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A ESCRAVIDÃO NEGRA SOB A PERSPECTIVA DO DIREITO NO BRASIL IMPERIAL1 Adriane Eunice de Paula Roos DEDICATÓRIA Ao meu filho Marco Antônio ao meu marido Jorge e ao professor mestre dos mestres Wilmar Taborda RESUMO O presente estudo aborda o tratamento que a legislação imperial brasileira deu à escravidão negra Trata da escravidão negra no Brasil e da legislação codificada do século XIX Palavraschave escravidão negra legislação imperial legislação codificada do Século XIX SUMÁRIO 1 O tratamento dado à escravidão na legislação imperial 11 Antecedentes da legislação imperial 12 Lei Diogo Feijó de 7 de novembro de 183113 Lei Eusébio Queirós Lei nº 581 de 4 de setembro de 1850 2 A questão da emancipação 21 Leis emancipacionistas 211 A Lei do Ventre Livre Lei nº 2040 de 28 de setembro de 1871 212 A Lei dos Sexagenários de 28 de setembro de 1885 22 As cartas de alforria na prática forense 3 A escravidão negra e a legislação codificada do século XIX 31 A Constituição de 1824 32 O Código Criminal do Império e a Lei nº 4 de 10 de junho de 1835 321 A escravidão e a 1 Artigo extraído do Trabalho de Conclusão do Curso de Direito orientado pela Professora Doutora Maren Guimarães Taborda e apresentado à Banca Examinadora composta pela Professora Mestre Ligia Mori Madeira e pelo Professor Plínio Saraiva Melgaré 2 pena de morte Joaquim Nabuco e a defesa do preto Tomás Conclusão Referências INTRODUÇÃO O estudo buscou subsídios para a constatação de que os textos das leis da época não contemplavam a escravidão e quando a ela se referiam pareciam tratar de leis de exceção que se refletiram nas desigualdades sociais e econômicas que perduram ainda hoje 1 O TRATAMENTO DADO À ESCRAVIDÃO NA LEGISLAÇÃO IMPERIAL 11 Antecedentes da legislação imperial O tratamento legal dado à escravidão remonta ao Direito Romano em Roma a liberdade é a regra a escravidão a exceção Várias eram as causas da escravidão e segundo Moreira Alves podese dividilas em dois grupos as do ius gentium e as do ius civile as primeiras perduraram durante toda a evolução do Direito romano e as outras sofreram modificações As causas do ius gentium eram duas o nascimento e a captura pelo inimigo2 No Brasil a escravidão dos negros se dava pelo tráfico antes de 1831 ou pelo nascimento antes da promulgação da Lei nº 2040 de 28 de setembro de 1871 Conforme ensina Kátia Mattoso a prática jurídica brasileira como a de todas as sociedades de regime escravista manda que o filho da escrava nasça escravo mesmo se o pai é um homem livre Partus sequitur ventrem Prossegue a mesma autora a criança gerada por obra do senhor é livre após a morte de seu pai Mesmo assim é preciso que tenha sido reconhecida 3 Na opinião de Joaquim Nabuco o partus sequitur ventrem máxima do Direito romano é o incentivo à luxúria dos brancos Pouco se importam estes em engrossar o patrimônio dos amigos com filhos seus que jamais reconhecerão4 Em face da escassa legislação relativa a escravos tanto na legislação portuguesa como posteriormente na legislação imperial ao Direito Romano se recorria como subsidiário ao nosso para a resolução de casos que surgiam no foro envolvendo escravidão A legislação civil pela qual o Brasil colonial se regia era 2 ALVES José Carlos Moreira Direito Romano Rio de Janeiro Forense 2002 p 99 v I 3 MATTOSO Kátia Mde Queirós Ser escravo no Brasil 3 ed São Paulo Brasiliense 1990 p 176 4 NABUCO Joaquim A escravidão Rio de Janeiro Nova Fronteira 1999 p 76 3 desordenada sem sistema sem nexo e omissa ou defeituosa em uma infinidade de assuntos da ciência legislativa e por isso convinha indicar as fontes às quais se deveria recorrer enquanto não existisse um Código Civil Trigo de Loureiro indica duas fontes ou seja as fontes com força de lei e as subsidiárias5 Embora a obra de Teixeira de Freitas seja o primeiro Código Civil brasileiro frente à previsão na Constituição de 1824 que dispunha no artigo 179 inciso XVIII que se deveria organizar um Código Civil e Criminal fundado nas sólidas bases de justiça e eqüidade Trigo de Loureiro sistematizou o Direito Civil brasileiro que precedeu à Consolidação das Leis Civis publicada em 1858 Quanto à aplicação do Direito romano como fonte subsidiária de Direito o autor diz que O Direito Romano constitui entre nós a mais copiosa fonte subsidiária da nossa jurisprudência civil já porque as Ordenações Filipinas expressamente o mandão observar em muitos casos já porque a citada Lei de 18 de agosto de 1769 o declarou subsidiário de direito pátrio nos casos omissos nele ou incompletamente providenciados uma vez que na espécie sujeita ele seja conforme a boa razão ou direito natural e não se baseie em motivos supersticiosos e peculiares ao povo romano ou em costumes máximas ou princípios rejeitados pela civilização moderna6 No mesmo sentido Agostinho Marques Perdigão Malheiro Remontemos aos romanos de cujo Direito teremos de socorrer muitas vezes como subsidiário ao nosso mas bem entendido segundo o uso moderno quando conforme a boa razão ao espírito do Direito atual às idéias do século costumes e índole da nação7 Como já referido a codificação civil brasileira somente passou a existir em 1858 com a Consolidação das Leis Civis de Teixeira de Freitas da qual o mérito 5 Entre estas fontes arrola as Ordenações dos Filipes de Espanha datadas de 1603 que D João IV de Portugal revalidou por sua Lei de 29 de janeiro de 1643 Esse corpo de leis condensa quase toda a matéria de Direito Civil no Livro 4 e com as alterações sofridas atravessou o período do Império e chegou à República quando foi revogado pelo Código Civil de 1916 artigo 1807 Acrescentou as Leis Extravagantes Regimentos Decretos Alvarás e Resoluções vigentes até 21 de abril de 1821 data que marca o retorno de D João VI a Portugal e mais os decretos das Cortes Portuguesas especificados e mandados observar pela lei do Brasil independente de 20 de outubro de 1823 Conclui com a legislação promulgada por D Pedro como regente do reino unido a Portugal e após o sete de setembro na condição de imperador Quanto às fontes subsidiárias coletadas Trigo de Loureiro além do Direito Romano registra os assentos da Casa de Suplicação os usos e costumes as opiniões dos Jurisconsultos e os arestos concluído com as leis das nações cultas e civilizadas LOUREIRO Lourenço Trigo de Instituições de Direito Civil brasileiro Brasília Senado Federal Conselho Editorial Superior Tribunal de Justiça 2004 v I p 23 a 26 6 LOUREIRO Lourenço Trigo de Op cit p 27 v I 7 MALHEIRO Agostinho Marques Perdigão A escravidão no Brasil Ensaio histórico jurídico social 3 ed 2 ed integral Petrópolis Vozes Ltda em convênio com o Instituto do Livro 2 v I 149 e respectiva nota nº 818 1866 p 93 4 histórico é realçado pela repulsa ao escravismo manifestada pelo próprio autor nas notas introdutórias desta obra Cumpre advertir que não há um só lugar do nosso texto onde se trate de escravos Temos é verdade a escravidão entre nós mas esse mal é uma excepção que lamentamos condemnado á extinguirse em época mais ou menos remota façamos também uma excepção um capitulo avulso na reforma das nossas Leis Civis não as maculemos com disposições vergonhosas que não podem servir para a posteridade fique o estado de liberdade sem o seu correlativo odioso As Leis concernentes á escravidão que não são muitas serão pois classificadas á parte e formarão nosso Codigo Negro8 O referido Código Negro nunca existiu É sensível a omissão a respeito das disposições concernentes à escravidão no Código Civil de 1858 uma vez que ela deveria abranger por motivos políticos e de ordem pública uma lei especial que nunca foi escrita e que na época era suprida pela transferência da escravidão antiga para a escravidão colonial moderna operação bem adequada à mentalidade de juristas formados na tradição européia de Direito comum Mais do que resolver os casos concretos de delicadas questões que este assunto oferecia na justiça tais regras pareciam legitimar a condição escrava Quanto ao Direito Penal anterior à legislação imperial se faz necessário observar a influência que as leis portuguesas tiveram no Brasil Formalmente a lei penal que deveria ser aplicada no país naquela época era a contida nos 143 títulos do Livro V das Ordenações Filipinas isto se explica porque no momento em que a escravidão estava desaparecendo na Europa Ocidental a descoberta da América revitalizaria a escravidão9 Orientavase no sentido de uma ampla e severa criminalização com drásticas punições Além do predomínio da pena de morte utilizavase outras sanções cruéis como açoites amputação dos membros as galés e o degredo entre outras Não se adotava o princípio da legalidade ficando ao arbítrio do julgador a escolha da sanção aplicável10 8 FREITAS Augusto Teixeira de Consolidação das leis civis Prefácio de Ruy Rosado de Aguiar Brasília Senado Federal Conselho Editorial 2003 p XXXVII Coleção história do direito brasileiro Direito Civil 2 v A transcrição respeita a linguagem da época 9 LOPES José Reinaldo de Lima O direito na história Lições introdutórias São Paulo Max Limonad 2000 p 344 10 BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de Direito Penal parte geral 8 ed São Paulo Saraiva 2003 p 41 v 1 5 O Livro V das Ordenações Filipinas vigora no Brasil até a edição do primeiro Código Criminal em 16 de dezembro de 183011 Apesar da grande influência estrangeira o Código Criminal foi inovador em vários aspectos entre eles a exclusão da pena capital para crimes políticos fixava um esboço de individualização da pena e previa a existência de atenuantes e agravantes estabelecia julgamento especial para menores de quatorze anos e polemizava quanto à pena aplicada aos escravos prevista no artigo 6012 12 Lei Diogo Feijó de 7 de novembro de 1831 A vinda dos negros africanos para o Brasil deuse pelo tráfico até 1850 Em 7 de novembro de 1831 o Brasil promulgou a Lei Diogo Feijó a qual foi um ato de caráter internacional com o objetivo de acabar com o tráfico no continente africano de acordo com os tratados de 19 de fevereiro de 1810 22 de janeiro de 1815 e 28 de julho de 1817 entre as coroas da GrãBretanha e do Brasil para que o Brasil desse à Inglaterra decisivas intenções da fiel observância do último tratado firmado em 1817 Convém reproduzir o artigo 1º da Lei de 7 de novembro de 1831 do seguinte teor Todos os escravos que entrarem no território ou portos do Brasil vindos de fora ficam livres13 Entendese que este artigo extinguiu no Brasil a escravidão por importação todavia a realidade era outra porque aqui chegando os negros eram escravizados A Lei Diogo Feijó que declarou livres todos os escravos vindos de fora do império e impôs penas aos importadores dos mesmos escravos ficou sem execução e aqueles que ela declarou livres continuaram em cativeiro porque a Lei 11 O Código Criminal sofreu influências das idéias européias vigentes na época princípios liberais do Iluminismo e algumas idéias de Bentham autor que não via na crueldade da pena um fim em si mesmo iniciando um progressivo abandono do conceito tradicional que considerava que a pena devia causar muita dor e sofrimento BITENCOURT Cezar Roberto Op cit p 38 As influências legislativas mais importantes foram do Código Francês de 1810 Código Napolitano de 1819 12 Código Criminal artigo 60 verbis Se o réo fôr escravo e incorrer em pena que não seja a capital ou de galés será condemnado na de açoutes e depois de os soffrer será entregue a seu senhor que se obrigará a trazelo com um ferro pelo tempo e maneira que o juiz designar O numero de açoutes será fixado na sentença e o escravo não poderá levar por dia mais de cincoenta BRASIL Código Criminal do Império Lei de 16 de dezembro de 1830 Disponível em httpwww2camaragovbrlegislação publicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 7 out 2006 13 BRASIL Lei Imperial de 7 de novembro de 1831 Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça Rio de Janeiro Livro 1º de Leis fl 98 15111831 Disponível em httpwww2camaragovbr legislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 7 out 2006 6 de 7 de novembro num período de 52 anos após a sua promulgação nunca foi invocada em favor da liberdade14 Segundo Evaristo de Moraes embora houvesse a penalidade e o empenho de autoridades superiores na aplicação da lei ocorreu o que sempre acontece quando o meio social não está preparado mormente quando fortíssimos interesses colidem com o cumprimento de qualquer determinação legal15 O poder do tráfico era irresistível e até 1851 não menos de um milhão de africanos foram lançados em nossas senzalas A cifra de cinqüenta mil por ano não é exagerada16 13 Lei Eusébio de Queirós Tratavase da Lei nº 581 de 4 de setembro de 1850 que estabelecia medidas para a repressão do tráfico de africanos no Império e por influência da Lei Bill Aberdeen decretou no artigo 4º que a importação de escravos no território do Império a partir da vigência daquela lei seria considerada pirataria17 Cabe aqui ressaltar que pela Convenção de 1826 o comércio de africanos devia no fim de três anos ser equiparado à pirataria mas a lei que finalmente os equiparou só foi editada em 4 de setembro de 1850 Segundo Joaquim Nabuco Nessa questão do tráfico bebemos as fezes todas do cálice18 No texto legal havia previsão de serem aplicadas penas inclusive para tentativa de tráfico bem como da cumplicidade Eram considerados cúmplices segundo o artigo 3º parte final da Lei nº 581 a equipagem e os que atuassem como coadjuvantes no desembarque de escravos no território brasileiro ou aqueles que concorressem para ocultar os autores do fato da autoridade bem como quem 14 Lei de 7 de novembro de 1831 artigo 2º verbis Cominava aos importadores de escravos a pena corporal do artigo 179 do Código Criminal referente a reduzir à escravidão pessoa livre e mais a multa de 200 mil réis por cabeça de escravo importado além do pagamento de despesas com reexportação para qualquer parte da África Os infratores responderão cada um por si e por todos MORAES Evaristo de A escravidão africana no Brasil das origens à extinção São Paulo Companhia Editora Nacional 1933 p 52 15 MORAES Evaristo Op cit p 52 16 NABUCO Joaquim O abolicionismo Publicações LCC eletrônicas Disponível em httpwwwbibvirfuturouspbrtextosautoresjoaquimnabucoabolicionismotextohtml Acesso em 6 out 2006a 17 BRASIL Lei nº 581 de 4 de setembro de 1850 Coleção das Leis do Império do Brasil Lei Eusébio de Queirós Chancelaria do Império Rio de Janeiro 5 set 1850 Disponível em httpwww2camaragovbrlegislaçãopublicações doimperiocoleção3html Acesso em 7 out 2006 18 NABUCO Joaquim Op cit onlinea 7 impedisse que os autores do tráfico fossem presos no mar ou em ato de desembarque em momento de perseguição O artigo terceiro desta lei dá ainda a definição de quem são aos autores do crime de importação ou de tentativa de importação São autores do crime de importação ou de tentativa de importação o dono o capitão ou mestre o piloto e o contramestre da embarcação e o sobrecarga Mais uma vez a tentativa de extinguir o tráfico por meio de lei não deu certo porque até 1854 as atividades de importação de negros continuaram Em Porto de Galinhas Pernambuco a lei era facilmente burlada porque a carga de escravos chegava da África sob a denominação de Carga de galinhas de Angola e a partir dali era distribuída Mudavase o nome para a prática costumeira tráfico Segundo Lenine Nequete em 1871 foi levantada por parte do Judiciário a dúvida de que com a promulgação da Lei Eusébio de Queirós estaria prescrita a Lei de 1831 por falta de aplicação desta lei por mais de meio século tratandose de centenas de milhares de pessoas a quem devia ter sido aplicada e por desuso não foi O entendimento do Judiciário se dividia não se chegando a um consenso naquela época O entendimento de uns era o de que a Lei de 7 de novembro de 1831 nunca esteve em esquecimento porque se em 1871 alguém importasse escravos deveria ser punido não pela Lei de 4 de setembro de 1850 mas pela Lei de 1831 uma vez que o vigor desta Lei tanto na parte criminal como na civil ainda era manifesto por não haver outra depois dela com as espécies ali definidas Outros no entanto consideravam a Lei de 1831 caduca por sua nãoexecução e desuso e ainda inexeqüível pela dificuldade de provas19 O que se constata pela Lei de 4 de setembro de 1850 nos artigos 1º 4º e 9º é que esta lei suscitou