacges internacionais em tetQ do ineJl2QpQlas as queQlhain somente para eniaTriiemacional Para sustentar a swCanalise ele afirma que OS resultados das relaoes intemacionais sao quase sempre os mesmos a despeito das mudanas no carater dos atores 19 A conseqliencia que Waltz retira desta regularidade 6 portanto que Ifule ncessario estudar 0 carater QOS Estados n laoes intemacionais m do que sena necessaria quIdQ M 18Kenneth Waltz Theory of International Politics New York Random House 1979 poroes significativas foram republicadas em Robert Keohane ed NeoRealism and its Critics New York Columbia University Press 1986 que tambem incluiu urn texto adicional de Waltz Reflections on Theory of International Politics A response to my critics Referencias subseqtientes darao ambas estas fontes 1Waltz Theory p 66 Keohane NeoRealism p 53 46 Fred Halliday sam os mercados estudar os funcionamentos intemos das firmas Como sera discutido a segu1resta6urrta conCiioqestior Theory of International Politics inicia com uma afirmaao da ne l essidade e da possibilidade da construao de uma teoria para o estudo as relaoes intemacionais e destaca a importancia de se nalisar as es truturas nas quaire procssam J6ejntrYti Para Waltz es lP iura sigonluntog21ue nosistema 1 mt2il 6 2JJQliticadopordoisprQGeQs s tee taoll19 CQI111JtaIempl Estados e a competi9ao Na visao de Waltz a estrutura do sistema poHiicci internadonal 6 codicionada JOr trs pe pela guill pois nao existe uma au tonde supeno aos Estads pela ausencia de uma diferQiasao ds llidtferyntes fllgad todos os Estados desempenham mais ou menos as mesmas funoes e pela existencia de uma distribuisao de sigual de caeagg ha uma distinao entre os grandeseospequenos poderes Destas proposi6es gerais ele tira varias outras conclusoes a de que o mecanismocentral do sjstema politico internacional 6 o ilf brio de poder e que a natureza de urn sistema interestatal em urn dado riioment6dda pler e elo numero de seus graades EOIt Em opos1ao a multlpolartdade dos seculos XVIII e X esde 1945 o mundo tern sido constituido pela bipolaridade pelas rela9oes entre dois grandes poderes A reconsideraao do realismo 6 aproveitada por Waltz como uma oportunidade para estudar algumas questoes contemporaneas das rela 6es intemacionais com sua teoria Assim ele critica os entusiastas da teoria da ipterdendencia pela falta de perspectiva hist6rica em 1914 aTriteTdejendenciifofJemu1tasmaneiras nlaiordo que 6 hoje e por negligenciar os perigos que uma iriteraao excessiva entreos Estados roQgzJ Em oposiao aos que argurnenfamcomo parte da posl ao da interdependencia que o poder militar 6 menos util do que em 6pocas antefiores Waltz attrma que ele mant6in seus prop6sitos em urn mundo bipolar Para Waltz o sistema bipolar p6s45 foi desejavel pois re oriSQdoconmto No sistema intemacional ele defende UJStnQr Voltando a questao de administrar as relaoes intema cionais Waltz discute contra aqueles que destacam a importancia das instituioes intemacionais e da difusao de poder que a administraao rconstrutva das rlaoes intemacionais deped dos grandes poderes p Ex1stem d01s grandes problemas na analise de Waltz que imedia t amente tomamse evidentes na leitura de sua exposiao e na de seus cri ticos 0 primeiro 6 que sua analise 6 ahist6rica no sentido de que toma como transist6ricas ou permanentes caracteristicas do sistema que sao produto de fases distintas e especificas das rela6es intemacionais As 20Waltz Theory p 73 Keohane NeoRealism p 62 Repensando as rela6es intemacionais 47 palavras de Goran Therbom tern tanta relevancia Para a teoria das Rl como para as outras areas da ciencia social Mesmo o mais abstrato dos discursos te6ricos e os empreendimentos cientfficos sao produrs de sociedades parti cu lares em urn Pa rticular perfodo histo rico Invocando Tucfdides e exemplqs de ylidQ casos hist6ricos rgEm que asettJr clo tmjteJlgpnJer maneddo as inesniiiijiQi milhaces de anos22 Portanto estamos li dandocomumieoria abstrata qucIgiialao sistema de Estados con temporaneos e a sua formayaO a outros processos hist6ricos que ocorreram no perfodo entre a Grecia do seculo IV AC e a epoca p6s 45 A suposi9ao feita par ele e muitos outros escritores de rela96es intemacionais e a de que existia urn sitema intacional antes dos Estadosmpdernos ou na96es ou da emergencia do mercactD internacionl Entretanto esta e uma postura questiomivel tanto quanta a que estuda a polftica de pre9os na Roma antiga e na Ame rica contempodinea ou o comportamento eleitoral na agora grega e nas elei9oes modemas Algumas considera96es gerais podem ser le vantadas e aplicadas a todos os sistemas mas elas seriam tao banais que sua importancia seria marginal Na verdade por todo o texto Waltz faz afirma9oes que somente se sustentam em uma escala hist6rica muito limitada Assim ao discutir a durabilidade dos Estados no mundo contemporaneo ele observa A taxa de mortalidade entre OS Estados e muito baixa23 Se par Estados querse dizer Estados independentes na era modema entao Waltz esta realmente certo Se entretanto seus Estados forem colocados frente a urn registro hist6rico dos ultimos dais mil ou mesmo 150 anos entao a afirma9ao se toma ridfcula o numero de entidades distintas da Euro pa e do Terceiro Mundo que foram dominadas e elirninadas par varias formas de conquista no mfnimo pelos ataques do imperialismo devem chegar a rnilharese a afirma9ao de Waltz sabre a rara morte de Esta dos e tomada como uma caracteristica da estrutura que ele esta discu tindo entao esta estrutura e na verdade uma cria9ao bastante recente posterior a emergencia de urn sistema intemacional na Europa do secu lo XVII e ao tim do colonialismqJ Esta perspectiva ahist6rica e refor9ada pela ausencia de qual quer hist6ria sabre o proprio sistema e em particular sabre as ori gens do sistema estatal contemporaneo no perfodo pasmedieval e a sua rela9ao com a ascensao do capitalismoJa que Waltz aspira a uma analise estritamerite polftica das rela9oes intemacionais e tern 11Goran Therbom The economic theorists of capitalism New Left Review n8788 SeptemberDecember 1974 p 125 22Keohane NeoRealism p 329 13Waltz Theory p 95 Keohane NeoRealism p 90 48 Fred Halliday urn conceito nacionalterritorial de Estado nao existe espa9o em sua visao para urn conceito de capitalismo e para o estudo da rela yao entre a ascensao de Estados diferenciados e a dissemina9ao in temacional deste capitalismo Apesar de toda a sua preocupa9ao com o processo intemacio nal e mais recentemente com os processos econoinicos intemacio i nais a literatura sabre as rela9oes intemacionais e surpreendente 1 mente timida como usa em qualquer oportunidade do termo ca pitalismo Uma das conseqtiencias desta negligencia e que a teoria e a hist6ria que ela infere tern uma considera9ao distinta de I tomo OS Estados e 0 sistema internacional se interrelacionam De acordo com este mito os Estados emer iram como entidades indi viduaiJill9me tetulafiesuns CQJ os otrs or esta razao al afirma As estruturas el coextsenct entre s Est 241so ignra urn das li9es centrais il da soctologta histonca e a sua cons1dera9ao do desenvolvtmento dos Estados OS Estados no sentido de erttidades administrativascoer citivas desenvolvemse como resultados dos processos intemacio nais e nao da forma contrariaA competi9ao militar e a expansao do mercado somadas a existencia de uma cultura comum sao precon di96es e nao resultados da emergencia do sistema estatal A visao ortodoxa de que primeiro os Estados nasceram e depois come9aram a se interrelacionai para constituir o sistema intemacional tern tanta rela9ao com a realidade quanta o rnito do contrato social ou o da cegonha A confusao sabre a hist6ria e a defini9ao dos Estados e evidente na ior dificuldade da e de Waltz reivindica9ao de que as rela96es mtemacionais podem e devem ser estudadas em urn nivel puramente sistemico Os argumentos que Waltz coloca para isso sao ru dimentares que existe suficiente regularidade nas rela96es intemacio nais para desconsiderar o exame das caracterfsticas intemas dos Esta dos e a reivindica9ao mais geral de que a elegancia da teoria e deseja veJAs formula96es de Waltz sobre isso sao novamente reveladoras Seu argumento de que os fatores sisternicos devem ser levados ein conta ao analisar as relay5es intemacionais isto e que OS Estados nao sao sim iemeJiYpaQlQYrm e sgJjiP1tadosjiefiiistema como odEdePrezfylAssim ele plausivelmente coloca Nao eposstvel entender o mundo da polftica mundial simplesmente olhando para dentro dos Estados meu italico25 Entretanto isto e bastante diferente de dizer que os processos inteinos dos Estados podem ser completamente exclufdos da teoriza9ao das rela9oes intemacionais afirmar que as RI nao podem ser estudadas simplesmente pelo exa 24Waltz Theory p 91 Keohane NeoRealism p 85 2Waltz Theory p 65 Keohane NeoRealism p 52 Repensando as relacoes intemacionais 49 me do interno e diferente de considerar que 0 interno nao e impor tante e pode ser ignorado Talvez sob a influencia de outros usos do termo estrutura como aqueles da antropologia e da lingiiftic Waltz e levado para urn uso que e determinfstico e eleyancta das dtferenS ent S Unt dades indiyiduais mas ao fazelo ele mistura oOfeos ae anahs nas quats as consideraoes internas podem mesmo ser tXelevantes as da estrutura como na linglifstica com outros nos quats o externo eo interno de fato se interrelacionam Os Estados nao sao amHogos a morfemas a planetas ou a estruturas de parentesco Waltz e com cer teza auxihado em sua negaao da relevancia do interno pela con fusao padrao das relaoes internacionais sabre o significado da pala vra Estado no significado polfticolegal e estritamente impossfvel perguntar sabre o interno dao qe ele e enilobado par definiao neste conceito Entretanto ao mves de tamar tsso como uma boa ra zao para abandonar este conceito convencional e confuso Waltz uti liza 0 conceito nacionalterritorial em sua conclusao 16gica e produz uma teoria desequilibrada das relaoes internacionais Em resposta a seus crfticos no fim de NeoRealism Waltz pare ce estar disposto a cder urn pouco xnas na ate ao Pto A de abndo nar a sua preferencta par uma teona estrttamente ststemtca em oposiao a reducionista 26 Ao fazer isto entretanto pelo menos ele fornece urn exemplo aberto a interpretaao das teorias reducionista e sistemica Frana e a Alemanha ele diz provvelmete nao mais irao a guerra por causa da mudana em sua sttuaao no ststema nter nacional isto e ees nao sao mais grandes podereSJ7 a etstem muitos pafses med10s e pequenos no mundo que poieffi e rrao a guer ra Ira e Iraque ou india e Paquistao e eles ao sao maiores do que a Frana e a Alemanha 0 que determina a opao dos poderes nao e a sua posiao estrutural mas a combinaao desta com fa tares interns 0 tipo de experiencia hist6rica ue tiveram no secu XX no mfm mo as duas grandes guerras os ttpos de regtmes polttico e sociOeco nomico que mantem e as alianas 16gicas que estabeleceram Com base neste exemplo podese argumentar o contrario do que faz Waltz que as relaoes inteonais nao poQer ntendidas simplesmenreie olliando para as relatoesntre OS EstatfEs A alternattva apresentada por Waltz entre uma teona reducto nista ou sistemica nao e necessaria 0 que e preciso como varios co laboradores de NeoRealism and Its Critics sugeriram que cbine os nfveis internos e externos Como Ruggie coloa a emergencia do sistema de Estados modernos sustentase sabre hpos 26Keohane NeoRealism p 32330 271bid p 323 50 Fred Halliday bastante distintos derelaao Estadosociedade que tiveram impacto considenivel na forma a a das relaoes internacionais 28 Tambem e evidente que urn estudo das dimensoes internacio nais da revoluao pode mostrar s foJ llacionfe tam o funcionamento interno dos EstaIqF omos mudansas iij ternas provoadas comQIYsultl4tdelJllflrYlusoes podm afetar o sistema internaciQYll Waltz em comum com a matona oS reahstas tmscamrnlmizar os efeitos internacionais da revoluao e tern certo prazer em contar a hist6ria de como a Revoluao Bolche vique tinha em 1922 aceito as normas de comportamento intema cional como tinha em outras palavras sido socializada pela es trutura Como sera discutido no Capftulo 5 o fato que Chicherin usou smoking e assinou urn acordo secreta com a Alemanha em Rapallo nao significa de forma alguma que o conflito ideo16gico basico entre a Revoluao Russa e o ocidente capitalista tivesse terminado A so cializaao no sentido de aceitaao das normas prevalecentes do sis tema e da legitimidade de outros atores principais dentro dele cer tamente nao ocorreu mais do que teria ocorrido quando Chou En lai chegou em Genebra em 1954 e tomou cha com Anthony Eden Depois da Revoluao Bolchevique que adquiriu vida nova durante e depois da Segunda Guerra Mundial urn conflito de Iongo prazo co meou este conflito nao poderia ser explicado somente pelo equilfbrio de poder ou pelas abstraoes do realismo mas envoi via uma incompati Y bilidade entre sistemas sociais e polfticos Para explicar comoe porque este conflito se desenvolveu requer urn exame das caracterfsticas domes ticas da URSS e de seus adversarios ocidentais alga que a teoria realis ta nos impede de fazer A HISTORIA MAIS ELEVADA 0 POSMODERNISMO E 0 INTERNACIONAL A entrada do p6smodernismo no campo das relaoes intemaci onais pode ser localizada no final dos anos 1980 seguindo o seu de senvolvimento em outras areas de domfnio academico primeiro a estetica e as humanidades e depois a sociologia a hist6ria e a polfti ca29 A partir daf ele participou do que foi chamado de terceiro de bate nas Rl atualmente o quarto se a introduao do estruturalis 28fuid p 1278 29Para consides da emergnciadesta escola ver James DerDerian e Shapiro IntemationaV Intertextual Relations PostModern Readings of World Politics Lexington MA DCHeath 1989 Mark Hoffman Reestructuring reconstruction reinscription and rearticulation Four voices in critical international theory Millenium vl6 n2 1987 Repensando as rela6es intemacionais 51 mo e do marxismo forem considerados como o terceiro 0 terceiro debate cobriu desafios muito diferentes dois dos quais o feminis mo eo materialismo hist6rico sedio depois considerados Nos termos mais simples as reivindicaoes do p6smodemismo sao duas primeiro a de que nao existe uma racionalidade unica ou narrativa hist6rica ern termos das quais se possa compreender a hist6ria ou qualquer area das ciencias sociais segundo que as categorias aparentemente dis tintas e unitarias das ciencias sociais e outras formas de interpreta ao escondem uma diversidade de sentidos e de identiddes que or nam os objetos da vida polftica muito mais complexos e mdetenmna dos do que as abordagens mais racionais sugeririam Fortemente in fluenciado em concepao e estilo pelos escritos p6sestruturalistas franceses mas tambem previamente pela indeterminaao conceitual e moral de Nietzsche nos anos 1980 o p6smodemismo tomouse o grande novo desafio de quase todas as ciencias sociais A enfase do p6smodemismo sobre o papel do discurso em seu sentido mais amplo as palavras os significados os sfmbolos as identidades as formas de comunicaao na constituiao da soci edade e do poder tern implicaoes significativas para as relaoes in ternacionais pelo menos na maneira pela qual os Estados buscam atribuirse e projetar legitimidade Em urn mundo no qual a comu nicaao e as imagens da mfdia tern urn papel importante ha muito o que se examinar o trabalho de Robertson e Featherstone por exem plo estudando a disseminaao de varias alternativas no mundo demonstra o potencial de tal analise 30 Ao mesmo tempo a afirma ao da multiplicidade de identidades aberta a todos os sujeitos hu manos e a nega9ao das necessarias contradioes ed entre o naci onal e 0 intemacional tern importancia explicativa e etica 0 advento do p6smodemismo nas RI tern entretanto sido acom panhado por inumeras contribui5es mais discutfveis que Ionge de aju dar nas discussoes tern trazido maior confusao Em primeiro Iugar a introduao e debate do p6smodemismo nas RI vern sendo conduzido quase que em completa separaao de urn debate mais amplo sobre esta tendencia dentro das ciencias sociais aqueles que a defendiam no final dos anos 1980 tern dado pouca atenao ou respondem as muitas criti cas a abordagem desenvolvida ha quase mais de dez anos31 Resumi damente estas crfticas destacam a amoralidade subjacente ao p6smo demismo com sua negaao de quaisquer princfpios morais generica mente aplicados a sua inabilidade em fomecer uma explicaao subs 30Ver p 256 n3 31Uma exceliO confusa e Richard Ashley em Der Derian e Shapiro International lntertextual Relations p 31 719 Ashley reconhece a existencia destes criticismos e entlio recua neste conselho para ouvir grupos marginais Sim mas 52 Fred Halliday tantiva de eventos ou perfodos hist6ricos a sua exacerbaao do papel dos fatores discursivos ou ideol6gicos na sociedade e a omissao da relaao destes com outros processos mais materiais de produao com as relaoes sociais e mesmo como cotidiano32 A estas crfticas gerais podem ser acrescidas mais duas eviden tes nos escritos dentro da RI A primeira referese a dependencia de toda a abordagem de algo denominado de p6smodemidade uma suposiao de validade questionavel que estabelece que o mundo entrou em uma nova fase hist6rica Freqtientemente de aplicaao hist6rica frouxa e baseada em observaoes contingenciais sobre o espao o tempo o risco e a percep9ao esta invocaao de urn mun do p6smodemo serve como urn fetiche mais do que como uma explicaao Alem disso ela esta sujeita a outras afirmaoes sobre o novo e as suas implicaoes metodol6gicas Se as suposioes filos6 ficas e epistemo16gicas do p6smodernismo a respeito dos fracas sos do pensamento iluminista sobre a identidade sobre a distinao entre fato e valor e as demais categorias forem validas entao elas sempre foram assim nos seculos XV ou XVI ou na epoca moder na A fora do trabalho de Foucault sobre a loucura e o encarcera mento reside em sua aplicaao hist6rica atraves dos seculos Alem destes problemas substantivos existe urn aspecto adicional da literatura p6smodemista que merece e na verdade con vida as crfti cas seu tome estilo Os p6smodemistas fazem de sua preocupaao o dominado o marginal o subaltemo mesmo assim isto e acompanhado por urn vacuo prescritivo e presunao de que eles sao as primeiras ou unicas pessoas a ter esta preocupaao Uma vez e sempre os escritores desta tendencia fazem uso de mecanismo estilfsticos de tentativas arti ficiais e coloca9oes irrefutaveis quando a analise substantiva de hist6 ria e conceitos parece falhar Como nos escritos do clero islamico re petiao vtgar e ameaa conceitual sao muito facilmente utilizadas nao para reforar o argumento mas para compensar a falta de urn Palavras como mediaao sao indicativas de uma piedade produzida que e par te deste estilo como o e o uso de fragmentos de escritos literanos e his t6ricos colocados para prop6sitos omamentais da mesma maneira que os realistas gostam de temperar sua narrativa com epis6dios de Tucfdi des ou citaoes de Cfcero On Diplomacy de Der Derian e urn exemplo perfeito deste genero As tentaoes da surenchere parisienne evidentes nas previas escolas anglosaxonicas derivadas dos escritos franceses es pecificamente de Sartre e Althusser sao reproduzidas nem sempre de formas muito felizes A palavra continental e usada para dar carater espurio a estas ideias e estilo como o termo cerveja importada foi lan ado nos anos 1970 que uma ideia e continental ou insular parisi 32Der Derlan e Shapirolnternationallntertextual Relations p ixx Repensando as rela6es intemacionais 53 ense ou de Los Angeles nao diz nada a ninguem sobre a ua valida de ou o seu alcance explicativo Neste sentido o tratamento de questoes de epistemologia ou mais mundanamente de filosofia da ciencia social desempenha urn papel importante apesar disso ser realizado de uma aneira preci osista freqtientemente banal e incompetente A despetto do que esta linha te6rica possa ter representado ela nao foi uma percepao in formal dos desenvolvimentos na filosofia da ciencia ou na ciencia social Estes autores tern grande prazer em anunciar novas formas de epistemologia hermeneutica dialetica conclusao e assim por diante mas ao fazelo eles nem resolvem as questoes da filosofia da ciencia em geral ou contribuem para a teorizaao das RI Seu tra balho e neste campo pretensioso derivado e esvaziado uma imi taao anglosaxonica do que ja fora em sua forma parisiense urn debate confuso e de segunda categoria 0 trecho abaixo tirado de uma coleao pioneira de tais textos captura isto 54 As varias praticas conhecidas sob a rubrica do p6smoderno ou p6s estruturalismo de forma alguma uma escola unica ou unitaria dentre elas a desconstruao a semi6tica a genealogia a teoria psicanalftica fe minista e suas variantes compartilham de varios temas comuns apesar de suas diferenas Acima de tudo elas consideram as questOes de como o conhecimento a verdade e o significado sao constitufdos Em seu sen tido mais amplo estes trabalhos oferecem uma explicaao para a sua insatisfaao com o projeto iluminista Filos6fico em sua origem e pnitica o p6sestruturalismo desafia as suposioes intelectuais sob as quais se sustentam o racionalismo e o positivismo ocidentais Estas se revelam como as suposioes que fundaram a ciencia moderna e a sua adorada criana adotada as ciencias sociais As criticas p6sestruturais do racionalismo feitas pelos fil6sofos france ses revelaramse como imensamente atraentes a ciutros campos Por ra zoes que ninguem adequadamente explicou os primeiros interpretes en tusiastas foram os te6ricos literarios americanosAs analises p6sestrutu ralistas colocam urn desafio radical para os dois a distinao fatovalor e para a nossa concepao factual em geral urn conceito que os p6sestrutu ralistas afirmam e convencional e culturalmente construfdo mais do que fundado na natureza Seu locus especffico e trabalhar sobre a linguagem que lhes permite revelar de forma persuasiva as convenoes que fame cern ao fato sua aparencia para o convencimento Em nome da objetivi dade cientlfica os discursos criados para sustentar as poderosas foras sociais sao regimes da verdade Os metodos p6sestruturalistas de ana lise pretendem oferecer novas maneiras de criticar este condominia de poder e conhecimento e tambem metodos uteis para a consideraao das teorias sociais cientfficas Uma razao palpavel para que o p6sestruturalismo fosse tao bern recebi do pelos te6ricos da literatura e que a tolerancia nestes grupos a pluralidade na interpretaao ja os ensinara algo importante a respeito da constituiao Fred Halliday de significados Como esperado nas maos destes te6ricos tais metodos de desconstruao ou genealogia tendem a ser adaptados como ferramen tas afiadas para intrincadas analises textuais 33 Tudo esta presente aqui a invocaao preciosista do parisiense a confusa salada de abordagens te6ricas a inocente ingenuidade decla rada sobre a diferena entre os domfnios da crftica literaria e o da ci encia social Urn exemplo representativo da fora e da fraqueza desta abor dagem eo trabalho de Robert Walker InsideOutside International Relations and Political Theory 34 Urn dos aspectos mais fortes da crftica de Walker e que ele localiza as principais areas de discordan cia nao no campo do intemacional mas no da teoria polftica em geral A presunao disciplinar de autarquia estabelece que o intemacional e urn domfnio separado do real e do etico a sua reavaliaao da tra diao coloca a teoria das RI de volta em seu cohtexto intelectual e academico mais amplo Ele tern pouco tempo para as principias al ternativas apresentadas em anos recentes se o realismo classico re presenta a descuidada adoao de antagonismo ontol6gicos profun dos as abordagens cientfficas nada mais sao do que Kantianis mo kitsch o neorealismo e somente uma reificaao requentada as teorias da escolha racional sao hist6rias utilitaristas e a econo mia polftica permanece presa no tempo e no espao Para Walker amplamente influenciado pelo pensamento p6smo demista e p6sestruturalista a teoria das RI tern tres fraquezas princi pais todas derivadas da teoria polftica ela trata como etemas e dadas as categorias e os contrastes que sao historicamente produzidos e por esta razao passfveis de mudana ela falha em registrar o grau como o mundo polftico nacional e intemacional esta mudando com as trans formaoes do mundo p6smodemo e portanto ela exclui e elimi na pelo silencio a evoluao de teorias e praticas altemativas que po deriam permitir uma melhora na condiao humana nos nfveis nacio nal intemacional e local Se Martin Wight tivesse que classificar Walker ele seria urn revolucionario mas urn revolucionario cetico das categorias de Kant ou Marx Na visao de Walker eles seriam repre sentantes de suas pr6prias reificaoes Walker usa o p6smodemismo para fomecer uma crftica a ca tegorias eternas e em particular a urn conjunto de opostos que ele 33Dentre as muitas crfticas do posmodemismo ver Peter Dews Logics of Disintegration London Veros 1986 Perry Anderson In the Tracks of Historical Materialism London Verso 1983 Ernest Gellner PostModernism Reason and Religion London Routledge 1992 34Robert Walker InsideOutside International Relations and Political Theory Cambridge Cambridge University Press 1993 Rtpensando as rela6es intemacionais 55 J identifica como pilares da teoria das RI em suas formas tanto uto picaidealista como realista a identiade e a diferena Q dentro e 0 fora o espao e o tempo a comumdade e a anarquta Dentro das relaoes internacionais ele identifica o papel constitutivo das ca tegorias de tempo e de espao concretizado no conceito de sobe rania do Estado Em sua critica destas reificaoes Walker cita o filosofo frances da ciencia Gaston Bachelard para mostrar que as palavras aqui e hi tern sido elevadas ao absoluto a partir do qual estes desafortunados adverbios de Iugar sao dotados de poderes incontrolaveis de determina ao ontologica3s As categorias dentro e fora que sao procla madas no titulo se referem em primeira instancia ao argumento de que existe alguma diferena radical entre os caracteres domestico e internacional da politica e urn abismo entre as praticas apropriadas ou possfveis em cada esfera Estas praticas fornecem ua bs apa rentemente imutavel para duas concepoes de soberama dtstmtas uma que funciona dentro do pais e e democratica e outra que esa fora necessariamente competitiva e antagonica Em urn de seus mats sugestivos leitmotif ele traa a evoluao desta concepao bnaria de soberania de Hobbes a Weber uma figura freqiientemente tgnorada na teoria das RI mas central as modemas concepoes de Estado e a inevitabilidade repugnante do conflito interestatal 36 Mesmo para aqueles que nao foram convencidos pelas bases teori cas do argumento de Walker existe algo irresistfvel aqui a localizaao da teoria das RI em urn contexto mais amplo da teoria politica e do po der socialmente corporificado e urn grande avano sobre as genealogias oficiais de X leY ou mesmo pior B foi o estudante de A a afirma ao do carater historicamente constitufdo e contingente das teorias de soberania e igualmente bemvindo Existe aqui muito a sr cmsiderado pelos que vern de ouas dt oes criticas com a advertencta de que algumas destas categonas Ja fo ram levantadas e aprofundadas dentro destas mesmas tradioes haven do algumas poucas reivindicaoes de renascimento teorico a sociolo gia historica Charles Tilly Michael Mann John Halle Theda Skocpo e a historiografia marxista do Estado Perry Anderson Ellen Wood e mats recentemente Justin Rosenberg exploraram a historicidade de nossas concepoes de Estado e de soberania Neste escritos a reavaliaao criti ca das categorias polfticas centrais das Rl e representada por uma maior proximidade e interaao com os processos e os fatos historicos algo 35Walker InsideOutside International Relations and Political Theory pl 36Para uma discussao esclarecedora das visoes de Weber sobre o nacionalismo eo conflito international e o lugar destes em seu trabalho mais amplo ver Anderson A Zone of Engagement Capitulo 9 p 158 56 Fred Halliday que os posmoElemistas parecem nao ser capazes de igualar buscando freneticamente a proxima transformaao a densidade textual ou a disseminaao Aparte a questao da novidade as dificuldades com a teoria de Walker nascem precisamente onde ele em sua propria critica das RI localizou o problema primeiro nas afirmaoes amplas sobre mudana hist6rica invocadas para sustentar seu argumento segundo na coloca ao de uma altemativa de pertinencia polftica e etica para as eternidades existentesAprimeira como na maioria do pensamento e da modelagem alternativa permanece indefinida na verdade monotona lima invo caao benigna do local do cosmopolita e do desconstrufdo sem susten taao em uma realidade social ou em uma necessidade etica ou hist6ri ca mesmo Walker admite isto resumindo seu argumento como uma teia de possibilidades minimamente teorizadas e lutas tentativas A leitura de Kant como estadista e central a seu argumento com a dis cussao de Perpetual Peace e nao Universal History Desconfiase que este seja urn movimento teorico sintomatico para eliminar a discus sao de que o professor de Konigsberg alcanou ha dois seculos atras e com maior vigor intelectual o mesmo patamar em que hoje estao encalhados os posmodernistas Walker recria o problema geral com urn argumento sobre a pos modernidade sobre como o mundo esta verdadeiramente mudando e se assemelha a uma variante dos entusiastas do transnacionalismo Rose nau misturado com Giddens e Derrida 0 argumento sobre a posmoder nidade como urn fenomeno global se sustenta sob a concepao do nasci mento de uma nova fase na historia marcada por uma maior aceleraao na mudana e pelo desaparecimento de categorias passadas Walker como Giddens e outros repete a visao de que as identidades nao sao mais claras e que em geral predomina a indeterminaao onde antes havia clareza Como muitos outros posmodemistas ele e rapido em aceitar as afirma oes do transnacionalismo e ignorar outras muitas Ele tambem fica feliz em se aproveitar da frase de Marx para destacar que Tudo que e solido desmancha no ar Mesmo assim tudo que e solido nao desmancha no ar e certamente nao porque os sociologos e os pensadores altemativos nos fariam acreditar na verdade eles omitem a segunda parte da frase que passa uma mensagem muito diferente racional e teleologica e o homem e por fim compelido a enfrentar racionalmente as suas reais condiaes de vida e as suas relaoes com os de seu tipoY Para os modemistas nao pode haver uma concepao do real ou na verdade do racional Nas ciencias sociais muitas pessoas falam sobre a posmoder nidade mas em urn exame proximo ela pode ser somente outra moda 37Karl Marx e Friedrich Engels The Revolutions f 1848 London Penguin 1973 p 701 Repensando as rela6es intemacionais 57 apocalfptica junto com o fim da ideologia a morte do novo a nova ordem mundial a superaao do Estado e assim por diante Name lhor das hip6teses muitas das suposioes sabre urn novo mundo es pacial e teporal sao metaf6ricas no pior agitaoes classistas e na verdade etnocentricas Se os p6smodemistas desejarem o argumento sabre a incerteza da identidade pode ser combatido evidenciando como ela se tomou mais importante do que nunca vaporizando com a freqliencia o Estado na guerra da antiga Iugoshivia nao surpreen deu a investida de novas formas de identidade e ideologia polftica mas a vitalidade das antigas Alem de identificar algumas mudanas amplas mas 6bvias no mundo e duvidoso que qualquer fora empfrica possa ser atribufda ao conceito de p6smodemidade como sugerido a maioria dos que o utilizam possui pouca ou nenhuma qualificaao e inclinaao para discutir o real Engenhosos encantamentos sobre a alteridade a dissoluao e as estruturas e reivindicaoes exageradas sabre o que de fato mudou no mundo nao sao substitutas adequadas de uma interaao substantiva com a hist6ria ou de uma conceitualizaao plausfvel das altemativas para a mudana polftica e te6rica Fasci nados por suas pr6prias frases por urn conjunto de afirmaoes sem sustentaao e inuteis generalizaoes sejam elas sabre o equilfbrio de poder ou a teleologia progressista os p6smodemistas transfor mamse no que procuram eliminar faltandolhes tambem qualquer significado analftico ou normativo ou a percepao sabre a mudana e a representaao Como no caso de Walker nao inesperadamente existe uma afinidade marcante com Maquiavel cujo ceticismo etico e acaso hist6rico pressagiaram as modas parisienses de nosso tem po Ele certamente tambem era urn homem do p6s Apesar disso e precisamente na discussao da representaao que o livro de Walker sugere urn conjunto importante de novas consideraoes focadas nao smente no abandono do EstadoNaao mas na apresenta ao de umconteudo novo mais democnitico e polivalenteAqui tambem reside urn dos mais substantivos e possivelmente uteis insights do p6s modemismo o de que todos os individuos e instituioes polfticas pos suem varias identidades que se sobrepoem e nao uma unica e ex clusiva 0 Capitulo 7 do livro de Walker sobre a democracia analisa estes t6picos de uma forma que nao e eticamente indeterminada e que em sua abordagem mais criativa e compatfvel com tradioes de pensamento anteriores sobre como se pode aperfeioar a demo cracia nos nfveis domestico e intemacional neste ponto ele e emi 38Para uma consideraiio esclarecedora do p6smodemismo e os neg6cios internacionais ver Christopher Norris Postmodemism Intellectuals and the GulfWarLondon Lawrence Wishart 1992 58 Fred Halliday nentemente kantiano Tal posiao pode sugerir a conclusao de que existe urn argumento modemista mais substantivo rigoroso e racio nal por tras de seus excessos No passado o pensamento politico tern avanado pela remoao da semente racional de sua concha mfstica e mistificadora este pode ser urn caso no qual esta transfor maao ou incursao e apropriada Entretanto realizar este potencial envolveria ir alem das invoca6es genericas dos novas movimentos sociais das quais abusam os p6s modemistas e muitos outrosA literatura sabre os novas movimentos39 evoluiu nos anos 1970 em resposta por urn lado a crise dos velhos partidos politicos principalmente comunistas e por outro ao cres cimento real de movimentos que nao eram ligados a partidos espe cfficos ou baseados em identidades de classe os movimentos de genera a raa a ecologia e o desarmamento eram as categorias mais evidentes Ainda assim como freqlientemente ocorre no debate aca demico a literatura permaneceu presa a estas consideraoes ou se apegou a afirmaoes reconfortantes como as de que o movimento de paz encerrara a Guerra Fria40 Neste caso urn discurso crftico da esquerda acompanhou as mais ortodoxas reivindicaoes do trans nacionalismo sabre os atores naoestatais Esta literatura deixou de perceber varios e menos bemvindos fenomenos primeiro 0 papel destes movimentos era bern menor do que freqlientemente afirma do e eles eram como qualquer partido tradicional com maior ou menor intensidade marcados por suas pr6prias discordancias e fac cionalismos segundo enquanto alguns movimentos eram benignos e emancipat6rios muitos outros nao o eram Os movimentos de massa de carater racista na Alemanha e na Frana o fundamentalis mo hindu e islamico ou as multiplas manifestaoes da direita dos Esta dos Unidos eram movimentos sociais tanto quanta as tendencias de esquerda e dos verdes defendidas pelos p6smodemistas A habilidade dos p6smodemistas em responder aos seus desafios principais o da explicaao e o da identificaao do sujeito da emancipaao era na reali dade bastante limitada Como os behavioristas antes deles os p6smo dernistas nao cumpriram suas promessas 39Um corpo influente de literatura sobre os novos movimentos sociais foi aquele de Emesto Laclau e Chantal Mouffe notadamente seuHegemony and Social Classes London Verso 1985 Alem de seu bastante habilidoso uso da linguagem e mesmo da aura do debate parisiense e questionavel com compreensao tardia se sua analise tinha mais apoio sobre a realidade po1ftica das democracias industrializadas do que aquele da escola marxis ta ortodoxa que eles reivindicavam substituir Sobre isto ver o debate inspirado com NormaGeras em New Left Review n163 MayJune 1987 166 NovemberDecember 1987 e 169 MayJune 1988 40Ver meudebate com EP Thompson em Robin Blackburn ed After the Fall London verso 1991 Tam bern Paul Hirst Peace and Political Theory Economy and Society v16 n2 Repensando as relac6es intemacionais 59 CONCLUSAO OUTRO CAMINHO Qual metodo e portanto apropriado para 0 estudo das relacoes intemacionais Os capftulos seguintes sao uma tentativa de contri buir para tal empreendimento e para encontrar algum criterio amplo para o trabalho te6rico neste campo Primeiro eles desenvolvem uma abordagem que e antiempfrica conceitual e crftica em telacao aos fatos e a realidade existente Segundo eles procuram encontrar 0 criterio que e central para as ciencias sociais qual seja o da expli cacao gerando atraves dele agendas de pesquisa e programas de trabalho para a investigaao As discussoes da Guerra Fria em par ticular sao tentativas de combinar urn conjunto de preocupacoes te6ricas com a explicaao hist6rica Muitas das abordagens te6ricas do segundo e do terceiro debates nao possuem esta capacida de Terceiro estes capftulos sao hist6ricos nao no sentido de procu rar respostas somente a partir da hist6ria ou da narrativa mas por examinar e contextualizar historicamente questoes e conceitos Se o realismo toma os conceitos ahist6ricos ao aplicalos por toda a his t6ria o behaviorismo nega por completo sua relevancia e o p6s modemismo afirma a ruptura entre o modemo eo p6smodemo Em contrapaitida os capftulos seguintes reconhecem as continuidades da hist6ria e identificam as especificidades e as contingencias das ideias e dos eventos 60 Fred Halliday capitulo 2 UM ENCONTRO NECESSARIO 0 MATERIALISMO HISTORICO E AS RELA6ES INTERNACIONAIS UM DESAFIO EVITADO Durante o ultimo seculo o destino do marxismo nas ciencias sociais tern sido profundamente incerto e em alguns aspectos a ambivalencia se acentuou por causa do colapso dos movimentos e regimes comunis tas desde o final dos anos 1980 Por urn lado o desafio do marxismo a padroes estabelecidos de pensamento e ao sistema estatal existente le varam a sua exclusao da academia justificada por dogmatismos pole nUcas e simplificaoes de que os marxistas estavam buscando conquis tar e deter o poder Por outro como parte da tradiao liberal radical do iluminismo e da resposta a ascensao da sociedade industrial como a sociologia e a economia o marxismo influenciou e compartilhou preo cupaoes academicas com varias outras disciplinas Dentro de algumas areas das ciencias sociais isto levou a emergencia de uma COrrente mar xista a sua difusao e maior influencia tomando mais genericamente aceitas as abordagens associadas ao marxismo Neste sentido como in dica a frase de Gramsci o marxismo se tomou o senso comum de nos sa epoca Acentuada pelo desafio comunista e pela Guerra Fria a ambiva lencia foi certamente ampliada pelo fim deste conflito e do desafio ofi cial que o comunismo representavaAgora e facil dizer que o marxismo esta desacreditado e em alguns aspectos a serem examinados em mais detalhes neste capitulo e neste livro isto e verdadeiro qualquer teoria baseada em uma teleologia hist6rica impHcita em uma etica das con Repensando as relaoes intemacionais 61 seqtiencias ou na suposiao de que alguma sociedade radicalmente di ferente pode ser criada foi desacreditada Contudo este reconhecimen to nao leva a conclusao de que a abordagem cristalizada no materialis mo historico nao possui relevancia na verdade ela pode constituir uma contribuiao importante para a interpretaao e onde for possfvel e dese javel para a determinaao do mundo contemporaneo Se o realismo distanciouse de seus primos o datWinismo social o racismo e a Machtpolitik o marxismo interpretative tambem pode separarse de suas visoes instrumentais Tal distinao en valve principal mente urn exame do que os proprios Marx e Engels escreveram e do tra balho de marxistas independentes que ultrapassando Lenin e a domina lio comunista ortodoxa buscaram fornecer uma interpretaao alterna tiva aquela dos dogmaticosI Como na sociologia na historia e nas outras ciencias sociais esta corrente marxista ocidental independen te tern sido capaz de estabelecer urn corpo de trabalho reconhecido e analiticamente fertil mostrando que existe potencial para fazer o mesmo na esfera das Rl Tal potencial 6 explorado neste capitulo mostrando a interaao entre as RI e a tradiao marxista Apesar de rnuitas decadas de interaao potencial o estabelecirnento de uma relaao entre o materialismo historico e a disciplina das relaoes internacionais ainda esta em urn estagio inicial Em vanas etapas da his t6ria da disciplina existiram pesquisas sobre as implicaoes do marxis mo para as relaoes internacionais nas quais se identificaram os pontos de contato existentes 2 Desde os anos 1970 varios escritores defen derarn trabalhos teoricos adicionais como a elaboraao de uma a bordagern marxista generica para as relaoes internacionais ou o desenvolvimento de domfnios nos quais a disciplina das relaoes internacionais como presentemente constitufda poderia fortalecer as suas conquistas analfticas fazendo uso de elementos espedficos do materialismo historico 3 Em urn estudo inovador e criterioso 1Sobre a hist6ria do marxismo independente ver Peny Anderson Considerations on Western Marxism London NLB 1976 Para uma tradiao representativa ver Karl Korsch Marxism and Philosophy traduzido e introduzido por Fred Halliday London NLB 1970 2Ver Miklos Molnar Marx Engels et la Politique Internationale Paris Gallimard 1975 Vendulka Kubalkova e Andrew Cruickshank Marxism and International Relations Oxford Oxford University Press 1986 Tony Thorndike Marxism and International Relations in Trevor Taylor ed Approaches and Theory in International Relations London Longman 1978 Stephen Gill ed Gramsci Historical Materialism and International Relations Cambridge Cambridge University Press 1992 Robert Cox Social Forces states and world orders Beyond international relations theory Millenium v10 n2 Summer 1981 0 trabalho de Cox uma ruptura em termos te6ricos dependeu excessivamente de uma extrapolaao da malfadada campanha por uma Nova Ordem Econornica lnternacional 62 Fred Halliday Andrew Linklater examinou as implicaoes do marxisino crftico para as RI enquanto destacando os limites que o sistema intemaci onal impoe sabre qualquer projeto emancipat6rio 4 Entretanto em oposiao a outras areas das ciencias sociais como a sociologia a economia e a hist6ria o materialismo historico nunca ocu pou urn Iugar seguro dentro das rela6es internacionais Existem muitos os que buscam limitar a sua aplicaao como foi o caso dos que explici tamente negaram a sua relevancia como Martin Wight e Hans Morgen thau ou dos que implcitamente relegaramno a urn Iugar menor ou o apresentaram em uma mterpretaao seletiva cuja pertinencia e restritas Basiament isto e otio inorando as principais quest6es teoricas do smo E urn ato mdtcatlvo qe as I quase nao mencionem o capi tahsmo a categna entral da ahse soctal modema do marxismo Igual mente como dtscutldo no Capitulo 7 a maneira pela qual a Guerra Fria envolvia nao so interesses estrategicos rivais mas tambem socioecono micos tern sido ignorada na maior parte da literatura sabre RI As fonts deste fracasso residem nos dais lados da relaao Como dtsctplma as relaoes internacionais desenvolveramse prin ctpalmente em univeJsidades britanicas e americanas e como urn derivado torico de outras disciplinas das ciencias sociais Em ne nhum destes contextos institucionais ou teoricos o marxismo teve urn Iugar proeminente ou reconhecido Por outro lado o proprio materialismo historico nao desenvolveu o enfoque teorico necessaria para oferecer uma contribuiao abrangen t e inteligfvel para as rla6es internacionais Muito do que foi produ ztdo m nome do maxtsmo pelos regimes comunistas e seus seguido res nao pas sou de Plermca vulgar de uma repetiao de urn certo padrao de fonnul e de letturas do proprio marxismo visando justificar inte resses pohttcos 0 confinamento da discussao marxista do intemacio nal a questao do imperialismo e a interpretaao unilateral e banal des te fenomeno foi responsabilidade tanto de seus defensores como de seus opositores 6 Dentro das correntes independentes do materialis 4Andrew Linklater Beyond Realism and Marxism Critical Theory and International Relations London Macmillan 1990 artin Wiht em Intertional Theory The Three Traditions editado por Gabrielle Wight e Bnan Poer Leicester Leicester University Press tern quatro menoes de arx tres das qurus se revelam repetindo sua visao sobre a fora como a parteira da hist6na p 107 214 222 Em nenhum momento ele considera o caso de incluir Marx coo urn te6rico em uma de suas tres categorias de revolucionismo Politics Among Natwns de Morgenthau 5ed New York Alfred A Knopf 1978 nao e melhor tudo o que ele faz e devotar duas paginas ao que classifica de teoria diab6lica do imperialis mo nada disso vern de Marx cujo trabalho ele falha em mencionar de qualquer manei ra e o resto e uma simplificaao de Lenin 6Para uma critica espirituosa da abordagem ortodoxa ver Bill Warren Imperialism Pioneer of Capitalism London Verso 1981 Repensando as relaG6es internadonais 63 mo hist6rico os que desejaram elaborar uma abordagetmarxista para as relaoes interncionais nfrentara as mesmas dtftculdades te6ricas dos que buscaram anahsar a pohtlca e os fatores tdeol6gt cos domesticos de Estados especfficos Ao mesmo tempo a enfase do marxismo em fatores economt cos no ambito internacional enfraqueceu qualquer tentattva de ex plicar as questoes polfticas ideol6gicas e de sguranapercebtds pelas rela96es internacionais como seu domm1o exclustvo 0 po prio conceito do internacional coloca premas para os mrxts hts no qual o contraste implfcito com 0 nacinal nao e ae1t0 e imediato comeando pelo Manifesto Comunzta rna a1rmaao cosmopolita na mesma linha do melhor transc10nahsmo bea no qual se encontram inumeras invocaoes de mtrependencta o marxismo tern percebido os acontecimentos ntundtats como urn pro cesso unico 0 resultado e que 0 estudo do mteresatal e das rel oes internacionais poderia parecer irrelevante svtando atenao das foras reais e universais que moldam a pohtica mundtal A vi sao de Marx sabre o nacionalismo apesar de menos hostll 1o que a sugerida par seus criticos tambem neou qualquer postcsao cu contradiao entre a formaao das naos e a crescente mterhaao dos Estados e das sociedades com a pnmetra anteceden1o a ultima e sen do parte de urn processo teleol6gico e hist6rico mats amplo 7 0 MARXISMO E OS TREs GRANDES DEBATES DAS RI As dificuldades especfficas nesta exploraao te6rica geram a falta de cantata entre estes dois corpos intelectuais Cmo eboado na Introduao em seus pouco mis de 7 ans de ex1stenc1a como disciplina academica as relaoes mtemac10nats foam mcadas por tres grandes debates te6ricos que acabaram defimndo a heratura e os posteriores programas de pesquisa Ate agor o marxtsmo nao se encaixa confortavelmente em nenhum dos tres 0 primeiro foi o entre as aborgn ut6picas e realistas Ape sar de serem elas mesmas termos arttfictrus ambas servrr para esta lecer uma polarizaao ideol6gica Nesta estrutura o marx1smo compatt lha de elementos das duas e ut6pco ao postuar forma altemattva de oJ1lenar a polftica e ao introduztr preocupoes ettcas no nJunto a aniilise e e realista em sua enfase sabre OS mteresses matenats por tras 7Sobre isto ver a bastante perceptiva avaliacao de Erica Benner Marx nd Engels on Nationalism and National Identity A Reappraisal Oxford Oxford Umverstty Press 1994 64 Fred Halliday da aao humana sabre a hipocrisia a falsidade e o cinismo da vida poH tica Apesar de existirem paralelos swpreendentes em cada urn dos pro jetos idealistas iniciados depois da Primeira Guerra Mundial a Interna cional Comunista e a Liga das Na6es a utopia proposta pelo leninis mo estava em clara oposiao ao idealismo wilsoniano Urn problema similar nasce no segundo debate entre os tradicio nalistas e os behavioristas Entusiasta das metodologias cientfficas do seculo XIX e imbufdo da influencia da economia britanica chissica o marxismo certamente enfatiza o potencial cientffico da analise social a quantificaao e o estabelecimento de leis se encontram no nucleo da abordagem de Marx em 0 Capital Como na maior parte do pensamen to radical do seculo XIX o progressivismo foi validado cientificamen te pelas hipoteticas teorias darwinistas de evoluao 8 Alem disso o mar xismo e influenciado por outra abordagem 0 materialismo hist6rico e nao somente o materialismo de Feuerbach A hist6ria como eventos e importante para a analis marxista assirn como para qualquer estudan te das relaoes intemacionais tradicionais embora assuma urn signifi cado diferente No marxismo procurase identificar a historicidade gu seja as condi6es de origem e de reproduao de uma sociedade ou id6ia Na verdade esta e a diferena fundamental entre Feuerbach e Marx o ultimo enfatizando a necessidade de mudar o mundo9 0 marxismo pode enquadrarse com urn pouco mais de suces so no terceiro debate representado pelas abordagens centradas no Estado e nos sistemas mundiais Com certeza o marxismo enfatiza que o capitalismo criou urn mercado mundial e com ele foras de classe 9ue operrun em uma escala global Na ldeologia Alemii Marx argumentou que o proletariado somente poderia existir hist6rico mundialmente como resultado de urn process a hist6rico economico mundial a disseminaao do capitalismo e como urn agente atuan do nesta mesma escala 10 Weltklasse Weltpartei Weltrevolution o proprio programa do Comintern resumem esta visao como o an terior Manifesto ja havia feito Alem disso o marxismo devotou muito de sua energia te6rica no seculo passado e neste em urn trabalho te6rico e pratico sabre o Estado analisando sua fora e os interesses de classe nele embutidos 11 Como Valentino Gerratana Marx and DarWin New Left Review n82 NovemberDecember 1973 9Em seu de outra maneira criterioso The World of States Charles Reynolds resume a teoria de Marx como o homem eo que ele comepS29 este jogo de palavras alemao man ist was er isst e na verdade a viso de Feuerbach que Marx rejeitava 1Karl Marx e Friedrich Engels The German Ideology London Lawrence Wishart 1965 p467 11Ralph Miliband The State in Capitalist Society London Weidenfeld Nicolson 1969 Repensando as rela6es intemacionais 65 discutido no Capitulo 3 a conceitualizaao do que e o Estado e como ele se relaciona com outras foras na sociedade tern sido objeto de de bate dentro e fora da tradiao marxista Mesmo assim a premissa de toda esta literatura e que o Estado Ionge de desaparecer ou de ser transcen dido permanece como urn fator central na polftica sujeit a pressoes intemas e intemacionais 0 marxismo reconhece a tmportancta do Es tado como urn objeto de controle polltico e do EstadoNao como m princfpio organizador fundamental seja na uta dos moImntos naciO nalistas por poder ou na consolidaao de regimes revoluc10nanos em utn mundo hostil A maioria dos marxistas seria bastante cettca sobre as rei vindicaoes contempodineas liberais e transnacionalistas de que o Esta do como locus do poder de classe estava sendo erodido como urn ele mnto de polftica intemacional ou sobre a suposiao e que a fora e a coerao foram substitufdas como instrumentos centrals ou pelo menos de reserva de dominaao de classe A partir dos anos 1970 esta aparente falta de comunicaao come ou a desmoronar a literatura acadeca da RI concedeu urn certo Iu gar ao marxismo Mas com a excao de Lmklater e outros JOuos a propria forma desta concessao apresentava problemas Na essenc1a era debatido que uma abordagem te6ric urn paradg derivdo o mar xismo poderia ser usado para expbcar a relaoes nteac10na1 e que este paradigma geralmente chamado de esturahsmo Pfna lear a resultados significativos 12 Pelo menos parec1a que o tensflo us t6rico havia encontrado o seu Iugar dentro das relaoes mtemac10na1s Mas a equaao entre o materialismo hist6rico como uma abor dagem te6rica eo estruturalismo urn paraiga constiufo den tro da disciplina trouxe alguns problemas Pnmetro o propro cm ceito de estruturalismo derivado da lingtifstica e da antropoog1a dlfe ria em aspectos fundamentais do materialisTIo hist6rico E rna for ma de determinismo no sentido de negar hberdade de aao ou de representaao aos elementos dentro da estura 0 marxiso pesar de sua defesa das leis de ferro da h1stona e das determmaoes do contexto socioeconomico contem urn elemento de liberdade de von tade de possibilidade e de voluntarismo Marx no mio da longa ela boraao das leis sobre o modo de produao no Capztal afirma que em algum momento do conflito entre proprietario e expordor os trabalhadores irao rebelarse 13 0 Manifesto e uma lllJUnao a aao A posterior hist6ria o marxism Plftico nas maos de lferes revolucionarios como Lemn e Mao d1ficdmente se conforma a 1ma 12ver por exemplo as leituras que formaram a base ara o inovador curso da Open University sobre polftica mundial em Richard Little e Michael Srmth eds Perspectives on World Politics 2 ed London Routledge 1991 t3Karl Marx Capital vol 1 London Penguin Books em associacao com New Left Review 1976 p92930 66 Fred Halliday gem do homem como urn Prometeus algemado ao chao pelas estru turas de seu ser social Igualmente dentro da tradiao marxista oci dental independente nao existe unanimidade sobre isto enquanto alguns te6ricos especialmente Louis Althusser destacam o determi nismo outros identificaram uma habilidade dos indivfduos e das foras polfticas de perseguir uma emancipaao desafiadora dos cons trangimentos objetivos e de contestar atraves da aao consciente os limites da sociedade Na verdade isto gerou uma outra area fundamental de penetraao do marxismo nas RI atraves da teoria crftica associada a Escola de Frankfurt nesta perspectiva exemplificada pelo trabalho de Robert Cox a enfase e precisamente no potencial emancipat6rio dos grupos e dos indivfduos e sobre a possibilidade de uma resposta te6rica apropriada Uma das grandes contribuioes do trabalho de Habermas foi a distinao entre as tres formas de conhecimento a positivista a hermeneutica e a crftica a ultima sendo a base para urn projeto emancipat6rio 14 0 estruturalismo tambem e enganoso pois sugere em seu uso con vencional que uma multiplicidade de relaoes afeta os elementos do sis tema apesar de reconhecer uma multiplicidade de influencias como as diversas determina6es declasse naao genero Iugar cultura e contexto hist6rico o materialismo hist6rico destaca a primazia de urn destes nf veis de determinaao o que Althusser definiu como uma estrutura em controle Tal controle e dado pelo nfvel material e socioeconomico em oposiao a contingencia do estruturalismo convencional o marxismo e uma teoria da determinaao socioeconomica Exemplos da determinaao contingente dentro da literatura das RI sao a teoria de Susan Strange das quatro estruturas das rela6es in temacionais e a teoria estrutural de Galting sobre o imperialismo 15 A conceitualizaao de Michael Mann das quatro formas de poder tern uma indeterminaao similar Todas estas teorias reconhecem a importancia das formas de determinaao abordadas pelo materialismo hist6rico a produao e a exploraao economica mas destacam que estas podem ser ainda acompanhadas por outras formas de constrangimento A es trutura em contrQle e substitufda por uma determinaao a esmo Outra dificuldade e trazida pela imagem que as RI tradicionais tern do estruturalismo referente a limitaao de seu alcance Como mostrara uma pesquisa nos livros o paradigma estruturalista e asso ciado a temas limitados dentro das relaoes internacionais como a 14Sobre Cox ver Nota 3 e a discussao de Linklater em Beyond Realism and Marxism Sobre Habermas Ian Craib Modern Social Theory Brighton HarvesterWheatsheaf 1984 e Anthony Giddens Jurgen Habermas em Quentin Skinner ed The Return of Grand Theory in the Human Sciences Cambridge Cambridge University Press 1985 1Susan Strange States and Markets London Pinter 1988 Johann Gal tung A structural theory ofimperialism em Michael Smith et al eds Perspectives on World Politics Repensando as rela6es intemacionais 67 questao NorteSui Alem de fornecer uma teoria geral sobre esta questao o estruturalismo destaca a sua centralidade nas rela6es internacionais algo que nao era reconhecido Entretanto existem duas limita6es significativas a esta abordagem Em primeiro Iugar a propria teoria agrupada sob o nome de estru turalismo fomece somente urna consideraao parcial do que ja fora ob jeto de estudo dentro do rnaterialismo hist6rico Na verdade a maior par te da literatura destaca 0 carater de exploraao e de dorninaao do impe rialismo mas outra linha mais proxima as percep6es iniciais de Marx apresenta a questao de uma maneira mais complexa 0 imperialismo urn produto da disseminaao global do capitalismo possui urn impacto des trutivo e criativo duplo que desorganiza as formas sociais e econornicas estabelecidas e gera novas Presente no trabalho de Marx esta perspecti va apesar de condenar 0 sofrimento imposto a humanidade incluindo 0 mundo colonial jela disseminaao do capitalismo e a sua hipocrisia mo ralizante destaca alguns efeitos economicos e sociais positivos Nem Marx ou Lenin possuiam qualquer simpatia pelas sociedades precapitalistas do mundo Somente depois sob o impacto de uma leitura anticolonial de Marx e da teoria da dependencia e que o marxismo passou a ser domina do pela visao de que o imperialismo tinha somente impactos negativos Contudo foi somente a partir dos anos 1970 e dos evidentes sucessos da industrialao e da mudana polftica em vanos paises do Terceiro Mundo que esta velha tendencia rnarxista pooe tomarse mais evidente Aiem da limitaao das possibilidades de interpretaao do ma terialismo hist6rico existe urn problema adicional na identificaao entre o marxismo e o estruturalismo a limitaao das quest6es consi deradas relevantes Qualquer paradigma que busca algum impacto procura fazelo pela redefiniao da hierarquia de quest6es e da agen da da disciplina mas o foco sobre o estruturalismo tern liniitado o alcance do paradigma Apesar de terem se tornado importantes as rela6es NorteSui nao podem ser percebidas como contendo a chave no sentido kantiano da polftica mundial A enfase sob estas dimen s6es restringe inibe e pretende limitar o ambito do materialismo hist6rico As rela6es entre os pafses do Norte os Estados capitalis tas desenvolvidos e as entre os pafses do Sui a guerra e os proble mas relacionados assim como o papel das hist6rias nacionais espe cfficas de Estados individuais nao podem ser tratados como proble mas exclusivos Assim a maior parte da hist6ria do sistema interna cional seria exclufda 16 Ironicamente esta delimitaao sustentouse sobre uma leitura er ronea do supostamente estruturalista Imperialism de Lenin Ionge 16Sobre isto ver principalmente Bill Warren Imperialism Pioneer of Capitalism e Nigel Harris The End of the Third World London Penguin 1985 68 Fred Halliday de ser urn livro sobre as rela6es NorteSui este foi urn estudo de por que OS grandes poderes imperialistas foram a guerra em 1914 e de como os socialistas deveriam reagir a istoY Para examinar a re levancia do marxismo e preciso ampliar 0 alcance te6rico do para digma e nao abandonar a enfase e a abordagem te6rica do estrutu ralismo englobando os temas principais e centrais de sua agenda Para que o potencial do materialismo hist6rico possa ser aproveita do no campo das rela6es internacionais e necessaria urn processo duplo de redefiniao da agenda e de expansao de sua esfera te6rica para abranger todas as preocupa6es da disciplina 0 POTENCIAL DO MATERIALISMO HISTORICO Nao e possfvel afirmar que as ferramentas intelectuais para tal encontro estao disponfveis 0 marxismo continua em evoluao como abordagem te6rica muitas quest6es foram levantadas em seus 150 anos de exisrencia mas muitas ainda devem ser estudadas assim como a sua obra e contradit6ria ultrapassada e confusa Nisto ele nao e diferente das outras abordagens como o liberalismo e a economia convencional Em grande medida a tarefa de analisar as rela6es internacionais esta reservada ao futuro nao estando presente nos tra balhos atuais Que tal empreendimento seja possfvel e possa Ievar a urn novo e abrangente paradigma devese a duas raz6es gerais Primeiro como e evidente pelo seu impacto nas outras cienci as sociais o materialismo hist6rico e uma teoria geral abrangente da aao polftica social e economica capaz de considerar todos os cam pos da aao social Na verdade o materialismo hist6rico e a tentati va mais consistente de fornecer uma teoria abrangente da sociedade elaborada no seculo passado 0 seu impacto ja tern sido evidente em algumas areas da ciencia social na economia na hist6ria e na sociologia 0 fato dele nao ocupar urn Iugar semelhante nas rela 6es internacionais e de nao ter respondido adequadamente aos desafios da disciplina e urn resultado dos obstaculos te6ricos e his t6ricos especfficos ja esboados Muitos aspectos conceituais do materialismo hist6rico contem po tencial para as rela6es intemacionais e podem nelas ser aplicados como ja o foram em outras teorias Como vimos na Introduao em suas pou cas decadas de existencia a maior parte das ferramentas te6ricas das re la6es intemacionais foi emprestada de outras disciplinas comeando pelas primeiras influencias do direito e da filosofia passando pela teo 17Para uma interpretaao esclarecedora ver Georg Lukacs Lenin A Study in the Unity of his Thought London NLB 1970 cap 4 Repensando as relaoes intemacionais 69 ria de poder da escola de Chicago o behaviorismo a teoda da aao racional as teorias do conflito o funcionalismo e chegando agora ate a teoria crftica as influencias de outros ramos das ciencias sociais sao evidentes 0 pctencial do materialismo hist6rico para enriquecer a disciplina e considenivel mesmo que como na hist6 ria e na sociologia ele nao seja sustentado por trabalhos diretamen te ligados as rela6es intemacionais Segundo dentro de sua obra como presentemente construlda o materialismo hist6rico produziu trabalhos referentes a agenda conven cional das rela6es intemacionais e muito alem da interpretaao especl fica do estruturalismo algo que foi reconhecido no final dos anos 1970 sobre a guerra a violencia o Estado o conflito intemacional as ques toes economicas transnacionais e 0 desenvolvimento do proprio sistema intemacional A tentativa do marxismo no periodo de 190020 de teori zar o sistema intemacional em tomo do conceito de imperialismo entendido como a rivalidade estrategica interestatal e uma das mais ambiciosas e criativas jamais feita antes Desde 1970 outro considenivel corpo de lieratura sobre quest6es intemacionais foi produzido sob a influencia qo marxismo alem de abun dantes estudos sobre o imperialismo existiram as teorias do sistema mundial de Wallerstein OS debates da Guerra Fria e as analises das rela oes intercapitalistas Diferente das RI ortodoxas o trabalho de Wallers tein coloca uma hist6ria bastante diversa do sistema intemacional ape sar de cobrir quase o mesmo periodo de 1500 ao presente Em oposiao a analise polltica e diplomatica realista a abordagem de Wallerstein en fatiza o papel das rela6es economicas na constituiao do sistema ela destaca a criaao de uma hierarquia enquanto as demais apontam a for maao de uma sociedade intemacional juridicamente igualitana alem disso ela procura relacionar o processo do conflito intemacional e a mudana social e poHtica intema em oposiao a negaao realista da re levancia do intemacional 18 Ao mesmo tempo dentro do materialis mo hist6rico o trabalho de Wallerstein recebeu criticas substanci ais por ser uma teoria que da muita importancia a circulaao e nao a produao por atuar como uma ingenua defensora das foras anti sistemicas mesmo quando elas sao repressoras e por ser sustentada em uma explicaao do imperialismo limitada e ligada a teoria da dependencia 19 Para a afirmaao original ver Immanuel Wallerstein The Modern World System London Academic 1974 Ver Historical Capitalism London Verso 1980 para uma mais sucinta considerao de sua visao 9Peter Worsley One world or Three A Critique of the World System of Immanuel Wallerstein Socialist Register 1980 Ernest Laclau Politics and Ideology in Marxist Theory London NLB 1977 Theda Skocpol Wallersteins world capitalis system A theoretical and historical critique American Journal of Sociology v82 n5 1977 70 Fred Halliday Apesar de ter sido objeto de diversas abordagens o debate sobre a Guerra Fria devido a oposiao do realismo e de outras correntes dentro das RI sempre foi marcado pela relutancia em analisar o fe nomeno em termos te6ricos Para o realismo a Guerra Fria foi ape nas uma continuaao da competiao interestatal para as teorias da independencia e estruturais ela era urn embaraoso desenvolvimen to secundario uma distraao de suas agendas principais sobre o in terdesenvolvimento e as rela6es NorteSui As conseqtiencias des ta postura para a teoria das RI sao discutidas em maior extensao nos Capltulos 7 e 8 aqui basta registrar que praticamente o unico de bate te6rico sobre a natureza deste conflito intemacional que domi nou a segunda metade do seculo XX teve Iugar dentro do paradig ma materialista hist6rico 20 Este foi o caso da literatura sobre as rela6es intercapitalistas subs trato da literatura da interdependencia a partir dos anos 1970 e que se refletiu nos trabalhos de Keohane Gilpin e Strange escritores que tam bern participaram do debate sobre o decHnio dos Estados Unidos nos 1980 Como estes pr6prios autores reconhecem foram os mar xistas que produziram a maior parte dos escritos sobre o assunto an tes da Primeira Guerra Mundial e a ele retomaram em urn novo con texto intelectual esta contribuiao e representada pelo trabalho de van der Pijl Kolko Gill e outros 21 Dentro das rela6es intemacionais esta literatura foi acompanha da pela emergencia de escritos em uma area semelhante mas nao for malmente inserida dentro da disciplina a hist6ria intemacional Aqui a divisao disciplinar convencional somada a rivalidade de longa data en tre as duas abordagens academicas impediu as RIde adequadamente considerarem a emergencia de urn corpo substancial de literatura dentro do campo hist6rico 0 marxismo ja contribulra substancialmente com outros campos mais especlficos da hist6ria a nacional a polltica a social e a econo mica Mas a partir dos anos 1960 surgiram trabalhos de hist6ria inter nacional influenciados pelo materialismo hist6rico e muito diferentes da diplomaCia hist6rica convencional Dentre outros podese mencionar o trabalho de Eric Wolf Perry Anderson e Eric Hobsbawm 0 estudo de Wolf e uma analise abrangente e convincente da subjugaao do 20E P Thompson Fred Halliday e Rudolf Bahro Exterminism and Cold War London NLB 1982 21Kees van der Pijl The Making of American Ruling Class London Verso 1984 Outro corpo influente de trabalho em paralelo aqui e o da escola francesa de regulao de Alan Lipiers e MichelAglietta Para uma critica poderosa desta escola ver Alice Amsden Third World Industrialization Global Fordism or a New Model New Left Review nl82 JulyAugust 1990 Repensando as relaroes intemadonais 71 mundo naoeuropeu ao sistema socioeconomico europeu 22 0 tra balho de Anderson traa a evoluao do Estado ate a epoca da demo cracia abordando o desenvolvimento social e politico intemo e a competiao extema23 0 trabalho de Hobsbawm talvez o mais abran gente e com as implicaoes mais diretas para o estudo das relaoes intemacionais encontrase em urn conjunto de tres estudos compa rativos sabre a evoluao do sistema intemacional InQderno A Era das Revolufoes 17891848 A Era do Capita18481875 A Era dos lmperios 18751914 24 A obra de Hobsbawm apresentou urn trabalho de importancia direta as relaOeS intemacionais e as questoes que ela consiqera a emer gencia dos Estados das naOes dos mercados o papel dos fatores eco nomicos politicos e estrategicos nos assuntos intemacionais e as fon tes de conflito dentro e entre as sociedades Nenhum trabalho compa ravel surgiu dentro da hist6ria intemacional convencional ou das RI sabre a sociedade intemacional Apesar de empiricamente constru fdo e equilibrado o trabalho de Hobsbawm esta ligado segundo ele mesmo ao materialismo hist6rico e as suas amplas categorias de in dagaao e explicaao Par exemplo em sua dade do lmperialismo as quatro decadas anteriores a eclosao da Primeira Guerra Mundial sao examinadas no contexto do desenvolvimento da sociedade industrial e da sua expansao mesmo nos capftulos sabre a disseminaao da democracia do nacionalismo e do imperialismo ou dos eventos que levaram a guerra em 1914 este contexto materialista hist6rico geral e mantido sem qualquer reducionismo 0 que Hobsbawm retrata nao e entretanto 0 desenvolvimento de alguma sociedade intemacional abstrata ou urn outro exemplo do funcionamento do equilibria de poder mas a civilizaao e a crise de urn periodo hist6rico muito particular Estes dais fatores o potencial te6rio desta abordagem como uma teoria social abrangente e as contribuioes especfficas subs tantivas e conceituais que podem ser feitas as relaoes intemacio nais combinamse para sugerir que o materialismo hist6rico pode oferecer uma explicaao abrangente das relaoes intemacionais setn complacencia com relaao a sua adequaao frente as questoes abor dadas e as suas fraquezas intemas A seguir combinarei as implicaoes das discussoes apresenta das ate este ponto e esboarei alguns caminhos pelos quais esta ela 22Eric Wolf Erope and The People Without History Berkeley University of California Press 1982 23Perry Anderson Lineages oithe Absolutist State London NLBNerso 1974 24TheAge of Revolutions 17891848 London Weidenfeld Nicolson 1962 The Age of Capital18481875 London Weidenfeld Nicolson 1975 The Age of Imperialism I875I9I4 London Weidenfeld Nicolson 1987 72 Fred Halliday boraao pode prosseguir Inicialmente isto sera feito pela apresen taao dos parametros gerais do paradigma materialista hist6rico e depois pela discussao de certas contribuioes tematicas especfficas que o materialismo hist6rico pode fazer para as relaoes intemacio nais Assim sera possfvel identificar alguns dos problemas envolvi dos em tal trabalho te6rico 0 PARADIGMA MATERIALISTA HISTORICO Marx e Engels escreveram extensamente sabre as questoes in temacionais considerando as questoes te6ricas relativas a intema cionalizaao do capitalismo e aos eventos politicos intemacionais de seu tempo 25 Nestes escritos existe muita substancia conceitos e matizes que sao pertinentes para construir a interaao entre o mate rialismo hist6rico e as Rl Entretanto a classica ouvre marxista so bre as RI e uma base insuficiente para a sustentaao deste empreen dimento te6rico primeiro porque existem diferenas profundas entre os escritos te6ricos e conjunturais nao havendo uma reuniao das1 duas dimensoes segundo porque urn foco exclusivo sabre a in temacional reduz o alcance de como a teoria marxista como um todo pode ser capaz de contribuir para este estudo Em Marx e outros te6ricos 0 que e mais importante para as relaoes intemacionais nem sempre esta presente na analise do intemacional mas nas impli caoes mais amplas de toda a teoria Ao procurarmos ideias criati vas sabre as questoes intemacionais nao nos voltamos aos escritos de Maquiavel sabre as colOnias ou sabre os mercenarios ou para as reflexoes de Rousseau sabre as virtudes do movimento de indepen dencia da C6rsega ou as visoes de Kant sabre raa mas buscamos a sua abordagem te6rica mais ampla e os seus insights Ao Iongo de varios escritos de Marx e Engels existem quatro te mas gerais que podem ser identificados como definindo e constituindo a posiao intelectual par eles defendida 0 primeiro e 0 da determina ao material ou mais precisamente a determinaao par fatores soci oeconomicos com a palavra material possuindo este sentido particu lar Marx percebia a sociedade como uma totalidade urn composto dentro do qual cada elemento era govemado em urn sentido mais geral pelo carater e pelo funcionamento do todo Em qualquer sociedade a aividade centrale a produao economica e as principais questoes anaH 25Para as melhores pesquisas ver Molnar Marx Engels et la Politique Internationale sobre a guerra ver Bernard Semmel ed Marxism and the Science of War Oxford Oxford University Press 1981 sobre na6es e nacionalismo ver Benner Marx and Engels on Nationalism and National Identity Repensando as relaoes intemacionais 73 ticas sao consideradas a partir desta estrutura qual e o nfvel de produao ou em outros termos em que estagio de desenvolvimen to se encontram as foras da produao Segundo quais sao os sistemas de propriedade e de controle efetivo que definem a propri redade destas foras ou seja quais sao as relaoes de produao Combinadas estas foras e relaoes formam urn modo de produ ao o feudalismo o capitalismo ou o socialismo e atraves desta determina9ao estrutural uma sociedade particular ou formaao social i e constitufda As ideias as instituioes e os eventos de uma formaao societaria devem set percebidos a partir de sua relaao com a totalidade e com as formas de determinaao material definidas pelas foras e rela oes de produao e nao em urn contexto isolado ou abstrafdo do modo de produao Afirmar isto nao significa como o fazem muitos marxis tas vulgares e crfticos do marxismo dizer que tudo deve ser reduzido a atividade economica isto nao e o que Marx afirmava e as suas anali ses dos acontecimentos polfticos e dos conflitos na Frana de 1840 e 1870 ou dos eventos internacionais de sua epoca assim o demonstram Alem disso o seu conceito de capitalismo abrangia nao somente as foras es pecfficas e a apropriaao da economia mas um con junto mais amplo de instituioes polfticas legais e culturais que a elas se relacionavam26 Os conceitos gerais de modo de produao e de formaao social vinculam a analise de qualquer atividade humana ao contexto socioeco nomico e nao a partir de sua abstraao Nao existe portanto penh urn Es do1 nenhuma crena nenhum conflito nenhum poder emgerarmTe peiioente deste contexte Por extensao nao existe nenhum sistema in ternacional ou qualquer componente de sua atividade seja a guerra ou a diplomacia que possa ser abstrafdo do modo de produao Na verda de l rJaqsiJlsmlliQll4243 rS entre a csQciaiQ9slrJQl9l4 A partir do inomento em que se aplica esta percepao as quest5es do internacional uma clara mudana de foco e visfvel Assimgg1JO e mais percebido como uma corporificaao do interesse nac10nal ou da neutralidade judicial mas sim como locus dos intresses de uma sguspecfica ou deJlma fgsao socialdfinidapor suasijiisgQQ11Pmic Identificar ate queponto as dasses controlam o Estado ou estao separadas dele tern sido uma das quest5es principais de disputa dentro da area Da mesma forma a soberania se torna nao urn conceito legal generico mas a sobe rania de foras sociais especfficas a sua hist6ria e a das formas de po der social e ada sua legitimaao A segurana e removida da esfera teo rica tradicional em que foi colocada e se torna a segurana de gru pos sociais e por razoes socioeconomicas especfficas 26Derek Sayer The Violence of Abstraction Oxford Blackwell 1987 para uma inter pretalio nlioreducionista de Marx 74 Fred Halliday A hist6ria do sistema tambem e vista com outros olhos o siste ma interestatal moderno emergiu em urn contexto de disseminaao global do capitalismo e da subjugaao das sociedades precapitalis tas Simultaneamente este sistema socioeconomico sustentou o ca rater individual dos Estados e as suas relaoes nenltUIlfl analise das 1 e JQmtmcJpnat posstvel sem referencta ao capitalismo as formQgais P9Leli geradas e ao sistemamundiaJ27 0 segundo tema central presente nancmie do paradigma e 0 da it6rJ C 4UEO hcSricJl Inicialmente Marx argu mentou que a hist6ria influenciava o comportamento presente Como por exemplo na frase usada em uma ocasiao a tradiao das geraoes mortas paira como urn pesadelo sob as mentes dos viven tes Mas ele queria dizer mais do que isso Marx defendia que os eventos e as caracterfsticas de qualquer sociedade somente poderi f am ser percebidos em seu contexto hist6rico devese indagar como se constitui o objeto de estudo quais foram as influencias dos even tos passados e qual impacto teria o passado na definiao da situaao presente 28 Assim como defendia que a sociedade deve ser percebi da em seu contexto socioeconomico Marx tambem acreditava que as suas condi5es de origem e Iugar no sistema eram centrais para a analise Para compreender a sociedade capitalista contemporanea devem ser pesquisadas as suas origens e os seus condicionantes passados problemas e tendencias Tambem deve ser avaliado como estes fatores limitavam as opoes percebidas por urn povo e como o levavam a ser influenciado ou totalmente determinado por paix5es ilusaes e identificaoes inconscientemente herdadas de outras epocas Qualquer urn familiarizado com o funcionamento do sistema in ternacional ira de uma certa maneira estar consciente disso a supres sao ideol6gica das origens do sistema a propensao para negar a violen cia envolvida em sua criaao e a fora dos fatores irracionais como o nacionalismo dentro dos assuntos internacionais Assim o que Marx disse sbre o papel da hst6a se aplia a todos ospatses as polfcas domesttca e externa os mstmtos dos hderes e as respostas do pubhco l as institui5es polfticas as magoas e os medos que movem a populao I tudo isto e mais reflexo do passado do que se costuma admitir Ao lado da determinaao socioeconomica e hist6rica Marx tam bern percebia estes fatores condicionantes como destruindo a aparencia 27E este argumento que alem de formar o tema central dos trabalhos de Wolf Anderson e Hobsbawm mencionados forma a base da analise de Jus tin Rosenberg sobre as origens e os desenvolvimentos do sistema intemacional The Empire of Civil Society A Critique of The Realist Theory of International Relations London Verso 1994 Sou extremamente grato a Justin Rosenberg pelas muitas sugestoes proveitosas que ele fez sobre o material neste captulo 28Eric Hobsbawm Marx and History New Left Review n143 JanuaryFebruary 1984 Repensando as relaoes intemacionais 75 i de que todos os eventos eram naturais ou permanentes em qual quer sociedade uma das principais funoes da socializaao polftica e tamar estes eventos imutaveis e inevitaveis 0 mesmo se aplica ao terreno do intemacional e as suas formas continuas a naao o Es tado a soberania etc Localizar as caracterfstcaQruieda4f no contexto historico de sua ongetrrcflttliIzt igeiade ques sj naturaisoiietemas e pode sugeiir a existenciB 4aterttYyas Entretanto como ja admitido o Iugar da hist6ria no estudo das relaoes intemacionais e incomodo Isto ocorre por raoes terica praticas e profissionais No primeiro caso as relaoes mtemactonats buscam diferenciarse como uma esfera conceitual distinta de estudo e nos demais anseiam em definirse em oposiao a abordagem ide ol6gica da hist6ria diplomatica e do seu fetiche por arquivos e datas A questao da origem hist6rica recebe menos atenao e quando a his t6ria esta presente geralmente o e como uma ilustraao ou mais fre qlientemente ainda como uma forma de intimidar o leitor com uma avalanche de exemplos evidente tanto em James DerDerian On Diplomacy como em Martin Wight Como resultado muitas das questoes consideradas dentro das re laoes intemacionais sao perigosamente abstrafdas de seu contexto his t6rico Primeiro isto se aplica a falta de cultura hist6rica da maioria dos que escrevem e estudam o assunto de forma que a proporao e o alcance de referenda a hist6ria esta quase sempre ausente 0 behavi orismo certamente fez da rejeiao da hist6ria urn de seus pilares cen trais Da mesma maneira isto se aplica a abstraao de conceitos espe cfficos da situaao hist6rica em que nasceram A freqliente e repetida afirmaao de que os Estados contemporaneos britanico e americana sao exemplos de urn caminho pacffico e naorevolucionario de de senvolvimento e urn exemplo marcante disso A expansao da soci edade ocidental ou da sociedade intemacional foi alcanada atraves da subjugactao do saque e em alguns casas do massacre de socieda des coloniais Urn caso mais recente e a discussao da relaao dos con ceitos de interdependencia e de ingovemabilidade praticamen te isto anula a importancia do evento que provocou a emergencia desta questiio no nfvel politico a Guerra do Vietna e o seu impacto no sis tema polftico e social dos Estados Unidos 29 0 terceiro tema central da abordagem materialista hist6rica e a centralidade das classes como tres na vida pliccestica e 29 A questiio do impacto da Guerra do Vietna sobre as RI e especificamente nos escritos produzidos nos EUA poderia parecer sem resposta ja que sua principal conseqtiencia aparente foi tornar o estudo de alguns assuntos como o estudo das revoluroes e do conflito social menos atrativo Urna resposta e entretanto que o impacto deve ser en contrado no interesse pela interdependencia ja que o conflito no Sudeste da Asia foi visto como provocando irnportantes conflitos nos EUA 76 Fred Halliday internacional 30 Genericamente as classes sao definidas pela posse eemrttd5rmeios de produao e isto depois determina as outras formas de poder social que elas detem Se dentro de urn Estado par ticular as classes agem para subjugar e controlar os menos podero sos intemacionalmente elas agem para aliarse a grupos similares quando isto lhes e benefico e para competir por meios pacfficos ou militares quando se prefere a rivalidade 0 conflito entre as classes ou seja a luta de classes ocorre portanto em dois nfveis entre grupos em diferentes posioes na escala socioeconomica e entre grupos de posiao equivalente Tal luta tambem ocorre dentro e fora dos Estados com a disseminaao do capitalismo aumentou o tama nho do mundo capitalista e a rivalidade com outras classes domi nantes na esfera intemacional acompanhou as disputas intemas Cada classe dominante tern sido capaz de utilizar 0 carater intemacional do capitalismo para preservar a sua posiao dentro da sociedade ali andose com outras e para identificar na arena intemacional urn terreno para a expansao de seus interesses e poder enalidlde das classes comoferrameta alfca m uas con fsequenctas tmedtatas para as relaoes mtemactonats Primerro mveste os principais conflitos da polftica intemacional de urn carater socioeconomico Parafraseando Marx embora possa soar falso toda a hist6ria das rela5es intemacionais tern na luta de classes urn de seus componentes fundamen tais e decisivosAdisseminaao competitiva dos imperios europeus a eclo sao das duas guerras mundiais a crise do padrao ouro em 1931 a eleva ao dos pos da OPEP de 197173 as disputas sobre o comercio e as taxas de juros dentro da Aliancta Atlantica no infcio dos 1980 o conflito comercial entre os Estados Unidos eo Japao nos anos 1990 podem ser percebidos como parte do conflito entre as classes dominantes capitalis tas e entre os velhos poderes capitalistas e seus novas rivais a partir do seu desenvolvimento intemo de rela5es sociais capitalistas Muitas das disputas que marcaram a hist6ria do seculo XX se tomaram disputas inte rimperialistas e intercapitalistas indo alem de suas caracteristicas nacio nais geograficas e hist6ricas como ja notado a questao do conflito entre os grandes poderes e nao a dinamica das rela5es NorteSur era a prin cipal questao considerada por Lenin e por outros no debate sabre o impe rialismo antes da Primeira Guerra Mundial Partindo deste prisma os debates tradicionais que dominaram as re laoes intemacionais por tanto tempo parecem sustentados em algumas premissas questionaveis A percepao de que o Estado nao e uma entida de independente mas pelo contrario uma determinada pelo contexto so cioeconomico e declasse leva a uma mudana de carater no debate sobre 30Tom Bottomore Classes in Modern Society London Allen Unwin 1965 Para uma aplicaraoas Rl ver Cox Social forces states and world orders Repensando as relacoes intemacionais 77 a perda de seu poder frente aos atores naoestatais A questao nao reside em uma possfvel perda de proerninencia para os atores naoestatais no perfodo recente desde 1945 ou 1970 mas como estes atores noestatais que sempre afetaram o poder e o caniter do Estado agem atraves do Esta do ou atraves de outros canais Os atores naoestatais como as classes sempre estiveram presentes exercendo seu poder de vanas formas Alem disso a questao sabre onde estao sendo derrubadas as fronteiras entre a polftica domestica e a internacional adquire urn diferente significado no capitalismo as classes sempre tiveram uma atuaao intemacional come ando pela aao dos banqueiros e das companhias comerciais do seculo XVI ao mesmo tempo em que eram afetadas domesticamente pelas mu danas na situaao economica e polftica mundial 31 A primazia destas classes serve portanto para colocar dupla mente em questao o conceito de EstadoNaao ela mostra primei ro que o Estado em si mesmo e em uma medida considenivel uma funao de foras sociais mais amplas e segundo que a impermea bilidade da polftica domestica e uma aparencia que esconde uma permanente subjacente internacionalizaao de fatores polfticos e econornicos Nos pr6prios escritos de Marx ha uma ten sao interes sante nesta questao seus instintos polfticos o levaram a enfatizar o carater intemacional do proletariado a classe trabalhadora e a sua aspiraao e habilidade para organizar uma base intemacional con tra seus inimigos de classe Contudo esta teoria contem dentro de si outra sugestao nao e a classe trabalhadora mas a burguesia que era mais intemacional ja que a sua educaao e cultura por urn lado e os seus pr6prios interesses economicos por outro eram tais que a ela foi levada a agir cada vez mais intemacionalmente A hist6ria subseqiiente do capitalismo tern mais do que qualquer coisa sido uma hist6ria na qual a internacionalizaao da classe dorninante tern avana do tao rapido quanta ou mesmo rnais rapido do que aquela da classe trabalhadora Por esta razao como Jeff Frieden Stephen Gill Kees van der Pijl e outros mostraram a CE Comunidade Europeia a Comissao Trilateral e o 07 dentre muitos outros sao exemplos da elite de coor denaao transnacional para a melhor adrninistraao de ambas as econo mias a nacional e a intemacional 31Um exemplo 6bvio desta inteao e a industria do petr6leo onde por urn seculo ou mais as grandes corporal6es influenciaram e utilizaram os Estados em pafses produtores e consumidores para avanlar seus interesses Simon Bromley American Hegemony and World Oil Cambridge Cambridge University Press 1991 Para uma importante consi deao da inteao entre os bancos eo estado americano ver Jeffery Frieden Banking on the World New York Harper and Row 1987 Para outro estudo revelador da politica extema americana em termos de influencia de neg6cios ver David Gibbs The Political Economy of Third World Intervention 78 Fred Halliday 1 r 0 quarto conceito central do materialismo hist6rico e aquele do conflito e do seu apogeu a LY91iChA maior parte da literatura sobre o marxismo e dentro dele temse preocupado com a questao do conflito nos nfveis filos6fico e metodol6gico como refletido na questao da dialetica Esta e uma especulaao questionavel uma relfquia da influencia hegeliana sabre Marx e da visao comum do seculo XIX de que urn metoda unico para as ciencias naturais e sociais podia ser determinado 0 conflito e tornado aqui como urn conceito hist6rico e social pertencente as relaoes entre as diferen tes classes e os outros grupos sociais e gerado pelas diferenas em posioes socioeconomicas 0 materialismo hist6rico nao somente discute que tal conflito e inevitavel dadas as desigualdades de ri queza e posiao economica na sociedade contemporanea mas tam bern que e urn fator dinamico fundamental da polftica no sistema intemacional e nas sociedades individuais 0 cJaxde taiseontlitospode ocorrer de uma destas duas manei ras otfde u1llasombinaao da dllal glrra ea revolusaQ No marxis ffio as guerras representam