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Engenharia Química ·

Química Orgânica 1

· 2023/2

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HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 0 AMINOÁCIDOS E PROTEÍNAS Anticorpos Catalíticos: Catalisadores Desenhistas Os químicos estão se aproveitando da adaptabilidade natural do sistema imunológico para criar aquilo que podemos adequadamente chamar de catalisadores desenhistas. Tais catalisadores são anticorpos – espécies de proteínas geralmente produzidas pelo sistema imunológico para capturar e remover agentes estranhos, mas que, neste caso, são eliciados de modo a torná-los capazes de catalisar reações químicas. A criação dos primeiros anticorpos catalíticos por Richard A. Lerner (Scripps Research Institute) e Peter G. Schultz (Universidade da Califórnia, Berkeley) representou uma união engenhosa de princípios relacionados à química das enzimas e às capacidades naturais do sistema imunológico. Em alguns aspectos os anticorpos catalíticos são como as enzimas, as proteínas catalisadoras que estudaremos mais adiante neste capítulo. Diferente das enzimas, os anticorpos catalíticos podem virtualmente ser “feitos para possibilitar” as reações específicas por um casamento de química e imunologia. Exemplos incluem anticorpos catalíticos para rearranjo de Claisen, reações de Diels-Alder, hidrólise de ésteres e reações aldólicas. HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 1 AMINOÁCIDOS 1 – Introdução ....................................................................................... 2 2 – Aminoácidos.................................................................................... 3 A– Estrutura e Nomes ................................................................................................................................. 3 B– Aminoácidos Essenciais ........................................................................................................................ 4 C– Aminoácidos como Íons Dipolares ...................................................................................................... 4 3 – Síntese de αααα-Aminoácidos em Laboratório ................................... 6 A – Amonólise Direta de Ácido α-Halogenado ........................................................................................ 6 B – A partir da Ftalimida Potássica ............................................................................................................ 6 C – A Síntese de Strecker ........................................................................................................................... 6 D – Resolução de DL-Aminoácidos ........................................................................................................... 7 E – Sínteses Estereosseletivas de Aminoácidos .................................................................................... 7 4 – Análise de Polipeptídios e Proteínas ............................................. 7 5 – Seqüência de Aminoácidos nos Polipeptídios e nas Proteínas .. 9 A – Análise dos Resíduos Terminais ...................................................................................................... 10 B – Hidrólise Parcial ................................................................................................................................... 11 6 – Estruturas Primárias de Polipeptídios e Proteínas ..................... 11 A – Oxitocina e Vasopressina .................................................................................................................. 12 B – Insulina .................................................................................................................................................. 12 C – Outros Polipeptídios e Proteínas ...................................................................................................... 13 7 – Estruturas Secundária, Terciária e Quaternária das Proteínas . 13 A – Estrutura Secundária .......................................................................................................................... 13 B – Estrutura Terciária ............................................................................................................................... 16 C – Estrutura Quaternária ......................................................................................................................... 16 8 – Introdução às Enzimas ................................................................. 16 9 – Hemoglobina: uma proteína Conjugada ...................................... 18 HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 2 1 – Introdução São três os grupos de polímeros biológicos: polissacarídeos, proteínas e ácidos nucléicos. Estudamos os polissacarídeos e vimos que eles funcionam, principalmente, como reservas de energia, como marcadores bioquímicos das superfícies das células e, nos vegetais, como materiais estruturais. Quando estudarmos os ácidos nucléicos, veremos que servem para dois objetivos principais: armazenamento e transmissão de informação. Dos três grupos de biopolímeros, são as proteínas que possuem as funções mais diversas. Como enzimas e hormônios, as proteínas catalisam e regulam as reações que ocorrem no organismo; como músculos e tendões, proporcionam ao corpo os elementos do movimento; como pelos e cabelo, oferecem ao corpo revestimento externo; como moléculas de hemoglobina, transferem o importante oxigênio para os locais mais remotos do organismo; como anticorpos, nos fornecem os meios de proteção contra doenças; e em combinação com outras substâncias, nos ossos, proporcionam suporte estrutural. Com tal diversidade de funções, não seria surpreendente descobrir que as proteínas existam em diversos tamanhos e formas. Pelos padrões da maioria das moléculas que já estudamos, mesmo as proteínas pequenas possuem pesos moleculares muito altos. A lisozima, uma enzima, é uma proteína relativamente pequena e ainda assim seu peso molecular é 14.600. Os pesos moleculares da maioria das proteínas são muito maiores. Suas formas abrangem uma faixa que vai das proteínas globulares, tais como lisozima e hemoglobina, até as hélices da α-queratina (cabelos, unhas e lã) e as lâminas (folhas) pregueadas da fibroína da seda. Apesar desta diversidade de tamanho, formato e função, todas as proteínas têm características comuns que nos permitem deduzir suas estruturas e compreender suas propriedades. Mais adiante neste capitulo veremos como se faz isto. Proteínas são poliamidas e suas unidades monoméricas compreendem cerca de 20 α-aminoácidos diferentes: C H N C R O H O H H C H N C R " O H C H N C R ´ O H C H N C R O H C H N C R ´ ´ ´ O H C H N C R ´ ´ ´ ´ O H Um α-aminoácido Parte de uma molécula de proteína L i g a ç õ e s a m i d a As células usam α-aminoácidos diferentes para sintetizar proteínas. A seqüência exata dos α-aminoácidos ao