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Texto de pré-visualização

Professor de Economia do MIT DARON ACEMOGLU JAMES ROBINSON Professor de Administração Pública da Harvard University POR QUE AS NAÇÕES FRACASSAM As origens do poder da prosperidade e da pobreza Uma leitura obrigatória Steven Levitt coautor de Freakonomics Cadastrese em wwwelseviercombr para conhecer nosso catálogo completo ter acesso a serviços exclusivos no site e receber informações sobre nossos lançamentos e promoções Professor de Economia do MIT DARON ACEMOGLU JAMES ROBINSON Professor de Administração Pública da Harvard University POR QUE AS NAÇÕES FRACASSAM As origens do poder da prosperidade e da pobreza Tradução Cristiana Serra Do original Why Nations Fail Tradução autorizada do idioma inglês da edição publicada por Crown Business Copyright 2012 by Daron Acemoglu and James A Robinson 2012 Elsevier Editora Ltda Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9610 de 19021998 Nenhuma parte deste livro sem autorização prévia por escrito da editora poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados eletrônicos mecânicos fotográficos gravação ou quaisquer outros Copidesque Ivone Teixeira Revisão Jayme Teotônio Borges Luiz e Cynthia Gaudard Editoração Eletrônica Estúdio Castellani Produção do ebook Schaffer Editorial Elsevier Editora Ltda Conhecimento sem Fronteiras Rua Sete de Setembro 111 16o andar 20050006 Centro Rio de Janeiro RJ Brasil Rua Quintana 753 8o andar 04569011 Brooklin São Paulo SP Brasil Serviço de Atendimento ao Cliente 08000265340 sacelseviercombr ISBN 9788535263299 Edição original ISBN 9780307719218 Nota Muito zelo e técnica foram empregados na edição desta obra No entanto podem ocorrer erros de digitação impressão ou dúvida conceitual Em qualquer das hipóteses solicitamos a comunicação ao nosso Serviço de Atendimento ao Cliente para que possamos esclarecer ou encaminhar a questão Nem a editora nem o autor assumem qualquer responsabilidade por eventuais danos ou perdas a pessoas ou bens originados do uso desta publicação CIPBrasil Catalogaçãonafonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros RJ A157p Acemoglu Daron Por que as nações fracassam recurso eletrônico as origens do poder da prosperidade e da pobrezaDaron Acemoglu e James A Robinson tradução Cristiana Serra Rio de Janeiro Elsevier 2012 recurso digital Tradução de Why nations fail Inclui bibliografia e índice Formato ePub Requisitos do sistema Adobe Digital Editions Modo de acesso World Wide Web ISBN 9788535263299 recurso eletrônico 1 Economia 2 Política econômica 3 Relações econômicas internacionais4 Livros eletrônicos I Título 125110 CDD 337 CDU 33822 Para Arda e Asu DA Para María Angélica mi vida y mi alma JR E AGRADECIMENTOS STE LIVRO É FRUTO de 15 anos de pesquisa colaborativa e ao longo desse tempo acumulamos muitas dívidas práticas e intelectuais A maior delas é para com Simon Johnson nosso colaborador de longa data que dividiu conosco a autoria de muitos dos principais artigos científicos que foram moldando nossas concepções em desenvolvimento econômico comparativo Nossos outros coautores com quem trabalhamos em projetos de pesquisa relacionados desempenharam um papel significativo no desenvolvimento dos nossos pontos de vista e sob esse aspecto gostaríamos de agradecer particularmente a Philippe Aghion JeanMarie Baland María Angélica Bautista Davide Cantoni Isaías Chaves Jonathan Conning Melissa Dell Georgy Egorov Leopoldo Fergusson Camilo GarcíaJimeno Tarek Hassan Sebastián Mazzuca Jeffrey Nugent Neil Parsons Steve Pincus Pablo Querubín Rafael Santos Konstantin Sonin Davide Ticchi Ragnar Torvik Juan Fernando Vargas Thierry Verdier Andrea Vindigni Alex Wolitzky Pierre Yared e Fabrizio Zilibotti Muitas outras pessoas tiveram importância considerável em termos dos estímulos desafios e críticas que nos proporcionaram ao longo dos anos Agradecemos sobretudo a Lee Alston Abhijit Banerjee Robert Bates Timothy Besley John Coatsworth Jared Diamond Richard Easterlin Stanley Engerman Peter Evans Jeff Frieden Peter Gourevitch Stephen Haber Mark Harrison Elhanan Helpman Peter Lindert Karl Ove Moene Dani Rodrik e Barry Weingast Duas pessoas em especial exerceram profunda influência sobre nossos pontos de vista e nos incentivaram em nossa pesquisa e gostaríamos de aproveitar esta oportunidade para expressar nossa dívida intelectual e a mais sincera gratidão a ambos Joel Mokyr e Ken Sokoloff que infelizmente faleceu antes que este livro fosse escrito e faz enorme falta para nós dois Somos também imensamente gratos aos participantes da conferência que organizamos no Institute for Quantitative Social Science em Harvard em fevereiro de 2010 a fim de apresentar uma versão inicial do manuscrito deste livro Agradecemos sobretudo aos coorganizadores Jim Alt e Ken Shepsle e nossos debatedores na conferência Robert Allen Abhijit Banerjee Robert Bates Stanley Engerman Claudia Goldin Elhanan Helpman Joel Mokyr Ian Morris Sevket Pamuk Steve Pincus e Peter Temin Agradecemos ainda a Melissa Dell Jesús FernándezVillaverde Sándor László Suresh Naidu Roger Owen Dan Trefler Michael Walton e Noam Yuchtman que nos ofereceram uma variedade de comentários tanto nessa ocasião quanto em diversas outras Obrigado também a Charles Mann Leandro Prados de la Escosura e David Webster por suas orientações especializadas Durante boa parte do processo de pesquisa e elaboração deste livro fomos membros do programa do Canadian Institute for Advanced Research CIFAR sobre instituições organizações e crescimento Apresentamos pesquisas relacionadas a este livro diversas vezes em seminários do CIFAR e nos beneficiamos imensamente do apoio tanto dessa excelente organização quanto dos estudiosos que ela congrega Recebemos também comentários de literalmente centenas de pessoas em diversos seminários e conferências sobre as teses desenvolvidas neste livro e pedimos desculpas pela impossibilidade de atribuir adequadamente o crédito por eventuais sugestões ideias ou percepções que tenhamos derivado dessas apresentações e discussões Somos ainda muito gratos a María Angélica Bautista Melissa Dell e Leander Heldring por sua espetacular assistência na pesquisa para este projeto Por fim mas não menos importante tivemos a grande felicidade de contar com um maravilhoso e criativo editor John Mahaney que nos proporcionou todo o apoio de que precisávamos Os comentários e sugestões de John em muito contribuíram para o aprimoramento deste livro e sua assistência e entusiasmo pelo projeto tornaram o último ano e meio muito mais agradável e menos oneroso do que poderia ter sido SUMÁRIO Agradecimentos Prefácio Por que os egípcios lotaram a Praça Tahrir para derrubar Hosni Mubarak e o que isso significa para nosso entendimento das causas da prosperidade e da pobreza 1 Tão próximos mas tão diferentes Nogales Arizona e Nogales Sonora têm o mesmo povo cultura e geografia Por que uma é rica e a outra é pobre 2 Teorias que não funcionam Países pobres são pobres não em virtude de suas condições geográficas ou culturais nem porque seus líderes ignoram que políticas são capazes de enriquecer seus cidadãos 3 A criação da prosperidade e da pobreza Como prosperidade e pobreza são determinadas pelos incentivos criados por instituições e como a política determina que instituições a nação terá 4 Pequenas diferenças e conjunturas críticas o peso da história Como as instituições mudam por meio de conflitos políticos e como o passado modela o presente 5 Eu vi o futuro e ele funciona O crescimento sob instituições extrativistas O que Stálin o Rei Shyaam a Revolução Neolítica e as cidadesestados maias tinham em comum e como isso explica por que o atual surto de crescimento econômico chinês não vai durar 6 Diferenciação Como as instituições evoluem ao longo do tempo em geral diferenciandose lentamente umas das outras 7 A reviravolta Como uma revolução política em 1688 mudou as instituições na Inglaterra e engendrou a Revolução Industrial 8 Não no nosso quintal barreiras ao desenvolvimento Por que os poderosos políticos de tantas nações fizeram frente à Revolução Industrial 9 Revertendo o desenvolvimento Como o colonialismo europeu empobreceu boa parte do mundo 10 A difusão da prosperidade Como algumas partes do mundo tomaram rumos para a prosperidade distintos dos da GrãBretanha 11 O círculo virtuoso Como as instituições que estimulam a prosperidade criam um esquema de retroalimentação positiva que anula as tentativas das elites de solapálas 12 O círculo vicioso Como as instituições geradoras de pobreza estabelecem um esquema de retroalimentação negativa e perduram 13 Por que as nações fracassam hoje Instituições instituições instituições 14 Rompendo o padrão Como alguns países mudaram sua trajetória econômica ao mudar suas instituições 15 Compreendendo a prosperidade e a pobreza Como o mundo poderia ser diferente e como entender isso pode explicar por que fracassa a maioria das tentativas de combate à pobreza Ensaios e fontes bibliográficas Referências E PREFÁCIO STE LIVRO trata das diferenças abissais de receita e padrão de vida que separam os países ricos do mundo como Estados Unidos Reino Unido e Alemanha dos pobres como os da África subsaariana América Central e Sul da Ásia No momento em que redigimos este texto o Norte da África e o Oriente Médio foram sacudidos pela Primavera Árabe iniciada pela chamada Revolução de Jasmim esta por sua vez deflagrada pelo clamor público em torno da autoimolação de um vendedor ambulante Mohamed Bouazizi em 17 de dezembro de 2010 Em 14 de janeiro de 2011 o Presidente Zine El Abidine Ben Ali que governava a Tunísia desde 1987 foi deposto mas longe de aplacarse o fervor revolucionário contra o domínio das elites privilegiadas no país não só estava se intensificando como já estava se espalhando para o resto do Orien te Médio Hosni Mubarak que comandara o Egito com mão de ferro por quase 30 anos foi derrubado em 11 de fevereiro de 2011 Os destinos dos regimes do Barein Líbia Síria e Iêmen seguem desconhecidos ao concluirmos este prefácio O descontentamento nesses países tem suas raízes na pobreza O egípcio médio tem uma renda que corresponde a cerca de 12 daquela do cidadão norteamericano médio e sua expectativa de vida é 10 anos menor 20 da população vivem em terrível miséria Embora sejam diferenças significativas na verdade são até pequenas se comparadas às que separam os Estados Unidos e os países mais pobres do mundo como Coreia do Norte Serra Leoa e Zimbábue onde bem mais que metade da população vive na pobreza Por que o Egito é tão mais pobre que os Estados Unidos Quais são as restrições que impedem os egípcios de alcançar maior prosperidade Será a pobreza do país imutável ou poderá ser erradicada Uma maneira natural de começar a refletir a respeito é examinar o que os próprios egípcios dizem dos problemas que enfrentam e dos porquês de terem se insurgido contra o regime de Mubarak Noha Hamed 24 anos funcionária de uma agên cia publicitária no Cairo expressou com clareza sua opinião na Praça Tahrira Sofremos de corrupção opressão e educação de má qualidade Vivemos em um sistema corrupto que não tem perspectivas de mudança Outro manifestante Mosaab El Shami 20 anos estudante de Farmácia completou Espero que até o final deste ano tenhamos um governo eleito que as liberdades universais estejam em vigor e que tenhamos posto fim à corrupção que assola este país Os manifestantes da Praça Tahrir foram unâni mes em denunciar a corrupção do governo sua incapacidade de prestar serviços públi cos e a falta de igualdade de oportunidades em seu país Queixaramse especialmente da repressão e da falta de direitos políticos Como escreveu no Twitter Mohamed ElBaradei exdiretor da Agência de Energia Atômica Internacional em 13 de janei ro de 2011 Tunísia repressão falta de justiça social inexistência de canais para mudança pacífica bombarelógio Tanto egípcios quanto tunisianos percebiam que seus problemas econômicos eram causados fundamentalmente por sua falta de direitos políticos Quando os manifestantes começaram a formular suas demandas de maneira mais sistemática as 12 primeiras exigências imediatas publicadas por Wael Khalil engenheiro de software e blogueiro que surgiu como um dos líderes do movimento de protesto egípcio concentravamse todas em mudanças políticas Tópicos como o au mento do salário mínimo surgiriam apenas entre as demandas da transição que seriam implementadas mais tarde Para os egípcios entre os obstáculos enfrentados estavam o Estado ineficiente e corrupto e uma estrutura social em que não havia espaço para utilizarem seu talento ambição engenhosidade e a educação a que conseguissem acesso Mas também re conheciam que as origens desses problemas eram políticas Todos os impedimentos econômicos enfrentados no país são derivados do modo como o poder político no Egito é exercido e monopolizado por uma pequena elite Esse no entender dos egíp cios é o primeiro fator a modificar Entretanto ao defender tal tese os manifestantes da Praça Tahrir divergiram pro fundamente do senso comum a esse respeito Ao discutir por que um país como o Egito é pobre a maioria dos acadêmicos e comentaristas põe em evidência fatores completamente distintos Alguns acreditam que a pobreza do Egito seja determinada primariamente por sua geografia pelo fato de seu território ser em sua maior parte desértico com índices pluviométricos insuficientes e que seus solos e clima inviabi lizam uma agricultura produtiva Outros ao contrário apontam características cul turais dos egípcios que supostamente seriam incompatíveis com a prosperidade e o desenvolvimento econômico Falta aos egípcios argumentam eles o mesmo tipo de ética de trabalho e traços culturais que permitiram a outros prosperar em vez dis so adotaram crenças islâmicas irreconciliáveis com o êxito econômico Uma terceira abordagem dominante entre economistas e peritos em políticas públicas baseiase na ideia de que os governantes do Egito não sabem o que é preciso para fazer seu país prosperar tendo por isso adotado no passado políticas e estratégias equivocadas Se tais governantes recebessem orientações adequadas dos conselheiros certos segue o raciocínio o enriquecimento seria uma consequência lógica Para esses acadêmicos e peritos o fato de o Egito vir sendo governado por uma pequena elite que se esbalda em privilégios às custas do resto da sociedade parece irrelevante para a compreensão das dificuldades econômicas do país Neste livro defenderemos que são os egípcios da Praça Tahrir e não a maioria dos acadêmicos e comentaristas quem têm razão Com efeito o Egito é pobre exatamente por vir sendo governado por uma pequena elite que organizou a sociedade em função de seus próprios interesses em detrimento da massa da população O poder político estritamente concentrado vem sendo usado para gerar riqueza para aqueles que já a de têm como a fortuna de US70 bilhões que o exPresidente Mubarak parece ter acumu lado Quem sai perdendo é o povo como os próprios egípcios entendem muito bem Mostraremos que essa interpretação da pobreza egípcia a interpretação popular na verdade constitui uma explicação genérica de por que os países pobres são pobres Seja Coreia do Norte Serra Leoa ou Zimbábue vamos mostrar que os países pobres são pobres pelo mesmo motivo por que o Egito também é Países como o Reino Unido e os Estados Unidos enriqueceram porque seus cidadãos derrubaram as elites que contro lavam o poder e criaram uma sociedade em que os direitos políticos eram distribuídos de maneira muito mais ampla na qual o governo era responsável e tinha de responder aos cidadãos e onde a grande massa da população tinha condições de tirar vantagem das oportunidades econômicas Mostraremos que para compreender por que há tanta desigualdade no mundo de hoje teremos de mergulhar no passado e estudar a dinâmica histórica das sociedades Veremos que a razão por que o Reino Unido é mais rico que o Egito é que em 1688 os britânicos ou ingleses para sermos mais exatos promoveram uma revolução que transformou a política e por conseguinte a economia do país As pessoas lutaram por mais direitos políticos e os conquistaram usandoos para expandir suas oportunidades econômicas O resultado foi uma trajetória política e econômica essencialmente distinta que culminaria na Revolução Industrial A Revolução Industrial e as tecnologias por ela lançadas não se espalharam para o Egito porque este se encontrava então sob domínio do Império Otomano que tra tava o país mais ou menos da mesma maneira como mais tarde a família Mubarak A dominação otomana no Egito encontrou seu fim nas mãos de Napoleão Bonaparte em 1798 mas o país caiu então sob o controle do colonialismo britânico que tinha tão pouco interesse quanto os otomanos em promover a prosperidade egípcia Assim embora os egípcios tenham se livrado dos impérios otomano e britânico e em 1952 da própria monarquia suas revoluções não foram como a de 1688 na Inglaterra em lugar de promover uma radical transformação política no país limitaramse a conduzir ao poder mais uma elite tão desinteressada na prosperidade dos egípcios comuns quanto os otomanos e britânicos de outrora Em consequência a estrutura básica da sociedade não mudou e o Egito permaneceu pobre Neste livro estudaremos como esses padrões se reproduzem ao longo do tempo e por que às vezes são alterados como aconteceu na Inglaterra em 1688 e na França com a revolução de 1789 o que nos ajudará a entender se a situação no Egito atual mu dou e se a revolução que depôs Mubarak produzirá um novo conjunto de instituições capazes de proporcionar prosperidade ao povo egípcio O Egito já atravessou revoluções que nada mudaram pois seus promotores limitaramse a tomar as rédeas daqueles que depuseram recriando sistemas semelhantes Com efeito é difícil para os cidadãos comuns adquirir poder político real e modificar a maneira como sua sociedade fun ciona Mas é possível e veremos como isso aconteceu na Inglaterra França e Estados Unidos bem como no Japão Botsuana e Brasil Basicamente é uma transformação política desse gênero que se faz necessária para que uma sociedade pobre enriqueça Há indícios de que isso esteja acontecendo no Egito Reda Metwaly outro manifestante da Praça Tahrir observou Agora a gente vê muçulmanos e cristãos juntos velhos e no vos lado a lado todos em busca dos mesmos objetivos Veremos que esse movimento amplo da sociedade foi um aspecto fundamental dessas outras transformações políticas Se compreendermos quando e por que ocorrem tais transições estaremos em melhores condições de avaliar quando o fracasso será mais provável como tantas vezes aconteceu no passado e quanto podemos alimentar esperanças de que o sucesso traga benefícios para milhões de pessoas A 1 TÃO PRÓXIMOS MAS TÃO DIFERENTES A ECONOMIA DO RIO GRANDE CIDADE DE NOGALES é cortada ao meio por uma cerca Se você se aproximar dela e olhar para o norte verá Nogales Arizona no condado de Santa Cruz A renda familiar média é de cerca de US30 mil anuais A maioria dos adolescentes estuda e a maioria dos adultos concluiu o ensino médio Apesar de tudo o que se diz sobre as deficiências do sistema de saúde americano a população é relativamente rica com alta expectativa de vida pelos padrões globais Muitos dos moradores passaram dos 65 anos e têm acesso ao Medicareb apenas um dos muitos serviços prestados pelo governo vistos com naturalidade pela maioria como eletricidade telefonia sistema de esgotos saúde pública a malha rodoviária que liga a cidade às vizinhas e ao resto do país e por último mas não menos importante a lei e a ordem O povo de Nogales Arizona pode se dedicar às suas atividades diárias sem temer pela vida ou segurança nem viver com medo de roubos expropriações ou outras possibilidades que ponham em risco seus investimentos nos negócios e habitações Igualmente importante os residentes de Nogales Arizona partem da premissa de que apesar de toda a sua ineficiência e eventuais casos de corrupção o governo é seu agente Podem votar para substituir prefeito deputados e senadores votam nas eleições presidenciais que determinam quem comandará o país A democracia constitui para eles uma segunda pele Ao sul da cerca a poucos metros de distância é bastante diferente Embora a população de Nogales Sonora viva em uma região relativamente próspera do México a renda familiar média corresponde a cerca de um terço da de Nogales Arizona A maioria dos adultos de Nogales Sonora não completou o ensino médio e muitos adolescentes não vão à escola As mães têm de se preocupar com altos índices de mortalidade infantil Diante da precariedade da saúde pública não admira que os residentes de Nogales Sonora não vivam tanto quanto seus vizinhos do norte tampouco têm acesso a muitos serviços públicos Ao sul da cerca as estradas encontramse em péssimo estado a lei e a ordem em situação ainda pior A criminalidade é alta e abrir um negócio é uma atividade arriscada já que não só o dono corre o risco de ser roubado como não é tarefa fácil conseguir todas as permissões e molhar todas as mãos necessárias Os habitantes de Nogales Sonora convivem diariamente com a corrupção e a incompetência de seus políticos Em contraste com seus vizinhos do norte a democracia é uma experiência ainda recente para eles Até as reformas políticas do ano 2000 Nogales Sonora como o resto do México encontravase sob o controle corrupto do Partido Revolucionário Institucional PRI Como podem as duas metades do que é essencialmente a mesma cidade serem tão diferentes Inexistem diferenças geográficas climáticas ou entre os tipos de doenças prevalentes na região pois não há nada que impeça os micróbios de cruzar a fronteira entre Estados Unidos e México Evidentemente as condições de saúde são muito distintas mas não por causa do ambiente e sim porque quem está ao sul da fronteira tem de enfrentar condições de saneamento inferiores e a falta de um sistema de saúde decente Talvez então as populações sejam muito distintas Será possível que os residentes de Nogales Arizona sejam netos de imigrantes europeus ao passo que os do sul sejam descendentes de astecas Absolutamente não As origens dos habitantes dos dois lados da fronteira são bastante semelhantes Após a independência do México em 1821 a região em torno de Los dos Nogalesc fazia parte do estado mexicano de Vieja Califórnia e assim permaneceu até depois da guerra MéxicoEstados Unidos de 1846 1848 Com efeito só depois da Compra Gadsdend em 1853 a fronteira norte americana estendeuse até essa área Foi o Tenente N Michler quem inspecionando a fronteira notou a presença do lindo valezinho de Los Nogales Aqui dos dois lados da fronteira as duas cidades se ergueram Os habitantes de Nogales Arizona e Nogales Sonora têm ancestrais comuns gostam do mesmo tipo de comida e música e nos atreveríamos a dizer possuem a mesma cultura Naturalmente há uma explicação muito simples e óbvia para as diferenças entre as duas metades de Nogales que você provavelmente já adivinhou há muito a própria fronteira que define as duas metades Nogales Arizona fica nos Estados Unidos Seus moradores têm acesso às instituições econômicas americanas que lhes permitem escolher livremente suas ocupações adquirir educação e conhecimentos e estimular seus empregadores a investir na melhor tecnologia gerando salários mais altos Têm acesso ainda a instituições políticas que lhes permitem tomar parte do processo democrático elegendo seus representantes e substituindoos caso se comportem mal Por conseguinte os políticos providenciam os serviços básicos que vão da saúde pública e rodovias à lei e à ordem exigidos pelos cidadãos Os de Nogales Sonora não têm a mesma sorte Vivem em outro mundo moldado por instituições diferentes as quais criam incentivos completamente distintos tanto para a população das duas Nogales quanto para os empreendedores e empresas que pretendam investir ali Os estímulos criados pelas instituições próprias das duas cidades e dos países a que pertencem são a principal causa das diferenças de nível de prosperidade econômica de um lado e de outro da fronteira Por que as instituições dos Estados Unidos são tão mais conducentes ao êxito econômico do que as do México ou a rigor do resto da América Latina A resposta para essa pergunta reside na formação de cada sociedade nos primórdios do período colonial quando se instalou uma divergência institucional cujas implicações se estendem até os dias de hoje Para compreender essa discrepância precisamos começar pela fundação das colônias nas Américas Latina e do Norte A FUNDAÇÃO DE BUENOS AIRES No começo de 1516 o navegador espanhol Juan Díaz de Solís deparouse com um largo estuário no litoral leste da América do Sul Desembarcando Solís reclamou a terra para a Espanha batizando o rio de Río de la Plata já que os habitantes locais possuíam prata Os indígenas dos dois lados do estuário os charruas no atual Uruguai e os querandís nas planícies que ficariam conhecidas como pampas da moderna Argentina viram os recémchegados com hostilidade Esses povos locais eram caçadorescoletores que viviam em grupos pequenos sem fortes autoridades políticas centralizadas Com efeito foi um bando desses charruas que matou Solís a bordunadas durante suas explorações dos novos domínios que ele tentara ocupar para a Espanha Em 1534 os espanhóis ainda otimistas enviaram uma primeira missão de colonizadores sob a liderança de Pedro de Mendoza Naquele mesmo ano fundaram uma cidade na atual localização de Buenos Aires Deveria ser um lugar ideal para os europeus Buenos Aires que literalmente significa bons ares tinha um clima temperado e convidativo A primeira temporada dos espanhóis por lá teve vida curta porém Afinal eles não estavam atrás de bons ares mas de recursos para extrair e mão de obra para coagir Os charruas e os querandís contudo não se mostraram nem um pouco cooperativos Recusavamse a fornecer alimentos para os espanhóis assim como se recusavam a trabalhar quando capturados Atacaram o novo povoamento com arcos e flechas A fome grassava entre os espanhóis que não haviam planejado ter de obter a própria comida Buenos Aires não era absolutamente o que haviam sonhado Os povos locais não se deixavam forçar ao trabalho Não havia ouro nem prata a explorar pois a prata encontrada por Solís na verdade viera do estado inca nos Andes bem mais a oeste Os espanhóis enquanto lutavam pela sobrevivência puseramse a enviar expedições para encontrar um novo lugar capaz de proporcionarlhes maiores riquezas e uma população mais fácil de subjugar Em 1537 uma dessas expedições sob a liderança de Juan de Ayolas penetrou no Rio Paraná em busca de uma rota que os levasse até os incas No caminho entrou em contato com os guaranis povo sedentário de economia agrícola baseada no cultivo de milho e mandioca Ayolas percebeu de imediato que se tratava de um povo completamente distinto dos charruas e dos querandís Após um breve conflito os espanhóis venceram a resistência guarani e fundaram uma cidade Nuestra Señora de Santa María de la Asunción até hoje a capital do Paraguai Os conquistadores desposaram as princesas guaranis estabelecendose assim como a nova aristocracia Adaptaram os sistemas indígenas existentes de trabalho forçado e tributação colocandose no comando Era esse o tipo de colônia que desejavam e em quatro anos Buenos Aires estava abandonada pois todos os espanhóis que lá haviam se estabelecido mudaramse para a nova cidade Buenos Aires a Paris da América do Sul cidade de largas avenidas no estilo europeu baseada na incalculável riqueza agrícola dos pampas não seria repovoada antes de 1580 O abandono da cidade e a conquista dos guaranis revelam a lógica da colonização das Américas pelos europeus Os primeiros colonos espanhóis e como veremos ingleses não tinham o menor interesse em lavrar o solo com as próprias mãos queriam que outros o fizessem em seu lugar e desejavam riquezas ouro e prata para saquear DE CAJAMARCA As expedições de Solís Mendoza e Ayolas ocorreram no rastro de outras mais célebres que se seguiram à descoberta de uma das ilhas das Bahamas por Cristóvão Colombo em 12 de outubro de 1492 A expansão e colonização espanhola das Américas tiveram início com a invasão do México por Hernán Cortés em 1519 a expedição de Francisco Pizarro ao Peru uma década e meia mais tarde e a expedição de Pedro de Mendoza ao Rio da Prata apenas dois anos depois No decorrer do século seguinte a Espanha conquistaria e colonizaria a maior parte das regiões central ocidental e sul da América do Sul ao passo que Portugal ocupava o Brasil a leste A estratégia de colonização espanhola foi extremamente eficaz A princípio aprimorada por Cortés no México baseouse na observação de que a melhor maneira de os espanhóis dobrarem a resistência consistia em capturar o líder indígena o que lhes permitia reivindicar a fortuna acumulada pelo líder e obrigar os índios a pagar tributos e fornecer alimentos A etapa seguinte consistia em estabelecerse como nova elite reinante da sociedade indígena assumindo o controle dos métodos existentes de tributação e sobretudo de trabalho forçado Quando Cortés e seus homens chegaram à grande capital asteca de Tenochtitlán em 8 de novembro de 1519 foram recebidos por Montezuma o imperador asteca que havia decidido em face das muitas recomendações que lhe fizeram seus conselheiros saudar os espanhóis pacificamente O que se passou em seguida é bem descrito pelo relato compilado após 1545 pelo sacerdote franciscano Bernardino de Sahagún em seu célebre Códice Florentino Imediatamente os espanhóis agarraram Montezuma com firmeza e cada uma das armas disparou O medo prevaleceu Foi como se todos tivessem engolido o próprio coração Mesmo antes de escurecer grassaram o terror a perplexidade a apreensão o assombro das pessoas Ao amanhecer foram proclamadas todas as coisas que os espanhóis demandavam tortillas brancas perus assados ovos água potável madeira lenha carvão Isso foi Montezuma quem efetivamente determinou E uma vez que os espanhóis se haviam instalado inquiriram Montezuma acerca do tesouro da cidade buscavam ouro com imenso zelo E Montezuma conduziu os espanhóis Foram cercandoo cada qual o segurando cada qual o agarrando E quando chegaram ao armazém um lugar chamado Teocalco trouxeram tudo que brilhava o cocar de penas de quetzal as ferramentas os escudos os discos de ouro os crescentes nasais de ouro os protetores de perna de ouro os protetores de braço de ouro os protetores de testa de ouro Uma vez destacado o ouro eles imediatamente ateavam fogo incendiavam todas as preciosidades Tudo foi incinerado E com o ouro os espanhóis forjaram barras separadas E andavam por toda parte levando tudo o que viam que lhes seria de interesse Em seguida dirigiramse ao armazém do próprio Montezuma em um lugar chamado Totocalco trouxeram a propriedade do próprio Montezuma todas as coisas preciosas colares com pendentes protetores de braço com penachos de quetzal protetores de braço de ouro braceletes protetores de ouro com conchas e o diadema de turquesa atributo do monarca Levaram tudo A conquista militar dos astecas estava concluída em 1521 Cortés como governador da província da Nova Espanha começou então a repartir o recurso mais valioso a população indígena mediante a instituição da encomienda Esta fizera sua primeira aparição na Espanha no século XV como parte da reconquista do sul do país aos mouros árabes que ali se haviam instalado durante e após o século VIII No Novo Mundo ela assumiu uma forma muito mais perniciosa tratavase da concessão de lotes de povos indígenas a um espanhol chamado de encomendero Os índios tinham de pagar ao encomendero tributos e mão de obra em troca dos quais ele se encarregaria de convertêlos ao cristianismo Chegou até nós um relato vívido do funcionamento da encomienda escrito por Bartolomé de las Casas sacerdote dominicano que formulou a mais antiga e uma das mais devastadoras críticas do sistema colonial espanhol De las Casas chegou à ilha espanhola de Hispaniola em 1502 na esquadra comandada pelo novo governador Nicolás de Ovando Foi ficando cada vez mais desiludido e perturbado diante do tratamento cruel e abusivo dispensado aos povos indígenas que presenciava diariamente Em 1513 tomou parte como capelão da conquista espanhola de Cuba chegando a ser agraciado com uma encomienda pelos serviços prestados Todavia renunciou à concessão e encetou uma longa campanha pela reforma das instituições coloniais hispânicas Seus esforços culminaram com seu livro Brevíssima relação da destruição das Índias escrito em 1542 um libelo devastador contra a barbárie do domínio espanhol Sobre o sistema de encomiendas ele diz o seguinte a propósito do caso da Nicarágua Cada colono fixava residência na cidade que lhe coube ou lhe foi encomendada no jargão jurídico punha seus habitantes a seu serviço roubava seus já escassos víveres para si e apropriavase das terras pertencentes aos nativos e por eles trabalhadas nas quais tradicionalmente cultivavam sua própria safra O colono tratava o conjunto da população nativa dignitários velhos mulheres e crianças como membros de sua casa e como tais faziaos trabalhar dia e noite em benefício próprio sem nenhum descanso A respeito da conquista de Nova Granada atual Colômbia De las Casas fornece uma descrição da estratégia espanhola na prática A fim de levar a cabo seu objetivo em longo prazo de apoderarse de todo o ouro disponível os espanhóis lançaram mão da estratégia usual de distribuir entre si ou encomendar como dizem as cidades e seus habitantes para então como de hábito tratálos como escravos comuns O encarregado do comando geral da expedição capturou o rei do território para si e o manteve prisioneiro por seis ou sete meses demandando dele de forma bastante ilícita ouro e esmeraldas em quantidades cada vez maiores Esse rei um certo Bogotá ficou de tal modo aterrorizado que em sua ansiedade por libertarse das garras de seus algozes condescendeu com a exigência de encher uma casa inteira de ouro e entregarlhe para esse fim enviou seu povo em busca de ouro e pouco a pouco eles o providenciaram junto com muitas pedras preciosas No entanto não estava ainda a casa repleta e os espanhóis decidiram declarar que o condenariam à morte por não haver cumprido sua palavra O comandante sugeriu que se levasse o caso à sua presença como representante da lei e quando o fizeram apresentando acusações formais contra o rei sentenciouo à tortura caso persistisse em não honrar o acordo Torturaramno então com a estrapadae puseram sebo fervente na sua barriga prenderam suas pernas a postes com argolas de ferro e seu pescoço com outras e com dois homens segurandolhe as mãos queimaramlhe as solas dos pés De tempos em tempos o comandante aparecia para reiterar que o torturariam lentamente até a morte a menos que ele produzisse mais ouro e assim fizeram o rei por fim sucumbindo às agonias que lhe foram infligidas A estratégia e as instituições da conquista aprimoradas no México foram avidamente adotadas no restante do Império Espanhol Em nenhum outro lugar isso se deu com maior eficácia do que na conquista do Peru por Pizarro Nas palavras com que De las Casas inicia seu relato Em 1531 outro grande vilão dirigiuse com seus homens ao reino do Peru Partiu decidido a reproduzir a estratégia e as táticas adotadas por seus comparsas em outras partes do Novo Mundo Pizarro partiu do litoral próximo à cidade peruana de Tumbes e marchou rumo ao sul Em 15 de novembro de 1532 chegou à cidade de Cajamarca nos Andes onde o imperador inca Atahualpa estava acampado com seu exército No dia seguinte Atahualpa que acabara de derrotar seu irmão Huáscar na disputa pela sucessão ao trono de seu falecido pai Huayna Capac dirigiuse com seu séquito ao local de acampamento dos espanhóis Atahualpa estava irritado com as notícias que lhe haviam chegado das atrocidades já cometidas pelos espanhóis tais como violar um templo do Deus Sol Inti O que se passou em seguida é bem conhecido Os espanhóis prepararam uma armadilha mataram os guardas e servos de Atahualpa que possivelmente chegavam a dois mil homens e fizeram o rei prisioneiro Para ganhar a liberdade Atahualpa teve de prometer encher uma sala inteira com ouro e outras duas do mesmo tamanho com prata A promessa foi cumprida mas os espanhóis renegando sua parte no acordo o estrangularam em julho de 1533 Em novembro os espanhóis conquistaram a capital inca de Cusco onde a aristocracia nativa recebeu o mesmo tratamento de Atahualpa sendo mantida prisioneira até fornecer ouro e prata Quando as exigências espanholas não eram atendidas os nobres incas eram queimados vivos Os grandes tesouros artísticos de Cusco como o Templo do Sol tiveram seu ouro arrancado e fundido em barras Àquela altura os espanhóis voltaramse para os povos do Império Inca Como ocorrera no México os cidadãos foram divididos em encomiendas uma para cada um dos conquistadores que haviam acompanhado Pizarro A encomienda era a principal instituição usada para o controle e organização da mão de obra nos primórdios do período colonial mas não tardaria a encontrar uma adversária à altura Em 1545 um habitante local de nome Diego Gualpa partiu em busca de um santuário indígena nos Andes na região onde hoje é a Bolívia Foi atirado ao chão por uma súbita rajada de vento e à sua frente avistou uma jazida de minério de prata parte de uma gigantesca montanha de prata batizada pelos espanhóis de Cerro Rico Ao seu redor cresceu a cidade de Potosí que em seu apogeu em 1650 contava com 160 mil habitantes maior que as cidades de Lisboa ou Veneza nessa mesma época Para explorar a prata os espanhóis precisavam de mineiros muitos deles Enviaram um novo vicerei a mais alta autoridade colonial espanhola Francisco de Toledo cuja principal missão era solucionar o problema da mão de obra Toledo chegando ao Peru em 1569 passou os cinco primeiros anos viajando pela área e investigando sua nova incumbência Ordenou também um recenseamento maciço de toda a população adulta A fim de encontrar os trabalhadores necessários Toledo começou deslocando praticamente a população indígena inteira concentrandoa em novas cidades chamadas reducciones literalmente reduções que facilitariam sua exploração pela Coroa espanhola Em seguida ressuscitou e adaptou uma instituição inca conhecida como mita em quíchua turno Sob esse sistema os incas lançavam mão de trabalhos forçados para cultivar plantações com vistas ao fornecimento de provisões para os templos a aristocracia e o exército Em troca a elite inca garantia a segurança e o combate à fome Nas mãos de Toledo a mita sobretudo no caso de Potosí viria a ser o maior e mais oneroso esquema de exploração de mão de obra no período colonial espanhol Toledo delimitou uma gigantesca área de captação que se estendia da área central do atual Peru e abrangia a maior parte da Bolívia moderna cobrindo cerca de 520 mil quilômetros quadrados Nela um sétimo dos habitantes do sexo masculino recémchegados às suas reduções era recrutado para trabalhar nas minas de Potosí A mita de Potosí perdurou por todo o período colonial tendo sido abolida apenas em 1825 O Mapa 1 mostra a área de captação da mita superposta à extensão do Império Inca na época da conquista espanhola ilustrando a medida em que a mita se sobrepunha ao coração do império incluindo a capital Cusco Mapa 1 O Império Inca a rede inca de estradas e a área de captação da mita de mineração É notável que ainda hoje se detecte o legado da mita no Peru Tomemse a província de Calca e sua vizinha Acomayo Parece haver poucas diferenças entre elas Ambas ficam no alto da cordilheira ambas são habitadas pelos descendentes dos incas de idioma quíchua Não obstante Acomayo é muito mais pobre e sua população consome cerca de um terço a menos do que a de Calca E o povo sabe disso Em Acomayo perguntam aos intrépidos forasteiros Você não sabe que o povo daqui é mais pobre do que o de Calca Por que você quis vir aqui Intrépidos porque é muito mais difícil chegar a Acomayo a partir da capital regional de Cusco antigo centro do Império Inca do que a Calca A estrada para Calca é aplainada a que leva a Acomayo encontrase no mais terrível estado de conservação Para ir além de Acomayo é preciso um cavalo ou mula Em Calca e Acomayo são cultivados os mesmos produtos mas em Calca eles são vendidos no mercado por dinheiro em Acomayo a agricultura é exclusivamente de subsistência Tais disparidades perfeitamente claras para quem vê e para os habitantes da região podem ser compreendidas em termos das diferenças institucionais entre os dois departamentos cujas origens históricas remontam a Toledo e seu plano de exploração eficaz da mão de obra indígena A principal diferença histórica entre Acomayo e Calca é que Acomayo situavase na área de captação da mita de Potosí Calca não Além da concentração de mão de obra e da mita Toledo consolidou a encomienda num sistema de capitação uma soma fixa a ser paga anualmente em prata por todos os homens adultos outro esquema elaborado para obrigar o ingresso das pessoas no mercado de trabalho e reduzir os salários para os proprietários de terras espanhóis Outra instituição o repartimiento de mercancias também se disseminou durante o mandato de Toledo Derivado do verbo espanhol repartir no sentido de distribuir o repartimiento distribuição de bens envolvia a venda forçada de bens para os habitantes locais a preços definidos pelos espanhóis Por fim Toledo introduziu o trajin que significa literalmente fardo passando a usar os índios em vez de animais de carga para carregar pesados fardos de produtos como vinho folhas de coca ou tecidos para as empreitadas comerciais da elite espanhola Em todo o universo colonial espanhol nas Américas adotaramse instituições e estruturas sociais similares Após uma fase inicial de saques e ânsia por ouro e prata os espanhóis criaram uma rede de instituições com vistas à exploração dos povos indígenas Toda a gama de estratégias encomienda mita repartimiento e trajin tinha por objetivo rebaixar os padrões de vida dos povos indígenas ao nível da subsistência e assim destinar toda a receita excedente aos espanhóis Para tanto expropriaramlhes as terras forçaramnos ao trabalho oferecendo baixos salários impuseramlhes impostos elevados e preços caros por produtos cuja compra sequer era voluntária Embora essas instituições tenham gerado muita riqueza para a Coroa espanhola e tornado riquíssimos os conquistadores e seus descendentes converteram também a América Latina no continente mais desigual do mundo e solaparam boa parte de seu potencial econômico A JAMESTOWN Enquanto os espanhóis iniciavam a conquista das Américas na década de 1490 a Inglaterra era uma potência europeia menor que se recuperava dos efeitos devastadores de uma guerra civil a Guerra das Rosas Não estava em condições de tirar vantagem da disputa por butim e ouro nem da oportunidade de explorar os povos indígenas do Novo Mundo Quase 100 anos depois em 1588 o golpe de sorte do desbaratamento da Armada Espanhola após a tentativa do Rei Filipe II da Espanha de invadir a Inglaterra fez ondas de choque políticas percorrerem toda a Europa Por mais que a vitória tenha se devido à boa fortuna dos ingleses porém foi também sinal da crescente assertividade destes nos mares que lhes permitiria por fim tomar parte da contenda por um império colonial Não é então coincidência que a Inglaterra tenha dado início à colonização da América do Norte exatamente no mesmo momento Contudo era retardatária A opção pela América do Norte deveuse não à atratividade da região mas ao fato de que era o que estava disponível As partes desejáveis das Américas onde a população indígena a explorar era abundante e onde foram localizadas minas de ouro e prata já haviam sido ocupadas Aos ingleses couberam as sobras Quando o escritor e agricultor inglês do século XVIII Arthur Young discutiu onde eram produzidos os insumos básicos mais rentáveis referindose aos produtos agrícolas exportáveis observou Ao que parece as matériasprimas produzidas em nossas colônias diminuem em valor na proporção de sua distância em relação ao Sol Nas Índias Ocidentais que são as mais quentes de todas montam a um total de 8l 12s 1d por cabeça Nas do sul do continente 5l 10s Nas centrais 9s 6 12d Nas colônias do norte 2s 6d Tal escala sem dúvida sugere uma importantíssima lição evitar colonizar nas latitudes mais setentrionais A primeira tentativa inglesa de estabelecer uma colônia em Roanoke Carolina do Norte entre 1585 e 1587 foi um rematado desastre Em 1607 foi feita nova tentativa No apagar das luzes de 1606 três navios o Susan Constant o Godspeed e o Discovery sob o comando do Capitão Christopher Newport partiram rumo à Virginia Os colonos sob os auspícios da Virginia Company adentraram a Baía de Chesapeake e subiram um rio que batizaram de James em homenagem ao monarca inglês na época Jaime James I Em 14 de maio de 1607 fundaram a colônia de Jamestown cidade de Jaime Embora os colonos a bordo dos navios da Virginia Company fossem ingleses seguiam um modelo de colonização com forte influência do modelo instituído por Cortés Pizarro e Toledo Seu plano inicial consistia em capturar o chefe local e usálo como meio de obter provisões e obrigar a população a produzir alimentos e riquezas para os europeus Ao chegarem a Jamestown os colonos ingleses não sabiam que se encontravam em território pertencente à Confederação Powhatan uma coalizão de cerca de 30 grupos autônomos que deviam fidelidade a um rei chamado Wahunsunacock A capital de Wahunsunacock era a cidade de Werowocomoco a meros 30 quilômetros de Jamestown O plano dos colonos era inteirarse da situação local caso os nativos não pudessem ser induzidos a fornecer víveres e mão de obra os colonos poderiam ao menos comerciar com eles A ideia de que os colonos trabalhassem e cultivassem a própria subsistência ao que tudo indica não lhes passava pela cabeça Não era assim que agiam os conquistadores do Novo Mundo Wahunsunacock logo tomou conhecimento da presença dos colonos e os viu com profunda desconfiança Estava à frente do que para a América do Norte era um império bastante vasto Contudo como tinha muitos inimigos e faltavalhe o controle político centralizado inconteste dos incas decidiu averiguar quais eram as intenções dos ingleses a princípio enviando emissários com a mensagem de que desejava entabular com eles relações cordiais À medida que se aproximava o inverno de 1607 os suprimentos dos colonos de Jamestown começaram a se esgotar mas o líder designado do conselho de governo da colônia Edward Marie Wingfield hesitava A situação foi salva pelo Capitão John Smith Este cujos escritos constituem uma de nossas principais fontes de informação acerca do desenvolvimento da colônia nesses primeiros tempos era um personagem arquetípico Nascido em Lincolnshire na região rural da Inglaterra ignorou a ambição de seu pai no sentido de que se dedicasse aos negócios e em vez disso tornouse mercenário Primeiro lutou com o exército inglês nos Países Baixos após o que ingressou nas forças austríacas que se batiam na Hungria contra o Império Otomano Capturado na Romênia foi vendido como escravo e posto para trabalhar no campo Um dia conseguiu ludibriar seu senhor e roubandolhe as roupas e o cavalo fugiu para território austríaco Smith havia se metido em apuros na viagem para a Virginia tendo sido posto a ferros no Susan Constant por motim após desafiar as ordens de Wingfield Quando a frota aportou no Novo Mundo o plano era leválo a julgamento Para profundo horror de Wingfield Newport e demais membros da elite de colonos porém ao abrirem as ordens seladas que traziam descobriram que a Virginia Company havia nomeado Smith membro do conselho que governaria Jamestown Tendo Newport retornado à Inglaterra em busca de provisões e mais colonos e com Wingfield incerto quanto ao que fazer foi Smith quem salvou a colônia Encetou uma série de missões comerciais que asseguraram suprimentos vitais Numa delas foi capturado por Opechancanough um dos irmãos mais novos de Wahunsunacock e levado à presença do rei em Werowocomoco Foi o primeiro inglês a estar frente a frente com Wahunsunacock e foi nesse primeiro encontro que segundo alguns relatos a vida de Smith só foi salva graças à intervenção da jovem filha de Wahunsunacock Pocahontas Libertado em 2 de janeiro de 1608 Smith voltou a Jamestown cujas provisões ainda se encontravam em níveis perigosamente baixos até o oportuno retorno de Newport da Inglaterra mais tarde naquele mesmo dia Os colonos de Jamestown pouco proveito tiraram dessa experiência inicial Ao longo de 1608 insistiram em sua busca por ouro e metais preciosos Ao que tudo indica não pareciam compreender que para sobreviver não poderiam contar com os nativos para alimentálos fosse por coação ou comércio Smith foi o primeiro a perceber que o modelo de colonização que tão bem funcionara para Cortés e Pizarro de nada adiantaria na América do Norte As circunstâncias gerais eram demasiado distintas Smith observou que ao contrário de astecas e incas os povos da Virginia não possuíam ouro Com efeito anotou em seu diário Víveres é forçoso reconhecer são toda a sua riqueza Anas Todkill um dos primeiros colonos que deixou um extenso diário expressou muito bem as frustrações de Smith e dos poucos outros que se deram conta desse fato Não havia conversa não havia esperança não havia trabalho que não fosse escavar ouro refinar ouro carregar ouro Quando Newport partiu para a Inglaterra em abril de 1608 levou consigo uma carga de pirita ouro de tolo Retornou no fim de setembro com ordens da Virginia Company de assumir um controle mais estrito dos nativos Seu plano era coroar Wahunsunacock na esperança de assim garantir sua subserviência ao rei inglês Jaime I Convidaramno a visitar Jamestown mas Wahunsunacock ainda profundamente desconfiado em relação aos colonos não tinha a menor intenção de arriscarse à captura John Smith registrou a resposta de Wahunsunacock Se seu rei envioume presentes também eu sou rei e esta é a minha terra Seu pai que venha a mim não eu a ele e muito menos ao seu forte tampouco morderei eu tal isca Se Wahunsunacock não morderia tal isca Newport e Smith precisariam ir a Werowocomoco a fim de proceder à coroação Ao que parece o evento foi um total fiasco seu único resultado foi Wahunsunacock ter chegado à conclusão de que estava mais do que na hora de livrarse da colônia e impôslhe um embargo comercial Jamestown não poderia mais comercializar suprimentos Wahunsunacock estava decidido a matálos de fome Newport novamente fezse à vela rumo à Inglaterra em dezembro de 1608 levando consigo uma carta escrita por Smith rogando aos diretores da Virginia Company que mudassem seu pensamento acerca da condução da colônia Não havia possibilidade de explorar a Virginia nas mesmas linhas de enriquecimento fácil do México e do Peru Não havia ouro nem metais preciosos nem como obrigar os indígenas a trabalhar ou fornecer alimentos Smith percebeu que para que a colônia fosse viável eram os colonos que teriam de trabalhar Assim sendo solicitava aos diretores da companhia que lhes enviassem o tipo correto de pessoas Ao nos enviarem nova leva suplico lhes que mandem cerca de 30 carpinteiros agricultores hortelões pescadores ferreiros pedreiros e quem mais nos escave árvores e raízes bem fornidos e mais um milheiro desses ao nosso dispor Smith não queria mais inúteis ourives Mais uma vez Jamestown só sobreviveu graças à sua astúcia Por meio de lisonjas e ameaças conseguiu negociar com alguns grupos locais quando estes não cediam pilhava o que podia Na povoação inglesa Smith tinha domínio absoluto e impôs a regra de que quem não trabalhar não come Assim Jamestown sobreviveu a um segundo inverno Supunhase que a Virginia Company fosse um empreendimento rentável mas ao cabo de dois anos desastrosos não havia nem alento nem lucro Os diretores da empresa chegaram à conclusão de que precisavam de um novo modelo de governança e substituíram o conselho de governo por um só governador O primeiro homem designado para o cargo foi Sir Thomas Gates Levando em consideração alguns aspectos da advertência de Smith a companhia deuse conta de que seria preciso tentar alguma coisa nova impressão confirmada pelos acontecimentos do inverno de 1609 1610 a chamada época da fome No novo modo de governo não havia espaço para Smith que desgostoso retornou à Inglaterra no outono de 1609 Sem sua engenhosidade e com o boicote de Wahunsunacock ao fornecimento de provisões os colonos de Jamestown pereceram Dos 500 que começaram o inverno apenas 60 chegaram vivos a março A situação era tão desesperadora que não lhes restou outra alternativa senão recorrer ao canibalismo A novidade trazida à colônia por Gates e seu representante Sir Thomas Dale foi a imposição de um regime de trabalho de rigor draconiano para os colonos ingleses ainda que não é claro à elite que a administrava Foi Dale quem promulgou as Leis Divinas Morais e Marciais que incluíam as seguintes cláusulas Nenhum homem ou mulher se evadirá da colônia para buscar refúgio junto aos índios sob pena de morte Quem vier a roubar um jardim seja público ou privado ou vinha ou quem roubar espigas de trigo será punido com a morte Nenhum membro da colônia venderá ou dará qualquer mercadoria deste país para algum capitão marinheiro mestre ou marujo que a transporte para fora da colônia para seu próprio benefício sob pena de morte Se os povos indígenas não tinham como ser explorados raciocinou a Virginia Company talvez os colonos sim O novo modelo de desenvolvimento colonial baseavase na posse de toda a terra pela Virginia Company Os homens eram abrigados em alojamentos e recebiam rações determinadas pela companhia Foram definidos grupos de trabalho cada qual supervisionado por um agente da companhia Era algo próximo da lei marcial sendo a execução sumária a punição de primeiro recurso Como parte das novas instituições da colônia a primeira cláusula supracitada é significativa a companhia ameaçava com a morte os fugitivos Dado o novo regime de trabalho a fuga para viver com os nativos constituía cada vez mais alternativa atraente para os colonos forçados ao trabalho Igualmente interessante dada a baixa densidade mesmo das populações indígenas da Virginia na época era a perspectiva de partir por conta própria para a fronteira para além do controle da Virginia Company O poder da companhia diante de tais opções era restrito Não havia como impor o trabalho forçado aos colonos ingleses em troca de rações que mal lhes garantiam a subsistência O Mapa 2 apresenta uma estimativa da densidade demográfica de diferentes regiões das Américas na época da conquista espanhola A densidade populacional dos Estados Unidos exceto por alguns bolsões era no máximo de três quartos de pessoa a cada 25 quilômetros quadrados Na região central do México ou nos Andes peruanos chegava a 400 pessoas para a mesma área número mais de 500 vezes maior O que era possível no México ou no Peru não era praticável na Virginia A Virginia Company levou algum tempo para reconhecer que seu modelo inicial de colonização não daria certo na Virginia demorou outro tanto para admitir o fracasso de suas Leis Divinas Marciais e Morais A partir de 1618 partiuse para uma estratégia radicalmente nova Diante da impossibilidade de coagir tanto os habitantes locais quanto os colonos a única alternativa restante era fornecer incentivos a estes últimos Em 1618 a companhia inaugurou um sistema de concessões headright system que brindava cada colono do sexo masculino com 50 acres de terra e mais 50 acres para cada membro de sua família e todos os servos que uma família conseguisse levar à Virginia Os colonos ganharam suas casas e foram liberados de seus contratos e em 1619 foi introduzida uma Assembleia Geral que efetivamente conferiu voz a cada homem adulto nas leis e instituições que regiam a colônia Era o início da democracia nos Estados Unidos A Virginia Company demorou 12 anos para aprender sua primeira lição o que havia dado certo para os espanhóis no México e nas Américas Central e do Sul não funcionaria no Norte O resto do século XVII assistiu a uma longa série de batalhas em torno da segunda lição a de que a única opção para uma colônia economicamente viável seria criar instituições que dessem aos colonos incentivos para investir e trabalhar com dedicação À medida que a América do Norte se desenvolvia as elites inglesas volta e meia tentavam estabelecer instituições que imporiam severas restrições econômicas e políticas a todos os que não pertencessem à pequena parcela de privilegiados da colônia assim como haviam feito os espanhóis A cada tentativa porém o modelo soçobrava como acontecera na Virginia Uma das tentativas mais ambiciosas teve início pouco após a mudança de estratégia da Virginia Company Em 1632 10 milhões de acres de terra na região superior da Baía de Chesapeake foram concedidos pelo rei inglês Carlos I a Cecilius Calvert Lorde Baltimore A Carta de Maryland conferiu a Lorde Baltimore total liberdade para criar um governo nas linhas que bem desejasse com a cláusula VII sublinhando que Baltimore dispunha para o bom e feliz governo da dita província de livre pleno e absoluto poder pelo teor destas presentes de ordenar elaborar e promulgar leis do tipo que forem Baltimore arquitetou minucioso plano para instituir uma sociedade senhorial variante norteamericana de uma versão idealizada da Inglaterra rural do século XVII o que significava dividir a terra em lotes de milhares de acres a serem administrados por senhores Estes recrutariam arrendatários que trabalhariam e pagariam o aluguel à elite privilegiada no controle da terra Outra tentativa similar seria feita mais tarde em 1663 com a fundação da Carolina por oito proprietários entre os quais figurava Sir Anthony AshleyCooper AshleyCooper junto com seu secretário o grande filósofo inglês John Locke formulou as Constituições Fundamentais da Carolina documento que como a Carta de Maryland antes dele lançava as bases de uma sociedade elitista e hierárquica baseada na dominação pela elite de uma aristocracia rural O preâmbulo salientava que o governo desta província se fará perfeitamente consoante a monarquia sob a qual vivemos e de que esta província faz parte e comprometese a evitar a constituição de uma democracia numerosa Mapa 2 Densidade demográfica das Américas em 1500 As cláusulas das Constituições Fundamentais estabeleciam uma estrutura social rígida Na base estariam os lacaios leetmen sobre os quais a cláusula 23 determinava Os filhos de lacaios lacaios serão e assim será por todas as gerações Acima dos lacaios desprovidos de qualquer poder político ficariam os senhores landgraves e caciques caziques que comporiam a aristocracia A cada senhor caberiam 48 mil acres de terra e aos caciques 24 mil acres Haveria um parlamento em que senhores e caciques estariam representados mas ao qual seria permitido debater tão somente as medidas previamente aprovadas pelos oito proprietários Do mesmo modo como a tentativa de impor um regime draconiano na Virginia havia fracassado também os planos de implementar o mesmo tipo de instituição em Maryland e Carolina malograram por motivos similares Em todos os casos ficou comprovada a impossibilidade de sujeitar os colonos a uma rígida sociedade hierárquica porque eram muitas as opções ao seu alcance no Novo Mundo Pelo contrário era preciso oferecerlhes incentivos para que trabalhassem e logo estavam exigindo mais liberdade econômica e mais amplos direitos políticos Também em Maryland os colonos insistiam em ser proprietários das próprias terras e obrigaram Lorde Baltimore a criar uma assembleia Em 1691 esta induziu o rei a declarar Maryland colônia da Coroa destituindo assim de privilégios políticos Baltimore e seus senhores Embate similar ocorreu ainda que tardiamente nas Carolinas onde outra vez os aristocratas perderam e a Carolina do Sul tornouse colônia real em 1729 Na década de 1720 todas as 13 colônias que viriam a ser os Estados Unidos dispunham de estruturas de governo semelhantes Em todos os casos havia um governador e uma assembleia que representavam os proprietários de terras Não eram democracias a mulheres escravos e desprovidos era vedado o voto Ainda assim os direitos políticos eram bastante amplos se comparados a sociedades contemporâneas em outros lugares Foram essas assembleias e seus líderes que se reuniram em 1774 no Primeiro Congresso Continental prelúdio da independência dos Estados Unidos Em seu entender as assembleias dispunham tanto do direito de determinar sua própria composição quanto do direito à tributação o que como sabemos criou problemas para o governo colonial inglêsf UM CONTO DE DUAS CONSTITUIÇÕES A essa altura já deve estar evidente que não é coincidência o fato de terem sido os Estados Unidos e não o México a adotar e promulgar uma constituição que esposava princípios democráticos impunha limitações ao uso do poder político e distribuía tal poder pela sociedade de maneira ampla O documento que fez os delegados reunirem se para redigir na Filadélfia em maio de 1787 foi resultado de um longo processo iniciado com a formação da Assembleia Geral em Jamestown em 1619 É gritante o contraste entre o processo constitucional que se deu por ocasião da independência dos Estados Unidos e o ocorrido no México pouco tempo depois Em fevereiro de 1808 o exército francês de Napoleão Bonaparte invadiu a Espanha Em maio havia tomado Madri a capital do país Em setembro o rei espanhol Fernando fora capturado e havia abdicado Uma junta nacional a Junta Central ocupou seu lugar assumindo a incumbência de fazer frente aos franceses A Junta reuniuse pela primeira vez em Aranjuez mas recuou para o sul diante do avanço das tropas napoleônicas Por fim chegou ao Porto de Cádiz que apesar de sitiado pelas forças francesas resistiu Aqui a Junta formou um Parlamento chamado de Cortes Em 1812 as Cortes produziram o que ficaria conhecido como Constituição de Cádiz que determinava a introdução de uma monarquia constitucional com base em ideias de soberania popular Exigia também o fim de privilégios especiais e a introdução da igualdade perante a lei Todas essas demandas eram anátemas aos olhos das elites da América do Sul que ainda dominavam um ambiente institucional baseado nas encomiendas nos trabalhos forçados e no poder absoluto de que elas e o Estado colonial eram revestidos O colapso do Estado hispânico em decorrência da invasão napoleônica engendrou uma crise constitucional em toda a América Latina colonial O reconhecimento ou não da autoridade da Junta Central foi objeto de muita controvérsia e em resposta muitos latinoamericanos começaram a formar suas próprias juntas Era apenas questão de tempo até que vislumbrassem a possibilidade de se tornarem efetivamente independentes da Espanha A primeira declaração de independência veio à luz em La Paz Bolívia em 1809 embora tenha sido rapidamente esmagada por tropas espanholas enviadas do Peru No México as atitudes políticas da elite haviam sido moldadas pela Revolta de Hidalgo liderada em 1810 por um sacerdote Padre Miguel Hidalgo Quando os homens de Hidalgo saquearam Guanajuato em 23 de setembro mataram o intendente e o oficial colonial superior e puseramse a matar todos os brancos indiscriminadamente Foi mais uma guerra de classes ou mesmo étnica do que um movimento de independência com o efeito de unir todas as elites para fazerlhes frente Se a independência possibilitasse a participação popular na política as elites locais e não só os espanhóis seriam contra Por conseguinte as elites mexicanas viram a Constituição de Cádiz que abria caminho para a participação popular com extremo ceticismo e jamais reconheceram sua legitimidade Em 1815 com o colapso do império europeu de Napoleão o Rei Fernando VII voltou ao trono e a Constituição de Cádiz foi anulada Ao tentar retomar o controle de suas colônias na América a Coroa espanhola não enfrentou maiores problemas no México legalista Ainda assim em 1820 tropas hispânicas reunidas em Cádiz com destino às Américas a fim de ajudar a restabelecer a autoridade espanhola amotinaramse contra Fernando VII A elas logo se juntaram unidades do exército de todo o país e Fernando viuse compelido a restaurar a Constituição de Cádiz e voltar a convocar as Cortes que nessa reedição mostraramse ainda mais radicais do que aquelas que haviam redigido a Constituição de Cádiz propondo a abolição do trabalho forçado em todas as suas formas Atacavam também os privilégios especiais como por exemplo o direito dos militares de serem levados a julgamento criminal em tribunais próprios Finalmente confrontadas com a imposição desse documento no México as elites locais decidiram que seria melhor continuar por conta própria e declarar a independência Esse movimento de independência foi encabeçado por Augustín de Iturbide exoficial do Exército espanhol que em 24 de fevereiro de 1821 publicou o Plano de Iguala sua visão de um México independente O plano incluía uma monarquia constitucional com imperador mexicano e removia as provisões da Constituição de Cádiz que as elites locais consideravam tão perigosas para seu status e privilégios Recebeu apoio instantâneo e a Espanha logo reconheceu que não poderia impedir o inevitável Contudo Iturbide não se limitou a organizar a secessão mexicana Detectando o vácuo de poder tratou de tirar proveito de sua formação militar e fezse declarar imperador posição que o grande líder da independência sulamericana Simón Bolívar descrevia como por graça de Deus e das baionetas Iturbide não era limitado pelas mesmas instituições políticas que restringiam os presidentes dos Estados Unidos rapidamente se converteu em ditador e em outubro de 1822 dissolveu o Congresso sancionado pela Constituição e o substituiu por uma junta de sua escolha Embora Iturbide não tenha durado muito esse padrão de acontecimentos se repetiria vezes sem conta no México do século XIX A Constituição dos Estados Unidos não criou uma democracia pelos padrões modernos Cabia a cada estado determinar quem seriam os eleitores Assim embora os estados do norte logo tenham estendido o direito ao voto a todos os homens brancos independentemente de sua renda ou propriedades apenas aos poucos os do sul mostrariam a mesma prodigalidade Nenhum deles reconhecia os direitos de mulheres ou escravos e à medida que os brancos iam sendo liberados das limitações relativas a propriedade e riqueza eram adotadas restrições raciais que destituíam explicitamente os negros de todo e qualquer direito A escravidão é claro foi considerada legítima quando a Constituição dos Estados Unidos foi escrita na Filadélfia e teve lugar a mais sórdida das negociações com relação à divisão dos assentos na Câmara de Representantes entre os estados A alocação se daria de acordo com a população de cada estado mas os representantes do sul solicitaram que os escravos fossem contabilizados Os nortistas objetaram Chegouse ao acordo de que para fins de distribuição dos assentos na Câmara dos Representantes cada escravo contaria como três quintos de uma pessoa livre Os conflitos entre o Norte e o Sul dos Estados Unidos foram reprimidos durante o processo constitucional mediante a elaboração de pactos como essa regra dos três quintos e similares Novos ajustes seriam acrescentados com o passar do tempo como por exemplo o Acordo do Missouri segundo o qual um estado favorável à escravidão e outro contrário seriam sempre agregados juntos à União de modo a manter o equilíbrio no Senado entre as duas posições Foi graças a esses subterfúgios que as instituições políticas dos Estados Unidos mantiveramse em funcionamento pacífico até que a Guerra de Secessão viesse solucionar os conflitos em favor do Norte A Guerra de Secessão foi sangrenta e destrutiva Tanto antes quanto depois dela porém havia um semnúmero de oportunidades econômicas para uma vasta parcela da população sobretudo no norte e no oeste dos Estados Unidos No México a situação era outra Se os Estados Unidos experimentaram cinco anos de instabilidade política entre 1860 e 1865 o México viveu um quadro quase permanente de instabilidade nos 50 primeiros anos de sua independência o que é mais bem ilustrado pela trajetória de Antonio López de Santa Ana Santa Ana filho de um dignitário colonial em Veracruz destacouse como soldado lutando pela Coroa espanhola nas guerras de independência Em 1821 mudou de lado com Iturbide e jamais olhou para trás Tornouse presidente do México pela primeira vez em maio de 1833 embora tenha permanecido no poder por menos de um mês preferindo deixar o exercício do cargo para Valentín Gómez Farías O mandato de Gómez Farías duraria 15 dias ao fim dos quais Santa Ana retomou o poder Todavia sua segunda presidência foi tão breve quanto a primeira e no começo de julho ele foi novamente substituído por Gómez Farías Santa Ana e Gómez Farías continuariam sua dança até meados de 1835 quando Santa Ana foi substituído por Miguel Barragán Santa Ana porém não era de desistir Retornou à presidência em 1839 1841 1844 1847 e por fim entre 1853 e 1855 No total foi presidente 11 vezes no decorrer das quais assistiu à perda do Álamo e do Texas e à desastrosa Guerra Mexicano Americana que culminou com a perda do que viria a ser o Novo México e o Arizona Entre 1824 e 1867 foram 22 os presidentes do México poucos dos quais assumiram o poder por vias sancionadas pela lei A consequência dessa instabilidade política sem precedentes para as instituições e incentivos econômicos deveria ser óbvia Tamanha inconsistência acarretou profunda insegurança com relação ao direito à propriedade bem como grave enfraquecimento do Estado mexicano que agora dispunha de pouquíssima autoridade e capacidade de aumentar a arrecadação ou assegurar a prestação de serviços públicos Com efeito muito embora Santa Ana fosse presidente do México vastas parcelas do país não se encontravam sob seu controle o que possibilitou a anexação do Texas pelos Estados Unidos Ademais conforme acabamos de ver a força motriz por trás da declaração de independência mexicana foi o desejo de proteger o conjunto de instituições econômicas desenvolvidas durante o período colonial que havia feito do México nas palavras do grande explorador e geógrafo da América Latina o alemão Alexander von Humbolt o país da desigualdade Tais instituições ao erigirem a sociedade sobre a exploração dos povos indígenas e a criação de monopólios bloquearam os incentivos econômicos e iniciativas da grande massa da população Assim enquanto os Estados Unidos começavam a passar pela Revolução Industrial na primeira metade do século XIX o México empobrecia TER UMA IDEIA ABRIR UMA EMPRESA E OBTER UM EMPRÉSTIMO A Revolução Industrial começou na Inglaterra Seu primeiro êxito foi revolucionar a fabricação de tecidos de algodão graças às novas máquinas movidas a rodasdágua e mais tarde aos motores a vapor A mecanização da produção multiplicou de forma exponencial a produtividade dos trabalhadores primeiro na indústria têxtil e depois também em outras O motor das transformações tecnológicas em todos os segmentos da economia era a inovação encabeçada por novos empreendedores e homens de negócios ávidos por aplicar suas ideias Esse florescimento inicial não tardou a atravessar o Atlântico Norte e disseminarse pelos Estados Unidos as pessoas percebiam as grandes oportunidades econômicas decorrentes da adoção das novas tecnologias desenvolvidas na Inglaterra e viamse também inspiradas a criar suas próprias invenções Podemos tentar compreender a natureza dessas invenções mediante um breve exame quanto a quem eram concedidas as patentes O sistema de patentes que protege os direitos de propriedade das ideias foi sistematizado pelo Estatuto de Monopólios promulgado pelo Parlamento inglês em 1623 em parte como uma tentativa de impedir que o rei concedesse cartas de patente arbitrárias conferindo a quem bem entendesse direitos exclusivos sobre o empreendimento de determinadas atividades ou negócios O que mais chama a atenção no registro de patentes nos Estados Unidos é o fato de que os autores dos pedidos vinham de todo tipo de extrato sociocultural e história de vida não só do meio dos ricos e da elite Muitos fizeram fortuna graças às suas patentes Foi o caso de Thomas Edison inventor do fonograma e da lâmpada elétrica e fundador da General Electric até hoje uma das maiores empresas do mundo Edison era o mais novo de sete irmãos Seu pai Samuel Edison teve diversas ocupações de serrador de sarrafos para telhados a alfaiate passando por dono de taverna Thomas teve pouca educação formal mas sua mãe o ensinou em casa Entre 1820 e 1845 apenas 19 dos detentores de patentes nos Estados Unidos tinham pais com formação profissional específica ou eram provenientes de grandes famílias proprietárias de terras Nesse mesmo período 40 dos que registravam uma patente tiveram acesso apenas à educação primária ou menos como Edison Ademais com frequência exploravam sua patente abrindo uma empresa outra vez como Edison Do mesmo modo como os Estados Unidos eram no século XIX mais democráticos em termos políticos do que praticamente qualquer outro país do mundo na época eram também mais democráticos que os demais quando o assunto era inovação um elemento crítico em sua caminhada rumo a tornarse a nação economicamente mais inovadora do planeta Se você fosse pobre e tivesse uma boa ideia uma coisa era registrar uma patente que afinal de contas nem era um procedimento tão caro assim Outra coisa inteiramente distinta era usála para ganhar dinheiro Uma possibilidade claro era vendêla para terceiros Foi o que Edison fez logo no princípio a fim de levantar recursos quando vendeu seu telégrafo quadruplex por US10 mil para a Western Union Contudo a venda de patentes só era uma boa ideia em casos como o de Edison que tinha ideias mais rápido do que era capaz de botar em prática tendo chegado a um recorde mundial de 1093 patentes emitidas em seu nome nos Estados Unidos e 1500 em todo o mundo O verdadeiro modo de ganhar dinheiro com patentes era fundar seu próprio negócio Para tanto porém era preciso capital e bancos que o emprestassem Mais uma vez os inventores norteamericanos contaram com um empurrãozinho da sorte Durante o século XIX houve uma rápida expansão do sistema bancário e de intermediação financeira um crucial facilitador do ímpeto de crescimento e industrialização experimentado pela economia Se em 1818 havia 338 bancos em operação nos Estados Unidos com um ativo total de US160 milhões em 1914 já eram 27864 bancos com um ativo total de US273 bilhões Os potenciais inventores nos Estados Unidos tinham pronto acesso a capital para montar seus negócios Além disso a intensa concorrência entre bancos e instituições financeiras americanas significava que tais recursos encontravamse disponíveis a taxas de juros relativamente baixas No México a situação era outra Com efeito em 1910 ano em que teve início a Revolução Mexicana havia apenas 42 bancos no país dois dos quais controlavam 60 do ativo bancário total Ao contrário dos Estados Unidos onde a competição era acirrada entre os bancos mexicanos ela era quase inexistente o que significava que os bancos não só podiam cobrar taxas de juros extorsivas de seus clientes como normalmente mantinham os empréstimos restritos àqueles privilegiados e já ricos que assim podiam valerse de seu acesso ao crédito para aumentar o controle que exerciam sobre os vários setores da economia A forma assumida pela indústria bancária mexicana ao longo dos séculos XIX e XX foi resultado direto das instituições políticas que se consolidaram no país após a independência Ao caos da era de Santa Ana seguiuse uma tentativa malfadada do governo francês do Imperador Napoleão II de instalar um regime colonial no México sob o Imperador Maximiliano entre 1864 e 1867 Os franceses foram expulsos e foi elaborada uma nova Constituição Todavia o governo constituído primeiro por Benito Juárez e após sua morte por Sebastián Lerdo de Tejada logo seria desafiado por um jovem militar de nome Porfírio Díaz Díaz general vitorioso na guerra contra os franceses e que havia desenvolvido aspirações de poder formou um exército rebelde e em novembro de 1876 derrotou as tropas do governo na Batalha de Tecoac Em maio do ano seguinte elegeuse presidente e governaria o México de forma mais ou menos contínua e cada vez mais autoritária até ser deposto ao irromper a revolução 34 anos depois Como seus antecessores Iturbide e Santa Ana Díaz começou a vida como comandante militar Esse tipo de trajetória política iniciada nas Forças Armadas foi sem dúvida conhecida nos Estados Unidos O primeiro presidente dos Estados Unidos George Washington também fora um bemsucedido general na Guerra de Independência Ulysses S Grant um dos generais vitoriosos da União na Guerra de Secessão assumiria a presidência em 1869 e Dwight D Eisenhower comandante supremo das forças aliadas na Europa durante a Segunda Guerra Mundial seria presidente do país entre 1953 e 1961 Ao contrário de Iturbide Santa Ana e Díaz entretanto nenhum desses militares recorreu à força para guindarse ao poder e tampouco fez uso dela para não ter de abdicar de sua posição Todos submeteramse à Constituição Embora o México tivesse constituições no século XIX elas impunham poucas restrições ao que Iturbide Santa Ana e Díaz podiam fazer A única maneira de tirar esses homens do poder era do mesmo modo como eles o conquistaram com violência Díaz transgrediu os direitos de propriedade das pessoas facilitando a expropriação de vastas extensões de terra e concedeu monopólios e favores a seus defensores em todas as linhas de negócios inclusive no setor bancário Não que houvesse algo de novo em seu modo de proceder Era exatamente o que os conquistadores espanhóis haviam feito e o que fizera Santa Ana em seu rastro O motivo pelo qual os Estados Unidos dispunham de uma indústria bancária substancialmente mais favorável para a prosperidade econômica do país nada tinha a ver com alguma peculiaridade no que movia os proprietários de bancos De fato a motivação do lucro esteio da natureza monopolística da indústria bancária no México estava igualmente presente nos Estados Unidos só que canalizado de forma distinta em virtude de as instituições serem radicalmente distintas Os banqueiros lidavam com instituições econômicas diferentes que os submetiam a uma concorrência muito maior o que se devia em grande parte por sua vez ao fato de que os políticos que elaboraram as regras para os banqueiros também recebiam incentivos muito diferentes engendrados por outras instituições políticas Com efeito no final do século XVIII pouco depois de a Constituição americana entrar em vigor começou a despontar um sistema bancário bastante parecido com o que posteriormente viria a dominar o México Os políticos tentaram instalar monopólios que pudessem distribuir entre amigos e parceiros em troca de parte de seus lucros Os bancos também logo se puseram a emprestar dinheiro aos políticos que os regulavam como no México Nos Estados Unidos porém essa situação não poderia se sustentar porque os políticos que tentavam implementar tais monopólios ao contrário de seus colegas mexicanos eram sujeitos a eleição e reeleição A criação de monopólios bancários e a obtenção de empréstimos exclusivos é um bom negócio para os políticos quando conseguem sair incólumes Não é particularmente benéfico para os cidadãos contudo Ao contrário do México nos Estados Unidos os cidadãos tinham condições de manter os políticos sob controle e livrarse dos que procurassem legislar em causa própria ou agraciar seus camaradas com privilégios Por conseguinte os monopólios bancários vieram abaixo A ampla distribuição de direitos políticos nos Estados Unidos sobretudo se comparada ao México garantia igualdade de acesso a recursos e empréstimos o que por sua vez assegurava que aqueles que tivessem ideias e invenções delas se beneficiassem MUDANÇAS QUE DEPENDEM DA TRAJETÓRIA O mundo estava mudando nas décadas de 1870 e 1880 e a América Latina não era exceção As instituições estabelecidas por Porfírio Díaz não eram idênticas às de Santa Ana ou do Estado colonial espanhol A economia mundial apresentou um boom na segunda metade do século XIX e inovações nos meios de transporte como o navio a vapor e as ferrovias resultaram em enorme expansão do comércio internacional Tamanha onda de globalização significava que países ricos em recursos como o México ou para uma descrição mais adequada suas elites locais poderiam enriquecer mediante a exportação de matériasprimas e recursos naturais para a América do Norte ou a Europa Ocidental então em pleno processo de industrialização Díaz e seus companheiros viamse portanto em um mundo muito diferente e em rápida transformação Perceberam que também o México precisava mudar o que não queria dizer todavia que as instituições coloniais seriam extirpadas e substituídas por outras similares às norteamericanas pelo contrário a mudança a promover seria dependente da trajetóriag limitandose a levar ao estágio seguinte as instituições que tanto já haviam contribuído para a pobreza e a desigualdade da América Latina A globalização tornou valiosos os vastos espaços vazios das Américas suas fronteiras abertas De modo geral eram terras que se encontravam vagas apenas de um ponto de vista mítico pois eram habitadas por povos indígenas submetidos a uma brutal destituição De todo modo a corrida por esse recurso recémvalorizado foi um dos processos definidores das Américas na segunda metade do século XIX A súbita abertura da preciosa fronteira porém em vez de deflagrar processos paralelos nos Estados Unidos e na América Latina contribuiu apenas para aprofundar as divergências em virtude das diferenças institucionais já existentes sobretudo aquelas que determinavam quem tinha acesso à terra Nos Estados Unidos uma longa série de atos legislativos desde a Lei da Terra Land Ordinance de 1785 até a Lei da Propriedade Rural Homestead Act de 1862 deu amplo acesso às terras de fronteira Embora os povos indígenas tenham sido ignorados instaurouse assim uma fronteira igualitária e economicamente dinâmica Na maior parte dos países da América Latina todavia as instituições políticas locais engendraram um resultado completamente distinto As fronteiras foram repartidas entre os que já eram poderosos em termos políticos e os detentores de riqueza e dos contatos certos multiplicando ainda mais seu poderio Díaz também se dedicou ao desmantelamento de vários legados institucionais dos tempos da colônia que estorvavam o comércio internacional vislumbrando aí novas possibilidades de enriquecimento para si mesmo e seus partidários Seu modelo contudo continuou não sendo o tipo de desenvolvimento econômico que se via ao norte do Rio Grandeh mas aquele de Cortés Pizarro e Toledo no qual a elite fazia fortunas incalculáveis enquanto o resto da população permanecia à margem Quando a elite investia a economia apresentava um pequeno crescimento fadado no entanto a ser decepcionante além de sobrevir sempre em detrimento daqueles desprovidos de direitos nessa nova ordem Foi o caso por exemplo do povo yaqui de Sonora sertão de Nogales entre 1900 e 1910 possivelmente 30 mil yaquis foram deportados em essência escravizados e enviados para trabalhar nos latifúndios de agave de Iucatã As fibras do agave constituíam um importante item de exportação dada sua utilidade na confecção de cordas e barbante A persistência século XX adentro de um padrão institucional específico incompatível com o crescimento no México e América Latina é bem ilustrada pelo fato de que como no século XIX tal padrão continuou gerando estagnação econômica e instabilidade política golpes e guerras civis à medida que os grupos digladiavam pelos benefícios do poder Díaz finalmente perdeu o poder para forças revolucionárias em 1910 À Revolução Mexicana seguiramse outras na Bolívia em 1952 Cuba em 1959 e Nicarágua em 1979 Nesse ínterim Colômbia El Salvador Guatemala e Peru foram assolados por conflitos civis contínuos A expropriação de ativos ou ameaça de expropriação prosseguia em ritmo acelerado com reformas agrárias em massa ou tentativas de reforma na Bolívia Brasil Chile Colômbia Guatemala Peru e Venezuela Revoluções desapropriações e instabilidade política acompanhavam governos militares e ditaduras dos mais diversos tipos Embora se verificasse também uma muito gradual implementação de poderes políticos mais amplos só na década de 1990 a maioria dos países latinoamericanos tornouse uma democracia e mesmo então continuaram atolados em instabilidade Tamanha instabilidade era acompanhada de homicídios e repressão em massa O Relatório da Comissão Nacional para a Verdade e a Reconciliação no Chile de 1991 concluiu que 2279 pessoas foram assassinadas por motivos políticos durante a ditadura Pinochet entre 1973 e 1990 Possivelmente 50 mil foram presas e torturadas e centenas de milhares perderam o emprego O Relatório da Comissão Guatemalteca para Esclarecimento Histórico de 1999 identificou pelo nome um total de 42275 vítimas embora haja quem afirme que chegam a 200 mil os assassinados na Guatemala entre 1962 e 1996 70 mil só durante o regime do General Efrain Ríos Montt capaz de perpetrar tais crimes com tamanho grau de impunidade que ele pôde disputar a presidência em 2003 felizmente não venceu A Comissão Nacional sobre o Desaparecimento de Pessoas na Argentina estabeleceu em nove mil os mortos no país pelos militares entre 1976 e 1983 com a ressalva de que o número talvez seja maior estimativas de organizações de direitos humanos costumam situálo em torno de 30 mil GANHANDO UM BILHÃOZINHO OU DOIS As duradouras implicações da organização da sociedade colonial e dos legados institucionais dessas sociedades são determinantes para as atuais diferenças entre Estados Unidos e México e por conseguinte as duas metades de Nogales O contraste entre o modo como Bill Gates e Carlos Slim vieram a ser os dois homens mais ricos do mundo estando Warren Buffett também na disputa ilustra bem as forças em jogo A ascensão de Gates e da Microsoft é bem conhecida mas o fato de Gates ser a pessoa mais rica do mundo e fundador de uma das empresas mais inovadoras em termos tecnológicos não impediu o Departamento de Justiça norteamericano de mover ações civis contra a Microsoft Corporation em 8 de maio de 1998 acusandoa de abuso de monopólio O que estava particularmente em questão era o modo como a Microsoft havia embutido o Internet Explorer seu navegador para a Web no Windows seu sistema operacional O governo americano estava há algum tempo de olho em Gates e já em 1991 a Federal Trade Commission Comissão Federal de Comércio havia aberto um inquérito para averiguar se a Microsoft estava incorrendo em abuso de monopólio com relação aos sistemas operacionais para PCs Em novembro de 2001 a Microsoft chegou a um acordo com o Departamento de Justiça e teve suas asas cortadas ainda que as penalidades ficassem aquém do que muitos esperavam No México o enriquecimento de Carlos Slim não se deu por meio da inovação A princípio destacouse na composição de acordos no mercado de capitais e na compra e renovação de empresas que não davam lucro Sua maior jogada foi a aquisição da Telmex monopólio mexicano de telecomunicações privatizado pelo Presidente Carlos Salinas em 1990 O governo anunciou sua intenção de vender 51 das ações com direito a voto 204 do patrimônio total da empresa em setembro de 1989 e recebeu as ofertas em novembro de 1990 Embora Slim não tenha feito a oferta mais alta um consórcio liderado por seu Grupo Corso venceu o leilão Em vez de efetuar o pagamento à vista Slim conseguiu postergálo usando os próprios dividendos da Telmex para pagar pela compra O que fora outrora monopólio público tornouse monopólio de Slim e de alta rentabilidade As instituições econômicas que tornaram Carlos Slim quem ele é são muito diferentes daquelas existentes nos Estados Unidos Se você for um mexicano empreendedor as barreiras que encontrará a cada estágio de sua carreira vão desempenhar um importante papel em sua trajetória Entre elas se encontram licenças caras que será preciso obter burocracias que será preciso superar políticos e encarregados que atravessarão o seu caminho e a dificuldade de obter financiamento de um setor financeiro que não raro estará mancomunado com os encarregados que você tentará dobrar Tais barreiras serão ou instransponíveis mantendoo fora das áreas rentáveis ou suas maiores aliadas mantendo seus concorrentes à margem A diferença entre as duas situações é evidentemente quem você conhece e quem consegue influenciar e quem você pode subornar Carlos Slim um homem de talento e ambição de origem relativamente modesta entre imigrantes libaneses é um mestre na obtenção de contratos exclusivos conseguiu monopolizar o lucrativo mercado das telecomunicações no México para em seguida estender seu alcance ao restante da América Latina Houve desafios ao monopólio de Slim com a Telmex mas sem êxito Em 1996 a Avantel operadora de telefonia de longa distância solicitou à Comissão de Concorrência Mexicana que averiguasse se a Telmex desfrutava de uma posição dominante no mercado de telecomunicações Em 1997 a comissão declarou que a empresa detinha substancial poder de monopólio com relação à telefonia local ligações nacionais de longa distância e ligações internacionais de longa distância entre outros fatores Mesmo assim todas as tentativas das autoridades reguladoras do país de limitar tais monopólios foram inúteis Um dos motivos é que Slim e a Telmex podem valerse do que se conhece como recurso de amparo literalmente apelo por proteção um dispositivo para que determinada lei não se aplique a determinado caso individual A ideia do amparo remonta à Constituição mexicana de 1857 tendo sido originalmente concebido como garantia de direitos e liberdades individuais Nas mãos da Telmex e outros monopólios mexicanos porém tornouse um formidável instrumento para consolidar seu poder Em vez de resguardar os direitos da população o amparo constitui um subterfúgio para esquivarse da igualdade perante a lei Slim amealhou sua fortuna na economia mexicana em grande parte graças às suas conexões políticas Sua incursão nos Estados Unidos foi um fracasso Em 1999 seu Grupo Corso adquiriu a CompUSA rede de varejo de computadores que na época havia concedido uma franquia a uma empresa chamada COC Services para vender seus produtos no México Slim imediatamente violou esse contrato com a intenção de estabelecer sua própria rede de lojas sem a concorrência da COC Esta porém entrou com um processo contra a CompUSA em um tribunal de Dallas Como não há amparos em Dallas Slim perdeu e teve de pagar uma multa no valor de US454 milhões O advogado da COC Mark Werner observaria depois que a lição dada por esse veredicto é que nesta economia global as empresas terão de respeitar as regras dos Estados Unidos se quiserem instalarse aqui Sob as instituições americanas as táticas habituais de Slim para ganhar dinheiro não deram certo RUMO A UMA TEORIA DA DESIGUALDADE MUNDIAL Vivemos em um mundo desigual As diferenças entre as nações são análogas àquelas que separam as duas metades de Nogales ainda que em escala maior Nos países ricos a população é mais saudável tem expectativa de vida mais alta e acesso muito maior à educação Dispõe também de uma variedade de recursos e opções na vida de férias a possibilidades de carreira com o que nos países pobres podese apenas sonhar Os habitantes dos países ricos dirigem em estradas sem crateras e desfrutam de vasos sanitários eletricidade e água corrente em suas casas Em geral contam também com governos que não os prendem nem assediam de maneira arbitrária pelo contrário prestam serviços como educação saúde rodovias lei e ordem Igualmente notável é o fato de que os cidadãos votam nas eleições e têm alguma voz nos rumos políticos tomados por sua pátria As grandes diferenças em termos de desigualdade mundial são evidentes para todos mesmo aqueles nos países pobres a quem falta acesso à televisão ou à internet É a percepção e a realidade dessas discrepâncias que leva as pessoas a cruzarem ilegalmente o Rio Grande ou o Mar Mediterrâneo em busca da possibilidade de experimentar as oportunidades e padrões de vida dos países ricos Tal desigualdade não tem consequências apenas para a vida dos indivíduos nos países pobres causa também queixas e ressentimentos com imensas consequências políticas para os Estados Unidos e outros países Compreender as razões por que tais diferenças existem e o que as causa é nosso objetivo neste livro Chegar a esse entendimento não constitui um fim em si mas é também um primeiro passo no sentido da geração de ideias mais eficazes acerca de como melhorar a vida de bilhões que ainda vivem na pobreza As disparidades entre os dois lados da cerca em Nogales são apenas a ponta do iceberg Como é regra no norte do México que se beneficia do comércio com os Estados Unidos ainda que nem todo ele seja legal os residentes de Nogales são mais abastados que outros mexicanos cuja renda familiar anual média gira em torno de US5 mil Essa maior prosperidade relativa de Nogales Sonora devese aos parques industriais de fábricas maquiladorasi o primeiro dos quais foi fundado por Richard Campbell Jr fabricante de cestas californiano Sua primeira locatária foi a CoinArt fabricante de instrumentos musicais que pertencia a Richard Bosse proprietário da Artley uma fábrica de flautas e saxofones em Nogales Arizona A CoinArt foi seguida pela Memorex cabeamento de computadores Avent vestuário hospitalar Grant óculos de sol Chamberlain fabricante de abridores de portas de garagem para a Sears e Samsonite maletas Significativamente são todas empresas com sede nos Estados Unidos e de proprietários americanos usando capital e knowhow americanos A maior riqueza de Nogales Sonora em relação ao resto do México portanto vem de fora As diferenças entre os Estados Unidos e o México por sua vez são pequenas se comparadas àquelas encontradas no resto do planeta O cidadão americano médio é 7 vezes mais rico que o mexicano médio e 10 vezes mais que o peruano ou centro americano cerca de 20 vezes mais rico que o morador médio da África subsaariana e quase 40 vezes mais que os habitantes dos países africanos mais pobres como Mali Etiópia e Serra Leoa e não são só os Estados Unidos Há um pequeno mas crescente grupo de países ricos situados em sua maioria na Europa e América do Norte mas composto também por Austrália Japão Nova Zelândia Cingapura Coreia do Sul e Taiwan cujos cidadãos levam uma vida muito diferente daquela da população do resto do planeta O motivo por que Nogales Arizona é muito mais rica que Nogales Sonora é simples tratase do fruto de instituições completamente distintas de um lado e de outro da fronteira que geram incentivos muito diferentes para os habitantes de cada metade da cidade Os Estados Unidos também são muito mais ricos hoje do que o México ou o Peru graças ao modo como suas instituições tanto econômicas quanto políticas geram incentivos para empresas indivíduos e políticos Cada sociedade funciona com um conjunto de regras econômicas e políticas criadas e aplicadas pelo Estado e pelos cidadãos em conjunto As instituições econômicas dão forma aos incentivos econômicos incentivos para buscar mais educação para poupar e investir para inovar e adotar novas tecnologias e assim por diante É o processo político que determina a que instituições econômicas as pessoas viverão submetidas e são as instituições políticas que ditam como funciona esse processo Por exemplo são as instituições políticas de uma nação que estabelecem a capacidade dos cidadãos de controlar os políticos e influenciar seu comportamento o que por sua vez define se os políticos serão agentes dos cidadãos ainda que imperfeitos ou se terão a possibilidade de abusar do poder que lhes foi confiado ou que usurparam para fazer fortuna e agir em benefício próprio em detrimento dos cidadãos As instituições políticas incluem Constituições escritas mas não se limitam a elas e o fato de a sociedade ser uma democracia Compreendem o poder e a capacidade do Estado de regular e governar a sociedade É igualmente necessário considerar de forma mais ampla os fatores que determinam como o poder político se distribui na sociedade sobretudo a capacidade de diferentes grupos de agir coletivamente em busca de seus objetivos ou impedir outros de atingirem os seus À medida que influenciam comportamentos e incentivos na vida real as instituições forjam o sucesso ou fracasso dos países O talento individual é importante em todos os níveis da sociedade mas mesmo ele requer um arcabouço institucional para converter se em força positiva Bill Gates como outras figuras lendárias da indústria de tecnologia da informação como Paul Allen Steve Ballmer Steve Jobs Larry Page Sergey Brin e Jeff Bezos era dotado de imenso talento e ambição mas em última instância respondeu a incentivos O sistema educacional americano possibilitou que Gates e outros como ele adquirissem um conjunto único de competências que vieram complementar seus talentos As instituições econômicas dos Estados Unidos permitiram que esses homens fundassem empresas com facilidade sem para isso enfrentar obstáculos intransponíveis essas mesmas instituições viabilizaram o financiamento de seus projetos O mercado de trabalho americano lhes permitiu contratar pessoal qualificado e o ambiente de mercado relativamente competitivo possibilitou que expandissem suas empresas e comercializassem seus produtos Esses empreendedores tinham a convicção desde o começo de que os projetos dos seus sonhos tinham condições de ser implementados confiavam nas instituições e no estado de direito por elas engendrado e nada tinham a temer em relação à segurança de seus direitos de propriedade Por fim as instituições políticas lhes asseguravam estabilidade e continuidade De um lado garantiam que não havia risco de um ditador assumir o poder e mudar as regras do jogo desapropriandoos de sua riqueza aprisionandoos ou ameaçando sua vida e meios de subsistência Asseguravam também que nenhum interesse particular presente na sociedade seria capaz de abduzir o governo e impelilo em alguma direção desastrosa em termos econômicos já que o poder político era ao mesmo tempo limitado e distribuído de maneira suficientemente ampla para possibilitar o surgimento de uma série de instituições econômicas geradoras de incentivos para a prosperidade Este livro pretende mostrar que por mais vitais que sejam as instituições econômicas para determinar o grau de pobreza ou riqueza de dado país a política e as instituições políticas é que ditam que instituições econômicas o país terá Em última instância as boas instituições econômicas dos Estados Unidos são fruto das instituições políticas que emergiram gradualmente após 1619 Nossa teoria da desigualdade mundial mostra como interagem as instituições políticas e econômicas causando pobreza ou prosperidade e como cada parte do mundo acabou desenvolvendo seu próprio conjunto de instituições Nossa breve revisão da história das Américas limitou se a dar uma pincelada das forças que moldam as instituições políticas e econômicas Cada padrão institucional hoje se encontra profundamente enraizado no passado porque uma vez que a sociedade se organiza de determinado modo este tende a persistir Mostraremos que esse fato se deve ao modo como as instituições políticas e econômicas interagem Tal persistência e as forças que a criam explicam também por que é tão difícil extirpar a desigualdade do mundo e enriquecer os países pobres Embora as instituições sejam a chave para as diferenças entre as duas Nogales bem como entre México e Estados Unidos isso não quer dizer que haverá qualquer consenso no México no sentido de modificar suas instituições Não é necessário que uma sociedade desenvolva ou adote as instituições que são melhores para o crescimento econômico ou o bemestar de seus cidadãos porque outras instituições podem ser ainda melhores para aqueles que detêm o controle da política e das instituições políticas Os poderosos e o restante da sociedade com frequência vão divergir quanto a quais instituições devem permanecer e quais devem ser modificadas Carlos Slim não gostaria nem um pouco de ver o desaparecimento de suas conexões políticas nem a dissolução das barreiras que protegem seus negócios por mais que o surgimento de novas empresas significasse o enriquecimento de milhões de mexicanos Por não haver tal consenso as regras que acabam regendo cada sociedade são definidas pela política quem detém o poder e como esse poder pode ser exercido Carlos Slim tem o poder de conseguir o que quer O poder de Bill Gates é muito mais limitado É por isso que nossa teoria trata não só de economia mas também de política Trata dos efeitos das instituições sobre o sucesso e o fracasso das nações e portanto da economia da pobreza e da prosperidade trata também de como as instituições são determinadas e transformamse ao longo do tempo e como acabam tornandose incapazes de mudar quando criam pobreza e miséria para milhões e portanto da política da pobreza e da prosperidade N 2 TEORIAS QUE NÃO FUNCIONAM AS CIRCUNSTÂNCIAS ATUAIS OSSO LIVRO se concentra na explicação não só das desigualdades mundiais mas também de alguns dos padrões gerais mais prontamente visíveis que nela encontram morada O primeiro país a experimentar crescimento econômico sustentado foi a Inglaterra ou Grã Bretanha como é conhecida a união de Inglaterra País de Gales e Escócia desde 1707 O crescimento despontou gradualmente na segunda metade do século XVIII à medida que a Revolução Industrial baseada em grandes inovações tecnológicas e sua aplicação na indústria ia se estabelecendo À industrialização da Inglaterra logo se seguiria a da maior parte da Europa Ocidental e Estados Unidos A prosperidade inglesa não tardou a espalharse também pelas colônias de povoamento britânicas Canadá Austrália e Nova Zelândia Uma lista dos 30 países mais ricos hoje inclui estes que citamos mais Japão Cingapura e Coreia do Sul A prosperidade dos três últimos é por sua vez parte de um padrão mais amplo conforme o qual diversas nações do Leste Asiático inclusive Taiwan e posteriormente a China experimentaram acelerado crescimento em tempos recentes O segmento inferior da distribuição da renda mundial apresenta um quadro tão agudo e peculiar quanto o superior Se ao contrário fizermos uma lista dos 30 países mais pobres do mundo atual constataremos que quase todos se encontram na África subsaariana A estes se juntam países como Afeganistão Haiti e Nepal que mesmo não se situando na África têm um elemento crítico em comum com as nações africanas como vamos explicar Se voltássemos 50 anos no tempo os 30 países mais ricos e mais pobres não seriam muito diferentes Cingapura e Coreia do Sul não figurariam entre os mais ricos e haveria vários outros entre os 30 mais pobres mas a situação geral que se apresentaria seria notavelmente consistente com o que vemos nos dias atuais Voltando 100 anos ou 150 encontraríamos praticamente os mesmos países nos mesmos grupos O Mapa 3 mostra a situação em 2008 Os países em cor mais escura são os mais pobres do mundo aqueles cuja renda per capita chamada pelos economistas de PIB Produto Interno Bruto é inferior a US2 mil anuais A maioria da África aparece dessa cor assim como Afeganistão Haiti e partes do Sudeste Asiático como Camboja e Laos A Coreia do Norte também se encontra nesse grupo de países Aqueles em branco são os mais ricos com renda per capita anual de US20 mil ou mais Aqui encontramos os suspeitos de sempre América do Norte Europa Ocidental Australásia e Japão Mapa 3 Prosperidade no mundo em 2008 Outro padrão interessante pode ser detectado nas Américas Se arrolarmos os países americanos em ordem decrescente de riqueza dos mais prósperos para os mais pobres veremos que no topo estão Estados Unidos e Canadá seguidos do Chile Argentina Brasil México e Uruguai e talvez também a Venezuela dependendo do preço do petróleo em seguida temos Colômbia República Dominicana Equador e Peru No final há outro grupo separado bem mais pobre composto por Bolívia Guatemala e Paraguai Se recuarmos 50 anos no tempo encontraremos a mesma classificação Cem anos a mesma coisa E novamente se voltarmos 150 anos Portanto não são só Estados Unidos e Canadá que são mais ricos que a América Latina há também uma separação definida e persistente entre países ricos e pobres dentre os latinoamericanos Um último padrão interessante pode ser encontrado no Oriente Médio onde encontramos nações ricas em petróleo como Arábia Saudita e Kuwait cujos níveis de renda são próximos àqueles dos 30 mais ricos Caso o preço do petróleo caia porém eles despencarão para o estrato inferior Países do Oriente Médio com pouco ou nenhum petróleo como Egito Jordânia e Síria aglomeramse em torno de um nível de renda próximo ao da Guatemala ou Peru Sem suas reservas petrolíferas as nações do Oriente Médio são tão pobres quanto as da América Central e dos Andes ainda que não tanto quanto as da África subsaariana Apesar da grande persistência dos padrões de prosperidade que observamos hoje ao nosso redor contudo eles não são cristalizados nem imutáveis Em primeiro lugar como já enfatizamos grande parte da atual desigualdade mundial remonta ao final do século XVIII tendo nascido no rastro da Revolução Industrial As lacunas entre os diferentes níveis de riqueza não só eram menores até meados do século XVIII mas a ordenação que desde então tem se mostrado tão estável não se manterá caso recuemos mais longe no tempo Nas Américas por exemplo a classificação que se manteve nos últimos 150 anos era completamente outra 500 anos atrás Em segundo lugar diversas nações experimentaram décadas seguidas de crescimento acelerado como boa parte do Leste Asiático da Segunda Guerra Mundial para cá e mais recentemente a China E não poucas delas viram posteriormente tal tendência se inverter A Argentina por exemplo cresceu rapidamente por cinco décadas até 1920 chegando a se tornar um dos países mais ricos do mundo mas desde então iniciou um longo declínio A União Soviética constitui um exemplo ainda mais notável tendo apresentado crescimento acentuado entre 1930 e 1970 mas experimentando depois um súbito colapso O que explica essas diferenças significativas de grau de pobreza e prosperidade e entre padrões de crescimento Por que os países da Europa Ocidental e seus rebentos coloniais povoados com colonos europeus começaram a crescer no século XIX sem olhar para trás O que explica a persistência do ranking da desigualdade nas Américas O que impede a África subsaariana e o Oriente Médio de apresentarem o mesmo crescimento econômico ocorrido na Europa Ocidental enquanto tão grande parte do Leste Asiático vem ostentando níveis de crescimento estratosféricos Podese pensar que o fato de a desigualdade mundial ser tão acentuada com consequências tão graves e padrões tão nítidos e evidentes implique que haja para ela alguma explicação que goze de ampla aceitação Não é o caso A maioria das hipóteses propostas pelos cientistas sociais para as origens da pobreza e da prosperidade não funciona e revelase incapaz de explicar de maneira convincente as atuais circunstâncias A HIPÓTESE GEOGRÁFICA Uma teoria muito aceita sobre as causas da desigualdade mundial é a hipótese geográfica segundo a qual o abismo que separa países ricos e pobres é gerado por diferenças geográficas Muitos países pobres como os da África da América Central e do Sul da Ásia localizamse entre os trópicos de Câncer e de Capricórnio As nações ricas em contrapartida tendem a situarse nas latitudes temperadas Essa concentração geográfica da pobreza e da riqueza confere um apelo superficial à hipótese geográfica ponto de partida das teorias e opiniões de não poucos cientistas sociais e sumidades em geral o que não a torna menos equivocada Já no final do século XVIII o grande filósofo político francês Montesquieu assinalava a concentração geográfica da prosperidade e da pobreza e propunhase a explicála A seu ver os habitantes dos climas tropicais tendiam a ser preguiçosos e pouco inquisitivos Por conseguinte não trabalhavam com empenho suficiente nem eram inovadores motivos pelos quais eram pobres Montesquieu especulava também que as pessoas preguiçosas tendiam a ser governadas por déspotas sugerindo que a localização nos trópicos justificaria não só a pobreza mas também parte dos fenômenos políticos associados ao fracasso econômico como regimes ditatoriais A teoria de que os países quentes são intrinsecamente pobres embora recentemente desmentida pelo acelerado avanço econômico de países como Cingapura Malásia e Botsuana ainda é objeto de ardorosa defesa por parte de alguns como o economista Jeffrey Sachs A moderna versão dessa tese salienta não os efeitos diretos do clima sobre a dedicação ao trabalho ou os processos mentais mas dois outros argumentos primeiro o de que as doenças tropicais sobretudo a malária têm consequências muito adversas para a saúde e por conseguinte para a produtividade e segundo o de que os solos tropicais não permitem uma agricultura produtiva A conclusão entretanto é a mesma os climas temperados possuem uma vantagem relativa sobre as regiões tropicais e subtropicais As desigualdades mundiais todavia não podem ser explicadas pelo clima ou doenças nem qualquer outra versão da hipótese geográfica Basta lembrarmos de Nogales O que separa as duas metades da cidade não são as condições de clima geografia nem de saúde mas a fronteira MéxicoEstados Unidos Se a hipótese geográfica não dá conta de explicar as diferenças entre o Norte e o Sul de Nogales ou as Coreias do Norte e do Sul ou entre as Alemanhas Ocidental e Oriental antes da queda do Muro de Berlim poderia ter ainda alguma utilidade para explicar as diferenças entre as Américas do Norte e do Sul Entre Europa e África Não A história demonstra a inexistência de ligações simples ou duradouras entre clima ou geografia e êxito econômico Por exemplo não é verdade que os trópicos tenham sido sempre mais pobres que as latitudes temperadas Como vimos no capítulo anterior na época da conquista das Américas por Colombo a faixa ao sul do Trópico de Câncer e ao norte do de Capricórnio que hoje compreendem México América Central Peru e Bolívia continha as grandes civilizações asteca e inca impérios politicamente centralizados e complexos que construíram estradas e prestavam auxílio contra a fome Os astecas dispunham tanto de moeda quanto de escrita e os incas embora lhes faltassem essas duas tecnologias fundamentais registravam vasta quantidade de informação em cordões cheios de nós chamados quipos Em agudo contraste nessa mesma época as áreas ao norte e ao sul daquela habitada por esses dois povos onde hoje se encontram Estados Unidos Canadá Argentina e Chile eram habitadas basicamente por civilizações na Idade da Pedra desprovidas de tais tecnologias Os trópicos nas Américas eram portanto muito mais ricos que as zonas temperadas o que indica que o fato óbvio da pobreza tropical não é nem óbvio e muito menos um fato Pelo contrário a maior riqueza dos Estados Unidos e Canadá hoje representa uma acentuada inversão da fortuna em relação ao cenário vigente por ocasião da chegada dos europeus Tal inversão claramente nada teve a ver com a geografia mas como já vimos com o modo como se deu a colonização dessas áreas um processo que não se restringiu às Américas Os povos do Sul da Ásia sobretudo no subcontinente indiano e na China eram mais prósperos do que os de muitas outras partes da Ásia e certamente mais que as populações da Austrália e Nova Zelândia Também esse quadro se inverteu à medida que Coreia do Sul Cingapura e Japão despontaram como nações mais ricas da Ásia e Austrália e Nova Zelândia ultrapassaram quase todo o continente asiático em termos de prosperidade Mesmo no âmbito da África subsaariana verificouse uma inversão similar Em tempos mais recentes antes de começar o intenso contato europeu com os africanos o sul da África era a área de menor densidade populacional e a que estava mais longe de apresentar Estados estruturados que exercessem algum tipo de controle sobre seus territórios Não obstante a África do Sul é hoje uma das mais prósperas nações da África subsaariana Voltando atrás na história novamente vemos muita prosperidade nos trópicos algumas das grandes civilizações prémodernas como Angkor no moderno Camboja Vijayanagara no sul da Índia e Aksum na Etiópia floresceram nos trópicos do mesmo modo como as civilizações do Vale do Indo de Mohenjo Daro e Harapa no atual Paquistão Diante das evidências históricas portanto restamnos poucas dúvidas de que não existe correlação simples entre localização tropical e sucesso econômico As doenças tropicais evidentemente são causa de profundo sofrimento e elevadas taxas de mortalidade infantil na África mas não constituem a razão da pobreza africana O adoecimento é em grande parte consequência da pobreza e da falta de capacidade ou vontade dos governos para tomar as medidas de saúde pública necessárias à sua erradicação A Inglaterra no século XIX também era um lugar bastante insalubre mas o governo efetuou investimentos graduais no abastecimento de água limpa no devido tratamento de esgotos e efluentes e por fim em serviços de saúde eficazes A melhoria das condições de saúde e o aumento da expectativa de vida decerto não foram as causas do êxito econômico britânico mas um dos frutos de suas transformações políticas e econômicas prévias O mesmo vale para Nogales Arizona A outra parte da hipótese geográfica diz que os trópicos devem sua pobreza à intrínseca improdutividade da agricultura tropical Os solos tropicais são finos e incapazes de reter nutrientes segundo esse argumento que enfatiza a rapidez com que eles são erodidos pelas chuvas torrenciais A ideia não deixa de ter seu mérito sem dúvida mas como mostraremos o principal determinante da baixíssima produtividade agrícola expressa em produção agrícola por acre em tantos países pobres sobretudo na África subsaariana pouco tem a ver com a qualidade do solo Pelo contrário é consequência da estrutura de propriedade da terra e dos incentivos criados para os fazendeiros pelos governos e instituições sob os quais vivem Vamos demonstrar também que a desigualdade mundial não pode ser explicada por diferenças na produtividade agrícola As profundas disparidades do mundo moderno nascidas no século XIX foram causadas pela disseminação desigual das tecnologias industriais e da produção manufatureira não por diferenças no desempenho agrícola Outra versão influente da hipótese geográfica é defendida pelo ecologista e biólogo evolutivo Jared Diamond para quem a origem das desigualdades intercontinentais nos primórdios da era moderna há 500 anos jazem na falta de uniformidade na distribuição histórica de espécies vegetais e animais que posteriormente influenciaria a produtividade agrícola Em alguns lugares como o Crescente Fértil no atual Oriente Médio havia grande número de espécies passíveis de domesticação pelos seres humanos Em outros como as Américas não O grande número de espécies domesticáveis tornou interessante para as sociedades fazer a transição de um estilo de vida de caça e coleta para outro agrário Por conseguinte a agricultura desenvolveuse antes no Crescente Fértil que nas Américas A densidade demográfica aumentou possibilitando a especialização da mão de obra o comércio a urbanização e o desenvolvimento político Fundamentalmente nos lugares em que a agricultura se tornou dominante as novações tecnológicas ocorreram com mais rapidez do que em outras partes do mundo Assim de acordo com Diamond as discrepâncias na disponibilidade de espécies animais e vegetais acarretaram graus variados de exploração agrícola o que por sua vez conduziu a caminhos distintos de transformação tecnológica e prosperidade em cada continente Embora a tese de Diamond constitua uma abordagem respeitável ao problema sobre o qual ele se debruça não pode ser estendida à explicação da desigualdade no mundo moderno Por exemplo Diamond defende que os espanhóis conseguiram dominar as civilizações das Américas graças à maior antiguidade de sua tradição agrícola e consequente superioridade tecnológica Agora porém precisamos explicar por que os mexicanos e peruanos que habitam as antigas terras dos astecas e incas são pobres Por mais que o acesso a trigo cevada e cavalos tornasse os espanhóis mais ricos que os incas a disparidade de renda entre os dois povos não era tão significativa A renda média de um espanhol correspondia provavelmente a menos que o dobro da de um cidadão do Império Inca A tese de Diamond sugere que uma vez que os incas viramse expostos a todas as espécies e tecnologias delas resultantes que não haviam sido capazes de desenvolver por conta própria deveriam ter atingido rapidamente o padrão de vida dos espanhóis Todavia não foi em absoluto o que aconteceu Pelo contrário nos séculos XIX e XX abriuse uma lacuna muito maior entre as rendas de espanhóis e peruanos Hoje o espanhol médio é mais de seis vezes mais rico do que o peruano médio um abismo intimamente relacionado à heterogeneidade na disseminação das modernas tecnologias industriais mas que pouco tem a ver tanto com o potencial para a domesticação de plantas e animais quanto com as diferenças intrínsecas de produtividade agrícola entre os dois países Enquanto a Espanha ainda que com atraso adotou as tecnologias do motor a vapor ferrovias eletricidade mecanização e produção manufatureira o Peru não ou no máximo o fez de modo muito lento e imperfeito Tal lacuna tecnológica persiste ainda hoje e reproduzse em maior escala à medida que as novas tecnologias sobretudo aquelas relacionadas à tecnologia da informação alimentam mais crescimento em muitas nações desenvolvidas e outras em acelerado desenvolvimento A tese de Diamond não nos diz por que essas tecnologias cruciais não se difundem e uniformizam a renda ao redor do mundo como tampouco explica por que a metade norte de Nogales é tão mais rica que sua gêmea ao sul da cerca muito embora ambas fizessem parte da mesma civilização 500 anos atrás A história de Nogales põe em evidência outro grave problema da adaptação da teoria de Diamond como já vimos fossem quais fossem os pontos fracos dos impérios inca e asteca em 1532 Peru e México eram sem dúvida mais prósperos do que aquelas regiões das Américas que viriam a ser os Estados Unidos e o Canadá A América do Norte tornouse mais rica justamente por haver adotado com entusiasmo as tecnologias e avanços da Revolução Industrial O nível educacional da população aumentou e as ferrovias se espalharam pelas grandes pradarias em agudo contraste com o que transcorreu na América do Sul Isso não pode ser justificado apontandose as distintas características geográficas das Américas do Norte e do Sul as quais digase de passagem concederiam vantagem à América do Sul As desigualdades no mundo moderno são em grande parte fruto da falta de homogeneidade na disseminação e adoção de tecnologias e a tese de Diamond de fato inclui dois argumentos importantes a esse respeito Por exemplo ele defende seguindo o historiador William McNeill que a orientação lesteoeste da Eurásia possibilitou que produtos agrícolas animais e inovações se difundissem do Crescente Fértil para a Europa Ocidental ao passo que a orientação nortesul das Américas justifica que os sistemas de escrita criados no México não se disseminassem pelos Andes ou pela América do Norte Não obstante a orientação dos continentes não constitui explicação para as desigualdades mundiais existentes hoje Consideremos a África Embora o Deserto do Saara constituísse de fato uma barreira significativa à penetração de bens e ideias do norte na África subsaariana não chegava a ser um obstáculo intransponível Os portugueses seguidos de outros europeus circumnavegaram a costa e eliminaram as diferenças de conhecimento num período em que as diferenças de renda eram ínfimas comparadas à situação atual De lá para cá a África não só não alcançou a Europa como pelo contrário a lacuna entre a renda da maioria dos países africanos e a dos europeus apenas se aprofundou Deve estar claro também que a argumentação de Diamond centrada na desigualdade intercontinental não é bem equipada para explicar as variações dentro dos continentes um aspecto essencial da moderna desigualdade mundial Por exemplo por mais que a orientação da massa de terra eurasiática possa explicar como a Inglaterra logrou beneficiarse das inovações do Oriente Médio sem precisar reinventá las não explica por que a Revolução Industrial se deu na Inglaterra em vez de digamos na Moldávia Ademais como o próprio Diamond destaca China e Índia tiraram imenso proveito tanto da rica diversidade da fauna e da flora quanto da orientação da Eurásia Ainda assim a maior parte da população pobre do mundo hoje encontrase nesses dois países De fato a melhor maneira de entender o escopo da tese de Diamond é em termos de suas próprias variáveis O Mapa 4 apresenta dados sobre a distribuição de javalis Sus scrofa ancestrais do porco moderno e de auroques antecessores dos bois atuais Ambos tinham ampla distribuição por toda a Eurásia e mesmo o Norte da África O Mapa 5 mostra a distribuição de alguns dos ancestrais selvagens dos produtos agrícolas domesticados de hoje como o Oryza sativa antecessor do arroz cultivado asiático e os ancestrais do trigo e cevada modernos A ilustração demonstra que o ancestral selvagem do arroz estava amplamente distribuído por todo o sul e sudeste da Ásia ao passo que os antecessores do trigo e da cevada distribuíamse ao longo de um comprido arco que ia do Levante e passava pelo Irã e Afeganistão até os istões Turcomenistão Tadjiquistão e Quirguistão Essas espécies ancestrais encontramse presentes em grande parte da Eurásia mas sua ampla distribuição sugere que não há como justificar as desigualdades nesse continente com uma teoria baseada na incidência das espécies A hipótese geográfica não só é inútil na explicação das origens da prosperidade no decorrer da história além de basicamente incorreta em sua ênfase mas também incapaz de justificar as circunstâncias com que começamos este capítulo Seria possível argumentar que qualquer padrão persistente como a hierarquia de rendas nas Américas ou as acentuadas e duradouras diferenças entre Europa e Oriente Médio Dis tr ibuição de bovinos sel va ge ns Dis tr ibuição de suínos selv ag en s Fr onteir as mode rn as Mapa 4 Distribuição histórica de suínos e bovinos selvagens podem ser explicadas pela inalterabilidade da geografia Todavia não é esse o caso Já vimos que é altamente improvável que os padrões no contexto das Américas tenham sido causados por fatores geográficos Antes de 1492 eram as civilizações no vale central do México América Central e Andes que dispunham de tecnologia e padrões de vida superiores aos da América do Norte ou lugares como Argentina e Chile E embora a geografia tenha permanecido a mesma as instituições impostas pelos colonos europeus provocaram uma inversão da fortuna Dificilmente a geografia também explicaria a pobreza do Oriente Médio por motivos similares Afinal o Oriente Médio liderou o mundo na revolução neolítica e as primeiras cidades desenvolveramse onde atualmente fica o Iraque O ferro foi fundido pela primeira vez na Turquia e até a Idade Média o Oriente Médio era dinâmico em termos tecnológicos Não foi a geografia do Oriente Médio que levou a revolução neolítica a florescer naquela parte do mundo como veremos no Capítulo 5 assim como tampouco foi a geografia que tornou o Oriente Médio pobre Pelo contrário a expansão e a consolidação do Império Otomano o legado institucional desse império é que mantêm a região imersa em pobreza ainda hoje Mapa 5 Distribuição histórica de arroz trigo e cevada selvagens Por fim os fatores geográficos são inúteis para explicar não só as diferenças que vemos entre as diversas partes do mundo hoje mas também por que muitas nações como Japão ou China atravessam longos períodos de estagnação para depois encetar um processo de crescimento acelerado Precisamos de outra teoria melhor A HIPÓTESE CULTURAL A segunda teoria que goza de ampla aceitação a hipótese cultural correlaciona prosperidade e cultura A hipótese cultural do mesmo modo que a geográfica é de linhagem distinta remontando no mínimo ao grande sociólogo alemão Max Weber que defendia que a Reforma Protestante e a ética protestante dela decorrente desempenharam papel central na facilitação da ascensão da moderna sociedade industrial na Europa Ocidental A hipótese cultural já não se baseia exclusivamente na religião mas enfatiza igualmente outros tipos de crenças valores e éticas Por mais que não seja politicamente correto dizêlo em público ainda há quem mantenha e não são poucos que os africanos são pobres por serem desprovidos de uma boa ética de trabalho insistindo em acreditar em feitiçaria e magia ou resistindo às novas tecnologias ocidentais Muitos acreditam também que a América Latina jamais enriquecerá devido ao caráter intrinsecamente libertino e carente de seu povo que além disso sofre do mal da cultura ibérica a tendência a deixar tudo para mañana amanhã Evidentemente muitos já acreditaram que a cultura chinesa e o confucionismo fossem incompatíveis com o crescimento econômico muito embora a importância da ética de trabalho chinesa como motor do crescimento na China Hong Kong e Cingapura seja agora alardeada Será que a hipótese cultural é útil para compreender a desigualdade mundial Sim e não Sim no sentido de que as normas sociais que são relacionadas à cultura exercem profunda influência e podem ser difíceis de mudar além de por vezes darem sustentação às diferenças institucionais que segundo este livro são o que explica as desigualdades mundiais Em sua maior parte porém não à medida que os aspectos culturais que se costuma enfatizar religião ética nacional valores africanos ou latinos não têm importância para entendermos como chegamos até aqui e por que as desigualdades do mundo persistem Outros aspectos como até que ponto as pessoas confiam umas nas outras ou são capazes de colaborar são importantes mas constituem basicamente um resultado das instituições não causas independentes Voltemos a Nogales Como já observamos diversos aspectos culturais são idênticos de um lado e de outro da cerca Não obstante detectamse certas diferenças marcantes de práticas normas e valores ainda que elas sejam não causas mas consequências da divergência entre os rumos do desenvolvimento dos dois lugares Por exemplo nas pesquisas os mexicanos normalmente dizem confiar em outras pessoas menos do que os cidadãos dos Estados Unidos declaram confiar nos outros Contudo a falta de confiança dos mexicanos não surpreende tendose em vista que seu governo mostrase incapaz de eliminar os cartéis de drogas ou assegurar um sistema jurídico imparcial O mesmo vale para as Coreias do Norte e do Sul como discutiremos no próximo capítulo O Sul é um dos países mais ricos do mundo ao passo que o Norte enfrenta fomes periódicas e uma pobreza abjeta Embora hoje a cultura dos dois países seja muito distinta ela não fez a menor diferença nos destinos econômicos divergentes dessas duas meiasnações A península coreana tem um longo período de história comum Até a Guerra da Coreia e a divisão no paralelo 38 apresentava uma homogeneidade sem precedentes em termos de idioma etnicidade e cultura Como em Nogales o importante é a fronteira Ao norte fica um regime diferente que impõe instituições singulares e cria outros incentivos Eventuais divergências culturais encontradas nas terras ao sul e ao norte da fronteira que corta Nogales ou a Coreia em duas é pois consequência e não causa das diferenças nos níveis de prosperidade E a África e a cultura africana Historicamente a África subsaariana sempre foi mais pobre do que a maior parte do resto do mundo e suas civilizações antigas chegaram a desenvolver a roda a escrita exceto por Etiópia e Somália e o arado Embora tais tecnologias não tivessem utilização mais ampla até o advento da colonização formal europeia no final do século XIX e início do XX as sociedades africanas tomaram conhecimento de sua existência muito antes Os europeus começaram a circumnavegar sua costa ocidental no final do século XV e embarcações asiáticas chegavam à África Oriental já muito antes disso Podemos compreender por que essas tecnologias não foram adotadas com base na história do Reino do Congo na foz do Rio Congo que deu seu nome à moderna República Democrática do Congo O Mapa 6 mostra a localização do Congo em relação a outro importante Estado centroafricano o Reino Bacaba que discutiremos mais à frente neste livro O Congo entabulou intensas relações com os portugueses após ser visitado pela primeira vez pelo navegador Diogo Cão em 1483 Na época o Congo era um reino altamente centralizado pelos padrões africanos cuja capital Mbanza contava com uma população de 60 mil habitantes o que a tornava mais ou menos do mesmo tamanho da capital portuguesa Lisboa e maior do que Londres com sua população de cerca de 50 mil habitantes em 1500 O rei do Congo Nzinga a Nkuwu converteuse ao catolicismo e mudou de nome para João I Mais tarde o nome de Mbanza seria mudado para São Salvador Graças aos portugueses os congolenses aprenderam sobre a roda e o arado cuja adoção foi mesmo incentivada por missões agrícolas lusitanas em 1491 e 1512 Contudo todas essas iniciativas fracassaram Não obstante os congolenses estavam longe de ser avessos às modernas tecnologias em geral foram muito rápidos por exemplo em adotar outra venerável inovação ocidental a pólvora Usaram essa nova e poderosa ferramenta para responder a incentivos de mercado a captura e exportação de escravos Não há nenhum indício de que a cultura ou os valores africanos de alguma maneira concorressem para impedir a adoção de novas tecnologias e práticas À medida que se estreitavam seus laços com os europeus os congolenses adotariam outras práticas ocidentais a escrita estilos de indumentária e arquitetura habitacional No século XIX não poucas sociedades africanas tiraram proveito também das crescentes oportunidades econômicas engendradas pela Revolução Industrial mudando seus padrões de produção Na África Ocidental verificouse rápido crescimento econômico com base na exportação de óleo de palma e amendoim em todo o sul do continente os africanos desenvolveram produtos a serem exportados para as áreas industriais e de mineração em acelerada expansão no Randj na África do Sul Contudo esses promissores experimentos econômicos foram obliterados não pela cultura africana nem pela incapacidade dos africanos comuns de tomar iniciativas em prol de seus próprios interesses mas pelo colonialismo europeu em primeiro lugar e mais tarde pelos governos africanos pósindependência A verdadeira razão por que os congolenses não adotaram uma tecnologia superior foi o simples fato de que lhes faltaram incentivos para tanto Enfrentavam elevado risco de expropriação e tributação de sua produção pelo monarca todopoderoso houvesse ele se convertido ao catolicismo ou não Com efeito a insegurança imperava não só no que dizia respeito à propriedade mas a continuidade de sua própria existência encontravase sempre por um fio Muitos eram capturados e vendidos como escravos condições que dificilmente serviriam de estímulo para investimentos que aumentassem a produtividade em longo prazo Tampouco o rei dispunha de incentivos para adotar o arado em larga escala ou para fazer do aumento da produtividade agrícola sua maior prioridade a exportação de escravos era muito mais rentável Gbadolit e Fr onteir as mode rna s Re inos históricos Rio Ca ss ai Rio Cong o Ni gé ri a Ca marõ es Re públic a Ce ntro A frican a Gu iné Eq uatori al São To mé e Pr íncipe Ga bã o Cong o Br az za vi ll e Re ino do Cong o Re ino Bacuba Lele Bu shon g Kins ha sa Mapa 6 Reino do Congo Reino Bacuba Bushong e Lele Talvez se possa afirmar que hoje os africanos confiam menos uns nos outros que outros povos de outras partes do mundo o que seria contudo fruto de uma longa história de instituições que solaparam os direitos humanos e de propriedade na África A possibilidade de serem capturados e vendidos como escravos sem dúvida exerceu alguma influência sobre o grau de confiança dos africanos entre si ao longo do tempo E a ética protestante de Max Weber Embora seja verdade que países predominantemente protestantes como Holanda e Inglaterra foram os primeiros grandes sucessos econômicos da Era Moderna há pouca ligação entre religião e prosperidade econômica A França país predominantemente católico rapidamente reproduziu o desempenho econômico dos holandeses e ingleses no século XIX e a Itália é tão próspera quanto qualquer desses países hoje Olhando mais para o Oriente veremos que nenhum dos sucessos econômicos do Leste Asiático guarda qualquer relação com a religião cristã de modo que tampouco aí a tese de uma conexão especial entre o protestantismo e o êxito econômico encontra grande respaldo Voltemonos para uma das regiões favoritas dos entusiastas da hipótese cultural o Oriente Médio onde os países são preponderantemente islâmicos e os que não produzem petróleo são muito pobres como já notamos Os produtores de petróleo são mais ricos mas esse golpe de sorte pouco contribuiu para a instalação de economias modernas e diversificadas na Arábia Saudita ou Kuwait Esses fatos não constituem uma demonstração cabal da influência da religião Por mais plausível que seja esse argumento também não está correto Sim países como Síria e Egito são pobres e suas populações são basicamente muçulmanas Contudo apresentam outras peculiaridades bem mais significativas para efeitos de prosperidade Em primeiro lugar todos foram províncias do Império Otomano o que afetou intensa e adversamente o modo como se desenvolveram Após o colapso do domínio otomano o Oriente Médio foi absorvido pelos impérios coloniais inglês e francês que continuaram tolhendo suas possibilidades Após a independência a exemplo de boa parte do antigo mundo colonial desenvolveram regimes políticos hierárquicos e autoritários de que faziam parte poucas das instituições políticas e econômicas que como mostraremos são cruciais para a geração de prosperidade econômica Essa trajetória de desenvolvimento foi moldada em grande parte pela história dos domínios otomano e europeu A relação entre religião islâmica e pobreza no Oriente Médio é basicamente espúria O papel desses acontecimentos históricos e não de fatores culturais na conformação do percurso econômico da região pode ser constatado também no fato de que aquelas partes do Oriente Médio que escaparam temporariamente ao jugo do Império Otomano e das potências europeias como o Egito entre 1805 e 1848 sob Muhammad Ali mostraramse capazes de enveredar por um caminho de acelerado crescimento Muhammad Ali usurpou o poder logo após a retirada das forças francesas que haviam ocupado o país sob o comando de Napoleão Bonaparte Aproveitandose da tibieza do controle exercido pelos otomanos sobre o território egípcio na época logrou fundar sua própria dinastia que de uma forma ou de outra governaria o país até a revolução encabeçada por Nasser em 1952 As reformas de Muhammad Ali embora tenham sido impostas por coerção promoveram o crescimento do país à medida que a burocracia estatal o Exército e o sistema de arrecadação fiscal foram modernizados gerando crescimento na agricultura e na indústria Não obstante tal processo de modernização e crescimento chegou ao fim com a morte de Ali quando o Egito voltou a cair sob influência europeia Todavia essa talvez seja uma forma errada de considerar a presença da cultura na equação Talvez os fatores culturais mais importantes não estejam ligados à religião mas a culturas nacionais específicas Quem sabe a influência da cultura inglesa não seja importante e explique a prosperidade de países como Estados Unidos Canadá e Austrália Por mais sedutora que essa ideia possa parecer à primeira vista também não funciona Sim Canadá e Estados Unidos foram colônias britânicas mas Serra Leoa e Nigéria também As variações de prosperidade entre as excolônias inglesas é tão grande quanto entre os demais países do mundo O legado britânico não é a causa do enriquecimento da América do Norte Entretanto há ainda outra versão da hipótese cultural talvez a questão não seja ingleses versus não ingleses mas europeus versus não europeus Será que os europeus são de algum modo superiores em virtude de sua ética do trabalho perspectiva de vida valores judaicocristãos ou legado romano É verdade que a Europa Ocidental e a América do Norte cuja população é primordialmente de ascendência europeia são as regiões mais ricas do mundo Talvez o legado europeu e sua superioridade cultural sejam as razões da prosperidade e o derradeiro refúgio da hipótese cultural Infelizmente essa versão da hipótese oferece tão pouca capacidade de explicação quanto as demais Argentina e Uruguai apresentam descendentes de europeus em proporções maiores de sua população total que o Canadá e os Estados Unidos mas o desempenho econômico tanto de uma quanto do outro deixa muito a desejar Japão e Cingapura nunca tiveram mais que uma gota de descendentes de europeus entre seus habitantes mas são tão abastados quanto muitas áreas da Europa Ocidental A China apesar de umas tantas imperfeições em seu sistema econômico e político tem sido o país de crescimento mais rápido nas três ultimas décadas Sua pobreza até a morte de Mao TséTung nada tinha a ver com a cultura chinesa mas com o modo desastroso como Mao organizou a economia e conduziu a política Na década de 1950 ele promoveu o Grande Salto Adiante drástica política de industrialização que acarretou fome em massa Nos anos 1960 propagou a Revolução Cultural que levou à perseguição maciça de intelectuais e eruditos qualquer um cuja fidelidade ao partido pudesse ser posta em dúvida o que mais uma vez provocou enorme desperdício dos talentos e recursos da sociedade Da mesma forma o atual crescimento chinês nada tem a ver com os valores ou mudanças na cultura local é fruto de um processo de transformação econômica deflagrado pelas reformas implementadas por Deng Xiaoping e seus aliados que após a morte de Mao TséTung foram pouco a pouco abandonando as instituições e políticas econômicas socialistas primeiro na agricultura depois na indústria Como no caso de sua correlata geográfica a hipótese cultural tampouco tem serventia para explicar outros aspectos do atual estado de coisas Há evidentemente diferentes crenças valores e atitudes culturais entre Estados Unidos e América Latina porém assim como as que separam Nogales Arizona e Nogales Sonora ou as Coreias do Sul e do Norte tais disparidades são consequências das diferentes instituições e histórias institucionais distintas dos dois lugares Fatores culturais que enfatizem o modo como a cultura hispânica ou latina moldou o Império Espanhol não dão conta das divergências no seio da própria América Latina por exemplo por que Argentina e Chile são mais ricos que Peru e Bolívia Outros tipos de argumentos culturais por exemplo os que salientam a cultura indígena contemporânea saemse igualmente mal Argentina e Chile tinham população nativa relativamente pequena se comparada ao Peru e Bolívia Embora seja verdade a cultura indígena como explicação também não funciona Colômbia Equador e Peru têm níveis de renda similares mas a Colômbia hoje apresenta muito poucos indígenas ao contrário do Equador e Peru Por fim as atitudes culturais em geral de modificação tão lenta dificilmente responderão por si pelos milagres do crescimento no Leste Asiático e China Por mais persistentes que sejam as instituições em determinadas circunstâncias podem transformarse rapidamente como veremos A HIPÓTESE DA IGNORÂNCIA A última teoria popular para explicar por que certos países são pobres e outros ricos é a hipótese da ignorância segundo a qual a desigualdade existe no mundo porque nós ou nossos governantes não sabemos o que fazer para tornar ricos os países pobres É uma ideia defendida por não poucos economistas inspirados pela célebre definição proposta pelo economista inglês Lionel Robbins em 1935 segundo a qual a economia é uma ciência que estuda o comportamento humano como uma relação entre os fins e meios escassos que têm usos alternativos Ficamos assim a um passo da conclusão de que a ciência econômica deveria enfocar o melhor uso de meios escassos para satisfazer os fins sociais Com efeito o mais famoso resultado teórico em economia o chamado Primeiro Teorema do Bem Estar Social identifica as circunstâncias em que a alocação de recursos em uma economia de mercado tornase do ponto de vista econômico desejável socialmente A economia de mercado não passa de uma abstração para descrever aquela situação em que todos os indivíduos e empresas têm liberdade de produzir comprar e vender os produtos ou serviços que bem entenderem Se essas circunstâncias não estiverem presentes dizse que há falha do mercado Tais falhas constituem a base de uma teoria da desigualdade no mundo uma vez que quanto mais elas seguirem sem solução mais pobre o país provavelmente será A hipótese da ignorância sustenta que os países pobres devem sua pobreza ao excesso de falhas de mercado e ao fato de que seus economistas e autoridades ignoram como livrarse delas tendo dado ouvidos aos conselhos errados no passado Já os países ricos são ricos por terem concebido políticas melhores e conseguido eliminar tais falhas Seria a hipótese da ignorância capaz de explicar as desigualdades no mundo Será possível que os países africanos são mais pobres do que o resto do planeta porque seus líderes tendem a partir das mesmas premissas equivocadas acerca do governo de seus países levando ao quadro de pobreza ao passo que os líderes da Europa Ocidental são mais bem informados ou orientados o que explicaria seu relativo êxito Embora haja alguns exemplos famosos de líderes que adotaram políticas desastrosas por terem se enganado a respeito de suas consequências a ignorância pode na melhor das hipóteses explicar no máximo uma pequena parte das desigualdades mundiais Aparentemente o declínio econômico contínuo que se instaurou em Gana após sua independência da Inglaterra foi causado por ignorância O economista britânico Tony Killick então atuando como consultor do governo de Kwame Nkrumah registrou em detalhes uma série de dificuldades As políticas de Nkrumah foram centradas no desenvolvimento da indústria estatal o que se mostrou muito ineficiente Killick recorda A fábrica de calçados pelo transporte de couro teria ligado a fábrica de carne no norte através de uma distância de mais de 800 quilômetros a um curtume no sul atualmente abandonado o couro seria então levado de volta para a fábrica de calçados em Kumasi na área central do país a cerca de 320 quilômetros do curtume Uma vez que o principal mercado consumidor fica na região metropolitana de Acra os sapatos teriam de voltar para o sul sendo transportados por mais 320 quilômetros Killick de certo modo dá a entender que tal empreendimento teve sua viabilidade solapada pela má localização de seus componentes A fábrica de calçados foi apenas um entre muitos projetos similares entre eles a fábrica de manga enlatada situada em uma região de Gana onde não havia plantações da fruta e cuja produção seria superior à demanda mundial do produto em sua totalidade Essa interminável sucessão de empreitadas economicamente irracionais não pode ter sido causada por falta de informação ou ignorância de Nkrumah ou seus consultores com relação às políticas econômicas mais acertadas Afinal eles contavam com pessoas como Killick e até Sir Arthur Lewis vencedor do Prêmio Nobel que estavam mais que cientes de que tais opções não dariam bons resultados Contudo o que determinou o formato assumido pelas políticas econômicas do país foi a necessidade de Nkrumah de utilizálas para obter apoio político e assim dar sustentação ao seu regime totalitário Nem o decepcionante desempenho de Gana após a independência nem os inumeráveis outros casos de aparente desvario econômico podem ser atribuídos à ignorância Afinal se fosse ela o problema líderes bemintencionados logo compreenderiam que alternativas seriam capazes de promover o aumento da renda e do bemestar de seus cidadãos e naturalmente as adotariam Consideremos as trajetórias divergentes de Estados Unidos e México Responsabilizar a ignorância dos governantes dos dois países por tais disparidades é para dizer o mínimo altamente implausível Não foram diferenças de conhecimento ou intenção entre John Smith e Cortés que causaram o afastamento entre os dois países ainda no período colonial assim como não foram diferenças de conhecimento entre seus presidentes posteriores como os americanos Teddy Roosevelt ou Woodrow Wilson e o mexicano Porfirio Díaz que levaram o México a optar entre o fim do século XIX e o começo do XX por instituições econômicas que assegurariam o enriquecimento das elites em detrimento do resto da sociedade enquanto Roosevelt e Wilson tomavam o caminho oposto Pelo contrário foram as distintas delimitações institucionais encontradas pelos presidentes e elites dos respectivos países Analogamente os governantes africanos que se deixaram debilitar ao longo dos últimos 50 anos pela fragilidade do direito à propriedade e das instituições econômicas acarretando o empobrecimento da maior parte de seus povos não permitiram que isso se desse por acreditarem que estavam fazendo boa economia mas porque podiam fazêlo impunemente e enriquecer à custa dos demais ou por acharem que seria uma boa política que os manteria no poder mediante a compra do apoio de grupos ou elites cruciais A experiência do primeiroministro de Gana em 1971 Kofi Busia ilustra o quanto a hipótese da ignorância pode ser ilusória Busia enfrentava uma perigosa crise econômica Tendo ascendido ao poder em 1969 como o seu antecessor Nkrumah adotou políticas econômicas insustentáveis e impôs vários mecanismos de controle de preços por meio de organizações comerciais e da sobrevalorização cambial Embora Busia tivesse feito oposição a Nkrumah e conduzisse um regime democrático deparou se com muitas das mesmas restrições políticas Como havia acontecido com Nkrumah suas políticas econômicas foram adotadas não em virtude de sua ignorância e crença de que estava pondo em prática uma boa economia ou uma maneira ideal de promover o desenvolvimento de seu país Tais opções foram feitas por serem boa política que permitiria a Busia transferir recursos para grupos politicamente poderosos nas áreas urbanas por exemplo que precisavam ser mantidos satisfeitos Os controles de preços esmagaram a agricultura proporcionando alimentos baratos para os grupos urbanos e gerando receita para financiar os gastos do governo Todavia esses controles eram insustentáveis Gana logo sofreria de uma série de crises no balanço de pagamentos e escassez de moeda estrangeira Diante de tamanhos dilemas em 27 de dezembro de 1971 Busia assinou um acordo com o Fundo Monetário Internacional que incluía a desvalorização em massa da moeda do país O FMI o Banco Mundial e toda a comunidade internacional pressionavam Busia para implementar as reformas previstas no acordo Embora as instituições internacionais ignorassem alegremente o fato Busia estava plenamente ciente das implicações daquela aposta política A consequência imediata da desvalorização da moeda foi uma série de levantes e tumultos em Acra capital de Gana que sofreu escalada vertiginosa até Busia ser derrubado pelos militares encabeçados pelo TenenteCoronel Acheampong que imediatamente tratou de reverter a desvalorização A hipótese da ignorância distinguese das hipóteses geográfica e cultural à medida que implica uma pronta sugestão sobre como solucionar o problema da pobreza se foi a ignorância que nos trouxe até aqui basta contar com autoridades e governantes esclarecidos e bem informados para sair deste lugar e assim implementar a prosperidade em todo o mundo mediante a divulgação das orientações corretas e o convencimento dos políticos acerca do que seria uma economia de qualidade No entanto a experiência de Busia sublinha o fato de que o principal obstáculo à adoção de políticas capazes de reduzir as falhas do mercado e estimular o crescimento econômico não é a ignorância das autoridades mas os incentivos e restrições que lhes são impostos pelas instituições políticas e econômicas em suas sociedades Ainda que a hipótese da ignorância reine soberana entre a maior parte dos economistas e nos altos círculos do Ocidente que excluindo praticamente qualquer outra possibilidade concentramse na implementação mecânica da prosperidade é só mais uma hipótese que não dá certo Não explica a origem da prosperidade no mundo nem as circunstâncias em que estamos imersos por exemplo por que determinados países como México e Peru mas não Estados Unidos ou Inglaterra adotaram instituições e políticas que levariam ao empobrecimento da maioria dos seus cidadãos ou por que quase toda a África subsaariana e a maior parte da América Central são tão mais pobres do que a Europa Ocidental ou o Leste Asiático Quando os países rompem com os padrões institucionais que os mantinham condenados à pobreza e conseguem enveredar por um caminho de crescimento econômico não é porque seus líderes ignorantes de repente se tornaram mais bem informados ou menos egocêntricos ou porque passaram a ser orientados por economistas melhores A China por exemplo é um dos países que substituíram as políticas econômicas conducentes à pobreza e à fome de milhões por outras de estímulo ao crescimento econômico Entretanto como discutiremos adiante em maior profundidade isso não se deu porque o Partido Comunista chinês finalmente compreendeu que a propriedade coletiva das terras agrícolas e da indústria constituíam péssimos incentivos econômicos Assim Deng Xiaoping e seus aliados que não eram menos egocêntricos que seus adversários mas tinham outros interesses e objetivos políticos derrotaram seus poderosos oponentes no Partido Comunista e planejaram uma espécie de revolução política mudando radicalmente a liderança e a direção do partido Suas reformas econômicas que criaram incentivos de mercado à agricultura e posteriormente à indústria foram consequências dessa transformação política Foi a política que determinou a passagem do comunismo para os incentivos de mercado na China não orientações melhores ou um melhor entendimento do funcionamento da economia DEFENDEMOS QUE para compreender as desigualdades do mundo é preciso entender por que algumas sociedades são organizadas de maneiras muito ineficazes e socialmente indesejáveis Os países às vezes conseguem adotar instituições eficientes e alcançar a prosperidade mas infelizmente são casos raros A maioria dos economistas e autoridades concentrase em acertar quando o que é de fato necessário é uma explicação de onde os países pobres estão errando E erram basicamente não por uma questão de ignorância ou cultura Como pretendemos mostrar os países pobres são pobres porque os detentores do poder fazem escolhas que geram pobreza Erram não por equívoco ou ignorância mas de propósito Para entender melhor o leitor terá de ir além da economia e das orientações dos especialistas acerca do melhor a fazer e em vez disso estudar como as decisões são efetivamente tomadas quem são seus autores e por que eles decidem fazer o que fazem Estamos no campo da política e dos processos políticos A economia tradicionalmente ignora a política mas compreendêla é crucial para explicar as desigualdades do mundo Como observou o economista Abba Lerner na década de 1970 a economia conquistou o título de Rainha das Ciências Sociais ao escolher como domínio problemas políticos já resolvidos Defendemos que a conquista da prosperidade depende da resolução de certos problemas políticos básicos É exatamente por partir do pressuposto de que os problemas políticos já foram solucionados que a economia tornase incapaz de apresentar uma explicação convincente das desigualdades mundiais Para explicálas a economia ainda terá de compreender como os diferentes tipos de políticas e acordos sociais afetam os incentivos e comportamentos econômicos Mas para tanto precisará também da política N 3 A CRIAÇÃO DA PROSPERIDADE E DA POBREZA A ECONOMIA DO PARALELO 38 O VERÃO DE 1945 quando a Segunda Guerra Mundial se aproximava do fim a colônia japonesa na Coreia começou a entrar em colapso Um mês depois da rendição incondicional do Japão em 15 de agosto a Coreia foi dividida em duas esferas de influência usando o paralelo 38 como referência O sul seria administrado pelos Estados Unidos e o norte pela Rússia A paz desconfortável da Guerra Fria seria quebrada em junho de 1950 quando o exército nortecoreano invadiu o sul Embora a princípio os nortecoreanos tenham realizado amplas incursões chegando a capturar a capital Seul no outono já estavam em plena retirada Foi nessa época que Hwang PyŏngWŏn e seu irmão foram separados Hwang PyŏngWŏn conseguiu se esconder e escapar à abdução pelo exército nortecoreano permaneceu no sul onde conseguiu trabalho como farmacêutico Seu irmão um médico que cuidava em Seul dos soldados feridos do exército sulcoreano foi levado para o norte durante o recuo dos norte coreanos Separados em 1950 voltariam a encontrarse em Seul no ano 2000 pela primeira vez em 50 anos depois de os dois governos terem finalmente concordado em iniciar um programa restrito de reunificação familiar Como médico o irmão de Hwang PyŏngWŏn tinha acabado empregado na Aeronáutica boa colocação em uma ditadura militar Contudo mesmo os privilegiados na Coreia do Norte não se saem muito bem Quando os irmãos se encontraram Hwang PyŏngWŏn perguntou como era a vida ao norte do paralelo 38 Ele tinha um carro mas seu irmão não Você tem telefone perguntou ao irmão Não replicou o outro Minha filha que trabalha no Ministério do Exterior tem mas quem não sabe o código não tem como ligar Como Hwang PyŏngWŏn sabia que todos os habitantes do norte que participavam da reunião pediam dinheiro ofereceu algum ao irmão este porém recusou Se eu voltar com dinheiro o governo vai tirálo de mim Melhor você ficar com ele Hwang PyŏngWŏn notou que o casaco do irmão estava puído Tire esse casaco e troque comigo sugeriu Não posso fazer isso O governo me emprestou esse para que eu viesse aqui Hwang PyŏngWŏn comentaria depois que seu irmão parecia inquieto e nervoso como se alguém estivesse ouvindo Era mais pobre do que Hwang PyŏngWŏn havia imaginado Disse que vivia bem mas para Hwang PyŏngWŏn seu aspecto pareceu péssimo e ele estava magro como um caniço A população da Coreia do Sul tem um padrão de vida similar ao de Portugal e Espanha No norte na chamada República Democrática Popular da Coreia ou Coreia do Norte o padrão de vida é equivalente ao dos países subsaarianos ou cerca de um décimo do padrão de vida médio da Coreia do Sul A saúde dos nortecoreanos encontrase em estado ainda pior o nortecoreano médio tem expectativa de vida 10 anos menor do que seus vizinhos ao sul do paralelo 38 O Mapa 7 ilustra de maneira drástica o abismo econômico que separa as duas Coreias apresentando dados sobre a intensidade luminosa à noite captada por imagens de satélite A Coreia do Norte encontrase quase completamente no escuro devido à falta de eletricidade já a do Sul mostrase fulgurante Tão notórias diferenças não são antigas Com efeito não existiam até o final da Segunda Guerra Mundial De 1945 para cá entretanto os diferentes governos do Norte e do Sul adotaram maneiras muito distintas de organização econômica A Coreia do Sul foi governada e teve suas instituições políticas moldadas pelo ferrenho anticomunista Syngman Rhee oriundo de Harvard e Princeton e que contava com significativo apoio dos Estados Unidos Rhee foi eleito presidente em 1948 Forjada em meio à Guerra da Coreia e contra a ameaça de contaminação comunista a Coreia do Sul estava longe de ser uma democracia Tanto Rhee quanto seu sucessor igualmente célebre o General Park ChungHee garantiram seus lugares na história como presidentes autoritários Não obstante ambos geriram uma economia de mercado em que havia reconhecimento da propriedade privada e após 1961 Park usou com eficácia o peso do Estado para impulsionar o rápido crescimento econômico canalizando crédito e subsídios para as empresas mais bemsucedidas A situação ao norte do paralelo 38 era muito diferente Kim IlSung líder dos guerrilheiros comunistas da resistência durante a Segunda Guerra Mundial já estava estabelecido como ditador em 1947 e com auxílio soviético introduziu um modelo rígido de economia planificada parte do chamado sistema juche A propriedade privada foi declarada ilegal os mercados foram banidos As liberdades foram cerceadas não só no mercado mas em todas as esferas da vida dos nortecoreanos exceto no caso dos membros da pequeníssima elite governante que gravitava em torno de Kim IlSung e mais tarde seu filho e sucessor Kim JongIl Não deveria ser surpresa que a sorte econômica das Coreias do Norte e do Sul tenham sido tão distintas A economia totalitária de Kim IlSung e o sistema juche logo se revelaram desastrosos Não há estatísticas detalhadas sobre a Coreia do Norte onde tudo tem caráter de segredo de Estado para dizer o mínimo Não obstante os dados disponíveis confirmam o que sabemos pelas fomes recorrentes a produção industrial do país não só não conseguiu decolar como a Coreia do Norte de fato experimentou um colapso na produtividade agrícola A inexistência de propriedade privada fez com que poucos tivessem incentivos para investir ou exercer qualquer esforço para aumentar ou mesmo manter a produtividade O regime repressivo e sufocante opunhase a toda e qualquer inovação e adoção de novas tecnologias Todavia Kim IlSung Kim JongIl e seus comparsas não tinham a menor intenção de reformar o sistema introduzir qualquer forma de propriedade mercados ou contratos privados nem de modificar as instituições econômicas e políticas A Coreia do Norte continua imersa em estagnação econômica Mapa 7 Luzes na Coreia do Sul e trevas na Coreia do Norte Nesse ínterim no sul as instituições econômicas estimulavam investimentos e comércio Os políticos sulcoreanos investiram em educação atingindo altos índices de alfabetização e escolaridade As empresas do país não demoraram a tirar proveito da população relativamente bem qualificada das políticas de incentivo aos investimentos e industrialização às exportações e à transferência de tecnologia Assim a Coreia do Sul logo se tornou um dos casos de milagre econômico do Leste Asiático um dos países de crescimento econômico mais acelerado do mundo No final da década de 1990 em cerca de apenas meio século o crescimento da Coreia do Sul e a estagnação da Coreia do Norte haviam levado a primeira a uma situação 10 vezes melhor que a segunda dá para imaginar a diferença que alguns séculos fariam O desastre econômico da Coreia do Norte que resultou na fome de milhões quando comparado ao êxito econômico da Coreia do Sul é impressionante nem a cultura nem a geografia nem a ignorância podem explicar a divergência entre os caminhos tomados pelas duas vizinhas Será preciso buscar uma resposta no âmbito institucional INSTITUIÇÕES ECONÔMICAS EXTRATIVISTAS E INCLUSIVAS Os países apresentam diferenças em termos de êxito econômico em virtude de instituições distintas das regras que regem o funcionamento da economia e dos incentivos que motivam a população Imaginemos os adolescentes norte e sulcoreanos e seus sonhos para o futuro Os do norte crescem em meio à pobreza desprovidos de iniciativa empreendedora criatividade ou educação adequada que os prepare para o trabalho qualificado Boa parte da educação que recebem na escola não passa de propaganda visando a reforçar a legitimidade do regime há poucos livros e os computadores são ainda mais escassos Terminada a escola todos têm de passar 10 anos no Exército Essa garotada sabe que não terá direito a propriedade privada não poderá abrir um negócio nem terá qualquer possibilidade de enriquecer ainda que muitos para ganhar a vida dediquemse ilegalmente a atividades econômicas privadas Eles sabem também que não terão acesso legal a mercados em que possam usar suas competências ou o dinheiro que ganharem na compra dos bens necessários ou desejados Não têm certeza nem mesmo dos direitos humanos que lhes serão assegurados Os do sul por sua vez recebem boa educação e encontram incentivos que os estimulam a empenharse e destacarse na vocação escolhida A Coreia do Sul é uma economia de mercado erguida sobre a propriedade privada seus jovens sabem que caso sejam empreendedores ou profissionais bemsucedidos poderão um dia colher os frutos de seus investimentos e esforços melhorar de padrão de vida e comprar carros casas e atendimento médico de qualidade No sul o Estado apoia a atividade econômica o que torna possível aos empreendedores contrair empréstimos nos bancos e mercados financeiros às empresas estrangeiras firmar parcerias com suas congêneres sulcoreanas aos indivíduos fazer financiamentos para a aquisição da casa própria No sul em geral se é livre para abrir qualquer negócio que se queira No norte não No sul podese contratar trabalhadores vender produtos ou serviços e gastar dinheiro no mercado como bem se entender No norte o único mercado é o negro Essas regras distintas são as instituições que regem a vida de norte e sulcoreanos Instituições econômicas inclusivas como as encontradas na Coreia do Sul ou nos Estados Unidos são aquelas que possibilitam e estimulam a participação da grande massa da população em atividades econômicas que façam o melhor uso possível de seus talentos e habilidades e permitam aos indivíduos fazer as escolhas que bem entenderem Para serem inclusivas as instituições econômicas devem incluir segurança da propriedade privada sistema jurídico imparcial e uma gama de serviços públicos que proporcionem condições igualitárias para que as pessoas possam realizar intercâmbios e estabelecer contratos além de possibilitar o ingresso de novas empresas e permitir a cada um escolher sua profissão O CONTRASTE ENTRE as Coreias do Sul e do Norte bem como entre Estados Unidos e América Latina ilustra um princípio geral As instituições econômicas inclusivas fomentam a atividade econômica o aumento da produtividade e a prosperidade da economia Os direitos de propriedade são cruciais uma vez que somente quem os tiver assegurados vai se dispor a investir e aumentar a produtividade Quem acreditar que corre o risco de ter sua produção roubada expropriada ou exageradamente tributada terá pouco incentivo para trabalhar e muito menos para investir e inovar E tais direitos devem estar garantidos para a maior parte da sociedade Em 1680 o governo britânico fez o recenseamento da população de sua colônia de Barbados nas Índias Ocidentais O censo revelou que do total de cerca de 60 mil habitantes da ilha quase 39 mil eram escravos africanos que por sua vez pertenciam ao terço remanescente da população Com efeito eram propriedades dos 175 maiores latifundiários da canadeaçúcar donos também da maior parte das terras Esses grandes proprietários rurais contavam com direitos assegurados sobre suas terras e mesmo seus escravos Se um deles quisesse vender escravos a outro não só teria condições de fazêlo como poderia contar com os tribunais para avalizar a transação ou qualquer outro contrato por ele redigido Por quê Porque dos 40 juízes e juízes de paz da ilha 29 eram latifundiários Ademais os oito militares de patente mais alta eram também grandes proprietários de terras Assim apesar dos contratos e direitos de propriedade bem definidos seguros e garantidos para a elite da ilha Barbados não possuía instituições econômicas inclusivas uma vez que dois terços da população eram compostos por escravos sem acesso à educação ou a oportunidades econômicas que não dispunham da possibilidade nem de incentivos para fazer uso de seus talentos ou competências Instituições econômicas inclusivas demandam direitos de propriedade assegurados e oportunidades econômicas não só para a elite mas para uma ampla parcela da sociedade O asseguramento dos serviços públicos leis direitos de propriedade e da liberdade de firmar contratos e relações de troca depende do Estado instituição detentora da capacidade coerciva de impor a ordem impedir roubos e fraudes e fazer valer contratos entre partes privadas Para ter seu bom funcionamento garantido a sociedade requer também outros serviços públicos estradas e uma rede para o transporte de bens infraestrutura pública para que a atividade econômica tenha condições de florescer algum tipo de regulamentação básica para a prevenção de fraudes e má conduta sobretudo por parte das autoridades Embora muitos dos serviços públicos possam ser prestados pelos mercados e por cidadãos particulares o grau de coordenação necessário para seu funcionamento em larga escala em geral requer a intervenção de uma autoridade central Assim o Estado apresenta vínculos inexoráveis com as instituições econômicas como impositor da lei e da ordem da propriedade privada e dos contratos e em geral como prestador fundamental de serviços públicos As instituições econômicas inclusivas precisam do Estado e dele fazem uso As instituições econômicas da Coreia do Norte e da América Latina a mita a encomienda ou o repartimiento que já descrevemos não apresentam essas características Não existe propriedade privada na Coreia do Norte Na América Latina dos tempos coloniais havia propriedade privada para os espanhóis mas com relação à propriedade dos indígenas a insegurança era total Em nenhuma dessas sociedades a vasta massa da população tinha a possibilidade de tomar as decisões econômicas que bem entendesse estava sujeita à coação generalizada Em nenhuma delas o poder do Estado era usado na prestação de serviços públicos fundamentais a fim de promover a prosperidade Na Coreia do Norte o Estado erigiu um sistema educacional cujo objetivo é inculcar propaganda mas mostrouse incapaz de impedir a fome Na América Latina colonial o Estado concentravase na submissão dos povos indígenas Em nenhuma dessas sociedades havia condições igualitárias de atuação econômica nem um sistema jurídico imparcial Na Coreia do Norte o Judiciário não passa de um braço do Partido Comunista reinante na América Latina serviu de ferramenta de discriminação contra a maior parte da população Chamamos essas instituições cujas propriedades são opostas às daquelas ditas inclusivas de instituições econômicas extrativistas por terem como finalidade a extração da renda e da riqueza de um segmento da sociedade para benefício de outro MOTORES DE PROSPERIDADE As instituições econômicas inclusivas criam mercados inclusivos que não só conferem às pessoas a liberdade de realizar em sua vida aquela vocação mais adequada aos seus talentos mas também criam condições iguais para todos capazes de lhes proporcionar oportunidade para tanto Quem tiver uma boa ideia terá a possibilidade de iniciar um negócio os trabalhadores vão tender a dirigirse às atividades em que sua produtividade seja maior as empresas menos eficientes poderão ser substituídas por outras de maior eficácia Comparese o modo como a profissão de cada um é escolhida nos mercados inclusivos do Peru e Bolívia dos tempos coloniais onde sob a mita muitos eram forçados a trabalhar nas minas de prata e mercúrio fossem quais fossem as suas competências ou aspirações Os mercados inclusivos não são meros mercados livres Barbados no século XVII também contava com mercados próprios Do mesmo modo porém como inexistiam os direitos de propriedade para quem não pertencesse à restrita elite de latifundiários seus mercados estavam longe de ser inclusivos a escravidão de fato era parte das instituições econômicas responsáveis pela coação sistemática da maioria da população e por privar as pessoas da possibilidade de escolher sua profissão e decidir como utilizar seus talentos As instituições econômicas inclusivas preparam o terreno também para dois outros motores da prosperidade tecnologia e educação O crescimento econômico sustentado é quase sempre acompanhado de melhorias tecnológicas que permitem às pessoas mão de obra à terra e ao capital existente prédios maquinário e assim por diante aumentar a sua produtividade Basta pensar em nossos tataravós há apenas um século que não tinham acesso a aviões automóveis nem à maior parte dos medicamentos e recursos médicos que hoje consideramos naturais para não falar na água encanada no ar condicionado nos shoppings no rádio ou no cinema nem na tecnologia da informação robótica ou equipamentos controlados por computadores Voltando mais algumas gerações atrás o knowhow tecnológico e os padrões de vida eram ainda mais retrógrados a ponto de ser difícil para nós conceber como as pessoas em geral sobreviviam Tais avanços são fruto da ciência e da atuação de empreendedores como Thomas Edison que aplicava os princípios científicos à criação de negócios rentáveis Esse processo de inovação é viabilizado por instituições econômicas que estimulem a propriedade privada assegurem contratos criem condições igualitárias para todos e incentivem e possibilitem o surgimento de novas empresas capazes de trazer as novas tecnologias à vida Não deveria portanto ser surpresa para ninguém o fato de ter sido a sociedade norteamericana e não o México ou o Peru que gerou Thomas Edison e que é a Coreia do Sul e não a do Norte que hoje produz empresas inovadoras em termos tecnológicos como Samsung e Hyundai Intimamente ligados à tecnologia estão a educação as habilidades as competências e o knowhow dos trabalhadores adquiridos em escolas em casa no trabalho Somos muito mais produtivos do que há um século não só graças à melhor tecnologia personificada pelas máquinas mas também ao maior conhecimento da força de trabalho Nem toda a tecnologia do mundo seria de grande utilidade sem profissionais que soubessem como operála Contudo as habilidades e competências implicam mais que a mera capacidade de fazer funcionar equipamentos são a educação e as competências da força de trabalho que geram o conhecimento científico sobre o qual se ergue o nosso progresso e que permite a adaptação e a adoção dessas tecnologias nas mais diversas linhas de negócios Embora tenhamos visto no Capítulo 1 que muitos dos inovadores da Revolução Industrial e depois como Thomas Edison não haviam recebido grande educação formal suas invenções foram muito mais simples do que a tecnologia atual A mudança tecnológica hoje requer um aprendizado tanto por parte do inovador quanto do trabalhador Aqui vemos a importância das instituições econômicas que criam uma igualdade de oportunidades Os Estados Unidos foram capazes de produzir ou atrair do exterior gente do porte de Bill Gates Steve Jobs Sergey Brin Larry Page e Jeff Bezos bem como as centenas de cientistas que fizeram descobertas fundamentais em tecnologia da informação energia nuclear biotecnologia e demais campos em que esses empreendedores construíram seus negócios Há uma profusão de talentos a aproveitar porque a maioria dos adolescentes nos Estados Unidos tem acesso a quanta educação quiser ou tenha condições de acompanhar Imaginese agora outra sociedade como a do Congo ou do Haiti por exemplo onde uma vasta parcela da população não dispõe de meios de ir à escola ou onde quando consegue ir à escola a qualidade do ensino é lamentável os professores não aparecem para dar aula e mesmo que o façam não há livros para estudar O baixo nível educacional dos países pobres é causado por instituições econômicas incapazes de gerar incentivos para que os pais eduquem seus filhos e instituições políticas incapazes de induzir o governo a construir financiar e dar suporte às escolas e aos desejos dos pais e das crianças O preço pago por esses países pela reduzida escolaridade de sua população e inexistência de mercados inclusivos é elevado tornamse incapazes de mobilizar seus talentos incipientes Contam com muitos Bill Gates em potencial e talvez um ou dois Albert Einsteins que hoje trabalham como fazendeiros pobres e sem formação escolar forçados a trabalhar com algo que não querem ou recrutados compulsoriamente para o serviço militar por não terem tido jamais a oportunidade de realizar sua vocação na vida A capacidade das instituições econômicas de explorar o potencial dos mercados inclusivos estimular a inovação tecnológica investir em pessoas e mobilizar os talentos e competências de grande número de indivíduos é fundamental para o crescimento econômico Explicar por que tantas instituições econômicas mostramse incapazes de atingir esses objetivos simples é o tema central deste livro INSTITUIÇÕES POLÍTICAS EXTRATIVISTAS E INCLUSAS Todas as instituições econômicas são criadas pela sociedade As da Coreia do Norte por exemplo foram impingidas aos cidadãos do país pelos comunistas que assumiram o poder no país na década de 1940 ao passo que as da América Latina dos tempos coloniais foram impostas pelos conquistadores espanhóis A Coreia do Sul acabou tendo instituições econômicas muito diferentes das do Norte porque foram outras pessoas com outros interesses e objetivos que tomaram as decisões acerca de como estruturar a sociedade Em outras palavras na Coreia do Sul a política foi diferente A política é o processo pelo qual uma sociedade escolhe as regras que vão governála A política permeia as instituições pelo simples motivo de que por melhores que as instituições inclusivas sejam para a prosperidade econômica de cada país para certas pessoas ou grupos como a elite do Partido Comunista da Coreia do Norte ou os latifundiários da canadeaçúcar da Barbados colonial será muito mais vantajoso estabelecer instituições extrativistas Sempre que houver conflito em torno das instituições o que acontecerá vai depender das pessoas ou grupos que vencerem o jogo político quem conseguir mais apoio obtiver mais recursos e formar mais alianças eficazes Em suma o vencedor será determinado pela distribuição de poder político na sociedade As instituições políticas de uma sociedade são determinantes cruciais do resultado do jogo São as regras que regem os incentivos políticos Definem como o governo é escolhido e que parte de sua estrutura possui o direito de fazer o quê As instituições políticas definem quem são os detentores de poder na sociedade e para que fins ele pode ser utilizado Se a distribuição de poder for estreita e irrestrita as instituições políticas serão absolutistas como ilustrado pelas monarquias absolutas que imperaram por todo o mundo durante boa parte da história Sob instituições políticas absolutistas como as da Coreia do Norte e da América Latina colonial os detentores do poder dispõem de meios para implementar instituições econômicas visando ao próprio enriquecimento e aumento de seu poder em detrimento da sociedade Em contrapartida as instituições políticas promotoras de ampla distribuição de poder na sociedade e sujeitas às suas restrições são pluralistas Em vez de ser investido em um único indivíduo ou grupo limitado o poder político é depositado nas mãos de uma coalizão ampla ou uma pluralidade de grupos Há obviamente íntima relação entre pluralismo e instituições econômicas inclusivas Entretanto a chave para entender por que a Coreia do Sul e os Estados Unidos contam com instituições econômicas inclusivas não consiste tão somente em suas instituições políticas pluralistas mas também em um Estado centralizado e poderoso o bastante Uma comparação significativa pode ser feita com a Somália país no leste da África Como veremos mais adiante neste livro o poder político na Somália goza há muito de ampla distribuição quase pluralista Com efeito não há uma autoridade real que possa controlar ou sancionar qualquer ato A sociedade dividese em clãs inimigos que não conseguem imporse uns aos outros O poder de um clã só é cerceado pelas armas de outro Uma distribuição de poder com tais características leva não a instituições inclusivas mas ao caos em sua origem encontrase a falta de uma centralização política ou estatal de qualquer ordem por parte do Estado somali bem como sua incapacidade de fazer valer a lei e a ordem mesmo em dose mínima suficiente para dar sustentação à atividade econômica comércio ou segurança básica dos cidadãos Max Weber que já encontramos no capítulo anterior forneceu a mais célebre e amplamente aceita definição de Estado identificandoo com o monopólio da violência legítima na sociedade Sem esse monopólio e o grau de centralização que ele acarreta o Estado não tem condições de desempenhar seu papel de impositor da lei e da ordem e muito menos prestar serviços públicos e incentivar e regulamentar a atividade econômica Quando o Estado mostrase incapaz de obter alguma centralização política a sociedade mais cedo ou mais tarde acaba caindo no caos como no caso da Somália Vamos nos referir a instituições políticas suficientemente centralizadas e pluralistas como instituições políticas inclusivas Em caso de falha em uma dessas condições vamos chamálas de instituições políticas extrativistas Há uma forte sinergia entre as instituições econômicas e políticas As instituições políticas extrativistas concentram poder nas mãos de uma pequena elite e impõem poucas restrições ao exercício de seu poder As instituições econômicas são então em geral estruturadas por essa elite de modo a extorquir recursos do restante da sociedade As instituições econômicas extrativistas assim naturalmente acompanham suas congêneres políticas Com efeito sua sobrevivência será inerentemente dependente de instituições políticas extrativistas As instituições políticas inclusivas tenderiam a erradicar as instituições econômicas que expropriam recursos da maioria erguem barreiras alfandegárias e suprimem o funcionamento dos mercados de modo que apenas uns poucos deles se beneficiam Em Barbados por exemplo o sistema de plantation baseado na exploração da mão de obra escrava não poderia sobreviver sem instituições políticas que suprimissem e excluíssem por completo os escravos do processo político O sistema econômico que condena milhões ao empobrecimento em benefício de uma pequena elite comunista na Coreia do Norte também seria inconcebível sem o absoluto domínio político do Partido Comunista Essa relação sinérgica entre instituições econômicas e políticas extrativistas engendra um arraigado círculo vicioso as instituições políticas conferem às elites o poder político de selecionar aquelas instituições econômicas com menos restrições ou forças contrárias Permitem também que elas estruturem as futuras instituições políticas e sua evolução As instituições econômicas extrativistas por sua vez vêm enriquecer essas mesmas elites cuja riqueza e poder econômico ajudam a consolidar seu domínio político Em Barbados ou na América Latina por exemplo os colonos lograram usar seu poder político para impor uma série de instituições econômicas que lhes garantiu fortunas imensas em detrimento do restante da população Os recursos gerados por tais instituições econômicas permitiram às elites reunir exércitos e forças de segurança para defender seu monopólio absolutista do poder político A implicação claro é que as instituições extrativistas políticas e econômicas sustentamse mutuamente e tendem a persistir Porém há mais a acrescentar acerca da sinergia entre instituições extrativistas de ambas as ordens Quando as elites existentes são desafiadas sob as instituições políticas extrativistas e surgem recémchegados estes provavelmente estarão submetidos a apenas algumas restrições Dispõem portanto de incentivos para manter as instituições políticas e fundar um conjunto similar de instituições econômicas como fizeram Porfirio Díaz e a elite reunida ao seu redor no México de fins do século XIX As instituições econômicas inclusivas por sua vez consolidamse sobre os fundamentos lançados por instituições políticas da mesma ordem que asseguram a ampla distribuição de poder por toda a sociedade e restringem seu exercício arbitrário Tais instituições políticas dificultam também a usurpação do poder e enfraquecimento dos fundamentos das instituições inclusivas por terceiros Os detentores do poder político não têm como usálo facilmente para implementar instituições econômicas extrativistas em benefício próprio Já as instituições econômicas inclusivas geram uma distribuição mais equitativa de recursos facilitando a persistência de instituições políticas inclusivas Não foi coincidência que quando a Virginia Company em 1618 concedeu terras e liberou de seus contratos draconianos os colonos que até então tentava coagir a Assembleia Geral no ano seguinte permitiu que estes começassem a se autogerir Eles não confiariam em direitos econômicos sem direitos políticos correspondentes sobretudo após os insistentes esforços da Virginia Company no sentido de coagilos A economia não teria perdurado nem alcançado qualquer estabilidade Com efeito a combinação de instituições inclusivas e extrativista raramente se sustenta Instituições econômicas extrativistas sob instituições políticas inclusivas dificilmente sobreviverão por muito tempo como indica nossa discussão sobre Barbados Analogamente instituições econômicas inclusivas não têm condições de sustentar nem de ser sustentadas por instituições políticas extrativistas ou se tornam extrativistas em favor dos interesses estritos dos detentores do poder ou a dinâmica econômica por elas gerada acaba desestabilizando as instituições políticas extrativistas abrindo caminho para a emergência de instituições políticas inclusivas Instituições econômicas inclusivas também tendem a reduzir os benefícios desfrutados pelas elites ao derrubar as instituições políticas extrativistas graças à concorrência no mercado e às restrições que as submetem aos contratos e direitos de propriedade do restante da sociedade POR QUE NÃO OPTAR SEMPRE PELA PROSPERIDADE As instituições econômicas e políticas que em última instância são sempre frutos de escolhas da sociedade podem ser inclusivas e estimular o crescimento econômico ou extrativistas e obstaculizálo Os países fracassam quando adotam instituições econômicas extrativistas sustentadas por instituições políticas extrativistas que impedem e até bloqueiam o crescimento econômico Isso significa porém que a escolha de instituições isto é a política institucional é uma peçachave em nossa busca de compreender as causas do êxito ou fracasso das nações Precisamos compreender por que a política de determinadas sociedades produz instituições inclusivas que fomentam o crescimento econômico ao passo que a política da vasta maioria das sociedades ao longo da história conduziu como conduz ainda hoje a instituições extrativistas que vêm estorvar o crescimento econômico Pode parecer óbvio que seja do interesse de todos instaurar instituições econômicas capazes de promover a prosperidade Não seria o desejo de todo cidadão político e até ditador predatório tornar seu país o mais rico possível Voltemos ao Reino do Congo sobre o qual já discutimos Embora tenha entrado em colapso no século XVII foi dele que veio o nome do país atual que conquistou sua independência do domínio colonial belga em 1960 Como Estado independente o Congo experimentou declínio econômico quase ininterrupto e pobreza crescente sob o governo de Joseph Mobutu entre 1965 e 1997 O declínio prosseguiu após Mobutu ser derrubado por Laurent Kabila Mobutu instaurou um conjunto de instituições econômicas de caráter profundamente extrativista Os cidadãos empobreceram mas Mobutu e a elite que o cercava conhecida como Les Grosses Legumes Grandes Legumes angariaram fortunas extraordinárias Mobutu mandou construir um palácio para morar em sua terra natal Gbadolite no norte do país com aeroporto grande o bastante para pousar um Concorde supersônico avião que ele costumava alugar da Air France para viajar à Europa onde adquiriu castelos e vastas parcelas da capital belga Bruxelas Não teria sido melhor para Mobutu engendrar instituições econômicas que aumentassem a riqueza dos congoleses em vez de aprofundar sua pobreza Se Mobutu tivesse conseguido aumentar a prosperidade de seu país não teria podido apropriarse de um montante ainda maior comprar um Concorde em vez de alugálo ter mais castelos e mansões talvez até um Exército maior e mais poderoso Infelizmente para os cidadãos de tantos países no mundo a resposta é não As instituições econômicas que criam incentivos para o progresso econômico podem ao mesmo tempo operar redistribuição de renda e de poder de tal modo que a situação particular de um ditador predatório e outros detentores de poder político acabe sendo pior O problema fundamental é que haverá necessariamente divergências e conflitos entre instituições econômicas Diferentes instituições têm diferentes consequências para a prosperidade de uma nação para o modo como se dá a distribuição de tal prosperidade e a quem caberá o poder O crescimento econômico que pode ser induzido pelas instituições produz tanto ganhadores quanto perdedores o que ficou claro durante a Revolução Industrial na Inglaterra que lançou as bases da prosperidade que encontramos hoje nos países ricos do mundo O processo girou em torno de uma série de mudanças tecnológicas inovadoras nos campos da energia a vapor transporte e produção têxtil Por mais que a mecanização resultasse em gigantesco aumento das rendas totais e em última instância constituísse o fundamento da moderna sociedade industrial sofreu a ferrenha oposição de muitos e não por ignorância ou miopia muito pelo contrário Com efeito a oposição ao crescimento econômico possui sua própria lógica que infelizmente tem sua coerência O crescimento econômico e a mudança tecnológica são acompanhados do que o grande economista Joseph Schumpeter chamou de destruição criativa substituem o velho pelo novo Novos setores atraem e desviam recursos dos antigos Novas empresas absorvem os negócios daquelas já estabelecidas Novas tecnologias tornam obsoletas as competências e equipamentos existentes O processo de crescimento econômico e as instituições inclusivas sobre as quais ele se baseia criam tanto perdedores quanto vencedores na arena política e no mercado econômico É o temor da destruição criativa que em geral se encontra na origem da oposição às instituições políticas e econômicas inclusivas A história europeia constitui um vívido exemplo das consequências da destruição criativa Às vésperas da Revolução Industrial no século XVIII os governos da maioria dos países europeus eram controlados por aristocracias e elites tradicionais cujas principais fontes de renda eram a propriedade da terra ou os privilégios comerciais de que usufruíam graças aos monopólios conferidos e barreiras alfandegárias impostas pelos monarcas De acordo com a ideia de destruição criativa a disseminação das indústrias fábricas e cidades retirou recursos da terra reduziu o valor dos aluguéis das propriedades e aumentou os salários que os proprietários rurais tinham de pagar aos seus funcionários Essas elites também assistiram ao surgimento de novos empresários e mercadores que erodiu seus privilégios comerciais De modo geral foram claramente eles que em termos econômicos saíram perdendo com a industrialização A urbanização e a emergência de uma classe média e operária mais consciente em termos sociais também vieram desafiar o monopólio político das aristocracias rurais de modo que a difusão da Revolução Industrial não lhes traria a derrota apenas no âmbito econômico corriam o risco também de perderem seu domínio no campo político Com seu poderio político e econômico em xeque essas elites tendiam a oferecer uma formidável oposição à industrialização A aristocracia não foi a única a perder com a industrialização Os artesãos cujas habilidades manuais foram substituídas pela mecanização opuseramse também à disseminação da indústria Muitos se organizaram contra ela realizando levantes e destruindo as máquinas que viam como responsáveis pela decadência de seu ganhapão Foi o ludismo palavra que se tornou hoje sinônima de resistência à mudança tecnológica John Kay inglês que inventou a lançadeira voadora em 1733 uma das primeiras novidades significativas na mecanização da tecelagem teve a casa incendiada por ludistas em 1753 James Hargreaves inventor da máquina de fiar hidráulica inovação igualmente revolucionária recebeu tratamento similar Na realidade os artesãos foram muito menos eficazes que as elites e proprietários rurais em sua oposição à industrialização Não possuíam o poder político isto é a capacidade de afetar resultados políticos indo de encontro aos desejos de outros grupos da aristocracia rural Na Inglaterra a industrialização prosseguiu apesar da oposição do ludismo porque a oposição da aristocracia por mais real que fosse foi amortecida Nos impérios austrohúngaro e russo onde os monarcas absolutistas e aristocratas tinham muito mais a perder a industrialização foi bloqueada Por conseguinte as economias de ambos acabaram estagnadas e eles foram deixados para trás pelas demais nações europeias onde o crescimento econômico deslanchou durante o século XIX Não obstante o sucesso e o fracasso de grupos específicos uma lição está clara grupos poderosos em geral se opõem ao progresso econômico e aos motores da prosperidade O crescimento econômico não é apenas um processo de mais e melhores máquinas e mais gente com acesso a melhor educação mas é também um processo transformador e desestabilizador associado à destruição criativa generalizada O crescimento só avança pois se não for bloqueado pelos derrotados na esfera econômica prevendo o fim de seus privilégios nessa área e na esfera política temendo a erosão de seu poder nesse campo A disputa por recursos renda e poder limitados traduzse em conflito em torno das regras do jogo das instituições econômicas que determinarão as atividades nessa esfera e quem será beneficiado por elas E em caso de conflito não há como atender simultaneamente os desejos de todas as partes envolvidas Algumas sairão derrotadas e frustradas ao passo que outras conseguirão assegurar os resultados almejados A definição dos vencedores em cada caso terá implicações fundamentais para a trajetória econômica do país Se os grupos contrários ao crescimento saírem ganhando conseguirão bloqueálo e a economia acabará paralisada A lógica que leva os poderosos a não desejar necessariamente implementar as instituições econômicas promotoras da riqueza aplicase facilmente à escolha de instituições políticas Em um regime absolutista algumas elites podem exercer seu poder no sentido de impor as instituições econômicas de sua preferência Teriam interesse em mudar as instituições políticas a fim de tornálas mais pluralistas Em geral não visto que essa opção apenas diluiria seu poder político dificultando ou mesmo impossibilitandoas de estruturar as instituições econômicas de modo a favorecer ainda mais seus próprios interesses Mais uma vez vemos uma fonte imediata de conflito As pessoas que sofrem sob instituições econômicas extrativistas não podem esperar de seus governantes absolutistas que voluntariamente transformem as instituições políticas e procedam à redistribuição do poder na sociedade A única maneira de mudálas será forçar a elite a criar instituições mais pluralistas Do mesmo modo como não há por que as instituições políticas tornaremse automaticamente pluralistas não existe nenhuma tendência natural à centralização política Certamente haveria incentivos à criação de instituições estatais mais centralizadas em qualquer sociedade sobretudo naquelas desprovidas de centralização em qualquer grau Por exemplo na Somália se um clã criasse um Estado centralizado capaz de impor ordem ao país haveria benefícios econômicos que enriqueceriam o clã O que impede que isso aconteça O maior obstáculo à centralização política é de novo determinada espécie de medo da mudança qualquer clã grupo ou político que tente centralizar o poder no Estado estará também tentando centralizar o poder em suas próprias mãos o que com toda probabilidade despertará a ira de outros clãs grupos e indivíduos que seriam os derrotados políticos nesse processo A ausência de centralização política implica não só falta de lei e ordem em boa parte do território mas também a existência de diversos atores dotados de poder suficiente para bloquear ou desagregar o atual estado de coisas o receio de sua oposição e reação violenta em geral basta para dissuadir os pretensos centralizadores de suas aspirações A centralização política só terá chance de se dar quando um grupo de pessoas for suficientemente mais poderoso que os demais para construir um Estado Na Somália o poder encontrase de tal modo equilibrado que nenhum clã consegue impor sua vontade aos outros Assim a falta de centralização política persiste A LONGA AGONIA DO CONGO As forças que explicam por que a prosperidade econômica é tão persistentemente rara sob as instituições extrativistas ou que ilustram a sinergia entre estas e suas congêneres políticas são poucas vezes exemplificadas de maneira melhor ou mais deprimente do que no caso do Congo Visitantes portugueses e holandeses à região já nos séculos XV e XVI notavam a pobreza miserável ali reinante A tecnologia era rudimentar pelos padrões europeus os congoleses não dispunham de escrita roda nem arado A razão de sua pobreza assim como a relutância dos fazendeiros locais em adotar tecnologias melhores quando delas tomavam conhecimento fica clara a partir dos relatos históricos existentes a natureza extrativista das instituições econômicas do país Como vimos o Reino do Congo era governado pelo rei em Mbanza futura São Salvador As regiões distantes da capital eram dominadas por uma elite cujos membros faziam as vezes de governantes das diferentes partes do reino e cuja riqueza baseavase nas plantações na região de São Salvador manejadas por mão de obra escrava e a cobrança de impostos do resto do país A escravidão era um elemento central da economia sendo usada pela elite para abastecer suas próprias terras e pelos europeus no litoral Os impostos eram arbitrários havia um que era coletado sempre que o barrete do rei lhe caía da cabeça Para enriquecer seria preciso que o povo congolês economizasse e investisse mediante por exemplo a compra de arados Mas não valeria a pena já que todo e qualquer aumento de produtividade obtido graças a melhor tecnologia estaria sujeito à expropriação por parte do rei e sua elite Em vez de investir no aumento da produtividade e na venda de seus produtos nos mercados os congoleses optavam por afastar suas aldeias dos mercados na tentativa de mantendose o mais longe possível das estradas reduzir a incidência de saques e fugir do alcance dos traficantes de escravos A pobreza do Congo era portanto fruto de instituições econômicas extrativistas que não só bloqueavam todos os motores de prosperidade como até invertiam seu funcionamento O governo do país prestava muito poucos serviços públicos a seus cidadãos nem mesmo os básicos como assegurar os direitos de propriedade ou da lei e da ordem Pelo contrário o próprio governo representava a maior ameaça aos direitos humanos e de propriedade de seus súditos A instituição da escravidão significava que o mercado mais fundamental de todos um mercado de trabalho inclusivo no qual as pessoas tivessem a possibilidade de escolher suas respectivas profissões ou trabalhos daquela maneira tão crucial para a prosperidade econômica era inexistente Ademais o comércio e as atividades mercantis de longa distância eram controlados pelo monarca e estavam abertos somente aos seus associados Embora a elite logo se alfabetizasse após a introdução da escrita pelos portugueses o rei não fez qualquer tentativa de difundir o conhecimento da leitura e da escrita pela grande massa da população Não obstante tal disseminação da pobreza miserável as instituições extrativistas congolesas seguiam sua própria e impecável lógica garantiam o enriquecimento vertiginoso de umas poucas pessoas as detentoras do poder político No século XVI o rei do Congo e a aristocracia dispunham de meios para importar artigos de luxo europeus e viviam cercados de servos e escravos As instituições econômicas da sociedade congolesa tinham sua origem na distribuição do poder político na sociedade e portanto na natureza das instituições políticas Não havia nada que impedisse o rei de tomar as propriedades ou o corpo de seus súditos exceto a ameaça de sedição e embora fosse um perigo real não era suficiente para garantir a segurança da população ou de sua riqueza As instituições políticas do Congo eram verdadeiramente absolutistas liberando o rei e a elite de praticamente toda e qualquer restrição e privando os cidadãos de voz com relação à forma de organização de sua sociedade Evidentemente não é difícil constatar o agudo contraste entre as instituições políticas do Congo e as instituições políticas inclusivas encontradas onde o poder tem limites e ampla distribuição As instituições absolutistas do Congo eram sustentadas pelas Forças Armadas O rei contava com um Exército de prontidão de cinco mil homens no século XVII com um núcleo de 500 mosqueteiros número formidável para a época É fácil compreender a avidez com que o rei e a aristocracia adotaram as armas de fogo europeias Não havia a menor possibilidade de crescimento econômico sustentado sob tal conjunto de instituições econômicas e mesmo os incentivos para a geração de um crescimento temporário eram muito limitados Uma reforma das instituições econômicas de modo a ampliar os direitos de propriedade individuais teria tornado mais próspera a sociedade congolesa de maneira geral no entanto é improvável que a elite se beneficiasse do enriquecimento geral Em primeiro lugar tais reformas significariam uma derrota econômica para a elite à medida que solaparia a riqueza derivada do tráfico escravista e dos latifúndios baseados em mão de obra escrava Em segundo lugar tais reformas só seriam possíveis caso o monarca e sua elite tivessem seu poder político reduzido Por exemplo se o rei continuasse no comando de seus 500 mosqueteiros quem acreditaria em um eventual anúncio da abolição da escravatura O que impediria o rei de voltar atrás em seguida A única garantia concreta seria uma mudança nas instituições políticas de modo que aos cidadãos fosse assegurado algum poder político de contrapeso conferindolhes algum poder decisório com relação aos impostos arrecadados ou às ações dos mosqueteiros Nesse caso entretanto dificilmente a manutenção dos níveis de consumo e do estilo de vida do monarca e da elite figuraria no topo de sua lista de prioridades Nesse caso as mudanças capazes de instaurar melhores instituições econômicas na sociedade teriam levado à derrocada não só econômica mas também política do rei e da aristocracia A interação das instituições políticas e econômicas de 500 anos atrás ainda é relevante para compreendermos por que a pobreza miserável ainda hoje grassa no moderno Estado do Congo O advento do domínio europeu na região penetrando mais profundamente na bacia do Rio Congo na época da partilha da África no final do século XIX acarretou insegurança ainda mais egrégia em relação aos direitos humanos e de propriedade do que aquela que caracterizava o Congo précolonial Ademais veio reproduzir as instituições extrativistas e o absolutismo político que tanto poder e riqueza trouxeram para poucos em detrimento das massas ainda que os poucos agora fossem os colonizadores belgas sobretudo o Rei Leopoldo II Quando o Congo conquistou a independência em 1960 o mesmo padrão de instituições econômicas incentivos e desempenho se repetiu As instituições econômicas extrativistas congolesas mais uma vez encontraram sustentação em instituições políticas altamente extrativistas A situação agravouse porque o colonialismo europeu criou uma entidade política o Congo composta de diversos Estados e sociedades précoloniais distintos sobre os quais o Estado nacional comandado a partir da capital Kinshasa dispunha de controle reduzido Embora o Presidente Mobutu tenha usado o Estado para locupletarse e aos seus comparsas por exemplo mediante o programa de zairinização de 1973 que consistiu na expropriação em massa de interesses econômicos estrangeiros ele ainda assim presidia um Estado não centralizado com pouca autoridade sobre a maior parte do país tendo precisado recorrer a auxílio externo para impedir a secessão das províncias de Katanga e Kasai na década de 1960 Tamanha falta de centralização política quase a ponto do total colapso do Estado é um traço que o Congo compartilha com boa parte da África subsaariana A moderna República Democrática do Congo continua pobre porque seus cidadãos são ainda hoje privados das instituições econômicas capazes de gerar incentivos básicos para garantir a prosperidade social Não é a geografia a cultura ou a ignorância de seus cidadãos ou políticos que mantêm o Congo na pobreza mas suas instituições econômicas extrativistas que seguem inabaladas após tantos séculos porque o poder político continua estritamente concentrado nas mãos de uma elite que dispõe de poucos incentivos para assegurar os direitos de propriedade do povo prestar serviços públicos básicos capazes de melhorar a qualidade de vida ou fomentar o progresso econômico Pelo contrário seus interesses são extorquir renda e sustentar seu poder que usam não para construir um Estado centralizado pois nesse caso se deparariam com os mesmos problemas de oposição e desafios políticos que o crescimento econômico acarretaria Ademais como ocorre na maior parte do resto da África subsaariana as disputas internas provocadas pelas tentativas de grupos rivais de assumir o controle das instituições extrativistas destruíram por completo qualquer eventual tendência à centralização do Estado A história do Reino do Congo assim como a história mais recente do Congo constitui um vívido exemplo de como as instituições políticas determinam as instituições econômicas e por intermédio destas os incentivos e o escopo do crescimento econômico Ilustra também a relação simbiótica entre absolutismo político e instituições econômicas que conferem poder e riqueza a poucos em detrimento de muitos CRESCIMENTO SOB INSTITUIÇÕES POLÍTICAS EXTRATIVISTAS O Congo hoje é um exemplo extremo onde vigoram o desregramento generalizado e a tibieza dos direitos de propriedade Entretanto na maioria das vezes tal extremismo não atenderia aos interesses da elite uma vez que lançaria por terra todos os incentivos econômicos e geraria poucos recursos a extrair A tese central deste livro é que o crescimento econômico e a prosperidade estão associados a instituições políticas e econômicas inclusivas ao passo que as instituições extrativistas tendem a acarretar estagnação e pobreza o que não implica porém que as instituições extrativistas sejam incapazes de fomentar crescimento nem que todas as instituições extrativistas sejam idênticas Há duas maneiras distintas mas complementares pelas quais se pode dar o crescimento sob instituições políticas extrativistas Em primeiro lugar mesmo que as instituições econômicas sejam extrativistas o crescimento é possível quando as elites conseguem alocar recursos diretamente para atividades de alta produtividade que elas mesmas possam controlar Um exemplo notório desse tipo de crescimento sob instituições extrativistas foi o das ilhas do Caribe entre os séculos XVI e XVIII onde a maioria da população era escrava trabalhava nas mais medonhas condições nas plantations mal ultrapassando o nível de subsistência Muitos morriam de desnutrição e exaustão Em Barbados Cuba Haiti e Jamaica nos séculos XVII e XVIII uma pequena minoria a elite de latifundiários controlava todo o poder político e detinha todos os ativos inclusive todos os escravos Enquanto a maioria não dispunha de direito algum a propriedade e os ativos da elite estavam bem protegidos Apesar das instituições econômicas extrativistas que exploravam abusivamente a maioria da população essas ilhas estavam entre os lugares mais ricos do mundo por produzirem açúcar e o venderem nos mercados mundiais A economia das ilhas só estagnou quando surgiu a necessidade de realizar uma transição para novas atividades econômicas pondo em risco tanto a renda quanto o poder político da elite latifundiária Outro exemplo é o crescimento econômico e a industrialização da União Soviética do primeiro Plano Quinquenal em 1928 até a década de 1970 As instituições políticas e econômicas eram altamente extrativistas e os mercados controlados com mão de ferro Não obstante a União Soviética logrou alcançar acelerado crescimento econômico graças à sua capacidade de utilizar o poder do Estado para deslocar recursos da agricultura onde eram empregados com grande ineficiência para a indústria O segundo tipo de crescimento sob instituições políticas extrativistas ocorre quando tais instituições permitem o desenvolvimento de instituições econômicas relativamente ainda que não de todo inclusivas Muitas sociedades com instituições políticas extrativistas esquivamse de instituições econômicas inclusivas por medo da destruição criativa Contudo a medida pela qual a elite consegue monopolizar o poder varia de uma sociedade para outra Em algumas a posição da elite pode ser segura o bastante para que ela tolere certas iniciativas na direção de instituições econômicas inclusivas quando têm a relativa certeza de que isso não porá em risco seu poder político Assim o contexto histórico pode ser tal que um regime político altamente extrativista se veja dotado de instituições econômicas bastante inclusivas que os detentores do poder optam por não bloquear o que constitui a segunda maneira pela qual o crescimento pode se dar sob instituições políticas extrativistas A rápida industrialização da Coreia do Sul sob o General Park é um bom exemplo Park chegou ao poder por meio de um golpe militar em 1961 mas isso em uma sociedade que gozava de amplo apoio dos Estados Unidos e cujas instituições econômicas eram essencialmente inclusivas Apesar do autoritarismo do regime de Park era seguro o suficiente para fomentar o crescimento econômico o que de fato fez de forma bastante ativa talvez em parte porque o regime não fosse diretamente sustentado por instituições econômicas extrativistas Ao contrário da União Soviética e da maioria dos outros casos de crescimento sob instituições extrativistas a Coreia do Sul efetuou a transição das instituições políticas extrativistas para as inclusivas na década de 1980 Seu êxito nessa operação deveuse a uma confluência de fatores Na década de 1970 as instituições econômicas sulcoreanas já haviam se tornado inclusivas o bastante para esvaziar um dos mais fortes sustentáculos das instituições políticas extrativistas a elite econômica tinha pouco a ganhar com seu próprio domínio ou o dos militares na política A relativa igualdade de renda no país significava também que a elite tinha menos a temer com relação ao pluralismo e à democracia A influência decisiva dos Estados Unidos sobretudo em vista da ameaça representada pela Coreia do Norte implicava também que o intenso movimento democrático que desafiava a ditadura militar não poderia continuar sendo reprimido por muito mais tempo Assim muito embora o assassinato do General Park em 1979 tenha sido seguido de um novo golpe militar encabeçado por Chun Doohwan o sucessor escolhido de Chun Roh Taewoo deu início a um processo de reformas políticas que levou à consolidação de uma democracia pluralista a partir de 1992 Claro não houve uma transição desse tipo na União Soviética Por conseguinte o crescimento soviético perdeu o gás e a economia do país começou a entrar em colapso nos anos 1980 para desmoronar por completo na década seguinte O crescimento econômico chinês de hoje apresenta também vários elementos comuns com as experiências soviética e sulcoreana Enquanto seus primeiros estágios foram capitaneados por reformas radicais no setor agrícola no segmento industrial elas foram mais discretas Ainda hoje o Estado e o Partido Comunista desempenham papel central na seleção dos setores e empresas que receberão injeções de capital para se expandirem ocasionando a construção e a destruição de fortunas nesse processo Do mesmo modo como ocorreu na União Soviética em seu auge a China vem crescendo rapidamente mas tal crescimento se dá ainda sob instituições extrativistas sob o controle do Estado com parcos indícios de uma transição para instituições políticas inclusivas O fato de as instituições econômicas chinesas estarem longe de ser plenamente inclusivas sugere ainda que uma transição ao estilo sulcoreano é improvável ainda que evidentemente não impossível Vale notar que a centralização política é crucial para ambos os sentidos em que o crescimento sob instituições políticas extrativistas pode se dar Sem algum grau de centralização política a elite rural em Barbados Cuba Haiti e Jamaica não teria conseguido manter a lei e a ordem e defender seus próprios ativos e propriedades Sem significativa centralização e firme controle do poder político nem as elites militares sulcoreanas nem o Partido Comunista chinês teriam segurança suficiente para promover reformas econômicas significativas conseguindo ao mesmo tempo agarrarse ao poder E sem tal centralização o Estado na União Soviética ou na China não teria sido capaz de coordenar a atividade econômica de modo a canalizar recursos para áreas de alta produtividade Uma das características centrais das instituições políticas extrativistas capazes de fomentar crescimento portanto é o seu grau de centralização política Onde esta estiver ausente como em boa parte da África subsaariana será difícil obter qualquer crescimento ainda que limitado Muito embora as instituições extrativistas sejam capazes de gerar riqueza em geral não terão como gerar crescimento econômico sustentado e certamente não o tipo de crescimento acompanhado por destruição criativa Quando tanto as instituições políticas quanto as econômicas são extrativistas não há incentivos para a destruição criativa e a mudança tecnológica O Estado pode até conseguir durante algum tempo fomentar um rápido crescimento econômico mediante a alocação de recursos e pessoas por decreto mas o processo é intrinsecamente limitado Quando os limites são atingidos o crescimento é interrompido como se deu na União Soviética nos anos 1970 Mesmo durante o acelerado crescimento econômico soviético na maior parte da economia verificouse pouca mudança tecnológica ainda que a injeção maciça de recursos nas Forças Armadas lhe tenha permitido desenvolver tecnologias militares e até passar à frente dos Estados Unidos nas corridas espacial e nuclear por um breve período Sem destruição criativa e sem inovação tecnológica de base ampla todavia esse crescimento não seria sustentável e teve um fim abrupto Ademais os mecanismos que fundamentam o crescimento econômico sob instituições políticas extrativistas são por sua própria natureza frágeis podem cair por terra ou ser facilmente destruídos pelos conflitos internos gerados por essas mesmas instituições Com efeito as instituições políticas e econômicas extrativistas criam uma tendência geral à dissidência interna por promoverem a concentração de riqueza e poder nas mãos de uma elite estreita Se outro grupo conseguir sobrepujar a elite dominante e assumir o controle do Estado vai se tornar o novo detentor da riqueza e do poder Por conseguinte como nossa discussão sobre o colapso do Império Romano e das cidades maias vai ilustrar páginas 131136 e 113117 os embates pelo controle do Estado totalitário permanecem sempre latentes periodicamente intensificamse e acarretam o esboroamento desses regimes podendo conduzir à guerra civil e às vezes ao total colapso e desmanche do Estado Uma implicação desse processo é que se uma sociedade sob instituições extrativistas chega a atingir algum grau de centralização do Estado essa situação necessariamente não perdurará De fato as disputas internas pelo controle das instituições extrativistas em geral leva a guerras civis e à ilegalidade generalizada consagrando uma persistente ausência da centralização do Estado como se vê em tantos países da África subsaariana e alguns da América Latina e Sul da Ásia Por fim quando o crescimento se dá sob instituições políticas extrativistas mas onde as instituições econômicas apresentam traços inclusivos conforme se deu no caso da Coreia do Sul há sempre o risco de que as instituições econômicas se tornem mais extrativistas e o crescimento seja interrompido Os detentores do poder político acabarão achando mais interessante usar seu poder para restringir a competição para aumentar a sua fatia do bolo ou mesmo pilhar e saquear os outros em vez de apoiar o progresso econômico A distribuição e a capacidade de exercer o poder acabarão em última instância solapando as próprias fundações da prosperidade econômica a menos que as instituições políticas se convertam de extrativistas em inclusivas E 4 PEQUENAS DIFERENÇAS E CONJUNTURAS CRÍTICAS O PESO DA HISTÓRIA O MUNDO CRIADO PELA PESTE NEGRA M 1346 A FEBRE BUBÔNICA também conhecida como peste negra chegou à cidade portuária de Tanais na embocadura do Rio Don no Mar Negro Transmitida por pulgas de ratos a doença foi trazida da China por mercadores que percorriam a Rota da Seda a grande artéria comercial que cruzava a Ásia Graças aos comerciantes genoveses os ratos logo estavam espalhando suas pulgas e a peste de Tanais por todo o Mediterrâneo No começo de 1347 a peste havia chegado a Constantinopla No primeiro semestre de 1348 espalhavase pela França e o Norte da África e subia pela bota italiana A epidemia varria cerca de metade da população das áreas atingidas Sua chegada à cidade italiana de Florença foi testemunhada em primeira mão pelo escritor italiano Giovanni Boccaccio que mais tarde recordaria Diante de seu assalto toda a sabedoria e engenho humanos eram em vão A peste começou de maneira aterrorizante e extraordinária a revelar seus efeitos desastrosos Não assumiu a forma que havia apresentado no Oriente onde qualquer um que sangrasse pelo nariz tinha um óbvio presságio de morte certa Pelo contrário seu sintoma mais precoce era o surgimento de certos inchaços na virilha ou axila alguns em formato de ovo ao passo que outros apresentavam aproximadamente o tamanho de uma maçã comum Mais tarde os sintomas da enfermidade mudaram e muitas pessoas começaram a notar pústulas e erupções escuras nos braços coxas e outras partes do corpo Contra tais males todas as orientações dos médicos e todo conhecimento da medicina eram inúteis e sem serventia Na maioria dos casos a morte sobrevinha três dias após o surgimento dos sintomas que descrevemos Na Inglaterra as pessoas sabiam que a peste estava se encaminhando em sua direção e tinham plena consciência da tragédia iminente Em meados de agosto de 1348 o Rei Eduardo III pediu ao Arcebispo de Cantuária que organizasse orações e muitos bispos escreveram cartas a serem lidas pelos sacerdotes nas igrejas a fim de ajudar as pessoas a lidar com o que as aguardava Ralph de Shrewsbury Bispo de Bath escreveu aos seus clérigos Deus TodoPoderoso usa os trovões relâmpagos e outros golpes que lança de seu trono para açoitar os filhos que deseja redimir Assim uma vez que uma catastrófica pestilência do Oriente atingiu um reino vizinho é muito de se temer que a menos que oremos devota e incessantemente pestilência similar estenda seus venenosos braços sobre este reino derrubando e consumindolhe os habitantes Portanto devemos todos nos colocar diante da presença do Senhor em confissão recitando salmos Não adiantou nada A peste abateuse sobre os ingleses e rapidamente eliminou metade da população Catástrofes desse porte podem ter um efeito avassalador sobre as instituições da sociedade Multidões enlouqueceram o que é compreensível Boccaccio comenta que alguns defendiam que uma maneira infalível de afastar aquele mal aterrador consistia em afogarse na bebida aproveitar a vida ao máximo entregarse a cantorias e folguedos satisfazer todos os seus desejos sempre que se apresentasse qualquer oportunidade e a tudo encarar como uma grande piada o que explica por que as mulheres que se recuperavam seriam possivelmente menos castas no período que se seguia Todavia a peste exerceu também um impacto profundamente transformador em termos sociais econômicos e políticos sobre as sociedades medievais europeias Na virada do século XIV a Europa obedecia a uma ordem feudal uma forma de organização da sociedade que havia emergido na Europa Ocidental após a derrocada do Império Romano Baseavase em relações hierárquicas entre o rei e os nobres a ele subordinados tendo os camponeses na base O rei era o dono da terra que ele concedia aos senhores em troca de serviços militares Os nobres por sua vez alocavam a terra aos camponeses em troca do que estes ofereciam sua mão de obra gratuita e submetiamse a um semfim de multas e impostos Os camponeses que em virtude de sua situação servil eram chamados servos permaneciam presos à terra impossibilitados de deslocarse sem a permissão de seu senhor que não era apenas o senhor das terras mas também juiz júri e força policial Era um sistema altamente segregacionista no qual a riqueza fluía para o alto dos muitos camponeses para os poucos senhores A extrema escassez de mão de obra ocasionada pela peste abalou as fundações da ordem feudal estimulando os camponeses a demandar mudanças Na Abadia de Eynsham por exemplo os camponeses exigiram a redução de muitas das multas e do volume de trabalho não remunerado Foram atendidos e seu novo contrato começava com a seguinte descrição No tempo da mortandade ou pestilência que teve lugar em 1349 mal restaram dois locatários na herdade tendo estes expressado sua intenção de partir a menos que o Irmão Nicholas de Upton seu abade e senhor das terras firmasse com eles um novo acordo E foi o que aconteceu O ocorrido em Eynsham repetiuse por toda parte Os camponeses começaram a libertarse do trabalho compulsório e das muitas obrigações devidas aos seus senhores Os salários começaram a subir O governo na tentativa de pôr um ponto final nesse processo promulgou em 1351 o Estatuto dos Trabalhadores que começava nos seguintes termos Tendo uma grande parcela do povo e sobretudo dos trabalhadores e servos perecido na pestilência alguns constatando as dificuldades dos senhores e a escassez de servos não se mostram dispostos a servir a menos que recebam salários excessivos Considerando as graves inconveniências que podem decorrer da falta especialmente de lavradores e trabalhadores que tais nós decidimos por bem dispor que todo homem e mulher do nosso reino da Inglaterra estará fadado a servir aquele a quem tiver convindo recorrer aos seus serviços receberá para tanto tão somente a remuneração recompensa ou salário que nos lugares onde ele se puser a servir costumavamse pagar no vigésimo ano do nosso reino na Inglaterra o Rei Eduardo III subiu ao trono em 25 de janeiro de 1327 portanto a referência aqui é a 1347 ou nos cinco ou seis anos ordinários que a este sucederam O estatuto de fato procurou fixar os salários nos níveis em vigor antes da peste negra Particularmente preocupante para a elite inglesa era a sedução a tentativa de um nobre de atrair os raros camponeses de outro A solução encontrada foi adotar a prisão como penalidade pelo abandono do emprego sem a devida permissão do empregador E caso um ceifeiro ou cortador ou qualquer outro trabalhador ou servo qualquer que seja a sua situação ou condição que seja retido no serviço do senhor abandone o dito serviço antes do fim do período acordado sem a devida permissão ou causa razoável sofrerá a pena de encarceramento e ninguém ademais poderá pagar ou permitir o pagamento de qualquer outra remuneração recompensa ou salário costumeiros até então A tentativa inglesa de impedir as mudanças nas instituições e sistemas de remuneração decorrentes da peste negra não deu certo Em 1381 irrompeu a Revolta dos Camponeses no decorrer da qual os rebeldes sob a liderança de Wat Tyler chegaram a apoderarse da maior parte de Londres Embora tenham acabado derrotados e Tyler executado não houve novas tentativas de impor o Estatuto dos Trabalhadores O esquema de trabalho feudal definhou emergiu um mercado de trabalho inclusivo na Inglaterra e os salários subiram A peste parece ter se abatido sobre a maior parte do mundo fazendo em todos os lugares uma proporção similar de vítimas de modo que o impacto demográfico no Leste Europeu foi o mesmo da Inglaterra ou da Europa Ocidental como um todo As forças sociais e econômicas em ação eram também as mesmas A mão de obra era escassa e o povo reivindicava liberdades maiores No leste porém vigorava uma lógica paradoxal mais poderosa Menos gente significava salários mais altos em um mercado de trabalho inclusivo contudo a situação incentivava os senhores a manterem um mercado de trabalho extrativista e os camponeses servis Na Inglaterra essa motivação também estivera em ação tendo se refletido no Estatuto dos Trabalhadores mas os trabalhadores tiveram poder suficiente para impor suas demandas Na Europa Oriental ocorreu o inverso Após a peste os senhores locais começaram a apropriarse de vastas extensões de terra e expandir seus domínios que já eram maiores do que os do oeste do continente As cidades eram mais fracas e menos populosas e em vez de se tornarem mais livres os trabalhadores viram minguar as liberdades que já possuíam Os efeitos ficaram especialmente claros após 1500 quando a Europa Ocidental começou a demandar os produtos agrícolas como trigo centeio e gado produzidos no leste Do centeio importado por Amsterdã 80 vinham dos vales dos Rios Elba Vístula e Oder Logo metade do florescente comércio holandês era com o Leste Europeu À medida que aumentava a demanda ocidental os senhores do leste foram estreitando o controle que exerciam sobre a força de trabalho a fim de expandir sua oferta processo que ficaria conhecido como Segunda Servidão distinta e mais intensa do que sua forma original no início da Idade Média Os nobres aumentaram os impostos coletados sobre as glebas de seus próprios vassalos apoderandose de metade da produção bruta Em Korczyn Polônia todo o trabalho prestado para o senhor em 1533 era remunerado Em 1600 porém quase metade consistia em trabalho forçado não remunerado Em 1500 os trabalhadores de Mecklenberg leste da Alemanha deviam apenas alguns dias de serviços não remunerados por ano Em 1550 era um dia por semana em 1600 havia chegado a três dias por semana Os filhos dos trabalhadores tinham de trabalhar de graça para o senhor por vários anos Na Hungria os senhores assumiram o total controle da terra em 1514 determinando que cada trabalhador prestasse um dia por semana de trabalhos não remunerados Em 1550 o número passou para dois dias semanais No fim do século chegara a três dias A essa altura os servos submetidos a essas regras correspondiam a 90 da população rural Embora em 1346 houvesse poucas diferenças entre a Europa Ocidental e a Oriental em termos de instituições políticas e econômicas em 1600 as duas partes do continente eram mundos completamente distintos No oeste os trabalhadores estavam livres das obrigações multas e regulamentações feudais tornandose peçaschave na nova economia de mercado em expansão No leste também tomavam parte dessa organização econômica mas como servos coagidos responsáveis pela produção dos alimentos e produtos agrícolas demandados pelo Ocidente Tamanha discrepância institucional foi fruto de uma situação em que as diferenças entre as duas regiões a princípio pareciam insignificantes no leste os nobres mostravamse um pouco mais organizados com direitos ligeiramente maiores e sobre a terra mais bem consolidados As cidades eram mais fracas e menores os camponeses eram menos organizados No esquema mais amplo da História eram divergências muito sutis Não obstante essas pequenas diferenças entre leste e oeste teriam graves consequências para a vida de suas populações e para o futuro caminho de desenvolvimento institucional quando a ordem feudal se visse abalada pela peste negra A peste negra é um vívido exemplo de uma daquelas circunstâncias críticas um grande acontecimento ou confluência de fatores que vêm romper o equilíbrio econômico ou político existente na sociedade Um momento crítico como esse é uma faca de dois gumes capaz de provocar reviravolta nos rumos tomados por cada país Por um lado pode abrir caminho para a interrupção do ciclo de instituições extrativistas e possibilitar o surgimento de outras mais inclusivas como aconteceu na Inglaterra Ou pode intensificar a emergência de instituições extrativistas como no caso da segunda servidão na Europa Oriental Compreender como a história e essas circunstâncias críticas moldam a trajetória das instituições econômicas e políticas vai nos ajudar a desenvolver uma teoria mais completa das causas das discrepâncias em pobreza e prosperidade Ajudanos também a explicar o atual estado de coisas e por que alguns países conseguem realizar a transição para instituições econômicas e políticas inclusivas ao passo que outros não A CONSTITUIÇÃO DAS INSTITUIÇÕES INCLUSIVAS A Inglaterra foi um caso único entre as nações ao fazer a passagem para o crescimento econômico sustentado no século XVII Grandes mudanças econômicas foram precedidas por uma revolução política que produziu um conjunto específico de instituições políticas e econômicas muito mais inclusivas do que as encontradas em qualquer sociedade anterior Essas instituições teriam profundas implicações não só em termos de prosperidade e incentivos econômicos mas também de quem poderia colher os frutos da prosperidade Baseavamse não em um consenso mas pelo contrário nasceram de intensos conflitos entre diferentes grupos disputando o poder contestando a autoridade alheia e tentando estruturar instituições em seu próprio benefício O apogeu dessas querelas institucionais dos séculos XVI e XVII deuse em dois eventoschave a Guerra Civil inglesa entre 1642 e 1651 e sobretudo a Revolução Gloriosa de 1688 A Revolução Gloriosa restringiu o poder do monarca e do Executivo e deslocou para o Parlamento a possibilidade de determinar as instituições econômicas Ao mesmo tempo abriu o sistema político para um amplo corte transversal da sociedade aumentando a parcela da população capaz de exercer considerável influência sobre o funcionamento do Estado A Revolução Gloriosa foi a pedra angular de uma sociedade pluralista tendo não só se apoiado em mas também acelerado um processo de centralização política Criou o primeiro conjunto de instituições políticas inclusivas no mundo Por conseguinte as instituições econômicas também começaram a tornarse mais inclusivas Nem a escravidão nem as rígidas restrições econômicas do período medieval feudal como a servidão existiam na Inglaterra no princípio do século XVII Não obstante havia muitas restrições às atividades econômicas às quais as pessoas podiam se dedicar Tanto a economia doméstica quanto a internacional estavam estranguladas por monopólios O Estado determinava impostos arbitrários e manipulava o sistema legal A maior parte da terra estava submetida a formas arcaicas de direitos de propriedade que impossibilitavam sua venda e faziam dela um investimento demasiadamente arriscado A situação mudou após a Revolução Gloriosa O governo adotou uma série de instituições econômicas que ofereciam incentivos ao investimento comércio e inovação Os direitos de propriedade inclusive patentes que concediam direitos sobre ideias foram assegurados com firmeza estimulando assim a inovação O Estado começou a garantir a lei e a ordem e a lei inglesa passou a valer para todos os cidadãos algo que não tinha precedentes históricos Os tributos arbitrários foram descontinuados sendo abolidos quase por completo O Estado promovia agressivamente as atividades mercantis e trabalhava na promoção da indústria nacional não só removendo barreiras à expansão da atividade industrial mas também se valendo de todo o poderio da Marinha inglesa para resguardar interesses mercantis Ao racionalizar os direitos de propriedade facilitou a construção de infraestrutura sobretudo estradas canais e mais tarde ferrovias que se provaria crucial para a expansão industrial Tais fundamentos alteraram de forma decisiva os incentivos dados à população e impeliram os motores da prosperidade preparando o terreno para a Revolução Industrial Antes e acima de tudo a Revolução Industrial dependeu de grandes avanços tecnológicos baseados no conhecimento acumulado na Europa ao longo dos séculos passados Representou uma ruptura radical com o passado que só foi possível graças ao método científico e aos talentos de diversos indivíduos especiais A plena força dessa revolução veio do mercado que criou oportunidades rentáveis para o desenvolvimento e aplicação de tecnologias Foi a natureza inclusiva dos mercados que permitiu às pessoas alocarem seus talentos nas linhas mais adequadas de negócios A educação e as competências deram também sua contribuição à medida que foram os níveis relativamente altos de educação pelo menos pelos padrões da época que possibilitaram a emergência de empreendedores dotados de suficiente visão para empregar as novas tecnologias em seus negócios e procurar trabalhadores com as habilidades necessárias para manejálas Não é coincidência que a Revolução Industrial tenha iniciado na Inglaterra poucas décadas após a Revolução Gloriosa Grandes inventores como James Watt que aprimorou o motor a vapor Richard Trevithick construtor da primeira locomotiva a vapor Richard Arkwright inventor de uma máquina de fiar algodão hidráulica e Isambard Kingdom Brunel construtor de vários navios a vapor revolucionários puderam aproveitar as oportunidades econômicas geradas por suas ideias confiando em que seus direitos de propriedade seriam respeitados e tiveram acesso a mercados nos quais suas inovações poderiam ser vendidas e utilizadas de maneira rentável Em 1775 logo após renovar a patente de seu motor a vapor que chamava de máquina de fogo James Watt escreveu a seu pai Caro pai Após uma série de várias e violentas oposições finalmente obtive um decreto do Parlamento investindome e aos meus representantes na propriedade de minhas novas máquinas de fogo por toda a GrãBretanha e latifúndios pelos próximos 25 anos o que espero sermeá muito benéfico visto que existe já considerável demanda para elas A carta revela duas coisas Primeiro Watt estava motivado pelas oportunidades de mercado que antevia a considerável demanda na GrãBretanha e seus latifúndios as colônias ultramarinas inglesas Em segundo lugar mostra como ele foi capaz de influenciar o Parlamento de modo a obter o que queria uma vez que este se mostrava responsivo aos apelos de indivíduos e inovadores Os avanços tecnológicos o impulso de expansão e investimento das empresas e o uso eficiente de competências e talentos foram viabilizados pelas instituições econômicas inclusivas desenvolvidas na Inglaterra estas por sua vez baseadas nas instituições políticas inclusivas do país A Inglaterra desenvolveu tais instituições políticas inclusivas em virtude de dois fatores Primeiro foram as instituições políticas entre elas um Estado centralizado que lhe permitiriam dar o passo seguinte radical e inédito rumo a instituições inclusivas com a deflagração da Revolução Gloriosa Embora esse elemento tenha colocado a Inglaterra em situação claramente distinta da maior parte do mundo não a diferenciou de maneira muito significativa de outros países da Europa Ocidental como França e Espanha Mais importante foi o segundo fator a escalada de eventos que precipitaram a Revolução Gloriosa forjou ampla a poderosa coalizão capaz de impor restrições duradouras ao poder da Coroa e do Executivo forçandoos assim a abrirse às reivindicações