220
Literatura
UFSB
211
Literatura
UFSB
20
Literatura
UFSB
25
Literatura
UFSB
4
Literatura
UFSB
32
Literatura
UFSB
9
Literatura
UFSB
24
Literatura
UFSB
22
Literatura
UFSB
45
Literatura
UFSB
Texto de pré-visualização
ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 25 O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música1 Laila Rosa2 Universidade Federal da Bahia Brasil Isabel Nogueira3 Universidade Federal do Rio Grande do Sul Brasil Resumo Este texto discute aspectos teóricos das perspectivas feministas póscoloniais e traz uma reflexão sobre sua aplicabilidade e desdobramentos para a criação musical a partir de uma perspectiva que inclui marcadores sociais como gênero raça e etnia sexualidades classe social dentre outros Sob as lentes da abordagem feminista de conhecimento situado consideramos nossos trabalhos anteriores com musicologia e etnomusicologia Também pretendemos descrever os processos que tornaram possível assumirmos nossa identidade como compositoras e observar como a prática da criação sonora está profundamente relacionada a esta trajetória Descrevemos assim os processos de elaboração de nossos trabalhos autorais como cantautoras trazendo esta categoria para o centro do debate por sua articulação das figuras de compositora e intérprete e sua importância para o debate feminista Problematizando as ausências da produção musical das mulheres dos espaços musicais e acadêmicos 1 What Moves Us What Unfolds Us What Instigates Us Notes About Feminist Epistemologies Creative Processes Education And Transgressive Possibilities In Music Data de submissão 06112015 Data de aprovação 26112015 2 Sou cantautora pernambucana professora pesquisadora e militante Feminista integrante do Núcleo de Estudos Interdisciplinares da Mulher NEIMUFBA Praticante de Yoga Uma mulher do axé Filha de Iemanjá do Terreiro Xambá Olinda PE Sou professora da Escola de Música e dos Progamas de PósGraduação em Música e em Gênero Mulheres e Feminismo da UFBA Coordeno a Feminaria Musical grupo de pesquisa e experimentos sonoros Email lailarosamusicagmailcom 3 Sou compositora e performer musicóloga e professora do Instituto de Artes da UFRGS Coordeno o Grupo de Pesquisa em Estudos de Gênero Corpo e Música e participo do Grupo de Pesquisa em Criação Sonora e Grupo de Pesquisa em Práticas Interpretativas da UFRGS Sou professora e orientadora dos PPG Mestrado e Doutorado em Música da UFRGS e PPG Memória e Social e Patrimônio Cultural da UFPel Email isabelisabelnogueiragmailcom ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 26 buscamos também discutir possibilidades de atuação nestes contextos articulando os mesmos com os aportes teóricos dos estudos sobre gênero e música num sentido amplo Palavraschave Feminismo Criação Musical Pesquisa Artística Póscolonialidade Abstract This paper discusses theoretical aspects of feminist postcolonial perspective and offers a reflection on their applicability and consequences for musical creation from a perspective that includes social markers such as gender race and ethnicity sexualities social class and so on Under the lens of the feminist situated knowledge approach we take into account our previous work in musicology and ethnomusicology We also aim to describe the process that made it possible to assume our identity as songwriters and observe how the practice of sound creation is deeply related to this trajectory So we describe the making processes of our own work as cantautoras bringing this category into the heart of the debate for its articulation of the songwriter and the performer and its importance to the feminist debate By discussing the absence of women musical production in the musical and academic spaces we also discuss possibilities of action in these contexts articulating them under the theoretical approaches from gender and music studies in a broad sense Keywords Feminism Musical Creation Artistic Research Post colonialism ara começar a presente incursão musical feminista partimos de algumas questões como pensar música processos criativos performance e educação a partir de uma perspectiva das epistemologias feministas póscoloniais Quais as contribuições das mesmas epistemologias para reconfigurar este extenso panorama musical nosso de cada dia O que nos move e inquieta para trazer estas questões Quais outras trajetórias que nos inspiram para pensar sobre nossas próprias trajetórias e atuações musicais enquanto musicistas compositoras pesquisadoras educadoras e ativistas feministas Como ponto de partida trazemos referências musicais e feministas póscoloniais tais quais Gloria Anzaldúa 2000 ao falar em línguas sobre uma consciência fronteiriça e mestiça de poesia e enfrentamento criando uma nova língua aquela que refuta a hegemonia que não nos pauta não nos contempla não nos representa a produção de conhecimento heteronormativa branca sexista classista que nega e exclui a existência das mulheres enquanto criadoras pensadoras pessoas O que se configura numa verdadeira tentativa de extermínio de seus feitos e de sua existência Esta é também uma tentativa de organizar a reflexão sobre nossas composições nestas distintas esferas nossa forma de compor no mundo e sobretudo de possibilidade de existência OLIVEIRA P ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 27 FILHO 2014 Possibilidade de existirmos enquanto feministas que acreditam na dialogicidade freireana FREIRE 2011 e 1990 e na pedagogia feminista antirracista CASTRO 2010 LOURO 1997 hooks4 2013 como forma de transgressão descoberta e conhecimento ainda que no espaço institucional das nossas universidades e para além das mesmas É uma construção artística que por lidar com a poesia não quer dizer que esteja isenta de dor e de rupturas Ao contrário a poesia e a música nascem das rupturas e da dor que transformam É um processo criativo no sentido amplo onde ao criarmos caminhos artísticos e de produção de conhecimento próprios também nos reinventamos como pessoas Sobre a dimensão humana do ato criativo o psicanalista dramaturgo e ator argentino Eduardo Pavlosky 1982 nos traz interessantes reflexões sobre o grande esforço implicado no processo criativo que transita entre a loucura a descoberta o terror e ao mesmo tempo a superação dentre vários outros sentimentos e lugares afetivos Meu teatro é um esforço para superar a minha esquizoidia Sinto meus personagens às vezes como vômitos impulsivos que partem do mais profundo do meu ser Isto que está no palco em cada uma das minhas obras sou eu São meus sonhos minha loucura meu sadismo meus medos infantis meu medo da solidão meus terrores à vida minha claustrofobia Enfim o mais aterrorizante de mim Mas eles também são a minha constante superação de tudo que é assustador É ali no mesmo terror da minha solidão de onde surge o mais vital e mais intenso em minha vida o que eu mais quero de mim Não existe saúde sem reconhecimento profundo de nossa loucura Eu não acredito na sanidade neste mundo A rebelião transformadora é um constante esforço para superar um sistema despersonalizante Que corramos o perigo de tornarnos loucos não significa que não se tenha feito o esforço para encontrar o amor pela verdade A muitos dos que qualificamos como loucos devemos as grandes certezas deste mundo PAVLOSKY 1982 p 95 Dialogando com o referido autor propomos nossa pequena rebelião transformadora que sendo nossa e tão intimamente nossa não deixa de ser também coletiva a de outras sujeitas que se encontram nas inquietações artísticas nos artevismos na militância e na produção de conhecimento feminista Neste sentido ainda que consideremos a dimensão subjetiva como fundamental pois o pessoal é político não propomos uma narrativa de nossas obras sonoridades e desejos de modo 4 bell hooks é o pseudônimo de Gloria Jean Watkins que deve ser escrito propositalmente e sempre com as iniciais em minúsculo por uma questão política adotada pela autora estadunidense como denúncia da invisibilidade das mulheres negras da sociedade 5 Mi teatro es un esfuerzo por superar mi esquizoidia Mis personajes a veces los siento como vomitos impulsivos que parten de lo mas profundo de mi ser Eso que esta en el escenario en cada una de mis obras soy yo Son mis suenos mi locura mi sadismo mis miedos infantiles mi fobia a la soledad mis terrores a la vida mi panico al encierro En fin lo mas terrorifico de mi Pero tambien son mi constante superacion de lo terrorifico Es alli en el mismo terror de mi soledad de donde surge lo mas vital y lo mas intenso en mi vida lo que mas quiero de mi No hay salud sin reconocimiento profundo de nuestra locura No creo en la cordura en este mundo La rebelion transformadora es un constante esfuerzo por superar un sistema despersonalizante Que corramos el peligro de volvernos locos no significa que no se haya hecho el esfuerzo de buscar el amor por la verdad A muchos que calificamos como locos les debemos las grandes certidumbres de este mundo PAVLOSKY 1982 p 9 ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 28 individualizado apenas mas que estejam em consonância e em prol de um bem comum dos direitos humanos que incluem os direitos das mulheres da comunidade LGBTT das comunidades indígenas negras periféricas que ainda não estão representadas ou contempladas dignamente pelos estudos e ações em música Mas claro que de longe afirmamos representar todo este coletivo e sim nos conectar e solidarizar com suas agendas através de nossas atuações e interlocuções que falaremos mais adiante Claro que reconhecemos que o debate sobre gênero e feminismo em música no Brasil é emergente tendo rendido frutos de grande importância6 Contudo reconhecemos também que o mesmo ainda é incipiente na configuração de projetos e políticas públicas no que tange a materialidade do musical e dos seus sujeitos e sujeitas sobretudo nas áreas da educação musical e da etnomusicologia que assumem uma intervenção mais direta com comunidades instituições grupos etc como nos mostrou um mapeamento sobre produção de conhecimento sobre mulheres e música no Brasil ROSA et al 2013 considerando as interseccionalidades de raçaetnia das sexualidades classe social geração e demais marcadores sociais da diferença diversidade e diferenciação BRAH 2006 Caminhando para trabalhar nosso potencial criativo como uma tentativa de projeto solidário situado feminista e localizado no Brasil NordesteSulAmérica do SulAmérica Latina que burla a solidão a até o medo da morte dialogamos mais uma vez com Pavlosky 1982 p 7 ao afirmar que Todos estamos sozinhos isso é verdade Todos tememos a morte isso também é verdade Mas nossa vida pode ter mais alegria se aparece um sentido de projeto futuro Ali então a angustia frente à morte é atenuada na realização de um projeto solidário Por isto pensamos que a angústia existencial de um revolucionário latinoamericano é de uma qualidade diferente do que um pequenoburguês europeu 7 Contudo este projeto solidário e feminista para situar mais uma vez nossa fala nos termos da perspectiva de conhecimento situado HARAWAY 1995 extrapola o âmbito do escritosupostamente racional e científico e chegavem para odo corpo onde mora outro conhecimento o da experiência da vivência musical dos desejos mais íntimos de fazer uma música que nos acolha e nos represente que nos ponha em diálogo com outras tantas que compartilham experiências semelhantes Um espaço de empoderamento Obras que nos brotam escapam e já não mais nos pertencem que formam uma estrutura estética que gera também uma sensação que integra e repara 6 Desde os trabalhos pioneiros de Rita Laura Segato 1984 Maria Ignez Cruz Mello 2005 Laila Rosa 2005 e 2009 Rodrigo Gomes 2011 Carlos Palombini 2003 Rafael Noleto 2012 Talitha Couto Moreira 2012 a importante e pioneira coletânea Gênero Corpo e Música organizada por Susan Campos e Isabel Nogueira 2013 Jurema Werneck 2007 dentre outros 7 Todos estamos solos eso es verdad Todos tememos la muerte eso tambien es verdad Pero nuestra vida puede tener mas alegria si aparece un sentido de proyecto futuro Alli entonces la angustia frente a la muerte se mitiga en la realizacion de un proyecto solidario Por eso pensamos que la angustia existencial de un revolucionario latinoamericano es de diferente calidad que la de un pequenoburgues europeo ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 29 Minhas obras me brotam os personagens me escapam e já não me pertencem Parecem nascer do mais intimo do meu ser e em seguida se separam como filhos de uma mãe superprotetora Verdadeiro processo de luto Separação devastadora Independência alheia a minha vontade Seus projetos de filhos separados não correspondem ao meu projeto inicial Eles se desprendem do meu ventre e vivem sua vida São as vezes injustos maus filhos que não me obedecem Suas réplicas não são as que às vezes gostaria de ter colocado em sua boca como mãe que desejaria terlhes ensinado a falar o seu próprio idioma e eles se rebelaram falando à sua maneira Mas durante o momento criativo tudo é surpresa tudo é insólito como um pesadelo sem fim que não pode ser controlado Separação dolorosa mas também prazer pela magia da descoberta Esta maravilha do inusitado do inesperado do desconhecido de si mesmo se integra quando se consegue dar forma a uma estrutura estética e em seguida se adquire uma sensação de completude integradora reparadora PAVLOSKY 1982 p 178 Começamos pelas epistemologias feministas póscoloniais ainda juntamente com a pensadora e compositora dominicana Ochy Curiel 2010 que traz sua identidade cantante transgressora negra e lésbica como marcadores fundamentais de sua obra Pensamos composição como criação de mundos que criam sentido e sobretudo está relacionada a relações de poder Como entender os atos composicionais em suas relações com os campos de poder Campos de poder ou relações de poder que préexistem e até mesmo condicionam tais atos ou então de outra perspectiva campos de poder que são acionados pelas próprias escolhas que o compor exige e engendra O que pode uma composição Distintos modos de criar no mundo historicidade e mainstream e o desafio de construção de autonomia das assim chamadas periferias LIMA 2014 p 4950 A respeito de compor no mundo Pedro Amorim Oliveira Filho 2012 nos traz um interessante panorama de modelo composicional onde relaciona os aspectos contingenciais e operacionais do ato de compor onde os aspectos contingenciais consistem nas condições de compor contexto e inspiração e os operacionais consistem nas dimensões ou instâncias da composição materiais processos e forma Por fim na sua proposta de modelo os aspectos do compor se relacionam com os aspectos do mundo físico sensível e mental ou conceitual idem 2012 8 Mis obras me brotan los personajes se me escapan y ya no me pertenecen Parecen nacer desde lo mas intimo de mi ser y luego se separan como hijos de una madre sobreprotectora Verdadero proceso de duelo Separacion desgarradora Independencia ajena a mi voluntad Sus proyectos de hijos separados no corresponden a mi proyecto inicial Se desprenden de mi vientre y viven su vida Son a veces injustos malos hijos que no me obedecen Sus replicas no son las que a veces quisie ra ponerles en la boca como madre que quisiera ensenarles a hablar su propio idioma y ellos se me rebelaran hablando a su manera Pero durante el momento creador todo es sorpresa todo es insolito como una pesadilla interminable que no se puede controlar Desgarramiento doloroso pero tambien placer por la magia del descubrimiento Esa maravilla de lo insolito de lo inesperado de lo desconocido de uno mismo se integra cuando se logra plasmar una estructura estetica y entonces se adquiere una sensacion de completud integradora reparadora PAVLOSKY 1982 p 17 ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 30 Fig 1 Modelo de Compor no Mundo OLIVEIRA FILHO 2012 Apesar de reconhecermos tais questões sobre o compor no sentido amplo como pertinentes e assim também compormos nossas próprias narrativas e trajetórias reiteramos a importância do retorno às epistemologias feministas em detrimento ao suposto universal masculino do compor aquele que não toca na dimensão de gênero Retornamos então à perspectiva de uma reescrita da história SCOTT 1992 sobre processos do compor de performance de pensar e agir feministas E neste sentido somente autorases feministas e Queer em sua maioria contribuíram para esta ruptura fundamental de produção de conhecimento sobre o musical A reescrita de artistas negras mulheres pobres da classe trabalhadora que não tiveram acesso a escreverem sobre suas histórias por exemplo mas que através de suas performances e canções imprimiram conhecimentos e vivências de resistência negra feminina contra o racismo e o sexismo como nos mostra Angela Davis 1998 é uma reescrita fundamental para pensar sobre o musical que os trabalhos da área de música em sua maioria não aprofundam9 A autora propõe o estudo da música 9 A autora aborda as contribuições artísticas destas cantoras negras de blues estadunidense nas politicas de sexualidade que transformaram as relações de gênero nas comunidades negras de suas épocas When I first began researching the literature on blues and jazz women I discovered that with some significant exceptions the vast majority comprised either biographies or technical studies within the disciplines of music and musicology Im not suggesting that investigations of these artists lives and music are not interesting However what I wanted to know more about was the way their work addressed urgent social issues and helped to shape collective modes of black consciousness Because most studies of the blues have tended to be gendered implicitly as male those that have engaged with the social implications of this music have overlooked or marginalized women DAVIS 1998 xiv ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 31 como terreno para examinar uma consciência feminista histórica que reflete as vidas de mulheres negras cantoras e compositoras de blues estadunidense oriundas da classe trabalhadora das comunidades negras cujos trabalhos artísticos eram provocativos como representações estéticas de políticas de gênero e sexualidade idem p xv Cita os mesmos como possibilidades fascinantes de uma emergente consciência feminista no blues destas artistas de um lado da subserviência ao desejo masculino que de outro lado se transmutava para a expressão de um desejo e recusa que eram de grande autonomia feminista Outro aspecto importante que a autora trabalha é o papel da oralidade nessa reescrita da consciência feminista negra ibidem p xix Tais questões trazidas por Angela Davis nos remetem à teoria da música feminista e a questão da suposta dicotomia mente x corpo problematizada pela musicóloga Suzanne Cusick 1994 onde ressalta que uma teoria de música feminista ao invés de procurar se encaixar nas teorias já estabelecidas que focam apenas os aspectos racionais da mente busca fazer outras perguntas que considerem corpo e desejo num sentido amplo onde gênero e sexualidade assim como estão presentes na sociedade como aspectos estruturantes estão presentes também nas escolhas musicais composicionais eou da performance além é claro do próprio contexto no qual a pessoa está inserida De que forma e falando de nosso lugar sendo mulheres brancas com distintas trajetórias uma do nordeste e outra do sul podemos colaborar e reiterar esse enfrentamento a partir de nosso trabalho como educadoras e em nossas produções artísticas e de conhecimento uma vez que estas atuações estão intimamente relacionadas Por outro lado gênero raça e sexualidade que compõem dimensões não somente físicas mas históricas culturais políticas e também mentais psicológicas considerando sua dimensão afetiva e cognitiva sem determinismos mas que conferem a identidade e subjetividades marcas estruturantes que podem ser exploradas pelos processos criativos em música de compositoras como bem nos lembra Suzanne Cusick 1994 Igualmente propondo outros caminhos analíticos Deborah Vargas 2012 no seu livro Dissonant Divas afirma que os protagonismos de cantoras e musicistas da cena chicana do início do século XX se afirmaram como dissonantes em relação aos cânones musicais e patriarcais deste mesmo contexto E este ser dissonante passava pela performance música estilo estética experiência voz e instrumentação dentre outros aspectos que borravam fronteiras de identidades sociais10 A autora problematiza ainda como estas artistas não se encaixavam em padrões hegemônicos e normativos 10 A autora afirma que In Chicana Music assembles a dissonant cultural and sonic landscape of ChicanaTejana singers and musicians since the early decade of the twentieth century to the present who through performance song style aesthetics lived experience voice and instrumentation are incompatible inconsistent unharmonious and unsuitable with canonical ChicanoTejano narratives VARGAS 2012 p ix Cita cantoras e musicistas tais quais Rosita Fernández Chelo Silva Eva Garza dentre outras que have represented innovative instrumental and vocal stylings evoked new passions and politics of the erotic created new spatialities of belonging and modes of being ChicanaTejana that offer us an alternative understanding of borderlands social identitiesidem ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 32 dentro das narrativas da música chicana chamada de La Onda compondo subjetividades deslocadas das construções heteronormativas de gênero cidadania resistência de classe lar feminilidade e família Propõe portanto uma abordagem analítica de produção cultural e musical fronteiriça a uma lógica sexista de resistência e subordinação configurando relações de gênero e de poder 11 Em Queering the Popular Pitch WHITELEY RYCENGA 2006 a proposta consiste em problematizar sobre como o queering desafia estruturas não somente culturais e sociais mas também musicais invocando novos modos de escuta São caminhos analíticos diversos para considerar o espaço da música popular como de ambiguidade heteronormatividade e resistência ao mesmo tempo12 São dimensões subjetivas e coletivas que aqui também propomos onde corpo e política são a face de uma mesma moeda musical E este corpo tem história contexto conhecimento13 Por fim todas estas abordagens contribuem para esta nossa narrativa musical conjunta compondo também nossos repertórios no sentido de fortalecer a compreensão de nossos próprios processos criativos descobertas e desejos que ora apresentamos Nosso lugar de fala artistascantautoras pesquisadoras e educadoras Quem nós somos e o que nos move diante de tantas questões provocantes e desafiadoras São questões norteadoras que nos situam assim como situam nossas produções e desejos enquanto artistascantautoras pesquisadoras e educadoras Somos artistas musicistas compositoras musicóloga e etnomusicóloga respectivamente educadoras que se pensam com grande afinidade teórica e musical Somos cantoras pianista violinista e rabequeira respectivamente que buscam trazer para nossa produção de modo global as questões que nos movem bem como nossas identidades gaúcha e pernambucana corporificadas brancasheterasprofessoras universitárias de distintas trajetórias uma exanarcopunk de movimento estudantil de escola pública pernambucana na adolescência vivida em parte no interior e em parte em Recife outra que começou muito cedo suas perguntas escritas leituras 11 A feministofcolor analysis of theses figures cultural contributions by advancing a notion of musical dissonance a