longo da cadeia protéica é denominada estrutura primaria da proteína. Como o nome sugere, esta estrutura primaria é de importância fundamental. Para a proteína exercer certa função específica, a estrutura primaria deve estar bem determinada. Veremos mais adiante que quando a estrutura está correta, a cadeia de poliamidas se dobra, de modo apropriado, para lhe oferecer a forma necessária para executar uma tarefa específica. Este dobramento da cadeia das poliamidas leva os níveis de complexidade maiores, chamados de estruturas secundaria e terciária das proteínas. A estrutura quaternária surge quando a proteína contém uma agregação de mais de uma cadeia de poliamida. A hidrólise de proteínas em meio ácido ou alcalino produz uma mistura de diferentes aminoácidos. Embora a hidrólise de proteínas naturais possa levar a até cerca de 22 aminoácidos diferentes, todos eles possuem uma importante característica estrutural em comum: com exceção da glicina (cujas moléculas são aquirais), quase todos os aminoácidos naturais possuem configuração L no carbono α. Isto é, possuem a mesma configuração relativa que o L-gliceraldeído: C H H 2 N C O 2 H R C H H O C H O C H 2 O H C H 2 C O 2 H N H 2 C O 2 HH R H 2 N C H OH C H 2 O H H O Um L-α-aminoácido [usualmente um (S)-α-aminoácido] L - G l i c e r a l d e í d o [ ( S ) - g l i c e r a l d e í d o ] G l i c i n a P r o j e ç õ e s d e F i s c h e r p a r a u m L - α - a m i n o á c i d o e p a r a o L - g l i c e r a l d e í d o HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 3 2 – Aminoácidos A– Estrutura e Nomes Os 22 α-aminoácidos que podem ser obtidos das proteínas podem ser subdivididos em três grupos diferentes, com base nas estruturas de suas cadeias laterais, R. Estes aminoácidos estão na Tabela 1. HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 4 De fato, apenas 20 das 22 α-aminoácidos da tabela 1 são usados pelas células na síntese de proteínas. 2 aminoácidos são sintetizados após a cadeia da poliamida estar completa. Hidroxiprolina (presente principalmente no colágeno) é sintetizada a partir da prolina, e cistina (presente na maioria das proteínas) é sintetizada a partir da cisteína. A conversão da cisteína em cistina requer um comentário adicional. O grupo –SH da cisteína a torna um tiol. Uma propriedade dos tióis é que eles podem ser convertidos em dissulfetos por agentes oxidantes brandos. Esta conversão, por sua vez, pode ser revertida pela ação de agentes redutores brandos. S H R 2 Tiol Dissulfeto S S R R [ O ] [ H ] H O 2 C C H C H 2 S H N H 2 [ H ] [ O ] H O 2 C C H C H 2 S S C H 2 C H C O 2 H N H 2 N H 2 2 Cisteína Cistina L i g a ç ã o d i s s u l f e t o Veremos mais adiante como as ligações dissulfeto entre unidades de cisteína na cadeia das proteínas contribuem para a estrutura e para o formato global da proteína. B– Aminoácidos Essenciais Os aminoácidos podem ser sintetizados por todos os organismos vivos, vegetais ou animais. Muitos animais superiores, porém, são deficientes no que se refere à capacidade de sintetizar todos os aminoácidos que necessitam para suas proteínas. Assim, estes animais precisam de certos aminoácidos como parte de suas dietas. Para um humano adulto, são oito os aminoácidos essenciais; estão representados pelo índice superior e, na Tabela 1. C– Aminoácidos como Íons Dipolares Os aminoácidos contêm um grupo básico (–NH2) e um grupo ácido (–COOH). No estado sólido, seco, os aminoácidos existem como íons dipolares, de uma forma em que o grupo carboxila está presente como íon carboxilato, –CO2 –, e o grupo amino como íon amínio, –NH3 +. (Íons dipolares são também chamados zwitterions.) Em solução aquosa, existe um equilíbrio entre o íon dipolar e as formas aniônica e catiônica do aminoácido. H 3 N C H C O 2 H R H 3 N C H C O 2 - R H 2 N C H C O 2 - R + + H 3 O + + - Forma catiônica (predominante em soluções fortemente ácidas, com pH 0, por exemplo) Íon dipolar Forma aniônica (predominante em soluções fortemente básicas, com pH 14, por exemplo) + H 3 O + - H 3 O + H 3 O + Em solução, a forma predominante do aminoácido depende do pH da solução e da natureza do aminoácido. Em soluções fortemente ácidas, todos os aminoácidos estarão presentes, principalmente como cátions; em soluções fortemente básicas, eles estarão presentes como ânions. Num certo pH intermediário, chamado de ponto isoelétrico (pI), a concentração do íon dipolar será máxima e as concentrações dos ânions e cátions serão iguais. Cada aminoácido tem seu próprio ponto isoelétrico, que está mostrado na Tabela 1. Consideremos inicialmente um aminoácido com a cadeia lateral que não contém grupos ácidos nem básicos – um aminoácido tal como a alanina. Se a alanina estiver presente em uma solução fortemente ácida (p.ex., em pH 0), estará principalmente na forma catiônica mostrada abaixo. O pKa para o grupo carboxila da forma catiônica é 2,3. Este valor é consideravelmente menor do que o pKa do ácido carboxílico correspondente (p.ex., o do ácido propiônico) e indica que a forma catiônica da alanina é o ácido mais forte. Mas esperaríamos que fosse assim. Afinal, é uma espécie carregada positivamente e, por isto, deve perder um próton mais facilmente. C H 3 C H C O 2 H N H 3 C H 3 C H 2 C O 2 H + Ácido propanóico pKa = 4,89 Forma catiônica da alanina pKa = 2,3 A forma do íon dipolar de um aminoácido é também um ácido em potencial, pois o grupo –NH3 + pode doar um próton. O pKa do íon dipolar da alanina é 9,7. HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 5 C H 3 C H C O 2 - N H 3 + pKa = 9,7 O ponto isoelétrico (pI) de um aminoácido como a alanina é a média entre pKa1 e pKa2. (ponto isoelétric o da alanina) 0,6 2 7,9 3,2 p = + I = O que isto significa sobre o comportamento da alanina, quando o pH da solução fortemente ácida em que se encontra vai sendo gradualmente aumentado pela adição de base (isto é, de OH–)? No inicio (pH 0), a forma catiônica predomina. Quando a acidez chega a pH 2,3 (o pKa da forma catiônica, pKa1), metade da forma catiônica estará convertida em íon dipolar. Com o próximo aumento de pH – de pH 2,3 para 9,7 – a forma predominante será a do íon dipolar1. Em pH 6,0, o pH é igual ao pI e a concentração do íon dipolar é máxima. Quando o pH atinge 9,7 (o pKa do íon dipolar), metade do íon dipolar está convertido na forma aniônica. Então, à medida que o pH se aproxima de pH 14, a forma aniônica torna-se predominante na solução. Se a cadeia lateral do aminoácido possuir um grupo ácido, ou básico, extra, então o equilíbrio é mais complexo. Considere, por exemplo, a lisina, um aminoácido que possui um grupo –NH2 extra no carbono ε. Em soluções fortemente ácidas, a lisina está presente como um dicátion, pois ambos os grupos amino estão protonados. O primeiro próton a ser perdido, à medida que o pH aumenta, é um próton do grupo carboxila (pKa = 2,2); o próximo vem do grupo α-amínio (pKa = 9,0) e o último do grupo ε-amínio. H 3 N C H C O 2 