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HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL Flávio Azevedo Marques de Saes Alexandre Macchione Saes Editora Saraiva O Capítulo 14 A GRANDE DEPRESSÃO 19291933 dia 24 de outubro de 1929 ficou marcado na história como a Quinta feira negra considerado o dia decisivo para a quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque A quebra da bolsa está associada à pior crise econômica de toda a história norteamericana não só por seu profundo impacto sobre a própria economia dos Estados Unidos mas também pelos reflexos espalhados por todo o mundo1 Contudo as depressões já eram consideradas como inerentes ao desenvolvimento capitalista pensadas como a fase final de um período de crescimento A recorrência de crises levou à elaboração de teorias dos ciclos econômicos por economistas de diferentes orientações teóricas para justificar e prever os momentos de prosperidade e regressão na economia2 Menos de uma década antes do colapso da bolsa em 1929 norte americanos e britânicos haviam enfrentado outra severa depressão Entre 1920 e 1921 como já discutido no capítulo anterior uma forte deflação nos preços causada em parte pela saturação do mercado em parte pelas políticas restritivas governamentais fez despencar a produção nos Estados Unidos e na GrãBretanha Considerando o impacto imediato a deflação de 19201921 parece tão ou mais severa do que a recessão de 19291930 assim como da recessão que ocorreu em 19371938 o declínio do PIB em 1921 foi comparável ao de 1930 e maior do que o de 1938 a deflação foi maior do que em 1930 e 1938 assim como o aumento do desemprego Tabela 141 TABELA 141 Alterações nas variáveis macroeconômicas em três períodos 359 Fonte SCHWARTZ 1982 p17 PIB preços constantes 1958 Apesar dessas semelhanças a atenção dos analistas se voltou majoritariamente para a crise de 1929 e para a Grande Depressão dos anos 1930 Sem dúvida tanto pelo tempo de duração aproximadamente 24 meses consecutivos de quedas até a recuperação como pela difusão da crise imposta ao mundo a Grande Depressão foi a mais marcante e terrível para a economia mundial O impacto da depressão posterior à crise de 1929 se estendeu por longos anos de maneira que o PIB norteamericano apenas recuperou o valor referente ao período anterior ao colapso em 1937 O extraordinário desempenho da economia norteamericana durante a segunda metade da década de 1920 com a crescente produção de automóveis empreendimentos imobiliários e atividade acionária não foi repetido em momento algum durante a década seguinte Logo os investimentos norteamericanos de maneira geral continuariam tímidos pela década de 1930 e excluindo o ano de 1937 representado por uma rápida elevação nos investimentos e sucessiva queda diante de uma nova depressão a toada dessa década foi de uma economia em permanente fragilidade Tabela 142 Como se observa a partir de 1929 e até 1933 houve abrupta redução do PIB que caiu quase 30 no período assim como do investimento que chegou praticamente a zero em 1933 e dos dispêndios em construção Paralelamente observouse também forte deflação que junto com o elevado desemprego que atingiu a taxa de 25 completou o ambiente recessivo Se em 1933 se chegou ao fundo do poço a recuperação iniciada no ano seguinte foi lenta apenas em 1937 se retomaram os níveis de atividade de 1929 No ano de 1938 nova recessão Apenas durante a Segunda Guerra Mundial a economia norteamericana superou os prolongados efeitos da Grande Depressão da década de 1930 Esses efeitos da crise de 1929 e da depressão dos anos 1930 não ficaram restritos aos Estados Unidos e nem mesmo à esfera estritamente econômica No entender de Eric Hobsbawm Sem ele o crash de Nova Iorque com certeza não teria havido Hitler Quase certamente não teria havido Roosevelt É muito improvável que o sistema soviético tivesse sido encarado como um sério rival econômico e uma alternativa possível ao capitalismo mundial As consequências da crise econômica no mundo não europeu ou não ocidental foram patentemente impressionantes Em 360 suma o mundo da segunda metade do século XX é incompreensível se não entendermos o impacto do colapso econômico HOBSBAWM 1995 p91 TABELA 142 Desenvolvimento de componentes selecionados EUA 19191939 bilhões de dólares em 1929 Fonte TEMIN 1976 p46 Consequentemente para compreender o programa do New Deal e a ascensão do Nazismo e do Fascismo na Europa temas do próximo capítulo e ainda o fortalecimento da economia soviética tema do capítulo final desta parte o crash de 1929 é uma inflexão decisiva Tudo isso justificaria a eleição da crise de 1929 e da Grande Depressão dos anos 1930 como temas preferenciais de pesquisa No entanto há razões adicionais para a quantidade de estudos dedicados a esses temas explicações da crise e da Grande Depressão colocam frente a frente concepções teóricas distintas com implicações em termos de política econômica A compreensão 361 dos eventos para keynesianos e para monetaristas é completamente diferente mais importante suas explicações sugerem que diferentes políticas econômicas poderiam ter induzido outro curso para os acontecimentos da década de 1930 É claro as conclusões procuravam fortalecer argumentos que eram esgrimidos por essas correntes em relação à política econômica da época em que os economistas escreviam principalmente as décadas de 1950 1960 e 1970 A dicotomia keynesianos monetaristas não esgota as contribuições à polêmica sobre a crise de 1929 e sobre a Grande Depressão às diferentes interpretações dos eventos dedicamos o último tópico deste capítulo Antes procuramos expor os principais fatos que antecederam a crise de 1929 e o modo como se deu a propagação do impacto recessivo nos Estados Unidos e em algumas partes do mundo 141 O CRASH DA BOLSA DE NOVA IORQUE Frequentemente a quebra da bolsa de Nova Iorque em 1929 é explicada como fruto de um processo especulativo o aumento prolongado do preço das ações negociadas na bolsa ao longo de alguns anos tornouse excessivo constituindo o que se tem caracterizado como uma bolha Durante alguns anos a expectativa de que os preços das ações continuariam em alta era suficiente para que novas compras fossem efetivadas Em algum momento a percepção de que os preços das ações eram incompatíveis com os fundamentos das empresas levou alguns investidores à venda dessas ações Quando essa percepção se generalizou houve uma corrida para se livrar das ações provocando o rápido declínio de seus preços e o estouro da bolha Essa descrição bastante simplificada não é totalmente destituída de fundamento No entanto ela omite condições que definem o quadro econômico mais geral em que se inseriu a quebra da bolsa de Nova Iorque em 1929 Numa primeira aproximação podemos dizer que essas condições são de suas ordens de um lado o contexto internacional da década de 1920 e de outro o desempenho da economia norteamericana no período No contexto internacional como já discutido em parte no capítulo anterior os Estados Unidos começavam a assumir uma nova posição dentro da organização econômica mundial Posição hegemônica como maior país industrializado e maior credor do mundo que não havia amadurecido dentro do projeto político dos governos norteamericanos diante das pressões internas favoráveis a um certo isolacionismo Diferentemente da liderança da Grã Bretanha no período áureo do padrãoouro que se estendeu do século XIX à primeira década do século XX os Estados Unidos durante os anos 1920 eram um país praticamente autossuficiente o que reduzia a necessidade de 362 importações O diferencial inglês era o seu balanço de pagamentos porque ao mesmo tempo em que era o maior exportador de serviços e capital do mundo o mercado britânico era também o maior consumidor de produtos primários dos mais diferentes países Esse fato era importante para países como Brasil e Argentina entre muitos outros que podiam exportar seus produtos primários como o café o trigo e a carne e com isso criavam receitas para realizar importações de produtos manufaturados serviços e empréstimos ingleses Os Estados Unidos após a Primeira Guerra Mundial por outro lado haviam se tornado exportadores de capitais os empréstimos para a recuperação europeia e para o pagamento dos débitos de guerra e também exportadores de produtos industriais e primários Em contrapartida a autossuficiência norte americana não permitia que os países europeus por meio de exportações para os Estados Unidos criassem saldos para pagar os déficits comerciais e financeiros Logo a volta ao padrãoouro nos termos anteriores à Primeira Guerra Mundial envolvia um sério dilema financeiro para a Europa com o risco iminente de gerar uma profunda descapitalização das reservas de ouro Essa diferença entre as políticas econômicas britânicas e norteamericanas era refletida no sistema financeiro Enquanto o banco central norteamericano Federal Reserve Board era influenciado de maneira contundente por interesses internos o Banco da Inglaterra manteve uma posição de controle das finanças internacionais atuando no limite como emprestador em última instância ROTHERMUND 1996 p2122 Este fato não impediu que Benjamin Strong presidente do Federal Reserve Bank de Nova Iorque rebaixasse as taxas de redesconto norteamericanas em 1924 e 1927 como forma de apoiar a estabilização das moedas europeias Em 1924 o banco norteamericano aceitou as reivindicações britânicas com Winston Churchill à frente do Tesouro inglês para o retorno ao padrãoouro abaixando sucessivamente as taxas de redesconto norteamericanas Já em 1927 diante da contínua fraqueza da economia europeia frente aos Estados Unidos Montagu Norman presidente do Banco da Inglaterra Charles Rist presidente do Banco da França e Hjalmar Schacht presidente do Banco Alemão viajaram a Nova Iorque para pedir uma nova redução na taxa de redesconto do Federal Reserve Benjamin Strong aceitou o pedido reduzindo a taxa de 4 para 35 Isso por um lado como esperado permitia que o capital voltasse a procurar os centros financeiros de Londres Paris e Berlim e por outro lado barateando ainda mais o crédito ajudava naquele momento a expansão de empréstimos financiamentos de novos negócios e possivelmente de especulação Em situação especialmente delicada estava a GrãBretanha que por meio de uma política deflacionária e restritiva além da sobrevalorização da libra 363 havia reduzido seu poder de compra no exterior O objetivo dos líderes ingleses era tentar recuperar a posição de centro financeiro mundial e para isso buscavam fortalecer a moeda nacional pressionando toda a sociedade pelos altos níveis de desemprego A França por outro lado voltaria ao padrãoouro com uma moeda tremendamente desvalorizada tornando seus produtos mais baratos no mercado internacional aumentando as exportações e em contrapartida tornando os produtos estrangeiros mais caros reduzindo suas importações Políticas econômicas como a francesa de Poincaré tornavam as trocas internacionais mais difíceis e nessas condições de instabilidade monetária e desequilíbrio dos pagamentos o padrãoouro como uma espécie de lei fundamental das relações monetárias internacionais ficou obsoleto Nenhuma nação estava disposta a abrir mão de seu direito de soberania para proteger sua moeda como julgasse conveniente e poucas nações podiam arcar com a aceitação das restrições implícitas na conversibilidade LANDES 2005 p388 Assim até 1927 por mais que as incongruências e os desequilíbrios da economia mundial já estivessem postas em cena existia uma disposição dos Estados Unidos para auxiliar a recuperação europeia e consequentemente compensar as perdas nas balanças econômicas Tal fato estava implícito nas ações de Benjamin Strong e do Plano Dawes cujo objetivo era criar recursos para a Europa especialmente para a Alemanha que devia vultosas somas de reparações de guerra Tais ações não eram gratuitas pois além de auxiliar a reconstrução europeia os empréstimos dos Estados Unidos estavam garantindo poder de compra para países como França Inglaterra e Alemanha poder de compra que em parte se dirigia à importação dos produtos norte americanos No final da década de 1920 enfim o fluxo desses recursos provenientes de empréstimos começou a diminuir A falta de garantias do retorno dos pagamentos rompeu com as levas de empréstimos para a Alemanha em 1928 ROTHERMUND 1996 p343 Somavase a esse problema o boom agrícola mundial O crescente volume da produção agrícola e especialmente de trigo reduziu os preços mundiais no momento de contração do crédito A queda dos preços agrícolas pressionava ainda mais as economias periféricas que perdiam sua principal fonte de renda como num efeito em cadeia sem entrada de ouro nos países periféricos pela queda nas exportações era reduzida a demanda por produtos industrializados provenientes da Europa e dos Estados Unidos Portanto a economia mundial inteira acabava perdendo poder de compra diminuindo o ritmo do crescimento econômico e gerando um ciclo deflacionário Em suma o ambiente internacional no final da década de 1920 perdera seu ímpeto expansionista tendendo mesmo à estagnação 364 Por outro lado internamente um dos primeiros sinais de que o crescimento da economia norteamericana estava desgovernado ocorreu com a especulação imobiliária na Flórida anos antes do craque da Bolsa O crescimento da renda da elite norteamericana as melhorias nos meios de transporte e a disposição dos especuladores para ganhar dinheiro de maneira rápida possibilitaram um aumento da demanda por balneários turísticos Nas palavras de Galbraith em meados da década de 1920 Miami Coral Gables a costa Oriental tão distante do Norte como de Palm Beach e as cidades do condado de Gulf tinham sido atacadas pelo grande boom imobiliário da Flórida GALBRAITH 1972 p39 As aquisições iniciais levaram à região da Flórida não só turistas interessados em passar os quentes verões nas praias do sul dos EUA mas também inúmeros especuladores que viam as terras se valorizando semanalmente Em 1925 grandes porções de terras eram divididas em inúmeros terrenos que trocavam de mãos compulsivamente sempre na esperança de uma nova valorização O que era chamado de praia ficava a dez vinte ou trinta quilômetros do trecho mais próximo do mar GALBRAITH 1972 p40 Em 1926 a febre por novos terrenos na Flórida pareceu declinar e para piorar no final desse mesmo ano dois grandes furacões devastaram parte considerável dos bens na região aumentando ainda mais o desinteresse de novos compradores Os cheques para compensação em Miami que haviam totalizado US 1066528000 em 1925 tiveram seu valor reduzido incrivelmente para US 143364000 em 1928 A crença do rápido enriquecimento pela especulação imobiliária havia chegado ao fim e grande parte daqueles que haviam adquirido os terrenos perdeu sua posse para os proprietários originais devido à falta de pagamento Independentemente da queda especulativa na Flórida as perspectivas para os investidores nas bolsas norteamericanas se mostravam extremamente positivas Era difícil imaginar que os preços das ações ordinárias estivessem subindo senão por causa do aumento dos lucros das empresas E mesmo os meses de 1928 em que uma grande variação nas vendas acabou provocando prejuízos para alguns investidores como março e junho não desanimaram os negócios nas bolsas O discurso do presidente em final de mandato Calvin Coolidge em 4 de dezembro de 1928 reafirmava aos norteamericanos um futuro otimista Nas palavras do presidente Nenhum Congresso dos Estados Unidos já reunido até hoje para apreciar o estado da União viuse diante de uma perspectiva mais agradável do que a que se apresenta no momento atual No campo nacional há tranquilidade e contentamento e o recorde absoluto de anos de prosperidade No campo internacional há paz a boa vontade proveniente do entendimento mútuo GALBRAITH 1972 p37 365 Em 1928 Calvin Coolidge se despedia da presidência dando lugar ao também republicano Herbert Hoover animando novamente o mercado acionário A quantidade de empréstimos subia a níveis incríveis os doze bancos ligados ao Federal Reserve realizavam empréstimos a taxas de 5 enquanto bancos e corretores repassavam esse capital para investidores a juros de 12 O capital adquirido por meio da arbitragem logo circulava no mercado para a compra de ações ordinárias a termo e como os bancos exigiam pequenas parcelas do valor das ações para realizar os empréstimos o capital se multiplicava de maneira estrondosa O processo especulativo realizado pelos bancos privados empresas e corretores era reconhecido pela Junta do Federal Reserve Board órgão responsável pela orientação e direção dos doze Bancos da Reserva Federal como em comunicado emitido em 2 de fevereiro de 1929 Contudo a área de atuação de Roy A Young presidente da Junta e de Benjamim Strong e George Harrison presidentes do principal Federal Reserve o de Nova Iorque o primeiro até sua morte em 1928 e o segundo presidente a partir de primeiro de janeiro de 1929 era restrita ao controle das operações de mercado aberto e manipulação das taxas de redesconto que eram inúteis para controlar o processo especulativo E foi efetivamente o que fizeram em agosto de 1929 depois de certos períodos de incerteza como a queda das ações entre os dias 25 e 26 de março o Federal Reserve aumentou a taxa de redesconto de 5 para 6 Nos meses anteriores ao grande crash da bolsa essa política restritiva defendida pelo Federal Reserve uma ação controversa para o período emergiria como outro elemento para a crise Conforme as perspectivas de pessimistas se concretizavam o banco central norteamericano passou a elevar as taxas de redesconto e buscava reduzir a circulação monetária como forma de arrefecer a explosão especulativa no mercado de ações4 De 35 no início de 1928 a taxa foi sendo aumentada constantemente até atingir seu ápice pouco antes de outubro de 1929 aos 6 Ação controversa porque ao mesmo tempo em que a elevação dos juros mostravase insuficiente para reduzir as transações econômicas entre bancos empresas e investidores o Federal Reserve por meio de sua política restritiva criava um ambiente deflacionário não incentivando novos investimentos no setor produtivo e assim reduzindo o crescimento econômico FRIEDMAN SCHWARTZ 1963 p363 Outro ingrediente para o não acompanhamento do estoque monetário com a demanda exigida pelo crescimento econômico norteamericano estava inscrito na retirada de circulação de parte do ouro ganho nas transações internacionais que era depositado no Forte Knox para evitar ainda mais pressões inflacionárias ROTHERMUND 1996 p54 Nesse ínterim o explosivo boom na formação de companhias de 366 investimento demonstrava que as ações do Federal Reserve eram infrutíferas No começo da década de 1920 essas empresas não somavam nem 40 no início de 1927 já eram 160 com a formação de mais 140 companhias no decorrer daquele ano em 1928 foram formados mais 186 consórcios de investimento e finalmente durante 1929 antes mesmo do final do mês de outubro já eram mais 265 consórcios Esses grandes consórcios tinham como objetivo levantar capital para investir em negócios diversificados mas geravam também uma supervalorização das ações por uma reação em cadeia de compras A força de alavanca era conseguida pela emissão de debêntures ações preferenciais bem como ações ordinárias para se adquirir mais ou menos exclusivamente uma carteira de ações ordinárias A maior parte ou o total do ganho proveniente dos valores ascendentes da carteira se concentrava nas ações ordinárias do consórcio de investimento que em consequência subiam de modo assombroso GALBRAITH 1972 p94 A presença dos consórcios de investimentos de grandes empresas e de bancos atuando no mercado de ações como financiadores demonstrava a explosão de crédito que houve no final da década de 1920 para ser direcionado a ganhos financeiros por meio da especulação Um dado sugere o quanto se ampliou a esfera financeira em grande medida por especulação entre 1925 e 1929 no primeiro desses anos o valor de novos investimentos no sentido macroeconômico era de US 35 bilhões ao passo que no ano de 1929 atingiu apenas US 32 bilhões Contudo o valor nominal das ações comercializadas foi de US 27 bilhões em 1925 