de tal coalizão o que lançou as bases de instituições políticas pluralistas as quais por sua vez possibilitaram o desenvolvimento das instituições econômicas subjacentes à primeira Revolução Industrial PEQUENAS DIFERENÇAS QUE FAZEM A DIFERENÇA As desigualdades no mundo aumentaram drasticamente com a Revolução Industrial britânica ou inglesa porque apenas algumas partes do mundo adotaram as inovações e novas tecnologias desenvolvidas por homens como Arkwright Watt e os muitos que se seguiram A resposta de cada país à onda de tecnologias que determinaria quem permaneceria na pobreza e quem alcançaria um crescimento econômico sustentado foi em grande parte moldada pelos vários rumos históricos de suas respectivas instituições Em meados do século XVIII já se verificou uma disparidade notória nas instituições políticas e econômicas encontradas ao redor do globo Mas de onde vinham tais diferenças Em 1688 as instituições políticas inglesas rumavam para um pluralismo muito maior do que as da França e Espanha por exemplo mas se voltarmos 100 anos no tempo para 1588 as discrepâncias são praticamente nulas Os três países eram regidos por monarcas relativamente absolutistas Elizabeth I na Inglaterra Filipe II na Espanha e Henrique II na França Todos digladiavam com assembleias de cidadãos na Inglaterra o Parlamento na Espanha as Cortes na França os Estados Gerais que reivindicavam mais direitos e controle sobre a monarquia Cada uma possuía poderes e alçadas ligeiramente distintos Por exemplo o Parlamento inglês e as Cortes espanholas podiam interferir na tributação enquanto os Estados Gerais não Na Espanha esse ponto tinha pouca importância em virtude do vasto império americano amealhado desde 1492 pela Coroa que se beneficiava imensamente do ouro e prata lá encontrados Na Inglaterra a situação era outra Elizabeth I gozava de independência financeira consideravelmente menor de modo que precisava suplicar ao Parlamento que aumentasse os impostos Em contrapartida a casa exigia concessões sobretudo restrições ao direito da rainha de criar monopólios A disputa foi sendo pouco a pouco vencida pelo Parlamento Na Espanha as Cortes perderam um conflito análogo e o comércio não só foi monopolizado mas monopolizado pela monarquia local Essas diferenças que a princípio pareciam mínimas revestiramse de maior importância no século XVII Embora as Américas tivessem sido descobertas em 1492 e Vasco da Gama houvesse chegado à Índia contornando o Cabo da Boa Esperança no extremo sul da África em 1498 a maior parte do comércio mundial especialmente no Atlântico só seria inaugurada após 1600 Em 1585 instalouse em Roanoke na atual Carolina do Norte o primeiro núcleo de colonização inglesa na América do Norte Em 1600 foi fundada a Companhia das Índias Orientais inglesa seguida em 1602 por sua contraparte holandesa Em 1607 nasceu a colônia de Jamestown sob a batuta da Virginia Company Na década de 1620 o Caribe estava sendo colonizado Barbados seria ocupada em 1627 A França também se expandia no Atlântico a Cidade de Quebec foi fundada em 1608 como capital da Nova França onde hoje é o Canadá Todavia devido àquelas sutis diferenças iniciais os reflexos de tal expansão econômica sobre as instituições inglesas foram muito distintos daqueles sofridos pela Espanha e França Elizabeth I e seus sucessores não tinham condições de monopolizar o comércio com as Américas Outros monarcas europeus sim Assim enquanto na Inglaterra o comércio no Atlântico e a colonização começaram a formar um grande grupo de comerciantes prósperos e sem muitos vínculos com a Coroa não foi o que se deu na Espanha ou França Os comerciantes ingleses incomodavamse com o controle régio e reivindicavam mudanças nas instituições políticas e restrição das prerrogativas reais e desempenhariam papel fundamental tanto na Guerra Civil inglesa quanto na Revolução Gloriosa Conflitos similares irromperam por toda parte Os monarcas franceses por exemplo enfrentaram a Rebelião da Fronda entre 1648 e 1652 A diferença foi que na Inglaterra era muito mais provável que os adversários do absolutismo vencessem dada sua relativa prosperidade e o fato de serem em maior número do que os opositores do regime na Espanha e na França As trajetórias divergentes das sociedades inglesa francesa e espanhola no século XVII ilustram a importância da interrelação das pequenas diferenças institucionais e as circunstâncias críticas durante as quais um grande evento ou confluência de fatores vem romper o equilíbrio de poder político ou econômico existente em determinado país Estes podem afetar não só um único país como a morte do Presidente Mao Tsé Tung em 1976 que a princípio representou uma circunstância crítica apenas para a China comunista Em geral contudo as circunstâncias críticas afetam todo um conjunto de sociedades tal como no caso da colonização e da descolonização processos que abalaram a maior parte do mundo Essas circunstâncias críticas são importantes porque os obstáculos às transformações graduais são formidáveis resultados da sinergia entre instituições políticas e econômicas extrativistas e seu apoio mútuo A persistência desse mecanismo de retroalimentação cria um círculo vicioso os favorecidos pelo status quo são ricos e bem organizados o que os torna capazes de fazer frente de fato a mudanças significativas que poderiam priválos de seus privilégios econômicos e poder político Deflagrada uma circunstância crítica as pequenas diferenças que fazem a diferença são aquelas peculiaridades institucionais iniciais que põem em movimento respostas muito diversas É por isso que as discrepâncias institucionais relativamente sutis entre Inglaterra França e Espanha acarretaram rumos de desenvolvimento radicalmente distintos Elas foram frutos da circunstância crítica gerada pelas oportunidades econômicas apresentadas aos europeus pelo comércio atlântico Por mais diferença que as pequenas diferenças institucionais façam em circunstâncias críticas nem todas as diferenças institucionais são sutis e naturalmente diferenças institucionais mais amplas produzem discrepâncias ainda maiores nesses casos Assim embora as diferenças institucionais entre Inglaterra e França fossem mínimas em 1588 a Europa Ocidental e o Leste Europeu eram separados por um abismo No lado ocidental Estados fortes e centralizados como Inglaterra França e Espanha contavam com instituições constitucionais latentes o Parlamento os Estados Gerais e as Cortes havia também similaridades subjacentes em suas instituições econômicas como a ausência de servidão No Leste Europeu a história era outra O reino da PolôniaLituânia por exemplo era governado por uma elite chamada szlachta uma classe tão poderosa que havia chegado a introduzir eleições para o cargo de rei Não se tratava de um regime absoluto como a França de Luís XIV o ReiSol mas o absolutismo de uma elite instituições políticas extrativistas do mesmo modo Os szlachta dominavam uma sociedade basicamente rural na qual predominavam os servos privados de qualquer liberdade de movimentação ou oportunidade econômica Mais a leste o imperador russo Pedro o Grande também estava consolidando um absolutismo muito mais intenso e extrativista do que mesmo Luís XIV seria capaz de administrar O Mapa 8 oferece uma maneira simples de perceber a magnitude das disparidades entre o Leste e o Oeste Europeu no começo do século XIX Nele podese ver se no país vigorava ou não servidão em 1800 nos países em cores escuras sim nos claros não O Leste Europeu é escuro a Europa Ocidental clara Não obstante as instituições da Europa Ocidental nem sempre foram tão diferentes das da Europa Oriental Como já vimos as divergências tiveram início no século XIV quando a peste negra abateuse sobre o continente em 1346 As diferenças entre as instituições políticas e econômicas do Leste e do Oeste Europeu eram mínimas Inglaterra e Hungria eram comandadas por membros da família angevina As diferenças institucionais mais significativas surgidas após a peste negra criariam então o cenário em que ao longo dos séculos XVII XVIII e XIX as discrepâncias já consideráveis entre leste e oeste se fariam sentir Mapa 8 Servidão na Europa em 1800 Mas como surgem afinal as pequenas diferenças institucionais que deflagram esse processo de divergência Por que o Leste Europeu possuía instituições políticas e econômicas diferentes das ocidentais no século XIV Por que o equilíbrio de poder entre Coroa e Parlamento era um na Inglaterra e outro na França e Espanha Como veremos no próximo capítulo mesmo sociedades muito menos complexas do que a nossa sociedade moderna criam instituições políticas e econômicas com efeitos poderosos sobre a vida de seus membros o que vale mesmo para grupos de caçadores e coletores como sabemos por culturas remanescentes como o povo san na moderna Botsuana que não tem agricultura nem vive em povoações permanentes Cada sociedade cria suas próprias instituições com base em seus respectivos costumes sistemas de direitos de propriedade específicos e maneiras peculiares de dividir um animal morto ou o butim tomado de outro grupo Algumas reconhecerão a autoridade dos mais velhos outras não algumas conquistarão desde cedo algum grau de centralização política mas não outras Todas as sociedades encontramse constantemente expostas a conflitos econômicos e políticos que resolvem de diferentes formas de acordo com especificidades históricas o papel dos indivíduos ou outros elementos aleatórios Tais discrepâncias em geral começam insignificantes mas vão se acumulando e criando um processo de distanciamento institucional Do mesmo modo como as diferenças entre duas populações isoladas de organismos vão gradualmente se aprofundando em um processo de diferenciação genética devido ao acúmulo de mutações genéticas aleatórias duas sociedades similares sob outros aspectos também tendem a se afastar lentamente uma da outra em termos institucionais Assim como a diferenciação genética porém a diferenciação institucional não tem um caminho predeterminado nem sequer precisa ser cumulativa ao longo dos séculos pode levar a diferenças perceptíveis e às vezes significativas As disparidades decorrentes desse processo serão particularmente impactantes nos momentos críticos à medida que influenciam o modo como a sociedade reage a circunstâncias econômicas ou políticas Os padrões profusamente díspares de desenvolvimento econômico encontrados no mundo dependem da interrelação entre as circunstâncias críticas e a diferenciação institucional As instituições políticas e econômicas existentes às vezes moldadas por um longo processo de diferenciação institucional e outras vezes resultantes de diferentes respostas a circunstâncias críticas anteriores representam a bigorna sobre a qual as futuras mudanças serão forjadas Tanto a peste negra quanto a expansão do comércio mundial após 1600 constituíram circunstâncias críticas significativas para as potências europeias foi a partir de sua interação com as diferentes instituições preexistentes em cada sociedade que surgiram grandes divergências Como os camponeses da Europa Ocidental possuíam em 1346 mais poder e autonomia do que no Leste Europeu a peste negra conduziu à dissolução do feudalismo na primeira e a segunda servidão no segundo Como a Europa Ocidental e a Oriental tinham começado a se afastar no século XIV as novas oportunidades econômicas que foram despontando nos séculos XVII XVIII e XIX teriam também implicações essencialmente distintas para as duas metades do continente Como em 1600 o jugo da Coroa era mais leve na Inglaterra do que na França e na Espanha o comércio atlântico preparou o terreno para a criação de novas instituições com maior pluralismo na Inglaterra ao mesmo tempo em que fortaleceu os monarcas francês e espanhol OS RUMOS CONTINGENTES DA HISTÓRIA Os resultados dos acontecimentos durante circunstâncias críticas vão depender do peso da história à medida que as instituições econômicas e políticas moldam o equilíbrio de poder e delineiam o que é viável politicamente O resultado final porém será contingente e não sujeito a qualquer tipo de predeterminação histórica O percurso exato do desenvolvimento institucional durante esses períodos se dará de acordo com qual das forças em conflito sairá vitoriosa que grupos serão capazes de constituir coalizões eficazes e que líderes conseguirão estruturar os acontecimentos em benefício próprio O papel da casualidade pode ser ilustrado pelas origens das instituições políticas inclusivas na Inglaterra Não somente nada havia de preestabelecido na vitória dos grupos que se bateram pela limitação do poder da Coroa e por instituições mais pluralistas na Revolução Gloriosa de 1688 como todo o caminho que conduziu a tal revolução política estava à mercê de acontecimentos fortuitos Venceu quem venceu graças à circunstância crítica decorrente da ascensão do comércio atlântico que enriqueceu e encheu de ânimo os comerciantes que faziam oposição à Coroa Um século antes contudo nada menos óbvio do que a perspectiva de que a Inglaterra pudesse ter qualquer possibilidade de vir a dominar os mares colonizar vasta parte do Caribe e da América do Norte ou apoderarse de tão significativa parcela do lucrativo comércio com as Américas e o Oriente Nem Elizabeth I nem qualquer dos Tudor que a antecederam no trono haviam construído uma Marinha poderosa e unificada A Marinha inglesa dependia de mercenários e navios mercantes independentes o que a tornava muito menos respeitável do que a Armada Espanhola Entretanto os lucros do comércio atlântico atraíram os mercenários pondo em xeque o monopólio hispânico dos mares Em 1588 os espanhóis resolveram dar um basta a tais desafios ao seu domínio bem como às interferências inglesas nos Países Baixos espanhóis que na época batiamse com a Espanha por sua independência O monarca espanhol Filipe II enviou sua poderosa Armada comandada pelo Duque de MedinaSidônia O resultado óbvio para muitos era que os espanhóis esmagariam os ingleses consolidando seu monopólio do Atlântico e provavelmente derrubariam Elizabeth I talvez mesmo adquirindo em última instância o controle das Ilhas Britânicas O que se deu porém foi inteiramente distinto O mau tempo e os erros estratégicos do duque que fora encarregado do comando da frota na última hora devido ao falecimento de um comandante mais experiente fizeram a Armada espanhola perder a vantagem Contrariando todas as probabilidades os ingleses destruíram boa parte da esquadra de seus mais poderosos adversários O Oceano Atlântico estava agora aberto aos ingleses em termos mais igualitários Sem essa improvável vitória dos ingleses a cadeia de acontecimentos que criariam a circunstância crítica transformadora e engendrariam as instituições políticas pluralistas da Inglaterra pós1688 jamais teria sido posta em movimento O Mapa 9 mostra o rastro de naufrágios espanhóis durante a perseguição à Armada ao redor das Ilhas Britânicas Evidentemente ninguém em 1588 poderia prever as consequências da feliz vitória inglesa Provavelmente poucos compreenderam na época que o ocorrido constituiria uma circunstância crítica que por sua vez daria origem a uma grande revolução política um século depois Não se presuma porém que determinada circunstância crítica vai necessariamente se desdobrar em uma bemsucedida revolução política ou em mudanças para melhor A história é repleta de exemplos de revoluções e movimentos radicais que substituíram uma tirania por outra em um padrão que o sociólogo alemão Robert Michels alcunhou de lei de ferro da oligarquia uma forma particularmente perniciosa de círculo vicioso Oceano Atlântico Irlanda Manchester Leeds ReinoUnido Birmingham Castelo de Windsor Runnymede Brixham Bélgica França Andorra Portugal Espanha Gibraltar Fronteiras atuais Rotas da Armada Naufrágios Mapa 9 Armada Espanhola naufrágios e pontoschave que criaram a reviravolta O fim do colonialismo nas décadas que se seguiram à Segunda Guerra Mundial gerou circunstâncias críticas para muitas das excolônias Entretanto na maioria dos casos na África subsaariana e em muitos da Ásia os governos pósindependência meteram no bolso uma página do livro de Robert Michels e dedicaramse a repetir e intensificar os abusos perpetrados por seus predecessores em geral estreitando ainda mais a distribuição de poder político desmantelando restrições aos poderosos e solapando os já pífios incentivos proporcionados pelas instituições econômicas aos investimentos e progresso econômico Apenas em alguns poucos casos em sociedades como a de Botsuana ver páginas 313320 as circunstâncias críticas foram usadas para deflagrar um processo de transformação política e econômica que preparou o terreno para o crescimento Do mesmo modo as circunstâncias críticas podem acarretar uma guinada em direção a instituições extrativistas em vez de um afastamento As instituições inclusivas embora contem com seu próprio mecanismo de retroalimentação o círculo virtuoso também podem reverter seu curso e tornarse paulatinamente mais extrativistas em virtude de desafios no seu decorrer e se isso acontecerá ou não será de novo casual A República Veneziana como veremos no Capítulo 6 deu largos passos rumo a instituições políticas e econômicas inclusivas no período medieval porém enquanto tais instituições foram pouco a pouco se fortalecendo na Inglaterra após a Revolução Gloriosa de 1688 em Veneza acabariam se configurando em instituições extrativistas sob o controle de uma elite reduzida de posse do monopólio tanto das oportunidades econômicas quanto do poder político COMPREENDENDO O CONTEXTO ATUAL A emergência de uma economia de mercado na Inglaterra do século XVIII baseada em instituições inclusivas e no crescimento econômico sustentado teria reflexos em todo o mundo e não menos por ter possibilitado à Inglaterra colonizar boa parte do globo Contudo se a influência do crescimento econômico inglês sem dúvida espalhouse pelo planeta as instituições econômicas e políticas por ele responsáveis não se difundiram de forma automática A disseminação da Revolução Industrial gerou diferentes efeitos sobre o mundo do mesmo modo que a peste negra teve consequências distintas sobre Oeste e Leste Europeu assim como a expansão do comércio atlântico teve impactos diferentes sobre Inglaterra e Espanha Foram as instituições em vigor nas várias partes do mundo que determinaram como cada uma seria afetada e tais instituições eram de fato distintas devido a pequenas diferenças que foram sendo ampliadas ao longo do tempo por circunstâncias críticas anteriores As discrepâncias institucionais e suas implicações tendem a persistir até o presente ainda que de maneira imperfeita em virtude dos círculos viciosos e virtuosos e são a chave para compreender tanto a emergência das desigualdades no mundo quanto a natureza do atual estado de coisas Certas regiões do mundo desenvolveram instituições muito próximas àquelas da Inglaterra ainda que por vias as mais diversas Foi o caso particularmente de algumas das colônias de povoamento europeias como Austrália Canadá e Estados Unidos muito embora suas instituições se encontrassem ainda em formação no decorrer da Revolução Industrial Como vimos no Capítulo 1 um processo iniciado com a fundação da colônia de Jamestown em 1607 e que culminou na Guerra de Independência e promulgação da Constituição americana compartilha muitas das mesmas características da longa batalha na Inglaterra entre Parlamento e monarquia uma vez que levou também a um Estado centralizado com instituições políticas pluralistas Assim a Revolução Industrial disseminouse rapidamente por vários países A Europa Ocidental que experimentou muitos dos mesmos processos históricos tinha instituições similares às inglesas na época da Revolução Industrial Havia diferenças sutis mas significativas entre a Inglaterra e o resto e por isso a Revolução Industrial deuse na Inglaterra e não na França A revolução criou então um contexto absolutamente inédito assim como uma série de desafios específicos para os regimes europeus que por sua vez deu origem a uma nova sucessão de conflitos que culminariam na Revolução Francesa Esta constituiria uma nova circunstância crítica que fez as instituições da Europa Ocidental irem ao encontro das inglesas ao passo que o Leste Europeu distanciavase ainda mais O resto do mundo seguiu outras trajetórias institucionais A colonização europeia abriu caminho para a divergência institucional nas Américas onde em contraste com as instituições inclusivas surgidas nos Estados Unidos e Canadá a América Latina caracterizouse pelas extrativistas o que explica os padrões de desigualdade observados no continente As instituições políticas e econômicas extrativistas implementadas pelos conquistadores hispânicos na América Latina perduraram condenando a maior parte da região à pobreza Argentina e Chile no entanto saíramse consideravelmente melhor do que a maior parte dos demais países latinoamericanos Sem uma grande população nativa nem riquezas minerais foram ambos negligenciados pelos espanhóis que preferiram concentrarse nas terras ocupadas pelas civilizações asteca maia e inca Não é coincidência que a área mais pobre da Argentina seja o noroeste único setor do país integrado à economia colonial espanhola Sua pobreza persistente e o legado de instituições extrativistas são análogos àqueles criados pela mita de Potosí na Bolívia e no Peru páginas 1213 A África foi a parte do mundo cujas instituições mostraramse menos capazes de tirar proveito das oportunidades propiciadas pela Revolução Industrial Durante pelo menos os últimos mil anos exceto por bolsões localizados e por períodos limitados de tempo a África ficou muito atrasada em relação ao resto do mundo em termos de tecnologia desenvolvimento político e prosperidade Nessa região do mundo os Estados centralizados se formaram muito tarde e com contornos muito tênues Onde efetivamente se constituíram tendiam a ser altamente absolutistas como o Congo e em geral logo entravam em colapso A África compartilha essa trajetória de falta de centralização com países como Afeganistão Haiti e Nepal que também têm se mostrado incapazes de impor a ordem em seus territórios e instaurar um quadro que se aproximasse minimamente da estabilidade e lhes permitisse alcançar o mais módico dos progressos econômicos Apesar de localizados em partes completamente distintas do mundo Afeganistão Haiti e Nepal têm muito em comum em termos institucionais com a maioria dos países da África subsaariana figurando portanto entre os mais pobres países do mundo hoje A transformação sofrida pelas instituições africanas até chegarem à sua atual forma extrativista mais uma vez ilustra o processo de diferenciação institucional pontuado por circunstâncias críticas só que dessa vez em geral com resultados altamente perversos sobretudo no período da expansão do tráfico de escravos através do Atlântico Surgiram novas oportunidades econômicas para o Reino do Congo com a chegada dos traficantes europeus O comércio de longa distância que mudou a face da Europa também modificou o Reino do Congo mas também aqui as divergências institucionais iniciais fizeram toda a diferença O absolutismo congolês transmutouse de um regime com total domínio da sociedade por meio de instituições econômicas extrativistas que se apropriavam da produção agrícola de seus cidadãos a um governo que escravizava e vendia em massa a sua população para os portugueses em troca de armas e artigos de luxo para a elite local As diferenças iniciais entre Inglaterra e Congo levaram na primeira à criação pelas novas oportunidades comerciais de longa distância de uma circunstância crítica no sentido de instituições políticas pluralistas ao mesmo tempo no segundo puseram fim a toda e qualquer esperança de extinção do absolutismo Em grande parte da África os lucros substanciais obtidos com o tráfico de escravos promoveram não só sua intensificação e a exacerbação da insegurança dos direitos de propriedade da população como também conflitos violentos e a destruição de muitas das instituições existentes em poucos séculos todo e qualquer traço de centralização do Estado foi revertido por completo e muitos dos Estados africanos estavam aniquilados Ainda que alguns Estados novos e às vezes poderosos tenham surgido para explorar o tráfico de escravos eram baseados no belicismo e na pilhagem A mesma circunstância crítica da descoberta das Américas que tanto ajudou a Inglaterra a desenvolver instituições inclusivas apenas tornou as instituições africanas ainda mais extrativistas Embora o tráfico de escravos estivesse basicamente encerrado a partir de 1807 o colonialismo europeu subsequente não só reverteu a incipiente modernização econômica em algumas partes do sul e do oeste da África como também eliminou qualquer possibilidade de reforma das instituições locais Por conseguinte mesmo fora de regiões como Congo Madagascar Namíbia e Tanzânia onde a pilhagem a violência generalizada e o genocídio eram a regra a África tinha poucas chances de alterar sua trajetória institucional Pior ainda as estruturas coloniais muniram o continente na década de 1960 de um legado institucional ainda mais complexo e pernicioso do que o dos primórdios do período colonial O desenvolvimento de instituições políticas e econômicas em muitas colônias africanas significou que em vez de gerar uma circunstância crítica propícia ao seu aprimoramento institucional a independência abriu uma brecha para que líderes inescrupulosos assumissem o poder e intensificassem a exploração até então promovida pelos colonialistas europeus Os incentivos políticos proporcionados por essas estruturas criaram um estilo de política que veio apenas reproduzir os padrões históricos de direitos de propriedade inseguros e ineficientes sob Estados com fortes tendências absolutistas mas não obstante desprovidos de qualquer autoridade centralizada sobre seus territórios A Revolução Industrial ainda não se disseminou pela África porque o continente atravessou um longo círculo vicioso de persistência e recriação de instituições políticas e econômicas extrativistas Botsuana é uma exceção Como veremos páginas 313320 no século XIX o Rei Khama avô do primeiro primeiroministro de Botsuana por ocasião da independência Seretse Khama deflagrou mudanças institucionais no sentido de modernizar as instituições políticas e econômicas de sua tribo Caso único tais mudanças não chegaram a ser destruídas durante o período colonial em parte graças à inteligente tática de Khama e outros chefes de desafiar a autoridade da metrópole e sua interrelação com a circunstância crítica gerada pela independência lançou as bases do êxito econômico e político do país Mais um caso de peculiaridades históricas discretas que fizeram a diferença Há uma tendência a encarar os acontecimentos históricos como consequências inevitáveis de forças arraigadas Contudo por mais ênfase que demos à criação de círculos viciosos e virtuosos pela história das instituições econômicas e políticas o acaso como salientamos no contexto do desenvolvimento das instituições inglesas sempre pode ser um fator Seretse Khama que foi estudar na Inglaterra na década de 1940 apaixonouse por Ruth Williams uma branca Diante disso o regime racista do apartheid sulafricano persuadiu o governo inglês a banilo do protetorado então chamado de Bechuanalândia cuja administração encontravase a cargo do Alto Comissário da África do Sul e ele abdicou da coroa Ao retornar para comandar a resistência anticolonialista tinha a firme intenção não de reforçar as instituições tradicionais mas de adaptálas ao mundo moderno Khama foi um homem extraordinário sem interesse no enriquecimento pessoal e devotado à construção de seu país A maioria dos demais países africanos não teve a mesma sorte Os dois aspectos tanto o desenvolvimento histórico das instituições em Botsuana quanto os fatores contingentes que levaram à sua edificação fizeram a diferença em vez de fazer com que fossem destruídas ou distorcidas como aconteceu no resto da África NO SÉCULO XIX um absolutismo não muito distinto daquele que imperava na África ou no Leste Europeu bloqueava o caminho da industrialização na maior parte da Ásia Na China o Estado era marcadamente absolutista e industriais mercadores e cidades independentes não existiam ou eram muito mais fracos em termos políticos A China era uma grande potência naval tendo se envolvido em volumoso comércio de longa distância muitos séculos antes dos europeus Entretanto havia deixado os oceanos justamente no momento errado quando os imperadores Ming chegaram à conclusão no final do século XIV e início do XV de que a intensificação do comércio de longa distância e a destruição criativa que daí adviria talvez lhes ameaçasse o trono Na Índia a diferenciação institucional funcionou de outra maneira levando ao desenvolvimento de um sistema de castas de rigidez ímpar que restringia o funcionamento dos mercados e a alocação de mão de obra pelos diferentes ofícios com rigor muito maior que o da ordem feudal na Europa medieval além de sustentar outro forte regime absoluto sob o domínio mogol A maioria dos países europeus contava com sistemas similares na Idade Média Certos sobrenomes anglosaxões atuais como Baker Cooper e Smith são descendentes diretos das categorias profissionais hereditárias Os Bakers padeiros faziam pão os Coopers tanoeiros fabricavam tonéis os Smiths ferreiros trabalhavam o ferro Entretanto essas categorias nunca foram tão rígidas quanto a divisão de castas indiana e foram aos poucos perdendo o sentido como indicadoras da ocupação de cada um Na Índia ainda que houvesse mercadores que se dedicavam ao comércio por todo o Oceano Índico e tenha surgido uma ativa indústria têxtil o sistema de castas e o absolutismo mogóis constituíram sérios impedimentos ao desenvolvimento de instituições inclusivas econômicas no país No século XIX a situação tornouse ainda menos propícia à industrialização visto que a Índia tornouse uma colônia de exploração da Inglaterra A China nunca chegou a ser formalmente colonizada por uma potência europeia muito embora depois da derrota para os ingleses nas guerras do ópio entre 1839 e 1842 e de novo mais adiante entre 1856 e 1860 os chineses tivessem de assinar uma série de tratados humilhantes permitindo a entrada das exportações europeias À medida que a China a Índia e outras regiões foram se mostrando incapazes de tirar vantagem das oportunidades comerciais e industriais a Ásia exceto pelo Japão foi ficando para trás enquanto a Europa Ocidental ganhava a dianteira a todo vapor O CURSO DOS RUMOS institucionais seguidos pelos japoneses no século XIX outra vez ilustra a interação entre as circunstâncias críticas e diferenças sutis geradas pela diferenciação institucional O Japão como a China vivia sob um regime absolutista A família Tokugawa subiu ao poder em 1600 e assumiu o controle de um sistema feudal que também baniu o comércio internacional O Japão também enfrentou uma circunstância crítica criada pela intervenção ocidental quando quatro navios de guerra americanos sob o comando de Matthew C Perry adentraram a Baía de Edo em julho de 1853 e impuseram concessões comerciais análogas àquelas arrancadas aos chineses pela Inglaterra nas guerras do ópio Todavia essa circunstância crítica teve desdobramentos muito distintos no Japão Apesar de sua proximidade e frequência das interações no século XIX as instituições de China e Japão já se haviam diferenciado Embora o governo Tokugawa no Japão fosse absolutista e extrativista sua ascendência sobre os principais líderes dos demais domínios feudais era tênue e passível de questionamentos Apesar das rebeliões de camponeses e de insurreições civis na China o absolutismo era mais forte e a oposição menos organizada e autônoma Não se encontravam aí os equivalentes a líderes de outros domínios capazes de fazer frente ao regime absolutista do imperador e traçar uma alternativa institucional Essa peculiaridade institucional sob vários aspectos insignificante se comparada às diferenças que separavam a China e o Japão da Europa Ocidental teve consequências decisivas durante a circunstância crítica engendrada pela entrada forçada de ingleses e americanos A China prosseguiu em seu caminho absolutista após as guerras do ópio ao passo que a ameaça americana consolidou a oposição ao governo Tokugawa no Japão e desencadeou uma revolução política a Restauração Meiji como veremos no Capítulo 10 Essa revolução política japonesa possibilitou o desenvolvimento de novas instituições políticas e econômicas inclusivas lançando as bases para o acelerado crescimento japonês subsequente ao passo que a China se arrastava sob o absolutismo A reação japonesa à ameaça representada pelos navios de guerra americanos deflagrando um processo de transformação institucional fundamental nos ajuda a entender outro aspecto do nosso contexto atual as transições da estagnação para o rápido crescimento Coreia do Sul Taiwan e por fim a China alcançaram índices vertiginosos de crescimento econômico desde a Segunda Guerra Mundial percorrendo uma trajetória similar àquela outrora descrita pelos japoneses Em cada um desses casos o crescimento foi precedido por mudanças históricas nas instituições econômicas desses países ainda que nem sempre em suas instituições políticas como revela o caso chinês A lógica de como episódios de crescimento acentuado encontram um fim abrupto e entram em reversão também está relacionada Do mesmo modo como medidas decisivas em favor de instituições econômicas inclusivas podem provocar rápido crescimento econômico um brusco afastamento dessas instituições pode levar à estagnação econômica Com frequência ainda maior porém o colapso de um surto de crescimento como ocorreu na Argentina ou na União Soviética é resultado do esgotamento de um episódio de crescimento sob instituições extrativistas Como vimos isso pode ser fruto de disputas internas em torno dos despojos do extrativismo fazendo o regime ir a pique ou do limite imposto ao crescimento sustentado pela inerente falta de inovação e destruição criativa sob instituições extrativistas O modo como os soviéticos se chocaram contra esses limites será discutido em mais detalhes no próximo capítulo SE AS INSTITUIÇÕES POLÍTICAS e econômicas da América Latina ao longo dos últimos 500 anos foram moldadas pelo colonialismo espanhol as do Oriente Médio sofreram a influência do colonialismo otomano Em 1453 os otomanos comandados pelo sultão Maomé II capturaram Constantinopla e a adotaram como capital No resto do século conquistaram uma vasta fatia dos Bálcãs e a maior parte do restante da Turquia Na primeira metade do século XVI o domínio otomano estendeuse sobre todo o Oriente Médio e o Norte da África Em 1566 ano da morte do sultão Solimão I alcunhado de Magnífico seu império ia desde a Tunísia no extremo oeste passando pelo Egito chegando a Meca na Península Arábica até o atual Iraque O Estado otomano era absolutista o sultão prestava contas a poucos e não dividia o poder com ninguém As instituições econômicas impostas por eles eram extremamente extrativistas Não havia propriedade privada da terra que a rigor pertencia toda ao Estado A carga tributária que incidia sobre a terra e a produção agrícola junto com os despojos das guerras constituía a principal fonte de receita do governo Não obstante o Estado otomano não exercia sobre o Oriente Médio o mesmo grau de controle que tinha sobre sua terra natal a Anatólia nem aquele do Estado espanhol sobre a sociedade latinoamericana sofrendo constantes desafios de parte dos beduínos e outras potências tribais na Península Arábica Faltavamlhe tanto a capacidade de impor uma ordem estável sobre a maior parte do Oriente Médio como também recursos administrativos para a arrecadação dos impostos Sendo assim estes foram delegados o direito de coletar impostos foi vendido a indivíduos autorizados a cobrálos como bem entendessem Esses cobradores de impostos tornaramse autônomos e poderosos A carga tributária nos territórios do Oriente Médio era altíssima variando entre metade ou dois terços de toda a produção agrícola Grande parte dessa renda era retida nas mãos dos cobradores Como o Estado otomano mostrouse incapaz de implementar uma ordem estável na região os direitos de propriedade eram inseguros e a ilegalidade e o banditismo grassavam sob a forma de grupos armados que disputavam o controle local Na Palestina por exemplo a situação era tão nefasta que a partir do final do século XVI os camponeses abandonaram as terras mais férteis e deslocaramse para as montanhas que lhes proporcionavam mais proteção contra os bandidos Nas áreas urbanas do Império Otomano as instituições econômicas extrativistas não eram menos esmagadoras O comércio encontravase sob o controle estatal e os vários ofícios estavam submetidos à rígida regulamentação de guildas e monopólios Em consequência na época da Revolução Industrial as instituições econômicas vigentes no Oriente Médio eram extrativistas e a economia da região estagnouse Na década de 1840 os otomanos tentaram reformar suas instituições por exemplo revertendo o mecanismo de cobradores individuais e submetendo grupos autônomos locais Todavia o absolutismo persistiria até o fim da Primeira Guerra Mundial e as tentativas de reforma seriam frustradas pelos habituais temores em relação à destruição criativa e pela ansiedade das elites dominantes em relação à possibilidade de perda econômica ou política Embora os reformadores otomanos falassem na adoção de direitos à propriedade privada da terra com vistas ao aumento da produtividade agrícola o status quo se manteve devido ao desejo de controle político e tributação À colonização otomana sucedeuse a europeia após 1918 Uma vez encerrado o controle europeu instalouse a mesma dinâmica que vimos na África subsaariana com as instituições coloniais extrativistas agora nas mãos das elites independentes Em alguns casos como a monarquia jordaniana esses setores da sociedade foram uma criação direta das potências coloniais o que também ocorreu com frequência na África como veremos Os países do Oriente Médio desprovidos de petróleo hoje têm níveis de renda próximos aos dos países latinoamericanos pobres mesmo não tendo sofrido com forças geradoras de miséria como o tráfico de escravos e tendo se beneficiado por um período mais longo dos fluxos de tecnologia provenientes da Europa Na Idade Média o próprio Oriente Médio também era uma região relativamente avançada do mundo em termos econômicos No entanto hoje embora não seja tão miserável quanto a África a maior parte de sua população ainda vive na pobreza VIMOS QUE NEM as teorias baseadas na ignorância ou na ordem cultural nem em fatores geográficos são úteis para explicar o atual estado de coisas que nos cerca pois não oferecem uma explicação satisfatória para os padrões de desigualdade mundial isto é o fato de que o processo de disparidade econômica teve início com a Revolução Industrial na Inglaterra durante os séculos XVIII e XIX difundindose em seguida pela Europa Ocidental e colônias de povoamento europeias a persistente divergência entre as diversas partes das Américas a pobreza da África e do Oriente Médio as diferenças entre Europa Ocidental e Leste Europeu as transições da estagnação para a expansão e as interrupções por vezes abruptas de surtos de crescimento Nossa teoria institucional sim Nos capítulos restantes vamos discutir de maneira mais minuciosa o funcionamento dessa teoria institucional e ilustrar o amplo leque de fenômenos que ela pode cobrir das origens da Revolução Neolítica ao colapso de várias civilizações seja devido aos limites intrínsecos do crescimento sob instituições extrativistas ou à reversão de uns poucos passos titubeantes em direção a maior inclusão Veremos como e por que medidas decisivas rumo a instituições políticas inclusivas foram tomadas durante a Revolução Gloriosa na Inglaterra examinando mais especificamente os seguintes fatores Como as instituições inclusivas nasceram da interrelação da circunstância crítica produzida pelo comércio atlântico e a natureza das instituições inglesas já existentes Como essas instituições persistiram e fortaleceramse a ponto de lançar as bases da Revolução Industrial graças em parte ao círculo virtuoso e em parte a certos acasos felizes Como muitos regimes dominados por instituições absolutistas e extrativistas opuseram resistência ferrenha à difusão de novas tecnologias deflagrada pela Revolução Industrial Como os próprios europeus anularam toda e qualquer possibilidade de crescimento econômico em muitas das regiões do mundo que conquistaram Como o círculo vicioso e a lei de ferro da oligarquia geraram uma tendência irresistível à persistência das instituições extrativistas fazendo as regiões para as quais a Revolução Industrial não se disseminou originalmente permanecerem relativamente pobres Por que a Revolução Industrial e outras novas tecnologias não se difundiram e dificilmente se difundirão para regiões do mundo em que hoje ainda não se atingiu um grau mínimo de centralização do Estado Nossa discussão mostrará também que determinadas regiões que lograram transformar suas instituições no sentido de um maior grau de inclusão como Japão ou França ou que impediram o estabelecimento de instituições extrativistas como Estados Unidos ou Austrália mostraramse mais receptivas à Revolução Industrial e saltaram à frente das demais Como na Inglaterra o processo nem sempre foi suave e ao longo do caminho foram superados muitos desafios às instituições inclusivas às vezes devido à dinâmica do círculo virtuoso às vezes graças aos rumos contingentes da história Por fim debateremos também como o fracasso de certos países hoje é profundamente influenciado por suas histórias institucionais quanto de suas políticas baseiase em hipóteses incorretas e é potencialmente danoso e como os países ainda são capazes de aproveitar as circunstâncias críticas para romper paradigmas reformar suas instituições e enveredar por caminhos conducentes a maior prosperidade A 5 EU VI O FUTURO E ELE FUNCIONA O CRESCIMENTO SOB INSTITUIÇÕES EXTRATIVISTAS EU VI O FUTURO S DIFERENÇAS INSTITUCIONAIS desempenham papel crítico na explicação do crescimento econômico através dos tempos Contudo se a maioria das sociedades ao longo da história baseiase em instituições políticas e econômicas extrativistas será que o crescimento jamais ocorrerá Claro que não As instituições extrativistas por sua própria lógica têm de gerar riqueza que possa ser extraída Um governante que monopolize o poder político e esteja no controle de um Estado centralizado pode introduzir algum grau de lei e ordem e um sistema de regras bem como estimular a atividade econômica Entretanto o crescimento sob instituições extrativistas é de natureza distinta daquele fomentado por instituições inclusivas Sobretudo não será um crescimento sustentado que demande mudança tecnológica mas se baseará nas tecnologias existentes A trajetória econômica da União Soviética constitui uma vívida ilustração de como a autoridade e incentivos oferecidos pelo Estado podem produzir um surto de crescimento econômico sob instituições extrativistas e como esse tipo de crescimento acaba se esgotando e entrando em colapso A PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL havia chegado ao fim e as potências vitoriosas e derrotadas reuniramse no grande Palácio de Versalhes perto de Paris para definir os parâmetros da paz Entre os participantes destacavase Woodrow Wilson presidente dos Estados Unidos Uma ausência notória foi a de qualquer representação da Rússia O velho regime czarista fora derrubado pelos bolcheviques em outubro de 1917 Desde então grassava uma guerra civil entre Vermelhos os bolcheviques e Brancos Ingleses franceses e americanos enviaram forças expedicionárias para combater os bolcheviques Uma missão comandada por um jovem diplomata William Bullitt e o veterano intelectual e jornalista Lincoln Steffens foi enviada a Moscou para conversar com Lênin e tentar compreender as intenções dos bolcheviques e como chegar a algum acordo com eles Steffens fizera fama como iconoclasta um jornalista investigativo que se dedicava à denúncia dos males do capitalismo nos Estados Unidos Estivera na Rússia na época da revolução Sua presença tinha o objetivo de conferir credibilidade à missão e fazer não parecer tão hostil Os dois retornaram com o esboço de uma proposta de Lênin com relação às demandas da recémcriada União Soviética para a paz Steffens estava desconcertado com o que considerava o grande potencial do regime soviético A Rússia soviética recordaria ele em sua autobiografia de 1931 era um governo revolucionário com planejamento evolucionário Seu plano não era enfrentar males como pobrezas e riquezas subornos privilégios tiranias e guerras de maneira direta mas buscar e eliminar suas causas Haviam implementado uma ditadura com o apoio de uma pequena minoria bem preparada para promover e manter por algumas gerações um rearranjo científico de forças econômicas que produziriam primeiro uma democracia econômica e depois política Ao voltar de sua missão diplomática Steffens foi visitar seu velho amigo o escultor Jo Davidson e encontrouo trabalhando em um busto do rico financista Bernard Baruch Quer dizer que você foi à Rússia não é perguntou Baruch Steffens respondeu Fui até o futuro E funciona Mais tarde ele aprimoraria seu adágio formulandoo de um modo que entraria para a história Eu vi o futuro e ele funciona Até princípios da década de 1980 muitos ocidentais continuavam vendo o futuro na União Soviética e ainda acreditavam que estava funcionando Em certo sentido estava mesmo ou pelo menos funcionou durante algum tempo Lênin havia morrido em 1924 e em 1927 Joseph Stálin havia consolidado seu domínio do país Promoveu o expurgo de seus opositores e lançou um programa para a rápida industrialização do país Para tanto municiou o Comitê Estatal de Planejamento Gosplan criado em 1921 O Gosplan foi responsável pela elaboração do primeiro Plano Quinquenal em vigor entre 1928 e 1933 O crescimento econômico à Stálin era simples consistia em desenvolver a indústria por determinação do governo obtendo os recursos necessários para tanto mediante a imposição de uma carga tributária esmagadora sobre a agricultura Como o Estado comunista não dispunha de um sistema eficaz de arrecadação Stálin optou por coletivizar a agricultura processo que implicou a abolição dos direitos de propriedade privada da terra e a aglomeração de toda a população rural em gigantescas fazendas coletivas dirigidas pelo Partido Comunista Assim ficou bem mais fácil para Stálin se apropriar da produção agrícola e usála para alimentar todos os trabalhadores que estavam construindo e operando as novas fábricas todavia as consequências para o povo do campo foram desastrosas As fazendas coletivas eram completamente destituídas de incentivos para que as pessoas se empenhassem e a produção sofreu uma queda vertiginosa Era extraída parcela tão grande da produção que não sobrava o suficiente para comer e a fome se instalou No fim das contas provavelmente seis milhões de pessoas morreram de fome enquanto centenas de milhares de outras foram assassinadas ou deportadas para a Sibéria durante o processo de coletivização compulsória Nem a indústria recémcriada nem as fazendas coletivizadas eram eficientes economicamente no sentido de fazerem o melhor uso possível dos recursos de que a União Soviética dispunha Parece uma receita de estagnação e desastre econômicos senão rematado colapso No entanto a União Soviética cresceu rapidamente e não é difícil entender por quê Permitir que cada um tome suas próprias decisões por intermédio dos mercados é a melhor maneira de uma sociedade gerir seus recursos com eficiência Quando pelo contrário o Estado ou uma pequena elite assumem o controle de todos esses recursos nem os incentivos corretos serão criados nem haverá alocação eficaz das competências e talentos das pessoas Em alguns casos porém a produtividade da mão de obra e do capital podem ser tão mais altos em determinado setor ou atividade como a indústria pesada na União Soviética que mesmo um processo imposto de cima para baixo sob instituições extrativistas que alocam recursos para aquele setor é capaz de gerar crescimento Como vimos no Capítulo 3 as instituições extrativistas nas ilhas do Caribe como Barbados Cuba Haiti e Jamaica lograram fomentar níveis de receita relativamente elevados por alocarem recursos para a produção de açúcar mercadoria cobiçada em todo o mundo A produção de açúcar baseada na escravidão por certo nada tinha de eficiente e não havia mudança tecnológica ou destruição criativa nessas sociedades mas isso não as impediu de alcançar alguma medida de crescimento sob as instituições extrativistas Na União Soviética deuse situação similar com a indústria desempenhando o papel da canade açúcar no Caribe O crescimento industrial na União Soviética foi facilitado também por seu grau de atraso tecnológico em relação ao que havia disponível na Europa e Estados Unidos de modo que se podiam obter grandes ganhos pela realocação de recursos para a indústria ainda que tudo se desse de maneira ineficiente e imposta Até 1928 a maioria dos russos vivia no campo A tecnologia usada pelos camponeses era primária e poucos eram os incentivos à produtividade Com efeito os derradeiros vestígios do feudalismo russo só foram erradicados pouco antes da Primeira Guerra Mundial Um imenso potencial econômico irrealizado foi despertado ao realocarse tamanho volume de mão de obra da agricultura para a indústria A industrialização stalinista foi uma maneira brutal de liberar esse potencial Por decreto Stálin desviou aqueles recursos tão mal empregados para a indústria onde seriam utilizados de forma mais produtiva ainda que a indústria em si fosse organizada de maneira muito ineficiente sobretudo se comparada ao que se poderia ter alcançado De fato entre 1928 e 1960 a renda nacional cresceu a uma taxa de 6 ao ano provavelmente o mais agressivo surto de crescimento econômico já registrado até então Esse rápido crescimento econômico foi consequência não de uma mudança tecnológica mas da realocação de mão de obra e da acumulação de capital por meio da criação de novas ferramentas e fábricas O crescimento foi tão abrupto que mesmerizou gerações de ocidentais não só Lincoln Steffens A Agência Central de Inteligência americana a CIA ficou mesmerizada Os próprios líderes soviéticos deixaramse fascinar como aconteceu com Nikita Khrushchev que se vangloriou em 1956 num discurso a diplomatas ocidentais Vamos enterrar vocês o Ocidente Ainda em 1977 um economista inglês defendia em um livro de referência muito considerado nos meios acadêmicos que as economias ao estilo soviético eram superiores às capitalistas em termos de crescimento econômico sendo capazes de proporcionar emprego pleno e estabilidade de preços e até de injetar na população motivações altruístas O pobre e velho capitalismo ocidental cansado de guerra só se saía melhor mesmo na concessão de liberdades políticas Com efeito o livro didático mais utilizado nas faculdades de Economia de autoria do ganhador do Prêmio Nobel Paul Samuelson previa repetidamente a iminente preponderância econômica da União Soviética Na edição de 1961 Samuelson previa que a renda soviética teria ultrapassado a americana possivelmente em 1984 mas mais provavelmente até 1997 Na edição de 1980 houve ligeira alteração na análise sendo as duas datas adiadas respectivamente para 2002 e 2012 Embora as políticas de Stálin e das lideranças soviéticas posteriores tenham logrado gerar um rápido crescimento econômico este não se revelou sustentado Na década de 1970 o crescimento econômico havia parado A mais importante lição a se tirar daí é que as instituições extrativistas são incapazes de gerar uma mudança tecnológica sustentada por dois motivos falta de incentivos econômicos e resistência das elites Ademais uma vez que todos os recursos tão mal utilizados haviam sido realocados para a indústria não restavam maiores ganhos econômicos adicionais a alcançar por decreto Nesse ponto o sistema soviético chegou a um impasse com a falta de inovação e a insuficiência de incentivos econômicos estorvando a continuidade do progresso O único campo em que os soviéticos conseguiram efetivamente manter algum grau de inovação foi graças a um esforço hercúleo na tecnologia militar e aeroespacial Assim conseguiram levar a primeira cadela Laika e o primeiro homem Yuri Gagárin ao espaço além de deixar ao mundo o AK47 como um de seus legados O Gosplan era o supostamente todopoderoso órgão incumbido do planejamento central da economia soviética Um dos benefícios da sequência de planos quinquenais escritos e administrados pelo Gosplan seria em teoria o longo horizonte de tempo necessário à inovação e ao investimento racionais Na prática porém o que era de fato implementado na indústria soviética pouca relação guardava com os planos quinquenais que eram revisados ou reescritos com frequência ou ignorados O desenvolvimento da indústria se deu na base de comandos de Stálin e do Politburo que volta e meia mudavam de ideia e não raro reviam por completo suas decisões anteriores Todos os planos eram classificados como esboços ou preliminares Uma única cópia de um plano considerado final aquele referente à indústria leve em 1939 chegou a ver a luz do dia O próprio Stálin comentou em 1937 que só mesmo os burocratas podem acreditar que o planejamento do trabalho termina com a criação do plano A criação do plano é apenas o começo Os rumos reais tomados pelo plano emergem somente depois de ele ser concluído Stálin queria maximizar sua liberdade para recompensar as pessoas ou grupos que lhe eram politicamente fieis e punir os que não fossem Quanto ao Gosplan sua função principal era fornecer informações a Stálin para que ele melhor pudesse monitorar seus amigos e inimigos Na verdade o órgão evitava tomar decisões Afinal quem tomasse uma decisão malograda poderia ser condenado ao pelotão de fuzilamento Melhor evitar qualquer responsabilidade Um exemplo do que podia acontecer com quem levasse o trabalho a sério demais em vez de ter a sensibilidade de adivinhar os desejos do Partido Comunista é o caso do censo soviético de 1937 À medida que os resultados parciais iam chegando foi ficando claro que apontariam para uma população de cerca de 162 milhões muito menos do que os 180 milhões antevistos por Stálin e de fato abaixo dos 168 milhões que o próprio Stálin anunciara em 1934 O censo de 1937 era o primeiro realizado desde 1926 e portanto o primeiro após as grandes fomes e os expurgos do começo da década de 1930 Os números corretos da população refletiam esses acontecimentos A reação de Stálin foi mandar prender e deportar para a Sibéria ou matar os organizadores do censo Ordenou então a realização de outro ocorrido em 1939 Dessa vez os recenseadores acertaram descobriram que a União Soviética contava com 171 milhões de habitantes Stálin entendia que na economia soviética as pessoas não dispunham de maiores incentivos para se empenhar Uma resposta natural seria introduzir tais incentivos o que ele às vezes fazia por exemplo direcionando víveres para as áreas onde a produtividade havia caído a fim de recompensar os êxitos Ademais já em 1931 ele havia abandonado a ideia de criar homens e mulheres socialistas que trabalhariam sem nenhum incentivo monetário Em um discurso célebre criticou a perpetração da igualdade e dali por diante não só diferentes ocupações passaram a contar com remunerações distintas como também se adotou um sistema de bonificação É instrutivo entender como era o seu funcionamento Normalmente uma empresa sob planejamento central precisava cumprir determinada meta de produção estabelecida pelo plano ainda que os planos fossem com frequência renegociados e alterados A partir da década de 1930 os trabalhadores passaram a receber bônus caso os resultados almejados fossem atingidos Os prêmios podiam ser bastante altos chegando por exemplo até 37 do salário dos gerentes ou engenheiros seniores Seu pagamento porém acarretava todo tipo de desestímulo à mudança tecnológica visto que qualquer inovação desviaria recursos da produção atual implicando o risco do não cumprimento das metas de produção e o não pagamento dos bônus Ademais as metas de produção em geral baseavamse nos níveis de produção anteriores o que constituía enorme incentivo para jamais expandir a produção o que só significaria ter de produzir mais no futuro já que as metas dali por diante seriam ampliadas Manter um desempenho mediano era sempre a melhor maneira de atingir as metas e assegurar a bonificação O fato de esta ser mensal também mantinha todos focados no presente ao passo que toda inovação implica fazer algum sacrifício hoje para obter mais amanhã Mesmo quando bônus e incentivos eram eficazes na promoção da mudança de comportamento acabavam criando outras dificuldades O planejamento central não era uma boa alternativa ao que o economista Adam Smith denominara no século XVIII de mão invisível do mercado Quando o plano era formulado em termos de toneladas de lâminas de aço o aço era fabricado mais pesado Quando era expresso em termos da área das lâminas estas saíam mais finas Quando a meta da fabricação de lustres era colocada em toneladas os lustres eram tão pesados que mal conseguiam susterse nos tetos Na década de 1940 as autoridades do país ainda que não seus admiradores no Ocidente tinham plena consciência desses incentivos perversos Os líderes soviéticos agiam como se se tratassem de problemas técnicos que pudessem ser corrigidos Por exemplo substituíram o pagamento de bônus baseados em metas de produção pela permissão para que as empresas reservassem parte dos lucros para as bonificações Contudo a motivação do lucro revelouse não mais encorajadora da inovação do que aquela baseada em metas de produtividade O sistema de preços a partir dos quais eram calculados os lucros era quase completamente desconectado com o valor de eventuais inovações ou de novas tecnologias Ao contrário das economias de mercado os preços na União Soviética eram definidos pelo governo mantendo pois pouca ou nenhuma relação com o valor Para criar incentivos mais específicos a União Soviética introduziu então bônus explícitos para a inovação em 1946 Desde 1918 reconheciase o princípio de que o inovador deveria receber recompensas monetárias por sua inovação mas estas eram demasiado pequenas e sem relação com o valor da nova tecnologia Essa situação só mudaria em 1956 quando se estipulou que a recompensa fosse proporcional à produtividade da inovação Entretanto uma vez que a produtividade era calculada em termos do benefício econômico mensurado de acordo com o sistema de preços existente continuou não havendo incentivos significativos para inovar Seria possível encher páginas e páginas com exemplos dos incentivos perversos gerados por tais esquemas Por exemplo o fato de o montante total do fundo para o pagamento de bônus por inovação ser limitado pela massa salarial de cada empresa automaticamente reduzia o incentivo para produzir ou adotar qualquer inovação que pudesse poupar mão de obra O foco nas diferentes regras e esquemas de bonificação tende a mascarar os problemas inerentes ao sistema Enquanto a autoridade e o poder políticos estivessem nas mãos do Partido Comunista seria impossível qualquer mudança de fundo nos incentivos básicos com que a população lidava quer se tratasse ou não de bônus Desde a sua concepção o partido usara não só cenouras como iscas mas também chibatas e porretes para conseguir o que queria Com a produtividade na economia não foi diferente Todo um conjunto de leis veio criar delitos penais para os trabalhadores que fossem considerados indolentes Em junho de 1940 por exemplo uma lei enquadrou o absenteísmo definido como qualquer ausência não autorizada de 20 minutos ou mesmo a morosidade no trabalho como delito penal passível de pena de seis meses de trabalhos forçados e um corte de 25 na remuneração Foi introduzida toda sorte de punições similares aplicadas com espantosa assiduidade Entre 1940 e 1955 36 milhões de pessoas cerca de um terço da população adulta foram julgados culpados de delitos dessa ordem Destes 15 milhões foram presos e 250 mil fuzilados A qualquer ano dado haveria um milhão de adultos presos por violações trabalhistas para não falar nos 25 milhões de pessoas exilados por Stálin nos gulags da Sibéria E mesmo assim de nada adiantou Por mais que você possa transferir alguém para uma fábrica não há como obrigar ninguém a pensar e ter boas ideias à força de ameaças de morte A coação nesse nível pode até ter engendrado alta produção de açúcar em Barbados ou na Jamaica mas não poderia compensar a falta de incentivos em uma moderna economia industrial A impossibilidade de incorporar incentivos verdadeiramente eficazes à econômica centralizada não foi devida a erros técnicos no planejamento do sistema de bonificação Era intrínseca ao método por meio do qual fora obtido o crescimento de natureza extrativista fruto de decreto governamental que só poderia solucionar alguns problemas econômicos básicos Contudo para estimular o crescimento econômico sustentado seria preciso que os indivíduos fizessem uso de seus talentos e suas ideias o que jamais seria possível no modelo econômico soviético Seria necessário que os governantes da União Soviética abdicassem das instituições econômicas extrativistas contudo tal iniciativa poria em risco seu poder político Com efeito quando Mikhail Gorbachev começou a abandonar as instituições econômicas extrativistas a partir de 1987 o poder do Partido Comunista caiu por terra arrastando consigo toda a União Soviética A UNIÃO SOVIÉTICA conseguiu gerar um crescimento abrupto mesmo sob instituições extrativistas porque os bolcheviques erigiram um poderoso Estado centralizado e o usaram para alocar recursos para a indústria Todavia como em todos os casos de crescimento sob instituições extrativistas o processo excluía a possibilidade de mudança tecnológica não sendo por isso sustentado A princípio o ritmo do crescimento diminuiu até que desmoronou por completo Mesmo efêmero esse tipo de crescimento ilustra como as instituições extrativistas são capazes de estimular a atividade econômica Ao longo da história a maioria das sociedades foi regida por instituições extrativistas aquelas que lograram impor alguma medida de ordem em seus territórios puderam gerar algum crescimento limitado ainda que nenhuma dessas sociedades extrativistas tenha conseguido obter crescimento sustentado De fato alguns dos momentos mais críticos da história caracterizaramse por inovações institucionais que vieram consolidar instituições extrativistas e aumentaram a autoridade de determinado grupo para impor a lei e a ordem e beneficiarse do extrativismo No restante deste capítulo discutiremos primeiro a natureza das inovações institucionais que estabelecem algum grau de centralização do Estado e possibilitam o crescimento sob instituições extrativistas Em seguida mostraremos como esses conceitos nos ajudam a compreender a Revolução Neolítica a basilar transição para a agricultura que subjaz a tantos aspectos da nossa civilização atual Concluiremos ilustrando com o caso das cidadesestados maias como o crescimento sob instituições extrativistas é limitado não só pela falta de progresso tecnológico mas também por estimular disputas internas entre grupos rivais ávidos por assumir o controle do Estado e beneficiarse dos frutos de seu extrativismo ÀS MARGENS DO CASSAI Um dos maiores tributários do Rio Congo é o Cassai De sua nascente em Angola ele segue para o norte e juntase ao Congo a nordeste de Kinshasa a capital da moderna República Democrática do Congo Por mais pobre que esta seja quando comparada ao resto do mundo sempre houve significativa discrepância na prosperidade dos vários grupos dentro do país O Cassai é a fronteira entre dois deles Logo após sua entrada no território congolês ao longo de suas margens ocidentais encontramos o povo lele na margem oriental ficam os bushong Mapa 6 À primeira vista parece haver poucas diferenças entre os dois grupos com relação ao grau de riqueza São separados por um rio que pode ser transposto de barco As duas tribos têm origem comum e seus idiomas são aparentados Ademais muitos de seus produtos são de estilo similar inclusive casas vestuário e artesanato No entanto quando a antropóloga Mary Douglas e o historiador Jan Vansina estudaram os dois grupos na década de 1950 descobriram algumas diferenças espantosas entre ambos Nas palavras de Douglas Os lele são pobres ao passo que os bushong são ricos Tudo o que os lele têm ou fazem os bushong têm mais e fazem melhor É fácil apresentar algumas explicações simples para tamanha desigualdade Uma diferença que nos lembra aquela que distingue as regiões do Peru que fizeram ou não parte da mita de Potosí é que os lele produziam para a sua subsistência ao passo que os bushong produziam para comercializar no mercado Douglas e Vansina observaram também que os lele faziam uso de tecnologia inferior Por exemplo não usavam redes para caçar ainda que estas proporcionassem grande aumento da produtividade Segundo Douglas a falta de redes é coerente com uma tendência geral dos lele a não investir tempo e mão de obra em equipamentos de longo prazo Havia também distinções consideráveis nas tecnologias e organização agrícolas Os bushong praticavam uma sofisticada forma de cultivo misto na qual cinco produtos eram plantados em sucessão em um sistema de rotação bianual Plantavam inhame batatadoce mandioca e feijão e colhiam duas às vezes três safras de milho por ano Os lele não dispunham de tal sistema e tudo o que conseguiam era uma colheita anual de milho As diferenças também eram marcantes em termos da lei e da ordem Os lele viviam dispersos em aldeias fortificadas envolvidas em constantes escaramuças Quem viajasse de uma para outra ou mesmo se aventurasse na selva para coletar comida corria o risco de um ataque ou sequestro No território bushong algo assim raramente ou nunca acontecia O que há por trás dessas diferenças entre os padrões de produção tecnologia agrícola e ordem vigente É evidente que não foram fatores geográficos que induziram o s lele a adotar tecnologias agrícolas e de caça inferiores Sem dúvida não foi por ignorância porque tinham conhecimento das ferramentas utilizadas pelos bushong Outra explicação poderia ser a cultura seria possível que a cultura dos lele não os estimulasse a investir em redes de caça e habitações mais sólidas e resistentes Tampouco esse parecia ser o caso Como na história do Reino do Congo os lele mostravam grande interesse na compra de armas a ponto de Douglas anotar que a avidez com que adquirem armas de fogo comprova que sua cultura não os restringe a técnicas inferiores quando estas não requerem colaboração e esforço de longo prazo Portanto nem uma aversão cultural à tecnologia nem a ignorância nem a geografia dão conta de explicar a maior prosperidade dos bushong em relação aos lele O que justifica as diferenças entre os dois povos são as diferentes instituições políticas desenvolvidas nas terras de um e de outro Já observamos que os lele viviam em aldeias fortificadas que não integravam uma estrutura política unificada Do outro lado do Cassai a história era outra Por volta de 1620 houve uma revolução política liderada por um homem de nome Shyaam Este fundou o Reino Bacuba que vimos no Mapa 6 tendo os bushong como povo e ele mesmo como soberano Até então havia provavelmente poucas diferenças entre os bushong e os lele as discrepâncias surgiram em consequência do modo como Shyaam reorganizou a sociedade a leste do rio Constituiuse um Estado e uma pirâmide de instituições políticas que eram não só notoriamente mais centralizados do que a estrutura de poder anterior como também envolviam estruturas altamente elaboradas Shyaam e seus sucessores criaram uma burocracia para aumentar os impostos e um sistema legal e uma força policial para administrar a lei Os líderes prestavam contas aos conselhos que deviam consultar antes de tomar qualquer decisão Havia até o julgamento por um corpo de jurados caso ao que tudo indica único na África subsaariana antes do colonialismo europeu Não obstante o Estado centralizado construído por Shyaam era uma ferramenta extrativista e altamente absolutista Ninguém o elegera e as políticas estatais eram determinadas pelo topo não objeto de participação popular Essa revolução política que introduziu tanto a centralização do Estado quanto a lei e a ordem no território bacuba promoveu por sua vez uma revolução econômica A agricultura foi reorganizada com a adoção de novas tecnologias para aumentar a produtividade Os produtos que até então se limitavam a gêneros de primeira necessidade foram substituídos por outros de rendimento mais alto provenientes das Américas sobretudo milho mandioca e pimentas Foi nessa época que se introduziu o ciclo de plantio misto intensivo e a quantidade de alimentos produzidos por cabeça duplicou Para adotar esses produtos e reorganizar o ciclo agrícola houve necessidade de mais mãos nos campos Assim a idade de casar foi reduzida para 20 anos o que inseriu os homens mais cedo na força de trabalho agrícola O contraste com os lele não podia ser maior Seus homens tendiam a casarse aos 35 e só então começavam a trabalhar nos campos Até então dedicavam sua vida a lutas e assaltos A ligação entre a revolução política e econômica foi simples O Rei Shyaam e seus correligionários queriam explorar os impostos e a riqueza dos bacubas que precisavam para tanto produzir um superávit além daquilo que consumiam para sua subsistência Ainda que Shyaam e seus homens não tenham introduzido instituições inclusivas na margem oriental do Cassai algum grau de prosperidade econômica é intrínseco às instituições extrativistas que alcançam algum grau de centralização do Estado e impõem a lei e a ordem Incentivar a atividade econômica era do interesse de Shyaam e seus homens uma vez que de outro modo nada haveria a explorar Assim como Stálin Shyaam criou por decreto um conjunto de instituições capazes de gerar a riqueza necessária para dar sustentação a esse sistema Comparado à total ausência de lei e ordem que imperava na outra margem do Cassai este produziu significativa prosperidade econômica ainda que boa parte dela fosse explorada por Shyaam e sua elite Esse estado de coisas porém era necessariamente restrito Do mesmo modo como na União Soviética não havia destruição criativa no Reino Bacuba nem qualquer inovação tecnológica após essa mudança inicial A situação permaneceria mais ou menos inalterada até as autoridades coloniais belgas se depararem com o reino pela primeira vez no final do século XIX A EMPREITADA DO REI SHYAAM mostra como é possível obter algum grau de êxito econômico por meio de instituições extrativistas A geração de tal crescimento requer um Estado centralizado Para centralizar o Estado em geral é preciso uma revolução política Uma vez criado esse Estado Shyaam pôde lançar mão de seu poder para reorganizar a economia e estimular a produtividade agrícola sobre a qual poderia então impor uma carga tributária Por que os bushong fizeram uma revolução política mas não os lele Os lele não poderiam ter tido seu próprio rei Shyaam Shyaam realizou uma inovação institucional que não estava de modo algum vinculada à geografia cultura ou ignorância Os lele poderiam ter feito uma revolução dessas e analogamente transformado suas instituições mas não foi o que aconteceu Talvez isso se deva a motivos que não temos como compreender em virtude de nossos conhecimentos limitados acerca de sua sociedade então O mais provável é que a causa esteja nos meandros fortuitos da história Foram provavelmente as mesmas contingências que entraram em ação quando algumas das sociedades do Oriente Médio 12 mil anos atrás enveredaram por uma série de inovações institucionais ainda mais radicais que engendrariam sociedades sedentárias e em seguida à domesticação de plantas e animais como veremos a seguir O LONGO VERÃO Por volta de 15000 aC a Era Glacial chegou ao fim e o clima na Terra começou a esquentar Indícios coletados em núcleos de gelo da Groenlândia sugerem que as temperaturas médias subiram cerca de 15C em um breve período o que coincidiu ao que parece com um abrupto aumento da população humana já que o aquecimento global teria propiciado uma expansão das espécies animais e a disponibilidade bem maior de alimentos e plantas silvestres O processo foi rapidamente revertido em torno de 14000 aC durante um período de esfriamento conhecido como Dryas Recentek após 9600 aC porém as temperaturas globais voltaram a subir ganhando cerca de 7C em menos de uma década tendo permanecido elevadas desde então o que o arqueólogo Brian Fagan chama de Longo Verão O aquecimento do clima constituiu uma enorme circunstância crítica que serviria de pano de fundo para a Revolução Neolítica mediante a qual as sociedades humanas realizaram a transição para a vida sedentária a agricultura e a pecuária Esses acontecimentos assim como toda a história humana subsequente se desenrolaram no calor desse Longo Verão Há uma diferença fundamental entre agricultura e pecuária e caça e coleta As duas primeiras baseiamse na domesticação de espécies vegetais e animais com ativa intervenção em seus ciclos de vida inclusive promovendo alterações genéticas de modo a aumentar sua utilidade para os humanos A domesticação constitui uma mudança tecnológica que possibilita aos seres humanos aumentar muito a produção de alimentos a partir dos vegetais e animais existentes A domesticação do milho por exemplo teve início com a coleta do teosinto planta silvestre que foi sua ancestral Os sabugos de teosinto são muito pequenos com no máximo alguns centímetros de comprimento Perto de um sabugo de milho atual são minúsculos Pouco a pouco contudo por meio da seleção das espigas maiores de teosinto e outras plantas cujas espigas não se abriam mas permaneciam na haste para serem colhidas os seres humanos criaram o milho moderno um produto capaz de proporcionar muito mais nutrição a partir do mesmo pedaço de terra As mais antigas evidências de agricultura pecuária e domesticação de vegetais e animais foram encontradas no Oriente Médio sobretudo na região conhecida como Flancos Montanhosos que se estende do sul do atual Israel sobe através da Palestina e da margem ocidental do Rio Jordão passa pela Síria e penetra pelo sudeste da Turquia norte do Iraque e oeste do Irã Por volta de 9500 aC as primeiras plantas domésticas o farro Triticum dicoccum e um tipo de cevada de duas fileiras de grãos eram encontradas em Jericó na margem ocidental do Rio Jordão na Palestina e farro ervilhas e lentilhas em Tell Aswad mais ao norte na Síria Ambas as localidades correspondiam à chamada cultura natufiana e sustentavam aldeias de grande porte a de Jericó contava com uma população de talvez 500 habitantes na época Por que as primeiras aldeias camponesas surgiram aqui e não em qualquer outro lugar Por que foram os natufianos e não algum outro povo que domesticaram as ervilhas e lentilhas Foi um golpe de sorte eles por acaso viverem em uma região onde havia grande variedade de potenciais candidatos à domesticação Sim também contudo muitos outros povos viviam em meio a essas mesmas espécies e não as domesticaram Como vimos no Capítulo 2 nos Mapas 4 e 5 pesquisas de geneticistas e arqueólogos visando ao mapeamento da distribuição dos ancestrais silvestres dos vegetais e animais domésticos modernos revelam que muitos desses ancestrais espalhavamse por áreas muito vastas de milhões de quilômetros quadrados Os ancestrais silvestres das espécies domésticas de animais espalhavamse por toda a Eurásia Por mais que os Flancos Montanhosos fossem particularmente bemdotados em termos de espécies silvestres cultiváveis esta estava longe de ser uma peculiaridade exclusiva Não foi o fato de os natufianos viverem em uma região com características únicas que fez a diferença mas o fato de eles terem se sedentarizado antes de iniciar a domesticação de plantas e animais Uma evidência é fornecida pelos dentes das gazelas que são compostos de cemento um tecido ósseo conectivo que se desenvolve em camadas Durante a primavera e o verão quando o cemento cresce mais rápido as camadas têm cor diferente daquelas formadas no inverno O corte transversal de um dente mostra a cor da última camada formada antes da morte da gazela o que permite determinar se o animal foi morto no verão ou no inverno Nas áreas habitadas pelos natufianos encontramse gazelas mortas em todas as estações do ano o que é indicativo de uma residência fixa ao longo do ano A aldeia de Abu Hureyra no Rio Eufrates é uma das povoações natufianas mais estudadas Durante quase 40 anos os arqueólogos examinaram as camadas da aldeia que constitui um dos mais bem documentados exemplos de vida sedentária antes e depois da transição para a agricultura O povoamento teve início provavelmente por volta de 9500 aC e seus habitantes ainda prosseguiram em seu estilo de vida de caçadores e coletores por cerca de 500 anos antes de adotarem a agricultura Os arqueólogos estimam que a população da aldeia antes da agricultura oscilava entre 100 e 300 membros Podese imaginar todo tipo de motivo para uma sociedade considerar vantajoso sedentarizarse O deslocamento constante é custoso crianças e velhos têm de ser carregados e em movimento é impossível armazenar alimentos para os períodos de escassez Ademais ferramentas como foices e pedras de moer são úteis para o processamento de alimentos silvestres mas pesados para transportar Há evidências de que mesmo caçadores e coletores nômades costumavam armazenar alimentos em determinados locais como cavernas Uma das vantagens do milho é o fato de ser muito resistente à armazenagem o que foi um dos principais motivos de seu cultivo ter sido tão amplamente adotado nas Américas A possibilidade de administrar de maneira mais eficaz a armazenagem e os estoques acumulados de alimentos deve ter constituído incentivo primordial para a adoção de um estilo de vida sedentário Por mais que o sedentarismo possa ser desejável para a coletividade isso não significa que necessariamente sobrevirá Um grupo nômade de caçadores e coletores teria de concordar em fixarse ou verse forçado a fazêlo Alguns arqueólogos sugerem que o aumento da densidade demográfica e a queda dos padrões de vida foram determinantes na ocorrência do sedentarismo obrigando povos nômades a estabelecerse em um só lugar No entanto a densidade das áreas habitadas por natufianos não é maior do que as de grupos anteriores de modo que nada parece sugerir um aumento da densidade populacional Evidências ósseas e dentárias tampouco indicam deterioração da saúde Por exemplo a escassez de alimentos faz surgirem linhas finas no esmalte dos dentes quadro chamado de hipoplasia Na verdade essas linhas são menos prevalentes entre os natufianos que em povos agrícolas posteriores Ainda mais significativa é a constatação de que embora o sedentarismo tivesse seus prós apresentava também muitos contras A resolução de conflitos era provavelmente bem mais difícil entre os grupos sedentários uma vez que as divergências não seriam facilmente resolvidas pela mera partida de pessoas ou grupos inteiros A partir do momento em que as pessoas haviam construído habitações permanentes e possuíam mais bens do que podiam carregar ir embora se tornava uma opção muito menos atraente Assim as aldeias precisavam de formas mais eficazes de resolução de conflitos e noções mais elaboradas de propriedade Era preciso definir quem teria acesso a que partes do terreno ao redor da aldeia ou quem colheria as frutas de que fileiras de árvores e pescaria em que parte do rio Tornouse necessário não só desenvolver regras mas as instituições que as criariam e zelariam pelo seu cumprimento Para que o sedentarismo tenha podido emergir parece plausível supor que os caçadores e coletores tenham sido forçados a fixarse o que por sua vez teria de ter sido precedido por uma inovação institucional que concentrasse o poder nas mãos de um grupo que constituiria a elite política fazendo valer os direitos de propriedade mantendo a ordem e beneficiandose de seu status para extrair recursos do resto da sociedade De fato é provável que uma revolução política similar àquela iniciada pelo Rei Shyaam ainda que em escala mais modesta tenha marcado a ruptura que acabou produzindo o sedentarismo Os indícios arqueológicos de fato nos dão razões para crer que os natufianos desenvolveram uma sociedade complexa caracterizada pela existência de hierarquia ordem e desigualdade os primórdios do que reconheceríamos como instituições extrativistas muito antes de se tornarem agricultores Um forte indício de tal hierarquia e desigualdade é fornecido pelos túmulos natufianos Algumas pessoas eram enterradas com grande quantidade de obsidiana e conchas de dentálio oriundas do litoral mediterrâneo próximo ao Monte Carmelo Outros tipos de ornamentação incluem colares braçadeiras e braceletes confeccionados com caninos falanges de cervos e conchas Outras pessoas eram enterradas sem nada disso As conchas e a obsidiana eram comercializadas e o controle dessas mercadorias muito provavelmente constituía uma fonte de acumulação de poder e desigualdade Outras evidências de desigualdades econômicas e políticas foram encontradas na localidade natufiana de Ain Mallaha ao norte do Mar da Galileia Em meio a um agrupamento de cerca de 50 cabanas redondas e muitos poços claramente usados para armazenagem há uma construção de grande porte coberta de argamassa reforçada próxima a um amplo espaço central quase certamente a habitação de um chefe Entre os túmulos ali encontrados alguns são muito mais elaborados havendo também indícios de adoração a crânios possivelmente um culto aos ancestrais característico das povoações natufianas sobretudo Jericó A maioria das evidências natufianas indica que provavelmente já se tratava de sociedades com instituições elaboradas que determinavam a herança do status de elite e que se dedicavam ao comércio com locais distantes e dispunham de formas incipientes de religião e hierarquias políticas A emergência de elites políticas muito provavelmente acarretou a transição primeiro para o sedentarismo e depois para a agricultura Como revelam os povoamentos natufianos a vida sedentária não implicava necessariamente adesão à agricultura e à pecuária O povo podia fixarse mas continuar vivendo da caça e da coleta Afinal o Longo Verão tornou as plantas silvestres mais abundantes o que provavelmente tornaria a caça e a coleta mais atraentes A maioria das pessoas se satisfaria com uma vida de subsistência baseada na caça e na coleta o que não demandaria maiores esforços Ademais a inovação tecnológica não fomentaria necessariamente um aumento da produção agrícola de fato sabese que uma importante inovação tecnológica a introdução do machado de aço entre os aborígenes australianos conhecidos como Yir Yoront levou não a uma intensificação da produção mas a maior número de horas de sono à medida que permitiu que as necessidades de subsistência fossem atendidas com mais facilidade com poucos incentivos para trabalhar mais Segundo a explicação tradicional da Revolução Neolítica baseada em fatores geográficos peça central do argumento de Jared Diamond que vimos no Capítulo 2 o processo teria sido deflagrado pela disponibilidade fortuita de diversas espécies vegetais e animais facilmente domesticáveis o que teria tornado atraentes a agricultura e a pecuária e induzido ao sedentarismo Depois que as sociedades se houvessem sedentarizado e adotado a agricultura aí se teria iniciado o desenvolvimento da hierarquia da religião e de instituições significativamente mais complexas Ainda que essa hipótese tradicional goze de ampla aceitação as evidências natufianas sugerem que na verdade ela coloca o carro adiante dos bois As mudanças institucionais se deram algum tempo antes de as sociedades fazerem a transição para a agricultura tendo provavelmente sido a causa tanto da adoção do sedentarismo que por sua vez reforçou as mudanças quanto posteriormente da Revolução Neolítica Esse padrão é sugerido não só pelos indícios encontrados nos Flancos Montanhosos a região mais amplamente estudada mas também pela maioria das evidências das Américas África subsaariana e Leste Asiático Sem dúvida a transição para a agricultura não só acarretou maior produtividade agrícola como possibilitou considerável expansão populacional Por exemplo em locais como Jericó e Abu Hureyra é notório que a aldeia nos primórdios da agricultura era bem maior do que antes Em geral as aldeias cresciam duas a seis vezes após a transição Ademais muitos dos fatos que se costuma alegar terem decorrido da transição sem dúvida aconteceram Deuse maior especialização ocupacional e aceleração do progresso tecnológico e provavelmente o desenvolvimento de instituições políticas mais complexas e talvez menos igualitárias Contudo a ocorrência desses fatores em cada lugar específico era determinada não pela disponibilidade de espécies vegetais e animais mas pela adesão daquela sociedade às inovações institucionais sociais e políticas capazes de possibilitar o sedentarismo e depois o surgimento da agricultura Embora o Longo Verão e a presença de espécies vegetais e animais tenham tornado tudo isso possível não determinavam onde ou quando exatamente após o aquecimento do clima o processo se daria Pelo contrário o que era determinante era a interação entre uma circunstância crítica o Longo Verão com pequenas mas significativas peculiaridades institucionais que faziam a diferença À medida que as temperaturas aumentavam algumas sociedades como os natufianos desenvolveram elementos de instituições centralizadas e hierarquia ainda que em escala muito menor que a dos modernos Estados nacionais Como os bushong sob Shyaam as sociedades reorganizaramse de modo a tirar proveito das maiores oportunidades criadas pela superabundância de animais e plantas silvestres e sem dúvida as elites políticas foram as maiores beneficiárias dessas novas oportunidades e do processo de centralização política Outros lugares cujas instituições eram apenas ligeiramente diferentes não permitiram que suas elites políticas tirassem proveito similar dessa circunstância e ficaram para trás no processo de centralização política e criação de sociedades sedentárias e agrícolas mais complexas Assim estava preparado o terreno para uma disparidade subsequente exatamente do mesmo tipo que já vimos Uma vez surgidas essas divergências elas se disseminaram para certos lugares mas não para outros Por exemplo a agricultura difundiuse do Oriente Médio para a Europa a partir de cerca de 6500 aC basicamente em consequência da migração de agricultores Na Europa as instituições diferenciaramse das de outras regiões do mundo como a África onde as instituições originais eram diferentes e as inovações deflagradas no Oriente Médio pelo Longo Verão só surgiriam muito mais tarde e mesmo assim sob outras formas AS INOVAÇÕES INSTITUCIONAIS dos natufianos embora muito provavelmente tenham sido o pivô da Revolução Neolítica não deixaram um legado simples na história do mundo nem levaram inexoravelmente à prosperidade em longo prazo de sua terra natal os atuais Israel Palestina e Síria Síria e Palestina são países relativamente pobres na atualidade e a riqueza de Israel foi em boa parte importada pelos colonos judeus após a Segunda Guerra Mundial com seus elevados níveis de escolaridade e fácil acesso a tecnologias de ponta O crescimento inicial dos natufianos não se tornou sustentado pelo mesmo motivo por que o crescimento soviético se extinguiu Por mais que tenha sido altamente significativo e mesmo revolucionário em sua época não deixou de ser crescimento sob instituições extrativistas No caso da sociedade natufiana é provável que esse tipo de crescimento tenha fomentado também profundos conflitos quanto a quem deteria o controle das instituições e de sua exploração Para cada elite a se beneficiar do extrativismo há uma não elite que adoraria substituíla Às vezes as disputas internas levam tão somente à substituição de uma elite por outra Às vezes destroem toda a sociedade extrativista desencadeando um colapso do Estado e da sociedade como um todo como no caso da espetacular civilização constituída pelas cidadesestados maias mais de mil anos atrás O EXTRATIVISMO INSTÁVEL A agricultura emergiu de maneira independente em várias regiões do mundo No atual México formaramse sociedades que estabeleceram Estados e povoações e aderiram à agricultura Como no caso dos natufianos no Oriente Médio lograram também algum grau de crescimento econômico As cidadesestados maias que se estendiam pelo sul do México Belize Guatemala e oeste de Honduras constituíram de fato uma civilização bastante sofisticada com suas instituições extrativistas peculiares A experiência maia aponta não só para a possibilidade de crescimento sob instituições extrativistas mas também para outro limite fundamental desse tipo de crescimento a instabilidade política daí decorrente a qual em última instância leva ao colapso tanto da sociedade quanto do Estado à medida que diferentes grupos e pessoas se digladiam para controlar os meios extrativistas As cidades maias começaram a se desenvolver por volta de 500 aC Essas primeiras experiências acabaram fracassando em algum momento do século I dC Surgiu então um novo modelo político lançando as bases para a Era Clássica entre 250 e 900 dC período marcado pelo pleno florescimento da cultura e civilização maias Entretanto essa civilização mais sofisticada também entraria em colapso no decorrer dos 600 anos seguintes Por ocasião da chegada dos conquistadores espanhóis no começo do século XVI os grandes templos e palácios de cidades maias como Tikal Palenque e Calakmul haviam sido engolidos pela selva e só seriam redescobertos no século XIX As cidades maias nunca chegaram a unificarse em um império ainda que algumas fossem subordinadas a outras e haja indícios frequentes de cooperação sobretudo na guerra O principal vínculo entre as cidadesestados da região 50 das quais são reconhecíveis por seus respectivos glifos era o idioma seus habitantes falavam cerca de 31 línguas distintas mas intimamente relacionadas Os maias desenvolveram um sistema de escrita do qual sobreviveram pelo menos 15 mil inscrições que descrevem diversos aspectos da vida cultura e religião de suas elites Dispunham também de um calendário sofisticado para o registro de datas Conhecido como Contagem Longa era bem semelhante ao nosso próprio sistema à medida que contabilizava o desdobramento dos anos a partir de uma data fixa e era utilizado por todas as cidades maias A contagem longa tinha início em 3114 aC embora não saibamos o significado atribuído pelos maias a essa data que antecede em muito o surgimento de qualquer sociedade semelhante à sua Os maias eram rematados construtores tendo chegado de maneira independente à invenção do cimento Seus edifícios e inscrições fornecem informações vitais sobre a história de suas cidades pois costumavam registrar os acontecimentos seguindo a datação da contagem longa Assim um exame dessas construções permite aos arqueólogos contabilizar quantos edifícios foram concluídos em determinados anos Poucos monumentos datam de cerca de 500 dC Por exemplo no ano que na contagem longa corresponde a 514 dC foram registrados apenas 10 Houve então uma expansão constante chegando a 20 em 672 dC e a 40 em meados do século VIII Depois disso o número de monumentos datados despenca No século IX volta para 10 por ano e no século X desce a zero Essas inscrições datadas nos proporcionam uma clara visão da expansão das cidades maias e sua subsequente contração a partir do final do século VIII Essa análise das datas pode ser complementada pelo exame das listas de monarcas registradas pelos maias Na cidade maia de Copán hoje no oeste de Honduras há um monumento célebre conhecido como Altar Q O Altar Q contém o nome de todos os reis desde o fundador da dinastia Kinich Yax Kuk Mo ou Rei Sol Primeiro Arara Quetzal Verde cujo nome era uma homenagem não só ao Sol mas também a duas das aves exóticas da selva centroamericana cujas penas eram muito valorizadas pelos maias Kinich Yax Kuk Mo ascendeu ao poder em Copán em 426 dC como nos informa a data da contagem longa no Altar Q Fundou uma dinastia que reinaria por 400 anos Alguns de seus descendentes tiveram nomes igualmente descritivos O glifo do 13o traduzse como Coelho 18 cujos sucessores seriam Macaco de Fumaça e Concha de Fumaça que viria a falecer em 763 dC O último nome da lista é o do Rei Yax Pasaj Chan Yoaat ou Primeiro Deus do Relâmpago do Céu do Sol Nascido que foi o 16o governante da dinastia e assumiu o poder com a morte de Concha de Fumaça Depois dele temos notícia de apenas mais um rei Ukit Took Protetor da Pederneira a partir de um fragmento de altar Após Yax Pasaj a construção de edifícios e as inscrições são interrompidos e ao que tudo indica a dinastia seria derrubada pouco depois Ukit Took provavelmente nem tinha direito real ao trono não devia passar de um usurpador Há uma última leitura possível das evidências de Copán desenvolvida pelos arqueólogos Ann Corinne Freter Nancy Gonlin e David Webster Esses pesquisadores mapearam a ascensão e queda da cidade por meio da análise demográfica do Vale de Copán ao longo de um período de 850 anos de 400 a 1250 dC por meio da técnica de hidratação da obsidiana que calcula o conteúdo de água da obsidiana na época de sua extração Uma vez extraída a obsidiana seu conteúdo de água cai a uma razão conhecida o que permite aos arqueólogos calcular a data de mineração de determinado fragmento Freter Gonlin e Webster situaram assim quando diferentes pedaços de obsidiana foram encontrados no Vale de Copán e monitoraram a expansão e posterior contração da cidade Como é possível fazer uma projeção razoável do número de casas e edifícios em determinada área podese estimar a população total da cidade No período de 400449 dC a população era insignificante avaliada em cerca de 600 habitantes Cresceu de maneira continuada até um ápice de 28 mil em 750799 dC Pelos nossos parâmetros urbanos contemporâneos o número não impressiona mas era gigantesco para a época a população de Copán superava a de Londres ou Paris no mesmo período Outras cidades maias como Tikal e Calakmul eram sem dúvida muito maiores Em consonância com evidências das datas da contagem longa 800 dC assinalou o apogeu populacional de Copán A partir daí iniciouse um declínio e em 900 dC a população caíra para cerca de 15 mil pessoas dali por diante houve uma redução contínua até que em 1200 dC ela havia voltado aos patamares de 800 anos antes O fundamento do desenvolvimento econômico dos maias da Era Clássica foi o mesmo dos bushong e natufianos a criação de instituições extrativistas com algum grau de centralização do Estado Tais instituições caracterizavamse por uma série de elementos centrais Por volta de 100 dC na cidade de Tikal na Guatemala surgiu um novo tipo de reino dinástico Estabeleceuse uma classe dominante baseada no ajaw senhor ou governante com um rei intitulado kuhul ajaw senhor divino e abaixo dele uma hierarquia de aristocratas O senhor divino organizava a sociedade com a cooperação dessas elites além de comunicarse com os deuses Até onde se sabe esse novo conjunto de instituições políticas não admitia nenhum tipo de participação popular mas trouxe estabilidade O kuhul ajaw aumentou os impostos dos agricultores e organizou a mão de obra de modo a possibilitar a construção dos grandes monumentos e a coalescência dessas instituições seria a pedra angular de uma impressionante expansão econômica A economia maia baseavase em ampla especialização ocupacional com ceramistas tecelões marceneiros ferramenteiros e fabricantes de ornamentos altamente qualificados Comercializavam ainda obsidiana peles de jaguar conchas marinhas cacau sal e penas entre si e com outras cidades chegando até o México Provavelmente dispunham também de alguma forma de dinheiro e como os astecas usavam sementes de cacau como moeda O modo como a Era Clássica maia foi fundada na criação de instituições políticas extrativistas foi muito similar à situação entre os bushong tendo Yax Ehb Xook de Tikal papel similar ao do Rei Shyaam As novas instituições políticas fomentaram significativo aumento da prosperidade econômica de boa parte da qual a nova elite organizada em torno do kuhul ajaw apropriavase em seguida Uma vez consolidado esse sistema porém por volta de 300 dC praticamente não voltou a haver mudanças tecnológicas Embora haja alguma evidência de aprimoramentos nas técnicas de irrigação e abastecimento de água a tecnologia agrária era rudimentar e ao que tudo indica assim permaneceu Embora as técnicas arquitetônicas e artísticas tenham ganhado muito em sofisticação com o passar do tempo no geral houve pouca inovação Não havia destruição criativa Não faltaram porém outras formas de destruição já que a riqueza gerada pelas instituições extrativistas para o kuhul ajaw e a elite maia desencadeava guerras constantes que com o tempo só fizeram recrudescer A sequência de conflitos é registrada nas inscrições maias com glifos específicos indicando a ocorrência de uma guerra em determinada data da contagem longa O planeta Vênus era o patrono celestial da guerra e os maias consideravam determinadas fases da órbita do planeta particularmente propícias para o início das hostilidades O glifo indicador de conflitos conhecido pelos arqueólogos como guerra nas estrelas mostra uma estrela despejando sobre a terra um líquido que pode ser água ou sangue As inscrições revelam também padrões de aliança e competição Os Estados maiores como Tikal Calakmul Copán e Palenque envolviamse em intermináveis disputas pelo poder e no processo subjugavam os Estados menores obrigandoos à vassalagem como indicam os glifos que assinalam as acessões ao trono que começam a indicar nessa época que os Estados menores passaram a ser regidos por governantes externos O Mapa 10 mostra as principais cidades maias e os vários padrões de contato entre elas tal como reconstruídos pelos arqueólogos Nikolai Grube e Simon Martin Tais padrões indicam que embora as grandes cidades como Calakmul Dos Pilas Piedras Negras e Yaxchilan tivessem amplos contatos diplomáticos algumas eram com frequência dominadas por outras além de lutarem entre si A constatação irretorquível com relação ao colapso maia é que ela coincide com a derrubada do modelo político baseado no kuhul ajaw Vimos em Copán que após a morte de Yax Pasaj em 810 dC não houve mais reis Por volta dessa época os palácios reais foram abandonados Trinta quilômetros ao norte de Copán na cidade de Quiriguá o último monarca Céu de Jade subiu ao trono entre 795 e 800 dC O último monumento datado é de 810 dC pela contagem longa mesmo ano da morte de Yax Pasaj A cidade seria abandonada pouco depois Em todo o território maia a história é a mesma as instituições políticas que haviam criado o contexto para a expansão do comércio agricultura e população desapareceram Cortes reais deixaram de funcionar cessaram as gravações em monumentos e templos e os palácios ficaram desertos À medida que as instituições políticas e sociais eram desbaratadas revertendo o processo de centralização do Estado a economia entrou em contração e os níveis populacionais despencaram Em certos casos os principais centros sucumbiram à violência generalizada A região de Petexbatun na Guatemala onde os grandes templos seriam posteriormente derrubados para que as pedras fossem empregadas na construção de muralhas defensivas constitui um exemplo claro Como veremos no próximo capítulo foi um caso muito semelhante ao do fim do Império Romano Mais tarde em lugares como Copán onde há menos sinais de violência na época do colapso muitos monumentos seriam desfigurados ou destruídos Em alguns lugares a elite permaneceu mesmo após a queda do kuhul ajaw Em Copán há indícios de que a elite ainda construiria novos edifícios por pelo menos mais 200 anos antes de finalmente também desaparecer Em outros lugares as elites parecem ter se extinguido junto com o senhor divino As evidências arqueológicas existentes não nos permitem chegar a uma conclusão definitiva acerca do porquê da deposição do kuhul ajaw e das elites que o cercavam nem do colapso das instituições que haviam desencadeado a Era Clássica maia Sabemos que isso se deu no contexto de um recrudescimento dos conflitos entre as cidades e ao que tudo indica oposição e insurreições dentro das próprias cidades talvez conduzidas por facções rivais dentro da elite derrubaram a instituição Embora as instituições extrativistas criadas pelos maias tenham gerado suficiente riqueza para que as cidades florescessem e a elite enriquecesse e produzisse uma arte sofisticada e construções monumentais o sistema não era estável As instituições extrativistas que fundamentavam o poder dessa pequena elite engendraram uma desigualdade generalizada aprofundando assim o potencial de conflitos entre os possíveis beneficiários da riqueza extraída do povo Foram essas disputas as responsáveis em última instância pelo desmoronamento da civilização maia Mapa 10 Cidadesestados maias seus contatos e conflitos O QUE DÁ ERRADO As instituições extrativistas são tão recorrentes na história em virtude de sua lógica poderosa conseguem gerar uma dose limitada de prosperidade ao mesmo tempo distribuindoa entre os integrantes de uma pequena elite Para que esse crescimento se dê é preciso que haja centralização política Uma vez que esta esteja implementada o Estado ou a elite que o controla em geral dispõe de incentivos para investir e produzir riqueza estimulando por sua vez outros a investir de modo a possibilitar que o Estado extraia recursos destes e até simule alguns dos processos que normalmente seriam desencadeados por mercados e instituições econômicas inclusivas Nas economias de plantation do Caribe as instituições extrativistas assumiram a forma de uma elite que fazia uso da coação para obrigar os escravos a produzirem açúcar Na União Soviética manifestaramse através da realocação de recursos da agricultura para a indústria pelo Partido Comunista bem como da estruturação de certos incentivos para gerentes e trabalhadores Como vimos tais incentivos eram anulados pela própria natureza do sistema O potencial de geração de crescimento extrativista fornece impulso suficiente para a centralização política foi o que motivou o Rei Shyaam a criar o Reino Bacuba e é o que provavelmente justifica a adoção pelos natufianos no Oriente Médio de modalidades primitivas de lei e ordem hierarquia e instituições extrativistas que por sua vez deflagrariam a Revolução Neolítica É provável que processos similares tenham também acarretado a emergência de sociedades sedentárias e a transição para a agricultura nas Américas podendo ser identificados na sofisticada civilização construída pelos maias com base em instituições altamente extrativistas que coagiam muitos em benefício de suas pequenas elites O crescimento proporcionado pelas instituições extrativistas é porém de natureza completamente distinta daquele criado sob instituições inclusivas Acima de tudo não é sustentável Por sua própria natureza as instituições extrativistas não abrem espaço para a destruição criativa propiciando no máximo níveis limitados de progresso tecnológico O crescimento por elas engendrado portanto tem fôlego curto A experiência soviética constitui clara ilustração desse limite A Rússia soviética conheceu um surto de crescimento alcançando rapidamente algumas das mais avançadas tecnologias do mundo e transferindo recursos do ineficientíssimo setor agrícola para a indústria No fim das contas todavia os incentivos encontrados em cada setor da agricultura à indústria não se mostraram capazes de estimular o progresso tecnológico Este se manteve apenas em determinados bolsões onde os recursos eram injetados e a inovação amplamente recompensada em decorrência de seu papel na corrida contra o Ocidente O crescimento soviético por mais acentuado que tenha sido estava fadado a ter vida curta com efeito já estava perdendo o gás na década de 1970 A ausência de destruição criativa e inovação não é o único motivo de existirem limites estritos ao crescimento sob instituições extrativistas A história das cidades estados maias ilustra um fim mais sombrio e infelizmente mais corriqueiro intrínseco à lógica interna das instituições extrativistas O fato de tais instituições proporcionarem ganhos significativos para a elite constitui forte incentivo para que outros grupos se empenhem em tomar o lugar da elite dominante Os conflitos internos e a instabilidade constituem assim características inerentes às instituições extrativistas não só criando novas ineficiências como também em geral revertendo a centralização política e por vezes até induzindo ao total colapso da lei e da ordem e ao mergulho no caos tal como ocorreu com as cidadesestados maias após seu relativo êxito durante sua Era Clássica Apesar de intrinsecamente limitado o crescimento sob as instituições extrativistas pode todavia parecer espetacular quando em movimento Muitos na União Soviética e muitos mais no Ocidente ficaram deslumbrados com o crescimento soviético nas décadas de 1920 a 1960 chegando à de 1970 do mesmo modo como ficam hoje assombrados com o ritmo vertiginoso do crescimento econômico da China Como discutiremos em mais detalhes no Capítulo 15 contudo a China sob o domínio do Partido Comunista é mais um exemplo de sociedade que cresce sob a tutela de instituições extrativistas e é improvável do mesmo modo que venha a gerar crescimento sustentado a menos que sofra uma transformação política fundamental rumo a instituições inclusivas de fato O 6 DIFERENCIAÇÃO COMO VENEZA TORNOUSE UM MUSEU ARQUIPÉLAGO QUE forma Veneza situase no extremo norte do Mar Adriático Na Idade Média Veneza era talvez o lugar mais rico do mundo com o mais avançado conjunto de instituições econômicas inclusivas fundamentadas em uma incipiente inclusão política Conquistou sua independência em 810 dC através do que se revelaria ter sido um golpe de sorte A economia europeia estava se recuperando do declínio sofrido com o colapso do Império Romano e reis como Carlos Magno encontravamse em vias de reconstituir um poder político central forte promovendo maior estabilidade e segurança e a expansão do comércio do qual Veneza estava em condições únicas para se aproveitar Era uma nação de lobos do mar posicionada bem no meio do Mediterrâneo Do Oriente chegavam especiarias produtos de fabricação bizantina e escravos Veneza enriqueceu Em 1050 quando a cidade já se expandia economicamente havia pelo menos um século sua população montava a 45 mil habitantes Em 1200 esse número sofrera um aumento superior a 50 chegando a 70 mil Em 1330 havia crescido outros 50 totalizando 110 mil a cidade tinha então o mesmo tamanho de Paris e provavelmente três vezes o de Londres Um dos principais fundamentos da expansão econômica de Veneza foi uma série de inovações contratuais que tornaram as instituições econômicas muito mais inclusivas Destas a mais célebre era a commenda um tipo rudimentar de sociedade anônima por ações que se constituía apenas pela duração de determinada missão comercial Cada commenda envolvia dois sócios um sedentário que permanecia em Veneza e outro que punha o pé na estrada O sedentário injetava capital na empreitada ao passo que o que viajava acompanhava a carga Normalmente era o primeiro quem contribuía com a maior parte do capital Jovens empreendedores que ainda não houvessem feito fortuna podiam entrar no ramo do comércio acompanhando as mercadorias um canal decisivo de ascensão social Eventuais prejuízos na viagem eram divididos de acordo com a parcela de capital com que cada sócio tivesse colaborado Caso a viagem redundasse em lucro sua divisão se daria conforme dois tipos de contrato de commenda Caso se tratasse de uma commenda unilateral o mercador sedentário forneceria 100 do capital e receberia 75 dos lucros Se fosse bilateral o sedentário entrava com 67 do capital e ficava com 50 do lucro Uma análise dos documentos oficiais mostra toda a potencialidade da commenda para fomentar a ascensão social são todos repletos de nomes desconhecidos pessoas sem histórico de pertencimento à elite veneziana Na documentação governamental de 960 971 e 982 dC o número de nomes novos compreende 69 81 e 65 respectivamente do total de nomes registrados Tamanha inclusão econômica aliada à ascensão de novas famílias por meio do comércio obrigou o sistema político a tornarse ainda mais aberto O doge que governava a cidade era indicado vitaliciamente pela Assembleia Geral Embora fosse uma reunião geral de todos os cidadãos na prática a Assembleia Geral era dominada por um núcleo central de famílias poderosas Embora o próprio doge gozasse de grande poder este foi sendo paulatinamente reduzido ao longo do tempo mediante modificações realizadas nas instituições políticas A partir de 1032 o doge passou a ser escolhido junto com o recémcriado Conselho Ducal cuja função era certificarse de que o doge não adquirisse poder absoluto O primeiro doge a ter seus poderes cerceados por esse conselho Domenico Flabianico era um abastado mercador de seda de uma família que nunca antes ocupara um cargo elevado A essa mudança institucional seguiuse uma gigantesca expansão do poderio naval e mercantil veneziano Em 1082 Veneza conquistou amplos privilégios comerciais em Constantinopla onde foi fundado um bairro veneziano que logo abrigava 10 mil deles Temos aqui um caso de instituições políticas e econômicas inclusivas caminhando lado a lado A expansão econômica de Veneza que apenas fez alimentar a pressão por mais mudança política explodiu após a implementação de alterações nas instituições políticas e econômicas em decorrência do assassinato do doge em 1171 A primeira inovação significativa foi a instauração de um Grão Conselho que a partir de então seria a fonte última de poder político na cidade O conselho era composto de altos funcionários do Estado veneziano como juízes e era dominado por aristocratas Além desses dignitários a cada ano 100 novos membros eram designados por um comitê de nomeação cujos 4 integrantes eram escolhidos por sorteio dentre os conselheiros existentes Posteriormente o órgão escolheria também os membros de dois subconselhos o Senado e o Conselho dos Quarenta com diversas atribuições legislativas e executivas O Grão Conselho era responsável também pela escolha do Conselho Ducal ampliado de 2 para seis membros A segunda inovação foi a criação de mais um conselho sorteado pelo Grão Conselho agora para nomear o doge Embora sua escolha precisasse ser ratificada pela Assembleia Geral uma vez que era feita uma única indicação a medida efetivamente colocou a escolha do doge nas mãos do conselho A terceira inovação foi que o novo doge passou a prestar um juramento do cargo que circunscrevia o poder ducal Com o tempo essas restrições foram paulatinamente expandidas de modo que os doges subsequentes passaram a obedecer aos magistrados depois tiveram todas as suas decisões submetidas à aprovação do Conselho Ducal Este assumiu também a função de garantir que o doge cumprisse todas as decisões do Grão Conselho Tais reformas políticas desencadearam uma nova série de inovações institucionais como a criação de magistrados e tribunais independentes um tribunal de apelação e novas leis sobre falências e contratos particulares Essas novas instituições econômicas venezianas possibilitaram a criação de novas formas jurídicas de negócios e novos tipos de contratos As inovações financeiras sucederamse rapidamente e vemos os primórdios do moderno sistema bancário despontando na cidade por volta dessa época A dinâmica que conduzia Veneza em direção a instituições plenamente inclusivas parecia irreversível Contudo havia uma tensão subjacente a tudo isso O crescimento econômico sustentado pelas instituições inclusivas venezianas era acompanhado de um mecanismo de destruição criativa Cada nova onda de jovens empreendedores a enriquecer por meio da commenda ou instituições econômicas similares tendia a reduzir os lucros e o êxito econômico das elites estabelecidas E não só lhes restringiam o lucro como também desafiavam seu poder político Persistia sempre a tentação assim para que as elites existentes representadas no Grão Conselho fechassem o sistema aos novos membros Quando o Grão Conselho foi criado determinouse que seus integrantes seriam definidos anualmente Como vimos no fim de cada ano quatro eleitores seriam escolhidos ao acaso para designar 100 membros para o ano seguinte aceitos automaticamente Em 3 de outubro de 1286 propôsse ao Grão Conselho uma emenda às regras de modo que as indicações passassem a ser confirmadas pela maioria dos membros do Conselho dos Quarenta sob estrito controle das famílias da elite o que lhes conferiria poder de veto sobre as novas nomeações para o conselho algo que elas não possuíam até então A proposta foi indeferida Em 5 de outubro de 1286 outra proposta foi apresentada e dessa vez aprovada Dali por diante a confirmação seria automática se os pais e avós do nomeado tivessem servido no conselho Do contrário seria necessária a confirmação do Conselho Ducal Em 17 de outubro foi introduzida uma nova mudança nas regras estipulando que qualquer indicação para o Grão Conselho precisaria da aprovação do Conselho dos Quarenta do doge e do Conselho Ducal Os debates e emendas constitucionais de 1286 pressagiaram La Serrata O Fechamento de Veneza Em fevereiro de 1297 decidiuse que quem tivesse sido membro do Grão Conselho nos quatro anos anteriores gozaria de nomeação e aprovação automáticas Dali por diante as novas indicações teriam de ser aceitas pelo Conselho dos Quarenta mas apenas com 12 votos A partir de 11 de setembro de 1298 os membros atuais e suas famílias não precisariam mais de confirmação O Grão Conselho estava agora de fato vedado a forasteiros e seus mandatários tornaramse assim uma aristocracia hereditária A novidade seria selada em 1315 com o Libro dOro ou Livro de Ouro um registro oficial da nobreza veneziana Os excluídos dessa nobreza incipiente não veriam seus poderes lhes escapar sem lutar A tensão política recrudesceu na cidade entre 1297 e 1315 A reação parcial do Grão Conselho foi ampliar seus tentáculos Na tentativa de cooptar seus adversários mais ruidosos cresceu de 450 para 1500 membros A expansão foi complementada pela repressão Criouse uma força policial pela primeira vez em 1310 e verificouse um crescimento contínuo da coação interna sem dúvida como meio de consolidar a nova ordem política Tendo implementado uma Serrata política o Grão Conselho tratou em seguida de promover uma Serrata econômica À instauração de instituições políticas extrativistas seguiuse a adoção de instituições econômicas extrativistas Sobretudo os contratos de commenda uma das grandes inovações institucionais que haviam feito a fortuna de Veneza foram banidos Não é de admirar a commenda beneficiava os novos comerciantes que agora a elite estabelecida tentava excluir Foi apenas mais um passo rumo a instituições econômicas mais extrativistas Deuse outro passo quando a partir de 1314 o Estado veneziano começou a assumir o controle do comércio e a nacionalizálo As galés estatais foram organizadas para realizar atividades comerciais e de 1324 em diante quem quisesse participar teria de arcar com pesados impostos O comércio de longa distância tornouse prerrogativa da nobreza Foi o começo do fim da prosperidade veneziana Com as principais linhas de negócios sob o monopólio de uma elite cada vez mais restrita o declínio era inevitável Veneza que parecia ter chegado à iminência de converterse na primeira sociedade inclusiva do mundo sucumbiu a um golpe Suas instituições políticas e econômicas foram se tornando cada vez mais extrativistas até que a cidade entrou em declínio Em 1500 a população havia despencado para cem mil habitantes Entre 1650 e 1800 enquanto a população da Europa crescia rapidamente a de Veneza não parava de cair Hoje a única atividade econômica de Veneza além de um pouco de pesca é o turismo Em vez de rotas comerciais e instituições econômicas pioneiras os venezianos fazem pizzas e sorvetes e sopram vidro colorido para as hordas de estrangeiros Os turistas vêm ver as maravilhas venezianas dos tempos anteriores à Serrata como o Palácio do Doge e os leões da Catedral de São Marcos frutos da pilhagem de Bizâncio quando Veneza dominava o Mediterrâneo Veneza deixou de ser uma potência econômica para converterse em museu NESTE CAPÍTULO vamos nos concentrar no desenvolvimento histórico de instituições em diferentes partes do mundo e explicar por que em cada lugar elas tomaram os rumos específicos que tomaram Vimos no Capítulo 4 como as instituições da Europa Ocidental se diferenciaram daquelas do Leste Europeu e como as da Inglaterra se distanciaram daquelas do resto da Europa Ocidental tudo consequência de pequenas diferenças institucionais em sua maioria decorrentes da interação entre o processo de diferenciação institucional e as circunstâncias críticas intervenientes Poderia ser então tentador imaginar que essas diferenças institucionais não passam da ponta de um profundo iceberg histórico e que abaixo da linha da água temos as instituições europeias e inglesas afastandose inexoravelmente daquelas de outras plagas com base em acontecimentos históricos que remontam a milênios no passado E o resto como se diz é história Mas não é nada disso e por duas razões Em primeiro lugar os movimentos na direção de instituições inclusivas como comprova nosso relato sobre Veneza podem ser revertidos Veneza enriqueceu Contudo suas instituições políticas e econômicas caíram por terra e sua prosperidade foi revertida Hoje Veneza só é rica porque pessoas que acumulam recursos em outros lugares escolhem gastálos lá admirando as glórias de seu passado O fato de que instituições inclusivas podem ir ao chão mostra que não há um processo cumulativo simples de aprimoramento institucional Em segundo lugar as pequenas diferenças institucionais que desempenham um papel crucial durante as circunstâncias críticas são por natureza efêmeras Por serem mínimas podem ser anuladas voltar a emergir e desaparecer de novo Veremos neste capítulo que ao contrário do que se poderia esperar com base nas teorias geográfica ou cultural a Inglaterra onde o passo decisivo em direção às instituições inclusivas seria dado no século XVII era um lugar atrasado não só nos milênios que se seguiram à Revolução Neolítica ocorrida no Oriente Médio mas também no princípio da Idade Média após a queda do Império Romano do Ocidente As Ilhas Britânicas eram marginais ao Império Romano e decerto tinham menos importância que a Europa Ocidental continental o Norte da África os Bálcãs Constantinopla ou o Oriente Médio Quando o Império Romano do Ocidente ruiu no século V a GrãBretanha enfrentou o mais absoluto declínio Não obstante as revoluções políticas responsáveis por deflagrar a Revolução Industrial ocorreriam não na Itália Turquia nem na Europa Ocidental continental mas nas Ilhas Britânicas Para compreender o percurso que levou até a Revolução Industrial inglesa e dos países que se seguiram o legado romano é significativo porém por diversas razões Primeiro Roma como Veneza experimentou precocemente importantes inovações institucionais Como aconteceria com os venezianos o êxito econômico romano baseouse a princípio em instituições inclusivas pelo menos segundo os padrões do seu tempo Como em Veneza essas instituições foram se tornando definitivamente mais extrativistas ao longo do tempo No caso de Roma essa transformação foi fruto da passagem da República 51049 aC para o Império 49 aC476 Muito embora durante o período republicano Roma tenha construído um império impressionante e o transporte e o comércio de longa distância tenham florescido muito da economia romana baseavase na extração A transição da República para o Império aumentou o extrativismo desencadeando em última instância o tipo de conflito interno instabilidade e colapso que vimos nas cidadesestados maias Segundo e mais importante veremos que o subsequente desenvolvimento institucional na Europa Ocidental mesmo não sendo herança direta de Roma foi consequência de circunstâncias críticas que se tornaram comuns na região no rastro do colapso do Império Romano do Ocidente Tais circunstâncias tiveram pouco paralelo em outras partes do mundo como África Ásia ou Américas ainda que como também vamos mostrar por meio da história da Etiópia outros lugares que atravessaram circunstâncias críticas semelhantes às vezes apresentaram reações de notável similaridade O declínio romano conduziu ao feudalismo que teve como efeitos colaterais o progressivo desaparecimento da escravidão o nascimento de cidades fora da esfera de influência dos monarcas e aristocratas e no processo deu à luz uma série de instituições que vieram a enfraquecer o poder político dos governantes Foi sobre essa fundação feudal que a peste negra pôde fazer estragos e reforçar ainda mais a autonomia das cidades e dos camponeses em detrimento dos monarcas aristocratas e grandes proprietários rurais Seria nesse cenário que as oportunidades engendradas pelo comércio atlântico despontariam Muitas partes do mundo não sofreram tais mudanças e por conseguinte se distanciaram AS VIRTUDES ROMANAS O tribuno da plebe Tibério Graco foi morto a pauladas em 133 aC pelos senadores romanos sendo seu corpo lançado ao Tibre sem nenhum rito fúnebre Seus assassinos eram aristocratas como o próprio Tibério e o atentado fora orquestrado pelo seu primo Públio Cornélio Cipião Nasica Tibério Graco vinha de uma impecável linhagem aristocrática descendente que era de alguns dos mais ilustres líderes da República Romana entre eles Lúcio Emílio Paulo herói da Segunda Guerra Púnica e da Guerra Ilírica e Cipião Africano o general que derrotou Aníbal na Segunda Guerra Púnica Por que os poderosos senadores de seu tempo inclusive seu primo teriam se voltado contra ele A resposta revela muito sobre as tensões vigentes na república e as causas de seu posterior declínio O que jogou Tibério contra os demais senadores foi sua iniciativa de ir de encontro a eles em uma questão crucial daquela época a distribuição da terra e os direitos dos plebeus os cidadãos comuns No tempo de Tibério Graco Roma já era uma república bem estabelecida Suas instituições políticas e as virtudes dos cidadãos soldados romanos tal como capturadas por JacquesLouis David em sua famosa tela O juramento dos Horácios que mostra os filhos jurando aos pais defender a República Romana com a própria vida ainda são consideradas por não poucos historiadores a base do êxito da república Os cidadãos romanos criaram a república ao derrubar seu rei Lúcio Tarquínio Soberbo conhecido como Tarquínio o Soberbo por volta de 510 aC Inteligentemente a república implementou instituições políticas com diversos elementos inclusivos Era governada por magistrados eleitos por um ano O fato de o ocupante desse cargo ser eleito anualmente e abalizado por muitas pessoas ao mesmo tempo restringia a possibilidade de determinado indivíduo procurar consolidar ou explorar seu poder em causa própria As instituições republicanas compreendiam um sistema de pesos e contrapesos responsáveis por uma distribuição bastante ampla do poder ainda que nem todos os cidadãos contassem com igual representação uma vez que o voto era indireto Havia também vasto número de escravos cruciais para a produção em grande parte da Itália que montavam talvez a um terço da população Estes evidentemente não gozavam nem de direitos que dirá de representação política No entanto como em Veneza as instituições políticas romanas continham elementos pluralistas Os plebeus possuíam sua própria assembleia que podia eleger o tribuno da plebe com poder para vetar as iniciativas dos magistrados convocar a Assembleia da Plebe e propor leis Foram os plebeus que puseram Tibério Graco no poder em 133 aC Seu poder fora forjado por secessão uma espécie de greve dos plebeus sobretudo soldados que se retiravam para uma colina nos limites da cidade e recusavamse a cooperar com os magistrados enquanto não tivessem suas reivindicações examinadas Tal ameaça adquiria particular relevância é claro em tempos de guerra Ao que tudo indica foi durante uma secessão dessas no século V aC que os cidadãos conquistaram o direito de eleger seu próprio tribuno e aprovar leis para governar sua comunidade Sua proteção política e legal por mais restrita que pudesse parecer a julgar por nossos parâmetros modernos criou oportunidades econômicas para os cidadãos e instituições econômicas inclusivas em algum grau Como resultado o comércio por todo o Mediterrâneo floresceu sob a República Romana Evidências arqueológicas indicam que embora tanto a maioria de cidadãos quanto de escravos vivesse não muito acima do nível de subsistência muitos romanos inclusive alguns cidadãos comuns alcançavam receitas elevadas com acesso a serviços públicos como sistemas municipais de esgotos e iluminação pública Há ainda evidências de algum crescimento econômico sob a república As fortunas econômicas dos romanos podem ser rastreadas a partir de naufrágios O império construído pelos romanos era de certo modo uma rede de portos de Atenas Antióquia e Alexandria no Oriente passando por Roma Cartago e Cádiz até chegar a Londres no extremo ocidente A expansão dos territórios romanos foi acompanhada da intensificação do comércio e da navegação o que se pode deduzir dos naufrágios encontrados por arqueólogos no fundo do Mediterrâneo Há várias maneiras de datá los Com frequência os barcos levavam ânforas cheias de vinho ou azeite de oliva da Itália para a Gália ou o azeite espanhol era levado para ser vendido ou distribuído de graça na capital As ânforas vasos selados de cerâmica costumavam conter informações sobre quem as confeccionara e quando Junto ao Rio Tibre em Roma há uma pequena colina o Monte Testaccio também conhecido como Monte dei Cocci Morro dos Potes composto de aproximadamente 53 milhões dessas ânforas Uma vez descarregadas dos navios as ânforas eram descartadas dando origem ao longo dos séculos a essa verdadeira montanha Outras mercadorias transportadas e a própria embarcação às vezes podem ser datadas por radiocarbono uma poderosa técnica usada pelos arqueólogos para determinar a idade de resíduos orgânicos As plantas obtêm energia por meio da fotossíntese que utiliza a energia solar para converter dióxido de carbono em açúcares Nesse processo o vegetal incorpora certa quantidade de um radioisótopo natural o carbono14 Depois da morte do organismo o carbono14 entra em deterioração o decaimento radioativo Quando os arqueólogos encontram um naufrágio podem calcular a idade do madeirame do navio comparando a fração remanescente de carbono14 nele presente ao carbono14 atmosférico esperado o que lhes proporciona uma estimativa de quando a árvore foi cortada Apenas cerca de 20 naufrágios remontam a 500 aC e em época tão remota provavelmente não se trata de embarcações romanas talvez sejam cartaginesas por exemplo Em seguida porém o número de naufrágios romanos apresenta aumento vertiginoso Por volta do tempo do nascimento de Cristo chegaram a um ápice de 180 Os naufrágios são uma boa maneira de mapear os contornos econômicos da república e de fato fornecem indícios de algum crescimento econômico mas é preciso manter certa perspectiva Provavelmente dois terços da carga dessas embarcações eram propriedade do Estado impostos e tributos que eram levados das províncias para Roma ou grãos e azeite do Norte da África a serem distribuídos de graça entre os cidadãos da capital São esses frutos do extrativismo os principais componentes do Monte Testaccio Outra maneira fascinante de obter evidências de crescimento econômico é através do Projeto do Testemunho de Gelo da Groenlândia Ao caírem os flocos de neve absorvem pequenas quantidades da poluição atmosférica sobretudo os metais chumbo prata e cobre A neve congela e vai se acumulando sobre a neve precipitada nos anos anteriores O processo vem acontecendo há milênios e constitui uma oportunidade ímpar para os cientistas entenderem o grau de poluição do ar há milhares de anos Em 19901992 o Projeto do Testemunho de Gelo da Groenlândia perfurou 3030 metros de gelo cobrindo cerca de 250 mil anos de história humana Uma das principais descobertas do trabalho bem como de outros que o precederam foi que houve nítido aumento nos poluentes atmosféricos a partir de 500 aC As quantidades de chumbo prata e cobre em suspensão no ar apresentam dessa data em diante crescimento contínuo atingindo um ápice no século I Curiosamente tais níveis atmosféricos de chumbo só voltariam a ser atingidos no século XIII o que mostra a intensidade se comparada aos períodos anteriores e que se seguiram da mineração pelos romanos Tamanho surto na atividade mineradora é um evidente indicador de expansão econômica Entretanto tal crescimento era insustentável ocorrendo sob instituições que eram em parte inclusivas e em parte extrativistas Ainda que os cidadãos possuíssem direitos políticos e econômicos a escravidão era generalizada e muito extrativista e a elite a classe senatorial dominava tanto a economia quanto a política Apesar da existência da assembleia e do tributo da plebe por exemplo o verdadeiro poder permanecia nas mãos do Senado cujos membros eram os grandes proprietários rurais que constituíam a classe senatorial Segundo o historiador romano Lívio o Senado foi criado pelo primeiro rei de Roma Rômulo sendo composto de uma centena de homens Seus descendentes dariam origem à classe senatorial ainda que com algum acréscimo de sangue novo A distribuição de terra era muito desigual situação que devia ter se agravado no século II aC desencadeando os problemas que Tibério Graco como tribuno pôs em evidência À medida que prosseguia a sua expansão por todo o Mediterrâneo Roma conheceu um influxo de vastas riquezas Tamanho tesouro porém estava ao alcance basicamente de um punhado de famílias abastadas de status senatorial e o abismo entre ricos e pobres se aprofundou Os senadores deviam sua riqueza não só ao controle das lucrativas províncias mas também aos seus enormes latifúndios espalhados pela Itália Essas propriedades eram trabalhadas por turmas de escravos em geral prisioneiros das guerras em que Roma se envolvera Todavia também é significativa a origem dessas terras Os exércitos romanos durante a república eram compostos por cidadãos soldados que eram pequenos proprietários rurais primeiro nos arredores da capital e depois em outras regiões da Itália Tradicionalmente lutavam no exército quando necessário e depois voltavam para seus afazeres À medida que Roma se expandia e as campanhas se prolongavam esse modelo deixou de funcionar Os soldados afastavam se de suas terras por anos a fio e muitas propriedades acabaram abandonadas Suas famílias às vezes se viam soterradas em dívidas e à beira da miséria Assim paulatinamente muitas dessas fazendas foram deixadas para trás sendo absorvidas pelas dos senadores Com o crescente enriquecimento da classe senatorial a grande massa de cidadãos sem terras foi se congregando na capital não raro após serem dispensados do exército Sem terra para onde voltar tratavam de procurar trabalho na capital No fim do século II aC a situação chegara a um perigoso ponto de ebulição tanto devido à ampliação do fosso que separava os ricos dos pobres instaurando entre ambos uma distância sem precedentes quanto por haver na cidade hordas de cidadãos descontentes prontos a reagir a tais injustiças insurgirse e voltarse contra a aristocracia romana Não obstante o poder político permanecia nas mãos dos ricos proprietários rurais da classe senatorial os beneficiários das mudanças que se haviam dado no decorrer dos dois últimos séculos E a maioria deles não tinha a menor intenção de modificar o sistema que os vinha servindo tão bem Segundo o historiador romano Plutarco Tibério Graco viajando pela Etrúria região da atual Itália central deuse conta das dificuldades enfrentadas pelas famílias dos cidadãossoldados Fosse em virtude dessa experiência fosse em decorrência de outros atritos com os poderosos senadores de seu tempo ele logo se envolveria em um ousado plano para modificar a distribuição de terras na Itália Concorreu ao tribunato da plebe em 133 aC usando então o cargo para propor uma reforma agrária uma comissão investigaria a eventual ocupação ilegal de terras públicas e procederia a uma redistribuição daquelas que ultrapassassem o limite legal de 300 acres para cidadãos sem terra O limite de 300 acres era na verdade previsto por uma lei antiga que era ignorada e deixara de ser implementada havia séculos O projeto de Tibério Graco sacudiu até os alicerces da classe senatorial que conseguiu bloquear a implementação de suas reformas durante algum tempo Quando Tibério conseguiu usar o poder do apoio popular de que gozava para depor outro tribuno que havia ameaçado vetar sua reforma agrária a comissão por ele proposta foi finalmente instituída O Senado porém impediua de trabalhar secando suas fontes de financiamento A tensão chegou ao auge quando Tibério Graco reivindicou para sua comissão da reforma agrária os recursos deixados para o povo romano pelo rei da cidade grega de Pérgamo Tentou também candidatarse pela segunda vez ao tribunato em parte por recear a perseguição do Senado após deixar o cargo Era o pretexto que os senadores esperavam para acusálo de pretender declararse rei Ele e seus correligionários sofreram um atentado e muitos foram mortos O próprio Tibério Graco foi um dos primeiros a cair ainda que sua morte não solucionasse o problema e outros ainda tentassem renovar a distribuição de terras entre outros aspectos da economia e da sociedade romana Muitos teriam destino similar O irmão de Tibério Graco por exemplo Caio também pereceria nas mãos dos proprietários rurais depois de assumir o lugar do irmão Essas tensões voltariam periodicamente a aflorar durante o século seguinte desencadeando por exemplo a Guerra Social entre 91 aC e 87 aC O agressivo paladino dos interesses senatoriais Lúcio Cornélio Sila não só suprimiu com violência as reivindicações de mudança como também impôs limites rigorosos aos poderes do tribuno da plebe As mesmas questões voltariam à baila no apoio recebido por Júlio César do povo de Roma em seu embate com o Senado As instituições políticas que constituíam o cerne da república foram desmontadas por Júlio César em 49 aC quando ele cruzou com suas tropas o Rubicão riacho que separava a província da Gália Cisalpina da Itália Roma ajoelhouse diante de César e mais uma guerra civil teve início Embora vitorioso César seria morto por senadores descontentes liderados por Brutus e Cássio em 44 aC A república jamais ressurgiria Irrompeu novo conflito civil entre os partidários de César sobretudo Marco Antônio e Otávio e seus inimigos Após a vitória de Antônio e Otávio irrompeu o conflito entre ambos até Otávio emergir triunfante da Batalha de Áccio em 31 aC A partir do ano seguinte e pelos 45 anos subsequentes Otávio conhecido após 28 aC como Augusto César governaria Roma sozinho Augusto fundou o Império Romano embora preferisse o título princep uma espécie de primeiro entre seus pares e chamasse o regime de principado O Mapa 11 mostra o império em sua maior extensão em 117 Indica também o Rio Rubicão que César tão desditosamente cruzou Foi essa passagem da república para o principado e mais tarde o império puro e simples que marcou o início do declínio de Roma As instituições políticas parcialmente inclusivas que eram as pedras angulares de seu êxito econômico foram sendo minadas pouco a pouco Por mais que a república favorecesse a classe senatorial e outros romanos abastados não era um regime absolutista e nunca antes havia concentrado tanto poder em um único cargo As mudanças deflagradas por Augusto a princípio apenas políticas teriam mais à frente consideráveis consequências econômicas exatamente como no caso da Serrata veneziana Em decorrência dessas transformações no século V o Império Romano do Ocidente como o lado ocidental ficou conhecido depois de separarse de sua contraparte oriental havia mergulhado em tal decadência econômica e militar que se encontrava à beira do colapso Mapa 11 O Império Romano no ano 117 E OS VÍCIOS ROMANOS Flávio Aécio foi um personagem lendário dos estertores do império saudado como o último dos romanos por Edward Gibbon autor de Declínio e queda do Império Romano Entre 433 e 454 dC até ser assassinado pelo Imperador Valentiniano III Aécio um general foi provavelmente o mais poderoso indivíduo no império Ditou as políticas interna e externa e travou uma série de batalhas cruciais tanto contra os bárbaros quanto contra outros romanos em conflitos civis Caso único entre os poderosos generais que digladiavam entre eles não almejava o trono para si Desde o fim do século II a guerra civil tornarase parte integrante da vida do império Desde a morte de Marco Aurélio em 180 dC até o colapso do Império Romano do Ocidente em 476 dC não passou uma década que não assistisse a uma guerra civil ou um golpe palaciano contra um imperador Poucos foram os imperadores a morrer de causas naturais ou em batalha A maioria foi assassinada por usurpadores ou por suas próprias tropas A carreira de Aécio ilustra as mudanças ocorridas desde a república e primórdios do império até o ocaso do império Não só seu envolvimento em guerras civis intermináveis e sua influência sobre todos os assuntos do império entram em agudo contraste com o poder muito mais restrito de generais e senadores em períodos anteriores mas também ilustra as mudanças radicais na sorte dos romanos sob outros aspectos nos séculos intervenientes No apagar das luzes do império os chamados bárbaros outrora dominados e incorporados ao Exército romano ou escravizado assumiram o controle de várias partes do império Em sua juventude Aécio fora mantido refém por bárbaros primeiro pelos godos sob o comando de Alarico e depois pelos hunos As relações romanas com essas tribos indicam como as coisas haviam mudado desde os tempos da república Alarico era ao mesmo tempo um feroz inimigo e um aliado tanto que em 405 foi nomeado um dos mais graduados generais das forças de Roma O acordo porém foi temporário Em 408 Alarico estava combatendo os romanos invadindo a Itália e saqueando a capital Os hunos também eram tanto inimigos poderosos quanto aliados frequentes dos romanos Embora também tenham feito Aécio de refém mais tarde lutariam com ele em uma guerra civil Contudo os hunos não ficavam muito tempo do mesmo lado e sob o comando de Átila enfrentaram os romanos em uma grande batalha em 451 do outro lado do Reno Dessa vez quem estava defendendo os romanos eram os godos comandados por Teodorico Nada disso impediu as elites de Roma de tentar apaziguar os líderes bárbaros em geral não para resguardar os territórios do império mas para colocarse em posição mais vantajosa em disputas internas pelo poder Por exemplo os vândalos encabeçados por seu Rei Genserico devastaram enormes áreas da Península Ibérica para depois conquistar os celeiros do império no Norte da África a partir de 429 A reação romana foi oferecer a Genserico a mão da filha do Imperador Valentiniano III em casamento O rei vândalo estava na época casado com a filha de um dos líderes godos o que não parece ter sido nenhum impedimento Anulou seu casamento sob o pretexto de que a esposa estaria tramando assassinálo e devolveua à família não sem antes havêla mutilado cortandolhe ambas as orelhas e o nariz Felizmente para a futura noiva em virtude de sua tenra idade ela permaneceu na Itália e não chegou a ter seu casamento consumado Mais tarde seria desposada por outro poderoso general Petrônio Máximo que maquinaria a morte de Aécio pelas mãos do Imperador Valentiniano III este por sua vez pereceria em seguida num complô armado pelo genro Máximo posteriormente se declararia imperador mas seu brevíssimo reinado se encerraria com seu desaparecimento durante a grande ofensiva dos vândalos comandados por Genserico contra a Itália que viu Roma cair e ser saqueada com selvageria EM PRINCÍPIOS DO século XV os bárbaros estavam literalmente às portas do império Para alguns historiadores a situação se justifica por terem sido esses os mais formidáveis oponentes enfrentados pelos romanos no final de sua história Todavia o êxito dos godos hunos e vândalos contra o Império foi um sintoma e não a causa de seu declínio Durante a república Roma havia lidado com adversários muito mais organizados e perigosos como os cartagineses Sua decadência teve causas muito semelhantes às das cidadesestados maias Foram as instituições políticas e econômicas cada vez mais extrativistas que levaram à sua queda em virtude dos conflitos internos e guerras civis causados por elas As origens do declínio remontam no mínimo à ascensão de Augusto ao poder quando se desencadearam mudanças que intensificariam o extrativismo das instituições políticas romanas Aí se incluem alterações na estrutura do exército que tornaram a secessão impossível e removeram assim um elemento crucial para assegurar a representação política dos romanos comuns O Imperador Tibério que sucedeu a Augusto em 14 dC aboliu a Assembleia da Plebe transferindo seus poderes para o Senado Em vez de uma voz política os cidadãos dispunham agora de distribuição gratuita de trigo e mais tarde azeite de oliva vinho e carne de porco além de serem entretidos com espetáculos de circo e lutas de gladiadores A partir das reformas de Augusto os imperadores passaram a depender menos do exército integrado por cidadãos soldados e mais da Guarda Pretoriana tropa de elite composta de soldados profissionais criada por Augusto A própria guarda não tardaria a adquirir voz própria e sonora na determinação do nome do imperador com frequência por meios nada pacíficos mas mediante intrigas e disputas civis Augusto havia fortalecido a aristocracia em oposição aos cidadãos comuns e a crescente desigualdade que fora o pivô do conflito entre Tibério Graco e os aristocratas persistiu talvez até aprofundada A acumulação de poder no centro tornou os direitos de propriedade dos romanos comuns menos seguros As propriedades estatais mediante confiscos também se expandiram com o império chegando em muitas regiões a metade da terra Os direitos de propriedade tornaramse especialmente instáveis em virtude da concentração de poder nas mãos do imperador e seu séquito Em um padrão não muito distinto do que se deu nas cidadesestados maias os conflitos internos pelo controle desse poderoso cargo recrudesceram As guerras civis tornaramse recorrentes mesmo antes do caótico século V quando os bárbaros reinaram soberanos Por exemplo Sétimo Severo derrubou do poder Dídio Juliano coroado imperador após o assassinato de Pertinax em 193 dC Severo o terceiro imperador do chamado Ano dos Cinco Imperadores entrou em guerra então contra os Generais Pescênio Níger e Clódio Albino que também disputavam o trono e seriam subjugados em 194 e 197 dC respectivamente Na guerra civil resultante Severo mandou confiscar todas as propriedades dos dois derrotados Embora governantes competentes como Trajano 98117 dC Adriano e Marco Aurélio no século seguinte tenham conseguido estancar o declínio não puderam ou não quiseram enfrentar os problemas institucionais básicos Nenhum desses homens propôsse a abdicar da estrutura imperial ou recriar instituições políticas eficazes nas linhas daquelas da república Marco Aurélio apesar de todos os seus êxitos foi seguido de seu filho Cômodo que se assemelhava mais a Calígula ou Nero que ao próprio pai A crescente instabilidade é evidenciada pelo traçado e localização das aldeias e cidades no império No século III dC todas as cidades de algum porte contavam com uma muralha defensiva Em muitos casos os monumentos eram saqueados para que a pedra pudesse ser usada em fortificações Na Gália antes da chegada dos romanos em 125 era comum construir os povoados nas elevações onde a defesa seria facilitada Sob a dominação romana a princípio as aldeias foram transferidas para as planícies No século III essa tendência foi revertida Junto com a crescente instabilidade política sobrevieram mudanças sociais que tornaram as instituições econômicas mais extrativistas Embora a cidadania fosse expandida em tal medida que em 212 dC quase todos os habitantes do império eram cidadãos essa alteração veio acompanhada de outras estabelecendo diferentes status de cidadania Qualquer noção eventualmente existente de igualdade perante a lei deteriorouse Por exemplo na época do reinado de Adriano 117 a 138 dC havia claras distinções entre os tipos de leis que se aplicavam a cada categoria de cidadão Ademais o papel dos cidadãos era completamente distinto daquele da época da República Romana quando as assembleias lhes davam condições para que exercessem algum grau de influência sobre as decisões políticas e econômicas A escravidão foi uma constante durante todo o império embora haja alguma controvérsia quanto à proporção de escravos na população que chegou a cair ao longo dos séculos Por outro lado à medida que o império se desenvolvia um número cada vez maior de trabalhadores agrícolas foi sendo reduzido a um estado de semisservidão e ficando preso à terra O status desses coloni servis é objeto de extenso debate em documentos jurídicos como o Codex Theodosianus e o Codex Justinianus tendo nascido provavelmente durante o reinado de Diocleciano 284 a 305 dC Os direitos dos senhores sobre os coloni foram sendo ampliados pouco a pouco O Imperador Constantino em 332 autorizou os senhores a agrilhoar um colonus que fosse suspeito de tentar escapar e a partir de 365 dC tornouse vedado aos coloni vender sua propriedade sem a permissão de seu senhor Do mesmo modo como podemos usar os naufrágios e os núcleos de gelo da Groenlândia para rastrear a expansão econômica de Roma em períodos anteriores podemos usálos também para acompanhar seu declínio Em 500 dC o ápice de 180 navios fora reduzido a 20 Com a decadência do império o comércio no Mediterrâneo entrou em colapso e há estudiosos que defendem até que só no século XIX ele voltaria aos patamares da época de Roma O gelo groenlandês conta uma história parecida Os romanos usavam prata na cunhagem de moedas e o chumbo tinha uma variedade de usos inclusive encanamento e talheres Após o apogeu no século I dC os depósitos de chumbo prata e cobre nos testemunhos de gelo caem A experiência de crescimento econômico durante a república foi impressionante assim como outros casos de expansão sob instituições extrativistas a União Soviética por exemplo Tratouse porém de um crescimento limitado e não sustentado mesmo quando se leva em consideração que ele se deu sob instituições parcialmente inclusivas Baseouse numa produtividade agrícola relativamente alta e na incidência de carga tributária significativa sobre as províncias e o comércio de longa distância mas não era movido pelo avanço tecnológico ou pela destruição criativa Os romanos herdaram algumas tecnologias básicas ferramentas e armas de ferro escrita arado e técnicas arquitetônicas Nos primórdios da república inventaram outras alvenaria com cimento bombas e rodadágua Desde então contudo a tecnologia permaneceu estagnada por toda a duração do Império Romano Na construção naval por exemplo houve poucas alterações no projeto ou cordame dos navios e os romanos nunca chegaram a desenvolver o leme de popa governando suas embarcações com remos Como a disseminação das rodasdágua foi muito lenta a energia hidráulica não chegou a revolucionar a economia Mesmo realizações consideráveis como aquedutos e redes urbanas de esgoto fizeram uso de tecnologias anteriores ainda que aperfeiçoadas Sem inovação foi possível algum nível de crescimento econômico baseado na tecnologia existente mas sem destruição criativa não poderia perdurar Assim a crescente insegurança dos direitos de propriedade e o desmanche dos direitos econômicos dos cidadãos seguindose ao de seus correlatos políticos foram acompanhados do declínio econômico inevitável Um aspecto curioso com relação a novas tecnologias no período romano é que sua criação e difusão parecem ter sido motivadas pelo Estado o que é bom pelo menos até o governo chegar à conclusão de que não tem interesse no desenvolvimento tecnológico algo recorrente em virtude do temor da destruição criativa O grande escritor romano Plínio o Velho conta a seguinte história durante o reinado de Tibério um homem inventou um vidro inquebrável e foi até o imperador na expectativa de uma grande recompensa Demonstrou sua invenção e Tibério perguntoulhe se ele havia falado sobre aquilo com alguém Diante da negativa o imperador ordenou que o levassem de sua presença e o matassem para que o ouro não tivesse seu valor reduzido a lama Há dois elementos interessantes nessa narrativa Primeiro o inventor dirigiuse a Tibério em busca de uma recompensa em vez de montar um negócio ou tratar de ganhar dinheiro com a venda do novo material o que revela o papel do governo no controle da tecnologia Segundo Tibério tratou de destruir a inovação devido às consequências adversas que poderia ter sobre a economia Eis aí o receio dos efeitos econômicos da destruição criativa Do período do império dispomos também de evidências diretas do medo inspirado pelas consequências políticas da destruição criativa Suetônio conta como o Imperador Vespasiano que governou entre 69 e 79 dC foi abordado por um homem que havia inventado um dispositivo para transportar colunas para o Capitólio a cidadela de Roma a um custo relativamente reduzido As colunas eram grandes pesadas e de transporte muito difícil Transportálas desde as minas onde eram confeccionadas até a capital envolvia a mão de obra de milhares de pessoas com grande despesa para o governo Vespasiano não mandou dar cabo do homem mas também se recusou a adotar a novidade justificandose Como será possível alimentar o populacho Outro exemplo em que o inventor recorre ao governo Talvez fosse mais natural do que no caso do vidro inquebrável visto que o governo romano tinha investimentos pesados na mineração e transporte de colunas Mais uma vez uma inovação foi preterida devido ao risco da destruição criativa não tanto por seu impacto econômico mas por receio de suas implicações políticas Vespasiano temia que se não mantivesse o povo satisfeito e sob controle ficaria politicamente desestabilizado Os plebeus tinham de permanecer ocupados e dóceis de modo que seria bom ter trabalho para lhes oferecer tal como levar colunas de um lado para o outro Era o complemento necessário do pão e circo também distribuídos de graça para manter a população contente Talvez seja sintomático que os dois exemplos tenham se dado pouco após o colapso da república Os imperadores romanos tinham muito mais poder para impedir mudanças que as autoridades republicanas Outra causa significativa da falta de inovação tecnológica foi a prevalência da escravatura À medida que se expandiam os territórios dominados pelos romanos multiplicavase o número de escravos que com frequência eram levados para a Itália a fim de guarnecer as vastas propriedades rurais Muitos cidadãos de Roma não precisavam trabalhar viviam dos subsídios do governo De onde viriam inovações Defendemos que elas ocorrem quando novas pessoas com novas ideias desenvolvem novas soluções para velhos problemas Em Roma os encarregados da produção eram escravos e mais tarde coloni semisservis com poucos incentivos para inovar uma vez que seriam os seus senhores e não eles mesmos os beneficiários de qualquer novidade Como veremos muitas vezes neste livro economias baseadas na repressão da mão de obra e sistemas como a escravidão e a servidão são notoriamente não inovadores Isso se aplica desde a Antiguidade até os tempos modernos Nos Estados Unidos por exemplo o Norte participou da Revolução Industrial não o Sul Claro que a escravidão e a servidão geram imensa riqueza para os donos dos escravos ou senhores dos servos mas não proporcionam inovação tecnológica ou prosperidade para a sociedade como um todo NINGUÉM ESCREVE DE VINDOLANDA Em 43 dC o imperador romano Cláudio havia conquistado a Inglaterra mas não a Escócia Uma derradeira tentativa em vão foi feita pelo governador romano Agrícola que desistiu e em 85 dC erigiu uma série de fortalezas para proteger a fronteira norte inglesa Destas uma das maiores localizavase em Vindolanda situada 56 quilômetros a oeste de Newcastle e representada no Mapa 11 no extremo noroeste do Império Romano Mais tarde Vindolanda seria incorporada à muralha defensiva de 136 quilômetros de extensão construída pelo imperador Adriano em 103 dC porém quando Cândido centurião romano encontravase estacionado ali era ainda um forte isolado Cândido que tinha um acordo com seu amigo Otávio acerca do abastecimento da guarnição romana recebeu deste a seguinte resposta a uma carta que havia enviado Otávio a seu irmão Cândido saudações Por diversas vezes já te escrevi que comprei aproximadamente 5 mil modii de espigas de grãos por conta dos quais necessito de dinheiro A menos que me remetas pelo menos 500 denarii estarei em risco de perder os cerca de 300 denarii por mim depositados em caução o que me poria em situação constrangedora Diante disso peçote que me envie algum dinheiro tão breve quanto possível Os couros a que te referes encontramse em Cataractônio ordena que me sejam entregues bem como ao carro por ti mencionado Eu já os teria ido buscar mas não quis expor os animais estando as estradas ainda ruins Vê com Tércio sobre os 85 denarii que ele recebeu de Fatal e não creditou em minha conta Trata de enviarme o dinheiro para que eu possa mandar debulhar as espigas Minhas saudações a Espétato e Firmo Adeus A correspondência entre Cândido e Otávio aponta certas facetas significativas da prosperidade da Inglaterra romana uma sofisticada economia monetária dotada de serviços financeiros a presença de estradas construídas mesmo que às vezes em más condições a presença de um sistema fiscal que arrecadava impostos para arcar com os soldos de Cândido e mais evidentemente que ambos eram alfabetizados e capazes de tirar proveito de um serviço postal de algum tipo A Inglaterra romana beneficiavase ainda da produção maciça de cerâmica de alta qualidade particularmente em Oxfordshire centros urbanos com banhos e edifícios públicos e técnicas de construção com uso de argamassa e telhas nos telhados No século IV tudo isso estava em decadência até que a partir de 411 dC o Império Romano desistiu da Inglaterra As tropas foram retiradas os homens que ficaram deixaram de ser remunerados e com a ruína do Estado os administradores foram expulsos pela população local Em 450 dC todas essas evidências de prosperidade econômica haviam desaparecido O dinheiro sumiu de circulação As zonas urbanas foram abandonadas e a pedra usada nas construções começou a ser reaproveitada As estradas acabaram cobertas de mato As peças de cerâmica deixaram de ser fabricadas em série e passaram a ser de confecção manual e rudimentar O uso da argamassa caiu no esquecimento e o conhecimento da escrita teve declínio substancial Os telhados passaram a ser feitos de galhos não mais telhas Ninguém mais escrevia de Vindolanda Após 411 dC a Inglaterra entrou em colapso econômico e tornouse um lugar pobre e atrasado e não era a primeira vez No capítulo anterior vimos como a Revolução Neolítica teve início no Oriente Médio por volta de 9500 aC Enquanto os habitantes de Jericó e Abu Hureyra moravam em aldeias e cultivavam o solo os da Inglaterra ainda viviam da caça e da coleta e desse modo permaneceriam por no mínimo outros 5500 anos e mesmo assim os ingleses não inventaram a agricultura nem a pecuária trazidas de fora por imigrantes que desde o Oriente Médio foram se espalhando pela Europa ao longo de milhares de anos Enquanto a população da Inglaterra adotava essas inovações a do Oriente Médio inventava as cidades a escrita e a cerâmica Em 3500 aC grandes cidades como Uruk e Ur surgiram na Mesopotâmia moderno Iraque Uruk talvez chegasse a 14 mil habitantes em 3500 aC e a 40 mil pouco depois A roda de oleiro foi inventada na Mesopotâmia mais ou menos na mesma época do transporte sobre rodas A capital egípcia Mênfis despontaria como cidade de grande porte logo em seguida A escrita surgiu de maneira independente nas duas regiões Enquanto os egípcios erguiam as grandes pirâmides de Gizé por volta de 2500 aC os ingleses construíam seu mais famoso monumento antigo o círculo de pedras em Stonehenge Nada mal pelos padrões locais mas não tinha tamanho para abrigar nem mesmo um dos barcos cerimoniais enterrados na base da pirâmide do Rei Quéops A Inglaterra continuaria atrasada limitandose a tomar emprestadas as criações do Oriente Médio e do resto da Europa até e inclusive o período romano Apesar de história tão pouco auspiciosa foi lá que surgiu a primeira sociedade verdadeiramente inclusiva e lá começou a Revolução Industrial Já defendemos páginas 8089 a tese de que isso teria sido resultado de uma série de interações entre pequenas diferenças institucionais e circunstâncias críticas por exemplo a peste negra e a descoberta das Américas A divergência inglesa teve origens históricas mas o que vemos de Vindolanda indica que suas raízes não eram nem muito profundas nem por certo historicamente predeterminadas Suas sementes não foram plantadas na Revolução Neolítica nem mesmo durante os séculos de hegemonia romana Em 450 dC no princípio do que os historiadores costumam chamar de Alta Idade Média a Inglaterra havia voltado a submergir na pobreza e no caos político e por centenas de anos não se instalaria lá um Estado centralizado eficaz CAMINHOS DIVERGENTES A ascensão de instituições inclusivas e o subsequente crescimento industrial inglês não foram um legado direto de instituições nem romanas nem anteriores o que não significa que a queda do Império Romano do Ocidente um marco histórico que afetou a maior parte da Europa não tenha tido impacto considerável também aí Uma vez que várias regiões do continente compartilhavam as mesmas circunstâncias críticas os desdobramentos sofridos por suas instituições seriam similares talvez ostentando uma marca europeia geral A queda do Império Romano foi um elemento crucial dessas circunstâncias críticas comuns Essa trajetória europeia contrasta com as de outras partes do mundo como a África subsaariana a Ásia e as Américas cujas peculiaridades devemse em parte às circunstâncias críticas distintas com que se depararam A Inglaterra romana ruiu fragorosamente Não foi o caso da Itália nem da Gália moderna França ou mesmo do Norte da África onde muitas das antigas instituições sobreviveram de alguma forma Ainda assim não resta dúvida de que a passagem da hegemonia de um Estado único romano para uma pletora de Estados controlados por francos visigodos ostrogodos vândalos e burgúndios foi significativa O poder desses Estados era muito menor constantemente fustigados que eram por intermináveis incursões em suas periferias Do norte vinham os vikings e danos em seus dracares Do leste chegavam os cavaleiros hunos Por fim o surgimento do Islã como religião e força política no século que se seguiu à morte de Maomé em 632 dC acarretou a criação de novos Estados islâmicos na maior parte do Império Bizantino Norte da África e Espanha Esses processos comuns sacudiram a Europa e em seu rastro despontou determinado tipo de sociedade que se costuma denominar feudal Era descentralizada porque os Estados centrais fortes haviam se atrofiado ainda que alguns governantes como Carlos Magno tenham tentado reconstruílos As instituições feudais baseadas na coação da mão de obra não livre os servos e obviamente extrativistas foram as pedras angulares de um longo período de lento crescimento extrativista na Europa durante a Idade Média Por outro lado foram também decisivas para desdobramentos posteriores Por exemplo ao longo do processo de redução da população rural à servidão a escravatura desapareceu da Europa Em uma época em que era possível para as elites reduzir a população rural inteira à servidão parecia desnecessária a existência de uma classe à parte de escravos presente em todas as sociedades até então O feudalismo também criou um vácuo de poder no qual se tornou possível o florescimento de cidades independentes especializadas na produção e no comércio Todavia quando o equilíbrio de poder mudou após a peste negra e a servidão começou a cair por terra na Europa Ocidental estava preparado o cenário para o surgimento de uma sociedade muito mais pluralista sem a presença de escravos As circunstâncias críticas que deram origem à sociedade feudal foram peculiares mas não se restringiram à Europa Uma comparação relevante pode ser feita com a atual Etiópia na África nascida a partir do Reino de Axum fundado no norte do país por volta de 400 aC Axum foi um reino relativamente desenvolvido para a época tendo se envolvido no comércio internacional com Índia Arábia Grécia e Império Romano Sob diversos aspectos era comparável ao Império Romano do Oriente no mesmo período Dispunha de moeda própria construiu estradas e edifícios públicos monumentais e contava com tecnologias muito similares por exemplo na agricultura e navegação Há também paralelos ideológicos interessantes entre Axum e Roma Em 312 dC o imperador romano Constantino converteuse ao cristianismo do mesmo modo como o Rei Ezana de Axum mais ou menos na mesma altura O Mapa 12 mostra a localização do Estado histórico de Axum nas atuais Etiópia e Eritreia com postos avançados do outro lado do Mar Vermelho na Arábia Saudita e Iêmen Assim como Roma entrou em declínio também Axum e sua queda seguiram um padrão análogo ao do Império Romano do Ocidente O papel desempenhado pelos hunos e vândalos no declínio de Roma foi assumido pelos árabes que no século VII expandiramse pela região do Mar Vermelho e desceram pela Península Arábica Axum perdeu suas colônias e rotas comerciais na Arábia o que precipitou seu declínio econômico a cunhagem de moedas foi abandonada caiu o número da população urbana e o Estado se deslocou para o interior do país subindo as montanhas da moderna Etiópia Arábia Saudita Eritreia Axum Mar Vermelho Iêmen Omã Djibuti Dir Adis Abeba Etiópia Isaq Somália Rahanw eyn Hawiy e Hawiy e Digil Mogandishu Darod Quênia Oceano Índico Tanzânia Axum Periferia de Axum Limites étnicos somalis Fronteiras modernas Mapa 12 O Império de Axum e os clãs somalis Na Europa as instituições feudais seguiramse ao colapso da autoridade do Estado central O mesmo se deu na Etiópia com base em um sistema chamado de gult que consistia em concessões de terra pelo imperador Há referências à instituição em manuscritos do século XIII embora suas origens talvez sejam bem anteriores O termo gult é derivado de uma palavra em amárico que se traduz por ele designou um feudo Ou seja em troca da terra o destinatário do gult tinha de prestar serviços ao imperador especialmente de natureza militar Em contrapartida adquiria o direito de coletar impostos dos que lhe lavravam as terras Uma variedade de fontes históricas sugere que esses senhores extraíam entre metade e três quartos da produção agrícola dos camponeses Mesmo tendo se desenvolvido de maneira independente o sistema apresentava notáveis semelhanças com o feudalismo europeu embora provavelmente fosse ainda mais extrativista No auge do feudalismo na Inglaterra os servos enfrentavam um extrativismo menos oneroso perdendo cerca de metade de sua produção para seus senhores de uma forma ou de outra A Etiópia contudo não era representativa da África Em outras áreas a escravatura não chegou a ser substituída pela servidão a escravidão africana e as instituições que a sustentavam continuariam ainda por muitos séculos Mesmo o futuro da Etiópia seria muito distinto Após o século VII o país continuou isolado nas montanhas da África Oriental dos processos que mais à frente exerceriam influência decisiva sobre os rumos institucionais da Europa como a emergência de cidades independentes as incipientes restrições aos monarcas e a expansão do comércio atlântico após a descoberta das Américas Por conseguinte sua versão das instituições absolutistas permaneceu basicamente inalterada O continente africano mais tarde interagiria com a Europa e a Ásia de uma posição muito diferente A África Oriental tornouse uma das principais fontes de escravos para o mundo árabe e as Áfricas Central e Ocidental seriam arrastadas para a economia mundial durante a expansão europeia associada ao comércio atlântico como fornecedoras de mão de obra escrava O modo como o comércio atlântico levou à disparidade de percursos entre a Europa Ocidental e a África é mais um exemplo de divergências institucionais resultantes da interação entre circunstâncias críticas e especificidades institucionais anteriores Enquanto na Inglaterra os lucros do tráfico de escravos ajudaram a enriquecer os opositores do absolutismo na África contribuíram para a criação e o fortalecimento exatamente desse tipo de regime Longe da Europa os processos de diferenciação institucional gozavam de liberdade obviamente ainda maior para seguir seus próprios caminhos Nas Américas por exemplo que se viram isoladas da Europa por volta de 15000 aC pelo derretimento do gelo que ligava o Alasca à Rússia verificaramse inovações institucionais similares às dos natufianos levando ao sedentarismo hierarquia e desigualdade em suma instituições extrativistas O processo se deu primeiro no México e na região andina do Peru e da Bolívia deflagrando a Revolução Neolítica americana com a domesticação do milho Foi nesses lugares que ocorreram formas primitivas de crescimento extrativista como vimos no caso das cidadesestados maias No entanto do mesmo modo como as grandes inovações no sentido de instituições inclusivas e crescimento industrial na Europa não ocorreram naqueles lugares onde a cultura romana tinha presença mais marcante as instituições inclusivas nas Américas tampouco se desenvolveram nas terras dessas primeiras civilizações Com efeito como vimos no Capítulo 1 essas sociedades de alta densidade demográfica estabeleceram uma forma perversa de interação com o colonialismo europeu o que acarretou uma inversão de rumo e tornou relativamente pobres regiões das Américas que até então haviam gozado de certa prosperidade Hoje são os Estados Unidos e o Canadá outrora muito atrasados em relação às complexas civilizações do México Peru e Bolívia que são muito mais ricos do que o restante das Américas CONSEQUÊNCIAS DO CRESCIMENTO INICIAL O longo período que separou a Revolução Neolítica iniciada em 9500 aC e a Revolução Industrial britânica no final do século XVIII é repleto de surtos de crescimento econômico deflagrados por inovações institucionais que cedo ou tarde acabariam esmorecendo Na Roma Antiga as instituições da república responsáveis por certo grau de vitalidade econômica e pela construção de um império gigantesco desmoronaram após o golpe de Júlio César e a estruturação do império sob Augusto Levou séculos para que o Império Romano finalmente desaparecesse e o declínio se consolidasse não obstante uma vez que as relativamente inclusivas instituições republicanas deram lugar às do império mais extrativistas a recessão tornouse inevitável A dinâmica veneziana foi similar A prosperidade econômica de Veneza foi forjada por instituições caracterizadas por consideráveis elementos inclusivos que se viram porém solapados quando a elite existente fechou o sistema ao ingresso de novos membros chegando mesmo a extinguir as instituições econômicas que haviam engendrado a prosperidade da república Por mais notável que tenha sido a experiência de Roma não foi o legado romano o responsável direto pela ascensão de instituições inclusivas na Inglaterra nem pela Revolução Industrial britânica O desenvolvimento das instituições é moldado por fatores históricos mas não se trata de um processo simples predeterminado nem cumulativo Roma e Veneza são exemplos de como passos iniciais em direção à inclusão podem ser revertidos O cenário econômico e institucional instaurado por Roma em toda a Europa e Oriente Médio não levou inexoravelmente às instituições inclusivas mais firmemente arraigadas de séculos posteriores Pelo contrário estas surgiriam em primeiro lugar e com mais força na Inglaterra onde a hegemonia romana era mais fraca e onde desapareceu em definitivo quase sem deixar traço durante o século V dC De fato como discutimos no Capítulo 4 a história desempenha um papel mais significativo por meio da diferenciação institucional que produz peculiaridades por menores que às vezes sejam que acabam se amplificando ao interagir com determinadas circunstâncias críticas É justamente por essas diferenças serem com frequência mínimas que podem ser revertidas com tamanha facilidade e não são necessariamente consequências de um processo cumulativo simples Claro que Roma exerceu um impacto duradouro sobre a Europa As instituições e o direito romanos influenciaram as instituições e leis estabelecidas pelos reinos bárbaros após o colapso do Império Romano do Ocidente Foi também a queda de Roma que engendrou o cenário de descentralização política que daria origem à ordem feudal O desaparecimento da escravatura e a emergência de cidades independentes foram efeitos colaterais de longuíssimo prazo e claro historicamente contingentes desse processo e teriam particular influência quando a peste negra abalasse as estruturas da sociedade feudal Das cinzas da peste nasceriam vilas e cidades mais fortes e um campesinato não mais preso à terra recémliberto das obrigações feudais Foram precisamente essas circunstâncias críticas deflagradas pela ruína do Império Romano as responsáveis por uma intensa diferenciação institucional que afetaria toda a Europa de uma maneira sem paralelos na África subsaariana Ásia ou Américas No século XVI a Europa era muito distinta em termos institucionais da África subsaariana e das Américas Embora não fosse muito mais abastada do que as civilizações asiáticas da Índia ou China mais espetaculares a Europa delas se distinguia sob determinados aspectos fundamentais Por exemplo havia desenvolvido instituições representativas ímpares desconhecidas em outros lugares Estas desempenhariam um papel crítico na implementação de instituições inclusivas Como veremos nos próximos dois capítulos seriam as pequenas diferenças institucionais que realmente fariam a diferença na Europa e elas favoreciam a Inglaterra por ser lá que a ordem feudal havia cedido lugar de maneira mais abrangente para proprietários rurais de mentalidade mais comercial e centros urbanos independentes nos quais mercadores e industriais tiveram a oportunidade de florescer Esses grupos já reivindicavam de seus monarcas direitos de propriedade mais seguros diferentes instituições econômicas e voz política em um processo que chegaria ao clímax no século XVII E 7 A REVIRAVOLTA PROBLEMAS COM MEIAS M 1583 WILLIAM LEE voltou de seus estudos na Universidade de Cambridge para tornarse o pároco local em Calverton Inglaterra Elizabeth I 15581603 havia recentemente determinado que seus súditos sempre usassem um barrete de tricô Lee notou que as tricoteiras eram o único meio de produzir essas peças de vestuário mas a demora para terminar cada item era demasiado longa Pusme a refletir Observei minha mãe e minhas irmãs sentadas no luscofusco do entardecer às voltas com suas agulhas Se cada peça era confeccionada por duas agulhas e uma linha de fio por que não várias agulhas para conduzir o fio Esse lampejo marcou o início da mecanização da produção têxtil Lee ficou obcecado pela construção de uma máquina que libertasse as pessoas daquele infindável tricotar manual Segundo ele comecei a negligenciar meus deveres para com a Igreja e a família A ideia de minha máquina e sua criação tomaramme por completo o coração e o cérebro Por fim em 1589 sua máquina de tricotar meias ficou pronta Entusiasmado ele se dirigiu a Londres na esperança de conseguir uma audiência com Elizabeth I para mostrarlhe o quanto a máquina podia ser útil e solicitar uma patente a fim de impedir a cópia da ideia por terceiros Alugou um prédio para montar a máquina e com o auxílio de seu representante local no Parlamento Richard Parkyns foi apresentado a Henry Carey Lorde Hundson membro do Conselho Privado da rainha Carey conseguiu que a Rainha Elizabeth fosse conhecer a máquina mas sua reação foi devastadora não só se recusou a conceder a patente de Lee como o admoestou Quanto atrevimento Senhor Lee Considera o que tal invenção me poderia causar aos pobres súditos Decerto lhes traria a ruína ao priválos de emprego convertendoos assim em mendigos Arrasado Lee mudouse para a França a fim de lá tentar sua sorte tendo também ali fracassado retornou à Inglaterra onde requisitou a patente a Jaime I 16031625 sucessor de Elizabeth Jaime I também recusou com a mesma justificativa de Elizabeth Ambos temiam que a mecanização da produção de meias os desestabilizasse politicamente à medida que deixaria as pessoas sem trabalho geraria desemprego e instabilidade política constituindo em última instância uma ameaça ao poder real A máquina de tecer meias era uma inovação que prometia um gigantesco salto na produtividade mas também muita destruição criativa A REAÇÃO À BRILHANTE invenção de Lee ilustra a tese central deste livro O medo da destruição criativa é o principal motivo por que não houve uma melhoria sustentada dos padrões de vida entre as revoluções neolítica e industrial A inovação tecnológica contribui para a prosperidade das sociedades humanas mas também implica a substituição do antigo pelo novo bem como a destruição dos privilégios econômicos e do poder político de alguns Para que haja crescimento econômico sustentado são necessárias novas tecnologias e novas maneiras de fazer as coisas que em geral virão de gente nova como Lee A sociedade pode enriquecer mas o processo de destruição criativa assim desencadeado constitui uma ameaça aos meios de subsistência daqueles que trabalham com as antigas tecnologias como as tricoteiras que a tecnologia de Lee deixaria sem emprego Acima de tudo inovações significativas como a máquina de tecer meias de Lee implicam também a possibilidade de uma reconfiguração do poder político Em última instância não foi a preocupação com o destino dos possíveis desempregados devido à invenção de Lee que levou Elizabeth I e Jaime I a lhe negarem a patente foi seu medo de saírem perdendo politicamente isto é seu receio de que os prejudicados pela máquina viessem a gerar instabilidade política e pôr em risco o seu poder Como vimos no caso dos ludistas páginas 6667 em geral é possível superar a resistência de trabalhadores como as tricoteiras Todavia a elite sobretudo quando vê seu poder político em risco constitui a mais formidável barreira à inovação O fato de ter tanto a perder com a destruição criativa significa não só que ela não será uma fonte de inovações como também que vai tender a resistir e procurar impedilas Assim a sociedade precisa de gente nova que introduza as inovações mais radicais pessoas que junto com a destruição criativa que virão promover terão de superar várias fontes de resistência inclusive a das elites e autoridades detentoras do poder Antes da Inglaterra do século XVII as instituições extrativistas foram ao longo da história a norma Vez por outra mostraramse capazes de gerar crescimento econômico como mostramos nos dois últimos capítulos sobretudo quando continham elementos inclusivos como em Veneza e Roma Contudo não admitiam destruição criativa O crescimento por elas engendrado não era sustentado e chegava ao fim em virtude da falta de novas inovações das disputas políticas internas decorrentes da ânsia por beneficiarse do extrativismo ou da completa reversão dos elementos inclusivos incipientes como no caso de Veneza A expectativa de vida de um morador da aldeia natufiana de Abu Hureyra provavelmente não era muito diferente daquela de um cidadão da Roma Antiga A expectativa de vida de um romano típico era relativamente próxima daquela de um habitante médio da Inglaterra no século XVII Em termos de renda em 301 dC o imperador romano Diocleciano emitiu o Edito dos Preços Máximos estabelecendo uma tabela com os salários a serem pagos aos vários tipos de trabalhadores Não sabemos o quanto na prática os salários e preços de Diocleciano entraram em vigor porém quando o historiador econômico Robert Allen usou tal edito para calcular o padrão de vida de um típico trabalhador sem qualificação constatou que seria quase exatamente o mesmo de um trabalhador não especializado na Itália do século XVII Mais ao norte na Inglaterra os salários não só já eram mais altos como estavam subindo e a situação geral estava em franca transformação Como isso se deu é o assunto deste capítulo O ONIPRESENTE CONFLITO POLÍTICO As disputas em torno das instituições e da distribuição de recursos são onipresentes ao longo da história Vimos por exemplo como os conflitos políticos afetaram a evolução de Veneza e da Roma Antiga onde acabaram sendo decididos em favor das elites que lograram incrementar sua hegemonia A história inglesa também é repleta de conflitos entre a monarquia e seus súditos entre as várias facções digladiandose pelo poder e entre as elites e os cidadãos contudo o resultado nem sempre foi o reforço do poder de seus detentores até então Em 1215 os barões que compunham a camada da elite imediatamente abaixo do rei desafiaram o Rei João e o obrigaram a assinar a Magna Carta em Runnymede ver o Mapa 9 O documento estabelecia alguns princípios básicos que impunham restrições significativas à autoridade do rei Acima de tudo determinava que o rei precisaria do consentimento dos barões para poder aumentar os impostos A cláusula mais controversa era a de número 61 segundo a qual os barões elegerão quaisquer 25 barões do reino que queiram os quais disporão de plenos poderes para observar manter e assegurar a observância da paz e das liberdades por nós concedidas e por eles confirmadas mediante esta nossa presente carta Em suma os barões criaram um comitê a fim de garantir a implementação da carta pelo rei e caso este não o fizesse seus 25 membros teriam o direito de apropriarse de castelos terras e propriedades até que em seu julgamento sejam feitas as devidas emendas O Rei João não ficou nem um pouco satisfeito e assim que os nobres se dispersaram conseguiu que o papa anulasse a Magna Carta Não obstante tanto o poder político dos barões quanto a influência do documento se manteriam A Inglaterra havia dado seu primeiro e hesitante passo em direção ao pluralismo Os conflitos em torno das instituições políticas prosseguiram e o poder da monarquia se veria ainda mais limitado pelo primeiro Parlamento eleito em 1265 Ao contrário da Assembleia da Plebe em Roma ou das atuais legislaturas eleitas seus membros a princípio eram nobres feudais e mais tarde cavaleiros e os mais abastados aristocratas do país Apesar de composto pelas elites o Parlamento inglês desenvolveu duas peculiaridades Primeiro representava não só as elites mais próximas e aliadas ao rei mas também um amplo leque de interesses inclusive a pequena aristocracia cujos integrantes se dedicavam a ofícios distintos como o comércio e a indústria e mais tarde os fidalgos uma nova classe de proprietários rurais comerciantes que ascenderam socialmente Assim o Parlamento veio conferir poder a uma seção bastante ampla da sociedade sobretudo pelos padrões da época Em segundo lugar e em grande parte em decorrência dessa primeira característica diversos membros do Parlamento opunhamse veementemente às tentativas da Coroa de aumentar seu poder e se constituiriam no esteio dos adversários da monarquia na Guerra Civil inglesa e em seguida na Revolução Gloriosa A despeito da Magna Carta e do primeiro Parlamento eleito os conflitos políticos em torno dos poderes da monarquia e de quem seria nomeado rei prosseguiram Esses conflitos dentro da elite foram encerrados com a Guerra das Rosas uma longa querela entre as casas de Lancaster e York duas famílias com pretendentes ao trono Os vencedores foram os lancastrianos cujo candidato à Coroa Henrique Tudor se sagraria Henrique VII em 1485 Deramse então dois outros processos interrelacionados O primeiro foi o reforço da centralização política deflagrada pelos Tudors A partir de 1485 Henrique VII começou a desarmar a aristocracia desmilitarizandoa e assim fazendo recrudescer o poder do Estado central Seu filho Henrique VIII implementou uma verdadeira revolução no governo por intermédio de seu principal ministro Thomas Cromwell Na década de 1530 Cromwell introduziu um incipiente Estado burocrático Em vez de o governo restringirse à casa real passaria a constituir um conjunto à parte de instituições permanentes O processo foi complementado pela ruptura de Henrique VIII com a Igreja Católica Romana e a Dissolução dos Monastérios por meio da qual Henrique expropriou todas as terras da Igreja A eliminação do poder da Igreja foi parte do processo de centralização do Estado E instituições estatais mais centralizadas significavam que pela primeira vez instituições políticas inclusivas tornavamse possíveis O processo iniciado por Henrique VII e Henrique VIII não só centralizou as instituições mas também incrementou a demanda por uma representação política de base mais ampla Tal processo de centralização pode de fato acarretar uma forma de absolutismo à medida que o rei e seus asseclas podem vir a esmagar outros grupos poderosos da sociedade e essa é uma das razões por que há oposição à centralização do Estado como vimos no Capítulo 3 Entretanto indo de encontro a essa força as instituições centralizadoras podem também mobilizar a demanda por uma modalidade incipiente de pluralismo como na Inglaterra dos Tudors Quando os barões e as elites locais reconhecem que o poder político será cada vez mais centralizado e que esse processo será difícil de reverter reivindicam o direito de ter voz ativa com relação ao uso que se fará desse poder centralizado Na Inglaterra no final do século XV e durante todo o século XVI isso implicou a intensificação dos esforços desses grupos no sentido de transformar o Parlamento em um contrapeso à Coroa e de impor controles parciais ao modo de funcionamento do Estado Assim o projeto dos Tudors não só desencadeou uma centralização política um dos pilares das instituições inclusivas mas também contribuiu indiretamente para o outro pilar o pluralismo Esses desdobramentos em termos das instituições políticas deramse no contexto de outras mudanças significativas na própria natureza da sociedade Particularmente significativo foi o recrudescimento dos conflitos políticos que ampliaram o leque de grupos capazes de apresentar suas demandas à monarquia e às elites políticas A Revolta Camponesa de 1381 página 78 foi seminal depois dela a elite inglesa foi sacudida por uma longa sequência de insurreições populares O poder político estava sendo redistribuído não apenas do rei para os nobres mas também da elite para o povo Essas transformações aliadas às crescentes restrições impostas ao poder monárquico possibilitou o surgimento de uma vasta coalizão de oposição ao absolutismo lançando assim as bases para instituições políticas pluralistas Apesar de contestadas as instituições políticas e econômicas herdadas e mantidas pelos Tudors eram ainda claramente extrativistas Em 1603 Elizabeth I filha de Henrique VIII que subira ao trono em 1553 morreu sem deixar filhos e os Tudors foram substituídos pela dinastia Stuart O primeiro Rei Stuart Jaime I herdou não só as instituições mas os conflitos dos quais eram pivôs Sua ambição era ser um governante absolutista Embora o Estado tenha se tornado mais centralizado e as mudanças sociais estivessem promovendo uma redistribuição de poder na sociedade as instituições políticas ainda não chegavam a ser pluralistas Na economia o extrativismo manifestavase não só na oposição ao invento de Lee mas sob a forma de monopólios monopólios e mais monopólios Em 1601 uma lista deles foi lida no Parlamento e um de seus membros indagou ironicamente O pão está incluído aí Em 1621 eram 700 deles Nas palavras do historiador inglês Christopher Hill cada homem vivia em uma casa construída com tijolos monopolizados com janelas de vidro monopolizado aqueciase com carvão monopolizado na Irlanda lenha monopolizada que ardia em uma grelha forjada em ferro monopolizado Lavavase com sabão monopolizado e às roupas com goma monopolizada Vestia se com rendas monopolizadas tecidos monopolizados couro monopolizado fios de ouro monopolizados Suas roupas eram seguras por cintos monopolizados botões monopolizados alfinetes monopolizados e tingidas com corantes monopolizados Comia manteiga monopolizada groselhas monopolizadas arenque monopolizado salmão monopolizado e lagostas monopolizadas Temperava a comida com sal monopolizado pimenta monopolizada vinagre monopolizado Escrevia com penas monopolizadas em papel de carta monopolizado lia com óculos monopolizados e à luz de velas monopolizadas livros de impressão monopolizada Esses e muitos outros monopólios conferiam a indivíduos ou grupos o direito exclusivo de controlar a produção de muitos bens impedindo o tipo de alocação de talentos que é tão crucial à prosperidade econômica Tanto Jaime I quanto seu filho e sucessor Carlos I aspiravam a reforçar a Coroa reduzir a influência do Parlamento e estabelecer instituições absolutistas similares às que estavam sendo estruturadas na Espanha e França de modo a intensificar o controle exercido pelo trono e pela elite sobre a economia tornando as instituições mais extrativistas Os conflitos entre Jaime I e o Parlamento chegaram ao clímax na década de 1620 tendo por pivô o controle do comércio tanto ultramarino como dentro das Ilhas Britânicas A concessão de monopólios pela Coroa era uma das principais fontes de renda do Estado sendo usada com frequência como uma maneira de conferir direitos exclusivos aos partidários do rei Não admira que essa instituição extrativista que impedia o acesso e inibia o funcionamento do mercado fosse tão altamente daninha à atividade econômica e aos interesses de muitos membros do Parlamento Em 1623 o Parlamento obteve uma vitória notável ao conseguir promulgar o Estatuto dos Monopólios proibindo Jaime I de implementar novos monopólios domésticos Contudo ele ainda poderia conceder monopólios no campo do comércio externo visto que a autoridade do Parlamento não se estendia às relações internacionais Assim os monopólios já existentes internacionais ou não permaneceram intactos O Parlamento não tinha reuniões regulares precisando ser convocado pelo rei Segundo a convenção determinada pela Magna Carta a convocação era necessária para que o Parlamento avaliasse novos impostos propostos pelo rei Carlos I foi coroado em 1625 recusouse a convocar o Parlamento a partir de 1629 e intensificou os esforços de Jaime I no sentido de consolidar o regime absolutista Impôs empréstimos forçados ou seja forçou a população a emprestarlhe dinheiro modificando unilateralmente os termos dos acordos e recusandose a quitar suas dívidas Criou e vendeu monopólios no âmbito que o Estatuto dos Monopólios lhe havia deixado o das empreitadas comerciais no estrangeiro Solapou a independência do Judiciário e tentou intervir e influenciar no resultado de julgamentos Instituiu diversas multas e taxas das quais a mais polêmica foi a tarifa naval cobrando dos condados litorâneos a partir de 1634 uma taxa para sustentar a Marinha Real e no ano seguinte estendendo a cobrança aos condados do interior Essa tarifa naval seria coletada anualmente até 1640 O comportamento cada vez mais absolutista de Carlos e suas políticas extrativistas fomentaram o ressentimento e geraram resistência em todo o país Em 1640 estalou o conflito com a Escócia e sem dinheiro para aparelhar o exército o rei foi forçado a convocar o Parlamento e solicitar aumento dos impostos O chamado Parlamento Breve reuniuse por apenas três semanas Os parlamentares que se apresentaram em Londres não só se recusaram a discutir os impostos como expressaram uma série de queixas até que Carlos optou por dispensálos Os escoceses percebendo que Carlos não contava com apoio em seu país invadiram a Inglaterra ocupando a cidade de Newcastle Carlos entabulou negociações e os invasores exigiram a participação do Parlamento obrigandoo a convocar o que ficou então conhecido como Parlamento Longo pois continuaria reunido até 1648 recusandose a dissolverse mesmo quando o rei assim o determinou Em 1642 irrompeu a Guerra Civil entre o monarca e o Parlamento ainda que muitos parlamentares tenham se aliado ao trono O padrão dos conflitos refletiu a contenda em torno das instituições políticas e econômicas O Parlamento pretendia pôr fim às instituições políticas absolutistas o rei queria reforçálas O conflito tinha profundas raízes econômicas Muitos apoiaram a Coroa por terem sido agraciados com lucrativos monopólios por exemplo os monopólios locais controlados pelos ricos e poderosos mercadores de Shrewsbury e Oswestry eram protegidos pelo trono da concorrência dos mercadores londrinos Esses mercadores aliaramse a Carlos I Por outro lado a indústria metalúrgica havia florescido na região de Birmingham porque ali os monopólios eram fracos e os recémchegados à indústria não precisavam submeter se aos sete anos de aprendizado exigidos no resto do país durante a Guerra Civil fabricaram espadas e voluntariaramse para o lado do Parlamento Analogamente a falta de restrições associativas no condado de Lancashire permitiu o desenvolvimento ainda antes de 1640 dos novos tecidos um novo estilo de fazendas mais leves a região onde a produção desses tecidos se concentrava foi a única área de Lancashire a apoiar o Parlamento Sob a liderança de Oliver Cromwell os parlamentaristas conhecidos como Cabeças Redondas pelo estilo de corte de cabelo que adotavam derrotaram os realistas conhecidos como Cavaleiros Carlos foi levado a julgamento e executado em 1649 Sua derrota e a abolição da monarquia entretanto não produziram instituições inclusivas pelo contrário a monarquia foi substituída pela ditadura de Oliver Cromwell Após a morte deste a monarquia foi restaurada em 1660 voltando a aferrarse a muitos dos privilégios que lhe haviam sido arrancados em 1649 O filho de Carlos Carlos II retomou então o velho projeto de instauração do absolutismo na Inglaterra Suas tentativas seriam apenas intensificadas por seu irmão Jaime II que o sucederia no trono após sua morte em 1685 Em 1688 a tentativa do rei de restabelecer o absolutismo provocou outra crise desencadeando nova guerra civil O Parlamento dessa vez encontravase mais unido e organizado e convidou o Statholder holandês Guilherme de Orange e sua esposa Maria a filha protestante de Jaime para o trono deste Guilherme traria um exército e reivindicaria o trono para governar não como monarca absoluto mas sob uma monarquia constitucional forjada pelo Parlamento Dois meses após o desembarque de Guilherme nas Ilhas Britânicas em Brixham Devon ver o Mapa 9 as tropas de Jaime se dispersaram e ele fugiu para a França A REVOLUÇÃO GLORIOSA Após a vitória na Revolução Gloriosa o Parlamento e Guilherme negociaram uma nova Constituição As mudanças prenunciadas pela Declaração feita por Guilherme às vésperas de sua invasão seriam consagradas na Declaração de Direitos formulada pelo Parlamento em fevereiro de 1689 A Declaração foi lida para Guilherme na mesma sessão em que lhe foi ofertada a coroa Sob diversos aspectos a Declaração intitulada Carta de Direitos Bill of Rights após ser convertida em lei era vaga o mais crucial porém era o fato de que efetivamente estabelecia certos princípios constitucionais centrais Determinava a sucessão ao trono e de um modo que divergia significativamente dos princípios hereditários em vigor até então Se o Parlamento pudera uma vez destituir um monarca e substituílo por outro mais do seu agrado por que não fazêlo novamente A Declaração de Direitos asseverava também que o monarca não poderia suspender ou promulgar leis e reiterava a ilegalidade dos impostos que não gozassem de aprovação parlamentar Ademais determinava que não poderia haver Exército permanente na Inglaterra sem consentimento parlamentar A ambiguidade se manifestava em clausulas como a de número 8 que estabelecia que a eleição dos membros do Parlamento deve ser livre sem explicitar como esse grau de liberdade seria determinado Ainda mais obscura era a cláusula 13 cujo ponto central era que o Parlamento se reunisse com frequência Uma vez que quando e se o Parlamento se reuniria haviam sido questões tão contenciosas durante todo o século seria de se esperar uma especificidade bem maior nesse artigo Não obstante o motivo de tamanha imprecisão é claro Cláusulas têm de ser cumpridas Durante o reinado de Carlos II estivera em vigor uma Lei Trienal que estipulava que o Parlamento fosse convocado no mínimo uma vez a cada três anos Entretanto Carlos a tinha ignorado por completo sem que nada acontecesse pois não havia como impor seu cumprimento Após 1688 o Parlamento poderia ter aproveitado para introduzir algum dispositivo que assegurasse que ela fosse respeitada do mesmo modo como os barões haviam feito com seu conselho depois da assinatura da Magna Carta pelo Rei João Não o fez entretanto por ser desnecessário a autoridade e o poder decisório após 1688 passaram às mãos do Parlamento Mesmo sem regras ou legislação específicas Guilherme abdicou de muitas das práticas dos monarcas anteriores Parou de interferir em decisões legais e abriu mão de direitos régios até então como a apropriação vitalícia da receita alfandegária Em seu conjunto essas mudanças nas instituições políticas representaram o triunfo do Parlamento sobre o trono e portanto o fim do absolutismo na Inglaterra e posteriormente na GrãBretanha a partir da integração de Inglaterra e Escócia pela Lei da União em 1707 Desde então o Parlamento manteve se no firme controle das políticas de Estado o que fez uma enorme diferença visto que os interesses do Parlamento eram muito diversos daqueles dos reis Stuart Como muitos integrantes da casa tinham consideráveis investimentos no comércio e na indústria nutriam o mais profundo interesse pelo asseguramento dos direitos de propriedade Se antes eles volta e meia eram infringidos pelos Stuarts de agora em diante seriam defendidos com vigor Ademais quando cabia aos monarcas determinar como o governo despenderia seus recursos os parlamentares opunhamse ao aumento de impostos e bradavam contra qualquer menção ao reforço do poder do Estado Agora que era a própria casa que controlava os gastos este de bom grado aumentava a carga tributária e canalizava fundos para as atividades que considerasse relevantes Destas a principal era o fortalecimento da Marinha encarregada de proteger os interesses mercantis ultramarinos de muitos dos membros do Parlamento Ainda mais importante que os interesses dos parlamentares era a incipiente natureza pluralista das instituições políticas O povo inglês passou a ter acesso tanto ao Parlamento quanto às políticas e instituições econômicas ali forjadas de uma maneira sem precedentes no tempo em que as políticas públicas eram ditadas pela Coroa A mudança deveuse parcialmente é claro ao fato de os membros do Parlamento agora serem eleitos Contudo uma vez que a Inglaterra estava longe de ser uma democracia nesse período tal acesso gerou somente um pequeno grau de responsividade Uma de suas muitas desigualdades consistia em que no século XVIII menos de 2 da população tinha direito a voto e tinham de ser homens As cidades onde a Revolução Industrial ocorreu Birmingham Leeds Manchester e Sheffield não dispunham de representação independente no Parlamento e pelo contrário as regiões rurais gozavam de representação excessiva Igualmente negativos eram os fatos de que o direito a voto nas áreas rurais os condados baseavase na propriedade da terra ao passo que diversas áreas urbanas os burgos eram controladas por uma pequena elite que não concedia aos novos industrialistas o direito ao voto ou à candidatura a cargos eletivos No burgo de Buckingham por exemplo 13 cidadãos tinham exclusividade do direito a voto Ademais havia os burgos podres que por tradição possuíam direito a voto mas se haviam deteriorado porque sua população com o tempo havia ido embora ou como no caso de Dunwich no litoral leste da Inglaterra literalmente se precipitara no oceano em decorrência da erosão costeira Em todos os burgos podres número reduzido de eleitores escolhia dois membros para o Parlamento Old Sarum tinha 7 votantes e Dunwich 32 mas ambas elegiam dois parlamentares do mesmo modo Havia contudo outras maneiras de influenciar o Parlamento e por conseguinte as instituições econômicas A mais importante era por petição muito mais significativa que o alcance restrito da democracia para a emergência do pluralismo após a Revolução Gloriosa Qualquer um podia enviar uma petição ao Parlamento e as petições choviam Sintomaticamente eram recebidas com atenção pelo Parlamento um sinal acima de tudo da queda do absolutismo do poder recémadquirido por uma fatia relativamente ampla da sociedade e da ascensão do pluralismo na Inglaterra após 1688 O ritmo frenético com que as petições chegavam mostra o quanto era vasto o segmento da população indo muito além dos que ocupavam assentos no Parlamento ou eram por eles representados que tinha o poder de influenciar o modo de funcionamento do Estado E era um poder bem utilizado O caso dos monopólios é o melhor exemplo do que queremos dizer Já vimos como estes se encontravam no cerne das instituições econômicas extrativistas no século XVII Viramse atacados em 1623 com o Estatuto dos Monopólios e representaram significativo pomo da discórdia durante a Guerra Civil inglesa O Parlamento Longo aboliu todos os monopólios que afetavam a vida da população no âmbito doméstico Embora nem Carlos II nem Jaime II os tenham restaurado conseguiram resguardar sua capacidade de conceder monopólios ultramarinos Um deles foi a Royal African Company cuja carta de monopólio foi emitida por Carlos II em 1660 Essa companhia detinha o monopólio do lucrativo tráfico de escravos africano e seu governador e principal acionista era o irmão de Carlos Jaime que em breve seria entronizado Jaime II Depois de 1688 a companhia perdeu não só seu governador mas seu maior defensor Jaime havia se dedicado assiduamente à proteção do seu monopólio face aos entrelopos os comerciantes independentes que tentavam adquirir escravos no Oeste da África e vendêlos nas Américas Era um comércio muito rentável e a Royal African Company enfrentava muitos desafios já que todas as demais atividades mercantis inglesas no Atlântico eram livres Em 1689 a companhia confiscou o carregamento de um desses entrelopos um certo Nightingale Nightingale processoua por confisco ilegal de bens e o Presidente da Suprema Corte Holt determinou a ilegalidade do ato por tratarse do exercício de um direito de monopólio criado por prerrogativa real Ora argumentou Holt os privilégios de monopólio só podiam ser criados por estatuto o que tinha de ser feito pelo Parlamento Assim Holt depositou todos os futuros monopólios não só a Royal Africa Company nas mãos do Parlamento Até 1688 Jaime II teria rapidamente destituído qualquer juiz que emitisse tal sentença desde 1688 porém muita coisa estava diferente O Parlamento precisava agora decidir o que fazer com o monopólio e começaram a chegar petições 135 no total vindas de entrelopos que solicitavam livre acesso ao comércio no Atlântico Embora a Royal African Company tenha respondido na mesma moeda não tinha como fazer frente ao número ou escopo das petições que exigiam sua derrota Os entrelopos conseguiram enquadrar seus protestos em termos não só de seus mais estritos interesses pessoais mas do interesse nacional o que de fato eram Por conseguinte apenas 5 das 135 petições eram assinadas pelos entrelopos em si e 73 das petições dos entrelopos vinham de províncias fora de Londres contra 8 em favor da companhia Das colônias onde as petições não eram permitidas os entrelopos reuniram 27 petições a companhia 11 Os entrelopos colheram também um número muito maior de assinaturas para suas petições montando a 8 mil contra 25 mil em favor da companhia A batalha prosseguiria até 1698 quando o monopólio da Royal African Company foi abolido Junto com esse novo núcleo para elaboração das instituições econômicas e a nova responsividade pós1688 os parlamentares começaram a implementar uma série de mudanças fundamentais nas instituições econômicas e políticas públicas que em última instância preparariam o terreno para a Revolução Industrial Os direitos de propriedade tão desgastados sob os Stuarts foram reforçados O Parlamento deu início a um processo de reforma das instituições econômicas a fim de fomentar a atividade manufatureira em vez de ameaçála e onerála A fumagem imposto anual cobrado por cada lareira ou fogão e que incidia mais pesadamente sobre as manufaturas que eram suas ferrenhas opositoras foi extinta em 1689 logo após a ascensão de Guilherme e Maria ao trono Em vez de taxar as lareiras o Parlamento começou a onerar a terra A redistribuição da carga tributária não foi apenas uma política promanufatureira apoiada pelo Parlamento Foi aprovada toda uma série de leis no intuito de expandir o mercado e a rentabilidade dos têxteis de lã o que fazia todo sentido em termos políticos já que muitos dos parlamentares opositores de Jaime investiam pesadamente naqueles empreendimentos manufatureiros nascentes O Parlamento aprovou ainda uma legislação que possibilitou a total reorganização dos direitos de propriedade sobre a terra permitindo a consolidação e eliminação de diversas formas arcaicas de propriedade e direitos de uso Outra prioridade do Parlamento era a reforma das finanças Embora tivesse havido uma expansão do sistema bancário e financeiro no período que levou à Revolução Gloriosa o processo seria consolidado com a criação do Banco da Inglaterra em 1694 como fonte de recursos para a indústria outra consequência direta da referida revolução A fundação do banco preparou o terreno para uma revolução financeira mais ampla que acarretaria grande expansão dos mercados financeiros e serviços bancários No princípio do século XVIII havia empréstimos disponíveis para quem dispusesse das garantias necessárias para oferecer Os registros do período 17021724 de um banco londrino relativamente pequeno o C Hoares Co que chegaram intactos até nós ilustram essa questão Embora o banco emprestasse dinheiro para aristocratas e nobres dois terços dos maiores tomadores do Hoares nesse período não pertenciam às classes sociais privilegiadas Pelo contrário eram mercadores e homens de negócios entre eles certo John Smith epônimo do inglês médio que contraiu um empréstimo de 26 mil junto ao banco entre 1715 e 1719 Até aqui sublinhamos como a Revolução Gloriosa transformou as instituições políticas inglesas tornandoas mais pluralistas além de lançar as bases para instituições econômicas inclusivas Contudo outra mudança significativa nas instituições nasceu da Revolução Gloriosa o Parlamento deu continuidade ao processo de centralização política iniciado pelos Tudors Não foram só as restrições que aumentaram ou o Estado que passou a regular a economia de outra forma ou a gastar dinheiro com outras coisas mas a capacidade e recursos estatais se ampliaram também em todos os sentidos o que vem novamente ilustrar a relação entre centralização política e pluralismo até 1688 o Parlamento se opusera a aumento da eficácia e melhor aparelhamento do Estado por não dispor de meios para controlálo Depois dessa data a história já era outra O Estado começou a se expandir e seus gastos logo chegaram a cerca de 10 da renda nacional graças a uma expansão da base tributária relativa sobretudo aos impostos que incidiam sobre a fabricação de uma longa lista de itens produzidos no país Era um enorme orçamento de Estado para a época com efeito maior do que o que se encontra hoje em vários lugares do mundo O orçamento colombiano por exemplo só atingiria o mesmo tamanho relativo na década de 1980 Em muitos lugares da África subsaariana como Serra Leoa ainda hoje o orçamento de Estado seria muito inferior em relação ao tamanho total da economia sem o significativo influxo de ajuda estrangeira A expansão do tamanho do Estado porém corresponde a apenas parte do processo de centralização política Mais importante é o modo qualitativo de funcionamento do Estado e o modo de agir dos que o controlam e nele trabalham Embora a construção das instituições estatais na Inglaterra remonte à Idade Média as medidas decisivas rumo à centralização política e ao desenvolvimento da moderna administração foram como vimos página 146 tomadas por Henrique VII e Henrique VIII Mesmo assim o Estado ainda estava longe do formato moderno que emergiria após 1688 Por exemplo muitas indicações eram feitas seguindo critérios políticos não com base no mérito ou talento e o Estado dispunha ainda de possibilidades muito restritas de aumentar os impostos Depois de 1688 o Parlamento começou a melhorar a capacidade de incrementar sua receita por meios tributários como bem se nota pela sofisticação da burocracia envolvida no imposto sobre a produção que deu um salto de 1211 funcionários em 1690 para 4800 em 1780 Os inspetores fiscais eram designados para postos espalhados por todo o país supervisionados por coletores que participavam de rondas para medição e checagem das quantidades de pão cerveja e outros itens sujeitos a tributação A amplitude dessa operação é ilustrada pela reconstituição das rondas do Supervisor George Cowperthwaite pelo historiador John Brewer Entre 12 de junho e 5 de julho de 1710 o Supervisor Cowperthwaite percorreu 465 quilômetros no distrito de Richmond em Yorkshire Nesse período visitou 263 estalajadeiros 71 malteiros 20 fabricantes de velas e um cervejeiro comum No total tomou 81 medidas diferentes de produção e verificou o trabalho de 9 coletores que lhe eram subordinados Oito anos mais tarde o encontramos trabalhando com o mesmo empenho mas agora no distrito de Wakefield em outra região de Yorkshire Em Wakefield ele percorria em média mais de 30 quilômetros por dia e trabalhava seis dias por semana normalmente inspecionando quatro ou cinco estabelecimentos Em seu dia de folga aos domingos preenchia seus livros de modo a manter um registro atualizado de suas atividades Com efeito o sistema de arrecadação era de registro muito elaborado Havia três tipos de registros diferentes os três deveriam coincidir e qualquer adulteração dos números era considerada crime grave Tão notável grau de supervisão da sociedade pelo Estado supera em muito a capacidade dos governos de muitos países pobres hoje e isso em 1710 Outro elemento significativo é que após 1688 o Estado começou a depender mais do talento e menos de indicações de cunho político desenvolvendo uma complexa infraestrutura para administrar o país A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL A Revolução Industrial afetou todos os aspectos da economia inglesa Houve grandes avanços nos transportes metalurgia e energia a vapor Entretanto a área mais significativa de inovação foi a mecanização da produção têxtil e o surgimento de fábricas para a produção desses tecidos manufaturados Esse processo dinâmico foi deflagrado pelas mudanças institucionais geradas pela Revolução Gloriosa Já não era mais uma questão de abolição de monopólios domésticos o que já fora conquistado em 1640 ou de arrecadação fiscal ou de acesso a recursos financeiros Tratavase agora de uma reorganização fundamental das instituições econômicas em favor dos inovadores e empreendedores a partir do surgimento de direitos de propriedade mais seguros e eficientes A maior segurança e eficiência dos direitos de propriedade desempenhou um papel central por exemplo na revolução dos transportes que preparou o terreno para a Revolução Industrial Os investimentos em canais e estradas com cobrança de pedágio aumentaram em progressão geométrica após 1688 e à medida que reduziram os custos de transporte ajudaram a criar um importante prérequisito para a Revolução Industrial Até 1688 esse tipo de investimento em infraestrutura era obstaculizado por intervenções arbitrárias dos Stuarts A mudança pós1688 é vividamente ilustrada pelo caso do Rio Salwerpe em Worcestershire Em 1662 o Parlamento aprovou uma lei estimulando iniciativas que tornassem o rio navegável e a família Baldwyn investiu 6 mil para esse fim obtendo em contrapartida o direito de cobrar pela navegação de suas águas Em 1693 apresentouse um projeto ao Parlamento para transferir os direitos de pedágio para o Conde de Shrewsbury e Lorde Coventry A nova lei foi questionada por Sir Timothy Baldwyn que imediatamente fez ao Parlamento uma petição alegando que o referido projeto representava basicamente uma expropriação de seu pai que fizera pesados investimentos no rio na expectativa do pedágio que poderia cobrar Baldwyn argumentava que o novo projeto tende a invalidar a lei anterior e a tornar nulos todo o trabalho e materiais gastos na sua consecução Esse tipo de realocação de direitos era exatamente o que os Stuarts costumavam fazer Baldwyn porém advertiu Há consequências funestas em privar um indivíduo de seus direitos adquiridos por determinação parlamentar sem seu devido consentimento O novo projeto foi indeferido e os direitos de Baldwyn mantidos Depois de 1688 os direitos de propriedade tornaramse bem mais seguros em parte porque sua garantia estava de acordo com os interesses do Parlamento em parte porque as instituições pluralistas podiam ser influenciadas pelo mecanismo de petições Observase que a partir desse ano o sistema político tornouse significativamente mais pluralista criando maior igualdade de oportunidades na Inglaterra Subjacentes à revolução dos transportes e de modo mais geral à reorganização da terra ocorrida ao longo do século XVIII estavam leis parlamentares que viriam a modificar a natureza da propriedade Até 1688 vigorava ainda a ficção jurídica de que toda a terra na Inglaterra pertencia em última instância à Coroa um legado direto da organização feudal da sociedade Muitos terrenos estavam submetidos a várias formas arcaicas de direitos de propriedade e uma série de reivindicações sobrepostas Boa parte da terra correspondia às chamadas propriedades equitativas o que significava que o proprietário não podia hipotecar arrendar nem vender a terra As terras comuns em geral só podiam ser utilizadas de maneira tradicional Havia gigantescos impedimentos ao seu uso de maneiras que pudessem ser economicamente desejáveis O Parlamento começou a reverter esse quadro ao permitir que grupos de pessoas apresentassem petições solicitando a simplificação e reorganização dos direitos de propriedade alterações que posteriormente se traduziriam em centenas de leis Tal reorganização das instituições econômicas manifestouse também no empenho em proteger a produção têxtil nacional dos produtos importados Não admira que parlamentares e seus eleitores não se opusessem a todas as barreiras alfandegárias e monopólios aqueles que lhes ampliassem os mercados e lucros eram bemvindos Entretanto o pluralismo das instituições políticas o fato de que o Parlamento representava conferia poder e dava ouvidos a amplo segmento da sociedade significava que tais barreiras não poderiam estrangular outros industrialistas ou excluir por completo a entrada de sangue novo como fizera a Serrata em Veneza páginas 122 123 Os poderosos fabricantes de lã não demorariam a fazer essa descoberta Em 1688 os tecidos indianos madras e musselinas respondiam por larga fatia das importações inglesas chegando a cerca de um quarto do total de importações de têxteis Também importantes eram as sedas chinesas Madras e sedas eram importadas pela Companhia das Índias Orientais que até 1688 desfrutava de um monopólio governamental sobre o comércio com a Ásia Contudo tal monopólio e poder político eram mantidos às custas de pesadas propinas pagas a Jaime II após 1688 a companhia viuse em posição vulnerável e não tardou a sofrer ataques sob a forma de um intenso bombardeio de petições De um lado comerciantes ávidos por atuar no Extremo Oriente e na Índia demandavam que os parlamentares liberassem a concorrência com a Companhia das Índias Orientais de outro a companhia respondia com contrapetições e ofertas de empréstimo ao Parlamento A companhia perdeu foi fundada uma nova Companhia das Índias Orientais para fazerlhe frente Entretanto os produtores têxteis não queriam apenas aumentar a concorrência no comércio indiano demandavam o aumento da carga tributária ou mesmo o banimento das importações dos tecidos baratos indianos madras que representavam para eles fortes concorrentes Àquela altura os mais importantes fabricantes ingleses produziam fazendas de lã mas os produtores de tecidos de algodão vinham ganhando importância econômica e poder político Em princípios da década de 1660 a indústria da lã intensificou suas tentativas de se proteger promovendo as Leis Suntuárias que entre outras coisas proibiam o uso de tecidos mais leves Promoveu também um pesado lobby junto ao Parlamento no sentido da aprovação de leis em 1666 e 1678 tornando ilegal que as pessoas fossem enterradas envoltas em mortalhas de qualquer outro material que não fosse lã Ambas as medidas visavam à proteção do mercado de artigos de lã e reduziram a concorrência asiática enfrentada pelos fabricantes ingleses Não obstante nessa época a Companhia das Índias Orientais era demasiado forte para que se lograsse restringir as importações de têxteis asiáticos A maré virou após 1688 Entre 1696 e 1698 os fabricantes de lã de East Anglia e de West Country aliaramse aos produtores de seda de Londres e Cantuária e à Levant Company para restringir as importações Os importadores de seda da Levant mesmo tendo acabado de perder seu monopólio queriam vetar as sedas asiáticas a fim de criar um nicho para as do Império Otomano Essa coalizão começou a apresentar projetos ao Parlamento impondo restrições ao uso de algodões e sedas asiáticos bem como ao tingimento e impressão de têxteis da Ásia na Inglaterra Em resposta em 1701 o Parlamento finalmente aprovou uma lei para o mais efetivo emprego dos pobres mediante o estímulo aos produtores deste reino Em setembro de 1701 decretou Todas as sedas bengalas e que tais mescladas a fibras vegetais de fabricação na Pérsia China ou Índia Oriental todos os madras lá pintados tingidos impressos ou coloridos que sejam ou venham a ser importados para este reino não poderão ser vestidos Agora era ilegal vestir sedas e madras asiáticos na Inglaterra Mas ainda era possível importálos para reexportar para a Europa ou outros mercados sobretudo as colônias americanas Ademais madras lisos podiam ser importados e finalizados na Inglaterra e as musselinas estavam isentas do veto Após uma longa batalha essas falhas como os fabricantes ingleses de têxteis de lã as viam foram corrigidas pela Lei de Madras de 1721 A partir de 25 de dezembro de 1722 deixará de ser legal que qualquer pessoa ou pessoas usem ou vistam na Grã Bretanha qualquer vestimenta ou traje de qualquer tipo qualquer madras impresso pintado ou tingido Uma vez eliminada a concorrência asiática às lãs inglesas restava ainda uma ativa indústria nacional de algodão e linho para fazer face à lã ambos eram misturados na fabricação de um tecido muito popular de nome fustão Excluída a concorrência asiática a indústria da lã procurou asfixiar o linho Sendo um produto oriundo basicamente da Escócia e Irlanda uma coalizão inglesa teria alguma margem de manobra para reivindicar a exclusão desses países dos mercados ingleses Todavia o poder dos fabricantes de lã tinha limites Suas novas tentativas encontraram ferrenha oposição dos produtores de fustão dos florescentes centros industriais de Manchester Lancaster e Liverpool O pluralismo das instituições políticas significava que todos esses grupos distintos agora tinham acesso ao processo de elaboração de políticas no Parlamento por votação e acima de tudo petição Embora chovessem petições dos dois lados recolhendo assinaturas favoráveis e contrárias o resultado do conflito foi uma vitória dos novos interesses contra os da indústria da lã A Lei de Manchester de 1736 reconheceu que vastas quantidades de produtos feitos de fio de linho e algodão vêm sendo há muitos anos manufaturados e tingidos ou pintados neste reino da Grã Bretanha O texto prosseguia Nenhum ponto da referida lei de 1721 será estendido ou deduzido no sentido de proibir o vestuário ou aplicação em trajes artigos domésticos mobiliário ou outros qualquer item confeccionado em fio de linho ou algodão manufaturado e tingido ou pintado em qualquer cor ou cores dentro do reino da Grã Bretanha A Lei de Manchester constituiu uma vitória significativa para os nascentes fabricantes de algodão Entretanto seu significado histórico e econômico foi na realidade muito mais profundo Em primeiro lugar demonstrou os limites às barreiras alfandegárias que as instituições políticas pluralistas da Inglaterra parlamentar tolerariam Em segundo lugar ao longo do meio século seguinte inovações tecnológicas na manufatura do algodão desempenhariam papel fundamental na Revolução Industrial acarretando transformações fundamentais para a sociedade por meio da introdução do sistema fabril Depois de 1688 enquanto no âmbito interno iam se constituindo condições mais igualitárias no plano internacional o Parlamento empenhavase em ampliar as prerrogativas inglesas o que é evidenciado não só pelas leis do madras mas também pelas leis da navegação a primeira das quais foi promulgada em 1651 e que permaneceriam em vigor de um modo ou de outro pelos 200 anos seguintes Tais leis visavam a facilitar o monopólio do comércio internacional pelos britânicos ainda que com a crucial particularidade de que se tratava de um monopólio não por parte do Estado mas do setor privado O princípio básico era que o comércio inglês deveria ser transportado em navios ingleses As leis proibiam o transporte de bens de fora da Europa para a Inglaterra ou suas colônias por embarcações de bandeira estrangeira vetavam também o transporte de produtos originários de outros países europeus para a Inglaterra em navios de uma terceira nacionalidade Tal vantagem dos comerciantes e produtores ingleses naturalmente aumentava sua margem de lucro e talvez tenha incentivado inovações nesses novos e altamente rentáveis ramos de atividade Em 1760 a combinação de todos esses fatores novos e aprimorados direitos de propriedade melhor infraestrutura regime fiscal renovado maior acesso ao crédito e agressiva proteção ao comércio e à manufatura começava a revelar seus efeitos Desse ano em diante ocorre um salto no número de invenções patenteadas e a profusão de avanços tecnológicos que constituiria o cerne da Revolução Industrial vai ficando evidente As inovações se davam nas mais diversas frentes refletindo o ambiente institucional mais arejado Nesse sentido um campo crucial foi o da energia mais notadamente as novidades no uso dos motores a vapor frutos das ideias de James Watt na década de 1760 A primeira inovação de Watt foi a introdução de uma câmara de condensação à parte para o vapor de modo que o cilindro onde se alojava o pistão pudesse ser mantido em alta temperatura todo o tempo em vez de precisar ser sucessivamente aquecido e resfriado Mais tarde ele desenvolveria diversas outras ideias métodos mais eficientes de conversão do movimento do motor a vapor em energia útil por exemplo dos quais o mais notável foi seu sistema planetário de engrenagens Em todas essas áreas as inovações tecnológicas basearamse em trabalhos anteriores de terceiros No caso do motor a vapor incluise aí a obra pioneira do inventor inglês Thomas Newcomen e também de Dionysius Papin físico e inventor francês A história da invenção de Papin é outro exemplo de como sob instituições extrativistas o risco de destruição criativa impede os avanços tecnológicos Em 1679 Papin desenvolveu o projeto de um digestor de vapor e em 1690 havia chegado a um motor de pistões Em 1705 usou esse motor rudimentar para construir o primeiro barco a vapor do mundo Na época Papin era professor de Matemática na Universidade de Marburg no estado germânico de Kassel e resolveu testar o barco descendo o Rio Fulda até o Rio Weser Qualquer barco que fizesse esse percurso era obrigado a parar na cidade de Münden Naquele tempo o tráfego fluvial no Fulda e no Weser era monopólio de uma guilda de barqueiros Papin deve ter imaginado que poderia enfrentar problemas Seu amigo e mentor o célebre físico alemão Gottfried Leibniz escreveu para o eleitor de Kassel o chefe de Estado solicitando permissão para que Papin passasse sem ser molestado por Kassel O pedido porém foi negado e Leibniz recebeu a lacônica resposta de que os conselheiros eleitorais encontraram graves obstáculos à concessão da supracitada petição e sem indicar suas razões ordenaramme que vos informasse de sua decisão por conseguinte o pedido será indeferido por sua Alteza Eleitoral Inconformado Papin resolveu realizar a travessia do mesmo modo Quando seu barco chegou a Münden a guilda de barqueiros primeiro tentou que um juiz local apreendesse a embarcação mas sem sucesso Os barqueiros então cercaram o barco de Papin e o destruíram junto com o motor a vapor Papin morreria na pobreza e seu nome seria relegado ao esquecimento Na Inglaterra dos Tudors ou Stuarts Papin talvez recebesse tratamento hostil similar mas tudo mudou depois de 1688 De fato quando seu barco foi destruído sua intenção era navegar até Londres Na metalurgia contribuições cruciais foram feitas na década de 1780 por Henry Cort que introduziu novas técnicas de depuração do ferro possibilitando a produção de um metal de qualidade muito superior fator crítico para a manufatura de pregos ferramentas e peças para máquinas A produção de grande quantidade de ferro batido por meio das técnicas de Cort foi facilitada pelas inovações introduzidas desde 1709 por Abraham Darby e seus filhos pioneiros no uso do carvão na fundição do minério O processo seria aprimorado em 1762 mediante a adaptação por John Smeaton de energia hidráulica para mover cilindros sopradores no refino do coque Desde então o carvão vegetal desapareceria da produção do ferro sendo substituído pela hulha muito mais barata e acessível Muito embora as inovações não sejam cumulativas houve evidente aceleração em meados do século XVIII e em nenhum campo esse efeito foi mais visível do que na produção têxtil A operação mais básica na produção de têxteis é a fiação que consiste na extração de fibras de origem vegetal ou animal como algodão ou lã e enrolálas formando o fio Este por sua vez é tecido formando o pano Uma das grandes inovações tecnológicas do período medieval foi a roda de fiar que veio a substituir a fiação manual Esse invento surgiu por volta de 1280 na Europa provavelmente oriunda do Oriente Médio Os métodos de fiação permaneceriam intactos até o século XVIII Começaram a despontar inovações significativas a partir de 1738 quando Lewis Paul patenteou um novo método usando roletes para substituir as mãos humanas na extração das fibras fiadas Contudo seu aparelho não funcionava muito bem e foram as inovações de Richard Arkwright e James Hargreaves que de fato revolucionaram a fiação Em 1769 Arkwright uma das figuras mais proeminentes da Revolução Industrial patenteou sua máquina de tecer hidráulica um gigantesco avanço em relação à de Lewis Associouse a Jedediah Strutt e Samuel Need fabricantes de malha e em 1771 construíram uma das primeiras fábricas do mundo em Cromford As novas máquinas eram movidas a água e Arkwright mais tarde faria a crucial transição para a energia a vapor Em 1774 sua empresa contava com 600 operários Expandiuse a largos passos acabando por estabelecer fábricas em Manchester Matlock Bath e New Lanark na Escócia As inovações de Arkwright foram complementadas em 1764 pela invenção da máquina de fiar hidráulica por Hargreaves aprimorada por Samuel Crompton em 1779 dando origem à mula e posteriormente por Richard Roberts criador da mula automática Os efeitos dessas novidades foram verdadeiramente revolucionários no começo do século eram necessárias 50 mil horas para fiar à mão 45 quilos de algodão A máquina hidráulica de Arkwright era capaz de realizar o mesmo volume de trabalho em 300 horas e a mula automática em 135 A mecanização da fiação foi acompanhada da mecanização da tecelagem O primeiro passo importante nesse sentido foi a invenção da lançadeira voadora por John Kay em 1733 Ainda que a princípio ela tenha se limitado a aumentar a produtividade das tecelãs manuais seu impacto mais duradouro seria na preparação do terreno para o processo mecanizado Partindo da lançadeira voadora Edmund Cartwright introduziu o tear mecânico em 1785 a primeira de uma série de inovações que levariam por fim à substituição do trabalho manual pelas máquinas também na tecelagem como já acontecia na fiação Além de ser a força motriz da Revolução Industrial a indústria têxtil inglesa também revolucionou a economia mundial As exportações inglesas encabeçadas pelas fazendas de algodão duplicaram entre 1780 e 1800 Foi o crescimento nesse setor que impulsionou toda a economia A combinação de inovação tecnológica e organizacional constituiu o modelo de progresso econômico que transformou as economias do mundo que enriqueceriam Para levar a cabo tal transformação era crucial que houvesse novas cabeças cheias de novas ideias Consideremos a inovação nos transportes Na Inglaterra houve sucessivas ondas de inovação primeiro os canais depois as estradas por fim as ferrovias A cada etapa os inovadores eram gente nova Os canais começaram a surgir na Inglaterra a partir de 1770 e em 1810 já interligavam muitas das mais importantes regiões manufatureiras À medida que transcorria a Revolução Industrial os canais desempenharam papel significativo na redução dos custos de transporte dos grandes volumes de novos bens industriais como os têxteis de algodão e os insumos necessários à produção sobretudo o algodão cru e a hulha para os motores a vapor Os pioneiros na construção de canais foram homens como James Brindley contratado pelo Duque de Bridgewater para abrir o canal de mesmo nome que acabaria ligando a cidade industrial de Manchester ao Porto de Liverpool Nascido na Derbyshire rural Brindley era por profissão construtor de moinhos e sua reputação de encontrar soluções criativas para problemas de engenharia chegou ao conhecimento do duque Não possuía nenhuma experiência prévia com os problemas relacionados a transportes caso também de outros grandes engenheiros de canais como Thomas Telford que começou a vida como pedreiro ou John Smeaton engenheiro e ferramenteiro Do mesmo modo como os mais proeminentes engenheiros de canais não tinham nenhuma ligação anterior com o campo dos transportes os grandes engenheiros de estradas e ferroviários também não John McAdam que inventou o macadame betuminoso por volta de 1816 era o segundo filho de uma família da pequena nobreza A primeira locomotiva a vapor foi construída em 1804 por Richard Trevithick cujo pai envolveuse com mineração na Cornualha Richard ingressou ainda jovem no mesmo ramo de negócios tendo ficado fascinado pelos motores a vapor usados para bombear as minas Mais importantes foram as inovações de George Stephenson filho de pais analfabetos e construtor da célebre locomotiva The Rocket que começou trabalhando como maquinista em uma mina de carvão Foram também novos homens que movimentaram a crucial indústria têxtil de algodão Alguns dos pioneiros desse novo setor foram pessoas até então profundamente envolvidas na produção e comércio de fazendas de lã John Foster por exemplo empregava 700 tecelões manuais na indústria de lã quando mudou para o algodão e fundou a Black Dyke Mills em 1835 Perfis como o de Foster no entanto eram minoria Apenas cerca de um quinto dos principais industrialistas da época tinha experiência prévia em qualquer atividade manufatureira Não admira Por um lado a indústria do algodão despontou em novas cidades no norte da Inglaterra As fábricas eram uma maneira completamente nova de organizar a produção A indústria da lã organizavase de maneira muito distinta distribuindo a matériaprima para os trabalhadores levarem para casa onde fiavam e teciam por conta própria Em sua maioria portanto os envolvidos na indústria da lã estavam muito mal preparados para aderir ao algodão como no caso de Foster Era preciso forasteiros para desenvolver e utilizar as novas tecnologias A rápida expansão do algodão dizimou a indústria da lã a destruição criativa em ação A destruição criativa promove uma redistribuição não só da renda e da riqueza mas também do poder político como William Lee pôde constatar ao depararse com autoridades que por receio de suas consequências políticas mostraramse tão pouco receptivas à sua invenção À medida que a economia industrial se expandia em Manchester e Birmingham os novos donos de fábricas e grupos de classe média que surgiram ao seu redor começaram a questionar sua falta de direitos políticos e as políticas governamentais que se opunham aos seus interesses Seu alvo principal foram as leis do trigo que vedavam a importação de trigo na verdade todos os grãos e cereais mas principalmente o trigo caso os preços caíssem demais garantindo assim a margem de lucro dos grandes proprietários rurais Era uma ótima política para os grandes produtores de trigo mas péssima para os manufaturadores que precisavam arcar com salários mais altos para compensar a alta do preço do pão Com os trabalhadores concentrados nas novas fábricas e centros industriais ficou mais fácil organizarse e promover insurreições Na década de 1820 a exclusão política dos novos manufaturadores e centros manufatureiros estava se tornando insustentável Em 16 de agosto de 1819 planejouse um comício para criticar o sistema político e as políticas governamentais a realizarse em St Peters Fields Manchester O organizador era Joseph Johnson fabricante local de pincéis e um dos fundadores do jornal radical Manchester Observer Entre outros organizadores estavam John Knight produtor de algodão e reformador e John Thacker Saxton editor do Manchester Observer Reuniramse 60 mil manifestantes muitos exibindo cartazes com os dizeres Chega das Leis do Trigo Sufrágio Universal e Voto na Urna referência ao voto secreto não aberto como ainda em voga então As autoridades muito nervosas com a manifestação haviam reunido uma força de 600 hussardos Quando começaram os discursos um magistrado local decidiu emitir um mandado para prisão dos palestrantes Quando a polícia tentou executar a ordem deparouse com a oposição da multidão e instalouse o conflito A essa altura os hussardos arremeteramse contra a multidão Ao cabo de alguns minutos caóticos havia 11 mortos e provavelmente 600 feridos O Manchester Observer chamou o ocorrido de Massacre de Peterloo Em vista das transformações já sofridas pelas instituições políticas e econômicas a longo prazo a repressão na Inglaterra não seria uma solução O Massacre de Peterloo não passaria de um incidente isolado Após o levante as instituições políticas inglesas cederam à pressão e à ameaça desestabilizadora de uma agitação social ainda maior ainda mais depois da revolução de 