conflitos entre duas classes sociais ri Vais de caracterfsticas similares para obter o monop61io de merca dos de recursos e de territ6rios Marx faz uma distinao entre as revoluoes polfticas que somente mudam a forma do govemo e as revoluoes sociais que alteram o sistema de dorninaao de clas se Ele esta preocupado com esta ultima As revoluoes represen tam conflitos entre classes sociais de diferentes carateres dentro de Estados particulares AsY9JlJQS sao eventos que nascendo de conflitos profundos dentro de rima estrutura socioeconomica levam a mudanas no carater soci5l dos Estados e a mudanas substanci ais no carater da polftica jtitemacional Longe de representar aber raoes colapsos ou intupoes da polftica normal elas sao difu sas e pontos de transio centrais dentro da hist6ria das naoes e da comunidade intemapional em geral Elas sao nas palavras de Marx as locomotivas dihist6ria 32 s est prlfpiodO materialismo hist6rico e estendido ao inter nacional entao ele sugere que a preocupaao central das relaoes in temacionais se tome nao a segurana f as aoes do EstadoNaao dirigidas para aumentala e defendela mas pelo contrario o conflito e as formas pelas quais ele e gerado conduzido e resolvido 0 confli to social dentro e atraves de fronteiras visando a riqueza e ao poder economico esta presente na origem de inumeros eventos internacio nais 33 Considerandose a deterrninaao hist6rica de Estados especffi 32lsto e discutido em maior extensao no Capitulo 5 33Para um exemplo esclarecedor da aplicaliiO do metodo marxista a um evento hist6rico principal ver Ernest Mandel The Meaning of World War London Verso 1986 Repensando as rela6es intemacionais 79 cos tornase necessario perguntar porque eles existem ou mais pre cisamente a partir de que conflitos hist6ricos eles emergiram 0 apa rentemente mais pacifico dos Estados pode ter nascido de passados extremamente sangrentos a hist6ria da tranqiiila Holanda e repleta de revoluoes invasaes e guerras internas No presente o funcionamen to regular da democracia na Alemanha e no Japao esconde o fato de que este sistema politico foi imposto somente ha duas geraaes JOr meio de uma intervenao militar externa Desde 1945 a repentma chegada de quase cern novos Estados no cenario mundial e freqilen temente exemplificada como uma mera adiao numerica uma expan sao complicadora e diluidora do anterior sistema continuo de Estados 0 fato de que este processo foi urn resultado dos intensos conflitos entre as colllnias e o poder colonial e como uma precondiao funda mental derivou do enfraquecimento dos imperios coloniais na Segun da Guerra Mundial recebe menos atenao do que deveria Marx tinha consciencia disso na metade do seculo XIX Escre vendo sobre o desafio ao equilibrio de poder das cinco naoes a pentarquia ele alertou sobre a presenva de uma sexta grande potencia a revoluao Assim o problema dominante da poUtica intemacional do seculo XX e percebido pela teoria das relaoos intemacionais convencionais como sendo aquele da segurana mas muito deste periodo pode tambem ser considerado como urn de contenao do conflito intercapitalista e da revoluao social Em outras palavras a administraao do conflito social e a questao que mais tern preocu pado os poHticos e os analistas academicos da poHtica extema 34 Como Amo Mayer mostrou urn evento intemacional aparentemen te neutro como a Conferencia de Paz de Versalhes em 1919 estava preocupado com a questao de agir contra a revoluao e center a desordem Marx estava enganado ao emprestar nuances misticas e 1 deterministicas a revoluao que acabaram sendo associadas a ela e igualmente errado ao acreditar que alguma sociedade radicalmen te diferente e emancipada emergiria de tais levantes Entretanto ele estava certo ao perceber o conflito social sobre a propriedade o poder e os recursos como uma caracteristica central da poHtica e ao per guntar como tal conflito sustentava o aparentemente autonomo mundo da revolta politica e do conflito intemacional Em parte Marx foi capaz de fazer isto pela introduao dos contex tos material e hist6rico Quando se diz que a politica intemacional bus ca uma ordem devese perguntar ordem para quem e com quais in teresses Similarmente quando e dito como por exemplo por Hedley 34Amo Mayer Politics and Diplomacy of Peace Making Containment and Counter Revolution at Versailles 19181919NewYork Knopf 1967 80 Fred Halliday Bull que a sociedade internacional e anarquica isto tanto reco nhece como evita a questao ha o reconhecimento quando se admi te que existe urn conflito e que ele e endemico ao sistema intemaci onal mas se evita a questao quando se nega a existencia de uma fora subjacente a este conflito alem do sistema de Estados e quando se localiza a coerencia do sistema somente no ambito de seus meca nismos ou das suas chamadas instituiyoes desenvolvidas para administrar este conflito A afirmaao da anarquia esconde o fato de que este conflito incoerente na superficie e produto de fatores que podem ser definidos e percebidos mesmo se eles nao podem ser controlados como gostariam os principais atores Alem disso para xiJllomfis impqrtJJ QtmHnlte no e a anarquiiao stemQ ladosmasa do merag e d pr9ptiocapitalismo 35 0 tema do conflito possibilita a avaliaao da importancia da questao da vontade e da atividade humana consciente dentro do pen samento marxista Marx enfatizou a importancia da determinava so cioeconomica e hist6rica estas foras agem profundamente sobre os atores humanos e definem os limites do que eles podem atingir e as tendencias de suas aoes Outro tema central do materialismo hist6rico e o reconhecimento da esfera da necessidade e do poder de influencia de fatores nao re conhecidos em nosso comportamento Neste sentido Marx afirmou a importancia de fatores sociais e hist6ricos naoreconheciveis ou de algumas formas tao poderosas quanto o inconsciente individual de Freud Mas como Freud ele acreditava que a vontade humana e o objetivo de tornar o inconsciente explicito e consciente eram pos siveis dentro de certos limites Alem disso tal reconhecimento era urn caminho nao para a celebraao do inevitavel do renderse face ao determinado mas pelo contrario uma precondiao para o exer cicio da liberdade que as circunstancias permitem Os grupos soci ais poderiam mais facilmente mudar sua posiyao se percebessem a extensao dos fatores que determinavam a sua situaao Similarmente a possibilidade de que a aao alterasse o sistema existente de relaaes intemacionais ou promovesse urn conflito com al gum sucesso dependia de urn reconhecimento comparavel da necessi dade Os conflitos sao em larga medida promovidos por atores que sao cegos ou por aqueles que nao podem atingir os objetivos que racional mente colocam para si mesmos Nas relaoes intemacionais esta habi lidade na hist6ria em termos hegelianos encoraja o aparecimento de urn sistema intemacional que e imprevisivel e anarquico ou urn que e imu tavel para ambos o materialismo hist6rico fomeceu uma explicaao 35Ver Rosenberg The Empire of Civil Society cap 5 Repensando as rela6es intemacionais 81 altemativa e uma prescricrao Ele indicou urn sistema intemacional altemativo mas que somente poderia ser atingido atraves de urn esforcro sustentado e de uma tentativa inexonivel de reconhecer ate que ponto os atores humanos permanecem prisioneiros das forcras sociais e hist6ricas que atuam sobre eles Mais do que as outras teo rias foi o materialismo hi2ricsjB1firmQtLq acrao huma11a criou e esteit ra capitalista k AS INIBIOES DA TEORIA Os quatro temas gerais considerados anteriormente fornecem urn resumo urn tanto breve e inadequado de uma possfvel aborda gem materialista historica para as relacroes intemacionais e as suas implicacroes Esse paradigma ainda nao produziu o trabalho empfri co em relacroes intemacionais que seu potencial sugere pois con tern dificuldades maiores que inibem o seu desenvolvimento e inti midam os seus praticantes 0 mais poderoso fator inibidor do marxismo e 0 tom de sua abor dagem geral algo que dificultou seu desenvolvimento te6rico e tomou seu entendimento pelos outros obscuro Tal situacrao reflete o dogmatis mo e a intolerancia de parte da amilise que aparece sob seu nome e como uma parte dominante deste dogmatismo a imanencia de uma teleologia historica a crencra de que a historia estavaesta movendose em uma di recrao particular derradeiramente emancipatoria Este dogmatismo foi urn produto de consideracroes polfticas de muitos de seus praticantes e em particular dos govemantes dos Estados comunistas e dos que os apoi aram Ironicamente ele iria fomecer 0 unico conceito intemacional de fensavel de validade geral produzido pelo comunismo o da correlaao de forcras A correlacrao de forcras era uma concepcrao dinamica am pia das relacroes entre os blocos que combinava o militar com os fatores culturais polfticos e economicos e era mais elaborado do que a altema tiva do equilfbrio de poder Entretanto ele estava errado a respeito da direcrao para a qual estava se movendo esta correlacrao36 Porem o dogmatismo da maior parte do marxismo reflete algo mais do que a sua associacrao com o poder estatal ditatorial Ele tambem e produto de fatores entranhados no proprio marxismo chissico e que nascem da crencra na inevitabilidade da crise capitalista e do advento do socialismo A consciencia do determinismo produz urn senso de retitude e por esta razao de intolerancia Tal atitude presente como era 36Julian Linder Correlation of Forces An Analysis of MarxistLeninist Concepts Aldershot Gowerm 1988 Margot Light The Soviet Theory of International Relations Brighton Wheatsheaf 1988 82 Fred Halliday em Marx e em urn certo sentido completamente naomarxista pois fomece as ideias uma permanencia negada por sua propria contingen cia historica e socioecortomica Este dogmatismo uma reafirmacrao in flexfvel de argumentos dentro de urn certo paradigma de forma algu ma e especffico ao marxismo como bern o sabem os estudantes das relacr5es intemacionais e das outras ciencias sociais Contudo ele e uma forcra poderosa e envolvente dentro do proprio materialismo historico e que retardou seu crescimento tomando mais facil para os seus inimi gos desconsideralo ou distorcelo e ainda esta Ionge de desaparecer Nao existe evidencia maior disto do que as ultimas reflex5es sobre o imperialismo nas quais urn conjunto de arrrmacroes absolutas sobre 0 impacto dos pafses industrializados sob o Terceiro Mundo bloqueou a analise do que estava realmente acontecendo nestas sociedades e de suas possibilidades intemas de mudancras A primeira das limitacroes das preocupacroes do marxismo re ferese ao proprio conceito de determinaao o grau em que os eventos polfticos ou atores ou mesmo o proprio Estado podem ser vistos como meras express5es da estrutura socioeconomica de uma sociedade Este problema e tao relevante para as relacroes intemaci onais quanto e para qualquer outra area da atividade humana a arte a psicologia o comportamento social a filosofia Enquanto os es critos dos marxistas ocidentais independentes foram capazes de escapar disto a tendencia em direao ao reducionismo deformou quase toda a analise marxista no ultimo seculo E mais produtivo e empiricamente plausfvel perceber a determinacrao como o fizeram os marxistas ocidentais como urn conjunto de limites e significados e nao como algo absoluto que retira de todos os fenomenos nao materiais 0 seu significado ou elimina a capacidade de acrao indivi dual para a mudancra Perceber tais componentes sejam eles os in divfduos os partidos os govemos ou as ideologias fora de seu con texte socioeconomico e abstraflos dos fatores que OS fazem existir e lhes conferem vigor Outra area de inibicrao da teoria e ainda mais afetada por e problema geral da determinacrao socioeconomica a autonomia re lativa da polftica Embora Marx Engels Lenin e seus sucessores tenham escrito copiosamente sobre a polftica como eles eram avi dos praticantes seus escritos sempre refletiam urn problema profundo e naoresolvido sobre como analisala Esse problema e pertinente tanto na analise da polftica domestica como na da intemacional A despeito de identificar as formas pelas quais os fatores socioecono micos influenciam a polftica os materialistas historicos freqliente mente nao sao bern sucedidos em explicar adequadamente o seu funcionamento ou seja o funcionamento da dimensao da polftica que naci e simplesmente uma expressao do socioeconomico Repensando as rela6es intemacionals 83 Os pr6prios escritos de Marx sabre a politica de seu tempo re velam este problema em meio a astucia tatica de sua observaao Em nenhuma parte isso e mais evidente do que em seus escritos sabre os conflitos de grandes poderes em sua epoca nos quais uma profunda hostilidade com a Russia czarista o levou a uma teoria moralizadora e conspirat6ria que nao possufa nenhuma relaao subs tantiva com sua abordagem te6rica mais geral A ingenuidade de Lenin sabre o Estado revolucionario no infcio de 1917 e a sua des consideraao dos perigos de uma nova ditadura depois de 1918 ilus tram a mesma fraqueza A ilusao de que o Estado definharia em sua dimensao interna is to e visavis a sociedade e reproduzida na ilu sao de que a divisao entre OS Estados sera superada pela interdepen dencia capitalista ou pela revoluao socialista Talvez o maior e mais eloqtiente exemplo desta subestimaao do Estado seja a dificuldade permanente que os marxistas ortodoxos tern em explicar duas das mias duradouras caracterfsticas da politica do se culo XX o nacionalismo e a democracia capitalista Pais apesar de toda a ret6rica sabre a falsa consciencia a mistificaao e a traiao de lideran ca estes fenomenos fundamentais representam urn problema te6rico para 0 marxismo 0 primeiro persistentemente temse provado superior as lealdades de classe como urn meio de mobilizar o apoio das massas sem diferenas entre os oprimidos e os opressores 0 ultimo assegura a leal dade ou pelo menos a aquiescencia da massa da populaao nos pafses capitalistas mais desenvolvidos par mais de meio seculo com urn uso limitado da coercao e da intimidaao por parte das classes dominantes Estas dificuldades tern implica6es importantes para o estudo das rela5es intemacionais Dentro das rela5es intemacionais existem varias subdisciplinas que se reunem para compor a disciplina Estas incluem o direito intemacional as institui5es a segurana a tomada de decisao as relacoes economicas e a filosofia Urn reconhecimento te6rico e pratico equilibrado das determina5es do socioeconomico e do hist6rico sem abstraflas de seu contexto e totalidade passa pela percepcao de que elas sao como na polftica domestica govemadas por regras e tendencias pr6prias que nem sempre pode ser reduzi das ao socioeconomico Par exemplo perceber a OTAN Organiza cao do Tratado do AtHintico Norte somente como uma alianca entre os Estados capitalistas sem qualquer especificidade geografica cul tural e hist6rica seria tao enganoso quanta percebela em termos de relacoes intemacionais como uma aliana em geral sem referenda aos interesses socioeconomicos ofensivos e defensivos dos gover nos que a criaram e a sustentam Similarmente e possfvel analisar os Estados da OPEP como Estados produtores de petr6leo inseguros a maioria de Estados arabes do Oriente Media e como resultado de urn desenvolvimento combinado e desigual do capitalismo na epoca do 84 Fred Halliday p6sguerra com comportamento correspondente aos de fomecedo res de mercadorias em uma posicao monopolfstica 0 MARXISMO ALEM DA GUERRA FRIA terialismo hist6rico prtanto e urn Ce conceitos 9e elVllialtsar a total extencompQJaffil11Qsocia1 incht dass relacoes mternacwna1s Escritores trabalhando com sua abor dagem teonca Ja produz1ram algumas anahses espec1ficas de quest5es e de eventos dentro das rela5es intemacionais e criaram conceitos gerais que tern potencial para serem aplicados sistematicamente a dis ciplina 0 materialismo hist6rico pode apresentar uma altemativa te 6rica e empfrica para se trabalhar dentro da disciplina das relacoes intemacionais como ate aqui convencionalmente constitufda Mas somente pode fazelo pelo reconhecimento do desafio que as pr6pri as rela5es intemacionais lpe colocam como pelo necessaria desen volvimento de seu potencial analitico em resposta aos eventos e a al gumas teorias altemativas do mundo contemporaneo Defender a relevancia do materialismo hist6rico no encerramento da Guerra Fria e com o colapso do sistema comunista pode a primeira vista parecer perverso se nao desesperado Tal empreendimento e pas sf vel par causa destas mudanas e nao apesar delas Aimportancia do materialismo hist6rico como urn sistema explicativo nunca foi depen dente do sucesso dos movimentos ditatoriais que diziam estar falando em seu nome mais do que o capitalismo pode dizer que o seu sucesso dependeu dos regimes autoritarios racistas e beligerantes que produziu A evoluao separada e conflitante de urn comunismo oficial e de urn mar xismo independente ao Iongo da maior parte do seculo XX e evidencia suficiente distoAlem destas considera5es existe a possibilidade de que o materialismo hist6rico se tome mais relevante ainda como urn sistema explicativo pais em sua origem e desenvolvimento toma como ponto de partida e foco de analise o fenomeno que hoje mais do que nunca domina o mundo o capitalismo 0 marxismo estava errado em declarar a iminencia da altemativa revolucionaria a sociedade capitalista e subestimou o potencial para a mudana e para a melhora dentro do capitalismo Como iremos ver no Capitulo 9 a afirmaao de que o capitalismo inevitavelmente leva a guerra podese tamar ela mesma hist6rica uma reflexao sabre Estados que ainda nao eram completamente democraticos Entretanto a dupla constataao de que o modo de producao fomece o contexto para a analise dos feno menos polfticos nacionais e intemacionais e de que o sistema capitalis ta e marcado por conflitos perigos e fracassos enraizados nestes fato res socioeconomicos e tao valida hoje como o foi no passado Repensando as relacoes intemacionais 85 Os capftulos que concluem este livro fornecem urn cojunto de respostas a isso explorando como uma abordage matenahsta hist6rica pode oferecer explicayoes para a Guerra Fna e o seu des confortavel resultado Como fim da longa confrontayao como co munismo e da continua compulsao de esconder as questoes socioe conomicas as RI podem agora admitir em que medida os interess pollticos e sociais espedficos determinaram a sua agenda e a pohu ca externa dos Estados Em tal contexto o materialismo hist6rico Iiberto do dogmatismo e 6a conformidade pode tornarse mais e nao menos significative dentro do estudo do internacional 86 Fred Halliday capitulo 3 OESTADOEA SOCIEDADE NAS RELAOES INTERNACIONAIS 0 IMPASSE SOBRE 0 ESTADO Desde o infcio dos anQSlZO a maior parte do debate te6rico den tro daSiefayaes internacionais enfocou a questao do Estado Algumas cuss5es foram sobre a sprtmazia anaJltica 99 o aQ coQPJYO rel5es intemacwnais enquanto outras enfocaram as quest6es normati b 1 r a a rfi vas so re o grau em que ee puue ser cons1 era o como o pnnctpa a aor do que e born dentro e entre OS Estados O zyalm9 Estaocntri co reafirmou posic6es tradicionais sobre o stado e tem atraves da emergencia do neorealismo afirmado novas ideias especialmente nn campo das relacoes economicas intemacionais Outros paradigmas de safiaramaprimazia do Estado seJa pela a do papel dos atores naciestataiS como as teonasillfiiiferaepeiiaeDcia e do transnacionalis IilQSeJafirmacaoClil primazia dos sistemas globais e das estruturas sooieatofes especffkorestataisotrnoestataisftxtrur essas tres aborda gerisforam1nflueiiCiadas porfunderieias mais amplas dentro da ciencia polltica o realismo pela teoria polltica dominante o transnacionalismo pela rejeiyao pluralista e behaviorista do Estado em favor do estudo das ac6es e o estruturalismo pelas teorias de determinacao socioeconomica No final dos anos 1980 entretanto pareceria que este debate den tro das relayoes intemacionais havia chegado a urn impasse Os tres paradigmas com suas muitas variayoes e reformulay6es permanece ram vigorosos e a quantidade de seus partidarios aumentou e dimi nuiu com o desenvolvimento profissional e o modismo intelectua1 Contudo nao havia nenhum sinal de que qualquer urn deles poderia 1 A defesa da diversidade de paradigmas e energeticamente feita emAgainst Method London Repensando as relat6es intemadonais 87 iJJM ou iria prevalecer sobre 0 outros Os que desafiavam o realismo ain da buscavam refutalo e substituflo enquanto os seus partidarios pro curavam demonstrar a inadequaao de tal contestaaol A procura por uro paradigma unico para a normalidade definida em termos huh nianos produziu uma situaao de pluralismo esteril e insatisfat6rio Todavia podese considerar que a pluralidade de paradigmas e na verdade uma indicaao de ue a disciplina e saudavel e nao urn bloco mono ttlco o qu sao exc ufdosoiitras perspecllvas pr6giilmas de pes quisa conceiros e fato PouCOsestud1ososcrasruecras6utrasciei1CiaS SOClaisoeseJam voltar para o mundo exclusivo e clorof6rmico de mui tas ciencias sociais dos anos 50 no qual um paradigma reinava com autoconfiana institucionalizada Alem disso podese discutir que bus car refutar utn paradigma com base em uma visao intelectual estreita e uma aventura inutil ja que as razoes de atraao e vigor de uma deter minada abordagem sao multiplas e incluem a sua coerencia intelectual o seu apoio institucional e as influencias das tendencias e do senso co mum das ciencias sociais e de sua epoca 2 Entretanto Ceitar a legitimidade e a inevitabilidade do pluralismo eradigmatico nao elimia a jgd exLs razes a vfll mesmo que nem todos os paradigmas possam igual mente ser tratados como validos no caso do debate sobre o Estado e pertinente indagar por que ele avanou tao pouco nas ultimas tres deca das nao houve qualquer resultado ou abertura de terreno Uma das ra z6es para isso presente no trabalho de Kuhn e de seus seguidores e a percepao de qtJe os paradigmas e seus argumentos nao podem ser com parados porque empregam diferentes conceitos e sistemas coriceituais perguntam diferentes questoes e selecionam diferentes fatos3 As expli ca6es que urn paradigma irrefutavel oferece para as anomalias ou para as outras tendencias no mundo real podem ser vistas por outros paradig mas como ameaas a sua validade assim os realistas podem incorporar Verso 1975 de Paul Feyerabend A teoria anarquista de Feyerabend de que qualquer paradigma e valido e implausfvel mas a sua demonstrao dos beneffcios da competiiio entre paradigmas e dos muitos fatores niiocientfficos que atuam no desenvolvimento cientffico e na aceitaiio de paradigmas e convincente 2Uma discussiio notavel e aquela de Stanley Hoffman An American Social Science International Relations Daedalus vl06 n3 October 1977 Hoffman evita a tendencia de alguns outros que criticaram a maneira como uma certa ortodoxia norteamericana tern dominado as reloes intemacionais colocar a questiio em termos nacionais como uma abordagem americana 0 que ambos os expoentes ortodoxos das relaoes intemacio nais e os seus crfticos nacionalistas escondem e a existencia de uma imensa di versidade dentro da Iiteratura americana e que e a negaiio desta diversidade que constitui o problema real com a apresentaiio americana ortodoxa 3Sobre a incomensurabilidade verTS Kuhn The Structure of Scientific Revolutions Chi cago University of Chicago 1970 pl48ff 88 Fred Halliday as corporaoes multinacionais CMNs os te6ricos da interdependencia a contfnua importancia do papel das quest6es de segurana e os estrutu ralistas a ascensao dos novos pafses industrializados NPis Como Kuhn escreveu Todas as teorias historicamente significativas concordaram com os fatos mas somente mais ou menos Portanto o impasse sobreQ Estado m arte uto de urn impasse te6rico muito mais profundo ue determina a ausencia de dis utas so re a uestao rna segun ra zao que POde ser i entifica a em parte da literatura sobre a economia polftica internacional e que 0 desenvolviJtlltO de perspectivas sobre 0 Iugar s sdo lEoLJlas intmiplas tern sido urn proresso con no que nem confrrma e nem refuta a mais simples das aiialiiSes re ahstas ou naorealistas Neste sentido se sao identificadas inUmeras ma neiras s guais E lPeiicjJfuirimoaQ9 taas varus outras que EOV ltenso fJtaliento ou seja a posuao do Estado rot enrraquec1da e fortalecida e neiifitiifia ieso lucao ernpfrica Ou te6rica desta questao e QQrv Se OS realistas pare cern excessivamente complacentes ao afrrmar que pouco ou nada real mente mudou seus opositores freqlientemente superestimam o grau em que os Estados nao sao mais os atores centrais isso aparece tanto em suas analises do presente curso das rela6es internacionais como em suas ten dencias de extrapolar as tendencias atuais para prever um futuro deseja vel aparentemente proximo no qual onde nao existiria o Estado Porem a compreensao te6rica deste processo contradit6rio de fortalecimento enfraquecimento do Estado pode levarnos alem da atual polarizaao Contudo existe uma terceira razao para o impasse que penetra no amago das relaoes intemacionais nos conceitos que a susten tam nos programas de pesquisa por elas gerados e na sua relaao com as outras disciplinas dentro das ciencias sociais a questao da definiao de Estado que e utilizada Algumas vezes parece que OS te6ricos das relaoes intemacionais estao trabalhando com os con ceitos dos antigos te6ricos polfticos Apesar de nao reconhecidos pelas relaoes internacionais nos ultimos 20 anos tambem existiram debates paralelos sobre o funcionamento do Estado dentro da soci ologia e do marxismo Mais relevante ainda ao mesmo tempo em que os inovadores e defensores de novos paradigmas para as rela oes intemacionais buscaram rejeitar ou reduzir a importancia do Estado sem definilo na sociologia as mesmas correntes inova doras buscaram reexaminar o Estado e reafirmar sua centralidade nos contextos hist6rico e contemporaneo enquanto o debate mar xista abordou nao o desaparecimento do Estado mas a sua relaao com as classes sociais 4 Esta ocorrendo uma mudana fundamental 4Ralph iliband The State in Capitalist Society London Weidenfeld Nicolson 1969 e a analise classica desta questiio Para uma visiio dos debates subseqUentes ver Bob Jessup The Capitalist State Oxford Martin Robertson 1982 Hepensando as rela6es intemacionais 89 em favor do Estado 0 titulo de uma coleao de ensaios sociol6gi cos sobre esta questao Bringing the State Back In 5 resume o deba te e contem artigos de muitos de seus principals analistas sugere urn desenvolviinento contnirio mas extremamente relevante para a dis ciplina das relaoes internacionais que tern consideniveis implica oes para a discussao sobre esta questao involuntariamente auto centrada lgualmente o debate marxista desconsidera qualquer con traposiao entre os atores estatais e naoestatais Ylm tos sugerem que o debate sobre o Estado dentro das relaoes inter nacwrialsGevesei teconsiderado por meio dO estudo destas discus soe lirietae Pelo qltofueio da 4ei1ii19iio excIYCI taro aprtircla qpa1a maiorprte do debatenesta area tern girado Niiodevemos discutir se somos ou nao EstatocentriCos mas so bre o que queremos dizer com Estado 0 renascimento da teoria do Estado e particularmente relevante para os que afirmaram que o termo deveria ser abandonado Em uma sucessao de livros e artigos publicados a partir da metade dos 1980 Yale Ferguson e Richard Mansbach debateram que o conceito de Es tado e tao confuso e inapropriado que nao pode fornecer uma base para trabalho te6rico sobre as rela6es intemacionais Apesar de esta rem certos ao chamar a atenao para a multiplicidade de significados associados ao Estado eles nao se justificam em muitos de seus outros argumentos ou conclusoes Por urn lado nao ha nada inerente ao conceito de Estado como definido abaixo que impea a discussao das varias formas de poder estatal e de alocaao de valor por eles destacadas Por outro eles passam ao largo na verdade falham seri amente em engajarse com a literatura sobre o Estado que se desen volveu dentro da literatura sociol6gica e produziu inumeros trabalhos exatamente quando eles estavam declarando que o conceito nao po deria ser utilizado reivindica9ao de queJrm9cJQqgA Eamente tern COnstasesnormatiyas e bstIIlal Sua tenta tlva ae relacionar a inutilidade acicoiiceilo de Estado a uma crise mais ampla na teoria das RI e igualmente rrada por ser sustentada 5Jeter Evans Dietrich Rueschemeyer and Theda Skocpol eds Bringing the State Back In Cambridge Cambridge University Press 1985 Dentre outras contribuiy6es ver John Hall e John Ikenberry The State Milton Keynes Open University Press 1989 John Hall Power and Liberties Harmondsworth Penguin 1986 John Hall ed States in History Oxford Basil Blackwell 1986 e sua participayao State em Joel Krieger ed The Oxford Companion to Politics of the World Oxford Oxford University Press 1993 Michael Banks e Martin Shaw eds State and Society in International Relations London HarvesterWheatsheaf 1991 e Anthony Giddens The Nation State and Violence Cambridge Cambridge University Press 1985 Giddens p17 distingue os dois significados de Estado mas nao ve isto como colocando urn problema central Uma discussao recente das implicayoes do trabalho de Giddens para as relayoes intemacio nais e encontrada em Linklater Beyond Realism and Marxism passim 90 Fred Halliday I no questionamento da escolha do metodo e na indeterminaao do conceito A eliminaao do conceito de Estado segundo as conclu soes encaminhadas por estes trabalhos nao acarretaria o surgimento de novas relaoes internacionais mas somente mais confusao 6 DEFINIOES EM OPOSIAO A primeira vista nao e 6bvio que existe urn problema sobre a de finiao do Estado nas rela6es intemacionais pela simples razao de que a distinao operacional e implicita e nao convencionalmente sujeita a extensa amilise te6rica ou empirica Na verdadee paradoxa que urn conceito tao central a toda disciplina tenha escapado de uma discussao como esse o fez Podem ser encontradas muitas discussoes sobre a guerra a soberania as institui6es e assim por diante mas podese pro curar em vao nos livros por discussoes semelhantes sobre o Estado Os te6ricos das relaoes intemacionais supoem que n6s sabemos o que eie e Bull que e uma comunidade politica Waltz que e na pnitica uma coextensao da naao 7 Como urn todo as relaoes intemacionais con sideram como dada uma definictaQcifica o gue se pOd classtticai de totalidade nacionalterrit9ri Assim o EstadoGraBretanha Rus sia Americietc abrange em forma conceitual o que e percebido visualmente no mapa politico o pais como urn todo e tudo o que esta dentro dele o territ6rio o govemo o povo e a sociedade A melhor sin tese desta percepao e encontrada no capitulo introdt6rio de The In ternational Political System de Northedge Urn Estado no sentido utilizado neste livro e wna associa9iio territorial de pessoas reconhecida para os prop6sitos do direito e da diplomacia como wn membro legalmente igual do sistema deEstados Na realidade e uma forma de organizar as pessoas com o prop6sito de participar do sistema intemacional 8 6Yale Ferguson e Richard Mansbach The Elusive Quest Theory and International Politics Columbia SC University of South Carolina Press 1988 Capitulo 5 The state as an obstacle to international theory Ferguson e Mansbach The State Conceptual Chaos and the Future of International Relations London Lynne Reiner 1989 Ferguson e Mansbach Between celebration and despair Constructive suggestions for future international theory International Studies Quarterly v35 n4 December 1991 As sugest6es construtivas revelamse como ideias gerais ser historicamente consciente etc e sao pouco mais do que uma lista de prescriyes ao acaso Hedley Bull The Anarchical Society London Macmillan 1977 p 8 Kenneth Waltz Man The State and War New York Columbia University Press 1954 p1728 8FS Northedge The International Political System London Faber Faber 1976 p 15 Uma considerayao mais recente desta posiyiio classica pode ser encontrada em Alan James Sovereign Statehood London Allen Unwin 1986 James apresenta o conceito de Estado ditetamente usandoo para abrangerterrit6rio pessoas e urn governo p 13 Repensando as relac6es intemacionais 91 Nao e discutido pelos que defendem este conceito especial mente pelos ue tal Estado existe empiricamente mas so mente 9ue esta abstraao flri Ylifla tpria PftCl e lo internacional e heuristicamente a mais apropriada para as relacoes irirniicioriais 9 Em outras palavrasa teonasustentiaa sabre este conceito e a que explica mais sabre as relaoes internacionais e deve portanto ser mantida Esta e uma razao vHida para manter a abstra ao a questao nao e se ela fornece uma base para a explicaao mas ao inves disso quao adequada e a explicaao que ela fornece De veria ser evidente que uma vez aceito este conceito por definiao a questao dos atores naoestatais e prejudicada 0 conceito altemativo de Estadoautilizado em muitos escritos s1 giQs rccerites e no gJti mIiiijpo Ele rerena nao a totalidade soctaltemtonal mas urn conJunto espectfico de mslY saes coercitivas e administrativas distinto do contexto politico social e oiiLIJIo iirnnueticiaaa Jeia triifiloalInr de MaX Weber e Otto Hintze Skocpol defme o Estado como urn conJun to de organiza5es administrativas poHticas e militares encaadas e mais ou menos bern coordenadas por uma autoridade executiva10 Muitas 4 finic5es alternativas do EQ2po flegs dptro E abor dem socio1gifa Entretanto este conceito de instituioes coerctttvas e administrativas serve para apresentar urn conceito bastante diferente de Estado e para sugerir uma maneira altemativa pela qual o conceito pode ser incorporado dentro da discussao das relaoes intemacionais Dentro da discussao sociol6gica do Estado que emergiu ao Iongo das ultimas decadas muitos problemas contllll Olio Urn L a questao de como delimitaEfei1fl92ta9q se o Estado e perce rudo como urn mecanismo para dominar regular e reproduzir uma so ciedade sob dadas relaoes sociais entao emerge a questao de onde lo calizar as institui5es que sao formalmente independentes mas que tam bern sao influenciadas pelo Estado e acompanham as suas funoes re gulat6rias e reprodutivas as escolas as universidades as igrejas e em alguns de seus papeis a famt1ia 0 debate sabre a concepao de Althusser dos estabelecimentos educacionais como Aparatos Ideol6gicos do Es tado foi urn exemplo disso 11 Urn segundo QeQ bem representado em Bringing the State Back In 9iz respeitQJfllQJlQOEado uma vez gue o Estado e vista como institucionalmente distinto da soci 9Este e o argumento de Cornelia Navari em sua introduao a The Condition of States Milton Keynes Open University Press 1991 pll15 Sua percepao dos diferentes significados do Estado nao e repetida nos cap1tulos de seus outros contribuidores 1Theda Skocpol States and Social Revolutions Cambridge Cambridge University Press 1979 p 29 HLouisAlthusser Ideology and ideological state apparatuses em Lenin and Philosophy London New Left 1971 92 Fred Halliday edade nasce a questao dos limites dentro dos quais ele pode agir auto nomajetesentarytles separad dqull sociedade iries 0 que no final seja por ela constrarigido 0 conceito institucional de Estado e em parte uma foima de resistir aquelas teorias marxistas que veem o Estado como em maior ou menor medida uma expressao do interesse de classe ou economico 0 grau em que aqueles no poder podem perseguir polfticas contra os aparentes desejos da maioria da sociedade pela imposiao de reformas ou fazendo guerras que sao impopulares e destrutivas coloca esta questao da autonomia bastante claramente Uma explicaao e que 0 Estado tern OS interesses estrategi cos de Iongo prazo da sociedade em mente Para alguns como Sko cpol existe uma area distinta de autonomia que e bastante fortalecida pelo papel internacional do Estado Urn marxista como Fred Block tam bern tern esta posiao 12 Para muitos como Robert Brenner uma clivi sao de trabalho entre a administracao societaria e a apropriaao privada nao deveria ser confundida com qualquer autonomia real e a teoria marxista do Estado como instrumento declasse permanece valida 13 Urn terceiro debate localizado especificamente dentro da tradiao socf016 gica marxiStareferiuse a reiSCg4Q99lllllPl1eo CIIP pitalismo e as cfasSesliidoalem da visao marxistaleninlsta inicial do Estado coiiiOUmmero instrumento de dominaao declasse este deba te gerou vcirias teses altemativas a esta abordagem saindo da 16gica do capital para chegar aquela que destaca a administraao dos conflitos interelite a abordagem influenciada por uma leitura de Gramsci de acordo com a qual a funao do Estado e manter a hegemonia de classe em to das as suas dimens5es a coercitiva a administrativa a regulat6ria e a ideol6gica E ri ti y8Jlellte dctjt etrut al atribJL9Estado lliDgJAlJDPiQmiQLfle ayton A diferena entre estas duas concepoes de Estado refletese na linguagem do diaadia Nas discussoes sabre o territ6rio faze mas uma distinao entre o territ6rio do Estado em seu sentido mais geral e as areas de terra que sao propriedade do Estado em seu sentido institucional Similarmente diferenciamos a populaao e a populaao trabalhadora de urn Estado da porcentagem daquela po pulaao que esta diretamente empregada pelo Estado Em revolu oes o Estado institucional e derrubado mas o Estado total perma nece Todavia muito do debate das relaoes internacionais parece envolver uma fl1flsa destes iific92 Assim quando os criticos do marxism a dizeque ele e uma forma de realism a por 12Fred Block Beyond relative autonomy State managers as historical subjects Socialist Register 1980 13Robert Brenner The Autonomy of the State Isaac Deutscher Memorial Lecture London School of Economics 21 de Novembro de 1986 Repensando as rela6es intemacionais 93 ser Estatocentrico isto mistura os dois conceitos de Estado os marxistas usam o termo Estado de uma forma muito diferente da realista 0 resultado e o domfnio do conceito de totalidade porque a propria definiao envolvida impede outras areas de investigaao teorica Isto e 0 que urn paradigma deve fazer OS realistas defendem e podem fazelo que as questoes e dados identificados como relevantes por outros paradigmas sao relativamente insignificantes Se o conceito sociologico tern maior poteCiJtlicJlj cativo doqueoaetotalidadtnniclOiialterrftoiial e uma questao a ser discutidaMesmo ass1m seJa qual foro JUlgamento fmal sobre este as sunto duas oposioes sao imediatamente evidentes A primeira e que eara uma displina preadJlJrela drlllidau conceito sociologico e uma abstraiqlSa attaJtda aeilaCional terntodalOCoiiCeitci normalmente utilizaoo nas relaoes lnternacionais nioe simplesmente uma conveniencia analitica e pos sui varias suposioes legais e de valor isto e que OS Estados sao iguais que eles controlam seu territorio que eles coincidem com as naoes e que eles representam suas proprias populaos teccei cQnleflcionaLdeEstago olerttli reles tefl1 agP feria ser menos realista Unia segunda oposi ao relevante 6 ue a a tf1Jiafiiitsri1earo6zas partCiaionaesferatntemacfonafauinenta e fortalece OS Estados e em particular por que lhes da condiao de agir mais independentemente das sociedades que governamEstaf8Elilal d ffilJdo moderno que os Estados podem ser menos uscet1ve1s a e represena ttysde slia sJechides precisalliIPi34scUntJla cional e desconslderada ab initio peias SUQosiOes do conceito naci anaJterritodaY 0 lilinimoque pode ser dito portanto e que uma conceitualizaao alternativa do Estado permite questoes analiticas e caminhos de pesqui sa muito diferentes daqueles possfveis dcntro da abordagem da totalida de Em primeiro Iugar esta definiao altemativa de Estado abre urn con junto de distin6es conceituais que estao confusas e misturadas na lite ratura das relaoes intemacionais mas que precisam ser identificadas para se perceber com maior clareza a relaao Estadosociedade 0 pro prio conceito de intemacional tern como muitos crfticos apontaram dificultado a questao ao confundir as relaoes entre as naoes como que usualmente sao as rela6es entre Estados Sintomaticamente o classico de Morgenthau Politics Among Nations como as proprias Naoes Uni das possui o nome errado Uma iistinqlyta entt o Estado lls lti9o scl co ea sociedade isto e asimQlruiosindivfduos e pr4ti cquexrsiema1em Cfocontrole diretefinanciamento da enti 94 Fred Halliday ade centrJ 14 A propria sociedade nao e homogenea abrangen do diferentes classes sociais grupos etnicos e de interesse cujo acesso ao Estado e determinado pelo seu poder riqueza e habili dade polftica A relaao Estadosociedade e portanto variavel e aqui que o debate marxista tern sido mais pontual e onde muitos marxistas criticaram a abordagem institucional 15 Uma eg4Lill9eiste Cne o Esta5 EY9DJuntodapaQJtdPristrattvoeopessoal JCcutivofonnaL em posiaa de control uprm9 0 discurso polftico convencional con sidera que estes sao identicos assim como o par Estadogovemo e con siderado como representando a sociedade como urn todoAssim emseu uso ortodoxo as indicaoes primeiroministro ou presidente de urn pafs sao prontamente substitufdas pelo nome do proprio pais A posi ao da GraBretanha sobre o desarmamento e etc Entretanto a dis tinao Estadogovemo pode em algumas situaoes tomarse de consi deravel relevancia a medida que elementos dentro de urn Estado resis tem ou ativamente se opoem as polfticas do govemo Isto pode assumir formas relativamente inocuas vazamentos para a imprensa atraso de medidas arranjos na agenda ou crfticas culminando na mais extrema das contradioes Estadogovemo o coup detat militar Qma terceira distiQaO central e1tfQ gggQCEa00 termo Estadonaao baseado em uma suposiao de homogeneidade etnica e representatividade polftica e em termos empfricos inapropriado ao mundo modemo Os Estados coercitivos podem nao representar a naao a sociedade que eles govemam onde existe diversidade etnica como na maioria dos Estados do mundo o Estado pode representar mais os interesses de urn grupo nacional do que de outros Portanto esta aberta a questao de ate que ponto o Estado representa a naao Apesar da anali se de polftica extema ter desafiado esta fusao realista dos termos ela nao apresentou uma conceitualizaao alternativa de Estado 16 Alem disso19igPlciQlqgift Slr uma visao altroati CJlI1SlJEiqtjgIlS stados Afltesde maJStada SUa enfase e sobre o Estado como urn instrumento de coerao e exploraao das populaoes sujeitadas e rivais Como Tilly mostrou com base na investigaao historica os Estados europeus comaram como instrumen 14Qualquer conceito de sociedade intemacional pressupoe urn conceito de sociedade domestica Sobre isto ver Capitulo 4 15Paul Cammack Bringing the State Back In British Journal of Political Science vl9 Aprill989 16 As implicaoes de l9ngo prazo da analise de politica extema podem desafiar a totalidade prevalecente do conceito de Estado mas muito da literatura tern operado dentro de uma estrutura pehaviorista que ignora a relevfulcia do escrito sociol6gico sobre o Estado ou que se tomou iestrita pelo fetichismo da tomada de decisao como urn fim em si mesma Repensando as relac6es intemacionais 95 tos de subjugaao como redes de proteao 17 Ao Iongo dos seculos pode ser que estas redes tenham desenvolvido uma funao mais repre sentativa mas isto e contingente algo que varia de pafs para pafs e urn processo que pode nao estar completo Devese lembrar que o princf pio de uma pessoaum voto s6 foi introduzido nos principais Estados ocidentais a partir da Segunda Guerra Mundial 18 Nas discussoes sobre a ascensao do sistema modemo negligenciar o fato de que em suas origens as principais funoes dos Estados eram a conquista de bens e territ6rios a subjugaao de populaoes e a guerra contra rivais implica afirmar que os Estados ja eram representativos desde 1648 Urn terceiro tema central levantado na Introduao e que OS Es tados e a sua organizaao inteina desenvolyCrlLllSQJltexto mundilhist9riQJsto e emiriterao eiE glQado Longe da constituiao intemaaasEstaaos e das sociedades ser imu ne pelo menos ate recentemente aos fenomenos do intemacional esta dimensao fomeceu o seu contexto e a sua influencia fom1ativa igualmente isto se aplica a maior parte dos Estados p6scoloniais e portanto moldados por esta experiencia previa mas tambem aos Es tados europeus A economia mundial a reforma os valores da legiti midade e acima de tudo as pressoes da competiao economica e militar indicam isto 19 lsso e tao importante ntca marxlsfibcomo em Giddens e Mann quanto em uma teoria iniernacioriaTalternativa ao realismo que deriva o sistema dos Estados 0 quarto tema constitutivo referese ao pesQEdqpa f ao das sociedades da co11sciencia nacional dasidqlqgilS ncilSgue fSfoiijtos de Jessoas em 11a9oes em eOJ1Qnlll mti9ruUs bs Estados sempre desempenharam papeis em moldar as econormas nao somente atraves do planejamento da taxaao e da promao dos setores t7Charles Tilly War making and state making as organised crime em Evans et al eds Bringing the State Back In e Charles Tilly ed The Formation of National States in Europe Princeton NJ Princeton University Press 1975 Para urna exposiiio brilhan te do papel da violencia na constituiiio dos Estados modemos ver J B Barrington Moore The Social Origins of Dictatorship and Democracy London Allen Lane 1966 18Goran Therbom What Does the Ruling Class do When it Rules London New Left 1978 fomece uma pesquisa esclarecedora sobre o relacionamento entre os fatores ex temos e o funcionamento do aparato estatal 19Felix Gilbert ed The Historical Essays of Otto Hintze New York Oxford University Press 1975 nos Capitulos 4 a 8 fomece uma analise bist6rica detalhada da relaiio entre a formaiio individual do Estado e a competiiio internacional entre os Estados na bist6 ria europeia moderna Para urn estudo esclarecedor do impacto dos fatores polfticos internacionais sobre as politicas econCrnicas dos Estados ver Gautam Sem The Military Origins of Industrialization and International Trade Rivalry London Frances Pinter 1984 Karl Polany The Great Transformation The Political and Economic Origins of Our Time Boston Beacon Press 1957 fomece uma visiio da bist6ria dos seculos XIX e XX com uma inclinaiio similar 96 Fred Halliday ligados ao interesse nacional especificamente o militar mas tambem pela sua regulaao atraves da legislaao sobre 0 que e ou nao legftimo e por meio dos mecanismos financeiros dos bancos centrais Independentemen te de sua origem e natureza o capital intemacional no rmal do seculo XX reconhece os poderes regulat6rios dos Estados Em nenhum Iugar isto e mais evidente do que nas flutua6es dos mercados de capitais provoca das pelos resultados eleitorais dos principais Estados ocidentais e pelas mudanas em poderes regulat6rios e do que no nervosismo das bolsas de valores com a indicao de urn novo presidente de banco central Seria facil ignorar pesquisas preeleitorais ou novas fom1as de regulamenao se as polfticas dos Estados britanico japones e americana nao afetassem os mercados de capitais Ao considerar que o papel dos Estados na eco nomia e limitado a sua propriedade formal de servios produtivos e fi nanceiros a maior parte da literatura comete uma falacia e ignora os po deres muito mais amplos que historicamente estes Estados tern mantido e mantem visavis suas economias Finalmente existe urn importante coljunto de quest5es ligado a composiao interna do Estado e a sua relaao com a sociedade que e levantado pela sociologia hist6rica Como Michael Mann mostrou a questao da capacidade dos Estados de como os Estados administram suas popula6es e seus territ6rios e dos muitos mecanismos para impor e estender controle e uma das que mais produz resultados na investiga ao comparada e hist6rica 20 llJQQfQg liberta o estudo do Esta do do conceito de soberania da suposicrao de queo Estado tein ci ino no6h eaaongo q uiJ territ6io dITiiiitado e ao mves dtsso egltgQo te q11e pntoecom quais mudanas eSEtfosedeenylyeu A premissa de vanos traballiosaerela 5es internacionais e a de que o Estado e soberano ao controlar efetiva mente o territ6rio e a populaao sob seu governo Entretanto isto e uma simplificaao empfrica mesmo para o mais eficiente dos Estados Ela impede a analise de como o controle e exercido e desenvolvido e como outros fatores incluindo os intemacionais podem modificar e afetar a capacidade de controle de urn Estado Estes temas amplos recorrentes em grande parte da literatura sociol6gica e hist6ricosociol6gica recente sugerem areas nas quais o conceito altemativo de Estado pode afetar o estudo das relaoes intemacionais Abaixo seguem algumas sugestoes mais especfficas de como dado este paradigma alternativo o estudo das relaoes intemacionais pode ser desenvolvido 20Michael Mann The Sources of Social Power vol 1 Cambridge Cambridge University Press 1976 The autonomous power of the state Its origins mechanisms and results em John Hall edates in History Oxford Basil Blackwell 1988 especialmente Capitulo 1 Repensando as rela6es intemacionais 97 0 ESTADO COMO ATOR DOMESTICO E INTERNACIONAL Dentro desta literatura o tema mais significative para as rela coes internacionais e a percepcao da acao do Estado em duas dimen soes a domestica e a internacional 0 Estado compee com os ou tros Estados para mobilizar recurel11ll2eu Rapel internaiLPfiEa soidall s1Ja J29Slotlf111e Por exemplo urn Estado poae apropnarse de temtono tr a guerra bus car urn cordo de controle de armamentos para ganhar vantagem domestica enquanto pode prornover a industrializacao introduzir a mudanca educacional aumentar impostos ou tratar melhor uma minoria etnica para atingir objetivos internacionis Conduzida c sucesso esta poHtica em duas frentes pode func10nar par benefct ar 0 Estado e e evidente que os que controlam o poder tern mmtas vantagens perseguindoa Entretanto esta dpla diensao envolve grandes riscos Urn Estado que coloca pressao metd sobre sua sociedade para mobilizar recursos para a compettcao 1nteac10nal pode provocar uma reacao intensa e ser derrubado 21 Alternattvamen te a busca de uma polftica domesticamente vantajosa pode levar o Estado a conflitos destrutivos com outros Estados Contudo bem sucedida ou nao esta perspectiva bidirnensiI1Jt bre Pelitic kit11titpa4to e pOJifie PECPl9Soc S9Efht9 Aqlees ue cnrlam o poder nostado e aqueles a ele assoctados trao dtspombthzar recursos internacionais para conter ameacas domesticas Estes recursos po dem ser militares incluindo tropas aliadas economicos fornecidos por uma corporacao multinacional ou pelas instituicoes itrnacio nais como ajuda aos detentores do poder estatal ou pohttcos na forma de apoio moral tratados ou aliancas com Estados amigos Muito nas relac5es intemacionais pode ser percebj9opQJ1to como jJ9it 0it4iiiatEJici 6em buscam tais contatos internacionais e tern atraves da hist6ria moderna feito bastante uso desta dimensao Certamente existe es paco para o estudo das forcas antisistemicas nas relacoes internaci onais e para urn estudo substancial de como os que se opoem aos Estados estabelecidos tern condicoes e poder de internacionalizar apoios Entretanto a realidade parece ser que assim como nos con flitos puramente domesticos o Estado e os seus defensores tern uma vantagem distinta e podem mobilizar recursos dentro e alem das 21Skocpol States and Social Revolutions Capitulo 1 98 Fred Halliday I I fronteiras muito mais do que OS seus desafiadores Aos ultimos fre qlientemente faltam recursos e acesso aos mecanismos para uma apropriada e suficientemente poderosa integracao internacional a atividade antisistemica22 0 Capitulo 2 sugere que a teoria da inter nacionalizacao das classes de Marx pode ser aplicada tanto ou mais tis cll iiiiiiaiites dque as dominadas A perspectiva sociol6gica sobre o Estado indica a necessidade de estudar em urn contexto comparative e hist6rico como o funcionamen to internacional do Estado afetou os mecanismos intemos do proprio aparato estatal Nos estudos de Hintze este tema sobre a formacao do Estado envolve o exame de como as suas atividades intemacionais a guerra a apropriacao territorial e a diplomacia afetaram a origem soci al do funciomirio do Estado o predomfnio de alguns ramos administra tivos em seu interior os valores destes funciomirios o tamanho eo fi nanciamento do Estado 0 papel dos elementos militares do exercito como urn todo ou de comandarites individuais dentt6de Estados e so ciedade mplo mais eloqliente da deterniiiiaffo iliteinacional ria f0fffi29e EstadoA manutencao da influeiicia aristocnitica dentro dos Estados europeus mesmo com a eliminacao do poder baseado na terra em algumas sociedades e urn indicador de como a diplomacia afetou o Estado como urn todo A adocao de urn papel global pelo Estado ameri cana no p6s45 levou alguns criticos liberais a sugerir a existencia de urn Estado de seguranca nacional nos Estados Unidos Em termos gerais este e urn argumento unilateral ja que a Guerra Fria coincidiu com a extensao e nao com a reducao da democracia nos EUA 23 mas o au mento do poder do presidente o fluxo e refluxo dos controles con gressionais a ascensao de novas burocracias com funcoes interna cionais a Agenda Central de Inteligencia o Conselho de Seguran ca Nacional eo novo carater do Departamento de Estado sao todos exemplos do impacto da esfera intemacional no aparato estatal Alem QiS9 JJjplleessariamente as ideologias e os funciomirios do Esta gQ reOtem s9riteiiemiidanas no miuido exteriio a petfuarieriie nUuenda do JiSSaq de gra114e pqdr colonial mesmo nPdfJ5 sob EstaQ britanico e os seus funcioriaiios eeviilenCla Sirficiente EmEstados revolucionanos sitiados onde a sobrevivencia e incerta a cada mes para os que estao no poder garantir a protecao contra a invasao e a subversao e urn enorme peso na alocacao de tempo e de recursos e afeta a concepcao do que e a discordancia legftima 22Uma pesquisa pioneira dos acessos intemacionais relativos das classes begem6nicas e dominadas e a de Carolyn Vogler The Nation State Aldersbot Gower 1985 23Goran Tberbom The rule of capital and the rise of democracy New Left Review nl 03 MayJunel977 Como Therbom aponta o princfpio de uma pessoaum voto nao foi efeti vo nos Estados Unidos ou na GraBretanba ate 1960 Repensando as relaoes internacionais 99 OS INTERESSES ESTATAIS E AS FORcAS SOCIAlS Igualmente elaQlgpstclE a ociedade e ptl ment afetada pelo intemacional Isto aparece claramente em todas asquatro dimensoes que Michael Mann viu como constitutivas do poder estatal a ideol6gica a militar a administrativa e a poHtica Os beneficios economicos do imperialismo para o Estado brWinico fo ram muito debatidos mas poucos podem duvidar dos beneffcios ideol6gicos que resultaram e ainda resultam para o Estado por causa da afirmaao de seu poder em lugares distantes A necessidade de manter foras armadas na paz assim como na guerra deu ao Esta do um interesse fundamental na intervenao na economia e no esta belecimento de relaoes pr6ximas com os que decidem estas ques toes na sociedade Isto foi verdadeiro na nascente Europa moderna assim como e hoje 0 papel de apoio dos lobbies militares nos Esta dos Unidos e os mecanismos de interaao pessoais institucionais financeiros entre os fornecedores de defesa o Congresso eo Pen tagono foram bern documentados assim como a ligaao entre as operaoes secretas no exterior e os interesses pri vados em cas a e a implementaao de poHticas estatais 0 stado recruta seoes da sociedade dolTIillPra as 511as a vi dadeSlniemacfonisA9 JiigJfgP ec9iuocwdia biisamha9iPat sl1c9ns iJE fIsJl donais Previamente foi apontado que 0 conceito institucional de Esta dotoma possfvel distinguir entre os tennos Estado sociedade govemo e naao Muito da relaao entre estes e constitufda dentro de sociedades especfficas mas existem muitas maneiras pelas quais estas relaoes ad quirem uma dimensao intemacional os Estados buscam regular sua pro pria posiao pela obtenao de apoio intemacional os govemos os gru pos sociais e os grupos etnicos tentam melhorar sua posiao visavis seus pr6prios Estados obtendo auxflio intemacional como a ajuda eco nomica e militar e os atores extemos buscam avanar contra os Estados competidores estabelecendo ligaoes diretas com elementos dentro de suas sociedades Urn caso 6bvio de tal interaao eo patrocfnio de gol pes militares em Estados independentes a promoao de conflitos de govemoEstado Outro e a promoao de agitaao social ou levante etni co em pafses rivais atraves de dinheiro armas transmissoes de radio e apoio diplomatico Por toda a parte a existencia da relaao Estgosoci edade permite meios altematlvos de conduztr as rela9oes1iitemacionais iicorajiioiEstaifQie s r91sapersegu1r poHticasiit cionais que irao increJI1enJarrelativamente as suai posioes domesticas 100 Fred Halliday AS SOCIEDADES E OS SISTEMAS DE ESTADO A interaao recfproca entre ociei4yJltemacional e as socieda des especffiQiin9mfefii9 fetiyctYPiamentJrYHhLm aao doEstado ou como prop6sito de influenchilo Existem outros pro cessosdentro da sociedade que sao influenciados e que podem influen ciar a relaao de urn Estado particular com o sistema intemacional mas que refletem processos bastante distintos da atividade estatal no nfvel intemacional Por urn lado existem mudanas de Iongo prazo dentro de uma sociedade especffica que em urn momenta de impacto crescente sobre o Estado e a polftica do govemo ou do executivo tern grande in fluencia sobre as atividades intemacionais daquele Estado Longe de le v antes revolucionarios estas podem ser mudanas de equiHbrio entre diferentes grupos sociais mudanas de ideologia e atitude e transforma oes geograficas refletindo mudanas economicas A ascensao de uma burguesia mercantil na Europa ocidental no nascente periodo modemo acto sabre a poHtica estatal e a orientaao religiosaideol6gi ca foi a das influencias constitutivas da emergencia de urn sistema intern cional As transforma6es nas prioridades americanas provoca d s pelo declfnio do bloco hegemonico nordeste em favor do sun belt podem explicar as mudanas acentuadas de polfticas entre 1970 e 1980 Ao mesmo tempo9 intemacional pode ter impacto fundamental na com posisao social de uaggedaQ de forma fl tambem poder moldar e ilJ iUenciar o Estado A conquista e a dominaao colonial sao o exemplo mats extrema russo no qual novos sistemas de Estados podem simples mente ser impastos a sociedades subjugadas Na ausencia de tais impo sioes dramaticas do intemacional sobre a sociedade individual existem muitas outras maneiras atraves das quais as mudanas economicas e so ciais iritemacionais podem afetar uma sociedade particular fortalecen do a posiao de alguns grupos sociais e reduzindo a influencia de ou tros A incomorasao no sistema mundial afeta giIEF9 de poder militar intemacionai maSiaiiil5em o eguiHbrio de poder so ciai dentroaassoCieaaaes Este foco narefEstadosociedade tambem pode ajudar a ree xarninar e reteorizar a maneira pela qual os grupos sociais com inte resse intemacional relacionamse com o poder estatal Algo disto esta presente no trabalho empfrico sabre os lobbies as campanhas para ex cluir bens estrangeiros para ajudar empreendimentos associados no ex terior e para demandar concessoes de Estados estrangeiros Contudo le soQritinfJJenciatclatiYad alortiniost gIEII11Pri9ade a este rspitP como se acorporliq mul tinaciollCMJD gpnmdo no exterim desJllSegrr illlePtlldenteellte aosEstados IstJ91lQJre aqustQJlQJespJyi a autonoIDilcloEs dooEst alguns aspectos e mais emcertos peri S j 1 Repensando as rela6es intemacionais I 0 I J t1 4 f r lf odos mais especificamente em tempos de guerra mas Eim9Ipo seufitotqJmroJJitres Jstadg ll1ubcrdilla e sob o comando de interesss influentes dentro dlLQade Ntsto re y side a forla da teona estrutura uo Estado Aqui novamentea tradidonal abordagem caixapreta do Estado toma diffcil responder a questao da relaao CMNEstadoja que somente nos permite examinar o relacionamento intemacionalmente Uma vez que se toma possfvel entretanto examinar a relalao dentro de uma socieda de e identificar o grau de colaboralao na simbiose relativa do Estado e de alguns setores ou classes da sociedade en tao a natureza da clabora lao intemacional e a aparente divisao de trabalho tomase mats clara Existem casos nos quais as CMNs desafiam os Estados como na eca da de 80 comercializando com pafses como Nicaragua Angola Africa do Sul e Russia sob OS quais se desejavam impor pressoes economicas Em muitos outros casos os Estados agem para promover e defender as CMNs Quando a International Telephone and Telegraph ITT teve problemas no Chile em 1970 Harold Geneen presidente da firma li gou para a Casa Branca 0 Congresso impos condil6es para a ajuda a pafses que nacionalizavam as firmas americanas sem a compensa9ao adequada Se o relacionamento entre o Estado e algumas partes da soci edade e visto como constitufdo domesticamente e as atividades intema cionais de cada urn sao vistas sob esta luz entao pode ficar mais facil resolver a inoportuna questao de ate que ponto os atores estatais e nao estatais agem independentemente nos neg6cios mundiais Como veremos em maiores detalhes no Capitulo 5 a rela9ao soci edadeEstado e central para outra dimensao das relal6es intemacionais a do levante social e das revolu96es e em particular a questiio de como as revolu96es tern efeitos internacionais Em geral a literatura de rela96es intemacionais relegou as revolu96es a uma posi9ao marginal enquanto a maioria da literatura sociol6gica sobre as revolu96es tende a negligen ciar as suas implical6es intfilisj0 grande merito do frabalho pde Skocpol e quebusca interrelacionar os dois mostrando o grau em que t as revolu96es sao em wtm medida consideravel um produto de fatores j interestatais e intemacionais e por sugerir como a consolida9ao de Esta i dos p6srevolucionarios e a extensa9 lJfr ea ii influencilgas pelas Jress6es intemacionllisrNao pode existir demonstra9ao mais clara Tallgaioentrea politica intema e a intemacional do que as maneiras pelas quais as revolu96es podem ser estimuladas por fatores intemacio nais sejam a mobiliza9ao de grupos dorninados ou o enfraquecimento 24A mais breve olhada nos livrospadroes de relacoes intemacionais pode mostrar quao pouco as implicacoes te6ricas e empfricas das revolucoes foram consideradas com as excecoes parciais da discussao da intervencao e da subversao Para uma omissao com para vel da dimensao intemacional dentro da literatura sociol6gica mais convencional ver Stan Taylor Social Sciences and Revolutions London MacMillan 1985 102 Fred Halliday de dorninadores previamente seguros Da mesma foIllattmnto as conseqQfu9i igtemacionais das revol1196e1 sugriiionsQJICas lld cionals para a rela9ao Estadosociedade a coroptJlsac Jrvollcion osem promoverl se niio exportar a reyoltJlaQ para 0 exterior a mtsedade earesposta contrarevoluconaria que as rvol1J9 11lm91Qrnais fraco 05soos podem provocar nos poderes hegemonicos A resposta para as dtias qifesloes pooe residir suostandalinenteiii reiaao Estadosocie dade Os Estadolli9Ero VIl1 rpa intemacionaliza9ao de sa luta como parte da consolidaao domestica rnilitarmente ganhando ali ados com mesriiopensaiiierito econorriicamente conquistando a cola boralaO de tais aliados e ideologicamente na promQ9ao em nfvel inter nacional de ideias sirnilares aquelas que legitinlam o seu proprio regime Do lado daqueles contraries a revolulaO preocupa96es similares podem existir perder uma sociedade igual para urn sistema rival enfraquece o Estado intemacionalmente e a sua legitirnidade domestica Como Ray mond Aron indicou e sera discutido no capftulo 4 e aprfrencJtmla homogeneidade nos arranjpoS9JOforwa qep9Verllit lgiti ln1daae e esJde llemacionasle infld de fre nlente subestimadiaepencmnciados arranjos doms1ico4R fa tores iniernaCionafseogiaU em que os TatmesCJCriicos i11luinQoJ relactonariiento EStaCtosociedade fiiflueiiCfama polftica extema 2S 0 re giSfiOTiiSIOnco dosauiiitosCioiss6Culossugerequeoii iois projetos da promQ9aO de revolulao em outros Estados e da derrubada de regimes revolucionanos normalmente falham em seus objetivos declarados Entretanto como as san96es econornicas estas aventuras pooem ter pro p6sitos mUltiples e refletir objetivos ideo16gicos e domesticamente orien tados mais amplos do que aqueles especificamente declarados 0 estudo das dimensoes intemacionais das revolu96es pode portanto fomecer insights sobre as areas das rela96es intemacionais que sao afetadas por tais abalos e sobre as causas e influencias transnacionais que influenciam as mudan9as domesticas 26 Es1Jeoriza9ao darela9ao sociedadeEstado tambem tern implica 96es para a quesio gers91Jrlftattlieza do sisteniliintemaCionaJ Como dtscutido naIiitroCluiio dentro da presente ieoria o terffio sistema e usado de vanas formas comando pela concepao realista de urn sis tema de Estados na qual o termo e usado em seu sentido mais frouxo ate chegar as aplica96es da teoria dos sistemas as rela96es intemacio nais com resultados bastante modestos e as afirma96es de urn sis tema intemacional capitalista pelos escritos marxistas ou influenci 25RaymondAron Peace and War London Weidenfeld Nicolson 1966 p 37381 26Ver Martin Wight Power Politics Harmondsworth Pelican 1979 p92 Em uma nota de rodape esclarecedora Wight sugere que para a maioria dos anos entre 1942 e 1960 as relacoes intemacionais foram revolucioniirias ao inves de normais As implicacoes disto enttetanto nao tern sido convencionalmente reconhecidas Repensando as rela6es intemacionais 1 03 ados pelo marxismo 0 problema com o2JiCrealiglg1l evitam relacionar osfiltoressoooeconomicos dentro e fora dos Es taaosaotunCionamentodos1stemaeste ultimosendov1sioesii1ia menie em terni6s p6Tfticos 0 probma de rtgsievel d tq IDSs 911sslsHmamopapeJ eiBqa disl ta dos Estados Neste ultimo paradigma a grande questao e par que os Estadas precisam existir se ja existe uma economia mundial na qual os interesses de classe funcionam mundialmente EgtQUfas palavras qual e a especificidade e efetividade de Estaaos diint ctenmfaeiimatofilTiladeeconomicarnicaEstes enigmas a deterl iiiiria6 do socioeconomiCo a especificidade do politico nao po dem ser respondidos dentro de urn contexto unicamente domestico ou intemacional pelo contrario eles sugerem a necessidade de iden tificar ate que ponto cada nfvel determina o sistema e como os Esta dos funcionam nao somente como atores independentes no sistema mas tambem como mediadores e reguladores de urn con junto de intera oes que tomadas como uma totalidade constituem a sociedade inter nacional apesar desta sociedade ser idealizada Alem de sugerir uma base altemativa para o conceito de sistema no ambito intemacional e de como ele afeta a analise do mundo contempo raneo esta teorizaao tambem indica uma outra abordagem das rela6es internacionais convencionais uma hist6ria alterntiYUL 3iQIill Are agora nos tern sido oferecida uma visao predominantemente realista atraves da qual o sistema intemacional constituido par Estados desenvolvese cresce e se expande atraves da multiplicao de Estados e de sua aceitaao do que Bull em The Anarchical Society definiu como as institui6es das relaOeS interestatais Nao e necessaria destacar que esta visao tern urn fundo implicitamente evolucionista e difusionista como se tudo fosse facil Apesar de todo o pessimism a da visao relisW elllci sugerifooiJjst6 itetiSffafimaia em discre pancta com o processo sangumano de rmpostao reststencta e reafrrma ao de controle que e caracteristico das rela6es internacionais no mun do colonial ou no Terceiro Mundo ao Iongo dos ultirnos quatro seculos Como discutido no Capitulo 2 a visao alternativa e ate o momenta mi noritaria do sistema e esbada par escritores como Wallerstein e Wolf cujas pesquisas sabre a expansao do capitalismo desde 1450 ofereceram uma hist6ria intemacional bastante distinta retratando urn sistema base ado nas rela6es de mercado capitalistas 27 0 pressuposto te6rico da abor dagem de Wallerstein de que o desenvolvimento da sociedade intemacional e constituido pela disseminaao de urn sistema social na esfera intemaci onal e muito distinto do realista sabre o crescimento das relaoes entre 271mmanuel Wallerstein The Modern World System London Academic 1974 e Eric Wolf Europe and the People Without History Berkeley CA University of California Press 1982 104 Fred Halliday Estados unitarios e analiticamente primaries e semelhante a da sociolo gia hist6rica com seu destaque do contexto hist6ricomimdial dos desen volvimentos intemacionais e dos multiplos conflitos intra e internacionais que o marcaram Entretanto como ja indicado podese questionar esta hist6ria da sociedade mundial par sua negligencia do polftico e pela sua suposiao com enfase no Estado da homogeneidade capitalista do mundo da Guerra Fria pesacr o carter ClRitajsJa mi geral dgjemaipJJli nal nao emficallfirllage asxelQ Qji g siJplsUiente transnalmiaiMarx no seculo XIX e mais claramente o pensamen to sociol6gico contemporaneo cometem o mesmo erro ao supor que o Estado e simplesmente assolado pelos processes transnacionais Esta visao pelo contrario considera o Estado seriamente mas ques tiona mais precisamente o seu papel dentro do contexto socioeco nomico Em outras palavras ela examina a funao de Estados dis tintos dentro de tal contexto socioeconomico se e representar dife rentes grupos dominantes ou interesses estatais distintos e autono mos ou se e regular e manter urn sistema de hierarquia intemacio nal Existe a questao adicional referente as implicaoes de urn mun do como ode 1945 a 1989 composto par dais sistemas socioeco nomicos genericamente urn capitalista e outro planejado central mente As funoes dos Estados e nao somente os aspectos milita res de administrar continuar e controlar esta rivalidade entre siste mas sociais competitivos e opostos sao mais discutidas no Capitulo 7 Many e o escritor em relaoes internacionais que nos disse com base em dados comparatives exaustivos que existe pouca 6u ne nhuma correlaao entre o resultado da polftica externa e o sistema socioeconomico sob o risco de blasfemia os estudantes da hist6ria p6s1945 podem ser perdoados par questionar esta conclusao Levara urn certo tempo para que as implicaoes desta concei tualizaao altemativa de Estado sejam absorvidas pelas relaoes in temacionais e isto envolvera urn rnaior reconhecimento das tenden cias em outras ciencias sociais como a sociologia e a sociologia hist6rica que ate agora receberam pouca atenao Nao existe qual quer duvida de que tal evoluao envolvera incertezas e desaponta mentos sera diffcil traar urn mundo no qual o Estado nao lnais pode ser tornado como representante da totalidade e no qual o Estado naao a soberania e o interesse nacional nao sao mais marcos seguros Par outro lado em muitas areas substanciais das relaoes intemacionais como a analise de polftica externa e a economia po lftica internacional muitos trabalhos significativos ja vern sendo produzidos ao Iongo destas linhas No final das contas ja que o sig nificado e a validade de qualquer abordagem conceitual residem na relevancia de suas conclusoes e no seu poder explicative a maneira lYPIlr yresente imolJilidade das relaoes intemacionaisar peito do Estado sera pela redefiniao dOproprio Estado e Repensando as relac6es intemacionais 1 05 lllliiiliillll capitulo 4 ASOCIEDADE INTERNACIONAL COMO HOMOGENEIDADE OS SIGNIFICADOS DE SOCIEDADE INTERNACIONAe 0 conceito de sociedade intemacional ocupa urn Iugar signifi cativo ao mesmo tempo constitutivo e fantasmag6rico no estudo das relaoes intemacionais Algumas raz6es para a ambivalencia desta po siao serao discutidas abaixo mas talvez a mais importante de todas e a diferena de sentidos que sao atribufdos ao termo Dentro do realiQ sociedade intemacional referese a relaao entre os Estaos baseada emiioiiiiaScompartilliadase eritendimeiifos este eo sentido no qual e usaooporMiirtiii WfgliHectley lJUIJ James Mayall e outros te6ricos da escola inglesa Dentro do transnacionalismo referese a emergencia de laos naoestatais dEQImtJ21iSoeiaa6qe cul e de ideologia gue transe11cll frlteirs dsiafos e constitl em maior ou menoririedida uma socedde qle vafJfmcrs mes mas frQntirasorigirialirieiite descoberto por escrliOres influenciados peiObehaviorismo e pela abordagem transnacionalista John Burton Robert Keohane e Joseph Nye dentro das relaoes intemacionais o con ceito tambem foi desenvolvido em trabalhos mais recentes desta litera tura Evan Luard e da literatura sobre a globalizaao da sociologia Mi chael Featherstone Roland Robertson Leslie Sklair John Urry Os dois usos o interestatal e 6 transnacional possuem urn importante pooerx plicadvo deniro de suas estruturas te6ricas Entretanto existe umttirceiro uso possfvel do termo socieda Repensando as relat6es intemacionais I 07 de intemacional que indica urn conjunto de normas compartilha lpsiiJifererites sociedades qJe e promovido pela fornpifiI19 1nterestatal Este uso nao e sustentado por nenhum dos dms mode Tos o 1nterestatal e o transnacional mas pela suposi9ao de uma igualdade intersocietal e interestatal que se refere a semelhan9a de valores domesticos e de organiza9ao entendida como a homoge neidade das formas de organiza9ao societarias Este terceiro conceito de sociedade intemacional tern implica oes fisffntaspara o estudo das rela9oes intemacionais1 ja que indica uma relasiC stilltura ntnt ctas sociedades e inteJ11acimal Resumidamente esta abordagem investiga de qu maneira como urn resultado das press5es intemacionais os Est3aossocompelidos acoll formar seus arranjos intemos aos dos demais Diferentemente do con ceito realista a ideia de homogeneidadepresta atenao considera vel ao que acontece dentro dos Estados e das sociedades e examina a interaao da atividade intemacional com a legitimidade domestica e a estabilidade Em qposiao ao transnacionalista ele confere uma im eYfstJ1fe efid coino uma parte importante de seu processo formativo e considera a competiao comoum fator tao importante desta formaao quanta os laos transnacionais intersocietarios E coClcJ9 4uma sociedade intemacional hompea abrange parte do material inclufdo nos otitios dois conceitos aorgnj reifistadossistemaspolfticose as Iigas tninsnacionais Por6m seupont6departida6bastante diferente ja que comea pela necessida de das sociedades e das polfticas de permanecerem distintas a despeito das pressoes para se conformar a urn modelo intemacionalmente defini do Portanto e urn conceito que se refere tanto ao desenvolviniento in temo quanta as rela95es intemacionais A ideia da homogeneidade e evidente mesmo que iniplicitamen te na JllaiOr parte ilifteoria socialepolfica Apercepaodo desenvOf viriiento economico encontrada ein historhidores economicos como Gerschenkron e outros enfatizando a necessidade dos Estados de se equiparar e baSeada nesta ideia de homogeneizaao competitiva 2 Neste capftulo iremos explorar como o conceito de homogeneidade e uti lizado por tres diferentes pensadores em tres diferentes perfodos hist6 ricos Burke Marx e Fukuyama Tal conceito nao se sustenta em rela 5es internacionais sociais entre OS EstadostruiS na anliilse de CCl1TIO 1Para uma discussao previa do conceito de homogeneidade ver RaymondAron Peace and War London Weidenfeld Nicolson 1966 p37381 2 Alexander Gerschenkron Economic Backwardness in Historical Perspective Cambridge Harvard University Press 1962 1 08 Fred Halliday as relaos sociais polfticas e economicas dentro dos Estados sao afe tadaeJg intinacional A aplicaao destes resultados pernutlni que as relacoes intmacionais se tomem nao somente o estudo dos Estados apesar de sua importancia hoje e sempre mas tambem o estudo te6ri coEt6i dQCsos iteJ1anais e de suas CflES o Iuncionamento mtemo dos Estados tanto irifluenda como e influenci ado pelos processos intemacionais Aqui e este conceito de sociedade intemacional indicando uma forma9ao transnacional da sociedade que sera caracterizado como sendo parte da tradiao constitutiva Discutiremos a seguir que o conceito de homoll9e m rece maior atenao porq lll S9HmltiYisiCa5 te6rics7 aiiahbcas e noilfultivas para 0 estudo das relaOes internaciOniiisenao somente por causa da importiincia do internacional na formaao das so ciedades Apesar de sua fora e de aparecer ao Iongo da hist6ria do pen samento sabre o sistema intemacional em escolas consideradas muito diferentes este conceito ainda nao achou o seu lugar real Alem das recompensas trazidas pela recuperaao das tradi96es classicas existem raz5es especfficas que justificam a necessidade de se examinar mais de perto estas ideias no mundo contempodineo Por urn lado os desenvolvimentos em areas cognatas especial mente na sociologia hist6rica e na sociologia das relaoes globais tern indicadp novas formas pelas quais os conceitos interestatal do in temacional eo da sociedade internacional podem ser limitados3 Mesmo que somente como reaoes a intrusoes extradisciplinares estes desen volvimentos vern instigando a necessidade de uma definiao mais especffica do assunto para os estudantes de relaoes internacionais Por outro nvolviment mundo conteoriill sentam esafios a rtasmajgpais IDPodem ser eluci aados pefituliliZacao deste conceito altmativo d QPjaaeTntemacio t Os estudaiitesde globalizaao e da crescente transmtcionillzaao das sociedades pelo menos na Comunidade Europeia podem valerse de muitas destas quest5es Contudo tambem pode ser discutido que o conceito e pertinente ao assunto dos Capitulos 79 as mudanas recentes no sistema intemacional ou seja a Guerra Fria a forma pela qual ela ter rninou e as perspectivas para o fim do conflito militar entre os grandes poderes cujas implicaoes te6ricas podem nao parecer tao evidentes Como discutirei em maior extensao nos Capftulos 7 e 8 e em outras partes 4 9zaxl a Glrra fi Ill aC1UPat O 3Ver por exemplo Leslie Sklair Sociology of the Global System Hemel Hempstead HarvesterWheatsheaf 1991 e ensaios por Featherstone Urry Robertson e Apparudai em Michael Featherstone ed Global Culture Nationalism Globalization and Modernization ediao especial de Theory Culture and Society London Sage 1990 4 The ends of Cold War em Robin Blackburn edAftertheFall London Verso 1991 p 7899 Repensando as rela6es internacionais 1 09 htQriQttfJ 111 sido dominada por reflexoes de curta prazo e bastaCJnsruentais sabre a estrategia pode sei que somente agora como fim do conflito tomese poss1vel urn exame dos pro blemas te6ricos por ele levantados Nossa alegaQgll a pressao lm92lll para a mnogeneaao destiihia Uniao Sovitica a iuenaFriafoiiiOnnal das contas uiriconflito eritre dois conceitos diversos de sociedade intemad6nal e que terminou por9ue Cievido a ra6es intersoCiefais internacioriais e nao ipJIai 11111 lQQ piyjlsore 0 QUtro Foi a tshirt e 0 supermercado nao a ca nhoneira ou as manufaturas mais baratas que destrufram a legitimi dade e a estabilidade do sistema sovietico No final do seculo XX Bruce Springsteen teve o mesmo efeito que as Guerras do Opio 0 realismclYDfiQlil nopode explicaro fim do comunis JEQo te6rica colocada peta Guerra Fria eo seu encerramento e precisamente aquela de olhar para OS mecanismos da competiao intemacional e para o tipo de interao que a teoria interestatal orto doxa esconde isto inclui o conceito como aqui definido de soci edade intemacionar Em resumo estamos levantando a hip6tese de que nao somente esta concepao de sociedade internacional me rece reconhecimento por seu pr6prio merito mas tambem que ela tern implicaoes fundamentais na forma pela qual olhamos os Esta dos as sociedades individuais e o sistema intemacional Esta ava lanche de outras conceitualizaoes da sociedade intemacional tern ajudado a esconder o poder explicative que ela poderia ter para es tudar o passado e o presente e sem qualquer pretensoes cientificis tas para prever o futuro do sistemaJifua QQ pSSsQuerra Fria a questaodahomqgnggolQla de 9lfmJtioatfui gir uma nova era das relaoes intemacionais baseadumllJIDfl sQci edade interiiaCiorialfiorii eiieiiseliouveracoiisoHda ao dafOJ ms dCicas libers nos Estados mais IlPtn3 Dado que o termo sociedade intemacional e normalmente reco nhecido como sendo urn conceito de parte da tradiao realista das rela 6es intemacionais pareceria apropriado comar aqui a discussao do conceito A parte e importante porque embora nao confinado aos es critores da escola inglesa o termo e encontrado com muito menos fre qtiencia na escola realista germaneamericana predominante no lado ocidental do Atliintico dificilmente ele merece uma menao no traba lho de Hans Morgenthau Henry Kissinger e Kenneth Waltz em oposi ao a sua centralidade em Martin Wight Hedley Bulle James Mayall Waltz por exemplo apesar de toda a sua simpatia pelas tradioes filo s6ficas britanicas nao demonstra qualquer interesse no suposto criador da escola inglesa Hugo Gr6cio Nos escritos que fazem uso do termo a sgde intemacional exerce sua funao constitutiva em tres imPortantes CiimetisoescoillQ 110 Fred Halliday urna expli99JJra fllCIlE citeIl ixtlacional alerp do corifliiQhopleiano como uma rspotatericctpara ausencia ae uma autoridade tinica na esfera intemaional e como uma cate go flit central parl lldr a difumij io istmaeUropel oc1oenfalsNo realismo britanico apesar do conceito exercer estas roesede ter sua importancia formalmente reconhecida ele ain da permanece bastante vago podendo ser percebido tanto quanta urn anjo da guarda como urn conceito hegemonico Alem de ocor rer por razoes internas ao pr6prio conceito relativas a exclusao do significado real do termo sociedade esta situaao e produzida porque ao estar afirmando urn conceito de sociedade intemacional ou seja as relaoes entre os Estados esta categoria realista conven cional impede a discussao de outras teorizaoes igualmente suges tivas a respeito do sistema internacional e de sua interaao com outras formas de relaao A formulaao do conceito de sociedade intemacional pelos realis tas ingleses foi melhor resumida por Bull que destaca Uma sociedade de Estados ou sociedade intemacional existe quando urn grupo de Estados conscientes de certos interesses comuns e valores comuns forma uma sociedade no sentido de que eles concebem a si mes mos como determinados por urn con junto comum de regras em suas rela oes uns com os outros e compartilham o funcionamento de instituioes comuns6 Mais adiante o princfpio da sociedade tern estado e sempre es teve presente no sistema intemacional modemo embora somente como urn de seus elementos cuja sobrevivencia e as vezes precaria7 Com algumas variaoes a enumeraao de Bull do que abrange uma sociedade os interesses os valores as regras as instituioes e a sua interpretaao hist6rica concebida para provar que pelo menos al guns de seus principios existiram por urn certo tempo aplicase a toda a escola realista Na extensao postumamente publicada deste argumento Wight passeando pela hist6ria com sua tranqtiilidade taxionomica habitu al nos apresenta tres variantes sabre a questao da sociedade intemaci 5Ver entre outros James Mayall International society and international theory em Michael Donelan ed The Reason of States LondonAllen Unwin 1978 p122141 e Hedley Bull eAdam Watson The Expansion oflnternationol SocietyLondon Oxford University Press 194 6Hedley Bull The Anarchical Society A Study of Order in World Politics Basingstoke Macmillan 1977 Enfase no original 71bid p 41 e de fato todo o Capftulo 2 Repensando as rela6es intemacionais 111 onal que correspondem as escolas do realismo do racionalismo e do revolucionismo Tais abordagens diferem em seu foco anaHtico co meando pela guerra hobbesiana passando pela comunidade grocia nasuareziana e chegando a civitas maxima kantiana A primeira cor responde ao que na terminologia da escola inglesa pode ser classifi cado como urn sistema sem qualquer atributos sociais adicionais A terceira variante a de Kant corresponde em alguns aspectos a perspectiva transnacionalista com urn programa moral mais aberto e uma teleologia pacifista implicita ja que a paz segue da gradual que brada autoridade e das barreiras entre os Estados Todas as tres vari antes de Wight sao baseadas em concepoes de relaoes interestatais ou intersociais e evitam a questao da constituiao domestica ou ho mogeneizaao A segunda corresponde mais proximamente a concep ao de WightBull da sociedade intemacional urn sistema mais ele mentos adicionais Eo conceito realista difundido atraves da teoria e da historia e servindo as tres funoes mencionadas que os estudantes da intemacional devem principalmente enfrentar 8 0 conceito de sociedade e supostamente emprestado da soci ologia e emergiu em seu uso mais corrente que as relaoes intemaci onais dizem compartilhar durante o seculo XIX9 Enquanto as varia oes no seu uso teorico pelas disciplinas nao causam qualquer sur presa para mencionar apenas duas bastase pensar nas peregrinaoes de estrutura e realismo e valido comear apontando algumas diferenas obvias entre as formas do termo sociedade que sao usa das nas duas disciplinas 10 Primeiro dentro da sociologia assim como dentro da teoria politica o conceito de sociedade adquire seu sen tide primariamente em oposiao ao Estado visto como uma auto ridade suprema cuja ausencia foi enfatizada pelos teoricos realistas na esfera intemacional Como conseqliencia na teoria das relaoes intemacionais falta ao termo sociedade sua contraparte dada esta definiao de sociedade nao pode haver equivalente realista ao con ceito sociedade civil ja que por definiao e aquela area da ativi dade poHtica ou social nao controlada pelo Estado Uma segunda conseqiiencia desta definiao e que seu uso nas rela5es intemacionais parece esconder uma das mais centrais distin oes da sociologia exposta por Tennies em 1887 aquela entre uma sociedade frouxa mais informal Gesellschaft e uma comunidade 8Martin Wight International Theory The Three Traditions editado por Gabrielle Wight e Brian Porter Leicester Leicester University Press London The Royal Institute of International Affairs Capitulo 3 9Sobre o desenvolvimento do uso ingls do termo sociedade ver Raymond Williams Keywords London Fontana 1976 10Para uma consideriio do termo no pensamento classico e modemo ver David Frisby e Derek Sayer Society Chichester Elis Horwood London Tavistock 1986 112 Fred Halliday mais fechada mais moralmente coesa Gemeinschajt Na verdade no uso de BullWight as duas sao intercambhiveis e esta socieda de independentemente do que ela realmente seja devido a enfase em val ores compartilhados e mais proxima de Gemeinschaft Terceiro a principal preocupaao da teorizaao da sociedade den tro da sociologia e observar as formas de constrangimento ou em ou tras palavras escapar da ideia do indivlduo como livre e desimpedi do Os fatos sociais de Durkheim por exemplo eram limites sobre o indivlduo Dentro das relaoes intemacionais esta funao e desem penhada pelo conceito de sistema urn termo que na sociologia nao e oposto a sociedade mas serve como base para teorizaoes altema tivas das relaoes sociais como a de Parsons Nas relaoes intemaci onais realistas o uso do termo sociedade corresponde mais direta mente a antigas expressoes do termo e nao tanto ao seu conceito so ciologico seja para indicar urn clube ou urn grupo autoselecionado como em construindo ou debatendo ou simplesmente para in dicar uma elite social freqiientemente na moda 11 0 carater elitista exclusivista da sociedade de Estados e certa mente a base sobre a qual toda a historia se desenvolveu e a expan sao ocorreu Na origem a sociedade europeia de Estados era urn clube de monarcas cristaos ocidentais e produziu suas primeiras for mas de organizaao contra os muulmanos os turcos infieis Na verda de este era o sentido dado ao termo pelo proprio Wight que definiu a sociedade como urn numero de indivlduos agregados em urn sistema de rela5es para certos propositos comuns 12 A medida que a condi ao central de pertencimento a soberania evoluiu ela passou a ser reservada para os Estados que podiam e consideravam apropriado sujeitar o resto do mundo a sua regra hegemonica amplamente coloni al A soeiedade educada de Jane Austen ou a alta sociedade de Cole Porter aproximamse das concepoes das rela5es intemacionais