dissonance that I contend offers further complexity to analyses of gender and power within Chicanao cultural productionsVARGAS 2012 p x Music is never void of power and always the site of gender class sexuality and race politics For minority communities in the United States music has often been the mechanism for counterhistorical narratives selfrepresentation and cultural empowerment idem p ix E afirma ainda que Sounds marks place Music channels memory Memories establish a presence Place engenders social identities Social identities are given presence through music Sonic imaginaries processes histories Histories as canonical narratives silences ephemera oral tellings scandalous chisme gossip in the shape of dissonant figures are contested struggles over remembering idem p 1 12 Popular music for these authors is not a neatly squaredoff discourse rather it can be considered as a social force that constructs heteronormativity and resistant queer sexualitites idem p xiii 13 Queering to contemporary popular music issues concerning race and ethnicity forgotten histories the body in music and the use of popular music in power politics idem p xiii ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 33 e estudos de música moradora e ao mesmo tempo não se sentindo parte da cidade das charqueadas e dos casarões da praça Uma oriunda de família pobre da classe trabalhadora do interior de Pernambuco outra originária de família de classe média mais vinculada ao mercado público da cidade do que às tradicionais famílias e doçarias pelotenses Uma praticante de yoga e a outra praticante de macrobiótica acupuntura e homeopatia uma filha de Iemanjá e adepta ao candomblé e a outra filha de Iansã e Xangô que estudou em colégio de freiras mas nunca se sentiu parte de nenhuma religião definida Enfim são vários os nossos marcadores que atravessam nossas falas e nossas produções identidades identificações bem como desejos de intervenção e de interlocução Para pensar este nosso lugar amplo de distintas mas complementares atuações reformulamos o conceito de cantautora refutando o lugar de autoridade masculina de criador universal Na medida em que nos apropriamos do termo que é amplamente utilizado na língua espanhola na América Latina para designar compositora que interpreta suas obras propomos uma reformulação do mesmo em tradução para nossa língua não apenas designando esta identidade nossa de ser compositora mas ampliando o mesmo como sinônimo de artevismo feminista autoral que é ao mesmo tempo musical político e teórico Ou seja ser cantautora engloba o fazer musical nas instâncias que o mesmo nos atravessa tocar cantar compor pensar escrever ensinar militar enquanto feministas nos diversos espaços que transitamos Conforme destaca Juan Pablo González 2013 o trabalho da cantautora diferese da cantoraintérprete ou da cantadorafolclorista porque traz consigo a questão da autoria do interpretar a própria produção vinculada geralmente a temáticas políticas mas fundamentalmente por trazer seu pensamento e suas concepções para o centro do discurso musical Como assinala Citron 1993 p 81 se o compositor já é um outsider social a mulher compositora será duplamente outsider pois também o é do cânone profissional e artístico masculinizante González 2013 destaca que após sua chegada triunfal à cena criollista nacional a mulher pareceu experimentar um retrocesso como artista do folclore O autor observa que os movimentos de renovação do folclore latinoamericano dos anos 1960 e 1970 estavam baseados nos conceitos de autor e compositor a partir de uma tradição trovadoresca e com isto a forte inclinação masculina do cânone imperante percebia a mulher com falta de profissionalismo e originalidade algo que a musicologia feminista se encarregou de questionar Segundo González idem p 184 com exceção da mexicana Amparo Ochoa e da chilena Isabel Parra as poucas mulheres que participaram da cantautoria latino americana foram principalmente intérpretes como Mercedes Sosa condição na qual não aparece o homem O autor destaca que a chilena Violeta Parra é a grande exceção posto que irrompeu em um espaço reservado ao homem seja apropriandose do canto em décimas dos poetas populares chilenos ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 34 ou fazendo com que a palavra cantautor se pronunciasse também no feminino Segundo González Um cantautor deve compartilhar com seu público suas próprias vivências posições e visões de mundo por meio da canção e do ato performativo o que Violeta fazia com toda propriedade Para Violeta Parra a mulher está ao mesmo nível do homem no amor ela é a que escolhe a que convida a que ama que é deixada e também deixa de amar ibidem p 184 Em pesquisa que nós estamos iniciando em parceria a partir deste ano sobre compositoras de diversos gêneros musicais em Salvador e Porto Alegre constatamos a invisibilização das compositoras não somente na retórica do meio musical como também no desconhecimento de músicos e musicistas em relação a suas obras e atuações nos mais diferentes tempos históricos contextos e gêneros musicais E ainda de modo geral enquanto educadoras constatamos assustadoramente a exclusão de suas obras por parte de docentes nas suas aulas de música análise composição educação musical etc o que naturalmente reflete na formação dasos estudantes onde esta invisibilização é naturalizada Esta pesquisa cujo objetivo inicial foi de mapear compositoras atuantes em SalvadorBA ROSA 201114 vem trazendo no entanto boas surpresas Para chegarmos até as compositoras iniciamos conversas informais com diversas pessoas do meio musical dentro e fora da Escola de Música da UFBA e que atuam profissionalmente na área As respostas eram a princípio desanimadoras Parecia que as compositoras não existiam ou eram pouquíssimas e ainda pouco representativas nos seus trabalhos e atuações artísticas Felizmente para nossa alegria e também tristeza já contamos com um número acima de 100 Alegria por encontrarmos tantas Tristeza pelo fato de que ao encontrarmos tantas como seria possível que elas fossem simplesmente invisíveis para todas aquelas pessoas consultadas Atualmente eu Laila tenho lançado a simples pergunta a estudantes dos diversos cursos de música da Escola de Música15 onde leciono desde 2011 na graduação e PósGraduação e também estudantes do Programa de PósGraduação sobre Gênero Mulheres e Feminismo na UFBA você 14 O plano de trabalho O som das compositoras de Salvador integra o projeto de pesquisa Feminaria Musical ou epistemologias feministas em música no Brasil ROSA 2011 O mesmo vem sendo realizado desde 2013 ano de sua aprovação enquanto projeto de iniciação científica tendo sido contemplado com bolsas PIBIC da UFBA total de 15 bolsas até este ano de 2015 para estudantes de graduação contando também com tutorases da PósGraduação níveis mestrado e doutorado Para o referido plano de trabalho contamos com a colaboração das estudantes bolsistas Neila Khadi 3 anos consecutivos e Thalita Vieira ambas jovens musicistas atuantes no cenário de Salvador 15 Leciono a disciplina Apreciação Musical para estudantes de composição licenciatura instrumento e também estudantes do curso de música popular nas habilitações canto composição e arranjo e instrumento Sou ainda credenciada aos programas de PósGraduação em Música e de Gênero Mulheres e Feminismo ambos na UFBA onde desde 2012 oriento estudantes de mestrado e doutorado Ou seja é possível obter um panorama amplo deste desconhecimento musicais em relação a produção de compositoras e mais ainda de sua desvalorização generalizada como protagonistas de obras menores em relação aos grandes compositores que figuram no currículo e nas escolhas dos professores destes diversos cursos ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 35 conhece compositoras Ouve seus trabalhos Você já ouviu ou analisou obras de compositoras durante seu curso de graduação ou mesmo na pósgraduação para estudantes de música Infelizmente e já sem surpresa de minha parte a resposta foi massivamente negativa salvo raríssimas exceções como no caso de um estudante de composição cujo curso tem duração de seis anos e que em todo o curso ouviu uma compositora Já outro estudante de mestrado em composição afirmou nunca nem na graduação em composição nem no mestrado o que totaliza um período de cerca de 8 anos ao todo ouviu ou analisou obras de compositoras em sala de aula Naturalmente que no Programa de Pós Graduação em estudos sobre gênero a valorização de artistas e compositoras é reiterada mas como não é um programa sobre música o desconhecimento ainda é forte e expressivo infelizmente Estes são exemplos elucidativos de questões que nos movem e que interferem diretamente na formação dasos nossasos estudantes O projeto Mulheres Compositoras em Porto Alegre começou a ser desenvolvido em 2015 na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e conta com a bolsista Isadora Nocchi Martins e o bolsista Nikkolas Gomes Ferranddis e a realidade observada é a mesma que em Salvador uma produção bastante significativa ainda que invisibilizada O levantamento inicial realizado nestes dois meses de desenvolvimento do projeto mapeou trinta compositoras em atividade ressaltando que estes são números iniciais provavelmente muito distantes ainda da realidade embora as obras destas mulheres estejam também ausentes das audições de salas de aula e repertórios das salas de concerto A notícia boa desta discussão é que ao pesquisarmos sobre cantautoras feministas encontramos uma diversidade representativa L Herrera Menstruadora 2014 publicou no seu blog a informação de que Cantantes abiertamente feministas son tendencia Nos últimos anos têm aparecido novas e diferentes vozes em regiões da América Latina e outras partes do mundo que através de diversos gêneros musicais cantam dirigindose a outras mulheres sobre as formas com que resistem a diferentes opressões A continuação algumas destas que sem medo a enunciarse a partir do feminismo levantam a voz com ritmo16 No blog Una docena de Emi Escudero organiza Una docena de canciones feministas onde problematiza a questão da transmissão cultural e produção de estereótipos femininos em épocas e países diferentes nas artes em geral e que nem sempre tem significado uma imagem feminina positiva Mas que por outro lado sempre existiram mulheres fazendo arte buscando representar a si mesmas reivindicando desta forma dignidade e direitos Escudero destaca ainda a importância de uma 16 En los últimos años han aparecido nuevas y diferentes voces en regiones de América Latina y otras partes del mundo que a través de diversos géneros musicales le cantan a otras mujeres sobre formas en que resisten a diferentes opresiones A continuación algunas pocas de aquellas que sin temor a enunciarse desde el feminismo levantan la voz con ritmo ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 36 produção artística feminista onde canções e músicas defendem a igualdade e promovem o empoderamento das mulheres considerando sua diversidade sexual e afetiva17 Esta abordagem de cantautora feminista dada por ambas as autoras é a que nos instiga Seguimos existindo Mas não chegamos até aqui como compositoras desde o início de nossas trajetórias Esta identidade é fruto de um processo de empoderamento que construímos ao longo de nossas carreiras E neste momento a pensar sobre nossos processos criativos e no potencial feminista e transgressor nosso de compor É importante no entanto considerar a dimensão composicional da interpretação como nos alerta Rafael Noleto 2012 ao estudar a relação do público homossexual com as cantoras consideradas como divas mas que não são compositoras Contudo as mulheres atuando como musicistas são automaticamente pensadas como cantoras e no máximo instrumentistas Raramente como compositoras E o pior diversas cantoras reconheceram que compõem mas em suas falas diminuem suas produções ressaltando que mesmo compondo não se consideram compositoras Vivemos também este processo para nos afirmar enquanto compositoras Saímos dos nossos armários composicionais somente após relativamente estabelecidas enquanto pesquisadoras e docentes Atribuímos este autoreconhecimento tardio em relação a nossas respectivas atuações enquanto musicistas como fruto de um longo processo de investigação sobre gênero e música que para nós significou olhar para dentro para nossas próprias trajetórias E desta nos empoderarmos Logo trazemos todas as sujeitas e interlocutoras de pesquisa para este diálogo e para nossa própria autoafirmação E claro enquanto educadoras esperamos poder contribuir para o empoderamento de outras compositoras musicistas mulheres Deste desejo nascem nossos grupos de pesquisa Feminaria Musical grupo de pesquisa e experimentos sonoros da UFBA ROSA HORA SILVA 2013 ROSA et al 2013 e Grupo de Estudos em Música e Gênero da Universidade Federal do Rio Grande do Sul É atuando a partir da perspectiva da pedagogia feminista e da dialogicidade freireana que seguimos 17 A nadie se le escapa que la cultura de una sociedad es el reflejo de sus valores básicos valores que no son otra cosa que normas compartidas abstractas de lo que es correcto deseable y digno de respeto decir o pensar en una situación determinada La transmisión cultural se puede producir a través del arte en general de las artes visuales de la literatura los medios de comunicación la publicidad y por supuesto la música La presencia de las mujeres en el arte de todas las épocas y países no siempre ha significado algo positivo para nosotras pues nuestra imagen es la expresión de estereotipos sobre la condición femenina por tanto lo que debía y debe ser una mujer frente a lo que debe ser un hombre según la época la geografía y las tradiciones Por otro lado no toda la producción artística está hecha por varones ha habido y hay muchas mujeres que pintan esculpen escriben componen y construyen Sus obras ofrecen un mensaje diferente porque en ellas se representan a sí mismas no como lo prescribe el patriarcado sino en su realidad y con la consiguiente reivindicación de su dignidad y derechos Por qué feministas Porque el Feminismo a pesar de la dificultad existente por transmitir su verdadero significado a pesar de que hay todavía gente que lo entiende como lo opuesto al machismo y no conoce el verdadero significado del Feminismo es la corriente filosófica teoría política y social ideología y un conjunto de movimientos políticos culturales y económicos que tienen como objetivo la igualdad de derechos entre hombres y mujeres Por eso las canciones y la música feministas pueden y deben contribuir a crear un imaginario colectivo diferente al patriarcal Son aquellas canciones que rompen con estereotipos moldes con personajes encorsetados son canciones que defienden la igualdad y promueven el empoderamiento de las mujeres el respeto las relaciones sanas y la diversidad sexual y afectivaDisponível em httpunadocenadecomunadocenadecancionesfeministas ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 37 pensando e fazendo música com nossas estudantes e parceiras E ao nos considerarmos enquanto cantautoras nos conectamos também com nossas irmãs latino americanas feministas que através de suas diversas e particulares produções musicais propõem um artevismo que extrapola fronteiras o que novamente nos remete à consciência fronteiriça uma nova consciência a consciência mestiça lindamente proposta por Gloria Anzaldúa 2005 p 704 que citamos poeticamente Porque eu uma mestiza continuamente saio de uma cultura para outra porque eu estou em todas as culturas ao mesmo tempo alma entre dos mundos tres cuatro me zumba la cabeza con lo contradictorio Estoy norteada por todas las voces que me hablan simultáneamente Não queremos assumir que a consciência fronteiriça e chicana proposta por Anzaldúa possa ser simplesmente transplantada para nossa realidade brasileira Assumimos que fora do Brasil comungamos com esta identidade subalterna e fronteiriça latinoamericana Por outro lado em território nacional a mesma é reformulada pela perversa lógica racista da pigmentocracia brasileira NASCIMENTO e NASCIMENTO SD que estabelece uma paleta de cores de pele onde há uma hierarquização na gradação da mesma sendo a cor considerada clara não negra a mais privilegiada simbólica e materialmente Esta é a lógica da branquitude que independe de classe social pois como apresentam Aparecida Bento 2002 e Liv Sovik 2009 esta consiste num livre transitar diferenciado e desigual entre pessoas brancas e não brancas que se estende muitas vezes a uma desigual atuação representação e acesso no âmbito da música Nesta lógica da branquitude racista e da pigmentocracia ainda que em lugares distintos Sul Nordeste somos igualmente privilegiadas como brancas o que não nos irmana em sentido de igualdade com as mulheres não brancas negras e indígenas Em termos de classe social não nos irmana em condições de igualdade com as mulheres não escolarizadas e pobres oriundas da classe trabalhadora e da periferia Em termos das sexualidades da heteronormatividade e da cisgeneridade poeticamente denunciada por Viviane V 2014 ativista transfeminista não nos irmana em pé de igualdade com as mulheres lésbicas bissexuais eou trans Em termos de acessibilidade não nos irmana com as mulheres com deficiência por exemplo Assim como também não nos irmana em termos geracionais com as jovens ainda não estabelecidas no mercado de trabalho ou mais velhas e aposentadas por exemplo Como podemos perceber são dimensões fronteiriças diferenciadas e desiguais a serem ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 38 consideradas assim como já o fez Sonia Alvarez 2009 ao relatar sua própria vivência enquanto cubana não branca nos EUA e branca no Brasil propõe uma reflexão sobre um feminismo translocal que a depender do contexto nos posiciona num lugar de subalternidade EUA ou de privilégios Brasil Nossos múltiplos locais ou posições de sujeito mudam de forma crucial para a política da tradução de acordo com nossos movimentos e passagens por localidades espaçotemporais Nossas subjetividades são ao mesmo tempo baseadas no lugar e deslocadas ou mal colocadas Se eu sou uma cubanoamericana étnica no sul da Flórida e uma latina racializada na Nova Inglaterra no momento em que pouso em São Paulo eu me torno branca Mas incorporo essa branquitude provisória de maneira desconfortável pois tenho consciência das injúrias infligidas pelo racismo tanto no norte como no sul das Américas Apesar de menos flexível para os corpos mais negros devido ao fato da negritude a raça pode ser um significante móvel através das fronteiras ALVAREZ 2009 p 745 A saída proposta pela autora e que aqui comungamos nasce da solidariedade feminista antirracista que inclui também a anticlassista etarista capacitista heteronormativa e cisgênera Por outro lado em âmbito nacional nós duas igualmente brancas e professoras universitárias de instituições federais também nos encontramos em desigualdade em termos regionais simbólica e materialmente Sul Nordeste mas juntas fora do Brasil em âmbito estadunidense ou europeu estaremos igualmente classificadas e racializadas como latinas sul americanas sudacas Enfim questões que julgamos relevantes e inquietantes para nos pensar e pensar sobre nossas produções e atuações E claro pensarmos também na possibilidade de fortalecimento de uma sororidade musical e feminista Imbricação entre processos e produtos nos trabalhos fonográficos Nesta mudança de paradigma a forma de criar produzir e interpretar a música é de vital importância Os trabalhos que apresentamos aqui se inscrevem na categoria canção popular em um viés que dialoga com as tradições e também com a música experimental em uma concepção expandida da canção Calcada na improvisação como impulso gerador e formativo do trabalho adotamos ainda como premissa o fato de que concebemos e interpretamos nosso trabalho musical ressoando aqui o conceito da cantautora presente fortemente na América Latina conforme discutimos anteriormente Compartilhamos assim os processos de criação de nossos trabalhos musicais Água Viva de Laila Rosa e Vestígios Violeta e Lusque fusque de Isabel Nogueira Laila Água Viva é meu primeiro cd autoral que foi lançado em 2013 tendo sido contemplado pelo edital Demanda Espontânea da Secretaria de Cultura do Estado da Bahia O mesmo envolveu cerca de 35 musicistas e músicos entre artista e banda mais participações especiais de Pernambuco e ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 39 Bahia além das pessoas que trabalharam em outras áreas não diretamente musicais De modo geral o cd consiste numa ode poéticomusical que celebra o a obra homônima de Clarice Lispector 1973 juntamente aos arquétipos femininos das águas salgada e doce Iemanjá e Oxum respectivamente Aspectos mais detalhados sobre os arranjos e o cd como um todo já foram abordados em outro momento ROSA 2015 no prelo e portanto aqui serão discutidos aspectos relacionados aos textos de duas canções bem como relacionados às escolhas das sonoridades principais que conferem identidade a De sertão e arranhacéu e Mar Azul De sertão e arranhacéu que relata um pouco da minha trajetória pessoal musical e de inserção e atuação no campo da etnomusicologia ao qual dediquei cerca de dez anos pesquisando sobre os universos sagrados dos orixás e da jurema do terreiro de Nação Xambá onde posteriormente me tornei filha de santo Esta faixa conta com a participação especial do grupo Bongar que é um grupo de coco composto por filhos de santo do terreiro Xambá Vale ressaltar que a escolha do coco gênero musical tradicional afroindígena em compasso binário que rege esta canção se deve ao fato de que este é o gênero das entidades mestras da jurema sagrada religião afroindígena ROSA 2009 Outro aspecto especial a ser comentado a respeito do coco é que a vinheta de abertura desta música é o coco das estrelas um coco em homenagem às mulheres coquistas e mestras da cultura popular de Pernambuco de autoria de Dona Del do Coco coquista pernambucana Ambas as canções bem como o cd pode ser ouvidos integralmente na minha página do soundcloud httpssoundcloudcomlailarosa O caráter cíclico deste coco com o riff do bandolim em F com a seguinte sequência das notas Fá Fá FáMib 7o grau rebaixado para colorirRéFáFáFáSolFá que percorre toda música celebra a perspectiva da roda viva e do movimento da minha vida da não hierarquização como princípio que constitui a roda em diversas tradições culturais e musicais reforçando o conceito presente na capoeira do mundo que dá volta e eu caminho nele volta do mundo camará mundo dá volta camará De sertão e arranhacéu Coco de roda Punk rock Maracatu Baião Rabeca e pife De Sertão E Arranhacéu Quero compor uma canção Como se fosse um repente Daqueles que vem do luar Daqueles que vem do litoral ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 40 Daqueles que vem do coração Daqueles que vem Blues Café Rapadura Sertão Viola machete Cachoeira Federação O mundo que dá volta e eu caminho nele Quero compor uma canção Como se fosse ponto de mestra Daqueles que vem da jurema Daqueles que vem do Xambá Daqueles que vem do Bongar Daqueles que vem O mundo que dá volta e eu caminho nele Sou filha de Casa Amarela Sou cria do Rio Capibaribe O mundo que dá volta e eu caminho nele Volta do mundo camará O mundo que dá volta e eu caminho nele Mundo dá volta camará O mundo que dá volta e eu caminho nele Em relação ao texto vários elementos e vivências pessoais