1830 na França contra Carlos X que havia tentado restaurar o absolutismo posto abaixo pela Revolução Francesa de 1789 Em 1832 o governo inglês promulgou a Primeira Lei da Reforma conferindo direitos a Birmingham Leeds Manchester e Sheffield e ampliando a base de votação de modo que os manufaturadores ganhassem representação no Parlamento O consequente deslocamento do poder político inclinou as políticas públicas na direção desejada por esses interesses recémrepresentados assim em 1846 as detestadas leis do trigo foram por fim abolidas mais uma vez demonstrando que a destruição criativa implicava a redistribuição não só da renda mas também do poder político E naturalmente toda mudança na distribuição de poder político levaria com o tempo a nova redistribuição de renda Foi a natureza inclusiva das instituições inglesas que possibilitou a ocorrência desse processo Os que seriam prejudicados pela destruição criativa e a temiam não teriam mais condições de evitála POR QUE NA INGLATERRA A Revolução Industrial teve início e deu seus maiores passos na Inglaterra em virtude de suas instituições econômicas inclusivas caso único no mundo Estas por sua vez erguiamse sobre as bases lançadas pelas instituições políticas inclusivas produzidas pela Revolução Gloriosa Esta fora a responsável pelo fortalecimento e racionalização dos direitos de propriedade aprimoramento dos mercados financeiros enfraquecimento dos monopólios sancionados pelo Estado no comércio exterior e remoção das barreiras à expansão da indústria Foi a Revolução Gloriosa que tornou o sistema político aberto e responsivo às aspirações e necessidades econômicas da sociedade Essas instituições econômicas inclusivas ofereceram a homens de talento e visão como James Watt a oportunidade e o incentivo de que eles precisavam para desenvolver suas habilidades e ideias e exercer sobre o sistema uma influência que beneficiaria tanto a eles pessoalmente quanto ao país Naturalmente tendo alcançado o êxito almejado esses homens tinham os mesmos impulsos de quaisquer outros queriam impedir que outros ingressassem em seus respectivos ramos de atividade e lhes fizessem frente e temiam o processo de destruição criativa que poderia pôr seus negócios a perder do mesmo modo como eles mesmos antes haviam levado outros à falência Depois de 1688 isso se tornou mais difícil Em 1775 Richard Arkwright entrou com amplo pedido de patente que esperava ele no futuro lhe conferiria o monopólio sobre a indústria da fiação do algodão que então se expandia rapidamente Os tribunais indeferiram sua solicitação Por que esse processo ocorreu unicamente na Inglaterra e por que no século XVII Por que a Inglaterra desenvolveu instituições políticas pluralistas e afastouse das instituições extrativistas Como vimos os acontecimentos políticos que culminaram na Revolução Gloriosa foram moldados por uma série de processos interligados Uma peçachave foram as disputas políticas entre o absolutismo e seus opositores um conflito cujos resultados não só puseram fim às tentativas de renovar e reforçar o absolutismo na Inglaterra mas também fortaleceram os defensores de mudanças fundamentais nas instituições da sociedade Os rivais do absolutismo não se limitaram a tentar construir outro tipo de regime absoluto não se tratava apenas da derrota da Casa de York para a Casa de Lancaster na Guerra das Rosas Pelo contrário a Revolução Gloriosa implicou a emergência de um novo regime baseado na constitucionalidade e no pluralismo Esse resultado foi consequência da diferenciação das instituições inglesas e do modo como elas interagiram com as circunstâncias críticas Vimos no capítulo anterior como as instituições feudais surgiram na Europa Ocidental após o colapso do Império Romano do Ocidente O feudalismo disseminouse pela maior parte do continente tanto no lado ocidental quanto no oriental Contudo como mostrou o Capítulo 4 após a peste negra surgiram entre as duas bandas do continente divergências radicais Pequenas diferenças nas instituições políticas e econômicas implicaram que no lado ocidental o equilíbrio de poder vigente levasse ao aprimoramento das instituições e no oriental à sua deterioração Não obstante esse caminho não levaria necessária e inexoravelmente ao estabelecimento de instituições inclusivas Seria preciso que houvesse vários outros desdobramentos cruciais ao longo do caminho Embora a Magna Carta já procurasse lançar certas fundações institucionais básicas para um regime constitucional muitas outras regiões europeias inclusive no Leste Europeu assistiram a querelas similares envolvendo documentos parecidos Ainda assim após a peste negra a Europa Ocidental afastouse significativamente da Oriental Documentos como a Magna Carta adquiriram peso maior no oeste No leste não significaram muito Na Inglaterra mesmo antes dos conflitos do século XVII estabeleceuse a norma de que o rei não poderia aumentar os impostos sem autorização do Parlamento Não menos importante foi o lento e progressivo deslocamento do poder das elites para uma parcela mais ampla dos cidadãos como exemplificado pela mobilização política das comunidades rurais manifesta na Inglaterra em momentos como a Revolta dos Camponeses de 1381 Essa diferenciação institucional entrou em interação com outra circunstância crítica deflagrada pela expansão ultramarina Como vimos no Capítulo 4 a influência desse elemento sobre a futura dinâmica institucional iria depender da capacidade da Coroa de monopolizar ou não o comércio atlântico Na Inglaterra o poder ligeiramente maior do Parlamento impediu os reis tanto da dinastia Tudor quanto da Stuart de fazê lo criando uma nova classe de mercadores e empresários ferrenhos opositores da criação do absolutismo na Inglaterra Na Londres de 1686 por exemplo havia 702 mercadores que exportavam para o Caribe e 1283 importadores Na América do Norte eram 691 exportadores e 626 importadores Empregavam gerentes de armazém marinheiros capitães portuários escriturários todos os quais partilhavam de maneira geral os mesmos interesses Outros portos vibrantes como Bristol Liverpool e Portsmouth eram analogamente repletos de mercadores assim Esses novos homens desejavam e demandavam outras instituições econômicas e quanto mais enriqueciam com o comércio mais poderosos se tornavam As mesmas forças estavam em ação na França Espanha e Portugal nesses lugares porém os reis mostraramse muito mais capazes de manter o comércio e seus lucros sob o controle da Coroa Os novos grupos que transformariam a Inglaterra também surgiram nesses países mas eram aí consideravelmente menores e mais fracos Por ocasião da reunião do Parlamento Longo e da irrupção da Guerra Civil em 1642 esses mercadores aliaramse à causa parlamentar Na década de 1670 estiveram intimamente ligados à formação do Partido Whig liberal que se oporia ao absolutismo dos Stuarts e em 1688 seriam os pivôs da deposição de Jaime II Assim a expansão das oportunidades comerciais proporcionada pelas Américas a entrada maciça dos mercadores ingleses nesse comércio e o desenvolvimento econômico das colônias bem como as fortunas amealhadas no processo inclinaram a balança de poder na disputa entre a monarquia e os adversários do absolutismo Talvez de maneira ainda mais decisiva a emergência de diversos grupos de interesses indo desde os fidalgos uma classe de proprietários rurais comerciantes que havia despontado no período Tudor até vários tipos de manufaturadores passando pelos mercadores no Atlântico e o poder que foram adquirindo tornou não só forte mas também abrangente a coalizão contra o absolutismo dos Stuarts Essa coalizão foi ainda mais reforçada pela fundação do Partido Whig na década de 1670 que lhes proporcionou uma organização para defender seus interesses Esse fortalecimento foi fundamental para o desenvolvimento do pluralismo após a Revolução Gloriosa Se todos os que combatiam os Stuarts tivessem os mesmos interesses e a mesma origem a derrubada da dinastia muito provavelmente se limitaria a repetir a contenda entre a Casa de Lancaster e a de York assim de dois conjuntos estreitos e rivais de interesses em última instância emergiria um que apenas substituiria e recriaria as mesmas instituições extrativistas assumissem elas ou não uma forma similar A abrangência da coalizão implicou maior demanda pela constituição de instituições políticas pluralistas Sem alguma espécie de pluralismo haveria o perigo de que um dos vários interesses em jogo usurpasse o poder em detrimento dos demais O fato de o Parlamento após 1688 representar uma coalizão tão ampla foi um fator crucial que levou os parlamentares a dar ouvidos às petições mesmo quando vinham de pessoas de fora do Parlamento e mesmo daqueles sem direito a voto Esse foi o elemento fundamental para a prevenção de eventuais tentativas de um grupo de fundar um monopólio às expensas do resto como tentou fazer a indústria da lã antes da promulgação da Lei de Manchester A Revolução Gloriosa foi um acontecimento momentoso exatamente por ter sido conduzido por uma coalizão ampla que conseguiu forjar um regime constitucional com limites claros ao poder tanto do executivo quanto de cada um de seus demais membros Foram essas restrições por exemplo que impediram os fabricantes de lã de esmagar a potencial concorrência dos manufaturadores de algodão e fustão Assim a abrangência dessa coalizão não só foi essencial na criação de um Parlamento forte após 1688 como também criou mecanismos dentro do próprio Parlamento para evitar que qualquer grupo específico acumulasse poder em excesso e dele pudesse abusar Esse foi o fator crítico na emergência das instituições políticas pluralistas O fortalecimento de tão ampla coalizão desempenhou também importante papel na persistência e reforço das instituições inclusivas tanto políticas quanto econômicas como veremos no Capítulo 11 Não obstante nada disso tornaria inevitável um regime verdadeiramente pluralista e seu surgimento deveuse em parte aos rumos contingentes da história Uma coalizão não muito diferente emergiu vitoriosa da Guerra Civil inglesa contra os Stuarts somente para desembocar na ditadura de Oliver Cromwell A força dessa coalizão tampouco seria garantia de derrota do absolutismo Jaime II poderia ter vencido Guilherme de Orange O caminho da profunda mudança institucional foi como de hábito não menos contingente do que o resultado de outros conflitos políticos E assim seria por mais que a trajetória específica de diferenciação institucional que gerou essa ampla coalizão contra o absolutismo e a circunstância crítica das oportunidades comerciais no Atlântico tenham desequilibrado o jogo contra os Stuarts Nesse caso portanto a contingência e a abrangência da coalizão foram os fatores decisivos para o nascimento do pluralismo e das instituições inclusivas E 8 NÃO NO NOSSO QUINTAL BARREIRAS AO DESENVOLVIMENTO PROIBIDO IMPRIMIR M 1445 NA CIDADE GERMÂNICA de Mainz Johannes Gutenberg levou a público uma inovação com profundas consequências para a história econômica posterior uma prensa tipográfica baseada em tipos móveis Até então os livros precisavam ou ser copiados à mão por escribas processo muito lento e laborioso ou eram xilogravados com uma peça de madeira entalhada específica para cada página Os livros eram poucos e esparsos e caríssimos Depois da invenção de Gutenberg as coisas começaram a mudar Os livros agora impressos aumentaram em número e disponibilidade Sem tal inovação a alfabetização e a escolarização em massa teriam sido impossíveis Na Europa Ocidental a prensa tipográfica logo teve sua importância reconhecida Em 1460 já havia uma prensa fora das fronteiras alemãs em Estrasburgo França No final da década de 1460 a tecnologia já se espalhara por toda a Itália com prensas em Roma e Veneza logo seguidas por Florença Milão e Turim Em 1476 William Caxton havia instalado um exemplar em Londres dois anos depois havia outra em Oxford Nesse mesmo período a novidade tinha se difundido pelos Países Baixos chegado à Espanha e até ao Leste Europeu com a montagem de uma prensa em Budapeste em 1473 e na Cracóvia no ano seguinte Nem todos viam a imprensa como uma inovação desejável porém Já em 1485 o sultão otomano Bayezid II emitiu um edito proibindo expressamente os muçulmanos de imprimir em árabe A norma seria reforçada pelo Sultão Selim I em 1515 Só em 1727 a primeira prensa seria admitida em terras otomanas O Sultão Ahmed III expediu um decreto concedendo permissão a İbrahim Müteferrika para montála Contudo mesmo esse ato tardio foi cercado de restrições embora o decreto fizesse menção ao feliz dia em que essa técnica ocidental será desvelada como uma noiva e não se voltará a esconder jamais a imprensa de Müteferrika seria objeto da mais atenta vigilância Afirmava o decreto A fim de que os livros impressos fiquem livres de erros tipográficos os doutos honoráveis e meritórios eruditos religiosos especializados em lei islâmica os excelentes cádi de Istambul Mevlana Ishak e o cádi de Tessalônica Mevlana Sahib e o cádi de Gálata Mevlana Asad que seus méritos sejam louvados junto com os das ilustres ordens religiosas e o pilar dos justos e religiosos eruditos o xeque do Kasim Paşa Mevlevihane Mevlana Musa que sua sabedoria e conhecimento se multipliquem vão supervisionar a revisão das provas Müteferrika foi autorizado a instalar sua prensa mas tudo o que fosse impresso teria de passar pelo crivo de três eruditos religiosos e legais os cádis Talvez a sabedoria e o conhecimento dos cádis como os de todos os demais se tivessem multiplicado bem mais rápido caso a prensa tipográfica estivesse mais acessível Não seria esse o caso contudo mesmo após a devida permissão para sua montagem Não admira que Müteferrika tenha impresso tão poucos livros apenas 17 entre 1729 quando a prensa entrou em operação e 1743 quando ele parou de trabalhar Sua família tentou dar prosseguimento à tradição mas conseguiu imprimir apenas sete outros livros quando finalmente desistiram em 1797 Fora do coração do Império Otomano na Turquia o advento da impressão foi ainda mais retardado No Egito por exemplo a primeira prensa tipográfica seria instalada apenas em 1798 por franceses que tomaram parte da tentativa fracassada de Napoleão Bonaparte de capturar o país A segunda metade do século XIX seguia já bastante avançada e a produção de livros no Império Otomano continuava a cargo primariamente de escribas que copiavam à mão os livros existentes No começo do século XVIII havia ao que consta 80 mil desses escribas ativos em Istambul Tamanha resistência à prensa tipográfica teve consequências óbvias para a alfabetização escolarização e prosperidade econômica Em 1800 provavelmente apenas 2 a 3 dos cidadãos do Império Otomano sabiam ler e escrever comparados aos 60 dos homens e 40 das mulheres em idade adulta na Inglaterra Na Holanda e na Alemanha os índices de alfabetização eram ainda mais altos Já os territórios otomanos estavam muito atrasados em relação aos países europeus que tinham os mais baixos índices de escolarização dessa época como Portugal onde talvez apenas cerca de 20 dos adultos soubessem ler e escrever Considerandose as instituições altamente absolutistas e extrativistas dos otomanos a hostilidade do sultão em relação à prensa tipográfica fica fácil de entender Os livros disseminavam ideias e tornavam a população bem mais difícil de controlar Algumas dessas ideias podiam ser novas e preciosas maneiras de fomentar o crescimento econômico mas outras talvez fossem subversivas e desafiassem o status quo político e social existente Os livros também solapam o poder de quem controla o conhecimento oral uma vez que facilitam seu pronto acesso por parte de qualquer pessoa alfabetizada um perigo para a ordem vigente na qual o saber era prerrogativa das elites O estabelecimento religioso e os sultões otomanos temiam a destruição criativa daí resultante A solução encontrada foi a proibição da imprensa A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL engendrou uma circunstância crítica que afetaria quase todos os países Alguns deles como a Inglaterra que não só aceitaram mas também estimularam ativamente o comércio a industrialização e o empreendedorismo apresentaram crescimento acelerado Muitos como Império Otomano China e outros regimes absolutistas ficaram para trás por terem bloqueado ou no mínimo se furtado a incentivar a difusão da indústria As instituições políticas e econômicas moldaram as respostas à inovação tecnológica mais uma vez ensejando o já nosso conhecido padrão de interação entre as instituições existentes e as circunstâncias críticas e produzindo discrepâncias entre as diferentes instituições e respectivos resultados econômicos O Império Otomano continuaria sendo absolutista até seu colapso no final da Primeira Guerra Mundial o que lhe permitiu oporse ou impedir inovações como a prensa tipográfica e a destruição criativa por ela acarretada A razão por que as mudanças econômicas ocorridas na Inglaterra não se verificaram também no Império Otomano é a ligação natural entre as instituições políticas extrativistas e absolutistas e o extrativismo econômico O absolutismo consiste no governo sem nenhuma restrição imposta pela lei ou pela vontade de terceiros ainda que na realidade os absolutistas reinem com o apoio de um pequeno grupo ou elite qualquer Na Rússia do século XIX por exemplo os czares eram monarcas absolutistas que contavam com o apoio da nobreza a qual correspondia a cerca de 1 da população total Esse grupo pequeno organizava as instituições políticas de modo a perpetuar o próprio poder Não houve parlamento ou representação política de outros grupos da sociedade russa até 1905 quando o czar criou a Duma muito embora ele logo tenha tratado de esvaziar os poucos poderes que lhe havia concedido Não admira que as instituições econômicas fossem extrativistas organizadas de modo a tornar o czar e a classe nobre o mais ricos possível A base desse sistema como em tantos outros exemplos de extrativismo econômico era um esquema de coação e controle em massa da mão de obra sob a forma particularmente perniciosa assumida pela servidão no país Todavia o absolutismo não era o único tipo de instituição política a impedir a industrialização Por menos pluralistas que fossem os regimes absolutistas e por mais que temessem a destruição criativa muitos contavam com Estados centralizados ou ao menos centralizados o bastante para vedar o acesso a inovações como a prensa tipográfica Ainda hoje em países como Afeganistão Haiti e Nepal falta centralização política ao Estado nacional Na África subsaariana a situação é ainda mais grave Como já mostramos sem uma centralização que promova a ordem e faça valer as regras e os direitos de propriedade não é possível a emergência de instituições inclusivas Veremos neste capítulo que em várias regiões da África subsaariana por exemplo na Somália e no Sul do Sudão um dos maiores impedimentos à industrialização foi a inexistência de qualquer forma de centralização política Na ausência desses pré requisitos naturais a industrialização não teria a menor chance de decolar Embora o absolutismo e a falta de centralização política ou sua fragilidade sejam obstáculos distintos à disseminação da indústria há uma conexão entre os dois por um lado ambos são sustentados pelo medo da destruição criativa por outro o processo de centralização política em geral cria uma propensão ao absolutismo A resistência à centralização política é alimentada por motivos similares aos da resistência a instituições políticas inclusivas o receio da perda de poder político só que agora para o Estado recémcentralizador e aqueles em cujas mãos estiver o seu controle Vimos no capítulo anterior como o processo de centralização política sob a monarquia Tudor inglesa contribuiu para as demandas das várias elites locais no sentido da obtenção de voz e representação nas instituições políticas nacionais seria uma forma de evitar essa perda de poder político Surgiu assim um Parlamento mais forte que acabaria possibilitando a emergência de instituições políticas inclusivas Em diversos outros casos contudo ocorre justamente o oposto e o processo de centralização política também dá origem a uma era de absolutismo ainda maior Assim nasceria o absolutismo russo forjado por Pedro o Grande desde 1682 até sua morte em 1725 Pedro construiu uma nova capital São Petersburgo destituindo de poder a velha aristocracia os boiardos a fim de criar um Estado burocrático e um Exército modernos Chegou mesmo a abolir a Duma boiarda que o havia coroado Pedro introduziu a Tabela de Cargos uma hierarquia social inteiramente nova cuja essência era o serviço ao trono Assumiu também o controle da Igreja exatamente como fizera Henrique VIII ao centralizar o Estado inglês Por meio desse processo de centralização política Pedro foi retirando o poder de terceiros e dele se apropriando Suas reformas militares induziram a guarda real tradicional os streltsy à rebelião levante logo seguido por outros como o dos baskires na Ásia Central e a Revolta de Astracã Nenhuma logrou êxito Embora Pedro o Grande tenha sido muito bemsucedido em seu projeto de centralização política superando a oposição em muitos lugares do mundo o tipo de força que ao ter seu poder desafiado resistia à centralização do Estado como os streltsy saiu vitoriosa A falta de centralização do Estado daí resultante portanto significou a manutenção de instituições políticas extrativistas de outra espécie Neste capítulo veremos como durante a circunstância crítica criada pela Revolução Industrial muitos países deixaram passar a oportunidade e não tiraram proveito da disseminação da indústria por serem dominados por instituições políticas absolutistas e econômicas extrativistas como no caso do Império Otomano ou por lhes faltar a centralização política necessária como na Somália UMA PEQUENA DIFERENÇA QUE FAZ A DIFERENÇA Ao longo do século XVII enquanto na Inglaterra o absolutismo vacilava na Espanha ele só se exacerbava O equivalente espanhol do Parlamento inglês as Cortes tinha existência apenas nominal A Espanha foi forjada em 1492 pela fusão dos reinos de Castela e Aragão através do casamento da Rainha Isabel e do Rei Fernando A data coincidiu com a conclusão da Reconquista o longo processo de expulsão dos árabes que desde o século VIII ocupavam o sul do país e ergueram as grandes cidades de Granada Córdoba e Sevilha O derradeiro Estado árabe na Península Ibérica Granada caiu perante as forças hispânicas ao mesmo tempo em que Cristóvão Colombo chegava às Américas e reclamava as novas terras para a Rainha Isabel e o Rei Fernando que lhe haviam patrocinado a viagem A fusão das coroas de Castela e Aragão e os casamentos dinásticos e heranças que se seguiram acabariam criando um superestado europeu Isabel morreu em 1504 e sua filha Joana sagrouse rainha de Castela Joana era casada com Filipe da Casa de Habsburgo filho do Sacro Imperador Romano Maximiliano I Em 1516 Carlos filho de Joana e Filipe foi coroado Carlos I de Castela e Aragão Quando seu pai morreu Carlos herdou a Holanda e o FrancoCondado que agregou aos seus territórios na Península Ibérica e Américas Em 1519 quando por sua vez Maximiliano I veio a falecer legou a Carlos também os territórios dos Habsburgo na Alemanha tornandoo o Sacro Imperador Romano Carlos V O que inicialmente não passara da fusão de dois reinos espanhóis em 1492 converteuse em um império multicontinental e Carlos deu prosseguimento ao projeto de fortalecimento do Estado absolutista iniciado por Isabel e Fernando O projeto de construção e consolidação do absolutismo na Espanha contou com o inestimável auxílio da descoberta de metais preciosos nas Américas Na década de 1520 a prata já fora descoberta em vasta quantidade em Guanajuato México e logo depois também em Zacatecas no mesmo território A conquista do Peru a partir de 1532 proporcionou uma riqueza ainda maior para a Coroa sob a forma de uma participação o quinto real que incidia sobre todo e qualquer produto da conquista e da atividade de mineração Como vimos no Capítulo 1 uma montanha de prata foi descoberta em Potosí na década de 1540 despejando ainda mais riqueza nos cofres do soberano espanhol Na época da fusão de Castela e Aragão a Espanha figurava entre as regiões europeias mais prósperas economicamente Após a consolidação de seu sistema político absolutista entrou em declínio econômico relativo e de 1600 em diante absoluto Um dos primeiros atos de Isabel e Fernando após a Reconquista foi a expropriação dos judeus Os cerca de 200 mil judeus que viviam no país receberam um prazo de quatro meses para partir Tiveram de vender todas as suas terras e bens a preços irrisórios e foram proibidos de levar qualquer ouro ou prata consigo Tragédia humana similar se daria novamente apenas 100 anos mais tarde Entre 1609 e 1614 Filipe III expulsou os mouriscos descendentes dos cidadãos dos antigos Estados árabes no sul da Espanha Como ocorrera com os judeus os mouriscos tiveram de partir levando apenas o que podiam carregar sem que pudessem transportar consigo nenhum ouro prata ou outros metais preciosos Os direitos de propriedade eram inseguros também em outros sentidos na Espanha sob domínio dos Habsburgo Filipe II que sucedeu seu pai Carlos V em 1556 recusouse a honrar suas dívidas em 1557 e de novo em 1560 levando assim à ruína as famílias de banqueiros Fugger e Welser O papel dessas famílias alemãs foi então assumido pelas genovesas por sua vez também arruinadas pela inadimplência espanhola durante o reinado dos Habsburgo em 1575 1596 1607 1627 1647 1652 1660 e 1662 Tão crucial quanto a instabilidade dos direitos de propriedade na Espanha absolutista foi o impacto do absolutismo sobre as instituições econômicas ligadas ao comércio e ao desenvolvimento do império colonial espanhol Como vimos no capítulo anterior a prosperidade econômica inglesa baseouse na rápida expansão mercantil Muito embora se comparada a Espanha e Portugal a Inglaterra houvesse chegado tarde ao comércio atlântico o país não obstante conquistou uma participação relativamente ampla nas oportunidades comerciais e coloniais A riqueza que enchia os cofres da Coroa na Espanha na Inglaterra foi para os bolsos da emergente classe mercante sobre a qual se ergueria o incipiente dinamismo econômico inglês e que se tornaria o baluarte da coalizão política antiabsolutista Na Espanha os processos geradores de progresso econômico e mudança institucional não tiveram lugar Depois da descoberta das Américas Isabel e Fernando organizaram o comércio entre suas novas colônias e a metrópole em torno de uma guilda de mercadores de Sevilha os quais com controle de todo o comércio cumpririam a função de assegurar que a Coroa tivesse o seu filão na riqueza das Américas Não havia comércio livre com nenhuma das colônias e a cada ano uma grande frota chegava a Sevilha carregada de metais preciosos e bens valiosos do novo continente A estreita base desse comércio monopolizado impedia que a partir das oportunidades comerciais com as colônias uma ampla classe de mercadores se estruturasse Mesmo o comércio dentro das Américas estava sujeito a pesadas regulamentações Por exemplo um mercador de uma colônia como a Nova Espanha mais ou menos correspondente ao México moderno não podia estabelecer relações comerciais diretas com ninguém em Nova Granada a atual Colômbia Tais restrições ao comércio no seio do Império Espanhol não só reduziam sua prosperidade econômica como também indiretamente os benefícios que a Espanha poderia auferir do comércio com outro império mais próspero Não obstante eram interessantes à medida que garantiam a continuidade do influxo de prata e ouro para a metrópole As instituições econômicas extrativistas espanholas foram resultado direto da construção do absolutismo e do caminho distinto daquele seguido pela Inglaterra pelo qual enveredaram as instituições políticas do país Tanto o reino de Castela quanto o de Aragão possuíam suas próprias Cortes um parlamento que representava os vários grupos ou estamentos do reino Como no caso do Parlamento inglês as Cortes castelhanas precisavam ser convocadas para aprovar novos impostos Entretanto em Castela e Aragão representavam basicamente as principais cidades não as áreas urbanas e rurais como no caso do Parlamento inglês no século XV eram compostas pelos deputados de apenas 18 cidades dois para cada uma Por conseguinte não eram representativas de vasta gama de grupos como sua contraparte britânica e nunca chegaram a constituir uma coalizão de interesses diversos com o intuito comum de impor restrições ao absolutismo Não podiam legislar e mesmo o escopo de seus poderes com relação à carga tributária era limitado Nesse contexto foi fácil para a Coroa espanhola alijálas no processo de consolidação de seu próprio poder Embora a prata chegasse das Américas em volumes cada vez maiores Carlos V e Filipe II exigiam uma carga tributária crescente a fim de financiar uma série de guerras dispendiosas Em 1520 Carlos V apresentou às Cortes uma solicitação de novo aumento dos impostos As elites urbanas aproveitaram o ensejo para reivindicar amplas mudanças nas Cortes e seus poderes A oposição irrompeu violenta e o movimento logo ficou conhecido como Revolta dos Comuneiros Carlos conseguiu esmagála com o auxílio das tropas leais ao trono pelo resto do século XVI porém haveria uma disputa contínua entre a Coroa e as Cortes em que a primeira tentaria arrancar o direito de criar novos tributos e aumentar os já existentes Apesar de suas idas e vindas a batalha acabaria sendo vencida pela monarquia A partir de 1664 as Cortes não voltariam a se reunir só se restabeleceriam durante as invasões napoleônicas quase 150 anos depois Na Inglaterra a derrocada do absolutismo em 1688 levou tanto ao nascimento de instituições políticas pluralistas quanto ao desenvolvimento de um Estado centralizado muito mais eficaz Na Espanha com o triunfo do absolutismo o movimento foi o inverso Mesmo tendo emasculado as Cortes e eliminado qualquer possível restrição ao seu comportamento foi ficando cada vez mais difícil para a Coroa aumentar os impostos mesmo através de negociações diretas com cada cidade Enquanto o Estado inglês criava uma burocracia tributária moderna e eficiente o espanhol mais uma vez caminhava na direção oposta e não só se mostrava incapaz de assegurar os direitos de propriedade dos empreendedores e monopolizar o comércio como pior condescendia com a venda de cargos não raro convertidos em hereditários com a privatização da coleta de impostos e mesmo com a venda de imunidade jurídica As consequências dessas instituições políticas e econômicas extrativistas na Espanha eram previsíveis Durante o século XVII enquanto a Inglaterra avançava rumo à expansão comercial seguida de uma rápida industrialização a Espanha entrava em uma espiral de declínio econômico generalizado No começo do século um em cada cinco habitantes do país morava em áreas urbanas No final desse período essa proporção havia sido reduzida para a metade 1 em cada 10 acompanhando o crescente empobrecimento da população espanhola Aqui a receita despencava enquanto a Inglaterra enriquecia A persistência e o fortalecimento do absolutismo na Espanha ao mesmo tempo em que era extirpado na Inglaterra é mais um exemplo de pequenas diferenças durante as circunstâncias críticas Havia pequenas diferenças em termos de força e natureza das instituições representativas a circunstância crítica foi a descoberta das Américas A interação de ambas levou a Espanha a enveredar por um caminho institucional completamente distinto daquele tomado pela Inglaterra As instituições econômicas relativamente inclusivas então surgidas na Inglaterra fomentaram um dinamismo econômico sem precedentes que culminaria na Revolução Industrial ao passo que a industrialização não teria a menor chance na Espanha Quando a tecnologia industrial começasse a se difundir por muitas partes do mundo a economia espanhola teria chegado a tamanha decadência que sequer haveria necessidade de a Coroa ou as elites rurais espanholas bloquearem a industrialização MEDO DA INDÚSTRIA Sem mudanças nas instituições políticas e na estrutura de poder similares àquelas ocorridas na Inglaterra após 1688 eram remotas as chances de os países absolutistas se beneficiarem das inovações e novas tecnologias da Revolução Industrial Na Espanha por exemplo a inexistência de direitos de propriedade seguros e o declínio econômico generalizado implicaram que a população não dispunha de incentivos para fazer os investimentos e sacrifícios necessários Já na Rússia e no Império AustroHúngaro não foi a mera negligência e má administração por parte das elites nem o insidioso depauperamento sob instituições extrativistas que impediram a industrialização pelo contrário os governantes bloquearam ativamente toda e qualquer tentativa de introduzir tanto as novas tecnologias quanto os investimentos básicos em infraestrutura como ferrovias por exemplo que poderiam ter favorecido a sua propagação Na época da Revolução Industrial nos séculos XVIII e XIX o mapa político europeu era bastante diferente do atual O Sacro Império Romano uma colcha de retalhos de mais de 400 divisões administrativas a maioria das quais acabaria se consolidando na Alemanha unificada ocupava a maior parte da Europa Central A Casa de Habsburgo ainda era uma importante potência política e seu império conhecido como Habsburgo ou AustroHúngaro ocupava uma vasta extensão de terra com cerca de 650 mil quilômetros quadrados mesmo não incluindo mais a Espanha desde que em 1700 os Bourbon haviam assumido o trono do país Em termos demográficos era o terceiro maior Estado europeu compreendendo um sétimo de toda a população do continente No final do século XVIII o território dos Habsburgo incluía a oeste a área que hoje corresponde à Bélgica então denominada Países Baixos Austríacos A maior parte porém consistia no bloco contíguo de terras ao redor da Áustria e Hungria incluindo a República Tcheca e a Eslováquia ao norte e Eslovênia Croácia e ampla parcela da Itália e da Sérvia ao sul A leste incorporava também grande parte do que é hoje a Romênia e a Polônia Os mercadores nos domínios dos Habsburgo tinham menos importância que na Inglaterra e prevaleciam as relações de servidão Como vimos no Capítulo 4 Hungria e Polônia foram os polos da segunda servidão no Leste Europeu Os Habsburgo ao contrário dos Stuart lograram suster um regime intensamente absoluto Francisco I o último imperador do Sacro Império Romano entre 1792 e 1806 e depois soberano do Império AustroHúngaro até sua morte em 1835 foi um rematado absolutista não pretendia reconhecer nenhum limite ao seu poder e acima de tudo desejava preservar o status quo político Sua estratégia básica consistia em oporse à mudança qualquer que fosse ela o que ele deixou bem claro em um discurso de 1821 típico dos governantes Habsburgo proferido perante os professores de uma escola em Laibach no qual asseverou Não preciso de sábios mas de cidadãos bons e honestos Sua missão é educar os jovens para tanto Aquele que se encontra a meu serviço ensinará aquilo que eu lhe ordenar Se alguém não for capaz de fazêlo ou caso se saia com novas ideias pode ir embora ou eu o porei para fora A imperatriz Maria Teresa que reinou entre 1740 e 1780 diante de sugestões sobre como melhorar ou modificar as instituições costumava retorquir Deixe tudo como está Não obstante ela e seu filho José II imperador entre 1780 e 1790 foram responsáveis por uma tentativa de construir um Estado central mais poderoso e um sistema administrativo mais eficaz Entretanto fizeramno no contexto de um sistema político sem restrições efetivas aos seus atos e sem muitos elementos pluralistas Não havia um Parlamento nacional que pudesse exercer mesmo o mais módico dos controles sobre a monarquia apenas um sistema de estamentos e dietas regionais que por tradição detinha alguns poderes com relação à tributação e ao recrutamento militar Os Habsburgo austrohúngaros estavam submetidos a ainda menos controles do que os monarcas espanhóis e o poder político era altamente concentrado Enquanto o absolutismo Habsburgo recrudescia ao longo do século XVIII o poder de todas as instituições não monárquicas se rarefazia ainda mais Quando uma delegação de cidadãos da província austríaca do Tirol foi solicitar uma Constituição a Francisco este replicou Quereis uma Constituição então Vede a mim pouco se me dá Eu vos darei uma Constituição mas sabei que os soldados obedecem a mim e não pedirei duas vezes caso tenha alguma necessidade financeira Em todo caso aconselhovos a tomar cuidado quanto ao que ireis dizer Diante disso os líderes tiroleses decidiram Se é assim que pensais melhor então que não haja Constituição ao que Francisco retrucou Assim também penso eu Francisco dissolveu o Conselho Estatal que Maria Teresa usara como fórum de consulta com seus ministros Dali por diante não haveria nenhuma consulta nem discussão pública acerca das decisões da Coroa Francisco criou um Estado policial censurando implacavelmente tudo o que lhe parecesse o mais levemente radical Sua filosofia de governo era descrita pelo Conde Hartig um auxiliar de longa data como a imorredoura manutenção da autoridade do soberano e a impugnação de toda e qualquer demanda por parte da população no sentido de participar de tal autoridade Para assistilo em seu projeto Francisco contava com o Príncipe Von Metternich nomeado seu ministro de Relações Exteriores em 1809 O poder e a influência de Metternich aliás sobreviveriam aos do imperador e ele permaneceria no cargo por quase 40 anos As instituições econômicas dos Habsburgo giravam em torno da ordem feudal e da servidão No âmbito do império quanto mais para leste se fosse mais o feudalismo se intensificava refletindo aquele gradiente genérico das instituições econômicas visto no Capítulo 4 no deslocamento do oeste para o leste do continente A mobilidade da mão de obra era altamente circunscrita e a emigração era ilegal Quando o filantropo inglês Robert Owen tentou convencer o governo austríaco a implementar certas reformas sociais a fim de melhorar as condições da população mais pobre um dos assistentes de Metternich Friedrich von Gentz replicou Não desejamos absolutamente que as grandes massas se vejam em situação de maior conforto e independência Do contrário como poderíamos governálas Além da servidão que bloqueava por completo a emergência de um mercado de trabalho e despojava de todo e qualquer incentivo econômico ou iniciativa a massa da população rural floresciam sob o absolutismo dos Habsburgo os monopólios e restrições similares ao comércio A economia urbana era dominada por guildas que limitavam o acesso aos respectivos ofícios Até 1775 perduraram tarifas alfandegárias internas na própria Áustria e na Hungria até 1784 A tarifação que incidia sobre os bens importados era altíssima e havia um semnúmero de proibições explícitas quanto à importação e à exportação de produtos A supressão dos mercados e a criação de instituições econômicas extrativistas são é claro bastante características do absolutismo mas Francisco foi além Não que as instituições econômicas extrativistas destituíssem os indivíduos de incentivos para inovar ou adotar novas tecnologias Vimos no Capítulo 2 como no Reino do Congo as tentativas de promover o uso do arado foram malsucedidas porque faltava às pessoas incentivos para tanto dada a natureza extrativista das instituições econômicas O rei do Congo sabia que se pudesse convencer seus súditos a adotarem os arados a produtividade agrícola seria maior gerando mais riqueza de que ele poderia se beneficiar um potencial estímulo para todos os governos mesmo os absolutistas O problema no Congo era que as pessoas estavam cientes de que tudo o que produzissem poderia vir a ser confiscado pelo monarca absolutista e portanto não tinham incentivos para investir ou adotar tecnologias melhores Nas terras dos Habsburgo Francisco não encorajava seus cidadãos a utilizar tecnologias melhores pelo contrário fezlhes frente abertamente e bloqueou a disseminação de tecnologias que a população estaria disposta a adotar mesmo nas instituições econômicas vigentes A oposição à inovação manifestavase de duas maneiras Primeiro Francisco I impediu o desenvolvimento da indústria A indústria levaria a fábricas e as fábricas concentrariam trabalhadores pobres nas cidades sobretudo na capital Viena Esses trabalhadores se aliariam então aos adversários do absolutismo Todas as suas políticas pretendiam congelar as elites tradicionais em seu lugar e manter intocado o status quo político e econômico Sua intenção era manter a sociedade basicamente agrária e a melhor maneira de atingir seu objetivo acreditava ele era antes de qualquer coisa impedir a construção das fábricas Suas intervenções nesse sentido não podiam ser mais diretas em 1802 por exemplo a criação de novas fábricas em Viena foi proibida Em lugar de estimular a importação e a instalação de novos equipamentos base da industrialização Francisco as proibiu até 1811 Segundo o imperador opôsse à construção de ferrovias uma das principais novas tecnologias que acompanharam a Revolução Industrial Quando apresentado ao projeto de construção de uma ferrovia no norte Francisco I retorquiu Nada disso Nada terei que ver com isso a menos que queira ver a revolução adentrar este país Já que o governo não daria uma concessão para uma ferrovia a vapor a primeira estrada de ferro construída no império teve de usar carros puxados a cavalo A linha que ligava as cidades de Linz no Danúbio à cidade boêmia de Budweis no Rio Moldau foi construída com inclinações e interseções o que posteriormente inviabilizaria sua conversão para trens a vapor Assim ela continuaria com tração animal até a década de 1860 O potencial econômico para o desenvolvimento de ferrovias no império já fora pressentido pelo banqueiro Salomon Rothschild representante em Viena da grande família de banqueiros O irmão de Salomon Nathan que estava instalado na Inglaterra ficou muito impressionado com a locomotiva The Rocket de George Stephenson e o potencial do transporte a vapor Entrou em contato com o irmão estimulandoo a buscar oportunidades para a implementação de estradas de ferro na Áustria pois acreditava que a família obteria grande lucro se financiasse a construção de ferrovias Salomon concordou mas o plano malogrou o Imperador Francisco disse não A oposição à indústria e às ferrovias deviase aos receios de Francisco com relação à destruição criativa que acompanharia o desenvolvimento de uma economia moderna Suas maiores prioridades eram assegurar a estabilidade das instituições extrativistas que administrava e resguardar as vantagens das elites tradicionais que o apoiavam A industrialização não só lhe traria poucos benefícios à medida que abalaria a ordem feudal por atrair a mão de obra do campo para as cidades Francisco reconhecia também a ameaça que grandes mudanças econômicas representariam ao seu poder político Por conseguinte optou por bloquear a indústria e o progresso econômico aferrandose ao retrocesso que se manifestava das mais diversas maneiras Por exemplo ainda em 1883 quando 90 do ferro produzido no mundo era produzido à base de hulha mais da metade da produção dos territórios dos Habsburgo continuava empregando o carvão vegetal muito menos eficiente Analogamente até a Primeira Guerra Mundial quando o império entrou em colapso a tecelagem não era mecanizada mas ainda manual O Império AustroHúngaro não era o único a temer a indústria Mais a leste a Rússia organizavase em torno de um conjunto igualmente absolutista de instituições políticas forjadas por Pedro o Grande conforme já discutido neste capítulo Como a ÁustriaHungria as instituições econômicas russas eram altamente extrativistas baseadas na servidão mantinham pelo menos metade da população presa à terra Os servos tinham de trabalhar de graça três dias por semana nas terras de seus senhores Não gozavam de liberdade de movimentação nem para escolher sua ocupação e podiam ser vendidos por um senhor a outro ao seu belprazer O filósofo radical Piotr Kropotkin um dos fundadores do moderno anarquismo deixou um vívido retrato do funcionamento da servidão no reinado do Czar Nicolau I que governou a Rússia de 1825 a 1855 Ele recordava da sua infância histórias de homens e mulheres arrancados do seio de suas famílias e aldeias e vendidos perdidos no jogo ou trocados por um par de cães de caça e levados para alguma plaga remota da Rússia de crianças tiradas de seus pais e vendidas para senhores cruéis ou dissolutos de chicotadas no gado que ocorriam todos os dias com crueldade indizível de uma menina cuja única salvação possível foi afogarse de um homem que envelhecera a serviço de seu patrão e acabou se enforcando sob a janela de seu senhor e de revoltas de servos suprimidas pelos generais de Nicolau I açoitando até a morte 1 em cada 10 ou 5 homens escolhidos ao acaso e arrasando a aldeia Quanto à pobreza que presenciei em nossas viagens por certas aldeias especialmente aquelas pertencentes à família imperial não há palavras para descrever tamanha miséria para leitores que não a viram Exatamente como no Império AustroHúngaro o absolutismo russo não se limitou a criar um conjunto de instituições econômicas que impediam a prosperidade da sociedade Havia temor similar em relação à destruição criativa um medo da indústria e das ferrovias No cerne dessa atitude durante o reinado de Nicolau I estava o Conde Egor Kankrin ministro das Finanças entre 1823 e 1844 e protagonista da oposição às mudanças sociais necessárias à promoção da prosperidade econômica As políticas de Kankrin visavam ao reforço dos tradicionais pilares políticos do regime sobretudo a aristocracia rural e o perfil campesino e agrário da sociedade Ao assumir o ministério Kankrin imediatamente contestou e reverteu uma proposta de seu antecessor Gurev de instituir um banco comercial do governo para fazer empréstimos à indústria Pelo contrário Kankrin reabriu o Banco de Empréstimos do Estado que fechara as portas durante as guerras napoleônicas e fora criado originalmente para emprestar dinheiro aos grandes proprietários de terras a juros subsidiados política que ele via com bons olhos Como os empréstimos exigiam que os tomadores dessem servos como garantia apenas os senhores feudais tinham condições de contraílos Para financiálo Kankrin transferiu ativos do Banco Comercial matando dois coelhos com uma cajadada só assim não sobraria muito dinheiro para a indústria As iniciativas de Kankrin foram conscientemente moldadas pelo receio de que mudanças econômicas provocassem mudanças políticas e assim temia o Czar Nicolau A entronização de Nicolau em dezembro de 1825 quase fora abortada por uma tentativa de golpe de oficiais militares os chamados dezembristas adeptos de um programa radical de mudança social Nicolau escreveu ao Grãoduque Mikhail A revolução está às portas da Rússia mas juro que não a deixarei penetrar este país enquanto houver um sopro de vida em meu corpo Nicolau temia as mudanças sociais acarretadas pela promoção de uma economia moderna Como ele mesmo disse em um discurso feito em um encontro de manufaturadores em uma exposição industrial em Moscou Tanto o Estado quanto os manufaturadores devem permanecer atentos a uma questão do contrário as próprias fábricas se tornarão um mal em vez de um bem tratase do cuidado para com os trabalhadores cujo número aumenta a cada ano Eles requerem a enérgica e paternal supervisão de sua moral sem o que essa massa humana será gradualmente corrompida e acabará se tornando uma classe tão miserável quanto perigosa para seus patrões Assim como Francisco I Nicolau receava que a destruição criativa desencadeada por uma moderna economia industrial debilitasse o status quo político russo Instado por Nicolau Kankrin tomou providências específicas no sentido de reduzir o potencial da indústria Assim baniu várias exposições industriais até então realizadas periodicamente a fim de divulgar as novas tecnologias e facilitar sua adoção Em 1848 a Europa foi convulsionada por uma série de tumultos revolucionários Em resposta A A Zakrevskii governador militar de Moscou encarregado da manutenção da ordem pública escreveu a Nicolau Para o bem da preservação da calma e da prosperidade das quais no presente momento apenas a Rússia desfruta o governo não pode permitir a aglomeração de indivíduos desabrigados e dissolutos que facilmente se juntarão a qualquer movimento pondo a perder a paz social ou privada Sua recomendação foi apresentada aos ministros de Nicolau e em 1849 foi promulgada uma nova lei estabelecendo severos limites ao número de fábricas que poderiam ser abertas em qualquer área de Moscou e proibindo especificamente a abertura de qualquer nova fiação de algodão ou lã e fundições de ferro Em outros setores como o de tecelagem e o de tingimento seria preciso solicitar autorização ao governador militar para abrir novas unidades fabris Pouco adiante a fiação de algodão seria explicitamente banida por uma lei que pretendia evitar toda e qualquer concentração de trabalhadores potencialmente rebeldes na cidade A oposição às ferrovias acompanhou a oposição à indústria exatamente como no Império AustroHúngaro Até 1842 havia uma única ferrovia na Rússia a Tsarskoe Selo que percorria os 27 quilômetros que separavam São Petersburgo das residências imperiais de Tsarskoe Selo e Pavlovsk Do mesmo modo como combatia a indústria Kankrin não via razão para fomentar o desenvolvimento das ferrovias que a seu ver promoveriam uma perigosa mobilidade tendo chegado a observar que as estradas de ferro nem sempre resultam de uma necessidade natural constituem mais um objeto de luxo ou necessidade artificial Incentivam deslocamentos desnecessários de um lugar para outro característica típica de nosso tempo Kankrin recusou um semnúmero de propostas de construção de ferrovias e só em 1851 uma linha foi instalada entre Moscou e São Petersburgo Sua política ganharia continuidade nas mãos do Conde Kleinmichel encarregado da principal administração de Transporte e Obras Públicas órgão que seria o principal árbitro da construção de ferrovias usado por Kleinmichel como plataforma para desencorajar sua multiplicação A partir de 1849 ele chegou a usar seu poder para censurar o debate nos jornais acerca do desenvolvimento ferroviário no país O Mapa 13 mostra as consequências dessa lógica Enquanto a GrãBretanha e a maior parte do noroeste da Europa eram em 1870 interligados por ferrovias muito poucas eram as que penetravam no vasto território russo A política contrária às estradas de ferro só seria revertida com a derrota definitiva da Rússia pelas forças inglesas francesas e otomanas na Guerra da Crimeia 18531856 quando finalmente se compreendeu o grave risco para a segurança nacional que o atraso de sua rede de transportes representava Havia também pouco desenvolvimento ferroviário no Império AustroHúngaro exceto pela Áustria e pela região ocidental do império ainda que as revoluções de 1848 tenham provocado mudanças nesses territórios em especial a abolição da servidão Mapa 13 Estradas de ferro na Europa em 1870 PROIBIDO NAVEGAR O absolutismo imperava não só em grande parte da Europa mas também na Ásia onde de maneira análoga impediu a industrialização durante a circunstância crítica criada pela Revolução Industrial As dinastias chinesas Ming e Qing e o absolutismo do Império Otomano ilustram bem esse padrão Sob a dinastia Song entre 960 e 1279 a China esteve na vanguarda mundial de diversas inovações tecnológicas Os chineses inventaram relógios a bússola a pólvora o papel e o papelmoeda a porcelana e as fornalhas para fundição de ferro antes dos europeus Desenvolveram de forma independente as rodas de fiar e a energia hidráulica mais ou mesmo ao mesmo tempo em que elas surgiam no extremo oposto da Eurásia Em função disso em 1500 o padrão de vida era provavelmente tão alto na China quanto na Europa Por séculos vigorou aí também um Estado centralizado com serviço público recrutado com base no mérito Não obstante o regime em vigor na China era absolutista e o crescimento sob a dinastia Song deuse sob instituições extrativistas Não havia representação política de grupos sociais fora da monarquia nenhuma estrutura análoga ao Parlamento ou às Cortes Os mercadores gozaram sempre de um status precário no país e as grandes invenções do período foram motivadas não por incentivos de mercado mas geradas por patrocínio ou mesmo ordens do governo Poucas chegaram a ser comercializadas O controle por parte do Estado recrudesceu durante as dinastias Ming e Qing que sucederam os Song No âmago de tudo isso estava a lógica usual das instituições extrativistas Como a maioria dos governantes à frente de instituições extrativistas os imperadores absolutistas da China opunhamse à mudança buscavam a estabilidade e em essência temiam a destruição criativa Esse ponto é mais bem ilustrado pela história do comércio internacional Como vimos a descoberta das Américas e o modo como se organizou o comércio internacional desempenharam um papel crucial nos conflitos políticos e mudanças institucionais dos primórdios da Europa moderna Na China enquanto mercadores privados eram em geral os responsáveis pelo comércio dentro das fronteiras do país o Estado monopolizava o comércio ultramarino Quando a dinastia Ming ascendeu ao poder em 1368 o Imperador Hongwu foi o primeiro a ocupar o trono por 30 anos Temendo que o comércio ultramarino levasse à desestabilização política e social autorizou sua condução exclusivamente pelo governo e somente à medida que envolvesse o pagamento de tributos não atividades comerciais Hongwu ordenou a execução de centenas de pessoas acusadas de tentar converter missões tributárias em empreitadas comerciais Entre 1377 e 1397 as missões tributárias marítimas foram banidas Pessoas físicas foram proibidas de comerciar com estrangeiros e os chineses não tinham permissão para fazerse à vela Em 1402 o imperador Yongle subiu ao trono e deu início a um dos mais célebres períodos da história chinesa retomando o comércio exterior em grande escala sob os auspícios do governo Yongle patrocinou o Almirante Zheng He em seis missões gigantescas ao Sudeste e Sul da Ásia Arábia e África Eram lugares conhecidos dos chineses por sua longa história de relações comerciais mas nada jamais se dera naquela escala antes A primeira frota compreendia 27800 homens e 62 grandes navios de tesouro acompanhados de 190 embarcações menores entre elas algumas específicas para o transporte de água potável outras para suprimentos e outras ainda para as tropas Contudo após a sexta missão em 1422 o Imperador Yongle ordenou uma interrupção temporária declarada permanente por seu sucessor Hongxi que governou de 1424 a 1425 A morte prematura de Hongxi levou ao trono o Imperador Xuande que a princípio autorizou uma última missão de Zheng He em 1433 Depois disso porém todo o comércio ultramarino voltou a ser banido Em 1436 a construção de embarcações marítimas chegou a ser declarada ilegal O veto ao comércio ultramarino só seria anulado em 1567 Essa sequência de acontecimentos embora não passasse da ponta do iceberg extrativista que impunha um bloqueio a tantas atividades econômicas tidas como potencialmente desestabilizadoras exerceria um impacto fundamental sobre o desenvolvimento econômico chinês Na mesma época em que o comércio internacional e a descoberta das Américas promoviam uma transformação radical nas instituições inglesas a China isolavase dessa circunstância crítica e fechavase em torno do próprio umbigo Esse fechamento não se encerrou em 1567 A dinastia Ming foi sobrepujada em 1644 pelo povo jurchen os manchus do interior da Ásia que fundaram a dinastia Qing Seguiuse um período de intensa instabilidade política Os Qing dedicaramse à expropriação em massa de bens e propriedades Na década de 1690 Tang Chen mercador falido e erudito chinês aposentado escreveu Mais de 50 anos se passaram desde a fundação da dinastia Ching Qing e o império empobrece a cada dia Os fazendeiros estão indigentes os artesãos estão indigentes os mercadores estão indigentes e também as autoridades estão indigentes Os grãos estão baratos mas é difícil conseguir se alimentar Os tecidos estão baratos mas é difícil conseguir se vestir Navios repletos de produtos vão de um mercado a outro mas sua carga é vendida com prejuízo As autoridades após deixarem seus cargos descobremse sem nenhum meio para sustentar sua família Com efeito as quatro principais ocupações estão igualmente empobrecidas Em 1661 o Imperador Kangxi ordenou que toda a população que vivia ao longo da costa do Vietnã até Chekiang basicamente todo o litoral sul outrora a região mais ativa do país em termos comerciais se deslocasse 110 quilômetros para o interior O litoral passou a ser patrulhado por soldados a fim de assegurar o cumprimento da ordem e até 1693 a navegação ao longo de toda a costa permaneceu banida No século XVIII o veto de vez em quando voltaria a entrar em vigor o que efetivamente tolheu o desenvolvimento do comércio ultramarino chinês Até havia alguma atividade mas não eram muitos os que se dispunham a investir sabendo que o imperador poderia mudar subitamente de ideia e voltar a proibir o comércio pondo a perder todo o investimento em embarcações equipamentos e relações comerciais A justificativa dos Estados Ming e Qing para oporse ao comércio internacional já nos é familiar o medo da destruição criativa O objetivo principal de suas lideranças era a estabilidade política O comércio internacional era potencialmente desestabilizador à medida que enriquecia e encorajava a classe mercante como aconteceu na Inglaterra na época da expansão atlântica Essa não era apenas uma crença dos governantes das dinastias Ming e Qing mas também a atitude dos governantes da dinastia Song ainda que estes tivessem se mostrado dispostos a patrocinar inovações tecnológicas e admitir maior liberdade comercial desde que ela permanecesse sob o seu controle A situação se agravou durante as dinastias Ming e Qing à medida que o controle imposto pelo Estado à atividade econômica se estreitou e o comércio ultramarino foi banido Sem dúvida havia mercados e comércio na China durante esse tempo e a carga tributária que incidia sobre a economia doméstica não pesava muito Entretanto o governo pouco apoio deu à inovação trocando o fomento à prosperidade mercantil ou industrial por sua estabilidade política A consequência de tamanho controle absolutista da economia era previsível a economia chinesa permaneceu estagnada durante todo o século XIX e princípio do XX enquanto as demais se industrializavam Quando Mao instaurou seu regime comunista em 1949 a China se tornou um dos países mais pobres do mundo O ABSOLUTISMO DE PRESTE JOÃO O absolutismo como conjunto de instituições políticas e as consequências econômicas dele decorrentes não se restringiram à Europa e à Ásia Fezse presente também na África por exemplo no Reino do Congo como vimos no Capítulo 2 Outro exemplo ainda mais duradouro de absolutismo africano foi o caso da Etiópia ou Abissínia cujas origens discutimos no Capítulo 6 quando tratamos da emergência do feudalismo após o declínio de Axum O absolutismo abissínio teve vida ainda mais longa que suas contrapartes europeias pois encontrou desafios e circunstâncias críticas muito diferentes Após a conversão do monarca axumita Ezana ao cristianismo os etíopes permaneceram cristãos e no século XIV chegaram a ser o tema da lenda do Rei Preste João Preste João foi um monarca cristão que acabara isolado da Europa pela ascensão do Islã no Oriente Médio A princípio pensouse que seu reino localizavase na Índia Contudo com o acúmulo de conhecimento dos europeus sobre a Índia chegouse à conclusão de que não podia ser isso O rei da Etiópia sendo cristão tornouse pois o alvo natural do mito De fato os reis etíopes persistiram muito na tentativa de forjar alianças com os monarcas europeus contra as invasões árabes tendo enviado missões diplomáticas à Europa pelo menos de 1300 em diante e chegado mesmo a persuadir o rei português a enviar tropas Esses soldados junto com diplomatas jesuítas e viajantes que queriam conhecer Preste João deixaram diversos relatos sobre a Etiópia Alguns dos mais interessantes do ponto de vista econômico são os de Francisco Álvares capelão que acompanhou uma missão diplomática portuguesa que esteve na Etiópia entre 1520 e 1527 Ademais há relatos do jesuíta Manoel de Almeida que lá viveu a partir de 1624 e de John Bruce viajante que visitou o país entre 1768 e 1773 Os escritos desses homens traçam um belo retrato das instituições políticas e econômicas da época na Etiópia e não deixam nenhuma dúvida a Etiópia era um rematado exemplo de absolutismo Não havia instituições pluralistas de nenhum tipo nem qualquer restrição ou limite ao poder do imperador que justificava seu direito ao trono mediante sua suposta descendência do Rei Salomão e da Rainha de Sabá A consequência do absolutismo foi uma imensa insegurança quanto aos direitos de propriedade fruto da estratégia política do imperador Bruce por exemplo nota Todas as terras pertencem ao rei ele as distribui pelos que bem entende conforme melhor lhe apraz e as retira quando é a sua vontade Ao morrer todas as terras do reino são postas à disposição da Coroa e não só isso mas com a morte do dono atual suas propriedades tão longamente desfrutadas retornam às mãos do rei em vez de serem legadas ao filho mais velho Álvares acreditava que haveria bem mais frutas e produtos agrícolas se os grandes não maltratassem tanto o povo O relato de Almeida sobre o funcionamento da sociedade é muito consistente Ele observa É tão usual que o imperador troque modifique e retire as terras de cada homem a cada dois ou três anos às vezes a cada ano ou mesmo várias vezes ao longo de um ano que não causa nenhum espanto Com frequência um homem lavra o solo outro o semeia e um terceiro colhe Então não há ninguém para cuidar da terra não há ninguém que plante uma árvore pois todos sabem que aquele que a planta raramente é o que colhe o fruto Para o rei entretanto parece útil mantêlos tão dependentes de si Essas descrições sugerem uma profunda similaridade entre as estruturas políticas e econômicas da Etiópia e as do absolutismo europeu embora também deixem claro que o absolutismo etíope era mais intenso e suas instituições econômicas ainda mais extrativistas Ademais como salientamos no Capítulo 6 a Etiópia não estava sujeita às mesmas circunstâncias críticas que ajudaram a solapar o regime absolutista na Inglaterra permaneceu imune a muitos dos processos que moldaram o mundo moderno Mas ainda que assim não fosse a intensidade do seu absolutismo provavelmente o teria levado a fortalecerse ainda mais Por exemplo como na Espanha o comércio internacional etíope inclusive o lucrativo tráfico de escravos era controlado pelo monarca A Etiópia não estava completamente isolada os europeus haviam procurado pelo Preste João e ela precisou envolverse em guerras contra os Estados islâmicos circundantes Não obstante o historiador Edward Gibbon com boa dose de acurácia notou que cercados por todos os lados pelos inimigos de sua religião os etíopes dormiram por quase mil anos esquecidos do mundo por quem haviam sido esquecidos Quando a colonização europeia da África teve início no século XIX a Etiópia era um reino independente sob Ras Duque Kassa coroado Imperador Tewodros II em 1855 Tewodros dedicouse à modernização do Estado criando uma burocracia e um sistema judiciário mais centralizados e Forças Armadas capazes de controlar o país e eventualmente fazer frente aos europeus Designou governadores militares para todas as províncias responsáveis pela coleta de impostos e seu envio para a Coroa Suas negociações com as potências europeias eram difíceis e exasperado ele aprisionou o cônsul inglês Em 1868 os ingleses enviaram uma força expedicionária que saqueou sua capital Tewodros cometeu suicídio De todo modo o governo reconstruído por Tewodros conseguiu obter um dos maiores triunfos anticoloniais do século XIX contra os italianos Em 1889 o trono foi entregue a Menelik II que imediatamente se defrontou com o interesse da Itália em estabelecer uma colônia em seu país Em 1885 o chanceler germânico Bismarck havia convocado uma conferência em Berlim em que as potências europeias procederam à partilha da África isto é decidiram como dividir o continente em diferentes esferas de influência Nessa ocasião a Itália obteve direito a colônias na Eritreia ao longo da costa da Etiópia e da Somália A Etiópia embora não contasse com representantes na conferência de algum modo conseguiu escapar ilesa Os italianos contudo ainda acalentavam planos para a região e em 1896 marcharam com um exército vindo da Eritreia ao sul A resposta de Menelik foi similar à de um monarca medieval europeu formou seu exército com os homens armados convocados por cada nobre Sua estratégia não lhe permitiria manter suas tropas em campo por muito tempo mas permitiulhe montar uma força imensa por pouco tempo Esse breve intervalo foi o suficiente para derrotar os italianos cujos 15 mil homens foram esmagados pelos 100 mil de Menelik na Batalha de Adowa em 1896 Foi a mais grave derrocada militar que um país pré colonial africano conseguiu infligir a uma potência europeia e assegurou a independência etíope por mais 40 anos O último imperador da Etiópia Ras Tafari foi coroado Hailê Selassiê em 1930 reinou até ser deposto por uma segunda invasão italiana iniciada em 1935 mas retornou do exílio com ajuda inglesa em 1941 Governou então até ser derrubado em 1974 por um golpe do Derg o Conselho um grupo de oficiais militares marxistas que continuaram a empobrecer e devastar o país As instituições econômicas extrativistas básicas do império absolutista etíope como o gult página 140 e o feudalismo surgido após o declínio de Axum perduraram até sua abolição pela revolução de 1974 Hoje a Etiópia é um dos países mais pobres do mundo A renda de um etíope médio equivale a cerca de 140 de um cidadão médio na Inglaterra A maior parte da população vive em áreas rurais e pratica agricultura de subsistência Faltam água potável eletricidade e acesso a escolas ou cuidados médicos adequados A expectativa de vida gira em torno de 55 anos e apenas um terço dos adultos é alfabetizado Uma comparação entre a Inglaterra e a Etiópia dá a dimensão dos níveis a que chega a desigualdade no mundo A razão de a Etiópia estar onde está hoje é que ao contrário da Inglaterra nela o absolutismo persistiu até o passado recente e com ele vieram instituições econômicas extrativistas e pobreza para a massa dos etíopes embora claro imperadores e nobreza tenham se beneficiado imensamente Entretanto a mais duradoura implicação do absolutismo foi a incapacidade da sociedade etíope de tirar proveito das oportunidades de industrialização ao longo do século XIX e princípio do XX o que levou à pobreza abjeta em que hoje vivem seus cidadãos OS FILHOS DE SAMAALE As instituições políticas absolutistas impediram a industrialização nos mais diversos lugares quer de forma indireta no modo como ajudaram a organizar a economia ou direta como vimos nos casos do Império AustroHúngaro e Rússia Contudo o absolutismo não é o único obstáculo à emergência de instituições econômicas inclusivas No princípio do século XIX em várias regiões do mundo sobretudo na África inexistia um Estado capaz de assegurar mesmo o mínimo grau de lei e ordem prérequisitos de uma economia moderna Não houve um equivalente de Pedro o Grande que deflagrou na Rússia o processo de centralização política para em seguida forjar o regime absolutista e muito menos dos Tudor que na Inglaterra centralizaram o Estado sem destruir inteiramente ou para colocar em palavras mais adequadas sem ser inteiramente capazes de destruir o Parlamento e outras restrições ao seu poder Sem algum grau de centralização política mesmo que as elites desses Estados africanos pretendessem saudar a industrialização de braços abertos não haveria muito o que fazer A Somália localizada no Chifre da África ilustra bem os efeitos devastadores da falta de centralização política Tradicionalmente o país é dominado por povos organizados em seis clãs familiares dos quais os quatro maiores Dir Darod Isaq e Hawiye atribuem suas origens a um ancestral mítico comum Samaale Vindos do norte do país espalharamse paulatinamente pelo sul e pelo leste e são ainda hoje basicamente povos pastoris que migram com seus rebanhos de cabras carneiros e camelos Os outros dois clãs Digil e Rahanweyn povos agrícolas sedentários moram no sul Os territórios dos seis estão representados no Mapa 12 Os somalis identificamse em primeiro lugar com o respectivo clã familiar ainda que esses clãs sejam muito amplos e compreendam uma variedade de subgrupos Os mais importantes são aqueles que descendem de um dos clãs maiores dentro destes os mais significativos são os grupos de parentes próximos que pagam e coletam a diya ou dote de sangue isto é compensações pelo assassinato de um de seus membros Os clãs somalis e grupos de diya viramse ao longo da história aprisionados em disputas quase contínuas pelos escassos recursos à sua disposição sobretudo as fontes de água e boas terras de pasto para seus animais além de assaltarem constantemente os rebanhos dos clãs e grupos vizinhos Embora os clãs tivessem líderes chamados de sultões e conselhos de anciãos estes nunca detiveram nenhum poder efetivo O poder político era bastante disperso cada somali adulto tinha voz nas decisões que pudessem afetar o clã ou o grupo como um todo graças a um conselho informal composto de todos os homens adultos Não havia lei escrita polícia nem sistema jurídico exceto pela charia usada como referência à qual leis informais eram incorporadas Essas leis informais de cada grupo de diya eram codificadas no chamado heer um corpo de obrigações deveres e direitos de formulação explícita cujo cumprimento era exigido pelo grupo daqueles que com ele interagissem Com o advento do período colonial esses heers começaram a ser escritos Por exemplo a linhagem Hassan Ugaas um grupo de diya de cerca de 1500 homens era um subclã da família Dir na Somalilândia inglesa Em 8 de março de 1950 seu heer foi registrado pelo comissário britânico do distrito sendo suas três primeiras cláusulas as seguintes 1 Quando um homem dos Hassan Ugaas for morto por um grupo externo 20 camelos de seu dote de sangue 100 serão levados por seus familiares e os 80 restantes serão partilhados entre todos os Hassan Ugaas 2 Se um homem dos Hassan Ugaas for ferido por um forasteiro e seus ferimentos forem avaliados em 33 camelos e um terço 10 camelos vão ser dados a ele ao passo que os demais ficarão com seu grupo de jiffo uma subdivisão do grupo de diya 3 Homicídios entre os membros dos Hassan Ugaas estão sujeitos a compensação à razão de 33 camelos e um terço pagos tão somente aos familiares do morto Caso o culpado seja incapaz de arcar com toda ou parte da dívida será auxiliado por sua estirpe A ênfase do heer em assassinatos e ferimentos reflete o estado de guerra quase constante entre os clãs e grupos de diya que giravam em torno do dote de sangue e da vendeta Um crime contra determinado indivíduo era um crime contra o grupo de diya inteiro e requeria uma compensação coletiva o dote de sangue Se este não fosse pago o grupo de diya do autor do crime enfrentaria a represália coletiva da vítima Quando os modernos meios de transporte chegaram à Somália o dote de sangue foi estendido a mortos ou feridos em acidentes automobilísticos O heer dos Hassan Ugaas não se referia apenas a assassinatos a cláusula 6 estabelecia Se um homem dos Hassan Ugaas insultar outro em uma reunião do Conselho dos Hassan Ugaas deverá pagar 150 xelins à parte ofendida No começo de 1955 os rebanhos de dois clãs os Habar Tol Jalo e os Habar Yuunis pastavam em áreas próximas na região de Domberelly Um homem dos Yuunis foi ferido após uma desavença com um membro dos Tol Jalo acerca dos animais O clã atingido retaliou de imediato atacando os rivais e matando um homem Sua morte segundo o código do dote de sangue obrigava os Yuunis a oferecer uma compensação aos Tol Jalo que a aceitaram O dote de sangue deveria ser pago em pessoa em geral sob a forma de camelos Na cerimônia de entrega um dos Tol Jalo matou um Yuuni confundindoo com um integrante do grupo de diya do assassino o que desencadeou uma guerra aberta e nas 48 horas seguintes foram mortos 13 Yuunis e 26 Tol Jalo O conflito prosseguiria por um ano inteiro até que os anciãos dos dois clãs reunidos pela administração colonial inglesa conseguiram negociar um acordo uma troca de dotes de sangue capaz de satisfazer os dois lados que seria pago no decorrer dos três anos seguintes O pagamento do dote de sangue se dava à sombra da ameaça de uso da força e da retomada da vendeta e mesmo quando era pago não constituía necessariamente um ponto final para o conflito Em geral as disputas desvaneciam e voltavam a se acender O poder político encontravase amplamente distribuído pela sociedade somali portanto de forma quase pluralista Contudo sem a autoridade de um Estado centralizado para impor a ordem que dirá os direitos de propriedade não se produziam instituições inclusivas Ninguém respeitava a autoridade alheia e ninguém nem o Estado colonial britânico que se instalou mostrouse capaz de impor a ordem A falta de centralização política tornou impossível que a Somália se beneficiasse da Revolução Industrial Em tal ambiente seria inimaginável adotar ou investir nas novas tecnologias trazidas da GrãBretanha ou mesmo instaurar os tipos de organização necessários para tanto A complexa política somali teve implicações ainda mais sutis para o progresso econômico Já mencionamos alguns dos grandes enigmas tecnológicos da história africana Até a expansão dos regimes coloniais no final do século XIX as sociedades africanas não faziam uso da roda para o transporte nem do arado na agricultura e poucas como a Etiópia conheciam a escrita Os somalis também possuíam uma escrita mas ao contrário dos etíopes não a utilizavam Já discutimos casos similares na história africana e por mais que as sociedades do continente não empregassem rodas nem arados sem dúvida os conheciam No caso do Reino do Congo como vimos essa situação deviase basicamente ao fato de que as instituições econômicas não criavam incentivos para que as pessoas adotassem tais tecnologias Poderia ocorrer o mesmo com relação ao uso da escrita O Reino de Taqali localizado a noroeste da Somália nas Montanhas Nuba sul do Sudão pode nos ajudar a elucidar a questão O Reino de Taqali foi criado no final do século XVIII por um bando de guerreiros liderados por um certo Ismail permanecendo independente até ser amalgamado em 1884 ao Império Britânico Seu povo tinha acesso à escrita em árabe mas não a utilizava com exceção dos reis para fins de comunicação externa com outros Estados e correspondência diplomática A princípio a situação parece muito intrigante Segundo o relato tradicional da origem da escrita na Mesopotâmia ela foi desenvolvida pelos Estados a fim de fazer o registro das informações controlar a população e coletar impostos O Estado Taqali não tinha interesse em nada disso Essas indagações foram investigadas pela historiadora Janet Ewald em fins dos anos 1970 em sua tentativa de reconstituição da história do Estado Taqali Em parte a justificativa é que os cidadãos teriam resistido ao uso da escrita por receio de que ela fosse utilizada para controlar recursos como a valiosa terra à medida que possibilitaria ao Estado reivindicar sua propriedade Temeriam também que a adoção da escrita possibilitasse uma tributação mais sistemática A dinastia fundada por Ismail não se consolidou em um Estado poderoso Mesmo que quisesse este não era forte o bastante para impor sua vontade às objeções dos cidadãos Por outro lado havia outros fatores mais sutis em ação Diversos grupos de elite opunhamse também à centralização política preferindo por exemplo a interação oral à escrita com a população por lhes proporcionar o máximo de flexibilidade Leis ou ordens escritas não poderiam ser retiradas ou desmentidas e seriam mais difíceis de modificar estabeleceriam referências que as elites dominantes talvez preferissem reverter Assim nem os governados nem os governantes de Taqali viam com bons olhos a introdução da escrita Os primeiros temiam o possível uso que os governantes dela fariam ao passo que estes mesmos em seu precário controle do poder consideravam útil a ausência de escrita Foi a política entre os Taqali que impediu a introdução da escrita Embora a elite somali fosse ainda menos definida que a do Reino Taqali é bastante plausível que as mesmas forças tenham inibido sua adoção da escrita e outras tecnologias básicas O caso da Somália demonstra as consequências da falta de centralização política para o crescimento econômico Na literatura histórica não há registro de tentativas de instaurar tal centralização no país Ainda assim está claro por que isso seria muito difícil proceder à centralização política significaria que determinados clãs teriam de se submeter ao controle de outros Todavia os somalis repudiavam qualquer hierarquia do gênero e a abdicação de poder que ela implicaria Ademais o equilíbrio de poder militar na sociedade também dificultaria o estabelecimento de instituições centralizadas Com efeito é provável que qualquer grupo ou clã que viesse a tentar centralizar o poder não só enfrentasse resistência ferrenha como também acabasse perdendo o poder e privilégios de que já gozava Em decorrência de tamanha falta de centralização política e da inerente ausência mesmo do mínimo asseguramento dos direitos de propriedade a sociedade somali nunca chegou a gerar os incentivos necessários para o investimento em tecnologias que incrementassem a produtividade Enquanto o processo de industrialização se encontrava em andamento em outras regiões do mundo nos séculos XIX e começo do XX os somalis digladiavam em vendetas intermináveis e lutavam pela própria vida e seu atraso econômico apenas se arraigava cada vez mais ATRASO PERSISTENTE A Revolução Industrial gerou uma circunstância crítica transformadora para o mundo inteiro durante o século XIX e além as sociedades que permitiram e incentivaram seus cidadãos a investir em novas tecnologias apresentaram rápido crescimento Contudo muitas em todo o mundo falharam nesse processo ou optaram explicitamente por não realizálo Países submetidos a instituições políticas e econômicas extrativistas não geravam tais incentivos Espanha e Etiópia são bons exemplos em que o controle absolutista das instituições políticas e as instituições econômicas intrinsecamente extrativistas asfixiaram os incentivos econômicos muito antes de despontar o século XIX O resultado foi semelhante em outros regimes absolutistas como o Império AustroHúngaro a Rússia o Império Otomano e a China muito embora nesses casos os governantes por medo da destruição criativa tenham não só negligenciado o fomento ao progresso econômico como também tomado medidas explícitas para bloquear a difusão da indústria e a introdução de novas tecnologias que promoveriam a industrialização O absolutismo não é a única modalidade de instituição política extrativista e não foi o único fator a impedir a industrialização Instituições políticas e econômicas inclusivas requerem algum grau de centralização política para que o Estado possa impor a lei e a ordem defender os direitos de propriedade e fomentar a atividade econômica quando necessário mediante o investimento em serviços públicos Mesmo hoje porém em diversos países como Afeganistão Haiti Nepal e Somália o Estado é incapaz de manter a ordem mais rudimentar e os incentivos econômicos encontramse absolutamente destruídos O caso da Somália ilustra como o processo de industrialização também foi ignorado por essas sociedades A centralização política é objeto de resistência pelo mesmo motivo pelo qual os regimes absolutistas resistem à mudança em geral o receio quase sempre justificado de que ela desloque o eixo do poder político transferindoo dos que dominam hoje para as mãos de novos indivíduos e grupos Assim do mesmo modo como o absolutismo bloqueia toda e qualquer transformação no sentido do pluralismo e da mudança econômica as elites e clãs tradicionais dominantes nas sociedades que não dispõem de Estado centralizado agem no mesmo sentido Por conseguinte as sociedades em que tal centralização era ainda inexistente nos séculos XVIII e XIX estavam particularmente mal posicionadas para a era da indústria Enquanto uma variedade de instituições extrativistas desde o absolutismo até a relativa falta de centralização do Estado inviabilizava a disseminação da indústria em determinados países em outros a circunstância crítica da Revolução Industrial tinha consequências muito distintas Como veremos no Capítulo 10 as sociedades que já haviam dado seus primeiros passos em direção a instituições políticas e econômicas inclusivas como Estados Unidos e Austrália bem como aquelas onde o absolutismo sofreu abalos mais graves como França e Japão puderam tirar proveito das novas oportunidades econômicas e dar início a um processo de rápido crescimento econômico Assim o padrão habitual de interação entre uma circunstância crítica e as diferenças institucionais existentes levando à intensificação do processo de diferenciação institucional e econômica mais uma vez entrou em ação no século XIX mas agora com impacto ainda maior e efeitos mais profundos sobre a prosperidade e a pobreza das nações O 9 REVERTENDO O DESENVOLVIMENTO ESPECIARIAS E GENOCÍDIO ARQUIPÉLAGO DAS MOLUCAS na moderna Indonésia é composto de três grupos de ilhas No começo do século XVII as Molucas do Norte compreendiam os reinos independentes de Tidore Ternate e Bacan O grupo do meio incluía o reino insular de Ambon No sul ficavam as Ilhas Banda um pequeno arquipélago ainda não unificado politicamente Embora hoje talvez nos pareça um lugar remoto as Molucas eram na época peçaschave do comércio mundial por serem as únicas produtoras de especiarias preciosas como cravodaíndia macis e nozmoscada sendo que destes a nozmoscada e o macis eram originários exclusivamente das Ilhas Banda Os habitantes dessas ilhas produziam e exportavam tais especiarias raras em troca de alimentos e produtos manufaturados provenientes da Ilha de Java do entreposto de Melaka na Península da Malásia e da Índia China e Arábia O primeiro contato desse povo com os europeus ocorreu no século XVI com os navegadores portugueses que chegaram em busca de especiarias que até então chegavam à Europa via Oriente Médio por rotas comerciais controladas pelo Império Otomano No intuito de obter acesso direto às Ilhas das Especiarias e a esse comércio os europeus partiram em busca de uma passagem contornando a África ou através do Atlântico O marinheiro português Bartolomeu Dias dobrou o Cabo da Boa Esperança em 1488 e por aí a Índia foi alcançada por Vasco da Gama em 1498 Pela primeira vez os europeus dispunham de sua própria rota independente até as Ilhas das Especiarias Os portugueses imediatamente se lançaram à tarefa de tentar controlar o comércio de especiarias Capturaram Melaka em 1511 Estrategicamente localizada na Costa Oeste da Península da Malásia era para lá que mercadores de todo o Sudeste Asiático se dirigiam para vender suas especiarias para outros mercadores indianos chineses e árabes que então os embarcavam para o Ocidente Nas palavras do viajante português Tomé Pires em 1515 O comércio entre as diferentes nações num raio de 65 mil quilômetros passa obrigatoriamente por Melaka Quem for senhor de Melaka terá as mãos na garganta de Veneza Com Melaka em suas mãos os portugueses deram início a tentativas sistemáticas de conquistar o monopólio do inestimável comércio de especiarias Em vão Ín di a Ch in a Ta iwan Ja pã o Av a Mian ma r Laos Pe gu Ta ilândi a Ca mboja V iet nã Fi lipi na s L uzo n Ma nila Vi saya s Cebu Ma gu indana o Mindan o Su lu Br u nei Bo rn éu Banjarma si n Su lawesi Te rnat e Tidore Ma lu ku Am bo n Banda Timor Le st e Lo mbok Sura ba ya Ba li Tu ban Ac eh Pe ní ns ula da Ma lá sia Me la ka C ing apur a Pa lemban g Sumatr a Ja car ta Banten Ja va Mapa 14 Sudeste Asiático Ilhas das Especiarias Ambon e Banda em 1600 Os rivais que teriam de encarar nada tinham de insignificantes Entre os séculos XIV e XVI o comércio de especiarias promoveu um surto de desenvolvimento econômico no Sudeste Asiático Cidadesestados como Aceh Banten Melaka Makassar Pegu e Brunei expandiramse rapidamente produzindo e exportando especiarias e outros produtos como madeiras de lei Esses Estados apresentavam formas absolutistas de governo similares às existentes na Europa no mesmo período O desenvolvimento de instituições políticas foi fomentado por processos similares entre eles as mudanças tecnológicas nos métodos de guerra e comércio internacional As instituições estatais foram paulatinamente se centralizando girando em torno de um soberano que reivindicava o poder absoluto Como os monarcas absolutos europeus os reis do Sudeste Asiático dependiam basicamente do comércio como fonte de renda e tanto se dedicavam pessoalmente a ele quanto concediam monopólios para as elites locais e estrangeiras Como na Europa absolutista essa estratégia gerou algum crescimento econômico embora oferecesse um conjunto de instituições econômicas que estava longe de ser o ideal para a prosperidade econômica com barreiras alfandegárias significativas e direitos de propriedade predominantemente instáveis Não obstante o processo de comercialização já se encontrava em andamento enquanto os portugueses se desdobravam para estabelecer seu domínio no Oceano Índico A presença dos europeus ganhou muito em peso e impacto com a chegada dos holandeses Estes logo se deram conta de que monopolizar o fornecimento de especiarias valiosas das Molucas seria muito mais rentável do que concorrer com os comerciantes locais ou outros europeus Assim em 1600 persuadiram o governante de Ambon a assinar um contrato de exclusividade que lhes conferia o monopólio do comércio local de cravodaíndia Com a fundação da Companhia Holandesa das Índias Orientais em 1602 os holandeses acabaram levando a melhor em suas tentativas de se apoderar de todo o comércio de especiarias e eliminar seus concorrentes por bem ou por mal Tanto pior para o Sudeste Asiático A Companhia Holandesa das Índias Orientais foi depois da Companhia Inglesa das Índias Orientais a segunda sociedade anônima por ações europeia dois marcos no desenvolvimento das corporações modernas que mais tarde desempenhariam papel central no crescimento industrial europeu Foi também a segunda empresa a dispor de Exército próprio com suficiente poder para travar guerras e colonizar terras estrangeiras Lançando mão do poderio militar da companhia os holandeses trataram de tirar do caminho todos os potenciais obstáculos ao seu tratado com o governante de Ambon Assim em 1605 capturaram um forte estratégico dos portugueses e afastaram à força todos os demais mercadores Expandiramse então para as Molucas do Norte obrigando os soberanos de Tidore Ternate e Bacan a vedar o cultivo e a comercialização do cravodaíndia em seus territórios O tratado imposto a Ternate chegava mesmo a permitir que os holandeses destruíssem todos os pés de cravodaíndia que porventura encontrassem dentro de suas fronteiras O regime vigente em Ambon era similar ao de boa parte da Europa e das Américas na mesma época Seus cidadãos pagavam tributos ao governante local e eram submetidos a trabalhos forçados Os holandeses assumiram o controle e intensificaram o sistema de modo a extrair mais trabalho e maior quantidade de cravo da ilha Até a sua chegada famílias extensas pagavam à elite local tributos sob a forma de cravoda índia Os holandeses estipularam então que cada uma delas permaneceria presa à terra e teria de cultivar determinado número de pés de cravo além de passar a ser obrigada a prestar trabalhos forçados aos novos senhores Os holandeses assumiram também o controle das Ilhas Banda agora no intuito de monopolizar o macis e a nozmoscada Contudo a organização dessas ilhas era completamente distinta da de Ambon eram compostas de um semnúmero de pequenas cidadesestados autônomas sem hierarquia social ou política Esses pequenos Estados na realidade não mais que aldeias eram regidos por assembleias de cidadãos Não havia uma autoridade central que os holandeses pudessem coagir a assinar um contrato de monopólio nem uma estrutura tributária de que se pudessem apropriar a fim de capturar todo o fornecimento de nozmoscada e macis A princípio isso significou que os holandeses teriam de concorrer com os mercadores ingleses portugueses indianos e chineses perdendo as especiarias para os adversários sempre que não pagassem preços altos o bastante Vendo desmoronar os seus planos iniciais de estabelecer um monopólio do macis e da nozmoscada o governador holandês da Batávia Jan Pieterszoon Coen divisou um novo plano Em 1618 Coen fundou Batávia na Ilha de Java como nova capital da Companhia Holandesa das Índias Orientais Em 1621 dirigiuse a Banda com uma esquadra e tratou de massacrar quase toda a população das ilhas provavelmente umas 15 mil pessoas Todos os líderes foram executados com os demais e apenas alguns permaneceram vivos em número suficiente para preservar o knowhow necessário à produção das especiarias Concluído o genocídio Coen instaurou a estrutura política e econômica necessária para seu plano uma sociedade de plantation As ilhas foram divididas em 68 lotes confiados a 68 holandeses em sua maioria funcionários ou exfuncionários da Companhia Holandesa das Índias Orientais Os novos donos da terra aprenderam com os habitantes sobreviventes a cultivar as especiarias comprando escravos da companhia para povoar as ilhas agora desertas e produzir o macis e a nozmoscada a serem vendidos à companhia a preços predeterminados As instituições extrativistas instauradas pelos holandeses nas Ilhas das Especiarias alcançaram os efeitos desejados ainda que em Banda isso tenha se dado ao custo de 15 mil vidas inocentes e do estabelecimento de instituições políticas e econômicas que condenariam as ilhas ao subdesenvolvimento No final do século XVII os holandeses haviam reduzido em cerca de 60 o fornecimento mundial dessas especiarias e o preço da nozmoscada havia duplicado Os holandeses espalharam a estratégia que aperfeiçoaram nas Molucas para a região inteira com profundas implicações para as instituições políticas e econômicas do resto do Sudeste Asiático O longo processo de expansão comercial de diversos Estados da região iniciado no século XIV entrou em retrocesso Mesmo aqueles que não chegaram a ser diretamente submetidos ao poder colonial e esmagados pela Companhia Holandesa das Índias Orientais fecharamse e abandonaram o comércio A incipiente transformação econômica e política no Sudeste Asiático foi interrompida A fim de evitar o perigo representado pela Companhia Holandesa das Índias Orientais vários Estados abandonaram a produção agrícola para exportação e abdicaram de toda atividade comercial A autossuficiência era mais segura do que enfrentar os holandeses Em 1620 o Estado de Banten na Ilha de Java derrubou suas pimenteiras na esperança de assim induzir os holandeses a deixálo em paz Quando um mercador holandês visitou Maguindanao no sul das Filipinas em 1686 disseramlhe Aqui é possível cultivar nozmoscada e cravodaíndia como em Malaku Não nos dedicamos mais a isso porque o antigo rajá ordenou que fossem todas destruídas antes de morrer por medo de que a companhia holandesa viesse disputálas Outro comerciante ouviu declaração similar sobre o regente de Maguindanao em 1699 Ele havia proibido que se continuasse plantando pimenta para não acabar envolvido em uma guerra fosse com a companhia holandesa ou com algum outro potentado Seguiuse um processo de desurbanização e até de declínio econômico Em 1635 os birmaneses transferiram sua capital de Pegu no litoral para Ava bem no interior subindo o Rio Irrawaddy Não sabemos que rumos tomariam os Estados do Sudeste Asiático em seu desenvolvimento econômico e político se não tivesse havido a agressão holandesa Talvez produzissem seu próprio estilo de absolutismo e permanecessem no mesmo estágio em que se encontravam no final do século XVI ou talvez tivessem dado continuidade às suas atividades comerciais e gradualmente fossem adotando instituições cada vez mais inclusivas Do mesmo modo como nas Molucas porém o colonialismo holandês mudou de maneira drástica a direção de seu desenvolvimento econômico e político Os povos do Sudeste Asiático puseram fim ao seu intercâmbio comercial fecharamse e intensificaram seu absolutismo Nos dois séculos que se seguiram não estariam em condições de tirar proveito das inovações decorrentes da Revolução Industrial E em última instância nem a interrupção do comércio os poria a salvo dos europeus no final do século XVIII quase todos haviam sido engolfados por impérios coloniais VIMOS NO CAPÍTULO 7 como a expansão europeia no Atlântico impulsionou a instalação de instituições inclusivas na GrãBretanha Conforme ilustrado pela experiência das Molucas sob domínio holandês porém essa mesma expansão espalhou as sementes do subdesenvolvimento nos mais diversos cantos do mundo ao impor instituições extrativistas ou reforçar as já existentes Estas de maneira direta ou indireta puseram a perder a incipiente atividade comercial e industrial em todo o planeta ou ajudaram a perpetuar instituições que bloquearam a industrialização Por conseguinte enquanto a Revolução Industrial se disseminava por determinadas regiões do mundo aqueles lugares submetidos aos impérios coloniais europeus não tinham a menor chance de beneficiarse das novas tecnologias A INSTITUIÇÃO HABITUAL No Sudeste Asiático a difusão do poder comercial e naval europeu nos primórdios da era moderna abortou um período promissor de expansão econômica e transformação institucional Na mesma época em que a Companhia Holandesa das Índias Orientais se expandia uma modalidade comercial completamente distinta se intensificava na África o tráfico de escravos Nos Estados Unidos a escravidão nos estados do sul costumava ser denominada instituição peculiar Historicamente porém como tão bem assinalou o grande estudioso clássico Moses Finlay a escravidão nunca teve nada de peculiar pelo contrário esteve presente em praticamente todas as sociedades Era como vimos endêmica na Roma Antiga e na África tradicional fornecedora de escravos para a Europa ainda que não a única Nos tempos romanos os escravos eram provenientes dos povos eslavos do entorno do Mar Negro do Oriente Médio e do Norte da Europa mas em 1400 os europeus já haviam parado de escravizarse mutuamente A África todavia como vimos no Capítulo 6 não fez a transição como a Europa medieval da escravidão à servidão Nos primórdios da era moderna no Leste Africano era vibrante o tráfico de escravos transportados em grande número através do Saara até a Península Arábica Ademais os grandes Estados medievais de Mali Gana e Songhai na África Ocidental faziam intenso uso de mão de obra escrava no governo Exército e agricultura tendo adotado os modelos organizacionais dos Estados muçulmanos norteafricanos com os quais mantinham relações comerciais Foi o desenvolvimento das colônias produtoras de açúcar no Caribe a partir do princípio do século XVII que provocou uma escalada extrema do tráfico internacional de escravos e o aumento sem precedentes da importância da escravidão dentro da própria África No século XVI provavelmente em torno de 300 mil escravos foram comercializados no Atlântico oriundos em sua maioria da África Central com intensa participação do Congo e dos portugueses mais ao sul em Luanda hoje capital de Angola Durante esse período o tráfico de escravos transaariano foi ainda mais volumoso com o deslocamento provavelmente de cerca de 550 mil africanos escravizados rumo ao norte No século XVII a situação se inverteu Por volta de 1350000 africanos foram vendidos como escravos no comércio atlântico sendo enviados em sua maioria para as Américas Os números relativos ao comércio saariano permaneceram quase idênticos O século XVIII assistiu a outro salto abrupto com aproximadamente 6 milhões de escravos mandados para o outro lado do Atlântico e talvez 700 mil atravessando o Saara Somando os números dos diferentes períodos e regiões da África chegase a bem mais de 10 milhões de africanos degredados do continente como escravos O Mapa 15 dá a dimensão da escala do tráfico de escravos Partindo das fronteiras nacionais atuais apresenta estimativas da medida cumulativa da escravidão entre 1400 e 1900 como uma porcentagem da população em 1400 Os tons mais escuros indicam escravidão mais intensa Por exemplo em Angola Benin Gana e Togo o número de escravos exportados chegou a um total acumulado superior à população inteira do país em 1400 O súbito aparecimento de europeus por toda a costa da África Ocidental e Central ávidos por comprar escravos não teria como não exercer um impacto transformador sobre as sociedades africanas A maioria dos escravos deportados para as Américas consistia em prisioneiros de guerra que eram levados até o litoral O recrudescimento dos conflitos foi alimentado pela gigantesca importação de armas e munição que os europeus trocavam por escravos Em 1730 cerca de 180 mil armas eram importadas todos os anos só no litoral oeste do continente entre 1750 e princípios do século XIX só os britânicos venderam entre 283 mil e 394 mil armas por ano Entre 1750 e 1807 os ingleses venderam o extraordinário volume de 22 mil toneladas de pólvora chegando a uma média de 384 mil quilos ao ano além de 91 mil quilos de chumbo anuais Mais ao sul o comércio era igualmente vigoroso No litoral do Reino de Luangu ao norte do Reino do Congo os europeus venderam cerca de 50 mil armas por ano Dados inexisten te s Ma rr ocos Tu nísia Ar gé li a Saara O cide nt al Ma ur itânia Ma li Ní ge r Ch ade Su dã o Eritreia Djibu ti Et iópi a So má li a Se ne ga l Gâmb ia Gu in é Se rr a Le oa Costa do Ma m Li bé ri a Burkin a Fa so To go Gana Be ni n Ni gé ri a Ca marõ es Re públic a Ce ntro A frican a Gu iné Eq uatori al Ga bã o Cong o Br az za vi ll e Re públic a De mocrát ic a do Cong o Ug anda Qu ên ia Ru anda Bu ru nd i Ta nzâni a An go la Zâmbia Ma láui Mo çambique Ma da ga scar Zimbábue Na míbi a Bo tsuana Su azil ândi a Lesoto África do Su l Exportações de escra vos po rc enta ge m da população em 140 0 150 0 50100 100300 Mapa 15 Exportações de escravos da África Tanta guerra e conflito não só foram causas de vasta mortandade e sofrimento humano mas também desencadearam determinado caminho de desenvolvimento institucional na África Até o início da era moderna as sociedades africanas eram menos centralizadas politicamente do que as da Eurásia A maioria dos Estados era de pequena escala com a terra e os recursos sob o controle de chefes tribais talvez reis Muitos como mostramos no caso da Somália não contavam com absolutamente nenhuma estrutura de autoridade política hierárquica O tráfico de escravos pôs em andamento dois processos políticos adversos Primeiro diversos Estados a princípio tornaramse mais absolutistas organizandose em função de um único objetivo escravizar e vender os demais para os traficantes europeus Segundo em consequência mas paradoxalmente em oposição ao primeiro a beligerância incessante e a escravidão acabaram destruindo por completo qualquer tipo de ordem e autoridade estatal legítima porventura existente na África subsaariana Além das guerras os escravos também eram sequestrados e capturados em ataques de surpresa de menor escala A lei também se converteu em instrumento de escravização Qualquer que fosse o crime cometido a pena seria a escravidão O mercador inglês Francis Moore notou as consequências disso ao longo da costa da Senegâmbia na África Ocidental na década de 1730 Desde que o tráfico de escravos assim entrou em vigor todas as punições passaram a ser a escravidão havendo vantagem em tais condenações constituíramse em excessivo rigor punitivo a fim de assegurar o benefício da venda do criminoso Não só o assassinato o roubo e o adultério são punidos pela venda do criminoso como escravo mas as maiores frivolidades são penalizadas da mesma maneira As instituições mesmo as religiosas foram pervertidas pela ânsia de capturar e vender escravos Um exemplo foi o famoso oráculo de Arochuku no leste da Nigéria que se acreditava falar em nome de uma importante divindade da região respeitada pelos principais grupos étnicos locais ijos ibibios e igbos Buscavase o oráculo para solucionar disputas e arbitrar em desavenças Os consulentes que viajavam a Arochuku para consultálo tinham de descer da cidade até uma garganta do Rio Cross onde em uma vasta caverna com a frente toda decorada com crânios humanos o oráculo estava abrigado Os sacerdotes em conluio com os mercadores e traficantes de escravos aros comunicavam a decisão do oráculo a qual em geral implicava que as pessoas fossem engolidas por ele o que significava na verdade que uma vez atravessada a caverna seriam levadas rio abaixo até os navios negreiros dos europeus no litoral Esse processo de desvirtuamento e violação de todas as leis e costumes tendo em vista a captura de escravos em número cada vez maior exerceu impacto devastador sobre a centralização política embora em determinaras áreas tenha levado ao surgimento de Estados poderosos cuja principal razão de ser eram as incursões e a escravização O próprio Reino do Congo foi provavelmente o primeiro Estado africano a metamorfosearse em escravagista até terminar despedaçado pela guerra civil Outros Estados escravagistas despontaram sobretudo na África Ocidental incluindo os oyos na Nigéria os daomeanos no Benin e mais tarde os axântis em Gana A expansão do Estado oyo em meados do século XVII por exemplo foi diretamente relacionada ao recrudescimento das exportações de escravos no litoral Seu poderio foi decorrente de uma revolução militar que envolveu a importação de cavalos do norte e a formação de uma poderosa cavalaria capaz de dizimar os exércitos rivais À medida que os oyos se expandiam para o sul rumo à costa iam esmagando as sociedades que encontravam no caminho e vendiam significativa parcela de sua população para o tráfico negreiro No período entre 1690 e 1740 os oyos estabeleceram seu monopólio no interior do que ficaria conhecido como Costa dos Escravos Estimase que 80 a 90 dos escravos vendidos no litoral tenham sido fruto dessas conquistas Relação dramática semelhante entre guerra e fornecimento de escravos deuse mais a oeste no século XVIII na Costa do Ouro área onde hoje se localiza Gana A partir de 1700 o Estado axânti começou a expandirse do interior de modo bastante similar ao dos oyos anteriormente Ao longo da primeira metade do século XVIII essa expansão desencadeou as chamadas Guerras de Akan nas quais os axântis foram derrotando um Estado independente depois do outro O último deles Gyaman foi subjugado em 1747 Em sua maioria os 375 mil escravos exportados da Costa do Ouro entre 1700 e 1750 eram prisioneiros capturados nessas guerras Provavelmente o efeito mais óbvio desse extrativismo maciço de seres humanos foi demográfico É difícil saber com algum grau de certeza qual seria a população da África antes do período moderno mas há diversas estimativas plausíveis de estudiosos sobre o impacto populacional do tráfico de escravos O historiador Patrick Manning avalia em 2225 milhões em princípios do século XVIII o número de habitantes das áreas do oeste e centrooeste africanos fornecedoras de mão de obra escrava para exportação Partindose da premissa conservadora de que essa região sem o tráfico de escravos teria experimentado durante os séculos XVIII e XIX um índice de crescimento populacional de cerca de 05 ao ano Manning calculou que seu número de habitantes giraria em 1850 em torno de pelo menos 4653 milhões Na realidade era aproximadamente metade disso Tão gigantesca diferença deveuse não só aos cerca de 8 milhões de pessoas exportadas como escravos entre 1700 e 1850 mas aos milhões que devem ter sucumbido na permanente perseguição e captura de escravos Ademais a escravidão e o tráfico negreiro na África jogaram por terra as estruturas familiares e matrimoniais além de talvez terem reduzido a fertilidade A partir de fins do século XVIII um vigoroso movimento pela abolição do tráfico de escravos começou a ganhar força na GrãBretanha encabeçado pela carismática figura de William Wilberforce Após sucessivos fracassos em 1807 os abolicionistas persuadiram o Parlamento a aprovar uma lei tornando o tráfico ilegal Os Estados Unidos seguiram o exemplo aprovando iniciativa similar no ano seguinte O governo britânico porém foi ainda mais longe empenhouse ativamente em implementar a medida para tanto posicionando estrategicamente esquadras navais no Atlântico a fim de reprimir a circulação de navios negreiros Embora tenha demorado ainda algum tempo para que tais iniciativas se mostrassem realmente eficazes e só em 1834 a escravidão em si fosse de fato abolida no Império Britânico o tráfico de escravos no Atlântico que respondia de longe pela maior parte desse comércio estava com os dias contados Por mais que o fim do tráfico de escravos após 1807 houvesse reduzido a demanda externa por escravos da África isso não significou que o impacto da escravidão sobre as sociedades e instituições africanas se dissolveria magicamente Não poucos Estados africanos haviam se organizado em torno do escravismo e não seria o veto imposto pelos britânicos ao comércio que mudaria essa realidade Ademais a escravidão havia se tornado muito mais prevalente dentro da própria África Esses fatores acabariam por moldar os rumos do desenvolvimento no continente tanto antes quanto depois de 1807 No lugar da escravidão sobreveio o comércio legítimo expressão cunhada para referirse à exportação pelos africanos de outros produtos sem ligação com o tráfico negreiro Entre essas mercadorias figuravam óleo de palma e nozes amendoim marfim borracha e goma arábica Com o incremento das receitas europeia e norteamericana em decorrência da difusão da Revolução Industrial a demanda por muitos desses produtos tropicais disparou E com a mesma agressividade com que haviam aproveitado as oportunidades econômicas oferecidas pelo tráfico de escravos as sociedades africanas lançaramse sobre o comércio legítimo Fizeramno porém em um contexto muito peculiar no qual a escravidão constituía um modo de vida mas a demanda externa por escravos havia se esgotado subitamente O que fazer com todos aqueles escravos agora que já não podiam mais ser vendidos para os europeus A resposta era simples continuariam gerando lucro trabalhando sob coação na África mesmo produzindo os novos artigos para o comércio legítimo Um dos exemplos mais bem documentados foi o caso dos axântis na Gana de hoje Até 1807 o Império Axânti havia se dedicado inteiramente à captura e exportação de escravos levandoos até a costa para vendêlos nas grandes feitorias de escravos de Cape Coast e Elmina Depois de 1807 estando vedada essa opção a elite política axânti tratou de reorganizar sua economia Entretanto a captura e a utilização da mão de obra escrava não tiveram fim Pelo contrário os escravos foram instalados em grandes latifúndios a princípio nas cercanias da capital Kumase mas mais tarde espalhados por todo o império cujo território correspondia a quase todo o interior da atual Gana Eram empregados no garimpo do ouro e no plantio de nozes de cola para exportação mas também cultivavam alimentos em grande quantidade e eram intensivamente empregados como carregadores já que os axântis não faziam uso do transporte sobre rodas Mais a leste verificaramse adaptações similares Em Daomé por exemplo o rei tinha vastas plantations de óleo de palma junto aos portos costeiros de Whydah e Porto Novo todas baseadas em mão de obra escrava Desse modo a abolição do tráfico de escravos em vez de levar a escravidão na África à dissolução acarretou tão somente a redistribuição dos escravos agora empregados dentro da própria África em vez de nas Américas Ademais muitas das instituições políticas engendradas pelo tráfico de escravos nos dois séculos anteriores seguiram inalteradas e seus padrões de comportamento persistiram Na Nigéria por exemplo nas décadas de 1820 e 1830 o outrora imponente Reino Oyo desmoronou solapado por guerras civis e a ascensão das cidadesestados iorubás como Illorin e Ibadan diretamente envolvidas no tráfico de escravos mais ao sul Na década de 1830 a capital de Oyo foi saqueada depois do que as cidades iorubás puseramse a disputar com Daomé a dominação regional Engajaramse em uma série quase contínua de guerras na primeira metade do século que geravam uma oferta maciça de escravos e às quais se vinham juntar os já rotineiros sequestros condenações por oráculos e incursões em menor escala Os sequestros constituíam tamanho problema em determinadas regiões da Nigéria que os pais não deixavam seus filhos brincar ao ar livre por medo de que fossem levados e vendidos como escravos Assim a escravidão em vez de extinguirse ao que parece foi recrudescendo na África no decorrer do século XIX Embora seja difícil chegar a números exatos uma série de relatos escritos por viajantes e mercadores nessa época sugere que na África Ocidental tanto nos reinos de Axânti e Daomé quanto nas cidadesestados iorubás metade da população era composta de escravos Dispomos de dados mais acurados dos primeiros registros coloniais franceses do oeste do Sudão uma imensa fatia da África Ocidental que se estendia do Senegal via Mali e Burkina Faso até o Níger e Chade Nessa região em 1900 30 da população era escrava Do mesmo modo como o advento do comércio legítimo a colonização formal iniciada com a Partilha da África mostrouse incapaz de destruir a escravidão aí vigente Ainda que a penetração europeia no continente fosse em boa parte justificada com o argumento de que era preciso combater e abolir a escravidão a realidade era muito diferente Na maior parte da África colonial a escravidão seguiria em vigor até que o século XX estivesse já bastante avançado Em Serra Leoa por exemplo só em 1928 a escravidão seria finalmente abolida muito embora a capital do país Freetown tivesse sido fundada originalmente em fins do século XVIII como um porto seguro para escravos repatriados das Américas Tornouse então uma importante base para a frota antiescravagista britânica e um novo lar para escravos libertos resgatados dos navios negreiros capturados pelos ingleses Mesmo com esse simbolismo a escravidão ainda perduraria por 130 anos em Serra Leoa A Libéria ao sul de Serra Leoa foi igualmente fundada na década de 1840 para escravos libertos americanos Também lá porém a escravidão adentraria o século XX ainda nos anos 1960 estimavase que um quarto da força de trabalho era coagida vivendo e trabalhando em condições análogas às da escravidão Dadas as instituições políticas e econômicas extrativistas baseadas no tráfico de escravos a industrialização não se disseminou pela África subsaariana que enquanto outras regiões do mundo transformavam suas economias estagnouse ou mesmo experimentou um retrocesso econômico INSTAURANDO O DUALISMO ECONOMICO O paradigma do dualismo econômico proposto originalmente em 1955 por Sir Arthur Lewis ainda molda a maneira como muitos cientistas sociais estudam os problemas econômicos dos países menos desenvolvidos Segundo Lewis várias economias menos desenvolvidas ou subdesenvolvidas possuem uma estrutura dual dividindose em um setor moderno e outro tradicional O primeiro que corresponde à parte mais desenvolvida da economia está associado à vida urbana à indústria moderna e ao uso de tecnologias avançadas O segundo é aquele ligado à vida rural à agricultura e a instituições e tecnologias retrógradas As instituições agrícolas antiquadas incluem a propriedade comunitária da terra que implica a ausência de direitos de propriedade privada sobre ela Nesse setor tradicional a mão de obra seria usada com tamanha ineficiência segundo Lewis que poderia ser realocada para o moderno sem reduzir a produtividade do rural Após gerações e gerações de economistas do desenvolvimento trabalhando com base nos conceitos de Lewis o problema do desenvolvimento passou a significar a transferência de pessoas e recursos do setor tradicional da agricultura e dos meios rurais para o setor moderno a indústria e as cidades Em 1979 Lewis foi agraciado com o Prêmio Nobel por sua obra sobre desenvolvimento econômico Lewis e os economistas do desenvolvimento que se basearam em suas teses sem dúvida acertaram ao identificar as economias duais A África do Sul era um dos exemplos mais claros cindida entre um setor tradicional retrógrado e pobre e outro moderno vibrante e próspero Ainda hoje nesse país o dualismo econômico apontado por Lewis pode ser detectado por toda parte Uma das maneiras mais drásticas de constatar esse fenômeno é cruzar a fronteira entre os estados de KwaZuluNatal antigo Natal e Transkei que coincide com o curso do Rio Great Kei A leste do rio em Natal junto à costa há imponentes propriedades com vista para o mar defronte ao extenso areal de praias magníficas O interior é coberto por plantações verdejantes de canade açúcar As estradas são lindas a região inteira exala prosperidade Atravessando o rio parece que se adentra outro tempo e país O cenário é de desolação Não há verde apenas a terra marrom da área desmatada Em vez de casas luxuosas com água corrente banheiros e todas as conveniências modernas a população vive em barracos improvisados e prepara sua comida em fogueiras a céu aberto A existência é definitivamente tradicional muito longe do estilo de vida moderno do lado oriental do rio A esta altura não será surpresa para o leitor saber que tamanha disparidade está ligada a profundas diferenças entre as instituições econômicas de um lado e de outro do rio A leste em Natal encontramos direitos de propriedade privada sistemas jurídicos funcionais mercados indústria e agricultura comercial A oeste até pouco tempo atrás vigorava no Transkei a propriedade comunitária da terra e a liderança por todo poderosos chefes tradicionais Examinado através das lentes da teoria do dualismo econômico de Lewis o contraste entre o Transkei e Natal ilustra os problemas do desenvolvimento africano De fato podemos ir mais longe e observar que historicamente a África inteira era como o Transkei pobre e com instituições econômicas prémodernas tecnologia retrógrada e governada por chefes locais Segundo essa perspectiva o desenvolvimento econômico deveria consistir em assegurar que o Transkei se transformasse em Natal Esse ponto de vista contém alguma dose de verdade mas deixa escapar por completo a lógica do surgimento do dualismo econômico e sua relação com a economia moderna O atraso do Transkei não é apenas um resquício do atraso natural da África Entretanto o dualismo econômico entre Transkei e Natal é bastante recente e nada tem de natural Foi produzido pelas elites brancas sulafricanas no intuito de gerar uma reserva de mão de obra barata para seus negócios e reduzir a concorrência com os negros africanos O dualismo econômico é mais um exemplo de subdesenvolvimento que foi criado não surgiu naturalmente e persistiu ao longo dos séculos África do Sul e Botsuana como veremos adiante conseguiram evitar a maior parte dos efeitos adversos do tráfico de escravos e guerras dele decorrentes A primeira interação significativa entre os sulafricanos e os europeus deuse quando a Companhia Holandesa das Índias Orientais fundou uma base na Baía da Mesa hoje o porto da Cidade do Cabo em 1652 Na época o lado ocidental da África do Sul era esparsamente povoado pelos khoikhoi caçadores e coletores Mais a leste nos atuais Ciskei e Transkei havia sociedades agrícolas africanas densamente povoadas Não houve a princípio uma interação mais intensa com a nova colônia de holandeses nem estes aderiram à escravidão O litoral sulafricano era muito afastado dos mercados de escravos e os habitantes do Ciskei e do Transkei conhecidos como xhosa viviam longe o suficiente do litoral para não chamar a atenção de ninguém Por conseguinte essas sociedades não sofreram o impacto de muitas das forças adversas que se abateram sobre as Áfricas Ocidental e Central O isolamento desses lugares mudaria no século XIX Para os europeus havia algo de muito atraente nas condições climáticas e ambientais da África do Sul onde ao contrário da África Ocidental por exemplo o clima era temperado e livre de doenças tropicais como a malária e a febre amarela que haviam convertido a maior parte da África no túmulo do homem branco e impedia os europeus de se estabelecerem ou mesmo instalarem entrepostos permanentes A África do Sul era uma candidata muito melhor para a colonização de povoamento A expansão dos europeus rumo ao interior teve início logo após os britânicos haverem tomado a Cidade do Cabo dos holandeses durante as guerras napoleônicas e precipitou uma longa série de guerras envolvendo os xhosa à medida que a fronteira colonial avançava terra adentro A penetração no continente intensificouse em 1835 quando os europeus remanescentes de descendência holandesa que ficariam conhecidos como africâneres ou bôeres começaram sua célebre migração em massa a Grande Caminhada na tentativa de escapar ao controle britânico do litoral e da região da Cidade do Cabo Posteriormente os africâneres fundariam dois Estados independentes no interior da África o Estado Livre de Orange e o Transvaal O estágio de desenvolvimento seguinte da África do Sul teve início com a descoberta de vastas reservas de diamante em Kimberly em 1867 e de ricas minas de ouro em Joanesburgo em 1886 Tamanha riqueza mineral no interior imediatamente convenceu os ingleses a estenderem seu controle sobre a África do Sul inteira A resistência do Estado Livre de Orange e do Transvaal levou às célebres Guerras dos Bôeres em 18801881 e 18991902 Após uma inesperada derrota inicial os ingleses conseguiram incorporar os Estados africâneres à Província do Cabo e Natal fundando assim em 1910 a União da África do Sul Além dos conflitos entre africâneres e ingleses o desenvolvimento da economia mineradora e a expansão do povoamento europeu tiveram outras implicações para o desenvolvimento da região sobretudo em termos da geração de demanda por alimentos e outros produtos agrícolas e da criação de novas oportunidades econômicas para os africanos nativos tanto na agricultura quanto no comércio Os xhosa no Ciskei e no Transkei reagiram sem demora a essas oportunidades econômicas conforme documentado pelo historiador Colin Bundy Já em 1832 antes mesmo do boom da atividade mineradora um missionário morávio no Transkei assinalou o novo dinamismo econômico que havia despontado na região e salientou a demanda por parte dos africanos para os novos bens de consumo cuja existência lhes fora desvelada pela disseminação dos europeus Em suas palavras A fim de obter tais objetos empenhamse em conseguir dinheiro pelo trabalho de suas mãos e compram roupas pás arados carroças e outros artigos de utilidade A descrição feita pelo comissário civil John Hemming de sua visita a Fingoland no Ciskei em 1876 é igualmente reveladora Ele descreve seu espanto com o imenso avanço realizado pelos locais em poucos anos Onde quer que eu fosse encontrava cabanas sólidas e estruturas de tijolo ou pedra Em não poucos casos resistentes casas de tijolos haviam sido postas de pé e árvores frutíferas plantadas onde quer que houvesse um curso dágua disponível fora desviado e o solo encontravase cultivado até onde fosse possível irrigálo as encostas das colinas e até os topos das montanhas encontravamse cultivados até onde fosse possível introduzir um arado A extensão do plantio surpreendeume há anos não vejo tão vasta área de terra cultivada Como em outras regiões da África subsaariana o uso do arado era uma novidade na agricultura mas sempre que tinham a oportunidade os lavradores africanos pareciam muito dispostos a adotar a nova tecnologia além de prontos a investir em carroças e obras de irrigação À medida que se desenvolvia a economia agrícola as rígidas instituições tribais começaram a se dissolver Há uma série de evidências de que houve mudanças nos direitos de propriedade Em 1879 o magistrado em Umzimkulu de Griqualand East no Transkei mencionou o desejo crescente por parte dos nativos de se tornarem donos da terra tendo adquirido 154 mil quilômetros quadrados em terrenos Três anos mais tarde ele registraria o fato de que cerca de 8 mil agricultores africanos no distrito haviam comprado e começado a trabalhar em 365 mil quilômetros quadrados de terras A África certamente não estava na iminência de uma Revolução Industrial mas havia mudanças muito concretas em andamento A propriedade privada da terra havia enfraquecido os chefes locais e possibilitado a novos homens adquirir a terra e enriquecer algo impensável poucas décadas antes o que também ilustra a rapidez com que o afrouxamento das instituições extrativistas e do controle absolutista pode engendrar um dinamismo econômico inédito Um dos casos de sucesso foi o de Stephen Sonjica do Ciskei fazendeiro de origem pobre que fez fortuna Em um discurso que proferiu em 1911 Sonjica recordou que ao expor pela primeira vez para seu pai seu desejo de adquirir terra este lhe respondera Comprar terra Como você pode querer comprar terra Então não sabe que toda a terra é de Deus e foi por Ele dada somente aos chefes Era uma reação compreensível mas Sonjica não desistiu Arranjou um emprego em King Williams Town e seguiu em frente Tive a esperteza de abrir uma contacorrente no banco na qual depositava uma parte dos meus ganhos mas só até eu conseguir economizar 80 libras Comprei uma junta de bois com a canga ajoujo arado e toda a parafernália agrícola Agora adquiri um pequeno sítio Nunca é demais reforçar o quanto a agricultura é recomendável para meus compatriotas desde que se adotem contudo métodos modernos de obtenção de lucro Um extraordinário indicador do dinamismo econômico e prosperidade dos agricultores africanos desse período é encontrado em uma carta enviada em 1869 por um missionário metodista W J Davis Escrevendo à Inglaterra ele declara satisfeito haver coletado 46 libras em dinheiro para a Caixa de Previdência do Algodão de Lancashire Nessa época os prósperos africanos estavam doando dinheiro para assistência dos pobres trabalhadores têxteis ingleses Não admira que o novo dinamismo econômico não agradasse aos chefes tradicionais que em um padrão que já nos é bem familiar viam sua riqueza e poder escapandolhe por entre os dedos Em 1879 Matthew Blyth principal magistrado do Transkei comentou que houve oposição ao levantamento topográfico necessário à divisão dos lotes a serem vendidos Anotou que alguns dos chefes objetaram ainda que a maior parte da população tenha gostado da ideia pois os chefes percebem que a concessão de títulos de propriedade individuais porá a perder sua influência entre os líderes Os chefes resistiram também às melhorias implementadas nas terras como a abertura de canais de irrigação ou a construção de cercas Reconheciam que tais aprimoramentos não passavam de prelúdios aos direitos individuais de propriedade da terra o começo do fim para eles Observadores europeus chegaram a registrar que os chefes e outras autoridades tradicionais como os feiticeiros tentaram barrar a adoção de todos os modos europeus aí incluídos o plantio de novos produtos ferramentas como arados e artigos comerciais No entanto a integração do Ciskei e do Transkei ao Estado colonial britânico solapou o poder dos chefes e lideranças tradicionais e sua resistência não seria suficiente para impedir o novo dinamismo econômico da África do Sul Em Fingoland em 1884 um comentarista europeu conta que o povo havia transferido para nós sua lealdade Seus chefes converteramse agora em uma espécie de proprietários rurais desprovidos de poder político Perdido o medo da ingerência do chefe ou da arma mortal o feiticeiro que abate o próspero criador de gado o hábil conselheiro a introdução de novos costumes o habilidoso lavrador reduzindoos a todos ao uniforme nível da mediocridade não mais apreensivos diante dessa possibilidade os homens dos clãs são agora progressistas Ainda camponeses possuem porém carroças e arados abrem sulcos para irrigação criam rebanhos de carneiros Bastaram umas poucas instituições inclusivas e a erosão do poder dos chefes aos quais foram impostas algumas restrições para deflagrar na África um vigoroso boom econômico que infelizmente teria vida curta Entre 1890 e 1913 o processo seria abruptamente interrompido e revertido Nesse período duas forças contribuíram para a destruição da prosperidade rural e dinamismo criados pelos africanos nos 50 anos anteriores A primeira foi o antagonismo dos fazendeiros europeus que competiam com os africanos e viam os preços de seus produtos serem achatados pelo êxito destes a solução que encontraram foi eliminar a concorrência A segunda força foi ainda mais sinistra os europeus desejavam uma força de trabalho barata que pudessem empregar na florescente economia mineradora A única maneira de assegurar seu barateamento seria empobrecendo os africanos objetivo a que se dedicariam metodicamente nas décadas seguintes O depoimento dado em 1897 por George Albu presidente da Associação das Minas perante uma comissão de inquérito descreve com impressionante clareza a lógica do empobrecimento dos africanos a fim de garantir a mão de obra barata Na ocasião ele explicou como realizou seu intento apenas comunicando aos garotos que teriam uma redução de salário Seu testemunho prossegue Comissão Suponhamos que os kaffirs negros africanos retornem ao seus kraals cercados para gado O senhor seria a favor de solicitar ao Governo que os obrigasse ao trabalho Albu Certamente eu o tornaria compulsório Por que seria possível a um negro ficar sem fazer nada Creio que um kaffir deve ser obrigado a trabalhar a fim de ganhar a vida Comissão Se um homem puder viver sem trabalhar como o senhor poderá forçá lo Albu Multeo então Comissão Então o senhor não permitiria que o kaffir fosse proprietário de terras no país mas determinaria que trabalhasse para os brancos a fim de enriquecêlos Albu Ele terá de fazer a sua parte no trabalho de colaborar com os vizinhos Os dois objetivos a eliminação da concorrência para os fazendeiros brancos e a criação de numerosa força de trabalho de baixa remuneração foram simultaneamente atingidos pela Lei da Terra dos Nativos de 1913 Antecipandose ao conceito de dualismo econômico de Lewis a lei dividiu a África do Sul em duas partes uma moderna e próspera a outra tradicional e pobre Todavia eram prosperidade e pobreza criadas pela própria lei que determinava que 87 da terra fossem destinados aos europeus que representavam cerca de 20 da população Os 13 restantes ficariam com os africanos A Lei da Terra tivera uma série de predecessoras claro pois os europeus foram pouco a pouco confinando os africanos em reservas cada vez menores Foi a lei de 1913 porém que institucionalizou a situação de modo definitivo preparando o terreno para a consolidação do regime sulafricano do apartheid em que a minoria branca deteria tanto os direitos políticos quanto os econômicos e a maioria negra permaneceria destituída de ambos A lei determinava que várias reservas de terras entre elas o Transkei e o Ciskei seriam os lares dos africanos mais tarde chamados de bantustões outro elemento da retórica do apartheid sulafricano segundo o qual os povos africanos da África do Sul não eram nativos da região mas descendentes dos povos bantos que haviam emigrado do leste da Nigéria cerca de mil anos antes Não tinham pois mais direito à terra e evidentemente na prática tinham bem menos do que os colonizadores europeus O Mapa 16 mostra a área irrisória destinada aos africanos pela Lei da Terra de 1913 e por sua sucessora em 1936 Registra também dados de 1970 a respeito da extensão de uma distribuição similar de terras ocorrida durante a construção no Zimbábue de outro sistema de dualismo econômico como discutimos no Capítulo 13 A legislação de 1913 previa ainda medidas no intuito de impedir que arrendatários de terra e grileiros negros cultivassem terras de proprietários brancos em qualquer outra condição que não a de locatários Como explicou o secretário para relações com os nativos O efeito da lei foi pôr um ponto final para o futuro em todas as transações que implicassem alguma forma de parceria entre europeus e nativos no tocante à terra ou aos seus frutos Todos os novos contratos com nativos devem ser de prestação de serviços Desde que haja um acordo legítimo dessa natureza não há nada que impeça um empregador de remunerar um nativo em espécie ou pelo privilégio de cultivar determinado terreno Contudo o nativo não pode pagar ao senhor por seu direito de ocupar a terra Zâmbia Ma láui Mo çambique Ha rare Zimbábue Bo tsuana Na míbi a Ga bo rone Oceano Atlântico Jo anesbu rg o Su azil ândi a Kimberle y África do Su l Griq ua land Lesoto T ransk ei Ci sk ei Fi ng olan d Ci dade do Ca bo Leis da Te rr a 1913 e 1936 Dist ribu ição da te rr a 1970 Fr onteir as mode rna s Mapa 16 Áreas destinadas aos africanos pelos regimes minoritários brancos da África do Sul e Zimbábue Aos olhos dos economistas do desenvolvimento que visitaram a África do Sul nas décadas de 1950 e 1960 quando essa disciplina acadêmica começava a tomar forma e as ideias de Arthur Lewis estavam se disseminando o contraste entre os bantustões e a próspera e moderna economia branca parecia ser a representação exata da tese do dualismo econômico A parte europeia da economia era urbana escolarizada e empregava tecnologias modernas As áreas destinadas aos nativos eram pobres rurais e retrógradas a improdutividade era alta e a escolaridade baixa Aparentemente a essência daquela África atrasada e parada no tempo A questão é que tal dualismo econômico nada tinha de natural ou inevitável Fora engendrado pelo colonialismo europeu Sim os bantustões eram pobres e atrasados em termos tecnológicos e sua população não tinha acesso à educação Todavia esse quadro era resultado de políticas públicas que haviam anulado toda e qualquer possibilidade de crescimento econômico dos nativos e criado uma reserva de mão de obra africana desqualificada e barata a ser empregada nas terras e minas controladas pelos europeus A partir de 1913 os nativos foram expulsos às multidões de suas terras que passaram para as mãos dos brancos e amontoados nos bantustões demasiado pequenos para possibilitar uma subsistência independente Exatamente como se pretendia portanto não lhes restaria outra opção senão buscar meios de ganhar a vida na economia branca fornecendolhes mão de obra barata Com o colapso dos incentivos econômicos de que dispunham até então os progressos ocorridos nos 50 anos anteriores foram revertidos Os arados foram pouco a pouco abandonados e os nativos acabaram voltando às enxadas isto é se houvesse trabalho Em geral limitavamse a estar disponíveis na condição de mão de obra barata tal como os bantustões estavam encarregados de assegurar Não só os incentivos econômicos foram destruídos as transformações políticas que haviam começado a ocorrer também foram revertidas O poder dos chefes locais e líderes tradicionais até então em franco declínio viuse fortalecido já que o projeto de criação de uma força de trabalho barata previa a eliminação da propriedade privada da terra reafirmando o controle dos chefes sobre ela Essas iniciativas chegaram ao apogeu em 1951 quando o governo aprovou a Lei das Autoridades Bantas Já em 1940 G Findlay identificou com precisão o problema A posse tribal é uma garantia de que a terra nunca será trabalhada de maneira adequada e jamais pertencerá de fato aos nativos Mão de obra barata requer sementeira barata que é assim fornecida aos africanos às suas próprias custas A desapropriação dos produtores rurais africanos acarretou seu empobrecimento em massa não só lançando as bases institucionais do retrocesso econômico mas também fornecendo os pobres necessários para abastecêlo As evidências disponíveis demonstram a reversão dos níveis de vida nos bantustões após a Lei da Terra dos Nativos de 1913 O Transkei e o Ciskei mergulharam em prolongado declínio econômico Os dados de emprego nas companhias mineradoras de ouro compilados pelo historiador Francis Wilson mostram que o declínio foi generalizado pela economia sulafricana como um todo Após a Lei da Terra dos Nativos entre outras a remuneração dos mineiros despencou 30 entre 1911 e 1921 Em 1961 apesar do crescimento relativamente contínuo da economia sul africana seus salários continuavam 12 mais baixos do que em 1911 Não admira que ao longo desse período a África do Sul tenha se tornado o país mais desigual do mundo Mesmo nessas circunstâncias porém será que os negros não poderiam ter encontrado meios de ingressar na moderna economia europeia iniciando algum negócio ou estudando para se profissionalizar O governo providenciou para que nada disso fosse possível Os africanos foram proibidos de adquirir imóveis ou abrir empresas na parte europeia da economia os 87 do território do país O regime do apartheid percebeu também que negros escolarizados concorreriam com os brancos em vez de fornecer mão de obra barata para as minas e propriedades agrícolas destes Já em 1904 foi introduzido na mineração um sistema de reserva de vagas para europeus Os negros não tinham autorização para trabalhar como amalgamadores caldeireiros ensaiadores ferreiros modeladores de metais pedreiros polidores de metais serradores de madeira e a lista prosseguia interminável até sinaleirosl De um só golpe foi vetada aos africanos a ocupação nesse setor de qualquer cargo que exigisse qualificação Foi a primeira encarnação das famosas leis antimiscigenação uma das tantas invenções racistas do regime sulafricano O segregacionismo seria generalizado em 1926 para a economia inteira e perduraria até os anos 1980 Não admira que os negros não fossem escolarizados o Estado sulafricano não só anulou toda e qualquer possibilidade de eles se beneficiarem economicamente do acesso à educação como se recusou a investir em escolas para essa parcela da população e desestimulou sua educação Tal política chegaria ao apogeu nos anos 1950 quando encabeçado por Hendrik Verwoerd um dos arquitetos do regime do apartheid que prosseguiria até 1994 o governo aprovou a Lei da Educação Banta A filosofia subjacente a essa legislação foi cruamente exposta pelo próprio Verwoerd em um discurso de 1954 Os bantos devem ser orientados a servir sua própria comunidade sob todos os aspectos Não há para eles lugar na comunidade europeia acima do nível de determinadas modalidades de trabalho Por esse motivo não haverá serventia em serem qualificados visando à sua absorção na comunidade europeia uma vez que não podem nem serão absorvidos lá Naturalmente o tipo de dualismo econômico articulado no discurso de Verwoerd é muito distinto daquele previsto na teoria de Lewis Na África do Sul o dualismo econômico não foi um resultado inevitável do processo de desenvolvimento pelo contrário foi fruto da ação deliberada do Estado Na África do Sul o desenvolvimento econômico não seria acompanhado por uma transferência espontânea dos pobres do setor retrógrado da economia para o moderno Afinal o êxito do setor moderno dependia da existência do retrógrado que permitia aos empregadores brancos auferir lucros gigantescos mediante o pagamento de salários ínfimos aos trabalhadores negros sem formação Na África do Sul não ocorreria um processo gradual de educação e qualificação dos trabalhadores do setor tradicional como previa a abordagem de Lewis Com efeito os negros eram propositadamente privados de qualificação e barrados dos cargos especializados a fim de poupar os profissionais brancos da concorrência e assegurar seus altos salários Na África do Sul os africanos negros estavam efetivamente amarrados à economia tradicional nos bantustões Não se tratava porém do problema do desenvolvimento que o crescimento trataria de corrigir eram os bantustões que viabilizavam o desenvolvimento da economia branca Tampouco será surpresa o fato de que o tipo de desenvolvimento econômico apresentado pela África do Sul branca era em última instância limitado baseado em instituições extrativistas construídas pelos brancos para explorar os negros Os brancos sulafricanos possuíam direitos de propriedade investiam em educação e podiam extrair ouro e diamantes e vendêlos com lucro no mercado mundial enquanto isso porém 80 da população sulafricana encontravamse marginalizados e excluídos da grande maioria das atividades econômicas desejáveis Aos negros eram vedadas oportunidades de usar seus talentos não podiam tornarse trabalhadores especializados homens de negócios empreendedores engenheiros ou cientistas As instituições econômicas eram extrativistas os brancos enriqueciam extorquindo os negros Com efeito enquanto os sulafricanos brancos compartilhavam o padrão de vida dos países da Europa Ocidental os negros mal ultrapassavam o resto da África subsaariana Esse crescimento econômico sem destruição criativa de que apenas os brancos se beneficiavam se estenderia pelo tempo em que a receita gerada pelo ouro e pelos diamantes aumentasse Na década de 1970 no entanto a economia parou de crescer De novo não será surpresa constatar que esse conjunto de instituições econômicas extrativistas teve como fundação uma série de instituições políticas também altamente extrativistas Até sua derrocada em 1994 o sistema político sulafricano destinava todo o poder aos brancos os únicos autorizados a votar e candidatarse a cargos públicos Os brancos controlavam a força policial as Forças Armadas e todas as instituições políticas estruturadas sob o domínio militar dos colonizadores brancos Na época da fundação da União da África do Sul em 1910 as divisões administrativas africâneres do Estado Livre de Orange e do Transvaal adotaram privilégios raciais explícitos excluindo inteiramente os negros da participação no processo político Natal e a Colônia do Cabo permitiam que os negros votassem caso possuíssem patrimônio suficiente o que em geral não era o caso O status quo de Natal e da Colônia do Cabo foi mantido em 1910 mas na década de 1930 os negros já haviam sido ostensivamente privados de qualquer direito na África do Sul O dualismo econômico da África do Sul chegou ao fim em 1994 mas não em virtude das razões sobre as quais teorizou Sir Arthur Lewis Não foi o curso natural do desenvolvimento econômico que pôs um ponto final nas leis antimiscigenação e nos bantustões Os negros sulafricanos protestavam e sublevavamse contra o regime que não lhes reconhecia os direitos básicos nem partilhava com eles os ganhos do crescimento econômico Após o levante de Soweto em 1976 os protestos foram crescendo em organização e força até culminarem na derrubada do Estado do apartheid Foi o progressivo empoderamento dos negros que se tornaram capazes de se organizar e insurgir que acabou pondo fim ao dualismo econômico da África do Sul do mesmo modo como a força política dos brancos sulafricanos o havia criado originalmente REVERSÃO DO DESENVOLVIMENTO A desigualdade existente hoje no mundo se deve ao fato de que durante os séculos XIX e XX certos países lograram tirar proveito da Revolução Industrial e das tecnologias e métodos de organização por ela acarretados ao passo que outros não A mudança tecnológica é apenas uma das forças motrizes da prosperidade mas talvez seja também a mais crítica Os países que não aproveitaram as novas tecnologias tampouco se beneficiaram de outros motores da prosperidade Como mostramos neste capítulo e no anterior tal lacuna deveuse às suas instituições extrativistas consequência ora da persistência de seus regimes absolutistas ora da falta de Estados centralizados Contudo este capítulo mostrou também que em diversos casos as instituições extrativistas subjacentes à pobreza desses países eram impostas ou pelo menos reforçadas pelo mesmíssimo processo que impulsionou o crescimento da Europa a expansão comercial e colonial europeia Com efeito a lucratividade desses impérios coloniais não raro dependia da destruição de unidades políticas independentes e economias indígenas pelo mundo ou da criação de instituições extrativistas basicamente do zero como nas ilhas do Caribe onde após o colapso quase total das populações nativas os colonizadores importaram escravos africanos e instauraram sistemas de plantation Jamais saberemos como teriam sido as trajetórias de cidadesestados independentes como as das Ilhas Banda em Aceh ou na Birmânia Mianmar sem a intervenção europeia Talvez passassem por suas próprias revoluções gloriosas locais ou avançassem paulatinamente em direção a instituições políticas e econômicas mais inclusivas baseadas no florescente comércio de especiarias e outras mercadorias valiosas De todo modo essa possibilidade foi extinta pela expansão da Companhia Holandesa das Índias Orientais que eliminou por completo qualquer esperança de desenvolvimento indígena nas Ilhas Banda ao promover o genocídio de seus habitantes ameaça que também levou as cidadesestados de muitos outros pontos do Sudeste Asiático a renunciar ao comércio A história de uma das mais antigas civilizações asiáticas a Índia é similar embora a reversão do desenvolvimento aí tenha se dado pelas mãos não dos holandeses mas dos britânicos A Índia era a maior produtora e exportadora de têxteis do mundo no século XVIII Seus madras e musselinas inundavam os mercados europeus e eram comercializados por toda a Ásia e mesmo a África Oriental O principal agente a transportálas até as Ilhas Britânicas era a Companhia Britânica das Índias Orientais Fundada em 1600 dois anos antes de sua contraparte holandesa a Companhia britânica passou todo o século XVII tentando estabelecer seu monopólio sobre as valiosas exportações indianas enfrentando a concorrência dos portugueses que tinham bases em Goa Chittagong e Bombaim e dos franceses com bases em Pondicherry Chandernagore Yanam e Karaikal Ainda mais prejudicial para a Companhia foi a Revolução Gloriosa como vimos no Capítulo 7 Seu monopólio concedido pelos monarcas Stuart viuse imediatamente desafiado após 1688 chegando a ser abolido por mais de uma década Foi uma perda de poder significativa como já vimos páginas 155156 porque os produtores têxteis britânicos conseguiram persuadir o Parlamento a banir a importação de madras o mais rentável item comercial da Companhia No século XVIII encabeçada por Robert Clive a Companhia das Índias Orientais mudou de estratégia e pôsse a erguer um império continental Na época a Índia estava fragmentada em um semnúmero de unidades políticas concorrentes ainda que muitas continuassem oficialmente sob o controle do imperador mogol de Délhi A Companhia começou por Bengala no leste eliminando os potentados locais nas batalhas de Plassey em 1757 e Buxar em 1764 apropriouse das riquezas regionais e assumiu e talvez tenha até intensificado as instituições tributárias extrativistas dos governantes mogóis da Índia Sua expansão coincidiu com a contração maciça da indústria têxtil indiana uma vez que afinal de contas já não havia mais mercado para esses artigos na GrãBretanha A retração foi acompanhada de um processo de desurbanização e recrudescimento da pobreza marcando o início de um longo período de reversão do desenvolvimento na Índia Não tardou para que em vez de produzir tecidos os indianos começassem a comprálos dos ingleses e a cultivar ópio para ser vendido na China pela Companhia das Índias Orientais O tráfico de escravos no Atlântico reproduziu o mesmo padrão na África ainda que partindo de condições muito menos desenvolvidas do que o Sudeste Asiático e a Índia Vários Estados africanos transformaramse em máquinas de guerra no intuito de capturar e vender escravos para os europeus À medida que o conflito entre as diferentes unidades políticas e Estados degenerou em beligerância contínua as instituições estatais que em muitos casos não haviam ainda atingido de todo modo um grau significativo de organização política esboroaram em vastas regiões da África preparando o terreno para as persistentes instituições extrativistas e os Estados falidos de hoje em dia que estudaremos mais à frente Nas poucas áreas do continente que escaparam ao tráfico de escravos como a África do Sul os europeus impuseram um conjunto distinto de instituições agora com o objetivo de criar uma reserva de mão de obra barata para suas minas e fazendas O Estado sulafricano engendrou um dualismo econômico que vedou a 80 da população o acesso à profissionalização à agricultura comercial e ao empreendedorismo Tudo isso não só explica por que a industrialização passou ao largo de vastas regiões do mundo mas também é uma boa síntese do modo como o desenvolvimento econômico pode às vezes alimentarse do subdesenvolvimento ou mesmo gerálo em alguma outra parte da economia doméstica ou global A 10 A DIFUSÃO DA PROSPERIDADE HONRA ENTRE LADRÕES INGLATERRA DO SÉCULO XVIII ou mais apropriadamente a GrãBretanha após a união em 1707 de Inglaterra País de Gales e Escócia tinha uma solução simples para lidar com criminosos longe dos olhos longe do coração ou pelo menos longe de encrencas Muitos eram os degredados para as colônias penais do império Até a Independência dos Estados Unidos os réus condenados eram deportados basicamente para as colônias americanas Depois de 1783 os Estados Unidos já não se mostravam dispostos a receber criminosos e as autoridades britânicas precisaram encontrar outro destino para acolhêlos Lembraramse primeiro da África Ocidental mas o clima caracterizado por doenças endêmicas como a malária e a febre amarela contra as quais os europeus não tinham qualquer imunidade era tão letal que as autoridades chegaram à conclusão de que seria inaceitável mandar mesmo condenados para o túmulo dos brancos A segunda opção seria a Austrália Sua orla marítima oriental fora explorada pelo Capitão James Cook grande homem do mar Em 29 de abril de 1770 Cook aportou em uma magnífica enseada que batizou de Botany Bay em homenagem à riqueza da flora ali encontrada pelos naturalistas que acompanhavam sua expedição Pareceu para os funcionários do governo britânico a localização ideal o clima era temperado e o lugar tão longe dos olhos e do coração quanto se poderia imaginar Uma frota de 11 navios lotados de condenados já estava a caminho de Botany Bay em janeiro de 1788 sob o comando do Capitão Arthur Phillip Em 26 de janeiro hoje celebrado como Dia da Austrália montaram acampamento em Sydney Cove no coração da atual cidade de Sydney Batizaram a colônia de Nova Gales do Sul A bordo de um dos navios o Alexander capitaneado por Duncan Sinclair havia um casal de condenados Henry e Susannah Cable Susannah fora sentenciada por roubo e a princípio recebera pena de morte A sentença fora depois comutada para 14 anos e degredo nas colônias americanas plano que cairia por terra com a independência dos Estados Unidos Nesse ínterim na Prisão do Castelo de Norwich Susannah conheceu Henry e se apaixonou pelo colega de presídio Em 1787 foi incluída na primeira leva de presos levados para a nova colônia penal na Austrália mas Henry não Àquela altura Susannah e Henry tinham um filhinho pequeno também chamado de Henry A decisão faria a família se separar Susannah foi levada para um navio penitenciário ancorado no Tâmisa mas a notícia daquele caso dilacerante se espalhou e chegou aos ouvidos de uma filantropa Lady Cadogan Esta organizou uma bemsucedida campanha para reunir os Cables Agora seriam ambos levados para a Austrália junto com o pequeno Henry Lady Cadogan também levantou 20 a fim de comprarlhe bens que receberiam na Austrália Embarcaram no Alexander mas chegando a Botany Bay o pacote com suas coisas havia desaparecido ou pelo menos foi o que o Capitão Sinclair alegou O que os Cables podiam fazer Não muito segundo as leis inglesas ou britânicas Embora em 1787 a GrãBretanha dispusesse de instituições políticas e econômicas inclusivas a inclusão por elas proporcionada não se estendia a condenados que eram praticamente destituídos de direitos Não podiam ter bens Definitivamente não podiam mover um processo judicial contra ninguém De fato não podiam nem mesmo apresentar provas perante um juiz Sabendo disso Sinclair provavelmente roubou o pacote Embora jamais o admitisse chegou a se gabar de que os Cables não poderiam processálo e tinha razão segundo a lei britânica Na GrãBretanha a questão toda teria terminado por ali Na Austrália não Um mandado de segurança foi impetrado ao Juiz David Collins nos seguintes termos Henry Cable e sua esposa novos colonos deste lugar possuíam antes de deixar a Inglaterra certo pacote embarcado no Alexander a cargo do Capitão Duncan Sinclair composto de roupas e diversos outros artigos apropriados à sua situação atual que foram coletados e adquiridos às custas de várias pessoas de índole caridosa para usufruto do dito Henry Cable sua esposa e filho Uma série de solicitações foi feita no sentido expresso de obter o referido pacote do Capitão do Alexander ora ancorado neste porto e sem outro efeito senão resgatar uma pequena parte do pacote mencionado contendo alguns livros o restante sendo de valor mais considerável permanecendo a bordo do dito navio Alexander cujo capitão ao que parece tem se mostrado negligente em providenciar que o mesmo seja devidamente apresentado aos seus respectivos donos conforme já citado Henry e Susannah sendo analfabetos não tinham condições de assinar o mandado limitandose a marcar um x cada um ao pé da página As palavras novos colonos deste lugar foram posteriormente riscadas mas eram altamente significativas Alguém deve ter imaginado que se Henry Cable e sua esposa fossem descritos como condenados não haveria esperança de que o caso avançasse tiveram então a ideia de chamálos de novos colonos o que deve ter sido um pouco demais para o Juiz Collins engolir e muito provavelmente foi ele mesmo quem mandou cortar essas palavras Não obstante o recurso funcionou Collins aceitou o caso e o levou a julgamento com um júri exclusivamente composto de soldados Sinclair foi convocado Por menos entusiasmado que Collins se mostrasse com o caso e embora os jurados fossem pessoas enviadas para a Austrália para vigiar condenados como os Cables estes conseguiram ganho de causa Sinclair contestou as acusações com base na condição de sentenciados do casal mas o veredicto se manteve e ele teve de pagar 15 libras Para chegar a esse veredicto o Juiz Collins não aplicou a lei britânica pelo contrário ignoroua Foi o primeiro caso civil da Austrália O primeiro caso criminal teria parecido igualmente bizarro àqueles na GrãBretanha Um condenado foi considerado culpado de roubar o pão de outro no valor de dois pence Na época tal caso jamais seria levado a julgamento uma vez que condenados não tinham permissão para possuir nada Contudo a Austrália não era a GrãBretanha e suas leis não se limitariam a reproduzir as inglesas Assim a Austrália não tardaria a diferenciarse da GrãBretanha tanto no tocante aos seus códigos criminal e civil quanto em uma variedade de instituições políticas e econômicas A colônia penal de Nova Gales do Sul era a princípio composta pelos condenados e seus guardas soldados em sua maioria Havia poucos colonos livres na Austrália até a década de 1820 e o degredo de condenados ainda que em Nova Gales do Sul tenha sido descontinuado em 1840 na Austrália Ocidental prosseguiria até 1868 Os condenados tinham de executar trabalhos compulsórios outra denominação para trabalhos forçados com os quais os guardas pretendiam lucrar A princípio os condenados não eram remunerados Recebiam apenas comida em troca das tarefas executadas Os guardas retinham sua produção Porém esse sistema como as tentativas feitas pela Virginia Company em Jamestown não funcionou muito bem à medida que os condenados não dispunham de incentivos para empenharse ou trabalhar direito eram açoitados ou banidos para a Ilha de Norfolk míseros 33 quilômetros quadrados de território situados a mais de 1500 quilômetros a leste da Austrália no meio do Oceano Pacífico Contudo visto que nem o degredo nem o açoitamento deram certo a alternativa foi oferecerlhes incentivos Não era uma ideia natural para soldados e guardas Condenados eram condenados e não se supunha que vendessem seu trabalho ou possuíssem bens Na Austrália porém não havia mais ninguém para tanto Havia claro os aborígenes chegando possivelmente a um milhão na época da fundação de Nova Gales do Sul Contudo espalhavamse por um vasto continente e sua densidade em Nova Gales do Sul era insuficiente para a criação de uma economia baseada em sua exploração Não havia na Austrália nenhuma opção latinoamericana Os guardas enveredaram assim por um caminho que acabaria levando a instituições ainda mais inclusivas do que aquelas existentes na GrãBretanha Os condenados recebiam um conjunto de tarefas de que se desincumbir e caso lhes sobrasse tempo poderiam trabalhar por conta própria e vender sua produção Os guardas também se beneficiaram das novas liberdades econômicas dos condenados Com o aumento da produção estabeleceram monopólios para venderlhes bens manufaturados Destes o mais rentável era o rum Nova Gales do Sul na época como qualquer outra colônia britânica era dirigida por um governador indicado pelo governo britânico Em 1806 a GrãBretanha designou William Bligh homem que 17 anos antes em 1789 fora capitão do HMS Bounty durante o célebre motim a bordo do Bounty Bligh era um disciplinador estrito característica que deve ter sido a principal causa do motim Seus modos continuavam os mesmos e ele imediatamente desafiou os monopolistas do rum o que deflagraria outro motim agora conduzido pelos monopolistas e encabeçado por um exsoldado John Macarthur Essa sequência de eventos que ficaria conhecida como Rebelião do Rum mais uma vez faria Bligh verse superado pelos rebeldes dessa vez em terra e não a bordo do Bounty Macarthur mandou prender Bligh As autoridades britânicas mais tarde enviariam mais soldados para lidar com a rebelião Macarthur foi preso e embarcado de volta para a GrãBretanha Logo porém acabou solto e voltou para a Austrália a fim de desempenhar um papel central tanto na política quanto na economia da colônia As origens da Rebelião do Rum eram essencialmente econômicas A estratégia de fornecer inventivos aos condenados garantiu uma receita polpuda para homens como Macarthur que chegou à Austrália como soldado da segunda esquadra aportada em 1790 Em 1796 pediu baixa do Exército a fim de ocuparse exclusivamente dos negócios Àquela altura já possuía sua primeira ovelha e percebeu que havia muito dinheiro a ganhar com os rebanhos de ovelhas e a exportação de lã A transposição das Montanhas Azuis perto de Sydney finalmente ultrapassadas em 1813 revelou do outro lado vastas pradarias o paraíso das ovelhas Macarthur logo seria o mais rico homem da Austrália e ele e seus colegas magnatas dos ovinos ficaram conhecidos como Posseiros Squatters uma vez que a terra em que apascentavam seus animais pertencia não a eles mas ao governo britânico A princípio porém isso não passava de um detalhe insignificante Os posseiros eram a elite da Austrália ou numa expressão mais adequada a Posseirocracia Squattocracy Mesmo sendo uma posseirocracia Nova Gales do Sul em nada se parecia com os regimes absolutistas do Leste Europeu ou das colônias sulamericanas Não havia servos como no Império AustroHúngaro e Rússia nem vastas populações indígenas a explorar como no México e Peru Nova Gales do Sul pelo contrário sob muitos aspectos assemelhavase a Jamestown Virginia a elite acabou percebendo serlhe interessante criar instituições econômicas significativamente mais inclusivas que as austrohúngaras russas mexicanas e peruanas Os condenados eram a única força de trabalho e a única maneira de incentiválos era pagarlhes salários pelo trabalho realizado Logo os condenados foram autorizados a tornaremse empreendedores e contratar outros sentenciados Principalmente uma vez cumprida sua pena tinham todos os direitos restaurados e até ganhavam terra Alguns começaram a enriquecer mesmo o analfabeto Henry Cable Em 1798 era dono de um hotel chamado Ramping Horse e possuía também uma loja Comprou um barco e entrou no comércio de peles de focas Em 1809 era proprietários de pelo menos nove fazendas de cerca de 2 mil quilômetros quadrados além de diversas lojas e casas em Sydney O conflito seguinte em Nova Gales do Sul se daria entre a elite e o resto da sociedade composta de condenados excondenados e suas famílias A elite encabeçada por exguardas e soldados como Macarthur incluía alguns dos colonos livres atraídos para a colônia pelo boom da economia da lã A maior parte das propriedades continuava nas mãos desse grupo e os excondenados e seus descendentes queriam o fim do degredo a oportunidade de julgamento por um júri de iguais e livre acesso à terra A elite não queria nada disso Sua maior preocupação era estabelecer títulos legais para as terras de que eram posseiros A situação era de novo similar aos eventos que haviam transpirado na América do Norte mais de dois séculos antes Como vimos no Capítulo 1 as vitórias dos servos submetidos a trabalhos forçados contra a Virginia Company foram seguidas por embates em Maryland e nas Carolinas Em Nova Gales do Sul os papéis de Lorde Baltimore e Sir Anthony Ashley Cooper foram desempenhados por Macarthur e os posseiros O governo britânico mais uma vez colocouse do lado da elite mesmo temendo também que um dia Macarthur e os posseiros se sentissem tentados a declarar independência O governo britânico enviou John Bigge para a colônia em 1819 a fim de conduzir uma comissão de inquérito a respeito da situação local Bigge ficou chocado com os direitos de que os condenados gozavam e surpreso com a natureza fundamentalmente inclusiva das instituições econômicas daquela colônia penal Recomendou uma revisão radical os condenados não poderiam mais possuir terra ficaria vedado o pagamento de salários aos condenados as anistias seriam restritas excondenados não ganhariam terras e as punições se tornariam ainda mais draconianas Bigge considerava os posseiros a aristocracia natural da Austrália e vislumbrava uma sociedade autocrática dominada por eles Não seria bem assim Enquanto Bigge tentava retroceder no tempo os excondenados seus filhos e filhas demandavam maiores direitos Mais ainda como nos Estados Unidos perceberam que para consolidar plenamente seus direitos econômicos e políticos precisariam de instituições políticas que os incluíssem no processo de tomada de decisões Exigiam eleições de que pudessem participar como iguais e assembleias e instituições representativas cujos cargos pudessem ocupar Os excondenados e seus filhos e filhas eram comandados pelo pitoresco escritor explorador e jornalista William Wentworth Wentworth fora um dos líderes da primeira expedição a cruzar as Montanhas Azuis que abrira as vastas planícies para os posseiros há nessas montanhas até hoje uma cidade batizada em sua homenagem Suas simpatias estavam com os condenados talvez por causa de seu pai que fora acusado de assalto e teve de aceitar o degredo na Austrália a fim de escapar ao julgamento e à possível condenação Àquela altura Wentworth era ferrenho defensor de instituições políticas mais inclusivas assembleia eleita julgamento com júri para excondenados e suas famílias e o fim do degredo para Nova Gales do Sul Fundou um jornal o Australian que dali por diante encabeçaria os ataques às instituições políticas existentes Macarthur não gostava de Wentworth como certamente não via com bons olhos suas reivindicações Elaborou uma lista dos correligionários do rival descrevendoos nos seguintes termos sentenciado à forca ele aqui aportou repetidas vezes açoitado no pelourinhom um judeu de Londres publicano judeu recémprivado de sua licença leiloeiro degredado por tráfico de escravos com frequência açoitado por aqui filho de dois condenados um trapaceiro afundado em dívidas um aventureiro americano um advogado sem caráter forasteiro recémfalido aqui em uma loja de música casado com a filha de dois condenados casado com uma condenada que tocava tamborimn Nem a vigorosa oposição de Macarthur e dos posseiros seria capaz de deter o bonde da história na Austrália porém A demanda por instituições representativas era forte e não podia ser suprimida Até 1823 o governador havia administrado Nova Gales do Sul mais ou menos por conta própria Naquele ano viu seus poderes serem limitados pela criação de um conselho designado pelo governo britânico A princípio os nomeados vinham das fileiras dos posseiros e da elite que excluía os condenados dentre os quais Macarthur mas isso não duraria muito Em 1831 o Governador Richard Bourke cedeu às pressões e pela primeira vez permitiu que excondenados tomassem parte de corpos de júri Os excondenados e na verdade muitos dos novos colonos livres queriam também o fim do degredo de condenados da GrãBretanha pois gerava concorrência no mercado de trabalho e pressionava os salários para baixo Os posseiros gostavam dos salários baixos mas perderam Em 1840 o degredo para Nova Gales do Sul foi banido e em 1842 instaurouse um conselho legislativo com dois terços dos membros eleitos o restante foi nomeado Os excondenados poderiam concorrer a cargos públicos e votar caso possuíssem patrimônio suficiente como era o caso de muitos Na década de 1850 a Austrália adotou o voto universal dos brancos adultos As reivindicações dos cidadãos excondenados e suas famílias encontravamse agora muito à frente do que William Wentworth havia imaginado a princípio Com efeito a essa altura ele já estava alinhado com os conservadores insistindo em um Conselho Legislativo que não fosse eleito Do mesmo modo como Macarthur contudo Wentworth não teria como deter o curso dos acontecimentos em direção a instituições políticas mais inclusivas Em 1856 os estados de Victoria que se separara de Nova Gales do Sul em 1851 e da Tasmânia seriam os primeiros lugares do mundo a adotar o voto efetivamente secreto nas eleições o que impediria a compra de votos e a coação Até hoje o métodopadrão para assegurar o voto secreto nas eleições é chamado em inglês voto australiano australian ballot As circunstancias iniciais em Sydney Nova Gales do Sul eram muito similares àquelas encontradas em Jamestown Virginia 181 anos antes ainda que os colonos de Jamestown fossem em sua maioria empregados em trabalhos forçados não criminosos condenados Nos dois casos as circunstâncias iniciais não permitiram a implementação de instituições coloniais extrativistas A colônia não dispunha de populações indígenas com densidade demográfica suficiente para possibilitar a exploração acesso imediato a metais preciosos como ouro ou prata ou solo e produtos agrícolas que tornassem viáveis economicamente latifúndios baseados em mão de obra escrava O tráfico de escravos ainda era vibrante na década de 1780 e Nova Gales do Sul poderia ter se enchido deles caso fosse rentável Não era Tanto a Virginia Company quanto os soldados e colonos livres que governavam a Nova Gales do Sul cederam às pressões criando gradualmente instituições econômicas inclusivas que se desenvolveriam junto com instituições políticas inclusivas o que se deu em Nova Gales do Sul com ainda menos conflitos do que na Virginia assim as tentativas subsequentes de reverter essa tendência fracassaram A AUSTRÁLIA COMO OS ESTADOS UNIDOS chegou às instituições inclusivas por um caminho distinto daquele tomado pela Inglaterra As mesmas revoluções que sacudiram a Inglaterra durante a Guerra Civil e depois a Revolução Gloriosa foram desnecessárias nos Estados Unidos ou Austrália graças às circunstâncias muito diferentes de nascimento desses países embora isso não signifique claro que as instituições inclusivas tenham se estabelecido sem nenhum conflito no processo os Estados Unidos por exemplo tiveram de se livrar do colonialismo britânico Na Inglaterra havia uma longa história de regime absolutista profundamente arraigado que precisou de uma revolução para ser extirpado Nos Estados Unidos e Austrália não havia nada disso Por mais que Lorde Baltimore em Maryland e John Macarthur em Nova Gales do Sul pudessem aspirar a esse papel não tinham condições de impor um controle tão estrito sobre a sociedade a ponto de seus planos frutificarem As instituições inclusivas estabelecidas nos Estados Unidos e Austrália permitiram à Revolução Industrial disseminarse sem demora por essas terras que começaram a enriquecer Os rumos tomados por esses países foram seguidos também por colônias como Canadá e Nova Zelândia Havia ainda outras opções para chegar a instituições inclusivas Vastas regiões da Europa Ocidental enveredaram ainda por um terceiro caminho impulsionadas pela Revolução Francesa que derrubou o absolutismo na França para em seguida gerar uma série de conflitos entre Estados que difundiriam as reformas institucionais por boa parte da Europa Ocidental A consequência econômica dessas reformas foi a emergência de instituições econômicas inclusivas na maior parte da Europa Ocidental a Revolução Industrial e o crescimento econômico ROMPENDO BARREIRAS A REVOLUÇÃO FRANCESA Por três séculos até 1789 a França foi regida por uma monarquia absolutista A sociedade francesa era dividida em três segmentos os chamados estados Os aristocratas a nobreza compunham o Primeiro Estado o clero o Segundo Estado e todos os demais o Terceiro Estado Cada um estava sujeito a diferentes leis e os dois primeiros estados possuíam direitos vedados ao resto da população A nobreza e o clero não pagavam impostos enquanto sobre os demais cidadãos incidiam os mais variados tributos como seria de esperar de um regime amplamente extrativista Com efeito não só a Igreja era isenta de tributação como também possuía vastas extensões de terra e podia impor seus próprios ônus aos camponeses Monarca nobreza e clero desfrutavam de um estilo de vida luxuoso ao passo que boa parte do Terceiro Estado vivia na mais abjeta pobreza Várias leis não só asseguravam uma posição econômica extremamente vantajosa à nobreza e ao clero mas também lhes conferiam poder político A vida nas cidades francesas do século XVIII era árida e insalubre A manufatura era regulamentada por guildas poderosas que geravam uma boa receita para seus membros mas impedia que forasteiros ingressassem nesses ofícios ou abrissem novos negócios O chamado Ancien Régime orgulhavase de sua continuidade e estabilidade A chegada de novos empreendedores e gente talentosa criaria instabilidade e não seria tolerada Se a vida nas cidades era dura nas aldeias provavelmente era pior Como vimos àquela altura a forma mais extrema de servidão que prendia as pessoas à terra e as obrigava a trabalhar para os senhores feudais e pagarlhes tributos já se encontrava havia muito em declínio na França Não obstante havia restrições à mobilidade e uma pletora de tarifas feudais que os camponeses franceses tinham de pagar ao monarca à nobreza e à Igreja Nesse contexto a Revolução Francesa foi um evento extremo Em 4 de agosto de 1789 a Assembleia Nacional Constituinte promoveu total reformulação das leis francesas promulgando uma nova Constituição O primeiro artigo determinava A Assembleia Nacional vem por meio desta abolir por completo o sistema feudal Decreta que dentre os direitos e deveres existentes feudais e censuais todos os quais oriundos ou representantes de laços reais ou pessoais de servidão serão abolidos sem direito a indenização Seu artigo nono prosseguia Privilégios pecuniários pessoais ou reais no pagamento de impostos estão extintos em definitivo Os impostos incidirão sobre todo cidadão e toda propriedade da mesma maneira e sob a mesma forma Serão considerados planos para que a carga tributária seja proporcional e universal mesmo para os seis últimos meses do corrente ano Desse modo de um só golpe a Revolução Francesa desmontou o sistema feudal e todas as obrigações e ônus por ele acarretados além de eliminar por completo as isenções fiscais da nobreza e do clero No entanto o que talvez tenha sido mais radical e mesmo impensável para a época foi o artigo décimo primeiro que estabelecia Todos os cidadãos sem distinção de nascimento são elegíveis para qualquer cargo seja de cunho eclesiástico civil ou militar e nenhum ofício será considerado inferior a outro Assim havia agora igualdade para todos perante a lei não só na vida e nos negócios cotidianos mas também na política As reformas revolucionárias prosseguiram após 4 de agosto Posteriormente foram abolidas a autoridade da Igreja para coletar tributos especiais e o clero foi convertido em funcionários do Estado Junto com a remoção das rígidas normas políticas e sociais vieram abaixo barreiras críticas às atividades econômicas As guildas e todas as restrições ocupacionais foram derrubadas criando condições mais igualitárias nas cidades Essas reformas foram o primeiro passo para pôr um ponto final no domínio dos monarcas franceses absolutistas Várias décadas de instabilidade e beligerância seguiramse às deliberações de 4 de agosto todavia fora dado um passo irreversível para rechaçar o absolutismo e as instituições extrativistas e substituílas por instituições políticas e econômicas inclusivas A essas mudanças se seguiriam outras reformas na economia e na política culminando por fim na Terceira República em 1870 que traria para a França o tipo de sistema parlamentar que a Revolução Gloriosa havia começado a instalar na Inglaterra A Revolução Francesa acarretou muita violência sofrimento instabilidade e guerra não obstante foi graças a ela que os franceses não se viram atados a instituições extrativistas que lhes bloqueassem o crescimento econômico e a prosperidade como aconteceu com os regimes absolutistas do Leste Europeu caso do Império AustroHúngaro e da Rússia por exemplo Como a monarquia absolutista francesa chegou à iminência da revolução de 1789 Afinal vimos que muitos regimes absolutistas conseguiram sobreviver por longos períodos mesmo em meio à estagnação econômica e a convulsões sociais Como costuma ocorrer na maioria dos casos de revoluções e transformações radicais foi uma confluência de fatores que abriu caminho para a Revolução Francesa intimamente ligados ao fato de que a GrãBretanha estava se industrializando rapidamente Evidentemente o caminho foi como de hábito contingente visto que as várias tentativas da Coroa de estabilizar o regime fracassaram e a revolução mostrouse mais bemsucedida na modificação das instituições na França e em outras regiões da Europa do que muitos poderiam supor em 1789 Muitas leis e privilégios na França eram resquícios dos tempos medievais Não só favoreciam o Primeiro e o Segundo Estados em detrimento da maioria da população como lhes concediam privilégios em relação à Coroa Luís XIV o ReiSol governou o país por 54 anos de 1661 até sua morte em 1715 embora tenha sido coroado de fato em 1643 aos 5 anos Consolidou o poder da monarquia dando continuidade ao aprofundamento do absolutismo iniciado séculos antes Muitos monarcas consultavam com frequência a chamada Assembleia dos Notáveis composta de aristocrataschave escolhidos a dedo pela Coroa Embora fosse um órgão eminentemente consultivo a Assembleia ainda funcionava como uma ligeira restrição ao poder do monarca Por esse motivo Luís XIV reinou sem convocála Em seu reinado a França obteve algum crescimento econômico por exemplo por meio de sua participação no comércio atlântico e colonial O habilidoso ministro das Finanças de Luís XIV JeanBaptiste Colbert supervisionou também o desenvolvimento de uma indústria sob os auspícios e controle do governo uma modalidade de crescimento extrativista O crescimento limitado beneficiava quase exclusivamente o Primeiro e o Segundo Estados Luís XIV decidiu também racionalizar o sistema tributário francês pois o Estado costumava ter dificuldade para financiar as guerras recorrentes em que se envolvia seu grande exército permanente e o luxuoso séquito consumo e palácios do rei A impossibilidade de onerar mesmo a pequena nobreza impunhalhe severas restrições à receita Apesar do crescimento econômico reduzido quando Luís XVI ascendeu ao poder em 1774 mudanças consideráveis tinham se dado na sociedade Ademais as dificuldades fiscais anteriores haviam degenerado em uma crise tributária de grandes proporções e a Guerra dos Sete Anos contra os britânicos entre 1756 e 1763 na qual a França perdeu o Canadá fora particularmente onerosa Um semnúmero de nomes de peso tentou equilibrar o orçamento real mediante a reestruturação da dívida e o aumento dos impostos entre eles AnneRobertJacques Turgot um dos mais famosos economistas de seu tempo Jacques Necker que desempenharia também um papel crucial após a revolução e Charles Alexander de Calonne Nenhum porém logrou êxito Calonne como parte de sua estratégia persuadiu Luís XVI a convocar a Assembleia dos Notáveis O rei e seus conselheiros esperavam que a Assembleia endossasse suas reformas do mesmo modo como Carlos I supunha que o Parlamento inglês concordaria em financiar um exército para combater os escoceses ao ser convocado em 1640 A Assembleia num movimento inesperado decretou que só um órgão representativo os EstadosGerais poderia avalizar tais reformas Os EstadosGerais eram de natureza muito distinta da Assembleia dos Notáveis Enquanto esta última era composta por nobres selecionados pessoalmente pela Coroa dentre os maiores aristocratas os primeiros compreendiam representantes dos três estados Sua última convocação se dera em 1614 Quando os EstadosGerais se reuniram em Versalhes em 1789 imediatamente ficou claro que não seria possível chegar a nenhum acordo Havia um impasse intransponível à medida que o Terceiro Estado viu a situação como a grande chance de aumentar seu poder político e tentou aumentar seu número de votos nos EstadosGerais iniciativa a que nobreza e clero opuseramse vigorosamente A reunião foi encerrada em 5 de maio de 1789 sem ter formulado nenhuma outra resolução além da decisão de convocar uma instância mais poderosa a Assembleia Nacional aprofundando a crise política O Terceiro Estado sobretudo os mercadores homens de negócios profissionais e artesãos que reivindicavam mais poder interpretaram esses desdobramentos como indícios de sua influência crescente Na Assembleia Nacional portanto exigiram participação maior nos procedimentos e direitos mais amplos em geral O apoio que receberam nas ruas de todo o país de cidadãos encorajados pelo desenrolar dos acontecimentos levou à recomposição da Assembleia como Assembleia Nacional Constituinte em 9 de julho Nesse ínterim os ânimos pelo país e sobretudo em Paris iam se exaltando Em reação os círculos conservadores ao redor de Luís XVI convenceramno a depor Necker o ministro das Finanças reformista o que provocou um recrudescimento da radicalização nas ruas O resultado foi a célebre derrubada da Bastilha em 14 de julho de 1789 Dali por diante a revolução começou a sério Necker foi reconduzido ao cargo e o revolucionário Marquês de Lafayette encarregado da Guarda Nacional de Paris Ainda mais notável que a queda da Bastilha foi a dinâmica da Assembleia Nacional Constituinte que em 4 de agosto de 1789 com confiança renovada promulgou a nova Constituição abolindo o feudalismo e os privilégios especiais do Primeiro e Segundo Estados A radicalização contudo fez a Assembleia se fragmentar dada a variedade de pontos de vista conflitantes acerca do formato que a sociedade deveria assumir O primeiro passo foi a formação de clubes locais dentre os quais destacavase o radical Clube Jacobino que mais à frente assumiria as rédeas da revolução Ao mesmo tempo os nobres debandavam os chamados émigrés Muitos incitavam também o rei a romper com a Assembleia e tomar providências por conta própria ou com a ajuda de potências estrangeiras como a Áustria terra natal da Rainha Maria Antonieta e onde a maioria dos émigrés fora se refugiar À medida que o povo nas ruas começava a detectar a ameaça iminente contra as conquistas da revolução nos últimos dois anos o extremismo ia ganhando corpo A Assembleia Nacional Constituinte promulgou a versão definitiva da Constituição em 29 de setembro de 1791 convertendo a França em monarquia constitucional e prevendo igualdade de direitos para todos os homens a extinção das obrigações ou tarifas feudais e a abolição de todas as restrições comerciais impostas pelas guildas A França ainda era uma monarquia mas o rei fora reduzido a um papel insignificante de fato fora privado de sua liberdade Entretanto a dinâmica da revolução viuse irreversivelmente modificada pela guerra que irrompeu em 1792 entre a França e a primeira coalizão encabeçada pela Áustria A guerra intensificou a determinação e o radicalismo dos revolucionários e das massas os chamados sansculottes que se traduz como sem calções por não poderem arcar com o estilo de calças então em voga O resultado desse processo foi o período conhecido como Terror sob o comando da facção jacobina encabeçada por Robespierre e SaintJust e deflagrada após as execuções de Luís XVI e Maria Antonieta levando às execuções não só de enorme número de aristocratas e contrarrevolucionários mas também de vários personagens centrais da própria revolução entre eles os antigos líderes populares Brissot Danton e Desmoulins Contudo o Terror logo saiu de controle e acabaria chegando ao fim em julho de 1794 por ocasião da execução dos próprios líderes inclusive Robespierre e Saint Just Seguiuse uma fase de relativa estabilidade primeiro sob o tanto insípido Diretório entre 1795 e 1799 e depois com o poder mais concentrado nas mãos de um triunvirato o Consulado composto de Ducos Sieyès e Napoleão Bonaparte Já durante o Diretório as façanhas militares do jovem General Napoleão Bonaparte haviam lhe granjeado fama considerável e sua influência só faria crescer após 1799 O Consulado não tardaria a converterse em governo pessoal de Napoleão Os anos entre 1799 e o fim do reinado de Napoleão 1815 testemunharam uma série de vitórias militares acachapantes para a França inclusive as de Austerlitz Jena Auerstadt e Wagram que colocaram a Europa continental de joelhos Permitiram também a Napoleão impor sua vontade suas reformas e seu código legal a um vasto território A queda de Napoleão após sua derrota final em 1815 desencadearia também um período de retrocesso com direitos políticos mais restritos e a restauração da monarquia francesa sob Luís XVII Nada disso porém faria mais que retardar a emergência última de instituições políticas inclusivas As forças liberadas pela revolução de 1789 puseram fim ao absolutismo francês e era inevitável que acarretassem mesmo que lentamente a emergência de instituições inclusivas Assim a França e as regiões da Europa para onde as reformas revolucionárias chegaram a ser exportadas tomariam parte do processo de industrialização já em andamento no século XIX EXPORTANDO A REVOLUÇÃO Às vésperas da Revolução Francesa em 1789 os judeus de toda a Europa eram submetidos a severas restrições Na cidade germânica de Frankfurt por exemplo sua vida era regulamentada pelas determinações de um estatuto que datava da Idade Média Não podia haver mais de 500 famílias judias na cidade todas obrigadas a viver em uma pequena área murada da cidade denominada Judengasse gueto judeu de onde não tinham permissão para sair à noite aos domingos ou durante festividades cristãs O Judengasse era incrivelmente apinhado Tinha 400 metros de comprimento mas não mais de 35 metros de largura em certos pontos menos de 3 metros Os judeus viviam sob constante repressão e regulação Todos os anos no máximo duas novas famílias podiam ser admitidas no gueto e no máximo 12 casais judeus podiam contrair matrimônio isso se ambos contassem mais de 25 anos Os judeus eram proibidos de cultivar a terra e comercializar armas especiarias vinho ou grãos Até 1726 tinham de usar certos emblemas dois círculos amarelos concêntricos para os homens e um véu listrado para as mulheres Todos tinham de arcar com uma capitação especial Quando estourou a Revolução Francesa vivia no Judengasse de Frankfurt um jovem e bemsucedido comerciante Mayer Amschel Rothschild Em princípios da década de 1780 Rothschild havia se estabelecido como o principal negociante de moedas metais e antiguidades em Frankfurt Como todos os judeus da cidade porém não podia abrir um negócio nem viver fora dos limites do gueto Mas a situação logo mudaria Em 1791 a Assembleia Nacional francesa emancipou os judeus do país Os exércitos franceses ocuparam também a Renânia e emanciparam os judeus da Alemanha Ocidental Em Frankfurt seu efeito seria mais abrupto e não totalmente intencional Em 1796 os franceses bombardearam a cidade arrasando metade do Judengasse no processo Cerca de dois mil judeus viramse sem teto e tiveram de se mudar os Rothschild entre eles Uma vez fora do gueto e livres agora da miríade de regulamentações que circunscreviam seu empreendedorismo podiam aproveitar novas oportunidades de negócios incluindo um contrato de fornecimento de grãos para o exército austríaco algo que até então lhes era vedado No fim daquela década Rothschild era um dos mais ricos judeus de Frankfurt e um homem de negócios estabelecido A emancipação plena teria de esperar até 1811 sendo plenamente implementada por Karl von Dalberg nomeado GrãoDuque de Frankfurt na reorganização da Alemanha promovida por Napoleão em 1806 Mayer Amschel disse então ao seu filho Você agora é um cidadão A luta pela emancipação judaica não havia ainda chegado ao fim uma vez que haveria reveses posteriores sobretudo no Congresso de Viena em 1815 que estabeleceria a configuração política pósnapoleônica Para os Rothschild porém não haveria retorno ao gueto Mayer Amschel e seus filhos logo teriam o maior banco da Europa do século XIX com filiais em Frankfurt Londres Paris Nápoles e Viena Sua história familiar não constituiu um acontecimento isolado Primeiro os exércitos revolucionários franceses e depois Napoleão invadiram grande parte da Europa continental e em quase todas as áreas ocupadas as instituições existentes eram remanescentes dos tempos medievais reservando o poder a reis príncipes e nobres e restringindo o comércio nas cidades e no campo Em muitas dessas áreas a servidão e o feudalismo eram muito mais importantes do que na própria França No Leste Europeu incluindo a Prússia e a parte húngara do Império AustroHúngaro os servos encontravamse presos à terra Na parte ocidental do continente essa forma mais estrita de servidão já havia desaparecido mas os camponeses deviam aos senhores feudais um semnúmero de taxas tributos e obrigações trabalhistas Por exemplo no estado de NassauUsingen estavam submetidos a 230 diferentes pagamentos tarifas e serviços As tarifas previam pagamento após um animal ser abatido chamado de dízimo de sangue havia também o dízimo das abelhas e o dízimo da cera Se uma propriedade fosse comprada ou vendida o senhor teria taxas a recolher As guildas que regulamentavam todos os tipos de atividade econômica nas cidades normalmente gozavam também de mais força nesses lugares do que na França Nas cidades de Colônia e Aachen na Alemanha Ocidental a adoção das máquinas de fiar e de tecer fora bloqueada por essas associações de ofícios Muitas cidades de Berna na Suíça a Florença na Itália eram controladas por umas poucas famílias Os líderes da Revolução Francesa e posteriormente Napoleão exportaram a revolução para essas terras derrubando o absolutismo pondo fim aos vínculos feudais com a terra abolindo as guildas e impondo igualdade perante a lei a noção fundamental de estado de direito que discutiremos em mais minúcias no próximo capítulo Assim a Revolução Francesa preparou o terreno não só na França mas também na maior parte do restante da Europa para as instituições inclusivas e o crescimento econômico que elas seriam responsáveis por deflagrar Como vimos alarmadas com o rumo tomado pelos acontecimentos em território francês várias potências europeias organizaramse em torno da Áustria em 1792 para atacar a França com o objetivo explícito de libertar o Rei Luís XVI mas na realidade para esmagar a Revolução Francesa Supunhase que os exércitos improvisados postos em campo pela revolução sofreriam uma derrocada Após algumas derrotas iniciais porém as tropas da nova república francesa acabaram vencendo uma guerra que haviam começado na defensiva Apesar de graves problemas organizacionais a superar os franceses estavam à frente dos demais países em uma inovação crucial o recrutamento em massa Introduzido em agosto de 1793 o sistema permitiu aos franceses pôr grandes exércitos em campo e adquirir vantagem militar que já beirava a supremacia antes mesmo de o decantado talento militar de Napoleão entrar em cena Mapa 17 O império de Napoleão O êxito militar inicial incentivou as lideranças da república a expandir as fronteiras do país no intuito de criar um amortecedor eficaz entre a nova república e os monarcas hostis da Prússia e da Áustria Os franceses logo se apoderaram dos Países Baixos Austríacos e das Províncias Unidas correspondendo à Bélgica e à Holanda atuais assumiram também boa parte da Suíça de hoje Os três lugares foram mantidos sob rigoroso controle durante toda a década de 1790 A Alemanha foi a princípio objeto de disputa acirrada mas em 1795 os franceses detinham total controle da Renânia a área ocidental da Alemanha na margem esquerda do Rio Reno fato que os prussianos foram obrigados a reconhecer no Tratado de Basileia Entre 1795 e 1802 os franceses dominaram a Renânia mas nenhuma outra região alemã Em 1802 a Renânia foi oficialmente incorporada à França Por toda a segunda metade da década de 1790 a Itália seria o principal campo de batalha no embate com os austríacos A anexação da Saboia pela França ocorreria em 1792 seguida de um impasse que se estenderia até a invasão por Napoleão em abril de 1796 Em sua primeira grande campanha continental em princípios de 1797 Napoleão havia conquistado quase todo o Norte da Itália exceto Veneza que estava em poder dos austríacos O Tratado de Campo Formio assinado com os austríacos em outubro de 1797 pôs fim à Guerra da Primeira Coalizão e reconheceu uma série de repúblicas sob domínio francês no Norte da Itália Entretanto os franceses continuaram expandindo seu controle sobre a Itália mesmo após a assinatura do tratado invadindo os Estados Pontifícios e fundando a República Romana em março de 1798 Em janeiro de 1799 Nápoles foi conquistada dando origem à República Partenopeia Com exceção de Veneza que permanecia austríaca a península italiana encontravase inteira sob domínio francês quer de modo direto como no caso de Saboia quer por meio de Estados satélites como as repúblicas Cisalpina Liguriana Romana e Partenopeia Houve novas idas e vindas na Guerra da Segunda Coalizão entre 1798 e 1801 que não obstante terminou com os franceses basicamente ainda no controle Seus exércitos revolucionários logo trataram de promover reformas radicais nas terras conquistadas abolindo os vestígios remanescentes da servidão e das relações feudais com a terra e impondo a igualdade perante a lei O clero foi destituído de seu status e poderes especiais e as guildas nas áreas urbanas foram extintas ou ao menos gravemente enfraquecidas Foi o que ocorreu nos Países Baixos Austríacos imediatamente depois da invasão em 1795 e nas Províncias Unidas onde os franceses fundaram a República Batava com instituições políticas muito similares às da França Na Suíça a situação era similar e guildas senhores feudais e Igreja foram derrotados os privilégios feudais foram extintos e as guildas abolidas e expropriadas O trabalho iniciado pelo exército revolucionário teve de uma forma ou de outra continuidade pelas mãos de Napoleão Seu objetivo maior era obter o firme controle dos territórios que conquistava e para tanto ele às vezes fazia acordos com as elites locais ou punha sua família e parceiros no comando como durante seu breve domínio da Espanha e da Polônia Entretanto Napoleão acalentava também o desejo genuíno de dar prosseguimento e aprofundar as reformas revolucionárias para tanto codificou o direito romano e as ideias de igualdade perante a lei em um sistema legal que ficaria conhecido como Código Napoleônico que ele considerava seu maior legado e pretendia impor em todos os territórios que controlava Evidentemente as reformas impostas pela Revolução Francesa e por Napoleão não eram irreversíveis Em determinados lugares como em Hanover Alemanha as antigas elites voltaram ao poder logo após a queda de Napoleão e a maior parte do que os franceses haviam conquistado perdeuse de vez Em muitos outros lugares porém o feudalismo as guildas e a nobreza foram destruídos ou enfraquecidos em caráter permanente Por exemplo mesmo depois da partida dos invasores em diversos casos o Código Napoleônico mantevese em vigor No fim das contas os exércitos franceses espalharam o sofrimento pela Europa mas também promoveram mudanças drásticas na situação geral Em grande parte da Europa foram extintas as relações feudais a influência das guildas o controle absolutista exercido por monarcas e príncipes o poderio econômico social e político do clero e os fundamentos do Ancien Régime que tratava as diferentes pessoas de maneira desigual com base no segmento social em que nasciam Essas mudanças criaram o tipo de instituição econômica inclusiva que permitiria à industrialização arraigarse nesses lugares Em meados do século XIX a industrialização encontravase em franco andamento em quase todas as regiões que estiveram sob controle francês ao passo que lugares como o Império AustroHúngaro e a Rússia que os franceses não conquistaram ou Polônia e Espanha onde seu domínio foi temporário e limitado mantiveramse de modo geral estagnados EM BUSCA DA MODERNIDADE No outono de 1867 Ōkubo Toshimichi um dos principais cortesãos do domínio de Satsuma no Japão feudal viajou da capital Edo hoje Tóquio até a cidade de Yamaguchi Em 14 de outubro encontrouse com líderes do domínio Chōshū Tinha uma proposta simples a fazer que juntassem forças marchassem com seus exércitos até Edo e derrubassem o xógum o governante supremo do país Àquela altura Ōkubo Toshimichi já tinha os domínios Tosa e Aki ao seu lado Uma vez que os líderes dos poderosos Chōshū concordaram formouse uma aliança secreta a Aliança Satcho Em 1868 o Japão era um país economicamente subdesenvolvido estando desde 1600 sob o domínio da família Tokugawa cujo soberano assumira o título de xógum comandante em 1603 O imperador japonês era uma figura decorativa com papel exclusivamente cerimonial Os xóguns Tokugawa eram os membros mais proeminentes de uma classe de senhores feudais que administravam e tributavam seus próprios domínios entre eles o de Satsuma pertencente à família Shimazu Esses senhores junto com seus vassalos militares os famosos samurais dirigiam uma sociedade similar à da Europa medieval com categorias ocupacionais rígidas restrições ao comércio e elevada carga tributária sobre os agricultores O xógum governava de Edo onde monopolizava e controlava o comércio exterior e bania os estrangeiros do país As instituições políticas e econômicas eram extrativistas e o Japão era pobre Contudo o xógum não dispunha de poder total Ainda que a família Tokugawa tivesse assumido o país em 1600 não tinha condições de controlar a todos No sul do país o domínio Satsuma mantinha relativa autonomia gozando até de permissão para manter atividades comerciais independentes com o mundo exterior através das Ilhas Ryūkyū Foi na capital Satsuma Kagoshima que Ōkubo Toshimichi nasceu em 1830 Sendo filho de samurai também ele seguiria o caminho do pai Seu talento logo chamou a atenção de Shimazu Nariakira senhor de Satsuma que não tardou a promovêlo na burocracia Na época Shimazu Nariakira já havia formulado um plano para usar tropas de Satsuma para derrubar o xógum Queria expandir o comércio com a Ásia e a Europa abolir as antigas instituições econômicas feudais e transformar o Japão em um Estado moderno Seu plano incipiente foi abortado por sua morte em 1858 Seu sucessor Shimazu Hisamitsu mostrouse mais circunspecto ao menos a princípio Ōkubo Toshimichi cada vez mais seguro de que o Japão precisava derrubar o xogunato feudal acabou persuadindo Shimazu Hisamitsu A fim de angariar apoio para sua causa trataram de maquiála com uma suposta irritação pelo esvaziamento do lugar do imperador O tratado já assinado por Ōkubo Toshimichi com o domínio Tosa alegava que país algum tem dois monarcas lar nenhum tem dois senhores o governo deve permanecer nas mãos de um só A verdadeira intenção contudo não era só restaurar o poder do imperador mas modificar por completo as instituições políticas e econômicas No lado dos Tosa um dos signatários do tratado foi Sakamoto Ryūma Enquanto os Satsuma e os Chōshū mobilizavam suas tropas Sakamoto Ryūma apresentava ao xógum um plano de oito pontos instandoo a abdicar a fim de evitar uma guerra civil Era um plano radical e embora a cláusula 1 estabelecesse que o poder político do país deve ser restituído à Corte Imperial sendo todos os decretos promulgados pela Corte compreendia muito mais do que a mera restauração do imperador As cláusulas 2 3 4 e 5 determinavam 1 Dois corpos legislativos uma Câmara Alta e outra Baixa serão estabelecidos e todas as medidas governamentais serão definidas com base na opinião geral 2 Homens talentosos entre os senhores nobres e pessoas em geral serão empregados como conselheiros e os cargos tradicionais do passado que tiverem perdido o propósito serão abolidos 3 As relações exteriores devem ser conduzidas de acordo com regulamentações adequadas elaboradas com base no senso comum 4 A legislação e as regulamentações de outrora serão postas de lado e um código novo e adequado será elaborado O xógum Yoshinobu concordou em abdicar e em 3 de janeiro de 1868 foi declarada a Restauração Meiji o Imperador Kōmei e seu filho Meiji quando um mês mais tarde o velho imperador faleceu foram reconduzidos ao poder Embora Edo e a capital imperial Quioto estivessem ocupadas por tropas Satsuma e Chōshū temiase que os Tokugawa tentassem reconquistar o poder e restaurar o xogunato Ōkubo Toshimichi queria vêlos esmagados para sempre Assim persuadiu o imperador a abolir o domínio Tokugawa e confiscarlhes as terras Em 27 de janeiro o antigo xógum Yoshinobu atacou forças Satsuma e Chōshū irrompeu a guerra civil que se estenderia até o verão quando os Tokugawa foram por fim derrotados Após a Restauração Meiji houve no Japão uma série de reformas institucionais transformadoras Em 1869 o feudalismo foi abolido e os 300 feudos restituídos ao governo central e convertidos em prefeituras sob o controle de um governador indicado As tributação era centralizada em um moderno Estado burocrático substituiu o antigo feudal Em 1869 foi introduzida a igualdade de todas as classes sociais perante a lei as restrições à migração e ao comércio internos foram abolidas A classe dos samurais foi extinta ainda que para tanto fosse preciso sufocar algumas rebeliões Introduziramse direitos individuais de propriedade sobre a terra e concedeuse a todos a liberdade de ingresso e prática de qualquer ofício O Estado dedicouse avidamente à construção de infraestrutura Em contraste com as atitudes dos regimes absolutistas com relação às ferrovias em 1869 o governo nipônico inaugurou uma linha de barcos a vapor entre Tóquio e Osaka e construiu a primeira estrada de ferro ligando Tóquio e Yokohama Começou também a desenvolver uma indústria manufatureira e Ōkubo Toshimichi como ministro das Finanças supervisionou os primórdios de um esforço coordenado de industrialização O senhor do domínio Satsuma havia assumido a dianteira desse movimento construindo fábricas de cerâmica canhões e fio de algodão e importando equipamentos têxteis ingleses a fim de criar a primeira fiação moderna de algodão no país em 1861 construiu também dois estaleiros Em 1890 o Japão era o primeiro país asiático a adotar uma Constituição escrita e estabelecer uma monarquia constitucional com Parlamento eleito a Dieta e Judiciário independente Tais mudanças foram decisivas para permitir ao Japão ser o maior beneficiário da Revolução Industrial na Ásia EM MEADOS DO SÉCULO XIX tanto a China quanto o Japão eram países pobres que definhavam sob regimes absolutistas Havia séculos que o governo chinês via com desconfiança toda e qualquer possibilidade de mudança Embora fossem muitas as semelhanças entre China e Japão o xogunato de Tokugawa também havia banido o comércio ultramarino no século XVII do mesmo modo como os imperadores chineses haviam feito antes e opunhase a mudanças políticas e econômicas havia também diferenças políticas notórias A China era um império burocrático centralizado regido por um imperador absoluto cujo poder sem dúvida sofria restrições das quais a mais importante era a ameaça de rebelião Durante o período de 1850 a 1864 por exemplo o sul da China inteiro foi assolado pela Rebelião de Taiping em que milhões pereceram no conflito direto ou sucumbiram à fome generalizada Entretanto a oposição ao imperador não era institucionalizada A estrutura das instituições políticas japonesas era outra Embora o xogunato houvesse reduzido o imperador a um papel decorativo como vimos o poder Tokugawa estava longe de ser absoluto e domínios como o dos Satsuma mantiveram não só a independência como até a capacidade de praticar comércio exterior por sua própria conta Como aconteceu no caso da França uma consequência significativa da Revolução Industrial inglesa para a China e o Japão foi a vulnerabilidade militar A China foi humilhada pelo poderio marítimo britânico na Primeira Guerra do Ópio entre 1839 e 1842 a mesma ameaça materializouse diante dos japoneses na Baía de Edo em 1853 sob a forma dos navios de guerra americanos comandados pelo Comodoro Matthew Perry A constatação de que o atraso econômico acarretava atraso também na esfera militar foi uma das forças motrizes por trás do plano de Shimazu Nariakira de derrubar o xogunato e desencadear as mudanças que acabariam levando à Restauração Meiji Os líderes do domínio Satsuma deramse conta de que o crescimento econômico e talvez até a sobrevivência dos japoneses só poderia ser obtido por meio de reformas institucionais às quais o xógum se opunha contudo porque seu poder estava vinculado ao conjunto de instituições existentes Para que as reformas fossem realizadas o xógum teria de ser derrubado e foi A situação era similar na China mas as diferenças nas instituições políticas iniciais tornavam muito mais difícil destronar o imperador o que só aconteceria em 1911 Em vez de reformar suas instituições os chineses tentaram fazer frente aos britânicos no campo militar por meio da importação de armamentos modernos Os japoneses optaram pela construção de sua própria indústria bélica Em consequência dessas diferenças iniciais cada país respondeu à sua própria maneira aos desafios do século XIX e Japão e China divergiram drasticamente face à circunstância crítica engendrada pela Revolução Industrial Enquanto as instituições nipônicas eram transformadas e sua economia enveredava por um caminho de rápido crescimento na China as forças favoráveis à mudança institucional não possuíam suficiente intensidade e as instituições extrativistas persistiriam inabaláveis até desandar de vez com a revolução comunista de Mao em 1949 ORGIGENS DA DESIGUALDADE MUNDIAL Este capítulo e os três anteriores contaram a história de como as instituições políticas e econômicas inclusivas surgiram na Inglaterra possibilitando a Revolução Industrial e por que certos países beneficiaramse da industrialização e enveredaram pelo caminho do crescimento ao passo que outros não ou pior ainda recusaramse terminantemente a admitir a implementação da indústria mesmo em seus primórdios O que determinava se o país ia embarcar ou não na industrialização eram basicamente suas instituições Os Estados Unidos que sofreram transformação similar à Revolução Gloriosa inglesa já haviam desenvolvido suas próprias instituições políticas e econômicas inclusivas no fim do século XVIII Seria por isso o primeiro país a explorar as novas tecnologias oriundas das Ilhas Britânicas e não tardaria em ultrapassar a GrãBretanha e assumir a dianteira da industrialização e da mudança tecnológica A Austrália seguiu um caminho parecido rumo a instituições inclusivas ainda que um pouco mais tarde e de forma menos notória Seus cidadãos assim como os ingleses e os norteamericanos precisaram lutar para construir instituições inclusivas Uma vez instauradas a Austrália daria início ao seu próprio processo de crescimento econômico Austrália e Estados Unidos conseguiram industrializarse e crescer rapidamente porque suas instituições relativamente inclusivas não bloquearam novas tecnologias inovações nem a destruição criativa Na maioria das demais colônias europeias a história já seria outra sua dinâmica seria oposta àquela da Austrália e dos Estados Unidos A inexistência de uma população nativa ou de recursos a serem extraídos tornou muito peculiar o colonialismo em ambos ainda que seus cidadãos tenham precisado lutar muito por instituições inclusivas e por seus direitos políticos Nas Ilhas Molucas assim como em muitas outras regiões colonizadas pelos europeus na Ásia no Caribe e na América do Sul os cidadãos não tinham a menor chance de vencer essa disputa Nesses lugares os colonos europeus impuseram uma nova modalidade de instituições extrativistas ou assumiram aquelas que encontravam a fim de extrair recursos valiosos de especiarias e açúcar a prata e ouro Em muitos desses casos desencadearam uma série de mudanças institucionais que reduziram muito a probabilidade da emergência de instituições inclusivas em alguns deles eliminaram explicitamente toda e qualquer forma de indústria ou instituições econômicas inclusivas que porventura existissem A maioria desses lugares não se veria em condições de beneficiarse da industrialização no século XIX ou nem mesmo no XX A dinâmica no resto da Europa foi também bastante diferente daquela da Austrália e Estados Unidos Enquanto a Revolução Industrial na GrãBretanha ganhava velocidade no fim do século XVIII a maioria dos países europeus era governada por regimes absolutistas controlada por monarcas e aristocratas cuja principal fonte de renda provinha das terras que possuíam ou dos privilégios comerciais de que desfrutavam graças a barreiras alfandegárias proibitivas A destruição criativa fomentada pelo processo de industrialização acabaria erodindo os lucros das lideranças e desviando recursos e mão de obra de suas terras As aristocracias sairiam perdendo economicamente com a industrialização E mais importante sairiam perdendo também politicamente à medida que o processo de industrialização sem dúvida produziria instabilidade e criaria desafios políticos ao seu monopólio do poder No entanto as transformações institucionais na GrãBretanha e a Revolução Industrial geraram novas oportunidades e desafios para os Estados europeus Embora houvesse absolutismo na Europa Ocidental a região compartilhava também boa parte das peculiaridades institucionais que haviam afetado a GrãBretanha no milênio anterior No Leste Europeu Império Otomano e China todavia a situação era muito diversa o que fez enorme diferença no tocante à disseminação da Revolução Industrial Do mesmo modo como a peste negra ou a ascensão do comércio atlântico a circunstância crítica engendrada pela industrialização intensificou as perenes disputas em torno das instituições em muitos países europeus Um fator central nesse sentido foi a Revolução Francesa de 1789 O fim do absolutismo na França abriu caminho para instituições inclusivas e acabaria levando os franceses a embarcar na industrialização e no rápido crescimento econômico A Revolução Francesa porém na verdade fez mais que isso exportou suas instituições invadindo e reformando à força as instituições extrativistas de vários países vizinhos Assim preparou o terreno para a industrialização não só na França mas também na Bélgica Holanda Suíça e partes da Alemanha e Itália Mais a leste a reação foi similar àquela que se seguiu à peste negra quando em vez de desmoronar o feudalismo se intensificou O Império Austro Húngaro a Rússia e o Império Otomano ficaram ainda mais para trás economicamente mas suas monarquias absolutistas ainda conseguiriam se sustentar no poder até a Primeira Guerra Mundial Em outros lugares do mundo o absolutismo mostrouse tão resiliente quanto no Leste Europeu o que se revelou particularmente verdadeiro na China onde a transição da dinastia Ming para a Qing engendrou um Estado comprometido com a construção de uma sociedade agrária estável hostil ao comércio internacional Na Ásia porém também havia peculiaridades institucionais significativas Se a China reagiu à Revolução Industrial do mesmo modo como o Leste Europeu a reação japonesa foi análoga à da Europa Ocidental Como na França foi preciso uma revolução para modificar o sistema aqui liderada pelos renegados senhores dos domínios Satsuma Chōshū Tosa e Aki Esses nobres derrubaram o xógum deflagraram a Restauração Meiji e colocaram o Japão no caminho das reformas institucionais e do crescimento econômico Vimos também como o absolutismo foi resiliente na longínqua Etiópia Em outras regiões do continente o mesmo ímpeto de comércio internacional que ajudou a transformar as instituições inglesas no século XVII aprisionou vastas áreas das Áfricas Ocidental e Central em instituições altamente extrativistas via tráfico de escravos o que destruiu sociedades em certos lugares enquanto levava à criação de Estados escravocratas e extrativistas em outros A dinâmica institucional que descrevemos acabaria determinando que países seriam capazes de tirar proveito das grandes oportunidades que se apresentaram a partir do século XIX e quais não conseguiriam fazêlo As origens das desigualdades mundiais que hoje observamos podem ser encontradas nessa divergência Salvo raras exceções os países ricos de hoje são aqueles que embarcaram no processo de industrialização e transformação tecnológica a partir do século XIX e os pobres são aqueles que não seguiram esse caminho O 11 O CÍRCULO VIRTUOSO A LEI NEGRA CASTELO DE WINDSOR a oeste de Londres é uma das grandes residências reais da Inglaterra No começo do século XVIII era cercado por uma grande floresta repleta de cervos embora não haja muitos resquícios dela hoje Um dos guardiães da floresta em 1722 Baptist Nunn viuse em meio a um violento conflito Em 27 de junho ele escreveu Os Negros chegaram no meio da noite e atiraram três vezes duas balas na janela do meu quarto e concordei em pagarlhes 5 guinéus em Crowthorne dia 30 Em outra anotação no diário de Nunn lêse Mais uma surpresa Apareceume um embuçado com uma mensagem de destruição Quem eram os misteriosos Negros que faziam ameaças atiravam em Nunn e exigiam dinheiro Os Negros eram grupos de homens locais que escureciam o rosto para não serem reconhecidos à noite Apareciam por todo o sul da Inglaterra nessa época matando e mutilando cervos e outros animais ateando fogo a fardos de feno e celeiros destruindo cercas e açudes Aparentemente não passavam de arruaceiros mas não era o caso A caça ilegal de cervos em terras pertencentes ao rei ou outros membros da aristocracia vinha acontecendo havia já algum tempo Na década de 1640 durante a Guerra Civil toda a população de cervos do Castelo de Windsor fora morta Após a Restauração em 1660 quando Carlos II subiu ao trono o parque de cervos foi repovoado Contudo os Negros não estavam apenas matando os animais para comer dedicavamse também à mera destruição Com que propósito Um elemento crucial da Revolução Gloriosa de 1688 foi o pluralismo de interesses representados no Parlamento Nenhum dos grupos mercadores industrialistas proprietários rurais ou aristocratas aliados a Guilherme de Orange e depois à Casa de Hanover que sucederia a Rainha Ana em 1714 teria força bastante para fazer valer sua vontade de maneira unilateral As tentativas de restaurar a monarquia Stuart prosseguiram durante a maior parte do século XVIII Após a morte de Jaime II em 1701 seu filho Jaime Francisco Eduardo Stuart o Velho Pretendente Old Pretender foi reconhecido como legítimo herdeiro da Coroa inglesa por França Espanha o papa e os partidários da monarquia Stuart na Inglaterra e Escócia os chamados jacobitas Em 1708 o Velho Pretendente tentou retomar o trono com apoio de tropas francesas mas sem êxito Nas décadas seguintes haveria uma série de revoltas jacobitas inclusive de grande porte em 1715 e 1719 Em 17451746 houve uma nova tentativa agora por parte do filho do Velho Pretendente Carlos Eduardo Stuart o Jovem Pretendente Young Pretender mas suas tropas foram derrotadas pelo exército britânico O partido político Whig que como vimos páginas 163164 fora fundado nos anos 1670 a fim de representar os novos interesses mercantis e econômicos foi a principal organização por trás da Revolução Gloriosa tendo dominado o Parlamento de 1714 a 1760 Uma vez no poder viramse tentados a usar sua posição recémalcançada para escorchar os direitos alheios esperando o bolo crescer para comêlo sozinhos Sob esse aspecto não eram diferentes dos reis Stuart mas seu poder estava longe de ser absoluto era restrito tanto por grupos rivais no Parlamento sobretudo o Partido Tory formado para oporse aos whigs e pelas próprias instituições por cuja implementação eles mesmos tanto haviam lutado a fim de fortalecer o Parlamento e impedir o surgimento de um novo absolutismo com o retorno dos Stuart A natureza pluralista da sociedade nascida da Revolução Gloriosa significava também que a população em geral mesmo aqueles sem representação formal no Parlamento havia ganhado poder nesse sentido os atos dos Negros eram exatamente a reação das pessoas comuns à percepção de que eram exploradas pelos Whigs O caso de William Cadogan bemsucedido general na Guerra da Sucessão Espanhola entre 1701 e 1714 e na supressão das revoltas jacobitas ilustra bem o tipo de abuso dos direitos dos cidadãos comuns pelos Whigs que acabaria provocando o fenômeno dos Negros Jorge I elevou Cadogan a barão em 1716 e depois a conde em 1718 Era também membro influente do Conselho de Regência de Juízes da Suprema Corte que presidia aos mais importantes assuntos de Estado além de atuar na prática como comandante em chefe Adquiriu um amplo terreno de cerca de quatro quilômetros quadrados em Caversham aproximadamente 30 quilômetros a oeste de Windsor Lá construiu uma mansão e jardins ornamentais com um parque de cervos de um quilômetro quadrado Todavia sua propriedade ergueuse sobre a violação dos direitos de seus vizinhos que sofreram desapropriações e viramse tolhidos em seus tradicionais direitos de criar animais e recolher lenha e turfa Cadogan enfrentou a ira dos Negros Em 1o de janeiro de 1722 e depois novamente em julho o parque foi assaltado por grupos montados e armados No primeiro ataque morreram 16 cervos O Conde Cadogan não foi o único As propriedades de muitos proprietários de terra e políticos notáveis também foram alvos dos Negros O governo Whig não deixaria aquilo passar em brancas nuvens Em maio de 1723 o Parlamento promulgou a Lei Negra estabelecendo uma lista de 50 novos delitos extraordinários passíveis de condenação à forca A Lei Negra transformou em crime não só portar armas mas também andar com o rosto enegrecido Aliás a lei logo receberia uma emenda tornando este último ponto também passível de enforcamento As elites Whig puseramse a implementar a lei com muito gosto Baptist Nunn montou uma rede de informantes na Floresta de Windsor a fim de descobrir a identidade dos Negros Logo vários foram presos Supostamente a transição da prisão à pena capital deveria ser rápida Afinal a Lei Negra já fora promulgada os Whigs dominavam o Parlamento o Parlamento dominava o país e os Negros estavam indo diretamente de encontro aos interesses de alguns Whigs poderosos Até Sir Robert Walpole secretário de Estado e depois primeiroministro e como Cadogan também membro influente do Conselho de Regência de Juízes da Suprema Corte estava envolvido Tinha interesses velados no Richmond Park no sudoeste de Londres criado por Carlos I a partir de terras públicas O parque também transgredia os direitos tradicionais da população local de criar animais caçar lebres e coelhos e catar lenha Todavia ao que parece a extinção desses direitos não vinha sendo posta em prática com rigor e a caça e o pastoreio prosseguiam até que Walpole conseguiu colocar o próprio filho encarregado do parque O lugar foi então fechado com a edificação de um muro e a instalação de armadilhas Walpole gostava de caçar cervos e mandou construir uma casa para hospedálo em Houghton no interior do parque o que imediatamente despertou a animosidade dos Negros locais Em 10 de novembro de 1724 um morador das cercanias do parque John Huntridge foi acusado de ajudar ladrões de cervos e de acobertar Negros conhecidos ambos crimes passíveis de enforcamento O inquérito contra Huntridge veio do alto instaurado pelo Conselho de Regência de Juízes da Suprema Corte dominado por Walpole e Cadogan Walpole chegou a obter pessoalmente provas da culpa de Huntridge junto a um informante local Richard Blackburn A condenação deveria ser favas contadas mas não foi Ao fim de um julgamento de oito ou nove horas o júri absolveu Huntridge em parte por razões processuais devido às irregularidades no modo como as provas haviam sido coletadas Nem todos os Negros ou os que simpatizavam com sua causa tiveram a mesma sorte de Huntridge Embora alguns outros também tivessem sido inocentados ou tivessem as penas comutadas muitos foram condenados à forca ou ao degredo na colônia penal preferida na época a América do Norte a lei em si permaneceria nos livros até ser abolida em 1824 Ainda assim a vitória de Huntridge é notável O júri era composto não de iguais de Huntridge mas de grandes proprietários de terras e fidalgos que deveriam ter sido simpáticos a Walpole Mas não era mais o século XVII quando a Câmara Estrelada limitavase a subscrever os desejos dos monarcas Stuart e servir lhes de instrumento repressivo contra seus oponentes e da qual os reis podiam remover os juízes cujas decisões lhes desagradassem Agora os Whigs também tinham de se dobrar ao estado de direito isto é o princípio de que a legislação não poderia ser aplicada de maneira seletiva nem arbitrária e de que ninguém está acima da lei O EPISÓDIO DA LEI NEGRA deixou claro que a Revolução Gloriosa havia instituído o estado de direito e que essa ideia estava se arraigando na Inglaterra e na GrãBretanha em geral impondo às elites limites bem mais estritos do que elas mesmas supunham Notese que estado de direito rule of law não é o mesmo que governar por decreto rule by law Por mais que os Whigs dispusessem de meios para promulgar uma legislação severa e repressiva que esmagasse a resistência das pessoas comuns teriam de enfrentar as restrições decorrentes do estado de direito Sua lei violava os direitos já estendidos a todos pela Revolução Gloriosa e pelas mudanças sofridas em seu rastro pelas instituições políticas que haviam derrubado por terra os direitos divinos dos reis e os privilégios das elites Era inevitável pois que tanto as classes privilegiadas quanto os que não pertenciam a elas oferecessem resistência à implementação do estado de direito Analisado a partir de uma perspectiva histórica o estado de direito é um conceito muito estranho Por que as leis deveriam ser aplicadas igualitariamente a todos Se o rei e a aristocracia possuem poder político e o resto não é natural que o que é justo para esses poderosos seja banido e passível de punição para os demais Com efeito o estado de direito não é concebível sob instituições políticas absolutistas é fruto do pluralismo político e das amplas coalizões que o propiciam Só quando os mais diversos indivíduos e grupos participam das decisões e do poder político é que a ideia de que todos devem ser tratados com justiça começa a fazer sentido No começo do século XVIII a GrãBretanha estava se tornando pluralista o bastante para que as elites Whig descobrissem que as próprias leis e instituições lhes imporiam restrições algo inerente ao estado de direito No entanto por que os Whigs e os parlamentares se submetiam a tais restrições Por que não usavam seu controle do Parlamento e do Estado para impingir uma implementação intransigente da Lei Negra e imporse aos tribunais quando suas decisões não os agradavam A resposta é muito reveladora da natureza da Revolução Gloriosa por que ela não se limitou a substituir o absolutismo antigo por uma nova versão do mesmo da relação entre o pluralismo e o estado de direito e da dinâmica dos círculos virtuosos Como vimos no Capítulo 7 a Revolução Gloriosa não foi a derrubada de uma elite por outra mas uma insurreição contra o absolutismo por uma ampla coalizão composta por proprietários rurais mercadores e manufaturadores além de certos grupos de whigs e tories O surgimento de instituições políticas pluralistas foi consequência dessa revolução O estado de direito nasceu também como subproduto desse processo Com muitos partidos sentados à mesa dividindo o poder era natural fazer as leis e restrições se aplicarem a todos eles para que nenhum dos envolvidos começasse a acumular poder demais e acabasse solapando os próprios fundamentos do pluralismo Daí a ideia de imposição de limites e restrições aos governantes essência do estado de direito ser intrínseca ao pluralismo engendrado pela ampla coalizão que compôs a oposição ao absolutismo dos Stuart Nesse contexto não surpreende que o princípio do estado de direito aliado à ideia de que os monarcas não eram detentores de direitos divinos tenha sido o argumento central contra o absolutismo Stuart Segundo o historiador britânico E P Thompson nesse embate empreenderamse enormes esforços no sentido de projetar a imagem de uma classe governante submetida ao estado de direito cuja legitimidade se baseasse no igualitarismo e na universalidade dessas formas jurídicas Ora querendo ou não os governantes acabaram se tornando prisioneiros da própria retórica jogaram os jogos do poder segundo as regras que mais lhes convinham mas não podiam quebrálas do contrário o jogo inteiro estaria perdido Botar o jogo a perder significaria desestabilizar o sistema e abrir caminho para o absolutismo por parte de um segmento da coalizão ampla ou mesmo correr o risco de que os Stuart retornassem Nas palavras de Thompson o que impedia o Parlamento de fundar um novo absolutismo era o fato de que eliminar a lei e as prerrogativas reais talvez ricocheteasse contra sua vida e suas propriedades Além disso era intrínseca à própria natureza do meio escolhido por eles os aristocratas mercadores etc que se insurgiram contra a Coroa para sua autodefesa a impossibilidade de reserválo para uso exclusivo de sua própria classe A lei em suas formas e tradições acarretava princípios de igualdade e universalidade que tinham de ser estendidos a todos os tipos e níveis de homens Uma vez instaurada a noção de estado de direito não só manteve o absolutismo a distância como instalou uma espécie de círculo virtuoso se as leis fossem aplicadas igualmente para todos nenhum indivíduo ou grupo nem mesmo Cadogan ou Walpole poderia erguerse acima da lei e as pessoas comuns acusadas de invasão de propriedade privada ainda teriam direito a um julgamento justo VIMOS COMO SURGEM instituições políticas e econômicas inclusivas Mas como fazem para se manter ao longo do tempo A história da Lei Negra e os limites à sua implementação são um bom exemplo do mecanismo de círculo virtuoso um poderoso processo de feedback positivo que assegura a preservação dessas instituições em face das tentativas de enfraquecêlas e de fato desencadeia forças que promovem maior inclusão A lógica dos círculos virtuosos decorre em parte do fato de que as instituições inclusivas baseiamse em restrições ao exercício do poder e em uma distribuição pluralista do poder político na sociedade inerentes ao estado de direito A possibilidade de determinado subgrupo impor sua vontade a outros sem nenhuma restrição mesmo que esses outros sejam cidadãos comuns como no caso de Huntridge põe em risco esse mesmo equilíbrio Se houvesse uma suspensão temporária no caso de camponeses protestando contra elites que se apropriassem de suas terras comunitárias que garantias haveria de que não ocorreria uma nova suspensão quando necessário E na próxima suspensão o que impediria a Coroa e a aristocracia de tirar o que os mercadores homens de negócios e proprietários rurais tivessem ganhado naquele meio século Com efeito na suspensão seguinte talvez todo o projeto de pluralismo desmoronasse porque um estreito conjunto de interesses assumiria o controle em detrimento da coalizão mais ampla O sistema político não poderia correr tal risco Foi o que fez do pluralismo e do estado de direito dele decorrente características persistentes das instituições políticas britânicas Veremos que uma vez estabelecidos o pluralismo e o estado de direito haveria demanda por um pluralismo crescente e uma participação mais ampla no processo político O círculo virtuoso nasce não só da lógica inerente do pluralismo e do estado de direito mas também porque instituições políticas inclusivas tendem a sustentar instituições econômicas inclusivas o que leva a uma distribuição de renda mais igualitária conferindo mais poder e autonomia a um amplo segmento da sociedade e igualando ainda mais as condições de participação no jogo político Limitase assim o que cada indivíduo pode obter mediante a usurpação de poder político e reduzemse os incentivos à recriação de instituições políticas extrativistas Esses fatores foram fundamentais na emergência de instituições políticas verdadeiramente democráticas na GrãBretanha O pluralismo cria também um sistema mais aberto permitindo o florescimento de mídias independentes e facilitando para os grupos interessados na continuidade das instituições inclusivas as tarefas de tomar conhecimento e de organizarse contra eventuais ameaças a essas instituições É extremamente significativo que o Estado inglês tenha abandonado a censura à imprensa a partir de 1688 Aliás os meios de comunicação desempenharam um papel de importância similar no empoderamento da população em geral e na continuidade do círculo virtuoso de desenvolvimento institucional nos Estados Unidos como veremos neste capítulo Embora o círculo virtuoso crie uma tendência para que as instituições inclusivas persistam não é inevitável nem irreversível Tanto na GrãBretanha quanto nos Estados Unidos as instituições políticas e econômicas inclusivas enfrentaram não poucos desafios Em 1745 o Jovem Pretendente conseguiu chegar com um exército até Derby a apenas 160 quilômetros de Londres a fim de derrubar as instituições políticas forjadas durante a Revolução Gloriosa Foi derrotado porém Mais consideráveis que os desafios de fora eram os potenciais desafios vindos de dentro que também poderiam ter levado ao solapamento das instituições inclusivas Como vimos no contexto do Massacre de Peterloo em Manchester 1819 página 162 e como veremos em mais detalhes em seguida as elites políticas britânicas chegaram a cogitar o uso da repressão para evitar ter de abrir ainda mais o sistema político mas recuaram a tempo Analogamente as instituições políticas e econômicas inclusivas nos Estados Unidos enfrentaram sérias dificuldades que poderiam perfeitamente têlas vencido mas não foi o caso E claro não estava predeterminado que tais desafios seriam superados É graças não só ao círculo virtuoso mas também ao reconhecimento do caráter contingente dos rumos da história que as instituições inclusivas britânicas e norte americanas conseguiram sobreviver e ganhar força substancial ao longo do tempo A LENTA MARCHA DA DEMOCRACIA A reação à Lei Negra mostrou aos britânicos comuns que eles tinham mais direitos do que jamais haviam se dado conta Podiam defender seus direitos tradicionais e interesses econômicos nos tribunais e no Parlamento por meio de petições e lobby Contudo tal pluralismo não havia ainda gerado uma democracia de fato A maioria dos homens adultos não tinha acesso ao voto nem as mulheres e subsistiam ainda diversas desigualdades nas estruturas democráticas existentes Tudo isso mudaria O círculo virtuoso de instituições inclusivas não só preserva o que já foi conquistado como também abre passagem para maior inclusão Muito provavelmente a elite britânica do século XVIII se defrontaria com sérios desafios ao seu controle do poder político Esse segmento da população havia ascendido ao poder arrostando o direito divino dos reis e preparando o terreno para a participação popular na política mas em seguida concedera esse direito a apenas uma pequena minoria Era só uma questão de tempo até que uma parcela cada vez maior da população reivindicasse o direito de tomar parte do processo político E nos anos que transcorreram até 1831 foi o que aconteceu As três primeiras décadas do século XIX assistiram a uma crescente agitação social na GrãBretanha basicamente em reação às crescentes desigualdades econômicas e à demanda por parte das massas desprovidas de direitos de maior representação política Às Revoltas Luditas de 18111816 nas quais os trabalhadores combateram a introdução de novas tecnologias que a seu ver levariam à redução de seus salários seguiramse outras em que se exigiam explicitamente direitos políticos a Revolta de Spa Fields Londres em 1816 e o Massacre de Peterloo Manchester em 1819 Na Revolta Swingo de 1830 trabalhadores rurais protestaram contra a queda do padrão de vida bem como contra a introdução de novas tecnologias Enquanto isso em Paris explodia a Revolução de Julho de 1830 Começava a se formar entre as elites um consenso de que o descontentamento estava chegando a um ponto crítico e a única maneira de apagar o estopim da agitação social e evitar uma revolução seria atendendo as demandas das massas e promovendo uma reforma parlamentar Não foi nenhuma surpresa portanto que a eleição de 1831 tenha girado praticamente em torno de um único tema reforma política Os Whigs quase 100 anos depois de Sir Robert Walpole mostraramse bem mais simpáticos aos desejos das pessoas comuns e aderiram à campanha pela ampliação dos direitos de voto Contudo isso implicou dilatação apenas ligeira do eleitorado O sufrágio universal ainda que só para os homens não estava em pauta Os Whigs venceram as eleições e seu líder Conde Grey tornouse primeiroministro O conde não era nenhum radical muito pelo contrário Ele e os Whigs pressionaram por reformas não por acreditarem que maior poder de voto seria algo mais justo nem por desejarem compartilhar o poder A democracia britânica não foi uma oferta da elite As massas basicamente se apropriaram dela beneficiadas pela maior autonomia que os processos políticos ocorridos na Inglaterra e no resto da GrãBretanha havia vários séculos lhes foram conferindo Foram encorajadas pela mudança de natureza das instituições políticas deflagrada pela Revolução Gloriosa As reformas foram concedidas porque a elite acreditava que elas seriam o único modo de assegurar a continuidade de seu poder mesmo que um pouco atenuado O Conde Grey em seu célebre discurso ao Parlamento em favor de reformas políticas disseo muito claramente Ninguém se opõe a parlamentos anuais sufrágio universal e voto secreto mais do que eu Meu objetivo não é favorecer mas pôr um ponto final em tais esperanças e projetos O princípio da minha reforma é prevenir a necessidade de uma revolução reformar para preservar não derrubar As massas não almejavam ao voto por si mesmo queriam ter uma voz que lhes permitisse defender seus interesses Isso foi bem compreendido pelo movimento cartista que encabeçou a campanha pelo sufrágio universal a partir de 1838 tendo tirado seu nome da Carta do Povo a qual por sua vez remetia a um paralelo com a Carta Magna O cartista J R Stephens explicou por que o sufrágio universal e o voto de todos os cidadãos eram cruciais para as massas A questão do sufrágio universal é muito simples e fundamental Quero dizer com sufrágio universal que todo trabalhador desta terra tem direito a um bom casaco nas costas um bom chapéu na cabeça um bom teto para abrigo de sua família e um bom jantar em sua mesa Stephens havia entendido bem que o sufrágio universal era a maneira mais duradoura de distribuir o poder pelas massas britânicas e assegurar um casaco um chapéu um teto e um bom jantar para cada trabalhador No fim das contas o Conde Grey conseguiu ao mesmo tempo assegurar a aprovação da Primeira Lei da Reforma e desarmar os ímpetos revolucionários sem nenhuma medida extrema em direção ao sufrágio universal As reformas de 1832 foram modestas limitandose a duplicar o direito de voto de 8 para cerca de 16 da população de homens adultos de cerca de 2 a 4 da população como um todo Aproveitaram para livrarse ainda dos municípios podres e conferir representação independente para os centros industriais em formação como Manchester Leeds e Sheffield Ainda permaneceram porém muitas questões por resolver Assim logo viriam à tona novas demandas pela ampliação do direito de voto e mais agitação social às quais se seguiria o aprofundamento das reformas Por que as elites britânicas cederam às reivindicações Por que o Conde Grey entendeu que uma reforma parcial a rigor extremamente parcial seria a única maneira de preservar o sistema Por que não tiveram alternativa senão escolher entre o menor de dois males reforma ou revolução em vez de apenas manter seu poder sem reforma nenhuma Não podiam ter feito o mesmo que fizeram os conquistadores espanhóis na América do Sul o que fariam os monarcas austrohúngaro e russo nas décadas seguintes quando o clamor por reformas chegou às suas terras e o que os próprios britânicos haviam perpetrado no Caribe e na Índia usar a força para asfixiar as reivindicações A resposta a essa pergunta é dada pelo círculo virtuoso As mudanças econômicas e políticas já ocorridas na GrãBretanha tornavam o uso da força para reprimir as demandas ao mesmo tempo desinteressante para a elite e cada vez menos viável Nas palavras de E P Thompson Quando as lutas de 17901832 indicaram que esse equilíbrio havia mudado os governantes da Inglaterra foram defrontados com alternativas alarmantes Poderiam dispensar o estado de direito desmantelar suas elaboradas estruturas constitucionais contradizer sua própria retórica e imporse pela força ou submeterse às próprias regras e abdicar de sua hegemonia foram dando passos hesitantes na primeira direção No fim das contas porém em vez de despedaçar sua própria autoimagem e renegar 150 anos de legalidade constitucional acabaram rendendose à lei Em outras palavras as mesmas forças que induziram a elite britânica a não pôr abaixo o estado de direito no episódio da Lei Negra também a levou a repudiar a repressão e o governo à força que mais uma vez poriam em risco a estabilidade do sistema inteiro Se na tentativa de implementar a Lei Negra a opção pelo enfraquecimento da lei teria solapado o sistema construído pelos mercadores homens de negócios e proprietários rurais na Revolução Gloriosa a instauração de uma ditadura repressora em 1832 o teria posto inteiramente a perder Com efeito os organizadores das manifestações em prol da reforma parlamentar tinham plena consciência da importância do estado de direito e seu simbolismo para as instituições políticas britânicas durante esse