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119 artigo Bruno Milanez Rodrigo Salles Pereira dos Santos NEOEXTRATIVISMO NO BRASIL uMA ANáLISE dA pROpOSTA dO NOVO MARcO LEgAL dA MINERAçãO Resumo O neoextrativismo é definido como um mo delo de desenvolvimento focado no cresci mento econômico e baseado na apropriação de recursos naturais em redes produtivas pouco diversificadas e na inserção subordi nada na nova divisão internacional do tra balho O fenômeno vem sendo associado a diferentes tensões sejam ligadas ao baixo crescimento econômico de longo prazo se jam associadas a impactos sociais e ambien tais diversificados Neste artigo argumen tamos que sinais de implantação de um mo delo neoextrativista podem ser percebidos no Brasil em duas dimensões pelo processo de reprimarização da economia brasileira e pela adoção de certos pressupostos na pro posta de novo marco legal da mineração A partir dessa análise defendemos que uma maior democratização do processo de for mulação de políticas e tomada de decisão so bre o uso de recursos minerais no Brasil que incluísse as populações impactadas pela in dústria extrativa mineral poderia ser uma estratégia para neutralizar algumas das tensões criadas pelo modelo neoextrativista de desenvolvimento PalavRaschave Neoextrativismo Mineração Comércio in ternacional Estratégia de desenvolvimento abstRact Neoextrativism is defined as a develop ment model focused on economic growth and grounded on the appropriation of na ture poorly diversified production net works and the subordinate position in the new international division of labor It has been associated with different strains be connected to low longterm economic growth or associated with varied social and environmental impacts In this paper we argue that traces of the establishment of a neoextrativist model can be observed in Brazil in two domains by the process of re primarization of the Brazilian economy and by the adoption of certain assumptions in the proposal of a new legal framework for the mining sector From this analysis we claim that greater democratization of the process of policy formulation and deci sionmaking on the use of mineral resourc es in Brazil which included the popula tions affected by the mining industry could be a strategy to offset some of the strains created by the neoextrativist mod el of development KeywoRds Neoextrativism Mining International trade Development strategy 120 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 1 Introdução Neste artigo argumentamos que a presen ça do neoextrativismo pode ser percebida em duas dimensões no Brasil Por um lado ele pode ser associado ao processo de reprimari zação da economia brasileira medido pelo au mento constante da participação da indústria extrativa mineral na pauta de exportação e no Produto Interno Bruto PIB do país Por ou tro lado pressupostos neoextrativistas podem ser também identificados na proposta de novo marco legal da mineração elaborada pelo Mi nistério de Minas e Energia MME Essa percepção é motivo de preocupação devido às diversas tensões que a intensifi cação desse modelo pode causar No âmbito econômico há diferentes autores que asso ciam economias extrativistas a um menor crescimento de longo prazo Com relação às questões sociais e ambientais muitos são os impactos negativos gerados por essas ativi dades especialmente no âmbito local Como forma de discutir e avaliar o grau de influência do paradigma neoextrativista na economia e política brasileiras este artigo é organizado em quatro seções além dessa introdução A seção 2 discute o neoextrati vismo em seus aspectos conceituais buscan do apresentar a literatura latinoamericana pertinente ao público brasileiro A seção se debruça também sobre seu caráter de tipo institucional híbrido vinculando caracte rísticas de paradigmas de desenvolvimento precedentes de uso comum na literatura na cional Nesse âmbito discute seu principal ca ractere distintivo o papel do Estado a partir de funções tradicionais como a provisão de financiamento e infraestrutura e da regula ção pública assim como de sua nova função como Estado compensador Finalmente dis cute as chamadas tensões econômicas e so cioambientais geradas pelo neoextrativismo A terceira seção apresenta e discute al guns dos principais sinais de sua emergên cia como paradigma no âmbito da economia nacional Assim o acoplamento entre ten dências econômicas estruturais operando ao nível da configuração dos mercados glo bais de commodities e de disposições eco nômicas e políticas conjunturais refletindo estratégias tradicionais de equacionamento das contas públicas e mitigação da pobre za vem produzindo desde o início dos anos 2000 uma situação de reprimarização da economia brasileira A quarta seção discute a proposta do novo marco legal da mineração como uma expres são da emergência do paradigma neoextra tivista e mais importante como mecanismo institucional de sua potencial consolidação As soluções relativas à atração e expan são dos investimentos privados à elevação da produtividade e da competitividade e à agregação de valor de um lado ao aperfei çoamento e ampliação da captura de parce la da renda extrativa com efeitos acerca do fortalecimento organizacional do Estado de outro assim como relacionadas às dimensões ambiental e social envolvidas na regulação da indústria extrativa mineral no novo marco se subordinam a uma pretensão expansiva da economia nacional ad infinitum e se encon tram de fato sob o paradigma neoextrativis ta Finalmente a última seção apresenta as reflexões conclusivas do trabalho enfocando a necessidade de democratização do debate em torno do novo marco e principalmente da emergência do neoextrativismo Neoextrativismo no Brasil 121 2 o neoextrativismo 21 aspectos gerais Gudynas 2009 2012a define o neoex trativismo como um modelo de desenvolvi mento focado no crescimento econômico e baseado na apropriação de recursos natu rais em redes produtivas pouco diversifica das e na inserção internacional subordina da No modelo proposto pelo autor o Estado tem um papel ativo buscando sua legitima ção por meio da apropriação e redistribuição de parte da renda gerada apresentando afi nidades com a emergência de governos au todefinidos como progressistas GUDYNAS 2012a p 130 A ideia de neoextrativismo corresponde ria a uma reconfiguração do extrativismo conceito cunhado para definir um conjun to de estratégias de desenvolvimento anco radas em um grupo de setores econômicos que removem um grande volume de recur sos naturais para comercialização após ne nhum ou quase nenhum processamento O conceito normalmente se refere a atividades desenvolvidas em enclaves1 e voltadas à ex portação Apesar de o paradigma do extra tivismo ser comumente aplicado à extração de recursos minerais e do petróleo ele tam bém pode ser associado a atividades agrá rias florestais e de pesca ACOSTA 2011 GUDYNAS 2012a 2012b O conceito do neoextrativismo foi de finido principalmente em referência a pa íses da América Latina embora possa ser também aplicado a outras regiões Ele vem sendo utilizado tanto no contexto de países tradicionalmente extrativistas que passam por um momento de aprofundamento do modelo como por países que inspirados pe las experiências regionais buscam emular as mesmas práticas Um possível resultado das atuais políti cas neoextrativistas pode ser verificado no Gráfico 1 que mostra o aumento da partici pação de bens tipicamente extrativos miné rios e combustíveis na pauta de exportação de alguns países latinoamericanos Como pode ser verificado entre 2001 e 2011 houve um crescimento significativo da importân cia destes produtos na região A Venezuela chama a atenção uma vez que a participa ção passa de 80 para 90 Nos casos do Brasil e do México devido ao maior grau de industrialização a participação é menos relevante ainda assim notase o aumento da importância dos bens extrativos no caso brasileiro essa participação passa de 10 para 30 A Argentina acompanha a ten dência dos demais países entre 2000 e 2006 porém a partir de 2007 a participação desses bens se reduz consideravelmente2 1 O conceito econômico de enclave remonta à definição proposta por Cardoso e Faleto 1970 acerca da vigência de núcleos de atividades primárias controladas de forma direta pelo exterior Idem p 46 sepa rados dos demais núcleos de atividades econômicas compreendidos por sua vez como interiores A cisão fundamental remete às oposições entre internacional x nacional moderno x tradicional dentre outras No entanto as referidas oposições devem ser entendidas a partir de sua complementaridade funcional de modo que o enclave particularmente o de tipo mineiro que nos interessa em especial separa e une assimétrica e dialeticamente setores e subsetores econômicos economias nacionais e regionais e principalmente popu lações e territórios O enclave diz respeito a espaços econômicos políticos e sociais antitéticos localizando se em um deles mas referindose ao outro e pertencendo a ambos 2 Uma possível explicação para esse fato devese ao processo de redução da produção de petróleo no país que se iniciou no final da década de 1990 e que obrigou o Estado a reorientar a comercialização para garan tir o abastecimento do mercado doméstico REUTERS 2013 122 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 Gráfico 1 Participação dos minerais e combustíveis na pauta de exportação de alguns países da américa latina 1997 1996 1995 2000 1999 1998 2001 2002 2005 2004 2003 2008 2007 2006 2009 2010 2011 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 Argentina Bolívia Brasil Chile Equador México Peru Venezuela Percentual do valor das exportações Fonte unctad 2012 Nota Produtos com código sItc 3 carvão coque petróleo gás energia elétrica sItc 27 fertilizantes e minerais não beneficiados sItc 28 metais ferrosos e sucata metálica e sItc 68 metais não ferrosos O paradigma neoextrativista tem sido caracterizado como a combinação de al gumas práticas tradicionais desses países com elementos inovadores Ao resumir suas principais características Gudynas 2009 2012a acredita que o neoextrativismo seria uma versão contemporânea do desenvolvi mentismo Este teria constituído a raciona lidade predominante na América Latina no século XX apresentando tradicionalmente o crescimento econômico como forma de superação da desigualdade social e que em sua roupagem recente se identifica com o financiamento de programas sociais Neste contexto os setores extrativistas se mante riam como um pilar da obsessão pelo cres cimento ALTVATER 2002 Além disso o Estado deixaria de ter como função apenas a manutenção de regras que garantissem o funcionamento dos processos produtivos e passaria a ter um papel protagonista nas ati vidades extrativas Gudynas 2012a comenta porém que essa estratégia tenderia a promover a com petição entre os países por investimentos estrangeiros e intensificaria a redução da qualidade de vida graças à flexibilização das normas trabalhistas e ambientais bem como aprofundaria a fragmentação territo rial por meio da formação de novos enclaves de produção Nesse sentido o neoextrativis mo seria um indutor de uma corrida para o fundo race to the bottom Neoextrativismo no Brasil 123 22 a construção do neoextrativismo A dependência da extração dos recursos naturais como vetor de crescimento econô mico não é uma novidade na América La tina Esta estratégia tem sido implementada desde as origens do período colonial SCOT TO 2011 e é tão inerente ao processo de de senvolvimento da região que Barton 2006 cunhou o termo ecodependência para des crevêla Segundo o autor o conceito se re fere às relações socioeconômicas ligadas às atividades de extração de recursos naturais para exportação De certa forma o neoextrativismo é pro duto de diferentes aspectos que caracteri zam as institucionalidades constituídas na região Para Acosta 2011 a existência da riqueza natural e as crises econômicas re correntes na América Latina consolidaram uma mentalidade rentista bem como prá ticas clientelistas e patrimonialistas Essas particularidades teriam dado origem a ins tituições democráticas frágeis e facilmente corrompíveis que voltam a se reorganizar dentro do contexto neoextrativista A dependência do extrativismo para ga rantir o crescimento econômico na região foi questionada com mais ênfase a partir dos anos 1950 quando foi proposto o modelo de industrialização via substituição de impor tações Naquele momento eram criticados os padrões de comércio internacional sen do salientados os termos de troca desiguais Como alternativa era defendida a substitui ção da importação de produtos industriais básicos por meio da constituição de infra estrutura produtiva Procuravase imple mentar esta mudança por meio do endivi damento externo de investimentos diretos internacionais e da intervenção do governo Essa intervenção poderia ocorrer por meio de empresas estatais na forma de subsídios e da infraestrutura necessária ao surgimento das novas indústrias SIKKINK 1991 Apesar dos resultados obtidos nos anos 1950 e 1960 o modelo de industrialização via substituição de importações que já vi nha apresentando enorme desgaste ao longo da década de 1970 com endividamento ex terno e déficit comercial crescentes tornou se insustentável com a elevação das taxas de juros internacionais em 1979 resultante da nova política monetária restritiva norte americana MATTEI SANTOS JÚNIOR 2009 p 107 O vínculo de dependência dramaticamente rememorado entre as eco nomias nacional e mundial se expressou em uma grave crise financeira nos anos 1980 impulsionando a reorientação da estrutura e da estratégia econômicas para o pagamento da dívida se refletindo em baixas taxas de crescimento ao longo de todo o período Esse processo aliado a mudanças no ce nário internacional resultou em uma forte reação contra o modelo em vigor e induziu uma guinada neoliberal a partir dos anos 1990 BARTON 2006 A maioria dos países da América Latina então passou por um pro cesso de rápida redução do tamanho do Esta do entrada de capitais transnacionais aber tura comercial e privatização de empresas públicas No caso da mineração importantes estatais foram privatizadas como a Cia Vale do Rio Doce CVRD e a Minero Peru Ainda nesse período o foco no mercado interno foi reduzido e retomouse a preocu pação com o crescimento para fora de tal forma que a exportação voltou a ser vista como nova estratégia de desenvolvimento BARTON 2006 Todavia o processo de in serção internacional foi marcado pela baixa competitividade dos produtos industrializa dos regionais o que levou os países a nova mente se apoiarem na exportação de pro dutos intensivos em recursos naturais onde 124 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 ainda possuíam vantagens comparativas Com relação ao mercado mineral cf Gráfico 2 nesse momento ocorreu um grande au mento da participação destes países na ofer ta internacional No final dos anos 1990 a região passou a responder por mais de 25 da produção mundial de bauxita 45 de cobre e 29 de estanho Gráfico 2 Participação da américa latina na produção mineral mundial Fonte us Geological survey 2012 Dessa forma o período neoliberal levou a uma especialização da região na comer cialização de produtos intensivos em re cursos naturais que permitiam a entrada de divisas necessárias à importação de bens in tensivos em tecnologia SCHAPER VÉRÈZ 2001 Por exemplo Albavera 2004 identi fica um aumento na exportação de minérios muito acima do aumento da participação de refinados O autor menciona como emble mático o caso da bauxita cuja produção em mina representava 26 do total mundial enquanto a produção de alumínio primá rio ainda girava em torno de 8 O mes mo comportamento foi identificado com o cobre sendo produzido 45 do minério e apenas 26 do metal refinado A partir dos anos 2000 a região passou por novas mudanças de rumo com a chegada ao poder de governos identificados como pro gressistas Assim entre as lideranças regionais encontravamse Hugo Chávez Venezuela 1998 Ricardo Lagos Chile 2000 Luiz Inácio Lula da Silva Brasil 2003 Evo Morales Bo lívia 2005 Tabaré Vázquez Uruguai 2005 Rafael Correa Equador 2006 e Fernando Lugo Paraguai 2008 No novo contexto ocorreram diferentes graus de ruptura das es 0 10 20 30 40 50 60 1985 1990 1995 2000 2005 2010 Bauxita Cobre Minério de ferro Níquel Estanho Zinco Percentual Neoextrativismo no Brasil 125 tratégias adotadas anteriormente enquanto alguns aspectos da política neoliberal foram mantidos outros foram revistos conforman do o que viria a ser caracterizado como neoex trativismo de modo geral GUDYNAS 2012a ou como neoextrativismo progressista mais especificamente GUDYNAS 20093 A partir desta análise o que se percebe é que o paradigma neoextrativista não é uma completa inovação institucional mas sim uma combinação de aspectos historicamente enraizados na paisagem econômica e política latinoamericana Conforme pode ser identi ficado no Quadro 1 apesar dos elementos no vos o modelo de desenvolvimento se consti tui pela apropriação e releitura de elementos característicos de períodos passados 3 A despeito dos vínculos materiais e simbólicos entre políticas redistributivas amplas moderadas ou limitadas que caracterizam a emergência de governos de esquerda e centroesquerda na América Latina de um lado e da difusão de estratégias de crescimento econômico ancoradas na exploração intensiva e extensiva de bens naturais BRIDGE 2004 a influência estrutural dos mercados de commodities e das formas de acumulação baseadas em recursos nos anos 2000 se exerceu de modo generalizado na política continental Desse modo os autores optam por definir o neoextrativismo de modo amplo considerandoo a partir de dois eixos a saber a centralidade da exploração de bens naturais e a ampliação do papel do Estado operadas inclusive por governos de direita e centrodireita como no Chile Peru e México nas estratégias de desenvolvimento Não obstante a redistribuição assume relevância analítica como variável dependente Quadro 1 aspectos gerais do neoextrativismo Liberalismo Desenvolvimentismo Neoliberalismo Neoextrativismo 18891930 19301945 19852002 2003 19451985 Meios Especialização da Generalização da Especialização da estrutura produtiva estrutura produ estrutura produtiva como inserção externa competitiva tiva como inserção como industrialização externa vantajosa Escala Nacional Nacional Internacional Global Resultados Estrutura produtiva Estrutura produtiva Estrutura produtiva simples monolítica complexa completa incompleta e desconexa e conexa Papel do Coadjuvante apenas Protagonista por meio Coadjuvante Protagonista Estado garantindo condições de empresas estatais apenas regulando por meio de para atuação a atuação empresas esta das empresas das empresas tais ou semies tatais e captura de renda Origem Internacional Nacional Internacional Indiferente com dominante ao nível das Internacional algumas posições do estruturas de favoráveis ao investimento financiamento e capital nacional comercialização Fonte os autores 126 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 Nesse sentido os governos progressistas instalados na região pouco questionaram o papel das indústrias extrativas na busca do desenvolvimento nacional Ao contrário buscaram criar novos argumentos para jus tificar sua adoção Em primeiro lugar talvez o argumento mais comumente usado seja que as atividades extrativas minerais são de interesse nacional ou interesse público ALBAVERA 2004 ou ainda são o que a maioria quer GUDYNAS 2012a Todavia esse é um dos argumentos mais vagos e frá geis uma vez que raramente este interesse é especificado ou explicitado Um segundo argumento também normalmente apresen tado e com uma visão essencialmente utili tarista da natureza afirma que os países la tinoamericanos possuem enormes riquezas que devem