tanto quanto as reflexoes de Auguste Comte ou Ferdinand Tennies Outras tres quest5es mais amplas levantadas por este uso do ter mo sociedade intemacional precisam ser discutidas A primeira nasce da perspectiva interestatal particularmente nas areas nas quais a in fluencia de Hobbes e forte Este uso realista negaria que o termo so ciedade pode ser usado para definir urn agrupamento no qual a guerra 11Um interessante exemplo adiciopal deste uso elitista e encontrado no vocabulario po litico russo do infcio do seculo XX onde a palavraobshchestvo tendia a significar soci edade educada urbana nobre e proprietiiria de terra 0 termo descrevia aqueles mem bros da populaiio que por virtu de de educaiio riqueza ou servios publicos tinham urn direito implicito de participar na politica mas eram impedidos pelo Estado David McLaren Macdonald United Government and Foreign Policy in Russia 190014 London Harvard University Press 1992 p 222 nota 5 12Martin Wight Power Politics Harmondsworth Pelican 1979 p 105 Repensando as rela6es intemacionais 113 e a ameaca de guerra permaneceram tao centrais Seria mais defensa vel urn uso do termo que nao o confinasse aos Estados que nao ame acassem os demais no sistema mas esta restricao nao e observada pelos que 0 utilizam na tradicao de Bulle Wight Normalmente os que pro poem este conceito sao cuiddosos o no definir quais Estados so e quais nao sao parte da SOCledade lStO e OS que segundo SUa VlSaO estao no sistema mas nao na sociedade Entretanto uma leitura da literatura sugeriria que para a maior par te dos que usam 0 termo todos OS Estados soberanos do seculo XX sao parte desta sociedade por causa de sua participacao na pnitica diplomati ca A resposta como no Capitulo 8 de The Anarchical Society usando a palavra instituicao no sentido funcional que e picIru a abordgem pode ou nao ser convincente certamente ela ampha e ddm o conce1to de sociedade muito mais do que permitiria urn uso mais rigoroso Uma critica adicional ao termo nasce da defmicao de qual concei to de sociedade esta sendo usado e nao do exame da corresponden cia entre o sistema interestatal e urn modelo de sociedade Aqui como em quase toda teoria das relacoes intemacionais tende a existir urn ele mento de absolutismo definicional alcancado nao por decreto mas por elipse assim como ocorre com Estado poder e nacao isto tam bern acontece com sociedade 0 argumento em favor de uma con ceitualizacao particular do intemacional e reforcado pelo mais simples de todos os mecanisinos qual seja a relutancia em reconhecer que existem altemativas neste caso conceitos altemativos de sociedade Como apresentado inicialmente por Bull sociedade quer dizer normas interesses regras e valores a unica questao que permanece e ate onde este modelo vai ou nao corresponder a realidade intemacional 0 uso de Bull de seu conceito de sociedade e certamente consis tente e constr6i a base para urn retrato irrefutavel do sistema intemaci onal Todavia assim como com o termo Estado e precisamente aqui que interessantes quest5es sao ignoradas A questao nao e se as rela c5es intemacionais definidas como relac5es interestatais correspondem a uma definicao de sociedade mas pelo contnirio a qual defmicao elas podem corresponder Como ja destacado dentro da teoria socio16gica o proprio conceito de sociedade evoluiu ao Iongo dos dois ultimos seculos para englobar vanos significados todos aqueles dentro de uma comunidade a elite daquela comunidade ou o elemento de uma nacao que e distinto do Estado como na recuperacao da sociedade civil Nao existe conseqtientemente uma definicao unica de sociedade A consideracao de Bull pode ser definida como comunitaria ja que implica que uma sociedade e urn agrupamento com valores compar tilhados esta ideia pode ser oposta a outras percepcoes como as inspi radas no marxismo que destacam as estruturas e o poder algo como urn sistema hienirquico formal Podese aplicar ao intemacional os mesmos argumentos que foram aplicados a sociedades espedficas per 114 Fred Halliday guntandose ate que ponto o funcionamento de uma sociedade e a trans missao de yalores dentro dela reflete a aceitacao de urn interesse co mum ou a coercao Em nenhuma sociedade a resposta e unica entre tanto a apresentacao desta questao levanta importantes preocupac5es evitadas pelo modelo comunitario de Bull sobre o que constitui uma sociedade e o grau de desigualdade e forca dentro dela As relac5es interestatais podem portanto constituir uma sociedade nao tanto por causa da existencia dos valores compartilhados mas por que sao uin agrupamento estabelecido pela coercao de alguns Estados sobre outros e mantido por meio de varios mecanismos ideol6gicos e militares utilizados pelos membros mais poderosos Nesta linha tanlbem mudam de significado os outros termos que os realistas usando a abor dagem da sociedade invocam assim a socializacao tomase nao a inculcacao e a difusao de valores compartilhados mas a imposicao de urn conjunto de val ores pelos Estados as escolas a familia o clero a mfdia e outros acreditem ou nao neles aqueles que na verdade os imp5em Os mecanismos identificados no conceito de hegemonia de Gramsci por meio dos quais os subjugados aceitam os valores de seus dominadores tambem se aplicariam a arena intemacional a tese de Gramsci levanta algumas ambigtiidades te6ricas aqueles que sao subordinados aceitam os valores acreditam neles fingem ou sao mesmo subjugados por sua adesao a urn sistema de valor diferente e subaltemo 13 Bull ao reconhecer este problema com seu conceito de socieda de produziu uma tensao dentro de seu pensamento entre a sua defi nicao de sociedade intemacional e a sua real exposicao por esta ra zao 0 papel dos grandes poderes e da guerra e apresentado como duas de suas cinco instituicoes Entretanto ele nao desenvolve as implica coes desta tensao para questionar a definicao explicita e implfcita de sociedade que ele mesmo fomece no infcio da exposicao Uma soci edade intemacional criada e mantida pelos grandes poderes pode ser o melhor que a raca humana pode fazer mas esta Ionge de ser uma sociedade baseada unicamente em valores compartilhados A terceira critica do conceito de sociedade internacional surge da variacao das teorias da sociedade e particularmente daquelas ja sugeridas no Capitulo 2 que derivam do materialismo hist6rico Dois 13Sobre estas tres interpret3oes do conceito de hegemonia ver Brian Turner Paul Abercrombie e Stephen Hill The Dominant Ideology Thesis London Allen Unwin 1981 Sobre a teoria de hegemonia de Gramsci mais complexa e especffica do que sugeriria a sua recente ocorrencia dentro da literatura das rel30es intemacionais ver Antonio Gramsci Selectionsarm Prison Notebooks editado e traduzido por Quintin Hoare e Geoffrey Nowell Smith London Lawrence Wishart 1971 John Cammet Antonio Gramsci and the Origins of Italian Communism Stanford CA Stanford University Press 1967 Capftulo 10 e Perry Anderson The antinomies of Antonio GramsciNewLeft Review n100 NovemberDecember 1976 pS78 Repensando as rela6es intemacionais 115 componentes do que poderia ser uma crftica materialista hist6rica ja foram sugeridos o papel da coenao em manter uma sociedade e a natureza particularista especifica de classe de valores supostamen te comuns ou universais Porem existe uma crftica ainda mais fundamental baseada nos prin clpios que agrupam e constituem as sociedades Ao inves de afrrmar que sao as normas ou as instituioes polfticas que desempenham esta fun ao de ligaao a tese oposta considera que a econornia tern este papel Isto acarreta uma definiao do sistema intemacional como primariamente constitufdo pela atividade econornica e pela disserninaao das rela6es sociais e economicas capitalistas em uma escala mundial Como ja indicado no Capitulo 3 a teoria altemativa permite hist6ri as altemativas Immanuel Wallerstein Eric Wolfe Eric Hobsbawm que trazem formulaoes contrarias a expansao da sociedade intemacional 14 Estas hist6rias altemativas nao devem excluir a importancia das normas e da transmissao de valores pelo sistema Coercitivos ou nao as normas e os valores sao uma parte essencial do funcionamento de qualquer soci edade Alem de ser hierarquica esta difusao de normas reside em outra parcela da atividade humana que sustenta e forma a propria sociedade A disseminaao da cristandade teve muito pouco a ver com a fora A ques tao portanto tomase nao como e ate que ponto estas normas espalham se o problema historiografico das teorias ortodoxas de sociedade in temacional mas sim o estudo de como o capitalismo como urn siste ma socioeconomico disseminouse o papel que os valores e as normas incluindo o conceito de soberania desempenharam dentro dele e o equi libria em mudana entre a coerao e o consentimento envolvidos na re produao desta sociedade Desta forma a teoria altemativa sugere a his t6ria altemativa a subjugaao dos povos precapitalistas a unificaao do mundo atraves de processes economicos e a formaao de urn bloco de palses economicamente desenvolvidos e liberais democraticos 15 0 TRANSNACIONALISMO E OS SEUS LIMITES A definiao transnacional de sociedade intemacional e as suas implicaoes para a teoria das relaoes intemacionais tambem nao ne cessitam de uma extensa recapitulaao aqui Como vimos na Introdu ao comeando pela preocupaao behaviorista de evitar a paralisia 14lmmanuel Wallertsein The Modern World System London Academic Press 1979 Eric Wolf Europe and the People Without History Berkeley CA University of California Press 1982 e Eric Hobsbawm The Age of Empire London Weidenfeld Nicolson 1987 15Sou particularmente grato a Justin Rosenberg por seus muitos insights sobre este proble ma ver seu Whats the matter with realism Review of International Studies vol 16 n4 Ocotber 1990 p 285303 116 Fred Halliday do institucionalismo e uma consciencia de uma perspectiva emplri ca de que muitos processos que cruzam as fronteiras nao eram con duzidos ou controlados pelos Estados os escritores transnacionalis tas buscaram a partir de 1970 apresentar urn retrato altemativo do sistema intemacional no qual as relaoes interestatais estavam cada vez mais superadas ou influenciadas por estes processos naoestatais Desta mudana intelectual surgiram as teorias da interdependen cia de Robert Keohane e Joseph Nye o paradigma da sociedade mundial de John Burton e grande parte da economia polltica intema cional 16 As quatro estruturas de poder de Susan Strange foram uma tentativa extraordinaria de preservar a importancia da dimensao mili tar e de segurana enquanto identificando a emergencia o crescimento e em muitos casos o predomlnio de processos naoestatais Em ou tro estudo Evan Luard discutiu que existe uma crescente convergen cia entre a sociedade domestica e a intemacional assim como as so ciedades individuais estao ficando cada vez menos homogeneas e centralizadas tambem as relaoes intemacionais estao englobando diversas intera6es algumas organizadas pelo Estado muitas nao que produzem relaoes semelhantes aquelas dentro da sociedade 17 Em urn desenvolvimento paralelo dentro da sociologia inumeros escritores passaram a identificar o que consideram como sendo uma glo balizaao ou uma intemacionalizaao das relaoes sociais e a quebra de entidades sociais antes distintas a sociedade no sentido tradicional Leslie Sklair identifica tres conjuntos de PTNs praticas transnacionais o econornico o poHtico e o culturalideol6gico 18 0 primeiro abrange as atividades das corpora6es transnacionais no mlnimo o seu impacto em pafses do Terceiro Mundo e socialistas o segundo as liga6es entre as foras poHticas principalmente aquelas no poder e o ultimo a dissemi naao de praticas consurnistas e de outras crenas pelo mundo Em urn campo semelhante de analise fomente influenciado pelo trabalho de Roland Robertson e pelos insights p6smodemistas sobre a possibilidade de multiplas estruturas desconstruldas e de significados dentro do sistema intemacional Arjun Appadurai identificou cinco di mensoes de fluxo cultural global as etnicas da mldia as tecnol6gicas as financeiras e as ideol6gicas 19 Dentro de cada uma destas dimensoes diferentes atores cruzam as fronteiras turistas irnigrantes refugiados trabalhadores migrantes ativistas poHticos modelos ou astros pop Fe 16Robert 0 Keohane e Joseph Nye Power and Interdependence Boston Little Borwn 1977 John Burton World Society e Susan Strange States and Markets London Pinter 1988 17Evan LuardInternational Society Basingstoke Macmillam 1990 18Sklair Sociology of the Global System 19Featherstone ed Global Culture Repensando as rela6es intemacionais 117 l f chando o cfrculo te6rico o conceito de sociedade intemacional re tomou a disciplina da qual supostamente se originou20 Apesar de ricas em insights as varias teorias do transnacionalismo deixam sem resposta varias questoes quatro das quais podem ser aqui resumidas Primeiro a questao da determinaao e do significado nao e resolvida nao esta claro se devemos considerar todos os processos trans nacionais como igualmente importantes ou autonomos Os realistas orto doxos sugeririam que o papel do Estado nao pode ser inteiramente dis solvido em uma mescla de interaoes globais e que isto e urn problema para as teorias da globalizaao e para a abordagem da sociedade mundial Os marxistas e os representantes da economia polftica intemacional po deriam sugerir que o papel da economia e de suas estruturas hienirqui cas e central para a hist6ria do desenvolvimento da sociedade intemaci onal Uma proliferaao de nfveis de camadas ou de significados pode nos dizer muito pouco Uma consideraao equilibrada a respeito do cani ter da totalidade social global e substitufda por repentinas descobertas de tirar o folego a respeito de novas areas de interaao num dia a aldeia global ou os mercados financeiros que funcionam 24 horas no outro o jlaneur transnacional ou as comunica6es via satelite Segundo e em oposiao a uma consideraao mais s6bria a respeito da localizaao da mudana real existe na maior parte da literatura trans nacionalista urn elemento de reducionismo hist6rico Muitos dos proces sos economicos polfticos e religiosos que caracterizaram o transnacio nalismo contemporaneo estavam presentes se nao em intensidade seme lhante decadas e mesmo seculos atras A Reforma a Revoluao fudustri al a disseminaao do sufnigio universal para indicar tres processos trans nacionais predatam a obsessao com o imediatismo e com uma estrutura hist6rica reducionista A migraao foi u fenomeno importante no secu lo XIX e na verdade tambem nos seculos XVIII e XX em alguns pafses Dificilmente podese dizer que os Estados estao menos envolvidos neste processo agora do que estavam no passado Em nenhum Iugar este redu cionismo hist6rico e mais enganoso do que na maior parte da literatura sobre a p6smodemidade como algo especffico a era p6s1945 isto implica rupturas na sociedade ou no mundo que sao exageros urn pro duto de capricho ahist6rico Nao se pode duvidar que certos fenomenos sao especfficos a era contemporanea mas a atraao da p6smodemida de como urn conceito explicativo ou como uma categoria hist6rica fre qiientemente obscurece onde a mudana ocorreu ou nao Terceiro existe uma teleologia implfcita nestes trabalhos seja o entusiasmo pela integraao europeia encontrado nos escritos sobre a 20Para uma visao hist6rica da precoupaao sociol6gica duradoura com a formao intema cional de sociedades individuais ver o ensaio de Brian Turner The two faces of sociology Global or national em Michael Featherstone ed Global Culture 118 Fred Halliday I Comunidade Europeia ou na crena de que uma cultura global base adana juventude na TV via satelite no esporte ou na religiao esta engolindo a humanidade como urn todo Em particular isto se aplica a velocidade com que o proprio Estado e desconsiderado A trajet6ria de Keohane transcendendo o Estado nos anos 1970 acomodandoo e reabilitandoo em After Hegemony de 1980 e uma indicaao das dificuldades encontradas por aqueles que buscam marginalizar o seu papel21 Sinistramente existem muitas semelhanas entre o otimismo e a teleologia dos escritos liberais intemacionalistas e a anterior litera lura sobre a transiao para o socialismo recuos e atrasos podem acontecer mas no tim tudo esta destinado a acontecer Finalmente a teorizaao de uma globalizaao ou transnacionaliza ao da cultura muito freqlientemente ignora o processo simuWineo de fragmentaao e divisao dos nfveis sociais global e domestico como re sultado direto da intemacionalizaao Certamente este e o paradoxa do nacionalismo urn fenomeno global e uma resposta a press6es intemaci onais que gera o particularismo e a fragmentaao Em nenhum Iugar isto foi percebido com maior clareza do que na brutalmente dividida Europa de 1992 no ocidente a uniao alfandegana Maastricht e as Olimpfadas de Barcelona nos Balcas o genocfdio a guerra etnica feroz e o 6dio as sassino Os transnacionalistas freqlientemente apontam para fenomenos que em sua visao justificam a reivindicaao de uma crescente socieda de comum atraves das fronteiras Entretanto dentro dos muitos fluxos que eles identificam novas formas de divisao chauvinismo ou hegemonia particularista podem estar emergindo a religiao o esporte a TV via sarelite sendo casos em questao Qualquer teoria a respeito do impacto dos pro cessos intemacionais sabre o mundo tern que abarcar as duas dimens6es deste processo a integraao e a fragmentaao Alem disso esta teoria tern que identificar as continuidades e as descontinuidades do papel duradouro e em mudana do Estado nos processos intemacionais e transnacionais 22 A maior dificuldade com o conceito transnacional de sociedade intemacional gira em tomo de seu tratamento do Estado a precipita da superaao behaviorista em alguns casos em outros a ecletic mul tiplicaao de estruturas e nfveis ou urn comodo recuo para urn Es tatocentrismo modificado23 Como discuti no Capftulo 3 parte desta confusao e resultado de dois diferentes significados de Estado que levam a uma falsa contraposiao do Estado aos processos transna 21Ver Capitulo p 301 22Para uma excelente discus sao ver Joseph Camilleru e Jim Falk The End of Sovereignty Aldershot Edward Elgar 1992 23Para criticas das teorias sobre uma crescente economia transnacional ver David Gordon The global economy new edifice or crumbling New Left Review n168 Marchpril 1988 p 2464 e Paul Hirst e Graeme Thompson The problem of Globalisation Economy and Society v21 n4 November 1992 p 35796 Repensando as relac6es intemacionais 119 cionais e sociais e a preocupasao com 0 que e de muitas maneiras uma falsa questao aquela do grau em que o Estado esta sendo ou nao tornado pelos processos transnacionais Neste capitulo o argu mento e centrado em outra conseqliencia desta polaridade estatalnao estatal qual seja o modo pelo qual esta falsa oposisao torna diffcil perceber como os processos transnacionais ou internacionais Ionge de enfraquecer o Estado o desenvolvem eo alteram como em ou tras palavras os pr6prios processos de mudansa poHtica e social den tro dos pafses sao resultado de processos externos e como por sua vez a divergencia ou convergencia dos Estados com relasao as nor mas de homogeneidade afeta o curso das relasoes internacionais 0 PARADIGMA CONSTITUTIVO E OS SEUS PROTAGONISTAS BURKE MARX E FUKUYAMA Ate aqui a discussao foi sabre as duas variantes de sociedade in ternacional a realista interestatal reprodutiva e a transnacionalista Agora e possfvel atentar para uma outra reinterpretasao do conceito de sociedade internacional uma que nao procura interpretas6es variantes do interestatal ou das dimensoes de interasao transnacional este concei to busca enquanto nao negando as forsas destas dimensoes localizar a discussao em outra dimensao na qual o termo sociedade intemacional pode ser mais apropriadamente aplicado Neste contexto as relas6es in terestatais e os seus conflitos incluindo a guerra nao sao dissolvidas mas sao Iocalizadas dentro de uma estrutura mais ampla A primeira vista isto pode parecer ser outra variante do usa soci o16gico do termo sociedade internacional no sentido de sociedade transnacional Entretanto este ultimo conceito aponta para uma socie dade internacional unica uma entidade transnacional ligada por inu meros processos e instituisoes e que gradualmente substitui a intera sao dos Estados Com isso ela esta pouco interessada nas questoes ortodoxas das relas6es internacionais concebidas como as relas6es entre OS Estados 0 conceito homogeneo oferecido aqui e bastante dife rente atribuindo urn papel permanente e continuamente adaptativo aos Estados e buscando explicar seu comportamento pela identificasao de urn contexto maJs amplo de relasoes transnacionais e os meios pelos quais estes dais nfveis de atividade internacional interagem com o do mestico Os elementos desta teoria ficarao mais claros com a analise de tres escritores te6rica e historicamente diferentes em cujos trabalhos e poss1ve1 discernir esta terceira concepsao de sociedade internacional A ideia de sociedades separadas sendo ligadas par caracteristicas comuns e de suas poHticas externas como sendo positivamente afetadas par tal similitude foi amplamente empregada no pensamento do secu1o 120 Fred Halliday XVill Os anos que vao do Tratado de Utrecht em 1713 a Revolusao Fran cesa de 1789 pareceram naquela epoca e em retrospecto relativamente harmoniosos entre os grandes poderes europeus Uma explicasao muito utilizada e que a paz residia no equilfbrio de poder mas naquele perfodo e depois outras explicasoes tambem invocaram os princfpios comparti lhados de legitimidade polftica e social domestica de que gozavam os Es tados europeus Assim Voltaire falou da Europa crista com ou sem a Russia como urn tipo de grande comunidade na qual as mesmas cren sas religiosas basicas e os mesmos princfpios de lei publica e polftica desconhecidos em outras partes do mundo prevaleceram Heeren o ana lista hanoveriano do sistema de Estados cujo trabalho muito influenciou Wight Bulle seus parceiros na escola inglesa definiu o sistema de Es tados em termos interestatal e domestico como a uniao de varios Esta dos contfguos parecendose uns com os outros em seus costumes reli giao e condisao social e colocados juntos por uma reciprocidade de inte resses 24 Lugar comum nas relativamente pacfficas decadas antes de 1789 esta ideia somente recebeu urn tratamento mais elaborado quando as su posis6es nas quais se sustentava foram colocadas em questao foi neste contexto que a ideia de uma sociedade internacional baseada em idei as polfticas e sociais compartilhadas foi exposta por Burke As linhas gerais da teoria polftica de Burke sao bern conhecidas e necessitam de pouca explicasao aqui Similarmente o tear geral de suas visoes sabre as questoes internacionais tambem foi bern descri to25 Burke possufa a visao de que a sociedade e os sistemas polfti cos eram mantidos por fatores intangfveis os sentimentos os valo res as praticas herdadas os costumes e que se estes sofressem in terferencias abruptas ou racionais sucederia o caos Apesar de ser urn 24Como citado em Adam Watson The Evolution of International Society London Routledge 1992 p2068 Watson p8 tambem cita Gibbon como afmnando que a urn fil6sofo pode ser pennitido considerar a Europa como uma grande republica unica A despeito de sua afili a Escola Inglesa Watson parece pouco preocupado com a distin ao entre sistemas e sociedades de Estados Sobre a pratica do seculo XVIII e as suas implicaoes para as ideias de urn conjunto comum de valores ver Felix Gilbert The new diplomacy oftheeighteenthcentury World Politics 1951p 45 25Para uma visao geral das teorias de Burle para as rel6es intemacionais ver John Vincent Edmund Burke and the theory of international relations Review of International Studies v10 n3 July 1984 p 20518 e HansGerd Schumann Edmund Burkes Anschauungen von Gleichgewicht in Staat und Staatensystem Meisenheim Gain 1964 Para discussao de seus escritos posteriores sobre a Frana com fragmentos extensos e comentarios ver Conor Cruise OBrien The Great Melody A Thenuztic Biography and Commented Anthology of Edmund Burke London SinclairStevenson 1992 p 54269 Ele discute que apesar de Burke estar errado em perceber o regime p6s1794 como revolucionano ele estava certo em prever a busca de Napoleao por honra gl6ria e riquezas atraves da expansao p 555 Uma discussao da teoria de Burke que se assemelha a esta e encontrada em Edmund Burke and the Commonwealth of Europe de Jennifer Welsh paper apresentado na conferencia anual da British International Studies Association Dezembro 1992 Repensando as relabes intemacionais 121 conservador Burke nao era contra a mudan9a e sua reflexao sobre a America a India e a Irlanda mostravam is to 26 Sua metodologia era genericamente falando presociologica desprovida de uma preocu pa9ao com a industrializa9ao ou a sociedade moderna empregan do todavia sem usar o termo urn conceito de ideologia como o pre cipitador do desenvolvimento social e o principal garantidor da paz e da estabilidade Sua oposi9ao a Revolu9ao Francesa devese a isto ele nao somente abominava os atuais feitos dos jacobinos as Reflec tions foram escritas em 1790 bern antes do pior terror ou das expan s5es napoleonicas como tambem a propria aplica9ao da razao are jei9ao da tradi9ao e a persegui9ao do progresso e da perfei9ao Ao inves dos tres pilares da estabilidade a monarquia a aristocracia e a igreja existia urn novo trio perigoso regicida atelsta e jacobinista A implica96es disto indicadas em uma ou duas passagens de Reflections de 179027 sao expressas em maior extensao em suas Let ters on a Regicide Peace escritas em 17956 Fragmentados e mal humorados como sao estes textos eles contem uma teoria bastante distinta da homogeneidade na sociedade intemacional e as conclu s5es anaHticas e normativas que delas provem Em essencia a teo ria de Burke sobre a sociedade internacional pode ser resumida segundo as formula96es dos panigrafos seguintes Primeiro urna sociedade internacional existe em virtude de normas politicas e sociais comuns que vigoram dentro da sociedade Burke con sidera que as rela96es estaveis entre os Estados residem na semelhan9a de ordens polfticas e sociais em aspectos fundamentais eles sao homo gneos Aplicando ao internacional esta concep9ao de coesao social que desenvolveu internamente Burke discute como Os homens nao sao ligados uns aos outros por papeis e selos Eles sa9 levados a se associar por semelhanas e conformidades por simpatias E assim com as naoes e com os indivfduos Nada e mais forte como urn lao de amizade entre as naoes do que a semelhana de leis costumes maneiras e habitos de vida Eles tern mais foras do que os tratados Eles sao obrigaoes escritas no coraao28 Adiante ele se refere a conformidade a analogia e a si militude entre as na96es da Europa seus costumes e praticas 26Para uma interpreiio de Burke como de certa forma urn radical ver Conor Cruise 0 Brien Introduction to Reflections on the Revolution in France Hannondsworth Penguin 1968 27Burke Reflections p 1256 2625 e 3767 Todas as outras citaoes sao de The Works and Correspondence of Edmund Burke voL 5 London Francis and John Rivington 1852 28Burke Works and Correspondence p 3056 122 Fred Halliday J I No fundo todos estes sao os mesmos FUentemente os autores do direito publico chamavam este agregado de naoes de uma comunidade Eles tinham motivos Virtualmente ele e urn grande Estado possuindo a mesma base de direito geral com alguma diversidade de costumes pro vinciais e estabelecimentos locais Por esta semelhana nas formas de intercurso e no modo de vida nenhum cidadao da Europa podeni estar em completo exmo em qualquer parte dela Nada mais existe alem de uma varia9ao agradavelpara recriar e instruir a mente para enriquecer a imagina9ao e melhorar o coraao Daf segue que a amea9a representada pela Revolu9ao France sa reside nao somente nas polfticas especfficas que ela possa perse guir mas no proprio fato dela ser uma revolu9ao Por seu exemplo ela desafia toda a ordem sobre a qual reside a sociedade britanica Nas palavras de Burke a Revolu9ao Francesa constitui uma fac 9ao que simplesmente por continuar a existir minara os outros Es tados na Europa nos quais outras fac96es comparaveis existem ou podem vir a existir como tal a Fran9a revolucionaria e urn tipo de perigo bastante distinto do que antes existia Burke escreve Uma destruiao certa paira sabre estes prfncipes apaixonados que no conflito com este poder novo e jamais vista agem como se estivessem engajados em uma guerra que tern uma semelhana com disputas passa das Sempre fui da opiniao que esta desordem nao era em sua natureza intermitente Concebi que esta disputa uma vez iniciada nao poderia repetirse e deveria ser encerrada por nossa pr6pria prudencia nossa pri meira briga com este mal seria tambem a nossa ultima Nunca penseique poderfamos estar em paz com o sistema nao era por causa de urn objeto que a rivalidade continuava estavamos em guerra como pr6prio sistema Como compreendi o problema nao estavamos em guerra com a sua con duta mas com a sua existencia estavamos convencidos de que a sua existencia e a sua hostilidade eram a mesmil coisa29 Nesta frase final a essencia da teoria da homogeneidade e re sumida a Fran9a revolucionaria era urn perigo mortal somente pelo fato de existir A estabilidade das outras sociedades na Europa de pendia de que a Fran9a fosse como elas Sem homogeneidade nao poderia haver paz interna ou intemacional Para Burke a Revolu9ao Francesa representava uma amea9a tao grande nao somente por causa do desafio que colocava para a semelhan 9a e a similitude termos por ele utilizados para definir a homoge neidade dos pafses do ancien regime mas tambem para o que ele cha mava de vizinhan9a Existe uma lei de vizinhanfa que nao perrnite que urn homem seja o senhor perfeito de seu proprio domfnio Quando urn 291bid p320I Repensando as rela6es intemacionais 123 vizinho ve a sua porta uma nova construriio uma perturbaao ele tern o direito de representaao frente ao juiz que por sua parte tern o direito de ordenar a paralisaao do trabalho ou se construido a sua remoao Nenhuma inovariio e permitida que possa resultar mesmo secundariamente em prejuizo de urn vizinho Burke entao aplica isso a arena intemacional Este princfpio que como o resto 6 verdadeiro para as nacoes e os homens conferiu aos maiores arredores da Europa urn dever de saber e urn direito de prevenir qualquer inovasao capital que possa resultar na construcao de uma perigosa perturbasao A vizinhansa da Europa olio tinha somen te urn direito mas uma tarefa indispensavel e urn interesse exigente de denunciar este novo trabalho antes que ele produzisse o perigo que sen timos agora com dor e que sentirfamos por muito tempo Ele viola os direitos sobre os quais riao somente a comunidade da Franca mas todas as comunidades sao fundadas Os princfpios que as sustentam sao gerais e sao tlio verdadeiros na Inglaterra como em qualquer outro pais30 Destes princfpios segue uma teoria de segurana polftica e social eo programa de intervenao contrarevoluciomiria pelo qual Burke e me thor conhecido Uma vez que os princfpios da homogeneidade e da vizi nhana sao aceitos segue entao que nenhum pafs ou Estado pode de fender seus interesses ou seu modo de vida por si mesmo Refletindo sobre a GraBretanha no final do seculo XVIIT Burke discute que em bora ela parea forte intemamente a Revoluao Francesa s6 por seu exemplo ja constitui uma ameaa Se nao olharmos para nada alem de nossa condicao domestica o Estado da naclio 6 mesmo cheio de abundftncia mas se imaginarmos que este pais pode longamente preservar seu sangue e sua comida separado da comunidade humana tal opinilio nao merece refutaclio como absurda mas piedade como insana 31 Burke defende de fato uma guerra preventiva contra a Frana re volucionaria para eliminala antes que engula o resto da Europa A es cola da humanidade e 0 exemplo e eles nao vao aprender em nenhuma outra Esta guerra e uma guerra contra aquele exemplo 32 Em Let ter II Burke discute que apesar de alguns perceberem o conflito com a Frana como uma guerra externa encorajados pelos pr6prios ja cobinos eles estao enganados Na verdade ela e uma guerra civil 301bid p 3079 311bid p 259 321bid p 313 124 Fred Halliday E uma guerra entre os partidarios da antiga ordem civil morale politica da Europa contra uma seita de ateus fanaticos e ambiciosos que buscam mudar tudo Nao e a Franca estendendo urn imperio externo sobre as outras naoes e uma seita objetivando urn imprio universal comean do com a conquista da Fransa 33 A analise de Burke das conseqliencias internacionais da Revo luao Francesa e das respostas adequadas normalmente tern sido lida a luz de sua teoria da intervenao OU mais amplamente a partir de suas visoes sabre as formas de mudanas apropriadas e inapropria das dentro da sociedade Contudo presente etn suas Letters estao OS elementOS de OUtra teoria pertinente a toda discussao das rela oes internacionais Burke esta argumentando que as relaoes entre os Estados residem nao sabre a conduta de polftica extema em seu sentido mais estreito mas principalmente na convergencia e na si militude de seus arranjos domesticos ou em outras palavras sobre a prevalencia de uma sociedade intemacional homogenea A con clusao alcanada e que para a manutenao da paz em uma ordem internacional qualquer e preciso que ela desenvolva normas de com portamento interestatal e tambem produza uma comunidade de Es tados com constituioes internas bastante similares Poucos te6ricos poderiam ter urn ponto de partida e conclusoes mais diversas de Burke do que Karl Marx que duas geraoes de pais produziu uma teoria alternativa das implicaoes da Revoluao Francesa e do que constituia a coesao social e poHtica Se Burke opunhase a Revoluao Francesa Marx a considerou como o como de urn processo de emancipaao humana global se Burke invocou a tradiao e o costume Marx os denunciou como ideologia e invo cou a razao se Burke percebia as ideias como constitutivas da soci edade Marx percebia o processo produtivo em suas formas materi al e social como a sua base Contudo alem ou dentro destas enormes diferenas existem tres pontos de convergencia de particular relevancia para esta discus sao Primeiro ambos dao importancia em sua analise da sociedade ao que hoje definiriamos como ideologia isto e urn conjunto de valo res sabre o que e desejavel nas relaoes sociais e poHticas ate onde e possfvel mudalas e quais poderiam ser os agentes apropriados de mudana e estabilidade Burke nao deriva seu conceito de ideologia das rela5es socioeconomicas como o faz Marx mas ele percebe que elas sao proximamente ligadas aos interesses dos que detem o poder dentro da sociedade a monarquia a aristocracia e a igreja e a acei taao pela massa da populaao de que estes valores constitufam uma importante forma de poder politico e social a teoria de Burke era pro 33Ibid p322 Repensando as relac6es intemacionais 125 WPt3 tomarxista ou mais precisamente protogramsciana fomecendo um conceito de hegemonia sem o conceito de dominaao Segundo a crena na importancia da ideologia dentro de qual quer sociedade produziu uma perspectiva intemacional compartilha da Burke e Marx perceberam a estabilidade e o desenvolvimento das sociedades individuais e dos Estados como sendo detenninadas pe los processos intemacionais Isto os levou a sua terceira posiao co mum de que as revoluoes sao eventos internacionais em suas cau sas e conseqtiencias e que impoem necessidades eticas As conclu soes normativas das duas teorias mostram um atraente contraponto para Burke a obrigaao era intrvir para esmagar a revoluao antes que ela se consolidasse e se disseminasse para Marx a obrigaao era agir para apoiala sustentando a continuidade dos processos intema cionais por elas libertados A tarefa de intervir era comum para am bos mas alcanada a partir de pontos de vista totalmente opostos A maioria das analises dos escritos de Marx trata suas ideias sabre questoes polfticas especfficas como derivadas de sua teoria geral e tais deriva5es sao sem duvida validas mas em muitos casas ao inves de colocar alguma derivaao de urn tipo vertical pode ser igualmente per tinente olhar para a influencia de outros pensadores e para o clima inte lectual da epoca 0 que se pode denominar de influencias horizontais No caso das visoes de Marx sabre o nacionalismo isto pode ser bastan te recomendavel a ideia de Marx pode ser bemexplicada pelo que ou tros como John Stuart Mill estavam falando como por suas teorias de valor excedente e de desenvolvimento capitalista34 Uma ligaao se melhante horizontal pode ser feita com relaao a suas visoes sabre a sociedade intemacional como fica evidente ao se examinar urn de seus precursores na tradiao socialista SaintSimon SaintSimon acreditava que a sociedade europeia estava se tomando cada vez mais homogenea e na verdade nenhuma grande mudana era possfvel em um s6 pafs De forma alguma a Frana possui uma vida moral s6 sua Ela e somente um membro da sociedade europeia e existe uma pro ximidade forada entre os seus princfpios polfticos e os de seus vizinhos Invertendo Burke SaintSimon defende que o resto da Europa deveria con formarse as mudanas pelas quais a Frana estava passando A naao francesa nao pode ser tratada e curada em isolamento os remedios que podem curala precisam ser aplicados par toda a Europa Esta solidarie dade nasce em parte da necessidade moral de que eles renunciem a guer ra mas tern uma raiz mais profunda no continuo processo de industriali zaao que sujeita estas sociedades a urn destino comum e produz urn conjunto novo e compartilhado de interesses na paz No fim argu 34Sobre estasimilaridade entre Marx e os outros contemporllneos ver meu Bringing the economic back in The case of nationalism Economy and Society v21 n4 November 1992 126 Fred Halliday menta SaintSimon a sociedade industrial alem de criar a homoge neidade tambem cria um interesse intemacional na paz A homoge neizaao e portanto tanto um procsso objetivo como urn prop6sito etico e politico 35 A visao de uma sociedade intemacional e afirmada com maior clareza no Manifesto Comunista no qual Marx apresenta a forma pela qual o modo capitalista de produao com a burguesia como agente transforma todas as sociedades por todo o mundo Tanto quanta qualquer pensador liberal de sua epoca Marx acreditava no triunfo inevitavel de um modelo de sociedade sabre os outros e em uma crescente convergencia e homogeneizaao da sociedade En quanta Burke refletindo sobre a comunidade da Europa do secu lo XVIII considerava a homogeneidade da sociedade intemacional como uma realidade estabelecida embora sob a ameaa da Revolu ao Francesa Marx percebia a sociedade intemacional como uma ordem global emergerite sendo criada pela disseminaao do capita lismo na qual as sociedades individuais estavam tomandose cada vez mais parecidas umas com as outras A necessidade de urn mercado em constante expansao para seus produtos persegue a burguesia par toda a face do globo Ela tern que abrigarse por todo o lado fixarse por todo o lado estabelecer conex5es por todo o lado A burguesia pelo nipido aperfeioamento de todos os instrumentos de produ ao pelos imensamente facilitados meios de comunicaao traz todas mes mo a mais barbara das naOes para dentro da civilizaao Os baixos pos das mercadorias sao a pesada artilharia com que derruba todas as muralhas da China com as quais fora a capitular o 6dio intenso e obstinado dos barbaros aos estrangeiros Ela compele todas as na5es sob o risco de extinao a adotar o modo burgues de produao compeleas a introduzir o que chama de Civilizaao em seu meio para que se tornem elas mesmas burguesas Em uma palavra ela cria urn mundo a sua pr6priaimagem36 A primeira vista a concepao de Marx de sociedade intemacional pode parecer ter mais em comum com a conceao transnacional do que com a constitutiva Certamente ele compartilha a visao dos liberais inter nacionalistas como Adam Smith e Richard Cobden cujos herdeiros de direito sao os transnacionalistas dos anos 1970 e 1980 de que o crescen te cantata entre as sociedades produz uma maior integraao e unidade nos neg6cios mundiais Porem o foco da analise de Marx nao reside 35Cioes de SaintSimon e a discussao em Emile Durkheim Socialism and SaintSimon editado por Alvin Gouldner London Routledge Kegan Paul 1959 p 1705 36Manifesto of the Communist Party em Karl Marx The Revolutions of 1848 Political Writings d David Fembach vol 1 Harmondsworth Penguin Books em associaao com New Left Review 1973 p 71 Repensando as rela6es intemacionais 127 somente nos crescentes laos entre sociedades e no problema do trans nacionalismo mas tambem no grau em que atraves do globo as socie dades cada vez mais esHio se conformando umas com as outras Marx reconheceu o processo de homogeneizaao intemacional e a centralida de desci confonnidade intema para as rela5es intemacionais Para Marx a questiio central nas relaoes intemacionais e como esta crescente ho mogeneiza9ao urn resultado da disseminaao do capitalismo afeta nao somente a polftica domestica e intemacional de diferentes paises mas tambem a sua estrutura social Este e o principia que perpassa seu mais importante trabalho de todos 0 Capital que considera uma sociedade a GraBretanha como a exemplificaao do desenvolvimento capitalista como urn todo e procura examinando a sua estrutura e desenvolvimen to colocar urn modelo universal A premissa implfcita no Capital e de que uma sociedade intemacional esta sendo criada pela disseminaao global do capitalismo Para Marx os mecanismos da economia e os pa dr5es de propriedade associados a eles desempenham as mesmas fun 5es que as praticas e os costumes tinham em Burke Existem como discutido no Capitulo 2 fraquezas manifestas na teoria de Marx com implica96es para esta concepao de sociedade intemacional e das relaoes intemacionais como urn todo Primeiro a perspectiva historica fundamental a teleologia sabre a qual esta teo ria sustentavase era falsa o capitalismo enquanto tornado pela irra cionalidade a desigualdade e as revoltas cfclicas nao estava inevita velmente criando urn conjunto de contradioes que entao iria des truilo Alem disso como ele proprio comeou a reconhecer depois o capitalismo nao estava criando urn mundo homogeneo no qual uma economia comparavel aquela dos paises mais desenvolvidos seria reproduzida atraves do globoY 0 capitalismo estava unificando o mundo e criando seu proprio sistema mundial mas isto era na base de multiplas desigualdades e hierarquias e nao da homogeneizaao como ele supunha com livre despreocupaao no Manifesto Marx tambem estava enganado a respeito das implica5es polf ticas e intemacionais desta homogeneizaao Pais Ionge de levar a criaao de uma unica burguesia pelo mundo ou a cooperaao entre as burguesias para urn beneficio economico mutua esta crescente unificaao do mundo e a homogeneizaao de sociedade foi acompa nhada por crescentes antagonismos entre as burguesias de diferentes paises Poi legada a geraao teorica que o sucedeu Karl Kautsky Rudolf Hilferding Rosa Luxemburgo VI Lenin e Nikolai B ukharin a tarefa de produzir dentro de uma estrutura marxista uma teoria de como o capitalismo em urn mundo que se unifica tambem criou 37Sobre o foco em mudana no trabalho de Marx ver Teodor Shanin ed Late Marx and the Russian Road London Routledge 1983 128 Fred Halliday urn desenvolvimento desigual que levou as classes dominantes dos paises mais avanados a se enfrentar na guerra Na verdade este era o contexto no qual o debate marxista sabre o imperialismo ocorreu nas duas primeiras decadas deste seculo Depois isto seria formaliza do como a teoria do desenvolvimento combinado e desigual 38 Contudo se Marx estava enganado em seu entendimento da concepao inerente ao desenvolvimento hist6rico e do grau em que a homogeneiza9ao ou a harmonizaao ocorreram de fato ele estava certo em identificar a dissemina9iio do capitalismo e o seu impacto sabre as economias os sistemas politicos e as culturas de todos os paises 0 reexame de onde ele estava certo e onde estava errado ficou muito mais facil pouco mais de urn seculo depois de sua morte como fim nao somente do grande interludio da homogeneizaao capitalista representada pelo colonialismo mas tambem pela no fi nal das contas infrutifera tentativa de seus seguidores de buscar urn caminho de desenvolvimento alternativo e heterogeneo 0 capita lismo derrubou as muralhas da China nao somente dos imperios e das sociedades precapitalistas mas tambem daqueles que quiseram erigir urn bloco p6scapitalista Como veremos nos Capitulos 7 9 este nada mais e do que urn exemplo dos mecanismos da socie dade intemacional Poderia parecer inapropriado incluir nesta discussao uma conside raao do trabalho de Francis Fukuyama o cientista politico americana cujo ensaio 0 fun da historia e depois o livro 0 Fim da Hist6ria e o Ultimo Homem flzeram dele uma das mais controversas flguras intelec tuais do inicio dos anos1990 39 Fukuyama tern sido desconsiderado por muitos comentadores academicos e na verdade ha muito em seu traba lho que e questionavel ou impreciso Entretanto como sera discutido em maior extensao no Capitulo 9 seu trabalho eo momenta no qual ele apareceu colocam urn importante conjunto de quest5es Tal conjunto permite nao somente analisar o fim da Guerra Fria mas tambem o curso das rela5es intemacionais nem que seja so por causa de sua idiossincra tica mas reveladora invocaao de vanos pensadores classicos mais es pecificamente Kant Hegel e Nietzsche para restabelecer uma conexao entre os debates contemporaneos e a tradiao do pensamento politico Fukuyama propoese examinar se e possivel escrever no sen tido kantiano uma historia universal de urn ponto de vista cosmo polita Sua resposta e sim que e possivel que a historia tern uma 38Ver Tom Kemp Imperialism London Dennis Dobson 1967 e Bill Warren Imperialism Pioneer of Capitalism London Verso 1980 Michael LOwi The Politics of Combined and Uneven DevelopmentLondon Verso 1981 39Francis Fukuyama The end of history The National Enquirer Summer 1989 e The End of History and the Last Man London Hamish Hamilton 1992 Repensando as rela6es intemacionais 129 direcao Esta direcao e determinada por dais processos a dinamica da ciencia modema eo avanco em direcao a democracia liberal Ele percebe a dinamica da ciencia modema como urn processo inces sante que determina como e por que o desenvolvimento economico e social ocorre e evolui e explica porque cada vez mais este proces so produz sociedades similares 0 primeiro fator identificado por Fukuyama e o impacto da com peticao militar que ele argumenta encoraja a racionalizacao das socie dades e a formacao de estruturas sociais uniformes uma consideracao muito mais pontual do que uma baseada somente no benigno transnaci onalismo naoestatal Fukuyama fomece muitos exemplos de modemi zacao defensiva forcando os pafses a se conformar terminando com a Russia no final dos anos 1980 A ciencia natural moderna impoese ao homem quer ele se importe com isso ou niio a maioria das naaes niio tern a opiio de rejeitar o racionalismo tecnol6gicO da modernidade se quiser preservar a sua autonomia nacio nal Vemos aqui uma demonstraiio da verdade da observaiio de Kant de que a mudana hist6rica acontece como urn resultado da sociabilidade asocial do homem e o conflito ao inves da cooperaiio que primeiro induz o homem a viver em sociedades e entiio desenvolver o potencial destas sociedades mais completamente40 0 segundo fator que leva a crescente convergencia das socie dades atraves da ciencia e 0 desenvolvimento economico e as ne cessidades que cria para a organizacao do trabalho do Estado e da educacao Todos os pafses passando por uma modernizaiio econ6mica devem crescentemente assemelharse eles precisam unificarse nacionalmente com base em urn Estado centralizado urbanizarse substituir formas tra dicionais de organizaiio social como a tribo as seitas e a familia por formas economicamente racionais baseadas na funcionalidade e na efici encia e fornecer educaiio universal para seus cidadiios Tais sociedades tornaramse cada vez mais ligadas umas com as outras atraves dos mer carlos globais e da expansiio de uma cultura de consumidor universal41 Fukuyama nao considera que este imperativo cientfficodesenvol vimentista necessariamente traga a democracia e a sua grande adver tencia hist6rica e que uma sociedade autoritaria pode ter sucesso em termos economicos como por exemplo no leste asiatica Contudo ele afirma que em alguns aspectos como na liberdade de informacao e na 4Fukuyama End of History p 76 411bid p xivxv 130 Fred Halliday tomada de decisao a democracia liberal contribui para tal desenvolvi mento Ele tambem discute em terreno bastante distinto que a demo cracia liberal apesar de todos os seus fracassos e melhor do que qual quer outro sistema para atender o que ele percebe como as mais funda mentais das necessidades humanas o reconhecimento e o respeito A combinacao destas duas necessidades eventual mas que se reforca fomece a base para duas de suas afirmac6es mais abrangentes primei ro que uma hist6ria universal pode ser escrita repleta com teleologia e segundo ja que uma resposta para os principais problemas do desen volvimento humano foi encontrada na teoria e em alguma medida implementada na pratica pelos Estados mais fortes e influentes do mun do a hist6ria no sentido de urn conflito entre modelos globais acabou Existem duas importantes implicac5es da teoria de Fukuyama para esta discussao de sociedade internacional ambas sao em al guma medida trabalhadas ao Iongo de seu livro A primeira e que como urn resultado dos processos que ele identifica do conflito e da rivalidade dos Estados os pafses sao cada vez mais forcados a se conformar a produzir a semelhanca identificada por Burke Fukuya ma nao atribui a ideologia ao costume ou a pratica a importancia dada por Burke mas percebe a cultura como uma importante parte da modemidade para a qual todas as sociedades sao forcadas a se dirigir Alem disso a cultura e urn dos mecanismos atraves dos quais as so ciedades sao forcadas por outras a se conformar a sua analise do fim da Guerra Fria baseada na transmissao para uma populacao educada dentro dos pafses comunistas de uma imagem de urn mais bemsuce dido mundo ocidental faz uso considera vel de fa totes ideol6gicos Segundo Fukuyama trabalhando o argumento de Michael Doyle e outros desenvolve a tese de que a democracia liberal significara o tun do conflito interestatal como o conhecemos por raz5es significativas ja que as democracias liberais nao vao a guerra umas com as outras a dis seminacao da democracia liberal reduz a probabilidade do conflito e da rivalidade militar entre os Estados desenvolvidos e progressivamente confina a guerra as relac6es com ou entre OS Estados naodemocrati cos42 A medida que a democracia liberal se difunde tambem se reduz o domfnio da guerra No fmal das contas o tim da hist6ria significara o fim das relac5es intemacionais como ate aqui as conhecemos A criacao pela primeira vez de uma sociedade intemacional significa que a visao de Kant de paz universal sera realizada Marx encontraria uma vinganca perver sa nao atraves da criacao de uma sociedade comunista em escala mun dial mas atraves da completa realizacao urn seculo e meio depois da publicacao do Manifesto de urn mundo criado a imagem capitalista A 42Michael Doyle Liberalism and world politics American Political Science Review v80 n4 December 1986 p 11569 Repensando as rela6es internacionais 13 1 Revoluao Bolchevique desafiou o mundo capitalista ameaado pela extinao43 no fim ela foi extinta As disputas levantadas pela teoria de Fukuyama sao muitas e tocam em quest5es distantes da amilise da sociedade internacional Tres em particular merecem atenao cdtica a representaaO a de mocracia e o desenvolvimento Voltarei a elas no capitulo final no contexto de uma consideraao geral de seu trabalho Aqui basta dizer que s dificuldaes com a ua toria assim como com a sua pers pectlva geral dtzem respetto dtretamente a questao da sociedade iternacional e aos proprios significados de sociedade que sao vtstos como funcionando no nivel internacional AS IMPLICACOES PARA AS RELACOES INTERNACIONAIS Em resumo estes sao os elementos do que pode ser identificado como o terceiro modelo de sociedade internacional o constitutivo Como qual quer mdana teoric a sua inoduao e dirigida nao tanto para negar a coerencta e o potenctal exphcativo dos outros dois conceitos embora te os identificado algumas dificuldades neles mas para apon uma outra terptaao q pode em seu proprio contexto sugerir urn programa de mvestigao adtctalPeber a soci intemacional como os processos representados pel 1de1a de omgenete pode ajudarnos a olhar para as areas das relaoes mtemactonats que ate agora tern sido subreconheci que por meio de recentes desenvolvimentos sejam eles teoricos ou histoncos foram colocadas em uma nova perspectiva Em primeiro Iugar qualquer abordagem baseada no conceito de homgenidade con vida a uma his tori a alternativa das rela5es in ternacwnats e do desenvolvtmento das sociedades individuais Para a us a ud9a e evident que antes podia ser percebido como htstonas nacwnats tsoladas e dtstlntas agora aparece muito mais cla rament omo o resultad de processos internacionais de imitaao de compettao e de moderntzaao defensiva e de influencia Como o tra balho dos ociologs historicos sobre o Estado discutido no Capitulo 3 Otto Hmtze Mtchael Mann mostrou atraves da historia o cres ctmento das institui5es administrativas e coercitivas tern sido influ encado pel cpeiao co outros Estados Esta perspectiva da scctologta htstonca mteacwnal pode ser empregada para explicar nao somente o desenvolvtmento economico mas tambem a mudan a politia ocial e onmia deno dos pafses As implica5es para as relaoes tnternacwnats sao muttas Se perguntarmos como o in 43Manifesto p 71 132 Fred Halliday ternacional importa e por extensao quais SaO OS processos interna cionais que merecem maior atensao entao este processo de imitaao homogeneizaao e resistencia a ele se torna central 0 conflito entre os Estados e a atividade diplomatica ortodoxa nao sao exclufdos mas formam parte de urn padrao mais amplo de interasao internacional Urn fenomeno que esta abordagem conceitual ajuda a identificar e explicar e urn que pode ser chamado em retrospecto de pathos da fuga semiperiferica Por isto querse dizer a tentativa ao Iongo do ultimo se culo de vanos pafses que nao estavam na linha de frente do desenvolvi mento capitalista ocidental de escolher as vias de desenvolvimento que desafiaram o modelo de organizasao polftica e economica estabelecido Em Uiil sentido estes eram exemplos do alcanar gerschenkro niano mas 0 que e pertinente aqui e como no fim eles tiveram de abandonar os meios excepcionais de tentar fazelo 0 que e marcante nestas tentativas e que enquanto bemsucedidas por algumas deca das elas no final das contas foram destrufdas pelas press5es interna cionais da guerra da competisao naomilitar ou da influencia cultural ideologica Os mais obvios exemplos disso sao os Estados comunis tas que por urn razmivel perfodo de tempo de Outubro de 1917 a Agosto de 1991 para ser preciso buscaram mapear tal caminho alter nativo Destes o mais significativo foi a URSS que embora extrema mente antibeligerante pelos padr5es da maioria dos Estados moder nos envolveuse apesar disso em conflitos militares prolongados com os grandes poderes capitalistas rivais ela venceu seu primeiro grande desafio o do autoritarismo capitalista na Alemanha mas sucumbiu frente ao segundo o do capitalismo liberal no periodo pos1945 0 pathos da fuga semiperiferica entretanto nao se aplica somente aos regimes de esquerda Na direita varios pafses especificamente a Alemanha a ltalia e o Japao buscaram seu proprio caminho alterna tivo nos anos 1920 e 1930 somente para serem colocados na linha pelo mais firme de todos os instrumentos de homogeneizaao a der rota JUilitar e a ocupaao 0 que a Segunda Guerra Mundial trouxe para estes tres pafses a atrasao do mercado e as press5es da classe media para a modernizaaO cultural e polftica tambem trouxe para OS menores e menos beligerantes Estados europeus de direita Espanha Portugal e lrlanda44 Cada urn deles adotou regimes conservadores 44Pareceria a primeira vista injusto incluir a lrlanda nesta categoria ja que em oposilio aos pafses fascistas ela permitiu o pluralismo politico e uma medida de liberdade constitu cional desde a independencia em 1922 Em alguns aspectos entretanto particularmente sob os governos de Fianna Fail de 1930 e 1940 ela esteve envolvida em uma verslio branda de fuga semiperiferica a represslio ideol6gica atraves da censura e do controle clerical da educalio de desligamento econ6mico atraves da substituilio de importalio e de controles comerciais tudo isto tambem coberto pela linguagem nacionalista sobre o excepcionalismo hibemiano na economia e aos olhos de Deus Repensando as rela6es intemacionais 133 depois das guerras civis no periodo entreguerras que criteriosamente prolongaram a sua existencia ficando de fora do conflito global dos anos 1940 Embora a sua exclusao estrategica atrasasse a sua homo geneizacao a partir do final dos anos 1950 eles comecaram a experi mentar as atraoes do Mercado Comum e estavam no final da deca da de 1970 integrados na CEE e apropriadamente homogeneizados45 0 mesmo se aplica com alguma variaao a Grecia Mesmo os EUA eo Reino Unido sem duvida os casos mais puros de desenvolvimento capitalista nao escaparam de intrusoes abruptas externamente alimentadas os EUA tentaram ate 1860 manter o caso mais extrema de oligarquia capitalista o sui escravo crata enquanto o Reino Unido atrasou a extensao do sufragio a classe trabalhadora e as mulheres ate ser forado pela Primeira Guerra Mundial Perceber como os fatores externos em particular a pres sao para conformarse contribufram para estes resultados nao sig nifica negar a impordincia de fatores end6genos e especfficos Este entendimento da sociedade internacional como homoge nea tern consideraveis implica5es para a questao discutida nos Ca pftulos 79 a analise da Guerra Fria e do seu fim primeiro na explica cao que sugere sobre como e por que o sistema sovietico entrou em colapso urn caso unico de urn bloco hegemonico desaparecendo na ausencia de uma guerra interestatal e segundo nasimplicaoes que levanta para o padrao das relacoes internacionais no p6sGuerra Fria Qualquer teoria de relaoes internacionais que se sustente pode presumivelmente elaborar uma explicacao de por que a Guerra Fria ter minou 0 carater particular do co lap so sovietico entretanto sugere que alguns mecanismos de pressao internacional separados tanto do confli to interestatal como da interacao economica transnacional estavam agin do que em outras palavras os mecanismos de homogeneidade no fim cobraram seus direitos Urn exemplo adicional disto aparece na ret6rica da campanha eleitoral americana em 1992 Enquanto na era da Guerra Fria a principal dimensao e leitmotif da competicao inter nacional como retletido nos discursos eleitorais era a rivalidade militar com a URSS em 1992 ela havia mudado para a arena da competicao economica como Japao e a Comunidade Europeia As soluoes oferecidas por Bush e mais ainda por Clinton residiam explicitamente em comparacoes internacionais sobre a educaao os gastos sociais a polftica de investimentos e os nfveis salariais Os 45Para uma breve analise do caso portugus ver meu Whatever happened to the Portuguese Revolution New Statesman 15 April 1992 A discussiio aqui ever sea Revoluiio Portuguesa de 19745 tendo sido trafda ou perdida desligouse das inten6es da maioria daqueles que a organizaram e a apoiaram que era precisamente cumprir a agenda incompleta da revoluiio constitucionalliberal de 1910 integrar como resto da Europa e liberarse do onus anacronico das colonias africanas 134 Fred Halliday dois principais candidatos defenderam que somente se tornando mais parecidos com os seus competidores os Estados Unidos poderiam manter ou recuperar a sua posicao internacional46 Para o futuro se a suposiao de que as democracias liberais nao vao a guerra sustentarse e se este sistema polftico prevalecer em uma significativa parte do mundo mais especificamente estabelecerse e manterse na Russia eritao o estabelecimento de uma sociedade inter nacional no sentido mais forte mais homogeneo da palavra signifi cara que uma nova era nas relacoes internacionais comecou 0 fim da hist6ria se traduziria no fim das relaoes internacionais como ate aqui entendidas Estas consideracoes analfticas e hist6ricas deixam sem solu cao a questao te6rica de como a homogeneizacao funciona E pre ciso ainda especificar uma terceira dimensao dos relacionamentos internacionais interligados com mas separados dos dais nfveis identificados pelas outras concepoes de sociedade internacional a interestatal e a transnacional Isto seria legitimamente chamado de socializacao mas indicaria nao a socializaao de que fala o realismo ou seja de fazer com que os outros Estados soberanos aceitem certas normas em seu comportamento internacional mas sim a reproducao dentro das sociedades de normas estabelecidas em outro Iugar do sistema47 Esta terceira dimensao aquela da in fluencia social poHtica e ideo16gica e da homogeneizacao pode em urn dado momenta estar subordinada as outras duas mas pode em outros prevalecer sabre elas 0 mfnimo que se pode dizer e que independentemente de qual for a estrutura seja a evolucao do sistema ao Iongo dos ultimos cinco seculos e o papel dentro dela da evoluao do capitalismo ou o destino dos pafses semiperiferi cos no seculo XX a relevancia deste processo de homogeneiza cao parece ser consideravel 0 fim da hist6ria pode significar o fim das relacoes internacionais como polftica de poder Tambem pode ser o pressagio do comeco das relacoes internacionais como uma interpretacao te6rica abrangente e adequada das multiplas dimen soes da sociedade internacional 46Tais compara6es eram muito menos evidentes no ambiente politico mais reservado do Reino Unido onde os apelos nacionalistas sobre a especificidade britaruca especialmente em questiies de reforma constitucional dominavam a agenda Uma exceiio marcante foi a manchete de primeira pagina sobre os baixos padroes educacionais na lnglaterra Bottom of the Class Only Brazil Mozambique and the old Soviet Union have WORSE schools The Daily Mirror 13 March 1992 47Para uma tentativa de teorizarprecisamente tal processo ver G John Ikenberry e Charles A Kupchan Socialization and hegemonic power International Organization v44 n3 Summer1990 p 283315 Repensando as rrla6es internncionais 1 3 5 Capitulo s 1 SEXTA GRANDE POTENCii AS REVOWOES E 0 SISTEMA INTERNACIONAL UM CASO DE DESATENAo MUTUA A disciplina das relaes intemacionais tern uma relaao descon fortavel com a revoluao A afmnaao de Hannah Arendt de que o secu lo XX tern sido moldado pelas guerras e as revoluOes e freqUentemente citada mas e surpreendente como dentro da pesquisa institucionaliza da e do ensino das relaes intemacionais estes dois processos histori camente formativos recebem tratamento diferencial Sao muitos os cur sos as revistas e os departamentos sobre a guerra 0 estudo da guerra em sua8 dimenses hist6ricas estrategicas eticas e pollticas e central para o estudo academico das RI Em oposiao as revolues tiveram uma existencia marginal Livros e explicaOes te6ricas lhe devotam pouco espao Nao existe nenhuma revista especializada na questaoAlgum dia ainda iremos encontrar o professor de Estudos Revolucionarios Oliver Cromwell nao ha convites para palestras no Instituto Intemacional Tho mas Paine para o Estudo Coparado da Mudana Revolucionana Nao existe uma raziio unica para esta marginalao V arios fatores dentro da tradiao intelectual e do contexto institucional das RI convergi ralll para produzir esta situaao As pr6prias RI coaram como um es tudo da guerra e das causas da guerra e permanecem guiadas como os documentos para a prevenao da guerra na Carta da ONU pela crena de que a guerra entre os Estados deve ser percebida como uma agressao raci onalmente decidida e nao a intemacionalizaao do conflito social 0 desenvolvimento te6rico posterior das RI tern confmnado isto de muitas maneiras Na incorporaao da ciencia polltica americana e Repensando as rela6es intemacionais 13 7 britanica as RI existe urn adicional desprezo e desatencao com as re volucoes percebidas como quebras dos processes regulars a soci edade nacional e internaciona1 Com a ascensao do behav10nsmo o conceito de revolucao junto com aquele de Estado foi dissolvido em tim espectro de violencia e de guerra interna que nega a sua especificidade anaHtica e historical 0 neorealismo em sua versao waltziana classificando todas as referencias a processes internes e transnacionais como reducionista tern por sua vez impedido a consideracao da interacao entre a mudanca internacional e a interna 2 Outros fatores podem ser levantados no contexte mais geral das ciencias sociais 0 estudo da revolucao nao se sente em casa em qual quer das ciencias sociais embora tenha recebido mais atenao dentro da sociologia e da hist6ria Nestas disciplinas entretanto ex1stem poucas referencias as dimens6es intemacionais do fenomeno A maioria dos tra balhos sociol6gicos ate States and Social Revolutions de Skocpol tra tou as revolucoes como se elas tivessem acontecido dentro de entidades polfticonacionais distintas 3 Outra importante contribuicao recente aoestudo comparado e te6rico das revolucoes o trabalho de Jack Goldstone e associados chamou a atencao para certos fatores inter nacionais que levam ao enfraquecimento dos Estados especialmente as pressoes econ6micofiscais e as polfticas de alianca desestabili zadoras entretanto foilhes atribuido urn Iugar secundario no que ainda permanece predominantemente como a analise de entidades nacionais e pollticas autonomas A mais importante dimensao com parativa do trabalho de Goldstone aquela da pressao demografica ver Harry Eckstein Internal War New York Free Press 1964 e James Rosenau Internal War as an International Event em Rosenau ed nota 9 2Este e urn princfpio m1cleo do realismo e do neorealimo a despeito de concessoes de muitos realistas de que a exclusao dos fatores internos e simplesmente uma convenien cia analftica 0 argumento de Waltz e claramente expresso em Theory of International Politics Capitulo 4 Discuti esta suposicao e as mudancas no argumento envolvidas no Capitulo 1 Sao varios os exemplos da supressao convencional das dimensoes inteTaci onais da revolucao dentro dasRI Por exemplo Jack Plano e Roy Olton The Internatzonal Relations Dictionary 4ed Santa Barbara Longman 1988 nao tern nenhuma discus sao da interrelacao geral entre os dois assuntos um item naoindexado sobre a revo lucao e a guerra discute somente aspectos internos A literatura das RI esta repleta de discussoes de alianca mesmo assim raramente e deixado claro que a muitas aliancas tern como seu prop6sito original a supressao da revolucao dentro dos Estados membros e b que uma das razoes principais para o colapso ou o tim das aliancas e que revolu coes ocorrem dentro de alguns dos membros os destinos da OTASE CENTO e o Pacto de Vars6via deveriam deixar este ultimo ponto suficientemente evidente vftimas res pectivamente dos levantes vietnamita iraniano e leste europeu De fato a CENTO foi vftima da revolucao por duas vezes sua forma inicial o Pacto de Bagda teve que ser abandonado em favor do CENTO depois da Revolucao Iraquiana de 1958 3Ver por exemplo uma visao da literatura sociol6gica em Stan Taylor Social Science and Revolutions London Macmillan 1984 13 8 Fred Halliday J possui uma origem incerta no internacional e como ele mesmo in dica os fatores internacionais tern impactos ambfguos sob os Esta dos com potencial para fortalecelos e enfraquecelos 4 Dentro das abordagens teoricas das RI o realismo discute as re volucoes mas elas sao normalmente invocadas nao como objetos de estudo em si mesmas mas para provar as pressoes da conformidade e da socializacao que os constrangimentos do sistema impoem mes mo sobre o mais diferente e revisionista dos Estados Nenhum livro realista e complete sem a afirmacao de validade dubia de que os Bolcheviques haviam se enquadrado no sistema em 1922 A licao ti rada e que mesmo as revolucoes nao podem escapar do sistema5 A discussao mais extensa das revolucoes em uma perspectiva realista e a de David Armstrong em Revolution and World Order The Revolutionary State in International Society Armstrong afastase de alguma forma da concepcao convencional de sociedade intemacio nal de WightBull primeiro pela inclusao nas normas das questoes societarias relacionadas a constituicao interna dos Estados como a escravidao ou a conduta democratica e segundo pela aceitacao de que mesmo quando sao socializados os Estados revolucionarios podem forcar os poderes do status quo a revisar as normas de relaci onamento estatal como demonstra o sucesso da Uniao Sovietica em levar ao estabelecimento da Organizacao Internacional do Trabalho nos anos 20 e o fim do colonialismo depois da Segunda Guerra mun dial6 Entretanto mesmo que isto rompa os canones realistas pela acei tacao da importancia das estruturas polfticas e sociais internas na melhor das hip6teses este e urn ajuste parcial por urn lado evita a questao de investigar o que intemamente constitui a norma do Esta do no mfnimo as suas relacoes de propriedade por outro negligen Jack Goldstone Ted Robert Gurr e Farrokh Moshiri eds Revolutions of the Late Twentieth Century Boulder and Oxford Westview 1991 p 41 Ver tambem Jack Goldstone Revolution and Rebellion in the Early Modern World Berkeley and Oxford California University Press 1991 Jack Goldstone ed Revolutions Theoretical Comparative and Historical Studies London Harcourt Brace Jovanovitch 1986 Para uma discussao extensa de e por Goldstone ver Contention Debates in Society Culture and Science Winter 1993 n5 particularmente o artigo de John Foran Revolutionising theoryffheorising revolutions que considera Revolution and Rebellion de Goldstone Foran p 73 coloca a intrigante questao de ate que ponto o crescimento demografico pode ser tratado como uma varia vel independente pelo qual ele significa externamente deterrninada e de ate que ponto ele e resultado de diferentes processos nacionais 5 Fred Northedge The International Political System London Faber Faberm 1976 p 2830 Waltz Theory of International Politics p 1278 A despeito da naoconforrnidade em outras questoes James DerDerian chega a conclusoes similares On Diplomacy The Revolutionary State in International Society A Genealogy of Western Estrangement Oxford Basil Blackwell 1989 p 198 6Revolution and World Order Oxford Clarendon Press 1993 p 811 401 758 155 7242330710 Repensando as rela6es internacionais 13 9 cia as operaoes da sociedade internacional no sentido amplo identi ficado no Capitulo 4 e que vao muito alem das aoes de governos Outras tendencias dos anos 1970 e 1980 igualmente dedicam um espao pequeno aos levantes revoluciomirios a economia polftica inter nacional e a interdependencia estao preocupadas com as relaoes dentro do mundo capitalista e principalmente com as suas partes desenvolvidas sem muita necessidade de olhar para os Estados mais pobres e revoluci omirios 0 papel da Guerra do Vietna para provocar a conscientizaao da interdependencia e esquecido Os estudos estrategicos do periodo da Guerra Fria muito distante de suas amarras hist6ricas clausewitzianas examinaram a corrida armamentista LesteOeste em quase completa abs traao das composis socioeconomicas conflitantes dos sistemas sovi etico e americana Pouca atenao foi dada aos conflitos sociais e politicos do Terceiro Mundo que Ionge de constitufrem uma dimensao secunda ria da Guerra Fria eramlhe centrais e catalisadores da propria corrida armamentista7 Em termos de moldar o mundo do p6sguerra a guerra de guerrilha em suas formas revolucionarias e contrarevolucionarias foi pelo menos tao influente como as armas nucleares contudo dificilmente ela figura no currfculo ortodoxo de estudos estrategicos Alem de fatores de clima academico e intelectual outras influ encias que Kuhn educamente chama de institucionais tambem de sempenharam a sua parte com a breve exceao dos anos 1950 e 1960 houve o distanciamento de urn t6pico dificil e controverso 0 custo da maior integraao academica com o mundo real foi uma crescen te concentraao naqueles aspectos da realidade considerados como adequados pelos financiadores nos nfveis corporativo e estatal 8 Apesar disso existem tres aspectos nos quais estes elementos de desatenao mutua nao tern sido absolutos ou nos quais elemen 7Desenvolvi este argumento em meu The Making of the Second Cold War London Verso 1983 Alguns escritores em estudos estrategicos incluindo Alexander Goerge Raymond Garthoff e Michael Mandelbaum discutiram estainterrel mas na maior parte falharam em encontrar lugar suficiente para ela na analise da corrida annamentista p6sguerra e com peticao estrategica Por exemplo Garthoff em Reflections on the Cuban Missile Ctisis Washington Brookings Institution 1987 menciona os temores sovieticos de uma invasao americana em Cuba mas amplamente subestima a importllncia desta preocupruao na decisao sovietica eminentemente racional de colocar misseis na ilha A confirmruao de que isto era uma possibilidade e feita por Pierre Salinger nesta epoca secretario de imprensa de Kennedy ver Kennedy and Cuba the pressure to invade was fierce International Herald Tribune 6 February 1989 Nos estudos academicos britllnicos convencionais da corrida arrnamentista nuclear o impacto das revolucoes do Terceiro Mundo dificilmente merece mencao 8 A cronologia do financiamento e da publicacao de trabalhos americanos sobre as guerras intemas e as suas dimensoes intemacionais conta a sua pr6pria hist6ria urn acumulo de interesse motivado pela preocupacao no despertar da Revolucao Cubana no infcio de 1960 seguido por urn tenso silencio uma vez que as dificuldades da Guerra do Vietna se tomaram evidentes 0 impacto explicito e tacito da Guerra do Vietna sobre o estudo academico das relacoes intemacionais ainda esta por ser analisado 140 Fred Halliday tos de uma interaao das RI com a revoluao podem ser identifica dos Antes de mais nada ha urn corpo de literatura dentro das RI que explicitamente abordou as questoes analfticas e comparativas apresentadas pelas revoluoes os trabalhos de Kissinger Rosecrance Wight Rosenau Kim Calvert eo ja mencionado de Armstrong9 A compensaao e que apesar de sua exfgua quantidade a qualidade e a perspicacia com que estas importantes questoes sao colocadas e normalmente muito boa Mesmo os trabalhos produzidos antes da pesquisa sociol6gica mais recente sobre as revoluoes tern urn alto padrao as questoes que eles colocam passaram no teste do tempo Segundo as revoluoes tern estado presentes dentro das RI de forma disfarada dentro dos t6picos que apresentam pontos de par tida alternativos e nos quais uma releitura e reconstituiao da litera tura existente pode tornala relevante para o estudo desta questao isto e verdadeiro para alguns dos trabalhos de Rosenau sobre as li gaoes transnacionais para a literatura sobre a intervenao suas causas elementos praticos e etica e embora de uma maneira mais abstrata para parte da literatura sobre o terrorismo 10 Terceiro existe alguma literatura em ciencias sociais cognatas que e acessivel e relevante para a construao de uma discussao das RI sobre as revolu5es se isto e verdade em trabalhos hist6ricos que destacam os aspectos internacionais da revoluao Palmer Rude Hobsbawm sobre o seculo XVIII Carr Liebman Deutscher Harding sobre a Revoluao Bolchevique11 o e ainda mais na terceira onda de escritos socio 9Henry Kissinger A World Restored Gloucester MA Peter Smith 1973 Richard Rosecrance Action and Reaction in International Politics Boston Little Brown 1963 Martin Wight Power Politics London Penguin 1966 Capftulo 7 James Rosenau ed International Aspects of Civil Strife Princeton Princeton University Press 1964 Kim Kyongwon Revolutions and International System London University of London Press 1970 e Peter Cal vert Revolution and International Politics London Frances Pinter 1984 10No escrito acadmico sobre as RI a superestimruao do termo terrorismo para cobrir muito mais ac5es do que as do pr6prio terror tern sido urn dos capitulos mais escorregadios da disciplina 0 terrorismo no sentido sensacional em que a palavra vern sendo normalmente usada e uma caracterfstica subaltema das relacoes intemacionais Para uma perspectiva hist6rica e alguma etica ver Walter Lacqueur Terrorism 2ed London Weidenfeld Nicolson 1989 Conor Gearty Terror London Faber Faber 1991 Fred Halliday Terrorism in historical perspective Arab Studies Quarterly v9 n2 Spring 1987 11RR Palmer The world revolution of the West Political Science Quarterly v69 n1 March 1954 RR Palmer The Age of the Democratic Revolution 17601800 2 vols Princeton Princeton University Press 1959 e 1964 George Rude Revolutionary Europe I 7 I 3I 8 I 5 London Fontana 1964 Jacques Godechot La Grande Nation Paris Aubier 1956 Eric Hobsbawm The Age of Revolution Europe 17891948 London Weidenfeld Nicolson 1962 EH Carr The Bolshevik Revolution v3 London Penguin 1973 Marcel Liebman Leninism under Lenin London Merlin press 1973 parte 4 Isaac Deutscher Marxism Wars and Revolution London Verso 1984 e suas biografias de Stalin e Trotsky Neil Harding Lenin S Political Thought v2 London Macmillan 1981 Repensando as rela6es internacionais 141 16gicos sobre a revoluao especialmente os de Skocpol e Goldsto ne concentrando seu interesse no enfraquecimento e no desmoro namento dos Estados eles destacam o papel da competiao interes tatal nas causas das revoluoes e na formaao dos Estados p6sre voluciomirios Da mesma maneira que os escritos de RI sobre o as sunto estes textos sociol6gicos nao sao numerosos e podem como ja notado tender a enfatizar os sistemas nacionais entretanto as suas implica6es anaHticas e te6ricas sao consideniveis 12 A analise do Iugar das revoluoes nas RI parecena englobar tres grandes areas de investigaao A primeira e hist6rica para deter minar o Iugar e a influencia das revoluoes na hist6ria do sistema intemacional e na formaao do ambiente intemacional do seculo XX 0 mfnirno que pode ser dito aqui e que o papel das revoluoes a la Hannah Arendt tern sido sistematicamente subestimado A segunda area de investigaao e descritiva propondo o exame das pr6prias dimens6es intemacionais das revolu6es e deterrninando ate qe ponto podem ser identificadas regularidades no cornportamento politt co A consideraao realista dominante do sistema intemacional supoe ja haver identificado quais sao estas regularidades e as conrtrma por suas afirmaoes entretanto pode haver muito ainda a ser desvendado A terceira e mais fundamental area de investigaao diz respeito a teoria is to e quais sao as questoes te6ricas que 0 estudo das revoluoes coloca para as RI Isto leva a urn exame de ate que ponto cada urn dos paradigrnas estabelecidos pode ou nao lidar com urn reconhecimento adequado da importancia das revolu6es e ate que ponto artrma6es apa rentemente centrais da disciplina precisam ser reexaminadas a luz de tal investigaao Esta sondagem te6rica todavia nos leva alem do domfnio das RI envolve urn processo duplo urn que deve examinar nao somente como as revoluoes afetam as RI mas ate que ponto uma consideraao apropriada do contexto intemacional pode colocar questoes para as ex plicaoes socio16gicas e polfticas estabelecidas sobre a revoluao AS REVOLUOES E OS SEUS EFEITOS 0 uso dos conceitos dentro das RI depende em urn grau nao reconhecido pela disciplina das definioes emprestadas de outras areas A revoluao assim como os conceitos de Estado poder e sis tema nao e uma exceao Como todos os conceitos da ciencia soci al o conceito de revoluao evoluiu ao Iongo do tempo e contem varios significados Na discussao abaixo utilizamos urn sentido do 12Estes pontos sao bern Ievantados por Jack Goldstone Theories of Revolution the third generation World PoliticsAprill980 142 Fred Halliday termo restrito e discriminat6rio definido por Skocpol e outros as revoluoes sociais e polfticas fundamentais Em particular a discus sao se sustenta em tres contribuioes importantes ao estudo das re voluoes que servem para delimitalas como eventos hist6ricos se parados e comparativamente raros mas que Ionge de serem margi nais ou atfpicos para a hist6ria dos Estados e do sistema intemacio nal sao pontos de transiao e de formaao sem os quais o mundo modemo nao seria como e A prime ira destas contribuioes publicada em 1979 e States and Social Revolutions de Theda Skocpol As revoluoes foram identifica das como uma categoria distinta de evento hist6rico com base no grau de transformaao da sociedade e da destruiao do velho Estado As revolucoes sociais sao transformacoes nipidas e basicas do Estado de uma sociedade e de suas estruturas de classe elas sao acompanhadas e em parte realizadas pelas revoltas de classe vindas de baixo As revolu coes sociais sao separadas de outros tipos de conflito e processos transformativos acima de tudo pela combinacao de duas coincidencias a coincidencia da mudanca estrutural societaria com o levante de classe e a coincidencia da transformacao polftica com a social13 Apesar de considerar a mobilizaao de massa e a aspiraao demo cnitica Skocpol priorizou a relaao entre as revoluoes e os Estados ambos buscaram derrubar os Estados existentes e consolidar novos Ao fazelo destacou como a competiao interestatal nos terrenos economi cos militares e politicos serviu para enfraquecer os Estados e preparou o caminho para a revoluao algo evidente nos tres casos que conside ra Frana Russia e China 0 segundo alicerce deste estudo sobre as revoluoes e The Social Origins of Dictatorship and Democracy de JB BarringtonMoore pu blicado em 1967 Moore examinou os caminhos opostos para a indus trializaao e a democracia liberal de vanos importantes Estados e mos trou como estas trajet6rias dependiam consideravelmente dos padr6es de poder agnirio presentes no perfodo preindustrial Contudo o traba lho de BarringtonMoore tambern desenvolveu dois argumentos que con trariaram grande parte do pensamento convencional sobre a revoluao Em oposiao a ideia dominante de urn caminho pacffico naorevolu cionario perseguido pela Inglaterra e os EUA ele apontou para os capf tulos extremamente violentos atraves dos quais estes pafses fizeram a transiao para a modemidade Incluindo nos EUA a primeira guerra industrializada da hist6ria modema 1861 a 1865 por ele considerada uma revoluao Ao mesmo tempo ao analisar os pafses que aparente 13Theda Skocpol States and Social Revolutions Cambridge Cambridge University Press 1979 p 4 Repensando as rela6es intemacionais 143 mente evitaram as transicoes por nao ter revolucoes a Alemanha e o Japao ele mostrou a violencia que acompanhou as suas transicoes com a repressao intema e a agressao extema Em resumo ele argu mentou que nao existia uma escolha entre urn caminho violento e urn naoviolento e que ambos os caminhos o revoluciomirio e o nao revoluciomirio possufam custos humanos As revolucoes eram portanto nao aberracoes a uma alternativa naoviolenta mas uma forma de transicao inevitavelmente violenta para uma sociedade moderna e freqlientemente uma forma que em escala internacio nal foi menos violenta do que a altemativa germanoniponica 0 terceiro componente da concepcao de revolucao social aqui uti lizado eo dissico ainda naotraduzido do escritor alemao Karl Griewank Der Neuzeitliche Revolutions be griff Entstehung und Entwicklung 14 Gri ewank tracou o desenvolvimento do conceito de revoluyao atraves de suas previas fontes astronomicas e constitucionais ate o conceito rna demo que nasceu da Revolucao Francesa 15 Isto Ihe permitiu nao somente identificar diferentes sentidos do termo mas tambem dis cemir mais claramente os componentes do seu uso modemo as re volucoes nao abrangem somente a mudanca polftica ou a constitu cional mas tambem a participacao da massa neste processo o alva central das revolucoes era o controle do Estado e por esta razao nenhum conceito de revolucao era possfvel antes da emergencia do Estado modemo casualmente o mesmo se aplica a qualquer con ceito do sistema interestatal ou internacional agora as revolucoes sao encaradas como momentos de transicao para urn mundo novo melhor ou mesmo perfeito o comeco de uma nova era na qual tudo seria diferente E esta concepcao modema de revolucao analisa da por Griewank e herdada da Revolucao Francesa que tern perme ado a maior parte da discussao posterior As questoes da definicao e do papel hist6rico das revolucoes sao com certeza centrais para qualquer discussao destes lev antes no contexto intemacional Quase toda a discussao sabre as revolucoes na literatura das RI as percebe em urn sentido muito mais frouxo para incluir os golpes e as explosoes de violencia o que nao as dissolve simples mente em urn espectro behaviorista A maior parte da literatura das RI supoe tambem que as revolucoes sao momentos de colapso ao inves de transicao e que estes momentos sao diferenciados pela vi olencia em oposicao a regimes estaveis e repressores mas que nao 14Der Neuzeilitche Revolutionsbegriff Entstehung und Entwicklung Weimar Hermann Bohlaus Nachfolgerm 1955 Uma se91i0 foi traduzida em Heinz Lubacs Revolution London Macmillan 1968 urn artigo chissico que cobre o mesmo terreno que Griewank eAT Hatto Revolution an enquiry into the uselfuness of an historical term Mind October 1949 144 Fred Halliday seram violentos Na verdade enqunto cada urn dos principais pa radtgma contemporaneos as I hda com as revolucoes em algo ma med1da as bases concettuats de suas consideracoes variam em tal extensao que os seus achados se aproximam do incomensuravel Ito ocorre nao somente por causa de diferencas de conceitualiza yao geral mas porque cada urn se utiliza de um conceito diferente de revoluyio Uma visao condensada necessariamente resumida de como cada um dos tres principais paradigmas trata as revoluyoes pode tamar isto mais clara Para os ealistas a tndencia e perceber as revoluy6es como mu dancas em estils de pohttca externa e de prioridades dos Estados tanto que estas constttuem um fator revisionista insatisfeito ou desequi librador no sistema internacional e devem ser adequadamente domadas as reoluy6es sao urn colapso em urn mundo de outra forma ordenado Em st mesmas elas nao requerem nem explicacao ou contextualizayao hist6rica Mesmo uma analise realista perceptiva como aquela de Ro srance opera com este modelo A World Restored de Kissinger 0 exem phfica Armstrong como ja discutido vai de algum modo localizar as revoluc6es mais centralmente dentro do curso da hist6ria intemacional de certa maneira violando o paradigma realista Para os beaioristas como Rosenau as revolucoos sao parte do espectro de v10lencta e podem espalharse transnacionalmente como um vfrus contudo esta violencia e vista em termos psicol6gicos abstraida de sua casa socal ou do contexto intemacional e de novo ela e oposta a altemauva estavel e supostamente naoviolenta 0 materialismo hist6rico presente nas RI em sua variante estru tlista doma presta muito mais atenyio as revoluy6es e as ve con dtciOnando prectsamente o papel formativo e transicional identificado por kocpol e BngtonMOre e envolvendo uma mudanya social e pohtica substanctal Em opostyao aos realistas e aos behavioristas os materialistas hist6ricos consideram as revolucees positivamente e m bem comecam a olhar para os fatores internacionais definidos pelo ca pitliso e pelo imperialiso como o contexto no qual qualquer revo luyao mdtvtdual sera localtzada De forma sagaz Marx criticou as afir mac6es de rna teoria baseada nos grandes poderes atrrmando que a ordem pentarqutca do seculo XIX aquela dos cinco poderes seria var nda pela sexta grande potencia a revoluyao Entretanto por causa de sua enfase sabre