período e usavam sua retórica para explicitar esse ponto Uma das primeiras organizações a defender a reforma parlamentar chamavase Hampden Club em homenagem ao primeiro parlamentar a oferecer resistência a Carlos I no caso da tarifa naval evento crítico que desencadeou a primeira grande sublevação contra o absolutismo Stuart como vimos no Capítulo 7 Havia também um feedback positivo dinâmico entre as instituições políticas e econômicas inclusivas que tornava atraente esse curso de ação As instituições econômicas inclusivas acarretavam o desenvolvimento de mercados inclusivos induzindo a uma alocação de recursos muito mais eficiente maior estímulo ao investimento em educação e desenvolvimento de competências e inovações contínuas em tecnologia Todas essas forças estavam em ação na GrãBretanha de 1831 Sufocar as reivindicações populares e promover um golpe contra as instituições políticas inclusivas destruiria também esses ganhos e as elites que se opunham a uma maior democratização e inclusão provavelmente acabariam figurando entre os que perderiam suas fortunas em consequência dessa destruição Outro aspecto desse feedback positivo é que sob instituições políticas e econômicas inclusivas o controle do poder perdia centralidade No Império Austro Húngaro e na Rússia como vimos no Capítulo 8 os monarcas e a aristocracia tinham muito a perder com a industrialização e a reforma Em contrapartida na GrãBretanha do começo do século XIX graças ao desenvolvimento de instituições econômicas inclusivas havia muito menos em jogo não havia servos a coerção no mercado de trabalho era relativamente pequena e poucos monopólios eram protegidos por barreiras alfandegárias Agarrarse ao poder teria sido muito menos rentável para a elite britânica A lógica do círculo virtuoso tornava também cada vez mais impraticáveis eventuais medidas repressivas de novo em virtude do feedback positivo entre as instituições políticas e econômicas inclusivas As instituições econômicas inclusivas levam a uma distribuição de recursos mais equitativa que as extrativistas Desse modo conferem mais poder aos cidadãos de modo geral e criam assim condições mais igualitárias mesmo no tocante à disputa de poder o que torna mais difícil para uma pequena elite esmagar as massas em vez de ceder às suas demandas ao menos algumas delas As instituições inclusivas britânicas também haviam deflagrado a Revolução Industrial e a GrãBretanha já apresentava um elevado índice de urbanização Fazer uso de repressão contra um agrupamento urbano concentrado e parcialmente organizado de pessoas dotadas de algum grau de poder seria muito mais difícil do que reprimir camponeses ou servos dependentes Foi assim que o círculo virtuoso levou a GrãBretanha à Primeira Lei da Reforma em 1832 Mas era só o começo Havia ainda um longo caminho a percorrer rumo a uma democracia efetiva já que em 1832 a elite limitouse a oferecer aquilo que achava que devia e nada mais A questão da reforma parlamentar seria abordada pelo movimento cartista cuja Carta do Povo de 1838 incluía as seguintes cláusulas Um voto para cada homem de 21 anos de plena posse de suas faculdades mentais e que não esteja cumprindo pena por crime Voto a fim de proteger o eleitor no exercício de seu voto Nenhuma qualificação patrimonial para membros do Parlamento permitindo assim que os eleitores votem no nome de sua preferência seja rico ou pobre A remuneração dos membros possibilitando assim que um comerciante trabalhador ou outra pessoa honesta cumpra um mandato quando afastado de seus negócios para atender aos interesses do país Igualdade eleitoral assegurando a mesma representatividade para o mesmo número de eleitores em vez de permitir que eleitorados de pequeno porte engulam os votos dos grandes Parlamentos anuais apresentando assim o mais eficaz empecilho a subornos e chantagens uma vez que se um eleitor pode ser comprado uma vez a cada sete anos mesmo com o voto bolsa alguma teria condições de comprar o eleitorado sob o sistema de sufrágio universal a cada 12 meses e visto que os membros tendo sido eleitos por apenas um ano não teriam como desafiar e trair seus eleitores nesse contexto A palavra voto referese aqui ao voto secreto e ao fim das eleições abertas que até então facilitavam a compra de votos e a intimidação dos eleitores O movimento cartista organizou uma série de manifestações em massa e no decorrer de todo esse período o Parlamento discutiu continuamente a possibilidade de novas reformas Embora o cartismo tenha se desintegrado após 1848 foi sucedido pela União pela Reforma Nacional fundada em 1864 e pela Liga da Reforma fundada em 1865 Em julho de 1866 uma série de manifestações turbulentas no Hyde Park em prol das reformas voltou a colocar o assunto na ordem do dia do debate político A pressão gerou frutos sob a forma da Segunda Lei da Reforma de 1867 que duplicou o número total de eleitores finalmente alçando a classe trabalhadora à condição de maioria em todas as zonas eleitorais urbanas Pouco depois introduziuse o voto secreto e tomaramse medidas para eliminar as práticas eleitorais corruptas como a dos agrados que consistia basicamente numa compra de votos em troca dos quais os eleitores recebiam um agrado em geral dinheiro comida ou álcool O eleitorado novamente dobraria de tamanho com a Terceira Lei da Reforma de 1884 quando o direito de voto chegou a 60 dos homens adultos Após a Primeira Guerra Mundial a Lei da Representação Popular de 1918 estendeu o voto a todos os homens adultos com mais de 21 anos e a toda mulher acima de 30 que fosse contribuinte ou casada com um deles Por fim todas as mulheres receberiam o direito a voto nas mesmas condições dos homens em 1928 As medidas de 1918 negociadas durante a guerra foram fruto de uma permuta entre o governo e as classes trabalhadoras que eram necessárias tanto para lutar quanto para produzir munição Ademais o governo deve ter observado o radicalismo da Revolução Russa Em paralelo ao gradual desenvolvimento de novas instituições políticas inclusivas deuse um movimento em direção à multiplicação de instituições econômicas do mesmo tipo Uma das principais consequências da Primeira Lei da Reforma foi a revogação das leis do trigo em 1846 Como vimos no Capítulo 7 essas leis proibiam a importação de grãos e cereais mantendo seus preços altos e assegurando os lucros dos grandes proprietários de terras Os novos parlamentares de Manchester e Birmingham queriam trigo barato e salários baixos Ganharam e os interesses ruralistas sofreram uma derrota significativa As mudanças no eleitorado e outras dimensões das instituições políticas ocorridas no decorrer do século XIX foram seguidas por novas reformas Em 1871 o primeiro ministro liberal Gladstone abriu os órgãos governamentais a exames públicos tornandoo meritocrático e dando continuidade assim ao processo de centralização política e construção de instituições estatais iniciado durante a era Tudor Os governos desse período tanto liberais quanto tories introduziram considerável volume de legislações para regulamentar o mercado de trabalho Por exemplo as leis de senhores e servos que possibilitavam aos empregadores reduzir a mobilidade de seus empregados foram rechaçadas alterando a natureza das relações trabalhistas em favor dos trabalhadores Durante 19061914 o Partido Liberal sob a liderança de H H Asquith e David Lloyd George começou a usar o Estado para prestar número crescente de serviços públicos entre eles saúde e segurodesemprego pensões financiadas pelo governo salários mínimos e o compromisso com a tributação redistributiva Em decorrência dessas modificações fiscais a parcela do produto interno representada pela arrecadação de impostos mais que dobrou nas últimas três décadas do século XIX voltando a duplicar nas três primeiras décadas do século XX O sistema fiscal também se tornou mais progressivo de modo que os mais ricos arcavam com um ônus maior Enquanto isso o sistema educacional que até então era destinado basicamente à elite ou era comandado por denominações religiosas ou exigia dos pobres o pagamento de taxas tornouse mais acessível às massas a Lei da Educação de 1870 estabeleceu pela primeira vez o compromisso do governo com a prestação sistemática de educação universal A educação tornouse inteiramente gratuita em 1891 Em 1893 a idade para encerrar os estudos foi definida em 11 anos Em 1899 foi aumentada para 12 e introduziramse cláusulas especiais para os filhos de famílias necessitadas Em decorrência dessas mudanças a proporção de crianças de 10 anos matriculadas na escola que em 1870 estava em decepcionantes 40 saltou para 100 em 1900 Por fim a Lei da Educação de 1902 promoveu considerável expansão dos recursos destinados às escolas e instituiu as grammar schools escolas de gramática que viriam a ser o fundamento da educação secundária na GrãBretanha Com efeito o caso britânico uma ilustração do círculo virtuoso de instituições inclusivas constitui um exemplo de círculo virtuoso gradual As transformações políticas deramse inequivocamente no sentido de instituições políticas mais inclusivas e foram fruto das reivindicações das massas dotadas de cada vez mais poder e autonomia Por outro lado ocorreram de forma paulatina A cada década um novo passo às vezes menor outras vezes maior era dado rumo à democracia Cada passo foi cercado de conflitos e o resultado concreto de cada um foi contingente Entretanto o círculo virtuoso gerou forças que reduziram os ganhos dos que se agarrassem ao poder além de estimular o estado de direito tornando progressivamente mais difícil fazer uso de força contra aqueles que exigiam aquilo que essas mesmas elites haviam exigido dos monarcas Stuart Foi se tornando cada vez menos provável que o conflito degenerasse em revolução e aumentaram as chances de que fosse decidido em favor de maior inclusão Há grande virtude nesse tipo de transformação gradual é menos ameaçadora para a elite que a derrubada geral do sistema Cada passo é pequeno e faz mais sentido ceder a uma pequena reivindicação do que criar uma confrontação de grande porte o que explica em parte como as leis do trigo puderam ser abolidas sem mais querelas Em 1846 os proprietários rurais já não conseguiam mais controlar a legislação no Parlamento graças à Primeira Lei da Reforma Entretanto se em 1832 a ampliação do eleitorado a reforma dos burgos podres e a revogação das leis do trigo tivessem sido propostas todas ao mesmo tempo os proprietários rurais teriam oferecido resistência muito maior A realização primeiro de reformas políticas limitadas para só depois a abolição das leis do trigo entrar em pauta desarmou o conflito A transformação gradual também evitou aventuras por territórios desconhecidos Uma derrubada violenta do sistema obriga a que se erga algo inteiramente novo no lugar do que foi removido Foi o que aconteceu no caso da Revolução Francesa quando as primeiras experiências com a democracia levaram primeiro ao Terror retornando depois duas vezes à monarquia antes de finalmente conduzir à Terceira República francesa em 1870 Foi o caso também da Revolução Russa em que os anseios de muitos por um sistema mais igualitário que o do Império Russo engendrou uma ditadura unipartidária que se revelaria muito mais violenta sangrenta e viciosa do que o regime que viera substituir A reforma gradual era difícil nessas sociedades exatamente por faltar aí o pluralismo necessário e por serem altamente extrativistas Foi o pluralismo decorrente da Revolução Gloriosa e o estado de direito por ela introduzido que tornaram a mudança progressiva possível e desejável na GrãBretanha O comentarista inglês Edmund Burke conservador e ferrenho opositor da Revolução Francesa escreveu em 1790 É com infinita cautela que um homem deve arriscarse a pôr abaixo um edifício que em alguma medida tolerável respondeu por séculos aos objetivos comuns da sociedade ou a proporse a reerguêlo sem ter diante dos olhos modelos e padrões de comprovada utilidade Em termos gerais Burke equivocouse A Revolução Francesa veio substituir um edifício condenado e abriu caminho para instituições inclusivas não só na França mas em boa parte da Europa Ocidental Por outro lado sua cautela não era inteiramente despropositada O processo gradual da reforma política britânica iniciado em 1688 ganharia velocidade décadas após a morte de Burke e deveria sua maior eficácia justamente ao fato de sua natureza paulatina tornálo mais poderoso irresistível e em última instância duradouro DESMONTANDO TRUSTES As instituições inclusivas nos Estados Unidos tiveram origem nas lutas na Virginia em Maryland e nas duas Carolinas durante o período colonial páginas 1421 e foram reforçadas pela Constituição americana com seu sistema de restrições e separação de poderes A Constituição contudo não assinalou o fim de desenvolvimento das instituições inclusivas Como na GrãBretanha elas foram reforçadas por um processo de feedback positivo baseado no círculo virtuoso Em meados do século XIX todos os homens brancos mulheres e negros não podiam votar nos Estados Unidos As instituições econômicas tornaramse mais inclusivas por exemplo com a promulgação da Lei da Propriedade Rural em 1862 página 28 que tornou as terras de fronteira disponíveis aos colonos em potencial em vez de reserválas para as elites políticas Do mesmo modo como na GrãBretanha porém os desafios às instituições inclusivas nunca deixaram de existir de todo O fim da Guerra de Secessão americana marcou o início de um surto de crescimento econômico acelerado no Norte À medida que ferrovias indústria e comércio se expandiam algumas pessoas amealhavam vastas fortunas Estimulados pelo êxito econômico esses homens e suas empresas foram se tornando cada vez mais inescrupulosos e acabaram sendo apelidados de Barões Ladrões em virtude de suas práticas calculistas visando a consolidar monopólios e impedir a entrada de possíveis concorrentes no mercado ou ao menos de que estes encontrassem condições iguais de atuação Um dos mais notórios deles foi Cornelius Vanderbilt célebre pelas palavras De que me importa a lei Não tenho poder Outro desse grupo foi John D Rockefeller que fundou a Standard Oil Company em 1870 livrouse rapidamente dos adversários em Cleveland e tentou monopolizar o transporte e o varejo de petróleo e derivados Em 1882 havia criado um gigantesco monopólio na linguagem de hoje um truste Em 1890 a Standard Oil controlava 88 do fluxo de petróleo refinado nos Estados Unidos e Rockefeller tornouse o primeiro bilionário do mundo em 1916 Charges da época apresentam a Standard Oil como um polvo envolvendo não só a indústria petrolífera mas também o Congresso americano Quase tão infame foi John Pierpont Morgan fundador do moderno conglomerado bancário JP Morgan que mais tarde após uma série de fusões ao longo das décadas viria a ser o JPMorgan Chase Junto com Andrew Carnegie Morgan fundou a US Steel Company em 1901 primeira corporação com valor capitalizado de mais de US1 bilhão e de longe a maior siderúrgica do mundo Na década de 1890 começaram a surgir grandes trustes em quase todos os setores da economia muitos dos quais controlavam mais de 70 do mercado em seus respectivos segmentos Aí estavam incluídos muitos nomes familiares como Du Pont Eastman Kodak e International Harvester Tradicionalmente os Estados Unidos pelo menos no Norte e no Meio Oeste contavam com mercados relativamente competitivos e eram mais igualitários do que outras áreas do país sobretudo o Sul Nesse período porém a competição cedeu lugar ao monopólio e a desigualdade de riqueza deu um salto O pluralista sistema político americano já conferia a um amplo segmento de sua sociedade suficiente autonomia e poder para insurgirse contra tais abusos As vítimas das práticas monopolísticas dos Barões Ladrões ou os que objetavam à sua dominação inescrupulosa das indústrias começaram a organizarse contra sua atuação Assim se formou o movimento populista e em seguida o progressista O movimento populista nasceu de uma prolongada crise agrária que se abateu sobre o MeioOeste a partir de fins da década de 1860 A National Grange of the Order of Patrons of Husbandry Associação Nacional da Ordem dos Patronos da Agricultura cujos membros eram conhecidos como grangers fazendeiros foi fundada em 1867 para mobilizar os proprietários rurais contra práticas comerciais injustas e discriminatórias Em 1873 e 1874 os grangers conquistaram o controle de 11 assembleias legislativas no MeioOeste e o descontentamento do setor culminou na formação em 1892 do Partido Populista que obteve 85 da votação popular nas eleições presidenciais de 1892 Nas duas eleições seguintes os populistas apoiaram o candidato democrata derrotado William Jennings Bryan que adotou muitas de suas causas A oposição popular à disseminação dos trustes estava agora organizada na tentativa de contraporse à influência exercida por Rockefeller e outros Barões Ladrões na política nacional Pouco a pouco esses movimentos políticos começaram a exercer um impacto nas atitudes políticas e em seguida na legislação especialmente no tocante ao papel do Estado na regulamentação dos monopólios A primeira lei importante foi a Lei do Comércio Interestadual de 1887 que criou a Comissão do Comércio Interestadual e marcou o início do desenvolvimento da regulamentação federal do setor rapidamente seguida pela Lei Sherman Antitruste de 1890 A Lei Sherman até hoje uma peçachave da legislação antitruste americana seria o fundamento dos ataques aos trustes dos Barões Ladrões Importantes iniciativas contra esses trustes deramse após a eleição de presidentes comprometidos com a reforma e a imposição de restrições ao poder dos Barões Ladrões Theodore Roosevelt 19011909 William Taft 19091913 e Woodrow Wilson 19131921 Uma força política crucial por trás do movimento antitruste e pela imposição de uma regulamentação federal da indústria foi de novo o voto rural As primeiras tentativas de estados específicos ainda na década de 1870 de regulamentar as ferrovias vieram de organizações de fazendeiros Com efeito quase todas as 59 petições relacionadas a trustes enviadas ao Congresso antes da promulgação da Lei Sherman partiram de estados agrícolas provenientes de organizações como a Farmers Union Sindicato dos Fazendeiros Farmers Alliance Aliança dos Fazendeiros Farmers Mutual Benefit Association Associação para Benefício Mútuo dos Fazendeiros e Patrons of Animal Husbandry Patronos da Criação de Animais Os proprietários rurais encontraram um interesse coletivo na oposição às práticas monopolísticas da indústria Das cinzas dos populistas que entraram em vertiginoso declínio após jogar seu peso no respaldo aos democratas emergiram os progressistas um movimento heterogêneo de reforma com ênfase em muitas das mesmas questões A princípio aglutinaramse em torno da figura de Teddy Roosevelt vicepresidente de William McKinley que assumiu o mandato presidencial após o assassinato deste em 1901 Antes de ascender à presidência Roosevelt fora um obstinado governador de Nova York tendo trabalhado com afinco pela eliminação da corrupção na política e da máquina partidária Em seu primeiro pronunciamento perante o Congresso Roosevelt concentrou sua atenção nos trustes Defendeu que a prosperidade dos Estados Unidos baseavase na economia de mercado e na engenhosidade dos homens de negócios mas ao mesmo tempo há males graves e reais e uma arraigada crença do povo americano de que as grandes corporações conhecidas como trustes são em alguns de seus aspectos e tendências nocivas ao bemestar geral Tal certeza deriva não de um espírito de inveja ou deslealdade nem da falta de orgulho pelas significativas conquistas industriais que elevaram este país à vanguarda das nações que disputam a supremacia comercial Tampouco procede de uma falta de apreciação inteligente da necessidade de atender com novos métodos a condições comerciais cambiantes e sempre novas nem da ignorância do fato de que a combinação de capital no esforço de realizar grandes coisas é necessária quando o progresso mundial requer que grandes coisas sejam realizadas Baseiase isso sim na mais sincera convicção de que combinação e concentração devem ser não proibidas mas supervisionadas e dentro de limites razoáveis controladas E tratase a meu ver de uma convicção acertada Ele prosseguiu Deveria do mesmo modo figurar entre os objetivos daqueles que anseiam por melhores condições sociais livrar o mundo dos negócios de crimes de astúcia tanto quanto livrar o corpo político como um todo de crimes de violência Sua conclusão foi que no interesse de todo o povo a nação deveria sem interferir no poder de cada estado nas questões específicas assumir também o poder de supervisão e regulamentação de todas as corporações envolvidas em negócios interestaduais principalmente quando a corporação derivar uma parte de sua riqueza da existência de algum elemento ou tendência monopolísticos em sua constituição Roosevelt propôs que o Congresso instituísse uma agência federal com poder para investigar as questões relacionadas às grandes corporações e que se necessário se lançasse mão de uma emenda constitucional para a criação de tal órgão Em 1902 Roosevelt já havia usado a Lei Sherman para dividir a Northern Securities Company afetando os interesses da JP Morgan processos posteriores foram movidos contra Du Pont American Tobacco Company e Standard Oil Company Roosevelt ainda reforçaria a Lei do Comércio Interestadual com a Lei Hepburn de 1906 ampliando os poderes da Comissão do Comércio Interestadual o que lhe permitiria sobretudo inspecionar a contabilidade de ferrovias e estenderia sua autoridade para novas esferas O sucessor de Roosevelt William Taft processou os trustes com assiduidade ainda maior sua empreitada tendo por auge o desmembramento da Standard Oil Company em 1911 Taft também promoveu outras reformas significativas como a introdução de um imposto de renda federal que acompanhou a ratificação da Décima Sexta Emenda em 1913 O apogeu das reformas progressistas ocorreu com a eleição de Woodrow Wilson em 1912 Em seu livro lançado em 1913 A nova liberdade Wilson assinala Se o monopólio persistir terá sempre as rédeas do governo nas mãos Não guardo expectativas de que verei o monopólio conter a si mesmo Se houver neste país homens de porte grande o bastante para apoderarse do governo dos Estados Unidos eles o farão Wilson empenhouse em aprovar a Lei Cayton Antitruste em 1914 fortalecendo a Lei Sherman e criando a Comissão para o Comércio Federal a qual por sua vez assegurava a aplicação da Lei de Clayton Ademais aproveitando o impulso dado pela investigação empreendida pela Comissão Pujo liderada pelo congressista da Louisiana Arsene Pujo acerca dos trustes financeiros money trusts isto é a invasão da indústria financeira pelos monopólios Wilson tratou de intensificar a regulamentação do setor Em 1913 criou o Federal Reserve Board Conselho do Banco Central responsável por regular as atividades monopolistas no setor financeiro A ascensão dos Barões Ladrões e seus trustes entre o fim do século XIX e o começo do XX vem reiterar que como já salientamos no Capítulo 3 a presença de mercados não constitui em si garantia da existência de instituições inclusivas Os mercados podem vir a ser dominados por umas poucas empresas que cobrem preços exorbitantes e bloqueiam a entrada de novas tecnologias e rivais mais eficientes Os mercados quando abandonados à própria sorte podem perder o traço inclusivo deixandose cada vez mais dominar pelos poderosos em termos econômicos e políticos As instituições econômicas inclusivas demandam não mercados apenas mas mercados que sejam inclusivos e capazes de proporcionar condições e oportunidades econômicas igualitárias para a maioria da população A disseminação de monopólios respaldados pelo poder político da elite vai de encontro a esse ideal Por outro lado a reação aos trustes demonstra também que quando as instituições políticas são inclusivas geram uma força de resistência a eventuais afastamentos da inclusão nos mercados É o círculo virtuoso em ação as instituições econômicas inclusivas constituem a base sobre a qual as instituições políticas inclusivas podem florescer ao passo que estas restringem possíveis prejuízos às primeiras A derrocada dos trustes nos Estados Unidos em contraste com o que vimos no México páginas 2930 ilustra esse aspecto do círculo virtuoso Enquanto os mexicanos não contam com nenhum corpo político que restrinja o monopólio de Carlos Slim ao longo do último século os americanos lançaram mão incontáveis vezes das leis Sherman e Clayton para cercear a formação de trustes monopólios e cartéis garantindo assim que os mercados permaneçam inclusivos A experiência americana na primeira metade do século XX põe em evidência também a vital importância da liberdade de imprensa para o empoderamento de amplos segmentos da sociedade e por conseguinte o círculo virtuoso Em 1906 Roosevelt cunhou o termo muckraker baseado em um personagem literário o homem com o ancinho para juntar esterco muckrake em O peregrino de Bunyanp para descrever o que a seu ver constituía um jornalismo importuno A expressão pegou e passou a referirse àqueles jornalistas que lançando mão de métodos invasivos logravam expor tanto os excessos dos Barões Ladrões quanto a corrupção nas esferas políticas regional e federal Talvez o mais famoso deles tenha sido Ida Tarbell cuja History of Standard Oil Company História da Standard Oil Company de 1904 exerceu influência decisiva sobre a opinião pública colocandoa contra Rockefeller e seus interesses comerciais o que culminaria no desmembramento da Standard Oil em 1911 Outro desses jornalistas investigativos foi o advogado e escritor Louis Brandeis que mais tarde seria designado juiz da Suprema Corte americana pelo Presidente Wilson Brandeis denunciou uma série de escândalos financeiros em seu livro Other Peoples Money and How Bankers Use It O dinheiro dos outros e como os banqueiros o usam e exerceu considerável influência sobre a Comissão Pujo O magnata da imprensa William Randolph Hearst também desempenhou importante papel denunciativo Sua revista The Cosmopolitan publicou em 1906 uma série de artigos intitulada A Traição do Senado de autoria de David Graham Phillips que galvanizou a campanha pela adoção de eleições diretas para o Senado outra reforma progressista crucial que se concretizou com a promulgação em 1913 da Sétima Emenda à constituição americana Esses jornalistas investigativos foram fundamentais para induzir os políticos a tomar medidas contra os trustes Embora fossem detestados pelos Barões Ladrões as instituições políticas dos Estados Unidos os impediam de eliminálos ou silenciálos As instituições políticas inclusivas ensejam o florescimento de uma imprensa livre a qual por sua vez torna possível expor eventuais ameaças às instituições políticas e econômicas inclusivas ao conhecimento do público e oferecerlhes resistência Já sob instituições políticas extrativistas seja no absolutismo ou em governos ditatoriais tamanha liberdade é impossível o que permite aos regimes extrativistas cortar pela raiz a formação de qualquer oposição séria As informações divulgadas pela imprensa livre foram evidentemente cruciais durante a primeira metade do século XX nos Estados Unidos Sem elas a opinião pública norteamericana não teria tomado conhecimento da real extensão do poder e dos abusos dos Barões Ladrões nem teria se mobilizado contra os seus trustes COMPRANDO O JUIZ Franklin D Roosevelt candidato democrata e primo de Teddy Roosevelt foi eleito presidente em 1932 em meio à Grande Depressão Chegou ao poder com suficiente aprovação popular para implementar um ambicioso leque de políticas de combate à recessão Por ocasião de sua posse no começo de 1933 um quarto da força de trabalho encontravase desempregada e muitos estavam jogados na pobreza A produção industrial havia caído por mais da metade desde a irrupção da crise em 1929 e os investimentos estavam em colapso As políticas propostas por Roosevelt para enfrentar a situação ficaram conhecidas em seu conjunto como New Deal Ele havia conquistado uma vitória sólida com 57 dos votos e o Partido Democrata era majoritário tanto no Congresso quanto no Senado o que era mais do que bastante para a aprovação das medidas relativas ao New Deal Entretanto algumas dessas leis tiveram a constitucionalidade questionada e foram levadas a julgamento na Suprema Corte onde o capital eleitoral de Roosevelt não exercia influência quase nenhuma Um dos pilares centrais do New Deal era a Lei Nacional de Recuperação Industrial que tratava em seu Título I da recuperação industrial O Presidente Roosevelt e sua equipe acreditavam que a restrição da competição industrial a ampliação dos direitos dos trabalhadores de formar sindicatos e a regulamentação dos padrões de trabalho eram essenciais para o programa de recuperação O Título II instituía a Secretaria de Obras Públicas cujos projetos de infraestrutura incluíam marcos como a estação ferroviária da Thirtieth Street na Filadélfia a Ponte Triboroughq a Represa Grand Couleer e a Overseas Highway que ligaria Key West na Flórida ao continente Sancionada pelo Presidente Roosevelt em 16 de junho de 1933 a Lei Nacional de Recuperação Industrial imediatamente começou a ser questionada nos tribunais Em 27 de maio de 1935 a Suprema Corte decidiuse por unanimidade pela inconstitucionalidade de seu Título I Seu veredicto postulava em tom solene que condições extraordinárias podem exigir soluções extraordinárias No entanto condições extraordinárias não criam nem ampliam o poder constitucional Antes que saísse a decisão da Suprema Corte Roosevelt havia passado à etapa seguinte de seu plano e subscrevera a Lei da Previdência Social responsável pela introdução do moderno Estado de bemestar social nos Estados Unidos com pagamento de pensão para aposentados benefícios para os desempregados auxílio a famílias com dependentes menores de idade e alguns serviços relacionados a saúde pública e deficiências Aprovou também a Lei Nacional de Relações Trabalhistas que reforçou os direitos dos trabalhadores de organizar sindicatos realizar negociações coletivas e entrar em greve contra seus empregadores Todas essas medidas também foram questionadas na Suprema Corte Enquanto abriam caminho pelos meandros do Judiciário Roosevelt era reeleito em 1936 com enorme apoio popular 61 dos votos Com popularidade recorde Roosevelt não toleraria que a Suprema Corte desmantelasse seu programa de políticas públicas e expôs seus planos em um de seus Fireside Chatss transmitido ao vivo pelo rádio em 9 de março de 1937 Começou assinalando que em seu primeiro mandato políticas imprescindíveis haviam passado por um fio pelo crivo da Suprema Corte E prosseguiu Lembrome daquela noite de março quatro anos atrás quando me dirigi em rede nacional a vocês pela primeira vez Estávamos na época em meio a uma profunda crise bancária Pouco depois com autorização do Congresso pedimos à população que entregasse ao governo federal todo o ouro de que dispunha privadamente dólar por dólar A recuperação que presenciamos hoje é a prova cabal do acerto daquela política Quando porém quase dois anos mais tarde foi levada a julgamento pela Suprema Corte quase não teve sua constitucionalidade ratificada foram cinco votos contra quatro Bastaria um único voto diferente para que esta imensa nação se visse novamente mergulhada no mais absoluto caos Com efeito quatro juízes decidiram que o direito estabelecido por contrato privado de arrancar o couro de alguémt era mais sagrado que os objetivos centrais da Constituição de estabelecer uma nação duradoura Obviamente era um risco que não valia a pena correr outra vez Roosevelt continuou Na quintafeira passada descrevi o sistema de governo americano como um conjunto de três cavalos fornecido pela Constituição ao povo americano para arar suas terras Os três animais são naturalmente os três poderes o Legislativo o Executivo e o Judiciário Dois dos cavalos o Congresso e o Executivo trabalham hoje em sintonia enquanto o terceiro insiste em puxar para o outro lado Roosevelt salientou em seguida que a Constituição americana a rigor não concedia à Suprema Corte o direito de questionar a constitucionalidade da legislação embora esse papel tivesse sido assumido em 1803 Na época o Juiz Bushrod Washington havia estipulado que a Suprema Corte decidisse em favor da validade de determinada lei até que a violação da Constituição por ela perpetrada fosse comprovada sem sombra de dúvida Então atacou Nos últimos quatro anos a sólida regra de conferir aos estatutos o benefício da dúvida foi deixada de lado A Suprema Corte tem funcionado não como órgão judicial mas como agência legislativa Roosevelt defendeu que dispunha de suficiente capital eleitoral para mudar essa situação e que após cuidadosa consideração das reformas a propor o único método claramente constitucional é injetar sangue novo em todas as instâncias do nosso udiciário Alegou que os membros da Suprema Corte estavam sobrecarregados e que a carga de trabalho era excessiva para os mais velhos justamente aqueles que se opunham às suas leis Propôs então que todos os magistrados tivessem aposentadoria compulsória aos 70 anos e que como presidente ele gozasse de autonomia para nomear até seis novos juízes Essa ideia apresentada por Roosevelt como Projeto de Reorganização do Judiciário teria bastado para remover os magistrados empossados anteriormente por governos mais conservadores os mais ferrenhos opositores do New Deal Embora Roosevelt tivesse habilmente tentado obter apoio popular para essa medida as pesquisas de opinião indicavam que apenas cerca de 40 da população eram favoráveis ao seu plano Louis Brandeis era àquela altura juiz da Suprema Corte Embora simpatizasse com boa parte da legislação proposta por Roosevelt posicionou se contra as tentativas presidenciais de erodir o poder do mais alto tribunal do país e suas alegações de sobrecarga dos magistrados Ainda que os democratas de Roosevelt contassem com ampla maioria nas duas casas do Congresso a Câmara dos Representantes mais ou menos recusouse a lidar com o projeto de lei do presidente Roosevelt tentou então o Senado e o projeto foi enviado para o Comitê Judiciário da casa que realizou audiências de temperatura elevadíssima nas quais foram postas em pauta as mais variadas opiniões a respeito do projeto que acabaria retornando ao plenário do Senado com um parecer negativo segundo o qual o projeto constituiria um desnecessário vão e profundamente perigoso abandono dos princípios constitucionais sem qualquer precedente ou justificativa Por 70 votos a 20 o Senado decidiu devolvêlo ao Comitê para ser reescrito e todos os elementos de compra de juízes foram eliminados Roosevelt não conseguiria livrarse das restrições impostas pela Suprema Corte ao seu poder Não obstante tais limites porém houve concessões e as Leis da Previdência Social e das Relações Trabalhistas foram julgadas constitucionais Mais importante que o destino dessas duas leis entretanto foi a lição geral que se extraiu desse episódio Instituições políticas inclusivas não só impedem a anulação das instituições econômicas inclusivas como também resistem às tentativas de prejudicar sua própria continuidade Era do interesse imediato do Congresso e do Senado democratas que a Suprema Corte fosse dobrada e se assegurasse assim a sobrevivência da legislação relacionada ao New Deal Todavia do mesmo modo como as elites políticas britânicas no começo do século XVIII compreenderam que a suspensão do estado de direito poria em risco os ganhos que haviam arrancado da monarquia os congressistas e senadores americanos entenderam que caso o presidente pudesse reduzir a independência do Judiciário o equilíbrio de forças no sistema que protegia também a eles do presidente e assegurava a continuidade das instituições políticas pluralistas seria igualmente solapado Talvez Roosevelt chegasse em seguida à conclusão de que a obtenção da maioria no Legislativo demandava tempo e negociações demais e que melhor seria então governar por decreto derrubando completamente por terra o pluralismo e o sistema político americano Isso os congressistas sem dúvida não aprovariam mas Roosevelt então apelaria diretamente à população asseverando que o Congresso constituía um empecilho à tomada das iniciativas necessárias para fazer frente à Depressão Talvez lançasse mão da polícia para fechar o Congresso Parece um exagero Foi exatamente isso o que aconteceu no Peru e na Venezuela na década de 1990 Os Presidentes Fujimori e Chávez apelaram para seu capital eleitoral para fechar as portas dos respectivos Congressos que se recusavam a cooperar e em seguida reescreveram suas Constituições com reforço significativo dos poderes do presidente Foi exatamente o medo que os que compartilham o poder sob instituições políticas pluralistas têm de enveredar por esse caminho traiçoeiro que impediu tanto Walpole de manipular os tribunais britânicos na década de 1720 quanto o Congresso norteamericano de avalizar o plano de Roosevelt para assegurar o apoio da Suprema Corte Roosevelt defrontouse com o poder dos círculos virtuosos Todavia nem sempre essa lógica entra em funcionamento sobretudo em sociedades que têm algumas características inclusivas mas são extrativistas em sentido mais amplo Já vimos essa dinâmica em Roma e Veneza Outra ilustração é dada pela comparação entre a tentativa malograda de Roosevelt de comprar a Suprema Corte e projetos similares na Argentina onde tiveram lugar basicamente as mesmas disputas mas no contexto de instituições políticas e economicamente predominantemente extrativistas A Constituição argentina de 1853 criou uma Suprema Corte com atribuições análogas às de sua contraparte norteamericana Uma decisão de 1887 permitiu que a corte argentina assumisse o mesmo papel da americana com relação ao julgamento da constitucionalidade de leis específicas Em tese a Suprema Corte poderia ter se tornado um dos mais importantes componentes das instituições políticas inclusivas na Argentina mas o restante do sistema político e econômico mantevese altamente extrativista e não se chegou a promover no país nem o empoderamento de amplos segmentos da sociedade nem o pluralismo Como nos Estados Unidos a função constitucional da Suprema Corte também seria desafiada na Argentina Em 1946 Juan Domingo Perón foi eleito presidente por vias democráticas Perón excoronel havia ganhado destaque no cenário nacional pela primeira vez após um golpe militar em 1943 quando fora nomeado Ministro do Trabalho Nesse cargo costurou com os sindicatos e o movimento trabalhista uma coalizão política que seria crucial para sua eleição presidencial Logo após a vitória membros governistas da Câmara dos Deputados propuseram o impeachment de quatro dos cinco membros da Suprema Corte Várias acusações foram levantadas contra o tribunal Uma delas dizia respeito ao fato de este haver inconstitucionalmente aceitado a legalidade dos dois regimes militares de 1930 e 1943 o que não deixa de ser uma ironia visto que Perón fora um dos protagonistas do segundo golpe Outra tratava das leis derrubadas pela Corte do mesmo modo como fazia sua correspondente americana Em especial imediatamente antes da eleição de Perón para a presidência a Corte havia se decidido pela inconstitucionalidade do novo quadro de relações trabalhistas de Perón Assim como a Suprema Corte americana havia sido alvo de pesadas críticas por parte de Roosevelt em sua campanha de 1936 pela reeleição Perón fez o mesmo em sua campanha de 1946 Nove meses depois de deflagrado o processo de impeachment a Câmara de Deputados depôs três dos juízes tendo o quarto já abdicado do cargo O Senado aprovou a ação e Perón nomeou então quatro novos juízes O enfraquecimento da Corte teve o efeito evidente de libertar Perón de toda e qualquer restrição política Agora ele podia exercer um poder ilimitado do mesmo modo como fizeram os regimes militares na Argentina antes e depois de seu mandato presidencial Seus juízes recémnomeados por exemplo julgaram constitucional a condenação de Ricardo Balbín líder do principal partido de oposição a Perón o Partido Radical por desrespeito ao presidente De fato Perón governou como ditador Desde a bemsucedida compra da Suprema Corte por Perón tornouse norma na Argentina que cada novo presidente escolhesse a dedo seus próprios juízes para o mais alto tribunal do país Dessa maneira esvaziouse a instituição política que deveria impor limites ao poder do Executivo O regime de Perón foi derrubado do poder por outro golpe em 1955 sendo seguido por uma longa sequência de governos militares e civis alternandose no poder tanto uns quanto os outros designando seus próprios juízes Contudo a escolha de juízes da Suprema Corte argentina não era uma atividade restrita à transição entre governos civis e militares Em 1990 a Argentina por fim conheceu uma transição entre governos eleitos pelas vias democráticas um regime democrático sucedido por outro Àquela altura porém em suas relações com a Suprema Corte os regimes democráticos já não agiam de maneira muito diferente daquela dos militares Quem assumiu a presidência foi Carlos Saúl Menem do Partido Peronista Os juízes da Suprema Corte haviam sido empossados após a transição para a democracia em 1983 pelo presidente do Partido Radical Raúl Alfonsín Sendo uma transição democrática não deveria haver razão para Menem indicar sua própria Corte Antes mesmo das eleições porém Menem já havia mostrado a que viera procurando insistentemente ainda que nem sempre com êxito estimular ou até intimidar os integrantes do tribunal a abdicar Ficou célebre o episódio em que ele ofereceu uma embaixada ao juiz Carlos Fayt que este não só recusou como respondeu remetendo lhe um exemplar de seu livro Direito e ética com uma advertência Cuidado sou eu o autor desta obra Imperturbável três meses após assumir a presidência Menem enviou um projeto de lei para a Câmara dos Deputados propondo uma expansão da Suprema Corte de cinco para nove membros Um de seus argumentos era idêntico ao usado por Roosevelt em 1937 o tribunal estava sobrecarregado Aprovada sem demora pelo Senado e pela Câmara a leio permitiu a Menem nomear quatro novos juízes e obter assim a maioria desejada A vitória de Menem contra a Suprema Corte pôs em movimento aquela dinâmica traiçoeira que já mencionamos Seu próximo passo foi reescrever a Constituição e retirar a limitação quanto ao número de mandatos a fim de que ele pudesse concorrer à presidência novamente Após a reeleição Menem tentou reescrever a Constituição mas foi impedido não pelas instituições políticas argentinas mas por facções dentro de seu próprio partido o Peronista que resistiu aos seus impulsos de dominação pessoal Desde sua independência a Argentina sofre da maioria dos problemas institucionais que assolam a América Latina presa em um círculo vicioso não virtuoso Por conseguinte processos positivos como os primeiros passos rumo ao estabelecimento de uma Suprema Corte independente jamais chegaram a se arraigar Em um contexto pluralista nenhum grupo deseja ou se atreve a derrubar outro do poder por receio de que seu próprio poder venha a ser desafiado posteriormente Ao mesmo tempo a distribuição mais ampla de poder dificulta essa derrubada A Suprema Corte terá poder se receber apoio substancial de amplos segmentos da sociedade dispostos a rechaçar toda e qualquer tentativa de boicotar a independência do tribunal Foi o que aconteceu nos Estados Unidos mas não na Argentina onde os legisladores não hesitaram em enfraquecer a Corte mesmo prevendo que assim poriam em risco sua própria posição Um motivo é que a presença de instituições extrativistas faz com que haja muito a ganhar com a derrubada da Suprema Corte e os potenciais benefícios compensam os riscos FEEDBACK POSITIVO E CÍRCULOS VIRTUOSOS Instituições políticas e econômicas inclusivas não surgem de maneira espontânea Em geral são fruto de consideráveis conflitos entre as elites de um lado que resistem ao crescimento econômico e às mudanças políticas e do outro os que pretendem cercear o poder político e econômico das mesmas As instituições inclusivas surgem durante circunstâncias críticas como a Revolução Gloriosa na Inglaterra ou a fundação da colônia de Jamestown na América do Norte quando uma série de fatores vem enfraquecer o poder das elites fortalecendo seus opositores e gerando incentivos para a formação de uma sociedade pluralista O resultado do conflito político nunca é certo ainda que em retrospecto consideremos inevitáveis muitos acontecimentos históricos os rumos da história são sempre fortuitos Não obstante uma vez estabelecidas as instituições políticas e econômicas inclusivas tendem a criar um círculo virtuoso um processo de feedback positivo ampliando as chances de que essas instituições persistam e até mesmo se expandam O círculo virtuoso funciona através de diversos mecanismos Primeiro a lógica das instituições políticas pluralistas dificulta bastante a usurpação do poder por parte de um ditador facção governista ou mesmo um presidente bemintencionado como descobriram Franklin Roosevelt ao tentar livrarse das restrições impostas pela Suprema Corte ao seu poder e Sir Robert Walpole quando tentou promulgar sumariamente a Lei Negra Nos dois casos a maior concentração de poder nas mãos de um indivíduo ou pequeno grupo começou a solapar as bases das instituições políticas pluralistas e a verdadeira medida do pluralismo consiste exatamente em sua capacidade de fazer frente a tais tentativas O pluralismo também sacramenta a noção de estado de direito o princípio de que as leis devem ser igualmente aplicadas a todos algo impossível naturalmente sob uma monarquia absolutista Contudo o estado de direito por sua vez significa que as leis não podem ser usadas por determinado grupo para violar os direitos de outro Ademais o princípio do estado de direito abre a possibilidade de maior participação no processo político e de maior inclusão à medida que introduz a ideia de que as pessoas devem ser iguais não só diante da lei mas também do sistema político Esse foi um dos princípios que tornaram tão difícil para o sistema político britânico resistir à imperiosa demanda por mais democracia ao longo do século XIX abrindo caminho para a gradual extensão do direito a voto a todos os adultos Em segundo lugar como já vimos tantas vezes as instituições políticas inclusivas apoiam e são apoiadas por instituições econômicas inclusivas o que cria outro mecanismo de círculo virtuoso As instituições econômicas inclusivas anulam as mais egrégias relações econômicas extrativistas como a escravidão e a servidão reduzem a importância dos monopólios e fundam uma economia dinâmica fatores que reduzem os benefícios econômicos que se podem obter individualmente ao menos em curto prazo mediante a usurpação do poder político Porque as instituições econômicas já haviam se tornado suficientemente inclusivas na GrãBretanha no século XVIII a elite não só tinha menos a ganhar agarrandose ao poder como na verdade tinha muito a perder se lançasse mão de meios de repressão generalizada contra quem reivindicava mais democracia Essa característica do círculo virtuoso ao mesmo tempo em que tornou o processo gradual de democratização da GrãBretanha no século XIX menos ameaçador para a elite aumentou suas chances de êxito em contraste com a situação de regimes absolutistas como o do Império AustroHúngaro ou o do russo em que as instituições econômicas eram ainda intensamente extrativistas e por conseguinte onde a demanda por maior inclusão política mais à frente no século XIX sofreria maior repressão já que a elite tinha muito a perder se partilhasse seu poder Por fim as instituições políticas inclusivas possibilitam o florescimento de uma imprensa livre a qual por sua vez em geral fornece informações a respeito de eventuais ameaças às instituições inclusivas e mobiliza a oposição a elas como aconteceu durante o último quarto do século XIX e primeiro quarto do século XX quando a crescente dominação econômica dos Barões Ladrões ameaçava a essência das instituições econômicas inclusivas nos Estados Unidos Por mais que o resultado desses conflitos permanentes seja sempre fortuito é por meio desses mecanismos que o círculo virtuoso fomenta uma poderosa tendência das instituições inclusivas a persistir a resistir aos desafios e a expandirse como ocorreu na GrãBretanha e nos Estados Unidos Infelizmente como veremos no próximo capítulo as instituições extrativistas engendram forças igualmente intensas no sentido de sua própria sobrevivência é o processo do círculo vicioso T 12 O CÍRCULO VICIOSO O TREM JÁ NÃO VAI MAIS ATÉ BO ODO O TERRITÓRIO DE SERRA LEOA NA ÁFRICA OCIDENTAL tornouse colônia britânica em 1896 Originalmente a capital Freetown fora fundada em fins do século XVIII a fim de abrigar escravos libertos e repatriados Contudo quando esta se converteu em colônia britânica o interior do país ainda era composto por uma miríade de pequenos reinos Gradualmente na segunda metade do século XIX os britânicos estenderam seu domínio terra adentro mediante uma longa série de tratados com os governantes locais Em 31 de agosto de 1896 o governo colonial com base nesses acordos declarou a colônia um protetorado Os líderes mais importantes foram identificados e agraciados com um novo título chefe supremo No leste do país por exemplo no moderno distrito diamantino de Kono reinava Suluku um poderoso monarca guerreiro O Rei Suluku foi designado Chefe Supremo Suluku criandose a chefia de Sandor como unidade administrativa do protetorado Ao firmar acordos com o administrador britânico reis como Suluku não compreenderam que os documentos assinados seriam interpretados como cartas brancas para o estabelecimento de colônias Quando os britânicos tentaram instituir um imposto sobre cabanas uma tarifa de cinco xelins que incidiria sobre cada habitação em janeiro de 1898 os chefes sublevaramse em uma guerra civil que ficaria conhecida como Revolta do Imposto das Cabanas Embora tivesse início no norte adquiriu mais força e permanência no sul sobretudo em Mendeland dominada pelo grupo étnico mende A revolta seria logo subjugada mas serviu de advertência aos britânicos acerca das dificuldades de controlar o interior do país Eles já haviam começado a construir uma estrada de ferro ligando Freetown ao interior Os trabalhos tiveram início em março de 1896 e a linha chegou a Songo Town em dezembro de 1898 em plena rebelião Documentos parlamentares de 1904 registraram No caso da Sierra Leone Railways a Insurreição Nativa que irrompeu em fevereiro de 1898 teve como consequência a total interrupção das obras e a desorganização temporária dos operários Os rebeldes atiraramse sobre a ferrovia com o resultado de que todos os trabalhadores tiveram de ser recolhidos em Freetown Rotifunk hoje localizada junto à estrada de ferro a cerca de 90 quilômetros de Freetown estava na época inteiramente nas mãos dos rebeldes Com efeito Rotifunk não constava do planejamento da linha férrea em 1894 O trajeto original foi modificado após a conflagração da revolta de modo que em vez de dirigirse para o nordeste ela seguiu para o sul via Rotifunk e Bo rumo a Mendeland Os britânicos queriam rápido acesso à região dos mendes âmago da rebelião bem como a outras áreas potencialmente conflituosas do interior caso estourassem novos levantes Por ocasião da independência de Serra Leoa em 1961 os britânicos entregaram o poder a Sir Milton Margai e seu Partido Popular de Serra Leoa SLPP Sierra Leone Peoples Party que contava com apoio basicamente no sul sobretudo em Mendeland e no leste Sir Milton foi sucedido no cargo de primeiroministro por seu irmão Sir Albert Margai em 1964 Em 1967 o SLPP perdeu por estreita margem de votos uma muito contestada eleição para a oposição o Partido do Congresso de Todo o Povo APC All Peoples Congress Party liderado por Siaka Stevens Stevens era um limba do norte e o APC angariou a maior parte de seus correligionários junto aos grupos étnicos da região os limbas temnes e lokos Embora a ferrovia para o sul tivesse sido projetada pelos britânicos a princípio tendo em vista o domínio de Serra Leoa em 1967 seu papel era predominantemente econômico transportando a maior parte dos produtos de exportação do país café cacau e diamantes Os fazendeiros que cultivavam café e cacau eram mendes e a estrada de ferro era o meio de comunicação de Mendeland com o mundo A região havia dado a imensa contribuição para a eleição de Albert Margai em 1967 Ora Stevens estava muito mais interessado em agarrarse ao poder do que em promover as exportações de Mendeland Seu raciocínio era simples o que quer que fosse bom para os mendes era bom para o SLPP e ruim para seus interesses pessoais Assim decidiu extinguir o acesso ferroviário a Mendeland chegando a vender os trilhos e as composições a fim de assegurar a irreversibilidade da mudança Hoje em dia ao dirigir pelas estradas que ligam Freetown ao leste do país passase pelas dilapidadas estações de Hastings e Waterloo Não há mais trens para Bo Naturalmente a drástica iniciativa de Stevens foi fatal para alguns dos mais vibrantes setores da economia de Serra Leoa Como muitos dos líderes africanos pósindependência porém quando se tratava de escolher entre a consolidação de seu poder ou o estímulo ao crescimento econômico do país Stevens optava sem hesitar pela primeira Hoje não se pode mais ir de trem para Bo porque como o Czar Nicolau I que temia que as estradas de ferro levassem a revolução até a Rússia Stevens acreditava que os trens fortaleceriam seus adversários Como tantos outros governantes à frente de instituições extrativistas ele temia desafios ao seu poder político e estava disposto a sacrificar o crescimento econômico a fim de evitálos À primeira vista a estratégia de Stevens contrasta com a britânica Na realidade contudo verificase entre o domínio britânico e o regime de Stevens significativa continuidade que ilustra bem a lógica do círculo vicioso Stevens valeuse de métodos similares para extrair recursos do povo de Serra Leoa e continuava no poder em 1985 não por ter sido reeleito por votação popular mas por haver estabelecido a partir de 1967 uma violenta ditadura matando e ameaçando inimigos políticos sobretudo os membros do SLPP Autoproclamouse presidente em 1971 a partir de 1978 Serra Leoa passou a contar com um único partido político seu APC Assim Stevens logrou consolidar seu poder ainda que ao custo do empobrecimento da maior parte do interior do país Durante o período colonial os britânicos se valeram de um esquema de governo indireto em Serra Leoa como na maioria de suas colônias africanas Na base desse sistema estavam os chefes supremos que arrecadavam impostos distribuíam a justiça e mantinham a ordem Em vez de isolar os cacaueiros e cafeicultores o governo colonial os obrigava a vender sua produção para uma junta comercial estabelecida supostamente no intuito de ajudar os produtores rurais Os preços das commodities agrícolas variavam muito ao longo do tempo o cacau podia estar caro em um ano mas barato no seguinte e as receitas dos produtores acompanhavam tamanha oscilação A existência das juntas comerciais se justificava com o argumento de que seriam elas e não os produtores que absorveriam o impacto das flutuações de preço Quando os preços mundiais estivessem altos a junta pagaria aos produtores de Serra Leoa um valor inferior mas quando os preços caíssem faria o contrário Parecia em princípio uma boa ideia todavia a realidade mostrouse muito diferente A Junta Comercial de Produtos de Serra Leoa Sierra Leone Produce Marketing Board foi fundada em 1949 Evidentemente necessitava de uma fonte de renda para funcionar A maneira mais natural de obtêla consistia em pagar aos produtores um pouco menos do que receberiam fosse em anos bons ou ruins e os recursos assim angariados poderiam ser usados para custos administrativos e despesas gerais Não demorou para que o pouco menos se tornasse muito menos O Estado colonial usava a junta comercial como meio de onerar os produtores com uma pesada carga tributária Muitos acalentavam a expectativa de que as piores práticas dos governos coloniais na África subsaariana cessariam após a independência e que o uso de juntas comerciais para sobretaxar os produtores rurais finalmente chegaria ao fim Não foi o que aconteceu porém Com efeito a exploração extrativista dos produtores pelas juntas comerciais intensificouse ainda mais Em meados da década de 1960 os produtores de dendê recebiam da junta comercial 56 do preço mundial os cacaueiros 48 e os cafeicultores 49 Quando Stevens deixou a presidência em 1985 abdicando em favor de Joseph Momoh o sucessor que havia escolhido para assumir o cargo em seu lugar esses números eram 37 19 e 27 respectivamente Por pior que isso possa parecer ainda era melhor do que os valores obtidos pelos produtores durante o reinado de Stevens que giravam quase sempre em torno de 10 Ou seja 90 da receita dos produtores rurais eram extraídos pelo governo de Stevens e não para serem revertidos na prestação de serviços públicos como a construção de rodovias ou educação pelo contrário destinavamse ao enriquecimento pessoal do presidente e seus asseclas bem como à compra de apoio político Como parte de seu mecanismo de governo indireto os britânicos haviam também estipulado a vitaliciedade do cargo de chefe supremo Ora para ser elegível para tal posição era preciso pertencer a um clã dominante reconhecido A identidade dos clãs dominantes em cada chefia foi sendo desenvolvida ao longo do tempo mas baseavase essencialmente na linhagem tanto dos reis de cada área quanto das famílias da elite que haviam assinado tratados com os britânicos no fim do século XIX Os chefes eram eleitos mas não por meios democráticos Um órgão intitulado Autoridade Tribal cujos membros eram chefes locais menores ou indicados pelos chefes supremos chefes locais ou autoridades britânicas decidia quem se tornaria chefe supremo Seria de se imaginar que essa instituição colonial também fosse abolida ou ao menos reformada após a independência Assim como a junta comercial porém ela permaneceu intacta Até hoje os chefes supremos são encarregados da arrecadação tributária Não se trata mais de um imposto sobre cabanas mas de seu descendente direto uma capitação Em 2005 a Autoridade Tribal de Sandor elegeu um novo chefe supremo Só candidatos do único clã dominante o Fasuluku podiam se apresentar O vencedor foi Sheku Fasuluku trineto do Rei Suluku O comportamento das juntas comerciais e os sistemas tradicionais de propriedade agrária ajudam a entender por que em Serra Leoa e em boa parte da África subsaariana a produtividade agrícola é tão restrita Na década de 1980 o cientista político Robert Bates propôsse a desvendar os maus resultados africanos nesse setor muito embora os livros didáticos de economia apregoassem que ele deveria ser o mais dinâmico e chegou à conclusão de que a causa do fenômeno nada tinha a ver com os fatores geográficos nem com outros dos discutidos no Capítulo 2 que supostamente tornariam a produtividade agrícola intrinsecamente baixa Pelo contrário a explicação era simples as políticas de preços das juntas comerciais anulavam todo e qualquer incentivo para que os produtores investissem utilizassem fertilizantes ou preservassem o solo Ora as políticas das juntas comerciais eram tão desfavoráveis aos interesses do campo porque estes eram desprovidos de poder político Essas políticas de preços interagiam com outros fatores fundamentais tornando a propriedade insegura e solapando ainda mais os incentivos ao investimento Em Serra Leoa os chefes supremos não só garantem a lei e a ordem prestam serviços jurídicos e aumentam os impostos como também são os guardiões da terra Por mais que as famílias clãs e dinastias detenham direitos tradicionais e de uso sobre a terra em última instância são os chefes que determinam quem cultivará qual pedaço de chão Os direitos de propriedade de cada um só estarão garantidos à medida que a pessoa estiver ligada ao chefe e talvez até pertença ao clã reinante A terra não pode ser comprada vendida nem usada como garantia de empréstimos e quem não for nativo de determinada chefia não pode cultivar nenhum produto perene como café cacau ou dendê para que não se acabe estabelecendo a propriedade por usucapião O contraste entre as instituições extrativistas instauradas pelos britânicos em Serra Leoa e as inclusivas que se desenvolveram em outras colônias como a Austrália é bem ilustrado pelas diferentes maneiras de administrar os recursos minerais Foram descobertos diamantes em Kono leste de Serra Leoa em janeiro de 1930 eram diamantes de aluvião isto é que não se encontravam em minas profundas O método primário de exploração portanto era bateando nos rios Alguns cientistas sociais referemse às pedras desse tipo como diamantes democráticos por possibilitarem o envolvimento de muita gente no garimpo criando uma oportunidade potencialmente inclusiva Não em Serra Leoa porém Ignorando de bom grado a natureza intrinsecamente democrática da bateia o governo colonial instituiu um monopólio sobre todo o protetorado batizouo de Sierra Leone Selection Trust Monopólio de Seleção de Serra Leoa e o confiou à De Beers a gigante sulafricana da mineração diamantífera Em 1936 a De Beers também foi agraciada com o direito de estabelecer a Diamond Protection Force Força de Proteção ao Diamante DPF um exército privado que superaria em tamanho as forças do governo colonial Ainda assim a ampla disponibilidade dos diamantes aluviais dificultava muito o policiamento Na década de 1950 a DPF foi sobrepujada por milhares de garimpeiros ilegais eterna fonte de conflito e caos Em 1955 o governo britânico abriu alguns dos campos diamantíferos para mineradores licenciados fora do Sierra Leone Selection Trust muito embora a empresa permanecesse no controle das áreas mais prolíficas os campos de Yengema Koidu e Tongo Depois da independência a situação complicouse ainda mais Em 1970 Siaka Stevens efetivamente nacionalizou o Sierra Leone Selection Trust fundando a National Diamond Mining Company Sierra Leone Limited de que o governo a rigor Stevens detinha 51 do controle Era o início da implementação do plano de Stevens no sentido de controlar a mineração de diamantes no país Na Austrália do século XIX foi o ouro descoberto em 1851 em Nova Gales do Sul e no recémcriado estado de Victoria e não os diamantes que capturou a atenção de todos Como no caso dos diamantes de Serra Leoa tratavase de ouro de aluvião e era preciso definir como seria a sua exploração Houve quem como James Macarthur filho de John Macarthur o proeminente líder dos posseiros que já discutimos aqui páginas 216219 propusesse que se erguessem cercas ao redor das áreas de mineração e que o direito de monopólio fosse objeto de uma concorrência Queriam uma versão australiana do Sierra Leone Selection Trust Não obstante muitos no país desejavam livre acesso ao garimpo do ouro e o modelo inclusivo venceu em vez de estabelecerem um monopólio as autoridades australianas permitiram que qualquer um que pagasse uma licença anual de mineração pudesse prospectar e garimpar o terreno Não tardou para que os garimpeiros como esses aventureiros acabaram ficando conhecidos se tornassem uma poderosa força na política australiana sobretudo em Victoria desempenhando papel fundamental na adoção do sufrágio universal e do voto secreto Já vimos dois efeitos perniciosos da expansão europeia e do domínio colonial na África a introdução do tráfico negreiro transatlântico que estimulou o desenvolvimento de instituições políticas e econômicas de caráter extrativista no continente africano e a aplicação de leis e instituições coloniais visando a inibir o desenvolvimento de uma agricultura comercial que poderia ter feito frente à europeia A escravidão foi sem dúvida uma força central em Serra Leoa Nos tempos da colônia não havia um Estado centralizado forte no interior apenas diversos pequenos reinos rivais que se fustigavam continuamente em incursões para captura dos homens e mulheres uns dos outros A escravidão era endêmica possivelmente 50 da população eram constituídos por mão de obra escrava As condições de salubridade ambiental impossibilitavam a colonização branca em larga escala tal qual a que se deu na África do Sul portanto não havia brancos concorrendo com os africanos Ademais a inexistência de uma economia mineradora da escala de Joanesburgo significava que além da falta de demanda por mão de obra africana para as terras dos colonos não havia incentivos para a criação das instituições extrativistas do mercado de trabalho tão características do apartheid na África do Sul No entanto havia outros mecanismos em ação Os cafeicultores e cacaueiros de Serra Leoa não enfrentavam a concorrência dos brancos mas ainda tinham suas receitas expropriadas por meio de um monopólio governamental as juntas comerciais Serra Leoa sofria também com o governo indireto Em muitas regiões da África onde as autoridades britânicas pretendiam lançar mão desse sistema de colonização a população local não contava com uma autoridade centralizada que pudesse ser controlada Por exemplo no leste da Nigéria quando os colonizadores descobriram os povos igbos no século XIX eles não dispunham de chefes Foi preciso criálos e assim surgiram os chefes tenentes warrant chiefs Em Serra Leoa os britânicos baseariam o governo indireto nos sistemas de autoridade e instituições nativas já existentes Não obstante a despeito da fundamentação histórica dos indivíduos reconhecidos como chefes supremos em 1896 o governo indireto e os poderes por ele investidos nesses chefes mudaram por completo a estrutura política existente na região Para começar introduziram um sistema de estratificação social os clãs dominantes onde antes não havia nada similar Uma aristocracia hereditária veio instalarse onde antes havia uma situação muito mais fluida em que os chefes necessitavam de apoio popular Em seu lugar surgiu um sistema rígido no qual estes se mantinham em caráter vitalício graças a seus patronos em Freetown ou na GrãBretanha praticamente sem ter de prestar contas àqueles que governavam Os britânicos trataram de subverter as instituições locais também de outras maneiras por exemplo substituindo líderes legítimos por quem se mostrasse mais cooperativo Com efeito a família Margai que forneceu os dois primeiros primeirosministros da Serra Leoa independente assumira o poder na chefia do Baixo Banto Lower Banta quando por ocasião da Revolta do Imposto das Cabanas aliouse aos britânicos contra o então chefe Nyama Nyama foi deposto e os Margai tornaramse chefes assim permanecendo até 2010 O mais notável é o grau de continuidade entre a Serra Leoa colonial e a independente Os britânicos criaram as juntas comerciais e as usaram para tributar os produtores rurais Os governos póscoloniais impuseram o mesmo extrativismo de forma ainda mais intensa Os britânicos implementaram o sistema de governo indireto por meio dos chefes supremos Os governos posteriores à independência não só não rejeitaram essa instituição colonial como pelo contrário também a adotaram na administração pública Os britânicos estabeleceram um monopólio sobre a exploração de diamantes e tentaram excluir os garimpeiros africanos Os governos pós independência fizeram o mesmo É verdade que os britânicos acreditavam que a construção de ferrovias seria uma boa forma de dominar Mendeland ao passo que Siaka Stevens pensava o contrário contudo os primeiros podiam confiar em seu exército e sabiam que poderiam enviar suas tropas para Mendeland caso estourasse uma rebelião Stevens por sua vez não podia se dar a esse luxo Como em diversas outras nações africanas Forças Armadas fortes representariam uma ameaça ao poder de Stevens que por essa razão emasculouas reduzindo seu tamanho e privatizando a violência por meio de unidades paramilitares criadas especialmente para esse fim e leais somente a ele Nesse processo ele precipitou o declínio da já reduzida autoridade estatal existente em Serra Leoa Em lugar do exército veio primeiro a Internal Security Unit Unidade de Segurança Interna a ISU sigla que o sofrido povo serraleonense traduzia como I Shoot U eu atiro em você Depois veio a Special Security Division Divisão de Segurança Especial a SSD apelidada pelo povo de Siaka Stevenss Dogs cães de Siaka Stevens Por fim a ausência de um exército dando sustentação ao regime acabaria sendo sua ruína Foi um grupo de apenas 30 soldados encabeçados pelo Capitão Valentine Strasser que derrubou o regime da APC em 29 de abril de 1992 O desenvolvimento de Serra Leoa ou a falta dele pode ser mais bem entendido como resultado desse círculo vicioso Foram as autoridades coloniais britânicas que criaram as instituições extrativistas em primeiro lugar e os políticos africanos pós independência de muito bom grado receberam esse bastão Verificouse um padrão assustadoramente semelhante em toda a África subsaariana Havia esperanças similares para Gana Quênia Zâmbia e muitos outros países africanos após a independência entretanto em todos esses casos as instituições extrativistas foram recriadas segundo o padrão previsto pelo círculo vicioso com uma diferença foram se tornando mais viciosas com o passar do tempo Em todos esses países por exemplo as juntas comerciais e o sistema de governo indireto instituídos pelos britânicos foram mantidos A existência do círculo vicioso tem razões naturais Instituições políticas extrativistas produzem instituições econômicas também extrativistas que promovem a riqueza de poucos em detrimento de muitos Aqueles que se beneficiam do extrativismo dispõem assim dos recursos para montar seus próprios exércitos privados e reunir mercenários a seu serviço comprar seus juízes e manipular as eleições de modo a perpetuarse no poder Têm também o maior interesse em resguardar o sistema Portanto as instituições econômicas extrativistas servem de plataforma para que suas contrapartes políticas persistam O poder é valioso em regimes com instituições políticas extrativistas por ser irrestrito e promover tantas benesses econômicas As instituições políticas extrativistas tampouco protegem contra eventuais abusos de poder A afirmação de que o poder corrompe é questionável mas Lorde Acton sem dúvida tinha razão ao defender que o poder absoluto fomenta uma corrupção igualmente absoluta Vimos no capítulo anterior que mesmo quando Franklin Roosevelt quis usar seus poderes presidenciais de uma maneira que ele acreditava que seria benéfica para a sociedade sem o empecilho dos limites impostos pela Suprema Corte as instituições políticas inclusivas norteamericanas o impediram de livrarse das restrições ao seu poder Sob instituições políticas extrativistas são poucos os limites ao exercício do poder por mais distorcido e sociopático que ele venha a se tornar Em 1980 Sam Bangura então presidente do Banco Central em Serra Leoa criticou as políticas de Siaka Stevens que classificou como perdulárias Pouco depois foi assassinado e atirado do último andar do edifício da instituição que comandava Apropriadamente seu corpo despencou na Rua Siaka Stevens As instituições políticas extrativistas tendem também a criar um círculo vicioso por desguarnecerem o Estado de suas defesas contra quem quiser usurpar e desvirtuar os seus poderes Outro mecanismo do círculo vicioso consiste no fato de que as instituições extrativistas ao produzirem um poder irrestrito e uma profunda desigualdade de renda aumentam os possíveis ganhos com o jogo político Se quem controla o Estado tornase beneficiário desse poder excessivo e da riqueza por ele gerada as instituições extrativistas criam incentivos para disputas internas pelo controle do poder e seus benefícios uma dinâmica que vimos em ação nas cidadesestados maias e na Roma Antiga Sob essa luz não admira que as instituições extrativistas herdadas das potências coloniais por muitos países africanos tenham semeado disputas de poder e guerras civis conflitos muito diferentes da Guerra Civil inglesa e da Revolução Gloriosa Seriam travados não com o objetivo de mudar as instituições políticas introduzir restrições ao exercício do poder ou fomentar o pluralismo mas para apropriarse do poder e enriquecer um grupo em detrimento dos demais Em Angola Burundi Chade Costa do Marfim República Democrática do Congo Etiópia Libéria Moçambique Nigéria República do CongoBrazzaville Ruanda Somália Sudão e Uganda além claro de Serra Leoa como veremos em mais detalhes no próximo capítulo esses conflitos se converteriam em sangrentas guerras civis levando à ruína econômica e a um sofrimento humano sem paralelos e à falência do Estado DA ENCOMIENDA À GRILAGEM DE TERRAS Em 14 de janeiro de 1993 Ramiro De León Carpio foi empossado na presidência da Guatemala Nomeou Richard Aitkenhead Castillo seu ministro das Finanças e Ricardo Castillo Sinibaldi ministro do Desenvolvimento Esses homens tinham algo em comum todos três eram descendentes diretos de conquistadores espanhóis que chegaram à Guatemala no começo do século XVI De León tinha por ilustre ancestral Juan De León Cardona ao passo que os Castillos eram aparentados com Bernal Díaz del Castillo autor de um dos mais célebres testemunhos oculares da conquista do México Em reconhecimento dos serviços prestados a Hernán Cortés Díaz del Castillo foi designado para o governo de Santiago de los Caballeros hoje cidade de Antígua na Guatemala Tanto Castillo quanto De León fundaram dinastias assim como outros conquistadores como Pedro de Alvarado A socióloga guatemalteca Marta Casaús Arzú identificou um grupo central de 22 famílias de seu país que tinham vínculos pelo matrimônio com outras 26 famílias adjacentes a esse núcleo Seu estudo genealógico e político mostrou que essas famílias detêm o poder econômico e político na Guatemala desde 1531 Uma definição segundo critérios mais amplos de que famílias faziam parte dessa elite sugeriu que elas respondiam por pouco mais de 1 da população na década de 1990 Em Serra Leoa e em grande parte da África subsaariana o círculo vicioso assumiu a forma da adoção por parte dos líderes pósindependência das instituições extrativistas estabelecidas pelas potências coloniais Na Guatemala como em boa parte da América Central vemos uma modalidade mais simples e desnuda do círculo vicioso os detentores do poder econômico e político encontram meios de estruturar as instituições de modo a assegurar a continuidade de seu poder Esse tipo de círculo vicioso leva à persistência das instituições extrativistas e à permanência das mesmas elites no poder bem como à manutenção do subdesenvolvimento Na época da conquista a Guatemala era densamente povoada provavelmente com uma população de cerca de dois milhões de maias As doenças e a exploração tiveram efeitos desastrosos do mesmo modo como no restante das Américas Só na década de 1920 seu nível populacional retornaria aos patamares précolombianos Como em outras regiões do Império Espanhol os nativos foram distribuídos entre os conquistadores por meio da concessão de encomiendas Como vimos no contexto da colonização do México e do Peru a encomienda era um sistema de trabalhos forçados que posteriormente dariam lugar a instituições coercivas similares sobretudo o repartimiento na Guatemala também conhecido como mandamiento A elite composta dos descendentes dos conquistadores e alguns elementos indígenas não só se beneficiou dos diversos esquemas de trabalhos forçados como também instituiu o controle e o monopólio do comércio por meio de uma guilda mercantil intitulada Consulado de Comercio A maior parte da população guatemalteca encontravase no alto das montanhas e longe do litoral Os elevados custos de transporte reduziam a amplitude da economia de exportação e a princípio a terra não tinha grande valor Boa parte dela continuava nas mãos dos povos nativos organizada em grandes propriedades comunais chamadas ejidos O resto permanecia em grande parte desocupado e em tese pertencia ao governo Nesse contexto o controle e a tributação do comércio geravam mais receita do que o controle da terra Como no México a elite guatemalteca recebeu com hostilidade a Constituição de Cádiz páginas 2124 o que a estimulou a declarar independência do mesmo modo como sua contraparte mexicana Após uma breve união com o México e a Federação da América Central a elite colonial governou a Guatemala sob a ditadura de Rafael Carrera de 1839 a 1871 Nesse período os descendentes dos conquistadores e a elite indígena mantiveram basicamente inalteradas as instituições econômicas extrativistas da era colonial Nem a organização do Consulado foi modificada a partir da independência Embora fosse uma instituição régia foi de muito bom grado mantida pelo governo republicano A independência não passou pois de mero golpe orquestrado pela elite local já existente como no México e as instituições econômicas extrativistas de que ela tanto se beneficiava como de hábito tiveram continuidade naturalmente Por ironia durante esse período o Consulado permaneceu encarregado do desenvolvimento econômico do país Como antes da independência porém o Consulado era movido por seus próprios interesses não pelos do país Entre suas responsabilidades estava o desenvolvimento de infraestrutura como portos e estradas mas do mesmo modo como no Império AustroHúngaro Rússia e Serra Leoa iniciativas nesse sentido não raro implicavam risco de destruição criativa e de desestabilização do sistema Assim em vez de desenvolvimento de infraestrutura o que com frequência se verificava era resistência à sua implementação Por exemplo o desenvolvimento de um porto no litoral de Suchitepéquez no Oceano Pacífico era um dos projetos propostos Na época as únicas instalações portuárias adequadas situavamse do lado caribenho e estavam sob controle do Consulado Este nada fazia do lado do Pacífico porque um porto naquela região constituiria uma saída muito mais fácil para o escoamento de produtos das cidades de Mazatenango e Quezaltenango nas montanhas e caso esses produtos tivessem acesso a outros mercados o monopólio do Consulado sobre o comércio exterior se veria ameaçado A mesma lógica aplicavase às estradas de rodagem setor de que também o Consulado estava encarregado para todo o país Previsivelmente o órgão se recusava a abrir estradas que poderiam fortalecer grupos rivais ou talvez pusessem seu monopólio a perder A pressão por sua construção de novo vinha do oeste da Guatemala e de Quezaltenango em Los Altos Porém se houvesse melhorias na estrada que ligava Los Altos ao litoral de Suchitepéquez talvez despontasse uma classe mercante que entraria em competição com os comerciantes do Consulado na capital Assim a estrada permaneceu tal como era Em decorrência dessa dominação da elite a Guatemala viuse aprisionada em uma dobra temporal em meados do século XIX enquanto o resto do mundo mudava rapidamente Entretanto tais transformações acabariam afetando o país Os custos de transporte estavam caindo graças a inovações como os trens a vapor as ferrovias e tipos novos e mais rápidos de navios Ademais o aumento da renda das populações da Europa Ocidental e América do Norte foi criando uma demanda maciça por muitos produtos que um país como a Guatemala tinha potencial para fornecer No começo do século dois corantes naturais índigo e cochonilha chegaram a ser produzidos em alguma quantidade para exportação todavia a oportunidade mais rentável viria do café para cuja produção a Guatemala dispunha de muita terra adequada e o cultivo começou a se difundir sem nenhuma assistência do Consulado À medida que o preço mundial do produto subia e o comércio internacional se expandia surgiam oportunidades de lucros gigantescos despertando o interesse da elite guatemalteca Em 1871 o duradouro regime do ditador Carrera foi finalmente derrubado por um grupo de autointitulados Liberais após a disseminação desse título pelo mundo O significado de liberalismo vem mudando ao longo do tempo mas no século XIX nos Estados Unidos e Europa era similar ao que hoje se chama de libertarismo saindo em defesa da liberdade dos indivíduos do governo limitado e do livre comércio Não foi bem o que se passou na Guatemala Liderados a princípio por Miguel García Granados e depois de 1873 por Justo Rufino Barrios os liberais guatemaltecos não eram em sua maioria homens novos com ideais liberais Basicamente as mesmas famílias permaneceram no poder mantendo as instituições políticas extrativistas e implementando uma reorganização em vasta escala da economia voltada para a exploração do café De fato o Consulado foi abolido em 1871 mas as circunstâncias econômicas haviam mudado O foco das instituições econômicas extrativistas passaria a ser a produção e a exportação de café A produção cafeeira requeria terra e mão de obra Para proporcionar a primeira para as fazendas de café os liberais impuseram uma política de privatização na realidade um processo de grilagem que lhes permitiu apropriarse de terras até então pertencentes ao governo ou de propriedade comunitária Embora sua iniciativa enfrentasse ferrenha oposição dadas as instituições políticas altamente extrativistas e a concentração de poder político no país a elite acabou logrando êxito entre 1871 e 1883 apoderouse de quase um milhão de acres em sua maioria territórios de fronteira ou terras comunitárias indígenas e só então o café iniciou seu rápido desenvolvimento O objetivo era a formação de latifúndios As terras privatizadas normalmente eram leiloadas entre os membros da elite tradicional ou pessoas a eles ligadas Em seguida o poder de coação do Estado liberal foi empregado para conferir aos latifundiários acesso à mão de obra mediante a adaptação e intensificação de diversos sistemas de trabalhos forçados Em novembro de 1876 o Presidente Barrios escreveu a todos os governadores do país salientando que uma vez que o país dispõe de vastas extensões de terra que é preciso explorar agricolamente lançando mão para tanto da multidão de trabalhadores que hoje se encontram ainda fora do movimento de desenvolvimento dos elementos produtivos da nação os senhores devem fornecer todo o apoio necessário para exportar a agricultura 1 Das aldeias indígenas de sua jurisdição de modo a fornecer aos proprietários das fincas fazendas do respectivo departamento que solicitarem mão de obra o número necessário de trabalhadores sejam 50 ou uma centena O repartimiento recrutamento para o trabalho compulsório não havia chegado a ser abolido após a independência mas dessa vez teve seu escopo e duração ampliados Foi institucionalizado em 1877 pelo Decreto 177 que determinou que os empregadores poderiam solicitar e receber do governo até 60 trabalhadores para 15 dias de trabalho caso a propriedade se localizasse no mesmo departamento e por 30 dias caso se situasse fora O pedido poderia ser renovado se o empregador assim desejasse Os trabalhadores seriam recrutados compulsoriamente a menos que pudessem demonstrar com base em sua carteira de trabalho que haviam recentemente prestado serviços do gênero de maneira satisfatória Todos os trabalhadores rurais ficaram obrigados também a portar uma libreta a tal carteira de trabalho em que se registravam detalhes como para quem estavam empregados e eventuais dívidas muitos trabalhadores rurais deviam a seus empregadores e os endividados não podiam abandonar o empregador atual sem autorização O Decreto 177 estipulava ainda que a única maneira de alguém evitar o recrutamento para o repartimiento era mostrando que se encontrava em dívida para como algum empregador Os trabalhadores estavam em um beco sem saída Além dessa legislação promulgouse uma série de leis referentes à vadiagem de modo que quem não conseguisse provar que estava empregado seria imediatamente arrolado para o repartimiento ou outros tipos de trabalhos forçados nas estradas ou seria obrigado a aceitar emprego em alguma fazenda Como na África do Sul dos séculos XIX e XX a partir de 1871 as políticas fundiárias também tinham por objetivo solapar a economia de subsistência das populações indígenas impingindolhes o trabalho compulsório por baixos salários O repartimiento perduraria até a década de 1920 o sistema de libreta e toda a gama de leis contra a vadiagem permaneceram em vigor até 1945 quando a Guatemala conheceu seu primeiro e breve despertar da democracia Como ocorrera até 1871 a elite guatemalteca governava por intermédio de homens fortes militares e o esquema foi mantido após o início do boom do café Jorge Ubico presidente de 1931 a 1944 foi quem permaneceu por mais tempo no poder Ubico venceu as eleições presidenciais de 1931 sem adversários já que ninguém seria tolo o bastante para concorrer com ele Como o Consulado ele não aprovava nada que pudesse induzir à destruição criativa e pusesse em risco tanto seu poder político quanto seus lucros pessoais e os da elite que representava Assim sendo opôsse à implementação da indústria pelo mesmo motivo de Francisco I no Império Austro Húngaro e Nicolau I na Rússia os operários lhe teriam causado problemas Em uma legislação sem paralelo em sua repressão paranoica Ubico proibiu o uso de palavras como obreros operários sindicatos e huelgas greves Quem usasse alguma delas poderia ser preso Ubico detinha grande poder mas era a elite que ditava as regras A oposição ao seu regime estourou em 1944 encabeçada por universitários rebeldes que começaram a organizar manifestações Com o recrudescimento da insatisfação popular em 24 de junho 311 pessoas muitas delas pertencentes à elite assinaram o Memorial de los 311 uma carta aberta denunciando o regime Ubico renunciou em 1o de julho Embora um regime democrático o sucedesse em 1945 seria derrubado por um golpe em 1954 que desencadeou violenta guerra civil A Guatemala só voltaria a se democratizar em 1986 Os conquistadores espanhóis não tiveram o menor escrúpulo em estabelecer um sistema político e econômico extrativista Foi exatamente para isso que vieram até o Novo Mundo Todavia a maioria das instituições por eles criadas pretendia ser temporária A encomienda por exemplo era uma concessão temporária de direitos sobre a mão de obra Não foi elaborado um plano para estabelecer um sistema capaz de sobreviver por 400 anos Com efeito as instituições então estabelecidas sofreram mudanças significativas ao longo do tempo exceto sob um aspecto sua natureza extrativista fruto do círculo vicioso O extrativismo mudou em sua forma mas não na natureza das instituições nem da identidade da elite Na Guatemala a encomienda o repartimiento e o monopólio do comércio deram lugar à libreta e à grilagem de terras Contudo a maioria dos maias nativos continuou a trabalhar como mão de obra mal remunerada com pouco acesso à educação destituída de direitos e sem serviços públicos Na Guatemala como na maior parte da América Central em um típico padrão de círculo vicioso as instituições políticas extrativistas deram sustentação às suas contrapartes econômicas que por sua vez vieram servir de base para as primeiras e para a manutenção da mesma elite no poder DA ESCRAVIDÃO A JIM CROWu Na Guatemala as instituições extrativistas subsistiram dos tempos coloniais aos modernos sob o firme controle de uma mesma elite Eventuais mudanças institucionais resultavam de adaptações a ambientes em transformação como no caso da grilagem de terras pela elite em decorrência do boom do café As instituições no Sul dos Estados Unidos apresentaram até a Guerra de Secessão um perfil extrativista análogo A economia e a política eram dominadas pela elite sulista latifundiários com vastas propriedades e alto número de escravos Estes eram desprovidos de todo e qualquer direito político e econômico com efeito praticamente não possuíam direito nenhum Em meados do século XIX as instituições políticas e econômicas extrativistas do Sul haviam tornado a região significativamente mais pobre do que o Norte Não havia indústria e os investimentos em infraestrutura eram relativamente pequenos Em 1860 sua produção manufatureira total era inferior à da Pensilvânia Nova York ou Massachusetts Apenas 9 da população viviam em áreas urbanas comparados a 35 no Nordeste americano A densidade de linhas férreas isto é quilômetros de trilhos divididos por área era três vezes maior no Norte do que nos estados do Sul A razão de quilometragem de canais era similar O Mapa 18 mostra a extensão da escravidão representando a porcentagem da população que era escrava nos condados americanos em 1840 Fica evidente que a escravidão era predominante no Sul onde os escravos em alguns condados ao longo do Rio Mississippi por exemplo chegavam a 95 da população O Mapa 19 mostra em seguida uma das consequências desse fato a proporção de mão de obra empregada na manufatura em 1880 Embora pelos padrões do século XX esta não fosse alta em lugar nenhum notase uma diferença gritante entre o Norte e o Sul Em boa parte do Nordeste americano mais de 10 da força de trabalho estavam na manufatura Em contrapartida na maior parte do Sul sobretudo nas áreas com elevada concentração de escravos essa medida caía praticamente para zero O Sul não se mostrava inovador nem mesmo nos setores de sua especialidade de 1837 a 1859 o número de patentes emitidas por ano para inovações relacionadas a milho e trigo foi em média 12 e 10 respectivamente e houve apenas uma por ano para o mais importante produto do Sul o algodão Não há nenhum indício de que a industrialização e o crescimento econômico estivessem para começar tão cedo Por outro lado à derrota na Guerra de Secessão seguiramse reformas econômicas e políticas fundamentais à ponta de baioneta A escravidão foi abolida e os homens negros ganharam direito ao voto Mapa 18 A escravidão nos condados americanos em 1840 Mudanças tão significativas deveriam ter aberto caminho para uma transformação radical das instituições extrativistas do sul revestindoas de um caráter inclusivo e colocado a região no caminho da prosperidade econômica Em mais uma manifestação do círculo vicioso porém nada disso aconteceu As instituições extrativistas do Sul ganharam continuidade sob a forma das leis de Jim Crow no lugar da escravidão A expressão supostamente originária de Jump Jim Crow Pule Jim Crow uma sátira dos negros datada do século XIX e realizada por brancos de rosto pintado de preto passou a ser usada em referência ao conjunto de leis segregacionistas promulgadas no Sul a partir de 1865 e que perdurariam por quase um século inteiro até o advento de outra convulsão social o movimento pelos direitos civis Nesse ínterim os negros continuaram reprimidos e excluídos do poder A agricultura baseada em plantations usando mão de obra mal remunerada e sem acesso à educação se manteve e a renda do Sul caiu ainda mais em relação à média nacional O círculo vicioso de instituições extrativistas mostrouse mais forte do que muitos na época poderiam esperar Mapa 19 Emprego na manufatura nos condados americanos em 1880 A razão por que a trajetória econômica e política do Sul se manteve inalterada apesar da abolição da escravatura e da concessão do direito ao voto aos homens negros foi a debilidade do poder político e da independência econômica dessa parcela da população Os grandes proprietários rurais sulistas podiam ter perdido a guerra mas venceriam na paz Continuavam organizados e a terra permanecia em suas mãos Durante a guerra acenouse aos escravos libertos com a promessa de 40 acres de terreno e uma mula quando a escravidão fosse abolida e alguns de fato foram assim agraciados durante as célebres campanhas do General William T Sherman Em 1865 todavia o Presidente Andrew Johnson revogou as ordens de Sherman e a tão ansiada redistribuição fundiária jamais se deu Em um debate a respeito no Congresso o congressista George Washington Julian comentou com presciência Que serventia terá um decreto legislativo determinando a total remissão da escravidão se as velhas bases agrícolas do poder aristocrático permanecerem Foi o começo da redenção do velho Sul e da persistência da elite rural sulista de sempre O sociólogo Jonathan Wiener estudou a perseverança da elite latifundiária em cinco condados do Cinturão Negro região produtora de algodão no sul do Alabama Monitorando as famílias por meio de dados censitários e considerando aquelas com no mínimo US10 mil em bens imóveis ele constatou que dos 236 membros da elite rural de 1850 101 mantinham sua posição em 1870 curiosamente uma proporção muito similar à experimentada no período anterior à Guerra de Secessão das 236 famílias rurais mais ricas em 1850 apenas 110 assim permaneceram uma década mais tarde Não obstante das 25 famílias latifundiárias detentoras das maiores propriedades em 1870 18 72 figuravam na elite em 1860 e 16 na de 1850 Embora o número de mortos na guerra passasse dos 600 mil as elites rurais sofreram poucas baixas A lei criada pelos grandes donos de terras e para os grandes donos de terras isentava do serviço militar o proprietário para cada 20 escravos que possuísse Enquanto centenas de milhares de homens caíam para preservar a economia de plantations do Sul muitos grandes senhores de escravos e seus filhos assistiam à guerra de suas varandas o que lhes permitiu assegurar assim a sobrevivência da economia latifundiária Com o fim do conflito a elite rural retomou o controle sobre a força de trabalho Ainda que a escravidão como instituição econômica houvesse sido abolida as evidências apontam para uma clara persistência no sistema econômico da região baseado na combinação de agricultura latifundiária e mão de obra barata O sistema econômico foi mantido através de uma variedade de canais inclusive pelo controle da política local e pelo exercício da violência Em consequência nas palavras do estudioso afroamericano WEB Du Bois o Sul converteuse em mero campo de batalha para intimidação do povo negro Em 1865 a Assembleia Legislativa do Alabama aprovou o Black Code Código Negro um marco significativo na repressão à mão de obra negra Similar ao Decreto 177 na Guatemala o Código Negro do Alabama consistia em uma lei contra a vadiagem e outra contra a incitação dos trabalhadores à agitação que tinham por objetivo restringir a mobilidade da força de trabalho e reduzir a concorrência no mercado de trabalho bem como assegurar aos latifundiários sulistas uma reserva de mão de obra confiável e de baixo custo Após a Guerra de Secessão o período denominado Reconstrução estendeuse de 1865 a 1877 Os políticos do Norte com ajuda do Exército da União promoveram algumas transformações sociais no Sul Entretanto a reação sistemática da elite sulista à guisa de apoio aos chamados Redentoristas que buscavam a redenção do Sul lograria recriar o antigo sistema Nas eleições presidenciais de 1877 Rutherford Hayes precisou do apoio do Sul no colégio eleitoral Este em vigor ainda hoje era o cerne da eleição indireta para presidente criada pela Constituição norteamericana e na qual os votos dos cidadãos não indicam diretamente o presidente mas eleitores que por sua vez compõem o colégio eleitoral que escolherá o presidente Em troca de seu apoio no colégio eleitoral os sulistas exigiram que os soldados da União se retirassem do Sul e que a região reconquistasse sua autonomia Hayes consentiu Com o apoio sulista tornouse presidente e recolheu as tropas O período pós1877 foi marcado assim pelo efetivo ressurgimento da elite agrária de antes da Guerra de Secessão A redenção do Sul envolveu a introdução de novas capitações e provas de alfabetização para os eleitores privando sistematicamente de seus direitos não só os negros mas também os brancos pobres Tais iniciativas lograram criar um regime unipartidário democrata no qual a maior parte do poder político encontravase nas mãos da elite rural As leis de Jim Crow criaram escolas separadas e como seria de prever inferiores O Alabama por exemplo reescreveu para tanto sua magna carta em 1901 e é chocante que ainda hoje na Seção 256 da Constituição Estadual embora não mais aplicada ainda se leia Dever da legislatura de estabelecer e manter o sistema público de educação dotação do fundo de educação pública escolas separadas para crianças brancas e de cor A legislatura deverá estabelecer organizar e manter uma rede liberal de escolas públicas em todo o estado para benefício das crianças e jovens locais entre as idades de 7 e 21 anos O fundo de educação pública deverá ser alocado para os diferentes condados em proporção ao número de alunos em idade escolar que aí se encontrem sendo do mesmo modo distribuído entre as escolas nos distritos e municipalidades de cada condado de modo a assegurar da forma mais exata possível períodos letivos de igual duração em tais distritos ou municipalidades Serão oferecidas escolas separadas para crianças brancas e de cor e a nenhuma criança de qualquer das duas raças será permitido frequentar a instituição de ensino reservada à raça oposta Uma emenda que pretendia revogar a Seção 256 da Constituição foi derrotada na Assembleia Legislativa do Estado por estreita margem de votos em 2004 A privação de direitos políticos leis contra a vadiagem como o Código Negro do Alabama diversas leis de Jim Crow e as ações da Ku Klux Klan em geral com financiamento e apoio da elite transformaram o Sul dos Estados Unidos no período pósGuerra de Secessão em uma sociedade de apartheid de fato em que negros e brancos levavam vidas opostas Como na África do Sul tais leis e práticas tinham em vista o controle da população e da mão de obra negras A atuação dos políticos sulistas em Washington também tinha como finalidade assegurar a sobrevivência das instituições extrativistas do Sul Assim trataram de bloquear a aprovação por exemplo de todo e qualquer projeto ou obra pública federal capaz de pôr em risco o controle exercido pela elite sulista sobre a força de trabalho negra Por conseguinte o Sul adentrou o século XX como uma sociedade basicamente rural com baixíssimos níveis educacionais e tecnologia retrógrada que ainda se valia do trabalho manual e da tração animal praticamente sem apetrechos mecânicos Ainda que a proporção de população urbana tenha aumentado era ainda muito menor que a do Norte Em 1900 por exemplo 135 da população do Sul eram urbanizados em comparação com 60 no Nordeste Ao fim e ao cabo as instituições extrativistas do Sul dos Estados Unidos baseadas no poder da elite agrária da agricultura em plantations e na mão de obra mal remunerada e de baixo nível educacional sobreviveram até o século XX estar já bem adiantado Só começariam a ruir após a Segunda Guerra Mundial e entrariam em franca decadência apenas depois de o movimento dos direitos civis destruir os fundamentos políticos do sistema Foi somente após a derrocada dessas instituições nos anos 1950 e 1960 que o Sul desencadeou seu processo de acelerada convergência em relação ao Norte O Sul dos Estados Unidos revela outro aspecto mais resiliente do círculo vicioso como na Guatemala a elite latifundiária da região permaneceu no comando e estruturou as instituições econômicas e políticas locais de modo a assegurar a continuidade de seu poder À diferença dos guatemaltecos porém viuse confrontada com desafios significativos após sua derrota na Guerra de Secessão que veio a abolir a escravatura e reverter a total exclusão dos negros da vida política até então assegurada constitucionalmente Mas quem não tem cão caça com gato enquanto a elite agrária permanecesse no controle de seus vastos latifúndios e se mantivesse organizada sempre poderia estruturar um novo conjunto de instituições as leis de Jim Crow em lugar da escravidão para atingir o mesmo objetivo O círculo vicioso revelouse mais forte do que muitos inclusive Abraham Lincoln haviam imaginado Baseiase em instituições políticas extrativistas que criam instituições econômicas igualmente extrativistas as quais por sua vez vêm dar sustentação às primeiras à medida que riqueza e poder econômicos compram poder político Uma vez afastada a hipótese de concessão de 40 acres de terra e uma mula para cada escravo liberto o poder econômico da elite rural sulista mantevese intacto E como seria tristemente de esperar as implicações tanto para a população negra do Sul quanto para o desenvolvimento econômico da região foram as mesmas A LEI DE FERRO DA OLIGARQUIA A dinastia salomônica na Etiópia perdurou até ser derrubada por um golpe militar em 1974 liderado pelo Derg um grupo de oficiais militares marxistas O regime destronado era um anacronismo histórico que parecia congelado em algum século anterior O dia do imperador Hailé Selassié começava com sua chegada ao Grande Palácio erguido pelo Imperador Menelik II em fins do século XIX diante do edifício havia sempre uma multidão de dignitários aguardando a sua chegada desfazendose em mesuras e tentativas desesperadas de chamarlhe a atenção O imperador recebia a corte na Sala de Audiências sentado no trono imperial Selassié era baixo para que suas pernas não ficassem balançando no ar era função de um segurador de almofadas especial acompanhálo aonde quer que fosse e certificarse de que houvesse sempre uma almofada adequada para acomodarlhe os pés Para tanto esse funcionário dispunha de um estoque de 52 almofadas que lhe permitiria lidar com qualquer tipo de situação Selassié presidia um conjunto de instituições extremamente extrativistas governando o país como se fosse propriedade particular sua distribuindo favores e patrocínios e punindo de forma implacável qualquer falta de lealdade Sob a dinastia salomônica não se verificou na Etiópia nenhum desenvolvimento econômico digno de nota Inicialmente o Derg era composto por 108 representantes de diferentes unidades militares de todo o país O representante da Terceira Divisão da província de Harar era um major chamado Mengistu Hailé Mariam Embora em sua declaração inicial de 4 de julho de 1974 os oficiais do Derg tenham reafirmado sua lealdade ao imperador logo começaram a prender membros do governo a fim de testar o quanto de oposição encontrariam Tendo ganhado mais confiança com relação ao esvaziamento do apoio ao regime de Selassié investiram contra o próprio prendendoo em 12 de setembro Então começaram as execuções Muitos políticos do núcleo do antigo regime foram prontamente mortos Em dezembro o Derg declarou que a Etiópia era um Estado socialista Selassié morreu provavelmente assassinado em 27 de agosto de 1975 Nesse mesmo ano o Derg começou a nacionalizar as propriedades inclusive todas as terras urbanas e rurais e a maior parte das propriedades privadas O comportamento cada vez mais autoritário do regime inflamou a oposição por todo o país Vastas regiões da Etiópia haviam sido agregadas durante a expansão colonial europeia no fim do século XIX e começo do XX graças às políticas do Imperador Menelik II vencedor da Batalha de Adowa que já encontramos antes página 184 Aí se incluíam Eritreia e Tigré no norte e Ogaden no leste Em resposta à inclemência do regime do Derg despontaram movimentos de independência na Eritreia e em Tigré ao passo que o exército da vizinha Somália invadia o território de Ogaden de idioma somali O próprio Derg começou a desintegrarse e fragmentarse em facções O Major Mengistu revelouse o mais atroz e inteligente deles Em meados de 1977 havia eliminado seus principais adversários e praticamente assumira o controle do governo que só se salvou do colapso graças a um considerável influxo de armas e tropas da União Soviética e Cuba em novembro daquele ano Em 1978 o regime organizou uma celebração nacional para assinalar o quarto aniversário do destronamento de Hailé Selassié A essa altura Mengistu era o líder inequívoco do Derg Como residência o lugar de onde governaria a Etiópia ele havia escolhido o Grande Palácio de Selassié que havia ficado desocupado desde a abolição da monarquia Na celebração ele se acomodou em uma poltrona dourada como os imperadores de antigamente para assistir à parada O Grande Palácio voltou a sediar o governo e o antigo trono de Hailé Selassié passou a ser ocupado por Mengistu que começou a compararse ao Imperador Tewodros que havia reinaugurado a Dinastia Salomônica em meados do século XIX após um período de declínio Um de seus ministros Dawit Wolde Giorgis registra em suas memórias No começo da revolução todos havíamos rejeitado fervorosamente tudo o que guardasse qualquer relação com o passado Recusávamonos a dirigir automóveis ou usar ternos e considerávamos criminosas as gravatas Tudo o que nos conferisse um aspecto abastado ou burguês tudo que tivesse laivos de opulência ou sofisticação era desprezado como parte da velha ordem Todavia por volta de 1978 isso começou a mudar Pouco a pouco o materialismo passou a ser não só aceito mas necessário Trajes assinados pelos melhores alfaiates europeus tornaramse os uniformes de todos os mais altos funcionários do governo e membros do Conselho Militar Tínhamos o melhor de tudo as melhores moradias os melhores carros o melhor uísque champanhe comida Uma total inversão dos ideais da revolução Giorgis recorda também vividamente como Mengistu mudou após transformarse no único governante Mengistu revelou sua verdadeira face vingativo cruel e autoritário Muitos de nós que conversávamos com ele de igual para igual com as mãos nos bolsos começamos a nos pegar em posição de sentido adotando uma atitude cautelosamente respeitosa em sua presença Ao dirigirmonos à sua pessoa sempre havíamos usado a forma familiar você ante agora preferíamos o mais formal senhor ersiwo Ele se mudou para uma sala maior e mais suntuosa no Palácio de Menelik Começou a usar os automóveis do imperador Onde originalmente se supunha que houvesse uma revolução de igualdade ele agora se tinha convertido no novo imperador O padrão do círculo vicioso retratado pela transição de Hailé Selassié para Mengistu ou dos governadores coloniais britânicos de Serra Leoa para Siaka Stevens é tão extremo e sob determinados aspectos tão estranho que merece um nome especial Como já mencionamos no Capítulo 4 é o que o sociólogo alemão Robert Michels chama de lei de ferro da oligarquia A lógica interna das oligarquias e a rigor de todas as organizações hierárquicas consiste segundo Michels na tendência a se reproduzirem não só quando o mesmo grupo está no poder mas quando um grupo inteiramente novo assume o controle O que passou despercebido de Michels talvez foi um eco da afirmação de Karl Marx de que a história se repete na primeira vez como tragédia na segunda como farsa Os líderes da África pósindependência não se limitaram a ocupar as mesmas residências utilizar as mesmas redes de patronagem e lançar mão dos mesmos recursos para manipular mercados e extrair recursos empregados pelos regimes coloniais e imperadores que vieram substituir mais que isso eles efetivamente pioraram a situação Com efeito o fato de que o ferrenho anticolonialista Stevens tratou de submeter o mesmo povo os mendes que os britânicos tanto se empenharam em controlar não pode ser descrito senão como farsesco o mesmo se pode dizer de sua opção por valerse dos mesmos chefes aos quais os britânicos haviam conferido poder e usado para controlar o interior do país bem como de sua decisão de administrar a economia do mesmo modo expropriando os fazendeiros por intermédio das mesmas juntas comerciais e submetendo a exploração de diamantes a um monopólio similar Foi de fato uma farsa e muito triste o fato de Laurent Kabila que logrou mobilizar um exército contra a ditadura de Mobutu acenando com a promessa de libertar o povo e pôr fim à corrupção e repressão sufocantes e depauperantes que grassavam no Zaire ter ascendido ao poder apenas para implementar um regime tão corrupto quanto o anterior e talvez ainda mais desastroso Foi por certo farsesca sua tentativa de instaurar um culto mobutesco à sua personalidade auxiliado e instigado por Dominique Sakombi Inongo exministro da Informação de Mobutu e que o governo do próprio Mobutu tenha seguido padrões de exploração das massas iniciados mais de um século antes com o Estado Livre do Congo do Rei Leopoldo Sem a menor sombra de dúvida foi uma farsa o fato de o oficial marxista Mengistu ter ido morar em um palácio considerandose um imperador e locupletandose e ao seu entourage do mesmíssimo modo como Hailé Selassié e outros imperadores antes dele Tudo não passou de uma farsa mas também ainda mais trágica que a tragédia original e não só para as esperanças então esmagadas Stevens e Kabila como tantos outros governantes da África começaram assassinando seus rivais e depois cidadãos inocentes Mengistu e as forças policiais do Derg fariam cair sobre as férteis terras etíopes fomes recorrentes A história se repetia mas de maneira muito distorcida Foi uma fome na província de Wollo em 1973 à qual Hailé Selassié reagiu com aparente indiferença que finalmente consolidou a oposição ao seu regime No entanto Selassié ao menos havia se mostrado apenas indiferente Mengistu por sua vez usava a fome como ferramenta política a fim de solapar a força dos adversários A história não mostrou somente uma face farsesca e trágica para os cidadãos da Etiópia e da África subsaariana mas também cruel É justamente da essência da lei de ferro da oligarquia essa faceta específica do círculo vicioso que os novos líderes que vêm derrubar os antigos com promessas de mudança radical nada tragam de novo além de mais do mesmo Sob certos aspectos é mais difícil entendêla do que às demais características do círculo vicioso Há uma lógica clara na persistência das instituições extrativistas no Sul dos Estados Unidos e na Guatemala os mesmos grupos conservaramse no controle da economia e da política por séculos Apesar dos empecilhos como no caso dos latifundiários sulistas após a Guerra de Secessão americana seu poder permaneceu intacto o que lhes permitiu manter e recriar um conjunto similar de instituições extrativistas de que continuar beneficiandose Todavia como podemos compreender os que se alçaram ao poder em nome de mudanças radicais apenas para recriar o mesmo sistema A resposta a essa pergunta demonstra mais uma vez que o círculo vicioso é mais forte do que pode parecer à primeira vista Nem todas as mudanças radicais estão fadadas ao fracasso A Revolução Gloriosa foi radical e levou àquela que talvez tenha sido a mais importante revolução política dos últimos dois milênios A Revolução Francesa foi ainda mais radical com todo o caos e excessiva violência que fomentou até a ascensão de Napoleão Bonaparte mas não retomou o Ancien Régime Três fatores facilitaram enormemente a emergência de instituições políticas mais inclusivas após as Revoluções Gloriosa e Francesa O primeiro foi o desejo dos novos mercadores e homens de negócios de deflagrar a destruição criativa em toda a sua potência que lhes teria enorme serventia esses novos homens estavam entre os protagonistas das coalizões revolucionárias e não pretendiam assistir ao desenvolvimento de um novo conjunto de instituições extrativistas que apenas continuaria a explorálos O segundo foi a natureza da ampla coalizão que se formou em ambos os casos Por exemplo a Revolução Gloriosa não foi um golpe levado a cabo por um grupo restrito ou interesses muito específicos mas um vasto movimento que contava com o apoio de mercadores industriais fidalgos e facções políticas diversas O mesmo se pode dizer em termos gerais da Revolução Francesa O terceiro fator diz respeito à história das instituições políticas inglesas e francesas que criou um contexto em que regimes novos e mais inclusivos puderam se desenvolver Nos dois países havia uma tradição parlamentar e de divisão de poder que remontava à Magna Carta na Inglaterra e à Assembleia de Notáveis na França Ademais ambas as revoluções deramse em meio a um processo que já havia enfraquecido o poder dos regimes absolutistas ou aspirantes a absolutistas Nos dois casos as instituições políticas existentes tornariam difícil que novos governantes ou grupos estritos tomassem o poder do Estado e usurpassem a riqueza econômica angariando um poder político irrestrito e duradouro De fato no rastro da Revolução Francesa um pequeno grupo encabeçado por Robespierre e SaintJust chegou a assumir o comando com consequências desastrosas mas foi um domínio temporário que não chegou a desviar o curso dos acontecimentos rumo a instituições mais inclusivas Tudo isso contrasta com a situação de sociedades com longo histórico de instituições econômicas e políticas extremamente extrativistas em que o poder dos governantes não encontra limites Nessas sociedades não haveria uma nova classe de mercadores ou homens de negócios fortes capazes de dar suporte material e financeiro à resistência ao regime existente em parte a fim de obter instituições econômicas mais inclusivas nem coalizões amplas que pudessem introduzir restrições ao poder de cada um de seus membros nem instituições políticas que dissuadissem os novos governantes de eventuais intenções de usurpação e exploração do poder Por conseguinte em Serra Leoa na Etiópia e no Congo seria muito mais difícil resistir ao círculo vicioso e muito mais improvável que iniciativas na direção de instituições inclusivas chegassem a se concretizar Tampouco havia instituições tradicionais ou históricas capazes de restringir o poder de quem pretendesse assumir o controle do Estado Em determinadas regiões da África houve algumas dessas às vezes como em Botsuana chegando a sobreviver à era colonial Entretanto ao longo da história de Serra Leoa por exemplo foram muito menos proeminentes e quando chegaram a estar presentes acabaram curvandose ao governo indireto O mesmo vale para outras colônias britânicas na África como Quênia e Nigéria Já no reino absolutista da Etiópia elas nunca existiram No Congo as instituições nativas foram emasculadas pelo colonialismo belga e pelas políticas autocráticas de Mobutu Em todas essas sociedades tampouco havia novos mercadores homens de negócios ou empreendedores que pudessem oferecer suporte aos novos regimes e reivindicar direitos de propriedade seguros e o fim das instituições extrativistas anteriores Com efeito graças às instituições econômicas extrativistas do período colonial não restaram grandes negócios nem empreendedorismo para contar história afinal A comunidade internacional acreditava que a independência africana póscolonial acarretaria crescimento econômico por meio de um processo de planejamento estatal e incentivo ao setor privado Contudo não havia nem sombra de setor privado exceto nas áreas rurais que por não terem representação nos novos governos seriam justamente as suas primeiras vítimas O mais importante talvez é que na maioria desses casos os benefícios de agarrarse ao poder eram imensos benefícios que não só atraíam os homens mais inescrupulosos como Stevens em sua ambição de monopolizar o poder como ao mesmo tempo despertavam o pior deles uma vez alcançado o predomínio Não havia nada capaz de romper o círculo vicioso FEEDBACK NEGATIVO E CÍRCULOS VICIOSOS Os países ricos devem sua prosperidade basicamente ao fato de terem conseguido desenvolver em algum momento dos últimos 300 anos instituições inclusivas que persistiram por meio de um processo de círculos virtuosos Ainda que a princípio fossem inclusivas em sentido ainda muito limitado e às vezes frágil elas puderam engendrar uma dinâmica que acarretaria um processo de feedback positivo aumentando gradualmente sua capacidade de inclusão A Inglaterra não se tornou uma democracia após a Revolução Gloriosa de 1688 Muito pelo contrário apenas uma pequena parcela da população foi contemplada com representação formal O elemento crucial nesse caso contudo foi o pluralismo uma vez consagrado instalouse a tendência das instituições a se tornarem cada vez mais inclusivas ao longo do tempo por maiores que fossem os percalços e incertezas encontrados no processo Sob esse aspecto a Inglaterra é um exemplo de círculo virtuoso instituições políticas inclusivas impõem restrições ao exercício e usurpação do poder além de tenderem a criar instituições econômicas inclusivas que por sua vez aumentam as chances de continuidade das instituições políticas inclusivas Sob instituições econômicas inclusivas a riqueza não se concentra nas mãos de um pequeno grupo que pode então valerse de seu poderio econômico para ampliar desproporcionadamente seu poder político Ademais sob instituições econômicas inclusivas os ganhos decorrentes da detenção do poder político são mais limitados reduzindo os incentivos para grupos e aventureiros individuais ambiciosos tentarem assumir o controle do Estado Em geral uma confluência de fatores em uma circunstância crítica entre eles as interrelações entre as instituições existentes e as oportunidades e desafios produzidos pela própria circunstância crítica é responsável pelo despontar de instituições inclusivas como demonstra o caso inglês Uma vez instaladas essas instituições inclusivas porém já não precisamos mais da mesma confluência de fatores para assegurarlhes a sobrevivência Os círculos virtuosos embora continuem sujeitos a contingências significativas possibilitam a continuidade das instituições e com frequência chegam mesmo a desencadear uma dinâmica que conduz a sociedade a uma inclusão crescente Do mesmo modo como os círculos virtuosos fazem as instituições inclusivas persistirem os viciosos criam forças poderosas em direção à manutenção das instituições extrativistas História não é destino e os círculos viciosos não são inquebráveis como veremos mais adiante no Capítulo 14 mas são resistentes Podem criar um poderoso processo de feedback negativo em que as instituições políticas extrativistas forjem suas contrapartes econômicas as quais por sua vez fornecem a base para a persistência das primeiras Foi o que vimos com muita clareza no caso da Guatemala onde a mesma elite permaneceu no poder primeiro no período colonial depois no país independente por mais de quatro séculos as instituições extrativistas enriquecem a elite e tal riqueza constitui a base para a continuidade de seu domínio O mesmo processo do círculo vicioso fica evidente também na sobrevivência da economia de plantation no Sul dos Estados Unidos cuja trajetória demonstra também a enorme resiliência desse mecanismo vicioso frente a desafios Com a derrota na Guerra de Secessão os latifundiários sulistas perderam o controle formal das instituições econômicas e políticas a escravidão base da economia de plantation foi abolida e concederamse aos negros direitos políticos e econômicos iguais Não obstante a guerra não destruiu o poder político da elite rural nem seus fundamentos econômicos o que lhe permitiu reestruturar o sistema agora com nova roupagem mas ainda sob seu controle político local conquistando assim o mesmo objetivo a abundância de mão de obra barata para os latifúndios Essa modalidade de círculo vicioso em que as instituições extrativistas perduram porque persiste também a elite que as controla e delas se beneficia não é a única A princípio uma forma de feedback negativo mais intrigante mas não menos real e não menos daninha moldou o desenvolvimento político e econômico de diversos países sendo exemplificada pelas experiências encontradas em boa parte da África subsaariana sobretudo em Serra Leoa e na Etiópia Em um esquema que o sociólogo Robert Michels reconheceria como a lei de ferro da oligarquia a derrubada de um regime que preside instituições extrativistas precede o advento de um novo grupo de senhores para explorar o mesmo conjunto de perniciosas instituições extrativistas A lógica desse tipo de círculo vicioso em retrospecto é também de fácil entendimento instituições políticas extrativistas impõem poucas restrições ao exercício do poder de modo que praticamente inexistem instituições capazes de cercear o uso e o abuso do poder por parte de quem derruba os ditadores preexistentes e assume o controle do Estado por outro lado o extrativismo das instituições econômicas implica que o mero controle do poder assegura grandes lucros e riqueza graças à expropriação dos ativos alheios e ao estabelecimento de monopólios Naturalmente a lei de ferro da oligarquia não é uma lei de verdade no mesmo sentido das leis da física Ou seja não estabelece um caminho inevitável como bem ilustram a Revolução Gloriosa na Inglaterra ou a Restauração Meiji no Japão Um fator crucial nesses episódios que envolveram uma reviravolta crucial em direção a instituições inclusivas foi o empoderamento de ampla coalizão capaz de fazer frente ao absolutismo e substituir as instituições absolutistas por outras mais inclusivas e pluralistas Uma revolução encabeçada por uma coalizão ampla aumenta muito a probabilidade de emergência de instituições políticas pluralistas Em Serra Leoa e na Etiópia a lei de ferro da oligarquia mostrouse mais provável não só devido ao alto grau de extrativismo das instituições existentes mas também porque nem o movimento de independência na primeira nem o golpe do Derg na segunda foram revoluções realizadas por coalizões com essa característica mas por indivíduos e grupos ávidos por poder e por apropriarse eles mesmos das ferramentas de extração Existe outra faceta do círculo vicioso ainda mais destrutiva antecipada por nossa discussão do caso das cidadesestados maias no Capítulo 5 Quando as instituições extrativistas produzem imensas desigualdades na sociedade e conferem grande riqueza e poder irrestrito para quem estiver no comando muitos se disporão a lutar para assumir o controle do Estado e das instituições Assim as instituições extrativistas não só preparam o terreno para o próximo regime que será então ainda mais extrativista como também acarretam disputas internas e guerras civis ininterruptas conflitos civis que não só causam mais sofrimento humano como destroem qualquer eventual centralização do Estado que essas sociedades possam ter alcançado Assim em geral se deflagra por sua vez uma espiral descendente rumo à ilegalidade à falência do Estado e ao caos político esmagando toda e qualquer esperança de prosperidade econômica como ilustrará o próximo capítulo E 13 POR QUE AS NAÇÕES FRACASSAM HOJE COMO GANHAR A LOTERIA NO ZIMBÁBUE RA JANEIRO DE 2000 em Harare Zimbábue O mestre de cerimônias Fallot Chawawa estava encarregado de sortear o bilhete vencedor da loteria nacional organizada por um banco parcialmente estatal o Zimbabwe Banking Corporation Zimbank A loteria fora aberta a todos os clientes que houvessem mantido US5 mil ou mais do Zimbábue em suas contas durante o mês de dezembro de 1999 Quando Chawawa retirou o bilhete ficou perplexo Nas palavras da declaração pública do Zimbank o mestre de cerimônias Fallot Chawawa mal pôde crer no que seus olhos viam quando o bilhete sorteado para o prêmio de Z100000 lhe foi entregue e ele leu o nome de Sua Excelência RG Mugabe O Presidente Robert Mugabe que desde 1980 governava o Zimbábue por bem ou por mal geralmente com pulso de ferro ganhou o prêmio da loteria no valor de US100 mil do Zimbábue cerca de cinco vezes a renda anual per capita do país Segundo o Zimbank o nome de Mugabe fora sorteado dentre milhares de clientes possíveis Que homem de sorte Desnecessário dizer que a rigor ele não precisava do dinheiro Com efeito Mugabe recentemente concedera a si mesmo e ao seu gabinete aumentos salariais de até 200 O bilhete de loteria não passou de mais um indício das instituições extrativistas do Zimbábue Poderíamos qualificar o ocorrido como corrupção mas isso não passa de um sintoma do malestar institucional no Zimbábue O fato de Mugabe poder até ganhar na loteria se quisesse mostrou o grau de controle por ele exercido sobre o país e deu ao mundo um vislumbre da dimensão das instituições extrativistas do Zimbábue O motivo mais comum por que as nações fracassam hoje é o fato de suas instituições serem extrativistas Zimbábue sob o regime de Mugabe é um exemplo vívido das consequências econômicas e sociais Embora as estatísticas nacionais no país sejam muito pouco dignas de confiança a melhor estimativa é que em 2008 sua renda per capita caíra para cerca da metade da época da conquista da independência em 1980 Por mais dramático que esse dado possa parecer ele nem começa a descrever o grau de deterioração dos padrões de vida no Zimbábue O Estado ruiu e mais ou menos parou de prestar qualquer serviço público básico Em 20082009 a degeneração do sistema de saúde levou a um surto de cólera no país Em 10 de janeiro de 2010 havia 98741 casos relatados e 4293 mortos fazendo daquele o mais mortal surto de cólera na África dos últimos 15 anos Nesse ínterim o desemprego em massa também alcançou níveis sem precedentes No começo de 2009 o Gabinete de Coordenação de Assuntos Humanitários da ONU declarou que o índice de desemprego havia atingido o incrível patamar de 94 As origens de muitas instituições econômicas e políticas no Zimbábue como no caso da maior parte da África subsaariana remontam ao período colonial Em 1890 a Companhia Britânica da África do Sul comandada por Cecil Rhodes enviou uma expedição militar para o então reino dos ndebele sediado em Matabeleland e também para a vizinha Mashonaland A superioridade de seus armamentos assegurou sem dificuldade a supressão da resistência africana e em 1901 foi fundada a colônia de Rodésia do Sul nome em homenagem a Rhodes na área do atual Zimbábue Tendo convertido a região em uma concessão privada pertencente à Companhia Britânica da África do Sul Rhodes esperava ganhar dinheiro prospectando e garimpando minerais preciosos Seus planos não chegaram a decolar mas as riquíssimas terras agrícolas começaram a atrair imigrantes brancos Esses colonos não tardaram a apropriarse de boa parte do território Em 1923 haviam se libertado do controle da Companhia Britânica da África do Sul e persuadido o governo britânico a concederlhes autonomia parcial de governo O que se passou então é muito similar ao que ocorrido na África do Sul cerca de uma década antes Em 1913 a Lei das Terras Nativas páginas 205206 fundou uma economia dupla na África do Sul A Rodésia aprovou uma legislação muito similar e com inspiração no modelo sulafricano pouco depois de 1923 emergiu um estado de apartheid só para brancos Com o colapso dos impérios coloniais europeus em fins da década de 1950 e começo da de 1960 em 1965 a elite branca da Rodésia liderada por Ian Smith e compreendendo talvez 5 da população declarou independência da Inglaterra Poucos governos internacionais a reconheceram e a ONU decretou sanções econômicas e políticas contra a Rodésia Os cidadãos negros organizaram uma guerrilha com bases nos países vizinhos de Moçambique e Zâmbia As pressões internacionais e a rebelião encetada pelos dois grupos principais ZANU Zimbabwe African National Union União Nacional Africana do Zimbábue de Mugabe e ZAPU Zimbabwe African Peoples Union União do Povo Africano do Zimbábue encabeçado por Joshua Nkomo resultaram no fim negociado do domínio branco O Estado do Zimbábue foi criado em 1980 Após a independência Mugabe rapidamente estabeleceu seu controle pessoal ora eliminando violentamente seus opositores ora cooptandoos Os atos de violência mais egrégios ocorreram em Matabeleland principal fonte de apoio do ZAPU onde cerca de 20 mil pessoas foram mortas no começo dos anos 1980 Em 1987 o ZAPU havia se fundido com o ZANU criando o ZANUPF e Joshua Nkomo fora anulado politicamente Mugabe conseguiu reescrever a Constituição que herdara como parte da negociação da independência tornandose presidente havia começado como primeiro ministro e abolindo os títulos dos eleitores brancos parte integrante do acordo de independência até que em 1990 conseguiu livrarse em definitivo do Senado e introduzir cargos no Legislativo cujos ocupantes cabia a ele nomear O resultado foi um Estado de fato unipartidário encabeçado por Mugabe Por ocasião da independência Mugabe assumiu o controle de um conjunto de instituições econômicas extrativistas criadas pelo regime branco Aí figuravam uma variedade de regulamentações de preço e do comércio internacional indústrias estatizadas e as obrigatórias juntas comerciais agrícolas O funcionalismo público expandiuse rapidamente com a distribuição de cargos entre os partidários do ZANU PF O rígido controle da economia pelo governo interessava às elites do ZANUPF por dificultar o surgimento de uma classe independente de homens de negócios africanos que poderiam vir a desafiar o monopólio político então vigente situação muito similar àquela de Gana na década de 1960 como vimos no Capítulo 2 páginas 5053 Por ironia claro isso destinou aos brancos o papel de principal classe de negócios Durante esse período os pontos mais fortes da economia branca especialmente o setor altamente produtivo de agricultura de exportação permaneceu incólume Contudo essa situação duraria somente até Mugabe perder a popularidade O modelo de regulamentação e intervenção do mercado foi pouco a pouco se mostrando insustentável após uma grave crise fiscal teve início em 1991 um processo de reforma institucional com apoio do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional A deterioração do desempenho econômico levou por fim à emergência de uma séria oposição política ao governo unipartidário do ZANUPF o Movimento pela Mudança Democrática MDC As eleições parlamentares de 1995 nada tiveram de competitivas porém O ZANUPF obteve 81 dos votos conquistando 118 dos 120 assentos Desses membros do Parlamento 55 foram eleitos sem adversários As eleições presidenciais no ano seguinte apresentaram ainda mais indícios de irregularidades e fraude Mugabe recebeu 93 dos votos mas seus dois rivais Abel Muzorewa e Ndabaningi Sithole já haviam retirado suas candidaturas antes das eleições acusando o governo de coação e fraude Depois do ano 2000 apesar de toda a corrupção o domínio do ZANUPF começou a fraquejar Conseguiu apenas 49 dos votos populares e somente 63 assentos no Parlamento Todos foram contestados pelo MDC que conquistou todos os votos da capital Harare Nas eleições presidenciais de 2002 Mugabe venceu por pouco com apenas 56 do total de votos Nas duas votações o ZANUPF saiu vitorioso somente graças à violência e intimidação aliadas a fraude eleitoral Em resposta à perda de poder político Mugabe tratou de intensificar tanto a repressão quanto o uso da máquina estatal para angariar apoio Partindo para o ataque frontal aos proprietários de terras brancos começou a incentivar e apoiar a partir do ano 2000 uma ampla série de ocupações e expropriações de terras em geral conduzidas por associações de veteranos de guerra grupos supostamente compostos por antigos combatentes da guerra de independência Parte das terras expropriadas foi entregue a esses grupos mas boa parte delas foi parar também nas mãos das elites do ZANUPF A insegurança dos direitos de propriedade promovida por Mugabe e pelo ZANUPF levou a um colapso da produção e da produtividade agrícolas Com a falência da economia a única saída que restava era imprimir dinheiro para comprar apoio o que acarretou uma hiperinflação galopante Em janeiro de 2009 tornouse legal usar outras moedas como o rand sulafricano e o dólar do Zimbábue papel sem valor desapareceu de circulação O que se passou no Zimbábue a partir de 1980 foi lugarcomum na África subsaariana após a independência Em 1980 o Zimbábue herdou uma série de instituições econômicas e políticas altamente extrativistas mantidas relativamente intactas na primeira década e meia Por ocasião das eleições as instituições políticas eram tudo menos inclusivas Já as instituições econômicas mudaram um pouco a discriminação explícita dos negros por exemplo foi abolida Em seu conjunto porém permaneceram extrativistas com a única diferença de que em vez de o extrativismo ser promovido por Ian Smith e demais brancos agora eram Robert Mugabe e as elites do ZANUPF a encher seus bolsos Com o passar do tempo as instituições foram se tornando cada vez mais extrativistas e as fontes de renda do país entraram em colapso A falência econômica e política do Zimbábue é mais uma manifestação da lei de ferro da oligarquia nesse caso com o regime extrativista e repressor de Ian Smith sendo substituído pelo regime extrativista corrupto e repressor de Robert Mugabe A vitória forjada de Mugabe na loteria de 2000 não passou portanto da ponta de um iceberg de enorme corrupção ao longo da história AS NAÇÕES FRACASSAM HOJE porque suas instituições econômicas extrativistas são incapazes de engendrar os incentivos necessários para que as pessoas poupem invistam e inovem e suas contrapartes políticas lhes dão suporte à medida que consolidam o poder dos beneficiários do extrativismo As instituições econômicas e políticas extrativistas ainda que seus pormenores variem sob diferentes circunstâncias encontramse sempre na origem do fracasso Este muitas vezes como veremos nos casos da Argentina Colômbia e Egito assume a forma de insuficiência da atividade econômica em virtude da exploração dos recursos promovida pelos políticos que tratam de esmagar todo e qualquer tipo de atividade econômica independente que possa vir a ameaçálos e às elites econômicas Em certos casos extremos como no Zimbábue e em Serra Leoa que discutiremos a seguir as instituições extrativistas preparam o terreno para a total falência do Estado pondo não só a lei e a ordem a perder mas também mesmo os mais básicos incentivos econômicos O resultado é a estagnação econômica e como comprovam as histórias recentes de Angola Camarões Chade República Democrática do Congo Haiti Libéria Nepal Serra Leoa Sudão e Zimbábue conflitos civis migrações em massa fomes e epidemias tornando muitos desses países mais pobres hoje do que eram nos anos 1960 UMA CRUZADA DE CRIANÇAS Em 23 de março de 1991 um grupo de homens armados liderados por Foday Sankoh cruzou o limite entre Libéria e Serra Leoa e atacou a cidade fronteiriça serraleonense de Kailahun Sankoh excabo do Exército deste país fora feito prisioneiro após tomar parte de um golpe contra o governo de Siaka Stevens em 1971 Depois de libertado acabou indo parar na Líbia onde ingressou em um campo de treinamento mantido pelo ditador líbio Coronel Kaddafi para revolucionários africanos Lá conheceu Charles Taylor que planejava derrubar o governo liberiano Quando Taylor invadiu a Libéria na véspera de Natal de 1989 Sankoh estava ao seu lado e foi com um grupo de homens de Taylor em sua maioria liberianos e burquinabeses cidadãos de Burquina Faso que Sankoh invadiu Serra Leoa Autointitulavamse RUF sigla em inglês para Frente Unida Revolucionária Revolutionary United Front e anunciaram sua intenção de derrubar o governo corrupto e tirânico do APC Como vimos no capítulo anterior Siaka Stevens e seu All Peoples Congress o APC assumiram o controle das instituições coloniais de Serra Leoa e intensificaram seu extrativismo do mesmo modo como Mugabe e o ZANUPF fizeram no Zimbábue Em 1985 quando Stevens já com câncer colocou Joseph Momoh em seu lugar a economia estava em franco colapso Stevens aparentemente sem ironia gostava de citar o aforismo a vaca pasta onde a amarram Onde Stevens havia pastado então Momoh refestelouse As estradas se desintegraram as escolas ruíram A programação da televisão nacional foi encerrada em 1987 quando o transmissor foi vendido pelo ministro de Informações e em 1989 uma torre de rádio que repetia os sinais para fora de Freetown veio abaixo pondo fim às transmissões fora da capital Uma análise publicada em 1995 em um jornal da capital Freetown mostrouse muito acurada No fim de seu governo Momoh havia deixado de pagar os funcionários públicos professores e mesmo os Chefes Supremos O governo central havia se desagregado e como consequência inevitável havia incursões nas fronteiras rebeldes e armas automáticas afluindo pela fronteira com a Libéria O NPRC rebeldes e sobeldes soldados transformados em rebeldes contribuem para o caos que se espera encontrar quando o governo desaparece Nada disso é causa dos nossos problemas mas sintoma O colapso do Estado sob Momoh mais uma vez consequência do círculo vicioso desencadeado pelas instituições extremamente extrativistas de Stevens significava que não havia nada que impedisse a RUF de atravessar a fronteira em 1991 O Estado não dispunha de recursos para evitar a invasão Stevens já havia emasculado as Forças Armadas por receio de que elas tentassem derrubálo Assim foi fácil para um número relativamente pequeno de homens armados espalhar o caos pelo país Divulgaram até um manifesto intitulado Passos para a Democracia que começava com uma citação do intelectual negro Frantz Fanon Cada geração deve a partir da relativa obscuridade descobrir sua missão para então cumprila ou traíla A seção Pelo que estamos lutando principia da seguinte maneira Seguimos lutando por estarmos cansados de ser as eternas vítimas da pobreza patrocinada pelo Estado e da degradação humana que sobre nós se abate em decorrência de anos de militarismo e governo autocrático Contudo exercitaremos a continência e continuaremos aguardando com paciência nosso encontro com a paz onde seremos todos vitoriosos Nosso compromisso é com a paz imprescindível a todo custo mas não temos a menor intenção de nos tornarmos vítimas dela Sabemos que nossa causa é justa e DeusAlá jamais nos abandonará em nossa luta por reconstruir uma nova Serra Leoa Ainda que Sankoh e outras lideranças da RUF pudessem ter partido de reivindicações políticas e por mais que as necessidades do povo que sofria sob o jugo das instituições extrativistas do APC pudessem havêlos estimulado a princípio a ingressar no movimento a situação não tardou a mudar e escaparlhes ao controle A missão da RUF mergulhou Serra Leoa em agonia como revela o testemunho de um adolescente de Geoma no sul do país Eles reuniram um grupo Escolheram alguns dos nossos amigos e os mataram dois deles Eram filhos dos chefes tinham botas de soldados e bens em suas casas Atiraram neles sem nenhum outro motivo além da suspeita de estarem escondendo soldados Os chefes também foram mortos por serem membros do governo Indicaram um novo chefe Ainda insistiam em dizer que tinham vindo nos libertar do APC Depois de um tempo já não escolhiam mais pessoas para matar atiravam em qualquer um No primeiro ano da invasão todo e qualquer laivo intelectual que a RUF pudesse ter extinguiuse por completo Sankoh executava todos os que criticassem o recrudescimento das atrocidades Não tardou para que fossem poucos os que se juntavam voluntariamente à RUF que precisou recorrer então ao recrutamento compulsório sobretudo de crianças Com efeito era o que faziam todos os lados envolvidos inclusive o Exército Se a guerra civil serraleonense foi uma cruzada pela construção de uma sociedade melhor no fim das contas foi uma cruzada de crianças O conflito intensificouse com massacres e a violação generalizada dos direitos humanos incluindo estupros coletivos e amputação de mãos e orelhas Quando a RUF assumia o controle de determinada área entregavase também à exploração econômica prática mais evidente na mineração de diamantes onde a população era coagida a trabalhar no garimpo mas disseminada também em outros setores A RUF não era a única a perpetrar atrocidades massacres e trabalhos forçados organizados O governo fazia o mesmo Era de tal magnitude o colapso da lei e da ordem que era difícil para as pessoas distinguir os soldados dos rebeldes A disciplina militar desapareceu por completo Ao final da guerra em 2001 o saldo era provavelmente de 80 mil mortos além de um país devastado Estradas casas e edifícios foram completamente destruídos Até hoje quem chega a Koidu grande região diamantífera no leste do país avista filas de casas queimadas e cobertas de buracos de bala Em 1991 o Estado em Serra Leoa havia se desintegrado por completo Recordemos a prática inaugurada pelo Rei Shyaam com os bushong páginas 105106 ao estabelecer instituições extrativistas que consolidaram seu poder e lhe permitiram extrair os frutos produzidos pelo resto da sociedade Mesmo instituições extrativistas concentradas nas mãos de uma autoridade central representavam um avanço em relação à ausência de lei e ordem autoridade central e direitos de propriedade que caracterizava a sociedade lele do outro lado do Rio Cassai Tamanha falta de ordem e autoridade central tem sido o destino de um semnúmero de países africanos nas últimas décadas parcialmente porque o processo de centralização política sofreu um atraso histórico em grande parte da África subsaariana mas também porque o círculo vicioso de instituições extrativistas tratou de reverter qualquer centralização do Estado porventura existente abrindo caminho para a falência do Estado Durante os 10 anos de sua sangrenta Guerra Civil entre 1991 e 2001 Serra Leoa foi um caso típico de falência do Estado O processo teve início como qualquer outro país tolhido por instituições extrativistas ainda que de um tipo particularmente nocivo e ineficiente Os países tornamse Estados falidos não em virtude de sua geografia ou cultura mas em função do legado de instituições extrativistas que concentram o poder e a riqueza nas mãos de quem detém o controle do Estado preparando o terreno para agitação social conflitos e guerra civil As instituições extrativistas também contribuem diretamente para a gradual falência do Estado à medida que negligenciam os investimentos nos serviços públicos mais fundamentais exatamente o que aconteceu em Serra Leoa As instituições extrativistas que expropriam e empobrecem o povo e bloqueiam o desenvolvimento econômico são bastante comuns na África Ásia e América do Sul Charles Taylor ajudou a deflagrar a Guerra Civil em Serra Leoa ao mesmo tempo em que iniciava um conflito selvagem na Libéria que levou à falência do Estado também nesse país Encontrase esse mesmo padrão de colapso das instituições extrativistas degenerando em guerra civil e falência do Estado em outras regiões da África como em Angola Costa do Marfim República Democrática do Congo Moçambique República do Congo Somália Sudão e Uganda O extrativismo prepara o terreno para o conflito de modo semelhante às disputas geradas pelas instituições altamente extrativistas das cidadesestados maias quase mil anos atrás O conflito por sua vez precipita a falência do Estado Portanto outra causa do fracasso das nações hoje é a falência de seus respectivos Estados o que por sua vez é uma consequência de décadas de governo sob instituições econômicas e políticas extrativistas QUEM É O ESTADO Os casos do Zimbábue Somália e Serra Leoa ainda que típicos dos países pobres da África e talvez mesmo de alguns da Ásia parecem bastante extremos Dificilmente na América Latina encontraríamos países com Estados falidos onde seus presidentes teriam o atrevimento de ganhar a loteria não é Na Colômbia a Cordilheira dos Andes dissolvese gradualmente ao norte com uma vasta planície litorânea banhada pelo Mar do Caribe Os colombianos chamam essa área de tierra caliente terra quente em oposição à região andina da tierra fria terra fria Durante os últimos 50 anos a Colômbia foi considerada uma democracia pela maior parte dos cientistas políticos e governos Os Estados Unidos de bom grado negociam um potencial acordo de livre comércio com o país e despejam sobre ele todo tipo de assistência sobretudo de cunho militar Desde o encerramento em 1958 de um breve governo militar vêm sendo realizadas eleições regulares embora até 1974 um pacto assegurasse o revezamento no poder político e na presidência dos dois partidos políticos tradicionais os conservadores e os liberais Ademais tal pacto chamado de Frente Nacional foi ratificado pelo próprio povo colombiano por meio de um plebiscito o que confere ao país suficiente aparência democrática Apesar do longo histórico de eleições democráticas no país porém suas instituições não são inclusivas Pelo contrário sua trajetória ao longo do tempo vem sendo tolhida por violações das liberdades civis execuções extrajudiciais violência contra civis e guerra civil Nada mais longe do cenário que se espera de uma democracia A Guerra Civil na Colômbia é diferente da de Serra Leoa onde Estado e sociedade entraram em colapso e o caos se instaurou Mas não deixa de ser um conflito civil que já causou um número de mortes bem maior que o serraleonense Em parte aliás o governo militar dos anos 1950 foi uma resposta a uma guerra civil conhecida em espanhol como La Violencia A Violência Desde então uma variedade de grupos insurgentes em sua maioria revolucionários comunistas vem assolando o interior promovendo sequestros e assassinatos Na Colômbia rural para evitar uma dessas opções desagradáveis é preciso pagar a vacuna literalmente vacina isto é é preciso inocularse contra assassinatos ou sequestros mediante pagamentos mensais a determinado grupo de facínoras armados Nem todos os grupos armados na Colômbia são comunistas em 1981 membros da principal guerrilha comunista colombiana as Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia FARC Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia sequestraram um fabricante de laticínios Jesus Castaño morador de uma aldeia chamada Amalfi na terra quente região nordeste do departamento de Antioquia Foi pedido um resgate de US75 mil uma pequena fortuna na Colômbia rural Para levantar o dinheiro a família hipotecou a fazenda mas o pai foi encontrado morto do mesmo modo acorrentado a uma árvore Para três dos filhos de Castaño Carlos Fidel e Vicente foi a gota dágua Fundaram um grupo paramilitar Los Tangueros a fim de caçar membros das FARC e vingar o assassinato do pai Os irmãos revelaramse bons organizadores e seu bando não demorou a crescer e começar a encontrar interesses comuns com outros grupos paramilitares semelhantes que haviam surgido por motivos parecidos Em muitas regiões onde os colombianos sofriam nas mãos das guerrilhas de esquerda começaram a se formar milícias de direita Os paramilitares foram adotados pelos proprietários rurais para se defender das guerrilhas mas envolviamse também em tráfico de drogas extorsões sequestro e assassinato de cidadãos Em 1997 os paramilitares encabeçados pelos irmãos Castaño haviam conseguido compor uma milícia nacional batizada de Autodefensas Unidas de Colombia AUC Forças de Autodefesa Unidas da Colômbia que se expandiram por vastas áreas do país sobretudo pelas terras quentes nos departamentos de Córdoba Sucre Magdalena e César Em 2001 as AUC contavam talvez com 30 mil homens armados à sua disposição organizados em diferentes blocos paramilitares Em Córdoba havia o Bloque Catatumbo liderado por Salvatore Mancuso Com a ampliação de seu poder as AUC tomaram a decisão estratégica de imiscuirse na política Milicianos e políticos começaram a cortejarse Organizouse na cidade de Santa Fé de Ralito em Córdoba um encontro entre as lideranças das AUC e políticos proeminentes Foi emitido um documento conjunto um pacto reivindicando uma nova fundação do país assinado por membros de destaque das AUC como Jorge 40 alcunha de Rodrigo Tovar Pupo Adolfo Paz codinome de Diego Fernando Don Berna Murillo e Diego Vecino nome verdadeiro Edwar Cobo Téllez junto com políticos entre eles os senadores William Montes e Miguel de la Espriella A essa altura as AUC tinham sob seu controle vastas fatias do território colombiano sendo fácil para elas determinar os vencedores das eleições de 2002 para o Congresso e o Senado Por exemplo no município de San Onofre em Sucre a eleição foi encomendada pelo líder miliciano Cadena Corrente Uma testemunha ocular descreveu nos seguintes termos o que se passou Os caminhões enviados por Cadena percorreram os bairros corregimientos e regiões rurais de San Onofre recolhendo as pessoas Segundo alguns habitantes nas eleições de 2002 centenas de camponeses foram levados ao corregimiento Plan Parejo a fim de verem os rostos dos candidatos em quem teriam de votar nas eleições parlamentares Jairo Merlano para o Senado e Muriel Benito Rebollo para o Congresso Cadena pôs em uma bolsa os nomes dos membros do conselho municipal sorteou dois e disse que os mataria além de outras pessoas escolhidas ao acaso caso Muriel não vencesse Ao que parece a ameaça funcionou cada candidato obteve 40 mil votos em todo o departamento de Sucre Não admira que o prefeito de San Onofre tenha assinado o pacto de Santa Fé de Ralito Provavelmente um terço dos congressistas e senadores deveu sua eleição em 2002 ao apoio paramilitar e o Mapa 20 que mostra as áreas da Colômbia sob controle paramilitar demonstra o quanto seu poder era difundido O próprio Salvatore Mancuso expressouse do seguinte modo em uma entrevista Mapa 20 Presença paramilitar na Colômbia 19972005 Trinta e cinco por cento do Congresso foram eleitos em áreas dos estados dos grupos de autodefesa nos quais éramos nós que arrecadávamos impostos promovíamos a justiça dispúnhamos de suficiente controle militar e territorial da região e todos os que quisessem entrar na política tinham de lidar com os representantes políticos que havíamos reunido ali Não é difícil inferir os efeitos para a política e a sociedade do exercício de um controle paramilitar dessa magnitude sobre as instituições econômicas e as políticas públicas A expansão das AUC não foi um processo pacífico O grupo não só combatia as FARC mas também assassinava civis inocentes e aterrorizava e desalojava de suas casas centenas de milhares de pessoas Segundo o Internal Displacement Monitoring Centre IDMC Centro de Monitoramento de Refugiados Internos do Norwegian Refugee Council Conselho Norueguês para Refugiados no começo de 2010 cerca de 10 da população da Colômbia quase 45 milhões de pessoas eram compostos de refugiados internos Os milicianos também assumiram o governo e todas as suas funções exceto pelo fato de que as tarifas que arrecadavam não passavam de mera extorsão para seus próprios bolsos Um pacto extraordinário entre o líder paramilitar Martín Llanos nome verdadeiro Héctor Germán Buitrago e os prefeitos dos municípios de Tauramena Aguazul Maní Villanueva Monterrey e Sabanalarga no departamento de Casanare leste da Colômbia enumera as seguintes normas às quais os prefeitos deveriam aderir por determinação dos Camponeses Paramilitares de Casanare 1 Ceder 50 do orçamento municipal para ser administrado pelos Camponeses aramilitares de Casanare 2 10 de cada contrato municipal destinados aos Camponeses Paramilitares de Casanare 3 Comparecimento obrigatório a todos os encontros convocados pelos Camponeses Paramilitares de Casanare 4 Inclusão dos Camponeses Paramilitares de Casanare em todos os projetos de infraestrutura 5 Afiliação ao novo partido político formado pelos Camponeses Paramilitares de Casanare 6 Cumprimento de seu programa de governo Casanare não é um departamento pobre Pelo contrário é o departamento de maior receita per capita da Colômbia graças às suas consideráveis reservas de petróleo exatamente o tipo de recurso natural que enche os olhos dos milicianos Com efeito uma vez reforçado o seu poder eles trataram de intensificar a expropriação sistemática de bens alheios O próprio Mancuso teria acumulado US25 milhões em imóveis rurais e urbanos Estimase que as terras expropriadas na Colômbia por paramilitares cheguem a 10 do total de terras agrárias A Colômbia não é um Estado falido à beira do colapso mas é um Estado desprovido de suficiente centralização cuja autoridade sobre seu próprio território está longe de ser completa Embora seja capaz de proporcionar segurança e prestar serviços públicos em grandes áreas urbanas como Bogotá e Barranquilla há significativas áreas do país em que os serviços públicos são escassos e a lei e ordem parcas Aí grupos e indivíduos alternativos como Mancuso controlam a política e os recursos Há partes do país em que as instituições econômicas funcionam bastante bem e há elevados níveis de capital humano e competência empresarial em outras regiões as instituições altamente extrativistas são incapazes de oferecer sequer um grau mínimo de autoridade estatal Pode ser difícil compreender como uma situação assim chega a se sustentar por décadas ou mesmo séculos De fato porém verificase aí uma lógica própria como uma espécie de círculo vicioso A violência e a ausência de instituições estatais centralizadas constituem uma relação simbiótica em que os políticos gerenciam os aspectos funcionais da sociedade A simbiose decorre da exploração pelos políticos da falta de lei nas regiões periféricas do país enquanto o governo nacional deixa os grupos paramilitares à vontade para fazer o que bem entendem Esse padrão ficou particularmente evidente nos anos 2000 Em 2002 as eleições para presidente foram vencidas por Álvaro Uribe Uribe tinha algo em comum com os irmãos Castaño seu pai fora morto pelas FARC e sua campanha baseouse no repúdio às tentativas da administração anterior de fazer as pazes com elas Em 2002 sua votação foi 3 pontos percentuais maior nas áreas controladas por paramilitares do que naquelas sem milicianos Em 2006 quando foi reeleito obteve uma votação 11 pontos percentuais maior nessas mesmas regiões Se Mancuso e seus comparsas conseguiam comandar as votações para o Congresso e o Senado podiam repetir a façanha também nas eleições presidenciais sobretudo em se tratando de um candidato em íntima consonância com sua visão de mundo e grande probabilidade de mostrarse leniente com sua atuação Como declarou em setembro de 2005 Jairo Angarita representante de Salvatore Mancuso e exlíder dos blocos de Sinú e San Jorge das AUC ele tinha orgulho em trabalhar pela reeleição do melhor presidente que já tivemos Uma vez eleitos os senadores e deputados milicianos votaram de acordo com os interesses de Uribe especialmente no sentido de mudar a constituição de modo a permitir sua reeleição em 2006 o que não fora possível em 2002 Em troca o Presidente Uribe promulgou uma lei extremamente indulgente permitindo a desmobilização das milícias Desmobilização bem entendido significando não o fim do paramilitarismo mas tão somente sua institucionalização em grandes partes da Colômbia e do Estado colombiano que os milicianos haviam assumido e receberam permissão para manter Na Colômbia diversos aspectos das instituições econômicas e políticas foram se tornando mais inclusivos ao longo do tempo Todavia determinados elementos extrativistas significativos permanecem A ilegalidade e a insegurança dos direitos de propriedade são endêmicas em vastas parcelas do país consequência da falta de controle por parte do Estado nacional de muitas regiões bem como do formato específico assumido pela falta de centralização do Estado na Colômbia Todavia esse não é um cenário inevitável tratase da consequência de uma dinâmica que reflete o círculo vicioso as instituições políticas colombianas não geram incentivos para que os políticos prestem serviços públicos e promovam a lei e a ordem na maior parte do país nem impõem restrições suficientes aos seus atos para impedi los de firmar acordos implícitos ou explícitos com milicianos e facínoras EL CORRALITO No final de 2001 a Argentina encontravase em plena crise econômica Havia três anos que as receitas despencavam o desemprego disparava e o país havia acumulado uma dívida internacional estratosférica As políticas que haviam acarretado essa situação foram adotadas a partir de 1989 pelo governo de Carlos Menem na tentativa de conter a hiperinflação e estabilizar a economia Por algum tempo haviam logrado êxito Em 1991 Menem atrelou o peso argentino ao dólar americano Por lei um peso passou a ser equivalente a US1 e o câmbio permaneceria inalterado Ponto final Bem quase final A fim de convencer a população de que o governo pretendia de fato cumprir a lei as pessoas foram persuadidas a abrir contas bancárias em dólares Estes seriam usados nas lojas da capital Buenos Aires e sacados nos caixas eletrônicos de toda a cidade Tal medida talvez tivesse ajudado a estabilizar a economia se não fosse uma grande desvantagem as exportações argentinas encareceram demais e as importações estrangeiras baratearam Com isso as primeiras foram estancando até parar ao passo que as segundas jorravam A única maneira de pagar pelas importações era endividandose uma situação insustentável Cada vez mais preocupados com a sustentabilidade do peso os argentinos trataram de converter seu patrimônio em dólares depositados em suas contas correntes Afinal se o governo derrubasse a lei e desvalorizasse o peso todos estariam seguros com suas contas em dólares certo E tinham toda razão em preocuparse com o peso Porém foram demasiado otimistas com relação aos seus dólares Em 1o de dezembro de 2001 o governo congelou todas as contas bancárias em princípio por 90 dias Apenas uma pequena soma em dinheiro poderia ser sacada a cada semana No começo eram 250 pesos ainda equivalentes a US250 depois 300 pesos O saque contudo só podia ser efetuado de contas em pesos Não era permitido sacar de contas em dólares a menos que estes fossem convertidos em pesos o que ninguém queria fazer Os argentinos batizaram a situação de el Corralito curralzinho os depositantes viramse confinados em um curral como gado sem ter para onde ir Em janeiro ocorreu finalmente a desvalorização agora em vez de um peso para cada dólar logo eram quatro pesos por dólar Os defensores da poupança em dólares deviam ter se sentido justificados mas não pois o governo então converteu compulsoriamente em pesos todas as contascorrentes que estavam em dólar só que ao câmbio antigo de um para um Quem tivesse economizado US1 mil de repente viuse com apenas US250 O governo havia expropriado três quartos da poupança dos cidadãos A Argentina deixa os economistas perplexos Para ilustrar a dificuldade de se compreender o país o vencedor do Prêmio Nobel de Economia Simon Kuznets certa vez afirmou numa frase que ficaria célebre que havia quatro tipos de países os desenvolvidos os subdesenvolvidos o Japão e a Argentina Afinal na época da Primeira Guerra Mundial o país era um dos mais ricos do mundo iniciou então um declínio contínuo em relação aos demais países ricos da Europa Ocidental e da América do Norte que nas décadas de 1970 e 1980 tornouse um declínio absoluto Aparentemente o desempenho econômico argentino é intrigante mas as razões de sua decadência ficam mais claras quando examinadas sob a ótica das instituições inclusivas e extrativistas É verdade que antes de 1914 a Argentina experimentou cerca de 50 anos de crescimento econômico mas foi um caso clássico de crescimento sob instituições extrativistas Na época o país era governado por uma pequena elite com pesados investimentos na economia agrícola de exportação O crescimento econômico se deu graças à exportação de carne couro e grãos em um período de boom dos preços mundiais dessas commodities Como todas as experiências similares de crescimento sob instituições extrativistas não havia destruição criativa nem inovação envolvidas nem era uma situação sustentável Por volta da Primeira Guerra Mundial a crescente instabilidade política e uma sucessão de revoltas armadas levaram as elites argentinas a tentar abrir o sistema político com o efeito porém de mobilizar forças que elas não tinham condições de controlar Assim em 1930 ocorreu o primeiro golpe militar Entre esse ano e 1983 o país oscilou repetidamente entre o totalitarismo e a democracia bem como entre diversas instituições extrativistas Houve repressão em massa sob o regime militar que chegou ao seu auge na década de 1970 quando pelo menos nove mil pessoas provavelmente muito mais que isso foram ilegalmente executadas Centenas de milhares foram presos e torturados Nos períodos de governo civil havia eleições uma democracia entre aspas por assim dizer pois o sistema político estava longe de ser inclusivo A partir da ascensão de Perón nos anos 1940 a democracia argentina esteve dominada pelo partido político fundado por ele o Partido Justicialista em geral chamado apenas de Peronista Os peronistas venciam as eleições graças a uma portentosa máquina política que lhes angariava a vitória por meio da compra de votos da patronagem e da corrupção generalizada incluindose a concessão de contratos e cargos no governo em troca de apoio político Em certo sentido era uma democracia ainda que nada pluralista O poder estava altamente concentrado nas mãos do Partido Peronista que não era submetido a praticamente nenhuma restrição ao menos quando os militares não se davam ao trabalho de derrubálo do poder Como já vimos páginas 256258 se a Suprema Corte se pusesse no caminho de determinada medida pior para ela Na década de 1940 Perón havia cultivado o movimento trabalhista como base política Ao verse enfraquecido pela repressão militar nos anos 1970 e 1980 seu partido optou por comprar outros votos As políticas e instituições econômicas tinham por objetivo assegurar a receita de seus aliados não garantir igualdade de condições para todos Quando nos anos 1990 o Presidente Menem deparouse com uma limitação no número de mandatos que o impediria de concorrer à reeleição aplicou o mesmo princípio reescreveu a constituição e livrouse do inconveniente Como demonstra o caso de el Corralito mesmo contando com eleições e governos eleitos pelo voto popular estes são perfeitamente capazes de ignorar os direitos de propriedade e expropriar impunemente os próprios cidadãos Os presidentes argentinos e suas elites políticas praticamente não estão submetidos a nenhuma restrição e sem dúvida a nenhum pluralismo O que intrigava Kuznets e decerto tantos outros que visitam Buenos Aires é o fato de a cidade parecer tão diferente de Lima Cidade da Guatemala ou mesmo Cidade do México Não se veem indígenas nem descendentes dos antigos escravos O que salta aos olhos é a arquitetura gloriosa e os prédios erguidos durante a Belle Époque os anos de crescimento sob instituições extrativistas Todavia em Buenos Aires vêse apenas parte da Argentina Menem por exemplo não era da capital Nasceu em Anillaco na província de La Rioja nas montanhas a noroeste da capital e cumpriu três mandatos como governador provincial Na época da conquista das Américas pelos espanhóis essa região do país era uma parte remota do Império Inca e apresentava densa população indígena ver o Mapa 1 Os espanhóis trataram de ali estabelecer encomiendas levando ao florescimento de uma economia altamente extrativista baseada na produção de alimentos e na criação de mulas para os mineiros de Potosí ao norte De fato La Rioja era muito mais próxima de Potosí no Peru e na Bolívia do que de Buenos Aires No século XIX a região produziu o célebre líder militar Facundo Quiroga que governou a região com mão de ferro e marchou com seu exército sobre a capital A história do desenvolvimento das instituições políticas argentinas é a história de como as províncias interioranas como La Rioja foram firmando acordos com Buenos Aires os quais na verdade eram tréguas os senhores da guerra de La Rioja concordaram em deixar Buenos Aires em paz para que suas elites pudessem ganhar dinheiro em troca estas desistiram de reformar as instituições do interior Assim embora a princípio os argentinos pareçam habitar um mundo muito distinto daquele dos peruanos e bolivianos as diferenças se desvanecem quando se deixa as elegantes avenidas de Buenos Aires para trás É a incorporação das preferências e da política do interior às instituições do país que explica o fato de a Argentina apresentar uma trajetória institucional tão semelhante às de outros países latinoamericanos extrativistas Essa incapacidade de fomentar instituições políticas ou econômicas inclusivas por meio do processo eleitoral é típica da América Latina Na Colômbia os paramilitares conseguem definir um terço dos resultados das eleições nacionais Na Venezuela de hoje como na Argentina o governo democraticamente eleito de Hugo Chávez investe contra seus opositores demiteos de cargos no setor público fecha jornais cujos editoriais contrariem seus interesses e expropria propriedades Chávez é muito mais poderoso e encontra muito menos empecilhos do que Sir Robert Walpole com sua tentativa malograda de condenar John Huntridge sob a Lei Negra páginas 235239 na GrãBretanha da década de 1720 Huntridge não teria se dado tão bem na Venezuela ou na Argentina de hoje Por mais que a democracia que emerge na América Latina seja em princípio diametralmente oposta ao predomínio das elites e tanto em sua retórica quanto em seus atos procure promover uma redistribuição dos direitos e oportunidades detidos por pelo menos um segmento da elite seus fundamentos encontramse firmemente arraigados em regimes extrativistas em dois sentidos Em primeiro lugar a persistência por séculos das desigualdades sob regimes extrativistas leva os eleitores nas democracias emergentes a votar em favor de políticos com programas radicais Não que os argentinos não passem de uns ingênuos que acreditam piamente que Juan Perón ou os políticos peronistas mais recentes como Menem ou os Kirchners sejam altruístas preocupados tão somente com os interesses do país ou que os venezuelanos vejam em Chávez a sua salvação Pelo contrário não poucos argentinos e venezuelanos reconhecem que todos os demais políticos e partidos mostraramse por muito tempo incapazes de lhes dar voz proporcionarlhes os serviços públicos mais básicos como estradas e educação e protegêlos da exploração por parte das elites locais Muitos venezuelanos hoje apoiam as políticas adotadas por Chávez ainda que venham acompanhadas de corrupção e desperdício do mesmo modo como muitos argentinos apoiaram as políticas de Perón nas décadas de 1940 e 1970 Em segundo lugar mais uma vez são as instituições extrativistas subjacentes que tornam a política tão favorável e proveitosa para homens fortes como Perón e Chávez em vez de constituir um sistema partidário eficaz na produção de alternativas desejáveis em termos sociais Perón Chávez e dezenas de outros homens fortes latinoamericanos não passam de mais um aspecto da lei de ferro da oligarquia e como o nome indica as raízes dessa lei encontramse no controle subliminar do regime pelas elites O NOVO ABSOLUTISMO Em novembro de 2009 o governo da Coreia do Norte implementou o que os economistas chamam de reforma monetária Em geral esse tipo de iniciativa é causado por surtos inflacionários Na França em janeiro de 1960 uma reforma monetária introduziu um novo franco equivalente a 100 dos francos anteriores Os velhos francos continuaram em circulação e as pessoas continuaram cotando os preços na moeda antiga enquanto a transição paulatina para os novos francos ainda se dava Por fim os velhos francos perderam a validade em janeiro de 2002 quando a França introduziu o euro A reforma nortecoreana à primeira vista pareceu similar Como os franceses em 1960 o governo nortecoreano decidiu tirar dois zeros da moeda Cem dos velhos wons a moeda do país passariam a valer um won novo Os indivíduos poderiam trocar a moeda antiga pela nova mas teriam apenas uma semana para tanto não 42 anos como no caso francês Aí vinha a pegadinha o governo anunciou que ninguém poderia converter mais de 100 mil wons embora o valor posteriormente fosse ampliado para 500 mil Cem mil wons correspondiam a cerca de US40 no câmbio negro De um só golpe o governo varreu do mapa uma enorme fração da riqueza privada dos cidadãos nortecoreanos não se sabe exatamente quanto mas o valor é provavelmente maior do que o total expropriado pelo governo argentino em 2002 O governo da Coreia do Norte é uma ditadura comunista que se opõe à propriedade privada e aos mercados Entretanto é difícil controlar o mercado negro e nele as transações se dão em dinheiro vivo Claro há sempre alguma moeda estrangeira em jogo sobretudo chinesa mas muitas vezes é o won que circula A reforma monetária pretendia punir os usuários desse mercado paralelo e mais especificamente certificarse de que eles não acumulassem fortuna ou poder suficientes para representar uma ameaça ao regime Era mais seguro mantêlos pobres Mas a questão não era só o mercado negro Os nortecoreanos também mantêm suas economias em wons porque há poucos bancos no país todos pertencentes ao governo Na verdade a reforma serviu para expropriar boa parte da poupança da população Por mais que o governo diga que considera o mercado um mal a verdade é que a elite nortecoreana aprecia bastante o que ele pode lhe proporcionar O líder Kim Jong Il falecido em dezembro de 2011 e sucedido pelo filho Kim Jongun usufruia de um palácio de sete andares equipado com bar aparelho de karaokê e um pequeno movie theater No térreo há uma piscina imensa com uma máquina de ondas onde Kim gostava de usar uma prancha munida de um motorzinho Quando em 2006 os Estados Unidos impuseram sanções à Coreia do Norte sabiam exatamente como atingir o regime onde mais doeria Assim proibiram a exportação de mais de 60 artigos de luxo para o país dentre os quais iates jet skis carros de corrida motocicletas aparelhos de DVD e televisões de mais de 29 polegadas Nada mais de echarpes de seda canetas tinteiro assinadas peles nem malas de couro exatamente os itens colecionados por Kim e as elites do Partido Comunista Um estudioso com base nas vendas da empresa francesa Hennessy estimou em US800 mil o orçamento anual de Kim para conhaque antes das sanções É impossível compreender muitas das mais pobres regiões do mundo no fim do século XX sem um entendimento do novo absolutismo do século XX o comunismo Marx vislumbrou um sistema capaz de gerar prosperidade sob condições mais humanas e sem desigualdade Lênin e seu Partido Comunista foram inspirados por ele mas a prática não podia estar mais distante da teoria A Revolução Bolchevique de 1917 foi um evento sangrento que nada teve de humano A igualdade não entrou na equação tampouco já que a primeira coisa que Lênin e seu séquito fizeram foi instalar uma nova elite eles mesmos à frente do Partido Bolchevique Para levar a cabo seus planos trataram de expurgar e assassinar não só elementos não comunistas mas também outros comunistas que pudessem vir a representar uma ameaça ao seu poder No entanto as verdadeiras tragédias ainda estavam por vir primeiro a Guerra Civil depois a coletivização e os recorrentes expurgos de Stálin em que talvez 40 milhões tenham perecido O comunismo russo foi brutal repressivo e sangrento mas não foi um caso isolado As consequências econômicas e o sofrimento humano foram análogos aos de outros exemplos como por exemplo o Camboja da década de 1970 sob o Khmer Vermelho a China e a própria Coreia do Norte Em todos esses casos o comunismo acarretou regimes totalitaristas viciosos e abusos generalizados dos direitos humanos Além da carnificina e do sofrimento humano todos os regimes comunistas estabeleceram vários tipos de instituições extrativistas As de ordem econômica houvesse ou não mercados eram elaboradas especificamente com vistas à extração de recursos da população e em seu absoluto repúdio aos direitos de propriedade em geral acarretavam pobreza em vez de prosperidade No caso soviético como vimos no Capítulo 5 o sistema comunista a princípio engendrou um crescimento acelerado mas depois tropeçou e produziu estagnação As consequências foram muito mais devastadoras na China de Mao no Camboja do Khmer Vermelho e na Coreia do Norte onde as instituições econômicas comunistas conduziram ao colapso econômico e à fome As instituições econômicas comunistas eram por sua vez sustentadas por instituições políticas extrativistas que concentravam todo o poder nas mãos dos partidos comunistas sem impor qualquer restrição ao seu exercício Por mais diversas que essas instituições pudessem parecer em sua forma seus efeitos sobre os meios de vida da população eram análogos aos das instituições extrativistas do Zimbábue e de Serra Leoa ONDE O ALGODÃO É REI O algodão responde por cerca de 45 das exportações do Uzbequistão o que faz dele o produto agrícola mais importante do país desde o estabelecimento da independência a partir do desmanche da União Soviética em 1991 Na vigência do comunismo soviético todas as terras aráveis do Uzbequistão encontravamse sob o controle de 2048 fazendas estatais que após 1991 foram dissolvidas e a terra distribuída Contudo isso não significava que os fazendeiros tivessem autonomia para agir O algodão era demasiado valioso para o novo governo do primeiro e até agora único presidente do Uzbequistão Ismail Karimov Assim foram introduzidas regulamentações determinando o que os produtores poderiam plantar e exatamente por quanto poderiam vendêlo O algodão é uma exportação valiosa e os agricultores recebem uma fração ínfima dos valores praticados no mercado mundial o restante fica com o governo Como ninguém plantaria algodão por esses preços o governo os obriga Hoje cada fazendeiro tem de reservar 35 de suas terras ao algodão o que causou muitos problemas sendo um deles as dificuldades com o maquinário Na época da independência cerca de 40 da safra era colhida por colheitadeiras Após 1991 não surpreende em vista dos incentivos criados pelo regime do Presidente Karimov para os agricultores que estes não se mostrassem nem um pouco dispostos nem a adquirilas nem a cuidar de sua manutenção Reconhecendo o problema Karimov saiu se com uma solução na realidade uma opção mais barata que as colheitadeiras crianças em idade escolar As cápsulas de algodão começam a amadurecer e estão no ponto para a colheita no começo de setembro mais ou menos na altura da volta às aulas Karimov determinou que os governadores locais enviassem cotas de entrega de algodão às escolas No começo de setembro os bancos escolares perdem 27 milhões de alunos dados de 2006 Os professores em vez de instrutores tornamse recrutadores de mão de obra Gulnaz mãe de duas dessas crianças explicou o que acontece No começo de cada ano letivo aproximadamente no princípio de setembro as aulas são suspensas e em vez de irem para a escola as crianças vão para a colheita do algodão Ninguém pede autorização dos pais Não há descanso no fim de semana durante a colheita Se por algum motivo uma criança fica em casa seu professor ou o tutor da turma aparece para denunciar os pais É feito um planejamento para cada uma de 2060 kg diários dependendo da idade Se alguma delas deixa de atingir sua meta na manhã seguinte é repreendida na frente de toda a classe A colheita se estende por dois meses As crianças da região rural que têm a sorte de ser designadas para fazendas perto de casa podem ir andando ou são levadas de ônibus para o trabalho As que moram mais longe ou vêm das cidades têm de dormir nos telheiros ou currais junto com as máquinas e o gado Não há banheiros nem cozinhas As crianças têm de levar sua própria comida para o almoço Os principais beneficiários de todo esse trabalho forçado são as elites políticas encabeçadas pelo Presidente Karimov o rei de fato de todo o algodão uzbeque Em tese os estudantes são pagos pelo trabalho mas só em tese Em 2006 quando o preço mundial do algodão girava em torno de US140 por quilo as crianças recebiam cerca de US003 por sua cota diária de 2060 kg Provavelmente 75 do algodão são hoje colhidos por crianças Na primavera as escolas fecham as portas para a capina do solo e transplante de mudas Como se chegou a esse ponto Supunhase que o Uzbequistão como as demais repúblicas socialistas soviéticas conquistasse a independência após o colapso da União Soviética e desenvolvesse uma democracia e uma economia de mercado Todavia como em muitas outras repúblicas soviéticas não foi o que aconteceu O Presidente Karimov que iniciou sua carreira política no Partido Comunista da antiga União Soviética e ascendeu ao cargo de primeiro secretário do Uzbequistão no oportuno momento de 1989 exatamente quando o Muro de Berlim vinha abaixo conseguiu reinventarse como nacionalista Contando com o crucial apoio das forças de segurança em dezembro de 1991 venceu a primeira eleição presidencial da história do Uzbequistão Uma vez no poder abateuse sobre a oposição independente Hoje seus adversários políticos estão presos ou exilados Não existe imprensa livre no país e não são permitidas organizações não governamentais O auge da repressão crescente ocorreu em 2005 quando possivelmente 750 manifestantes talvez mais foram assassinados pela polícia e pelo exército em Andijon Valendose de seu controle das forças de segurança e domínio absoluto da mídia Karimov primeiro estendeu seu mandato presidencial por cinco anos mediante um referendo para em seguida conquistar a reeleição em 2000 para um novo mandato de sete anos com 912 dos votos Seu único oponente declarou ter votado em Karimov Em sua reeleição de 2007 amplamente considerada fraudulenta obteve 88 dos votos As eleições no Uzbequistão são semelhantes àquelas organizadas por Joseph Stálin no apogeu da União Soviética Uma delas em 1937 celebrizouse pela cobertura de Harold Denny correspondente do New York Times que reproduziu uma tradução do Pravda o jornal do Partido Comunista a fim de transmitir a tensão e excitação das eleições soviéticas Soa a meianoite O dia 12 de dezembro data das primeiras eleições gerais igualitárias e diretas para o Soviete Supremo chega ao fim O resultado da votação logo será anunciado A comissão permanece só em sua sala O silêncio é total e as luzes refulgem com brilho solene Em meio à profunda e expectante atenção de todos o presidente da mesa desincumbese de todas as formalidades necessárias antes de proceder à contagem das cédulas confere na lista quantos eram os votantes e quantos efetivamente votaram e o resultado é 100 100 Que eleição em que país para que candidato contou com 100 de resposta A tarefa maior tem início agora Alvoroçado o presidente inspeciona os selos das urnas Estes são em seguida verificados também pelos membros do comitê intactos São cortados e as urnas abertas O silêncio impera Inspetores e agentes eleitorais permanecem circunspectos e graves em seus assentos É chegado o momento de abrir os envelopes Três membros do comitê empunham suas tesouras O presidente põese de pé Os escrivães têm seus livros abertos O primeiro envelope é aberto Todos os olhos estão voltados em sua direção O presidente retira duas cédulas uma branca para um candidato ao Soviete da União e outra azul para um candidato ao Soviete das Nacionalidades e lê alto Camarada Stálin De imediato a solenidade é quebrada Todos os presentes de um salto aplaudem cheios de alegria e paixão o primeiro voto da primeira eleição geral secreta sob a constituição stalinista um voto no nome do autor da Constituição Esse mesmo clima teria capturado também o suspense em torno das reeleições de Karimov que vem se revelando um digno pupilo de Stálin no tocante à repressão e controle político e parece organizar eleições que rivalizam com as do mestre em seu surrealismo As instituições econômicas e políticas do Uzbequistão de Karimov são extremamente extrativistas É um país pobre Provavelmente um terço da população vive na pobreza com renda anual média em torno de US1 mil Nem todos os indicadores de desenvolvimento são ruins Segundo dados do Banco Mundial a taxa de matrículas escolares é de 100 com a possível exceção da temporada de colheita do algodão Os índices de alfabetização são também bastante altos muito embora além de controlar todos os meios de comunicação o governo também proíba livros e censure a internet Enquanto a maioria dos trabalhadores recebe apenas uns míseros centavos por dia na colheita do algodão a família Karimov e antigos quadros comunistas que se reinventaram após 1989 como as novas elites econômicas e políticas uzbeques vêm amealhando uma fabulosa riqueza Os interesses econômicos familiares são administrados pela filha de Karimov Gulnora que deve suceder o pai na presidência Em um país tão pouco transparente e cheio de segredos ninguém sabe ao certo o que a família Karimov controla nem quanto dinheiro ganha mas a experiência da empresa americana Interspan é sugestiva do que se passou na economia do país nas últimas duas décadas O algodão não é o único produto agrícola determinadas regiões do país são ideais para o cultivo do chá e a Interspan decidiu investir nessas áreas Em 2005 tinha se apoderado de mais de 30 do mercado local quando então começaram os problemas Gulnora chegou à conclusão de que a indústria do chá parecia bastante promissora economicamente Não demorou para que os funcionários locais da Interspan começassem a ser sistematicamente presos surrados e torturados As operações tornaramse inviáveis e em agosto de 2006 a empresa deixou o país Seus negócios passaram para as mãos da família Karimov cujas atividades no setor expandiamse rapidamente e na época representavam 67 do mercado em contraste com os 2 de poucos anos antes Sob muitos aspectos o Uzbequistão parece uma relíquia do passado de uma era esquecida que está definhando sob o absolutismo de uma única família e seus comparsas com uma economia baseada em trabalhos forçados especificamente trabalhos forçados de crianças Contudo não se trata de um caso isolado O país é mais uma peça do atual mosaico de sociedades que estão indo à falência sob instituições extrativistas e infelizmente tem muito em comum com outras exrepúblicas socialistas soviéticas que compreendem desde a Armênia e o Azerbaijão até o Quirguistão o Tadjiquistão e o Turcomenistão Esses casos nos lembram que mesmo no século XXI as instituições econômicas e políticas extrativistas podem assumir uma forma atroz e despudoradamente extrativista GARANTINDO CONDIÇÕES DESIGUAIS PARA TODOS A década de 1990 foi um período de reforma no Egito Desde o golpe militar que destronou a monarquia em 1954 o Egito vinha sendo governado como uma sociedade semissocialista em cuja economia o governo desempenhava papel central Muitos setores eram dominados por empresas estatais Ao longo dos anos a retórica socialista entrou em declínio os mercados se abriram e o setor privado se desenvolveu Não eram porém mercados inclusivos uma vez que se encontravam sob o controle do Estado e de um punhado de empresários aliados ao Partido Nacional Democrático PND fundado pelo Presidente Anwar Sadat em 1978 O envolvimento dos empresários com o partido e viceversa só fez aumentar durante o governo de Hosni Mubarak Este que se tornou presidente em 1981 após o assassinato de Anwar Sadat governou com o PND até ser forçado a renunciar por uma série de protestos populares e pelos militares em fevereiro de 2011 como discutimos no Prefácio página 1 Grandes empresários foram nomeados para cargos centrais no governo em áreas intimamente relacionadas aos seus interesses econômicos Rasheed Mohamed Rasheed expresidente da Unilever AMET África Oriente Médio e Turquia tornouse ministro da Indústria e Comércio Exterior Mohamed Zoheir Wahid Garana proprietário e gerentegeral da Garana Travel Company uma das maiores do Egito foi designado para o Ministério do Turismo Amin Ahmed Mohamed Osman Abaza fundador da Nile Cotton Trade Company maior exportadora de algodão do país tornouse ministro da Agricultura Em diversos setores da economia os empresários persuadiram o governo a erguer barreiras protecionistas entre eles as indústrias de comunicação metalurgia e siderurgia automobilística de bebidas alcoólicas e cimento Cada qual se tornou muito concentrado com medidas que protegiam empresários e firmas todos politicamente interligados Grandes empresários próximos ao regime como Ahmed Ezz metalurgia e siderurgia a família Sawiris multimídia bebidas e telecomunicações e Mohamed Nosseir bebidas e telecomunicações eram agraciados não só com a proteção do Estado mas também venciam concorrências públicas e obtinham grandes empréstimos bancários sem precisar apresentar garantias Ahmed Ezz era ao mesmo tempo presidente do Conselho da Ezz Steel maior siderúrgica da indústria egípcia que respondia por 70 do aço do país e alto dignitário do PND presidente do Comitê de Planejamento e Orçamento da Assembleia do Povo e colaborador próximo de Gamal Mubarak um dos filhos do Presidente Mubarak As reformas econômicas da década de 1990 conduzidas por economistas e instituições financeiras internacionais visavam à libertação dos mercados e redução do papel do Estado na economia Um dos pilares centrais dessas reformas é sempre a privatização de bens estatais No México o processo de privatização páginas 2930 em vez de aumentar a concorrência limitouse a converter os monopólios estatais em privados promovendo o enriquecimento de empresários com boas conexões políticas como Carlos Slim Ocorreu exatamente o mesmo no Egito Empresários ligados ao regime exerceram forte influência sobre a implementação do programa de privatização egípcio induzindoo a favorecer a próspera elite empresarial as baleias como são conhecidos por lá Na época em que as privatizações começaram a economia do país era dominada por 32 dessas baleias Uma deles era Ahmed Zayat que estava à frente do Luxor Group Em 1996 o governo decidiu privatizar a Al Ahram Beverages ABC detentora do monopólio da fabricação de cerveja no Egito Um consórcio da Egyptian Finance Company comandada pelo incorporador imobiliário Farid Saad com a primeira empresa de capital de risco constituída no Egito em 1995 apresentou uma proposta O consórcio incluía Fouad Sultan exministro do Turismo Mohamed Nosseir e Mohamed Ragab outro empresário da elite Era um grupo bem relacionado mas não bem relacionado o bastante Seu lance de 400 milhões de libras egípcias foi recusado por ser demasiado baixo Zayat tinha conexões melhores Na falta do capital necessário para a compra da ABC saiuse com um plano de uma engenhosidade digna de um Carlos Slim Ao ser negociado pela primeira vez na Bolsa de Valores de Londres o Luxor Group adquiriu 749 das ações da ABC a 685 libras egípcias cada Três meses depois as ações foram duplicadas e o Luxor Group vendeuas todas a 525 libras cada obtendo um lucro líquido de 36 com o qual Zayat conseguiu custear a aquisição da ABC no mês seguinte por 231 milhões de libras Na época a ABC contava com lucro anual em torno de 413 milhões de libras egípcias e dispunha de reservas orçamentárias de 93 milhões de libras egípcias Uma pechincha Em 1999 a recémprivatizada ABC ampliou seu monopólio da cerveja para o vinho ao adquirir o monopólio nacional privatizado também deste a Gianaclis uma empresa altamente rentável protegida por uma tarifa alfandegária de 3000 sobre os vinhos importados e com margem de lucro de 70 sobre suas vendas Em 2002 o monopólio mais uma vez mudou de mãos quando Zayat vendeu a ABC para a Heineken por 13 bilhão de libras egípcias um lucro de 563 em cinco anos Mohamed Nosseir nem sempre ficou do lado dos perdedores Em 1993 comprou a privatizada El Nasr Bottling Company detentora do monopólio do engarrafamento e venda da CocaCola no Egito As relações de Nosseir com o então primeiroministro do setor de empresas públicas Atef Ebeid permitiramlhe efetuar a compra sem grande concorrência Dois anos depois Nosseir venderia a empresa por um valor correspondente a mais de três vezes o preço de aquisição Outro exemplo foi a medida em fins dos anos 1990 de envolver a iniciativa privada na indústria cinematográfica estatal Mais uma vez as ligações políticas fizeram com que apenas duas famílias tivessem autorização para entrar na concorrência e operar os cinemas uma delas a família Sawiris O Egito hoje é um país pobre não tão pobre quanto a maioria dos países ao sul na África subsaariana mas onde cerca de 40 da população ainda se encontra em grande pobreza e sobrevive com menos de US2 por dia Ironicamente como já vimos páginas 4849 no século XIX o país sediou sob Muhammad Ali uma tentativa a princípio bemsucedida de transformação institucional e modernização econômica o que de fato acarretou um período de crescimento econômico extrativista antes de sua anexação definitiva ao Império Britânico Do período colonial britânico emergiu um conjunto de instituições extrativistas ao qual as Forças Armadas a partir de 1954 dariam continuidade Verificouse algum crescimento econômico e investimento em educação mas a maioria da população contava com escassas oportunidades econômicas ao passo que a nova elite podia beneficiarse de suas conexões com o governo Mais uma vez essas instituições econômicas extrativistas tiveram suas contrapartes políticas como esteio O Presidente Mubarak pretendia dar início a uma dinastia política e preparava seu filho Gamal para substituílo Seus planos só foram abreviados pelo colapso de seu regime extrativista no começo de 2011 perante a agitação social generalizada e as manifestações da chamada Primavera Árabe Durante o período em que Nasser ocupou a presidência despontaram alguns aspectos inclusivos das instituições econômicas o Estado de fato abriu o sistema educacional e surgiram determinadas oportunidades que o regime anterior do Rei Farouk nunca havia oferecido Contudo foi um exemplo de combinação instável de instituições políticas extrativistas com algum grau de inclusão por parte das instituições econômicas O resultado inevitável advindo durante o mandato de Mubarak foi que as instituições econômicas tornaramse mais extrativistas refletindo a distribuição de poder político na sociedade Em certo sentido a Primavera Árabe foi uma reação a tudo isso tanto no caso do Egito quanto no da Tunísia onde três décadas de crescimento sob instituições políticas extrativistas começaram a entrar em reversão à medida que o Presidente Ben Ali e sua família vampirizavam a economia cada vez mais POR QUE AS NAÇÕES FRACASSAM As nações fracassam economicamente devido ao extrativismo de suas instituições São elas que mantêm os países pobres na pobreza e os impedem de enveredar por um caminho de crescimento econômico É o caso hoje na África de lugares como Zimbábue e Serra Leoa na América do Sul de países como Colômbia e Argentina na Ásia de lugares como Coreia do Norte e Uzbequistão e no Oriente Médio de nações como o Egito As diferenças entre esses países são evidentes Alguns são de clima tropical outros se encontram em latitudes temperadas Alguns foram colônias britânicas outros do Japão da Espanha e da Rússia Apresentam as mais diversas histórias idiomas e culturas O que todos têm em comum são as instituições extrativistas Em todos esses casos a base dessas instituições é uma elite que estrutura as instituições econômicas de modo a locupletarse e perpetuar o próprio poder em detrimento da vasta maioria da população As diferentes histórias e estruturas sociais desses países produzem peculiaridades na natureza das elites e nos detalhes das instituições extrativistas entretanto a razão da persistência dessas instituições extrativistas está sempre relacionada ao círculo vicioso e as consequências dessas instituições em termos do empobrecimento de seus cidadãos são similares por mais distintas que sejam em sua intensidade No Zimbábue por exemplo a elite compreende Robert Mugabe e o núcleo do ZANUPF que encabeçou a luta anticolonial na década de 1970 Na Coreia do Norte corresponde à corriola do já falecido Kim JongIl e do Partido Comunista No Uzbequistão é composta pelo Presidente Ismail Karimov sua família e seus comparsas reciclados da era soviética São grupos obviamente muito distintos entre si e são justamente essas diferenças junto com a diversidade das entidades políticas e economias por eles governados que tornam tão variáveis as formas específicas assumidas por suas respectivas instituições extrativistas Por exemplo por ter sido criada a partir de uma revolução comunista a Coreia do Norte toma como modelo político o modelo unipartidário do Partido Comunista Ainda que Mugabe tenha convidado as Forças Armadas nortecoreanas nos anos 1980 a ajudálo a massacrar seus oponentes em Matabeleland esse modelo de instituição política extrativista não seria aplicável ao Zimbábue Pelo contrário pelo fato de ter ascendido ao poder no contexto da luta anticolonial Mugabe precisou disfarçar seu regime com eleições ainda que por algum tempo ele tenha logrado de fato arquitetar um Estado unipartidário consagrado por vias constitucionais Em contrapartida a Colômbia possui um longo histórico de eleições que despontaram após a independência da Espanha como método de partilha do poder entre os Partidos Liberal e Conservador E não é só em sua natureza que as elites podem diferir mas também em número No Uzbequistão Karimov pôde sequestrar os remanescentes do Estado soviético o que lhe conferiu um forte aparato para suprimir e assassinar eventuais elites alternativas Na Colômbia a falta de autoridade do Estado central em determinadas regiões do país produziu naturalmente elites mais fragmentárias tanto com efeito que seus integrantes por vezes matamse uns aos outros Não obstante apesar de tamanha variação encontradas nas elites e instituições políticas estas em geral conseguem consolidar e reproduzir o poder do grupo que as criou embora haja casos em que as disputas internas por elas produzidas levem o Estado ao colapso como em Serra Leoa Se diferentes histórias e estruturas implicam diferenças tanto na identidade das elites quanto nos pormenores das instituições políticas extrativistas o mesmo vale para as especificidades das instituições econômicas extrativistas criadas nesse contexto Na Coreia do Norte as ferramentas do extrativismo foram igualmente um legado do kit básico do comunismo abolição da propriedade privada fazendas e indústria estatais No Egito sob o regime militar alegadamente socialista estabelecido pelo Coronel Nasser a partir de 1952 a situação era bastante similar Nasser alinhouse com a União Soviética durante a Guerra Fria expropriando investimentos estrangeiros como o Canal de Suez propriedade britânica e estatizou boa parte da economia Entretanto a situação no Egito nas décadas de 1950 e 1960 era bem distinta daquela da Coreia do Norte nos anos 1940 Era muito mais fácil para os nortecoreanos criar uma economia mais radicalmente ao estilo comunista visto que podiam expropriar os antigos bens japoneses e basearse no modelo econômico da Revolução Chinesa Em contrapartida a Revolução Egípcia foi mais um golpe empreendido por um grupo de oficiais militares Quando o Egito virou a casaca na Guerra Fria e bandeouse para o lado ocidental foi relativamente fácil e conveniente para os militares egípcios substituir o comando central da economia por um capitalismo de fachada como método de extrativismo Ainda assim a superioridade do desempenho econômico do Egito quando comparado ao da Coreia do Norte foi consequência do extrativismo mais restrito das instituições egípcias Por um lado na ausência do controle asfixiante imposto pelo Partido Comunista nortecoreano o regime egípcio viuse obrigado a aplacar seus cidadãos de uma maneira que os nortecoreanos estavam isentos Por outro mesmo o capitalismo de fachada gera alguns incentivos para o investimento pelo menos entre aqueles favorecidos pelo regime que na Coreia do Norte são inteiramente inexistentes Embora todas essas minúcias sejam importantes e interessantes as lições mais cruciais encontramse na situação mais geral a qual revela que em cada um desses casos as instituições políticas extrativistas produziram instituições econômicas igualmente extrativistas transferindo riqueza e poder para a elite A intensidade do extrativismo em cada um desses países varia evidentemente o que tem consequências consideráveis em termos da prosperidade geral Na Argentina por exemplo a Constituição e as eleições democráticas não são muito eficazes na promoção do pluralismo mas ainda funcionam muito melhor do que na Colômbia pelo menos o Estado argentino pode reivindicar o monopólio da violência Em parte como consequência a renda per capita argentina é o dobro da colombiana Por outro lado as instituições políticas desses dois países cumprem muito melhor a função de restringir as elites do que as do Zimbábue e Serra Leoa por conseguinte estes são muito mais pobres do que os primeiros Ainda de acordo com a lógica de funcionamento do círculo vicioso mesmo quando as instituições extrativistas acarretam o colapso do Estado como em Serra Leoa e no Zimbábue isso não significa o fim do predomínio dessas instituições Já vimos que guerras civis e revoluções embora possam se dar durante circunstâncias críticas não promovem necessariamente mudanças institucionais Os acontecimentos em Serra Leoa desde o conflito civil encerrado em 2002 são uma vívida ilustração dessa possibilidade Em 2007 em uma eleição democrática o velho partido de Siaka Stevens o APC voltou ao poder Embora o candidato vencedor à presidência Ernest Bai Koroma não tivesse nenhuma relação com os antigos governos do APC muitos integrantes de seu gabinete tinham Dois dos filhos de Stevens Bockarie e Jengo chegaram a ser nomeados embaixadores do país nos Estados Unidos e na Alemanha De certo modo é uma versão mais volátil do que aquilo que vimos acontecer na Colômbia onde a falta de autoridade do Estado em várias regiões do país persiste ao longo do tempo por ser do interesse de parte da elite política nacional permitir que isso aconteça ao mesmo tempo que as principais instituições estatais mostramse também fortes o bastante para evitar que a desordem degenere no caos total Em Serra Leoa em parte devido à natureza mais extrativista das instituições econômicas e em parte em virtude da tradição altamente extrativista das instituições políticas do país a sociedade não só sofre economicamente como oscila entre a mais rematada desordem e um princípio de ordem Não obstante o efeito a longo prazo é o mesmo o Estado permanece ausente e as instituições seguem extrativistas Em todos os casos citados encontrase uma longa história de instituições extrativistas desde pelo menos o século XIX Cada um desses países encontrase aprisionado em um círculo vicioso Colômbia e Argentina têm suas origens nas instituições do governo colonial espanhol páginas 714 Zimbábue e Serra Leoa nasceram do regime colonial britânico instaurado no final do século XIX Em Serra Leoa na ausência de colonizadores brancos o regime tirou amplo proveito das estruturas políticas extrativistas précoloniais e as intensificou Estas por sua vez eram fruto de um longo círculo vicioso caracterizado por falta de centralização política e os efeitos desastrosos do tráfico de escravos No Zimbábue deuse em medida bem maior a construção de instituições extrativistas inéditas já que a Companhia Britânica da África do Sul implementou uma economia dupla Já o Uzbequistão pôde aproveitar as instituições extrativistas da União Soviética e como o Egito transformálas em um capitalismo de fachada As instituições extrativistas da própria URRS eram sob muitos aspectos continuação daquelas do regime czarista mais uma vez em um padrão previsto pela lei de ferro da oligarquia À medida que cada um desses círculos viciosos se desenrolava em diferentes partes do mundo ao longo dos últimos 250 anos as desigualdades mundiais foram surgindo e persistem até hoje A solução para o fracasso econômico e político das nações hoje é transformar suas instituições extrativistas em inclusivas O fenômeno do círculo vicioso dificulta bastante essa tarefa mas não é impossível e a lei de ferro da oligarquia não é inescapável Bastam alguns elementos inclusivos já presentes nas instituições ou a existência de coalizões amplas que encabecem a resistência ao regime vigente ou a mera natureza contingente da história para romper círculos viciosos Assim como a Guerra Civil em Serra Leoa a Revolução Gloriosa de 1688 também foi uma luta por poder Todavia foi um embate de natureza muito diferente daquela do conflito serra leonense É provável que alguns integrantes do Parlamento que lutaram para destronar Jaime II no rastro da Revolução Gloriosa até se imaginassem no papel de novos absolutistas como fez Oliver Cromwell após a Guerra Civil inglesa Contudo o fato de o Parlamento já possuir bastante poder e consistir em ampla coalizão composta por interesses econômicos variados e diferentes pontos de vista tornou mais improvável a aplicação da lei de ferro da oligarquia em 1688 Ajudou também o fato de a sorte estar do lado do Parlamento e contra Jaime II No próximo capítulo veremos outros exemplos de países que conseguiram romper o padrão e mudar suas instituições para melhor mesmo após uma longa tradição de instituições extrativistas E 14 ROMPENDO O PADRÃO TRÊS CHEFES AFRICANOS M 6 DE SETEMBRO DE 1895 o transatlântico Tantallon Castle ancorou em Plymouth litoral sul da Inglaterra Três chefes africanos Khama dos ngwato Bathoen dos ngwaketse e Sebele dos kwena desembarcaram e tomaram o expresso de 8h10 para a Estação Paddington Londres Os três foram à GrãBretanha com uma missão salvar seus domínios mais cinco outros Estados tswana de Cecil Rhodes Os ngwato ngwaketse e kwena eram três dos cinco Estados tswana que compreendiam a região então conhecida como Bechuanaland que viria a ser Botsuana após a independência em 1966 As tribos haviam mantido relações comerciais com os europeus durante a maior parte do século XIX Na década de 1840 o célebre missionário escocês David Livingstone percorrera toda a Bechuanaland e convertera o Rei Sechele dos kwena ao cristianismo A primeira tradução da Bíblia para um idioma africano foi para o setswana língua dos twana Em 1885 Bechuanaland foi declarada protetorado inglês Os tswana ficaram satisfeitos pois acharam que assim estariam protegidos de novas invasões europeias sobretudo dos bôeres com quem vinham se confrontando desde a Grande Caminhada de 1835 uma migração de milhares de bôeres para o interior na tentativa de escapar do colonialismo britânico Os britânicos por sua vez almejavam o controle da região a fim de bloquear novas tentativas de expansão dos bôeres páginas 202203 e possíveis incursões dos alemães que haviam anexado a região do sudoeste da África correspondente à atual Namíbia Os britânicos não acreditavam que uma empreitada colonizadora em larga escala valesse a pena Em 1885 o alto comissário Rey sintetizou com clareza a posição do governo britânico Não temos outro interesse nas terras ao norte do Molope o protetorado de Bechuanaland além de como via de passagem para o interior assim sendo por ora trataremos de nos ater à prevenção da ocupação daquela parte do protetorado por flibusteiros ou potências estrangeiras restringindonos ao mínimo possível em termos de administração ou colonização Contudo a situação dos tswana mudou em 1889 quando a Companhia Britânica da África do Sul de Cecil Rhodes iniciou sua expansão rumo ao norte partindo da África do Sul e expropriando vastas extensões da terra que viriam a constituir as Rodésias do Norte e do Sul atuais Zâmbia e Zimbábue Em 1895 ano da visita dos três chefes a Londres Rhodes estava de olho no território a sudoeste da Rodésia Bechuanaland Os chefes sabiam que as terras que caíssem sob o controle de Rhodes estariam fadadas ao desastre e à exploração Embora lhes fosse impossível vencêlo militarmente estavam determinados a combater Rhodes por todos os meios que estivessem ao seu alcance Assim decidiram optar pelo menor de dois males antes a ampliação do controle por parte dos britânicos que a anexação por Rhodes Com a ajuda da London Missionary Society viajaram até Londres a fim de tentar persuadir a Rainha Vitória e Joseph Chamberlain então secretário colonial a intensificar seu controle de Bechuanaland e protegêla de Rhodes Em 11 de setembro de 1895 tiveram seu primeiro encontro com Chamberlain Sebele foi o primeiro a falar seguido de Bathoen e por último Khama Chamberlain declarou que consideraria a possibilidade de impor o controle britânico a fim de proteger as tribos de Rhodes Nesse ínterim os chefes trataram de embarcar em uma série de palestras por todo o país a fim de angariar apoio popular para sua causa Visitaram e falaram em Windsor e Reading nos arredores de Londres em Southampton no litoral sul e em Leicester e Birmingham na base política de Chamberlain as Midlands Dirigiramse ao norte à industrial Yorkshire a Sheffield Leeds Halifax e Bradford foram também para oeste a Bristol subindo em seguida até Manchester e Liverpool Enquanto isso na África do Sul Cecil Rhodes cuidava dos preparativos do que seria a desastrosa incursão de Jameson um ataque armado à República Bôer do Transvaal a despeito das fortes objeções de Chamberlain Essa sequência de acontecimentos provavelmente tornou Chamberlain bem mais simpático à súplica dos chefes do que ele seria em circunstâncias normais Em 6 de novembro encontraramse novamente com ele em Londres Os chefes falaram por meio de um intérprete Chamberlain Falarei sobre as terras dos chefes sobre a ferrovia e sobre a lei que deverá ser observada no território dos chefes Vejamos o mapa Tomaremos a terra necessária para a estrada de ferro e nada além Khama Eu digo que se o Senhor Chamberlain tomar a terra para si ficarei satisfeito Chamberlain Digalhe então que cuidarei eu mesmo de construir a ferrovia pelos olhos de um enviado meu e tomarei tão somente aquilo de que eu necessitar oferecendo compensações caso me aproprie de algo de valor Khama Gostaria de saber como isto é por onde o trem vai passar Chamberlain Atravessarei o seu território mas delimitados por uma cerca e não tomaremos terra alguma Khama Acredito que o senhor cuidará dos trabalhos como se fosse para mim mesmo e farmeá justiça nessa questão Chamberlain Zelarei por seus interesses No dia seguinte Edward Fairfield da Secretaria Colonial explicou o acordo firmado com Chamberlain em mais detalhes Cada um dos três chefes Khama Sebele e Bathoen disporá de um território dentro do qual viverá sob a proteção da rainha tal como viveu até aqui A rainha indicará um funcionário graduado para residir com eles Os chefes seguirão governando seu próprio povo tal como foi feito até hoje A reação de Rhodes ao se descobrir superado pela astúcia dos três chefes africanos foi previsível Em um telegrama que enviou a um de seus funcionários protestou Recusome a reconhecerme vencido por três nativos lamurientos Os chefes na verdade eram detentores de um bem precioso que haviam protegido de Rhodes como posteriormente protegeriam do governo indireto britânico No século XIX os Estados tswana haviam desenvolvido um núcleo central de instituições políticas que envolviam um grau incomum pelos padrões da África subsaariana tanto de centralização política quanto de procedimentos decisórios coletivos e que podem ser entendidas como uma forma incipiente e primitiva de pluralismo Do mesmo modo como a Magna Carta possibilitou a participação dos barões no processo político de tomada de decisões e impôs algumas restrições aos atos dos monarcas ingleses as instituições políticas dos tswana sobretudo os kgotla também incentivavam a participação política e delimitavam o poder dos chefes O antropólogo sulafricano Isaac Schapera descreve nos seguintes termos o modus operandi dos kgotla Todas as questões da política tribal são abordadas por fim por uma assembleia geral dos homens adultos no kgotla local do conselho do chefe Essas reuniões se dão com grande frequência e entre os tópicos discutidos figuram as disputas tribais querelas entre o chefe e seus parentes a imposição de novos tributos a realização de novas obras públicas a promulgação de novos decretos pelo chefe Não é incomum que a assembleia tribal vá de encontro aos desejos do monarca Uma vez que todos podem falar esses encontros permitem que ele se mantenha a par dos sentimentos de seus súditos de maneira geral proporcionando lhes por sua vez uma oportunidade de dar voz às suas insatisfações Caso a ocasião assim exija ele e seus conselheiros podem verse severamente repreendidos uma vez que as pessoas não costumam mostrar escrúpulos para falar de maneira aberta e franca Além dos kgotla o cargo de chefe entre os tswana não era estritamente hereditário mas encontravase aberto a qualquer homem que demonstrasse talento e habilidade para tanto O antropólogo John Comaroff estudou em detalhes a história política de outro Estado tswana os rolong e demonstrou que embora aparentemente os tswana dispusessem de regras claras que estipulavam como a posição de chefe seria herdada na prática essas normas eram interpretadas de modo a remover maus governantes e permitir que candidatos promissores ocupassem a chefia Sua pesquisa revelou que a ascensão ao trono era na realidade fruto de uma conquista embora recebesse em seguida uma interpretação elaborada de modo que o concorrente vencedor parecesse ser o herdeiro legítimo Os tswana traduziam essa ideia com um provérbio que tinha um quê de monarquia constitucional kgosi ke kgosi ka morafe o rei é rei pela graça do povo Após a viagem a Londres os chefes tswana continuaram empenhados em seu objetivo de manter a independência da Inglaterra e preservar suas instituições nativas Aceitaram a construção de ferrovias em Bechuanaland mas limitaram a intervenção dos britânicos em outros aspectos de sua vida econômica e política Não se opuseram à construção de estradas de ferro embora decerto não pelos mesmos motivos por que os monarcas austrohúngaros e russos as vetaram apenas se deram conta de que os trens como as demais políticas inglesas não promoveriam o desenvolvimento de Bechuanaland enquanto esta permanecesse sob controle colonial A experiência inicial de Quett Masire presidente da Botsuana independente de 1980 a 1998 explica por quê Masire foi um fazendeiro empreendedor nos anos 1950 desenvolveu novas técnicas de cultivo de sorgo e detectou um potencial cliente na Vryburg Milling empresa localizada do outro lado da fronteira com a África do Sul Procurou o agente da estação ferroviária de Lobatse em Bechuanaland e solicitou permissão para alugar dois vagões de trem a fim de transportar seus produtos até Vryburg O agente recusou Pediu então a um amigo branco que interviesse Com relutância o agente concordou mas cobrou de Masire um valor quatro vezes superior à tarifa paga pelos brancos Masire desistiu e concluiu que era a prática dos brancos e não só as leis que proibiam os africanos de possuir suas próprias terras ou adquirir licenças comerciais que impedia os negros de ser empreendedores em Bechuanaland Ao fim e ao cabo os chefes e o povo tswana tiveram sorte Contrariando todas as expectativas conseguiram impedir a investida de Rhodes Uma vez que os interesses dos britânicos em Bechuanaland eram ainda secundários o estabelecimento do governo indireto na região não criou o tipo de círculo vicioso desenvolvido em Serra Leoa páginas 260267 Evitaram também o mesmo tipo de expansão colonial ocorrido no interior da África do Sul que acabou convertendo a região em uma reserva de mão de obra barata para os fazendeiros ou garimpeiros brancos Os estágios iniciais do processo de colonização constituem uma circunstância crítica para a maioria das sociedades um período crucial durante o qual transpiram os eventos que terão consideráveis consequências a longo prazo para seu desenvolvimento econômico e político Como discutimos no Capítulo 9 a maioria das sociedades na África subsaariana do mesmo modo como as da América do Sul e as do Sul da Ásia assistiu durante a colonização ao estabelecimento ou intensificação de instituições extrativistas Os tswana pelo contrário lograram esquivarse tanto do governo indireto intensivo quanto do destino muito pior que se teria abatido sobre eles caso Rhodes houvesse conseguido anexar suas terras Não se tratou porém de mero golpe de sorte Mais uma vez sua trajetória foi resultado da interrelação entre as instituições já existentes moldadas pelo processo de diferenciação institucional específico dos tswana e a circunstância crítica produzida pelo colonialismo Os três chefes tomaram nas mãos as rédeas do próprio destino quando tiveram a iniciativa de viajar para Londres o que lhes possibilitou tal atitude foi o grau de autoridade de que dispunham extraordinário quando comparado a outros líderes tribais da África subsaariana graças à centralização política atingida pelas tribos tswana Talvez contassem também com um grau incomum de legitimidade em virtude do incipiente pluralismo presente em suas instituições tribais Outra circunstância crítica no fim do período colonial seria mais central para o sucesso de Botsuana permitindolhe desenvolver instituições inclusivas Quando Bechuanaland tornouse independente em 1966 com o nome de Botsuana o bom êxito dos chefes Sebele Bathoen e Khama já eram águas passadas Nesse ínterim os ingleses pouco haviam investido em Bechuanaland Por ocasião de sua independência era um dos países mais pobres do mundo contava com um total de 12 quilômetros de estradas pavimentadas 22 cidadãos com diploma universitário e 100 que haviam concluído a escola secundária Para piorar encontravase quase inteiramente rodeada pelos regimes brancos da África do Sul Namíbia e Rodésia todos os três hostis a países africanos independentes governados por negros Dificilmente seria incluída em muitas listas de nações com boas chances de sucesso Não obstante nos 45 anos seguintes Botsuana se tornaria um dos países de crescimento mais acelerado no mundo Hoje possui a mais alta renda per capita da África subsaariana e encontrase no mesmo patamar de países bemsucedidos do Leste Europeu como Estônia e Hungria e das nações latinoamericanas de maior êxito como Costa Rica Como Botsuana conseguiu romper o padrão Tratando de desenvolver rapidamente após a independência instituições políticas e econômicas inclusivas Desde então permaneceu democrática realiza eleições periódicas e competitivas e nunca conheceu guerra civil ou intervenção militar O governo estabeleceu instituições econômicas que fazem valer os direitos de propriedade assegurando a estabilidade macroeconômica e incentivando o desenvolvimento de uma economia de mercado inclusiva Evidentemente porém a questão mais desafiadora é como foi que Botsuana conseguiu estabelecer uma democracia estável e instituições pluralistas e optar por instituições econômicas inclusivas enquanto a maioria dos demais países africanos fazia o contrário Para responder a essa pergunta será preciso compreender como uma circunstância crítica aqui o fim do domínio colonial interagiu com as instituições já existentes no país Na maior parte da África subsaariana por exemplo em Serra Leoa e no Zimbábue a independência foi uma oportunidade perdida seguida da recriação de instituições extrativistas do mesmo tipo existente durante o período colonial Os estágios iniciais da independência se desenrolariam de maneira muito distinta em Botsuana mais uma vez graças em grande parte ao cenário estabelecido pelas instituições históricas tswana Sob esse aspecto Botsuana apresentava um série de semelhanças com a Inglaterra na iminência da Revolução Gloriosa Esta havia alcançado rápida centralização política sob os Tudor além de dispor da Magna Carta e da tradição do Parlamento que podia ao menos aspirar a conter os monarcas e garantir algum grau de pluralismo Botsuana também contava com algum grau de centralização do Estado e instituições tribais relativamente pluralistas que sobreviveram ao colonialismo Na Inglaterra havia uma coalizão ampla em formação composta por comerciantes transatlânticos industriais e fidalgos empreendedores que era partidária de direitos de propriedade consolidados Em Botsuana também havia uma aliança em favor de sólidos direitos de procedimentos os chefes tswana e elites detentoras do principal ativo da economia o gado Muito embora a terra fosse de propriedade comum o gado era um bem privado nos Estados tswana e as elites eram também defensoras de direitos de propriedade bem assegurados Nada disso claro nega o curso contingente da história As coisas teriam transcorrido de modo muito diferente na Inglaterra caso as lideranças parlamentares e o novo monarca tivessem tentado valerse da Revolução Gloriosa para usurpar o poder Analogamente a história em Botsuana poderia ter sido outra especialmente se o país não tivesse tido a sorte de encontrar líderes como Seretse Khama ou Quett Masire que preferiram disputar o poder por meio de eleições em vez de subverter o sistema eleitoral como fizeram tantos líderes pósindependência na África subsaariana Os tswana emergiram de sua independência com uma tradição de instituições que delimitavam os poderes dos chefes e estabeleciam algum grau de responsabilidade destes perante o povo É claro que os tswana não eram os únicos da África a disporem de instituições assim mas só no caso deles tais instituições sobreviveram ilesas em tão larga medida ao período colonial O governo britânico mantiverase ausente Bechuanaland fora administrada de Mafeking na África do Sul e foi só durante a transição para a independência na década de 1960 que foram elaborados planos para a capital Gaborone As novas estruturas lá instaladas não pretendiam eliminar as instituições nativas mas tirar proveito delas assim durante a construção de Gaborone novos kgotlas foram sendo planejados A independência deuse também de maneira relativamente ordenada O movimento nesse sentido foi encabeçado pelo Partido Democrático de Botsuana BDP Botswana Democratic Party fundado em 1960 por Quett Masire e Seretse Khama Khama era neto do Rei Khama III seu primeiro nome Seretse significa a argila que une e não poderia ser mais adequado Khama era o chefe hereditário dos ngwato e a maioria dos chefes e as elites tswana aderiram ao BDP Botsuana não possuía junta de comércio devido ao desinteresse dos britânicos na colônia Em 1967 o partido tratou de fundar uma a Comissão da Carne de Botsuana que em lugar de expropriar rancheiros e proprietários de gado desempenhou papel central no desenvolvimento da economia pecuária ergueu cercas a fim de controlar a febre aftosa e promoveu as exportações o que contribuiria tanto para o desenvolvimento econômico quanto para a sustentação das instituições econômicas inclusivas Embora o crescimento inicial de Botsuana dependesse da exportação de carne a situação mudou drasticamente com a descoberta de diamantes O gerenciamento dos recursos naturais do país também foi nitidamente diferente de outras nações africanas Durante o período colonial os chefes tswana haviam se empenhado ao máximo para impedir a prospecção de minérios em Bechuanaland por saberem que se os europeus encontrassem pedras ou metais preciosos sua autonomia estaria acabada A primeira grande descoberta de diamantes deuse em território ngwato terra natal de Seretse Khama Antes do anúncio da descoberta Khama incentivou uma mudança na lei a fim de que todos os direitos sobre a exploração mineral do subsolo pertencessem ao país não à tribo garantindo assim que a riqueza proveniente das pedras não criasse profundas desigualdades em Botsuana A decisão deu impulso também ao processo de centralização do Estado à medida que a receita gerada pelos diamantes pôde ser aplicada na construção de uma infraestrutura e burocracia estatais e investida na educação Em Serra Leoa como em muitas outras nações da África subsaariana os diamantes serviram de combustível para o conflito entre diferentes grupos e ajudou a perpetuar as guerras civis o que lhes valeu a alcunha de Diamantes de Sangue em vista da carnificina promovida pelas guerras que foram travadas pelo seu controle Em Botsuana a receita oriunda das pedras foi administrada tendo em vista o bem da nação A alteração nos direitos sobre os minerais do subsolo não foi a única política visando à estruturação do Estado implementada pelo governo de Seretse Khama Em última instância a Lei da Chefia de 1965 promulgada pela assembleia legislativa antes da independência bem como sua emenda de 1970 dariam continuidade ao processo de centralização política consolidando o poder do Estado e do presidente eleito mediante a remoção do direito dos chefes de distribuir terras e permitindo ao presidente depor caso necessário um chefe do cargo Outro aspecto da centralização política foi o empenho em consolidar a unificação do país por meio por exemplo de uma legislação determinando que o setswana e o inglês fossem as únicas línguas ensinadas na escola Hoje Botsuana parece um país homogêneo sem a fragmentação étnica e linguística associada com tantas outras nações africanas Todavia isso é fruto da política de adoção nas escolas apenas do inglês e de um único idioma nacional o setswana a fim de minimizar os conflitos entre diferentes tribos e grupos dentro da sociedade O último censo que incluiu perguntas sobre etnicidade foi o de 1946 que revelou considerável heterogeneidade no país Na reserva ngwato por exemplo apenas 20 da população identificavamse como ngwato puros embora houvesse outras tribos tswana havia também diversos grupos que não eram tswana e que não tinham o setswana como primeiro idioma Tamanha heterogeneidade subliminar vem sendo mitigada tanto pelas políticas do governo pósindependência quanto pelas instituições relativamente inclusivas das tribos tswana do mesmo modo como a heterogeneidade na GrãBretanha por exemplo entre ingleses e galeses tem sido abrandada pelo Estado britânico O Estado botsuano fez o mesmo Desde a independência o censo em Botsuana não inclui perguntas sobre a heterogeneidade étnica porque lá todos são tswana Botsuana atingiu índices de crescimento notáveis após a independência porque Seretse Khama Quett Masire e o Partido Democrático de Botsuana conduziram o país rumo a instituições políticas e econômicas inclusivas Quando os diamantes começaram a jorrar na década de 1970 em vez de levar à guerra civil lançaram uma base fiscal sólida para o governo que usaria a receita para investir em serviços públicos Havia muito menos incentivos para desafiar ou derrubar o governo e controlar o Estado Instituições políticas inclusivas fomentavam a estabilidade política e sustentavam instituições econômicas inclusivas Em um padrão que já conhecemos do círculo virtuoso descrito no Capítulo 11 as instituições econômicas inclusivas aumentaram a viabilidade e a durabilidade das instituições políticas inclusivas Botsuana rompeu o padrão por ter sido capaz de beneficiarse de uma circunstância crítica a independência póscolonial e estabelecer instituições inclusivas O Partido Democrático de Botsuana e as elites tradicionais inclusive o próprio Khama não tentaram forjar um regime ditatorial nem implementar instituições extrativistas que pudessem enriquecêlos em detrimento da sociedade outro fruto da interrelação entre uma circunstância crítica e as instituições já existentes Como vimos ao contrário de quase todos os demais países da África subsaariana Botsuana já possuía instituições tribais que haviam atingido algum grau de autoridade centralizada e apresentavam características notoriamente pluralistas Ademais o país contava com elites econômicas que por sua vez tinham muito a ganhar com direitos de propriedade seguros Não menos importante o percurso contingente da história trabalhou em favor de Botsuana O país teve sorte especialmente por Seretse Khama e Quett Masire não serem Siaka Stevens e Robert Mugabe O primeiro dedicouse honestamente à construção de instituições inclusivas a partir da base das instituições tribais dos tswanas Esse conjunto de fatores aumentou as chances de Botsuana conseguir desenvolver instituições inclusivas enquanto a maior parte do resto da África subsaariana nem ao menos tentava ou fracassava logo de saída O FIM DO EXTRATIVISMO NO SUL A data era 1o de dezembro de 1955 A cidade de Montgomery Alabama tem registrado o horário de ocorrência do delito como sendo 18h06 James Blake motorista de ônibus estava enfrentando problemas chamou a polícia e os oficiais Day e Mixon dirigiram se ao local Em seu relatório assinalaram Recebemos uma chamada e ao chegarmos o motorista do ônibus informounos de que havia uma mulher de cor sentada no setor branco a qual se recusava a dirigir se para os fundos do veículo Nós também a vimos O motorista assinou um testemunho contra ela Rosa Parks cf foi acusada de acordo com o Capítulo 6 seção 11 do Código Municipal de Montgomery O delito cometido por Rosa Parks foi sentarse em uma parte do ônibus da Cleveland Avenue reservada para brancos um crime segundo as leis de Jim Crow do Alabama Parks foi multada em US10 mais US4 de custas judiciais Mas Rosa Parks não era qualquer uma Já era secretária da seção de Montgomery da NAACP National Association for the Advancement of Colored People Associação Nacional para o Progresso das Pessoas de Cor que lutava havia muito para mudar as instituições no Sul dos Estados Unidos Sua prisão desencadeou um movimento de massa o Boicote aos Ônibus de Montgomery idealizada por Martin Luther King Jr Em 3 de dezembro King e outros líderes negros haviam organizado um boicote coordenado aos ônibus convencendo todos os negros a não andarem de ônibus na cidade O boicote bem sucedido estendeuse até 20 de dezembro de 1956 pondo em movimento um processo que culminou na determinação pela Suprema Corte americana da inconstitucionalidade das leis que segregavam o transporte público no Alabama e em sua capital O Boicote aos Ônibus de Montgomery foi um momento crucial do movimento pelos direitos civis no Sul dos Estados Unidos O movimento foi parte de uma série de eventos e mudanças que finalmente rompeu o padrão nos estados sulistas e provocou uma mudança institucional fundamental Como vimos no Capítulo 12 após a Guerra Civil as elites latifundiárias locais conseguiram recriar as instituições políticas e econômicas extrativistas que haviam predominado na região até a Guerra de Secessão Por mais que os detalhes dessas instituições mudassem a escravidão por exemplo já não era mais possível seu impacto negativo sobre a prosperidade geral e os incentivos econômicos na região permaneceram os mesmos O Sul continuou sendo notavelmente mais pobre do que o resto do país A partir dos anos 1950 as instituições sulistas conduziriam a região por uma trajetória de crescimento muito mais acelerado As instituições extrativistas que acabaram sendo eliminadas do sul dos Estados Unidos eram diferentes das instituições coloniais da Botsuana préindependência O tipo de circunstância crítica que iniciou seu processo de abandono foi igualmente distinto apesar de várias características comuns Desde a década de 1940 os que arcavam com o ônus da discriminação e das instituições extrativistas do sul pessoas como Rosa Parks vinham se organizando bem melhor para fazerlhes frente Ao mesmo tempo a Suprema Corte americana e o governo federal finalmente começaram a interferir sistematicamente no sentido de reformar as instituições extrativistas locais Assim um dos fatores centrais na criação de uma circunstância crítica para a mudança no sul foi o empoderamento dos americanos negros da região e o fim do domínio irrestrito das elites sulistas As instituições políticas do sul tanto antes quanto depois da Guerra de Secessão seguiam uma lógica econômica clara não muito distinta do regime sulafricano do apartheid e com o mesmo objetivo de assegurar mão de obra barata para as plantations Na década de 1950 porém tal propósito estava perdendo a força Por um lado em decorrência tanto da Grande Depressão quanto da Segunda Guerra Mundial vinha ocorrendo significativo êxodo negro que nas décadas de 1940 e 1950 alcançou uma média de cem mil pessoas por ano Nesse ínterim as inovações tecnológicas na agricultura ainda que adotadas muito lentamente iam reduzindo a dependência que os latifundiários tinham de mão de obra barata A maior parte dos trabalhadores nas plantações era usada na colheita do algodão Em 1950 quase todo o algodão do Sul ainda era colhido à mão Contudo a mecanização da colheita do algodão vinha reduzindo a demanda por esse tipo de mão de obra Em 1960 nos estados cruciais do Alabama Louisiana e Mississippi quase metade da produção fora mecanizada Assim ao mesmo tempo em que ficava mais difícil encurralar os negros eles iam deixando de ser indispensáveis para os latifundiários Havia menos motivos pois para que as elites continuassem lutando com o mesmo vigor para manter as velhas instituições econômicas extrativistas o que não significava porém que estivessem dispostas a aceitar de boa vontade as mudanças institucionais Assim estourou um conflito havia muito protelado Uma coalizão incomum entre os negros do sul e as instituições federais inclusivas dos Estados Unidos produziu uma força poderosa no sentido de repudiar o extrativismo sulista e ir ao encontro de direitos civis e políticos igualitários para os negros do sul o que por fim eliminaria os significativos empecilhos ao crescimento econômico no Sul dos Estados Unidos O mais importante impulso para a mudança veio do movimento pelos direitos civis A ponta de lança do processo foi o empoderamento dos negros no Sul como em Montgomery desafiando as instituições extrativistas ao seu redor exigindo seus direitos e manifestandose e mobilizandose a fim de obtêlos Todavia eles não estavam sozinhos porque o Sul dos Estados Unidos não constitui um país à parte e as elites locais não eram autônomas como as da Guatemala por exemplo Sendo parte integrante dos Estados Unidos da América o Sul do país estava sujeito à Constituição e demais legislações federais A causa das reformas fundamentais na região receberia finalmente o apoio dos poderes executivo legislativo e judiciário americanos em parte porque o movimento pelos direitos civis conseguiu fazerse ouvir fora do Sul mobilizando assim a esfera federal do governo A intervenção federal no sentido de modificar as instituições sulistas teve início em 1944 quando a Suprema Corte determinou a inconstitucionalidade de eleições primárias às quais somente os brancos tinham acesso Como vimos os negros viramse destituídos de seus direitos políticos na década de 1890 graças ao uso de capitações e testes de alfabetização páginas 272277 os quais costumavam ser manipulados a fim de discriminar os negros ao mesmo tempo em que asseguravam o voto de brancos pobres e analfabetos Em um exemplo célebre ocorrido na Louisiana no começo dos anos 1960 um candidato branco foi considerado apto após dar a resposta FRDUM FOOF SPETGH a uma pergunta sobre a constituição estadual A decisão da Suprema Corte em 1944 quando reconheceu a importância de afrouxar o controle exercido pelos brancos sobre os partidos políticos foi a salva de abertura da longa batalha pela abertura do sistema político aos negros A essa decisão seguiuse o caso Brown versus Board of Education em 1954 em que a Suprema Corte determinou que a segregação patrocinada pelo Estado nas escolas e outros locais públicos era inconstitucional Em 1962 o tribunal pôs abaixo outro pilar da dominação política das elites brancas a desproporcionalidade na representação legislativa Quando uma legislatura é desproporcional como no caso dos burgos podres na Inglaterra antes da Primeira Lei da Reforma determinadas áreas ou regiões têm uma representação muito maior do que deveriam considerandose sua participação na população relevante No Sul dos Estados Unidos isso significava que as áreas rurais coração da elite agrária da região contavam com uma representação excessiva em relação às áreas urbanas A Suprema Corte eliminou esse problema em 1962 com sua decisão no caso Baker versus Carr que introduziu o padrão cada pessoa um voto As decisões da Suprema Corte não fariam grande diferença contudo se não fossem postas efetivamente em vigor De fato na década de 1890 a legislação federal que assegurava os direitos políticos dos negros não chegou a ser implementada porque quem controlava o cumprimento das leis no Sul dos Estados Unidos eram a elite local e o Partido Democrata e o governo federal por sua vez de muito bom grado consentiu em tal estado de coisas A partir do momento em que os negros começaram a se insurgir contra a elite sulista porém esse bastião do apoio a Jim Crow desmoronou e o Partido Democrata liderado por seus membros de fora do Sul voltouse contra a segregação racial Os democratas sulistas renegados então reagruparamse sob a bandeira do Partido Democrata pelos Direitos dos Estados States Rights Democratic Party e disputaram as eleições presidenciais de 1948 Seu candidato Strom Thurmond liderou em quatro estados e conquistou 39 votos no Colégio Eleitoral um eco muito distante contudo do