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209 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 TERRITÓRIOS PÓSCOLONIAIS Cultura Arte Política e Relações de Poder no Processo de Construção da Identidade Quilombola1 Heliana Castro Alves2 Samira Lima da Costa3 Resumo A perspectiva póscolonial nos permite refletir sobre os fenômenos que forjam uma nova relação temporal com a história assumindo como eixo problematizador o período colonial e seus desdobramentos sociais No Brasil as comunidades quilombolas conquistaram direitos no âmbito político e representam atualmente uma importante dimensão póscolonial no movimento negro Ao relacionar a luta pelo território e a identidade cultural este artigo se propõe a refletir sobre as novas estruturas das relações de poder no contexto do movimento quilombola A pesquisa elegeu como objeto de estudo as dinâmicas sociais advindas das demandas políticoidentitárias e utilizou o método de histórias de vida Para a análise de conteúdo temática usouse o software AtlasTI no processo de codificação e categorização temática por núcleos de sentido descritivos Em consideração ao fenômeno da globalização as produções artísticoculturais das comunidades tradicionais encontram novos cenários políticos e possibilidades de negociação identitária forjando assim novas enunciações no espaço coletivo PalavrasChaves Cultura afrobrasileira Identidade cultural Póscolonialismo Colonialidade Comunidades quilombolas Abstract The postcolonial perspective allows us to think about the phenomena which forge a new temporal relation with history assuming the colonial period and its social ramifications as the problematizing axis In Brazil Quilombola communities have conquered their granted rights in the political context representing an important postcolonial dimension in the Brazilian black movement When we relate the Quilombola fight for territory and the cultural identity issue this article proposes a debate on new structures of power relations of Quilombola movement This research choose as object the social dynamics from the political identity demands and also used the method of life stories The content analysis was performed via AtlasTI software for coding and the thematic categorization by meaningful nuclei Due to the globalization phenomenon culturalartistic productions in traditional communities have found new political scenarios and possibilities of identity negotiation forging thus new enunciations in the public and collective space Keywords AfroBrazilian Culture Cultural Identity PostColonialism Coloniality Quilombola Communities 1 O presente texto apresenta parte dos resultados e reflexões tecidas a partir da pesquisa de doutorado da primeira autora realizada junto ao programa EICOS da UFRJ O projeto de pesquisa foi aprovado pelo CEP do CFCH UFRJ sob o CAAE 37760814900005582 e foi financiado pela Capes Prodoutoral e Capes Cofecub 2 Universidade Federal do Triângulo Mineiro Doutora em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social Docente adjunto do curso de Terapia Ocupacional Email helianasolargmailcom 3 Universidade Federal do Rio de Janeiro Doutora em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social Docente adjunto do curso de Terapia Ocupacional Email biasam2000gmailcom Territórios póscoloniais 210 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 1 Introdução As comunidades quilombolas no Brasil constituem territórios rurais ou urbanos historicamente ocupados por grupos étnicoraciais cujas trajetórias específicas presumem a ancestralidade negra e remetem a processos de resistência à opressão histórica sofrida Brasil 2003 Ao refutarmos uma ideia estática ou exótica sobre este grupo social e considerarmos sua intensa participação no debate político contemporâneo sua dinâmica social pode ser compreendida a partir de perspectivas teóricas implicadas com a questão póscolonial vislumbramos novas narrativas subalternas que surgem no rompimento dos laços lineares do tempo histórico problematizando neste entretempo as relações sociais de poder advindas da modernidade O referencial póscolonial nos oferece parâmetros teóricos para refletirmos sobre os fenômenos contemporâneos que forjam uma nova relação temporal com a história tendo como marco e eixo problematizador o período colonial Neste trabalho apontamos dois quadros teóricos cuja confluência possibilita uma nova perspectiva ao olharmos para as lutas sociais relacionadas ao movimento quilombola hoje na América Latina o póscolonialismo e o Giro Decolonial Trabalhado em Bhabha 2013 Santos 2010 Stuart Hall 2011 entre outros o termo póscolonialismo não constitui uma referência temporal simples e fixa mas sim uma perspectiva complexa socialmente problematizadora e intelectualmente envolvida na crítica ao eurocentrismo e nos processos de colonização para compreender as novas relações globais e locais na contemporaneidade O ideário póscolonial é marcado pela corrente filosófica do pósestruturalismo como afirma Costa 2006 já que esta contribui para uma nova forma de se pensar o sujeito concebido como construção discursiva no jogo semântico da diferenciação Desta forma as perspectivas dos Estudos PósColoniais e dos Estudos Culturais problematizam a contemporaneidade ao tratar a temática da diáspora africana identidade cultural globalização hibridismo fragmentação cultural cultura popular transculturação EstadoNação e políticas de identidades ressaltando a emergência destes temas acadêmicos no campo da sociologia O Giro Decolonial a partir de autores como Mignolo 2005 Quijano 1992 2000 Grosfoguel 2006 2008 por outro lado ao realizar uma crítica ao eurocentrismo busca refletir sobre o processo histórico da colonização esmiuçando a lógica colonial a Heliana Castro Alves Samira Lima da Costa 211 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 continuidade da colonialidade do poder e as consequências sociais do colonialismo no mundo contemporâneo Para tanto rompendo com a teoria póscolonial e os estudos culturais e subalternos este grupo intelectual apresenta como ponto de partida a compreensão do sistemamundo moderno a partir da América Latina A ênfase desta corrente latinoamericana está em realizar uma crítica bem fundamentada ao eurocentrismo epistemológico presente na produção geopolítica do conhecimento Ao compreender que a modernidade só se concretiza a partir da invenção da América a perspectiva decolonial radicaliza sua crítica afirmando a necessidade de descolonizar a epistemologia fundamentada nos cânones ocidentais Grosfoguel 2008 Assim a modernidade depende da matriz colonial de poder e a invenção da América é formulada a partir do ponto de vista da colonialidade Mignolo 2005 Contar uma história sobre o ponto de vista do colonizado questionando as narrativas eurocêntricas da modernidade requer antes de tudo uma transformação na geografia do conhecimento No que diz respeito às diferenciações do Giro Decolonial Modernidade Colonialidade em relação à teoria póscolonial Restrepo e Rojas 2010 apontam três aspectos Primeiro a distinção entre colonialidade e colonialismo enquanto a perspectiva decolonial opera a partir da problematização aberta pela colonialidade do poder os estudos póscoloniais operam no que é constituído pelo colonialismo em si Na teoria Decolonial da América Latina crivase a diferença entre colonialismo e colonialidade o primeiro se encerra num tempo histórico o segundo pode se perpetuar em diferentes sistemas políticos ao longo do tempo O segundo aspecto diz respeito ao locus de enunciação e as experiências históricas a perspectiva decolonial trabalha a partir da América Latina enquanto o póscolonialismo aborda outros localismos geopolíticos como a Ásia e a África O terceiro e último aspecto se destaca pelas bases epistemológicas utilizadas já que a perspectiva decolonial busca essencialmente uma base epistêmica latinoamericana4 localizando a produção de saber No entanto como afirmam os autores estas distinções não significam que não se possam traçar algumas confluências entre as duas