enquanto em 1929 foi de US 87 bilhões Cada vez mais o valor comercializado na bolsa de valores perdia sua relação com o investimento e com a produção nacional já que os recursos estavam se concentrando apenas no mercado de ações e não no setor produtivo ROTHERMUND 1996 p50 Mensalmente durante o ano de 1929 abalos rondavam Wall Street As oscilações na bolsa eram justificadas como reajustamentos momentâneos pelos gurus do mercado acionário garantindo que a crença otimista se manteria firme Mas o desempenho da economia norteamericana não mais correspondia à expansão no mercado acionário A produção industrial de modo geral e mais especificamente os setores de aço de automóveis de empreendimentos imobiliários e de transporte de cargas ferroviárias não continuavam em ascensão Fatores internos à economia norteamericana auxiliavam esse arrefecimento no crescimento Afinal depois de meia década de amplo desenvolvimento o mercado chegava à sua saturação os norte americanos que podiam já haviam comprado casas carros e grande parte dos bens duráveis desejados Consequentemente com menos produtos para comprar e capitais em expansão estimulavase cada vez mais novos 367 investidores para o mercado acionário Por outro lado a concentração de renda impossibilitava que outras camadas da sociedade norteamericana pudessem consumir no mercado reduzindo as possibilidades para a manutenção das taxas de crescimento produtivo anteriores ROTHERMUND 1996 p4950 Os precedentes à explosão da bolha contudo não estavam restritos ao mercado interno dos Estados Unidos Na GrãBretanha em 20 de setembro de 1929 o reputado império industrial e financeiro da Clarence Hatry ruiu de repente apresentando irregularidades em seus negócios Talvez como reflexo dessa quebra em Massachusetts em 11 de outubro foi determinada a proibição do desdobramento de ações que chegava a criar de uma ação outras quatro Era uma proibição sem precedentes nos Estados Unidos mas era um sinal do receio do crescimento de ações sem correspondência com ativos reais Setembro e outubro tornaramse meses com tendência de baixa nos mercados acionários mas sujeita a momentos de bruscas alternâncias devido ao contínuo empréstimo dos corretores Do dia 19 ao dia 23 de outubro Wall Street fechou com outras grandes quedas Tanto a dúvida como a incerteza tomou conta de todo o mercado acionário O auge das quedas se deu na quintafeira negra dia 24 de outubro quando o medo avassalador acelerou ainda mais o ritmo da venda de ações alcançando 13 milhões de ações vendidas Notícias de suicídios de acionistas de quebras de bancos e empresas pioravam ainda mais o pânico no mercado Com a meta de reverter a situação diretores dos principais bancos norteamericanos foram a público entre eles Richard Whitney do Banco Morgan e Charles Mitchell do Federal Reserve de Nova Iorque formando o que ficou conhecido como apoio organizado objetivavam reter as quedas no mercado por meio da compra de ações de empresas estratégicas criando um efeito valorizador As reuniões causavam pequenos arrefecimentos nas quedas mas logo a incerteza e o pânico dos investidores geravam novas desvalorizações acionárias A semana seguinte manteve a propensão de quedas e pela primeira vez os empréstimos dos corretores tiveram uma brusca redução As companhias de investimento outrora o ponto culminante das valorizações acionárias agora se mostravam fragilizadas de maneira que seus títulos quando muito podiam ser vendidos por somas irrisórias Na terçafeira dia 29 de outubro mais de 16 milhões de ações haviam sido vendidas um novo recorde No dia 30 de outubro na quartafeira seguinte o Federal Reserve declarou feriado em Wall Street e voltou a reduzir as taxas de redesconto na esperança de ampliar a liquidez no mercado norteamericano Pouco aconteceu as quedas foram contínuas e mesmo considerando que em janeiro fevereiro e março de 1930 368 o mercado de ações apresentou uma recuperação substancial depois em abril a recuperação perdeu impulso e em julho houve outra grande queda A seguir com poucas exceções o mercado passou a cair de semana para semana de mês para mês e de ano para ano até o término de julho de 1932 GALBRAITH 1972 p182 Os preços das ações em Nova Iorque cujo pico foi atingido em setembro de 1929 índice 216 caíram a seu menor nível em junho de 1932 índice 34 Sua recuperação foi lenta e irregular o maior nível desde então até 1938 foi alcançado em fevereiro e março de 1937 índice 154 recuperando valores de 1928 KINDLEBERGER 1986 p9899 Em suma o impacto dos eventos de 1929 sobre o desempenho da bolsa foi profundo e prolongado 142 DA QUEBRA DA BOLSA DE NOVA IORQUE À GRANDE DEPRESSÃO NOS ESTADOS UNIDOS Se a quebra da bolsa de Nova Iorque tem um forte significado simbólico como expressão da crise do capitalismo muito mais graves e dramáticos foram os eventos identificados com a Grande Depressão Falências de bancos e empresas desemprego elevadíssimo crise da agricultura são componentes típicos do desempenho da economia norteamericana na década de 1930 com profundo impacto social e político A Grande Depressão induziu substanciais mudanças na economia tendo em vista a necessidade de enfrentar seus efeitos deletérios mudanças que serão tratadas no próximo capítulo Embora os sinais da Grande Depressão apareçam na sequência da quebra da bolsa de Nova Iorque não se pode atribuir apenas à crise da bolsa o início da depressão Alguns antecedentes já foram referidos anteriormente a expansão da indústria manufatureira e da construção civil sofria sensível redução nos anos finais da década de 1920 isso refletia tanto o elevado nível de investimento em capital fixo durante a década como certo arrefecimento da demanda de bens duráveis em especial automóveis e de habitações KINDLEBERGER 1986 p104 Como resultado ampliavase a capacidade ociosa e acumulavamse estoques Paralelamente a agricultura também enfrentava redução de sua renda pois o aumento da produção mundial de certas mercadorias como o trigo havia reduzido seu preço internacional Desse modo diferentes componentes da demanda se mostravam enfraquecidos antes mesmo da quebra da bolsa embora no agregado não impedissem a continuidade da expansão da economia norteamericana Também devemos lembrar que a partir de 1928 o Federal Reserve iniciou a elevação dos juros o que tendia a enfraquecer ainda mais a demanda No entanto depois de 1929 o declínio dos principais indicadores do desempenho 369 da economia foi abrupto como vemos na Tabela 143 TABELA 143 Estados Unidos Indicadores econômicos selecionados 19281933 Fonte MAZZUCCHELLI 2009 p210 A profundidade da Grande Depressão é suficientemente esclarecida por alguns indicadores entre 1929 e 1933 o declínio do PIB foi de cerca de 30 o da produção industrial de quase 40 o desemprego ascendeu a 25 da força de trabalho a deflação foi da ordem de 25 e as exportações se reduziram a pouco mais de 30 do que eram em 1929 Quais os fatores que conduziram a tais resultados Nos meses seguintes à quebra da bolsa alguns indicadores sofreram queda abrupta A produção industrial caiu do nível 110 em outubro para 105 em novembro e 100 em dezembro de 1929 a queda mais rápida desde 1920 os preços de commodities despencaram no mercado internacional entre setembro e dezembro de 1929 borracha menos 257 cacau menos 154 café menos 131 zinco menos 167 cobre menos 93 milho menos 141 trigo menos 36 KINDLEBERGER 1986 p112113 Esse rápido declínio imediatamente após a quebra da bolsa sugere alguma conexão entre os eventos embora haja diferentes hipóteses sobre essa conexão As perdas decorrentes da queda do preço das ações ao reduzirem a riqueza das famílias podem ter provocado a súbita redução das compras em especial de bens duráveis O ambiente de incerteza decorrente da quebra da bolsa também deve ter gerado algum impacto na disposição de consumo das famílias Expectativas pessimistas provavelmente adiaram investimentos Em suma haveria fortes motivos para a redução da demanda como reação aos efeitos da crise da bolsa de Nova Iorque No entanto o prolongado declínio do PIB da produção industrial do nível de emprego e dos preços sugere a existência de outros mecanismos econômicos que conduziram à Grande Depressão Kindleberger entende que a crise de liquidez que seguiu a quebra da bolsa 370 teve forte impacto sobre os gastos das famílias e das empresas para compensar as perdas financeiras sofridas na bolsa as famílias tentavam vender ativos por exemplo imóveis para pagar os encargos das hipotecas as empresas reduziam estoques com o objetivo de gerar liquidez e os bancos reduziam o crédito O resultado da busca pela liquidez com o corte de gastos foi o declínio dos preços A deflação se moveu do declínio no mercado de ações para os cortes de produção e as reduções de estoques em uma sequência e dos preços das ações para os preços das mercadorias e para o reduzido valor das importações em outra Ambas foram rápidas A conexão entre o mercado de ações e os mercados de bens foi em parte psicológica e em parte no início por meio dos mecanismos de crédito pois bancos e empresas lutavam para se tornar líquidos KINDLEBERGER 1986 p114 O Federal Reserve procurou por meio da redução dos juros se contrapor às forças deflacionistas e recessivas depois de outubro de 1929 as taxas caíram até 15 ao ano sem qualquer resultado efetivo sobre o desempenho da economia Na verdade os bancos não se dispunham a emprestar recursos diante da onda de falências que grassava naqueles anos e o ambiente recessivo também não estimulava empresas a tomarem empréstimos A política do governo também foi incapaz de impedir a falência de milhares de bancos O sistema bancário norteamericano era extremamente pulverizado no final dos anos 1920 havia cerca de 26000 bancos Em outubro de 1930 iniciouse uma primeira onda de quebra de bancos aprofundada no mês de dezembro com a falência do Bank of United States5 Em março do ano seguinte uma nova onda que levou de roldão cerca de 5000 bancos Tentando conter esse movimento um verdadeiro pânico bancário o presidente Hoover criou em dezembro de 1931 um órgão Reconstruction Finance Corporation que deveria salvar bancos e outras instituições financeiras em risco de quebra No entanto o movimento de falências não foi contido entre o final de 1932 época da eleição de Roosevelt e março de 1933 mês da posse do novo presidente mais 4000 bancos deixaram de operar No total admitese que cerca de 11000 bancos encerraram suas atividades entre 1929 e 1933 MAZZUCCHELLI 2009 p215 Às falências bancárias pelas perdas que impunham aos seus depositantes e pela contração adicional do crédito somavamse aos outros fatores que aprofundavam a depressão da economia norteamericana Na tentativa de defender a economia nacional o governo norteamericano retrocedeu a uma política extremamente protecionista Ilustra essa política a lei SmootHawley de 1930 que ampliava as barreiras alfandegárias e estimulava ampla redução das importações Apesar de seu objetivo de auxiliar a recuperação da produção nacional a lei SmootHawley pode ter gerado 371 consequências adversas para o crescimento econômico pois provocou como reação a implementação de políticas protecionistas por outros países levando à queda dos fluxos de comércio internacional Além disso durante a Depressão até mesmo o fluxo internacional de capital pareceu secar Entre 1927 e 1933 os empréstimos internacionais caíram mais de 90 HOBSBAWM 1995 p93 Se todas as informações acima apresentadas sugerem o que foi a dimensão da Grande Depressão o dado mais eloquente e expressivo do drama vivido por amplas parcelas da população norteamericana é o do número de desempregados em 1929 somavam 1550000 em 1930 4340000 em 1931 8020000 em 1932 12060000 e em 1933 12830000 MAZZUCCHELLI 2009 p226 Diante dos números da Grande Depressão as tentativas do presidente Herbert Hoover e do Federal Reserve de recolocar a economia numa direção ascendente se mostraram pífias Só em 1933 após a posse de Roosevelt as ações do governo deram algum alívio à população mais afetada pela depressão Por outro lado a política externa norteamericana enrijecida pelas ações protecionistas e pelo mau ajustamento do novo padrãoouro ajudava a difundir ainda mais os efeitos da depressão para a economia mundial fazendo do crash de Nova Iorque um evento internacional 143 A DISSEMINAÇÃO DA GRANDE DEPRESSÃO PELO MUNDO A posição de destaque dentro da economia mundial tornou os Estados Unidos com suas políticas econômicas paíschave para os planos de desenvolvimento econômico de outros países Os elos entre os Estados Unidos e a Europa o Japão e a América Latina haviam se estreitado durante a década de 1920 Mais do que produtos industrializados o mundo recorria aos capitais norte americanos para saldar dívidas equilibrar a balança comercial ou mesmo promover investimentos nas economias nacionais Enquanto a Europa tentava recuperar a posição econômica de antes da Primeira Guerra Mundial utilizando para tanto empréstimos norteamericanos países periféricos dependiam do crescimento do comércio internacional para ampliar as exportações e garantir acesso aos produtos e serviços dos países centrais Assim se o boom econômico dos Estados Unidos durante a segunda metade da década de 1920 havia em muito auxiliado o crescimento econômico mundial arrefecendo os danos causados pela Primeira Guerra Mundial o crash da Bolsa de Nova Iorque por outro lado seria sentido de maneira ainda mais intensa por todo o mundo6 Na América Latina as mudanças foram abruptas e praticamente imediatas 372 Doze países mudaram de governo ou de regime entre 19301931 e entre eles dez por meio de golpes militares Tal radicalismo latinoamericano podese explicar em parte pela vulnerabilidade clássica frente à dependência das exportações num momento delicado de redução das relações comerciais internacionais Com rápida queda nas exportações e portanto na principal receita nacional a reação dos países no plano econômico foi a suspensão da conversibilidade permitindo a desvalorização de suas moedas entre fins de 1929 e o início de 1930 Entre 1880 e 1913 nunca ocorrera uma evasão em massa do padrãoouro como em 1929 afinal anteriormente a suspensão estava ligada às condições específicas internas dos países como má colheita conflitos militares políticas econômicas nacionais que levaram à crise enfim eventos que provocavam queda nas exportações ou interrupções da entrada de capitais em dados países Entretanto desta vez a crise era provocada pelo centro do sistema portanto sua radiação para os países periféricos era imediata e violenta EICHEENGREEN 2000 p107 Com a ruptura do elo entre produções primárias exportadoras dos países periféricos e mercado consumidor dos países centrais leiase Estados Unidos e Europa grande parte dos países latinoamericanos partiu para vias alternativas de crescimento econômico Assumindo grande autonomia no período logo após 1930 e por meio de Estados intervencionistas houve uma importante diversificação na agricultura além da expansão do processo de industrialização A substituição de importações foi desta maneira um processo significativo na construção de caminhos independentes ROTHERMUND 1996 p9899 Esses foram os casos do Brasil e da Colômbia países que dependiam da exportação de café e que desvalorizando a moeda e saindo do padrãoouro puderam incentivar a expansão da emergente indústria nacional O Chile exportador de minérios como o cobre e o Peru exportador de petróleo tiveram suas receitas reduzidas e seguindo a tendência abandonaram o padrãoouro e declararam moratórias voltandose para o desenvolvimento interno até 1937 quando as exportações voltariam a crescer O México sofreu demasiadamente no início da depressão pois sua economia estava estreitamente atrelada aos investimentos norteamericanos De qualquer maneira durante a depressão por meio de medidas protecionistas e o intervencionismo estatal conseguiu saldos positivos no crescimento econômico Finalmente a Argentina que mantinha uma intensa atividade comercial com a GrãBretanha por meio da exportação de carne e trigo produtos que garantiram grandes saldos em ouro para o país latino evitou declarar moratória às dívidas com os credores ingleses contudo para se defender desvalorizou a moeda e promoveu políticas protecionistas Ainda na periferia nos dois principais países da Ásia as reações à Grande 373 Depressão seguiram caminhos opostos A China era ainda na década de 1930 um país essencialmente agrário com os principais portos e a própria política monetária controlados pelos britânicos O padrão monetário era baseado na prata e não no ouro como grande parte do mundo o que possibilitou livrar a China da crise mundial por alguns anos Por outro lado o Japão era um país soberano controlando seu comércio e políticas econômicas O tardio retorno do Japão ao padrãoouro foi feito em 1930 já no momento de intensa turbulência econômica que causaria seu desligamento no ano seguinte A maior fraqueza japonesa naquele momento de depressão era a herança de estreitos laços econômicos com os Estados Unidos Para fugir da crise promoveuse a desvalorização cambial com a ascensão de um governo militar o Japão passou a investir num impressionante crescimento industrial e pôde assumir o papel de país hegemônico na região O Japão se aproveitou dos efeitos tardios da crise que se abatera sobre a China a desvalorização da prata no mercado mundial e a suspensão norteamericana de saídas de prata levou a China a crise para invadir a Manchúria em 1931 ROTHERMUND 1996 p110 A disseminação da Grande Depressão na Europa não foi tão imediata quanto na América Latina e no Japão contudo a desintegração do padrão ouro nos países periféricos ajudava a comprometer a estabilidade nos países centrais Mas foram causas internas à Europa que impulsionaram a expansão da crise iniciada na Áustria O país arcava com um grande endividamento externo e o principal banco de depósito austríaco o Credit Anstalt sofria com a crescente inadimplência A solução do governo foi intervir na economia auxiliando o banco com o aumento da circulação da moeda nacional em 25 em menos de três semanas a inflação e a desvalorização cambial eram inevitáveis As recentes experiências de hiperinflação incentivaram o início de uma nova onda de fuga de capitais do país Estava em jogo o tradeoff ou defender o sistema bancário austríaco ou sustentar o padrãoouro A Áustria enfim decidiu amparar o sistema bancário por meio de imposições de controle ao câmbio em vez de promover uma desvalorização de sua moeda A crise austríaca não demorou muito para atingir a Hungria e a Alemanha Os capitais estrangeiros depositados nos bancos húngaros nos primeiros sinais de pânico em Viena fugiram de Budapeste também O governo húngaro que ainda precisava quitar as dívidas de guerra e tinha receitas reduzidas devido à queda dos preços agrícolas impôs controles de câmbio e determinou que a conversibilidade da moeda doméstica em ouro fosse suspensa Assim como na Áustria o padrãoouro transformouse numa concha oca EICHENGREEN 2000 p116 374 O cenário alemão era muito semelhante ao austríaco já que os dois sistemas bancários estavam comprometidos com investimentos no setor industrial o qual diante da depressão sofreu grandes prejuízos e transferiu a crise para o setor bancário Depois da crise austríaca investidores nacionais e estrangeiros passaram a sacar dinheiro dos bancos alemães O Reichsbank amparou os bancos injetando liquidez no sistema bancário mas a dívida alemã de curto prazo continuava a pressionar as reservas do banco central O estoque de ouro reduziase diante da fuga de capitais e para defender o padrãoouro o Reichsbank recuou a uma política de restrição de créditos O arrocho de crédito aprofundou a falência de empresas e intensificou a crise bancária fazendo da Alemanha o país com uma das maiores taxas de desemprego na Europa 447 Em 13 de junho de 1931 o governo adotou controles sobre o câmbio deixando assim o padrãoouro A economia inglesa por outro lado estava resistindo na medida do possível à Grande Depressão até o início de 1931 A indústria do país já estava bem reduzida antes do crash de Nova Iorque afinal as políticas de valorização da libra e aumento das taxas de