poder do Partido Democrata unificado na política nacional e de sua captura pelas elites sulistas A campanha de Strom Thurmond girou em torno do questionamento do direito do governo federal de interferir nas instituições do Sul e ele defendia sua posição com palavras fortes Quero dizerlhes senhoras e senhores que não há homens suficientes no Exército para obrigar o povo do Sul a acabar com a segregação e admitir a raça dos pretos em nossos cinemas piscinas lares e igrejas A história mostraria que ele estava errado As determinações da Suprema Corte significavam que as instituições educativas sulistas entre elas a Universidade do Mississippi em Oxford teriam de ser dessegregadas Em 1962 após uma longa batalha jurídica tribunais federais decidiram que James Meredith jovem veterano negro da Força Aérea americana teria de ser admitido na Ole Missv A oposição ao cumprimento dessa determinação foi orquestrada pelos chamados Conselhos de Cidadãos o primeiro dos quais surgira em 1954 em Indianola Mississippi com o objetivo de combater o processo de dessegregação no Sul O governador do estado Ross Barnett foi a público repudiar em fala televisionada em 13 de setembro a dessegregação determinada pela Justiça anunciando que as universidades estaduais fechariam as portas antes de consentir com o fim da segregação Por fim após uma interminável negociação entre Barnett o Presidente John Kennedy e o secretário de Justiça Robert Kennedy em Washington o governo federal interveio à força no sentido de fazer valer a decisão Foi marcada uma data para os oficiais de justiçax levarem Meredith a Oxford imediatamente os defensores da supremacia branca começaram a se organizar Em 30 de setembro véspera da chegada de Meredith oficiais de justiça federais entraram no campus e cercaram a reitoria Uma multidão de cerca de 2500 pessoas apareceu para protestar e logo irrompeu um tumulto Os oficiais usaram gás lacrimogêneo para dispersar os baderneiros mas logo se viram acuados Às 22 horas forças federais chegaram a Oxford para restaurar a ordem Logo havia 20 mil militares e 11 mil homens da Guarda Nacional na cidade No total 300 pessoas seriam presas Meredith decidiu permanecer no campus onde protegido das ameaças de morte por uma escolta de oficiais de justiça e 300 soldados acabaria conseguindo se formar A atuação do Poder Legislativo em âmbito federal foi uma das pedras angulares do processo de reforma institucional no Sul dos Estados Unidos Na votação do projeto da primeira Lei dos Direitos Civis em 1957 o então senador Strom Thurmond falou ininterruptamente por 24 horas e 18 minutos a fim de impedir ou ao menos retardar a promulgação da lei Em sua fala ele leu de tudo da Declaração da Independência a diversas listas telefônicas em vão A lei de 1957 culminaria na Lei dos Direitos Civis de 1964 que declarou ilegal um vasto espectro de práticas e legislações segregacionistas estaduais A Lei dos Direitos Eleitorais de 1965 determinou a ilegalidade de testes de alfabetização captações e outros métodos usados para anular os direitos políticos dos negros do Sul além de ampliar a supervisão federal das eleições nos estados O efeito de todos esses acontecimentos foi uma mudança significativa nas instituições econômicas e jurídicas do Sul No Mississippi por exemplo apenas cerca de 5 dos negros elegíveis votavam em 1960 Em 1970 esse número saltara para 50 No Alabama e na Carolina do Sul passou de cerca de 10 em 1960 para 50 em 1970 Esses padrões mudaram a natureza das eleições tanto para os cargos locais quanto para os nacionais Mais importante erodiuse o apoio político do Partido Democrata dominante às instituições extrativistas que discriminavam os negros Estava aberto o caminho assim para uma sucessão de mudanças nas instituições econômicas Até as reformas institucionais da década de 1960 os negros haviam permanecido quase inteiramente excluídos do emprego nos moinhos de algodão Em 1960 apenas 5 dos empregados nos moinhos aproximadamente eram negros A legislação dos direitos civis reverteu essa discriminação Em 1970 tal proporção havia aumentado para 15 em 1990 havia chegado a 25 A discriminação econômica contra os negros começou a cair as oportunidades educacionais para essa parcela da população expandiramse significativamente e o mercado de trabalho sulista tornouse mais competitivo As instituições inclusivas foram acompanhadas de melhorias econômicas mais aceleradas na região Em 1940 os estados sulistas alcançavam apenas cerca de 50 do nível da renda per capita dos Estados Unidos Esse quadro começou a mudar no final da década de 1940 e durante os anos 1950 Em 1990 essa distância foi praticamente eliminada Como em Botsuana o elementochave no Sul dos Estados Unidos foi o desenvolvimento de instituições econômicas e políticas inclusivas que ocorreu a partir da justaposição do crescente descontentamento entre os negros esmagados sob as instituições extrativistas do Sul e a dissolução do domínio unipartidário do Partido Democrata no Sul Mais uma vez as instituições conformaram os rumos da mudança Nesse caso foi fundamental que as instituições sulistas estivessem situadas no contexto das instituições federais inclusivas americanas o que permitiu aos negros do Sul dos Estados Unidos finalmente mobilizarem o governo e as instituições federais em prol da sua causa O processo como um todo foi facilitado também pelo fato de com o êxodo maciço de negros do Sul e a mecanização da produção de algodão também as condições econômicas haviam mudado fazendo as elites locais terem menos motivos para resistir RENASCIMENTO NA CHINA O Partido Comunista sob a liderança de Mao TséTung finalmente derrubou os nacionalistas liderados por Chiang Kaishek em 1949 A República Popular da China foi proclamada em 1o de outubro As instituições políticas e econômicas criadas após 1949 eram altamente extrativistas No âmbito político compreendiam o regime totalitarista do Partido Comunista Chinês e nenhuma outra organização é permitida na China desde então Até sua morte em 1976 Mao dominou inteiramente o partido e o governo Tais instituições políticas autoritárias e extrativistas foram acompanhadas de instituições econômicas igualmente radicais em seu extrativismo Mao nacionalizou de imediato a terra e aboliu todos os direitos de propriedade de um só golpe Mandou executar os proprietários rurais bem como outros segmentos que considerasse contrários ao regime A economia de mercado foi essencialmente eliminada Pouco a pouco a população rural foi organizada em fazendas comunitárias Dinheiro e salários foram substituídos por pontos de trabalho que podiam ser trocados por bens Os passaportes internos foram introduzidos em 1956 proibindo deslocamentos sem a devida autorização a fim de aumentar o controle político e econômico Analogamente toda a indústria foi nacionalizada e Mao lançou uma tentativa ambiciosa de promover o desenvolvimento acelerado da indústria por meio de planos quinquenais baseados no modelo soviético Como ocorre com todas as instituições extrativistas o governo Mao empenhouse em extrair recursos do vasto país que tinha agora em mãos Como no caso do governo de Serra Leoa com sua junta comercial o Partido Comunista Chinês detinha o monopólio da venda de determinados produtos como arroz e grãos e o usava para impor pesados tributos aos fazendeiros As tentativas de industrialização resultaram a partir de 1958 no infame Grande Salto Adiante com o desenrolar do segundo plano quinquenal Mao anunciou que a produção de aço seria duplicada em um ano com base em altosfornos de fundo de quintal de pequena escala Declarou que em 15 anos a produção chinesa igualaria a britânica O único problema é que não havia maneira viável de cumprir essas metas Para atingilas era preciso usar sucata derreter potes e panelas e até ferramentas agrícolas como enxadas e arados Os trabalhadores que deveriam cultivar os campos estavam produzindo aço a partir da destruição de seus arados e portanto de sua futura capacidade de alimentarse e ao país O resultado foi uma fome catastrófica no campo Embora os estudiosos hoje debatam a participação das políticas de Mao em comparação com o impacto das secas nessa mesma época ninguém questiona a contribuição central do Grande Salto Adiante para a morte de 20 40 milhões de pessoas Não sabemos exatamente quantas foram as baixas pois a China de Mao não efetuou um levantamento dos números que teriam documentado as atrocidades A renda per capita despencou por volta de um quarto Um dos resultados do Grande Salto Adiante foi fazer um alto dignitário do Partido Comunista Deng Xiaoping general extremamente bemsucedido no período revolucionário realizador de uma campanha antidireitista que promovera a execução de muitos inimigos da revolução mudar de ideia Em uma conferência realizada na cidade de Cantão no sul da China em 1961 Deng defendeu a ideia de que não importa se o gato é preto ou branco se pegar ratos é um bom gato Ou seja não importava se as políticas pareciam ou não comunistas a China precisava era de políticas que estimulassem a produção de modo a continuar alimentando sua gente Todavia Deng não tardaria a sofrer as consequências de seu recémdescoberto pragmatismo Em 16 de maio de 1966 Mao anunciou que a revolução encontravase sob a ameaça de interesses burgueses que estavam solapando a sociedade comunista chinesa e pretendiam recriar o capitalismo Em resposta anunciou a Grande Revolução Cultural do Proletariado em geral conhecida como Revolução Cultural e baseada em 16 pontos O primeiro começava da seguinte forma Embora tenha sido derrubada a burguesia insiste em tentar usar as velhas ideias cultura costumes e hábitos das classes exploradoras para corromper as massas manipulálas e ensaiar um retorno O proletariado deve fazer o exato oposto encarar de frente todos os desafios burgueses no campo ideológico e utilizar as novas ideias cultura costumes e hábitos do proletariado para mudar a perspectiva mental da sociedade como um todo No momento nosso objetivo é combater e esmagar aqueles membros do governo que estejam enveredando pela senda capitalista criticar e repudiar as autoridades acadêmicas burguesas reacionárias e a ideologia da burguesia e de todas as demais classes exploradoras e transformar a educação a literatura a arte e todos os demais aspectos da superestrutura que não correspondam à base econômica socialista de modo a propiciar a consolidação e o desenvolvimento do sistema socialista Logo a Revolução Cultural do mesmo modo como o Grande Salto Adiante começaria a despedaçar tanto a economia quanto um semnúmero de vidas humanas Formaramse unidades da Guarda Vermelha por todo o país jovens e entusiásticos membros do Partido Comunista que foram usados para promover o expurgo dos opositores do regime Muitos foram os mortos presos ou mandados para o exílio interno O próprio Mao replicou frente à preocupação quanto à extensão da violência O tal Hitler foi ainda mais feroz Quanto mais feroz melhor não é mesmo Quanto mais gente se mata mais revolucionário se é Deng foi considerado desertor capitalista número dois sendo preso em 1967 e exilado na província de Jiangxi em 1969 condenado a trabalhar em uma fábrica rural de tratores Acabaria sendo reabilitado em 1974 e Mao foi persuadido pelo primeiro ministro Chu EnLai a nomear Deng primeiro viceprimeiroministro Já em 1975 Deng supervisionou a composição de três documentos do partido que teriam colocado a China em uma nova direção caso tivessem sido aprovados demandavam a revitalização da educação superior a retomada dos incentivos materiais na indústria e na agricultura e a remoção dos esquerdistas do partido Nessa época a saúde de Mao estava se deteriorando e o poder ia se concentrando cada vez mais nas mãos dos mesmos esquerdistas que Deng Xiaoping queria afastar do poder A esposa de Mao Chiang Ching e três de seus associados mais próximos conhecidos coletivamente como o Bando dos Quatro haviam sido grandes defensores da Revolução Cultural e da repressão resultante Sua intenção era manter esse projeto de administração do país sob a ditadura do Partido Comunista Em 5 de abril uma celebração espontânea da vida de Chu EnLai na Praça da Paz Celestial converteuse em um protesto contra o governo O Bando dos Quatro atribuiu a Deng a culpa pelas manifestações e ele se viu novamente despojado de todos os cargos e demitido Assim em vez de conseguir a remoção dos esquerdistas Deng viuse removido por eles Após a morte de Chu EnLai Mao havia designado Hua Guofeng para a posição de primeiroministro em lugar de Deng No relativo vácuo de poder de 1976 Hua conseguiu acumular enorme dose de poder pessoal Em setembro ocorreu uma circunstância crítica a morte de Mao O Partido Comunista chinês estivera até então sob seu domínio e o Grande Salto Adiante e a Revolução Cultural foram em grande parte iniciativas suas Com seu desaparecimento instaurouse um verdadeiro vácuo de poder que resultou em uma disputa entre os defensores de pontos de vista e crenças distintos acerca das consequências da mudança O Bando dos Quatro pretendia dar continuidade às políticas da Revolução Cultural única maneira de consolidar seu próprio poder e o do Partido Comunista Hua Guofeng queria abandonar a Revolução Cultural mas não podia afastarse demasiadamente dela por dever sua própria ascensão dentro do partido aos seus efeitos Em vez disso postulou o retorno a uma versão mais equilibrada da visão de Mao que resumiu nos Dois Quaisquer como chamou o Diário do Povo jornal do Partido Comunista chinês em 1977 Hua declarou Manteremos com resolução quaisquer decisões políticas tomadas pelo Presidente Mao e seguiremos inabaláveis quaisquer instruções que ele nos tenha deixado Deng Xiaoping não pretendia mais do que Hua abolir o regime comunista e substituílo por mercados inclusivos Também ele fazia parte do mesmo grupo de pessoas que a revolução comunista havia guindado ao poder Todavia ele e seus correligionários acreditavam na possibilidade de obter significativo crescimento econômico sem pôr em perigo seu controle político para o que dispunham de um modelo de crescimento sob instituições políticas extrativistas que não poria seu poder em risco porque o povo chinês encontravase na mais absoluta necessidade de melhorar seus padrões de vida e porque toda oposição significativa ao Partido Comunista fora obliterada durante o governo de Mao e a Revolução Cultural Assim pretendiam repudiar não só a Revolução Cultural como também boa parte do legado institucional maoísta Perceberam que o crescimento econômico só seria viabilizado por medidas significativas rumo a instituições econômicas inclusivas por isso desejavam reformar a economia e injetar ânimo novo no papel dos incentivos e forças de mercado Queriam também expandir o escopo da propriedade privada e reduzir o papel do Partido Comunista na sociedade e na administração livrandose de conceitos como luta de classes O grupo de Deng também estava aberto a investimentos estrangeiros e ao comércio internacional e tencionava adotar uma política muito mais agressiva de integração com a economia internacional Contudo havia limites e construir instituições econômicas verdadeiramente inclusivas e afrouxar de modo considerável o controle exercido pelo Partido Comunista sobre a economia não eram sequer opções A reviravolta chinesa sobreveio com a ascensão de Hua Guofeng ao poder e sua determinação a usálo contra o Bando dos Quatro Um mês após a morte de Mao Hua tramou um golpe contra os Quatro que foram todos presos Em março de 1977 reinstalou Deng Nada houve de inevitável nesse curso de acontecimentos nem nos significativos passos seguintes que resultaram na derrocada política do próprio Hua orquestrada por sua vez por Deng Xiaoping Deng estimulou a crítica pública da Revolução Cultural e começou a preencher cargos em todos os níveis do Partido Comunista com pessoas que como ele haviam sofrido durante esse período Hua não podia repudiar a Revolução Cultural o que o enfraqueceu ademais era relativamente recémchegado aos centros do poder e faltavalhe a rede de conexões e relações informais que Deng havia construído ao longo de muitos anos Em uma série de discursos Deng começou a criticar as políticas de Hua Em setembro de 1978 atacou explicitamente os Dois Quaisquer defendendo que em vez de permitir que qualquer coisa que Mao tivesse dito determinasse as políticas adotadas a abordagem correta seria buscar a verdade dos fatos Deng de maneira brilhante começou também a instigar a pressão popular contra Hua o que se manifestou de forma mais intensa no movimento do Muro da Democracia em 1978 em que as pessoas afixavam cartazes com queixas sobre o país em um muro em Pequim Em julho daquele mesmo ano um aliado de Deng Hu Qiaomu apresentou alguns princípios básicos de reforma econômica que incluíam a proposta de que as empresas dispusessem de maior iniciativa e autoridade para que tomassem suas próprias decisões com relação à produção Os preços deveriam ser um reflexo da oferta e da procura não estabelecidos pelo governo e o controle estatal da economia deveria de modo geral sofrer uma redução Eram sugestões radicais mas Deng vinha ganhando influência Em novembro e dezembro de 1978 a III Sessão Plenária do XI Comitê Central do Partido gerou uma inovação Sob os protestos de Hua decidiuse que dali por diante o foco do partido seria não mais a luta de classes mas a modernização econômica A plenária anunciou alguns experimentos iniciais com um sistema de responsabilidade familiar em determinadas províncias numa tentativa de reduzir a extensão da agricultura coletiva e introduzir incentivos econômicos no setor agrícola No ano seguinte o Comitê Central reconheceria a centralidade do conceito de verdade dos fatos e declararia que a Revolução Cultural fora uma grande calamidade para o povo chinês Durante esse período Deng tratou de assegurar a nomeação de seus próprios simpatizantes para cargoschave no partido exército e governo Embora precisasse de cautela em suas investidas contra os defensores de Hua no Comitê Central foi criando bases paralelas de poder Em 1980 Hua foi forçado a deixar o cargo de primeiroministro sendo substituído por Zhao Ziyang Em 1982 Hua foi afastado do Comitê Central Todavia Deng não parou por aí No XII Congresso do Partido em 1982 e depois na Conferência Nacional do Partido em setembro de 1985 conseguiu promover uma reorganização quase total dos quadros de liderança do partido agora ocupados por pessoas mais jovens e de mentalidade reformista Assim em 1985 haviam sido substituídos 21 dos 26 membros do politburo 8 dos 11 membros do secretariado do Partido Comunista e 10 dos 18 viceprimeirosministros que ocupavam os respectivos cargos em 1980 Uma vez consumada a revolução política de Deng e seus reformistas que detinham agora o controle do Estado foi lançada uma série de mudanças nas instituições econômicas começando pela agricultura em 1983 seguindo as ideias de Hu Qiaomu o sistema de responsabilidade familiar que forneceria incentivos econômicos aos agricultores foi adotado universalmente Em 1985 a compra compulsória de grãos pelo Estado foi abandonada e substituída por um sistema de contratos mais voluntários e o controle administrativo dos preços agrícolas foi muito relaxado Na economia urbana as empresas estatais ganharam mais autonomia e 14 cidades foram qualificadas como abertas passando a poder atrair investimentos estrangeiros A economia rural foi a primeira a deslanchar A introdução de incentivos levou a aumento drástico da produtividade agrícola Em 1984 a produção de grãos foi um terço maior do que em 1978 embora houvesse menos gente trabalhando no setor Muitos tinham passado a trabalhar nas novas indústrias rurais as chamadas Empresas de Cantão e Povoado Township and Village Enterprises autorizadas a expandirse fora do sistema de planejamento estatal da indústria desde 1979 quando passou a ser aceita a entrada em atividade de novas empresas e sua concorrência com as estatais Paulatinamente foram introduzidos também incentivos econômicos no setor industrial sobretudo na operação das empresas estatais embora nesse estágio não houvesse ainda o menor indício de privatização que teria de esperar até meados dos anos 1990 O renascimento da China acompanhou um significativo repúdio a um dos mais extrativistas conjuntos de instituições econômicas do mundo e sua substituição por outras mais inclusivas Os incentivos de mercado na agricultura e na indústria seguidos de tecnologia e investimentos estrangeiros colocariam a China num caminho de crescimento econômico acelerado Como discutiremos em mais detalhes no próximo capítulo tal crescimento se deu sob instituições políticas extrativistas ainda que não tão repressivas quanto na época da Revolução Cultural e apesar de as instituições econômicas terem se tornado parcialmente inclusivas nada disso porém diminui o grau de radicalismo das mudanças sofridas pelas instituições econômicas chinesas A China rompeu o padrão mesmo não transformando suas instituições políticas Como em Botsuana e no Sul dos Estados Unidos as mudanças cruciais ocorreram durante uma circunstância crítica no caso da China após a morte de Mao Foram também contingentes na verdade extremamente fortuitas já que nada havia de inevitável no fato de o Bando dos Quatro ter sido derrotado na luta pelo poder e se não houvesse sido assim a China não teria conhecido o crescimento econômico sustentado que testemunhou nos últimos 30 anos Entretanto o nível de devastação e sofrimento humano provocados pelo Grande Salto Adiante e pela Revolução Cultural engendrou suficiente demanda por mudança para que Deng Xiaoping e seus aliados conseguissem vencer a batalha política BOTSUANA CHINA e o Sul dos Estados Unidos do mesmo modo como a Revolução Gloriosa na Inglaterra a Revolução Francesa e a Restauração Meiji no Japão são ilustrações vívidas de que história não é destino Apesar do círculo vicioso as instituições extrativistas podem ser substituídas por outras inclusivas o que não se dá de maneira automática contudo nem com facilidade Em geral é necessária uma confluência de fatores especialmente uma circunstância crítica aliada a ampla coalizão entre os que pressionam por reformas ou outras instituições existentes que sejam propícias para que um país avance ao encontro de instituições mais inclusivas Além disso um toque de sorte é sempre fundamental porque a história sempre se desenrola de forma contingente E 15 COMPREENDENDO A PROSPERIDADE E A POBREZA ORIGENS HISTÓRICAS XISTEM DIFERENÇAS GIGANTESCAS de padrão de vida ao redor do mundo Mesmo os mais pobres cidadãos dos Estados Unidos possuem renda e acesso à saúde educação serviços públicos e oportunidades econômicas e sociais muito superiores àqueles disponíveis para a vasta massa de habitantes da África subsaariana Sul da Ásia e América Central O contraste entre as Coreias do Sul e do Norte as duas Nogales e Estados Unidos e México recordanos que se trata de um fenômeno relativamente recente Há 500 anos o México sede do Estado asteca era definitivamente mais rico que as regiões mais ao norte e só seria ultrapassado pelos Estados Unidos no século XIX A lacuna entre as duas Nogales é ainda mais recente Já as Coreias do Sul e do Norte eram indiscerníveis em termos econômicos sociais e culturais até o país ser dividido após a Segunda Guerra Mundial na altura do paralelo 38 Analogamente a maioria das abissais diferenças econômicas que observamos hoje à nossa volta surgiu no decorrer dos últimos 200 anos Era mesmo necessário que fosse assim Haveria alguma predeterminação histórica ou geográfica ou cultural ou étnica no sentido de que Europa Ocidental Estados Unidos e Japão se tornassem tão mais ricos do que a África subsaariana América Latina e China no decorrer de cerca dos últimos 200 anos Seria inevitável que a Revolução Industrial tivesse início no século XVIII na GrãBretanha e em seguida se disseminasse pela Europa Ocidental e por seus desdobramentos na América do Norte e Australásia Seria possível outro mundo em que as Revoluções Gloriosa e Industrial ocorressem no Peru que então colonizaria a Europa Ocidental e escravizaria os brancos Ou essa alternativa não passa de uma espécie de ficção científica histórica Para responder a essas perguntas e na verdade até para poder pensar a respeito necessitamos de uma teoria acerca do porquê de algumas nações serem prósperas ao passo que outras fracassam e caem na pobreza Tal teoria precisa delinear tanto os fatores que criam e retardam a prosperidade quanto suas raízes históricas É o que este livro se propôs a fazer Qualquer fenômeno social complexo tal como as origens das diferentes trajetórias econômicas e políticas de centenas de Estados em todo o mundo provavelmente terá uma miríade de causas o que leva a maioria dos cientistas sociais a repudiar teorias simples de aplicação ampla e que identifiquem uma única causa para os acontecimentos por isso tendem a preferir uma série de explicações diferentes para resultados aparentemente similares que ocorram em locais e tempos distintos O que fizemos em vez disso foi oferecer uma teoria simples usandoa para explicar os principais contornos do desenvolvimento econômico e político ao redor do mundo desde a Revolução Neolítica Nossa escolha foi motivada não por uma crença ingênua de que tal teoria poderia fornecer explicações para tudo mas pela convicção de que a teoria deve nos permitir abordar os paralelismos ainda que por vezes à custa da abstração de não poucas minúcias interessantes Uma teoria bemsucedida portanto não procura reproduzir detalhes com fidelidade mas proporciona uma justificativa útil e empiricamente bem fundamentada para uma gama de processos ao mesmo tempo em que joga luz sobre as principais forças em ação Nossa teoria procurou alcançar esse objetivo atuando em dois níveis O primeiro é a distinção entre instituições econômicas e políticas extrativistas e inclusivas O segundo é nossa explicação de por que as instituições inclusivas surgiram em determinadas regiões do mundo mas não em outras Enquanto o primeiro nível de nossa teoria trata de uma interpretação institucional da história o segundo trata de como esta molda os percursos institucionais das nações Um elemento central de nossa teoria é a ligação entre instituições econômicas e políticas inclusivas e prosperidade Instituições econômicas inclusivas que asseguram os direitos de propriedade criam condições igualitárias para todos e incentivam os investimentos em novas tecnologias e competências têm maiores chances de conduzir ao crescimento econômico do que as extrativistas que são estruturadas de modo que poucos possam extrair recursos de muitos e mostramse incapazes de proteger os direitos de propriedade ou fornecer incentivos para a atividade econômica As instituições econômicas inclusivas são sustentadas por suas contrapartes políticas isto é aquelas que promovem ampla distribuição do poder político de maneira pluralista e conseguem alcançar algum grau de centralização política de modo a estabelecer a lei e a ordem que são os fundamentos de direitos de propriedade seguros e de uma economia de mercado inclusiva ao mesmo tempo em que lhes dão sustentação Analogamente as instituições econômicas extrativistas são sinergicamente ligadas às suas equivalentes políticas que concentram poder nas mãos de uns poucos os quais são incentivados assim a manter e desenvolver instituições econômicas extrativistas em benefício próprio usando os recursos obtidos para consolidar seu controle do poder político Essas tendências não significam que o extrativismo das instituições econômicas e políticas seja inconsistente com o crescimento econômico Pelo contrário é do maior interesse de toda e qualquer elite estimular ao máximo o crescimento de modo a ter mais a extrair As instituições extrativistas que alcançam um grau mínimo de centralização política em geral conseguem gerar algum crescimento O crucial porém é que o crescimento sob instituições extrativistas não será sustentado por duas razões principais Primeiro para ser sustentado o crescimento econômico requer inovação esta por sua vez não pode ser dissociada da destruição criativa que não só vem substituir o velho pelo novo no âmbito econômico como também desestabiliza as relações estabelecidas de poder na esfera política Dado o temor que as elites que dominam as instituições extrativistas têm da destruição criativa elas vão resistir e qualquer crescimento que eventualmente venha a ocorrer sob instituições extrativistas está fadado a ter vida curta Em segundo lugar a capacidade que têm aqueles que dominam as instituições extrativistas de beneficiarse imensamente em detrimento do resto da sociedade implica que o poder político sob instituições extrativistas é um bem cobiçado o que leva inúmeros grupos e indivíduos a disputálo Por conseguinte emergem forças poderosas que empurram as sociedades sob instituições extrativistas para a instabilidade política As sinergias entre instituições econômicas e políticas extrativistas criam um círculo vicioso no qual as instituições extrativistas uma vez instauradas tendem a persistir Analogamente há um círculo virtuoso associado a instituições econômicas e políticas inclusivas Vicioso ou virtuoso porém nenhum dos dois tipos de círculo é absoluto Com efeito algumas nações vivem hoje sob instituições inclusivas porque embora as instituições extrativistas tenham sido a norma ao longo da história certas sociedades conseguiram romper o padrão e efetuar a transição rumo a instituições inclusivas Nossa explicação para essas transições é de caráter histórico mas não historicamente predeterminada Mudanças institucionais significativas que são prérequisitos para mudanças econômicas significativas são resultados da interação entre as instituições existentes e circunstâncias críticas isto é eventos de magnitude considerável que rompem o equilíbrio político e econômico existente em uma ou mais sociedades Foi o caso da peste negra por exemplo que talvez tenha eliminado até metade da população da maioria das regiões europeias no século XIV da abertura das rotas comerciais atlânticas que engendrou enormes oportunidades de lucro para muitos na Europa Ocidental e da Revolução Industrial que gerou potencial para mudanças aceleradas mas desagregadoras na estrutura das economias de todo o mundo As diferenças institucionais entre as próprias sociedades são fruto de mudanças institucionais passadas Por que o caminho da mudança institucional varia de uma sociedade para outra A resposta a essa pergunta está na diferenciação institucional Do mesmo modo como os genes de duas populações isoladas de organismos vão se diferenciar pouco a pouco em virtude de mutações aleatórias no chamado processo de diferenciação evolutiva ou genética duas sociedades que sob outros aspectos são similares também se diferenciam em termos institucionais ainda que também aqui devagar Conflitos com relação a receita e poder e indiretamente instituições são uma constante em todas as sociedades Em geral seu resultado é contingente mesmo que as condições de disputa para cada parte envolvida não sejam igualitárias É a resolução do conflito que promove a diferenciação institucional Todavia não se trata de um processo necessariamente cumulativo ele não implica que as pequenas diferenças que emergem em algum ponto vão obrigatoriamente se ampliar com o tempo Pelo contrário conforme ilustrado por nossa discussão da Britânia romana no Capítulo 6 pequenas diferenças vêm à tona desaparecem e voltam a surgir Entretanto quando ocorre uma circunstância crítica essas pequenas diferenças decorrentes da diferenciação institucional podem ser aquelas que fazem a diferença levando sociedades que sob outros aspectos são similares a divergir radicalmente Vimos nos Capítulos 7 e 8 que apesar das diversas semelhanças entre Inglaterra França e Espanha foi na primeira que a circunstância crítica do comércio atlântico exerceu impacto mais transformador devido às pequenas diferenças a que nos referimos como o fato de que em função do desenrolar dos acontecimentos durante os séculos XV e XVI a Coroa inglesa não podia controlar todo o comércio ultramarino enquanto na França e na Espanha este se encontrava basicamente sob o monopólio da Coroa Por conseguinte nesses dois países a monarquia e os grupos a ela aliados foram os principais beneficiários dos grandes lucros criados pelo comércio atlântico e pela expansão colonial enquanto na Inglaterra foram grupos que se opunham ferrenhamente à Coroa os beneficiários das oportunidades econômicas escancaradas por essa circunstância crítica Embora a diferenciação institucional produza diferenças pequenas sua interrelação com as circunstâncias críticas acarreta divergências institucionais que por sua vez geram as diferenças mais consideráveis que a circunstância crítica seguinte afetará A história é crucial pois são os processos históricos que via diferenciação institucional criam as peculiaridades que podem fazer toda a diferença durante as circunstâncias críticas Estas constituem momentos de reviravolta histórica e os círculos viciosos e virtuosos significam que temos de estudar a história para compreender a natureza das diferenças institucionais estruturadas historicamente Todavia nossa teoria não implica determinismo histórico nem de nenhum outro tipo É por essa razão que a resposta à pergunta com que abrimos este capítulo é não não havia nenhuma necessidade histórica de que o Peru acabasse se tornando tão mais pobre do que a Europa Ocidental ou os Estados Unidos Para começar em contraste com as hipóteses geográfica e cultural o Peru não está fadado à pobreza em virtude de sua geografia ou cultura Segundo a nossa teoria o Peru hoje é tão mais pobre que a Europa Ocidental e os Estados Unidos devido às suas instituições e para compreender as razões disso precisamos entender seu processo histórico de desenvolvimento institucional Como vimos no segundo capítulo 500 anos atrás o Império Inca que ocupou o território atual do país era mais rico mais sofisticado tecnologicamente e mais centralizado em termos políticos do que os Estados menores que ocupavam a América do Norte A chave foi o modo como essa região foi colonizada e como isso contrastou com a colonização da América do Norte ou seja não se tratou do fruto de um processo historicamente predeterminado mas do resultado contingente de uma série de desdobramentos institucionais cruciais ao longo de diversas circunstâncias críticas Ao menos três fatores poderiam ter mudado essa trajetória e produzido padrões muito diferentes a longo prazo Primeiro as diferenças institucionais nas Américas durante o século XV moldaram a forma como essas áreas foram colonizadas A América do Norte seguiu uma trajetória institucional diferente da peruana não só devido à sua baixa densidade demográfica antes da colonização mas também por ter atraído colonos europeus que mais tarde lograriam êxito em sua sublevação contra a elite que entidades como a Virginia Company e a Coroa britânica tentaram criar Em contrapartida os conquistadores espanhóis encontraram no Peru um Estado centralizado e extrativista de que se apropriar bem como uma vasta população que puderam pôr para trabalhar em minas e plantations Também não havia nada de geograficamente predeterminado na situação das Américas na época da chegada dos europeus Do mesmo modo como a emergência entre os bushong de um Estado centralizado liderado pelo Rei Shyaam foi fruto de uma inovação institucional considerável ou talvez mesmo de uma revolução política como vimos no Capítulo 5 a civilização inca no Peru e a grande população da região surgiram em decorrência de significativas inovações institucionais Estas poderiam muito bem ter se dado na América do Norte em lugares como o Vale do Mississippi ou mesmo o nordeste dos Estados Unidos Nesse caso os europeus talvez tivessem encontrado terras vazias nos Andes e Estados centralizados na América do Norte e os papéis do Peru e dos Estados Unidos seriam invertidos Os europeus teriam então se estabelecido em território peruano e o conflito entre a maioria dos colonos e a elite teria levado à criação de instituições inclusivas lá em vez de na América do Norte Os rumos posteriores do desenvolvimento econômico seriam provavelmente outros então Em segundo lugar o Império Inca poderia ter resistido ao colonialismo europeu como fez o Japão por ocasião da chegada da esquadra do Comodoro Perry na Baía de Edo Embora o maior extrativismo do Império Inca em relação ao de Tokugawa Japão sem dúvida diminuísse a probabilidade de ocorrência no Peru de uma revolução política nos moldes da Restauração Meiji não havia nenhuma necessidade histórica de que os incas sucumbissem de maneira tão cabal à dominação europeia Se tivessem conseguido resistir ou mesmo modernizar suas instituições em resposta às ameaças externas todo o percurso histórico do Novo Mundo e com ele toda a história mundial poderia ser diferente Terceiro agora radicalizando nosso raciocínio não havia nenhum determinismo histórico geográfico ou cultural que ditasse que fossem os europeus a colonizar a Terra Poderiam ter sido os chineses por exemplo ou mesmo os incas Naturalmente tal desdobramento seria impossível quando olhamos o mundo do ponto de vista do século XV quando a Europa Ocidental já havia saltado à frente das Américas e a China já tinha se fechado em sua concha Contudo a Europa Ocidental do século XV foi ela mesma fruto de um processo contingente de diferenciação institucional pontuado por circunstâncias críticas que nada teve de inevitável As potências do Oeste Europeu não teriam conseguido assumir a dianteira e conquistar o mundo sem uma sucessão de reviravoltas históricas entre elas os rumos específicos tomados pelo feudalismo substituindo a escravidão e diminuindo o poder dos monarcas no caminho o fato de que os primeiros séculos após a virada do primeiro milênio na Europa assistiram ao desenvolvimento de cidades independentes e autônomas em termos comerciais o fato de que os monarcas europeus não se sentiram tão ameaçados pelo comércio ultramarino e portanto não procuraram desestimulálo como fizeram os imperadores chineses durante a dinastia Ming e o advento da peste negra que abalou as fundações da ordem feudal Caso esses acontecimentos tivessem se dado de outra forma poderíamos viver hoje em um mundo muito diferente em que o Peru talvez fosse mais rico que a Europa Ocidental ou os Estados Unidos NATURALMENTE A CAPACIDADE PREDITIVA de uma teoria em que a contingência e as pequenas diferenças desempenham papéis centrais será restrita Poucos teriam antevisto no século XV ou mesmo no XVI e muito menos nos muitos séculos que se seguiram à queda do Império Romano que a maior guinada rumo a instituições inclusivas ocorreria na GrãBretanha O processo específico de diferenciação institucional e a natureza da circunstância crítica criada pela abertura do comércio atlântico é que criaram essa possibilidade Do mesmo modo poucos poderiam imaginar em plena Revolução Cultural na década de 1970 que a China logo estaria a caminho de mudanças radicais em suas instituições econômicas e em seguida em uma trajetória de crescimento vertiginoso Analogamente é impossível prever com qualquer grau de certeza qual será o estado de coisas daqui a 500 anos o que não chega a caracterizar um ponto fraco da nossa teoria O relato histórico que apresentamos até aqui indica que toda abordagem baseada no determinismo histórico a partir da geografia cultura ou mesmo outros fatores históricos é inadequada As pequenas diferenças e a contingência não fazem parte apenas da nossa teoria fazem parte do desenrolar da história Por mais difícil que seja fazer previsões acuradas acerca de que sociedades vão prosperar em relação às outras vimos no decorrer de todo este livro que nossa teoria explica bastante bem as vastas diferenças na prosperidade e pobreza das nações do mundo Veremos no resto deste capítulo que ela também fornece algumas diretrizes com relação aos tipos de sociedades com maiores chances de alcançar crescimento econômico nas próximas décadas Em primeiro lugar os círculos virtuosos e viciosos geram muita persistência e inércia Não há muita dúvida de que daqui a 50 ou mesmo 100 anos Estados Unidos e Europa Ocidental com base em suas instituições econômicas e políticas inclusivas serão mais ricos e é provável que consideravelmente mais ricos do que a África subsaariana o Oriente Médio a América Central ou o Sudeste Asiático Entretanto dentro desses padrões gerais haverá consideráveis mudanças institucionais ao longo do próximo século com alguns países rompendo o padrão e fazendo a transição da pobreza para a riqueza Países praticamente desprovidos de qualquer centralização política como Somália e Afeganistão ou aqueles que atravessaram um colapso do Estado como o Haiti nas últimas décadas muito antes do violento terremoto de 2010 que devastou a infraestrutura do país dificilmente atingirão algum crescimento sob instituições políticas extrativistas ou produzirão mudanças consideráveis rumo a instituições inclusivas Pelo contrário as nações com maiores possibilidades de crescimento nas próximas décadas ainda que provavelmente sob instituições extrativistas são aquelas com algum grau de centralização política Na África subsaariana enquadramse nessa descrição Burundi Etiópia Ruanda países com longo histórico de centralização do Estado e a Tanzânia que desde a independência conseguiu promover certa centralização ou ao menos implementar alguns dos prérequisitos para tanto Na América Latina incluemse Brasil Chile e México que não só atingiram a centralização política como também vêm dando passos significativos em direção a um pluralismo nascente Por outro lado nossa teoria sugere que o crescimento econômico sustentado é muito improvável na Colômbia A teoria sugere ainda que o crescimento sob instituições políticas extrativistas como na China não será sustentado e provavelmente perderá o ímpeto Para além desses casos prevalece a incerteza Cuba por exemplo pode efetuar a transição para instituições inclusivas e experimentar uma profunda transformação econômica ou pode permanecer sob instituições políticas e econômicas extrativistas O mesmo pode ser dito da Coreia do Norte e Mianmar na Ásia Assim embora nossa teoria forneça ferramentas para pensar sobre como as instituições mudam e as consequências de tais mudanças a sua natureza o papel das pequenas diferenças e da contingência dificulta uma precisão maior Cautela ainda maior se faz necessária ao elaborar recomendações de políticas a partir desse relato genérico das origens da prosperidade e da pobreza Do mesmo modo como o impacto das circunstâncias críticas depende das instituições existentes o modo como cada sociedade responderá à mesma intervenção depende das instituições em jogo Claro está que nossa teoria trata de como os países podem caminhar ao encontro da prosperidade transformando suas instituições extrativistas em inclusivas Por outro lado a teoria também deixa claro desde o começo que não há receitas fáceis para efetuar tal transição Primeiro o mecanismo do círculo vicioso implica uma dificuldade muito maior para mudar instituições do que a princípio pode parecer O que é particularmente insidioso é que as instituições extrativistas têm a capacidade de se recriar sob os mais diferentes disfarces como vimos com a lei de ferro da oligarquia no Capítulo 12 Assim o fato de o regime extrativista do Presidente Mubarak ter sido derrubado por manifestações populares em fevereiro de 2011 não constitui garantia de que o Egito vá enveredar por um caminho que o leve a instituições mais inclusivas Pelo contrário as instituições extrativistas mostramse capazes de se recriar apesar do vibrante e esperançoso movimento em prol da democracia Segundo já que o caminho contingente da história torna difícil saber se determinada interação entre as circunstâncias críticas e as diferenças institucionais existentes levará a instituições mais inclusivas ou mais extrativistas seria arrojado formular recomendações gerais com o objetivo de instigar a mudança rumo a instituições inclusivas Não obstante nossa teoria mantém sua utilidade para a análise política assim como nos permite reconhecer recomendações equivocadas para as políticas públicas baseadas ou em hipóteses incorretas ou em um entendimento inadequado de como as instituições podem mudar Aqui como em geral acontece evitar os piores erros é tão importante quanto tentar encontrar soluções simples e mais realista o que fica mais claramente visível ao considerarmos as atuais recomendações que estimulam o crescimento autoritário com base na bemsucedida experiência chinesa de crescimento das últimas décadas Em seguida explicaremos por que essas recomendações são equivocadas e por que o crescimento chinês tal como ocorreu até aqui não passa de mais uma forma de crescimento sob instituições políticas extrativistas que dificilmente se traduzirá em desenvolvimento econômico sustentado O IRRESISTÍVEL CHARME DO CRESCIMENTO AUTORITÁRIO Dai Guofang farejou logo no começo o iminente boom urbano na China Nos anos 1990 novos centros comerciais autoestradas residências e arranhacéus espalhavamse por toda parte no país e Dai imaginou que o crescimento só se aceleraria na década seguinte Na expectativa de que sua empresa a Jingsu Tieben Iron and Steel poderia capturar um vasto mercado como produtora de baixo custo sobretudo quando comparada às ineficientes siderúrgicas estatais planejou tornarse um verdadeiro gigante do aço Com o apoio das lideranças do partido em Changzhou começou a construir em 2003 Em março de 2004 porém o projeto fora interrompido por determinação do Partido Comunista chinês em Pequim e Dai acabou sendo preso por motivos que não chegaram a ser explicados com clareza As autoridades devem ter presumido que encontrariam algo de incriminador em sua contabilidade No processo ele passou os cinco anos seguintes entre a cadeia e a prisão domiciliar até ser julgado culpado em 2009 de uma acusação menor Seu verdadeiro delito foi dar início a um grande projeto que concorreria com empresas estatais e pior sem aprovação dos chefões do partido Sem dúvida foi essa a lição que outros tiraram do caso A reação do Partido Comunista a empreendedores como Dai não surpreende Chen Yun um dos mais próximos colaboradores de Deng Xiaoping e indiscutivelmente o principal articulador das reformas de mercado em seus estágios iniciais sintetizou o ponto de vista da maioria dos quadros do partido ao traçar uma analogia entre a economia chinesa e um pássaro na gaiola a economia era o pássaro o controle pelo partido a gaiola que precisava ganhar espaço para que a ave se tornasse mais saudável e dinâmica mas sem jamais ser destrancada ou eliminada para que o pássaro não escapasse Jiang Zemin logo após tornarse secretáriogeral do Partido Comunista o cargo mais poderoso do país em 1989 foi ainda mais longe e resumiu a desconfiança do partido em relação a empreendedores ao caracterizálos como mercadores e mascates autônomos que se dedicam a promover fraudes desvio de recursos subornos e evasão fiscal No decorrer dos anos 1990 enquanto choviam investimentos estrangeiros na China e as estatais eram incentivadas a expandir a iniciativa privada era encarada com desconfiança e muitos empreendedores eram expropriados ou mesmo presos A opinião de Jiang Zemin sobre empresários embora venha sofrendo um relativo declínio segue ainda muito em voga na China Nas palavras de um economista chinês as grandes estatais podem envolverse em projetos gigantescos Quando porém a iniciativa privada faz o mesmo sobretudo concorrendo com o Estado surgem problemas de todo lados sic Embora já se encontre hoje um semnúmero de empresas privadas operando com lucro no país muitos elementos da economia continuam sob o comando e a proteção do Estado O jornalista Richard McGregor conta que na mesa do presidente de cada uma das maiores estatais chinesas há um telefone vermelho Quando ele toca é o partido ligando para dar ordens acerca do que a empresa deve fazer onde deve investir e quais serão as suas metas Esses titãs seguem sob o comando do partido fato de que somos lembrados sempre que o partido decide trocar seus principais executivos demitilos ou promovêlos sem mais explicações Nenhuma dessas histórias pretende negar é evidente que a China realizou grandes progressos em direção a instituições econômicas inclusivas e são esses avanços que estão por trás dos extraordinários índices de crescimento do país nos últimos 30 anos A maioria dos empresários dispõe de alguma segurança e não menos por cultivar o apoio dos quadros locais e das elites do Partido Comunista em Pequim A maior parte das estatais visa ao lucro e compete nos mercados internacionais o que representa uma mudança radical em relação à China de Mao Como vimos no capítulo anterior a China só pôde começar a crescer porque sob Deng Xiaoping houve reformas radicais que substituíram as instituições econômicas mais extrativistas por outras inclusivas O crescimento prosseguiu com as instituições econômicas chinesas expandindo seu grau de inclusão ainda que em ritmo lento A China também se beneficia enormemente de sua vasta oferta de mão de obra barata e do acesso às tecnologias capital e mercados estrangeiros Por mais que as instituições econômicas do país sejam incomparavelmente mais inclusivas hoje que três décadas atrás a experiência chinesa é um rematado exemplo de crescimento sob instituições políticas extrativistas Apesar da recente ênfase em inovação e tecnologia o crescimento chinês baseiase na adoção das tecnologias existentes e na rapidez do investimento não na destruição criativa Um aspecto importante dessa realidade é que os direitos de propriedade não são inteiramente seguros na China Vez por outra como no caso de Dai alguns empreendedores são expropriados A mobilidade da mão de obra é estritamente controlada e o mais básico dos direitos de propriedade o direito de cada um vender o próprio trabalho do modo como bem entender é ainda muito precário A distância que ainda separa as instituições econômicas de serem verdadeiramente inclusivas é ilustrada pelo fato de que apenas uns poucos homens e mulheres de negócios se arriscariam a dedicarse a qualquer atividade sem assegurar o apoio do quadro local do partido ou ainda mais importante de Pequim A ligação entre o empresariado e o partido é altamente rentável para ambos os lados As empresas que contam com o apoio do partido recebem contratos em termos favoráveis desapropriam pessoas comuns de suas terras e transgridem impunemente leis e regulamentações Os que atravessarem o caminho de seus planos de negócios serão esmagados podendo até acabar presos ou assassinados A mão onipresente do Partido Comunista e das instituições extrativistas na China lembra as inúmeras semelhanças entre o crescimento soviético nas décadas de 1950 e 1960 e o crescimento chinês atual embora haja também diferenças notórias A União Soviética pôde crescer sob instituições econômicas e políticas extrativistas por ter alocado recursos à força para a indústria sob uma estrutura de comando centralizada sobretudo para o setor de armamentos e a indústria pesada Tal crescimento tornouse viável em parte por haver muito atraso a tirar o crescimento sob instituições extrativistas é mais fácil quando a destruição criativa não é uma necessidade As instituições econômicas chinesas são sem dúvida mais inclusivas que as soviéticas mas as instituições políticas do país continuam extrativistas O Partido Comunista chinês é todopoderoso e controla toda a burocracia estatal as forças armadas a mídia e vastos segmentos da economia O povo chinês dispõe de liberdades políticas restritas e de muito pouca participação no processo político São muitos os que há tempos acreditam que o crescimento na China conduziria à democracia e a maior pluralismo Houve um sentimento generalizado em 1989 de que as manifestações na Praça da Paz Celestial promoveriam maior abertura e talvez até levassem ao colapso do regime comunista Entretanto os tanques foram enviados contra os manifestantes e em vez de uma revolução pacífica os livros de história hoje se referem ao Massacre da Praça da Paz Celestial Em muitos sentidos as instituições políticas chinesas tornaramse mais extrativistas após esses acontecimentos reformadores como Zhao Ziyang que como secretáriogeral do Partido Comunista expressou seu apoio aos estudantes da Praça foram expurgados e o partido redobrou o zelo no aniquilamento das liberdades civis e de imprensa Zhao Ziyang permaneceria em prisão domiciliar por mais de 15 anos e sua figura pública seria paulatinamente apagada de modo que ele não se tornasse sequer um símbolo para os defensores de mudanças políticas Atualmente o partido exerce sobre os meios de comunicação inclusive a internet um nível de controle sem precedentes do qual boa parte se dá por meio da autocensura os veículos de comunicação sabem que não devem mencionar Zhao Ziyang nem Liu Xiaobo o crítico do governo que reivindica maior democratização e que segue apodrecendo na prisão mesmo depois de agraciado com o Prêmio Nobel da Paz A autocensura é complementada por um aparato orwelliano capaz de monitorar conversas e comunicações fechar jornais e sites até bloquear o acesso especificamente a determinadas notícias na internet Todo esse sistema foi acionado em 2009 quando estouraram acusações de corrupção contra o filho do secretáriogeral do partido desde 2002 Hu Jintao O aparelho governamental entrou em ação e não só conseguiu impedir a mídia chinesa de cobrir o caso como também foi capaz de bloquear as matérias sobre o caso nos sites do New York Times e do Financial Times Devido ao controle do partido sobre as instituições econômicas a destruição criativa é muito restrita e assim permanecerá até que haja reformas radicais nas instituições políticas Assim como na União Soviética a experiência chinesa de crescimento sob instituições políticas extrativistas é muito facilitada pelo fato de haver um enorme atraso a tirar A renda per capita na China ainda é uma fração daquela dos Estados Unidos e Europa Ocidental Sem dúvida o crescimento chinês é consideravelmente mais diversificado que o soviético não é função somente das indústrias pesada ou de armamentos e os empresários chineses vêm se mostrando bem mais engenhosos De todo modo esse crescimento está fadado a se esgotar a menos que o extrativismo das instituições políticas dê lugar a maior inclusão Enquanto as instituições políticas permanecerem extrativistas o crescimento será intrinsecamente limitado como em todos os casos similares A experiência da China levanta uma série de questões interessantes acerca do futuro do seu crescimento e sobretudo do quanto o crescimento autoritário é desejável e viável Esse tipo de crescimento vem se tornando uma alternativa popular ao consenso de Washington que salienta a importância da liberalização do mercado e do comércio bem como de determinadas formas de reforma institucional para impulsionar o crescimento econômico em muitas regiões menos desenvolvidas do mundo Embora parte do apelo da opção autoritária consista justamente na reação ao consenso de Washington talvez seu maior charme sem dúvida para os governantes que controlam instituições extrativistas resida na liberdade concedida para manter e até reforçar seu poder além de legitimar seu extrativismo Como destaca a nossa teoria sobretudo nas sociedades que passaram por algum grau de centralização do Estado esse tipo de crescimento sob instituições extrativistas é possível e pode até constituir o cenário mais provável para muitas nações indo do Camboja e do Vietnã ao Burundi Etiópia e Ruanda A teoria sugere também contudo que como todos os casos de crescimento sob instituições políticas extrativistas ele não será sustentado No caso da China o processo de crescimento baseado na compensação do atraso importação de tecnologia estrangeira e exportação de produtos manufaturados de baixa qualidade deve prosseguir por algum tempo Não obstante o crescimento chinês também deve esgotarse especialmente depois que a China alcançar o padrão de vida de um país de renda mediana O cenário mais provável é que o Partido Comunista e as cada vez mais poderosas elites econômicas do país consigam manter seu altíssimo grau de domínio nas próximas décadas Nesse caso a história e nossa teoria sugerem que o crescimento com destruição criativa e verdadeira inovação não se dará e os espetaculares índices de crescimento na China vão acabar se esvanecendo Tal resultado porém está longe de ser predeterminado pode ser evitado caso a China adote instituições políticas inclusivas antes que suas possibilidades de crescimento sob instituições extrativistas se esvaiam Não obstante como veremos em seguida há poucos motivos para supor que uma transição rumo a instituições políticas mais inclusivas seja provável na China ou que possa ocorrer de maneira automática e indolor Mesmo algumas vozes dentro do Partido Comunista chinês vêm reconhecendo os perigos à frente e disseminando a ideia de que uma reforma política isto é uma transição para instituições políticas mais inclusivas para usar a nossa terminologia se faz necessária O poderoso primeiroministro Wen Jiabao recentemente alertou para o perigo de que o crescimento econômico venha a ser prejudicado caso não se realizem reformas na esfera política A nosso ver a análise de Wen é presciente ainda que haja quem duvide de sua sinceridade No entanto muitos no Ocidente discordam dos pronunciamentos de Wen para eles a China revela um caminho alternativo ao crescimento econômico sustentado que se dá sob a égide do autoritarismo em vez de sob instituições políticas e econômicas inclusivas Mas estão errados Já detectamos as razões do êxito chinês uma transformação radical das instituições econômicas com a substituição daquelas rigidamente comunistas por outras que fornecem incentivos ao incremento da produtividade e do comércio Visto dessa perspectiva não há nada de fundamentalmente diferente na experiência chinesa em relação à de países que conseguiram afastarse um pouco de instituições econômicas extrativistas e aproximar se das inclusivas mesmo que isso se dê sob instituições políticas extrativistas como no caso chinês A China alcançou o crescimento econômico portanto não graças às suas instituições políticas extrativistas mas apesar delas sua bemsucedida experiência de crescimento no decorrer das três últimas décadas devese a um afastamento radical das instituições econômicas extrativistas e a uma convergência para outras mais inclusivas tarefa que se torna mais difícil não mais fácil pela presença de instituições políticas extrativistas altamente autoritárias OUTRO TIPO DE ENDOSSO dado ao crescimento autoritário reconhece sua natureza nada atraente mas entende que o autoritarismo é apenas uma fase transitória É uma ideia que remonta a uma das teorias clássicas da sociologia política a teoria da modernização formulada por Seymour Martin Lipset e segundo a qual todas as sociedades ao crescerem encaminhamse para uma forma de existência mais moderna desenvolvida e civilizada e principalmente rumo à democracia Muitos defensores da teoria da modernização alegam também que assim como a democracia as instituições inclusivas emergirão como subproduto do processo de crescimento Ademais por mais que democracia não seja sinônimo de instituições políticas inclusivas o desenvolvimento destas tende a ser fomentado pela realização de eleições regulares e pela livre concorrência política Diferentes versões da teoria da modernização também afirmam que o acesso da força de trabalho à educação naturalmente leva à democracia e a instituições melhores Em uma versão meio pósmoderna da referida teoria Thomas Friedman colunista do New York Times chegou a sugerir que quando o país atinge um número suficiente de restaurantes do McDonalds a democracia e as instituições fatalmente se seguem É um quadro otimista Ao longo dos últimos 60 anos a maioria dos países mesmo muitos daqueles com instituições extrativistas experimentou algum grau de crescimento e muitos assistiram a um aumento notável no grau de escolaridade de suas forças de trabalho Assim à medida que os níveis de renda e escolaridade forem aumentando de todo modo todos os outros fatores positivos como democracia direitos humanos liberdades civis e segurança dos direitos de propriedade devem seguirse automaticamente A teoria da modernização conta com grande número de adeptos tanto dentro quanto fora da academia Foi por suas hipóteses por exemplo que se pautaram as recentes atitudes dos Estados Unidos para com a China por exemplo George H W Bush resumiu a política americana em relação à democracia chinesa com as palavras pratiquemos o livre comércio com a China e o tempo estará a nosso favor A ideia era que havendo livre comércio entre a China e o Ocidente o país cresceria o crescimento por sua vez se encarregaria de promover a democracia e instituições melhores no país conforme previsto pela teoria da modernização No entanto a rápida intensificação das relações comerciais entre China e Estados Unidos desde meados da década de 1980 pouco contribuiu para a democracia chinesa e a integração cada vez mais estreita aguardada para a próxima década dará resultados igualmente pífios As expectativas de muitos com relação ao futuro da sociedade e da democracia iraquianas após a invasão liderada pelos Estados Unidos mostraramse igualmente otimistas em virtude dessas mesmas teses Apesar de seu desempenho econômico desastroso sob o regime de Saddam Hussein em 2002 o Iraque não era tão pobre quanto muitos países da África subsaariana e contava com uma população de razoável escolaridade em termos comparativos daí a crença de que seria terreno fértil para o desenvolvimento da democracia e das liberdades civis e talvez até para o que poderíamos chamar de pluralismo Tais esperanças viramse rapidamente esmagadas quando o caos e a guerra civil abateramse sobre a sociedade iraquiana A teoria da modernização não só é incorreta como também não contribui para a reflexão a respeito do enfrentamento dos principais problemas das instituições extrativistas A melhor evidência em seu favor é o fato de que as nações ricas são aquelas que contam com regimes democráticos respeitam os direitos humanos e civis e apresentam mercados funcionais e de modo geral instituições econômicas inclusivas Ainda assim interpretar tal associação como comprovação dessa teoria significa ignorar os efeitos consideráveis das instituições políticas e econômicas inclusivas sobre o crescimento econômico Como defendemos ao longo de todo este livro foram as sociedades dotadas de instituições inclusivas que cresceram no decorrer dos últimos 300 anos e tornaramse relativamente ricas hoje o que justifica o atual estado de coisas no mundo como fica evidente se encararmos os fatos de uma perspectiva ligeiramente distinta enquanto as nações que construíram instituições políticas e econômicas inclusivas ao longo dos últimos séculos alcançaram um crescimento econômico sustentado os regimes autoritários que cresceram mais rapidamente nos últimos 60 ou 100 anos ao contrário do que a teoria da modernização de Lipset nos levaria a crer não se tornaram mais democráticas Não admira o crescimento sob instituições extrativistas é possível exatamente por não implicar necessária ou automaticamente a derrocada dessas mesmas instituições pelo contrário costuma ocorrer porque quem controla as instituições extrativistas encara o crescimento econômico não como uma ameaça mas como um sustentáculo do regime como tem feito o Partido Comunista chinês desde a década de 1980 Tampouco surpreende que o crescimento engendrado por um aumento do valor dos recursos naturais de um país como ocorreu no Gabão Rússia Arábia Saudita e Venezuela dificilmente acarrete uma transformação fundamental desses regimes autoritários rumo a instituições inclusivas O registro histórico é ainda menos generoso com a teoria da modernização Muitos países relativamente prósperos sucumbiram a ditaduras repressivas e mantiveram instituições extrativistas Tanto a Alemanha quanto o Japão figuravam entre as nações mais ricas e industrializadas do mundo na primeira metade do século XX e seus cidadãos apresentavam níveis de escolaridade relativamente altos Nada disso impediu a ascensão do Partido NacionalSocialista na Alemanha nem a de um regime militarista voltado para a expansão territorial por meios bélicos no Japão o que levou as instituições econômicas e políticas de ambos a dar uma guinada radical rumo a instituições extrativistas A Argentina também era um dos países mais ricos do mundo no século XIX tanto quanto a GrãBretanha ou talvez até mais por ter se beneficiado d o boom mundial de recursos sua população era também a de mais alto grau de escolaridade da América Latina Contudo a democracia e o pluralismo não eram mais bemsucedidos no país do que no resto da América Latina pelo contrário mostraram se indiscutivelmente mais frágeis Os golpes se sucederam e como vimos no Capítulo 11 até os líderes eleitos pela via democrática comportaramse como ditadores rapaces Mesmo recentemente muito pouco se avançou no sentido do desenvolvimento de instituições econômicas inclusivas como vimos no Capítulo 13 os governos argentinos em pleno século XXI ainda conseguem expropriar impunemente a riqueza de seus cidadãos De todas essas considerações podemos deduzir uma série de conclusões significativas Primeiro o crescimento sob instituições políticas extrativistas autoritárias na China embora provavelmente ainda vá prosseguir por algum tempo não se traduzirá em crescimento sustentado apoiado em instituições econômicas verdadeiramente inclusivas e na destruição criativa Em segundo lugar contrariando as teses da teoria da modernização não contaríamos com a criação de democracia nem de instituições políticas inclusivas com base no crescimento autoritário China Rússia e diversos outros regimes autoritários que hoje apresentam algum grau de expansão devem atingir os limites do crescimento extrativista antes de aumentar o grau de inclusão de suas instituições políticas e de fato provavelmente antes do surgimento de qualquer desejo de mudança nesse sentido por parte das elites ou de uma oposição forte que as obrigue a mudar Terceiro o crescimento autoritário não é nem desejável nem viável a longo prazo e portanto não deve contar com o endosso da comunidade internacional como modelo para países da América Latina Ásia e África subsaariana mesmo sendo um caminho que muitos deles escolherão exatamente por estar às vezes de acordo com os interesses das elites políticas e econômicas que os dominam PROSPERIDADE NÃO SE ARQUITETA Ao contrário da teoria que desenvolvemos neste livro a hipótese da ignorância implica prontamente uma sugestão acerca de como solucionar o problema da pobreza se foi a ignorância que nos colocou nesta situação são o fornecimento de informações e o esclarecimento dos governantes e autoridades que podem nos tirar dela e deveríamos conseguir arquitetar prosperidade pelo mundo dando instruções adequadas e convencendo os políticos de quais são os bons princípios econômicos No Capítulo 2 quando discutimos essa hipótese mostramos como a experiência de Kofi Busia primeiroministro de Gana no começo da década de 1970 veio demonstrar que o principal obstáculo à adoção de políticas públicas capazes de reduzir a falência dos mercados e estimular o crescimento econômico não é a ignorância dos políticos mas os incentivos e restrições que lhes são impostos pelas instituições econômicas e políticas de suas sociedades Não obstante a hipótese da ignorância continua reinando soberana entre as autoridades ocidentais que praticamente em detrimento de toda e qualquer outra possibilidade têm como foco a criação da prosperidade Essas tentativas de criação seguem dois modelos básicos O primeiro que costuma ser defendido por órgãos internacionais como o Fundo Monetário Internacional parte da premissa de que o desenvolvimento incompleto é fruto de instituições e políticas econômicas de má qualidade propondo então uma lista de melhorias que esses órgãos internacionais empenhamse em induzir os países pobres a adotar o próprio consenso de Washington compõe uma lista dessas Essas melhorias giram em torno de objetivos sensatos como estabilidade macroeconômica e metas macroeconômicas aparentemente interessantes como a redução do tamanho do setor governamental câmbio flexível e liberalização das contas de capital Incluem também metas de ordem mais microeconômica como privatização aumento de eficiência na prestação de serviços públicos e talvez também sugestões quanto a como incrementar o funcionamento do próprio Estado com ênfase em medidas anticorrupção Por mais sensatas que muitas dessas reformas possam ser por si sós a abordagem de organizações internacionais em Washington Londres Paris e alhures continua embebida de uma perspectiva equivocada que se mostra incapaz de reconhecer o papel das instituições políticas e das restrições por elas impostas à formulação de políticas públicas Toda tentativa por parte dos organismos internacionais no sentido de fomentar o crescimento econômico mediante a intimidação dos países pobres obrigandoos a adotar instituições e políticas de melhor qualidade fracassa por não identificar outra causa para as más políticas e instituições além da ignorância dos líderes dos países pobres A consequência é que tais políticas não são adotadas ou implementadas ou são instauradas apenas de forma nominal Por exemplo diversas economias de todo o mundo que adotaram ostensivamente tais reformas sobretudo na América Latina ficaram estagnadas durante toda as décadas de 1980 e 1990 Na realidade tais medidas foram impingidas a esses países em contextos políticos que de resto permaneceram intocados Assim mesmo onde se realizaram reformas estas tiveram sua intenção subvertida ou os políticos lançaram mão de outros meios para suavizar seu impacto Tudo isso é ilustrado pela implementação de uma das principais recomendações dos órgãos internacionais com vistas à conquista da estabilidade macroeconômica a independência do banco central Tal orientação costuma ser implementada na teoria mas não na prática ou solapada pelo uso de outras ferramentas políticas Em princípio é muito razoável Muitos políticos de todo o mundo que gastavam mais do que arrecadavam com os impostos forçavam seus bancos centrais a compensar a diferença mediante a impressão de papel moeda A inflação resultante criava instabilidade e incerteza A teoria era que bancos centrais independentes como o Bundesbank alemão resistiriam à pressão política e poriam um freio na inflação O Presidente Mugabe do Zimbábue decidido a seguir os conselhos internacionais declarou o Banco Central de seu país independente em 1995 Até então os índices de inflação zimbabuanos oscilavam em torno de 20 Em 2002 haviam chegado a 140 em 2003 a quase 600 em 2007 a 66000 e em 2008 a 230000000 Evidentemente em um país cujo presidente ganha na loteria páginas 286290 não deveria surpreender ninguém que a promulgação de uma lei declarando o Banco Central independente nada queira dizer Deve ter chegado ao conhecimento do presidente do banco central zimbabuano o modo como seu colega de Serra Leoa havia caído do último andar do edifício do banco central quando discordara de Siaka Stevens página 267 Independente ou não cumprir as exigências do presidente ainda era a escolha mais prudente para sua saúde pessoal ainda que não para a da economia Por outro lado nem todos os países são como o Zimbábue Na Argentina e na Colômbia os Bancos Centrais também se tornaram independentes na década de 1990 e efetivamente se desincumbiram da missão de conter a inflação Contudo uma vez que em nenhuma das duas houve transformação política as elites políticas encontraram outras maneiras de comprar votos manter seus interesses e recompensar a si mesmas e aos seus seguidores Como já não podiam fazêlo por meio da emissão de papelmoeda tiveram de encontrar outros meios Nos dois países a introdução da independência do Banco Central coincidiu com uma grande expansão dos gastos governamentais financiada em grande parte mediante empréstimos O segundo método de criação da prosperidade encontrase muito mais em voga hoje em dia reconhece que não existem soluções fáceis para erguer uma nação da pobreza à prosperidade do dia para a noite ou mesmo no decorrer de algumas décadas e em vez disso defende que há uma série de microfalhas de mercado que podem ser compensadas por boas orientações Assim a prosperidade será alcançada caso as autoridades tirem proveito de tais oportunidades o que mais uma vez podese conseguir com a ajuda e visão de economistas e congêneres Segundo essa abordagem as pequenas falhas de mercado pululam nos países pobres em seus sistemas educacionais por exemplo ou serviços de saúde bem como no modo como seus mercados são organizados o que sem dúvida é verdade Todavia o problema é que essas pequenas falhas podem ser apenas a ponta do iceberg sintomas de problemas mais arraigados nas sociedades que funcionam sob instituições extrativistas Assim como não é coincidência o fato de os países pobres terem péssimas políticas macroeconômicas tampouco é coincidência que seus sistemas educacionais não funcionem bem Talvez essas falhas de mercado não se devam exclusivamente à ignorância As autoridades e burocratas que deveriam seguir tão bemintencionadas orientações podem fazer também parte do problema e as diversas tentativas de retificar as ineficiências podem acabar saindo pela culatra justamente porque os encarregados da máquina pública deixam de atacar as causas institucionais da pobreza em primeiro lugar Essas dificuldades são ilustradas pela intervenção idealizada pela organização não governamental ONG Seva Mandir com vistas à melhoria dos serviços de saúde prestados no estado do Rajastão na Índia Os serviços de saúde indianos têm um longo histórico de ineficiência e fracasso A saúde proporcionada pelo governo é pelo menos em tese amplamente disponível e barata e os profissionais são de modo geral qualificados Nem os indianos mais pobres entretanto usam as instalações de saúde governamentais preferindo em vez disso os prestadores privados bem mais caros irregulares e às vezes até deficientes Isso se deve não a algum tipo de irracionalidade ocorre que nos estabelecimentos governamentais assolados pelo absenteísmo a população não consegue acesso aos serviços oferecidos O indiano que se dirige a uma instituição pública não só não encontra enfermeiros que o atendam como provavelmente sequer consegue entrar no edifício já que as organizações de saúde passam a maior parte do tempo de portas fechadas Em 2006 a Seva Mandir associouse a um grupo de economistas para elaborar um esquema de incentivos que incentivasse a equipe de enfermagem a comparecer ao trabalho do distrito de Udaipur no Rajastão A ideia era simples a Seva Mandir introduziu relógios de ponto que assinalariam a data e a hora de entrada de cada profissional no respectivo local de trabalho Os cartões deveriam ser marcados três vezes ao dia a fim de assegurar sua chegada e saída no horário e permanência no local Se tudo corresse como planejado e a qualidade e a quantidade de serviços de saúde prestados aumentasse seria uma demonstração cabal da teoria de que problemas graves podem ter soluções fáceis Na prática contudo a intervenção revelou algo diferente Logo após a implementação do programa a assiduidade dos enfermeiros disparou mas foi um fenômeno efêmero Em pouco mais de um ano a administração de saúde local boicotou deliberadamente o esquema de incentivos introduzido pela Seva Mandir O absenteísmo retornou aos níveis de sempre mas houve uma multiplicação dos dias de isenção nos quais a ausência da equipe de enfermagem contava com a sanção oficial da secretaria de saúde local Proliferaram também os problemas de manutenção à medida que os relógios de ponto começaram a aparecer quebrados e a Seva Mandir não conseguiu substituílos porque os secretários de saúde recusavamse a cooperar Obrigar enfermeiros a bater ponto três vezes por dia não parece uma ideia lá muito inovadora Com efeito tratase de uma prática amplamente difundida na indústria mesmo a indiana e deve ter ocorrido às autoridades de saúde como uma potencial solução de seus problemas Parece improvável portanto que tenha sido a ignorância de tão simples mecanismo de incentivo que impediu seu uso em primeiro lugar O que se passou durante o programa apenas confirmou isso As autoridades de saúde sabotaram o programa por estarem mancomunadas com a equipe de enfermagem e por serem cúmplices dos problemas endêmicos de absenteísmo O que esse episódio ilustra é uma microversão da dificuldade de se implementar mudanças significativas quando a causa primeira dos problemas reside nas instituições Nesse caso não foram políticos corruptos ou empresas poderosas os responsáveis por solapar a reforma institucional mas pelo contrário as autoridades locais de saúde e os enfermeiros que conseguiram sabotar o esquema de incentivos da Seva Mandir e dos economistas do desenvolvimento Isso sugere que muitas das microfalhas de mercado aparentemente fáceis de reparar podem ser ilusórias a estrutura institucional que acarreta falhas de mercado também acaba impedindo a implementação de intervenções que aprimorem os inventivos em nível micro Insistir em tentar arquitetar prosperidade sem confrontar as causas originais dos problemas instituições extrativistas e a política que as sustenta dificilmente dará bons frutos O FRACASSO DA AJUDA EXTERNA Logo após os ataques de 11 de setembro de 2001 forças militares lideradas pelos Estados Unidos trataram de derrubar o regime repressivo do Talibã no Afeganistão que estava dando abrigo a membros centrais da Al Qaeda e recusavase a entregálos O Acordo de Bonn firmado em dezembro de 2001 entre líderes dos antigos mujahedin afegãos que haviam colaborado com as forças americanas e alguns dos principais membros da diáspora afegã entre eles Hamid Karzai definiu um plano para o estabelecimento de um regime democrático O primeiro passo seria a grande assembleia nacional a Loya Jirga que elegeu Karzai para o comando do governo interino As perspectivas do país estavam melhorando A maioria do povo afegão ansiava por deixar o Talibã para trás A comunidade internacional acreditava que tudo de que o Afeganistão precisava agora era uma grande injeção de ajuda externa Representantes da ONU e várias ONGs de renome logo desembarcavam na capital Kabul O que se seguiu não deveria espantar ninguém especialmente em vista do recorrente fracasso das iniciativas de ajuda externa a países pobres e Estados falidos ao longo das últimas cinco décadas Surpresa ou não repetiuse o ritual de sempre Uma multidão de funcionários de organizações de ajuda humanitária e suas respectivas comitivas afluiu para a cidade em seus jatinhos particulares ONGs de todo tipo chegaram para cumprir seus próprios objetivos e tiveram início elaboradas negociações entre governos e delegações da comunidade internacional Bilhões de dólares eram agora despejados sobre o Afeganistão Apenas uma parcela ínfima desse montante porém chegou a ser aplicada na construção de infraestrutura escolas ou outros serviços públicos essenciais para o desenvolvimento de instituições inclusivas ou mesmo para a restauração da lei e da ordem Embora boa parte da infraestrutura se encontrasse em petição de miséria a primeira parcela dos recursos foi usada para contratar uma companhia aérea para o transporte do pessoal da ONU e outras autoridades internacionais que em seguida precisariam de motoristas e intérpretes Assim contrataram os poucos burocratas com conhecimento de inglês e os professores que ainda restavam nas escolas para dirigir seus veículos e ciceroneálos pagandolhes valores muito acima dos salários afegãos da época À medida que os poucos burocratas qualificados eram desviados para a prestação de serviços para a comunidade de ajuda humanitária os recursos externos em vez de contribuir para a construção de infraestrutura no Afeganistão ajudaram a solapar ainda mais o Estado que deveriam estruturar e fortalecer Os aldeões de um distrito remoto no vale central do Afeganistão ouviram pelo rádio um comunicado sobre um novo programa multimilionário para a construção de abrigos na região Muito tempo depois foram entregues algumas traves de madeira trazidas pelo cartel de transporte de carga de Ismail Khan conhecido exlíder militar e membro do governo afegão Como porém eram demasiado grandes para ter qualquer utilidade no distrito os aldeões deramlhe o único uso possível lenha Sendo assim que fim tiveram os milhões de dólares prometidos à população Dos recursos prometidos 20 foram destinados aos custos administrativos da ONU em Genebra O resto foi terceirizado para uma ONG que abateu mais 20 para cobrir seus próprios custos administrativos em Bruxelas e assim por diante por mais três camadas nas quais cada parte se apropriava de mais 20 do restante que lhe chegava às mãos A pequena quantia que chegou ao Afeganistão foi usada para comprar madeira no oeste do Irã e em grande parte para contratar o cartel de Ismail Khan arcando com preços de transporte inflacionados Foi quase um milagre que aquelas traves de madeira gigantes tivessem sequer alcançado a aldeia O que aconteceu no vale central do Afeganistão não foi um incidente isolado Vários estudos estimam que apenas 10 ou no máximo 20 dos recursos humanitários chegam ao seu destino Há dezenas de investigações em curso referentes a denúncias de fraude por parte de autoridades locais e funcionários da ONU acusados de desvio de verbas Todavia a maior parte do desperdício no âmbito da ajuda externa não é fraude mas apenas incompetência ou ainda pior tratase apenas dos procedimentos habituais das organizações de ajuda Na verdade a experiência afegã em comparação com outras constituiu um êxito retumbante No decorrer das últimas cinco décadas centenas de bilhões de dólares foram destinados a governos de todo o mundo a título de fomento do desenvolvimento A maioria desses recursos foi desperdiçada nos meandros da burocracia e da corrupção como no Afeganistão Pior boa parte deles foi parar nas mãos de ditadores como Mobutu que dependiam da ajuda externa de seus patronos ocidentais tanto para comprar o apoio de seus clientes fortalecendo o regime quanto para locupletarse Em quase todo o resto da África subsaariana encontravase situação similar Já a ajuda humanitária concedida como auxílio temporário para tempos de crise de que os exemplos mais recentes foram o do Haiti e Paquistão sem dúvida teve maior utilidade ainda que sua entrega também tenha sido prejudicada por dificuldades similares Apesar desse nada lisonjeiro histórico de auxílio para o desenvolvimento a ajuda externa constitui uma das políticas mais populares recomendadas por governos ocidentais organizações internacionais como a ONU e as mais variadas ONGs como método de combate à pobreza ao redor do mundo E claro o ciclo de fracasso da ajuda externa repetese vezes sem conta A ideia de que os ricos países ocidentais deveriam despejar consideráveis quantias de auxílio para o desenvolvimento sobre a África subsaariana Caribe América Central e Sul da Ásia a fim de erradicar o problema da pobreza nessas regiões baseiase em um entendimento equivocado de suas causas Países como o Afeganistão são pobres em virtude de suas instituições extrativistas resultantes por sua vez da falta de direitos de propriedade lei e ordem e sistemas jurídicos de funcionamento adequado bem como da sufocante presença das elites nacionais e com mais frequência locais na vida política e econômica Os mesmos problemas institucionais significam que a ajuda externa será ineficaz pois será saqueada e dificilmente chegará às mãos de seus reais destinatários Na pior das hipóteses acabarão realimentando os próprios regimes que estão na origem das dificuldades dessas sociedades Se o crescimento econômico sustentado depende de instituições inclusivas fornecer auxílio aos regimes que presidem instituições extrativistas não pode ser a solução Isso não implica negar que para além mesmo de qualquer ajuda humanitária um bem considerável decorre de programas específicos de auxílio que erguem escolas em áreas onde antes não havia nenhuma e pagam professores que do contrário não receberiam um tostão sequer Embora grande parte do pessoal das organizações humanitárias que invadiu Kabul tenha feito muito pouco pela melhoria das condições de vida dos afegãos comuns houve também êxitos notórios na construção de escolas sobretudo para meninas que eram inteiramente excluídas da educação não só sob o Talibã mas mesmo antes Uma solução que vem ganhando popularidade em parte com base no reconhecimento de que as instituições têm alguma coisa a ver com a prosperidade e até com a entrega dos recursos humanitários constitui em tornar o auxílio condicional Segundo esse ponto de vista a continuidade da ajuda deveria depender do cumprimento de determinadas metas por parte dos governos destinatários por exemplo a liberalização dos mercados ou o deslocamento do Estado em direção à democracia A administração George W Bush deu o maior passo rumo a esse tipo de auxílio condicional ao lançar o programa Millennium Challenge Accounts tornando os futuros pagamentos de auxílio dependentes de aprimoramentos quantitativos em uma série de dimensões do desenvolvimento econômico e político No entanto a eficácia da ajuda condicionada não parece maior que a da não condicionada Os países que se mostram incapazes de satisfazer essas condições em geral recebem tanta ajuda quanto os capazes O motivo é simples eles têm maior necessidade de ajuda seja em termos de fomento ou do tipo humanitário Previsivelmente o auxílio condicional parece exercer pouco impacto sobre as instituições de cada país Afinal seria assombroso se alguém como Siaka Stevens de Serra Leoa ou Mobutu do Congo de repente começasse a desmontar as instituições extrativistas de que dependem para obter um pouco mais de ajuda externa Mesmo na África subsaariana onde a ajuda externa constitui uma fração significativa do orçamento total de muitos governos e mesmo depois das Millennium Challenge Accounts que aumentaram o grau de condicionalidade o volume de ajuda externa que um ditador pode obter abdicando de seu próprio poder é ínfimo e não compensa o risco que representa para a continuidade de seu domínio do país nem para sua própria vida Nada disso significa porém que a ajuda externa com exceção do tipo humanitário deveria deixar de existir Além de provavelmente acarretar mais sofrimento humano seria impraticável eliminála devido aos sentimentos de culpa e desconforto com que os cidadãos de muitos países ocidentais encaram os desastres econômicos e humanitários de todo o mundo e a ajuda externa os leva a crer que algo está sendo feito para combater os problemas Por menos eficiente que seja essa alternativa o impulso nesse sentido continuará existindo e a ajuda externa também O gigantesco complexo de organizações internacionais e ONGs tampouco cessará de demandar e mobilizar recursos para assegurar a manutenção do status quo Ademais seria de uma insensibilidade ímpar cortar o auxílio dado aos países mais necessitados Sim boa parte dos recursos se perde em desperdício Ainda assim se de cada dólar distribuído a título de ajuda US010 conseguirem chegar às mãos das pessoas mais pobres do mundo serão US010 a mais do que elas tinham antes para aliviar sua mais abjeta pobreza e talvez isso ainda seja melhor do que nada Há aqui duas importantes lições Primeiro a ajuda externa não é um meio muito eficaz de lidar com o fracasso das nações do mundo muito pelo contrário Os países necessitam de instituições políticas e econômicas inclusivas a fim de romper o ciclo da pobreza A ajuda externa normalmente pouco pode fazer quanto a isso e sem dúvida não no seu formato atual É fundamental reconhecer as origens da desigualdade e da pobreza mundiais exatamente para que não atrelemos nossas esperanças a falsas promessas À medida que suas origens estão nas instituições a ajuda externa promovida no contexto dessas mesmas instituições nas nações destinatárias pouco poderá fazer no sentido de incentivar o crescimento sustentado Segundo se o desenvolvimento de instituições políticas e econômicas é crucial poderia ser útil usar os fluxos existentes de ajuda externa ao menos em parte para facilitar esse desenvolvimento Como vimos a resposta não está na condicionalidade já que esta requer que os atuais governantes façam concessões pelo contrário uma perspectiva mais positiva talvez consistisse na estruturação da ajuda externa de modo que seu emprego e administração insiram no processo decisório grupos e lideranças de resto excluídos do poder empoderando assim um amplo segmento da população EMPONDERAMENTO Tudo indicava que o dia 12 de maio de 1978 seria mais um dia normal na fábrica de caminhões da Scania na cidade de São Bernardo do Campo São Paulo Contudo os operários estavam agitados As greves estavam proibidas no país desde 1964 quando os militares derrubaram o governo democrático do Presidente João Goulart Acabara de se espalhar a notícia porém de que as autoridades vinham fixando os números da inflação nacional de modo que o aumento do custo de vida fora subestimado Quando teve início o turno das 7 horas os trabalhadores largaram suas ferramentas Às 8 horas Gilson Menezes sindicalista que trabalhava na fábrica mandou chamar o sindicato O presidente dos metalúrgicos de São Bernardo era um ativista de 33 anos chamado Luiz Inácio Lula da Silva Lula Ao meiodia Lula chegou à fábrica Quando a empresa lhe solicitou que convencesse os empregados a voltar para o trabalho ele se recusou A greve da Scânia foi a primeira de uma onda que varreu o Brasil Embora aparentemente elas girassem em torno da questão salarial Lula mais tarde comentaria Acho que não podemos separar os fatores econômicos dos políticos A luta era por salários mas ao lutar por salários a classe trabalhadora conquistou uma vitória política O ressurgimento do movimento trabalhista brasileiro foi apenas uma faceta de uma reação social muito mais ampla a uma década e meia de governo militar O intelectual de esquerda Fernando Henrique Cardoso que como Lula se tornaria presidente do país após a retomada da democracia defendia em 1973 que o regime democrático seria restaurado no Brasil pela união dos vários grupos sociais que faziam oposição aos militares Segundo ele havia necessidade de uma reativação da sociedade civil as associações profissionais sindicatos igrejas organizações estudantis grupos de estudo e círculos de debates os movimentos sociais em outras palavras uma coalizão ampla que tivesse em vista a recriação da democracia e a transformação da sociedade brasileira A fábrica da Scânia foi o prenúncio da formação dessa coalizão No final de 1978 Lula cogitava a possibilidade de criar um novo partido político o Partido dos Trabalhadores PT que não ficaria porém restrito aos sindicalistas Lula insistia em que aquele fosse o partido de todos os assalariados e pobres em geral Aqui as tentativas dos líderes sindicais de organizar uma plataforma política começaram a convergir com os inúmeros movimentos sociais que iam surgindo Em 18 de agosto de 1979 houve um encontro em São Paulo para discutir a formação do Partido dos Trabalhadores que agregaria antigos políticos da oposição lideranças sindicais estudantes intelectuais e representantes de uma centena dos mais diversos movimentos sociais que haviam começado a se organizar ao longo da década de 1970 por todo o Brasil Em 13 de outubro de 1979 no salão de festas do restaurante São Judas Tadeu em São Bernardo do Campo é lançado oficialmente o Movimento pelo Partido dos Trabalhadores que viria a representar todos esses grupos distintos O partido logo começou a tirar proveito da abertura política que os militares com relutância organizavam Nas eleições locais de 1982 candidatos do PT concorreram pela primeira vez e venceram as eleições para duas prefeituras Ao longo dos anos 1980 à medida que a democracia ia sendo gradualmente recriada no Brasil o Partido dos Trabalhadores foi assumindo um número crescente de governos locais Em 1988 controlava os governos de 36 municípios inclusive cidades grandes como São Paulo e Porto Alegre Em 1989 por ocasião das primeiras eleições presidenciais livres desde o golpe militar Lula obteve 16 dos votos no primeiro turno como candidato do PT No segundo turno contra Fernando Collor conquistou 44 dos votos Ao assumir o comando de vários governos regionais processo que se intensificou nos anos 1990 o Partido dos Trabalhadores começou a desenvolver uma relação simbiótica com diversos movimentos sociais locais Em Porto Alegre a primeira administração do PT após 1988 introduziu o chamado orçamento participativo um mecanismo para envolver os cidadãos comuns na formulação das prioridades de gastos para a cidade Estabeleceuse assim um sistema que se tornou um modelo mundial de prestação de contas e responsividade governamental acompanhado de enormes melhorias na prestação de serviços públicos e na qualidade de vida na cidade A bem sucedida estrutura de governança do partido em âmbito local traduziuse em maior mobilização política e sucesso no âmbito nacional Embora Lula tenha sido derrotado por Fernando Henrique Cardoso nas eleições presidenciais de 1994 e 1998 acabou sendo eleito presidente do Brasil em 2002 e o Partido dos Trabalhadores permanece no poder desde então A formação de uma ampla coalizão no Brasil fruto da convergência de diversos movimentos sociais e do sindicalismo exerceu um profundo impacto na economia do país De 1990 para cá o crescimento econômico vem sendo rápido com a redução da proporção da população vivendo na pobreza de 45 para 30 em 2006 A desigualdade que havia disparado no regime militar despencou sobretudo desde que o Partido dos Trabalhadores assumiu o poder e promoveu enorme expansão do acesso à educação com o número médio de anos passados na escola saltando de seis em 1995 para oito em 2006 O Brasil hoje faz parte do BRIC grupo que compreende Brasil Rússia Índia e China e é o primeiro país latinoamericano a adquirir peso de fato nos círculos diplomáticos internacionais A ASCENSÃO BRASILEIRA desde a década de 1970 não foi arquitetada por economistas de instituições internacionais que instruíram as autoridades brasileiras com relação à melhor maneira de criar políticas ou evitar a falência dos mercados Não se deu tampouco mediante injeções de ajuda externa Também não foi o resultado natural da modernização Pelo contrário foi consequência da construção corajosa de instituições inclusivas por diversos grupos que acabariam produzindo instituições econômicas mais inclusivas A transformação brasileira como a da Inglaterra no século XVII começou pela criação de instituições políticas inclusivas mas como uma sociedade pode construir instituições desse tipo A história como vimos está repleta de exemplos de movimentos de reforma que sucumbiram à lei de ferro da oligarquia e substituíram um conjunto de instituições extrativistas por outras ainda mais perniciosas Vimos que nos casos da Inglaterra de 1688 da França de 1789 e do Japão durante a Restauração Meiji de 1868 o processo de estabelecimento de instituições políticas inclusivas foi desencadeado por uma revolução Contudo tais revoluções políticas em geral produzem muita destruição e penúria e seu êxito está longe de ser certo A Revolução Bolchevique propagandeava seu objetivo como sendo a substituição do sistema econômico de exploração da Rússia czarista por outro mais justo e eficiente que proporcionasse liberdade e prosperidade a milhões de russos Infelizmente o resultado seriam as instituições extrativistas opostas e muito mais repressoras do que aquelas do governo derrubado pelos bolcheviques As experiências da China Cuba e Vietnã foram similares Muitas reformas não comunistas impostas de cima para baixo tampouco deram melhores resultados Nasser jurou construir uma sociedade igualitária e moderna no Egito o que apenas levou ao regime corrupto de Hosni Mubarak como vimos no Capítulo 13 Robert Mugabe era considerado por muitos um paladino da liberdade que derrubaria por terra o regime racista e altamente extrativista de Ian Smith em vigor na Rodésia desde então Não obstante as instituições do Zimbábue não se tornaram menos extrativistas e seu desempenho econômico chegou mesmo a piorar em relação a antes da independência O que há em comum entre as revoluções políticas que lograram abrir caminho para instituições mais inclusivas e as graduais mudanças institucionais na América do Norte na Inglaterra do século XIX e em Botsuana após a independência e que também promoveu significativo fortalecimento das instituições políticas inclusivas é o fato de terem conseguido empoderar um segmento transversal bastante amplo da sociedade O pluralismo pedra angular das instituições políticas inclusivas requer que o poder político tenha ampla distribuição pela sociedade o que começando pelas instituições extrativistas que concentram o poder nas mãos de uma elite estrita exige por sua vez um processo de empoderamento Foi isso como enfatizamos no Capítulo 7 que distinguiu a Revolução Gloriosa da mera derrubada de uma elite por outra Nesse caso o pluralismo nasceu da derrubada de Jaime II por uma rebelião política liderada por uma ampla coalizão de mercadores industriais fidalgos e muitos membros da aristocracia inglesa que não eram aliados da Coroa Como vimos a Revolução Gloriosa foi facilitada pela mobilização e empoderamento anteriores dessa coalizão ampla e mais importante levou por sua vez ao empoderamento de um segmento da sociedade ainda mais extenso do que antes ainda que claramente muito menos extenso do que a sociedade como um todo e a Inglaterra fosse se manter ao largo de uma verdadeira democracia por mais de 200 anos ainda Os fatores que levaram à emergência de instituições inclusivas nas colônias da América do Norte também foram similares como vimos no primeiro capítulo Mais uma vez o caminho iniciado em Virginia Carolina Maryland e Massachusetts que levaria à Declaração de Independência e à consolidação de instituições políticas inclusivas nos Estados Unidos deuse no sentido do empoderamento de segmentos cada vez mais amplos da sociedade Também a Revolução Francesa constitui um exemplo de empoderamento de um segmento mais amplo da sociedade que se sublevou contra o Ancien Régime na França e conseguiu preparar o terreno para um sistema político mais pluralista Todavia a Revolução Francesa especialmente o interlúdio do Terror sob Robespierre um regime repressivo e homicida ilustra também como o processo de empoderamento tampouco está livre de suas ciladas Em última instância porém Robespierre e seus companheiros jacobinos foram postos de lado fazendo com que o legado mais importante da Revolução Francesa fosse não a guilhotina mas as reformas de longo alcance por ela implementadas na França e em outras regiões da Europa São muitos os paralelos entre esses processos históricos de empoderamento e o que ocorreu no Brasil nos anos 1970 Embora uma das raízes do Partido dos Trabalhadores seja o movimento sindicalista desde o princípio líderes como Lula junto com os muitos intelectuais e políticos de oposição que deram seu apoio ao partido empenharamse em convertêlo em uma coalizão ampla fundindose com movimentos sociais locais por todo o país à medida que o partido assumia governos regionais estimulando a participação cívica e promovendo uma espécie de revolução da governança no país inteiro No Brasil em contraste com a Inglaterra no século XVII ou a França da virada do século XVIII não houve uma revolução radical que desencadeasse o processo de transformação das instituições políticas de um só golpe No entanto o processo de empoderamento iniciado nas fábricas de São Bernardo foi eficaz em parte por traduzirse em mudanças políticas fundamentais em âmbito nacional como por exemplo a transição do governo militar para a democracia Mais importante o empoderamento das camadas mais populares no Brasil assegurou que a transição para a democracia correspondesse a um movimento em direção a instituições políticas inclusivas constituindose portanto em elemento central na emergência de um governo comprometido com a prestação de serviços públicos expansão educacional e condições de fato igualitárias Como vimos a democracia não é garantia de que haja pluralismo O contraste entre o desenvolvimento das instituições pluralistas no Brasil e a experiência venezuelana é nesse contexto revelador A Venezuela também efetuou a transição para a democracia após 1958 mas sem um empoderamento das bases da sociedade nem a criação de uma distribuição pluralista do poder político Pelo contrário a corrupção na política as redes de apadrinhamento e os conflitos persistiram no país e em parte em decorrência disso quando os eleitores foram às urnas mostraramse dispostos a apoiar até mesmo déspotas em potencial como Hugo Chávez muito provavelmente por acreditarem que somente ele seria capaz de erguerse contra as elites estabelecidas na Venezuela Assim ela prossegue sob instituições extrativistas ao passo que o Brasil rompeu o padrão O QUE SE PODE FAZER PARA desencadear ou talvez apenas facilitar o processo de empoderamento e assim o desenvolvimento de instituições políticas inclusivas A resposta honesta naturalmente é que não existe receita para a criação dessas instituições É evidente que há alguns fatores óbvios que podem ajudar a fazer o processo de empoderamento decolar Aí se incluem a presença de alguma medida de ordem centralizada de modo que os movimentos sociais que venham a desafiar os regimes existentes não mergulhem de imediato no total desregramento algumas instituições políticas preexistentes que introduzam certa dose de pluralismo como as instituições políticas tradicionais de Botsuana de modo que coalizões amplas possam se constituir e perdurar e a presença de instituições da sociedade civil capazes de coordenar as demandas da população de modo que movimentos oposicionistas não possam nem ser facilmente esmagados pelas elites vigentes nem inevitavelmente se convertam em veículos para que outro grupo assuma o controle das instituições extrativistas existentes Entretanto muitos desses fatores são historicamente predeterminados e só se transformam muito lentamente O caso brasileiro mostra como as instituições da sociedade civil e organizações partidárias associadas podem ser erguidas de baixo para cima ainda que seja um processo demorado e suas possibilidades de êxito sob diferentes circunstâncias não são ainda bem entendidas Há outro participante ou conjunto de participantes capaz de desempenhar um papel transformador no processo de empoderamento a imprensa Seria difícil coordenar e sustentar o empoderamento da sociedade como um todo sem a disseminação de informações acerca de eventuais abusos econômicos e políticos por parte dos ocupantes do poder Vimos no Capítulo 11 o impacto exercido pela mídia em termos da informação do público e coordenação de suas demandas contra forças que solapavam as instituições inclusivas americanas Os meios de comunicação podem também exercer a importante função de canalizar o empoderamento de um amplo segmento da sociedade para reformas políticas mais duradouras tal como ilustrado mais uma vez em nossa discussão no Capítulo 11 sobretudo no contexto da democratização britânica Panfletos e livros informando e catalisando a opinião pública tiveram participação importante durante a Revolução Gloriosa na Inglaterra a Revolução Francesa e a trajetória britânica rumo à democracia no século XIX Analogamente os veículos de comunicação sobretudo as novas modalidades baseadas nos avanços da tecnologia da informação e das comunicações como blogs serviços de batepapo entre anônimos Facebook e Twitter desempenharam papel central na oposição iraniana à eleição fraudulenta de Ahmadinejad em 2009 e sua posterior repressão e parecem estar protagonizando analogamente os protestos da Primavera Árabe em andamento enquanto este manuscrito encontrase em fase de conclusão Regimes autoritários costumam ter consciência da importância de uma imprensa livre e empenhamse ao máximo para combatêla Um exemplo extremo foi o do governo Alberto Fujimori no Peru Embora originalmente tenha sido eleito de forma democrática Fujimori não demorou a instituir um regime ditatorial no Peru promovendo um golpe enquanto ocupava o cargo em 1992 A partir de então embora as eleições prosseguissem Fujimori construiu um regime corrupto baseado na repressão e em subornos Uma peçachave para tanto era seu braço direito Valdimiro Montesinos que encabeçava o poderoso serviço de inteligência peruano Montesinos homem organizado manteve registros completos de quanto a administração pagava a cada indivíduo para comprar sua lealdade chegando a gravar em vídeo várias situações de suborno Havia uma lógica em sua atitude Além do mero histórico tais evidências lhe garantiam o registro dos atos de seus cúmplices que seriam assim considerados tão culpados quanto Fujimori e Montesinos Com a queda do regime essas gravações caíram nas mãos de jornalistas e autoridades Os montantes negociados são indicativos do valor da imprensa para uma ditadura Um juiz da Suprema Corte foi avaliado entre US5 mil e US10 mil mensais e políticos de qualquer partido recebiam quantias similares Quando se tratava de jornais ou emissoras de televisão no entanto as somas iam para a casa dos milhões Fujimori e Montesinos desembolsaram US9 milhões em certa ocasião e mais US10 milhões em outra a fim de controlar as emissoras de televisão Pagaram mais de US1 milhão a um dos principais jornais e a outros menores pagavam algo entre US3 mil e US8 mil por manchete Para Fujimori e Montesinos o controle da imprensa era muito mais importante do que o de políticos e juízes Um dos homens de confiança de Montesinos General Bello sintetizou a questão em um dos vídeos ao afirmar Se não controlarmos a televisão não fazemos nada As atuais instituições extrativistas na China dependem também essencialmente do controle exercido pelas autoridades sobre os meios de comunicação que como vimos adquiriu grau assustador de sofisticação Como resumiu um comentarista chinês Para manter a liderança do partido nas reformas políticas três princípios devem ser seguidos que o partido controle as Forças Armadas que o partido controle os quadros e que o partido controle as notícias Todavia é evidente que a liberdade de imprensa e as novas tecnologias de comunicação só podem ajudar nas margens fornecendo informações e coordenando as demandas e iniciativas dos que reivindicam instituições mais inclusivas Sua utilidade só se traduzirá em mudanças efetivas quando um amplo segmento da sociedade se mobilizar e se organizar no intuito de levar a cabo mudanças políticas e o faça não por sectarismo ou para assumir o controle das instituições extrativistas mas para transformálas em outras mais inclusivas Se tal processo se porá em movimento e abrirá a porta para um empoderamento crescente e por fim para a reforma política duradoura vai depender como vimos em tantos exemplos distintos da história das instituições políticas e econômicas das muitas pequenas diferenças que fazem a diferença e dos tão contingentes rumos da história ENSAIOS E FONTES BIBLIOGRÁFICAS Prefácio As opiniões de Mohamed El Baradei podem ser encontradas em twittercomElBaradei As citações de Mosaab El Shami e Noha Hamed foram extraídas de Yahoo news 262011 em news yahoocomsyblogexclusive20110206tsyblogexclusiveegyptianvoicesfromtahrirsquare Sobre as 12 reivindicações imediatas publicadas no blog de Wael Khalil ver alethonews wordpresscom20110227egyptreviewingthedemands Reda Metwaly is quoted on Al Jazeera 212011 em englishaljazeeranetnewsmiddleeas t2011022011212597913527html Capítulo 1 Uma boa discussão sobre a exploração do Rio de La Plata pelos espanhóis encontrase em Rock 1992 cap 1 Sobre a descoberta e colonização dos guaranis ver Ganson 2003 As citações de Sahagún são de Sahagún 1975 pp 4749 Gibson 1963 é fundamental sobre a conquista espanhola do México e as instituições por eles estruturadas As citações de De las Casas são de De las Casas 1992 pp 39 11718 e 107 respectivamente Sobre Pizarro no Peru ver Hemming 1983 Os caps 16 tratam do encontro em Cajamarca a marcha para o sul e a captura da capital inca Cuzco Ver Hemming 1983 cap 20 sobre de Toledo Bakewell 1984 oferece uma visão geral sobre o funcionamento da mita de Potosí e Dell 2010 fornece evidências estatísticas que demonstram a persistência de seus efeitos ao longo do tempo A citação de Arthur Young é reproduzida de Sheridan 1973 p 8 Há diversos bons livros que descrevem a história de Jamestown em seus primórdios por exemplo Price 2003 e Kupperman 2007 Nossa abordagem tem forte influência de Morgan 1975 e Galenson 1996 A citação de Anas Todkill vem da p 38 de Todkill 1885 As citações de John Smith são de Price 2003 p 77 Víveres p 93 Se seu rei e p 96 Ao nos enviarem A Carta de Maryland as Constituições Fundamentais da Carolina e outras constituições coloniais foram disponibilizadas na internet pelo Avalon Project da Universidade de Yale em avalonlawyale edu17thcentury Bakewell 2009 cap 14 discute a independência do México e a constituição Ver Stevens 1991 e Knight 2011 sobre os presidentes e a instabilidade política pósindependência Coatsworth 1978 é o trabalho seminal acerca das evidências sobre o declínio econômico no México após a independência Haber 2010 apresenta a comparação entre o desenvolvimento do sistema bancário no México e nos Estados Unidos Sokoloff 1988 e Sokoloff e Khan 1990 fornecem evidências sobre o contexto social dos inovadores nos Estados Unidos que registraram patentes Ver Israel 2000 para uma biografia de Thomas Edison Haber Maurer e Razo 2003 propõem uma interpretação da economia política do regime de Porfirio Díaz muito em consonância com a nossa discussão Haber Klein Maurer e Middlebrook 2008 estendem essa abordagem da economia política mexicana até o século XX Sobre a alocação diferencial de terras de fronteira nas Américas do Norte e Latina ver Nugent e Robinson 2010 e GarcíaJimeno e Robinson 2011 HuDeHart 1984 discute a deportação do povo yaqui no cap 6 Sobre a fortuna de Carlos Slim e como ela foi amealhada ver Relea 2007 e Martinez 2002 Nossa interpretação do desenvolvimento econômico comparativo das Américas baseiase em nossas pesquisas anteriores com Simon Johnson sobretudo Acemoglu Johnson e Robinson 2001 2002 tendo sofrido também forte influência de Coatsworth 1978 2008 e Engerman e Sokoloff 1997 Capítulo 2 Os pontos de vista de Jared Diamond sobre as desigualdades no mundo estão expostos em seu livro Guns Germs and Steel 1997 Sachs 2006 estabelece sua própria versão do determinismo geográfico Os pontos de vista sobre a teoria cultural estão amplamente disseminados pela literatura acadêmica mas não chegaram a ser reunidos em uma só obra Weber 2002 defende que a Reforma Protestante explica por que a Europa realizou a Revolução Industrial Landes 1999 propõe que os europeus do norte desenvolveram um conjunto único de atitudes culturais que os levam a dedicarse ao trabalho poupar e ser inovadores Harrison e Huntington orgs 2000 é uma vigorosa defesa da importância da cultura para o desenvolvimento econômico comparativo A ideia de que há alguma espécie de superioridade cultural ou institucional britânica é disseminada sendo usada para explicar o excepcionalismo dos Estados Unidos Fisher 1989 bem como padrões de desenvolvimento comparativo em geral La Porta Lopezde Silanes e Shleifer 2008 As obras de Banfield 1958 e Putnam Leonardi e Nanetti 1994 constituem interpretações culturais muito influentes de como determinado aspecto da cultura ou capital social como a chamam contribui para a pobreza do sul da Itália Para um levantamento do uso feito por economistas da noção de cultura ver Guiso Sapienza e Zingales 2006 Tabellini 2010 examina a correlação entre a medida em que as pessoas confiam umas nas outras na Europa Ocidental e os níveis de renda anual per capita Nunn e Wantchekon 2010 mostram como a falta de confiança e o capital social na África estão correlacionados com a intensidade histórica do tráfico de escravos A história do Reino do Congo relacionada a esse tema é apresentada em Hilton 1985 e Thornton 1983 Sobre o atraso histórico da tecnologia africana ver as obras de Goody 1971 Law 1980 e Austen e Headrick 1983 A definição de economia proposta por Robbins foi retirada de Robbins 1935 p 16 A citação de Abba Lerner encontrase em Lerner 1972 p 259 A ideia de que a ignorância explica o desenvolvimento comparativo está implícita na maioria das análises econômicas do desenvolvimento econômico e reforma política por exemplo Williamson 1990 Perkins Radelet e Lindauer 2006 e Aghion e Howitt 2009 Uma versão recente e vigorosa dessa perspectiva é desenvolvida em Banerjee e Duflo 2011 Acemoglu Johnson e Robinson 2001 2002 fornecem uma análise estatística do papel relativo das instituições geografia e cultura mostrando que as primeiras superam os outros dois tipos de explicações na justificativa das diferenças de renda per capita hoje Capítulo 3 A reconstrução do encontro entre Hwang PyŏngWŏn e seu irmão foi extraída da entrevista de Hwang por James A Foley transcrita em Foley 2003 pp 197203 O conceito de instituições extrativistas é derivado de Acemoglu Johnson e Robinson 2001 A terminologia instituições inclusivas nos foi sugerida por Tim Besley A terminologia de derrota econômica e a distinção entre esta e a derrota política vem de Acemoglu e Robinson 2000b Os dados sobre Barbados vêm de Dunn 1969 Nossa abordagem sobre a economia soviética baseiase em Nove 1992 e Davies 1998 Allen 2003 apresenta outra interpretação mais positiva da história econômica soviética Na literatura de ciência social há um grande volume de pesquisas relacionadas às nossas teses e argumentos Ver Acemoglu Johnson e Robinson 2005b para uma visão geral dessa literatura e nossa contribuição a ela A perspectiva institucional do desenvolvimento comparativo baseiase em uma série de obras importantes Particularmente notável é o trabalho de North ver North e Thomas 1973 North 1982 North e Weingast 1989 e North Wallis e Weingast 2009 Olson 1984 também faz uma apresentação muito influente da economia política do crescimento econômico Mokyr 1990 é um livro fundamental que relaciona quem é derrotado economicamente à mudança tecnológica comparativa na história mundial O conceito de perdedores econômicos é muito difundido em ciência social como explicação da não ocorrência de resultados eficientes em termos institucionais e de políticas públicas Nossa interpretação baseada em Robinson 1998 e Acemoglu e Robinson 2000b 2006b distinguese por enfatizar a ideia de que o obstáculo mais importante à emergência de instituições inclusivas é o receio que as elites têm de perder seu poder político Jones 2003 apresenta uma rica história comparativa salientando temas similares e a importante obra de Engerman e Sokoloff 1997 sobre as Américas também sublinha as mesmas ideias Uma seminal interpretação em termos de economia política do subdesenvolvimento africano foi delineada por Bates 1981 1983 1989 cujo pensamento exerceu forte influência sobre o nosso Estudos fundamentais de Dalton 1965 e Killick 1978 enfatizam o papel da política no desenvolvimento africano e sobretudo como o medo da perda de poder político afeta as políticas econômicas A noção de perdedores políticos foi sugerida anteriormente em outras obras teóricas de economia política como Besley e Coate 1998 e Bourguignon e Verdier 2000 O papel da centralização política e das instituições estatais no desenvolvimento é sublinhado por sociólogos da história a partir da obra de Max Weber Destacamos os trabalhos de Mann 1986 1993 Migdal 1988 e Evans 1995 Na África a ligação entre Estado e desenvolvimento é salientada por Herbst 2000 e Bates 2001 Recentemente os economistas iniciaram sua contribuição para essa literatura por exemplo Acemoglu 2005 e Besley e Persson 2011 Por fim Johnson 1982 Haggard 1990 Wade 1990 e Amsden 1992 salientam como a economia política específica dos países do Leste Asiático lhes possibilitou lograr tamanho êxito econômico Finley 1965 defendeu a tese seminal de que a escravidão foi responsável pela falta de dinamismo tecnológico no mundo clássico A ideia de que o crescimento sob instituições extrativistas é possível mas também propenso a perder a força é enfatizada em Acemoglu 2008 Capítulo 4 Benedictow 2004 fornece uma visão geral definitiva da peste negra embora suas estimativas do número de mortos pela epidemia sejam controversas As citações de Boccaccio e Ralph de Shrewsbury são reproduzidas de Horrox 1994 Hatcher 2008 apresenta um relato instigante da expectativa e chegada da peste à Inglaterra O texto do Estatuto dos Trabalhadores está disponível online no Avalon Project em avalonlawyale edumedievalstatlabasp As obras fundamentais sobre o impacto da peste negra sobre a divergência entre oeste e leste da Europa são North e Thomas 1973 e principalmente Brenner 1976 cuja análise de como a distribuição inicial do poder político afetou as consequências da peste exerceu profunda influência sobre nossos pontos de vista Ver DuPlessis 1997 sobre a segunda servidão no Leste Europeu Conning 2010 e Acemoglu e Wolitzky 2011 desenvolvem formalizações da tese de Brenner A citação de James Watt é reproduzida a partir de Robinson 1964 pp 22324 Em Acemoglu Johnson e Robinson 2005a apresentamos pela primeira vez a tese de que foi a interação entre o comércio atlântico e as diferenças institucionais que levaram à diferencia ção das instituições inglesas e em última instância à Revolução Industrial Devemos o conceito de lei de ferro da oligarquia a Michels 1962 O conceito de circunstância crítica foi desenvolvido inicialmente por Lipset e Rokkan 1967 Sobre o papel das instituições no desenvolvimento a longo prazo do Império Otomano a pesquisa de Owen 1981 Owen e Pamuk 1999 e Pamuk 2006 é fundamental Capítulo 5 Sobre a missão de Steffens à Rússia e suas palavras a Baruch ver Steffens 1931 cap 18 pp 790802 Sobre o número de afetados pela fome na década de 1930 usamos os dados de Davies e Wheatcroft 2004 Sobre os números do recenseamento de 1937 ver Wheatcroft e Davies 1994a 1994b A natureza da inovação na economia soviética é estudada em Berliner 1976 Nossa discussão sobre o real funcionamento do stalinismo e principalmente a economia centralizada baseiase em Gregory e Harrison 2005 Sobre como os autores de livros didáticos americanos de economia interpretaram reiteradamente o crescimento econômico soviético de maneira equivocada ver Levy e Peart 2009 Nossa abordagem e interpretação dos lele e dos bushong baseiase na pesquisa de Douglas 1962 1963 e Vansina 1978 Sobre o conceito de Longo Verão ver Fagan 2003 Uma introdução acessível sobre os natufianos e os sítios arqueológicos por nós mencionados pode ser encontrada em Mithen 2006 e Barker 2006 A obra seminal sobre Abu Hureyra é Moore Hillman e Legge 2000 que documenta como o sedentarismo e a inovação institucional surgiram antes da agricultura Ver em Smith 1998 uma visão geral dos indícios de que a vida sedentária teria precedido a agricultura e ver BarYosef e BelferCohen 1992 sobre o caso dos natufianos Nossa abordagem da Revolução Neolítica é inspirada por Sahlins 1972 que também registra o caso dos Yir Yoront Nossa discussão da história maia baseiase em Martin e Grube 2000 e Webster 2002 A reconstrução da história demográfica de Copán vem de Webster Freter e Gonlin 2000 O número de monumentos datados foi extraído de Sidrys e Berger 1979 Capítulo 6 A discussão do caso veneziano segue Puga e Trefler 2010 bem como os caps 8 e 9 de Lane 1973 O material sobre Roma pode ser encontrado em qualquer livropadrão de história Nossa interpretação sobre as instituições econômicas romanas segue Finlay 1999 e Bang 2008 Nosso relato do declínio romano segue Ward Perkins 2006 e Goldsworthy 2009 Sobre as mudanças institucionais no Império Romano tardio ver Jones 1964 As histórias sobre Tibério e Adriano foram extraídas de Finley 1999 As evidências fornecidas pelos naufrágios foram usadas pela primeira vez por Hopkins 1980 Ver De Callataÿ 2005 e Jongman 2007 para uma visão geral desse tema e do Greenland Ice Core Project As tábulas de Vindolanda estão disponíveis online em vindolandacsadoxacuk A citação que usamos foi extraída de TVII Pub n 343 A discussão dos fatores que levaram ao declínio da Britânia segue Cleary 1989 cap 4 Faulkner 2000 cap 7 Dark 1994 cap 2 Sobre Axum ver MunroHay 1991 A obra seminal sobre o feudalismo europeu e suas origens é Bloch 1961 ver Crummey 2000 sobre o feudalismo etíope Phillipson 1998 faz a comparação entre o colapso de Axum e o colapso do Império Romano Capítulo 7 A história da máquina de Lee e seu encontro com a Rainha Elizabeth I está disponível em calvertonhomesteadcomwillleehtml Allen 2009b fornece os dados sobre os salários reais com base no Edito de Diocleciano sobre Preços Máximos Nossa tese acerca das causas da Revolução Industrial sofreu profunda influência das teses defendidas em North e Thomas 1973 North e Weingast 1989 Brenner 1993 Pincus 2009 e Pincus e Robinson 2010 Esses estudiosos por sua vez foram inspirados por interpretações marxistas anteriores das transformações institucionais britânicas e do nascimento do capitalismo ver Dobb 1963 e Hill 1961 1980 Ver também a tese de Tawney 1941 sobre como o projeto de construção de Estado de Henrique VIII mudou a estrutura social inglesa O texto da Magna Carta encontrase disponível online no Avalon Project em avalonlaw yaleedumedievalmagframeasp Elton 1953 é a obra seminal sobre o desenvolvimento das instituições estatais sob Henrique VIII e Neale 1971 as relaciona à evolução do Parlamento Sobre a Revolta dos Camponeses ver Hilton 2003 A citação de Hill sobre os monopólios foi extraída de Hill 1961 p 25 Sobre o período de governo pessoal de Carlos I seguimos Sharp 1992 Nossas evidências sobre como diferentes grupos e regiões aliaramse pró ou contra o Parlamento foram extraídas de Brunton e Pennington 1954 Hill 1961 e Stone 2001 Pincus 2009 é referência fundamental sobre a Revolução Gloriosa discutindo muitas das mudanças específicas nas instituições econômicas e políticas públicas por exemplo a abolição da fumagem e a criação do Banco da Inglaterra Ver também Pincus e Robinson 2010 Pettigrew 2007 2009 discute o ataque aos monopólios inclusive a Royal African Company e nossos dados sobre as petições foram extraídos de seus artigos Knights 2010 enfatiza a importância política das petições Nossas informações sobre o Hoares Bank foram extraídas de Temin e Voth 2008 Nossas informações sobre o Supervisor Cowperthwaite e a burocracia do imposto sobre produtos foram extraídas de Brewer 1988 Nossa visão geral da história econômica da Revolução Industrial baseiase em Mantoux 1961 Daunton 1995 Allen 2009a e Mokyr 1990 2009 que fornecem detalhes sobre os célebres inventores e invenções que discutimos A história da família Baldwyn foi extraída de Bogart e Richardson 2009 2011 que sublinham a ligação entre a Revolução Gloriosa a reorganização dos direitos de propriedade e a construção de estradas e canais Sobre as Leis do Madras e as Leis de Manchester ver OBrien Griffiths e Hunt 1991 que é a fonte das citações da legislação Sobre o predomínio de sangue novo na indústria ver Daunton 1995 cap 7 e Crouzet 1985 Nosso relato sobre por que as grandes mudanças institucionais ocorreram inicialmente na Inglaterra baseiase em Acemoglu Johnson e Robinson 2005a e Brenner 1976 Os dados sobre o número de mercadores independentes e suas preferências políticas foram extraídos de Zahedieh 2010 Capítulo 8 Sobre a oposição à prensa tipográfica no Império Otomano ver SavageSmith 2003 pp 65659 A comparação dos dados históricos sobre alfabetização foi extraída de Easterlin 1981 Nossa discussão sobre as instituições políticas espanholas seguem Thompson 1994a 1994b Para evidências sobre o declínio espanhol no decorrer desse período ver Nogal e Prados de la Escosura 2007 Nossa discussão sobre os impedimentos ao desenvolvimento econômico no Império AustroHúngaro segue Blum 1943 Freudenberger 1967 e Gross 1973 A citação de Maria Teresa foi extraída de Freudenberger p 495 Todas as demais citações do Conde Hartig e Francisco I foram extraídas de Blum A resposta de Francisco aos emissários do Tirol é citada em Jászi 1929 pp 8081 O comentário de Friedrich von Gentz a Robert Owen também é citado em Jászi 1929 p 80 A experiência dos Rothschilds na Áustria é discutida no cap 2 de Corti 1928 Nossa análise da Rússia segue Gerschenkron 1970 A citação de Kropotkin é da p 60 da edição de 2009 de seu livro O diálogo entre Nicolau e Mikhail é citado em Saunders 1992 p 117 A citação de Kankrin sobre as ferrovias encontrase em Owen 1991 pp 1516 O discurso de Nicolau aos manufaturadores é reproduzido de Pintner 1967 p 100 A citação de A A Zakrevskii foi extraída de Pintner 1967 p 235 Sobre o Almirante Zheng ver Dreyer 2007 A história econômica dos primórdios da China Moderna é coberta por Myers e Wang 2002 A citação de Tang Chen foi extraída de Myers e Wang pp 56465 Ver Zewde 2002 para obter uma visão geral da história etíope relacionada a esse tema Os dados sobre a história da Etiópia extrativista foram extraídos de Pankhurst 1961 assim como todas as citações aqui reproduzidas Nossa descrição das instituições e história somalis segue Lewis 1961 2002 O heer dos Hassan Ugaas é reproduzido na p177 de Lewis 1961 nossa descrição de uma vendeta foi derivada do cap 8 de Lewis 1961 em que ele fornece muitos outros exemplos Sobre o Reino de Tegali e a escrita ver Ewald 1988 Capítulo 9 Nossa discussão sobre a tomada de Ambon e Banda pela Companhia Holandesa das Índias Orientais e o impacto negativo da companhia sobre o desenvolvimento do Sudeste Asiático é baseado em Hanna 1978 e sobretudo Reid 1993 cap 5 As citações de Reid sobre Tomé Pires foram extraídas da p 271 a influência holandesa em Maguindanao p 299 o sultão de Maguindanao pp 299300 Os dados sobre o impacto da Companhia Holandesa das Índias Orientais sobre o preço das especiarias foram extraídos de ORourke e Williamson 2002 Uma visão geral definitiva da escravidão na sociedade africana e o impacto do tráfico de escravos é Lovejoy 2000 Lovejoy p 47 Quadro 31 fornece estimativas consensuais sobre a extensão do tráfico de escravos Nunn 2008 forneceu as primeiras estimativas quantitativas do impacto do tráfico de escravos sobre as instituições econômicas e o crescimento econômico africanos Os dados sobre as importações de armas de fogo e pólvora foram extraídos de Inikori 1977 O testemunho de Francis Moore foi extraído de Lovejoy 2000 pp 8990 Law 1977 é um estudo seminal da expansão do Estado oyo As estimativas do impacto do tráfico de escravos sobre a população africana são extraídas de Manning 1990 Lovejoy 2000 cap 8 os artigos em Law 1995 e o importante livro de Austin 2005 são as pedras angulares de nossa discussão da análise do período de comércio legítimo Os dados sobre a proporção de africanos que eram escravos na África foram extraídos de Lovejoy 2000 por exemplo p 192 Tabela 92 Os dados sobre a mão de obra na Libéria foram extraídos de Clower Dalton Harwitz e Walters 1966 O conceito de dualismo econômico foi desenvolvido por Lewis 1954 Fergusson 2010 desenvolve um modelo matemático do dualismo econômico A ideia de que este teria sido fruto do colonialismo foi proposta pela primeira vez na seminal coletânea de artigos editada por Palmer e Parsons 1977 Nosso relato sobre a África do Sul baseiase em Bundy 1979 e Feinstein 2005 O missionário morávio é citado em Bundy 1979 p 46 e John Hemming é citado em Bundy p 72 A disseminação da propriedade privada da terra em Griqualand East foi extraída de Bundy p 89 as façanhas de Stephen Sonjica de Bundy p 94 a citação de Matthew Blyth é da p 97 e a citação de um observador europeu em Fingoland 1884 de Bundy pp 100101 George Albu é citado em Feinstein 2005 p 63 o secretário de relações com os nativos é citado em Feinstein p 45 e Verwoerd é citado em Feinstein p 159 Os dados sobre os salários reais dos mineiros de ouro africanos foram extraídos da p 66 de Wilson 1972 G Findlay é citado por Bundy 1979 p 242 O conceito de que o desenvolvimento dos países ricos do Ocidente é a imagem invertida do subdesenvolvimento do resto do mundo foi desenvolvido originalmente por Wallertsein 19742011 embora ele dê ênfase a mecanismos muito diferentes dos destacados por nós Capítulo 10 Esse capítulo fundamentase basicamente em nossa pesquisa anterior com Simon Johnson e Davide Cantoni Acemoglu Johnson e Robinson 2002 e Acemoglu Cantoni Johnson e Robinson 2010 2011 Nossa discussão sobre o desenvolvimento das primeiras instituições na Austrália segue a obra seminal de Hirst 1983 1988 2003 e Neal 1991 O manuscrito original da petição ao Juiz Collins encontrase disponível graças à Macquarie University Law School in Australia em wwwlawmqeduau scnswhtmlCable20v20Sinclair201788htm A descrição dos correligionários de Wentworth por Macarthur foi extraída de Melbourne 1963 pp 13132 Nossa discussão sobre as origens dos Rothschilds segue Ferguson 1998 a declaração de Mayer Rothschild ao filho é reproduzida de Ferguson p 76 Nossa discussão sobre o impacto dos franceses sobre as instituições europeias foi extraída de Acemoglu Cantoni Johnson e Robinson 2010 2011 e das referências bibliográficas ali mencionadas Ver Doyle 2002 para uma visão geral padrão da Revolução Francesa As informações sobre as obrigações feudais em NassauUsingen foram extraídas de Lenger 2004 p 96 Ogilivie 2011 apresenta uma visão geral do impacto histórico das guildas sobre o desenvolvimento europeu Para um relato da vida de Ōkubo Toshimichi ver Iwata 1964 O plano de oito pontos de Sakamoto Ryūma é reproduzido de Jansen 2000 p 310 Capítulo 11 Nossa discussão da Lei Negra segue Thompson 1975 O relato de Baptist Nunn datado de 27 de junho foi extraído de Thompson 1975 pp 6566 As demais citações são da seção de Thompson sobre o respeito à lei pp 25869 que vale a pena ser lida na íntegra Nossa abordagem do processo de democratização da Inglaterra baseiase em Acemoglu e Robinson 2000a 2001 e 2006a O discurso do Conde Grey foi extraído de Evans 1996 p 223 O comentário de Stephens sobre a democracia é citado em Briggs 1959 p 34 A citação de Thompson foi extraída de Thompson 1975 p 269 O texto da Carta do Povo na íntegra pode ser encontrado em Cole e Filson 1951 e em webbhamacuk1848documentpeoplechhtm A citação de Burke foi extraída de Burke 17901969 p 152 Lindert 2004 2009 faz uma abordagem seminal da coevolução da democracia e políticas públicas nos últimos 200 anos Keyssar 2009 constitui uma introdução fundamental à evolução dos direitos políticos nos Estados Unidos Vanderbilt é citado em Josephson 1934 p 15 O texto do discurso de Roosevelt encontrase em wwwtheodore rooseveltcomsotu1html A citação de Woodrow Wilson foi extraída de Wilson 1913 p 286 O texto do pronunciamento do Presidente Roosevelt em seu Fireside Chat pode ser encontrado em miller centerorgscrippsarchivespeechesdetail3309 Dados sobre o poder relativo dos juízes da Suprema Corte na Argentina e nos Estados Unidos são apresentados em Iaryczower Spiller e Tommasi 2002 Helmke 2004 discute a história do aparelhamento da Suprema Corte na Argentina e cita o Juiz Carlos Fayt Capítulo 12 Esse capítulo baseiase fundamentalmente em nossa pesquisa teórica e empírica sobre persistência institucional sobretudo Acemoglu Johnson e Robinson 2005b e Acemoglu e Robinson 2008a Heath 1972 e Kelley e Klein 1980 fizeram uma seminal aplicação da lei de ferro da oligarquia à Revolução Boliviana de 1952 A citação dos documentos parlamentares britânicos é reproduzida da p 15 da Câmara dos Comuns 1904 Os primórdios da história política de Serra Leoa pósindependência são bem relatados por Cartwright 1970 Embora haja diferentes interpretações quanto ao porquê de Siaka Stevens ter desmontado a linha férrea a que mais se destaca é que ele pretendia isolar Mendeland Nesse ponto seguimos Abraham e Sesay 1993 p 120 Richards 1996 pp 42 43 e Davies 2007 pp 68485 Reno 1995 2003 tem as melhores descrições do regime de Stevens Os dados sobre as juntas comerciais agrícolas foram extraídos de Davies 2007 Sobre o assassinato de Sam Bangura por defenestração ver Reno 1995 pp 13741 Jackson 2004 p 63 e Keen 2005 p 17 discutem os acrônimos ISU e SSD Bates 1981 é a análise fundamental de como as juntas comerciais destruíram a produtividade agrícola na África após a independência ver Goldstein e Udry 2009 sobre como as ligações políticas com os chefes determinam os direitos de propriedade da terra em Gana Sobre a relação entre políticos em 1993 e os conquistadores ver Dosal 1995 cap 1 e Casaús Arzú 2007 Nossa discussão sobre a política do Consulado de Comércio segue Woodward 1966 A citação do Presidente Barrios foi extraída de McCreery 1994 pp 18788 Nossa discussão sobre o regime de Jorge Ubico segue Grieb 1979 Nossa discussão sobre o subdesenvolvimento do Sul dos Estados Unidos segue Acemoglu e Robinson 2008b Ver Wright 1978 sobre o desenvolvimento da economia escrava antes da Guerra de Secessão e Bateman e Weiss 1981 sobre a ausência de indústria Fogel e Engerman 1974 apresentam uma interpretação distinta e controversa Wright 1986 e Ransom e Sutch 2001 apresentam a medida em que a economia sulista efetivamente mudou após 1865 O deputado George Washington Julian é citado em Wiener 1978 p 6 O mesmo livro contém a análise da persistência da elite da terra no sul depois da guerra Naidu 2009 examina o impacto da introdução da captação e testes de alfabetização nos estados do Sul na década de 1890 A citação de WEB Du Bois encontrase no livro Du Bois 1903 p 88 A cláusula 256 da Constituição do Alabama pode ser encontrada em wwwlegislaturestatealus CodeOfAlabama Constitution1901CA245806htm Alston e Ferrie 1999 discutem como os políticos do sul bloqueavam as leis federais que acreditavam ser prejudiciais à economia do Sul Woodward 1955 oferece uma descrição seminal da criação do personagem Jim Crow Uma visão geral da revolução etíope pode ser encontrada em Halliday e Molyneux 1981 Sobre as almofadas do imperador ver Kapuściński 1983 As citações de Dawit Wolde Giorgis são de Dawit Wolde Giorgis 1989 pp 49 e 48 respectivamente Capítulo 13 Sobre a reportagem da BBC sobre a vitória de Mugabe na loteria inclusive a declaração pública do Zimbank ver newsbbccouk2hiafrica621895stm Nossa abordagem da instituição do domínio branco na Rodésia segue Palmer 1977 e Alexander 2006 Meredith 2007 oferece uma boa visão geral da política mais recente do Zimbábue Nosso relato da guerra civil em Serra Leoa segue Richards 1996 a Comissão de Verdade e Reconciliação 2004 e Keen 2005 A análise publicada em um jornal da capital Freetown em 1995 é citada por Keen 2005 p 34 O texto dos Passos Rumo à Democracia Footpaths to Democracy da FRU pode ser encontrado em wwwsierraleoneorgAFRCRUFfootpathshtml A citação de um adolescente de Geoma foi extraída de Keen 2005 p 42 Nossa discussão dos paramilitares colombianos segue Acemoglu Robinson e Santos 2010 e Chaves e Robinson 2010 que por sua vez baseiamse no amplo trabalho de estudiosos colombianos sobretudo Romero 2003 os artigos em Romero 2007 e López 2010 León 2009 faz um relato acessível e equilibrado da natureza dos conflitos atuais na Colômbia Igualmente fundamental é o site administrado pelo jornal semanal Semana wwwverdadabiertacom Todas as citações foram extraídas de Acemoglu Robinson e Santos 2010 O contrato entre Martín Llanos e os prefeitos em Casanare está disponível em espanhol em wwwverdadabiertacom victimarioslosjefes714perfil hectorgermanbuitragoaliasmartinllanos As origens e consequências de el Corralito são bem apresentadas em uma série de artigos na revista The economist disponível em wwweconomistcomsearchapachesolrsearchcorralito Sobre o papel do interior no desenvolvimento argentino ver Sawers 1996 Hassig e Oh 2009 oferecem um excelente e inestimável relato da vida na Coreia do Norte O cap 2 cobre o estilo de vida luxuoso das autoridades e os caps 3 e 4 as realidades econômicas enfrentadas pela maioria da população A cobertura da BBC da reforma monetária pode ser lida em newsbbccouk2hi8500017stm Sobre o palácio do prazer e o consumo de brandy ver cap 12 de Post 2004 Nossa discussão sobre o trabalho infantil e sua utilização na colheita do algodão no Uzbequistão segue Kandiyoti 2008 disponível em wwwsoasacukcccaceventscottonsectorincentralasia2005fi le49842pdf A citação de Gulnaz encontrase na p 20 de Kandiyoti Sobre o levante de Andijon ver International Crisis Group 2005 A descrição da eleição de Joseph Stálin na União Soviética é reproduzida de Denny 1937 Nossa análise do capitalismo clientelista no Egito segue Sfakianakis 2004 Capítulo 14 Nossa abordagem do caso de Botsuana segue Acemoglu Johnson e Robinson 2003 Robinson e Parsons 2006 e Leith 2005 Schapera 1970 e Parsons Henderson e Tlou 1995 são obras fundamentais O Alto Comissário Rey é citado em Acemoglu Johnson e Robinson 2003 p 96 A discussão sobre a visita dos três chefes à Inglaterra segue Parsons 1998 e todas as citações relacionadas a esse tema foram extraídas de seu livro Chamberlain pp 2067 Fairfield p 209 e Rhodes p 223 Schapera foi extraído de Schapera 1940 p 72 A citação de Quett Masire é de Masire 2006 p 43 Sobre a composição étnica das tribos tswana ver Schapera 1952 Nossa abordagem da mudança no Sul dos Estados Unidos segue Acemoglu e Robinson 2008b Sobre a emigração do Sul americano ver Wright 1999 sobre a mecanização da colheita de algodão Heinicke 1994 FRDUM FOOF SPETGH foi extraído de Mickey 2008 p 50 O pronunciamento de Thurmond em 1948 foi extraído de wwwslatecomid2075151 onde é possível também ouvir a gravação do áudio Sobre James Meredith e Oxford Mississippi ver Doyle 2001 Ver Wright 1999 sobre o impacto da legislação dos direitos civis sobre a votação negra no Sul Sobre a natureza e a política da transição política da China a partir da morte de Mao ver Harding 1987 e MacFarquhar e Schoenhals 2008 A citação de Deng sobre o gato foi extraída de Harding p 58 O primeiro ponto da Revolução Cultural foi extraído de Schoenhals 1996 p 33 a fala de Mao sobre Hitler foi extraída de MacFarquhar e Schoenhals p 102 Hua sobre os dois quaisquer que sejam foi extraída de Harding p 56 Capítulo 15 Sobre a história de Dai Guofang ver McGregor 2010 pp 21926 A história dos telefones vermelhos também foi extraída de McGregor cap 1 Sobre o controle exercido pelo partido sobre a mídia ver Pan 2008 cap 9 e McGregor 2010 pp 6469 e 23562 As citações sobre as atitudes do partido com relação aos empreendedores foram extraídas de McGregor 2010 pp 200201 e 223 Para os comentários de Wen Jiabao sobre as reformas políticas na China ver wwwguardiancoukworld2010aug29wenjiabaochinareform A hipótese da modernização é articulada com clareza em Lipset 1959 As evidências contra ela são discutidas em detalhes em Acemoglu Johnson Robinson e Yared 2008 2009 A citação de George H W Bush foi extraída de newsbbcco uk2hibusiness752224stm Nossa discussão da atividade da ONG e do auxílio estrangeiro no Afeganistão a partir de dezembro de 2001 foi baseada em Ghani e Lockhart 2008 Ver também Reinikka e Svensson 2004 e Easterly 2006 sobre os problemas do auxílio estrangeiro Nossa discussão sobre os problemas da reforma macroeconômica e inflação no Zimbábue foi baseada em Acemoglu Johnson Robinson e Querubín 2008 A discussão sobre a Seva Mandir foi extraída de Banerjee Duflo e Glennerster 2008 A formação do Partido dos Trabalhadores no Brasil é coberta por Keck 1992 sobre a greve na Scânia ver cap 4 A citação de Cardoso foi extraída de Keck pp 4445 a citação de Lula foi extraída de Keck p 65 A discussão sobre o empenho tanto de Fujimori quanto de Montesinos para controlar a mídia foi derivada de McMillan e Zoido 2004 e a citação sobre o controle por parte do Partido Comunista chinês é de McGregor 2010 p 69 Fontes dos mapas Mapa 1 O Império Inca e a malha rodoviária foram adaptados de John V Murra 1984 Andean Societies before 1532 in Leslie Bethell org The Cambridge History of Latin America vol 1 Nova York Cambridge University Press O mapa da área de captação da mita foi extraído de Melissa Dell 2010 The Persistent Effects of Perus Mining Mita econometrica 786 18631903 Mapa 2 Desenhado com base em dados de Miriam Bruhn e Francisco Gallego 2010 The Good the Bad e the Ugly Do They Matter for Economic Development a publicar na Review of economics and Statistics Mapa 3 Desenhado com base em dados sobre Indicadores de Desenvolvimento Mundial World Development Indicators 2008 do Banco Mundial Mapa 4 Mapa de porcos selvagens adaptado de W L R Oliver I L Brisbin Jr e S Takahashi 1993 The Eurasian Wild Pig Sus scrofa in W L R Oliver org Pigs Peccaries e Hippos Status Survey and Action Plan Gland Switzerland IUCN pp 11221 Bovinos selvagens adaptados do mapa de auroques de Cis van Vuure 2005 Retracing the Aurochs Sofia Pensoft Publishers p 41 Mapa 5 Adaptado de Daniel Zohary e Maria Hopf 2001 The Domestication of Plants in the Old World 3a edição Nova York Oxford University Press mapa 4 trigo p 56 mapa 5 cevada p 55 Mapa da distribuição de arroz adaptado de TeTzu Chang 1976 The Origin Evolution Cultivation Dissemination e Diversification of Asian and African Rices euphytica 25 42541 figura 2 p 433 Mapa 6 O Reino Bacuba baseiase em Jan Vansina 1978 The Children of Woot Madison University of Wisconsin Press mapa 2 p 8 O do Congo baseiase em Jan Vansina 1995 Equatorial Africa Before the Nineteenth Century in Philip Curtin Steven Feierman Leonard Thompson e Jan Vansina 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Europe e the Nile Valley Third Edition Nova York Oxford University Press a Nota da tradutora A Praça Tahrir árabe Midan alTahrir Praça da Libertação maior praça pública no centro do Cairo foi onde se concentraram os manifestantes egípcios que ali se reuniram aos milhares para protestar entre 25 de janeiro e 11 de fevereiro de 2011 data da renúncia de Mubarak b Nota da Tradutora Medicare é o sistema de seguros de saúde administrado pelo governo dos Estados Unidos e destinado às pessoas de idade igual ou maior que 65 anos ou que verifiquem certos critérios de rendimento c Nota da Tradutora As duas nogueiras d Nota da Tradutora Compra Gadsden designa a aquisição pelos Estados Unidos em 1853 de territórios mexicanos com área total de aproximadamente 77770km2 atualmente situados no sul dos estados norteameri canos do Arizona e Novo México definindo as fronteiras finais do território continental dos Estados Unidos e Nota da Tradutora Antiga forma de tortura que consistia em amarrar as mãos do punido pelas costas e ligálas a uma corda presa a um aparelho que o suspendia e soltava com violência para que seus membros superiores fossem deslocados pelo peso do corpo f Nota da Tradutora Foi a convicção de que a Lei do Chá Tea Act aprovada pelo Parlamento britânico em 1773 violava seu direito de serem tributados tão somente por seus próprios representantes eleitos que levou os colonos de Massachusetts em protesto a destruírem um carregamento de chá submetido ao novo imposto jogandoo ao mar no Porto de Boston no episódio que ficou conhecido como Festa do Chá de Boston Boston Tea Party em 16 de dezembro de 1773 um dos pontos de partida da Independência americana g Nota da Tradutora Em uma relação de dependência de trajetória path dependence as decisões tomadas em determinado momento dependem das circunstâncias ocorridas anteriormente h Nota da Tradutora Rio que marca a fronteira entre México e Estados Unidos i Nota da Tradutora Empresas maquiladoras são aquelas que importam materiais sem o pagamento de impostos com a garantia de que seus produtos não serão comercializados no país em que são fabricados j Nota da Tradutora O Witwatersrand é uma cadeia de montanhas que corre de leste a oeste através do território sulafricano O nome vem do africâner e significa cume das águas brancas Também conhecido como Rand ou recife é célebre por ser fonte de 40 do ouro explorado no mundo k Nota da Tradutora O nome se deve à planta da flora alpina e da tundra Dryas octopetala l Nota da tradutora No original em inglês os autores vão citando os itens em ordem alfabética amalgamator assayer banksman blacksmith boiler maker brass finisher brassmolder bricklayer até woodworking machinist a fim de dar uma boa ideia da extensão da lista m Nota da tradutora Tradução livre O texto original referese a flogged at a carts tail castigo corporal comum na Inglaterra em que o condenado era amarrado à parte traseira de uma carroça e açoitado n Nota da tradutora As tambourine girls eram moças que não gozavam de muito boa fama na sociedade da época o Nota da Tradutora Nome devido ao pseudônimo Capitão Swing hipotético líder do movimento que assinava cartas com ameaças a magistrados párocos fazendeiros e outros p Nota da Tradutora Clássico da língua inglesa escrito em duas partes pelo inglês John Bunyan e publicado em 1678 e 1684 respectivamente O peregrino The Pilgrims Progress é uma alegoria que descreve a jornada do cristão desde a Cidade da Destruição até a Cidade Celestial q Nota da Tradutora Complexo de três pontes na cidade de Nova York interligando Manhattan Queens e o Bronx r Nota da Tradutora Represa no Rio Columbia no estado de Washington Quando foi inaugurada apresentava a maior capacidade de geração de eletricidade do mundo ocupando hoje o terceiro lugar s Nota da Tradutora Os fireside chats batepapos ao pé da lareira expressão em inglês que designa uma conversa informal de cunho franco e pessoal foram uma série de 30 pronunciamentos radiofônicos feitos pelo Presidente Franklin Roosevelt entre 1933 e 1944 t Nota da Tradutora Em inglês exact a pound of flesh extrair meio quilo de carne expressão usada para referirse a cobradores gananciosos que se aproveitam do desespero do devedor Derivada da peça O mercador de Veneza de Shakespeare em que o judeu Shylock arrancará meio quilo de carne de Antonio caso este não quite sua dívida em três meses u Nota da Tradutora A alcunha Jim Crow era dada com frequência aos escravos negros norteamericanos tendo sido imortalizada por uma canção muito em voga no século XIX O nome leis de Jim Crow referese ao conjunto de leis estaduais e locais segregacionistas que vigoraram de 1876 a 1965 nos estados sulistas e limítrofes dos Estados Unidos afetando afroamericanos asiáticos e outros grupos Eram distintas dos Black Codes Códigos Negros 18001866 que visavam a restringir as liberdades e direitos civis dos afroamericanos v Nota da Tradutora Apelido da Universidade do Mississippi que significa algo como velha senhorita x Nota da Tradutora Os US Marshals United States Marshals Service USMS constituem uma agência federal americana de aplicação da lei pertencente ao Departamento de Justiça dos Estados Unidos Faz parte do ramo executivo do governo e é o braço fiscalizador dos tribunais federais responsável pelo bom funcionamento do sistema judicial O capítulo 6 do livro Por Que as Nações Fracassam discute como Veneza que era uma das cidades mais ricas do mundo na Idade Média transformouse em um destino turístico A cidade desenvolveu instituições econômicas inclusivas como a commenda uma forma primitiva de sociedade anônima que permitia mobilidade social e crescimento econômico O sistema político veneziano também evoluiu para ser mais inclusivo com a criação de conselhos e limitações ao poder do doge Entretanto esse sistema começou a se fechar com La Serrata O Fechamento em 1297 quando o Grão Conselho se tornou hereditário criando uma aristocracia fechada Isso levou à implementação de instituições econômicas extrativistas com a proibição da commenda e a nacionalização do comércio Como resultado Veneza entrou em declínio econômico O texto então expande a discussão para analisar o desenvolvimento histórico de instituições em diferentes partes do mundo focando especialmente no Império Romano Roma inicialmente prosperou com instituições parcialmente inclusivas durante a República mas tornouse mais extrativista durante o Império levando ao seu eventual declínio O texto destaca como o medo da destruição criativa e a prevalência da escravidão inibiram a inovação tecnológica em Roma A narrativa também aborda como diferentes regiões do mundo seguiram caminhos distintos de desenvolvimento institucional Por exemplo a Inglaterra que era relativamente atrasada durante o período romano acabaria se tornando o berço da Revolução Industrial devido a uma série de circunstâncias históricas específicas O texto enfatiza que o desenvolvimento institucional não é um processo linear ou predeterminado mas resultado de interações complexas entre pequenas diferenças institucionais e circunstâncias críticas ao longo do tempo Por fim o capítulo conclui que embora Roma tenha exercido influência duradoura na Europa através de suas instituições e leis foi a queda do império e o subsequente desenvolvimento do feudalismo que criaram as condições para o surgimento de instituições mais inclusivas na Europa diferenciandoa de outras regiões do mundo como África Ásia e Américas 6 D I F E R E N C I A Ç Ã O C O M O A S I N S T I T U I Ç Õ E S E V O L U E M A O L O N G O D O T E M P O E M G E R A L D I F E R E N C I A N D O S E L E N T A M E N T E U M A S D A S O U T R A S POR QUE AS NAÇÕES FRACASSAM CAPÍTULO 6 V E N E Z A N A I D A D E M É D I A Posição estratégica no Mediterrâneo Uma das cidades mais ricas do mundo População em crescimento 1050 45 mil habitantes 1200 70 mil habitantes 1330 110 mil habitantes Inovações contratuais inclusivas A C O M M E N D A E I N S T I T U I Ç Õ E S I N C L U S I V A S Commenda sociedade anônima primitiva Sócio sedentário capital Sócio viajante execução Mobilidade social significativa 6581 de nomes novos nos registros Sistema político Assembleia Geral Conselho Ducal Grão Conselho L A S E R R ATA O F E C H A M E N T O 1297 Início do fechamento político Principais mudanças Grão Conselho tornase hereditário Criação do Libro dOro registro da nobreza Repressão aos opositores Consequências econômicas Proibição da commenda Nacionalização do comércio Monopólio comercial da nobreza O D E C L Í N I O D E V E N E Z A Impactos do fechamento institucional Queda populacional Declínio comercial Perda de relevância econômica Transformação em destino turístico Foco em turismo e artesanato Musealização da cidade P A R A L E L O C O M R O M A Padrão similar de declínio República instituições parcialmente inclusivas Império instituições extrativistas Fatores de estagnação Medo da destruição criativa Prevalência da escravidão Resistência à inovação tecnológica L I Ç Õ E S P A R A O D E S E N V O L V I M E N T O I N S T I T U C I O N A L Pontoschave Desenvolvimento não é linear Pequenas diferenças podem ter grandes impactos Instituições inclusivas podem ser revertidas Importância do equilíbrio entre inclusão e inovação C O N C L U S Ã O O caso de Veneza oferece uma poderosa lição sobre como o desenvolvimento institucional não segue um caminho linear e predeterminado A cidadeestado que no auge de seu poder desenvolveu instituições econômicas e políticas notavelmente inclusivas para sua época demonstrou como a prosperidade pode ser construída através de inovações institucionais como a commenda e um sistema político que permitia checks and balances No entanto o mesmo caso também ilustra como esse progresso pode ser revertido quando as elites temendo a destruição criativa e a perda de seus privilégios optam por fechar o sistema político e econômico A transformação de Veneza de potência comercial em destino turístico serve como um alerta sobre as consequências de longo prazo da transição de instituições inclusivas para extrativistas O processo conhecido como La Serrata não apenas consolidou o poder nas mãos de uma aristocracia hereditária mas também sufocou as próprias inovações que haviam tornado Veneza próspera Este exemplo histórico demonstra que a manutenção de instituições inclusivas requer vigilância constante e que o desenvolvimento econômico sustentável depende fundamentalmente da capacidade de uma sociedade em resistir às tentações do exclusivismo político e econômico A história veneziana portanto continua relevante para compreendermos os desafios contemporâneos do desenvolvimento institucional e da distribuição de poder nas sociedades modernas

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Professor de Economia do MIT DARON ACEMOGLU JAMES ROBINSON Professor de Administração Pública da Harvard University POR QUE AS NAÇÕES FRACASSAM As origens do poder da prosperidade e da pobreza Uma leitura obrigatória Steven Levitt coautor de Freakonomics Cadastrese em wwwelseviercombr para conhecer nosso catálogo completo ter acesso a serviços exclusivos no site e receber informações sobre nossos lançamentos e promoções Professor de Economia do MIT DARON ACEMOGLU JAMES ROBINSON Professor de Administração Pública da Harvard University POR QUE AS NAÇÕES FRACASSAM As origens do poder da prosperidade e da pobreza Tradução Cristiana Serra Do original Why Nations Fail Tradução autorizada do idioma inglês da edição publicada por Crown Business Copyright 2012 by Daron Acemoglu and James A Robinson 2012 Elsevier Editora Ltda Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9610 de 19021998 Nenhuma parte deste livro sem autorização prévia por escrito da editora poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados eletrônicos mecânicos fotográficos gravação ou quaisquer outros Copidesque Ivone Teixeira Revisão Jayme Teotônio Borges Luiz e Cynthia Gaudard Editoração Eletrônica Estúdio Castellani Produção do ebook Schaffer Editorial Elsevier Editora Ltda Conhecimento sem Fronteiras Rua Sete de Setembro 111 16o andar 20050006 Centro Rio de Janeiro RJ Brasil Rua Quintana 753 8o andar 04569011 Brooklin São Paulo SP Brasil Serviço de Atendimento ao Cliente 08000265340 sacelseviercombr ISBN 9788535263299 Edição original ISBN 9780307719218 Nota Muito zelo e técnica foram empregados na edição desta obra No entanto podem ocorrer erros de digitação impressão ou dúvida conceitual Em qualquer das hipóteses solicitamos a comunicação ao nosso Serviço de Atendimento ao Cliente para que possamos esclarecer ou encaminhar a questão Nem a editora nem o autor assumem qualquer responsabilidade por eventuais danos ou perdas a pessoas ou bens originados do uso desta publicação CIPBrasil Catalogaçãonafonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros RJ A157p Acemoglu Daron Por que as nações fracassam recurso eletrônico as origens do poder da prosperidade e da pobrezaDaron Acemoglu e James A Robinson tradução Cristiana Serra Rio de Janeiro Elsevier 2012 recurso digital Tradução de Why nations fail Inclui bibliografia e índice Formato ePub Requisitos do sistema Adobe Digital Editions Modo de acesso World Wide Web ISBN 9788535263299 recurso eletrônico 1 Economia 2 Política econômica 3 Relações econômicas internacionais4 Livros eletrônicos I Título 125110 CDD 337 CDU 33822 Para Arda e Asu DA Para María Angélica mi vida y mi alma JR E AGRADECIMENTOS STE LIVRO É FRUTO de 15 anos de pesquisa colaborativa e ao longo desse tempo acumulamos muitas dívidas práticas e intelectuais A maior delas é para com Simon Johnson nosso colaborador de longa data que dividiu conosco a autoria de muitos dos principais artigos científicos que foram moldando nossas concepções em desenvolvimento econômico comparativo Nossos outros coautores com quem trabalhamos em projetos de pesquisa relacionados desempenharam um papel significativo no desenvolvimento dos nossos pontos de vista e sob esse aspecto gostaríamos de agradecer particularmente a Philippe Aghion JeanMarie Baland María Angélica Bautista Davide Cantoni Isaías Chaves Jonathan Conning Melissa Dell Georgy Egorov Leopoldo Fergusson Camilo GarcíaJimeno Tarek Hassan Sebastián Mazzuca Jeffrey Nugent Neil Parsons Steve Pincus Pablo Querubín Rafael Santos Konstantin Sonin Davide Ticchi Ragnar Torvik Juan Fernando Vargas Thierry Verdier Andrea Vindigni Alex Wolitzky Pierre Yared e Fabrizio Zilibotti Muitas outras pessoas tiveram importância considerável em termos dos estímulos desafios e críticas que nos proporcionaram ao longo dos anos Agradecemos sobretudo a Lee Alston Abhijit Banerjee Robert Bates Timothy Besley John Coatsworth Jared Diamond Richard Easterlin Stanley Engerman Peter Evans Jeff Frieden Peter Gourevitch Stephen Haber Mark Harrison Elhanan Helpman Peter Lindert Karl Ove Moene Dani Rodrik e Barry Weingast Duas pessoas em especial exerceram profunda influência sobre nossos pontos de vista e nos incentivaram em nossa pesquisa e gostaríamos de aproveitar esta oportunidade para expressar nossa dívida intelectual e a mais sincera gratidão a ambos Joel Mokyr e Ken Sokoloff que infelizmente faleceu antes que este livro fosse escrito e faz enorme falta para nós dois Somos também imensamente gratos aos participantes da conferência que organizamos no Institute for Quantitative Social Science em Harvard em fevereiro de 2010 a fim de apresentar uma versão inicial do manuscrito deste livro Agradecemos sobretudo aos coorganizadores Jim Alt e Ken Shepsle e nossos debatedores na conferência Robert Allen Abhijit Banerjee Robert Bates Stanley Engerman Claudia Goldin Elhanan Helpman Joel Mokyr Ian Morris Sevket Pamuk Steve Pincus e Peter Temin Agradecemos ainda a Melissa Dell Jesús FernándezVillaverde Sándor László Suresh Naidu Roger Owen Dan Trefler Michael Walton e Noam Yuchtman que nos ofereceram uma variedade de comentários tanto nessa ocasião quanto em diversas outras Obrigado também a Charles Mann Leandro Prados de la Escosura e David Webster por suas orientações especializadas Durante boa parte do processo de pesquisa e elaboração deste livro fomos membros do programa do Canadian Institute for Advanced Research CIFAR sobre instituições organizações e crescimento Apresentamos pesquisas relacionadas a este livro diversas vezes em seminários do CIFAR e nos beneficiamos imensamente do apoio tanto dessa excelente organização quanto dos estudiosos que ela congrega Recebemos também comentários de literalmente centenas de pessoas em diversos seminários e conferências sobre as teses desenvolvidas neste livro e pedimos desculpas pela impossibilidade de atribuir adequadamente o crédito por eventuais sugestões ideias ou percepções que tenhamos derivado dessas apresentações e discussões Somos ainda muito gratos a María Angélica Bautista Melissa Dell e Leander Heldring por sua espetacular assistência na pesquisa para este projeto Por fim mas não menos importante tivemos a grande felicidade de contar com um maravilhoso e criativo editor John Mahaney que nos proporcionou todo o apoio de que precisávamos Os comentários e sugestões de John em muito contribuíram para o aprimoramento deste livro e sua assistência e entusiasmo pelo projeto tornaram o último ano e meio muito mais agradável e menos oneroso do que poderia ter sido SUMÁRIO Agradecimentos Prefácio Por que os egípcios lotaram a Praça Tahrir para derrubar Hosni Mubarak e o que isso significa para nosso entendimento das causas da prosperidade e da pobreza 1 Tão próximos mas tão diferentes Nogales Arizona e Nogales Sonora têm o mesmo povo cultura e geografia Por que uma é rica e a outra é pobre 2 Teorias que não funcionam Países pobres são pobres não em virtude de suas condições geográficas ou culturais nem porque seus líderes ignoram que políticas são capazes de enriquecer seus cidadãos 3 A criação da prosperidade e da pobreza Como prosperidade e pobreza são determinadas pelos incentivos criados por instituições e como a política determina que instituições a nação terá 4 Pequenas diferenças e conjunturas críticas o peso da história Como as instituições mudam por meio de conflitos políticos e como o passado modela o presente 5 Eu vi o futuro e ele funciona O crescimento sob instituições extrativistas O que Stálin o Rei Shyaam a Revolução Neolítica e as cidadesestados maias tinham em comum e como isso explica por que o atual surto de crescimento econômico chinês não vai durar 6 Diferenciação Como as instituições evoluem ao longo do tempo em geral diferenciandose lentamente umas das outras 7 A reviravolta Como uma revolução política em 1688 mudou as instituições na Inglaterra e engendrou a Revolução Industrial 8 Não no nosso quintal barreiras ao desenvolvimento Por que os poderosos políticos de tantas nações fizeram frente à Revolução Industrial 9 Revertendo o desenvolvimento Como o colonialismo europeu empobreceu boa parte do mundo 10 A difusão da prosperidade Como algumas partes do mundo tomaram rumos para a prosperidade distintos dos da GrãBretanha 11 O círculo virtuoso Como as instituições que estimulam a prosperidade criam um esquema de retroalimentação positiva que anula as tentativas das elites de solapálas 12 O círculo vicioso Como as instituições geradoras de pobreza estabelecem um esquema de retroalimentação negativa e perduram 13 Por que as nações fracassam hoje Instituições instituições instituições 14 Rompendo o padrão Como alguns países mudaram sua trajetória econômica ao mudar suas instituições 15 Compreendendo a prosperidade e a pobreza Como o mundo poderia ser diferente e como entender isso pode explicar por que fracassa a maioria das tentativas de combate à pobreza Ensaios e fontes bibliográficas Referências E PREFÁCIO STE LIVRO trata das diferenças abissais de receita e padrão de vida que separam os países ricos do mundo como Estados Unidos Reino Unido e Alemanha dos pobres como os da África subsaariana América Central e Sul da Ásia No momento em que redigimos este texto o Norte da África e o Oriente Médio foram sacudidos pela Primavera Árabe iniciada pela chamada Revolução de Jasmim esta por sua vez deflagrada pelo clamor público em torno da autoimolação de um vendedor ambulante Mohamed Bouazizi em 17 de dezembro de 2010 Em 14 de janeiro de 2011 o Presidente Zine El Abidine Ben Ali que governava a Tunísia desde 1987 foi deposto mas longe de aplacarse o fervor revolucionário contra o domínio das elites privilegiadas no país não só estava se intensificando como já estava se espalhando para o resto do Orien te Médio Hosni Mubarak que comandara o Egito com mão de ferro por quase 30 anos foi derrubado em 11 de fevereiro de 2011 Os destinos dos regimes do Barein Líbia Síria e Iêmen seguem desconhecidos ao concluirmos este prefácio O descontentamento nesses países tem suas raízes na pobreza O egípcio médio tem uma renda que corresponde a cerca de 12 daquela do cidadão norteamericano médio e sua expectativa de vida é 10 anos menor 20 da população vivem em terrível miséria Embora sejam diferenças significativas na verdade são até pequenas se comparadas às que separam os Estados Unidos e os países mais pobres do mundo como Coreia do Norte Serra Leoa e Zimbábue onde bem mais que metade da população vive na pobreza Por que o Egito é tão mais pobre que os Estados Unidos Quais são as restrições que impedem os egípcios de alcançar maior prosperidade Será a pobreza do país imutável ou poderá ser erradicada Uma maneira natural de começar a refletir a respeito é examinar o que os próprios egípcios dizem dos problemas que enfrentam e dos porquês de terem se insurgido contra o regime de Mubarak Noha Hamed 24 anos funcionária de uma agên cia publicitária no Cairo expressou com clareza sua opinião na Praça Tahrira Sofremos de corrupção opressão e educação de má qualidade Vivemos em um sistema corrupto que não tem perspectivas de mudança Outro manifestante Mosaab El Shami 20 anos estudante de Farmácia completou Espero que até o final deste ano tenhamos um governo eleito que as liberdades universais estejam em vigor e que tenhamos posto fim à corrupção que assola este país Os manifestantes da Praça Tahrir foram unâni mes em denunciar a corrupção do governo sua incapacidade de prestar serviços públi cos e a falta de igualdade de oportunidades em seu país Queixaramse especialmente da repressão e da falta de direitos políticos Como escreveu no Twitter Mohamed ElBaradei exdiretor da Agência de Energia Atômica Internacional em 13 de janei ro de 2011 Tunísia repressão falta de justiça social inexistência de canais para mudança pacífica bombarelógio Tanto egípcios quanto tunisianos percebiam que seus problemas econômicos eram causados fundamentalmente por sua falta de direitos políticos Quando os manifestantes começaram a formular suas demandas de maneira mais sistemática as 12 primeiras exigências imediatas publicadas por Wael Khalil engenheiro de software e blogueiro que surgiu como um dos líderes do movimento de protesto egípcio concentravamse todas em mudanças políticas Tópicos como o au mento do salário mínimo surgiriam apenas entre as demandas da transição que seriam implementadas mais tarde Para os egípcios entre os obstáculos enfrentados estavam o Estado ineficiente e corrupto e uma estrutura social em que não havia espaço para utilizarem seu talento ambição engenhosidade e a educação a que conseguissem acesso Mas também re conheciam que as origens desses problemas eram políticas Todos os impedimentos econômicos enfrentados no país são derivados do modo como o poder político no Egito é exercido e monopolizado por uma pequena elite Esse no entender dos egíp cios é o primeiro fator a modificar Entretanto ao defender tal tese os manifestantes da Praça Tahrir divergiram pro fundamente do senso comum a esse respeito Ao discutir por que um país como o Egito é pobre a maioria dos acadêmicos e comentaristas põe em evidência fatores completamente distintos Alguns acreditam que a pobreza do Egito seja determinada primariamente por sua geografia pelo fato de seu território ser em sua maior parte desértico com índices pluviométricos insuficientes e que seus solos e clima inviabi lizam uma agricultura produtiva Outros ao contrário apontam características cul turais dos egípcios que supostamente seriam incompatíveis com a prosperidade e o desenvolvimento econômico Falta aos egípcios argumentam eles o mesmo tipo de ética de trabalho e traços culturais que permitiram a outros prosperar em vez dis so adotaram crenças islâmicas irreconciliáveis com o êxito econômico Uma terceira abordagem dominante entre economistas e peritos em políticas públicas baseiase na ideia de que os governantes do Egito não sabem o que é preciso para fazer seu país prosperar tendo por isso adotado no passado políticas e estratégias equivocadas Se tais governantes recebessem orientações adequadas dos conselheiros certos segue o raciocínio o enriquecimento seria uma consequência lógica Para esses acadêmicos e peritos o fato de o Egito vir sendo governado por uma pequena elite que se esbalda em privilégios às custas do resto da sociedade parece irrelevante para a compreensão das dificuldades econômicas do país Neste livro defenderemos que são os egípcios da Praça Tahrir e não a maioria dos acadêmicos e comentaristas quem têm razão Com efeito o Egito é pobre exatamente por vir sendo governado por uma pequena elite que organizou a sociedade em função de seus próprios interesses em detrimento da massa da população O poder político estritamente concentrado vem sendo usado para gerar riqueza para aqueles que já a de têm como a fortuna de US70 bilhões que o exPresidente Mubarak parece ter acumu lado Quem sai perdendo é o povo como os próprios egípcios entendem muito bem Mostraremos que essa interpretação da pobreza egípcia a interpretação popular na verdade constitui uma explicação genérica de por que os países pobres são pobres Seja Coreia do Norte Serra Leoa ou Zimbábue vamos mostrar que os países pobres são pobres pelo mesmo motivo por que o Egito também é Países como o Reino Unido e os Estados Unidos enriqueceram porque seus cidadãos derrubaram as elites que contro lavam o poder e criaram uma sociedade em que os direitos políticos eram distribuídos de maneira muito mais ampla na qual o governo era responsável e tinha de responder aos cidadãos e onde a grande massa da população tinha condições de tirar vantagem das oportunidades econômicas Mostraremos que para compreender por que há tanta desigualdade no mundo de hoje teremos de mergulhar no passado e estudar a dinâmica histórica das sociedades Veremos que a razão por que o Reino Unido é mais rico que o Egito é que em 1688 os britânicos ou ingleses para sermos mais exatos promoveram uma revolução que transformou a política e por conseguinte a economia do país As pessoas lutaram por mais direitos políticos e os conquistaram usandoos para expandir suas oportunidades econômicas O resultado foi uma trajetória política e econômica essencialmente distinta que culminaria na Revolução Industrial A Revolução Industrial e as tecnologias por ela lançadas não se espalharam para o Egito porque este se encontrava então sob domínio do Império Otomano que tra tava o país mais ou menos da mesma maneira como mais tarde a família Mubarak A dominação otomana no Egito encontrou seu fim nas mãos de Napoleão Bonaparte em 1798 mas o país caiu então sob o controle do colonialismo britânico que tinha tão pouco interesse quanto os otomanos em promover a prosperidade egípcia Assim embora os egípcios tenham se livrado dos impérios otomano e britânico e em 1952 da própria monarquia suas revoluções não foram como a de 1688 na Inglaterra em lugar de promover uma radical transformação política no país limitaramse a conduzir ao poder mais uma elite tão desinteressada na prosperidade dos egípcios comuns quanto os otomanos e britânicos de outrora Em consequência a estrutura básica da sociedade não mudou e o Egito permaneceu pobre Neste livro estudaremos como esses padrões se reproduzem ao longo do tempo e por que às vezes são alterados como aconteceu na Inglaterra em 1688 e na França com a revolução de 1789 o que nos ajudará a entender se a situação no Egito atual mu dou e se a revolução que depôs Mubarak produzirá um novo conjunto de instituições capazes de proporcionar prosperidade ao povo egípcio O Egito já atravessou revoluções que nada mudaram pois seus promotores limitaramse a tomar as rédeas daqueles que depuseram recriando sistemas semelhantes Com efeito é difícil para os cidadãos comuns adquirir poder político real e modificar a maneira como sua sociedade fun ciona Mas é possível e veremos como isso aconteceu na Inglaterra França e Estados Unidos bem como no Japão Botsuana e Brasil Basicamente é uma transformação política desse gênero que se faz necessária para que uma sociedade pobre enriqueça Há indícios de que isso esteja acontecendo no Egito Reda Metwaly outro manifestante da Praça Tahrir observou Agora a gente vê muçulmanos e cristãos juntos velhos e no vos lado a lado todos em busca dos mesmos objetivos Veremos que esse movimento amplo da sociedade foi um aspecto fundamental dessas outras transformações políticas Se compreendermos quando e por que ocorrem tais transições estaremos em melhores condições de avaliar quando o fracasso será mais provável como tantas vezes aconteceu no passado e quanto podemos alimentar esperanças de que o sucesso traga benefícios para milhões de pessoas A 1 TÃO PRÓXIMOS MAS TÃO DIFERENTES A ECONOMIA DO RIO GRANDE CIDADE DE NOGALES é cortada ao meio por uma cerca Se você se aproximar dela e olhar para o norte verá Nogales Arizona no condado de Santa Cruz A renda familiar média é de cerca de US30 mil anuais A maioria dos adolescentes estuda e a maioria dos adultos concluiu o ensino médio Apesar de tudo o que se diz sobre as deficiências do sistema de saúde americano a população é relativamente rica com alta expectativa de vida pelos padrões globais Muitos dos moradores passaram dos 65 anos e têm acesso ao Medicareb apenas um dos muitos serviços prestados pelo governo vistos com naturalidade pela maioria como eletricidade telefonia sistema de esgotos saúde pública a malha rodoviária que liga a cidade às vizinhas e ao resto do país e por último mas não menos importante a lei e a ordem O povo de Nogales Arizona pode se dedicar às suas atividades diárias sem temer pela vida ou segurança nem viver com medo de roubos expropriações ou outras possibilidades que ponham em risco seus investimentos nos negócios e habitações Igualmente importante os residentes de Nogales Arizona partem da premissa de que apesar de toda a sua ineficiência e eventuais casos de corrupção o governo é seu agente Podem votar para substituir prefeito deputados e senadores votam nas eleições presidenciais que determinam quem comandará o país A democracia constitui para eles uma segunda pele Ao sul da cerca a poucos metros de distância é bastante diferente Embora a população de Nogales Sonora viva em uma região relativamente próspera do México a renda familiar média corresponde a cerca de um terço da de Nogales Arizona A maioria dos adultos de Nogales Sonora não completou o ensino médio e muitos adolescentes não vão à escola As mães têm de se preocupar com altos índices de mortalidade infantil Diante da precariedade da saúde pública não admira que os residentes de Nogales Sonora não vivam tanto quanto seus vizinhos do norte tampouco têm acesso a muitos serviços públicos Ao sul da cerca as estradas encontramse em péssimo estado a lei e a ordem em situação ainda pior A criminalidade é alta e abrir um negócio é uma atividade arriscada já que não só o dono corre o risco de ser roubado como não é tarefa fácil conseguir todas as permissões e molhar todas as mãos necessárias Os habitantes de Nogales Sonora convivem diariamente com a corrupção e a incompetência de seus políticos Em contraste com seus vizinhos do norte a democracia é uma experiência ainda recente para eles Até as reformas políticas do ano 2000 Nogales Sonora como o resto do México encontravase sob o controle corrupto do Partido Revolucionário Institucional PRI Como podem as duas metades do que é essencialmente a mesma cidade serem tão diferentes Inexistem diferenças geográficas climáticas ou entre os tipos de doenças prevalentes na região pois não há nada que impeça os micróbios de cruzar a fronteira entre Estados Unidos e México Evidentemente as condições de saúde são muito distintas mas não por causa do ambiente e sim porque quem está ao sul da fronteira tem de enfrentar condições de saneamento inferiores e a falta de um sistema de saúde decente Talvez então as populações sejam muito distintas Será possível que os residentes de Nogales Arizona sejam netos de imigrantes europeus ao passo que os do sul sejam descendentes de astecas Absolutamente não As origens dos habitantes dos dois lados da fronteira são bastante semelhantes Após a independência do México em 1821 a região em torno de Los dos Nogalesc fazia parte do estado mexicano de Vieja Califórnia e assim permaneceu até depois da guerra MéxicoEstados Unidos de 1846 1848 Com efeito só depois da Compra Gadsdend em 1853 a fronteira norte americana estendeuse até essa área Foi o Tenente N Michler quem inspecionando a fronteira notou a presença do lindo valezinho de Los Nogales Aqui dos dois lados da fronteira as duas cidades se ergueram Os habitantes de Nogales Arizona e Nogales Sonora têm ancestrais comuns gostam do mesmo tipo de comida e música e nos atreveríamos a dizer possuem a mesma cultura Naturalmente há uma explicação muito simples e óbvia para as diferenças entre as duas metades de Nogales que você provavelmente já adivinhou há muito a própria fronteira que define as duas metades Nogales Arizona fica nos Estados Unidos Seus moradores têm acesso às instituições econômicas americanas que lhes permitem escolher livremente suas ocupações adquirir educação e conhecimentos e estimular seus empregadores a investir na melhor tecnologia gerando salários mais altos Têm acesso ainda a instituições políticas que lhes permitem tomar parte do processo democrático elegendo seus representantes e substituindoos caso se comportem mal Por conseguinte os políticos providenciam os serviços básicos que vão da saúde pública e rodovias à lei e à ordem exigidos pelos cidadãos Os de Nogales Sonora não têm a mesma sorte Vivem em outro mundo moldado por instituições diferentes as quais criam incentivos completamente distintos tanto para a população das duas Nogales quanto para os empreendedores e empresas que pretendam investir ali Os estímulos criados pelas instituições próprias das duas cidades e dos países a que pertencem são a principal causa das diferenças de nível de prosperidade econômica de um lado e de outro da fronteira Por que as instituições dos Estados Unidos são tão mais conducentes ao êxito econômico do que as do México ou a rigor do resto da América Latina A resposta para essa pergunta reside na formação de cada sociedade nos primórdios do período colonial quando se instalou uma divergência institucional cujas implicações se estendem até os dias de hoje Para compreender essa discrepância precisamos começar pela fundação das colônias nas Américas Latina e do Norte A FUNDAÇÃO DE BUENOS AIRES No começo de 1516 o navegador espanhol Juan Díaz de Solís deparouse com um largo estuário no litoral leste da América do Sul Desembarcando Solís reclamou a terra para a Espanha batizando o rio de Río de la Plata já que os habitantes locais possuíam prata Os indígenas dos dois lados do estuário os charruas no atual Uruguai e os querandís nas planícies que ficariam conhecidas como pampas da moderna Argentina viram os recémchegados com hostilidade Esses povos locais eram caçadorescoletores que viviam em grupos pequenos sem fortes autoridades políticas centralizadas Com efeito foi um bando desses charruas que matou Solís a bordunadas durante suas explorações dos novos domínios que ele tentara ocupar para a Espanha Em 1534 os espanhóis ainda otimistas enviaram uma primeira missão de colonizadores sob a liderança de Pedro de Mendoza Naquele mesmo ano fundaram uma cidade na atual localização de Buenos Aires Deveria ser um lugar ideal para os europeus Buenos Aires que literalmente significa bons ares tinha um clima temperado e convidativo A primeira temporada dos espanhóis por lá teve vida curta porém Afinal eles não estavam atrás de bons ares mas de recursos para extrair e mão de obra para coagir Os charruas e os querandís contudo não se mostraram nem um pouco cooperativos Recusavamse a fornecer alimentos para os espanhóis assim como se recusavam a trabalhar quando capturados Atacaram o novo povoamento com arcos e flechas A fome grassava entre os espanhóis que não haviam planejado ter de obter a própria comida Buenos Aires não era absolutamente o que haviam sonhado Os povos locais não se deixavam forçar ao trabalho Não havia ouro nem prata a explorar pois a prata encontrada por Solís na verdade viera do estado inca nos Andes bem mais a oeste Os espanhóis enquanto lutavam pela sobrevivência puseramse a enviar expedições para encontrar um novo lugar capaz de proporcionarlhes maiores riquezas e uma população mais fácil de subjugar Em 1537 uma dessas expedições sob a liderança de Juan de Ayolas penetrou no Rio Paraná em busca de uma rota que os levasse até os incas No caminho entrou em contato com os guaranis povo sedentário de economia agrícola baseada no cultivo de milho e mandioca Ayolas percebeu de imediato que se tratava de um povo completamente distinto dos charruas e dos querandís Após um breve conflito os espanhóis venceram a resistência guarani e fundaram uma cidade Nuestra Señora de Santa María de la Asunción até hoje a capital do Paraguai Os conquistadores desposaram as princesas guaranis estabelecendose assim como a nova aristocracia Adaptaram os sistemas indígenas existentes de trabalho forçado e tributação colocandose no comando Era esse o tipo de colônia que desejavam e em quatro anos Buenos Aires estava abandonada pois todos os espanhóis que lá haviam se estabelecido mudaramse para a nova cidade Buenos Aires a Paris da América do Sul cidade de largas avenidas no estilo europeu baseada na incalculável riqueza agrícola dos pampas não seria repovoada antes de 1580 O abandono da cidade e a conquista dos guaranis revelam a lógica da colonização das Américas pelos europeus Os primeiros colonos espanhóis e como veremos ingleses não tinham o menor interesse em lavrar o solo com as próprias mãos queriam que outros o fizessem em seu lugar e desejavam riquezas ouro e prata para saquear DE CAJAMARCA As expedições de Solís Mendoza e Ayolas ocorreram no rastro de outras mais célebres que se seguiram à descoberta de uma das ilhas das Bahamas por Cristóvão Colombo em 12 de outubro de 1492 A expansão e colonização espanhola das Américas tiveram início com a invasão do México por Hernán Cortés em 1519 a expedição de Francisco Pizarro ao Peru uma década e meia mais tarde e a expedição de Pedro de Mendoza ao Rio da Prata apenas dois anos depois No decorrer do século seguinte a Espanha conquistaria e colonizaria a maior parte das regiões central ocidental e sul da América do Sul ao passo que Portugal ocupava o Brasil a leste A estratégia de colonização espanhola foi extremamente eficaz A princípio aprimorada por Cortés no México baseouse na observação de que a melhor maneira de os espanhóis dobrarem a resistência consistia em capturar o líder indígena o que lhes permitia reivindicar a fortuna acumulada pelo líder e obrigar os índios a pagar tributos e fornecer alimentos A etapa seguinte consistia em estabelecerse como nova elite reinante da sociedade indígena assumindo o controle dos métodos existentes de tributação e sobretudo de trabalho forçado Quando Cortés e seus homens chegaram à grande capital asteca de Tenochtitlán em 8 de novembro de 1519 foram recebidos por Montezuma o imperador asteca que havia decidido em face das muitas recomendações que lhe fizeram seus conselheiros saudar os espanhóis pacificamente O que se passou em seguida é bem descrito pelo relato compilado após 1545 pelo sacerdote franciscano Bernardino de Sahagún em seu célebre Códice Florentino Imediatamente os espanhóis agarraram Montezuma com firmeza e cada uma das armas disparou O medo prevaleceu Foi como se todos tivessem engolido o próprio coração Mesmo antes de escurecer grassaram o terror a perplexidade a apreensão o assombro das pessoas Ao amanhecer foram proclamadas todas as coisas que os espanhóis demandavam tortillas brancas perus assados ovos água potável madeira lenha carvão Isso foi Montezuma quem efetivamente determinou E uma vez que os espanhóis se haviam instalado inquiriram Montezuma acerca do tesouro da cidade buscavam ouro com imenso zelo E Montezuma conduziu os espanhóis Foram cercandoo cada qual o segurando cada qual o agarrando E quando chegaram ao armazém um lugar chamado Teocalco trouxeram tudo que brilhava o cocar de penas de quetzal as ferramentas os escudos os discos de ouro os crescentes nasais de ouro os protetores de perna de ouro os protetores de braço de ouro os protetores de testa de ouro Uma vez destacado o ouro eles imediatamente ateavam fogo incendiavam todas as preciosidades Tudo foi incinerado E com o ouro os espanhóis forjaram barras separadas E andavam por toda parte levando tudo o que viam que lhes seria de interesse Em seguida dirigiramse ao armazém do próprio Montezuma em um lugar chamado Totocalco trouxeram a propriedade do próprio Montezuma todas as coisas preciosas colares com pendentes protetores de braço com penachos de quetzal protetores de braço de ouro braceletes protetores de ouro com conchas e o diadema de turquesa atributo do monarca Levaram tudo A conquista militar dos astecas estava concluída em 1521 Cortés como governador da província da Nova Espanha começou então a repartir o recurso mais valioso a população indígena mediante a instituição da encomienda Esta fizera sua primeira aparição na Espanha no século XV como parte da reconquista do sul do país aos mouros árabes que ali se haviam instalado durante e após o século VIII No Novo Mundo ela assumiu uma forma muito mais perniciosa tratavase da concessão de lotes de povos indígenas a um espanhol chamado de encomendero Os índios tinham de pagar ao encomendero tributos e mão de obra em troca dos quais ele se encarregaria de convertêlos ao cristianismo Chegou até nós um relato vívido do funcionamento da encomienda escrito por Bartolomé de las Casas sacerdote dominicano que formulou a mais antiga e uma das mais devastadoras críticas do sistema colonial espanhol De las Casas chegou à ilha espanhola de Hispaniola em 1502 na esquadra comandada pelo novo governador Nicolás de Ovando Foi ficando cada vez mais desiludido e perturbado diante do tratamento cruel e abusivo dispensado aos povos indígenas que presenciava diariamente Em 1513 tomou parte como capelão da conquista espanhola de Cuba chegando a ser agraciado com uma encomienda pelos serviços prestados Todavia renunciou à concessão e encetou uma longa campanha pela reforma das instituições coloniais hispânicas Seus esforços culminaram com seu livro Brevíssima relação da destruição das Índias escrito em 1542 um libelo devastador contra a barbárie do domínio espanhol Sobre o sistema de encomiendas ele diz o seguinte a propósito do caso da Nicarágua Cada colono fixava residência na cidade que lhe coube ou lhe foi encomendada no jargão jurídico punha seus habitantes a seu serviço roubava seus já escassos víveres para si e apropriavase das terras pertencentes aos nativos e por eles trabalhadas nas quais tradicionalmente cultivavam sua própria safra O colono tratava o conjunto da população nativa dignitários velhos mulheres e crianças como membros de sua casa e como tais faziaos trabalhar dia e noite em benefício próprio sem nenhum descanso A respeito da conquista de Nova Granada atual Colômbia De las Casas fornece uma descrição da estratégia espanhola na prática A fim de levar a cabo seu objetivo em longo prazo de apoderarse de todo o ouro disponível os espanhóis lançaram mão da estratégia usual de distribuir entre si ou encomendar como dizem as cidades e seus habitantes para então como de hábito tratálos como escravos comuns O encarregado do comando geral da expedição capturou o rei do território para si e o manteve prisioneiro por seis ou sete meses demandando dele de forma bastante ilícita ouro e esmeraldas em quantidades cada vez maiores Esse rei um certo Bogotá ficou de tal modo aterrorizado que em sua ansiedade por libertarse das garras de seus algozes condescendeu com a exigência de encher uma casa inteira de ouro e entregarlhe para esse fim enviou seu povo em busca de ouro e pouco a pouco eles o providenciaram junto com muitas pedras preciosas No entanto não estava ainda a casa repleta e os espanhóis decidiram declarar que o condenariam à morte por não haver cumprido sua palavra O comandante sugeriu que se levasse o caso à sua presença como representante da lei e quando o fizeram apresentando acusações formais contra o rei sentenciouo à tortura caso persistisse em não honrar o acordo Torturaramno então com a estrapadae puseram sebo fervente na sua barriga prenderam suas pernas a postes com argolas de ferro e seu pescoço com outras e com dois homens segurandolhe as mãos queimaramlhe as solas dos pés De tempos em tempos o comandante aparecia para reiterar que o torturariam lentamente até a morte a menos que ele produzisse mais ouro e assim fizeram o rei por fim sucumbindo às agonias que lhe foram infligidas A estratégia e as instituições da conquista aprimoradas no México foram avidamente adotadas no restante do Império Espanhol Em nenhum outro lugar isso se deu com maior eficácia do que na conquista do Peru por Pizarro Nas palavras com que De las Casas inicia seu relato Em 1531 outro grande vilão dirigiuse com seus homens ao reino do Peru Partiu decidido a reproduzir a estratégia e as táticas adotadas por seus comparsas em outras partes do Novo Mundo Pizarro partiu do litoral próximo à cidade peruana de Tumbes e marchou rumo ao sul Em 15 de novembro de 1532 chegou à cidade de Cajamarca nos Andes onde o imperador inca Atahualpa estava acampado com seu exército No dia seguinte Atahualpa que acabara de derrotar seu irmão Huáscar na disputa pela sucessão ao trono de seu falecido pai Huayna Capac dirigiuse com seu séquito ao local de acampamento dos espanhóis Atahualpa estava irritado com as notícias que lhe haviam chegado das atrocidades já cometidas pelos espanhóis tais como violar um templo do Deus Sol Inti O que se passou em seguida é bem conhecido Os espanhóis prepararam uma armadilha mataram os guardas e servos de Atahualpa que possivelmente chegavam a dois mil homens e fizeram o rei prisioneiro Para ganhar a liberdade Atahualpa teve de prometer encher uma sala inteira com ouro e outras duas do mesmo tamanho com prata A promessa foi cumprida mas os espanhóis renegando sua parte no acordo o estrangularam em julho de 1533 Em novembro os espanhóis conquistaram a capital inca de Cusco onde a aristocracia nativa recebeu o mesmo tratamento de Atahualpa sendo mantida prisioneira até fornecer ouro e prata Quando as exigências espanholas não eram atendidas os nobres incas eram queimados vivos Os grandes tesouros artísticos de Cusco como o Templo do Sol tiveram seu ouro arrancado e fundido em barras Àquela altura os espanhóis voltaramse para os povos do Império Inca Como ocorrera no México os cidadãos foram divididos em encomiendas uma para cada um dos conquistadores que haviam acompanhado Pizarro A encomienda era a principal instituição usada para o controle e organização da mão de obra nos primórdios do período colonial mas não tardaria a encontrar uma adversária à altura Em 1545 um habitante local de nome Diego Gualpa partiu em busca de um santuário indígena nos Andes na região onde hoje é a Bolívia Foi atirado ao chão por uma súbita rajada de vento e à sua frente avistou uma jazida de minério de prata parte de uma gigantesca montanha de prata batizada pelos espanhóis de Cerro Rico Ao seu redor cresceu a cidade de Potosí que em seu apogeu em 1650 contava com 160 mil habitantes maior que as cidades de Lisboa ou Veneza nessa mesma época Para explorar a prata os espanhóis precisavam de mineiros muitos deles Enviaram um novo vicerei a mais alta autoridade colonial espanhola Francisco de Toledo cuja principal missão era solucionar o problema da mão de obra Toledo chegando ao Peru em 1569 passou os cinco primeiros anos viajando pela área e investigando sua nova incumbência Ordenou também um recenseamento maciço de toda a população adulta A fim de encontrar os trabalhadores necessários Toledo começou deslocando praticamente a população indígena inteira concentrandoa em novas cidades chamadas reducciones literalmente reduções que facilitariam sua exploração pela Coroa espanhola Em seguida ressuscitou e adaptou uma instituição inca conhecida como mita em quíchua turno Sob esse sistema os incas lançavam mão de trabalhos forçados para cultivar plantações com vistas ao fornecimento de provisões para os templos a aristocracia e o exército Em troca a elite inca garantia a segurança e o combate à fome Nas mãos de Toledo a mita sobretudo no caso de Potosí viria a ser o maior e mais oneroso esquema de exploração de mão de obra no período colonial espanhol Toledo delimitou uma gigantesca área de captação que se estendia da área central do atual Peru e abrangia a maior parte da Bolívia moderna cobrindo cerca de 520 mil quilômetros quadrados Nela um sétimo dos habitantes do sexo masculino recémchegados às suas reduções era recrutado para trabalhar nas minas de Potosí A mita de Potosí perdurou por todo o período colonial tendo sido abolida apenas em 1825 O Mapa 1 mostra a área de captação da mita superposta à extensão do Império Inca na época da conquista espanhola ilustrando a medida em que a mita se sobrepunha ao coração do império incluindo a capital Cusco Mapa 1 O Império Inca a rede inca de estradas e a área de captação da mita de mineração É notável que ainda hoje se detecte o legado da mita no Peru Tomemse a província de Calca e sua vizinha Acomayo Parece haver poucas diferenças entre elas Ambas ficam no alto da cordilheira ambas são habitadas pelos descendentes dos incas de idioma quíchua Não obstante Acomayo é muito mais pobre e sua população consome cerca de um terço a menos do que a de Calca E o povo sabe disso Em Acomayo perguntam aos intrépidos forasteiros Você não sabe que o povo daqui é mais pobre do que o de Calca Por que você quis vir aqui Intrépidos porque é muito mais difícil chegar a Acomayo a partir da capital regional de Cusco antigo centro do Império Inca do que a Calca A estrada para Calca é aplainada a que leva a Acomayo encontrase no mais terrível estado de conservação Para ir além de Acomayo é preciso um cavalo ou mula Em Calca e Acomayo são cultivados os mesmos produtos mas em Calca eles são vendidos no mercado por dinheiro em Acomayo a agricultura é exclusivamente de subsistência Tais disparidades perfeitamente claras para quem vê e para os habitantes da região podem ser compreendidas em termos das diferenças institucionais entre os dois departamentos cujas origens históricas remontam a Toledo e seu plano de exploração eficaz da mão de obra indígena A principal diferença histórica entre Acomayo e Calca é que Acomayo situavase na área de captação da mita de Potosí Calca não Além da concentração de mão de obra e da mita Toledo consolidou a encomienda num sistema de capitação uma soma fixa a ser paga anualmente em prata por todos os homens adultos outro esquema elaborado para obrigar o ingresso das pessoas no mercado de trabalho e reduzir os salários para os proprietários de terras espanhóis Outra instituição o repartimiento de mercancias também se disseminou durante o mandato de Toledo Derivado do verbo espanhol repartir no sentido de distribuir o repartimiento distribuição de bens envolvia a venda forçada de bens para os habitantes locais a preços definidos pelos espanhóis Por fim Toledo introduziu o trajin que significa literalmente fardo passando a usar os índios em vez de animais de carga para carregar pesados fardos de produtos como vinho folhas de coca ou tecidos para as empreitadas comerciais da elite espanhola Em todo o universo colonial espanhol nas Américas adotaramse instituições e estruturas sociais similares Após uma fase inicial de saques e ânsia por ouro e prata os espanhóis criaram uma rede de instituições com vistas à exploração dos povos indígenas Toda a gama de estratégias encomienda mita repartimiento e trajin tinha por objetivo rebaixar os padrões de vida dos povos indígenas ao nível da subsistência e assim destinar toda a receita excedente aos espanhóis Para tanto expropriaramlhes as terras forçaramnos ao trabalho oferecendo baixos salários impuseramlhes impostos elevados e preços caros por produtos cuja compra sequer era voluntária Embora essas instituições tenham gerado muita riqueza para a Coroa espanhola e tornado riquíssimos os conquistadores e seus descendentes converteram também a América Latina no continente mais desigual do mundo e solaparam boa parte de seu potencial econômico A JAMESTOWN Enquanto os espanhóis iniciavam a conquista das Américas na década de 1490 a Inglaterra era uma potência europeia menor que se recuperava dos efeitos devastadores de uma guerra civil a Guerra das Rosas Não estava em condições de tirar vantagem da disputa por butim e ouro nem da oportunidade de explorar os povos indígenas do Novo Mundo Quase 100 anos depois em 1588 o golpe de sorte do desbaratamento da Armada Espanhola após a tentativa do Rei Filipe II da Espanha de invadir a Inglaterra fez ondas de choque políticas percorrerem toda a Europa Por mais que a vitória tenha se devido à boa fortuna dos ingleses porém foi também sinal da crescente assertividade destes nos mares que lhes permitiria por fim tomar parte da contenda por um império colonial Não é então coincidência que a Inglaterra tenha dado início à colonização da América do Norte exatamente no mesmo momento Contudo era retardatária A opção pela América do Norte deveuse não à atratividade da região mas ao fato de que era o que estava disponível As partes desejáveis das Américas onde a população indígena a explorar era abundante e onde foram localizadas minas de ouro e prata já haviam sido ocupadas Aos ingleses couberam as sobras Quando o escritor e agricultor inglês do século XVIII Arthur Young discutiu onde eram produzidos os insumos básicos mais rentáveis referindose aos produtos agrícolas exportáveis observou Ao que parece as matériasprimas produzidas em nossas colônias diminuem em valor na proporção de sua distância em relação ao Sol Nas Índias Ocidentais que são as mais quentes de todas montam a um total de 8l 12s 1d por cabeça Nas do sul do continente 5l 10s Nas centrais 9s 6 12d Nas colônias do norte 2s 6d Tal escala sem dúvida sugere uma importantíssima lição evitar colonizar nas latitudes mais setentrionais A primeira tentativa inglesa de estabelecer uma colônia em Roanoke Carolina do Norte entre 1585 e 1587 foi um rematado desastre Em 1607 foi feita nova tentativa No apagar das luzes de 1606 três navios o Susan Constant o Godspeed e o Discovery sob o comando do Capitão Christopher Newport partiram rumo à Virginia Os colonos sob os auspícios da Virginia Company adentraram a Baía de Chesapeake e subiram um rio que batizaram de James em homenagem ao monarca inglês na época Jaime James I Em 14 de maio de 1607 fundaram a colônia de Jamestown cidade de Jaime Embora os colonos a bordo dos navios da Virginia Company fossem ingleses seguiam um modelo de colonização com forte influência do modelo instituído por Cortés Pizarro e Toledo Seu plano inicial consistia em capturar o chefe local e usálo como meio de obter provisões e obrigar a população a produzir alimentos e riquezas para os europeus Ao chegarem a Jamestown os colonos ingleses não sabiam que se encontravam em território pertencente à Confederação Powhatan uma coalizão de cerca de 30 grupos autônomos que deviam fidelidade a um rei chamado Wahunsunacock A capital de Wahunsunacock era a cidade de Werowocomoco a meros 30 quilômetros de Jamestown O plano dos colonos era inteirarse da situação local caso os nativos não pudessem ser induzidos a fornecer víveres e mão de obra os colonos poderiam ao menos comerciar com eles A ideia de que os colonos trabalhassem e cultivassem a própria subsistência ao que tudo indica não lhes passava pela cabeça Não era assim que agiam os conquistadores do Novo Mundo Wahunsunacock logo tomou conhecimento da presença dos colonos e os viu com profunda desconfiança Estava à frente do que para a América do Norte era um império bastante vasto Contudo como tinha muitos inimigos e faltavalhe o controle político centralizado inconteste dos incas decidiu averiguar quais eram as intenções dos ingleses a princípio enviando emissários com a mensagem de que desejava entabular com eles relações cordiais À medida que se aproximava o inverno de 1607 os suprimentos dos colonos de Jamestown começaram a se esgotar mas o líder designado do conselho de governo da colônia Edward Marie Wingfield hesitava A situação foi salva pelo Capitão John Smith Este cujos escritos constituem uma de nossas principais fontes de informação acerca do desenvolvimento da colônia nesses primeiros tempos era um personagem arquetípico Nascido em Lincolnshire na região rural da Inglaterra ignorou a ambição de seu pai no sentido de que se dedicasse aos negócios e em vez disso tornouse mercenário Primeiro lutou com o exército inglês nos Países Baixos após o que ingressou nas forças austríacas que se batiam na Hungria contra o Império Otomano Capturado na Romênia foi vendido como escravo e posto para trabalhar no campo Um dia conseguiu ludibriar seu senhor e roubandolhe as roupas e o cavalo fugiu para território austríaco Smith havia se metido em apuros na viagem para a Virginia tendo sido posto a ferros no Susan Constant por motim após desafiar as ordens de Wingfield Quando a frota aportou no Novo Mundo o plano era leválo a julgamento Para profundo horror de Wingfield Newport e demais membros da elite de colonos porém ao abrirem as ordens seladas que traziam descobriram que a Virginia Company havia nomeado Smith membro do conselho que governaria Jamestown Tendo Newport retornado à Inglaterra em busca de provisões e mais colonos e com Wingfield incerto quanto ao que fazer foi Smith quem salvou a colônia Encetou uma série de missões comerciais que asseguraram suprimentos vitais Numa delas foi capturado por Opechancanough um dos irmãos mais novos de Wahunsunacock e levado à presença do rei em Werowocomoco Foi o primeiro inglês a estar frente a frente com Wahunsunacock e foi nesse primeiro encontro que segundo alguns relatos a vida de Smith só foi salva graças à intervenção da jovem filha de Wahunsunacock Pocahontas Libertado em 2 de janeiro de 1608 Smith voltou a Jamestown cujas provisões ainda se encontravam em níveis perigosamente baixos até o oportuno retorno de Newport da Inglaterra mais tarde naquele mesmo dia Os colonos de Jamestown pouco proveito tiraram dessa experiência inicial Ao longo de 1608 insistiram em sua busca por ouro e metais preciosos Ao que tudo indica não pareciam compreender que para sobreviver não poderiam contar com os nativos para alimentálos fosse por coação ou comércio Smith foi o primeiro a perceber que o modelo de colonização que tão bem funcionara para Cortés e Pizarro de nada adiantaria na América do Norte As circunstâncias gerais eram demasiado distintas Smith observou que ao contrário de astecas e incas os povos da Virginia não possuíam ouro Com efeito anotou em seu diário Víveres é forçoso reconhecer são toda a sua riqueza Anas Todkill um dos primeiros colonos que deixou um extenso diário expressou muito bem as frustrações de Smith e dos poucos outros que se deram conta desse fato Não havia conversa não havia esperança não havia trabalho que não fosse escavar ouro refinar ouro carregar ouro Quando Newport partiu para a Inglaterra em abril de 1608 levou consigo uma carga de pirita ouro de tolo Retornou no fim de setembro com ordens da Virginia Company de assumir um controle mais estrito dos nativos Seu plano era coroar Wahunsunacock na esperança de assim garantir sua subserviência ao rei inglês Jaime I Convidaramno a visitar Jamestown mas Wahunsunacock ainda profundamente desconfiado em relação aos colonos não tinha a menor intenção de arriscarse à captura John Smith registrou a resposta de Wahunsunacock Se seu rei envioume presentes também eu sou rei e esta é a minha terra Seu pai que venha a mim não eu a ele e muito menos ao seu forte tampouco morderei eu tal isca Se Wahunsunacock não morderia tal isca Newport e Smith precisariam ir a Werowocomoco a fim de proceder à coroação Ao que parece o evento foi um total fiasco seu único resultado foi Wahunsunacock ter chegado à conclusão de que estava mais do que na hora de livrarse da colônia e impôslhe um embargo comercial Jamestown não poderia mais comercializar suprimentos Wahunsunacock estava decidido a matálos de fome Newport novamente fezse à vela rumo à Inglaterra em dezembro de 1608 levando consigo uma carta escrita por Smith rogando aos diretores da Virginia Company que mudassem seu pensamento acerca da condução da colônia Não havia possibilidade de explorar a Virginia nas mesmas linhas de enriquecimento fácil do México e do Peru Não havia ouro nem metais preciosos nem como obrigar os indígenas a trabalhar ou fornecer alimentos Smith percebeu que para que a colônia fosse viável eram os colonos que teriam de trabalhar Assim sendo solicitava aos diretores da companhia que lhes enviassem o tipo correto de pessoas Ao nos enviarem nova leva suplico lhes que mandem cerca de 30 carpinteiros agricultores hortelões pescadores ferreiros pedreiros e quem mais nos escave árvores e raízes bem fornidos e mais um milheiro desses ao nosso dispor Smith não queria mais inúteis ourives Mais uma vez Jamestown só sobreviveu graças à sua astúcia Por meio de lisonjas e ameaças conseguiu negociar com alguns grupos locais quando estes não cediam pilhava o que podia Na povoação inglesa Smith tinha domínio absoluto e impôs a regra de que quem não trabalhar não come Assim Jamestown sobreviveu a um segundo inverno Supunhase que a Virginia Company fosse um empreendimento rentável mas ao cabo de dois anos desastrosos não havia nem alento nem lucro Os diretores da empresa chegaram à conclusão de que precisavam de um novo modelo de governança e substituíram o conselho de governo por um só governador O primeiro homem designado para o cargo foi Sir Thomas Gates Levando em consideração alguns aspectos da advertência de Smith a companhia deuse conta de que seria preciso tentar alguma coisa nova impressão confirmada pelos acontecimentos do inverno de 1609 1610 a chamada época da fome No novo modo de governo não havia espaço para Smith que desgostoso retornou à Inglaterra no outono de 1609 Sem sua engenhosidade e com o boicote de Wahunsunacock ao fornecimento de provisões os colonos de Jamestown pereceram Dos 500 que começaram o inverno apenas 60 chegaram vivos a março A situação era tão desesperadora que não lhes restou outra alternativa senão recorrer ao canibalismo A novidade trazida à colônia por Gates e seu representante Sir Thomas Dale foi a imposição de um regime de trabalho de rigor draconiano para os colonos ingleses ainda que não é claro à elite que a administrava Foi Dale quem promulgou as Leis Divinas Morais e Marciais que incluíam as seguintes cláusulas Nenhum homem ou mulher se evadirá da colônia para buscar refúgio junto aos índios sob pena de morte Quem vier a roubar um jardim seja público ou privado ou vinha ou quem roubar espigas de trigo será punido com a morte Nenhum membro da colônia venderá ou dará qualquer mercadoria deste país para algum capitão marinheiro mestre ou marujo que a transporte para fora da colônia para seu próprio benefício sob pena de morte Se os povos indígenas não tinham como ser explorados raciocinou a Virginia Company talvez os colonos sim O novo modelo de desenvolvimento colonial baseavase na posse de toda a terra pela Virginia Company Os homens eram abrigados em alojamentos e recebiam rações determinadas pela companhia Foram definidos grupos de trabalho cada qual supervisionado por um agente da companhia Era algo próximo da lei marcial sendo a execução sumária a punição de primeiro recurso Como parte das novas instituições da colônia a primeira cláusula supracitada é significativa a companhia ameaçava com a morte os fugitivos Dado o novo regime de trabalho a fuga para viver com os nativos constituía cada vez mais alternativa atraente para os colonos forçados ao trabalho Igualmente interessante dada a baixa densidade mesmo das populações indígenas da Virginia na época era a perspectiva de partir por conta própria para a fronteira para além do controle da Virginia Company O poder da companhia diante de tais opções era restrito Não havia como impor o trabalho forçado aos colonos ingleses em troca de rações que mal lhes garantiam a subsistência O Mapa 2 apresenta uma estimativa da densidade demográfica de diferentes regiões das Américas na época da conquista espanhola A densidade populacional dos Estados Unidos exceto por alguns bolsões era no máximo de três quartos de pessoa a cada 25 quilômetros quadrados Na região central do México ou nos Andes peruanos chegava a 400 pessoas para a mesma área número mais de 500 vezes maior O que era possível no México ou no Peru não era praticável na Virginia A Virginia Company levou algum tempo para reconhecer que seu modelo inicial de colonização não daria certo na Virginia demorou outro tanto para admitir o fracasso de suas Leis Divinas Marciais e Morais A partir de 1618 partiuse para uma estratégia radicalmente nova Diante da impossibilidade de coagir tanto os habitantes locais quanto os colonos a única alternativa restante era fornecer incentivos a estes últimos Em 1618 a companhia inaugurou um sistema de concessões headright system que brindava cada colono do sexo masculino com 50 acres de terra e mais 50 acres para cada membro de sua família e todos os servos que uma família conseguisse levar à Virginia Os colonos ganharam suas casas e foram liberados de seus contratos e em 1619 foi introduzida uma Assembleia Geral que efetivamente conferiu voz a cada homem adulto nas leis e instituições que regiam a colônia Era o início da democracia nos Estados Unidos A Virginia Company demorou 12 anos para aprender sua primeira lição o que havia dado certo para os espanhóis no México e nas Américas Central e do Sul não funcionaria no Norte O resto do século XVII assistiu a uma longa série de batalhas em torno da segunda lição a de que a única opção para uma colônia economicamente viável seria criar instituições que dessem aos colonos incentivos para investir e trabalhar com dedicação À medida que a América do Norte se desenvolvia as elites inglesas volta e meia tentavam estabelecer instituições que imporiam severas restrições econômicas e políticas a todos os que não pertencessem à pequena parcela de privilegiados da colônia assim como haviam feito os espanhóis A cada tentativa porém o modelo soçobrava como acontecera na Virginia Uma das tentativas mais ambiciosas teve início pouco após a mudança de estratégia da Virginia Company Em 1632 10 milhões de acres de terra na região superior da Baía de Chesapeake foram concedidos pelo rei inglês Carlos I a Cecilius Calvert Lorde Baltimore A Carta de Maryland conferiu a Lorde Baltimore total liberdade para criar um governo nas linhas que bem desejasse com a cláusula VII sublinhando que Baltimore dispunha para o bom e feliz governo da dita província de livre pleno e absoluto poder pelo teor destas presentes de ordenar elaborar e promulgar leis do tipo que forem Baltimore arquitetou minucioso plano para instituir uma sociedade senhorial variante norteamericana de uma versão idealizada da Inglaterra rural do século XVII o que significava dividir a terra em lotes de milhares de acres a serem administrados por senhores Estes recrutariam arrendatários que trabalhariam e pagariam o aluguel à elite privilegiada no controle da terra Outra tentativa similar seria feita mais tarde em 1663 com a fundação da Carolina por oito proprietários entre os quais figurava Sir Anthony AshleyCooper AshleyCooper junto com seu secretário o grande filósofo inglês John Locke formulou as Constituições Fundamentais da Carolina documento que como a Carta de Maryland antes dele lançava as bases de uma sociedade elitista e hierárquica baseada na dominação pela elite de uma aristocracia rural O preâmbulo salientava que o governo desta província se fará perfeitamente consoante a monarquia sob a qual vivemos e de que esta província faz parte e comprometese a evitar a constituição de uma democracia numerosa Mapa 2 Densidade demográfica das Américas em 1500 As cláusulas das Constituições Fundamentais estabeleciam uma estrutura social rígida Na base estariam os lacaios leetmen sobre os quais a cláusula 23 determinava Os filhos de lacaios lacaios serão e assim será por todas as gerações Acima dos lacaios desprovidos de qualquer poder político ficariam os senhores landgraves e caciques caziques que comporiam a aristocracia A cada senhor caberiam 48 mil acres de terra e aos caciques 24 mil acres Haveria um parlamento em que senhores e caciques estariam representados mas ao qual seria permitido debater tão somente as medidas previamente aprovadas pelos oito proprietários Do mesmo modo como a tentativa de impor um regime draconiano na Virginia havia fracassado também os planos de implementar o mesmo tipo de instituição em Maryland e Carolina malograram por motivos similares Em todos os casos ficou comprovada a impossibilidade de sujeitar os colonos a uma rígida sociedade hierárquica porque eram muitas as opções ao seu alcance no Novo Mundo Pelo contrário era preciso oferecerlhes incentivos para que trabalhassem e logo estavam exigindo mais liberdade econômica e mais amplos direitos políticos Também em Maryland os colonos insistiam em ser proprietários das próprias terras e obrigaram Lorde Baltimore a criar uma assembleia Em 1691 esta induziu o rei a declarar Maryland colônia da Coroa destituindo assim de privilégios políticos Baltimore e seus senhores Embate similar ocorreu ainda que tardiamente nas Carolinas onde outra vez os aristocratas perderam e a Carolina do Sul tornouse colônia real em 1729 Na década de 1720 todas as 13 colônias que viriam a ser os Estados Unidos dispunham de estruturas de governo semelhantes Em todos os casos havia um governador e uma assembleia que representavam os proprietários de terras Não eram democracias a mulheres escravos e desprovidos era vedado o voto Ainda assim os direitos políticos eram bastante amplos se comparados a sociedades contemporâneas em outros lugares Foram essas assembleias e seus líderes que se reuniram em 1774 no Primeiro Congresso Continental prelúdio da independência dos Estados Unidos Em seu entender as assembleias dispunham tanto do direito de determinar sua própria composição quanto do direito à tributação o que como sabemos criou problemas para o governo colonial inglêsf UM CONTO DE DUAS CONSTITUIÇÕES A essa altura já deve estar evidente que não é coincidência o fato de terem sido os Estados Unidos e não o México a adotar e promulgar uma constituição que esposava princípios democráticos impunha limitações ao uso do poder político e distribuía tal poder pela sociedade de maneira ampla O documento que fez os delegados reunirem se para redigir na Filadélfia em maio de 1787 foi resultado de um longo processo iniciado com a formação da Assembleia Geral em Jamestown em 1619 É gritante o contraste entre o processo constitucional que se deu por ocasião da independência dos Estados Unidos e o ocorrido no México pouco tempo depois Em fevereiro de 1808 o exército francês de Napoleão Bonaparte invadiu a Espanha Em maio havia tomado Madri a capital do país Em setembro o rei espanhol Fernando fora capturado e havia abdicado Uma junta nacional a Junta Central ocupou seu lugar assumindo a incumbência de fazer frente aos franceses A Junta reuniuse pela primeira vez em Aranjuez mas recuou para o sul diante do avanço das tropas napoleônicas Por fim chegou ao Porto de Cádiz que apesar de sitiado pelas forças francesas resistiu Aqui a Junta formou um Parlamento chamado de Cortes Em 1812 as Cortes produziram o que ficaria conhecido como Constituição de Cádiz que determinava a introdução de uma monarquia constitucional com base em ideias de soberania popular Exigia também o fim de privilégios especiais e a introdução da igualdade perante a lei Todas essas demandas eram anátemas aos olhos das elites da América do Sul que ainda dominavam um ambiente institucional baseado nas encomiendas nos trabalhos forçados e no poder absoluto de que elas e o Estado colonial eram revestidos O colapso do Estado hispânico em decorrência da invasão napoleônica engendrou uma crise constitucional em toda a América Latina colonial O reconhecimento ou não da autoridade da Junta Central foi objeto de muita controvérsia e em resposta muitos latinoamericanos começaram a formar suas próprias juntas Era apenas questão de tempo até que vislumbrassem a possibilidade de se tornarem efetivamente independentes da Espanha A primeira declaração de independência veio à luz em La Paz Bolívia em 1809 embora tenha sido rapidamente esmagada por tropas espanholas enviadas do Peru No México as atitudes políticas da elite haviam sido moldadas pela Revolta de Hidalgo liderada em 1810 por um sacerdote Padre Miguel Hidalgo Quando os homens de Hidalgo saquearam Guanajuato em 23 de setembro mataram o intendente e o oficial colonial superior e puseramse a matar todos os brancos indiscriminadamente Foi mais uma guerra de classes ou mesmo étnica do que um movimento de independência com o efeito de unir todas as elites para fazerlhes frente Se a independência possibilitasse a participação popular na política as elites locais e não só os espanhóis seriam contra Por conseguinte as elites mexicanas viram a Constituição de Cádiz que abria caminho para a participação popular com extremo ceticismo e jamais reconheceram sua legitimidade Em 1815 com o colapso do império europeu de Napoleão o Rei Fernando VII voltou ao trono e a Constituição de Cádiz foi anulada Ao tentar retomar o controle de suas colônias na América a Coroa espanhola não enfrentou maiores problemas no México legalista Ainda assim em 1820 tropas hispânicas reunidas em Cádiz com destino às Américas a fim de ajudar a restabelecer a autoridade espanhola amotinaramse contra Fernando VII A elas logo se juntaram unidades do exército de todo o país e Fernando viuse compelido a restaurar a Constituição de Cádiz e voltar a convocar as Cortes que nessa reedição mostraramse ainda mais radicais do que aquelas que haviam redigido a Constituição de Cádiz propondo a abolição do trabalho forçado em todas as suas formas Atacavam também os privilégios especiais como por exemplo o direito dos militares de serem levados a julgamento criminal em tribunais próprios Finalmente confrontadas com a imposição desse documento no México as elites locais decidiram que seria melhor continuar por conta própria e declarar a independência Esse movimento de independência foi encabeçado por Augustín de Iturbide exoficial do Exército espanhol que em 24 de fevereiro de 1821 publicou o Plano de Iguala sua visão de um México independente O plano incluía uma monarquia constitucional com imperador mexicano e removia as provisões da Constituição de Cádiz que as elites locais consideravam tão perigosas para seu status e privilégios Recebeu apoio instantâneo e a Espanha logo reconheceu que não poderia impedir o inevitável Contudo Iturbide não se limitou a organizar a secessão mexicana Detectando o vácuo de poder tratou de tirar proveito de sua formação militar e fezse declarar imperador posição que o grande líder da independência sulamericana Simón Bolívar descrevia como por graça de Deus e das baionetas Iturbide não era limitado pelas mesmas instituições políticas que restringiam os presidentes dos Estados Unidos rapidamente se converteu em ditador e em outubro de 1822 dissolveu o Congresso sancionado pela Constituição e o substituiu por uma junta de sua escolha Embora Iturbide não tenha durado muito esse padrão de acontecimentos se repetiria vezes sem conta no México do século XIX A Constituição dos Estados Unidos não criou uma democracia pelos padrões modernos Cabia a cada estado determinar quem seriam os eleitores Assim embora os estados do norte logo tenham estendido o direito ao voto a todos os homens brancos independentemente de sua renda ou propriedades apenas aos poucos os do sul mostrariam a mesma prodigalidade Nenhum deles reconhecia os direitos de mulheres ou escravos e à medida que os brancos iam sendo liberados das limitações relativas a propriedade e riqueza eram adotadas restrições raciais que destituíam explicitamente os negros de todo e qualquer direito A escravidão é claro foi considerada legítima quando a Constituição dos Estados Unidos foi escrita na Filadélfia e teve lugar a mais sórdida das negociações com relação à divisão dos assentos na Câmara de Representantes entre os estados A alocação se daria de acordo com a população de cada estado mas os representantes do sul solicitaram que os escravos fossem contabilizados Os nortistas objetaram Chegouse ao acordo de que para fins de distribuição dos assentos na Câmara dos Representantes cada escravo contaria como três quintos de uma pessoa livre Os conflitos entre o Norte e o Sul dos Estados Unidos foram reprimidos durante o processo constitucional mediante a elaboração de pactos como essa regra dos três quintos e similares Novos ajustes seriam acrescentados com o passar do tempo como por exemplo o Acordo do Missouri segundo o qual um estado favorável à escravidão e outro contrário seriam sempre agregados juntos à União de modo a manter o equilíbrio no Senado entre as duas posições Foi graças a esses subterfúgios que as instituições políticas dos Estados Unidos mantiveramse em funcionamento pacífico até que a Guerra de Secessão viesse solucionar os conflitos em favor do Norte A Guerra de Secessão foi sangrenta e destrutiva Tanto antes quanto depois dela porém havia um semnúmero de oportunidades econômicas para uma vasta parcela da população sobretudo no norte e no oeste dos Estados Unidos No México a situação era outra Se os Estados Unidos experimentaram cinco anos de instabilidade política entre 1860 e 1865 o México viveu um quadro quase permanente de instabilidade nos 50 primeiros anos de sua independência o que é mais bem ilustrado pela trajetória de Antonio López de Santa Ana Santa Ana filho de um dignitário colonial em Veracruz destacouse como soldado lutando pela Coroa espanhola nas guerras de independência Em 1821 mudou de lado com Iturbide e jamais olhou para trás Tornouse presidente do México pela primeira vez em maio de 1833 embora tenha permanecido no poder por menos de um mês preferindo deixar o exercício do cargo para Valentín Gómez Farías O mandato de Gómez Farías duraria 15 dias ao fim dos quais Santa Ana retomou o poder Todavia sua segunda presidência foi tão breve quanto a primeira e no começo de julho ele foi novamente substituído por Gómez Farías Santa Ana e Gómez Farías continuariam sua dança até meados de 1835 quando Santa Ana foi substituído por Miguel Barragán Santa Ana porém não era de desistir Retornou à presidência em 1839 1841 1844 1847 e por fim entre 1853 e 1855 No total foi presidente 11 vezes no decorrer das quais assistiu à perda do Álamo e do Texas e à desastrosa Guerra Mexicano Americana que culminou com a perda do que viria a ser o Novo México e o Arizona Entre 1824 e 1867 foram 22 os presidentes do México poucos dos quais assumiram o poder por vias sancionadas pela lei A consequência dessa instabilidade política sem precedentes para as instituições e incentivos econômicos deveria ser óbvia Tamanha inconsistência acarretou profunda insegurança com relação ao direito à propriedade bem como grave enfraquecimento do Estado mexicano que agora dispunha de pouquíssima autoridade e capacidade de aumentar a arrecadação ou assegurar a prestação de serviços públicos Com efeito muito embora Santa Ana fosse presidente do México vastas parcelas do país não se encontravam sob seu controle o que possibilitou a anexação do Texas pelos Estados Unidos Ademais conforme acabamos de ver a força motriz por trás da declaração de independência mexicana foi o desejo de proteger o conjunto de instituições econômicas desenvolvidas durante o período colonial que havia feito do México nas palavras do grande explorador e geógrafo da América Latina o alemão Alexander von Humbolt o país da desigualdade Tais instituições ao erigirem a sociedade sobre a exploração dos povos indígenas e a criação de monopólios bloquearam os incentivos econômicos e iniciativas da grande massa da população Assim enquanto os Estados Unidos começavam a passar pela Revolução Industrial na primeira metade do século XIX o México empobrecia TER UMA IDEIA ABRIR UMA EMPRESA E OBTER UM EMPRÉSTIMO A Revolução Industrial começou na Inglaterra Seu primeiro êxito foi revolucionar a fabricação de tecidos de algodão graças às novas máquinas movidas a rodasdágua e mais tarde aos motores a vapor A mecanização da produção multiplicou de forma exponencial a produtividade dos trabalhadores primeiro na indústria têxtil e depois também em outras O motor das transformações tecnológicas em todos os segmentos da economia era a inovação encabeçada por novos empreendedores e homens de negócios ávidos por aplicar suas ideias Esse florescimento inicial não tardou a atravessar o Atlântico Norte e disseminarse pelos Estados Unidos as pessoas percebiam as grandes oportunidades econômicas decorrentes da adoção das novas tecnologias desenvolvidas na Inglaterra e viamse também inspiradas a criar suas próprias invenções Podemos tentar compreender a natureza dessas invenções mediante um breve exame quanto a quem eram concedidas as patentes O sistema de patentes que protege os direitos de propriedade das ideias foi sistematizado pelo Estatuto de Monopólios promulgado pelo Parlamento inglês em 1623 em parte como uma tentativa de impedir que o rei concedesse cartas de patente arbitrárias conferindo a quem bem entendesse direitos exclusivos sobre o empreendimento de determinadas atividades ou negócios O que mais chama a atenção no registro de patentes nos Estados Unidos é o fato de que os autores dos pedidos vinham de todo tipo de extrato sociocultural e história de vida não só do meio dos ricos e da elite Muitos fizeram fortuna graças às suas patentes Foi o caso de Thomas Edison inventor do fonograma e da lâmpada elétrica e fundador da General Electric até hoje uma das maiores empresas do mundo Edison era o mais novo de sete irmãos Seu pai Samuel Edison teve diversas ocupações de serrador de sarrafos para telhados a alfaiate passando por dono de taverna Thomas teve pouca educação formal mas sua mãe o ensinou em casa Entre 1820 e 1845 apenas 19 dos detentores de patentes nos Estados Unidos tinham pais com formação profissional específica ou eram provenientes de grandes famílias proprietárias de terras Nesse mesmo período 40 dos que registravam uma patente tiveram acesso apenas à educação primária ou menos como Edison Ademais com frequência exploravam sua patente abrindo uma empresa outra vez como Edison Do mesmo modo como os Estados Unidos eram no século XIX mais democráticos em termos políticos do que praticamente qualquer outro país do mundo na época eram também mais democráticos que os demais quando o assunto era inovação um elemento crítico em sua caminhada rumo a tornarse a nação economicamente mais inovadora do planeta Se você fosse pobre e tivesse uma boa ideia uma coisa era registrar uma patente que afinal de contas nem era um procedimento tão caro assim Outra coisa inteiramente distinta era usála para ganhar dinheiro Uma possibilidade claro era vendêla para terceiros Foi o que Edison fez logo no princípio a fim de levantar recursos quando vendeu seu telégrafo quadruplex por US10 mil para a Western Union Contudo a venda de patentes só era uma boa ideia em casos como o de Edison que tinha ideias mais rápido do que era capaz de botar em prática tendo chegado a um recorde mundial de 1093 patentes emitidas em seu nome nos Estados Unidos e 1500 em todo o mundo O verdadeiro modo de ganhar dinheiro com patentes era fundar seu próprio negócio Para tanto porém era preciso capital e bancos que o emprestassem Mais uma vez os inventores norteamericanos contaram com um empurrãozinho da sorte Durante o século XIX houve uma rápida expansão do sistema bancário e de intermediação financeira um crucial facilitador do ímpeto de crescimento e industrialização experimentado pela economia Se em 1818 havia 338 bancos em operação nos Estados Unidos com um ativo total de US160 milhões em 1914 já eram 27864 bancos com um ativo total de US273 bilhões Os potenciais inventores nos Estados Unidos tinham pronto acesso a capital para montar seus negócios Além disso a intensa concorrência entre bancos e instituições financeiras americanas significava que tais recursos encontravamse disponíveis a taxas de juros relativamente baixas No México a situação era outra Com efeito em 1910 ano em que teve início a Revolução Mexicana havia apenas 42 bancos no país dois dos quais controlavam 60 do ativo bancário total Ao contrário dos Estados Unidos onde a competição era acirrada entre os bancos mexicanos ela era quase inexistente o que significava que os bancos não só podiam cobrar taxas de juros extorsivas de seus clientes como normalmente mantinham os empréstimos restritos àqueles privilegiados e já ricos que assim podiam valerse de seu acesso ao crédito para aumentar o controle que exerciam sobre os vários setores da economia A forma assumida pela indústria bancária mexicana ao longo dos séculos XIX e XX foi resultado direto das instituições políticas que se consolidaram no país após a independência Ao caos da era de Santa Ana seguiuse uma tentativa malfadada do governo francês do Imperador Napoleão II de instalar um regime colonial no México sob o Imperador Maximiliano entre 1864 e 1867 Os franceses foram expulsos e foi elaborada uma nova Constituição Todavia o governo constituído primeiro por Benito Juárez e após sua morte por Sebastián Lerdo de Tejada logo seria desafiado por um jovem militar de nome Porfírio Díaz Díaz general vitorioso na guerra contra os franceses e que havia desenvolvido aspirações de poder formou um exército rebelde e em novembro de 1876 derrotou as tropas do governo na Batalha de Tecoac Em maio do ano seguinte elegeuse presidente e governaria o México de forma mais ou menos contínua e cada vez mais autoritária até ser deposto ao irromper a revolução 34 anos depois Como seus antecessores Iturbide e Santa Ana Díaz começou a vida como comandante militar Esse tipo de trajetória política iniciada nas Forças Armadas foi sem dúvida conhecida nos Estados Unidos O primeiro presidente dos Estados Unidos George Washington também fora um bemsucedido general na Guerra de Independência Ulysses S Grant um dos generais vitoriosos da União na Guerra de Secessão assumiria a presidência em 1869 e Dwight D Eisenhower comandante supremo das forças aliadas na Europa durante a Segunda Guerra Mundial seria presidente do país entre 1953 e 1961 Ao contrário de Iturbide Santa Ana e Díaz entretanto nenhum desses militares recorreu à força para guindarse ao poder e tampouco fez uso dela para não ter de abdicar de sua posição Todos submeteramse à Constituição Embora o México tivesse constituições no século XIX elas impunham poucas restrições ao que Iturbide Santa Ana e Díaz podiam fazer A única maneira de tirar esses homens do poder era do mesmo modo como eles o conquistaram com violência Díaz transgrediu os direitos de propriedade das pessoas facilitando a expropriação de vastas extensões de terra e concedeu monopólios e favores a seus defensores em todas as linhas de negócios inclusive no setor bancário Não que houvesse algo de novo em seu modo de proceder Era exatamente o que os conquistadores espanhóis haviam feito e o que fizera Santa Ana em seu rastro O motivo pelo qual os Estados Unidos dispunham de uma indústria bancária substancialmente mais favorável para a prosperidade econômica do país nada tinha a ver com alguma peculiaridade no que movia os proprietários de bancos De fato a motivação do lucro esteio da natureza monopolística da indústria bancária no México estava igualmente presente nos Estados Unidos só que canalizado de forma distinta em virtude de as instituições serem radicalmente distintas Os banqueiros lidavam com instituições econômicas diferentes que os submetiam a uma concorrência muito maior o que se devia em grande parte por sua vez ao fato de que os políticos que elaboraram as regras para os banqueiros também recebiam incentivos muito diferentes engendrados por outras instituições políticas Com efeito no final do século XVIII pouco depois de a Constituição americana entrar em vigor começou a despontar um sistema bancário bastante parecido com o que posteriormente viria a dominar o México Os políticos tentaram instalar monopólios que pudessem distribuir entre amigos e parceiros em troca de parte de seus lucros Os bancos também logo se puseram a emprestar dinheiro aos políticos que os regulavam como no México Nos Estados Unidos porém essa situação não poderia se sustentar porque os políticos que tentavam implementar tais monopólios ao contrário de seus colegas mexicanos eram sujeitos a