H C H 3 H 3 N C H C O 2 - C H 3 H 2 N C H C O 2 - C H 3 + + H 3 O + + - Forma catiônica pKa = 2,3 Íon dipolar pKa = 9,7 Forma aniônica + H 3 O + - H 3 O + H 3 O + O ponto isoelétrico da lisina é a média entre o pKa2 (do monocátion) e o pKa3 (do íon dipolar). (ponto isoelétric o da lisina) 8,9 2 10 5, 0,9 p = + I = Problema 1: Que forma do ácido glutâmico você espera que predomina em: (a) soluções fortemente ácidas? (b) soluções fortemente básicas? (c) No seu ponto isoelétrico (pI 3,2)? (d) O ponto isoelétrico da glutamina (pI 5,7) é consideravelmente maior do que o ácido glutâmico. Explique. Problema 2: O grupo guanidino da arginina é um dos grupos orgânicos mais fortemente básicos. Explique. N H NC H N H 2 1 A equação de Henderson-Hasselbalch mostra que para um ácido (HA) e sua base conjugada (A-): [ ] [ ] A- log HA pH p + Ka = Quando o ácido estiver metade neutralizado, [HA] = [A-] e log [HA]/[A-] = 0; assim, pH = pKa HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 6 3 – Síntese de αααα-Aminoácidos em Laboratório Muitos métodos foram desenvolvidos para a síntese de α-aminoácidos em laboratório. Descreveremos aqui três métodos gerais, todos baseados em reações conhecidas. A – Amonólise Direta de Ácido αααα-Halogenado C H 2 C O 2 H R R C H C O 2 H X C H C O 2 - N H 3 R + X 2 , P H 2 O N H 3 ( e x c e s s o ) ( 1 ) ( 2 ) Este método é, possivelmente, o menos usado, pois os rendimentos costumam ser baixos. B – A partir da Ftalimida Potássica Este método é uma modificação da síntese de Gabriel para as aminas. Os rendimentos costumam ser altos e os produtos são facilmente purificados. Glicina (85%) Ácido ftálico + + CH2CO2 - NH3 CO2H CO2H (1) (2) HCl KOH/H2O (97%) Cloroacetato de etila Ftalimida potássica N O O CH2CO2C2H5 + ClCH2CO2C2H5 N-K+ O O Em uma variação deste procedimento usa-se ftalimida potássica e α-bromomalonato de dietila para preparar um éster imidomalônico. Ilustramos o método com a síntese da metionina. DL-Metionina + + + CH3SCH2CH2CHCO2 - NH3 CO2 CO2H CO2H HCl (84-85%) CO2 - C O N CH2CH2SCH3 CO2 - CO2 - NaOH N O O CH2CH2SCH3 CO2C2H5 CO2C2H5 (96-98%) (82-85%) Éster ftalimidomalônico ClCH2CH2SCH3 NaOCH2CH3 a-Bromomalonato de dietila Ftalimida potássica N O O CH(CO2C2H5)2 + BrCH(CO2C2H5)2 N-K+ O O Problema 3: Partindo do α-bromomalonato de dietila e da ftalimida potássica, e usando quaisquer outros reagentes necessários, mostre como você sintetizaria: (a) DL-leucina, (b) DL-alanina e (c) DL-fenilalanina. C – A Síntese de Strecker O tratamento de um aldeído com amônia e cianeto de hidrogênio produz uma α-aminonitrila. Hidrólise do grupo nitrila da α-aminonitrila converte-a em um α-aminoácido. Esta síntese é chamada de síntese de Strecker. α-Aminoácido α-Aminonitrila H2O H3O+, calor RCHCO2 - NH3 RCHCN NH2 HCN NH3 RCH O + + + A primeira etapa desta síntese provavelmente envolve a formação inicial de uma imina, a partir do aldeído e da amônia, seguindo-se da adição de cianeto de hidrogênio. Problema 4: (a) Esboce uma síntese de Strecker para a DL-fenilalanina. (b) DL-metionina também pode ser preparada pela síntese de Strecker. O aldeído inicial pode ser preparado a partir da acroleína (CH2=CHCHO) e do metanotiol (CH3SH). Esquematize todas as etapas desta síntese da DL-metionina. HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 7 D – Resolução de DL-Aminoácidos Com exceção da glicina, que não possui um estereocentro, todos os aminoácidos obtidos pelos métodos que descrevemos são produzidos nas formas racêmicas. Para obter o L-aminoácido natural devemos, obviamente, resolver a forma racêmica. Isto pode ser feito de vários métodos. Um método particularmente interessante para resolver aminoácidos baseia-se no emprego de enzimas chamadas deacilases. Estas enzimas catalisam a hidrólise de N-acilaminoácidos em organismos vivos. Como o sítio ativo da enzima é quiral, ela hidrolisa apenas os N-acilaminoácidos de configuração L. Quando a enzima é exposta à mistura racêmica de N-acilaminoácidos, apenas o derivado do L-aminoácido é afetado, e os produtos, conseqüentemente, são facilmente separados. RCHCO2 - NH3 DL (CH3CO)2O RCHCO2 - DL CH3CONH enzima deacilase CH3CO2H CO2 - H R H3N+ CO2 - NHCOCH3 R H + L-aminoácido D-N-acetilaminoácido separados facilmente E – Sínteses Estereosseletivas de Aminoácidos A síntese ideal de um aminoácido , é claro, seria a que produzisse apenas o L-aminoácido de ocorrência natural. Hoje em dia este ideal pode ser atingido com o uso de catalisadores quirais de hidrogenação, derivados de metais de transição. Uma grande variedade de catalisadores tem sido usada. Um deles, desenvolvido por B. Bosnich (da Universidade de Toronto), baseia-se num complexo de ródio com (R)-1,2- bis(difenilfosfino)propano, um composto conhecido como “(R)-profos”. Quando um complexo de ródio do norbornadieno (NBD) é tratado com (R)-profos, este substitui uma das moléculas do norbornadieno que estão ao redor do átomo de ródio e produz um complexo quiral de ródio. (R)-profos H3C H P(C6H5)2 (C6H5)2P C CH2 [Rh(NBD)2]ClO4 + (R)-profos [Rh((R)profos)(NBD)]ClO4 + NBD Complexo quiral de ródio O tratamento deste complexo de ródio com hidrogênio, em um solvente como o etanol, produz uma solução contendo o catalisador quiral de hidrogenação, ativo, que provavelmente tem a composição [Rh((R)- profos)(H2)(EtOH)2]+. Quando o ácido 2-acetilaminopropenóico é adicionado a esta solução, realizando a hidrogenação, o produto da reação é o derivado N-acetilado da L-alanina, com 90% de excesso enantiomérico. Posterior hidrólise do grupo N-acetil gera a L-alanina. Como o catalisador de hidrogenação é quiral, ele transfere seus átomos de hidrogênio de modo estereosseletivo. Este tipo de reação é normalmente chamado de síntese assimétrica ou síntese enantiosseletiva. CH2 C NHCOCH3 CO2H [Rh((R)profos)(H2)(solvente)2]+ H2 C CO2H NHCOCH3 H H3C 2-acetilaminopropenóico N-acetil-L-alanina (1) (2) OH-, H2O, calor H3O+ C CO2 - NH3 + H H3C L-alanina O mesmo procedimento foi usado para sintetizarem-se vários outros L-aminoácidos a partir de ácidos 2- acetilaminopropenóicos com substituintes na posição 3. O uso do catalisador (R)-profos na hidrogenação do isômero (Z) produz o L-aminoácido com um excesso enantiomérico de 87-93%. [Rh((R)profos)(H2)(solvente)2]+ H2 Ácido (Z)- 2-acetilaminopropenóico, 3-substituído (1) (2) OH-, H2O, calor H3O+ C CO2 - NH3 + H RH2C L-aminoácido (3) C C H R CO2H NHCOCH3 4 – Análise de Polipeptídios e Proteínas As enzimas podem causar a polimerização dos α-aminoácidos, através da eliminação de água: HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 8 CH R H3N+ C O O- CH R´ H3N+ C O O- + Um dipeptídio [ H2O] - CH R H3N+ C O CH R´ NH C O O- A ligação –CO–NH– (amida) que se forma entre os aminoácidos é conhecida como ligação peptídica ou laço peptídico. Os aminoácidos unidos desta maneira (diferentes de quando estão livres) são chamados de resíduos de aminoácidos. Os polímeros que contêm 2, 3, alguns