teorias tanto em consideração aos objetos de estudo tanto em consideração às críticas ao eurocentrismo Restrepo e Rojas 2010 Ambas as perspectivas 4 As principais correntes filosóficas utilizadas para estabelecer as bases conceituais da corrente intelectual decolonial da América Latina são a teoria da dependência de Aníbal Quijano que problematiza as desigualdades estruturais que influenciam as relações entre centro e periferia no sistemamundo a teoria da libertação de Dussel Freire que buscam colocar a condição do oprimido como um privilégio epistêmico para a articulação da práxis e a teoria do sistemamundo de Wallerstein que se volta para a concepção das origens da modernidade no sistemamundo Territórios póscoloniais 212 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 teóricas estão preocupadas sobretudo em buscar as narrativas contrahegemônicas de povos que passaram pelo processo de colonização É necessário observar portanto que a despeito das suas diferenças epistêmicas estas teorias incidem de maneiras e de lugares diferentes numa crítica ao eurocentrismo sendo portanto implicadas política e intelectualmente na observação e problematização dos efeitos do colonialismo moderno na organização geopolítica da atualidade e nos processos sociais advindos das relações do poder colonial Alves 2016 É necessário enfatizar a questão das comunidades quilombolas neste contexto em consideração ao processo de marginalização ocorrido nas garras da lógica colonial que impôs um sistema de exclusão e desigualdade social cujas consequências são observáveis até os dias de hoje Em parte algumas comunidades foram formadas como alternativas de vida ao modelo hegemônicoexcludente ainda no período colonial e seguiram na marginalidade e invisibilidade social até os dias atuais Neste sentido Grosfoguel 2008 critica uma epistemologia colonial eurocêntrica e propõe uma perspectiva epistêmica proveniente da diferença colonial em que o lócus de enunciação muda no processo de construção de um sistema a recuperação de um lugar geopolítico e de um corpopolítico do sujeito que fala Grosfoguel 2008 p 119 É nesta perspectiva decolonial que devemos considerar o atual contexto das lutas epistêmicas de povos que ficaram durante séculos marginalizados da história carregando as marcas de um tempo histórico perpetuado pela colonialidade do poder De fato como afirma Mignolo 2005 a colonialidade é uma matriz de poder constitutiva da concepção de mundo moderno que se perpetua enquanto estrutura lógica em diversos sistemas políticos ao longo da história Neste contexto a questão cultural passa a ganhar uma dimensão significativa se considerarmos que a legitimação do poder colonial se afirmou através da dominação eou supressão cultural de outros povos A expansão europeia foi marcada não apenas pela eliminação de vidas prescindíveis no sistemamundo colonial mas também e principalmente pela subjugação de culturas Heliana Castro Alves Samira Lima da Costa 213 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 Políticas Públicas Identidade e Cultura o PósColonialismo e o Giro Decolonial da América Latina como perspectivas No cenário social de encontro do Europeu com o seu Outro a interculturalidade passa a conduzir uma nova lógica cultural na qual o hibridismo surge como uma estética política na formação de povos sob o crivo da diáspora diáspora europeia intencional e colonizadora e diáspora negra compulsória e colonizada A tradução cultural emerge neste contexto como uma mecânica que fabrica continuamente esses processos sociais A diáspora africana possibilitou os processos de hibridização e sincretismo que transformam desestabilizam e deslocam as identidades originais teatralizando novas relações de poder no espaço social O hibridismo conceito central no póscolonialismo constitui um processo social que combina diferentes grupos culturais resultando em identidades e grupos renovados podendo ocorrer em várias esferas linguística cultural política racial Tadeu da Silva 2000 Ashcroft Griffiths e Tiffin 2000 As identidades híbridas evidenciam seu caráter fluido inacabado instável e impuro na formação cultural é o espaço da mestiçagem do barroco da dupla consciência da tradução e das fronteiras Santos 2010 Bhabha 2013 Gilroy 2001 Hall 2011 O termo hibridismo também tem sido associado ao trabalho de Homi Babha 2013 cujas análises sobre a relação entre colonizador e colonizado evidenciam a interdependência e construção mútua de suas respectivas subjetividades Ashcroft Griffiths e Tiffin 2000 O autor ainda afirma que toda cultura e sistemas culturais são construídos no espaço que ele chama de terceiro espaço de enunciação nas fronteiras entre duas culturas que estão em contato A identidade cultural emerge deste espaço ambivalente que torna o discurso da pureza cultural insustentável A partir dos encontros entre as diferentes culturas as relações são construídas neste terceiro espaço criandose assim novas formas transculturais na zona de contato produzida pela colonização Bhabha 2013 Nesta perspectiva Paul Gilroy 2001 metaforiza a imagem do navio em movimento pelo atlântico negro como um sistema vivo microcultural e micropolítico constituindo um símbolo organizador central que reflete uma estrutura heurística e fractual da formação transcultural Gilroy 2001 p 37 No período da primeira expansão colonial europeia houve um forte movimento de globalização caracterizado pelo hibridismo cultural A partir do século XX tem início um Territórios póscoloniais 214 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 aprofundamento no processo de globalização não mais caracterizado como projeto de expansão de territórios mas de mercado Em consideração a esse novo movimento novos fenômenos surgem no cenário geopolítico mudando as configurações entre global e local pluralizandose as identidades e trazendo novas dinâmicas não apenas políticas e econômicas mas também estéticas e culturais Nesse contexto as diferenças culturais passam a marcar fronteiras entre si e a produzir discursos de diversidade Compreendida portanto em sua conexão com a produção da diferença a identidade cultural passa a ser vista não apenas como o conjunto de características que distinguem os diferentes grupos culturais entre si mas como um processo social discursivo Tadeu Silva 2005 as identidades hoje são fragmentadas e fluidas em consideração à intensa globalização cultural Hall 2011 O turismo e as produções artísticas e culturais se inserem numa nova lógica global mercadológica como nos lembra Canclini 2012 produzindose novas nuances no que diz respeito à luta social de populações historicamente marginalizadas Estas produções artísticas sofrem transformações e traduções culturais reproblematizando e refletindo as novas relações de poder na contemporaneidade No contexto brasileiro a diferença cultural esteve sempre atrelada ao componente do racismo histórica e politicamente instalado com o advento da colonização Como bem observou Florestan Fernandes 20085 a densa desigualdade racial reflete a condição de sociedade pósescravagista advinda de um contexto político em que o processo abolicionista foi mais simbólico do que realmente moral em relação aos escravizados não se efetuando medidas de integração do negro na sociedade de classes As políticas sociais adotadas no contexto brasileiro nos últimos anos realizam portanto a proposta de reparação moral ao período da escravidão a partir de ações afirmativas intensamente presentes nos debates públicos se vinculando a um discurso de reconhecimento e cidadania junto à população negra Neste cenário social as comunidades negras que reivindicam sua ascendência escrava possuem hoje um espaço representativo na conflituosa arena política em consideração à questão fundiária refletindo uma importante dimensão pós colonial da luta do movimento negro Entre os campos de disputa que abarcam a cultura como demanda política e estética se configura a questão da tradição dos povos fazendo emergir como categoria os chamados Povos Tradicionais E é diante desses debates