eleição e reeleição A criação de monopólios bancários e a obtenção de empréstimos exclusivos é um bom negócio para os políticos quando conseguem sair incólumes Não é particularmente benéfico para os cidadãos contudo Ao contrário do México nos Estados Unidos os cidadãos tinham condições de manter os políticos sob controle e livrarse dos que procurassem legislar em causa própria ou agraciar seus camaradas com privilégios Por conseguinte os monopólios bancários vieram abaixo A ampla distribuição de direitos políticos nos Estados Unidos sobretudo se comparada ao México garantia igualdade de acesso a recursos e empréstimos o que por sua vez assegurava que aqueles que tivessem ideias e invenções delas se beneficiassem MUDANÇAS QUE DEPENDEM DA TRAJETÓRIA O mundo estava mudando nas décadas de 1870 e 1880 e a América Latina não era exceção As instituições estabelecidas por Porfírio Díaz não eram idênticas às de Santa Ana ou do Estado colonial espanhol A economia mundial apresentou um boom na segunda metade do século XIX e inovações nos meios de transporte como o navio a vapor e as ferrovias resultaram em enorme expansão do comércio internacional Tamanha onda de globalização significava que países ricos em recursos como o México ou para uma descrição mais adequada suas elites locais poderiam enriquecer mediante a exportação de matériasprimas e recursos naturais para a América do Norte ou a Europa Ocidental então em pleno processo de industrialização Díaz e seus companheiros viamse portanto em um mundo muito diferente e em rápida transformação Perceberam que também o México precisava mudar o que não queria dizer todavia que as instituições coloniais seriam extirpadas e substituídas por outras similares às norteamericanas pelo contrário a mudança a promover seria dependente da trajetóriag limitandose a levar ao estágio seguinte as instituições que tanto já haviam contribuído para a pobreza e a desigualdade da América Latina A globalização tornou valiosos os vastos espaços vazios das Américas suas fronteiras abertas De modo geral eram terras que se encontravam vagas apenas de um ponto de vista mítico pois eram habitadas por povos indígenas submetidos a uma brutal destituição De todo modo a corrida por esse recurso recémvalorizado foi um dos processos definidores das Américas na segunda metade do século XIX A súbita abertura da preciosa fronteira porém em vez de deflagrar processos paralelos nos Estados Unidos e na América Latina contribuiu apenas para aprofundar as divergências em virtude das diferenças institucionais já existentes sobretudo aquelas que determinavam quem tinha acesso à terra Nos Estados Unidos uma longa série de atos legislativos desde a Lei da Terra Land Ordinance de 1785 até a Lei da Propriedade Rural Homestead Act de 1862 deu amplo acesso às terras de fronteira Embora os povos indígenas tenham sido ignorados instaurouse assim uma fronteira igualitária e economicamente dinâmica Na maior parte dos países da América Latina todavia as instituições políticas locais engendraram um resultado completamente distinto As fronteiras foram repartidas entre os que já eram poderosos em termos políticos e os detentores de riqueza e dos contatos certos multiplicando ainda mais seu poderio Díaz também se dedicou ao desmantelamento de vários legados institucionais dos tempos da colônia que estorvavam o comércio internacional vislumbrando aí novas possibilidades de enriquecimento para si mesmo e seus partidários Seu modelo contudo continuou não sendo o tipo de desenvolvimento econômico que se via ao norte do Rio Grandeh mas aquele de Cortés Pizarro e Toledo no qual a elite fazia fortunas incalculáveis enquanto o resto da população permanecia à margem Quando a elite investia a economia apresentava um pequeno crescimento fadado no entanto a ser decepcionante além de sobrevir sempre em detrimento daqueles desprovidos de direitos nessa nova ordem Foi o caso por exemplo do povo yaqui de Sonora sertão de Nogales entre 1900 e 1910 possivelmente 30 mil yaquis foram deportados em essência escravizados e enviados para trabalhar nos latifúndios de agave de Iucatã As fibras do agave constituíam um importante item de exportação dada sua utilidade na confecção de cordas e barbante A persistência século XX adentro de um padrão institucional específico incompatível com o crescimento no México e América Latina é bem ilustrada pelo fato de que como no século XIX tal padrão continuou gerando estagnação econômica e instabilidade política golpes e guerras civis à medida que os grupos digladiavam pelos benefícios do poder Díaz finalmente perdeu o poder para forças revolucionárias em 1910 À Revolução Mexicana seguiramse outras na Bolívia em 1952 Cuba em 1959 e Nicarágua em 1979 Nesse ínterim Colômbia El Salvador Guatemala e Peru foram assolados por conflitos civis contínuos A expropriação de ativos ou ameaça de expropriação prosseguia em ritmo acelerado com reformas agrárias em massa ou tentativas de reforma na Bolívia Brasil Chile Colômbia Guatemala Peru e Venezuela Revoluções desapropriações e instabilidade política acompanhavam governos militares e ditaduras dos mais diversos tipos Embora se verificasse também uma muito gradual implementação de poderes políticos mais amplos só na década de 1990 a maioria dos países latinoamericanos tornouse uma democracia e mesmo então continuaram atolados em instabilidade Tamanha instabilidade era acompanhada de homicídios e repressão em massa O Relatório da Comissão Nacional para a Verdade e a Reconciliação no Chile de 1991 concluiu que 2279 pessoas foram assassinadas por motivos políticos durante a ditadura Pinochet entre 1973 e 1990 Possivelmente 50 mil foram presas e torturadas e centenas de milhares perderam o emprego O Relatório da Comissão Guatemalteca para Esclarecimento Histórico de 1999 identificou pelo nome um total de 42275 vítimas embora haja quem afirme que chegam a 200 mil os assassinados na Guatemala entre 1962 e 1996 70 mil só durante o regime do General Efrain Ríos Montt capaz de perpetrar tais crimes com tamanho grau de impunidade que ele pôde disputar a presidência em 2003 felizmente não venceu A Comissão Nacional sobre o Desaparecimento de Pessoas na Argentina estabeleceu em nove mil os mortos no país pelos militares entre 1976 e 1983 com a ressalva de que o número talvez seja maior estimativas de organizações de direitos humanos costumam situálo em torno de 30 mil GANHANDO UM BILHÃOZINHO OU DOIS As duradouras implicações da organização da sociedade colonial e dos legados institucionais dessas sociedades são determinantes para as atuais diferenças entre Estados Unidos e México e por conseguinte as duas metades de Nogales O contraste entre o modo como Bill Gates e Carlos Slim vieram a ser os dois homens mais ricos do mundo estando Warren Buffett também na disputa ilustra bem as forças em jogo A ascensão de Gates e da Microsoft é bem conhecida mas o fato de Gates ser a pessoa mais rica do mundo e fundador de uma das empresas mais inovadoras em termos tecnológicos não impediu o Departamento de Justiça norteamericano de mover ações civis contra a Microsoft Corporation em 8 de maio de 1998 acusandoa de abuso de monopólio O que estava particularmente em questão era o modo como a Microsoft havia embutido o Internet Explorer seu navegador para a Web no Windows seu sistema operacional O governo americano estava há algum tempo de olho em Gates e já em 1991 a Federal Trade Commission Comissão Federal de Comércio havia aberto um inquérito para averiguar se a Microsoft estava incorrendo em abuso de monopólio com relação aos sistemas operacionais para PCs Em novembro de 2001 a Microsoft chegou a um acordo com o Departamento de Justiça e teve suas asas cortadas ainda que as penalidades ficassem aquém do que muitos esperavam No México o enriquecimento de Carlos Slim não se deu por meio da inovação A princípio destacouse na composição de acordos no mercado de capitais e na compra e renovação de empresas que não davam lucro Sua maior jogada foi a aquisição da Telmex monopólio mexicano de telecomunicações privatizado pelo Presidente Carlos Salinas em 1990 O governo anunciou sua intenção de vender 51 das ações com direito a voto 204 do patrimônio total da empresa em setembro de 1989 e recebeu as ofertas em novembro de 1990 Embora Slim não tenha feito a oferta mais alta um consórcio liderado por seu Grupo Corso venceu o leilão Em vez de efetuar o pagamento à vista Slim conseguiu postergálo usando os próprios dividendos da Telmex para pagar pela compra O que fora outrora monopólio público tornouse monopólio de Slim e de alta rentabilidade As instituições econômicas que tornaram Carlos Slim quem ele é são muito diferentes daquelas existentes nos Estados Unidos Se você for um mexicano empreendedor as barreiras que encontrará a cada estágio de sua carreira vão desempenhar um importante papel em sua trajetória Entre elas se encontram licenças caras que será preciso obter burocracias que será preciso superar políticos e encarregados que atravessarão o seu caminho e a dificuldade de obter financiamento de um setor financeiro que não raro estará mancomunado com os encarregados que você tentará dobrar Tais barreiras serão ou instransponíveis mantendoo fora das áreas rentáveis ou suas maiores aliadas mantendo seus concorrentes à margem A diferença entre as duas situações é evidentemente quem você conhece e quem consegue influenciar e quem você pode subornar Carlos Slim um homem de talento e ambição de origem relativamente modesta entre imigrantes libaneses é um mestre na obtenção de contratos exclusivos conseguiu monopolizar o lucrativo mercado das telecomunicações no México para em seguida estender seu alcance ao restante da América Latina Houve desafios ao monopólio de Slim com a Telmex mas sem êxito Em 1996 a Avantel operadora de telefonia de longa distância solicitou à Comissão de Concorrência Mexicana que averiguasse se a Telmex desfrutava de uma posição dominante no mercado de telecomunicações Em 1997 a comissão declarou que a empresa detinha substancial poder de monopólio com relação à telefonia local ligações nacionais de longa distância e ligações internacionais de longa distância entre outros fatores Mesmo assim todas as tentativas das autoridades reguladoras do país de limitar tais monopólios foram inúteis Um dos motivos é que Slim e a Telmex podem valerse do que se conhece como recurso de amparo literalmente apelo por proteção um dispositivo para que determinada lei não se aplique a determinado caso individual A ideia do amparo remonta à Constituição mexicana de 1857 tendo sido originalmente concebido como garantia de direitos e liberdades individuais Nas mãos da Telmex e outros monopólios mexicanos porém tornouse um formidável instrumento para consolidar seu poder Em vez de resguardar os direitos da população o amparo constitui um subterfúgio para esquivarse da igualdade perante a lei Slim amealhou sua fortuna na economia mexicana em grande parte graças às suas conexões políticas Sua incursão nos Estados Unidos foi um fracasso Em 1999 seu Grupo Corso adquiriu a CompUSA rede de varejo de computadores que na época havia concedido uma franquia a uma empresa chamada COC Services para vender seus produtos no México Slim imediatamente violou esse contrato com a intenção de estabelecer sua própria rede de lojas sem a concorrência da COC Esta porém entrou com um processo contra a CompUSA em um tribunal de Dallas Como não há amparos em Dallas Slim perdeu e teve de pagar uma multa no valor de US454 milhões O advogado da COC Mark Werner observaria depois que a lição dada por esse veredicto é que nesta economia global as empresas terão de respeitar as regras dos Estados Unidos se quiserem instalarse aqui Sob as instituições americanas as táticas habituais de Slim para ganhar dinheiro não deram certo RUMO A UMA TEORIA DA DESIGUALDADE MUNDIAL Vivemos em um mundo desigual As diferenças entre as nações são análogas àquelas que separam as duas metades de Nogales ainda que em escala maior Nos países ricos a população é mais saudável tem expectativa de vida mais alta e acesso muito maior à educação Dispõe também de uma variedade de recursos e opções na vida de férias a possibilidades de carreira com o que nos países pobres podese apenas sonhar Os habitantes dos países ricos dirigem em estradas sem crateras e desfrutam de vasos sanitários eletricidade e água corrente em suas casas Em geral contam também com governos que não os prendem nem assediam de maneira arbitrária pelo contrário prestam serviços como educação saúde rodovias lei e ordem Igualmente notável é o fato de que os cidadãos votam nas eleições e têm alguma voz nos rumos políticos tomados por sua pátria As grandes diferenças em termos de desigualdade mundial são evidentes para todos mesmo aqueles nos países pobres a quem falta acesso à televisão ou à internet É a percepção e a realidade dessas discrepâncias que leva as pessoas a cruzarem ilegalmente o Rio Grande ou o Mar Mediterrâneo em busca da possibilidade de experimentar as oportunidades e padrões de vida dos países ricos Tal desigualdade não tem consequências apenas para a vida dos indivíduos nos países pobres causa também queixas e ressentimentos com imensas consequências políticas para os Estados Unidos e outros países Compreender as razões por que tais diferenças existem e o que as causa é nosso objetivo neste livro Chegar a esse entendimento não constitui um fim em si mas é também um primeiro passo no sentido da geração de ideias mais eficazes acerca de como melhorar a vida de bilhões que ainda vivem na pobreza As disparidades entre os dois lados da cerca em Nogales são apenas a ponta do iceberg Como é regra no norte do México que se beneficia do comércio com os Estados Unidos ainda que nem todo ele seja legal os residentes de Nogales são mais abastados que outros mexicanos cuja renda familiar anual média gira em torno de US5 mil Essa maior prosperidade relativa de Nogales Sonora devese aos parques industriais de fábricas maquiladorasi o primeiro dos quais foi fundado por Richard Campbell Jr fabricante de cestas californiano Sua primeira locatária foi a CoinArt fabricante de instrumentos musicais que pertencia a Richard Bosse proprietário da Artley uma fábrica de flautas e saxofones em Nogales Arizona A CoinArt foi seguida pela Memorex cabeamento de computadores Avent vestuário hospitalar Grant óculos de sol Chamberlain fabricante de abridores de portas de garagem para a Sears e Samsonite maletas Significativamente são todas empresas com sede nos Estados Unidos e de proprietários americanos usando capital e knowhow americanos A maior riqueza de Nogales Sonora em relação ao resto do México portanto vem de fora As diferenças entre os Estados Unidos e o México por sua vez são pequenas se comparadas àquelas encontradas no resto do planeta O cidadão americano médio é 7 vezes mais rico que o mexicano médio e 10 vezes mais que o peruano ou centro americano cerca de 20 vezes mais rico que o morador médio da África subsaariana e quase 40 vezes mais que os habitantes dos países africanos mais pobres como Mali Etiópia e Serra Leoa e não são só os Estados Unidos Há um pequeno mas crescente grupo de países ricos situados em sua maioria na Europa e América do Norte mas composto também por Austrália Japão Nova Zelândia Cingapura Coreia do Sul e Taiwan cujos cidadãos levam uma vida muito diferente daquela da população do resto do planeta O motivo por que Nogales Arizona é muito mais rica que Nogales Sonora é simples tratase do fruto de instituições completamente distintas de um lado e de outro da fronteira que geram incentivos muito diferentes para os habitantes de cada metade da cidade Os Estados Unidos também são muito mais ricos hoje do que o México ou o Peru graças ao modo como suas instituições tanto econômicas quanto políticas geram incentivos para empresas indivíduos e políticos Cada sociedade funciona com um conjunto de regras econômicas e políticas criadas e aplicadas pelo Estado e pelos cidadãos em conjunto As instituições econômicas dão forma aos incentivos econômicos incentivos para buscar mais educação para poupar e investir para inovar e adotar novas tecnologias e assim por diante É o processo político que determina a que instituições econômicas as pessoas viverão submetidas e são as instituições políticas que ditam como funciona esse processo Por exemplo são as instituições políticas de uma nação que estabelecem a capacidade dos cidadãos de controlar os políticos e influenciar seu comportamento o que por sua vez define se os políticos serão agentes dos cidadãos ainda que imperfeitos ou se terão a possibilidade de abusar do poder que lhes foi confiado ou que usurparam para fazer fortuna e agir em benefício próprio em detrimento dos cidadãos As instituições políticas incluem Constituições escritas mas não se limitam a elas e o fato de a sociedade ser uma democracia Compreendem o poder e a capacidade do Estado de regular e governar a sociedade É igualmente necessário considerar de forma mais ampla os fatores que determinam como o poder político se distribui na sociedade sobretudo a capacidade de diferentes grupos de agir coletivamente em busca de seus objetivos ou impedir outros de atingirem os seus À medida que influenciam comportamentos e incentivos na vida real as instituições forjam o sucesso ou fracasso dos países O talento individual é importante em todos os níveis da sociedade mas mesmo ele requer um arcabouço institucional para converter se em força positiva Bill Gates como outras figuras lendárias da indústria de tecnologia da informação como Paul Allen Steve Ballmer Steve Jobs Larry Page Sergey Brin e Jeff Bezos era dotado de imenso talento e ambição mas em última instância respondeu a incentivos O sistema educacional americano possibilitou que Gates e outros como ele adquirissem um conjunto único de competências que vieram complementar seus talentos As instituições econômicas dos Estados Unidos permitiram que esses homens fundassem empresas com facilidade sem para isso enfrentar obstáculos intransponíveis essas mesmas instituições viabilizaram o financiamento de seus projetos O mercado de trabalho americano lhes permitiu contratar pessoal qualificado e o ambiente de mercado relativamente competitivo possibilitou que expandissem suas empresas e comercializassem seus produtos Esses empreendedores tinham a convicção desde o começo de que os projetos dos seus sonhos tinham condições de ser implementados confiavam nas instituições e no estado de direito por elas engendrado e nada tinham a temer em relação à segurança de seus direitos de propriedade Por fim as instituições políticas lhes asseguravam estabilidade e continuidade De um lado garantiam que não havia risco de um ditador assumir o poder e mudar as regras do jogo desapropriandoos de sua riqueza aprisionandoos ou ameaçando sua vida e meios de subsistência Asseguravam também que nenhum interesse particular presente na sociedade seria capaz de abduzir o governo e impelilo em alguma direção desastrosa em termos econômicos já que o poder político era ao mesmo tempo limitado e distribuído de maneira suficientemente ampla para possibilitar o surgimento de uma série de instituições econômicas geradoras de incentivos para a prosperidade Este livro pretende mostrar que por mais vitais que sejam as instituições econômicas para determinar o grau de pobreza ou riqueza de dado país a política e as instituições políticas é que ditam que instituições econômicas o país terá Em última instância as boas instituições econômicas dos Estados Unidos são fruto das instituições políticas que emergiram gradualmente após 1619 Nossa teoria da desigualdade mundial mostra como interagem as instituições políticas e econômicas causando pobreza ou prosperidade e como cada parte do mundo acabou desenvolvendo seu próprio conjunto de instituições Nossa breve revisão da história das Américas limitou se a dar uma pincelada das forças que moldam as instituições políticas e econômicas Cada padrão institucional hoje se encontra profundamente enraizado no passado porque uma vez que a sociedade se organiza de determinado modo este tende a persistir Mostraremos que esse fato se deve ao modo como as instituições políticas e econômicas interagem Tal persistência e as forças que a criam explicam também por que é tão difícil extirpar a desigualdade do mundo e enriquecer os países pobres Embora as instituições sejam a chave para as diferenças entre as duas Nogales bem como entre México e Estados Unidos isso não quer dizer que haverá qualquer consenso no México no sentido de modificar suas instituições Não é necessário que uma sociedade desenvolva ou adote as instituições que são melhores para o crescimento econômico ou o bemestar de seus cidadãos porque outras instituições podem ser ainda melhores para aqueles que detêm o controle da política e das instituições políticas Os poderosos e o restante da sociedade com frequência vão divergir quanto a quais instituições devem permanecer e quais devem ser modificadas Carlos Slim não gostaria nem um pouco de ver o desaparecimento de suas conexões políticas nem a dissolução das barreiras que protegem seus negócios por mais que o surgimento de novas empresas significasse o enriquecimento de milhões de mexicanos Por não haver tal consenso as regras que acabam regendo cada sociedade são definidas pela política quem detém o poder e como esse poder pode ser exercido Carlos Slim tem o poder de conseguir o que quer O poder de Bill Gates é muito mais limitado É por isso que nossa teoria trata não só de economia mas também de política Trata dos efeitos das instituições sobre o sucesso e o fracasso das nações e portanto da economia da pobreza e da prosperidade trata também de como as instituições são determinadas e transformamse ao longo do tempo e como acabam tornandose incapazes de mudar quando criam pobreza e miséria para milhões e portanto da política da pobreza e da prosperidade N 2 TEORIAS QUE NÃO FUNCIONAM AS CIRCUNSTÂNCIAS ATUAIS OSSO LIVRO se concentra na explicação não só das desigualdades mundiais mas também de alguns dos padrões gerais mais prontamente visíveis que nela encontram morada O primeiro país a experimentar crescimento econômico sustentado foi a Inglaterra ou Grã Bretanha como é conhecida a união de Inglaterra País de Gales e Escócia desde 1707 O crescimento despontou gradualmente na segunda metade do século XVIII à medida que a Revolução Industrial baseada em grandes inovações tecnológicas e sua aplicação na indústria ia se estabelecendo À industrialização da Inglaterra logo se seguiria a da maior parte da Europa Ocidental e Estados Unidos A prosperidade inglesa não tardou a espalharse também pelas colônias de povoamento britânicas Canadá Austrália e Nova Zelândia Uma lista dos 30 países mais ricos hoje inclui estes que citamos mais Japão Cingapura e Coreia do Sul A prosperidade dos três últimos é por sua vez parte de um padrão mais amplo conforme o qual diversas nações do Leste Asiático inclusive Taiwan e posteriormente a China experimentaram acelerado crescimento em tempos recentes O segmento inferior da distribuição da renda mundial apresenta um quadro tão agudo e peculiar quanto o superior Se ao contrário fizermos uma lista dos 30 países mais pobres do mundo atual constataremos que quase todos se encontram na África subsaariana A estes se juntam países como Afeganistão Haiti e Nepal que mesmo não se situando na África têm um elemento crítico em comum com as nações africanas como vamos explicar Se voltássemos 50 anos no tempo os 30 países mais ricos e mais pobres não seriam muito diferentes Cingapura e Coreia do Sul não figurariam entre os mais ricos e haveria vários outros entre os 30 mais pobres mas a situação geral que se apresentaria seria notavelmente consistente com o que vemos nos dias atuais Voltando 100 anos ou 150 encontraríamos praticamente os mesmos países nos mesmos grupos O Mapa 3 mostra a situação em 2008 Os países em cor mais escura são os mais pobres do mundo aqueles cuja renda per capita chamada pelos economistas de PIB Produto Interno Bruto é inferior a US2 mil anuais A maioria da África aparece dessa cor assim como Afeganistão Haiti e partes do Sudeste Asiático como Camboja e Laos A Coreia do Norte também se encontra nesse grupo de países Aqueles em branco são os mais ricos com renda per capita anual de US20 mil ou mais Aqui encontramos os suspeitos de sempre América do Norte Europa Ocidental Australásia e Japão Mapa 3 Prosperidade no mundo em 2008 Outro padrão interessante pode ser detectado nas Américas Se arrolarmos os países americanos em ordem decrescente de riqueza dos mais prósperos para os mais pobres veremos que no topo estão Estados Unidos e Canadá seguidos do Chile Argentina Brasil México e Uruguai e talvez também a Venezuela dependendo do preço do petróleo em seguida temos Colômbia República Dominicana Equador e Peru No final há outro grupo separado bem mais pobre composto por Bolívia Guatemala e Paraguai Se recuarmos 50 anos no tempo encontraremos a mesma classificação Cem anos a mesma coisa E novamente se voltarmos 150 anos Portanto não são só Estados Unidos e Canadá que são mais ricos que a América Latina há também uma separação definida e persistente entre países ricos e pobres dentre os latinoamericanos Um último padrão interessante pode ser encontrado no Oriente Médio onde encontramos nações ricas em petróleo como Arábia Saudita e Kuwait cujos níveis de renda são próximos àqueles dos 30 mais ricos Caso o preço do petróleo caia porém eles despencarão para o estrato inferior Países do Oriente Médio com pouco ou nenhum petróleo como Egito Jordânia e Síria aglomeramse em torno de um nível de renda próximo ao da Guatemala ou Peru Sem suas reservas petrolíferas as nações do Oriente Médio são tão pobres quanto as da América Central e dos Andes ainda que não tanto quanto as da África subsaariana Apesar da grande persistência dos padrões de prosperidade que observamos hoje ao nosso redor contudo eles não são cristalizados nem imutáveis Em primeiro lugar como já enfatizamos grande parte da atual desigualdade mundial remonta ao final do século XVIII tendo nascido no rastro da Revolução Industrial As lacunas entre os diferentes níveis de riqueza não só eram menores até meados do século XVIII mas a ordenação que desde então tem se mostrado tão estável não se manterá caso recuemos mais longe no tempo Nas Américas por exemplo a classificação que se manteve nos últimos 150 anos era completamente outra 500 anos atrás Em segundo lugar diversas nações experimentaram décadas seguidas de crescimento acelerado como boa parte do Leste Asiático da Segunda Guerra Mundial para cá e mais recentemente a China E não poucas delas viram posteriormente tal tendência se inverter A Argentina por exemplo cresceu rapidamente por cinco décadas até 1920 chegando a se tornar um dos países mais ricos do mundo mas desde então iniciou um longo declínio A União Soviética constitui um exemplo ainda mais notável tendo apresentado crescimento acentuado entre 1930 e 1970 mas experimentando depois um súbito colapso O que explica essas diferenças significativas de grau de pobreza e prosperidade e entre padrões de crescimento Por que os países da Europa Ocidental e seus rebentos coloniais povoados com colonos europeus começaram a crescer no século XIX sem olhar para trás O que explica a persistência do ranking da desigualdade nas Américas O que impede a África subsaariana e o Oriente Médio de apresentarem o mesmo crescimento econômico ocorrido na Europa Ocidental enquanto tão grande parte do Leste Asiático vem ostentando níveis de crescimento estratosféricos Podese pensar que o fato de a desigualdade mundial ser tão acentuada com consequências tão graves e padrões tão nítidos e evidentes implique que haja para ela alguma explicação que goze de ampla aceitação Não é o caso A maioria das hipóteses propostas pelos cientistas sociais para as origens da pobreza e da prosperidade não funciona e revelase incapaz de explicar de maneira convincente as atuais circunstâncias A HIPÓTESE GEOGRÁFICA Uma teoria muito aceita sobre as causas da desigualdade mundial é a hipótese geográfica segundo a qual o abismo que separa países ricos e pobres é gerado por diferenças geográficas Muitos países pobres como os da África da América Central e do Sul da Ásia localizamse entre os trópicos de Câncer e de Capricórnio As nações ricas em contrapartida tendem a situarse nas latitudes temperadas Essa concentração geográfica da pobreza e da riqueza confere um apelo superficial à hipótese geográfica ponto de partida das teorias e opiniões de não poucos cientistas sociais e sumidades em geral o que não a torna menos equivocada Já no final do século XVIII o grande filósofo político francês Montesquieu assinalava a concentração geográfica da prosperidade e da pobreza e propunhase a explicála A seu ver os habitantes dos climas tropicais tendiam a ser preguiçosos e pouco inquisitivos Por conseguinte não trabalhavam com empenho suficiente nem eram inovadores motivos pelos quais eram pobres Montesquieu especulava também que as pessoas preguiçosas tendiam a ser governadas por déspotas sugerindo que a localização nos trópicos justificaria não só a pobreza mas também parte dos fenômenos políticos associados ao fracasso econômico como regimes ditatoriais A teoria de que os países quentes são intrinsecamente pobres embora recentemente desmentida pelo acelerado avanço econômico de países como Cingapura Malásia e Botsuana ainda é objeto de ardorosa defesa por parte de alguns como o economista Jeffrey Sachs A moderna versão dessa tese salienta não os efeitos diretos do clima sobre a dedicação ao trabalho ou os processos mentais mas dois outros argumentos primeiro o de que as doenças tropicais sobretudo a malária têm consequências muito adversas para a saúde e por conseguinte para a produtividade e segundo o de que os solos tropicais não permitem uma agricultura produtiva A conclusão entretanto é a mesma os climas temperados possuem uma vantagem relativa sobre as regiões tropicais e subtropicais As desigualdades mundiais todavia não podem ser explicadas pelo clima ou doenças nem qualquer outra versão da hipótese geográfica Basta lembrarmos de Nogales O que separa as duas metades da cidade não são as condições de clima geografia nem de saúde mas a fronteira MéxicoEstados Unidos Se a hipótese geográfica não dá conta de explicar as diferenças entre o Norte e o Sul de Nogales ou as Coreias do Norte e do Sul ou entre as Alemanhas Ocidental e Oriental antes da queda do Muro de Berlim poderia ter ainda alguma utilidade para explicar as diferenças entre as Américas do Norte e do Sul Entre Europa e África Não A história demonstra a inexistência de ligações simples ou duradouras entre clima ou geografia e êxito econômico Por exemplo não é verdade que os trópicos tenham sido sempre mais pobres que as latitudes temperadas Como vimos no capítulo anterior na época da conquista das Américas por Colombo a faixa ao sul do Trópico de Câncer e ao norte do de Capricórnio que hoje compreendem México América Central Peru e Bolívia continha as grandes civilizações asteca e inca impérios politicamente centralizados e complexos que construíram estradas e prestavam auxílio contra a fome Os astecas dispunham tanto de moeda quanto de escrita e os incas embora lhes faltassem essas duas tecnologias fundamentais registravam vasta quantidade de informação em cordões cheios de nós chamados quipos Em agudo contraste nessa mesma época as áreas ao norte e ao sul daquela habitada por esses dois povos onde hoje se encontram Estados Unidos Canadá Argentina e Chile eram habitadas basicamente por civilizações na Idade da Pedra desprovidas de tais tecnologias Os trópicos nas Américas eram portanto muito mais ricos que as zonas temperadas o que indica que o fato óbvio da pobreza tropical não é nem óbvio e muito menos um fato Pelo contrário a maior riqueza dos Estados Unidos e Canadá hoje representa uma acentuada inversão da fortuna em relação ao cenário vigente por ocasião da chegada dos europeus Tal inversão claramente nada teve a ver com a geografia mas como já vimos com o modo como se deu a colonização dessas áreas um processo que não se restringiu às Américas Os povos do Sul da Ásia sobretudo no subcontinente indiano e na China eram mais prósperos do que os de muitas outras partes da Ásia e certamente mais que as populações da Austrália e Nova Zelândia Também esse quadro se inverteu à medida que Coreia do Sul Cingapura e Japão despontaram como nações mais ricas da Ásia e Austrália e Nova Zelândia ultrapassaram quase todo o continente asiático em termos de prosperidade Mesmo no âmbito da África subsaariana verificouse uma inversão similar Em tempos mais recentes antes de começar o intenso contato europeu com os africanos o sul da África era a área de menor densidade populacional e a que estava mais longe de apresentar Estados estruturados que exercessem algum tipo de controle sobre seus territórios Não obstante a África do Sul é hoje uma das mais prósperas nações da África subsaariana Voltando atrás na história novamente vemos muita prosperidade nos trópicos algumas das grandes civilizações prémodernas como Angkor no moderno Camboja Vijayanagara no sul da Índia e Aksum na Etiópia floresceram nos trópicos do mesmo modo como as civilizações do Vale do Indo de Mohenjo Daro e Harapa no atual Paquistão Diante das evidências históricas portanto restamnos poucas dúvidas de que não existe correlação simples entre localização tropical e sucesso econômico As doenças tropicais evidentemente são causa de profundo sofrimento e elevadas taxas de mortalidade infantil na África mas não constituem a razão da pobreza africana O adoecimento é em grande parte consequência da pobreza e da falta de capacidade ou vontade dos governos para tomar as medidas de saúde pública necessárias à sua erradicação A Inglaterra no século XIX também era um lugar bastante insalubre mas o governo efetuou investimentos graduais no abastecimento de água limpa no devido tratamento de esgotos e efluentes e por fim em serviços de saúde eficazes A melhoria das condições de saúde e o aumento da expectativa de vida decerto não foram as causas do êxito econômico britânico mas um dos frutos de suas transformações políticas e econômicas prévias O mesmo vale para Nogales Arizona A outra parte da hipótese geográfica diz que os trópicos devem sua pobreza à intrínseca improdutividade da agricultura tropical Os solos tropicais são finos e incapazes de reter nutrientes segundo esse argumento que enfatiza a rapidez com que eles são erodidos pelas chuvas torrenciais A ideia não deixa de ter seu mérito sem dúvida mas como mostraremos o principal determinante da baixíssima produtividade agrícola expressa em produção agrícola por acre em tantos países pobres sobretudo na África subsaariana pouco tem a ver com a qualidade do solo Pelo contrário é consequência da estrutura de propriedade da terra e dos incentivos criados para os fazendeiros pelos governos e instituições sob os quais vivem Vamos demonstrar também que a desigualdade mundial não pode ser explicada por diferenças na produtividade agrícola As profundas disparidades do mundo moderno nascidas no século XIX foram causadas pela disseminação desigual das tecnologias industriais e da produção manufatureira não por diferenças no desempenho agrícola Outra versão influente da hipótese geográfica é defendida pelo ecologista e biólogo evolutivo Jared Diamond para quem a origem das desigualdades intercontinentais nos primórdios da era moderna há 500 anos jazem na falta de uniformidade na distribuição histórica de espécies vegetais e animais que posteriormente influenciaria a produtividade agrícola Em alguns lugares como o Crescente Fértil no atual Oriente Médio havia grande número de espécies passíveis de domesticação pelos seres humanos Em outros como as Américas não O grande número de espécies domesticáveis tornou interessante para as sociedades fazer a transição de um estilo de vida de caça e coleta para outro agrário Por conseguinte a agricultura desenvolveuse antes no Crescente Fértil que nas Américas A densidade demográfica aumentou possibilitando a especialização da mão de obra o comércio a urbanização e o desenvolvimento político Fundamentalmente nos lugares em que a agricultura se tornou dominante as novações tecnológicas ocorreram com mais rapidez do que em outras partes do mundo Assim de acordo com Diamond as discrepâncias na disponibilidade de espécies animais e vegetais acarretaram graus variados de exploração agrícola o que por sua vez conduziu a caminhos distintos de transformação tecnológica e prosperidade em cada continente Embora a tese de Diamond constitua uma abordagem respeitável ao problema sobre o qual ele se debruça não pode ser estendida à explicação da desigualdade no mundo moderno Por exemplo Diamond defende que os espanhóis conseguiram dominar as civilizações das Américas graças à maior antiguidade de sua tradição agrícola e consequente superioridade tecnológica Agora porém precisamos explicar por que os mexicanos e peruanos que habitam as antigas terras dos astecas e incas são pobres Por mais que o acesso a trigo cevada e cavalos tornasse os espanhóis mais ricos que os incas a disparidade de renda entre os dois povos não era tão significativa A renda média de um espanhol correspondia provavelmente a menos que o dobro da de um cidadão do Império Inca A tese de Diamond sugere que uma vez que os incas viramse expostos a todas as espécies e tecnologias delas resultantes que não haviam sido capazes de desenvolver por conta própria deveriam ter atingido rapidamente o padrão de vida dos espanhóis Todavia não foi em absoluto o que aconteceu Pelo contrário nos séculos XIX e XX abriuse uma lacuna muito maior entre as rendas de espanhóis e peruanos Hoje o espanhol médio é mais de seis vezes mais rico do que o peruano médio um abismo intimamente relacionado à heterogeneidade na disseminação das modernas tecnologias industriais mas que pouco tem a ver tanto com o potencial para a domesticação de plantas e animais quanto com as diferenças intrínsecas de produtividade agrícola entre os dois países Enquanto a Espanha ainda que com atraso adotou as tecnologias do motor a vapor ferrovias eletricidade mecanização e produção manufatureira o Peru não ou no máximo o fez de modo muito lento e imperfeito Tal lacuna tecnológica persiste ainda hoje e reproduzse em maior escala à medida que as novas tecnologias sobretudo aquelas relacionadas à tecnologia da informação alimentam mais crescimento em muitas nações desenvolvidas e outras em acelerado desenvolvimento A tese de Diamond não nos diz por que essas tecnologias cruciais não se difundem e uniformizam a renda ao redor do mundo como tampouco explica por que a metade norte de Nogales é tão mais rica que sua gêmea ao sul da cerca muito embora ambas fizessem parte da mesma civilização 500 anos atrás A história de Nogales põe em evidência outro grave problema da adaptação da teoria de Diamond como já vimos fossem quais fossem os pontos fracos dos impérios inca e asteca em 1532 Peru e México eram sem dúvida mais prósperos do que aquelas regiões das Américas que viriam a ser os Estados Unidos e o Canadá A América do Norte tornouse mais rica justamente por haver adotado com entusiasmo as tecnologias e avanços da Revolução Industrial O nível educacional da população aumentou e as ferrovias se espalharam pelas grandes pradarias em agudo contraste com o que transcorreu na América do Sul Isso não pode ser justificado apontandose as distintas características geográficas das Américas do Norte e do Sul as quais digase de passagem concederiam vantagem à América do Sul As desigualdades no mundo moderno são em grande parte fruto da falta de homogeneidade na disseminação e adoção de tecnologias e a tese de Diamond de fato inclui dois argumentos importantes a esse respeito Por exemplo ele defende seguindo o historiador William McNeill que a orientação lesteoeste da Eurásia possibilitou que produtos agrícolas animais e inovações se difundissem do Crescente Fértil para a Europa Ocidental ao passo que a orientação nortesul das Américas justifica que os sistemas de escrita criados no México não se disseminassem pelos Andes ou pela América do Norte Não obstante a orientação dos continentes não constitui explicação para as desigualdades mundiais existentes hoje Consideremos a África Embora o Deserto do Saara constituísse de fato uma barreira significativa à penetração de bens e ideias do norte na África subsaariana não chegava a ser um obstáculo intransponível Os portugueses seguidos de outros europeus circumnavegaram a costa e eliminaram as diferenças de conhecimento num período em que as diferenças de renda eram ínfimas comparadas à situação atual De lá para cá a África não só não alcançou a Europa como pelo contrário a lacuna entre a renda da maioria dos países africanos e a dos europeus apenas se aprofundou Deve estar claro também que a argumentação de Diamond centrada na desigualdade intercontinental não é bem equipada para explicar as variações dentro dos continentes um aspecto essencial da moderna desigualdade mundial Por exemplo por mais que a orientação da massa de terra eurasiática possa explicar como a Inglaterra logrou beneficiarse das inovações do Oriente Médio sem precisar reinventá las não explica por que a Revolução Industrial se deu na Inglaterra em vez de digamos na Moldávia Ademais como o próprio Diamond destaca China e Índia tiraram imenso proveito tanto da rica diversidade da fauna e da flora quanto da orientação da Eurásia Ainda assim a maior parte da população pobre do mundo hoje encontrase nesses dois países De fato a melhor maneira de entender o escopo da tese de Diamond é em termos de suas próprias variáveis O Mapa 4 apresenta dados sobre a distribuição de javalis Sus scrofa ancestrais do porco moderno e de auroques antecessores dos bois atuais Ambos tinham ampla distribuição por toda a Eurásia e mesmo o Norte da África O Mapa 5 mostra a distribuição de alguns dos ancestrais selvagens dos produtos agrícolas domesticados de hoje como o Oryza sativa antecessor do arroz cultivado asiático e os ancestrais do trigo e cevada modernos A ilustração demonstra que o ancestral selvagem do arroz estava amplamente distribuído por todo o sul e sudeste da Ásia ao passo que os antecessores do trigo e da cevada distribuíamse ao longo de um comprido arco que ia do Levante e passava pelo Irã e Afeganistão até os istões Turcomenistão Tadjiquistão e Quirguistão Essas espécies ancestrais encontramse presentes em grande parte da Eurásia mas sua ampla distribuição sugere que não há como justificar as desigualdades nesse continente com uma teoria baseada na incidência das espécies A hipótese geográfica não só é inútil na explicação das origens da prosperidade no decorrer da história além de basicamente incorreta em sua ênfase mas também incapaz de justificar as circunstâncias com que começamos este capítulo Seria possível argumentar que qualquer padrão persistente como a hierarquia de rendas nas Américas ou as acentuadas e duradouras diferenças entre Europa e Oriente Médio Dis tr ibuição de bovinos sel va ge ns Dis tr ibuição de suínos selv ag en s Fr onteir as mode rn as Mapa 4 Distribuição histórica de suínos e bovinos selvagens podem ser explicadas pela inalterabilidade da geografia Todavia não é esse o caso Já vimos que é altamente improvável que os padrões no contexto das Américas tenham sido causados por fatores geográficos Antes de 1492 eram as civilizações no vale central do México América Central e Andes que dispunham de tecnologia e padrões de vida superiores aos da América do Norte ou lugares como Argentina e Chile E embora a geografia tenha permanecido a mesma as instituições impostas pelos colonos europeus provocaram uma inversão da fortuna Dificilmente a geografia também explicaria a pobreza do Oriente Médio por motivos similares Afinal o Oriente Médio liderou o mundo na revolução neolítica e as primeiras cidades desenvolveramse onde atualmente fica o Iraque O ferro foi fundido pela primeira vez na Turquia e até a Idade Média o Oriente Médio era dinâmico em termos tecnológicos Não foi a geografia do Oriente Médio que levou a revolução neolítica a florescer naquela parte do mundo como veremos no Capítulo 5 assim como tampouco foi a geografia que tornou o Oriente Médio pobre Pelo contrário a expansão e a consolidação do Império Otomano o legado institucional desse império é que mantêm a região imersa em pobreza ainda hoje Mapa 5 Distribuição histórica de arroz trigo e cevada selvagens Por fim os fatores geográficos são inúteis para explicar não só as diferenças que vemos entre as diversas partes do mundo hoje mas também por que muitas nações como Japão ou China atravessam longos períodos de estagnação para depois encetar um processo de crescimento acelerado Precisamos de outra teoria melhor A HIPÓTESE CULTURAL A segunda teoria que goza de ampla aceitação a hipótese cultural correlaciona prosperidade e cultura A hipótese cultural do mesmo modo que a geográfica é de linhagem distinta remontando no mínimo ao grande sociólogo alemão Max Weber que defendia que a Reforma Protestante e a ética protestante dela decorrente desempenharam papel central na facilitação da ascensão da moderna sociedade industrial na Europa Ocidental A hipótese cultural já não se baseia exclusivamente na religião mas enfatiza igualmente outros tipos de crenças valores e éticas Por mais que não seja politicamente correto dizêlo em público ainda há quem mantenha e não são poucos que os africanos são pobres por serem desprovidos de uma boa ética de trabalho insistindo em acreditar em feitiçaria e magia ou resistindo às novas tecnologias ocidentais Muitos acreditam também que a América Latina jamais enriquecerá devido ao caráter intrinsecamente libertino e carente de seu povo que além disso sofre do mal da cultura ibérica a tendência a deixar tudo para mañana amanhã Evidentemente muitos já acreditaram que a cultura chinesa e o confucionismo fossem incompatíveis com o crescimento econômico muito embora a importância da ética de trabalho chinesa como motor do crescimento na China Hong Kong e Cingapura seja agora alardeada Será que a hipótese cultural é útil para compreender a desigualdade mundial Sim e não Sim no sentido de que as normas sociais que são relacionadas à cultura exercem profunda influência e podem ser difíceis de mudar além de por vezes darem sustentação às diferenças institucionais que segundo este livro são o que explica as desigualdades mundiais Em sua maior parte porém não à medida que os aspectos culturais que se costuma enfatizar religião ética nacional valores africanos ou latinos não têm importância para entendermos como chegamos até aqui e por que as desigualdades do mundo persistem Outros aspectos como até que ponto as pessoas confiam umas nas outras ou são capazes de colaborar são importantes mas constituem basicamente um resultado das instituições não causas independentes Voltemos a Nogales Como já observamos diversos aspectos culturais são idênticos de um lado e de outro da cerca Não obstante detectamse certas diferenças marcantes de práticas normas e valores ainda que elas sejam não causas mas consequências da divergência entre os rumos do desenvolvimento dos dois lugares Por exemplo nas pesquisas os mexicanos normalmente dizem confiar em outras pessoas menos do que os cidadãos dos Estados Unidos declaram confiar nos outros Contudo a falta de confiança dos mexicanos não surpreende tendose em vista que seu governo mostrase incapaz de eliminar os cartéis de drogas ou assegurar um sistema jurídico imparcial O mesmo vale para as Coreias do Norte e do Sul como discutiremos no próximo capítulo O Sul é um dos países mais ricos do mundo ao passo que o Norte enfrenta fomes periódicas e uma pobreza abjeta Embora hoje a cultura dos dois países seja muito distinta ela não fez a menor diferença nos destinos econômicos divergentes dessas duas meiasnações A península coreana tem um longo período de história comum Até a Guerra da Coreia e a divisão no paralelo 38 apresentava uma homogeneidade sem precedentes em termos de idioma etnicidade e cultura Como em Nogales o importante é a fronteira Ao norte fica um regime diferente que impõe instituições singulares e cria outros incentivos Eventuais divergências culturais encontradas nas terras ao sul e ao norte da fronteira que corta Nogales ou a Coreia em duas é pois consequência e não causa das diferenças nos níveis de prosperidade E a África e a cultura africana Historicamente a África subsaariana sempre foi mais pobre do que a maior parte do resto do mundo e suas civilizações antigas chegaram a desenvolver a roda a escrita exceto por Etiópia e Somália e o arado Embora tais tecnologias não tivessem utilização mais ampla até o advento da colonização formal europeia no final do século XIX e início do XX as sociedades africanas tomaram conhecimento de sua existência muito antes Os europeus começaram a circumnavegar sua costa ocidental no final do século XV e embarcações asiáticas chegavam à África Oriental já muito antes disso Podemos compreender por que essas tecnologias não foram adotadas com base na história do Reino do Congo na foz do Rio Congo que deu seu nome à moderna República Democrática do Congo O Mapa 6 mostra a localização do Congo em relação a outro importante Estado centroafricano o Reino Bacaba que discutiremos mais à frente neste livro O Congo entabulou intensas relações com os portugueses após ser visitado pela primeira vez pelo navegador Diogo Cão em 1483 Na época o Congo era um reino altamente centralizado pelos padrões africanos cuja capital Mbanza contava com uma população de 60 mil habitantes o que a tornava mais ou menos do mesmo tamanho da capital portuguesa Lisboa e maior do que Londres com sua população de cerca de 50 mil habitantes em 1500 O rei do Congo Nzinga a Nkuwu converteuse ao catolicismo e mudou de nome para João I Mais tarde o nome de Mbanza seria mudado para São Salvador Graças aos portugueses os congolenses aprenderam sobre a roda e o arado cuja adoção foi mesmo incentivada por missões agrícolas lusitanas em 1491 e 1512 Contudo todas essas iniciativas fracassaram Não obstante os congolenses estavam longe de ser avessos às modernas tecnologias em geral foram muito rápidos por exemplo em adotar outra venerável inovação ocidental a pólvora Usaram essa nova e poderosa ferramenta para responder a incentivos de mercado a captura e exportação de escravos Não há nenhum indício de que a cultura ou os valores africanos de alguma maneira concorressem para impedir a adoção de novas tecnologias e práticas À medida que se estreitavam seus laços com os europeus os congolenses adotariam outras práticas ocidentais a escrita estilos de indumentária e arquitetura habitacional No século XIX não poucas sociedades africanas tiraram proveito também das crescentes oportunidades econômicas engendradas pela Revolução Industrial mudando seus padrões de produção Na África Ocidental verificouse rápido crescimento econômico com base na exportação de óleo de palma e amendoim em todo o sul do continente os africanos desenvolveram produtos a serem exportados para as áreas industriais e de mineração em acelerada expansão no Randj na África do Sul Contudo esses promissores experimentos econômicos foram obliterados não pela cultura africana nem pela incapacidade dos africanos comuns de tomar iniciativas em prol de seus próprios interesses mas pelo colonialismo europeu em primeiro lugar e mais tarde pelos governos africanos pósindependência A verdadeira razão por que os congolenses não adotaram uma tecnologia superior foi o simples fato de que lhes faltaram incentivos para tanto Enfrentavam elevado risco de expropriação e tributação de sua produção pelo monarca todopoderoso houvesse ele se convertido ao catolicismo ou não Com efeito a insegurança imperava não só no que dizia respeito à propriedade mas a continuidade de sua própria existência encontravase sempre por um fio Muitos eram capturados e vendidos como escravos condições que dificilmente serviriam de estímulo para investimentos que aumentassem a produtividade em longo prazo Tampouco o rei dispunha de incentivos para adotar o arado em larga escala ou para fazer do aumento da produtividade agrícola sua maior prioridade a exportação de escravos era muito mais rentável Gbadolit e Fr onteir as mode rna s Re inos históricos Rio Ca ss ai Rio Cong o Ni gé ri a Ca marõ es Re públic a Ce ntro A frican a Gu iné Eq uatori al São To mé e Pr íncipe Ga bã o Cong o Br az za vi ll e Re ino do Cong o Re ino Bacuba Lele Bu shon g Kins ha sa Mapa 6 Reino do Congo Reino Bacuba Bushong e Lele Talvez se possa afirmar que hoje os africanos confiam menos uns nos outros que outros povos de outras partes do mundo o que seria contudo fruto de uma longa história de instituições que solaparam os direitos humanos e de propriedade na África A possibilidade de serem capturados e vendidos como escravos sem dúvida exerceu alguma influência sobre o grau de confiança dos africanos entre si ao longo do tempo E a ética protestante de Max Weber Embora seja verdade que países predominantemente protestantes como Holanda e Inglaterra foram os primeiros grandes sucessos econômicos da Era Moderna há pouca ligação entre religião e prosperidade econômica A França país predominantemente católico rapidamente reproduziu o desempenho econômico dos holandeses e ingleses no século XIX e a Itália é tão próspera quanto qualquer desses países hoje Olhando mais para o Oriente veremos que nenhum dos sucessos econômicos do Leste Asiático guarda qualquer relação com a religião cristã de modo que tampouco aí a tese de uma conexão especial entre o protestantismo e o êxito econômico encontra grande respaldo Voltemonos para uma das regiões favoritas dos entusiastas da hipótese cultural o Oriente Médio onde os países são preponderantemente islâmicos e os que não produzem petróleo são muito pobres como já notamos Os produtores de petróleo são mais ricos mas esse golpe de sorte pouco contribuiu para a instalação de economias modernas e diversificadas na Arábia Saudita ou Kuwait Esses fatos não constituem uma demonstração cabal da influência da religião Por mais plausível que seja esse argumento também não está correto Sim países como Síria e Egito são pobres e suas populações são basicamente muçulmanas Contudo apresentam outras peculiaridades bem mais significativas para efeitos de prosperidade Em primeiro lugar todos foram províncias do Império Otomano o que afetou intensa e adversamente o modo como se desenvolveram Após o colapso do domínio otomano o Oriente Médio foi absorvido pelos impérios coloniais inglês e francês que continuaram tolhendo suas possibilidades Após a independência a exemplo de boa parte do antigo mundo colonial desenvolveram regimes políticos hierárquicos e autoritários de que faziam parte poucas das instituições políticas e econômicas que como mostraremos são cruciais para a geração de prosperidade econômica Essa trajetória de desenvolvimento foi moldada em grande parte pela história dos domínios otomano e europeu A relação entre religião islâmica e pobreza no Oriente Médio é basicamente espúria O papel desses acontecimentos históricos e não de fatores culturais na conformação do percurso econômico da região pode ser constatado também no fato de que aquelas partes do Oriente Médio que escaparam temporariamente ao jugo do Império Otomano e das potências europeias como o Egito entre 1805 e 1848 sob Muhammad Ali mostraramse capazes de enveredar por um caminho de acelerado crescimento Muhammad Ali usurpou o poder logo após a retirada das forças francesas que haviam ocupado o país sob o comando de Napoleão Bonaparte Aproveitandose da tibieza do controle exercido pelos otomanos sobre o território egípcio na época logrou fundar sua própria dinastia que de uma forma ou de outra governaria o país até a revolução encabeçada por Nasser em 1952 As reformas de Muhammad Ali embora tenham sido impostas por coerção promoveram o crescimento do país à medida que a burocracia estatal o Exército e o sistema de arrecadação fiscal foram modernizados gerando crescimento na agricultura e na indústria Não obstante tal processo de modernização e crescimento chegou ao fim com a morte de Ali quando o Egito voltou a cair sob influência europeia Todavia essa talvez seja uma forma errada de considerar a presença da cultura na equação Talvez os fatores culturais mais importantes não estejam ligados à religião mas a culturas nacionais específicas Quem sabe a influência da cultura inglesa não seja importante e explique a prosperidade de países como Estados Unidos Canadá e Austrália Por mais sedutora que essa ideia possa parecer à primeira vista também não funciona Sim Canadá e Estados Unidos foram colônias britânicas mas Serra Leoa e Nigéria também As variações de prosperidade entre as excolônias inglesas é tão grande quanto entre os demais países do mundo O legado britânico não é a causa do enriquecimento da América do Norte Entretanto há ainda outra versão da hipótese cultural talvez a questão não seja ingleses versus não ingleses mas europeus versus não europeus Será que os europeus são de algum modo superiores em virtude de sua ética do trabalho perspectiva de vida valores judaicocristãos ou legado romano É verdade que a Europa Ocidental e a América do Norte cuja população é primordialmente de ascendência europeia são as regiões mais ricas do mundo Talvez o legado europeu e sua superioridade cultural sejam as razões da prosperidade e o derradeiro refúgio da hipótese cultural Infelizmente essa versão da hipótese oferece tão pouca capacidade de explicação quanto as demais Argentina e Uruguai apresentam descendentes de europeus em proporções maiores de sua população total que o Canadá e os Estados Unidos mas o desempenho econômico tanto de uma quanto do outro deixa muito a desejar Japão e Cingapura nunca tiveram mais que uma gota de descendentes de europeus entre seus habitantes mas são tão abastados quanto muitas áreas da Europa Ocidental A China apesar de umas tantas imperfeições em seu sistema econômico e político tem sido o país de crescimento mais rápido nas três ultimas décadas Sua pobreza até a morte de Mao TséTung nada tinha a ver com a cultura chinesa mas com o modo desastroso como Mao organizou a economia e conduziu a política Na década de 1950 ele promoveu o Grande Salto Adiante drástica política de industrialização que acarretou fome em massa Nos anos 1960 propagou a Revolução Cultural que levou à perseguição maciça de intelectuais e eruditos qualquer um cuja fidelidade ao partido pudesse ser posta em dúvida o que mais uma vez provocou enorme desperdício dos talentos e recursos da sociedade Da mesma forma o atual crescimento chinês nada tem a ver com os valores ou mudanças na cultura local é fruto de um processo de transformação econômica deflagrado pelas reformas implementadas por Deng Xiaoping e seus aliados que após a morte de Mao TséTung foram pouco a pouco abandonando as instituições e políticas econômicas socialistas primeiro na agricultura depois na indústria Como no caso de sua correlata geográfica a hipótese cultural tampouco tem serventia para explicar outros aspectos do atual estado de coisas Há evidentemente diferentes crenças valores e atitudes culturais entre Estados Unidos e América Latina porém assim como as que separam Nogales Arizona e Nogales Sonora ou as Coreias do Sul e do Norte tais disparidades são consequências das diferentes instituições e histórias institucionais distintas dos dois lugares Fatores culturais que enfatizem o modo como a cultura hispânica ou latina moldou o Império Espanhol não dão conta das divergências no seio da própria América Latina por exemplo por que Argentina e Chile são mais ricos que Peru e Bolívia Outros tipos de argumentos culturais por exemplo os que salientam a cultura indígena contemporânea saemse igualmente mal Argentina e Chile tinham população nativa relativamente pequena se comparada ao Peru e Bolívia Embora seja verdade a cultura indígena como explicação também não funciona Colômbia Equador e Peru têm níveis de renda similares mas a Colômbia hoje apresenta muito poucos indígenas ao contrário do Equador e Peru Por fim as atitudes culturais em geral de modificação tão lenta dificilmente responderão por si pelos milagres do crescimento no Leste Asiático e China Por mais persistentes que sejam as instituições em determinadas circunstâncias podem transformarse rapidamente como veremos A HIPÓTESE DA IGNORÂNCIA A última teoria popular para explicar por que certos países são pobres e outros ricos é a hipótese da ignorância segundo a qual a desigualdade existe no mundo porque nós ou nossos governantes não sabemos o que fazer para tornar ricos os países pobres É uma ideia defendida por não poucos economistas inspirados pela célebre definição proposta pelo economista inglês Lionel Robbins em 1935 segundo a qual a economia é uma ciência que estuda o comportamento humano como uma relação entre os fins e meios escassos que têm usos alternativos Ficamos assim a um passo da conclusão de que a ciência econômica deveria enfocar o melhor uso de meios escassos para satisfazer os fins sociais Com efeito o mais famoso resultado teórico em economia o chamado Primeiro Teorema do Bem Estar Social identifica as circunstâncias em que a alocação de recursos em uma economia de mercado tornase do ponto de vista econômico desejável socialmente A economia de mercado não passa de uma abstração para descrever aquela situação em que todos os indivíduos e empresas têm liberdade de produzir comprar e vender os produtos ou serviços que bem entenderem Se essas circunstâncias não estiverem presentes dizse que há falha do mercado Tais falhas constituem a base de uma teoria da desigualdade no mundo uma vez que quanto mais elas seguirem sem solução mais pobre o país provavelmente será A hipótese da ignorância sustenta que os países pobres devem sua pobreza ao excesso de falhas de mercado e ao fato de que seus economistas e autoridades ignoram como livrarse delas tendo dado ouvidos aos conselhos errados no passado Já os países ricos são ricos por terem concebido políticas melhores e conseguido eliminar tais falhas Seria a hipótese da ignorância capaz de explicar as desigualdades no mundo Será possível que os países africanos são mais pobres do que o resto do planeta porque seus líderes tendem a partir das mesmas premissas equivocadas acerca do governo de seus países levando ao quadro de pobreza ao passo que os líderes da Europa Ocidental são mais bem informados ou orientados o que explicaria seu relativo êxito Embora haja alguns exemplos famosos de líderes que adotaram políticas desastrosas por terem se enganado a respeito de suas consequências a ignorância pode na melhor das hipóteses explicar no máximo uma pequena parte das desigualdades mundiais Aparentemente o declínio econômico contínuo que se instaurou em Gana após sua independência da Inglaterra foi causado por ignorância O economista britânico Tony Killick então atuando como consultor do governo de Kwame Nkrumah registrou em detalhes uma série de dificuldades As políticas de Nkrumah foram centradas no desenvolvimento da indústria estatal o que se mostrou muito ineficiente Killick recorda A fábrica de calçados pelo transporte de couro teria ligado a fábrica de carne no norte através de uma distância de mais de 800 quilômetros a um curtume no sul atualmente abandonado o couro seria então levado de volta para a fábrica de calçados em Kumasi na área central do país a cerca de 320 quilômetros do curtume Uma vez que o principal mercado consumidor fica na região metropolitana de Acra os sapatos teriam de voltar para o sul sendo transportados por mais 320 quilômetros Killick de certo modo dá a entender que tal empreendimento teve sua viabilidade solapada pela má localização de seus componentes A fábrica de calçados foi apenas um entre muitos projetos similares entre eles a fábrica de manga enlatada situada em uma região de Gana onde não havia plantações da fruta e cuja produção seria superior à demanda mundial do produto em sua totalidade Essa interminável sucessão de empreitadas economicamente irracionais não pode ter sido causada por falta de informação ou ignorância de Nkrumah ou seus consultores com relação às políticas econômicas mais acertadas Afinal eles contavam com pessoas como Killick e até Sir Arthur Lewis vencedor do Prêmio Nobel que estavam mais que cientes de que tais opções não dariam bons resultados Contudo o que determinou o formato assumido pelas políticas econômicas do país foi a necessidade de Nkrumah de utilizálas para obter apoio político e assim dar sustentação ao seu regime totalitário Nem o decepcionante desempenho de Gana após a independência nem os inumeráveis outros casos de aparente desvario econômico podem ser atribuídos à ignorância Afinal se fosse ela o problema líderes bemintencionados logo compreenderiam que alternativas seriam capazes de promover o aumento da renda e do bemestar de seus cidadãos e naturalmente as adotariam Consideremos as trajetórias divergentes de Estados Unidos e México Responsabilizar a ignorância dos governantes dos dois países por tais disparidades é para dizer o mínimo altamente implausível Não foram diferenças de conhecimento ou intenção entre John Smith e Cortés que causaram o afastamento entre os dois países ainda no período colonial assim como não foram diferenças de conhecimento entre seus presidentes posteriores como os americanos Teddy Roosevelt ou Woodrow Wilson e o mexicano Porfirio Díaz que levaram o México a optar entre o fim do século XIX e o começo do XX por instituições econômicas que assegurariam o enriquecimento das elites em detrimento do resto da sociedade enquanto Roosevelt e Wilson tomavam o caminho oposto Pelo contrário foram as distintas delimitações institucionais encontradas pelos presidentes e elites dos respectivos países Analogamente os governantes africanos que se deixaram debilitar ao longo dos últimos 50 anos pela fragilidade do direito à propriedade e das instituições econômicas acarretando o empobrecimento da maior parte de seus povos não permitiram que isso se desse por acreditarem que estavam fazendo boa economia mas porque podiam fazêlo impunemente e enriquecer à custa dos demais ou por acharem que seria uma boa política que os manteria no poder mediante a compra do apoio de grupos ou elites cruciais A experiência do primeiroministro de Gana em 1971 Kofi Busia ilustra o quanto a hipótese da ignorância pode ser ilusória Busia enfrentava uma perigosa crise econômica Tendo ascendido ao poder em 1969 como o seu antecessor Nkrumah adotou políticas econômicas insustentáveis e impôs vários mecanismos de controle de preços por meio de organizações comerciais e da sobrevalorização cambial Embora Busia tivesse feito oposição a Nkrumah e conduzisse um regime democrático deparou se com muitas das mesmas restrições políticas Como havia acontecido com Nkrumah suas políticas econômicas foram adotadas não em virtude de sua ignorância e crença de que estava pondo em prática uma boa economia ou uma maneira ideal de promover o desenvolvimento de seu país Tais opções foram feitas por serem boa política que permitiria a Busia transferir recursos para grupos politicamente poderosos nas áreas urbanas por exemplo que precisavam ser mantidos satisfeitos Os controles de preços esmagaram a agricultura proporcionando alimentos baratos para os grupos urbanos e gerando receita para financiar os gastos do governo Todavia esses controles eram insustentáveis Gana logo sofreria de uma série de crises no balanço de pagamentos e escassez de moeda estrangeira Diante de tamanhos dilemas em 27 de dezembro de 1971 Busia assinou um acordo com o Fundo Monetário Internacional que incluía a desvalorização em massa da moeda do país O FMI o Banco Mundial e toda a comunidade internacional pressionavam Busia para implementar as reformas previstas no acordo Embora as instituições internacionais ignorassem alegremente o fato Busia estava plenamente ciente das implicações daquela aposta política A consequência imediata da desvalorização da moeda foi uma série de levantes e tumultos em Acra capital de Gana que sofreu escalada vertiginosa até Busia ser derrubado pelos militares encabeçados pelo TenenteCoronel Acheampong que imediatamente tratou de reverter a desvalorização A hipótese da ignorância distinguese das hipóteses geográfica e cultural à medida que implica uma pronta sugestão sobre como solucionar o problema da pobreza se foi a ignorância que nos trouxe até aqui basta contar com autoridades e governantes esclarecidos e bem informados para sair deste lugar e assim implementar a prosperidade em todo o mundo mediante a divulgação das orientações corretas e o convencimento dos políticos acerca do que seria uma economia de qualidade No entanto a experiência de Busia sublinha o fato de que o principal obstáculo à adoção de políticas capazes de reduzir as falhas do mercado e estimular o crescimento econômico não é a ignorância das autoridades mas os incentivos e restrições que lhes são impostos pelas instituições políticas e econômicas em suas sociedades Ainda que a hipótese da ignorância reine soberana entre a maior parte dos economistas e nos altos círculos do Ocidente que excluindo praticamente qualquer outra possibilidade concentramse na implementação mecânica da prosperidade é só mais uma hipótese que não dá certo Não explica a origem da prosperidade no mundo nem as circunstâncias em que estamos imersos por exemplo por que determinados países como México e Peru mas não Estados Unidos ou Inglaterra adotaram instituições e políticas que levariam ao empobrecimento da maioria dos seus cidadãos ou por que quase toda a África subsaariana e a maior parte da América Central são tão mais pobres do que a Europa Ocidental ou o Leste Asiático Quando os países rompem com os padrões institucionais que os mantinham condenados à pobreza e conseguem enveredar por um caminho de crescimento econômico não é porque seus líderes ignorantes de repente se tornaram mais bem informados ou menos egocêntricos ou porque passaram a ser orientados por economistas melhores A China por exemplo é um dos países que substituíram as políticas econômicas conducentes à pobreza e à fome de milhões por outras de estímulo ao crescimento econômico Entretanto como discutiremos adiante em maior profundidade isso não se deu porque o Partido Comunista chinês finalmente compreendeu que a propriedade coletiva das terras agrícolas e da indústria constituíam péssimos incentivos econômicos Assim Deng Xiaoping e seus aliados que não eram menos egocêntricos que seus adversários mas tinham outros interesses e objetivos políticos derrotaram seus poderosos oponentes no Partido Comunista e planejaram uma espécie de revolução política mudando radicalmente a liderança e a direção do partido Suas reformas econômicas que criaram incentivos de mercado à agricultura e posteriormente à indústria foram consequências dessa transformação política Foi a política que determinou a passagem do comunismo para os incentivos de mercado na China não orientações melhores ou um melhor entendimento do funcionamento da economia DEFENDEMOS QUE para compreender as desigualdades do mundo é preciso entender por que algumas sociedades são organizadas de maneiras muito ineficazes e socialmente indesejáveis Os países às vezes conseguem adotar instituições eficientes e alcançar a prosperidade mas infelizmente são casos raros A maioria dos economistas e autoridades concentrase em acertar quando o que é de fato necessário é uma explicação de onde os países pobres estão errando E erram basicamente não por uma questão de ignorância ou cultura Como pretendemos mostrar os países pobres são pobres porque os detentores do poder fazem escolhas que geram pobreza Erram não por equívoco ou ignorância mas de propósito Para entender melhor o leitor terá de ir além da economia e das orientações dos especialistas acerca do melhor a fazer e em vez disso estudar como as decisões são efetivamente tomadas quem são seus autores e por que eles decidem fazer o que fazem Estamos no campo da política e dos processos políticos A economia tradicionalmente ignora a política mas compreendêla é crucial para explicar as desigualdades do mundo Como observou o economista Abba Lerner na década de 1970 a economia conquistou o título de Rainha das Ciências Sociais ao escolher como domínio problemas políticos já resolvidos Defendemos que a conquista da prosperidade depende da resolução de certos problemas políticos básicos É exatamente por partir do pressuposto de que os problemas políticos já foram solucionados que a economia tornase incapaz de apresentar uma explicação convincente das desigualdades mundiais Para explicálas a economia ainda terá de compreender como os diferentes tipos de políticas e acordos sociais afetam os incentivos e comportamentos econômicos Mas para tanto precisará também da política N 3 A CRIAÇÃO DA PROSPERIDADE E DA POBREZA A ECONOMIA DO PARALELO 38 O VERÃO DE 1945 quando a Segunda Guerra Mundial se aproximava do fim a colônia japonesa na Coreia começou a entrar em colapso Um mês depois da rendição incondicional do Japão em 15 de agosto a Coreia foi dividida em duas esferas de influência usando o paralelo 38 como referência O sul seria administrado pelos Estados Unidos e o norte pela Rússia A paz desconfortável da Guerra Fria seria quebrada em junho de 1950 quando o exército nortecoreano invadiu o sul Embora a princípio os nortecoreanos tenham realizado amplas incursões chegando a capturar a capital Seul no outono já estavam em plena retirada Foi nessa época que Hwang PyŏngWŏn e seu irmão foram separados Hwang PyŏngWŏn conseguiu se esconder e escapar à abdução pelo exército nortecoreano permaneceu no sul onde conseguiu trabalho como farmacêutico Seu irmão um médico que cuidava em Seul dos soldados feridos do exército sulcoreano foi levado para o norte durante o recuo dos norte coreanos Separados em 1950 voltariam a encontrarse em Seul no ano 2000 pela primeira vez em 50 anos depois de os dois governos terem finalmente concordado em iniciar um programa restrito de reunificação familiar Como médico o irmão de Hwang PyŏngWŏn tinha acabado empregado na Aeronáutica boa colocação em uma ditadura militar Contudo mesmo os privilegiados na Coreia do Norte não se saem muito bem Quando os irmãos se encontraram Hwang PyŏngWŏn perguntou como era a vida ao norte do paralelo 38 Ele tinha um carro mas seu irmão não Você tem telefone perguntou ao irmão Não replicou o outro Minha filha que trabalha no Ministério do Exterior tem mas quem não sabe o código não tem como ligar Como Hwang PyŏngWŏn sabia que todos os habitantes do norte que participavam da reunião pediam dinheiro ofereceu algum ao irmão este porém recusou Se eu voltar com dinheiro o governo vai tirálo de mim Melhor você ficar com ele Hwang PyŏngWŏn notou que o casaco do irmão estava puído Tire esse casaco e troque comigo sugeriu Não posso fazer isso O governo me emprestou esse para que eu viesse aqui Hwang PyŏngWŏn comentaria depois que seu irmão parecia inquieto e nervoso como se alguém estivesse ouvindo Era mais pobre do que Hwang PyŏngWŏn havia imaginado Disse que vivia bem mas para Hwang PyŏngWŏn seu aspecto pareceu péssimo e ele estava magro como um caniço A população da Coreia do Sul tem um padrão de vida similar ao de Portugal e Espanha No norte na chamada República Democrática Popular da Coreia ou Coreia do Norte o padrão de vida é equivalente ao dos países subsaarianos ou cerca de um décimo do padrão de vida médio da Coreia do Sul A saúde dos nortecoreanos encontrase em estado ainda pior o nortecoreano médio tem expectativa de vida 10 anos menor do que seus vizinhos ao sul do paralelo 38 O Mapa 7 ilustra de maneira drástica o abismo econômico que separa as duas Coreias apresentando dados sobre a intensidade luminosa à noite captada por imagens de satélite A Coreia do Norte encontrase quase completamente no escuro devido à falta de eletricidade já a do Sul mostrase fulgurante Tão notórias diferenças não são antigas Com efeito não existiam até o final da Segunda Guerra Mundial De 1945 para cá entretanto os diferentes governos do Norte e do Sul adotaram maneiras muito distintas de organização econômica A Coreia do Sul foi governada e teve suas instituições políticas moldadas pelo ferrenho anticomunista Syngman Rhee oriundo de Harvard e Princeton e que contava com significativo apoio dos Estados Unidos Rhee foi eleito presidente em 1948 Forjada em meio à Guerra da Coreia e contra a ameaça de contaminação comunista a Coreia do Sul estava longe de ser uma democracia Tanto Rhee quanto seu sucessor igualmente célebre o General Park ChungHee garantiram seus lugares na história como presidentes autoritários Não obstante ambos geriram uma economia de mercado em que havia reconhecimento da propriedade privada e após 1961 Park usou com eficácia o peso do Estado para impulsionar o rápido crescimento econômico canalizando crédito e subsídios para as empresas mais bemsucedidas A situação ao norte do paralelo 38 era muito diferente Kim IlSung líder dos guerrilheiros comunistas da resistência durante a Segunda Guerra Mundial já estava estabelecido como ditador em 1947 e com auxílio soviético introduziu um modelo rígido de economia planificada parte do chamado sistema juche A propriedade privada foi declarada ilegal os mercados foram banidos As liberdades foram cerceadas não só no mercado mas em todas as esferas da vida dos nortecoreanos exceto no caso dos membros da pequeníssima elite governante que gravitava em torno de Kim IlSung e mais tarde seu filho e sucessor Kim JongIl Não deveria ser surpresa que a sorte econômica das Coreias do Norte e do Sul tenham sido tão distintas A economia totalitária de Kim IlSung e o sistema juche logo se revelaram desastrosos Não há estatísticas detalhadas sobre a Coreia do Norte onde tudo tem caráter de segredo de Estado para dizer o mínimo Não obstante os dados disponíveis confirmam o que sabemos pelas fomes recorrentes a produção industrial do país não só não conseguiu decolar como a Coreia do Norte de fato experimentou um colapso na produtividade agrícola A inexistência de propriedade privada fez com que poucos tivessem incentivos para investir ou exercer qualquer esforço para aumentar ou mesmo manter a produtividade O regime repressivo e sufocante opunhase a toda e qualquer inovação e adoção de novas tecnologias Todavia Kim IlSung Kim JongIl e seus comparsas não tinham a menor intenção de reformar o sistema introduzir qualquer forma de propriedade mercados ou contratos privados nem de modificar as instituições econômicas e políticas A Coreia do Norte continua imersa em estagnação econômica Mapa 7 Luzes na Coreia do Sul e trevas na Coreia do Norte Nesse ínterim no sul as instituições econômicas estimulavam investimentos e comércio Os políticos sulcoreanos investiram em educação atingindo altos índices de alfabetização e escolaridade As empresas do país não demoraram a tirar proveito da população relativamente bem qualificada das políticas de incentivo aos investimentos e industrialização às exportações e à transferência de tecnologia Assim a Coreia do Sul logo se tornou um dos casos de milagre econômico do Leste Asiático um dos países de crescimento econômico mais acelerado do mundo No final da década de 1990 em cerca de apenas meio século o crescimento da Coreia do Sul e a estagnação da Coreia do Norte haviam levado a primeira a uma situação 10 vezes melhor que a segunda dá para imaginar a diferença que alguns séculos fariam O desastre econômico da Coreia do Norte que resultou na fome de milhões quando comparado ao êxito econômico da Coreia do Sul é impressionante nem a cultura nem a geografia nem a ignorância podem explicar a divergência entre os caminhos tomados pelas duas vizinhas Será preciso buscar uma resposta no âmbito institucional INSTITUIÇÕES ECONÔMICAS EXTRATIVISTAS E INCLUSIVAS Os países apresentam diferenças em termos de êxito econômico em virtude de instituições distintas das regras que regem o funcionamento da economia e dos incentivos que motivam a população Imaginemos os adolescentes norte e sulcoreanos e seus sonhos para o futuro Os do norte crescem em meio à pobreza desprovidos de iniciativa empreendedora criatividade ou educação adequada que os prepare para o trabalho qualificado Boa parte da educação que recebem na escola não passa de propaganda visando a reforçar a legitimidade do regime há poucos livros e os computadores são ainda mais escassos Terminada a escola todos têm de passar 10 anos no Exército Essa garotada sabe que não terá direito a propriedade privada não poderá abrir um negócio nem terá qualquer possibilidade de enriquecer ainda que muitos para ganhar a vida dediquemse ilegalmente a atividades econômicas privadas Eles sabem também que não terão acesso legal a mercados em que possam usar suas competências ou o dinheiro que ganharem na compra dos bens necessários ou desejados Não têm certeza nem mesmo dos direitos humanos que lhes serão assegurados Os do sul por sua vez recebem boa educação e encontram incentivos que os estimulam a empenharse e destacarse na vocação escolhida A Coreia do Sul é uma economia de mercado erguida sobre a propriedade privada seus jovens sabem que caso sejam empreendedores ou profissionais bemsucedidos poderão um dia colher os frutos de seus investimentos e esforços melhorar de padrão de vida e comprar carros casas e atendimento médico de qualidade No sul o Estado apoia a atividade econômica o que torna possível aos empreendedores contrair empréstimos nos bancos e mercados financeiros às empresas estrangeiras firmar parcerias com suas congêneres sulcoreanas aos indivíduos fazer financiamentos para a aquisição da casa própria No sul em geral se é livre para abrir qualquer negócio que se queira No norte não No sul podese contratar trabalhadores vender produtos ou serviços e gastar dinheiro no mercado como bem se entender No norte o único mercado é o negro Essas regras distintas são as instituições que regem a vida de norte e sulcoreanos Instituições econômicas inclusivas como as encontradas na Coreia do Sul ou nos Estados Unidos são aquelas que possibilitam e estimulam a participação da grande massa da população em atividades econômicas que façam o melhor uso possível de seus talentos e habilidades e permitam aos indivíduos fazer as escolhas que bem entenderem Para serem inclusivas as instituições econômicas devem incluir segurança da propriedade privada sistema jurídico imparcial e uma gama de serviços públicos que proporcionem condições igualitárias para que as pessoas possam realizar intercâmbios e estabelecer contratos além de possibilitar o ingresso de novas empresas e permitir a cada um escolher sua profissão O CONTRASTE ENTRE as Coreias do Sul e do Norte bem como entre Estados Unidos e América Latina ilustra um princípio geral As instituições econômicas inclusivas fomentam a atividade econômica o aumento da produtividade e a prosperidade da economia Os direitos de propriedade são cruciais uma vez que somente quem os tiver assegurados vai se dispor a investir e aumentar a produtividade Quem acreditar que corre o risco de ter sua produção roubada expropriada ou exageradamente tributada terá pouco incentivo para trabalhar e muito menos para investir e inovar E tais direitos devem estar garantidos para a maior parte da sociedade Em 1680 o governo britânico fez o recenseamento da população de sua colônia de Barbados nas Índias Ocidentais O censo revelou que do total de cerca de 60 mil habitantes da ilha quase 39 mil eram escravos africanos que por sua vez pertenciam ao terço remanescente da população Com efeito eram propriedades dos 175 maiores latifundiários da canadeaçúcar donos também da maior parte das terras Esses grandes proprietários rurais contavam com direitos assegurados sobre suas terras e mesmo seus escravos Se um deles quisesse vender escravos a outro não só teria condições de fazêlo como poderia contar com os tribunais para avalizar a transação ou qualquer outro contrato por ele redigido Por quê Porque dos 40 juízes e juízes de paz da ilha 29 eram latifundiários Ademais os oito militares de patente mais alta eram também grandes proprietários de terras Assim apesar dos contratos e direitos de propriedade bem definidos seguros e garantidos para a elite da ilha Barbados não possuía instituições econômicas inclusivas uma vez que dois terços da população eram compostos por escravos sem acesso à educação ou a oportunidades econômicas que não dispunham da possibilidade nem de incentivos para fazer uso de seus talentos ou competências Instituições econômicas inclusivas demandam direitos de propriedade assegurados e oportunidades econômicas não só para a elite mas para uma ampla parcela da sociedade O asseguramento dos serviços públicos leis direitos de propriedade e da liberdade de firmar contratos e relações de troca depende do Estado instituição detentora da capacidade coerciva de impor a ordem impedir roubos e fraudes e fazer valer contratos entre partes privadas Para ter seu bom funcionamento garantido a sociedade requer também outros serviços públicos estradas e uma rede para o transporte de bens infraestrutura pública para que a atividade econômica tenha condições de florescer algum tipo de regulamentação básica para a prevenção de fraudes e má conduta sobretudo por parte das autoridades Embora muitos dos serviços públicos possam ser prestados pelos mercados e por cidadãos particulares o grau de coordenação necessário para seu funcionamento em larga escala em geral requer a intervenção de uma autoridade central Assim o Estado apresenta vínculos inexoráveis com as instituições econômicas como impositor da lei e da ordem da propriedade privada e dos contratos e em geral como prestador fundamental de serviços públicos As instituições econômicas inclusivas precisam do Estado e dele fazem uso As instituições econômicas da Coreia do Norte e da América Latina a mita a encomienda ou o repartimiento que já descrevemos não apresentam essas características Não existe propriedade privada na Coreia do Norte Na América Latina dos tempos coloniais havia propriedade privada para os espanhóis mas com relação à propriedade dos indígenas a insegurança era total Em nenhuma dessas sociedades a vasta massa da população tinha a possibilidade de tomar as decisões econômicas que bem entendesse estava sujeita à coação generalizada Em nenhuma delas o poder do Estado era usado na prestação de serviços públicos fundamentais a fim de promover a prosperidade Na Coreia do Norte o Estado erigiu um sistema educacional cujo objetivo é inculcar propaganda mas mostrouse incapaz de impedir a fome Na América Latina colonial o Estado concentravase na submissão dos povos indígenas Em nenhuma dessas sociedades havia condições igualitárias de atuação econômica nem um sistema jurídico imparcial Na Coreia do Norte o Judiciário não passa de um braço do Partido Comunista reinante na América Latina serviu de ferramenta de discriminação contra a maior parte da população Chamamos essas instituições cujas propriedades são opostas às daquelas ditas inclusivas de instituições econômicas extrativistas por terem como finalidade a extração da renda e da riqueza de um segmento da sociedade para benefício de outro MOTORES DE PROSPERIDADE As instituições econômicas inclusivas criam mercados inclusivos que não só conferem às pessoas a liberdade de realizar em sua vida aquela vocação mais adequada aos seus talentos mas também criam condições iguais para todos capazes de lhes proporcionar oportunidade para tanto Quem tiver uma boa ideia terá a possibilidade de iniciar um negócio os trabalhadores vão tender a dirigirse às atividades em que sua produtividade seja maior as empresas menos eficientes poderão ser substituídas por outras de maior eficácia Comparese o modo como a profissão de cada um é escolhida nos mercados inclusivos do Peru e Bolívia dos tempos coloniais onde sob a mita muitos eram forçados a trabalhar nas minas de prata e mercúrio fossem quais fossem as suas competências ou aspirações Os mercados inclusivos não são meros mercados livres Barbados no século XVII também contava com mercados próprios Do mesmo modo porém como inexistiam os direitos de propriedade para quem não pertencesse à restrita elite de latifundiários seus mercados estavam longe de ser inclusivos a escravidão de fato era parte das instituições econômicas responsáveis pela coação sistemática da maioria da população e por privar as pessoas da possibilidade de escolher sua profissão e decidir como utilizar seus talentos As instituições econômicas inclusivas preparam o terreno também para dois outros motores da prosperidade tecnologia e educação O crescimento econômico sustentado é quase sempre acompanhado de melhorias tecnológicas que permitem às pessoas mão de obra à terra e ao capital existente prédios maquinário e assim por diante aumentar a sua produtividade Basta pensar em nossos tataravós há apenas um século que não tinham acesso a aviões automóveis nem à maior parte dos medicamentos e recursos médicos que hoje consideramos naturais para não falar na água encanada no ar condicionado nos shoppings no rádio ou no cinema nem na tecnologia da informação robótica ou equipamentos controlados por computadores Voltando mais algumas gerações atrás o knowhow tecnológico e os padrões de vida eram ainda mais retrógrados a ponto de ser difícil para nós conceber como as pessoas em geral sobreviviam Tais avanços são fruto da ciência e da atuação de empreendedores como Thomas Edison que aplicava os princípios científicos à criação de negócios rentáveis Esse processo de inovação é viabilizado por instituições econômicas que estimulem a propriedade privada assegurem contratos criem condições igualitárias para todos e incentivem e possibilitem o surgimento de novas empresas capazes de trazer as novas tecnologias à vida Não deveria portanto ser surpresa para ninguém o fato de ter sido a sociedade norteamericana e não o México ou o Peru que gerou Thomas Edison e que é a Coreia do Sul e não a do Norte que hoje produz empresas inovadoras em termos tecnológicos como Samsung e Hyundai Intimamente ligados à tecnologia estão a educação as habilidades as competências e o knowhow dos trabalhadores adquiridos em escolas em casa no trabalho Somos muito mais produtivos do que há um século não só graças à melhor tecnologia personificada pelas máquinas mas também ao maior conhecimento da força de trabalho Nem toda a tecnologia do mundo seria de grande utilidade sem profissionais que soubessem como operála Contudo as habilidades e competências implicam mais que a mera capacidade de fazer funcionar equipamentos são a educação e as competências da força de trabalho que geram o conhecimento científico sobre o qual se ergue o nosso progresso e que permite a adaptação e a adoção dessas tecnologias nas mais diversas linhas de negócios Embora tenhamos visto no Capítulo 1 que muitos dos inovadores da Revolução Industrial e depois como Thomas Edison não haviam recebido grande educação formal suas invenções foram muito mais simples do que a tecnologia atual A mudança tecnológica hoje requer um aprendizado tanto por parte do inovador quanto do trabalhador Aqui vemos a importância das instituições econômicas que criam uma igualdade de oportunidades Os Estados Unidos foram capazes de produzir ou atrair do exterior gente do porte de Bill Gates Steve Jobs Sergey Brin Larry Page e Jeff Bezos bem como as centenas de cientistas que fizeram descobertas fundamentais em tecnologia da informação energia nuclear biotecnologia e demais campos em que esses empreendedores construíram seus negócios Há uma profusão de talentos a aproveitar porque a maioria dos adolescentes nos Estados Unidos tem acesso a quanta educação quiser ou tenha condições de acompanhar Imaginese agora outra sociedade como a do Congo ou do Haiti por exemplo onde uma vasta parcela da população não dispõe de meios de ir à escola ou onde quando consegue ir à escola a qualidade do ensino é lamentável os professores não aparecem para dar aula e mesmo que o façam não há livros para estudar O baixo nível educacional dos países pobres é causado por instituições econômicas incapazes de gerar incentivos para que os pais eduquem seus filhos e instituições políticas incapazes de induzir o governo a construir financiar e dar suporte às escolas e aos desejos dos pais e das crianças O preço pago por esses países pela reduzida escolaridade de sua população e inexistência de mercados inclusivos é elevado tornamse incapazes de mobilizar seus talentos incipientes Contam com muitos Bill Gates em potencial e talvez um ou dois Albert Einsteins que hoje trabalham como fazendeiros pobres e sem formação escolar forçados a trabalhar com algo que não querem ou recrutados compulsoriamente para o serviço militar por não terem tido jamais a oportunidade de realizar sua vocação na vida A capacidade das instituições econômicas de explorar o potencial dos mercados inclusivos estimular a inovação tecnológica investir em pessoas e mobilizar os talentos e competências de grande número de indivíduos é fundamental para o crescimento econômico Explicar por que tantas instituições econômicas mostramse incapazes de atingir esses objetivos simples é o tema central deste livro INSTITUIÇÕES POLÍTICAS EXTRATIVISTAS E INCLUSAS Todas as instituições econômicas são criadas pela sociedade As da Coreia do Norte por exemplo foram impingidas aos cidadãos do país pelos comunistas que assumiram o poder no país na década de 1940 ao passo que as da América Latina dos tempos coloniais foram impostas pelos conquistadores espanhóis A Coreia do Sul acabou tendo instituições econômicas muito diferentes das do Norte porque foram outras pessoas com outros interesses e objetivos que tomaram as decisões acerca de como estruturar a sociedade Em outras palavras na Coreia do Sul a política foi diferente A política é o processo pelo qual uma sociedade escolhe as regras que vão governála A política permeia as instituições pelo simples motivo de que por melhores que as instituições inclusivas sejam para a prosperidade econômica de cada país para certas pessoas ou grupos como a elite do Partido Comunista da Coreia do Norte ou os latifundiários da canadeaçúcar da Barbados colonial será muito mais vantajoso estabelecer instituições extrativistas Sempre que houver conflito em torno das instituições o que acontecerá vai depender das pessoas ou grupos que vencerem o jogo político quem conseguir mais apoio obtiver mais recursos e formar mais alianças eficazes Em suma o vencedor será determinado pela distribuição de poder político na sociedade As instituições políticas de uma sociedade são determinantes cruciais do resultado do jogo São as regras que regem os incentivos políticos Definem como o governo é escolhido e que parte de sua estrutura possui o direito de fazer o quê As instituições políticas definem quem são os detentores de poder na sociedade e para que fins ele pode ser utilizado Se a distribuição de poder for estreita e irrestrita as instituições políticas serão absolutistas como ilustrado pelas monarquias absolutas que imperaram por todo o mundo durante boa parte da história Sob instituições políticas absolutistas como as da Coreia do Norte e da América Latina colonial os detentores do poder dispõem de meios para implementar instituições econômicas visando ao próprio enriquecimento e aumento de seu poder em detrimento da sociedade Em contrapartida as instituições políticas promotoras de ampla distribuição de poder na sociedade e sujeitas às suas restrições são pluralistas Em vez de ser investido em um único indivíduo ou grupo limitado o poder político é depositado nas mãos de uma coalizão ampla ou uma pluralidade de grupos Há obviamente íntima relação entre pluralismo e instituições econômicas inclusivas Entretanto a chave para entender por que a Coreia do Sul e os Estados Unidos contam com instituições econômicas inclusivas não consiste tão somente em suas instituições políticas pluralistas mas também em um Estado centralizado e poderoso o bastante Uma comparação significativa pode ser feita com a Somália país no leste da África Como veremos mais adiante neste livro o poder político na Somália goza há muito de ampla distribuição quase pluralista Com efeito não há uma autoridade real que possa controlar ou sancionar qualquer ato A sociedade dividese em clãs inimigos que não conseguem imporse uns aos outros O poder de um clã só é cerceado pelas armas de outro Uma distribuição de poder com tais características leva não a instituições inclusivas mas ao caos em sua origem encontrase a falta de uma centralização política ou estatal de qualquer ordem por parte do Estado somali bem como sua incapacidade de fazer valer a lei e a ordem mesmo em dose mínima suficiente para dar sustentação à atividade econômica comércio ou segurança básica dos cidadãos Max Weber que já encontramos no capítulo anterior forneceu a mais célebre e amplamente aceita definição de Estado identificandoo com o monopólio da violência legítima na sociedade Sem esse monopólio e o grau de centralização que ele acarreta o Estado não tem condições de desempenhar seu papel de impositor da lei e da ordem e muito menos prestar serviços públicos e incentivar e regulamentar a atividade econômica Quando o Estado mostrase incapaz de obter alguma centralização política a sociedade mais cedo ou mais tarde acaba caindo no caos como no caso da Somália Vamos nos referir a instituições políticas suficientemente centralizadas e pluralistas como instituições políticas inclusivas Em caso de falha em uma dessas condições vamos chamálas de instituições políticas extrativistas Há uma forte sinergia entre as instituições econômicas e políticas As instituições políticas extrativistas concentram poder nas mãos de uma pequena elite e impõem poucas restrições ao exercício de seu poder As instituições econômicas são então em geral estruturadas por essa elite de modo a extorquir recursos do restante da sociedade As instituições econômicas extrativistas assim naturalmente acompanham suas congêneres políticas Com efeito sua sobrevivência será inerentemente dependente de instituições políticas extrativistas As instituições políticas inclusivas tenderiam a erradicar as instituições econômicas que expropriam recursos da maioria erguem barreiras alfandegárias e suprimem o funcionamento dos mercados de modo que apenas uns poucos deles se beneficiam Em Barbados por exemplo o sistema de plantation baseado na exploração da mão de obra escrava não poderia sobreviver sem instituições políticas que suprimissem e excluíssem por completo os escravos do processo político O sistema econômico que condena milhões ao empobrecimento em benefício de uma pequena elite comunista na Coreia do Norte também seria inconcebível sem o absoluto domínio político do Partido Comunista Essa relação sinérgica entre instituições econômicas e políticas extrativistas engendra um arraigado círculo vicioso as instituições políticas conferem às elites o poder político de selecionar aquelas instituições econômicas com menos restrições ou forças contrárias Permitem também que elas estruturem as futuras instituições políticas e sua evolução As instituições econômicas extrativistas por sua vez vêm enriquecer essas mesmas elites cuja riqueza e poder econômico ajudam a consolidar seu domínio político Em Barbados ou na América Latina por exemplo os colonos lograram usar seu poder político para impor uma série de instituições econômicas que lhes garantiu fortunas imensas em detrimento do restante da população Os recursos gerados por tais instituições econômicas permitiram às elites reunir exércitos e forças de segurança para defender seu monopólio absolutista do poder político A implicação claro é que as instituições extrativistas políticas e econômicas sustentamse mutuamente e tendem a persistir Porém há mais a acrescentar acerca da sinergia entre instituições extrativistas de ambas as ordens Quando as elites existentes são desafiadas sob as instituições políticas extrativistas e surgem recémchegados estes provavelmente estarão submetidos a apenas algumas restrições Dispõem portanto de incentivos para manter as instituições políticas e fundar um conjunto similar de instituições econômicas como fizeram Porfirio Díaz e a elite reunida ao seu redor no México de fins do século XIX As instituições econômicas inclusivas por sua vez consolidamse sobre os fundamentos lançados por instituições políticas da mesma ordem que asseguram a ampla distribuição de poder por toda a sociedade e restringem seu exercício arbitrário Tais instituições políticas dificultam também a usurpação do poder e enfraquecimento dos fundamentos das instituições inclusivas por terceiros Os detentores do poder político não têm como usálo facilmente para implementar instituições econômicas extrativistas em benefício próprio Já as instituições econômicas inclusivas geram uma distribuição mais equitativa de recursos facilitando a persistência de instituições políticas inclusivas Não foi coincidência que quando a Virginia Company em 1618 concedeu terras e liberou de seus contratos draconianos os colonos que até então tentava coagir a Assembleia Geral no ano seguinte permitiu que estes começassem a se autogerir Eles não confiariam em direitos econômicos sem direitos políticos correspondentes sobretudo após os insistentes esforços da Virginia Company no sentido de coagilos A economia não teria perdurado nem alcançado qualquer estabilidade Com efeito a combinação de instituições inclusivas e extrativista raramente se sustenta Instituições econômicas extrativistas sob instituições políticas inclusivas dificilmente sobreviverão por muito tempo como indica nossa discussão sobre Barbados Analogamente instituições econômicas inclusivas não têm condições de sustentar nem de ser sustentadas por instituições políticas extrativistas ou se tornam extrativistas em favor dos interesses estritos dos detentores do poder ou a dinâmica econômica por elas gerada acaba desestabilizando as instituições políticas extrativistas abrindo caminho para a emergência de instituições políticas inclusivas Instituições econômicas inclusivas também tendem a reduzir os benefícios desfrutados pelas elites ao derrubar as instituições políticas extrativistas graças à concorrência no mercado e às restrições que as submetem aos contratos e direitos de propriedade do restante da sociedade POR QUE NÃO OPTAR SEMPRE PELA PROSPERIDADE As instituições econômicas e políticas que em última instância são sempre frutos de escolhas da sociedade podem ser inclusivas e estimular o crescimento econômico ou extrativistas e obstaculizálo Os países fracassam quando adotam instituições econômicas extrativistas sustentadas por instituições políticas extrativistas que impedem e até bloqueiam o crescimento econômico Isso significa porém que a escolha de instituições isto é a política institucional é uma peçachave em nossa busca de compreender as causas do êxito ou fracasso das nações Precisamos compreender por que a política de determinadas sociedades produz instituições inclusivas que fomentam o crescimento econômico ao passo que a política da vasta maioria das sociedades ao longo da história conduziu como conduz ainda hoje a instituições extrativistas que vêm estorvar o crescimento econômico Pode parecer óbvio que seja do interesse de todos instaurar instituições econômicas capazes de promover a prosperidade Não seria o desejo de todo cidadão político e até ditador predatório tornar seu país o mais rico possível Voltemos ao Reino do Congo sobre o qual já discutimos Embora tenha entrado em colapso no século XVII foi dele que veio o nome do país atual que conquistou sua independência do domínio colonial belga em 1960 Como Estado independente o Congo experimentou declínio econômico quase ininterrupto e pobreza crescente sob o governo de Joseph Mobutu entre 1965 e 1997 O declínio prosseguiu após Mobutu ser derrubado por Laurent Kabila Mobutu instaurou um conjunto de instituições econômicas de caráter profundamente extrativista Os cidadãos empobreceram mas Mobutu e a elite que o cercava conhecida como Les Grosses Legumes Grandes Legumes angariaram fortunas extraordinárias Mobutu mandou construir um palácio para morar em sua terra natal Gbadolite no norte do país com aeroporto grande o bastante para pousar um Concorde supersônico avião que ele costumava alugar da Air France para viajar à Europa onde adquiriu castelos e vastas parcelas da capital belga Bruxelas Não teria sido melhor para Mobutu engendrar instituições econômicas que aumentassem a riqueza dos congoleses em vez de aprofundar sua pobreza Se Mobutu tivesse conseguido aumentar a prosperidade de seu país não teria podido apropriarse de um montante ainda maior comprar um Concorde em vez de alugálo ter mais castelos e mansões talvez até um Exército maior e mais poderoso Infelizmente para os cidadãos de tantos países no mundo a resposta é não As instituições econômicas que criam incentivos para o progresso econômico podem ao mesmo tempo operar redistribuição de renda e de poder de tal modo que a situação particular de um ditador predatório e outros detentores de poder político acabe sendo pior O problema fundamental é que haverá necessariamente divergências e conflitos entre instituições econômicas Diferentes instituições têm diferentes consequências para a prosperidade de uma nação para o modo como se dá a distribuição de tal prosperidade e a quem caberá o poder O crescimento econômico que pode ser induzido pelas instituições produz tanto ganhadores quanto perdedores o que ficou claro durante a Revolução Industrial na Inglaterra que lançou as bases da prosperidade que encontramos hoje nos países ricos do mundo O processo girou em torno de uma série de mudanças tecnológicas inovadoras nos campos da energia a vapor transporte e produção têxtil Por mais que a mecanização resultasse em gigantesco aumento das rendas totais e em última instância constituísse o fundamento da moderna sociedade industrial sofreu a ferrenha oposição de muitos e não por ignorância ou miopia muito pelo contrário Com efeito a oposição ao crescimento econômico possui sua própria lógica que infelizmente tem sua coerência O crescimento econômico e a mudança tecnológica são acompanhados do que o grande economista Joseph Schumpeter chamou de destruição criativa substituem o velho pelo novo Novos setores atraem e desviam recursos dos antigos Novas empresas absorvem os negócios daquelas já estabelecidas Novas tecnologias tornam obsoletas as competências e equipamentos existentes O processo de crescimento econômico e as instituições inclusivas sobre as quais ele se baseia criam tanto perdedores quanto vencedores na arena política e no mercado econômico É o temor da destruição criativa que em geral se encontra na origem da oposição às instituições políticas e econômicas inclusivas A história europeia constitui um vívido exemplo das consequências da destruição criativa Às vésperas da Revolução Industrial no século XVIII os governos da maioria dos países europeus eram controlados por aristocracias e elites tradicionais cujas principais fontes de renda eram a propriedade da terra ou os privilégios comerciais de que usufruíam graças aos monopólios conferidos e barreiras alfandegárias impostas pelos monarcas De acordo com a ideia de destruição criativa a disseminação das indústrias fábricas e cidades retirou recursos da terra reduziu o valor dos aluguéis das propriedades e aumentou os salários que os proprietários rurais tinham de pagar aos seus funcionários Essas elites também assistiram ao surgimento de novos empresários e mercadores que erodiu seus privilégios comerciais De modo geral foram claramente eles que em termos econômicos saíram perdendo com a industrialização A urbanização e a emergência de uma classe média e operária mais consciente em termos sociais também vieram desafiar o monopólio político das aristocracias rurais de modo que a difusão da Revolução Industrial não lhes traria a derrota apenas no âmbito econômico corriam o risco também de perderem seu domínio no campo político Com seu poderio político e econômico em xeque essas elites tendiam a oferecer uma formidável oposição à industrialização A aristocracia não foi a única a perder com a industrialização Os artesãos cujas habilidades manuais foram substituídas pela mecanização opuseramse também à disseminação da indústria Muitos se organizaram contra ela realizando levantes e destruindo as máquinas que viam como responsáveis pela decadência de seu ganhapão Foi o ludismo palavra que se tornou hoje sinônima de resistência à mudança tecnológica John Kay inglês que inventou a lançadeira voadora em 1733 uma das primeiras novidades significativas na mecanização da tecelagem teve a casa incendiada por ludistas em 1753 James Hargreaves inventor da máquina de fiar hidráulica inovação igualmente revolucionária recebeu tratamento similar Na realidade os artesãos foram muito menos eficazes que as elites e proprietários rurais em sua oposição à industrialização Não possuíam o poder político isto é a capacidade de afetar resultados políticos indo de encontro aos desejos de outros grupos da aristocracia rural Na Inglaterra a industrialização prosseguiu apesar da oposição do ludismo porque a oposição da aristocracia por mais real que fosse foi amortecida Nos impérios austrohúngaro e russo onde os monarcas absolutistas e aristocratas tinham muito mais a perder a industrialização foi bloqueada Por conseguinte as economias de ambos acabaram estagnadas e eles foram deixados para trás pelas demais nações europeias onde o crescimento econômico deslanchou durante o século XIX Não obstante o sucesso e o fracasso de grupos específicos uma lição está clara grupos poderosos em geral se opõem ao progresso econômico e aos motores da prosperidade O crescimento econômico não é apenas um processo de mais e melhores máquinas e mais gente com acesso a melhor educação mas é também um processo transformador e desestabilizador associado à destruição criativa generalizada O crescimento só avança pois se não for bloqueado pelos derrotados na esfera econômica prevendo o fim de seus privilégios nessa área e na esfera política temendo a erosão de seu poder nesse campo A disputa por recursos renda e poder limitados traduzse em conflito em torno das regras do jogo das instituições econômicas que determinarão as atividades nessa esfera e quem será beneficiado por elas E em caso de conflito não há como atender simultaneamente os desejos de todas as partes envolvidas Algumas sairão derrotadas e frustradas ao passo que outras conseguirão assegurar os resultados almejados A definição dos vencedores em cada caso terá implicações fundamentais para a trajetória econômica do país Se os grupos contrários ao crescimento saírem ganhando conseguirão bloqueálo e a economia acabará paralisada A lógica que leva os poderosos a não desejar necessariamente implementar as instituições econômicas promotoras da riqueza aplicase facilmente à escolha de instituições políticas Em um regime absolutista algumas elites podem exercer seu poder no sentido de impor as instituições econômicas de sua preferência Teriam interesse em mudar as instituições políticas a fim de tornálas mais pluralistas Em geral não visto que essa opção apenas diluiria seu poder político dificultando ou mesmo impossibilitandoas de estruturar as instituições econômicas de modo a favorecer ainda mais seus próprios interesses Mais uma vez vemos uma fonte imediata de conflito As pessoas que sofrem sob instituições econômicas extrativistas não podem esperar de seus governantes absolutistas que voluntariamente transformem as instituições políticas e procedam à redistribuição do poder na sociedade A única maneira de mudálas será forçar a elite a criar instituições mais pluralistas Do mesmo modo como não há por que as instituições políticas tornaremse automaticamente pluralistas não existe nenhuma tendência natural à centralização política Certamente haveria incentivos à criação de instituições estatais mais centralizadas em qualquer sociedade sobretudo naquelas desprovidas de centralização em qualquer grau Por exemplo na Somália se um clã criasse um Estado centralizado capaz de impor ordem ao país haveria benefícios econômicos que enriqueceriam o clã O que impede que isso aconteça O maior obstáculo à centralização política é de novo determinada espécie de medo da mudança qualquer clã grupo ou político que tente centralizar o poder no Estado estará também tentando centralizar o poder em suas próprias mãos o que com toda probabilidade despertará a ira de outros clãs grupos e indivíduos que seriam os derrotados políticos nesse processo A ausência de centralização política implica não só falta de lei e ordem em boa parte do território mas também a existência de diversos atores dotados de poder suficiente para bloquear ou desagregar o atual estado de coisas o receio de sua oposição e reação violenta em geral basta para dissuadir os pretensos centralizadores de suas aspirações A centralização política só terá chance de se dar quando um grupo de pessoas for suficientemente mais poderoso que os demais para construir um Estado Na Somália o poder encontrase de tal modo equilibrado que nenhum clã consegue impor sua vontade aos outros Assim a falta de centralização política persiste A LONGA AGONIA DO CONGO As forças que explicam por que a prosperidade econômica é tão persistentemente rara sob as instituições extrativistas ou que ilustram a sinergia entre estas e suas congêneres políticas são poucas vezes exemplificadas de maneira melhor ou mais deprimente do que no caso do Congo Visitantes portugueses e holandeses à região já nos séculos XV e XVI notavam a pobreza miserável ali reinante A tecnologia era rudimentar pelos padrões europeus os congoleses não dispunham de escrita roda nem arado A razão de sua pobreza assim como a relutância dos fazendeiros locais em adotar tecnologias melhores quando delas tomavam conhecimento fica clara a partir dos relatos históricos existentes a natureza extrativista das instituições econômicas do país Como vimos o Reino do Congo era governado pelo rei em Mbanza futura São Salvador As regiões distantes da capital eram dominadas por uma elite cujos membros faziam as vezes de governantes das diferentes partes do reino e cuja riqueza baseavase nas plantações na região de São Salvador manejadas por mão de obra escrava e a cobrança de impostos do resto do país A escravidão era um elemento central da economia sendo usada pela elite para abastecer suas próprias terras e pelos europeus no litoral Os impostos eram arbitrários havia um que era coletado sempre que o barrete do rei lhe caía da cabeça Para enriquecer seria preciso que o povo congolês economizasse e investisse mediante por exemplo a compra de arados Mas não valeria a pena já que todo e qualquer aumento de produtividade obtido graças a melhor tecnologia estaria sujeito à expropriação por parte do rei e sua elite Em vez de investir no aumento da produtividade e na venda de seus produtos nos mercados os congoleses optavam por afastar suas aldeias dos mercados na tentativa de mantendose o mais longe possível das estradas reduzir a incidência de saques e fugir do alcance dos traficantes de escravos A pobreza do Congo era portanto fruto de instituições econômicas extrativistas que não só bloqueavam todos os motores de prosperidade como até invertiam seu funcionamento O governo do país prestava muito poucos serviços públicos a seus cidadãos nem mesmo os básicos como assegurar os direitos de propriedade ou da lei e da ordem Pelo contrário o próprio governo representava a maior ameaça aos direitos humanos e de propriedade de seus súditos A instituição da escravidão significava que o mercado mais fundamental de todos um mercado de trabalho inclusivo no qual as pessoas tivessem a possibilidade de escolher suas respectivas profissões ou trabalhos daquela maneira tão crucial para a prosperidade econômica era inexistente Ademais o comércio e as atividades mercantis de longa distância eram controlados pelo monarca e estavam abertos somente aos seus associados Embora a elite logo se alfabetizasse após a introdução da escrita pelos portugueses o rei não fez qualquer tentativa de difundir o conhecimento da leitura e da escrita pela grande massa da população Não obstante tal disseminação da pobreza miserável as instituições extrativistas congolesas seguiam sua própria e impecável lógica garantiam o enriquecimento vertiginoso de umas poucas pessoas as detentoras do poder político No século XVI o rei do Congo e a aristocracia dispunham de meios para importar artigos de luxo europeus e viviam cercados de servos e escravos As instituições econômicas da sociedade congolesa tinham sua origem na distribuição do poder político na sociedade e portanto na natureza das instituições políticas Não havia nada que impedisse o rei de tomar as propriedades ou o corpo de seus súditos exceto a ameaça de sedição e embora fosse um perigo real não era suficiente para garantir a segurança da população ou de sua riqueza As instituições políticas do Congo eram verdadeiramente absolutistas liberando o rei e a elite de praticamente toda e qualquer restrição e privando os cidadãos de voz com relação à forma de organização de sua sociedade Evidentemente não é difícil constatar o agudo contraste entre as instituições políticas do Congo e as instituições políticas inclusivas encontradas onde o poder tem limites e ampla distribuição As instituições absolutistas do Congo eram sustentadas pelas Forças Armadas O rei contava com um Exército de prontidão de cinco mil homens no século XVII com um núcleo de 500 mosqueteiros número formidável para a época É fácil compreender a avidez com que o rei e a aristocracia adotaram as armas de fogo europeias Não havia a menor possibilidade de crescimento econômico sustentado sob tal conjunto de instituições econômicas e mesmo os incentivos para a geração de um crescimento temporário eram muito limitados Uma reforma das instituições econômicas de modo a ampliar os direitos de propriedade individuais teria tornado mais próspera a sociedade congolesa de maneira geral no entanto é improvável que a elite se beneficiasse do enriquecimento geral Em primeiro lugar tais reformas significariam uma derrota econômica para a elite à medida que solaparia a riqueza derivada do tráfico escravista e dos latifúndios baseados em mão de obra escrava Em segundo lugar tais reformas só seriam possíveis caso o monarca e sua elite tivessem seu poder político reduzido Por exemplo se o rei continuasse no comando de seus 500 mosqueteiros quem acreditaria em um eventual anúncio da abolição da escravatura O que impediria o rei de voltar atrás em seguida A única garantia concreta seria uma mudança nas instituições políticas de modo que aos cidadãos fosse assegurado algum poder político de contrapeso conferindolhes algum poder decisório com relação aos impostos arrecadados ou às ações dos mosqueteiros Nesse caso entretanto dificilmente a manutenção dos níveis de consumo e do estilo de vida do monarca e da elite figuraria no topo de sua lista de prioridades Nesse caso as mudanças capazes de instaurar melhores instituições econômicas na sociedade teriam levado à derrocada não só econômica mas também política do rei e da aristocracia A interação das instituições políticas e econômicas de 500 anos atrás ainda é relevante para compreendermos por que a pobreza miserável ainda hoje grassa no moderno Estado do Congo O advento do domínio europeu na região penetrando mais profundamente na bacia do Rio Congo na época da partilha da África no final do século XIX acarretou insegurança ainda mais egrégia em relação aos direitos humanos e de propriedade do que aquela que caracterizava o Congo précolonial Ademais veio reproduzir as instituições extrativistas e o absolutismo político que tanto poder e riqueza trouxeram para poucos em detrimento das massas ainda que os poucos agora fossem os colonizadores belgas sobretudo o Rei Leopoldo II Quando o Congo conquistou a independência em 1960 o mesmo padrão de instituições econômicas incentivos e desempenho se repetiu As instituições econômicas extrativistas congolesas mais uma vez encontraram sustentação em instituições políticas altamente extrativistas A situação agravouse porque o colonialismo europeu criou uma entidade política o Congo composta de diversos Estados e sociedades précoloniais distintos sobre os quais o Estado nacional comandado a partir da capital Kinshasa dispunha de controle reduzido Embora o Presidente Mobutu tenha usado o Estado para locupletarse e aos seus comparsas por exemplo mediante o programa de zairinização de 1973 que consistiu na expropriação em massa de interesses econômicos estrangeiros ele ainda assim presidia um Estado não centralizado com pouca autoridade sobre a maior parte do país tendo precisado recorrer a auxílio externo para impedir a secessão das províncias de Katanga e Kasai na década de 1960 Tamanha falta de centralização política quase a ponto do total colapso do Estado é um traço que o Congo compartilha com boa parte da África subsaariana A moderna República Democrática do Congo continua pobre porque seus cidadãos são ainda hoje privados das instituições econômicas capazes de gerar incentivos básicos para garantir a prosperidade social Não é a geografia a cultura ou a ignorância de seus cidadãos ou políticos que mantêm o Congo na pobreza mas suas instituições econômicas extrativistas que seguem inabaladas após tantos séculos porque o poder político continua estritamente concentrado nas mãos de uma elite que dispõe de poucos incentivos para assegurar os direitos de propriedade do povo prestar serviços públicos básicos capazes de melhorar a qualidade de vida ou fomentar o progresso econômico Pelo contrário seus interesses são extorquir renda e sustentar seu poder que usam não para construir um Estado centralizado pois nesse caso se deparariam com os mesmos problemas de oposição e desafios políticos que o crescimento econômico acarretaria Ademais como ocorre na maior parte do resto da África subsaariana as disputas internas provocadas pelas tentativas de grupos rivais de assumir o controle das instituições extrativistas destruíram por completo qualquer eventual tendência à centralização do Estado A história do Reino do Congo assim como a história mais recente do Congo constitui um vívido exemplo de como as instituições políticas determinam as instituições econômicas e por intermédio destas os incentivos e o escopo do crescimento econômico Ilustra também a relação simbiótica entre absolutismo político e instituições econômicas que conferem poder e riqueza a poucos em detrimento de muitos CRESCIMENTO SOB INSTITUIÇÕES POLÍTICAS EXTRATIVISTAS O Congo hoje é um exemplo extremo onde vigoram o desregramento generalizado e a tibieza dos direitos de propriedade Entretanto na maioria das vezes tal extremismo não atenderia aos interesses da elite uma vez que lançaria por terra todos os incentivos econômicos e geraria poucos recursos a extrair A tese central deste livro é que o crescimento econômico e a prosperidade estão associados a instituições políticas e econômicas inclusivas ao passo que as instituições extrativistas tendem a acarretar estagnação e pobreza o que não implica porém que as instituições extrativistas sejam incapazes de fomentar crescimento nem que todas as instituições extrativistas sejam idênticas Há duas maneiras distintas mas complementares pelas quais se pode dar o crescimento sob instituições políticas extrativistas Em primeiro lugar mesmo que as instituições econômicas sejam extrativistas o crescimento é possível quando as elites conseguem alocar recursos diretamente para atividades de alta produtividade que elas mesmas possam controlar Um exemplo notório desse tipo de crescimento sob instituições extrativistas foi o das ilhas do Caribe entre os séculos XVI e XVIII onde a maioria da população era escrava trabalhava nas mais medonhas condições nas plantations mal ultrapassando o nível de subsistência Muitos morriam de desnutrição e exaustão Em Barbados Cuba Haiti e Jamaica nos séculos XVII e XVIII uma pequena minoria a elite de latifundiários controlava todo o poder político e detinha todos os ativos inclusive todos os escravos Enquanto a maioria não dispunha de direito algum a propriedade e os ativos da elite estavam bem protegidos Apesar das instituições econômicas extrativistas que exploravam abusivamente a maioria da população essas ilhas estavam entre os lugares mais ricos do mundo por produzirem açúcar e o venderem nos mercados mundiais A economia das ilhas só estagnou quando surgiu a necessidade de realizar uma transição para novas atividades econômicas pondo em risco tanto a renda quanto o poder político da elite latifundiária Outro exemplo é o crescimento econômico e a industrialização da União Soviética do primeiro Plano Quinquenal em 1928 até a década de 1970 As instituições políticas e econômicas eram altamente extrativistas e os mercados controlados com mão de ferro Não obstante a União Soviética logrou alcançar acelerado crescimento econômico graças à sua capacidade de utilizar o poder do Estado para deslocar recursos da agricultura onde eram empregados com grande ineficiência para a indústria O segundo tipo de crescimento sob instituições políticas extrativistas ocorre quando tais instituições permitem o desenvolvimento de instituições econômicas relativamente ainda que não de todo inclusivas Muitas sociedades com instituições políticas extrativistas esquivamse de instituições econômicas inclusivas por medo da destruição criativa Contudo a medida pela qual a elite consegue monopolizar o poder varia de uma sociedade para outra Em algumas a posição da elite pode ser segura o bastante para que ela tolere certas iniciativas na direção de instituições econômicas inclusivas quando têm a relativa certeza de que isso não porá em risco seu poder político Assim o contexto histórico pode ser tal que um regime político altamente extrativista se veja dotado de instituições econômicas bastante inclusivas que os detentores do poder optam por não bloquear o que constitui a segunda maneira pela qual o crescimento pode se dar sob instituições políticas extrativistas A rápida industrialização da Coreia do Sul sob o General Park é um bom exemplo Park chegou ao poder por meio de um golpe militar em 1961 mas isso em uma sociedade que gozava de amplo apoio dos Estados Unidos e cujas instituições econômicas eram essencialmente inclusivas Apesar do autoritarismo do regime de Park era seguro o suficiente para fomentar o crescimento econômico o que de fato fez de forma bastante ativa talvez em parte porque o regime não fosse diretamente sustentado por instituições econômicas extrativistas Ao contrário da União Soviética e da maioria dos outros casos de crescimento sob instituições extrativistas a Coreia do Sul efetuou a transição das instituições políticas extrativistas para as inclusivas na década de 1980 Seu êxito nessa operação deveuse a uma confluência de fatores Na década de 1970 as instituições econômicas sulcoreanas já haviam se tornado inclusivas o bastante para esvaziar um dos mais fortes sustentáculos das instituições políticas extrativistas a elite econômica tinha pouco a ganhar com seu próprio domínio ou o dos militares na política A relativa igualdade de renda no país significava também que a elite tinha menos a temer com relação ao pluralismo e à democracia A influência decisiva dos Estados Unidos sobretudo em vista da ameaça representada pela Coreia do Norte implicava também que o intenso movimento democrático que desafiava a ditadura militar não poderia continuar sendo reprimido por muito mais tempo Assim muito embora o assassinato do General Park em 1979 tenha sido seguido de um novo golpe militar encabeçado por Chun Doohwan o sucessor escolhido de Chun Roh Taewoo deu início a um processo de reformas políticas que levou à consolidação de uma democracia pluralista a partir de 1992 Claro não houve uma transição desse tipo na União Soviética Por conseguinte o crescimento soviético perdeu o gás e a economia do país começou a entrar em colapso nos anos 1980 para desmoronar por completo na década seguinte O crescimento econômico chinês de hoje apresenta também vários elementos comuns com as experiências soviética e sulcoreana Enquanto seus primeiros estágios foram capitaneados por reformas radicais no setor agrícola no segmento industrial elas foram mais discretas Ainda hoje o Estado e o Partido Comunista desempenham papel central na seleção dos setores e empresas que receberão injeções de capital para se expandirem ocasionando a construção e a destruição de fortunas nesse processo Do mesmo modo como ocorreu na União Soviética em seu auge a China vem crescendo rapidamente mas tal crescimento se dá ainda sob instituições extrativistas sob o controle do Estado com parcos indícios de uma transição para instituições políticas inclusivas O fato de as instituições econômicas chinesas estarem longe de ser plenamente inclusivas sugere ainda que uma transição ao estilo sulcoreano é improvável ainda que evidentemente não impossível Vale notar que a centralização política é crucial para ambos os sentidos em que o crescimento sob instituições políticas extrativistas pode se dar Sem algum grau de centralização política a elite rural em Barbados Cuba Haiti e Jamaica não teria conseguido manter a lei e a ordem e defender seus próprios ativos e propriedades Sem significativa centralização e firme controle do poder político nem as elites militares sulcoreanas nem o Partido Comunista chinês teriam segurança suficiente para promover reformas econômicas significativas conseguindo ao mesmo tempo agarrarse ao poder E sem tal centralização o Estado na União Soviética ou na China não teria sido capaz de coordenar a atividade econômica de modo a canalizar recursos para áreas de alta produtividade Uma das características centrais das instituições políticas extrativistas capazes de fomentar crescimento portanto é o seu grau de centralização política Onde esta estiver ausente como em boa parte da África subsaariana será difícil obter qualquer crescimento ainda que limitado Muito embora as instituições extrativistas sejam capazes de gerar riqueza em geral não terão como gerar crescimento econômico sustentado e certamente não o tipo de crescimento acompanhado por destruição criativa Quando tanto as instituições políticas quanto as econômicas são extrativistas não há incentivos para a destruição criativa e a mudança tecnológica O Estado pode até conseguir durante algum tempo fomentar um rápido crescimento econômico mediante a alocação de recursos e pessoas por decreto mas o processo é intrinsecamente limitado Quando os limites são atingidos o crescimento é interrompido como se deu na União Soviética nos anos 1970 Mesmo durante o acelerado crescimento econômico soviético na maior parte da economia verificouse pouca mudança tecnológica ainda que a injeção maciça de recursos nas Forças Armadas lhe tenha permitido desenvolver tecnologias militares e até passar à frente dos Estados Unidos nas corridas espacial e nuclear por um breve período Sem destruição criativa e sem inovação tecnológica de base ampla todavia esse crescimento não seria sustentável e teve um fim abrupto Ademais os mecanismos que fundamentam o crescimento econômico sob instituições políticas extrativistas são por sua própria natureza frágeis podem cair por terra ou ser facilmente destruídos pelos conflitos internos gerados por essas mesmas instituições Com efeito as instituições políticas e econômicas extrativistas criam uma tendência geral à dissidência interna por promoverem a concentração de riqueza e poder nas mãos de uma elite estreita Se outro grupo conseguir sobrepujar a elite dominante e assumir o controle do Estado vai se tornar o novo detentor da riqueza e do poder Por conseguinte como nossa discussão sobre o colapso do Império Romano e das cidades maias vai ilustrar páginas 131136 e 113117 os embates pelo controle do Estado totalitário permanecem sempre latentes periodicamente intensificamse e acarretam o esboroamento desses regimes podendo conduzir à guerra civil e às vezes ao total colapso e desmanche do Estado Uma implicação desse processo é que se uma sociedade sob instituições extrativistas chega a atingir algum grau de centralização do Estado essa situação necessariamente não perdurará De fato as disputas internas pelo controle das instituições extrativistas em geral leva a guerras civis e à ilegalidade generalizada consagrando uma persistente ausência da centralização do Estado como se vê em tantos países da África subsaariana e alguns da América Latina e Sul da Ásia Por fim quando o crescimento se dá sob instituições políticas extrativistas mas onde as instituições econômicas apresentam traços inclusivos conforme se deu no caso da Coreia do Sul há sempre o risco de que as instituições econômicas se tornem mais extrativistas e o crescimento seja interrompido Os detentores do poder político acabarão achando mais interessante usar seu poder para restringir a competição para aumentar a sua fatia do bolo ou mesmo pilhar e saquear os outros em vez de apoiar o progresso econômico A distribuição e a capacidade de exercer o poder acabarão em última instância solapando as próprias fundações da prosperidade econômica a menos que as instituições políticas se convertam de extrativistas em inclusivas E 4 PEQUENAS DIFERENÇAS E CONJUNTURAS CRÍTICAS O PESO DA HISTÓRIA O MUNDO CRIADO PELA PESTE NEGRA M 1346 A FEBRE BUBÔNICA também conhecida como peste negra chegou à cidade portuária de Tanais na embocadura do Rio Don no Mar Negro Transmitida por pulgas de ratos a doença foi trazida da China por mercadores que percorriam a Rota da Seda a grande artéria comercial que cruzava a Ásia Graças aos comerciantes genoveses os ratos logo estavam espalhando suas pulgas e a peste de Tanais por todo o Mediterrâneo No começo de 1347 a peste havia chegado a Constantinopla No primeiro semestre de 1348 espalhavase pela França e o Norte da África e subia pela bota italiana A epidemia varria cerca de metade da população das áreas atingidas Sua chegada à cidade italiana de Florença foi testemunhada em primeira mão pelo escritor italiano Giovanni Boccaccio que mais tarde recordaria Diante de seu assalto toda a sabedoria e engenho humanos eram em vão A peste começou de maneira aterrorizante e extraordinária a revelar seus efeitos desastrosos Não assumiu a forma que havia apresentado no Oriente onde qualquer um que sangrasse pelo nariz tinha um óbvio presságio de morte certa Pelo contrário seu sintoma mais precoce era o surgimento de certos inchaços na virilha ou axila alguns em formato de ovo ao passo que outros apresentavam aproximadamente o tamanho de uma maçã comum Mais tarde os sintomas da enfermidade mudaram e muitas pessoas começaram a notar pústulas e erupções escuras nos braços coxas e outras partes do corpo Contra tais males todas as orientações dos médicos e todo conhecimento da medicina eram inúteis e sem serventia Na maioria dos casos a morte sobrevinha três dias após o surgimento dos sintomas que descrevemos Na Inglaterra as pessoas sabiam que a peste estava se encaminhando em sua direção e tinham plena consciência da tragédia iminente Em meados de agosto de 1348 o Rei Eduardo III pediu ao Arcebispo de Cantuária que organizasse orações e muitos bispos escreveram cartas a serem lidas pelos sacerdotes nas igrejas a fim de ajudar as pessoas a lidar com o que as aguardava Ralph de Shrewsbury Bispo de Bath escreveu aos seus clérigos Deus TodoPoderoso usa os trovões relâmpagos e outros golpes que lança de seu trono para açoitar os filhos que deseja redimir Assim uma vez que uma catastrófica pestilência do Oriente atingiu um reino vizinho é muito de se temer que a menos que oremos devota e incessantemente pestilência similar estenda seus venenosos braços sobre este reino derrubando e consumindolhe os habitantes Portanto devemos todos nos colocar diante da presença do Senhor em confissão recitando salmos Não adiantou nada A peste abateuse sobre os ingleses e rapidamente eliminou metade da população Catástrofes desse porte podem ter um efeito avassalador sobre as instituições da sociedade Multidões enlouqueceram o que é compreensível Boccaccio comenta que alguns defendiam que uma maneira infalível de afastar aquele mal aterrador consistia em afogarse na bebida aproveitar a vida ao máximo entregarse a cantorias e folguedos satisfazer todos os seus desejos sempre que se apresentasse qualquer oportunidade e a tudo encarar como uma grande piada o que explica por que as mulheres que se recuperavam seriam possivelmente menos castas no período que se seguia Todavia a peste exerceu também um impacto profundamente transformador em termos sociais econômicos e políticos sobre as sociedades medievais europeias Na virada do século XIV a Europa obedecia a uma ordem feudal uma forma de organização da sociedade que havia emergido na Europa Ocidental após a derrocada do Império Romano Baseavase em relações hierárquicas entre o rei e os nobres a ele subordinados tendo os camponeses na base O rei era o dono da terra que ele concedia aos senhores em troca de serviços militares Os nobres por sua vez alocavam a terra aos camponeses em troca do que estes ofereciam sua mão de obra gratuita e submetiamse a um semfim de multas e impostos Os camponeses que em virtude de sua situação servil eram chamados servos permaneciam presos à terra impossibilitados de deslocarse sem a permissão de seu senhor que não era apenas o senhor das terras mas também juiz júri e força policial Era um sistema altamente segregacionista no qual a riqueza fluía para o alto dos muitos camponeses para os poucos senhores A extrema escassez de mão de obra ocasionada pela peste abalou as fundações da ordem feudal estimulando os camponeses a demandar mudanças Na Abadia de Eynsham por exemplo os camponeses exigiram a redução de muitas das multas e do volume de trabalho não remunerado Foram atendidos e seu novo contrato começava com a seguinte descrição No tempo da mortandade ou pestilência que teve lugar em 1349 mal restaram dois locatários na herdade tendo estes expressado sua intenção de partir a menos que o Irmão Nicholas de Upton seu abade e senhor das terras firmasse com eles um novo acordo E foi o que aconteceu O ocorrido em Eynsham repetiuse por toda parte Os camponeses começaram a libertarse do trabalho compulsório e das muitas obrigações devidas aos seus senhores Os salários começaram a subir O governo na tentativa de pôr um ponto final nesse processo promulgou em 1351 o Estatuto dos Trabalhadores que começava nos seguintes termos Tendo uma grande parcela do povo e sobretudo dos trabalhadores e servos perecido na pestilência alguns constatando as dificuldades dos senhores e a escassez de servos não se mostram dispostos a servir a menos que recebam salários excessivos Considerando as graves inconveniências que podem decorrer da falta especialmente de lavradores e trabalhadores que tais nós decidimos por bem dispor que todo homem e mulher do nosso reino da Inglaterra estará fadado a servir aquele a quem tiver convindo recorrer aos seus serviços receberá para tanto tão somente a remuneração recompensa ou salário que nos lugares onde ele se puser a servir costumavamse pagar no vigésimo ano do nosso reino na Inglaterra o Rei Eduardo III subiu ao trono em 25 de janeiro de 1327 portanto a referência aqui é a 1347 ou nos cinco ou seis anos ordinários que a este sucederam O estatuto de fato procurou fixar os salários nos níveis em vigor antes da peste negra Particularmente preocupante para a elite inglesa era a sedução a tentativa de um nobre de atrair os raros camponeses de outro A solução encontrada foi adotar a prisão como penalidade pelo abandono do emprego sem a devida permissão do empregador E caso um ceifeiro ou cortador ou qualquer outro trabalhador ou servo qualquer que seja a sua situação ou condição que seja retido no serviço do senhor abandone o dito serviço antes do fim do período acordado sem a devida permissão ou causa razoável sofrerá a pena de encarceramento e ninguém ademais poderá pagar ou permitir o pagamento de qualquer outra remuneração recompensa ou salário costumeiros até então A tentativa inglesa de impedir as mudanças nas instituições e sistemas de remuneração decorrentes da peste negra não deu certo Em 1381 irrompeu a Revolta dos Camponeses no decorrer da qual os rebeldes sob a liderança de Wat Tyler chegaram a apoderarse da maior parte de Londres Embora tenham acabado derrotados e Tyler executado não houve novas tentativas de impor o Estatuto dos Trabalhadores O esquema de trabalho feudal definhou emergiu um mercado de trabalho inclusivo na Inglaterra e os salários subiram A peste parece ter se abatido sobre a maior parte do mundo fazendo em todos os lugares uma proporção similar de vítimas de modo que o impacto demográfico no Leste Europeu foi o mesmo da Inglaterra ou da Europa Ocidental como um todo As forças sociais e econômicas em ação eram também as mesmas A mão de obra era escassa e o povo reivindicava liberdades maiores No leste porém vigorava uma lógica paradoxal mais poderosa Menos gente significava salários mais altos em um mercado de trabalho inclusivo contudo a situação incentivava os senhores a manterem um mercado de trabalho extrativista e os camponeses servis Na Inglaterra essa motivação também estivera em ação tendo se refletido no Estatuto dos Trabalhadores mas os trabalhadores tiveram poder suficiente para impor suas demandas Na Europa Oriental ocorreu o inverso Após a peste os senhores locais começaram a apropriarse de vastas extensões de terra e expandir seus domínios que já eram maiores do que os do oeste do continente As cidades eram mais fracas e menos populosas e em vez de se tornarem mais livres os trabalhadores viram minguar as liberdades que já possuíam Os efeitos ficaram especialmente claros após 1500 quando a Europa Ocidental começou a demandar os produtos agrícolas como trigo centeio e gado produzidos no leste Do centeio importado por Amsterdã 80 vinham dos vales dos Rios Elba Vístula e Oder Logo metade do florescente comércio holandês era com o Leste Europeu À medida que aumentava a demanda ocidental os senhores do leste foram estreitando o controle que exerciam sobre a força de trabalho a fim de expandir sua oferta processo que ficaria conhecido como Segunda Servidão distinta e mais intensa do que sua forma original no início da Idade Média Os nobres aumentaram os impostos coletados sobre as glebas de seus próprios vassalos apoderandose de metade da produção bruta Em Korczyn Polônia todo o trabalho prestado para o senhor em 1533 era remunerado Em 1600 porém quase metade consistia em trabalho forçado não remunerado Em 1500 os trabalhadores de Mecklenberg leste da Alemanha deviam apenas alguns dias de serviços não remunerados por ano Em 1550 era um dia por semana em 1600 havia chegado a três dias por semana Os filhos dos trabalhadores tinham de trabalhar de graça para o senhor por vários anos Na Hungria os senhores assumiram o total controle da terra em 1514 determinando que cada trabalhador prestasse um dia por semana de trabalhos não remunerados Em 1550 o número passou para dois dias semanais No fim do século chegara a três dias A essa altura os servos submetidos a essas regras correspondiam a 90 da população rural Embora em 1346 houvesse poucas diferenças entre a Europa Ocidental e a Oriental em termos de instituições políticas e econômicas em 1600 as duas partes do continente eram mundos completamente distintos No oeste os trabalhadores estavam livres das obrigações multas e regulamentações feudais tornandose peçaschave na nova economia de mercado em expansão No leste também tomavam parte dessa organização econômica mas como servos coagidos responsáveis pela produção dos alimentos e produtos agrícolas demandados pelo Ocidente Tamanha discrepância institucional foi fruto de uma situação em que as diferenças entre as duas regiões a princípio pareciam insignificantes no leste os nobres mostravamse um pouco mais organizados com direitos ligeiramente maiores e sobre a terra mais bem consolidados As cidades eram mais fracas e menores os camponeses eram menos organizados No esquema mais amplo da História eram divergências muito sutis Não obstante essas pequenas diferenças entre leste e oeste teriam graves consequências para a vida de suas populações e para o futuro caminho de desenvolvimento institucional quando a ordem feudal se visse abalada pela peste negra A peste negra é um vívido exemplo de uma daquelas circunstâncias críticas um grande acontecimento ou confluência de fatores que vêm romper o equilíbrio econômico ou político existente na sociedade Um momento crítico como esse é uma faca de dois gumes capaz de provocar reviravolta nos rumos tomados por cada país Por um lado pode abrir caminho para a interrupção do ciclo de instituições extrativistas e possibilitar o surgimento de outras mais inclusivas como aconteceu na Inglaterra Ou pode intensificar a emergência de instituições extrativistas como no caso da segunda servidão na Europa Oriental Compreender como a história e essas circunstâncias críticas moldam a trajetória das instituições econômicas e políticas vai nos ajudar a desenvolver uma teoria mais completa das causas das discrepâncias em pobreza e prosperidade Ajudanos também a explicar o atual estado de coisas e por que alguns países conseguem realizar a transição para instituições econômicas e políticas inclusivas ao passo que outros não A CONSTITUIÇÃO DAS INSTITUIÇÕES INCLUSIVAS A Inglaterra foi um caso único entre as nações ao fazer a passagem para o crescimento econômico sustentado no século XVII Grandes mudanças econômicas foram precedidas por uma revolução política que produziu um conjunto específico de instituições políticas e econômicas muito mais inclusivas do que as encontradas em qualquer sociedade anterior Essas instituições teriam profundas implicações não só em termos de prosperidade e incentivos econômicos mas também de quem poderia colher os frutos da prosperidade Baseavamse não em um consenso mas pelo contrário nasceram de intensos conflitos entre diferentes grupos disputando o poder contestando a autoridade alheia e tentando estruturar instituições em seu próprio benefício O apogeu dessas querelas institucionais dos séculos XVI e XVII deuse em dois eventoschave a Guerra Civil inglesa entre 1642 e 1651 e sobretudo a Revolução Gloriosa de 1688 A Revolução Gloriosa restringiu o poder do monarca e do Executivo e deslocou para o Parlamento a possibilidade de determinar as instituições econômicas Ao mesmo tempo abriu o sistema político para um amplo corte transversal da sociedade aumentando a parcela da população capaz de exercer considerável influência sobre o funcionamento do Estado A Revolução Gloriosa foi a pedra angular de uma sociedade pluralista tendo não só se apoiado em mas também acelerado um processo de centralização política Criou o primeiro conjunto de instituições políticas inclusivas no mundo Por conseguinte as instituições econômicas também começaram a tornarse mais inclusivas Nem a escravidão nem as rígidas restrições econômicas do período medieval feudal como a servidão existiam na Inglaterra no princípio do século XVII Não obstante havia muitas restrições às atividades econômicas às quais as pessoas podiam se dedicar Tanto a economia doméstica quanto a internacional estavam estranguladas por monopólios O Estado determinava impostos arbitrários e manipulava o sistema legal A maior parte da terra estava submetida a formas arcaicas de direitos de propriedade que impossibilitavam sua venda e faziam dela um investimento demasiadamente arriscado A situação mudou após a Revolução Gloriosa O governo adotou uma série de instituições econômicas que ofereciam incentivos ao investimento comércio e inovação Os direitos de propriedade inclusive patentes que concediam direitos sobre ideias foram assegurados com firmeza estimulando assim a inovação O Estado começou a garantir a lei e a ordem e a lei inglesa passou a valer para todos os cidadãos algo que não tinha precedentes históricos Os tributos arbitrários foram descontinuados sendo abolidos quase por completo O Estado promovia agressivamente as atividades mercantis e trabalhava na promoção da indústria nacional não só removendo barreiras à expansão da atividade industrial mas também se valendo de todo o poderio da Marinha inglesa para resguardar interesses mercantis Ao racionalizar os direitos de propriedade facilitou a construção de infraestrutura sobretudo estradas canais e mais tarde ferrovias que se provaria crucial para a expansão industrial Tais fundamentos alteraram de forma decisiva os incentivos dados à população e impeliram os motores da prosperidade preparando o terreno para a Revolução Industrial Antes e acima de tudo a Revolução Industrial dependeu de grandes avanços tecnológicos baseados no conhecimento acumulado na Europa ao longo dos séculos passados Representou uma ruptura radical com o passado que só foi possível graças ao método científico e aos talentos de diversos indivíduos especiais A plena força dessa revolução veio do mercado que criou oportunidades rentáveis para o desenvolvimento e aplicação de tecnologias Foi a natureza inclusiva dos mercados que permitiu às pessoas alocarem seus talentos nas linhas mais adequadas de negócios A educação e as competências deram também sua contribuição à medida que foram os níveis relativamente altos de educação pelo menos pelos padrões da época que possibilitaram a emergência de empreendedores dotados de suficiente visão para empregar as novas tecnologias em seus negócios e procurar trabalhadores com as habilidades necessárias para manejálas Não é coincidência que a Revolução Industrial tenha iniciado na Inglaterra poucas décadas após a Revolução Gloriosa Grandes inventores como James Watt que aprimorou o motor a vapor Richard Trevithick construtor da primeira locomotiva a vapor Richard Arkwright inventor de uma máquina de fiar algodão hidráulica e Isambard Kingdom Brunel construtor de vários navios a vapor revolucionários puderam aproveitar as oportunidades econômicas geradas por suas ideias confiando em que seus direitos de propriedade seriam respeitados e tiveram acesso a mercados nos quais suas inovações poderiam ser vendidas e utilizadas de maneira rentável Em 1775 logo após renovar a patente de seu motor a vapor que chamava de máquina de fogo James Watt escreveu a seu pai Caro pai Após uma série de várias e violentas oposições finalmente obtive um decreto do Parlamento investindome e aos meus representantes na propriedade de minhas novas máquinas de fogo por toda a GrãBretanha e latifúndios pelos próximos 25 anos o que espero sermeá muito benéfico visto que existe já considerável demanda para elas A carta revela duas coisas Primeiro Watt estava motivado pelas oportunidades de mercado que antevia a considerável demanda na GrãBretanha e seus latifúndios as colônias ultramarinas inglesas Em segundo lugar mostra como ele foi capaz de influenciar o Parlamento de modo a obter o que queria uma vez que este se mostrava responsivo aos apelos de indivíduos e inovadores Os avanços tecnológicos o impulso de expansão e investimento das empresas e o uso eficiente de competências e talentos foram viabilizados pelas instituições econômicas inclusivas desenvolvidas na Inglaterra estas por sua vez baseadas nas instituições políticas inclusivas do país A Inglaterra desenvolveu tais instituições políticas inclusivas em virtude de dois fatores Primeiro foram as instituições políticas entre elas um Estado centralizado que lhe permitiriam dar o passo seguinte radical e inédito rumo a instituições inclusivas com a deflagração da Revolução Gloriosa Embora esse elemento tenha colocado a Inglaterra em situação claramente distinta da maior parte do mundo não a diferenciou de maneira muito significativa de outros países da Europa Ocidental como França e Espanha Mais importante foi o segundo fator a escalada de eventos que precipitaram a Revolução Gloriosa forjou ampla a poderosa coalizão capaz de impor restrições duradouras ao poder da Coroa e do Executivo forçandoos assim a abrirse às reivindicações de tal coalizão o que lançou as bases de instituições políticas pluralistas as quais por sua vez possibilitaram o desenvolvimento das instituições econômicas subjacentes à primeira Revolução Industrial PEQUENAS DIFERENÇAS QUE FAZEM A DIFERENÇA As desigualdades no mundo aumentaram drasticamente com a Revolução Industrial britânica ou inglesa porque apenas algumas partes do mundo adotaram as inovações e novas tecnologias desenvolvidas por homens como Arkwright Watt e os muitos que se seguiram A resposta de cada país à onda de tecnologias que determinaria quem permaneceria na pobreza e quem alcançaria um crescimento econômico sustentado foi em grande parte moldada pelos vários rumos históricos de suas respectivas instituições Em meados do século XVIII já se verificou uma disparidade notória nas instituições políticas e econômicas encontradas ao redor do globo Mas de onde vinham tais diferenças Em 1688 as instituições políticas inglesas rumavam para um pluralismo muito maior do que as da França e Espanha por exemplo mas se voltarmos 100 anos no tempo para 1588 as discrepâncias são praticamente nulas Os três países eram regidos por monarcas relativamente absolutistas Elizabeth I na Inglaterra Filipe II na Espanha e Henrique II na França Todos digladiavam com assembleias de cidadãos na Inglaterra o Parlamento na Espanha as Cortes na França os Estados Gerais que reivindicavam mais direitos e controle sobre a monarquia Cada uma possuía poderes e alçadas ligeiramente distintos Por exemplo o Parlamento inglês e as Cortes espanholas podiam interferir na tributação enquanto os Estados Gerais não Na Espanha esse ponto tinha pouca importância em virtude do vasto império americano amealhado desde 1492 pela Coroa que se beneficiava imensamente do ouro e prata lá encontrados Na Inglaterra a situação era outra Elizabeth I gozava de independência financeira consideravelmente menor de modo que precisava suplicar ao Parlamento que aumentasse os impostos Em contrapartida a casa exigia concessões sobretudo restrições ao direito da rainha de criar monopólios A disputa foi sendo pouco a pouco vencida pelo Parlamento Na Espanha as Cortes perderam um conflito análogo e o comércio não só foi monopolizado mas monopolizado pela monarquia local Essas diferenças que a princípio pareciam mínimas revestiramse de maior importância no século XVII Embora as Américas tivessem sido descobertas em 1492 e Vasco da Gama houvesse chegado à Índia contornando o Cabo da Boa Esperança no extremo sul da África em 1498 a maior parte do comércio mundial especialmente no Atlântico só seria inaugurada após 1600 Em 1585 instalouse em Roanoke na atual Carolina do Norte o primeiro núcleo de colonização inglesa na América do Norte Em 1600 foi fundada a Companhia das Índias Orientais inglesa seguida em 1602 por sua contraparte holandesa Em 1607 nasceu a colônia de Jamestown sob a batuta da Virginia Company Na década de 1620 o Caribe estava sendo colonizado Barbados seria ocupada em 1627 A França também se expandia no Atlântico a Cidade de Quebec foi fundada em 1608 como capital da Nova França onde hoje é o Canadá Todavia devido àquelas sutis diferenças iniciais os reflexos de tal expansão econômica sobre as instituições inglesas foram muito distintos daqueles sofridos pela Espanha e França Elizabeth I e seus sucessores não tinham condições de monopolizar o comércio com as Américas Outros monarcas europeus sim Assim enquanto na Inglaterra o comércio no Atlântico e a colonização começaram a formar um grande grupo de comerciantes prósperos e sem muitos vínculos com a Coroa não foi o que se deu na Espanha ou França Os comerciantes ingleses incomodavamse com o controle régio e reivindicavam mudanças nas instituições políticas e restrição das prerrogativas reais e desempenhariam papel fundamental tanto na Guerra Civil inglesa quanto na Revolução Gloriosa Conflitos similares irromperam por toda parte Os monarcas franceses por exemplo enfrentaram a Rebelião da Fronda entre 1648 e 1652 A diferença foi que na Inglaterra era muito mais provável que os adversários do absolutismo vencessem dada sua relativa prosperidade e o fato de serem em maior número do que os opositores do regime na Espanha e na França As trajetórias divergentes das sociedades inglesa francesa e espanhola no século XVII ilustram a importância da interrelação das pequenas diferenças institucionais e as circunstâncias críticas durante as quais um grande evento ou confluência de fatores vem romper o equilíbrio de poder político ou econômico existente em determinado país Estes podem afetar não só um único país como a morte do Presidente Mao Tsé Tung em 1976 que a princípio representou uma circunstância crítica apenas para a China comunista Em geral contudo as circunstâncias críticas afetam todo um conjunto de sociedades tal como no caso da colonização e da descolonização processos que abalaram a maior parte do mundo Essas circunstâncias críticas são importantes porque os obstáculos às transformações graduais são formidáveis resultados da sinergia entre instituições políticas e econômicas extrativistas e seu apoio mútuo A persistência desse mecanismo de retroalimentação cria um círculo vicioso os favorecidos pelo status quo são ricos e bem organizados o que os torna capazes de fazer frente de fato a mudanças significativas que poderiam priválos de seus privilégios econômicos e poder político Deflagrada uma circunstância crítica as pequenas diferenças que fazem a diferença são aquelas peculiaridades institucionais iniciais que põem em movimento respostas muito diversas É por isso que as discrepâncias institucionais relativamente sutis entre Inglaterra França e Espanha acarretaram rumos de desenvolvimento radicalmente distintos Elas foram frutos da circunstância crítica gerada pelas oportunidades econômicas apresentadas aos europeus pelo comércio atlântico Por mais diferença que as pequenas diferenças institucionais façam em circunstâncias críticas nem todas as diferenças institucionais são sutis e naturalmente diferenças institucionais mais amplas produzem discrepâncias ainda maiores nesses casos Assim embora as diferenças institucionais entre Inglaterra e França fossem mínimas em 1588 a Europa Ocidental e o Leste Europeu eram separados por um abismo No lado ocidental Estados fortes e centralizados como Inglaterra França e Espanha contavam com instituições constitucionais latentes o Parlamento os Estados Gerais e as Cortes havia também similaridades subjacentes em suas instituições econômicas como a ausência de servidão No Leste Europeu a história era outra O reino da PolôniaLituânia por exemplo era governado por uma elite chamada szlachta uma classe tão poderosa que havia chegado a introduzir eleições para o cargo de rei Não se tratava de um regime absoluto como a França de Luís XIV o ReiSol mas o absolutismo de uma elite instituições políticas extrativistas do mesmo modo Os szlachta dominavam uma sociedade basicamente rural na qual predominavam os servos privados de qualquer liberdade de movimentação ou oportunidade econômica Mais a leste o imperador russo Pedro o Grande também estava consolidando um absolutismo muito mais intenso e extrativista do que mesmo Luís XIV seria capaz de administrar O Mapa 8 oferece uma maneira simples de perceber a magnitude das disparidades entre o Leste e o Oeste Europeu no começo do século XIX Nele podese ver se no país vigorava ou não servidão em 1800 nos países em cores escuras sim nos claros não O Leste Europeu é escuro a Europa Ocidental clara Não obstante as instituições da Europa Ocidental nem sempre foram tão diferentes das da Europa Oriental Como já vimos as divergências tiveram início no século XIV quando a peste negra abateuse sobre o continente em 1346 As diferenças entre as instituições políticas e econômicas do Leste e do Oeste Europeu eram mínimas Inglaterra e Hungria eram comandadas por membros da família angevina As diferenças institucionais mais significativas surgidas após a peste negra criariam então o cenário em que ao longo dos séculos XVII XVIII e XIX as discrepâncias já consideráveis entre leste e oeste se fariam sentir Mapa 8 Servidão na Europa em 1800 Mas como surgem afinal as pequenas diferenças institucionais que deflagram esse processo de divergência Por que o Leste Europeu possuía instituições políticas e econômicas diferentes das ocidentais no século XIV Por que o equilíbrio de poder entre Coroa e Parlamento era um na Inglaterra e outro na França e Espanha Como veremos no próximo capítulo mesmo sociedades muito menos complexas do que a nossa sociedade moderna criam instituições políticas e econômicas com efeitos poderosos sobre a vida de seus membros o que vale mesmo para grupos de caçadores e coletores como sabemos por culturas remanescentes como o povo san na moderna Botsuana que não tem agricultura nem vive em povoações permanentes Cada sociedade cria suas próprias instituições com base em seus respectivos costumes sistemas de direitos de propriedade específicos e maneiras peculiares de dividir um animal morto ou o butim tomado de outro grupo Algumas reconhecerão a autoridade dos mais velhos outras não algumas conquistarão desde cedo algum grau de centralização política mas não outras Todas as sociedades encontramse constantemente expostas a conflitos econômicos e políticos que resolvem de diferentes formas de acordo com especificidades históricas o papel dos indivíduos ou outros elementos aleatórios Tais discrepâncias em geral começam insignificantes mas vão se acumulando e criando um processo de distanciamento institucional Do mesmo modo como as diferenças entre duas populações isoladas de organismos vão gradualmente se aprofundando em um processo de diferenciação genética devido ao acúmulo de mutações genéticas aleatórias duas sociedades similares sob outros aspectos também tendem a se afastar lentamente uma da outra em termos institucionais Assim como a diferenciação genética porém a diferenciação institucional não tem um caminho predeterminado nem sequer precisa ser cumulativa ao longo dos séculos pode levar a diferenças perceptíveis e às vezes significativas As disparidades decorrentes desse processo serão particularmente impactantes nos momentos críticos à medida que influenciam o modo como a sociedade reage a circunstâncias econômicas ou políticas Os padrões profusamente díspares de desenvolvimento econômico encontrados no mundo dependem da interrelação entre as circunstâncias críticas e a diferenciação institucional As instituições políticas e econômicas existentes às vezes moldadas por um longo processo de diferenciação institucional e outras vezes resultantes de diferentes respostas a circunstâncias críticas anteriores representam a bigorna sobre a qual as futuras mudanças serão forjadas Tanto a peste negra quanto a expansão do comércio mundial após 1600 constituíram circunstâncias críticas significativas para as potências europeias foi a partir de sua interação com as diferentes instituições preexistentes em cada sociedade que surgiram grandes divergências Como os camponeses da Europa Ocidental possuíam em 1346 mais poder e autonomia do que no Leste Europeu a peste negra conduziu à dissolução do feudalismo na primeira e a segunda servidão no segundo Como a Europa Ocidental e a Oriental tinham começado a se afastar no século XIV as novas oportunidades econômicas que foram despontando nos séculos XVII XVIII e XIX teriam também implicações essencialmente distintas para as duas metades do continente Como em 1600 o jugo da Coroa era mais leve na Inglaterra do que na França e na Espanha o comércio atlântico preparou o terreno para a criação de novas instituições com maior pluralismo na Inglaterra ao mesmo tempo em que fortaleceu os monarcas francês e espanhol OS RUMOS CONTINGENTES DA HISTÓRIA Os resultados dos acontecimentos durante circunstâncias críticas vão depender do peso da história à medida que as instituições econômicas e políticas moldam o equilíbrio de poder e delineiam o que é viável politicamente O resultado final porém será contingente e não sujeito a qualquer tipo de predeterminação histórica O percurso exato do desenvolvimento institucional durante esses períodos se dará de acordo com qual das forças em conflito sairá vitoriosa que grupos serão capazes de constituir coalizões eficazes e que líderes conseguirão estruturar os acontecimentos em benefício próprio O papel da casualidade pode ser ilustrado pelas origens das instituições políticas inclusivas na Inglaterra Não somente nada havia de preestabelecido na vitória dos grupos que se bateram pela limitação do poder da Coroa e por instituições mais pluralistas na Revolução Gloriosa de 1688 como todo o caminho que conduziu a tal revolução política estava à mercê de acontecimentos fortuitos Venceu quem venceu graças à circunstância crítica decorrente da ascensão do comércio atlântico que enriqueceu e encheu de ânimo os comerciantes que faziam oposição à Coroa Um século antes contudo nada menos óbvio do que a perspectiva de que a Inglaterra pudesse ter qualquer possibilidade de vir a dominar os mares colonizar vasta parte do Caribe e da América do Norte ou apoderarse de tão significativa parcela do lucrativo comércio com as Américas e o Oriente Nem Elizabeth I nem qualquer dos Tudor que a antecederam no trono haviam construído uma Marinha poderosa e unificada A Marinha inglesa dependia de mercenários e navios mercantes independentes o que a tornava muito menos respeitável do que a Armada Espanhola Entretanto os lucros do comércio atlântico atraíram os mercenários pondo em xeque o monopólio hispânico dos mares Em 1588 os espanhóis resolveram dar um basta a tais desafios ao seu domínio bem como às interferências inglesas nos Países Baixos espanhóis que na época batiamse com a Espanha por sua independência O monarca espanhol Filipe II enviou sua poderosa Armada comandada pelo Duque de MedinaSidônia O resultado óbvio para muitos era que os espanhóis esmagariam os ingleses consolidando seu monopólio do Atlântico e provavelmente derrubariam Elizabeth I talvez mesmo adquirindo em última instância o controle das Ilhas Britânicas O que se deu porém foi inteiramente distinto O mau tempo e os erros estratégicos do duque que fora encarregado do comando da frota na última hora devido ao falecimento de um comandante mais experiente fizeram a Armada espanhola perder a vantagem Contrariando todas as probabilidades os ingleses destruíram boa parte da esquadra de seus mais poderosos adversários O Oceano Atlântico estava agora aberto aos ingleses em termos mais igualitários Sem essa improvável vitória dos ingleses a cadeia de acontecimentos que criariam a circunstância crítica transformadora e engendrariam as instituições políticas pluralistas da Inglaterra pós1688 jamais teria sido posta em movimento O Mapa 9 mostra o rastro de naufrágios espanhóis durante a perseguição à Armada ao redor das Ilhas Britânicas Evidentemente ninguém em 1588 poderia prever as consequências da feliz vitória inglesa Provavelmente poucos compreenderam na época que o ocorrido constituiria uma circunstância crítica que por sua vez daria origem a uma grande revolução política um século depois Não se presuma porém que determinada circunstância crítica vai necessariamente se desdobrar em uma bemsucedida revolução política ou em mudanças para melhor A história é repleta de exemplos de revoluções e movimentos radicais que substituíram uma tirania por outra em um padrão que o sociólogo alemão Robert Michels alcunhou de lei de ferro da oligarquia uma forma particularmente perniciosa de círculo vicioso Oceano Atlântico Irlanda Manchester Leeds ReinoUnido Birmingham Castelo de Windsor Runnymede Brixham Bélgica França Andorra Portugal Espanha Gibraltar Fronteiras atuais Rotas da Armada Naufrágios Mapa 9 Armada Espanhola naufrágios e pontoschave que criaram a reviravolta O fim do colonialismo nas décadas que se seguiram à Segunda Guerra Mundial gerou circunstâncias críticas para muitas das excolônias Entretanto na maioria dos casos na África subsaariana e em muitos da Ásia os governos pósindependência meteram no bolso uma página do livro de Robert Michels e dedicaramse a repetir e intensificar os abusos perpetrados por seus predecessores em geral estreitando ainda mais a distribuição de poder político desmantelando restrições aos poderosos e solapando os já pífios incentivos proporcionados pelas instituições econômicas aos investimentos e progresso econômico Apenas em alguns poucos casos em sociedades como a de Botsuana ver páginas 313320 as circunstâncias críticas foram usadas para deflagrar um processo de transformação política e econômica que preparou o terreno para o crescimento Do mesmo modo as circunstâncias críticas podem acarretar uma guinada em direção a instituições extrativistas em vez de um afastamento As instituições inclusivas embora contem com seu próprio mecanismo de retroalimentação o círculo virtuoso também podem reverter seu curso e tornarse paulatinamente mais extrativistas em virtude de desafios no seu decorrer e se isso acontecerá ou não será de novo casual A República Veneziana como veremos no Capítulo 6 deu largos passos rumo a instituições políticas e econômicas inclusivas no período medieval porém enquanto tais instituições foram pouco a pouco se fortalecendo na Inglaterra após a Revolução Gloriosa de 1688 em Veneza acabariam se configurando em instituições extrativistas sob o controle de uma elite reduzida de posse do monopólio tanto das oportunidades econômicas quanto do poder político COMPREENDENDO O CONTEXTO ATUAL A emergência de uma economia de mercado na Inglaterra do século XVIII baseada em instituições inclusivas e no crescimento econômico sustentado teria reflexos em todo o mundo e não menos por ter possibilitado à Inglaterra colonizar boa parte do globo Contudo se a influência do crescimento econômico inglês sem dúvida espalhouse pelo planeta as instituições econômicas e políticas por ele responsáveis não se difundiram de forma automática A disseminação da Revolução Industrial gerou diferentes efeitos sobre o mundo do mesmo modo que a peste negra teve consequências distintas sobre Oeste e Leste Europeu assim como a expansão do comércio atlântico teve impactos diferentes sobre Inglaterra e Espanha Foram as instituições em vigor nas várias partes do mundo que determinaram como cada uma seria afetada e tais instituições eram de fato distintas devido a pequenas diferenças que foram sendo ampliadas ao longo do tempo por circunstâncias críticas anteriores As discrepâncias institucionais e suas implicações tendem a persistir até o presente ainda que de maneira imperfeita em virtude dos círculos viciosos e virtuosos e são a chave para compreender tanto a emergência das desigualdades no mundo quanto a natureza do atual estado de coisas Certas regiões do mundo desenvolveram instituições muito próximas àquelas da Inglaterra ainda que por vias as mais diversas Foi o caso particularmente de algumas das colônias de povoamento europeias como Austrália Canadá e Estados Unidos muito embora suas instituições se encontrassem ainda em formação no decorrer da Revolução Industrial Como vimos no Capítulo 1 um processo iniciado com a fundação da colônia de Jamestown em 1607 e que culminou na Guerra de Independência e promulgação da Constituição americana compartilha muitas das mesmas características da longa batalha na Inglaterra entre Parlamento e monarquia uma vez que levou também a um Estado centralizado com instituições políticas pluralistas Assim a Revolução Industrial disseminouse rapidamente por vários países A Europa Ocidental que experimentou muitos dos mesmos processos históricos tinha instituições similares às inglesas na época da Revolução Industrial Havia diferenças sutis mas significativas entre a Inglaterra e o resto e por isso a Revolução Industrial deuse na Inglaterra e não na França A revolução criou então um contexto absolutamente inédito assim como uma série de desafios específicos para os regimes europeus que por sua vez deu origem a uma nova sucessão de conflitos que culminariam na Revolução Francesa Esta constituiria uma nova circunstância crítica que fez as instituições da Europa Ocidental irem ao encontro das inglesas ao passo que o Leste Europeu distanciavase ainda mais O resto do mundo seguiu outras trajetórias institucionais A colonização europeia abriu caminho para a divergência institucional nas Américas onde em contraste com as instituições inclusivas surgidas nos Estados Unidos e Canadá a América Latina caracterizouse pelas extrativistas o que explica os padrões de desigualdade observados no continente As instituições políticas e econômicas extrativistas implementadas pelos conquistadores hispânicos na América Latina perduraram condenando a maior parte da região à pobreza Argentina e Chile no entanto saíramse consideravelmente melhor do que a maior parte dos demais países latinoamericanos Sem uma grande população nativa nem riquezas minerais foram ambos negligenciados pelos espanhóis que preferiram concentrarse nas terras ocupadas pelas civilizações asteca maia e inca Não é coincidência que a área mais pobre da Argentina seja o noroeste único setor do país integrado à economia colonial espanhola Sua pobreza persistente e o legado de instituições extrativistas são análogos àqueles criados pela mita de Potosí na Bolívia e no Peru páginas 1213 A África foi a parte do mundo cujas instituições mostraramse menos capazes de tirar proveito das oportunidades propiciadas pela Revolução Industrial Durante pelo menos os últimos mil anos exceto por bolsões localizados e por períodos limitados de tempo a África ficou muito atrasada em relação ao resto do mundo em termos de tecnologia desenvolvimento político e prosperidade Nessa região do mundo os Estados centralizados se formaram muito tarde e com contornos muito tênues Onde efetivamente se constituíram tendiam a ser altamente absolutistas como o Congo e em geral logo entravam em colapso A África compartilha essa trajetória de falta de centralização com países como Afeganistão Haiti e Nepal que também têm se mostrado incapazes de impor a ordem em seus territórios e instaurar um quadro que se aproximasse minimamente da estabilidade e lhes permitisse alcançar o mais módico dos progressos econômicos Apesar de localizados em partes completamente distintas do mundo Afeganistão Haiti e Nepal têm muito em comum em termos institucionais com a maioria dos países da África subsaariana figurando portanto entre os mais pobres países do mundo hoje A transformação sofrida pelas instituições africanas até chegarem à sua atual forma extrativista mais uma vez ilustra o processo de diferenciação institucional pontuado por circunstâncias críticas só que dessa vez em geral com resultados altamente perversos sobretudo no período da expansão do tráfico de escravos através do Atlântico Surgiram novas oportunidades econômicas para o Reino do Congo com a chegada dos traficantes europeus O comércio de longa distância que mudou a face da Europa também modificou o Reino do Congo mas também aqui as divergências institucionais iniciais fizeram toda a diferença O absolutismo congolês transmutouse de um regime com total domínio da sociedade por meio de instituições econômicas extrativistas que se apropriavam da produção agrícola de seus cidadãos a um governo que escravizava e vendia em massa a sua população para os portugueses em troca de armas e artigos de luxo para a elite local As diferenças iniciais entre Inglaterra e Congo levaram na primeira à criação pelas novas oportunidades comerciais de longa distância de uma circunstância crítica no sentido de instituições políticas pluralistas ao mesmo tempo no segundo puseram fim a toda e qualquer esperança de extinção do absolutismo Em grande parte da África os lucros substanciais obtidos com o tráfico de escravos promoveram não só sua intensificação e a exacerbação da insegurança dos direitos de propriedade da população como também conflitos violentos e a destruição de muitas das instituições existentes em poucos séculos todo e qualquer traço de centralização do Estado foi revertido por completo e muitos dos Estados africanos estavam aniquilados Ainda que alguns Estados novos e às vezes poderosos tenham surgido para explorar o tráfico de escravos eram baseados no belicismo e na pilhagem A mesma circunstância crítica da descoberta das Américas que tanto ajudou a Inglaterra a desenvolver instituições inclusivas apenas tornou as instituições africanas ainda mais extrativistas Embora o tráfico de escravos estivesse basicamente encerrado a partir de 1807 o colonialismo europeu subsequente não só reverteu a incipiente modernização econômica em algumas partes do sul e do oeste da África como também eliminou qualquer possibilidade de reforma das instituições locais Por conseguinte mesmo fora de regiões como Congo Madagascar Namíbia e Tanzânia onde a pilhagem a violência generalizada e o genocídio eram a regra a África tinha poucas chances de alterar sua trajetória institucional Pior ainda as estruturas coloniais muniram o continente na década de 1960 de um legado institucional ainda mais complexo e pernicioso do que o dos primórdios do período colonial O desenvolvimento de instituições políticas e econômicas em muitas colônias africanas significou que em vez de gerar uma circunstância crítica propícia ao seu aprimoramento institucional a independência abriu uma brecha para que líderes inescrupulosos assumissem o poder e intensificassem a exploração até então promovida pelos colonialistas europeus Os incentivos políticos proporcionados por essas estruturas criaram um estilo de política que veio apenas reproduzir os padrões históricos de direitos de propriedade inseguros e ineficientes sob Estados com fortes tendências absolutistas mas não obstante desprovidos de qualquer autoridade centralizada sobre seus territórios A Revolução Industrial ainda não se disseminou pela África porque o continente atravessou um longo círculo vicioso de persistência e recriação de instituições políticas e econômicas extrativistas Botsuana é uma exceção Como veremos páginas 313320 no século XIX o Rei Khama avô do primeiro primeiroministro de Botsuana por ocasião da independência Seretse Khama deflagrou mudanças institucionais no sentido de modernizar as instituições políticas e econômicas de sua tribo Caso único tais mudanças não chegaram a ser destruídas durante o período colonial em parte graças à inteligente tática de Khama e outros chefes de desafiar a autoridade da metrópole e sua interrelação com a circunstância crítica gerada pela independência lançou as bases do êxito econômico e político do país Mais um caso de peculiaridades históricas discretas que fizeram a diferença Há uma tendência a encarar os acontecimentos históricos como consequências inevitáveis de forças arraigadas Contudo por mais ênfase que demos à criação de círculos viciosos e virtuosos pela história das instituições econômicas e políticas o acaso como salientamos no contexto do desenvolvimento das instituições inglesas sempre pode ser um fator Seretse Khama que foi estudar na Inglaterra na década de 1940 apaixonouse por Ruth Williams uma branca Diante disso o regime racista do apartheid sulafricano persuadiu o governo inglês a banilo do protetorado então chamado de Bechuanalândia cuja administração encontravase a cargo do Alto Comissário da África do Sul e ele abdicou da coroa Ao retornar para comandar a resistência anticolonialista tinha a firme intenção não de reforçar as instituições tradicionais mas de adaptálas ao mundo moderno Khama foi um homem extraordinário sem interesse no enriquecimento pessoal e devotado à construção de seu país A maioria dos demais países africanos não teve a mesma sorte Os dois aspectos tanto o desenvolvimento histórico das instituições em Botsuana quanto os fatores contingentes que levaram à sua edificação fizeram a diferença em vez de fazer com que fossem destruídas ou distorcidas como aconteceu no resto da África NO SÉCULO XIX um absolutismo não muito distinto daquele que imperava na África ou no Leste Europeu bloqueava o caminho da industrialização na maior parte da Ásia Na China o Estado era marcadamente absolutista e industriais mercadores e cidades independentes não existiam ou eram muito mais fracos em termos políticos A China era uma grande potência naval tendo se envolvido em volumoso comércio de longa distância muitos séculos antes dos europeus Entretanto havia deixado os oceanos justamente no momento errado quando os imperadores Ming chegaram à conclusão no final do século XIV e início do XV de que a intensificação do comércio de longa distância e a destruição criativa que daí adviria talvez lhes ameaçasse o trono Na Índia a diferenciação institucional funcionou de outra maneira levando ao desenvolvimento de um sistema de castas de rigidez ímpar que restringia o funcionamento dos mercados e a alocação de mão de obra pelos diferentes ofícios com rigor muito maior que o da ordem feudal na Europa medieval além de sustentar outro forte regime absoluto sob o domínio mogol A maioria dos países europeus contava com sistemas similares na Idade Média Certos sobrenomes anglosaxões atuais como Baker Cooper e Smith são descendentes diretos das categorias profissionais hereditárias Os Bakers padeiros faziam pão os Coopers tanoeiros fabricavam tonéis os Smiths ferreiros trabalhavam o ferro Entretanto essas categorias nunca foram tão rígidas quanto a divisão de castas indiana e foram aos poucos perdendo o sentido como indicadoras da ocupação de cada um Na Índia ainda que houvesse mercadores que se dedicavam ao comércio por todo o Oceano Índico e tenha surgido uma ativa indústria têxtil o sistema de castas e o absolutismo mogóis constituíram sérios impedimentos ao desenvolvimento de instituições inclusivas econômicas no país No século XIX a situação tornouse ainda menos propícia à industrialização visto que a Índia tornouse uma colônia de exploração da Inglaterra A China nunca chegou a ser formalmente colonizada por uma potência europeia muito embora depois da derrota para os ingleses nas guerras do ópio entre 1839 e 1842 e de novo mais adiante entre 1856 e 1860 os chineses tivessem de assinar uma série de tratados humilhantes permitindo a entrada das exportações europeias À medida que a China a Índia e outras regiões foram se mostrando incapazes de tirar vantagem das oportunidades comerciais e industriais a Ásia exceto pelo Japão foi ficando para trás enquanto a Europa Ocidental ganhava a dianteira a todo vapor O CURSO DOS RUMOS institucionais seguidos pelos japoneses no século XIX outra vez ilustra a interação entre as circunstâncias críticas e diferenças sutis geradas pela diferenciação institucional O Japão como a China vivia sob um regime absolutista A família Tokugawa subiu ao poder em 1600 e assumiu o controle de um sistema feudal que também baniu o comércio internacional O Japão também enfrentou uma circunstância crítica criada pela intervenção ocidental quando quatro navios de guerra americanos sob o comando de Matthew C Perry adentraram a Baía de Edo em julho de 1853 e impuseram concessões comerciais análogas àquelas arrancadas aos chineses pela Inglaterra nas guerras do ópio Todavia essa circunstância crítica teve desdobramentos muito distintos no Japão Apesar de sua proximidade e frequência das interações no século XIX as instituições de China e Japão já se haviam diferenciado Embora o governo Tokugawa no Japão fosse absolutista e extrativista sua ascendência sobre os principais líderes dos demais domínios feudais era tênue e passível de questionamentos Apesar das rebeliões de camponeses e de insurreições civis na China o absolutismo era mais forte e a oposição menos organizada e autônoma Não se encontravam aí os equivalentes a líderes de outros domínios capazes de fazer frente ao regime absolutista do imperador e traçar uma alternativa institucional Essa peculiaridade institucional sob vários aspectos insignificante se comparada às diferenças que separavam a China e o Japão da Europa Ocidental teve consequências decisivas durante a circunstância crítica engendrada pela entrada forçada de ingleses e americanos A China prosseguiu em seu caminho absolutista após as guerras do ópio ao passo que a ameaça americana consolidou a oposição ao governo Tokugawa no Japão e desencadeou uma revolução política a Restauração Meiji como veremos no Capítulo 10 Essa revolução política japonesa possibilitou o desenvolvimento de novas instituições políticas e econômicas inclusivas lançando as bases para o acelerado crescimento japonês subsequente ao passo que a China se arrastava sob o absolutismo A reação japonesa à ameaça representada pelos navios de guerra americanos deflagrando um processo de transformação institucional fundamental nos ajuda a entender outro aspecto do nosso contexto atual as transições da estagnação para o rápido crescimento Coreia do Sul Taiwan e por fim a China alcançaram índices vertiginosos de crescimento econômico desde a Segunda Guerra Mundial percorrendo uma trajetória similar àquela outrora descrita pelos japoneses Em cada um desses casos o crescimento foi precedido por mudanças históricas nas instituições econômicas desses países ainda que nem sempre em suas instituições políticas como revela o caso chinês A lógica de como episódios de crescimento acentuado encontram um fim abrupto e entram em reversão também está relacionada Do mesmo modo como medidas decisivas em favor de instituições econômicas inclusivas podem provocar rápido crescimento econômico um brusco afastamento dessas instituições pode levar à estagnação econômica Com frequência ainda maior porém o colapso de um surto de crescimento como ocorreu na Argentina ou na União Soviética é resultado do esgotamento de um episódio de crescimento sob instituições extrativistas Como vimos isso pode ser fruto de disputas internas em torno dos despojos do extrativismo fazendo o regime ir a pique ou do limite imposto ao crescimento sustentado pela inerente falta de inovação e destruição criativa sob instituições extrativistas O modo como os soviéticos se chocaram contra esses limites será discutido em mais detalhes no próximo capítulo SE AS INSTITUIÇÕES POLÍTICAS e econômicas da América Latina ao longo dos últimos 500 anos foram moldadas pelo colonialismo espanhol as do Oriente Médio sofreram a influência do colonialismo otomano Em 1453 os otomanos comandados pelo sultão Maomé II capturaram Constantinopla e a adotaram como capital No resto do século conquistaram uma vasta fatia dos Bálcãs e a maior parte do restante da Turquia Na primeira metade do século XVI o domínio otomano estendeuse sobre todo o Oriente Médio e o Norte da África Em 1566 ano da morte do sultão Solimão I alcunhado de Magnífico seu império ia desde a Tunísia no extremo oeste passando pelo Egito chegando a Meca na Península Arábica até o atual Iraque O Estado otomano era absolutista o sultão prestava contas a poucos e não dividia o poder com ninguém As instituições econômicas impostas por eles eram extremamente extrativistas Não havia propriedade privada da terra que a rigor pertencia toda ao Estado A carga tributária que incidia sobre a terra e a produção agrícola junto com os despojos das guerras constituía a principal fonte de receita do governo Não obstante o Estado otomano não exercia sobre o Oriente Médio o mesmo grau de controle que tinha sobre sua terra natal a Anatólia nem aquele do Estado espanhol sobre a sociedade latinoamericana sofrendo constantes desafios de parte dos beduínos e outras potências tribais na Península Arábica Faltavamlhe tanto a capacidade de impor uma ordem estável sobre a maior parte do Oriente Médio como também recursos administrativos para a arrecadação dos impostos Sendo assim estes foram delegados o direito de coletar impostos foi vendido a indivíduos autorizados a cobrálos como bem entendessem Esses cobradores de impostos tornaramse autônomos e poderosos A carga tributária nos territórios do Oriente Médio era altíssima variando entre metade ou dois terços de toda a produção agrícola Grande parte dessa renda era retida nas mãos dos cobradores Como o Estado otomano mostrouse incapaz de implementar uma ordem estável na região os direitos de propriedade eram inseguros e a ilegalidade e o banditismo grassavam sob a forma de grupos armados que disputavam o controle local Na Palestina por exemplo a situação era tão nefasta que a partir do final do século XVI os camponeses abandonaram as terras mais férteis e deslocaramse para as montanhas que lhes proporcionavam mais proteção contra os bandidos Nas áreas urbanas do Império Otomano as instituições econômicas extrativistas não eram menos esmagadoras O comércio encontravase sob o controle estatal e os vários ofícios estavam submetidos à rígida regulamentação de guildas e monopólios Em consequência na época da Revolução Industrial as instituições econômicas vigentes no Oriente Médio eram extrativistas e a economia da região estagnouse Na década de 1840 os otomanos tentaram reformar suas instituições por exemplo revertendo o mecanismo de cobradores individuais e submetendo grupos autônomos locais Todavia o absolutismo persistiria até o fim da Primeira Guerra Mundial e as tentativas de reforma seriam frustradas pelos habituais temores em relação à destruição criativa e pela ansiedade das elites dominantes em relação à possibilidade de perda econômica ou política Embora os reformadores otomanos falassem na adoção de direitos à propriedade privada da terra com vistas ao aumento da produtividade agrícola o status quo se manteve devido ao desejo de controle político e tributação À colonização otomana sucedeuse a europeia após 1918 Uma vez encerrado o controle europeu instalouse a mesma dinâmica que vimos na África subsaariana com as instituições coloniais extrativistas agora nas mãos das elites independentes Em alguns casos como a monarquia jordaniana esses setores da sociedade foram uma criação direta das potências coloniais o que também ocorreu com frequência na África como veremos Os países do Oriente Médio desprovidos de petróleo hoje têm níveis de renda próximos aos dos países latinoamericanos pobres mesmo não tendo sofrido com forças geradoras de miséria como o tráfico de escravos e tendo se beneficiado por um período mais longo dos fluxos de tecnologia provenientes da Europa Na Idade Média o próprio Oriente Médio também era uma região relativamente avançada do mundo em termos econômicos No entanto hoje embora não seja tão miserável quanto a África a maior parte de sua população ainda vive na pobreza VIMOS QUE NEM as teorias baseadas na ignorância ou na ordem cultural nem em fatores geográficos são úteis para explicar o atual estado de coisas que nos cerca pois não oferecem uma explicação satisfatória para os padrões de desigualdade mundial isto é o fato de que o processo de disparidade econômica teve início com a Revolução Industrial na Inglaterra durante os séculos XVIII e XIX difundindose em seguida pela Europa Ocidental e colônias de povoamento europeias a persistente divergência entre as diversas partes das Américas a pobreza da África e do Oriente Médio as diferenças entre Europa Ocidental e Leste Europeu as transições da estagnação para a expansão e as interrupções por vezes abruptas de surtos de crescimento Nossa teoria institucional sim Nos capítulos restantes vamos discutir de maneira mais minuciosa o funcionamento dessa teoria institucional e ilustrar o amplo leque de fenômenos que ela pode cobrir das origens da Revolução Neolítica ao colapso de várias civilizações seja devido aos limites intrínsecos do crescimento sob instituições extrativistas ou à reversão de uns poucos passos titubeantes em direção a maior inclusão Veremos como e por que medidas decisivas rumo a instituições políticas inclusivas foram tomadas durante a Revolução Gloriosa na Inglaterra examinando mais especificamente os seguintes fatores Como as instituições inclusivas nasceram da interrelação da circunstância crítica produzida pelo comércio atlântico e a natureza das instituições inglesas já existentes Como essas instituições persistiram e fortaleceramse a ponto de lançar as bases da Revolução Industrial graças em parte ao círculo virtuoso e em parte a certos acasos felizes Como muitos regimes dominados por instituições absolutistas e extrativistas opuseram resistência ferrenha à difusão de novas tecnologias deflagrada pela Revolução Industrial Como os próprios europeus anularam toda e qualquer possibilidade de crescimento econômico em muitas das regiões do mundo que conquistaram Como o círculo vicioso e a lei de ferro da oligarquia geraram uma tendência irresistível à persistência das instituições extrativistas fazendo as regiões para as quais a Revolução Industrial não se disseminou originalmente permanecerem relativamente pobres Por que a Revolução Industrial e outras novas tecnologias não se difundiram e dificilmente se difundirão para regiões do mundo em que hoje ainda não se atingiu um grau mínimo de centralização do Estado Nossa discussão mostrará também que determinadas regiões que lograram transformar suas instituições no sentido de um maior grau de inclusão como Japão ou França ou que impediram o estabelecimento de instituições extrativistas como Estados Unidos ou Austrália mostraramse mais receptivas à Revolução Industrial e saltaram à frente das demais Como na Inglaterra o processo nem sempre foi suave e ao longo do caminho foram superados muitos desafios às instituições inclusivas às vezes devido à dinâmica do círculo virtuoso às vezes graças aos rumos contingentes da história Por fim debateremos também como o fracasso de certos países hoje é profundamente influenciado por suas histórias institucionais quanto de suas políticas baseiase em hipóteses incorretas e é potencialmente danoso e como os países ainda são capazes de aproveitar as circunstâncias críticas para romper paradigmas reformar suas instituições e enveredar por caminhos conducentes a maior prosperidade A 5 EU VI O FUTURO E ELE FUNCIONA O CRESCIMENTO SOB INSTITUIÇÕES EXTRATIVISTAS EU VI O FUTURO S DIFERENÇAS INSTITUCIONAIS desempenham papel crítico na explicação do crescimento econômico através dos tempos Contudo se a maioria das sociedades ao longo da história baseiase em instituições políticas e econômicas extrativistas será que o crescimento jamais ocorrerá Claro que não As instituições extrativistas por sua própria lógica têm de gerar riqueza que possa ser extraída Um governante que monopolize o poder político e esteja no controle de um Estado centralizado pode introduzir algum grau de lei e ordem e um sistema de regras bem como estimular a atividade econômica Entretanto o crescimento sob instituições extrativistas é de natureza distinta daquele fomentado por instituições inclusivas Sobretudo não será um crescimento sustentado que demande mudança tecnológica mas se baseará nas tecnologias existentes A trajetória econômica da União Soviética constitui uma vívida ilustração de como a autoridade e incentivos oferecidos pelo Estado podem produzir um surto de crescimento econômico sob instituições extrativistas e como esse tipo de crescimento acaba se esgotando e entrando em colapso A PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL havia chegado ao fim e as potências vitoriosas e derrotadas reuniramse no grande Palácio de Versalhes perto de Paris para definir os parâmetros da paz Entre os participantes destacavase Woodrow Wilson presidente dos Estados Unidos Uma ausência notória foi a de qualquer representação da Rússia O velho regime czarista fora derrubado pelos bolcheviques em outubro de 1917 Desde então grassava uma guerra civil entre Vermelhos os bolcheviques e Brancos Ingleses franceses e americanos enviaram forças expedicionárias para combater os bolcheviques Uma missão comandada por um jovem diplomata William Bullitt e o veterano intelectual e jornalista Lincoln Steffens foi enviada a Moscou para conversar com Lênin e tentar compreender as intenções dos bolcheviques e como chegar a algum acordo com eles Steffens fizera fama como iconoclasta um jornalista investigativo que se dedicava à denúncia dos males do capitalismo nos Estados Unidos Estivera na Rússia na época da revolução Sua presença tinha o objetivo de conferir credibilidade à missão e fazer não parecer tão hostil Os dois retornaram com o esboço de uma proposta de Lênin com relação às demandas da recémcriada União Soviética para a paz Steffens estava desconcertado com o que considerava o grande potencial do regime soviético A Rússia soviética recordaria ele em sua autobiografia de 1931 era um governo revolucionário com planejamento evolucionário Seu plano não era enfrentar males como pobrezas e riquezas subornos privilégios tiranias e guerras de maneira direta mas buscar e eliminar suas causas Haviam implementado uma ditadura com o apoio de uma pequena minoria bem preparada para promover e manter por algumas gerações um rearranjo científico de forças econômicas que produziriam primeiro uma democracia econômica e depois política Ao voltar de sua missão diplomática Steffens foi visitar seu velho amigo o escultor Jo Davidson e encontrouo trabalhando em um busto do rico financista Bernard Baruch Quer dizer que você foi à Rússia não é perguntou Baruch Steffens respondeu Fui até o futuro E funciona Mais tarde ele aprimoraria seu adágio formulandoo de um modo que entraria para a história Eu vi o futuro e ele funciona Até princípios da década de 1980 muitos ocidentais continuavam vendo o futuro na União Soviética e ainda acreditavam que estava funcionando Em certo sentido estava mesmo ou pelo menos funcionou durante algum tempo Lênin havia morrido em 1924 e em 1927 Joseph Stálin havia consolidado seu domínio do país Promoveu o expurgo de seus opositores e lançou um programa para a rápida industrialização do país Para tanto municiou o Comitê Estatal de Planejamento Gosplan criado em 1921 O Gosplan foi responsável pela elaboração do primeiro Plano Quinquenal em vigor entre 1928 e 1933 O crescimento econômico à Stálin era simples consistia em desenvolver a indústria por determinação do governo obtendo os recursos necessários para tanto mediante a imposição de uma carga tributária esmagadora sobre a agricultura Como o Estado comunista não dispunha de um sistema eficaz de arrecadação Stálin optou por coletivizar a agricultura processo que implicou a abolição dos direitos de propriedade privada da terra e a aglomeração de toda a população rural em gigantescas fazendas coletivas dirigidas pelo Partido Comunista Assim ficou bem mais fácil para Stálin se apropriar da produção agrícola e usála para alimentar todos os trabalhadores que estavam construindo e operando as novas fábricas todavia as consequências para o povo do campo foram desastrosas As fazendas coletivas eram completamente destituídas de incentivos para que as pessoas se empenhassem e a produção sofreu uma queda vertiginosa Era extraída parcela tão grande da produção que não sobrava o suficiente para comer e a fome se instalou No fim das contas provavelmente seis milhões de pessoas morreram de fome enquanto centenas de milhares de outras foram assassinadas ou deportadas para a Sibéria durante o processo de coletivização compulsória Nem a indústria recémcriada nem as fazendas coletivizadas eram eficientes economicamente no sentido de fazerem o melhor uso possível dos recursos de que a União Soviética dispunha Parece uma receita de estagnação e desastre econômicos senão rematado colapso No entanto a União Soviética cresceu rapidamente e não é difícil entender por quê Permitir que cada um tome suas próprias decisões por intermédio dos mercados é a melhor maneira de uma sociedade gerir seus recursos com eficiência Quando pelo contrário o Estado ou uma pequena elite assumem o controle de todos esses recursos nem os incentivos corretos serão criados nem haverá alocação eficaz das competências e talentos das pessoas Em alguns casos porém a produtividade da mão de obra e do capital podem ser tão mais altos em determinado setor ou atividade como a indústria pesada na União Soviética que mesmo um processo imposto de cima para baixo sob instituições extrativistas que alocam recursos para aquele setor é capaz de gerar crescimento Como vimos no Capítulo 3 as instituições extrativistas nas ilhas do Caribe como Barbados Cuba Haiti e Jamaica lograram fomentar níveis de receita relativamente elevados por alocarem recursos para a produção de açúcar mercadoria cobiçada em todo o mundo A produção de açúcar baseada na escravidão por certo nada tinha de eficiente e não havia mudança tecnológica ou destruição criativa nessas sociedades mas isso não as impediu de alcançar alguma medida de crescimento sob as instituições extrativistas Na União Soviética deuse situação similar com a indústria desempenhando o papel da canade açúcar no Caribe O crescimento industrial na União Soviética foi facilitado também por seu grau de atraso tecnológico em relação ao que havia disponível na Europa e Estados Unidos de modo que se podiam obter grandes ganhos pela realocação de recursos para a indústria ainda que tudo se desse de maneira ineficiente e imposta Até 1928 a maioria dos russos vivia no campo A tecnologia usada pelos camponeses era primária e poucos eram os incentivos à produtividade Com efeito os derradeiros vestígios do feudalismo russo só foram erradicados pouco antes da Primeira Guerra Mundial Um imenso potencial econômico irrealizado foi despertado ao realocarse tamanho volume de mão de obra da agricultura para a indústria A industrialização stalinista foi uma maneira brutal de liberar esse potencial Por decreto Stálin desviou aqueles recursos tão mal empregados para a indústria onde seriam utilizados de forma mais produtiva ainda que a indústria em si fosse organizada de maneira muito ineficiente sobretudo se comparada ao que se poderia ter alcançado De fato entre 1928 e 1960 a renda nacional cresceu a uma taxa de 6 ao ano provavelmente o mais agressivo surto de crescimento econômico já registrado até então Esse rápido crescimento econômico foi consequência não de uma mudança tecnológica mas da realocação de mão de obra e da acumulação de capital por meio da criação de novas ferramentas e fábricas O crescimento foi tão abrupto que mesmerizou gerações de ocidentais não só Lincoln Steffens A Agência Central de Inteligência americana a CIA ficou mesmerizada Os próprios líderes soviéticos deixaramse fascinar como aconteceu com Nikita Khrushchev que se vangloriou em 1956 num discurso a diplomatas ocidentais Vamos enterrar vocês o Ocidente Ainda em 1977 um economista inglês defendia em um livro de referência muito considerado nos meios acadêmicos que as economias ao estilo soviético eram superiores às capitalistas em termos de crescimento econômico sendo capazes de proporcionar emprego pleno e estabilidade de preços e até de injetar na população motivações altruístas O pobre e velho capitalismo ocidental cansado de guerra só se saía melhor mesmo na concessão de liberdades políticas Com efeito o livro didático mais utilizado nas faculdades de Economia de autoria do ganhador do Prêmio Nobel Paul Samuelson previa repetidamente a iminente preponderância econômica da União Soviética Na edição de 1961 Samuelson previa que a renda soviética teria ultrapassado a americana possivelmente em 1984 mas mais provavelmente até 1997 Na edição de 1980 houve ligeira alteração na análise sendo as duas datas adiadas respectivamente para 2002 e 2012 Embora as políticas de Stálin e das lideranças soviéticas posteriores tenham logrado gerar um rápido crescimento econômico este não se revelou sustentado Na década de 1970 o crescimento econômico havia parado A mais importante lição a se tirar daí é que as instituições extrativistas são incapazes de gerar uma mudança tecnológica sustentada por dois motivos falta de incentivos econômicos e resistência das elites Ademais uma vez que todos os recursos tão mal utilizados haviam sido realocados para a indústria não restavam maiores ganhos econômicos adicionais a alcançar por decreto Nesse ponto o sistema soviético chegou a um impasse com a falta de inovação e a insuficiência de incentivos econômicos estorvando a continuidade do progresso O único campo em que os soviéticos conseguiram efetivamente manter algum grau de inovação foi graças a um esforço hercúleo na tecnologia militar e aeroespacial Assim conseguiram levar a primeira cadela Laika e o primeiro homem Yuri Gagárin ao espaço além de deixar ao mundo o AK47 como um de seus legados O Gosplan era o supostamente todopoderoso órgão incumbido do planejamento central da economia soviética Um dos benefícios da sequência de planos quinquenais escritos e administrados pelo Gosplan seria em teoria o longo horizonte de tempo necessário à inovação e ao investimento racionais Na prática porém o que era de fato implementado na indústria soviética pouca relação guardava com os planos quinquenais que eram revisados ou reescritos com frequência ou ignorados O desenvolvimento da indústria se deu na base de comandos de Stálin e do Politburo que volta e meia mudavam de ideia e não raro reviam por completo suas decisões anteriores Todos os planos eram classificados como esboços ou preliminares Uma única cópia de um plano considerado final aquele referente à indústria leve em 1939 chegou a ver a luz do dia O próprio Stálin comentou em 1937 que só mesmo os burocratas podem acreditar que o planejamento do trabalho termina com a criação do plano A criação do plano é apenas o começo Os rumos reais tomados pelo plano emergem somente depois de ele ser concluído Stálin queria maximizar sua liberdade para recompensar as pessoas ou grupos que lhe eram politicamente fieis e punir os que não fossem Quanto ao Gosplan sua função principal era fornecer informações a Stálin para que ele melhor pudesse monitorar seus amigos e inimigos Na verdade o órgão evitava tomar decisões Afinal quem tomasse uma decisão malograda poderia ser condenado ao pelotão de fuzilamento Melhor evitar qualquer responsabilidade Um exemplo do que podia acontecer com quem levasse o trabalho a sério demais em vez de ter a sensibilidade de adivinhar os desejos do Partido Comunista é o caso do censo soviético de 1937 À medida que os resultados parciais iam chegando foi ficando claro que apontariam para uma população de cerca de 162 milhões muito menos do que os 180 milhões antevistos por Stálin e de fato abaixo dos 168 milhões que o próprio Stálin anunciara em 1934 O censo de 1937 era o primeiro realizado desde 1926 e portanto o primeiro após as grandes fomes e os expurgos do começo da década de 1930 Os números corretos da população refletiam esses acontecimentos A reação de Stálin foi mandar prender e deportar para a Sibéria ou matar os organizadores do censo Ordenou então a realização de outro ocorrido em 1939 Dessa vez os recenseadores acertaram descobriram que a União Soviética contava com 171 milhões de habitantes Stálin entendia que na economia soviética as pessoas não dispunham de maiores incentivos para se empenhar Uma resposta natural seria introduzir tais incentivos o que ele às vezes fazia por exemplo direcionando víveres para as áreas onde a produtividade havia caído a fim de recompensar os êxitos Ademais já em 1931 ele havia abandonado a ideia de criar homens e mulheres socialistas que trabalhariam sem nenhum incentivo monetário Em um discurso célebre criticou a perpetração da igualdade e dali por diante não só diferentes ocupações passaram a contar com remunerações distintas como também se adotou um sistema de bonificação É instrutivo entender como era o seu funcionamento Normalmente uma empresa sob planejamento central precisava cumprir determinada meta de produção estabelecida pelo plano ainda que os planos fossem com frequência renegociados e alterados A partir da década de 1930 os trabalhadores passaram a receber bônus caso os resultados almejados fossem atingidos Os prêmios podiam ser bastante altos chegando por exemplo até 37 do salário dos gerentes ou engenheiros seniores Seu pagamento porém acarretava todo tipo de desestímulo à mudança tecnológica visto que qualquer inovação desviaria recursos da produção atual implicando o risco do não cumprimento das metas de produção e o não pagamento dos bônus Ademais as metas de produção em geral baseavamse nos níveis de produção anteriores o que constituía enorme incentivo para jamais expandir a produção o que só significaria ter de produzir mais no futuro já que as metas dali por diante seriam ampliadas Manter um desempenho mediano era sempre a melhor maneira de atingir as metas e assegurar a bonificação O fato de esta ser mensal também mantinha todos focados no presente ao passo que toda inovação implica fazer algum sacrifício hoje para obter mais amanhã Mesmo quando bônus e incentivos eram eficazes na promoção da mudança de comportamento acabavam criando outras dificuldades O planejamento central não era uma boa alternativa ao que o economista Adam Smith denominara no século XVIII de mão invisível do mercado Quando o plano era formulado em termos de toneladas de lâminas de aço o aço era fabricado mais pesado Quando era expresso em termos da área das lâminas estas saíam mais finas Quando a meta da fabricação de lustres era colocada em toneladas os lustres eram tão pesados que mal conseguiam susterse nos tetos Na década de 1940 as autoridades do país ainda que não seus admiradores no Ocidente tinham plena consciência desses incentivos perversos Os líderes soviéticos agiam como se se tratassem de problemas técnicos que pudessem ser corrigidos Por exemplo substituíram o pagamento de bônus baseados em metas de produção pela permissão para que as empresas reservassem parte dos lucros para as bonificações Contudo a motivação do lucro revelouse não mais encorajadora da inovação do que aquela baseada em metas de produtividade O sistema de preços a partir dos quais eram calculados os lucros era quase completamente desconectado com o valor de eventuais inovações ou de novas tecnologias Ao contrário das economias de mercado os preços na União Soviética eram definidos pelo governo mantendo pois pouca ou nenhuma relação com o valor Para criar incentivos mais específicos a União Soviética introduziu então bônus explícitos para a inovação em 1946 Desde 1918 reconheciase o princípio de que o inovador deveria receber recompensas monetárias por sua inovação mas estas eram demasiado pequenas e sem relação com o valor da nova tecnologia Essa situação só mudaria em 1956 quando se estipulou que a recompensa fosse proporcional à produtividade da inovação Entretanto uma vez que a produtividade era calculada em termos do benefício econômico mensurado de acordo com o sistema de preços existente continuou não havendo incentivos significativos para inovar Seria possível encher páginas e páginas com exemplos dos incentivos perversos gerados por tais esquemas Por exemplo o fato de o montante total do fundo para o pagamento de bônus por inovação ser limitado pela massa salarial de cada empresa automaticamente reduzia o incentivo para produzir ou adotar qualquer inovação que pudesse poupar mão de obra O foco nas diferentes regras e esquemas de bonificação tende a mascarar os problemas inerentes ao sistema Enquanto a autoridade e o poder políticos estivessem nas mãos do Partido Comunista seria impossível qualquer mudança de fundo nos incentivos básicos com que a população lidava quer se tratasse ou não de bônus Desde a sua concepção o partido usara não só cenouras como iscas mas também chibatas e porretes para conseguir o que queria Com a produtividade na economia não foi diferente Todo um conjunto de leis veio criar delitos penais para os trabalhadores que fossem considerados indolentes Em junho de 1940 por exemplo uma lei enquadrou o absenteísmo definido como qualquer ausência não autorizada de 20 minutos ou mesmo a morosidade no trabalho como delito penal passível de pena de seis meses de trabalhos forçados e um corte de 25 na remuneração Foi introduzida toda sorte de punições similares aplicadas com espantosa assiduidade Entre 1940 e 1955 36 milhões de pessoas cerca de um terço da população adulta foram julgados culpados de delitos dessa ordem Destes 15 milhões foram presos e 250 mil fuzilados A qualquer ano dado haveria um milhão de adultos presos por violações trabalhistas para não falar nos 25 milhões de pessoas exilados por Stálin nos gulags da Sibéria E mesmo assim de nada adiantou Por mais que você possa transferir alguém para uma fábrica não há como obrigar ninguém a pensar e ter boas ideias à força de ameaças de morte A coação nesse nível pode até ter engendrado alta produção de açúcar em Barbados ou na Jamaica mas não poderia compensar a falta de incentivos em uma moderna economia industrial A impossibilidade de incorporar incentivos verdadeiramente eficazes à econômica centralizada não foi devida a erros técnicos no planejamento do sistema de bonificação Era intrínseca ao método por meio do qual fora obtido o crescimento de natureza extrativista fruto de decreto governamental que só poderia solucionar alguns problemas econômicos básicos Contudo para estimular o crescimento econômico sustentado seria preciso que os indivíduos fizessem uso de seus talentos e suas ideias o que jamais seria possível no modelo econômico soviético Seria necessário que os governantes da União Soviética abdicassem das instituições econômicas extrativistas contudo tal iniciativa poria em risco seu poder político Com efeito quando Mikhail Gorbachev começou a abandonar as instituições econômicas extrativistas a partir de 1987 o poder do Partido Comunista caiu por terra arrastando consigo toda a União Soviética A UNIÃO SOVIÉTICA conseguiu gerar um crescimento abrupto mesmo sob instituições extrativistas porque os bolcheviques erigiram um poderoso Estado centralizado e o usaram para alocar recursos para a indústria Todavia como em todos os casos de crescimento sob instituições extrativistas o processo excluía a possibilidade de mudança tecnológica não sendo por isso sustentado A princípio o ritmo do crescimento diminuiu até que desmoronou por completo Mesmo efêmero esse tipo de crescimento ilustra como as instituições extrativistas são capazes de estimular a atividade econômica Ao longo da história a maioria das sociedades foi regida por instituições extrativistas aquelas que lograram impor alguma medida de ordem em seus territórios puderam gerar algum crescimento limitado ainda que nenhuma dessas sociedades extrativistas tenha conseguido obter crescimento sustentado De fato alguns dos momentos mais críticos da história caracterizaramse por inovações institucionais que vieram consolidar instituições extrativistas e aumentaram a autoridade de determinado grupo para impor a lei e a ordem e beneficiarse do extrativismo No restante deste capítulo discutiremos primeiro a natureza das inovações institucionais que estabelecem algum grau de centralização do Estado e possibilitam o crescimento sob instituições extrativistas Em seguida mostraremos como esses conceitos nos ajudam a compreender a Revolução Neolítica a basilar transição para a agricultura que subjaz a tantos aspectos da nossa civilização atual Concluiremos ilustrando com o caso das cidadesestados maias como o crescimento sob instituições extrativistas é limitado não só pela falta de progresso tecnológico mas também por estimular disputas internas entre grupos rivais ávidos por assumir o controle do Estado e beneficiarse dos frutos de seu extrativismo ÀS MARGENS DO CASSAI Um dos maiores tributários do Rio Congo é o Cassai De sua nascente em Angola ele segue para o norte e juntase ao Congo a nordeste de Kinshasa a capital da moderna República Democrática do Congo Por mais pobre que esta seja quando comparada ao resto do mundo sempre houve significativa discrepância na prosperidade dos vários grupos dentro do país O Cassai é a fronteira entre dois deles Logo após sua entrada no território congolês ao longo de suas margens ocidentais encontramos o povo lele na margem oriental ficam os bushong Mapa 6 À primeira vista parece haver poucas diferenças entre os dois grupos com relação ao grau de riqueza São separados por um rio que pode ser transposto de barco As duas tribos têm origem comum e seus idiomas são aparentados Ademais muitos de seus produtos são de estilo similar inclusive casas vestuário e artesanato No entanto quando a antropóloga Mary Douglas e o historiador Jan Vansina estudaram os dois grupos na década de 1950 descobriram algumas diferenças espantosas entre ambos Nas palavras de Douglas Os lele são pobres ao passo que os bushong são ricos Tudo o que os lele têm ou fazem os bushong têm mais e fazem melhor É fácil apresentar algumas explicações simples para tamanha desigualdade Uma diferença que nos lembra aquela que distingue as regiões do Peru que fizeram ou não parte da mita de Potosí é que os lele produziam para a sua subsistência ao passo que os bushong produziam para comercializar no mercado Douglas e Vansina observaram também que os lele faziam uso de tecnologia inferior Por exemplo não usavam redes para caçar ainda que estas proporcionassem grande aumento da produtividade Segundo Douglas a falta de redes é coerente com uma tendência geral dos lele a não investir tempo e mão de obra em equipamentos de longo prazo Havia também distinções consideráveis nas tecnologias e organização agrícolas Os bushong praticavam uma sofisticada forma de cultivo misto na qual cinco produtos eram plantados em sucessão em um sistema de rotação bianual Plantavam inhame batatadoce mandioca e feijão e colhiam duas às vezes três safras de milho por ano Os lele não dispunham de tal sistema e tudo o que conseguiam era uma colheita anual de milho As diferenças também eram marcantes em termos da lei e da ordem Os lele viviam dispersos em aldeias fortificadas envolvidas em constantes escaramuças Quem viajasse de uma para outra ou mesmo se aventurasse na selva para coletar comida corria o risco de um ataque ou sequestro No território bushong algo assim raramente ou nunca acontecia O que há por trás dessas diferenças entre os padrões de produção tecnologia agrícola e ordem vigente É evidente que não foram fatores geográficos que induziram o s lele a adotar tecnologias agrícolas e de caça inferiores Sem dúvida não foi por ignorância porque tinham conhecimento das ferramentas utilizadas pelos bushong Outra explicação poderia ser a cultura seria possível que a cultura dos lele não os estimulasse a investir em redes de caça e habitações mais sólidas e resistentes Tampouco esse parecia ser o caso Como na história do Reino do Congo os lele mostravam grande interesse na compra de armas a ponto de Douglas anotar que a avidez com que adquirem armas de fogo comprova que sua cultura não os restringe a técnicas inferiores quando estas não requerem colaboração e esforço de longo prazo Portanto nem uma aversão cultural à tecnologia nem a ignorância nem a geografia dão conta de explicar a maior prosperidade dos bushong em relação aos lele O que justifica as diferenças entre os dois povos são as diferentes instituições políticas desenvolvidas nas terras de um e de outro Já observamos que os lele viviam em aldeias fortificadas que não integravam uma estrutura política unificada Do outro lado do Cassai a história era outra Por volta de 1620 houve uma revolução política liderada por um homem de nome Shyaam Este fundou o Reino Bacuba que vimos no Mapa 6 tendo os bushong como povo e ele mesmo como soberano Até então havia provavelmente poucas diferenças entre os bushong e os lele as discrepâncias surgiram em consequência do modo como Shyaam reorganizou a sociedade a leste do rio Constituiuse um Estado e uma pirâmide de instituições políticas que eram não só notoriamente mais centralizados do que a estrutura de poder anterior como também envolviam estruturas altamente elaboradas Shyaam e seus sucessores criaram uma burocracia para aumentar os impostos e um sistema legal e uma força policial para administrar a lei Os líderes prestavam contas aos conselhos que deviam consultar antes de tomar qualquer decisão Havia até o julgamento por um corpo de jurados caso ao que tudo indica único na África subsaariana antes do colonialismo europeu Não obstante o Estado centralizado construído por Shyaam era uma ferramenta extrativista e altamente absolutista Ninguém o elegera e as políticas estatais eram determinadas pelo topo não objeto de participação popular Essa revolução política que introduziu tanto a centralização do Estado quanto a lei e a ordem no território bacuba promoveu por sua vez uma revolução econômica A agricultura foi reorganizada com a adoção de novas tecnologias para aumentar a produtividade Os produtos que até então se limitavam a gêneros de primeira necessidade foram substituídos por outros de rendimento mais alto provenientes das Américas sobretudo milho mandioca e pimentas Foi nessa época que se introduziu o ciclo de plantio misto intensivo e a quantidade de alimentos produzidos por cabeça duplicou Para adotar esses produtos e reorganizar o ciclo agrícola houve necessidade de mais mãos nos campos Assim a idade de casar foi reduzida para 20 anos o que inseriu os homens mais cedo na força de trabalho agrícola O contraste com os lele não podia ser maior Seus homens tendiam a casarse aos 35 e só então começavam a trabalhar nos campos Até então dedicavam sua vida a lutas e assaltos A ligação entre a revolução política e econômica foi simples O Rei Shyaam e seus correligionários queriam explorar os impostos e a riqueza dos bacubas que precisavam para tanto produzir um superávit além daquilo que consumiam para sua subsistência Ainda que Shyaam e seus homens não tenham introduzido instituições inclusivas na margem oriental do Cassai algum grau de prosperidade econômica é intrínseco às instituições extrativistas que alcançam algum grau de centralização do Estado e impõem a lei e a ordem Incentivar a atividade econômica era do interesse de Shyaam e seus homens uma vez que de outro modo nada haveria a explorar Assim como Stálin Shyaam criou por decreto um conjunto de instituições capazes de gerar a riqueza necessária para dar sustentação a esse sistema Comparado à total ausência de lei e ordem que imperava na outra margem do Cassai este produziu significativa prosperidade econômica ainda que boa parte dela fosse explorada por Shyaam e sua elite Esse estado de coisas porém era necessariamente restrito Do mesmo modo como na União Soviética não havia destruição criativa no Reino Bacuba nem qualquer inovação tecnológica após essa mudança inicial A situação permaneceria mais ou menos inalterada até as autoridades coloniais belgas se depararem com o reino pela primeira vez no final do século XIX A EMPREITADA DO REI SHYAAM mostra como é possível obter algum grau de êxito econômico por meio de instituições extrativistas A geração de tal crescimento requer um Estado centralizado Para centralizar o Estado em geral é preciso uma revolução política Uma vez criado esse Estado Shyaam pôde lançar mão de seu poder para reorganizar a economia e estimular a produtividade agrícola sobre a qual poderia então impor uma carga tributária Por que os bushong fizeram uma revolução política mas não os lele Os lele não poderiam ter tido seu próprio rei Shyaam Shyaam realizou uma inovação institucional que não estava de modo algum vinculada à geografia cultura ou ignorância Os lele poderiam ter feito uma revolução dessas e analogamente transformado suas instituições mas não foi o que aconteceu Talvez isso se deva a motivos que não temos como compreender em virtude de nossos conhecimentos limitados acerca de sua sociedade então O mais provável é que a causa esteja nos meandros fortuitos da história Foram provavelmente as mesmas contingências que entraram em ação quando algumas das sociedades do Oriente Médio 12 mil anos atrás enveredaram por uma série de inovações institucionais ainda mais radicais que engendrariam sociedades sedentárias e em seguida à domesticação de plantas e animais como veremos a seguir O LONGO VERÃO Por volta de 15000 aC a Era Glacial chegou ao fim e o clima na Terra começou a esquentar Indícios coletados em núcleos de gelo da Groenlândia sugerem que as temperaturas médias subiram cerca de 15C em um breve período o que coincidiu ao que parece com um abrupto aumento da população humana já que o aquecimento global teria propiciado uma expansão das espécies animais e a disponibilidade bem maior de alimentos e plantas silvestres O processo foi rapidamente revertido em torno de 14000 aC durante um período de esfriamento conhecido como Dryas Recentek após 9600 aC porém as temperaturas globais voltaram a subir ganhando cerca de 7C em menos de uma década tendo permanecido elevadas desde então o que o arqueólogo Brian Fagan chama de Longo Verão O aquecimento do clima constituiu uma enorme circunstância crítica que serviria de pano de fundo para a Revolução Neolítica mediante a qual as sociedades humanas realizaram a transição para a vida sedentária a agricultura e a pecuária Esses acontecimentos assim como toda a história humana subsequente se desenrolaram no calor desse Longo Verão Há uma diferença fundamental entre agricultura e pecuária e caça e coleta As duas primeiras baseiamse na domesticação de espécies vegetais e animais com ativa intervenção em seus ciclos de vida inclusive promovendo alterações genéticas de modo a aumentar sua utilidade para os humanos A domesticação constitui uma mudança tecnológica que possibilita aos seres humanos aumentar muito a produção de alimentos a partir dos vegetais e animais existentes A domesticação do milho por exemplo teve início com a coleta do teosinto planta silvestre que foi sua ancestral Os sabugos de teosinto são muito pequenos com no máximo alguns centímetros de comprimento Perto de um sabugo de milho atual são minúsculos Pouco a pouco contudo por meio da seleção das espigas maiores de teosinto e outras plantas cujas espigas não se abriam mas permaneciam na haste para serem colhidas os seres humanos criaram o milho moderno um produto capaz de proporcionar muito mais nutrição a partir do mesmo pedaço de terra As mais antigas evidências de agricultura pecuária e domesticação de vegetais e animais foram encontradas no Oriente Médio sobretudo na região conhecida como Flancos Montanhosos que se estende do sul do atual Israel sobe através da Palestina e da margem ocidental do Rio Jordão passa pela Síria e penetra pelo sudeste da Turquia norte do Iraque e oeste do Irã Por volta de 9500 aC as primeiras plantas domésticas o farro Triticum dicoccum e um tipo de cevada de duas fileiras de grãos eram encontradas em Jericó na margem ocidental do Rio Jordão na Palestina e farro ervilhas e lentilhas em Tell Aswad mais ao norte na Síria Ambas as localidades correspondiam à chamada cultura natufiana e sustentavam aldeias de grande porte a de Jericó contava com uma população de talvez 500 habitantes na época Por que as primeiras aldeias camponesas surgiram aqui e não em qualquer outro lugar Por que foram os natufianos e não algum outro povo que domesticaram as ervilhas e lentilhas Foi um golpe de sorte eles por acaso viverem em uma região onde havia grande variedade de potenciais candidatos à domesticação Sim também contudo muitos outros povos viviam em meio a essas mesmas espécies e não as domesticaram Como vimos no Capítulo 2 nos Mapas 4 e 5 pesquisas de geneticistas e arqueólogos visando ao mapeamento da distribuição dos ancestrais silvestres dos vegetais e animais domésticos modernos revelam que muitos desses ancestrais espalhavamse por áreas muito vastas de milhões de quilômetros quadrados Os ancestrais silvestres das espécies domésticas de animais espalhavamse por toda a Eurásia Por mais que os Flancos Montanhosos fossem particularmente bemdotados em termos de espécies silvestres cultiváveis esta estava longe de ser uma peculiaridade exclusiva Não foi o fato de os natufianos viverem em uma região com características únicas que fez a diferença mas o fato de eles terem se sedentarizado antes de iniciar a domesticação de plantas e animais Uma evidência é fornecida pelos dentes das gazelas que são compostos de cemento um tecido ósseo conectivo que se desenvolve em camadas Durante a primavera e o verão quando o cemento cresce mais rápido as camadas têm cor diferente daquelas formadas no inverno O corte transversal de um dente mostra a cor da última camada formada antes da morte da gazela o que permite determinar se o animal foi morto no verão ou no inverno Nas áreas habitadas pelos natufianos encontramse gazelas mortas em todas as estações do ano o que é indicativo de uma residência fixa ao longo do ano A aldeia de Abu Hureyra no Rio Eufrates é uma das povoações natufianas mais estudadas Durante quase 40 anos os arqueólogos examinaram as camadas da aldeia que constitui um dos mais bem documentados exemplos de vida sedentária antes e depois da transição para a agricultura O povoamento teve início provavelmente por volta de 9500 aC e seus habitantes ainda prosseguiram em seu estilo de vida de caçadores e coletores por cerca de 500 anos antes de adotarem a agricultura Os arqueólogos estimam que a população da aldeia antes da agricultura oscilava entre 100 e 300 membros Podese imaginar todo tipo de motivo para uma sociedade considerar vantajoso sedentarizarse O deslocamento constante é custoso crianças e velhos têm de ser carregados e em movimento é impossível armazenar alimentos para os períodos de escassez Ademais ferramentas como foices e pedras de moer são úteis para o processamento de alimentos silvestres mas pesados para transportar Há evidências de que mesmo caçadores e coletores nômades costumavam armazenar alimentos em determinados locais como cavernas Uma das vantagens do milho é o fato de ser muito resistente à armazenagem o que foi um dos principais motivos de seu cultivo ter sido tão amplamente adotado nas Américas A possibilidade de administrar de maneira mais eficaz a armazenagem e os estoques acumulados de alimentos deve ter constituído incentivo primordial para a adoção de um estilo de vida sedentário Por mais que o sedentarismo possa ser desejável para a coletividade isso não significa que necessariamente sobrevirá Um grupo nômade de caçadores e coletores teria de concordar em fixarse ou verse forçado a fazêlo Alguns arqueólogos sugerem que o aumento da densidade demográfica e a queda dos padrões de vida foram determinantes na ocorrência do sedentarismo obrigando povos nômades a estabelecerse em um só lugar No entanto a densidade das áreas habitadas por natufianos não é maior do que as de grupos anteriores de modo que nada parece sugerir um aumento da densidade populacional Evidências ósseas e dentárias tampouco indicam deterioração da saúde Por exemplo a escassez de alimentos faz surgirem linhas finas no esmalte dos dentes quadro chamado de hipoplasia Na verdade essas linhas são menos prevalentes entre os natufianos que em povos agrícolas posteriores Ainda mais significativa é a constatação de que embora o sedentarismo tivesse