poucos (entre 3 e 10) ou muitos resíduos de aminoácidos são chamados dipeptídios, tripeptídios, oligopeptídios e polipeptídios, respectivamente. Proteínas são moléculas que contêm uma ou mais cadeias de polipeptídios. Polipeptídios são polímeros lineares. Uma das extremidades da cadeia do polipeptídio termina com um resíduo de aminoácido que tem o grupo –NH3 + livre; a outra termina com um resíduo de aminoácido que tem o grupo –CO2 – livre. Estes dois grupos são chamados de resíduo N-terminal e resíduo C–terminal, respectivamente. CH R NH C O CH R´ NH C O CH R" NH C O O- n Resíduo N-terminal Resíduo C-terminal Por convenção, representamos s estruturas dos peptídios e das proteínas com o resíduo do aminoácido N- terminal à esquerda e o resíduo C-terminal à direita. H3N+CH2C NHCHCO- CH H3C CH3 O O Glicilvalina (Gli.Val) CH H3C CH3 H3N+CHC NHCH2CO- O O Valilglicina (Val.Gli) Quando se refluxa uma proteína ou um polipeptídio com ácido clorídrico 6M, por 24h, normalmente ocorre hidrólise de todas as ligações amida, produzindo uma mistura de aminoácidos. Uma das primeiras tarefas a cumprir na determinação da estrutura de um polipeptídio ou de uma proteína é a separação e a identificação dos aminoácidos individuais presentes na mistura. Como até 22 aminoácidos diferentes podem estar presentes, esta tarefa torna-se formidável se nos restringirmos aos métodos convencionais. Felizmente, foram desenvolvidas técnicas baseadas no principio da eluição cromatográfica, que simplificam imensamente este problema, permitindo, inclusive, que sua solução seja automatizada. Analisadores automáticos tornaram-se disponíveis comercialmente. Baseiam-se no uso de polímeros insolúveis contendo grupos sulfonato, chamados de resinas trocadoras de cátions. NH3 + CH R CO2H CH2 SO3 - CH2 CH2 SO3 - CH2 CH2 SO3 - CH2 CH2 SO3 - NH3 + CH R CO2H NH3 + CH R CO2H NH3 + CH R CO2H Se a solução ácida, contendo mistura de aminoácidos, passar através de uma coluna empacotada com resina trocadora de cátions, os aminoácidos serão adsorvidos na resina, devido ás forças atrativas entre os grupos sulfonato, carregados negativamente, e os aminoácidos, carregados positivamente. A força da adsorção varia com a basicidade de cada aminoácido; os que forem mais básicos são presos mais fortemente. Se a coluna for então eluída com solução tamponada, em dado pH, os aminoácidos individuais descerão pela coluna em diferentes velocidades, sendo assim separados. No fim da coluna, o eluato é misturado com ninidrina, HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 9 substância que reage com a maioria dos aminoácidos e dá derivado com intensa coloração púrpura (λmax = 570 nm). O analisador de aminoácidos é construído de modo que possa medir, continuamente, a absorvância do eluato (a 570 nm) e registrá-la em função do volume do efluente. Um gráfico típico de analisador automático de aminoácidos é mostrado a seguir. Quando o procedimento é padronizado, as posições dos picos são características de cada aminoácido, e as áreas definidas pelos picos correspondem às suas quantidades relativas. Ninidrina é o hidrato de indano-1,2,3-triona. Com exceção da prolina e da hidroxiprolina, todos os α−aminoácidos encontrados nas proteínas reagem com ninidrina, dando o mesmo ânion de intensa coloração púrpura. Não detalharemos o mecanismo aqui, mas observe que a única parte do ânion que provém do α- aminoácido é o nitrogênio. O O O + - H2O H2O C O O OH OH Indano-1,2,3-triona Ninidrina O O O 2 RCHCO2 - NH3 + + (- H3O+) O O N O -O RCH O + CO2 + ânion de cor púrpura Prolina e hidroxiprolina não reagem com ninidrina do mesmo modo porque os respectivos grupos α-amino são aminas secundarias e fazem parte de anel de cinco membros. 5 – Seqüência de Aminoácidos nos Polipeptídios e nas Proteínas Uma vez determinada a composição de aminoácidos da proteína ou do polipeptídio, devemos em seguida determinar seu peso molecular. Vários métodos são disponíveis para isto, incluindo técnicas químicas, espectrometria de massa, ultracentrifugação, difusão de luz, pressão osmótica e difração de raios X. Tendo o peso molecular e a composição de aminoácidos, podemos agora calcular a fórmula molecular da proteína; isto é, podemos saber quantos aminoácidos de cada tipo estão presentes como resíduos de aminoácido em cada molécula da proteína. Infelizmente, porém, este é só o começo da tarefa de determinar a estrutura da proteína. A etapa seguinte é realmente formidável. Temos que determinar a ordem em que os aminoácidos estão conectados; ou seja, temos que determinar a estrutura covalente (ou estrutura primária) do polipeptídio. Um tripeptídio simples composto por 3 aminoácidos diferentes pode ter 6 seqüências diferentes de aminoácidos; um tetrapeptídio composto por 4 aminoácidos diferentes pode ter 24 seqüências. Para uma proteína constituída por 20 aminoácidos diferentes, numa só cadeia de 100 resíduos, existem 20100 = 1,27.10130 polipeptídios possíveis, um número muito maior do que o número de átomos que se estima haver no Universo (9.1078). Apesar disto, foram desenvolvidos muitos métodos que permitem a determinação da seqüência de aminoácidos e, como veremos, estes métodos foram empregados com sucesso fantástico. Limitaremos nossa discussão a dois métodos, que ilustram como as determinações de seqüência podem ser feitas: a análise dos resíduos terminais e a hidrolise parcial. HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 10 A – Análise dos Resíduos Terminais Um método muito útil para determinar o resíduo de aminoácido N-terminal, chamado método de Sanger, baseia-se no uso de 2,4-dinitrofluorobenzeno (DNFB). Quando um polipeptídio é tratado com DNFB, em solução levemente básica, ocorre uma substituição nucleofílica aromática (SNAr) envolvendo o grupo amino livre do resíduo N-terminal. Hidrólise subseqüente do polipeptídio dá uma mistura de aminoácidos, onde o aminoácido N-terminal está marcado pelo grupo 2,4-dinitrofenil. Então, depois de separar este aminoácido da mistura, podemos identificá-lo. Polipeptídio 2,4-dinitrofluorbenzeno (DNFB) etc H2NCHCO R NHCHCO R' + O2N NO2 F O2N NO2 HNCHCO R NHCHCO R' etc HCO3 - (-HF) H3O+ O2N NO2 HNCHCO2H R H3N+CHCO2 - R' + aminoácido N-terminal marcado Mistura de aminoácidos separar e identificar Polipeptídio marcado É certo que o 2,4-dinitrofluorobenzeno reagirá com qualquer grupo amino livre presente no polipeptídio, inclusive o grupo ε-amino da lisina. Porém, apenas o aminoácido de resíduo N-terminal será marcado no grupo α-amino. O segundo método de análise do resíduo N-terminal é a degradação de Edman (desenvolvido por P. Edman, da Universidade de Lund, Suécia). Este método oferece uma vantagem sobre o método de Sanger, já que remove o resíduo N-terminal e deixa a cadeia peptídica restante intacta. A degradação de Edman é baseada na reação de marcação entre o grupo amino N-terminal e o isotiocianato de fenila, C6H5N=C=S. Polipeptídio com um resíduo