a dimensao intemacio nal da revolu9ao o materialismo hist6rico tern dificuldade em explicar porq as revolus pareccm etar confinadas a Estados especificos e a extbrr caractensttcas nactonats e nacionalistas tao distintas Aiem disso concepyao materialista hist6rica de revolucio na pratica e na teona reside sobre uma visio da hist6ria como se movendo atra ves de estagios em direcio a urn alvo hist6rico determinado tele ologicamfmte supunhase que as revolucoes eram de algoma for Repensando as rela6es intemadonais 145 rna transioes ou pedagios de uma evoluao unilinear da socieda de humana Apesar de poder haver espao para algum conceito de progresso na sociedade humana esta visao determinista era uma ilu sao e constituiu uma grande falha de toda a abordagem marxista Ao estar presente mesmo de forma disfarada nos escritos influen ciados pelo marxismo incluindo BarringtonMoore e Skocpol esta visao e tambem uma fonte de debilidade destes trabalhos Urn exame resumido das tres areas de analise ja identificadas a hist6rica a descritiva e a te6rica pode enfatizar melhor estas res pectivas anomalias A FORMAAO DO SISTEMA INTERNACIONAL Em uma surpreendente passagem no Capitulo 6 de seu Power Politics intitulado Revoluoes Internacionais Martin Wight ob serva Podese muito bern perguntar par que a polftica intemacio nal naorevolucionaria deveria ser considerada como mais normal do que a revolucionaria ja que a historia da sociedade intemacional temse dividido quase que igualmente entre as duas 16 Em uma nota de rodape ele desenvolve este ponto Se tomando datas convenci onais consideramos 14921517 16431792 e 18711914 como anos naorevolucionarios e 15171648 17921871 e 191660 como revolucionarios entao sao 256 anos de revoluao internacional para 212 nao revolucionarios Aqui ou ali pode haver alguma discus sao sabre datas ou fases mas o ponto levantado par Wight e con vincente na maior parte da historia do sistema intemacional as re laoes entre OS Estados nao tern sido determinadas pelos fatores normais Wight cita o direito o costume e a polftica de poder mas pelos anormais os revolucionarios Nestes fatores as divisoes ide ol6gicas desempenham urn papel importante e os Estados objetivam alterar de uma forma substancial as ordens polfticas e sociais dos demais Wight argumenta que no fim a doutrina da Iugar a polftica de poder mas o seu reconhecimento da importancia da revoluao no sistema intemacional dominante par mais da metade da hist6ria do sistema e marcante A anarquia e produto tanto da ideologia como do sistema de Estados sem soberania Os primeiros exemplos desta diversidade ideologica podem ser mencionados brevemente no seculo XVI os levantes ideologicos e po Hticos da Reforma em si mesma urn caso de ligaao transnacional e de interaao ideologica no seculo XVII as guerras e as revoluoes em 1640 quando nao menos do que seis Estados europeus enfrentaram le 16Wight Power Politics p 92 146 Fred Halliday vantes no mesmo ana 164817 e no final do seculo XVIII comeo do XIX a Revoluao Atlantica de 17601800 18 A imporHincia da revoluao no seculo XX tern sido imensa ARe voluao Bolchevique de 1917 estabeleceu a fissura fundamental das re laes intemacionais deste seculo uma que baseada em dais sistemas soc10polfticos competitivos e distintos respectivamente contribuiu e depois donou as fricses do perido etreguerras e do mundo pos guerra Ate qe ponto fat o antagomsmo a Revolusao Bolchevique e 0 medo deseu tmpato na Europa central que fomeceram o impulse para a ascensao do naztsmo e uma questao em aberto o proprio Hitler tinha outras preocupasoes mas a disposisao das classes medias alemas e do exercito em apoialo pode ter sido consideravelmente afetada pelo de safio comumsta Tal duvida nao se aplica ao curso da historia mundial nas quatro decadas depois de 1945 a divisao ja constitufda entre os Es tados capitalistas e os comunistas era composta par e em interaao com urn avalanche de revolus6es no Terceiro Mundo cuja propria enume rasa corresponde a das crises mais importantes do posguerra China Corea uba e Vtetn e no final dos anos 1970 e 1980 Camboja Ango la Ettopta Ira Ntcaragua eAfeganistao Como discutido em mais detalhes no Capitulo 7 a Guerra Fria foi urn conflito intersistemico entre dais sistemas sociais e polfticos e a sua etensao para e influenciando os conflitos do Terceiro Mundo produ zm os mats pengosos e violentos epis6dios da segunda metade do secu lo XX De 1945 a 1989 foram os conflitos no Terce ira Mundo que mais ahmentaram as ens6es inteacionais urn indicador disto foi a polftica para as revolusoes do Tercerro Mundo que levou os presidentes ameri canos a dar seusnomes para douttinas 19 Igualmente foram os pro bIemas do Tererro Mundo que mats desafiaram as posisoes dos pre stdentes amencanos como bern souberam Truman Johnson e Car ter Nos anos 1960 o declfnio parcial da hegemonia dos Estados Unidos foi em grande parte urn resultado do Vietna A historia do mundo do tim da Segunda Guerra Mundial ate o final dos anos 1980 foi quase toda embora nao exclusivamente uma de resposta do sis 17Sobre as revoluoes dos anos 1640 ver Geoffrey Parker e Lesley Smith eds The General Crisis of the Seventeenth Century London Routledge Kegan Paul 1978 18Ver Palmer World Revolution e Democratic Revolution 9Dos oito presidentes americanos entre 1945 e 1988 nada menos do que seis deram seus noe a doutrtna de segurana formuladas para conter o comunismo e outros desafios radicrus no Terce1ro Mundo Truman Eisenhower Kennedy Nixon Carter e Reagan Iyndon Johnson lode nao ter tido nenhuma doutrina com seu nome mas certamente ele tmha uma napratica como mostram o Vietna e a Republica Dominicana So mente Gerald Frd o substitute qe ocupou a Cas a Branca por do is anos depois da renuncia de Richard N1xcn em 194 fm uma exceao Ver Fred Halliday Cold War Third World London RadmsHutchmson 1989 Capftulo 3 para discussao adicional Repensando as rela6es intemacionais 14 7 tema internacional a revoluao Durante as quatro decadas de Guer ra Fria a revoluao forneceu o alicerce hist6rico para o sistema bi polar alimentando a corrida armamentista nuclear fornecendo mo tivos para a competiao dos grandes poderes e ameaando a estabi lidade politica domestica dos principais pafses 20 0 conflito intersistemico da Guerra Fria foi seguido pelos le vantes na Europa oriental de 1989 que desferiram urn golpe mortal no mundo bipolar que sobrevivera desde 1945 Em certo sentido estas revolucoes pareceram ir contra 0 padrao dos levantes dos ulti mos 200 anos a concepcao de revolucao identificada por Griewank elas aconteceram com relativamente pouca violencia e nao foram feitas em nome de alguma alternativa heterogenea mas para ou pelo menos assim era esperado alinhar estes pafses as normas sociais polfticas e economicas dominantes do ocidente Na polftica exter na como na domestica elas nao buscaram desafiar as normas inter nacionais dominantes nao somente elas aceitaram as pniticas gerais da diplomacia e do direito mas quiseram ser incorporadas nas prin cipais instituicoes do ocidente incluindo a OTAN e a Comunidade Europeia CE Como discutido depois nos Capftulos 8 e 9 estas revolucoes sao originais em varios aspectos e nao se pode questionar sua importancia para a polftica internacional A Guerra Fria terminou nao por causa do entendimento ou detente entre os grandes poderes mas pela superiori dade de urn lado sobre ou outro em outras palavras foi a revolucao nao o mutuo entendimento que quebrou o molde do mundo pos1945 e anun ciou urn novo periodo hist6rico Alem dis so foram estas revolucoes que colocaram em movimento uma serie de conflitos inooitos ou praticamente esquecidos dentro e entre os Estados isto os ameacou e em alguns ca sos os levou a guerras por territ6rios Pode ser muito cedo para consi derar por inteiro o impacto destes levantes que eles sao revolucoes e que eles alteraram 0 curso da hist6ria intemacional ja e evidente OS PADROES HISTORICOS As revolucoes sao eventos internacionais em suas causas e efei tos e com a excecao parcial daquelas de 1989 elas revelam urn grau surpreendente de uniformidade A generalizacao com base em exem 2Fui mais a fundo nesta relaao entre o conflito LesteOeste e a revoluao no Terceiro Mundo em meu The Making of the Second Cold War London Verso 1983 e em Cold War Third World Urn reconhecimento interessante mesmo que atrasado da ligaao e encontrado no relat6rio do PentagonoDiscriminate Deterrence Washington Department of Defense 1989 148 Fred Halliday plos hist6ricos nao pode fornecer urn substituto para a investigacao te6rica mas pode fornecer materiaprima para identificar inumeros problemas que afetam o trabalho te6rico No caso das revolucoes existem pelo menos quatro areas nas quais tais generalizacoes podem ser examinadas a causa ate que ponto os fatores intemacionais pro duzem revolucoes a polftica externa como os Estados revoluciona rios conduzem as suas relacoes externas as respostas as reacoes dos outros Estados a formacao como em urn periodo de tempo mais Iongo os fatores internacionais e o sistema como urn todo constran gem o desenvolvimento interno p6srevolucionario dos Estados e determinam as suas evolucoes polfticas sociais e economicas Como ja observado as revolucoes ocorrem quando existem duas condicoes gerais a revolta dos dominados e a impossibilidade dos governantes continuarem governando Uma discussao mais in tuitiva das causas da revolucao aborda o primeiro destes dois fatos o estfmulo a revolta Os crfticos sao nipidos em identificar ou in ventar uma mao externa na subversao e na agitacao e em alguns casos na promocao das revolucoes Contudo como mostraram os trabalhos de Skocpol Goldstone e outros da terceira onda e quase sempre atraves da outra dimen sao a do enfraquecimento dos Estados que OS fatores internacionais promovem a revolucao Os fatores internacionais desempenham urn papel multiplo em trazer a tona revolucoes mas e fundamentalmente pelo enfraquecimento dos Estados que eles contribuem para a mudan ca atraves da derrota ou da crise na guerra atraves das mudancas economicas internacionais que destroem as ordens tradicionais atra ves de confrontos entre os Estados e as sociedades provocados pela mobilizacao de recursos para a competicao intemacional atraves da remocao das garantias do poder hegemonico Em outras palavras enquanto os Estados podem usar a dimensao intemacional e os recur sos que ela fornece para consolidar a sua posicao em casa eles tam bern podemse descobrir enfraquecidos internamente como urn resul tado de suas atividades e aliancas internacionais Isto se aplica a mui tos casos anteriores pelo menos a Franca a Russia e a China e igual mente a 1989 Como discutido nos Capftulos 8 e 9 o colapso dos regimes comunistas europeus orientais em 1989 foi no contexto ime diato urn resultado da remocao da garantia sovietica de intervir mili tarmente em seu favor e no Iongo prazo uma conseqliencia da perda de legitimidade destes regimes nas esferas economica e polftica 0 outro tipo de causa o encorajamento dos revolucionarios evi dentemente e importante armas sustentaao polftica e acima de tudo o encorajamento ideol6gico e a forca do exemplo Entretanto sem o concomitante enfraquecimento dos Estados tal estimulo extemo tern efeitos limitados testemunhese o exemplo da Africa do Sui no qual Repensando as rela6es intemacionais 149 apesar de imensa pressao de baixo o Estado reteve seu poder por muitos anos e somente mudou no final da decada de 1980 quando as pressoes economicas externas especialmente o boicote de inves timentos dos Estados Vnidos ameaaram o regime A polftica externa dos Estados revolucionarios do perfodo pre 1989 e uma area ampla e extremamente pouco estudada Parte da literatura enfatiza a questao da nova diplomacia isto e 0 papel da ideologia revolucionaria e da aao naoconvencional na polftica ex terna dos Estados revolucionarios 21 Contudo este desafio ideol6 gico as normas de comportamento internacional e no maximo uma questao secundaria a ideologia e a interferencia tambem desempe nham urn papel nas polfticas externas dos poderes do status quo e os Estados revolucionarios tern polfticas externas distintas principal mente por causa dos diferentes objetivos que eles perseguem nao tanto pelos metodos que utilizam Este ultimo ponto e significative porque na maior parte da litera tura na realista e na liberal existe uma suposiao de que os objetivos dos Estados revolucionarios sao semelhantes aos dos outros Estados Os liberais por sua parte argumentam que caso os Estados revolucionarios fossem melhor tratados eles nao buscariam exportar a revoluao para alterar as rela6es dentro dos outros Estados 0 registro hist6rico e mui to diferente todos os Estados revolucionarios quase sem nenhuma ex ceao buscaram promover a revoluao em outros Estados 0 desafio que eles colocam para o sistema internacional nao reside em uma nova for ma de diplomacia ou de relacionamento interestatal mas no conteudo de sua polftica externa que tern como prioridade percebida quase que como urn direito ou uma obrigaao a transformaad das rela6es soci ais e polfticas dos outros Estados Isto e subestimado pela maior parte da literatura realista e trans nacional assim como por quase todas as politicas concebidas para re solver as diferenas entre os EVA e as revoluoes do Terceiro Mundo na epoca do p6sguerra com relaao a China Cuba Ira ou Nicara gua Dado o compromisso internacionalista presente nas polfticas externas destes Estados nenhuma soluao foi possivel estas polfti cas refletiram os componentes ideol6gicos das revolu6es e as pres soes domesticas para a realizaao de tal polftica externa22 Ao Iongo 21Por exemplo Andrew Scott The Revolution in Statecraft Informal Penetration New York Random Housem 1965 DerDerian On Diplomacy tern uma discus sao semelhante 22Um exemplo de tal argumento com relacao a Revolucao Iraniana e encontrado nas conclusoes a The Eagle and the Lion New Haven and London Yale University Press 1988 de James Bill Bill propoe 12 maneiras pelas quais a polftica americana em situacoes revolucionanas pode ser melhorada para reduzir o conflito com o Estado revolucionano Estes sao em sua maioria conselhos para aperfeicoamento 15 0 Fred Halliday do tempo tais compromissos foram sendo moderados mas continu aram se repetindo nas revoluoes modernas comeando pelos giron dinos passando pelo Comintern Lin Piao e Che Guevara ate chegar aos apelos panisHimicos de Khomeini e ao seu patrocinio do sudur i inqilab ou a exportaao da revoluao na verdade neste assim como em muitos outros aspectos e surpreendente como a Revoluao Iraniana apesar de sua forma religiosa particular foi fiel aos parame tres e convencional 23 De uma perspectiva hist6rica a discussao sobre quem provoca quem a revoluao internacional a contrarevoluao ou viceversa esta fora de Iugar os dois processes podem comear de forma auto noma por raz6es internas e sistemicas e alimentandose urn do ou tro levam a confrontaao Se o internacionalismo revolucionario e urn resultado quase que universal das revoluoes isso tambem vale para seu oposto o intemacionalismo contrarevolucionario a tentativa dos poderes do status quo de impedir a disseminaao das revoluoes de promover a sua reforma e onde possfvel a sua derrubada Esta interaao coloca mais duas outras questoes que talvez sao mais recompensadoras e que nos levam ao nucleo do sistema internaci onal Vma e a questao da tendencia do sistema internacional a homoge neizaao isto e em direao a uma organizaao similar das relas6es en tre os Estados e de seus sistemas politicos e sociais internos levantada por Richard Rosecrance e RaymondAron e depois desenvolvida por Stan ley Hoffmann e discutida nos Capftulos 4 e 7 24 Os internaciona lismos revolucionario e contrarevolucionario derivam desta tenden chi a homogeneizasao que vai alem das consideraoes especificas de segurana internacional sobre a ameaa militar de urn Estado a outro a questao nao era se o regime sandinista na Nicaragua nos anos 1980 desafiava ou poderia desafiar os EVA militarmente A segunda questao para qual a hist6ria destes dois internacionalis mos aponta a despeito das suposioes de intervenao e ada durabilida de do sistema de Estados Todos os Estados revolucionarios tentaram promover a revoluao no exterior exportala no sentido direto do termo nenhum jamais teve sucesso 0 fracasso de Khomeini em promover a revoluao no Iraque no infcio dos anos 1980 ou dos 23Fred Halliday Iranian foreign policy since 1979 Internationalism and nationalism in the Islamic Revolution em Juan Colee Nikki Keddie eds Shiism and Social Protest New Haven and London Yale University Press 1986 24Raymond Aron Peace and War London Weidenfeld Nicolson 1966 pp 37381 Como discutido no Capitulo 4 este pressuposto de homogeneidade nos arranjos politi cos e sociais intemos e diferente do encontrado no conceito de sociedade intemacional da escola inglesa a Ultima se preocupa somente com a homogeneidade dos valores e das praticas intemacionais Repensando as relac6es intemacionais 151 sandinistas em garantir uma vit6ria da guerrilha em El Salvador no mesmo perfodo sao urn exemplo perfeito poucas imagens sao mais incorretas nas relaoes intemacionais do que as da teoria do domi no A criaao de regimes companiveis em Estados vizinhos ocorre somente por meio de guerras interestatais que no contexto de guer ras mais amplas entao permitem a implantaao de regimes hom6lo gos as republiques soeurs dos anos 1790 as democracias do povo no final dos anos 1940 Na mesma linha a contrarevoluao dirigi da pelo Estado quase sempre falha exceto em casos raros como os das guerras interestatais Frana 1815 Hungria 1919 ou de uma severa divisao intema dentro do proprio regime revoluciomirio Fin landia 1918 Ira 1953 Republica Dominicana 1965 Granada 1983 Apesar de todo o bombardeio dos periodos de conflito revo luciomirio o sistema de Estados tende a manterse no curto prazo Contudo este curto prazo e significativo pois a maior parte da discussao realista sobre a socializaao dos Estados aborda o periodo imediatamente p6srevoluciomirio e a aparente domestica ao dos Estados 0 fato de q11e eles introduzem treguas abandonam a ret6rica intemacionalista e participam da diplomacia nao signifi ca entretanto que os Estados revolucionarios tenham sido sociali zados Uma nipida olhada na hist6ria de Iongo prazo dos Estados revoluciomirios mostra que enquanto as suas ordens internas p6s revoluciomirias permanecerem intactas eles continuam a represen tar urn desafio ao sistema dos outros Estados A URSS promoveu efetivamente a revoluao no exterior nos anos 1940 no encerramen to da Segunda Guerra Mundial e na decada de 1970 quando os EUA enfrentavam uma onda de revoluoes no Terceiro Mundo e nao nos anos 1920 quando ainda estava enfraquecida A onda revoluciona ria cubana fracassou na America Latina nos anos 1960 mas em 1975 foras cubanas intervieram para consolidar a ala de esquerda do MLPA Movimento para a Libertaao Popular de Angola em Ango la ein 1977 elas ajudaram a expulsar a invasao somali que ameaa va com certa ajuda extema a Revoluao Etfope e em 1979 os san dinistas em larga medida armados e encorajados por Cuba chega ram ao poder na Nicaragua Em Janeiro de 1989 a maioria dos ex perts estava debatendo se a Revoluao Iraniana fragilizada pela guerra e pela crise economica agora faria a paz com o ocidente Urn velho homem pensou diferente sucedeu a crise de Rushdie Esta perspectiva de Iongo prazo sugere que a socializaao da revoluao e menos facil do que a ortodoxia realista nos faz acreditar e tambem sugere que este desafio recorrente mesmo que normalmente frustrado das revoluoes 6 urn produto tanto de fatores intemos como de extemos Isto leva a seguinte conclusao ate que ocorra uma re imposiao da homogeneidade isto e ate que as ordens intemas dos Estados revolucionarios divergentes voltem para as ordens convenci 152 Fred Halliday onais dos outros poderes os poderes revolucionarios e os naorevo lucionarios permanecerao em conflito Nao poderia existir exemplo mais 6bvio disto que o declinio da URSS a partir de 1985 uma nova e mais conciliat6ria politica extema evoluiu pari passu com uma re forma da polftica e da economia sovieticas A expectativa era que com base em urn maior entendimento mutuo poderseia chegar a detente e a urn arranjo das disputas intemacionais Todavia na analise final esta reconciliaao na esfera intemacional tomouse possfvel somente quando o sistema sociopolitico dentro da propria URSS mudou Nao foi a acomodaao pelos tratados ou pela diplomacia que encerrou a Guerra Fria mas o fim da heterogeneidade dos dois sistemas A interaao entre as revolu6es e o sistema intemacional portan to levanta quest6es nao somente para o estudo da revoluao mas para o das pr6prias RI Urn amplo repensamento te6rico pode ser produzido a partir da descoberta destas implica6es e da identificaao de cinco areas nas quais as revoluoes ocupam urn Iugar central dentro das RI AS LIGAOES DOMEsTICAS E AS INTERNACIONAIS As revoluoes nos foram a questionar uma das principais afir ma6es realistas a de que as estruturas intemasdomesticas podem ser exclufdas do estudo das relaoes intemacionais Dentro das Rl os maiores interpretes dos efeitos intemacionais das revoluoes como Rosecrance e Rosenau reconheceram isto defendendo a inclusao de fatores domesticos no estudo da formulaao de polftica extema e de seus efeitos nao e urn acidente que Waltz em sua reafirmaao do realismo em 1979 argumentaria tao pesadamente contra isto A ua divisao de teorias em sistemica e reducionista embora possa ser muito elegante nao se sustenta o mais breve exame de como as revoluoes contribufram para o conflito intemacional para a guerra em seu sentido estrito mostra como a cadeia interativa sistema in temacionallsistema domesticosistema intemacional 6 uma caracte ristica central de como as guerras aconteceram 25 As guerras de 1760 contribufram para a Revoluao Francesa que levou as Guerras Napoleonicas A pressao sobre o Imperio Oto mano levou a Revoluao dos Jovens Turcos de 1908 que precipi tou as Guerras dos Balcas e daf estimulou a Primeira Guerra Mundi al A Primeira Guerra Mundial levou a Revoluao Bolchevique que determinou o papel da Russia na Segunda Guerra Mundial e alem 250 conceito de Rosenau de ligaao soldada captura bern esta interrelaao Sobre a recusa de Waltz em aceitar isto como uma parte legftima da teoria das Rl ver nota 2 Repensando as rela6es intemacionais 153 o conflito interestatal e mais amplamente o conflito intersodetal levou ao colapso do comunismo no final dos anos 1980 Enfocan do somente o sistemico o modelo de Waltz paradoxalmente mi nimiza a forya do internacional Depois da competiyao interestatal e do seu impacto dentro da sociedade ocorrem mudanyas que entao levam a mais conflito interestatal Como discutido em maiores deta lhes no Capitulo 4 esta e a interayao formativa que tanto moldou a hist6ria intemacional 0 Capitulo 3 ja esboyou uma discussao sobre as diferentes impli cay6es do conceito de Estado para as relac6es intemacionais aqui e possivel somente resumilas para o estudo da revolucao As revolucoes se referem aos Estados todavia as RI operam com urn conceito proprio e cada vez mais problematico de Estado Tanto quanto outros desenvol vimentos nas RI e nas ciencias sociais as revoluy6es obrigam a introdu yao de urn novo conceito de Estado alem da categoria polfticolegal nor malmente usada nas RI uma categoria sociol6gica que o perceba como uma entidade administrativacoercitiva 0 conceito de Estado convencionalmente usado mesmo que rara mente definido nas RI impede precisamente uma analise dos proces ses que tornam as revolucoes internacionais os efeitos da competiyao interestatal nas relacoes Estadosociedade o enfraquecimento das liga y6es Estadosociedade pelo impacto das revolucoes em outros Es tados e a determinacao da politica extema revoluciom1ria pelos con flitos Estadosociedade de periodos p6srevolucionarios 0 segundo conceito de Estado e mais restrito e nos permite ver sua personalidade de Janus como uma entidade de duas faces que olha para dentro em direcao a sociedade que busca dominar e para fora em dire yliO aos outros Estados eou sociedades com as quais interage com o ob jetivo de fortalecer a sua propria posicao intema Com este conceito de Estado de duas faces tambem tornase possivel reexaminar uma carac terfstica do sistema internacional que a teoria convencional considera como dada e para a qual fornece respostas tautol6gicas ou axiomaticas por que os Estados competem Especificamente podese perguntar por que como os pr6prios realistas freqiientemente percebem a competicao entre OS Estados ideologicamente antagonicos heterogeneos e mais duradoura e abrangente do que aquela entre os Estados de orientaclio semelhante As respostas convencionais em termos de maximizaclio de poder na arena intemacional deixam de fora os determinantes domesti cos de tais conflitos intersistemicos 0 fa tor dornestico na atividade interestatallevanos a questlio ain da nao respondida colocada por Rosecrance Aron e Hoffmann e discu tida em maior extensao no Capitulo 4 ada homogeneidade e a da hete rogeneidade Em urn certo nivel poderia parecer excessivo identificar uma tendencia a homogeneidade das ordens internas dentro do sis tema intemacional Afinal Estados com diferentes ordens podem co 154 Fred Halliday mercializar e trocar embaixadores Se eles respeitam a nliointerfe rencia e concordam com a diversidade do sistema interno isto e se coexistem pacificamente entao a heterogeneidade nlio deveria ser a causa do conflito Kim por exemplo com base em seu estudo da Revoluylio Francesa ve isto como uma solucao viavel 26 Alem disso urn elemento de heterogeneidade pode ser percebido como benefice para os Estados ja que fomece urn outro urn estran geiro e urn objeto ameacador no mundo extemo a partir do qual os Esta dos podem mobilizar apoio social e polftico intemo Estas nao sao consi deray6es imagimirias existem muitos casos nos quais a tolerancia ou o fortalecimento atraves da diversidade funcionaram Entretanto a eviden cia hist6rica indica que o equihbrio esta em outra direcao isto e a hetero geneidade promove o conflito Em outras palavras existe uma suposi yao de homogeneidade dentro do sistema Isto e obviamente real em urn sentido negativo se os Estados slio organizados em diferentes bases entlio provavelmente eles se sentem mais ameacados uns pelos outros 0 mais importante impacto intemacional e internacionaiista das revoluy6es reside nao nas acoes deliberadas dos Estados mas na forca do exemplo a Revoluclio Francesa proclamou os direitos do homem confiscou as terras dos aristocratas e decapitou o rei e a rainha A Revolucao Bolchevique derrubou a monarquia naciona lizou a propriedade e proclamou urn Estado da classe trabalhadora 0 impacto do Ira tern sido exemplar e ideol6gico muito alem do alcance identificavel da Republica Islamica Mesmo quando os Estados nao buscam promover o seu mode lo como a maioria o faz a caridade maligna denunciada por Burke o conhecimento do que fizeram ou do que se acredita que tenham feito age como urn catalisador ele perturba as ordens estabeleci das 0 colapso serial dos regimes comunistas na Europa oriental em 1989 foi uma instancia extraordinaria de tal efeito de demonstraclio Uma vez que se tornou evidente em junho daquele ano que urn governo naocomunista seria capaz de chegar ao poder na Polonia o destino dos outros regimes estava selado 0 problema da homogeneidade vai entretanto alem desta questao de exemplos alternatives no que obscurece algo que talvez seja uma questao mais fundamental o papel positivo da homogeneidade fortale cendo os Estados is toe fortalecendo a interaclio normal e estavel entre os Estados Os Estados nlio sao unidades isoladas eles existem em urn contexto internacional e suas praticas constituicoes ordens sociais e economicas retiram sua forca do fato de que outros Estados com portamse como eles Este tambem nao e urn desenvolvimento re 26Kim Kyongwon Revolution and International System New York New York University Press 1970 Repensando as relacoes intemacionais 155 cente como a literatura sobre a interdependencia facilmente de duz 0 capitalismo e o Estado moderno nasceram em urn contexte internacional nio o caminho inverse lsto aponta para a ideia de que a dimensio intemacional e cen tral a explicaao da instabilidade e da estabilidade das ordens polfti cas e sociais dos Estados respectivamente em situa6es de heteroge neidade e de homogeneidade A maior parte da literatura sociol6gica sobre isto subestima a dimensio intemacional seja no debate durkhei miano sobre a cultura comum e seu papel na coesio social ou no de bate marxista sobre a ideologia dominante existe urn reconhecimen to inadequado de como a fora do exemplo intemacional atraves da similaridade e do fortalecimento serve para consolidar ordens sociais especlficas27 Contudo 0 fundamento mais importante de qualquer ideologia a reivindicaio de que os componentes de uma dada or dem social e polftica sao etemos naturais e imutaveis depende de tal fortalecimento para a sua confirmaio Uma vez que se toma eviden te que podem existir diferentes ordens em outros Estados que po dem existir republicas ou paises nos quais as mulheres votam ou onde as casas podem ser adequadamente separadas entio a naturalida de de qualquer ordem dada entra em colapso Em outras palavras a chave para o entendimento do desafio ide ol6gico da heterogeneidade reside na identificaio do papel ideol6gi co preexistente da homogeneidade e de seu fortalecimento Pelo me nos isto serve para ressaltar a importancia do intemacional na anali se de qualquer ordem social ou politica o intemacional nio somente se toma relevante quando as coisas desmoronam quando existe uma ameaya polftica de fora uma invasio urn poder economico rival mas e igualmente importante na constituiyio e na reprodu9io de Estados estaveis aparentemente autosustentados e autonomos 0 intemacio nal como a saude importa quando as coisas dao certo tanto quanto quando elas dio errado Como os soci6logos hist6ricos nos lembra ram o intemacional criou o Estado e nao viceversa28 27Sobre os poderes contnirios das teses da ideologia dominante e da cultura comum ver Nicholas Abercrombie Stephen Hille Brian Turner The Dominant Ideology Thesis London Unwin Hyman 1980 Estes escritores nao discutem como os fatores intema cionais ideol6gicos e materiais podem contribuir para a formacao o fortalecimento e o enfraquecimento de ideologias especfficas dominantes ou subordinadas dentro de qual quer sociedade mas nao e dificil ver como o seu argumento pode ser estendido para mostrar como estes fatores externos silo importantes e como podem agir sob uma soci edade especffica como confirmadores e desafiadores A forca do exemplo sozinha de sempenha urn papel importante Somente devese mapear a disseminacao global de urn f8nomeno como o sufnigio universal ou o respeito pelos direitos humanos ou de ten d8ncias religiosas sejam estas a reforma ou as sociedades islfunicas contemporfuleas para ver como as forcas extemas podem moldar cs sistemas ideol6gicos internos 28ContribuicCies recentes ao campo incluemJohn Hall Power and Liberties London Penguin 1986 e Michael Mann States War and Capitalism Oxford Basil Blackwell 1988 156 Fred Halliday AS REVOLUOES E A GUERRA Como indicado na discussao sobre a ligayio domesticain temacional a rela9ao das revoluyoes com as guerras dificilmente precisa ser destacada no sentido de que as guerras causam revolu y6es e viceversa Freqlientemente tern sido percebido como as guer ras minando OS Estados levam as revoluoes mas tambem e im portante notar como as revoluyoes levaram a guerras 1789 levou as Guerras Napoleonicas e a eclosao da Primeira Guerra Mundial convencionalmente entendida como urn resultado do colapso do equilibria de poder foi precedida por uma enchente de revoluyoes no mundo semiperiferico da China ao Mexico e com conseqlien cias mais diretas para o sistema interestatal europeu na Turquia Esta conexao esteve vivamente presente nos conflitos do inicio dos anos 1980 no Camboja Afeganistao Ira Angola e Nicaragua Somente o registro hist6rico sugere que qualquer estudo sobre as causas da guerra e dos meios de prevela ou prevenila dependem da identificayao do co meyo e do impacto das revolu6es Todavia fazer isso envolve recuperar uma dificil mas recorrente caracteristica do debate sobre as relay6es in temacionais qual seja a relayao de seguranya entre os Estados a segu rana vertical e a segurana dentro de Estados a seguranya horizon tal A maior parte da literatura e a Carta da ONU sup6em que e possivel discutir a seguranya vertical sem considerar a segunda o que acontece dentro dos Estados A razao para evitala e evidente com a proximidade da relaao podem surgir conclus6es polfticas e morais indesejaveis e os que se dedicam a prevenir as guerras e os conflitos entre os Estados de veriam tamb6m passar a prevenir as mudanas radicais em seu interior A seguranya en tao requer estabilidade e contrarevoluao Aqueles que estabelecem uma ligayio pr6xima entre estes dois tipos de seguranya tendem a set contrarevolucionarios consisten tes e radicais ou a defender urn processo revolucionario mundial permanente justificandoo segundo a ideia de que o conflito entre os Estados revolucionarios e contrarevolucionarios e inevitavel e que portanto nao pode haver seguranya para os Estados revoluci onarios enquanto os seus oponentes continuarem existindo Dentre os que fizeram a primeira conexao Mettemich e Kissinger em seu A World Restored foram talvez os mais proeminentes e mais lucidos mas a Doutrina Brejnev insistindo na soberania limitada dos pa ises comunistas expressava uma perspectiva similar Lenin Stalin e Mao com sua teoria da inevitabilidade da guerra entre o socialismo e o capitalismo representaram a segunda conclusio Mesmo antes das armas nucleares entretanto era evidente que a despeito da pr6xima ligayao entre as duas dimensoes de seguranya a sua combinaio nao era inevitavel 0 consenso tern sido evitar o Repensando as relacoes intemacionais 157 problema e negar que as revolucoes levam a guerra o resultado foi que a comunidade intemacional estava despreparada para a eclosao das guerras que se seguiriam as revolucoes do Terceiro Mundo nos anos 1970 Alem de uma consciencia mais realista e historicamente informada de como o conflito interestatal pode seguirse a revolucao social esta ligacao recorrente tambem sugere que deve ser dada mai or atencao as formas de flexibilizar 0 sistema intemacional para que OS desafios a seguransa dentro dos Estados nao levem a guerra inte restatal 0 maier erro seria manter a ideia de que o conflito na esfera intemacional pode ser isolado do conflito interne aos Estados Dentro do contexte geral da teoria das RI estas quatro ques toes apontam para uma quinta presente na maneira pela qual os principais paradigmas das RI tratam a questao das dimensoes inter nacionais da revolucao o proprio caniter do sistema intemacional Para o conceito de revolucao assim como para o de sistema inter nacional cada urn dos paradigmas apresenta suposicoes que dife rem significativamente entre si Para OS realistas 0 sistema e constitufdo por Estados interagin do Para os pluralistas e behavioristas os Estados permanecem im portantes mas o sistema permite outras interacoes que nao passam pelos Estados categorizadas como as ligasoes a interdependencia ou os processes transnacionais Para OS materialistas historicos 0 sistema intemacional e consti tufdo por urn sistema socioeconomico global o capitalista sobrepos to no qual as estruturas polfticas existem desempenhando varies pa peis importantes mas no final das contas secundarios derivados ou superestruturais Durante a Guerra Fria esta visao ampla englobava as duas abordagens para a escola ortodoxa dos materialistas histori cos os pafses comunistas tinham se separado deste sistema para ou tros como Wallerstein nenhuma fuga parcial havia ocorrido Nos dois cases existia urn sistema intemacional nao por causa da interacao entre as unidades separadas como no caso dos realistas e dos transnacio nalistas mas por causa da unidade de urn nfvel determinante o soci oeconomico Para os estruturalistas a formacao e o desenvolvimento de Estados depois Estadosnacao ocorrem dentro de urn sistema ja estabelecido A polftica intemacional nao e a polftica entre OS Esta dos mas a guerra civil dentro de urn sistema social intemacional As implicacoes das revolucoes para estes tres modelos de sis tema sao consideniveis e acompanham as conclusoes dos Capftu los 24 Por urn lado os teoricos realistas e transnacionais subesti mam o grau em que os Estados e as sociedades distintas foram for madas e continuam a existir dentro de urn contexte intemacional definido por caracterfsticas sociais economicas e ideologicas co muns Em outras palavras o seu modele de sistema toma diffcil discemir porque as revolucoes tern efeitos intemacionais 15 8 Fred Halliday 0 modelo marxista convencional sofre do problema contnirio o do exagero com base nos fatores socioeconomicos na unidade do sistema intemacional e na subestimacao de como os Estados se jam eles artificiais arbitrarios e interativos e as suas ideologias na cionalistas agem para fragmentar e amortecer os impactos das revo lucoes em Estados especfficos sob o sistema intemacional como urn todo A discussao leva portanto a urn exame de como o carater in temacional geral da economia da sociedade e da cultura capitalista interagem com a divisao do mundo em Estados e com a resultante fragmentacao de territories populacoes capacidades coercitivas e ideologias particularistas A escolha se resume a uma teoria que ve as relacoes intemacionais como no fim dominadas por Estados e uma altemativa que olha para este sistema como urn de conflito so cial em escala mundial mediado e fragmentado pelos Estados Pode ser discutido depois do colapso e do fim do comunismo e depois da diminuicao da perspectiva revolucionaria herdada da Revo lucao Francesa que a questao da revolucffo deixara de ser central para o curse das relacoes intemacionais Mesmo se este fosse o caso isto nao eliminaria a necessidade de olhar novamente para a historia do sis tema intemacional nos ultimos 500 anos e de examinar as possfveis con seqliencias teoricas e historicas das revolucoes Entretanto existem ra z5es para sugerir que a despeito do que o futuro imediato possa trazer uma certeza de Iongo prazo com relacao a esta questao e imprudente29 Inicialmente se aceitamos que as revolucoes sao improvaveis ou impossfveis em Estados democraticos estamos somente falando de algo em tomo de tres duzias de Estados entre os quase 200 no mundo como o Capitulo 9 sugere pode existir urn intervale muito grande entre as conseqliencias ideologicas de 1989 o fim da his t6ria e a realizacao do potencial associado a disseminacao da de mocracia atraves do globe Aiem disso se considerarmos seriamen te as implicacoes do argumento de Goldstone de que uma crise do poder estatal combinada com o crescimento demografico provavel mente leva a revolucao e combinalo com projecoes de crescimen to da populacao global podemos entao estar definindo o padrao predominante de crise para 0 proximo seculo 30 29Para amilises materialistas hist6ricas das dimensoes intemacionais da revoluao ver Giovanni Arrighi Terence Hopkins e Immanuel Wallerstein Anti Systemic Movements London verso 1989 Michael L6wi The Politics of Combined and Uneven Development The Theory of Permanent Revolution London Verso 1981 Jan Pieterse Empire and Emancipation Power and Liberation on a World Scale London Pluto 1990 Franz Schurmann The Logic of World Power An Inquiry into the Origins Currents and Contradicitions of World Politics New York Pantheon 1974 30Este e um dos principais argumentos de Paul Kennedy Preparing for the TwentyFirst Century London Harper Collins 1993 Repensando as rela6es intemacionais 159 Os soci6ogos hist6ricos os economistas politicos intemacio nats os anhstas da revoluao enfrentam todos a questao do que cmstlm o stsema a questao central nas RI 0 mfnimo que se pode dtzer e que ate agora nao se chegou a nenhuma resposta adequada com sutentao hist6rca e te6rica 0 estudo das revoluoes com urn fenomeno Itemac10nal alem de sua validade intrfnseca pode frnecer u me10 de abordar a questao e alguns poucos outros Alem tsso e mtto cdo para sugerir 9ue este e somente urn problema de mteresse htstotco ou retrospecttvo levara urn seculo ou dois para que est questao se resolva Caso acontea das revoluoes nao se rem mats relvantes parao estudo das relaoes internacionais terf amos que revtsar o resumo hist6rico de Wight urn tero ao inves da metae da hist6ria do sistema intemacional teria entao que ser ca raccnzada como dominda pelo conflito entre os Estados revoluci nanos e ontrarevoluciOnarios Mesmo assim isto ainda investi na a questao de uma certa importancia 160 Fred Halliday Capitulo 6 AUSENTEDASRELAOES INTERNACIONAIS AS MULHERES E A ARENA INTERNACIONAL 0 SILENCIO DAS RELAQOES INTERNACIONAIS Nos Ultimos 25 anos as quest6es de genero e particularmente aque las referentes ao Iugar e ao papel das mulheres tern adquirido uma im portancia muito maior dentro das ciencias sociais como urn todo Em resposta a ascensao dos movimentos de mulheres em algumas socieda des ocidentais e a produao de urn corpo crescente de literatura analfti ca com relaao a posiao da mulher tern havido urn desenvolvimento significativo na agenda e nos conceitos estudados em varias disciplinas academicas Se isto tern sido especialmente percebido na hist6ria e na sociologia tambem tern sido evidente na ciencia polftica na economia e na antropologia e vern adquirindo maior importancia na literatura de humanidades mais ideologicamente constitufda 1 Ate o final dos anos 1980 existia entretanto uma exceao marcante nesta crescente cons cientizaao de quest6es de genero as relaoes internacionais Uma pesquisa em artigos publicados e em livros resenhados pe las principais revistas inglesas e americanas de rela6es intemacionais Dentre muitas outras contribuiy6es a campos individuais das ciencias sociais ver para estudos de desenvolvimento Ester Boserup Women and Ecomic Development London Allen Unwin 1970 talvez a primeira grande irrupyao do feminismo nas ciencias sociais e Kate Young Carol Wolkowitz e Rosalyn McCullaugh eds Of Marriage and the Market London CSE 1981 para teoria poHtica Anne Philips Engendering Democracy Cambridge Polity 1991 e Carole Pateman The Sexual Contract Cambridge Polity 1988 para antroplogia Henrietta Moore Feminism and Anthropology Cambridge Polity 1988 para hist6ria Sheila Rowbotham ver nota 3 Repensando as rela6es intemacionais 161 durante as decadas de 1970 e 1980 revelani pouco ou nada de ques t6es de genero e poucas que reflitam uma percepao da expansao desse interesse em areas relacionadas das ciencias sociais 2 Examinandose 0 conteudo dos cursos introdut6riospadrao nas relacoes intemacio nais dos principais livros de estudo das prateleiras de livrarias aca demicas relevantes uma ausencia similar foi evidente N a enxurrada de livros publicados sobre a estrategia nuclear o terrorismo a dfvida do Terceiro Mundo e as outras preocupacoes dos anos 1980 parece nao haver nada nem urn s6 livro dedicado a esta questao Tomando emprestada a imagem popularizada no estudo sobre as mulheres e a hist6ria de Sheila Rowbotham as mulheres foram escondidas das re la6es intemacionais 3 E como se as questoes levantadas pelo femi nismo fossem simplesmente consideradas nao relevantes para a esfe ra intemacional e nao precisassem formar parte da agenda academica do estudo das relacoes intemacionais Superar a invisibilidade das mulheres requer analise de por que ocorre este ocultamento e das varias razoes que se combinam para for talecelo Uma explicacao e a inercia institucional dentro da disciplina das Rl A medida que existe urn silencio virtualmente completo sobre a questao aqueles preocupados com ela sao desencorajados de trabalhar ou escolhem fazelo em outras disciplinas academicas mais receptivas ou em contextos extraacademicos Em seu veneravel papel de prote toras as revistas indexadas freqlientemente desempenham o equiva lente academico do seculo XX da Inquisicao excluindo tal material Urn segundo fator e a separacao seletiva das relacoes intemacio nais dos desenvolvimentos em outras ciencias sociais As relacoes in temacionais sao em alguns aspectos importadoras entusiasmadas podese sugerir compradoras de conceitos de outras disciplinas En tretanto existem varias areas de teoria de ciencia social que parecem nao ser reconhecidas dentro das relac6es intemacionais como discuti do nos Capftulos 3 e 4 os conceitos sociol6gicos exceto quando em prestados de uma maneira instrumental como ode sociedade sao quase totalmente ignorados a economia polftica intemacional enquanto sutil em prover as RI de alguns fatores de producao como dinheiro e tecnologia quase nao se manifesta a respeito de outro fator das rela 6es intemacionais o trabalho 0 crescimento dos estudos sobre mu lheres foi igualmente por muito tempo ignorado no campo das RI 2Dentre as raras exceoes de discus sao relevante da literatura de relacoes internacionais estao Georgina Ashworth The UN Womens Conference and international linkages in the womens movement em Peter Willets ed Pressure Groups in the Global System London Farnces Pinterm 1982 e Ellen Bonepath ed Women Power and Polity New York and Oxford Pergamon 1982 parte 4 Sheila Rowbotham Hidden from History Three Hundred Years ofWomen s Oppression and the Fight Against It London Pluto 1973 162 Fred Halliday Aiem disso existe a definicao convencional do que constitui o objeto de estudo das relaoes intemacionais a high politics as ques toes de polftica estatal especialmente aquelas referentes a seguran ca e a administracao macroeconomica As questoes de genera tern urn Iugar pouco aparente nesta hierarquia Mesmo o alargamento das relacoes intemacionais para abranger mais questoes transnacionais distintas da seguranca e nao necessariamente mediadas alraves dos Estados pouco tern feito para corrigir esta situacao A literatura so bre o transnacionalismo e a sociedade mundial mantem o silencio sobre as questoes de genero tanto quanto ada high politics A reserva academica e composta pelo fato de que o terreno da pratica intemacional em ministerios exteriores ministerios de defesa e 6rgaos polfticos relacionados e ele proprio urn domfnio especial mas culino distante inclusive das normas prevalecentes em outros cor pos de formulaaO de polfticas como indicado pelo numero fnfimo de mulheres em ministerios exteriores ou de embaixadoras pelo mun do Na ideologia convencional as mulheres nao sao preparadas para tais responsabilidades e nao se pode contar com elas em ques toes de seguranca e crise Nada poderia estar parece mais distante da esfera tradicional das preocupacoes das mulheres do que a segurana intemacional e as outras questoes globais4 Existe uma razao mais fundamental para a cegueira de genera na maior parte das rela6es intemacionais uma suposiao de separaao entre as duas esferas a de genera e a das relac6es intemacionais Aiem do mais esta suposicao e compartilhada pelas RI e pela maior parte da literatura feminista Por urn lado presumese no escrito academico que as relaoes intemacionais como tais sao pouco afetadas se o sao de alguma maneira pelas questoes relacionadas as mulheres Colocando isso em termos simplistas a suposicao e de que se pode estudar o curso das relaOeS entre OS Estadossem referenda as quest6es de genera Alem disso ao negligenciar a dimensao de genera as relaoes intemacionais implicitamente ap6iam a tese de que OS procesSOS intemacionais sao eles mesmos neutros em genero isto e que eles nao tern nenhum efeito sobre a posicao e o papel das mulheres na sociedade e sobre o posicionamen to relativo de mulheres e de homens De sua parte o feminismo preo cupado acima de tudo com o interpessoal o subjetivo o privado ana lisa as formas de dominaao a ideologia e a divisao do trabalho a partir da estrutura classica da sociologia e da psicologia ortodoxa a socieda de em separado a famflia ou individual Portanto ambas contribufram para fortalecer o abismo entre as RI e o feminismoJ 4Para a discussiio desta questiio ver Edward Crapo I ed Women and American Foreign Policy Westport CT Greenwood 1987 Na metade dos anos 1980 urn conselho de mulheres de polftica extema foi estabelecido por urn grupo de mulheres americanas incluindo Bella Abzug e Mim Kelber pedindo uma maior alocaiio de mass a crftica de mulheres em posioes senior de polftica extema e defesa Repensando as rela6es intemacionais 163 0 fato 6 que como em outras pniticas sociais os processos inter nacionais possuem efeitos de genero dos militares e economicos aos de formaao e difusao de imagens sobre as mulheres e de modismos feministasJA hist6ria da politica estatal sobre o que pode a primeira vista parecer ser a mais privada e individual questao de todas qual seja a reproduao humana esta repleta de casos nos quais os Estados bus caram influenciar a taxa de natalidade ate muito recentemente para aumentar o numero de nascimentos como parte da competiao inte restatal No seculo XIX varios pafses a GraBretanha e a Frana inclu fdas perceberam estes nascimentos no sentido biol6gico e social como uma parte central da nova ordem imperial e militarista nas palavras de urn dos eugenistas imperiais Caleb Saleeby A hist6ria das naoes 6 determinada nao no campo de batalha mas no berario e os batalhoes que dao a vit6ria final sao os batalh5es dos bebes A polftica do futuro sera domestica Ou em termos mais graficos Nao existe urn utero estatal nao existem seios estatais nao existe nenhum substituto real para a beleza da matemidade individual5 Na Frana eram concedidos pre mios estatais as mulheres que tinham dez crianas lsto estabeleceu uma ligaao entre a competiao interestatal e a taxa de natalidade uma ideologia e politica estatal de natalidade que misturava estere6tipos sobre as mulheres e os seus papeis re produtivo e socializador com concepoes de grandeza nacional e de dever patri6tico Ecos de ideias estatais similares podem ser encon trados em muitos Estados nacionalistas do seculo XX da Nicaragua dos sandinistas ao Iraque de Saddam Hussein 6 t linguagem da politica intemacional tambem sugere urn forte conteudo convencional masculino e freqlientemente homof6bico com sua enfase sobre a obstinaao e a competiao Se isto era explfcito na ret6rica imperial do fim do seculo XIX comeo do seculo XX com o culto social darwinista das naoes viris e seu direito de conquistar os mais fracos presumivelmente menos viris tern permanecido presente no discurso e no imaginario do conflito entre os grandes poderesJ 5Citado emAnna Davin Imperialism and motherhood History Workshop Journal n5 Spring 1978 p 29 6Sobre os sandinistas ver Maxine Molyneux The politics of abortion in Nicaragua Revolutionary pragmatismor feminism in the realm of necessity Feminist Review n29 spring 1988 p 123 Sobre Saddam Hussein ver Saddam Hussein awards medals to women says their role more important than mens BBC Summary of World Broadcasts parte 4 March 7 1992 ME1323N47 7Sem reivindicar que esta atitude era universal ou constitufa a verdade profunda da expan sao hegemonica na epoca do p6sguerra e vaIido relembrar a rendicao ficcional da rnissao americana como trazida pela consideracao de Norman Mailer da CIA na Guerra Fria Harlots Ghost London Abacus 1992 p7345 Rurninando sobre as visitas de seu colega Sherman aos bordeis de Montevideu o narrador especula Ele se via como urn born legionario do imperio americano possuindo as femeas nos pafses 164 Fred Halliday Na teoria e linguagem polftica classica as virtudes masculinas sao consideradas como as mais desejaveis nas rela5es intemacionais na verdade como a analise de Maquiavel mostrou o proprio termo virtu a qualidade do vir ou do masculino opoese a inconstancia de sua altemativa feminina a fortuna 8 Dentre muitas possfveis cita5es as prescrioes de Edmund Burke podem servir para ilustrar ainda mais o ponto9 Escrevendo em 1796 sobre a necessidade de confrontar a ameaa da Frana revoluciomiria Burke repreende os ingleses por suas crenas em sua pr6prias fraquezas e por aceitar o argumento que uma feminilidade frfvola tomouse o carater nacional Ao inves disso ele argumenta os ingleses superaram suas fraquezas Emergimos do golfo de desalento especulativo e fomos levados ao mais alto ponto do vigor pnitico Nunca o espirito masculine da Inglaterra se mostrou com mais energia nem o seu genio se levantou com maior orgu lhosa proeminencia sobre a Frana do que no periodo quando a trivoli dade e a feminilidade desta tinham sido consideradas como o seu caniter nacional pelo menos tacitamente pelas boas pessoas deste reino Dificilmente precisase ser urn p6smodemista para desconstruir as camadas do simbolismo de genero aqui No debate politico contemporaneo a linguagem polftica marcada pelo genero 6 freqliente 6 insultante ser chamada de uma Poliana uma chorona ou uma molenga As mulheres que vieram a ocupar posioes polfticas no topo tinham em sua maioria buscado assegurar a sua con traparte masculina e as opini5es publica masculina e feminina que poderiam ser tao fortes quanto os homens Golda Meir Margaret Tha tcher Jean Kirkpatrick todas se enquadram nisto 0 ditado Tudo vale no amor e na guerra sugeriria uma conexao entre estes dois domfnios hobbesianos Na verdade a analise da linguagem da estrategia militar e particularmente de sua variante nuclear revelou uma surpreendente pelos quais viajava Ou estava eu diferencas regionais a parte perto de descrever tambem a rnim mesmo Mesmo quando eu estava comprando uma bora de uma garota aquela noite e uma segunda mulher para uma segunda bora eu me sentia mais livre com aquelas estranhas do que jahavia me sentido em todos meus vinte e cinco anos talvez a raiz onde rninha ganancia estivesse guardada finalmente estivesse se derramando sobre o Seculo Americano e eu tambem estivesse Ia fora copulando pela bandeira A propria ganancia tinhase transfonnado em uma emocao mais nobre e senti o brilho do poder interior como se eu estivesse finalmente ligado a grande mecanicadas coisas sobre Maquiavel Hanna Fenickel Pitkin Fortune is a Woman Gender and Politics in the Thought of Niccolo Machiavelli Berkeley University of California Press 1984 Sobre teoria ocidental mais genericamente Susan Moeller Okin Women in Western Political Thought Princeton Princeton University Press 1979 Diana Coole Women in Political Theory Brighton Wheatsheaf 1988 9Letters on a Regicide Peace Letter 1 em The Works and Correspondence of Edmund Burke v5 p 257 Repensando as rela6es intemacionais 165 incidencia de linguagem com genera na analise dos armamentos e 1 1 10 de sua posstve co ocacao LA emergencia das questoes sobre as mulheres dentro das rela coes internacionais envolve urn desafio duplo para qualquer supos ta separacao dos dois domfnios e urn desafio para ambas as RI e o feminismo se a primeira deveria ter que reconhecer em que grau a disciplina esta sujeita a percepcao de genera 0 ultimo teria que su perar a sua negacao da relacao entre as relacoes de genera e os pro cesses intemacionais e formular a sua analise e sugestoes para apre sentar uma alternativa em termos menos abstratos ou ret6ricos Urn aspecto do desafio e revelar como as questoes de genera e valores poderiam desempenhar e desempenham urn papel nas rela coes internacionais o segundo e analisar as conseqtiencias especffi cas de genera dos processos intemacionais sejam estes militares eco nomicos polfticos ou ideol6gicos Esta ultima modificacao teria im plicacoes para o estudo das relacoes intemacionais como urn todo ja que reside sobre o argumento desenvolvido em maior extensao nos capftulos anteriores de que as relacoes intemacionais deveriam estu dar as conseqtiencias domesticas dos processos internacionais o im pacto resultante destas mudancas intemas sobre as relacoes intemaci onais e a esfera dos processos internacionais tout court UMA PREOCUPAcAo EMERGENTE QUATRO DIMENSOES Vinte anos depois da emergencia do feminismo dentro das ci encias sociais alguma percepcao dentro das relacoes internacionais da relevancia deste t6pico temse tornado evidente Pode set valio so identificar OS fatores que levaram a mudanca Tern ocorrido al guma interacao entre as relacoes intemacionais e as outras ciencias sociais sobre as questoes de genera de forma que as questoes e os conceitos levantados em disciplinas cognatas podem ser vistas como relevantes para o terreno internacional 0 Genero e a Teoria 0 crescimento de uma corrente feminista dentro da teoria polftica e social produziu analises com evidentes implicac5es para a teoria das 10 A classica e bastante engracada considerayao dis to e Carol Cohn Sex and death in the rational world of defense intellectuals Signs v12 n4 Summer 1987 0 voyeurismo sugerido pelos vfdeos do Pentagono de mfsseis de cuzeiro atingindo seus al vos na Guerra do Kuwait nao deve ter escapado aos telespectadores 166 Fred Halliday relacoes internacionais11 Estas incluem as crfticas do poder e de sua simbolizacao em termos de genera assim como discussoes das defmi coes especfficas de genera da seguranca dos direitos e a autcridad 9s direitos humanos por exemplo tomaramse uma questao mwto mats relevante nas relac5es intemacionais e a medida que adquiriram uma dimensao de genero sao diretamente relevantes para a analise do papel dos Estados e dos outros atores em promover ou negar os direitos para mulheres lsto ocorre na arena polftica mais ampla assim como em are as de maior disputa como o casamento e a lei de farm1ia a contracep cao e o aborto as polfticas para o emprego feminino e as respostas para o estupro e as outras formas de violencia contra a mulherJ As discuss5es envolvendo os problemas associados ao conceito de interesse nacional tern tornado mais evidente 0 seu carater freqtientemente partidario e especffico de grupo Enquanto muito da crftica ore o interes se nacional enfatiza as diferencas envolvendo grupos soctais mteresses burocraticos ou etnicos e grupos religiosos esta crftica evidentemnte po deria ser estendida sabre a questao de se as definicoos de interesse nacional SaO especfficas de genero e se beneficiam OS homens mais do que as IDU lheres em circunstancias particularesO mfnirno que pode ser dito e que polfticas diferentes sejam ela militares ou economicas podem ter efeitos variados sobre os homens e as mulheres e que qualquer suposico de neu tralidade de genero e discutfveD Se esta crftica das categorias das RI em termos das teorias feministas tern tambem irnplicacoos epistemol6gicas mais am plas como algumas feministas sugeriram que ela possa levar a formas al temativas de racionalidade conceitualizao e expressao e uma outra ques tao a qual retomarei mais tarde neste capitulo Os Processos Transnacionais segunda dimensao da interacao entre as mulheres e a esfra intemacional e em que medida as polfticas e OS proceSSOS mtemaciO nais Ionge de serem neutros de genera na pnhica desempenham urn importante papel na determinacao do Iugar das mulheres na socieda de e na estruturacao das relacoes economicas sociais e polfticas entre os sexosIsto e mais claro e com freqtiencia brutalmente evidente na Para umtrabalho geral sobre teoria polfticae genero verAnne Philips Engendering Democracy Cambridge Polity 19 e Carol Pateman The Sexual ContractCambridge Polity 1988 e Okin e Coole nota 7 Para uma visao crftica do escrito feminista nas Rl ver MacysiaZalewski Feminist theory and international relations em From Cold War to Collapse Theory Wold Politics in the 1980s Cambridge Cambridge University Press 1993 Sobre teonapolftica intemacional ver o capitulo de JAnn Tickner em Rebecca Grant e Kathlee Newland Gender and International Relations Milton Keynes Open University Press 1991 e seu Gender and lntematioiWl Relations Oxford Columbia University Press 1992 Repensando as rela6es intemacionais 167 atividade que e a quintessencia das RI e do conflito interestatal a guerra Deixando de lado a questao sobre se existe ou nao uma posiao especffica das mulheres a respeito da propria guerra nao pode haver duvida de que a guerra tern multiplas implicaaes para as mulheres as mulheres vieram a simbolizar muito os motivos da guerra o pafs ou a patria a sua proteao de ataques e elas tambem sao mobilizadas ere alocadas pelo Estado em varias novas atividades reprodutivas produti vas e mais limitadamente militares Uma das mais reveladoras dimen soes desta realocaao e 0 emprego de mulheres em areas de trabalho que em tempos de paz sao reservadas aos homeQSLfQIQ Qharia e as fabricas de muniao das quais como o filmBqlh Rivetebem mostrou sao retiradas assim que retoma a normalidade fKs mulheres tambem sao as principais vftimas da guerra nao somente como civis sem genera mas como objetos de estupro As guerras na exJugoslavia que comearam em 1991 chamaram es pecial atenao para o papel do estupro como urn sfmbolo de subju gaao e humilhaao urn meio de propagar a raa superior e urn tema para mobilizar a furia etnica 12 0 estupro tern sido recorrente nas guerras modemas como efeito secundario e como instrumento de politica a hist6ria da guerra mundial como urn conflito de genero indo do estupro japones em ambos os sentidos de Nanking em 1937 ate a legitimaao do estupro pelo Exercito Vermelho quando avanava para o oeste ainda permanece para ser escrita3 Em contextos nao militares o impacto dos processos intema cionais sobre as mulheres e talvez mais 6bvio na economia nas decadas recentes os processos economicos intemacionais tern afe tado profundamente as mulheres nos pafses desenvolvidos e menos desenvolvidos Os novos pafses industrializados assistiram ao recru tamento em massa de mulheres em industrias de alta tecnologia 14 12Sobre is to ver os relat6rios de Dame Anne Warburton EC Investigative Mission into the Treatment of Muslim Women in the Former Yugoslavia Report to the EC Foreign Ministers February 1993Amnesty International BosniaHerzegovina Rape and SexualAbuse by Armed Forces January 1993 13Sobre o Exercito Vermelho vera troca sintornatica entre Stalin e seus interlocutores iugoslavos sobre o assunto em Milovan Djilas Conversations With Stalin London Penguin 1962 p 87 8 Depois p 132 descobrimos que Marshal Zhukov foi despedido de seu posto como roman dante das f sovieticas porroubar j6ias naBerlimocupada VOce sabe o camaradaStalin nao agUenta a imoralidade urn de seus assessores confidenciou ao autor 14Para uma visao da literatura sobre isto ver Ruth Pearson Latin American women and the new international division of labour a reassessment Bulletin of Latin American Research v5 n2 1986 e para uma analise previa Diane Elson e Ruth Pearson The subordination of women and the internalisation of factory production em Kate Young Carol Wolkowitz e Rosalyn McCullagh Of Marriage and the Market Womens Subordination in International Perspective London CSE 1981 168 Fred Halliday I Em pafses do Terceiro Mundo as mudanas no emprego agricola assim como os altos indices de migraao masculina para os Estados mais ricos do Terceiro Mundo ou para os pafses mais desenvolvidos tern tido grande impacto nos papeis e nas responsabilidades das mu lheres As poHticas de ajuste estrutural buscadas por inumeros go vemos do Terceiro Mundo nos anos 1980 freqlientemente sob os auspfcios do FMI e Banco Mundial tiveram conseqUencias especf ficas de genera a medida que OS nfveis salariais deterioramse as mulheres sao freqlientemente compelidas a trabalhar nas areas me nos remuneradas enquanto os servios publicos financiados dos quais mulheres e crianas sao particularmente dependentes depreciam se Assim as mulheres parecem sofrer urn onus desproporcional nas es trategias de refinanciamento da dfvida Nos pafses desenvolvidos a mudana industrial promoveu o em prego de mulheres em algumas areas e o reduziu em outras 13 0 cres cimento em alguns pafses desenvolvidos de uma classe baixa com pasta largamente de mulheres e crianas e em parte urn produto das novas formas de competiao intemacional a esfera poHtica a entrada das mulheres na vida poHtica como votantes e sujeitos polfticos urn fenomeno intemacional norrnalmente experimentado e subseqlientemente apresentado como urn puramente nacional foi uma das mudanas mais marcantes do seculo XXJ Mesmo a mais separada de todas as arenas as relaoes familiares tern sido afetada de muitas maneiras pelas transforrna96es intemacio nais neste seculo pelas mudan9as na medicina especialmente na con tracepao pela disseminaao de tecnologias domesticas pela difusao de novos papeis e ideologias das relaoes homemmulher pafscriana pelas como ja notado polfticas estatais motivadas pelas supostas ne cessidades da competiao interestatal nas taxas de natalidade A forma ao da posiao das mulheres na sociedade na economia e em casa con siderado tudo que e privado e sujeito a varia5es nacionais deve muito as transforma5es e tendencias que sao intemacionais e transnacionais Nao existe dimensao das rela5es transnacionais mais controver tida e de longa duraao do que a religiosa Nao e diffcil ver como as mudanas na polftica e modismos religiosos tiveram em anos recentes como tambem antes conseqliencias diretas para as mulheres Isto e ver dadeiro para as mulheres nos pafses islamicos nos quais a ascensao dos movimentos islamicos nos anos 1970 e 1980 afetou muitos aspec tos de suas vidas e tambem se aplica as comunidades cat6licas nas quais a reafirmaao da doutrina tradicional sabre a reproduao tern s Haleh Afshar e Carolynne Dews eds Women and Adjustment Policies in the Third World London Macmillan 1992 Jeanne Vickers Women and the World Economic Crisis London Zed 1991 Repensando as relaoes intemacionais 169 provocado resistencia disseminada Com o risco de algum exagero e possel estender 0 slogan do movimento das mulheres que 0 pessoal e politico para afirmar que 0 pessoal e intemacional no sentido de que as relaoes interpessoais e micropoliticas sao bastan te influenciadas pelos processos transnacionais Se isto nao se apli ca de muitas maneiras existem muitas outras nas quais e real mais do que o sensa comum nos faria acreditar Os processos intemacio nais freqlientemente nao sao neutros de genera e as relaoes de ge nera apesar de toda a sua autonomia nao sao separadas dos fatores intemacionais Muitos destes fatores juntaramse em urn processo intemacional que comeou nos anos 1980 e que marcou todas as mulheres que esta vam vivendo nos pafses afetados o colapso do comunismo Este foi em muitos aspectos urn fenomeno intemacional e transnacional os regimes comunistas entraram em colapso principalmente por causa de sua ina bilidade em sustentar a competiao interestatal as mudanas que entao ocorreram dentro deles envolveram a gradual intromissao e em alguns casas a imposiao de modos ocidentais de comportamento social poli tico e economico e da emergencia de formas nacionalistas e religiosas nativas de ideologiaQs efeitos nas relaoes de genera foram multiplos o fim dos con troles comunistas levou a urn aumento na prostituiao e na pomografia esta ultima associada a liberdade e a modemidade ociden tal ao desemprego de milh5es de mulheres e ao colapso dos sistemas de bemestar incluindo alguns especificamente projetados para ajudar as maes que trabalham 0 novo chauvinismo destacou o retorno das mu lheres para casa e a necessidade do respeito a valores familiares tradi cionais contra os valores impastos ou cosmopolitas do comunismoJ As mulheres nao experimentaram a transiao do p6scomunismo unicamente como vftimas e em muitos aspectos se beneficiaram mais obviamente em termos de liberdades polfticasositivas ou negativas as mudanas as quais foram submetidas originaramse de uma crise inter nacional e tiveram amplos impactos semelhantes em diferentes pafses As Mulheres como A to res Internacionais Terceiro a despeito da subordinaao que as mulheres tern ex perimentado e experimentam em anos recentes elas adquiriram maior proeminencia como atores internacionais Isto tern sido ver dadeiro em questoes sobre a guerra e a paz o desenvolvimento eco 16Maxine Molyneux Marxism feminism and the demise of the Soviet model em Grant e Newland eds Gender and International Relations e seu The women question in the age ofperestrbikaNew Left Review 183 SpetemberOctober 1990 Peggy Watson The new masculinism in Eastern Europe New Left Review nl98 MarchApril1993 170 Fred Halliday nomico e social e no crescimento do proprio movimento de mulhe res que em sua preocupaao em alterar a posiao eo pensamento em varias questoes sociais e pessoais disseminouse atraves do mundo desenvolvid e tern tido consideravel ressonncia tambem no Terceiro Mundo A disseminaao das organiza5es de mulheres e campanhas atra ves de fronteiras desde o final dos anos 1960 e urn exemplo marcante de transnacionalismo Este e urn dos mais claros casas de atores niio estatais ja que seguramente pode ser estabelecido que as mulheres como urn grupo nao detem poder estatal em qualquer urn dos 190 pafses independentes do mundo Este desenvolvimento e caracteriza do por ambos o crescente transnacionalismo de organizaao e de debate sabre as questoes de mulheres e pela combinaao da mobili zaao sabre as questoes de mulheres com a aao em questoes inter nacionais mais convencionais Assim como em muitos aspectos do transnacionalismo e do feminismo esta combinaao e menos recente do que freqlientemente se supoe Urn dos mais marcantes movimen tos transnacionais dos tempos modemos foi o de apoio ao sufragio feminino nas duas primeiras decadas deste seculo Enquanto questoes de genera sao vistas como questoes pesso ais ou unicas por muito tempo elas formaram parte de uma visao politica e ideol6gica mais ampla como e evidente nas campanhas para promover a igualdade das mulheres e nas que a elas se opunham ligaao entre as questoes de mulheres e a mudana politica e intema cional estava evidente no tempo da Revoluao Francesa nos escritos de Mary Wollstonecraft dentre outrUma das fundadoras do inter nacionalismo socialista nos anos 1840 foi a feminista Flora TristanY Similarmente oposiao a igualdade das mulheres pode freqlientemente ser correlacionada com certas atitudes sabre as questoes intemacio nais No infcio dos anos 1980 uma das mais ativas opositoras a Emenda de Direitos Iguais a Constituiao dos Estados Unidos era Phyllis Schla fly uma Hder da ala da direita que tambem tinha escrito tres livros sabre a estrategia nuclear nos quais ela exigia que os EUA tivessem a capa cidade nuclear do firststrike contra a URSS e acusava Nixon e Kis singer de serem marionetes de Moscou As Mulheres e a Politica Externa Muitas areas da polftica extema tern urn componente especffi co de genera Comeando com a questao da guerra o nucleo con 17Ela foi uma das fundadoras da teoria do intemacionalismo proletiirio Dominique Desanti Flora Tristan Vie Ouvre Melees Paris Union generale deditions 1973 Repensando as relac6es intemacionais 171 vencional do assunto existe lima riqueza de discussao sobre a con tribui9ao especffica das mulheres na preven9ao da guerraTFreqtien temente existe uma ambigtiidade conceitual aqui ja que cdmo Ruth Roach Pierson demonstrou existe uma distin9ao entre derivar uma posi9ao feminista sobre a paz do papel da mulher como mae e de bater esta posiao partindo da constata9ao que as mulheres sao pes soas normalmente separadas do acesso aos meios da guerr A despeito disso a discussao sobre as mulheres e a paz tern uma lon ga tradi9ao analitica e militante Se esta conexao foi evidente na decada de 1980 em campanhas contra as armas nucleares foi igual mente uma caracteristica das campanhas de paz antes e durante a Primeira Guerra mundial 19 Adicionalmente existe discussao substancial sobre o papel das mulheres na guerra como combatentes em situa9ao de resistencia a ocupayao e apoiando politicas militarista Nos anos recentes a dis semina9ao dentro dos pafses da OTAN de recrutamento feminino em exercitos regulares em tempos de paz gerou urn debate amplo sobre como as mulheres podem se integrar e se integram as estruturas mi litares 21 A disputa sobre o papel das mulheres em servi9o na invasao dos EUA do Panama e na Guerra do Golfo na qual 30 mil mulheres estavam entre os 500 mil soldados americanos enviados serviu para destacar quanta resistencia a mudan9a ainda existe sobre esta questao 18Para a discussiio destas questoes ver Sharon Macdonald Pat Holden e Shirley Ardener eds Images of Women in Peace and War London Macmillan 1987 especialmente o ensaio de Ruth Pearson que elabora a distiniio entre uma critica feminista baseada sobre as ideias de matemidade e uma derivando da separiio das mulheres nos meios da guerra Uma discussiio excelente das quest6es envolvidas e Micaela di Leonardo Morals mothers and militarism antimilitarism and feminist theory Feminist Studies v11 n3 Fall 1985 19Ver Anne Wiltsher Most Dangerous Women Feminist Peace Campaigners of the Great War London Pandora 1985 e Lela Costin Feminism pacifism internationalism and the 1915 International Congress of Women em Judith Stiehm ed Women and Mens War Oxford Pergamon 1983 Urn estudo fascinante da relaiio entre o movimento das sufragetes OS sindicatOS e 0 movimento de independncia irlandesa as vesperas da Primeira Guerra Mundial e apresentado por George Dangerfield em The Strange Death of Liberal Eng lang New York Capricorn 1961 A tese de Dangerfield e que a combi naao destas tres foras de oposijiio ameaava a derrubada 9o Estado britfulico e que seu desafio somente foi eliminado pela eclosiio da guerra 20Stiehm ed Women and Men S War Jean Bethke Elshtain Women and War New York Basic 1987 0 trabalho previo de Elshtain tern sido objeto de debate considera vel como em Judith Stacey The new conservative feminism Feminist Studies 21Judith Stiehm Bring Me Men and Women Mandated Change at the US Air Force Academy Berkeley CA University of California Press 1972 Cynthia Enloe Does Khaki Become You The Militarisation ofWomenS Lives London Pluto Press 1983 Wendy Chapkis ed Loaded Questions Women in the Military Amsterdam Transnational Institute 1981 172 Fred Halliday no aparato militar e publico assim como a complexidade de questoes subjacentes pelo menos de uma perspectiva feminista 22 Poi por aca so que em 1993 em seu primeiro ano no cargo como Secretario de Defesa dos Estados lnidos Les Aspn efrento tres questoes crfti cas cada uma corponficando uma questao de genera mulheres em combate direitos homossexuais e assedio sexual Se existe uma dimensao significativa de genera no que suposta mente e 0 nucleo t6pico das rela95es intemacionais dimensoes com paraveis podem ser encontradas em outras areas da disciplina As ins tituiy5es intemacionais devotam muito mais aten9a0 a posi9a0 das mulheres dentro das sociedades assim como nas rela9oes entre elas e a Decada da ONU para as Mulheres 19761985 gerou interesse disseminado em quest5es de direito intemacional poHticas de desen volvimento e politicas nacionais sobre as mulheres23 Tanto a ONU como a CE produziram urn corpo substantivo de politica e analise sobre a posi9ao das mulheres 24 Inumeras organiza9oes naogovemamen tais sao ativas em questoes femininas variando do geral como por exemplo a Unidade de Genera e Desenvolvimento da Oxfam ao especffico como a francesa Mulheres Vivendo Sobre Leis IsHimicas As dimensoes de genera da politica economica intemacional sejam estas com rela9ao ao emprego as divisoes sexuais do traba lho ao desenvolvimento OU a migra9a0 tambem estao COIDO ja des tacado recebendo muito mais aten9ao A ajuda extema urn dos aspectos mais proeminentes da poHtica economica intemacional dos Estados desenvolvidos adquiriu urn componente claro de genero Desde a metade dos anos 1970 urn compromisso em ajudar as mu lheres atraves de programas de desenvolvimento temse dissemina do nos paises da OCDE Organiza9ao para o Desenvolvimento Eco nomico e Cooperayao Diversos pafses europeus mais especifica mente a Suecia incluiram beneficios para as mulheres entre as con di9oes para o envio de seus programas de ajuda A Emenda Percy aprovada pelo Congresso dos EUA em 1973 estipulava que os pro 22Sobre o uso militar americano de mulheres no Golfo e em outros lugares ver inter alia Helen Vozelinker Women in the military deceptive feminist gain In These Times 1723 April 1991 Discutindo o caso da Capitiio Linda Bray que coinandou uma tropa de soldados no Panama ela escreve Gostaria que uma mulher que mata urn conjuge abusivo tivesse tanta publicidade e orgulho quanto a Capita Bray e as mulheres que serviram no Golfo 23Sobre a Decada da ONU para as Mulheres ver Carolyn Stephenson em Stiehm ed Women and Men S War 0 estudo classico das mulheres e desenvolvimento permanece o de Ester Boserup Women S Role in Economic Development Tambem Gita Sem e Caren Grown Development Crises andAltemative Visions Third World Women S Perspectives New York Monthly Review 1987 24Sobre mulheres e a CEE ver Catherine Hoskyns Women European law and transnational politics lnternationalJoumal of the Sociology of Law v14 n3 4 winter 1986 e The community of women Marxism Today January 1987 Repensando as rela6es intemacionais 1 73 gramas da USAID deveriam gastar anualmente pelo menos 10 mi lhoes de d6lares em projetos especialmente concebidos para bene ficiar as mulheres Particularmente genero e mulheres desempenham urn papel adicional na polftica extema como sfmbolos ou instrumentos de com petiao interestatal e de superioridade de uma sociedade sobre a outra Que isto tern pouco ou nada a ver com a preocupaao com as pr6prias mulheres deveria ser evidente assim como a revelaao de que estes discursos de genero nao significam que a polftica extema ou as relaoes intemacionais sao normalmente ou em algum senti do ultimo unicamente preocupadas com mulheres Mesmo assim ilustra a intercessao adicional de genero com a polftica extema de maneiras que ate agora tern sido subestimadas Enquanto os Estados ocidentais em oposiao a urn numero de or ganizaoes naogovemamentais tern sido cautelosos em fazer declara oes oficiais sobre os direitos das mulheres em outros pafses os Esta dos do Terceiro Mundo em oposiao ao que percebem como valores im perialistas nao tern sido tao reticentes A Republica IsHimica do Ira por exemplo freqtientemente tern atacado o que considera como o tratamento ocidental erroneo das mulheres Oaf o relat6rio de urn discurso do pre sidente iraniano Khamenei em 1989 A condiao das mulheres na sociedade ocidental e aterrorizante disse o Presidente Khamenei e continuou para detalhar a sua opressao hist6rica como meros objetos de prazer a despeito das reivindicaaes enganosas do ocidente de liberdade para as mulheres e de seus papeis na sociedade Em oposiao marcante com a honra e o respeito acordado as mulheres no Isla a sociedade ocidental degradouas ao nfvel mais baixo disse o Presi dente e deplorava a cultura da permissividade e nudez que da ao homem livre controle para explorar e insultar a sua personalidade25 Urn exemplo marcante desta exploraao estatal das questoes de genero vern de urn dos mais famosos epis6dios da Guerra Fria quando Nixon e Kruschev se encontraram em 1959 na cozinha modelo de uma exposiao americana em Moscou Este Debate da Cozinha conhecido como uma discussao sobre qual sistema era superior ao outro na verdade girou em tomo das questoes mais domesticas e de genero as mulheres e o trabalho de casa Isso nao significou que a Guerra Fria foi totalmente ou mesmo principalmente a respeito da subjugaao das mulheres ou da reorganizaao do tra balho domestico mas mostrou como sfmbolos de genero foram urn dos recursos ideol6gicos usados nesta competiao interestatal 25BBC Summary of World Broadcasts part 4 January 1989 ME0372 N5 1 7 4 Fred Halliday Urn historiador da Guerra Fria fomece os dois ados da hist6 ria comeando com a consideraao de Nixon Eles deixaram o estudio e com urn grande contingente de imprensa bri gando para colocar seus gravadores entre os dois homens eles entraram em urn modelo de cozinha americana A discussao continuou a medida que Nixon apontava as ultimas inovaoes Qualquer coisa que faa as mulhe res trabalharem menos e born Kruschev balanou a sua cabea Nao pensamos nas mulheres em termos de capitalismo Pensamos melhor de las Nixon disse que uma casa prefabricada como esta custaria somente 14 mil d6lares na America bern ao alcance do trabalhador medio A versao de Kruschev do famoso debate com Nixon e urn pouco diferente Completamente desconsiderando qualquer coisa dita no estu dio de televisao ele afirmou que quando chegou na cozinha pegou urn espremedor de limao e resmungou que coisa idiota aquilo era Tudo o que se precisa para o eM sao duas gotas de suco de limao Acho que demoraria mais para uma dona de casa usar esta invenlio do que levaria para ela fazer o que fazem as nossas donas de casa que e cortar urn ode limao colocalo em urn copo de cha entlio espremer algumas poucas gotas com uma collier Este e o modo como sempre fizemos desde que eu era criana e nlio acho que este utensflio de voces e uma melhora em qualquer sentido26 Sejam quais fossem as suas outras diferenas com certeza ambos supuseram que seriam as mulheres que fariam o cha Resumindo existem pelo menos quatro maneiras distintas pe las quais as questoes relacionadas as mulheres e a arena intemacio nal tern atraves de varios processos recebido maior reconhecimen to nos anos recentes atraves do encontro do feminismo com a teo ria das relaoes internacionais atraves do reconhecimento crescen te das conseqtiencias especfficas de genero de varios processos transnacionais atraves da emergencia das mulheres como atores distintos na cena intemacional e atraves de uma crescente conscien tizaao do componente de genero nas questoes de polftica extema 0 ESTADO E AS MULHERES 0 NACIONALISMO E OS DIREITOS HUMANOS Muitas das questoes levantadas nestes quatro aspectos amplos da dimensao de genero nas relaoes intemacionais podem ser ilus 26Jeffrey Robinson The End of the American Century Hidden Agendas of the Cold War London Hutchinson 1992 p 2901 Repensando as rela6es intemadonais 1 7 5 tradas pelo exame de areas nas quais as questoes de genero fazem intercessao com valores e polfticas estabelecidas Dentre todos os t6picos urn dos mais disputados e relevantes e aquele referente as mulheres e ao nacionalismo outro igualmente diffcil e o Iugar dos direitos das mulheres na formulasao das relasoes interestatais Am bos levam ao que sao em termos convencionais conclus5es inacei taveis Isto somente poderia sugerir que eles colocam questoes que sao importantes em seu proprio direito e que tambem sao relevantes para a identificasao e a discussao de suposisoes subjacentes das relasoes intemacionais como urn todo A mudansa no sentido da palavra mae patria pelo menos dentro da lingua inglesa e ela mesmo reveladora em seu sentido original do seculo XVlli significava a terra como mae isto e fonte de algo se jam minerais ou artes e este foi o sentido ate 1840 Entretanto com a ascensao do nacionalismo no meio do seculo XIX ela adquiriu urn sen tido novo ideol6gico qual seja o do pafs de origem de uma pessoa Esta fusao de uma imagem de matemidade com a identidade nacio nal serviu a seus prop6sitos se existe uma suposisao de que a indepen dencia e o interesse nacional tern precedencia sobre as reivindicasoes de qualquer grupo especffico dentro da nasao tainbem existe uma suposisao de que em geral a disseminasao do nacionalismo e benefica para as mu lheres ja que elas sao uma parte da nasao 0 nacionalismo mobiliza as mu lheres na vida polftica exalta as tradis5es nacionais particulares com re Iasao as mulheres e por lhes dar direitos politicos como cidada fornece uma fundasao para superar as desigualdades especfficas de genero 27 Existe entretanto urn outro lado da hist6ria Os movimentos na cionalistas subordinam as mulheres em uma definisao particular de seus papeis e lugares na sociedade reforsam a conformidade com valores que sao freqiientemente definidos pelos homens e tomam possfvel deslegi timar pollticas altemativas sob a justificativa de que sao estrangeiras Como o fundador da moderna teoria nacionalista Mazzini deixou cla ro o nacionalismo era acima de tudo obediencia 28 0 uso de argu mentos nacionalistas e antiimperialistas para desacreditar e silenciar movimentos feministas nos anos recentes e indicador suficiente dis to Os Estados nao somente os novos Estados independentes exis tem para reforar hierarquias Por todo o mundo os homens tern visto 27Para uma visao abrangente ver Kumari Jayawardena Feminism and Nationalism in the Third World London Zed 1986 Para consideraoes crfticas ver Jan Pettiman Living in the Margins Racism Sexism and Feminism in Australia Sydney Allen Unwin 1992 e Deniz Kandiyoti Identity and its Discontents Women and the Nation Millenium v20 n3 1991 Nira Yuval Davis e FloyaAnthias eds Woman Nation State London Macmillan 1989 e Deniz Kandiyoti Women Islam and the State London Macmillan 1991 28 Norberto Bobbio Liberalism and Democracy London Verso 1990 p6872 1 7 6 Fred Halliday no Estado e nas ideologias que o legitimam das quais o naciona lismo e a mais potente urn meio de reforsar seus controles sobre as mulheres que este controle e freqiientemente exercido via uma ret6rica de exaltasao e respeito ou atraves de polfticas estatais que melhoram a posisao das mulheres nao elimina o caniter instru mental e subordinador desta pratica 0 nacionalismo esta Ionge de ser neutro de genero Ele busca mo bilizar as mulheres para apoiar seus objetivos a independencia e a con solidasao de urn regime p6sindependencia especificamente definido Os seus efeitos para as mulheres sao contradit6rios Como nacionalismos particulares tern afetado as mulheres em determinados pafses e urn im portante t6pico para a pesquisa e a analise assim como a mais ampla questao te6rica de ate onde uma percepsao da posisao das mulheres pode levar ao questionamento dos valores predominantes nas relas5es inter nacionais como os de soberania estatal e da primazia da independencia nacional Aqui certamente a longa tradisao da associasao entre o femi nismo e 0 intemacionalismo pode ser pertinente enquanto 0 ultimo e visto nao somente como uma fe na solidariedade intemacional mas como uma posisao morale polftica a partir da qual podem ser criticadas as rei vindicasoes nacionalistas e a autoridade dos govemos J a foi feita mensao do intemacionalismo de Flora Tristan e talvez a mais famosa de todas as declaras5es do intemacionalismo das mulhe res seja a de Virginia Woolf Escrevendo sobre uma mulher que e cha mada a apoiar o esforso de guerra ela responde Ela ira achar que niio tern nenhuma boa raziio para pedir a seu irmiio para lutar em seu nome para proteger nosso pais Nosso pais ela dira ao Iongo da maior parte de sua hist6ria tern me tratado como uma escrava te me negado educaiio ou qualquer parcela de suas possessaes Nos so pafs ainda deixa de ser meu se eu casar com urn estrangeiro Nosso pais me nega os meios de me proteger forlame a pagar a outro largas somas anualmente para protegerme e e tao pouco capaz de protegerme que precauloes contra urn ataque aereo estiio escritas em minha parede Portanto se voce insistir em lutar para me proteger ou a nosso pais deve ser entendido sobriamente e racionalmente entre n6s que voce esta lutando para satisfazer urn instinto sexual que eu niio posso compartilhar para encontrar beneffcios que eu niio compartilhei e que provavelmente niio irei copartilhar mas niio para satisfazer os meus instintos ou prote ger a mim mesma e a meu pafs Pois urn forasteiro ira dizer de fato como uma mulher eu niio tenho pafs Como uina mulher niio quero pafs Como uma mulher meu pafs eo mundo todo29 29Virginia Woolf A Room of Ones Own Three Guineas Oxford Oxford University Press 1992 p 313 A discussao de Woolf sobre a mulher e a guerra op5ese ao quadro muito diferente de trabalho de