internacionais 5 Edição original 1964 O exemplar citado pelas autoras se refere à 5ª Edição do livro Heliana Castro Alves Samira Lima da Costa 215 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 acerca dos povos originários tribais e tradicionais que se configuram alguns contornos específicos como os povos quilombolas No Brasil a discussão sobre o tema das comunidades quilombolas ganhou novas forças e formatos a partir da Constituição de 1988 que prevê no artigo de disposições transitórias número 68 o direito de acesso à titulação das terras ocupadas e o direito de preservação da cultura afrobrasileira Desde a constituição cidadã o movimento negro se organizou junto a outras instâncias como a Associação Brasileira de Antropologia ABA para discutirem um conceito mais adequado de remanescentes de quilombo Essas discussões demandadas pelo próprio Ministério Público resultaram na recusa em se adotar a concepção colonial cristalizada e historicamente essencializada de quilombo tido como uma unidade social isolada e autossuficiente de negros fugidos Leite 2000 Admitese desde então uma variedade de processos de ocupação de terra nas diferentes trajetórias históricas ligadas à resistência negra alargandose a concepção de comunidade quilombola Desde então portanto cultura e território sempre estiveram articulados no processo de luta destas comunidades mesmo que dissociáveis em consideração às múltiplas realidades A titulação definitiva do território envolve ainda hoje porém muitos conflitos fundiários tornandose um ícone forte de luta póscolonial para estas comunidades Neste contexto é importante sinalizar os impactos das novas políticas sociais para o processo de luta da população quilombola endossando a discussão sobre a identidade cultural enquanto um marco de afirmação política no processo de negociação com o poder público nos contextos global e local e em diferentes esferas Ao observarmos o caráter político dos processos identitários a questão do reconhecimento das comunidades neste campo passa a ser importante na compreensão das lutas sociais redistributivas pelo território O decreto 4887 de novembro de 2003 estabelece que o reconhecimento de uma comunidade quilombola seja realizado pela própria população através de um processo de autoidentificação atribuindose à Fundação Cultural dos Palmares FCP a responsabilidade pela expedição das certidões de reconhecimento das comunidades e ao INCRA a identificação reconhecimento delimitação demarcação e finalmente a titulação das terras Brasil 2003 Um fator importante para a validade deste decreto é a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho OIT de 1989 que trata de uma resolução da Assembleia das Nações Unidas por meio da qual os Estados membros condenam a discriminação racial e comprometemse a adotar uma política Territórios póscoloniais 216 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 destinada a eliminar qualquer forma de discriminação A Convenção 169 da OIT ratificada pelo Brasil pode ser considerada um instrumento político e jurídico em garantia aos direitos das comunidades tradicionais indígenas e quilombolas O critério de autoatribuição concede à população quilombola um novo instrumento político emancipatório que soma forças no processo de acesso à titulação das terras e consequentemente autonomia para a realização de suas práticas socioculturais Realmente podemos observar um maior número de territórios reconhecidos entre os anos de 2003 e 2006 representando um impacto positivo desta política para o movimento quilombola O decreto 48872003 tem sido contestado no Congresso Nacional através da ADI 32396 que visa derrubálo em definitivo sob a alegação de inconstitucionalidade refletindo os interesses fundiários dos setores conservadores ligados ao agronegócio na esfera do poder público A autoatribuição e o respectivo reconhecimento pela FCP no entanto não implicam no processo de titulação de terras o sistema ainda apresenta importantes barreiras de contestação política que dificultam o acesso às terras apesar de sua previsão no corpo da constituição brasileira Como podemos observar pelo Sistema de Monitoramento das Políticas de Promoção da Igualdade Racial o maior índice de terras tituladas em relação ao número de certidões de reconhecimento emitidas se localiza no Estado do Pará onde ainda assim apenas 23 de terras reconhecidas como quilombolas são realmente tituladas pelo INCRA O menor índice desta relação se encontra no Sergipe e no Piauí contando com apenas 29 de terras tituladas Seppir 2015 Na arena deste debate sociopolítico sobre a questão fundiária articulase a noção de território entre os elementos fundamentais no surgimento deste novo ator social considerandoo um fator que influencia fortemente o processo de construção identitária e de reconhecimento de direitos na contemporaneidade Numa concepção mais ampla apontase o território como um lugar de memória histórias modos de vida e de afirmação produção cultural que se constrói processualmente a partir de subjetividades e afetividades ligando estes sujeitos políticos à terra tradicionalmente ocupada Na contexto latinoamericano o território constitui um instrumento de práxis política catalisador das energias emancipatórias 6 Ação Direta de Inconstitucionalidade 2004 Partido da Frente Liberal httpwwwconectasorgarquivoseditorfilesADI3239pdf Acesso em 10042015 Em 2012 foi iniciado o julgamento da ADI no Supremo Tribunal Federal tendo sido interrompido em alguns momentos desde então e está sendo retomado em agosto de 2017 Heliana Castro Alves Samira Lima da Costa 217 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 CRUZ 2011 Num gesto de resistência às múltiplas supremacias eurocristãs as comunidades negras reafirmam a luta pela manutenção de suas práticas socioculturais e religiosas no território compreendendoo enquanto espaço de produção de vida e embate político Defendem seu direito àquilo que Costa 2012 chamou de ocupação tradicional tratada a partir de dois sentidos a ocupação tradicional compreendida como prática significante e produtora de patrimônio por um lado e por outro como uso coletivo de solos e recursos naturais Arturo Escobar 1999 articula uma defesa do lugar que tem por foco os vínculos múltiplos entre identidade espaço e cultura desfazendose a relação binária entre natureza e cultura sem que para isso seja necessário naturalizar ou construir os lugares como fonte de identidades essencializadas Nesta perspectiva teórica a vida social não está necessariamente oposta à natureza e o território é concebido como uma entidade multidimensional que estabelece vínculos entre os sistemas simbólicos culturais e as relações produtivas Escobar 1999 Para o desenvolvimento das políticas culturais no Brasil contamos com alguns documentos internacionais como a aprovação da Agenda 21 da cultura em 2004 na cidade de Barcelona Comisión de Cultura Barcelona 2004 e a Convenção para a Proteção e a Promoção da Diversidade das Expressões Culturais em Paris em 2005 Conferência Geral da ONU para Educação Ciência e Cultura Paris 2005 Em 2006 no Brasil o Congresso Nacional ratificou esta Convenção tornandose um dos seus primeiros signatários Este fato assinala o comprometimento do Estado com a implementação de políticas públicas de democratização cultural facilitando o acesso à fruição e produção cultural por parte de populações mais vulneráveis às dinâmicas econômicas excludentes Nos últimos anos o Estado tem atuado discursivamente na perspectiva dos direitos culturais vinculando a cultura aos processos de cidadania e justiça social A partir deste entendimento de cultura em 2006 o governo federal elabora o Plano Nacional de Cultura baseado na Declaração Universal sobre Diversidade Cultural da UNESCO As novas perspectivas das políticas culturais instrumentalizam as comunidades quilombolas no agenciamento de suas diferentes práticas culturais fortalecendo a busca por legitimação dos territórios e conquistas de direitos sociais O contexto políticosocial possibilita que estas práticas culturais