a observância da Lei de 1831 reconhecendoa em vigor completandoa com o disposto nos seus artigos 1º 2º e 3º o que leva à conclusão de que o argumento do desuso é infundado A Lei Eusébio de Queirós não faz nenhuma referência aos escravos importados desde a data da Lei de 1831 talvez porque depois de 1831 não devessem existir mais escravos A Lei de 1850 invocou a de 1831 uma vez que subsistia na de 1850 a razão de ser daquela outra que era a proibição do tráfico a punição do traficante e a conseqüente libertação do africano objeto do tráfico isto é 19 NEQUETE Lenine Escravos e magistrados no 2º Reinado aplicação da Lei nº 2040 de 2891871 Brasília Fundação Petrônio Portela 1988 p 187 8 a destruição da mercadoria do contrabando A importação não havia cessado em 1850 e por isso a Lei Eusébio de Queirós tomou providências mais enérgicas contra a repressão do tráfico 2 A QUESTÃO DA EMANCIPAÇÃO 21 Leis emancipacionistas 211 A Lei do Ventre Livre Lei nº 2040 de 28 de setembro de 1871 Lenine Nequete diferencia a Lei nº 2040 promulgada em 28 de setembro de 1871 das anteriores editadas em 1831 e 1850 dizendo que aquela foi a primeira que direta e exclusivamente tratou da emancipação dos escravos no Brasil enquanto estas foram somente leis de repressão20 Ainda segundo Lenine Nequete a Lei do Ventre Livre foi uma brilhante conquista jurídica porque não legislou notese bem para escravos realmente existentes na realidade extrauterina nem mesmo na realidade intrauterina sim para escravos mentalmente existentes escravos do futuro e no presente representáveis pelo ventre vácuo da mulher escrava isto é pelo ventre materno em possível produção de filhos produção incerta em função da esterilidade também possível da mulher21 Neste ponto o autor esclarece que em Direito romano libertar escravos nascidos é manumissão manumissio denominada no Direito brasileiro como alforria cujo sentido é de libertar escravos ainda não nascidos mas concebidos no ventre da mulher Libertar porém escravos nem nascidos nem ainda concebidos no ventre materno que ato será que nome deve ter Libertação do ventre é o nome deste ato novo dessa delicada criação jurídica que não sabemos por quem foi pela primeira vez escrito ou pronunciado Esta riqueza é nossa é do Século XIX é da história das Colônias Americanas mas seu germe sem dúvida herdamolo do Direito Romano que tomando a parte pelo todo designa a mulher grávida pelo seu ventre pleno e a curadoria do póstumo por curadoria do ventre22 20 NEQUETE Lenine Op cit p 187 21 Idem ibidem p 126 22 Idem p 128 9 A beleza do texto de Lenine Nequete repousa no sentido de que se via uma mulher livre no seu ventre livre uma mulher escrava no seu ventre escravo até que com a promulgação da Lei do Ventre Livre se passaria a conceber um futuro ventre livre de mulher escrava Como naturalmente conceberse sem a mulher inteira o ventre da mulher Como suporse na parte de um todo indivisível uma qualidade que o todo não tem E ao fazer essas indagações o autor refletia O Direito brasileiro realizou a divisibilidade local por suas leis da libertação do ventre nada menos do que a mulher livre no ventre escrava no resto de seu corpo Bem se vê que as leis podem mais que a natureza que o mundo das leis é mais opulento que o da natureza23 O artigo 1º da referida lei dispõe que os filhos da mulher escrava que nascerem no Império desde a data desta lei serão considerados de condição livre24 Desta lei presumese que a escravidão tem por limite a vida do escravo nascido na véspera da lei No entanto a aplicação da Lei do Ventre Livre tornou evidente também que entre a lei e a prática da lei havia uma boa diferença Na prática o ingênuo nascido liberto pela Lei devia permanecer sob a tutela do senhor de sua mãe até a idade de oito anos completos Chegando a criança a esta idade o proprietário de sua mãe teria a opção de receber do Estado a indenização de 600000 réis ou de utilizarse dos serviços do menor até a idade de vinte e um anos completos No primeiro caso o menor ficaria sob a tutela do Estado mas a grande maioria dos senhores das mães dos ingênuos optou pela utilização dos serviços deles Já que os haviam criado até os oito anos idade a partir da qual começavam a ser realmente úteis era natural que quisessem conserválos e usufruir de seus serviços até que completassem vinte e um anos Misturandose com a senzala no diaadia os ingênuos não eram diferenciados dos escravos e recebiam o mesmo tratamento que estes tendo sido muito freqüentes as suas queixas ou de seus familiares pelos castigos e maustratos que lhes eram indevidamente aplicados Ainda que o artigo 18 do Regulamento de 13 de novembro de 1872 desse aos responsáveis pelos ingênuos o direito de infligirlhes castigos corporais desde que 23 NEQUETE Lenine Op cit p 128 24 Idem ibidem p 128 Esta lei está salva frutificou entre nós por aplicação nova porque se nascem escravos os filhos de escravas com ventre escravo nascem livres os filhos de escravas com ventre livre Esta regra também está salva porque se o parto é escravo seguindo o ventre materno o parto é livre seguindo o ventre livre 10 não fossem excessivos foram muitos os casos de abuso desse direito25 Serve de exemplo de tais abusos o caso registrado pelo jornal Dezenove de Dezembro de Curitiba em 1º de junho de 1881 em Guarapuava Domingos Mendes Machado infligiu excessivos castigos ao ingênuo Lucrécio filho de sua escrava de nome Benedita Procedidas as devidas diligências foram os autos encaminhados à autoridade competente26 Os emancipacionistas viam na Lei o procedimento correto e adequado a uma política abolicionista legalizada gradual e eficiente para gerar tranqüilidade nas senzalas acalmar os abolicionistas e manter os direitos dos senhores no tocante ao acesso à indenização No entanto conforme a historiografia vem demonstrando a chamada Lei do Ventre Livre trouxe no seu bojo muito mais que um simples sancionamento legal em relação à libertação do escravo Em torno dela foi edificada uma estratégia política de avanço e recuo em relação aos objetivos históricos que a referida legislação pretendia alcançar27 212 A Lei dos Sexagenários Lei nº 3270 de 28 de setembro de 1885 Segundo Joseli Mendonça a Lei nº 3270 de 28 de setembro de 1885 inserida em um conjunto jurídico que buscava orientar o processo de abolição não tinha como objetivo único encaminhar a extinção da escravidão Ao contrário essa lei de forma bastante marcante procurava também delimitar e compor as relações sociais na sociedade livre e por certo qualquer projeto de abolição não poderia naquele momento deixar de colocar em evidência tantas questões relativas à liberdade e à organização do trabalho livre Dessa forma parte significativa e 25 Em linguagem da época Art 18 Cessa a prestação dos serviços dos filhos das escravas antes de atingirem elles a idade de 21 annos se por sentença do juízo criminal reconhecerse que os senhores das mãis os maltratam inflingindolhes castigos excessivos Lei art 1º 6º BRASIL Decreto nº 5135 de 13 de novembro de 1872 Approva o regulamento geral para a execução da Lei nº 2040 de 28 de setembro de 1871 In Coleção das Leis do Império do Brasil Disponível em httpwww2camaragovbrlegislação publicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 1 mar 2007 26 GRAF Márcia Elisa de Campos Cidade cidadania e exclusão a lei e a prática Disponível em http httpwwwutpbrproppeX20seminariopesquisaArtigos20completosFCHLACIDADE 20CIDADANIA20E20EXCLUSC3O20A20LEI20E20A20PRC1TICAdoc Acesso em 7 fev 2007 27 PAPALI Maria Aparecida C R A legislação de 1871 o Judiciário e a tutela de ingênuos na cidade de Taubaté Disponível em httpwwwtjrsgovbrinstitumemorialRevistaJHvol2n309Papalipdf Acesso em 13 abr 2007 11 fundamental da lei de 1885 esteve relacionada às relações entre libertos e ex senhores28 Na Câmara por ocasião dos Projetos Dantas e Saraiva os deputados debatiam a respeito da necessidade de proteção de que necessitaria o escravo liberto principalmente no que se referisse à liberdade dos escravos sexagenários uma vez que se tratava de velhos escravos que além dos defeitos que a escravidão lhes imprimira teriam pelos limites da idade muito mais dificuldades para suprir sua sobrevivência Dizia um dos debatedores que o negro velho liberto com a liberdade abandonaria de forma imediata a casa de seu exsenhor e se lançaria na mendicidade para gozar esta liberdade na vagabundagem em decorrência de não ter noções de justiça não ter conhecimento do mundo ser ignorante e incapaz de resistir a vícios além de tornarse um produto da imprevidência dos legisladores por isso considerava mais humanitário deixar os velhos escravos nas fazendas Um outro deputado nessa mesma discussão dizia não entender que tipo de felicidade a liberdade traria aos escravos sexagenários se esta liberdade seria vivida na ociosidade e na mendicância Os opositores ao projeto Dantas invocavam o argumento de que a liberdade seria um mal aos libertos velhos os quais estariam condenados a morrer nas estradas à míngua porque a liberdade para quem não pudesse gozar dela era um presente cruel Neste ponto há de ser considerado que a liberdade como sinônimo de desproteção não estava restrita somente aos sexagenários embora em relação a eles a questão fosse mais preocupante Se o liberto precisava de proteção e neste ponto surge uma questão fundamental no que se refere ao encaminhamento do processo de abolição havia de ser definido o âmbito no qual essa proteção seria exercida A incapacidade do Estado para viabilizar qualquer medida nesse sentido era um argumento ao qual se recorria porque bastava analisar e trazer para o debate o destino que tiveram os filhos de escravos libertos pela lei de 1871 Os ingênuos que não estavam no domínio dos senhores de suas mães porque foram vendidos ou porque as mães faleceram fazendo com que os senhores se desfizessem dos filhos por abandono ou por venda quanto a estes o Estado não dispunha de meios de darlhes proteção por não ter estabelecimentos que pudessem receber os menores Nesse 28 MENDONÇA Joseli M N Entre a mão e os anéis a Lei dos Sexagenários e os caminhos da abolição no Brasil Campinas Unicamp Centro de Pesquisa em História Social e Cultura 1999 p 45 12 sentido a incapacidade do Estado para prover proteção era um forte argumento quando se colocava em questão a liberdade dos sexagenários porque sem o amparo de seus senhores e sem o amparo do Estado os sexagenários transformados em libertos seriam deixados à própria sorte Sobre a questão da proteção Joseli Mendonça diz que a relação de dependência era parte daquele mundo de senhores e escravos de exsenhores e libertos os quais eram livres do ponto de vista jurídico mas que mantinham com os exsenhores relação de dependência favorecimento e gratidão e não cortar estes laços de dependência que por tanto tempo a escravidão mantinha significava para os senhores manter sua dignidade senhorial29 Derrotado Dantas seu projeto de reforma da questão servil foi substituído pelo Projeto Saraiva Este projeto foi aprovado Encaminhado ao Senado em nada foi modificado e sob a liderança de um político conservador o Barão de Cotegipe o projeto do elemento servil transformouse na Lei nº 3270 de 28 de setembro de 1885 sancionada por D Pedro II p 3536 apelidada Lei dos Sexagenários mas também denominada Lei SaraivaCotegipe que alforriava os escravos idosos mas estipulava aos libertandos a obrigatoriedade da prestação de serviços pelo espaço de três anos ou até os 65 anos30 Essa lei foi geralmente negligenciada pela historiografia que se ocupou muito mais da abordagem da lei de 1871 e da própria lei de 1888 Segundo Joseli Mendonça o período de prestação de serviços pelos escravos sexagenários foi um mecanismo que tornou possível manter uma relação de domínio para além dos limites da liberdade e dessa forma tratando de liberdade a lei de 1885 tratou sempre de escravidão Conforme a mesma autora ainda que a liberdade pudesse trazer aos escravos a igualdade jurídica havia de se assegurar que desigualdades fossem mantidas31 Burlar a lei era uma possibilidade que existia para os senhores e esta entre outras considerações decorre dos fatos narrados em relação à Lei dos Sexagenários A primeira delas é que a liberdade para um sexagenário não era favorecimento algum já que este escravo velho não teria vantagem em ser livre com 29 MENDONÇA Joseli M N Op cit p 80 30 BRASIL Lei Imperial n 3270 de 28 de setembro de 1885 Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura Comércio e Obras Públicas Rio de Janeiro 1º out 1885 Disponível em httpwww2camaragovbrlegislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 7 out 2006 31 Nesse sentido a lei de 1885 tentou prover os senhores de mecanismos que tornassem possível uma relação de domínio para além dos limites da liberdade MENDONÇA Joseli M N Op cit p 118 13 tal idade Uma segunda consideração diz respeito ao favorecimento dos senhores do ônus de manterem escravos improdutivos nos seus domínios os quais poderiam ser abandonados em nome da liberdade que a lei lhes garantia Constatase que perder escravos velhos ou moços por determinação da lei não era das coisas mais agradáveis para o senhor e este por meio de dispositivos jurídicos procurava manter escravos no seu domínio e quando este domínio tivesse de ser rompido por determinação da lei e não pela sua vontade a indenização era um elemento do qual não estava disposto a abrir mão32 211 As cartas de alforria na prática forense As ações de liberdade envolviam procedimentos jurídicos utilizados para a requisição da emancipação de algum cativo perante o Judiciário brasileiro da época Os atos do processo de liberdade abarcavam grandes complexidades e sutilezas Os aplicadores do Direito viamse diante da difícil tarefa de equilibrarse entre de um lado o reconhecimento das negociações entre escravos e senhores e de outro a preservação do Direito patrimonial Na dúvida sobre a interpretação das leis os juízes da época poderiam recorrer ao Conselho de Estado que com base em suas atribuições respondia às questões levantadas o que garantia a aplicação uniforme das leis e sua interpretação limitando se como se acreditava os poderes do juiz a simplesmente declarar a lei aplicável ao caso concreto sem inovar nem criar A dúvida chegava ao Conselho em forma de Consulta e a resposta tomava a forma de um Aviso33 Um fato concreto que suscitava dúvida e ao qual se recorria ao Conselho é fornecido pela própria Constituição que garantia a propriedade em toda sua 32 MENDONÇA Joseli M N Op cit p 201206 33 Segundo Reinaldo Lopes o Conselho de Estado era uma instituição característica da monarquia oitocentista No Brasil houve três Conselhos dos quais o terceiro atuou durante o segundo Império O Conselho era ouvido em questões que dissessem respeito ao Poder Moderador e pronunciavase em conflitos de jurisdição entre as autoridades administrativas e entre estas e as judiciárias sobre decretos regulamentos e instruções para a boa execução das leis Opinava ainda sobre propostas que o poder executivo enviasse à Assembléia Geral e sobre abusos das autoridades aclesiásticas LOPES José Reinaldo de Lima Op cit p 322325 14 plenitude no artigo 179 inciso XX34 Este dispositivo constitucional indica a dificuldade da tarefa dos magistrados ao enfrentarem no cotidiano da Justiça pleitos cada vez mais diversos e imprevistos Em várias ocasiões o aplicador do Direito precisava refletir detidamente sobre a solução a ser empregada para que a vontade senhorial e o princípio da propriedade privada não fossem maculados35 Quanto às cartas de liberdade estas carregavam consigo vários sentidos além da outorga da liberdade a um escravo e muitas vezes tal concessão transformavase em uma espécie de compromisso tácito de lealdade entre o senhor e seu escravo A efetividade desse mecanismo exigia o cumprimento dos atos pactuados Cabia então ao sistema judiciário não apenas os reconhecer como também e principalmente legitimar e proteger esses atos no caso de serem desrespeitados por alguma parte ilegítima interessada em violar a vontade senhorial A intervenção da Justiça somente se justificava em caso de impasse As ações de liberdade impetradas após a vigência da Lei do Ventre Livre pertencem a uma época de crescente agitação abolicionista e de leis e de decisões judiciárias indicativas da necessidade de reformas no sistema Movidos pelo