juros haviam desestimulado o crescimento industrial e as exportações de manufaturas desde a volta da GrãBretanha ao padrãoouro Deste modo o desempenho do balanço de transações correntes dependia essencialmente das receitas invisíveis provenientes do fornecimento de serviços e empréstimos Entretanto à medida que a depressão transbordava dos Estados Unidos para a América Latina e países da Europa Central uma nova fase de crescimento das barreiras alfandegárias e políticas protecionistas foi colocada em prática A queda no comércio internacional prejudicava a GrãBretanha cujas receitas provenientes do transporte marítimo e de seguros deterioramse amplamente Em 1931 para piorar a situação enquanto países latinoamericanos deixavam de pagar as dívidas externas Áustria Hungria e Alemanha proibiam as transferências de juros para a GrãBretanha Com queda nas receitas e aumento na saída de ouro do país a política implementada pelo Banco da Inglaterra foi aumentar a taxa de redesconto em 2 pontos em julho de 1931 A fuga de capitais continuou intensa e o aumento na taxa de juros agravava ainda mais as condições de emprego e aumentava o custo do serviço da dívida pública Em 19 de setembro de 1931 enfim a Grã Bretanha suspendeu a conversibilidade simbolizando o fim do padrãoouro mundial A libra que havia se tornado junto com o dólar a âncora cambial do novo padrãoouro em menos de três meses perdeu um terço de seu valor Essa desvalorização comprometeu a confiança em outras moedas As reservas em dólares dos bancos centrais estrangeiros foram convertidas em ouro em razão dos temores de que eles poderiam sofrer perdas de capital em 375 seus saldos na moeda EICHENGREEN 2000 p122 O temor de que o dólar pudesse ser desvalorizado fez com que no mercado se passasse a vender dólares o que foi contraatacado pelo aumento nas taxas de juros norte americanas De qualquer maneira a saída da GrãBretanha do padrãoouro tirava a legitimidade do antigo sistema monetário e já no início de 1932 outros 25 países abandonaram a conversibilidade e desvalorizaram suas moedas A França junto com outros países da Europa como Bélgica Suíça Holanda Tchecoslováquia Polônia e Romênia e ainda os Estados Unidos se manteve no padrãoouro depois de 1932 O país se beneficiava da desvalorização do franco em 1928 no momento do retorno ao padrãoouro Durante quase uma década essa desvalorização da moeda havia permitido que a balança comercial francesa fosse extremamente favorável e que as reservas de ouro crescessem Contudo à medida que o fim da conversibilidade era declarado por mais países com a consecutiva desvalorização das moedas a vantagem cambial francesa foi se extinguindo e se transformando em desvantagem O limite se deu com a saída dos Estados Unidos do padrãoouro em 1933 por meio da nova política econômica apresentada pelo presidente Roosevelt tema do próximo capítulo O saldo no balanço de pagamentos francês estava sendo reduzido abruptamente e cada vez mais colocavase em risco a manutenção da conversibilidade principalmente quando a depressão atingiu o país em 1934 Junto com a França os outros países que permaneceram no padrãoouro perderam qualquer estímulo em perpetuar o sistema sem a presença dos Estados Unidos Logo todos os países que ainda mantinham o padrãoouro foram obrigados a abandonálo a França a Suíça e os Países Baixos o fizeram em 1936 Chegavase ao fim de uma era a do padrãoouro 144 O DEBATE SOBRE A GRANDE DEPRESSÃO O impacto da Grande Depressão foi sentido por todo o globo no decorrer da década de 1930 inclusive com revoluções sociais instauração de novas formas de governos e também criação de novas políticas econômicas Tal peculiaridade transformou o crash da Bolsa de Nova Iorque e a depressão dele decorrente num dos grandes temas dentre estudos e debates econômicos Para economistas e historiadores investigar as causas determinantes da maior crise da economia capitalista tinha um interesse que ia além do estritamente acadêmico tratavase de buscar na análise da crise argumentos de apoio para opções teóricas que por sua vez sustentavam diferentes orientações políticas e de política econômica Em especial estava em questão o papel do estado na 376 economia um estado mais intervencionista ou mais liberal Várias polêmicas se travaram em torno da crise da bolsa e da Grande Depressão Por exemplo a crise da bolsa em 1929 foi a causa da Grande Depressão ou tratase de eventos independentes A Grande Depressão tem causas monetárias ou se explica pelo declínio dos gastos ou insuficiência da demanda A Grande Depressão foi um fenômeno norteamericano cujos efeitos se disseminaram pelo mundo ou expressa desequilíbrios presentes na economia mundial já na década de 1920 A Grande Depressão resultou da fragilidade da economia ou de políticas econômicas equivocadas A seguir procuramos explorar algumas destas questões a fim de situar importantes contribuições de economistas para a discussão do tema identificando os argumentos teóricos e as evidências empíricas relevantes em cada caso Christina Romer propôs a primeira questão a crise da bolsa e a Grande Depressão foram eventos independentes As pessoas que não são economistas frequentemente veem a quebra da bolsa e a Grande Depressão como o mesmo evento A queda do preço das ações em outubro de 1929 e a tremenda redução do produto real entre 1929 e 1933 são vistos simplesmente como parte do mesmo declínio cataclísmico da economia americana Em contraste muitos economistas acreditam que os dois eventos são quando muito tangencialmente relacionados ROMER 1990 p597 Dornbusch e Fischer por exemplo afirmam que desde agosto de 1929 a economia norteamericana já se encontrava em trajetória descendente Desse modo a recessão teria se iniciado antes mesmo que se manifestasse o declínio dos preços das ações na bolsa de Nova Iorque DORNBUSCH FISCHER 1982 p304 No entanto Romer lembra que o declínio do produto real efetivamente iniciado em agosto de 1929 acelerouse dramaticamente após o colapso do preço das ações em outubro desse ano Desse modo admite haver uma ligação entre a quebra da bolsa e a aceleração do declínio do produto real no fim de 1929 e durante o ano de 1930 ROMER 1990 p598 Como explicar esse vínculo entre quebra da bolsa e Grande Depressão Um argumento frequente afirma que a redução da riqueza das famílias decorrente da queda do preço das ações teria induzido a suspensão de gastos principalmente em bens de consumo duráveis Romer descarta essa hipótese pois entende que no agregado o efeito da queda dos preços das ações sobre a riqueza não seria suficientemente elevada para justificar o brutal declínio do produto real Para Romer a redução dos gastos foi induzida pelo aumento da incerteza sobre a renda futura das famílias decorrente da crise na bolsa Diante da incerteza as compras principalmente de bens duráveis seriam postergadas Romer sugere que o aumento da incerteza também afetaria os gastos dos produtores em especial seus investimentos Desse modo a queda do produto real de fins de 1929 aos fins de 1930 teria como ponto de partida a 377 queda do preço das ações pela incerteza que teria gerado sobre o futuro da economia ROMER 1990 p602603 Ao afirmar que a depressão ganhou corpo pela redução dos gastos Romer nos permite introduzir uma polêmica central sobre a Grande Depressão a que opõe keynesianos a monetaristas De forma bastante sintética Temin define o núcleo da divergência explicativa O que eu chamei de a hipótese monetária afirma que o colapso do sistema bancário foi a causa primária da Depressão enquanto a hipótese do dispêndio afirma que uma queda no gasto autônomo agregado se situa na raiz do declínio TEMIN 1976 p7 A primeira formulação da hipótese do dispêndio provavelmente foi apresentada por J M Keynes em sua obra Treatise on Money publicada ainda em 1930 O boom de 19281929 e a recessão de 19291930 nos Estados Unidos correspondem respectivamente a um excesso e a uma deficiência de investimento Eu atribuo a recessão de 1930 primariamente aos efeitos desestimulantes sobre o investimento do longo período de dinheiro caro que precedeu o colapso do mercado de ações e só secundariamente ao próprio colapso Mas tendo ocorrido o colapso ele agravou substancialmente a situação especialmente nos Estados Unidos ao provocar desinvestimento no capital produtivo apud TEMIN 1976 p31 À hipótese de declínio do investimento foram agregados outros componentes do gasto cuja redução teria levado à recessão menor consumo menor demanda por imóveis e esgotamento das oportunidades de investimento8 Assim a hipótese do dispêndio se fixa na análise dos gastos e em sua forma extrema recusa o impacto deflacionário e recessivo de fatores monetários inclusive a quebra dos bancos sobre a economia norteamericana entre outubro de 1929 e setembro de 1931 GORDON WILCOX 1981 p54 Temin defensor dessa forma extrema discute o movimento dessas formas de dispêndio comparando a Grande Depressão com outras recessões a de 19211922 e a de 19371938 admite que essas variáveis só seriam responsáveis pela profundidade e duração da Grande Depressão se o seu comportamento fosse diferente do observado nas outras recessões Entende que o investimento e a demanda por imóveis não apresentaram entre 1929 e 1931 um comportamento substancialmente diferente daquele encontrado nas outras recessões É claro seu declínio contribuiu para a recessão porém não o suficiente para explicar a dimensão que o fenômeno adquiriu no início dos anos 1930 Na análise de Temin a redução do consumo foi o fator decisivo para a brutal redução do PIB e do emprego na Grande Depressão porém reconhece ser difícil explicar com rigor as razões dessa redução do consumo Como Romer entende que as perdas de riqueza decorrentes da quebra da bolsa não parecem ser suficientes para explicar a redução do consumo pois 378 representavam pequena parcela da riqueza global da sociedade norte americana A queda da renda agrícola decorrente de uma colheita pobre em 1929 também pode ter afetado o consumo porém é insuficiente para explicar a Grande Depressão Uma alternativa seria atribuir às expectativas de tempos piores a atitude de reduzir o consumo Temin pondera que em 1929 a maior parte das pessoas acreditava que os bons tempos continuariam e que em 1933 a expectativa era de tempos piores No entanto não pôde afirmar quando as expectativas otimistas de 1929 sofreram essa reversão Assim Temin conclui que No atual estágio de nosso conhecimento a parte não explicada da queda no consumo é maior do que a parte que podemos explicar porém a magnitude da queda total não está sujeita a controvérsia O forte declínio dos gastos de consumo para bens duráveis e não duráveis em 1930 teve um efeito profundamente depressivo sobre a economia TEMIN 1976 p172 Desse modo Temin defende a hipótese do dispêndio para explicar a Grande Depressão pelo menos em relação à queda do PIB entre 1929 e 19319 Nessa defesa há implícita uma polêmica com a hipótese monetária hipótese associada principalmente aos economistas Milton Friedman e Anna Schwartz Em meados dos anos 1960 Friedman e Schwartz publicaram o livro A Monetary History of the United States 18671960 que incluía uma resposta monetarista à interpretação fundada no dispêndio para explicar a profundidade da Grande Depressão Em sua versão extrema o monetarismo afirmaria que a contração de 19291933 foi iniciada e agravada por fatores monetários e que os fatores não monetários não tiveram qualquer papel GORDON WILCOX 1981 p53 Dado o caráter decisivo do elemento monetário nesta interpretação o Federal Reserve a autoridade monetária nos Estados Unidos assume papel central para explicar a Grande Depressão10 Schwartz apresenta uma síntese das relações entre oferta monetária e expansãoretração da economia de 1929 a 1933 definindo seis fases distintas No período anterior ao primeiro pânico bancário entre agosto de 1929 e outubro de 1930 ocorreu a quebra do mercado de ações ao qual o Federal Reserve respondeu com breve aumento na quantidade de moeda Em seguida houve declínio na quantidade de moeda mas não houve tentativa dos bancos para liquidar seus empréstimos e dos depositantes para retirar seus recursos Nesse período a contração da economia mostrouse tão severa quanto à observada em recessões anteriores não se justificando a noção de Grande Depressão até esse momento No último trimestre de 1930 verificouse o primeiro pânico bancário a quebra de bancos levando à redução da oferta monetária e a economia real 379 piorou sensivelmente No primeiro trimestre de 1931 sinais de recuperação da economia foram sufocados pelo início da segunda crise bancária em março de 1931 A parte final de 1931 foi marcada pela resposta do Federal Reserve à suspensão do padrãoouro pela GrãBretanha para fazer frente à desvalorização da libra o Federal Reserve aumentou as taxas de juros e restringiu a oferta monetária o que levou à eclosão de um novo pânico bancário e ao aprofundamento do declínio da economia que persistiu durante o primeiro trimestre de 1932 No segundo trimestre de 1932 o Federal Reserve realizou compras de títulos no openmarket aumentando a oferta monetária e induzindo a recuperação da economia real até o terceiro trimestre A partir do final de 1932 os problemas com bancos se alastraram a economia real novamente entrou em recessão e a contração culminou em março de 1933 com a quebra do Banco Holiday e o colapso dos mercados financeiros SCHWARTZ 1982 p67 A descrição dessas seis fases por Schwartz evidencia a lógica subjacente à explicação da Grande Depressão na perspectiva monetarista As variações da oferta monetária seja pela ação direta do Federal Reserve seja pelo impacto indireto sobre as falências bancárias foi o fator determinante do declínio da economia real E conclui ao se referir à obra escrita junto com Friedman Nosso principal tema era de que o efeito das forças econômicas que produziam a contração quaisquer que elas fossem era magnificado por um declínio sem precedentes da oferta monetária resultante das crises bancárias Nosso julgamento adicional era de que o Federal Reserve System poderia ter prevenido as consequências monetárias das crises bancárias mas fracassou em fazêlo SCHWARTZ 1982 p7 Em suma se o Federal Reserve tivesse praticado a política monetária adequada ou seja a que aumentasse a oferta monetária na proporção do aumento do produto real a falência dos bancos seria evitada e a Grande Depressão não teria a dimensão que adquiriu seria uma recessão semelhante a tantas outras verificadas na economia norteamericana Nem Temin nem FriedmanSchwartz levam ao extremo as hipóteses do dispêndio e monetarista Temin admite que depois de 1931 os fatores monetários importam para entender o aprofundamento da depressão igualmente FriedmanSchwartz consideram que os fatores monetários magnificaram a contração produzida por forças econômicas quaisquer que elas fossem No entanto a polêmica entre as duas correntes ia além da discussão das causas da Grande Depressão a hipótese do dispêndio ao 380 afirmar que a contração resultara da redução dos gastos implicitamente sugeria que as recessões deveriam ser combatidas por meio da realização de gastos do governo ou seja as políticas sugeridas por Keynes em especial na sua obra Teoria Geral do Emprego do Juro e da Moeda A hipótese monetarista afirmava que a Grande Depressão resultara de uma política monetária equivocada e mais que o mercado com a política monetária correta e sem a necessidade de gastos do governo seria incumbido da tarefa de evitar a deflação e a recessão e também a inflação Tratavase portanto de um desdobramento da polêmica sobre a eficácia da política fiscal ou da política monetária para enfrentar recessões polêmica que polarizou as correntes keynesianas e monetaristas durante décadas e um debate que se reproduz até os dias atuais quando se discute como enfrentar mais uma crise da economia capitalista ao nível mundial As causas da Grande Depressão também foram discutidas numa perspectiva mais ampla neste caso se estabelecia outra dicotomia a depressão foi um fenômeno norteamericano que se disseminou pelo mundo ou a economia internacional da década de 1920 comportava grandes inconsistências que tiveram na Grande Depressão um de seus resultados De um lado autores como Sir Arthur Lewis HW Arndt Robert Triffin e Charles Kindleberger11 apresentam suas hipóteses tendo em vista a evolução e transformação da economia internacional ao longo da década de 1920 Para esses autores mais que os fatores internos à economia dos Estados Unidos foram elementos presentes nas estruturas da economia internacional que em mau funcionamento tornaramse geradores e propagadores da depressão Assim a Grande Depressão ao assumir o caráter da maior crise do capitalismo representaria uma profunda disfunção das relações econômicas dos Estados Unidos com a economia internacional Tratase de situar os Estados Unidos dentro de uma visão global em que o contexto histórico internacional e as estruturas econômicas mundiais passaram a ser fatores essenciais dentre as causas do colapso da Bolsa de Nova Iorque como da difusão para o alémmar da crise numa longa e dura depressão econômica Entre os primeiros autores que sintetizaram análises sobre a Grande Depressão nessa perspectiva estavam H Arndt com o livro de 1944 Economic lessons of the 1930s e Sir Arthur Lewis com o livro de 1949 Economic Survey 1919 1949 As duas interpretações recuperam a evolução do mercado internacional durante os anos 1920 e por isso acabam tendo elementos que se entrecortam e aproximam Arndt enfatizava o aumento das políticas protecionistas após a Primeira Guerra Mundial enquanto Lewis se voltava aos problemas da explosão da produção agrícola mundial e a consecutiva queda nos preços dos produtos primários KENWOOD LOUGHEED 1992 p223 381 Ambos os autores partem da crise mundial deixada pela Primeira Guerra O protecionismo era consequência tanto da redução da produção industrial como da crise nas balanças comerciais europeias Em média entre 1913 e 1927 a tarifa europeia para produtos manufaturados subiu cerca de 50 Por outro lado matériasprimas e produtos agrícolas tornavamse abundantes No entender de Sir Arthur Lewis a abundância de produtos era resultado primeiro da taxa de crescimento populacional que havia perdido o fôlego e no caso europeu da população que havia se reduzido abruptamente com a consequente redução da taxa de natalidade Em segundo lugar da produção mundial que havia aumentado substancialmente com absorção de novas regiões produtoras Com o retorno da produção europeia ao fim da Primeira Guerra Mundial essas novas regiões perdiam mercado e o preço dos produtos despencava Portanto para o autor o cerne do problema era O declínio do comércio de produtos manufaturados não se deveu nem às tarifas nem à industrialização de novos países O comércio de produtos manufaturados só foi reduzido porque os países industrializados estavam comprando quantidades pequenas demais de produtos primários e pagando um preço muito baixo por aquilo que compravam apud LANDES 2005 p389391 Ainda seguindo a perspectiva de considerar as causas da Grande Depressão como fenômeno global duas importantes sínteses seriam elaboradas durante as décadas de 1960 e 1970 Todavia para esses autores mais importante do que elementos conjunturais presentes nas leituras de Sir Lewis e H Arndt era preciso considerar o crash como representação do final de uma era Seria assim a manifestação da crise do sistema monetário internacional dominante durante a segunda metade do século XIX mas que precisava se remodelar a partir de então Escrevendo o livro Gold and the Dollar Crisis o economista belga Robert Triffin imputou a grande crise de 1929 ao mau funcionamento do padrãoouro durante a década de 1920 Triffin acreditava que a nova estrutura que assegurava as trocas internacionais era incompatível com o padrãoouro e desta maneira o sistema tendia a entrar em colapso mais cedo ou mais tarde Paralelamente Charles Kindleberger com o livro The World in Depression 19291939 de 1973 realizou uma das mais amplas sínteses sobre a Grande Depressão encarandoa como uma crise no sistema econômico mundial herdado do século XIX Para o autor o sistema