sejam reapropriadas e reinventadas no novo cenário visibilizando os discursos pela preservação da diversidade cultural numa perspectiva patrimonial Este processo de reapropriação e reinvenção das práticas culturais portanto passa a constituir um material discursivo e jurídico que permanece Territórios póscoloniais 218 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 em campo de disputa política abarcando novas relações de poder e processos de negociação identitária entre o poder público os interesses privados e a população quilombola na luta pelo seu território Ao relacionar a luta quilombola e a questão da identidade cultural que surge como ícone afirmativo no contexto da emancipação social destacase a relevância de se tecer reflexões sobre as novas estruturas das relações de poder numa perspectiva póscolonial e decolonial A pesquisa foi realizada junto à comunidade quilombola Machadinha em Quissamã ao norte do estado do Rio de Janeiro A coleta de dados foi feita através de entrevistas abertas utilizandose a metodologia de histórias de vida pesquisa documental e observação direta das reuniões comunitárias do cotidiano e dos ensaios das práticas artísticoculturais dentro do território quilombola A análise de conteúdo temática foi realizada a partir do software AtlasTI7 na utilização de ferramentas de codificação e categorização temática por núcleos de sentido descritivos Realizouse assim um recorte da pesquisa de doutorado com o objetivo de realizar reflexões sobre as novas estruturas das relações de poder no contexto do movimento quilombola tendo como ponto de partida as dinâmicas sócioculturaisartísticas da comunidade estudada 2 Desenvolvimento A Reinvenção das Práticas Culturais no Contexto Póscolonial Território Luta e Identidade Quilombola A Comunidade Quilombola Machadinha é formada por cinco sítios Boa Vista Bacurau Santa Luzia Mutum e fazenda Machadinha Ela abrange no seu extenso território as antigas fazendas de cana de açúcar dos séculos XVIII e XIX num período em que ocorreu um 7 O AtlasTi é um software para análise qualitativa de volumosos corpos de dados textuais gráficos áudios e vídeos auxiliando o pesquisador com ferramentas organizativas e de gerenciamento dos dados brutos de forma criativa e sistemática para posterior realização do processo de análise O pesquisador codifica e monitora a produção de sentidos entre os diferentes códigos levantados Estes códigos não constituem um estado estático na atribuição de sentidos mas dinâmico sendo possível relacionálos com outros códigos mudálos e atribuir diferentes articulações a partir de suas conexões evidenciando novas estruturas que podem ser significadas pelo pesquisador Heliana Castro Alves Samira Lima da Costa 219 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 forte emprego de mão de obra escrava na região Diante da preservação da estrutura arquitetônica deste período ao longo do tempo alguns dos moradores afrodescendentes ainda habitam as antigas senzalas localizadas no sítio da fazenda Machadinha A comunidade teve seu autorreconhecimento registrado pela Fundação Palmares em 2006 mas suas terras ainda não foram até o presente momento tituladas pelo INCRA Em uma das partes do território além das antigas senzalas se encontram a Casa Grande em ruínas uma pequena igreja que foi construída em 1833 a antiga cavalariça que também foi reformada no início deste século se transformando na Casa de Artes um campo de futebol uma mercearia uma área de lazer e o Memorial Machadinha este último instalado recentemente pela prefeitura dentro de uma das casas das antigas senzalas Em 2001 a prefeitura do município de Quissamã comprou uma parte das terras da antiga usina de cana deaçúcar na antiga fazenda Machadinha e começou a traçar metas para fortalecer o turismo históricocultural como alternativa orçamentária para o município Isso ocorreu em consideração ao amplo incentivo discursivo do poder público federal contido no interior das políticas sociais no processo de instauração dos direitos culturais e alguns decretos leis de incentivo tanto no que diz respeito à cultura afrobrasileira e ao patrimônio histórico imaterial quanto no que diz respeito à questão das comunidades tradicionais A iniciativa governamental pela reforma de aparatos arquitetônicos no território instalação de novos equipamentos culturais como o Memorial Machadinha e a revitalização das manifestações artísticoculturais tradicionais colocou a população quilombola em contato direto com o poder local em um longo processo de negociação identitária a partir das riquezas culturais apresentadas pela população e seu território Neste artigo trataremos sobre o jongo e o Memorial Machadinha para apontar as novas configurações de poder inseridas no processo de transformação da dinâmica sociocultural da comunidade nos últimos anos Uma das práticas culturais que sofreu um intenso processo de revitalização e renegociação no campo das relações com o poder público foi a manifestação artística do jongo O jongo ou o tambor como era chamado pelos antigos moradores é uma manifestação cultural que reúne dança canto e instrumentos percussivos cujas origens são remetidas à ancestralidade negra no período da escravidão A origem africana aqui pode ser contextualizada metaforicamente falando ao cruzar o oceano todas as práticas culturais Territórios póscoloniais 220 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 sofreram mudanças e hibridações impacto de diferentes linguagens ambientes vivências interstícios históricotemporais e novas traduções culturais O jongo traz em suas letras poéticas e metafóricas uma narrativa memorial de histórias do cotidiano vividas a partir do contexto da colonização expressando o sofrimento dos escravos seus valores e seu diaadia Melo 2012 Mattos e Abreu 2011 Lara e Pacheco 2007 Ao relacionarem memória e luta política nas comunidades jongueiras Mattos e Abreu 2011 afirmam que as histórias envolvendo antigos senhores castigos riquezas doações de terra a exescravos e ações do tráfico ilegal podem ser contadas ainda hoje pelo fato de terem se preservado ao longo do tempo nas performances festeiras nas danças nos jongos calangos e afins É importante observar portanto que a prática do jongo foi desterritorializada e retraduzida em novas formas culturais apresentandose híbrida e historicamente situada Em Machadinha o tamborjongo praticado desde a escravidão passou por um período de enfraquecimento enquanto prática na comunidade tendo sido retomado seu status de manifestação artística tradicional de base comunitária a partir do início do século XXI em consideração a um contexto político de valorização das práticas culturais historicamente marginalizadas Nesse processo de revitalização o tambor jongo sofreu muitas mudanças e condicionamentos estéticos para sua absorção na atividade do turismo Isso não ocorreu de forma passiva mas sim ativa e algumas vezes sutilmente conflituosa Os tamboeiros mais antigos mesmo diante do interesse em revitalizar a atividade cultural na comunidade questionavam a transposição de símbolos presentes na sua prática durante este processo que foi agenciado por atores ligados diretamente ao poder público local Assim além da mudança do nome quando o tambor passou a se chamar oficialmente jongo passouse a utilizar roupa branca que não era utilizada antigamente Os antigos tamboeirosjongueiros de Machadinha no entanto dissociavam a prática do tambor jongo da prática do candomblé religião afrobrasileira Por esse motivo ao ser assimilada a roupa branca nas novas apresentações a mestre do tambor mais antigo que também se inseria paralelamente na prática do candomblé passou a se preocupar com as possíveis consequências espirituais negativas da prática cultural principalmente sobre as crianças Para o poder público no entanto os recondicionamentos da apresentação artísticocultural representavam apenas uma mera mudança estética que permitiria uma melhor absorção do jongo no mercado global do Heliana Castro Alves Samira Lima da Costa 221 