desejo e muitas vezes pela necessidade de criar uma situação mais justa os cativos exploravam o espaço institucional disponível na busca de alternativas inexistentes na relação pessoal com seu proprietário Os escravos para arrancar do senhor alguma vantagem recorriam à submissão e à subserviência como estratégias e quando tais alternativas não alcançavam êxito o Judiciário convertiase numa instância de enfrentamento e desgaste da vontade senhorial 34 É garantido o Direito de Propriedade em toda a sua plenitude Se o bem público legalmente verificado exigir o uso e emprego da Propriedade do cidadão será ele previamente indenizado do valor dela A Lei marcará os casos em que terá lugar esta única exceção e dará as regras para se determinar a indenização BRASIL Constituição Política do Império do Brasil de 25 de março de 1824 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03ConstituicaoContituiC3A7ao24htm Acesso em 11 out 2006 35 Na Comarca de Vitória ES Venâncio Gomes Loureiro por exemplo quis beneficiar com a liberdade seu afilhado Sebastião filho de Efigênia escrava do finado Francisco Pinto Ribeiro O padrinho do escravo não obtendo o consentimento do tutor e curador geral dos órfãos requereu em juízo o arbitramento do valor para depósito O Juiz encarregado avaliou o ingênuo em cinqüenta mil réis e Venâncio juntou ao processo um talão de depósito da quantia ajuizada Em 1851 a sentença foi favorável ao pleito Julgo por liberto ao menor Sebastião filho de Efigênia escrava dos órfãos filhos do finado Francisco Pinto Ribeiro CAMPOS Adriana Pereira Escravidão e liberdade nas barras dos tribunais Disponível em http7214205104searchqcacheJk8CixqeXtcJwwwhistoricaarquivo estadospgovbrmateriasanterioresedicao09materia03texto03pdfescravosC3B3rfC3A3os hlptBRctclnkcd26glbr Acesso em 10 mar 2007 15 De modo geral os escravos tentavam estabelecer previamente um ajuste consensual pela alforria Apenas ocasionalmente quando de um impasse requisitavase a intervenção do juízo da localidade 3 A ESCRAVIDÃO NEGRA E A LEGISLAÇÃO CODIFICADA DO SÉCULO XIX 31 A Constituição de 1824 A Constituição de 1824 consagrou a declaração dos direitos individuais no seu ordenamento inspirandose no exemplo francês e separando os direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros no artigo 179 Mencionou o cidadão ativo titular de direitos políticos artigos 90 e 91 mas os direitos de igualdade e de liberdade ficaram prejudicados na prática uma vez que no contexto social prevalecia uma discriminação quase generalizada de direitos A Constituição de 1824 a qual dita liberal em seu Título 2º artigo 6º referente aos cidadãos brasileiros no parágrafo I diz São cidadãos brasileiros os que no Brasil tiverem nascido quer sejam ingênuos ou libertos ainda que o pai seja estrangeiro uma vez que este não resida por serviço de sua Nação Entretanto a Lei Costumeira a que realmente vigorava revelava uma outra realidade aquela em que o ingênuo e o liberto estavam longe de poder fazer valer a sua cidadania o que explica os muitos estratagemas utilizados por uns e por outros para tornar suas existências possíveis na sociedade em que viviam As contradições começam na própria Constituição Logo no Título 4º Capítulo VI das Eleições o artigo 94 refere Podem ser Eleitores e votar na eleição dos Deputados Senadores e Membros dos Conselhos de Província todos os que podem votar na Assembléia Parochial Exceptuamse I Os que não tiverem de renda liquida annual duzentos mil réis por bens de raiz industria commercio ou emprego II Os Libertos 36 36 BRASIL Constituição Política do Império do Brasil de 25 de março de 1824 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03ConstituicaoContituiC3A7ao24htm Acesso em 11 out 2006 16 Os ingênuos assim como os escravos libertos estavam enquadrados em categorias jurídicas específicas que não lhes davam acesso a direitos iguais aos das pessoas nascidas livres37 A Constituição de 1824 no Título 8º que trata das disposições gerais das garantias dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros sem mencionar as palavras escravo ou escravidão no artigo 179 refere A inviolabilidade dos Direitos Civis e Politicos dos Cidadãos Brazileiros que tem por base a liberdade a segurança individual e a propriedade é garantida pela Constituição do Imperio pela maneira seguinte XIX Desde já ficam abolidos os açoites a tortura a marca de ferro quente e todas as mais penas cruéis38 Segundo Reinaldo Lopes diziase que os senhores de escravos eram legítimos proprietários e que a abolição significava simplesmente desapropriar sem indenizar o que era inconstitucional39 Ainda segundo o mesmo autor este era um argumento de caráter jurídico bem localizado no artigo 179 parágrafo XX da Constituição do Império que garantia o direito de propriedade que serviu tanto para os abolicionistas quanto para antiabolicionistas No Titulo 8º Das disposições gerais e das garantias dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros em linha evidentemente liberal se constata Art 179 A inviolabilidade dos Direitos Civis e Politicos dos Cidadãos Brazileiros que tem por base a liberdade a segurança individual e a propriedade é garantida pela Constituição do Imperio pela maneira seguinte XXII É garantido o Direito de Propriedade em toda a sua plenitude Se o bem publico legalmente verificado exigir o uso e emprego da propriedade do Cidadão será elle préviamente indemnisado do valor della A Lei marcará os casos em que terá logar esta unica excepção e dará as regras para se determinar a indemnisação grifouse A concepção da propriedade contida no texto da Carta Imperial no artigo acima referido também pode ser relacionada à indenização mencionada nos textos das leis do Império conforme visto na Lei dos Sexagenários por exemplo por isso 37 Ingênuos eram os filhos de mulher escrava libertados ao nascer ou na pia batismal A prática da libertação do nascituro já era antiga e havia sido incorporada ao costume sobretudo para resolver muitos casos de filhos bastardos fruto das relações entre os proprietários ou os filhos destes e suas escravas GRAF Márcia Elisa de Campos Op cit online 38 Tendo em vista enfocar o caráter histórico deste trabalho optouse por manter a ortografia da época na transcrição textual do artigo da Constituição 39 LOPES José Reinaldo de Lima Op cit p 345 17 as defesas que se faziam nos recintos parlamentares em torno das indenizações podem ser ligadas à tentativa de manutenção do domínio senhorial ou seja ao aludirem à necessidade de que todo e qualquer senhor devesse ser indenizado por todo e qualquer escravo alforriado os parlamentares estavam tentando preservar as condições de legitimidade do exercício do domínio senhorial prevista no artigo constitucional acima reproduzido a ponto de que fosse possível a continuidade das relações de escravidão Na escravidão o poder senhorial era absoluto e a intervenção da lei no direito de propriedade como aconteceu nas leis de 1871 e 1885 tendia a provocar desgastes e fissuras na base do sistema40 32 O Código Criminal do Império e a Lei nº 4 de 10 de junho de 1835 Em 1830 já com previsão constitucional foi editado o Código Criminal do Império que de certa forma não foi pensado em relação aos preceitos constitucionais uma vez que o artigo 14 estabelece Será o crime justificável e não terá punição dele 6º Quando o mal consistir em castigo moderado que os pais derem a seus filhos os senhores a seus escravos e os mestres a seus discípulos ou desses castigos resultar uma vez que a qualidade dele não seja contrária às leis em vigor grifouse Ao longo da história foram denunciadas diferentes modalidades de violência a que eram submetidos os negros durante a escravidão as quais foram denunciadas pelos abolicionistas em larga escala na época em que as mesmas ocorriam e pelos registros históricos que chegaram até os dias atuais Quando o artigo referido menciona como requisito para crime justificável castigo moderado entendese que todos os castigos eram moderados e portanto todos os crimes justificáveis o que fez com que a lei não correspondesse à realidade para a qual foi criada e a prática tornou o senhor soberano uma vez que a justiça certamente não penetrava nas propriedades para que os escravos pudessem queixarse de castigos imoderados e era inútil a queixa de um escravo à autoridade porque o escravo para queixarse do senhor precisa a mesma força de 40 MENDONÇA Joseli Op cit p 137147 18 vontade e resolução que para fugir ou suicidarse sobretudo se ele deixa algum refém no cativeiro41 Como se percebe a violência estava institucionalizada porque a tortura pública não era impedida mas aplicada em nome da lei O castigo público não excluía outras penas tais como o calabouço a palmatória o ferro para marcar as correntes entre outros Com a publicação da Lei nº 4 de 10 de junho de 1835 passou a vigorar no ordenamento jurídico brasileiro a pena de morte para crimes violentos de escravos contra seus senhores conforme se constata no artigo 1º Serão punidos com a pena de morte os escravos ou escravas que matarem por qualquer maneira que seja propinarem veneno ferirem gravemente ou fizerem outra qualquer grave ofensa física a seu senhor a sua mulher a descendentes ou ascendentes que em sua companhia morarem a administrador feitor e às suas mulheres que com eles viverem Se o ferimento ou ofensa física forem leves a pena será de açoites a proporção das circunstâncias mais ou menos agravantes42 No Conselho de Estado foi proposta a revogação do artigo 60 do Código Criminal que criou a pena de açoites e a Lei de 10 de junho Sustentando uma e outra abolição iniciada pela Comissão da qual era relator o Conselheiro Nabuco fez algumas considerações assim resumidas na ata da sessão de 30 de abril de 1868 O conselheiro Nabuco sustenta a necessidade da abolição da lei excepcional de 10 de junho de 1835 Que ela tem sido ineficaz está provado pela estatística criminal os crimes que ela previne têm aumentado É uma lei injusta porque destrói todas as regras de imputação criminal toda a proporção das penas porquanto os fatos graves e menos graves são confundidos e não se consideram circunstâncias atenuantes e agravantes como se os escravos não fossem homens não tivessem paixões e o instinto de conservação Que a pena de morte e sempre a morte não é uma pena exemplar para o escravo que só vê nela a cessação dos males da escravidão Que o suicídio freqüente entre os escravos e a facilidade com que confessam os crimes e se entregam depois de cometêlos provam bem que eles não temem a morte43 Por esta afirmação pressupõese que o pensamento abolicionista da época mostrava a escravidão como ela era e para a qual o suicídio ou a morte pareciam 41 NABUCO Joaquim Op cit onlinea 42 BRASIL Lei Imperial nº 4 de 10 de junho de 1835 Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça Rio de Janeiro Livro 1º de Leis fl 142v 1561835 Disponível em httpwww2camaragovbr legislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 7 out 2006 43 NABUCO Joaquim Op cit onlinea 19 para o escravo a cessação dos males decorrentes do cativeiro e um incentivo para o crime Joaquim Nabuco posicionouse a respeito da pena de açoites da seguinte forma É um castigo que não corrige mas desmoraliza É além disso uma pena que não mantém o princípio da proporção das penas sendo que o mesmo número de açoites substitui a prisão perpétua a prisão por 30 20 e 10 anos As forças do escravo é que regulam o máximo de açoites e pois o máximo vem a ser o mesmo para os casos graves e os mais graves Que a execução dessa pena dá lugar a muitos abusos sendo que em muitos casos é iludida em outros tem causado a morte44 A pena de açoites vigorou até 22 antes da abolição da escravatura mesmo que juridicamente não pudesse ser aplicada na lei penal brasileira uma vez que a Constituição de 1824 no artigo 179 inciso XIX aboliu esta pena por considerála cruel 321 A escravidão e a pena de morte Joaquim Nabuco e a defesa do Preto Tomás No aspecto legal Joaquim Nabuco considerava a escravidão como um crime contra a humanidade sendo ilegal perante até o direito de propriedade e que a legislação criando dois tipos de sanção em relação ao senhor e em relação ao escravo acirrou o conflito entre as duas ordens sociais45 Para lutar corpoacorpo com a escravidão e a pena de morte um dia o jovem acadêmico apresentouse para defender perante o Júri de Recife um escravo assassino Tratavase de um réu confesso e seu crime tinha todas as agravantes o preto Tomás para vingarse de ter sido açoitado na praça pública havia 44 NABUCO Joaquim Op cit onlinea 45 Joaquim Nabuco começou seus estudos de Direito em 1866 iniciandoos na Faculdade de Direito de São Paulo mas terminandoos na de Recife São Paulo e Recife eram as duas únicas academias de Direito no Brasil Em 1869 Nabuco voltou ao Recife para cursar o quarto ano acadêmico Desde moço o jovem estudante revelou posição marcantemente abolicionista época em que escreveu A Escravidão livro que nunca chegou a ser publicado nem terminado porque faltou escreverlhe o último capítulo O próprio Joaquim Nabuco na maturidade escreveu a cerca de sua obra No meu 5º ano no Recife levei a preparar um livro que ainda guardo uma espécie de Perdigão Malheiro inédito sobre a escravidão entre nós NABUCO Joaquim Minha formação Disponível em bibliocombrconteudoJoaquimNabucominhaformaE7E3ohtm Acesso em 11 mar 2007 20 assassinado o seu ofensor premeditadamente com um tiro à queimaroupa Mais tarde conseguiu fugir da cadeia matando um guarda Depois cercado pela polícia em um quarteirão central de Recife defendeuse de seus captores por mais de 24 horas homiziandose nas casas e subindo nos telhados deixando a população sobressaltada com os disparos que fazia contra os que tentavam capturálo A cidade conta Carolina Nabuco46 não dormiu enquanto não teve notícia de sua prisão Não era mais um homem era um tigre reconheceu Joaquim Nabuco47 Ao abordar o caso do Preto Tomás réu de morte defendido por ele no júri do Recife embora não quisesse fazer um paralelo entre a escravidão e a pena de morte com este fato verídico Joaquim Nabuco protesta ao mesmo tempo contra a escravidão e contra a morte O preto Tomás foi condenado a galés perpétuas posteriormente em Olinda foilhe confirmada a pena de morte Joaquim Nabuco foi o advogado do negro Tomás e o caso foi relatado pelo próprio defensor do caso no livro A escravidão48 Joaquim Nabuco se indagava qual a razão de ser da pena de açoites uma vez que o legislador ao limitar os açoites a cinqüenta por dia não tinha a intenção de que esta pena atentasse contra a vida do escravo Quem se degrada na praça pública o que açoita ou o que é açoitado Não é este Profundamente aviltante esse castigo só serve para destruir o resto de pudor que uma natureza escrava possa ter e quando esse pudor não se gasta redobra tornase em uma paixão em um desejo insaciável de vingança e ainda assim principalmente a lei não alcança seu fim49 Depreendese do relato do caso que Tomás foi preso com muita dificuldade uma vez que era homem muito forte O Tribunal de Olinda anteriormente já havia condenado o escravo à morte A defesa de Joaquim Nabuco em Recife seria uma das mais difíceis já que praticamente o réu estava condenado à morte antes mesmo desse julgamento e o Imperador devido ao Poder Moderador estava acostumado a comutar a pena capital em prisão perpétua no entanto abstinhase nesses casos ou 46 NABUCO Joaquim O réu escravo Ordem dos Advogados do Brasil Secção São Paulo Série Grandes Causas Disponível em httpwwwoabsporgbrinstitucionalgrandescausasoreuescravo Acesso em 1º mar 2007 47 NABUCO Joaquim Op cit 1999 p 42 48 Idem ibidem p 4146 49 Idem ibidem p 40 21 seja quando o escravo matava o feitor ou o senhor Os fazendeiros reunidos exigiam castigo exemplar ao escravo Tomás no Tribunal do Júri50 Na origem desse processo havia dois crimes sociais a escravidão e a pena de morte Fora a escravidão que levara Tomás a praticar o primeiro crime e a pena de morte que o levara a perpetrar o segundo Referiu Nabuco Obrigado pela lei natural a conservar uma vida que não era da sociedade mas de Deus tentara evadirse quando o quiseram prender de novo para o cadafalso foi então o seu segundo crime ou por medo invencível ou por vindita atroz aniquilou ele um homem que o agarrara pelas costas para sujeitálo à pena da lei e isso quando ele estava a entrar no gozo