ser aproveitadas e não podem ser desperdiçadas GUDYNAS 2012b Outro grupo de justificativas utilizadas para embasar o neoextrativismo parte da de fesa do crescimento econômico Dentro dessa perspectiva as atividades extrativas são vis tas como geradoras de riqueza sendo im portantes elementos para o combate à pobre za e à desigualdade Nesse sentido o discurso pode apresentar as vantagens da geração de emprego obtendo apoio de sindicatos e ou tros movimentos sociais como também fonte de renda para ser distribuída para grupos es pecíficos Uma variação em escala local do discurso do crescimento econômico diz res peito às indústrias extrativas como vetores de desenvolvimento Essa argumentação é utilizada principalmente nos projetos de en clave devido à construção de infraestrutura bem como à possibilidade da geração de em pregos formais em regiões de economias de subsistência GUDYNAS 2012a Essa preocupação com a defesa do neo extrativismo se intensifica em um momento em que as commodities primárias apresen tam elevado preço no mercado internacio nal devido à demanda dos países asiáti cos em particular da China BEBBINGTON 2009 CACCIAMALI BOBIK CELLI JR 2012 Esse contexto internacional tem sido determinante para o significativo aumento da participação da renda extrativa no PIB dos países da América Latina4 conforme pode ser visto no Gráfico 3 4 Perspectivas de curto prazo sugerem ainda um possível aprofundamento do modelo uma vez que em 2011 a região concentrava quase 30 dos investimentos em projetos minerais no mundo enquanto que a América do Norte em segundo lugar recebia cerca de 20 e a Ásia apenas 11 ICMM 2012 Neoextrativismo no Brasil 127 Gráfico 3 evolução da renda mineral na américa latina e no mundo Fonte world bank 2011 Nota a renda mineral é definida como a diferença entre o valor de produção de um mineral a preços mundiais e seu custo total de produção os minerais considerados neste cálculo são estanho ouro chumbo zinco ferro cobre níquel prata bauxita e fosfato 23 o papel do estado no modelo neoextrativista Talvez a principal ruptura do modelo neoextrativista com o período neoliberal esteja relacionada ao papel desempenhado pelo Estado Por um lado ele retoma algu mas das atribuições definidas pelo modelo de substituição de importações e por ou tro recebe novas responsabilidades pro postas pelos governos progressistas Neste novo contexto tais governos liberalizam e protegem dinâmicas próprias do capita lismo se abstendo de tomar decisões que possam colocar em risco processos de acu mulação GUDYNAS 2012a Dentre essas atribuições podem ser listados o apoio à internacionalização de empresas nacionais a adaptação da legislação para estimular a extração dos recursos naturais e principal mente a compensação por meio de políticas de transferência de renda O apoio à internacionalização de algu mas empresas nacionais vem se dando por dois instrumentos principais o suporte fi nanceiro e a construção de infraestrutura No caso do suporte financeiro a concessão de empréstimos já foi amplamente utilizada no passado No caso brasileiro esse papel vem sendo desempenhado especialmente pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social BNDES que têm apor tado grande quantidade de recursos a um seleto grupo de empresas atuantes em seto 1970 1973 1976 1979 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003 2006 00 05 10 15 20 30 25 América Latina Mundo 128 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 res intensivos em bens naturais tais como o grupo JBSFriboi e diretamente extrativos como a Vale SA GUDYNAS 2012a De forma geral no período entre 2002 e 2012 a participação dos setores de óleo e gás mi neração e energia saltou de 54 para 75 da carteira da BNDES Participações SA BNDESPar5 e se forem incluídos ainda os setores de papel e celulose e alimentos par ticularmente proteína animal a concentra ção sobre para 89 TORRES GÓES 2013 Ao mesmo tempo a ideia do Estado como responsável pelo fornecimento de infraes trutura para o desenvolvimento das ativi dades econômicas não é uma novidade na região Em grande parte o modelo de subs tituição de importações já propunha essa es tratégia Entretanto enquanto originalmen te se defendia a construção de infraestrutu ra que consolidasse o mercado interno no neoextrativismo a prioridade é dada ao es coamento da produção para o abastecimen to do mercado internacional Dessa forma grande importância é dada à logística e mui to se fala nos gargalos da produção nos índice de competitividade dos países e no nosso caso no custo Brasil No contexto latinoamericano tem grande importância a Iniciativa para a Integração da Infraestru tura Regional SulAmericana IIRSA que é definida por Bebbington 2009 p 13 como uma rede de rodovias hidrovias e portos ca paz de abrir o continente no caso especí fico do Brasil podem ser implicadas as obras associadas ao Programa de Aceleração do Crescimento PAC Uma segunda atribuição que vem sendo desempenhada pelos governos progressistas diz respeito à reconfiguração da regulação legal do setor extrativo As modificações aí envolvidas representariam uma continuida de das reformas realizadas nos anos 1990 quando muitos dos países alteraram regimes regulatórios nacionais associados aos bens naturais para favorecer a implantação de grandes empresas e a institucionalização de seus direitos de propriedade SCOTTO 2011 Entretanto na fase neoextrativista essas mudanças teriam como objetivo garantir ou ampliar a participação do Estado na apro priação da renda extrativa cf Quadro 2 Estratégias de tal natureza têm se mostrado eficazes uma vez que em todos os países da região o Estado possui o domínio absoluto dos recursos minerais e combustíveis lhe cabendo conceder permissões para sua ex ploração econômica ALBAVERA 2004 5 A BNDESPar é uma subsidiária integral do BNDES com vistas à gestão de sua participação social em empreendimentos públicos e privados prioritariamente constituídos sob a legislação nacional Neoextrativismo no Brasil 129 Quadro 2 mudanças institucionais na américa latina com impactos sobre a indústria extrativa Período neoliberal Período Neoextrativista País Mudanças visando o Mudanças permitindo Mudanças visando à apropriação estímulo à atividade facilitando investimentos estatal da renda extrativa privada na mineração estrangeiros no país genéricos ou em mineração Argentina Ley 244981995 de Decreto Nº 18531993 Lei de recuperação da YPF Actualización Minera modifica Ley Nº 213821976 Ley 267412012 de Inversión Extranjera Brasil EC 61995 Aumento de percentual e modificação na base de cálculo dos royalties propostas no novo marco legal da mineração Bolívia Código de Minería Ley de Inversiones Criação do Imposto Direto sobre Ley 17771997 Ley 11821990 Hidrocarbonetos Ley 30582005 Nacionalização dos hidrocarbo netos DS Nº 287012006 Chile Código de Minería Estatuto de la Inversión Criação do novo regime tributrario Ley 182481983 Extranjera do imposto específico Decreto Ley 6001976 para a renda operacional da ati vidade mineira Ley 204692010 Equador Ley de Minería Ley 12 de Cámaras de Lei reformatória da lei de Ley 1261991 Minería Decreto Nº 4151993 hidrocarbonetos Ley 852007 Peru Ley General de Minería Ley de Promoción de la Aumento de percentual e Decreto Legislativo Inversión Privada modificação na base de cálculo 1091992 Decreto Legislativo dos royalties Decreto Supremo 7571991 2092011 Venezuela Decreto con rango y Regulación de la inversión Lei de imposto sobre preços ex fuerza de ley de minas extranjera traordinários do mercado inter 2951999 Decreto 20951992 nacional de hidrocarbonetos Ley 401142013 Fontes adaptado a partir de chaparro 2002 e viale 2012 130 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 A avaliação dos efeitos da mudança na legislação referente à indústria extrativa mineral dos diferentes países está além do escopo deste texto porém o tema deve ser aprofundado uma vez que governos da re gião possuem uma tradição patrimonialista não sendo incomum a ingerência de empre sas extrativas inclusive por meio da escolha de representantes de tais empresas para car gos públicos ACOSTA 20116 Por fim o maior diferencial sobre a atua ção do Estado dentro do paradigma do neo extrativismo seria o que Gudynas 2012a 2012b convencionou chamar de Estado compensador Ao assumir este papel o Es tado se propõe a implantar programas de combate à pobreza a partir da distribuição de recursos fiscais Em alguns casos como o Bono Juancito Pinto Bolívia esses progra mas são diretamente vinculados à captura de renda extrativa Segundo o autor essa se ria uma das principais diferenças entre go vernos neoextrativistas e rentistas clássicos nos quais as receitas eram exclusivamente capturadas por elites locais No caso do Bra sil embora não haja conexão direta entre a renda extrativa e programas sociais como o Programa Bolsa Família PBF a legitimação para intensificação das atividades extrati vas vem se dando por meio da vinculação da renda capturada pelo Estado na forma de royalties a investimentos em educação tanto no caso do petróleo FOLHA ONLINE 2012 quanto na proposta do novo marco legal da mineração BARROCAL 2013 24 tensões criadas pelo neoextrativismo Diferentes críticos têm se manifestado contra estratégias de desenvolvimento ba seadas fundamentalmente na extração de recursos naturais em geral e dentro desse contexto contra o neoextrativismo Nesse sentido dois grupos de tensões são comu mente levantados por um lado existem as tensões econômicas relacionadas aos os efeitos sobre as possibilidades de crescimen to econômico de longo prazo por outro lado há as tensões socioambientais que dizem respeito aos impactos sobre trabalhadores comunidades e meio ambiente 241 tensões econômicas Diferentes estudos têm buscado avaliar a relação entre o grau de dependência que os países têm dos recursos naturais em ge ral e de produtos minerais em particular e a sua taxa de crescimento econômico Algumas análises de longo prazo identi ficaram que muitas das economias depen dentes de tais produtos têm apresentado baixo crescimento ou mesmo crescimento negativo SACHS WARNER 1997 DA VIS TILTON 2005 PUGA 2007 Embo ra a correlação encontrada não necessa riamente indique causalidade TORVIK 2009 a existência de tal relação fortalece o argumento de que esta não seria uma es tratégia capaz de garantir o crescimento econômico no longo prazo 6 Por exemplo a Lei da Mineração no Peru aprovada em abril de 2008 foi elaborada em forte proximidade com empresas transnacionais particularmente canadenses BEBBINGTON 2009 No Brasil situações como essas podem ser encontradas como no caso do Coordenador Geral de Políticas e Programa para Mineração indicado em 2008 que era egresso da companhia Nacional de Grafite Ltda Da mesma forma os estudos que subsidiaram o Plano Nacional de Mineração 2030 foram encomendados a uma empresa de consultoria que pertencia a um excoordenador do Instituto Brasileiro de Mineração Neoextrativismo no Brasil 131 Como forma de explicar esse fenômeno autores têm se referido à maldição dos re cursos naturais Esta proposta defende que a abundância de recursos naturais geraria uma série de distorções econômicas e polí ticas que acabariam por reduzir a contribui ção das atividades extrativas para a econo mia BEBBINGTON et al 2008 A maldi ção dos recursos naturais seria associada a uma série de fenômenos específicos entre eles a deterioração dos termos de troca a elevada volatilidade dos preços dos recursos naturais a monotonização econômica e a doença holandesa7 Desde a década de 1950 a partir da hi pótese PrebischSinger muitos estudos têm tentado verificar o comportamento da razão de preços entre bens primários e manufatu rados Apesar de ainda não haver consenso há fortes indícios de que no longo prazo o preço das commodities tende a cair em relação ao preço dos bens manufaturados MORGAN SAPSFORD 1994 SAPSFORD BALASUBRAMANYAM 1994 Esse com portamento poderia ser explicado pelo fato de produtos intensivos em tecnologia pos suírem maior dinamismo e maior elasticida derenda do que os intensivos em recursos naturais além de contribuírem mais para o aprendizado e ganhos de produtividade DA VIS TILTON 2005 Além da tendência de queda no lon go prazo os preços de produtos primários apresentam grande instabilidade Esta par ticularidade acaba por dificultar o planeja mento econômico dos países dependentes de minérios uma vez que a receita gerada por impostos e royalties tende também a oscilar consideravelmente MORGAN SAPSFORD 1994 SAPSFORD BALASUBRAMANYAM 1994 DAVIS TILTON 2005 Acosta 2011 argumenta que esse processo tem um im pacto negativo potencializado pela depen dência das economias do sistema financeiro Segundo o autor não é incomum que nos momentos de preços elevados governos na cionais de economias extrativas lastreiem ou mesmo contraiam grandes empréstimos para financiar investimentos na infraestru tura com vistas à ampliação da produção Porém ao não realizar um planejamento para os momentos de queda nos preços em tais situações os países se veem sem recursos para saldar as dívidas contraídas provocan do dificuldades fiscais e instabilidade dos investimentos públicos A monotonização8 econômica diz respei to por sua vez à concentração de atividades 7 Os autores optam por discutir e problematizar a literatura pertinente acerca da maldição dos recursos a partir dos quatro efeitos econômicos acima apresentados termos de troca volatilidade de preço mono tonização econômica e doença holandesa em detrimento do vasto debate acerca das estruturas e formas políticoinstitucionais do crescimento econômico baseado em recursos naturais essencialmente negati vos da perspectiva da maldição dos recursos Fenômenos econômicos relacionados como a influência da composição diferencial da pauta exportadora de nações extrativas no crescimento econômico ISHAM et al 2005 e da seletividade extensiva e intensiva do investimento setorial constituindo novos padrões e escalas de desigualdade BRIDGE 2004 p 411 aprofundam e sofisticam a referida opção Nesse sentido questões como políticas inadequadas adotadas por Estados predatórios NEUMAYER 2004 e possíveis estratégias para minimizar os impactos da maldição dos recursos MIKESELL 1997 estão além do escopo deste trabalho 8 A noção de monotonização vem sendo desenvolvida a partir do intenso debate promovido por agentes sociais representativos como organizações não governamentais movimentos sociais e comunidades atingidas em torno do novo marco legal da mineração Os autores agradecem especialmente a Carlos Alberto Lucio Bittencourt Filho consultor e pesquisador do IBASE por sua inspiração original 132 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 em apenas um setor Uma vez que existem grandes retornos financeiros em setores espe cíficos na forma de oportunidades de lucros e salários observase um processo de migra ção de investimentos e mão de obra de ou tras áreas para o setor extrativo A principal consequência seria a redução da diversidade produtiva e o aumento da dependência eco nômica do setor intensivo em recursos natu rais Essa situação mostrase especialmente preocupante no caso de recursos não renová veis uma vez que o esgotamento das reservas tende a levar à depressão econômica pela au sência de atividades alternativas Apesar de não necessariamente usarem o conceito de monotonização econômica diferentes autores têm descrito diversas for mas pelas quais a intensificação de ativi dades extrativas pode reduzir a diversidade econômica de um país ou região Albavera 2004 comenta que o encadeamento para frente ou para trás apresenta limitações e riscos e não pode ser tomado como consequ ência natural da implantação das atividades extrativas Alvim e Fantine 2008 por sua vez identificam sinais desse processo nos anos 1970 no Brasil Segundo os autores o governo e as empresas optaram naquele momento por direcionar parte significa tiva dos investimentos para a produção de commodities e para a respectiva infraestru tura Como consequência quando os pre ços foram reduzidos na década de 1980 a produtividade destes investimentos foi sim plesmente esterilizada Da mesma forma Gudynas 2012b comenta que as tentativas de diversificação da produção colocadas em prática no Chile após a ditadura militar não tiveram muito êxito Por fim a doença holandesa referese aos efeitos da intensa entrada de capital inter nacional nos países e regiões especializados na exploração de recursos naturais gerando problemas macroeconômicos Alguns eco nomistas indicam que o crescimento rápido da exportação de produtos extrativos ten de a gerar uma apreciação do câmbio bem como uma elevação dos salários locais tor nando economias nacionais e regionais me nos competitivas Como impacto final esse processo tornaria outros setores econômicos menos dinâmicos reforçando a monotoni zação econômica mencionada anteriormen te DAVIS 1995 DAVIS TILTON 2005 BE BBINGTON et al 2008 Apesar desse cenário de elevado risco eco nômico não é incomum que governos de paí ses neoextrativistas argumentem que as políti cas corretas aplicadas no momento adequa do seriam capazes de fazer com que os países escapassem da maldição dos recursos Porém segundo Bebbington 2009 as questões es truturais colocadas e as margens de manobra existentes permitem classificar tais posturas como otimistas uma vez que a chance de repetição dos problemas identificados é muito maior do que a de sua superação 242 tensões socioambientais O segundo grupo de tensões criadas pelo paradigma neoextrativista diz respeito aos seus impactos ambientais e sociais em particular no contexto local Também cha madas de tensões territoriais GUDYNAS 2012b elas estão associadas ao processo de distribuição desigual dos recursos e serviços ambientais bem como da repartição injusta dos riscos ambientais e estão nas origens de conflitos descritos e denunciados por mo vimentos que lutam por justiça ambiental PORTO MILANEZ 2009 A indústria extrativa mineral é por de finição intensiva em recursos naturais e poluição causando impactos negativos re levantes sobre os territórios onde se locali Neoextrativismo no Brasil 133 za Essas características ao contrário de se rem mitigadas são acentuadas no contexto neoextrativista Ademais o fato de os go vernos desses países terem flexibilizado as exigências ambientais para implantação de projetos extrativistas como estratégia para estimular tais atividades apenas reforça a dimensão dos riscos ambientais envolvidos no setor GUDYNAS 2012a 2012b As atividades extrativas produzem mu danças significativas nos territórios Nas áreas rurais tendem a causar poluição at mosférica contaminação hídrica desmata mento e erosão já nas regiões urbanas os efeitos incluem inchaço urbano faveliza ção aumento da violência exploração se xual e sobredemanda dos serviços públicos de saúde saneamento e segurança Nesse sentido as comunidades locais tendem a ar car com a maioria dos impactos negativos enquanto que grande parte dos benefícios é concentrada pelas empresas ou pelos go vernos nacionais caracterizando um grande desequilíbrio na distribuição dos benefícios e prejuízos gerados DAVIS TILTON 2005 Além dos impactos sociais e ambientais mencionados outros problemas surgem quando as atividades extrativas implantam enclaves produtivos em áreas remotas Nes sas situações elas ainda causam a fragmen tação territorial deslocando comunidades locais e inviabilizando formas tradicionais de reprodução social Problemas dessa natu reza são muitas vezes ignorados pelo poder público porque os Estados neoextrativistas de forma geral desconsideram demandas não econômicas tais como aquelas basea das em valores culturais ou religiosos Pelo contrário quando alguma reivindicação é feita os debates são limitados ao valor das compensações econômicas e à definição dos grupos passíveis