econômico mundial na década de 1920 sofria de uma instabilidade latente superprodução de produtos primários e forte redução de seus preços insistência da França em cobrar reparações de guerra da Alemanha demandas americanas pelo pagamento das dívidas de guerra sobrevalorização da libra e subvalorização do franco suspensão dos empréstimos externos por Nova Iorque e a quebra do mercado 382 de ações são indicadores dessa instabilidade Mas apesar dessa instabilidade latente a Grande Depressão não seria inevitável A explicação deste livro é que a depressão de 1929 foi tão ampla tão profunda e tão prolongada porque o sistema econômico internacional se tornou instável pela incapacidade britânica e pela falta de vontade americana de assumirem a responsabilidade de estabilizálo desempenhando cinco funções Manter um mercado relativamente aberto para bens com dificuldades no mercado Prover empréstimos de longo prazo contracíclicos ou pelo menos estáveis Supervisionar um sistema de taxas de câmbio relativamente estável Assegurar a coordenação de políticas macroeconômicas Agir como emprestador de última instância provendo liquidez nas crises financeiras KINDLEBERGER 1986 p289 Entretanto essa forma de análise sistêmica presente nas obras de Triffin e Kindleberger somente ganhou força depois da década de 1960 com a perspectiva mais distante do fenômeno Os anos posteriores ao crash foram anos de intenso debate político sobre qual seria o caminho a percorrer para recuperar a economia Por isso mesmo durante muito tempo os fatores estritamente ligados à economia norteamericana foram enfatizados A divergência entre keynesianos e monetaristas se insere neste quadro mas visões mais amplas das raízes da Grande Depressão nos Estados Unidos também foram elaboradas Um exemplo dessa abordagem nos é dada por um economista keynesiano John Kenneth Galbraith mas cuja análise da Grande Depressão vai bem além da hipótese do dispêndio Galbraith situa as raízes estruturais do fenômeno sem ignorar seus aspectos mais notórios Em seu livro O Colapso da Bolsa 1929 de 1954 é enfático logo no primeiro capítulo O craque do mercado de ações no outubro de 1929 há muito tempo vem sendo considerado como um acontecimento secundário Porém o craque do mercado de ações e a especulação que o tornou inevitável tiveram um efeito importante no comportamento ou melhor no mau comportamento da economia nos meses e anos subsequentes GALBRAITH 1972 p32 Nesse sentido o crash de Wall Street era resultado de um intenso processo especulativo que foi para Galbraith a causa primordial da depressão diferentemente por exemplo das análises de Arndt e Lewis Assim o autor acaba se vinculando às teorias keynesianas não só ao discutir a evolução do crash da bolsa mas ao defender as políticas econômicas identificadas com as propostas keynesianas para enfrentar a depressão durante a década de 1930 383 Recuperando todo o histórico anterior ao crash da Bolsa de Nova Iorque Galbraith demonstrou que existiam forças deflacionárias dos Estados Unidos que avançavam inversamente ao crescimento dos investimentos na bolsa de valores de Nova Iorque A queda na demanda por projetos imobiliários a redução do crescimento da população e dos créditos hipotecários a crise no setor agrícola e finalmente o crescimento limitado do consumo de bens duráveis eram alguns dos principais elementos deflacionários na economia dos Estados Unidos Assim no entender do autor o mercado de ações é apenas um espelho que talvez como nesse caso um tanto tardiamente proporciona uma imagem da situação econômica implícita ou fundamental Causa e efeito originamse da economia para o mercado de ações nunca o contrário Em 1929 a economia estava a caminho da crise Finalmente essa crise se refletiu de modo violento em Wall Street GALBRAITH 1972 p127 E como entender que acionistas e investidores continuavam a transacionar na bolsa com esse ambiente de crise Na verdade segundo Galbraith muito mais importante do que a taxa de juro e o fornecimento de crédito é a disposição de ânimo A especulação em grande escala requer uma sensação penetrante de confiança otimismo e convicção de que as pessoas comuns estavam destinadas a ser ricas GALBRAITH 1972 p212 E foi essa confiança de contínuos ganhos reafirmados a todo o momento por banqueiros e especuladores a facilidade de créditos no mercado e o incentivo à compra de ações ordinárias que asseguraram por longos meses o crescimento do mercado acionário E por trás desse cenário de expansão especulativa a economia norte americana se alicerçava em bases não muito sólidas Para Galbraith eram cinco as fraquezas da economia dos Estados Unidos 1 má distribuição de renda provocando um estreitamento do mercado consumidor 2 má estrutura das empresas que aceitavam a compra de seus ativos por especuladores e geravam a redução nos investimentos e o aumento das pressões deflacionárias 3 má estrutura bancária com a grande quantidade de bancos que podiam provocar uma reação em cadeia com as falências 4 estado duvidoso das transações com o exterior ilustrado pelo desequilíbrio do comércio internacional com os Estados Unidos 5 o empenho da política econômica conservadora que presa numa camisa de força não permitia que o padrão ouro fosse suspenso e o déficit público fosse utilizado como instrumento de política econômica Estudos mais recentes sobre a Grande Depressão têm sugerido abordagens mais ecléticas de certo modo os vários fatores acima levantados nas várias interpretações da quebra da bolsa e da Grande Depressão são articulados numa explicação mais abrangente É o caso por exemplo de Eichengreen em artigo 384 de 1992 inclui em sua discussão vários elementos mudanças na composição da produção funcionamento dos mercados de trabalho operação do sistema monetário internacional padrão das relações internacionais política monetária dos Estados Unidos papel do padrãoouro na transmissão da recessão norte americana para outros países protecionismo são fatores estudados em sua relação com a Grande Depressão EICHENGREEN 1992 A tensa polarização entre keynesianos e monetaristas certamente perdeu sua força na discussão dos eventos de 1929 e da década de 1930 No entanto a crise financeira que se propagou pelo mundo a partir dos Estados Unidos desde 2008 trouxe à tona novamente as propostas keynesianas recolocando de certo modo a polêmica sobre a política econômica adequada para enfrentar uma recessão Esta foi aliás questão presente no restante da década de 1930 quando mudanças políticas e de política econômica alteraram radicalmente o panorama da economia mundial REFERÊNCIAS ARNDT H 1963 The Economic Lessons of 1930s London Crass DORNBUSCH R FISCHER S 1982 Macroeconomia São Paulo McGrawHill do Brasil EICHENGREEN B 1992 The Origins and Nature of the Great Slump Revisited Economic History Review XLV 2 maio EICHENGREEN B 2000 A Globalização do Capital Uma História do Sistema Monetário Internacional São Paulo Editora 34 FRIEDMAN M SCHWARTZ A 1963 A Monetary History of the United States 18671960 Princeton Princeton University Press GALBRAITH J K 1972 O Colapso da Bolsa 1929 São Paulo Expressão e Cultura Primeira Edição de 1954 GORDON R J WILCOX J A 1982 Monetarist Interpretations of the Great Depression An Evaluation and Critique BRUNNER K Ed The Great Depression Revisited New York Rochester HOBSBAWM E 1995 A Era dos Extremos O Breve Século XX 19141991 São Paulo Cia das Letras 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principalmente por seu impacto sobre a Europa Em 2012 os efeitos da crise ainda se disseminaram pelo mundo dificultando a comparação com a Grande Depressão dos anos 1930 2 Vale ressaltar aqui a teoria do economista russo N D Kondratiev que durante a década de 1920 desenvolveu sua teoria dos ciclos considerando que para cada período de 5060 anos de uma onda longa de desenvolvimento a onda Kondratiev existiria uma fase de expansão seguida de outra de declínio da economia Ciclos e flutuações econômicos também foram tratados por Clement Juglar Ernest Labrousse Joseph Kitchin Joseph A Schumpeter Simon Kuznets e Artur Burns entre outros 3 No fim de 1928 e início de 1929 os bancos norteamericanos começaram a resgatar seus empréstimos europeus de modo que as exportações líquidas de capital vindas dos Estados Unidos que haviam subido de menos de US 200 milhões em 1926 para mais de US 1 bilhão em 1928 despencaram de novo para US 200 milhões de 1929 LANDES 2005 p395 4 O Comitê de Investimento do Mercado Aberto seguindo recomendações do Federal Reserve limitou em setembro de 1929 as compras de títulos de curto prazo do governo ao valor de US 25 milhões por semana Em decorrência dessa limitação de compra de títulos os bancos privados podiam descontar menores quantidades de dinheiro reduzindo a liquidez do mercado como um todo 5 A primeira onda de falências bancárias esteve associada à crise da agricultura norteamericana A queda dos preços recebidos pelos agricultores não compensada por queda proporcional dos preços pagos pelos insumos reduziu sua renda em mais de 30 de 1929 a 1930 e em cerca de 60 de 1929 a 1933 Evidentemente muitos agricultores foram incapazes de saldar seus empréstimos levando à quebra de pequenos bancos de regiões agrícolas como o MeioOeste e o Sul MAZZUCCHELLI 2009 p214215 6 Para um estudo detalhado sobre o impacto da Grande Depressão no mundo ver ROTHERMUND 1996 7 Entre 19321933 no pior período da depressão as taxas de desemprego chegaram a 22 na GrãBretanha 24 na Suécia 27 nos Estados Unidos 29 na Áustria e 31 na Dinamarca HOBSBAWM 1995 p97 8 Temin faz minuciosa resenha das contribuições à hipótese do dispêndio TEMIN 1976 p31 53 9 Temin entende que depois de 1931 com a suspensão do padrãoouro na Inglaterra e a mudança na política monetária norteamericana o aprofundamento da recessão responde a um conjunto mais amplo de fatores que não pode ser reduzido à hipótese do dispêndio 10 O fundamento teórico da interpretação monetarista da Grande Depressão é a teoria quantitativa da moeda reformulada por Milton Friedman De forma bastante esquemática podemos dizer que nesta versão a autoridade monetária por meio de sua política não tem capacidade para afetar variáveis reais como produto e emprego de forma duradoura embora possa ter alguma influência por períodos limitados Assim a autoridade monetária deveria se concentrar no controle do nível de preços Para tanto deveria controlar a oferta de moeda de modo que sua expansão acompanhasse o crescimento do produto real se a oferta de moeda crescesse menos do que o produto real haveria deflação se crescesse mais haveria inflação 11 ARNDT HW The Economic Lessons of the NineteenThirties Oxford Oxford University Press 1944 LEWIS WA Economic Survey 19191939 London George Allen Unwin1949 TRIFFIN R Gold and the Dollar Crisis New Haven Yale University Press 1960 KINDLEBERGER C The World in Depression 19291939 London Penguin 1973 688 História Econômica do Século XX 012024 Fichamentos da Unidade 2 FICHAMENTO 1 OPCIONAL ESPECIFICAR O TEXTO Referência SOBRENOME DO AUTOR Nome do autor Título da obra subtítulo da obra Local Editora ano da edição consultada Capítulo ou parte da obra que está sendo resenhada se for o caso 1 Objetivos do texto 2 Argumentos desenvolvidos no texto 3 Impressões do estudante sobre o texto 4 Trechos que por alguma razão você queira destacar com indicação de página FICHAMENTO 2 OPCIONAL ESPECIFICAR O TEXTO Referência SOBRENOME DO AUTOR Nome do autor Título da obra subtítulo da obra Local Editora ano da edição consultada Parte da obra que está sendo resenhada 1 Objetivos do texto 2 Argumentos desenvolvidos no texto 3 Impressões do estudante sobre o texto 4 Trechos que por alguma razão você queira destacar com indicação de página FICHAMENTO 3 OPCIONAL ESPECIFICAR O TEXTO Referência SOBRENOME DO AUTOR Nome do autor Título da obra subtítulo da obra Local Editora ano da edição consultada Parte da obra que está sendo resenhada 1 Objetivos do texto 2 Argumentos desenvolvidos no texto 3 Impressões do estudante sobre o texto 4 Trechos que por alguma razão você queira destacar com indicação de página A EVOLUÇÃO APÓS A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL O emprego e a produtividade no processo de crescimento econômico História Econômica do Século XX 072024 Fichamentos da Unidade 2 FICHAMENTO Referência SAES Flávio Azevedo Marques de SAES Alexandre Macchione História econômica geral 2013 Editora Saraiva Capítulo 14 A GRANDE DEPRESSÃO 19291933 1 Objetivos do texto O objetivo desse texto é fornecer uma análise sobre a Grande Depressão de 19291933 destacando o impacto econômico nos Estados Unidos e no mundo O texto aborda a quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque em 1929 as consequências da crise econômica a recorrência de crises ao longo do desenvolvimento capitalista e a influência desses eventos em eventos históricos posteriores como a ascensão do Nazismo do Fascismo e o fortalecimento da economia soviética O texto explora as diferentes teorias econômicas e políticas associadas à compreensão da crise de 1929 e da Grande Depressão destacando as implicações para a política econômica O objetivo é fornecer uma visão abrangente e analítica desses eventos históricos considerando diferentes perspectivas teóricas e suas influências no cenário econômico e político da época 2 Argumentos desenvolvidos no texto Os autores destacam a recorrência de crises econômicas ao longo da história e a elaboração de teorias dos ciclos econômicos para justificar e prever momentos de prosperidade e regressão na economia O texto enfatiza que a compreensão dos eventos da década de 1930 é essencial para entender o surgimento do New Deal a ascensão do Nazismo e do Fascismo na Europa bem como o fortalecimento da economia soviética 3 Impressões do estudante sobre o texto O capítulo 14 de Saes e Saes apresenta um panorama detalhado da Grande Depressão destacando a quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque em 1929 como um marco decisivo O impacto da crise econômica não se limitou aos Estados Unidos afetando também outras partes do mundo A recorrência de crises econômicas levou à elaboração de teorias dos ciclos econômicos por diferentes economistas O texto destaca a lenta recuperação da economia norteamericana após a depressão e como os efeitos da crise influenciaram eventos políticos e econômicos posteriores como o New Deal e a ascensão do Nazismo e do Fascismo na Europa As explicações sobre a crise e a Grande Depressão apresentam diferentes concepções teóricas e implicações em termos de política econômica o que justifica a quantidade de estudos dedicados a esses temas 4 Trechos que por alguma razão você queira destacar com indicação de página Menos de uma década antes do colapso da bolsa em 1929 norteamericanos e britânicos haviam enfrentado outra severa depressão Entre 1920 e 1921 como já discutido no capítulo anterior uma forte deflação nos preços causada em parte pela saturação do mercado em parte pelas políticas restritivas governamentais fez despencar a produção nos Estados Unidos e na GrãBretanha Considerando o impacto imediato a deflação de 19201921 parece tão ou mais severa do que a recessão de 19291930 assim como da recessão que ocorreu em 19371938 o declínio do PIB em 1921 foi comparável ao de 1930 e maior do que o de 1938 a deflação foi maior do que em 1930 e 1938 assim como o aumento do desemprego p 359 há razões adicionais para a quantidade de estudos dedicados a esses temas explicações da crise e da Grande Depressão colocam frente a frente concepções teóricas distintas com implicações em termos de política econômica A compreensão dos eventos para keynesianos e para monetaristas é completamente diferente mais importante suas explicações sugerem que diferentes políticas econômicas poderiam ter induzido outro curso para os acontecimentos da década de 1930 p 361 362 O diferencial inglês era o seu balanço de pagamentos porque ao mesmo tempo em que era o maior exportador de serviços e capital do mundo o mercado britânico era também o maior consumidor de produtos primários dos mais diferentes países Esse fato era importante para países como Brasil e Argentina entre muitos outros que podiam exportar seus produtos primários como o café o trigo e a carne e com isso criavam receitas para realizar importações de produtos manufaturados serviços e empréstimos ingleses p 363 Por outro lado internamente um dos primeiros sinais de que o crescimento da economia norte americana estava desgovernado ocorreu com a especulação imobiliária na Flórida anos antes do craque da Bolsa O crescimento da renda da elite norteamericana as melhorias nos meios de transporte e a disposição dos especuladores para ganhar dinheiro de maneira rápida possibilitaram um aumento da demanda por balneários turísticos p 365 Nos meses anteriores ao grande crash da bolsa essa política restritiva defendida pelo Federal Reserve uma ação controversa para o período emergiria como outro elemento para a crise Conforme as perspectivas de pessimistas se concretizavam o banco central norteamericano passou a elevar as taxas de redesconto e buscava reduzir a circulação monetária como forma de arrefecer a explosão especulativa no mercado de ações p 366 Fatores internos à economia norteamericana auxiliavam esse arrefecimento no crescimento Afinal depois de meia década de amplo desenvolvimento o mercado chegava à sua saturação os norte americanos que podiam já haviam comprado casas carros e grande parte dos bens duráveis desejados p 367 O ambiente de incerteza decorrente da quebra da bolsa também deve ter gerado algum impacto na disposição de consumo das famílias Expectativas pessimistas provavelmente adiaram investimentos Em suma haveria fortes motivos para a redução da demanda como reação aos efeitos da crise da bolsa de Nova Iorque No entanto o prolongado declínio do PIB da produção industrial do nível de emprego e dos preços sugere a existência de outros mecanismos econômicos que conduziram à Grande Depressão p 370 Às falências bancárias pelas perdas que impunham aos seus depositantes e pela contração adicional do crédito somavamse aos outros fatores que aprofundavam a depressão da economia norteamericana p 371 Entre 1880 e 1913 nunca ocorrera uma evasão em massa do padrãoouro como em 1929 afinal anteriormente a suspensão estava ligada às condições específicas internas dos países como má colheita conflitos militares políticas econômicas nacionais que levaram à crise enfim eventos que provocavam queda nas exportações ou interrupções da entrada de capitais em dados países p 373 A solução do governo foi intervir na economia auxiliando o banco com o aumento da circulação da moeda nacional em 25 em menos de três semanas a inflação e a desvalorização cambial eram inevitáveis As recentes experiências de hiperinflação incentivaram o início de uma nova onda de fuga de capitais do país Estava em jogo o tradeoff ou defender o sistema bancário austríaco ou sustentar o padrãoouro p 374 a Grande Depressão ao assumir o caráter da maior crise do capitalismo representaria uma profunda disfunção das relações econômicas dos Estados Unidos com a economia internacional Tratase de situar os Estados Unidos dentro de uma visão global em que o contexto histórico internacional e as estruturas econômicas mundiais passaram a ser fatores essenciais dentre as causas do colapso da Bolsa de Nova Iorque como da difusão para o alémmar da crise numa longa e dura depressão econômica p 381 Estudos mais recentes sobre a Grande Depressão têm sugerido abordagens mais ecléticas de certo modo os vários fatores acima levantados nas várias interpretações da quebra da bolsa e da Grande Depressão são articulados numa explicação mais abrangente p 384