da liberdade pela fuga51 Diante dos jurados Joaquim Nabuco exclamou Não cometeu um crime removeu um obstáculo frase que provocou grande vibração na assistência demonstrando ser conhecedor da arte da oratória que dominava bem com grande mestria52 O réu foi condenado a galés perpétuas que era o menor castigo que se poderia esperar para o caso e o discurso de Nabuco foi incluído no rol dos acontecimentos que passariam para a História Em 28 de novembro de 1870 Nabuco recebeu o grau de bacharel em Ciências Sociais e Jurídicas A título de curiosidade o escravo Tomás durante suas peripécias de fuga dados os adjetivos que a população utilizava em relação a ele tais como notório facínora tão revoltante acusado permitem que se faça um breve questionamento a respeito do dano mais especificamente quanto à reparação do dano cometido por escravo crime cuja reparação estava prevista no Código Criminal grifou se No capítulo IV o artigo 21 do Código Criminal dispõe quanto à satisfação do dano verbis O delinqüente satisfará o damno que causar com o delicto E quanto a escravos estava expressamente previsto no referido Código no artigo 28 50 Por esta afirmação entendese que o escravo Tomás era visto como um problema de segurança pública e também se percebe o envolvimento das elites locais com o crime e a criminalidade e que a violência e a tortura são os meios mais aprovados para serem utilizados pelo Estado na manutenção da ordem social e política Transportados para a nossa época percebese que hoje ainda esta questão é atual quando se pensa em afirmação do Estado de Direito respeito aos direitos humanos e consolidação da cidadania no país KOERNER Andrei Org História da Justiça Penal no Brasil pesquisas e análises São Paulo IBCCRIM 2006 p 137149 51 NABUCO Joaquim Op cit 1999 p 43 52 Idem ibidem p 43 22 parágrafo 1º verbis Serão obrigados á satisfação posto que não sejam delinqüentes 1º O senhor pelo escravo até o valor deste Fica bastante claro nos citados artigos que quem causa prejuízo a outrem fica obrigado a reparar o dano Este é um princípio que evoluiu no tempo e está consagrado nos dias atuais mas que não teve origem no Código Criminal do Império As Ordenações Filipinas Livro V Título 86 parágrafo 5º53 já impunha ao senhor a obrigação de pagar o dano ou de dar o escravo e pelo preço da venda ser pago o dano Na Consolidação das Leis Civis de Teixeira de Freitas54 no Código Civil de 191655 este príncípio também foi incorporado bem como está presente no Código Civil de 200256 A elaboração deste princípio foi feita com base nas disposições da Lex Aquilia lei que vigorou provavelmente no século III aC e dispunha no primeiro capítulo que quien matase injustamente a un esclavo ajeno una esclava ajena o ganado cuadrúpedo será condenado a pagar al propietario tanto dinero cuanto fuera su valor máximo en ese año57 Originariamente a sanção da Lex Aquilia só se aplicava a dano causado por ato positivo e consistente em estrago físico e material da coisa corpórea Assim quanto ao primeiro requisito não constituía dano perante aquela lei deixar sem alimento um cavalo causando com isso sua morte Quanto ao segundo não era considerado pela Lex Aquilia como dano deixar fugir o animal alheio porque não ocorria estrago físico e material Além destes requisitos a Lex Aquilia exigia que a danificação fosse feita iniuria isto é contra a lei 53 Livro V Título 86 parágrafo 5º E se achar culpado no pôr do fogo de que se seguir o dano algum escravo seja açoitado publicamente e ficará na vontade de seu senhor pagar o dano que o fogo fez ou dar o escravo para se vender e do preço se pagar o dito dano ORDENAÇÕES FILIPINAS Livro V Título 86 parágrafo 5º Disponível em httpwwwucptihtiprojfilipinas14p863htm Acesso em 25 fev 2007 54 Artigo 799 da Consolidação das Leis civis verbis Todo o delinquente está obrigado á satisfazer o damno que causar com o delicto FREITAS Augusto Teixeira de Op cit p 484 55 Artigo 159 verbis Aquele que por ação ou omissão voluntária negligência violar direito ou causar prejuízo a outrem fica obrigado a reparar o dano BRASIL Código Civil e legislação civil em vigor Theotonio Negrão e José Roberto Ferreira Gouvêa 22 ed atual até 13 jan 2003 São Paulo Saraiva 2003 p 1367 56 No novo Código Civil de 2002 o dano aquiliano foi incorporado no artigo 186 verbis Aquele que por ação ou omissão voluntária negligência violar direito e causar dano a outrem ainda que exclusivamente moral comete ato ilícito e no que se refere à responsabilidade civil no artigo 927 verbis Aquele que por ato ilícito artigos 186 e 187 causar dano a outrem fica obrigado a reparálo Parágrafo único Haverá obrigação de reparar o dano independentemente de culpa nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar por sua natureza risco para os direitos de outrem 57 DOMINGO Rafael Coord Textos de Derecho Romano Lex Aquilia de damno iniuria dato Navarra Editorial Aranzadi 2002 p 256 23 Mais tarde os jurisconsultos entenderam que a palavra iniuria não significava apenas o ilícito o contrário à lei mas implicava também a culpabilidade do autor do dano58 Outrossim as sanções da Lex Aquilia aplicavamse mais tarde a outros casos de danificação além das restrições originárias como aos prejuízos causados por omissão ou verificados sem o estrago físico e material da coisa59 No cálculo do valor do dano originariamente se limitava a estabelecer o valor objetivo da coisa mas no período clássico incluíase todo o interesse do proprietário relativamente a ela Assim desde essa época o cálculo do dano incluía além do dano efetivo e material damnum emergens também a perda de lucro lucrum cessans sofrida pelo proprietário por causa do ato ilícito do ofensor60 Segundo Perdigão Malheiro do fato criminoso do escravo resulta para o senhor a obrigação de indenizar o dano ao ofendido segundo o artigo 28 1º do Código Criminal mas somente até o valor do mesmo escravo Refere ainda que esta reparação não pode ser pedida senão por ação cível61 que prescreve em trinta anos62 É a Ação Noxal63 dos romanos e já conhecida do Direito brasileiro Ordenações Livro 5º Título 86 5º Mas se o escravo morresse se fosse 58 O elemento da iniuria incluía a antijuricidade e a intencionalidade esta última se apreciava em razão da situação que tipicamente a envolvia A jurisprudência fez uma interpretação progressivamente extensiva desta lei incluindo a comissão por omissão e por negligência e apreciando uma causalidade imediata DOMINGO Rafael Op cit p 372 59 A partir da Lex Aquilia embora de forma primitiva a noção de culpa pela primeira vez passou a ser esboçada como fundamento da responsabilidade civil de forma com que o agente não seria responsável pelo dano se agisse sem culpa Esta lei introduziu o damno iniuria datum ou melhor prejuízo causado a bem alheio empobrecendo o lesado sem enriquecer o lesante Esta teoria que se propagou pela Idade Média deu início à responsabilidade civil subjetiva na qual o fator culpa é determinante para a existência da indenização assim como o dano e o nexo causal Dessa forma o Dano Aquiliano foi incorporado à época atual pelo Código Civil de 1916 no artigo 159 e pelo Novo Código Civil de 2002 nos artigos 186 e 927 verbis Aquele que por ato ilícito artigos 186 e 187 causar dano a outrem fica obrigado a reparálo Parágrafo único Haverá obrigação de reparar o dano independentemente de culpa nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar por sua natureza risco para os direitos de outrem BRASIL Código Civil e legislação civil em vigor Op cit p 166 60 MARKY Thomas Curso elementar de Direito Romano 8 ed São Paulo Saraiva 1995 p 136137 61 Lei nº 261 de 3 de dezembro de 1841 artigo 68 que derrogou o artigo 31 do Código Criminal e o artigo 269 5º do Código de Processo Criminal verbis A indemnização em todos os casos será pedida por ação civil ficando revogado o Artigo 31º do Código Criminal e o 5º do artigo 269º do Código de Processo Não se poderá porêm questionar mais sobre a existencia do facto e sobre quem seja o seu autor quando estas questões se achem decididas no crime 62 Artigo 36 da Lei de 1841 verbis A obrigação de indemnizar prescreve passados trinta annos contado do dia em que o delicto for commetido BRASIL Lei nº 261 de 3 de dezembro de 1841 In Coleção das Leis do Império do Brasil 1841 Tomo 4º Parte 1ª Secção 32ª Disponível em httpwww 2camaragovbrlegislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 15 maio 2006 63 Noxa daño perjuicio delito hijo o esclavo que causa el daño o comete el delito DOMINGO Rafael Op cit p 456 24 condenado em pena capital ou perpétua como foi o caso de Tomás se o senhor o entregasse ficaria liberado Perdigão Malheiro entendia esta questão da seguinte maneira dispunha o Direito Romano e a nossa lei anterior caso em que recebido pelo ofendido o escravo ou seu produto temse preenchida a satisfação como quer a lei Código Criminal artigo 28 1º64 Prossegue Perdigão Malheiro se podem levantar outras hipóteses porquanto sendo o falecimento um sucesso fatal e os outros fatos conseqüências ou efeitos da condenação todavia o ofendido nenhuma indenização receberia se o senhor não fosse obrigado o que parece oporse ao determinado no Código Criminal artigos 21 e seguintes e mesmo no artigo 28 que declara o senhor subsidiariamente responsável embora seja esta responsabilidade limitada ao valor do escravo e não à pessoa deste65 Quanto à indenização de dano tratase principalmente na reparação do mal causado ao ofendido a qual deve ser a mais completa que se possa independente da punição e da criminalidade Segundo Teixeira de Freitas em tais casos o senhor não fica obrigado sobretudo se tem feito abandono de escravo porque seria iníquo como se decide em várias leis romanas que além de perder o escravo pagasse ao ofendido quantia igual ao valor dele quando já semelhante valor ele não conserva66 Ainda no pensamento de Teixeira de Freitas cabe esclarecer que este autor considerava ter sido mal interpretada a norma constitucional que mandava organizar o quanto antes um Código Civil e Criminal artigo 179 parágrafo 18 da Constituição de 1824 uma vez que foi elaborado o Código Criminal em 1830 sem haver um Código Civil o que considerava um erro transgressão do sábio pensamento da Legislação Fundamental67 CONCLUSÃO Este trabalho descritivo de reconstrução histórica ao abordar o tema da escravidão negra no Brasil deparouse com o distanciamento entre as leis 64 MALHEIRO Agostinho Marques Perdigão Op cit p 1819 65 Idem ibidem p 1819 66 FREITAS Augusto Teixeira de Op cit p 487 67 Idem ibidem p 485 25 disponíveis e a prática social Isso foi constatado pelo encadeamento de leis e decretos que pouco a pouco num processo lento e gradual levaram o país à abolição total da escravidão em 1888 Podese dizer que desde a Lei Diogo Feijó de 1831 que pretendeu abolir o tráfico de escravos até Lei dos Sexagenários de 1885 que declarava livre todo escravo com mais de sessenta anos se as normas não eram sumariamente ignoradas seus detalhes faziam com que fossem absolutamente inócuas na prática Destes fatos percebese que o problema central sobre o qual a escravidão negra se situava na legislação da época se dava em razão do direito de propriedade dos senhores em relação aos seus escravos A Constituição imperial entre os direitos individuais inalienáveis registrava o direito de propriedade e isto se tornava um problema difícil de ser resolvido porque nem os abolicionistas sabiam como extinguir a escravidão sem indenizar os senhores pelo seu direito adquirido REFERÊNCIAS ALVES José Carlos Moreira Direito Romano Rio de Janeiro Forense 2002 v I BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de Direito Penal parte geral 8 ed São Paulo Saraiva 2003 v 1 BRASIL Código Civil e legislação civil em vigor Theotonio Negrão e José Roberto Ferreira Gouvêa 22 ed atual até 13 jan 2003 São Paulo Saraiva 2003 Código Criminal do Império Lei de 16 de dezembro de 1830 Disponível em httpwww2camaragovbrlegislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 7 out 2006 Constituição Política do Império do Brasil de 25 de março de 1824 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03ConstituicaoContituiC3A7ao 24htm Acesso em 11 out 2006 Decreto nº 5135 de 13 de novembro de 1872 Approva o regulamento geral para a execução da Lei nº 2040 de 28 de setembro de 1871 In Coleção das Leis do Império do Brasil Disponível em httpwww2camaragovbrlegislação publicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 1 mar 2007 Lei nº 261 de 3 de dezembro de 1841 In Coleção das Leis do Império do Brasil 1841 Tomo 4º Parte 1ª Secção 32ª Disponível em httpwww 2camaragovbrlegislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 15 maio 2006 26 BRASIL Lei Imperial de 7 de novembro de 1831 Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça Rio de Janeiro Livro 1º de Leis fl 98 15111831 Disponível em httpwww2camaragovbrlegislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 7 out 2006 Lei Imperial nº 4 de 10 de junho de 1835 Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça Rio de Janeiro Livro 1º de Leis fl 142v 1561835 Disponível em httpwww2camaragovbrlegislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 7 out 2006 Lei Imperial n 3270 de 28 de setembro de 1885 Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura Comércio e Obras Públicas Rio de Janeiro 1º out 1885 Disponível em httpwww2camaragovbrlegislaçãopublicaçõesdoimperio coleção3html Acesso em 7 out 2006 Lei nº 581 de 4 de setembro de 1850 Coleção das Leis do Império do Brasil Lei Eusébio de Queirós Chancelaria do Império Rio de Janeiro 5 set 1850 Disponível em httpwww2camaragovbrlegislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção 3html Acesso em 7 out 2006 CAMPOS Adriana Pereira Escravidão e liberdade nas barras dos tribunais Disponível em http7214205104searchqcacheJk8CixqeXtcJwwwhistorica arquivoestadospgovbrmateriasanterioresedicao09materia03texto03pdfescrav osC3B3rfC3A3oshlptBRctclnkcd26gl br Acesso em 10 mar 2007 DOMINGO Rafael Coord Textos de Derecho Romano Lex Aquilia de damno iniuria dato Navarra Editorial Aranzadi 2002 FREITAS Augusto Teixeira de Consolidação das leis civis Prefácio de Ruy Rosado de Aguiar Brasília Senado Federal Conselho Editorial 2003 Coleção história do direito brasileiro Direito Civil 2 v GRAF Márcia Elisa de Campos Cidade cidadania e exclusão a lei e a prática Disponível em http httpwwwutpbrproppeX20seminariopesquisaArtigos 20completosFCHLACIDADE20CIDADANIA20E20EXCLUSC3O20A20 LEI20E20A20PRC1TICAdoc Acesso em 7 fev 2007 KOERNER Andrei Org História da Justiça Penal no Brasil pesquisas e análises São Paulo IBCCRIM 2006 LOPES José Reinaldo de Lima O direito na história Lições introdutórias São Paulo Max Limonad 2000 LOUREIRO Lourenço Trigo de Instituições de Direito Civil brasileiro Brasília Senado Federal Conselho Editorial Superior Tribunal de Justiça 2004 v I MALHEIRO Agostinho Marques Perdigão A escravidão no Brasil Ensaio histórico jurídico social 3 ed 2 ed integral Petrópolis Vozes 1866 2 v 27 MARKY Thomas Curso elementar de Direito Romano 8 ed São Paulo Saraiva 1995 MATTOSO Kátia Mde Queirós Ser escravo no Brasil 3 ed São Paulo Brasiliense 1990 MENDONÇA Joseli M N Entre a mão e os anéis a Lei dos Sexagenários e os caminhos da abolição no Brasil Campinas Unicamp Centro de Pesquisa em História Social e Cultura 1999 MORAES Evaristo de A escravidão africana no Brasil das origens à extinção São Paulo Companhia Editora Nacional 1933 NABUCO Joaquim A escravidão Rio de Janeiro Nova Fronteira 1999 Minha formação Disponível em bibliocombrconteudo JoaquimNabucominhaformaE7E3ohtm Acesso em 11 mar 2007 O abolicionismo Publicações LCC eletrônicas Disponível em httpwwwbibvirfuturouspbrtextosautoresjoaquimnabucoabolicionismotextoht ml Acesso em 6 out 2006a O réu escravo Ordem dos Advogados do Brasil Secção São Paulo Série Grandes Causas Disponível em httpwwwoabsporgbr institucionalgrandescausasoreuescravo Acesso em 1º mar 2007 NEQUETE Lenine Escravos e magistrados no 2º Reinado aplicação da Lei nº 2040 de 2891871 Brasília Fundação Petrônio Portela 1988 ORDENAÇÕES FILIPINAS Disponível em httpwwwucptihtiprojfilipinas14p863htm Acesso em 25 fev 2007 PAPALI Maria Aparecida C R A legislação de 1871 o Judiciário e a tutela de ingênuos na cidade de Taubaté Disponível em httpwwwtjrsgovbr institumemorialRevistaJHvol2n309Papalipdf Acesso em 13 abr 2007