de aminoácido a menos H3NCHCO R´ etc. + Feniltioidantoína Intermediário instável Polipeptídio marcado N C CH NH C O S R calor rearranjo N H C N CH C S H R O HA NH C S HNCHCO R NHCHCO R´ etc. + pH 9 OH- H2NCHCO R NHCHCO R´ etc. N C S Quando o polipeptídio marcado é tratado com ácido, o resíduo de aminoácido N-terminal separa-se como intermediário instável, que se rearranja e forma uma feniltioidantoína. Este produto pode ser identificado por comparação com feniltioidantoínas preparadas a partir de aminoácidos-padrão. O polipeptídio que permanece após a primeira degradação de Edman pode ser submetido a outra degradação, para identificar o próximo aminoácido na seqüência. O processo foi, inclusive, automatizado. Infelizmente, degradações de Edman não podem ser repetidas indefinidamente. À medida que os resíduos vão sendo sucessivamente removidos, os aminoácidos formados pela hidrólise, durante o tratamento ácido, se acumulam na mistura reacional e interferem no procedimento. A degradação de Edman, no entanto, foi automatizada, no que se denomina seqüenciador. Cada aminoácido é detectado automaticamente, à medida que é removido. Esta técnica foi aplicada de modo bem-sucedido para polipeptídios com até 60 resíduos de aminoácidos Resíduos C-terminais podem ser identificados pelo uso de enzimas digestivas chamadas carboxipeptidases. Estas enzimas catalisam, especificamente, a hidrólise da ligação amida do resíduo de aminoácido contendo um grupo –CO2H livre, liberando-o como aminoácido livre. Uma carboxipeptidase, no entanto, continuará atacando a cadeia do polipeptídio remanescente, arrancando os resíduos C-terminais. Conseqüentemente, será necessário seguir os aminoácidos liberados em função do tempo. O procedimento pode ser aplicado a apenas uma seqüência limitada de aminoácidos pois, depois de um certo tempo, a situação fica muito complicada para ser compreendida. Problema 5: (a) Escreva uma reação mostrando como 2,4-dinitrofluorobenzeno pode ser usado para identificar o aminoácido N-terminal de Val.Ala.Gli. (b) Que produtos você esperaria (após hidrólise) quando Val.Lis.Gli é tratado com 2,4-dinitrofluorobenzeno? HeRvE M. LABORDE QUIMICA ORGANICA Problema 6: Escreva as reagées envolvidas na degradacgdo de Edman seqiiencial de Met.Ile.Arg. B — Hidrolise Parcial Anélise seqiiencial utilizando degradagaéo de Edman ou carboxipeptidase torna-se impraticavel com proteinas ou polipeptidios de tamanho apreciavel. Felizmente, porém, pode-se recorrer a outra técnica, a da hidrolise parcial. Usando dcidos diluidos ou enzimas, tenta-se quebrar a cadeia do polipeptidio em fragmentos menores, que possam ser identificados mediante a técnica do DNFB ou pela degradagéo de Edman. Entao, examinam-se as estruturas destes fragmentos menores, procurando por pontos de sobreposi¢f&o; e tenta-se estabelecer a seqiiéncia de aminoacidos do polipeptidio original. Considere um exemplo simples: temos um pentopeptidio que sabemos que contém valina (dois residuos), leucina (um residuo), histidina (um residuo) e fenilalanina (um residuo). Com esta informagao podemos escrever a “férmula molecular” da proteina do seguinte modo, usando virgulas para indicar que a seqiiéncia é desconhecida. Val, Leu, His, Fen Vamos admitir que, mediante DNFB e carboxipeptidase, descobrimos que a valina e a leucina sao os residuos N-terminal e C-terminal, respectivamente. Até entaéo sabemos que Val (Val, His, Fen) Leu Mas as seqiiéncia dos trés aminoacidos nao-terminais ainda é desconhecida. Submetemos, entéo, o pentapeptidio a hidrdélise acida parcial e obtemos os dipeptidios a seguir. (Também obtemos aminoacidos individuais e fragmentos maiores, i.e., tripeptidios e tetrapeptidios) Val-His + His-Val + Val-Fen + Fen-Leu Os pontos de sobreposi¢ado dos dipeptidios (His, Val e Fen) nos dizem que o pentapeptidio original deve ser o seguinte: Val-His-Val-Fen-Leu Duas enzimas também sao empregadas freqiientemente para clivar certas ligagdes peptidicas numa proteina maior. A tripsina catalisa preferencialmente a hidrolise de ligagdes peptidicas onde 0 grupo carboxila faz parte do residuo da lisina ou da arganina. A guimotripsina catalisa preferencialmente a hidrdlise de ligagdes peptidicas nos grupos carboxila da fenilalanina, da tirosina e do triptofano. Também ataca as ligag6es peptidicas nos grupos carboxila da leucina, da metionina, da aspargina e da glutamina. O tratamento de uma proteina grande com tripsina ou com quimotripsina a dividira em pedacos menores. Depois, cada pedago menor pode ser submetido a uma degradacgao de Edman ou a um processo de marcacao seguido por hidrélise parcial. Problema 7: A glutationa é um tripeptidio encontrado na maioria das células vivas. Hidrélise parcial catalisada por dcido da glutationa gera dois dipeptidios, o Cis-Gli e um outro constituido por Glu e Cis. Quando este segundo dipeptidio é tratado com DNFB, a hidrélise dcida da Glu com N marcado. (a) Com base apenas nesta informagdo, que estruturas seriam possiveis para a glutationa? (b) Experiéncias de sintese mostraram que o segundo dipeptidio possui a seguinte estrutura: HaNCHCH»CHpCONHCHCO, CO. CH2SH Qual é a estrutura da glutationa? Problema 8: Dé a seqiiéncia de aminodcidos dos seguintes polipeptidios, usando apenas os dados fornecidos pela hidrolise dcida parcial. (a) Ser, Hip, Pro, Tre > Ser-Tre + Tre-Hip + Pro-Ser (b) Ala, Arg, Cis, Val, Leu > Ala-Cis + Cis-Arg + Arg-Val + Leu-Ala 6 — Estruturas Primarias de Polipeptidios e Proteinas A estrutura covalente de uma proteina ou de um polipeptidio é chamada de estrutura primaria. Empregando as técnicas que descrevemos nas segdes anteriores, os quimicos obtiveram notavel sucesso na determinagao de estruturas primarias de polipeptidios e protefnas. Os compostos descritos nas paginas seguintes sao exemplos importantes. Amino-acidos 11 HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 12 A – Oxitocina e Vasopressina Oxitocina e vasopressina são dois polipeptídios bastante pequenos, com estruturas notavelmente semelhantes (onde a oxitocina tem leucina, a vasopressina tem arginina e onde a oxitocina tem isoleucina, a vasopressina tem fenilalanina). Apesar da semelhança das seqüências de aminoácidos, estes dois polipeptídios possuem efeitos fisiológicos muito diferentes. A oxitocina ocorre apenas nas fêmeas das espécies animais e estimula a contração do útero durante o parto. A vasopressina ocorre em machos e fêmeas e causa a contração dos vasos sangüíneos periféricos e o aumento da pressão sangüínea. Sua principal função, entretanto, é como antidiurético; os fisiologistas referem-se freqüentemente à vasopressina como hormônio antidiurético. As estruturas da oxitocina e da vasopressina também ilustram a importância da ligação dissulfeto entre resíduos de cisteína na estrutura primaria global de um polipeptídio. Nestas duas moléculas as ligações dissulfeto levam a uma estrutura cíclica. Leu Oxitina N C C O O CHNH NH C CH