são pontuados compondo a dinâmica do discurso e materialidade musicais da adolescência punk sendo filha de Casa Amarela bairro de periferia de Recife e também cria do Capibaribe rioreferência de Pernambuco narrado no poema de João Cabral de Melo Neto no clássico Morte e vida Severina musicado por Chico Buarque Das minhas vivências sigo para a descoberta da cultura popular pernambucana coco de roda punk rock maracatu baião e do contato estreitado a partir da vida em Carpina cidade do interior pernambucano onde vivi até a adolescência e acompanhei diversos folguedos populares Posteriormente da etnomusicologia que me levou a resgatar o CavaloMarinho folguedo tradicional popular que havia conhecido ainda na infância em Carpina e onde a rabeca é instrumento solista Foi por conta da etnomusicologia que fui levada ao Terreiro Xambá Olinda PE pela primeira vez em 1999 como bolsista de iniciação científica do Prof Dr Carlos Sandroni Foi lá onde conheci e me aproximei afetivamente e espiritualmente dos universos dos orixás e da jurema sagrada Mas neste coco as mestras ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 41 da jurema é que são as principais homenageadas Ao mesmo tempo o texto trata dos trânsitos e hibridismos que saem do tradicional muitas vezes concebido como estático circulando entre o sertão e o arranhacéu o interior e a capital o terreiro e os palcos do mundo Sabese que em Pernambuco sempre foi forte uma movimentação artística de trabalhar com referências da cultura popular pernambucana tradicionais na música popular e de concerto como uma estratégia de reafirmar identidade musical pernambucana Isto aconteceu desde o Movimento Armorial nos anos 70 que teve em Ariano Suassuna uma grande referência e de onde surgiu o artista o compositor cantor violinista rabequeiro e dançarino Antônio Nóbrega por exemplo aos movimento musicais experimentais progressivos e psicodélicos como o clássico disco Paêbiru de Zé Ramalho e Lula Cortes 1970 e toda uma geração de artistas como Alceu Valença e Geraldo Azevedo até o Mangue Beat nos anos 90 que acompanhei de perto Tendo este último movimento fortalecido um protagonismo musical de artistas atuantes na periferia movimento Hip Hop e grupos tradicionais de maracatu e coco dentre outros e através sobretudo e Chico Science e Nação Zumbi alcançado uma projeção internacional A segunda canção representativa do meu cd é Mar Azul tema que traz como vinheta de abertura a canção Odomiô que significa uma das saudações a Iemanjá de autoria de Dona Graça do Coco coquista pernambucana e com arranjo para quarteto de cordas de Aaron Lopes compondo um diálogo fronteiriço entre o tradicional gênero musical o coco e o universo das cordas friccionadas De modo geral o tema que foi orientalizado com a presença do Ud instrumento tradicional do universo turco e árabe Costurando uma conexão com o oriental presente no Nordeste onde temos a forte presença de comunidades ciganas que são invisibilizadas e também de entidades espirituais ciganas como é possível perceber nas experiências das juremeiras protagonistas da minha tese de doutorado ROSA 2009 Mar Azul agrega mares plurais infinitos poderosos que nos diferenciam e nos conectam Mar azul Uma luz brilha sobre a mulher Que ama a si Uma luz brilha sobre a mulher Que é singular A fulana que ama o mundo Negra Branca Índigena Feminino plural A mulher tem consciência Se ela for de enfrentamentos ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 42 Infinito feminino De qualquer parte que seja Uma luz brilha sobre a mulher Que dá a luz Uma luz brilha sobre a mulher Que é divindade Iemanjá que traz a luz Como mulher dágua Fluida e forte Iemanjá A mulher de tantas faces Feminino em mar azul Infinito feminino De qualquer parte que seja Como é explícito no texto considero este como um dos temas mais expressamente feministas e de empoderamento feminino do cd onde a autoestima feminina tão bombardeada pela cultura sexista e racista é a tônica sendo cantada como uma luz que brilha sobre a mulher que ama a si em primeiro lugar e onde a mulher tem consciência se ela for de enfrentamentos A luz aqui se refere a esta consciência feminista que é plural negra branca indígena etc ou seja feminino plural E por isso falamos sobre feminismos pois para falarmos sobre sororidade entre as mulheres precisamos reconhecer nossas diferenças e também nossas desigualdades Ao mesmo tempo a luz vem da benção de Iemanjá meu orixá de cabeça estando relacionada à espiritualidade arquetípica do candomblé e especificamente deste orixá feminino que é a mãe de todos os orixás Neste momento há também uma reverência ao poder da maternidade e da vida onde uma luz brilha sobre a mulher que dá a luz Após reiterar em primeiro lugar a autoestima da mulher que não nasceu para procriar e detém a autonomia do seu corpo trato da questão da maternidade situando políticas de afirmação do direito ao próprio corpo e a existir a parir em condições dignas humanizadas Vale ressaltar que de modo geral mulheres pobres negras e indígenas não têm acesso a um sistema de saúde qualificado nem para parir nem para abortar em condições dignas e humanizadas diferentemente das mulheres de classe média sobretudo brancas18 Portanto diante de tantos 18 No Brasil estamos vivendo neste momento uma onda conservadora que promove tentativas de retrocessos dos direitos das mulheres como é o caso da PL5069 do Deputado Eduardo Cunha PMDBRJ que de forma negativa reconfigura o próprio conceito de violência e propõe a retirada do direito ao acesso à pílula do dia seguinte para mulheres vítimas de estupro Ou seja obrigando as mulheres a levarem uma gestação indesejada fruto de violência sexual e ainda retirando delas o direito ao aborto que consta da constituição desde os anos 40 Nós feministas de todo o Brasil fomos às ruas para gritar Fora Cunha reivindicando nossos direitos e autonomia sobre nossos corpos ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 43 enfrentamentos peço a benção de Iemanjá poderosa e infinita como o mar que pode ser calmo acalentador e sereno mas que também pode ser arrebatador São diversos lugares e possibilidades de feminino que se resumem no infinito feminino de qualquer parte que seja Isabel Desde muito cedo comecei meus estudos de piano ao observar a pianista que acompanhava as aulas de ballet que eu frequentava Ao mesmo tempo que o aprendizado da música comecei aos oito anos a escrever poesias e histórias algumas breves outras mais longas Ao terminar o bacharelado em piano fui realizar o doutorado em musicologia em Madri onde me reconheci como latinoamericana e como brasileira frente à uma outra comunidade que me considerava como pertencente à uma massa de pessoas identificadas coletivamente como sudamericanas ou sudacas Retornando ao Brasil em 1997 prestei concurso para a Universidade Federal de Pelotas onde comecei a desenvolver um trabalho de pesquisas em musicologia sobre o acervo documental do Conservatório de Música desta instituição que em 2002 resultaria na fundação do Centro de Documentação Musical Analisando os livros de matrículas de alunas e alunos do Conservatório de Música da UFPel me surpreendia o número de matrículas de meninas e este interesse estendeuse logo para o estudo das fotografias e dos programas de concerto do acervo da instituição A partir da leitura das fotografias minha percepção sobre as mulheres que estiveram realizando concertos na cidade vindas de diversos lugares moldava meus questionamentos e reflexões sobre as construções de gênero na música e a performance constituída a partir destes fazeres Como eu nunca havia lido nada sobre estas mulheres Que silenciamento operava para que não estivessem nos livros de história da música Para que mal se tenha ouvido falar delas Através dos conceitos de LópezCano e Opazo 2014 sobre a pesquisa artística fui operando um entrelaçamento entre o que os documentos me faziam pensar e minha subjetividade a reflexão através da pratica manifestouse no refletir sobre o que se fez trazendoo novamente para modelar este fazer motivando um novo processo de reflexão Piano e musicologia se cruzaram entrelaçando então com canto e composição originando os trabalhos artísticos Vestígios Violeta 2014 e Lusquefusque 2015 Vestígios Violeta 2014 é um disco de canções e poemas que busca destacar a dimensão composicional da performance considerando que o processo de escolha do repertório e da elaboração dos arranjos e os desdobramentos e redes de pertencimento gerados para e a partir destas escolhas transformam o processo interpretativo em processo criativo O trabalho foi financiado pelo Programa Procultura da Prefeitura Municipal de Pelotas RS foi produzido e arranjado por Gilberto Oliveira com direção artística de Isabel Nogueira Foram escolhidas canções em português e em espanhol de compositoras e compositores do ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 44 Brasil e América Latina pontuando e sublinhando o sul do Brasil como lugar de pertencimento e intercâmbios entre fronteiras onde o idioma e os aspectos culturais perpassam os limites geográficos e configuram uma região com elementos similares As compositoras interpretadas foram Violeta Parra Chabuca Granda Déa Trancoso na tradição das cantautoras latinoamericanas e brasileiras e as poetas foram Angélica Freitas e Monique Revillion Incluir estas obras era para mim uma declaração de princípios de identidade e feminismo especialmente pela trajetória de Violeta e seu amálgama artevida do qual falarei mais detalhadamente a seguir O título do CD foi efetivamente uma homenagem à ela e aos vestígios de sua atuação em minha vida reunindo em sua atitude de cantautoria e no reivindicar suas raízes mapuches elementos que não haviam sido antes reunidos Para mim uma das canções mais fortes e significativas de Violeta Parra escolhida foi Maldigo del alto cielo uma maldição cheia de vigor e fúria contra o mundo e seus destinos Percebo Violeta Parra como uma das artistas mais intensas desta região cultural do sul da América à qual não se pode ficar indiferente E este sentimento se mistura para mim com a própria situação da mulher e do feminismo posto que uma vez que se percebe a sua estrutura não se pode ficar indiferente a ela Lusque fusque 2015 é um trabalho de criação de canções composto e interpretado em parceria com Luciano Zanatta a partir de improvisações sobre materiais prégravados sobre os quais é realizada a performance Lusquefusque faz referência à hora do dia onde as fronteiras claroescuro se diluem onde a luz difusa não deixa perceber exatamente se ainda é dia ou se já se fez noite O trabalho evoca os borramentos e dobras do conceito canção e os desdobramentos das epistemologias feministas Na perspectiva do trabalho sobre canções pesquisa artística e epistemologias feministas o trabalho de Lusque fusque teve como um de seus eixos condutores a perspectiva de trazer para o centro do discurso a perspectiva da apropriação ZANATTA 2015 Apropriação de formas de compor e interpretar dialogando diretamente com a ideia da cantautoria posto que as canções foram compostas para ser interpretadas pelo grupo Abordadas como um texto gravado sobre uma base previamente composta as canções foram construídas aproximando canto voz falada voztimbre voz expandida desvios de afinação processamento digital recortes de gravação tensões temporais com deslocamentos métricos e ambiguidades rítmicas sobre batida O processo de criação das canções foi configurado a partir de materiais précompostos sequências programadas ou patches modulares virtuais As canções incorporam como textosignificado relações amplas com estruturas sonoras onde incluemse os conflitos programados em harmonia contrapontos timbres e tempos ZANATTA NOGUEIRA MACHADO 2015 Para este trabalho farei referência à duas canções Violeta e Azinconstâncias ambas do projeto Lusquefusque 2015 Como uma continuidade do trabalho fonográfico Vestígios Violeta a canção ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 45 Violeta fez parte de um conjunto de três canções que se debruçaram sobre as histórias de vida de três cantautoras latinoamericanas Violeta Parra Chile Chabuca Granda Peru e Maria Elena Walsh Argentina A partir de uma recriação ficcional pela escritora porto alegrense Monique Revillion na forma de uma contação de histórias sobre os dados biográficos das compositoras entre eles o bilhete de suicídio de Violeta Parra as canções foram concebidas Trazemos assim relatos de vida que incluem a trajetória de Maria Elena Walsh importante compositora com uma sólida obra de música para crianças mas que teve sua posição política e sua sexualidade lésbica como fortes marcadores e de Chabuca Granda que buscou trazer para sua música as referências afro peruanas e teve o divórcio como marcador social em sua vida Juan Pablo González destaca que Violeta Parra possui uma terceira condição de outsider a de encarnar uma alteridade social de componentes culturais étnicos e de classe Se trata de uma encarnação que se realiza performativamente posto que é sobre o palco na radio e no disco que Violeta exerce como cantora camponesa e reinvindica raízes mapuches definitivamente onde coloca em pratica sua alteridade social Em sua opção artevida Violeta Parra encarna sua condição de outsider a partir de sua atividade artística fazendo do mundo seu cenário e de seu cenário o mundo GONZÁLEZ 2013 p 185 Trago aqui a letra da canção Violeta do projeto Lusquefusque a partir da historia recriada por Monique Revilion Vou contar um segredo que nunca contei a ninguém quando eu era jovem e algum rapaz me interessava pedia a ele que tentasse adivinhar meu nome Era uma brincadeira um jogo gostava de ouvir meu nome dito por outra pessoa Nenhum deles acertou Um jogo de adivinhar O começo de todo amor a curiosidade verdade simples Como uma mulher de talentos e habilidades sou uma aranha armadeira deste deserto a perder de vista capaz de tecer pintar bordar modelar o barro tocar cantar habilidosa operária em minhas oito negras patas agarrandose em sua arte para não ser esquecida Minha teia no entanto não foi feita para agarrar sonhos como as que tecem as artesãs contas e pedras penduradas em varandas agarrando a sorte Os sonhos aqui duraram pouco sou contemporânea desta era de pesadelos e em meu país há mais o que denunciar do que cantar ainda assim eu canto e minha voz é meu destino e minha circunstância Me chamo Violeta mas não estou muito segura Tenho cinqüenta anos à disposição do vento forte ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 46 E a mim me coube tudo muito seco ou muito salgado mas assim é a vida uma agitação desordenada que não se compreende O inverno se instalou no fundo da minha alma e duvido que em alguma parte exista primavera Já nada me interessa nem nada mais quero ver Então coloco a cama diante da porta e me vou No projeto Lusquefusque as letras das canções nem sempre ocupam um papel central no tempo da canção Seu protagonismo alcança lugar as vezes por configurarse em uma vinheta final ou de abertura ou por receber processamentos que transformam o timbre Além da desterritorialização da voz como centro da canção se trata de lidar com um novo lugar de associações onde o produto voz não pode ser diretamente associado à fonte sonora que o gerou Para mim isto significa o novo olhar que o feminismo possibilita uma nova lente para ver o mundo onde se configura portanto um novo lugar Este trecho para mim simboliza isto Tem uma lente que muda o olho de quem quer ver sob o olhar que invade tudo que a gente pensou em ser Por fim trago uma cançãotexto também de Lusquefusque em que o reconhecimento das maleabilidades das trajetórias do agregar as diferenças minhas e alheias em favor de uma não obtusidade com relação à diversidade é o tema Azinconstancias canção e texto recitado Choro em lágrimas Verto intempestades Onde ainda posso ir Por onde ainda posso andar Derreto ausências Verto ansiedades Urgências de um lugar qualquer Pintar o chão com os pés no ar Fui ensinada a ser calma contida discreta e me movimentar devagar Não discutir não brigar não fazer ruído não chamar atenção não discordar Ser amável esperar e calar Ao dirigir a palavra desviar o olhar Temer que meus olhos digam mais do que quero ouvir Temer até o que nem sei que temo Desejei ser invisível e não precisar impor minha presença a ninguém Não ter que responder pelo que fiz ou pensei Não falar não dizer não pensar só viver uma existência quase etérea sem ânsias incômodos ou quereres extremos ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 47 Mornidão quietude silêncio Nos dias diáfana presença aérea e angelical Nas noites cultivo olhares fixos dirigidos ao infinito Mas em alguma parte de mim vive algo que é outro Que se desborda sem que eu saiba do que é feito Que deseja o que não conheço com a força das madrugadas Esperei paciente que se acalmasse e não ferisse meus silêncios Uma e outra vez esperei Agora já não quero que silencie Quero que fale com a voz que tenha e os escuto Estas ânsias movências tempestades vulcões e dissaberes são todos meus E os acolho com a leveza do estar em casa e a certeza das inconstâncias Considerações finais As tramas da subjetividade desafios desejos e dobramentos Falar da própria produção musical lida diretamente com as dificuldades por uma parte do falar de um processo artístico com o qual se está diretamente envolvida e que possivelmente por isto se possa oferecer um olhar absolutamente peculiar sobre as motivações e desejos envolvidos e por outro de não poder oferecer o distanciamento analítico que se tornou o modelo predominante em alguns círculos do campo da composição musical No entanto nossa intenção é justamente questionar os paradigmas deste modelo dominante que junto com as perspectivas de análise supostamente isentas de envolvimento pessoal elevou à categoria de método cientifico um discurso hegemônico falsamente neutro e com isto buscando disfarçar um lugar de poder autoridade e dominação do masculino branco e europeu Se os saberes que não se enquadram neste modelo foram considerados subalternos menos científicos e com isto não são valorizados pela tradição acadêmica construída é justamente este lugar que queremos questionar e por isto nossa fala se centra precisamente na escolha do falar sobre nosso próprio trabalho desejos e processos artísticos Ao mesmo tempo em que buscamos assim trazer a reflexão sobre nossa experiência para o centro do discurso desejamos fazer de um relato pessoal uma possibilidade de trabalho como forma de espelhamento e possibilidade de transmissão de saberes mas sobretudo uma via expressiva de relatos sobre o fazer artístico Pretendemos neste processo incorporar as reflexões trazidas pelas epistemologias feministas que pretendem não apenas a inclusão das relações de gênero na leitura das sociedades mas o questionamento do processo mesmo de produção de conhecimento construído a partir de relações de poder privilegiando os processos racionais em detrimento da subjetividade considerando alguns protagonistas ambientes e documentos como mais válidos do que outros NOGUEIRA 2015 Assim a epistemologia feminista defende o relativismo cultural a historicidade dos conceitos e coexistência de temporalidades múltiplas RAGO 1998 ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 48 A autora destaca que os estudos feministas abrem possibilidades abertas que não se restringem a novos temas ou a uma política compensatória que inclua as mulheres nas narrativas históricas mas descortinam um olhar sobre novos suportes e temas aliado à um pensar feminina e subjetivamente sobre as práticas do pensar e escrever acadêmico Na história do pensamento feminista a reflexão segue a experiência operase uma deshierarquização dos acontecimentos as práticas passam a ser privilegiadas em relação aos sujeitos sociais a realidade já não cede à necessidade de encaixarse na teoria previamente moldada No cotidiano das relações acadêmicas no entanto a vivência diária da exclusão das mulheres nos repertórios veiculados e considerados nas orquestras concursos de composição nas obras na programação dos concertos nos livros de história da música ou outros papeis de protagonismo é uma realidade tão presente que passa a ter status de uma suposta condição de normalidade Trazer a produção feminina para o centro do discurso pretende então lidar não apenas com estes mecanismos de exclusão de protagonismos instituídos mas também com os mecanismos velados da negação de toda e qualquer possibilidade de ocupação do espaço público cotidiano ou simbólico Estes mecanismos se traduzem por uma parte na dificuldade de lidar compreender espelharse ou se inserir nos espaços públicos de atuação Não apenas de ascender aos espaços mas ainda além da possibilidade de buscar criálos De que forma buscar argumentos para justificar para uma maioria masculina que a ausência de mulheres não é só uma forma normal mas um silenciamento de uma parcela significativa da produção musical Manterse falando a partir das margens e buscar interlocução apenas com os pares ou buscar inserirse nos meios instituídos lidando com os mecanismos de validação que excluem os trabalhos e os modos de produzir das mulheres Neste sentido este estudo busca intencionalmente trazer para o centro do discurso não apenas uma temática de inclusão do trabalho das mulheres mas uma perspectiva de pesquisa onde a reflexão sobre o próprio processo suas motivações e desejos são o centro do trabalho Discutir não apenas produtos acabados mas seus processos formativos e generativos Buscamos para isto apoio nas epistemologias feministas e na pesquisa artística que defende a produção do conhecimento a partir da própria pratica e de como a observação e reflexão sobre estes processos engendram modificam e retroalimentam a prática artística Mais além da composição ou criação musical buscamos então dialogar com a área da pesquisa artística modalidade de trabalho acadêmico investigativo que tem o processo criativo e o produto artístico como foco e objetivo A investigação artística se desenvolve através da imersão doa artistapesquisadora nas ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 49 atividades de criação e reflexão a respeito do processo do reconhecimento de seu lugar de fala e de escuta do mundo e do retorno destas reflexões à sua própria prática desenvolvendo uma documentação que reflita dos procedimentos metodológicos adotados para o trabalho Coessens Crispin e Douglas 2009 argumentam a favor de uma virada artística artistic turn no ambiente acadêmico onde a cultura da pesquisa artística implica na desterritorialização das fronteiras estabelecidas entre os paradigmas do campo da pesquisa científica e das artes O conceito de desterritorialização adotado pelas autoras referese às ideias de Deleuze e Guattari 1997 p 508 de um processo que tira o território de uma entidade previamente existente abrindo as fronteiras e possibilitando a alteridade e a diferença As autoras destacam que na pesquisa artística a metodologia adotada assume formas hibridas onde o objeto determina o método a ser utilizado e as fontes são oriundas de práticas artísticas da literatura de pesquisa e de processos artísticos O material de pesquisa pode incluir entre outros interpretação processos de criação comparação com criações similares e o estudo da relação entre a manifestação artística e sua recepção Ibid Id p 68 LópezCano e Opazo 2014 p 130 destacam que