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A ESCRAVIDÃO NEGRA SOB A PERSPECTIVA DO DIREITO NO BRASIL IMPERIAL1 Adriane Eunice de Paula Roos DEDICATÓRIA Ao meu filho Marco Antônio ao meu marido Jorge e ao professor mestre dos mestres Wilmar Taborda RESUMO O presente estudo aborda o tratamento que a legislação imperial brasileira deu à escravidão negra Trata da escravidão negra no Brasil e da legislação codificada do século XIX Palavraschave escravidão negra legislação imperial legislação codificada do Século XIX SUMÁRIO 1 O tratamento dado à escravidão na legislação imperial 11 Antecedentes da legislação imperial 12 Lei Diogo Feijó de 7 de novembro de 183113 Lei Eusébio Queirós Lei nº 581 de 4 de setembro de 1850 2 A questão da emancipação 21 Leis emancipacionistas 211 A Lei do Ventre Livre Lei nº 2040 de 28 de setembro de 1871 212 A Lei dos Sexagenários de 28 de setembro de 1885 22 As cartas de alforria na prática forense 3 A escravidão negra e a legislação codificada do século XIX 31 A Constituição de 1824 32 O Código Criminal do Império e a Lei nº 4 de 10 de junho de 1835 321 A escravidão e a 1 Artigo extraído do Trabalho de Conclusão do Curso de Direito orientado pela Professora Doutora Maren Guimarães Taborda e apresentado à Banca Examinadora composta pela Professora Mestre Ligia Mori Madeira e pelo Professor Plínio Saraiva Melgaré 2 pena de morte Joaquim Nabuco e a defesa do preto Tomás Conclusão Referências INTRODUÇÃO O estudo buscou subsídios para a constatação de que os textos das leis da época não contemplavam a escravidão e quando a ela se referiam pareciam tratar de leis de exceção que se refletiram nas desigualdades sociais e econômicas que perduram ainda hoje 1 O TRATAMENTO DADO À ESCRAVIDÃO NA LEGISLAÇÃO IMPERIAL 11 Antecedentes da legislação imperial O tratamento legal dado à escravidão remonta ao Direito Romano em Roma a liberdade é a regra a escravidão a exceção Várias eram as causas da escravidão e segundo Moreira Alves podese dividilas em dois grupos as do ius gentium e as do ius civile as primeiras perduraram durante toda a evolução do Direito romano e as outras sofreram modificações As causas do ius gentium eram duas o nascimento e a captura pelo inimigo2 No Brasil a escravidão dos negros se dava pelo tráfico antes de 1831 ou pelo nascimento antes da promulgação da Lei nº 2040 de 28 de setembro de 1871 Conforme ensina Kátia Mattoso a prática jurídica brasileira como a de todas as sociedades de regime escravista manda que o filho da escrava nasça escravo mesmo se o pai é um homem livre Partus sequitur ventrem Prossegue a mesma autora a criança gerada por obra do senhor é livre após a morte de seu pai Mesmo assim é preciso que tenha sido reconhecida 3 Na opinião de Joaquim Nabuco o partus sequitur ventrem máxima do Direito romano é o incentivo à luxúria dos brancos Pouco se importam estes em engrossar o patrimônio dos amigos com filhos seus que jamais reconhecerão4 Em face da escassa legislação relativa a escravos tanto na legislação portuguesa como posteriormente na legislação imperial ao Direito Romano se recorria como subsidiário ao nosso para a resolução de casos que surgiam no foro envolvendo escravidão A legislação civil pela qual o Brasil colonial se regia era 2 ALVES José Carlos Moreira Direito Romano Rio de Janeiro Forense 2002 p 99 v I 3 MATTOSO Kátia Mde Queirós Ser escravo no Brasil 3 ed São Paulo Brasiliense 1990 p 176 4 NABUCO Joaquim A escravidão Rio de Janeiro Nova Fronteira 1999 p 76 3 desordenada sem sistema sem nexo e omissa ou defeituosa em uma infinidade de assuntos da ciência legislativa e por isso convinha indicar as fontes às quais se deveria recorrer enquanto não existisse um Código Civil Trigo de Loureiro indica duas fontes ou seja as fontes com força de lei e as subsidiárias5 Embora a obra de Teixeira de Freitas seja o primeiro Código Civil brasileiro frente à previsão na Constituição de 1824 que dispunha no artigo 179 inciso XVIII que se deveria organizar um Código Civil e Criminal fundado nas sólidas bases de justiça e eqüidade Trigo de Loureiro sistematizou o Direito Civil brasileiro que precedeu à Consolidação das Leis Civis publicada em 1858 Quanto à aplicação do Direito romano como fonte subsidiária de Direito o autor diz que O Direito Romano constitui entre nós a mais copiosa fonte subsidiária da nossa jurisprudência civil já porque as Ordenações Filipinas expressamente o mandão observar em muitos casos já porque a citada Lei de 18 de agosto de 1769 o declarou subsidiário de direito pátrio nos casos omissos nele ou incompletamente providenciados uma vez que na espécie sujeita ele seja conforme a boa razão ou direito natural e não se baseie em motivos supersticiosos e peculiares ao povo romano ou em costumes máximas ou princípios rejeitados pela civilização moderna6 No mesmo sentido Agostinho Marques Perdigão Malheiro Remontemos aos romanos de cujo Direito teremos de socorrer muitas vezes como subsidiário ao nosso mas bem entendido segundo o uso moderno quando conforme a boa razão ao espírito do Direito atual às idéias do século costumes e índole da nação7 Como já referido a codificação civil brasileira somente passou a existir em 1858 com a Consolidação das Leis Civis de Teixeira de Freitas da qual o mérito 5 Entre estas fontes arrola as Ordenações dos Filipes de Espanha datadas de 1603 que D João IV de Portugal revalidou por sua Lei de 29 de janeiro de 1643 Esse corpo de leis condensa quase toda a matéria de Direito Civil no Livro 4 e com as alterações sofridas atravessou o período do Império e chegou à República quando foi revogado pelo Código Civil de 1916 artigo 1807 Acrescentou as Leis Extravagantes Regimentos Decretos Alvarás e Resoluções vigentes até 21 de abril de 1821 data que marca o retorno de D João VI a Portugal e mais os decretos das Cortes Portuguesas especificados e mandados observar pela lei do Brasil independente de 20 de outubro de 1823 Conclui com a legislação promulgada por D Pedro como regente do reino unido a Portugal e após o sete de setembro na condição de imperador Quanto às fontes subsidiárias coletadas Trigo de Loureiro além do Direito Romano registra os assentos da Casa de Suplicação os usos e costumes as opiniões dos Jurisconsultos e os arestos concluído com as leis das nações cultas e civilizadas LOUREIRO Lourenço Trigo de Instituições de Direito Civil brasileiro Brasília Senado Federal Conselho Editorial Superior Tribunal de Justiça 2004 v I p 23 a 26 6 LOUREIRO Lourenço Trigo de Op cit p 27 v I 7 MALHEIRO Agostinho Marques Perdigão A escravidão no Brasil Ensaio histórico jurídico social 3 ed 2 ed integral Petrópolis Vozes Ltda em convênio com o Instituto do Livro 2 v I 149 e respectiva nota nº 818 1866 p 93 4 histórico é realçado pela repulsa ao escravismo manifestada pelo próprio autor nas notas introdutórias desta obra Cumpre advertir que não há um só lugar do nosso texto onde se trate de escravos Temos é verdade a escravidão entre nós mas esse mal é uma excepção que lamentamos condemnado á extinguirse em época mais ou menos remota façamos também uma excepção um capitulo avulso na reforma das nossas Leis Civis não as maculemos com disposições vergonhosas que não podem servir para a posteridade fique o estado de liberdade sem o seu correlativo odioso As Leis concernentes á escravidão que não são muitas serão pois classificadas á parte e formarão nosso Codigo Negro8 O referido Código Negro nunca existiu É sensível a omissão a respeito das disposições concernentes à escravidão no Código Civil de 1858 uma vez que ela deveria abranger por motivos políticos e de ordem pública uma lei especial que nunca foi escrita e que na época era suprida pela transferência da escravidão antiga para a escravidão colonial moderna operação bem adequada à mentalidade de juristas formados na tradição européia de Direito comum Mais do que resolver os casos concretos de delicadas questões que este assunto oferecia na justiça tais regras pareciam legitimar a condição escrava Quanto ao Direito Penal anterior à legislação imperial se faz necessário observar a influência que as leis portuguesas tiveram no Brasil Formalmente a lei penal que deveria ser aplicada no país naquela época era a contida nos 143 títulos do Livro V das Ordenações Filipinas isto se explica porque no momento em que a escravidão estava desaparecendo na Europa Ocidental a descoberta da América revitalizaria a escravidão9 Orientavase no sentido de uma ampla e severa criminalização com drásticas punições Além do predomínio da pena de morte utilizavase outras sanções cruéis como açoites amputação dos membros as galés e o degredo entre outras Não se adotava o princípio da legalidade ficando ao arbítrio do julgador a escolha da sanção aplicável10 8 FREITAS Augusto Teixeira de Consolidação das leis civis Prefácio de Ruy Rosado de Aguiar Brasília Senado Federal Conselho Editorial 2003 p XXXVII Coleção história do direito brasileiro Direito Civil 2 v A transcrição respeita a linguagem da época 9 LOPES José Reinaldo de Lima O direito na história Lições introdutórias São Paulo Max Limonad 2000 p 344 10 BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de Direito Penal parte geral 8 ed São Paulo Saraiva 2003 p 41 v 1 5 O Livro V das Ordenações Filipinas vigora no Brasil até a edição do primeiro Código Criminal em 16 de dezembro de 183011 Apesar da grande influência estrangeira o Código Criminal foi inovador em vários aspectos entre eles a exclusão da pena capital para crimes políticos fixava um esboço de individualização da pena e previa a existência de atenuantes e agravantes estabelecia julgamento especial para menores de quatorze anos e polemizava quanto à pena aplicada aos escravos prevista no artigo 6012 12 Lei Diogo Feijó de 7 de novembro de 1831 A vinda dos negros africanos para o Brasil deuse pelo tráfico até 1850 Em 7 de novembro de 1831 o Brasil promulgou a Lei Diogo Feijó a qual foi um ato de caráter internacional com o objetivo de acabar com o tráfico no continente africano de acordo com os tratados de 19 de fevereiro de 1810 22 de janeiro de 1815 e 28 de julho de 1817 entre as coroas da GrãBretanha e do Brasil para que o Brasil desse à Inglaterra decisivas intenções da fiel observância do último tratado firmado em 1817 Convém reproduzir o artigo 1º da Lei de 7 de novembro de 1831 do seguinte teor Todos os escravos que entrarem no território ou portos do Brasil vindos de fora ficam livres13 Entendese que este artigo extinguiu no Brasil a escravidão por importação todavia a realidade era outra porque aqui chegando os negros eram escravizados A Lei Diogo Feijó que declarou livres todos os escravos vindos de fora do império e impôs penas aos importadores dos mesmos escravos ficou sem execução e aqueles que ela declarou livres continuaram em cativeiro porque a Lei 11 O Código Criminal sofreu influências das idéias européias vigentes na época princípios liberais do Iluminismo e algumas idéias de Bentham autor que não via na crueldade da pena um fim em si mesmo iniciando um progressivo abandono do conceito tradicional que considerava que a pena devia causar muita dor e sofrimento BITENCOURT Cezar Roberto Op cit p 38 As influências legislativas mais importantes foram do Código Francês de 1810 Código Napolitano de 1819 12 Código Criminal artigo 60 verbis Se o réo fôr escravo e incorrer em pena que não seja a capital ou de galés será condemnado na de açoutes e depois de os soffrer será entregue a seu senhor que se obrigará a trazelo com um ferro pelo tempo e maneira que o juiz designar O numero de açoutes será fixado na sentença e o escravo não poderá levar por dia mais de cincoenta BRASIL Código Criminal do Império Lei de 16 de dezembro de 1830 Disponível em httpwww2camaragovbrlegislação publicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 7 out 2006 13 BRASIL Lei Imperial de 7 de novembro de 1831 Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça Rio de Janeiro Livro 1º de Leis fl 98 15111831 Disponível em httpwww2camaragovbr legislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 7 out 2006 6 de 7 de novembro num período de 52 anos após a sua promulgação nunca foi invocada em favor da liberdade14 Segundo Evaristo de Moraes embora houvesse a penalidade e o empenho de autoridades superiores na aplicação da lei ocorreu o que sempre acontece quando o meio social não está preparado mormente quando fortíssimos interesses colidem com o cumprimento de qualquer determinação legal15 O poder do tráfico era irresistível e até 1851 não menos de um milhão de africanos foram lançados em nossas senzalas A cifra de cinqüenta mil por ano não é exagerada16 13 Lei Eusébio de Queirós Tratavase da Lei nº 581 de 4 de setembro de 1850 que estabelecia medidas para a repressão do tráfico de africanos no Império e por influência da Lei Bill Aberdeen decretou no artigo 4º que a importação de escravos no território do Império a partir da vigência daquela lei seria considerada pirataria17 Cabe aqui ressaltar que pela Convenção de 1826 o comércio de africanos devia no fim de três anos ser equiparado à pirataria mas a lei que finalmente os equiparou só foi editada em 4 de setembro de 1850 Segundo Joaquim Nabuco Nessa questão do tráfico bebemos as fezes todas do cálice18 No texto legal havia previsão de serem aplicadas penas inclusive para tentativa de tráfico bem como da cumplicidade Eram considerados cúmplices segundo o artigo 3º parte final da Lei nº 581 a equipagem e os que atuassem como coadjuvantes no desembarque de escravos no território brasileiro ou aqueles que concorressem para ocultar os autores do fato da autoridade bem como quem 14 Lei de 7 de novembro de 1831 artigo 2º verbis Cominava aos importadores de escravos a pena corporal do artigo 179 do Código Criminal referente a reduzir à escravidão pessoa livre e mais a multa de 200 mil réis por cabeça de escravo importado além do pagamento de despesas com reexportação para qualquer parte da África Os infratores responderão cada um por si e por todos MORAES Evaristo de A escravidão africana no Brasil das origens à extinção São Paulo Companhia Editora Nacional 1933 p 52 15 MORAES Evaristo Op cit p 52 16 NABUCO Joaquim O abolicionismo Publicações LCC eletrônicas Disponível em httpwwwbibvirfuturouspbrtextosautoresjoaquimnabucoabolicionismotextohtml Acesso em 6 out 2006a 17 BRASIL Lei nº 581 de 4 de setembro de 1850 Coleção das Leis do Império do Brasil Lei Eusébio de Queirós Chancelaria do Império Rio de Janeiro 5 set 1850 Disponível em httpwww2camaragovbrlegislaçãopublicações doimperiocoleção3html Acesso em 7 out 2006 18 NABUCO Joaquim Op cit onlinea 7 impedisse que os autores do tráfico fossem presos no mar ou em ato de desembarque em momento de perseguição O artigo terceiro desta lei dá ainda a definição de quem são aos autores do crime de importação ou de tentativa de importação São autores do crime de importação ou de tentativa de importação o dono o capitão ou mestre o piloto e o contramestre da embarcação e o sobrecarga Mais uma vez a tentativa de extinguir o tráfico por meio de lei não deu certo porque até 1854 as atividades de importação de negros continuaram Em Porto de Galinhas Pernambuco a lei era facilmente burlada porque a carga de escravos chegava da África sob a denominação de Carga de galinhas de Angola e a partir dali era distribuída Mudavase o nome para a prática costumeira tráfico Segundo Lenine Nequete em 1871 foi levantada por parte do Judiciário a dúvida de que com a promulgação da Lei Eusébio de Queirós estaria prescrita a Lei de 1831 por falta de aplicação desta lei por mais de meio século tratandose de centenas de milhares de pessoas a quem devia ter sido aplicada e por desuso não foi O entendimento do Judiciário se dividia não se chegando a um consenso naquela época O entendimento de uns era o de que a Lei de 7 de novembro de 1831 nunca esteve em esquecimento porque se em 1871 alguém importasse escravos deveria ser punido não pela Lei de 4 de setembro de 1850 mas pela Lei de 1831 uma vez que o vigor desta Lei tanto na parte criminal como na civil ainda era manifesto por não haver outra depois dela com as espécies ali definidas Outros no entanto consideravam a Lei de 1831 caduca por sua nãoexecução e desuso e ainda inexeqüível pela dificuldade de provas19 O que se constata pela Lei de 4 de setembro de 1850 nos artigos 1º 4º e 9º é que esta lei