O CH C CH2 CH2 CH S NH O CH3 H3C C S O CHCH2CH2CNH2 CH2 NH O C CH CHCHCH2CH3 H2N NH CH3 C C CH NH O O CH2 H2NCCH2NH O OH O Fen Arg Vasopressina N C C O O CHNH NH C CH O CH C CH2 CH2 CH2 S NH O C S O CHCH2CH2CNH2 CH2 NH O C CH CH H2N NH C C CH NH O O CH2 H2NCCH2NH O OH O CH2 CH2 NH C NH H2N Problema 9: O tratamento da oxitocina com certos agentes redutores (p.ex., sódio em amônia líquida) causa uma única modificação química, que pode ser revertida por oxidação ao ar. Que mudanças químicas estão envolvidas? B – Insulina Insulina, um hormônio secretado pelo pâncreas, regula o metabolismo da glicose. A deficiência de insulina nos humanos é o principal problema do diabete melito. A seqüência de aminoácidos da insulina bovina tem um total de 51 resíduos de aminoácido: a treonina substitui a alanina uma vez na cadeia A (resíduo 8) e uma vez na cadeia B (resíduo 30), e a isoleucina substitui a valina uma vez na cadeia A (resíduo 10). As insulinas da maioria dos outros mamíferos possuem estruturas semelhantes. HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 13 Gli Ile Val Glu Gln Cis Cis S Ala S Ser Cis Val Ser Leu S S Cis Gli Leu Ser His His Gln Leu Asn Val Val Glu Fen Ala Leu Tir Leu Val Cis Gli S Glu S Arg Cis Gli Asn Tir Fen Asn Fen Glu Tir Leu Tre Gln Pro Tir Lis Ala Cadeia B Cadeia A Insulina C – Outros Polipeptídios e Proteínas Análises seqüenciais bem-sucedidas foram alcançadas para centenas de outros polipeptídios e proteínas, incluindo os que se seguem: 1. Ribonuclease bovina. Esta enzima que catalisa a hidrólise do ácido ribonucléico possui uma única cadeia, constituída por 124 resíduos de aminoácidos e quatro ligações dissulfeto no interior da cadeia. 2. Hemoglobina humana. Há quatro cadeias peptídicas nesta importante proteína carregadora de oxigênio. Duas cadeias α idênticas, cada uma com 141 resíduos, e duas cadeias β idênticas, cada uma com 146 resíduos. 3. Tripsinogênio e quimotripsinogênio bovinos. Estes dois precursores enzimáticos possuem cadeias simples constituídas, respectivamente, por 229 e 245 resíduos de aminoácidos. 4. Gamaglobulina. Esta imunoproteína tem um total de 1.320 resíduos de aminoácidos em quatro cadeias, duas com 214 resíduos e duas com 446 resíduos. 5. p53, uma proteína anticâncer. A proteína chamada p53 (p de proteína), constituída por 393 resíduos de aminoácidos, possui várias funções celulares, mas as mais importantes envolvem o controle das etapas que levam ao crescimento das células. Atua como supressor de tumor, obstando o crescimento anormal de células normais e, desta maneira, previne o câncer. Descoberta em 1979, imaginou-se inicialmente que a proteína p53 fosse sintetizada por um oncógeno (gene que causa câncer). Pesquisas mais recentes, porém, mostraram que a forma da p53 que se pensava ter esta ação cancerígena era uma forma mutante da proteína normal. A forma sem mutação (ou tipo selvagem) da p53 aparentemente coordena um conjunto complexo de respostas a variações do DNA que, de outra maneira, poderiam levar ao câncer. Quando p53 sofre mutação, a proteína não mais atribui à célula sua função de prevenção contra o câncer; aparentemente faz o oposto, agindo para estimular o crescimento anormal. Mais da metade das pessoas diagnosticadas com câncer, a cada ano, possuem uma forma mutante da p53 no tumor. Formas diferentes de câncer forma mostradas como resultantes de mutações diferentes da proteína e a lista de tipos de câncer associados à p53 mutante inclui a maioria das partes do corpo: cérebro, seios, vesícula, colo do útero, cólon, fígado, pulmão, ovário, pâncreas, próstata, pele, estomago, etc. 6. Proteínas Ras. São proteínas modificadas associadas ao crescimento celular e à resposta das células à insulina. Pertencem à classe de proteínas denominadas proteínas preniladas, nas quais os grupos lipídicos derivados da biossíntese dee isoprenóide são apendiculados como tioéteres aos resíduos C- terminais da cisteína. Certas formas mutantes das proteínas ras causam modificações oncogênicas em vários tipos de células eucarióticas. Um efeito da prenilação e de outras modificações lipídicas das proteínas é prender estas proteínas nas membranas celulares. A prenilação pode também auxiliar o reconhecimento molecular de proteínas preniladas por outras proteínas. 7 – Estruturas Secundária, Terciária e Quaternária das Proteínas Vimos como as ligações amida e dissulfeto constituem a estrutura covalente ou estrutura primária das proteínas. Igualmente importante para a compreensão do modo de funcionamento das proteínas é o conhecimento do arranjo tridimensional das cadeias peptídicas. Este arranjo envolve as estruturas secundária e terciária das proteínas. A – Estrutura Secundária Define-se como estrutura secundária de uma proteína a conformação local de seu esqueleto polipeptídico. Tais conformações locais se descrevem em termos de padrões regulares de dobramento, HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 14 conhecidos como hélices, lâminas pregueadas e espiras. As principais técnicas experimentais usadas na elucidação das estruturas secundárias das proteínas são raios X e RMN (incluindo RMN 2D). Quando os raios X atravessam uma substância cristalina, produzem padrões de difração diferentes. Análises destes padrões indica uma repetição regular de certas unidades estruturais específicas, com distâncias fixas entre elas, chamadas módulos de repetição. Análise de raios X revelou que a cadeia peptídica de uma proteína natural pode interagir consigo mesmo de dois modos principais: pela formação de lâmina ββββ-pregueada e de αααα-hélice. Para compreender como ocorrem estas interações, observemos inicialmente o que a análise de raios X revelou sobre a geometria da própria ligação peptídica. As ligações peptídicas tendem a assumir uma geometria onde seis átomos da ligação amida estão coplanares. A ligação carbono-nitrogênio da amida é excepcionalmente curta, indicando que são importantes as contribuições de ressonância mostradas a seguir. N C O N+ C O- Conseqüentemente, a ligação carbono-nitrogênio possui caráter acentuado de ligação dupla (≅ 40 %) e as rotações dos grupos ao redor desta ligação são drasticamente dificultadas. Rotações dos grupos ligados ao nitrogênio amídico e ao carbono carbonílico são relativamente livres, porém estas rotações permitem que as cadeias peptídicas adquiram conformações diferentes. O arranjo transóide dos grupos ao redor da ligação amida, relativamente rígida, faz com que os grupos R se alternem de um lado a outro da cadeia peptídica completamente esticada: Os cálculos mostram que a cadeia peptídica teria um modulo (i.e., distância entre unidades alternadas) de 7,2 Å. Cadeias polipeptídicas completamente esticadas poderiam formar uma estrutura laminar, com aminoácidos alternados, de cada cadeia, formando duas ligações hidrogênio com um aminoácido na cadeia adjacente: N H C C O N C C O N R H H R H H C C O N R H H N H C C O N C C O