de receber compensações GUDYNAS 2012a Conforme mencionado anteriormente as práticas neoextrativistas são muitas ve zes legitimadas como sendo de interesse nacional Considerando que as demandas concorrentes e questionamentos ao modelo são muitas vezes feitos por grupos nume ricamente pequenos e marginalizados no contexto nacional tais movimentos são em grande medida desqualificados pelos go vernos centrais sendo definidos como po líticos radicais ou ainda identificados como práticas de antidesenvolvimento GUDYNAS 2012a Sendo assim a postura geral conforme resumida por Bebbington 2009 p 19 consiste em afirmar que os recursos pertencem à nação e não a uma co munidade indígena ou local e que eles se rão desenvolvidos de modo que as consul tas serão apenas um processo administrati vo e as discordâncias não serão permitidas 3 sinais do neoextrativismo no brasil e a reprimarização da economia No Brasil o debate sobre neoextrati vismo é embrionário Como o país possui uma estrutura produtiva mais complexa e um perfil comercial distinto do restante da América Latina sua população raramente o identifica como um país extrativo BAR TON 2006 Ao mesmo tempo vem se apro fundando aqui um debate sobre as possibili dades do neodesenvolvimentismo definido como um modelo no qual um Estado forte através de políticas nacionais de desenvol vimento adequadas deveria estimular o florescimento de um mercado forte e junto com ele promover o crescimento econômi co necessário para reduzir a desigualdade social Sua estratégia fundamental se baseia na redefinição de sua inserção internacional e para tanto seria função do Estado investir na infraestrutura do país para aumentar sua 134 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 competitividade bem como apoiar finan ceiramente empresas que tivessem chance de se tornar agentes globais SICSÚ PAULA MICHEL 2007 Apesar das diferenças entre neodesen volvimentismo e neoextrativismo os dois conceitos apresentam muitos pontos em co mum Este é o caso por exemplo do enten dimento do crescimento econômico como sinônimo de desenvolvimento do foco na inserção internacional e da definição do Estado como protagonista do processo de mudança GUDYNAS 2012b Além disso políticas desenvolvimentistas quando não plenamente implementadas ou quando restringidas por aspectos externos podem aprofundar o perfil extrativo de uma região ou mesmo do país Este por exemplo foi o caso do Programa Grande Carajás PGC que em sua concepção original argumen tava que a implantação de 22 produtoras in dependentes de ferro gusa sete unidades de ferroligas e uma unidade de silício metálico seria suficiente para induzir o surgimento de um grande polo mínerometalúrgico in cluindo fábricas de bens de capital e bens fi nais CARVALHO 2001 Passados quase 30 anos o projeto entretanto ficou limitado a uma grande mina uma ferrovia um porto e 17 guseiras que produzem de forma inter mitente bens semiacabados exclusivamen te para a exportação Ao mesmo tempo o contexto do atual regime de preços dos recursos minerais e da fácil renda da exportação de produtos pri mários pode ser bastante tentador GUDY NAS 2012a levando grupos industriais a mudar o direcionamento de seus negócios e os transformando em empresas extrativas Talvez o caso mais emblemático dessa situa ção seja a Companhia Siderúrgica Nacional SA CSN símbolo do desenvolvimentismo brasileiro que em 2011 teve mais da metade do seu resultado operacional decorrente da extração de minério de ferro no município de Congonhas MG e não da produção de aço RIBEIRO 2012 Devido a esses fatores considerase per tinente avaliar até que ponto podem ser identificadas tendências neoextrativistas na economia brasileira Estes sinais já vêm sendo discutidos por diferentes autores que estudam a reprimarização da pauta de expor tação9 e a inserção regressiva do Brasil no co mércio internacional Esses trabalhos buscam avaliar até que ponto a exportação de bens mais complexos e de maior valor agregado está perdendo espaço para a exportação de bens primários agrícolas e minerais De forma geral essa tendência já havia sido identificada no início dos anos 2000 por Gonçalves 2001 p 1 quando o autor defi niu o processo de inserção regressiva como envolvendo tanto a significativa perda de competitividade internacional da indústria brasileira quanto o fenômeno da reprimari zação da pauta exportadora Para esse au tor a pauta de exportação do Brasil passou por uma fase upgrading ao longo da déca da de 1980 e da primeira metade dos anos 1990 tendo tal comportamento sido inver tido posteriormente Naquele momento tal processo foi explicado principalmente pela mudança na estrutura das exportações re presentada pelo aumento da importância relativa de produtos agrícolas 9 Ao se utilizar o termo reprimarização da pauta de exportação não se pretende sugerir que necessariamente haja uma redução da venda de bens industrializados mas sim que seu aumento tem sido inferior ao crescimento das exportações de produtos básicos BASTOS GOMES 2011 Neoextrativismo no Brasil 135 Uma análise de mesma natureza foi feita por De Negri e Alvarenga 2011 que apon taram a ampliação significativa nos últimos anos da participação das commodities pri márias na pauta de exportações brasileiras conforme apresentado no Gráfico 4 Desta case assim um movimento de insulamento de setores econômicos de alta competitivi dade intensivos em recursos naturais que tem como contraparte o desaparecimento de outros o que se traduz em simplifica ção tendo como eixo dinâmico os segmen tos de commodities primárias Esta especialização reversa constituiria uma das expressõeschave da dependência externa da economia nacional sendo a ati vidade extrativa mineral seu principal motor na atualidade Por exemplo em 2009 ape nas a indústria extrativa mineral respondeu por cerca de 20 das exportações brasileiras e a mais de 60 do saldo da balança comer cial Dentro desse contexto Squeff 2012 p 45 argumenta que os resultados da balan ça comercial brasileira têm se mantido posi tivos somente por conta dos superávits dos produtos não manufaturados Gráfico 4 evolução da exportação brasileira por intensidade tecnológica Fonte mdIc 2013 No âmbito mais estrito da indústria ex trativa mineral ainda seria o segmento de bens primários a se destacar em detrimen to dos de semimanufaturados ou manufa turados Dentre os bens primários por sua vez os minerais metálicos exercem ampla dominância uma vez que o valor exporta do deste grupo tem excedido grandemente o valor conjunto de minerais nãometálicos minerais energéticos e gemas e diamantes DNPM 2010 Conforme mencionado an teriormente o aumento da exportação dos 1997 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 1996 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 1998 1999 Produtos não industriais Médiaalta tecnologia Baixa tecnologia Médiabaixa tecnologia Alta tecnologia 136 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 minérios devese especialmente ao efeito China sendo seu crescimento econômico identificado como principal causa da eleva ção dos preços das commodities em particu lar metálicas e industriais PRATES 2007 O impacto deste crescimento na pauta de ex portação do Brasil foi verificado por Bastos e Gomes 2011 que estimaram que o efeito estrutura combinada10 da exportação do mi nério de ferro do Brasil para a China variou 1491 entre 19971999 e 20072009 A principal crítica à validade da tese da reprimarização da economia nacional diz respeito ao fato de que embora efetivo este processo estaria ocorrendo apenas no nível da pauta exportadora Entretanto um olhar mais detido revela que em realidade o re ferido processo apesar de recente se rela ciona diretamente à composição do setor secundário assim como à qualidade de sua participação no PIB Como pode ser verifica do no Gráfico 5 enquanto as atividades da construção civil e da produção e distribui ção de eletricidade gás água esgoto e lim peza urbana mantiveram sua participação constante entre 2000 e 2012 de 55 para 58 e de 34 para 31 respectivamen te observouse uma ascensão importante da indústria extrativa mineral que ampliou sua participação no produto nacional de 16 para 43 Não coincidentemente a indústria da transformação decresceu em termos relativos de 172 para 133 10 As autoras definem o efeito estrutura combinada como sendo a evolução relativa de cada mercado de destino ponderada pela importância relativa dessa parcela de mercado para o Brasil Gráfico 5 Participação atividades econômicas selecionadas no valor adicionado brasil 20002012 Fonte IbGe 2012 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 25 20 15 10 5 0 172 133 2012 Extrativa mineral Transformação Construção civil Produção distribuição de eletricidade gás esgoto e limp Urb 16 43 Neoextrativismo no Brasil 137 Dessa forma dados empíricos indicam que setores manufatureiros vêm perdendo espaço relativo para os setores extrativos e de transformação primária tanto na pauta de exportação quanto no PIB do país Embora essas mudanças não tenham sido suficientes para permitir a identificação da economia brasileira como uma economia extrativa tais tendências sugerem a necessidade de cuida dos para que esse modelo não se aprofunde No entanto a proposta que vem se conso lidando sobre o novo marco legal da mine ração reforça a presença de um paradigma neoextrativista emergente que pode vir a aprofundar as tensões mencionadas na seção 4 a proposta do novo marco legalda mineração e o risco da consolidação dos princípios neoextrativistas Nesta seção propõese avaliar até que ponto princípios associados à racionali dade neoextrativista podem ser identifica dos na proposta do novo marco legal da mineração11 Quando da elaboração deste artigo o governo ainda não havia dispo nibilizado a íntegra da nova legislação e por esse motivo a análise apresentada é baseada nos documentos públicos dispo nibilizados pelo MME na divulgação no novo marco regulatório12 41 Atrair investimento para o setor mineral estimular a maximização do aproveitamento das jazidas promover a mineração formal e contribuir para a elevação da competitividade das empre sas de mineração A preocupação do Governo Federal com relação à produção mineral é muito calca da no conceito do determinismo mineral e no pressuposto de que todo o minério dis ponível deve ser minerado Dessa forma uma das principais motivações subjacentes à proposta do novo marco legal é a criação de instrumentos que aumentem a quantida de de jazidas exploradas no país Nesse sen tido o Código Mineral de 1967 é criticado por permitir que pessoas ou empresas dete nham títulos de outorga e não desenvolvam nenhuma atividade de extração de recursos minerais como argumentado pelo Ministro de Minas e Energia nós temos hoje cerca de 160 mil áreas distribuídas por todo o mapa geográfico bra sileiro havendo áreas em todas as latitudes deste País enquanto que apenas oito mil des tas áreas são de fato produtivas e estão sendo exploradas regularmente Em 160 mil apenas oito mil Isto porque somos regidos por uma lei como disse frouxa que não corresponde em sua integralidade aos melhores interesses nacionais LOBÃO 2010 11 A noção de novo marco legal da mineração se refere à mudança prevista nas relações entre Estado empresa e sociedade no que concerne à legislação básica e à estrutura políticoinstitucional que regulam a indústria extrativa mineral Os três principais elementos da referida modificação dizem respeito aos aspec tos procedimentais de licenciamento da exploração mineral lavra à dimensão institucional da regulação pública e à regulamentação tributária setorial A discussão sobre o novo marco legal elaborado pelo Poder Executivo em substituição ao Decretolei nº 2271967 foi iniciada em 2009 pelo Ministério de Minas e Energia GOY 2013 12 As subseções foram organizadas de acordo com os objetivos do novo marco regulatório explicitamente divulgados pelo MME 2009 138 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 Nesse sentido as principais mudanças dizem respeito à criação de garantias da re alização de atividades mineradoras ou pena lidades à retenção de direitos de lavra Dessa forma propõese que as licenças de pesquisa tenham uma duração máxima de cinco anos prorrogável apenas por mais três e que as li cenças de lavra tenham prazo máximo de 35 anos renováveis quando as empresas cum prirem uma série de condições contratuais Da mesma forma são propostos procedimen tos de fiscalização mais rigorosos de modo a garantir que as empresas cumpram as ativi dades previstas em contrato bem como cri térios para devolução das áreas MME 2009 2010c VALOR ECONÔMICO 2010 Uma novidade com relação à concessão do direito de lavra é a redefinição das cha madas Áreas de Relevante Interesse Mineral ARIM Estas áreas são definidas como regi ões de interesse estratégico pelos tipos e ca racterísticas dos minérios encontrados cuja mineração é feita a partir de procedimentos especiais Em linhas gerais essas áreas são determinadas pelo Conselho Nacional de Política Mineral discutido na próxima se ção e os direitos para minerar estas regiões definidos por licitação MME 2010c A preocupação com a formalização da pro dução mineral é listada entre os objetivos da proposta de marco legal porém sem nenhuma ação concreta vinculada De qualquer forma tal objetivo também se alinha com a preocu pação de maximização da extração uma vez que mineradoras formais e mais profissionais tendem a ser mais eficientes em suas ativida des extrativas Além disso também se apro xima do objetivo de ampliação da captura de parcela da renda extrativa uma vez que mine radoras formalizadas pagam impostos e royal ties aumentando a arrecadação tributária Este objetivo se alinha portanto ao pres suposto do crescimento econômico baseado na apropriação da natureza Além disso a pre ocupação com a elevação da competitividade na indústria extrativa mineral sugere tam bém o ajuste do foco na exportação dos re cursos e bens de base mineral reconfigurando a inserção brasileira na divisão internacional do trabalho baseada em vantagens compara tivas e sob formas concorrenciais dinâmicas 42 Fortalecer a ação do estado no processo regulatório Do ponto de vista institucional há duas mudanças no marco legal da mineração buscando fortalecer o controle estatal dos recursos minerais a transformação do De partamento Nacional de Produção Mine ral DNPM em uma agência reguladora a Agência Nacional de Mineração ANM e a criação do Conselho Nacional de Política Mineral CNPM De acordo com o Código Mineral de 1967 o principal agente público envolvido no processo de licenciamento mi neral é o DNPM uma autarquia vinculada ao MME cujas superintendências regionais são responsáveis por receber os requerimen tos de pesquisa e de lavra e avaliálos A proposta da ANM segue o modelo das agências reguladoras existentes como a Agência Nacional de Energia Elétrica ANE EL e a Agência Nacional de Petróleo Gás Natural e Biocombustíveis ANP Esta nova agência tem como principais atribuições promover a regulação e a fiscalização da ati vidade de mineração arrecadar os royalties associados à atividade minerária e exercer a mediação em conflitos de interesse Sua direção é feita por um colegiado nomeado pela Presidência da República e submetido à aprovação do Senado Federal MME 2009 As principais mudanças institucionais pro postas pelo novo marco regulatório são re sumidas na Quadro 3 Neoextrativismo no Brasil 139 Quadro 3 mudanças institucionais propostas Competência Órgãos responsáveis Código Mineral de 1967 Modelo proposto Política setorial MME CNPM Poder concedente MME MME Regulação e fiscalização DNPM ANM Arrecadação royalties DNPM ANM Fonte adaptado de mme 2010c dos diretores da ANM quanto pela definição da composição do CNPM Nesse sentido pode ser identificada uma maior preocupação com o controle do uso dos recursos minerais o que vai ao encontro do paradigma neoextrativista Por outro lado a proposta parece ir ainda além e ao invés de garantir o controle do Estado transfere esse poder para o Chefe do Poder Executivo Esse viés centralizador não apenas diminui a participação democrática nas deci sões mas ainda permite ações autoritárias por parte do Governo Federal 43 aprimorar e dar mais transparência à forma de recolhimento controle e fiscalização Apesar de o objetivo explícito ser apri morar o recolhimento o que está implícito nas ações é o aumento da arrecadação por meio da mudança na cobrança da Compen sação Financeira pela Exploração de Recur sos Minerais CFEM No Brasil os royalties da mineração são pagos através da CFEM instituída pelas leis 79901989 e 80011990 e correspondem ao pagamento pelo direito de uso de recursos pertencentes à União O CNPM por sua vez foi inspirado no exemplo do Conselho Nacional de Políti ca Energética CNPE e tem sua composição definida por decreto do Poder Executivo13 Possui caráter consultivo assessorando a Presidência da República mas também de liberativo com o poder de emitir resoluções referendadas posteriormente pela Presidên cia O CNPM tem como principais funções estabelecer diretrizes para o planejamento do setor e para a promoção da agregação de valor criar áreas especiais de mineração e definir procedimentos licitatórios das ARI Ms e ainda manifestarse sobre a criação ou a alteração de áreas que importem restrição ou impedimento às atividades de mineração como por exemplo Unidades de Conser vação UCs e Terras Indígenas TIs MME 2009 2010b VALOR ECONÔMICO 2010 Sendo assim a mudança no marco regula tório tende a aumentar o poder discricionário do Governo Federal sobre os recursos minerais Mais do que isso suas propostas possuem um caráter centralizador uma vez que concedem novos poderes ao Poder Executivo Federal Segundo o marco proposto a Presidência as sume a responsabilidade tanto pela nomeação 13 O Conselho Nacional de Política Energética formado por pessoas designadas pelo Presidente da República é composto por nove ministros Minas e Energia Ciência e Tecnologia Planejamento Orçamento e Gestão Fazenda Meio Ambiente Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior Casa Civil Integração Nacional e Agricultura Pecuária e Abastecimento e um representante dos estados da sociedade civil das universidades da Empresa de Pesquisa Energética EPE e o Secretário Executivo do Ministério de Minas e Energia 140 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 A arrecadação da CFEM é calculada como um percentual do faturamento líquido da em presa mineradora que varia de acordo com o mineral O tributo é então distribuído entre o município 65 e o estado 23 onde se dão a lavra o DNPM 10 e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 2 BRASIL 1990 Tanto o MME quando as empresas mineradoras possuem diferentes propostas para mudança da CFEM De forma geral as alternativas dizem respeito ao cálcu lo da contribuição e à sua aplicação Com relação ao cálculo existe o desejo por parte do Governo Federal e dos municí pios mineradores de aumentar a alíquota co brada das empresas passando o percentual médio de 2 para 4 WARTH 2013 Uma segunda mudança diz respeito à base de cál culo da CFEM Na nova proposta do MME empregase a receita líquida e não mais o faturamento líquido Assim há menor dedu ção antes do cálculo da contribuição14 o que aumenta o valor arrecadado MME 2010a Em contrapartida existe uma intensa pressão por parte das empresas mineradoras para que um eventual aumento no paga mento da CFEM seja compensado pela re dução na carga tributária sob o argumento de que tal aumento iria reduzir a competi tividade do minério brasileiro no mercado internacional Esse argumento é baseado em um estudo encomendado pelas próprias empresas por meio do Instituto Brasileiro de Mineração IBRAM que afirma que o setor mineral no Brasil apresenta uma das três cargas tributárias mais elevadas