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 turismo Observase que o estabelecimento de uma hierarquia de poderes durante o processo de recondicionamento performático da prática do tambor jongo pode ter provocado em determinados momentos alguns conflitos e concessões por parte dos jongueiros mais antigos Essas roupas branca prá falar a verdade essas roupas brancas é de Oxalá é de Umbanda é de Oxalá eles jogam no tambor mas é de Oxalá eu percebo que é de Oxalá eu vejo que a criança ai eu que aguento muita coisa mas se soltar minha filha ó Cheiro entrevista cedida para o documentário Retalhos8 Durante a revitalização da prática cultural algumas estéticas corporais foram desaparecendo como a saca no tambor a umbigada o rolarcair no chão Por outro lado reapareceram outras como a dança em pares com giros sobre o próprio corpo além da teatralização encenada pelos dançarinos e composição espacial da roda Apesar dos processos hierárquicos e conflituosos em torno das múltiplas traduções culturais e negociações identitárias que envolvem novas relações de poder a comunidade protagonizou essas mudanças visando adaptar a prática do tambor a uma nova conjuntura política e cultural que a beneficiaria com a sustentabilidade econômica do turismo ganhos simbólicos uma nova posição social e sobretudo um importante espaço de articulação política Os jongueiros em meio a este contexto e apesar dos choques culturais e simbólicos significam positivamente as atualizações performáticas no contexto da inscrição da atividade no mapa turístico eles consideram o jongo uma ocupação tradicional da comunidade Machadinha combinando trajetórias de resgate cultural com novas invenções e tecendo tramas entre memórias ancestrais e as estratégias contemporâneas Autores como Nestor Canclini 2012 e Stuart Hall 2011 afirmam que a globalização enquanto fenômeno sociocultural causa um deslocamento das identidades culturais que como efeito paradoxal produz a pluralização das identidades locais Neste cenário estas identidades são fortalecidas gerando novos pontos de tensão entre local e global O turismo é uma prática social fortalecida na contemporaneidade em que a alteridade e a valorização da diversidade estimulam a pluralização destas identidades No entanto como observa Santos 2010 é 8 A entrevista de dona Cheiro consta na documentação visual do documentário Retalhos Ela foi cedida pelo cineasta Antonio Molina para o acervo do Espaço Cultural José Carlos de Barcellos constituindo parte do material utilizado para a análise documental da tese de doutorado No período de coleta de dados deste trabalho Dona Guilhermina Cheiro já era falecida Territórios póscoloniais 222 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 importante notar que a integração das diferenças nos circuitos culturais globais pode provocar apenas um deslocamento da condição de subalternidade de um sistema de exclusão para um sistema de desigualdade De fato os moradores de Machadinha relataram que a comunidade antes do investimento público no turismo cultural era completamente esquecida e negligenciada pelo município e que agora suas riquezas culturais passaram a oferecer visibilidade pública sem que condições sociais mais profundas no entanto fossem totalmente transformadas Como afirma este autor o reconhecimento social que neste caso ocorre através da cultura não pode se sobrepor às lutas por redistribuição social Santos 2010 a necessária articulação entre reconhecimento e redistribuição deve ser contemplada na busca por justiça social É a partir desta perspectiva e ainda visando a sustentabilidade econômica que as práticas culturais são reinventadas retraduzidas ressignificadas e reapropriadas pela população Como observa Canclini 2012 o desenvolvimento moderno não suprime as culturas populares tradicionais que seguem se transformando no tempo Para o autor a cultura popular se constitui em processos híbridos que utilizam como signos de identificação alguns elementos procedentes de diversas classes e nações9 Na mesma direção Hall 2011 considera que a cultura deve ser compreendida a partir das relações de poder ela não é pura mas um fenômeno complexo e movediço Observamos que a prática tradicional do jongo em Machadinha e outras comunidades passam a ganhar uma dimensão espetacularizada voltandose para um público turístico além de transformar seus contornos estéticos hibridizando suas formas Ao transcender o binarismo entre tradição e modernidade como nos apontaria Hall 2011 a reinscrição da cultura popular num novo contexto abre espaço para novas configurações de sociabilidade na produção e recriação de suas práticas culturais O protagonismo da comunidade nestes processos culturais transformativos dialeticamente construídos na relação com o poder público forja novas dinâmicas sociais e 9 É necessário observar que a cisão entre popular e erudito refletia nos séculos XIX e XX uma visão eurocêntrica no campo da cultura a cultura popular foi frequentemente associada ao folclore e tida como uma cultura em vias de desaparecimento A visão folclorista do século XX ao mesmo tempo em que se referia à contribuição das três matrizes étnicas para a formação da cultura de uma identidade nacional unificadora num gesto de reconhecimento simbólico do papel do negro na cultura brasileira ela também refletia o ideário cientificista eurocêntrico e racista reforçando os preconceitos em torno da população negra liberta e os prognósticos pouco auspiciosos sobre o seu futuro Souza e Silva 2012 O olhar do folclore é um olhar nostálgico que enaltece a pureza da cultura popular como se esta estivesse ameaçada pela modernização da sociedade difundiase assim uma retórica da perda da fixidez da pureza Heliana Castro Alves Samira Lima da Costa 223 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 identitárias transformando o cotidiano da população e tecendo novas vias de articulação e negociação em torno da luta pelo território Ao redor do jongo e atrelado a ele outras dinâmicas socioculturais começaram a se constituir no território Quando os turistas chegam à comunidade eles visitam primeiramente o Memorial Machadinha para em seguida assistirem a uma roda de jongo dentro do próprio Memorial ou em frente a ele realizandose uma articulação entre as duas práticas patrimoniais O Memorial foi construído e planejado pela prefeitura sem consulta prévia junto à comunidade quilombola impondo nuances essencialistas e fixas à identidade local Em 2008 a prefeitura realizou um projeto enviando pesquisadores para a região Kissama em Angola de onde veio um negro escravizado que batizou a cidade de Quissamã no período do império colonial Desta viagem trouxeram muitos objetos tradicionais da região e montaram o Memorial Machadinha que passou a fazer parte da dinâmica cultural e identitária da comunidade No momento da pesquisa muitos moradores mais antigos não gostavam do memorial primeiro porque não se identificavam com os objetos de uma África distante e segundo porque o Memorial havia sido instalado no lugar do antigo salão de festas da comunidade onde a população dançava o fado Observouse portanto por parte do poder local um discurso políticoidentitário essencialista que valoriza e enaltece as raízes africanas numa palpável tendência pela idealização de um retorno místico o Memorial Machadinha passou a se constituir como um lugar de memória A concepção estética do Memorial e a disposição dos objetos e fotos da África foi um projeto do poder local sem que houvesse um diálogo com os moradores Neste mesmo período a prefeitura local lançou uma série de livros dispostos à venda no Memorial sobre a história do surgimento de Quissamã e suas riquezas patrimoniais endossando o projeto de aquecimento do turismo históricocultural da região Alguns destes livros no entanto reproduzem a imagem do bom senhor de escravos preservada na memória da elite local contrariando a memória dos próprios moradores locais como seu Tide cuja bisavó escrava que dançava o tambor relatava os castigos violentos contra os escravos da fazenda Machadinha10 10 Livro Tidinho