literatura produzido no mesmo ano Mother Courage and Repensando as rela6es intemacionais 1 77 Poderoso como e o argumento de Woolf levanta tantas dificul dades quanto resolve A sua formulaao das razoes de por que as mu lheres nao querem ter pais ou nao tern e baseada em tres diferentes considera6es instinto exclusao da igualdade em relaao aos homens e a proteao inadequada pelos homens A implicaao e portanto que nos dois ultimos casos pelo menos a posiao das mulheres mudaria se estas dificuldades fossem resolvidas A sua atraao moral tambem se choca com a hist6ria das mulheres no seculo XX alem do simbo lismo feminine do patriotismo possivelmente desconsiderado como o trabalho de homens esta o proprio modo ativo pelo qual as mulhe res se mobilizaram para apoiar os esforos de guerra e os movimen tos nacionalistas As aoes de massa de mulheres no conflito iugosla vo de 19913 agindo como mulheres para bloquear os suprimentos de comida para outras comunidades e uma ilustraao grafica disto Podese sempre fazer uso do conceito de falsa consciencia mas isto certamente nao sugere a identificaao polftica automatica das mulhe res com o intemacionalismo ou das mulheres com outros grupos na cionais Seja esta relaao nacionalista patri6tica ou antinacionalista ela certamente sugere urn numero de conex6es significativas e recor rentes entre as mulheres e a esfera intemacional Uma maneira possfvel de abordar a questao mais ampla e pela via do que pode ser classificado de femiilismo luxemburguista Rosa Lu xemburgo argumentou que a independencia das naoes deveria ser vista como condicional ate o ponto em que avanasse os interesses da clas se trabalhadora no caso da Polonia pre1914 ela debateu que a Polo nia deveria nestes termos permanecer como uma parte do Estado rus so 30 Urn argumento semelhante poderia ser levantado em relaao as mulheres e a independencia nacional a independencia de Estados es pecfficos deveria ser julgada por varios criterios incluindo ate em que medida a idependencia avanou a posiao das mulheres Em urn cer Her Children de Brecht London Methuen Drama 1990 no ultimo a mae nao e contra a guerra pois ela lhe peimite ganhar dinheiro e na verdade ela coloca as suas preocupa oes comerciais simbolizadas em sua carroa acima de suas supostamente matemais incorporadas em suas crianas ou em qualquer compromisso feminista com a a paz Em urn ponto quando existem rumores de paz Mae Coragem diz A paz ira apertar meu pescoo Fui e segui o conselho de Chaplain ate outro dia estava estocando mantimentos frescos E agora eles estao desmobilizandose e eu serei deixada sentada em minhas mercorias p 63 sua resposta a morte de sua ftlha e continuar como seu neg6cio lucrattvo p 87 Ambos os trabalhos foram escritos em 1938 a sombra da guerra mundial que chegava e continham ressonlincias estranhas do trabalho classico de RI de E H Carr The Twenty Years Crisis escrito ao mesmo tempo 30JP Nettl Rosa Luxemburg ediiio revisada Oxford Oxford University Press 1969 p50019 e Horace B Davis ed The National Question Selected Writings by Rosa Luxemburg New York Monthly Review 1976 178 Fred Halliday to sentido OS argumentos luxemburguistas nao SaO mais relevantes urn mundo de Estados independentes foi criado e a questao do apoio qua lificado ou nao para a sua criaao nao mais se aplica Porem e conce bfvel que em casos nos quais as ideologias nacional e nacionalreligi osa subordinem mais as mulheres do que a anterior dominaao exter na a autoridade dos Estados independentes e suas culturas oficialmen te sancionadas nao deveriam ser tomadas como autoevidentes as mu lheres tern o direito de desafiar a autoridade do Estado que supostamente representa a naao ou mesmo rejeitar totalmente e desde o princpio as suas reivindicaoes Em pafses como lrlanda e Malta onde o dtv6r cio ainda e banido a identificaao da naao com a autoridade do clero tern efeitos especialmente pemiciosos Como no caso do argumento luxemburguista original existem muitos contraargumentos 6bvios que a posiao das mulheres como membros de uma naao tern precedencia sobre a sua posiao como mem bros de urn genera subordinado que a independencia nacional e urn ob jetivo superior aos direitos dos membros individuais da naao que nao e possfvel superar as desigualdades setoriais de classe etnia e genera dentro de uma naao ate que a independencia seja alcanada Todos es tes sao argumentos poderosos e provavelmente iriam ganhar a discus sao em qualquer contexte Entretanto a crftica feminista do nacionalis mo e da soberania nacional iria pelo menos abrir estas quest6es para a discussao de uma forma que nao permitisse a suposiao da primazia au tomatica da independencia nacional e da soberania Virtualmente em to dos os casos nos quais o nacionalismo tern conseqliencias pemiciosas para as mulheres a discussao de suas implicaoes tern sido silenciada ou marginalizada pelo apelo a valores supostamente mais elevados Dado o predominio de uma estrutura nacionalista para a discussao as mulhe res que se opoem as formas de opressao legitimadas como tradicionais autenticas e populares e assim por diante tiveram que discutir que tais polfticas nao sao de fato aquelas da naao ou que sao historicamente jus tificadas Desta maneira os nacionalistas tern forado o argumento para seu terrene negando a legitimidade de uma discussao especifica sobre os direitos das mulheres Deveria ser possfvel rejeitar em termos uni versalistas ideias e praticas repugnantes sejam elas tradicionais ou qual quer outra coisa Certamente similar distorao nacionalista e evidente com referenda a outras questoes polfticas como os direitos das minori as etnicas dos trabalhadores e dos intelectuais31 3Estas questoes sobre os direitos das mulheres e a autenticidade nacionalista t8m sido colocadas de forma contundente especialmente em pafses nos quais a religilio define a posiao nacional sobre as mulheres IrlandaArgelia e Ira slio exemplos disto Uma critica dura ao etnocentrismo reverso e ao uso da ideologia nacionalreligiosa para subordinar as mulheres no Ira e oferecida por Azar Tabari The womens movement in Iran A hopeful prognosis Feminist Studies vl2 n2 Summer 1986 Questoes Repensando as rela6es intemadonais 1 79 A Are o moento tern havido pouca discussao de uma area na qual o genero podena desempenhar urn papel significativo na polftica exter a os direits humanos Mesmo assim o alcance para tal modificaao e enorme Vtmos espectalmente nos anos 1980 os Estados condicio narem o futuro de sus relaoes com outros pafses a sua performance domestica com relaao a algumas formas de direitos humanos e impo rem ou amea9arem impor san90es de variados tipos seas expectativas nao fossem cumpridas Tais demandas nao tern ate o momento englo bado OS direitos das mulheres A princfpio nao existe nenhuma razao para que nao possam ser levantados argumentos comparaveis Os paf ses com urn compromisso com a igualdade de genero poderiam mol dar suas politicas extemas de acordo e poderiam tentar mobilizar coali zoes na ONU como o fazem em outras questoes para colocar pressao sobre os Estados delinqfientes responsaveis por apartheids de genero No tina ds anos 1980 come9ou a haver uma mudan9a na de fim9ao dos due1tos humanos para englobar as preocupa90es feminis tas uma mudan9a que foi mais evidente como e freqlientemente o caso no trabalho das organiza9oes nao govemamentais32 Na Confe rencia Mundial das Naoos Unidas sobre Direitos Humanos em 1992 realzada em yiea houve uma consideravel participa9ao de grupo apmando os dtrettos das mulheres e a declara9ao final incluiu nove paragrafos sobre o status igual e os direitos humanos das mulheres Inumeros cass Podem entretanto ser observados nos quais os Estados ou a atlvtdade estatal come9aram a fazer dos direitos das mulheres urn elemento de polftica extema Urn caso marcante foi o da Republica da Coreia que buscou compensa9ao do Japao pelo tratamento das mulheres coreanas como mulheres de conforto as prostitutas para o exercito durante a Segunda Guerra mundial etre 100 e 200 mil mulheres foram envolvidas segundo noticiado33 Subseqlientemente as prostitutas que trabalhavam nas bases ameri canas na Filipinas tambem come9aram a exigir compensaoes pelas doenas sexuais que contrafram similares comrelaifcio ao Irli sao colocadas por Kate Millett Going to Iran New Ymk Coward McCann and Geohegan 1992 Para urn debate sobre o orientalismo feminista ver Mai Ghoussou Feminismor the eemal masculinein theArab world New Left ReviW n161 JanuaryFebruary 1981 e os artigos em The New Left Review n170 JulyAugust 1988 Ver por exemplo duas instrucoes Focus daAmnesty International Women and human nghts March 1990 Against their will Rape and sexual abuse in custody Febraury 1992 0 trabalho da rede Change e de sua organizadora Georgina Ashworth tambem foi importante para influenciar a atividade naogovernamental e estatal 33lntemational Herald Tribune Seoul tells Japan Compensate women January 22 1992 Of sex and lies apse teacher debunks comfort women myths IHT 29 JIu 1992 George Htcks They wont allow Japan to push the comfort women astde lHT 10 February 1993 Depois em 1993 o governo japons chegou a urn acordo como govemo coreano sobre a quesHio da compensacao 180 Fred Halliday Urn segundo exemplo diz respeito a uma importante mudan9a na polftica de imigraao do govemo canadense em 1993 pela pri meira vez permitiuse que uma mulher da Arabia Saudita reivin dicasse asilo polftico nos termos que como uma mulher a ela eram negados seus direitos humanos em seu pais de origem Urn terceiro caso se refere a pressao sobre o govemo irlandes para alterar seu banimento total sobre o aborto devido ao estupro seguido de gra videz de uma garota de 14 anos Aiem de ameaar a associaao da Irlanda a CE isto tambem gerou consideravel animosidade entre a populaao unionista da Irlanda do Norte que via no banimento uma polftica medieval confirmando o medo de que a incorporaao ao Sui levasse a dominaao da Igreja Cat6lica 34 A mais comum de todas as disputas interestatais com relaao aos direitos das mulheres e aquela em tomo de disputas maritais sobre 0 di reito de domicflio de mulheres e mais explosivamente em tomo da cus t6dia de crianas quando ocorre o div6rcio A GraBretanha a Frana e a Australia estiveram todos envolvidos em disputas com os pafses mu ulmanos quando os pais vindos destes Estados tinham em desafio aberto as instruoes da corte destes pafses lev ado as crianas de volta aos seus pafses de origem e negado acesso razoavel as maes Em nfvel popular estas questoes manipuladas pela imprensa demonstraram mais do que nenhuma outra a importancia do genero e das relaes intemacionais 0 desenvolvimento de uma polftica intemacional sobre os direitos das mulheres nao e uma questao simplesmente de reconhecimento do tema como a Conferencia de Viena em 1993 provou existem grandes diferenas de abordagem dentro de qualquer compromisso geral espe cificamente entre uma abordagem baseada nos direitos humanos e outra que enfatiza o status igual preocupada com a pobreza o emprego e ou tras formas de discriminayao Alem disso existem muitos problemas praticos em relaao a esta opao de tomar o8 direitos das mulheres uma questao de polftica extema no mfnimo os problemas de funcionalidade e de retribuiao Estes peri gos comuns a todas as campanhas de direitos humanos nao deveriam esconder o que provavelmente e a fonte mais profunda de resistencia a tais campanhas a crena de que enquanto algumas formas de violaao dos direitos humanos sao assuntos apropriados para a polftica extema aquelas pertinentes as mulheres nao o sao Em termos convencionais e ridfculo que as questoes de genero devam desempenhar este papel nas relaes entre os Estados soberanos Havera inevitavelmente muita dis cussao sobre as diferentes tradioes nacionais e portavozes oficiais ho mens e mulheres serao produzidos nos pafses preocupados em denunci ar a interferencia extema nos assuntos intemos de sua sociedade Os sen 34Rape victims case stirs unionist fears The Guardian 20 February 1992 Repensando as rela6es intemacionais 181 timentos nacionais e onde relevante os antiimperialistas serao mobiliza dos para confrontar qualquer desafio extemo a dominaao masculina e aos poderes estatais que os reforam e incorporam Aqui existem questoes diffceis tanto para a polftica como para a teoria o fracasso da emergencia de tais polfticas e as provaveis respostas a elas ilustram claramente quao importantes sao as ques toes da subordinacsao das mulheres na constituiao total das ideolo gias nacionais Tambem demonstra como urn compromisso para com a igualdade de genero alem de quaisquer conseqtiencias do mesticas ou de polfticas intemas coloca urn desafio para as concep 6es dominantes de autoridade e soberania nas pr6prias relaoes internacionais 35 IMPLICAQOES E PROBLEMAS 0 escopo do que convencionalmente e percebido como a discipli na das relaoes intemacionais temse expandido consideravelmente nos anos recentes para abranger novas areas tematicas e conceituais Somente nos anos 1980 a ascensao da economia polftica intemacional alterou muito do conteudo academico do ensino e da pesquisa No caso das mu lheres foi argumentado aqui com base em quatro consideraoes gerais que a disciplina pode e deve ajustarse a urn conjunto de questoes que ate o momento tern recebido pouca atenao Nao e como se a consideraao de genero fosse alterar o ensino e a pesquisa das relacsoes intemacionais como urn todo Ira entretanto fazer mais do que simplesmente adicionar outro assunto a lista de t6 picos considerados ja que em somat6ria as questoes especfficas que levanta e as altemativas a val ores estabelecidos que sugere a questao de genero nas relacsoes intemacionais ira reforar uma mudana ja presente na maior parte da literatura sobre o transnacionalismo e a economia polftica intemacional Esta envolve nao somente perguntar como os Estados e as sociedades relacionamse uns com os outros mas tambem como os processes intemacionais sejam estes intergo vemamentais ou nao fazem sentirse dentro das sociedades A fora da literatura da sodologia hist6rica reside em sua demonstracsao de como processos considerados como intemos aos Estados e economi as sao em grau considenivel produto de fatores intemacionais36 Uma das muitas contribuicsoes potenciais de uma abordagem de genero e relacsoes intemacionais poderia mostrar como as relacsoes de 3SOeorginaAshworth A Feminist Foreign Policy palestra dada no Serninano Geral do Departamento de Reloes Intemacionais LSE February 1987 36Ver Capitulo 4 182 Fred Halliday genero na economia na polftica e na famflia sao moldada e modi ficadas por processos externos a sociedade A questao podeiia ser portanto parte de uma reorientacsao ampla das relacsoes intemacio nais em direcsao ao estudo olio somente do comportamento interes tatal mas tambem de como os Estados e as sociedades interagem Que tal desenvolvimento colocara dificuldades consideraveis para o ensino e a pesquisa e evidente A foote mais geral de resistencia sera a relutancia em aceitar uma reorientacsao geral das relaoes intemacionais uma rejeicsao mesquinha das implicacsoes do feminismo para o in temacional 37 Mas tambem existem problemas mais especfficos e pode ser valido identificar alguns deles brevemente A producsao de uma literatura sobre o assunto comeou mas levara tempo para se consolidar apesar disso alguns materiais estao disponfveis de are as relacionadas a sociologia os estudos de desenvolvimento a hist6ria e podem ser usados como base para urn trabalho inicial Tambem existe a questao recorrente nos estudos sobre as mulhe res do equilfbrio entre a autonomia e a integracsao Deveria ser esta belecido urn programa distinto de ensino e pesquisa ou este traba lho deveria ser integrado na estrutura academica mais ampla Uma resposta inicial pragmatica seria que as duas abordagens sao neces sarias com opcsoes de especializacsao e pesquisa reforando a inclu slio do genero como urn item regular em qualquer curso ou livro abrangente de relaoes internacionais 38 Outros problemas te6ricos podem ser vistos como relevantes para este t6pico e sao pontos bemestabelecidos do debate em outras areas da ciencia social Urn eo problema do relativismo cultural a suposi csao de que valores referentes as mulheres e aos outros atores sociais va riam entre as sociedades e que portanto e dificil ou impossfvel fazer afirmaoes gerais sobre o que constitui discriminacsao ou dominaao em diferentes sociedades Isto emergiu diretamente das consideracsoes da posilio das mulheres em contextos nacionais e religiosos Com todos os riscos de incompreensao extema pooe ter havido muita concessao 37Para uma variante caracterfstica disto ver Christopher Coker Women and International Relations The Salisbury Review June 1990 38 Alguns dos que estao preocupados com isso tambem o estao com a questao do titulo os argumentos para a defesa de mulheres e as relaoes intemacionais assim como para gnero e relaoes intemacionais foram bern ensaiados com o primeiro sugerindo uma marginalizaao da corrente dorninante da disciplina e o ultimo comprometendose com a consideraao da constituiao de gnero alem de urn exame das pr6prias mulheres Na pratica pode existir menos diferena nos cursos e programas de pesquisa destes dois tftulos do que parece a primeira vista Urn programa intitulado Mulheres e Relaoes Intemacionais talvez prometa urn programa menos ambicioso do que urn curso reivin dicando abranger a ampla variedade de questoes levantadas pela analise de gnero a ultima englobando as construoes e os usos da masculinidade e das sexualidades alter nativas dimtro da esfera intemacional Repensando as rela6es intemacionais 183 1M ii4ilM 5 y sobre isso ao custo de nao serem consideradas e criticadas ideolo gias e pnlticas que em nome de tradioes nacionais e da autentici dade oprimem as mulheres Uma tendencia similar funciona com outras formas de poder ao Iongo de linhas de ra9a classe ou idade Enquanto uma percepao da relatividade e da diferen9a e essencial para uma explicaao de como e por que os sistemas de dominaao originamse e sao mantidos tal reconhecimento nao necessariamente leva a nao ser a partir de uma malcolocada generosidade antropo 16gica a negar que as formas de opressao existem e ocorrem em uma grande variedade de sociedades e de contextos hist6ricos 0 outro problema te6rico eo que poderia ser definido como totali zaao precipitada esta e a tendencia uma vez que foram estabelecidas conex6es entre os diferentes nfveis de pnitica social e polftica de ver tudo como expressao de urn mecanisme ou processo unico Neste contexto a considera9ao da rela9ao entre o genero e as rela96es intemacionais nao necessariamente leva a afirma9ao de que as questoes de genero consti tuem 0 nucleo dos neg6cios intemacionais como se fosse necessaria haver urn ou a chave para o entendimento da arena intemacional como urn todo Alem disso tambem nao se pode afirmar que todos os aspec tos da localiza9ao e da experiencia das triulheres podem ser derivados do intemacional as guerras quentes ou a guerra fria a soberania ou o nacionalismo podem ser mostrados como tendo componentes significa tivos de genero sem que isto implique que o genero os determine ou a todos os aspectos de qualquer evento ou processo intemacional relacio nados Defender is to em algum retrabalho ferninista do conceito de to talidade hegeliano seria distorcer o caso Ao mesmo tempo muito tern sido feito para mostrar que seja quais forem as distin96es que prevale9am as questoes relacionadas as mulhe res tern urn Iugar no estudo das rela96es intemacionais Grande parte da resistencia a esta ligaao provem nao de uma visao em particular das rela96es intemacionais mas de uma recusa em aceitar a validade das preocupa96es ferninistas em geral Assim como em outras disputas so bre as rela96es intemacionais e o metodo poderia ser melhor deslocar a discussao para este terreno geral ao inves de tentar resolveIa no contex te necessariamente restrito das rela9oes intemacionais Uma terceira questao que diz respeito aos debates metodol6gicos mais amplos dentro das RI envolve a rela9ao entre este t6pico eo debate sobre a epistemologia e o metodo levantado pelas RI 0 p6smodemis mo e as abordagens associadas tern como indicado no Capitulo 1 urn significado contradit6rio enquanto fomecem ferramentas para urn exa me inovador dos discursos e das identidades elas tambem introduzem uma etica e uma explicaao fortuita que sao igualmente inirnigas da ami lise substantiva e do engajamento normative No contexte de urn inte resse disseminado pelo p6smodernismo a teoria feminista tern sido cres centemente influenciada pelo ultimo e isto tern urn impacto nas RI com 184 Fred Halliday resultados previsfveis Enquanto a autoridade das abordagens tradi cionais tern sido enfraquecida a altemativa proposta tomouse uma nova ortodoxia de urn tipo vago e freqtientemente autoderrotista As questoes metodol6gicas de ampla relevancia sao disputadas den tro do contexte das RI epistemologias altemativas sao oferecidas mas tudo que se traz e confusao a propria suposi9a0 etica a partir da qual o t6pico come9a e sobre a qual se iniciou o ferninismo a de urn compromisso com algoma forma de emancipa9ao atraves da igualdade e rejeitada em urn frenesi de prolixidade e de rodeios Aqui alem de tambem considerar as criticas gerais do p6smo dernismo como uma funda9ao analftica ou posi9ao polftica e rele vante lembrar das crfticas particulares feitas a qualquer tentativa de promover o p6smodernismo como uma abordagem geral para as feministas 39 Aqueles facilmente desprezados como apoiando epis temologias de genero ou remedios parciais podem no fim ter mais a oferecer do que os protagonistas de uma loquacidade hermeneuti ca A sua acusaao de que tudo o que tern sido feito e adicionar mulheres e mexer pode ser respondido que a sua abordagem abran ge urn menu menos produtivo ainda adicionar epistemologia e mexer Seria de fato catastr6fico se ao integrarse nas RI o femi nismo como explica9ao e prescriao fosse desprovido de impacto e conteudo pela submissao as banalidades da moda intelectual o resultado seria que tendo superado a nega9ao das RI convencional ele estaria escondido de novo sob uma nova monotonia Se estes perigos sao reconhecidos de nenhuma forma eles impe dem urn possfvel ou desejavel engajamento ferninista nas RI Sem qual quer exagero parece que existe bastante trabalho a ser feito sobre as mu lheres e as relaoes internacionais Esperase que esta questao encontre reconhecimento como urn t6pico importante e distinto dentro do progra ma total da disciplina e que se tome urn elemento estabelecido da agen da de ensino Este reconhecimento ha muito lhe e devido 39Sobre a critica feminista do p6smodernismo e com especial referencia as Rl ver os comentarios vigorosos de MarysiaZalewski em Feminist theocy and international relations Mike Bowker e Robin Brown eds From Cold War to Collapse Theory and World Politics in the 1980s Cambridge Cambridge University Press 1993 Mais genericamen te Sabine Lovibond Feminism and postmodernismNew Left Review n178 November December 1989 Feminism and Pragmatism A reply to Richard RortyNew Left Review n193 MayJuen 1992 e Kate Soper Postmodernism subjectivity and the question of valueNew Left Review n186 MarchApri11991 Repensando as rela6es intemacionais 185 Capitulo 7 0 CONFLITO INTERSISTEMICO 0 CASO DA GUERRA FRIA UMA FORMA DISTINTA DE CONFLITO A discussao do Capitulo 4 foi baseada na afirmacao de que as rela coes internacionais abrangem mais do que as relac5es entre os Estados e mesmo mais do que o transnacionalismo a interacao e a reuniao das sociedades A variante constitutiva do conceito de sociedade intema cional discutida aqui indica a maneira pela qual as sociedades sao afe tadas pela pr6pria estrutura interna de outros Estados e sao levadas a for mas particulares de conflito quando estes sistemas divergem quando em outras palavras a sociedade internacional e caracterizada pela hetero geneidade 0 prop6sito deste capitulo e examinar em maiores detalhes o funcionamento de tal conflito intersistemico no sentido de que ocorre entre duas sociedades ou grupos de sociedade baseados em formas de organizacao polftica e social radicalmente diferentes e incompatfveis 0 foco principal sera sobre a Guerra Fria do periodo p6s1945 mas as im plicac5es sao mais amp las e vao ao nucleo do debate sobre a pr6pria so ciedade internacional e as relac5es internacionais 0 conflito intersistemico e uma forma especifica de conflito interes tatal e intersocietal no qual formas convencionais de rivalidade a mill tar a economica e a politica sao compostas por e freqiientemente legi timadas em termos de uma total divergencia de normas polfticas e soci ais As formas convencionais de competicao incluindo a guerra podem desempenhar urn papel mas a competicao de valores e igualmente im portante e pode repetidas vezes ser a principal dimensao em que urn lado do conflito prevalece sobre 0 outro Que tal conflito nao e especffico a rivalidade sovieticaocidental da epoca p6s1945 e evidente em casos previos como a rivalidade entre os imperios otomano e manchu em rela cao ao ocidente e em exemplos adicionais de rivalidades prolongadas em que o militar e o estraregico foram revestidos pelo desafio que era coloca do a urn sistema de organizacao social e polftica Mesmo nestes periodos Repensando as rela6es intemacionais 187 mais antigos OS conflitos entre OS poderes estrategicos OU blOCOS defini dos em termos religiosos tinham algumas das mesmas caracterfsticas 0 retrato do conflito entre o ocidente e o isla no final do seculo XX e urn mito ja que a despeito de reivindicacoes diversas do contrario a religiao nao mais desempenha este papel mas a maior parte do perfodo entre os seculos VII e XVI assumiu a forma de urn conflito intersistemico triangular estruturado em termos religiosos nao somente entre a cristandade e o isla mas entre as duas areas ri vais do mundo cristao o romano e o ortodoxo e uma sucessao de imperios islamicos baseados no leste do Mediterraneo As instan cias otomana e manchu a serem examinadas no fim deste capitulo fomecem urn exemplo para a comparacao mas tambem contrastes significativos com o colapso do bloco sovietico AS TEORIAS DA GUERRA FRIA A primeira vista a questao do conflito intersistemico e quase totalmente ausente da discus sao da Guerra Fria N a literatura acade mica e relacionada a polftica sobre a Guerra Fria e a rivalidade Leste Oeste desde 1945 tern havido dois debates principais o primeiro e uma argumentacao historica referente as causas e a responsabilida de pela Guerra Fria e o segundo e parcialmente estruturado na lin guagem do movimento de paz e parcialmente dentro das proprias RI com relayao a dinamica subjacente ao conflito 0 primeiro debate se encaixa em tres grandes fases o consenso anticomunista inicial o desafio revisionista e o novo consenso p6srevisionista 1 Embo ra desenvolvido em tomo da Primeira Guerra Fria de 194753 o mes mo debate sobre as causas e a responsabilidade elaborado simulta neamente e nao seqliencialmente pode ser identificado comrelayao a Segunda Guerra Fria de 197919852 Apesar de rico em detalhe his t6rico este debate sobre a Guerra Fria sofreu duas limitacoes 6bvias JL Gaddis The emerging postrevolutionist synthesis on the origins of the cold war Diplomatic History v 7 1983 Para uma vi sao da literatura critica ver Michael Cox Radical theory and the new Cold War em Mike Bower e Robin Brown eds From Cold War to Collapse Theory and World Politics in the 1980s Cambridge Cambridge University Press 1993 Cox tern muitas coisas pertinentes a dizer sobre as pesquisas dos escritores radicais sobre a Guerra Fria mas ele considera erroneamente duas questoes em meus trabalhos primeiro apesar deter discutido as responsabilidades hist6ricas distintas do Leste e do Oeste meu trabalho foi precisamente uma tentativa de analisar a rela9ao dinfunica entre os dois blocos e a contribui9ao de cada urn segundo ele parece aceitar de uma maneira naocritica as afirmoes sobre o expansionismo sovietico no Terceiro Mundo Mais importante Cox parece pensar que no fim a Guerra Fria terminou atraves da acomoda9ao mutua perdendo o fato hist6rico bastante amplo de que urn lado capitulou e que o 188 Fred Halliday por urn lado nasceu de uma conjuntura polftica especffica e foi do minado pelas preocupacoes desta situayao tanto para os revisio nistas como para os anticomunistas segundo foi conduzido em quase total inocencia das quest5es teoricas refletindo o empirismo da historiografia anglosaxa e do proprio debate polftico fora do centro 0 segundo debate sobre a dinamica do conflito LesteOeste con tinha uma percepcao urn pouco maior das quest5es teoricas mas em nenhum de seus dois contextos o do movimento de paz e o da literatura das RI o fundamento teorico foi substancialmente desenvolvido alguns aspectos especfficos do conflito o papel da ideologia a corrida arma mentista a administracao das crises receberam tratamento te6rico den tro das RI mas nao a Guerra Fria como urn todo A amilise do que foi a Guerra Fria permaneceu quase toda no nfvel preteorico no sentido de ter posic5es teoricas implfcitas ao inves de explfcitas e de falhar em per guntar quais poderiam ser as implicac5es da Guerra Fria para a teoria das Rl Abstraindose desta literatura entretanto podese dizer que este se gundo debate abrangeu quatro abordagens principais A titulo de conve niencia e com o risco de limitayao da visao estas podem ser categoriza das como a realista a subjetivista a intemalista e a intersistemica3 Para o realismo e para os sociologos hist6ricos que recentemente o adotaram a Guerra Fria foi uma continuayao da polftica dos Gran des Poderes embora com certos acrescimos como as armas nuclea res a corrida armamentista e a rivalidade ideologica entre o capitalis mocomunismo A suposiyao desta continuidade dentro do conflito intemacional foi facilitada pelo foco na polftica extema da propria URSS que foi percebida como mantendo os objetivos extemos do regime pre1917 eou dos EUA que foi percebido como simplesmente urn outro poder imperial4 nao somente visaviso Terceiro Mundo ou os europeus e os japoneses mas tambem visavis a URSS Por subjetivista fazse referencia aquelas teorias que anali saram a Guerra Fria em termos de percepcao e de percepcao erro seu sistema sociopolftico entrou em colapso Sua propria teoria largamente implfcita traz tra9os de urn trotskysmoresidual afinal existem s6 duas gangues do capilalismo eviden te em seu trabalho anterior ver nota 8 Nestes escritos ainda sob a influencia de uma abordagem trotskysta estatal capitalista Cox apresentamuitos dos gumentos que depois ele ridiculariza em outros escritos incluindo a tese de que somente a renov socialista no Leste e Oeste poderia trazer paz ao continente Entretanto mais oportunamente ele argumen ta que a Uniao Sovietica nao apresentava nenhum desafio ao oeste ou vice versa Para uma discussao previa desta literatura ver meu The Making of the Second Cold War London Verso 1983 Capftulo 2 e Vigilantism in international relations Kubalkova Cruickshank and Marxist theoryReview of international Studies vl3 n3 1987 4Assim em seu livro de teoria realista The Anarchical Society Hedley Bull trata o conflito LesteOeste no perido p6sguerra como uma ilustrao e confirma9ao deste argumento mais ample Muitos outrosMorgenthau Waltz etcfizeram o mesmo Para os realistaS nao existia urn problema conceitual Repensando as rela6es intemadonais 189 nea A Iiteratura de RI sobre a percepao desenvolveuse nos anos 1960 e 1970 nos escritos de pessoas como Janis e Jervis Ela suge ria que a politica externa em geral e erros em polftica extema em particular poderiam ser em grande medida atribuidos as percepoes possufdas individual e coletivamente por aqueles que formulam a politica extema e pelas populaoes que a influenciavam e constran giam Este argumento nao foi especificamente dirigido para a dis cussao da Guerra Fria mas teve implicaoes para ela Fosse o argu mento explicitamente estendido desta forma ou de outra ele era paralelo e reforava uma posiao comum entre OS escritores liberais sobre a Guerra Fria e as revoluoes em geral o conflito poderia ter sido evitado se somente cada urn dos lados tivesse sido melhor in formado sobre o outro uma poHtica diferente para a Russia de pois de 1917 China depois de 1949 Cuba depois de 1959 ou oeste sentido Frana depois de 1789 5 Tais discussoes tendem a nao dar enfase a necessidade dos compromissos ideol6gicos em cada urn dos lados com a revoluao mundial a solidariedaderecuo a interven ao e assim por diante e a destacar a importancia de melhor infor maao e de contato entre os Estados supostamente mas nao real mente comprometidos com a transformaao mutua 0 termo intemalista indica as abordagens que localizam a di namica da Guerra Fria dentro ao inves de entre dos blocos conten dores Esta abordagem tern diversas variantes pode localizar a foo te do conflito dentro da politica domestica e da estrutura socioeco nomica dos pr6prios dois Estados principais e por extensao dentro de outros Estados constituintes ou dentro de urn proprio bloco in temacionalmente constitufdo percebido como uma totalidade na qual a Guerra Fria e funcional para a manutenao da coesao do bloco e da hegemonia dos Estados dominantes dentro dele A versao mais direta disso e a tese das duas masmorras de Chomsky de acordo com a qual os EUA e a URSS buscaram a Guerra Fria para disciplinar suas pr6prias sociedades e seus respectivosjunior partners A Guerra Fria e urn sistema altamente funcional pelo qual as superpotencias controlaram seus pr6prios domfnios e por isso que ela continua e ini continuar6 0 trabalho de Mary Kaldor tern urn im pulso similar Argumentos como aqueles de Alan Wolfe que relaci onam a Guerra Fria ao funcionamento da polltica domestica dos 5Como discutido no Capftulo 5 o debate sobre a inevitabilidade do conflito entre os poderes revoluciomirios e os do status quo e encontrado inter alia com relacao a Revo luciio Francesa em Kim Kyongwon Revolution and International System New York New York University Press 1970 e ao Ira em James Bill The Eagle and the Lion 6Como citado em Cox Radical theory and the new Cold War p 44 Para uma tentativa de incluir Chomsky nestas quesroes ver nos so debate em Bill Bourne Udi Eichler e David Herman eds Writers and Politics Nottingham Russell Press 1987 190 Fred Halliday Estados Unidos sao uma versao altemativa7 Em varios artigos Mi chael Cox tern desenvolvido uma analise que e rica em detalhe di plomatico mas que igualmente nega que a Guerra Fria seja sobre qualquer coisa alem da rivalidade convencional entre dois blocos amplamente similares 8 Muitas exposioes da tese intemalista enfatizam a pressao para a confrontaao defendida pelos setores economicos caracte risticamente pelo complexo industrialmilitar A teoria de EP Thompson do exterminismo e uma das mais elaboradas variantes desta tese ja que percebe a corrida armamentista nao somente como urn resultado do que os produtores de armas desejam mas como uma dinamica que veio a caracterizar genericamente as sociedades em questao Argumentos intemalistas tendem a negar a eficacia do conflito LesteOeste em si mesmo e implicar urn grau de homologia entre as polfticas extemas e as estruturas intemas dos dois blocos9 Embora formulado principalmente nos anos 1980 este trabalho teve antecedentes significativos dentro da abordagem critica da socie dade e das relaoes intemacionais utna instancia classica disto foi o trabalho do soci6logo americano C Wright Mills cujo The Origins of the Third World War publicado em 1957 argumentava que uma guerra nuclear era cada vez mais inevitavel nao por causa das rela6es entre os blocos ou dos desenvolvimentos no Terceiro Mundo mas por causa das estruturas de poder dentro de cada pafs Desenvolvendo insights primeiro enunciados por Max Weber sobre o desenvolvimento do Es tado burocratico e militarista como urn resultado do conflito intemaci onal Mills cuja principal contribuiao a sociologia foi a teoria da elite do poder e do complexo industrialmilitar discutia que ambos os campos eram govemados por tais elites o que inevitavelmente levaria o tnundo a guerra 0 que era sintomatico no trabalho de Mills era que como Weber ele percebia o intemacional como a fonte da degenera ao dos Estados e da perda do controle democratico Segundo ao to roar uma definiao sociol6gica abstrata das elites do poder Mills dis solveu quaisquer diferenas substantivas entre os dois sistemas Assim Mills como Thompson embora lanando urn aviso oportuno sobre os perigos da guerra e da influencia militar sem controle falhou em fome cer qualquer analise substantiva sobre por que ou como os dois blocos estavam competindo na esfera intemacional e tambem de quais eram as diferenas pollticas e sociais essenciais entre eles 7Mary Kaldor The Disintegrating West London Penguin 1978 e The Imaginary War Understanding EastWest Conflict Oxford Basil Blackwell 1990 Alan Wolfe The Rise and the Fall of the Soviet Threat Washington Institute for Policy Studies 1979 Western Capitalism and the Cold War System em Martin Shaw ed War State and Society London Macmillan 1984 The Cold War as a System Critique n 17 1986 9EP Thompson Fred Halliday e Rudolf Bahro Exterminism and Cold War London Verso 1982 Repensando as rela6es intemacionais 191 0 argumento intersistemico pode ser rapidamente distinto de todas as outras tres abordagens 10 em oposiao ao realismo ele nega que a rivalidade LesteOeste seja somente uma continuaao da politica tradicional dos Grandes Poderes nao somente pelo questio namento da validade deste modelo supostamente universal e classi co mas pela atribuiao de urn Iugar central no conflito ao carater diverso e heterogeneo dos Estados competidores nas esferas nacio nal e intemacional em oposiao as teorias da percepao erronea ele afirma que os programas polfticos em disputa e as perspectivas ide ol6gicas dos dois blocos devem ser consideradas seriamente em bora nao unicamente e que os Estados formando os blocos eram em termos amplos comprometidos com a sua realizaao contra os intemalistas a abordagem intersistemica afirma que o conflito in ternacional tinha uma realidade em outras palavras que os dais blocos estavam preocupados nao somente com questoes internas Iueras hierarquia oil ordem mas tambem em melhorar sua posi ao relativa visavis urn ao outro e em prevalecer sobre o outro A teoria intersistemica pode ser resumida em tres proposioesnu cleo a a rivalidade lesteoeste foi urn produto do conflito entre dais sis temas sociais distintos b esta competiao envolve uma dinfunica com petitiva e universalizadora e c somente poderia ser conclufda com urn dos blocos prevalecendo sabre 0 outro 0 termo sistema nao e usado aqui para indicar o sistema intemacional em geral como designado na teoria convencional das RI nem a Guerra Fria como sistema no senti do de urn refoo mutua caracterfstico dos intemalistas mas para indicar a organizaao intema das sociedades e polfticas de cada bloco Existiu conseqiientemente alga especffico e necessaria uma contradiao subjacente e universalizante na dinamica das relaoes LesteOeste A Guerra Fria foi acima de tudo urn produto da hete rogeneidade no sistema intemacional para repetir da heterogenei dade da organizaao intema e da pnitica intemacional e somente poderia ser encerrada pela obtenao de uma nova homogeneidade 0 resultado disto foi que enquanto os dois sistemas distintos existi ram o conflito da Guerra Fria estava destinado a continuar a Guer ra Fria nao poderia terminar como compromisso ou a convergen cia mas somente com a prevalencia de urn destes sistemas sabre o outro Somente quando o capitalismo prevalecesse sabre o comu nismo ou viceversa o conflito intersistemico se encerraria Embora suprimida da maior parte da discussao hist6rica e ne gada pela inclinaao realista esta concepao de Guerra Fria foi re 10Para urn reconhecimento desta dimensiio intersistmica ver Oyrind Osterud Intersystemic rivalry and international order Understanding the end of the Cold War em Pierre Allan e Kjell Goldmann eds The End of the Cold War London Martinus Njhoff 1992 p4789 192 Fred Halliday conhecida por alguns dos que nela participaram Do lado sovietico ela assumiu varias formas a visao leninista original de urn processo continuo de revoluao mundial a teoria dos dais campos de Sta lin e a teoria brejneviana da correlaao de foras a sua maneira mais diversa e bastante perceptiva Do lado ocidental os polfticos nao tiveram dificuldades em arti cular a teoria da disputa entre os mundos comunista e livre cuja tendencia foi levar a urn conjunto de implica6es mais imediatas usu almente militares e a urn repetido exagero das capacidades sovieticas e da ameaa que elas representavam Uma exceao e a amHise de Geor ge Kennan primeiro formulada em seu Iongo telegrama de Fevereiro de 1946 e entao publicada em forma revisada em 1947 na revista Fo reign Affairs11 esta analise e melhor conhecida pela polftica de con tenao militar elaborada para impedir os avanos estrategicos soveti cos na Europa ou no Terceiro Mundo Mas talvez em retrospecttva seu mais importante argumento e o de como uma vez que a contenao fosse alcanada trabalharseia em dirao a erosao de Iongo prazo da confiana sovietica e daf do bloco sovietico Na analise de Kennan este objetivo e bastante claro a contenao estrategica e precondiao para 0 fracasso final do sistema comunista devendo este objetivo final ser atin gido pela fora do exemplo e pela confusao do idealismo revoluciona rio Ele destaca que o conflito levara urn Iongo tempo 0 Kremlin nao esta sob nenhuma compulsao ideo16gica para alcansar os seus prop6sitos com pressa Como a Igreja ele esta Iidando com concei tos ideol6gicos que tern uma validade de Iongo prazo e podese dar ao luxo de ser paciente Nao tern nenhum direito de arriscar as conquistas existentes da revolusao em troca de vas ninharias do futuro Em resposta ele propoe uma estrategia igualmente de Iongo prazo e paciente mas dermitiva em seu resultado Na realidade as possibilidades para a polftica americana nao sao de nenhu ma forma limitadas em manter a posisao e esperar pelo melhor E inteiramen te possivel para os Estados Unidos influenciar por suas asaes os desenvol vimentos intemos dentro da Riissia e atraves do movimento comunista in ternacional pelo qual a politica russa e amplamente determinada Isto nao e somente uma questiio da modesta medida da atividade intemacional que este governo pode conduzir na Uniao Sovietica enos outros lugares embora isto tambem seja importante Pelo contrano e uma questiio da medida em que os Estados Unidos podem criar entre as pessoas do mundo em geral a impressao de urn pais que sabe o quer que esta lidando com sucesso com os problemas de sua vida intema e com as responsabilidades de urn poder 11The sources of soviet conduct ForeignAffairs July 1947 Repensando as relac6es intemadonais 193 mundial e que tern uma vitalidade espiritual capaz de sustentarse entre as princpais correnes ideol6gicas do temlo A medida que tal impressao pode ser cnada e mantida os alvos do comumsmo russo precisam parecer estereis e quixotescos as esperanas e o entusiasmo dos que ap6iam Moscou preci sam desaparecer e adicionar pressao as polfticas externas do Kremlin Pois a decrepitude paralisante do mundo capitalista e a pa central da filosofia comunista Mesmo o fracasso dos Estados Unidos em experimentar a preco ce depressao economica que as aves de rapina da Praa Vermelha preveem com confiana complacente desde que as hostilidades comaram teria re percuss5es profundas e importantes atraves do mundo comunista nenhum movimento mfstico messianico e particularrnente nao aquele do Kremlin pode encarar a frustraao indefinidamente sem eventualmente ajustarse de uma forma ou outra a 16gica deste estado de coisas Assim a decisii rsidini e larga medida neste pr6prio pals A questao das relaoes soIeticoamencanas e em essencia urn teste do valor geral dos Estados Umdos como uma naao entre as naoes Para evitar a des truitiio os Estados Unidos precisam somente estar a altura de suas pr6prias melhores traditlies e provaremse dignos de preservatiio como uma grande natiio italicos adicionados2 Despojado de suas referencias especfficas aos EUA e de seu tom vanglorioso isto apresentou urn programa claro para a conduta de urn coflio intersistemic aseado acima de tudo na competicao entre dots sistemas e no obJetlvo nao da paz ou do compromisso mas de finalmente prevalecer sobre 0 outro 0 que e impressionante e como eta formulacao eplicitada em uma das afirmacoes estrategicas cllis sicas da Guerra Fna enconttou tao pouca reflexao na teoria das RI ou em subseqtientes reflex6es sobre o carater essencial do conflito AS FONTES DE RESISTENCIA TEORICA Enquanto presente de uma forma implfcita em alguma discus sao da Guerra Fria teoria do conflito intersistemico foi pouco re presentada seJa na hteratura das RI ou nos escritos do movimento de paz Se extrai sua inspiracao mais 6bvia do marxismo tambem pde ser vista como uma continuacao de uma linha de arumenta cao dentro das RI que tern pouco ou nada a ver com o marxismo e que destaca a importancia da diferenca ideol6gica no conflito inter nacional I3 Sao varias as raz6es funcionado contra a sua aceitacao EmEw Luard edBsic Texts in International Relations Macmillan 1992 p4789 Duas discuss0es classicas sobre a heterogeneidade dentro da corrente dominante da hteratura d RI sao Richard Rosecrance Action and Reaction in International Politics oston Little Brown 1963 e RaymondAron Peace and WarLondon Weidenfeld Nicolson 1966 194 Fred Halliday Colocalas em itens poderia ajudar nao somente a deixar mais cla ras as suposicoes da abordagem intersistemica mas tambem iden tificar quais podem ser dentro da teoria das Rl alguns dos proble mas fundamentais levantados por esta questao Para a teoria realista convencional como em Bull e Waltz a questao da determinacao sistemica da poHtica extema e irrelevante na verdade tecnicamente inconcebivel ja que tudo o que importa sao as relacoes entre os Estados nenhuma admissao da relevancia dos processos intemos suas causas ou conseqtiencias e permitida dentro de tal teoria As relacoes entre os Estados podem ser anali sadas sem a consideracao de seus correlatos internos Alem disso ao colocar urn sistema intemacional abstrato que determina o com portamento dos Estados e imp6e certas regras aos membros compo nentes o realismo nega a possibilidade de formas de conflito inter nacional fundamentalmente variadas Discutir a teoria intersistemica em sua forma completa requer ter urn conceito adequado da diferenca entre os sistemas nao so mente em termos de alguns slogans e objetivos intemacionais mas em termos da constituicao das pr6prias sociedades e da base de seus desacordos Aqui a forte resistencia da teoria das RI a identifica cao das caracteristicas internas e ao conceito de capitalismo tor nase relevante urn visitante ingenuo do campo do internacional poderia pensar que se alguma coisa caracterizou o sistema inter nacional ao Iongo dos ultimos 500 anos foi este fenomeno No mfnimo ele e tao importante quanto a guerra 0 nacionalismo 0 Estado e outros termos familiares apesar disso quase nunca e mencionado exceto em formulacoes abafadas sobre o desenvol vimento da economia intemacional e da sociedade industrial e agora da interdependencia Desenvolver urn conceito de teoria intersistemica envolve entretanto ter alguma ideia do que consti tui o ocidente em ambos os niveis o intemo eo internacional o capitalismo e o seu desafiador de comparativamente curtadura cao seja qual for o seu nome Isto e algo que pode ser fornecido pela sociologia weberiana ou pela teoria marxista precisamente porque por ora com o silencio das RI e quase que impossfvel fazelo dentro da corrente dominante da teoria internacional Mesmo quando o intemo e considerado relevante como na ana lise de politica extema existe pouca sustentacao para a abordagem in tersisternica por urn lado as ligacoes que sao percebidas como ttans nacionais sao formas lirnitadas e especfficas de interacao baseadas em urn conceito de sociedade freqtientemente debil e comportamental bas tante diferente da visao abrangente da interacao intersisternica aqui con siderada por outto as correlac6es empfricas realizadas dentto da ana lise de poHtica extema nao confirmam quaisquer correlacoes distintas Repensando as rela6es intemacionais 195 entre 0 tipo de sistema politico momirquicorepublicano totalitariode mocratico eo resultado de polftica extema Ja que sociedades totalita rias podem ser agressivas ou defensivas a questiio da determinaao sis temica nao emerge A explicaao altemativa seria certamente que es tao sendo perguntadas as questoes erradas Uma teoria baseada no conflito intersistemico e menos atrativa ainda por causa do que pode aparentar ela pode facilmente ser as similada por urn ou por ambos os paradigmas do velho pensamen to sabre a pr6pria Guerra Fria as concep6es sovieticas dogmaticas dos dois campos e de urn conflito capitalismosocialismo ou as formulaoes ocidentais de urn conflito entre dois sistemas polfticos e econ6micos rivais moralmente opostos urn mundo livre con tra uma ditadura comunista A compulsao para o distanciamento dos dois estere6tipos explica porque os escritores liberais e do movimen to de paz apoiaram abordagens envolvendo urn grau de simetria causal e etica a subjetivista e a intemalista Uma preocupaao simi lar pode ser identificada nos escritos liberais que acompanharam o fim da Guerra Fria no final dos anos 1980 quando foi sugerido face a toda a evidencia que de alguma forma ambos os lados tinham sido exauridos pela Guerra Fria e que portanto eram perdedores certamente os EVA pagaram urn preo mas nao foram os banquei ros sovieticos que chegavam para supervisionar a transiao dos Es tados Unidos para o socialismo Os que se utilizavam de categorias marxistas para explicar a Guerra Fria foram quase que inevitavel mente assimilados pelas analises ortodoxas sovieticas pre1985 14 isto aconteceu nao somente par causa da inclinaao dos que fizeram a assimilaao mas tambem porque OS fundamentos te6ricos da anali se marxista nao foram deixados suficientemente claros Urn fator inibidor inicial e que urn dos temas centrais da teoria in tersistemica que a Guerra Fria e urn produto da heterogeneidade nao necessariamente gera consenso Contrana a visao intuitiva de que supos tamente a heterogeneidade leva a instabilidade e a homogeneidade a es tabilidade existe uma outra visao igualmente intuitiva de que a hetero geneidade leva a estabilidade Na teoria realista isto informa a visao defendida por Waltz e ou tros da estabilidade da bipolaridade A heterogeneidade sistemica e a suposiao implfcita da teoria das duas masmorras ela nao e explf cita na maior parte da teoria das RI ja que tal teoria somente esta pre ocupada com as rela6es entre os Estados mas esta presente no res 14 Vendulka Kubalkova e Albert A Cruickshank The new Cold War em Critical international relations studies Review of International Studies v12 n3 July 1986 e Fred Halliday Vigilantism in International Relations Kubalkova Cruickshank and Marxist Theory Review of International Studies v 13 n2April 1987 196 Fred Halliday I I suscitado te6rico alemao Carl Schmitt agora em moda que defendeu a necessidade de urn adversario na vida polftica domestica e por extensao intemacional e anteriormente na tese geral popularizada par Arnold Toynbee de desafio e resposta 15 Schmitt como a teoria intersistemica sofreu por associaao neste caso com o nazismo mas como a presena desta tese dentro dos escritos benignos liberais e do movimento de paz indica este argumento tern relevancia mais ampla ou no mfnimo seguidores nao conhecidos Ela refora a visao inicia da pela negaao de que o capitalismo ou comunismo tiveram qual quer dinamica universal que o conflito lesteoeste foi uma miragem e que era funcional para os grupos dominantes dos dais Iadas Colocando de lado as diferentes abordagens te6ricas existem razoes hist6ricas comuns na verdade de sensa comum para negar a validade da abordagem intersistemica Par urn lado parece haver pouca razao para estabelecer uma relaao entre o conflito e a reali dade intersistemica quando a hist6ria modema esta repleta de con flitos entre Estados homogeneos das explosoes intercapitalistas de 1914 e 1939 as disputas e as guerras do bloco socialista Por outro o padrao das alianas do p6sguerra e dos alinhamentos estrategi cos informais sugere que a heterogeneidade nao e urn obstaculo a colaboraao assim uma india capitalista colaborou com uma URSS socialista enquanto uma China socialista se alinhou com os EVA A PROEMINENCIA DA HETEROGENEIDADE As dificuldades com a abordagem intersistemica sao portanto consideraveis existem pelo menos outras tres altemativas principais para analisar a Guerra Fria existem fortes raz6es te6ricas e empfri cas para rejeitala ela possui associa6es polfticas pouco agradaveis Acima de tudo entretanto ela e subdesenvolvida em seus pr6prios termos aqueles que a patrocinaram lanaram argumentos ocasionais quanta a sua validade e a de seus componentes ou fizeram implica 6es de que existe uma leitura ultrapassada dentro do marxismo para explicar tal fen6meno Uma vez que e feita a tentativa de explicitar quais sao as reivindica6es da teoria intersistemica entao tomase evidente que em seu interior existem maiores complexidades te6ricas que inibem a sua adoao Contudo e somente atraves desta constru ao e identificaao de suas implica6es te6ricas mais amplas que o argumento pode ser levado adiante A luz desta discussao o argumento intersistemico pareceria residir em cinco proposioesnucleo 1Carl Schmitt The Concept of the Political New Brunswick Rutgers University Press 1976 Paul Hirst Carl Schmitts deciosinism Telos n72 Summer 1987 Repensando as relac6es intemacionais 197 i A heterogeneidade socioeconomica do Leste e do Oes te isto e das sociedades comunistas e capitalistas Isto faz refe rencia no minimo aos niveis economicos e politicos dentro de cada Estado e bloco 0 ponto de partida para o argumento intersistemico e esta diferena em termos fundamentais e constitutivos entre os dois tipos de sociedade e politica Esta diferena pode ser formu lada em termos weberianos ou marxistas mas envolve alguma con cepao do sistema social e polftico como urn todo As abordagens constitucional burocnitica e behaviorista da ciencia polftica as teo rias baseadas na convergencia ou aqueles que veem a URSS somente como outra forma de sociedade capitalista negam esta heteroge neidade e necessariamente impedirao a analise a partir de linhas in tersistemicas assim como o fazem aqueles que por raz6es diplo maticas OU por justia tratam OS dois sistemas simetricamente Se nao e admitido que os blocos sovietico e americano eram funda mentalmente diferentes em sua constituiao interna entao o argu mento nao pode continuar ii Esta compositiio socioeconomica e politica precisa ser mos trada como detenninante da polftica externa e das relatoes internacio nais em um sentido amplo e generico Nao existe a politica externa como tal mas somente a politica externa de tipos especificos de Esta dos e de sociedades Esta tese da determinaao de algumas formas so brep6ese e e teoricamente distinta da encontrada na analise da politica externa e no seu exame dos determinantes domesticos no resultado de politica externa A diferena reside na concepao do que constituem os determinantes domesticos relevantes e nas nao declaradas diferenas do que constitui a relaao Estadosociedade como na discussao da he terogeneidade a discussao inevitavelmente leva de volta a concepao geral de sociedade e de politica iii A tese do conflito intersistemico implica uma dinamica inter nacionalista e na verdade universalista dentro de cada bloco e siste ma em outras palavras implica que cada bloco e levado nao somente a proteger seu proprio Estado e economia a maximizar sua vantagem den tro dos constrangimentos de urn equilibria de poder e parecer desafiar o outro por raz6es de credibilidade ideol6gica interna mas tambem a dominar tanto o quanto for possfvel do mundo para minar e com espe rana abolir o sistema alternativo Tal argumento vai contra a concep ao ortodoxa das RI sobre a tendencia de preservaao por objetivo ou por necessidade de urn equilibria de poder e tambem contra a afir maao liberal de que nenhum lado tern quaisquer aspira6es ideol6gi cas e que o conflito foi todo em torno da maximizaao de poder Ate o momento alem de uma quantidade consideravel de evidencia hist6rica sobre as motiva6es do capitalismo os elementos desta dinamica uni versal sao reconhecidos nas teorias existentes a ambiao do capitalis mo em maximizar mercados e o acesso a materiasprimas os com 198 Fred Halliday T I promissos da URSS com a revoluao mundial e a competiao pr aliados no Terceiro Mundo para melhorar a segurana a fora poh tica e a militar Como ja notado o Iongo telegrama de Kennan reco nhecia que os dois lados tinham tal aspiraao e potencial Mas estes sao na melhor das hip6teses fragmentos de uma teoria mais ampla da universalizaao que ainda esta obscura 16 Por exemplo a motivaao do capitalismo nao e somente economica e outra forma ele estaria bastante feliz em deixar os Estados comums tas com seus sistemas politicos intactos dado que se realizasse co mercio entre eles Este desejo para a universalizaao e ligado ao da heterogeneidade cada sistema alem de quaisquer compromissos imediatos ou obstaculos estava comprometido com a transforma sao do outro 0 minimo que pode ser dito sobre o resultado dos anos 1980 e que ele valida isso a primeira vista e urn pouco mais adiante Urn lado prevaleceu e subordinou o outro iv 0 conflito intersistemico opera em multiplas dimenoes niio somente naquela das relatoes interestatais como convencionalmente concebidas a questiio de qual polftica externa os Estados perseguem abrange somente uma parte de como os do is sistemas socioeconomicos operavam internacionalmente A competiao intersistemica ocorreu em tres niveis principais 0 das rela6es interestatais como tal isto e a po Htica extema convencionalmente concebida o da interaao socioeco nomica mais amplamente interpretada para incluir as a6es de outras entidades que nao os Estadosgovernos mais especificamente os empre endimentos rmanceiros e industriais e o da interaao ideol6gica e em particular do impacto do exemplo do efeito demonstrativo sob uma sociedade comunista de outras capitalistas Um exemplo claro desta interasao tripla com o reforo mutuo de cada um dos nfveis foi o das rela6es RFARDA Alemanha Ocidental Alemanha Oriental no final dos anos 1980 atraves e ate o colapso do regime alemao oriental em 1980 como urn todo o projet da foi no sentido clausewitziano classtco de luta o de derrotar e nao amqm 1 isto e de ogar para baixo niederweifen a RDA Este foi Aumco flito intersistemico em sua forma mais crua e operou em todos os tres mvets as polfticas de Bonn minar a RDA a mobilizaao de uma maioria pr6 unificaao dentro dela e o descredito de qualquer opao socialista ou Uma consideraiio hist6rica poderosa da ambiiio universalizante do capitalismo pode ser encontrada em Eric Hobsbawm The Age of Empire London Weidenfeld Nicolson 1987 E surpreendente que esta tese hist6rica genericamente aceita e a eloqliente do Communist Manifesto tivessem tido tao pouco impacto na maior parte dos escritos so bre a Guerra Fria nos anos 1980 as afirmaoes de que o capitalismo possuia uma ten dencia para ambos para prevalecer sobre outras altemativas e para estabelecer a hegemonia global foram manipuladas pela politica sovietica ao inves disso tivemos a simetria discutfvel dos intemalistas Repensando as rela6es intemacionais 199 neutra foram obtidas pela pressao sobre a RDA nos tres nfveis Em oposiao ao que a teoria realista convencional com sua enfase no confli to interestatal poderia sugerir o papel do govemo de Bonn foi talvez o menos importante e o dos neg6cios alemaes secundano o nfvel mais influente foi o impacto sobre milh5es de alemaes orientais da imagem que eles tinham do ocidente e entao uma vez que a fronteira foi aberta ao visitar o ocidente houve o Reiseschok choque de viagem Este efeito demonstrative foi certamente composto pelas press5es dos bancos e empresas alemaes ocidentais sob a economia da RDA fosse ou nao esta pressao formalmente coordenada com Bonn e pelas aoes especfficas do proprio govemo de Bonn a condicionalidade para a ajuda economi ca o encotajamento atraves da cidadania automatica e dos beneffcios do bemestar para a populaao da RDA migrar o incentive a rumores sobre o iminente colapso da economia da RDA e assim por diante Teria sido bastante diffcil interpretar esta instncia do conflito intersistemico sem alguma referenda a tendencia do capitalismo em se expandir uma ten dencia tealizada nao somente atraves das a5es dos Estados mas tam bern atraves das intera5es sociais e ideol6gicas mais amp las 17 v A heterogeneidade do sistema socioeconomico interno im plica a heterogeneidade das relaoes internacionais concebidas em termos de objetivos amplos e de mecanismos de internacionaliza fiiO Os intersses dos dois blocos eram fundamentalmente opostos e os tipos de mundo que eles objetivavam criar divergiam como indicado Disto seguiuse que existiriam outras diferenas na polf tica externa e na extensao internacional destes sistemas Isto nao necessariamente significava que eles perseguiam tipos ou estilos diferentes de polftica externa isto e que OS instrumentos as con venoeS os procedimentos operacionais de polftica externa fossem eles mesnios heterogeneos Isto e deixado em aberto OS Estados envolvidos no conflito podem ou nao ter sido socializados no sen tide realista do termo 0 argumento nao pode ser resolvido anali sando a socializaao no sentido formal se eles tinham os mesmos tipos de convenoes diplomaticas ou se respeitavam soberania 0 argumento realista sobre a sociedade intemacional e os efeitos so cializadores do sistema e relevante em termos limitados mas nao responde a esta questao mais ampla Por outro lado a heterogeneidade de objetivos em geral ja que emerge da heterogeneidade do sistema e acompanhadapor uma hetero geneidade em pelo menos tres outros nfveis Primeiro a heteroge neidade de causa as razoes subjacentes para a dinamica universa 17Para consideraes da subjugaao da RDA ver o diario do assessor politico de Kohl Horst Teltschik 329 Tage lnnenansichten der lWedervereinigung Berlin SiedlerVerlag 1991 e Ulrich Albrecht Die Abwicklung der DDR Opladen Westdeutscher Verlag 1992 200 Fred Halliday Iizadora podem ser diferentes em sistemas socioecnomicos difer tes sendo mais ou menos economicas em urn mats ou menos mtlt tars e polfticas em outro Segundo os mecanismos para e o com promisso Om a criaao de urn blCO internacioal homogneo em tomo de urn Estadonucleo hegemomco podem dtvergtr asstm como esta evidente pelo menos nas bastante diferentes polfticas e polfti cas economicas dos EUA e da URSS dentro de seus respecttvos blo cos as formas de integraao e os mecanismos de hierarquia eram muito diferentes Terceiro os mecanismos para a competiao com o outro bloco tambem podem ser assimetricos esta assimetria refle tindo nao somente as diferenas de poder em sua concepao generica mas a importncia variada dos componentes do modus operandi do sistema o economico o ideol6gico eo militar como refletidos no nfvel intemacional 0 equilibria relativo de poder eco nomico e militar na composiao da influencia da Uniao Sovietica e dos EUA era muito diferente assim como o era o grau de controle poli tico direto exercido por cada urn deles sobre os seus respectivos clientes de bloco A competiao dos blocos pode portanto envolver nao smen te urn conflito de objetivos mas urn conflito de raz5es e de mecamsmos pelos quais as rela5es inteinacionais sao conduzidas AS IMPLICAOES ANALITICAS Apresentar este resurno dos componentes da teoria tersistemia inevitavelmente levanta mais quest5es do que responde Dots pontos sao imediatamente evidentes Primeiro sejam quais forem as suas foras ana lfticas e te6ricas a teoria intersistemica esta Ionge deter alcanado urn desenvolvimento adequado o aparecimento de tal desenvolvimento no previo dogma sovietico escondeu mais o qurevelou no mfnim pela teleologia imanente dentro de seu concetto d correlaao de foas qe implicava que a hist6ria estava se rnovendo mexoravelmente em drrao ao triunfo do bloco sovietico sobre o ocidental 18 Segundo qualquer elaboraao de urna teoria de conflito in tersisternico leva a uma estrutura te6rica rnais ampla ligeirarnente 10 termo sovietico correlao de foras uma alternativa supostamente mais dinfunica e materialista ao equilfbrio de poder nunca foi levado a serio no ocidente e foi abandonado nos anos 1980 na URSS na verdade ele provou sua validade precisamente porque levou os fatores socioeconomicos e ideol6gicos em consideraao na competiao intemacional e viu a possibilidade de uma mudana decisiva em favor de urn bloco 0 se engano sore qual bloco iria beneficiarse da mudana na correlaao foi talvez urn descutdo secundario Para uma analise Iucida do conceito ver Margot Light The Soviet Theory of International Relations Brighton Wheatsheaf 1988 eJulianLider Correlation of Forces AnAnalysis of Marxist Leninist Concepts Aldershot Gower 1988 Repensando as relaoes intemacionais 20 I derivada da sociologia weberiana ou do materialismo hist6dco con ceitos como Estado sistema o intemacional enquanto apa rentemente moeda comum dentro da corrente dominante das RI e do materalismo sociol6gicohist6rico nao o sao ao serem exami nados de perto Mais importante ainda como o resumo acima deixa clara e nao por raz5es de deferencia canonica o ponto de partida de qualquer teoria do conflito intersistemico nao e a diferena generica entre OS objetiVOS ou os estilos de polftica extema ou a divergencia derivada da assimetria geoestrategica mas a diferen9a na constituiao da propria sociedade em ambas as variantes domestica e intemacional 0 ponto de partida de qual quer teoria relacionada das RI e portanto o conceito do que e na teoria marxista o modo de produ9ao e as rela96es entre estas e o Estado sem estas a teoria do conflito intersistemico e impensavel Uma mistu ra ecumenica das diferen9as entre as RI dominante que impede tais con ceitos e estas outras teorias socioeconomicas leva a confusao Nao pode existir uma analise do conflito intersistemico que nao admita a catego ria capitalismo e as suas varias antiteses de names diferentes Se este argumento e valido neste caso somadas ao desenvolvimen to de uma teoria do conflito intemacional e d3 rela96es intemacionais genericamente baseadas no sistema social existem pelo menos tres ou tras areas de deserivolvimento te6rico sugeridas pela teoria do conflito intersistemico i Dimensoes e Mecanismos de lnterafiio lntemacional Se como ja indicado o conflito intersistemico pode ser vis to como operando em tres niveis o interestatal o socioeconomico eo ideologi co entao se toma necessaria analisar como estes interagem e como o equilibria relativo muda de tempos em tempos para urn Estado especifi co e entre os diferentes tipos de Estado 0 que esta impllcito aqui e nada mais do que uma sociologia ade quada das rela96es intemacionais nao no sentido de apresentar alguma teoria ultrapassada das RI a partir da sociologia existente ou de fazer al gumas generalizaoes amplas e possivelmente nao apropriadas sabre como as rela96es intemacionais tern aspectos sociais lei ideologia con ven9ao etc mas sim para examinar como dentro de urn sistema inter nacional constituido por diferentes Estados o socioeconomico determina duplamente os Estados individuais e transcendendo os Estados o siste ma como urn todo A luz da hist6riados Ultimos 500 anos e do resulta do da propria Guerra Fria existe uma especial necessidade de reexami nar e elucidar a motivaao universalista do capitalismo tanto em termos do porque ele busca moldar o mundo a sua imagem como dos varios mecanismos utilizados para isso se a musica pop e as tshirts sao as ca nhoneiras do final do seculo XX existe uma continuidade subjacente a motiva9ao multifacetada e agressiva do capitalismo em destruir e incor Plar todosS sisteJlSsocioeconomicos rivais 202 Fred Halliday ii 0 Conjlito Jntersistemico e Os Movimentos AntiSistemicos 0 conflito entre os sistemas sociais incorporado e mediado atra ves dos Estados EUA URSS etc na Guerra Fria tern sido alllpanhado por movimentos mais amplos dentro e entre os Estados dtngtdos con tra os Estados e as ordens intemacionais que eles representam Ao lon godeste seculo estes assumiram varias formas revAolu9es gevs guer ras de guerrilha mudan9as ideol6gicas etc e tern stdo dtrectonados contra as ordens hegemonicas nos dois blocos Tres analisespadrao destes movimentos antisistemicos estao dis ponfveis a abordagem convencional das RI que os subrdma aos Esta dos e nega a sua relevancia para as rea5es mtemac10nats exceo uan do recebem 0 apoio dos Estados veJase o quase completo stlencto da literatura das RI sabre as revolu5es e os sindicatos19 a abordagem sovietica ortodoxa que assimilava os movimentos antisistemicos naoestatais aos interesses de Estado da propria URSS assim dissol vendo as questoes de autonomia e de contradiao envolvidas neta rela9ao e a abordagem dos sistetIas mundiai a e Wallerstem Arrighi e outros20 que ve os movtmentos anttststemtcos como o motor da hist6ria intemacional e como capazes de superar os pode res e a fragmenta9ao dos Estados No caso o ultimo e dos sctos analogos do movimento de paz estes novtentos attststemtccs sao vistas como dirigidos contra o que e urn ststema amda homoge neo com a nega9ao da divergencia entre o capitalisno e o cptJu nismo Assim os movimentos de trabalhadores na Paloma e Afrtca do Sui sao parte de uma dinamica antisistemicA iii 0 Estudo Comparativo do Confltto lntertstmtco A 0 foco desta analise tern sido sabre o confltto mterststermco do periodo p6sguerra aquele nTe os bloos conunista e cpitalista Tal conflito tern certas caractensttcas espectficas nao encontradas em ep cas anteriores as dimens5es tecnologica e economica de sua compett ao militar as formas ideol6gicas especfficas de hegemonia reividica das pelos dais lados a mobiliza9ao de grandes massas da opla9a e atividade sistemica e antisistemica Este parttcular confltto mtestst mico pareceria ter uma outra caracterfsica uni urn resutado htstn co contrario ao dos ciclos no qual urn ststema Ja estabelectdo o captta lismo gerou e depois sufocou o seu novo rival emergente Alem dis so em outros aspectos o conflito intersisteco nao e e forma alguma espedfico a epoca da Gurr Fria OS coflttos as socte dades baseadas no feudalismo e no capttaltsmo a parttr do seculo XIV na Europa e os ultimos redutos do precapitalismo no Terceiro Mundo 19Capftulo 5 20QiovanniArrighi Terence Hopkins e Immanuel Wallerstem AntlSystemzc Movements LondonVerso 1989 Repensando as relac6es intemacionais 203 no final do seculo XX poderiam merecer uma analise comparativa assim como os conflitos mais especfficos entre as sociedades escra vocratas e as que exploravam o trabalho livre Os meios pelos quais o capitalismo cercou minou e entao destruiu o bloco sovietico tern algo em comum com os primeiros ataques capitalistas aos imperios chines e otomano pelo menos na maneira pela qual os reformistas alarmados dos blocos sitiados ao tentar alterar seu proprio sistema para competir melhor aceleraram a decomposicao de seus sistemas sociais e politicos Igualmente os historiadores da economia mostraram como a inte racao do mundo mais desenvolvido como menos desenvolvido pode afora a conquista e a derrota direta na guerra minar os Estados mais ira cos este foi o impacto do imperialismo mesmo quando ele nao se enga jou em conquista colonial direta Os destinos dos imperios otomano e chines da Ultima metade do seculo XIX ate o seu desaparecimento final durante a Primeira Guerra Mundial sao dois casos classicos disso Cer tamente houve uma derrota na guerra mas esta nao foi em si mesma uma explicacao para o declinio embora no caso do Imperio Otomano a Primeira Guerra Mundial tenha trazido o coup de grace 0 processo foi mais complexo a derrota na guerra as margens do territorio imperial trou xe pressoes para a reforma administrativa e economica uma oscilacao entre a reforma e a reafirmacao tradicionalista marcou a politica estatal nas decadas anteriores a morte final o processo de reforma entao pro vocou maior dissensao interna dentro do Estado e nas relacoes Estado sociedade a gradual intrusao do comercio extemo via concessoes e for cas do mercado tambem enfraqueceu o poder estatal e promoveu o des contentamento social regioes remotas provaramse mais dificeis de go vemar e gradualmente separaramse insurreicoes Taiping os Boxers os Joens Turcos desafiaram a autoridade estabelecida21 E evidente que algumas destas caracteristicas do declinio otoma no e manchu estao presentes no colapso do comunismo 0 sistema sovi etico enfrentou o desafio de urn rival que era a organizado segundo principios socioeconomicos e politicos fundamentalmente diferentes e b claramente superior e mais forte que ele em todos os aspectoscha ves exceto por algumas dimensoes do militar 0 conflito foi portanto duplamente heterogeneo e desigual o fato de que a URSS era diferen temente da Turquia e da China capaz de competir com o ocidente em algumas areas selecionadas de atividade estrategica militar espaco ar ms nucleares e que como o oeste tinha aspiracoes globais nao dimi num a sua fraqueza global Como nos conflitos otomano e manchu o processo de erosao foi gradual nao cataclismico e envolveu varias di 21Roer Owen The Middle East in the World Economy 18001914 2ed London IB Tauns 1993 204 Fred Halliday mensoes a militar a economica e a diplomatica Como os antigos imperios o sistema sovietico tentou sustentar a competicao militar por meio de uma mobilizacao mais intensiva mas permanentemen te ineficiente e da concentracao de recursos intemos enquanto ao mesmo tempo separava a sua propria economia dos bens e das pra ticas de seu competidor Entretanto apesar de todas as similaridades as diferencas sao ain da maiores Em primeiro Iugar a competicao militar e o seu impacto no sistema sovietico foi de urn tipo diferente estrategico e tecnologico As politicas militares otomana e manchu foram construidas para prevenir a gradual erosao de seu imperio territorial por poderes coloniais hostis e de nenhuma maneira representaram uma ameaca a eles mesmos No caso sovietico nao houve o equivalente das anexac6es e das conquistas so fridas pelos otomanos em 1770 e pelos chineses em 1840 A maior perda do sistema sovietico ada China em 1963 apesar de ser em algoma medida urn resultado das politicas diplomatcas oci dentais que OS separaram nao levou a imediata anexacao da China ao ocidente e foi seguida por outros avancos militares e estrategicos do poder sovietico no Terceiro Mundo Os aliados sovieticos sobreviveram aos dois maiores desafios enfrentados a Coreia e o Vietna e neste ulti mo eles tiveram uma vitoria clara No final dos anos 1970 e inicio dos 1980 os estrategistas america nos comecaram a discutir a erosao do poder sovietico pelas beiradas isto e encorajar a revolta nos aliados sovieticos do Terceiro Mundo es pecialmente CambojaAfeganistao Nicaragua eAngola Mas apesar de terem sido exaustivos nao foram nestes conflitos que as fissuras apare ceram no final da decada de 1980 Em termos militarestecnologicos o conflito foi igualmente diferente aqui em maior intensidade do que em qualquer outra esfera da competicao a disputa foi igual em alguns as pectos mesmo com os EUA sendo mais capazes de em quase todos os pontos atingir superioridade tecnica sobre a Uniao Sovietica 0 mais relevante e que em termos economicos as diferencas entre os modelos otomanomanchu e o da URSS foram substanciais Alem de perder os territories para seus rivais estrategicos a posicao dos imperios manchu e otomano mesmo no territorio sobre o qual retinham controle foi erodida pela intrusao de bens vindos do mundo de fora que minaram os grupos sociais existentes e os sistemas economicos logo ambos os imperios acumularam dfvidas extemas que tiveram que honrar por meio de concess6es e a supervisao de suas alfandegas por oficiais ocidentais Nenhum destes processes ocorreu no contexto sovietico Dado o controle do Estado da atividade economica nestes paises a intro ducao de bens externos foi mediada pelo Estado e virtualmente nao teve nenhum impacto sobre o emprego e o status dos grupos sociais dentrodestes paises 0 papel do comercio externo no sistema sovi etico ea maneira pela qual ele afetou 0 sistema foram fundamental Repensando as rela6es intemacionais 205 mente diferentes dos casas otomano e manchu 0 fornecimento de credito e de tecnologia ocidentais Ionge de enfraquecer o poder da liderana comunista serviu para fortalecela e como o ocidente acreditou melhorar a sua capacidade militar 0 controle exercido pelos partidos comunistas foi tal que nao existiu a questao de ofici ais externos monitorando ou afetando a coleta de receita e outras funoes Considerandose os ganhos de exportaao nos anos 1970 eles foram elevados pelo aumento dos preos no mercado mundial dos principais produtos de exportaao sovieticos o petr6leo e o gas Sea interaao e a competiaoeconomica como ocidente desempe nharam urn papel em minar o sistema comunista nao foi atraves do enfraquecimento do controle do Estado da economia por permitir maior espao para os atores economicos ocidentais operarem dentro des tas sociedades ou pela alteraao de padroes domesticos de produao e de distribuiao 0 mercado nao fez isso de forma alguma Aqui o resultado da Guerra Fria com a rapida morte do poder so vietico no final dos anos 1980 mereceu somente menoes ocasionais Isto sera examinado em maiores detalhes nos Capftulos 8 e 9 Contudo pareceria plausfvel argumentar que em alguns importantes aspectos isto sugere uma teoria do conflito intersistemico primeiro o colapso do co munismo nao ocorreu por causa do mecanismo convencional de confli to interestatal a guerra nem atraves da erosao do territ6rio do bloco so vietico por pressao militar e comercial ocidental mas pelo contrano pela corrosao do sistema pelo efeito demonstrativo do sucesso do ocidente nos campos social economico e polftico22 segundo a Guerra Fria nao terminou por causa do equilibria de poder ou de uma exaustao mutua mas pela prevalencia de urn bloco sabre o outro em outras palavras por causa de uma vit6ria sistemica Certamente outras interpretaoes sabre este resultado e sabre o carater essencial da Guer ra Fria sao possfveis entretanto precisamos ter esperanas de que pelo menos algum dia sejam examinadas as suposioes e as impli caoes te6ricas fundamentais da dimensao dominante do conflito intemacional p6s45 22Para aplicacoes destas ideias ao colapso do bloco sovietico ver tambem meu The ends of Cold War New Left Review n180 MarchApril 1990 206 Fred Halliday Capitulo 8 UM COLAPSO SINGULAR A UNIAO SOVIETICA E A COMPETicAo INTERESTATAL UMA NOVA LUZ SOBRE VELHAS QUESTOES 0 Capitulo 7 apresentou uma discussao sabre a Guerra Fria e a sua dinamica subjacente No final dos anos 1980 o colapso do sis tema sovietico dentro da URSS e intemacionalmente somado as suas muitas implicaoes para as polfticas individuais e globais levantou varias questoes adicionais estimulantes e nao resolvidas dentro da teoria social e internacional que serao examinadas aqui A primeira questao a ser enfrentada por qualquer analise deste fenomeno e a da explicaao fomecendo uma consideraao que aponte as razoes ava liadas e interrelacionadas do porque urn sistema politico e socioe conomico especffico praticamente igual a seu rival no campo mili tar desmoronou desta forma rapida e inequfvoca e na ausencia de qualquer conflito militar internacional 1 Inexoravelmente esta questao analftica levanta pelo menos mais outras duas A prime ira pouco ex pres sa nestes tempos mas que vai alem da curiosidade referese a inevitabilidade ou nao deste colapso Neste 1E surpreendente que ofim da Guerra Fria tenha provocado mais reflexao te6rica do que a pr6pria Guerra Fria Ver Pierre Allan e Kjell Goldmann eds The End of the Cold War London Martinus Nijhoff 1992 JL Gaddis International relations theory and the end of the Cold War International Security v17 n3 19923 Lynn Eden The end of US Cold War History A review essay International Security v18 n2 1993 Ver tambem meu The ends of the Cold War New Left Review n180 MarchApril 1990 George Schopflin Why communism collapsed International Affairs January 1990 Gale Stokes The lessons of 1989 Problems of Communism v XL n5 SeptemberOcotober 1991 Daniel Deudney e John Ikenberry Soviet Reform and the end of the Cold War Explaining largescale historical change Review of International Studies v17 n3 July 1991 Repensando as rela6es intemacionais 207 sentido podese indagar se o comunismo em sua variante sovietica es tava destinado a falhar mais cedo ou mais tarde ou se com uma sorte politicas ou liderana diferentes ele poderia ter continuado expandido ou prevalecido em uma escala mundial este foi sempre urn beco sem safda ou uma altemativa possfvel de se criar urn sistema nao capitalis ta2 A outra pertinente para ambas para a explicaao e a avaliaao da hist6ria geral do comunismo e quando e como esta crise terminal se ini ciou se ela pode ser datada a partir de decis6es espec1ficas principal mente aquelas da liderana p6s1985 na URSS ou se este declfnio foi mais prolongado derivado digamos do visfvel comeo de estagnaao economica no meio da decada de 1970 ou do fracasso em democratizar e reformar a economia no infcio dos anos 1960 ou se foi na verdade uma conseqliencia de Iongo prazo do sistema de comando e terror cria do por Stalin em 1930 Mesmo se argumentado que no Iongo prazo o comunismo nunca poderia ter funcionado e que ele estava necessaria mente condenado o timing e a forma de sua morte nao estavam deter minados e requerem uma analise especffica Desafiadoras e precisando ser sustentadas por suposi6es concei tuais e te6ricas explfcitas ou nao estas quest6es hist6ricas sao neces sariamente distintas de outro conjunto de preocupaoes levantado pelo colapso comunista A pr6pria variedade a surpreendente velocidade das recentes mudanas e a luz que elas jogam sobre o que acontecera previ amente nestas sociedades constituem urn laborat6rio de processos soci ais e politicos nao controlados relevantes para a avaliaao de teorias conflitantes Dentre varios e possfvel mencionar quatro processos que dizem respeito a interaao dos Estados no sistema intemacional eles sao ao mesmo tempo relevantes para a avaliaao dos Estados das intera6es sociedadeEstado e das formas e limites das capacidades de Estados Urn destes processos a natureza da Guerra Fria eo seu carater intersistemi co ja foi considerado no Capitulo 7 Aqui e possfvel examinar tres ou tras destas quest6es amplas os padroes de transformaao vindos desde cima e o papel dos fatores intemacionais em moldalos e limitalos as possibilidades e as perspectivas para uma transiao ate aqui linica aquela do comunismo para o capitalismo e as varias dimensoes da competiao intemacional e o seu papel no colapso sovietico 2Para o argumento do porque na economia o modelo do Estado socialista nao poderia funcionar a despeito de seus sucessos iniciais e de uma margem para a reforma ver Wlodzimierz Brus e Kazimierz Laski From Marx to Market Oxford Clarendon Press 1989 e Daniel Deudney e John Ikenberry Soviet Reform 208 Fred Halliday A TRANSFORMAAO DESDE CIMA 0 destino do comunismo e urn caso importante para a avaliaao da tese de que a constituiao de Estados revolucionanos envolveu urn fortalecimento do controle estatal de uma intervenao na sociedade realizado em urn grau consideravel como uma resposta as pres sees internacionais 3 Apesar de em certa medida os regimes comu nistas terem sido produzidos por movimentos revolucionarios e de terem pelo menos em seus perfodos iniciais sido baseados em mo biliza6es de massa e em algum consentimento popular todos eles se tomaram sistemas nos quais a poHtica era decidida por uma pequena elite As capacidades metodos e objetivos destas elites eram em par te resultado de seus pr6prios objetivos teleologicamente concebidos mas tambem eram bastante condicionados por fatores intemacionais o objetivo de rivalizar e supostamente superar o capitalismo a imita ao e a colaboraao com outras lideranas de partidos comunistas o apoio e o controle da URSS dos partidos locais na Europa oriental depois da Segunda Guerra Mundial e a orientaao e a mobilizaao de recursos domesticos para defender o campo socialista contra a ameaa externa fosse ela real ou inventada As lideranas comunistas estiveram portanto engajadas em urn projeto que era tanto nacional como intemacional era intemacional como urn resultado da pressao sistemica de outros Estados mas tamb6m ideo 16gico em seu pr6prio direito como uma tentativa de constituir uma sociedade que era exemplar em uma escala intemacional e de promover movimentos similares em outros pafses Alem disso se o fracasso total do comunismo precisa incluir a discussao de como ele falhou em se dis seminar em escala mundial o ponto de partida para analisar por que os regimes desmoronaram no final dos anos 1980 precisa sera hist6ria das transforma6es intemas desde cima por eles ptomovidas Estas elites presentes nos comites centrais e politburos dos parti dos govemantes buscaram transformar as suas sociedades de acordo com urn mapa te6rico de para onde deveria moverse a sociedade socialista Sabemos agora que este projeto e urn fracasso o objetivo para o qual supostamente caminhavam estas sociedades nunca foi alcanado e qua se tudo que tinha sido aparentemente conquistado era superficial e pou co duradouro Se as reivindica6es de que o socialismo desenvolvido ou de que algum outro tipo de sociedade mais perfeita tinham sido al canadas eram falsas tambem o eram as menos apologeticas reivindi ca6es de que estas sociedades com todas as suas imperfei6es es 3Theda Skocpol States and Social Revolutions Cambridge Cambrige University ss 1979 Ellen KayTrimberger Revolution from Above New Brunswick NJ Transaction 1978 Repensando as rela6es intemacionais 209 tavam em algum sentido hist6rico e implicitamente teleol6gico em transiao para algum novo modelo socioeconomico e representa vam algum movimento permanente alem do que o capitalismo ofe recera ou poderia oferecer Esta falta de permanencia se aplica tanto as tentativas de criar uma economia planificada viavel e autosustentada como as de forjar urn sistema unipartidario politicamente factfvel e para as tentativas de reformar as atitudes em areas fundamentais de importancia ideo 16gica especialmente o trabalho o genera a religiao e a etnia A explicaao mais simples do colapso e dizer que tal projeto foi em urn sentido absoluto urn fracasso esta e a conclusao a que mui tos chegam agora nos pafses comunistas assim como sempre o fi zeram aqueles que negavam a eficacia da engenharia social Exis tem entretanto razoes para resistir a tal conclusao Em termos de avaliar as capacidades dos Estados para transformar as sociedades desde cima 0 registro nao e tao absoluto Primeiro ainda e muito cedo para prever quanta permanecera do legado comunista de govemo e se na verdade algo dele podera ainda sobreviver Segundo seria errado tamar como evidencia do fracasso do comunismo a emergencia de foras que parecem marcar urn retorno a formas precomunistas de comportamento ja que muitas destas tern urn carater que esta sendo moldado pelo proprio impacto desta mesma trans formaao o conflito etnico e urn caso 6bvio Similarmente assim como muitos dos que analisaram a emergencia de Gorbachev mostraram a mudana na sociedade sovietica foi em alguns aspectos produto das pr6prias conquistas do comunismo sendo a expansao em educaao e urbanizaao os fatores que mais