do mundo ERNST YOUNG 2008 Entretanto tais afirmativas precisam ser avaliadas cuidadosamente pois tal conclusão está longe de ser consensual Outra pesquisa com base em 30 jurisdições países estados ou províncias apresenta uma conclusão bas tante diferente indicando que a tributação no Brasil seria somente superior a da China Cazaquistão Suécia e Chile Segundo este es tudo a tributação mineral no Brasil 3515 é muito inferior aos 638 aplicado pela província de Ontário no Canadá ou 499 do estado do Arizona nos EUA Sendo as sim o estudo conclui que as companhias mineradoras têm pouco do que se queixar e fundamentalmente uma revisão em sentido ascendente das alíquotas minerais têm pouca possibilidade de afetar negativamente o nível de investimento no setor SANTOS 2012 p 12 Indo ao encontro de tais afir mativas uma pesquisa realizada pelo Fraser Institute com representantes de mais de 800 empresas mineradoras em todo o mundo in dica que apenas 1 dos entrevistados não investiria no Brasil por causa dos impostos MCMAHON CERVANTES 2012 Dessa forma existe uma disputa inten sa sobre a renda extrativa De um lado as empresas tentam garantir a manutenção dos altos lucros que vêm obtendo recentemente dado o contexto de alta dos preços dos mi nérios no mercado mundial Em oposição o Governo Federal tenta aumentar a partici pação do Estado nesses resultados em con formidade com estratégias recorrentes pro postas na esfera do neoextrativismo 14 Essa decisão provavelmente devese ao fato de muitas empresas superestimarem seus gastos de transporte incluindo nas deduções valores associados a máquinas e equipamentos usados na operação das minas esteiras pás carregadeiras caminhões fora de estrada etc que deveriam ser contabilizados como despesas operacionais LIMA et al 2011 15 Representantes públicos defendem que a discussão sobre os royalties não ocorra de forma isolada mas sim a partir de um debate mais amplo a respeito dos impostos sobre a mineração MME 2009 Neoextrativismo no Brasil 141 44 melhorar a distribuição da riqueza gerada pela mineração e estimular o desenvolvimento de regiões produtoras Outro debate colocado pela proposta de novo marco legal diz respeito ao destino dos recursos da CFEM Uma primeira mudança re ferese ao uso que os municípios devem dar à receita obtida Segundo as leis de 1989 e 1990 somente há a proibição de que esses recursos sejam utilizados em pagamento de pessoal ou de dívidas Na grande maioria dos municípios mineradores estudados por Enriquez 2007 a CFEM era enviada para um caixa único mu nicipal16 ou não tinha destino específico Documentos referentes ao novo marco regulatório mencionam um possível Fun do Especial da Mineração gerido por um Conselho Deliberativo com participação de Governo Federal e da sociedade e utilizado para contemplar municípios adjacentes im pactados pela mineração ENRIQUEZ 2010 MME 2010a Por meio desse fundo o MME amplia o número de municípios beneficia dos pela CFEM seguindo diretrizes seme lhantes àquelas adotadas na distribuição dos royalties do petróleo Outra mudança se relaciona à pretensão de restrição da aplica ção dos recursos a alguns fins específicos como a diversificação econômica e o desen volvimento de capital humano Desse modo os fundos especiais aparecem como estratégia de legitimação da atividade mineral Assim como o Bono Juancito Pin to depende da extração de hidrocarbonetos para a sua manutenção os fundos especiais são vinculados à continuidade ou expansão da mineração Mais do que isso a transferên cia dos fundos para os municípios estimula os governos locais a criarem políticas que in tensifiquem a mineração em seus territórios 45 Fomentar a agregação de valor na cadeia produtiva mineral Os documentos disponibilizados pelo MME 2010b sobre o novo marco legal não qualificam conceitos como capital hu mano ou diversificação da economia mencionados na seção anterior No primei ro caso se mantida a visão setorial existe a possibilidade de que tais recursos sejam concentrados no treinamento de trabalha dores para atuar na cadeia mineral apro fundando a dependência extrativa No Plano Nacional de Mineração 2030 no entanto o MME 2011 p 75 relaciona a diversificação à agregação de valor via beneficiamento mineral no país Esta estratégia sugere con fusão entre diversificação e verticalização da cadeia assim como ausência de intenção explícita de reduzir a dependência das loca lidades da extração mineral Dentre os objetivos propostos pelo novo marco regulatório este é o único com ligação menos direta com o neoextrativismo estando mais relacionado a uma perspectiva neode senvolvimentista Seguindo essa linha de ra ciocínio o Governo Federal busca estimular a industrialização baseandose no argumento de que ela aumentaria o valor agregado dos produtos elevaria a receita das exportações geraria mais empregos e permitiria a arre cadação de mais impostos como defendido pelo então Diretor do DNPM 16 Itabira MG era uma das poucas exceções uma vez que a Prefeitura dessa cidade motivada pelo esgotamento iminente de suas jazidas aplicava os recursos da CFEM em um fundo para pesquisa tecnológica e diversificação da economia local Outra exceção foi o município de Forquilhinha SC que vinculou a CFEM a um fundo municipal de meio ambiente 142 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 Acho que o fato de termos esse modelo sem dúvida alguma estimulará inclusive permi tirá que o governo possa exigir investimen tos na cadeia produtiva e permitirá que o grau de agregação de valores da matériapri ma mineral possa também estar sendo pensa do e avançar de tal sorte que a matériaprima mineral não seja exportada sem a necessária agregação de valor ou seja o aço seja produ zido aqui ou o refino do cobre seja feito aqui ou seja a matériaprima não seja exportada como concentrada e sim como já o bem final Isso é fundamental porque aqui é que vão es tar sendo gerados os empregos a renda circu lará aqui e certamente o País estará ganhan do NERY 2010 Apesar da tentativa de romper com o paradigma neoextrativista arriscase apro fundar o modelo ignorando dinâmicas es truturais próprias dos mercados globais de minérios e bens minerais beneficiados Con forme debatido na seção 3 durante o perío do desenvolvimentista houve uma série de iniciativas de desenvolvimento da indústria de base centradas em diferentes redes de ex tração mineral que acabaram apenas por gerar enclaves extrativos Assim conforme já diagnosticado por Bebbington 2009 o Governo Federal apresenta uma perspectiva mais otimista do que realista ao apostar na repetição de tais políticas 46 estimular a prevenção da saúde a segurança das minas e o controle ambiental e contribuir para o desenvolvimento sustentável Além dos cinco objetivos debatidos aci ma documentos governamentais afirmam que o novo código mineral visa ainda con tribuir para o desenvolvimento sustentável sem entretanto qualificar este conceito ou definir ações concretas implicadas MME 2010b Apesar da falta de detalhamento lançar dúvidas sobre o grau de prioridade dado ao tema a forma como ele é descrito no Plano Nacional de Mineração 2030 suge re como a questão deverá ser tratada De forma geral as principais ações pro postas para promover uma produção sus tentável podem ser organizadas em dois grandes grupos Por um lado há as ações de melhoria de desempenho operacional que incluem utilização mais eficiente de energia e de recursos hídricos bem como reaprovei tamento de resíduos De outro lado existem as medidas relacionadas ao cumprimento de requerimentos legais como a realização de um inventário de minas abandonadas e a fis calização de barragens MME 2011 p 129 Podese afirmar então que o Governo Federal possui uma visão restrita dos im pactos ambientais gerados pela indústria extrativa mineral Ele adota como pressu posto que os impactos socioambientais da mineração somente ocorrem por má gestão de modo que uma mineração sustentável é possível desde que suas atividades sejam realizadas de forma adequada Esta ideia se baseia na crença de que não é necessá rio criar limites para a atividade mineral apenas é preciso guiála na direção correta Essa leitura sugere que o Plano Nacional de Mineração 2030 que orientou a formulação da proposta de novo marco legal apresenta uma visão utilitarista da natureza entendi da apenas como um recurso a ser explorado pela sociedade Dessa forma nesse quesito também parece haver alinhamento ideológi co de apropriação da natureza entre o marco proposto e as ideias neoextrativistas O Quadro 4 tenta resumir as principais questões apontadas nesta análise De forma geral o que se pode perceber é uma forte asso ciação da proposta de novo marco legal da mi Neoextrativismo no Brasil 143 neração com os princípios neoextrativistas A implementação dessa proposta cria o risco da intensificação do modelo neoextrativista no país aprofundando as tensões econômicas e socioambientais mencionadas anteriormente Quadro 4 avaliação do novo marco legal a partir do paradigma do neoextrativismo Objetivos do novo marco legal Estratégia Relação com neoextrativismo Atrair investimento para o Mudança no processo de Geração de riqueza pela extração setor mineral contribuir para a concessão de direito de lavra das riquezas nacionais e pelo elevação da competitividade para reduzir especulação aumento da participação no das empresas de mineração com títulos mercado internacional estimular a maximização do aproveitamento das jazidas e Criação das ARIM promover a mineração formal Fortalecer a ação do Estado Transformação do DNPM em Estado como protagonista das no processo regulatório agência ANM atividades extrativas Criação do CNPM Aprimorar e dar mais Mudança no sistema de cobrança Aumentar participação do Estado transparência à forma de dos royalties nos resultados econômicos recolhimento controle e fiscalização Melhorar a distribuição da Criação do Fundo Especial Uso de parte dos recursos gerados riqueza gerada pela mineração da Mineração pela extração em políticas sociais e estimular o desenvolvimento de regiões produtoras Fomentar a agregação de valor Cobrança de royalties Vínculo ao pensamento neode na cadeia produtiva mineral progressivos senvolvimentista Estimular a prevenção da Nenhuma estratégia concreta Visão utilitarista da natureza saúde a segurança das minas entendida apenas como recurso e o controle ambiental e natural a ser explorado contribuir para o desenvolvimento sustentável Fonte os autores a partir de mme 2010b 2010a Entretanto essa não seria a única estra tégia possível Existem diferentes pressu postos que poderiam ser incorporados ao novo marco legal da mineração que cons truíssem outra relação dessa atividade com a sociedade e o meio ambiente Alguns desses pontos são discutidos na próxima seção 5 considerações finais Ao longo desse texto procurouse avaliar em que medida o neoextrativismo pode ser percebido no Brasil tendo permitido iden tificar elementos desse paradigma em duas dimensões sendo uma econômica e outra 144 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 política Na dimensão econômica o neoex trativismo foi associado à reprimarização da pauta de exportação brasileira e do PIB definida como o aumento da importância relativa das atividades de extração mineral visàvis os demais setores econômicos Na dimensão política características específi cas do paradigma neoextrativista puderam ser associadas aos principais objetivos da proposta de novo marco legal mineral De forma geral a proposta de novo mar co legal apresenta como principal caracte rística além de uma intenção elementar de expansão da produção mineral um forte componente centralizador O reforço do po der discricionário do Governo Federal so bre a indústria extrativa mineral expressa assim dois elementos chave O primeiro diz respeito à centralidade dos resultados eco nômicos do setor quanto à adição de valor e ao comércio exterior para a contabilida de nacional O segundo se relaciona à neces sidade de expansão da captura de parcela da renda extrativa no contexto da fragilidade do equilíbrio das contas públicas como eixo de uma estratégia redistributiva restrita via políticas sociais e mais importante para a manutenção de sua legitimidade política A avaliação do paradigma neoextrati vista aqui apresentada sugere que o apro fundamento desse modelo pode gerar uma série de tensões tanto econômicas quanto socioambientais Entre as tensões econômi cas podem ser listadas a deterioração dos termos de troca a elevada volatilidade dos preços dos recursos naturais a monotoniza ção econômica e a doença holandesa to das elas com fortes impactos sobre o desen volvimento econômico de longo prazo Por outro lado entre as tensões socioambientais estão degradação da paisagem poluição at mosférica contaminação hídrica inchaço urbano favelização e comprometimento da qualidade dos serviços públicos nas cidades Todavia argumentamos que essa não é a única alternativa possível e que outros pa radigmas poderiam ser adotados para evitar a concretização dos cenários aqui descritos Como ponto de partida deveria ser aban donada a perspectiva tecnocrática setorial adotada na formulação do marco legal e substituída por estratégias democráticas e participativas Nesse sentido é importan te mencionar que a população vive sobre o solo e portanto é o uso do solo que deve definir a exploração do subsolo e não o con trário Sendo assim as comunidades que vi vem nas áreas de mineração deveriam ser as primeiras a serem ouvidas e a elas deveria ser garantido o direito de participar ativa mente desse debate A partir da discussão com esses gru pos novas propostas poderiam surgir para prevenir ou ao menos mitigar alguns dos impactos socioambientais do setor Entre as questões a serem debatidas podem ser lista das a escala de operação e os efeitos cumu lativos de diferentes minas e de suas redes de produção extensivas implicando em portos e minerodutos ferrovias e terminais portuários etc sobre o mesmo território o monitoramento participativo dos impactos e a coexistência da indústria extrativa mi neral com outras atividades Ainda nesse rol de questões alguns países como Peru e Ar gentina vêm debatendo o conceito de terri tórios livres de mineração bem como o di reito de dizer não que poderão criar novos instrumentos para que as pessoas decidam como deve ser ocupado seu território Complementando essas questões tam bém parece ser fundamental debater aspec tos associados às tensões econômicas gera das pela mineração Embora devido à estru tura econômica do país seja pouco provável que os impactos mencionados acima sejam Neoextrativismo no Brasil 145 sentidos nacionalmente há indícios de que algumas regiões mineradoras tradicionais podem vir a passar por depressão econô mica devido ao esgotamento dos minérios explorados Para evitar esse tipo de arma dilha fazse necessária a discussão sobre a transição do modelo atual para uma possível economia pósextrativa Todavia as associações empresariais re presentativas da indústria extrativa mineral e os organismos governamentais relaciona dos à sua regulamentação são pouco incli nados a expandir tanto o temário quanto a gama de agentes implicados no novo marco regulatório da mineração Como consequên cia um debate público sobre o novo marco regulatório da mineração é impedido reco brindo as transformações que se anunciam de um verniz antidemocrático De fato apenas uma participação ampla deliberativa e trans parente pode proporcionar legitimidade às escolhas econômicas políticas e sociais que definem o fenômeno do neoextrativismo ReFeRêNcIas ACOSTA A Extractivismo y neoextractivismo dos caras de la misma maldición In GRUPO PERMANENTE DE TRABAJO SOBRE ALTERNA TIVAS AL DESARROLLO In Más alla del desar rollo Quito AbyaYala Fundación Rosa Luxem burg 2011 ALBAVERA F S El desarrollo productive basa do em la explotación de los recursos naturales Santiago de Chile CEPAL 2004 ALTVATER E The growth obsession In PAN TICH L LEYS C In Socialist register a world of contradictions London Merlin Press 2002 p7392 ALVIM C F FANTINE J Commodismo pré sal e desenvolvimento In Economia Ener gia vXII n67 2008 BARROCAL A Minério por escolas Carta Capi tal p 2226 20 fev 2013 BARTON J R Ecodependency in Latin Ameri ca In Singapore Journal of Tropical Geogra phy v27 n2 p134149 2006 BASTOS S Q A GOMES J E Modificações na estrutura das exportações brasileiras análi se diferencialestrutural para o período de 1997 a 2009 In Revista de História Econômica Economia Regional Aplicada v6 n11 p111 132 2011 BEBBINGTON A The new extraction rewriting the political ecology of the Andes In NACLA Report on the Americas v42 n5 p1220 2009 BEBBINGTON A HINOJOSA L BEBBINGTON D H et al Contention and ambiguity mining and the possibilities of development In Devel opment and Change v39 n6 p887914 2008 BRASIL Lei nº 8001 de 13 de março de 1990 que define os percentuais da distribuição da compensação financeira de que trata a Lei nº 7990 de 28 de dezembro de 1989 e dá outras providências Brasília 1990 BRIDGE G Mapping the bonanza geographies of mining investment in an era of neoliberal re form In The Professional Geographer v56 n3 p406421 2004 CACCIAMALI M C BOBIK M CELLI JR U Em busca de uma nova inserção da América Lati na na economia global In Estudos Avançados v26 n75 2012 p91110 2012 CARDOSO F H FALETTO E Dependência e desenvolvimento na América Latina ensaio de interpretação sociológica Rio de Janeiro LTC 1970 CARVALHO G O Metallurgical development in the Carajás area a case study of the evolution of environmental policy formation in Brazil Soci ety Natural Resources v14 n2 p127143 2001 146 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 CHAPARRO E Actualización de la compilación de leyes mineras de catorce países de América Latina y el Caribe Santiago de Chile CEPAL 2002 DAVIS G A Learning to love the Dutch disease evidence from the mineral economies In World Development v23 n10 p17651779 1995 DAVIS G A TILTON J E The resource curse In Natural Resources Forum v29 n3 p233 242 2005 DE NEGRI F ALVARENGA G V A primariza ção da pauta de exportações no Brasil ainda um dilema In Radar Tecnologia Produção e Co mércio Exterior n13 p714 2011 DNPM Anuário Mineral Brasileiro 2010 Bra sília Departamento Nacional de Produção Mine ral 2010 ENRIQUEZ M A R S Maldição ou dádiva Os dilemas do desenvolvimento sustentável a partir de uma base mineira Serviço Geológico do Paraná Centro de Desenvolvimento Sustentá vel Universidade de Brasília Brasília 2007 Economista analisa Marco Regulató rio e aumento da CFEM 2010 Disponível em httpwwwmineroparprgovbrmodulesno ticiasarticlephpstoryid865 Acesso em 11 abr 2012 ERNSTYOUNG Práticas tributárias interna cionais indústria de mineração São Paulo Instituto Brasileiro de Mineração ErnstYoung 2008 FOLHA ONLINE Governo vai 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147 Argentina uma análise histórica comparada In Revista de Economia v35 n1 p93115 2009 MCMAHON F CERVANTES M Fraser In stitute annual survey of mining companies 20112012 Vancouver Fraser Institute 2012 MDIC Exportaçãoimportação brasileira dos setores industriais por intensidade tecno lógica 2013 Disponível em httpwww desenvolvimentogovbrsitiointernainterna phparea5menu1113refr608 Acesso em 14 mar 2013 MIKESELL R F Explaining the resource curse with special reference to mineralexporting countries Resources Policy v23 n4 p191 197 1997 MME Apresentação do novo marco regulatório da mineração 2009 Disponível em http wwwmmegovbrsgmgaleriasarquivosnoti ciasSGMApresNovoMarcoRegulatorioda Mineracaopdf Acesso em 7 mar 2012 Proposta de anteprojeto de lei para compensação financeira sobre exploração mi neral CFEM Brasília Ministério de Minas e Energia 2010ª Proposta de novo marco regulatório da mineração Brasília Ministério de Minas e Energia 2010b Resumo do marco regulatório da