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HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL Flávio Azevedo Marques de Saes Alexandre Macchione Saes Editora Saraiva O Capítulo 14 A GRANDE DEPRESSÃO 19291933 dia 24 de outubro de 1929 ficou marcado na história como a Quinta feira negra considerado o dia decisivo para a quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque A quebra da bolsa está associada à pior crise econômica de toda a história norteamericana não só por seu profundo impacto sobre a própria economia dos Estados Unidos mas também pelos reflexos espalhados por todo o mundo1 Contudo as depressões já eram consideradas como inerentes ao desenvolvimento capitalista pensadas como a fase final de um período de crescimento A recorrência de crises levou à elaboração de teorias dos ciclos econômicos por economistas de diferentes orientações teóricas para justificar e prever os momentos de prosperidade e regressão na economia2 Menos de uma década antes do colapso da bolsa em 1929 norte americanos e britânicos haviam enfrentado outra severa depressão Entre 1920 e 1921 como já discutido no capítulo anterior uma forte deflação nos preços causada em parte pela saturação do mercado em parte pelas políticas restritivas governamentais fez despencar a produção nos Estados Unidos e na GrãBretanha Considerando o impacto imediato a deflação de 19201921 parece tão ou mais severa do que a recessão de 19291930 assim como da recessão que ocorreu em 19371938 o declínio do PIB em 1921 foi comparável ao de 1930 e maior do que o de 1938 a deflação foi maior do que em 1930 e 1938 assim como o aumento do desemprego Tabela 141 TABELA 141 Alterações nas variáveis macroeconômicas em três períodos 359 Fonte SCHWARTZ 1982 p17 PIB preços constantes 1958 Apesar dessas semelhanças a atenção dos analistas se voltou majoritariamente para a crise de 1929 e para a Grande Depressão dos anos 1930 Sem dúvida tanto pelo tempo de duração aproximadamente 24 meses consecutivos de quedas até a recuperação como pela difusão da crise imposta ao mundo a Grande Depressão foi a mais marcante e terrível para a economia mundial O impacto da depressão posterior à crise de 1929 se estendeu por longos anos de maneira que o PIB norteamericano apenas recuperou o valor referente ao período anterior ao colapso em 1937 O extraordinário desempenho da economia norteamericana durante a segunda metade da década de 1920 com a crescente produção de automóveis empreendimentos imobiliários e atividade acionária não foi repetido em momento algum durante a década seguinte Logo os investimentos norteamericanos de maneira geral continuariam tímidos pela década de 1930 e excluindo o ano de 1937 representado por uma rápida elevação nos investimentos e sucessiva queda diante de uma nova depressão a toada dessa década foi de uma economia em permanente fragilidade Tabela 142 Como se observa a partir de 1929 e até 1933 houve abrupta redução do PIB que caiu quase 30 no período assim como do investimento que chegou praticamente a zero em 1933 e dos dispêndios em construção Paralelamente observouse também forte deflação que junto com o elevado desemprego que atingiu a taxa de 25 completou o ambiente recessivo Se em 1933 se chegou ao fundo do poço a recuperação iniciada no ano seguinte foi lenta apenas em 1937 se retomaram os níveis de atividade de 1929 No ano de 1938 nova recessão Apenas durante a Segunda Guerra Mundial a economia norteamericana superou os prolongados efeitos da Grande Depressão da década de 1930 Esses efeitos da crise de 1929 e da depressão dos anos 1930 não ficaram restritos aos Estados Unidos e nem mesmo à esfera estritamente econômica No entender de Eric Hobsbawm Sem ele o crash de Nova Iorque com certeza não teria havido Hitler Quase certamente não teria havido Roosevelt É muito improvável que o sistema soviético tivesse sido encarado como um sério rival econômico e uma alternativa possível ao capitalismo mundial As consequências da crise econômica no mundo não europeu ou não ocidental foram patentemente impressionantes Em 360 suma o mundo da segunda metade do século XX é incompreensível se não entendermos o impacto do colapso econômico HOBSBAWM 1995 p91 TABELA 142 Desenvolvimento de componentes selecionados EUA 19191939 bilhões de dólares em 1929 Fonte TEMIN 1976 p46 Consequentemente para compreender o programa do New Deal e a ascensão do Nazismo e do Fascismo na Europa temas do próximo capítulo e ainda o fortalecimento da economia soviética tema do capítulo final desta parte o crash de 1929 é uma inflexão decisiva Tudo isso justificaria a eleição da crise de 1929 e da Grande Depressão dos anos 1930 como temas preferenciais de pesquisa No entanto há razões adicionais para a quantidade de estudos dedicados a esses temas explicações da crise e da Grande Depressão colocam frente a frente concepções teóricas distintas com implicações em termos de política econômica A compreensão 361 dos eventos para keynesianos e para monetaristas é completamente diferente mais importante suas explicações sugerem que diferentes políticas econômicas poderiam ter induzido outro curso para os acontecimentos da década de 1930 É claro as conclusões procuravam fortalecer argumentos que eram esgrimidos por essas correntes em relação à política econômica da época em que os economistas escreviam principalmente as décadas de 1950 1960 e 1970 A dicotomia keynesianos monetaristas não esgota as contribuições à polêmica sobre a crise de 1929 e sobre a Grande Depressão às diferentes interpretações dos eventos dedicamos o último tópico deste capítulo Antes procuramos expor os principais fatos que antecederam a crise de 1929 e o modo como se deu a propagação do impacto recessivo nos Estados Unidos e em algumas partes do mundo 141 O CRASH DA BOLSA DE NOVA IORQUE Frequentemente a quebra da bolsa de Nova Iorque em 1929 é explicada como fruto de um processo especulativo o aumento prolongado do preço das ações negociadas na bolsa ao longo de alguns anos tornouse excessivo constituindo o que se tem caracterizado como uma bolha Durante alguns anos a expectativa de que os preços das ações continuariam em alta era suficiente para que novas compras fossem efetivadas Em algum momento a percepção de que os preços das ações eram incompatíveis com os fundamentos das empresas levou alguns investidores à venda dessas ações Quando essa percepção se generalizou houve uma corrida para se livrar das ações provocando o rápido declínio de seus preços e o estouro da bolha Essa descrição bastante simplificada não é totalmente destituída de fundamento No entanto ela omite condições que definem o quadro econômico mais geral em que se inseriu a quebra da bolsa de Nova Iorque em 1929 Numa primeira aproximação podemos dizer que essas condições são de suas ordens de um lado o contexto internacional da década de 1920 e de outro o desempenho da economia norteamericana no período No contexto internacional como já discutido em parte no capítulo anterior os Estados Unidos começavam a assumir uma nova posição dentro da organização econômica mundial Posição hegemônica como maior país industrializado e maior credor do mundo que não havia amadurecido dentro do projeto político dos governos norteamericanos diante das pressões internas favoráveis a um certo isolacionismo Diferentemente da liderança da Grã Bretanha no período áureo do padrãoouro que se estendeu do século XIX à primeira década do século XX os Estados Unidos durante os anos 1920 eram um país praticamente autossuficiente o que reduzia a necessidade de 362 importações O diferencial inglês era o seu balanço de pagamentos porque ao mesmo tempo em que era o maior exportador de serviços e capital do mundo o mercado britânico era também o maior consumidor de produtos primários dos mais diferentes países Esse fato era importante para países como Brasil e Argentina entre muitos outros que podiam exportar seus produtos primários como o café o trigo e a carne e com isso criavam receitas para realizar importações de produtos manufaturados serviços e empréstimos ingleses Os Estados Unidos após a Primeira Guerra Mundial por outro lado haviam se tornado exportadores de capitais os empréstimos para a recuperação europeia e para o pagamento dos débitos de guerra e também exportadores de produtos industriais e primários Em contrapartida a autossuficiência norte americana não permitia que os países europeus por meio de exportações para os Estados Unidos criassem saldos para pagar os déficits comerciais e financeiros Logo a volta ao padrãoouro nos termos anteriores à Primeira Guerra Mundial envolvia um sério dilema financeiro para a Europa com o risco iminente de gerar uma profunda descapitalização das reservas de ouro Essa diferença entre as políticas econômicas britânicas e norteamericanas era refletida no sistema financeiro Enquanto o banco central norteamericano Federal Reserve Board era influenciado de maneira contundente por interesses internos o Banco da Inglaterra manteve uma posição de controle das finanças internacionais atuando no limite como emprestador em última instância ROTHERMUND 1996 p2122 Este fato não impediu que Benjamin Strong presidente do Federal Reserve Bank de Nova Iorque rebaixasse as taxas de redesconto norteamericanas em 1924 e 1927 como forma de apoiar a estabilização das moedas europeias Em 1924 o banco norteamericano aceitou as reivindicações britânicas com Winston Churchill à frente do Tesouro inglês para o retorno ao padrãoouro abaixando sucessivamente as taxas de redesconto norteamericanas Já em 1927 diante da contínua fraqueza da economia europeia frente aos Estados Unidos Montagu Norman presidente do Banco da Inglaterra Charles Rist presidente do Banco da França e Hjalmar Schacht presidente do Banco Alemão viajaram a Nova Iorque para pedir uma nova redução na taxa de redesconto do Federal Reserve Benjamin Strong aceitou o pedido reduzindo a taxa de 4 para 35 Isso por um lado como esperado permitia que o capital voltasse a procurar os centros financeiros de Londres Paris e Berlim e por outro lado barateando ainda mais o crédito ajudava naquele momento a expansão de empréstimos financiamentos de novos negócios e possivelmente de especulação Em situação especialmente delicada estava a GrãBretanha que por meio de uma política deflacionária e restritiva além da sobrevalorização da libra 363 havia reduzido seu poder de compra no exterior O objetivo dos líderes ingleses era tentar recuperar a posição de centro financeiro mundial e para isso buscavam fortalecer a moeda nacional pressionando toda a sociedade pelos altos níveis de desemprego A França por outro lado voltaria ao padrãoouro com uma moeda tremendamente desvalorizada tornando seus produtos mais baratos no mercado internacional aumentando as exportações e em contrapartida tornando os produtos estrangeiros mais caros reduzindo suas importações Políticas econômicas como a francesa de Poincaré tornavam as trocas internacionais mais difíceis e nessas condições de instabilidade monetária e desequilíbrio dos pagamentos o padrãoouro como uma espécie de lei fundamental das relações monetárias internacionais ficou obsoleto Nenhuma nação estava disposta a abrir mão de seu direito de soberania para proteger sua moeda como julgasse conveniente e poucas nações podiam arcar com a aceitação das restrições implícitas na conversibilidade LANDES 2005 p388 Assim até 1927 por mais que as incongruências e os desequilíbrios da economia mundial já estivessem postas em cena existia uma disposição dos Estados Unidos para auxiliar a recuperação europeia e consequentemente compensar as perdas nas balanças econômicas Tal fato estava implícito nas ações de Benjamin Strong e do Plano Dawes cujo objetivo era criar recursos para a Europa especialmente para a Alemanha que devia vultosas somas de reparações de guerra Tais ações não eram gratuitas pois além de auxiliar a reconstrução europeia os empréstimos dos Estados Unidos estavam garantindo poder de compra para países como França Inglaterra e Alemanha poder de compra que em parte se dirigia à importação dos produtos norte americanos No final da década de 1920 enfim o fluxo desses recursos provenientes de empréstimos começou a diminuir A falta de garantias do retorno dos pagamentos rompeu com as levas de empréstimos para a Alemanha em 1928 ROTHERMUND 1996 p343 Somavase a esse problema o boom agrícola mundial O crescente volume da produção agrícola e especialmente de trigo reduziu os preços mundiais no momento de contração do crédito A queda dos preços agrícolas pressionava ainda mais as economias periféricas que perdiam sua principal fonte de renda como num efeito em cadeia sem entrada de ouro nos países periféricos pela queda nas exportações era reduzida a demanda por produtos industrializados provenientes da Europa e dos Estados Unidos Portanto a economia mundial inteira acabava perdendo poder de compra diminuindo o ritmo do crescimento econômico e gerando um ciclo deflacionário Em suma o ambiente internacional no final da década de 1920 perdera seu ímpeto expansionista tendendo mesmo à estagnação 364 Por outro lado internamente um dos primeiros sinais de que o crescimento da economia norteamericana estava desgovernado ocorreu com a especulação imobiliária na Flórida anos antes do craque da Bolsa O crescimento da renda da elite norteamericana as melhorias nos meios de transporte e a disposição dos especuladores para ganhar dinheiro de maneira rápida possibilitaram um aumento da demanda por balneários turísticos Nas palavras de Galbraith em meados da década de 1920 Miami Coral Gables a costa Oriental tão distante do Norte como de Palm Beach e as cidades do condado de Gulf tinham sido atacadas pelo grande boom imobiliário da Flórida GALBRAITH 1972 p39 As aquisições iniciais levaram à região da Flórida não só turistas interessados em passar os quentes verões nas praias do sul dos EUA mas também inúmeros especuladores que viam as terras se valorizando semanalmente Em 1925 grandes porções de terras eram divididas em inúmeros terrenos que trocavam de mãos compulsivamente sempre na esperança de uma nova valorização O que era chamado de praia ficava a dez vinte ou trinta quilômetros do trecho mais próximo do mar GALBRAITH 1972 p40 Em 1926 a febre por novos terrenos na Flórida pareceu declinar e para piorar no final desse mesmo ano dois grandes furacões devastaram parte considerável dos bens na região aumentando ainda mais o desinteresse de novos compradores Os cheques para compensação em Miami que haviam totalizado US 1066528000 em 1925 tiveram seu valor reduzido incrivelmente para US 143364000 em 1928 A crença do rápido enriquecimento pela especulação imobiliária havia chegado ao fim e grande parte daqueles que haviam adquirido os terrenos perdeu sua posse para os proprietários originais devido à falta de pagamento Independentemente da queda especulativa na Flórida as perspectivas para os investidores nas bolsas norteamericanas se mostravam extremamente positivas Era difícil imaginar que os preços das ações ordinárias estivessem subindo senão por causa do aumento dos lucros das empresas E mesmo os meses de 1928 em que uma grande variação nas vendas acabou provocando prejuízos para alguns investidores como março e junho não desanimaram os negócios nas bolsas O discurso do presidente em final de mandato Calvin Coolidge em 4 de dezembro de 1928 reafirmava aos norteamericanos um futuro otimista Nas palavras do presidente Nenhum Congresso dos Estados Unidos já reunido até hoje para apreciar o estado da União viuse diante de uma perspectiva mais agradável do que a que se apresenta no momento atual No campo nacional há tranquilidade e contentamento e o recorde absoluto de anos de prosperidade No campo internacional há paz a boa vontade proveniente do entendimento mútuo GALBRAITH 1972 p37 365 Em 1928 Calvin Coolidge se despedia da presidência dando lugar ao também republicano Herbert Hoover animando novamente o mercado acionário A quantidade de empréstimos subia a níveis incríveis os doze bancos ligados ao Federal Reserve realizavam empréstimos a taxas de 5 enquanto bancos e corretores repassavam esse capital para investidores a juros de 12 O capital adquirido por meio da arbitragem logo circulava no mercado para a compra de ações ordinárias a termo e como os bancos exigiam pequenas parcelas do valor das ações para realizar os empréstimos o capital se multiplicava de maneira estrondosa O processo especulativo realizado pelos bancos privados empresas e corretores era reconhecido pela Junta do Federal Reserve Board órgão responsável pela orientação e direção dos doze Bancos da Reserva Federal como em comunicado emitido em 2 de fevereiro de 1929 Contudo a área de atuação de Roy A Young presidente da Junta e de Benjamim Strong e George Harrison presidentes do principal Federal Reserve o de Nova Iorque o primeiro até sua morte em 1928 e o segundo presidente a partir de primeiro de janeiro de 1929 era restrita ao controle das operações de mercado aberto e manipulação das taxas de redesconto que eram inúteis para controlar o processo especulativo E foi efetivamente o que fizeram em agosto de 1929 depois de certos períodos de incerteza como a queda das ações entre os dias 25 e 26 de março o Federal Reserve aumentou a taxa de redesconto de 5 para 6 Nos meses anteriores ao grande crash da bolsa essa política restritiva defendida pelo Federal Reserve uma ação controversa para o período emergiria como outro elemento para a crise Conforme as perspectivas de pessimistas se concretizavam o banco central norteamericano passou a elevar as taxas de redesconto e buscava reduzir a circulação monetária como forma de arrefecer a explosão especulativa no mercado de ações4 De 35 no início de 1928 a taxa foi sendo aumentada constantemente até atingir seu ápice pouco antes de outubro de 1929 aos 6 Ação controversa porque ao mesmo tempo em que a elevação dos juros mostravase insuficiente para reduzir as transações econômicas entre bancos empresas e investidores o Federal Reserve por meio de sua política restritiva criava um ambiente deflacionário não incentivando novos investimentos no setor produtivo e assim reduzindo o crescimento econômico FRIEDMAN SCHWARTZ 1963 p363 Outro ingrediente para o não acompanhamento do estoque monetário com a demanda exigida pelo crescimento econômico norteamericano estava inscrito na retirada de circulação de parte do ouro ganho nas transações internacionais que era depositado no Forte Knox para evitar ainda mais pressões inflacionárias ROTHERMUND 1996 p54 Nesse ínterim o explosivo boom na formação de companhias de 366 investimento demonstrava que as ações do Federal Reserve eram infrutíferas No começo da década de 1920 essas empresas não somavam nem 40 no início de 1927 já eram 160 com a formação de mais 140 companhias no decorrer daquele ano em 1928 foram formados mais 186 consórcios de investimento e finalmente durante 1929 antes mesmo do final do mês de outubro já eram mais 265 consórcios Esses grandes consórcios tinham como objetivo levantar capital para investir em negócios diversificados mas geravam também uma supervalorização das ações por uma reação em cadeia de compras A força de alavanca era conseguida pela emissão de debêntures ações preferenciais bem como ações ordinárias para se adquirir mais ou menos exclusivamente uma carteira de ações ordinárias A maior parte ou o total do ganho proveniente dos valores ascendentes da carteira se concentrava nas ações ordinárias do consórcio de investimento que em consequência subiam de modo assombroso GALBRAITH 1972 p94 A presença dos consórcios de investimentos de grandes empresas e de bancos atuando no mercado de ações como financiadores demonstrava a explosão de crédito que houve no final da década de 1920 para ser direcionado a ganhos financeiros por meio da especulação Um dado sugere o quanto se ampliou a esfera financeira em grande medida por especulação entre 1925 e 1929 no primeiro desses anos o valor de novos investimentos no sentido macroeconômico era de US 35 bilhões ao passo que no ano de 1929 atingiu apenas US 32 bilhões Contudo o valor nominal das ações comercializadas foi de US 27 bilhões em 1925 enquanto em 1929 foi de US 87 bilhões Cada vez mais o valor comercializado na bolsa de valores perdia sua relação com o investimento e com a produção nacional já que os recursos estavam se concentrando apenas no mercado de ações e não no setor produtivo ROTHERMUND 1996 p50 Mensalmente durante o ano de 1929 abalos rondavam Wall Street As oscilações na bolsa eram justificadas como reajustamentos momentâneos pelos gurus do mercado acionário garantindo que a crença