seus prós apresentava também muitos contras A resolução de conflitos era provavelmente bem mais difícil entre os grupos sedentários uma vez que as divergências não seriam facilmente resolvidas pela mera partida de pessoas ou grupos inteiros A partir do momento em que as pessoas haviam construído habitações permanentes e possuíam mais bens do que podiam carregar ir embora se tornava uma opção muito menos atraente Assim as aldeias precisavam de formas mais eficazes de resolução de conflitos e noções mais elaboradas de propriedade Era preciso definir quem teria acesso a que partes do terreno ao redor da aldeia ou quem colheria as frutas de que fileiras de árvores e pescaria em que parte do rio Tornouse necessário não só desenvolver regras mas as instituições que as criariam e zelariam pelo seu cumprimento Para que o sedentarismo tenha podido emergir parece plausível supor que os caçadores e coletores tenham sido forçados a fixarse o que por sua vez teria de ter sido precedido por uma inovação institucional que concentrasse o poder nas mãos de um grupo que constituiria a elite política fazendo valer os direitos de propriedade mantendo a ordem e beneficiandose de seu status para extrair recursos do resto da sociedade De fato é provável que uma revolução política similar àquela iniciada pelo Rei Shyaam ainda que em escala mais modesta tenha marcado a ruptura que acabou produzindo o sedentarismo Os indícios arqueológicos de fato nos dão razões para crer que os natufianos desenvolveram uma sociedade complexa caracterizada pela existência de hierarquia ordem e desigualdade os primórdios do que reconheceríamos como instituições extrativistas muito antes de se tornarem agricultores Um forte indício de tal hierarquia e desigualdade é fornecido pelos túmulos natufianos Algumas pessoas eram enterradas com grande quantidade de obsidiana e conchas de dentálio oriundas do litoral mediterrâneo próximo ao Monte Carmelo Outros tipos de ornamentação incluem colares braçadeiras e braceletes confeccionados com caninos falanges de cervos e conchas Outras pessoas eram enterradas sem nada disso As conchas e a obsidiana eram comercializadas e o controle dessas mercadorias muito provavelmente constituía uma fonte de acumulação de poder e desigualdade Outras evidências de desigualdades econômicas e políticas foram encontradas na localidade natufiana de Ain Mallaha ao norte do Mar da Galileia Em meio a um agrupamento de cerca de 50 cabanas redondas e muitos poços claramente usados para armazenagem há uma construção de grande porte coberta de argamassa reforçada próxima a um amplo espaço central quase certamente a habitação de um chefe Entre os túmulos ali encontrados alguns são muito mais elaborados havendo também indícios de adoração a crânios possivelmente um culto aos ancestrais característico das povoações natufianas sobretudo Jericó A maioria das evidências natufianas indica que provavelmente já se tratava de sociedades com instituições elaboradas que determinavam a herança do status de elite e que se dedicavam ao comércio com locais distantes e dispunham de formas incipientes de religião e hierarquias políticas A emergência de elites políticas muito provavelmente acarretou a transição primeiro para o sedentarismo e depois para a agricultura Como revelam os povoamentos natufianos a vida sedentária não implicava necessariamente adesão à agricultura e à pecuária O povo podia fixarse mas continuar vivendo da caça e da coleta Afinal o Longo Verão tornou as plantas silvestres mais abundantes o que provavelmente tornaria a caça e a coleta mais atraentes A maioria das pessoas se satisfaria com uma vida de subsistência baseada na caça e na coleta o que não demandaria maiores esforços Ademais a inovação tecnológica não fomentaria necessariamente um aumento da produção agrícola de fato sabese que uma importante inovação tecnológica a introdução do machado de aço entre os aborígenes australianos conhecidos como Yir Yoront levou não a uma intensificação da produção mas a maior número de horas de sono à medida que permitiu que as necessidades de subsistência fossem atendidas com mais facilidade com poucos incentivos para trabalhar mais Segundo a explicação tradicional da Revolução Neolítica baseada em fatores geográficos peça central do argumento de Jared Diamond que vimos no Capítulo 2 o processo teria sido deflagrado pela disponibilidade fortuita de diversas espécies vegetais e animais facilmente domesticáveis o que teria tornado atraentes a agricultura e a pecuária e induzido ao sedentarismo Depois que as sociedades se houvessem sedentarizado e adotado a agricultura aí se teria iniciado o desenvolvimento da hierarquia da religião e de instituições significativamente mais complexas Ainda que essa hipótese tradicional goze de ampla aceitação as evidências natufianas sugerem que na verdade ela coloca o carro adiante dos bois As mudanças institucionais se deram algum tempo antes de as sociedades fazerem a transição para a agricultura tendo provavelmente sido a causa tanto da adoção do sedentarismo que por sua vez reforçou as mudanças quanto posteriormente da Revolução Neolítica Esse padrão é sugerido não só pelos indícios encontrados nos Flancos Montanhosos a região mais amplamente estudada mas também pela maioria das evidências das Américas África subsaariana e Leste Asiático Sem dúvida a transição para a agricultura não só acarretou maior produtividade agrícola como possibilitou considerável expansão populacional Por exemplo em locais como Jericó e Abu Hureyra é notório que a aldeia nos primórdios da agricultura era bem maior do que antes Em geral as aldeias cresciam duas a seis vezes após a transição Ademais muitos dos fatos que se costuma alegar terem decorrido da transição sem dúvida aconteceram Deuse maior especialização ocupacional e aceleração do progresso tecnológico e provavelmente o desenvolvimento de instituições políticas mais complexas e talvez menos igualitárias Contudo a ocorrência desses fatores em cada lugar específico era determinada não pela disponibilidade de espécies vegetais e animais mas pela adesão daquela sociedade às inovações institucionais sociais e políticas capazes de possibilitar o sedentarismo e depois o surgimento da agricultura Embora o Longo Verão e a presença de espécies vegetais e animais tenham tornado tudo isso possível não determinavam onde ou quando exatamente após o aquecimento do clima o processo se daria Pelo contrário o que era determinante era a interação entre uma circunstância crítica o Longo Verão com pequenas mas significativas peculiaridades institucionais que faziam a diferença À medida que as temperaturas aumentavam algumas sociedades como os natufianos desenvolveram elementos de instituições centralizadas e hierarquia ainda que em escala muito menor que a dos modernos Estados nacionais Como os bushong sob Shyaam as sociedades reorganizaramse de modo a tirar proveito das maiores oportunidades criadas pela superabundância de animais e plantas silvestres e sem dúvida as elites políticas foram as maiores beneficiárias dessas novas oportunidades e do processo de centralização política Outros lugares cujas instituições eram apenas ligeiramente diferentes não permitiram que suas elites políticas tirassem proveito similar dessa circunstância e ficaram para trás no processo de centralização política e criação de sociedades sedentárias e agrícolas mais complexas Assim estava preparado o terreno para uma disparidade subsequente exatamente do mesmo tipo que já vimos Uma vez surgidas essas divergências elas se disseminaram para certos lugares mas não para outros Por exemplo a agricultura difundiuse do Oriente Médio para a Europa a partir de cerca de 6500 aC basicamente em consequência da migração de agricultores Na Europa as instituições diferenciaramse das de outras regiões do mundo como a África onde as instituições originais eram diferentes e as inovações deflagradas no Oriente Médio pelo Longo Verão só surgiriam muito mais tarde e mesmo assim sob outras formas AS INOVAÇÕES INSTITUCIONAIS dos natufianos embora muito provavelmente tenham sido o pivô da Revolução Neolítica não deixaram um legado simples na história do mundo nem levaram inexoravelmente à prosperidade em longo prazo de sua terra natal os atuais Israel Palestina e Síria Síria e Palestina são países relativamente pobres na atualidade e a riqueza de Israel foi em boa parte importada pelos colonos judeus após a Segunda Guerra Mundial com seus elevados níveis de escolaridade e fácil acesso a tecnologias de ponta O crescimento inicial dos natufianos não se tornou sustentado pelo mesmo motivo por que o crescimento soviético se extinguiu Por mais que tenha sido altamente significativo e mesmo revolucionário em sua época não deixou de ser crescimento sob instituições extrativistas No caso da sociedade natufiana é provável que esse tipo de crescimento tenha fomentado também profundos conflitos quanto a quem deteria o controle das instituições e de sua exploração Para cada elite a se beneficiar do extrativismo há uma não elite que adoraria substituíla Às vezes as disputas internas levam tão somente à substituição de uma elite por outra Às vezes destroem toda a sociedade extrativista desencadeando um colapso do Estado e da sociedade como um todo como no caso da espetacular civilização constituída pelas cidadesestados maias mais de mil anos atrás O EXTRATIVISMO INSTÁVEL A agricultura emergiu de maneira independente em várias regiões do mundo No atual México formaramse sociedades que estabeleceram Estados e povoações e aderiram à agricultura Como no caso dos natufianos no Oriente Médio lograram também algum grau de crescimento econômico As cidadesestados maias que se estendiam pelo sul do México Belize Guatemala e oeste de Honduras constituíram de fato uma civilização bastante sofisticada com suas instituições extrativistas peculiares A experiência maia aponta não só para a possibilidade de crescimento sob instituições extrativistas mas também para outro limite fundamental desse tipo de crescimento a instabilidade política daí decorrente a qual em última instância leva ao colapso tanto da sociedade quanto do Estado à medida que diferentes grupos e pessoas se digladiam para controlar os meios extrativistas As cidades maias começaram a se desenvolver por volta de 500 aC Essas primeiras experiências acabaram fracassando em algum momento do século I dC Surgiu então um novo modelo político lançando as bases para a Era Clássica entre 250 e 900 dC período marcado pelo pleno florescimento da cultura e civilização maias Entretanto essa civilização mais sofisticada também entraria em colapso no decorrer dos 600 anos seguintes Por ocasião da chegada dos conquistadores espanhóis no começo do século XVI os grandes templos e palácios de cidades maias como Tikal Palenque e Calakmul haviam sido engolidos pela selva e só seriam redescobertos no século XIX As cidades maias nunca chegaram a unificarse em um império ainda que algumas fossem subordinadas a outras e haja indícios frequentes de cooperação sobretudo na guerra O principal vínculo entre as cidadesestados da região 50 das quais são reconhecíveis por seus respectivos glifos era o idioma seus habitantes falavam cerca de 31 línguas distintas mas intimamente relacionadas Os maias desenvolveram um sistema de escrita do qual sobreviveram pelo menos 15 mil inscrições que descrevem diversos aspectos da vida cultura e religião de suas elites Dispunham também de um calendário sofisticado para o registro de datas Conhecido como Contagem Longa era bem semelhante ao nosso próprio sistema à medida que contabilizava o desdobramento dos anos a partir de uma data fixa e era utilizado por todas as cidades maias A contagem longa tinha início em 3114 aC embora não saibamos o significado atribuído pelos maias a essa data que antecede em muito o surgimento de qualquer sociedade semelhante à sua Os maias eram rematados construtores tendo chegado de maneira independente à invenção do cimento Seus edifícios e inscrições fornecem informações vitais sobre a história de suas cidades pois costumavam registrar os acontecimentos seguindo a datação da contagem longa Assim um exame dessas construções permite aos arqueólogos contabilizar quantos edifícios foram concluídos em determinados anos Poucos monumentos datam de cerca de 500 dC Por exemplo no ano que na contagem longa corresponde a 514 dC foram registrados apenas 10 Houve então uma expansão constante chegando a 20 em 672 dC e a 40 em meados do século VIII Depois disso o número de monumentos datados despenca No século IX volta para 10 por ano e no século X desce a zero Essas inscrições datadas nos proporcionam uma clara visão da expansão das cidades maias e sua subsequente contração a partir do final do século VIII Essa análise das datas pode ser complementada pelo exame das listas de monarcas registradas pelos maias Na cidade maia de Copán hoje no oeste de Honduras há um monumento célebre conhecido como Altar Q O Altar Q contém o nome de todos os reis desde o fundador da dinastia Kinich Yax Kuk Mo ou Rei Sol Primeiro Arara Quetzal Verde cujo nome era uma homenagem não só ao Sol mas também a duas das aves exóticas da selva centroamericana cujas penas eram muito valorizadas pelos maias Kinich Yax Kuk Mo ascendeu ao poder em Copán em 426 dC como nos informa a data da contagem longa no Altar Q Fundou uma dinastia que reinaria por 400 anos Alguns de seus descendentes tiveram nomes igualmente descritivos O glifo do 13o traduzse como Coelho 18 cujos sucessores seriam Macaco de Fumaça e Concha de Fumaça que viria a falecer em 763 dC O último nome da lista é o do Rei Yax Pasaj Chan Yoaat ou Primeiro Deus do Relâmpago do Céu do Sol Nascido que foi o 16o governante da dinastia e assumiu o poder com a morte de Concha de Fumaça Depois dele temos notícia de apenas mais um rei Ukit Took Protetor da Pederneira a partir de um fragmento de altar Após Yax Pasaj a construção de edifícios e as inscrições são interrompidos e ao que tudo indica a dinastia seria derrubada pouco depois Ukit Took provavelmente nem tinha direito real ao trono não devia passar de um usurpador Há uma última leitura possível das evidências de Copán desenvolvida pelos arqueólogos Ann Corinne Freter Nancy Gonlin e David Webster Esses pesquisadores mapearam a ascensão e queda da cidade por meio da análise demográfica do Vale de Copán ao longo de um período de 850 anos de 400 a 1250 dC por meio da técnica de hidratação da obsidiana que calcula o conteúdo de água da obsidiana na época de sua extração Uma vez extraída a obsidiana seu conteúdo de água cai a uma razão conhecida o que permite aos arqueólogos calcular a data de mineração de determinado fragmento Freter Gonlin e Webster situaram assim quando diferentes pedaços de obsidiana foram encontrados no Vale de Copán e monitoraram a expansão e posterior contração da cidade Como é possível fazer uma projeção razoável do número de casas e edifícios em determinada área podese estimar a população total da cidade No período de 400449 dC a população era insignificante avaliada em cerca de 600 habitantes Cresceu de maneira continuada até um ápice de 28 mil em 750799 dC Pelos nossos parâmetros urbanos contemporâneos o número não impressiona mas era gigantesco para a época a população de Copán superava a de Londres ou Paris no mesmo período Outras cidades maias como Tikal e Calakmul eram sem dúvida muito maiores Em consonância com evidências das datas da contagem longa 800 dC assinalou o apogeu populacional de Copán A partir daí iniciouse um declínio e em 900 dC a população caíra para cerca de 15 mil pessoas dali por diante houve uma redução contínua até que em 1200 dC ela havia voltado aos patamares de 800 anos antes O fundamento do desenvolvimento econômico dos maias da Era Clássica foi o mesmo dos bushong e natufianos a criação de instituições extrativistas com algum grau de centralização do Estado Tais instituições caracterizavamse por uma série de elementos centrais Por volta de 100 dC na cidade de Tikal na Guatemala surgiu um novo tipo de reino dinástico Estabeleceuse uma classe dominante baseada no ajaw senhor ou governante com um rei intitulado kuhul ajaw senhor divino e abaixo dele uma hierarquia de aristocratas O senhor divino organizava a sociedade com a cooperação dessas elites além de comunicarse com os deuses Até onde se sabe esse novo conjunto de instituições políticas não admitia nenhum tipo de participação popular mas trouxe estabilidade O kuhul ajaw aumentou os impostos dos agricultores e organizou a mão de obra de modo a possibilitar a construção dos grandes monumentos e a coalescência dessas instituições seria a pedra angular de uma impressionante expansão econômica A economia maia baseavase em ampla especialização ocupacional com ceramistas tecelões marceneiros ferramenteiros e fabricantes de ornamentos altamente qualificados Comercializavam ainda obsidiana peles de jaguar conchas marinhas cacau sal e penas entre si e com outras cidades chegando até o México Provavelmente dispunham também de alguma forma de dinheiro e como os astecas usavam sementes de cacau como moeda O modo como a Era Clássica maia foi fundada na criação de instituições políticas extrativistas foi muito similar à situação entre os bushong tendo Yax Ehb Xook de Tikal papel similar ao do Rei Shyaam As novas instituições políticas fomentaram significativo aumento da prosperidade econômica de boa parte da qual a nova elite organizada em torno do kuhul ajaw apropriavase em seguida Uma vez consolidado esse sistema porém por volta de 300 dC praticamente não voltou a haver mudanças tecnológicas Embora haja alguma evidência de aprimoramentos nas técnicas de irrigação e abastecimento de água a tecnologia agrária era rudimentar e ao que tudo indica assim permaneceu Embora as técnicas arquitetônicas e artísticas tenham ganhado muito em sofisticação com o passar do tempo no geral houve pouca inovação Não havia destruição criativa Não faltaram porém outras formas de destruição já que a riqueza gerada pelas instituições extrativistas para o kuhul ajaw e a elite maia desencadeava guerras constantes que com o tempo só fizeram recrudescer A sequência de conflitos é registrada nas inscrições maias com glifos específicos indicando a ocorrência de uma guerra em determinada data da contagem longa O planeta Vênus era o patrono celestial da guerra e os maias consideravam determinadas fases da órbita do planeta particularmente propícias para o início das hostilidades O glifo indicador de conflitos conhecido pelos arqueólogos como guerra nas estrelas mostra uma estrela despejando sobre a terra um líquido que pode ser água ou sangue As inscrições revelam também padrões de aliança e competição Os Estados maiores como Tikal Calakmul Copán e Palenque envolviamse em intermináveis disputas pelo poder e no processo subjugavam os Estados menores obrigandoos à vassalagem como indicam os glifos que assinalam as acessões ao trono que começam a indicar nessa época que os Estados menores passaram a ser regidos por governantes externos O Mapa 10 mostra as principais cidades maias e os vários padrões de contato entre elas tal como reconstruídos pelos arqueólogos Nikolai Grube e Simon Martin Tais padrões indicam que embora as grandes cidades como Calakmul Dos Pilas Piedras Negras e Yaxchilan tivessem amplos contatos diplomáticos algumas eram com frequência dominadas por outras além de lutarem entre si A constatação irretorquível com relação ao colapso maia é que ela coincide com a derrubada do modelo político baseado no kuhul ajaw Vimos em Copán que após a morte de Yax Pasaj em 810 dC não houve mais reis Por volta dessa época os palácios reais foram abandonados Trinta quilômetros ao norte de Copán na cidade de Quiriguá o último monarca Céu de Jade subiu ao trono entre 795 e 800 dC O último monumento datado é de 810 dC pela contagem longa mesmo ano da morte de Yax Pasaj A cidade seria abandonada pouco depois Em todo o território maia a história é a mesma as instituições políticas que haviam criado o contexto para a expansão do comércio agricultura e população desapareceram Cortes reais deixaram de funcionar cessaram as gravações em monumentos e templos e os palácios ficaram desertos À medida que as instituições políticas e sociais eram desbaratadas revertendo o processo de centralização do Estado a economia entrou em contração e os níveis populacionais despencaram Em certos casos os principais centros sucumbiram à violência generalizada A região de Petexbatun na Guatemala onde os grandes templos seriam posteriormente derrubados para que as pedras fossem empregadas na construção de muralhas defensivas constitui um exemplo claro Como veremos no próximo capítulo foi um caso muito semelhante ao do fim do Império Romano Mais tarde em lugares como Copán onde há menos sinais de violência na época do colapso muitos monumentos seriam desfigurados ou destruídos Em alguns lugares a elite permaneceu mesmo após a queda do kuhul ajaw Em Copán há indícios de que a elite ainda construiria novos edifícios por pelo menos mais 200 anos antes de finalmente também desaparecer Em outros lugares as elites parecem ter se extinguido junto com o senhor divino As evidências arqueológicas existentes não nos permitem chegar a uma conclusão definitiva acerca do porquê da deposição do kuhul ajaw e das elites que o cercavam nem do colapso das instituições que haviam desencadeado a Era Clássica maia Sabemos que isso se deu no contexto de um recrudescimento dos conflitos entre as cidades e ao que tudo indica oposição e insurreições dentro das próprias cidades talvez conduzidas por facções rivais dentro da elite derrubaram a instituição Embora as instituições extrativistas criadas pelos maias tenham gerado suficiente riqueza para que as cidades florescessem e a elite enriquecesse e produzisse uma arte sofisticada e construções monumentais o sistema não era estável As instituições extrativistas que fundamentavam o poder dessa pequena elite engendraram uma desigualdade generalizada aprofundando assim o potencial de conflitos entre os possíveis beneficiários da riqueza extraída do povo Foram essas disputas as responsáveis em última instância pelo desmoronamento da civilização maia Mapa 10 Cidadesestados maias seus contatos e conflitos O QUE DÁ ERRADO As instituições extrativistas são tão recorrentes na história em virtude de sua lógica poderosa conseguem gerar uma dose limitada de prosperidade ao mesmo tempo distribuindoa entre os integrantes de uma pequena elite Para que esse crescimento se dê é preciso que haja centralização política Uma vez que esta esteja implementada o Estado ou a elite que o controla em geral dispõe de incentivos para investir e produzir riqueza estimulando por sua vez outros a investir de modo a possibilitar que o Estado extraia recursos destes e até simule alguns dos processos que normalmente seriam desencadeados por mercados e instituições econômicas inclusivas Nas economias de plantation do Caribe as instituições extrativistas assumiram a forma de uma elite que fazia uso da coação para obrigar os escravos a produzirem açúcar Na União Soviética manifestaramse através da realocação de recursos da agricultura para a indústria pelo Partido Comunista bem como da estruturação de certos incentivos para gerentes e trabalhadores Como vimos tais incentivos eram anulados pela própria natureza do sistema O potencial de geração de crescimento extrativista fornece impulso suficiente para a centralização política foi o que motivou o Rei Shyaam a criar o Reino Bacuba e é o que provavelmente justifica a adoção pelos natufianos no Oriente Médio de modalidades primitivas de lei e ordem hierarquia e instituições extrativistas que por sua vez deflagrariam a Revolução Neolítica É provável que processos similares tenham também acarretado a emergência de sociedades sedentárias e a transição para a agricultura nas Américas podendo ser identificados na sofisticada civilização construída pelos maias com base em instituições altamente extrativistas que coagiam muitos em benefício de suas pequenas elites O crescimento proporcionado pelas instituições extrativistas é porém de natureza completamente distinta daquele criado sob instituições inclusivas Acima de tudo não é sustentável Por sua própria natureza as instituições extrativistas não abrem espaço para a destruição criativa propiciando no máximo níveis limitados de progresso tecnológico O crescimento por elas engendrado portanto tem fôlego curto A experiência soviética constitui clara ilustração desse limite A Rússia soviética conheceu um surto de crescimento alcançando rapidamente algumas das mais avançadas tecnologias do mundo e transferindo recursos do ineficientíssimo setor agrícola para a indústria No fim das contas todavia os incentivos encontrados em cada setor da agricultura à indústria não se mostraram capazes de estimular o progresso tecnológico Este se manteve apenas em determinados bolsões onde os recursos eram injetados e a inovação amplamente recompensada em decorrência de seu papel na corrida contra o Ocidente O crescimento soviético por mais acentuado que tenha sido estava fadado a ter vida curta com efeito já estava perdendo o gás na década de 1970 A ausência de destruição criativa e inovação não é o único motivo de existirem limites estritos ao crescimento sob instituições extrativistas A história das cidades estados maias ilustra um fim mais sombrio e infelizmente mais corriqueiro intrínseco à lógica interna das instituições extrativistas O fato de tais instituições proporcionarem ganhos significativos para a elite constitui forte incentivo para que outros grupos se empenhem em tomar o lugar da elite dominante Os conflitos internos e a instabilidade constituem assim características inerentes às instituições extrativistas não só criando novas ineficiências como também em geral revertendo a centralização política e por vezes até induzindo ao total colapso da lei e da ordem e ao mergulho no caos tal como ocorreu com as cidadesestados maias após seu relativo êxito durante sua Era Clássica Apesar de intrinsecamente limitado o crescimento sob as instituições extrativistas pode todavia parecer espetacular quando em movimento Muitos na União Soviética e muitos mais no Ocidente ficaram deslumbrados com o crescimento soviético nas décadas de 1920 a 1960 chegando à de 1970 do mesmo modo como ficam hoje assombrados com o ritmo vertiginoso do crescimento econômico da China Como discutiremos em mais detalhes no Capítulo 15 contudo a China sob o domínio do Partido Comunista é mais um exemplo de sociedade que cresce sob a tutela de instituições extrativistas e é improvável do mesmo modo que venha a gerar crescimento sustentado a menos que sofra uma transformação política fundamental rumo a instituições inclusivas de fato O 6 DIFERENCIAÇÃO COMO VENEZA TORNOUSE UM MUSEU ARQUIPÉLAGO QUE forma Veneza situase no extremo norte do Mar Adriático Na Idade Média Veneza era talvez o lugar mais rico do mundo com o mais avançado conjunto de instituições econômicas inclusivas fundamentadas em uma incipiente inclusão política Conquistou sua independência em 810 dC através do que se revelaria ter sido um golpe de sorte A economia europeia estava se recuperando do declínio sofrido com o colapso do Império Romano e reis como Carlos Magno encontravamse em vias de reconstituir um poder político central forte promovendo maior estabilidade e segurança e a expansão do comércio do qual Veneza estava em condições únicas para se aproveitar Era uma nação de lobos do mar posicionada bem no meio do Mediterrâneo Do Oriente chegavam especiarias produtos de fabricação bizantina e escravos Veneza enriqueceu Em 1050 quando a cidade já se expandia economicamente havia pelo menos um século sua população montava a 45 mil habitantes Em 1200 esse número sofrera um aumento superior a 50 chegando a 70 mil Em 1330 havia crescido outros 50 totalizando 110 mil a cidade tinha então o mesmo tamanho de Paris e provavelmente três vezes o de Londres Um dos principais fundamentos da expansão econômica de Veneza foi uma série de inovações contratuais que tornaram as instituições econômicas muito mais inclusivas Destas a mais célebre era a commenda um tipo rudimentar de sociedade anônima por ações que se constituía apenas pela duração de determinada missão comercial Cada commenda envolvia dois sócios um sedentário que permanecia em Veneza e outro que punha o pé na estrada O sedentário injetava capital na empreitada ao passo que o que viajava acompanhava a carga Normalmente era o primeiro quem contribuía com a maior parte do capital Jovens empreendedores que ainda não houvessem feito fortuna podiam entrar no ramo do comércio acompanhando as mercadorias um canal decisivo de ascensão social Eventuais prejuízos na viagem eram divididos de acordo com a parcela de capital com que cada sócio tivesse colaborado Caso a viagem redundasse em lucro sua divisão se daria conforme dois tipos de contrato de commenda Caso se tratasse de uma commenda unilateral o mercador sedentário forneceria 100 do capital e receberia 75 dos lucros Se fosse bilateral o sedentário entrava com 67 do capital e ficava com 50 do lucro Uma análise dos documentos oficiais mostra toda a potencialidade da commenda para fomentar a ascensão social são todos repletos de nomes desconhecidos pessoas sem histórico de pertencimento à elite veneziana Na documentação governamental de 960 971 e 982 dC o número de nomes novos compreende 69 81 e 65 respectivamente do total de nomes registrados Tamanha inclusão econômica aliada à ascensão de novas famílias por meio do comércio obrigou o sistema político a tornarse ainda mais aberto O doge que governava a cidade era indicado vitaliciamente pela Assembleia Geral Embora fosse uma reunião geral de todos os cidadãos na prática a Assembleia Geral era dominada por um núcleo central de famílias poderosas Embora o próprio doge gozasse de grande poder este foi sendo paulatinamente reduzido ao longo do tempo mediante modificações realizadas nas instituições políticas A partir de 1032 o doge passou a ser escolhido junto com o recémcriado Conselho Ducal cuja função era certificarse de que o doge não adquirisse poder absoluto O primeiro doge a ter seus poderes cerceados por esse conselho Domenico Flabianico era um abastado mercador de seda de uma família que nunca antes ocupara um cargo elevado A essa mudança institucional seguiuse uma gigantesca expansão do poderio naval e mercantil veneziano Em 1082 Veneza conquistou amplos privilégios comerciais em Constantinopla onde foi fundado um bairro veneziano que logo abrigava 10 mil deles Temos aqui um caso de instituições políticas e econômicas inclusivas caminhando lado a lado A expansão econômica de Veneza que apenas fez alimentar a pressão por mais mudança política explodiu após a implementação de alterações nas instituições políticas e econômicas em decorrência do assassinato do doge em 1171 A primeira inovação significativa foi a instauração de um Grão Conselho que a partir de então seria a fonte última de poder político na cidade O conselho era composto de altos funcionários do Estado veneziano como juízes e era dominado por aristocratas Além desses dignitários a cada ano 100 novos membros eram designados por um comitê de nomeação cujos 4 integrantes eram escolhidos por sorteio dentre os conselheiros existentes Posteriormente o órgão escolheria também os membros de dois subconselhos o Senado e o Conselho dos Quarenta com diversas atribuições legislativas e executivas O Grão Conselho era responsável também pela escolha do Conselho Ducal ampliado de 2 para seis membros A segunda inovação foi a criação de mais um conselho sorteado pelo Grão Conselho agora para nomear o doge Embora sua escolha precisasse ser ratificada pela Assembleia Geral uma vez que era feita uma única indicação a medida efetivamente colocou a escolha do doge nas mãos do conselho A terceira inovação foi que o novo doge passou a prestar um juramento do cargo que circunscrevia o poder ducal Com o tempo essas restrições foram paulatinamente expandidas de modo que os doges subsequentes passaram a obedecer aos magistrados depois tiveram todas as suas decisões submetidas à aprovação do Conselho Ducal Este assumiu também a função de garantir que o doge cumprisse todas as decisões do Grão Conselho Tais reformas políticas desencadearam uma nova série de inovações institucionais como a criação de magistrados e tribunais independentes um tribunal de apelação e novas leis sobre falências e contratos particulares Essas novas instituições econômicas venezianas possibilitaram a criação de novas formas jurídicas de negócios e novos tipos de contratos As inovações financeiras sucederamse rapidamente e vemos os primórdios do moderno sistema bancário despontando na cidade por volta dessa época A dinâmica que conduzia Veneza em direção a instituições plenamente inclusivas parecia irreversível Contudo havia uma tensão subjacente a tudo isso O crescimento econômico sustentado pelas instituições inclusivas venezianas era acompanhado de um mecanismo de destruição criativa Cada nova onda de jovens empreendedores a enriquecer por meio da commenda ou instituições econômicas similares tendia a reduzir os lucros e o êxito econômico das elites estabelecidas E não só lhes restringiam o lucro como também desafiavam seu poder político Persistia sempre a tentação assim para que as elites existentes representadas no Grão Conselho fechassem o sistema aos novos membros Quando o Grão Conselho foi criado determinouse que seus integrantes seriam definidos anualmente Como vimos no fim de cada ano quatro eleitores seriam escolhidos ao acaso para designar 100 membros para o ano seguinte aceitos automaticamente Em 3 de outubro de 1286 propôsse ao Grão Conselho uma emenda às regras de modo que as indicações passassem a ser confirmadas pela maioria dos membros do Conselho dos Quarenta sob estrito controle das famílias da elite o que lhes conferiria poder de veto sobre as novas nomeações para o conselho algo que elas não possuíam até então A proposta foi indeferida Em 5 de outubro de 1286 outra proposta foi apresentada e dessa vez aprovada Dali por diante a confirmação seria automática se os pais e avós do nomeado tivessem servido no conselho Do contrário seria necessária a confirmação do Conselho Ducal Em 17 de outubro foi introduzida uma nova mudança nas regras estipulando que qualquer indicação para o Grão Conselho precisaria da aprovação do Conselho dos Quarenta do doge e do Conselho Ducal Os debates e emendas constitucionais de 1286 pressagiaram La Serrata O Fechamento de Veneza Em fevereiro de 1297 decidiuse que quem tivesse sido membro do Grão Conselho nos quatro anos anteriores gozaria de nomeação e aprovação automáticas Dali por diante as novas indicações teriam de ser aceitas pelo Conselho dos Quarenta mas apenas com 12 votos A partir de 11 de setembro de 1298 os membros atuais e suas famílias não precisariam mais de confirmação O Grão Conselho estava agora de fato vedado a forasteiros e seus mandatários tornaramse assim uma aristocracia hereditária A novidade seria selada em 1315 com o Libro dOro ou Livro de Ouro um registro oficial da nobreza veneziana Os excluídos dessa nobreza incipiente não veriam seus poderes lhes escapar sem lutar A tensão política recrudesceu na cidade entre 1297 e 1315 A reação parcial do Grão Conselho foi ampliar seus tentáculos Na tentativa de cooptar seus adversários mais ruidosos cresceu de 450 para 1500 membros A expansão foi complementada pela repressão Criouse uma força policial pela primeira vez em 1310 e verificouse um crescimento contínuo da coação interna sem dúvida como meio de consolidar a nova ordem política Tendo implementado uma Serrata política o Grão Conselho tratou em seguida de promover uma Serrata econômica À instauração de instituições políticas extrativistas seguiuse a adoção de instituições econômicas extrativistas Sobretudo os contratos de commenda uma das grandes inovações institucionais que haviam feito a fortuna de Veneza foram banidos Não é de admirar a commenda beneficiava os novos comerciantes que agora a elite estabelecida tentava excluir Foi apenas mais um passo rumo a instituições econômicas mais extrativistas Deuse outro passo quando a partir de 1314 o Estado veneziano começou a assumir o controle do comércio e a nacionalizálo As galés estatais foram organizadas para realizar atividades comerciais e de 1324 em diante quem quisesse participar teria de arcar com pesados impostos O comércio de longa distância tornouse prerrogativa da nobreza Foi o começo do fim da prosperidade veneziana Com as principais linhas de negócios sob o monopólio de uma elite cada vez mais restrita o declínio era inevitável Veneza que parecia ter chegado à iminência de converterse na primeira sociedade inclusiva do mundo sucumbiu a um golpe Suas instituições políticas e econômicas foram se tornando cada vez mais extrativistas até que a cidade entrou em declínio Em 1500 a população havia despencado para cem mil habitantes Entre 1650 e 1800 enquanto a população da Europa crescia rapidamente a de Veneza não parava de cair Hoje a única atividade econômica de Veneza além de um pouco de pesca é o turismo Em vez de rotas comerciais e instituições econômicas pioneiras os venezianos fazem pizzas e sorvetes e sopram vidro colorido para as hordas de estrangeiros Os turistas vêm ver as maravilhas venezianas dos tempos anteriores à Serrata como o Palácio do Doge e os leões da Catedral de São Marcos frutos da pilhagem de Bizâncio quando Veneza dominava o Mediterrâneo Veneza deixou de ser uma potência econômica para converterse em museu NESTE CAPÍTULO vamos nos concentrar no desenvolvimento histórico de instituições em diferentes partes do mundo e explicar por que em cada lugar elas tomaram os rumos específicos que tomaram Vimos no Capítulo 4 como as instituições da Europa Ocidental se diferenciaram daquelas do Leste Europeu e como as da Inglaterra se distanciaram daquelas do resto da Europa Ocidental tudo consequência de pequenas diferenças institucionais em sua maioria decorrentes da interação entre o processo de diferenciação institucional e as circunstâncias críticas intervenientes Poderia ser então tentador imaginar que essas diferenças institucionais não passam da ponta de um profundo iceberg histórico e que abaixo da linha da água temos as instituições europeias e inglesas afastandose inexoravelmente daquelas de outras plagas com base em acontecimentos históricos que remontam a milênios no passado E o resto como se diz é história Mas não é nada disso e por duas razões Em primeiro lugar os movimentos na direção de instituições inclusivas como comprova nosso relato sobre Veneza podem ser revertidos Veneza enriqueceu Contudo suas instituições políticas e econômicas caíram por terra e sua prosperidade foi revertida Hoje Veneza só é rica porque pessoas que acumulam recursos em outros lugares escolhem gastálos lá admirando as glórias de seu passado O fato de que instituições inclusivas podem ir ao chão mostra que não há um processo cumulativo simples de aprimoramento institucional Em segundo lugar as pequenas diferenças institucionais que desempenham um papel crucial durante as circunstâncias críticas são por natureza efêmeras Por serem mínimas podem ser anuladas voltar a emergir e desaparecer de novo Veremos neste capítulo que ao contrário do que se poderia esperar com base nas teorias geográfica ou cultural a Inglaterra onde o passo decisivo em direção às instituições inclusivas seria dado no século XVII era um lugar atrasado não só nos milênios que se seguiram à Revolução Neolítica ocorrida no Oriente Médio mas também no princípio da Idade Média após a queda do Império Romano do Ocidente As Ilhas Britânicas eram marginais ao Império Romano e decerto tinham menos importância que a Europa Ocidental continental o Norte da África os Bálcãs Constantinopla ou o Oriente Médio Quando o Império Romano do Ocidente ruiu no século V a GrãBretanha enfrentou o mais absoluto declínio Não obstante as revoluções políticas responsáveis por deflagrar a Revolução Industrial ocorreriam não na Itália Turquia nem na Europa Ocidental continental mas nas Ilhas Britânicas Para compreender o percurso que levou até a Revolução Industrial inglesa e dos países que se seguiram o legado romano é significativo porém por diversas razões Primeiro Roma como Veneza experimentou precocemente importantes inovações institucionais Como aconteceria com os venezianos o êxito econômico romano baseouse a princípio em instituições inclusivas pelo menos segundo os padrões do seu tempo Como em Veneza essas instituições foram se tornando definitivamente mais extrativistas ao longo do tempo No caso de Roma essa transformação foi fruto da passagem da República 51049 aC para o Império 49 aC476 Muito embora durante o período republicano Roma tenha construído um império impressionante e o transporte e o comércio de longa distância tenham florescido muito da economia romana baseavase na extração A transição da República para o Império aumentou o extrativismo desencadeando em última instância o tipo de conflito interno instabilidade e colapso que vimos nas cidadesestados maias Segundo e mais importante veremos que o subsequente desenvolvimento institucional na Europa Ocidental mesmo não sendo herança direta de Roma foi consequência de circunstâncias críticas que se tornaram comuns na região no rastro do colapso do Império Romano do Ocidente Tais circunstâncias tiveram pouco paralelo em outras partes do mundo como África Ásia ou Américas ainda que como também vamos mostrar por meio da história da Etiópia outros lugares que atravessaram circunstâncias críticas semelhantes às vezes apresentaram reações de notável similaridade O declínio romano conduziu ao feudalismo que teve como efeitos colaterais o progressivo desaparecimento da escravidão o nascimento de cidades fora da esfera de influência dos monarcas e aristocratas e no processo deu à luz uma série de instituições que vieram a enfraquecer o poder político dos governantes Foi sobre essa fundação feudal que a peste negra pôde fazer estragos e reforçar ainda mais a autonomia das cidades e dos camponeses em detrimento dos monarcas aristocratas e grandes proprietários rurais Seria nesse cenário que as oportunidades engendradas pelo comércio atlântico despontariam Muitas partes do mundo não sofreram tais mudanças e por conseguinte se distanciaram AS VIRTUDES ROMANAS O tribuno da plebe Tibério Graco foi morto a pauladas em 133 aC pelos senadores romanos sendo seu corpo lançado ao Tibre sem nenhum rito fúnebre Seus assassinos eram aristocratas como o próprio Tibério e o atentado fora orquestrado pelo seu primo Públio Cornélio Cipião Nasica Tibério Graco vinha de uma impecável linhagem aristocrática descendente que era de alguns dos mais ilustres líderes da República Romana entre eles Lúcio Emílio Paulo herói da Segunda Guerra Púnica e da Guerra Ilírica e Cipião Africano o general que derrotou Aníbal na Segunda Guerra Púnica Por que os poderosos senadores de seu tempo inclusive seu primo teriam se voltado contra ele A resposta revela muito sobre as tensões vigentes na república e as causas de seu posterior declínio O que jogou Tibério contra os demais senadores foi sua iniciativa de ir de encontro a eles em uma questão crucial daquela época a distribuição da terra e os direitos dos plebeus os cidadãos comuns No tempo de Tibério Graco Roma já era uma república bem estabelecida Suas instituições políticas e as virtudes dos cidadãos soldados romanos tal como capturadas por JacquesLouis David em sua famosa tela O juramento dos Horácios que mostra os filhos jurando aos pais defender a República Romana com a própria vida ainda são consideradas por não poucos historiadores a base do êxito da república Os cidadãos romanos criaram a república ao derrubar seu rei Lúcio Tarquínio Soberbo conhecido como Tarquínio o Soberbo por volta de 510 aC Inteligentemente a república implementou instituições políticas com diversos elementos inclusivos Era governada por magistrados eleitos por um ano O fato de o ocupante desse cargo ser eleito anualmente e abalizado por muitas pessoas ao mesmo tempo restringia a possibilidade de determinado indivíduo procurar consolidar ou explorar seu poder em causa própria As instituições republicanas compreendiam um sistema de pesos e contrapesos responsáveis por uma distribuição bastante ampla do poder ainda que nem todos os cidadãos contassem com igual representação uma vez que o voto era indireto Havia também vasto número de escravos cruciais para a produção em grande parte da Itália que montavam talvez a um terço da população Estes evidentemente não gozavam nem de direitos que dirá de representação política No entanto como em Veneza as instituições políticas romanas continham elementos pluralistas Os plebeus possuíam sua própria assembleia que podia eleger o tribuno da plebe com poder para vetar as iniciativas dos magistrados convocar a Assembleia da Plebe e propor leis Foram os plebeus que puseram Tibério Graco no poder em 133 aC Seu poder fora forjado por secessão uma espécie de greve dos plebeus sobretudo soldados que se retiravam para uma colina nos limites da cidade e recusavamse a cooperar com os magistrados enquanto não tivessem suas reivindicações examinadas Tal ameaça adquiria particular relevância é claro em tempos de guerra Ao que tudo indica foi durante uma secessão dessas no século V aC que os cidadãos conquistaram o direito de eleger seu próprio tribuno e aprovar leis para governar sua comunidade Sua proteção política e legal por mais restrita que pudesse parecer a julgar por nossos parâmetros modernos criou oportunidades econômicas para os cidadãos e instituições econômicas inclusivas em algum grau Como resultado o comércio por todo o Mediterrâneo floresceu sob a República Romana Evidências arqueológicas indicam que embora tanto a maioria de cidadãos quanto de escravos vivesse não muito acima do nível de subsistência muitos romanos inclusive alguns cidadãos comuns alcançavam receitas elevadas com acesso a serviços públicos como sistemas municipais de esgotos e iluminação pública Há ainda evidências de algum crescimento econômico sob a república As fortunas econômicas dos romanos podem ser rastreadas a partir de naufrágios O império construído pelos romanos era de certo modo uma rede de portos de Atenas Antióquia e Alexandria no Oriente passando por Roma Cartago e Cádiz até chegar a Londres no extremo ocidente A expansão dos territórios romanos foi acompanhada da intensificação do comércio e da navegação o que se pode deduzir dos naufrágios encontrados por arqueólogos no fundo do Mediterrâneo Há várias maneiras de datá los Com frequência os barcos levavam ânforas cheias de vinho ou azeite de oliva da Itália para a Gália ou o azeite espanhol era levado para ser vendido ou distribuído de graça na capital As ânforas vasos selados de cerâmica costumavam conter informações sobre quem as confeccionara e quando Junto ao Rio Tibre em Roma há uma pequena colina o Monte Testaccio também conhecido como Monte dei Cocci Morro dos Potes composto de aproximadamente 53 milhões dessas ânforas Uma vez descarregadas dos navios as ânforas eram descartadas dando origem ao longo dos séculos a essa verdadeira montanha Outras mercadorias transportadas e a própria embarcação às vezes podem ser datadas por radiocarbono uma poderosa técnica usada pelos arqueólogos para determinar a idade de resíduos orgânicos As plantas obtêm energia por meio da fotossíntese que utiliza a energia solar para converter dióxido de carbono em açúcares Nesse processo o vegetal incorpora certa quantidade de um radioisótopo natural o carbono14 Depois da morte do organismo o carbono14 entra em deterioração o decaimento radioativo Quando os arqueólogos encontram um naufrágio podem calcular a idade do madeirame do navio comparando a fração remanescente de carbono14 nele presente ao carbono14 atmosférico esperado o que lhes proporciona uma estimativa de quando a árvore foi cortada Apenas cerca de 20 naufrágios remontam a 500 aC e em época tão remota provavelmente não se trata de embarcações romanas talvez sejam cartaginesas por exemplo Em seguida porém o número de naufrágios romanos apresenta aumento vertiginoso Por volta do tempo do nascimento de Cristo chegaram a um ápice de 180 Os naufrágios são uma boa maneira de mapear os contornos econômicos da república e de fato fornecem indícios de algum crescimento econômico mas é preciso manter certa perspectiva Provavelmente dois terços da carga dessas embarcações eram propriedade do Estado impostos e tributos que eram levados das províncias para Roma ou grãos e azeite do Norte da África a serem distribuídos de graça entre os cidadãos da capital São esses frutos do extrativismo os principais componentes do Monte Testaccio Outra maneira fascinante de obter evidências de crescimento econômico é através do Projeto do Testemunho de Gelo da Groenlândia Ao caírem os flocos de neve absorvem pequenas quantidades da poluição atmosférica sobretudo os metais chumbo prata e cobre A neve congela e vai se acumulando sobre a neve precipitada nos anos anteriores O processo vem acontecendo há milênios e constitui uma oportunidade ímpar para os cientistas entenderem o grau de poluição do ar há milhares de anos Em 19901992 o Projeto do Testemunho de Gelo da Groenlândia perfurou 3030 metros de gelo cobrindo cerca de 250 mil anos de história humana Uma das principais descobertas do trabalho bem como de outros que o precederam foi que houve nítido aumento nos poluentes atmosféricos a partir de 500 aC As quantidades de chumbo prata e cobre em suspensão no ar apresentam dessa data em diante crescimento contínuo atingindo um ápice no século I Curiosamente tais níveis atmosféricos de chumbo só voltariam a ser atingidos no século XIII o que mostra a intensidade se comparada aos períodos anteriores e que se seguiram da mineração pelos romanos Tamanho surto na atividade mineradora é um evidente indicador de expansão econômica Entretanto tal crescimento era insustentável ocorrendo sob instituições que eram em parte inclusivas e em parte extrativistas Ainda que os cidadãos possuíssem direitos políticos e econômicos a escravidão era generalizada e muito extrativista e a elite a classe senatorial dominava tanto a economia quanto a política Apesar da existência da assembleia e do tributo da plebe por exemplo o verdadeiro poder permanecia nas mãos do Senado cujos membros eram os grandes proprietários rurais que constituíam a classe senatorial Segundo o historiador romano Lívio o Senado foi criado pelo primeiro rei de Roma Rômulo sendo composto de uma centena de homens Seus descendentes dariam origem à classe senatorial ainda que com algum acréscimo de sangue novo A distribuição de terra era muito desigual situação que devia ter se agravado no século II aC desencadeando os problemas que Tibério Graco como tribuno pôs em evidência À medida que prosseguia a sua expansão por todo o Mediterrâneo Roma conheceu um influxo de vastas riquezas Tamanho tesouro porém estava ao alcance basicamente de um punhado de famílias abastadas de status senatorial e o abismo entre ricos e pobres se aprofundou Os senadores deviam sua riqueza não só ao controle das lucrativas províncias mas também aos seus enormes latifúndios espalhados pela Itália Essas propriedades eram trabalhadas por turmas de escravos em geral prisioneiros das guerras em que Roma se envolvera Todavia também é significativa a origem dessas terras Os exércitos romanos durante a república eram compostos por cidadãos soldados que eram pequenos proprietários rurais primeiro nos arredores da capital e depois em outras regiões da Itália Tradicionalmente lutavam no exército quando necessário e depois voltavam para seus afazeres À medida que Roma se expandia e as campanhas se prolongavam esse modelo deixou de funcionar Os soldados afastavam se de suas terras por anos a fio e muitas propriedades acabaram abandonadas Suas famílias às vezes se viam soterradas em dívidas e à beira da miséria Assim paulatinamente muitas dessas fazendas foram deixadas para trás sendo absorvidas pelas dos senadores Com o crescente enriquecimento da classe senatorial a grande massa de cidadãos sem terras foi se congregando na capital não raro após serem dispensados do exército Sem terra para onde voltar tratavam de procurar trabalho na capital No fim do século II aC a situação chegara a um perigoso ponto de ebulição tanto devido à ampliação do fosso que separava os ricos dos pobres instaurando entre ambos uma distância sem precedentes quanto por haver na cidade hordas de cidadãos descontentes prontos a reagir a tais injustiças insurgirse e voltarse contra a aristocracia romana Não obstante o poder político permanecia nas mãos dos ricos proprietários rurais da classe senatorial os beneficiários das mudanças que se haviam dado no decorrer dos dois últimos séculos E a maioria deles não tinha a menor intenção de modificar o sistema que os vinha servindo tão bem Segundo o historiador romano Plutarco Tibério Graco viajando pela Etrúria região da atual Itália central deuse conta das dificuldades enfrentadas pelas famílias dos cidadãossoldados Fosse em virtude dessa experiência fosse em decorrência de outros atritos com os poderosos senadores de seu tempo ele logo se envolveria em um ousado plano para modificar a distribuição de terras na Itália Concorreu ao tribunato da plebe em 133 aC usando então o cargo para propor uma reforma agrária uma comissão investigaria a eventual ocupação ilegal de terras públicas e procederia a uma redistribuição daquelas que ultrapassassem o limite legal de 300 acres para cidadãos sem terra O limite de 300 acres era na verdade previsto por uma lei antiga que era ignorada e deixara de ser implementada havia séculos O projeto de Tibério Graco sacudiu até os alicerces da classe senatorial que conseguiu bloquear a implementação de suas reformas durante algum tempo Quando Tibério conseguiu usar o poder do apoio popular de que gozava para depor outro tribuno que havia ameaçado vetar sua reforma agrária a comissão por ele proposta foi finalmente instituída O Senado porém impediua de trabalhar secando suas fontes de financiamento A tensão chegou ao auge quando Tibério Graco reivindicou para sua comissão da reforma agrária os recursos deixados para o povo romano pelo rei da cidade grega de Pérgamo Tentou também candidatarse pela segunda vez ao tribunato em parte por recear a perseguição do Senado após deixar o cargo Era o pretexto que os senadores esperavam para acusálo de pretender declararse rei Ele e seus correligionários sofreram um atentado e muitos foram mortos O próprio Tibério Graco foi um dos primeiros a cair ainda que sua morte não solucionasse o problema e outros ainda tentassem renovar a distribuição de terras entre outros aspectos da economia e da sociedade romana Muitos teriam destino similar O irmão de Tibério Graco por exemplo Caio também pereceria nas mãos dos proprietários rurais depois de assumir o lugar do irmão Essas tensões voltariam periodicamente a aflorar durante o século seguinte desencadeando por exemplo a Guerra Social entre 91 aC e 87 aC O agressivo paladino dos interesses senatoriais Lúcio Cornélio Sila não só suprimiu com violência as reivindicações de mudança como também impôs limites rigorosos aos poderes do tribuno da plebe As mesmas questões voltariam à baila no apoio recebido por Júlio César do povo de Roma em seu embate com o Senado As instituições políticas que constituíam o cerne da república foram desmontadas por Júlio César em 49 aC quando ele cruzou com suas tropas o Rubicão riacho que separava a província da Gália Cisalpina da Itália Roma ajoelhouse diante de César e mais uma guerra civil teve início Embora vitorioso César seria morto por senadores descontentes liderados por Brutus e Cássio em 44 aC A república jamais ressurgiria Irrompeu novo conflito civil entre os partidários de César sobretudo Marco Antônio e Otávio e seus inimigos Após a vitória de Antônio e Otávio irrompeu o conflito entre ambos até Otávio emergir triunfante da Batalha de Áccio em 31 aC A partir do ano seguinte e pelos 45 anos subsequentes Otávio conhecido após 28 aC como Augusto César governaria Roma sozinho Augusto fundou o Império Romano embora preferisse o título princep uma espécie de primeiro entre seus pares e chamasse o regime de principado O Mapa 11 mostra o império em sua maior extensão em 117 Indica também o Rio Rubicão que César tão desditosamente cruzou Foi essa passagem da república para o principado e mais tarde o império puro e simples que marcou o início do declínio de Roma As instituições políticas parcialmente inclusivas que eram as pedras angulares de seu êxito econômico foram sendo minadas pouco a pouco Por mais que a república favorecesse a classe senatorial e outros romanos abastados não era um regime absolutista e nunca antes havia concentrado tanto poder em um único cargo As mudanças deflagradas por Augusto a princípio apenas políticas teriam mais à frente consideráveis consequências econômicas exatamente como no caso da Serrata veneziana Em decorrência dessas transformações no século V o Império Romano do Ocidente como o lado ocidental ficou conhecido depois de separarse de sua contraparte oriental havia mergulhado em tal decadência econômica e militar que se encontrava à beira do colapso Mapa 11 O Império Romano no ano 117 E OS VÍCIOS ROMANOS Flávio Aécio foi um personagem lendário dos estertores do império saudado como o último dos romanos por Edward Gibbon autor de Declínio e queda do Império Romano Entre 433 e 454 dC até ser assassinado pelo Imperador Valentiniano III Aécio um general foi provavelmente o mais poderoso indivíduo no império Ditou as políticas interna e externa e travou uma série de batalhas cruciais tanto contra os bárbaros quanto contra outros romanos em conflitos civis Caso único entre os poderosos generais que digladiavam entre eles não almejava o trono para si Desde o fim do século II a guerra civil tornarase parte integrante da vida do império Desde a morte de Marco Aurélio em 180 dC até o colapso do Império Romano do Ocidente em 476 dC não passou uma década que não assistisse a uma guerra civil ou um golpe palaciano contra um imperador Poucos foram os imperadores a morrer de causas naturais ou em batalha A maioria foi assassinada por usurpadores ou por suas próprias tropas A carreira de Aécio ilustra as mudanças ocorridas desde a república e primórdios do império até o ocaso do império Não só seu envolvimento em guerras civis intermináveis e sua influência sobre todos os assuntos do império entram em agudo contraste com o poder muito mais restrito de generais e senadores em períodos anteriores mas também ilustra as mudanças radicais na sorte dos romanos sob outros aspectos nos séculos intervenientes No apagar das luzes do império os chamados bárbaros outrora dominados e incorporados ao Exército romano ou escravizado assumiram o controle de várias partes do império Em sua juventude Aécio fora mantido refém por bárbaros primeiro pelos godos sob o comando de Alarico e depois pelos hunos As relações romanas com essas tribos indicam como as coisas haviam mudado desde os tempos da república Alarico era ao mesmo tempo um feroz inimigo e um aliado tanto que em 405 foi nomeado um dos mais graduados generais das forças de Roma O acordo porém foi temporário Em 408 Alarico estava combatendo os romanos invadindo a Itália e saqueando a capital Os hunos também eram tanto inimigos poderosos quanto aliados frequentes dos romanos Embora também tenham feito Aécio de refém mais tarde lutariam com ele em uma guerra civil Contudo os hunos não ficavam muito tempo do mesmo lado e sob o comando de Átila enfrentaram os romanos em uma grande batalha em 451 do outro lado do Reno Dessa vez quem estava defendendo os romanos eram os godos comandados por Teodorico Nada disso impediu as elites de Roma de tentar apaziguar os líderes bárbaros em geral não para resguardar os territórios do império mas para colocarse em posição mais vantajosa em disputas internas pelo poder Por exemplo os vândalos encabeçados por seu Rei Genserico devastaram enormes áreas da Península Ibérica para depois conquistar os celeiros do império no Norte da África a partir de 429 A reação romana foi oferecer a Genserico a mão da filha do Imperador Valentiniano III em casamento O rei vândalo estava na época casado com a filha de um dos líderes godos o que não parece ter sido nenhum impedimento Anulou seu casamento sob o pretexto de que a esposa estaria tramando assassinálo e devolveua à família não sem antes havêla mutilado cortandolhe ambas as orelhas e o nariz Felizmente para a futura noiva em virtude de sua tenra idade ela permaneceu na Itália e não chegou a ter seu casamento consumado Mais tarde seria desposada por outro poderoso general Petrônio Máximo que maquinaria a morte de Aécio pelas mãos do Imperador Valentiniano III este por sua vez pereceria em seguida num complô armado pelo genro Máximo posteriormente se declararia imperador mas seu brevíssimo reinado se encerraria com seu desaparecimento durante a grande ofensiva dos vândalos comandados por Genserico contra a Itália que viu Roma cair e ser saqueada com selvageria EM PRINCÍPIOS DO século XV os bárbaros estavam literalmente às portas do império Para alguns historiadores a situação se justifica por terem sido esses os mais formidáveis oponentes enfrentados pelos romanos no final de sua história Todavia o êxito dos godos hunos e vândalos contra o Império foi um sintoma e não a causa de seu declínio Durante a república Roma havia lidado com adversários muito mais organizados e perigosos como os cartagineses Sua decadência teve causas muito semelhantes às das cidadesestados maias Foram as instituições políticas e econômicas cada vez mais extrativistas que levaram à sua queda em virtude dos conflitos internos e guerras civis causados por elas As origens do declínio remontam no mínimo à ascensão de Augusto ao poder quando se desencadearam mudanças que intensificariam o extrativismo das instituições políticas romanas Aí se incluem alterações na estrutura do exército que tornaram a secessão impossível e removeram assim um elemento crucial para assegurar a representação política dos romanos comuns O Imperador Tibério que sucedeu a Augusto em 14 dC aboliu a Assembleia da Plebe transferindo seus poderes para o Senado Em vez de uma voz política os cidadãos dispunham agora de distribuição gratuita de trigo e mais tarde azeite de oliva vinho e carne de porco além de serem entretidos com espetáculos de circo e lutas de gladiadores A partir das reformas de Augusto os imperadores passaram a depender menos do exército integrado por cidadãos soldados e mais da Guarda Pretoriana tropa de elite composta de soldados profissionais criada por Augusto A própria guarda não tardaria a adquirir voz própria e sonora na determinação do nome do imperador com frequência por meios nada pacíficos mas mediante intrigas e disputas civis Augusto havia fortalecido a aristocracia em oposição aos cidadãos comuns e a crescente desigualdade que fora o pivô do conflito entre Tibério Graco e os aristocratas persistiu talvez até aprofundada A acumulação de poder no centro tornou os direitos de propriedade dos romanos comuns menos seguros As propriedades estatais mediante confiscos também se expandiram com o império chegando em muitas regiões a metade da terra Os direitos de propriedade tornaramse especialmente instáveis em virtude da concentração de poder nas mãos do imperador e seu séquito Em um padrão não muito distinto do que se deu nas cidadesestados maias os conflitos internos pelo controle desse poderoso cargo recrudesceram As guerras civis tornaramse recorrentes mesmo antes do caótico século V quando os bárbaros reinaram soberanos Por exemplo Sétimo Severo derrubou do poder Dídio Juliano coroado imperador após o assassinato de Pertinax em 193 dC Severo o terceiro imperador do chamado Ano dos Cinco Imperadores entrou em guerra então contra os Generais Pescênio Níger e Clódio Albino que também disputavam o trono e seriam subjugados em 194 e 197 dC respectivamente Na guerra civil resultante Severo mandou confiscar todas as propriedades dos dois derrotados Embora governantes competentes como Trajano 98117 dC Adriano e Marco Aurélio no século seguinte tenham conseguido estancar o declínio não puderam ou não quiseram enfrentar os problemas institucionais básicos Nenhum desses homens propôsse a abdicar da estrutura imperial ou recriar instituições políticas eficazes nas linhas daquelas da república Marco Aurélio apesar de todos os seus êxitos foi seguido de seu filho Cômodo que se assemelhava mais a Calígula ou Nero que ao próprio pai A crescente instabilidade é evidenciada pelo traçado e localização das aldeias e cidades no império No século III dC todas as cidades de algum porte contavam com uma muralha defensiva Em muitos casos os monumentos eram saqueados para que a pedra pudesse ser usada em fortificações Na Gália antes da chegada dos romanos em 125 era comum construir os povoados nas elevações onde a defesa seria facilitada Sob a dominação romana a princípio as aldeias foram transferidas para as planícies No século III essa tendência foi revertida Junto com a crescente instabilidade política sobrevieram mudanças sociais que tornaram as instituições econômicas mais extrativistas Embora a cidadania fosse expandida em tal medida que em 212 dC quase todos os habitantes do império eram cidadãos essa alteração veio acompanhada de outras estabelecendo diferentes status de cidadania Qualquer noção eventualmente existente de igualdade perante a lei deteriorouse Por exemplo na época do reinado de Adriano 117 a 138 dC havia claras distinções entre os tipos de leis que se aplicavam a cada categoria de cidadão Ademais o papel dos cidadãos era completamente distinto daquele da época da República Romana quando as assembleias lhes davam condições para que exercessem algum grau de influência sobre as decisões políticas e econômicas A escravidão foi uma constante durante todo o império embora haja alguma controvérsia quanto à proporção de escravos na população que chegou a cair ao longo dos séculos Por outro lado à medida que o império se desenvolvia um número cada vez maior de trabalhadores agrícolas foi sendo reduzido a um estado de semisservidão e ficando preso à terra O status desses coloni servis é objeto de extenso debate em documentos jurídicos como o Codex Theodosianus e o Codex Justinianus tendo nascido provavelmente durante o reinado de Diocleciano 284 a 305 dC Os direitos dos senhores sobre os coloni foram sendo ampliados pouco a pouco O Imperador Constantino em 332 autorizou os senhores a agrilhoar um colonus que fosse suspeito de tentar escapar e a partir de 365 dC tornouse vedado aos coloni vender sua propriedade sem a permissão de seu senhor Do mesmo modo como podemos usar os naufrágios e os núcleos de gelo da Groenlândia para rastrear a expansão econômica de Roma em períodos anteriores podemos usálos também para acompanhar seu declínio Em 500 dC o ápice de 180 navios fora reduzido a 20 Com a decadência do império o comércio no Mediterrâneo entrou em colapso e há estudiosos que defendem até que só no século XIX ele voltaria aos patamares da época de Roma O gelo groenlandês conta uma história parecida Os romanos usavam prata na cunhagem de moedas e o chumbo tinha uma variedade de usos inclusive encanamento e talheres Após o apogeu no século I dC os depósitos de chumbo prata e cobre nos testemunhos de gelo caem A experiência de crescimento econômico durante a república foi impressionante assim como outros casos de expansão sob instituições extrativistas a União Soviética por exemplo Tratouse porém de um crescimento limitado e não sustentado mesmo quando se leva em consideração que ele se deu sob instituições parcialmente inclusivas Baseouse numa produtividade agrícola relativamente alta e na incidência de carga tributária significativa sobre as províncias e o comércio de longa distância mas não era movido pelo avanço tecnológico ou pela destruição criativa Os romanos herdaram algumas tecnologias básicas ferramentas e armas de ferro escrita arado e técnicas arquitetônicas Nos primórdios da república inventaram outras alvenaria com cimento bombas e rodadágua Desde então contudo a tecnologia permaneceu estagnada por toda a duração do Império Romano Na construção naval por exemplo houve poucas alterações no projeto ou cordame dos navios e os romanos nunca chegaram a desenvolver o leme de popa governando suas embarcações com remos Como a disseminação das rodasdágua foi muito lenta a energia hidráulica não chegou a revolucionar a economia Mesmo realizações consideráveis como aquedutos e redes urbanas de esgoto fizeram uso de tecnologias anteriores ainda que aperfeiçoadas Sem inovação foi possível algum nível de crescimento econômico baseado na tecnologia existente mas sem destruição criativa não poderia perdurar Assim a crescente insegurança dos direitos de propriedade e o desmanche dos direitos econômicos dos cidadãos seguindose ao de seus correlatos políticos foram acompanhados do declínio econômico inevitável Um aspecto curioso com relação a novas tecnologias no período romano é que sua criação e difusão parecem ter sido motivadas pelo Estado o que é bom pelo menos até o governo chegar à conclusão de que não tem interesse no desenvolvimento tecnológico algo recorrente em virtude do temor da destruição criativa O grande escritor romano Plínio o Velho conta a seguinte história durante o reinado de Tibério um homem inventou um vidro inquebrável e foi até o imperador na expectativa de uma grande recompensa Demonstrou sua invenção e Tibério perguntoulhe se ele havia falado sobre aquilo com alguém Diante da negativa o imperador ordenou que o levassem de sua presença e o matassem para que o ouro não tivesse seu valor reduzido a lama Há dois elementos interessantes nessa narrativa Primeiro o inventor dirigiuse a Tibério em busca de uma recompensa em vez de montar um negócio ou tratar de ganhar dinheiro com a venda do novo material o que revela o papel do governo no controle da tecnologia Segundo Tibério tratou de destruir a inovação devido às consequências adversas que poderia ter sobre a economia Eis aí o receio dos efeitos econômicos da destruição criativa Do período do império dispomos também de evidências diretas do medo inspirado pelas consequências políticas da destruição criativa Suetônio conta como o Imperador Vespasiano que governou entre 69 e 79 dC foi abordado por um homem que havia inventado um dispositivo para transportar colunas para o Capitólio a cidadela de Roma a um custo relativamente reduzido As colunas eram grandes pesadas e de transporte muito difícil Transportálas desde as minas onde eram confeccionadas até a capital envolvia a mão de obra de milhares de pessoas com grande despesa para o governo Vespasiano não mandou dar cabo do homem mas também se recusou a adotar a novidade justificandose Como será possível alimentar o populacho Outro exemplo em que o inventor recorre ao governo Talvez fosse mais natural do que no caso do vidro inquebrável visto que o governo romano tinha investimentos pesados na mineração e transporte de colunas Mais uma vez uma inovação foi preterida devido ao risco da destruição criativa não tanto por seu impacto econômico mas por receio de suas implicações políticas Vespasiano temia que se não mantivesse o povo satisfeito e sob controle ficaria politicamente desestabilizado Os plebeus tinham de permanecer ocupados e dóceis de modo que seria bom ter trabalho para lhes oferecer tal como levar colunas de um lado para o outro Era o complemento necessário do pão e circo também distribuídos de graça para manter a população contente Talvez seja sintomático que os dois exemplos tenham se dado pouco após o colapso da república Os imperadores romanos tinham muito mais poder para impedir mudanças que as autoridades republicanas Outra causa significativa da falta de inovação tecnológica foi a prevalência da escravatura À medida que se expandiam os territórios dominados pelos romanos multiplicavase o número de escravos que com frequência eram levados para a Itália a fim de guarnecer as vastas propriedades rurais Muitos cidadãos de Roma não precisavam trabalhar viviam dos subsídios do governo De onde viriam inovações Defendemos que elas ocorrem quando novas pessoas com novas ideias desenvolvem novas soluções para velhos problemas Em Roma os encarregados da produção eram escravos e mais tarde coloni semisservis com poucos incentivos para inovar uma vez que seriam os seus senhores e não eles mesmos os beneficiários de qualquer novidade Como veremos muitas vezes neste livro economias baseadas na repressão da mão de obra e sistemas como a escravidão e a servidão são notoriamente não inovadores Isso se aplica desde a Antiguidade até os tempos modernos Nos Estados Unidos por exemplo o Norte participou da Revolução Industrial não o Sul Claro que a escravidão e a servidão geram imensa riqueza para os donos dos escravos ou senhores dos servos mas não proporcionam inovação tecnológica ou prosperidade para a sociedade como um todo NINGUÉM ESCREVE DE VINDOLANDA Em 43 dC o imperador romano Cláudio havia conquistado a Inglaterra mas não a Escócia Uma derradeira tentativa em vão foi feita pelo governador romano Agrícola que desistiu e em 85 dC erigiu uma série de fortalezas para proteger a fronteira norte inglesa Destas uma das maiores localizavase em Vindolanda situada 56 quilômetros a oeste de Newcastle e representada no Mapa 11 no extremo noroeste do Império Romano Mais tarde Vindolanda seria incorporada à muralha defensiva de 136 quilômetros de extensão construída pelo imperador Adriano em 103 dC porém quando Cândido centurião romano encontravase estacionado ali era ainda um forte isolado Cândido que tinha um acordo com seu amigo Otávio acerca do abastecimento da guarnição romana recebeu deste a seguinte resposta a uma carta que havia enviado Otávio a seu irmão Cândido saudações Por diversas vezes já te escrevi que comprei aproximadamente 5 mil modii de espigas de grãos por conta dos quais necessito de dinheiro A menos que me remetas pelo menos 500 denarii estarei em risco de perder os cerca de 300 denarii por mim depositados em caução o que me poria em situação constrangedora Diante disso peçote que me envie algum dinheiro tão breve quanto possível Os couros a que te referes encontramse em Cataractônio ordena que me sejam entregues bem como ao carro por ti mencionado Eu já os teria ido buscar mas não quis expor os animais estando as estradas ainda ruins Vê com Tércio sobre os 85 denarii que ele recebeu de Fatal e não creditou em minha conta Trata de enviarme o dinheiro para que eu possa mandar debulhar as espigas Minhas saudações a Espétato e Firmo Adeus A correspondência entre Cândido e Otávio aponta certas facetas significativas da prosperidade da Inglaterra romana uma sofisticada economia monetária dotada de serviços financeiros a presença de estradas construídas mesmo que às vezes em más condições a presença de um sistema fiscal que arrecadava impostos para arcar com os soldos de Cândido e mais evidentemente que ambos eram alfabetizados e capazes de tirar proveito de um serviço postal de algum tipo A Inglaterra romana beneficiavase ainda da produção maciça de cerâmica de alta qualidade particularmente em Oxfordshire centros urbanos com banhos e edifícios públicos e técnicas de construção com uso de argamassa e telhas nos telhados No século IV tudo isso estava em decadência até que a partir de 411 dC o Império Romano desistiu da Inglaterra As tropas foram retiradas os homens que ficaram deixaram de ser remunerados e com a ruína do Estado os administradores foram expulsos pela população local Em 450 dC todas essas evidências de prosperidade econômica haviam desaparecido O dinheiro sumiu de circulação As zonas urbanas foram abandonadas e a pedra usada nas construções começou a ser reaproveitada As estradas acabaram cobertas de mato As peças de cerâmica deixaram de ser fabricadas em série e passaram a ser de confecção manual e rudimentar O uso da argamassa caiu no esquecimento e o conhecimento da escrita teve declínio substancial Os telhados passaram a ser feitos de galhos não mais telhas Ninguém mais escrevia de Vindolanda Após 411 dC a Inglaterra entrou em colapso econômico e tornouse um lugar pobre e atrasado e não era a primeira vez No capítulo anterior vimos como a Revolução Neolítica teve início no Oriente Médio por volta de 9500 aC Enquanto os habitantes de Jericó e Abu Hureyra moravam em aldeias e cultivavam o solo os da Inglaterra ainda viviam da caça e da coleta e desse modo permaneceriam por no mínimo outros 5500 anos e mesmo assim os ingleses não inventaram a agricultura nem a pecuária trazidas de fora por imigrantes que desde o Oriente Médio foram se espalhando pela Europa ao longo de milhares de anos Enquanto a população da Inglaterra adotava essas inovações a do Oriente Médio inventava as cidades a escrita e a cerâmica Em 3500 aC grandes cidades como Uruk e Ur surgiram na Mesopotâmia moderno Iraque Uruk talvez chegasse a 14 mil habitantes em 3500 aC e a 40 mil pouco depois A roda de oleiro foi inventada na Mesopotâmia mais ou menos na mesma época do transporte sobre rodas A capital egípcia Mênfis despontaria como cidade de grande porte logo em seguida A escrita surgiu de maneira independente nas duas regiões Enquanto os egípcios erguiam as grandes pirâmides de Gizé por volta de 2500 aC os ingleses construíam seu mais famoso monumento antigo o círculo de pedras em Stonehenge Nada mal pelos padrões locais mas não tinha tamanho para abrigar nem mesmo um dos barcos cerimoniais enterrados na base da pirâmide do Rei Quéops A Inglaterra continuaria atrasada limitandose a tomar emprestadas as criações do Oriente Médio e do resto da Europa até e inclusive o período romano Apesar de história tão pouco auspiciosa foi lá que surgiu a primeira sociedade verdadeiramente inclusiva e lá começou a Revolução Industrial Já defendemos páginas 8089 a tese de que isso teria sido resultado de uma série de interações entre pequenas diferenças institucionais e circunstâncias críticas por exemplo a peste negra e a descoberta das Américas A divergência inglesa teve origens históricas mas o que vemos de Vindolanda indica que suas raízes não eram nem muito profundas nem por certo historicamente predeterminadas Suas sementes não foram plantadas na Revolução Neolítica nem mesmo durante os séculos de hegemonia romana Em 450 dC no princípio do que os historiadores costumam chamar de Alta Idade Média a Inglaterra havia voltado a submergir na pobreza e no caos político e por centenas de anos não se instalaria lá um Estado centralizado eficaz CAMINHOS DIVERGENTES A ascensão de instituições inclusivas e o subsequente crescimento industrial inglês não foram um legado direto de instituições nem romanas nem anteriores o que não significa que a queda do Império Romano do Ocidente um marco histórico que afetou a maior parte da Europa não tenha tido impacto considerável também aí Uma vez que várias regiões do continente compartilhavam as mesmas circunstâncias críticas os desdobramentos sofridos por suas instituições seriam similares talvez ostentando uma marca europeia geral A queda do Império Romano foi um elemento crucial dessas circunstâncias críticas comuns Essa trajetória europeia contrasta com as de outras partes do mundo como a África subsaariana a Ásia e as Américas cujas peculiaridades devemse em parte às circunstâncias críticas distintas com que se depararam A Inglaterra romana ruiu fragorosamente Não foi o caso da Itália nem da Gália moderna França ou mesmo do Norte da África onde muitas das antigas instituições sobreviveram de alguma forma Ainda assim não resta dúvida de que a passagem da hegemonia de um Estado único romano para uma pletora de Estados controlados por francos visigodos ostrogodos vândalos e burgúndios foi significativa O poder desses Estados era muito menor constantemente fustigados que eram por intermináveis incursões em suas periferias Do norte vinham os vikings e danos em seus dracares Do leste chegavam os cavaleiros hunos Por fim o surgimento do Islã como religião e força política no século que se seguiu à morte de Maomé em 632 dC acarretou a criação de novos Estados islâmicos na maior parte do Império Bizantino Norte da África e Espanha Esses processos comuns sacudiram a Europa e em seu rastro despontou determinado tipo de sociedade que se costuma denominar feudal Era descentralizada porque os Estados centrais fortes haviam se atrofiado ainda que alguns governantes como Carlos Magno tenham tentado reconstruílos As instituições feudais baseadas na coação da mão de obra não livre os servos e obviamente extrativistas foram as pedras angulares de um longo período de lento crescimento extrativista na Europa durante a Idade Média Por outro lado foram também decisivas para desdobramentos posteriores Por exemplo ao longo do processo de redução da população rural à servidão a escravatura desapareceu da Europa Em uma época em que era possível para as elites reduzir a população rural inteira à servidão parecia desnecessária a existência de uma classe à parte de escravos presente em todas as sociedades até então O feudalismo também criou um vácuo de poder no qual se tornou possível o florescimento de cidades independentes especializadas na produção e no comércio Todavia quando o equilíbrio de poder mudou após a peste negra e a servidão começou a cair por terra na Europa Ocidental estava preparado o cenário para o surgimento de uma sociedade muito mais pluralista sem a presença de escravos As circunstâncias críticas que deram origem à sociedade feudal foram peculiares mas não se restringiram à Europa Uma comparação relevante pode ser feita com a atual Etiópia na África nascida a partir do Reino de Axum fundado no norte do país por volta de 400 aC Axum foi um reino relativamente desenvolvido para a época tendo se envolvido no comércio internacional com Índia Arábia Grécia e Império Romano Sob diversos aspectos era comparável ao Império Romano do Oriente no mesmo período Dispunha de moeda própria construiu estradas e edifícios públicos monumentais e contava com tecnologias muito similares por exemplo na agricultura e navegação Há também paralelos ideológicos interessantes entre Axum e Roma Em 312 dC o imperador romano Constantino converteuse ao cristianismo do mesmo modo como o Rei Ezana de Axum mais ou menos na mesma altura O Mapa 12 mostra a localização do Estado histórico de Axum nas atuais Etiópia e Eritreia com postos avançados do outro lado do Mar Vermelho na Arábia Saudita e Iêmen Assim como Roma entrou em declínio também Axum e sua queda seguiram um padrão análogo ao do Império Romano do Ocidente O papel desempenhado pelos hunos e vândalos no declínio de Roma foi assumido pelos árabes que no século VII expandiramse pela região do Mar Vermelho e desceram pela Península Arábica Axum perdeu suas colônias e rotas comerciais na Arábia o que precipitou seu declínio econômico a cunhagem de moedas foi abandonada caiu o número da população urbana e o Estado se deslocou para o interior do país subindo as montanhas da moderna Etiópia Arábia Saudita Eritreia Axum Mar Vermelho Iêmen Omã Djibuti Dir Adis Abeba Etiópia Isaq Somália Rahanw eyn Hawiy e Hawiy e Digil Mogandishu Darod Quênia Oceano Índico Tanzânia Axum Periferia de Axum Limites étnicos somalis Fronteiras modernas Mapa 12 O Império de Axum e os clãs somalis Na Europa as instituições feudais seguiramse ao colapso da autoridade do Estado central O mesmo se deu na Etiópia com base em um sistema chamado de gult que consistia em concessões de terra pelo imperador Há referências à instituição em manuscritos do século XIII embora suas origens talvez sejam bem anteriores O termo gult é derivado de uma palavra em amárico que se traduz por ele designou um feudo Ou seja em troca da terra o destinatário do gult tinha de prestar serviços ao imperador especialmente de natureza militar Em contrapartida adquiria o direito de coletar impostos dos que lhe lavravam as terras Uma variedade de fontes históricas sugere que esses senhores extraíam entre metade e três quartos da produção agrícola dos camponeses Mesmo tendo se desenvolvido de maneira independente o sistema apresentava notáveis semelhanças com o feudalismo europeu embora provavelmente fosse ainda mais extrativista No auge do feudalismo na Inglaterra os servos enfrentavam um extrativismo menos oneroso perdendo cerca de metade de sua produção para seus senhores de uma forma ou de outra A Etiópia contudo não era representativa da África Em outras áreas a escravatura não chegou a ser substituída pela servidão a escravidão africana e as instituições que a sustentavam continuariam ainda por muitos séculos Mesmo o futuro da Etiópia seria muito distinto Após o século VII o país continuou isolado nas montanhas da África Oriental dos processos que mais à frente exerceriam influência decisiva sobre os rumos institucionais da Europa como a emergência de cidades independentes as incipientes restrições aos monarcas e a expansão do comércio atlântico após a descoberta das Américas Por conseguinte sua versão das instituições absolutistas permaneceu basicamente inalterada O continente africano mais tarde interagiria com a Europa e a Ásia de uma posição muito diferente A África Oriental tornouse uma das principais fontes de escravos para o mundo árabe e as Áfricas Central e Ocidental seriam arrastadas para a economia mundial durante a expansão europeia associada ao comércio atlântico como fornecedoras de mão de obra escrava O modo como o comércio atlântico levou à disparidade de percursos entre a Europa Ocidental e a África é mais um exemplo de divergências institucionais resultantes da interação entre circunstâncias críticas e especificidades institucionais anteriores Enquanto na Inglaterra os lucros do tráfico de escravos ajudaram a enriquecer os opositores do absolutismo na África contribuíram para a criação e o fortalecimento exatamente desse tipo de regime Longe da Europa os processos de diferenciação institucional gozavam de liberdade obviamente ainda maior para seguir seus próprios caminhos Nas Américas por exemplo que se viram isoladas da Europa por volta de 15000 aC pelo derretimento do gelo que ligava o Alasca à Rússia verificaramse inovações institucionais similares às dos natufianos levando ao sedentarismo hierarquia e desigualdade em suma instituições extrativistas O processo se deu primeiro no México e na região andina do Peru e da Bolívia deflagrando a Revolução Neolítica americana com a domesticação do milho Foi nesses lugares que ocorreram formas primitivas de crescimento extrativista como vimos no caso das cidadesestados maias No entanto do mesmo modo como as grandes inovações no sentido de instituições inclusivas e crescimento industrial na Europa não ocorreram naqueles lugares onde a cultura romana tinha presença mais marcante as instituições inclusivas nas Américas tampouco se desenvolveram nas terras dessas primeiras civilizações Com efeito como vimos no Capítulo 1 essas sociedades de alta densidade demográfica estabeleceram uma forma perversa de interação com o colonialismo europeu o que acarretou uma inversão de rumo e tornou relativamente pobres regiões das Américas que até então haviam gozado de certa prosperidade Hoje são os Estados Unidos e o Canadá outrora muito atrasados em relação às complexas civilizações do México Peru e Bolívia que são muito mais ricos do que o restante das Américas CONSEQUÊNCIAS DO CRESCIMENTO INICIAL O longo período que separou a Revolução Neolítica iniciada em 9500 aC e a Revolução Industrial britânica no final do século XVIII é repleto de surtos de crescimento econômico deflagrados por inovações institucionais que cedo ou tarde acabariam esmorecendo Na Roma Antiga as instituições da república responsáveis por certo grau de vitalidade econômica e pela construção de um império gigantesco desmoronaram após o golpe de Júlio César e a estruturação do império sob Augusto Levou séculos para que o Império Romano finalmente desaparecesse e o declínio se consolidasse não obstante uma vez que as relativamente inclusivas instituições republicanas deram lugar às do império mais extrativistas a recessão tornouse inevitável A dinâmica veneziana foi similar A prosperidade econômica de Veneza foi forjada por instituições caracterizadas por consideráveis elementos inclusivos que se viram porém solapados quando a elite existente fechou o sistema ao ingresso de novos membros chegando mesmo a extinguir as instituições econômicas que haviam engendrado a prosperidade da república Por mais notável que tenha sido a experiência de Roma não foi o legado romano o responsável direto pela ascensão de instituições inclusivas na Inglaterra nem pela Revolução Industrial britânica O desenvolvimento das instituições é moldado por fatores históricos mas não se trata de um processo simples predeterminado nem cumulativo Roma e Veneza são exemplos de como passos iniciais em direção à inclusão podem ser revertidos O cenário econômico e institucional instaurado por Roma em toda a Europa e Oriente Médio não levou inexoravelmente às instituições inclusivas mais firmemente arraigadas de séculos posteriores Pelo contrário estas surgiriam em primeiro lugar e com mais força na Inglaterra onde a hegemonia romana era mais fraca e onde desapareceu em definitivo quase sem deixar traço durante o século V dC De fato como discutimos no Capítulo 4 a história desempenha um papel mais significativo por meio da diferenciação institucional que produz peculiaridades por menores que às vezes sejam que acabam se amplificando ao interagir com determinadas circunstâncias críticas É justamente por essas diferenças serem com frequência mínimas que podem ser revertidas com tamanha facilidade e não são necessariamente consequências de um processo cumulativo simples Claro que Roma exerceu um impacto duradouro sobre a Europa As instituições e o direito romanos influenciaram as instituições e leis estabelecidas pelos reinos bárbaros após o colapso do Império Romano do Ocidente Foi também a queda de Roma que engendrou o cenário de descentralização política que daria origem à ordem feudal O desaparecimento da escravatura e a emergência de cidades independentes foram efeitos colaterais de longuíssimo prazo e claro historicamente contingentes desse processo e teriam particular influência quando a peste negra abalasse as estruturas da sociedade feudal Das cinzas da peste nasceriam vilas e cidades mais fortes e um campesinato não mais preso à terra recémliberto das obrigações feudais Foram precisamente essas circunstâncias críticas deflagradas pela ruína do Império Romano as responsáveis por uma intensa diferenciação institucional que afetaria toda a Europa de uma maneira sem paralelos na África subsaariana Ásia ou Américas No século XVI a Europa era muito distinta em termos institucionais da África subsaariana e das Américas Embora não fosse muito mais abastada do que as civilizações asiáticas da Índia ou China mais espetaculares a Europa delas se distinguia sob determinados aspectos fundamentais Por exemplo havia desenvolvido instituições representativas ímpares desconhecidas em outros lugares Estas desempenhariam um papel crítico na implementação de instituições inclusivas Como veremos nos próximos dois capítulos seriam as pequenas diferenças institucionais que realmente fariam a diferença na Europa e elas favoreciam a Inglaterra por ser lá que a ordem feudal havia cedido lugar de maneira mais abrangente para proprietários rurais de mentalidade mais comercial e centros urbanos independentes nos quais mercadores e industriais tiveram a oportunidade de florescer Esses grupos já reivindicavam de seus monarcas direitos de propriedade mais seguros diferentes instituições econômicas e voz política em um processo que chegaria ao clímax no século XVII E 7 A REVIRAVOLTA PROBLEMAS COM MEIAS M 1583 WILLIAM LEE voltou de seus estudos na Universidade de Cambridge para tornarse o pároco local em Calverton Inglaterra Elizabeth I 15581603 havia recentemente determinado que seus súditos sempre usassem um barrete de tricô Lee notou que as tricoteiras eram o único meio de produzir essas peças de vestuário mas a demora para terminar cada item era demasiado longa Pusme a refletir Observei minha mãe e minhas irmãs sentadas no luscofusco do entardecer às voltas com suas agulhas Se cada peça era confeccionada por duas agulhas e uma linha de fio por que não várias agulhas para conduzir o fio Esse lampejo marcou o início da mecanização da produção têxtil Lee ficou obcecado pela construção de uma máquina que libertasse as pessoas daquele infindável tricotar manual Segundo ele comecei a negligenciar meus deveres para com a Igreja e a família A ideia de minha máquina e sua criação tomaramme por completo o coração e o cérebro Por fim em 1589 sua máquina de tricotar meias ficou pronta Entusiasmado ele se dirigiu a Londres na esperança de conseguir uma audiência com Elizabeth I para mostrarlhe o quanto a máquina podia ser útil e solicitar uma patente a fim de impedir a cópia da ideia por terceiros Alugou um prédio para montar a máquina e com o auxílio de seu representante local no Parlamento Richard Parkyns foi apresentado a Henry Carey Lorde Hundson membro do Conselho Privado da rainha Carey conseguiu que a Rainha Elizabeth fosse conhecer a máquina mas sua reação foi devastadora não só se recusou a conceder a patente de Lee como o admoestou Quanto atrevimento Senhor Lee Considera o que tal invenção me poderia causar aos pobres súditos Decerto lhes traria a ruína ao priválos de emprego convertendoos assim em mendigos Arrasado Lee mudouse para a França a fim de lá tentar sua sorte tendo também ali fracassado retornou à Inglaterra onde requisitou a patente a Jaime I 16031625 sucessor de Elizabeth Jaime I também recusou com a mesma justificativa de Elizabeth Ambos temiam que a mecanização da produção de meias os desestabilizasse politicamente à medida que deixaria as pessoas sem trabalho geraria desemprego e instabilidade política constituindo em última instância uma ameaça ao poder real A máquina de tecer meias era uma inovação que prometia um gigantesco salto na produtividade mas também muita destruição criativa A REAÇÃO À BRILHANTE invenção de Lee ilustra a tese central deste livro O medo da destruição criativa é o principal motivo por que não houve uma melhoria sustentada dos padrões de vida entre as revoluções neolítica e industrial A inovação tecnológica contribui para a prosperidade das sociedades humanas mas também implica a substituição do antigo pelo novo bem como a destruição dos privilégios econômicos e do poder político de alguns Para que haja crescimento econômico sustentado são necessárias novas tecnologias e novas maneiras de fazer as coisas que em geral virão de gente nova como Lee A sociedade pode enriquecer mas o processo de destruição criativa assim desencadeado constitui uma ameaça aos meios de subsistência daqueles que trabalham com as antigas tecnologias como as tricoteiras que a tecnologia de Lee deixaria sem emprego Acima de tudo inovações significativas como a máquina de tecer meias de Lee implicam também a possibilidade de uma reconfiguração do poder político Em última instância não foi a preocupação com o destino dos possíveis desempregados devido à invenção de Lee que levou Elizabeth I e Jaime I a lhe negarem a patente foi seu medo de saírem perdendo politicamente isto é seu receio de que os prejudicados pela máquina viessem a gerar instabilidade política e pôr em risco o seu poder Como vimos no caso dos ludistas páginas 6667 em geral é possível superar a resistência de trabalhadores como as tricoteiras Todavia a elite sobretudo quando vê seu poder político em risco constitui a mais formidável barreira à inovação O fato de ter tanto a perder com a destruição criativa significa não só que ela não será uma fonte de inovações como também que vai tender a resistir e procurar impedilas Assim a sociedade precisa de gente nova que introduza as inovações mais radicais pessoas que junto com a destruição criativa que virão promover terão de superar várias fontes de resistência inclusive a das elites e autoridades detentoras do poder Antes da Inglaterra do século XVII as instituições extrativistas foram ao longo da história a norma Vez por outra mostraramse capazes de gerar crescimento econômico como mostramos nos dois últimos capítulos sobretudo quando continham elementos inclusivos como em Veneza e Roma Contudo não admitiam destruição criativa O crescimento por elas engendrado não era sustentado e chegava ao fim em virtude da falta de novas inovações das disputas políticas internas decorrentes da ânsia por beneficiarse do extrativismo ou da completa reversão dos elementos inclusivos incipientes como no caso de Veneza A expectativa de vida de um morador da aldeia natufiana de Abu Hureyra provavelmente não era muito diferente daquela de um cidadão da Roma Antiga A expectativa de vida de um romano típico era relativamente próxima daquela de um habitante médio da Inglaterra no século XVII Em termos de renda em 301 dC o imperador romano Diocleciano emitiu o Edito dos Preços Máximos estabelecendo uma tabela com os salários a serem pagos aos vários tipos de trabalhadores Não sabemos o quanto na prática os salários e preços de Diocleciano entraram em vigor porém quando o historiador econômico Robert Allen usou tal edito para calcular o padrão de vida de um típico trabalhador sem qualificação constatou que seria quase exatamente o mesmo de um trabalhador não especializado na Itália do século XVII Mais ao norte na Inglaterra os salários não só já eram mais altos como estavam subindo e a situação geral estava em franca transformação Como isso se deu é o assunto deste capítulo O ONIPRESENTE CONFLITO POLÍTICO As disputas em torno das instituições e da distribuição de recursos são onipresentes ao longo da história Vimos por exemplo como os conflitos políticos afetaram a evolução de Veneza e da Roma Antiga onde acabaram sendo decididos em favor das elites que lograram incrementar sua hegemonia A história inglesa também é repleta de conflitos entre a monarquia e seus súditos entre as várias facções digladiandose pelo poder e entre as elites e os cidadãos contudo o resultado nem sempre foi o reforço do poder de seus detentores até então Em 1215 os barões que compunham a camada da elite imediatamente abaixo do rei desafiaram o Rei João e o obrigaram a assinar a Magna Carta em Runnymede ver o Mapa 9 O documento estabelecia alguns princípios básicos que impunham restrições significativas à autoridade do rei Acima de tudo determinava que o rei precisaria do consentimento dos barões para poder aumentar os impostos A cláusula mais controversa era a de número 61 segundo a qual os barões elegerão quaisquer 25 barões do reino que queiram os quais disporão de plenos poderes para observar manter e assegurar a observância da paz e das liberdades por nós concedidas e por eles confirmadas mediante esta nossa presente carta Em suma os barões criaram um comitê a fim de garantir a implementação da carta pelo rei e caso este não o fizesse seus 25 membros teriam o direito de apropriarse de castelos terras e propriedades até que em seu julgamento sejam feitas as devidas emendas O Rei João não ficou nem um pouco satisfeito e assim que os nobres se dispersaram conseguiu que o papa anulasse a Magna Carta Não obstante tanto o poder político dos barões quanto a influência do documento se manteriam A Inglaterra havia dado seu primeiro e hesitante passo em direção ao pluralismo Os conflitos em torno das instituições políticas prosseguiram e o poder da monarquia se veria ainda mais limitado pelo primeiro Parlamento eleito em 1265 Ao contrário da Assembleia da Plebe em Roma ou das atuais legislaturas eleitas seus membros a princípio eram nobres feudais e mais tarde cavaleiros e os mais abastados aristocratas do país Apesar de composto pelas elites o Parlamento inglês desenvolveu duas peculiaridades Primeiro representava não só as elites mais próximas e aliadas ao rei mas também um amplo leque de interesses inclusive a pequena aristocracia cujos integrantes se dedicavam a ofícios distintos como o comércio e a indústria e mais tarde os fidalgos uma nova classe de proprietários rurais comerciantes que ascenderam socialmente Assim o Parlamento veio conferir poder a uma seção bastante ampla da sociedade sobretudo pelos padrões da época Em segundo lugar e em grande parte em decorrência dessa primeira característica diversos membros do Parlamento opunhamse veementemente às tentativas da Coroa de aumentar seu poder e se constituiriam no esteio dos adversários da monarquia na Guerra Civil inglesa e em seguida na Revolução Gloriosa A despeito da Magna Carta e do primeiro Parlamento eleito os conflitos políticos em torno dos poderes da monarquia e de quem seria nomeado rei prosseguiram Esses conflitos dentro da elite foram encerrados com a Guerra das Rosas uma longa querela entre as casas de Lancaster e York duas famílias com pretendentes ao trono Os vencedores foram os lancastrianos cujo candidato à Coroa Henrique Tudor se sagraria Henrique VII em 1485 Deramse então dois outros processos interrelacionados O primeiro foi o reforço da centralização política deflagrada pelos Tudors A partir de 1485 Henrique VII começou a desarmar a aristocracia desmilitarizandoa e assim fazendo recrudescer o poder do Estado central Seu filho Henrique VIII implementou uma verdadeira revolução no governo por intermédio de seu principal ministro Thomas Cromwell Na década de 1530 Cromwell introduziu um incipiente Estado burocrático Em vez de o governo restringirse à casa real passaria a constituir um conjunto à parte de instituições permanentes O processo foi complementado pela ruptura de Henrique VIII com a Igreja Católica Romana e a Dissolução dos Monastérios por meio da qual Henrique expropriou todas as terras da Igreja A eliminação do poder da Igreja foi parte do processo de centralização do Estado E instituições estatais mais centralizadas significavam que pela primeira vez instituições políticas inclusivas tornavamse possíveis O processo iniciado por Henrique VII e Henrique VIII não só centralizou as instituições mas também incrementou a demanda por uma representação política de base mais ampla Tal processo de centralização pode de fato acarretar uma forma de absolutismo à medida que o rei e seus asseclas podem vir a esmagar outros grupos poderosos da sociedade e essa é uma das razões por que há oposição à centralização do Estado como vimos no Capítulo 3 Entretanto indo de encontro a essa força as instituições centralizadoras podem também mobilizar a demanda por uma modalidade incipiente de pluralismo como na Inglaterra dos Tudors Quando os barões e as elites locais reconhecem que o poder político será cada vez mais centralizado e que esse processo será difícil de reverter reivindicam o direito de ter voz ativa com relação ao uso que se fará desse poder centralizado Na Inglaterra no final do século XV e durante todo o século XVI isso implicou a intensificação dos esforços desses grupos no sentido de transformar o Parlamento em um contrapeso à Coroa e de impor controles parciais ao modo de funcionamento do Estado Assim o projeto dos Tudors não só desencadeou uma centralização política um dos pilares das instituições inclusivas mas também contribuiu indiretamente para o outro pilar o pluralismo Esses desdobramentos em termos das instituições políticas deramse no contexto de outras mudanças significativas na própria natureza da sociedade Particularmente significativo foi o recrudescimento dos conflitos políticos que ampliaram o leque de grupos capazes de apresentar suas demandas à monarquia e às elites políticas A Revolta Camponesa de 1381 página 78 foi seminal depois dela a elite inglesa foi sacudida por uma longa sequência de insurreições populares O poder político estava sendo redistribuído não apenas do rei para os nobres mas também da elite para o povo Essas transformações aliadas às crescentes restrições impostas ao poder monárquico possibilitou o surgimento de uma vasta coalizão de oposição ao absolutismo lançando assim as bases para instituições políticas pluralistas Apesar de contestadas as instituições políticas e econômicas herdadas e mantidas pelos Tudors eram ainda claramente extrativistas Em 1603 Elizabeth I filha de Henrique VIII que subira ao trono em 1553 morreu sem deixar filhos e os Tudors foram substituídos pela dinastia Stuart O primeiro Rei Stuart Jaime I herdou não só as instituições mas os conflitos dos quais eram pivôs Sua ambição era ser um governante absolutista Embora o Estado tenha se tornado mais centralizado e as mudanças sociais estivessem promovendo uma redistribuição de poder na sociedade as instituições políticas ainda não chegavam a ser pluralistas Na economia o extrativismo manifestavase não só na oposição ao invento de Lee mas sob a forma de monopólios monopólios e mais monopólios Em 1601 uma lista deles foi lida no Parlamento e um de seus membros indagou ironicamente O pão está incluído aí Em 1621 eram 700 deles Nas palavras do historiador inglês Christopher Hill cada homem vivia em uma casa construída com tijolos monopolizados com janelas de vidro monopolizado aqueciase com carvão monopolizado na Irlanda lenha monopolizada que ardia em uma grelha forjada em ferro monopolizado Lavavase com sabão monopolizado e às roupas com goma monopolizada Vestia se com rendas monopolizadas tecidos monopolizados couro monopolizado fios de ouro monopolizados Suas roupas eram seguras por cintos monopolizados botões monopolizados alfinetes monopolizados e tingidas com corantes monopolizados Comia manteiga monopolizada groselhas monopolizadas arenque monopolizado salmão monopolizado e lagostas monopolizadas Temperava a comida com sal monopolizado pimenta monopolizada vinagre monopolizado Escrevia com penas monopolizadas em papel de carta monopolizado lia com óculos monopolizados e à luz de velas monopolizadas livros de impressão monopolizada Esses e muitos outros monopólios conferiam a indivíduos ou grupos o direito exclusivo de controlar a produção de muitos bens impedindo o tipo de alocação de talentos que é tão crucial à prosperidade econômica Tanto Jaime I quanto seu filho e sucessor Carlos I aspiravam a reforçar a Coroa reduzir a influência do Parlamento e estabelecer instituições absolutistas similares às que estavam sendo estruturadas na Espanha e França de modo a intensificar o controle exercido pelo trono e pela elite sobre a economia tornando as instituições mais extrativistas Os conflitos entre Jaime I e o Parlamento chegaram ao clímax na década de 1620 tendo por pivô o controle do comércio tanto ultramarino como dentro das Ilhas Britânicas A concessão de monopólios pela Coroa era uma das principais fontes de renda do Estado sendo usada com frequência como uma maneira de conferir direitos exclusivos aos partidários do rei Não admira que essa instituição extrativista que impedia o acesso e inibia o funcionamento do mercado fosse tão altamente daninha à atividade econômica e aos interesses de muitos membros do Parlamento Em 1623 o Parlamento obteve uma vitória notável ao conseguir promulgar o Estatuto dos Monopólios proibindo Jaime I de implementar novos monopólios domésticos Contudo ele ainda poderia conceder monopólios no campo do comércio externo visto que a autoridade do Parlamento não se estendia às relações internacionais Assim os monopólios já existentes internacionais ou não permaneceram intactos O Parlamento não tinha reuniões regulares precisando ser convocado pelo rei Segundo a convenção determinada pela Magna Carta a convocação era necessária para que o Parlamento avaliasse novos impostos propostos pelo rei Carlos I foi coroado em 1625 recusouse a convocar o Parlamento a partir de 1629 e intensificou os esforços de Jaime I no sentido de consolidar o regime absolutista Impôs empréstimos forçados ou seja forçou a população a emprestarlhe dinheiro modificando unilateralmente os termos dos acordos e recusandose a quitar suas dívidas Criou e vendeu monopólios no âmbito que o Estatuto dos Monopólios lhe havia deixado o das empreitadas comerciais no estrangeiro Solapou a independência do Judiciário e tentou intervir e influenciar no resultado de julgamentos Instituiu diversas multas e taxas das quais a mais polêmica foi a tarifa naval cobrando dos condados litorâneos a partir de 1634 uma taxa para sustentar a Marinha Real e no ano seguinte estendendo a cobrança aos condados do interior Essa tarifa naval seria coletada anualmente até 1640 O comportamento cada vez mais absolutista de Carlos e suas políticas extrativistas fomentaram o ressentimento e geraram resistência em todo o país Em 1640 estalou o conflito com a Escócia e sem dinheiro para aparelhar o exército o rei foi forçado a convocar o Parlamento e solicitar aumento dos impostos O chamado Parlamento Breve reuniuse por apenas três semanas Os parlamentares que se apresentaram em Londres não só se recusaram a discutir os impostos como expressaram uma série de queixas até que Carlos optou por dispensálos Os escoceses percebendo que Carlos não contava com apoio em seu país invadiram a Inglaterra ocupando a cidade de Newcastle Carlos entabulou negociações e os invasores exigiram a participação do Parlamento obrigandoo a convocar o que ficou então conhecido como Parlamento Longo pois continuaria reunido até 1648 recusandose a dissolverse mesmo quando o rei assim o determinou Em 1642 irrompeu a Guerra Civil entre o monarca e o Parlamento ainda que muitos parlamentares tenham se aliado ao trono O padrão dos conflitos refletiu a contenda em torno das instituições políticas e econômicas O Parlamento pretendia pôr fim às instituições políticas absolutistas o rei queria reforçálas O conflito tinha profundas raízes econômicas Muitos apoiaram a Coroa por terem sido agraciados com lucrativos monopólios por exemplo os monopólios locais controlados pelos ricos e poderosos mercadores de Shrewsbury e Oswestry eram protegidos pelo trono da concorrência dos mercadores londrinos Esses mercadores aliaramse a Carlos I Por outro lado a indústria metalúrgica havia florescido na região de Birmingham porque ali os monopólios eram fracos e os recémchegados à indústria não precisavam submeter se aos sete anos de aprendizado exigidos no resto do país durante a Guerra Civil fabricaram espadas e voluntariaramse para o lado do Parlamento Analogamente a falta de restrições associativas no condado de Lancashire permitiu o desenvolvimento ainda antes de 1640 dos novos tecidos um novo estilo de fazendas mais leves a região onde a produção desses tecidos se concentrava foi a única área de Lancashire a apoiar o Parlamento Sob a liderança de Oliver Cromwell os parlamentaristas conhecidos como Cabeças Redondas pelo estilo de corte de cabelo que adotavam derrotaram os realistas conhecidos como Cavaleiros Carlos foi levado a julgamento e executado em 1649 Sua derrota e a abolição da monarquia entretanto não produziram instituições inclusivas pelo contrário a monarquia foi substituída pela ditadura de Oliver Cromwell Após a morte deste a monarquia foi restaurada em 1660 voltando a aferrarse a muitos dos privilégios que lhe haviam sido arrancados em 1649 O filho de Carlos Carlos II retomou então o velho projeto de instauração do absolutismo na Inglaterra Suas tentativas seriam apenas intensificadas por seu irmão Jaime II que o sucederia no trono após sua morte em 1685 Em 1688 a tentativa do rei de restabelecer o absolutismo provocou outra crise desencadeando nova guerra civil O Parlamento dessa vez encontravase mais unido e organizado e convidou o Statholder holandês Guilherme de Orange e sua esposa Maria a filha protestante de Jaime para o trono deste Guilherme traria um exército e reivindicaria o trono para governar não como monarca absoluto mas sob uma monarquia constitucional forjada pelo Parlamento Dois meses após o desembarque de Guilherme nas Ilhas Britânicas em Brixham Devon ver o Mapa 9 as tropas de Jaime se dispersaram e ele fugiu para a França A REVOLUÇÃO GLORIOSA Após a vitória na Revolução Gloriosa o Parlamento e Guilherme negociaram uma nova Constituição As mudanças prenunciadas pela Declaração feita por Guilherme às vésperas de sua invasão seriam consagradas na Declaração de Direitos formulada pelo Parlamento em fevereiro de 1689 A Declaração foi lida para Guilherme na mesma sessão em que lhe foi ofertada a coroa Sob diversos aspectos a Declaração intitulada Carta de Direitos Bill of Rights após ser convertida em lei era vaga o mais crucial porém era o fato de que efetivamente estabelecia certos princípios constitucionais centrais Determinava a sucessão ao trono e de um modo que divergia significativamente dos princípios hereditários em vigor até então Se o Parlamento pudera uma vez destituir um monarca e substituílo por outro mais do seu agrado por que não fazêlo novamente A Declaração de Direitos asseverava também que o monarca não poderia suspender ou promulgar leis e reiterava a ilegalidade dos impostos que não gozassem de aprovação parlamentar Ademais determinava que não poderia haver Exército permanente na Inglaterra sem consentimento parlamentar A ambiguidade se manifestava em clausulas como a de número 8 que estabelecia que a eleição dos membros do Parlamento deve ser livre sem explicitar como esse grau de liberdade seria determinado Ainda mais obscura era a cláusula 13 cujo ponto central era que o Parlamento se reunisse com frequência Uma vez que quando e se o Parlamento se reuniria haviam sido questões tão contenciosas durante todo o século seria de se esperar uma especificidade bem maior nesse artigo Não obstante o motivo de tamanha imprecisão é claro Cláusulas têm de ser cumpridas Durante o reinado de Carlos II estivera em vigor uma Lei Trienal que estipulava que o Parlamento fosse convocado no mínimo uma vez a cada três anos Entretanto Carlos a tinha ignorado por completo sem que nada acontecesse pois não havia como impor seu cumprimento Após 1688 o Parlamento poderia ter aproveitado para introduzir algum dispositivo que assegurasse que ela fosse respeitada do mesmo modo como os barões haviam feito com seu conselho depois da assinatura da Magna Carta pelo Rei João Não o fez entretanto por ser desnecessário a autoridade e o poder decisório após 1688 passaram às mãos do Parlamento Mesmo sem regras ou legislação específicas Guilherme abdicou de muitas das práticas dos monarcas anteriores Parou de interferir em decisões legais e abriu mão de direitos régios até então como a apropriação vitalícia da receita alfandegária Em seu conjunto essas mudanças nas instituições políticas representaram o triunfo do Parlamento sobre o trono e portanto o fim do absolutismo na Inglaterra e posteriormente na GrãBretanha a partir da integração de Inglaterra e Escócia pela Lei da União em 1707 Desde então o Parlamento manteve se no firme controle das políticas de Estado o que fez uma enorme diferença visto que os interesses do Parlamento eram muito diversos daqueles dos reis Stuart Como muitos integrantes da casa tinham consideráveis investimentos no comércio e na indústria nutriam o mais profundo interesse pelo asseguramento dos direitos de propriedade Se antes eles volta e meia eram infringidos pelos Stuarts de agora em diante seriam defendidos com vigor Ademais quando cabia aos monarcas determinar como o governo despenderia seus recursos os parlamentares opunhamse ao aumento de impostos e bradavam contra qualquer menção ao reforço do poder do Estado Agora que era a própria casa que controlava os gastos este de bom grado aumentava a carga tributária e canalizava fundos para as atividades que considerasse relevantes Destas a principal era o fortalecimento da Marinha encarregada de proteger os interesses mercantis ultramarinos de muitos dos membros do Parlamento Ainda mais importante que os interesses dos parlamentares era a incipiente natureza pluralista das instituições políticas O povo inglês passou a ter acesso tanto ao Parlamento quanto às políticas e instituições econômicas ali forjadas de uma maneira sem precedentes no tempo em que as políticas públicas eram ditadas pela Coroa A mudança deveuse parcialmente é claro ao fato de os membros do Parlamento agora serem eleitos Contudo uma vez que a Inglaterra estava longe de ser uma democracia nesse período tal acesso gerou somente um pequeno grau de responsividade Uma de suas muitas desigualdades consistia em que no século XVIII menos de 2 da população tinha direito a voto e tinham de ser homens As cidades onde a Revolução Industrial ocorreu Birmingham Leeds Manchester e Sheffield não dispunham de representação independente no Parlamento e pelo contrário as regiões rurais gozavam de representação excessiva Igualmente negativos eram os fatos de que o direito a voto nas áreas rurais os condados baseavase na propriedade da terra ao passo que diversas áreas urbanas os burgos eram controladas por uma pequena elite que não concedia aos novos industrialistas o direito ao voto ou à candidatura a cargos eletivos No burgo de Buckingham por exemplo 13 cidadãos tinham exclusividade do direito a voto Ademais havia os burgos podres que por tradição possuíam direito a voto mas se haviam deteriorado porque sua população com o tempo havia ido embora ou como no caso de Dunwich no litoral leste da Inglaterra literalmente se precipitara no oceano em decorrência da erosão costeira Em todos os burgos podres número reduzido de eleitores escolhia dois membros para o Parlamento Old Sarum tinha 7 votantes e Dunwich 32 mas ambas elegiam dois parlamentares do mesmo modo Havia contudo outras maneiras de influenciar o Parlamento e por conseguinte as instituições econômicas A mais importante era por petição muito mais significativa que o alcance restrito da democracia para a emergência do pluralismo após a Revolução Gloriosa Qualquer um podia enviar uma petição ao Parlamento e as petições choviam Sintomaticamente eram recebidas com atenção pelo Parlamento um sinal acima de tudo da queda do absolutismo do poder recémadquirido por uma fatia relativamente ampla da sociedade e da ascensão do pluralismo na Inglaterra após 1688 O ritmo frenético com que as petições chegavam mostra o quanto era vasto o segmento da população indo muito além dos que ocupavam assentos no Parlamento ou eram por eles representados que tinha o poder de influenciar o modo de funcionamento do Estado E era um poder bem utilizado O caso dos monopólios é o melhor exemplo do que queremos dizer Já vimos como estes se encontravam no cerne das instituições econômicas extrativistas no século XVII Viramse atacados em 1623 com o Estatuto dos Monopólios e representaram significativo pomo da discórdia durante a Guerra Civil inglesa O Parlamento Longo aboliu todos os monopólios que afetavam a vida da população no âmbito doméstico Embora nem Carlos II nem Jaime II os tenham restaurado conseguiram resguardar sua capacidade de conceder monopólios ultramarinos Um deles foi a Royal African Company cuja carta de monopólio foi emitida por Carlos II em 1660 Essa companhia detinha o monopólio do lucrativo tráfico de escravos africano e seu governador e principal acionista era o irmão de Carlos Jaime que em breve seria entronizado Jaime II Depois de 1688 a companhia perdeu não só seu governador mas seu maior defensor Jaime havia se dedicado assiduamente à proteção do seu monopólio face aos entrelopos os comerciantes independentes que tentavam adquirir escravos no Oeste da África e vendêlos nas Américas Era um comércio muito rentável e a Royal African Company enfrentava muitos desafios já que todas as demais atividades mercantis inglesas no Atlântico eram livres Em 1689 a companhia confiscou o carregamento de um desses entrelopos um certo Nightingale Nightingale processoua por confisco ilegal de bens e o Presidente da Suprema Corte Holt determinou a ilegalidade do ato por tratarse do exercício de um direito de monopólio criado por prerrogativa real Ora argumentou Holt os privilégios de monopólio só podiam ser criados por estatuto o que tinha de ser feito pelo Parlamento Assim Holt depositou todos os futuros monopólios não só a Royal Africa Company nas mãos do Parlamento Até 1688 Jaime II teria rapidamente destituído qualquer juiz que emitisse tal sentença desde 1688 porém muita coisa estava diferente O Parlamento precisava agora decidir o que fazer com o monopólio e começaram a chegar petições 135 no total vindas de entrelopos que solicitavam livre acesso ao comércio no Atlântico Embora a Royal African Company tenha respondido na mesma moeda não tinha como fazer frente ao número ou escopo das petições que exigiam sua derrota Os entrelopos conseguiram enquadrar seus protestos em termos não só de seus mais estritos interesses pessoais mas do interesse nacional o que de fato eram Por conseguinte apenas 5 das 135 petições eram assinadas pelos entrelopos em si e 73 das petições dos entrelopos vinham de províncias fora de Londres contra 8 em favor da companhia Das colônias onde as petições não eram permitidas os entrelopos reuniram 27 petições a companhia 11 Os entrelopos colheram também um número muito maior de assinaturas para suas petições montando a 8 mil contra 25 mil em favor da companhia A batalha prosseguiria até 1698 quando o monopólio da Royal African Company foi abolido Junto com esse novo núcleo para elaboração das instituições econômicas e a nova responsividade pós1688 os parlamentares começaram a implementar uma série de mudanças fundamentais nas instituições econômicas e políticas públicas que em última instância preparariam o terreno para a Revolução Industrial Os direitos de propriedade tão desgastados sob os Stuarts foram reforçados O Parlamento deu início a um processo de reforma das instituições econômicas a fim de fomentar a atividade manufatureira em vez de ameaçála e onerála A fumagem imposto anual cobrado por cada lareira ou fogão e que incidia mais pesadamente sobre as manufaturas que eram suas ferrenhas opositoras foi extinta em 1689 logo após a ascensão de Guilherme e Maria ao trono Em vez de taxar as lareiras o Parlamento começou a onerar a terra A redistribuição da carga tributária não foi apenas uma política promanufatureira apoiada pelo Parlamento Foi aprovada toda uma série de leis no intuito de expandir o mercado e a rentabilidade dos têxteis de lã o que fazia todo sentido em termos políticos já que muitos dos parlamentares opositores de Jaime investiam pesadamente naqueles empreendimentos manufatureiros nascentes O Parlamento aprovou ainda uma legislação que possibilitou a total reorganização dos direitos de propriedade sobre a terra permitindo a consolidação e eliminação de diversas formas arcaicas de propriedade e direitos de uso Outra prioridade do Parlamento era a reforma das finanças Embora tivesse havido uma expansão do sistema bancário e financeiro no período que levou à Revolução Gloriosa o processo seria consolidado com a criação do Banco da Inglaterra em 1694 como fonte de recursos para a indústria outra consequência direta da referida revolução A fundação do banco preparou o terreno para uma revolução financeira mais ampla que acarretaria grande expansão dos mercados financeiros e serviços bancários No princípio do século XVIII havia empréstimos disponíveis para quem dispusesse das garantias necessárias para oferecer Os registros do período 17021724 de um banco londrino relativamente pequeno o C Hoares Co que chegaram intactos até nós ilustram essa questão Embora o banco emprestasse dinheiro para aristocratas e nobres dois terços dos maiores tomadores do Hoares nesse período não pertenciam às classes sociais privilegiadas Pelo contrário eram mercadores e homens de negócios entre eles certo John Smith epônimo do inglês médio que contraiu um empréstimo de 26 mil junto ao banco entre 1715 e 1719 Até aqui sublinhamos como a Revolução Gloriosa transformou as instituições políticas inglesas tornandoas mais pluralistas além de lançar as bases para instituições econômicas inclusivas Contudo outra mudança significativa nas instituições nasceu da Revolução Gloriosa o Parlamento deu continuidade ao processo de centralização política iniciado pelos Tudors Não foram só as restrições que aumentaram ou o Estado que passou a regular a economia de outra forma ou a gastar dinheiro com outras coisas mas a capacidade e recursos estatais se ampliaram também em todos os sentidos o que vem novamente ilustrar a relação entre centralização política e pluralismo até 1688 o Parlamento se opusera a aumento da eficácia e melhor aparelhamento do Estado por não dispor de meios para controlálo Depois dessa data a história já era outra O Estado começou a se expandir e seus gastos logo chegaram a cerca de 10 da renda nacional graças a uma expansão da base tributária relativa sobretudo aos impostos que incidiam sobre a fabricação de uma longa lista de itens produzidos no país Era um enorme orçamento de Estado para a época com efeito maior do que o que se encontra hoje em vários lugares do mundo O orçamento colombiano por exemplo só atingiria o mesmo tamanho relativo na década de 1980 Em muitos lugares da África subsaariana como Serra Leoa ainda hoje o orçamento de Estado seria muito inferior em relação ao tamanho total da economia sem o significativo influxo de ajuda estrangeira A expansão do tamanho do Estado porém corresponde a apenas parte do processo de centralização política Mais importante é o modo qualitativo de funcionamento do Estado e o modo de agir dos que o controlam e nele trabalham Embora a construção das instituições estatais na Inglaterra remonte à Idade Média as medidas decisivas rumo à centralização política e ao desenvolvimento da moderna administração foram como vimos página 146 tomadas por Henrique VII e Henrique VIII Mesmo assim o Estado ainda estava longe do formato moderno que emergiria após 1688 Por exemplo muitas indicações eram feitas seguindo critérios políticos não com base no mérito ou talento e o Estado dispunha ainda de possibilidades muito restritas de aumentar os impostos Depois de 1688 o Parlamento começou a melhorar a capacidade de incrementar sua receita por meios tributários como bem se nota pela sofisticação da burocracia envolvida no imposto sobre a produção que deu um salto de 1211 funcionários em 1690 para 4800 em 1780 Os inspetores fiscais eram designados para postos espalhados por todo o país supervisionados por coletores que participavam de rondas para medição e checagem das quantidades de pão cerveja e outros itens sujeitos a tributação A amplitude dessa operação é ilustrada pela reconstituição das rondas do Supervisor George Cowperthwaite pelo historiador John Brewer Entre 12 de junho e 5 de julho de 1710 o Supervisor Cowperthwaite percorreu 465 quilômetros no distrito de Richmond em Yorkshire Nesse período visitou 263 estalajadeiros 71 malteiros 20 fabricantes de velas e um cervejeiro comum No total tomou 81 medidas diferentes de produção e verificou o trabalho de 9 coletores que lhe eram subordinados Oito anos mais tarde o encontramos trabalhando com o mesmo empenho mas agora no distrito de Wakefield em outra região de Yorkshire Em Wakefield ele percorria em média mais de 30 quilômetros por dia e trabalhava seis dias por semana normalmente inspecionando quatro ou cinco estabelecimentos Em seu dia de folga aos domingos preenchia seus livros de modo a manter um registro atualizado de suas atividades Com efeito o sistema de arrecadação era de registro muito elaborado Havia três tipos de registros diferentes os três deveriam coincidir e qualquer adulteração dos números era considerada crime grave Tão notável grau de supervisão da sociedade pelo Estado supera em muito a capacidade dos governos de muitos países pobres hoje e isso em 1710 Outro elemento significativo é que após 1688 o Estado começou a depender mais do talento e menos de indicações de cunho político desenvolvendo uma complexa infraestrutura para administrar o país A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL A Revolução Industrial afetou todos os aspectos da economia inglesa Houve grandes avanços nos transportes metalurgia e energia a vapor Entretanto a área mais significativa de inovação foi a mecanização da produção têxtil e o surgimento de fábricas para a produção desses tecidos manufaturados Esse processo dinâmico foi deflagrado pelas mudanças institucionais geradas pela Revolução Gloriosa Já não era mais uma questão de abolição de monopólios domésticos o que já fora conquistado em 1640 ou de arrecadação fiscal ou de acesso a recursos financeiros Tratavase agora de uma reorganização fundamental das instituições econômicas em favor dos inovadores e empreendedores a partir do surgimento de direitos de propriedade mais seguros e eficientes A maior segurança e eficiência dos direitos de propriedade desempenhou um papel central por exemplo na revolução dos transportes que preparou o terreno para a Revolução Industrial Os investimentos em canais e estradas com cobrança de pedágio aumentaram em progressão geométrica após 1688 e à medida que reduziram os custos de transporte ajudaram a criar um importante prérequisito para a Revolução Industrial Até 1688 esse tipo de investimento em infraestrutura era obstaculizado por intervenções arbitrárias dos Stuarts A mudança pós1688 é vividamente ilustrada pelo caso do Rio Salwerpe em Worcestershire Em 1662 o Parlamento aprovou uma lei estimulando iniciativas que tornassem o rio navegável e a família Baldwyn investiu 6 mil para esse fim obtendo em contrapartida o direito de cobrar pela navegação de suas águas Em 1693 apresentouse um projeto ao Parlamento para transferir os direitos de pedágio para o Conde de Shrewsbury e Lorde Coventry A nova lei foi questionada por Sir Timothy Baldwyn que imediatamente fez ao Parlamento uma petição alegando que o referido projeto representava basicamente uma expropriação de seu pai que fizera pesados investimentos no rio na expectativa do pedágio que poderia cobrar Baldwyn argumentava que o novo projeto tende a invalidar a lei anterior e a tornar nulos todo o trabalho e materiais gastos na sua consecução Esse tipo de realocação de direitos era exatamente o que os Stuarts costumavam fazer Baldwyn porém advertiu Há consequências funestas em privar um indivíduo de seus direitos adquiridos por determinação parlamentar sem seu devido consentimento O novo projeto foi indeferido e os direitos de Baldwyn mantidos Depois de 1688 os direitos de propriedade tornaramse bem mais seguros em parte porque sua garantia estava de acordo com os interesses do Parlamento em parte porque as instituições pluralistas podiam ser influenciadas pelo mecanismo de petições Observase que a partir desse ano o sistema político tornouse significativamente mais pluralista criando maior igualdade de oportunidades na Inglaterra Subjacentes à revolução dos transportes e de modo mais geral à reorganização da terra ocorrida ao longo do século XVIII estavam leis parlamentares que viriam a modificar a natureza da propriedade Até 1688 vigorava ainda a ficção jurídica de que toda a terra na Inglaterra pertencia em última instância à Coroa um legado direto da organização feudal da sociedade Muitos terrenos estavam submetidos a várias formas arcaicas de direitos de propriedade e uma série de reivindicações sobrepostas Boa parte da terra correspondia às chamadas propriedades equitativas o que significava que o proprietário não podia hipotecar arrendar nem vender a terra As terras comuns em geral só podiam ser utilizadas de maneira tradicional Havia gigantescos impedimentos ao seu uso de maneiras que pudessem ser economicamente desejáveis O Parlamento começou a reverter esse quadro ao permitir que grupos de pessoas apresentassem petições solicitando a simplificação e reorganização dos direitos de propriedade alterações que posteriormente se traduziriam em centenas de leis Tal reorganização das instituições econômicas manifestouse também no empenho em proteger a produção têxtil nacional dos produtos importados Não admira que parlamentares e seus eleitores não se opusessem a todas as barreiras alfandegárias e monopólios aqueles que lhes ampliassem os mercados e lucros eram bemvindos Entretanto o pluralismo das instituições políticas o fato de que o Parlamento representava conferia poder e dava ouvidos a amplo segmento da sociedade significava que tais barreiras não poderiam estrangular outros industrialistas ou excluir por completo a entrada de sangue novo como fizera a Serrata em Veneza páginas 122 123 Os poderosos fabricantes de lã não demorariam a fazer essa descoberta Em 1688 os tecidos indianos madras e musselinas respondiam por larga fatia das importações inglesas chegando a cerca de um quarto do total de importações de têxteis Também importantes eram as sedas chinesas Madras e sedas eram importadas pela Companhia das Índias Orientais que até 1688 desfrutava de um monopólio governamental sobre o comércio com a Ásia Contudo tal monopólio e poder político eram mantidos às custas de pesadas propinas pagas a Jaime II após 1688 a companhia viuse em posição vulnerável e não tardou a sofrer ataques sob a forma de um intenso bombardeio de petições De um lado comerciantes ávidos por atuar no Extremo Oriente e na Índia demandavam que os parlamentares liberassem a concorrência com a Companhia das Índias Orientais de outro a companhia respondia com contrapetições e ofertas de empréstimo ao Parlamento A companhia perdeu foi fundada uma nova Companhia das Índias Orientais para fazerlhe frente Entretanto os produtores têxteis não queriam apenas aumentar a concorrência no comércio indiano demandavam o aumento da carga tributária ou mesmo o banimento das importações dos tecidos baratos indianos madras que representavam para eles fortes concorrentes Àquela altura os mais importantes fabricantes ingleses produziam fazendas de lã mas os produtores de tecidos de algodão vinham ganhando importância econômica e poder político Em princípios da década de 1660 a indústria da lã intensificou suas tentativas de se proteger promovendo as Leis Suntuárias que entre outras coisas proibiam o uso de tecidos mais leves Promoveu também um pesado lobby junto ao Parlamento no sentido da aprovação de leis em 1666 e 1678 tornando ilegal que as pessoas fossem enterradas envoltas em mortalhas de qualquer outro material que não fosse lã Ambas as medidas visavam à proteção do mercado de artigos de lã e reduziram a concorrência asiática enfrentada pelos fabricantes ingleses Não obstante nessa época a Companhia das Índias Orientais era demasiado forte para que se lograsse restringir as importações de têxteis asiáticos A maré virou após 1688 Entre 1696 e 1698 os fabricantes de lã de East Anglia e de West Country aliaramse aos produtores de seda de Londres e Cantuária e à Levant Company para restringir as importações Os importadores de seda da Levant mesmo tendo acabado de perder seu monopólio queriam vetar as sedas asiáticas a fim de criar um nicho para as do Império Otomano Essa coalizão começou a apresentar projetos ao Parlamento impondo restrições ao uso de algodões e sedas asiáticos bem como ao tingimento e impressão de têxteis da Ásia na Inglaterra Em resposta em 1701 o Parlamento finalmente aprovou uma lei para o mais efetivo emprego dos pobres mediante o estímulo aos produtores deste reino Em setembro de 1701 decretou Todas as sedas bengalas e que tais mescladas a fibras vegetais de fabricação na Pérsia China ou Índia Oriental todos os madras lá pintados tingidos impressos ou coloridos que sejam ou venham a ser importados para este reino não poderão ser vestidos Agora era ilegal vestir sedas e madras asiáticos na Inglaterra Mas ainda era possível importálos para reexportar para a Europa ou outros mercados sobretudo as colônias americanas Ademais madras lisos podiam ser importados e finalizados na Inglaterra e as musselinas estavam isentas do veto Após uma longa batalha essas falhas como os fabricantes ingleses de têxteis de lã as viam foram corrigidas pela Lei de Madras de 1721 A partir de 25 de dezembro de 1722 deixará de ser legal que qualquer pessoa ou pessoas usem ou vistam na Grã Bretanha qualquer vestimenta ou traje de qualquer tipo qualquer madras impresso pintado ou tingido Uma vez eliminada a concorrência asiática às lãs inglesas restava ainda uma ativa indústria nacional de algodão e linho para fazer face à lã ambos eram misturados na fabricação de um tecido muito popular de nome fustão Excluída a concorrência asiática a indústria da lã procurou asfixiar o linho Sendo um produto oriundo basicamente da Escócia e Irlanda uma coalizão inglesa teria alguma margem de manobra para reivindicar a exclusão desses países dos mercados ingleses Todavia o poder dos fabricantes de lã tinha limites Suas novas tentativas encontraram ferrenha oposição dos produtores de fustão dos florescentes centros industriais de Manchester Lancaster e Liverpool O pluralismo das instituições políticas significava que todos esses grupos distintos agora tinham acesso ao processo de elaboração de políticas no Parlamento por votação e acima de tudo petição Embora chovessem petições dos dois lados recolhendo assinaturas favoráveis e contrárias o resultado do conflito foi uma vitória dos novos interesses contra os da indústria da lã A Lei de Manchester de 1736 reconheceu que vastas quantidades de produtos feitos de fio de linho e algodão vêm sendo há muitos anos manufaturados e tingidos ou pintados neste reino da Grã Bretanha O texto prosseguia Nenhum ponto da referida lei de 1721 será estendido ou deduzido no sentido de proibir o vestuário ou aplicação em trajes artigos domésticos mobiliário ou outros qualquer item confeccionado em fio de linho ou algodão manufaturado e tingido ou pintado em qualquer cor ou cores dentro do reino da Grã Bretanha A Lei de Manchester constituiu uma vitória significativa para os nascentes fabricantes de algodão Entretanto seu significado histórico e econômico foi na realidade muito mais profundo Em primeiro lugar demonstrou os limites às barreiras alfandegárias que as instituições políticas pluralistas da Inglaterra parlamentar tolerariam Em segundo lugar ao longo do meio século seguinte inovações tecnológicas na manufatura do algodão desempenhariam papel fundamental na Revolução Industrial acarretando transformações fundamentais para a sociedade por meio da introdução do sistema fabril Depois de 1688 enquanto no âmbito interno iam se constituindo condições mais igualitárias no plano internacional o Parlamento empenhavase em ampliar as prerrogativas inglesas o que é evidenciado não só pelas leis do madras mas também pelas leis da navegação a primeira das quais foi promulgada em 1651 e que permaneceriam em vigor de um modo ou de outro pelos 200 anos seguintes Tais leis visavam a facilitar o monopólio do comércio internacional pelos britânicos ainda que com a crucial particularidade de que se tratava de um monopólio não por parte do Estado mas do setor privado O princípio básico era que o comércio inglês deveria ser transportado em navios ingleses As leis proibiam o transporte de bens de fora da Europa para a Inglaterra ou suas colônias por embarcações de bandeira estrangeira vetavam também o transporte de produtos originários de outros países europeus para a Inglaterra em navios de uma terceira nacionalidade Tal vantagem dos comerciantes e produtores ingleses naturalmente aumentava sua margem de lucro e talvez tenha incentivado inovações nesses novos e altamente rentáveis ramos de atividade Em 1760 a combinação de todos esses fatores novos e aprimorados direitos de propriedade melhor infraestrutura regime fiscal renovado maior acesso ao crédito e agressiva proteção ao comércio e à manufatura começava a revelar seus efeitos Desse ano em diante ocorre um salto no número de invenções patenteadas e a profusão de avanços tecnológicos que constituiria o cerne da Revolução Industrial vai ficando evidente As inovações se davam nas mais diversas frentes refletindo o ambiente institucional mais arejado Nesse sentido um campo crucial foi o da energia mais notadamente as novidades no uso dos motores a vapor frutos das ideias de James Watt na década de 1760 A primeira inovação de Watt foi a introdução de uma câmara de condensação à parte para o vapor de modo que o cilindro onde se alojava o pistão pudesse ser mantido em alta temperatura todo o tempo em vez de precisar ser sucessivamente aquecido e resfriado Mais tarde ele desenvolveria diversas outras ideias métodos mais eficientes de conversão do movimento do motor a vapor em energia útil por exemplo dos quais o mais notável foi seu sistema planetário de engrenagens Em todas essas áreas as inovações tecnológicas basearamse em trabalhos anteriores de terceiros No caso do motor a vapor incluise aí a obra pioneira do inventor inglês Thomas Newcomen e também de Dionysius Papin físico e inventor francês A história da invenção de Papin é outro exemplo de como sob instituições extrativistas o risco de destruição criativa impede os avanços tecnológicos Em 1679 Papin desenvolveu o projeto de um digestor de vapor e em 1690 havia chegado a um motor de pistões Em 1705 usou esse motor rudimentar para construir o primeiro barco a vapor do mundo Na época Papin era professor de Matemática na Universidade de Marburg no estado germânico de Kassel e resolveu testar o barco descendo o Rio Fulda até o Rio Weser Qualquer barco que fizesse esse percurso era obrigado a parar na cidade de Münden Naquele tempo o tráfego fluvial no Fulda e no Weser era monopólio de uma guilda de barqueiros Papin deve ter imaginado que poderia enfrentar problemas Seu amigo e mentor o célebre físico alemão Gottfried Leibniz escreveu para o eleitor de Kassel o chefe de Estado solicitando permissão para que Papin passasse sem ser molestado por Kassel O pedido porém foi negado e Leibniz recebeu a lacônica resposta de que os conselheiros eleitorais encontraram graves obstáculos à concessão da supracitada petição e sem indicar suas razões ordenaramme que vos informasse de sua decisão por conseguinte o pedido será indeferido por sua Alteza Eleitoral Inconformado Papin resolveu realizar a travessia do mesmo modo Quando seu barco chegou a Münden a guilda de barqueiros primeiro tentou que um juiz local apreendesse a embarcação mas sem sucesso Os barqueiros então cercaram o barco de Papin e o destruíram junto com o motor a vapor Papin morreria na pobreza e seu nome seria relegado ao esquecimento Na Inglaterra dos Tudors ou Stuarts Papin talvez recebesse tratamento hostil similar mas tudo mudou depois de 1688 De fato quando seu barco foi destruído sua intenção era navegar até Londres Na metalurgia contribuições cruciais foram feitas na década de 1780 por Henry Cort que introduziu novas técnicas de depuração do ferro possibilitando a produção de um metal de qualidade muito superior fator crítico para a manufatura de pregos ferramentas e peças para máquinas A produção de grande quantidade de ferro batido por meio das técnicas de Cort foi facilitada pelas inovações introduzidas desde 1709 por Abraham Darby e seus filhos pioneiros no uso do carvão na fundição do minério O processo seria aprimorado em 1762 mediante a adaptação por John Smeaton de energia hidráulica para mover cilindros sopradores no refino do coque Desde então o carvão vegetal desapareceria da produção do ferro sendo substituído pela hulha muito mais barata e acessível Muito embora as inovações não sejam cumulativas houve evidente aceleração em meados do século XVIII e em nenhum campo esse efeito foi mais visível do que na produção têxtil A operação mais básica na produção de têxteis é a fiação que consiste na extração de fibras de origem vegetal ou animal como algodão ou lã e enrolálas formando o fio Este por sua vez é tecido formando o pano Uma das grandes inovações tecnológicas do período medieval foi a roda de fiar que veio a substituir a fiação manual Esse invento surgiu por volta de 1280 na Europa provavelmente oriunda do Oriente Médio Os métodos de fiação permaneceriam intactos até o século XVIII Começaram a despontar inovações significativas a partir de 1738 quando Lewis Paul patenteou um novo método usando roletes para substituir as mãos humanas na extração das fibras fiadas Contudo seu aparelho não funcionava muito bem e foram as inovações de Richard Arkwright e James Hargreaves que de fato revolucionaram a fiação Em 1769 Arkwright uma das figuras mais proeminentes da Revolução Industrial patenteou sua máquina de tecer hidráulica um gigantesco avanço em relação à de Lewis Associouse a Jedediah Strutt e Samuel Need fabricantes de malha e em 1771 construíram uma das primeiras fábricas do mundo em Cromford As novas máquinas eram movidas a água e Arkwright mais tarde faria a crucial transição para a energia a vapor Em 1774 sua empresa contava com 600 operários Expandiuse a largos passos acabando por estabelecer fábricas em Manchester Matlock Bath e New Lanark na Escócia As inovações de Arkwright foram complementadas em 1764 pela invenção da máquina de fiar hidráulica por Hargreaves aprimorada por Samuel Crompton em 1779 dando origem à mula e posteriormente por Richard Roberts criador da mula automática Os efeitos dessas novidades foram verdadeiramente revolucionários no começo do século eram necessárias 50 mil horas para fiar à mão 45 quilos de algodão A máquina hidráulica de Arkwright era capaz de realizar o mesmo volume de trabalho em 300 horas e a mula automática em 135 A mecanização da fiação foi acompanhada da mecanização da tecelagem O primeiro passo importante nesse sentido foi a invenção da lançadeira voadora por John Kay em 1733 Ainda que a princípio ela tenha se limitado a aumentar a produtividade das tecelãs manuais seu impacto mais duradouro seria na preparação do terreno para o processo mecanizado Partindo da lançadeira voadora Edmund Cartwright introduziu o tear mecânico em 1785 a primeira de uma série de inovações que levariam por fim à substituição do trabalho manual pelas máquinas também na tecelagem como já acontecia na fiação Além de ser a força motriz da Revolução Industrial a indústria têxtil inglesa também revolucionou a economia mundial As exportações inglesas encabeçadas pelas fazendas de algodão duplicaram entre 1780 e 1800 Foi o crescimento nesse setor que impulsionou toda a economia A combinação de inovação tecnológica e organizacional constituiu o modelo de progresso econômico que transformou as economias do mundo que enriqueceriam Para levar a cabo tal transformação era crucial que houvesse novas cabeças cheias de novas ideias Consideremos a inovação nos transportes Na Inglaterra houve sucessivas ondas de inovação primeiro os canais depois as estradas por fim as ferrovias A cada etapa os inovadores eram gente nova Os canais começaram a surgir na Inglaterra a partir de 1770 e em 1810 já interligavam muitas das mais importantes regiões manufatureiras À medida que transcorria a Revolução Industrial os canais desempenharam papel significativo na redução dos custos de transporte dos grandes volumes de novos bens industriais como os têxteis de algodão e os insumos necessários à produção sobretudo o algodão cru e a hulha para os motores a vapor Os pioneiros na construção de canais foram homens como James Brindley contratado pelo Duque de Bridgewater para abrir o canal de mesmo nome que acabaria ligando a cidade industrial de Manchester ao Porto de Liverpool Nascido na Derbyshire rural Brindley era por profissão construtor de moinhos e sua reputação de encontrar soluções criativas para problemas de engenharia chegou ao conhecimento do duque Não possuía nenhuma experiência prévia com os problemas relacionados a transportes caso também de outros grandes engenheiros de canais como Thomas Telford que começou a vida como pedreiro ou John Smeaton engenheiro e ferramenteiro Do mesmo modo como os mais proeminentes engenheiros de canais não tinham nenhuma ligação anterior com o campo dos transportes os grandes engenheiros de estradas e ferroviários também não John McAdam que inventou o macadame betuminoso por volta de 1816 era o segundo filho de uma família da pequena nobreza A primeira locomotiva a vapor foi construída em 1804 por Richard Trevithick cujo pai envolveuse com mineração na Cornualha Richard ingressou ainda jovem no mesmo ramo de negócios tendo ficado fascinado pelos motores a vapor usados para bombear as minas Mais importantes foram as inovações de George Stephenson filho de pais analfabetos e construtor da célebre locomotiva The Rocket que começou trabalhando como maquinista em uma mina de carvão Foram também novos homens que movimentaram a crucial indústria têxtil de algodão Alguns dos pioneiros desse novo setor foram pessoas até então profundamente envolvidas na produção e comércio de fazendas de lã John Foster por exemplo empregava 700 tecelões manuais na indústria de lã quando mudou para o algodão e fundou a Black Dyke Mills em 1835 Perfis como o de Foster no entanto eram minoria Apenas cerca de um quinto dos principais industrialistas da época tinha experiência prévia em qualquer atividade manufatureira Não admira Por um lado a indústria do algodão despontou em novas cidades no norte da Inglaterra As fábricas eram uma maneira completamente nova de organizar a produção A indústria da lã organizavase de maneira muito distinta distribuindo a matériaprima para os trabalhadores levarem para casa onde fiavam e teciam por conta própria Em sua maioria portanto os envolvidos na indústria da lã estavam muito mal preparados para aderir ao algodão como no caso de Foster Era preciso forasteiros para desenvolver e utilizar as novas tecnologias A rápida expansão do algodão dizimou a indústria da lã a destruição criativa em ação A destruição criativa promove uma redistribuição não só da renda e da riqueza mas também do poder político como William Lee pôde constatar ao depararse com autoridades que por receio de suas consequências políticas mostraramse tão pouco receptivas à sua invenção À medida que a economia industrial se expandia em Manchester e Birmingham os novos donos de fábricas e grupos de classe média que surgiram ao seu redor começaram a questionar sua falta de direitos políticos e as políticas governamentais que se opunham aos seus interesses Seu alvo principal foram as leis do trigo que vedavam a importação de trigo na verdade todos os grãos e cereais mas principalmente o trigo caso os preços caíssem demais garantindo assim a margem de lucro dos grandes proprietários rurais Era uma ótima política para os grandes produtores de trigo mas péssima para os manufaturadores que precisavam arcar com salários mais altos para compensar a alta do preço do pão Com os trabalhadores concentrados nas novas fábricas e centros industriais ficou mais fácil organizarse e promover insurreições Na década de 1820 a exclusão política dos novos manufaturadores e centros manufatureiros estava se tornando insustentável Em 16 de agosto de 1819 planejouse um comício para criticar o sistema político e as políticas governamentais a realizarse em St Peters Fields Manchester O organizador era Joseph Johnson fabricante local de pincéis e um dos fundadores do jornal radical Manchester Observer Entre outros organizadores estavam John Knight produtor de algodão e reformador e John Thacker Saxton editor do Manchester Observer Reuniramse 60 mil manifestantes muitos exibindo cartazes com os dizeres Chega das Leis do Trigo Sufrágio Universal e Voto na Urna referência ao voto secreto não aberto como ainda em voga então As autoridades muito nervosas com a manifestação haviam reunido uma força de 600 hussardos Quando começaram os discursos um magistrado local decidiu emitir um mandado para prisão dos palestrantes Quando a polícia tentou executar a ordem deparouse com a oposição da multidão e instalouse o conflito A essa altura os hussardos arremeteramse contra a multidão Ao cabo de alguns minutos caóticos havia 11 mortos e provavelmente 600 feridos O Manchester Observer chamou o ocorrido de Massacre de Peterloo Em vista das transformações já sofridas pelas instituições políticas e econômicas a longo prazo a repressão na Inglaterra não seria uma solução O Massacre de Peterloo não passaria de um incidente isolado Após o levante as instituições políticas inglesas cederam à pressão e à ameaça desestabilizadora de uma agitação social ainda maior ainda mais depois da revolução de 1830 na França contra Carlos X que havia tentado restaurar o absolutismo posto abaixo pela Revolução Francesa de 1789 Em 1832 o governo inglês promulgou a Primeira Lei da Reforma conferindo direitos a Birmingham Leeds Manchester e Sheffield e ampliando a base de votação de modo que os manufaturadores ganhassem representação no Parlamento O consequente deslocamento do poder político inclinou as políticas públicas na direção desejada por esses interesses recémrepresentados assim em 1846 as detestadas leis do trigo foram por fim abolidas mais uma vez demonstrando que a destruição criativa implicava a redistribuição não só da renda mas também do poder político E naturalmente toda mudança na distribuição de poder político levaria com o tempo a nova redistribuição de renda Foi a natureza inclusiva das instituições inglesas que possibilitou a ocorrência desse processo Os que seriam prejudicados pela destruição criativa e a temiam não teriam mais condições de evitála POR QUE NA INGLATERRA A Revolução Industrial teve início e deu seus maiores passos na Inglaterra em virtude de suas instituições econômicas inclusivas caso único no mundo Estas por sua vez erguiamse sobre as bases lançadas pelas instituições políticas inclusivas produzidas pela Revolução Gloriosa Esta fora a responsável pelo fortalecimento e racionalização dos direitos de propriedade aprimoramento dos mercados financeiros enfraquecimento dos monopólios sancionados pelo Estado no comércio exterior e remoção das barreiras à expansão da indústria Foi a Revolução Gloriosa que tornou o sistema político aberto e responsivo às aspirações e necessidades econômicas da sociedade Essas instituições econômicas inclusivas ofereceram a homens de talento e visão como James Watt a oportunidade e o incentivo de que eles precisavam para desenvolver suas habilidades e ideias e exercer sobre o sistema uma influência que beneficiaria tanto a eles pessoalmente quanto ao país Naturalmente tendo alcançado o êxito almejado esses homens tinham os mesmos impulsos de quaisquer outros queriam impedir que outros ingressassem em seus respectivos ramos de atividade e lhes fizessem frente e temiam o processo de destruição criativa que poderia pôr seus negócios a perder do mesmo modo como eles mesmos antes haviam levado outros à falência Depois de 1688 isso se tornou mais difícil Em 1775 Richard Arkwright entrou com amplo pedido de patente que esperava ele no futuro lhe conferiria o monopólio sobre a indústria da fiação do algodão que então se expandia rapidamente Os tribunais indeferiram sua solicitação Por que esse processo ocorreu unicamente na Inglaterra e por que no século XVII Por que a Inglaterra desenvolveu instituições políticas pluralistas e afastouse das instituições extrativistas Como vimos os acontecimentos políticos que culminaram na Revolução Gloriosa foram moldados por uma série de processos interligados Uma peçachave foram as disputas políticas entre o absolutismo e seus opositores um conflito cujos resultados não só puseram fim às tentativas de renovar e reforçar o absolutismo na Inglaterra mas também fortaleceram os defensores de mudanças fundamentais nas instituições da sociedade Os rivais do absolutismo não se limitaram a tentar construir outro tipo de regime absoluto não se tratava apenas da derrota da Casa de York para a Casa de Lancaster na Guerra das Rosas Pelo contrário a Revolução Gloriosa implicou a emergência de um novo regime baseado na constitucionalidade e no pluralismo Esse resultado foi consequência da diferenciação das instituições inglesas e do modo como elas interagiram com as circunstâncias críticas Vimos no capítulo anterior como as instituições feudais surgiram na Europa Ocidental após o colapso do Império Romano do Ocidente O feudalismo disseminouse pela maior parte do continente tanto no lado ocidental quanto no oriental Contudo como mostrou o Capítulo 4 após a peste negra surgiram entre as duas bandas do continente divergências radicais Pequenas diferenças nas instituições políticas e econômicas implicaram que no lado ocidental o equilíbrio de poder vigente levasse ao aprimoramento das instituições e no oriental à sua deterioração Não obstante esse caminho não levaria necessária e inexoravelmente ao estabelecimento de instituições inclusivas Seria preciso que houvesse vários outros desdobramentos cruciais ao longo do caminho Embora a Magna Carta já procurasse lançar certas fundações institucionais básicas para um regime constitucional muitas outras regiões europeias inclusive no Leste Europeu assistiram a querelas similares envolvendo documentos parecidos Ainda assim após a peste negra a Europa Ocidental afastouse significativamente da Oriental Documentos como a Magna Carta adquiriram peso maior no oeste No leste não significaram muito Na Inglaterra mesmo antes dos conflitos do século XVII estabeleceuse a norma de que o rei não poderia aumentar os impostos sem autorização do Parlamento Não menos importante foi o lento e progressivo deslocamento do poder das elites para uma parcela mais ampla dos cidadãos como exemplificado pela mobilização política das comunidades rurais manifesta na Inglaterra em momentos como a Revolta dos Camponeses de 1381 Essa diferenciação institucional entrou em interação com outra circunstância crítica deflagrada pela expansão ultramarina Como vimos no Capítulo 4 a influência desse elemento sobre a futura dinâmica institucional iria depender da capacidade da Coroa de monopolizar ou não o comércio atlântico Na Inglaterra o poder ligeiramente maior do Parlamento impediu os reis tanto da dinastia Tudor quanto da Stuart de fazê lo criando uma nova classe de mercadores e empresários ferrenhos opositores da criação do absolutismo na Inglaterra Na Londres de 1686 por exemplo havia 702 mercadores que exportavam para o Caribe e 1283 importadores Na América do Norte eram 691 exportadores e 626 importadores Empregavam gerentes de armazém marinheiros capitães portuários escriturários todos os quais partilhavam de maneira geral os mesmos interesses Outros portos vibrantes como Bristol Liverpool e Portsmouth eram analogamente repletos de mercadores assim Esses novos homens desejavam e demandavam outras instituições econômicas e quanto mais enriqueciam com o comércio mais poderosos se tornavam As mesmas forças estavam em ação na França Espanha e Portugal nesses lugares porém os reis mostraramse muito mais capazes de manter o comércio e seus lucros sob o controle da Coroa Os novos grupos que transformariam a Inglaterra também surgiram nesses países mas eram aí consideravelmente menores e mais fracos Por ocasião da reunião do Parlamento Longo e da irrupção da Guerra Civil em 1642 esses mercadores aliaramse à causa parlamentar Na década de 1670 estiveram intimamente ligados à formação do Partido Whig liberal que se oporia ao absolutismo dos Stuarts e em 1688 seriam os pivôs da deposição de Jaime II Assim a expansão das oportunidades comerciais proporcionada pelas Américas a entrada maciça dos mercadores ingleses nesse comércio e o desenvolvimento econômico das colônias bem como as fortunas amealhadas no processo inclinaram a balança de poder na disputa entre a monarquia e os adversários do absolutismo Talvez de maneira ainda mais decisiva a emergência de diversos grupos de interesses indo desde os fidalgos uma classe de proprietários rurais comerciantes que havia despontado no período Tudor até vários tipos de manufaturadores passando pelos mercadores no Atlântico e o poder que foram adquirindo tornou não só forte mas também abrangente a coalizão contra o absolutismo dos Stuarts Essa coalizão foi ainda mais reforçada pela fundação do Partido Whig na década de 1670 que lhes proporcionou uma organização para defender seus interesses Esse fortalecimento foi fundamental para o desenvolvimento do pluralismo após a Revolução Gloriosa Se todos os que combatiam os Stuarts tivessem os mesmos interesses e a mesma origem a derrubada da dinastia muito provavelmente se limitaria a repetir a contenda entre a Casa de Lancaster e a de York assim de dois conjuntos estreitos e rivais de interesses em última instância emergiria um que apenas substituiria e recriaria as mesmas instituições extrativistas assumissem elas ou não uma forma similar A abrangência da coalizão implicou maior demanda pela constituição de instituições políticas pluralistas Sem alguma espécie de pluralismo haveria o perigo de que um dos vários interesses em jogo usurpasse o poder em detrimento dos demais O fato de o Parlamento após 1688 representar uma coalizão tão ampla foi um fator crucial que levou os parlamentares a dar ouvidos às petições mesmo quando vinham de pessoas de fora do Parlamento e mesmo daqueles sem direito a voto Esse foi o elemento fundamental para a prevenção de eventuais tentativas de um grupo de fundar um monopólio às expensas do resto como tentou fazer a indústria da lã antes da promulgação da Lei de Manchester A Revolução Gloriosa foi um acontecimento momentoso exatamente por ter sido conduzido por uma coalizão ampla que conseguiu forjar um regime constitucional com limites claros ao poder tanto do executivo quanto de cada um de seus demais membros Foram essas restrições por exemplo que impediram os fabricantes de lã de esmagar a potencial concorrência dos manufaturadores de algodão e fustão Assim a abrangência dessa coalizão não só foi essencial na criação de um Parlamento forte após 1688 como também criou mecanismos dentro do próprio Parlamento para evitar que qualquer grupo específico acumulasse poder em excesso e dele pudesse abusar Esse foi o fator crítico na emergência das instituições políticas pluralistas O fortalecimento de tão ampla coalizão desempenhou também importante papel na persistência e reforço das instituições inclusivas tanto políticas quanto econômicas como veremos no Capítulo 11 Não obstante nada disso tornaria inevitável um regime verdadeiramente pluralista e seu surgimento deveuse em parte aos rumos contingentes da história Uma coalizão não muito diferente emergiu vitoriosa da Guerra Civil inglesa contra os Stuarts somente para desembocar na ditadura de Oliver Cromwell A força dessa coalizão tampouco seria garantia de derrota do absolutismo Jaime II poderia ter vencido Guilherme de Orange O caminho da profunda mudança institucional foi como de hábito não menos contingente do que o resultado de outros conflitos políticos E assim seria por mais que a trajetória específica de diferenciação institucional que gerou essa ampla coalizão contra o absolutismo e a circunstância crítica das oportunidades comerciais no Atlântico tenham desequilibrado o jogo contra os Stuarts Nesse caso portanto a contingência e a abrangência da coalizão foram os fatores decisivos para o nascimento do pluralismo e das instituições inclusivas E 8 NÃO NO NOSSO QUINTAL BARREIRAS AO DESENVOLVIMENTO PROIBIDO IMPRIMIR M 1445 NA CIDADE GERMÂNICA de Mainz Johannes Gutenberg levou a público uma inovação com profundas consequências para a história econômica posterior uma prensa tipográfica baseada em tipos móveis Até então os livros precisavam ou ser copiados à mão por escribas processo muito lento e laborioso ou eram xilogravados com uma peça de madeira entalhada específica para cada página Os livros eram poucos e esparsos e caríssimos Depois da invenção de Gutenberg as coisas começaram a mudar Os livros agora impressos aumentaram em número e disponibilidade Sem tal inovação a alfabetização e a escolarização em massa teriam sido impossíveis Na Europa Ocidental a prensa tipográfica logo teve sua importância reconhecida Em 1460 já havia uma prensa fora das fronteiras alemãs em Estrasburgo França No final da década de 1460 a tecnologia já se espalhara por toda a Itália com prensas em Roma e Veneza logo seguidas por Florença Milão e Turim Em 1476 William Caxton havia instalado um exemplar em Londres dois anos depois havia outra em Oxford Nesse mesmo período a novidade tinha se difundido pelos Países Baixos chegado à Espanha e até ao Leste Europeu com a montagem de uma prensa em Budapeste em 1473 e na Cracóvia no ano seguinte Nem todos viam a imprensa como uma inovação desejável porém Já em 1485 o sultão otomano Bayezid II emitiu um edito proibindo expressamente os muçulmanos de imprimir em árabe A norma seria reforçada pelo Sultão Selim I em 1515 Só em 1727 a primeira prensa seria admitida em terras otomanas O Sultão Ahmed III expediu um decreto concedendo permissão a İbrahim Müteferrika para montála Contudo mesmo esse ato tardio foi cercado de restrições embora o decreto fizesse menção ao feliz dia em que essa técnica ocidental será desvelada como uma noiva e não se voltará a esconder jamais a imprensa de Müteferrika seria objeto da mais atenta vigilância Afirmava o decreto A fim de que os livros impressos fiquem livres de erros tipográficos os doutos honoráveis e meritórios eruditos religiosos especializados em lei islâmica os excelentes cádi de Istambul Mevlana Ishak e o cádi de Tessalônica Mevlana Sahib e o cádi de Gálata Mevlana Asad que seus méritos sejam louvados junto com os das ilustres ordens religiosas e o pilar dos justos e religiosos eruditos o xeque do Kasim Paşa Mevlevihane Mevlana Musa que sua sabedoria e conhecimento se multipliquem vão supervisionar a revisão das provas Müteferrika foi autorizado a instalar sua prensa mas tudo o que fosse impresso teria de passar pelo crivo de três eruditos religiosos e legais os cádis Talvez a sabedoria e o conhecimento dos cádis como os de todos os demais se tivessem multiplicado bem mais rápido caso a prensa tipográfica estivesse mais acessível Não seria esse o caso contudo mesmo após a devida permissão para sua montagem Não admira que Müteferrika tenha impresso tão poucos livros apenas 17 entre 1729 quando a prensa entrou em operação e 1743 quando ele parou de trabalhar Sua família tentou dar prosseguimento à tradição mas conseguiu imprimir apenas sete outros livros quando finalmente desistiram em 1797 Fora do coração do Império Otomano na Turquia o advento da impressão foi ainda mais retardado No Egito por exemplo a primeira prensa tipográfica seria instalada apenas em 1798 por franceses que tomaram parte da tentativa fracassada de Napoleão Bonaparte de capturar o país A segunda metade do século XIX seguia já bastante avançada e a produção de livros no Império Otomano continuava a cargo primariamente de escribas que copiavam à mão os livros existentes No começo do século XVIII havia ao que consta 80 mil desses escribas ativos em Istambul Tamanha resistência à prensa tipográfica teve consequências óbvias para a alfabetização escolarização e prosperidade econômica Em 1800 provavelmente apenas 2 a 3 dos cidadãos do Império Otomano sabiam ler e escrever comparados aos 60 dos homens e 40 das mulheres em idade adulta na Inglaterra Na Holanda e na Alemanha os índices de alfabetização eram ainda mais altos Já os territórios otomanos estavam muito atrasados em relação aos países europeus que tinham os mais baixos índices de escolarização dessa época como Portugal onde talvez apenas cerca de 20 dos adultos soubessem ler e escrever Considerandose as instituições altamente absolutistas e extrativistas dos otomanos a hostilidade do sultão em relação à prensa tipográfica fica fácil de entender Os livros disseminavam ideias e tornavam a população bem mais difícil de controlar Algumas dessas ideias podiam ser novas e preciosas maneiras de fomentar o crescimento econômico mas outras talvez fossem subversivas e desafiassem o status quo político e social existente Os livros também solapam o poder de quem controla o conhecimento oral uma vez que facilitam seu pronto acesso por parte de qualquer pessoa alfabetizada um perigo para a ordem vigente na qual o saber era prerrogativa das elites O estabelecimento religioso e os sultões otomanos temiam a destruição criativa daí resultante A solução encontrada foi a proibição da imprensa A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL engendrou uma circunstância crítica que afetaria quase todos os países Alguns deles como a Inglaterra que não só aceitaram mas também estimularam ativamente o comércio a industrialização e o empreendedorismo apresentaram crescimento acelerado Muitos como Império Otomano China e outros regimes absolutistas ficaram para trás por terem bloqueado ou no mínimo se furtado a incentivar a difusão da indústria As instituições políticas e econômicas moldaram as respostas à inovação tecnológica mais uma vez ensejando o já nosso conhecido padrão de interação entre as instituições existentes e as circunstâncias críticas e produzindo discrepâncias entre as diferentes instituições e respectivos resultados econômicos O Império Otomano continuaria sendo absolutista até seu colapso no final da Primeira Guerra Mundial o que lhe permitiu oporse ou impedir inovações como a prensa tipográfica e a destruição criativa por ela acarretada A razão por que as mudanças econômicas ocorridas na Inglaterra não se verificaram também no Império Otomano é a ligação natural entre as instituições políticas extrativistas e absolutistas e o extrativismo econômico O absolutismo consiste no governo sem nenhuma restrição imposta pela lei ou pela vontade de terceiros ainda que na realidade os absolutistas reinem com o apoio de um pequeno grupo ou elite qualquer Na Rússia do século XIX por exemplo os czares eram monarcas absolutistas que contavam com o apoio da nobreza a qual correspondia a cerca de 1 da população total Esse grupo pequeno organizava as instituições políticas de modo a perpetuar o próprio poder Não houve parlamento ou representação política de outros grupos da sociedade russa até 1905 quando o czar criou a Duma muito embora ele logo tenha tratado de esvaziar os poucos poderes que lhe havia concedido Não admira que as instituições econômicas fossem extrativistas organizadas de modo a tornar o czar e a classe nobre o mais ricos possível A base desse sistema como em tantos outros exemplos de extrativismo econômico era um esquema de coação e controle em massa da mão de obra sob a forma particularmente perniciosa assumida pela servidão no país Todavia o absolutismo não era o único tipo de instituição política a impedir a industrialização Por menos pluralistas que fossem os regimes absolutistas e por mais que temessem a destruição criativa muitos contavam com Estados centralizados ou ao menos centralizados o bastante para vedar o acesso a inovações como a prensa tipográfica Ainda hoje em países como Afeganistão Haiti e Nepal falta centralização política ao Estado nacional Na África subsaariana a situação é ainda mais grave Como já mostramos sem uma centralização que promova a ordem e faça valer as regras e os direitos de propriedade não é possível a emergência de instituições inclusivas Veremos neste capítulo que em várias regiões da África subsaariana por exemplo na Somália e no Sul do Sudão um dos maiores impedimentos à industrialização foi a inexistência de qualquer forma de centralização política Na ausência desses pré requisitos naturais a industrialização não teria a menor chance de decolar Embora o absolutismo e a falta de centralização política ou sua fragilidade sejam obstáculos distintos à disseminação da indústria há uma conexão entre os dois por um lado ambos são sustentados pelo medo da destruição criativa por outro o processo de centralização política em geral cria uma propensão ao absolutismo A resistência à centralização política é alimentada por motivos similares aos da resistência a instituições políticas inclusivas o receio da perda de poder político só que agora para o Estado recémcentralizador e aqueles em cujas mãos estiver o seu controle Vimos no capítulo anterior como o processo de centralização política sob a monarquia Tudor inglesa contribuiu para as demandas das várias elites locais no sentido da obtenção de voz e representação nas instituições políticas nacionais seria uma forma de evitar essa perda de poder político Surgiu assim um Parlamento mais forte que acabaria possibilitando a emergência de instituições políticas inclusivas Em diversos outros casos contudo ocorre justamente o oposto e o processo de centralização política também dá origem a uma era de absolutismo ainda maior Assim nasceria o absolutismo russo forjado por Pedro o Grande desde 1682 até sua morte em 1725 Pedro construiu uma nova capital São Petersburgo destituindo de poder a velha aristocracia os boiardos a fim de criar um Estado burocrático e um Exército modernos Chegou mesmo a abolir a Duma boiarda que o havia coroado Pedro introduziu a Tabela de Cargos uma hierarquia social inteiramente nova cuja essência era o serviço ao trono Assumiu também o controle da Igreja exatamente como fizera Henrique VIII ao centralizar o Estado inglês Por meio desse processo de centralização política Pedro foi retirando o poder de terceiros e dele se apropriando Suas reformas militares induziram a guarda real tradicional os streltsy à rebelião levante logo seguido por outros como o dos baskires na Ásia Central e a Revolta de Astracã Nenhuma logrou êxito Embora Pedro o Grande tenha sido muito bemsucedido em seu projeto de centralização política superando a oposição em muitos lugares do mundo o tipo de força que ao ter seu poder desafiado resistia à centralização do Estado como os streltsy saiu vitoriosa A falta de centralização do Estado daí resultante portanto significou a manutenção de instituições políticas extrativistas de outra espécie Neste capítulo veremos como durante a circunstância crítica criada pela Revolução Industrial muitos países deixaram passar a oportunidade e não tiraram proveito da disseminação da indústria por serem dominados por instituições políticas absolutistas e econômicas extrativistas como no caso do Império Otomano ou por lhes faltar a centralização política necessária como na Somália UMA PEQUENA DIFERENÇA QUE FAZ A DIFERENÇA Ao longo do século XVII enquanto na Inglaterra o absolutismo vacilava na Espanha ele só se exacerbava O equivalente espanhol do Parlamento inglês as Cortes tinha existência apenas nominal A Espanha foi forjada em 1492 pela fusão dos reinos de Castela e Aragão através do casamento da Rainha Isabel e do Rei Fernando A data coincidiu com a conclusão da Reconquista o longo processo de expulsão dos árabes que desde o século VIII ocupavam o sul do país e ergueram as grandes cidades de Granada Córdoba e Sevilha O derradeiro Estado árabe na Península Ibérica Granada caiu perante as forças hispânicas ao mesmo tempo em que Cristóvão Colombo chegava às Américas e reclamava as novas terras para a Rainha Isabel e o Rei Fernando que lhe haviam patrocinado a viagem A fusão das coroas de Castela e Aragão e os casamentos dinásticos e heranças que se seguiram acabariam criando um superestado europeu Isabel morreu em 1504 e sua filha Joana sagrouse rainha de Castela Joana era casada com Filipe da Casa de Habsburgo filho do Sacro Imperador Romano Maximiliano I Em 1516 Carlos filho de Joana e Filipe foi coroado Carlos I de Castela e Aragão Quando seu pai morreu Carlos herdou a Holanda e o FrancoCondado que agregou aos seus territórios na Península Ibérica e Américas Em 1519 quando por sua vez Maximiliano I veio a falecer legou a Carlos também os territórios dos Habsburgo na Alemanha tornandoo o Sacro Imperador Romano Carlos V O que inicialmente não passara da fusão de dois reinos espanhóis em 1492 converteuse em um império multicontinental e Carlos deu prosseguimento ao projeto de fortalecimento do Estado absolutista iniciado por Isabel e Fernando O projeto de construção e consolidação do absolutismo na Espanha contou com o inestimável auxílio da descoberta de metais preciosos nas Américas Na década de 1520 a prata já fora descoberta em vasta quantidade em Guanajuato México e logo depois também em Zacatecas no mesmo território A conquista do Peru a partir de 1532 proporcionou uma riqueza ainda maior para a Coroa sob a forma de uma participação o quinto real que incidia sobre todo e qualquer produto da conquista e da atividade de mineração Como vimos no Capítulo 1 uma montanha de prata foi descoberta em Potosí na década de 1540 despejando ainda mais riqueza nos cofres do soberano espanhol Na época da fusão de Castela e Aragão a Espanha figurava entre as regiões europeias mais prósperas economicamente Após a consolidação de seu sistema político absolutista entrou em declínio econômico relativo e de 1600 em diante absoluto Um dos primeiros atos de Isabel e Fernando após a Reconquista foi a expropriação dos judeus Os cerca de 200 mil judeus que viviam no país receberam um prazo de quatro meses para partir Tiveram de vender todas as suas terras e bens a preços irrisórios e foram proibidos de levar qualquer ouro ou prata consigo Tragédia humana similar se daria novamente apenas 100 anos mais tarde Entre 1609 e 1614 Filipe III expulsou os mouriscos descendentes dos cidadãos dos antigos Estados árabes no sul da Espanha Como ocorrera com os judeus os mouriscos tiveram de partir levando apenas o que podiam carregar sem que pudessem transportar consigo nenhum ouro prata ou outros metais preciosos Os direitos de propriedade eram inseguros também em outros sentidos na Espanha sob domínio dos Habsburgo Filipe II que sucedeu seu pai Carlos V em 1556 recusouse a honrar suas dívidas em 1557 e de novo em 1560 levando assim à ruína as famílias de banqueiros Fugger e Welser O papel dessas famílias alemãs foi então assumido pelas genovesas por sua vez também arruinadas pela inadimplência espanhola durante o reinado dos Habsburgo em 1575 1596 1607 1627 1647 1652 1660 e 1662 Tão crucial quanto a instabilidade dos direitos de propriedade na Espanha absolutista foi o impacto do absolutismo sobre as instituições econômicas ligadas ao comércio e ao desenvolvimento do império colonial espanhol Como vimos no capítulo anterior a prosperidade econômica inglesa baseouse na rápida expansão mercantil Muito embora se comparada a Espanha e Portugal a Inglaterra houvesse chegado tarde ao comércio atlântico o país não obstante conquistou uma participação relativamente ampla nas oportunidades comerciais e coloniais A riqueza que enchia os cofres da Coroa na Espanha na Inglaterra foi para os bolsos da emergente classe mercante sobre a qual se ergueria o incipiente dinamismo econômico inglês e que se tornaria o baluarte da coalizão política antiabsolutista Na Espanha os processos geradores de progresso econômico e mudança institucional não tiveram lugar Depois da descoberta das Américas Isabel e Fernando organizaram o comércio entre suas novas colônias e a metrópole em torno de uma guilda de mercadores de Sevilha os quais com controle de todo o comércio cumpririam a função de assegurar que a Coroa tivesse o seu filão na riqueza das Américas Não havia comércio livre com nenhuma das colônias e a cada ano uma grande frota chegava a Sevilha carregada de metais preciosos e bens valiosos do novo continente A estreita base desse comércio monopolizado impedia que a partir das oportunidades comerciais com as colônias uma ampla classe de mercadores se estruturasse Mesmo o comércio dentro das Américas estava sujeito a pesadas regulamentações Por exemplo um mercador de uma colônia como a Nova Espanha mais ou menos correspondente ao México moderno não podia estabelecer relações comerciais diretas com ninguém em Nova Granada a atual Colômbia Tais restrições ao comércio no seio do Império Espanhol não só reduziam sua prosperidade econômica como também indiretamente os benefícios que a Espanha poderia auferir do comércio com outro império mais próspero Não obstante eram interessantes à medida que garantiam a continuidade do influxo de prata e ouro para a metrópole As instituições econômicas extrativistas espanholas foram resultado direto da construção do absolutismo e do caminho distinto daquele seguido pela Inglaterra pelo qual enveredaram as instituições políticas do país Tanto o reino de Castela quanto o de Aragão possuíam suas próprias Cortes um parlamento que representava os vários grupos ou estamentos do reino Como no caso do Parlamento inglês as Cortes castelhanas precisavam ser convocadas para aprovar novos impostos Entretanto em Castela e Aragão representavam basicamente as principais cidades não as áreas urbanas e rurais como no caso do Parlamento inglês no século XV eram compostas pelos deputados de apenas 18 cidades dois para cada uma Por conseguinte não eram representativas de vasta gama de grupos como sua contraparte britânica e nunca chegaram a constituir uma coalizão de interesses diversos com o intuito comum de impor restrições ao absolutismo Não podiam legislar e mesmo o escopo de seus poderes com relação à carga tributária era limitado Nesse contexto foi fácil para a Coroa espanhola alijálas no processo de consolidação de seu próprio poder Embora a prata chegasse das Américas em volumes cada vez maiores Carlos V e Filipe II exigiam uma carga tributária crescente a fim de financiar uma série de guerras dispendiosas Em 1520 Carlos V apresentou às Cortes uma solicitação de novo aumento dos impostos As elites urbanas aproveitaram o ensejo para reivindicar amplas mudanças nas Cortes e seus poderes A oposição irrompeu violenta e o movimento logo ficou conhecido como Revolta dos Comuneiros Carlos conseguiu esmagála com o auxílio das tropas leais ao trono pelo resto do século XVI porém haveria uma disputa contínua entre a Coroa e as Cortes em que a primeira tentaria arrancar o direito de criar novos tributos e aumentar os já existentes Apesar de suas idas e vindas a batalha acabaria sendo vencida pela monarquia A partir de 1664 as Cortes não voltariam a se reunir só se restabeleceriam durante as invasões napoleônicas quase 150 anos depois Na Inglaterra a derrocada do absolutismo em 1688 levou tanto ao nascimento de instituições políticas pluralistas quanto ao desenvolvimento de um Estado centralizado muito mais eficaz Na Espanha com o triunfo do absolutismo o movimento foi o inverso Mesmo tendo emasculado as Cortes e eliminado qualquer possível restrição ao seu comportamento foi ficando cada vez mais difícil para a Coroa aumentar os impostos mesmo através de negociações diretas com cada cidade Enquanto o Estado inglês criava uma burocracia tributária moderna e eficiente o espanhol mais uma vez caminhava na direção oposta e não só se mostrava incapaz de assegurar os direitos de propriedade dos empreendedores e monopolizar o comércio como pior condescendia com a venda de cargos não raro convertidos em hereditários com a privatização da coleta de impostos e mesmo com a venda de imunidade jurídica As consequências dessas instituições políticas e econômicas extrativistas na Espanha eram previsíveis Durante o século XVII enquanto a Inglaterra avançava rumo à expansão comercial seguida de uma rápida industrialização a Espanha entrava em uma espiral de declínio econômico generalizado No começo do século um em cada cinco habitantes do país morava em áreas urbanas No final desse período essa proporção havia sido reduzida para a metade 1 em cada 10 acompanhando o crescente empobrecimento da população espanhola Aqui a receita despencava enquanto a Inglaterra enriquecia A persistência e o fortalecimento do absolutismo na Espanha ao mesmo tempo em que era extirpado na Inglaterra é mais um exemplo de pequenas diferenças durante as circunstâncias críticas Havia pequenas diferenças em termos de força e natureza das instituições representativas a circunstância crítica foi a descoberta das Américas A interação de ambas levou a Espanha a enveredar por um caminho institucional completamente distinto daquele tomado pela Inglaterra As instituições econômicas relativamente inclusivas então surgidas na Inglaterra fomentaram um dinamismo econômico sem precedentes que culminaria na Revolução Industrial ao passo que a industrialização não teria a menor chance na Espanha Quando a tecnologia industrial começasse a se difundir por muitas partes do mundo a economia espanhola teria chegado a tamanha decadência que sequer haveria necessidade de a Coroa ou as elites rurais espanholas bloquearem a industrialização MEDO DA INDÚSTRIA Sem mudanças nas instituições políticas e na estrutura de poder similares àquelas ocorridas na Inglaterra após 1688 eram remotas as chances de os países absolutistas se beneficiarem das inovações e novas tecnologias da Revolução Industrial Na Espanha por exemplo a inexistência de direitos de propriedade seguros e o declínio econômico generalizado implicaram que a população não dispunha de incentivos para fazer os investimentos e sacrifícios necessários Já na Rússia e no Império AustroHúngaro não foi a mera negligência e má administração por parte das elites nem o insidioso depauperamento sob instituições extrativistas que impediram a industrialização pelo contrário os governantes bloquearam ativamente toda e qualquer tentativa de introduzir tanto as novas tecnologias quanto os investimentos básicos em infraestrutura como ferrovias por exemplo que poderiam ter favorecido a sua propagação Na época da Revolução Industrial nos séculos XVIII e XIX o mapa político europeu era bastante diferente do atual O Sacro Império Romano uma colcha de retalhos de mais de 400 divisões administrativas a maioria das quais acabaria se consolidando na Alemanha unificada ocupava a maior parte da Europa Central A Casa de Habsburgo ainda era uma importante potência política e seu império conhecido como Habsburgo ou AustroHúngaro ocupava uma vasta extensão de terra com cerca de 650 mil quilômetros quadrados mesmo não incluindo mais a Espanha desde que em 1700 os Bourbon haviam assumido o trono do país Em termos demográficos era o terceiro maior Estado europeu compreendendo um sétimo de toda a população do continente No final do século XVIII o território dos Habsburgo incluía a oeste a área que hoje corresponde à Bélgica então denominada Países Baixos Austríacos A maior parte porém consistia no bloco contíguo de terras ao redor da Áustria e Hungria incluindo a República Tcheca e a Eslováquia ao norte e Eslovênia Croácia e ampla parcela da Itália e da Sérvia ao sul A leste incorporava também grande parte do que é hoje a Romênia e a Polônia Os mercadores nos domínios dos Habsburgo tinham menos importância que na Inglaterra e prevaleciam as relações de servidão Como vimos no Capítulo 4 Hungria e Polônia foram os polos da segunda servidão no Leste Europeu Os Habsburgo ao contrário dos Stuart lograram suster um regime intensamente absoluto Francisco I o último imperador do Sacro Império Romano entre 1792 e 1806 e depois soberano do Império AustroHúngaro até sua morte em 1835 foi um rematado absolutista não pretendia reconhecer nenhum limite ao seu poder e acima de tudo desejava preservar o status quo político Sua estratégia básica consistia em oporse à mudança qualquer que fosse ela o que ele deixou bem claro em um discurso de 1821 típico dos governantes Habsburgo proferido perante os professores de uma escola em Laibach no qual asseverou Não preciso de sábios mas de cidadãos bons e honestos Sua missão é educar os jovens para tanto Aquele que se encontra a meu serviço ensinará aquilo que eu lhe ordenar Se alguém não for capaz de fazêlo ou caso se saia com novas ideias pode ir embora ou eu o porei para fora A imperatriz Maria Teresa que reinou entre 1740 e 1780 diante de sugestões sobre como melhorar ou modificar as instituições costumava retorquir Deixe tudo como está Não obstante ela e seu filho José II imperador entre 1780 e 1790 foram responsáveis por uma tentativa de construir um Estado central mais poderoso e um sistema administrativo mais eficaz Entretanto fizeramno no contexto de um sistema político sem restrições efetivas aos seus atos e sem muitos elementos pluralistas Não havia um Parlamento nacional que pudesse exercer mesmo o mais módico dos controles sobre a monarquia apenas um sistema de estamentos e dietas regionais que por tradição detinha alguns poderes com relação à tributação e ao recrutamento militar Os Habsburgo austrohúngaros estavam submetidos a ainda menos controles do que os monarcas espanhóis e o poder político era altamente concentrado Enquanto o absolutismo Habsburgo recrudescia ao longo do século XVIII o poder de todas as instituições não monárquicas se rarefazia ainda mais Quando uma delegação de cidadãos da província austríaca do Tirol foi solicitar uma Constituição a Francisco este replicou Quereis uma Constituição então Vede a mim pouco se me dá Eu vos darei uma Constituição mas sabei que os soldados obedecem a mim e não pedirei duas vezes caso tenha alguma necessidade financeira Em todo caso aconselhovos a tomar cuidado quanto ao que ireis dizer Diante disso os líderes tiroleses decidiram Se é assim que pensais melhor então que não haja Constituição ao que Francisco retrucou Assim também penso eu Francisco dissolveu o Conselho Estatal que Maria Teresa usara como fórum de consulta com seus ministros Dali por diante não haveria nenhuma consulta nem discussão pública acerca das decisões da Coroa Francisco criou um Estado policial censurando implacavelmente tudo o que lhe parecesse o mais levemente radical Sua filosofia de governo era descrita pelo Conde Hartig um auxiliar de longa data como a imorredoura manutenção da autoridade do soberano e a impugnação de toda e qualquer demanda por parte da população no sentido de participar de tal autoridade Para assistilo em seu projeto Francisco contava com o Príncipe Von Metternich nomeado seu ministro de Relações Exteriores em 1809 O poder e a influência de Metternich aliás sobreviveriam aos do imperador e ele permaneceria no cargo por quase 40 anos As instituições econômicas dos Habsburgo giravam em torno da ordem feudal e da servidão No âmbito do império quanto mais para leste se fosse mais o feudalismo se intensificava refletindo aquele gradiente genérico das instituições econômicas visto no Capítulo 4 no deslocamento do oeste para o leste do continente A mobilidade da mão de obra era altamente circunscrita e a emigração era ilegal Quando o filantropo inglês Robert Owen tentou convencer o governo austríaco a implementar certas reformas sociais a fim de melhorar as condições da população mais pobre um dos assistentes de Metternich Friedrich von Gentz replicou Não desejamos absolutamente que as grandes massas se vejam em situação de maior conforto e independência Do contrário como poderíamos governálas Além da servidão que bloqueava por completo a emergência de um mercado de trabalho e despojava de todo e qualquer incentivo econômico ou iniciativa a massa da população rural floresciam sob o absolutismo dos Habsburgo os monopólios e restrições similares ao comércio A economia urbana era dominada por guildas que limitavam o acesso aos respectivos ofícios Até 1775 perduraram tarifas alfandegárias internas na própria Áustria e na Hungria até 1784 A tarifação que incidia sobre os bens importados era altíssima e havia um semnúmero de proibições explícitas quanto à importação e à exportação de produtos A supressão dos mercados e a criação de instituições econômicas extrativistas são é claro bastante características do absolutismo mas Francisco foi além Não que as instituições econômicas extrativistas destituíssem os indivíduos de incentivos para inovar ou adotar novas tecnologias Vimos no Capítulo 2 como no Reino do Congo as tentativas de promover o uso do arado foram malsucedidas porque faltava às pessoas incentivos para tanto dada a natureza extrativista das instituições econômicas O rei do Congo sabia que se pudesse convencer seus súditos a adotarem os arados a produtividade agrícola seria maior gerando mais riqueza de que ele poderia se beneficiar um potencial estímulo para todos os governos mesmo os absolutistas O problema no Congo era que as pessoas estavam cientes de que tudo o que produzissem poderia vir a ser confiscado pelo monarca absolutista e portanto não tinham incentivos para investir ou adotar tecnologias melhores Nas terras dos Habsburgo Francisco não encorajava seus cidadãos a utilizar tecnologias melhores pelo contrário fezlhes frente abertamente e bloqueou a disseminação de tecnologias que a população estaria disposta a adotar mesmo nas instituições econômicas vigentes A oposição à inovação manifestavase de duas maneiras Primeiro Francisco I impediu o desenvolvimento da indústria A indústria levaria a fábricas e as fábricas concentrariam trabalhadores pobres nas cidades sobretudo na capital Viena Esses trabalhadores se aliariam então aos adversários do absolutismo Todas as suas políticas pretendiam congelar as elites tradicionais em seu lugar e manter intocado o status quo político e econômico Sua intenção era manter a sociedade basicamente agrária e a melhor maneira de atingir seu objetivo acreditava ele era antes de qualquer coisa impedir a construção das fábricas Suas intervenções nesse sentido não podiam ser mais diretas em 1802 por exemplo a criação de novas fábricas em Viena foi proibida Em lugar de estimular a importação e a instalação de novos equipamentos base da industrialização Francisco as proibiu até 1811 Segundo o imperador opôsse à construção de ferrovias uma das principais novas tecnologias que acompanharam a Revolução Industrial Quando apresentado ao projeto de construção de uma ferrovia no norte Francisco I retorquiu Nada disso Nada terei que ver com isso a menos que queira ver a revolução adentrar este país Já que o governo não daria uma concessão para uma ferrovia a vapor a primeira estrada de ferro construída no império teve de usar carros puxados a cavalo A linha que ligava as cidades de Linz no Danúbio à cidade boêmia de Budweis no Rio Moldau foi construída com inclinações e interseções o que posteriormente inviabilizaria sua conversão para trens a vapor Assim ela continuaria com tração animal até a década de 1860 O potencial econômico para o desenvolvimento de ferrovias no império já fora pressentido pelo banqueiro Salomon Rothschild representante em Viena da grande família de banqueiros O irmão de Salomon Nathan que estava instalado na Inglaterra ficou muito impressionado com a locomotiva The Rocket de George Stephenson e o potencial do transporte a vapor Entrou em contato com o irmão estimulandoo a buscar oportunidades para a implementação de estradas de ferro na Áustria pois acreditava que a família obteria grande lucro se financiasse a construção de ferrovias Salomon concordou mas o plano malogrou o Imperador Francisco disse não A oposição à indústria e às ferrovias deviase aos receios de Francisco com relação à destruição criativa que acompanharia o desenvolvimento de uma economia moderna Suas maiores prioridades eram assegurar a estabilidade das instituições extrativistas que administrava e resguardar as vantagens das elites tradicionais que o apoiavam A industrialização não só lhe traria poucos benefícios à medida que abalaria a ordem feudal por atrair a mão de obra do campo para as cidades Francisco reconhecia também a ameaça que grandes mudanças econômicas representariam ao seu poder político Por conseguinte optou por bloquear a indústria e o progresso econômico aferrandose ao retrocesso que se manifestava das mais diversas maneiras Por exemplo ainda em 1883 quando 90 do ferro produzido no mundo era produzido à base de hulha mais da metade da produção dos territórios dos Habsburgo continuava empregando o carvão vegetal muito menos eficiente Analogamente até a Primeira Guerra Mundial quando o império entrou em colapso a tecelagem não era mecanizada mas ainda manual O Império AustroHúngaro não era o único a temer a indústria Mais a leste a Rússia organizavase em torno de um conjunto igualmente absolutista de instituições políticas forjadas por Pedro o Grande conforme já discutido neste capítulo Como a ÁustriaHungria as instituições econômicas russas eram altamente extrativistas baseadas na servidão mantinham pelo menos metade da população presa à terra Os servos tinham de trabalhar de graça três dias por semana nas terras de seus senhores Não gozavam de liberdade de movimentação nem para escolher sua ocupação e podiam ser vendidos por um senhor a outro ao seu belprazer O filósofo radical Piotr Kropotkin um dos fundadores do moderno anarquismo deixou um vívido retrato do funcionamento da servidão no reinado do Czar Nicolau I que governou a Rússia de 1825 a 1855 Ele recordava da sua infância histórias de homens e mulheres arrancados do seio de suas famílias e aldeias e vendidos perdidos no jogo ou trocados por um par de cães de caça e levados para alguma plaga remota da Rússia de crianças tiradas de seus pais e vendidas para senhores cruéis ou dissolutos de chicotadas no gado que ocorriam todos os dias com crueldade indizível de uma menina cuja única salvação possível foi afogarse de um homem que envelhecera a serviço de seu patrão e acabou se enforcando sob a janela de seu senhor e de revoltas de servos suprimidas pelos generais de Nicolau I açoitando até a morte 1 em cada 10 ou 5 homens escolhidos ao acaso e arrasando a aldeia Quanto à pobreza que presenciei em nossas viagens por certas aldeias especialmente aquelas pertencentes à família imperial não há palavras para descrever tamanha miséria para leitores que não a viram Exatamente como no Império AustroHúngaro o absolutismo russo não se limitou a criar um conjunto de instituições econômicas que impediam a prosperidade da sociedade Havia temor similar em relação à destruição criativa um medo da indústria e das ferrovias No cerne dessa atitude durante o reinado de Nicolau I estava o Conde Egor Kankrin ministro das Finanças entre 1823 e 1844 e protagonista da oposição às mudanças sociais necessárias à promoção da prosperidade econômica As políticas de Kankrin visavam ao reforço dos tradicionais pilares políticos do regime sobretudo a aristocracia rural e o perfil campesino e agrário da sociedade Ao assumir o ministério Kankrin imediatamente contestou e reverteu uma proposta de seu antecessor Gurev de instituir um banco comercial do governo para fazer empréstimos à indústria Pelo contrário Kankrin reabriu o Banco de Empréstimos do Estado que fechara as portas durante as guerras napoleônicas e fora criado originalmente para emprestar dinheiro aos grandes proprietários de terras a juros subsidiados política que ele via com bons olhos Como os empréstimos exigiam que os tomadores dessem servos como garantia apenas os senhores feudais tinham condições de contraílos Para financiálo Kankrin transferiu ativos do Banco Comercial matando dois coelhos com uma cajadada só assim não sobraria muito dinheiro para a indústria As iniciativas de Kankrin foram conscientemente moldadas pelo receio de que mudanças econômicas provocassem mudanças políticas e assim temia o Czar Nicolau A entronização de Nicolau em dezembro de 1825 quase fora abortada por uma tentativa de golpe de oficiais militares os chamados dezembristas adeptos de um programa radical de mudança social Nicolau escreveu ao Grãoduque Mikhail A revolução está às portas da Rússia mas juro que não a deixarei penetrar este país enquanto houver um sopro de vida em meu corpo Nicolau temia as mudanças sociais acarretadas pela promoção de uma economia moderna Como ele mesmo disse em um discurso feito em um encontro de manufaturadores em uma exposição industrial em Moscou Tanto o Estado quanto os manufaturadores devem permanecer atentos a uma questão do contrário as próprias fábricas se tornarão um mal em vez de um bem tratase do cuidado para com os trabalhadores cujo número aumenta a cada ano Eles requerem a enérgica e paternal supervisão de sua moral sem o que essa massa humana será gradualmente corrompida e acabará se tornando uma classe tão miserável quanto perigosa para seus patrões Assim como Francisco I Nicolau receava que a destruição criativa desencadeada por uma moderna economia industrial debilitasse o status quo político russo Instado por Nicolau Kankrin tomou providências específicas no sentido de reduzir o potencial da indústria Assim baniu várias exposições industriais até então realizadas periodicamente a fim de divulgar as novas tecnologias e facilitar sua adoção Em 1848 a Europa foi convulsionada por uma série de tumultos revolucionários Em resposta A A Zakrevskii governador militar de Moscou encarregado da manutenção da ordem pública escreveu a Nicolau Para o bem da preservação da calma e da prosperidade das quais no presente momento apenas a Rússia desfruta o governo não pode permitir a aglomeração de indivíduos desabrigados e dissolutos que facilmente se juntarão a qualquer movimento pondo a perder a paz social ou privada Sua recomendação foi apresentada aos ministros de Nicolau e em 1849 foi promulgada uma nova lei estabelecendo severos limites ao número de fábricas que poderiam ser abertas em qualquer área de Moscou e proibindo especificamente a abertura de qualquer nova fiação de algodão ou lã e fundições de ferro Em outros setores como o de tecelagem e o de tingimento seria preciso solicitar autorização ao governador militar para abrir novas unidades fabris Pouco adiante a fiação de algodão seria explicitamente banida por uma lei que pretendia evitar toda e qualquer concentração de trabalhadores potencialmente rebeldes na cidade A oposição às ferrovias acompanhou a oposição à indústria exatamente como no Império AustroHúngaro Até 1842 havia uma única ferrovia na Rússia a Tsarskoe Selo que percorria os 27 quilômetros que separavam São Petersburgo das residências imperiais de Tsarskoe Selo e Pavlovsk Do mesmo modo como combatia a indústria Kankrin não via razão para fomentar o desenvolvimento das ferrovias que a seu ver promoveriam uma perigosa mobilidade tendo chegado a observar que as estradas de ferro nem sempre resultam de uma necessidade natural constituem mais um objeto de luxo ou necessidade artificial Incentivam deslocamentos desnecessários de um lugar para outro característica típica de nosso tempo Kankrin recusou um semnúmero de propostas de construção de ferrovias e só em 1851 uma linha foi instalada entre Moscou e São Petersburgo Sua política ganharia continuidade nas mãos do Conde Kleinmichel encarregado da principal administração de Transporte e Obras Públicas órgão que seria o principal árbitro da construção de ferrovias usado por Kleinmichel como plataforma para desencorajar sua multiplicação A partir de 1849 ele chegou a usar seu poder para censurar o debate nos jornais acerca do desenvolvimento ferroviário no país O Mapa 13 mostra as consequências dessa lógica Enquanto a GrãBretanha e a maior parte do noroeste da Europa eram em 1870 interligados por ferrovias muito poucas eram as que penetravam no vasto território russo A política contrária às estradas de ferro só seria revertida com a derrota definitiva da Rússia pelas forças inglesas francesas e otomanas na Guerra da Crimeia 18531856 quando finalmente se compreendeu o grave risco para a segurança nacional que o atraso de sua rede de transportes representava Havia também pouco desenvolvimento ferroviário no Império AustroHúngaro exceto pela Áustria e pela região ocidental do império ainda que as revoluções de 1848 tenham provocado mudanças nesses territórios em especial a abolição da servidão Mapa 13 Estradas de ferro na Europa em 1870 PROIBIDO NAVEGAR O absolutismo imperava não só em grande parte da Europa mas também na Ásia onde de maneira análoga impediu a industrialização durante a circunstância crítica criada pela Revolução Industrial As dinastias chinesas Ming e Qing e o absolutismo do Império Otomano ilustram bem esse padrão Sob a dinastia Song entre 960 e 1279 a China esteve na vanguarda mundial de diversas inovações tecnológicas Os chineses inventaram relógios a bússola a pólvora o papel e o papelmoeda a porcelana e as fornalhas para fundição de ferro antes dos europeus Desenvolveram de forma independente as rodas de fiar e a energia hidráulica mais ou mesmo ao mesmo tempo em que elas surgiam no extremo oposto da Eurásia Em função disso em 1500 o padrão de vida era provavelmente tão alto na China quanto na Europa Por séculos vigorou aí também um Estado centralizado com serviço público recrutado com base no mérito Não obstante o regime em vigor na China era absolutista e o crescimento sob a dinastia Song deuse sob instituições extrativistas Não havia representação política de grupos sociais fora da monarquia nenhuma estrutura análoga ao Parlamento ou às Cortes Os mercadores gozaram sempre de um status precário no país e as grandes invenções do período foram motivadas não por incentivos de mercado mas geradas por patrocínio ou mesmo ordens do governo Poucas chegaram a ser comercializadas O controle por parte do Estado recrudesceu durante as dinastias Ming e Qing que sucederam os Song No âmago de tudo isso estava a lógica usual das instituições extrativistas Como a maioria dos governantes à frente de instituições extrativistas os imperadores absolutistas da China opunhamse à mudança buscavam a estabilidade e em essência temiam a destruição criativa Esse ponto é mais bem ilustrado pela história do comércio internacional Como vimos a descoberta das Américas e o modo como se organizou o comércio internacional desempenharam um papel crucial nos conflitos políticos e mudanças institucionais dos primórdios da Europa moderna Na China enquanto mercadores privados eram em geral os responsáveis pelo comércio dentro das fronteiras do país o Estado monopolizava o comércio ultramarino Quando a dinastia Ming ascendeu ao poder em 1368 o Imperador Hongwu foi o primeiro a ocupar o trono por 30 anos Temendo que o comércio ultramarino levasse à desestabilização política e social autorizou sua condução exclusivamente pelo governo e somente à medida que envolvesse o pagamento de tributos não atividades comerciais Hongwu ordenou a execução de centenas de pessoas acusadas de tentar converter missões tributárias em empreitadas comerciais Entre 1377 e 1397 as missões tributárias marítimas foram banidas Pessoas físicas foram proibidas de comerciar com estrangeiros e os chineses não tinham permissão para fazerse à vela Em 1402 o imperador Yongle subiu ao trono e deu início a um dos mais célebres períodos da história chinesa retomando o comércio exterior em grande escala sob os auspícios do governo Yongle patrocinou o Almirante Zheng He em seis missões gigantescas ao Sudeste e Sul da Ásia Arábia e África Eram lugares conhecidos dos chineses por sua longa história de relações comerciais mas nada jamais se dera naquela escala antes A primeira frota compreendia 27800 homens e 62 grandes navios de tesouro acompanhados de 190 embarcações menores entre elas algumas específicas para o transporte de água potável outras para suprimentos e outras ainda para as tropas Contudo após a sexta missão em 1422 o Imperador Yongle ordenou uma interrupção temporária declarada permanente por seu sucessor Hongxi que governou de 1424 a 1425 A morte prematura de Hongxi levou ao trono o Imperador Xuande que a princípio autorizou uma última missão de Zheng He em 1433 Depois disso porém todo o comércio ultramarino voltou a ser banido Em 1436 a construção de embarcações marítimas chegou a ser declarada ilegal O veto ao comércio ultramarino só seria anulado em 1567 Essa sequência de acontecimentos embora não passasse da ponta do iceberg extrativista que impunha um bloqueio a tantas atividades econômicas tidas como potencialmente desestabilizadoras exerceria um impacto fundamental sobre o desenvolvimento econômico chinês Na mesma época em que o comércio internacional e a descoberta das Américas promoviam uma transformação radical nas instituições inglesas a China isolavase dessa circunstância crítica e fechavase em torno do próprio umbigo Esse fechamento não se encerrou em 1567 A dinastia Ming foi sobrepujada em 1644 pelo povo jurchen os manchus do interior da Ásia que fundaram a dinastia Qing Seguiuse um período de intensa instabilidade política Os Qing dedicaramse à expropriação em massa de bens e propriedades Na década de 1690 Tang Chen mercador falido e erudito chinês aposentado escreveu Mais de 50 anos se passaram desde a fundação da dinastia Ching Qing e o império empobrece a cada dia Os fazendeiros estão indigentes os artesãos estão indigentes os mercadores estão indigentes e também as autoridades estão indigentes Os grãos estão baratos mas é difícil conseguir se alimentar Os tecidos estão baratos mas é difícil conseguir se vestir Navios repletos de produtos vão de um mercado a outro mas sua carga é vendida com prejuízo As autoridades após deixarem seus cargos descobremse sem nenhum meio para sustentar sua família Com efeito as quatro principais ocupações estão igualmente empobrecidas Em 1661 o Imperador Kangxi ordenou que toda a população que vivia ao longo da costa do Vietnã até Chekiang basicamente todo o litoral sul outrora a região mais ativa do país em termos comerciais se deslocasse 110 quilômetros para o interior O litoral passou a ser patrulhado por soldados a fim de assegurar o cumprimento da ordem e até 1693 a navegação ao longo de toda a costa permaneceu banida No século XVIII o veto de vez em quando voltaria a entrar em vigor o que efetivamente tolheu o desenvolvimento do comércio ultramarino chinês Até havia alguma atividade mas não eram muitos os que se dispunham a investir sabendo que o imperador poderia mudar subitamente de ideia e voltar a proibir o comércio pondo a perder todo o investimento em embarcações equipamentos e relações comerciais A justificativa dos Estados Ming e Qing para oporse ao comércio internacional já nos é familiar o medo da destruição criativa O objetivo principal de suas lideranças era a estabilidade política O comércio internacional era potencialmente desestabilizador à medida que enriquecia e encorajava a classe mercante como aconteceu na Inglaterra na época da expansão atlântica Essa não era apenas uma crença dos governantes das dinastias Ming e Qing mas também a atitude dos governantes da dinastia Song ainda que estes tivessem se mostrado dispostos a patrocinar inovações tecnológicas e admitir maior liberdade comercial desde que ela permanecesse sob o seu controle A situação se agravou durante as dinastias Ming e Qing à medida que o controle imposto pelo Estado à atividade econômica se estreitou e o comércio ultramarino foi banido Sem dúvida havia mercados e comércio na China durante esse tempo e a carga tributária que incidia sobre a economia doméstica não pesava muito Entretanto o governo pouco apoio deu à inovação trocando o fomento à prosperidade mercantil ou industrial por sua estabilidade política A consequência de tamanho controle absolutista da economia era previsível a economia chinesa permaneceu estagnada durante todo o século XIX e princípio do XX enquanto as demais se industrializavam Quando Mao instaurou seu regime comunista em 1949 a China se tornou um dos países mais pobres do mundo O ABSOLUTISMO DE PRESTE JOÃO O absolutismo como conjunto de instituições políticas e as consequências econômicas dele decorrentes não se restringiram à Europa e à Ásia Fezse presente também na África por exemplo no Reino do Congo como vimos no Capítulo 2 Outro exemplo ainda mais duradouro de absolutismo africano foi o caso da Etiópia ou Abissínia cujas origens discutimos no Capítulo 6 quando tratamos da emergência do feudalismo após o declínio de Axum O absolutismo abissínio teve vida ainda mais longa que suas contrapartes europeias pois encontrou desafios e circunstâncias críticas muito diferentes Após a conversão do monarca axumita Ezana ao cristianismo os etíopes permaneceram cristãos e no século XIV chegaram a ser o tema da lenda do Rei Preste João Preste João foi um monarca cristão que acabara isolado da Europa pela ascensão do Islã no Oriente Médio A princípio pensouse que seu reino localizavase na Índia Contudo com o acúmulo de conhecimento dos europeus sobre a Índia chegouse à conclusão de que não podia ser isso O rei da Etiópia sendo cristão tornouse pois o alvo natural do mito De fato os reis etíopes persistiram muito na tentativa de forjar alianças com os monarcas europeus contra as invasões árabes tendo enviado missões diplomáticas à Europa pelo menos de 1300 em diante e chegado mesmo a persuadir o rei português a enviar tropas Esses soldados junto com diplomatas jesuítas e viajantes que queriam conhecer Preste João deixaram diversos relatos sobre a Etiópia Alguns dos mais interessantes do ponto de vista econômico são os de Francisco Álvares capelão que acompanhou uma missão diplomática portuguesa que esteve na Etiópia entre 1520 e 1527 Ademais há relatos do jesuíta Manoel de Almeida que lá viveu a partir de 1624 e de John Bruce viajante que visitou o país entre 1768 e 1773 Os escritos desses homens traçam um belo retrato das instituições políticas e econômicas da época na Etiópia e não deixam nenhuma dúvida a Etiópia era um rematado exemplo de absolutismo Não havia instituições pluralistas de nenhum tipo nem qualquer restrição ou limite ao poder do imperador que justificava seu direito ao trono mediante sua suposta descendência do Rei Salomão e da Rainha de Sabá A consequência do absolutismo foi uma imensa insegurança quanto aos direitos de propriedade fruto da estratégia política do imperador Bruce por exemplo nota Todas as terras pertencem ao rei ele as distribui pelos que bem entende conforme melhor lhe apraz e as retira quando é a sua vontade Ao morrer todas as terras do reino são postas à disposição da Coroa e não só isso mas com a morte do dono atual suas propriedades tão longamente desfrutadas retornam às mãos do rei em vez de serem legadas ao filho mais velho Álvares acreditava que haveria bem mais frutas e produtos agrícolas se os grandes não maltratassem tanto o povo O relato de Almeida sobre o funcionamento da sociedade é muito consistente Ele observa É tão usual que o imperador troque modifique e retire as terras de cada homem a cada dois ou três anos às vezes a cada ano ou mesmo várias vezes ao longo de um ano que não causa nenhum espanto Com frequência um homem lavra o solo outro o semeia e um terceiro colhe Então não há ninguém para cuidar da terra não há ninguém que plante uma árvore pois todos sabem que aquele que a planta raramente é o que colhe o fruto Para o rei entretanto parece útil mantêlos tão dependentes de si Essas descrições sugerem uma profunda similaridade entre as estruturas políticas e econômicas da Etiópia e as do absolutismo europeu embora também deixem claro que o absolutismo etíope era mais intenso e suas instituições econômicas ainda mais extrativistas Ademais como salientamos no Capítulo 6 a Etiópia não estava sujeita às mesmas circunstâncias críticas que ajudaram a solapar o regime absolutista na Inglaterra permaneceu imune a muitos dos processos que moldaram o mundo moderno Mas ainda que assim não fosse a intensidade do seu absolutismo provavelmente o teria levado a fortalecerse ainda mais Por exemplo como na Espanha o comércio internacional etíope inclusive o lucrativo tráfico de escravos era controlado pelo monarca A Etiópia não estava completamente isolada os europeus haviam procurado pelo Preste João e ela precisou envolverse em guerras contra os Estados islâmicos circundantes Não obstante o historiador Edward Gibbon com boa dose de acurácia notou que cercados por todos os lados pelos inimigos de sua religião os etíopes dormiram por quase mil anos esquecidos do mundo por quem haviam sido esquecidos Quando a colonização europeia da África teve início no século XIX a Etiópia era um reino independente sob Ras Duque Kassa coroado Imperador Tewodros II em 1855 Tewodros dedicouse à modernização do Estado criando uma burocracia e um sistema judiciário mais centralizados e Forças Armadas capazes de controlar o país e eventualmente fazer frente aos europeus Designou governadores militares para todas as províncias responsáveis pela coleta de impostos e seu envio para a Coroa Suas negociações com as potências europeias eram difíceis e exasperado ele aprisionou o cônsul inglês Em 1868 os ingleses enviaram uma força expedicionária que saqueou sua capital Tewodros cometeu suicídio De todo modo o governo reconstruído por Tewodros conseguiu obter um dos maiores triunfos anticoloniais do século XIX contra os italianos Em 1889 o trono foi entregue a Menelik II que imediatamente se defrontou com o interesse da Itália em estabelecer uma colônia em seu país Em 1885 o chanceler germânico Bismarck havia convocado uma conferência em Berlim em que as potências europeias procederam à partilha da África isto é decidiram como dividir o continente em diferentes esferas de influência Nessa ocasião a Itália obteve direito a colônias na Eritreia ao longo da costa da Etiópia e da Somália A Etiópia embora não contasse com representantes na conferência de algum modo conseguiu escapar ilesa Os italianos contudo ainda acalentavam planos para a região e em 1896 marcharam com um exército vindo da Eritreia ao sul A resposta de Menelik foi similar à de um monarca medieval europeu formou seu exército com os homens armados convocados por cada nobre Sua estratégia não lhe permitiria manter suas tropas em campo por muito tempo mas permitiulhe montar uma força imensa por pouco tempo Esse breve intervalo foi o suficiente para derrotar os italianos cujos 15 mil homens foram esmagados pelos 100 mil de Menelik na Batalha de Adowa em 1896 Foi a mais grave derrocada militar que um país pré colonial africano conseguiu infligir a uma potência europeia e assegurou a independência etíope por mais 40 anos O último imperador da Etiópia Ras Tafari foi coroado Hailê Selassiê em 1930 reinou até ser deposto por uma segunda invasão italiana iniciada em 1935 mas retornou do exílio com ajuda inglesa em 1941 Governou então até ser derrubado em 1974 por um golpe do Derg o Conselho um grupo de oficiais militares marxistas que continuaram a empobrecer e devastar o país As instituições econômicas extrativistas básicas do império absolutista etíope como o gult página 140 e o feudalismo surgido após o declínio de Axum perduraram até sua abolição pela revolução de 1974 Hoje a Etiópia é um dos países mais pobres do mundo A renda de um etíope médio equivale a cerca de 140 de um cidadão médio na Inglaterra A maior parte da população vive em áreas rurais e pratica agricultura de subsistência Faltam água potável eletricidade e acesso a escolas ou cuidados médicos adequados A expectativa de vida gira em torno de 55 anos e apenas um terço dos adultos é alfabetizado Uma comparação entre a Inglaterra e a Etiópia dá a dimensão dos níveis a que chega a desigualdade no mundo A razão de a Etiópia estar onde está hoje é que ao contrário da Inglaterra nela o absolutismo persistiu até o passado recente e com ele vieram instituições econômicas extrativistas e pobreza para a massa dos etíopes embora claro imperadores e nobreza tenham se beneficiado imensamente Entretanto a mais duradoura implicação do absolutismo foi a incapacidade da sociedade etíope de tirar proveito das oportunidades de industrialização ao longo do século XIX e princípio do XX o que levou à pobreza abjeta em que hoje vivem seus cidadãos OS FILHOS DE SAMAALE As instituições políticas absolutistas impediram a industrialização nos mais diversos lugares quer de forma indireta no modo como ajudaram a organizar a economia ou direta como vimos nos casos do Império AustroHúngaro e Rússia Contudo o absolutismo não é o único obstáculo à emergência de instituições econômicas inclusivas No princípio do século XIX em várias regiões do mundo sobretudo na África inexistia um Estado capaz de assegurar mesmo o mínimo grau de lei e ordem prérequisitos de uma economia moderna Não houve um equivalente de Pedro o Grande que deflagrou na Rússia o processo de centralização política para em seguida forjar o regime absolutista e muito menos dos Tudor que na Inglaterra centralizaram o Estado sem destruir inteiramente ou para colocar em palavras mais adequadas sem ser inteiramente capazes de destruir o Parlamento e outras restrições ao seu poder Sem algum grau de centralização política mesmo que as elites desses Estados africanos pretendessem saudar a industrialização de braços abertos não haveria muito o que fazer A Somália localizada no Chifre da África ilustra bem os efeitos devastadores da falta de centralização política Tradicionalmente o país é dominado por povos organizados em seis clãs familiares dos quais os quatro maiores Dir Darod Isaq e Hawiye atribuem suas origens a um ancestral mítico comum Samaale Vindos do norte do país espalharamse paulatinamente pelo sul e pelo leste e são ainda hoje basicamente povos pastoris que migram com seus rebanhos de cabras carneiros e camelos Os outros dois clãs Digil e Rahanweyn povos agrícolas sedentários moram no sul Os territórios dos seis estão representados no Mapa 12 Os somalis identificamse em primeiro lugar com o respectivo clã familiar ainda que esses clãs sejam muito amplos e compreendam uma variedade de subgrupos Os mais importantes são aqueles que descendem de um dos clãs maiores dentro destes os mais significativos são os grupos de parentes próximos que pagam e coletam a diya ou dote de sangue isto é compensações pelo assassinato de um de seus membros Os clãs somalis e grupos de diya viramse ao longo da história aprisionados em disputas quase contínuas pelos escassos recursos à sua disposição sobretudo as fontes de água e boas terras de pasto para seus animais além de assaltarem constantemente os rebanhos dos clãs e grupos vizinhos Embora os clãs tivessem líderes chamados de sultões e conselhos de anciãos estes nunca detiveram nenhum poder efetivo O poder político era bastante disperso cada somali adulto tinha voz nas decisões que pudessem afetar o clã ou o grupo como um todo graças a um conselho informal composto de todos os homens adultos Não havia lei escrita polícia nem sistema jurídico exceto pela charia usada como referência à qual leis informais eram incorporadas Essas leis informais de cada grupo de diya eram codificadas no chamado heer um corpo de obrigações deveres e direitos de formulação explícita cujo cumprimento era exigido pelo grupo daqueles que com ele interagissem Com o advento do período colonial esses heers começaram a ser escritos Por exemplo a linhagem Hassan Ugaas um grupo de diya de cerca de 1500 homens era um subclã da família Dir na Somalilândia inglesa Em 8 de março de 1950 seu heer foi registrado pelo comissário britânico do distrito sendo suas três primeiras cláusulas as seguintes 1 Quando um homem dos Hassan Ugaas for morto por um grupo externo 20 camelos de seu dote de sangue 100 serão levados por seus familiares e os 80 restantes serão partilhados entre todos os Hassan Ugaas 2 Se um homem dos Hassan Ugaas for ferido por um forasteiro e seus ferimentos forem avaliados em 33 camelos e um terço 10 camelos vão ser dados a ele ao passo que os demais ficarão com seu grupo de jiffo uma subdivisão do grupo de diya 3 Homicídios entre os membros dos Hassan Ugaas estão sujeitos a compensação à razão de 33 camelos e um terço pagos tão somente aos familiares do morto Caso o culpado seja incapaz de arcar com toda ou parte da dívida será auxiliado por sua estirpe A ênfase do heer em assassinatos e ferimentos reflete o estado de guerra quase constante entre os clãs e grupos de diya que giravam em torno do dote de sangue e da vendeta Um crime contra determinado indivíduo era um crime contra o grupo de diya inteiro e requeria uma compensação coletiva o dote de sangue Se este não fosse pago o grupo de diya do autor do crime enfrentaria a represália coletiva da vítima Quando os modernos meios de transporte chegaram à Somália o dote de sangue foi estendido a mortos ou feridos em acidentes automobilísticos O heer dos Hassan Ugaas não se referia apenas a assassinatos a cláusula 6 estabelecia Se um homem dos Hassan Ugaas insultar outro em uma reunião do Conselho dos Hassan Ugaas deverá pagar 150 xelins à parte ofendida No começo de 1955 os rebanhos de dois clãs os Habar Tol Jalo e os Habar Yuunis pastavam em áreas próximas na região de Domberelly Um homem dos Yuunis foi ferido após uma desavença com um membro dos Tol Jalo acerca dos animais O clã atingido retaliou de imediato atacando os rivais e matando um homem Sua morte segundo o código do dote de sangue obrigava os Yuunis a oferecer uma compensação aos Tol Jalo que a aceitaram O dote de sangue deveria ser pago em pessoa em geral sob a forma de camelos Na cerimônia de entrega um dos Tol Jalo matou um Yuuni confundindoo com um integrante do grupo de diya do assassino o que desencadeou uma guerra aberta e nas 48 horas seguintes foram mortos 13 Yuunis e 26 Tol Jalo O conflito prosseguiria por um ano inteiro até que os anciãos dos dois clãs reunidos pela administração colonial inglesa conseguiram negociar um acordo uma troca de dotes de sangue capaz de satisfazer os dois lados que seria pago no decorrer dos três anos seguintes O pagamento do dote de sangue se dava à sombra da ameaça de uso da força e da retomada da vendeta e mesmo quando era pago não constituía necessariamente um ponto final para o conflito Em geral as disputas desvaneciam e voltavam a se acender O poder político encontravase amplamente distribuído pela sociedade somali portanto de forma quase pluralista Contudo sem a autoridade de um Estado centralizado para impor a ordem que dirá os direitos de propriedade não se produziam instituições inclusivas Ninguém respeitava a autoridade alheia e ninguém nem o Estado colonial britânico que se instalou mostrouse capaz de impor a ordem A falta de centralização política tornou impossível que a Somália se beneficiasse da Revolução Industrial Em tal ambiente seria inimaginável adotar ou investir nas novas tecnologias trazidas da GrãBretanha ou mesmo instaurar os tipos de organização necessários para tanto A complexa política somali teve implicações ainda mais sutis para o progresso econômico Já mencionamos alguns dos grandes enigmas tecnológicos da história africana Até a expansão dos regimes coloniais no final do século XIX as sociedades africanas não faziam uso da roda para o transporte nem do arado na agricultura e poucas como a Etiópia conheciam a escrita Os somalis também possuíam uma escrita mas ao contrário dos etíopes não a utilizavam Já discutimos casos similares na história africana e por mais que as sociedades do continente não empregassem rodas nem arados sem dúvida os conheciam No caso do Reino do Congo como vimos essa situação deviase basicamente ao fato de que as instituições econômicas não criavam incentivos para que as pessoas adotassem tais tecnologias Poderia ocorrer o mesmo com relação ao uso da escrita O Reino de Taqali localizado a noroeste da Somália nas Montanhas Nuba sul do Sudão pode nos ajudar a elucidar a questão O Reino de Taqali foi criado no final do século XVIII por um bando de guerreiros liderados por um certo Ismail permanecendo independente até ser amalgamado em 1884 ao Império Britânico Seu povo tinha acesso à escrita em árabe mas não a utilizava com exceção dos reis para fins de comunicação externa com outros Estados e correspondência diplomática A princípio a situação parece muito intrigante Segundo o relato tradicional da origem da escrita na Mesopotâmia ela foi desenvolvida pelos Estados a fim de fazer o registro das informações controlar a população e coletar impostos O Estado Taqali não tinha interesse em nada disso Essas indagações foram investigadas pela historiadora Janet Ewald em fins dos anos 1970 em sua tentativa de reconstituição da história do Estado Taqali Em parte a justificativa é que os cidadãos teriam resistido ao uso da escrita por receio de que ela fosse utilizada para controlar recursos como a valiosa terra à medida que possibilitaria ao Estado reivindicar sua propriedade Temeriam também que a adoção da escrita possibilitasse uma tributação mais sistemática A dinastia fundada por Ismail não se consolidou em um Estado poderoso Mesmo que quisesse este não era forte o bastante para impor sua vontade às objeções dos cidadãos Por outro lado havia outros fatores mais sutis em ação Diversos grupos de elite opunhamse também à centralização política preferindo por exemplo a interação oral à escrita com a população por lhes proporcionar o máximo de flexibilidade Leis ou ordens escritas não poderiam ser retiradas ou desmentidas e seriam mais difíceis de modificar estabeleceriam referências que as elites dominantes talvez preferissem reverter Assim nem os governados nem os governantes de Taqali viam com bons olhos a introdução da escrita Os primeiros temiam o possível uso que os governantes dela fariam ao passo que estes mesmos em seu precário controle do poder consideravam útil a ausência de escrita Foi a política entre os Taqali que impediu a introdução da escrita Embora a elite somali fosse ainda menos definida que a do Reino Taqali é bastante plausível que as mesmas forças tenham inibido sua adoção da escrita e outras tecnologias básicas O caso da Somália demonstra as consequências da falta de centralização política para o crescimento econômico Na literatura histórica não há registro de tentativas de instaurar tal centralização no país Ainda assim está claro por que isso seria muito difícil proceder à centralização política significaria que determinados clãs teriam de se submeter ao controle de outros Todavia os somalis repudiavam qualquer hierarquia do gênero e a abdicação de poder que ela implicaria Ademais o equilíbrio de poder militar na sociedade também dificultaria o estabelecimento de instituições centralizadas Com efeito é provável que qualquer grupo ou clã que viesse a tentar centralizar o poder não só enfrentasse resistência ferrenha como também acabasse perdendo o poder e privilégios de que já gozava Em decorrência de tamanha falta de centralização política e da inerente ausência mesmo do mínimo asseguramento dos direitos de propriedade a sociedade somali nunca chegou a gerar os incentivos necessários para o investimento em tecnologias que incrementassem a produtividade Enquanto o processo de industrialização se encontrava em andamento em outras regiões do mundo nos séculos XIX e começo do XX os somalis digladiavam em vendetas intermináveis e lutavam pela própria vida e seu atraso econômico apenas se arraigava cada vez mais ATRASO PERSISTENTE A Revolução Industrial gerou uma circunstância crítica transformadora para o mundo inteiro durante o século XIX e além as sociedades que permitiram e incentivaram seus cidadãos a investir em novas tecnologias apresentaram rápido crescimento Contudo muitas em todo o mundo falharam nesse processo ou optaram explicitamente por não realizálo Países submetidos a instituições políticas e econômicas extrativistas não geravam tais incentivos Espanha e Etiópia são bons exemplos em que o controle absolutista das instituições políticas e as instituições econômicas intrinsecamente extrativistas asfixiaram os incentivos econômicos muito antes de despontar o século XIX O resultado foi semelhante em outros regimes absolutistas como o Império AustroHúngaro a Rússia o Império Otomano e a China muito embora nesses casos os governantes por medo da destruição criativa tenham não só negligenciado o fomento ao progresso econômico como também tomado medidas explícitas para