mi neração 2010c Disponível em httpwww mmegovbrsgmgaleriasarquivosnoticiasre sumomarcoregulatoriodamineracaopdf Acesso em 7 mar 2012 Plano Nacional de Mineração 2030 Brasília Ministério de Minas e Energia Secre taria de Geologia Mineração e Transformação Mineral 2011 MORGAN W SAPSFORD D Commodities and development some issues World Development v22 n11 p16811684 1994 NERY M A C 10ª Reunião extraordinária da 4ª sessão legislativa ordinária da 53ª legisla tura da Comissão de Serviços de Infraestrutu ra do Senado Federal Brasília Senado Federal 2010 NEUMAYER E Does the Resource Curse hold for growth in genuine income as well In World Development v32 n10 p16271640 2004 PORTO M F MILANEZ B Eixos de desenvolvi mento econômico e geração de conflitos socio ambientais no Brasil desafios para a sustentabi lidade e a justiça ambiental In Ciência Saúde Coletiva v14 n6 p19831994 2009 PRATES D M A alta recente dos preços das commodities In Revista de Economia Política v27 n3 p323344 2007 PUGA F A especialização do Brasil no mapa das exportações mundiais Rio de Janeiro Ban co Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social 2007 REUTERS Argentina busca más inversión petrolera con nuevo esquema de impuestos a exportación 2013 Disponível em http arreuterscomarticletopNewsidARL1E 9C725Z20130107 Acesso em 10 mar 2013 RIBEIRO I Mineração de ferro garante lucro da CSN em 2011 2012 Disponível em http wwwvalorcombrempresas2588888minera caodeferrogarantelucrodacsnem2011 Acesso em 10 mar 2013 SACHS J D WARNER A M Natural resource abundance and economic growth Cambridge MA Harvard Institute for International Develo pment 1997 SANTOS R S P Tributação fundos sociais minerais Rio de Janeiro Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas Justiça nos Tri lhos 2012 SAPSFORD D BALASUBRAMANYAM V N The longrun behavior of the relative price of primary commodities statistical evidence and 148 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 policy implications World Development v22 n11 p17371745 1994 SCHAPER M VÉRÈZ V O Evolución del co mercio y de las inversiones extranjeras en industrias ambientalmente sensibles Comu nidad Andina Mercosur y Chile 19901999 Santiago de Chile 2001 SCOTTO G Estados nacionais conflitos ambien tais e mineração na América Latina 4o Seminá rio de Pesquisa do Instituto de Ciências da Socie dade e Desenvolvimento Regional da Universidade Federal Fluminense Campos dos Goytacazes Uni versidade Federal Fluminense 2011 SICSÚ J PAULA L F MICHEL R Por que no vodesenvolvimentismo Revista de Economia Política v27 n4 p505524 2007 SIKKINK K Ideas and institutions develop mentalism in Brazil and Argentina Ithaca Cornell University Press 1991 SQUEFF G C Desindustrialização luzes e sombras no debate brasileiro Brasília Instituo de Pesquisa Econômica Aplicada 2012 TORRES F GÓES F BNDESPar concentra 89 dos investimentos em apenas 5 setores 2013 Disponível em httpwwwvalorcombrbra sil3044628bndesparconcentraaindamais seusinvestimentos Acesso em 14 mar 2013 TORVIK R Why do some 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PósGraduação em Geografia PPGeoUFJF Possui doutorado em Política Ambiental pela Lincoln University na Nova Zelândia Rodrigo Salles Pereira dos Santos é professor adjunto da Universidade Federal Fluminense UFF e do Programa de PósGraduação em Ser viço Social PPGSSUFJF É Doutor em Ciên cias Humanas Sociologia pela UFRJ e atua nas áreas de Sociologia Econômica e do Desenvol vimento com redes globais de produção mine ração e siderurgia Recebido em 131313 aprovado em 240513
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119 artigo Bruno Milanez Rodrigo Salles Pereira dos Santos NEOEXTRATIVISMO NO BRASIL uMA ANáLISE dA pROpOSTA dO NOVO MARcO LEgAL dA MINERAçãO Resumo O neoextrativismo é definido como um mo delo de desenvolvimento focado no cresci mento econômico e baseado na apropriação de recursos naturais em redes produtivas pouco diversificadas e na inserção subordi nada na nova divisão internacional do tra balho O fenômeno vem sendo associado a diferentes tensões sejam ligadas ao baixo crescimento econômico de longo prazo se jam associadas a impactos sociais e ambien tais diversificados Neste artigo argumen tamos que sinais de implantação de um mo delo neoextrativista podem ser percebidos no Brasil em duas dimensões pelo processo de reprimarização da economia brasileira e pela adoção de certos pressupostos na pro posta de novo marco legal da mineração A partir dessa análise defendemos que uma maior democratização do processo de for mulação de políticas e tomada de decisão so bre o uso de recursos minerais no Brasil que incluísse as populações impactadas pela in dústria extrativa mineral poderia ser uma estratégia para neutralizar algumas das tensões criadas pelo modelo neoextrativista de desenvolvimento PalavRaschave Neoextrativismo Mineração Comércio in ternacional Estratégia de desenvolvimento abstRact Neoextrativism is defined as a develop ment model focused on economic growth and grounded on the appropriation of na ture poorly diversified production net works and the subordinate position in the new international division of labor It has been associated with different strains be connected to low longterm economic growth or associated with varied social and environmental impacts In this paper we argue that traces of the establishment of a neoextrativist model can be observed in Brazil in two domains by the process of re primarization of the Brazilian economy and by the adoption of certain assumptions in the proposal of a new legal framework for the mining sector From this analysis we claim that greater democratization of the process of policy formulation and deci sionmaking on the use of mineral resourc es in Brazil which included the popula tions affected by the mining industry could be a strategy to offset some of the strains created by the neoextrativist mod el of development KeywoRds Neoextrativism Mining International trade Development strategy 120 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 1 Introdução Neste artigo argumentamos que a presen ça do neoextrativismo pode ser percebida em duas dimensões no Brasil Por um lado ele pode ser associado ao processo de reprimari zação da economia brasileira medido pelo au mento constante da participação da indústria extrativa mineral na pauta de exportação e no Produto Interno Bruto PIB do país Por ou tro lado pressupostos neoextrativistas podem ser também identificados na proposta de novo marco legal da mineração elaborada pelo Mi nistério de Minas e Energia MME Essa percepção é motivo de preocupação devido às diversas tensões que a intensifi cação desse modelo pode causar No âmbito econômico há diferentes autores que asso ciam economias extrativistas a um menor crescimento de longo prazo Com relação às questões sociais e ambientais muitos são os impactos negativos gerados por essas ativi dades especialmente no âmbito local Como forma de discutir e avaliar o grau de influência do paradigma neoextrativista na economia e política brasileiras este artigo é organizado em quatro seções além dessa introdução A seção 2 discute o neoextrati vismo em seus aspectos conceituais buscan do apresentar a literatura latinoamericana pertinente ao público brasileiro A seção se debruça também sobre seu caráter de tipo institucional híbrido vinculando caracte rísticas de paradigmas de desenvolvimento precedentes de uso comum na literatura na cional Nesse âmbito discute seu principal ca ractere distintivo o papel do Estado a partir de funções tradicionais como a provisão de financiamento e infraestrutura e da regula ção pública assim como de sua nova função como Estado compensador Finalmente dis cute as chamadas tensões econômicas e so cioambientais geradas pelo neoextrativismo A terceira seção apresenta e discute al guns dos principais sinais de sua emergên cia como paradigma no âmbito da economia nacional Assim o acoplamento entre ten dências econômicas estruturais operando ao nível da configuração dos mercados glo bais de commodities e de disposições eco nômicas e políticas conjunturais refletindo estratégias tradicionais de equacionamento das contas públicas e mitigação da pobre za vem produzindo desde o início dos anos 2000 uma situação de reprimarização da economia brasileira A quarta seção discute a proposta do novo marco legal da mineração como uma expres são da emergência do paradigma neoextra tivista e mais importante como mecanismo institucional de sua potencial consolidação As soluções relativas à atração e expan são dos investimentos privados à elevação da produtividade e da competitividade e à agregação de valor de um lado ao aperfei çoamento e ampliação da captura de parce la da renda extrativa com efeitos acerca do fortalecimento organizacional do Estado de outro assim como relacionadas às dimensões ambiental e social envolvidas na regulação da indústria extrativa mineral no novo marco se subordinam a uma pretensão expansiva da economia nacional ad infinitum e se encon tram de fato sob o paradigma neoextrativis ta Finalmente a última seção apresenta as reflexões conclusivas do trabalho enfocando a necessidade de democratização do debate em torno do novo marco e principalmente da emergência do neoextrativismo Neoextrativismo no Brasil 121 2 o neoextrativismo 21 aspectos gerais Gudynas 2009 2012a define o neoex trativismo como um modelo de desenvolvi mento focado no crescimento econômico e baseado na apropriação de recursos natu rais em redes produtivas pouco diversifica das e na inserção internacional subordina da No modelo proposto pelo autor o Estado tem um papel ativo buscando sua legitima ção por meio da apropriação e redistribuição de parte da renda gerada apresentando afi nidades com a emergência de governos au todefinidos como progressistas GUDYNAS 2012a p 130 A ideia de neoextrativismo corresponde ria a uma reconfiguração do extrativismo conceito cunhado para definir um conjun to de estratégias de desenvolvimento anco radas em um grupo de setores econômicos que removem um grande volume de recur sos naturais para comercialização após ne nhum ou quase nenhum processamento O conceito normalmente se refere a atividades desenvolvidas em enclaves1 e voltadas à ex portação Apesar de o paradigma do extra tivismo ser comumente aplicado à extração de recursos minerais e do petróleo ele tam bém pode ser associado a atividades agrá rias florestais e de pesca ACOSTA 2011 GUDYNAS 2012a 2012b O conceito do neoextrativismo foi de finido principalmente em referência a pa íses da América Latina embora possa ser também aplicado a outras regiões Ele vem sendo utilizado tanto no contexto de países tradicionalmente extrativistas que passam por um momento de aprofundamento do modelo como por países que inspirados pe las experiências regionais buscam emular as mesmas práticas Um possível resultado das atuais políti cas neoextrativistas pode ser verificado no Gráfico 1 que mostra o aumento da partici pação de bens tipicamente extrativos miné rios e combustíveis na pauta de exportação de alguns países latinoamericanos Como pode ser verificado entre 2001 e 2011 houve um crescimento significativo da importân cia destes produtos na região A Venezuela chama a atenção uma vez que a participa ção passa de 80 para 90 Nos casos do Brasil e do México devido ao maior grau de industrialização a participação é menos relevante ainda assim notase o aumento da importância dos bens extrativos no caso brasileiro essa participação passa de 10 para 30 A Argentina acompanha a ten dência dos demais países entre 2000 e 2006 porém a partir de 2007 a participação desses bens se reduz consideravelmente2 1 O conceito econômico de enclave remonta à definição proposta por Cardoso e Faleto 1970 acerca da vigência de núcleos de atividades primárias controladas de forma direta pelo exterior Idem p 46 sepa rados dos demais núcleos de atividades econômicas compreendidos por sua vez como interiores A cisão fundamental remete às oposições entre internacional x nacional moderno x tradicional dentre outras No entanto as referidas oposições devem ser entendidas a partir de sua complementaridade funcional de modo que o enclave particularmente o de tipo mineiro que nos interessa em especial separa e une assimétrica e dialeticamente setores e subsetores econômicos economias nacionais e regionais e principalmente popu lações e territórios O enclave diz respeito a espaços econômicos políticos e sociais antitéticos localizando se em um deles mas referindose ao outro e pertencendo a ambos 2 Uma possível explicação para esse fato devese ao processo de redução da produção de petróleo no país que se iniciou no final da década de 1990 e que obrigou o Estado a reorientar a comercialização para garan tir o abastecimento do mercado doméstico REUTERS 2013 122 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 Gráfico 1 Participação dos minerais e combustíveis na pauta de exportação de alguns países da américa latina 1997 1996 1995 2000 1999 1998 2001 2002 2005 2004 2003 2008 2007 2006 2009 2010 2011 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 Argentina Bolívia Brasil Chile Equador México Peru Venezuela Percentual do valor das exportações Fonte unctad 2012 Nota Produtos com código sItc 3 carvão coque petróleo gás energia elétrica sItc 27 fertilizantes e minerais não beneficiados sItc 28 metais ferrosos e sucata metálica e sItc 68 metais não ferrosos O paradigma neoextrativista tem sido caracterizado como a combinação de al gumas práticas tradicionais desses países com elementos inovadores Ao resumir suas principais características Gudynas 2009 2012a acredita que o neoextrativismo seria uma versão contemporânea do desenvolvi mentismo Este teria constituído a raciona lidade predominante na América Latina no século XX apresentando tradicionalmente o crescimento econômico como forma de superação da desigualdade social e que em sua roupagem recente se identifica com o financiamento de programas sociais Neste contexto os setores extrativistas se mante riam como um pilar da obsessão pelo cres cimento ALTVATER 2002 Além disso o Estado deixaria de ter como função apenas a manutenção de regras que garantissem o funcionamento dos processos produtivos e passaria a ter um papel protagonista nas ati vidades extrativas Gudynas 2012a comenta porém que essa estratégia tenderia a promover a com petição entre os países por investimentos estrangeiros e intensificaria a redução da qualidade de vida graças à flexibilização das normas trabalhistas e ambientais bem como aprofundaria a fragmentação territo rial por meio da formação de novos enclaves de produção Nesse sentido o neoextrativis mo seria um indutor de uma corrida para o fundo race to the bottom Neoextrativismo no Brasil 123 22 a construção do neoextrativismo A dependência da extração dos recursos naturais como vetor de crescimento econô mico não é uma novidade na América La tina Esta estratégia tem sido implementada desde as origens do período colonial SCOT TO 2011 e é tão inerente ao processo de de senvolvimento da região que Barton 2006 cunhou o termo ecodependência para des crevêla Segundo o autor o conceito se re fere às relações socioeconômicas ligadas às atividades de extração de recursos naturais para exportação De certa forma o neoextrativismo é pro duto de diferentes aspectos que caracteri zam as institucionalidades constituídas na região Para Acosta 2011 a existência da riqueza natural e as crises econômicas re correntes na América Latina consolidaram uma mentalidade rentista bem como prá ticas clientelistas e patrimonialistas Essas particularidades teriam dado origem a ins tituições democráticas frágeis e facilmente corrompíveis que voltam a se reorganizar dentro do contexto neoextrativista A dependência do extrativismo para ga rantir o crescimento econômico na região foi questionada com mais ênfase a partir dos anos 1950 quando foi proposto o modelo de industrialização via substituição de impor tações Naquele momento eram criticados os padrões de comércio internacional sen do salientados os termos de troca desiguais Como alternativa era defendida a substitui ção da importação de produtos industriais básicos por meio da constituição de infra estrutura produtiva Procuravase imple mentar esta mudança por meio do endivi damento externo de investimentos diretos internacionais e da intervenção do governo Essa intervenção poderia ocorrer por meio de empresas estatais na forma de subsídios e da infraestrutura necessária ao surgimento das novas indústrias SIKKINK 1991 Apesar dos resultados obtidos nos anos 1950 e 1960 o modelo de industrialização via substituição de importações que já vi nha apresentando enorme desgaste ao longo da década de 1970 com endividamento ex terno e déficit comercial crescentes tornou se insustentável com a elevação das taxas de juros internacionais em 1979 resultante da nova política monetária restritiva norte americana MATTEI SANTOS JÚNIOR 2009 p 107 O vínculo de dependência dramaticamente rememorado entre as eco nomias nacional e mundial se expressou em uma grave crise financeira nos anos 1980 impulsionando a reorientação da estrutura e da estratégia econômicas para o pagamento da dívida se refletindo em baixas taxas de crescimento ao longo de todo o período Esse processo aliado a mudanças no ce nário internacional resultou em uma forte reação contra o modelo em vigor e induziu uma guinada neoliberal a partir dos anos 1990 BARTON 2006 A maioria dos países da América Latina então passou por um pro cesso de rápida redução do tamanho do Esta do entrada de capitais transnacionais aber tura comercial e privatização de empresas públicas No caso da mineração importantes estatais foram privatizadas como a Cia Vale do Rio Doce CVRD e a Minero Peru Ainda nesse período o foco no mercado interno foi reduzido e retomouse a preocu pação com o crescimento para fora de tal forma que a exportação voltou a ser vista como nova estratégia de desenvolvimento BARTON 2006 Todavia o processo de in serção internacional foi marcado pela baixa competitividade dos produtos industrializa dos regionais o que levou os países a nova mente se apoiarem na exportação de pro dutos intensivos em recursos naturais onde 124 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 ainda possuíam vantagens comparativas Com relação ao mercado mineral cf Gráfico 2 nesse momento ocorreu um grande au mento da participação destes países na ofer ta internacional No final dos anos 1990 a região passou a responder por mais de 25 da produção mundial de bauxita 45 de cobre e 29 de estanho Gráfico 2 Participação da américa latina na produção mineral mundial Fonte us Geological survey 2012 Dessa forma o período neoliberal levou a uma especialização da região na comer cialização de produtos intensivos em re cursos naturais que permitiam a entrada de divisas necessárias à importação de bens in tensivos em tecnologia SCHAPER VÉRÈZ 2001 Por exemplo Albavera 2004 identi fica um aumento na exportação de minérios muito acima do aumento da participação de refinados O autor menciona como emble mático o caso da bauxita cuja produção em mina representava 26 do total mundial enquanto a produção de alumínio primá rio ainda girava em torno de 8 O mes mo comportamento foi identificado com o cobre sendo produzido 45 do minério e apenas 26 do metal refinado A partir dos anos 2000 a região passou por novas mudanças de rumo com a chegada ao poder de governos identificados como pro gressistas Assim entre as lideranças regionais encontravamse Hugo Chávez Venezuela 1998 Ricardo Lagos Chile 2000 Luiz Inácio Lula da Silva Brasil 2003 Evo Morales Bo lívia 2005 Tabaré Vázquez Uruguai 2005 Rafael Correa Equador 2006 e Fernando Lugo Paraguai 2008 No novo contexto ocorreram diferentes graus de ruptura das es 0 10 20 30 40 50 60 