otimista se manteria firme Mas o desempenho da economia norteamericana não mais correspondia à expansão no mercado acionário A produção industrial de modo geral e mais especificamente os setores de aço de automóveis de empreendimentos imobiliários e de transporte de cargas ferroviárias não continuavam em ascensão Fatores internos à economia norteamericana auxiliavam esse arrefecimento no crescimento Afinal depois de meia década de amplo desenvolvimento o mercado chegava à sua saturação os norte americanos que podiam já haviam comprado casas carros e grande parte dos bens duráveis desejados Consequentemente com menos produtos para comprar e capitais em expansão estimulavase cada vez mais novos 367 investidores para o mercado acionário Por outro lado a concentração de renda impossibilitava que outras camadas da sociedade norteamericana pudessem consumir no mercado reduzindo as possibilidades para a manutenção das taxas de crescimento produtivo anteriores ROTHERMUND 1996 p4950 Os precedentes à explosão da bolha contudo não estavam restritos ao mercado interno dos Estados Unidos Na GrãBretanha em 20 de setembro de 1929 o reputado império industrial e financeiro da Clarence Hatry ruiu de repente apresentando irregularidades em seus negócios Talvez como reflexo dessa quebra em Massachusetts em 11 de outubro foi determinada a proibição do desdobramento de ações que chegava a criar de uma ação outras quatro Era uma proibição sem precedentes nos Estados Unidos mas era um sinal do receio do crescimento de ações sem correspondência com ativos reais Setembro e outubro tornaramse meses com tendência de baixa nos mercados acionários mas sujeita a momentos de bruscas alternâncias devido ao contínuo empréstimo dos corretores Do dia 19 ao dia 23 de outubro Wall Street fechou com outras grandes quedas Tanto a dúvida como a incerteza tomou conta de todo o mercado acionário O auge das quedas se deu na quintafeira negra dia 24 de outubro quando o medo avassalador acelerou ainda mais o ritmo da venda de ações alcançando 13 milhões de ações vendidas Notícias de suicídios de acionistas de quebras de bancos e empresas pioravam ainda mais o pânico no mercado Com a meta de reverter a situação diretores dos principais bancos norteamericanos foram a público entre eles Richard Whitney do Banco Morgan e Charles Mitchell do Federal Reserve de Nova Iorque formando o que ficou conhecido como apoio organizado objetivavam reter as quedas no mercado por meio da compra de ações de empresas estratégicas criando um efeito valorizador As reuniões causavam pequenos arrefecimentos nas quedas mas logo a incerteza e o pânico dos investidores geravam novas desvalorizações acionárias A semana seguinte manteve a propensão de quedas e pela primeira vez os empréstimos dos corretores tiveram uma brusca redução As companhias de investimento outrora o ponto culminante das valorizações acionárias agora se mostravam fragilizadas de maneira que seus títulos quando muito podiam ser vendidos por somas irrisórias Na terçafeira dia 29 de outubro mais de 16 milhões de ações haviam sido vendidas um novo recorde No dia 30 de outubro na quartafeira seguinte o Federal Reserve declarou feriado em Wall Street e voltou a reduzir as taxas de redesconto na esperança de ampliar a liquidez no mercado norteamericano Pouco aconteceu as quedas foram contínuas e mesmo considerando que em janeiro fevereiro e março de 1930 368 o mercado de ações apresentou uma recuperação substancial depois em abril a recuperação perdeu impulso e em julho houve outra grande queda A seguir com poucas exceções o mercado passou a cair de semana para semana de mês para mês e de ano para ano até o término de julho de 1932 GALBRAITH 1972 p182 Os preços das ações em Nova Iorque cujo pico foi atingido em setembro de 1929 índice 216 caíram a seu menor nível em junho de 1932 índice 34 Sua recuperação foi lenta e irregular o maior nível desde então até 1938 foi alcançado em fevereiro e março de 1937 índice 154 recuperando valores de 1928 KINDLEBERGER 1986 p9899 Em suma o impacto dos eventos de 1929 sobre o desempenho da bolsa foi profundo e prolongado 142 DA QUEBRA DA BOLSA DE NOVA IORQUE À GRANDE DEPRESSÃO NOS ESTADOS UNIDOS Se a quebra da bolsa de Nova Iorque tem um forte significado simbólico como expressão da crise do capitalismo muito mais graves e dramáticos foram os eventos identificados com a Grande Depressão Falências de bancos e empresas desemprego elevadíssimo crise da agricultura são componentes típicos do desempenho da economia norteamericana na década de 1930 com profundo impacto social e político A Grande Depressão induziu substanciais mudanças na economia tendo em vista a necessidade de enfrentar seus efeitos deletérios mudanças que serão tratadas no próximo capítulo Embora os sinais da Grande Depressão apareçam na sequência da quebra da bolsa de Nova Iorque não se pode atribuir apenas à crise da bolsa o início da depressão Alguns antecedentes já foram referidos anteriormente a expansão da indústria manufatureira e da construção civil sofria sensível redução nos anos finais da década de 1920 isso refletia tanto o elevado nível de investimento em capital fixo durante a década como certo arrefecimento da demanda de bens duráveis em especial automóveis e de habitações KINDLEBERGER 1986 p104 Como resultado ampliavase a capacidade ociosa e acumulavamse estoques Paralelamente a agricultura também enfrentava redução de sua renda pois o aumento da produção mundial de certas mercadorias como o trigo havia reduzido seu preço internacional Desse modo diferentes componentes da demanda se mostravam enfraquecidos antes mesmo da quebra da bolsa embora no agregado não impedissem a continuidade da expansão da economia norteamericana Também devemos lembrar que a partir de 1928 o Federal Reserve iniciou a elevação dos juros o que tendia a enfraquecer ainda mais a demanda No entanto depois de 1929 o declínio dos principais indicadores do desempenho 369 da economia foi abrupto como vemos na Tabela 143 TABELA 143 Estados Unidos Indicadores econômicos selecionados 19281933 Fonte MAZZUCCHELLI 2009 p210 A profundidade da Grande Depressão é suficientemente esclarecida por alguns indicadores entre 1929 e 1933 o declínio do PIB foi de cerca de 30 o da produção industrial de quase 40 o desemprego ascendeu a 25 da força de trabalho a deflação foi da ordem de 25 e as exportações se reduziram a pouco mais de 30 do que eram em 1929 Quais os fatores que conduziram a tais resultados Nos meses seguintes à quebra da bolsa alguns indicadores sofreram queda abrupta A produção industrial caiu do nível 110 em outubro para 105 em novembro e 100 em dezembro de 1929 a queda mais rápida desde 1920 os preços de commodities despencaram no mercado internacional entre setembro e dezembro de 1929 borracha menos 257 cacau menos 154 café menos 131 zinco menos 167 cobre menos 93 milho menos 141 trigo menos 36 KINDLEBERGER 1986 p112113 Esse rápido declínio imediatamente após a quebra da bolsa sugere alguma conexão entre os eventos embora haja diferentes hipóteses sobre essa conexão As perdas decorrentes da queda do preço das ações ao reduzirem a riqueza das famílias podem ter provocado a súbita redução das compras em especial de bens duráveis O ambiente de incerteza decorrente da quebra da bolsa também deve ter gerado algum impacto na disposição de consumo das famílias Expectativas pessimistas provavelmente adiaram investimentos Em suma haveria fortes motivos para a redução da demanda como reação aos efeitos da crise da bolsa de Nova Iorque No entanto o prolongado declínio do PIB da produção industrial do nível de emprego e dos preços sugere a existência de outros mecanismos econômicos que conduziram à Grande Depressão Kindleberger entende que a crise de liquidez que seguiu a quebra da bolsa 370 teve forte impacto sobre os gastos das famílias e das empresas para compensar as perdas financeiras sofridas na bolsa as famílias tentavam vender ativos por exemplo imóveis para pagar os encargos das hipotecas as empresas reduziam estoques com o objetivo de gerar liquidez e os bancos reduziam o crédito O resultado da busca pela liquidez com o corte de gastos foi o declínio dos preços A deflação se moveu do declínio no mercado de ações para os cortes de produção e as reduções de estoques em uma sequência e dos preços das ações para os preços das mercadorias e para o reduzido valor das importações em outra Ambas foram rápidas A conexão entre o mercado de ações e os mercados de bens foi em parte psicológica e em parte no início por meio dos mecanismos de crédito pois bancos e empresas lutavam para se tornar líquidos KINDLEBERGER 1986 p114 O Federal Reserve procurou por meio da redução dos juros se contrapor às forças deflacionistas e recessivas depois de outubro de 1929 as taxas caíram até 15 ao ano sem qualquer resultado efetivo sobre o desempenho da economia Na verdade os bancos não se dispunham a emprestar recursos diante da onda de falências que grassava naqueles anos e o ambiente recessivo também não estimulava empresas a tomarem empréstimos A política do governo também foi incapaz de impedir a falência de milhares de bancos O sistema bancário norteamericano era extremamente pulverizado no final dos anos 1920 havia cerca de 26000 bancos Em outubro de 1930 iniciouse uma primeira onda de quebra de bancos aprofundada no mês de dezembro com a falência do Bank of United States5 Em março do ano seguinte uma nova onda que levou de roldão cerca de 5000 bancos Tentando conter esse movimento um verdadeiro pânico bancário o presidente Hoover criou em dezembro de 1931 um órgão Reconstruction Finance Corporation que deveria salvar bancos e outras instituições financeiras em risco de quebra No entanto o movimento de falências não foi contido entre o final de 1932 época da eleição de Roosevelt e março de 1933 mês da posse do novo presidente mais 4000 bancos deixaram de operar No total admitese que cerca de 11000 bancos encerraram suas atividades entre 1929 e 1933 MAZZUCCHELLI 2009 p215 Às falências bancárias pelas perdas que impunham aos seus depositantes e pela contração adicional do crédito somavamse aos outros fatores que aprofundavam a depressão da economia norteamericana Na tentativa de defender a economia nacional o governo norteamericano retrocedeu a uma política extremamente protecionista Ilustra essa política a lei SmootHawley de 1930 que ampliava as barreiras alfandegárias e estimulava ampla redução das importações Apesar de seu objetivo de auxiliar a recuperação da produção nacional a lei SmootHawley pode ter gerado 371 consequências adversas para o crescimento econômico pois provocou como reação a implementação de políticas protecionistas por outros países levando à queda dos fluxos de comércio internacional Além disso durante a Depressão até mesmo o fluxo internacional de capital pareceu secar Entre 1927 e 1933 os empréstimos internacionais caíram mais de 90 HOBSBAWM 1995 p93 Se todas as informações acima apresentadas sugerem o que foi a dimensão da Grande Depressão o dado mais eloquente e expressivo do drama vivido por amplas parcelas da população norteamericana é o do número de desempregados em 1929 somavam 1550000 em 1930 4340000 em 1931 8020000 em 1932 12060000 e em 1933 12830000 MAZZUCCHELLI 2009 p226 Diante dos números da Grande Depressão as tentativas do presidente Herbert Hoover e do Federal Reserve de recolocar a economia numa direção ascendente se mostraram pífias Só em 1933 após a posse de Roosevelt as ações do governo deram algum alívio à população mais afetada pela depressão Por outro lado a política externa norteamericana enrijecida pelas ações protecionistas e pelo mau ajustamento do novo padrãoouro ajudava a difundir ainda mais os efeitos da depressão para a economia mundial fazendo do crash de Nova Iorque um evento internacional 143 A DISSEMINAÇÃO DA GRANDE DEPRESSÃO PELO MUNDO A posição de destaque dentro da economia mundial tornou os Estados Unidos com suas políticas econômicas paíschave para os planos de desenvolvimento econômico de outros países Os elos entre os Estados Unidos e a Europa o Japão e a América Latina haviam se estreitado durante a década de 1920 Mais do que produtos industrializados o mundo recorria aos capitais norte americanos para saldar dívidas equilibrar a balança comercial ou mesmo promover investimentos nas economias nacionais Enquanto a Europa tentava recuperar a posição econômica de antes da Primeira Guerra Mundial utilizando para tanto empréstimos norteamericanos países periféricos dependiam do crescimento do comércio internacional para ampliar as exportações e garantir acesso aos produtos e serviços dos países centrais Assim se o boom econômico dos Estados Unidos durante a segunda metade da década de 1920 havia em muito auxiliado o crescimento econômico mundial arrefecendo os danos causados pela Primeira Guerra Mundial o crash da Bolsa de Nova Iorque por outro lado seria sentido de maneira ainda mais intensa por todo o mundo6 Na América Latina as mudanças foram abruptas e praticamente imediatas 372 Doze países mudaram de governo ou de regime entre 19301931 e entre eles dez por meio de golpes militares Tal radicalismo latinoamericano podese explicar em parte pela vulnerabilidade clássica frente à dependência das exportações num momento delicado de redução das relações comerciais internacionais Com rápida queda nas exportações e portanto na principal receita nacional a reação dos países no plano econômico foi a suspensão da conversibilidade permitindo a desvalorização de suas moedas entre fins de 1929 e o início de 1930 Entre 1880 e 1913 nunca ocorrera uma evasão em massa do padrãoouro como em 1929 afinal anteriormente a suspensão estava ligada às condições específicas internas dos países como má colheita conflitos militares políticas econômicas nacionais que levaram à crise enfim eventos que provocavam queda nas exportações ou interrupções da entrada de capitais em dados países Entretanto desta vez a crise era provocada pelo centro do sistema portanto sua radiação para os países periféricos era imediata e violenta EICHEENGREEN 2000 p107 Com a ruptura do elo entre produções primárias exportadoras dos países periféricos e mercado consumidor dos países centrais leiase Estados Unidos e Europa grande parte dos países latinoamericanos partiu para vias alternativas de crescimento econômico Assumindo grande autonomia no período logo após 1930 e por meio de Estados intervencionistas houve uma importante diversificação na agricultura além da expansão do processo de industrialização A substituição de importações foi desta maneira um processo significativo na construção de caminhos independentes ROTHERMUND 1996 p9899 Esses foram os casos do Brasil e da Colômbia países que dependiam da exportação de café e que desvalorizando a moeda e saindo do padrãoouro puderam incentivar a expansão da emergente indústria nacional O Chile exportador de minérios como o cobre e o Peru exportador de petróleo tiveram suas receitas reduzidas e seguindo a tendência abandonaram o padrãoouro e declararam moratórias voltandose para o desenvolvimento interno até 1937 quando as exportações voltariam a crescer O México sofreu demasiadamente no início da depressão pois sua economia estava estreitamente atrelada aos investimentos norteamericanos De qualquer maneira durante a depressão por meio de medidas protecionistas e o intervencionismo estatal conseguiu saldos positivos no crescimento econômico Finalmente a Argentina que mantinha uma intensa atividade comercial com a GrãBretanha por meio da exportação de carne e trigo produtos que garantiram grandes saldos em ouro para o país latino evitou declarar moratória às dívidas com os credores ingleses contudo para se defender desvalorizou a moeda e promoveu políticas protecionistas Ainda na periferia nos dois principais países da Ásia as reações à Grande 373 Depressão seguiram caminhos opostos A China era ainda na década de 1930 um país essencialmente agrário com os principais portos e a própria política monetária controlados pelos britânicos O padrão monetário era baseado na prata e não no ouro como grande parte do mundo o que possibilitou livrar a China da crise mundial por alguns anos Por outro lado o Japão era um país soberano controlando seu comércio e políticas econômicas O tardio retorno do Japão ao padrãoouro foi feito em 1930 já no momento de intensa turbulência econômica que causaria seu desligamento no ano seguinte A maior fraqueza japonesa naquele momento de depressão era a herança de estreitos laços econômicos com os Estados Unidos Para fugir da crise promoveuse a desvalorização cambial com a ascensão de um governo militar o Japão passou a investir num impressionante crescimento industrial e pôde assumir o papel de país hegemônico na região O Japão se aproveitou dos efeitos tardios da crise que se abatera sobre a China a desvalorização da prata no mercado mundial e a suspensão norteamericana de saídas de prata levou a China a crise para invadir a Manchúria em 1931 ROTHERMUND 1996 p110 A disseminação da Grande Depressão na Europa não foi tão imediata quanto na América Latina e no Japão contudo a desintegração do padrão ouro nos países periféricos ajudava a comprometer a estabilidade nos países centrais Mas foram causas internas à Europa que impulsionaram a expansão da crise iniciada na Áustria O país arcava com um grande endividamento externo e o principal banco de depósito austríaco o Credit Anstalt sofria com a crescente inadimplência A solução do governo foi intervir na economia auxiliando o banco com o aumento da circulação da moeda nacional em 25 em menos de três semanas a inflação e a desvalorização cambial eram inevitáveis As recentes experiências de hiperinflação incentivaram o início de uma nova onda de fuga de capitais do país Estava em jogo o tradeoff ou defender o sistema bancário austríaco ou sustentar o padrãoouro A Áustria enfim decidiu amparar o sistema bancário por meio de imposições de controle ao câmbio em vez de promover uma desvalorização de sua moeda A crise austríaca não demorou muito para atingir a Hungria e a Alemanha Os capitais estrangeiros depositados nos bancos húngaros nos primeiros sinais de pânico em Viena fugiram de Budapeste também O governo húngaro que ainda precisava quitar as dívidas de guerra e tinha receitas reduzidas devido à queda dos preços agrícolas impôs controles de câmbio e determinou que a conversibilidade da moeda doméstica em ouro fosse suspensa Assim como na Áustria o padrãoouro transformouse numa concha oca EICHENGREEN 2000 p116 374 O cenário alemão era muito semelhante ao austríaco já que os dois sistemas bancários estavam comprometidos com investimentos no setor industrial o qual diante da depressão sofreu grandes prejuízos e transferiu a crise para o setor bancário Depois da crise austríaca investidores nacionais e estrangeiros passaram a sacar dinheiro dos bancos alemães O Reichsbank amparou os bancos injetando liquidez no sistema bancário mas a dívida alemã de curto prazo continuava a pressionar as reservas do banco central O estoque de ouro reduziase diante da fuga de capitais e para defender o padrãoouro o Reichsbank recuou a uma política de restrição de créditos O arrocho de crédito aprofundou a falência de empresas e intensificou a crise bancária fazendo da Alemanha o país com uma das maiores taxas de desemprego na Europa 447 Em 13 de junho de 1931 o governo adotou controles sobre o câmbio deixando assim o padrãoouro A economia inglesa por outro lado estava resistindo na medida do possível à Grande Depressão até o início de 1931 A indústria do país já estava bem reduzida antes do crash de Nova Iorque afinal as políticas de valorização da libra e aumento das taxas de juros haviam desestimulado o crescimento industrial e as exportações de manufaturas desde a volta da GrãBretanha ao padrãoouro Deste modo o desempenho do balanço de transações correntes dependia essencialmente das receitas invisíveis provenientes do fornecimento de serviços e empréstimos Entretanto à medida que a depressão transbordava dos Estados Unidos para a América Latina e países da Europa Central uma nova fase de crescimento das barreiras alfandegárias e políticas