R H H R H C O N C C O H R H aglomeração aglomeração Estrutura laminar hipotética (não se forma devido ao impedimento estérico) Esta estrutura não ocorre nas proteínas naturais, devido à aglomeração que existiria entre os grupos R. Se existisse, teria o mesmo módulo da cadeia peptídica esticada ou seja, 7,2 Å. Uma pequena rotação das ligações, entretanto, pode transformar uma estrutura laminar na estrutura chamada lâmina ββββ-pregueada ou configuração ββββ. A estrutura de lâmina pregueada fornece espaço suficiente aos grupos R, pequenos e médios, para evitar repulsões de van der Waals. É a estrutura predominante da fibroína da seda (48% de resíduo de glicina e 38% de resíduo de serina e de resíduo de alanina). A estrutura de lâmina pregueada possui módulo de repetição um pouco menor, 7,0 Å, do que a de folha laminar. HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 15 A lâmina β-pregueada ou configuração β de uma proteína. Representação da estrutura α-helicoidal de um polipeptídio. As ligações hidrogênio estão representadas por linhas tracejadas. De importância muito maior para as proteínas de ocorrência natural é a estrutura secundária chamada α-hélice. Esta estrutura é uma hélice dextrogira, com 3,6 resíduos de aminoácido por volta. Cada grupo amida na cadeia faz uma ligação hidrogênio com outro grupo amida, à distância de três resíduos de aminoácido, em qualquer das duas direções, e os grupos R estão todos dirigidos para longe do eixo da hélice. O módulo da α-hélice é 5,4 Å. A estrutura α-helicoidal é encontrada em muitas proteínas; é a estrutura predominante das cadeias polipeptídicas de proteínas fibrosas, tais como miosina, a proteína dos músculos, e da α-queratina, a proteínas dos cabelos, da lã não-tensionada e das unhas. As hélices a as lâminas pregueadas respondem por apenas metade da estrutura das proteínas globulares médias. Os segmentos de polipeptídios restantes possuem o que se denomina serpentina, ou conformação espiralada. Estas estruturas não-repetitivas não são aleatórias, mas são mais difíceis de se descrever. Proteínas globulares têm também estiramentos, chamados voltas reversas ou curvas-ββββ, onde a cadeia polipeptídica muda de direção bruscamente. Estas mudanças acoplam diferentes segmentos das lâminas β e quase sempre ocorrem na superfície das proteínas. A seguinte figura mostra a estrutura da enzima humana anidrase carbônica, obtida com base em dados cristalográficos de raios X. Segmentos de α-hélice e lâminas β interagem entre voltas reversas e estruturas não- repetitivas. A localização das cadeias laterais de aminoácidos das proteínas globulares é, normalmente, o que se pode esperar de suas respectivas polaridades. 1. Resíduos com cadeias laterais apolares, hidrofóbicas, como valina, leucina, isoleucina, metionina e fenilalanina são quase sempre encontrados no interior da proteína, sem contato com o solvente aquoso. (Estas interações hidrofóbicas são as principais responsáveis pela estrutura terciária das proteínas. HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 16 2. Cadeias laterais de resíduos polares com cargas + ou -, como arganina, lisina, ácido aspártico e ácido glutâmico estão, geralmente, na superfície da proteína, em contato com o solvente aquoso. 3. Cadeias laterais polares sem carga, como as da serina, treonina, asparagina, glutamina, tirosina e triptofano são encontrados mais freqüentemente na superfície, mais algumas delas também no interior da proteína. Quando no interior, estão todas unidas, por ligações hidrogênio, a outros resíduos semelhantes. Aparentemente a ligação hidrogênio ajuda a neutralizar a polaridade desses grupos. Certas cadeias peptídicas assumem forma de enovelamento aleatório, uma estrutura flexível, mutável e estatisticamente randômica. Polilisina sintética, por exemplo, existe na forma de enovelamento randômico, e normalmente não forma α-hélice. Em pH 7 os grupos ε-amino dos resíduos de lisina estão com carga positiva, e, por isso, as forças de repulsão entre eles são tão grandes que ultrapassam qualquer estabilização que seria adquirida pela formação de ligação hidrogênio da α-hélice. Em pH 12, no entanto, os grupos ε- amino estão sem carga e a polilisina forma α-hélice espontaneamente. A presença de resíduos de prolina ou de hidroxiprolina nas cadeias polipeptídicas produz outro efeito notável: como os átomos de nitrogênio desses aminoácidos fazem parte de anéis de cinco membros, os grupos que estão ligados pela ligação nitrogênio-carbono α não podem girar o suficiente para permitir a formação da estrutura α-helicoidal. Sempre que a prolina ou a hidroxiprolina fizeram parte da cadeia peptídica, há um enroscamento ou dobra interrompendo a α-hélice. B – Estrutura Terciária A estrutura terciária da proteína é a forma tridimensional que surge do enovelamento de suas cadeias polipeptídicas, e enovelamento superposto às espiras das α-hélices. Este enovelamento não ocorre aleatoriamente: nas condições ambientais apropriadas, ocorre de modo particular – um modo característico de uma proteína específica e é de grande importância para realizar sua função. Várias forças estão envolvidas na estabilização de estruturas terciárias, inclusive as ligações dissulfeto da estrutura primária. Uma característica da maioria das proteínas é que o enovelamento acontece de modo a expor o número máximo de grupos polares (hidrofílicos) ao ambiente aquoso, e acomodar o número máximo de grupos apolares (hidrofóbicos) em seu interior. As proteínas globulares solúveis tendem a se enovelar muito mais do que as proteínas fibrosas. As proteínas fibrosas, porém, também possuem estrutura terciária; os filamentos α-helicoidais da α-queratina, por exemplo, enrolam-se numa “super-hélice”. A super-hélice dá uma volta completa a cada 35 voltas da α-hélice. A estrutura terciária, no entanto, não termina assim. As super-hélices podem se enrolar mutuamente, gerando uma estrutura semelhante a uma corda de sete fios. A mioglobina e a homoglobina foram as primeiras proteínas a serem submetidas a análise de raios X completamente bem-sucedida (em 1957 e 1959). Este trabalho foi realizado por J.C. Kendrew e Max Perutz, da Universidade de Cambridge, Inglaterra. (Eles receberam o Premio Nobel de Química em 1962). Desde então, muitas outras proteínas, como lisozima, ribonuclease e α-quimotripsina revelaram-se na análise estrutural completa. De fato, hoje é possível acessar dados de estruturas de raios X de milhares de proteínas, armazenados em bancos de dados púbicos por pesquisadores. C – Estrutura Quaternária Muitas proteínas existem na forma de agregados não-covalentes estáveis e ordenados de mais de uma cadeia polipeptídica. A estrutura global de uma proteína contendo subunidades múltiplas é denominada estrutura quaternária. A estrutura quaternária da homoglobina, por exemplo, envolve quatro subunidades. 