a investigação artística pode converterse em lugar de reflexão quando conseguimos pensar o mundo a partir do fazer Isto traz uma dimensão diferente de apropriação do produto musical tornando particular o produto da investigação Ao mesmo tempo todo o processo da prática investigativa gera um produto artístico a partir de onde expressamos os resultados da pesquisa idem p131 Os referidos autores ressaltam ainda que a prática artística oferece informação para a investigação mas também é um espaço de reflexão experimentação e comunicação da mesma observando que na investigação artística o que interessa é precisamente o acúmulo de ações que desenvolve o próprio autor da investigação ibidem p135 Assim instaurase o fazer reflexivo a reflexão após a prática e a realimentação de uma pela outra Ao mesmo tempo refletir teoricamente sobre a própria pratica artística requer um despirse das normativas academicamente convencionadas o que reitera as proposições das epistemologias feministas Falar em primeira pessoa trazerse para o centro do discurso e aprofundarse em seu próprio processo observando ressonâncias e particularidades são os desafios primeiros deste trabalho Ressaltamos este aspecto porque falar a partir das próprias realidades e percepções fere um suposto princípio ético de neutralidade da ciência que no entanto cremos que está alinhado com todos os outros aspectos normativos que geraram um modelo cientifico que permitiu emergir apenas a produção masculina branca e centro europeia como um suposto paradigma a ser alcançado e desprovido de ideologia A abertura da concepção de documento no campo da história que por consequência ressoa no ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 50 campo de todas as ciências humanas traz a micro história os relatos orais e pessoais as narrativas memoriais para o centro do discurso Além da abertura de possibilidades documentais as temáticas de gênero sexualidades raça e etnia etc emergem ainda como formas de entender o mundo que não podem mais ser consideradas como de uma pequena parcela da sociedade que se encontra apenas às suas margens Nesta perspectiva se insere este trabalho buscar uma escuta das margens a partir de nosso lugar de fala de nosso processo de produção de conhecimento atravessado por vivências desejos e dobramentos Ainda esta perspectiva lida de perto com um desejo de aprovação que tem feito de forma tácita ainda que nada fácil parte da formação feminina heteronormativa ocidental Educarse para estar apta a casar e cuidar dos filhos cuidar da aparência para fugir do estereótipo da loucura ao qual a medicina até a primeira metade do século XX associava as mulheres cuidar do corpo e manterse eternamente jovem como os ideais femininos que a indústria da moda defende diariamente e em sentido amplo Cuidar de si e manterse vinculada a um modelo feminino aceitável e controlado com o objetivo de aprovação pelos homens e pelas demais mulheres com vistas a poder concretizar um modelo de vida onde a validação da mulher se dá pela aceitação do homem seja pai marido professor ou colega e que não se torne uma ameaça para a comunidade feminina Este desejo de aprovação com o qual a construção da identidade feminina lida de forma ao mesmo tempo declarada e subliminar travestese na cultura ocidental de uma aura de a forma como apenas as coisas devem ser revestindose de uma crueldade ditatorial que afeta diretamente o estar no mundo para a imensa maioria das mulheres O tempo empregado em configurarse e perfazerse individualmente em um modelo exemplar de mulher mãe esposa amante profissional bemsucedida portadora mas não dona de um corpo cultivado dentro dos padrões ditados diariamente pelas propagandas novelas e meios de comunicação traz consigo um alto preço a ausência de foco na capacidade de realizar escolhas concretizar desejos e tomar decisões Veicular um modelo de feminino restrito e não diversificado do qual muitas mulheres simplesmente não farão parte porque sua estatura ou cor da pele naturalmente não atenderiam é apenas uma parte dele O modelo dominante inclui uma desqualificação prévia do trabalho intelectual feminino mediante modelos segundo os quais a priori a mulher pode desenvolver algumas funções tomando como exemplo a prática musical e não outras Lucy Green destaca que para este suposto ideal de feminilidade as mulheres professoras ou cantoras são mais aceitas do que as mulheres instrumentistas improvisadoras compositoras ou intelectuais GREEN 2001 As atividades que aproximam o fazer ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 51 feminino ao trabalho intelectual são consideradas transgressoras a este modelo e sofrem punições veladas e explícitas calcadas na desconsideração e menos valia do trabalho tácitas e aplicadas a priori onde a vinculação ao gênero determina o juízo de valor sobre o produto musical Outros modelos femininos foram excluídos e desconsiderados pelo discurso dominante na linhagem das liliths das bruxas das meigas das feiticeiras das benzedeiras das rezadeiras das curandeiras das videntes ialorixás das mulheres que assim se mantiveram no campo denominado cultura popular distante do modelo científico positivista asséptico e cartesiano No entanto a exclusão operou justamente para as que se mantiveram longe do discurso dominante aproximadas de um poder dado pelo conhecimento Desta forma trazerse para o centro do discurso e buscar compreender processos falar em primeira pessoa e destacar as subjetividades nele incluídas articuladas por desejos dobramentos e bordas que se materializam em discursos que dialogam com a poesia e o discurso musical se tornam o centro da proposição feminista com fortes ecos na pesquisa artística Buscar um processo de conhecimento que lide com a diferença com as possibilidades de tomar decisões sobre a postura acadêmica e artística como forma de estar no mundo de ocupar os espaços públicos e fazerse ver a partir da forma como se escolheu ser Assim o processo de apresentar estas possibilidades e compreender de forma crítica os processos produtivos traz em si a gênese do encorajamento da criação de elos de sororidade aprovação motivação do resgate do desejo de criar e da valoração das próprias memórias gerando finalmente redes de pertencimento e fortalecimento identitário que constituem nossa contribuição para o questionamento das formas de ser e estar no mundo Se produz assim uma outra memória de sonoridades repertórios e práticas e o estabelecimento de relações e sobreposições entre os campos de possibilidades musicais e estas memórias As epistemologias feministas cumprem desta forma a função de oferecer uma outra forma de escuta e olhar questionando a produção de conhecimento que prioriza a racionalidade o distanciamento e atrelado à ele o mundo masculino heteronormativo branco ocidental Assim a construção desta outra forma de olhar passa então por priorizar processos e não apenas produtos e a reflexão sobre nossos processos artísticos se torna então o centro deste texto Convidamos Anzaldúa para encerrar conosco esta reflexão quando observa que Contudo não é suficiente se posicionar na margem oposta do rio gritando perguntas desafiando convenções patriarcais brancas Um ponto de vista contrário nos prende em um duelo entre opressor e oprimido fechadosas em um combate mortal como polícia e bandido ambos são reduzidos a um denominador comum de violência O contraposicionamento refuta os pontos de vista e as crenças da cultura dominante e por isso é orgulhosamente desafiador Toda reação é limitada por e subordinada à aquilo contra o qual se está reagindo Porque o contraposicionamento brota de um problema com autoridade tanto externa ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 52 como interna representa um passo em direção à liberação da dominação cultural Entretanto não é um meio de vida A uma determinada altura no nosso caminho rumo a uma nova consciência teremos que deixar a margem oposta com o corte entre os dois combatentes mortais cicatrizado de alguma forma a fim de que estejamos nas duas margens ao mesmo tempo e ao mesmo tempo enxergar tudo com olhos de serpente e de águia Ou talvez decidamos nos desvencilhar da cultura dominante apagála por completo como uma causa perdida e cruzar a fronteira em direção a um território novo e separado Ou podemos trilhar uma outra rota As possibilidades são inúmeras uma vez tenhamos decidido agir em vez de apenas reagir ANZALDÚA 2005 p 706 Desejo Ação Subjetividades Sonhos Pensamentos Memórias Marcadores Desterritórios Veios Lentes Vôos AGRADECIMENTOS Isabel Nogueira agradeço à Rosa Antônio Jacy Lucia e Ernesta que me ensinaram em casa e no dia a dia sobre o estar no mundo a partir do seu olhar plural Agradeço à Laila Rosa pela interlocução terna e vigorosa e pelo aprendizado constante nas leituras e discussões sobre o feminino Agradeço a Luciano Zanatta pelas descobertas pelo amor pelas conversas e risadas de todos os dias Agradeço à Chico Machado Isadora Nocchi Martins Nikkolas Gomes Ferranddis Carlos Ferreira Ricardo De Carli Gilberto Oliveira e Davi Covalesky pelas parcerias musicais em Vestígios Violeta e Lusque Fusque Agradeço ao CNPQ IAUFRGS PPGMUSUFRGS e PPGMPUFPel pelo apoio Agradeço ao Grupo de Pesquisa em Criação Sonora UFRGS Grupo de Estudos em Música e Gênero UFRGS e ao Grupo SONORA pelas conversas e trocas sobre os temas da criação e do feminino Agradeço à Pedro Gabriel e Carolina por compartilhar o estar no mundo Laila Rosa em primeiro lugar agradeço à espiritualidade e a minha mãe Iemanjá ao Terreiro Xambá minha casa espiritual Agradeço as diversas interlocuções sobre Artevismos e feminismo negro e pós colonialidade que se fortaleceram com a amiga e parceira Carol Barreto Designer de moda doutoranda ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 53 do Programa de Pósgraduação em Cultura da UFBA e professora do Bacharelado sobre Gênero e Diversidade Interlocução que recentemente tem se estendido e fortalecido com esta linda parceria com a querida Isabel Nogueira Agradeço ainda ao Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher NEIMUFBA e ao Programa de PósGraduação em Música da UFBA Agradeço imensamente a Feminaria Musical grupo de pesquisa e experimentos sonoros que me fortalece como importante espaço de afetividade e transformação Por fim agradeço a todas as queridas parcerias musicais que fizeram parte do meu 1o cd e a Secretaria de Cultura do Estado da Bahia que viabilizou a realização deste projeto Axé Namastê REFERÊNCIAS ALCÂNTARA Neila O som das compositoras de Salvador da experiência etnográfica Relatório Final do Projeto de Iniciação Científica apresentado ao Programa PIBIC UFBA Salvador 2014 10p O som das compositoras de Salvador Relatório Final do Projeto de Iniciação Científica apresentado ao Programa PIBIC UFBA Salvador 2013 15p ALVAREZ Sonia E Construindo uma política feminista translocal da tradução Estudos Feministas Florianópolis Vol 173 SetDez p 743753 2009 ANZALDÚA Gloria La conciencia mestiza Rumo a uma nova conciencia Revista Estudos Feministas Tradução de LIMA Ana Cecília Acioli Florianópolis Vol 133 Setdez p 704719 2005 Falando em línguas uma carta para as mulheres escritoras do terceiro mundo Revista Estudos Feminista Florianópolis Vol 8 1 p 229236 2000 BENTO Maria Aparecida Silva Branqueamento e branquitude no Brasil CARONE Iray BENTO Maria Aparecida Silva Orgs Psicologia social do racismo estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil Petrópolis Vozes 2002 Pp 2558 BRAH Avtar Diferença diversidade diferenciação Caderno Pagu online n26 2006 Pp 329376 Disponível em httpwwwscielobrscielophpscriptsciarttextpidS0104 83332006000100014lngennrmiso Acessado em 10012013 CASTRO Luciana Martins A contribuição de Nísia Floresta para a educação feminina pioneirismo no Rio de Janeiro oitocentista Outros Tempos Vol 7 Número 10 dezembro Dossiê História e educação Pp 237256 2010 CITRON Marcia Gender and the Musical Canon Urbana University of Illinois Press 1993 COESSENS Kathleen CRISPIN Darla DOUGLAS Anne The artistic turn a manifesto Ghent Orpheus Institute 2009 CURIEL Ochy Hacia La construcción de un feminismo descolonizado MIÑOSO Yuderkys Espinosa org Aproximaciones críticas a las prácticas teóricopolíticas Del feminismo latinoamericanoVol I Buenos Aires En La Frontera 2010 Pp 6978 CUSICK Suzanne Feminist Theory Music Theory and the MindBody Problem Perspectives of New Music Vol 32 No 1 Winter 1994 Pp 827 Disponível em wwwjstororgstable833149 Acessado em 15082008 ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 54 DAVIS Angela Blues Legacies and Black Feminism Gertrud MaRainey Bessie Smith and Billie Holiday New York Vintage Books 1998 DELEUZE Gilles Guattari Félix Mil Platôs São Paulo Editora 34 1997 FREIRE Paulo Pedagogia do oprimido 50a ed Rev e atual Rio de Janeiro Paz e Terra 2011 Criando Métodos de Pesquisa Alternativa aprendendo a fazêla melhor através da ação BRANDÃO Carlos Rodrigues org Pesquisa Participante 8a ed São Paulo Brasiliense 1990 Pp 1022 GOMES Rodrigo Cantos Savelli Samba no feminino transformações das relações de gênero no samba carioca nas três primeiras décadas no século XX Dissertação Mestrado em Música Florianópolis UDESC 2011 GONZÁLEZ Juan Pablo Pensar la música desde américa latina problemas e interrogantes Santiago Ediciones Universidad Alberto Hurtado 2013 GREEN Lucy Música género y educación Madrid Ediciones Morata 2001 HARAWAY Donna Saberes Localizados a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial Cadernos Pagu 5 pp0741 1995 Disponível em httpperiodicosbcunicampbrojsindexphpcadpaguarticleview1773 Acessado em 02072008 hooks bell Ensinando a transgredir a educação como prática libertadora Tradução de Marcelo Brandão Cipolla São Paulo Editora WMF Martins Fontes 2013 LIMA Paulo Costa Teoria e prática do compor II diálogos de intervenção e ensino Salvador edufba 2014 LISPECTOR Clarice Água viva Rio de Janeiro Rocco 1973 LÓPEZCANO Rúben e OPAZO Ursula San Cristóbal Investigación artística em música problemas métodos experiencias e modelos Fondo Nacional para la Cultura y las Artes de México Barcelona Dezembro de 2014 LOURO Guacira Lopes Gênero sexualidade e educação uma perspectiva pósestruturalista Petrópolis RJ Vozes 1997 MELLO Maria Ignez Cruz Iamurikuma música mito e ritual entre os Wauja do Alto Xingu Tese Doutorado em Antropologia Florianópolis UFSC 2005 MOREIRA Talitha Couto Música Materialidade e Relações de Gênero Categorias Transbordantes Dissertação Mestrado em Música Belo Horizonte Universidade Federal de Minas Gerais 2012 NASCIMENTO Abdias NASCIMENTO Elisa Larkin Dança da decepção uma leitura das relações raciais no Brasil SD Disponível em httpwwwbeyondracismorgdancadecepcaohtm Acessado em 08112012 NOGUEIRA Isabel A construção das divas uma análise iconográfica de fotografias de mulheres intérpretes em programas de concerto ROCHA Luzia ed Iconografia Musical Autores de Países Ibero Americanos e Caraíbas Lisboa CESEMUniversidade Nova de Lisboa 2015 NOGUEIRA Isabel Iconografia musical em performance ou será que as formigas veem o céu de outra cor Conferência apresentada no 3º Congresso Brasileiro de Iconografia musical Iconografia música e cultura relações e trânsitos Salvador 2015a NOGUEIRA Isabel CAMPOS Susan orgs Estudosde gênero corpo e música Série Pesquisa em Música no Brasil 1a ed GoiâniaPorto Alegre ANPPOM 2013 v 3 NOLETO Rafael 2012a Poderosas divinas e maravilhosas o imaginário e a sociabilidade homossexual masculina ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 55 construídos em torno das cantoras de MPB Dissertação Mestrado em Antropologia Belém Universidade Federal do Pará 2012 Disponível em httpwwwacademiaedu2433377Poderosasdivinasemaravilhosasoimaginarioeasociabilida dehomossexualmasculinaconstruidosemtornodascantorasdeMPB Acessado em setembro de 2013 OLIVEIRA FILHO Pedro Amorim Compor no mundo um modelo de compor música sobre bases fenomenológicas Tese Doutorado em Música Salvador Universidade Federal da Bahia 2014 Blog Compor no Mundo Disponível em httpscompornomundowordpresscompage2 PALOMBINI Carlos Música Lésbica e Guei de Philip Brett e Elizabeth Wood notas de tradução PER MUSI Revista de Performance Musical v 8 p 157164 dez 2003 PAVLOSKY Eduardo Proceso Creador Terapia Y Existencia Buenos Aires ediciones Búsqueda 1982 RAGO Margareth Epistemologia feminista gênero e história PEDRO Joana GROSSI Miriam orgs Masculino Feminino Plural Florianópolis EdMulheres 1998 ROSA Laila Do meu canto em viva água percepções ou devaneios poéticos e filosóficos sobre criação musical performance e teorias feministas a partir de Água Viva um disco líquido 2015 No prelo Feminaria musical ou epistemologias feministas em música no Brasil Projeto de Iniciação Científica apresentado ao Programa Permanecer 2012 5p Feminaria musical ou epistemologias feministas em música no Brasil das experiências etnográficas Projeto de Iniciação Científica apresentado ao Programa PIBIC UFBA 2013 12p As juremeiras da nação Xambá Olinda PE músicas performances representações de feminino e relações de gênero na jurema sagrada Tese Doutorado em Música Universidade Federal da Bahia Salvador 2009 Disponível em httpwwwbibliotecadigitalufbabrtdebuscaarquivophpcodArquivo3600 Epahei IansãMúsica e resistência na nação Xambá uma história de mulheres Dissertação Mestrado em Música Universidade Federal da Bahia Salvador 2005 ROSA Laila CARDOSO Laura SOBRAL Rebeca Feminaria musical o que não se produz sobre mulheres e música no Brasil VII ENCONTRO NACIONAL DE ETNOMUSICOLOGIA Anais no prelo 2015 15p ROSA Laila IYANAGA M HORA E SILVA L ARAUJO S MEDEIROS Luciano ALCANTARA N Epistemologias feministas e a produção de conhecimento recente sobre mulheres e música no Brasil algumas reflexões NOGUEIRA Isabel CAMPOS Susan orgs Estudos de gênero corpo e música GoiâniaPorto Alegre ANPPOM 2013 vol 3 Pp 112128 SCOTT Joan História de mulheres BURKE Peter Org A Escrita da história novas perspectivas São Paulo Editora UNESP 1992 Pp 6395 SEGATO Rita Laura A folk theory of personality types goods and their symbolic representation by members of the shango cult in Recife Tese Doutorado em Música Belfast The Queens University of Belfast 1984 SOVIK Liv Aqui ninguém é branco Rio de Janeiro Aeroplano 2009 VARGAS Deborah R Dissonant Divas in Chicana Music The Limits of La Onda MinneapolisLondon University of Minenesota Press 2012 VERGUEIRO Viviane É a natureza quem decide Reflexões trans sobre gênero corpo e abuso de substâncias JESUS Jaqueline Gomes de e Colaboradores Transfeminismo teorias e práticas Rio de ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 56 Janeiro Matanoia Editora 2014 Pp 3047 WERNECK Jurema Pinto O samba segundo as ialodês mulheres negras e a cultura midiática Tese Doutorado em Comunicação UFRJ Rio de Janeiro 2007 WHITELEY Sheila RYCENGA Jennifer Queering the Popular Pitch New York Routledge 2006 ZANATTA L Música Popular Conferência durante o I ENCONTRO BRASILEIRO DE MÚSICA POPULAR NA UNIVERSIDADE UFRGS Porto Alegre UFRGS 2015 ZANATTA Luciano NOGUEIRA Isabel MACHADO João Carlos LusqueFusque Composición y Performance entre Canción y Musica Experimental Revista Sonic Ideas 2015 No prelo Gravações Isabel Nogueira Vestígios Violeta NOGUEIRA Isabel intérprete NOGUEIRA Isabel voz OLIVEIRA Gilberto baixo COVALESKY Davi violão SCHELLEMBERG Juan Pablo piano POPÓ Renato percussão Pelotas 2014 CD Projeto financiado pelo Programa Procultura da Prefeitura Municipal de Pelotas Violeta NOGUEIRA Isabel ZANATTA Luciano REVILLION Monique compositores NOGUEIRA Isabel voz ZANATTA Luciano computador e wavedrum FERREIRA Carlos guitarra Porto Alegre 2015 Canção do projeto LusqueFusque Gravação disponibilizada na plataforma virtual Soundcloud Azinconstâncias NOGUEIRA Isabel e ZANATTA Luciano compositores NOGUEIRA Isabel voz ZANATTA Luciano computador e wavedrum FERREIRA Carlos guitarra Porto Alegre 2015 Canção do projeto LusqueFusque Gravação disponibilizada na plataforma virtual Soundcloud Laila Rosa Água Viva um disco líquido ROSA Laila compositora e intérprete ROSA Laila voz violino rabeca cavaquinho guitarra baiana e direção musical CALDAS Julio voz guitarras violão de aço viola caipira e direção musical LOURENÇO Mauricio voz violão e direção musical HARDMANN Ricardo percussões MARIN Mariana voz e percussões SANTIAGO contrabaixos acústico e elétrico Com participações especiais diversas Salvador 2013 CD Projeto contemplado pelo edital Demanda Espontânea da Secretaria de Cultura do Estado da Bahia Disponível na plataforma virtual Soundcloud De sertão e arranhacéu ROSA Laila compositora e intérprete ROSA Laila voz Participações especiais AZEVEDO Gustavo pífanos e voz ARAÚJO Ana caracaxá BETO DA XAMBÁ ilú GUITINHO DA XAMBÁ voz IRAN DA XAMBÁ Ilú PUBLIUS bandolim e voz Música que integra o cd Água Viva um disco líquido Gravação disponibilizada gratuitamente da plataforma virtual Soundcloud Mar Azul ROSA Laila compositora e intérprete ROSA Laila voz e 1o violino Coletivo Os Ventos CALDAS Júlio violão HARDMANN Ricardo percussões MARIN Mariana percussões Participações especiais DURSO Renata viola FIGUEIREDO Priscila 2o violinoTAVARES Laís violoncelo NOBRE Cassio Ud Música que integra o cd Água Viva um disco líquido Gravação disponibilizada gratuitamente da plataforma virtual Soundcloud TAREFA A música é uma ferramenta pedagógica pois trata de diversos contextos e cenários promovendo assim indagações questionamentos e debates além de sensações e experiências Nesse sentido propõe novos caminhos de pensar e existir Impacta diretamente a imaginação a descoberta o suspense o conhecimento e diversos outras formas de sentir Nesse sentido pode ser caracterizada como veículo informativo uma vez que propaga diversos tipos de informações mesmo que de forma abstrata Dissemina informações relacionadas a política projetos instituições dentre outros A partir disso a comunicação entre povo com ele próprio se torna mais profunda e com diversas interpretações Embora uma música seja criada em determinada época e represente assim determinado cenário transpassa gerações e gerações e continua existindo A partir disso revoluciona pensamentos e óticas sociais afim de trazer informações de gerações passadas para uma geração atual e consigo diversas reflexões Outro ponto interessante se refere ao estímulo de criação musical a pensar na letra e no conjunto musical Isto é é necessário sentir a música antes de a criar de forma sólida é preciso construir seus versos a partir de uma ideia pensamento ou experiência E após ser desenvolvida ela passa de pessoa em pessoa de coração em coração e de pensamento em pensamento se tornando assim parte da história das pessoas e de suas construções existenciais Conforme o mundo muda e se desenvolve a forma de existir também se modifica bem como a forma de analisar todo o cenário a sua volta Nessa perspectiva quando um indivíduo cria uma música ele coloca um pouco de si mesmo ali o que embora eternizado em palavras muda conforme o tempo e estimula diversos sentimentos novos e os refaz a cada novo tempo Partindo desse pressuposto a música atual pode ser vista como heteronormativa e ao mesmo tempo não tendo em vista a forma como é interpretada e como é composta REFERÊNCIA ROSA L NOGUEIRA I O que nos move o que nos dobra o que nos instiga Notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista VÓRTEX Curitiba v03 n02 p 2556 2015
220
Literatura
UFSB
211
Literatura
UFSB
20
Literatura
UFSB
25
Literatura
UFSB
4