suscitou a observância da Lei de 1831 reconhecendoa em vigor completandoa com o disposto nos seus artigos 1º 2º e 3º o que leva à conclusão de que o argumento do desuso é infundado A Lei Eusébio de Queirós não faz nenhuma referência aos escravos importados desde a data da Lei de 1831 talvez porque depois de 1831 não devessem existir mais escravos A Lei de 1850 invocou a de 1831 uma vez que subsistia na de 1850 a razão de ser daquela outra que era a proibição do tráfico a punição do traficante e a conseqüente libertação do africano objeto do tráfico isto é 19 NEQUETE Lenine Escravos e magistrados no 2º Reinado aplicação da Lei nº 2040 de 2891871 Brasília Fundação Petrônio Portela 1988 p 187 8 a destruição da mercadoria do contrabando A importação não havia cessado em 1850 e por isso a Lei Eusébio de Queirós tomou providências mais enérgicas contra a repressão do tráfico 2 A QUESTÃO DA EMANCIPAÇÃO 21 Leis emancipacionistas 211 A Lei do Ventre Livre Lei nº 2040 de 28 de setembro de 1871 Lenine Nequete diferencia a Lei nº 2040 promulgada em 28 de setembro de 1871 das anteriores editadas em 1831 e 1850 dizendo que aquela foi a primeira que direta e exclusivamente tratou da emancipação dos escravos no Brasil enquanto estas foram somente leis de repressão20 Ainda segundo Lenine Nequete a Lei do Ventre Livre foi uma brilhante conquista jurídica porque não legislou notese bem para escravos realmente existentes na realidade extrauterina nem mesmo na realidade intrauterina sim para escravos mentalmente existentes escravos do futuro e no presente representáveis pelo ventre vácuo da mulher escrava isto é pelo ventre materno em possível produção de filhos produção incerta em função da esterilidade também possível da mulher21 Neste ponto o autor esclarece que em Direito romano libertar escravos nascidos é manumissão manumissio denominada no Direito brasileiro como alforria cujo sentido é de libertar escravos ainda não nascidos mas concebidos no ventre da mulher Libertar porém escravos nem nascidos nem ainda concebidos no ventre materno que ato será que nome deve ter Libertação do ventre é o nome deste ato novo dessa delicada criação jurídica que não sabemos por quem foi pela primeira vez escrito ou pronunciado Esta riqueza é nossa é do Século XIX é da história das Colônias Americanas mas seu germe sem dúvida herdamolo do Direito Romano que tomando a parte pelo todo designa a mulher grávida pelo seu ventre pleno e a curadoria do póstumo por curadoria do ventre22 20 NEQUETE Lenine Op cit p 187 21 Idem ibidem p 126 22 Idem p 128 9 A beleza do texto de Lenine Nequete repousa no sentido de que se via uma mulher livre no seu ventre livre uma mulher escrava no seu ventre escravo até que com a promulgação da Lei do Ventre Livre se passaria a conceber um futuro ventre livre de mulher escrava Como naturalmente conceberse sem a mulher inteira o ventre da mulher Como suporse na parte de um todo indivisível uma qualidade que o todo não tem E ao fazer essas indagações o autor refletia O Direito brasileiro realizou a divisibilidade local por suas leis da libertação do ventre nada menos do que a mulher livre no ventre escrava no resto de seu corpo Bem se vê que as leis podem mais que a natureza que o mundo das leis é mais opulento que o da natureza23 O artigo 1º da referida lei dispõe que os filhos da mulher escrava que nascerem no Império desde a data desta lei serão considerados de condição livre24 Desta lei presumese que a escravidão tem por limite a vida do escravo nascido na véspera da lei No entanto a aplicação da Lei do Ventre Livre tornou evidente também que entre a lei e a prática da lei havia uma boa diferença Na prática o ingênuo nascido liberto pela Lei devia permanecer sob a tutela do senhor de sua mãe até a idade de oito anos completos Chegando a criança a esta idade o proprietário de sua mãe teria a opção de receber do Estado a indenização de 600000 réis ou de utilizarse dos serviços do menor até a idade de vinte e um anos completos No primeiro caso o menor ficaria sob a tutela do Estado mas a grande maioria dos senhores das mães dos ingênuos optou pela utilização dos serviços deles Já que os haviam criado até os oito anos idade a partir da qual começavam a ser realmente úteis era natural que quisessem conserválos e usufruir de seus serviços até que completassem vinte e um anos Misturandose com a senzala no diaadia os ingênuos não eram diferenciados dos escravos e recebiam o mesmo tratamento que estes tendo sido muito freqüentes as suas queixas ou de seus familiares pelos castigos e maustratos que lhes eram indevidamente aplicados Ainda que o artigo 18 do Regulamento de 13 de novembro de 1872 desse aos responsáveis pelos ingênuos o direito de infligirlhes castigos corporais desde que 23 NEQUETE Lenine Op cit p 128 24 Idem ibidem p 128 Esta lei está salva frutificou entre nós por aplicação nova porque se nascem escravos os filhos de escravas com ventre escravo nascem livres os filhos de escravas com ventre livre Esta regra também está salva porque se o parto é escravo seguindo o ventre materno o parto é livre seguindo o ventre livre 10 não fossem excessivos foram muitos os casos de abuso desse direito25 Serve de exemplo de tais abusos o caso registrado pelo jornal Dezenove de Dezembro de Curitiba em 1º de junho de 1881 em Guarapuava Domingos Mendes Machado infligiu excessivos castigos ao ingênuo Lucrécio filho de sua escrava de nome Benedita Procedidas as devidas diligências foram os autos encaminhados à autoridade competente26 Os emancipacionistas viam na Lei o procedimento correto e adequado a uma política abolicionista legalizada gradual e eficiente para gerar tranqüilidade nas senzalas acalmar os abolicionistas e manter os direitos dos senhores no tocante ao acesso à indenização No entanto conforme a historiografia vem demonstrando a chamada Lei do Ventre Livre trouxe no seu bojo muito mais que um simples sancionamento legal em relação à libertação do escravo Em torno dela foi edificada uma estratégia política de avanço e recuo em relação aos objetivos históricos que a referida legislação pretendia alcançar27 212 A Lei dos Sexagenários Lei nº 3270 de 28 de setembro de 1885 Segundo Joseli Mendonça a Lei nº 3270 de 28 de setembro de 1885 inserida em um conjunto jurídico que buscava orientar o processo de abolição não tinha como objetivo único encaminhar a extinção da escravidão Ao contrário essa lei de forma bastante marcante procurava também delimitar e compor as relações sociais na sociedade livre e por certo qualquer projeto de abolição não poderia naquele momento deixar de colocar em evidência tantas questões relativas à liberdade e à organização do trabalho livre Dessa forma parte significativa e 25 Em linguagem da época Art 18 Cessa a prestação dos serviços dos filhos das escravas antes de atingirem elles a idade de 21 annos se por sentença do juízo criminal reconhecerse que os senhores das mãis os maltratam inflingindolhes castigos excessivos Lei art 1º 6º BRASIL Decreto nº 5135 de 13 de novembro de 1872 Approva o regulamento geral para a execução da Lei nº 2040 de 28 de setembro de 1871 In Coleção das Leis do Império do Brasil Disponível em httpwww2camaragovbrlegislação publicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 1 mar 2007 26 GRAF Márcia Elisa de Campos Cidade cidadania e exclusão a lei e a prática Disponível em http httpwwwutpbrproppeX20seminariopesquisaArtigos20completosFCHLACIDADE 20CIDADANIA20E20EXCLUSC3O20A20LEI20E20A20PRC1TICAdoc Acesso em 7 fev 2007 27 PAPALI Maria Aparecida C R A legislação de 1871 o Judiciário e a tutela de ingênuos na cidade de Taubaté Disponível em httpwwwtjrsgovbrinstitumemorialRevistaJHvol2n309Papalipdf Acesso em 13 abr 2007 11 fundamental da lei de 1885 esteve relacionada às relações entre libertos e ex senhores28 Na Câmara por ocasião dos Projetos Dantas e Saraiva os deputados debatiam a respeito da necessidade de proteção de que necessitaria o escravo liberto principalmente no que se referisse à liberdade dos escravos sexagenários uma vez que se tratava de velhos escravos que além dos defeitos que a escravidão lhes imprimira teriam pelos limites da idade muito mais dificuldades para suprir sua sobrevivência Dizia um dos debatedores que o negro velho liberto com a liberdade abandonaria de forma imediata a casa de seu exsenhor e se lançaria na mendicidade para gozar esta liberdade na vagabundagem em decorrência de não ter noções de justiça não ter conhecimento do mundo ser ignorante e incapaz de resistir a vícios além de tornarse um produto da imprevidência dos legisladores por isso considerava mais humanitário deixar os velhos escravos nas fazendas Um outro deputado nessa mesma discussão dizia não entender que tipo de felicidade a liberdade traria aos escravos sexagenários se esta liberdade seria vivida na ociosidade e na mendicância Os opositores ao projeto Dantas invocavam o argumento de que a liberdade seria um mal aos libertos velhos os quais estariam condenados a morrer nas estradas à míngua porque a liberdade para quem não pudesse gozar dela era um presente cruel Neste ponto há de ser considerado que a liberdade como sinônimo de desproteção não estava restrita somente aos sexagenários embora em relação a eles a questão fosse mais preocupante Se o liberto precisava de proteção e neste ponto surge uma questão fundamental no que se refere ao encaminhamento do processo de abolição havia de ser definido o âmbito no qual essa proteção seria exercida A incapacidade do Estado para viabilizar qualquer medida nesse sentido era um argumento ao qual se recorria porque bastava analisar e trazer para o debate o destino que tiveram os filhos de escravos libertos pela lei de 1871 Os ingênuos que não estavam no domínio dos senhores de suas mães porque foram vendidos ou porque as mães faleceram fazendo com que os senhores se desfizessem dos filhos por abandono ou por venda quanto a estes o Estado não dispunha de meios de darlhes proteção por não ter estabelecimentos que pudessem receber os menores Nesse 28 MENDONÇA Joseli M N Entre a mão e os anéis a Lei dos Sexagenários e os caminhos da abolição no Brasil Campinas Unicamp Centro de Pesquisa em História Social e Cultura 1999 p 45 12 sentido a incapacidade do Estado para prover proteção era um forte argumento quando se colocava em questão a liberdade dos sexagenários porque sem o amparo de seus senhores e sem o amparo do Estado os sexagenários transformados em libertos seriam deixados à própria sorte Sobre a questão da proteção Joseli Mendonça diz que a relação de dependência era parte daquele mundo de senhores e escravos de exsenhores e libertos os quais eram livres do ponto de vista jurídico mas que mantinham com os exsenhores relação de dependência favorecimento e gratidão e não cortar estes laços de dependência que por tanto tempo a escravidão mantinha significava para os senhores manter sua dignidade senhorial29 Derrotado Dantas seu projeto de reforma da questão servil foi substituído pelo Projeto Saraiva Este projeto foi aprovado Encaminhado ao Senado em nada foi modificado e sob a liderança de um político conservador o Barão de Cotegipe o projeto do elemento servil transformouse na Lei nº 3270 de 28 de setembro de 1885 sancionada por D Pedro II p 3536 apelidada Lei dos Sexagenários mas também denominada Lei SaraivaCotegipe que alforriava os escravos idosos mas estipulava aos libertandos a obrigatoriedade da prestação de serviços pelo espaço de três anos ou até os 65 anos30 Essa lei foi geralmente negligenciada pela historiografia que se ocupou muito mais da abordagem da lei de 1871 e da própria lei de 1888 Segundo Joseli Mendonça o período de prestação de serviços pelos escravos sexagenários foi um mecanismo que tornou possível manter uma relação de domínio para além dos limites da liberdade e dessa forma tratando de liberdade a lei de 1885 tratou sempre de escravidão Conforme a mesma autora ainda que a liberdade pudesse trazer aos escravos a igualdade jurídica havia de se assegurar que desigualdades fossem mantidas31 Burlar a lei era uma possibilidade que existia para os senhores e esta entre outras considerações decorre dos fatos narrados em relação à Lei dos Sexagenários A primeira delas é que a liberdade para um sexagenário não era favorecimento algum já que este escravo velho não teria vantagem em ser livre com 29 MENDONÇA Joseli M N Op cit p 80 30 BRASIL Lei Imperial n 3270 de 28 de setembro de 1885 Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura Comércio e Obras Públicas Rio de Janeiro 1º out 1885 Disponível em httpwww2camaragovbrlegislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 7 out 2006 31 Nesse sentido a lei de 1885 tentou prover os senhores de mecanismos que tornassem possível uma relação de domínio para além dos limites da liberdade MENDONÇA Joseli M N Op cit p 118 13 tal idade Uma segunda consideração diz respeito ao favorecimento dos senhores do ônus de manterem escravos improdutivos nos seus domínios os quais poderiam ser abandonados em nome da liberdade que a lei lhes garantia Constatase que perder escravos velhos ou moços por determinação da lei não era das coisas mais agradáveis para o senhor e este por meio de dispositivos jurídicos procurava manter escravos no seu domínio e quando este domínio tivesse de ser rompido por determinação da lei e não pela sua vontade a indenização era um elemento do qual não estava disposto a abrir mão32 211 As cartas de alforria na prática forense As ações de liberdade envolviam procedimentos jurídicos utilizados para a requisição da emancipação de algum cativo perante o Judiciário brasileiro da época Os atos do processo de liberdade abarcavam grandes complexidades e sutilezas Os aplicadores do Direito viamse diante da difícil tarefa de equilibrarse entre de um lado o reconhecimento das negociações entre escravos e senhores e de outro a preservação do Direito patrimonial Na dúvida sobre a interpretação das leis os juízes da época poderiam recorrer ao Conselho de Estado que com base em suas atribuições respondia às questões levantadas o que garantia a aplicação uniforme das leis e sua interpretação limitando se como se acreditava os poderes do juiz a simplesmente declarar a lei aplicável ao caso concreto sem inovar nem criar A dúvida chegava ao Conselho em forma de Consulta e a resposta tomava a forma de um Aviso33 Um fato concreto que suscitava dúvida e ao qual se recorria ao Conselho é fornecido pela própria Constituição que garantia a propriedade em toda sua 32 MENDONÇA Joseli M N Op cit p 201206 33 Segundo Reinaldo Lopes o Conselho de Estado era uma instituição característica da monarquia oitocentista No Brasil houve três Conselhos dos quais o terceiro atuou durante o segundo Império O Conselho era ouvido em questões que dissessem respeito ao Poder Moderador e pronunciavase em conflitos de jurisdição entre as autoridades administrativas e entre estas e as judiciárias sobre decretos regulamentos e instruções para a boa execução das leis Opinava ainda sobre propostas que o poder executivo enviasse à Assembléia Geral e sobre abusos das autoridades aclesiásticas LOPES José Reinaldo de Lima Op cit p 322325 14 plenitude no artigo 179 inciso XX34 Este dispositivo constitucional indica a dificuldade da tarefa dos magistrados ao enfrentarem no cotidiano da Justiça pleitos cada vez mais diversos e imprevistos Em várias ocasiões o aplicador do Direito precisava refletir detidamente sobre a solução a ser empregada para que a vontade senhorial e o princípio da propriedade privada não fossem maculados35 Quanto às cartas de liberdade estas carregavam consigo vários sentidos além da outorga da liberdade a um escravo e muitas vezes tal concessão transformavase em uma espécie de compromisso tácito de lealdade entre o senhor e seu escravo A efetividade desse mecanismo exigia o cumprimento dos atos pactuados Cabia então ao sistema judiciário não apenas os reconhecer como também e principalmente legitimar e proteger esses atos no caso de serem desrespeitados por alguma parte ilegítima interessada em violar a vontade senhorial A intervenção da Justiça somente se justificava em caso de impasse As ações de liberdade impetradas após a vigência da Lei do Ventre Livre pertencem a uma época de crescente agitação abolicionista e de leis e de decisões judiciárias indicativas da necessidade de reformas no sistema Movidos pelo