protecionistas foi colocada em prática A queda no comércio internacional prejudicava a GrãBretanha cujas receitas provenientes do transporte marítimo e de seguros deterioramse amplamente Em 1931 para piorar a situação enquanto países latinoamericanos deixavam de pagar as dívidas externas Áustria Hungria e Alemanha proibiam as transferências de juros para a GrãBretanha Com queda nas receitas e aumento na saída de ouro do país a política implementada pelo Banco da Inglaterra foi aumentar a taxa de redesconto em 2 pontos em julho de 1931 A fuga de capitais continuou intensa e o aumento na taxa de juros agravava ainda mais as condições de emprego e aumentava o custo do serviço da dívida pública Em 19 de setembro de 1931 enfim a Grã Bretanha suspendeu a conversibilidade simbolizando o fim do padrãoouro mundial A libra que havia se tornado junto com o dólar a âncora cambial do novo padrãoouro em menos de três meses perdeu um terço de seu valor Essa desvalorização comprometeu a confiança em outras moedas As reservas em dólares dos bancos centrais estrangeiros foram convertidas em ouro em razão dos temores de que eles poderiam sofrer perdas de capital em 375 seus saldos na moeda EICHENGREEN 2000 p122 O temor de que o dólar pudesse ser desvalorizado fez com que no mercado se passasse a vender dólares o que foi contraatacado pelo aumento nas taxas de juros norte americanas De qualquer maneira a saída da GrãBretanha do padrãoouro tirava a legitimidade do antigo sistema monetário e já no início de 1932 outros 25 países abandonaram a conversibilidade e desvalorizaram suas moedas A França junto com outros países da Europa como Bélgica Suíça Holanda Tchecoslováquia Polônia e Romênia e ainda os Estados Unidos se manteve no padrãoouro depois de 1932 O país se beneficiava da desvalorização do franco em 1928 no momento do retorno ao padrãoouro Durante quase uma década essa desvalorização da moeda havia permitido que a balança comercial francesa fosse extremamente favorável e que as reservas de ouro crescessem Contudo à medida que o fim da conversibilidade era declarado por mais países com a consecutiva desvalorização das moedas a vantagem cambial francesa foi se extinguindo e se transformando em desvantagem O limite se deu com a saída dos Estados Unidos do padrãoouro em 1933 por meio da nova política econômica apresentada pelo presidente Roosevelt tema do próximo capítulo O saldo no balanço de pagamentos francês estava sendo reduzido abruptamente e cada vez mais colocavase em risco a manutenção da conversibilidade principalmente quando a depressão atingiu o país em 1934 Junto com a França os outros países que permaneceram no padrãoouro perderam qualquer estímulo em perpetuar o sistema sem a presença dos Estados Unidos Logo todos os países que ainda mantinham o padrãoouro foram obrigados a abandonálo a França a Suíça e os Países Baixos o fizeram em 1936 Chegavase ao fim de uma era a do padrãoouro 144 O DEBATE SOBRE A GRANDE DEPRESSÃO O impacto da Grande Depressão foi sentido por todo o globo no decorrer da década de 1930 inclusive com revoluções sociais instauração de novas formas de governos e também criação de novas políticas econômicas Tal peculiaridade transformou o crash da Bolsa de Nova Iorque e a depressão dele decorrente num dos grandes temas dentre estudos e debates econômicos Para economistas e historiadores investigar as causas determinantes da maior crise da economia capitalista tinha um interesse que ia além do estritamente acadêmico tratavase de buscar na análise da crise argumentos de apoio para opções teóricas que por sua vez sustentavam diferentes orientações políticas e de política econômica Em especial estava em questão o papel do estado na 376 economia um estado mais intervencionista ou mais liberal Várias polêmicas se travaram em torno da crise da bolsa e da Grande Depressão Por exemplo a crise da bolsa em 1929 foi a causa da Grande Depressão ou tratase de eventos independentes A Grande Depressão tem causas monetárias ou se explica pelo declínio dos gastos ou insuficiência da demanda A Grande Depressão foi um fenômeno norteamericano cujos efeitos se disseminaram pelo mundo ou expressa desequilíbrios presentes na economia mundial já na década de 1920 A Grande Depressão resultou da fragilidade da economia ou de políticas econômicas equivocadas A seguir procuramos explorar algumas destas questões a fim de situar importantes contribuições de economistas para a discussão do tema identificando os argumentos teóricos e as evidências empíricas relevantes em cada caso Christina Romer propôs a primeira questão a crise da bolsa e a Grande Depressão foram eventos independentes As pessoas que não são economistas frequentemente veem a quebra da bolsa e a Grande Depressão como o mesmo evento A queda do preço das ações em outubro de 1929 e a tremenda redução do produto real entre 1929 e 1933 são vistos simplesmente como parte do mesmo declínio cataclísmico da economia americana Em contraste muitos economistas acreditam que os dois eventos são quando muito tangencialmente relacionados ROMER 1990 p597 Dornbusch e Fischer por exemplo afirmam que desde agosto de 1929 a economia norteamericana já se encontrava em trajetória descendente Desse modo a recessão teria se iniciado antes mesmo que se manifestasse o declínio dos preços das ações na bolsa de Nova Iorque DORNBUSCH FISCHER 1982 p304 No entanto Romer lembra que o declínio do produto real efetivamente iniciado em agosto de 1929 acelerouse dramaticamente após o colapso do preço das ações em outubro desse ano Desse modo admite haver uma ligação entre a quebra da bolsa e a aceleração do declínio do produto real no fim de 1929 e durante o ano de 1930 ROMER 1990 p598 Como explicar esse vínculo entre quebra da bolsa e Grande Depressão Um argumento frequente afirma que a redução da riqueza das famílias decorrente da queda do preço das ações teria induzido a suspensão de gastos principalmente em bens de consumo duráveis Romer descarta essa hipótese pois entende que no agregado o efeito da queda dos preços das ações sobre a riqueza não seria suficientemente elevada para justificar o brutal declínio do produto real Para Romer a redução dos gastos foi induzida pelo aumento da incerteza sobre a renda futura das famílias decorrente da crise na bolsa Diante da incerteza as compras principalmente de bens duráveis seriam postergadas Romer sugere que o aumento da incerteza também afetaria os gastos dos produtores em especial seus investimentos Desse modo a queda do produto real de fins de 1929 aos fins de 1930 teria como ponto de partida a 377 queda do preço das ações pela incerteza que teria gerado sobre o futuro da economia ROMER 1990 p602603 Ao afirmar que a depressão ganhou corpo pela redução dos gastos Romer nos permite introduzir uma polêmica central sobre a Grande Depressão a que opõe keynesianos a monetaristas De forma bastante sintética Temin define o núcleo da divergência explicativa O que eu chamei de a hipótese monetária afirma que o colapso do sistema bancário foi a causa primária da Depressão enquanto a hipótese do dispêndio afirma que uma queda no gasto autônomo agregado se situa na raiz do declínio TEMIN 1976 p7 A primeira formulação da hipótese do dispêndio provavelmente foi apresentada por J M Keynes em sua obra Treatise on Money publicada ainda em 1930 O boom de 19281929 e a recessão de 19291930 nos Estados Unidos correspondem respectivamente a um excesso e a uma deficiência de investimento Eu atribuo a recessão de 1930 primariamente aos efeitos desestimulantes sobre o investimento do longo período de dinheiro caro que precedeu o colapso do mercado de ações e só secundariamente ao próprio colapso Mas tendo ocorrido o colapso ele agravou substancialmente a situação especialmente nos Estados Unidos ao provocar desinvestimento no capital produtivo apud TEMIN 1976 p31 À hipótese de declínio do investimento foram agregados outros componentes do gasto cuja redução teria levado à recessão menor consumo menor demanda por imóveis e esgotamento das oportunidades de investimento8 Assim a hipótese do dispêndio se fixa na análise dos gastos e em sua forma extrema recusa o impacto deflacionário e recessivo de fatores monetários inclusive a quebra dos bancos sobre a economia norteamericana entre outubro de 1929 e setembro de 1931 GORDON WILCOX 1981 p54 Temin defensor dessa forma extrema discute o movimento dessas formas de dispêndio comparando a Grande Depressão com outras recessões a de 19211922 e a de 19371938 admite que essas variáveis só seriam responsáveis pela profundidade e duração da Grande Depressão se o seu comportamento fosse diferente do observado nas outras recessões Entende que o investimento e a demanda por imóveis não apresentaram entre 1929 e 1931 um comportamento substancialmente diferente daquele encontrado nas outras recessões É claro seu declínio contribuiu para a recessão porém não o suficiente para explicar a dimensão que o fenômeno adquiriu no início dos anos 1930 Na análise de Temin a redução do consumo foi o fator decisivo para a brutal redução do PIB e do emprego na Grande Depressão porém reconhece ser difícil explicar com rigor as razões dessa redução do consumo Como Romer entende que as perdas de riqueza decorrentes da quebra da bolsa não parecem ser suficientes para explicar a redução do consumo pois 378 representavam pequena parcela da riqueza global da sociedade norte americana A queda da renda agrícola decorrente de uma colheita pobre em 1929 também pode ter afetado o consumo porém é insuficiente para explicar a Grande Depressão Uma alternativa seria atribuir às expectativas de tempos piores a atitude de reduzir o consumo Temin pondera que em 1929 a maior parte das pessoas acreditava que os bons tempos continuariam e que em 1933 a expectativa era de tempos piores No entanto não pôde afirmar quando as expectativas otimistas de 1929 sofreram essa reversão Assim Temin conclui que No atual estágio de nosso conhecimento a parte não explicada da queda no consumo é maior do que a parte que podemos explicar porém a magnitude da queda total não está sujeita a controvérsia O forte declínio dos gastos de consumo para bens duráveis e não duráveis em 1930 teve um efeito profundamente depressivo sobre a economia TEMIN 1976 p172 Desse modo Temin defende a hipótese do dispêndio para explicar a Grande Depressão pelo menos em relação à queda do PIB entre 1929 e 19319 Nessa defesa há implícita uma polêmica com a hipótese monetária hipótese associada principalmente aos economistas Milton Friedman e Anna Schwartz Em meados dos anos 1960 Friedman e Schwartz publicaram o livro A Monetary History of the United States 18671960 que incluía uma resposta monetarista à interpretação fundada no dispêndio para explicar a profundidade da Grande Depressão Em sua versão extrema o monetarismo afirmaria que a contração de 19291933 foi iniciada e agravada por fatores monetários e que os fatores não monetários não tiveram qualquer papel GORDON WILCOX 1981 p53 Dado o caráter decisivo do elemento monetário nesta interpretação o Federal Reserve a autoridade monetária nos Estados Unidos assume papel central para explicar a Grande Depressão10 Schwartz apresenta uma síntese das relações entre oferta monetária e expansãoretração da economia de 1929 a 1933 definindo seis fases distintas No período anterior ao primeiro pânico bancário entre agosto de 1929 e outubro de 1930 ocorreu a quebra do mercado de ações ao qual o Federal Reserve respondeu com breve aumento na quantidade de moeda Em seguida houve declínio na quantidade de moeda mas não houve tentativa dos bancos para liquidar seus empréstimos e dos depositantes para retirar seus recursos Nesse período a contração da economia mostrouse tão severa quanto à observada em recessões anteriores não se justificando a noção de Grande Depressão até esse momento No último trimestre de 1930 verificouse o primeiro pânico bancário a quebra de bancos levando à redução da oferta monetária e a economia real 379 piorou sensivelmente No primeiro trimestre de 1931 sinais de recuperação da economia foram sufocados pelo início da segunda crise bancária em março de 1931 A parte final de 1931 foi marcada pela resposta do Federal Reserve à suspensão do padrãoouro pela GrãBretanha para fazer frente à desvalorização da libra o Federal Reserve aumentou as taxas de juros e restringiu a oferta monetária o que levou à eclosão de um novo pânico bancário e ao aprofundamento do declínio da economia que persistiu durante o primeiro trimestre de 1932 No segundo trimestre de 1932 o Federal Reserve realizou compras de títulos no openmarket aumentando a oferta monetária e induzindo a recuperação da economia real até o terceiro trimestre A partir do final de 1932 os problemas com bancos se alastraram a economia real novamente entrou em recessão e a contração culminou em março de 1933 com a quebra do Banco Holiday e o colapso dos mercados financeiros SCHWARTZ 1982 p67 A descrição dessas seis fases por Schwartz evidencia a lógica subjacente à explicação da Grande Depressão na perspectiva monetarista As variações da oferta monetária seja pela ação direta do Federal Reserve seja pelo impacto indireto sobre as falências bancárias foi o fator determinante do declínio da economia real E conclui ao se referir à obra escrita junto com Friedman Nosso principal tema era de que o efeito das forças econômicas que produziam a contração quaisquer que elas fossem era magnificado por um declínio sem precedentes da oferta monetária resultante das crises bancárias Nosso julgamento adicional era de que o Federal Reserve System poderia ter prevenido as consequências monetárias das crises bancárias mas fracassou em fazêlo SCHWARTZ 1982 p7 Em suma se o Federal Reserve tivesse praticado a política monetária adequada ou seja a que aumentasse a oferta monetária na proporção do aumento do produto real a falência dos bancos seria evitada e a Grande Depressão não teria a dimensão que adquiriu seria uma recessão semelhante a tantas outras verificadas na economia norteamericana Nem Temin nem FriedmanSchwartz levam ao extremo as hipóteses do dispêndio e monetarista Temin admite que depois de 1931 os fatores monetários importam para entender o aprofundamento da depressão igualmente FriedmanSchwartz consideram que os fatores monetários magnificaram a contração produzida por forças econômicas quaisquer que elas fossem No entanto a polêmica entre as duas correntes ia além da discussão das causas da Grande Depressão a hipótese do dispêndio ao 380 afirmar que a contração resultara da redução dos gastos implicitamente sugeria que as recessões deveriam ser combatidas por meio da realização de gastos do governo ou seja as políticas sugeridas por Keynes em especial na sua obra Teoria Geral do Emprego do Juro e da Moeda A hipótese monetarista afirmava que a Grande Depressão resultara de uma política monetária equivocada e mais que o mercado com a política monetária correta e sem a necessidade de gastos do governo seria incumbido da tarefa de evitar a deflação e a recessão e também a inflação Tratavase portanto de um desdobramento da polêmica sobre a eficácia da política fiscal ou da política monetária para enfrentar recessões polêmica que polarizou as correntes keynesianas e monetaristas durante décadas e um debate que se reproduz até os dias atuais quando se discute como enfrentar mais uma crise da economia capitalista ao nível mundial As causas da Grande Depressão também foram discutidas numa perspectiva mais ampla neste caso se estabelecia outra dicotomia a depressão foi um fenômeno norteamericano que se disseminou pelo mundo ou a economia internacional da década de 1920 comportava grandes inconsistências que tiveram na Grande Depressão um de seus resultados De um lado autores como Sir Arthur Lewis HW Arndt Robert Triffin e Charles Kindleberger11 apresentam suas hipóteses tendo em vista a evolução e transformação da economia internacional ao longo da década de 1920 Para esses autores mais que os fatores internos à economia dos Estados Unidos foram elementos presentes nas estruturas da economia internacional que em mau funcionamento tornaramse geradores e propagadores da depressão Assim a Grande Depressão ao assumir o caráter da maior crise do capitalismo representaria uma profunda disfunção das relações econômicas dos Estados Unidos com a economia internacional Tratase de situar os Estados Unidos dentro de uma visão global em que o contexto histórico internacional e as estruturas econômicas mundiais passaram a ser fatores essenciais dentre as causas do colapso da Bolsa de Nova Iorque como da difusão para o alémmar da crise numa longa e dura depressão econômica Entre os primeiros autores que sintetizaram análises sobre a Grande Depressão nessa perspectiva estavam H Arndt com o livro de 1944 Economic lessons of the 1930s e Sir Arthur Lewis com o livro de 1949 Economic Survey 1919 1949 As duas interpretações recuperam a evolução do mercado internacional durante os anos 1920 e por isso acabam tendo elementos que se entrecortam e aproximam Arndt enfatizava o aumento das políticas protecionistas após a Primeira Guerra Mundial enquanto Lewis se voltava aos problemas da explosão da produção agrícola mundial e a consecutiva queda nos preços dos produtos primários KENWOOD LOUGHEED 1992 p223 381 Ambos os autores partem da crise mundial deixada pela Primeira Guerra O protecionismo era consequência tanto da redução da produção industrial como da crise nas balanças comerciais europeias Em média entre 1913 e 1927 a tarifa europeia para produtos manufaturados subiu cerca de 50 Por outro lado matériasprimas e produtos agrícolas tornavamse abundantes No entender de Sir Arthur Lewis a abundância de produtos era resultado primeiro da taxa de crescimento populacional que havia perdido o fôlego e no caso europeu da população que havia se reduzido abruptamente com a consequente redução da taxa de natalidade Em segundo lugar da produção mundial que havia aumentado substancialmente com absorção de novas regiões produtoras Com o retorno da produção europeia ao fim da Primeira Guerra Mundial essas novas regiões perdiam mercado e o preço dos produtos despencava Portanto para o autor o cerne do problema era O declínio do comércio de produtos manufaturados não se deveu nem às tarifas nem à industrialização de novos países O comércio de produtos manufaturados só foi reduzido porque os países industrializados estavam comprando quantidades pequenas demais de produtos primários e pagando um preço muito baixo por aquilo que compravam apud LANDES 2005 p389391 Ainda seguindo a perspectiva de considerar as causas da Grande Depressão como fenômeno global duas importantes sínteses seriam elaboradas durante as décadas de 1960 e 1970 Todavia para esses autores mais importante do que elementos conjunturais presentes nas leituras de Sir Lewis e H Arndt era preciso considerar o crash como representação do final de uma era Seria assim a manifestação da crise do sistema monetário internacional dominante durante a segunda metade do século XIX mas que precisava se remodelar a partir de então Escrevendo o livro Gold and the Dollar Crisis o economista belga Robert Triffin imputou a grande crise de 1929 ao mau funcionamento do padrãoouro durante a década de 1920 Triffin acreditava que a nova estrutura que assegurava as trocas internacionais era incompatível com o padrãoouro e desta maneira o sistema tendia a entrar em colapso mais cedo ou mais tarde Paralelamente Charles Kindleberger com o livro The World in Depression 19291939 de 1973 realizou uma das mais amplas sínteses sobre a Grande Depressão encarandoa como uma crise no sistema econômico mundial herdado do século XIX Para o autor o sistema econômico mundial na década de 1920 sofria de uma instabilidade latente superprodução de produtos primários e forte redução de seus preços insistência da França em cobrar reparações de guerra da Alemanha demandas americanas pelo pagamento das dívidas de guerra sobrevalorização da libra e subvalorização do franco suspensão dos empréstimos externos por Nova Iorque e a quebra do mercado 382 de ações são indicadores dessa instabilidade Mas apesar dessa instabilidade latente