Literatura
UFSB
32
Literatura
UFSB
9
Literatura
UFSB
24
Literatura
UFSB
22
Literatura
UFSB
45
Literatura
UFSB
Texto de pré-visualização
ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 25 O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música1 Laila Rosa2 Universidade Federal da Bahia Brasil Isabel Nogueira3 Universidade Federal do Rio Grande do Sul Brasil Resumo Este texto discute aspectos teóricos das perspectivas feministas póscoloniais e traz uma reflexão sobre sua aplicabilidade e desdobramentos para a criação musical a partir de uma perspectiva que inclui marcadores sociais como gênero raça e etnia sexualidades classe social dentre outros Sob as lentes da abordagem feminista de conhecimento situado consideramos nossos trabalhos anteriores com musicologia e etnomusicologia Também pretendemos descrever os processos que tornaram possível assumirmos nossa identidade como compositoras e observar como a prática da criação sonora está profundamente relacionada a esta trajetória Descrevemos assim os processos de elaboração de nossos trabalhos autorais como cantautoras trazendo esta categoria para o centro do debate por sua articulação das figuras de compositora e intérprete e sua importância para o debate feminista Problematizando as ausências da produção musical das mulheres dos espaços musicais e acadêmicos 1 What Moves Us What Unfolds Us What Instigates Us Notes About Feminist Epistemologies Creative Processes Education And Transgressive Possibilities In Music Data de submissão 06112015 Data de aprovação 26112015 2 Sou cantautora pernambucana professora pesquisadora e militante Feminista integrante do Núcleo de Estudos Interdisciplinares da Mulher NEIMUFBA Praticante de Yoga Uma mulher do axé Filha de Iemanjá do Terreiro Xambá Olinda PE Sou professora da Escola de Música e dos Progamas de PósGraduação em Música e em Gênero Mulheres e Feminismo da UFBA Coordeno a Feminaria Musical grupo de pesquisa e experimentos sonoros Email lailarosamusicagmailcom 3 Sou compositora e performer musicóloga e professora do Instituto de Artes da UFRGS Coordeno o Grupo de Pesquisa em Estudos de Gênero Corpo e Música e participo do Grupo de Pesquisa em Criação Sonora e Grupo de Pesquisa em Práticas Interpretativas da UFRGS Sou professora e orientadora dos PPG Mestrado e Doutorado em Música da UFRGS e PPG Memória e Social e Patrimônio Cultural da UFPel Email isabelisabelnogueiragmailcom ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 26 buscamos também discutir possibilidades de atuação nestes contextos articulando os mesmos com os aportes teóricos dos estudos sobre gênero e música num sentido amplo Palavraschave Feminismo Criação Musical Pesquisa Artística Póscolonialidade Abstract This paper discusses theoretical aspects of feminist postcolonial perspective and offers a reflection on their applicability and consequences for musical creation from a perspective that includes social markers such as gender race and ethnicity sexualities social class and so on Under the lens of the feminist situated knowledge approach we take into account our previous work in musicology and ethnomusicology We also aim to describe the process that made it possible to assume our identity as songwriters and observe how the practice of sound creation is deeply related to this trajectory So we describe the making processes of our own work as cantautoras bringing this category into the heart of the debate for its articulation of the songwriter and the performer and its importance to the feminist debate By discussing the absence of women musical production in the musical and academic spaces we also discuss possibilities of action in these contexts articulating them under the theoretical approaches from gender and music studies in a broad sense Keywords Feminism Musical Creation Artistic Research Post colonialism ara começar a presente incursão musical feminista partimos de algumas questões como pensar música processos criativos performance e educação a partir de uma perspectiva das epistemologias feministas póscoloniais Quais as contribuições das mesmas epistemologias para reconfigurar este extenso panorama musical nosso de cada dia O que nos move e inquieta para trazer estas questões Quais outras trajetórias que nos inspiram para pensar sobre nossas próprias trajetórias e atuações musicais enquanto musicistas compositoras pesquisadoras educadoras e ativistas feministas Como ponto de partida trazemos referências musicais e feministas póscoloniais tais quais Gloria Anzaldúa 2000 ao falar em línguas sobre uma consciência fronteiriça e mestiça de poesia e enfrentamento criando uma nova língua aquela que refuta a hegemonia que não nos pauta não nos contempla não nos representa a produção de conhecimento heteronormativa branca sexista classista que nega e exclui a existência das mulheres enquanto criadoras pensadoras pessoas O que se configura numa verdadeira tentativa de extermínio de seus feitos e de sua existência Esta é também uma tentativa de organizar a reflexão sobre nossas composições nestas distintas esferas nossa forma de compor no mundo e sobretudo de possibilidade de existência OLIVEIRA P ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 27 FILHO 2014 Possibilidade de existirmos enquanto feministas que acreditam na dialogicidade freireana FREIRE 2011 e 1990 e na pedagogia feminista antirracista CASTRO 2010 LOURO 1997 hooks4 2013 como forma de transgressão descoberta e conhecimento ainda que no espaço institucional das nossas universidades e para além das mesmas É uma construção artística que por lidar com a poesia não quer dizer que esteja isenta de dor e de rupturas Ao contrário a poesia e a música nascem das rupturas e da dor que transformam É um processo criativo no sentido amplo onde ao criarmos caminhos artísticos e de produção de conhecimento próprios também nos reinventamos como pessoas Sobre a dimensão humana do ato criativo o psicanalista dramaturgo e ator argentino Eduardo Pavlosky 1982 nos traz interessantes reflexões sobre o grande esforço implicado no processo criativo que transita entre a loucura a descoberta o terror e ao mesmo tempo a superação dentre vários outros sentimentos e lugares afetivos Meu teatro é um esforço para superar a minha esquizoidia Sinto meus personagens às vezes como vômitos impulsivos que partem do mais profundo do meu ser Isto que está no palco em cada uma das minhas obras sou eu São meus sonhos minha loucura meu sadismo meus medos infantis meu medo da solidão meus terrores à vida minha claustrofobia Enfim o mais aterrorizante de mim Mas eles também são a minha constante superação de tudo que é assustador É ali no mesmo terror da minha solidão de onde surge o mais vital e mais intenso em minha vida o que eu mais quero de mim Não existe saúde sem reconhecimento profundo de nossa loucura Eu não acredito na sanidade neste mundo A rebelião transformadora é um constante esforço para superar um sistema despersonalizante Que corramos o perigo de tornarnos loucos não significa que não se tenha feito o esforço para encontrar o amor pela verdade A muitos dos que qualificamos como loucos devemos as grandes certezas deste mundo PAVLOSKY 1982 p 95 Dialogando com o referido autor propomos nossa pequena rebelião transformadora que sendo nossa e tão intimamente nossa não deixa de ser também coletiva a de outras sujeitas que se encontram nas inquietações artísticas nos artevismos na militância e na produção de conhecimento feminista Neste sentido ainda que consideremos a dimensão subjetiva como fundamental pois o pessoal é político não propomos uma narrativa de nossas obras sonoridades e desejos de modo 4 bell hooks é o pseudônimo de Gloria Jean Watkins que deve ser escrito propositalmente e sempre com as iniciais em minúsculo por uma questão política adotada pela autora estadunidense como denúncia da invisibilidade das mulheres negras da sociedade 5 Mi teatro es un esfuerzo por superar mi esquizoidia Mis personajes a veces los siento como vomitos impulsivos que parten de lo mas profundo de mi ser Eso que esta en el escenario en cada una de mis obras soy yo Son mis suenos mi locura mi sadismo mis miedos infantiles mi fobia a la soledad mis terrores a la vida mi panico al encierro En fin lo mas terrorifico de mi Pero tambien son mi constante superacion de lo terrorifico Es alli en el mismo terror de mi soledad de donde surge lo mas vital y lo mas intenso en mi vida lo que mas quiero de mi No hay salud sin reconocimiento profundo de nuestra locura No creo en la cordura en este mundo La rebelion transformadora es un constante esfuerzo por superar un sistema despersonalizante Que corramos el peligro de volvernos locos no significa que no se haya hecho el esfuerzo de buscar el amor por la verdad A muchos que calificamos como locos les debemos las grandes certidumbres de este mundo PAVLOSKY 1982 p 9 ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 28 individualizado apenas mas que estejam em consonância e em prol de um bem comum dos direitos humanos que incluem os direitos das mulheres da comunidade LGBTT das comunidades indígenas negras periféricas que ainda não estão representadas ou contempladas dignamente pelos estudos e ações em música Mas claro que de longe afirmamos representar todo este coletivo e sim nos conectar e solidarizar com suas agendas através de nossas atuações e interlocuções que falaremos mais adiante Claro que reconhecemos que o debate sobre gênero e feminismo em música no Brasil é emergente tendo rendido frutos de grande importância6 Contudo reconhecemos também que o mesmo ainda é incipiente na configuração de projetos e políticas públicas no que tange a materialidade do musical e dos seus sujeitos e sujeitas sobretudo nas áreas da educação musical e da etnomusicologia que assumem uma intervenção mais direta com comunidades instituições grupos etc como nos mostrou um mapeamento sobre produção de conhecimento sobre mulheres e música no Brasil ROSA et al 2013 considerando as interseccionalidades de raçaetnia das sexualidades classe social geração e demais marcadores sociais da diferença diversidade e diferenciação BRAH 2006 Caminhando para trabalhar nosso potencial criativo como uma tentativa de projeto solidário situado feminista e localizado no Brasil NordesteSulAmérica do SulAmérica Latina que burla a solidão a até o medo da morte dialogamos mais uma vez com Pavlosky 1982 p 7 ao afirmar que Todos estamos sozinhos isso é verdade Todos tememos a morte isso também é verdade Mas nossa vida pode ter mais alegria se aparece um sentido de projeto futuro Ali então a angustia frente à morte é atenuada na realização de um projeto solidário Por isto pensamos que a angústia existencial de um revolucionário latinoamericano é de uma qualidade diferente do que um pequenoburguês europeu 7 Contudo este projeto solidário e feminista para situar mais uma vez nossa fala nos termos da perspectiva de conhecimento situado HARAWAY 1995 extrapola o âmbito do escritosupostamente racional e científico e chegavem para odo corpo onde mora outro conhecimento o da experiência da vivência musical dos desejos mais íntimos de fazer uma música que nos acolha e nos represente que nos ponha em diálogo com outras tantas que compartilham experiências semelhantes Um espaço de empoderamento Obras que nos brotam escapam e já não mais nos pertencem que formam uma estrutura estética que gera também uma sensação que integra e repara 6 Desde os trabalhos pioneiros de Rita Laura Segato 1984 Maria Ignez Cruz Mello 2005 Laila Rosa 2005 e 2009 Rodrigo Gomes 2011 Carlos Palombini 2003 Rafael Noleto 2012 Talitha Couto Moreira 2012 a importante e pioneira coletânea Gênero Corpo e Música organizada por Susan Campos e Isabel Nogueira 2013 Jurema Werneck 2007 dentre outros 7 Todos estamos solos eso es verdad Todos tememos la muerte eso tambien es verdad Pero nuestra vida puede tener mas alegria si aparece un sentido de proyecto futuro Alli entonces la angustia frente a la muerte se mitiga en la realizacion de un proyecto solidario Por eso pensamos que la angustia existencial de un revolucionario latinoamericano es de diferente calidad que la de un pequenoburgues europeo ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 29 Minhas obras me brotam os personagens me escapam e já não me pertencem Parecem nascer do mais intimo do meu ser e em seguida se separam como filhos de uma mãe superprotetora Verdadeiro processo de luto Separação devastadora Independência alheia a minha vontade Seus projetos de filhos separados não correspondem ao meu projeto inicial Eles se desprendem do meu ventre e vivem sua vida São as vezes injustos maus filhos que não me obedecem Suas réplicas não são as que às vezes gostaria de ter colocado em sua boca como mãe que desejaria terlhes ensinado a falar o seu próprio idioma e eles se rebelaram falando à sua maneira Mas durante o momento criativo tudo é surpresa tudo é insólito como um pesadelo sem fim que não pode ser controlado Separação dolorosa mas também prazer pela magia da descoberta Esta maravilha do inusitado do inesperado do desconhecido de si mesmo se integra quando se consegue dar forma a uma estrutura estética e em seguida se adquire uma sensação de completude integradora reparadora PAVLOSKY 1982 p 178 Começamos pelas epistemologias feministas póscoloniais ainda juntamente com a pensadora e compositora dominicana Ochy Curiel 2010 que traz sua identidade cantante transgressora negra e lésbica como marcadores fundamentais de sua obra Pensamos composição como criação de mundos que criam sentido e sobretudo está relacionada a relações de poder Como entender os atos composicionais em suas relações com os campos de poder Campos de poder ou relações de poder que préexistem e até mesmo condicionam tais atos ou então de outra perspectiva campos de poder que são acionados pelas próprias escolhas que o compor exige e engendra O que pode uma composição Distintos modos de criar no mundo historicidade e mainstream e o desafio de construção de autonomia das assim chamadas periferias LIMA 2014 p 4950 A respeito de compor no mundo Pedro Amorim Oliveira Filho 2012 nos traz um interessante panorama de modelo composicional onde relaciona os aspectos contingenciais e operacionais do ato de compor onde os aspectos contingenciais consistem nas condições de compor contexto e inspiração e os operacionais consistem nas dimensões ou instâncias da composição materiais processos e forma Por fim na sua proposta de modelo os aspectos do compor se relacionam com os aspectos do mundo físico sensível e mental ou conceitual idem 2012 8 Mis obras me brotan los personajes se me escapan y ya no me pertenecen Parecen nacer desde lo mas intimo de mi ser y luego se separan como hijos de una madre sobreprotectora Verdadero proceso de duelo Separacion desgarradora Independencia ajena a mi voluntad Sus proyectos de hijos separados no corresponden a mi proyecto inicial Se desprenden de mi vientre y viven su vida Son a veces injustos malos hijos que no me obedecen Sus replicas no son las que a veces quisie ra ponerles en la boca como madre que quisiera ensenarles a hablar su propio idioma y ellos se me rebelaran hablando a su manera Pero durante el momento creador todo es sorpresa todo es insolito como una pesadilla interminable que no se puede controlar Desgarramiento doloroso pero tambien placer por la magia del descubrimiento Esa maravilla de lo insolito de lo inesperado de lo desconocido de uno mismo se integra cuando se logra plasmar una estructura estetica y entonces se adquiere una sensacion de completud integradora reparadora PAVLOSKY 1982 p 17 ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 30 Fig 1 Modelo de Compor no Mundo OLIVEIRA FILHO 2012 Apesar de reconhecermos tais questões sobre o compor no sentido amplo como pertinentes e assim também compormos nossas próprias narrativas e trajetórias reiteramos a importância do retorno às epistemologias feministas em detrimento ao suposto universal masculino do compor aquele que não toca na dimensão de gênero Retornamos então à perspectiva de uma reescrita da história SCOTT 1992 sobre processos do compor de performance de pensar e agir feministas E neste sentido somente autorases feministas e Queer em sua maioria contribuíram para esta ruptura fundamental de produção de conhecimento sobre o musical A reescrita de artistas negras mulheres pobres da classe trabalhadora que não tiveram acesso a escreverem sobre suas histórias por exemplo mas que através de suas performances e canções imprimiram conhecimentos e vivências de resistência negra feminina contra o racismo e o sexismo como nos mostra Angela Davis 1998 é uma reescrita fundamental para pensar sobre o musical que os trabalhos da área de música em sua maioria não aprofundam9 A autora propõe o estudo da música 9 A autora aborda as contribuições artísticas destas cantoras negras de blues estadunidense nas politicas de sexualidade que transformaram as relações de gênero nas comunidades negras de suas épocas When I first began researching the literature on blues and jazz women I discovered that with some significant exceptions the vast majority comprised either biographies or technical studies within the disciplines of music and musicology Im not suggesting that investigations of these artists lives and music are not interesting However what I wanted to know more about was the way their work addressed urgent social issues and helped to shape collective modes of black consciousness Because most studies of the blues have tended to be gendered implicitly as male those that have engaged with the social implications of this music have overlooked or marginalized women DAVIS 1998 xiv ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 31 como terreno para examinar uma consciência feminista histórica que reflete as vidas de mulheres negras cantoras e compositoras de blues estadunidense oriundas da classe trabalhadora das comunidades negras cujos trabalhos artísticos eram provocativos como representações estéticas de políticas de gênero e sexualidade idem p xv Cita os mesmos como possibilidades fascinantes de uma emergente consciência feminista no blues destas artistas de um lado da subserviência ao desejo masculino que de outro lado se transmutava para a expressão de um desejo e recusa que eram de grande autonomia feminista Outro aspecto importante que a autora trabalha é o papel da oralidade nessa reescrita da consciência feminista negra ibidem p xix Tais questões trazidas por Angela Davis nos remetem à teoria da música feminista e a questão da suposta dicotomia mente x corpo problematizada pela musicóloga Suzanne Cusick 1994 onde ressalta que uma teoria de música feminista ao invés de procurar se encaixar nas teorias já estabelecidas que focam apenas os aspectos racionais da mente busca fazer outras perguntas que considerem corpo e desejo num sentido amplo onde gênero e sexualidade assim como estão presentes na sociedade como aspectos estruturantes estão presentes também nas escolhas musicais composicionais eou da performance além é claro do próprio contexto no qual a pessoa está inserida De que forma e falando de nosso lugar sendo mulheres brancas com distintas trajetórias uma do nordeste e outra do sul podemos colaborar e reiterar esse enfrentamento a partir de nosso trabalho como educadoras e em nossas produções artísticas e de conhecimento uma vez que estas atuações estão intimamente relacionadas Por outro lado gênero raça e sexualidade que compõem dimensões não somente físicas mas históricas culturais políticas e também mentais psicológicas considerando sua dimensão afetiva e cognitiva sem determinismos mas que conferem a identidade e subjetividades marcas estruturantes que podem ser exploradas pelos processos criativos em música de compositoras como bem nos lembra Suzanne Cusick 1994 Igualmente propondo outros caminhos analíticos Deborah Vargas 2012 no seu livro Dissonant Divas afirma que os protagonismos de cantoras e musicistas da cena chicana do início do século XX se afirmaram como dissonantes em relação aos cânones musicais e patriarcais deste mesmo contexto E este ser dissonante passava pela performance música estilo estética experiência voz e instrumentação dentre outros aspectos que borravam fronteiras de identidades sociais10 A autora problematiza ainda como estas artistas não se encaixavam em padrões hegemônicos e normativos 10 A autora afirma que In Chicana Music assembles a dissonant cultural and sonic landscape of ChicanaTejana singers and musicians since the early decade of the twentieth century to the present who through performance song style aesthetics lived experience voice and instrumentation are incompatible inconsistent unharmonious and unsuitable with canonical ChicanoTejano narratives VARGAS 2012 p ix Cita cantoras e musicistas tais quais Rosita Fernández Chelo Silva Eva Garza dentre outras que have represented innovative instrumental and vocal stylings evoked new passions and politics of the erotic created new spatialities of belonging and modes of being ChicanaTejana that offer us an alternative understanding of borderlands social identitiesidem ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 32 dentro das narrativas da música chicana chamada de La Onda compondo subjetividades deslocadas das construções heteronormativas de gênero cidadania resistência de classe lar feminilidade e família Propõe portanto uma abordagem analítica de produção cultural e musical fronteiriça a uma lógica sexista de resistência e subordinação configurando relações de gênero e de poder 11 Em Queering the Popular Pitch WHITELEY RYCENGA 2006 a proposta consiste em problematizar sobre como o queering desafia estruturas não somente culturais e sociais mas também musicais invocando novos modos de escuta São caminhos analíticos diversos para considerar o espaço da música popular como de ambiguidade heteronormatividade e resistência ao mesmo tempo12 São dimensões subjetivas e coletivas que aqui também propomos onde corpo e política são a face de uma mesma moeda musical E este corpo tem história contexto conhecimento13 Por fim todas estas abordagens contribuem para esta nossa narrativa musical conjunta compondo também nossos repertórios no sentido de fortalecer a compreensão de nossos próprios processos criativos descobertas e desejos que ora apresentamos Nosso lugar de fala artistascantautoras pesquisadoras e educadoras Quem nós somos e o que nos move diante de tantas questões provocantes e desafiadoras São questões norteadoras que nos situam assim como situam nossas produções e desejos enquanto artistascantautoras pesquisadoras e educadoras Somos artistas musicistas compositoras musicóloga e etnomusicóloga respectivamente educadoras que se pensam com grande afinidade teórica e musical Somos cantoras pianista violinista e rabequeira respectivamente que buscam trazer para nossa produção de modo global as questões que nos movem bem como nossas identidades gaúcha e pernambucana corporificadas brancasheterasprofessoras universitárias de distintas trajetórias uma exanarcopunk de movimento estudantil de escola pública pernambucana na adolescência vivida em parte no interior e em parte em Recife outra que começou muito cedo suas perguntas escritas leituras 11 A feministofcolor analysis of theses figures cultural contributions by advancing a notion of musical dissonance a dissonance that I contend offers further complexity to analyses of gender and power within