o menino contador de histórias uma outra versão da história de Quissamã autoria de Raquel Fernandes O livro constitui uma publicação da prefeitura municipal administração de Armando Cunha Carneiro da Silva descendente da elite senhorial constando ainda a Fundação Cultura a partir de Alexandra Territórios póscoloniais 224 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 é ela gostava muito do jongo sempre tinha jongo aqui na comunidade né só o jongo naquele tempo era diferente o pessoal tratava como tambor agora é jongo ela ponhava um porretinho na hora que ela saía na rua na roda ela com porretinho passava com o porretinho no chão para espalhar o pessoal para abrir mais a roda pro pessoal poder dançar uma maderinha igual essa só que era uma bem feitinha traquejada essa aqui eu peguei para mim poder andar por causa de cachorro abrir a roda para formar dar espaço para o pessoal dançar aí ela conversava comigo que tinha que ela era escrava ela trabalhava na roça e quando chegava em casa as veiz o patrão o nhonhô mandava dar uma surra neles dava chibatada nela e nos homens os homens também apanhava né tinha o capataz que batia nos escravos mas ela dançava e gostava muito da parte do jongo e do do movimento que tinha dentro de casa né Tide Ao desenvolver a noção de colonialidade do saber Quijano 2000 aborda o poder epistêmico da Europa no sistemamundo moderno cabendo a ela a centralidade da produção legitimação e difusão de conhecimento Como afirmam Restrepo e Rojas 2010 a partir da perspectiva decolonial o que se denomina modernidade é o específico universo de relações intersubjetivas que se dá a partir da dominação eurocêntrica Este modo de conhecimento forjado pela centralidade da Europa que se autodenomina racional surge como emblema da modernidade Isso quer dizer que o eurocentrismo é antes de tudo uma perspectiva cognitiva que no entanto não é exclusiva dos europeus e nem do período colonial ela transpassa o tempo também pertencendo aos que tenham sido educados pela sua hegemonia Ou seja não apenas os europeus mas seus descendentes diretos e outros passaram a reproduzir nos territórios coloniais uma perspectiva eurocêntrica do conhecimento Restrepo e Rojas 2010 Neste mesmo sentido Aníbal Quijano 2000 propõe que na escala societal o poder é um espaço e uma malha de relações sociais de exploração dominação e conflitos que se articula em torno da disputa pelo controle de alguns âmbitos da existência social Entre eles se encontra a subjetividade e seus produtos materiais e intersubjetivos incluindo o conhecimento Quijano 2000 p 345 Observase que as memórias de determinados grupos Moreira Carvalho Gomes Organizador do projeto e diretor de arte Leonardo Vasconcellos Silva o livro distribuído na rede pública do município transmite a falácia ideológica do bom senhor de escravos Livro Quissamã A raiz de uma história de Aloysio Balbi 2011 afirma que o Visconde de Ururaí não era afeito à violência e assim não a delegava às mãos de seus feitores Afirma ainda que Machadinha nunca foi quilombo não existindo narrativas de fugas de negros escravizados desta fazenda veiculando uma concepção frigorificada de quilombo Escrito em meio à necessidade presente de apresentar as riquezas arquitetônicas diante o inegável potencial turístico este livro obteve apoio do Instituto Sete Capitães de Quissamã fundado em 2007 com o objetivo de preservar a história o patrimônio e o turismo em Quissamã e região tendo como primeiro presidente Haroldo Carneiro da Silva descendente do Visconde de Araruama José Carneiro da Silva Heliana Castro Alves Samira Lima da Costa 225 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 sociais dominantes utilizam o poder simbólico e o poder político para fazer prevalecer sua representação de passado a partir de uma perspectiva eurocêntrica evitando a polissemia de vozes e pontos de vista sobre a história Isso ocorre de forma sutil subliminar e sob novas roupagens éticopolíticas que paradoxalmente se voltam para um contexto de valorização da cultura negra reforçando no entanto a relação unilateral destas memórias reconstruídas a partir de um único ponto de vista o ponto de vista da elite No Memorial Machadinha as fotos de rostos angolanos se misturam às fotos do povo de Machadinha entre eles muitos jongueiros trazendo intencionalmente uma narrativa de semelhança física direta entre os dois povos A busca por uma origem pura tal como foi realizada reforçando um processo de construção identitária monocultural nos conduz a um tempo prédiaspórico transcendente ahistórico na fabricação ativa de uma memória essencializada que se baseia prioritariamente em um mito de origem observase que o Memorial reproduz uma visão absolutista e cristalizada de cultura e identidade Observamos portanto nesta concepção do Memorial como sinalizaria Gilroy 2001 p 355 que a memória da escravidão é substituída por uma noção mística da África tornandose indiferente à variação intraracial e portanto congelando a história no ponto em que os negros embarcaram nos navios que os levariam para os inimigos e horrores da Middle Passage Simbolicamente porém o dispositivo do Memorial Machadinha na relação com os jongueiros e os moradores parece forjar um sutil espaço de negociação de memórias e identidades A essencialização da identidade cultural de Machadinha e portanto a cristalização de sua origem pura e mistificada da África é reforçada pela inscrição das suas práticas culturais no contexto do turismo global deslocando sua historicidade das articulações culturais e movimentos tradutórios que ocorreram no contexto colonial e na luta de classes A postura essencialista ignora o sistema complexo de diferenças culturais sociais e históricas em que o sujeito se constrói criando hierarquias e naturalizando categorias como raça e gênero a serviço do discurso hegemônico Ashcroft Griffiths e Tiffins 2007 No entanto ao mesmo tempo em que o discurso essencialista destas práticas é enaltecido neste contexto a dimensão discursiva da poética dos jongueiros insiste na mestiçagem reivindicando para si a sua identidade híbrida e ambivalente O coordenador do grupo de jongo costuma recitar a seguinte poesia autoral antes de cada roda de Jongo Territórios póscoloniais 226 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 Sinto junto a mim as senzalas nos meus pés pesando como correntes Sinto a morte rude dos homens fortes que aqui habitavam livremente Sinto o balançar das ondas dos bravos navegadores que navegavam os mares em busca do desconhecido Sou filho do negro Sou filho do índio Sou filho do Branco Sou filho deste século louco Sou produto de milhares de gerações Sou poeta Sou guerreiro Leandro Comunidade Quilombola Machadinha Rio de Janeiro O poema de entrada das rodas de jongo em frente ao Memorial encerra em si um discurso enunciativo que coloca em pauta a densidade contemporânea e complexa do processo da formação de uma identidade fragmentada e híbrida como um caleidoscópio polifórmico e mutante O poema questiona ainda a essencialização das raízes africanas sem negálas problematizando suas origens que se movimentam laboriosamente no interstício temporal da modernidade no entretempo do acontecimento colonização e a enunciação no presente Bhabha 2013 A poesia traz a mestiçagem e seus movimentos tradutórios no encontro entre culturas enaltece a ambiguidade e a impureza híbrida da pele e portanto revela seu pensamento fronteiriço como uma consequência positiva do diferencial de poder É na terceira margem destas fronteiras e na fluidez da interculturalidade que a mestiçagem permite a descentralização da geopolítica do conhecimento Mignolo 2005 A identidade fronteiriça do jongo de Machadinha na contemporaneidade permite a transição entre vários mundos contato com diferentes públicos de países e municípios diferentes outras classes sociais diálogos com o poder público viagens atravessando barreiras e aumentando suas margens de negociação e articulação políticoidentitária em prol de sua luta pelo território Numa leitura póscolonial a partir de Homi