1985 1990 1995 2000 2005 2010 Bauxita Cobre Minério de ferro Níquel Estanho Zinco Percentual Neoextrativismo no Brasil 125 tratégias adotadas anteriormente enquanto alguns aspectos da política neoliberal foram mantidos outros foram revistos conforman do o que viria a ser caracterizado como neoex trativismo de modo geral GUDYNAS 2012a ou como neoextrativismo progressista mais especificamente GUDYNAS 20093 A partir desta análise o que se percebe é que o paradigma neoextrativista não é uma completa inovação institucional mas sim uma combinação de aspectos historicamente enraizados na paisagem econômica e política latinoamericana Conforme pode ser identi ficado no Quadro 1 apesar dos elementos no vos o modelo de desenvolvimento se consti tui pela apropriação e releitura de elementos característicos de períodos passados 3 A despeito dos vínculos materiais e simbólicos entre políticas redistributivas amplas moderadas ou limitadas que caracterizam a emergência de governos de esquerda e centroesquerda na América Latina de um lado e da difusão de estratégias de crescimento econômico ancoradas na exploração intensiva e extensiva de bens naturais BRIDGE 2004 a influência estrutural dos mercados de commodities e das formas de acumulação baseadas em recursos nos anos 2000 se exerceu de modo generalizado na política continental Desse modo os autores optam por definir o neoextrativismo de modo amplo considerandoo a partir de dois eixos a saber a centralidade da exploração de bens naturais e a ampliação do papel do Estado operadas inclusive por governos de direita e centrodireita como no Chile Peru e México nas estratégias de desenvolvimento Não obstante a redistribuição assume relevância analítica como variável dependente Quadro 1 aspectos gerais do neoextrativismo Liberalismo Desenvolvimentismo Neoliberalismo Neoextrativismo 18891930 19301945 19852002 2003 19451985 Meios Especialização da Generalização da Especialização da estrutura produtiva estrutura produ estrutura produtiva como inserção externa competitiva tiva como inserção como industrialização externa vantajosa Escala Nacional Nacional Internacional Global Resultados Estrutura produtiva Estrutura produtiva Estrutura produtiva simples monolítica complexa completa incompleta e desconexa e conexa Papel do Coadjuvante apenas Protagonista por meio Coadjuvante Protagonista Estado garantindo condições de empresas estatais apenas regulando por meio de para atuação a atuação empresas esta das empresas das empresas tais ou semies tatais e captura de renda Origem Internacional Nacional Internacional Indiferente com dominante ao nível das Internacional algumas posições do estruturas de favoráveis ao investimento financiamento e capital nacional comercialização Fonte os autores 126 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 Nesse sentido os governos progressistas instalados na região pouco questionaram o papel das indústrias extrativas na busca do desenvolvimento nacional Ao contrário buscaram criar novos argumentos para jus tificar sua adoção Em primeiro lugar talvez o argumento mais comumente usado seja que as atividades extrativas minerais são de interesse nacional ou interesse público ALBAVERA 2004 ou ainda são o que a maioria quer GUDYNAS 2012a Todavia esse é um dos argumentos mais vagos e frá geis uma vez que raramente este interesse é especificado ou explicitado Um segundo argumento também normalmente apresen tado e com uma visão essencialmente utili tarista da natureza afirma que os países la tinoamericanos possuem enormes riquezas que devem ser aproveitadas e não podem ser desperdiçadas GUDYNAS 2012b Outro grupo de justificativas utilizadas para embasar o neoextrativismo parte da de fesa do crescimento econômico Dentro dessa perspectiva as atividades extrativas são vis tas como geradoras de riqueza sendo im portantes elementos para o combate à pobre za e à desigualdade Nesse sentido o discurso pode apresentar as vantagens da geração de emprego obtendo apoio de sindicatos e ou tros movimentos sociais como também fonte de renda para ser distribuída para grupos es pecíficos Uma variação em escala local do discurso do crescimento econômico diz res peito às indústrias extrativas como vetores de desenvolvimento Essa argumentação é utilizada principalmente nos projetos de en clave devido à construção de infraestrutura bem como à possibilidade da geração de em pregos formais em regiões de economias de subsistência GUDYNAS 2012a Essa preocupação com a defesa do neo extrativismo se intensifica em um momento em que as commodities primárias apresen tam elevado preço no mercado internacio nal devido à demanda dos países asiáti cos em particular da China BEBBINGTON 2009 CACCIAMALI BOBIK CELLI JR 2012 Esse contexto internacional tem sido determinante para o significativo aumento da participação da renda extrativa no PIB dos países da América Latina4 conforme pode ser visto no Gráfico 3 4 Perspectivas de curto prazo sugerem ainda um possível aprofundamento do modelo uma vez que em 2011 a região concentrava quase 30 dos investimentos em projetos minerais no mundo enquanto que a América do Norte em segundo lugar recebia cerca de 20 e a Ásia apenas 11 ICMM 2012 Neoextrativismo no Brasil 127 Gráfico 3 evolução da renda mineral na américa latina e no mundo Fonte world bank 2011 Nota a renda mineral é definida como a diferença entre o valor de produção de um mineral a preços mundiais e seu custo total de produção os minerais considerados neste cálculo são estanho ouro chumbo zinco ferro cobre níquel prata bauxita e fosfato 23 o papel do estado no modelo neoextrativista Talvez a principal ruptura do modelo neoextrativista com o período neoliberal esteja relacionada ao papel desempenhado pelo Estado Por um lado ele retoma algu mas das atribuições definidas pelo modelo de substituição de importações e por ou tro recebe novas responsabilidades pro postas pelos governos progressistas Neste novo contexto tais governos liberalizam e protegem dinâmicas próprias do capita lismo se abstendo de tomar decisões que possam colocar em risco processos de acu mulação GUDYNAS 2012a Dentre essas atribuições podem ser listados o apoio à internacionalização de empresas nacionais a adaptação da legislação para estimular a extração dos recursos naturais e principal mente a compensação por meio de políticas de transferência de renda O apoio à internacionalização de algu mas empresas nacionais vem se dando por dois instrumentos principais o suporte fi nanceiro e a construção de infraestrutura No caso do suporte financeiro a concessão de empréstimos já foi amplamente utilizada no passado No caso brasileiro esse papel vem sendo desempenhado especialmente pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social BNDES que têm apor tado grande quantidade de recursos a um seleto grupo de empresas atuantes em seto 1970 1973 1976 1979 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003 2006 00 05 10 15 20 30 25 América Latina Mundo 128 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 res intensivos em bens naturais tais como o grupo JBSFriboi e diretamente extrativos como a Vale SA GUDYNAS 2012a De forma geral no período entre 2002 e 2012 a participação dos setores de óleo e gás mi neração e energia saltou de 54 para 75 da carteira da BNDES Participações SA BNDESPar5 e se forem incluídos ainda os setores de papel e celulose e alimentos par ticularmente proteína animal a concentra ção sobre para 89 TORRES GÓES 2013 Ao mesmo tempo a ideia do Estado como responsável pelo fornecimento de infraes trutura para o desenvolvimento das ativi dades econômicas não é uma novidade na região Em grande parte o modelo de subs tituição de importações já propunha essa es tratégia Entretanto enquanto originalmen te se defendia a construção de infraestrutu ra que consolidasse o mercado interno no neoextrativismo a prioridade é dada ao es coamento da produção para o abastecimen to do mercado internacional Dessa forma grande importância é dada à logística e mui to se fala nos gargalos da produção nos índice de competitividade dos países e no nosso caso no custo Brasil No contexto latinoamericano tem grande importância a Iniciativa para a Integração da Infraestru tura Regional SulAmericana IIRSA que é definida por Bebbington 2009 p 13 como uma rede de rodovias hidrovias e portos ca paz de abrir o continente no caso especí fico do Brasil podem ser implicadas as obras associadas ao Programa de Aceleração do Crescimento PAC Uma segunda atribuição que vem sendo desempenhada pelos governos progressistas diz respeito à reconfiguração da regulação legal do setor extrativo As modificações aí envolvidas representariam uma continuida de das reformas realizadas nos anos 1990 quando muitos dos países alteraram regimes regulatórios nacionais associados aos bens naturais para favorecer a implantação de grandes empresas e a institucionalização de seus direitos de propriedade SCOTTO 2011 Entretanto na fase neoextrativista essas mudanças teriam como objetivo garantir ou ampliar a participação do Estado na apro priação da renda extrativa cf Quadro 2 Estratégias de tal natureza têm se mostrado eficazes uma vez que em todos os países da região o Estado possui o domínio absoluto dos recursos minerais e combustíveis lhe cabendo conceder permissões para sua ex ploração econômica ALBAVERA 2004 5 A BNDESPar é uma subsidiária integral do BNDES com vistas à gestão de sua participação social em empreendimentos públicos e privados prioritariamente constituídos sob a legislação nacional Neoextrativismo no Brasil 129 Quadro 2 mudanças institucionais na américa latina com impactos sobre a indústria extrativa Período neoliberal Período Neoextrativista País Mudanças visando o Mudanças permitindo Mudanças visando à apropriação estímulo à atividade facilitando investimentos estatal da renda extrativa privada na mineração estrangeiros no país genéricos ou em mineração Argentina Ley 244981995 de Decreto Nº 18531993 Lei de recuperação da YPF Actualización Minera modifica Ley Nº 213821976 Ley 267412012 de Inversión Extranjera Brasil EC 61995 Aumento de percentual e modificação na base de cálculo dos royalties propostas no novo marco legal da mineração Bolívia Código de Minería Ley de Inversiones Criação do Imposto Direto sobre Ley 17771997 Ley 11821990 Hidrocarbonetos Ley 30582005 Nacionalização dos hidrocarbo netos DS Nº 287012006 Chile Código de Minería Estatuto de la Inversión Criação do novo regime tributrario Ley 182481983 Extranjera do imposto específico Decreto Ley 6001976 para a renda operacional da ati vidade mineira Ley 204692010 Equador Ley de Minería Ley 12 de Cámaras de Lei reformatória da lei de Ley 1261991 Minería Decreto Nº 4151993 hidrocarbonetos Ley 852007 Peru Ley General de Minería Ley de Promoción de la Aumento de percentual e Decreto Legislativo Inversión Privada modificação na base de cálculo 1091992 Decreto Legislativo dos royalties Decreto Supremo 7571991 2092011 Venezuela Decreto con rango y Regulación de la inversión Lei de imposto sobre preços ex fuerza de ley de minas extranjera traordinários do mercado inter 2951999 Decreto 20951992 nacional de hidrocarbonetos Ley 401142013 Fontes adaptado a partir de chaparro 2002 e viale 2012 130 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 A avaliação dos efeitos da mudança na legislação referente à indústria extrativa mineral dos diferentes países está além do escopo deste texto porém o tema deve ser aprofundado uma vez que governos da re gião possuem uma tradição patrimonialista não sendo incomum a ingerência de empre sas extrativas inclusive por meio da escolha de representantes de tais empresas para car gos públicos ACOSTA 20116 Por fim o maior diferencial sobre a atua ção do Estado dentro do paradigma do neo extrativismo seria o que Gudynas 2012a 2012b convencionou chamar de Estado compensador Ao assumir este papel o Es tado se propõe a implantar programas de combate à pobreza a partir da distribuição de recursos fiscais Em alguns casos como o Bono Juancito Pinto Bolívia esses progra mas são diretamente vinculados à captura de renda extrativa Segundo o autor essa se ria uma das principais diferenças entre go vernos neoextrativistas e rentistas clássicos nos quais as receitas eram exclusivamente capturadas por elites locais No caso do Bra sil embora não haja conexão direta entre a renda extrativa e programas sociais como o Programa Bolsa Família PBF a legitimação para intensificação das atividades extrati vas vem se dando por meio da vinculação da renda capturada pelo Estado na forma de royalties a investimentos em educação tanto no caso do petróleo FOLHA ONLINE 2012 quanto na proposta do novo marco legal da mineração BARROCAL 2013 24 tensões criadas pelo neoextrativismo Diferentes críticos têm se manifestado contra estratégias de desenvolvimento ba seadas fundamentalmente na extração de recursos naturais em geral e dentro desse contexto contra o neoextrativismo Nesse sentido dois grupos de tensões são comu mente levantados por um lado existem as tensões econômicas relacionadas aos os efeitos sobre as possibilidades de crescimen to econômico de longo prazo por outro lado há as tensões socioambientais que dizem respeito aos impactos sobre trabalhadores comunidades e meio ambiente 241 tensões econômicas Diferentes estudos têm buscado avaliar a relação entre o grau de dependência que os países têm dos recursos naturais em ge ral e de produtos minerais em particular e a sua taxa de crescimento econômico Algumas análises de longo prazo identi ficaram que muitas das economias depen dentes de tais produtos têm apresentado baixo crescimento ou mesmo crescimento negativo SACHS WARNER 1997 DA VIS TILTON 2005 PUGA 2007 Embo ra a correlação encontrada não necessa riamente indique causalidade TORVIK 2009 a existência de tal relação fortalece o argumento de que esta não seria uma es tratégia capaz de garantir o crescimento econômico no longo prazo 6 Por exemplo a Lei da Mineração no Peru aprovada em abril de 2008 foi elaborada em forte proximidade com empresas transnacionais particularmente canadenses BEBBINGTON 2009 No Brasil situações como essas podem ser encontradas como no caso do Coordenador Geral de Políticas e Programa para Mineração indicado em 2008 que era egresso da companhia Nacional de Grafite Ltda Da mesma forma os estudos que subsidiaram o Plano Nacional de Mineração 2030 foram encomendados a uma empresa de consultoria que pertencia a um excoordenador do Instituto Brasileiro de Mineração Neoextrativismo no Brasil 131 Como forma de explicar esse fenômeno autores têm se referido à maldição dos re cursos naturais Esta proposta defende que a abundância de recursos naturais geraria uma série de distorções econômicas e polí ticas que acabariam por reduzir a contribui ção das atividades extrativas para a econo mia BEBBINGTON et al 2008 A maldi ção dos recursos naturais seria associada a uma série de fenômenos específicos entre eles a deterioração dos termos de troca a elevada volatilidade dos preços dos recursos naturais a monotonização econômica e a doença holandesa7 Desde a década de 1950 a partir da hi pótese PrebischSinger muitos estudos têm tentado verificar o comportamento da razão de preços entre bens primários e manufatu rados Apesar de ainda não haver consenso há fortes indícios de que no longo prazo o preço das commodities tende a cair em relação ao preço dos bens manufaturados MORGAN SAPSFORD 1994 SAPSFORD BALASUBRAMANYAM 1994 Esse com portamento poderia ser explicado pelo fato de produtos intensivos em tecnologia pos suírem maior dinamismo e maior elasticida derenda do que os intensivos em recursos naturais além de contribuírem mais para o aprendizado e ganhos de produtividade DA VIS TILTON 2005 Além da tendência de queda no lon go prazo os preços de produtos primários apresentam grande instabilidade Esta par ticularidade acaba por dificultar o planeja mento econômico dos países dependentes de minérios uma vez que a receita gerada por impostos e royalties tende também a oscilar consideravelmente MORGAN SAPSFORD 1994 SAPSFORD BALASUBRAMANYAM 1994 DAVIS TILTON 2005 Acosta 2011 argumenta que esse processo tem um im pacto negativo potencializado pela depen dência das economias do sistema financeiro Segundo o autor não é incomum que nos momentos de preços elevados governos na cionais de economias extrativas lastreiem ou mesmo contraiam grandes empréstimos para financiar investimentos na infraestru tura com vistas à ampliação da produção Porém ao não realizar um planejamento para os momentos de queda nos preços em tais situações os países se veem sem recursos para saldar as dívidas contraídas provocan do dificuldades fiscais e instabilidade dos investimentos públicos A monotonização8 econômica diz respei to por sua vez à concentração de atividades 7 Os autores optam por discutir e problematizar a literatura pertinente acerca da maldição dos recursos a partir dos quatro efeitos econômicos acima apresentados termos de troca volatilidade de preço mono tonização econômica e doença holandesa em detrimento do vasto debate acerca das estruturas e formas políticoinstitucionais do crescimento econômico baseado em recursos naturais essencialmente negati vos da perspectiva da maldição dos recursos Fenômenos econômicos relacionados como a influência da composição diferencial da pauta exportadora de nações extrativas no crescimento econômico ISHAM et al 2005 e da seletividade extensiva e intensiva do investimento setorial constituindo novos padrões e escalas de desigualdade BRIDGE 2004 p 411 aprofundam e sofisticam a referida opção Nesse sentido questões como políticas inadequadas adotadas por Estados predatórios NEUMAYER 2004 e possíveis estratégias para minimizar os impactos da maldição dos recursos MIKESELL 1997 estão além do escopo deste trabalho 8 A noção de monotonização vem sendo desenvolvida a partir do intenso debate promovido por agentes sociais representativos como organizações não governamentais movimentos sociais e comunidades atingidas em torno do novo marco legal da mineração Os autores agradecem especialmente a Carlos Alberto Lucio Bittencourt Filho consultor e pesquisador do IBASE por sua inspiração original 132 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 em apenas um setor Uma vez que existem grandes retornos financeiros em setores espe cíficos na forma de oportunidades de lucros e salários observase um processo de migra ção de investimentos e mão de obra de ou tras áreas para o setor extrativo A principal consequência seria a redução da diversidade produtiva e o aumento da dependência eco nômica do setor intensivo em recursos natu rais Essa situação mostrase especialmente preocupante no caso de recursos não renová veis uma vez que o esgotamento das reservas tende a levar à depressão econômica pela au sência de atividades alternativas Apesar de não necessariamente usarem o conceito de monotonização econômica diferentes autores têm descrito diversas for mas pelas quais a intensificação de ativi dades extrativas pode reduzir a diversidade econômica de um país ou região Albavera 2004 comenta que o encadeamento para frente ou para trás apresenta limitações e riscos e não pode ser tomado como consequ ência natural da implantação das atividades extrativas Alvim e Fantine 2008 por sua vez identificam sinais desse processo nos anos 1970 no Brasil Segundo os autores o governo e as empresas optaram naquele momento por direcionar parte significa tiva dos investimentos para a produção de commodities e para a respectiva infraestru tura Como consequência quando os pre ços foram reduzidos na década de 1980 a produtividade destes investimentos foi sim plesmente esterilizada Da mesma forma Gudynas 2012b comenta que as tentativas de diversificação da produção colocadas em prática no Chile após a ditadura militar