8 – Introdução às Enzimas Todas as reações que ocorrem nas células vivas são mediadas por catalisadores biológicos notáveis, chamados enzimas. As enzimas possuem a capacidade de provocar aumento considerável na velocidade das HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 17 reações; na maioria dos casos, as velocidades das reações catalisadas por enzimas são mais rápidas do que as reações não-catalisadas, por fatores de 106-1012. Para os organismos vivos, aumentos de velocidade desta magnitude são importantes porque permitem que as reações ocorram em velocidades razoáveis, mesmo nas condições brandas que existem nas células vivas (i.e., pH aproximadamente neutro e temperatura da ordemde 35ºC). As enzimas também exibem notável especificidade diante de seus reagentes (chamados de substratos) e produtos. Esta especificidade é muito maior do que se verifica na maioria dos catalisadores químicos. Na síntese enzimática de proteínas, por exemplo (mediante reações que ocorrem nos ribossomas), polipeptídios constituídos de mais de 1.000 resíduos de aminoácidos são sintetizados, praticamente sem erro. Foi a descoberta de Emil Fisher, em 1894, sobre a capacidade de as enzimas distinguirem entre as ligações glicosídicas α e β que o levou a formular a hipótese da chave e fechadura para a especificidade das enzimas. De acordo com esta hipótese, a especificidade de uma enzima (a fechadura) e de seu substrato (a chave) provêm de suas formas geometricamente complementares. A enzima e o substrato combinam-se e formam um complexo enzima-substrato. A formação deste complexo freqüentemente induz uma mudança conformacional da enzima, que a leva a se ligar ao substrato de modo mais efetivo. A isto denomina-se ajustamento induzido. A união com o substrato também pode causar tensão de algumas ligações, tornando-as mais frágeis. O produto da reação normalmente tem uma forma diferente do substrato. Esta forma modificada ou, em alguns casos, a intervenção de outra molécula, causa a dissociação do complexo. A enzima, então, pode aceitar outra molécula do substrato e todo o processo se repete. Enzima + substrato complexo de enzima-substrato Enzima + produto Quase todas as enzimas são proteínas. O substrato se liga à proteína e a reação ocorre no chamado sítio ativo. As forças não-covalentes que unem o substrato ao sítio ativo são as mesmas que explicam as próprias conformações das proteínas: forças de van der Waals, forças eletrostáticas, ligações hidrogênio e interações hidrofóbicas. Os aminoácidos localizados nos sítios ativos estão organizados de modo a interagir especificamente com o substrato. As reações catalisadas por enzimas são completamente estereoespecíficas, e esta especificidade provém do modo como as enzimas se ligam aos seus substratos. Uma α-glicosidade apenas se ligará à forma α de um glicosídio, não à β. As enzimas que metabolizam os açúcares se ligam apenas aos açúcares D; as enzimas que sintetizam a maioria das proteínas se unem apenas aos L-aminoácidos, e assim por diante. Embora sejam absolutamente estereoespecíficas, as enzimas variam freqüentemente, de modo considerável, sua especificidade geométrica. Entende-se por especificidade geométrica a especificidade relacionada à identidade dos grupos químicos dos substratos. Algumas enzimas só aceitam um composto como seu respectivo substrato. Outras, porém, aceitam vários compostos com grupos semelhantes. A carboxipeptidase A, por exemplo, hidrolisa o peptídio C-terminal de todos os polipeptídios, desde que o penúltimo resíduo não seja arginina, lisina ou prolina e que o antepenúltimo resíduo não seja prolina. A quimotripsina, enzima digestiva que catalisa a hidrólise de ligações peptídicas, também catalisa a hidrólise de ésteres. C O R NH R' H2O H3N+ R' quimotripsina + + C O R O- Peptídio Éster C O R OH + + quimotripsina H2O C O R O R' HO R' Um composto que pode alterar negativamente a atividade de uma enzima é chamado inibidor. Um composto que compete diretamente com o substrato pelo sítio ativo é conhecido como inibidor competitivo. Por exemplo, a sulfanilamina é um inibidor competitivo da enzima bacteriana que incorpora o ácido p- aminobenzóico ao ácido fólico. Algumas enzimas requerem a presença de um co-fator. O co-fator pode ser um íon metálico como, por exemplo, o átomo de zinco da anidrase carbônica humana. Outras requerem a presença de uma molécula orgânica, como o NAD+, que é denominado coenzima. Coenzimas se modificam quimicamente no curso das reações enzimáticas. O NAD+ converte-se em NADH. Em algumas enzimas o co-fator está ligado permanentemente à enzima, chamado, neste caso, de grupo prostético. Muitas vitaminas solúveis em água são precursoras de coenzimas. A niacina (ácido nicotínico), por exemplo, é um precursor do NAD+. O ácido pantotênico é um precursor da coenzima A. O N C OH Niacina HO C N OH O CH3 CH3 OH O H Ácido pantotênico HERVÉ M. LABORDE QUÍMICA ORGÂNICA Amino-ácidos 18 9 – Hemoglobina: uma proteína Conjugada Algumas proteínas, denominadas proteínas conjugadas, contêm, como parte de sua estrutura, um grupo não-protéico chamado de grupo prostético. Um exemplo é a proteína transportadora de oxigênio, hemoglobina. Cada uma das quatro cadeias polipeptídicas da hemoglobina está unida a um grupo prostético chamado heme (fig). As quatro cadeias polipeptídicas enovelam-se de modo a dar à hemoglobina um formato aproximadamente esférico (fig). Além disto, cada grupo heme está numa fenda com os grupos vinila hidrofóbicos de sua estrutura porfirínica rodeados por cadeias laterais hidrofóbicas dos resíduos de aminoácidos. As duas cadeias laterais de propanoato da heme se acomodam próximas aos grupos amino carregados positivamente dos resíduos de lisina e de arginina. O2 Fe N N N N N (imidazol) Uma parte da hemoglobina oxigenada O ferro do grupo heme está no estado de oxidação +2 (ferroso) e forma uma ligação coordenada com um nitrogênio do grupo imidazolila da histidina da cadeia polipeptídica. Isto deixa uma valência do íon ferroso livre para se combinar com o oxigênio, do seguinte modo: Fe N N N N C C C C H H H H CH3 CH=CH2 CH3 CH=CH2 CH3 CH3 HOCCH2CH2 HOCCH2CH2 O O O fato de que o íon ferroso do grupo heme combina-se com o oxigênio não é particularmente notável; muitos compostos semelhantes fazem o mesmo. O que é notável sobre a hemoglobina é que quando a heme se combina com o oxigênio o íon ferroso não se oxida prontamente ao estado férrico. Estudos com modelos de compostos heme em água, por exemplo, mostram que sofrem uma rápida combinação com o oxigênio, mas também sofrem rápida oxidação do ferro, de Fe2+ para Fe3+. Quando estes mesmos compostos estão embutidos no ambiente hidrofóbico de uma resina de poliestireno, porém, o ferro é facilmente oxigenado e desoxigenado, sem mudança de seu estado de oxidação. A este respeito, é especialmente interessante notar que investigações da hemoglobina por raios X revelaram que as cadeias polipeptídicas fornecem a cada grupo heme um ambiente hidrofóbico semelhante.