Chicanao cultural productionsVARGAS 2012 p x Music is never void of power and always the site of gender class sexuality and race politics For minority communities in the United States music has often been the mechanism for counterhistorical narratives selfrepresentation and cultural empowerment idem p ix E afirma ainda que Sounds marks place Music channels memory Memories establish a presence Place engenders social identities Social identities are given presence through music Sonic imaginaries processes histories Histories as canonical narratives silences ephemera oral tellings scandalous chisme gossip in the shape of dissonant figures are contested struggles over remembering idem p 1 12 Popular music for these authors is not a neatly squaredoff discourse rather it can be considered as a social force that constructs heteronormativity and resistant queer sexualitites idem p xiii 13 Queering to contemporary popular music issues concerning race and ethnicity forgotten histories the body in music and the use of popular music in power politics idem p xiii ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 33 e estudos de música moradora e ao mesmo tempo não se sentindo parte da cidade das charqueadas e dos casarões da praça Uma oriunda de família pobre da classe trabalhadora do interior de Pernambuco outra originária de família de classe média mais vinculada ao mercado público da cidade do que às tradicionais famílias e doçarias pelotenses Uma praticante de yoga e a outra praticante de macrobiótica acupuntura e homeopatia uma filha de Iemanjá e adepta ao candomblé e a outra filha de Iansã e Xangô que estudou em colégio de freiras mas nunca se sentiu parte de nenhuma religião definida Enfim são vários os nossos marcadores que atravessam nossas falas e nossas produções identidades identificações bem como desejos de intervenção e de interlocução Para pensar este nosso lugar amplo de distintas mas complementares atuações reformulamos o conceito de cantautora refutando o lugar de autoridade masculina de criador universal Na medida em que nos apropriamos do termo que é amplamente utilizado na língua espanhola na América Latina para designar compositora que interpreta suas obras propomos uma reformulação do mesmo em tradução para nossa língua não apenas designando esta identidade nossa de ser compositora mas ampliando o mesmo como sinônimo de artevismo feminista autoral que é ao mesmo tempo musical político e teórico Ou seja ser cantautora engloba o fazer musical nas instâncias que o mesmo nos atravessa tocar cantar compor pensar escrever ensinar militar enquanto feministas nos diversos espaços que transitamos Conforme destaca Juan Pablo González 2013 o trabalho da cantautora diferese da cantoraintérprete ou da cantadorafolclorista porque traz consigo a questão da autoria do interpretar a própria produção vinculada geralmente a temáticas políticas mas fundamentalmente por trazer seu pensamento e suas concepções para o centro do discurso musical Como assinala Citron 1993 p 81 se o compositor já é um outsider social a mulher compositora será duplamente outsider pois também o é do cânone profissional e artístico masculinizante González 2013 destaca que após sua chegada triunfal à cena criollista nacional a mulher pareceu experimentar um retrocesso como artista do folclore O autor observa que os movimentos de renovação do folclore latinoamericano dos anos 1960 e 1970 estavam baseados nos conceitos de autor e compositor a partir de uma tradição trovadoresca e com isto a forte inclinação masculina do cânone imperante percebia a mulher com falta de profissionalismo e originalidade algo que a musicologia feminista se encarregou de questionar Segundo González idem p 184 com exceção da mexicana Amparo Ochoa e da chilena Isabel Parra as poucas mulheres que participaram da cantautoria latino americana foram principalmente intérpretes como Mercedes Sosa condição na qual não aparece o homem O autor destaca que a chilena Violeta Parra é a grande exceção posto que irrompeu em um espaço reservado ao homem seja apropriandose do canto em décimas dos poetas populares chilenos ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 34 ou fazendo com que a palavra cantautor se pronunciasse também no feminino Segundo González Um cantautor deve compartilhar com seu público suas próprias vivências posições e visões de mundo por meio da canção e do ato performativo o que Violeta fazia com toda propriedade Para Violeta Parra a mulher está ao mesmo nível do homem no amor ela é a que escolhe a que convida a que ama que é deixada e também deixa de amar ibidem p 184 Em pesquisa que nós estamos iniciando em parceria a partir deste ano sobre compositoras de diversos gêneros musicais em Salvador e Porto Alegre constatamos a invisibilização das compositoras não somente na retórica do meio musical como também no desconhecimento de músicos e musicistas em relação a suas obras e atuações nos mais diferentes tempos históricos contextos e gêneros musicais E ainda de modo geral enquanto educadoras constatamos assustadoramente a exclusão de suas obras por parte de docentes nas suas aulas de música análise composição educação musical etc o que naturalmente reflete na formação dasos estudantes onde esta invisibilização é naturalizada Esta pesquisa cujo objetivo inicial foi de mapear compositoras atuantes em SalvadorBA ROSA 201114 vem trazendo no entanto boas surpresas Para chegarmos até as compositoras iniciamos conversas informais com diversas pessoas do meio musical dentro e fora da Escola de Música da UFBA e que atuam profissionalmente na área As respostas eram a princípio desanimadoras Parecia que as compositoras não existiam ou eram pouquíssimas e ainda pouco representativas nos seus trabalhos e atuações artísticas Felizmente para nossa alegria e também tristeza já contamos com um número acima de 100 Alegria por encontrarmos tantas Tristeza pelo fato de que ao encontrarmos tantas como seria possível que elas fossem simplesmente invisíveis para todas aquelas pessoas consultadas Atualmente eu Laila tenho lançado a simples pergunta a estudantes dos diversos cursos de música da Escola de Música15 onde leciono desde 2011 na graduação e PósGraduação e também estudantes do Programa de PósGraduação sobre Gênero Mulheres e Feminismo na UFBA você 14 O plano de trabalho O som das compositoras de Salvador integra o projeto de pesquisa Feminaria Musical ou epistemologias feministas em música no Brasil ROSA 2011 O mesmo vem sendo realizado desde 2013 ano de sua aprovação enquanto projeto de iniciação científica tendo sido contemplado com bolsas PIBIC da UFBA total de 15 bolsas até este ano de 2015 para estudantes de graduação contando também com tutorases da PósGraduação níveis mestrado e doutorado Para o referido plano de trabalho contamos com a colaboração das estudantes bolsistas Neila Khadi 3 anos consecutivos e Thalita Vieira ambas jovens musicistas atuantes no cenário de Salvador 15 Leciono a disciplina Apreciação Musical para estudantes de composição licenciatura instrumento e também estudantes do curso de música popular nas habilitações canto composição e arranjo e instrumento Sou ainda credenciada aos programas de PósGraduação em Música e de Gênero Mulheres e Feminismo ambos na UFBA onde desde 2012 oriento estudantes de mestrado e doutorado Ou seja é possível obter um panorama amplo deste desconhecimento musicais em relação a produção de compositoras e mais ainda de sua desvalorização generalizada como protagonistas de obras menores em relação aos grandes compositores que figuram no currículo e nas escolhas dos professores destes diversos cursos ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 35 conhece compositoras Ouve seus trabalhos Você já ouviu ou analisou obras de compositoras durante seu curso de graduação ou mesmo na pósgraduação para estudantes de música Infelizmente e já sem surpresa de minha parte a resposta foi massivamente negativa salvo raríssimas exceções como no caso de um estudante de composição cujo curso tem duração de seis anos e que em todo o curso ouviu uma compositora Já outro estudante de mestrado em composição afirmou nunca nem na graduação em composição nem no mestrado o que totaliza um período de cerca de 8 anos ao todo ouviu ou analisou obras de compositoras em sala de aula Naturalmente que no Programa de Pós Graduação em estudos sobre gênero a valorização de artistas e compositoras é reiterada mas como não é um programa sobre música o desconhecimento ainda é forte e expressivo infelizmente Estes são exemplos elucidativos de questões que nos movem e que interferem diretamente na formação dasos nossasos estudantes O projeto Mulheres Compositoras em Porto Alegre começou a ser desenvolvido em 2015 na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e conta com a bolsista Isadora Nocchi Martins e o bolsista Nikkolas Gomes Ferranddis e a realidade observada é a mesma que em Salvador uma produção bastante significativa ainda que invisibilizada O levantamento inicial realizado nestes dois meses de desenvolvimento do projeto mapeou trinta compositoras em atividade ressaltando que estes são números iniciais provavelmente muito distantes ainda da realidade embora as obras destas mulheres estejam também ausentes das audições de salas de aula e repertórios das salas de concerto A notícia boa desta discussão é que ao pesquisarmos sobre cantautoras feministas encontramos uma diversidade representativa L Herrera Menstruadora 2014 publicou no seu blog a informação de que Cantantes abiertamente feministas son tendencia Nos últimos anos têm aparecido novas e diferentes vozes em regiões da América Latina e outras partes do mundo que através de diversos gêneros musicais cantam dirigindose a outras mulheres sobre as formas com que resistem a diferentes opressões A continuação algumas destas que sem medo a enunciarse a partir do feminismo levantam a voz com ritmo16 No blog Una docena de Emi Escudero organiza Una docena de canciones feministas onde problematiza a questão da transmissão cultural e produção de estereótipos femininos em épocas e países diferentes nas artes em geral e que nem sempre tem significado uma imagem feminina positiva Mas que por outro lado sempre existiram mulheres fazendo arte buscando representar a si mesmas reivindicando desta forma dignidade e direitos Escudero destaca ainda a importância de uma 16 En los últimos años han aparecido nuevas y diferentes voces en regiones de América Latina y otras partes del mundo que a través de diversos géneros musicales le cantan a otras mujeres sobre formas en que resisten a diferentes opresiones A continuación algunas pocas de aquellas que sin temor a enunciarse desde el feminismo levantan la voz con ritmo ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 36 produção artística feminista onde canções e músicas defendem a igualdade e promovem o empoderamento das mulheres considerando sua diversidade sexual e afetiva17 Esta abordagem de cantautora feminista dada por ambas as autoras é a que nos instiga Seguimos existindo Mas não chegamos até aqui como compositoras desde o início de nossas trajetórias Esta identidade é fruto de um processo de empoderamento que construímos ao longo de nossas carreiras E neste momento a pensar sobre nossos processos criativos e no potencial feminista e transgressor nosso de compor É importante no entanto considerar a dimensão composicional da interpretação como nos alerta Rafael Noleto 2012 ao estudar a relação do público homossexual com as cantoras consideradas como divas mas que não são compositoras Contudo as mulheres atuando como musicistas são automaticamente pensadas como cantoras e no máximo instrumentistas Raramente como compositoras E o pior diversas cantoras reconheceram que compõem mas em suas falas diminuem suas produções ressaltando que mesmo compondo não se consideram compositoras Vivemos também este processo para nos afirmar enquanto compositoras Saímos dos nossos armários composicionais somente após relativamente estabelecidas enquanto pesquisadoras e docentes Atribuímos este autoreconhecimento tardio em relação a nossas respectivas atuações enquanto musicistas como fruto de um longo processo de investigação sobre gênero e música que para nós significou olhar para dentro para nossas próprias trajetórias E desta nos empoderarmos Logo trazemos todas as sujeitas e interlocutoras de pesquisa para este diálogo e para nossa própria autoafirmação E claro enquanto educadoras esperamos poder contribuir para o empoderamento de outras compositoras musicistas mulheres Deste desejo nascem nossos grupos de pesquisa Feminaria Musical grupo de pesquisa e experimentos sonoros da UFBA ROSA HORA SILVA 2013 ROSA et al 2013 e Grupo de Estudos em Música e Gênero da Universidade Federal do Rio Grande do Sul É atuando a partir da perspectiva da pedagogia feminista e da dialogicidade freireana que seguimos 17 A nadie se le escapa que la cultura de una sociedad es el reflejo de sus valores básicos valores que no son otra cosa que normas compartidas abstractas de lo que es correcto deseable y digno de respeto decir o pensar en una situación determinada La transmisión cultural se puede producir a través del arte en general de las artes visuales de la literatura los medios de comunicación la publicidad y por supuesto la música La presencia de las mujeres en el arte de todas las épocas y países no siempre ha significado algo positivo para nosotras pues nuestra imagen es la expresión de estereotipos sobre la condición femenina por tanto lo que debía y debe ser una mujer frente a lo que debe ser un hombre según la época la geografía y las tradiciones Por otro lado no toda la producción artística está hecha por varones ha habido y hay muchas mujeres que pintan esculpen escriben componen y construyen Sus obras ofrecen un mensaje diferente porque en ellas se representan a sí mismas no como lo prescribe el patriarcado sino en su realidad y con la consiguiente reivindicación de su dignidad y derechos Por qué feministas Porque el Feminismo a pesar de la dificultad existente por transmitir su verdadero significado a pesar de que hay todavía gente que lo entiende como lo opuesto al machismo y no conoce el verdadero significado del Feminismo es la corriente filosófica teoría política y social ideología y un conjunto de movimientos políticos culturales y económicos que tienen como objetivo la igualdad de derechos entre hombres y mujeres Por eso las canciones y la música feministas pueden y deben contribuir a crear un imaginario colectivo diferente al patriarcal Son aquellas canciones que rompen con estereotipos moldes con personajes encorsetados son canciones que defienden la igualdad y promueven el empoderamiento de las mujeres el respeto las relaciones sanas y la diversidad sexual y afectivaDisponível em httpunadocenadecomunadocenadecancionesfeministas ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 37 pensando e fazendo música com nossas estudantes e parceiras E ao nos considerarmos enquanto cantautoras nos conectamos também com nossas irmãs latino americanas feministas que através de suas diversas e particulares produções musicais propõem um artevismo que extrapola fronteiras o que novamente nos remete à consciência fronteiriça uma nova consciência a consciência mestiça lindamente proposta por Gloria Anzaldúa 2005 p 704 que citamos poeticamente Porque eu uma mestiza continuamente saio de uma cultura para outra porque eu estou em todas as culturas ao mesmo tempo alma entre dos mundos tres cuatro me zumba la cabeza con lo contradictorio Estoy norteada por todas las voces que me hablan simultáneamente Não queremos assumir que a consciência fronteiriça e chicana proposta por Anzaldúa possa ser simplesmente transplantada para nossa realidade brasileira Assumimos que fora do Brasil comungamos com esta identidade subalterna e fronteiriça latinoamericana Por outro lado em território nacional a mesma é reformulada pela perversa lógica racista da pigmentocracia brasileira NASCIMENTO e NASCIMENTO SD que estabelece uma paleta de cores de pele onde há uma hierarquização na gradação da mesma sendo a cor considerada clara não negra a mais privilegiada simbólica e materialmente Esta é a lógica da branquitude que independe de classe social pois como apresentam Aparecida Bento 2002 e Liv Sovik 2009 esta consiste num livre transitar diferenciado e desigual entre pessoas brancas e não brancas que se estende muitas vezes a uma desigual atuação representação e acesso no âmbito da música Nesta lógica da branquitude racista e da pigmentocracia ainda que em lugares distintos Sul Nordeste somos igualmente privilegiadas como brancas o que não nos irmana em sentido de igualdade com as mulheres não brancas negras e indígenas Em termos de classe social não nos irmana em condições de igualdade com as mulheres não escolarizadas e pobres oriundas da classe trabalhadora e da periferia Em termos das sexualidades da heteronormatividade e da cisgeneridade poeticamente denunciada por Viviane V 2014 ativista transfeminista não nos irmana em pé de igualdade com as mulheres lésbicas bissexuais eou trans Em termos de acessibilidade não nos irmana com as mulheres com deficiência por exemplo Assim como também não nos irmana em termos geracionais com as jovens ainda não estabelecidas no mercado de trabalho ou mais velhas e aposentadas por exemplo Como podemos perceber são dimensões fronteiriças diferenciadas e desiguais a serem ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 38 consideradas assim como já o fez Sonia Alvarez 2009 ao relatar sua própria vivência enquanto cubana não branca nos EUA e branca no Brasil propõe uma reflexão sobre um feminismo translocal que a depender do contexto nos posiciona num lugar de subalternidade EUA ou de privilégios Brasil Nossos múltiplos locais ou posições de sujeito mudam de forma crucial para a política da tradução de acordo com nossos movimentos e passagens por localidades espaçotemporais Nossas subjetividades são ao mesmo tempo baseadas no lugar e deslocadas ou mal colocadas Se eu sou uma cubanoamericana étnica no sul da Flórida e uma latina racializada na Nova Inglaterra no momento em que pouso em São Paulo eu me torno branca Mas incorporo essa branquitude provisória de maneira desconfortável pois tenho consciência das injúrias infligidas pelo racismo tanto no norte como no sul das Américas Apesar de menos flexível para os corpos mais negros devido ao fato da negritude a raça pode ser um significante móvel através das fronteiras ALVAREZ 2009 p 745 A saída proposta pela autora e que aqui comungamos nasce da solidariedade feminista antirracista que inclui também a anticlassista etarista capacitista heteronormativa e cisgênera Por outro lado em âmbito nacional nós duas igualmente brancas e professoras universitárias de instituições federais também nos encontramos em desigualdade em termos regionais simbólica e materialmente Sul Nordeste mas juntas fora do Brasil em âmbito estadunidense ou europeu estaremos igualmente classificadas e racializadas como latinas sul americanas sudacas Enfim questões que julgamos relevantes e inquietantes para nos pensar e pensar sobre nossas produções e atuações E claro pensarmos também na possibilidade de fortalecimento de uma sororidade musical e feminista Imbricação entre processos e produtos nos trabalhos fonográficos Nesta mudança de paradigma a forma de criar produzir e interpretar a música é de vital importância Os trabalhos que apresentamos aqui se inscrevem na categoria canção popular em um viés que dialoga com as tradições e também com a música experimental em uma concepção expandida da canção Calcada na improvisação como impulso gerador e formativo do trabalho adotamos ainda como premissa o fato de que concebemos e interpretamos nosso trabalho musical ressoando aqui o conceito da cantautora presente fortemente na América Latina conforme discutimos anteriormente Compartilhamos assim os processos de criação de nossos trabalhos musicais Água Viva de Laila Rosa e Vestígios Violeta e Lusque fusque de Isabel Nogueira Laila Água Viva é meu primeiro cd autoral que foi lançado em 2013 tendo sido contemplado pelo edital Demanda Espontânea da Secretaria de Cultura do Estado da Bahia O mesmo envolveu cerca de 35 musicistas e músicos entre artista e banda mais participações especiais de Pernambuco e ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 39 Bahia além das pessoas que trabalharam em outras áreas não diretamente musicais De modo geral o cd consiste numa ode poéticomusical que celebra o a obra homônima de Clarice Lispector 1973 juntamente aos arquétipos femininos das águas salgada e doce Iemanjá e Oxum respectivamente Aspectos mais detalhados sobre os arranjos e o cd como um todo já foram abordados em outro momento ROSA 2015 no prelo e portanto aqui serão discutidos aspectos relacionados aos textos de duas canções bem como relacionados às escolhas das sonoridades principais que conferem identidade a De sertão e arranhacéu e Mar Azul De sertão e arranhacéu que relata um pouco da minha trajetória pessoal musical e de inserção e atuação no campo da etnomusicologia ao qual dediquei cerca de dez anos pesquisando sobre os universos sagrados dos orixás e da jurema do terreiro de Nação Xambá onde posteriormente me tornei filha de santo Esta faixa conta com a participação especial do grupo Bongar que é um grupo de coco composto por filhos de santo do terreiro Xambá Vale ressaltar que a escolha do coco gênero musical tradicional afroindígena em compasso binário que rege esta canção se deve ao fato de que este é o gênero das entidades mestras da jurema sagrada religião afroindígena ROSA 2009 Outro aspecto especial a ser comentado a respeito do coco é que a vinheta de abertura desta música é o coco das estrelas um coco em homenagem às mulheres coquistas e mestras da cultura popular de Pernambuco de autoria de Dona Del do Coco coquista pernambucana Ambas as canções bem como o cd pode ser ouvidos integralmente na minha página do soundcloud httpssoundcloudcomlailarosa O caráter cíclico deste coco com o riff do bandolim em F com a seguinte sequência das notas Fá Fá FáMib 7o grau rebaixado para colorirRéFáFáFáSolFá que percorre toda música celebra a perspectiva da roda viva e do movimento da minha vida da não hierarquização como princípio que constitui a roda em diversas tradições culturais e musicais reforçando o conceito presente na capoeira do mundo que dá volta e eu caminho nele volta do mundo camará mundo dá volta camará De sertão e arranhacéu Coco de roda Punk rock Maracatu Baião Rabeca e pife De Sertão E Arranhacéu Quero compor uma canção Como se fosse um repente Daqueles que vem do luar Daqueles que vem do litoral ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 40 Daqueles que vem do coração Daqueles que vem Blues Café Rapadura Sertão Viola machete Cachoeira Federação O mundo que dá volta e eu caminho nele Quero compor uma canção Como se fosse ponto de mestra Daqueles que vem da jurema Daqueles que vem do Xambá Daqueles que vem do Bongar Daqueles que vem O mundo que dá volta e eu caminho nele Sou filha de Casa Amarela Sou cria do Rio Capibaribe O mundo que dá volta e eu caminho nele Volta do mundo camará O mundo que dá volta e eu caminho nele Mundo dá volta camará O mundo que dá volta e eu caminho nele Em relação ao texto vários elementos e vivências pessoais são pontuados compondo a dinâmica do discurso e materialidade musicais da adolescência