não tiveram muito êxito Por fim a doença holandesa referese aos efeitos da intensa entrada de capital inter nacional nos países e regiões especializados na exploração de recursos naturais gerando problemas macroeconômicos Alguns eco nomistas indicam que o crescimento rápido da exportação de produtos extrativos ten de a gerar uma apreciação do câmbio bem como uma elevação dos salários locais tor nando economias nacionais e regionais me nos competitivas Como impacto final esse processo tornaria outros setores econômicos menos dinâmicos reforçando a monotoni zação econômica mencionada anteriormen te DAVIS 1995 DAVIS TILTON 2005 BE BBINGTON et al 2008 Apesar desse cenário de elevado risco eco nômico não é incomum que governos de paí ses neoextrativistas argumentem que as políti cas corretas aplicadas no momento adequa do seriam capazes de fazer com que os países escapassem da maldição dos recursos Porém segundo Bebbington 2009 as questões es truturais colocadas e as margens de manobra existentes permitem classificar tais posturas como otimistas uma vez que a chance de repetição dos problemas identificados é muito maior do que a de sua superação 242 tensões socioambientais O segundo grupo de tensões criadas pelo paradigma neoextrativista diz respeito aos seus impactos ambientais e sociais em particular no contexto local Também cha madas de tensões territoriais GUDYNAS 2012b elas estão associadas ao processo de distribuição desigual dos recursos e serviços ambientais bem como da repartição injusta dos riscos ambientais e estão nas origens de conflitos descritos e denunciados por mo vimentos que lutam por justiça ambiental PORTO MILANEZ 2009 A indústria extrativa mineral é por de finição intensiva em recursos naturais e poluição causando impactos negativos re levantes sobre os territórios onde se locali Neoextrativismo no Brasil 133 za Essas características ao contrário de se rem mitigadas são acentuadas no contexto neoextrativista Ademais o fato de os go vernos desses países terem flexibilizado as exigências ambientais para implantação de projetos extrativistas como estratégia para estimular tais atividades apenas reforça a dimensão dos riscos ambientais envolvidos no setor GUDYNAS 2012a 2012b As atividades extrativas produzem mu danças significativas nos territórios Nas áreas rurais tendem a causar poluição at mosférica contaminação hídrica desmata mento e erosão já nas regiões urbanas os efeitos incluem inchaço urbano faveliza ção aumento da violência exploração se xual e sobredemanda dos serviços públicos de saúde saneamento e segurança Nesse sentido as comunidades locais tendem a ar car com a maioria dos impactos negativos enquanto que grande parte dos benefícios é concentrada pelas empresas ou pelos go vernos nacionais caracterizando um grande desequilíbrio na distribuição dos benefícios e prejuízos gerados DAVIS TILTON 2005 Além dos impactos sociais e ambientais mencionados outros problemas surgem quando as atividades extrativas implantam enclaves produtivos em áreas remotas Nes sas situações elas ainda causam a fragmen tação territorial deslocando comunidades locais e inviabilizando formas tradicionais de reprodução social Problemas dessa natu reza são muitas vezes ignorados pelo poder público porque os Estados neoextrativistas de forma geral desconsideram demandas não econômicas tais como aquelas basea das em valores culturais ou religiosos Pelo contrário quando alguma reivindicação é feita os debates são limitados ao valor das compensações econômicas e à definição dos grupos passíveis de receber compensações GUDYNAS 2012a Conforme mencionado anteriormente as práticas neoextrativistas são muitas ve zes legitimadas como sendo de interesse nacional Considerando que as demandas concorrentes e questionamentos ao modelo são muitas vezes feitos por grupos nume ricamente pequenos e marginalizados no contexto nacional tais movimentos são em grande medida desqualificados pelos go vernos centrais sendo definidos como po líticos radicais ou ainda identificados como práticas de antidesenvolvimento GUDYNAS 2012a Sendo assim a postura geral conforme resumida por Bebbington 2009 p 19 consiste em afirmar que os recursos pertencem à nação e não a uma co munidade indígena ou local e que eles se rão desenvolvidos de modo que as consul tas serão apenas um processo administrati vo e as discordâncias não serão permitidas 3 sinais do neoextrativismo no brasil e a reprimarização da economia No Brasil o debate sobre neoextrati vismo é embrionário Como o país possui uma estrutura produtiva mais complexa e um perfil comercial distinto do restante da América Latina sua população raramente o identifica como um país extrativo BAR TON 2006 Ao mesmo tempo vem se apro fundando aqui um debate sobre as possibili dades do neodesenvolvimentismo definido como um modelo no qual um Estado forte através de políticas nacionais de desenvol vimento adequadas deveria estimular o florescimento de um mercado forte e junto com ele promover o crescimento econômi co necessário para reduzir a desigualdade social Sua estratégia fundamental se baseia na redefinição de sua inserção internacional e para tanto seria função do Estado investir na infraestrutura do país para aumentar sua 134 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 competitividade bem como apoiar finan ceiramente empresas que tivessem chance de se tornar agentes globais SICSÚ PAULA MICHEL 2007 Apesar das diferenças entre neodesen volvimentismo e neoextrativismo os dois conceitos apresentam muitos pontos em co mum Este é o caso por exemplo do enten dimento do crescimento econômico como sinônimo de desenvolvimento do foco na inserção internacional e da definição do Estado como protagonista do processo de mudança GUDYNAS 2012b Além disso políticas desenvolvimentistas quando não plenamente implementadas ou quando restringidas por aspectos externos podem aprofundar o perfil extrativo de uma região ou mesmo do país Este por exemplo foi o caso do Programa Grande Carajás PGC que em sua concepção original argumen tava que a implantação de 22 produtoras in dependentes de ferro gusa sete unidades de ferroligas e uma unidade de silício metálico seria suficiente para induzir o surgimento de um grande polo mínerometalúrgico in cluindo fábricas de bens de capital e bens fi nais CARVALHO 2001 Passados quase 30 anos o projeto entretanto ficou limitado a uma grande mina uma ferrovia um porto e 17 guseiras que produzem de forma inter mitente bens semiacabados exclusivamen te para a exportação Ao mesmo tempo o contexto do atual regime de preços dos recursos minerais e da fácil renda da exportação de produtos pri mários pode ser bastante tentador GUDY NAS 2012a levando grupos industriais a mudar o direcionamento de seus negócios e os transformando em empresas extrativas Talvez o caso mais emblemático dessa situa ção seja a Companhia Siderúrgica Nacional SA CSN símbolo do desenvolvimentismo brasileiro que em 2011 teve mais da metade do seu resultado operacional decorrente da extração de minério de ferro no município de Congonhas MG e não da produção de aço RIBEIRO 2012 Devido a esses fatores considerase per tinente avaliar até que ponto podem ser identificadas tendências neoextrativistas na economia brasileira Estes sinais já vêm sendo discutidos por diferentes autores que estudam a reprimarização da pauta de expor tação9 e a inserção regressiva do Brasil no co mércio internacional Esses trabalhos buscam avaliar até que ponto a exportação de bens mais complexos e de maior valor agregado está perdendo espaço para a exportação de bens primários agrícolas e minerais De forma geral essa tendência já havia sido identificada no início dos anos 2000 por Gonçalves 2001 p 1 quando o autor defi niu o processo de inserção regressiva como envolvendo tanto a significativa perda de competitividade internacional da indústria brasileira quanto o fenômeno da reprimari zação da pauta exportadora Para esse au tor a pauta de exportação do Brasil passou por uma fase upgrading ao longo da déca da de 1980 e da primeira metade dos anos 1990 tendo tal comportamento sido inver tido posteriormente Naquele momento tal processo foi explicado principalmente pela mudança na estrutura das exportações re presentada pelo aumento da importância relativa de produtos agrícolas 9 Ao se utilizar o termo reprimarização da pauta de exportação não se pretende sugerir que necessariamente haja uma redução da venda de bens industrializados mas sim que seu aumento tem sido inferior ao crescimento das exportações de produtos básicos BASTOS GOMES 2011 Neoextrativismo no Brasil 135 Uma análise de mesma natureza foi feita por De Negri e Alvarenga 2011 que apon taram a ampliação significativa nos últimos anos da participação das commodities pri márias na pauta de exportações brasileiras conforme apresentado no Gráfico 4 Desta case assim um movimento de insulamento de setores econômicos de alta competitivi dade intensivos em recursos naturais que tem como contraparte o desaparecimento de outros o que se traduz em simplifica ção tendo como eixo dinâmico os segmen tos de commodities primárias Esta especialização reversa constituiria uma das expressõeschave da dependência externa da economia nacional sendo a ati vidade extrativa mineral seu principal motor na atualidade Por exemplo em 2009 ape nas a indústria extrativa mineral respondeu por cerca de 20 das exportações brasileiras e a mais de 60 do saldo da balança comer cial Dentro desse contexto Squeff 2012 p 45 argumenta que os resultados da balan ça comercial brasileira têm se mantido posi tivos somente por conta dos superávits dos produtos não manufaturados Gráfico 4 evolução da exportação brasileira por intensidade tecnológica Fonte mdIc 2013 No âmbito mais estrito da indústria ex trativa mineral ainda seria o segmento de bens primários a se destacar em detrimen to dos de semimanufaturados ou manufa turados Dentre os bens primários por sua vez os minerais metálicos exercem ampla dominância uma vez que o valor exporta do deste grupo tem excedido grandemente o valor conjunto de minerais nãometálicos minerais energéticos e gemas e diamantes DNPM 2010 Conforme mencionado an teriormente o aumento da exportação dos 1997 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 1996 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 1998 1999 Produtos não industriais Médiaalta tecnologia Baixa tecnologia Médiabaixa tecnologia Alta tecnologia 136 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 minérios devese especialmente ao efeito China sendo seu crescimento econômico identificado como principal causa da eleva ção dos preços das commodities em particu lar metálicas e industriais PRATES 2007 O impacto deste crescimento na pauta de ex portação do Brasil foi verificado por Bastos e Gomes 2011 que estimaram que o efeito estrutura combinada10 da exportação do mi nério de ferro do Brasil para a China variou 1491 entre 19971999 e 20072009 A principal crítica à validade da tese da reprimarização da economia nacional diz respeito ao fato de que embora efetivo este processo estaria ocorrendo apenas no nível da pauta exportadora Entretanto um olhar mais detido revela que em realidade o re ferido processo apesar de recente se rela ciona diretamente à composição do setor secundário assim como à qualidade de sua participação no PIB Como pode ser verifica do no Gráfico 5 enquanto as atividades da construção civil e da produção e distribui ção de eletricidade gás água esgoto e lim peza urbana mantiveram sua participação constante entre 2000 e 2012 de 55 para 58 e de 34 para 31 respectivamen te observouse uma ascensão importante da indústria extrativa mineral que ampliou sua participação no produto nacional de 16 para 43 Não coincidentemente a indústria da transformação decresceu em termos relativos de 172 para 133 10 As autoras definem o efeito estrutura combinada como sendo a evolução relativa de cada mercado de destino ponderada pela importância relativa dessa parcela de mercado para o Brasil Gráfico 5 Participação atividades econômicas selecionadas no valor adicionado brasil 20002012 Fonte IbGe 2012 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 25 20 15 10 5 0 172 133 2012 Extrativa mineral Transformação Construção civil Produção distribuição de eletricidade gás esgoto e limp Urb 16 43 Neoextrativismo no Brasil 137 Dessa forma dados empíricos indicam que setores manufatureiros vêm perdendo espaço relativo para os setores extrativos e de transformação primária tanto na pauta de exportação quanto no PIB do país Embora essas mudanças não tenham sido suficientes para permitir a identificação da economia brasileira como uma economia extrativa tais tendências sugerem a necessidade de cuida dos para que esse modelo não se aprofunde No entanto a proposta que vem se conso lidando sobre o novo marco legal da mine ração reforça a presença de um paradigma neoextrativista emergente que pode vir a aprofundar as tensões mencionadas na seção 4 a proposta do novo marco legalda mineração e o risco da consolidação dos princípios neoextrativistas Nesta seção propõese avaliar até que ponto princípios associados à racionali dade neoextrativista podem ser identifica dos na proposta do novo marco legal da mineração11 Quando da elaboração deste artigo o governo ainda não havia dispo nibilizado a íntegra da nova legislação e por esse motivo a análise apresentada é baseada nos documentos públicos dispo nibilizados pelo MME na divulgação no novo marco regulatório12 41 Atrair investimento para o setor mineral estimular a maximização do aproveitamento das jazidas promover a mineração formal e contribuir para a elevação da competitividade das empre sas de mineração A preocupação do Governo Federal com relação à produção mineral é muito calca da no conceito do determinismo mineral e no pressuposto de que todo o minério dis ponível deve ser minerado Dessa forma uma das principais motivações subjacentes à proposta do novo marco legal é a criação de instrumentos que aumentem a quantida de de jazidas exploradas no país Nesse sen tido o Código Mineral de 1967 é criticado por permitir que pessoas ou empresas dete nham títulos de outorga e não desenvolvam nenhuma atividade de extração de recursos minerais como argumentado pelo Ministro de Minas e Energia nós temos hoje cerca de 160 mil áreas distribuídas por todo o mapa geográfico bra sileiro havendo áreas em todas as latitudes deste País enquanto que apenas oito mil des tas áreas são de fato produtivas e estão sendo exploradas regularmente Em 160 mil apenas oito mil Isto porque somos regidos por uma lei como disse frouxa que não corresponde em sua integralidade aos melhores interesses nacionais LOBÃO 2010 11 A noção de novo marco legal da mineração se refere à mudança prevista nas relações entre Estado empresa e sociedade no que concerne à legislação básica e à estrutura políticoinstitucional que regulam a indústria extrativa mineral Os três principais elementos da referida modificação dizem respeito aos aspec tos procedimentais de licenciamento da exploração mineral lavra à dimensão institucional da regulação pública e à regulamentação tributária setorial A discussão sobre o novo marco legal elaborado pelo Poder Executivo em substituição ao Decretolei nº 2271967 foi iniciada em 2009 pelo Ministério de Minas e Energia GOY 2013 12 As subseções foram organizadas de acordo com os objetivos do novo marco regulatório explicitamente divulgados pelo MME 2009 138 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 Nesse sentido as principais mudanças dizem respeito à criação de garantias da re alização de atividades mineradoras ou pena lidades à retenção de direitos de lavra Dessa forma propõese que as licenças de pesquisa tenham uma duração máxima de cinco anos prorrogável apenas por mais três e que as li cenças de lavra tenham prazo máximo de 35 anos renováveis quando as empresas cum prirem uma série de condições contratuais Da mesma forma são propostos procedimen tos de fiscalização mais rigorosos de modo a garantir que as empresas cumpram as ativi dades previstas em contrato bem como cri térios para devolução das áreas MME 2009 2010c VALOR ECONÔMICO 2010 Uma novidade com relação à concessão do direito de lavra é a redefinição das cha madas Áreas de Relevante Interesse Mineral ARIM Estas áreas são definidas como regi ões de interesse estratégico pelos tipos e ca racterísticas dos minérios encontrados cuja mineração é feita a partir de procedimentos especiais Em linhas gerais essas áreas são determinadas pelo Conselho Nacional de Política Mineral discutido na próxima se ção e os direitos para minerar estas regiões definidos por licitação MME 2010c A preocupação com a formalização da pro dução mineral é listada entre os objetivos da proposta de marco legal porém sem nenhuma ação concreta vinculada De qualquer forma tal objetivo também se alinha com a preocu pação de maximização da extração uma vez que mineradoras formais e mais profissionais tendem a ser mais eficientes em suas ativida des extrativas Além disso também se apro xima do objetivo de ampliação da captura de parcela da renda extrativa uma vez que mine radoras formalizadas pagam impostos e royal ties aumentando a arrecadação tributária Este objetivo se alinha portanto ao pres suposto do crescimento econômico baseado na apropriação da natureza Além disso a pre ocupação com a elevação da competitividade na indústria extrativa mineral sugere tam bém o ajuste do foco na exportação dos re cursos e bens de base mineral reconfigurando a inserção brasileira na divisão internacional do trabalho baseada em vantagens compara tivas e sob formas concorrenciais dinâmicas 42 Fortalecer a ação do estado no processo regulatório Do ponto de vista institucional há duas mudanças no marco legal da mineração buscando fortalecer o controle estatal dos recursos minerais a transformação do De partamento Nacional de Produção Mine ral DNPM em uma agência reguladora a Agência Nacional de Mineração ANM e a criação do Conselho Nacional de Política Mineral CNPM De acordo com o Código Mineral de 1967 o principal agente público envolvido no processo de licenciamento mi neral é o DNPM uma autarquia vinculada ao MME cujas superintendências regionais são responsáveis por receber os requerimen tos de pesquisa e de lavra e avaliálos A proposta da ANM segue o modelo das agências reguladoras existentes como a Agência Nacional de Energia Elétrica ANE EL e a Agência Nacional de Petróleo Gás Natural e Biocombustíveis ANP Esta nova agência tem como principais atribuições promover a regulação e a fiscalização da ati vidade de mineração arrecadar os royalties associados à atividade minerária e exercer a mediação em conflitos de interesse Sua direção é feita por um colegiado nomeado pela Presidência da República e submetido à aprovação do Senado Federal MME 2009 As principais mudanças institucionais pro postas pelo novo marco regulatório são re sumidas na Quadro 3 Neoextrativismo no Brasil 139 Quadro 3 mudanças institucionais propostas Competência Órgãos responsáveis Código Mineral de 1967 Modelo proposto Política setorial MME CNPM Poder concedente MME MME Regulação e fiscalização DNPM ANM Arrecadação royalties DNPM ANM Fonte adaptado de mme 2010c dos diretores da ANM quanto pela definição da composição do CNPM Nesse sentido pode ser identificada uma maior preocupação com o controle do uso dos recursos minerais o que vai ao encontro do paradigma neoextrativista Por outro lado a proposta parece ir ainda além e ao invés de garantir o controle do Estado transfere esse poder para o Chefe do Poder Executivo Esse viés centralizador não apenas diminui a participação democrática nas deci sões mas ainda permite ações autoritárias por parte do Governo Federal 43 aprimorar e dar mais transparência à forma de recolhimento