obviamente contribuiram4 Terceiro mesmo se muito ou tudo do que esta sendo associado ao govemo co munista desaparecer digamos no espao de 10 ou 20 anos o fato his t6rico da conquista comunista ao Iongo das ultimas decadas permane cera isto e evidente na transformaao socioeconomica na elevaao dos padr6es de vida e na implementaao de urn sistema de bemestar disse minado na sustentaqao e na reproduao de urn sistema polftico e nao menos importante no relativo sucesso na mais importante e diffcil de todas as areas a da competiao interestatal Pode ser que o sucesso nesta ultima a vit6ria sovietica na Se gunda Guerra Mundial e depois disso mais quatro decadas de riva lidade com o oeste tenha alimentado a ilusao da eficacia total do comunismo em casa e no exterior Entretanto somente a hist6ria da competiao interestatal sugeriria que a caracterizaao do registro comunista como urn fracasso e simplista Tal veredicto chegaria 4Moshe Lewin The Gorbachev Phenomenon London Radius 1988 e uma visiio h1cida das precondioes sociais e economicas para a ruptura da ordem brejneviana nos anos 1980 210 Fred Halliday como uma surpresa para por exemplo os 250 mil alemaes captura dos em Stalingrado assim como para os planejadores militares do Pentagono que enfrentaram os avanos sovieticos no espao no fi nal de 1950 e os desenvolvimentos de mfsseis durante 1970 e no infcio de 1980 A consideraao de por que o comunismo falhou envolve portan to olhar para os seus dois registros o intemo e o externo mesmo quan do e avaliada a performance e a capacidade do Estado lsto envolve uma separaao dos diferentes tipos de competiao interestatal e intersocie tal na dimensao mais convencional da competiao internacional ami litar o comunismo foi razoavelmente bemsucedido nao somente na Se gunda Guerra Mundial mas na subseqtiente corrida armamentista entre os grandes poderes e na competiao estrategica no Terceiro Mundo en tretanto o seu fracasso no nfvel socioeconomico tambem foi internaci onal ja que envolveu nao somente urn fracasso absoluto mas urn com parative percebido na impossibilidade de acompanhar a performance da competiao Sera sugerido que uma questao central para a analise do colapso do sistema sovietico e como e quando esta percepao de fra casso socioeconomico comparative comeou a ocorrer na liderana e na massa Dada a compulsao de competir inerente a ideologia comunista e dada a impossibilidade de guerra o registro domestico comparative do comunismo frente as suas principais altemativas capitalistas tornouse a dimensaochave da rivalidade e da sua morte final A TRANSIAO DO SOCIALISMO PARA 0 CAPITALISMO 0 colapso do comunismo como urn sistema socioeconomico envolve o que e na verdade a transiao de urn sistema socioecono mico em termos marxistas a transiao de urn modo de produao para outro5 0 que o modo naocapitalista foi co quanta ele rca lizou de seu potencial e assunto para muito debate tudo o que po demos fazer aqui e usar definioes de trabalho mas se as agonias da presente transiao tomaram algo mais clara e que pelo menos este sistema foi em seus aspectos fundamentais diferente do capi 5Muito temse falado a respeito do conceito de economia mista no contexto de ambos os sistemas nos anos 1980 Contudo em urn exame mais preciso dois tipos de economia mista sao indicados uma variante socialista e uma capitalista ed uma Jugoslavia e uma Suecia Uma distinliio clara ainda funcionava entre as economias nas quais o Estado desempenhava o papel dominante com ou sem setores de mercado em algumas areas da produliiO e aquelas nas quais o mercado prevalecia na produliiO e no capital com ou sem urn papel significativo do Estado em termos de propriedade emprego regulaliio fiscal e coordenaao politica Repensando as rela6es intemacionais 211 talismo Aiem disso e evidente que como no caso de outras transi soes a forma o ritmo e o resultado da transisao nao podem ser decididos unicamente por fatores intemos e que em cada pafs e no mundo p6scomunista como urn todo os fatores internacionais de sempenham urn papel central 0 fim do comunismo envolveu uma desilusao dupla primeiro a percepsao de que a economia centralmente planificada e dominada pelo Estado nao poderia permanecer funcionando dadas as suas crescentes dificuldades o que eram estas dificuldades e algoa que retomaremos mais tarde segundo ficou claro que este sistema nao poderia ser pre servado nem em uma versao reformista ou liberalizada o destino da lugoshivia eo novo mecanismo economico na Hungria foram uma indi casao disto6 Se a liderana sovietica sob Brejnev prendeuse a primeira ilu sao Gorbachev parece ter acolhido a segunda nos primeiros anos de seu mandato no gabiriete antes de aceitar em 1990 a impossibilida de de urn sistema centralizado reformado urn mercado regulado no sentido comunista do termo Assim como assumiu acreditando em urn sistema de partido unico no papel de lideransa do PCUS Partido Comunista da Uniao Sovietica e no sucesso da polftica leninista de nacionalidades tambem levou tempo para Gorbachev perceber que o sistema economico como urn todo precisava de transformasao e demorou ainda mais tempo para os muitos membros do PCUS chega rem tambem a esta conclusao 7 A mera aceitasao desta inevitabilidade nao e entretanto suficien te para garantir que tal transisao ocorreria como seus formuladores gos tariam Nao faltam na hist6ria casos da transisao de urn sistema econo mico para outro mas ate agora nao houve nenhuma deste tipo de urn sistema centralmente planificado para urn de livre mercado Certos fa tores favorecem tal processo as forsas educacionais e sociais das socie dades em questao a relativa vontade dos pafses capitalistas em fomecer assistencia atraves de canais privados e estatais o provavel decrescimo da competisao interestatal e a disponibilidade de urn modelo altemativo e comparativamente via vel As dificuldades sao entretanto evidentes falta de capital contexto legal e administrativo pessoal empreendedor e outros assim como as pressoes conflitantes da acomodasao polftica e da mudansa economi 6Sobre o fracasso das reformas iugoslava e hungara ver Bros e Laski From Marx to Market 7 As declar5es de Gorbachev ate o final de 1987 pelo menos endossavam a vi sao tradicional de que o socialismo tinha urn potencial superior ao do capitalismo Niio mais tardar do que no outono de 1989 ele pareceu acreditar que os paises da Europa Oriental manteriam o socialismo mesmo depois da retirada dos tanques sovieticos con versa com Georgi Shakhnazarov conselheiro de Gorbachev Moscou 10 de Junho de 1993 212 Fred Halliday ca 0 fim do govemo comunista introduziu urn novo perfodo de diver sidade polftica social e etnica nestas sociedades produzindo lutas qe afetarao como e em que medida sera criado urn sistema p6scomums ta somente os conflitos sociais na Polonia e na RDA na primeira meta de dos anos 1990 indicam que nenhuma transisao simples planeja da ou administrada pode ocorrer De urn ponto de vista limitado a competisao interestatal pode diminuir mas nao o conflito intersocial Se a hist6ria tern alguma lisao a oferecer e que alem do caniter e da forsa relativa ds forcas sociais domesticas destas sociedades 0 caniter intemacional desta transisao tambem e de grande impor tancia Em uma escala hist6rica ampla e possfvel distinguir entre o que se pode genericamente chamar de transisoes autodeterminadas isto e como a do feudalismo para o capitalismo na Europa que teve seu ritmo e processos consideravelmente gerados dentro das socie dades em questao e as transisoes impostas resultado do impacto sob as sociedades menos desenvolvidas e mais fracas de outras mais fortes como aconteceu no encontro colonial Dificilmente precisamos lembrar que as primeiras tiveram urn ca rater freqtientemente prolongado e sanguinaria comesando pelas guer ras da antiga Europa medieval ate ao que Amo Mayer habilmente de nominou de guerra dos trinta anos entre 1914458 meso assit as transisoes impostas foram ainda mais custosas e destrUidoras Ja que envolveram o genocfdio a escravidao dos povos subjugados o extermfnio de sociedades nativas e nao por fim a aparentemente cronica senao etema prisao dos povos subjugados em uma posi sao de inferioridade dentro do sistema mundial9 0 desejo de muitos na Europa Oriental e na URSS e que eles se tomem como a Europa Ocidental em urn relativamente curto perfodo e tempo de 5 ou 10 anos Mtiitos na URSS agora expressam as suas aspl rasoes como sendo as de que seu pafs se tome em algum sentido gene rico civilizado A realidade pode ser uma de conflito duradouro nos terrenos sociais e etnicos e de urn ciclo de instabilidade ao estilo da America Latina nos nfveis polftico e economico Se o intemacional im pede a heterogeneidade no Iongo prazo ele simulmeamente inibe uma imitasao bemsucedida Como resultado dos regimes marx1stas estas sociedades pareceriam vingar a teoria marxista sobre o desenvolvimen to capitalista como duplamente combinado e desigual E aqui que se toma possfvel considerar uma questao de impor tancia hist6rica e te6rica em que medida e de que maneiras a compe 8 Amo Mayer Why Did the Heavens Not Darken London Verso 1990 Capftulo 1 no qual a crise generalizada do seculo vinte e descrita 9 Immanqel Wallerstein Historical Capitalism London Verso 1986 para uma pesqmsa irrefutavel deste processo Repensando as rela6es intemacionais 213 ti9ao extema contribuiu para a evolu9ao e o colapso final do sistema comunista 0 sistema nao foi destrufdo pela guerra e nem seu colapso foi somente ex6geno Nem o resultado pode ser entendido somente se olhando para os Estados Entretanto de formas que requerem mai or exame as for9as extemas incluindo as economicas contribufram para o colapso final em 1989 Varios fatores na competi9ao interesta tal serao examinados a conclusao sera que acima de tudo nao foi a competi9ao em nenhum destes campos mas a percep9ao da perfor mance economica e ideol6gica que determinou o resultado No Capitulo 7 janos referimos a hist6ria da competi9ao esta tal entre os Estados comunistas e capitalistas e da necessidade de se distinguir entre as diferentes dimensoes desta competi9ao para de terminar por que o sistema comunista falhou 10 A luz do que os so ci6logos hist6ricos tern escrito existem certos pontos de partida 6bvios a propria guerra a pressao sobre as rela96es Estadosocie dade devido a necessidade de mobilizar recursos domesticos na pre para9ao para uma possfvel guerra e a forma9ao e a deforma9ao das institui96es domesticas como urn resultado da competi9ao externa Nao necessariamente e s6 a guerra mas tambem os custos das guer ras passadas e as pressoes das perspectivas de novas que podem como na Fran9a de 1763 aumentar as tensoes dentro de urn sistema polftico e social levandoo ao colapso final 11 OS FATORES INTERNACIONAIS E A GUERRA FRIA Ja foram mencionados os fatores intemacionais envolvidos no colapso do comunismo e os associados ao destino dos imperios oto mano e manchu isto e OS derivados da hist6ria anterior de intera96es entre sistemas heterogeneos e desiguais 0 outro conjunto de fatores intemacionais freqlientemente citado em conexao com a queda do comunismo e mais recente e singular sendo comumente considerado como o responsavel pelo colapso dos regimes comunistas e em par ticular pela crise da URSS no final dos anos 1980 Estes giram em too da discussao de que de alguma forma ou outra a pressao que o oc1dente colocou sobre o sistema comunista a partir da segunda me tade de 1970 corporificado nas polfticas da Segunda Guerra Fria foi tal que o sistema sovietico nao poderia sobreviver Quebrando em partes este argumento geral tres fatores espe cfficos sao quase sempre destacados o onus da corrida armamen tista os embargos economicos e tecnol6gicos da OTAN e os movi 10Ver nota 1 para discussiio adicional sobre este tema 11Skocpol States and Social Revolutions pennanece uma exposiciio classica desta tese 214 Fred Halliday mentos de guerrilha anticomunista nos aliados sovieticos do Tercei ro Mundo Em si mesmos ou em algum tipo de combina9ao estas foram como se afirma com freqliencia as formas de competi9ao intemacional e de pressao que colocaram a URSS de joelhos A Corrida Armamentista Agora sabemos o suficiente para sermos capazes de mapear a hist6ria e o significado da corrida armamentista LesteOeste de uma forma razoavelmente satisfat6ria Resumidamente ela caminhou da seguinte forma i A partir do final de 1940 a URSS e os EUAestiveram engaja dos em uma corrida armamentista convencional e nuclear envolvendo crescentes gastos e uma corrida tecno16gica Nesta corrida em todas as dimensoes principais exceto na espacial nos anos 50 os EUAestiveram na lideran9a no campo tecnol6gico e mantiveram na maioria das dimen soes a lideran9a em termos quantitativos 12 ii A despeito desta lideran9a o onus relativo sobre os EUA foi significativamente menor representando entre 5 e 10 do PIB Produto Intemo Bruto enquanto para a URSS os gastos com armas represen taram entre 10 e 20 ao Iongo deste perfodo alguns oficiais russos agora dizem que este percentual chegou ate 25 iii A despeito da ausencia de confronta9ao militar direta ameri canasovietica convencional ou nuclear esta corrida armamentista re presentou em urn sntido clausewitziano uma continua9ao da poHtica por outros meios refletiu uma busca por uma ilus6ria mas estrategica mente significativa superioridade incorporou a busca dos dois lados de prestfgio e status na arena intemacional e constituiu urn meio de pres sao sobre o or9amento e daf sobre a rela9ao domestica entre o Estado e a sociedade 13 Dado o onus sabre a URSS esta inabilidade em competir com os EUA e a evidente racionalidade clausewitziana da cotrida armamentis ta freqlientemente se defende que foi esta corrida que for9ou a URSS ao recuo estrategico na metade dos anos 1980 Pelo menos tres variantes deste argumento podem ser percebidas a economica o nivel de despesas com arrilamentos e o desvio de recur sos para o setor militar foram tais que a URSS nao poderia continuar a competir e precisava de uma drastica redu9ao de gastos militares para 12Sobre a corrida armamentista ver Fred Halliday The Making of the Second Cold War London Verso 1989 Capftulo 3 13Esta foi convencionalmente conhecida como a teoria de controle de armas da corrida armamentista Repensando as rela6es intemacionais 215 poder redirecionar recursos para a reorganizaao economica domes tica a tecnologica a continuidade da liderana dos EUA acentua damente representada no infcio dos anos 1980 por dais desenvolvi mentos a IDE Iniciativa de Defesa Estrategica eo mfssil continen tal foraram a Iiderana sovietica a perceber que nao poderia con tinuar a competir e a polftica os perigos e os custos envolvidos na guerra nuclear foraram 0 PCUS a abandonar a ideia de urn mundo dividido em dais campos preso ao conflito social em favor dos valores universais e dos interesses comuns da humanidade Em diferentes medidas todas estas tres variantes sao encontra das nos trabalhos dos escritores sovieticos e ocidentais e cada uma seguramente deve ter desempenhado urn papel 0 proprio Gorba chev conseqtientemente invocava o terceiro argumento o polftico enquanto o apelo a valores universais tern uma 1onga historia no pensamento sovietico e antes disso no russo o poder das armas nucleares eo acidente de Chernobyl em 1986 certamente serviram para reforar esta percepao dos perigos da energia nuclear e por extensao das armas nucleares Apesar deter sido muito importante existem raz5es significativas para qualificar a importancia da corrida armamentista como o fator prin cipal por tnis do colapso sovietico Sem duvida o argumento economico deve ter uma fora considemvel na verdade a propria figura quantitativa de 10 ou 20 do PIB sendo gasta em defesa subestima o seu impacto qualitativo e distorcido havendo tambem a alocaao do melhor pessoal administrativo e cientffico e de recursos materiais chaves para este setor Por outro lado gastos militares de 10 ou mais do PIB estao Ion ge de ser uma explicaao adequada para os fracassos da economia sovi etica Israel e Taiwan tiveram alocaoes de defesa compaiaveis no mes mo perfodo de tempo mas experimentaram padr5es de vida mais a os e maiores taxas de crescirriento 14 Alem disso este alto nfvel de gas tos militares como uma percentagem do PIB e uma outra forma de dizer que o proprio PIB era bastante baixo os niimeros do gasto total dos EUA e da URSS mostram que em termos absolutos os EUA estavam gastando mais do que a URSSY 4No infcio dos 1970 Taiwan gastou 10 do PIB em despesas militares Israel 20 International Institute of Security Studies The Military Balance 19721973 London 15A despesa americana em 1971 foi de 120 bilhoes de d6lares contra 94 bilhoes sovie ticos em 1980 111 bilhoes contra 107 A despesa total da UnHio Sovietica e de seus aliados foi somente metade daquela de seus oponentes a OTAN e os seus aliados do Extremo Oriente China J apao em 1980 120 bilhoes para o Pacto de Vars6via contra 243 bilhoes Todos os dados SIPR Yearbook 1981 mimeros fixos de 1978 Convencio nalmente a despesa americana foi subestimada por vanos mecanismos de calculo urn ds 3lclos era que o mimero de 1980 127 bilhoes deveria ser ajustado para cima 223 bilhoes Ie de 52 a 95 do PIB James Cypher em Monthly Review November 1981 216 Fred Halliday A enfase precisa portanto ser tanto na eficiencia e nos meca nismos de alocaao do setor civil como no peso dos gastos militares sabre o PIB fosse o PIB sovietico relativamente rnais alto e se os res tantes 80 da economia sovietica tivessem sido mais eficientemente organizados o onus do gasto militar teria sido menor e teria dada uma certa eficiencia e nfveis razoaveis de crescimento representado de qualquer forma uma percentagem mais baixa do PIB Problemas similares surgem com a variante tecnologica a su posiao da maior parte da analise sabre a corrida armamentista e da abordagem sovietica convencional antes disso foi que mais ou menos a URSS foi compelida pelas necessidades da competiao interestatal a se equiparar aos EUA em termos qualitativos e quanti tativos Previamente a URSS imitou os avanos americanos como no desenvolvimento dos mfsseis com multiplas ogivas depois de 1972 e na capacidade de Ianamento intercontinental de submari nos o desafio da IDE e dos mfsseis continentais foram tais que a URSS nao tinha replica companivel e nao havia antfdoto evidente que fosse capaz de produzir Apesar disso a URSS poderia sem uma rivalidade imitadora ter produzido contramedidas a estes desafios americanos mfsseis estrate gicos de voo em baixa altitude somados a urn sistema de chamarizes poderiam ter invalidado a IDE mesmo que ela se mostrasse via vel Uma polftica que foi definida como de mfnima dissuasao teria feito subs tancial diferena e dado condi6es a URSS de escapar de sua autoderro tista busca de paridade bruta 0 terceiro argumento relevante para a corrida arrnamentista o po lftico sabre a ameaa representada a humanidade pelas armas nucleares teve grande validade em si mesmo e e credito de Gorbachev telo articu lado rnais claramente do que qualquer outro contudo ele nao leva a todo o processo de mudana polftica e social dentro da URSS que acompa nhou a adoao destes valores universais associados ao novo pensamen to E concebfvel que a URSS tivesse optado pela retirada da corrida ar mamentista como anteriormente perseguida mas ela insistiu em preser var seu sistema polftico e socioeconomico distinto Explicar este ultimo envolve olhar alem da esfera da corrida armamentista e de seus custos economicos tecnicos e poHticos As Pressoes Economicas 0 segundo conjunto de questoes comumente citado para explicar o recuo sovietico eo economico e em particular o impacto sabre a URSS dos embargos ocidentais e das restrioes no campo de tecnologia de pon ta Aqui e valido repetir que esta linha de argumentaao e contraria ao que ate aqui e percebido como 0 impacto do comercio intemacional Repensando as rela6es intemacionais 21 7 poder redirecionar recursos para a reorganizaao economica domes tica a tecnol6gica a continuidade da liderana dos EUA acentua damente representada no inicio dos anos 1980 por dois desenvolvi mentos a IDE Iniciativa de Defesa Estrategica e o missil continen tal foraram a liderana sovietica a perceber que nao poderia con tinuar a competir e a polftica os perigos e os custos envolvidos na guerra nuclear foraram o PCUS a abandonar a ideia de urn mundo dividido em dois campos preso ao conflito social em favor dos valores universais e dos interesses comuns da humanidade Em diferentes medidas todas estas tres variantes sao encontra das nos trabalhos dos escritores sovieticos e ocidentais ecada uma seguramente deve ter desempenhado urn papel 0 proprio Gorba chev conseqtientemente invocava o terceiro argumento o politico enquanto o apelo a valores universais tern uma longa historia no pensamento sovietico e antes disso no russo o poder das armas nucleares eo acidente de Chemobyl em 1986 certamente serviram para reforar esta percepao dos perigos da energia nuclear e por extensao das armas nucleares Apesar deter sido muito importante existem razoes significativas para qualificar a importancia da corrida annamentista como o fator prin cipal por tnls do colapso sovietico Sem duvida o argumento economico deve ter uma foa considenivel na verdade a propria figura quantitativa de 10 ou 20 do PIB sendo gasta em defesa subestima o seu impacto qualitative e distorcido havendo tambem a alocaao do melhor pessoal administrative e cientifico e de recursos materiais chaves para este setor Por outro lado gastos militares de 10 ou mais do PIB estao Ion ge de ser uma explicaao adequada para os fracassos da economia sovi etica Israel e Taiwan tiveram alocaoes de defesa comparaveis no mes mo perfodo de tempo mas experimentaram padr5es de vida mais attos e maiores taxas de crescimento 14 Alem disso este alto nfvel de gas tos militares como uma percentagem do PIB e uma outra forma de dizer que o proprio PIB era bastante baixo os numeros do gasto total dos EUA e da URSS mostram que em termos absolutos os EUA estavam gastando mais do que a URSS 1s 14No infcio dos 1970 Taiwan gastou 10 do PIB em despesas militares Israel 20 International Institute of Security Studies The Military Balance 19721973 London 15A despesa americana em 1971 foi de 120 bilhoes de d6lares contra 94 bilhoes sovie ticos em 1980 111 bilhoes contra 107 A despesa total da Uniao Sovietica e de seus aliados foi somente metade daquela de seus oponentes a OTAN e os seus aliados do Extrema Oriente China Japao em 1980 120 bilh5es para o Pacto de Vars6via contra 243 bilhoes Todos os dados SIPRI Yearbook 1981 m1meros fixos de 1978 Convencio nalmente a despesa americana foi subestimada por vanos mecanismos de calculo urn dos calculos era que o numero de 1980 127 bilhoes deveria ser ajustado para cima 223 bilhoes ie de 52a 95 do PIR James Cypher em Monthly Review November 1981 216 Fred Halliday A enfase precisa portanto ser tanto na eficiencia e nos meca nismos de alocaao do setor civil como no peso dos gastos militares sobre o PIB fosse o PIB sovietico relativamente mais alto e se os res tantes 80 da economia sovietica tivessem sido mais eficientemente organizados o onus do gasto militar teria sido menor e teria dada uma certa eficiencia e nfveis razoaveis de crescimento representado de qualquer forma uma percentagem mais baixa do PIB Problemas similares surgem com a variante tecnol6gica a su posiao da maior parte da analise sobre a corrida armamentista e da abordagem sovietica convencional antes disso foi que mais ou menos a URSS foi compelida pelas necessidades da competiao interestatal a se equiparar aos EUA em termos qualitativos e quanti tativos Previaniente a URSS imitou os avanos americanos como no desenvolvimento dos mfsseis com multiplas ogivas depois de 1972 e na capacidade de lanamento intercontinental de submari nes o desafio da IDE e dos mfsseis continentais foram tais que a URSS nao tinha replica comparavel e nao havia antfdoto evidente que fosse capaz de produzir Apesar disso a URSS poderia sem uma rivalidade imitadora ter produzido contramedidas a estes desafios americanos misseis estrate gicos de voo em baixa altitude somados a urn sistema de chamarizes poderiam ter invalidado a IDE mesmo que ela se mostrasse via vel Uma polftica que foi definida como de minima dissuasao teria feito subs tancial diferena e dado condioes a URSS de escapar de sua autoderro tista busca de paridade bruta 0 terceiro argumento relevante para a corrida armamentista o po lftico sobre a ameaa representada a humanidade pelas armas nucleares teve grande validadeem si mesmo e e credito de Gorbachev telo articu lado mais claramente do que qualquer outro contudo ele nao leva a todo o processo de mudana polftica e social dentro da URSS que acompa nhou a adoao destes valores universais associados ao novo pensamen to E concebfvel que a URSS tivesse optado pela retirada da corrida ar mamentista como anteriormente perseguida mas ela insistiu em preser var seu sistema polftico e socioeconomico distinto Explicar este ultimo envolve olhar alem da esfera da corrida armamentista e de seus custos economicos tecnicos e polfticos As Pressoes Economicas 0 segundo conjunto de questoes comumente citado para explicar o recuo sovietico e o economico e em particular o impacto sobre a URSS dos embargos ocidentais e das restrioes no campo de tecnologia de pon ta Aqui e valido repetir que esta linha de argumentaao e contraria ao que ate aqui e percebido como 0 impacto do comercio intemacional Repensando as relac6es intemacionais 21 7 sobre urn sistema distinto no ultimo caso suporseia que o crescente comercio minaria o outro sistema e entao contribuiria para a sua der rubada na disputa LesteOeste consideravase que o comercio be neficiaria o bloco rival e que a sua morte seria apressada pela nega ao de tal interaao A maior parte da discussao do posguerra sobre a relaao entre o comercio e a segurana no contexto LesteOeste funcionou dentro da suposiao de que a maior interaao comercial entre os dois blocos contribuiria para a estabilidade do bloco sovie tico a discussao desenvolvida nos anos 1970 foi entre os que acre ditavam que maior comercio ao tornar a Uniao Sovietica mais se gura reduziria as areas de conflito entre ela e o ocidente e os que pensaram que isto encorajaria urn comportamento combativo Se a primeira visao fazendo uso das teorias da interdependencia do minou o inicio dos anos 1970 foi a ultima que prevaleceu no peri ado da Segunda Guerra Fria Com base na evidencia parcial disponivel pareceria que a intera ao econornica e as pressoes de varios tipos contribuiram duplamente para o colapso do sistema comunista Entretanto o mais importante fa tor nao foi a vulnerabilidade do sistema centralmente planificado mas a sua inabilidade em fazer uso das vantagens que o comercio como mun do capitalista proporcionou No caso de certos pafses europeus orientais a Polonia eo exem plo mais marcante a abertura para o ocidente no inlcio de 1970 teve ganhos de curto prazo em termos de disponibilidade de hens de consu mo e de investimento mas levou a uma crise de Iongo prazo com a df vida extema e a pres sao crescente sobre os ganhos domesticos uma vez que 0 refinanciamento da divida tomouse necessario 0 sistema econo mico centralmente planificado nao pode fazer uso do apoio extemo ade quadamente para desenvolver a sua propria economia e terrninou aprisi onado por seus compromissos intemacionais No caso da URSS toda a evidencia sugere que a interaao co mercia direta com o mundo capitalista teve como efeito fortalecer o sistema existente no curto prazo mais obviamente os altos preos do petroleo ganharamlhe tempo nos anos 1970 e as importasoes de trigo fomeceram o meio de apagar os fracassos na agricultura A elevasao do preo do petroleo em 1970 deu a URSS lucros inespe rados na maior parte da decada entretanto como os escritores sovi eticos recentemente apontaram as conseqUencias de Iongo prazo destes lucros foram inibidoras ja que permitiram aos planejadores centrais e aos administradores adiar mudansas que de outra forma poderiam ter sido introduzidas mais rapidamente 0 mesmo se aplicou ao caso da tecnologia o registro da inovaao tecnologica na URSS nao e de nenhuma maneira tao desanimador como freqtientemente e sugerido mas nao ha duvida de que a maioria das ino vaoes tecnologicas em decadas recentes originaramse no ocidente 218 Fred Halliday Aqui a URSS esteve em desvantagem em dois aspectos e o sgun do deles provavelmente foi mais importante do que o pnmetro E evidente para a propria URSS que ela nao prooveu nenhuma gade inovaao tecnologica e foi portanto compehda nas esferas tvll e militar a copiar ou simplesmente a roubar as vas tecnologtas do mundo capitalista 0 grau de isolamento sov1et1co d mercado m ternacional nunca foi tao grande quanto sugerem as 1magens con vencionais a industrializaao em 1930 dependeu pesadamente da importaao de hens de capital da GraBretanha e da Alemanha a historia aeroespacial sovietica e uma de reproduao das aeronaves e das tecnologias ocidentais Mesmo assim a URSS esteve sempre atnis na busca deste desenvolvimento tecnologico Mais importante ainda ela nao fi apaz de fazer uso apropnado das tecnologias das quais dispunha ex1stm pouca 1teraao entre s se tores militar e civil era inerente ao sistema de plamficaa centrahzada a falta de incentivo para a inovaao alem de serem encoraJados uso de metodos de produao ineficientes e tradicionais OS CnstrangientOS politicos e ideologicos inibiram o uso da tecnolog1a da mfxmao atra ves do sistema 0 padrao de modernizaao conservora 1dentrfcado como endemico as economias centralmente plamf1cadas funciOna va neste sentidoI6 Acima de tudo foi por isso qe a terceua evolu ao industrial do inicio dos anos 170 ada mcotecnologia e da precisao da engenharia computadonzada permitiU ao oc1dente ul trapassar a URSS mais do qe unca 0 papel da pressao econormca e do seu 1mpato politico tern d01s lados quando se consideram os embargos Aqu1 defendese que o comportamento sovietico na arena intemacioal foi afetado pelas rs trioes ocidentais sustentadas P preocupasoes de segurn9a naciO nal atraves do CoCom o Com1te Coordenador do Comercio Lese Oeste e dos embargos politicos mais amlos nuJcdos na esteua do Afeganistao primeira diziase tona s dificil para a URSS competir na cornda armamentlsta a ultima ana como retlrad o incentivo para aoes nao bemvindas da poht1ca exte sovtetlca Dado 0 grau em que a URSS protestou sobre estas restrioes parece c d Jl7 ria que seu tmpacto Jora cons1 erave Contudo em si mesmas estas pressoes d1fictlmente podem exph car a mudama na orientaao sovietica a partr da metade da eada de 80 a URSS face a urn terrivel atraso tecnologtco na esfera mtbtar po tver Bros e Laski From Marx to Market t7Para vislio sovietica do embargo ocidental ver Igor Artemiev International Economic Security em International Economic Security Soviet and BritishApproaches Chatham House Discussion Paper n7 1988 Repensando as rela6es intemacionais 219 deria ter feito concessoes substanciais tais como a retirada dos SS 20 ou o cancelamento dos mfsseis estrategicos SS18 sem colocar a sua estrategia global em questiio no curta prazo pelo menos eles nao responderam as sanoes polfticas do ocidente fazendo grandes concessoes de polftica externa e na verdade ate 1985 eles foram muito mais intransigentes do que antes Os mesmos fatores que di minufram a importancia do impacto comercial e tecnologico ocidental serviram para diminuir o impacto de sua retirada o sistema polftico e econCmico centralizado poderia absorver os choques assim como poderia inibir a difusao de novas tecnologias A Erosio do Bloco Urn terceiro fator adicional citado para explicar o recuo do poder sovietico foi o custo de apoiar econCmica e militarmente os seus aliados no Terceiro Mundo Inumeras razoes sugeremse para tal explicaao os proprios escritores sovieticos reclamaram aberta mente sabre os custos econCmicos e diplomaticos deste apoio e revrteram a sua previa visao kruschevitziana de que a libertaao nacwnal e os movtme11tos revolucionarios do Terceiro Mundo tinham uma contribuiao positiva para o poder da URSS 18 o conceito de superetensao imperial pareceria se aplicar aqui e fornecer uma perspectiva comparada sabre o recuo sovietico o proprio carater das relaoes sovieticas como Terceiro Mundo residindo em substanci ais subsfdios econCmicos em troca de recompensas polfticas e es trategicas tornou este conjunto de relacionamentos especialmente custoso para os estrategistas americanos no infcio de 1980 o elo mais fragil do sistema sovietico residia no Terceiro Mundo e por isso formulouse a Doutrina Reagan de apoio aos movimentos de guer rilha anticomunista Entretanto urn exame mais detalhado revela que a pres sao dos com promissos do Terceiro Mundo pode ter sido diferente e em alguns as pectos men or do que parece a prime ira vista 0 maior custo destes com promissos para a URSS foi no campo diplomatico o apoio sovietico aos alados e movimentos revoluciomirios piorou as relaoes com os EUA e a mvaso doAfeganistao criou condioes para que o ocidente rompesse os relac10namentos entre a URSS e o Terceiro Mundo como urn todo Galia Golan The Soviet Union and the National Liberation Movements in the Third Word London Unwin Hyman 1988 Jerry Hough The Struggle for the Third World Sov1t Debate and American Options Washington Brookings Institution 1986 Fred Halhay Cold War Third World Capftulo 4 para o repensamento da polftica sovietica em direlliO ao terceiro mundo 220 Fred Halliday Os outros fatores normalmente citados o econCmico e o mili tar podem tambem ter sido menos significatios Em primeiro Iu gar os numeros da ajuda sovietica ao Tercetro Mundo englobam varias formas de apoio incluindo no caso do mawr compromtso Cuba grandes acordos comerciais de Iongo przo que garanttarn termos comerciais muito melhores do que podenam ser consegut dos no mercado mundial preos mais altos para o aucar baixos para o petroleo Porem estas nao eram transferencas totais d e cursos no sentido comum No caso de Cuba extsttram beneftctos para a URSS obter aucar e nfquel que poderiam ser pagos em rublos ao inves de moeda real em outros casas o aliado do Tercei ro Mundo foi capaz de abastecer a URSS com importa9oes de valor gas afegao sendo urn exemplo Segundo e a despetto das sule restimativas sovieticas de seu registro de ajuda o montante de aJ da mesmo em uma definiao ampliada foi em termos comparat vos muito baixo 0 25 do PIB bastante distante do valor amen cano 19 Apesar de Terse tornado politicamente conveniente dentro da URSS culpar os aliados do Terceiro Mundo que certamente a ministraram mal as suas economias devido aos atrativos econCmt cos da URSS este dificilmente foi urn fator central na crise econC mica do sistema sovietico Da mesma forma que no caso dos gastos militares o foco da criti ca precisa avanar por todo sistema de planejamento e produao e por suas ineficiencias que eram incidentalmente reproduztdas pelos progra mas de ajuda sovieticos dentro dos Estados do Teceiro Mundo Em 1980 0 custo estrategico de sustentar aliados no Tercerro Mundo estava certa mente subindo como urn resultado da Doutrina Reagan mas se o pro pos ito dos movimentos anticomunistas foi ode enfraquecer a URSS m seu ponto mais vulneravel ste acabou o send o caso Uma das pn cipais razoes para o envolvtmento sovtetlco e octental noAegantstao foi o efeito demonstrativo da derrubada de urn parttdo comumsta gover nante 0 impacto da queda de Kabul na Europa Oriental seria acredita vam os dois lados potencialmente enorme Mesmo asstm no fim nao foi na Nicaragua nem no Afeganistao que os aliados sovieticos foram primeiro derrubados mas na propria Europa Oriental Foam os aconte cimentos de Varsovia Bedim e Praga que afetaram constderavelmente Managua Aden e Kabul e nao o in verso 19De acoroo com ndmeros da OECD DAC Repensando as rela6es intemacionais 221 UM FRACASSO COMPARATIVO Ate este nto discssao identificou duas categorias de fator externo a tradtctonaltmpenal discutida no Capitulo 7 e cente fi L a mats re e espect ca esteOeste da Guerra Fria aqui abordada u Pdem ser conteradas como tendo desempenhado urn papel na o sao e na destruao do poder sovietico Apesar de ambas terem algum poder exphcattvo foram sugeridas razoes que podem tom I dequadas Desta maneira o argumento e entao empurrad aa lvad a reexaC das razoes do co lap so do poder sovietico no mvts tstonco e teonco a urn reexame duplo do que aconteceu na reahdade e de como a nossa concepao de competi9ao interestatal pode prectar de modifica9ao a luz do caso sovietico 1 nomeno que requer explica9ao e como urn sistema internaci a e d stados entru ent colapso na ausencia da mais evidente das as e ameaa nao fot derrado na guerra mesmo no Afe anis tao nao enfrentou desafios pohttcos vindos de batxo q fi g de t p 1 A ue 01 mcapaz con er a o om sndo a umca excao parcial a despeito de van os PTbemas econoucos e sociais ele foi capaz de atingir os nfveis efonos aos quais a sua populaao estava acostumada Portanto e e nao entrou em colapso falhou ou desmontou em 1 sentido aboluto 0 que ocorreu pelo contrano foi que a lidei Edo mats poderos no sistema decidiu introduzir urn conjunto radi c nte novo de pohttcas dentro da URSS e do sistema como urn todo nao Ot o caso deque os ovemados nao pudessem continuar send govrnados d anttga manetra OU de que OS governantes nao pudessem contmuar asstm governando Devese perguntar 0 que foi que levou estes govemantes que nao podem ser acusados de nao terem dese ado o per no pssado ou de terem sido defensores disfarados do ocien te a Intrrlzrr as mudan9as da fonna como 0 fizeram Dots ttpos de razoes uma end6gena e outra ex6 ter leado a este rsultad Bias podem ser denominaaa esumtd de parahsta soctoeconomica e de falta de competitividade mternc10nal paralisia foi evidente em muitas esferas variadas as xas t e esctmeno em queda os problemas sociais crescente 0 ume o crrup2ao e da destlusao e a crise ecol6gica Nao somen Iste nao pode contmuar reproduzindo as taxas de crescimen me ora no fornectmento do bemestar caracterfsticas de suas anmetras fass 1930 195 como tambem parecia ter perdido 0 as e uma manetra geral Na llteratura sovietica dos anos 1980 fe g temente fa fi A quen zse re erencta a estes fenomenos como a estag Porem este e de muitas maneiras urn termo simplista2o ele 6i 20Sobre a estagn Mkh ao ver 1 rul Gorbachev Perestroika New Think fi 0 and the World London Collins 1987 Capfulo 1 mg or ur Country 222 Fred Halliday I I l mou o grau em que houve progresso continuo em algumas esferas pelo menos na polftica e ainda continha a suposi9ao teleol6gica de que o sistema poderia sob outras circunstancias ter continuado a cres cer ease desenvolver Mais importante a estagnaao deixou de fora o fator vital que foi de muitas maneiras o mais importante para forar a lideran9a so vietica a introduzir mudan9as ao ser confrontada com esta tendencia a percep9ao do fracasso comparative do sistema visaviso ocidente Acima de tudo foi na percepao da falta de habilidade do sistema sovietico em acompanhar quanto mais superar o oeste que pode ser percebido o aspecto central do colapso do sistema sovietico Poi o fracasso em competir internacionalmente que levou as mudan9as p6s 1985 na URSS uma vez iniciada a tentativa de refonnar o sistema para melhor sobreviver e competir rapidamente afundou no insucesso de salvar o Estado como tal Dentre os varios estagios da perda de esperana o ultimo foi a per cep9ao da inabilidade do sistema em competir em 1980 0 primeiro de sapontamento hist6rico ocorreu imediatamente depois de 1917 quan do os Bolcheviques perceberam que a sua revolu9ao nao seria repro duzida na Alemanha Esta percepao levou a uma dupla redefini9ao de estrategia o abandono temporario do objetivo de uma revoluao mun dial e a proclamaao da ideia de que urn regime socialista poderia ser construfdo na URSS Com as vit6rias na Segunda Guerra Mundial e o aumento no numero de aliados pr6sovieticos no Terceiro Mundo em 1950 e 1960 parecia que este isolamento inicial poderia ser superado junto como desenvolvimento do socialismo dentro da pr6pria URSS Os sucessos da reconstru9ao do p6sguerra e da tecnologia espacial em 1950 pareciam confirmar isto daf o novo programa de Kruschev se cularmente otimista que combinava a rivalidade duradoura com o oci dente no Terceiro Mundo com uma politica de desenvolvimento social planejada para alcan9ar e superar o oeste em duas decadas Apesar de ser dificil de acreditar nisto agora parece que esta perspectiva mo dificada por Brejnev dominou o pensamento sovietico are o infcio dos anos 1980 houve avan9os continuos no Terceiro Mundo a URSS al canou a paridade estrategica com os EUA na corrida armamentista e em casa a polftica oficial era afirmar que a URSS atingira urn novo patamar de Estado urn estagio de socialismo desenvolvido Entretanto a realidade era bastante diferente como cada uma das principais areas de competiao interestatal e entre os blocos mostrou Na mais publicae privilegiada area de competi9ao a militar a URSS foi como vimos sempre inferior em numeros e qualidade exceto por sua fora convencional na Europa Oriental No infcio dos anos 1980 ela enfrentou novos desafios aos quais foi forada a aceitar e ineren temente incapaz de responder e faltoulhe algo parecido as capacida Repensando as rela6es intemadonais 223 des de projeao de poder global dos EUA e de seus aliados Se era nesta area que a Uniao Sovietica podia melhor competir evidentemente ela nao o estava fazendo bern o suficiente Em segundo Iugar o sistema internacional criado pela URSS era marcantemente mais fraco quantitativa e qualitativamente do que o ocidental 0 mercado capitalista nao somente era muito mais forte em termos de resultados economicos e de numero de pafses incluf dos dentro dele como tambem era maior o seu nfvel de integraao urn dos paradoxos do planejamento dentro da URSS e do sistema intemacional sovietico mais genericamente era a sua inabilidade para integrar setores alem de fornecerlhes alvos de produao separados supostamente coordenados Na esfera militar uma disparidade si milar e inferioridade qualitativa prevaleceu na comparaaO entre a OTAN e o Pacto de Vars6via Apesar de toda a ret6rica de constru iio de uma nova ordem mundial a ordem sovietica era menos inte grada e muito mais fraca no todo 21 Em muitos aspectos no mfnimo nos da inovaao e de preO ela permaneceu dependente do sistema capitalista e como sua imitadora ineficaz Em si mesmo este fracasso em competir internacionalmente seria urn problema central ja que a rivalidade LesteOeste e a Guerra Fria eram uma tentativa dos dois lados de fornecer uma nova base para a ordem intemacional e de demonstrar a superioridade de urn sobre o outro Mas este bloqueio externo que data desde 1917 e que somente foi escondido pelos triunfos internacionais subseqlientes era composto pelos limites intemos do sistema em muitas esferas o fracasso em igualar os nfveis de produao do ocidente o crescente gap nos padroes de vida entre os Estados socialistas e capitalistas desenvolvidos e a oposiao entre o grau substancial de sucesso democratico no oeste e o controle politico cen tralizado do leste obscurecido pela ret6rica da democracia socialista Tivesse sido a URSS capaz de rivalizar com sucesso como ocidente em outras esferas estas deficiencias internas indicadas pela estagnaao poderiam ter sido escondidas por mais tempo mas foi o fracasso no nf vel internacional que fowou a liderana a enfrentalas Aqui chegamos a uma caracterfstica central do colapso embora possa ser quase impossfvel acreditar nisso agora ate o infcio de 1980 parecia que esta diferena entre as conquistas internas estava escon dida ou pelo menos nao reconhecida pela maioria dos observado res sovieticos dentro da liderana ou em qualquer parte A autocon fiana inerente ao sistema sovietico urn produto das reivindica6es 21 obre a comparaao OTAN Pacto de Vars6via ver nota 15 0 grau de integraiio econ6 rmca entre os membros do Comecon do leste europeu era muito menor do que aquele dentro da CEE a maioria do comercio era em uma base bilateral entre os sovieticos eo 1esteeuropeu 224 Fred Halliday hist6ricas da revoluiio e da vit6ria na Segunda Guerra Mundial parece ter durado ate este momenta mas em algum ponto no inicio da decada de 1980 ela comeOU a desmoronar primeiro entre ali derana e depois entre a populaao como urn todo A percepiio de como a maioria das pessoas vivia no oeste e do enorme gap ntre os padroes de vida produziu uma situaiio na qual a autoconftana que havia durado desde 1917 evaporou Ano espao e algns po cos anos Nao e possfvel separar o economtco das dtmensoes poh ticas mas a evidencia sugere que foi o economico que desempenhou urn papel principal no encaminhento do rocessDJa vez qu ogap dos padroes de vida tornouse evtdente entao a egtttrmdde do ststema politico foi varrida e aquela do sistema alternattvo a vanante octdental de pluralismo foi aumentada Neste ponto e valido notar o mecanismo pel qual esta mdan de atitude parece ter ocorrido A separaiio da soctedade sovtettca fot tanto ffsica falta de comuniCaiiO interferencia no radio ausencia de viagem puniiio daqueles que buscavam o contato cm o mundo ex terno quanto psicol6gica uma crena que a despetto do que desse errado u nas luchse as coisas sao melhores conosco 22 Aqueles que viajaram para o exterior ou tiveram acesso a ados comparados eram condenados ao silencio mesmo quando percebtam a verdade Nestas circunstiincias a mudana nas ideias da liderana foi de crucial impor tancia e abriu as comportas do descontentamento popular a quebra da autoconfiana secular no topo da lideaa dev crtamene ter stdo encorajada pelos fracassos na compettao economtca e htar as parece que a propria percepiio dos contrastes nos padroes de vtda destacando a realidade da paralisia interna no final dos anos 1970 de sempenhou o papel crucial No caso de Gorbachev or exemplo are ce que suas visitas ao Canada forneceram tal oastao bastar cmco minutos em urn supermercado canadense medto para a questao fie clara e para que a experiencia das deficiencias e dos problemas espect ficos que ele tivera governando a regHo de Stavropol fossem coloca dos em seu contexto decisivo e internacionalizado Uma vez que esta mudana ocorreu seguiu entao urn processo de conscientizaiio mais ampla A liberalizaiio do sistema politico so mente dentro da URSS permitiu uma maior quantidade de informa iiO sobre o mundo capitalista quase toda ela favoravel quando nao sem crfticas e uma consideraiio mais negativa do registro da URSS Tambtim e visfvel como em discursos feitos depois de 1985 Gorbachev fazia ele mesmo compara6es com o mundo capitalista no campo dos indicadores sociais a mortalidade infantil as condi 22Hedrick Smith The Russians London Sphere Books 1976 fomec evocaao poderosa desta atitude no perfodo anterior ao colapso da confiana sovutica Repensando as relac6es intemadonais 225 oes hospitalares o alcoolismo e a disponibilidade de alimentos basicos assim como no dos indicadores macroeconomicos e poli ticos gerais 23 Seu proprio processo de autoeducaao parece ter seguido tal caminho ja insatisfeito com a performance socialista ele assumiu em 1985 aparentemente acreditando que o sistema socia Iista poderia reformarse pela aplicaao de tecnologia de urn modo mais intensivo percebida como a melhor maneira de acelerar a produao mas em 1989 ele havia avancsado muito mais nas fren tes economica e politica face a inabilidade do sistema em se refor mar dentro dos parametros politicos e economicos socialistas orto doxos Em outras palavras a comparacsao internacional que o leva ra ao ponto de iniciar as principais reformas em 1985 o empurrou depois de 1985 a vislumbrar uma reforma muito mais radical do sis tema 0 fato dele ter forcsado esta comparacsao ao povo sovietico liberando uma insatisfaao adicional e disseminada somente serviu para confirmar esta tendencia Como indicado acima ainda esta em aberto a questao se este projeto poderia ter sido ou nao bemsucedido dadas as dificuldades internas da transiao e da posiao internacional subordinada ocupa da pela URSS Entretanto esta clara que a decisao da Iiderancsa para a mudancsa foi produto desta combinacsao de pressoes internacionais e especificamente da percepcsao do gap entre os padroes de vida Aqui e possfvel fazer uma distincsao entre as duas fases amplas do colapso a primeira consciente e controlada de 1985 a 1989 e a segunda descontrolada quando a situacsao na Europa Oriental e na propria URSS ficou fora de controle culminando no golpe fracassa do de Agosto de 1991 e na subseqtiente dissolucsao da propria URSS A primeira fase levou a segunda nao porque Gorbachev e seus associados previram que ela aconteceria mas precisamente porque nao o fizeram eles acreditaram que algum sistema socialista modi ficado reformado humanizado e acelerado poderia funcionar e a16m disso que os regimes da Europa Oriental poderiam resistir depois da remoao da garantia militar sovietica Tivessem eles per cebido a fragilidade do sistema comunista na propria URSS assim como na Europa Oriental e mais ainda se as elites militares e polf ticas tivessem percebido a impossibilidade de sustentar tais regimes entao e possfvel que OS acontecimentos nao tivessem tornado 0 rumo que tomaram os regimes comunistas poderiam com crescente des moralizaao e entropia ter sobrevivido por mais alguns anos ou mesmo uma ou duas decadas 23 A Perestroika de Gorbachev esta repleta de chamados para a economia sovietica elevar se aos padr5es mundiais ie aos do ocidente 226 Fred Halliday I I I Uma vez que as gatantias militares foram removidas os regi mes da Europa Oriental desmoronaram Dentro da URSS uma vez que as restrioes a informacsao e ao cantata com o mudo exte10r foram removidas e uma vez que o papel da confrotacsao e da nva lidade com 0 oeste terminou a coesao poHttca do ststem desmoo nou Em ambos os casas a remocsao dos componentes mternacto 1 d f I nais da estabilidade do sistema levou ao resu ta o ma A tudo isto precisa ser somado urn outro fator atctonl os calculos polfticos e as iniciativas seletivas de Hderes octdentats par ticularmente este foi o caso d Alemanha no qa Helmut Kohl percebendo a sua oportunidade fist6rica de reumfcar o pats e de abolir 0 sistema comunista na Alemanha Onenta phcou u mescla de pressao e de seduao para atingir o seu objettvo Esta mtrven ao polftica consciente foi decisiva no curso dos eventos depos que 0 Muro de Berlim veio abaixo em Novembro de 189 mas ft pos sfvel somente no contexto criado par urn outro conjunto de ctrcuns tancias internacionaiS 24 OS TREs NlVEIS DE COMPETIQAO INTERNACIONAL Esta analise da competiao LesteOeste ate o finll de 180 e do subseqtiente colapso da URSS e do sistema cmumsta mts e nericamente tern algumas implicacsoes para a teonl as relaoes m ternacionais em geral e para as teorias da competlo mterestatl e intersocietal em particular que retomam as conclusoes dos Capttu los 3 4 e 7 Ninguem estudando o conflito Lesteeste pd negar a relevancia dentro dele de preocupacsoe que senam 5lemtdas na linguagem das RI como realistas o eJa co rla as form interestatais convencionats de compettao nos niVe uhtar ecno mica e polftico A rivalidade entre os sistemas sovtettco e amenca no no perfodo p6sguerra envolveu uma competiao abrangene a qual 0 fator de inovaao nao foi o papldo Estados mas ao mves disso a maneira pela qual esta compettao mterestatal desenvolveu se e novas terrenos par urn lado a corrida armantentisa nuclear e por outro a mobilizacsao abrangente de reAcusos teologtcos Dada a sua forte posicsao no campo econormco fm ntural que o ocidente buscasse usar a sua fora economic par por raoes de segu rana pressionar a URSS a economia pohttca mtrnac10nal das re Iacsoes LesteOeste foi em essencia a do uso de mstrumentos eco 24S b alia5es de Kohl neste periodo ver o diario de seu conselheiro politico Horst Tesi j9 Tage nnenansichten der Einigung Berlin SiedlerVerlag 1991 Repensando as rela6es intemacionais 22 7 nomicos para fins politicos e militares pelo bloco mais forte 0 dos Estados ocidentais Na fase final do conflito e uma vez que os Esta dos comunistas abriram as portas para a influencia ocidental em suas politicas e demais areas a pressao entao foi muito mais clara com prescrioes gerais sobre a liberdade economica sendo ligadas a con dioes especfficas sobre o papel do Estado na economia Isto esteve mais evidente no programa de dez pontos anuncia do por Kohl depois da queda do muro de Bedim apesar de apresen tado como urn conJunto de acordos entre os dois pafses ele foi na verdade urn programa para a subjugaao da Republica Democrati ca Alema Os pontos urn e dois falavam da cooperaao entre os dois Estados mas o ponto tres tomava tudo isso condicional a mudan a undaental no sisemapolfticc e economico da RDA que de vena ser trreverstvel tsto e a capttulaao Como seu assessor dei xou claro Kohl usou o termo estruturas confederativas nao con federaao de forma a impedir que a relaao entre os dois Estados adquirisse urn carater duradouro 25 A despeito de sua abrangencia esta competiao interestatal nao e suficiente para explicar como porque e quando o sistema comunista desmoronou como o oeste teve sucesso em prevalecer sobre o leste Casos previos de conflito intersistemico os casos otomano e man chu fomecem na melhor das hip6teses pontos parciais de com paraao apesar de algumas similaridades as hist6rias foram funda mentalmente diferentes Os instrumentos de competiao interestatal espcficos a Gurra Fria a crrida rmamentista os embargos o ssediO ao Tercetro undo nao exphcam porque a liderana sovi etica tomou as dectsoes que tomou depois de 1985 Para analisar a rivalidade e necessaria tomar a percepao LesteOeste como urn todo abrangendo a competiao de sistemas dentro da qual a competiao estatal desempenha urn papel importante mas nao exclusive Nesta perspectiva tornase possfvel aplicar as tres dimensoes de comletio interrelacionadas mas analiticamente distintas que foram dtscutidas no Capitulo 7 os nfveis de atividade dos Estados das entidaes sociais e economicas especialmente das firmas os da tdeologta e os da cultura ou seja as dimensoes interestatal socioeconomica e ideol6gica Ao se considerar a questao de como o oeste pressionou o leste esta distinao pode ser util Atuando no primeiro nfvel a aao estatal ocidental teve efeitos mas nao foi somente esta a hist6ria A habilidade dos Estados ocidentais em pressionar diretamente tomouse maior do que nmica como mostrou a ligaao entre a assistencia economica e a mudana socioeconomica den tro da URSS e da Europa Oriental a perestroika criou condioes para e 25Teltschik 329 Tage p 546 228 Fred Halliday nao resultou da intervenao socioeconomica o G7 No caso da Europa Oriental as firmas ocidentais as mdustnas os bncs tam bern desempenharam urn papel especialmente nas negoctaoes c a Polonia no infcio de 1970 e na administraao da produao sovte tica de petr6leo Na abertura que aconeceu a partir do final d 1989 as empresas alemas ocidentais assumtram urn papel e uma ltdra a de alguma forma coordenada com mas seprada o propro governo de Bonn Uma vez que mro veio abatxo fot a pressao do Estado alemao ocidental mats o tmpacto detas firmas que se combinaram para tomar impossfvel qualquer regtme reformado no leste Seria analiticamente enganoso reduzir a polftica estata nas relaoes LesteOeste aos desejos das corporaoes multmac10nats ou ver as ultimas agindo somente dentro dos parametres colocados por ou em nome dos Estados ocidentais Suas aoes sao paralelas e normalmente embora nem sempre convergente a resposta dos set ores da comunidade de neg6cios aos embaros Phtcos sobre os s tados comunistas foi evidencia suficiente da dtvrgencta a est repetto Porem a dimensao ideol6gica e cultural fot amda de matr tpor tancia 0 seu papel no colapso do comunsmo e la antenor nvahdade LesteOeste foi decisive de algumas manetrasActma de tdo o qe for ou a liderana do PCUS a mudar de curso e 6 que destrum o apmo ou a aquiescencia dos povos da Europa Oriental e da SS ao cmumsmo foi 0 contraste percebido entre os padroes e condtoes de vtda entre o leste e 0 oeste Esta dimensao ideol6gica certamente e algo 9ue OS Esta dos ajudam a promover e a regular que seus 6rgaos de mfoaao e propaganda disseminam e que restde na performane economtca nos resultados e nas politicas de vendas das corpora9oes Durante a Guerra Fria as estaoes de radio ocidentais transmttmdo para o les te estavam de uma forma geral conscietes de qu os programas sobre a cultura e o estilo de vida ocidentats destrmnam gota a gota a confiana e a legitimidade dos regimes do leste 26 Contudo este processo e de alguma forma distinto do govemamenta abrangen do a cultura popular a midia a moda e em termo mats ampls a imagem do que constitui uma boa vida ele cobma o tradtctOal conceito de ideologia com o de consumtsmo Alem dtsso esta dt seminaao de imagens nao resulta simplesmente da aao e d deI sao do Estado ou das empresas ela acontece de uma maeua nao coordenada mas penetrante Atraves da telvisao e dos ftlmes da musica popular de impressoes obtidas vtagns e enconros pes soais Ela e informal e difusa mas constltUl a mats poderosa mterface entre as duas sociedades 0 abandono de qualquer crena em urn modo 26Seminrrio de Gerald Mansell antigo chefe da BBC Overseas Broadcasting LSE Novembro 1992 Repensando as rela6es intemacionais 229 ou entidade socialista separada pela maioria dos habitantes da Ale manha Oriental e acima de tudo urn produto deste encontro anos de exposiejaO as imagens da Alemanha Ocidental na televisao se guido pelo proprio encontro direto o Reiseshock A medida que esta distinejao e va1ida e a importancia dos fatores ideol6gicoculturais nas relaej6es internacionais e aceita entao sugere se urn outra intrpretaejo da Guerra Fria de seu fim e das relaejoes in temactoats mats genencamente e que envolve as pressoes para a ho mogenetdade e a foreja do exemplo ja discutidas no Capitulo 4 As rela CjOes entre os Estados retem a sua importancia e os mecanismos particu lare de cnflito e de mobilizaCjo de recursos permanecem sempre aber tos a analtse em uma base contmgente A negaCjao da eficacia do Estado e a prematura reduCjao de seu papel e enganosa assim como a insisten cia realista de que todas as relaCj6es internacionais podem ser vistas ou consideradas como ocorrendo entre os Estados Ao mesmo tempo a competiCjao internacional envolve duas outras dimensoes principais a nao oficial socioeconomica e a ide ol6ic A ultiiiIa tern sempre funcionado seria impossivl seguir a htstona da cnstandade de sua difusao e divisao sem ela Mas a dimensao ideol6gica tern uma importancia consideravel em urn mundo no qual o bemestar material a moda e o consumismo ocu pam urn Iapel eslecial n constitui9ao de sociedades especificas e em uma sttua9ao mtemacwnal caracterizada pela transmissao ime diata de sons e imagens Existe claramente uma rela9ao entre 0 po der e o poder ieo6gico concretizado pelo controle da imagem e dos mews de dtfusao Nunca a concep9ao de hegemonia de Grams ci no sentido de fatores ideol6gicos e culturais como instrumentos de dominaCjaO foi tao relevante como e hoje na analise do sistema intemaional Se o counismo se rendeu quase sem disparar ne nhum ttro fot porque o mstrumento de competi9ao internacional no final do seculo XX foi tanto a tshirt como a canhoneira 230 Fred Halliday capitulo 9 AS RELAOES INTERNACIONAIS E 0 FIM DA HISTORI Os dois capitulos anteriores examinaram a Guerra Fria e o seu re sultado a luz de dois dos temas que atravessam este livro 0 papel da he terogeneidade dos valores no conflito internacional e a contribui9ao e fatores socioeconomicos e ideol6gicos para o colapso do modelo sovte tico Este capitulo parte de uma visao mais ampla da evolu9ao do siste ma internacional incluindo o colapso do comunismo para sugerir algu mas maneiras pelas quais estes eventos p0dem iluminar as questoes le vantadas nos capitulos precedentes eo grau em que estas novas ques t6es e prioridades sao por eles levantadas No final dos anos 1980 inicio dos 1990 o mundo passou por urn terremoto estrategico e intelectual cujos efeitos sao compTeis aos causados pela Primeira e Segunda Guerras mas pelo menos mtctalmen te nao ao seu sofrimento humano Urn sistema hegemonico e a sua cor repondente distribui9ao de poder desmoronaram 0 mapa dos Etados foi redesenhado e cerca de 20 novos Estados soberanos foram cnados Urn grau de incerteza sem paralelos desde a decada de 1930 prevaleceu na arena internacional 0 mundo criado por este con junto de mudan9as nao correspondeu a nenhum modelo simples e certamente provocou consideravel confusao Neste capitulo depois de algumas observaCj6es gerais sobre o que ocorreu no periodo sao examinadas diferentes Ainter pretaCj6es sobre estes eventos e algumas ds respostas contemporanas Se evita a predi9ao ele espera mesmo assu oferecer algmas analtscs sobre para onde esta indo o sistema internactonal e a respetto das possi bilidades para o futuro Repensando as relaes intemacionais 23 1 0 DEPOIS DA GUERRA FRIA Os contoos hist6rcos e por esta razao a originalidade do que aconteceu no fmal da decada de 1980 podem ser resumidos breve mente 1 Urn bloco de Estados dominado pela URSS que desde 1940 estava engajado na competiao dos grandes poderes com o ocident e que na forma da pr6pria URSS vinha desafiando o mundo ociden tal deste 1917 desmoronou A origin ali dade do colapso deste siste ma precisa ser reconhecida como discutido no Capitulo 8 ele ocor reu sem uma guerra interestatal em urn espao muito curta de tempo sen a presena de formas evtdentes de vanguarda ou de organizaao poht1ca e sem derramamento de sangue significativo Alem disso em oposiao a outras revolues desde 1789 que em algum grau reivin dtcaram desafiar a norma mtemacional ou propor alga novo os que propnham a mudana neste contexto nao queriam como ate aqui tern stdo quase sempre o caso a criaao de algoma coisa nova uma altemativa a orem mndial dominante mas pelo contnlrio eles que n a onftdade aquela ordem urn recrutamento e uma incorpo raao tao raptda e sem dor quanta possfvel no que foi considerado como sendo a norma prevalecente seja ela a civilizaao a demo cracia o ocidente ou a modemidade 2 Algms importantes qualificaoes sao necessarias neste qua dro a mawna dos que eram govemados pelos partidos comunistas em 1988 17 bilhoes ainda o sao 14 bilhoes nao existe certeza sabre quais tipos de govemos aparecerao na antiga Uniao Sovietica ou em muitos de seus antigos aliados o futuro padrao da polftica externa russa e obscuro Apesar disso urn cataclisma de grandes proporoes ocorreu e trouxe urn fim nao somente a Guerra Fria e ao desafio da evoluao olchevique mas tambem a urn Iongci perfo do da htston mernacwnal n qua m movimento de contestaao da forma capttahsta hegemomca f01 tdentificavel 1Para breves avaliaoes er ike Bowkere Robi Brown edsFrom Cold War to Collapse Thery and World Polztzcs zn the 1980s Cambndge Cambridge University Press 1993 Rbm Blackburn ed After the Fall The Failure of Communism London Verso 1991 Mtchal Hog ed The End of the Cold ar its Meanings and Implications Cambridge Cambndge Umvers1ty Press 1992 Gabnel Partos The World that Came inform the Cold London BBCWorld ServiceRoyal Institute oflntemationaAffairs 1993 HorstTeltschik 329 TageJnneinansichten der Einigung Berlin Seidler Verlag 2Coo no teo us ado po Juren Habermas die fachholende Revolution o alcanar ou recuperar a revoluao What does socialism mean today The revolutions of recuperation and the need for new thinking em Blackburn edAfter the Fall Habennas pode ter tido a intenao de oferecer uma oposiao a visao comunista ortodoxa anterior sobre a revoluao socialista como uberholden superando o ocidente capitalista 232 Fred Halliday Como risco do que alguem poderia chamar de megalopre sentismo poderseda sugerir que 1989 trouxe urn fim ao periodo da hist6ria que comeou em 1789 com a Revoluao rancesa es te sentido o argumento de Fukuyama de que a novtdde na sttua ao contemporanea era a existenia e urn unico coJunto e res pastas aceitavel em escala undtal e en ert dtda vahdo E nisso acima de tudo que restde a 1rnportanc1a htstonca de 1989 urn ano que produziu tantas surpresas ou o que Hegel teria chamado de habilidade da razao quanta qualquer outro perfodo dramatico da hist6ria humana mas que se havia iniciado em meio as opinioes nervosas da elite de pollticos e jomalistas ocidentais que as vespe ras do bicentenario da Revoluao Francesa anunciavam que os le vantes e as rnudanas revolucionarias nao poderiam ocorrer e que as rnassas nao mais faziam hist6ria se algum dia o tinham feito 3 Nesta perspectiva o fim da Guerra Fria foi urn fenomeno com pasta envolvendo varias tendencias hist6ricas amplas que seguno s probabilidades demorariam urn Iongo tempo para funcwnar Em pnmet ro Iugar e de rnuitas maneiras o fato rnais importante o fim da Guerra Fria rnarcou o firn do conflito interestatal que dominara o mundo desde 1945 e o fim da confrontaao nuclear sovieticoamericana Duas ques toes futuras 6bvias foram primeiro se isto rnarcara o fim da rivalidade rnilitar entre OS grandes poderes COIDO urn todo pelo rneOS por Ua geraao ou rnais e segundo se urn novo padrao de blocos mterestatats e de hegemonia emergiria para substituir o velho 0 argurnento para sustentar a prirneira parceri ter consideravel fora hist6rica por urn seculo desde a guerra smoJaponesa de 184 os grandes poderesestiveram envolvidos em uma cofrontao rmhtar fundamental ou na ameaa de uma Agora a perspecttva para tsto pare ce ter definitivarnente diminufdo apesar de existirem os que preveem novas conflitos entre os grandes poderes para urn futuro pr6ximo pare ceria que 0 padrao do seculo passado fora uebrado 4 Existirarn especulaoes sobre novas conflttos emergmdo em tomo de blocos comerciais urn bloco de d6lar urn bloco de yen e urn bloco de ecu Apesar destes blocos comerciais em urn sentido frouxo stern claramente se formando e de ocorrerern fncoes sabre o comercto o mundo estava rnuito lange das guerras cornerciais ou dos sistemas clusivos que prevaleceram antes da Segunda Gue Mundtal e ea dtft cil velos se formando Alem disso mesmo se extsttsse urn confltto sa bre o comercio e urn fluxo de nacionalismo dirigido contra os competi 3Para uma perspectiva interssante ver Gale Stokes The lessons of 1989 Problems of Communism vol 40 n5 SeptemberOctober 1991 4 Richard Rosecrance A new concert of powers Foreign Policy vol 71 n2 Spnng 1992 John Mearsheimer Back to the future Instability in Europe after the Cold War International Security vl5 n summer 1990 Repensando as rela6es intemacionais 233 dares comerciais nao havia a inevitabilidade ou inicialmente mui ta probabilidade de que isto levasse a uma confrontaao militar Quanta a hegemonia e aos perigos de urn novo imperialismo existe agora uma situaao de grande fluidez em que nenhum bloco de Estados pareceria emergir para se equiparar aos EUA mas onde os proprios EUA pareceriam relutantes em desempenhar o papel romano que o colapso da URSS lhes atribuiu A ideia de que a guerra entre os Estados e quase sempre evitada quando existem os Estados democniticos liberais bemexplicada nos escritos de Michael Doyle e bastante interessante embora venha sendo utilizada como uma apologia para esconder como os Estados democniticos decla raram guerra contra os nao democniticos 5 apesar de verdadeiro em urn sentido pontual ele deslocaria nossa atenao para o renascimento de regimes autoritarios em alguns grandes Estados e para a questao da possibilidade de que alguns poderes tenham divergido deste modelo no Iongo prazo como a Russia ou o Japao ou os EUA a GraBretanha e a Alemanha tornados pela depressao A segunda dimensao do tim da Guerra Fria foi o tim do comunis mo como uma fora polftica Como ja indicado isto foi inicialmente urn fenomeno continado as regioes europeias e asiaticas da antiga URSS entretanto a tendencia dentro da China pareceria indicar uma mudana em direao ao capitalismo se nao ao liberalismo e os Esta dos comunistas remanescentes seriam incapazes de fomecer uma alter nativa intemacional Cuba Vietna e Coreia do Norte Duas questoes amplas surgem aqui primeiro qual futuro existiria agora para uma al temativa ao capitalismo ou se pelo menos haveria alguma e segun do qual fora a importancia historica de toda a experiencia comunista Com relaao a primeira parece que nenhum programa de desatio poitico revolucionario ao capitalismo liberal vindo da esquerda teria hoJe qualquer credito ou apoio serio 0 desatio comunista esta agora esgotado 0 que permaneceu foram as variantes de adaptaao social democrata dentro do capitalismo avanado mas que sao cada vez mais restritas pelas condioes intemacionais e pelas contiguraoes sociais e polfticas em mudana dentro dos pafses individuais Convencionalmente se afirma que o colapso da social democracia foi em parte urn resulta do o fracasso do comunismo o reverse pode entretanto ser o caso a dmamica da democracia social e de suas equivalentes foi quebrada nos pafses mais avanados em 1970 GraBretanha EUA Australia e Alemanha A propria falta de uma terceira via mediana e facti vel signi 5Liberalism and world politics American Political Science Review v80 n4 December 198 e em duas partes Kant liberal legacies and foreign affaris em Philosophy and Public ffatrs vol 12 summer 1983 e autumn 1983 Para uma crftica profunda dos maus usos ldeol6gicos ver o argumento de Doyle mas nao o m1cleo do proprio argumento ver Benedict Anderson The new world disorder New Left Review n193 MayJune 1992 234 Fred Halliday ticou que as escolhas disponfveis para os reformadores comunistas no final dos anos 1980 estavam completamente fechadas A questao do que foi o comunismo ainda muito proxima para permitir uma perspectiva confortavel tern varias candiatas a res pasta uma tendencia ditatorial na qual as elites revoluc10nanas to maram o controle das sociedades urn movimento fracassado de auto emancipaao de uma classe trabalhadora uma expressao de messi anismo judeucristao urn produto de despotismo oriental urn pro jete desenvolvimentista fracassado 6 Urn autor criterioso sugeiu que o comunismo poderia terminar sendo comparado ao expenmento jesufta no Paraguai uma tenativ racional de separar ua parte do mundo das pressoes intemac10nats de sustentar urn cammho de de senvolvimento alternative muito idealizada pelos intelectuais de seu d 7 tempo mas que no fim desapareceu sem etxar traos Alguma explicaao envolvendo diferentes elenos esta hsta acima pode ser muito apropriada em retrospeto e facll dtzer que comunismo nunca funcionou mas esta tentattva de escapar ao camt nho convencional de desenvolvimento capitalista foi bastante bemsu cedida por algum tempo no mfnimo no desatio ideologico e militar colocado para o oeste mesmo que no tim ele tenha sido forado a ca pitular e a fazelo quase sem qualquer resistencia Embra o seu fracs so agora para inevitavel o experimento comuntsta ao fot percebtdo assim durante muitas decadas tanto entre os que o apmaram como entre os que o temiam havia uma crena na eticacia da intervenao do Esta do socialista desmentida pelos eventos subseqlientes Pelo menos cmo sugerido no Capitulo 8 o colapso comunis merece urn estudocutda doso a partir da perspectiva dos que acredttavam no desenvolvtmento socialeconomico dirigido pelas elites ou ditado pelo Estado 0 terceiro elemento do tim da Guerra Fria foi a quebra da URSS e de seu sistema de alianas Nofinal de 1991 ainda nao era muito clara se o processo estava completo nao somente na Europa ental como tambem na propria Russia a Federaao Russa esteve suJetta a substan ciais foras centrifugas e ate mesmo poderia terse quebrada em tres partes sob pres sao intemacional e intema Mesmo se este processo de fragmentaao ja estivesse completo ele hberou mudanas poderosas na arena intemacional Ele criou uma situaao na qual com a quebra da ordem preexistente novas alianas regionais e novas paise hege monicos potenciais emergiram na Europa a Alemanh no Caucas Mar Negro e Asia Central a Turquia No Extrema Onente os reah 6Para uma localizaao percepti va ficcional do comunismo na corrent mais ampla do pensamento racionalista e messianico cristao e judruco ver George Stemer Proofs and Three Parables London Faber Faber 1992 7Perry Arderson A Zone of Engagement London Verso 1992 pp 3679 Repensando as rela6es intemacionais 23 5 nhamentos foram menores o poder sovietico ja estava mais fraco mas isto incentivou e coincidiu com o aumento dos poderes chines e japo nes Na verdade o Extremo Oriente foi a area com maior margem de manobra polftica e economica e prometia ser o sustentaculo do secu lo XXI se ela podera cooter estas mudanas sem urn grande conflito militar nao ficou ainda evidente 0 impacto sobre a Indochina com a remoao do papel sovietico no Camboja e no Vietna e no nordeste da regiao asiatica foi todavia substancial e contfnuo Algumas destas mudanas regionais levaram o mundo de volta a uma situaao anterior a 1914 sendo o padrao das alianas nos Balcas e no Bitico os casosem questao Outros padr5es foram novos a disputa turcotramana na Asia Central descendendo apenas remotamente das antriores Pareceria provavel que alguns destes poderes assumiriam ma10res responsabilidades e papeis intemacionais no seculo seguinte a Alemanha eo Japao politicamente muito diferentes do que eram antes da Segunda Guerra Mundial estavam relutantes em desempenhar tal pael especialmente no campo militar mas no fim seriam forados a fazelo Alguns viram esta reticencia somente como urn reconhecimento justo de seus passados criminosos mas nao era na polftica extema con temporanea que estavam os seus problemas com o passado 0 rnais pre ocupante sobre estes pafses nao era o perigo proximo de se tomarem novamente poderes militares agressivos mas sim a evasao e o eufemis mo que ainda prevaleciam em suas vidas domesticas Urn reconhecimento mais saudavel do passado lhes teria permitido urn papel intemacional mais adequado nas dimens5es economica e de segurana A quarta conseqliencia ampla do colapso do comunismo foi a que bra de u regime que prevalecera desde o fim da Segunda Guerra Mundtal e a parttr do qual mantinhase o existente mapa do mundo com suas desigualdades e arbitrariedades A despeito de toda ret6rica sobre a cisao e a unificaao que marcaram a epoca p6s1945 e surpreendente como ate 1989 este mapa mais ou menos se mante ve stdos tomaramse iependentes alguns perderam partes de seu terrtt6no mas a atual dtvtsao em 170 Estados foi mais ou menos con gelada A unificaao ou a fusao ocorreram somente pela fora e em mmentos d mcerteza nascendo da descolonizaao Palestina Saara octdental Ttmor e pode ser discutido Tibet ou atraves de fusoes volunaias novamente no momento da independencia de entidades colomats formalmente separadas Camaroes Somalia A secessao sonente ocorreu no caso de Bangladesh em 1971 mas ele ja era uma enttdade geograficamente separada do res to do Paquistao 8 obre secesso vr James Mayall Nationalism and International SocietyCambridge 3lllbnd7 Umverstty Press 1990 e Alexis Heraclides The SelfDetermination of Natzonaltzes and International Politics London Frank Cass 1991 236 Fred Halliday Depois de 1989 ambas a fusao e a divisao reapareceram na ordem do dia era esperado que a fusao dos Yemens e das Alema nhas fosse seguida embora com algum atraso pela das Coretas e provavelmente de uma forma ou de outra pela das te hinas Por outro lado a divisao foi o destino dos Estados multletmcos do an tigo sistema comunista URSS Jugoslavia Eti6pia Checoslovaquia Como resultado no espao de dois anos mais de vinte novos Esta dos soberanos passaram a existir Ninguem ainda podia dizer quais seriam os efettos demonstrattos deste processo mas nao deve haver duvida de que a queba do regme p6s1945 encorajaria muitos outros a pensar que ees tambem penam alcanar urn status separado de Estado Algumas aras foram mats afe tadas do que outras e aparentemente a fragmentaao somene ocorre ria em Estados nos quais os regimes comunistas foram desaloJados en tretanto partes da Europa e da Africa assim como da india provavel mente tambem estavam sujeitas a tensoes crescentes agora que s mos trou que a secessao era permitida Por sta razo pncipalmertte foi essencial que os Estados e os orgamsmos mtemac10nats desenvolvessem alguns meios mais adequados para avaliar e regular estc processo com portamento da comunidade intemacional sobr a questao a secessao tern sido urn exemplo marcante da lacuna entre o tdeal e a prattca enquanto 0 sistema e fundado sobre a suposiao de que OS poVOS sao SOberanOS e de que tern direito a seus pr6prios Estados a pratica tern sido a de oor a secessao ate o ultimo momento exceto quando prevalece urn automte resse direto freqlientemente de urn tipo expansionista A quebra da URSS e de seus tres Estados multietnicos associados no perfodo de 1989 93 ocorreu a despeito de nao por causa do encorajamento intemacio nal A resposta intemacional foi uma aceitaa relutante atrasad bern resumida na observaao informal do Secretano do Extenor da GraBre tanha Douglas Hurd em Junho de 1993 Espero que nao vejamos a cri aao de mais nenhum Estadonaao VARIEDADES DE AVALIAAO HISTORICA Eni termos amp los existiram tres tipos e resposta a esa muda as Uma foi o pessimismo secular uma sobttedade melanchca da dt reita que via a que bra da ordem da Guerra Fna coo em mmtos aspec tos urn retorno ao mundo anterior ao de 1914 ou aquele entre as duas gurras mundiais levando a urn maior conflito interesatal a roi feraao nuclear e ao hipernacionalism A segunda fot o pesstmts mo da esquerda que afirmava que estavanos em uma nova poca imperialista que o Norte era incapaz de ajudar n desenvolvtmen to do Sul que a destruiao ecol6gica estava contmuando e que os Repensando as rela6es intemacionais 23 7 EUA iriam sozinhos ou em associaao com seus antigos aliados usar as novas oportunidades para dominar o mundo A terceira abor dagem foi a otimista que viu o mundo como se tendo movido deci sivamen aiante e como sendo urn periodo no qual certos objeti vos deseJavets a paz a democracia e a maior prosperidade esta riam agora disponiveis para todos Embora estas abordagens tenham tid o merito de fornecer interpreta6es abrangentes elas eram de fictentes em alguns aspectos 6bvios A perspectiva pessimista de urn retorno a 1914 parecia sustentar se nas novas formas de conflito interestatal e na ascensao do nacionalis mo mas Ievou a analogia muito Ionge os principais poderes nao esta vam se atracando em urn nacionalismo dirigido urn contra o outro e es tavam relativamente desinteressados em prepararse para a ao militar houve uma torrente de nacionalismo mas ela tomou uma forma comu nal e interetnica muito distinta da estrategica 9 Muito foi dito sobre o destino cruel de Saravejo com a piada de humor negro de que somete as gurras mundiais que se iniciam em anos pares come am Ia Mas apesar de todo o horror e sofrimento e das diferenas de postao entre os membros do Conselho de Segurana este nao fot urn confltto que ameaou provocar uma guerra entre os grandes poderes Os pr6prios Estados envolvidos na arena internacional ti nhm mdad dramaticamente desde 1914 principalmente pela umversaltzaao d deocracia nenhum dos Estados mais impor tanes tmha suato umversal em 1914 e pelo crescimento da pros pendade econormca A Alemanha por exemplo nao era o Estado que fora em 1914 ou em 1939 a juventude neonazista era repug nante mas ainda nao era perigosa para os outros Estados como o foram o Kaiser ou Adolf Hitler oespirito d analogia hist6rica alguns compararam este periodo da htstoa ao a belle ePoque as decadas anteriores a 1914 quando a Europa mdustrtal parecena estar em urn novo pico de sucesso economi c politico e cultural somente para depois mergulhar nas guerras do seculo XX Extstem semelhanas com a belle epoque pelo menos na crena complacente de que os Estados ricos do ocidente haviam resolvi do os seus problemas e na elegancia das varias formas de irracionalismo Contudo existm difernas marcantes no minima tudo o que aconteceu no seculo mtervemente Poucos nos paises industrializados aora acreditavam como muitos o faziam seculos atras com graus va nados de presunao social darwinista que a guerra era urn meio via vel quanto mais desejavel de resolver os conflitos entre os principais para uma corrao davisao prevalecente sobre o nacionalismo como a ideologia domi nante a epoc ver Enc Hobsbawm Nations and Nationalism Since 1870 Cambridge Cambndge Uruversity Press 1990 23 8 Fred Halliday I I I I Estados Igualmente importante o mundo nao estava em urn periodo no qual estavam emergindo novos desafios ideol6gicos em situa6es de conflito social e politico uma das mais marcantes e em sua ma neira deprimentes caracteristicas do conflito internacional p6s1989 era que ninguem estava falando nada novo e que muitos estavam fa zenda os mesmos tipos de suposi6es que haviam sido escutadas urn seculo antes As verdades do nacionalismo nos Balcas ou a conflitan te aspiraao em torno de NagomoKarabagh nao eram sejam quais fossem os outros problemas o comunismo ou o fascismo do dia Na verdade o que foi de muitas formas desanimador a respeito de todo este fracionamento e clamor estridente e como ele era extremamente familiar Sabemos que o Sr Karadzic o Hder b6snioservio terapeuta de grupo para urn time da segunda divisao de futebol tornouse urn demagogo o encontramos muitas vezes antes Pcrtano m mmos aspectos o mundo se encontrava em uma nova sttuaao mtemacto nal tanto com relaao ao periodo do p6s45 como no geral A posiao contraria a do pessimismo da esquerda fortaleceuse com a Guerra do Golfo e existiram muitos que buscaram tirar li6es ge rais sobre o mundo p6scomunista a partir daquele evento 10 Deixando de lado a freqtientemente autocentrada analise de por que a guerra ocor reu os seus criticos estiveram em muitos aspectos e nao somente na cosideraao do significado de Iongo prazo do conflito errados Pri meiro e por toda a destruiao feita no Iraque o custo foi muit menor do que sugerido na epoca o total de iraquianos mortos 10 rml era 11 20 do que fora suposto e a despeito de toda a ret6rica do Iraque sendo bombardeado de volta a dade da Pedra quase todo o estrago da guerra tinha sido reparado em pouco mais de urn ano 11 A despeito do sonho imperial da direita e da especulaao sobre o carater de uma nova o dem mundial na esquerda os EUA nao foram capazes de usar a vtt6ria para colocar pressao sob seus rivais economicos ou ob outro pases do Terceiro Mundo nao ocorreu urn aumento no sentrmento mihtansta nos EUA como George Bush para seu desapontamento descobriu existiram movimentac6es em varias quest6es do Oriente Medio inclu indo a arabeisraelense e a liberdade de expressao pelo menos para os kuwaitianos no Kuwait A Guerra do Golfo foi urn capitulo importan te mas essencialmente diversivo nos assuntos mundiais A critica dos pessimistas da esquerda teve mais forca em outras partes primeiro com relacao a marginalizacao da discordancia orga 10Ver Capitulo 10 nota 3 11Para uma visao geral da guerra ver Lawrence Freedman e Efraim Karsh The Gulf Conflict 19901991 Diplomacy and War in the New World Order London Faber Faber 1992 Sobre mortes ver John Heindrich The GulfWar How many Iraqis died Foreign Policy n90 Spring 1993 Repensando as rela6es intemacionais 23 9 nizada e da crftica radical dentro do mundo desenvolvido e subdesen volvido e segundo sobre o problema das relacoes economicas inter nacionais e como a riqueza dos pafses mais ricos pode dados cons trangimentos hist6ricos e novos ser difundida de uma maneira razo avel para o resto da humanidade Esta questao sera discutida mais adiante neste capitulo e se trata de uma na qual as certezas convenci onais da direita e da esquerda parecem nao mais prevalecer Os dois pessimismos o da esquerda e o da direita comparti lham uma visao comum sobre o papel reduzido do Estado e sobre a crescente globalizacao do mundo nos nfveis economico politico e cultural No nfvel te6rico a questao mais desafiadora a ser enfrenta da e a de produzir uma resposta as mudancas no mundo de fora mudanca que tern se refletido em urn corpo crescente de literatura academica ou seja como conceber a crescente intemacionalizacao do mundo Aparentemente a intemacionalizacao pode ser vista por todos no comercio intemacional no crescimento das comunicacoes no encurtamento das distancias na criacao de urn sistema financei ro global e no decrescimo das localizacoes nacionais de empreendi mentos especfficos 12 Dentro da Europa temos urn processo de cres cente transferencia de poderes para as instituicoes da Uniao Econo mica e a introducao de urn mercado unico em 1992 Este quadro de crescente intemacionalizacao e normalmente acompanhado por duas outras preocupacoes as crencas de que a posicao do Estado como previamente estabelecida esta desmoronando e de que a natureza do poder no mundo contemporaneo esta mudando deixando de ser con finada ao poder militar paraser mais baseada em fatores economi cos e mesmo culturais 0 mundo esta somos levados a acreditar tomandose mais e mais internacional Ao mesmo tempo existe urn forte argumento pessimista a ser fei to sobre as tendencias globais a demognifica a tecnol6gica e a ecol6gi ca e as suas diferentes implicacoes nacionais urn exemplo contunden te desta abordagem e a de Paul Kennedy em seuPreparingfor the Twenty First Century 13 Ele e urn profeta qualificado e pouco entusiasta da rufna em oposicao a Fukuyama ele negligencia a polftica e o papel das ideias quase que completamente enfocando somente a mudan ca economica e cientffica Por outro lado seu pessimismo e de urn tipo nocivo e resignado Iiberto do peso nietzscheniano ou do da rwinismo social encontrado em escritores anteriores 12Para uma excelente visao das questOes envolvidas ver Joseph Camilleri e Jim Falk The End ofSovereingty The Politics of a Shrinking and Fragmenting world Aldershot Elgar 1992 Sobre a intemacionalizaiio das finanas ver Susan Strange Casino Capitalism Oxford Basil Blackwell 1986 13Preparing for the TwentyFirst Century London Harper Collins 1993 240 Fred Halliday Kennedy comeca com a analise de Thomas Malthus rimeiro publicada em 1798 segundo a qual o aumento da populacao mun dial iria superar o crescimento na producao de comida Ele argumenta que em sua epoca Malthus estava enganado por pelo mnos tres razoes a imigracao retirou o excedente populacwnal dos patses com as taxas mais rapidas de crescimento a produtividade agricola au mentou mais rapidamente do que esperado a industrializacao for neceu novas formas de emprego Sua suposicao agora e que dois seculos depois urn pessimismo comparavel ao de Malthus e muito mais valido a populacao mundial esta crescendo mais rapidamente do que nunca as pressoes demograficas economicas e sociais es tao criando maiores tensoes ainda no Terceiro Mundo a mudanca tecnol6gica atraves da robotizacao e da revolucao da biotecnolo gia esta reduzindo o numero de empregos disponfveis e promovendo maiores desigualdades de riqueza e produtividade Portanto ele nao esta dizendo como Malthus o fez que o mun do ficara sem comida mas ao inves disso que urn conjunto de outras contradicoes ira provocar conflito intemo e intemacional a popula cao esta crescendo onde a crise ecol6gica e mais extrema a mudanca tecnol6gica e separada da explosao demografica 0 numero de em pregos disponfveis esta sendo reduzido Apesar de destacar em urn conjunto de analises sobre pafses e regioes que a performance eo potencial variam enormemente entre os pafses ele alerta contra qual quer ideia de que os Estads mais ricos do mundo possam ser pro gidos das tensoes no Terceuo Mundo a mtgracao os levantes politi cos e militares os conflitos economicos e acima de tudo a degrada cao ambiental garantem que este seja urn conflito global Kennedy nao e fatalista sobre estas tendencias mas destaca que a maioria