punk sendo filha de Casa Amarela bairro de periferia de Recife e também cria do Capibaribe rioreferência de Pernambuco narrado no poema de João Cabral de Melo Neto no clássico Morte e vida Severina musicado por Chico Buarque Das minhas vivências sigo para a descoberta da cultura popular pernambucana coco de roda punk rock maracatu baião e do contato estreitado a partir da vida em Carpina cidade do interior pernambucano onde vivi até a adolescência e acompanhei diversos folguedos populares Posteriormente da etnomusicologia que me levou a resgatar o CavaloMarinho folguedo tradicional popular que havia conhecido ainda na infância em Carpina e onde a rabeca é instrumento solista Foi por conta da etnomusicologia que fui levada ao Terreiro Xambá Olinda PE pela primeira vez em 1999 como bolsista de iniciação científica do Prof Dr Carlos Sandroni Foi lá onde conheci e me aproximei afetivamente e espiritualmente dos universos dos orixás e da jurema sagrada Mas neste coco as mestras ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 41 da jurema é que são as principais homenageadas Ao mesmo tempo o texto trata dos trânsitos e hibridismos que saem do tradicional muitas vezes concebido como estático circulando entre o sertão e o arranhacéu o interior e a capital o terreiro e os palcos do mundo Sabese que em Pernambuco sempre foi forte uma movimentação artística de trabalhar com referências da cultura popular pernambucana tradicionais na música popular e de concerto como uma estratégia de reafirmar identidade musical pernambucana Isto aconteceu desde o Movimento Armorial nos anos 70 que teve em Ariano Suassuna uma grande referência e de onde surgiu o artista o compositor cantor violinista rabequeiro e dançarino Antônio Nóbrega por exemplo aos movimento musicais experimentais progressivos e psicodélicos como o clássico disco Paêbiru de Zé Ramalho e Lula Cortes 1970 e toda uma geração de artistas como Alceu Valença e Geraldo Azevedo até o Mangue Beat nos anos 90 que acompanhei de perto Tendo este último movimento fortalecido um protagonismo musical de artistas atuantes na periferia movimento Hip Hop e grupos tradicionais de maracatu e coco dentre outros e através sobretudo e Chico Science e Nação Zumbi alcançado uma projeção internacional A segunda canção representativa do meu cd é Mar Azul tema que traz como vinheta de abertura a canção Odomiô que significa uma das saudações a Iemanjá de autoria de Dona Graça do Coco coquista pernambucana e com arranjo para quarteto de cordas de Aaron Lopes compondo um diálogo fronteiriço entre o tradicional gênero musical o coco e o universo das cordas friccionadas De modo geral o tema que foi orientalizado com a presença do Ud instrumento tradicional do universo turco e árabe Costurando uma conexão com o oriental presente no Nordeste onde temos a forte presença de comunidades ciganas que são invisibilizadas e também de entidades espirituais ciganas como é possível perceber nas experiências das juremeiras protagonistas da minha tese de doutorado ROSA 2009 Mar Azul agrega mares plurais infinitos poderosos que nos diferenciam e nos conectam Mar azul Uma luz brilha sobre a mulher Que ama a si Uma luz brilha sobre a mulher Que é singular A fulana que ama o mundo Negra Branca Índigena Feminino plural A mulher tem consciência Se ela for de enfrentamentos ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 42 Infinito feminino De qualquer parte que seja Uma luz brilha sobre a mulher Que dá a luz Uma luz brilha sobre a mulher Que é divindade Iemanjá que traz a luz Como mulher dágua Fluida e forte Iemanjá A mulher de tantas faces Feminino em mar azul Infinito feminino De qualquer parte que seja Como é explícito no texto considero este como um dos temas mais expressamente feministas e de empoderamento feminino do cd onde a autoestima feminina tão bombardeada pela cultura sexista e racista é a tônica sendo cantada como uma luz que brilha sobre a mulher que ama a si em primeiro lugar e onde a mulher tem consciência se ela for de enfrentamentos A luz aqui se refere a esta consciência feminista que é plural negra branca indígena etc ou seja feminino plural E por isso falamos sobre feminismos pois para falarmos sobre sororidade entre as mulheres precisamos reconhecer nossas diferenças e também nossas desigualdades Ao mesmo tempo a luz vem da benção de Iemanjá meu orixá de cabeça estando relacionada à espiritualidade arquetípica do candomblé e especificamente deste orixá feminino que é a mãe de todos os orixás Neste momento há também uma reverência ao poder da maternidade e da vida onde uma luz brilha sobre a mulher que dá a luz Após reiterar em primeiro lugar a autoestima da mulher que não nasceu para procriar e detém a autonomia do seu corpo trato da questão da maternidade situando políticas de afirmação do direito ao próprio corpo e a existir a parir em condições dignas humanizadas Vale ressaltar que de modo geral mulheres pobres negras e indígenas não têm acesso a um sistema de saúde qualificado nem para parir nem para abortar em condições dignas e humanizadas diferentemente das mulheres de classe média sobretudo brancas18 Portanto diante de tantos 18 No Brasil estamos vivendo neste momento uma onda conservadora que promove tentativas de retrocessos dos direitos das mulheres como é o caso da PL5069 do Deputado Eduardo Cunha PMDBRJ que de forma negativa reconfigura o próprio conceito de violência e propõe a retirada do direito ao acesso à pílula do dia seguinte para mulheres vítimas de estupro Ou seja obrigando as mulheres a levarem uma gestação indesejada fruto de violência sexual e ainda retirando delas o direito ao aborto que consta da constituição desde os anos 40 Nós feministas de todo o Brasil fomos às ruas para gritar Fora Cunha reivindicando nossos direitos e autonomia sobre nossos corpos ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 43 enfrentamentos peço a benção de Iemanjá poderosa e infinita como o mar que pode ser calmo acalentador e sereno mas que também pode ser arrebatador São diversos lugares e possibilidades de feminino que se resumem no infinito feminino de qualquer parte que seja Isabel Desde muito cedo comecei meus estudos de piano ao observar a pianista que acompanhava as aulas de ballet que eu frequentava Ao mesmo tempo que o aprendizado da música comecei aos oito anos a escrever poesias e histórias algumas breves outras mais longas Ao terminar o bacharelado em piano fui realizar o doutorado em musicologia em Madri onde me reconheci como latinoamericana e como brasileira frente à uma outra comunidade que me considerava como pertencente à uma massa de pessoas identificadas coletivamente como sudamericanas ou sudacas Retornando ao Brasil em 1997 prestei concurso para a Universidade Federal de Pelotas onde comecei a desenvolver um trabalho de pesquisas em musicologia sobre o acervo documental do Conservatório de Música desta instituição que em 2002 resultaria na fundação do Centro de Documentação Musical Analisando os livros de matrículas de alunas e alunos do Conservatório de Música da UFPel me surpreendia o número de matrículas de meninas e este interesse estendeuse logo para o estudo das fotografias e dos programas de concerto do acervo da instituição A partir da leitura das fotografias minha percepção sobre as mulheres que estiveram realizando concertos na cidade vindas de diversos lugares moldava meus questionamentos e reflexões sobre as construções de gênero na música e a performance constituída a partir destes fazeres Como eu nunca havia lido nada sobre estas mulheres Que silenciamento operava para que não estivessem nos livros de história da música Para que mal se tenha ouvido falar delas Através dos conceitos de LópezCano e Opazo 2014 sobre a pesquisa artística fui operando um entrelaçamento entre o que os documentos me faziam pensar e minha subjetividade a reflexão através da pratica manifestouse no refletir sobre o que se fez trazendoo novamente para modelar este fazer motivando um novo processo de reflexão Piano e musicologia se cruzaram entrelaçando então com canto e composição originando os trabalhos artísticos Vestígios Violeta 2014 e Lusquefusque 2015 Vestígios Violeta 2014 é um disco de canções e poemas que busca destacar a dimensão composicional da performance considerando que o processo de escolha do repertório e da elaboração dos arranjos e os desdobramentos e redes de pertencimento gerados para e a partir destas escolhas transformam o processo interpretativo em processo criativo O trabalho foi financiado pelo Programa Procultura da Prefeitura Municipal de Pelotas RS foi produzido e arranjado por Gilberto Oliveira com direção artística de Isabel Nogueira Foram escolhidas canções em português e em espanhol de compositoras e compositores do ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 44 Brasil e América Latina pontuando e sublinhando o sul do Brasil como lugar de pertencimento e intercâmbios entre fronteiras onde o idioma e os aspectos culturais perpassam os limites geográficos e configuram uma região com elementos similares As compositoras interpretadas foram Violeta Parra Chabuca Granda Déa Trancoso na tradição das cantautoras latinoamericanas e brasileiras e as poetas foram Angélica Freitas e Monique Revillion Incluir estas obras era para mim uma declaração de princípios de identidade e feminismo especialmente pela trajetória de Violeta e seu amálgama artevida do qual falarei mais detalhadamente a seguir O título do CD foi efetivamente uma homenagem à ela e aos vestígios de sua atuação em minha vida reunindo em sua atitude de cantautoria e no reivindicar suas raízes mapuches elementos que não haviam sido antes reunidos Para mim uma das canções mais fortes e significativas de Violeta Parra escolhida foi Maldigo del alto cielo uma maldição cheia de vigor e fúria contra o mundo e seus destinos Percebo Violeta Parra como uma das artistas mais intensas desta região cultural do sul da América à qual não se pode ficar indiferente E este sentimento se mistura para mim com a própria situação da mulher e do feminismo posto que uma vez que se percebe a sua estrutura não se pode ficar indiferente a ela Lusque fusque 2015 é um trabalho de criação de canções composto e interpretado em parceria com Luciano Zanatta a partir de improvisações sobre materiais prégravados sobre os quais é realizada a performance Lusquefusque faz referência à hora do dia onde as fronteiras claroescuro se diluem onde a luz difusa não deixa perceber exatamente se ainda é dia ou se já se fez noite O trabalho evoca os borramentos e dobras do conceito canção e os desdobramentos das epistemologias feministas Na perspectiva do trabalho sobre canções pesquisa artística e epistemologias feministas o trabalho de Lusque fusque teve como um de seus eixos condutores a perspectiva de trazer para o centro do discurso a perspectiva da apropriação ZANATTA 2015 Apropriação de formas de compor e interpretar dialogando diretamente com a ideia da cantautoria posto que as canções foram compostas para ser interpretadas pelo grupo Abordadas como um texto gravado sobre uma base previamente composta as canções foram construídas aproximando canto voz falada voztimbre voz expandida desvios de afinação processamento digital recortes de gravação tensões temporais com deslocamentos métricos e ambiguidades rítmicas sobre batida O processo de criação das canções foi configurado a partir de materiais précompostos sequências programadas ou patches modulares virtuais As canções incorporam como textosignificado relações amplas com estruturas sonoras onde incluemse os conflitos programados em harmonia contrapontos timbres e tempos ZANATTA NOGUEIRA MACHADO 2015 Para este trabalho farei referência à duas canções Violeta e Azinconstâncias ambas do projeto Lusquefusque 2015 Como uma continuidade do trabalho fonográfico Vestígios Violeta a canção ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 45 Violeta fez parte de um conjunto de três canções que se debruçaram sobre as histórias de vida de três cantautoras latinoamericanas Violeta Parra Chile Chabuca Granda Peru e Maria Elena Walsh Argentina A partir de uma recriação ficcional pela escritora porto alegrense Monique Revillion na forma de uma contação de histórias sobre os dados biográficos das compositoras entre eles o bilhete de suicídio de Violeta Parra as canções foram concebidas Trazemos assim relatos de vida que incluem a trajetória de Maria Elena Walsh importante compositora com uma sólida obra de música para crianças mas que teve sua posição política e sua sexualidade lésbica como fortes marcadores e de Chabuca Granda que buscou trazer para sua música as referências afro peruanas e teve o divórcio como marcador social em sua vida Juan Pablo González destaca que Violeta Parra possui uma terceira condição de outsider a de encarnar uma alteridade social de componentes culturais étnicos e de classe Se trata de uma encarnação que se realiza performativamente posto que é sobre o palco na radio e no disco que Violeta exerce como cantora camponesa e reinvindica raízes mapuches definitivamente onde coloca em pratica sua alteridade social Em sua opção artevida Violeta Parra encarna sua condição de outsider a partir de sua atividade artística fazendo do mundo seu cenário e de seu cenário o mundo GONZÁLEZ 2013 p 185 Trago aqui a letra da canção Violeta do projeto Lusquefusque a partir da historia recriada por Monique Revilion Vou contar um segredo que nunca contei a ninguém quando eu era jovem e algum rapaz me interessava pedia a ele que tentasse adivinhar meu nome Era uma brincadeira um jogo gostava de ouvir meu nome dito por outra pessoa Nenhum deles acertou Um jogo de adivinhar O começo de todo amor a curiosidade verdade simples Como uma mulher de talentos e habilidades sou uma aranha armadeira deste deserto a perder de vista capaz de tecer pintar bordar modelar o barro tocar cantar habilidosa operária em minhas oito negras patas agarrandose em sua arte para não ser esquecida Minha teia no entanto não foi feita para agarrar sonhos como as que tecem as artesãs contas e pedras penduradas em varandas agarrando a sorte Os sonhos aqui duraram pouco sou contemporânea desta era de pesadelos e em meu país há mais o que denunciar do que cantar ainda assim eu canto e minha voz é meu destino e minha circunstância Me chamo Violeta mas não estou muito segura Tenho cinqüenta anos à disposição do vento forte ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 46 E a mim me coube tudo muito seco ou muito salgado mas assim é a vida uma agitação desordenada que não se compreende O inverno se instalou no fundo da minha alma e duvido que em alguma parte exista primavera Já nada me interessa nem nada mais quero ver Então coloco a cama diante da porta e me vou No projeto Lusquefusque as letras das canções nem sempre ocupam um papel central no tempo da canção Seu protagonismo alcança lugar as vezes por configurarse em uma vinheta final ou de abertura ou por receber processamentos que transformam o timbre Além da desterritorialização da voz como centro da canção se trata de lidar com um novo lugar de associações onde o produto voz não pode ser diretamente associado à fonte sonora que o gerou Para mim isto significa o novo olhar que o feminismo possibilita uma nova lente para ver o mundo onde se configura portanto um novo lugar Este trecho para mim simboliza isto Tem uma lente que muda o olho de quem quer ver sob o olhar que invade tudo que a gente pensou em ser Por fim trago uma cançãotexto também de Lusquefusque em que o reconhecimento das maleabilidades das trajetórias do agregar as diferenças minhas e alheias em favor de uma não obtusidade com relação à diversidade é o tema Azinconstancias canção e texto recitado Choro em lágrimas Verto intempestades Onde ainda posso ir Por onde ainda posso andar Derreto ausências Verto ansiedades Urgências de um lugar qualquer Pintar o chão com os pés no ar Fui ensinada a ser calma contida discreta e me movimentar devagar Não discutir não brigar não fazer ruído não chamar atenção não discordar Ser amável esperar e calar Ao dirigir a palavra desviar o olhar Temer que meus olhos digam mais do que quero ouvir Temer até o que nem sei que temo Desejei ser invisível e não precisar impor minha presença a ninguém Não ter que responder pelo que fiz ou pensei Não falar não dizer não pensar só viver uma existência quase etérea sem ânsias incômodos ou quereres extremos ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 47 Mornidão quietude silêncio Nos dias diáfana presença aérea e angelical Nas noites cultivo olhares fixos dirigidos ao infinito Mas em alguma parte de mim vive algo que é outro Que se desborda sem que eu saiba do que é feito Que deseja o que não conheço com a força das madrugadas Esperei paciente que se acalmasse e não ferisse meus silêncios Uma e outra vez esperei Agora já não quero que silencie Quero que fale com a voz que tenha e os escuto Estas ânsias movências tempestades vulcões e dissaberes são todos meus E os acolho com a leveza do estar em casa e a certeza das inconstâncias Considerações finais As tramas da subjetividade desafios desejos e dobramentos Falar da própria produção musical lida diretamente com as dificuldades por uma parte do falar de um processo artístico com o qual se está diretamente envolvida e que possivelmente por isto se possa oferecer um olhar absolutamente peculiar sobre as motivações e desejos envolvidos e por outro de não poder oferecer o distanciamento analítico que se tornou o modelo predominante em alguns círculos do campo da composição musical No entanto nossa intenção é justamente questionar os paradigmas deste modelo dominante que junto com as perspectivas de análise supostamente isentas de envolvimento pessoal elevou à categoria de método cientifico um discurso hegemônico falsamente neutro e com isto buscando disfarçar um lugar de poder autoridade e dominação do masculino branco e europeu Se os saberes que não se enquadram neste modelo foram considerados subalternos menos científicos e com isto não são valorizados pela tradição acadêmica construída é justamente este lugar que queremos questionar e por isto nossa fala se centra precisamente na escolha do falar sobre nosso próprio trabalho desejos e processos artísticos Ao mesmo tempo em que buscamos assim trazer a reflexão sobre nossa experiência para o centro do discurso desejamos fazer de um relato pessoal uma possibilidade de trabalho como forma de espelhamento e possibilidade de transmissão de saberes mas sobretudo uma via expressiva de relatos sobre o fazer artístico Pretendemos neste processo incorporar as reflexões trazidas pelas epistemologias feministas que pretendem não apenas a inclusão das relações de gênero na leitura das sociedades mas o questionamento do processo mesmo de produção de conhecimento construído a partir de relações de poder privilegiando os processos racionais em detrimento da subjetividade considerando alguns protagonistas ambientes e documentos como mais válidos do que outros NOGUEIRA 2015 Assim a epistemologia feminista defende o relativismo cultural a historicidade dos conceitos e coexistência de temporalidades múltiplas RAGO 1998 ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 48 A autora destaca que os estudos feministas abrem possibilidades abertas que não se restringem a novos temas ou a uma política compensatória que inclua as mulheres nas narrativas históricas mas descortinam um olhar sobre novos suportes e temas aliado à um pensar feminina e subjetivamente sobre as práticas do pensar e escrever acadêmico Na história do pensamento feminista a reflexão segue a experiência operase uma deshierarquização dos acontecimentos as práticas passam a ser privilegiadas em relação aos sujeitos sociais a realidade já não cede à necessidade de encaixarse na teoria previamente moldada No cotidiano das relações acadêmicas no entanto a vivência diária da exclusão das mulheres nos repertórios veiculados e considerados nas orquestras concursos de composição nas obras na programação dos concertos nos livros de história da música ou outros papeis de protagonismo é uma realidade tão presente que passa a ter status de uma suposta condição de normalidade Trazer a produção feminina para o centro do discurso pretende então lidar não apenas com estes mecanismos de exclusão de protagonismos instituídos mas também com os mecanismos velados da negação de toda e qualquer possibilidade de ocupação do espaço público cotidiano ou simbólico Estes mecanismos se traduzem por uma parte na dificuldade de lidar compreender espelharse ou se inserir nos espaços públicos de atuação Não apenas de ascender aos espaços mas ainda além da possibilidade de buscar criálos De que forma buscar argumentos para justificar para uma maioria masculina que a ausência de mulheres não é só uma forma normal mas um silenciamento de uma parcela significativa da produção musical Manterse falando a partir das margens e buscar interlocução apenas com os pares ou buscar inserirse nos meios instituídos lidando com os mecanismos de validação que excluem os trabalhos e os modos de produzir das mulheres Neste sentido este estudo busca intencionalmente trazer para o centro do discurso não apenas uma temática de inclusão do trabalho das mulheres mas uma perspectiva de pesquisa onde a reflexão sobre o próprio processo suas motivações e desejos são o centro do trabalho Discutir não apenas produtos acabados mas seus processos formativos e generativos Buscamos para isto apoio nas epistemologias feministas e na pesquisa artística que defende a produção do conhecimento a partir da própria pratica e de como a observação e reflexão sobre estes processos engendram modificam e retroalimentam a prática artística Mais além da composição ou criação musical buscamos então dialogar com a área da pesquisa artística modalidade de trabalho acadêmico investigativo que tem o processo criativo e o produto artístico como foco e objetivo A investigação artística se desenvolve através da imersão doa artistapesquisadora nas ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 49 atividades de criação e reflexão a respeito do processo do reconhecimento de seu lugar de fala e de escuta do mundo e do retorno destas reflexões à sua própria prática desenvolvendo uma documentação que reflita dos procedimentos metodológicos adotados para o trabalho Coessens Crispin e Douglas 2009 argumentam a favor de uma virada artística artistic turn no ambiente acadêmico onde a cultura da pesquisa artística implica na desterritorialização das fronteiras estabelecidas entre os paradigmas do campo da pesquisa científica e das artes O conceito de desterritorialização adotado pelas autoras referese às ideias de Deleuze e Guattari 1997 p 508 de um processo que tira o território de uma entidade previamente existente abrindo as fronteiras e possibilitando a alteridade e a diferença As autoras destacam que na pesquisa artística a metodologia adotada assume formas hibridas onde o objeto determina o método a ser utilizado e as fontes são oriundas de práticas artísticas da literatura de pesquisa e de processos artísticos O material de pesquisa pode incluir entre outros interpretação processos de criação comparação com criações similares e o estudo da relação entre a manifestação artística e sua recepção Ibid Id p 68 LópezCano e Opazo 2014 p 130 destacam que a investigação artística pode converterse em lugar de reflexão quando conseguimos