controle e fiscalização Apesar de o objetivo explícito ser apri morar o recolhimento o que está implícito nas ações é o aumento da arrecadação por meio da mudança na cobrança da Compen sação Financeira pela Exploração de Recur sos Minerais CFEM No Brasil os royalties da mineração são pagos através da CFEM instituída pelas leis 79901989 e 80011990 e correspondem ao pagamento pelo direito de uso de recursos pertencentes à União O CNPM por sua vez foi inspirado no exemplo do Conselho Nacional de Políti ca Energética CNPE e tem sua composição definida por decreto do Poder Executivo13 Possui caráter consultivo assessorando a Presidência da República mas também de liberativo com o poder de emitir resoluções referendadas posteriormente pela Presidên cia O CNPM tem como principais funções estabelecer diretrizes para o planejamento do setor e para a promoção da agregação de valor criar áreas especiais de mineração e definir procedimentos licitatórios das ARI Ms e ainda manifestarse sobre a criação ou a alteração de áreas que importem restrição ou impedimento às atividades de mineração como por exemplo Unidades de Conser vação UCs e Terras Indígenas TIs MME 2009 2010b VALOR ECONÔMICO 2010 Sendo assim a mudança no marco regula tório tende a aumentar o poder discricionário do Governo Federal sobre os recursos minerais Mais do que isso suas propostas possuem um caráter centralizador uma vez que concedem novos poderes ao Poder Executivo Federal Segundo o marco proposto a Presidência as sume a responsabilidade tanto pela nomeação 13 O Conselho Nacional de Política Energética formado por pessoas designadas pelo Presidente da República é composto por nove ministros Minas e Energia Ciência e Tecnologia Planejamento Orçamento e Gestão Fazenda Meio Ambiente Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior Casa Civil Integração Nacional e Agricultura Pecuária e Abastecimento e um representante dos estados da sociedade civil das universidades da Empresa de Pesquisa Energética EPE e o Secretário Executivo do Ministério de Minas e Energia 140 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 A arrecadação da CFEM é calculada como um percentual do faturamento líquido da em presa mineradora que varia de acordo com o mineral O tributo é então distribuído entre o município 65 e o estado 23 onde se dão a lavra o DNPM 10 e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 2 BRASIL 1990 Tanto o MME quando as empresas mineradoras possuem diferentes propostas para mudança da CFEM De forma geral as alternativas dizem respeito ao cálcu lo da contribuição e à sua aplicação Com relação ao cálculo existe o desejo por parte do Governo Federal e dos municí pios mineradores de aumentar a alíquota co brada das empresas passando o percentual médio de 2 para 4 WARTH 2013 Uma segunda mudança diz respeito à base de cál culo da CFEM Na nova proposta do MME empregase a receita líquida e não mais o faturamento líquido Assim há menor dedu ção antes do cálculo da contribuição14 o que aumenta o valor arrecadado MME 2010a Em contrapartida existe uma intensa pressão por parte das empresas mineradoras para que um eventual aumento no paga mento da CFEM seja compensado pela re dução na carga tributária sob o argumento de que tal aumento iria reduzir a competi tividade do minério brasileiro no mercado internacional Esse argumento é baseado em um estudo encomendado pelas próprias empresas por meio do Instituto Brasileiro de Mineração IBRAM que afirma que o setor mineral no Brasil apresenta uma das três cargas tributárias mais elevadas do mundo ERNST YOUNG 2008 Entretanto tais afirmativas precisam ser avaliadas cuidadosamente pois tal conclusão está longe de ser consensual Outra pesquisa com base em 30 jurisdições países estados ou províncias apresenta uma conclusão bas tante diferente indicando que a tributação no Brasil seria somente superior a da China Cazaquistão Suécia e Chile Segundo este es tudo a tributação mineral no Brasil 3515 é muito inferior aos 638 aplicado pela província de Ontário no Canadá ou 499 do estado do Arizona nos EUA Sendo as sim o estudo conclui que as companhias mineradoras têm pouco do que se queixar e fundamentalmente uma revisão em sentido ascendente das alíquotas minerais têm pouca possibilidade de afetar negativamente o nível de investimento no setor SANTOS 2012 p 12 Indo ao encontro de tais afir mativas uma pesquisa realizada pelo Fraser Institute com representantes de mais de 800 empresas mineradoras em todo o mundo in dica que apenas 1 dos entrevistados não investiria no Brasil por causa dos impostos MCMAHON CERVANTES 2012 Dessa forma existe uma disputa inten sa sobre a renda extrativa De um lado as empresas tentam garantir a manutenção dos altos lucros que vêm obtendo recentemente dado o contexto de alta dos preços dos mi nérios no mercado mundial Em oposição o Governo Federal tenta aumentar a partici pação do Estado nesses resultados em con formidade com estratégias recorrentes pro postas na esfera do neoextrativismo 14 Essa decisão provavelmente devese ao fato de muitas empresas superestimarem seus gastos de transporte incluindo nas deduções valores associados a máquinas e equipamentos usados na operação das minas esteiras pás carregadeiras caminhões fora de estrada etc que deveriam ser contabilizados como despesas operacionais LIMA et al 2011 15 Representantes públicos defendem que a discussão sobre os royalties não ocorra de forma isolada mas sim a partir de um debate mais amplo a respeito dos impostos sobre a mineração MME 2009 Neoextrativismo no Brasil 141 44 melhorar a distribuição da riqueza gerada pela mineração e estimular o desenvolvimento de regiões produtoras Outro debate colocado pela proposta de novo marco legal diz respeito ao destino dos recursos da CFEM Uma primeira mudança re ferese ao uso que os municípios devem dar à receita obtida Segundo as leis de 1989 e 1990 somente há a proibição de que esses recursos sejam utilizados em pagamento de pessoal ou de dívidas Na grande maioria dos municípios mineradores estudados por Enriquez 2007 a CFEM era enviada para um caixa único mu nicipal16 ou não tinha destino específico Documentos referentes ao novo marco regulatório mencionam um possível Fun do Especial da Mineração gerido por um Conselho Deliberativo com participação de Governo Federal e da sociedade e utilizado para contemplar municípios adjacentes im pactados pela mineração ENRIQUEZ 2010 MME 2010a Por meio desse fundo o MME amplia o número de municípios beneficia dos pela CFEM seguindo diretrizes seme lhantes àquelas adotadas na distribuição dos royalties do petróleo Outra mudança se relaciona à pretensão de restrição da aplica ção dos recursos a alguns fins específicos como a diversificação econômica e o desen volvimento de capital humano Desse modo os fundos especiais aparecem como estratégia de legitimação da atividade mineral Assim como o Bono Juancito Pin to depende da extração de hidrocarbonetos para a sua manutenção os fundos especiais são vinculados à continuidade ou expansão da mineração Mais do que isso a transferên cia dos fundos para os municípios estimula os governos locais a criarem políticas que in tensifiquem a mineração em seus territórios 45 Fomentar a agregação de valor na cadeia produtiva mineral Os documentos disponibilizados pelo MME 2010b sobre o novo marco legal não qualificam conceitos como capital hu mano ou diversificação da economia mencionados na seção anterior No primei ro caso se mantida a visão setorial existe a possibilidade de que tais recursos sejam concentrados no treinamento de trabalha dores para atuar na cadeia mineral apro fundando a dependência extrativa No Plano Nacional de Mineração 2030 no entanto o MME 2011 p 75 relaciona a diversificação à agregação de valor via beneficiamento mineral no país Esta estratégia sugere con fusão entre diversificação e verticalização da cadeia assim como ausência de intenção explícita de reduzir a dependência das loca lidades da extração mineral Dentre os objetivos propostos pelo novo marco regulatório este é o único com ligação menos direta com o neoextrativismo estando mais relacionado a uma perspectiva neode senvolvimentista Seguindo essa linha de ra ciocínio o Governo Federal busca estimular a industrialização baseandose no argumento de que ela aumentaria o valor agregado dos produtos elevaria a receita das exportações geraria mais empregos e permitiria a arre cadação de mais impostos como defendido pelo então Diretor do DNPM 16 Itabira MG era uma das poucas exceções uma vez que a Prefeitura dessa cidade motivada pelo esgotamento iminente de suas jazidas aplicava os recursos da CFEM em um fundo para pesquisa tecnológica e diversificação da economia local Outra exceção foi o município de Forquilhinha SC que vinculou a CFEM a um fundo municipal de meio ambiente 142 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 Acho que o fato de termos esse modelo sem dúvida alguma estimulará inclusive permi tirá que o governo possa exigir investimen tos na cadeia produtiva e permitirá que o grau de agregação de valores da matériapri ma mineral possa também estar sendo pensa do e avançar de tal sorte que a matériaprima mineral não seja exportada sem a necessária agregação de valor ou seja o aço seja produ zido aqui ou o refino do cobre seja feito aqui ou seja a matériaprima não seja exportada como concentrada e sim como já o bem final Isso é fundamental porque aqui é que vão es tar sendo gerados os empregos a renda circu lará aqui e certamente o País estará ganhan do NERY 2010 Apesar da tentativa de romper com o paradigma neoextrativista arriscase apro fundar o modelo ignorando dinâmicas es truturais próprias dos mercados globais de minérios e bens minerais beneficiados Con forme debatido na seção 3 durante o perío do desenvolvimentista houve uma série de iniciativas de desenvolvimento da indústria de base centradas em diferentes redes de ex tração mineral que acabaram apenas por gerar enclaves extrativos Assim conforme já diagnosticado por Bebbington 2009 o Governo Federal apresenta uma perspectiva mais otimista do que realista ao apostar na repetição de tais políticas 46 estimular a prevenção da saúde a segurança das minas e o controle ambiental e contribuir para o desenvolvimento sustentável Além dos cinco objetivos debatidos aci ma documentos governamentais afirmam que o novo código mineral visa ainda con tribuir para o desenvolvimento sustentável sem entretanto qualificar este conceito ou definir ações concretas implicadas MME 2010b Apesar da falta de detalhamento lançar dúvidas sobre o grau de prioridade dado ao tema a forma como ele é descrito no Plano Nacional de Mineração 2030 suge re como a questão deverá ser tratada De forma geral as principais ações pro postas para promover uma produção sus tentável podem ser organizadas em dois grandes grupos Por um lado há as ações de melhoria de desempenho operacional que incluem utilização mais eficiente de energia e de recursos hídricos bem como reaprovei tamento de resíduos De outro lado existem as medidas relacionadas ao cumprimento de requerimentos legais como a realização de um inventário de minas abandonadas e a fis calização de barragens MME 2011 p 129 Podese afirmar então que o Governo Federal possui uma visão restrita dos im pactos ambientais gerados pela indústria extrativa mineral Ele adota como pressu posto que os impactos socioambientais da mineração somente ocorrem por má gestão de modo que uma mineração sustentável é possível desde que suas atividades sejam realizadas de forma adequada Esta ideia se baseia na crença de que não é necessá rio criar limites para a atividade mineral apenas é preciso guiála na direção correta Essa leitura sugere que o Plano Nacional de Mineração 2030 que orientou a formulação da proposta de novo marco legal apresenta uma visão utilitarista da natureza entendi da apenas como um recurso a ser explorado pela sociedade Dessa forma nesse quesito também parece haver alinhamento ideológi co de apropriação da natureza entre o marco proposto e as ideias neoextrativistas O Quadro 4 tenta resumir as principais questões apontadas nesta análise De forma geral o que se pode perceber é uma forte asso ciação da proposta de novo marco legal da mi Neoextrativismo no Brasil 143 neração com os princípios neoextrativistas A implementação dessa proposta cria o risco da intensificação do modelo neoextrativista no país aprofundando as tensões econômicas e socioambientais mencionadas anteriormente Quadro 4 avaliação do novo marco legal a partir do paradigma do neoextrativismo Objetivos do novo marco legal Estratégia Relação com neoextrativismo Atrair investimento para o Mudança no processo de Geração de riqueza pela extração setor mineral contribuir para a concessão de direito de lavra das riquezas nacionais e pelo elevação da competitividade para reduzir especulação aumento da participação no das empresas de mineração com títulos mercado internacional estimular a maximização do aproveitamento das jazidas e Criação das ARIM promover a mineração formal Fortalecer a ação do Estado Transformação do DNPM em Estado como protagonista das no processo regulatório agência ANM atividades extrativas Criação do CNPM Aprimorar e dar mais Mudança no sistema de cobrança Aumentar participação do Estado transparência à forma de dos royalties nos resultados econômicos recolhimento controle e fiscalização Melhorar a distribuição da Criação do Fundo Especial Uso de parte dos recursos gerados riqueza gerada pela mineração da Mineração pela extração em políticas sociais e estimular o desenvolvimento de regiões produtoras Fomentar a agregação de valor Cobrança de royalties Vínculo ao pensamento neode na cadeia produtiva mineral progressivos senvolvimentista Estimular a prevenção da Nenhuma estratégia concreta Visão utilitarista da natureza saúde a segurança das minas entendida apenas como recurso e o controle ambiental e natural a ser explorado contribuir para o desenvolvimento sustentável Fonte os autores a partir de mme 2010b 2010a Entretanto essa não seria a única estra tégia possível Existem diferentes pressu postos que poderiam ser incorporados ao novo marco legal da mineração que cons truíssem outra relação dessa atividade com a sociedade e o meio ambiente Alguns desses pontos são discutidos na próxima seção 5 considerações finais Ao longo desse texto procurouse avaliar em que medida o neoextrativismo pode ser percebido no Brasil tendo permitido iden tificar elementos desse paradigma em duas dimensões sendo uma econômica e outra 144 R Pós Ci Soc v10 n19 janjun 2013 política Na dimensão econômica o neoex trativismo foi associado à reprimarização da pauta de exportação brasileira e do PIB definida como o aumento da importância relativa das atividades de extração mineral visàvis os demais setores econômicos Na dimensão política características específi cas do paradigma neoextrativista puderam ser associadas aos principais objetivos da proposta de novo marco legal mineral De forma geral a proposta de novo mar co legal apresenta como principal caracte rística além de uma intenção elementar de expansão da produção mineral um forte componente centralizador O reforço do po der discricionário do Governo Federal so bre a indústria extrativa mineral expressa assim dois elementos chave O primeiro diz respeito à centralidade dos resultados eco nômicos do setor quanto à adição de valor e ao comércio exterior para a contabilida de nacional O segundo se relaciona à neces sidade de expansão da captura de parcela da renda extrativa no contexto da fragilidade do equilíbrio das contas públicas como eixo de uma estratégia redistributiva restrita via políticas sociais e mais importante para a manutenção de sua legitimidade política A avaliação do paradigma neoextrati vista aqui apresentada sugere que o apro fundamento desse modelo pode gerar uma série de tensões tanto econômicas quanto socioambientais Entre as tensões econômi cas podem ser listadas a deterioração dos termos de troca a elevada volatilidade dos preços dos recursos naturais a monotoniza ção econômica e a doença holandesa to das elas com fortes impactos sobre o desen volvimento econômico de longo prazo Por outro lado entre as tensões socioambientais estão degradação da paisagem poluição at mosférica contaminação hídrica inchaço urbano favelização e comprometimento da qualidade dos serviços públicos nas cidades Todavia argumentamos que essa não é a única alternativa possível e que outros pa radigmas poderiam ser adotados para evitar a concretização dos cenários aqui descritos Como ponto de partida deveria ser aban donada a perspectiva tecnocrática setorial adotada na formulação do marco legal e substituída por estratégias democráticas e participativas Nesse sentido é importan te mencionar que a população vive sobre o solo e portanto é o uso do solo que deve definir a exploração do subsolo e não o con trário Sendo assim as comunidades que vi vem nas áreas de mineração deveriam ser as primeiras a serem ouvidas e a elas deveria ser garantido o direito de participar ativa mente desse debate A partir da discussão com esses gru pos novas propostas poderiam surgir para prevenir ou ao menos mitigar alguns dos impactos socioambientais do setor Entre as questões a serem debatidas podem ser lista das a escala de operação e os efeitos cumu lativos de diferentes minas e de suas redes de produção extensivas implicando em portos e minerodutos ferrovias e terminais portuários etc sobre o mesmo território o monitoramento participativo dos impactos e a coexistência da indústria extrativa mi neral com outras atividades Ainda nesse rol de questões alguns países como Peru e Ar gentina vêm debatendo o conceito de terri tórios livres de mineração bem como o di reito de dizer não que poderão criar novos instrumentos para que as pessoas decidam como deve ser ocupado seu território Complementando essas questões tam bém parece ser fundamental debater aspec tos associados às tensões econômicas gera das pela mineração Embora devido à estru tura econômica do país seja pouco provável que os impactos mencionados acima sejam Neoextrativismo no Brasil 145 sentidos nacionalmente há indícios de que algumas regiões mineradoras tradicionais podem vir a passar por depressão econô mica devido ao esgotamento dos minérios explorados Para evitar esse tipo de arma dilha fazse necessária a discussão sobre a transição do modelo atual para uma possível economia pósextrativa Todavia as associações empresariais re presentativas da indústria extrativa mineral e os organismos governamentais relaciona dos à sua regulamentação são pouco incli nados a expandir tanto o temário quanto a gama de agentes implicados no novo marco regulatório da mineração Como consequên cia um debate público sobre o novo marco regulatório da mineração é impedido reco brindo as transformações que se anunciam de um verniz antidemocrático De fato apenas uma participação ampla deliberativa e trans parente pode proporcionar legitimidade às escolhas econômicas políticas e sociais que definem o fenômeno do neoextrativismo ReFeRêNcIas ACOSTA A Extractivismo y neoextractivismo dos caras de la misma maldición In GRUPO PERMANENTE DE TRABAJO SOBRE ALTERNA TIVAS AL DESARROLLO In Más alla del desar rollo Quito AbyaYala Fundación Rosa Luxem 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PósGraduação em Geografia PPGeoUFJF Possui doutorado em Política Ambiental pela Lincoln University na Nova Zelândia Rodrigo Salles Pereira dos Santos é professor adjunto da Universidade Federal Fluminense UFF e do Programa de PósGraduação em Ser viço Social PPGSSUFJF É Doutor em Ciên cias Humanas Sociologia pela UFRJ e atua nas áreas de Sociologia Econômica e do Desenvol vimento com redes globais de produção mine ração e siderurgia Recebido em 131313 aprovado em 240513