delas nao podera ser evitada ao Iongo das pr6ximas deca das e que o Estado apesar de permanecer como o instrumento princi pal para administralas e cada vez mais inadequado para a tarefa de confrontar os problemas globais Ele nao tern nada a dizer sobre a solucao freqiientemente proposta a governanca global e as institui coes intemacionais e el consegue pintar urn quadro horrivel sem discutir o renascimento dos nacionalismos e dos conflitos etnicos Kennedy nao diz que o mundo esta fadado a se deteriorar da foa que ele indica e ele sugere como Malthus o fez antes dele que extste algo que os Estados podem fazer Mas ele esta Ionge de saber se to dos ou se de fato quaisquer Estados irao responder ou se mesmo se eles fizerem tudo que estiver a seu alcance is to sera suficiente Existe portanto uma consideravel quantidade de verdade nesta suposicao da globalizacao mas ela precisa ser qualificada Primeiro varios temas aos quais as pessoas se referem a migracao e os movi mentos religiosos transnacionais por exemplo ameacam o mundo con temporaneo ha muito tempo Segundo as tendencias indiscutfveis em Repensando as rela6es intemacionais 241 direlio a globalizalio em alguns terrenos mais do que em outros coincidem e na verdade estimulam maiores divisoes a politica da etnia e uma resposta 6bvia Mais importante ainda ambos sugerem para o melhor e para o pior freqtientemente para o pior que o poder dos Estados esta sendo erodido por estas foras transnacionais e que cada vez existem menos governos eleitos ou de fato nlioeleitos capazes de administrar os neg6cios de seus pafses Aqui deve ha ver cautela consideravel Primeiro como discutido no Capitulo 3 a propria globalizalio e em uma medida consideravel trabalho dos Estados que dirigem estimulam e ajudam as companhias a fazer o que eles querem que elas faam ninguem acredita que os neg6cios japoneses ou alemlies operem independentemente dos Estados nem isso se aplica a seus competidores franceses e anglosaxlios Aiem disso existe muito que os Estados podem fazer para estimular a competilio no plano interno mesmo quando eles perderam parte de seu controle dos fluxos de capital e das taxas de juro Na verdade podemos ter de fazer uma distinao entre duas ques toes primeiro pode qualquer forma de representalio humana ba seada no Estado ou em alguma outra instancia dar conta dos pro blemas que enfrentamos segundo caso seja possfvel alguma resposta estrategica intencional a estas questoes estas precisam ser baseadas no Estado ou em algum organismo intemacional Recentemente o conceito de govemana global tern ganho importancia e despoja do de aspiraoes nao realistas pode ser visto como tendo vanos com ponentes o fortalecimento das instituioes globais e regionais exis tentes a evolulio da lei e das normas prevalecendo sobre o compor tamento internacional a protelio e a promolio internacional dos hens publicos sejam estes o meio ambiente o espao os minerais ou os oceanos A despeito do quanto ainda podemos avanar e avan aremos nesta estrada os componentes da estrutura de governana serlio fundamentalmente os Estados e as consideraoes que movem os poHticos ou o publico a aceitala deverlio abranger urn interesse baseado tanto no Estado Cnacional quanto no global 14 0 mesmo se aplica ao terreno da competilio internacionallegfti ma e das principais tendencias globais ameaando a sociedade Pesqui sadas por Paul Kennedy Se tomarmos os tres fatores que ele considera como sendo as chaves da competitividade intemacional de Iongo prazo a qualidade da educalio o status das mulheres e a qualidade de lide rana politica entlio os Estados e as sociedades retem uma larga me dida de liberdade em todas estas e somente tern a si mesmos para culpar ou as press6es extemas se falharem em agir 0 mesmo sea plica as gran 4Sou grato a Meghnad Desai e a outros colegas no Centre for the Study of Global Governance na LSE por estimular a discusslio sobre esta questlio 242 Fred Halliday des ameaas ecol6gicas e demograficas que Kennedy corretamente aponta como pairando sobre o proximo seculo ests nao serao cn sidetadas contidas ou resolvidas por uma comumdade mternacto nal ou por foras transnacionais Os Estados e somente os Estados embora impelidos e ajudados por 6rglios nlio oficiais tern o poder de fazer algo sobre isso No minimo os desafios identificados por Kennedy e outros tornam ainda maior a necessidade por Estados as disciplinas e os custos das politicas de ajuste somente podem ser impastos por eles Portanto a crescente importancia do internacional tanto real como aparente e urn processo historicamente mais complexo e de dupla face muito alem do que nos levaria a suspeitar a afirmalio de que o mundo estase tornando mais internacionalizado Simultaneamente o mundo esta se movendo em pelo menos duas direoes contradit6rias Isto ja es tava evidente no processo amplo de mudana que esta ocorrendo e ain da mais claro no mundo no qual entramos recentemente como m re sultado das mudanas da ultima metade dos anos 1980 A Isto nos leva a ultima das perspectivas sobre o mundo contempora neo a otimista de que de alguma maneira encontramos uma resposta tanto internacional como domestica e que as coisas serao melhores Se concor darmos que a competilio militar entre os grandes Estado e pelo meos por urn tempo improvavel isto nlio signific que o confl1to nas relaoes internacionais declinara ou que qualquer cotsa se aproxtmando de uma nova ordem mundial foi ou podera ser criada Por urn breve perlodo entre 1988 e 1989 quando os EUAe a URSS estavam trabalhandojuntos para reduzir os pontos de tenslio o termo nova ordem ntundial tia m sentido real mesmo que limitado 0 colapso da URSS tiroulhe o stgnlfi cado e a proliferaao dos conflitos nao somente no Terceiro Mundo como tambem nos Balclis mostra como esta vislio onirica era infundada Mes mo em sua forma liberal intemacionalista de acordo com a qual os gran des poderes farao o seu melhor para ajudar o mundo ea e enganosa ja que superestima a vontade dos govemos das populaoes do mundo de senvolvido de assumir as suas responsab1hdades globa1s 0 FIM DA HISTORI 0 colapso do comunismo e a aparente disseminaao das formas poHticas liberais democraticas a varios paises p6scomunistas e doTe ceiro Mundo levou alguns a sugenr que uma nova era de democraca global estava proxima Este e em essencia o argument de FranciS Fukuyama apesar dele ser cuidadoso em afirmar que dtstme en tre a suposilio de que nlio existe nenhum outro modelo v1avel a disposilio e a ideia de que a consolidalio deste modelo em todos Repensando as relac6es internadonais 243 OS pafses e iminente ou mesmo plausfvel A discussao do fim da Guerra Fria pode portanto servir como uma introduao ao ultimo dos temas levantados por esta pesquisa a questao de se agora nos confrontamos com o que Fukuyama chama de o fim da hist6ria 15 Por hist6ria Fukuyama denomina urn perfodo no qual a humanida de esta em conflito em torno de valores fundamentais e orienta as suas foras na arena internacional para tal competiao Tern estado na moda denegrir Fukuyama mas existem inumeras partes de seu argumento que merecem atenao mais seria A primeira e a sua afirmaao sobre a importancia do progresso na hist6ria contemporanea Fukuyama nao esta dizendo que o progresso e sem custo nem que esta destinado a continuar mas afirma que a hu manidade como urn todo tern feito progressos de urn tipo significative ao Iongo dos seculos recentes e que tern a capacidade deixando de lado os desastres ecol6gicos e nucleares de assim prosseguir Desta forma ele rejeita os dois pessimismos o da direita que considera que a hist6 ria e circular ininteligfvel ou diretamente decadente e 0 da esquerda baseado nas varias formas de romanticismo hist6rico ou no caso de Wal lerstein em uma afirmaao combativa a respeito do declfnio global hu mano desde 140016 Esta nota cautelosa embora confidentemente oti mista e vHida nao somente porque existe algo reconhecido como pro gresso pela maioria das pessoas urn conceito que como os de impe rialismo e de patriarcado deixa muito a desejar mas que faute de mieux precisamos continuar usando mas tambem porque para que possamos discutir sobre o progresso e aceitemos isso ou nao ele ocor reu precisamos de alguns criterios analfticos e morais universais No clima intelectual contemporaneo do paticularismo nacionalista e reli gioso e da confusao p6smodemista generalizada esta afirmaao her dada do seculo XVIII sobre a possibilidade da existencia de criterios universais sejam quais forem as suas origens hist6ricas sociais ou ge ograficas deve ser bern recebida Neste sentido os que negam a exis tencia de qualquer progresso Wallerstein inclufdo sao eles mesmos aliados dos que dizem que nada podemos conhecer Segundo Fukuyama tern algo importante a dizer sobre a Guerra Fria Sua avaliaao de porque e como o comunismo desmoronou 6 contestavel mas seu julgamento do fim que urn lado ganhou e ou 15Sobre Fukuyama ver Perry Anderson The ends of history emA Zone of Engagement Workshop de Hist6ria After the End of History London Collins Brown 1992 Gregory Elliott The cards of confusion Reflections on historical communism and the end of history Radical Philosophy n64 summer 1993 161mmanuel Wallerstein Historical Capitalism London verso 1983 p 98 Simplesmen te nao e verdade que o capitalismo como urn sistema hist6rico representou urn progresso com relao aos vanos sistemas hist6ricos anteriores que destruiu ou transformou 244 Fred Halliday tro perdeu precisa ser considerado Isto pode parecer bastante 6b vio e sem duvida o 6 para os que estavam no lado perdedor e que estao lutando para tirar do capitalismo tanto quando puderem Mas devese ressaltar que o mesmo nao se aplica a maior parte dos dis curses da esquerda e dos liberais ocidentais Como foi discutido no Capitulo 7 antes de 1989 a visao domnaite era e que a Guea Fria nao era de forma alguma urn confhto tdeologtco ou mterstste mico este era urn mito do Pentagono da KGB e de pessoas estra nhas como eu que tentaram dizelo mas sim urn pa de deux de dois sistemas hegemonicos Cada urn deles pretendta nvahzar com o outro mas na verdade usavam a ideia do conflito para subjugar os seus pr6prios povos para lucrar com uma produao militar set utilidade e assim por diante Tal analise partiu de suposi6es perfet tamente justificaveis de que algumas pessoas como os fabricantes de armas beneficiaramse da Guerra Fria e da continua corrida ar mamentista e de que muitas das reivindicaoes ideol6gicas dos mundos livres e das democracias socialistas eram falsas Alem dis so segundo este ponto de vista a Guerra Fria permitiu que fosse preservadas outras formas de hegemonia intrabloco chegandse a bastante diferente e injustificada conclusao de que o confltto mter sistemico fora uma ilusao Mesmo depois de 1989 houve urn debate isolado considerando que enquanto o antigo sistema sovietico des moronou e fracassou o mesmo aconteceu de muitas maneiras no ocidente citandose a crise social e economica nos EUA como se fosse possfvel imaginar que qualquer urn pudesse lutar e ganhar uma guerra sem algumas perdas ou que no fim de urn conflito de titas seja ele a Segunda Guerra Mundial ou a Guerra Fria nao mais resta riam conflitos futuros 17 A realidade como destaca Fukuyama 6 que o mundo capitalista avanado ocidental ganhou a Guerra Fria 18 A terceira questao de interesse em Fukuyama 6 a da democracta liberal Certamente sua invocaao deste conceito e seletiva e hist6rica Ele nao reconhece que a maioria dos liberais classicos nao acreditava no sufragio universal ou na igualdade das naoes e defendia urn Esta 11um exemplo disto pode ser encontrado na de outra forma comedida consideraiiO de Martin Walker The Cold War and the Making of the Modem World London Fo Estate 1993 Capitulo 14 The Superlosers Urn critico liberal da politicaamericana Stopher Lasch pade escrever International Herald Tribune 13 July 1990 Apesar do octdente ter ganho a Guerra Fria os Esos Udos dificilmente poderiam ar qe compartilharam os frutos da vit6ria Seria mrus pr6x1mo da verdade dizer que a Umao Sovutica e os Estados Unidos destruframse mutuamente como grandes poderes Sobre 0 debate como movimento socialista a respeito do significado da Guerra Fria ver as contribui5es de Mike Davis e minha a Exterminism and Cold War London Vers 1983 Capitulo 2 do meu The Making of the Second Cold Ware as trocas em Robm Blackburn edAjier the Fall London Verso 1991 Repensando as rela6es intemacionais 245 do intervencionista Ele parece aderir a visao de que OS mercados podem de algoma maneira produzir a mudansa social negligenci ando o fato de que os mercados assim como as casas e as lingtiisas sao feitos pelo homem nao pode haver uma hist6ria dirigida pelo mercado tanto quanta pode haver uma dirigida por uma casa ou neste sentido uma teoria dirigida por uma lingtiisa Alem disso o principal motor de seu argumentasao se inclina em diresao a complacencia uma solusao foi encontrada na demo cracia liberal e ela ira mais ou menos durar para sempre Mas existe outra leitura possfvel de Fukuyama pelo menos nesta epoca do au tor destronado apesar da democracia liberal manterse como a so lusao dominante para a polftica no mundo contemporaneo ela sera intemamente instavel e passive de autodestruisao Esta discussao eminentemente hegeliana e premarxista sustentase sobre os efei tos desestabilizadores do thymos considerado por ele como o dese jo humano por reconhecimento e respeito nas relacoes dentro e fora do Estado As raz6es que Fukuyama apresenta para justificar por que talvez este modelo nao venha a marcar o fim da hist6ria devem ser questionadas mas elas sao menos importantes do que esta afirma cao convincente a respeito dos limites inerentes e do futuro proble matico desta forma politica agora percebida como a solucao dos problemas da humanidade Mesmo os marxistas que ainda acredi tam na inevitabilidade da revolucao socialista a medida que o capi talismo cava o seu proprio tumulo precisam ser lembrados de que existe urn caminho altemativo que pode ser seguido pela democra cia liberal a regressao a varias formas de barbarismo nacional e intemacional caso se concretize a reincidencia de tendencias capi talistasautoritarias nucleares ecol6gicas e racistas A quarta area em que a argumentacao de Fukuyama deve ser bern recebida diz respeito a sua analise da tendencia em direcao a universali zacao no mundo contemporaneo o tema do Capitulo 4 Aqui de novo sua tese pode parecer autoevidente nao fosse o fato de que substancial resistencia te6rica a ela pode ser detectada em varias vertentes Uma fonte desta resistencia ja mencionada com relacao a discus sao da Guerra Fria vern da parte dos que negam que o comunismo sovietico eo capitalismo ocidental buscaram prevalecer urn sobre o outro Presente nesta visao esta uma crenca que sobrevive mesmo em uma situasao de p6sGuerra Fria de algoma maneira o capitalismo precisa de urn inimigo A importancia te6rica desta ideia foi discutida no Capitulo 7 Aqui e valido detalhar suas conseqtiencias praticas com o fim do comunis mo sugerese que algum outro mal como as minorias etnicas ou o Isla precisa ser invocado Em alguns casos isto e usado para explicar a ge nese da Guerra do Golfo Na verdade como Marx e Engels destacaram tao bern na secao 2 do Manifesto Comunista o capitalismo nao precisa de nenhum inimigo ele busca tomar o mundo como ele a beira de ex 246 Fred Halliday tincao mais ou mens o que aconteceu com a olsao Bol chevique Raramente arttculado este argumento do tmmtgo neccs sario sustenta a maior parte da literatura critica sabre a Guerra Fna em sua relutancia em ver por que e como o capitalismo desenvol veu uma dinamica universalista nao somente na esfera do mercado e das relacoes produtivas mas tambem na das formas politicas e dos padroes culturais Tambem podese encontrar resistencia a esta ideia em uma es cola te6rica que Fukuyama critica insuficientemente o realismo da teoria Estatocentrica das relacoes intemacionais epitomizada por Waltz e discutida no Capitulo l de acordo com a qual tudo o que importa sao as relasoes entre os Estados devendose desconsiderar o seu carater intemo como reducionista Fukuyama critica o realismo como sendo irrelevante em uma situacao de p6sGuerra Fria na qual a interdependencia esta crescendo 19 Aqui entretanto ele falha em perceber a importancia da totalidade desta disussao reaismo nun ca foi uma explicasao adequada das relacoes mtemactonats Sempre existiu tim elemento universalizador no sistema desde que o captta lismo comecou a se desenvolver transnacionalmente no seculo XVI AS PERSPECTIVAS PARA A DEMOCRACIA LIBERAL E A PAZ Os problemas com a argumentasao de Fukuyama sao muitos mas sugerem por sua parte o que poderia ser urn programa de fu turo trabalho te6rico e hist6rico Ausente do artigo de 1989 extste aqui urn componente psicol6gico poderoso baseado no termo gre go thymos a sua interpretacao disto tanto pode levantar quanta re solver problemas20 Muito tern sido dito sabre como as extrapola soes confiantes de Fukuyama estao supostamente erradas as guer tCapftulo 23 The Unreality of realism 2Para Fukuyama os homens demandam reconhecimento de seu valor e se revoltam ou Iutam quando nao o conseguem Por isto eles nao estiio satisfeitos soente como bemetar economico que uma ditadura pr6spera pode fomecer mas necess1 de emocrac1a e tambem de uma certa medida de igualdadeAqui ele toea em alguma cmsa nmguem pode negar que este e urn fator na atividade politica dos homens nas esferas interpessoal nacional e internacional Entretanto como examinada em seu livro esta suposifiio de thymos e forca da Primeiro mesmo considerando a existencia de urn instinto de thymos como descrito similar aos dmais instintos sorrir comer tocar etc ele somente adquire urn senti do em urn contexto social Alem disso o que constitui a dignidade aceitavel ou o reconhecimento varia de urn periodo hist6rico para o outro e entre as sociedades o que e toleravel em urn Iugar e tempo niio 0 e em outros sem considerar as variacQes de genero Thymos e uma cons ciio sociai niio pode existir a invocaciio dethymoscom sentido se estanao levar em cons1de Repensando as rela6es intemacionais 24 7 ras irao continuar o sUi e uma ameasa que 14 bilhoes de pessoas ainda vivem sob o governo comunista em oposisao aos 17 bilhoes de antes de 1989 e assim por diante Estes nao desafiam o seu tema central ja que nem a modernizasao p6smaofsta nem o fundamen talismo islamico sao desafios em urn palco global a ameasa isla mica nada mais e do que uma combinasao maligna de clero bom bastico e de paranoia ocidental 0 desafio real do ocidente uma abstrasao da qual podemos prescindir e o Japao e nao o Ira ou a Argelia onde podese perguntar esta o desafio tecnol6gico ou o investimento destes dois ultimos Estados Em termos empfricos Fukuyama e mais fragil em outros dois as pectos primeiro em sua crensa de que o capitalismo pode elevar todo o mundo aos presentes nfveis de desenvolvimento segundo no grau em que ele acredita que a democracia liberal esta agora se dissemi nando No primeiro uma reafirmasao em termos da Rand Corpora tion da convincente visao expressa por Bill Warren ele esta certo em criticar os mitos da teoria da dependencia mas ignora os fatos que todos os anos nos chamam a atensao na Tabela 1 do World Bank Re raiio a socializaiio de pessoas em grupos e coleti vidades e infelizmente podemos denomimilo so mente como o antithymos q v Dostoievsky A aparente autoridade do conceito dethymose derivada da leitura da Republica de Platiio de Fukuyama via Allan Bloom mas esta parte da opeiio e na verdade deficiente Para o marxista ela niio lembra nada alem do que uma tentativa de espremer uma teoria geral da polftica socialista de algumas passagens descontextualizadas de Marx Lenin ou Mao No grego chissico a palavrathymos significa fUria ou luxuria por comida ou bebida e e uma qualidade associada aos animais e aos cavalos vivazes De maneira interessante em seu sentido original ela se aproxima da palavra arabe thawra iirabe contempodlneo para revolu iio mas em sua origem e uma palavra indicando a falta de espfrito dos touros e outros animais No proprio Platiio ela tern urn senti do mais especffico proximo ao autorespeitoa parte que ama a honra e a vit6ria Mas mesmo o uso de Platiio niio se equipara ao de Bloom Fukuyama como a leitura de outros comentadores indica Alem disso ele esta lendo errone amente Platiio ao implicar que a alma tenha partes de alguma forma o que Platiio quis dizer com partes da alma foi que as pessoas sao complexa Para diferentes consideroes do thymos em Platiio ver RC Cross e AD Woozley Plato s Republic A Philosophical Commentary London Macmillan 1964 pl20l e J uliaAnnas An Introduction to Plato s Republic Oxford Clarendon Press 1981 p1i68 Thymose identificado como irracional ja que e a morada da raiva e da fUria similar ao espfrito ou ao coraiio e e algo que se aproxima embora Fukuyama evidentemente niio perceba isto como apropriado do conceito psicanalftico de idA historiachave que Fukuyama invoca de Platiio para ilustrar o conceito aponta em outra direiio referese a Leontius o filho deAglaion que ao carninhar proximo as paredes deAtenas ve alguns corpos deitados sob a parede primeiro ele desvia seus olhos e entiio por curiosidade olha Ele depois se envergonha e se enfurece consigo mesmo sofrendo urn ataque de thymos Qualquer urn pode entender esta hist6ria mas ela dificilmente ilustra o conceito de thymos de Fukuyama que e tanto relacional envolvendo o que os outros pensam de nos como ligado ao reconhecimento e niio a raiva Independentemente da valida de os insights obre o papel do reconhecimento na polftica tudo sugere que derivalo a partir de uma agttiio de fun do textual e inconclusivo 248 Fred Halliday port apesar de poucos pafses fora da Africa estarem ficando mais pobres o gap entre os Estados ricos e os pobres esta auentando Alem disso como Giovani Arrrighi bern apontou 21 a assoctasao ao clube dos Estados ricos permaneceu constante ao Iongo do ultimo seculo ninguem saiu e embora os membros tenham trocado d Iugar na or dem dos mais fortes somente urn Estado entrou o Japao A crensa na democracia liberal subestima o grau em que a de mocracia capitalista e precaria ela precisa dura por pelo meno uma gerasao antes de suporse que ela permanecera Somente pectsase pensar na Republica de Weimar ou em Estados como Sn anka Liberia Argentina Lfbano nos anos 1960 para ver como a dttadura pode ser restabelecida A partir desta perspectiva mais hisoricmene cautelosa existem somente duas dezenas de democractas hberats estabelecidas no mundo de hoje em urn total de quase 180 Estados independentes Esta visao historicamente superficial da democracia e ligada a uma considerasao idealista e bastante enganosa de como a democracia se concretizou As datas que ele apresenta para o estabelecimento da de mocracia liberal 1790 para os EUA 1848 para a GraBretanha etc sao as do mito constitucional A realidade que Goran Therborn bern mostrou e a de que a democracia completa incluindo dentre outros cri terios uma pessoa urn voto e somente urn voto por pesa chegou a estes dois Estados em 1960 e como resultado da asao pohttca da luta e nao de uma evolusao idealista do sistema22 Aqui chegamos ao problema te6rico central do trabalho de ukuya ma 0 que constitui a hist6ria e mais especificamente a asao htst6nca e nao a questao de se a hist6ria chegou ao fim Por tras de tas estas teorias do fim da hist6ria reside tima teoria da asao Que a mawna das pessoas tenha algoma resposta funcional a esta questao e evidente se somente listarmos alguns dos candidatos a motor da hist6ria que apare ceram nos ultimos seculos Deus os deuses as estrelas a Razao o equi lfbrio de poder a classe trabalhadora a burguesia o campesinato a in telligentsia as teorias da conspirasao em todas as formas e tamanhos a economia e como vimos mais recentemente o mercado na verdade virtualmente todas as classes foram consideradas a excesao de uma que pode ter feito mais do que qualquer outra para moldar o seculo XX a pequena burguesia Sem duvida mais estao por vir A resposta de Fukuyama e idealista Para ele o motor da htst6na ou como ele define o Mecanismo e uma combinasao do desenvol 21Giovanni Arrighi World income inequalities and the future of socialism New Left Review nl89 SeptemberOctober 1989 22Goran Therbom The rule of capitalism and the rise of democracy New Left Review n103 MayJune 1977 Repensando as rela6es intemacionais 249 vimento economico cientffico e da evoluao da liberdade humana Aqui existe muito a discordar A sua consideraao da evoluao da ciencia sin gularmente ignora os estudos kuhnianos e outros institucionais de como as relaoos de poder determinam os progresses cientfficos compare a quantidade de dinheiro gasta em armas com a das pesquisas da AIDS Ele parece atribuirlhe uma direao independente da intenao e do inte resse humano Mais especificamente ele ignora aquele que e o princi pal motor da hist6ria humana neste e no seculo passado a aao politi ca coletiva a aao dos grupos sejam estes classes naoes ou Estados 0 tempo percorrido pela hist6ria mundial desde Hegel e Marx e no mf nimo ate o colapso do comunismo encorajanos a repensar como a aao coletiva funciona a aumentar o numero de tais possfveis atores e tambem a reavaliar a prioridade eo papel hist6rico designado pela te oria socialista com muita facilidade ao proletariado Na verdade e a reteorizaao desta questao que constitui o maior desafio do livro de Fukuyama Ao nos confrontarmos com o evidente descredito da teleologia e da aao na maior parte teoria marxista nao e necessario reverter simplesmente a afirmaao idealista de um espfrito mundial agora apresentado como a ciencia e o thymos moldando o curso dos eventos ou nos abandonarmos na vacuidade e frivolidade p6s modemista 0 problema com a teoria de Fukuyama e com a sua consi derao da hist6ria e fundamentalmente o mesmo de Hegel Existe cer tamente uma soluao classica para este problema fazer com Fukuya rna o que Feuerbach fez com Hegel viralo de cabea para baixo Nas rela6es intemaciohais temos sido muito cavalheiros com esta questao movendonos entre os Estados e o sistema ignorando outros caildidatos Temos sido particularmente recatados com a palavra capi talismo urn termo que nao provoca timidez entre os soci6logos e que sup6ese possa caracterizar 0 sistema intemacional dos ultimos seen los tao bern quanto qualquer outro Na verdade as relaoes inteinacio nais se comportam como se a aao fosse uma categoria marginal com parada as vanas determinaoes do sistema interestatal ou da hierarquia global que normalmente sao percebidas como os seus objetos adequa dos de estudo Responder a Fukuyama envolve entretanto uma res posta a esta parte de seu argumento com a apresentacao de uma teoria altemativa da aao nos neg6cios intemacionais e por esta razao de uma altemativa passada e de uma altemativa presente Face a hist6ria urn tanto deploravel da maior parte do seculo XX e aos assustadores pro blemas que confrontam o mundo a medida que ele caminha para o fim deste seculo esta pareceria ser uma tarefa com certa urgencia normati va e analftica Tambem e uma tarefa que insere as relaoes intemacio nais na 6rbita das outras ciencias sociais Abstraoes exculpat6rias so bre a hist6ria o sistema a estrutura e coisas afins tern tao 5ouca valida de quanto a invocaao do divino ou do astrol6gico Somos todos parti cipantes da construcao do futuro 250 Fred Halliday capfruloIo CONCLUSAO 0 FUTURO DAS RELAOES INTERNACIONAIS Este livro preocupouse com ideias de como o intemacional tern sido ou pode ser mudado e tambem ugeu processo e mecanisios par esta mudana sejam eles o transnac10nahsmo da soctedade e da tdeologta as forcas emancipat6rias de classe e de grupo ou a construcao de formas de govemanca global Qualquer empreendimento deste tipo levanta ques t6es nao somente de eficacia mas tambem de origem etica Os capftulos anteriores enfatizaram outras dimensoes a relacao entre a polftica domes tica e a intemacional e as SUaS implicaOeS para a analise do funcionamento do sistema intemacional Na conclusao entretanto parece apropriado voltar as quest6es morais levantadas pela mudana nos eventos intemacionais do final de 1980 e oferecer o que qualquer abordagem te6rica deveria ofere cer urn programa para trabalho futuro 0 DESAFIO DO NORMATIVO Os neg6cios intemacionais sao notoriamente a atea n qual as co sideracoes morais menos se aplicam e chegamos a acettar dtferentes cn terios morais para os Estados e para os indivfduos Mas ao mesmo tem po 0 intemacional e um terreno repleto de reivindicacoes e contrareivin diaOeS morais no mfnimo dos nacionalistas e inclusive a aceitacao de uma suposta realidade e assumir uma posiao moral Tambem e valido notar que em anos recentes algumas quest6es morais separadas das rei vindica6es das na6es e dos Estados passaram a desempenhar urn papel cada vez maior na discussao e na justificaao publica a justia economi ca os direitos humanos e a responsabilidade ecol6gica 0 deve nao ira ebora 0 que se revela menos desenvolvido e o conjunto de crirerios e discriminaoes que somos capazes de construir neste terreno 1 Para uma discussao das questoes eticas no terreno internacional ver inter alia Janna Repensando as rela6es intemacionais 251 Duas quest6es nonnativas levantadas mais diretamente pela recen te crise intemacional e indiretamente pela queda do comunismo refe remse ao nacionalismo e a intervenao Recentemente a maior parte do trabalho dedicada ao nacionalismo vern sendo sobre os seus aspec tos hist6ricos e sociol6gicos Ate agora as suas reivindica6es norma tivas vern atraindo muito menos atenao todos pertencemos a uma naao e a naao corporificada em seus lfderes tern uma reivindicaao sobre n6s e nos da identidade Proximamente relacionada e brutalmente pre sente nas Guerras dos Balcas no infcio de 1990 e a suposiao normati va adicional de que as naoes definidas por seus lfderes tern direitos sob urn territ6rio dado por Deus por deuses ou pela hist6ria E ut6pico no mau sentido vislumbrar urn mundo no qual os direitos das naoes sobre as pessoas ou sobre o territ6rio nao te nham nenhuma importancia Todavia e importante notar como es tas duas reivindicaoes sao triviais existe pouco alem de urn utilita rismo casual para justificar porque alguem deve ter lealdade a uma coleao heterogenea de pessoas no meio da qual aconteceu de nas cer ou porque se pode afirmar uma reivindicaao particular por ter rit6rio quando toda parte da superffcie da terra comporta reivindica 6es multiplas se nao dos vivos entao dos mortos Aqui existe uma fora consideravel nas visoes de Ernest Gellner que destacou a con tingencia da identidade nacional e da existencia das naoes e do finado Elie Kedourie que viu na disseminaao destes princfpios a reivindicaao da comunidade sobre o individual e das comunida des autodefinidas sobre o territ6rio a rufna do mundo moderno 2 Contudo estes princfpios agora prevalecem e temos de encon trar maneiras de moderalos e reduzilos Porem muito do que aspi ramos introduzir no sistema internacional ainda reside na aceitaao de ambos como caracterfsticas validas e permanentes das relaoes internacionais As pessoas tern o direito de viver em comunidades e de uma forma compatfvel com os seus desejos normalmente isto significa viver em comunidades nacionais e esperanosamente com urn Estado e urn territ6rio para refletilas Mas fomos muito Ionge ao aceitar quaisquer urn destes princfpios como supremos dada a irraci onalidade etnica e as conseqliencias nefastas que os acompanham A questao da intervenao ap6iase nao tanto na questao da et nia e dos direitos nacionais mas na da soberania estatal e foi direta ThompsonJustice and World Order A Philosophical Enquiry London Routledge 1992 Teny Nardin e David Mapel eds Traditions of International Ethics Cambridge Cambridge ipr 1992 Charles Beitz Political Theory and International Relations Guildford Surrey Princeton University Press 1979 Mervyn Frost Towards a Normative Theory of International Relations Cambridge Cambridge University Press 1986 2Brnest Gellner Nations and Nationalism Oxford Blackwell 1983 Elie Kedouri Nationalism London Hutchinson 1960 252 Fred Halliday mente Ievantada pelo fim da Guerra do Golfo e pelos demais even tos da Bosnia e da Somalia Indiscutivelmente esta e a ma10r mu dana na agenda internacional nos anos recentes e coloca urn con junto de questoes morais assim como praticas para todos nos 3 No caso da Guerra do Golfo ela foi colocada nao tanto pelo Kuwait como pelas decisoes tomadas depois da guerra e do levan te da ppulaao iraquiana para estabelecer urn refugio seguro no norte do Iraque4 Na situaao do pasguerra os EUA a GB e a Fran a intervieram para estabelecer m forma dC Estado seprado den tro do norte do Iraque e em ap01o a populaao curda nattva Nao existe precedente para isto na hist6ria do pasguerra e a aao foi percebida em algumas partes do mundo arabe como uma form de colonizaao ou da antiga politica imperialista de partiao Apesar dtsso ela estava de acordo com a vontade dos pr6prios curdos cujos fderes eleitos subseqlientemente manifestaram abertamelte o eu deseJO pea manutenao da polftica do refugio seguro Esta f01 u tpimeltaao pratica e inovadora da polftica de inerven5ao hurIamtana nao stgm cando com isto que os poderes que mtervmham ttnham soente motl vos humanitarios urn requisito que seria impossfvel cumpnr mas que em parte eles tinharn uma motivaao hanitaria e que as conseqlien cias de suas aoes possufam urn benef11 claro e substalctal para as populaoes envolvidas sta aiio consttum urn desafio dtret sobe rania do Iraque e uma movaao dramattca no campo da Pohttca dos direitos humanos As questoes morais levantadas o mutas e eram colocadas em sua fornJa classica por John Stuart Mill pnmerro que grau de tirania ou opressao justifica ou obriga a intervenao segundo a que custo a intervenao deve ser promovida terceiro se ela pode se pro movida somente em apoio a urn grupo etnico identificavel ou mats ge nericamente UnJa vez que o princfpio e adrnitido como razoavel e geral podem ser elaboradas respostas a estas indaga6es 5 Em unJa certa escala a intervenao nao envolve nornJaS mas pru dencia Apesar disso existe aqui urna questiio nonnativl refente so berimia e as obrigaoes dos Estados A air parte a tscussao Ctden tal nao se preocupou com a conseqlienctas da naomrvena mesmas considera6es de carater moral nJas com a questao de se nos a GraBretanha e os outros Estados devemos intervir De onde vern este JPara discussiio adicional ver Fred Halliday The GulfWar and the study of International Relations Review of International Studies v20 n1 January 1994 sob 0 levante e o seu resultado ver Kanan Makiya Cruelty and Silence London Century Hutchinson 1993 SJames Mayall Nonintervention selfdetermination and the n world oder International Affairs v67 n3 July 1991 Christopher Greenwood Is there a nght of humanitarian intervention The World Today v49 n2 Febraury 1993 Hedley Bull ed Intervention i World Politics Oxford Clarendon Press 1984 Repensando as rela6es intemacionais 253 deve De onde na verdade vern este deve com relaao a pobreza do Terceiro Mundo ou aos casos individuais de direitos humanos A res pos e em primeira instancia vern da Carta da ONU panigrafo 24 que obnga os membros do Conselho de Segurana a assurnir responsabili dade primma pela manutenao da paz intemacional e da segurana Aqm chegamos a uma questao que e muito discutida na litera tura das relaoes intemacionais mas que o debate publico esconde por raz5es compreensiveis o papel dos grandes poderes Juridicamen te todos os Estados sao soberanos e iguais porem na realidade eles nao 0 Sao e Sao muito mais desiguais do que OS individuos deno de urn Estado N a maior parte do seculo passado o sistema intemacio nal foi dirigido pelos grandes poderes atraves dos mecanismos do im perialismo que sujeitaram os povos e que os levaram a discutir e a brigar uns om os outros por vanos motivos 0 imperialismo no sentido de dormna fonnl ou de colonialismo mesmo na muito peculiar for ma sovtetlca esta acabado e da mesma maneira poderseia pensar qualquer papel proeminente para os grandes poderes Como argumentei 0 conflito entre OS grandes poderes pode nao ser mms o tor da politica intemacional e as opinioes publicas dos taos mats tmpntes relutam em correr riscos que antes eram acei taves Entretanto 1sto somente coloca de forma mais aguda o dilema da dtplomacia intemacional ja que estes poderes nao irao assumir a li derana quem ira 0 registro da crise do Golfo e claro e desacredita esta postura sem os EVA liderando nada teria acontecido No caso dos Balcas urn ds motivos pelo qual quase nada aconteceu e pelo qual os servtos acredttavam corretamente que poderiam continuar com suas campanhas e que os EVA pareciam considerar este como urn proble euopeu U das raz5es usadas pelo Congresso para recusar a ra tificaao do apoto d Woodrow Wilson a Liga das Naoes foi precisa mente a preocupaao como envolvimento nas Guerras dos Balcas Contdo algum papel de liderana dos grandes poderes parece na srmevttavel e na verdade desejavel assim como e desejavel e ne cessano urn papel dos principais poderes economicos e financeiros na cnduao da economia intemacional A questao nao e se eles irao ou nao desempena urn papel mas ao inves disso se este papel sera uni later compettttvo e de curto prazo ou se sera multilateral mais coo perativo ou de Iongo prazo A altemativa ao artigo 24 nao e a harmonia mtemactoa mas urn mundo no qual ninguem assuma a responsabili dad pnmarta pela manutenao da paz intemacional e segurana Os habtantes dos Balcas passaram muito por isto em 19914 podese duvtdar se eles o recomendariam para o mundo como urn todo Esas duas questoes a do nacionalismo e a da intervenao e s reaciOnadas aos ganes poderes tocam em algo que talvez seja mats penetrante e dtftctl de todas as questoes normativas confron 1 tando o mundo no momento a disputa entre os valores universais e 254 Fred Halliday os particulares Desde o seculo XVIII existe uma corrente no pensa mento ocidental que afirrriou a validade de certos principios morais universais e racionais para a vida polftica os direitos do individuo o secularismo e a democracia em alguma de suasformas Nos anos recentes tais principios foram ampliados para incluir urn reconhe cimento mais explicito da igualdade de genero e de raa De forma alguma estes valores sao apoiados universalmente ou permitem interpretaoes inequivocas Entretanto hoje eles estao conservados em documentos polfticos nacionais e intemacionais e fazem parte de uma visao de mundo otimista do p6sGuerra Fria parecendo que agora eles estariam destinados a prevalecer Ja foi sugerido no Ca pitulo 7 que em nenhum sentido imediato eles estao destinados a prevalecer porque as condioes nas quais digamos a democracia pode sustentarse nao estao dadas na maioria dos paises do mundo Alem disso cada vez mais existem outros desafios estes valores sao questionaveis em si mesmos e outros sistemas de valores de outras procedencias tern igual ou mesmo maior valor Os proponentes do fun damentalismo religioso estao na linha de frente com relaao a isto mas existe uma corrente mais ampla evidente no Leste Asiatico que con testa o que e dito como sendo urn sistema de valores ocidental e etno centrico Por simpatia ou por apoio a uma posiao frouxamente deno minada de p6smodemista muitos no ocidente tambem aderiram a este desafio relativista a qualquer c6digo nonnativo unico Historicamente existe muita validade ilesta critica estes c6digos foram produzidos em paises particulares refletindo o seu passado e os seus valores e nao foi por acidente que estes paises sao em larga me dida os mesmos que ocuparam e dominaram uma grande parcela do resto do mundo6 0 aumento da liberdade em casa coirtcidia com mai or espoliaao no exterior Tambem tern havido urn alto grau de hipocri sia nas reivindicaoes de integridade nonnativa feitas pelos poderes ocidentais dominantes eles fizeram mais do que quaisquer outros para violar a soberania ao Iongo dos dois Ultimos seculos OS maiores crimes contra a humanidade foram cometidos neste seculo em solo europeu Contudo estas reservas nao invalidam a reivindicao mais ampla de que em questoes primarias de prepcupaao normativa e politica existe urn certo consenso intemacional em tomo de urn conjunto de valores que independentemente de sua origem podem ser baseados na razao e que retem por motivos que os cientistas sociais podem ani madamente discutir alguma relaao com a prosperidade economica e a paz domestica e intemacional E uma pena e de fato e muito pe 6Para o debate no mundo iirabe ver Kevin Dwyer Arab Voices London Routledge 1991 e Anne Mayer Islam and Human Rights Tradition and Politics London Pinter 1991 Mayer e particularmente intrigante a respeito da manipulaao da critica doTer ceiro Mundo por grupos interessados dentro dos Estados islfunicos Repensando as relaoes intemacionais 255 rigoso que justamente no momento em que emerge uma nova situ aao intemacional exista falta de vontade polftica nos pafses com maior influencia intemacional para definir o que constitui ou nao urn sistema polftico desejavel Isto pode agradar os mais crfticos nestas sociedades mas podemos duvidar que isto ajudara o restante do mundo que quando perguntado deseja mais e nao menos destes princfpios universais tornados como certos nos paises mais felizes No debate internacional freqtientemente os que estao no poder e os que se be neficiam das varia96es correntes na norma internacional sao os pri meiros a nos dizer que os criterios universais nao se aplicam os go vernos os cleros na verdade os homens em geral proclamam o ex cepcionalismo normativo Entretanto a independencia o secularis mo a igualdade a regra da lei e varios privilegios economicos e soci ais constituem uma boa vida como internacionalmente definida Aqui voltamos a questao da interven9iiO dos limites e das for mas que estiio a disposiao da comunidade intemacional para buscar o cumprimento destas normas nas rela96es entre e dentro dos Estados Nao podemos explicar as rela9oes intemacionais ou o papel dos gran des poderes primeiramente em termos de uma polftica de for9a norma tiva todavia podemos perceber que quaisquer polfticas realistas e co operativas concebidas para aumentar o respeito a estes princfpios sao desejaveis e devemos desenvolvelas Se nao o fIZermos isto represen tara uma grande abdicaao mesmo se for defendida em nome da indi vidualidade da antihegemonia ou do capricho p6smodemista AS ALTERNATIVAS EM PESQUISA A negligencia do normativo na maior parte da literatura das rela 96es intemacionais da epoca pos1945 seja em suas variantes norte americana OU brltanica e parcialmente atribufda ao medo de repetir OS eiTOS dos ut6picos do entreguerras e tambem devido a identifica9ii0 entre a disciplina as prioridades e a disposi9ao dos Estados A orienta9ao me todol6gica neste caso uma complacencia de valor e tao subordinada quanto uma explica9ao apologetica do poder Alem disso mais do que ququer outra a omissao do normativo e favorecida pela incerteza que ve10 a prevalecer na discussao publica academica ou nao no encerra mento da Guerra Fria havendo o cruzamento entre as preocupaoes a resito da dirao geral da vida polftica com as vacuidades do p6smo demtsmo eo relativismo etico A unica resposta adequada a esta crise dupla da analise intemacional e dos meandros eticos e oferecer urn con junto alternative de temas para sustentar a pesquisa e a analise 0 que esta pesquisa particular de relaoes intemacionais suge re e esta agenda para o estudo das rela96es intemacionais sustenta 256 Fred Halliday da em uma maior percep9iio de varios conceitos que ate aqui tern ocupado urn Iugar secundario e marginal na disciplina e em uma orientaao metodol6gica que abandone o culto da quantificaao da predi9iio e da cientificidade em favor de urn compromisso com a explica9ao te6rica e hist6rica Sob esta luz os capftulos anteriores podem ser resumidos para sugerir o seguinte programa de pesquisa 1 as formas de expansao do sistema capitalista a partir do seculo XV seu impacto contradit6rio no mundo precapitalista a evolu9ao das formas de rela9ao intercapitalista e o conflito do capitalismo com o blo co transit6rio naocapitalista do comunismo do seculo XX 2 o exame de como o capitalismo opera como urn sistema inter nacional e das formas polfticas especfficas que produziu e manteve no presente o Estado soberano e a ideologia do nacionalismo e no atual contexto uma consideraao equilibrada das formas de intera9iio em mudan9a entre os Estados e os processos globais 3 a forma pela qual a a9ao incluindo a de classe s6 que nao ex clusivamente opera transnacionalmente na constitui9ao e na influen cia do sistema considerandose o impacto de atores naoestatais infor mados e ativos ecologia direitos humanos na organiza9ao intemacio nal dos grupos sociais hegemonicos e nas fragmentadas nms recorren tes a9oes intemacionais de grupos subordinados 4 o estudo do conflito em seu contexto social e poHtico e a anali se da guerra alem do fetichismo da corrida armamentista e dos equilf brios de poder e o papel de ambas da mobiliza9ao etnica e da revolu 9iio social em fraturar e constituir o sistema intemacional 5 a formula9ao e a potencial implementa9ao de princfpios mo rais e nos casos em que o acordo nao for possfvel uma forma con sensual mfnima de debate morallegftimo em questoes pertinentes ao intemacional dentre outras a lealdade a identidade a seguran a a igualdade e a liberdade Dada a combina9ao de disturbio polftico e confusao te6rica que parece estar acompanhando o fim do seculo XX o desafio e as respon sabilidades de uma disciplina preocupada como intemacional parece riam maiores do que antes 0 maior dos perigos seria o agnosticismo analftico ou moral ou uma recafda as conformidades dos dois lados do Atlantico Agora estas conformidades parecem estar esgotadas tanto quanto o contexto intemacional em que se originaram Entretanto seria igualmente errado confundir o que e sem duvida urn ponto de mudan 9a fundamental na hist6ria mundial com uma suposta necessidade de derrubar todos os sistemas conceituais estabelecidos 0 presentis mo dos neg6cios intemacionais nao precisa embora possa levar a uma revisao das abordagens te6ricas analfticas ou morais 0 mfni mo que pode ser dito e que as duas quest6es a de mudan9a na his t6ria mundial e a de mudan9a na orienta9iio filos6fica e te6rica pre cisam ser mantidas separadas o colapso do Muro de Bedim ou a Repensando as rela6es intemacionais 25 7 internacionalizaao do capital e do trabalho nao implicam que nao existe mais uma distinao entre o deve e o e ou que as formas basicas de racionalismo estao agora invalidadas mais do que isso significaria que a terra e chata ou que a Iua e feita de queijo 0 pro grama de pesquisa aqui esboado e desenvolvido atraves dos capf tulos crfticos deste Iivro sugeriria que existem muitas ferramentas conceituais disponfveis para analisar e fornecer orientaao moral no mundo p6sGuerra Fria Se existe validade na reivindicaao de que como cidadaos como politicos como academicos temos sonambulado atraves da historia entao a conclusao evidente o suficiente e que precisamos estar urn pou comais alertas e acordados Ouviremos e na verdade ja estamos ouvin do muita reflexao sabre o fim do seculo e o comeo de urn novo mile nio Tudo isto pode ser de uma irrelevancia solene pelo menos porque para a maior parte do mundo o milenio corresponde a urn diferente sis tema cronologico ate agora podem ser encontrados pelo menos seis outros sistemas de contar os anos o judaico o muulmano o persa zoroastriano o etfope o chines e o japones e seus milenios verne vao em tempos diferentes Nao existe nada mais etnocentrico do que o ano 2000 Mas se a ideia do milenio como a dos exames nos ajuda a pen sar melhor Os lideres politicos eleitos e nao eleitos tern uma performance bastante pobre ao Iongo dos ultimos cern anos mas os cientistas natu rais ou sociais tambem possuem registros confusos 0 perigo dos cien tistas sociais nao e 0 de estar muito afastados das preocupa6es do po der politico ou empreendedor mas o da falta de urn distanciamento su ficiente eles nao se empenharam para estar acima do sensa comum de sua epoca e se consolam com o vazio e o insignificante daf o esforo das ciencias naturais dedicado as armas de destruiao em massa e o fra casso ate o ultimo momenta de prever o impacto da humanidade sob o meio ambiente distoroes amplamente reproduzidas nas ciencias soci ais incluindo as relaoes intemacionais Neste ponto mais do que em qualquer outro os cientistas sociais vern freqlientemente falhando em mostrar independencia e empreendimento intelectual 0 mfnimo que pode ser dito de todos dos politicos e dos academicos dos cientistas naturais e dos sociais e que 0 registro dos seculos passados nao tern sido muito borne que o enorme sofrimento que se abate sabre a humanidade pode nos ensinar a melhor considerar as questoes que enfrentamos Mui tas das foras que irao moldar o pr6ximo seculo e o proximo milenio e que tambem irao moldar a agenda dos politicos e dos cientistas sociais ja foram liberadas e melhor analisalas agora Talvez nao seria muito irreal esperar que urn trabalho melhor do que aquele feito neste ultimo seculo possa ser feito no proximo 25 8 Fred Halliday rl APENDICES j I UM MUNDO UM MITO Este e urn ensaio explorat6rio sabre o mais crucial aspecto da seguranca internacional contempodlnea a rivalidade sovieticoame ricana no Terceiro Mundo Ele enfoca as varias politicas e ideolo gias produzidas por cada urn dos grandes poderes para conduzir esta rivalidade e as ilusoes por elas geradas Os capftulos seguin tes examinarao estas polfticas em seu pr6prio direito entretanto elas foram desenvolvidas e sao percebidas dentro de urn contex te mais ample de mudanca cultural e polftica Ja que este e urn tra balho dirigido a urn publico geral nao confinado a especialistas em relacoes internacionais pode ser apropriado comecar pqr al gumas observasoes resumidas de como este contexte se relaCiona com o assunto desta investigasao Os anos 1980 foram urn perfodo de profunda deterioraao nas relacoes internacionais a Guerra Fria entre os grandes pede res o desemprego internacionalizado no mundo capitalista de senvolvido a miseria no Sui e no campo ideol6gico o renasci mento e a reelaboracao do darwinismo social disfarcado sob os names de empreendimento e liberdade 0 clima cultural no mundo desenvolvido foi marcado pelo narcisismo de massa e pela am nesia hist6rica isso nunca esteve mais clara do que na crimca de que estavamos vivendo em urn mundo de cultura politica mo derna e universal cada vez mais livre e de urn sistema polftico unificado e melhor Sob o pretexto de fomecer uma cultura mais realista e atualizada esta ideologia suprime e rejeita alternativas especialmente aquelas de natureza critica ou radical Se existem razoes para aceitar que o mundo tomouse mais integrado durante estes anos e as tendencias nas comunicacoes na economia e na administraao dos problemas globais fornecem alguma eviden cia disso tambem existem razoes poderosas para reconhecer as desigualdades dentro desta unificacao e os processes contnirios de fragmentaao Durante esta decada a distancia entre os paf ses mais rices e mais pobres do mundo aumentou uma divisao que em termos estritamente economicos resulta dos novas meta des de aperfeicoamento desenvolvidos pelo capitalismo avansa do havendo a inovasao sempre as custas de outre alguem estes incluem a internacionalizasao do turismo sexual o dep6sito de lixo t6xico no Terceiro Mundo e a destruicao para o uso do Nor te de vastas areas ambientais do Sui Repensando as rela6es intemacionais 261 Dentro das pr6prias economias capitalistas desenvolvidas houve muita ret6rica sabre a derrubada de barreiras e a integraao economica Nao cabe discutir se este processo e ou nao uma ilu sao mas sim que ele esta ocorrendo por meio de uma crescente concentraao de poder e de uma epidemia de monop6lios em cada vez menos maos Alem disso se esta intemacionalizaao e mobi lidade se aplicam a alguns dos fatores de produao principalmen te o capital e a tecnologia elas sao totalmente contrarias a cres cente imobilidade de outro fator o trabalho As economias avan adas que durante seculos e sem convite ocuparam e saquearam o Terceiro Mundo percebem como apropriado em sua retitude p6s imperial dificultar o quanta possfvel os fluxos de trabalho Sui Norte a liberdade de movimento para uns se opoe a restriao para outros A alternativa de uma alocaao planejada de recursos com base em necessidades internacionalmente determinadas e assim exclufda Se isto e 6bvio na Europa onde o mercado metapatri6ti co voltado para dentro de 1992 esta chegando e igualmente evi dente no abandono pelos EUA do compromisso de fomecer refu gio para os pobres do mundo em uma epoca onde os mercados financeiros americanos se tornaram mais internacionais do que nunca a Estatua da Liberdade poderia com alguma justia ser transportada para as margens do Rio Grande 0 Japao nunca per mitiu a imigraao com exceao da comunidade da Coreia subju gada odiosamente mas ele tern como qualquer outro poder capi talista feito uso da violencia e da interferencia para a exploraao de seus vizinhos a pilhagem da China e da Coreia e mais recen temente a bordelizaao da maior parte da Asia do sudeste Na esfera da cultura em suas dimensoes polftica e estetica tern havido urn desabrochamento de particularismos muitos dos quais do tipo rna is mesquinho e historicamente limitado Nos pa fses capitalistas desenvolvidos isto tern envolvido os palavrea dos da herana da industria de massa freqiientemente gaban dose do quase totalitario conceito de comunidade o racismo penetrante e o chauvinismo em direao aos novas grupos de imi grantes os excesses dipsomanfacos e a violencia populista em eventos esportivos internacionais e nos EUA e no Japao a into xicaao religiosanacionalista em varias formas cristaos renas cidos xintofsmo Mesmo o Terceiro Mundo tern sido inundado por seus pr6prios conflitos natives e regressoes nacionalistas das autodestrutivas proclamaoes do fundamentalismo islamico que tern dividido mais o mundo muulmano do que qualquer ataque imperialista ao crescimento do chauvinismo hindu e budista no sui da Asia a hedionda disseminaao do comunalismo e dos conflitos etnicos atraves da Asia e da Africa Libano Punjab Sri Lanka Filipinas Sudao e Burundi 262 Fred Halliday 0 segundo mundo socialista certamente nao se tern safdo muito melhor urn dos aspectos mais louvaveis do agora desacre ditado velho pensamento era a importancia atribufda ao intema cionalismo a fratemidade entre Estados semelhantes a igualdade entre OS grupos etnicos dentro das naoes e ao imperative herda do da melhor parte do iluminismo de adotar uma atitude crftica e onde apropriado corrosiva frente as presunoes de superioridade de uma determinada cultura e hist6ria nacional A maior abertura eo pluralismo libertaram as aguas represadas em uma onda de fre nesi nacionalista e 6dio tanto dentro dos Estados URSS China Romenia Iugoslavia como entre eles Ao lado de varios outros aspectos mais recomendaveis apesar de inadequadamente imple mentados do programa de modernizaao dos partidos comunistas tradicionais a exclusao da religiao da vida publica e polftica a emancipaao das mulheres a limitaao da apropriaao privada o desenvolvimento economico planejado e a solidariedade com o Ter ceiro Mundo este compromisso como entendimento intemacio nalista parece ameaado no presente repensamento em muitos outros aspectos positive se atrasado do modelo socialista que vern sendo realizado na URSS na Europa Orientale na China Como revelou a liberaao dos controles polfticos nada nestes pafses es teve mais estagnado do que o mito nacionalista Este camaval de divisao e preconceito enquanto se alimentando de uma hist6ria artificial e formado por uma negaao da hist6ria real das causas passadas e dos problemas e tendencias presentes Os pafses desenvolvidos esqueceram muito facilmente que durante a pri meira metade deste seculo e antes eles atacaram ou ocuparam a maior parte do Terceiro Mundo quase que a vontade escravizando povos inteiros e violando direitos nacionais e humanos em uma es cala global a indignaao justificada do publico britanico frente a ameaa de morte do Aiatola Khomeini contra o escritor Salman Rushdie precisa ser complementada pela percepao da indignaao iraniana ao fato de que em duas ocasioes neste seculo a GraBreta nha interferiu no pafs Primeiro em associaao com sua aliada Rus sia ela invadiu o Ira e depois no infcio dos anos 50 conspirou com os EUA para assassinar oficiais iranianos e derrubar o govemo elei to do pafs E parte da cultura polftica dos anos 1980 perderse em uma negaao em urn tipo de autovirtuosidade p6simperial quan do tais questoes sao levantadas isto e evidente na autoindulgente discussao americana sabre o Vietna no encobrimento europeu do imperio e de sua cultura racista no eufemismo japones sabre ques toes controversas em urn grau que envergonharia mesmo a classe governante britanica e no caso de seus livros escolares a falsifica ao diret da hist6ria A embriaguez militarista que fascinou a Gra Bretanha durante a guerra do Atlantica do Sui foi uma expressao Repensando as rela6es intemacionais 263 adequada deste virus globalizado assim como o foi a exultaao nos EUA dos bombardeios repentinos sabre a Lfbia nos quais dezenas de civis foram mortos A morte do criminoso de guerra Hiroito em 1989 forneceu aos japoneses que temporariamente haviam repudi ado o militarismo a oportunidade de se deliciar com suas proprias fantasiais imperiais Em uma epoca na qual existe forte apoio popu lar na URSS para a construao de urn memorial para as vitimas da repressao de Stalin podese perguntar quanto tempo demerara se algum dia para que sejam erguidos monumentos as vitimas do co lonialismo nas capitais que o comandaram em Paris Londres Bru xelas Haia Berlim Roma Madrid Lisboa Washington e Toquio Urn acompanhamento essencial desta cultura polftica autocen trada tern sido a crena em uma modernidade nova e cosmopo lita Esta ideologia Ionge de ser universal reflete valores selecio nados de alguns dos Estados mais ricos do mundo e apresenta varias opoes que sao especfficas e exclusivas Muito do que e born no passado e rejeitado no minima a propria percepao da histo ria Definioes alternativas sabre o que a modernidade poderia constituir sabre as opoes etnicas tecnicas e polfticas disponfveis sao eliminadas da discussao Os componentes da modernidade podem ser organizados tanto para a hierarquia como para a de mocracia como esta mais evidente no campo do controle da mf dia Ao mesmo tempo a disseminaao da tecnologia da informa ao o fetiche da epoca envolve uma confirmaao adicional do domfnio do ingles as custas das outras 4 mil lfnguas do globo Em paises como a Espanha e a Frana e tambem a GraBretanha o culto da modemidade e saturado par uma reverencia a competi ao e ao empreendimento uma ganancia oficialmente sancio nada que tern exacerbado as distancias entre os ricos e os pobres e reintroduzido a mendicancia de massa nas ruas das capitais euro peias ocidentais em uma escala nao vista desde 1940 Alem de ostentar uma rejeiao do carinho e da compaixao em casa a cultu ra polftica da modernidade envolve urn abandono da preocupa ao com o Terceiro Mundo e de varias questoes que marcaram quase toda a cultura da esquerda em 1970 a ajuda para o desenvolvi mento o subdesenvolvimento a solidariedade a transformaao social intencional A exceao mais notavel a esta tendencia foi o sucesso do Bandaid a mobilizaao para fornecer ajuda ao Tercei ro Mundo organizada par Bob Geldof em 1985 mesmo assim a despeito de seu enorme sucesso humanitario o resultado material do Bandaid 70 milhoes de dolares foi uma esmola comparada ao declfnio em termos reais das transferencias de ajuda NorteSui e ao que os pafses desenvolvidos e as suas corporaoes estavam ti rando do Terceiro Mundo de inumeras maneiras no mfnimo atra ves do reembolso da dfvida e dos termos declinantes de comercio 264 Fred Halliday Similarmente o amplo apoio para campanhas ecol6gicas como as do Greenpeace pouco tern feito para impedir a destruiao dos rios das florestas dos mares e da atmosfera do planeta 0 antiterceiro mundismo tornouse urn marco caracterfstico des ta versao do modernismo similar ao realismo da antiga intelli gentsia de esquerda nos pafses desenvolvidos Na Europa os anti gas defensores dos movimentos revolueionarios vietnamita e chile no agora entoam os louvores dos EUA e denunciam antigos aliados em uma atitude comparavel ao recurso a irracionalidade e ao arcafs mo na crftica artfstica e literana a admiraao pelo imperio e os valo res cristaos e uma reverencia a Edward Elgar e John Betjeman Nos EUA existe uma disposiao esqualida epitomizada pelos anti gas escritores da Nova Esquerda e apoiada por Wall Street que zomba de seus antigos aliados e que valida retrospectivamente a Guerra do Vietna Em uma questao acima de todas na qual o gover no americana tern urn papel central a desempenhar a da Palestina a maioria da intelligentsia americana adotou urn conformismo timi do oferecendo compreensao aos israelenses os dominadores que tiveram seu proprio estado nacional e ultraje aos palestinos as vftimas que nao tiveram Mais do que em qualquer outro pais de senvolvido esta tendencia foi associada a uma adesao arrependida a ideologia nacional a urn americanismo fabricado que nega a rica historia eo potencial radical do pafs Esta traiao polftica tern sido fortalecida par uma aspereza di fusa de atitudes culturais como Terceiro Mundo Tanto com rela ao aos pafses do Sui como com os pobres em casa tornouse comum culpar as vftimas par sua falta de iniciativa e empreendi mento Novas modelos estao em aao agora Nos EUA esta dege neraao alcanou a sua apoteose na figura de Rambo urn catalep tico assassino de massa elevado a heroi nacional Na GraBreta nha existiu uma tendencia cultural paralela urn ressurgimento da nostalgia colonial em nenhum Iugar mais evidente do que na re cafda insidiosa da nomenclatura dos restaurantes indianos o Moti Mahal 0 Palacio da Perala eo Nuri Jahan Luz do Mundo de duas decadas atras se tornaram Bengals Bertie e The Last Days of the Rajah Nenhum drama erotica agora parece legftimo a nao ser que tenha Iugar em uma plantaao ou culmine sob urn punkah Os lfderes politicos japoneses menos constrangidos em expressar ati tudes racistas tern abertamente proclamado a inferioridade de ou tros povos especialmente dos negros Talvez se estes processos continuem possamos aguardar ansiosos par novelas sabre os agen tes do genoddio colonial par restaurantes chamados Coolies Pe tit Colon Le Pied Noir e Banzai e bares de vinhos lembrando o ambiente do trafico de escravos Houseboy The Middle Passage ou simplesmente Chains Repensando as relaoes intemadonais 265 Esta embalagem de modemidade e a hostilidade correspondente ao Terceiro Mundo sao urn cenario essencial ao que pode em si mesmo parecer ser urn desenvolvimento separado e bemvindo a torrente de nego ciaOeS entre os grandes poderes sobre as quest6es do Terceiro Mundo E tentador mas prematuro discutir que estas trouxeram urn tim a rivalidade entre os sistemas socialista e capitalista e conseqlientemente de sua rivali dade no Terceiro Mundo A impressiio geral no tim dos anos 1980 era de que uma nova era de reconciliaao havia comado 0 ano de 1988 foi com justia consideravel saudado como urn ano em que a paz irrompeu por quase todo o mundo 0 perfodo de negociaiio e do novo pensamen to que se seguiu a emergencia de Gorbachev levantou muitas esperanas tambem conteve incertezas principalmente para o Terceiro Mundo Muitos afirmaram de Gorbachev a Thatcher que esta mudana de eventos marcou o tim da Guerra Fria Como discuti em outro tra balho o termo Guerra Fria pode significar duas coisas diferentes Como urn perfodo de conflito intenso entre o lesteoeste que envol veu a confrontaao e uma intensiva corrida armamentista entiio cer tamente eo caso que a Segunda Guerra Fria terminou em 19851987 No outro sentido mais amplo o da rivalidade entre dois sistemas so ciais e politicos opostos a competiao hist6rica foi o sustentacula da polftica mundial desde 1945 a Guerra Fria permanece bastante pre sente Em nenhum Iugar isto e mais evidente do que no Afeganistiio No final dos anos 1980 a URSS e os EUA argumentaram que estavam encorajando o compromisso nos conflitos do Terceiro Mundo e urn desengajamento das foras extemas incluindo as suas pr6prias Escritores sovieticos falaram com carinho de niio haver perdedores nos arranjos regionais Em realidade tais garantias niio foram confirmadas pelos pafses envolvidos No Afeganistao o acor do de Genebra de Abril de 1988 levou a implementaao de urn s6 lado os russos retiraram suas foras em 15 de Fevereiro de 1989 o ocidente particularmente os EUA e a GB eo Paquistao niio leva ram a acordo em consideraao e continuaram a suprir os contrare volucionarios isHimicos com armas 0 resultado foi que quando as foras sovieticas se retiraram uma nova fase na guerra afegii uma guerra civil intensa comeou ninguem no Afeganistiio duvidou de que existia uma continua busca pela vit6ria da parte da guerrilha e de seus defensores externos Na verdade foi ironico que no meio de Fevereiro de 1989 quando o mundo ocidental estava unido em indignacao contra os chamados do fundamentalismo isHimico para a morte do escritor Salman Rushdie que os protagonistas deste mesmo fundamentalis mo devessem disfarados de defensores da liberdade estar se reunindo nos portoes de Cabul incitados pela totalidade do mundo ocidental e brandindo seus mfsseis fomecidos por Ronald Reagan e Margaret Thatcher Poucos se preocuparam em perguntar o que o 266 Fred Halliday Estado islamico proposto por estes mujahidin traria Os defenso res deste movimento estavam por todos os lados normalmente jornalistas presos a suas mesas posando para aars em chapeus da swat e xales patiis garotos de uma escola pubhca mglesa amma dos por urn mundo sem mulheres do tipo de John Buchan aventu reiros americanos e veteranos da Indochina alegres em vingarse da URSS e talvez tambem cativados pela pratica afega de mutilar os corpos de suas vftimas como os soldados fazalll no Vietna Se a m plementacao ocidental do acordo da ONU stgmticou alguma c01sa foi mostrar que nao havia tregua e nenhum terreno comum nos con flitos do Terceiro Mundo 0 papel dos Estados europeus ocidentais neste processo oi m seu todo conspirat6rio Na Europa o novo e menos provocattvo m tervencionismo americana foi muito bern recebido assim como o distanciamento da poHtica americana das serias preocupacoes com o Terceiro Mundo E valido notar por exemplo que quando no poder os partidos socialdemocrata da Europa ocidental pouco fi zeram de concreto para ajudar a Nicaragua a resistir a pressao ame ricana Miterrand e Gonzalez rapidamente se encaixaram a etiqueta do clube atlantica A invasao americana de Granada em 1983 gerou alguma crftica da GraBretanha mas esta em parte motivada pela preocupacao com as propriedades da Comunidade passou rapida mente Na verdade houve considenivel colaboracao entre os EUA e os seus aliados europeus em acoes secretas no Terceiro Mundo e na polftica pr6insurreicao entre os EUA e a Franca contra a L1 bia no Chade entre a Holanda e os EUA na organizaao da revolta no Suriname entre os EUA e a GraBretanh31 no fornecimento de armas aos mujahidin afegaos assim como na Asia do sudeste existiu colaboracao sinoamericana no Camboja Quando os EUA envaram forcas navais ao Golfo Persico em 1987 navios europeus se Junta ram em uma operacao de manutenao da paz espuria reminis cente do Libano e da Coreia contribuindo para uma escalada na guerra e para o seu prolongamento por mais varios meses Quando a marinha americana derrubou urn aviao civil iraniano em Julho de 1988 matando todos os seus passageiros e a tripulaao os europeus ticaram mudos Os paises da CEE desejavam muito desenvolver uma polftica externa comum sua tentativa mais destacada de fazelo a declaraao de Veneza sobre a disputa arabeisraelense esgotous e nenhum dos principais Estados da CEE estava preparado para arrts car urn confronto com Washington nesta questao A despeito das modas passageiras do final dos 1980 nero a ri validade lesteoeste nem o desafio polftico do Terceiro Mundo po dem ir embora Como foi demonstrado tao claramente no Afeganis tao existirao vencedores e perdedores nos conflitos do Terceiro Repensando as rela6es intemacionais 267 Mundo no Camboja em Angola e na Nicaragua e o rumo destas disputas e em grande medida ainda definido pela rivalidade teste oeste Este livro foi escrito como uma contribuiao preliminar ao entendimento desta interrelaao e para determinar como os EUA e a URSS chegaram ao poilto de mudana no final de 1980 Fred Halliday Londres 12 de Maro 1989 Traduzido de HALLIDAY Fred One World One Myth Introdwao a Cold War Third World An Essay on SovietUS Relations London Hutchinson Radius 1989 por Cristina Soreanu Pecequilo 268 Fred Halliday OS FINAlS DA GUERRA FRIA Os eventos da segunda metade de 1989 representam urn pro funda abalo na politica mundial Eles restabeleceram de forma dra matica a faceta mais negligenciada da vida politica tanto no leste como no oeste caracterizada pela capacidade da massa da popu laao de atuar em politica de forma subita rapida e original depois de urn Iongo perfodo de algo que parecia ser indiferena Por sua velocidade importancia e pelas incertezas que liberaram eles po dem ser comparados a uma guerra na qual todas as expectativas e pianos estabelecidos sao varridos perante novas e irrefutaveis rea lidades Nem a esquerda nem a direita podem reclamar creditos por esses eventos ainda que ambas pretendam reivindicalos A direita comeou em 1989 o ano dos aniversarios revolucionari os proclamando que as revoluoes eram coisa do passado A es querda confundiuse pela rejeiao popular ao socialismo e pela adoao do nacionalismo nos estados do leste Esta e nao s6 uma epoca propicia as grandes mudanas na situaao mundial mas tam bern para que o movimento socialista reexamine seus muitas ve zes implfcitos fundamentos Neste contexto incerto e confuso ouvemse vozes dos dois Ia das proclamando que a Guerra Fria acabou e que estamos entrando em uma epoca de grande segurana e usando o termo em voga de interdependencia Maior atenao tern sido prestada na Europa onde inicialmente separados os processos de integraao a oeste conclu fdos em 1992 e de desintegraao no bloco sovietico a leste agora uniramse ligados pela geografia na busca de uma nova arquitetura de segurana e vinculados pelo tema da unidade alema Qualquer que seja 0 significado de Guerra Fria OS acontecimentos dos ulti mos meses sublinharam o fato de que ao Iongo das quatro decadas congeladas que se passaram o tema fundamental o terreno cen tral da rivalidade tern sido a Europa e o seu sistema sociopolftico Apesar de toda a enfase atual em temas europeus este proces so envolve mais do que a Europa ainda que na sua forma mais sim plista a constataao do fim da Guerra Fria envolve mais do que o colapso do sistema polftico da Europa do leste e das expectativas geradas pela perestroika 0 1989 europeu foi precedido por outro ano de transiao talvez de igual importancia o 1988 do Terceiro Mundo Neste ano em uma dezena de conflitos na Asia Africa e America Latina os processos de negociaoes encorajados pelos Repensando as relac6es intemacionais 269 l grandes poderes comecaram l fazer efeito no Camboja Afeganis tao Golfo Persico norte da Africa Angola Saara Nicaragua e ou tros A importancia do Terceiro Mundo nesse processo e nas pers pectivas para as relacoes lesteoeste nos anos 90 e 6bvia enquanto a Europa desfruta de paz desde 1945 mais de 140 conflitos antico loniais intraestatais de classe ou etnicos eclodiram no Terceiro Mundo Trieste e Berlim a parte as maiores crises lesteoeste deram se no Terceiro Mundo comecando como Azerbaijao em 1946 pas sando por China Coreia Indochina Suez Congo Cuba ate os con flitos regionais da decada de 1980 0 numero de vftiinas fala por si mesmo Acreditase que mais de 20 milhoes de pessoas morreram nesses conflitos Na Europa o unico enfrentamento violento nos mesmos moldes foi a guerra civil grega na qual cerca de 80 mil pes soas pereceram Os Significados da Guerra Fria Antes de examinar essas mudancas seu Iugar na hist6ria mo dema e a questao do fim da Guerra Fria pode ser esclarecedor colo car duas quest5es anteriores qual o significado do termo Guerra Fria e qual foi a sua dinamica subjacente Apesar de sua proveniencia moderna academica e jornalfstica o termo tern uma curiosa pre hist6ria Criado por Don Juan Manuel urn escritor espanhol dose culo XVI para caracterizar a interminavel rivalidade entre cristaos e arabes na Espanha ele foi reinventado pelo financista e diplomata Bernard Baruch que declarou telo ouvido de urn mendigo sentadd num banco do Central Park em algum momenta do anode 1946 Esta origem casual nao favorece a precisao e o termo Guerra Fria pode ser usado pelo menos em duas acepcoes Uma para referirse aos perfodos de intensa confrontacao entre os dois maiores blocos do p6sguerra e em particular aos anos entre o final da decada de 1940 e o infcio da decada de 1950 a Primeira Guerra Fria e o final da decada de 1970 ate 1988 a Segunda Guerra Fria 0 outro uso do termo Guerra Fria referese a rivalidade essencial entre o co munismo eo capitalismo que comecou em 1917 e que como resul tado da Segunda Guerra converteuse na divisao dominante e cons titutiva dos assuntos mundiais Este segundo uso do termo sugere questoes mais amplas de interpretacao e de analise nas relacoes internacionais De forma geral podese dizer que na literatura sobre a Guerra Fria eo con flito lesteoeste existem quatro explicacoes gerais sabre por que os dois blocos se confrontaram como o fizeram Para uma escola associada ao realismo convencional e ao pensamento estrategico 270 Fred Halliday a rivalidade lesteoeste e apenas outra versao do conflito entre os grandes poderes a ser explicado pelo equilfbrio de poder e por outras consideracoes A ideologia e vista apenas como uma expres sao desta interacao estrategica e diferencas nas composicoes intemas destas sociedades sao analiticamente irrelevantes Uma segunda orientacao comum entre os escritores liberais atribui o conflito aos erros poHticos as oportunidades perdidas e as percepcoes inade quadas de ambos os lados Desse ponto de vista o conflito era evitavel uma melhor comunicacao no perfodo p6s1945 e no fi nal da decada de 1970 poderia ter evitado tanto a Primeira quanto a Segunda Guerra Fria Uma terceira escola argumenta que sob a aparencia de rivalidades internacionais ocultamse fatores inerentes a estas sociedades ou seja fatores poHticos e economicos levam os Estados em questao a competir urn com outro Particularmente muitas analises da Segunda Guerra Fria enfatizam o alcance dos fatores poHticos nos Estados Unidos e na URSS e a dinamica nao controlada da corrida armamentista como causadores da matura cao desse conflito A aparencia de conflito interbloco ou intersis temico mascarou uma homologia que as duas partes usaram e da qual se beneficiaram dentro de seus pr6prios domfnios Esse argu mento em suas variantes e comum entre os escritores de esquer da tanto nos Estados Unidos quanta na URSS como E P Thomp son Mary Kaldor Michael Cox Noam Chomsky e Andre Gunder Frank Para eles a Guerra Fria e em si mesma urn sistema mais do que uma competicao entre dois sistemas Nao se pode negar que cada uma destas tres explicacoes ilu mina o andamento das relacoes lesteoeste havia elementos de ri validade tradicional entre os grandes poderes erros de percepcao e determinantes domesticos 0 argumento da rivalidade intersiste mica foi enfraquecido por sua percepcao como uma mera diferen ca ideol6gica a direita sob a forma da rivalidade anticomunista liberdade versus totalitarismo e no bloco sovietico a dogmatica concepcao dos dois campos Urn dos incentives poderosos para os crfticos da Guerra Fria negarem seu carater intersistemico tern sido o desejo de romper com essas simplificacoes rivais mas ho m6logas Mas o argumento sugerido aqui e de que estas tres expli cacoes por si mesmas nao sao suficientes para explicar o carater a duracao e a profundidade da Guerra Fria 0 que lhe deu forca peculiar para alem das formas convencionais de conflito interna cional foi 0 seu carater intersistemico 0 fato de expressar a riva lidade entre dois sistemas social economica e politicamente dife rentes Cada urn pretendia prevalecer em escala mundial produzir uma ordem intraestatal homogenea e cada urn negava a legitimi dade do outro ainda que fossem compelidos a entrar em negocia Repensando as rela6es intemadonais 271 oes diplomaticas ou outras em grande parte pela ameaa das ar mas nucleares E necessaria mencionar que se no infcio dos anos 1980 esse argumento poderia ser apresentado em nfvel abstrato ou imanente os acontecimentos dos ultimos anos o confirmaram na pratica 0 que se segue e a afirmaao de que 1989 foi 0 anode teste das teorias da Guerra Pria ja nao se trata mais de julgar Em urn sentido amplo o fim da Guerra Pria representou a homogeneidade sistemica e o seu objetivo fora definido pela natureza socioeconomica e polftica dos Estados centrais de cada bloco que buscaram prevalecer urn sobre o outro durante o conflito Urn Triplo Contexto Hist6rico Considerar que a Guerra Pria terminou portanto e uma ideia ambfgua que depende da acepao em que o termo e utilizado Para responder se e em que sentido a Guerra Pria acabou e necessa ria o exame dos tres contextos hist6ricos dentro dos quais ocorre ram as mudanas de 1988 e 1989 0 primeiro mais evidente para os conflitos do Terceiro Mundo e da corrida armamentista com preende a detente do final dos anos 1980 que marca o termino do que vern sendo denominado de Segunda Guerra Pria ou seja o perfodo de intensa rivalidade e hostilidade entre os Estados Uni dos e a URSS que se iniciou por volta de 1979 e que durou ate a ascensao de Gorbachev em 1985 mais precisamente ate a cupula da IsHindia em 1986 0 termo Guerra Pria foi usado nesse contex to por analogi a com a Prime ira Guerra Fria do final dos anos 1940 e infcio dos anos 1950 para denotar urn perfodo sem uma guerra quente e sem uma paz normal mas de confrontaao e alerta proxi mo a urn enfrentamento militar total Ha varios pontos em disputa no que diz respeito a Segunda Guerra Fria Mas ela e razoavelmente comparavel a Primeira Guerra Pria e como esta envolveu a con frontaao nao violenta na Europa e multiples conflitos sangrentos no Terceiro Mundo 0 segundo significado do final de decada de 1980 e de que ele marca o termino do sistema p6sguerra prevalecente na Europa Isso se aplica mais obviamente a divisao da Europa e por extensao da Alemanha 0 Pacto de Vars6via e mesmo a OTAN reduziram consi derave1mente as suas funoes Com razoavel confiana pode ser afirmado que no curso dos anos 1990 as revoltas correntes produzi dio uma nova ordem a oeste da fronteira sovietica A Alemanha sera reunificada provavelmente em questao de meses e sistemas multi partidarios e economias capitalistas irao se desenvolver na Europa 272 Fred Halliday do leste Sejam quais forem as incertezas intemas que esses pafses possam enfrentar as pressoes internacionais diplomaticas finan ceiras irao impulsionalos nessa direao e conduzilos a transiao A transiao sera mais complicada do que nas anomalias da Europa ociderital da decada de 1970 Espanha e Portugal As alteraoes no sistema polftico sao obviamente mais faceis do que na estrutura so cioeconomica e ideol6gica Mas ha poucas duvidas de que essa tran siao possa e va ocorrer A mudana na Europa oriental e acompanhada e em si mesma integra outra alteraao no sistema p6sguerra que compreende o fim do sistema bipolar e em particular do sistema dominado pelas duas superpotencias 0 resultado de 1989 simbolizado na cupula de Malta realizada em meio ao naufragio dos regimes comunistas da Europa do leste e 0 da existencia de uma s6 superpotencia OS Estados Unidos A URSS perdeu sua margem de manobra na Europa com o colapso do Pacto de Vars6via Alem disso encontrase enfraqueci da e preocupada com a crise economica e social e nao mais apta a competir com os Estados Unidos ou com o ocidente nas esferas militar e economica A URSS e agora pouco mais do que uma po tencia continental sem o suporte do sistema de aliimas A ilusao da paridade como denominava Brezhnev nao e mais sustentavel 0 sistema percebido como 0 do p6sguerra e em geral 0 de Yalta estabelecido na cupula da Crimeia em fevereiro de 1945 Poi a partir deste referendal que os que rejeitaram este sistema respon sabilizaram as potencias ocidentais por concordarem com as de mandas sovieticas Na realidade contudo o modelo de uma Euro pa pacificada fora estabelecido dois anos antes e mais a noroeste nas batalhas de Stalingrado e Kursk quando o Exercito Vermelho final mente rompeu a formaao das foras de Hitler Nao houve nenhu ma discussao com Stalingrado Yalta simplesmente reconheceu o equilfbrio de foras entao na Europa Roosevelt e Churchill nao poderiam alterar a situaao mais do que o atual governo britanico poderia garantir o sistema de govemo em Hong Kong p6s1997 Os crfticos de Yalta tendem tambem a ignorar o significado do poder militar sovietico de uma outra perspectiva a derrota de Hitler nao s6 garantiu o controle sovietico da Europa oriental mas tambem possibilitou o restabelecimento de govemos democraticos na Euro pa ocidental Em urn tempo em que todo o passado sovietico e visto com desprezo dentro e fora da URSS e preciso recordar precisa mente o que refletia a aritmetica estrategica de 19441945 as 80 divisoes alemas na frente oriental contra apenas 20 na ocidental para nao mencionar as cifras comparativas de vftirnas dos exercitos sovi eticos e ocidentais Poi a partir desta base hist6rica que ambas as partes da modema Europa foram estabelecidas Sem Stalingrado urn regi Repensando as relacoes intemacionais 273 f me nazista poderia ainda estar no poder nao apenas em Berlim e vars6via mas tambem ern Paris e Amsterda Todas as coisas boas que podern seguirse a 1992 o Mercado Comum Europeu o mun do onirico dos festivais da cansao do Eurovision estao sendo cons truidas sobre as bases deixadas pelo Exercito Vermelho 0 Modelo de Versalhes Nao sao entretanto apenas os sistemas e os conflitos pas1945 que parecem estar em questao Os eventos de 1989 colocaram em questao nao apenas Yalta e Potsdam mas tambern o que fora esta belecido em uma conferencia anterior a de Versalhes Mais do que qualquer coisa a explosao na Europa nos leva de volta ao periodo da Primeira Guerra e em alguns aspectos a epocas anteriores Ha pelo rnenos tres aspectos de Versalhes que estao agora em ques tao 0 primeiro em geral negligenciado hoje em dia e o que diz respeito a realocasao de territarios coloniais Pelo rnenos dois des tes permanecem areas de conflito a Namibia e a Palestina ANa mibia parece agora ter alcansado uma resoluao ao tornarse o 170o Estado soberano no mundo contemporaneo A questao da Palestina permanece em aberto apesar das mudanas nas opini oes tanto dos israelenses quanto dos palestinos 0 segundo aspecto significativo de Versalhes foi o estabelecimento de uma ordem pas imperial na Europa Quatro imperios perderam seus dominios eu ropeus o Otornano o Russo o AustroHungaro e em urn proces so separado mas relacionado aos outros e freqtientemente esque cido nas ilhas o Britanico 0 resultado foi a independencia de di versas novas naoes europeias dentre elas os tres paises balticos a Finlandia a Polonia a Hungria a Tchecoslovaquia a Iugosla via a Albania a Irlanda A Alemanha foi subjugada e em parte desmilitarizada Em meados dos anos 1980 parecia que muito deste sistema permanecia a Alemanha que temporariamente havia que brada suas amarras na decada de 1930 perrnanecia subjugada e OS Estados nacionais que sobreviveram a Segunda Guerra com a excesao dos tres balticos estavam seguros Os acontecimentos do final da decada de 1980 alteraram esse panorama Como em outras ocasioes a Irlanda foi a primeira na ao a desafiar as fronteiras pas1918 com a reemergencia da ques tao de Ulster no final da decada de 1970 0 que Ulster representa numa perspectiva comparada e a falencia do arranjo p6sPrimeira Guerra e o ressurgimento em novas bases de dificuldades econo micas e perspectivas politicas das inimizades que eclodiram naque le periodo Hoje outras questoes alcanaram Ulster no desafio as decisoes de 19181920 e com conseqtiencias que prometem ser 274 Fred Halliday ainda mais violentas Kosovo Bulgaria Caucaso esse ultimo apesar de sua localizasao longinqua ainda faz parte da Europa geografica Quem sabe quanto tempo ha de passar antes que os habitantes de Fermanagh ou do Tyro do leste e centro da Europa sejarri novamente notfcia Macedonia Epiro do Norte Silesia e leste da Ucrania De Fall Roads a Rosenheirn e alem os solenes corn promissos de Helsinki de respeito as fronteiras pas1918 e pas1945 estao cada vez mais debeis Versalhes nao esteve contudo relacionado sornente a realoca sao de colonias e a nova divisao do mapa europeu Como Arno Mayer muito bern demonstrou em The Politics and Diplomacy of Peacemaking Versalhes esteve tambem relacionado com urn ou tro Iegado da Primeira Guerra Mundial a Revoluao Bolchevique Grande parre da estrategia ocidental anticomunista para a URSS desde a primeira intervensao passando pelas doutrinas de Riga ate a contensao pasguerra foi prenunciada nesse primeiro enfrenta mento das potencias imperialistas A colisao entre os dois sistemas mundiais que rnais tarde resultaria no conflito bipolar da decada de 1940 em diante tern suas origens em 1919 Entre as ruinas da guerra para terminar corn todas as guerras 1919 assistiu a constitui ao de dois sistemas politicos internacionais rivais cada qual base ado num misto de idealismo e calculo a Liga das Naoes e a Inter nacional Comunista Ao construir urn sistema politico e social total mente diferente e militante contra o capitalismo ocidental Lenin es tabeleceu os parametros de uma divisao do mundo e de seus confli tos inerentes 0 fato desse modelo nao ter adquirido relevancia mundial antes de 1945 devese a debilidade da URSS ate a Segunda Guerra 0 periodo entreguerras foi ainda dorninado pelo conflito intercapitalista Mas a rivalidade subjacente entre o capitalismo e o socialismo ja existia e perdurou ate os anos 1980 Stalin dissolveu o Comintern em 1943 para apaziguar os lideres ocidentais Mas ele o fez somente quanto possuia urn instrumento rnais eficiente para ampliar a influencia sovietica o Exercito Vermelho As mudanas dos ultimos cinco anos parecem todavia ter en cerrado essa fundamental assimetria entre capitalismo e cornunismo 0 recuo da URSS como potencia mundial foi acornpanhado por urn crescente questionamento de sua organizaao interna e ideologia 0 futuro da URSS e mais incerto do que o da Europa orientaL Con tudo uma fissura maior e provavelmente irreparavel produziuse no sistema economico e politico vigente na URSS desde a decada de 1920 Em politica internacional Gorbachev abandonou o com promisso de competir e oporse ao capitalismo ocidental renunci ando a luta de classes em nome de valores humanos universais Os sovieticos hoje negam qualquer conflito entre os dois sistemas ou a Repensando as relac6es intemacionais 2 7 5 validade de qualquer conceito tradicional de imperialism Nao ha mais como lamenta Fidel Castro urn campo scialita 0 espetro de sistema comunista intemacional que sobrevtveu a dtsputa smo sovietica da decada de 1960 nao mais se sustenta A politica sovie tica no Terceiro Mundo sem descartar compromissos previos tor nouse cada vez mais conciliat6ria ao ocidente As autoridades so vieticas agora dizem aos aliados do Terceiro Mundo que o termo so lidariedade foi substitufdo por interesses