desejo e muitas vezes pela necessidade de criar uma situação mais justa os cativos exploravam o espaço institucional disponível na busca de alternativas inexistentes na relação pessoal com seu proprietário Os escravos para arrancar do senhor alguma vantagem recorriam à submissão e à subserviência como estratégias e quando tais alternativas não alcançavam êxito o Judiciário convertiase numa instância de enfrentamento e desgaste da vontade senhorial 34 É garantido o Direito de Propriedade em toda a sua plenitude Se o bem público legalmente verificado exigir o uso e emprego da Propriedade do cidadão será ele previamente indenizado do valor dela A Lei marcará os casos em que terá lugar esta única exceção e dará as regras para se determinar a indenização BRASIL Constituição Política do Império do Brasil de 25 de março de 1824 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03ConstituicaoContituiC3A7ao24htm Acesso em 11 out 2006 35 Na Comarca de Vitória ES Venâncio Gomes Loureiro por exemplo quis beneficiar com a liberdade seu afilhado Sebastião filho de Efigênia escrava do finado Francisco Pinto Ribeiro O padrinho do escravo não obtendo o consentimento do tutor e curador geral dos órfãos requereu em juízo o arbitramento do valor para depósito O Juiz encarregado avaliou o ingênuo em cinqüenta mil réis e Venâncio juntou ao processo um talão de depósito da quantia ajuizada Em 1851 a sentença foi favorável ao pleito Julgo por liberto ao menor Sebastião filho de Efigênia escrava dos órfãos filhos do finado Francisco Pinto Ribeiro CAMPOS Adriana Pereira Escravidão e liberdade nas barras dos tribunais Disponível em http7214205104searchqcacheJk8CixqeXtcJwwwhistoricaarquivo estadospgovbrmateriasanterioresedicao09materia03texto03pdfescravosC3B3rfC3A3os hlptBRctclnkcd26glbr Acesso em 10 mar 2007 15 De modo geral os escravos tentavam estabelecer previamente um ajuste consensual pela alforria Apenas ocasionalmente quando de um impasse requisitavase a intervenção do juízo da localidade 3 A ESCRAVIDÃO NEGRA E A LEGISLAÇÃO CODIFICADA DO SÉCULO XIX 31 A Constituição de 1824 A Constituição de 1824 consagrou a declaração dos direitos individuais no seu ordenamento inspirandose no exemplo francês e separando os direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros no artigo 179 Mencionou o cidadão ativo titular de direitos políticos artigos 90 e 91 mas os direitos de igualdade e de liberdade ficaram prejudicados na prática uma vez que no contexto social prevalecia uma discriminação quase generalizada de direitos A Constituição de 1824 a qual dita liberal em seu Título 2º artigo 6º referente aos cidadãos brasileiros no parágrafo I diz São cidadãos brasileiros os que no Brasil tiverem nascido quer sejam ingênuos ou libertos ainda que o pai seja estrangeiro uma vez que este não resida por serviço de sua Nação Entretanto a Lei Costumeira a que realmente vigorava revelava uma outra realidade aquela em que o ingênuo e o liberto estavam longe de poder fazer valer a sua cidadania o que explica os muitos estratagemas utilizados por uns e por outros para tornar suas existências possíveis na sociedade em que viviam As contradições começam na própria Constituição Logo no Título 4º Capítulo VI das Eleições o artigo 94 refere Podem ser Eleitores e votar na eleição dos Deputados Senadores e Membros dos Conselhos de Província todos os que podem votar na Assembléia Parochial Exceptuamse I Os que não tiverem de renda liquida annual duzentos mil réis por bens de raiz industria commercio ou emprego II Os Libertos 36 36 BRASIL Constituição Política do Império do Brasil de 25 de março de 1824 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03ConstituicaoContituiC3A7ao24htm Acesso em 11 out 2006 16 Os ingênuos assim como os escravos libertos estavam enquadrados em categorias jurídicas específicas que não lhes davam acesso a direitos iguais aos das pessoas nascidas livres37 A Constituição de 1824 no Título 8º que trata das disposições gerais das garantias dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros sem mencionar as palavras escravo ou escravidão no artigo 179 refere A inviolabilidade dos Direitos Civis e Politicos dos Cidadãos Brazileiros que tem por base a liberdade a segurança individual e a propriedade é garantida pela Constituição do Imperio pela maneira seguinte XIX Desde já ficam abolidos os açoites a tortura a marca de ferro quente e todas as mais penas cruéis38 Segundo Reinaldo Lopes diziase que os senhores de escravos eram legítimos proprietários e que a abolição significava simplesmente desapropriar sem indenizar o que era inconstitucional39 Ainda segundo o mesmo autor este era um argumento de caráter jurídico bem localizado no artigo 179 parágrafo XX da Constituição do Império que garantia o direito de propriedade que serviu tanto para os abolicionistas quanto para antiabolicionistas No Titulo 8º Das disposições gerais e das garantias dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros em linha evidentemente liberal se constata Art 179 A inviolabilidade dos Direitos Civis e Politicos dos Cidadãos Brazileiros que tem por base a liberdade a segurança individual e a propriedade é garantida pela Constituição do Imperio pela maneira seguinte XXII É garantido o Direito de Propriedade em toda a sua plenitude Se o bem publico legalmente verificado exigir o uso e emprego da propriedade do Cidadão será elle préviamente indemnisado do valor della A Lei marcará os casos em que terá logar esta unica excepção e dará as regras para se determinar a indemnisação grifouse A concepção da propriedade contida no texto da Carta Imperial no artigo acima referido também pode ser relacionada à indenização mencionada nos textos das leis do Império conforme visto na Lei dos Sexagenários por exemplo por isso 37 Ingênuos eram os filhos de mulher escrava libertados ao nascer ou na pia batismal A prática da libertação do nascituro já era antiga e havia sido incorporada ao costume sobretudo para resolver muitos casos de filhos bastardos fruto das relações entre os proprietários ou os filhos destes e suas escravas GRAF Márcia Elisa de Campos Op cit online 38 Tendo em vista enfocar o caráter histórico deste trabalho optouse por manter a ortografia da época na transcrição textual do artigo da Constituição 39 LOPES José Reinaldo de Lima Op cit p 345 17 as defesas que se faziam nos recintos parlamentares em torno das indenizações podem ser ligadas à tentativa de manutenção do domínio senhorial ou seja ao aludirem à necessidade de que todo e qualquer senhor devesse ser indenizado por todo e qualquer escravo alforriado os parlamentares estavam tentando preservar as condições de legitimidade do exercício do domínio senhorial prevista no artigo constitucional acima reproduzido a ponto de que fosse possível a continuidade das relações de escravidão Na escravidão o poder senhorial era absoluto e a intervenção da lei no direito de propriedade como aconteceu nas leis de 1871 e 1885 tendia a provocar desgastes e fissuras na base do sistema40 32 O Código Criminal do Império e a Lei nº 4 de 10 de junho de 1835 Em 1830 já com previsão constitucional foi editado o Código Criminal do Império que de certa forma não foi pensado em relação aos preceitos constitucionais uma vez que o artigo 14 estabelece Será o crime justificável e não terá punição dele 6º Quando o mal consistir em castigo moderado que os pais derem a seus filhos os senhores a seus escravos e os mestres a seus discípulos ou desses castigos resultar uma vez que a qualidade dele não seja contrária às leis em vigor grifouse Ao longo da história foram denunciadas diferentes modalidades de violência a que eram submetidos os negros durante a escravidão as quais foram denunciadas pelos abolicionistas em larga escala na época em que as mesmas ocorriam e pelos registros históricos que chegaram até os dias atuais Quando o artigo referido menciona como requisito para crime justificável castigo moderado entendese que todos os castigos eram moderados e portanto todos os crimes justificáveis o que fez com que a lei não correspondesse à realidade para a qual foi criada e a prática tornou o senhor soberano uma vez que a justiça certamente não penetrava nas propriedades para que os escravos pudessem queixarse de castigos imoderados e era inútil a queixa de um escravo à autoridade porque o escravo para queixarse do senhor precisa a mesma força de 40 MENDONÇA Joseli Op cit p 137147 18 vontade e resolução que para fugir ou suicidarse sobretudo se ele deixa algum refém no cativeiro41 Como se percebe a violência estava institucionalizada porque a tortura pública não era impedida mas aplicada em nome da lei O castigo público não excluía outras penas tais como o calabouço a palmatória o ferro para marcar as correntes entre outros Com a publicação da Lei nº 4 de 10 de junho de 1835 passou a vigorar no ordenamento jurídico brasileiro a pena de morte para crimes violentos de escravos contra seus senhores conforme se constata no artigo 1º Serão punidos com a pena de morte os escravos ou escravas que matarem por qualquer maneira que seja propinarem veneno ferirem gravemente ou fizerem outra qualquer grave ofensa física a seu senhor a sua mulher a descendentes ou ascendentes que em sua companhia morarem a administrador feitor e às suas mulheres que com eles viverem Se o ferimento ou ofensa física forem leves a pena será de açoites a proporção das circunstâncias mais ou menos agravantes42 No Conselho de Estado foi proposta a revogação do artigo 60 do Código Criminal que criou a pena de açoites e a Lei de 10 de junho Sustentando uma e outra abolição iniciada pela Comissão da qual era relator o Conselheiro Nabuco fez algumas considerações assim resumidas na ata da sessão de 30 de abril de 1868 O conselheiro Nabuco sustenta a necessidade da abolição da lei excepcional de 10 de junho de 1835 Que ela tem sido ineficaz está provado pela estatística criminal os crimes que ela previne têm aumentado É uma lei injusta porque destrói todas as regras de imputação criminal toda a proporção das penas porquanto os fatos graves e menos graves são confundidos e não se consideram circunstâncias atenuantes e agravantes como se os escravos não fossem homens não tivessem paixões e o instinto de conservação Que a pena de morte e sempre a morte não é uma pena exemplar para o escravo que só vê nela a cessação dos males da escravidão Que o suicídio freqüente entre os escravos e a facilidade com que confessam os crimes e se entregam depois de cometêlos provam bem que eles não temem a morte43 Por esta afirmação pressupõese que o pensamento abolicionista da época mostrava a escravidão como ela era e para a qual o suicídio ou a morte pareciam 41 NABUCO Joaquim Op cit onlinea 42 BRASIL Lei Imperial nº 4 de 10 de junho de 1835 Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça Rio de Janeiro Livro 1º de Leis fl 142v 1561835 Disponível em httpwww2camaragovbr legislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 7 out 2006 43 NABUCO Joaquim Op cit onlinea 19 para o escravo a cessação dos males decorrentes do cativeiro e um incentivo para o crime Joaquim Nabuco posicionouse a respeito da pena de açoites da seguinte forma É um castigo que não corrige mas desmoraliza É além disso uma pena que não mantém o princípio da proporção das penas sendo que o mesmo número de açoites substitui a prisão perpétua a prisão por 30 20 e 10 anos As forças do escravo é que regulam o máximo de açoites e pois o máximo vem a ser o mesmo para os casos graves e os mais graves Que a execução dessa pena dá lugar a muitos abusos sendo que em muitos casos é iludida em outros tem causado a morte44 A pena de açoites vigorou até 22 antes da abolição da escravatura mesmo que juridicamente não pudesse ser aplicada na lei penal brasileira uma vez que a Constituição de 1824 no artigo 179 inciso XIX aboliu esta pena por considerála cruel 321 A escravidão e a pena de morte Joaquim Nabuco e a defesa do Preto Tomás No aspecto legal Joaquim Nabuco considerava a escravidão como um crime contra a humanidade sendo ilegal perante até o direito de propriedade e que a legislação criando dois tipos de sanção em relação ao senhor e em relação ao escravo acirrou o conflito entre as duas ordens sociais45 Para lutar corpoacorpo com a escravidão e a pena de morte um dia o jovem acadêmico apresentouse para defender perante o Júri de Recife um escravo assassino Tratavase de um réu confesso e seu crime tinha todas as agravantes o preto Tomás para vingarse de ter sido açoitado na praça pública havia 44 NABUCO Joaquim Op cit onlinea 45 Joaquim Nabuco começou seus estudos de Direito em 1866 iniciandoos na Faculdade de Direito de São Paulo mas terminandoos na de Recife São Paulo e Recife eram as duas únicas academias de Direito no Brasil Em 1869 Nabuco voltou ao Recife para cursar o quarto ano acadêmico Desde moço o jovem estudante revelou posição marcantemente abolicionista época em que escreveu A Escravidão livro que nunca chegou a ser publicado nem terminado porque faltou escreverlhe o último capítulo O próprio Joaquim Nabuco na maturidade escreveu a cerca de sua obra No meu 5º ano no Recife levei a preparar um livro que ainda guardo uma espécie de Perdigão Malheiro inédito sobre a escravidão entre nós NABUCO Joaquim Minha formação Disponível em bibliocombrconteudoJoaquimNabucominhaformaE7E3ohtm Acesso em 11 mar 2007 20 assassinado o seu ofensor premeditadamente com um tiro à queimaroupa Mais tarde conseguiu fugir da cadeia matando um guarda Depois cercado pela polícia em um quarteirão central de Recife defendeuse de seus captores por mais de 24 horas homiziandose nas casas e subindo nos telhados deixando a população sobressaltada com os disparos que fazia contra os que tentavam capturálo A cidade conta Carolina Nabuco46 não dormiu enquanto não teve notícia de sua prisão Não era mais um homem era um tigre reconheceu Joaquim Nabuco47 Ao abordar o caso do Preto Tomás réu de morte defendido por ele no júri do Recife embora não quisesse fazer um paralelo entre a escravidão e a pena de morte com este fato verídico Joaquim Nabuco protesta ao mesmo tempo contra a escravidão e contra a morte O preto Tomás foi condenado a galés perpétuas posteriormente em Olinda foilhe confirmada a pena de morte Joaquim Nabuco foi o advogado do negro Tomás e o caso foi relatado pelo próprio defensor do caso no livro A escravidão48 Joaquim Nabuco se indagava qual a razão de ser da pena de açoites uma vez que o legislador ao limitar os açoites a cinqüenta por dia não tinha a intenção de que esta pena atentasse contra a vida do escravo Quem se degrada na praça pública o que açoita ou o que é açoitado Não é este Profundamente aviltante esse castigo só serve para destruir o resto de pudor que uma natureza escrava possa ter e quando esse pudor não se gasta redobra tornase em uma paixão em um desejo insaciável de vingança e ainda assim principalmente a lei não alcança seu fim49 Depreendese do relato do caso que Tomás foi preso com muita dificuldade uma vez que era homem muito forte O Tribunal de Olinda anteriormente já havia condenado o escravo à morte A defesa de Joaquim Nabuco em Recife seria uma das mais difíceis já que praticamente o réu estava condenado à morte antes mesmo desse julgamento e o Imperador devido ao Poder Moderador estava acostumado a comutar a pena capital em prisão perpétua no entanto abstinhase nesses casos ou 46 NABUCO Joaquim O réu escravo Ordem dos Advogados do Brasil Secção São Paulo Série Grandes Causas Disponível em httpwwwoabsporgbrinstitucionalgrandescausasoreuescravo Acesso em 1º mar 2007 47 NABUCO Joaquim Op cit 1999 p 42 48 Idem ibidem p 4146 49 Idem ibidem p 40 21 seja quando o escravo matava o feitor ou o senhor Os fazendeiros reunidos exigiam castigo exemplar ao escravo Tomás no Tribunal do Júri50 Na origem desse processo havia dois crimes sociais a escravidão e a pena de morte Fora a escravidão que levara Tomás a praticar o primeiro crime e a pena de morte que o levara a perpetrar o segundo Referiu Nabuco Obrigado pela lei natural a conservar uma vida que não era da sociedade mas de Deus tentara evadirse quando o quiseram prender de novo para o cadafalso foi então o seu segundo crime ou por medo invencível ou por vindita atroz aniquilou ele um homem que o agarrara pelas costas para sujeitálo à pena da lei e isso quando ele estava a entrar no