a Grande Depressão não seria inevitável A explicação deste livro é que a depressão de 1929 foi tão ampla tão profunda e tão prolongada porque o sistema econômico internacional se tornou instável pela incapacidade britânica e pela falta de vontade americana de assumirem a responsabilidade de estabilizálo desempenhando cinco funções Manter um mercado relativamente aberto para bens com dificuldades no mercado Prover empréstimos de longo prazo contracíclicos ou pelo menos estáveis Supervisionar um sistema de taxas de câmbio relativamente estável Assegurar a coordenação de políticas macroeconômicas Agir como emprestador de última instância provendo liquidez nas crises financeiras KINDLEBERGER 1986 p289 Entretanto essa forma de análise sistêmica presente nas obras de Triffin e Kindleberger somente ganhou força depois da década de 1960 com a perspectiva mais distante do fenômeno Os anos posteriores ao crash foram anos de intenso debate político sobre qual seria o caminho a percorrer para recuperar a economia Por isso mesmo durante muito tempo os fatores estritamente ligados à economia norteamericana foram enfatizados A divergência entre keynesianos e monetaristas se insere neste quadro mas visões mais amplas das raízes da Grande Depressão nos Estados Unidos também foram elaboradas Um exemplo dessa abordagem nos é dada por um economista keynesiano John Kenneth Galbraith mas cuja análise da Grande Depressão vai bem além da hipótese do dispêndio Galbraith situa as raízes estruturais do fenômeno sem ignorar seus aspectos mais notórios Em seu livro O Colapso da Bolsa 1929 de 1954 é enfático logo no primeiro capítulo O craque do mercado de ações no outubro de 1929 há muito tempo vem sendo considerado como um acontecimento secundário Porém o craque do mercado de ações e a especulação que o tornou inevitável tiveram um efeito importante no comportamento ou melhor no mau comportamento da economia nos meses e anos subsequentes GALBRAITH 1972 p32 Nesse sentido o crash de Wall Street era resultado de um intenso processo especulativo que foi para Galbraith a causa primordial da depressão diferentemente por exemplo das análises de Arndt e Lewis Assim o autor acaba se vinculando às teorias keynesianas não só ao discutir a evolução do crash da bolsa mas ao defender as políticas econômicas identificadas com as propostas keynesianas para enfrentar a depressão durante a década de 1930 383 Recuperando todo o histórico anterior ao crash da Bolsa de Nova Iorque Galbraith demonstrou que existiam forças deflacionárias dos Estados Unidos que avançavam inversamente ao crescimento dos investimentos na bolsa de valores de Nova Iorque A queda na demanda por projetos imobiliários a redução do crescimento da população e dos créditos hipotecários a crise no setor agrícola e finalmente o crescimento limitado do consumo de bens duráveis eram alguns dos principais elementos deflacionários na economia dos Estados Unidos Assim no entender do autor o mercado de ações é apenas um espelho que talvez como nesse caso um tanto tardiamente proporciona uma imagem da situação econômica implícita ou fundamental Causa e efeito originamse da economia para o mercado de ações nunca o contrário Em 1929 a economia estava a caminho da crise Finalmente essa crise se refletiu de modo violento em Wall Street GALBRAITH 1972 p127 E como entender que acionistas e investidores continuavam a transacionar na bolsa com esse ambiente de crise Na verdade segundo Galbraith muito mais importante do que a taxa de juro e o fornecimento de crédito é a disposição de ânimo A especulação em grande escala requer uma sensação penetrante de confiança otimismo e convicção de que as pessoas comuns estavam destinadas a ser ricas GALBRAITH 1972 p212 E foi essa confiança de contínuos ganhos reafirmados a todo o momento por banqueiros e especuladores a facilidade de créditos no mercado e o incentivo à compra de ações ordinárias que asseguraram por longos meses o crescimento do mercado acionário E por trás desse cenário de expansão especulativa a economia norte americana se alicerçava em bases não muito sólidas Para Galbraith eram cinco as fraquezas da economia dos Estados Unidos 1 má distribuição de renda provocando um estreitamento do mercado consumidor 2 má estrutura das empresas que aceitavam a compra de seus ativos por especuladores e geravam a redução nos investimentos e o aumento das pressões deflacionárias 3 má estrutura bancária com a grande quantidade de bancos que podiam provocar uma reação em cadeia com as falências 4 estado duvidoso das transações com o exterior ilustrado pelo desequilíbrio do comércio internacional com os Estados Unidos 5 o empenho da política econômica conservadora que presa numa camisa de força não permitia que o padrão ouro fosse suspenso e o déficit público fosse utilizado como instrumento de política econômica Estudos mais recentes sobre a Grande Depressão têm sugerido abordagens mais ecléticas de certo modo os vários fatores acima levantados nas várias interpretações da quebra da bolsa e da Grande Depressão são articulados numa explicação mais abrangente É o caso por exemplo de Eichengreen em artigo 384 de 1992 inclui em sua discussão vários elementos mudanças na composição da produção funcionamento dos mercados de trabalho operação do sistema monetário internacional padrão das relações internacionais política monetária dos Estados Unidos papel do padrãoouro na transmissão da recessão norte americana para outros países protecionismo são fatores estudados em sua relação com a Grande Depressão EICHENGREEN 1992 A tensa polarização entre keynesianos e monetaristas certamente perdeu sua força na discussão dos eventos de 1929 e da década de 1930 No entanto a crise financeira que se propagou pelo mundo a partir dos Estados Unidos desde 2008 trouxe à tona novamente as propostas keynesianas recolocando de certo modo a polêmica sobre a política econômica adequada para enfrentar uma recessão Esta foi aliás questão presente no restante da década de 1930 quando mudanças políticas e de política econômica alteraram radicalmente o panorama da economia mundial REFERÊNCIAS ARNDT H 1963 The Economic Lessons of 1930s London Crass DORNBUSCH R FISCHER S 1982 Macroeconomia São Paulo McGrawHill do Brasil EICHENGREEN B 1992 The Origins and Nature of the Great Slump Revisited Economic History Review XLV 2 maio EICHENGREEN B 2000 A Globalização do Capital Uma História do Sistema Monetário Internacional São Paulo Editora 34 FRIEDMAN M SCHWARTZ A 1963 A Monetary History of the United States 18671960 Princeton Princeton University Press GALBRAITH J K 1972 O Colapso da Bolsa 1929 São Paulo Expressão e Cultura Primeira Edição de 1954 GORDON R J WILCOX J A 1982 Monetarist Interpretations of the Great Depression An Evaluation and Critique BRUNNER K Ed The Great Depression Revisited New York Rochester HOBSBAWM E 1995 A Era dos Extremos O Breve Século XX 19141991 São Paulo Cia das Letras KENWOOD A G LOUGHEED A L 1992 The Growth of the International Economy 1820 1990 London Routledge KINDLEBERGER C 1986 The World in Depression 19291939 Berkeley University of California Press LANDES D 2005 Prometeu Desacorrentado Rio de Janeiro Elsevier LEWIS W A 1949 Economic Survey 19191939 London George Allen Unwin MAZZUCCHELLI F 2009 Os Anos de Chumbo Economia e Política Internacional no Entreguerras São Paulo Campinas Editora Unesp Facamp ROMER Christina 1990 The Great Crash and the Onset of the Great Depression Quarterly Journal of Economics Vol 105 ROTHERMUND D 1996 The Global Impact of the Great Depression 19291939 London Routledge SCHWARTZ A 1982 Understanding 19291933 BRUNNER Karl The Great Depression Revisited New York Rochester 385 TEMIN P 1976 Did Monetary Forces Cause the Great Depression New York Norton Company TRIFFIN R 1960 Gold and the Dollar Crisis New Haven 386 1 A crise iniciada oitenta anos depois em 2008 talvez tenha dimensões comparáveis à da década de 1930 principalmente por seu impacto sobre a Europa Em 2012 os efeitos da crise ainda se disseminaram pelo mundo dificultando a comparação com a Grande Depressão dos anos 1930 2 Vale ressaltar aqui a teoria do economista russo N D Kondratiev que durante a década de 1920 desenvolveu sua teoria dos ciclos considerando que para cada período de 5060 anos de uma onda longa de desenvolvimento a onda Kondratiev existiria uma fase de expansão seguida de outra de declínio da economia Ciclos e flutuações econômicos também foram tratados por Clement Juglar Ernest Labrousse Joseph Kitchin Joseph A Schumpeter Simon Kuznets e Artur Burns entre outros 3 No fim de 1928 e início de 1929 os bancos norteamericanos começaram a resgatar seus empréstimos europeus de modo que as exportações líquidas de capital vindas dos Estados Unidos que haviam subido de menos de US 200 milhões em 1926 para mais de US 1 bilhão em 1928 despencaram de novo para US 200 milhões de 1929 LANDES 2005 p395 4 O Comitê de Investimento do Mercado Aberto seguindo recomendações do Federal Reserve limitou em setembro de 1929 as compras de títulos de curto prazo do governo ao valor de US 25 milhões por semana Em decorrência dessa limitação de compra de títulos os bancos privados podiam descontar menores quantidades de dinheiro reduzindo a liquidez do mercado como um todo 5 A primeira onda de falências bancárias esteve associada à crise da agricultura norteamericana A queda dos preços recebidos pelos agricultores não compensada por queda proporcional dos preços pagos pelos insumos reduziu sua renda em mais de 30 de 1929 a 1930 e em cerca de 60 de 1929 a 1933 Evidentemente muitos agricultores foram incapazes de saldar seus empréstimos levando à quebra de pequenos bancos de regiões agrícolas como o MeioOeste e o Sul MAZZUCCHELLI 2009 p214215 6 Para um estudo detalhado sobre o impacto da Grande Depressão no mundo ver ROTHERMUND 1996 7 Entre 19321933 no pior período da depressão as taxas de desemprego chegaram a 22 na GrãBretanha 24 na Suécia 27 nos Estados Unidos 29 na Áustria e 31 na Dinamarca HOBSBAWM 1995 p97 8 Temin faz minuciosa resenha das contribuições à hipótese do dispêndio TEMIN 1976 p31 53 9 Temin entende que depois de 1931 com a suspensão do padrãoouro na Inglaterra e a mudança na política monetária norteamericana o aprofundamento da recessão responde a um conjunto mais amplo de fatores que não pode ser reduzido à hipótese do dispêndio 10 O fundamento teórico da interpretação monetarista da Grande Depressão é a teoria quantitativa da moeda reformulada por Milton Friedman De forma bastante esquemática podemos dizer que nesta versão a autoridade monetária por meio de sua política não tem capacidade para afetar variáveis reais como produto e emprego de forma duradoura embora possa ter alguma influência por períodos limitados Assim a autoridade monetária deveria se concentrar no controle do nível de preços Para tanto deveria controlar a oferta de moeda de modo que sua expansão acompanhasse o crescimento do produto real se a oferta de moeda crescesse menos do que o produto real haveria deflação se crescesse mais haveria inflação 11 ARNDT HW The Economic Lessons of the NineteenThirties Oxford Oxford University Press 1944 LEWIS WA Economic Survey 19191939 London George Allen Unwin1949 TRIFFIN R Gold and the Dollar Crisis New Haven Yale University Press 1960 KINDLEBERGER C The World in Depression 19291939 London Penguin 1973 688 História Econômica do Século XX 012024 Fichamentos da Unidade 2 FICHAMENTO 1 OPCIONAL ESPECIFICAR O TEXTO Referência SOBRENOME DO AUTOR Nome do autor Título da obra subtítulo da obra Local Editora ano da edição consultada Capítulo ou parte da obra que está sendo resenhada se for o caso 1 Objetivos do texto 2 Argumentos desenvolvidos no texto 3 Impressões do estudante sobre o texto 4 Trechos que por alguma razão você queira destacar com indicação de página FICHAMENTO 2 OPCIONAL ESPECIFICAR O TEXTO Referência SOBRENOME DO AUTOR Nome do autor Título da obra subtítulo da obra Local Editora ano da edição consultada Parte da obra que está sendo resenhada 1 Objetivos do texto 2 Argumentos desenvolvidos no texto 3 Impressões do estudante sobre o texto 4 Trechos que por alguma razão você queira destacar com indicação de página FICHAMENTO 3 OPCIONAL ESPECIFICAR O TEXTO Referência SOBRENOME DO AUTOR Nome do autor Título da obra subtítulo da obra Local Editora ano da edição consultada Parte da obra que está sendo resenhada 1 Objetivos do texto 2 Argumentos desenvolvidos no texto 3 Impressões do estudante sobre o texto 4 Trechos que por alguma razão você queira destacar com indicação de página A EVOLUÇÃO APÓS A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL O emprego e a produtividade no processo de crescimento econômico História Econômica do Século XX 072024 Fichamentos da Unidade 2 FICHAMENTO Referência SAES Flávio Azevedo Marques de SAES Alexandre Macchione História econômica geral 2013 Editora Saraiva Capítulo 14 A GRANDE DEPRESSÃO 19291933 1 Objetivos do texto O objetivo desse texto é fornecer uma análise sobre a Grande Depressão de 19291933 destacando o impacto econômico nos Estados Unidos e no mundo O texto aborda a quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque em 1929 as consequências da crise econômica a recorrência de crises ao longo do desenvolvimento capitalista e a influência desses eventos em eventos históricos posteriores como a ascensão do Nazismo do Fascismo e o fortalecimento da economia soviética O texto explora as diferentes teorias econômicas e políticas associadas à compreensão da crise de 1929 e da Grande Depressão destacando as implicações para a política econômica O objetivo é fornecer uma visão abrangente e analítica desses eventos históricos considerando diferentes perspectivas teóricas e suas influências no cenário econômico e político da época 2 Argumentos desenvolvidos no texto Os autores destacam a recorrência de crises econômicas ao longo da história e a elaboração de teorias dos ciclos econômicos para justificar e prever momentos de prosperidade e regressão na economia O texto enfatiza que a compreensão dos eventos da década de 1930 é essencial para entender o surgimento do New Deal a ascensão do Nazismo e do Fascismo na Europa bem como o fortalecimento da economia soviética 3 Impressões do estudante sobre o texto O capítulo 14 de Saes e Saes apresenta um panorama detalhado da Grande Depressão destacando a quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque em 1929 como um marco decisivo O impacto da crise econômica não se limitou aos Estados Unidos afetando também outras partes do mundo A recorrência de crises econômicas levou à elaboração de teorias dos ciclos econômicos por diferentes economistas O texto destaca a lenta recuperação da economia norteamericana após a depressão e como os efeitos da crise influenciaram eventos políticos e econômicos posteriores como o New Deal e a ascensão do Nazismo e do Fascismo na Europa As explicações sobre a crise e a Grande Depressão apresentam diferentes concepções teóricas e implicações em termos de política econômica o que justifica a quantidade de estudos dedicados a esses temas 4 Trechos que por alguma razão você queira destacar com indicação de página Menos de uma década antes do colapso da bolsa em 1929 norteamericanos e britânicos haviam enfrentado outra severa depressão Entre 1920 e 1921 como já discutido no capítulo anterior uma forte deflação nos preços causada em parte pela saturação do mercado em parte pelas políticas restritivas governamentais fez despencar a produção nos Estados Unidos e na GrãBretanha Considerando o impacto imediato a deflação de 19201921 parece tão ou mais severa do que a recessão de 19291930 assim como da recessão que ocorreu em 19371938 o declínio do PIB em 1921 foi comparável ao de 1930 e maior do que o de 1938 a deflação foi maior do que em 1930 e 1938 assim como o aumento do desemprego p 359 há razões adicionais para a quantidade de estudos dedicados a esses temas explicações da crise e da Grande Depressão colocam frente a frente concepções teóricas distintas com implicações em termos de política econômica A compreensão dos eventos para keynesianos e para monetaristas é completamente diferente mais importante suas explicações sugerem que diferentes políticas econômicas poderiam ter induzido outro curso para os acontecimentos da década de 1930 p 361 362 O diferencial inglês era o seu balanço de pagamentos porque ao mesmo tempo em que era o maior exportador de serviços e capital do mundo o mercado britânico era também o maior consumidor de produtos primários dos mais diferentes países Esse fato era importante para países como Brasil e Argentina entre muitos outros que podiam exportar seus produtos primários como o café o trigo e a carne e com isso criavam receitas para realizar importações de produtos manufaturados serviços e empréstimos ingleses p 363 Por outro lado internamente um dos primeiros sinais de que o crescimento da economia norte americana estava desgovernado ocorreu com a especulação imobiliária na Flórida anos antes do craque da Bolsa O crescimento da renda da elite norteamericana as melhorias nos meios de transporte e a disposição dos especuladores para ganhar dinheiro de maneira rápida possibilitaram um aumento da demanda por balneários turísticos p 365 Nos meses anteriores ao grande crash da bolsa essa política restritiva defendida pelo Federal Reserve uma ação controversa para o período emergiria como outro elemento para a crise Conforme as perspectivas de pessimistas se concretizavam o banco central norteamericano passou a elevar as taxas de redesconto e buscava reduzir a circulação monetária como forma de arrefecer a explosão especulativa no mercado de ações p 366 Fatores internos à economia norteamericana auxiliavam esse arrefecimento no crescimento Afinal depois de meia década de amplo desenvolvimento o mercado chegava à sua saturação os norte americanos que podiam já haviam comprado casas carros e grande parte dos bens duráveis desejados p 367 O ambiente de incerteza decorrente da quebra da bolsa também deve ter gerado algum impacto na disposição de consumo das famílias Expectativas pessimistas provavelmente adiaram investimentos Em suma haveria fortes motivos para a redução da demanda como reação aos efeitos da crise da bolsa de Nova Iorque No entanto o prolongado declínio do PIB da produção industrial do nível de emprego e dos preços sugere a existência de outros mecanismos econômicos que conduziram à Grande Depressão p 370 Às falências bancárias pelas perdas que impunham aos seus depositantes e pela contração adicional do crédito somavamse aos outros fatores que aprofundavam a depressão da economia norteamericana p 371 Entre 1880 e 1913 nunca ocorrera uma evasão em massa do padrãoouro como em 1929 afinal anteriormente a suspensão estava ligada às condições específicas internas dos países como má colheita conflitos militares políticas econômicas nacionais que levaram à crise enfim eventos que provocavam queda nas exportações ou interrupções da entrada de capitais em dados países p 373 A solução do governo foi intervir na economia auxiliando o banco com o aumento da circulação da moeda nacional em 25 em menos de três semanas a inflação e a desvalorização cambial eram inevitáveis As recentes experiências de hiperinflação incentivaram o início de uma nova onda de fuga de capitais do país Estava em jogo o tradeoff ou defender o sistema bancário austríaco ou sustentar o padrãoouro p 374 a Grande Depressão ao assumir o caráter da maior crise do capitalismo representaria uma profunda disfunção das relações econômicas dos Estados Unidos com a economia internacional Tratase de situar os Estados Unidos dentro de uma visão global em que o contexto histórico internacional e as estruturas econômicas mundiais passaram a ser fatores essenciais dentre as causas do colapso da Bolsa de Nova Iorque como da difusão para o alémmar da crise numa longa e dura depressão econômica p 381 Estudos mais recentes sobre a Grande Depressão têm sugerido abordagens mais ecléticas de certo modo os vários fatores acima levantados nas várias interpretações da quebra da bolsa e da Grande Depressão são articulados numa explicação mais abrangente p 384