pensar o mundo a partir do fazer Isto traz uma dimensão diferente de apropriação do produto musical tornando particular o produto da investigação Ao mesmo tempo todo o processo da prática investigativa gera um produto artístico a partir de onde expressamos os resultados da pesquisa idem p131 Os referidos autores ressaltam ainda que a prática artística oferece informação para a investigação mas também é um espaço de reflexão experimentação e comunicação da mesma observando que na investigação artística o que interessa é precisamente o acúmulo de ações que desenvolve o próprio autor da investigação ibidem p135 Assim instaurase o fazer reflexivo a reflexão após a prática e a realimentação de uma pela outra Ao mesmo tempo refletir teoricamente sobre a própria pratica artística requer um despirse das normativas academicamente convencionadas o que reitera as proposições das epistemologias feministas Falar em primeira pessoa trazerse para o centro do discurso e aprofundarse em seu próprio processo observando ressonâncias e particularidades são os desafios primeiros deste trabalho Ressaltamos este aspecto porque falar a partir das próprias realidades e percepções fere um suposto princípio ético de neutralidade da ciência que no entanto cremos que está alinhado com todos os outros aspectos normativos que geraram um modelo cientifico que permitiu emergir apenas a produção masculina branca e centro europeia como um suposto paradigma a ser alcançado e desprovido de ideologia A abertura da concepção de documento no campo da história que por consequência ressoa no ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 50 campo de todas as ciências humanas traz a micro história os relatos orais e pessoais as narrativas memoriais para o centro do discurso Além da abertura de possibilidades documentais as temáticas de gênero sexualidades raça e etnia etc emergem ainda como formas de entender o mundo que não podem mais ser consideradas como de uma pequena parcela da sociedade que se encontra apenas às suas margens Nesta perspectiva se insere este trabalho buscar uma escuta das margens a partir de nosso lugar de fala de nosso processo de produção de conhecimento atravessado por vivências desejos e dobramentos Ainda esta perspectiva lida de perto com um desejo de aprovação que tem feito de forma tácita ainda que nada fácil parte da formação feminina heteronormativa ocidental Educarse para estar apta a casar e cuidar dos filhos cuidar da aparência para fugir do estereótipo da loucura ao qual a medicina até a primeira metade do século XX associava as mulheres cuidar do corpo e manterse eternamente jovem como os ideais femininos que a indústria da moda defende diariamente e em sentido amplo Cuidar de si e manterse vinculada a um modelo feminino aceitável e controlado com o objetivo de aprovação pelos homens e pelas demais mulheres com vistas a poder concretizar um modelo de vida onde a validação da mulher se dá pela aceitação do homem seja pai marido professor ou colega e que não se torne uma ameaça para a comunidade feminina Este desejo de aprovação com o qual a construção da identidade feminina lida de forma ao mesmo tempo declarada e subliminar travestese na cultura ocidental de uma aura de a forma como apenas as coisas devem ser revestindose de uma crueldade ditatorial que afeta diretamente o estar no mundo para a imensa maioria das mulheres O tempo empregado em configurarse e perfazerse individualmente em um modelo exemplar de mulher mãe esposa amante profissional bemsucedida portadora mas não dona de um corpo cultivado dentro dos padrões ditados diariamente pelas propagandas novelas e meios de comunicação traz consigo um alto preço a ausência de foco na capacidade de realizar escolhas concretizar desejos e tomar decisões Veicular um modelo de feminino restrito e não diversificado do qual muitas mulheres simplesmente não farão parte porque sua estatura ou cor da pele naturalmente não atenderiam é apenas uma parte dele O modelo dominante inclui uma desqualificação prévia do trabalho intelectual feminino mediante modelos segundo os quais a priori a mulher pode desenvolver algumas funções tomando como exemplo a prática musical e não outras Lucy Green destaca que para este suposto ideal de feminilidade as mulheres professoras ou cantoras são mais aceitas do que as mulheres instrumentistas improvisadoras compositoras ou intelectuais GREEN 2001 As atividades que aproximam o fazer ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 51 feminino ao trabalho intelectual são consideradas transgressoras a este modelo e sofrem punições veladas e explícitas calcadas na desconsideração e menos valia do trabalho tácitas e aplicadas a priori onde a vinculação ao gênero determina o juízo de valor sobre o produto musical Outros modelos femininos foram excluídos e desconsiderados pelo discurso dominante na linhagem das liliths das bruxas das meigas das feiticeiras das benzedeiras das rezadeiras das curandeiras das videntes ialorixás das mulheres que assim se mantiveram no campo denominado cultura popular distante do modelo científico positivista asséptico e cartesiano No entanto a exclusão operou justamente para as que se mantiveram longe do discurso dominante aproximadas de um poder dado pelo conhecimento Desta forma trazerse para o centro do discurso e buscar compreender processos falar em primeira pessoa e destacar as subjetividades nele incluídas articuladas por desejos dobramentos e bordas que se materializam em discursos que dialogam com a poesia e o discurso musical se tornam o centro da proposição feminista com fortes ecos na pesquisa artística Buscar um processo de conhecimento que lide com a diferença com as possibilidades de tomar decisões sobre a postura acadêmica e artística como forma de estar no mundo de ocupar os espaços públicos e fazerse ver a partir da forma como se escolheu ser Assim o processo de apresentar estas possibilidades e compreender de forma crítica os processos produtivos traz em si a gênese do encorajamento da criação de elos de sororidade aprovação motivação do resgate do desejo de criar e da valoração das próprias memórias gerando finalmente redes de pertencimento e fortalecimento identitário que constituem nossa contribuição para o questionamento das formas de ser e estar no mundo Se produz assim uma outra memória de sonoridades repertórios e práticas e o estabelecimento de relações e sobreposições entre os campos de possibilidades musicais e estas memórias As epistemologias feministas cumprem desta forma a função de oferecer uma outra forma de escuta e olhar questionando a produção de conhecimento que prioriza a racionalidade o distanciamento e atrelado à ele o mundo masculino heteronormativo branco ocidental Assim a construção desta outra forma de olhar passa então por priorizar processos e não apenas produtos e a reflexão sobre nossos processos artísticos se torna então o centro deste texto Convidamos Anzaldúa para encerrar conosco esta reflexão quando observa que Contudo não é suficiente se posicionar na margem oposta do rio gritando perguntas desafiando convenções patriarcais brancas Um ponto de vista contrário nos prende em um duelo entre opressor e oprimido fechadosas em um combate mortal como polícia e bandido ambos são reduzidos a um denominador comum de violência O contraposicionamento refuta os pontos de vista e as crenças da cultura dominante e por isso é orgulhosamente desafiador Toda reação é limitada por e subordinada à aquilo contra o qual se está reagindo Porque o contraposicionamento brota de um problema com autoridade tanto externa ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 52 como interna representa um passo em direção à liberação da dominação cultural Entretanto não é um meio de vida A uma determinada altura no nosso caminho rumo a uma nova consciência teremos que deixar a margem oposta com o corte entre os dois combatentes mortais cicatrizado de alguma forma a fim de que estejamos nas duas margens ao mesmo tempo e ao mesmo tempo enxergar tudo com olhos de serpente e de águia Ou talvez decidamos nos desvencilhar da cultura dominante apagála por completo como uma causa perdida e cruzar a fronteira em direção a um território novo e separado Ou podemos trilhar uma outra rota As possibilidades são inúmeras uma vez tenhamos decidido agir em vez de apenas reagir ANZALDÚA 2005 p 706 Desejo Ação Subjetividades Sonhos Pensamentos Memórias Marcadores Desterritórios Veios Lentes Vôos AGRADECIMENTOS Isabel Nogueira agradeço à Rosa Antônio Jacy Lucia e Ernesta que me ensinaram em casa e no dia a dia sobre o estar no mundo a partir do seu olhar plural Agradeço à Laila Rosa pela interlocução terna e vigorosa e pelo aprendizado constante nas leituras e discussões sobre o feminino Agradeço a Luciano Zanatta pelas descobertas pelo amor pelas conversas e risadas de todos os dias Agradeço à Chico Machado Isadora Nocchi Martins Nikkolas Gomes Ferranddis Carlos Ferreira Ricardo De Carli Gilberto Oliveira e Davi Covalesky pelas parcerias musicais em Vestígios Violeta e Lusque Fusque Agradeço ao CNPQ IAUFRGS PPGMUSUFRGS e PPGMPUFPel pelo apoio Agradeço ao Grupo de Pesquisa em Criação Sonora UFRGS Grupo de Estudos em Música e Gênero UFRGS e ao Grupo SONORA pelas conversas e trocas sobre os temas da criação e do feminino Agradeço à Pedro Gabriel e Carolina por compartilhar o estar no mundo Laila Rosa em primeiro lugar agradeço à espiritualidade e a minha mãe Iemanjá ao Terreiro Xambá minha casa espiritual Agradeço as diversas interlocuções sobre Artevismos e feminismo negro e pós colonialidade que se fortaleceram com a amiga e parceira Carol Barreto Designer de moda doutoranda ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 53 do Programa de Pósgraduação em Cultura da UFBA e professora do Bacharelado sobre Gênero e Diversidade Interlocução que recentemente tem se estendido e fortalecido com esta linda parceria com a querida Isabel Nogueira Agradeço ainda ao Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher NEIMUFBA e ao Programa de PósGraduação em Música da UFBA Agradeço imensamente a Feminaria Musical grupo de pesquisa e experimentos sonoros que me fortalece como importante espaço de afetividade e transformação Por fim agradeço a todas as queridas parcerias musicais que fizeram parte do meu 1o cd e a Secretaria de Cultura do Estado da Bahia que viabilizou a realização deste projeto Axé Namastê REFERÊNCIAS ALCÂNTARA Neila O som das compositoras de Salvador da experiência etnográfica Relatório Final do Projeto de Iniciação Científica apresentado ao Programa PIBIC UFBA Salvador 2014 10p O som das compositoras de Salvador Relatório Final do Projeto de Iniciação Científica apresentado ao Programa PIBIC UFBA Salvador 2013 15p ALVAREZ Sonia E Construindo uma política feminista translocal da tradução Estudos Feministas Florianópolis Vol 173 SetDez p 743753 2009 ANZALDÚA Gloria La conciencia mestiza Rumo a uma nova conciencia Revista Estudos Feministas Tradução de LIMA Ana Cecília Acioli Florianópolis Vol 133 Setdez p 704719 2005 Falando em línguas uma carta para as mulheres escritoras do terceiro mundo Revista Estudos Feminista Florianópolis Vol 8 1 p 229236 2000 BENTO Maria Aparecida Silva Branqueamento e branquitude no Brasil CARONE Iray BENTO Maria Aparecida Silva Orgs Psicologia social do racismo estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil Petrópolis Vozes 2002 Pp 2558 BRAH Avtar Diferença diversidade diferenciação Caderno Pagu online n26 2006 Pp 329376 Disponível em httpwwwscielobrscielophpscriptsciarttextpidS0104 83332006000100014lngennrmiso Acessado em 10012013 CASTRO Luciana Martins A contribuição de Nísia Floresta para a educação feminina pioneirismo no Rio de Janeiro oitocentista Outros Tempos Vol 7 Número 10 dezembro Dossiê História e educação Pp 237256 2010 CITRON Marcia Gender and the Musical Canon Urbana University of Illinois Press 1993 COESSENS Kathleen CRISPIN Darla DOUGLAS Anne The artistic turn a manifesto Ghent Orpheus Institute 2009 CURIEL Ochy Hacia La construcción de un feminismo descolonizado MIÑOSO Yuderkys Espinosa org Aproximaciones críticas a las prácticas teóricopolíticas Del feminismo latinoamericanoVol I Buenos Aires En La Frontera 2010 Pp 6978 CUSICK Suzanne Feminist Theory Music Theory and the MindBody Problem Perspectives of New Music Vol 32 No 1 Winter 1994 Pp 827 Disponível em wwwjstororgstable833149 Acessado em 15082008 ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 54 DAVIS Angela Blues Legacies and Black Feminism Gertrud MaRainey Bessie Smith and Billie Holiday New York Vintage Books 1998 DELEUZE Gilles Guattari Félix Mil Platôs São Paulo Editora 34 1997 FREIRE Paulo Pedagogia do oprimido 50a ed Rev e atual Rio de Janeiro Paz e Terra 2011 Criando Métodos de Pesquisa Alternativa aprendendo a fazêla melhor através da ação BRANDÃO Carlos Rodrigues org Pesquisa Participante 8a ed São Paulo Brasiliense 1990 Pp 1022 GOMES Rodrigo Cantos Savelli Samba no feminino transformações das relações de gênero no samba carioca nas três primeiras décadas no século XX Dissertação Mestrado em Música Florianópolis UDESC 2011 GONZÁLEZ Juan Pablo Pensar la música desde américa latina problemas e interrogantes Santiago Ediciones Universidad Alberto Hurtado 2013 GREEN Lucy Música género y educación Madrid Ediciones Morata 2001 HARAWAY Donna Saberes Localizados a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial Cadernos Pagu 5 pp0741 1995 Disponível em httpperiodicosbcunicampbrojsindexphpcadpaguarticleview1773 Acessado em 02072008 hooks bell Ensinando a transgredir a educação como prática libertadora Tradução de Marcelo Brandão Cipolla São Paulo Editora WMF Martins Fontes 2013 LIMA Paulo Costa Teoria e prática do compor II diálogos de intervenção e ensino Salvador edufba 2014 LISPECTOR Clarice Água viva Rio de Janeiro Rocco 1973 LÓPEZCANO Rúben e OPAZO Ursula San Cristóbal Investigación artística em música problemas métodos experiencias e modelos Fondo Nacional para la Cultura y las Artes de México Barcelona Dezembro de 2014 LOURO Guacira Lopes Gênero sexualidade e educação uma perspectiva pósestruturalista Petrópolis RJ Vozes 1997 MELLO Maria Ignez Cruz Iamurikuma música mito e ritual entre os Wauja do Alto Xingu Tese Doutorado em Antropologia Florianópolis UFSC 2005 MOREIRA Talitha Couto Música Materialidade e Relações de Gênero Categorias Transbordantes Dissertação Mestrado em Música Belo Horizonte Universidade Federal de Minas Gerais 2012 NASCIMENTO Abdias NASCIMENTO Elisa Larkin Dança da decepção uma leitura das relações raciais no Brasil SD Disponível em httpwwwbeyondracismorgdancadecepcaohtm Acessado em 08112012 NOGUEIRA Isabel A construção das divas uma análise iconográfica de fotografias de mulheres intérpretes em programas de concerto ROCHA Luzia ed Iconografia Musical Autores de Países Ibero Americanos e Caraíbas Lisboa CESEMUniversidade Nova de Lisboa 2015 NOGUEIRA Isabel Iconografia musical em performance ou será que as formigas veem o céu de outra cor Conferência apresentada no 3º Congresso Brasileiro de Iconografia musical Iconografia música e cultura relações e trânsitos Salvador 2015a NOGUEIRA Isabel CAMPOS Susan orgs Estudosde gênero corpo e música Série Pesquisa em Música no Brasil 1a ed GoiâniaPorto Alegre ANPPOM 2013 v 3 NOLETO Rafael 2012a Poderosas divinas e maravilhosas o imaginário e a sociabilidade homossexual masculina ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 55 construídos em torno das cantoras de MPB Dissertação Mestrado em Antropologia Belém Universidade Federal do Pará 2012 Disponível em httpwwwacademiaedu2433377Poderosasdivinasemaravilhosasoimaginarioeasociabilida dehomossexualmasculinaconstruidosemtornodascantorasdeMPB Acessado em setembro de 2013 OLIVEIRA FILHO Pedro Amorim Compor no mundo um modelo de compor música sobre bases fenomenológicas Tese Doutorado em Música Salvador Universidade Federal da Bahia 2014 Blog Compor no Mundo Disponível em httpscompornomundowordpresscompage2 PALOMBINI Carlos Música Lésbica e Guei de Philip Brett e Elizabeth Wood notas de tradução PER MUSI Revista de Performance Musical v 8 p 157164 dez 2003 PAVLOSKY Eduardo Proceso Creador Terapia Y Existencia Buenos Aires ediciones Búsqueda 1982 RAGO Margareth Epistemologia feminista gênero e história PEDRO Joana GROSSI Miriam orgs Masculino Feminino Plural Florianópolis EdMulheres 1998 ROSA Laila Do meu canto em viva água percepções ou devaneios poéticos e filosóficos sobre criação musical performance e teorias feministas a partir de Água Viva um disco líquido 2015 No prelo Feminaria musical ou epistemologias feministas em música no Brasil Projeto de Iniciação Científica apresentado ao Programa Permanecer 2012 5p Feminaria musical ou epistemologias feministas em música no Brasil das experiências etnográficas Projeto de Iniciação Científica apresentado ao Programa PIBIC UFBA 2013 12p As juremeiras da nação Xambá Olinda PE músicas performances representações de feminino e relações de gênero na jurema sagrada Tese Doutorado em Música Universidade Federal da Bahia Salvador 2009 Disponível em httpwwwbibliotecadigitalufbabrtdebuscaarquivophpcodArquivo3600 Epahei IansãMúsica e resistência na nação Xambá uma história de mulheres Dissertação Mestrado em Música Universidade Federal da Bahia Salvador 2005 ROSA Laila CARDOSO Laura SOBRAL Rebeca Feminaria musical o que não se produz sobre mulheres e música no Brasil VII ENCONTRO NACIONAL DE ETNOMUSICOLOGIA Anais no prelo 2015 15p ROSA Laila IYANAGA M HORA E SILVA L ARAUJO S MEDEIROS Luciano ALCANTARA N Epistemologias feministas e a produção de conhecimento recente sobre mulheres e música no Brasil algumas reflexões NOGUEIRA Isabel CAMPOS Susan orgs Estudos de gênero corpo e música GoiâniaPorto Alegre ANPPOM 2013 vol 3 Pp 112128 SCOTT Joan História de mulheres BURKE Peter Org A Escrita da história novas perspectivas São Paulo Editora UNESP 1992 Pp 6395 SEGATO Rita Laura A folk theory of personality types goods and their symbolic representation by members of the shango cult in Recife Tese Doutorado em Música Belfast The Queens University of Belfast 1984 SOVIK Liv Aqui ninguém é branco Rio de Janeiro Aeroplano 2009 VARGAS Deborah R Dissonant Divas in Chicana Music The Limits of La Onda MinneapolisLondon University of Minenesota Press 2012 VERGUEIRO Viviane É a natureza quem decide Reflexões trans sobre gênero corpo e abuso de substâncias JESUS Jaqueline Gomes de e Colaboradores Transfeminismo teorias e práticas Rio de ROSA Laila NOGUEIRA Isabel O que nos move o que nos dobra o que nos instiga notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista Vórtex Curitiba v3 n2 2015 p2556 56 Janeiro Matanoia Editora 2014 Pp 3047 WERNECK Jurema Pinto O samba segundo as ialodês mulheres negras e a cultura midiática Tese Doutorado em Comunicação UFRJ Rio de Janeiro 2007 WHITELEY Sheila RYCENGA Jennifer Queering the Popular Pitch New York Routledge 2006 ZANATTA L Música Popular Conferência durante o I ENCONTRO BRASILEIRO DE MÚSICA POPULAR NA UNIVERSIDADE UFRGS Porto Alegre UFRGS 2015 ZANATTA Luciano NOGUEIRA Isabel MACHADO João Carlos LusqueFusque Composición y Performance entre Canción y Musica Experimental Revista Sonic Ideas 2015 No prelo Gravações Isabel Nogueira Vestígios Violeta NOGUEIRA Isabel intérprete NOGUEIRA Isabel voz OLIVEIRA Gilberto baixo COVALESKY Davi violão SCHELLEMBERG Juan Pablo piano POPÓ Renato percussão Pelotas 2014 CD Projeto financiado pelo Programa Procultura da Prefeitura Municipal de Pelotas Violeta NOGUEIRA Isabel ZANATTA Luciano REVILLION Monique compositores NOGUEIRA Isabel voz ZANATTA Luciano computador e wavedrum FERREIRA Carlos guitarra Porto Alegre 2015 Canção do projeto LusqueFusque Gravação disponibilizada na plataforma virtual Soundcloud Azinconstâncias NOGUEIRA Isabel e ZANATTA Luciano compositores NOGUEIRA Isabel voz ZANATTA Luciano computador e wavedrum FERREIRA Carlos guitarra Porto Alegre 2015 Canção do projeto LusqueFusque Gravação disponibilizada na plataforma virtual Soundcloud Laila Rosa Água Viva um disco líquido ROSA Laila compositora e intérprete ROSA Laila voz violino rabeca cavaquinho guitarra baiana e direção musical CALDAS Julio voz guitarras violão de aço viola caipira e direção musical LOURENÇO Mauricio voz violão e direção musical HARDMANN Ricardo percussões MARIN Mariana voz e percussões SANTIAGO contrabaixos acústico e elétrico Com participações especiais diversas Salvador 2013 CD Projeto contemplado pelo edital Demanda Espontânea da Secretaria de Cultura do Estado da Bahia Disponível na plataforma virtual Soundcloud De sertão e arranhacéu ROSA Laila compositora e intérprete ROSA Laila voz Participações especiais AZEVEDO Gustavo pífanos e voz ARAÚJO Ana caracaxá BETO DA XAMBÁ ilú GUITINHO DA XAMBÁ voz IRAN DA XAMBÁ Ilú PUBLIUS bandolim e voz Música que integra o cd Água Viva um disco líquido Gravação disponibilizada gratuitamente da plataforma virtual Soundcloud Mar Azul ROSA Laila compositora e intérprete ROSA Laila voz e 1o violino Coletivo Os Ventos CALDAS Júlio violão HARDMANN Ricardo percussões MARIN Mariana percussões Participações especiais DURSO Renata viola FIGUEIREDO Priscila 2o violinoTAVARES Laís violoncelo NOBRE Cassio Ud Música que integra o cd Água Viva um disco líquido Gravação disponibilizada gratuitamente da plataforma virtual Soundcloud TAREFA A música é uma ferramenta pedagógica pois trata de diversos contextos e cenários promovendo assim indagações questionamentos e debates além de sensações e experiências Nesse sentido propõe novos caminhos de pensar e existir Impacta diretamente a imaginação a descoberta o suspense o conhecimento e diversos outras formas de sentir Nesse sentido pode ser caracterizada como veículo informativo uma vez que propaga diversos tipos de informações mesmo que de forma abstrata Dissemina informações relacionadas a política projetos instituições dentre outros A partir disso a comunicação entre povo com ele próprio se torna mais profunda e com diversas interpretações Embora uma música seja criada em determinada época e represente assim determinado cenário transpassa gerações e gerações e continua existindo A partir disso revoluciona pensamentos e óticas sociais afim de trazer informações de gerações passadas para uma geração atual e consigo diversas reflexões Outro ponto interessante se refere ao estímulo de criação musical a pensar na letra e no conjunto musical Isto é é necessário sentir a música antes de a criar de forma sólida é preciso construir seus versos a partir de uma ideia pensamento ou experiência E após ser desenvolvida ela passa de pessoa em pessoa de coração em coração e de pensamento em pensamento se tornando assim parte da história das pessoas e de suas construções existenciais Conforme o mundo muda e se desenvolve a forma de existir também se modifica bem como a forma de analisar todo o cenário a sua volta Nessa perspectiva quando um indivíduo cria uma música ele coloca um pouco de si mesmo ali o que embora eternizado em palavras muda conforme o tempo e estimula diversos sentimentos novos e os refaz a cada novo tempo Partindo desse pressuposto a música atual pode ser vista como heteronormativa e ao mesmo tempo não tendo em vista a forma como é interpretada e como é composta REFERÊNCIA ROSA L NOGUEIRA I O que nos move o que nos dobra o que nos instiga Notas sobre epistemologias feministas processos criativos educação e possibilidades transgressoras em música Revista VÓRTEX Curitiba v03 n02 p 2556 2015