recfprocos Mas as mudan9as intemas sao ainda mais importantes nao s6 por que anun ciam uma inexoravel aproxima9ao sovietica das praticas e dos va lores ocidentais e em termos ocidentais tambem por que inserem mais completamente a sociedade e a economia sovieticas dentro da ocidental Em suma o novo caminho trilhado por Gorbachev por mais incerto que seja o seu futuro representa uma ruptura com o legado da Revolu9ao Bolchevique intema e extemamente Signifi ca nada menos do que a reorganiza9ao da URSS em parametres capitalistas tanto socioeconomicos quanto polfticos Dentro do es pa9o de uma gera9ao pouco restou do impacto de 1917 fora uma difusa nostalgia popular por distribui9ao igualitaria e urn papel in temacional residual 0 PCUS ainda que permane9a o partido go vemante assemelhase mais ao PRI mexicano do que a seu mode lo anterior A Luta de Classes em Escala Internacional Agorae possfvel retornar a questao Cffi a qual come9amos ou seja sea Guerra Fria terminou ou nao E evidente que isso de pende de qual significado de Guerra Fria se esta usando No primei ro sentido e plausfvel afirmar que a Guerra Fria acabou Desde rrieados da decada de 1980 as rela96es entre a URSS eo ocidente melhoraram a tal ponto e em uma variedade tao ampla de temas que e diffcil prever urn regresso ao clima de 1950 ou de 1983 Poderia haver uma mudan9a consideravel de polfticas se Gorbachev fosse deposto por urn grupo nacionalista pr6Brezhnev ou se urn Dankwor th Quayle por alguma desventura pessoal ou eleitoral viesse a ocu par o Salao Oval Poderia tambem eclodir uma crise muito mais perigosa por nao poder ser antecipada envolvendo urn tema regio nal uma repeti9ao de Suez em 1956 ou Cuba em 1962 Mas o grau de relacionamento diplomatico ou de outras ordens e confian9a entre os dois lados e tal que mesmo se uma crise desse tipo ocorresse talvez nos Balcas ou no Ira as chances de conten9ao seriam altas E a pos sibilidade de minar a detente atual desencadeando uma Terceira Guerra Fria seria remota 276 Fred Halliday Quando examinamos o segundo significado da Guerra Fria a situa9ao e bastante diferente Ha uma tenta9ao difusa em reconhe cer que a Guerra Fria esta acabando mas que esse e urn processo simetrico convergente Os dois blocos enfrentaram dificuldades na Segunda Guerra Fria e foram incapazes de prevalecer como deseja vam os Estados Unidos procurando sobrepujar a URSS na corrida armamentista incorreram no maior deficit or9amentario da hist6ria tornandose a maior na9ao devedora do mundo e perdendo conti nuamente competitividade para os japoneses e alemaes Ha os que sugerem no ocidente e na URSS que tendo diminufdo as diferen yas entre o capitalismo e o comunismo as mudan9as internas no bloco sovietico que acompanharam a detente sao urn processo evo lutivo 0 capitalismo mudou e continuara mudando Mas seria ilu s6rio considerar que ambos os sistemas foram igualmente debilita dos ou que as mudan9as em curso foram simetricas 0 final da Guerra Fria na primeira acep9ao e o clima prevalecente de detente na Eu ropa e no Terceiro Mundo foi alcan9ado nao pela convergencia dos dois sistemas ou de uma tregua negociada entre eles mas pelo co lapso de urn lado perante o outro lsso significa nada menos do que a derrota do projeto comunista tal como foi conhecido no seculo XX e o triunfo do capitalismo 0 caso e tao evidente que parece uma valida9ao retrospectiva da interpreta9ao intersistemica da Guerra Fria A liga9ao entre a mudan9a intemacional e o relaxamento de tens6es com o colapso interne do comunismo e a expansao de rela96es ca pitalistas no antigo bloco do leste ilustram justamente como a dina mica da realidade interestatal relacionase com as diferen9as inter nas e sistemicas Mais ainda a dire9ao dos recentes acontecimentos deveria sublinhar para os que duvidaram que existiu nos pafses co munistas urn sistema baseado em criterios sociais e economicos di ferentes Se tudo tivesse sido capitalismo ou estivesse sujeito ao mercado capitalista intemacional nao teria havido necessidade de urn conflito lesteoeste e da reorganiza9ao radical das sociedades p6s comunistas Este processo nao esta de forma alguma conclufdo Ainda nao sabemos como sera o mapa p6seleitoral do leste Mas poucos ere em que os partidos comunistas existentes permanecerao no poder ou sobreviverao como uma das principais for9as politicas Uma marginaliza9ao eleitoral com 5 a 10 dos votos pareceria o mais provavel A situa9ao da URSS ainda esta evoluindo mas o espanto so e nao s6 a sua inabilidade em manter seu sistema de alian9as intemacionais o outro campo socialista mas tambem a falta de qualquer futuro plausfvel para o socialismo sovietico Que o desen lace dure 5 ou 50 anos que ocorra na base da uniao com a sus tenta9ao da URSS ou com a separa9ao das republicas constituintes Repensando as rela6es intemacionais 277 f que seja pacifica ou sangrento tudo isso nao podemo saber Ms nao seria imprudente temer 0 pwr A reahdade e que 0 SIStema SOV1 6tito perdeu sua autoconfian9a qualquer sensa de dire9aoe os fun damentos hist6ricos e eticos de seu papel internacional A URSS esta engajada num saudavel por muito tempo adiado e publico exame de seu passado e dos problemas atuais da sociedade sovietica Mas isto nao e tudo A presente polftica sovietica tambem se caracteriza por uma abjeta negaao das conquistas passadas mesmo na Segun da Guerra Mundial por urn exagero ingenuo das virtudes do capita lismo ocidental pela capitulaao a todo o tipo de ideologias retr6 gradas de carater nacionalista familiar e religioso e pelo abandono de compromissos internacionais que foram urn dos aspectos mais luminosos da Era Brezhnev Gorbachev esta com muita habilidade e convicao conduzindo o barco para urn porto cuja localiza9ao nao conhece Esta fazendo o melhor que pode para proporcionar aRe volu9ao Bolchevique uma aterrissagem suave As alternativas o dgido retrocesso de Ligachev e a insfpida demagogia de Yeltsin sao menos do que uma resposta No Terceiro Mundo muitos Estados que na decada de 1970 eram considerados socialistas ou pelo menos de orientaao so cialista estao agora imitando a URSS em economia e politica Gor bachev forneceulhes uma contradit6ria prescriao seguir seu pr6 prio caminho em direao ao socialismo e ao mesmo tempo apren der com o significado internacional da perestroika Hoje a sua con di9ao pode ser descrita como de Estados de desorientaao socialis ta Num calculo recente apenas cinco pafses no mundo ainda pro fessam na vida polftica urn modelo ortodoxo Cuba Albania Viet na Coreia do Norte e China Todos OS cincos e clara distinguem se pelo fato de terem abrigado movimentos revolucionarios nativos com bases sociais e carater nacionalista devendo pouco ao Exerci to Vermelho Os quatro menores estao cada vez mais na defensiva incapazes de tamar iniciativa frente a crescente pressao externa Cuba Albania e Coreia do Norte estao em paralisia polftica de tipo per verso 0 Vietna esta se ajustando e com uma soluao no Camboja poderia acertarse 0 ultimo dos cinco a China suscita os maiores problemas especialmente depois da Pra9a da Paz Celestial E facil culpar pelo massacre os velhos dirigentes que logo morrerao A or ganiza9ao fuzilamento e a repressao p6smassacre foram promovi dos pelos novos quadros que se apegaram a manuten9ao do siste ma Mas sera duro para a China resistir a pressao internacional a Iongo prazo especialmente quando seu modelo parece cada vez mais inadequado pelos desenvolvimentos na URSS No que diz respeito aos partidos do Terceiro Mundo comprometidos com o comunismo ortodoxo que ainda nao estao no poder eles estao condenados a 278 Fred Halliday fracassar ou ajustarse 0 Novo Exercito do Povo das Filipinas o Sendero Luminoso esse ultimo adorando as virtudes imaginarias de urn Mao dos primeiros anos e uma idealizaao de Enver Hoxha parecem estar fadados ao fracasso Ja o Partido Comunista Sul Afri cano e talvez a Frente de Libertaao Tigre parecem ter optado pelo ajustamento Na india a maior democracia burguesa do mundo o Partido Comunista indio Maofsta PCIM inicialmente baluarte da linha independente revolucionaria selou seu desaparecimento ce lebrando o massacre em Pequim 0 fracasso do modelo comunista em constituir urn bloco inter nacioilal distinto e viavel e o reverso hist6rico do processo que se iniciou em 1917 nao parece estar em duvida A Guerra Fria em sentido amplo COIJtinua mas com o colapso de urn de seus dois protagonistas Nesse sentido a aparente generosidade com que se proclama no ocidente o fim do antagonismo entre os dois oculta uma atitude triunfalista Para falar na linguagem do velho pensamento o que agora estamos presenciando e uma luta de classes em escala internacional na qual as for9as superiores do capitalismo ocidental abriram sociedades parcialmente fechadas a sua influencia por qua troou mais decadas Basta observar o rapido decisivo e met6dico estrangulamento da Republica Democratica Alema pela serpente do capitalismo da Alemanha Ocidental para perceber como funciona esse processo ou as compras de fabricas hungaras e polonesas que o empresariado ocidental realizou a preos irris6rios As Complexidades da Estagnaao 0 reconhecimento desse fato nao facilita muito entretanto as respostas a outras questoes o que produziu essa virada na Guerra Fria e em particular par que aconteceu nesse momenta A resposta convencional e de que o sistema comunista faliu que a sua econo mia perdeu qualquer dinamica que perdeu seu apelo polftico par nao ser democratico que nao poderia igualarse ao ocidente nas areas de competiao intemacional Ha alga de verdadeiro nisso Mas e preciso situar esta falencia em urn contexto Em primeiro Iugar ha numa perspectiva hist6rica pouca correlaao entre o apelo polftico do comunismo e o seu carater democratico 0 perfodo de maior re pressao na URSS nao foi a decada de 1980 e sima decada de 1930 Foi quando Stalin assassinou milhoes diretamente ou par negligen cia 0 sucesso militar e industrial do sistema sovietico foi tambem alcanado nesse momenta pela mobilizaao e apoio do povo sovie tico E foi tambem nesse momenta que o comunismo sovietico go zou de maior prestfgio no ocidente Isso tambem e valido para o Repensando as rela6es intemadonais 279 Terceiro Mundo como provam as revolu6es na China e no Vietna nos anos 1940 Mesmo na decada de 1970 quando a estagnaao haviase instalado na URSS o modelo sovietico gozou de amplo apoio nos recemindependentes Estados revoluciomlrios africanos A ironia hist6rica e que o comunismo perdeu seu apelo justamente no momenta em que demonstrou urn novo potencial politico uma habilidade para a mudan9a que fora posta em duvida pelos te6ricos do totalitarismo e por muitos outros na URSS Na esfera economica surgiu urn problema similar E conven cional agora afirmar que as economias de tipo sovietico sao urn fra casso e os escritores sovieticos absorveram isso com termos como estagnaao zastoi e desaceleraao zamedlenie empregados para a Era Brezhnev para cobrir uma gama de temas interrelacio nados taxas de crescimento decrescente inferioridade tecnol6gica paralisia industrial deterioraao social desastre ecol6gico De to das as formas essa caracterizaao e exagerada o fato e que no pe riodo p6sguerra em seu conjunto as taxas de crescimento na URSS e a provisao de uma gama de serviOS sociais incluindo moradia saude e educaaO melhoraram substancialmente Em termos glo bais os nfveis de vida na URSS duplicaram entre o fim da Segunda Guerra e meados da decada de 1970 Considerando o nfvel de vida da maior parte da populaao mundial a populaao sovietica vi ve comparativamente bern tern habitaao calado vestmirio transpor te saude lazer em nfveis maiores do que OS da maioria da popula ao latinaamericana sem mencionar a Asia e Africa As popula96es do leste europeu viviam ainda melhor em parte e claro pelo subsf dio sistematico de suas economias pela URSS Em nfvel intemacional a situaaO e tambem ambivalente Eva lido recordar que quando a Segunda Guerra Fria comeOU no final dos anos 1970 havia uma opiniao generalizada no ocidente de que ela era resultado de urn novo poder sovietico no mundo manifesta do sobretudo num fortalecido poder estrategicomilitar e numa posiao refor9ada no Terceiro Mundo Os mfsseis sovieticos os es trategicos SS19 e os de alcance intermediario SS20 fizeram a ba lana pender para o lado de Moscou No Terceiro Mundo a onda de revoluoes da segunda metade da decada de 1970 marcou o fim da pax americana e uma nova presen9a sovietica intemacional 0 Afe ganistao foi visto como o apogeu desse novo poder sovietico 0 fato de muitas autoridades sovieticas incluindo Brezhnev acreditarem nessa for9a conferialhe credibilidade adicional A America estava fraca 0 ocidente encontravase no mesmo caminho Ravia muita discussao a direita e A esquerda sobre o fim da hegemonia norte amricana Uma mudan9a parcial na posiao relativa dos Estadps Un1dos em algumas esferas foi convertida em uma perda absoluta 280 Fred Halliday de poder tanto em relaao a outros competidores capitalistas como o Japao quanto em relaao a URSS Muito disso era nonsense urn exagero deliberado do poder so vietico e uma representaaO distorcida dos desenvolvimentos do Terceiro Mundo e no campo nuclear Isto serviu tanto para difundir 0 alarmismo quanto para a esquerda obscurecer a continuidade da dominaaO americana e a direita para justificar a ofensiva ociden tal contra a URSS De qualquer forma a imagem de uma fora in temacional sovietica crescente na decada de 1970 nao era totalmente mftica ou imaginaria Correspondia a avanOS reais nas capacida des sovieticas Numa perspectiva hist6rica nao foi Khrushchev Lenin ou mesmo Stalin que causaram as maiores dificuldades ao ocidente fora da Europa o mais maligno foi Brezhnev Foram as armas e o apoio sovietico que permitiram o triunfo dos vietnamits e que muito facilitaram as vit6rias em Moambique Angola e via Cuba na Nicaragua Mesmo no final da decada de 1980 as conse qtiencias desses compromissos intemacionais eram visfveis apesar das tentativas dos govemos ocidentais de reivindicar 0 credito pelo acontecido a dramatica virada na Africa do Sul em 1990 muito deve ao apoio militar de Iongo prazo dado aos govemos nacionalistas contra Lisboa e Pretoria durante a decada de 1960 e infcio de 1970 E de Brezhnev mais do que de qualquer outra figura fora da Africa do Sul o credito pela ruptura com o bloco racista A Crise Terminal A questao que surge portanto e por que foi na decada de 1980 quando o sistema sovietico estava em uma posiaO aparentemee sustentavel que a crise eclodiu Esse e urn tema que afeta as anah ses da Segunda Guerra Fria produzidas ha uma decada uma vez que era muito raro perceber o quao vulneravel a posiao da URSS tor narase Em retrospecto e essa na minha visao a maior falha de minha propria analise em The making of the Second Cold War A hip6tese era de que mesmo se as afirma6es ocidentais de urn novo e agressivo poderio sovietico fossem infundadas o sistema sovieti co como urn todo era suficientemente vhivel para continuar a repro duzirse tanto na URSS quanto em outros pafses do bloco Em par te esse julgamento era acertado 0 sistema sovietico nao fliu em termos absolutos nao houve revolta popular sua econom1a pro porcionava uma oferta de bens adequada embora restrita Os niveis de desigualdade economica e de crime eram menores do que os dos pafses desenvolvidos Seu registro hist6rico era razoavel Estava mostrando consideravel habilidade de adaptaaO polftica Sua for9a Repensando as rela6es intemadonais 281 intemacional era maior do que nunca Mesmo assim o fato e que no final da decada de 1980 a URSS parece afetada por uma crise terminal incapaz de desafiar o capitalismo intemacionalmente ou de reproduzirse intemamente Como em qualquer processo desse tipo e ainda mais com a fa lencia de Estados depois de uma longa guerra e possivel voltarse para o que parecem ter sido anos de estagnaao e prognosticar a origem do colapso Ha duas razoes 6bvias para o colapso A primei ra a marxista classica facilmente esquecida nos tempos atuais foi de que no infcio da decada de 1980 o ocidente lanou uma ofensiva para debilitar e paralisar a URSS No campo nuclear os Estados Unidos buscaram explicitamente a superioridade sobre a URSS 0 ocidente investiu em novos programas eufemisticamente descritos como modemizaao e Reagan pressionou propondo e ameaan do como desenvolvimento de urn sistema estrategico defensivo que encerraria a politica de dissuasao ate entao em vigor No Terceiro Mundo a intervenao norteamericana em diversos nfveis encer rou a onda de revoluoes depois do Zimbabwe em 1980 nao hou ve mais revoltas seja em funao de repressao direta como em El Salvador ou atraves da dispetisao dos processos revolucionarios com candidatos reformistas como no caso nas Filipinas Haiti e Coreia do Sui Ao mesmo tempo a doutrina Reagan foi desenvolvida para justificar as pressoes sobre os Estados revolucionarios do Terceiro Mundo havia venda de armas para guerrilhas opositoras a regimes pr6sovieticos em quatro Estados Camboja Afeganistao Angola e Nicaragua Washington desenvolveu a politica de promover a era sao do poder sovietico nas margens referindose aos aliados so cialistas do Terceiro Mundo Centenas de milhares de pessoas mor reram e milh6es foram deslocadas de seus lares como resultado des sas guerras contrarevolucionarias dos anos 1980 0 resultado das elei6es de 1990 na Nicaragua foi acima de tudo urn resultado desse tipo de pressao representou a exaustao do povo depois de 30000 mortes nas maos dos contras Essa contrarevoluliao diferiu claque las do Chile Guatemala e Indonesia nao s6 porque foi pacifica mas porque os massacres ocorreram antes e nao depois da derrota do regime revolucionario 0 segundo argumento encontrado tanto em analises sovieti cas quanta ocidentais enfatiza o processo intemo a entropia Isso quer dizer que de alguma forma o modelo se esgotou na decada de 1980 exaurido depois de quatro a oito decadas de dinamismo Os sinais mais evidentes disto foram o estrangulamento economi co que parecia haver debilitado a URSS e outros paises do COME CON e os problemas sociais e ecol6gicos concomitantes As fon tes de crescimento previamente disponfveis foram consumidas o 282 Fred Halliday excedente de populalioes rurais as formas iniciais de industriali zaao os emprestimos ocidentais e a aplicaao seletiva de tecno logia Concomitantemente com essa estagnaao economica os problemas ecol6gicos produzidos por decadas de pilhagem in ten siva da natureza manifestaramse da poluiao dos rios no sudeste da Republica Democratica Alema ate a inexoravel contraao do Mar de Aral Problemas sociais tambem emergiram depois de de cadas de negligencia taxas de natalidade decrescente expectati va de vida declinante criminalidade crescente Acima de tudo houve urn esgotamento de credito politico historicamente 0 mo vimento comunista extraiu seu fmpeto de eventos especificos a Revoluao Bolchevique e a derrota do fascismo Sucessos poste riores a lideranlja inicial na exploraao espacial depois de 1957 a expansao dos ideais comunistas e socialistas no Terceiro Mundo pareciam confirmar a marcha para adiante A partir da decada de 1960 contudo essa perspectiva de avano hist6rico foi freada A construao do Muro de Berlim em 1961 o esmagamento da Tche coslovaquia em 1968 marcaram o fim do otimismo Foram necessarias talvez duas decadas ou mais para que ficas se evidente nao apenas que o sistema comunista perdera a sua di namica mas e esse e o ponto crucial que ele nao iria recuperala A ultima grande expressao do otimismo comunista deuse com Khrushchev com suas perspectivas triunfalistas de coexistencia pacifica proclamadas no 22o Congresso do Partido em 1961 Tres decadas depois aquela visao parece vazia baseada no exagero do potencial da sociedade sovietica e na crena infundada no determi nismo hist6rico A transia9 nao s6 fracassou como foi incapaz de reter o territ6rio conquistado Um Fracasso lnternacional Somente esses fatores impHcitos no termo estagnaao de Gorbachev nao explicam adequadamente o colapso do comunis mo no final da decada de 1980 Estagnaao e urn termo simplis ta que implica urn grau de homogeneidade dos Estados comunis tas que nao e aceitavel 0 grau de estagnaao nao era tao grande ou tao abrangente para ter gerado esse resultado De fato com base em criterios internos era muito plausfvel imaginar que o sistema sovietico na URSS e no bloco poderia ter continuado por anos e decadas liberalizando ate urn certo grau mas mantendo as carac teristicas essenciais da ortodoxia domestica e internacional Em outras palavras fatores end6genos nao podem explicar o colapso final 0 que foi determinante e coloca a estagnaao num outro Repensando as rela6es intemadonais 283 patamar foi o contexto global e em particular o desenvolvimen to relativo do comunismo em comparaao como seu competidor o capitalismo avanado Isso acima de tudo determinou os even tos do final dos anos 1980 Em termos te6ricos os partidos comunistas operaram com duas hip6teses que provaram ser falhas uma foi a inevitavel crise e o declf nio secular do capitalismo a outra foi a habilidade dos pafses co munistas em constituir uma alternativa rival e autosuficiente inde pendente do mundo capitalista Foi nestas bases que muitos comu nistas que reconheciam a aparente superioridade do capitalismo no p6sguerra mantinham seu otimismo original na crena de que o sucesso capitalista era uma miragem urn resultado da manipulaao que certamente existe ou urn boom temporario em processo de esgotamento Se o campo socialista pudesse sustentarse por tempo suficiente eles argumentavam o mundo capitalista entraria em cri se uma nova dinamica socialista eclodiria e o cenario inicial atra sado e distorcido desempenharia seu papeL Com efeito o perfodo p6sguerra refutou ambas as hip6teses e assim expos a falha central do marxismo E lugarcomum afir mar que o grande erro do marxismo foi subestimar o nacionalismo E uma consideraao duvidosa ja que o liberalismo tambem o fez e depreciciu o justificado ceticismo sobre o nacionalismo que corre junto com a tradiao socialista 0 menosprezo de Marx pelas ilusoes nacionalistas e a deniincia de Lenin das contendas nacionalistas parecem bern mais oportunos hoje 0 grande erro do marxismo e do pensamento socialista nao foi o de subestimar o nacionalisnio nem de superestimar o socialismo e seu potencial mas o de subes timar o capitalismo tanto em termos de seu potencial para a expan sao continua como em termos de sua carencia de uma teleologia catastrofista Nas palavras muito apropriadas de Bill Warren capi talismo tardio tarde para que Em termos de desempenho econo mico os pafses capitalistas avancados gozaram urn perfodo de cres cimento sem paralelo no p6sguerra e as quedas foram curtas e rela tivamente superficiais Embora as desigualdades de renda continu assem e crescessem a maioria da populaao nesses pafses teve seu padrao de vida elevado 0 sucesso economico combinouse com o sucesso polftico a extensao do sufragio universal nos pafses capita Iistas avanados a aceitaao da grande maioria da populaaO da legitimidade da democracia capitalista e o desaparecimento em urn perfodo muito curto do controle colonial formal sobre a Asia a Africa eo Caribe Enquanto o capitalismo visivelmente falhava na contenao da miseria de parte da populaao do Terceiro Mundo especialmente da Africa e do subcontinente asiatico a expansao da democracia para a maior parte do Terceiro Mundoconstruiu outra 284 Fred Halliday dimensao de sua fora Alem das limitaoes dos regimes revolucio narios do Terceiro Mundo a capacidade evidente da econcimia e da polftica capitalistas reduziu o apelo do socialismo mesmo naquelas regioes que no p6sguerra haviam gozado de maior exito 0 vfnculo entre o politico e o economico foi consolidado por uma mudana no carater da hegemonia capitalista como nos meca nismos pelos quais o domfnio do capital foi mantido e produzido e em particular nos valores e instituioes que incorporavam a legiti midade do sistema A medida que velhas barreiras sociais e identi dades pulverizavamse urn papel crescente foi assumido por formas de atividades associadas com as comunicaoes e cultura de consu ino o poder da TV da miisica pop e da moda sempre foram depen dentes de outras formas de poder mas mesmo assim adquiriram grande peso relativo nas sociedades ocidentais em conjunto Essa foi uma combinaao economicopolftica na qual a massa das neces sidades do diaadia satisfaziase pelo sistema e na qual prevlecia urn grau de liberdade de escolha que era de todo modo exagerado e manipulado A imagem do socialismo alcanando e ultrapassan do o capitalismo estava duplamente equivocada Em primeiro Iu gar ele nao foi capaz de alcanalo mesmo nos mais estreitos e tra dicionais parametros quantitativos como a produao industrial e de alimentos Alem disso os termos da competiao os criterios pelos quais seria julgado pelas populaoes governadas por partidos comu nistas estavam mudando Esse sucesso do capitalismo foi portanto de urn tipo ao qual a sociedade comunista estava especialmente vulneravel Ela nao pode competir economicamente em termos de produto e mudana tec nol6gica Pode competir menos ainda nos novos domfnios do con sumismo e da cultura popular A maior preocupacao dos lfderes so vieticos foi com a area mais vital de competicao a competicao mi litar Igualarse ao ocidente na quantidade deixando de lado a qua lidade tecnica foi cada vez mais diffcil 0 comunismo nao pode competir politicamente uma vez que seu sucesso revolucionario inicial falhou no desenvolvimento de sistemas funcionais e alterna tives de democracia A ditadura da politburocracia para usar a expressao de Bahro prevaleceu sobre o sistema Pode competir menos ainda nos novos campos pioneiros do capitalismo avanca do a cultura de consumo por urn lado a terceira revoluao indus trial e a expansao da tecnologia de informaao por outro As socie dades comunistas tampouco puderam constituir urn bloco interna cional alternative e esse foi o ponto crucial Em termos de atividade economica o bloco sovietico nunca constituiu urn bloco comercial dinamico capaz de rivalizar como ocidente Ele sempre ocupou urn espao defensivo subalterno na economia internacional Acossado Repensando as relacoes intemacionais 285 estava condenado a copiar no campo tecnol6gico 0 bloco sovieti co era muito fraco e seus mecanismos internos muito rigidos para pennitir tal desenvolvimento Ao mesmo tempo os pafses do bloco nao podiam isolarse do mundo capitalista No campo mais 6bvio de todos o das comunica oes tornouse cada vez mais possfvel para os povos dos pafses socialistas ver e ouvir o que estava acontecendo no mundo 0 im pacto da TV da Alemanha Ocidental na maior parte da Republica Democnitica Alema e na Tchecoslovaquia ou da TV da FinHindia na Estonia sao exemplos disso A musica pop tornouse urn meio direto de alcanar os jovens do mundo comunista Com altos nfveis de educaao e crescentes oportunidades de viajar a comparaao entre o padrao de vida e as condioes polfticas nos pafses comunistas e nos pafses capitalistas avanados tornouse mais evidente Poi essa diferena comparativa muito mais que absoluta que proporcionou as bases para o colapso do final da decada de 1980 Nao apenas fomentou o descontentamento com urn sistema falido mas tambem destruiu a crena de que em algum sentido secular mais amplo o comunismo poderia igualarse se nao ultrapassar o ocidente 0 resultado intemacional da crise nao foi contudo somente o produto da falencia do bloco sovietico em competir a propria crise teve dimensoes internacionais chaves Em primeiro Iugar a derro cada dos partidos comunistas govemantes na Europa oriental mes mo com todo o movimento des de baixo nao teria sido possfvel sem a mudana na politica sovietica proposta no final de 1988 de acordo com a qual a URSS nao interviria para manter esses regimes no poder Os velhos politburos nao poderiam continuar goveman do no velho estilo a mudana na polftica realizada por Gorbachev foi a condiao indispensavel para as mudanas que iriam ocorrer Em segundo Iugar como em outras situaoes revolucionarias o efei to demonstrativo de casos bemsucedidos foi de grande imporHin cia com cada pafs levando o processo mais adiante Primeiro ali beralizaao hungara pelo alto depois a eleiao do govemo do Soli dariedade na Polonia depois a lenta comparativamente erosao da Republica Democratica Alema atraves da emigraao em massa no verao e as posteriores manifestaoes mais tarde o rapido Ievante na Tchecoslovaquia e finalmente a subita e sangrenta mudana na Romenia A dimensao intemacional foi mais ainda significativa numa terceira e distinta maneira no estfmulo que as revoltas rece beram do bloco capitalista A maioria das revoluoes do p6sguerra foram contra o ocidente e pagaram o preo de desafiar o bloco he gemonico As revoltas de 1989 foram contra os govemos dos parti dos comunistas e foram facilitadas no seu andamento e posterior estabilizaao pelo apoio e boasvindas diplomaticas militares e fi 286 Fred Halliday nanceiras que receberam ou que as populaoes pensaram que iriam receber do ocidente Alternativas Reais e Imagimirias Esse fracasso comparativo do experimento comunista teve muitas conseqiiencias A primeira foi que a altemativa convencio nal a ortodoxia brezhnevista denominada de socialismo com face humana no sentido utilizado por Dubeck em 1968 nao e e nunca foi plausfvel 0 que o socialismo com face humana pretendia era a manutenao do partido comunista no poder mas seguindo politi cas mais humanas e democraticas A crena na democracia com controle partidario e uma constante nas polfticas comunistas liberais de Khrushchev a Primavera de Praga na decada de 1960 a altema tiva de Bahro na decada de 1970 as formulaoes iniciais da pres troika depois de 1985 Em urn mundo onde existe a atraao altema tiva do sistema capitalista com seu sistema multipartidario e com a possibilidade do partido comunista ser expulso do poder pelo voto essa opao e insustentavel Todas as consideraoes sabre economia mista e similares no ocidente obscurecem o fato de que a alteman cia polftica ocorre num sistema socioeconomico relativamente imu tavel e possfvel variar uma vez a cada quatro ou cinco anos nao e possfvel alterar urn sistema socioeconomico da mesma forma 0 par tido comunista com face humana ou nao humana teve de insistir em govemar sozinho ou permitir sua remoao do poder para sem pre Isso implica que os argumentos de que o sistema poderia ter sido salvo na decada de 1960 sao de validade duvidosa Bntretanto mesmo que Khrushchev tivesse prosseguido e sido mais consisten te mesmo que Brezhnev nao tivesse invadido a Tchecoslovaquia o istema ainda estaria sujeito as pressoes do exterior que teriam im pedido uma trajet6ria comunista estavel e reformada A segunda conseqiiencia diz respeito ao comunismo fora do bloco sovietico e em particular na Europa do leste Ha muito tem po os partidarios do comunismo liberal ou reformista proclamam que a imposiao de uma ditadura polftica em nome do socialismo no leste teria impedido o desenvolvimento do comunismo no oci dente Uma abertura politica no leste afirmavase facilitaria a ex pansao do Eurocomunismo e de outras correntes 0 registro hist6ri co contradiz isso como ja foi afirmado os partidos comunistas es tiveram no auge de sua influencia no ocidente na epoca de Stalin e sofreram esvaziamento desde entao pari passu as liberaliza5es de Khrushchev e Gorbachev De qualquer forma a crise final da orto doxia comunista no leste europeu em 1989 parece ter reeditado a Repensando as rela6es intemacionais 287 crise dos partidos comunistas na Europa ocidental As razoes para esse paradoxa nao sao diffceis de compreender Nao e tanto pelo fato do comunismo no ocidente estar baseado na admiraao oculta ou aberta pelas ditaduras beligerantes no leste urn frisson provocado pela identificaao autoritaria embora poucos possam negar que isso desempenhou urn papel mas sim pela permanencia da crena numa altemativa viavel e historicamente progressista Foi a destruiao dessa crena na decada de 1980 que minou a credibilidade do comunis mo no ocidente A outra razao para o aparente paradoxa dos parti dos comunistas e mais diffcil de especificar esta relacionado ao fato de que a precondiao essencial para qualquer socialismo viavel no pcidente eo seu grau de combatividade contra o sistema que desa fia o capitalismo Qualquer que fossem seus outros defeitos os partidos comunistas tradicionais possufam essa qualidade 0 mais marcante nos partidos comunistas da Europa Ocidental hoje nao e a sua postura crftica com relaao ao passado sovietico mas a falta de qualquer tipo de hostilidade radical em relaao ao capitalismo Nova Era Velhos Problemas Esse ponto de inflexao na hist6ria moderna derivado das con seqtiencias da Primeira e da Segunda Guerra Mundiais tern sido recebido com regozijo tanto no leste quanto no oeste 0 fim da Guerra Fria o inicio de urn nova era de harmonia intemacional e mesmo em urn sentido neohegeliano o fim da hist6ria esta sendo prometi do 0 1ninimo que pode ser dito e que se vamos retomar ao mundo pre1914 existem alguns perigos 6bvios Este mundo foi aquele do conflito intercapitalista nao barrado pela existencia de urn rival so cialismo que originou decadas de pilhagem colonial e a Grande Guerra Ele introduziu o que alguns denominaram de guerra civil europeia de 19141945 mas que foi como muitos vietnamitas e chineses assinalaram mais do que isso As ansiedades manifestadas em torno do poder alemao e japones dificilmente pressagiam urn seculo XXI tranqtiilo Em termos mais imediatos ha urn outro desa fio a paz internacional menos evitavel ainda denominado de con flito etnico e comunal 0 colapso do poder sovietico foi acompa nhado pela explosao do nacionalismo e dos conflitos etnicos na Europa do leste e na URSS Simultaneamente a maior parte do Ter ceiro Mundo p6scolonial tambem esta mergulhada na mesma vio lencia etnica que nao mostra sinais de esgotamento De fato se uma das marcas registradas dos fim dos anos 1980 foi o final da Guerra Fria a outra e o ressurgimento do sentimento nacionalista tanto no mundo desenvolvido quanta no mundo em desenvolvimento os 288 Fred Halliday excessos chauvinistas em eventos esportivos na Inglaterra ate ore nascimento da arrogancia de grande potencia nos Estados Unis Japao e Alemanha converteramse em lugares comuns da pohttca do mundo desenvolvido Tambem causa apreensao em outros con textos a indulgencia descabida pela intolerancia religiosa que se dis fara de antiracismo em alguns setores da intllgntsia liberl e a busca das tradioes nacionais por parte de parttdanos do movtmen to comunista internacional Subjacente a esses conflitos e tendencias poHticas reJousa o as pecto mais importante de todos aquele pelo qual o movtmento co munista foi fundado para combater e esta agora amelado pelo fim da Guerra Fria e pela extinao do bloco comunista E a questo as possibilidades poHticas e em particular o grau em que o capttahs mo avanado agora em ascensao esta aberto a crfticas em nome de uma alternativa desejavel e plausivel A cdtica ao capitalismo foi o ponto de partida do marxismo e socialismo e e o ponto ao qual uito apropriadamente essa tradiao pode regressar E surpreendente que em meio ao triunfo do capitalismo consumista e do colapso do co munismo a possibilidade de desvios esta sendo agora submersa em nome de uma nova conformidade internacional polftica e cultural todos aspiram e supostamente endossam uma utopia transnacional composta e definida pelos estilos de vida da Calif6rnia do Reno Westfalia e de Surrey Que essa nova utopia contem profundas es truturas de desigualdade definidas segundo classe sexo e regioes e evidente mas isso se encontra reprirnido na maior parte dos ds cursos publicos A determinaao com a qual essa utopia e anuncta da e defendida desde o relata de sucessos ate a apresentaao de estatfsticas s6 sugere que e uma construao artificial e vulneravel Sua prevalencia significa de todas as maneiras que as alternativas estao excluidas e desprestigiadas Nesse retrocesso precipitado desde o comunismo ortodoxo muito do que era positivo e necessaria foi abandonado urn com promisso com a justia social a insistencia na exclusao da religiao da vida publica a promoao pelo Estado da igualdade do homem e da mulher o intemacionalismo e a solidariedade para citar somente quatro elementos A necessidade de intervir para planejar e dirigir a atividade economica e agora quase que universalmente rejeitada num momenta em que a destrutividade c6srnica da produao e mais evidente do quenunca Nos paises comunistas o que esta ocorren do nessas frentes nao e urn avano mas urn retrocesso de propor oes de uma epoca E possivel percorrer as colunas do em outros aspectos refrescante Notfcias de Moscou sem encontrar menao e algo digno de merito na tradiao bolchevique No mundo capttahs ta avanado tern desaparecido a credibilidade social e poHtica de Repensando as relacoes intemacionais 289 promover mudanas A classe trabalhadora encontrase marginali zada e fragmentada tendose reduzido seus poderes organizacionais e legais Os novos movimentos sociais foras que identificaram e denunciaram diversas formas de opressao mas cuja coerencia e potencial foram superestimadas dispersaramse Novas for as so dais da direita radical tanto polftica quanto religiosa sao marcan tes na maioria desses Estados Igualmente ha uma escassez de idei as sobre como a sociedade contemporanea deveria e poderia ser organizada em bases sociais e polfticas diferentes Nao surge uma critica clara e plausfvel ao capitalismo nem da parte dos partidos sociaisdemocratas ocidentais nero da parte do leste reformado 0 triunfo da simplificaao ideol6gica e urn desenvolvimento curiosa e perverso No final das contas foi o capitalismo que nos trouxe o massacre das populaoes indfgenas de tres continentes no seculo XIX duas guerras mundiais nesse seculo 0 capitalismo fran camente fracassou em difundir a sua riqueza para reduzir a lacuna entre os ricos e os pobres em escala mundial e ainda conduz seus neg6cios num mercado baseado no frenesi adolescente que agora chega o tempo todo ate n6s na forma das notfcias financeiras 0 movimento comunista constituiu uma tentativa de desafio a esse sis tema para construir uma alternativa mais desejavel e viavel que substituiria a anarquia e a perversidade do capitalismo por uma for ma mais humana de gestao das atividades economicas Por sete de cadas o comunismo representou esse desafio mas ao final parece ter se esgotado A forma que emetgiu nao e aos olhos das popula oes do leste e do oeste nem mais desejavel nem mais viavel do que a do capitalismo avanado A implacavel fuga de jovens da Republica Democratica Alema para o ocidente rechaando a opres sao identificada ao socialismo contem uma liao hist6rica transcen dental Mesmo na area dos maiores exitos a competiao militar o comunismo s6 foi capaz de competir parcial e intermitentemente Talvez seja prematuro fazer a partir do materialismo hist6rico urn balano acerca do que representou o experimento comunista Poi urn desafio parcial e impaciente ao sistema dominante de nossa epo ca cujo desenvolvimento e desapariao s6 confirmam a tese inicial de Marx de que urn desafio ao capitalismo para ter exito devia ir romper e consolidarse em nivel global Em nome de urn potencial economico e polftico exagerado e de uma teleologia erronea as sociedades comunistas apresentavamse como uma forma social superior e historicamente mais adiantada do que as capitalistas Cer tamente elas foram naocapitalistas mas certamente tambem nao foram p6scapitalistas Em muitos aspectos estas sociedades pare dam formas imaturas de capitalismo com a sua confiana no poder militar e repressivo seu insucesso em gerar mudana tecnol6gica e 290 Fred Halliday l I I a sua falta de mecanismos funcionais de integraao economica in temacional Depois de decadas de sucesso parcial ela hoje parece haer sucmbido a urn modo de produao e a urn sistema polftico mutto mats forte e que nao parece estar fadado a nenhuma crise ou esgotmento predeterminado E necessaria e devese aproveitar a oportunidade para uma reavaliaao e para o realinhamento nao s6 do marxismo e dos movimentos socialistas mas tambem das tradioes revolucionari as e radicais da sociedade ocidental em sua totalidade Sendo urn estudioso entusiasta das revoltas da Alemanha e urn crente na de terminaao dos fatores socioeconomicos Marx nao se surpreenderia frente aos fatos dos ultimos meses Depois de seu Iongo e doloroso desvio hist6rico a tradiao comunista pode hoje retomar a seu ponto de origem a critica e o desafio a economia polftica capitalista A 9uestao e se existe uma altemativa ao modelo capitalista predomi nante e nesse caso que instituioes sociais podem ser mobiliza das democraticamente para criala e mantela A maior parte das reelaboraoes do marxismo classico tomou a forma de construao ou restabelecimento de vfnculos com formas contemporaneas de resistencia ate agora separadas da tradiao marxista a socialde mocracia marginalizada em 1914 e as correntes pos1945 entre outras o feminismo a ecologia eo antiracismo De igual impor tancia entretanto e o reconhecimento de quao relevantes as cor rentes premarxistas radicais podem ser especialmente em face dos ressurgimentos dos desafios daquela epoca 0 clericalismo 0 naci onalismo o irracionalismo E preciso recuperar tanto os esqueci dos primos do seculo XX quanto os ancestrais Aufgehobene do seclo XVIII Se o fim da Guerra Fria iluminar essa questao e li bertar o socialismo das respostas falsas e deterministas e das leal clades condenadas ao fracasso ele tera preparado uma importante agenda para o seculo XXI A tarefa de reflexao te6rica e polftica sobre os acontecimentos dos finais dos anos 1980 recemcome ou e e provis6ria A unica coisa que nao pode ser subestimada e o desafio que esses acontecimentos sugerem Traduzido de HALLIDAY Fred The ends of Cold War fu BLACKBURN Robin ed After the Fall the failure of comunism and the future of socia lism LondonNew York Verso 1991 p 7899 por Cfntia Vieira Souto Repensando as relaoes intemacionais 2 91 FUNDAMENTALISMO E 0 MUNDO coNTEMPOAANEO DESAFIOS POLITICOS E ETICOS 0 fundamentalismo e uma das questoes mais controversas na atual discussao das relaoes entre o Oriente Medio e a Europa Nes te texto espero jogar alguma luz explicativa e comparativa sobre esta questao e sugerir algumas respostas possfveis Esta discussao do fundamentalismo pretende examinar criticamente e de uma pers pectiva secular democratica e racional urn fenomeno poHtico cen tral de nossos tempos e nao confinado aos pafses isHimicos o fun damentalismo requer compreensao mas tambem coloca desafios a paz e a liberdade de muitas sociedades 0 proprio termo fundamen talismo originouse como uma resposta a ciencia e a razao em particular ao trabalho de Darwin Se a reaao deveuse especialmente a descoberta da origem e da evoluao das especies ela respondeu mais genericamente a reivindicaao da ciencia naturale do pnsa mento critico de reinterpretar e na verdade de desafiar as escnturas sagradas esta batalha que explodiu nos anos 1920 dentro dos EUA e que resultou no termo fundamentalismo e em sua doutrina associ ada do criacionismo ainda esta conosco Este conflito permanece tanto em sua forma particular visavis as origens da raa humana mas tambem visavis as quest5es intelectuais mais amplas em jogo 0 fundamentalismo islamico nao menos do que os outros desafia a ciencia e a razao Abordoa questao do que e definido como fundamentalismo em forma comparativa Quero oferecer algumas consideraoes so bre porque e como este fenomeno e tao importante no mundo roo demo e tambem destacar a sua contemporaneidade em dois outros aspectos urn e discutir que apesar de toda a sua invocaao de tradi ao e de seus chamados para o retorno a algum passado os funda mentalismos sao respostas ao mundo contemporaneo e sao em gran de medida estruturados em termos de ideias e preocupaoes con temporaneas segundo quero examinar alguns aspectos de como o inundo contemporaneo que habitamos a Europa Ocidental pode e precisa responder a este fenomeno e algumas das escolhas polfticas e morais levantadas pelo fundamentalismo se passamos com atra so a reconhecer a necessidade e o direito a uma poHtica da dife rena este direito a diferena deve se aplicar tanto dentro como entre as culturas as religioes e as comunidades etnicas 292 Fred Halliday Mesmo que vivamos fora de sociedades que sao governadas ou significativamente afetadas por movimentos fundamentalistas a sua ascensao portanto coloca diffceis questoes para a polftica externa e a avaliaao etica Na verdade uma das coisas que eu gos taria de sugerir aqui e que se nossas respostas polfticas foram incer tas as morais o foram ainda mais 0 fundamentalismo promete ter urn impacto central sobre o mundo nos anos a frente e certamente nao ini embora ou se apaziguani Poderiamos fazer pior do que co mear agora a nos engajar em uma discussao mais extensa deste fenomenoe reconhecer ate que ponto nao estamos preparados para ele Os fundamentalistas tern uma visao bastante clara e determina da do que sao Esta na hora para aqueles de n6s que nao somos fundamentalistas de produzir uma resposta que seja igualmente clara e determinada Em meio a todos os outros este e urn fenomeno que nao deve ser subestimado A Ascensao do Fundamentalismo Programa e Explicaao Quando falamos de fundamentalismo no mundo contempo raneo referimonos a uma variedade de movimentos em diferen tes pafses que compartilham certas caracterfsticas comuns e que sao em particular caracterizados por uma combinaao de dois ele mentos sem relaao necessaria urn com o outro mas que sao no caso dos fundamentalismos eventualmente relacionados Urn e a invocaao de urn retorno aos textos sagrados lidos de uma manei ra literal o outro e o chamado para a aplicaao destas doutrinas na vida social e poHtica Estes dois elementos estao presentes no fun damentalismo eo distinguem de outros dois movimentos de poH tica autoritaria e de casos nos quais movimentos naofundamenta listas ou naoliterarios buscam aplicar as doutrinas religiosas a poHtica como na influencia do catolicismo sobre o nacionalismo polones e irlandes ou da Igreja Radical na America Latina Esta definiao inacabada tern aplicaoes amplas o suficiente podemos pensar primeiro no movimento islamico no Ira que chegou ao poder em 1979 e que tern governado opals desde entao Mas tam bern podemos pensar nos movimentos fundamentalistas em outros pafses muulmanos no Egito e na Argelia em particular que similarmente buscam estabelecer o que eles definem como urn Estado islamico Eles nao fazem referenda a si mesmos como fun damentalistas embora a traduao do arabe do termo usuliyya seja usada ao lado de outros termos na linguagem polftica de hoje respectivamente mujiihidun e defensores do jihad por seus alia des e mutatarrifon e extremistas por seus opositores No caso dos Repensando as relac6es intemadonais 293 movirnentos isHimicos a Frana integriste sugerindo uma reivin dicayao para legislar por toda a atividade social e o termo ingles isHirnico indicando a aplicaao do isla a polftica sao no mfnimo igualrnente apropriados Apear de tda a enfse sore o mundo islamico o termo fundamentahsmo apltcase mmto ma1s amplamen te Ele engloba a tendencia ja mencionada na cristandade das fac oes protestantes evangelicas que emergiram nos 1920 e pediarn urn retorno a uma leitura literal da Bfulia Como qualquer outro termo fundamentalismo pode ser parci almente entendido examinandose o seu oposto neste caso a mo dernidade crista com referenda a leitura dos textos sagrados Na terceira das grandes religioes monotefstas o judafsmo tambem exis tem tendencias que sao convencionalmente categorizadas como fun damentalistas Tais tendencias envolvem em algum grau uma com binayao similar mas nao identica de lealdade as escrituras e urn prograrna sociopolftico ja presentes no isla e no cristianismo Isto e mais evidente entre os partidos da direita religiosa em Israel os ha redim e tambem entre os mais novos militantes religiosos especial mente Gush Emumin e outros por varios caminhos eles buscam estender a autoridade da lei judaica dentro de Israel e estabelecer urn Estado baseado nos textos legais apropriados neste caso o Halakha Apesar do fundamentalismo ser em sua origem urn produto das re ligioes monotefstas no mfrtimo porque elas tern a ideia mais clara do escrio sagrado para o qual retornar ele nao e peculiar a elas Nas ultirnas duas decadas emergiu na india urn forte fundamentalismo hindu que busca estabelecer Hindutva urn Estado hindu e Ramra ja urn Estado baseado nos ensinamentos do deus Ram o objetivo declarado e reviver o Estado sagrado de Bharat que por seculos tern sido aviltado pelos inimigos dos muejulmanosBharat judeus sikhs e bern no ultimo lugar OS britanicos Nem 0 budismo tern sido imu ne a tal fenomenos como mostrou a polftica de Sri Lanka Como com qualquer termo polftico comunismo fascismo po pulisrno nacionalismo nao estamos lidando com urn objeto uni co estes rnovimentos nao se assemelham em todos os aspectos Na verdade alem das diferenas teol6gicas pelas quais eles se definem existern outras fundamentais de contexto conteudo e objetivo 0 cristianismo por exemplo tern menos a dizer sobre os problemas de higiene e dieta pessoal o que os antrop6logos chamam ortopra xia do que tern o judafsmo o islamismo ou o hindufsmo 0 alcance da lei sagrada tambem e bastante diferente o Torah e o Sharia ten do rnais a dizer sobre Lei Canonica 0 cristianismo e o isla tern se culos de poder polftico e de conquista imperial para invocar enquanto o judafsmo nunca gozou de tais sucessos temporais Em alguns con textos e 0 clero que desempenha urn papel de liderana isto se 294 Fred Halliday aplica ao judafsmo ao protestantismo e ao islamismo xiita iraniano enquanto em outros e rnuitas vezes uma liderana espiritul na verdade uma lideranya polftica invocando a religiao qe subm ao poder como nos movimentos isHimicos do Norte da Afnca e ns hindus Desnecessario dizer os protagonistas de todos estes movi mentos teriam fortes objeej6es a quaisquer compara6es entre os seus pr6prios retornos a valores verdadeiros supostamente unicos e 0 fanatismo dos demais Neste sentido a questao da comparaao depende em alguma medida das questoes sendo perguntadas assim ja que estamos olhan do para estes movimentos como movimentos sociais e polfticos no mundo contemporaneo e valido destacar algumas de suas caracte rfsticas compartilhadas Aqui mencionaria quatro Em primeiro Iu gar todos estes movimentos buscam derivar sua autoridade de urn chamado para o retorno aos textos sagrados para escntos uposta mente derivados de Deus Este e em seu senttdo literal o s1gp1fica do do termo fundamentalismo Para os cristaos judeus e muulma nos estes textos sao claros o bastante a Bfblia o Torah e Talmud o Corao Hadith e fiqh ou textos legais Para os hindus a quem falta tal texto e urn deus monotefsta o trabalho tern sido mais diffcil mas agora comea a estar disponfvel o hindufsmo esta passando por uma reforma concebida para tornalo mais como as religioes monotefs tas com urn deus unico Ram cuja identidade sexual ate aqui an dr6gina foi masculinizada urn conjunto de textos sagrados a len das de Ram a adoraeja6 em congregaao e uma parte essenc1al do conceito monotefsta de uma religiao adequada a subjugaao das mu lheres 0 argumento de todos estes movimentos e que estes textos fornecem em si mesmos a base para definir uma vida apropriada e 0 que e mais pertinente nas presentes circunstancias pra definir a forma como a sociedade eo Estado devein ser orgamzados Nao obstante que ocorre na pratica e uma leitura por autoridades on temporaneas e para usos contemporaneos destes textos Da1 os debates interminaveis sobre interpretaao o que no Isla e chamado de tafsir como se a erudiao renovada e a autoridade pudessem de qualquer forma nos dizer o que estes textos verdadeira ou auten ticamente prescrevem sobre a posiao das mulheres ou a forma correta de governo ou o que comer ou heber quando o mundo chegara a urn fim ou quando comeou A segunda caracterfstica relacionada desta volta aos funda mentais e a reivindicaejao de que dentro deles pode ser identificada a constitui9ao de urn Estado perfeito no mundo contemporaneo Os fundamentalistas muulmanos fazem muito uso do shari a a des peito do fato de que sharia no sentido estrito das prescri96es 1 gais contidas no Corao representa somente algo em torno de 80 h Repensando as rela6es intemacionais 295 nhas e cobre alguns poucos topicos de legislasao potencial o pro prio termo literalmente a mane ira certa e mencionado poucas vezes A invocasao dos musulmanos do previa govemo IsHimico do Profeta e igualmente forsada mesmo supondo que urn sistema de govemo que se desenvolveu para as cidades arabes do seculo seti mo fosse apropriado para hoje e preciso perguntar quao valido ele era dado que tres dos quatro sucessores iniciais de Muhammad tive ram mortes inconstitucionais e violentas A invocasao judaica do passado bfblico e urn pouco mais substancial OS reinos de Saul Da vid e Salomao duraram no todo alga em tomo de 80 anos antes de dar Iugar as guerras entre Israel e a Judeia Dificilmente esta e a autoridade historica para reivindicar urn territorio pela etemidade ou uma base suficiente sabre a qual legitimar urn Estado restabelecido mais de dais mil anos depois A terceira caracteristica comum e que apesar de toda a sua apa rente prolixidade sabre outros assuntos eles aspiram a uma coisa acima de todas o poder politico e social No caso do judafsmo nao esta clara ate que ponto os haredim aspiram controlar o Estado dire tamente mas atraves de sua participasao na arena politica atraves do usa do sistema de representasao proporcional dos partidos e de outras atividades eles buscam estender o controle do poder dos ra binos par quase toda a sociedade assim como Gush Emumum bus ca marcar a sua posisao em algumas questoeschaves especialmente a terra No caso das outras tres cristianismo islamismo hinduis mo esta reivindicasao politica e muito mais clara eles nao sao movimentos de conversao nem movimentos de inovasao teologi ca mas sim movimentos que objetivam ganhar poder atraves das eleisoes da forsa ou da insurreisao e estabelecer Estados apropria dos Fundamentalismo e neste sentido urn meio de obter e uma vez obtido de manter o poder politico com certeza e par esta razao que ele preocupa a todos nos Isto me leva a dimensao final compartilhada por estes movi mentos qual seja a sua intolerancia e em uma medida considera vel o seu carater antidemocratico Embora eles digam falar em nome do povo e que perseguem seus objetivos atraves de meios democra ticos eles sao grupos politicos par ideologia e por organizasao autoritarios e potencialmente ditatoriais Eles rejeitam as premissas da politica democratica incluindo a tolerancia e os direitos indivi duais e reivindicam uma autoridade que nao e derivada daquela dos povos e derivada da vontade de Deus herdada das escrituras e in terpretada pelos lideres autoindicados exclusivamente homens sejam eles do clero ou nao Todos incluem como uma importante parte de sua ideologia a hostilidade para os que nao sao de sua fe e quase mais importante para os de sua fe que nao compartilham sua 296 Fred Halliday orientasao particular Todos sao felizes em condenar o resto de nos como descrentes e similares a dar horrfvel e sem fim Dada a maneira pela qual a identidade religiosa se entrelasou com a etnici dade no seculo XX OS movimentos fundamentalistas tambem pas saram a incluir visoes racistas dentro do todo de suas ideologias contra os judeus da parte de musulmanos e cristaos contra os ara bes da parte dos judeus contra os musulmanos da parte dos hin dus e assim par diante N a sociedade que eles imaginam normalmente existe urn Iu gar para aqueles que nao aceitam suas visoes mas este e na melhor das hipoteses urn status ambfguo e subordinado e a imposisao das praticas sociais defendidas par estes fundamentalistas e considera da legftima sabre todos os que vivem naquela sociedade Ao lado das afirmasoes sabre a tolerancia existe freqlientemente em sua Ii teratura a agressao e o desprezo para com aqueles que sao diferen tes seja o 6dio dos cristaos fundamentalistas par seus cidadaos seculares contemporaneos a critica dos islamicos contra a corrup sao do ocidente as conspirasoes dos judeus a jahiliyya ou a ig norancia do mundo contemporaneo 0 acido derramado pelos fun damentalistas hindus sabre os musulmanos na India como traido res imigrantes ilegais perpetradores de uma violasao historica do Bharat e assim por diante ou a hostilidade dos fundamentalistas judeus para os assimiladores os judeus seculares os cristaos os arabes e semelhantes Todos estes movimentos fazemmuito barulho sabre a agres si vi dade e as conspirasoes de seus inimigos e como eles proprios sao vitimas Mas freqlientemente existe uma forte dose de proje sao em tudo isso No momenta o mundo ocidental cristao e pos cdstao esta dizendo muito sabre quao agressivo o IsHi e e como ele ameasa o ocidente mas o estudo mais elementar da historia do mundo ao Iongo dos ultimos tres seculos sugeriria que a bota pelo contrario esta no outro pe permanecendo assim em muitas partes do mundo Na Bosnia foram OS antimusulmanos OS servios orto doxos e os catolicos croatas que mais fizeram para envenenar as relasoes intercomunais Mas os islamicos tern sua propria parcela de culpa A retorica islamica sabre os judeus e freqlientemente racista Recentemente os musulmanos tern praticado sabre a ques tao da blasfemia mas talvez todos os preocupados com esta ques tao deveriam estudar o Corao mais cuidadosamente ele nos diz que Cristo nao foi o filho de Deus que nao foi crucificado e que nao se levantou dos mortos todas proposisoes que se constituiriam em blasfemias no mundo cristao convencional Na India os chau vinistas hindus extravasando sabre o que os musulmanos fizeram com a India cunharam sua propria retorica intolerante Muslma Repensando as rela6es internacionais 297 nan ke dohi shtan pakistan aur kabristan para os muulmanos s6 existem dois lugares o Paquistao ou o tumulo Este chamado para os muulmanos serem expulsos para o PaquisHio se enquadra muito facilmente com a demanda de que o Paquistao seja abolido e reincorporado a India Tambem existe algo estranhamente nao nativo no argumento hindu de que os muulmanos sao bastante livres para Viver em seu Estado desde que eles aceitem a cultura a religiao hindu o caniter de Bharat e o seu sistema politico Todos acusam o outro de fanatismo e extremismo quando nao de terro rismo no presente e no passado todos os fundamentalismos men cionados podem ser urn born exemplo disso ExplicaoesAlternativas Escritura e Contingente Se agora pudermos nos voltar a questao da explicaao exis tem em termos amplos duas abordagens possiveis as que eu defi niria de escritura e contingente Por escritura refirome as abor dagens que olham para os fundamentalismos principalmente em termos de sua relaao com os textos sagrados e com os argumentos religiosos que seguem da interpretaao e da organizaao de urn movimento religioso Esta abordagem pode ser encontrada dentro da teologia mas tambem emerge nos debates de ciencias sociais sobre o significado e a influencia determinante das crenas religio sas no comportamento social e politico Max Weber por exemplo tinha muito a dizer sobre isto Assim examinar estes movimentos em termos do impacto digamos da jurisprudencia ou de uma visao de mundo islamica ou de uma etica protestante ou tradiao judaica ou hindu seria adotar esta abordagem 0 fundamentalismo deve portanto ser visto como urn retorno urn renascimento de algo que ja estava Iii Tal retorno e explicado pelo interesse renovado nos tex tos sagrados freqlientemente provocado pelo medo da corrupao ou da inovaao dentro de uma dada comunidade religiosa De mui tas maneiras esta abordagem fundamentalista da escritura equipa rase a abordagem tradicionalista ou perrnanente do nacionalismo as ideias a doutrina e o passado determinam o presente Desneces sario dizer esta e explicaao dos pr6prios fundamentalistas todos eles reivindicam estar retornando a uma interpretaao verdadeira e ao passado que sempre foi em urn sentido quase que arqueol6gi co o la esperando para ser redescoberto Dai tambem segue que o fundamentalismo nao e especffico ao mundo contemporaneo alem dos periodos e doutrinas originais e autoritarias invocadas pelos fun damentalistas existiram muitos movimentos atraves da hist6ria das principais religioes nos quais aconteceram o retorno as escrituras e 298 Fred Halliday as doutrinas o wahhabismo no isla e o metodismo no cristianismo para mencionar pelo menos dois A abordagem alternativa que classifiquei de contingente enfatiza a modernidade e a contingencia destes movimentos Pri meiro ela chama a atenao para as suas causas contemporaneas que embora variem de pais a pais e de religiao a religiao sao ca racterfsticas do mundo moderno Assim a ascensao dos fundamen talismos em muitos paises do Terceiro Mundo originase como uma reaao aos fracassos do Estado modernizador secular percebido como corrupto e incapaz de resolver os problemas economicos e sociais e que freqlientemente e ditatorial Isto vale tanto para o Xa do Ira como para a FLN na Argelia ou para o Partido do Congres so na india Igualmente estes movimentos sao respostas a ques toes muito reais que confrontam estes paises a urbanizaao em massa o desemprego e a percepao da continuidade da domina ao estrangeira Muitos surgem em paises que experimentaram ou continuam a experimentar a dominaao externa alem disso eles podem incluir elementos de nacionalismo e antiimperialismo no Terceiro Mundo Eles oferecem urna soluao simples aparentemen te clara para os problemas do mundo modemo Tambem emergem em urn contexto pr6prio de modernidade o EstadoNaao o apa rato modemizado do Estado as reivindicaoes sociais e legais do Estado sobre os seus cidadaos Em alguns casos o fundamentalis mo e associado a grupos sociais que estao em decadencia em outros as novas massas urbanas ou como no caso do Afeganistao depois de 1978 as populaoes rurais ameaadas reagindo as cres centes imposioes do Estado centralizado No caso de Israel o fun damentalismo para todos os que questionaram a possibilidade de urn Estado judeu antes da chegada do Messias envolve uma cam panha para determinar certas politicas deste Estado e para moldar o carater de sua nova populaao composta de imigrantes Esta modemidade e bastante evidente na linguagem e na ideo logia dos fundamentalistas A despeito de toda a invocaao do pas sado e dos simbolos tradicionais a linguagem e as politicas dos fun damentalismos podem ser vistas como urna forma de ideologia con temporanea que ecleticamente faz uso de temas tradicionais ou clas sicos para prop6sitos contemporaneos e de emprestimos das ideo logias seculares moderhas dai minha designaao desta abordagem como contingente As funoes gerais das ideologias politicas sao bern conhecidas estabelecer uma identidade quem n6s o povo ou a comunidade somos e igualmente importante quem nao e 0 oferecimento de uma hist6ria legitimadora incluindo atos her6icos traioes e opressoes uma moralidade de luta e freqlientemente de sacriflcio urn programa para mobilizar e assumir poder e como Repensando as rela6es intemacionais 299 estagio final fomecer urn modele de como contruir uma ov P ciedade dentro da qual sao colocados urn conJunto de pnnc1p1os concebidos para legitimar a negasao do poder aos que deseJam de safiar a nova ordem Por volta do seculo passado vimos muitos casas disso o liberalismo o fascismo e o comunismo em suas varias formas mas talvez a abordagem mais apropriada como aponta ram varies escritores dentre eles Sami Zubeida e Ervand Abrahami an seja a do populismo 0 populismo 6 uma ideologia transclasse abrangente destacan do a virtude do povo e a corrupsao financeira e moral dos opres sores Igualmente central ao populismo 6 uma forma de nacionalis mo e de hostilidade aos estrangeiros definida de varias formas e uma simpatia por teorias da conspirasao A sociedade secular modema e niio somente a sua ideologia constitutiva o liberalismo sao objetos de escamio particular Tudo isto e mais 6 encontrado nas ideologias do fundamentalismo Tais ideologias sao particularen te em suas variantes isHimica e hindu programas para a mobihza sao de apoio politico para a conquista e a manutensao do poder polftico No caso do judaismo e do cristianismo a enfase 6 menos sabre a dominasao extema e mais sabre a necessidade de lutar con tra os elementos perigosos corruptos e seculares dentro de suas pr6 prias sociedades Nao obstante estas duas tendencias tambem tern urn elemento nacionalista muito forte os movimentos cristaos e ju deus estao entre os mais patri6ticos e intransigentes e os que de monstrando virtuosidade religiosa estiveram entre os mais fortes defensores do uso da forsa e da destruisao de seus inimigos Nao 6 atoa que ao contemplar a guerra nuclear tantos escritores ameri canos durante a Guerra Fria fizeram uso da ideia religiosamente san cionada do Armageddon Nenhuma ideia moderna ou contexte 6 mais influente que a da nasao e dci nacionalismo em muitos casas uma identificasao apa rentemente religiosa representa uma etica uma mobilizasao de reli giosidade de ideia adorasao vestimenta e identidade em urn con texte de conflito nacional lsto se aplica tanto aos musulmanos da Palestina e da Bosnia como aos hindus na India Mesmo assim 6 o nacional que define e mobiliza a religiao e nao viceversa Na ver dade no caso indiana o que temos vista claramente a partir de 1920 com a fundasao da RSS 6 a elaborasao de urn programa baseado nas ideias europeias de status nacional para a criasao da nasao hin du e de uma rasa e cultura arianas derivadas do sanscrito que resga tarao Bharat das corrupsoes dos seculos Isto me leva a questao da interpretasao e do uso da escritura Talvez haja maior divergencia entre as abordagens escritura e con tiilgente na analise de como estes movimentos usam os textos Para 300 Fred Halliday a primeira o fundamentalismo constitui urn retorno aos textos para a ultima significa usar os textos e moldar a interpretasao para servir a necessidades contemporaneas Mesmo o mais devote con cederia que os textos sagrados contem muitas ambigtiidades e pos sibilidades para interpretasao altemativa o que os mais seculares dentre n6s chamariam de contradisoes A maior parte dos grandes trabalhos do pensamento e da literatura humana as possuem En tre os cristaos dar a outra face olho por olho dente por den te e assim por diante 0 Corao ordena que nao deva existir com pulsao na religiao Iii ikriihii fi aldin mas tambem deixa clara em termos bern punitivos o que acontecera aos descrentes 0 judais mo 6 ambivalente nas atitudes com o gentio 0 hinduismo contem muito que pode ser usado para ordenar uma naoviolencia etica e tolerancia como Gandhi percebeu tambem tern uma mitologia e linguagem repleta com a guerra e a sede de sangue como os mili tantes de hoje sao rapidos em nos dizer 0 que a interpretasao ideol6gica sugeriria 6 que a terminolo gia as injunsoes o proprio conteudo destes textos sao urn recurso que os movimentos populistas conscientemente ou nao usam para prop6sitos contemporaneos Nao existe nest sentido nem urn ver dadeiro isla ou cristianismo ou judaismo E possivel no Isla justi ficar por exemplo qualquer forma de sociedade nao s o capita lismo ou socialismo mas o feudalismo e a escravidao E possivel citar partes do Corao que favorecem a igualdade de homens e mu lheres tambem 6 possivel citar varias passagens que favprecem a supremacia masculina Muita energia tern sido gasta dentro do ju daismo com a interpretasao do termo Zion seja ele urn Estado mental ou de espirito ou se urn Iugar uma parte de ou o todo de Jerusalem ou do EstadoNasao com fronteiras particulares 0 impor tante e que nas circunstancias modemas sao OS desejos contempo raneos que determinam 0 uso dos textos e nao alguma interpretasao imanente da verdade por esta razao Zion veio a significar para os judeus alga que nao 6 de forma alguma especifico a eles o Estado Nasao com urn territ6rio clara populasao e lfngua lgualmente podese analisar os textos religiosos e ver como palavras de proce dencia aparentemente antiga sao usadas para prop6sitos contempo raneos Elas nao significam o que significaram no uso dos homens de mil ou 2 mil anos atras mas sim o que os ide61ogos de hoje que rem que elas signifiquem Deveria estar evislente que entre estas duas formas de inter pretasao a escritura e a contingente eu prefiro a ultima Elas nao sao necessariamente exclusivas mesmo o mais ardente defensor da escola contingencial deveria conceder que parte da energia e cara ter destes movimentos deriva de seu carater teo16gico A energia eo Repensando as rela6es intemacionais 301 dinheiro investidos na educaao religiosa em madras yeshivas classes de bfblia e encontros no templo sao evidencia suficiente Nao obstante nem as causas nem o conteudo quanto menos os programas e as conseqiiencias dos fundamentalismos podem ser adequadamente explicadas por isto Estamos olhando para movimen tos poHticos bern organizados modernos determinados para os quais 0 todo poderoso e uma legitimaao adequada e possivelmen te adorada com bastante sinceridade 0 Caso Iraniano Neste ponto gostaria de abandonar a discussao comparativa geral dos fundamentalismos para examinar em maiores detalhes o caso do Ira o mais proeminente de movimento fundamentalista e o pafs no qual este movimento radical esta no poder desde 1979 Es tive no Ira antes e depois da revoluao e entrevistei muitos de seus lfderes Fiquei parado nas ruas de Teedi e vi dezenas de milhares de pessoas marchando gritando Marg bar liberalizm Marte ao Libe ralistno Nao foi uma visao feliz Nao ha necessidade de repetir longamente a originalidade des ta revoluao comparada a outras na tradiao que comeou na Fran a em 1789 Nao somente ela foi feita por uma liderana do clero que clamou por urn retorno a urn modelo de governo derivado do seculo setimo mas em outros aspectos tambem parecia rejeitar as suposioes de todas as outras revoluoes p6s1789 rejeitava o de senvolvimento material Khomeini uma vez disse que a economia era uma preocupaao de ignorantes negou a soberania do povo esta vinha de Ala e rejeitou qualquer legitimaao em termos de antecedentes corruptos decadentes jiihil ou ignorantes somente o Profeta e seus sucessores imediatos importavam e tudo que havia acontecido antes deveria ser renunciado com algumas pequenas exceoes Nao poderia haver exemplo mais dramatico da que bra aparente entre o fundamentalismo e a modernidade Entretanto em urn exame pr6ximo nao e bern assim As cau sas da revoluao iraniana incluem varios fatores mais ou menos se culares e na verdade materiais que levaram a queda do regime do Xa o crescimento de uma situaao explosiva nas cidades com mi graao em massa corrupao desmedida e inflaao o fracasso do regime em permitir formas legftimas de descontentamento politico e a anterior supressao das foras de massa seculares a nacionalista e a comunista que dominaram a cena polftica do Ira na decada de pois da Segunda Guerra Mundial o sucesso de Khomeini em lide rar e organizar urn movimento polftico de massa sustentado em urn 302 Fred Halliday conjunto de objetivos simples amplamente apoiados a derrubada do Xa e o encerramento da influencia ocidental particularmente da americana no pafs Mesmo com toda a aparencia de que o Ira so freu uma volta ao passado e de que sua revoluao era tradicional em alguns aspectos ela foi moderna na verdade a mais moderna re voluao social vista em qualquer pafs Ela ocorreu nao entre os cam poneses mas entre as classes urbanas pobres e medias e atingiu os seus objetivos nao atraves da violencia principalmente mas por meios polfticos o protesto de massa da oposiao e uma greve polf tica geral Paradoxalmente a Revoluao Iraniana foi ambas a mais tradicional e a mais moderna das revoluoes sociais Isto e evidente tambem nas pr6prias ideias na ideologia polfti ca que Khomeini defendia A visao religiosa de Khomeini nao era baseada somente em uma leitura literal do Corao mas em certas ten dencias deritro do xifsmo iraniano por urn lado irfiin ou misticis mo que trazia urn certo desprezo pelo imediato e o material e por outro a interpretaao do xifsmo historicamente a seita dds que se opoem ao governo para significar nao tanto a abstenao do mundo e da polftica mas urn engajamento contestador com eles Isto inclufa algo que a maioria dos te6logos rejeitara previamente a ideia de que pudesse haver urn governo isHimico sobre a terra mesmo antes do retorno do 12 Imam A teoria de Khomeini do hokumati islami ou governo islamico repousava sobre o que era na pratica uma solu ao inovadora do problema de como o muulmano sincero podia afetar a polftica na ausencia do Imam a teoria da viceregencia da autoridade legal ou jurisconsulto velayati faqih Nesta teoria o interprete legal em primeira instancia Khomeini era autorizado a exercer a autoridade religiosa e a estabelecer urn governo islamico com uma autoridade vinda de Deus Puramente teol6gica na aparencia esta soluao devia certa mente ser entendida nao somente como uma revelaao mas como algo que servia a uma preocupaao muito mais imediata e materi al como adquirir e manter o poder politico ela justificava a to mada do Estado iraniano pelo clero e a depreciaao ou a negaao de outras formas de autoridade Se observamos a hist6ria subse qiiente da revoluao iraniana nao como uma de retorno as escritu ras mas de urn ponto de vista poHticopragmatico com a ideolo gia sendo usada para justificar o objetivo mundano e universal de manter o poder estatal muitas coisas ficam claras Os mulas con quistaram e mantiveram o controle atraves de mecanismos pree xistentes a mobilizaao para a guerra o uso arbitrario do bem estar a repressao de oponentes internos a demagogia sobre as ameaas e as conspiraoes externas Aoes dramaticas como o seqiiestro do pessoal diplomatico americano em 1979 ou a conde Repensando as rela6es intemacionais 303 nacao de Salman Rushdie em 1989 nao devem ser vistas como aberracoes ou irracionalidades mas como atos calculados de urn regime dirigido para maximizar apoio A logica poHtica da ques tao Rushdie pode ser mais evidente se colocada no contexto da historia de tais condenacoes vale lembrar que talvez os mais im portantes julgamentos da historia ocidental foram todos por acu sacoes de blasfemia Socrates Jesus Cristo Galileu e Spinoza Este conjunto de preocupacoes material e modemo tambem esta presente na propria ideologia do regime Se observamos a termino logia e as poHticas enunciadas por Khomeini tudo comeca a pare cer mais familiar particularmente a luz dos movimentos populistas do Terceiro Mundo da epoca do posguerra 0 conjunto central de conceitos de Khomeini mustakbarin e mustaz a fin literalmente o arrogante e o fraco correspondem a dupla povoelite encontrada em outros populismos Todos os termos populistas usados para desacre ditar a elite podem ser encontrados em Khomeini corrupta ligada aos estrangeiros decadente parasita Os slogans pollticos principais de Khomeini republica islamica revolucao independencia auto suficiencia economica sao os objetivospadroes do nacionalismo terceiromundista Seu termo para imperialismo istikbari jahani arrogancia mundial e imediatamente reconhecido por todos e nao e uma rna descricao A denuncia dos oponentes como liberais foi tirada dos comunistas Podese supor que estes emprestimos seriam subordinados a uma perspectiva teologica mas o que Khomeini de fato disse e fez uma vez que chegou ao poder ilustrou se nada mais a primazia da Realpolitik Assim embora ele comecasse renuncian do ao patriotismo e a identidade iraniana ele comecou invocando 0 Ira eo conceito de terra patria uma vez que a invasao do Iraque comecou em 1980 Mais interessante de tudo nos ultimos meses de sua vida ele enunciou urn novo prindpio de comportamento politi co baseado na primazia do maslaha ou do interesse o que importa va eram os interesses do povo e do Estado nao as prescricoes for mais da religiao Em situacoes de conflito entre os dais eram os interesses do Estado que prevaleciam nao poderia ser dada nenhu ma manifestacao mais clara do aparentemente impllcito principia secular da raison detat Respostas e Questoes Ate aqui esta discussao buscou analisar a disseminacao do fun damentalismo e sugerir certas causas e caracterfsticas comuns deste fenomeno Seria errado exagerar a importiincia destes movimentos A maioria dos pafses muculmanos nao esta em vias de ser assolado 304 Fred Halliday pelo fundamentalismo e a onda de fundamentalismo cristao tern tido uma historia intermitente nos EUA perdeu na grande questao da escolha no perfodo entre guerras a da proibicao do aborto e a in fluencia atual da chamada Moral Majority dos 1980 e menor do que muitos temiam no mfnimo por que seu Hder urn septuagemirio ca sado pela segunda vez somente tinha interesses eleitorais e logo fez a paz com o AntiCristo Na Europa Oriental o movimento de pro testa mais influenciado pela religiao o Solidariedade de forma al guma urn movimento fundamentalista segundo a definicao usada aqui chegou ao poder na Polonia somente para perdelo de novo para os comunistas reformados e para ver a sua legislacao sabre reproducao ser largamente ignorada pela populacao Entretanto al guns destes movimentos devido a crise dos pafses em que se origi naram e a sua propria determinacao podem ficar conosco por urn born tempo No Ira e no Sudao fundamentalistas isHimicos estao no poder Eles bern podem chegar ao poder na Argelia e poderiam faze lo no Egito Na India ninguem pode ter certeza se o BJP e os seus aliados fascistas podem ser mantidos Ionge do poder embora as coisas parecam urn pouco melhores do que estavam ha urn ano atras Em Israel o fundamentalismo judaico certamente pode ter urn im pacto nefasto Nas sociedades ocidentais o fundamentalismo ainda tern sua presenca mais forte nos EUA onde em sua forma evangeli ca supostamente comanda a lealdade de cerca de 40 milhoes de pessoas ele pode nao estar proximo de chegar ao poder mas conti nua a fazer bastante barulho tentando legislar sabre o que as mulhe res podem e nao podem fazer e em questoes especificas relacio nadas Na Europa ate aqui a direita radical e os movimentos de esquerda vern sendo seculares na verdade anticristaos mas pou cos podem prever como as coisas irao se desenvolver no leste daqui ha alguns anos Aqui chegafnos a questao da resposta em dais nfveis no po lftico e no filosofico Politicamente nao e possfvel ignorar a ameaca que estes movimentos colocam aos cidadaos dos paises em que vi vern e por extensao ao mundo A revolucao no Ira e a ascensao do fundamentalismo por todos OS lados levou a morte de muitas pesso as assim como talvez em maior escala a vitoria do FIS na Argelia Uma resposta poHtica precisa ser desenvolvida com base em pelo menos tres principios Primeiro temos que reconhecer as fontes do protesto na verdade a legitimidade destes movimentos e considerar as questoes sociais economicas e pollticas as quais eles respondem Nao pode haver uma solucao para a crise na Argelia sem a mudanca na economia para gerar empregos e a reforma do Estado cada vez mais corrupto Igualmente precisamos reconhecer como inumeras questoes agucam a militancia nacional e religiosa dos povos no casd Repensando as relac6es intemacionais 305 do mundo islamico a negligencia do ocidente sobre as questoes da Palestina e da Bosnia para mencionar duas estimulou o antiimperi alimo religioso Em muitos casos a ascensao do fundamentalismo seja em Gaza ou na Bosnia ou entre as comunidades muulmanas na Europa Ocidental e uma resposta as opressoes sentidas por estas comunidades e a aparentemente inadequada atenao dedicada pe las foras seculares dentro e fora dos pafses envolvidos Os racistas e OS alarmistas referemse constantemente a quinta couna fundamen talista dentro da Europa Ocidental primeiro devemos olhar como e porque estas pessoas que foram encorajadas e convidadas a se des locar e a trabalhar na Europa se voltaram para uma definiao mais religiosa e militante de sua identidade face aos problemas que en contraram 0 problema do Isla na Europa ocidental e acima de tudo urn problema de seus companheiros cidadaos cristaos e go vemos e nao de uma ameaa muulmana a sociedade existem cer ca de 6 milhoes de muulmanos em uma Europa Ocidental de mais de 250 milhoes Segundo precisamos em nossa propria amilise e abordagem escapar da simplificaao e do estereotipo que equaciona os muul manos aos islamicos a maioria dos muulmanos nao e islamica mais do que os hindus judeus ou cristaos sao fundamentalistas 0 Isla nao 6 em nenhum sentido serio uma ameaa ao ocidente militar ou economicamente Os Estados islamicos nao tern sido uma amea a militar desde o seculo XVII e se existe algum desafio economico hoje ele vern do Extremo Oriente e nao do Oriente Medio Nao exis te urn Isla ou nao por isso urn cristianismo nem o termo mu ulmano deve ser usado para indicar etnicidade Na discussao con temporanea freqiientemente perdese a propria diversidade e a va riedade existente entre estas religioes em suas possfveis leituras dos textos sagrados e em suas culturas literaturas e significados Se a civilizaao islamica por exemplo tern uma vertente dogmatica or todoxa severa algo que compartilha com outras religioes ela tam bern pode ser bastante cetica hedonista cosmopolita ironica e hu mana Os patriarcas de cada religiao conspiram com os seus inimi gos estereotipados para confundir isso tanto quanto os dogmaticos do passado discutiram que o scialismo real era s6 ode Joseph Stalin ou o de Enver Hoxha Somente quando e se esta diversidade e multiculturalismo forem reconhecidos dentro e entre as comuni dades 6 que as reivindicaoes dos fundamentalismos como expres soes autenticas da cultura nacional poderao ser rejeitadas Entretanto alem das questoes poHticas existem outras filoso ficas e morais que sao dignas de nota e preocupaao pois no mo menta da emergencia de urn novo conjunto de movimentos dogma ticos autoafirmativos existe confusao no campo dos que eles nao 306 Fred Halliday abrangem Por isto quero dizer em termos amplos o campo dos que estao comprometidos com urn conjunto de valores individualistas crfticos democraticos de necessidade e seculares Esta confusao assume pelo menos tres formas uma derivada da crftica da domi naao ocidental e do etnocentrismo pode amplamente definir a crf tica baseada no relativismo cultural que direito temos de impor nossos valores sobre outros povos a segunda muito ala mode no momento mas esperanosamente desaparecendo e a posmo demista dos que argumentam que nao podemos estar certos de quais quer valores racionais do iluminismo eles advogam a descons truao sem descanso a indeterminaao da analise e da etica a po Htica da diferena finalmente dentro do campo da filosofia moral contemporanea ouvimos o argumento de que nao podemos estar certos sobre quaisquer prindpios morais gerais quanto menos so bre os que deveriam ser universalmente defendidos entre as tradi 5es e as comunidades e tudo o que podemos fazer e recorrer a pro cedimentos para julgar disputas este 6 o argumento de Alasdair Macintyre Stuart Hampshire Raymond Plant todos nomes de peso No contexto do que esta acontecendo nas sociedades e comu nidades ameaadas pelo fundamentalismo ou nesta linha pela di tadura ou pelo nacionalismo militante estas ruminaoes incitam urn grau de perplexidade e irritaao Se voce esta definhando nas cadei as da guarda islamica no Ira ou sendo for ado a usar roupas medie vais nas mas de Teera ou tendo seus genitais mutilados por algum bando de matriarcas e parentes homens no Sudao ou sendo alveja do por seu comprometimento ao secularismo no Egito e Argelia ou sendo tirado de sua casa e possivelmente morto em Bombaim ou tendo a sua terra roubada por pessoas que dizem que ela lhes foi dada por Deus trazlhe pouco consolo enquanto voce protesta em nome de valores universais serlhe dito que voce e etnocentrico ou nao suficientemente engajado no posmodemismo ou que infelizmen te no final das contas nao podemos estar certos de que os direitos que voce pede que sejam defendidos estejam adequadamente fun damentados Existe nesta atmosfera de agnosticismo urn fracasso em compreender as questoes em jogo na maior parte do mundo e uma irresponsabilidade que se aproxima de uma versao de final do seculo XX do trahison des clercs Certamente e evidente que o projeto modemista de iluminis mo como elaborado antes neste seculo foi com freqiiencia realiza do de maneira pobre e inadequada Nao estamos vivendo em mun do no qual nao seja inevitavel algum progresso diferenciado ou no qual a secularizaao e o desencantamento sao universais Muitas das reivindicaoes da razao sao superestimadas quando nao impostas repressivamente Os maiores crimes do seculo XX nao foram come Repensando as rela6es intemadonais 307 tidos por fundametalistas religiosos 0 proprio termo que se encontra no amago deste debate 0 secularismo tam bern pode beneficiar se de urn reexame originalmente formulado nos anos 1840 como uma altemativa a autoridade religiosa e eclesiastica ele deixou muito de barato dentro das sociedades democniticas Porem estes concei tos do iluminismo permanecem uma fundaao sabre a qual e possf vel e eu defenderia necessaria construir tanto quanta e possfvel tambem fazlo a partir de nossos conceitos de democracia indivi dualismo direitos e tolerancia Deverfamos estar preparados para redefinilos e defendelos Sejamos bastante claros sabre isto os fundamentalismos de todos OS matizes sao inflexfveis e determina dos na perseguiao de seus objetivos e estao bastante preparados para silenciar em alguns casas matar os que estiverem em seu caminho assim como tambem para seja la o que isso importa mandarnos todos para o inferno Do lado daqueles que nao sao fundamentalis tas deveria existir maior elemento de clareza intransigencia e na verdade de combatividade antes que seja muito tarde Na Europa deverfamos ser autocriticos frente ao nosso proprio passado imperi al a nossa relaao com o mundo naoeuropeu e aos crimes cometi dos em nome da ciencia e da razao Mesmo assim a ciencia a ra zao a tolerancia e a universalidade sao valores comuns a sociedade democratica moderna e devemos desenvolvelos e defendelos 0 maior erro seria se no curso da autoavaliaao apropriada falhas semos em reconhecer e avaliar o inimigo Traduzido de HALLIDAY Fred Fundamentalism and the contempora ry world political and ethical challenges in WESSELING Henk etalli Is lam and Europe in Past and Present Wassenaar Netherlands Institute for Ad vanced Study in the Humanities and Social Science 1997 por Cristina Sore anu Pecequilo 308 Fred Halliday TITULOS PUBLICADOS Esta sene esta voltada a publi de obras destinadas ao estudo do ceruirio intemacional contemporiineo do sistema mundial da politica extema brasileira dos processos de inte particularmente o Mercosul Sua abrangmcia tern o carater multidisciplinar abarcando estudos te6ricos empiricos ou hist6ricos VISa contribuir para a retomada da discussao sobre urn projeto nacional para o Brasil no plano da arullise de opes estrategicas para a insao internacional do Pais repensando o tema a partir de uma perspectiva do Sui Relaoes internacionais e polftica externa do Brasil led Paulo Roberto de Almeida A polftica externa do regime militar brasileiro led Paulo Fagundes Vizentini Repensando as relaoes internacionais led Fred Halliday Quinhentos anos de periferia 4ed Samuel Pinheiro Guimariies El Mercosur y su contexto regional e internacional Jacques Ginesta 0 Brasil e a Liga das Naoes 19191926 led Eugenio Vargas Garcia A China e o Sudeste Asiatico Paulo Antonio Pereira Pinto A politica externa dos Estados Unidos led Cristina Soreanu Pecequilo Da substituiio de importaoes a substituiio de exportaoes Heloisa Conceiiio Machado da Silva