gozo da liberdade pela fuga51 Diante dos jurados Joaquim Nabuco exclamou Não cometeu um crime removeu um obstáculo frase que provocou grande vibração na assistência demonstrando ser conhecedor da arte da oratória que dominava bem com grande mestria52 O réu foi condenado a galés perpétuas que era o menor castigo que se poderia esperar para o caso e o discurso de Nabuco foi incluído no rol dos acontecimentos que passariam para a História Em 28 de novembro de 1870 Nabuco recebeu o grau de bacharel em Ciências Sociais e Jurídicas A título de curiosidade o escravo Tomás durante suas peripécias de fuga dados os adjetivos que a população utilizava em relação a ele tais como notório facínora tão revoltante acusado permitem que se faça um breve questionamento a respeito do dano mais especificamente quanto à reparação do dano cometido por escravo crime cuja reparação estava prevista no Código Criminal grifou se No capítulo IV o artigo 21 do Código Criminal dispõe quanto à satisfação do dano verbis O delinqüente satisfará o damno que causar com o delicto E quanto a escravos estava expressamente previsto no referido Código no artigo 28 50 Por esta afirmação entendese que o escravo Tomás era visto como um problema de segurança pública e também se percebe o envolvimento das elites locais com o crime e a criminalidade e que a violência e a tortura são os meios mais aprovados para serem utilizados pelo Estado na manutenção da ordem social e política Transportados para a nossa época percebese que hoje ainda esta questão é atual quando se pensa em afirmação do Estado de Direito respeito aos direitos humanos e consolidação da cidadania no país KOERNER Andrei Org História da Justiça Penal no Brasil pesquisas e análises São Paulo IBCCRIM 2006 p 137149 51 NABUCO Joaquim Op cit 1999 p 43 52 Idem ibidem p 43 22 parágrafo 1º verbis Serão obrigados á satisfação posto que não sejam delinqüentes 1º O senhor pelo escravo até o valor deste Fica bastante claro nos citados artigos que quem causa prejuízo a outrem fica obrigado a reparar o dano Este é um princípio que evoluiu no tempo e está consagrado nos dias atuais mas que não teve origem no Código Criminal do Império As Ordenações Filipinas Livro V Título 86 parágrafo 5º53 já impunha ao senhor a obrigação de pagar o dano ou de dar o escravo e pelo preço da venda ser pago o dano Na Consolidação das Leis Civis de Teixeira de Freitas54 no Código Civil de 191655 este príncípio também foi incorporado bem como está presente no Código Civil de 200256 A elaboração deste princípio foi feita com base nas disposições da Lex Aquilia lei que vigorou provavelmente no século III aC e dispunha no primeiro capítulo que quien matase injustamente a un esclavo ajeno una esclava ajena o ganado cuadrúpedo será condenado a pagar al propietario tanto dinero cuanto fuera su valor máximo en ese año57 Originariamente a sanção da Lex Aquilia só se aplicava a dano causado por ato positivo e consistente em estrago físico e material da coisa corpórea Assim quanto ao primeiro requisito não constituía dano perante aquela lei deixar sem alimento um cavalo causando com isso sua morte Quanto ao segundo não era considerado pela Lex Aquilia como dano deixar fugir o animal alheio porque não ocorria estrago físico e material Além destes requisitos a Lex Aquilia exigia que a danificação fosse feita iniuria isto é contra a lei 53 Livro V Título 86 parágrafo 5º E se achar culpado no pôr do fogo de que se seguir o dano algum escravo seja açoitado publicamente e ficará na vontade de seu senhor pagar o dano que o fogo fez ou dar o escravo para se vender e do preço se pagar o dito dano ORDENAÇÕES FILIPINAS Livro V Título 86 parágrafo 5º Disponível em httpwwwucptihtiprojfilipinas14p863htm Acesso em 25 fev 2007 54 Artigo 799 da Consolidação das Leis civis verbis Todo o delinquente está obrigado á satisfazer o damno que causar com o delicto FREITAS Augusto Teixeira de Op cit p 484 55 Artigo 159 verbis Aquele que por ação ou omissão voluntária negligência violar direito ou causar prejuízo a outrem fica obrigado a reparar o dano BRASIL Código Civil e legislação civil em vigor Theotonio Negrão e José Roberto Ferreira Gouvêa 22 ed atual até 13 jan 2003 São Paulo Saraiva 2003 p 1367 56 No novo Código Civil de 2002 o dano aquiliano foi incorporado no artigo 186 verbis Aquele que por ação ou omissão voluntária negligência violar direito e causar dano a outrem ainda que exclusivamente moral comete ato ilícito e no que se refere à responsabilidade civil no artigo 927 verbis Aquele que por ato ilícito artigos 186 e 187 causar dano a outrem fica obrigado a reparálo Parágrafo único Haverá obrigação de reparar o dano independentemente de culpa nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar por sua natureza risco para os direitos de outrem 57 DOMINGO Rafael Coord Textos de Derecho Romano Lex Aquilia de damno iniuria dato Navarra Editorial Aranzadi 2002 p 256 23 Mais tarde os jurisconsultos entenderam que a palavra iniuria não significava apenas o ilícito o contrário à lei mas implicava também a culpabilidade do autor do dano58 Outrossim as sanções da Lex Aquilia aplicavamse mais tarde a outros casos de danificação além das restrições originárias como aos prejuízos causados por omissão ou verificados sem o estrago físico e material da coisa59 No cálculo do valor do dano originariamente se limitava a estabelecer o valor objetivo da coisa mas no período clássico incluíase todo o interesse do proprietário relativamente a ela Assim desde essa época o cálculo do dano incluía além do dano efetivo e material damnum emergens também a perda de lucro lucrum cessans sofrida pelo proprietário por causa do ato ilícito do ofensor60 Segundo Perdigão Malheiro do fato criminoso do escravo resulta para o senhor a obrigação de indenizar o dano ao ofendido segundo o artigo 28 1º do Código Criminal mas somente até o valor do mesmo escravo Refere ainda que esta reparação não pode ser pedida senão por ação cível61 que prescreve em trinta anos62 É a Ação Noxal63 dos romanos e já conhecida do Direito brasileiro Ordenações Livro 5º Título 86 5º Mas se o escravo morresse se fosse 58 O elemento da iniuria incluía a antijuricidade e a intencionalidade esta última se apreciava em razão da situação que tipicamente a envolvia A jurisprudência fez uma interpretação progressivamente extensiva desta lei incluindo a comissão por omissão e por negligência e apreciando uma causalidade imediata DOMINGO Rafael Op cit p 372 59 A partir da Lex Aquilia embora de forma primitiva a noção de culpa pela primeira vez passou a ser esboçada como fundamento da responsabilidade civil de forma com que o agente não seria responsável pelo dano se agisse sem culpa Esta lei introduziu o damno iniuria datum ou melhor prejuízo causado a bem alheio empobrecendo o lesado sem enriquecer o lesante Esta teoria que se propagou pela Idade Média deu início à responsabilidade civil subjetiva na qual o fator culpa é determinante para a existência da indenização assim como o dano e o nexo causal Dessa forma o Dano Aquiliano foi incorporado à época atual pelo Código Civil de 1916 no artigo 159 e pelo Novo Código Civil de 2002 nos artigos 186 e 927 verbis Aquele que por ato ilícito artigos 186 e 187 causar dano a outrem fica obrigado a reparálo Parágrafo único Haverá obrigação de reparar o dano independentemente de culpa nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar por sua natureza risco para os direitos de outrem BRASIL Código Civil e legislação civil em vigor Op cit p 166 60 MARKY Thomas Curso elementar de Direito Romano 8 ed São Paulo Saraiva 1995 p 136137 61 Lei nº 261 de 3 de dezembro de 1841 artigo 68 que derrogou o artigo 31 do Código Criminal e o artigo 269 5º do Código de Processo Criminal verbis A indemnização em todos os casos será pedida por ação civil ficando revogado o Artigo 31º do Código Criminal e o 5º do artigo 269º do Código de Processo Não se poderá porêm questionar mais sobre a existencia do facto e sobre quem seja o seu autor quando estas questões se achem decididas no crime 62 Artigo 36 da Lei de 1841 verbis A obrigação de indemnizar prescreve passados trinta annos contado do dia em que o delicto for commetido BRASIL Lei nº 261 de 3 de dezembro de 1841 In Coleção das Leis do Império do Brasil 1841 Tomo 4º Parte 1ª Secção 32ª Disponível em httpwww 2camaragovbrlegislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 15 maio 2006 63 Noxa daño perjuicio delito hijo o esclavo que causa el daño o comete el delito DOMINGO Rafael Op cit p 456 24 condenado em pena capital ou perpétua como foi o caso de Tomás se o senhor o entregasse ficaria liberado Perdigão Malheiro entendia esta questão da seguinte maneira dispunha o Direito Romano e a nossa lei anterior caso em que recebido pelo ofendido o escravo ou seu produto temse preenchida a satisfação como quer a lei Código Criminal artigo 28 1º64 Prossegue Perdigão Malheiro se podem levantar outras hipóteses porquanto sendo o falecimento um sucesso fatal e os outros fatos conseqüências ou efeitos da condenação todavia o ofendido nenhuma indenização receberia se o senhor não fosse obrigado o que parece oporse ao determinado no Código Criminal artigos 21 e seguintes e mesmo no artigo 28 que declara o senhor subsidiariamente responsável embora seja esta responsabilidade limitada ao valor do escravo e não à pessoa deste65 Quanto à indenização de dano tratase principalmente na reparação do mal causado ao ofendido a qual deve ser a mais completa que se possa independente da punição e da criminalidade Segundo Teixeira de Freitas em tais casos o senhor não fica obrigado sobretudo se tem feito abandono de escravo porque seria iníquo como se decide em várias leis romanas que além de perder o escravo pagasse ao ofendido quantia igual ao valor dele quando já semelhante valor ele não conserva66 Ainda no pensamento de Teixeira de Freitas cabe esclarecer que este autor considerava ter sido mal interpretada a norma constitucional que mandava organizar o quanto antes um Código Civil e Criminal artigo 179 parágrafo 18 da Constituição de 1824 uma vez que foi elaborado o Código Criminal em 1830 sem haver um Código Civil o que considerava um erro transgressão do sábio pensamento da Legislação Fundamental67 CONCLUSÃO Este trabalho descritivo de reconstrução histórica ao abordar o tema da escravidão negra no Brasil deparouse com o distanciamento entre as leis 64 MALHEIRO Agostinho Marques Perdigão Op cit p 1819 65 Idem ibidem p 1819 66 FREITAS Augusto Teixeira de Op cit p 487 67 Idem ibidem p 485 25 disponíveis e a prática social Isso foi constatado pelo encadeamento de leis e decretos que pouco a pouco num processo lento e gradual levaram o país à abolição total da escravidão em 1888 Podese dizer que desde a Lei Diogo Feijó de 1831 que pretendeu abolir o tráfico de escravos até Lei dos Sexagenários de 1885 que declarava livre todo escravo com mais de sessenta anos se as normas não eram sumariamente ignoradas seus detalhes faziam com que fossem absolutamente inócuas na prática Destes fatos percebese que o problema central sobre o qual a escravidão negra se situava na legislação da época se dava em razão do direito de propriedade dos senhores em relação aos seus escravos A Constituição imperial entre os direitos individuais inalienáveis registrava o direito de propriedade e isto se tornava um problema difícil de ser resolvido porque nem os abolicionistas sabiam como extinguir a escravidão sem indenizar os senhores pelo seu direito adquirido REFERÊNCIAS ALVES José Carlos Moreira Direito Romano Rio de Janeiro Forense 2002 v I BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de Direito Penal parte geral 8 ed São Paulo Saraiva 2003 v 1 BRASIL Código Civil e legislação civil em vigor Theotonio Negrão e José Roberto Ferreira Gouvêa 22 ed atual até 13 jan 2003 São Paulo Saraiva 2003 Código Criminal do Império Lei de 16 de dezembro de 1830 Disponível em httpwww2camaragovbrlegislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 7 out 2006 Constituição Política do Império do Brasil de 25 de março de 1824 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03ConstituicaoContituiC3A7ao 24htm Acesso em 11 out 2006 Decreto nº 5135 de 13 de novembro de 1872 Approva o regulamento geral para a execução da Lei nº 2040 de 28 de setembro de 1871 In Coleção das Leis do Império do Brasil Disponível em httpwww2camaragovbrlegislação publicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 1 mar 2007 Lei nº 261 de 3 de dezembro de 1841 In Coleção das Leis do Império do Brasil 1841 Tomo 4º Parte 1ª Secção 32ª Disponível em httpwww 2camaragovbrlegislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 15 maio 2006 26 BRASIL Lei Imperial de 7 de novembro de 1831 Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça Rio de Janeiro Livro 1º de Leis fl 98 15111831 Disponível em httpwww2camaragovbrlegislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 7 out 2006 Lei Imperial nº 4 de 10 de junho de 1835 Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça Rio de Janeiro Livro 1º de Leis fl 142v 1561835 Disponível em httpwww2camaragovbrlegislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção3html Acesso em 7 out 2006 Lei Imperial n 3270 de 28 de setembro de 1885 Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura Comércio e Obras Públicas Rio de Janeiro 1º out 1885 Disponível em httpwww2camaragovbrlegislaçãopublicaçõesdoimperio coleção3html Acesso em 7 out 2006 Lei nº 581 de 4 de setembro de 1850 Coleção das Leis do Império do Brasil Lei Eusébio de Queirós Chancelaria do Império Rio de Janeiro 5 set 1850 Disponível em httpwww2camaragovbrlegislaçãopublicaçõesdoimperiocoleção 3html Acesso em 7 out 2006 CAMPOS Adriana Pereira Escravidão e liberdade nas barras dos tribunais Disponível em http7214205104searchqcacheJk8CixqeXtcJwwwhistorica arquivoestadospgovbrmateriasanterioresedicao09materia03texto03pdfescrav osC3B3rfC3A3oshlptBRctclnkcd26gl br Acesso em 10 mar 2007 DOMINGO Rafael Coord Textos de Derecho Romano Lex Aquilia de damno iniuria dato Navarra Editorial Aranzadi 2002 FREITAS Augusto Teixeira de Consolidação das leis civis Prefácio de Ruy Rosado de Aguiar Brasília Senado Federal Conselho Editorial 2003 Coleção história do direito brasileiro Direito Civil 2 v GRAF Márcia Elisa de Campos Cidade cidadania e exclusão a lei e a prática Disponível em http httpwwwutpbrproppeX20seminariopesquisaArtigos 20completosFCHLACIDADE20CIDADANIA20E20EXCLUSC3O20A20 LEI20E20A20PRC1TICAdoc Acesso em 7 fev 2007 KOERNER Andrei Org História da Justiça Penal no Brasil pesquisas e análises São Paulo IBCCRIM 2006 LOPES José Reinaldo de Lima O direito na história Lições introdutórias São Paulo Max Limonad 2000 LOUREIRO Lourenço Trigo de Instituições de Direito Civil brasileiro Brasília Senado Federal Conselho Editorial Superior Tribunal de Justiça 2004 v I MALHEIRO Agostinho Marques Perdigão A escravidão no Brasil Ensaio histórico jurídico social 3 ed 2 ed integral Petrópolis Vozes 1866 2 v 27 MARKY Thomas Curso elementar de Direito Romano 8 ed São Paulo Saraiva 1995 MATTOSO Kátia Mde Queirós Ser escravo no Brasil 3 ed São Paulo Brasiliense 1990 MENDONÇA Joseli M N Entre a mão e os anéis a Lei dos Sexagenários e os caminhos da abolição no Brasil Campinas Unicamp Centro de Pesquisa em História Social e Cultura 1999 MORAES Evaristo de A escravidão africana no Brasil das origens à extinção São Paulo Companhia Editora Nacional 1933 NABUCO Joaquim A escravidão Rio de Janeiro Nova Fronteira 1999 Minha formação Disponível em bibliocombrconteudo JoaquimNabucominhaformaE7E3ohtm Acesso em 11 mar 2007 O abolicionismo Publicações LCC eletrônicas Disponível em httpwwwbibvirfuturouspbrtextosautoresjoaquimnabucoabolicionismotextoht ml Acesso em 6 out 2006a O réu escravo Ordem dos Advogados do Brasil Secção São Paulo Série Grandes Causas Disponível em httpwwwoabsporgbr institucionalgrandescausasoreuescravo Acesso em 1º mar 2007 NEQUETE Lenine Escravos e magistrados no 2º Reinado aplicação da Lei nº 2040 de 2891871 Brasília Fundação Petrônio Portela 1988 ORDENAÇÕES FILIPINAS Disponível em httpwwwucptihtiprojfilipinas14p863htm Acesso em 25 fev 2007 PAPALI Maria Aparecida C R A legislação de 1871 o Judiciário e a tutela de ingênuos na cidade de Taubaté Disponível em httpwwwtjrsgovbr institumemorialRevistaJHvol2n309Papalipdf Acesso em 13 abr 2007