Bhabha 2013 p 389 é possível observar que os subalternos que agora se apoderam do acontecimento espetacular da modernidade o fazem em um gesto catacrético de reinscrição da censura da modernidade no presente enunciativo este sujeito estabelece um entrelugar e um entretempo da narrativa moderna póscolonial No palco das novas relações de poder da contemporaneidade em que ocorrem sutis mudanças nas condições sociais de enunciação de povos antes obliterados da história observamos neste poema a encenação dos acontecimentos da modernidade para transformar o locus do pensamento em sua crítica póscolonial como afirmaria Bhabha 2013 Assim o hibridismo que é invisibilizado nos discursos essencialistas do poder Heliana Castro Alves Samira Lima da Costa 227 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 público local no processo de negociação das identidades e memórias passa a ser enaltecido pela poética enunciativa subalterna póscolonial Através de práticas de rememoração os jongueiros realizam uma reflexão aprofundada e crítica em relação à história da comunidade e do jongo questionando a dependência em relação ao poder público local e algumas de suas práticas exploratórias Eles utilizam o espaço das reuniões do grupo e a história do próprio jongo enquanto uma prática cultural de resistência negra para uma constante revisão sobre a inserção da comunidade no atual cenário político Para compreender a relação entre o conjunto arquitetônico e a dinâmica cultural identitária no processo de luta pelo território é interessante sinalizar que o Memorial Machadinha foi instalado em uma das casas da antiga senzala estabelecendose no contexto do turismo um diálogo espacial com a prática cultural do jongo No entanto na memória jurídica local a terra e todo o conjunto arquitetônico da fazenda Machadinha um dos sítios do território quilombola foram adquiridas pela prefeitura local Em janeiro de 2007 a prefeitura municipal afirmou junto ao Ministério Público Federal Machadinha não é uma comunidade quilombola porque segundo a legislação as comunidades quilombolas são grupos étnicos com resistência à opressão histórica sofrida Em tal documento a administração municipal da época afirmou ainda que os antigos escravos sempre foram bem tratados levandoos a permanecer na terra mesmo após a abolição Silva 2009 Este pronunciamento publicado em portaria oficial constituiu uma grave deslegitimação da articulação comunitária em torno do seu autorreconhecimento expressando ainda uma visão restrita de quilombo ao se remeter a uma concepção frigorificada de comunidades isoladas de escravos fugitivos que desde 1994 já vinha sendo desconstruída em prol dos direitos de comunidades negras que viveram séculos de opressão histórica Além disso a declaração acima negou qualquer relação entre poder castigo e escravidão relegando ao silenciamento e ao esquecimento histórico todo o sofrimento e resistência do povo negro escravizado que ali viveu e que hoje configura a ancestralidade dos moradores contrariando inclusive suas memórias intergeracionais Em 2008 através de um decreto municipal a prefeitura finalmente reconheceu o território quilombola cedendo o direito à titulação das terras quilombolas em conformidade à constituição federal e ao decreto 48872003 o que até o presente momento não se efetivou concretamente A ambivalência de tais discursos e práticas reflete as novas instâncias discursivas nos conflitos sociais póscoloniais que se constroem através de uma teia muito Territórios póscoloniais 228 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 sutil de poder em torno das lutas identitárias e territoriais da comunidade Apesar do decreto supracitado a prefeitura continuou emitindo contratos temporários de moradia nas antigas senzalas ao invés de promover a titulação das terras a nível municipal apropriandose na prática de parte do território quilombola Esta ambiguidade presente nos discursos do poder local e a falta de autonomia da comunidade em relação ao próprio território elementos constantemente questionados pela comunidade parecem constituir uma das peças do jogo social contemporâneo em que se figuram as novas relações de poder Os quilombolas jongueiros se integraram a esta discussão articulando essas demandas sociais com a questão cultural na reivindicação de espaço político dos quilombolas junto à Secretaria de Cultura e outras instâncias de controle social Até o momento desta pesquisa os quilombolas não podiam administrar os equipamentos instalados no próprio território ainda em poder da prefeitura mostravamse inseguros diante de um contrato de comodato instável e deslegitimador e reivindicavam maior autonomia11 Diante deste cenário crítico em que surgem novas formas de colonialidade de poder como afirmaria Mignolo 2005 os quilombolas tentam vincular o discurso político ao redor da luta pelo território à prática do jongo na comunidade e buscam caminhos jurídicos e garantias de editais públicos federais para legitimação de suas práticas sóciopolítico culturais na busca de autonomia plena e reconhecimento social O jongo enquanto prática cultural discursiva sofre ressignificações culturais que continuam remontando diariamente à memória da sua trajetória histórica e ganha uma dimensão política para traçar futuros projetos em torno da conquista de direitos e justiça social por parte dos descendentes de escravos Considerações finais Este trabalho não expressa uma radicalização intelectual em relação às epistemologias do norte sul abarcando autores que reforçam nas suas produções a denúncia à colonialidade e ao colonialismo Acreditase que em consideração a esta nova etapa da globalização os 11 No momento presente a comunidade se organiza politicamente junto a administração local para a conquista da autonomia administrativa dos equipamentos sociais presentes no território Por exemplo em relação ao restaurante da Casa das Artes reivindicam no momento para que seja administrado por uma cooperativa de mulheres da comunidade quilombola Heliana Castro Alves Samira Lima da Costa 229 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 localismos intelectuais possam realizar em determinados momentos pontes relativistas para experiências de transnacionalização dos pensamentos e das experiências comuns na relação com o poder hegemônico eurocentrado Como afirma Grosfoguel 2006 é necessário pensar a produção de conhecimento mais em termos de situacionalidade epistêmica do que se encerrar nos localismos em si já que tanto as pessoas de países centrais dominantes podem adotar uma perspectiva crítica ao sistema quanto os intelectuais de países periféricos podem adotar a perspectiva do dominante Desta forma considerando a demanda dos dados da pesquisa e uma perspectiva integrativa optouse pelo apontamento das confluências teóricas entre a teoria póscolonial os estudos culturais e o Giro Decolonial da América Latina Machadinha é uma comunidade quilombola que apresenta um cenário rico em detalhes e singularidades contribuindo para o debate sobre a questão das práticas culturais e das lutas sociais pelo território no interior das novas relações de poder na contemporaneidade O artigo aponta reflexões sobre a existência de uma estrutura ambivalente nos discursos do poder público local tanto em torno do território quilombola quanto na gerência das práticas culturais Essa posição discursiva ambivalente e hierárquica produz como efeitos a tentativa de deslegitimação do autoreconhecimento da comunidade como quilombola e um processo de essencialização da identidade e da memória da comunidade remontandoa a uma ancestralidade africana deslocada da atualidade e fixada no tempo passado O palco da globalização econômica e cultural fornece substrato para o surgimento de novas relações de poder que se refletem no processo de construção identitária e nas dinâmicas socioculturais em meio aos conflitos de classe Como observa Santos 2010 o capitalismo pode se desenvolver sem o colonialismo enquanto relação política mas não o pode fazer sem o colonialismo enquanto relação social Neste contexto observamos a possibilidade de perpetuação da colonialidade de poder que ocorre paradoxalmente em meio às conquistas de direitos e de reconhecimento social No entanto na contemporaneidade e em consideração as diferentes trajetórias identitárias e históricas as comunidades quilombolas continuam se apresentando a partir das margens e inseridas no contexto de hegemonia cultural tanto a nível global quanto a nível local Apontase no horizonte da América Latina uma necessária transformação em direção a um paradigma decolonial nos movimentos e organizações sociais que despontam como uma forma de resistência à persistência da colonialidade enquanto epísteme do sistema econômico na atual configuração geopolítica Estas novas formas de Territórios póscoloniais 230 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 colonialidade manifestadas tanto nas barreiras institucionais burocráticas presentes na esfera macrossocial quanto nas micropolíticas das relações de poder locais encontram novas táticas de resistência pela via da produção do cotidiano por parte da população que passa a articular seus recursos culturais e patrimoniais à luta redistributiva pelo território Compreendida aqui enquanto projeção política a produção cultural reflete e ao mesmo tempo sustenta as lutas pela emancipação social De fato o interesse das comunidades quilombolas pelo turismo cultural segue a perspectiva de justiça social prevista nas políticas culturais e a noção de direitos culturais que as sustenta as práticas culturais dos diferentes grupos sociais em processo de marginalização podem ser utilizadas como alternativas para a sustentabilidade econômica abarcando o projeto de valorização da diversidade cultural e o acesso democrático à produção e financiamento destas práticas No entanto é necessário assegurar o protagonismo comunitário nesses processos evitandose os mecanismos sutis de colonialidade de poder por parte das administrações locais que podem cooptar as práticas culturais e os territórios dificultando ou impedindo o acesso aos direitos sociais e culturais das comunidades tradicionais A persistência da perspectiva eurocêntrica nas novas relações de poder na atualidade deve ser analisada na produção de discursos neocoloniais já que estes se mantêm ambíguos sutis e fragmentados dificultando o acesso aos direitos já conquistados A reinvindicação discursiva por uma identidade híbrida através da poética do jongo no contexto global abre o espaço enunciativo do agente cultural subalterno para a articulação política e negociação cultural O hibridismo portanto como força política e histórica encerra outras narrativas na temporalidade disjuntiva da modernidade e teatraliza as memórias da escravidão a partir de um posicionamento crítico dos acontecimentos contemporâneos Como diz Homi Bhabha o discurso póscolonial no momento limiar de identificação produz a partir da enunciação do hibridismo uma estratégia subversiva de agência subalterna que negocia a sua própria autoridade Bhabha 2013 p 296 O jongo neste processo de luta quilombola parece encerrar nas suas entrelinhas poéticas e nas micropolíticas do cotidiano junto a estas novas relações de poder um discurso póscolonial a possibilidade de reconstruir a memória da escravidão realizando para tanto projeções sociais futuras a partir do presente Heliana Castro Alves Samira Lima da Costa 231 REALIS v7 n 01 JanJun 2017 ISSN 21797501 Bibliografia ALVES H C 2016 Eu não sou milho que me soca no pilão jongo e memória pós colonial na comunidade quilombola Machadinha Quissamã Tese de Doutorado Programa de PósGraduação em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social EICOS Rio de Janeiro Universidade Federal do Rio de Janeiro ASHCROFT B GRIFFITHS G TIFFIN H 2007 PostColonial Studies The Key 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póscolonial O estudo do póscolonial apresenta segundo as autoras fontes para reflexões atemporais tornando de suma importância para a história uma nova relação entre o marco deste período e sua problematização uma vez que o indivíduo colonial se alto considerava senhor de si e do mundo ao seu redor uma entidade homogênea tendendo a perfeição e a unificação um átomo social e físico priorizando seus feitos e diminuindo a existência dos que eram diferentes tornando o outro um mero objeto O contraditório o aleatório o fantástico e a pluralidade existentes no indivíduo na sociedade do período pós colonial chama atenção na obra das autoras uma vez que e no real são considerados desvios e erros devendo ser reduzidos ou eliminados Este pensamento procura unificar controlar e racionalizar A solidariedade e a comunhão naturais tendem a ser substituídas por uma estrutura social racionalizada e racional e por dispositivos de comunicação entre os indivíduos É visivelmente abordado neste trabalho quadros teóricos cuja confluência possibilita uma nova perspectiva quando olhamos para as lutas sociais relacionadas ao movimento quilombola hoje na América Latina o póscolonialíssimo e o Giro De colonial Ainda que não dito explicitamente as autoras parecem descrever um processo de mudança que nunca ocorre totalmente como se o peso do passado fosse intransponível A polissemia da palavra fronteira é habilmente explorada pelas autoras a globalização enquanto fenômeno sociocultural causa um deslocamento das identidades culturais que como efeito paradoxal produz a pluralização das identidades locais Neste cenário estas identidades são fortalecidas gerando novos pontos de tensão entre local e global O brasil possui uma histórica com os afro brasileiros ao mesmo tempo o espaço colonial é o símbolo de uma mudança política com a vinda da Corte Corte que não valorizava mais zonas tampão É possível compreender a partir das palavras de Samira e Heliana as perspectivas dos Estudos PósColoniais e dos Estudos Culturais problematizam a contemporaneidade ao tratar a temática da diáspora africana identidade cultural globalização hibridismo fragmentação cultural cultura popular transculturação EstadoNação e políticas de identidades ressaltando a emergência destes temas acadêmicos no campo da sociologia Uma vez ser de suma importância a valorização a estes povos pois carregamos a herança genética e histórica é importantíssimo voltarmos os olhos a história dos povos quilombolas enfatizando seus costumes artes e cultura rompendo com a teoria póscolonial e os estudos culturais e subalternos as autoras definem intelectual apresenta como ponto de partida a compreensão do sistemamundo moderno a partir da América Latina Lendo o material foi visto que na o Descolonial da América Latina demonstra a divergência entre colonialismo e colonial idade sendo o como primeiro aspecto apresentado no tempo histórico e o segundo o pode se estabelecer em diferentes sistemas políticos ao longo do tempo O segundo aspecto diz respeito ao lócus de enunciação e as experiências históricas a perspectiva de colonial trabalha a partir da América Latina enquanto o pós colonialíssimo aborda outros localismos geopolíticos como em alguns continentes de exemplo o asiático e africano A análise desta obra traz importantes reflexões sobre o período colonial pós colonial seus aspectos e reflexos na sociedade moderna é um importante norte para adquirir uma ideia como é importante exaltarmos os povos que tanto fizeram por este país Representa uma ideia das culturas identidades e períodos importantes da história busca da ênfase aos povos quilombolas Expressando a verdadeira história no período pós colonial ressaltando especialmente os Política e Relações de Poder no Processo de Construção da Identidade Quilombola também foi perceptível alguns modos de alcançar mais visibilidade a diversidade social e potencializar a valorização das culturas dos povos originários deste país Sendo um trabalho de grande facilidade para a compreensão as autoras abordaram de forma adequada e simples um tema importantíssimo ressaltando pontos cruciais para a compreensão do leitor sobre os povos quilombolas e do período pós colonial