bloquear a difusão da indústria e a introdução de novas tecnologias que promoveriam a industrialização O absolutismo não é a única modalidade de instituição política extrativista e não foi o único fator a impedir a industrialização Instituições políticas e econômicas inclusivas requerem algum grau de centralização política para que o Estado possa impor a lei e a ordem defender os direitos de propriedade e fomentar a atividade econômica quando necessário mediante o investimento em serviços públicos Mesmo hoje porém em diversos países como Afeganistão Haiti Nepal e Somália o Estado é incapaz de manter a ordem mais rudimentar e os incentivos econômicos encontramse absolutamente destruídos O caso da Somália ilustra como o processo de industrialização também foi ignorado por essas sociedades A centralização política é objeto de resistência pelo mesmo motivo pelo qual os regimes absolutistas resistem à mudança em geral o receio quase sempre justificado de que ela desloque o eixo do poder político transferindoo dos que dominam hoje para as mãos de novos indivíduos e grupos Assim do mesmo modo como o absolutismo bloqueia toda e qualquer transformação no sentido do pluralismo e da mudança econômica as elites e clãs tradicionais dominantes nas sociedades que não dispõem de Estado centralizado agem no mesmo sentido Por conseguinte as sociedades em que tal centralização era ainda inexistente nos séculos XVIII e XIX estavam particularmente mal posicionadas para a era da indústria Enquanto uma variedade de instituições extrativistas desde o absolutismo até a relativa falta de centralização do Estado inviabilizava a disseminação da indústria em determinados países em outros a circunstância crítica da Revolução Industrial tinha consequências muito distintas Como veremos no Capítulo 10 as sociedades que já haviam dado seus primeiros passos em direção a instituições políticas e econômicas inclusivas como Estados Unidos e Austrália bem como aquelas onde o absolutismo sofreu abalos mais graves como França e Japão puderam tirar proveito das novas oportunidades econômicas e dar início a um processo de rápido crescimento econômico Assim o padrão habitual de interação entre uma circunstância crítica e as diferenças institucionais existentes levando à intensificação do processo de diferenciação institucional e econômica mais uma vez entrou em ação no século XIX mas agora com impacto ainda maior e efeitos mais profundos sobre a prosperidade e a pobreza das nações O 9 REVERTENDO O DESENVOLVIMENTO ESPECIARIAS E GENOCÍDIO ARQUIPÉLAGO DAS MOLUCAS na moderna Indonésia é composto de três grupos de ilhas No começo do século XVII as Molucas do Norte compreendiam os reinos independentes de Tidore Ternate e Bacan O grupo do meio incluía o reino insular de Ambon No sul ficavam as Ilhas Banda um pequeno arquipélago ainda não unificado politicamente Embora hoje talvez nos pareça um lugar remoto as Molucas eram na época peçaschave do comércio mundial por serem as únicas produtoras de especiarias preciosas como cravodaíndia macis e nozmoscada sendo que destes a nozmoscada e o macis eram originários exclusivamente das Ilhas Banda Os habitantes dessas ilhas produziam e exportavam tais especiarias raras em troca de alimentos e produtos manufaturados provenientes da Ilha de Java do entreposto de Melaka na Península da Malásia e da Índia China e Arábia O primeiro contato desse povo com os europeus ocorreu no século XVI com os navegadores portugueses que chegaram em busca de especiarias que até então chegavam à Europa via Oriente Médio por rotas comerciais controladas pelo Império Otomano No intuito de obter acesso direto às Ilhas das Especiarias e a esse comércio os europeus partiram em busca de uma passagem contornando a África ou através do Atlântico O marinheiro português Bartolomeu Dias dobrou o Cabo da Boa Esperança em 1488 e por aí a Índia foi alcançada por Vasco da Gama em 1498 Pela primeira vez os europeus dispunham de sua própria rota independente até as Ilhas das Especiarias Os portugueses imediatamente se lançaram à tarefa de tentar controlar o comércio de especiarias Capturaram Melaka em 1511 Estrategicamente localizada na Costa Oeste da Península da Malásia era para lá que mercadores de todo o Sudeste Asiático se dirigiam para vender suas especiarias para outros mercadores indianos chineses e árabes que então os embarcavam para o Ocidente Nas palavras do viajante português Tomé Pires em 1515 O comércio entre as diferentes nações num raio de 65 mil quilômetros passa obrigatoriamente por Melaka Quem for senhor de Melaka terá as mãos na garganta de Veneza Com Melaka em suas mãos os portugueses deram início a tentativas sistemáticas de conquistar o monopólio do inestimável comércio de especiarias Em vão Ín di a Ch in a Ta iwan Ja pã o Av a Mian ma r Laos Pe gu Ta ilândi a Ca mboja V iet nã Fi lipi na s L uzo n Ma nila Vi saya s Cebu Ma gu indana o Mindan o Su lu Br u nei Bo rn éu Banjarma si n Su lawesi Te rnat e Tidore Ma lu ku Am bo n Banda Timor Le st e Lo mbok Sura ba ya Ba li Tu ban Ac eh Pe ní ns ula da Ma lá sia Me la ka C ing apur a Pa lemban g Sumatr a Ja car ta Banten Ja va Mapa 14 Sudeste Asiático Ilhas das Especiarias Ambon e Banda em 1600 Os rivais que teriam de encarar nada tinham de insignificantes Entre os séculos XIV e XVI o comércio de especiarias promoveu um surto de desenvolvimento econômico no Sudeste Asiático Cidadesestados como Aceh Banten Melaka Makassar Pegu e Brunei expandiramse rapidamente produzindo e exportando especiarias e outros produtos como madeiras de lei Esses Estados apresentavam formas absolutistas de governo similares às existentes na Europa no mesmo período O desenvolvimento de instituições políticas foi fomentado por processos similares entre eles as mudanças tecnológicas nos métodos de guerra e comércio internacional As instituições estatais foram paulatinamente se centralizando girando em torno de um soberano que reivindicava o poder absoluto Como os monarcas absolutos europeus os reis do Sudeste Asiático dependiam basicamente do comércio como fonte de renda e tanto se dedicavam pessoalmente a ele quanto concediam monopólios para as elites locais e estrangeiras Como na Europa absolutista essa estratégia gerou algum crescimento econômico embora oferecesse um conjunto de instituições econômicas que estava longe de ser o ideal para a prosperidade econômica com barreiras alfandegárias significativas e direitos de propriedade predominantemente instáveis Não obstante o processo de comercialização já se encontrava em andamento enquanto os portugueses se desdobravam para estabelecer seu domínio no Oceano Índico A presença dos europeus ganhou muito em peso e impacto com a chegada dos holandeses Estes logo se deram conta de que monopolizar o fornecimento de especiarias valiosas das Molucas seria muito mais rentável do que concorrer com os comerciantes locais ou outros europeus Assim em 1600 persuadiram o governante de Ambon a assinar um contrato de exclusividade que lhes conferia o monopólio do comércio local de cravodaíndia Com a fundação da Companhia Holandesa das Índias Orientais em 1602 os holandeses acabaram levando a melhor em suas tentativas de se apoderar de todo o comércio de especiarias e eliminar seus concorrentes por bem ou por mal Tanto pior para o Sudeste Asiático A Companhia Holandesa das Índias Orientais foi depois da Companhia Inglesa das Índias Orientais a segunda sociedade anônima por ações europeia dois marcos no desenvolvimento das corporações modernas que mais tarde desempenhariam papel central no crescimento industrial europeu Foi também a segunda empresa a dispor de Exército próprio com suficiente poder para travar guerras e colonizar terras estrangeiras Lançando mão do poderio militar da companhia os holandeses trataram de tirar do caminho todos os potenciais obstáculos ao seu tratado com o governante de Ambon Assim em 1605 capturaram um forte estratégico dos portugueses e afastaram à força todos os demais mercadores Expandiramse então para as Molucas do Norte obrigando os soberanos de Tidore Ternate e Bacan a vedar o cultivo e a comercialização do cravodaíndia em seus territórios O tratado imposto a Ternate chegava mesmo a permitir que os holandeses destruíssem todos os pés de cravodaíndia que porventura encontrassem dentro de suas fronteiras O regime vigente em Ambon era similar ao de boa parte da Europa e das Américas na mesma época Seus cidadãos pagavam tributos ao governante local e eram submetidos a trabalhos forçados Os holandeses assumiram o controle e intensificaram o sistema de modo a extrair mais trabalho e maior quantidade de cravo da ilha Até a sua chegada famílias extensas pagavam à elite local tributos sob a forma de cravoda índia Os holandeses estipularam então que cada uma delas permaneceria presa à terra e teria de cultivar determinado número de pés de cravo além de passar a ser obrigada a prestar trabalhos forçados aos novos senhores Os holandeses assumiram também o controle das Ilhas Banda agora no intuito de monopolizar o macis e a nozmoscada Contudo a organização dessas ilhas era completamente distinta da de Ambon eram compostas de um semnúmero de pequenas cidadesestados autônomas sem hierarquia social ou política Esses pequenos Estados na realidade não mais que aldeias eram regidos por assembleias de cidadãos Não havia uma autoridade central que os holandeses pudessem coagir a assinar um contrato de monopólio nem uma estrutura tributária de que se pudessem apropriar a fim de capturar todo o fornecimento de nozmoscada e macis A princípio isso significou que os holandeses teriam de concorrer com os mercadores ingleses portugueses indianos e chineses perdendo as especiarias para os adversários sempre que não pagassem preços altos o bastante Vendo desmoronar os seus planos iniciais de estabelecer um monopólio do macis e da nozmoscada o governador holandês da Batávia Jan Pieterszoon Coen divisou um novo plano Em 1618 Coen fundou Batávia na Ilha de Java como nova capital da Companhia Holandesa das Índias Orientais Em 1621 dirigiuse a Banda com uma esquadra e tratou de massacrar quase toda a população das ilhas provavelmente umas 15 mil pessoas Todos os líderes foram executados com os demais e apenas alguns permaneceram vivos em número suficiente para preservar o knowhow necessário à produção das especiarias Concluído o genocídio Coen instaurou a estrutura política e econômica necessária para seu plano uma sociedade de plantation As ilhas foram divididas em 68 lotes confiados a 68 holandeses em sua maioria funcionários ou exfuncionários da Companhia Holandesa das Índias Orientais Os novos donos da terra aprenderam com os habitantes sobreviventes a cultivar as especiarias comprando escravos da companhia para povoar as ilhas agora desertas e produzir o macis e a nozmoscada a serem vendidos à companhia a preços predeterminados As instituições extrativistas instauradas pelos holandeses nas Ilhas das Especiarias alcançaram os efeitos desejados ainda que em Banda isso tenha se dado ao custo de 15 mil vidas inocentes e do estabelecimento de instituições políticas e econômicas que condenariam as ilhas ao subdesenvolvimento No final do século XVII os holandeses haviam reduzido em cerca de 60 o fornecimento mundial dessas especiarias e o preço da nozmoscada havia duplicado Os holandeses espalharam a estratégia que aperfeiçoaram nas Molucas para a região inteira com profundas implicações para as instituições políticas e econômicas do resto do Sudeste Asiático O longo processo de expansão comercial de diversos Estados da região iniciado no século XIV entrou em retrocesso Mesmo aqueles que não chegaram a ser diretamente submetidos ao poder colonial e esmagados pela Companhia Holandesa das Índias Orientais fecharamse e abandonaram o comércio A incipiente transformação econômica e política no Sudeste Asiático foi interrompida A fim de evitar o perigo representado pela Companhia Holandesa das Índias Orientais vários Estados abandonaram a produção agrícola para exportação e abdicaram de toda atividade comercial A autossuficiência era mais segura do que enfrentar os holandeses Em 1620 o Estado de Banten na Ilha de Java derrubou suas pimenteiras na esperança de assim induzir os holandeses a deixálo em paz Quando um mercador holandês visitou Maguindanao no sul das Filipinas em 1686 disseramlhe Aqui é possível cultivar nozmoscada e cravodaíndia como em Malaku Não nos dedicamos mais a isso porque o antigo rajá ordenou que fossem todas destruídas antes de morrer por medo de que a companhia holandesa viesse disputálas Outro comerciante ouviu declaração similar sobre o regente de Maguindanao em 1699 Ele havia proibido que se continuasse plantando pimenta para não acabar envolvido em uma guerra fosse com a companhia holandesa ou com algum outro potentado Seguiuse um processo de desurbanização e até de declínio econômico Em 1635 os birmaneses transferiram sua capital de Pegu no litoral para Ava bem no interior subindo o Rio Irrawaddy Não sabemos que rumos tomariam os Estados do Sudeste Asiático em seu desenvolvimento econômico e político se não tivesse havido a agressão holandesa Talvez produzissem seu próprio estilo de absolutismo e permanecessem no mesmo estágio em que se encontravam no final do século XVI ou talvez tivessem dado continuidade às suas atividades comerciais e gradualmente fossem adotando instituições cada vez mais inclusivas Do mesmo modo como nas Molucas porém o colonialismo holandês mudou de maneira drástica a direção de seu desenvolvimento econômico e político Os povos do Sudeste Asiático puseram fim ao seu intercâmbio comercial fecharamse e intensificaram seu absolutismo Nos dois séculos que se seguiram não estariam em condições de tirar proveito das inovações decorrentes da Revolução Industrial E em última instância nem a interrupção do comércio os poria a salvo dos europeus no final do século XVIII quase todos haviam sido engolfados por impérios coloniais VIMOS NO CAPÍTULO 7 como a expansão europeia no Atlântico impulsionou a instalação de instituições inclusivas na GrãBretanha Conforme ilustrado pela experiência das Molucas sob domínio holandês porém essa mesma expansão espalhou as sementes do subdesenvolvimento nos mais diversos cantos do mundo ao impor instituições extrativistas ou reforçar as já existentes Estas de maneira direta ou indireta puseram a perder a incipiente atividade comercial e industrial em todo o planeta ou ajudaram a perpetuar instituições que bloquearam a industrialização Por conseguinte enquanto a Revolução Industrial se disseminava por determinadas regiões do mundo aqueles lugares submetidos aos impérios coloniais europeus não tinham a menor chance de beneficiarse das novas tecnologias A INSTITUIÇÃO HABITUAL No Sudeste Asiático a difusão do poder comercial e naval europeu nos primórdios da era moderna abortou um período promissor de expansão econômica e transformação institucional Na mesma época em que a Companhia Holandesa das Índias Orientais se expandia uma modalidade comercial completamente distinta se intensificava na África o tráfico de escravos Nos Estados Unidos a escravidão nos estados do sul costumava ser denominada instituição peculiar Historicamente porém como tão bem assinalou o grande estudioso clássico Moses Finlay a escravidão nunca teve nada de peculiar pelo contrário esteve presente em praticamente todas as sociedades Era como vimos endêmica na Roma Antiga e na África tradicional fornecedora de escravos para a Europa ainda que não a única Nos tempos romanos os escravos eram provenientes dos povos eslavos do entorno do Mar Negro do Oriente Médio e do Norte da Europa mas em 1400 os europeus já haviam parado de escravizarse mutuamente A África todavia como vimos no Capítulo 6 não fez a transição como a Europa medieval da escravidão à servidão Nos primórdios da era moderna no Leste Africano era vibrante o tráfico de escravos transportados em grande número através do Saara até a Península Arábica Ademais os grandes Estados medievais de Mali Gana e Songhai na África Ocidental faziam intenso uso de mão de obra escrava no governo Exército e agricultura tendo adotado os modelos organizacionais dos Estados muçulmanos norteafricanos com os quais mantinham relações comerciais Foi o desenvolvimento das colônias produtoras de açúcar no Caribe a partir do princípio do século XVII que provocou uma escalada extrema do tráfico internacional de escravos e o aumento sem precedentes da importância da escravidão dentro da própria África No século XVI provavelmente em torno de 300 mil escravos foram comercializados no Atlântico oriundos em sua maioria da África Central com intensa participação do Congo e dos portugueses mais ao sul em Luanda hoje capital de Angola Durante esse período o tráfico de escravos transaariano foi ainda mais volumoso com o deslocamento provavelmente de cerca de 550 mil africanos escravizados rumo ao norte No século XVII a situação se inverteu Por volta de 1350000 africanos foram vendidos como escravos no comércio atlântico sendo enviados em sua maioria para as Américas Os números relativos ao comércio saariano permaneceram quase idênticos O século XVIII assistiu a outro salto abrupto com aproximadamente 6 milhões de escravos mandados para o outro lado do Atlântico e talvez 700 mil atravessando o Saara Somando os números dos diferentes períodos e regiões da África chegase a bem mais de 10 milhões de africanos degredados do continente como escravos O Mapa 15 dá a dimensão da escala do tráfico de escravos Partindo das fronteiras nacionais atuais apresenta estimativas da medida cumulativa da escravidão entre 1400 e 1900 como uma porcentagem da população em 1400 Os tons mais escuros indicam escravidão mais intensa Por exemplo em Angola Benin Gana e Togo o número de escravos exportados chegou a um total acumulado superior à população inteira do país em 1400 O súbito aparecimento de europeus por toda a costa da África Ocidental e Central ávidos por comprar escravos não teria como não exercer um impacto transformador sobre as sociedades africanas A maioria dos escravos deportados para as Américas consistia em prisioneiros de guerra que eram levados até o litoral O recrudescimento dos conflitos foi alimentado pela gigantesca importação de armas e munição que os europeus trocavam por escravos Em 1730 cerca de 180 mil armas eram importadas todos os anos só no litoral oeste do continente entre 1750 e princípios do século XIX só os britânicos venderam entre 283 mil e 394 mil armas por ano Entre 1750 e 1807 os ingleses venderam o extraordinário volume de 22 mil toneladas de pólvora chegando a uma média de 384 mil quilos ao ano além de 91 mil quilos de chumbo anuais Mais ao sul o comércio era igualmente vigoroso No litoral do Reino de Luangu ao norte do Reino do Congo os europeus venderam cerca de 50 mil armas por ano Dados inexisten te s Ma rr ocos Tu nísia Ar gé li a Saara O cide nt al Ma ur itânia Ma li Ní ge r Ch ade Su dã o Eritreia Djibu ti Et iópi a So má li a Se ne ga l Gâmb ia Gu in é Se rr a Le oa Costa do Ma m Li bé ri a Burkin a Fa so To go Gana Be ni n Ni gé ri a Ca marõ es Re públic a Ce ntro A frican a Gu iné Eq uatori al Ga bã o Cong o Br az za vi ll e Re públic a De mocrát ic a do Cong o Ug anda Qu ên ia Ru anda Bu ru nd i Ta nzâni a An go la Zâmbia Ma láui Mo çambique Ma da ga scar Zimbábue Na míbi a Bo tsuana Su azil ândi a Lesoto África do Su l Exportações de escra vos po rc enta ge m da população em 140 0 150 0 50100 100300 Mapa 15 Exportações de escravos da África Tanta guerra e conflito não só foram causas de vasta mortandade e sofrimento humano mas também desencadearam determinado caminho de desenvolvimento institucional na África Até o início da era moderna as sociedades africanas eram menos centralizadas politicamente do que as da Eurásia A maioria dos Estados era de pequena escala com a terra e os recursos sob o controle de chefes tribais talvez reis Muitos como mostramos no caso da Somália não contavam com absolutamente nenhuma estrutura de autoridade política hierárquica O tráfico de escravos pôs em andamento dois processos políticos adversos Primeiro diversos Estados a princípio tornaramse mais absolutistas organizandose em função de um único objetivo escravizar e vender os demais para os traficantes europeus Segundo em consequência mas paradoxalmente em oposição ao primeiro a beligerância incessante e a escravidão acabaram destruindo por completo qualquer tipo de ordem e autoridade estatal legítima porventura existente na África subsaariana Além das guerras os escravos também eram sequestrados e capturados em ataques de surpresa de menor escala A lei também se converteu em instrumento de escravização Qualquer que fosse o crime cometido a pena seria a escravidão O mercador inglês Francis Moore notou as consequências disso ao longo da costa da Senegâmbia na África Ocidental na década de 1730 Desde que o tráfico de escravos assim entrou em vigor todas as punições passaram a ser a escravidão havendo vantagem em tais condenações constituíramse em excessivo rigor punitivo a fim de assegurar o benefício da venda do criminoso Não só o assassinato o roubo e o adultério são punidos pela venda do criminoso como escravo mas as maiores frivolidades são penalizadas da mesma maneira As instituições mesmo as religiosas foram pervertidas pela ânsia de capturar e vender escravos Um exemplo foi o famoso oráculo de Arochuku no leste da Nigéria que se acreditava falar em nome de uma importante divindade da região respeitada pelos principais grupos étnicos locais ijos ibibios e igbos Buscavase o oráculo para solucionar disputas e arbitrar em desavenças Os consulentes que viajavam a Arochuku para consultálo tinham de descer da cidade até uma garganta do Rio Cross onde em uma vasta caverna com a frente toda decorada com crânios humanos o oráculo estava abrigado Os sacerdotes em conluio com os mercadores e traficantes de escravos aros comunicavam a decisão do oráculo a qual em geral implicava que as pessoas fossem engolidas por ele o que significava na verdade que uma vez atravessada a caverna seriam levadas rio abaixo até os navios negreiros dos europeus no litoral Esse processo de desvirtuamento e violação de todas as leis e costumes tendo em vista a captura de escravos em número cada vez maior exerceu impacto devastador sobre a centralização política embora em determinaras áreas tenha levado ao surgimento de Estados poderosos cuja principal razão de ser eram as incursões e a escravização O próprio Reino do Congo foi provavelmente o primeiro Estado africano a metamorfosearse em escravagista até terminar despedaçado pela guerra civil Outros Estados escravagistas despontaram sobretudo na África Ocidental incluindo os oyos na Nigéria os daomeanos no Benin e mais tarde os axântis em Gana A expansão do Estado oyo em meados do século XVII por exemplo foi diretamente relacionada ao recrudescimento das exportações de escravos no litoral Seu poderio foi decorrente de uma revolução militar que envolveu a importação de cavalos do norte e a formação de uma poderosa cavalaria capaz de dizimar os exércitos rivais À medida que os oyos se expandiam para o sul rumo à costa iam esmagando as sociedades que encontravam no caminho e vendiam significativa parcela de sua população para o tráfico negreiro No período entre 1690 e 1740 os oyos estabeleceram seu monopólio no interior do que ficaria conhecido como Costa dos Escravos Estimase que 80 a 90 dos escravos vendidos no litoral tenham sido fruto dessas conquistas Relação dramática semelhante entre guerra e fornecimento de escravos deuse mais a oeste no século XVIII na Costa do Ouro área onde hoje se localiza Gana A partir de 1700 o Estado axânti começou a expandirse do interior de modo bastante similar ao dos oyos anteriormente Ao longo da primeira metade do século XVIII essa expansão desencadeou as chamadas Guerras de Akan nas quais os axântis foram derrotando um Estado independente depois do outro O último deles Gyaman foi subjugado em 1747 Em sua maioria os 375 mil escravos exportados da Costa do Ouro entre 1700 e 1750 eram prisioneiros capturados nessas guerras Provavelmente o efeito mais óbvio desse extrativismo maciço de seres humanos foi demográfico É difícil saber com algum grau de certeza qual seria a população da África antes do período moderno mas há diversas estimativas plausíveis de estudiosos sobre o impacto populacional do tráfico de escravos O historiador Patrick Manning avalia em 2225 milhões em princípios do século XVIII o número de habitantes das áreas do oeste e centrooeste africanos fornecedoras de mão de obra escrava para exportação Partindose da premissa conservadora de que essa região sem o tráfico de escravos teria experimentado durante os séculos XVIII e XIX um índice de crescimento populacional de cerca de 05 ao ano Manning calculou que seu número de habitantes giraria em 1850 em torno de pelo menos 4653 milhões Na realidade era aproximadamente metade disso Tão gigantesca diferença deveuse não só aos cerca de 8 milhões de pessoas exportadas como escravos entre 1700 e 1850 mas aos milhões que devem ter sucumbido na permanente perseguição e captura de escravos Ademais a escravidão e o tráfico negreiro na África jogaram por terra as estruturas familiares e matrimoniais além de talvez terem reduzido a fertilidade A partir de fins do século XVIII um vigoroso movimento pela abolição do tráfico de escravos começou a ganhar força na GrãBretanha encabeçado pela carismática figura de William Wilberforce Após sucessivos fracassos em 1807 os abolicionistas persuadiram o Parlamento a aprovar uma lei tornando o tráfico ilegal Os Estados Unidos seguiram o exemplo aprovando iniciativa similar no ano seguinte O governo britânico porém foi ainda mais longe empenhouse ativamente em implementar a medida para tanto posicionando estrategicamente esquadras navais no Atlântico a fim de reprimir a circulação de navios negreiros Embora tenha demorado ainda algum tempo para que tais iniciativas se mostrassem realmente eficazes e só em 1834 a escravidão em si fosse de fato abolida no Império Britânico o tráfico de escravos no Atlântico que respondia de longe pela maior parte desse comércio estava com os dias contados Por mais que o fim do tráfico de escravos após 1807 houvesse reduzido a demanda externa por escravos da África isso não significou que o impacto da escravidão sobre as sociedades e instituições africanas se dissolveria magicamente Não poucos Estados africanos haviam se organizado em torno do escravismo e não seria o veto imposto pelos britânicos ao comércio que mudaria essa realidade Ademais a escravidão havia se tornado muito mais prevalente dentro da própria África Esses fatores acabariam por moldar os rumos do desenvolvimento no continente tanto antes quanto depois de 1807 No lugar da escravidão sobreveio o comércio legítimo expressão cunhada para referirse à exportação pelos africanos de outros produtos sem ligação com o tráfico negreiro Entre essas mercadorias figuravam óleo de palma e nozes amendoim marfim borracha e goma arábica Com o incremento das receitas europeia e norteamericana em decorrência da difusão da Revolução Industrial a demanda por muitos desses produtos tropicais disparou E com a mesma agressividade com que haviam aproveitado as oportunidades econômicas oferecidas pelo tráfico de escravos as sociedades africanas lançaramse sobre o comércio legítimo Fizeramno porém em um contexto muito peculiar no qual a escravidão constituía um modo de vida mas a demanda externa por escravos havia se esgotado subitamente O que fazer com todos aqueles escravos agora que já não podiam mais ser vendidos para os europeus A resposta era simples continuariam gerando lucro trabalhando sob coação na África mesmo produzindo os novos artigos para o comércio legítimo Um dos exemplos mais bem documentados foi o caso dos axântis na Gana de hoje Até 1807 o Império Axânti havia se dedicado inteiramente à captura e exportação de escravos levandoos até a costa para vendêlos nas grandes feitorias de escravos de Cape Coast e Elmina Depois de 1807 estando vedada essa opção a elite política axânti tratou de reorganizar sua economia Entretanto a captura e a utilização da mão de obra escrava não tiveram fim Pelo contrário os escravos foram instalados em grandes latifúndios a princípio nas cercanias da capital Kumase mas mais tarde espalhados por todo o império cujo território correspondia a quase todo o interior da atual Gana Eram empregados no garimpo do ouro e no plantio de nozes de cola para exportação mas também cultivavam alimentos em grande quantidade e eram intensivamente empregados como carregadores já que os axântis não faziam uso do transporte sobre rodas Mais a leste verificaramse adaptações similares Em Daomé por exemplo o rei tinha vastas plantations de óleo de palma junto aos portos costeiros de Whydah e Porto Novo todas baseadas em mão de obra escrava Desse modo a abolição do tráfico de escravos em vez de levar a escravidão na África à dissolução acarretou tão somente a redistribuição dos escravos agora empregados dentro da própria África em vez de nas Américas Ademais muitas das instituições políticas engendradas pelo tráfico de escravos nos dois séculos anteriores seguiram inalteradas e seus padrões de comportamento persistiram Na Nigéria por exemplo nas décadas de 1820 e 1830 o outrora imponente Reino Oyo desmoronou solapado por guerras civis e a ascensão das cidadesestados iorubás como Illorin e Ibadan diretamente envolvidas no tráfico de escravos mais ao sul Na década de 1830 a capital de Oyo foi saqueada depois do que as cidades iorubás puseramse a disputar com Daomé a dominação regional Engajaramse em uma série quase contínua de guerras na primeira metade do século que geravam uma oferta maciça de escravos e às quais se vinham juntar os já rotineiros sequestros condenações por oráculos e incursões em menor escala Os sequestros constituíam tamanho problema em determinadas regiões da Nigéria que os pais não deixavam seus filhos brincar ao ar livre por medo de que fossem levados e vendidos como escravos Assim a escravidão em vez de extinguirse ao que parece foi recrudescendo na África no decorrer do século XIX Embora seja difícil chegar a números exatos uma série de relatos escritos por viajantes e mercadores nessa época sugere que na África Ocidental tanto nos reinos de Axânti e Daomé quanto nas cidadesestados iorubás metade da população era composta de escravos Dispomos de dados mais acurados dos primeiros registros coloniais franceses do oeste do Sudão uma imensa fatia da África Ocidental que se estendia do Senegal via Mali e Burkina Faso até o Níger e Chade Nessa região em 1900 30 da população era escrava Do mesmo modo como o advento do comércio legítimo a colonização formal iniciada com a Partilha da África mostrouse incapaz de destruir a escravidão aí vigente Ainda que a penetração europeia no continente fosse em boa parte justificada com o argumento de que era preciso combater e abolir a escravidão a realidade era muito diferente Na maior parte da África colonial a escravidão seguiria em vigor até que o século XX estivesse já bastante avançado Em Serra Leoa por exemplo só em 1928 a escravidão seria finalmente abolida muito embora a capital do país Freetown tivesse sido fundada originalmente em fins do século XVIII como um porto seguro para escravos repatriados das Américas Tornouse então uma importante base para a frota antiescravagista britânica e um novo lar para escravos libertos resgatados dos navios negreiros capturados pelos ingleses Mesmo com esse simbolismo a escravidão ainda perduraria por 130 anos em Serra Leoa A Libéria ao sul de Serra Leoa foi igualmente fundada na década de 1840 para escravos libertos americanos Também lá porém a escravidão adentraria o século XX ainda nos anos 1960 estimavase que um quarto da força de trabalho era coagida vivendo e trabalhando em condições análogas às da escravidão Dadas as instituições políticas e econômicas extrativistas baseadas no tráfico de escravos a industrialização não se disseminou pela África subsaariana que enquanto outras regiões do mundo transformavam suas economias estagnouse ou mesmo experimentou um retrocesso econômico INSTAURANDO O DUALISMO ECONOMICO O paradigma do dualismo econômico proposto originalmente em 1955 por Sir Arthur Lewis ainda molda a maneira como muitos cientistas sociais estudam os problemas econômicos dos países menos desenvolvidos Segundo Lewis várias economias menos desenvolvidas ou subdesenvolvidas possuem uma estrutura dual dividindose em um setor moderno e outro tradicional O primeiro que corresponde à parte mais desenvolvida da economia está associado à vida urbana à indústria moderna e ao uso de tecnologias avançadas O segundo é aquele ligado à vida rural à agricultura e a instituições e tecnologias retrógradas As instituições agrícolas antiquadas incluem a propriedade comunitária da terra que implica a ausência de direitos de propriedade privada sobre ela Nesse setor tradicional a mão de obra seria usada com tamanha ineficiência segundo Lewis que poderia ser realocada para o moderno sem reduzir a produtividade do rural Após gerações e gerações de economistas do desenvolvimento trabalhando com base nos conceitos de Lewis o problema do desenvolvimento passou a significar a transferência de pessoas e recursos do setor tradicional da agricultura e dos meios rurais para o setor moderno a indústria e as cidades Em 1979 Lewis foi agraciado com o Prêmio Nobel por sua obra sobre desenvolvimento econômico Lewis e os economistas do desenvolvimento que se basearam em suas teses sem dúvida acertaram ao identificar as economias duais A África do Sul era um dos exemplos mais claros cindida entre um setor tradicional retrógrado e pobre e outro moderno vibrante e próspero Ainda hoje nesse país o dualismo econômico apontado por Lewis pode ser detectado por toda parte Uma das maneiras mais drásticas de constatar esse fenômeno é cruzar a fronteira entre os estados de KwaZuluNatal antigo Natal e Transkei que coincide com o curso do Rio Great Kei A leste do rio em Natal junto à costa há imponentes propriedades com vista para o mar defronte ao extenso areal de praias magníficas O interior é coberto por plantações verdejantes de canade açúcar As estradas são lindas a região inteira exala prosperidade Atravessando o rio parece que se adentra outro tempo e país O cenário é de desolação Não há verde apenas a terra marrom da área desmatada Em vez de casas luxuosas com água corrente banheiros e todas as conveniências modernas a população vive em barracos improvisados e prepara sua comida em fogueiras a céu aberto A existência é definitivamente tradicional muito longe do estilo de vida moderno do lado oriental do rio A esta altura não será surpresa para o leitor saber que tamanha disparidade está ligada a profundas diferenças entre as instituições econômicas de um lado e de outro do rio A leste em Natal encontramos direitos de propriedade privada sistemas jurídicos funcionais mercados indústria e agricultura comercial A oeste até pouco tempo atrás vigorava no Transkei a propriedade comunitária da terra e a liderança por todo poderosos chefes tradicionais Examinado através das lentes da teoria do dualismo econômico de Lewis o contraste entre o Transkei e Natal ilustra os problemas do desenvolvimento africano De fato podemos ir mais longe e observar que historicamente a África inteira era como o Transkei pobre e com instituições econômicas prémodernas tecnologia retrógrada e governada por chefes locais Segundo essa perspectiva o desenvolvimento econômico deveria consistir em assegurar que o Transkei se transformasse em Natal Esse ponto de vista contém alguma dose de verdade mas deixa escapar por completo a lógica do surgimento do dualismo econômico e sua relação com a economia moderna O atraso do Transkei não é apenas um resquício do atraso natural da África Entretanto o dualismo econômico entre Transkei e Natal é bastante recente e nada tem de natural Foi produzido pelas elites brancas sulafricanas no intuito de gerar uma reserva de mão de obra barata para seus negócios e reduzir a concorrência com os negros africanos O dualismo econômico é mais um exemplo de subdesenvolvimento que foi criado não surgiu naturalmente e persistiu ao longo dos séculos África do Sul e Botsuana como veremos adiante conseguiram evitar a maior parte dos efeitos adversos do tráfico de escravos e guerras dele decorrentes A primeira interação significativa entre os sulafricanos e os europeus deuse quando a Companhia Holandesa das Índias Orientais fundou uma base na Baía da Mesa hoje o porto da Cidade do Cabo em 1652 Na época o lado ocidental da África do Sul era esparsamente povoado pelos khoikhoi caçadores e coletores Mais a leste nos atuais Ciskei e Transkei havia sociedades agrícolas africanas densamente povoadas Não houve a princípio uma interação mais intensa com a nova colônia de holandeses nem estes aderiram à escravidão O litoral sulafricano era muito afastado dos mercados de escravos e os habitantes do Ciskei e do Transkei conhecidos como xhosa viviam longe o suficiente do litoral para não chamar a atenção de ninguém Por conseguinte essas sociedades não sofreram o impacto de muitas das forças adversas que se abateram sobre as Áfricas Ocidental e Central O isolamento desses lugares mudaria no século XIX Para os europeus havia algo de muito atraente nas condições climáticas e ambientais da África do Sul onde ao contrário da África Ocidental por exemplo o clima era temperado e livre de doenças tropicais como a malária e a febre amarela que haviam convertido a maior parte da África no túmulo do homem branco e impedia os europeus de se estabelecerem ou mesmo instalarem entrepostos permanentes A África do Sul era uma candidata muito melhor para a colonização de povoamento A expansão dos europeus rumo ao interior teve início logo após os britânicos haverem tomado a Cidade do Cabo dos holandeses durante as guerras napoleônicas e precipitou uma longa série de guerras envolvendo os xhosa à medida que a fronteira colonial avançava terra adentro A penetração no continente intensificouse em 1835 quando os europeus remanescentes de descendência holandesa que ficariam conhecidos como africâneres ou bôeres começaram sua célebre migração em massa a Grande Caminhada na tentativa de escapar ao controle britânico do litoral e da região da Cidade do Cabo Posteriormente os africâneres fundariam dois Estados independentes no interior da África o Estado Livre de Orange e o Transvaal O estágio de desenvolvimento seguinte da África do Sul teve início com a descoberta de vastas reservas de diamante em Kimberly em 1867 e de ricas minas de ouro em Joanesburgo em 1886 Tamanha riqueza mineral no interior imediatamente convenceu os ingleses a estenderem seu controle sobre a África do Sul inteira A resistência do Estado Livre de Orange e do Transvaal levou às célebres Guerras dos Bôeres em 18801881 e 18991902 Após uma inesperada derrota inicial os ingleses conseguiram incorporar os Estados africâneres à Província do Cabo e Natal fundando assim em 1910 a União da África do Sul Além dos conflitos entre africâneres e ingleses o desenvolvimento da economia mineradora e a expansão do povoamento europeu tiveram outras implicações para o desenvolvimento da região sobretudo em termos da geração de demanda por alimentos e outros produtos agrícolas e da criação de novas oportunidades econômicas para os africanos nativos tanto na agricultura quanto no comércio Os xhosa no Ciskei e no Transkei reagiram sem demora a essas oportunidades econômicas conforme documentado pelo historiador Colin Bundy Já em 1832 antes mesmo do boom da atividade mineradora um missionário morávio no Transkei assinalou o novo dinamismo econômico que havia despontado na região e salientou a demanda por parte dos africanos para os novos bens de consumo cuja existência lhes fora desvelada pela disseminação dos europeus Em suas palavras A fim de obter tais objetos empenhamse em conseguir dinheiro pelo trabalho de suas mãos e compram roupas pás arados carroças e outros artigos de utilidade A descrição feita pelo comissário civil John Hemming de sua visita a Fingoland no Ciskei em 1876 é igualmente reveladora Ele descreve seu espanto com o imenso avanço realizado pelos locais em poucos anos Onde quer que eu fosse encontrava cabanas sólidas e estruturas de tijolo ou pedra Em não poucos casos resistentes casas de tijolos haviam sido postas de pé e árvores frutíferas plantadas onde quer que houvesse um curso dágua disponível fora desviado e o solo encontravase cultivado até onde fosse possível irrigálo as encostas das colinas e até os topos das montanhas encontravamse cultivados até onde fosse possível introduzir um arado A extensão do plantio surpreendeume há anos não vejo tão vasta área de terra cultivada Como em outras regiões da África subsaariana o uso do arado era uma novidade na agricultura mas sempre que tinham a oportunidade os lavradores africanos pareciam muito dispostos a adotar a nova tecnologia além de prontos a investir em carroças e obras de irrigação À medida que se desenvolvia a economia agrícola as rígidas instituições tribais começaram a se dissolver Há uma série de evidências de que houve mudanças nos direitos de propriedade Em 1879 o magistrado em Umzimkulu de Griqualand East no Transkei mencionou o desejo crescente por parte dos nativos de se tornarem donos da terra tendo adquirido 154 mil quilômetros quadrados em terrenos Três anos mais tarde ele registraria o fato de que cerca de 8 mil agricultores africanos no distrito haviam comprado e começado a trabalhar em 365 mil quilômetros quadrados de terras A África certamente não estava na iminência de uma Revolução Industrial mas havia mudanças muito concretas em andamento A propriedade privada da terra havia enfraquecido os chefes locais e possibilitado a novos homens adquirir a terra e enriquecer algo impensável poucas décadas antes o que também ilustra a rapidez com que o afrouxamento das instituições extrativistas e do controle absolutista pode engendrar um dinamismo econômico inédito Um dos casos de sucesso foi o de Stephen Sonjica do Ciskei fazendeiro de origem pobre que fez fortuna Em um discurso que proferiu em 1911 Sonjica recordou que ao expor pela primeira vez para seu pai seu desejo de adquirir terra este lhe respondera Comprar terra Como você pode querer comprar terra Então não sabe que toda a terra é de Deus e foi por Ele dada somente aos chefes Era uma reação compreensível mas Sonjica não desistiu Arranjou um emprego em King Williams Town e seguiu em frente Tive a esperteza de abrir uma contacorrente no banco na qual depositava uma parte dos meus ganhos mas só até eu conseguir economizar 80 libras Comprei uma junta de bois com a canga ajoujo arado e toda a parafernália agrícola Agora adquiri um pequeno sítio Nunca é demais reforçar o quanto a agricultura é recomendável para meus compatriotas desde que se adotem contudo métodos modernos de obtenção de lucro Um extraordinário indicador do dinamismo econômico e prosperidade dos agricultores africanos desse período é encontrado em uma carta enviada em 1869 por um missionário metodista W J Davis Escrevendo à Inglaterra ele declara satisfeito haver coletado 46 libras em dinheiro para a Caixa de Previdência do Algodão de Lancashire Nessa época os prósperos africanos estavam doando dinheiro para assistência dos pobres trabalhadores têxteis ingleses Não admira que o novo dinamismo econômico não agradasse aos chefes tradicionais que em um padrão que já nos é bem familiar viam sua riqueza e poder escapandolhe por entre os dedos Em 1879 Matthew Blyth principal magistrado do Transkei comentou que houve oposição ao levantamento topográfico necessário à divisão dos lotes a serem vendidos Anotou que alguns dos chefes objetaram ainda que a maior parte da população tenha gostado da ideia pois os chefes percebem que a concessão de títulos de propriedade individuais porá a perder sua influência entre os líderes Os chefes resistiram também às melhorias implementadas nas terras como a abertura de canais de irrigação ou a construção de cercas Reconheciam que tais aprimoramentos não passavam de prelúdios aos direitos individuais de propriedade da terra o começo do fim para eles Observadores europeus chegaram a registrar que os chefes e outras autoridades tradicionais como os feiticeiros tentaram barrar a adoção de todos os modos europeus aí incluídos o plantio de novos produtos ferramentas como arados e artigos comerciais No entanto a integração do Ciskei e do Transkei ao Estado colonial britânico solapou o poder dos chefes e lideranças tradicionais e sua resistência não seria suficiente para impedir o novo dinamismo econômico da África do Sul Em Fingoland em 1884 um comentarista europeu conta que o povo havia transferido para nós sua lealdade Seus chefes converteramse agora em uma espécie de proprietários rurais desprovidos de poder político Perdido o medo da ingerência do chefe ou da arma mortal o feiticeiro que abate o próspero criador de gado o hábil conselheiro a introdução de novos costumes o habilidoso lavrador reduzindoos a todos ao uniforme nível da mediocridade não mais apreensivos diante dessa possibilidade os homens dos clãs são agora progressistas Ainda camponeses possuem porém carroças e arados abrem sulcos para irrigação criam rebanhos de carneiros Bastaram umas poucas instituições inclusivas e a erosão do poder dos chefes aos quais foram impostas algumas restrições para deflagrar na África um vigoroso boom econômico que infelizmente teria vida curta Entre 1890 e 1913 o processo seria abruptamente interrompido e revertido Nesse período duas forças contribuíram para a destruição da prosperidade rural e dinamismo criados pelos africanos nos 50 anos anteriores A primeira foi o antagonismo dos fazendeiros europeus que competiam com os africanos e viam os preços de seus produtos serem achatados pelo êxito destes a solução que encontraram foi eliminar a concorrência A segunda força foi ainda mais sinistra os europeus desejavam uma força de trabalho barata que pudessem empregar na florescente economia mineradora A única maneira de assegurar seu barateamento seria empobrecendo os africanos objetivo a que se dedicariam metodicamente nas décadas seguintes O depoimento dado em 1897 por George Albu presidente da Associação das Minas perante uma comissão de inquérito descreve com impressionante clareza a lógica do empobrecimento dos africanos a fim de garantir a mão de obra barata Na ocasião ele explicou como realizou seu intento apenas comunicando aos garotos que teriam uma redução de salário Seu testemunho prossegue Comissão Suponhamos que os kaffirs negros africanos retornem ao seus kraals cercados para gado O senhor seria a favor de solicitar ao Governo que os obrigasse ao trabalho Albu Certamente eu o tornaria compulsório Por que seria possível a um negro ficar sem fazer nada Creio que um kaffir deve ser obrigado a trabalhar a fim de ganhar a vida Comissão Se um homem puder viver sem trabalhar como o senhor poderá forçá lo Albu Multeo então Comissão Então o senhor não permitiria que o kaffir fosse proprietário de terras no país mas determinaria que trabalhasse para os brancos a fim de enriquecêlos Albu Ele terá de fazer a sua parte no trabalho de colaborar com os vizinhos Os dois objetivos a eliminação da concorrência para os fazendeiros brancos e a criação de numerosa força de trabalho de baixa remuneração foram simultaneamente atingidos pela Lei da Terra dos Nativos de 1913 Antecipandose ao conceito de dualismo econômico de Lewis a lei dividiu a África do Sul em duas partes uma moderna e próspera a outra tradicional e pobre Todavia eram prosperidade e pobreza criadas pela própria lei que determinava que 87 da terra fossem destinados aos europeus que representavam cerca de 20 da população Os 13 restantes ficariam com os africanos A Lei da Terra tivera uma série de predecessoras claro pois os europeus foram pouco a pouco confinando os africanos em reservas cada vez menores Foi a lei de 1913 porém que institucionalizou a situação de modo definitivo preparando o terreno para a consolidação do regime sulafricano do apartheid em que a minoria branca deteria tanto os direitos políticos quanto os econômicos e a maioria negra permaneceria destituída de ambos A lei determinava que várias reservas de terras entre elas o Transkei e o Ciskei seriam os lares dos africanos mais tarde chamados de bantustões outro elemento da retórica do apartheid sulafricano segundo o qual os povos africanos da África do Sul não eram nativos da região mas descendentes dos povos bantos que haviam emigrado do leste da Nigéria cerca de mil anos antes Não tinham pois mais direito à terra e evidentemente na prática tinham bem menos do que os colonizadores europeus O Mapa 16 mostra a área irrisória destinada aos africanos pela Lei da Terra de 1913 e por sua sucessora em 1936 Registra também dados de 1970 a respeito da extensão de uma distribuição similar de terras ocorrida durante a construção no Zimbábue de outro sistema de dualismo econômico como discutimos no Capítulo 13 A legislação de 1913 previa ainda medidas no intuito de impedir que arrendatários de terra e grileiros negros cultivassem terras de proprietários brancos em qualquer outra condição que não a de locatários Como explicou o secretário para relações com os nativos O efeito da lei foi pôr um ponto final para o futuro em todas as transações que implicassem alguma forma de parceria entre europeus e nativos no tocante à terra ou aos seus frutos Todos os novos contratos com nativos devem ser de prestação de serviços Desde que haja um acordo legítimo dessa natureza não há nada que impeça um empregador de remunerar um nativo em espécie ou pelo privilégio de cultivar determinado terreno Contudo o nativo não pode pagar ao senhor por seu direito de ocupar a terra Zâmbia Ma láui Mo çambique Ha rare Zimbábue Bo tsuana Na míbi a Ga bo rone Oceano Atlântico Jo anesbu rg o Su azil ândi a Kimberle y África do Su l Griq ua land Lesoto T ransk ei Ci sk ei Fi ng olan d Ci dade do Ca bo Leis da Te rr a 1913 e 1936 Dist ribu ição da te rr a 1970 Fr onteir as mode rna s Mapa 16 Áreas destinadas aos africanos pelos regimes minoritários brancos da África do Sul e Zimbábue Aos olhos dos economistas do desenvolvimento que visitaram a África do Sul nas décadas de 1950 e 1960 quando essa disciplina acadêmica começava a tomar forma e as ideias de Arthur Lewis estavam se disseminando o contraste entre os bantustões e a próspera e moderna economia branca parecia ser a representação exata da tese do dualismo econômico A parte europeia da economia era urbana escolarizada e empregava tecnologias modernas As áreas destinadas aos nativos eram pobres rurais e retrógradas a improdutividade era alta e a escolaridade baixa Aparentemente a essência daquela África atrasada e parada no tempo A questão é que tal dualismo econômico nada tinha de natural ou inevitável Fora engendrado pelo colonialismo europeu Sim os bantustões eram pobres e atrasados em termos tecnológicos e sua população não tinha acesso à educação Todavia esse quadro era resultado de políticas públicas que haviam anulado toda e qualquer possibilidade de crescimento econômico dos nativos e criado uma reserva de mão de obra africana desqualificada e barata a ser empregada nas terras e minas controladas pelos europeus A partir de 1913 os nativos foram expulsos às multidões de suas terras que passaram para as mãos dos brancos e amontoados nos bantustões demasiado pequenos para possibilitar uma subsistência independente Exatamente como se pretendia portanto não lhes restaria outra opção senão buscar meios de ganhar a vida na economia branca fornecendolhes mão de obra barata Com o colapso dos incentivos econômicos de que dispunham até então os progressos ocorridos nos 50 anos anteriores foram revertidos Os arados foram pouco a pouco abandonados e os nativos acabaram voltando às enxadas isto é se houvesse trabalho Em geral limitavamse a estar disponíveis na condição de mão de obra barata tal como os bantustões estavam encarregados de assegurar Não só os incentivos econômicos foram destruídos as transformações políticas que haviam começado a ocorrer também foram revertidas O poder dos chefes locais e líderes tradicionais até então em franco declínio viuse fortalecido já que o projeto de criação de uma força de trabalho barata previa a eliminação da propriedade privada da terra reafirmando o controle dos chefes sobre ela Essas iniciativas chegaram ao apogeu em 1951 quando o governo aprovou a Lei das Autoridades Bantas Já em 1940 G Findlay identificou com precisão o problema A posse tribal é uma garantia de que a terra nunca será trabalhada de maneira adequada e jamais pertencerá de fato aos nativos Mão de obra barata requer sementeira barata que é assim fornecida aos africanos às suas próprias custas A desapropriação dos produtores rurais africanos acarretou seu empobrecimento em massa não só lançando as bases institucionais do retrocesso econômico mas também fornecendo os pobres necessários para abastecêlo As evidências disponíveis demonstram a reversão dos níveis de vida nos bantustões após a Lei da Terra dos Nativos de 1913 O Transkei e o Ciskei mergulharam em prolongado declínio econômico Os dados de emprego nas companhias mineradoras de ouro compilados pelo historiador Francis Wilson mostram que o declínio foi generalizado pela economia sulafricana como um todo Após a Lei da Terra dos Nativos entre outras a remuneração dos mineiros despencou 30 entre 1911 e 1921 Em 1961 apesar do crescimento relativamente contínuo da economia sul africana seus salários continuavam 12 mais baixos do que em 1911 Não admira que ao longo desse período a África do Sul tenha se tornado o país mais desigual do mundo Mesmo nessas circunstâncias porém será que os negros não poderiam ter encontrado meios de ingressar na moderna economia europeia iniciando algum negócio ou estudando para se profissionalizar O governo providenciou para que nada disso fosse possível Os africanos foram proibidos de adquirir imóveis ou abrir empresas na parte europeia da economia os 87 do território do país O regime do apartheid percebeu também que negros escolarizados concorreriam com os brancos em vez de fornecer mão de obra barata para as minas e propriedades agrícolas destes Já em 1904 foi introduzido na mineração um sistema de reserva de vagas para europeus Os negros não tinham autorização para trabalhar como amalgamadores caldeireiros ensaiadores ferreiros modeladores de metais pedreiros polidores de metais serradores de madeira e a lista prosseguia interminável até sinaleirosl De um só golpe foi vetada aos africanos a ocupação nesse setor de qualquer cargo que exigisse qualificação Foi a primeira encarnação das famosas leis antimiscigenação uma das tantas invenções racistas do regime sulafricano O segregacionismo seria generalizado em 1926 para a economia inteira e perduraria até os anos 1980 Não admira que os negros não fossem escolarizados o Estado sulafricano não só anulou toda e qualquer possibilidade de eles se beneficiarem economicamente do acesso à educação como se recusou a investir em escolas para essa parcela da população e desestimulou sua educação Tal política chegaria ao apogeu nos anos 1950 quando encabeçado por Hendrik Verwoerd um dos arquitetos do regime do apartheid que prosseguiria até 1994 o governo aprovou a Lei da Educação Banta A filosofia subjacente a essa legislação foi cruamente exposta pelo próprio Verwoerd em um discurso de 1954 Os bantos devem ser orientados a servir sua própria comunidade sob todos os aspectos Não há para eles lugar na comunidade europeia acima do nível de determinadas modalidades de trabalho Por esse motivo não haverá serventia em serem qualificados visando à sua absorção na comunidade europeia uma vez que não podem nem serão absorvidos lá Naturalmente o tipo de dualismo econômico articulado no discurso de Verwoerd é muito distinto daquele previsto na teoria de Lewis Na África do Sul o dualismo econômico não foi um resultado inevitável do processo de desenvolvimento pelo contrário foi fruto da ação deliberada do Estado Na África do Sul o desenvolvimento econômico não seria acompanhado por uma transferência espontânea dos pobres do setor retrógrado da economia para o moderno Afinal o êxito do setor moderno dependia da existência do retrógrado que permitia aos empregadores brancos auferir lucros gigantescos mediante o pagamento de salários ínfimos aos trabalhadores negros sem formação Na África do Sul não ocorreria um processo gradual de educação e qualificação dos trabalhadores do setor tradicional como previa a abordagem de Lewis Com efeito os negros eram propositadamente privados de qualificação e barrados dos cargos especializados a fim de poupar os profissionais brancos da concorrência e assegurar seus altos salários Na África do Sul os africanos negros estavam efetivamente amarrados à economia tradicional nos bantustões Não se tratava porém do problema do desenvolvimento que o crescimento trataria de corrigir eram os bantustões que viabilizavam o desenvolvimento da economia branca Tampouco será surpresa o fato de que o tipo de desenvolvimento econômico apresentado pela África do Sul branca era em última instância limitado baseado em instituições extrativistas construídas pelos brancos para explorar os negros Os brancos sulafricanos possuíam direitos de propriedade investiam em educação e podiam extrair ouro e diamantes e vendêlos com lucro no mercado mundial enquanto isso porém 80 da população sulafricana encontravamse marginalizados e excluídos da grande maioria das atividades econômicas desejáveis Aos negros eram vedadas oportunidades de usar seus talentos não podiam tornarse trabalhadores especializados homens de negócios empreendedores engenheiros ou cientistas As instituições econômicas eram extrativistas os brancos enriqueciam extorquindo os negros Com efeito enquanto os sulafricanos brancos compartilhavam o padrão de vida dos países da Europa Ocidental os negros mal ultrapassavam o resto da África subsaariana Esse crescimento econômico sem destruição criativa de que apenas os brancos se beneficiavam se estenderia pelo tempo em que a receita gerada pelo ouro e pelos diamantes aumentasse Na década de 1970 no entanto a economia parou de crescer De novo não será surpresa constatar que esse conjunto de instituições econômicas extrativistas teve como fundação uma série de instituições políticas também altamente extrativistas Até sua derrocada em 1994 o sistema político sulafricano destinava todo o poder aos brancos os únicos autorizados a votar e candidatarse a cargos públicos Os brancos controlavam a força policial as Forças Armadas e todas as instituições políticas estruturadas sob o domínio militar dos colonizadores brancos Na época da fundação da União da África do Sul em 1910 as divisões administrativas africâneres do Estado Livre de Orange e do Transvaal adotaram privilégios raciais explícitos excluindo inteiramente os negros da participação no processo político Natal e a Colônia do Cabo permitiam que os negros votassem caso possuíssem patrimônio suficiente o que em geral não era o caso O status quo de Natal e da Colônia do Cabo foi mantido em 1910 mas na década de 1930 os negros já haviam sido ostensivamente privados de qualquer direito na África do Sul O dualismo econômico da África do Sul chegou ao fim em 1994 mas não em virtude das razões sobre as quais teorizou Sir Arthur Lewis Não foi o curso natural do desenvolvimento econômico que pôs um ponto final nas leis antimiscigenação e nos bantustões Os negros sulafricanos protestavam e sublevavamse contra o regime que não lhes reconhecia os direitos básicos nem partilhava com eles os ganhos do crescimento econômico Após o levante de Soweto em 1976 os protestos foram crescendo em organização e força até culminarem na derrubada do Estado do apartheid Foi o progressivo empoderamento dos negros que se tornaram capazes de se organizar e insurgir que acabou pondo fim ao dualismo econômico da África do Sul do mesmo modo como a força política dos brancos sulafricanos o havia criado originalmente REVERSÃO DO DESENVOLVIMENTO A desigualdade existente hoje no mundo se deve ao fato de que durante os séculos XIX e XX certos países lograram tirar proveito da Revolução Industrial e das tecnologias e métodos de organização por ela acarretados ao passo que outros não A mudança tecnológica é apenas uma das forças motrizes da prosperidade mas talvez seja também a mais crítica Os países que não aproveitaram as novas tecnologias tampouco se beneficiaram de outros motores da prosperidade Como mostramos neste capítulo e no anterior tal lacuna deveuse às suas instituições extrativistas consequência ora da persistência de seus regimes absolutistas ora da falta de Estados centralizados Contudo este capítulo mostrou também que em diversos casos as instituições extrativistas subjacentes à pobreza desses países eram impostas ou pelo menos reforçadas pelo mesmíssimo processo que impulsionou o crescimento da Europa a expansão comercial e colonial europeia Com efeito a lucratividade desses impérios coloniais não raro dependia da destruição de unidades políticas independentes e economias indígenas pelo mundo ou da criação de instituições extrativistas basicamente do zero como nas ilhas do Caribe onde após o colapso quase total das populações nativas os colonizadores importaram escravos africanos e instauraram sistemas de plantation Jamais saberemos como teriam sido as trajetórias de cidadesestados independentes como as das Ilhas Banda em Aceh ou na Birmânia Mianmar sem a intervenção europeia Talvez passassem por suas próprias revoluções gloriosas locais ou avançassem paulatinamente em direção a instituições políticas e econômicas mais inclusivas baseadas no florescente comércio de especiarias e outras mercadorias valiosas De todo modo essa possibilidade foi extinta pela expansão da Companhia Holandesa das Índias Orientais que eliminou por completo qualquer esperança de desenvolvimento indígena nas Ilhas Banda ao promover o genocídio de seus habitantes ameaça que também levou as cidadesestados de muitos outros pontos do Sudeste Asiático a renunciar ao comércio A história de uma das mais antigas civilizações asiáticas a Índia é similar embora a reversão do desenvolvimento aí tenha se dado pelas mãos não dos holandeses mas dos britânicos A Índia era a maior produtora e exportadora de têxteis do mundo no século XVIII Seus madras e musselinas inundavam os mercados europeus e eram comercializados por toda a Ásia e mesmo a África Oriental O principal agente a transportálas até as Ilhas Britânicas era a Companhia Britânica das Índias Orientais Fundada em 1600 dois anos antes de sua contraparte holandesa a Companhia britânica passou todo o século XVII tentando estabelecer seu monopólio sobre as valiosas exportações indianas enfrentando a concorrência dos portugueses que tinham bases em Goa Chittagong e Bombaim e dos franceses com bases em Pondicherry Chandernagore Yanam e Karaikal Ainda mais prejudicial para a Companhia foi a Revolução Gloriosa como vimos no Capítulo 7 Seu monopólio concedido pelos monarcas Stuart viuse imediatamente desafiado após 1688 chegando a ser abolido por mais de uma década Foi uma perda de poder significativa como já vimos páginas 155156 porque os produtores têxteis britânicos conseguiram persuadir o Parlamento a banir a importação de madras o mais rentável item comercial da Companhia No século XVIII encabeçada por Robert Clive a Companhia das Índias Orientais mudou de estratégia e pôsse a erguer um império continental Na época a Índia estava fragmentada em um semnúmero de unidades políticas concorrentes ainda que muitas continuassem oficialmente sob o controle do imperador mogol de Délhi A Companhia começou por Bengala no leste eliminando os potentados locais nas batalhas de Plassey em 1757 e Buxar em 1764 apropriouse das riquezas regionais e assumiu e talvez tenha até intensificado as instituições tributárias extrativistas dos governantes mogóis da Índia Sua expansão coincidiu com a contração maciça da indústria têxtil indiana uma vez que afinal de contas já não havia mais mercado para esses artigos na GrãBretanha A retração foi acompanhada de um processo de desurbanização e recrudescimento da pobreza marcando o início de um longo período de reversão do desenvolvimento na Índia Não tardou para que em vez de produzir tecidos os indianos começassem a comprálos dos ingleses e a cultivar ópio para ser vendido na China pela Companhia das Índias Orientais O tráfico de escravos no Atlântico reproduziu o mesmo padrão na África ainda que partindo de condições muito menos desenvolvidas do que o Sudeste Asiático e a Índia Vários Estados africanos transformaramse em máquinas de guerra no intuito de capturar e vender escravos para os europeus À medida que o conflito entre as diferentes unidades políticas e Estados degenerou em beligerância contínua as instituições estatais que em muitos casos não haviam ainda atingido de todo modo um grau significativo de organização política esboroaram em vastas regiões da África preparando o terreno para as persistentes instituições extrativistas e os Estados falidos de hoje em dia que estudaremos mais à frente Nas poucas áreas do continente que escaparam ao tráfico de escravos como a África do Sul os europeus impuseram um conjunto distinto de instituições agora com o objetivo de criar uma reserva de mão de obra barata para suas minas e fazendas O Estado sulafricano engendrou um dualismo econômico que vedou a 80 da população o acesso à profissionalização à agricultura comercial e ao empreendedorismo Tudo isso não só explica por que a industrialização passou ao largo de vastas regiões do mundo mas também é uma boa síntese do modo como o desenvolvimento econômico pode às vezes alimentarse do subdesenvolvimento ou mesmo gerálo em alguma outra parte da economia doméstica ou global A 10 A DIFUSÃO DA PROSPERIDADE HONRA ENTRE LADRÕES INGLATERRA DO SÉCULO XVIII ou mais apropriadamente a GrãBretanha após a união em 1707 de Inglaterra País de Gales e Escócia tinha uma solução simples para lidar com criminosos longe dos olhos longe do coração ou pelo menos longe de encrencas Muitos eram os degredados para as colônias penais do império Até a Independência dos Estados Unidos os réus condenados eram deportados basicamente para as colônias americanas Depois de 1783 os Estados Unidos já não se mostravam dispostos a receber criminosos e as autoridades britânicas precisaram encontrar outro destino para acolhêlos Lembraramse primeiro da África Ocidental mas o clima caracterizado por doenças endêmicas como a malária e a febre amarela contra as quais os europeus não tinham qualquer imunidade era tão letal que as autoridades chegaram à conclusão de que seria inaceitável mandar mesmo condenados para o túmulo dos brancos A segunda opção seria a Austrália Sua orla marítima oriental fora explorada pelo Capitão James Cook grande homem do mar Em 29 de abril de 1770 Cook aportou em uma magnífica enseada que batizou de Botany Bay em homenagem à riqueza da flora ali encontrada pelos naturalistas que acompanhavam sua expedição Pareceu para os funcionários do governo britânico a localização ideal o clima era temperado e o lugar tão longe dos olhos e do coração quanto se poderia imaginar Uma frota de 11 navios lotados de condenados já estava a caminho de Botany Bay em janeiro de 1788 sob o comando do Capitão Arthur Phillip Em 26 de janeiro hoje celebrado como Dia da Austrália montaram acampamento em Sydney Cove no coração da atual cidade de Sydney Batizaram a colônia de Nova Gales do Sul A bordo de um dos navios o Alexander capitaneado por Duncan Sinclair havia um casal de condenados Henry e Susannah Cable Susannah fora sentenciada por roubo e a princípio recebera pena de morte A sentença fora depois comutada para 14 anos e degredo nas colônias americanas plano que cairia por terra com a independência dos Estados Unidos Nesse ínterim na Prisão do Castelo de Norwich Susannah conheceu Henry e se apaixonou pelo colega de presídio Em 1787 foi incluída na primeira leva de presos levados para a nova colônia penal na Austrália mas Henry não Àquela altura Susannah e Henry tinham um filhinho pequeno também chamado de Henry A decisão faria a família se separar Susannah foi levada para um navio penitenciário ancorado no Tâmisa mas a notícia daquele caso dilacerante se espalhou e chegou aos ouvidos de uma filantropa Lady Cadogan Esta organizou uma bemsucedida campanha para reunir os Cables Agora seriam ambos levados para a Austrália junto com o pequeno Henry Lady Cadogan também levantou 20 a fim de comprarlhe bens que receberiam na Austrália Embarcaram no Alexander mas chegando a Botany Bay o pacote com suas coisas havia desaparecido ou pelo menos foi o que o Capitão Sinclair alegou O que os Cables podiam fazer Não muito segundo as leis inglesas ou britânicas Embora em 1787 a GrãBretanha dispusesse de instituições políticas e econômicas inclusivas a inclusão por elas proporcionada não se estendia a condenados que eram praticamente destituídos de direitos Não podiam ter bens Definitivamente não podiam mover um processo judicial contra ninguém De fato não podiam nem mesmo apresentar provas perante um juiz Sabendo disso Sinclair provavelmente roubou o pacote Embora jamais o admitisse chegou a se gabar de que os Cables não poderiam processálo e tinha razão segundo a lei britânica Na GrãBretanha a questão toda teria terminado por ali Na Austrália não Um mandado de segurança foi impetrado ao Juiz David Collins nos seguintes termos Henry Cable e sua esposa novos colonos deste lugar possuíam antes de deixar a Inglaterra certo pacote embarcado no Alexander a cargo do Capitão Duncan Sinclair composto de roupas e diversos outros artigos apropriados à sua situação atual que foram coletados e adquiridos às custas de várias pessoas de índole caridosa para usufruto do dito Henry Cable sua esposa e filho Uma série de solicitações foi feita no sentido expresso de obter o referido pacote do Capitão do Alexander ora ancorado neste porto e sem outro efeito senão resgatar uma pequena parte do pacote mencionado contendo alguns livros o restante sendo de valor mais considerável permanecendo a bordo do dito navio Alexander cujo capitão ao que parece tem se mostrado negligente em providenciar que o mesmo seja devidamente apresentado aos seus respectivos donos conforme já citado Henry e Susannah sendo analfabetos não tinham condições de assinar o mandado limitandose a marcar um x cada um ao pé da página As palavras novos colonos deste lugar foram posteriormente riscadas mas eram altamente significativas Alguém deve ter imaginado que se Henry Cable e sua esposa fossem descritos como condenados não haveria esperança de que o caso avançasse tiveram então a ideia de chamálos de novos colonos o que deve ter sido um pouco demais para o Juiz Collins engolir e muito provavelmente foi ele mesmo quem mandou cortar essas palavras Não obstante o recurso funcionou Collins aceitou o caso e o levou a julgamento com um júri exclusivamente composto de soldados Sinclair foi convocado Por menos entusiasmado que Collins se mostrasse com o caso e embora os jurados fossem pessoas enviadas para a Austrália para vigiar condenados como os Cables estes conseguiram ganho de causa Sinclair contestou as acusações com base na condição de sentenciados do casal mas o veredicto se manteve e ele teve de pagar 15 libras Para chegar a esse veredicto o Juiz Collins não aplicou a lei britânica pelo contrário ignoroua Foi o primeiro caso civil da Austrália O primeiro caso criminal teria parecido igualmente bizarro àqueles na GrãBretanha Um condenado foi considerado culpado de roubar o pão de outro no valor de dois pence Na época tal caso jamais seria levado a julgamento uma vez que condenados não tinham permissão para possuir nada Contudo a Austrália não era a GrãBretanha e suas leis não se limitariam a reproduzir as inglesas Assim a Austrália não tardaria a diferenciarse da GrãBretanha tanto no tocante aos seus códigos criminal e civil quanto em uma variedade de instituições políticas e econômicas A colônia penal de Nova Gales do Sul era a princípio composta pelos condenados e seus guardas soldados em sua maioria Havia poucos colonos livres na Austrália até a década de 1820 e o degredo de condenados ainda que em Nova Gales do Sul tenha sido descontinuado em 1840 na Austrália Ocidental prosseguiria até 1868 Os condenados tinham de executar trabalhos compulsórios outra denominação para trabalhos forçados com os quais os guardas pretendiam lucrar A princípio os condenados não eram remunerados Recebiam apenas comida em troca das tarefas executadas Os guardas retinham sua produção Porém esse sistema como as tentativas feitas pela Virginia Company em Jamestown não funcionou muito bem à medida que os condenados não dispunham de incentivos para empenharse ou trabalhar direito eram açoitados ou banidos para a Ilha de Norfolk míseros 33 quilômetros quadrados de território situados a mais de 1500 quilômetros a leste da Austrália no meio do Oceano Pacífico Contudo visto que nem o degredo nem o açoitamento deram certo a alternativa foi oferecerlhes incentivos Não era uma ideia natural para soldados e guardas Condenados eram condenados e não se supunha que vendessem seu trabalho ou possuíssem bens Na Austrália porém não havia mais ninguém para tanto Havia claro os aborígenes chegando possivelmente a um milhão na época da fundação de Nova Gales do Sul Contudo espalhavamse por um vasto continente e sua densidade em Nova Gales do Sul era insuficiente para a criação de uma economia baseada em sua exploração Não havia na Austrália nenhuma opção latinoamericana Os guardas enveredaram assim por um caminho que acabaria levando a instituições ainda mais inclusivas do que aquelas existentes na GrãBretanha Os condenados recebiam um conjunto de tarefas de que se desincumbir e caso lhes sobrasse tempo poderiam trabalhar por conta própria e vender sua produção Os guardas também se beneficiaram das novas liberdades econômicas dos condenados Com o aumento da produção estabeleceram monopólios para venderlhes bens manufaturados Destes o mais rentável era o rum Nova Gales do Sul na época como qualquer outra colônia britânica era dirigida por um governador indicado pelo governo britânico Em 1806 a GrãBretanha designou William Bligh homem que 17 anos antes em 1789 fora capitão do HMS Bounty durante o célebre motim a bordo do Bounty Bligh era um disciplinador estrito característica que deve ter sido a principal causa do motim Seus modos continuavam os mesmos e ele imediatamente desafiou os monopolistas do rum o que deflagraria outro motim agora conduzido pelos monopolistas e encabeçado por um exsoldado John Macarthur Essa sequência de eventos que ficaria conhecida como Rebelião do Rum mais uma vez faria Bligh verse superado pelos rebeldes dessa vez em terra e não a bordo do Bounty Macarthur mandou prender Bligh As autoridades britânicas mais tarde enviariam mais soldados para lidar com a rebelião Macarthur foi preso e embarcado de volta para a GrãBretanha Logo porém acabou solto e voltou para a Austrália a fim de desempenhar um papel central tanto na política quanto na economia da colônia As origens da Rebelião do Rum eram essencialmente econômicas A estratégia de fornecer inventivos aos condenados garantiu uma receita polpuda para homens como Macarthur que chegou à Austrália como soldado da segunda esquadra aportada em 1790 Em 1796 pediu baixa do Exército a fim de ocuparse exclusivamente dos negócios Àquela altura já possuía sua primeira ovelha e percebeu que havia muito dinheiro a ganhar com os rebanhos de ovelhas e a exportação de lã A transposição das Montanhas Azuis perto de Sydney finalmente ultrapassadas em 1813 revelou do outro lado vastas pradarias o paraíso das ovelhas Macarthur logo seria o mais rico homem da Austrália e ele e seus colegas magnatas dos ovinos ficaram conhecidos como Posseiros Squatters uma vez que a terra em que apascentavam seus animais pertencia não a eles mas ao governo britânico A princípio porém isso não passava de um detalhe insignificante Os posseiros eram a elite da Austrália ou numa expressão mais adequada a Posseirocracia Squattocracy Mesmo sendo uma posseirocracia Nova Gales do Sul em nada se parecia com os regimes absolutistas do Leste Europeu ou das colônias sulamericanas Não havia servos como no Império AustroHúngaro e Rússia nem vastas populações indígenas a explorar como no México e Peru Nova Gales do Sul pelo contrário sob muitos aspectos assemelhavase a Jamestown Virginia a elite acabou percebendo serlhe interessante criar instituições econômicas significativamente mais inclusivas que as austrohúngaras russas mexicanas e peruanas Os condenados eram a única força de trabalho e a única maneira de incentiválos era pagarlhes salários pelo trabalho realizado Logo os condenados foram autorizados a tornaremse empreendedores e contratar outros sentenciados Principalmente uma vez cumprida sua pena tinham todos os direitos restaurados e até ganhavam terra Alguns começaram a enriquecer mesmo o analfabeto Henry Cable Em 1798 era dono de um hotel chamado Ramping Horse e possuía também uma loja Comprou um barco e entrou no comércio de peles de focas Em 1809 era proprietários de pelo menos nove fazendas de cerca de 2 mil quilômetros quadrados além de diversas lojas e casas em Sydney O conflito seguinte em Nova Gales do Sul se daria entre a elite e o resto da sociedade composta de condenados excondenados e suas famílias A elite encabeçada por exguardas e soldados como Macarthur incluía alguns dos colonos livres atraídos para a colônia pelo boom da economia da lã A maior parte das propriedades continuava nas mãos desse grupo e os excondenados e seus descendentes queriam o fim do degredo a oportunidade de julgamento por um júri de iguais e livre acesso à terra A elite não queria nada disso Sua maior preocupação era estabelecer títulos legais para as terras de que eram posseiros A situação era de novo similar aos eventos que haviam transpirado na América do Norte mais de dois séculos antes Como vimos no Capítulo 1 as vitórias dos servos submetidos a trabalhos forçados contra a Virginia Company foram seguidas por embates em Maryland e nas Carolinas Em Nova Gales do Sul os papéis de Lorde Baltimore e Sir Anthony Ashley Cooper foram desempenhados por Macarthur e os posseiros O governo britânico mais uma vez colocouse do lado da elite mesmo temendo também que um dia Macarthur e os posseiros se sentissem tentados a declarar independência O governo britânico enviou John Bigge para a colônia em 1819 a fim de conduzir uma comissão de inquérito a respeito da situação local Bigge ficou chocado com os direitos de que os condenados gozavam e surpreso com a natureza fundamentalmente inclusiva das instituições econômicas daquela colônia penal Recomendou uma revisão radical os condenados não poderiam mais possuir terra ficaria vedado o pagamento de salários aos condenados as anistias seriam restritas excondenados não ganhariam terras e as punições se tornariam ainda mais draconianas Bigge considerava os posseiros a aristocracia natural da Austrália e vislumbrava uma sociedade autocrática dominada por eles Não seria bem assim Enquanto Bigge tentava retroceder no tempo os excondenados seus filhos e filhas demandavam maiores direitos Mais ainda como nos Estados Unidos perceberam que para consolidar plenamente seus direitos econômicos e políticos precisariam de instituições políticas que os incluíssem no processo de tomada de decisões Exigiam eleições de que pudessem participar como iguais e assembleias e instituições representativas cujos cargos pudessem ocupar Os excondenados e seus filhos e filhas eram comandados pelo pitoresco escritor explorador e jornalista William Wentworth Wentworth fora um dos líderes da primeira expedição a cruzar as Montanhas Azuis que abrira as vastas planícies para os posseiros há nessas montanhas até hoje uma cidade batizada em sua homenagem Suas simpatias estavam com os condenados talvez por causa de seu pai que fora acusado de assalto e teve de aceitar o degredo na Austrália a fim de escapar ao julgamento e à possível condenação Àquela altura Wentworth era ferrenho defensor de instituições políticas mais inclusivas assembleia eleita julgamento com júri para excondenados e suas famílias e o fim do degredo para Nova Gales do Sul Fundou um jornal o Australian que dali por diante encabeçaria os ataques às instituições políticas existentes Macarthur não gostava de Wentworth como certamente não via com bons olhos suas reivindicações Elaborou uma lista dos correligionários do rival descrevendoos nos seguintes termos sentenciado à forca ele aqui aportou repetidas vezes açoitado no pelourinhom um judeu de Londres publicano judeu recémprivado de sua licença leiloeiro degredado por tráfico de escravos com frequência açoitado por aqui filho de dois condenados um trapaceiro afundado em dívidas um aventureiro americano um advogado sem caráter forasteiro recémfalido aqui em uma loja de música casado com a filha de dois condenados casado com uma condenada que tocava tamborimn Nem a vigorosa oposição de Macarthur e dos posseiros seria capaz de deter o bonde da história na Austrália porém A demanda por instituições representativas era forte e não podia ser suprimida Até 1823 o governador havia administrado Nova Gales do Sul mais ou menos por conta própria Naquele ano viu seus poderes serem limitados pela criação de um conselho designado pelo governo britânico A princípio os nomeados vinham das fileiras dos posseiros e da elite que excluía os condenados dentre os quais Macarthur mas isso não duraria muito Em 1831 o Governador Richard Bourke cedeu às pressões e pela primeira vez permitiu que excondenados tomassem parte de corpos de júri Os excondenados e na verdade muitos dos novos colonos livres queriam também o fim do degredo de condenados da GrãBretanha pois gerava concorrência no mercado de trabalho e pressionava os salários para baixo Os posseiros gostavam dos salários baixos mas perderam Em 1840 o degredo para Nova Gales do Sul foi banido e em 1842 instaurouse um conselho legislativo com dois terços dos membros eleitos o restante foi nomeado Os excondenados poderiam concorrer a cargos públicos e votar caso possuíssem patrimônio suficiente como era o caso de muitos Na década de 1850 a Austrália adotou o voto universal dos brancos adultos As reivindicações dos cidadãos excondenados e suas famílias encontravamse agora muito à frente do que William Wentworth havia imaginado a princípio Com efeito a essa altura ele já estava alinhado com os conservadores insistindo em um Conselho Legislativo que não fosse eleito Do mesmo modo como Macarthur contudo Wentworth não teria como deter o curso dos acontecimentos em direção a instituições políticas mais inclusivas Em 1856 os estados de Victoria que se separara de Nova Gales do Sul em 1851 e da Tasmânia seriam os primeiros lugares do mundo a adotar o voto efetivamente secreto nas eleições o que impediria a compra de votos e a coação Até hoje o métodopadrão para assegurar o voto secreto nas eleições é chamado em inglês voto australiano australian ballot As circunstancias iniciais em Sydney Nova Gales do Sul eram muito similares àquelas encontradas em Jamestown Virginia 181 anos antes ainda que os colonos de Jamestown fossem em sua maioria empregados em trabalhos forçados não criminosos condenados Nos dois casos as circunstâncias iniciais não permitiram a implementação de instituições coloniais extrativistas A colônia não dispunha de populações indígenas com densidade demográfica suficiente para possibilitar a exploração acesso imediato a metais preciosos como ouro ou prata ou solo e produtos agrícolas que tornassem viáveis economicamente latifúndios baseados em mão de obra escrava O tráfico de escravos ainda era vibrante na década de 1780 e Nova Gales do Sul poderia ter se enchido deles caso fosse rentável Não era Tanto a Virginia Company quanto os soldados e colonos livres que governavam a Nova Gales do Sul cederam às pressões criando gradualmente instituições econômicas inclusivas que se desenvolveriam junto com instituições políticas inclusivas o que se deu em Nova Gales do Sul com ainda menos conflitos do que na Virginia assim as tentativas subsequentes de reverter essa tendência fracassaram A AUSTRÁLIA COMO OS ESTADOS UNIDOS chegou às instituições inclusivas por um caminho distinto daquele tomado pela Inglaterra As mesmas revoluções que sacudiram a Inglaterra durante a Guerra Civil e depois a Revolução Gloriosa foram desnecessárias nos Estados Unidos ou Austrália graças às circunstâncias muito diferentes de nascimento desses países embora isso não signifique claro que as instituições inclusivas tenham se estabelecido sem nenhum conflito no processo os Estados Unidos por exemplo tiveram de se livrar do colonialismo britânico Na Inglaterra havia uma longa história de regime absolutista profundamente arraigado que precisou de uma revolução para ser extirpado Nos Estados Unidos e Austrália não havia nada disso Por mais que Lorde Baltimore em Maryland e John Macarthur em Nova Gales do Sul pudessem aspirar a esse papel não tinham condições de impor um controle tão estrito sobre a sociedade a ponto de seus planos frutificarem As instituições inclusivas estabelecidas nos Estados Unidos e Austrália permitiram à Revolução Industrial disseminarse sem demora por essas terras que começaram a enriquecer Os rumos tomados por esses países foram seguidos também por colônias como Canadá e Nova Zelândia Havia ainda outras opções para chegar a instituições inclusivas Vastas regiões da Europa Ocidental enveredaram ainda por um terceiro caminho impulsionadas pela Revolução Francesa que derrubou o absolutismo na França para em seguida gerar uma série de conflitos entre Estados que difundiriam as reformas institucionais por boa parte da Europa Ocidental A consequência econômica dessas reformas foi a emergência de instituições econômicas inclusivas na maior parte da Europa Ocidental a Revolução Industrial e o crescimento econômico ROMPENDO BARREIRAS A REVOLUÇÃO FRANCESA Por três séculos até 1789 a França foi regida por uma monarquia absolutista A sociedade francesa era dividida em três segmentos os chamados estados Os aristocratas a nobreza compunham o Primeiro Estado o clero o Segundo Estado e todos os demais o Terceiro Estado Cada um estava sujeito a diferentes leis e os dois primeiros estados possuíam direitos vedados ao resto da população A nobreza e o clero não pagavam impostos enquanto sobre os demais cidadãos incidiam os mais variados tributos como seria de esperar de um regime amplamente extrativista Com efeito não só a Igreja era isenta de tributação como também possuía vastas extensões de terra e podia impor seus próprios ônus aos camponeses Monarca nobreza e clero desfrutavam de um estilo de vida luxuoso ao passo que boa parte do Terceiro Estado vivia na mais abjeta pobreza Várias leis não só asseguravam uma posição econômica extremamente vantajosa à nobreza e ao clero mas também lhes conferiam poder político A vida nas cidades francesas do século XVIII era árida e insalubre A manufatura era regulamentada por guildas poderosas que geravam uma boa receita para seus membros mas impedia que forasteiros ingressassem nesses ofícios ou abrissem novos negócios O chamado Ancien Régime orgulhavase de sua continuidade e estabilidade A chegada de novos empreendedores e gente talentosa criaria instabilidade e não seria tolerada Se a vida nas cidades era dura nas aldeias provavelmente era pior Como vimos àquela altura a forma mais extrema de servidão que prendia as pessoas à terra e as obrigava a trabalhar para os senhores feudais e pagarlhes tributos já se encontrava havia muito em declínio na França Não obstante havia restrições à mobilidade e uma pletora de tarifas feudais que os camponeses franceses tinham de pagar ao monarca à nobreza e à Igreja Nesse contexto a Revolução Francesa foi um evento extremo Em 4 de agosto de 1789 a Assembleia Nacional Constituinte promoveu total reformulação das leis francesas promulgando uma nova Constituição O primeiro artigo determinava A Assembleia Nacional vem por meio desta abolir por completo o sistema feudal Decreta que dentre os direitos e deveres existentes feudais e censuais todos os quais oriundos ou representantes de laços reais ou pessoais de servidão serão abolidos sem direito a indenização Seu artigo nono prosseguia Privilégios pecuniários pessoais ou reais no pagamento de impostos estão extintos em definitivo Os impostos incidirão sobre todo cidadão e toda propriedade da mesma maneira e sob a mesma forma Serão considerados planos para que a carga tributária seja proporcional e universal mesmo para os seis últimos meses do corrente ano Desse modo de um só golpe a Revolução Francesa desmontou o sistema feudal e todas as obrigações e ônus por ele acarretados além de eliminar por completo as isenções fiscais da nobreza e do clero No entanto o que talvez tenha sido mais radical e mesmo impensável para a época foi o artigo décimo primeiro que estabelecia Todos os cidadãos sem distinção de nascimento são elegíveis para qualquer cargo seja de cunho eclesiástico civil ou militar e nenhum ofício será considerado inferior a outro Assim havia agora igualdade para todos perante a lei não só na vida e nos negócios cotidianos mas também na política As reformas revolucionárias prosseguiram após 4 de agosto Posteriormente foram abolidas a autoridade da Igreja para coletar tributos especiais e o clero foi convertido em funcionários do Estado Junto com a remoção das rígidas normas políticas e sociais vieram abaixo barreiras críticas às atividades econômicas As guildas e todas as restrições ocupacionais foram derrubadas criando condições mais igualitárias nas cidades Essas reformas foram o primeiro passo para pôr um ponto final no domínio dos monarcas franceses absolutistas Várias décadas de instabilidade e beligerância seguiramse às deliberações de 4 de agosto todavia fora dado um passo irreversível para rechaçar o absolutismo e as instituições extrativistas e substituílas por instituições políticas e econômicas inclusivas A essas mudanças se seguiriam outras reformas na economia e na política culminando por fim na Terceira República em 1870 que traria para a França o tipo de sistema parlamentar que a Revolução Gloriosa havia começado a instalar na Inglaterra A Revolução Francesa acarretou muita violência sofrimento instabilidade e guerra não obstante foi graças a ela que os franceses não se viram atados a instituições extrativistas que lhes bloqueassem o crescimento econômico e a prosperidade como aconteceu com os regimes absolutistas do Leste Europeu caso do Império AustroHúngaro e da Rússia por exemplo Como a monarquia absolutista francesa chegou à iminência da revolução de 1789 Afinal vimos que muitos regimes absolutistas conseguiram sobreviver por longos períodos mesmo em meio à estagnação econômica e a convulsões sociais Como costuma ocorrer na maioria dos casos de revoluções e transformações radicais foi uma confluência de fatores que abriu caminho para a Revolução Francesa intimamente ligados ao fato de que a GrãBretanha estava se industrializando rapidamente Evidentemente o caminho foi como de hábito contingente visto que as várias tentativas da Coroa de estabilizar o regime fracassaram e a revolução mostrouse mais bemsucedida na modificação das instituições na França e em outras regiões da Europa do que muitos poderiam supor em 1789 Muitas leis e privilégios na França eram resquícios dos tempos medievais Não só favoreciam o Primeiro e o Segundo Estados em detrimento da maioria da população como lhes concediam privilégios em relação à Coroa Luís XIV o ReiSol governou o país por 54 anos de 1661 até sua morte em 1715 embora tenha sido coroado de fato em 1643 aos 5 anos Consolidou o poder da monarquia dando continuidade ao aprofundamento do absolutismo iniciado séculos antes Muitos monarcas consultavam com frequência a chamada Assembleia dos Notáveis composta de aristocrataschave escolhidos a dedo pela Coroa Embora fosse um órgão eminentemente consultivo a Assembleia ainda funcionava como uma ligeira restrição ao poder do monarca Por esse motivo Luís XIV reinou sem convocála Em seu reinado a França obteve algum crescimento econômico por exemplo por meio de sua participação no comércio atlântico e colonial O habilidoso ministro das Finanças de Luís XIV JeanBaptiste Colbert supervisionou também o desenvolvimento de uma indústria sob os auspícios e controle do governo uma modalidade de crescimento extrativista O crescimento limitado beneficiava quase exclusivamente o Primeiro e o Segundo Estados Luís XIV decidiu também racionalizar o sistema tributário francês pois o Estado costumava ter dificuldade para financiar as guerras recorrentes em que se envolvia seu grande exército permanente e o luxuoso séquito consumo e palácios do rei A impossibilidade de onerar mesmo a pequena nobreza impunhalhe severas restrições à receita Apesar do crescimento econômico reduzido quando Luís XVI ascendeu ao poder em 1774 mudanças consideráveis tinham se dado na sociedade Ademais as dificuldades fiscais anteriores haviam degenerado em uma crise tributária de grandes proporções e a Guerra dos Sete Anos contra os britânicos entre 1756 e 1763 na qual a França perdeu o Canadá fora particularmente onerosa Um semnúmero de nomes de peso tentou equilibrar o orçamento real mediante a reestruturação da dívida e o aumento dos impostos entre eles AnneRobertJacques Turgot um dos mais famosos economistas de seu tempo Jacques Necker que desempenharia também um papel crucial após a revolução e Charles Alexander de Calonne Nenhum porém logrou êxito Calonne como parte de sua estratégia persuadiu Luís XVI a convocar a Assembleia dos Notáveis O rei e seus conselheiros esperavam que a Assembleia endossasse suas reformas do mesmo modo como Carlos I supunha que o Parlamento inglês concordaria em financiar um exército para combater os escoceses ao ser convocado em 1640 A Assembleia num movimento inesperado decretou que só um órgão representativo os EstadosGerais poderia avalizar tais reformas Os EstadosGerais eram de natureza muito distinta da Assembleia dos Notáveis Enquanto esta última era composta por nobres selecionados pessoalmente pela Coroa dentre os maiores aristocratas os primeiros compreendiam representantes dos três estados Sua última convocação se dera em 1614 Quando os EstadosGerais se reuniram em Versalhes em 1789 imediatamente ficou claro que não seria possível chegar a nenhum acordo Havia um impasse intransponível à medida que o Terceiro Estado viu a situação como a grande chance de aumentar seu poder político e tentou aumentar seu número de votos nos EstadosGerais iniciativa a que nobreza e clero opuseramse vigorosamente A reunião foi encerrada em 5 de maio de 1789 sem ter formulado nenhuma outra resolução além da decisão de convocar uma instância mais poderosa a Assembleia Nacional aprofundando a crise política O Terceiro Estado sobretudo os mercadores homens de negócios profissionais e artesãos que reivindicavam mais poder interpretaram esses desdobramentos como indícios de sua influência crescente Na Assembleia Nacional portanto exigiram participação maior nos procedimentos e direitos mais amplos em geral O apoio que receberam nas ruas de todo o país de cidadãos encorajados pelo desenrolar dos acontecimentos levou à recomposição da Assembleia como Assembleia Nacional Constituinte em 9 de julho Nesse ínterim os ânimos pelo país e sobretudo em Paris iam se exaltando Em reação os círculos conservadores ao redor de Luís XVI convenceramno a depor Necker o ministro das Finanças reformista o que provocou um recrudescimento da radicalização nas ruas O resultado foi a célebre derrubada da Bastilha em 14 de julho de 1789 Dali por diante a revolução começou a sério Necker foi reconduzido ao cargo e o revolucionário Marquês de Lafayette encarregado da Guarda Nacional de Paris Ainda mais notável que a queda da Bastilha foi a dinâmica da Assembleia Nacional Constituinte que em 4 de agosto de 1789 com confiança renovada promulgou a nova Constituição abolindo o feudalismo e os privilégios especiais do Primeiro e Segundo Estados A radicalização contudo fez a Assembleia se fragmentar dada a variedade de pontos de vista conflitantes acerca do formato que a sociedade deveria assumir O primeiro passo foi a formação de clubes locais dentre os quais destacavase o radical Clube Jacobino que mais à frente assumiria as rédeas da revolução Ao mesmo tempo os nobres debandavam os chamados émigrés Muitos incitavam também o rei a romper com a Assembleia e tomar providências por conta própria ou com a ajuda de potências estrangeiras como a Áustria terra natal da Rainha Maria Antonieta e onde a maioria dos émigrés fora se refugiar À medida que o povo nas ruas começava a detectar a ameaça iminente contra as conquistas da revolução nos últimos dois anos o extremismo ia ganhando corpo A Assembleia Nacional Constituinte promulgou a versão definitiva da Constituição em 29 de setembro de 1791 convertendo a França em monarquia constitucional e prevendo igualdade de direitos para todos os homens a extinção das obrigações ou tarifas feudais e a abolição de todas as restrições comerciais impostas pelas guildas A França ainda era uma monarquia mas o rei fora reduzido a um papel insignificante de fato fora privado de sua liberdade Entretanto a dinâmica da revolução viuse irreversivelmente modificada pela guerra que irrompeu em 1792 entre a França e a primeira coalizão encabeçada pela Áustria A guerra intensificou a determinação e o radicalismo dos revolucionários e das massas os chamados sansculottes que se traduz como sem calções por não poderem arcar com o estilo de calças então em voga O resultado desse processo foi o período conhecido como Terror sob o comando da facção jacobina encabeçada por Robespierre e SaintJust e deflagrada após as execuções de Luís XVI e Maria Antonieta levando às execuções não só de enorme número de aristocratas e contrarrevolucionários mas também de vários personagens centrais da própria revolução entre eles os antigos líderes populares Brissot Danton e Desmoulins Contudo o Terror logo saiu de controle e acabaria chegando ao fim em julho de 1794 por ocasião da execução dos próprios líderes inclusive Robespierre e Saint Just Seguiuse uma fase de relativa estabilidade primeiro sob o tanto insípido Diretório entre 1795 e 1799 e depois com o poder mais concentrado nas mãos de um triunvirato o Consulado composto de Ducos Sieyès e Napoleão Bonaparte Já durante o Diretório as façanhas militares do jovem General Napoleão Bonaparte haviam lhe granjeado fama considerável e sua influência só faria crescer após 1799 O Consulado não tardaria a converterse em governo pessoal de Napoleão Os anos entre 1799 e o fim do reinado de Napoleão 1815 testemunharam uma série de vitórias militares acachapantes para a França inclusive as de Austerlitz Jena Auerstadt e Wagram que colocaram a Europa continental de joelhos Permitiram também a Napoleão impor sua vontade suas reformas e seu código legal a um vasto território A queda de Napoleão após sua derrota final em 1815 desencadearia também um período de retrocesso com direitos políticos mais restritos e a restauração da monarquia francesa sob Luís XVII Nada disso porém faria mais que retardar a emergência última de instituições políticas inclusivas As forças liberadas pela revolução de 1789 puseram fim ao absolutismo francês e era inevitável que acarretassem mesmo que lentamente a emergência de instituições inclusivas Assim a França e as regiões da Europa para onde as reformas revolucionárias chegaram a ser exportadas tomariam parte do processo de industrialização já em andamento no século XIX EXPORTANDO A REVOLUÇÃO Às vésperas da Revolução Francesa em 1789 os judeus de toda a Europa eram submetidos a severas restrições Na cidade germânica de Frankfurt por exemplo sua vida era regulamentada pelas determinações de um estatuto que datava da Idade Média Não podia haver mais de 500 famílias judias na cidade todas obrigadas a viver em uma pequena área murada da cidade denominada Judengasse gueto judeu de onde não tinham permissão para sair à noite aos domingos ou durante festividades cristãs O Judengasse era incrivelmente apinhado Tinha 400 metros de comprimento mas não mais de 35 metros de largura em certos pontos menos de 3 metros Os judeus viviam sob constante repressão e regulação Todos os anos no máximo duas novas famílias podiam ser admitidas no gueto e no máximo 12 casais judeus podiam contrair matrimônio isso se ambos contassem mais de 25 anos Os judeus eram proibidos de cultivar a terra e comercializar armas especiarias vinho ou grãos Até 1726 tinham de usar certos emblemas dois círculos amarelos concêntricos para os homens e um véu listrado para as mulheres Todos tinham de arcar com uma capitação especial Quando estourou a Revolução Francesa vivia no Judengasse de Frankfurt um jovem e bemsucedido comerciante Mayer Amschel Rothschild Em princípios da década de 1780 Rothschild havia se estabelecido como o principal negociante de moedas metais e antiguidades em Frankfurt Como todos os judeus da cidade porém não podia abrir um negócio nem viver fora dos limites do gueto Mas a situação logo mudaria Em 1791 a Assembleia Nacional francesa emancipou os judeus do país Os exércitos franceses ocuparam também a Renânia e emanciparam os judeus da Alemanha Ocidental Em Frankfurt seu efeito seria mais abrupto e não totalmente intencional Em 1796 os franceses bombardearam a cidade arrasando metade do Judengasse no processo Cerca de dois mil judeus viramse sem teto e tiveram de se mudar os Rothschild entre eles Uma vez fora do gueto e livres agora da miríade de regulamentações que circunscreviam seu empreendedorismo podiam aproveitar novas oportunidades de negócios incluindo um contrato de fornecimento de grãos para o exército austríaco algo que até então lhes era vedado No fim daquela década Rothschild era um dos mais ricos judeus de Frankfurt e um homem de negócios estabelecido A emancipação plena teria de esperar até 1811 sendo plenamente implementada por Karl von Dalberg nomeado GrãoDuque de Frankfurt na reorganização da Alemanha promovida por Napoleão em 1806 Mayer Amschel disse então ao seu filho Você agora é um cidadão A luta pela emancipação judaica não havia ainda chegado ao fim uma vez que haveria reveses posteriores sobretudo no Congresso de Viena em 1815 que estabeleceria a configuração política pósnapoleônica Para os Rothschild porém não haveria retorno ao gueto Mayer Amschel e seus filhos logo teriam o maior banco da Europa do século XIX com filiais em Frankfurt Londres Paris Nápoles e Viena Sua história familiar não constituiu um acontecimento isolado Primeiro os exércitos revolucionários franceses e depois Napoleão invadiram grande parte da Europa continental e em quase todas as áreas ocupadas as instituições existentes eram remanescentes dos tempos medievais reservando o poder a reis príncipes e nobres e restringindo o comércio nas cidades e no campo Em muitas dessas áreas a servidão e o feudalismo eram muito mais importantes do que na própria França No Leste Europeu incluindo a Prússia e a parte húngara do Império AustroHúngaro os servos encontravamse presos à terra Na parte ocidental do continente essa forma mais estrita de servidão já havia desaparecido mas os camponeses deviam aos senhores feudais um semnúmero de taxas tributos e obrigações trabalhistas Por exemplo no estado de NassauUsingen estavam submetidos a 230 diferentes pagamentos tarifas e serviços As tarifas previam pagamento após um animal ser abatido chamado de dízimo de sangue havia também o dízimo das abelhas e o dízimo da cera Se uma propriedade fosse comprada ou vendida o senhor teria taxas a recolher As guildas que regulamentavam todos os tipos de atividade econômica nas cidades normalmente gozavam também de mais força nesses lugares do que na França Nas cidades de Colônia e Aachen na Alemanha Ocidental a adoção das máquinas de fiar e de tecer fora bloqueada por essas associações de ofícios Muitas cidades de Berna na Suíça a Florença na Itália eram controladas por umas poucas famílias Os líderes da Revolução Francesa e posteriormente Napoleão exportaram a revolução para essas terras derrubando o absolutismo pondo fim aos vínculos feudais com a terra abolindo as guildas e impondo igualdade perante a lei a noção fundamental de estado de direito que discutiremos em mais minúcias no próximo capítulo Assim a Revolução Francesa preparou o terreno não só na França mas também na maior parte do restante da Europa para as instituições inclusivas e o crescimento econômico que elas seriam responsáveis por deflagrar Como vimos alarmadas com o rumo tomado pelos acontecimentos em território francês várias potências europeias organizaramse em torno da Áustria em 1792 para atacar a França com o objetivo explícito de libertar o Rei Luís XVI mas na realidade para esmagar a Revolução Francesa Supunhase que os exércitos improvisados postos em campo pela revolução sofreriam uma derrocada Após algumas derrotas iniciais porém as tropas da nova república francesa acabaram vencendo uma guerra que haviam começado na defensiva Apesar de graves problemas organizacionais a superar os franceses estavam à frente dos demais países em uma inovação crucial o recrutamento em massa Introduzido em agosto de 1793 o sistema permitiu aos franceses pôr grandes exércitos em campo e adquirir vantagem militar que já beirava a supremacia antes mesmo de o decantado talento militar de Napoleão entrar em cena Mapa 17 O império de Napoleão O êxito militar inicial incentivou as lideranças da república a expandir as fronteiras do país no intuito de criar um amortecedor eficaz entre a nova república e os monarcas hostis da Prússia e da Áustria Os franceses logo se apoderaram dos Países Baixos Austríacos e das Províncias Unidas correspondendo à Bélgica e à Holanda atuais assumiram também boa parte da Suíça de hoje Os três lugares foram mantidos sob rigoroso controle durante toda a década de 1790 A Alemanha foi a princípio objeto de disputa acirrada mas em 1795 os franceses detinham total controle da Renânia a área ocidental da Alemanha na margem esquerda do Rio Reno fato que os prussianos foram obrigados a reconhecer no Tratado de Basileia Entre 1795 e 1802 os franceses dominaram a Renânia mas nenhuma outra região alemã Em 1802 a Renânia foi oficialmente incorporada à França Por toda a segunda metade da década de 1790 a Itália seria o principal campo de batalha no embate com os austríacos A anexação da Saboia pela França ocorreria em 1792 seguida de um impasse que se estenderia até a invasão por Napoleão em abril de 1796 Em sua primeira grande campanha continental em princípios de 1797 Napoleão havia conquistado quase todo o Norte da Itália exceto Veneza que estava em poder dos austríacos O Tratado de Campo Formio assinado com os austríacos em outubro de 1797 pôs fim à Guerra da Primeira Coalizão e reconheceu uma série de repúblicas sob domínio francês no Norte da Itália Entretanto os franceses continuaram expandindo seu controle sobre a Itália mesmo após a assinatura do tratado invadindo os Estados Pontifícios e fundando a República Romana em março de 1798 Em janeiro de 1799 Nápoles foi conquistada dando origem à República Partenopeia Com exceção de Veneza que permanecia austríaca a península italiana encontravase inteira sob domínio francês quer de modo direto como no caso de Saboia quer por meio de Estados satélites como as repúblicas Cisalpina Liguriana Romana e Partenopeia Houve novas idas e vindas na Guerra da Segunda Coalizão entre 1798 e 1801 que não obstante terminou com os franceses basicamente ainda no controle Seus exércitos revolucionários logo trataram de promover reformas radicais nas terras conquistadas abolindo os vestígios remanescentes da servidão e das relações feudais com a terra e impondo a igualdade perante a lei O clero foi destituído de seu status e poderes especiais e as guildas nas áreas urbanas foram extintas ou ao menos gravemente enfraquecidas Foi o que ocorreu nos Países Baixos Austríacos imediatamente depois da invasão em 1795 e nas Províncias Unidas onde os franceses fundaram a República Batava com instituições políticas muito similares às da França Na Suíça a situação era similar e guildas senhores feudais e Igreja foram derrotados os privilégios feudais foram extintos e as guildas abolidas e expropriadas O trabalho iniciado pelo exército revolucionário teve de uma forma ou de outra continuidade pelas mãos de Napoleão Seu objetivo maior era obter o firme controle dos territórios que conquistava e para tanto ele às vezes fazia acordos com as elites locais ou punha sua família e parceiros no comando como durante seu breve domínio da Espanha e da Polônia Entretanto Napoleão acalentava também o desejo genuíno de dar prosseguimento e aprofundar as reformas revolucionárias para tanto codificou o direito romano e as ideias de igualdade perante a lei em um sistema legal que ficaria conhecido como Código Napoleônico que ele considerava seu maior legado e pretendia impor em todos os territórios que controlava Evidentemente as reformas impostas pela Revolução Francesa e por Napoleão não eram irreversíveis Em determinados lugares como em Hanover Alemanha as antigas elites voltaram ao poder logo após a queda de Napoleão e a maior parte do que os franceses haviam conquistado perdeuse de vez Em muitos outros lugares porém o feudalismo as guildas e a nobreza foram destruídos ou enfraquecidos em caráter permanente Por exemplo mesmo depois da partida dos invasores em diversos casos o Código Napoleônico mantevese em vigor No fim das contas os exércitos franceses espalharam o sofrimento pela Europa mas também promoveram mudanças drásticas na situação geral Em grande parte da Europa foram extintas as relações feudais a influência das guildas o controle absolutista exercido por monarcas e príncipes o poderio econômico social e político do clero e os fundamentos do Ancien Régime que tratava as diferentes pessoas de maneira desigual com base no segmento social em que nasciam Essas mudanças criaram o tipo de instituição econômica inclusiva que permitiria à industrialização arraigarse nesses lugares Em meados do século XIX a industrialização encontravase em franco andamento em quase todas as regiões que estiveram sob controle francês ao passo que lugares como o Império AustroHúngaro e a Rússia que os franceses não conquistaram ou Polônia e Espanha onde seu domínio foi temporário e limitado mantiveramse de modo geral estagnados EM BUSCA DA MODERNIDADE No outono de 1867 Ōkubo Toshimichi um dos principais cortesãos do domínio de Satsuma no Japão feudal viajou da capital Edo hoje Tóquio até a cidade de Yamaguchi Em 14 de outubro encontrouse com líderes do domínio Chōshū Tinha uma proposta simples a fazer que juntassem forças marchassem com seus exércitos até Edo e derrubassem o xógum o governante supremo do país Àquela altura Ōkubo Toshimichi já tinha os domínios Tosa e Aki ao seu lado Uma vez que os líderes dos poderosos Chōshū concordaram formouse uma aliança secreta a Aliança Satcho Em 1868 o Japão era um país economicamente subdesenvolvido estando desde 1600 sob o domínio da família Tokugawa cujo soberano assumira o título de xógum comandante em 1603 O imperador japonês era uma figura decorativa com papel exclusivamente cerimonial Os xóguns Tokugawa eram os membros mais proeminentes de uma classe de senhores feudais que administravam e tributavam seus próprios domínios entre eles o de Satsuma pertencente à família Shimazu Esses senhores junto com seus vassalos militares os famosos samurais dirigiam uma sociedade similar à da Europa medieval com categorias ocupacionais rígidas restrições ao comércio e elevada carga tributária sobre os agricultores O xógum governava de Edo onde monopolizava e controlava o comércio exterior e bania os estrangeiros do país As instituições políticas e econômicas eram extrativistas e o Japão era pobre Contudo o xógum não dispunha de poder total Ainda que a família Tokugawa tivesse assumido o país em 1600 não tinha condições de controlar a todos No sul do país o domínio Satsuma mantinha relativa autonomia gozando até de permissão para manter atividades comerciais independentes com o mundo exterior através das Ilhas Ryūkyū Foi na capital Satsuma Kagoshima que Ōkubo Toshimichi nasceu em 1830 Sendo filho de samurai também ele seguiria o caminho do pai Seu talento logo chamou a atenção de Shimazu Nariakira senhor de Satsuma que não tardou a promovêlo na burocracia Na época Shimazu Nariakira já havia formulado um plano para usar tropas de Satsuma para derrubar o xógum Queria expandir o comércio com a Ásia e a Europa abolir as antigas instituições econômicas feudais e transformar o Japão em um Estado moderno Seu plano incipiente foi abortado por sua morte em 1858 Seu sucessor Shimazu Hisamitsu mostrouse mais circunspecto ao menos a princípio Ōkubo Toshimichi cada vez mais seguro de que o Japão precisava derrubar o xogunato feudal acabou persuadindo Shimazu Hisamitsu A fim de angariar apoio para sua causa trataram de maquiála com uma suposta irritação pelo esvaziamento do lugar do imperador O tratado já assinado por Ōkubo Toshimichi com o domínio Tosa alegava que país algum tem dois monarcas lar nenhum tem dois senhores o governo deve permanecer nas mãos de um só A verdadeira intenção contudo não era só restaurar o poder do imperador mas modificar por completo as instituições políticas e econômicas No lado dos Tosa um dos signatários do tratado foi Sakamoto Ryūma Enquanto os Satsuma e os Chōshū mobilizavam suas tropas Sakamoto Ryūma apresentava ao xógum um plano de oito pontos instandoo a abdicar a fim de evitar uma guerra civil Era um plano radical e embora a cláusula 1 estabelecesse que o poder político do país deve ser restituído à Corte Imperial sendo todos os decretos promulgados pela Corte compreendia muito mais do que a mera restauração do imperador As cláusulas 2 3 4 e 5 determinavam 1 Dois corpos legislativos uma Câmara Alta e outra Baixa serão estabelecidos e todas as medidas governamentais serão definidas com base na opinião geral 2 Homens talentosos entre os senhores nobres e pessoas em geral serão empregados como conselheiros e os cargos tradicionais do passado que tiverem perdido o propósito serão abolidos 3 As relações exteriores devem ser conduzidas de acordo com regulamentações adequadas elaboradas com base no senso comum 4 A legislação e as regulamentações de outrora serão postas de lado e um código novo e adequado será elaborado O xógum Yoshinobu concordou em abdicar e em 3 de janeiro de 1868 foi declarada a Restauração Meiji o Imperador Kōmei e seu filho Meiji quando um mês mais tarde o velho imperador faleceu foram reconduzidos ao poder Embora Edo e a capital imperial Quioto estivessem ocupadas por tropas Satsuma e Chōshū temiase que os Tokugawa tentassem reconquistar o poder e restaurar o xogunato Ōkubo Toshimichi queria vêlos esmagados para sempre Assim persuadiu o imperador a abolir o domínio Tokugawa e confiscarlhes as terras Em 27 de janeiro o antigo xógum Yoshinobu atacou forças Satsuma e Chōshū irrompeu a guerra civil que se estenderia até o verão quando os Tokugawa foram por fim derrotados Após a Restauração Meiji houve no Japão uma série de reformas institucionais transformadoras Em 1869 o feudalismo foi abolido e os 300 feudos restituídos ao governo central e convertidos em prefeituras sob o controle de um governador indicado As tributação era centralizada em um moderno Estado burocrático substituiu o antigo feudal Em 1869 foi introduzida a igualdade de todas as classes sociais perante a lei as restrições à migração e ao comércio internos foram abolidas A classe dos samurais foi extinta ainda que para tanto fosse preciso sufocar algumas rebeliões Introduziramse direitos individuais de propriedade sobre a terra e concedeuse a todos a liberdade de ingresso e prática de qualquer ofício O Estado dedicouse avidamente à construção de infraestrutura Em contraste com as atitudes dos regimes absolutistas com relação às ferrovias em 1869 o governo nipônico inaugurou uma linha de barcos a vapor entre Tóquio e Osaka e construiu a primeira estrada de ferro ligando Tóquio e Yokohama Começou também a desenvolver uma indústria manufatureira e Ōkubo Toshimichi como ministro das Finanças supervisionou os primórdios de um esforço coordenado de industrialização O senhor do domínio Satsuma havia assumido a dianteira desse movimento construindo fábricas de cerâmica canhões e fio de algodão e importando equipamentos têxteis ingleses a fim de criar a primeira fiação moderna de algodão no país em 1861 construiu também dois estaleiros Em 1890 o Japão era o primeiro país asiático a adotar uma Constituição escrita e estabelecer uma monarquia constitucional com Parlamento eleito a Dieta e Judiciário independente Tais mudanças foram decisivas para permitir ao Japão ser o maior beneficiário da Revolução Industrial na Ásia EM MEADOS DO SÉCULO XIX tanto a China quanto o Japão eram países pobres que definhavam sob regimes absolutistas Havia séculos que o governo chinês via com desconfiança toda e qualquer possibilidade de mudança Embora fossem muitas as semelhanças entre China e Japão o xogunato de Tokugawa também havia banido o comércio ultramarino no século XVII do mesmo modo como os imperadores chineses haviam feito antes e opunhase a mudanças políticas e econômicas havia também diferenças políticas notórias A China era um império burocrático centralizado regido por um imperador absoluto cujo poder sem dúvida sofria restrições das quais a mais importante era a ameaça de rebelião Durante o período de 1850 a 1864 por exemplo o sul da China inteiro foi assolado pela Rebelião de Taiping em que milhões pereceram no conflito direto ou sucumbiram à fome generalizada Entretanto a oposição ao imperador não era institucionalizada A estrutura das instituições políticas japonesas era outra Embora o xogunato houvesse reduzido o imperador a um papel decorativo como vimos o poder Tokugawa estava longe de ser absoluto e domínios como o dos Satsuma mantiveram não só a independência como até a capacidade de praticar comércio exterior por sua própria conta Como aconteceu no caso da França uma consequência significativa da Revolução Industrial inglesa para a China e o Japão foi a vulnerabilidade militar A China foi humilhada pelo poderio marítimo britânico na Primeira Guerra do Ópio entre 1839 e 1842 a mesma ameaça materializouse diante dos japoneses na Baía de Edo em 1853 sob a forma dos navios de guerra americanos comandados pelo Comodoro Matthew Perry A constatação de que o atraso econômico acarretava atraso também na esfera militar foi uma das forças motrizes por trás do plano de Shimazu Nariakira de derrubar o xogunato e desencadear as mudanças que acabariam levando à Restauração Meiji Os líderes do domínio Satsuma deramse conta de que o crescimento econômico e talvez até a sobrevivência dos japoneses só poderia ser obtido por meio de reformas institucionais às quais o xógum se opunha contudo porque seu poder estava vinculado ao conjunto de instituições existentes Para que as reformas fossem realizadas o xógum teria de ser derrubado e foi A situação era similar na China mas as diferenças nas instituições políticas iniciais tornavam muito mais difícil destronar o imperador o que só aconteceria em 1911 Em vez de reformar suas instituições os chineses tentaram fazer frente aos britânicos no campo militar por meio da importação de armamentos modernos Os japoneses optaram pela construção de sua própria indústria bélica Em consequência dessas diferenças iniciais cada país respondeu à sua própria maneira aos desafios do século XIX e Japão e China divergiram drasticamente face à circunstância crítica engendrada pela Revolução Industrial Enquanto as instituições nipônicas eram transformadas e sua economia enveredava por um caminho de rápido crescimento na China as forças favoráveis à mudança institucional não possuíam suficiente intensidade e as instituições extrativistas persistiriam inabaláveis até desandar de vez com a revolução comunista de Mao em 1949 ORGIGENS DA DESIGUALDADE MUNDIAL Este capítulo e os três anteriores contaram a história de como as instituições políticas e econômicas inclusivas surgiram na Inglaterra possibilitando a Revolução Industrial e por que certos países beneficiaramse da industrialização e enveredaram pelo caminho do crescimento ao passo que outros não ou pior ainda recusaramse terminantemente a admitir a implementação da indústria mesmo em seus primórdios O que determinava se o país ia embarcar ou não na industrialização eram basicamente suas instituições Os Estados Unidos que sofreram transformação similar à Revolução Gloriosa inglesa já haviam desenvolvido suas próprias instituições políticas e econômicas inclusivas no fim do século XVIII Seria por isso o primeiro país a explorar as novas tecnologias oriundas das Ilhas Britânicas e não tardaria em ultrapassar a GrãBretanha e assumir a dianteira da industrialização e da mudança tecnológica A Austrália seguiu um caminho parecido rumo a instituições inclusivas ainda que um pouco mais tarde e de forma menos notória Seus cidadãos assim como os ingleses e os norteamericanos precisaram lutar para construir instituições inclusivas Uma vez instauradas a Austrália daria início ao seu próprio processo de crescimento econômico Austrália e Estados Unidos conseguiram industrializarse e crescer rapidamente porque suas instituições relativamente inclusivas não bloquearam novas tecnologias inovações nem a destruição criativa Na maioria das demais colônias europeias a história já seria outra sua dinâmica seria oposta àquela da Austrália e dos Estados Unidos A inexistência de uma população nativa ou de recursos a serem extraídos tornou muito peculiar o colonialismo em ambos ainda que seus cidadãos tenham precisado lutar muito por instituições inclusivas e por seus direitos políticos Nas Ilhas Molucas assim como em muitas outras regiões colonizadas pelos europeus na Ásia no Caribe e na América do Sul os cidadãos não tinham a menor chance de vencer essa disputa Nesses lugares os colonos europeus impuseram uma nova modalidade de instituições extrativistas ou assumiram aquelas que encontravam a fim de extrair recursos valiosos de especiarias e açúcar a prata e ouro Em muitos desses casos desencadearam uma série de mudanças institucionais que reduziram muito a probabilidade da emergência de instituições inclusivas em alguns deles eliminaram explicitamente toda e qualquer forma de indústria ou instituições econômicas inclusivas que porventura existissem A maioria desses lugares não se veria em condições de beneficiarse da industrialização no século XIX ou nem mesmo no XX A dinâmica no resto da Europa foi também bastante diferente daquela da Austrália e Estados Unidos Enquanto a Revolução Industrial na GrãBretanha ganhava velocidade no fim do século XVIII a maioria dos países europeus era governada por regimes absolutistas controlada por monarcas e aristocratas cuja principal fonte de renda provinha das terras que possuíam ou dos privilégios comerciais de que desfrutavam graças a barreiras alfandegárias proibitivas A destruição criativa fomentada pelo processo de industrialização acabaria erodindo os lucros das lideranças e desviando recursos e mão de obra de suas terras As aristocracias sairiam perdendo economicamente com a industrialização E mais importante sairiam perdendo também politicamente à medida que o processo de industrialização sem dúvida produziria instabilidade e criaria desafios políticos ao seu monopólio do poder No entanto as transformações institucionais na GrãBretanha e a Revolução Industrial geraram novas oportunidades e desafios para os Estados europeus Embora houvesse absolutismo na Europa Ocidental a região compartilhava também boa parte das peculiaridades institucionais que haviam afetado a GrãBretanha no milênio anterior No Leste Europeu Império Otomano e China todavia a situação era muito diversa o que fez enorme diferença no tocante à disseminação da Revolução Industrial Do mesmo modo como a peste negra ou a ascensão do comércio atlântico a circunstância crítica engendrada pela industrialização intensificou as perenes disputas em torno das instituições em muitos países europeus Um fator central nesse sentido foi a Revolução Francesa de 1789 O fim do absolutismo na França abriu caminho para instituições inclusivas e acabaria levando os franceses a embarcar na industrialização e no rápido crescimento econômico A Revolução Francesa porém na verdade fez mais que isso exportou suas instituições invadindo e reformando à força as instituições extrativistas de vários países vizinhos Assim preparou o terreno para a industrialização não só na França mas também na Bélgica Holanda Suíça e partes da Alemanha e Itália Mais a leste a reação foi similar àquela que se seguiu à peste negra quando em vez de desmoronar o feudalismo se intensificou O Império Austro Húngaro a Rússia e o Império Otomano ficaram ainda mais para trás economicamente mas suas monarquias absolutistas ainda conseguiriam se sustentar no poder até a Primeira Guerra Mundial Em outros lugares do mundo o absolutismo mostrouse tão resiliente quanto no Leste Europeu o que se revelou particularmente verdadeiro na China onde a transição da dinastia Ming para a Qing engendrou um Estado comprometido com a construção de uma sociedade agrária estável hostil ao comércio internacional Na Ásia porém também havia peculiaridades institucionais significativas Se a China reagiu à Revolução Industrial do mesmo modo como o Leste Europeu a reação japonesa foi análoga à da Europa Ocidental Como na França foi preciso uma revolução para modificar o sistema aqui liderada pelos renegados senhores dos domínios Satsuma Chōshū Tosa e Aki Esses nobres derrubaram o xógum deflagraram a Restauração Meiji e colocaram o Japão no caminho das reformas institucionais e do crescimento econômico Vimos também como o absolutismo foi resiliente na longínqua Etiópia Em outras regiões do continente o mesmo ímpeto de comércio internacional que ajudou a transformar as instituições inglesas no século XVII aprisionou vastas áreas das Áfricas Ocidental e Central em instituições altamente extrativistas via tráfico de escravos o que destruiu sociedades em certos lugares enquanto levava à criação de Estados escravocratas e extrativistas em outros A dinâmica institucional que descrevemos acabaria determinando que países seriam capazes de tirar proveito das grandes oportunidades que se apresentaram a partir do século XIX e quais não conseguiriam fazêlo As origens das desigualdades mundiais que hoje observamos podem ser encontradas nessa divergência Salvo raras exceções os países ricos de hoje são aqueles que embarcaram no processo de industrialização e transformação tecnológica a partir do século XIX e os pobres são aqueles que não seguiram esse caminho O 11 O CÍRCULO VIRTUOSO A LEI NEGRA CASTELO DE WINDSOR a oeste de Londres é uma das grandes residências reais da Inglaterra No começo do século XVIII era cercado por uma grande floresta repleta de cervos embora não haja muitos resquícios dela hoje Um dos guardiães da floresta em 1722 Baptist Nunn viuse em meio a um violento conflito Em 27 de junho ele escreveu Os Negros chegaram no meio da noite e atiraram três vezes duas balas na janela do meu quarto e concordei em pagarlhes 5 guinéus em Crowthorne dia 30 Em outra anotação no diário de Nunn lêse Mais uma surpresa Apareceume um embuçado com uma mensagem de destruição Quem eram os misteriosos Negros que faziam ameaças atiravam em Nunn e exigiam dinheiro Os Negros eram grupos de homens locais que escureciam o rosto para não serem reconhecidos à noite Apareciam por todo o sul da Inglaterra nessa época matando e mutilando cervos e outros animais ateando fogo a fardos de feno e celeiros destruindo cercas e açudes Aparentemente não passavam de arruaceiros mas não era o caso A caça ilegal de cervos em terras pertencentes ao rei ou outros membros da aristocracia vinha acontecendo havia já algum tempo Na década de 1640 durante a Guerra Civil toda a população de cervos do Castelo de Windsor fora morta Após a Restauração em 1660 quando Carlos II subiu ao trono o parque de cervos foi repovoado Contudo os Negros não estavam apenas matando os animais para comer dedicavamse também à mera destruição Com que propósito Um elemento crucial da Revolução Gloriosa de 1688 foi o pluralismo de interesses representados no Parlamento Nenhum dos grupos mercadores industrialistas proprietários rurais ou aristocratas aliados a Guilherme de Orange e depois à Casa de Hanover que sucederia a Rainha Ana em 1714 teria força bastante para fazer valer sua vontade de maneira unilateral As tentativas de restaurar a monarquia Stuart prosseguiram durante a maior parte do século XVIII Após a morte de Jaime II em 1701 seu filho Jaime Francisco Eduardo Stuart o Velho Pretendente Old Pretender foi reconhecido como legítimo herdeiro da Coroa inglesa por França Espanha o papa e os partidários da monarquia Stuart na Inglaterra e Escócia os chamados jacobitas Em 1708 o Velho Pretendente tentou retomar o trono com apoio de tropas francesas mas sem êxito Nas décadas seguintes haveria uma série de revoltas jacobitas inclusive de grande porte em 1715 e 1719 Em 17451746 houve uma nova tentativa agora por parte do filho do Velho Pretendente Carlos Eduardo Stuart o Jovem Pretendente Young Pretender mas suas tropas foram derrotadas pelo exército britânico O partido político Whig que como vimos páginas 163164 fora fundado nos anos 1670 a fim de representar os novos interesses mercantis e econômicos foi a principal organização por trás da Revolução Gloriosa tendo dominado o Parlamento de 1714 a 1760 Uma vez no poder viramse tentados a usar sua posição recémalcançada para escorchar os direitos alheios esperando o bolo crescer para comêlo sozinhos Sob esse aspecto não eram diferentes dos reis Stuart mas seu poder estava longe de ser absoluto era restrito tanto por grupos rivais no Parlamento sobretudo o Partido Tory formado para oporse aos whigs e pelas próprias instituições por cuja implementação eles mesmos tanto haviam lutado a fim de fortalecer o Parlamento e impedir o surgimento de um novo absolutismo com o retorno dos Stuart A natureza pluralista da sociedade nascida da Revolução Gloriosa significava também que a população em geral mesmo aqueles sem representação formal no Parlamento havia ganhado poder nesse sentido os atos dos Negros eram exatamente a reação das pessoas comuns à percepção de que eram exploradas pelos Whigs O caso de William Cadogan bemsucedido general na Guerra da Sucessão Espanhola entre 1701 e 1714 e na supressão das revoltas jacobitas ilustra bem o tipo de abuso dos direitos dos cidadãos comuns pelos Whigs que acabaria provocando o fenômeno dos Negros Jorge I elevou Cadogan a barão em 1716 e depois a conde em 1718 Era também membro influente do Conselho de Regência de Juízes da Suprema Corte que presidia aos mais importantes assuntos de Estado além de atuar na prática como comandante em chefe Adquiriu um amplo terreno de cerca de quatro quilômetros quadrados em Caversham aproximadamente 30 quilômetros a oeste de Windsor Lá construiu uma mansão e jardins ornamentais com um parque de cervos de um quilômetro quadrado Todavia sua propriedade ergueuse sobre a violação dos direitos de seus vizinhos que sofreram desapropriações e viramse tolhidos em seus tradicionais direitos de criar animais e recolher lenha e turfa Cadogan enfrentou a ira dos Negros Em 1o de janeiro de 1722 e depois novamente em julho o parque foi assaltado por grupos montados e armados No primeiro ataque morreram 16 cervos O Conde Cadogan não foi o único As propriedades de muitos proprietários de terra e políticos notáveis também foram alvos dos Negros O governo Whig não deixaria aquilo passar em brancas nuvens Em maio de 1723 o Parlamento promulgou a Lei Negra estabelecendo uma lista de 50 novos delitos extraordinários passíveis de condenação à forca A Lei Negra transformou em crime não só portar armas mas também andar com o rosto enegrecido Aliás a lei logo receberia uma emenda tornando este último ponto também passível de enforcamento As elites Whig puseramse a implementar a lei com muito gosto Baptist Nunn montou uma rede de informantes na Floresta de Windsor a fim de descobrir a identidade dos Negros Logo vários foram presos Supostamente a transição da prisão à pena capital deveria ser rápida Afinal a Lei Negra já fora promulgada os Whigs dominavam o Parlamento o Parlamento dominava o país e os Negros estavam indo diretamente de encontro aos interesses de alguns Whigs poderosos Até Sir Robert Walpole secretário de Estado e depois primeiroministro e como Cadogan também membro influente do Conselho de Regência de Juízes da Suprema Corte estava envolvido Tinha interesses velados no Richmond Park no sudoeste de Londres criado por Carlos I a partir de terras públicas O parque também transgredia os direitos tradicionais da população local de criar animais caçar lebres e coelhos e catar lenha Todavia ao que parece a extinção desses direitos não vinha sendo posta em prática com rigor e a caça e o pastoreio prosseguiam até que Walpole conseguiu colocar o próprio filho encarregado do parque O lugar foi então fechado com a edificação de um muro e a instalação de armadilhas Walpole gostava de caçar cervos e mandou construir uma casa para hospedálo em Houghton no interior do parque o que imediatamente despertou a animosidade dos Negros locais Em 10 de novembro de 1724 um morador das cercanias do parque John Huntridge foi acusado de ajudar ladrões de cervos e de acobertar Negros conhecidos ambos crimes passíveis de enforcamento O inquérito contra Huntridge veio do alto instaurado pelo Conselho de Regência de Juízes da Suprema Corte dominado por Walpole e Cadogan Walpole chegou a obter pessoalmente provas da culpa de Huntridge junto a um informante local Richard Blackburn A condenação deveria ser favas contadas mas não foi Ao fim de um julgamento de oito ou nove horas o júri absolveu Huntridge em parte por razões processuais devido às irregularidades no modo como as provas haviam sido coletadas Nem todos os Negros ou os que simpatizavam com sua causa tiveram a mesma sorte de Huntridge Embora alguns outros também tivessem sido inocentados ou tivessem as penas comutadas muitos foram condenados à forca ou ao degredo na colônia penal preferida na época a América do Norte a lei em si permaneceria nos livros até ser abolida em 1824 Ainda assim a vitória de Huntridge é notável O júri era composto não de iguais de Huntridge mas de grandes proprietários de terras e fidalgos que deveriam ter sido simpáticos a Walpole Mas não era mais o século XVII quando a Câmara Estrelada limitavase a subscrever os desejos dos monarcas Stuart e servir lhes de instrumento repressivo contra seus oponentes e da qual os reis podiam remover os juízes cujas decisões lhes desagradassem Agora os Whigs também tinham de se dobrar ao estado de direito isto é o princípio de que a legislação não poderia ser aplicada de maneira seletiva nem arbitrária e de que ninguém está acima da lei O EPISÓDIO DA LEI NEGRA deixou claro que a Revolução Gloriosa havia instituído o estado de direito e que essa ideia estava se arraigando na Inglaterra e na GrãBretanha em geral impondo às elites limites bem mais estritos do que elas mesmas supunham Notese que estado de direito rule of law não é o mesmo que governar por decreto rule by law Por mais que os Whigs dispusessem de meios para promulgar uma legislação severa e repressiva que esmagasse a resistência das pessoas comuns teriam de enfrentar as restrições decorrentes do estado de direito Sua lei violava os direitos já estendidos a todos pela Revolução Gloriosa e pelas mudanças sofridas em seu rastro pelas instituições políticas que haviam derrubado por terra os direitos divinos dos reis e os privilégios das elites Era inevitável pois que tanto as classes privilegiadas quanto os que não pertenciam a elas oferecessem resistência à implementação do estado de direito Analisado a partir de uma perspectiva histórica o estado de direito é um conceito muito estranho Por que as leis deveriam ser aplicadas igualitariamente a todos Se o rei e a aristocracia possuem poder político e o resto não é natural que o que é justo para esses poderosos seja banido e passível de punição para os demais Com efeito o estado de direito não é concebível sob instituições políticas absolutistas é fruto do pluralismo político e das amplas coalizões que o propiciam Só quando os mais diversos indivíduos e grupos participam das decisões e do poder político é que a ideia de que todos devem ser tratados com justiça começa a fazer sentido No começo do século XVIII a GrãBretanha estava se tornando pluralista o bastante para que as elites Whig descobrissem que as próprias leis e instituições lhes imporiam restrições algo inerente ao estado de direito No entanto por que os Whigs e os parlamentares se submetiam a tais restrições Por que não usavam seu controle do Parlamento e do Estado para impingir uma implementação intransigente da Lei Negra e imporse aos tribunais quando suas decisões não os agradavam A resposta é muito reveladora da natureza da Revolução Gloriosa por que ela não se limitou a substituir o absolutismo antigo por uma nova versão do mesmo da relação entre o pluralismo e o estado de direito e da dinâmica dos círculos virtuosos Como vimos no Capítulo 7 a Revolução Gloriosa não foi a derrubada de uma elite por outra mas uma insurreição contra o absolutismo por uma ampla coalizão composta por proprietários rurais mercadores e manufaturadores além de certos grupos de whigs e tories O surgimento de instituições políticas pluralistas foi consequência dessa revolução O estado de direito nasceu também como subproduto desse processo Com muitos partidos sentados à mesa dividindo o poder era natural fazer as leis e restrições se aplicarem a todos eles para que nenhum dos envolvidos começasse a acumular poder demais e acabasse solapando os próprios fundamentos do pluralismo Daí a ideia de imposição de limites e restrições aos governantes essência do estado de direito ser intrínseca ao pluralismo engendrado pela ampla coalizão que compôs a oposição ao absolutismo dos Stuart Nesse contexto não surpreende que o princípio do estado de direito aliado à ideia de que os monarcas não eram detentores de direitos divinos tenha sido o argumento central contra o absolutismo Stuart Segundo o historiador britânico E P Thompson nesse embate empreenderamse enormes esforços no sentido de projetar a imagem de uma classe governante submetida ao estado de direito cuja legitimidade se baseasse no igualitarismo e na universalidade dessas formas jurídicas Ora querendo ou não os governantes acabaram se tornando prisioneiros da própria retórica jogaram os jogos do poder segundo as regras que mais lhes convinham mas não podiam quebrálas do contrário o jogo inteiro estaria perdido Botar o jogo a perder significaria desestabilizar o sistema e abrir caminho para o absolutismo por parte de um segmento da coalizão ampla ou mesmo correr o risco de que os Stuart retornassem Nas palavras de Thompson o que impedia o Parlamento de fundar um novo absolutismo era o fato de que eliminar a lei e as prerrogativas reais talvez ricocheteasse contra sua vida e suas propriedades Além disso era intrínseca à própria natureza do meio escolhido por eles os aristocratas mercadores etc que se insurgiram contra a Coroa para sua autodefesa a impossibilidade de reserválo para uso exclusivo de sua própria classe A lei em suas formas e tradições acarretava princípios de igualdade e universalidade que tinham de ser estendidos a todos os tipos e níveis de homens Uma vez instaurada a noção de estado de direito não só manteve o absolutismo a distância como instalou uma espécie de círculo virtuoso se as leis fossem aplicadas igualmente para todos nenhum indivíduo ou grupo nem mesmo Cadogan ou Walpole poderia erguerse acima da lei e as pessoas comuns acusadas de invasão de propriedade privada ainda teriam direito a um julgamento justo VIMOS COMO SURGEM instituições políticas e econômicas inclusivas Mas como fazem para se manter ao longo do tempo A história da Lei Negra e os limites à sua implementação são um bom exemplo do mecanismo de círculo virtuoso um poderoso processo de feedback positivo que assegura a preservação dessas instituições em face das tentativas de enfraquecêlas e de fato desencadeia forças que promovem maior inclusão A lógica dos círculos virtuosos decorre em parte do fato de que as instituições inclusivas baseiamse em restrições ao exercício do poder e em uma distribuição pluralista do poder político na sociedade inerentes ao estado de direito A possibilidade de determinado subgrupo impor sua vontade a outros sem nenhuma restrição mesmo que esses outros sejam cidadãos comuns como no caso de Huntridge põe em risco esse mesmo equilíbrio Se houvesse uma suspensão temporária no caso de camponeses protestando contra elites que se apropriassem de suas terras comunitárias que garantias haveria de que não ocorreria uma nova suspensão quando necessário E na próxima suspensão o que impediria a Coroa e a aristocracia de tirar o que os mercadores homens de negócios e proprietários rurais tivessem ganhado naquele meio século Com efeito na suspensão seguinte talvez todo o projeto de pluralismo desmoronasse porque um estreito conjunto de interesses assumiria o controle em detrimento da coalizão mais ampla O sistema político não poderia correr tal risco Foi o que fez do pluralismo e do estado de direito dele decorrente características persistentes das instituições políticas britânicas Veremos que uma vez estabelecidos o pluralismo e o estado de direito haveria demanda por um pluralismo crescente e uma participação mais ampla no processo político O círculo virtuoso nasce não só da lógica inerente do pluralismo e do estado de direito mas também porque instituições políticas inclusivas tendem a sustentar instituições econômicas inclusivas o que leva a uma distribuição de renda mais igualitária conferindo mais poder e autonomia a um amplo segmento da sociedade e igualando ainda mais as condições de participação no jogo político Limitase assim o que cada indivíduo pode obter mediante a usurpação de poder político e reduzemse os incentivos à recriação de instituições políticas extrativistas Esses fatores foram fundamentais na emergência de instituições políticas verdadeiramente democráticas na GrãBretanha O pluralismo cria também um sistema mais aberto permitindo o florescimento de mídias independentes e facilitando para os grupos interessados na continuidade das instituições inclusivas as tarefas de tomar conhecimento e de organizarse contra eventuais ameaças a essas instituições É extremamente significativo que o Estado inglês tenha abandonado a censura à imprensa a partir de 1688 Aliás os meios de comunicação desempenharam um papel de importância similar no empoderamento da população em geral e na continuidade do círculo virtuoso de desenvolvimento institucional nos Estados Unidos como veremos neste capítulo Embora o círculo virtuoso crie uma tendência para que as instituições inclusivas persistam não é inevitável nem irreversível Tanto na GrãBretanha quanto nos Estados Unidos as instituições políticas e econômicas inclusivas enfrentaram não poucos desafios Em 1745 o Jovem Pretendente conseguiu chegar com um exército até Derby a apenas 160 quilômetros de Londres a fim de derrubar as instituições políticas forjadas durante a Revolução Gloriosa Foi derrotado porém Mais consideráveis que os desafios de fora eram os potenciais desafios vindos de dentro que também poderiam ter levado ao solapamento das instituições inclusivas Como vimos no contexto do Massacre de Peterloo em Manchester 1819 página 162 e como veremos em mais detalhes em seguida as elites políticas britânicas chegaram a cogitar o uso da repressão para evitar ter de abrir ainda mais o sistema político mas recuaram a tempo Analogamente as instituições políticas e econômicas inclusivas nos Estados Unidos enfrentaram sérias dificuldades que poderiam perfeitamente têlas vencido mas não foi o caso E claro não estava predeterminado que tais desafios seriam superados É graças não só ao círculo virtuoso mas também ao reconhecimento do caráter contingente dos rumos da história que as instituições inclusivas britânicas e norte americanas conseguiram sobreviver e ganhar força substancial ao longo do tempo A LENTA MARCHA DA DEMOCRACIA A reação à Lei Negra mostrou aos britânicos comuns que eles tinham mais direitos do que jamais haviam se dado conta Podiam defender seus direitos tradicionais e interesses econômicos nos tribunais e no Parlamento por meio de petições e lobby Contudo tal pluralismo não havia ainda gerado uma democracia de fato A maioria dos homens adultos não tinha acesso ao voto nem as mulheres e subsistiam ainda diversas desigualdades nas estruturas democráticas existentes Tudo isso mudaria O círculo virtuoso de instituições inclusivas não só preserva o que já foi conquistado como também abre passagem para maior inclusão Muito provavelmente a elite britânica do século XVIII se defrontaria com sérios desafios ao seu controle do poder político Esse segmento da população havia ascendido ao poder arrostando o direito divino dos reis e preparando o terreno para a participação popular na política mas em seguida concedera esse direito a apenas uma pequena minoria Era só uma questão de tempo até que uma parcela cada vez maior da população reivindicasse o direito de tomar parte do processo político E nos anos que transcorreram até 1831 foi o que aconteceu As três primeiras décadas do século XIX assistiram a uma crescente agitação social na GrãBretanha basicamente em reação às crescentes desigualdades econômicas e à demanda por parte das massas desprovidas de direitos de maior representação política Às Revoltas Luditas de 18111816 nas quais os trabalhadores combateram a introdução de novas tecnologias que a seu ver levariam à redução de seus salários seguiramse outras em que se exigiam explicitamente direitos políticos a Revolta de Spa Fields Londres em 1816 e o Massacre de Peterloo Manchester em 1819 Na Revolta Swingo de 1830 trabalhadores rurais protestaram contra a queda do padrão de vida bem como contra a introdução de novas tecnologias Enquanto isso em Paris explodia a Revolução de Julho de 1830 Começava a se formar entre as elites um consenso de que o descontentamento estava chegando a um ponto crítico e a única maneira de apagar o estopim da agitação social e evitar uma revolução seria atendendo as demandas das massas e promovendo uma reforma parlamentar Não foi nenhuma surpresa portanto que a eleição de 1831 tenha girado praticamente em torno de um único tema reforma política Os Whigs quase 100 anos depois de Sir Robert Walpole mostraramse bem mais simpáticos aos desejos das pessoas comuns e aderiram à campanha pela ampliação dos direitos de voto Contudo isso implicou dilatação apenas ligeira do eleitorado O sufrágio universal ainda que só para os homens não estava em pauta Os Whigs venceram as eleições e seu líder Conde Grey tornouse primeiroministro O conde não era nenhum radical muito pelo contrário Ele e os Whigs pressionaram por reformas não por acreditarem que maior poder de voto seria algo mais justo nem por desejarem compartilhar o poder A democracia britânica não foi uma oferta da elite As massas basicamente se apropriaram dela beneficiadas pela maior autonomia que os processos políticos ocorridos na Inglaterra e no resto da GrãBretanha havia vários séculos lhes foram conferindo Foram encorajadas pela mudança de natureza das instituições políticas deflagrada pela Revolução Gloriosa As reformas foram concedidas porque a elite acreditava que elas seriam o único modo de assegurar a continuidade de seu poder mesmo que um pouco atenuado O Conde Grey em seu célebre discurso ao Parlamento em favor de reformas políticas disseo muito claramente Ninguém se opõe a parlamentos anuais sufrágio universal e voto secreto mais do que eu Meu objetivo não é favorecer mas pôr um ponto final em tais esperanças e projetos O princípio da minha reforma é prevenir a necessidade de uma revolução reformar para preservar não derrubar As massas não almejavam ao voto por si mesmo queriam ter uma voz que lhes permitisse defender seus interesses Isso foi bem compreendido pelo movimento cartista que encabeçou a campanha pelo sufrágio universal a partir de 1838 tendo tirado seu nome da Carta do Povo a qual por sua vez remetia a um paralelo com a Carta Magna O cartista J R Stephens explicou por que o sufrágio universal e o voto de todos os cidadãos eram cruciais para as massas A questão do sufrágio universal é muito simples e fundamental Quero dizer com sufrágio universal que todo trabalhador desta terra tem direito a um bom casaco nas costas um bom chapéu na cabeça um bom teto para abrigo de sua família e um bom jantar em sua mesa Stephens havia entendido bem que o sufrágio universal era a maneira mais duradoura de distribuir o poder pelas massas britânicas e assegurar um casaco um chapéu um teto e um bom jantar para cada trabalhador No fim das contas o Conde Grey conseguiu ao mesmo tempo assegurar a aprovação da Primeira Lei da Reforma e desarmar os ímpetos revolucionários sem nenhuma medida extrema em direção ao sufrágio universal As reformas de 1832 foram modestas limitandose a duplicar o direito de voto de 8 para cerca de 16 da população de homens adultos de cerca de 2 a 4 da população como um todo Aproveitaram para livrarse ainda dos municípios podres e conferir representação independente para os centros industriais em formação como Manchester Leeds e Sheffield Ainda permaneceram porém muitas questões por resolver Assim logo viriam à tona novas demandas pela ampliação do direito de voto e mais agitação social às quais se seguiria o aprofundamento das reformas Por que as elites britânicas cederam às reivindicações Por que o Conde Grey entendeu que uma reforma parcial a rigor extremamente parcial seria a única maneira de preservar o sistema Por que não tiveram alternativa senão escolher entre o menor de dois males reforma ou revolução em vez de apenas manter seu poder sem reforma nenhuma Não podiam ter feito o mesmo que fizeram os conquistadores espanhóis na América do Sul o que fariam os monarcas austrohúngaro e russo nas décadas seguintes quando o clamor por reformas chegou às suas terras e o que os próprios britânicos haviam perpetrado no Caribe e na Índia usar a força para asfixiar as reivindicações A resposta a essa pergunta é dada pelo círculo virtuoso As mudanças econômicas e políticas já ocorridas na GrãBretanha tornavam o uso da força para reprimir as demandas ao mesmo tempo desinteressante para a elite e cada vez menos viável Nas palavras de E P Thompson Quando as lutas de 17901832 indicaram que esse equilíbrio havia mudado os governantes da Inglaterra foram defrontados com alternativas alarmantes Poderiam dispensar o estado de direito desmantelar suas elaboradas estruturas constitucionais contradizer sua própria retórica e imporse pela força ou submeterse às próprias regras e abdicar de sua hegemonia foram dando passos hesitantes na primeira direção No fim das contas porém em vez de despedaçar sua própria autoimagem e renegar 150 anos de legalidade constitucional acabaram rendendose à lei Em outras palavras as mesmas forças que induziram a elite britânica a não pôr abaixo o estado de direito no episódio da Lei Negra também a levou a repudiar a repressão e o governo à força que mais uma vez poriam em risco a estabilidade do sistema inteiro Se na tentativa de implementar a Lei Negra a opção pelo enfraquecimento da lei teria solapado o sistema construído pelos mercadores homens de negócios e proprietários rurais na Revolução Gloriosa a instauração de uma ditadura repressora em 1832 o teria posto inteiramente a perder Com efeito os organizadores das manifestações em prol da reforma parlamentar tinham plena consciência da importância do estado de direito e seu simbolismo para as instituições políticas britânicas durante esse período e usavam sua retórica para explicitar esse ponto Uma das primeiras organizações a defender a reforma parlamentar chamavase Hampden Club em homenagem ao primeiro parlamentar a oferecer resistência a Carlos I no caso da tarifa naval evento crítico que desencadeou a primeira grande sublevação contra o absolutismo Stuart como vimos no Capítulo 7 Havia também um feedback positivo dinâmico entre as instituições políticas e econômicas inclusivas que tornava atraente esse curso de ação As instituições econômicas inclusivas acarretavam o desenvolvimento de mercados inclusivos induzindo a uma alocação de recursos muito mais eficiente maior estímulo ao investimento em educação e desenvolvimento de competências e inovações contínuas em tecnologia Todas essas forças estavam em ação na GrãBretanha de 1831 Sufocar as reivindicações populares e promover um golpe contra as instituições políticas inclusivas destruiria também esses ganhos e as elites que se opunham a uma maior democratização e inclusão provavelmente acabariam figurando entre os que perderiam suas fortunas em consequência dessa destruição Outro aspecto desse feedback positivo é que sob instituições políticas e econômicas inclusivas o controle do poder perdia centralidade No Império Austro Húngaro e na Rússia como vimos no Capítulo 8 os monarcas e a aristocracia tinham muito a perder com a industrialização e a reforma Em contrapartida na GrãBretanha do começo do século XIX graças ao desenvolvimento de instituições econômicas inclusivas havia muito menos em jogo não havia servos a coerção no mercado de trabalho era relativamente pequena e poucos monopólios eram protegidos por barreiras alfandegárias Agarrarse ao poder teria sido muito menos rentável para a elite britânica A lógica do círculo virtuoso tornava também cada vez mais impraticáveis eventuais medidas repressivas de novo em virtude do feedback positivo entre as instituições políticas e econômicas inclusivas As instituições econômicas inclusivas levam a uma distribuição de recursos mais equitativa que as extrativistas Desse modo conferem mais poder aos cidadãos de modo geral e criam assim condições mais igualitárias mesmo no tocante à disputa de poder o que torna mais difícil para uma pequena elite esmagar as massas em vez de ceder às suas demandas ao menos algumas delas As instituições inclusivas britânicas também haviam deflagrado a Revolução Industrial e a GrãBretanha já apresentava um elevado índice de urbanização Fazer uso de repressão contra um agrupamento urbano concentrado e parcialmente organizado de pessoas dotadas de algum grau de poder seria muito mais difícil do que reprimir camponeses ou servos dependentes Foi assim que o círculo virtuoso levou a GrãBretanha à Primeira Lei da Reforma em 1832 Mas era só o começo Havia ainda um longo caminho a percorrer rumo a uma democracia efetiva já que em 1832 a elite limitouse a oferecer aquilo que achava que devia e nada mais A questão da reforma parlamentar seria abordada pelo movimento cartista cuja Carta do Povo de 1838 incluía as seguintes cláusulas Um voto para cada homem de 21 anos de plena posse de suas faculdades mentais e que não esteja cumprindo pena por crime Voto a fim de proteger o eleitor no exercício de seu voto Nenhuma qualificação patrimonial para membros do Parlamento permitindo assim que os eleitores votem no nome de sua preferência seja rico ou pobre A remuneração dos membros possibilitando assim que um comerciante trabalhador ou outra pessoa honesta cumpra um mandato quando afastado de seus negócios para atender aos interesses do país Igualdade eleitoral assegurando a mesma representatividade para o mesmo número de eleitores em vez de permitir que eleitorados de pequeno porte engulam os votos dos grandes Parlamentos anuais apresentando assim o mais eficaz empecilho a subornos e chantagens uma vez que se um eleitor pode ser comprado uma vez a cada sete anos mesmo com o voto bolsa alguma teria condições de comprar o eleitorado sob o sistema de sufrágio universal a cada 12 meses e visto que os membros tendo sido eleitos por apenas um ano não teriam como desafiar e trair seus eleitores nesse contexto A palavra voto referese aqui ao voto secreto e ao fim das eleições abertas que até então facilitavam a compra de votos e a intimidação dos eleitores O movimento cartista organizou uma série de manifestações em massa e no decorrer de todo esse período o Parlamento discutiu continuamente a possibilidade de novas reformas Embora o cartismo tenha se desintegrado após 1848 foi sucedido pela União pela Reforma Nacional fundada em 1864 e pela Liga da Reforma fundada em 1865 Em julho de 1866 uma série de manifestações turbulentas no Hyde Park em prol das reformas voltou a colocar o assunto na ordem do dia do debate político A pressão gerou frutos sob a forma da Segunda Lei da Reforma de 1867 que duplicou o número total de eleitores finalmente alçando a classe trabalhadora à condição de maioria em todas as zonas eleitorais urbanas Pouco depois introduziuse o voto secreto e tomaramse medidas para eliminar as práticas eleitorais corruptas como a dos agrados que consistia basicamente numa compra de votos em troca dos quais os eleitores recebiam um agrado em geral dinheiro comida ou álcool O eleitorado novamente dobraria de tamanho com a Terceira Lei da Reforma de 1884 quando o direito de voto chegou a 60 dos homens adultos Após a Primeira Guerra Mundial a Lei da Representação Popular de 1918 estendeu o voto a todos os homens adultos com mais de 21 anos e a toda mulher acima de 30 que fosse contribuinte ou casada com um deles Por fim todas as mulheres receberiam o direito a voto nas mesmas condições dos homens em 1928 As medidas de 1918 negociadas durante a guerra foram fruto de uma permuta entre o governo e as classes trabalhadoras que eram necessárias tanto para lutar quanto para produzir munição Ademais o governo deve ter observado o radicalismo da Revolução Russa Em paralelo ao gradual desenvolvimento de novas instituições políticas inclusivas deuse um movimento em direção à multiplicação de instituições econômicas do mesmo tipo Uma das principais consequências da Primeira Lei da Reforma foi a revogação das leis do trigo em 1846 Como vimos no Capítulo 7 essas leis proibiam a importação de grãos e cereais mantendo seus preços altos e assegurando os lucros dos grandes proprietários de terras Os novos parlamentares de Manchester e Birmingham queriam trigo barato e salários baixos Ganharam e os interesses ruralistas sofreram uma derrota significativa As mudanças no eleitorado e outras dimensões das instituições políticas ocorridas no decorrer do século XIX foram seguidas por novas reformas Em 1871 o primeiro ministro liberal Gladstone abriu os órgãos governamentais a exames públicos tornandoo meritocrático e dando continuidade assim ao processo de centralização política e construção de instituições estatais iniciado durante a era Tudor Os governos desse período tanto liberais quanto tories introduziram considerável volume de legislações para regulamentar o mercado de trabalho Por exemplo as leis de senhores e servos que possibilitavam aos empregadores reduzir a mobilidade de seus empregados foram rechaçadas alterando a natureza das relações trabalhistas em favor dos trabalhadores Durante 19061914 o Partido Liberal sob a liderança de H H Asquith e David Lloyd George começou a usar o Estado para prestar número crescente de serviços públicos entre eles saúde e segurodesemprego pensões financiadas pelo governo salários mínimos e o compromisso com a tributação redistributiva Em decorrência dessas modificações fiscais a parcela do produto interno representada pela arrecadação de impostos mais que dobrou nas últimas três décadas do século XIX voltando a duplicar nas três primeiras décadas do século XX O sistema fiscal também se tornou mais progressivo de modo que os mais ricos arcavam com um ônus maior Enquanto isso o sistema educacional que até então era destinado basicamente à elite ou era comandado por denominações religiosas ou exigia dos pobres o pagamento de taxas tornouse mais acessível às massas a Lei da Educação de 1870 estabeleceu pela primeira vez o compromisso do governo com a prestação sistemática de educação universal A educação tornouse inteiramente gratuita em 1891 Em 1893 a idade para encerrar os estudos foi definida em 11 anos Em 1899 foi aumentada para 12 e introduziramse cláusulas especiais para os filhos de famílias necessitadas Em decorrência dessas mudanças a proporção de crianças de 10 anos matriculadas na escola que em 1870 estava em decepcionantes 40 saltou para 100 em 1900 Por fim a Lei da Educação de 1902 promoveu considerável expansão dos recursos destinados às escolas e instituiu as grammar schools escolas de gramática que viriam a ser o fundamento da educação secundária na GrãBretanha Com efeito o caso britânico uma ilustração do círculo virtuoso de instituições inclusivas constitui um exemplo de círculo virtuoso gradual As transformações políticas deramse inequivocamente no sentido de instituições políticas mais inclusivas e foram fruto das reivindicações das massas dotadas de cada vez mais poder e autonomia Por outro lado ocorreram de forma paulatina A cada década um novo passo às vezes menor outras vezes maior era dado rumo à democracia Cada passo foi cercado de conflitos e o resultado concreto de cada um foi contingente Entretanto o círculo virtuoso gerou forças que reduziram os ganhos dos que se agarrassem ao poder além de estimular o estado de direito tornando progressivamente mais difícil fazer uso de força contra aqueles que exigiam aquilo que essas mesmas elites haviam exigido dos monarcas Stuart Foi se tornando cada vez menos provável que o conflito degenerasse em revolução e aumentaram as chances de que fosse decidido em favor de maior inclusão Há grande virtude nesse tipo de transformação gradual é menos ameaçadora para a elite que a derrubada geral do sistema Cada passo é pequeno e faz mais sentido ceder a uma pequena reivindicação do que criar uma confrontação de grande porte o que explica em parte como as leis do trigo puderam ser abolidas sem mais querelas Em 1846 os proprietários rurais já não conseguiam mais controlar a legislação no Parlamento graças à Primeira Lei da Reforma Entretanto se em 1832 a ampliação do eleitorado a reforma dos burgos podres e a revogação das leis do trigo tivessem sido propostas todas ao mesmo tempo os proprietários rurais teriam oferecido resistência muito maior A realização primeiro de reformas políticas limitadas para só depois a abolição das leis do trigo entrar em pauta desarmou o conflito A transformação gradual também evitou aventuras por territórios desconhecidos Uma derrubada violenta do sistema obriga a que se erga algo inteiramente novo no lugar do que foi removido Foi o que aconteceu no caso da Revolução Francesa quando as primeiras experiências com a democracia levaram primeiro ao Terror retornando depois duas vezes à monarquia antes de finalmente conduzir à Terceira República francesa em 1870 Foi o caso também da Revolução Russa em que os anseios de muitos por um sistema mais igualitário que o do Império Russo engendrou uma ditadura unipartidária que se revelaria muito mais violenta sangrenta e viciosa do que o regime que viera substituir A reforma gradual era difícil nessas sociedades exatamente por faltar aí o pluralismo necessário e por serem altamente extrativistas Foi o pluralismo decorrente da Revolução Gloriosa e o estado de direito por ela introduzido que tornaram a mudança progressiva possível e desejável na GrãBretanha O comentarista inglês Edmund Burke conservador e ferrenho opositor da Revolução Francesa escreveu em 1790 É com infinita cautela que um homem deve arriscarse a pôr abaixo um edifício que em alguma medida tolerável respondeu por séculos aos objetivos comuns da sociedade ou a proporse a reerguêlo sem ter diante dos olhos modelos e padrões de comprovada utilidade Em termos gerais Burke equivocouse A Revolução Francesa veio substituir um edifício condenado e abriu caminho para instituições inclusivas não só na França mas em boa parte da Europa Ocidental Por outro lado sua cautela não era inteiramente despropositada O processo gradual da reforma política britânica iniciado em 1688 ganharia velocidade décadas após a morte de Burke e deveria sua maior eficácia justamente ao fato de sua natureza paulatina tornálo mais poderoso irresistível e em última instância duradouro DESMONTANDO TRUSTES As instituições inclusivas nos Estados Unidos tiveram origem nas lutas na Virginia em Maryland e nas duas Carolinas durante o período colonial páginas 1421 e foram reforçadas pela Constituição americana com seu sistema de restrições e separação de poderes A Constituição contudo não assinalou o fim de desenvolvimento das instituições inclusivas Como na GrãBretanha elas foram reforçadas por um processo de feedback positivo baseado no círculo virtuoso Em meados do século XIX todos os homens brancos mulheres e negros não podiam votar nos Estados Unidos As instituições econômicas tornaramse mais inclusivas por exemplo com a promulgação da Lei da Propriedade Rural em 1862 página 28 que tornou as terras de fronteira disponíveis aos colonos em potencial em vez de reserválas para as elites políticas Do mesmo modo como na GrãBretanha porém os desafios às instituições inclusivas nunca deixaram de existir de todo O fim da Guerra de Secessão americana marcou o início de um surto de crescimento econômico acelerado no Norte À medida que ferrovias indústria e comércio se expandiam algumas pessoas amealhavam vastas fortunas Estimulados pelo êxito econômico esses homens e suas empresas foram se tornando cada vez mais inescrupulosos e acabaram sendo apelidados de Barões Ladrões em virtude de suas práticas calculistas visando a consolidar monopólios e impedir a entrada de possíveis concorrentes no mercado ou ao menos de que estes encontrassem condições iguais de atuação Um dos mais notórios deles foi Cornelius Vanderbilt célebre pelas palavras De que me importa a lei Não tenho poder Outro desse grupo foi John D Rockefeller que fundou a Standard Oil Company em 1870 livrouse rapidamente dos adversários em Cleveland e tentou monopolizar o transporte e o varejo de petróleo e derivados Em 1882 havia criado um gigantesco monopólio na linguagem de hoje um truste Em 1890 a Standard Oil controlava 88 do fluxo de petróleo refinado nos Estados Unidos e Rockefeller tornouse o primeiro bilionário do mundo em 1916 Charges da época apresentam a Standard Oil como um polvo envolvendo não só a indústria petrolífera mas também o Congresso americano Quase tão infame foi John Pierpont Morgan fundador do moderno conglomerado bancário JP Morgan que mais tarde após uma série de fusões ao longo das décadas viria a ser o JPMorgan Chase Junto com Andrew Carnegie Morgan fundou a US Steel Company em 1901 primeira corporação com valor capitalizado de mais de US1 bilhão e de longe a maior siderúrgica do mundo Na década de 1890 começaram a surgir grandes trustes em quase todos os setores da economia muitos dos quais controlavam mais de 70 do mercado em seus respectivos segmentos Aí estavam incluídos muitos nomes familiares como Du Pont Eastman Kodak e International Harvester Tradicionalmente os Estados Unidos pelo menos no Norte e no Meio Oeste contavam com mercados relativamente competitivos e eram mais igualitários do que outras áreas do país sobretudo o Sul Nesse período porém a competição cedeu lugar ao monopólio e a desigualdade de riqueza deu um salto O pluralista sistema político americano já conferia a um amplo segmento de sua sociedade suficiente autonomia e poder para insurgirse contra tais abusos As vítimas das práticas monopolísticas dos Barões Ladrões ou os que objetavam à sua dominação inescrupulosa das indústrias começaram a organizarse contra sua atuação Assim se formou o movimento populista e em seguida o progressista O movimento populista nasceu de uma prolongada crise agrária que se abateu sobre o MeioOeste a partir de fins da década de 1860 A National Grange of the Order of Patrons of Husbandry Associação Nacional da Ordem dos Patronos da Agricultura cujos membros eram conhecidos como grangers fazendeiros foi fundada em 1867 para mobilizar os proprietários rurais contra práticas comerciais injustas e discriminatórias Em 1873 e 1874 os grangers conquistaram o controle de 11 assembleias legislativas no MeioOeste e o descontentamento do setor culminou na formação em 1892 do Partido Populista que obteve 85 da votação popular nas eleições presidenciais de 1892 Nas duas eleições seguintes os populistas apoiaram o candidato democrata derrotado William Jennings Bryan que adotou muitas de suas causas A oposição popular à disseminação dos trustes estava agora organizada na tentativa de contraporse à influência exercida por Rockefeller e outros Barões Ladrões na política nacional Pouco a pouco esses movimentos políticos começaram a exercer um impacto nas atitudes políticas e em seguida na legislação especialmente no tocante ao papel do Estado na regulamentação dos monopólios A primeira lei importante foi a Lei do Comércio Interestadual de 1887 que criou a Comissão do Comércio Interestadual e marcou o início do desenvolvimento da regulamentação federal do setor rapidamente seguida pela Lei Sherman Antitruste de 1890 A Lei Sherman até hoje uma peçachave da legislação antitruste americana seria o fundamento dos ataques aos trustes dos Barões Ladrões Importantes iniciativas contra esses trustes deramse após a eleição de presidentes comprometidos com a reforma e a imposição de restrições ao poder dos Barões Ladrões Theodore Roosevelt 19011909 William Taft 19091913 e Woodrow Wilson 19131921 Uma força política crucial por trás do movimento antitruste e pela imposição de uma regulamentação federal da indústria foi de novo o voto rural As primeiras tentativas de estados específicos ainda na década de 1870 de regulamentar as ferrovias vieram de organizações de fazendeiros Com efeito quase todas as 59 petições relacionadas a trustes enviadas ao Congresso antes da promulgação da Lei Sherman partiram de estados agrícolas provenientes de organizações como a Farmers Union Sindicato dos Fazendeiros Farmers Alliance Aliança dos Fazendeiros Farmers Mutual Benefit Association Associação para Benefício Mútuo dos Fazendeiros e Patrons of Animal Husbandry Patronos da Criação de Animais Os proprietários rurais encontraram um interesse coletivo na oposição às práticas monopolísticas da indústria Das cinzas dos populistas que entraram em vertiginoso declínio após jogar seu peso no respaldo aos democratas emergiram os progressistas um movimento heterogêneo de reforma com ênfase em muitas das mesmas questões A princípio aglutinaramse em torno da figura de Teddy Roosevelt vicepresidente de William McKinley que assumiu o mandato presidencial após o assassinato deste em 1901 Antes de ascender à presidência Roosevelt fora um obstinado governador de Nova York tendo trabalhado com afinco pela eliminação da corrupção na política e da máquina partidária Em seu primeiro pronunciamento perante o Congresso Roosevelt concentrou sua atenção nos trustes Defendeu que a prosperidade dos Estados Unidos baseavase na economia de mercado e na engenhosidade dos homens de negócios mas ao mesmo tempo há males graves e reais e uma arraigada crença do povo americano de que as grandes corporações conhecidas como trustes são em alguns de seus aspectos e tendências nocivas ao bemestar geral Tal certeza deriva não de um espírito de inveja ou deslealdade nem da falta de orgulho pelas significativas conquistas industriais que elevaram este país à vanguarda das nações que disputam a supremacia comercial Tampouco procede de uma falta de apreciação inteligente da necessidade de atender com novos métodos a condições comerciais cambiantes e sempre novas nem da ignorância do fato de que a combinação de capital no esforço de realizar grandes coisas é necessária quando o progresso mundial requer que grandes coisas sejam realizadas Baseiase isso sim na mais sincera convicção de que combinação e concentração devem ser não proibidas mas supervisionadas e dentro de limites razoáveis controladas E tratase a meu ver de uma convicção acertada Ele prosseguiu Deveria do mesmo modo figurar entre os objetivos daqueles que anseiam por melhores condições sociais livrar o mundo dos negócios de crimes de astúcia tanto quanto livrar o corpo político como um todo de crimes de violência Sua conclusão foi que no interesse de todo o povo a nação deveria sem interferir no poder de cada estado nas questões específicas assumir também o poder de supervisão e regulamentação de todas as corporações envolvidas em negócios interestaduais principalmente quando a corporação derivar uma parte de sua riqueza da existência de algum elemento ou tendência monopolísticos em sua constituição Roosevelt propôs que o Congresso instituísse uma agência federal com poder para investigar as questões relacionadas às grandes corporações e que se necessário se lançasse mão de uma emenda constitucional para a criação de tal órgão Em 1902 Roosevelt já havia usado a Lei Sherman para dividir a Northern Securities Company afetando os interesses da JP Morgan processos posteriores foram movidos contra Du Pont American Tobacco Company e Standard Oil Company Roosevelt ainda reforçaria a Lei do Comércio Interestadual com a Lei Hepburn de 1906 ampliando os poderes da Comissão do Comércio Interestadual o que lhe permitiria sobretudo inspecionar a contabilidade de ferrovias e estenderia sua autoridade para novas esferas O sucessor de Roosevelt William Taft processou os trustes com assiduidade ainda maior sua empreitada tendo por auge o desmembramento da Standard Oil Company em 1911 Taft também promoveu outras reformas significativas como a introdução de um imposto de renda federal que acompanhou a ratificação da Décima Sexta Emenda em 1913 O apogeu das reformas progressistas ocorreu com a eleição de Woodrow Wilson em 1912 Em seu livro lançado em 1913 A nova liberdade Wilson assinala Se o monopólio persistir terá sempre as rédeas do governo nas mãos Não guardo expectativas de que verei o monopólio conter a si mesmo Se houver neste país homens de porte grande o bastante para apoderarse do governo dos Estados Unidos eles o farão Wilson empenhouse em aprovar a Lei Cayton Antitruste em 1914 fortalecendo a Lei Sherman e criando a Comissão para o Comércio Federal a qual por sua vez assegurava a aplicação da Lei de Clayton Ademais aproveitando o impulso dado pela investigação empreendida pela Comissão Pujo liderada pelo congressista da Louisiana Arsene Pujo acerca dos trustes financeiros money trusts isto é a invasão da indústria financeira pelos monopólios Wilson tratou de intensificar a regulamentação do setor Em 1913 criou o Federal Reserve Board Conselho do Banco Central responsável por regular as atividades monopolistas no setor financeiro A ascensão dos Barões Ladrões e seus trustes entre o fim do século XIX e o começo do XX vem reiterar que como já salientamos no Capítulo 3 a presença de mercados não constitui em si garantia da existência de instituições inclusivas Os mercados podem vir a ser dominados por umas poucas empresas que cobrem preços exorbitantes e bloqueiam a entrada de novas tecnologias e rivais mais eficientes Os mercados quando abandonados à própria sorte podem perder o traço inclusivo deixandose cada vez mais dominar pelos poderosos em termos econômicos e políticos As instituições econômicas inclusivas demandam não mercados apenas mas mercados que sejam inclusivos e capazes de proporcionar condições e oportunidades econômicas igualitárias para a maioria da população A disseminação de monopólios respaldados pelo poder político da elite vai de encontro a esse ideal Por outro lado a reação aos trustes demonstra também que quando as instituições políticas são inclusivas geram uma força de resistência a eventuais afastamentos da inclusão nos mercados É o círculo virtuoso em ação as instituições econômicas inclusivas constituem a base sobre a qual as instituições políticas inclusivas podem florescer ao passo que estas restringem possíveis prejuízos às primeiras A derrocada dos trustes nos Estados Unidos em contraste com o que vimos no México páginas 2930 ilustra esse aspecto do círculo virtuoso Enquanto os mexicanos não contam com nenhum corpo político que restrinja o monopólio de Carlos Slim ao longo do último século os americanos lançaram mão incontáveis vezes das leis Sherman e Clayton para cercear a formação de trustes monopólios e cartéis garantindo assim que os mercados permaneçam inclusivos A experiência americana na primeira metade do século XX põe em evidência também a vital importância da liberdade de imprensa para o empoderamento de amplos segmentos da sociedade e por conseguinte o círculo virtuoso Em 1906 Roosevelt cunhou o termo muckraker baseado em um personagem literário o homem com o ancinho para juntar esterco muckrake em O peregrino de Bunyanp para descrever o que a seu ver constituía um jornalismo importuno A expressão pegou e passou a referirse àqueles jornalistas que lançando mão de métodos invasivos logravam expor tanto os excessos dos Barões Ladrões quanto a corrupção nas esferas políticas regional e federal Talvez o mais famoso deles tenha sido Ida Tarbell cuja History of Standard Oil Company História da Standard Oil Company de 1904 exerceu influência decisiva sobre a opinião pública colocandoa contra Rockefeller e seus interesses comerciais o que culminaria no desmembramento da Standard Oil em 1911 Outro desses jornalistas investigativos foi o advogado e escritor Louis Brandeis que mais tarde seria designado juiz da Suprema Corte americana pelo Presidente Wilson Brandeis denunciou uma série de escândalos financeiros em seu livro Other Peoples Money and How Bankers Use It O dinheiro dos outros e como os banqueiros o usam e exerceu considerável influência sobre a Comissão Pujo O magnata da imprensa William Randolph Hearst também desempenhou importante papel denunciativo Sua revista The Cosmopolitan publicou em 1906 uma série de artigos intitulada A Traição do Senado de autoria de David Graham Phillips que galvanizou a campanha pela adoção de eleições diretas para o Senado outra reforma progressista crucial que se concretizou com a promulgação em 1913 da Sétima Emenda à constituição americana Esses jornalistas investigativos foram fundamentais para induzir os políticos a tomar medidas contra os trustes Embora fossem detestados pelos Barões Ladrões as instituições políticas dos Estados Unidos os impediam de eliminálos ou silenciálos As instituições políticas inclusivas ensejam o florescimento de uma imprensa livre a qual por sua vez torna possível expor eventuais ameaças às instituições políticas e econômicas inclusivas ao conhecimento do público e oferecerlhes resistência Já sob instituições políticas extrativistas seja no absolutismo ou em governos ditatoriais tamanha liberdade é impossível o que permite aos regimes extrativistas cortar pela raiz a formação de qualquer oposição séria As informações divulgadas pela imprensa livre foram evidentemente cruciais durante a primeira metade do século XX nos Estados Unidos Sem elas a opinião pública norteamericana não teria tomado conhecimento da real extensão do poder e dos abusos dos Barões Ladrões nem teria se mobilizado contra os seus trustes COMPRANDO O JUIZ Franklin D Roosevelt candidato democrata e primo de Teddy Roosevelt foi eleito presidente em 1932 em meio à Grande Depressão Chegou ao poder com suficiente aprovação popular para implementar um ambicioso leque de políticas de combate à recessão Por ocasião de sua posse no começo de 1933 um quarto da força de trabalho encontravase desempregada e muitos estavam jogados na pobreza A produção industrial havia caído por mais da metade desde a irrupção da crise em 1929 e os investimentos estavam em colapso As políticas propostas por Roosevelt para enfrentar a situação ficaram conhecidas em seu conjunto como New Deal Ele havia conquistado uma vitória sólida com 57 dos votos e o Partido Democrata era majoritário tanto no Congresso quanto no Senado o que era mais do que bastante para a aprovação das medidas relativas ao New Deal Entretanto algumas dessas leis tiveram a constitucionalidade questionada e foram levadas a julgamento na Suprema Corte onde o capital eleitoral de Roosevelt não exercia influência quase nenhuma Um dos pilares centrais do New Deal era a Lei Nacional de Recuperação Industrial que tratava em seu Título I da recuperação industrial O Presidente Roosevelt e sua equipe acreditavam que a restrição da competição industrial a ampliação dos direitos dos trabalhadores de formar sindicatos e a regulamentação dos padrões de trabalho eram essenciais para o programa de recuperação O Título II instituía a Secretaria de Obras Públicas cujos projetos de infraestrutura incluíam marcos como a estação ferroviária da Thirtieth Street na Filadélfia a Ponte Triboroughq a Represa Grand Couleer e a Overseas Highway que ligaria Key West na Flórida ao continente Sancionada pelo Presidente Roosevelt em 16 de junho de 1933 a Lei Nacional de Recuperação Industrial imediatamente começou a ser questionada nos tribunais Em 27 de maio de 1935 a Suprema Corte decidiuse por unanimidade pela inconstitucionalidade de seu Título I Seu veredicto postulava em tom solene que condições extraordinárias podem exigir soluções extraordinárias No entanto condições extraordinárias não criam nem ampliam o poder constitucional Antes que saísse a decisão da Suprema Corte Roosevelt havia passado à etapa seguinte de seu plano e subscrevera a Lei da Previdência Social responsável pela introdução do moderno Estado de bemestar social nos Estados Unidos com pagamento de pensão para aposentados benefícios para os desempregados auxílio a famílias com dependentes menores de idade e alguns serviços relacionados a saúde pública e deficiências Aprovou também a Lei Nacional de Relações Trabalhistas que reforçou os direitos dos trabalhadores de organizar sindicatos realizar negociações coletivas e entrar em greve contra seus empregadores Todas essas medidas também foram questionadas na Suprema Corte Enquanto abriam caminho pelos meandros do Judiciário Roosevelt era reeleito em 1936 com enorme apoio popular 61 dos votos Com popularidade recorde Roosevelt não toleraria que a Suprema Corte desmantelasse seu programa de políticas públicas e expôs seus planos em um de seus Fireside Chatss transmitido ao vivo pelo rádio em 9 de março de 1937 Começou assinalando que em seu primeiro mandato políticas imprescindíveis haviam passado por um fio pelo crivo da Suprema Corte E prosseguiu Lembrome daquela noite de março quatro anos atrás quando me dirigi em rede nacional a vocês pela primeira vez Estávamos na época em meio a uma profunda crise bancária Pouco depois com autorização do Congresso pedimos à população que entregasse ao governo federal todo o ouro de que dispunha privadamente dólar por dólar A recuperação que presenciamos hoje é a prova cabal do acerto daquela política Quando porém quase dois anos mais tarde foi levada a julgamento pela Suprema Corte quase não teve sua constitucionalidade ratificada foram cinco votos contra quatro Bastaria um único voto diferente para que esta imensa nação se visse novamente mergulhada no mais absoluto caos Com efeito quatro juízes decidiram que o direito estabelecido por contrato privado de arrancar o couro de alguémt era mais sagrado que os objetivos centrais da Constituição de estabelecer uma nação duradoura Obviamente era um risco que não valia a pena correr outra vez Roosevelt continuou Na quintafeira passada descrevi o sistema de governo americano como um conjunto de três cavalos fornecido pela Constituição ao povo americano para arar suas terras Os três animais são naturalmente os três poderes o Legislativo o Executivo e o Judiciário Dois dos cavalos o Congresso e o Executivo trabalham hoje em sintonia enquanto o terceiro insiste em puxar para o outro lado Roosevelt salientou em seguida que a Constituição americana a rigor não concedia à Suprema Corte o direito de questionar a constitucionalidade da legislação embora esse papel tivesse sido assumido em 1803 Na época o Juiz Bushrod Washington havia estipulado que a Suprema Corte decidisse em favor da validade de determinada lei até que a violação da Constituição por ela perpetrada fosse comprovada sem sombra de dúvida Então atacou Nos últimos quatro anos a sólida regra de conferir aos estatutos o benefício da dúvida foi deixada de lado A Suprema Corte tem funcionado não como órgão judicial mas como agência legislativa Roosevelt defendeu que dispunha de suficiente capital eleitoral para mudar essa situação e que após cuidadosa consideração das reformas a propor o único método claramente constitucional é injetar sangue novo em todas as instâncias do nosso udiciário Alegou que os membros da Suprema Corte estavam sobrecarregados e que a carga de trabalho era excessiva para os mais velhos justamente aqueles que se opunham às suas leis Propôs então que todos os magistrados tivessem aposentadoria compulsória aos 70 anos e que como presidente ele gozasse de autonomia para nomear até seis novos juízes Essa ideia apresentada por Roosevelt como Projeto de Reorganização do Judiciário teria bastado para remover os magistrados empossados anteriormente por governos mais conservadores os mais ferrenhos opositores do New Deal Embora Roosevelt tivesse habilmente tentado obter apoio popular para essa medida as pesquisas de opinião indicavam que apenas cerca de 40 da população eram favoráveis ao seu plano Louis Brandeis era àquela altura juiz da Suprema Corte Embora simpatizasse com boa parte da legislação proposta por Roosevelt posicionou se contra as tentativas presidenciais de erodir o poder do mais alto tribunal do país e suas alegações de sobrecarga dos magistrados Ainda que os democratas de Roosevelt contassem com ampla maioria nas duas casas do Congresso a Câmara dos Representantes mais ou menos recusouse a lidar com o projeto de lei do presidente Roosevelt tentou então o Senado e o projeto foi enviado para o Comitê Judiciário da casa que realizou audiências de temperatura elevadíssima nas quais foram postas em pauta as mais variadas opiniões a respeito do projeto que acabaria retornando ao plenário do Senado com um parecer negativo segundo o qual o projeto constituiria um desnecessário vão e profundamente perigoso abandono dos princípios constitucionais sem qualquer precedente ou justificativa Por 70 votos a 20 o Senado decidiu devolvêlo ao Comitê para ser reescrito e todos os elementos de compra de juízes foram eliminados Roosevelt não conseguiria livrarse das restrições impostas pela Suprema Corte ao seu poder Não obstante tais limites porém houve concessões e as Leis da Previdência Social e das Relações Trabalhistas foram julgadas constitucionais Mais importante que o destino dessas duas leis entretanto foi a lição geral que se extraiu desse episódio Instituições políticas inclusivas não só impedem a anulação das instituições econômicas inclusivas como também resistem às tentativas de prejudicar sua própria continuidade Era do interesse imediato do Congresso e do Senado democratas que a Suprema Corte fosse dobrada e se assegurasse assim a sobrevivência da legislação relacionada ao New Deal Todavia do mesmo modo como as elites políticas britânicas no começo do século XVIII compreenderam que a suspensão do estado de direito poria em risco os ganhos que haviam arrancado da monarquia os congressistas e senadores americanos entenderam que caso o presidente pudesse reduzir a independência do Judiciário o equilíbrio de forças no sistema que protegia também a eles do presidente e assegurava a continuidade das instituições políticas pluralistas seria igualmente solapado Talvez Roosevelt chegasse em seguida à conclusão de que a obtenção da maioria no Legislativo demandava tempo e negociações demais e que melhor seria então governar por decreto derrubando completamente por terra o pluralismo e o sistema político americano Isso os congressistas sem dúvida não aprovariam mas Roosevelt então apelaria diretamente à população asseverando que o Congresso constituía um empecilho à tomada das iniciativas necessárias para fazer frente à Depressão Talvez lançasse mão da polícia para fechar o Congresso Parece um exagero Foi exatamente isso o que aconteceu no Peru e na Venezuela na década de 1990 Os Presidentes Fujimori e Chávez apelaram para seu capital eleitoral para fechar as portas dos respectivos Congressos que se recusavam a cooperar e em seguida reescreveram suas Constituições com reforço significativo dos poderes do presidente Foi exatamente o medo que os que compartilham o poder sob instituições políticas pluralistas têm de enveredar por esse caminho traiçoeiro que impediu tanto Walpole de manipular os tribunais britânicos na década de 1720 quanto o Congresso norteamericano de avalizar o plano de Roosevelt para assegurar o apoio da Suprema Corte Roosevelt defrontouse com o poder dos círculos virtuosos Todavia nem sempre essa lógica entra em funcionamento sobretudo em sociedades que têm algumas características inclusivas mas são extrativistas em sentido mais amplo Já vimos essa dinâmica em Roma e Veneza Outra ilustração é dada pela comparação entre a tentativa malograda de Roosevelt de comprar a Suprema Corte e projetos similares na Argentina onde tiveram lugar basicamente as mesmas disputas mas no contexto de instituições políticas e economicamente predominantemente extrativistas A Constituição argentina de 1853 criou uma Suprema Corte com atribuições análogas às de sua contraparte norteamericana Uma decisão de 1887 permitiu que a corte argentina assumisse o mesmo papel da americana com relação ao julgamento da constitucionalidade de leis específicas Em tese a Suprema Corte poderia ter se tornado um dos mais importantes componentes das instituições políticas inclusivas na Argentina mas o restante do sistema político e econômico mantevese altamente extrativista e não se chegou a promover no país nem o empoderamento de amplos segmentos da sociedade nem o pluralismo Como nos Estados Unidos a função constitucional da Suprema Corte também seria desafiada na Argentina Em 1946 Juan Domingo Perón foi eleito presidente por vias democráticas Perón excoronel havia ganhado destaque no cenário nacional pela primeira vez após um golpe militar em 1943 quando fora nomeado Ministro do Trabalho Nesse cargo costurou com os sindicatos e o movimento trabalhista uma coalizão política que seria crucial para sua eleição presidencial Logo após a vitória membros governistas da Câmara dos Deputados propuseram o impeachment de quatro dos cinco membros da Suprema Corte Várias acusações foram levantadas contra o tribunal Uma delas dizia respeito ao fato de este haver inconstitucionalmente aceitado a legalidade dos dois regimes militares de 1930 e 1943 o que não deixa de ser uma ironia visto que Perón fora um dos protagonistas do segundo golpe Outra tratava das leis derrubadas pela Corte do mesmo modo como fazia sua correspondente americana Em especial imediatamente antes da eleição de Perón para a presidência a Corte havia se decidido pela inconstitucionalidade do novo quadro de relações trabalhistas de Perón Assim como a Suprema Corte americana havia sido alvo de pesadas críticas por parte de Roosevelt em sua campanha de 1936 pela reeleição Perón fez o mesmo em sua campanha de 1946 Nove meses depois de deflagrado o processo de impeachment a Câmara de Deputados depôs três dos juízes tendo o quarto já abdicado do cargo O Senado aprovou a ação e Perón nomeou então quatro novos juízes O enfraquecimento da Corte teve o efeito evidente de libertar Perón de toda e qualquer restrição política Agora ele podia exercer um poder ilimitado do mesmo modo como fizeram os regimes militares na Argentina antes e depois de seu mandato presidencial Seus juízes recémnomeados por exemplo julgaram constitucional a condenação de Ricardo Balbín líder do principal partido de oposição a Perón o Partido Radical por desrespeito ao presidente De fato Perón governou como ditador Desde a bemsucedida compra da Suprema Corte por Perón tornouse norma na Argentina que cada novo presidente escolhesse a dedo seus próprios juízes para o mais alto tribunal do país Dessa maneira esvaziouse a instituição política que deveria impor limites ao poder do Executivo O regime de Perón foi derrubado do poder por outro golpe em 1955 sendo seguido por uma longa sequência de governos militares e civis alternandose no poder tanto uns quanto os outros designando seus próprios juízes Contudo a escolha de juízes da Suprema Corte argentina não era uma atividade restrita à transição entre governos civis e militares Em 1990 a Argentina por fim conheceu uma transição entre governos eleitos pelas vias democráticas um regime democrático sucedido por outro Àquela altura porém em suas relações com a Suprema Corte os regimes democráticos já não agiam de maneira muito diferente daquela dos militares Quem assumiu a presidência foi Carlos Saúl Menem do Partido Peronista Os juízes da Suprema Corte haviam sido empossados após a transição para a democracia em 1983 pelo presidente do Partido Radical Raúl Alfonsín Sendo uma transição democrática não deveria haver razão para Menem indicar sua própria Corte Antes mesmo das eleições porém Menem já havia mostrado a que viera procurando insistentemente ainda que nem sempre com êxito estimular ou até intimidar os integrantes do tribunal a abdicar Ficou célebre o episódio em que ele ofereceu uma embaixada ao juiz Carlos Fayt que este não só recusou como respondeu remetendo lhe um exemplar de seu livro Direito e ética com uma advertência Cuidado sou eu o autor desta obra Imperturbável três meses após assumir a presidência Menem enviou um projeto de lei para a Câmara dos Deputados propondo uma expansão da Suprema Corte de cinco para nove membros Um de seus argumentos era idêntico ao usado por Roosevelt em 1937 o tribunal estava sobrecarregado Aprovada sem demora pelo Senado e pela Câmara a leio permitiu a Menem nomear quatro novos juízes e obter assim a maioria desejada A vitória de Menem contra a Suprema Corte pôs em movimento aquela dinâmica traiçoeira que já mencionamos Seu próximo passo foi reescrever a Constituição e retirar a limitação quanto ao número de mandatos a fim de que ele pudesse concorrer à presidência novamente Após a reeleição Menem tentou reescrever a Constituição mas foi impedido não pelas instituições políticas argentinas mas por facções dentro de seu próprio partido o Peronista que resistiu aos seus impulsos de dominação pessoal Desde sua independência a Argentina sofre da maioria dos problemas institucionais que assolam a América Latina presa em um círculo vicioso não virtuoso Por conseguinte processos positivos como os primeiros passos rumo ao estabelecimento de uma Suprema Corte independente jamais chegaram a se arraigar Em um contexto pluralista nenhum grupo deseja ou se atreve a derrubar outro do poder por receio de que seu próprio poder venha a ser desafiado posteriormente Ao mesmo tempo a distribuição mais ampla de poder dificulta essa derrubada A Suprema Corte terá poder se receber apoio substancial de amplos segmentos da sociedade dispostos a rechaçar toda e qualquer tentativa de boicotar a independência do tribunal Foi o que aconteceu nos Estados Unidos mas não na Argentina onde os legisladores não hesitaram em enfraquecer a Corte mesmo prevendo que assim poriam em risco sua própria posição Um motivo é que a presença de instituições extrativistas faz com que haja muito a ganhar com a derrubada da Suprema Corte e os potenciais benefícios compensam os riscos FEEDBACK POSITIVO E CÍRCULOS VIRTUOSOS Instituições políticas e econômicas inclusivas não surgem de maneira espontânea Em geral são fruto de consideráveis conflitos entre as elites de um lado que resistem ao crescimento econômico e às mudanças políticas e do outro os que pretendem cercear o poder político e econômico das mesmas As instituições inclusivas surgem durante circunstâncias críticas como a Revolução Gloriosa na Inglaterra ou a fundação da colônia de Jamestown na América do Norte quando uma série de fatores vem enfraquecer o poder das elites fortalecendo seus opositores e gerando incentivos para a formação de uma sociedade pluralista O resultado do conflito político nunca é certo ainda que em retrospecto consideremos inevitáveis muitos acontecimentos históricos os rumos da história são sempre fortuitos Não obstante uma vez estabelecidas as instituições políticas e econômicas inclusivas tendem a criar um círculo virtuoso um processo de feedback positivo ampliando as chances de que essas instituições persistam e até mesmo se expandam O círculo virtuoso funciona através de diversos mecanismos Primeiro a lógica das instituições políticas pluralistas dificulta bastante a usurpação do poder por parte de um ditador facção governista ou mesmo um presidente bemintencionado como descobriram Franklin Roosevelt ao tentar livrarse das restrições impostas pela Suprema Corte ao seu poder e Sir Robert Walpole quando tentou promulgar sumariamente a Lei Negra Nos dois casos a maior concentração de poder nas mãos de um indivíduo ou pequeno grupo começou a solapar as bases das instituições políticas pluralistas e a verdadeira medida do pluralismo consiste exatamente em sua capacidade de fazer frente a tais tentativas O pluralismo também sacramenta a noção de estado de direito o princípio de que as leis devem ser igualmente aplicadas a todos algo impossível naturalmente sob uma monarquia absolutista Contudo o estado de direito por sua vez significa que as leis não podem ser usadas por determinado grupo para violar os direitos de outro Ademais o princípio do estado de direito abre a possibilidade de maior participação no processo político e de maior inclusão à medida que introduz a ideia de que as pessoas devem ser iguais não só diante da lei mas também do sistema político Esse foi um dos princípios que tornaram tão difícil para o sistema político britânico resistir à imperiosa demanda por mais democracia ao longo do século XIX abrindo caminho para a gradual extensão do direito a voto a todos os adultos Em segundo lugar como já vimos tantas vezes as instituições políticas inclusivas apoiam e são apoiadas por instituições econômicas inclusivas o que cria outro mecanismo de círculo virtuoso As instituições econômicas inclusivas anulam as mais egrégias relações econômicas extrativistas como a escravidão e a servidão reduzem a importância dos monopólios e fundam uma economia dinâmica fatores que reduzem os benefícios econômicos que se podem obter individualmente ao menos em curto prazo mediante a usurpação do poder político Porque as instituições econômicas já haviam se tornado suficientemente inclusivas na GrãBretanha no século XVIII a elite não só tinha menos a ganhar agarrandose ao poder como na verdade tinha muito a perder se lançasse mão de meios de repressão generalizada contra quem reivindicava mais democracia Essa característica do círculo virtuoso ao mesmo tempo em que tornou o processo gradual de democratização da GrãBretanha no século XIX menos ameaçador para a elite aumentou suas chances de êxito em contraste com a situação de regimes absolutistas como o do Império AustroHúngaro ou o do russo em que as instituições econômicas eram ainda intensamente extrativistas e por conseguinte onde a demanda por maior inclusão política mais à frente no século XIX sofreria maior repressão já que a elite tinha muito a perder se partilhasse seu poder Por fim as instituições políticas inclusivas possibilitam o florescimento de uma imprensa livre a qual por sua vez em geral fornece informações a respeito de eventuais ameaças às instituições inclusivas e mobiliza a oposição a elas como aconteceu durante o último quarto do século XIX e primeiro quarto do século XX quando a crescente dominação econômica dos Barões Ladrões ameaçava a essência das instituições econômicas inclusivas nos Estados Unidos Por mais que o resultado desses conflitos permanentes seja sempre fortuito é por meio desses mecanismos que o círculo virtuoso fomenta uma poderosa tendência das instituições inclusivas a persistir a resistir aos desafios e a expandirse como ocorreu na GrãBretanha e nos Estados Unidos Infelizmente como veremos no próximo capítulo as instituições extrativistas engendram forças igualmente intensas no sentido de sua própria sobrevivência é o processo do círculo vicioso T 12 O CÍRCULO VICIOSO O TREM JÁ NÃO VAI MAIS ATÉ BO ODO O TERRITÓRIO DE SERRA LEOA NA ÁFRICA OCIDENTAL tornouse colônia britânica em 1896 Originalmente a capital Freetown fora fundada em fins do século XVIII a fim de abrigar escravos libertos e repatriados Contudo quando esta se converteu em colônia britânica o interior do país ainda era composto por uma miríade de pequenos reinos Gradualmente na segunda metade do século XIX os britânicos estenderam seu domínio terra adentro mediante uma longa série de tratados com os governantes locais Em 31 de agosto de 1896 o governo colonial com base nesses acordos declarou a colônia um protetorado Os líderes mais importantes foram identificados e agraciados com um novo título chefe supremo No leste do país por exemplo no moderno distrito diamantino de Kono reinava Suluku um poderoso monarca guerreiro O Rei Suluku foi designado Chefe Supremo Suluku criandose a chefia de Sandor como unidade administrativa do protetorado Ao firmar acordos com o administrador britânico reis como Suluku não compreenderam que os documentos assinados seriam interpretados como cartas brancas para o estabelecimento de colônias Quando os britânicos tentaram instituir um imposto sobre cabanas uma tarifa de cinco xelins que incidiria sobre cada habitação em janeiro de 1898 os chefes sublevaramse em uma guerra civil que ficaria conhecida como Revolta do Imposto das Cabanas Embora tivesse início no norte adquiriu mais força e permanência no sul sobretudo em Mendeland dominada pelo grupo étnico mende A revolta seria logo subjugada mas serviu de advertência aos britânicos acerca das dificuldades de controlar o interior do país Eles já haviam começado a construir uma estrada de ferro ligando Freetown ao interior Os trabalhos tiveram início em março de 1896 e a linha chegou a Songo Town em dezembro de 1898 em plena rebelião Documentos parlamentares de 1904 registraram No caso da Sierra Leone Railways a Insurreição Nativa que irrompeu em fevereiro de 1898 teve como consequência a total interrupção das obras e a desorganização temporária dos operários Os rebeldes atiraramse sobre a ferrovia com o resultado de que todos os trabalhadores tiveram de ser recolhidos em Freetown Rotifunk hoje localizada junto à estrada de ferro a cerca de 90 quilômetros de Freetown estava na época inteiramente nas mãos dos rebeldes Com efeito Rotifunk não constava do planejamento da linha férrea em 1894 O trajeto original foi modificado após a conflagração da revolta de modo que em vez de dirigirse para o nordeste ela seguiu para o sul via Rotifunk e Bo rumo a Mendeland Os britânicos queriam rápido acesso à região dos mendes âmago da rebelião bem como a outras áreas potencialmente conflituosas do interior caso estourassem novos levantes Por ocasião da independência de Serra Leoa em 1961 os britânicos entregaram o poder a Sir Milton Margai e seu Partido Popular de Serra Leoa SLPP Sierra Leone Peoples Party que contava com apoio basicamente no sul sobretudo em Mendeland e no leste Sir Milton foi sucedido no cargo de primeiroministro por seu irmão Sir Albert Margai em 1964 Em 1967 o SLPP perdeu por estreita margem de votos uma muito contestada eleição para a oposição o Partido do Congresso de Todo o Povo APC All Peoples Congress Party liderado por Siaka Stevens Stevens era um limba do norte e o APC angariou a maior parte de seus correligionários junto aos grupos étnicos da região os limbas temnes e lokos Embora a ferrovia para o sul tivesse sido projetada pelos britânicos a princípio tendo em vista o domínio de Serra Leoa em 1967 seu papel era predominantemente econômico transportando a maior parte dos produtos de exportação do país café cacau e diamantes Os fazendeiros que cultivavam café e cacau eram mendes e a estrada de ferro era o meio de comunicação de Mendeland com o mundo A região havia dado a imensa contribuição para a eleição de Albert Margai em 1967 Ora Stevens estava muito mais interessado em agarrarse ao poder do que em promover as exportações de Mendeland Seu raciocínio era simples o que quer que fosse bom para os mendes era bom para o SLPP e ruim para seus interesses pessoais Assim decidiu extinguir o acesso ferroviário a Mendeland chegando a vender os trilhos e as composições a fim de assegurar a irreversibilidade da mudança Hoje em dia ao dirigir pelas estradas que ligam Freetown ao leste do país passase pelas dilapidadas estações de Hastings e Waterloo Não há mais trens para Bo Naturalmente a drástica iniciativa de Stevens foi fatal para alguns dos mais vibrantes setores da economia de Serra Leoa Como muitos dos líderes africanos pósindependência porém quando se tratava de escolher entre a consolidação de seu poder ou o estímulo ao crescimento econômico do país Stevens optava sem hesitar pela primeira Hoje não se pode mais ir de trem para Bo porque como o Czar Nicolau I que temia que as estradas de ferro levassem a revolução até a Rússia Stevens acreditava que os trens fortaleceriam seus adversários Como tantos outros governantes à frente de instituições extrativistas ele temia desafios ao seu poder político e estava disposto a sacrificar o crescimento econômico a fim de evitálos À primeira vista a estratégia de Stevens contrasta com a britânica Na realidade contudo verificase entre o domínio britânico e o regime de Stevens significativa continuidade que ilustra bem a lógica do círculo vicioso Stevens valeuse de métodos similares para extrair recursos do povo de Serra Leoa e continuava no poder em 1985 não por ter sido reeleito por votação popular mas por haver estabelecido a partir de 1967 uma violenta ditadura matando e ameaçando inimigos políticos sobretudo os membros do SLPP Autoproclamouse presidente em 1971 a partir de 1978 Serra Leoa passou a contar com um único partido político seu APC Assim Stevens logrou consolidar seu poder ainda que ao custo do empobrecimento da maior parte do interior do país Durante o período colonial os britânicos se valeram de um esquema de governo indireto em Serra Leoa como na maioria de suas colônias africanas Na base desse sistema estavam os chefes supremos que arrecadavam impostos distribuíam a justiça e mantinham a ordem Em vez de isolar os cacaueiros e cafeicultores o governo colonial os obrigava a vender sua produção para uma junta comercial estabelecida supostamente no intuito de ajudar os produtores rurais Os preços das commodities agrícolas variavam muito ao longo do tempo o cacau podia estar caro em um ano mas barato no seguinte e as receitas dos produtores acompanhavam tamanha oscilação A existência das juntas comerciais se justificava com o argumento de que seriam elas e não os produtores que absorveriam o impacto das flutuações de preço Quando os preços mundiais estivessem altos a junta pagaria aos produtores de Serra Leoa um valor inferior mas quando os preços caíssem faria o contrário Parecia em princípio uma boa ideia todavia a realidade mostrouse muito diferente A Junta Comercial de Produtos de Serra Leoa Sierra Leone Produce Marketing Board foi fundada em 1949 Evidentemente necessitava de uma fonte de renda para funcionar A maneira mais natural de obtêla consistia em pagar aos produtores um pouco menos do que receberiam fosse em anos bons ou ruins e os recursos assim angariados poderiam ser usados para custos administrativos e despesas gerais Não demorou para que o pouco menos se tornasse muito menos O Estado colonial usava a junta comercial como meio de onerar os produtores com uma pesada carga tributária Muitos acalentavam a expectativa de que as piores práticas dos governos coloniais na África subsaariana cessariam após a independência e que o uso de juntas comerciais para sobretaxar os produtores rurais finalmente chegaria ao fim Não foi o que aconteceu porém Com efeito a exploração extrativista dos produtores pelas juntas comerciais intensificouse ainda mais Em meados da década de 1960 os produtores de dendê recebiam da junta comercial 56 do preço mundial os cacaueiros 48 e os cafeicultores 49 Quando Stevens deixou a presidência em 1985 abdicando em favor de Joseph Momoh o sucessor que havia escolhido para assumir o cargo em seu lugar esses números eram 37 19 e 27 respectivamente Por pior que isso possa parecer ainda era melhor do que os valores obtidos pelos produtores durante o reinado de Stevens que giravam quase sempre em torno de 10 Ou seja 90 da receita dos produtores rurais eram extraídos pelo governo de Stevens e não para serem revertidos na prestação de serviços públicos como a construção de rodovias ou educação pelo contrário destinavamse ao enriquecimento pessoal do presidente e seus asseclas bem como à compra de apoio político Como parte de seu mecanismo de governo indireto os britânicos haviam também estipulado a vitaliciedade do cargo de chefe supremo Ora para ser elegível para tal posição era preciso pertencer a um clã dominante reconhecido A identidade dos clãs dominantes em cada chefia foi sendo desenvolvida ao longo do tempo mas baseavase essencialmente na linhagem tanto dos reis de cada área quanto das famílias da elite que haviam assinado tratados com os britânicos no fim do século XIX Os chefes eram eleitos mas não por meios democráticos Um órgão intitulado Autoridade Tribal cujos membros eram chefes locais menores ou indicados pelos chefes supremos chefes locais ou autoridades britânicas decidia quem se tornaria chefe supremo Seria de se imaginar que essa instituição colonial também fosse abolida ou ao menos reformada após a independência Assim como a junta comercial porém ela permaneceu intacta Até hoje os chefes supremos são encarregados da arrecadação tributária Não se trata mais de um imposto sobre cabanas mas de seu descendente direto uma capitação Em 2005 a Autoridade Tribal de Sandor elegeu um novo chefe supremo Só candidatos do único clã dominante o Fasuluku podiam se apresentar O vencedor foi Sheku Fasuluku trineto do Rei Suluku O comportamento das juntas comerciais e os sistemas tradicionais de propriedade agrária ajudam a entender por que em Serra Leoa e em boa parte da África subsaariana a produtividade agrícola é tão restrita Na década de 1980 o cientista político Robert Bates propôsse a desvendar os maus resultados africanos nesse setor muito embora os livros didáticos de economia apregoassem que ele deveria ser o mais dinâmico e chegou à conclusão de que a causa do fenômeno nada tinha a ver com os fatores geográficos nem com outros dos discutidos no Capítulo 2 que supostamente tornariam a produtividade agrícola intrinsecamente baixa Pelo contrário a explicação era simples as políticas de preços das juntas comerciais anulavam todo e qualquer incentivo para que os produtores investissem utilizassem fertilizantes ou preservassem o solo Ora as políticas das juntas comerciais eram tão desfavoráveis aos interesses do campo porque estes eram desprovidos de poder político Essas políticas de preços interagiam com outros fatores fundamentais tornando a propriedade insegura e solapando ainda mais os incentivos ao investimento Em Serra Leoa os chefes supremos não só garantem a lei e a ordem prestam serviços jurídicos e aumentam os impostos como também são os guardiões da terra Por mais que as famílias clãs e dinastias detenham direitos tradicionais e de uso sobre a terra em última instância são os chefes que determinam quem cultivará qual pedaço de chão Os direitos de propriedade de cada um só estarão garantidos à medida que a pessoa estiver ligada ao chefe e talvez até pertença ao clã reinante A terra não pode ser comprada vendida nem usada como garantia de empréstimos e quem não for nativo de determinada chefia não pode cultivar nenhum produto perene como café cacau ou dendê para que não se acabe estabelecendo a propriedade por usucapião O contraste entre as instituições extrativistas instauradas pelos britânicos em Serra Leoa e as inclusivas que se desenvolveram em outras colônias como a Austrália é bem ilustrado pelas diferentes maneiras de administrar os recursos minerais Foram descobertos diamantes em Kono leste de Serra Leoa em janeiro de 1930 eram diamantes de aluvião isto é que não se encontravam em minas profundas O método primário de exploração portanto era bateando nos rios Alguns cientistas sociais referemse às pedras desse tipo como diamantes democráticos por possibilitarem o envolvimento de muita gente no garimpo criando uma oportunidade potencialmente inclusiva Não em Serra Leoa porém Ignorando de bom grado a natureza intrinsecamente democrática da bateia o governo colonial instituiu um monopólio sobre todo o protetorado batizouo de Sierra Leone Selection Trust Monopólio de Seleção de Serra Leoa e o confiou à De Beers a gigante sulafricana da mineração diamantífera Em 1936 a De Beers também foi agraciada com o direito de estabelecer a Diamond Protection Force Força de Proteção ao Diamante DPF um exército privado que superaria em tamanho as forças do governo colonial Ainda assim a ampla disponibilidade dos diamantes aluviais dificultava muito o policiamento Na década de 1950 a DPF foi sobrepujada por milhares de garimpeiros ilegais eterna fonte de conflito e caos Em 1955 o governo britânico abriu alguns dos campos diamantíferos para mineradores licenciados fora do Sierra Leone Selection Trust muito embora a empresa permanecesse no controle das áreas mais prolíficas os campos de Yengema Koidu e Tongo Depois da independência a situação complicouse ainda mais Em 1970 Siaka Stevens efetivamente nacionalizou o Sierra Leone Selection Trust fundando a National Diamond Mining Company Sierra Leone Limited de que o governo a rigor Stevens detinha 51 do controle Era o início da implementação do plano de Stevens no sentido de controlar a mineração de diamantes no país Na Austrália do século XIX foi o ouro descoberto em 1851 em Nova Gales do Sul e no recémcriado estado de Victoria e não os diamantes que capturou a atenção de todos Como no caso dos diamantes de Serra Leoa tratavase de ouro de aluvião e era preciso definir como seria a sua exploração Houve quem como James Macarthur filho de John Macarthur o proeminente líder dos posseiros que já discutimos aqui páginas 216219 propusesse que se erguessem cercas ao redor das áreas de mineração e que o direito de monopólio fosse objeto de uma concorrência Queriam uma versão australiana do Sierra Leone Selection Trust Não obstante muitos no país desejavam livre acesso ao garimpo do ouro e o modelo inclusivo venceu em vez de estabelecerem um monopólio as autoridades australianas permitiram que qualquer um que pagasse uma licença anual de mineração pudesse prospectar e garimpar o terreno Não tardou para que os garimpeiros como esses aventureiros acabaram ficando conhecidos se tornassem uma poderosa força na política australiana sobretudo em Victoria desempenhando papel fundamental na adoção do sufrágio universal e do voto secreto Já vimos dois efeitos perniciosos da expansão europeia e do domínio colonial na África a introdução do tráfico negreiro transatlântico que estimulou o desenvolvimento de instituições políticas e econômicas de caráter extrativista no continente africano e a aplicação de leis e instituições coloniais visando a inibir o desenvolvimento de uma agricultura comercial que poderia ter feito frente à europeia A escravidão foi sem dúvida uma força central em Serra Leoa Nos tempos da colônia não havia um Estado centralizado forte no interior apenas diversos pequenos reinos rivais que se fustigavam continuamente em incursões para captura dos homens e mulheres uns dos outros A escravidão era endêmica possivelmente 50 da população eram constituídos por mão de obra escrava As condições de salubridade ambiental impossibilitavam a colonização branca em larga escala tal qual a que se deu na África do Sul portanto não havia brancos concorrendo com os africanos Ademais a inexistência de uma economia mineradora da escala de Joanesburgo significava que além da falta de demanda por mão de obra africana para as terras dos colonos não havia incentivos para a criação das instituições extrativistas do mercado de trabalho tão características do apartheid na África do Sul No entanto havia outros mecanismos em ação Os cafeicultores e cacaueiros de Serra Leoa não enfrentavam a concorrência dos brancos mas ainda tinham suas receitas expropriadas por meio de um monopólio governamental as juntas comerciais Serra Leoa sofria também com o governo indireto Em muitas regiões da África onde as autoridades britânicas pretendiam lançar mão desse sistema de colonização a população local não contava com uma autoridade centralizada que pudesse ser controlada Por exemplo no leste da Nigéria quando os colonizadores descobriram os povos igbos no século XIX eles não dispunham de chefes Foi preciso criálos e assim surgiram os chefes tenentes warrant chiefs Em Serra Leoa os britânicos baseariam o governo indireto nos sistemas de autoridade e instituições nativas já existentes Não obstante a despeito da fundamentação histórica dos indivíduos reconhecidos como chefes supremos em 1896 o governo indireto e os poderes por ele investidos nesses chefes mudaram por completo a estrutura política existente na região Para começar introduziram um sistema de estratificação social os clãs dominantes onde antes não havia nada similar Uma aristocracia hereditária veio instalarse onde antes havia uma situação muito mais fluida em que os chefes necessitavam de apoio popular Em seu lugar surgiu um sistema rígido no qual estes se mantinham em caráter vitalício graças a seus patronos em Freetown ou na GrãBretanha praticamente sem ter de prestar contas àqueles que governavam Os britânicos trataram de subverter as instituições locais também de outras maneiras por exemplo substituindo líderes legítimos por quem se mostrasse mais cooperativo Com efeito a família Margai que forneceu os dois primeiros primeirosministros da Serra Leoa independente assumira o poder na chefia do Baixo Banto Lower Banta quando por ocasião da Revolta do Imposto das Cabanas aliouse aos britânicos contra o então chefe Nyama Nyama foi deposto e os Margai tornaramse chefes assim permanecendo até 2010 O mais notável é o grau de continuidade entre a Serra Leoa colonial e a independente Os britânicos criaram as juntas comerciais e as usaram para tributar os produtores rurais Os governos póscoloniais impuseram o mesmo extrativismo de forma ainda mais intensa Os britânicos implementaram o sistema de governo indireto por meio dos chefes supremos Os governos posteriores à independência não só não rejeitaram essa instituição colonial como pelo contrário também a adotaram na administração pública Os britânicos estabeleceram um monopólio sobre a exploração de diamantes e tentaram excluir os garimpeiros africanos Os governos pós independência fizeram o mesmo É verdade que os britânicos acreditavam que a construção de ferrovias seria uma boa forma de dominar Mendeland ao passo que Siaka Stevens pensava o contrário contudo os primeiros podiam confiar em seu exército e sabiam que poderiam enviar suas tropas para Mendeland caso estourasse uma rebelião Stevens por sua vez não podia se dar a esse luxo Como em diversas outras nações africanas Forças Armadas fortes representariam uma ameaça ao poder de Stevens que por essa razão emasculouas reduzindo seu tamanho e privatizando a violência por meio de unidades paramilitares criadas especialmente para esse fim e leais somente a ele Nesse processo ele precipitou o declínio da já reduzida autoridade estatal existente em Serra Leoa Em lugar do exército veio primeiro a Internal Security Unit Unidade de Segurança Interna a ISU sigla que o sofrido povo serraleonense traduzia como I Shoot U eu atiro em você Depois veio a Special Security Division Divisão de Segurança Especial a SSD apelidada pelo povo de Siaka Stevenss Dogs cães de Siaka Stevens Por fim a ausência de um exército dando sustentação ao regime acabaria sendo sua ruína Foi um grupo de apenas 30 soldados encabeçados pelo Capitão Valentine Strasser que derrubou o regime da APC em 29 de abril de 1992 O desenvolvimento de Serra Leoa ou a falta dele pode ser mais bem entendido como resultado desse círculo vicioso Foram as autoridades coloniais britânicas que criaram as instituições extrativistas em primeiro lugar e os políticos africanos pós independência de muito bom grado receberam esse bastão Verificouse um padrão assustadoramente semelhante em toda a África subsaariana Havia esperanças similares para Gana Quênia Zâmbia e muitos outros países africanos após a independência entretanto em todos esses casos as instituições extrativistas foram recriadas segundo o padrão previsto pelo círculo vicioso com uma diferença foram se tornando mais viciosas com o passar do tempo Em todos esses países por exemplo as juntas comerciais e o sistema de governo indireto instituídos pelos britânicos foram mantidos A existência do círculo vicioso tem razões naturais Instituições políticas extrativistas produzem instituições econômicas também extrativistas que promovem a riqueza de poucos em detrimento de muitos Aqueles que se beneficiam do extrativismo dispõem assim dos recursos para montar seus próprios exércitos privados e reunir mercenários a seu serviço comprar seus juízes e manipular as eleições de modo a perpetuarse no poder Têm também o maior interesse em resguardar o sistema Portanto as instituições econômicas extrativistas servem de plataforma para que suas contrapartes políticas persistam O poder é valioso em regimes com instituições políticas extrativistas por ser irrestrito e promover tantas benesses econômicas As instituições políticas extrativistas tampouco protegem contra eventuais abusos de poder A afirmação de que o poder corrompe é questionável mas Lorde Acton sem dúvida tinha razão ao defender que o poder absoluto fomenta uma corrupção igualmente absoluta Vimos no capítulo anterior que mesmo quando Franklin Roosevelt quis usar seus poderes presidenciais de uma maneira que ele acreditava que seria benéfica para a sociedade sem o empecilho dos limites impostos pela Suprema Corte as instituições políticas inclusivas norteamericanas o impediram de livrarse das restrições ao seu poder Sob instituições políticas extrativistas são poucos os limites ao exercício do poder por mais distorcido e sociopático que ele venha a se tornar Em 1980 Sam Bangura então presidente do Banco Central em Serra Leoa criticou as políticas de Siaka Stevens que classificou como perdulárias Pouco depois foi assassinado e atirado do último andar do edifício da instituição que comandava Apropriadamente seu corpo despencou na Rua Siaka Stevens As instituições políticas extrativistas tendem também a criar um círculo vicioso por desguarnecerem o Estado de suas defesas contra quem quiser usurpar e desvirtuar os seus poderes Outro mecanismo do círculo vicioso consiste no fato de que as instituições extrativistas ao produzirem um poder irrestrito e uma profunda desigualdade de renda aumentam os possíveis ganhos com o jogo político Se quem controla o Estado tornase beneficiário desse poder excessivo e da riqueza por ele gerada as instituições extrativistas criam incentivos para disputas internas pelo controle do poder e seus benefícios uma dinâmica que vimos em ação nas cidadesestados maias e na Roma Antiga Sob essa luz não admira que as instituições extrativistas herdadas das potências coloniais por muitos países africanos tenham semeado disputas de poder e guerras civis conflitos muito diferentes da Guerra Civil inglesa e da Revolução Gloriosa Seriam travados não com o objetivo de mudar as instituições políticas introduzir restrições ao exercício do poder ou fomentar o pluralismo mas para apropriarse do poder e enriquecer um grupo em detrimento dos demais Em Angola Burundi Chade Costa do Marfim República Democrática do Congo Etiópia Libéria Moçambique Nigéria República do CongoBrazzaville Ruanda Somália Sudão e Uganda além claro de Serra Leoa como veremos em mais detalhes no próximo capítulo esses conflitos se converteriam em sangrentas guerras civis levando à ruína econômica e a um sofrimento humano sem paralelos e à falência do Estado DA ENCOMIENDA À GRILAGEM DE TERRAS Em 14 de janeiro de 1993 Ramiro De León Carpio foi empossado na presidência da Guatemala Nomeou Richard Aitkenhead Castillo seu ministro das Finanças e Ricardo Castillo Sinibaldi ministro do Desenvolvimento Esses homens tinham algo em comum todos três eram descendentes diretos de conquistadores espanhóis que chegaram à Guatemala no começo do século XVI De León tinha por ilustre ancestral Juan De León Cardona ao passo que os Castillos eram aparentados com Bernal Díaz del Castillo autor de um dos mais célebres testemunhos oculares da conquista do México Em reconhecimento dos serviços prestados a Hernán Cortés Díaz del Castillo foi designado para o governo de Santiago de los Caballeros hoje cidade de Antígua na Guatemala Tanto Castillo quanto De León fundaram dinastias assim como outros conquistadores como Pedro de Alvarado A socióloga guatemalteca Marta Casaús Arzú identificou um grupo central de 22 famílias de seu país que tinham vínculos pelo matrimônio com outras 26 famílias adjacentes a esse núcleo Seu estudo genealógico e político mostrou que essas famílias detêm o poder econômico e político na Guatemala desde 1531 Uma definição segundo critérios mais amplos de que famílias faziam parte dessa elite sugeriu que elas respondiam por pouco mais de 1 da população na década de 1990 Em Serra Leoa e em grande parte da África subsaariana o círculo vicioso assumiu a forma da adoção por parte dos líderes pósindependência das instituições extrativistas estabelecidas pelas potências coloniais Na Guatemala como em boa parte da América Central vemos uma modalidade mais simples e desnuda do círculo vicioso os detentores do poder econômico e político encontram meios de estruturar as instituições de modo a assegurar a continuidade de seu poder Esse tipo de círculo vicioso leva à persistência das instituições extrativistas e à permanência das mesmas elites no poder bem como à manutenção do subdesenvolvimento Na época da conquista a Guatemala era densamente povoada provavelmente com uma população de cerca de dois milhões de maias As doenças e a exploração tiveram efeitos desastrosos do mesmo modo como no restante das Américas Só na década de 1920 seu nível populacional retornaria aos patamares précolombianos Como em outras regiões do Império Espanhol os nativos foram distribuídos entre os conquistadores por meio da concessão de encomiendas Como vimos no contexto da colonização do México e do Peru a encomienda era um sistema de trabalhos forçados que posteriormente dariam lugar a instituições coercivas similares sobretudo o repartimiento na Guatemala também conhecido como mandamiento A elite composta dos descendentes dos conquistadores e alguns elementos indígenas não só se beneficiou dos diversos esquemas de trabalhos forçados como também instituiu o controle e o monopólio do comércio por meio de uma guilda mercantil intitulada Consulado de Comercio A maior parte da população guatemalteca encontravase no alto das montanhas e longe do litoral Os elevados custos de transporte reduziam a amplitude da economia de exportação e a princípio a terra não tinha grande valor Boa parte dela continuava nas mãos dos povos nativos organizada em grandes propriedades comunais chamadas ejidos O resto permanecia em grande parte desocupado e em tese pertencia ao governo Nesse contexto o controle e a tributação do comércio geravam mais receita do que o controle da terra Como no México a elite guatemalteca recebeu com hostilidade a Constituição de Cádiz páginas 2124 o que a estimulou a declarar independência do mesmo modo como sua contraparte mexicana Após uma breve união com o México e a Federação da América Central a elite colonial governou a Guatemala sob a ditadura de Rafael Carrera de 1839 a 1871 Nesse período os descendentes dos conquistadores e a elite indígena mantiveram basicamente inalteradas as instituições econômicas extrativistas da era colonial Nem a organização do Consulado foi modificada a partir da independência Embora fosse uma instituição régia foi de muito bom grado mantida pelo governo republicano A independência não passou pois de mero golpe orquestrado pela elite local já existente como no México e as instituições econômicas extrativistas de que ela tanto se beneficiava como de hábito tiveram continuidade naturalmente Por ironia durante esse período o Consulado permaneceu encarregado do desenvolvimento econômico do país Como antes da independência porém o Consulado era movido por seus próprios interesses não pelos do país Entre suas responsabilidades estava o desenvolvimento de infraestrutura como portos e estradas mas do mesmo modo como no Império AustroHúngaro Rússia e Serra Leoa iniciativas nesse sentido não raro implicavam risco de destruição criativa e de desestabilização do sistema Assim em vez de desenvolvimento de infraestrutura o que com frequência se verificava era resistência à sua implementação Por exemplo o desenvolvimento de um porto no litoral de Suchitepéquez no Oceano Pacífico era um dos projetos propostos Na época as únicas instalações portuárias adequadas situavamse do lado caribenho e estavam sob controle do Consulado Este nada fazia do lado do Pacífico porque um porto naquela região constituiria uma saída muito mais fácil para o escoamento de produtos das cidades de Mazatenango e Quezaltenango nas montanhas e caso esses produtos tivessem acesso a outros mercados o monopólio do Consulado sobre o comércio exterior se veria ameaçado A mesma lógica aplicavase às estradas de rodagem setor de que também o Consulado estava encarregado para todo o país Previsivelmente o órgão se recusava a abrir estradas que poderiam fortalecer grupos rivais ou talvez pusessem seu monopólio a perder A pressão por sua construção de novo vinha do oeste da Guatemala e de Quezaltenango em Los Altos Porém se houvesse melhorias na estrada que ligava Los Altos ao litoral de Suchitepéquez talvez despontasse uma classe mercante que entraria em competição com os comerciantes do Consulado na capital Assim a estrada permaneceu tal como era Em decorrência dessa dominação da elite a Guatemala viuse aprisionada em uma dobra temporal em meados do século XIX enquanto o resto do mundo mudava rapidamente Entretanto tais transformações acabariam afetando o país Os custos de transporte estavam caindo graças a inovações como os trens a vapor as ferrovias e tipos novos e mais rápidos de navios Ademais o aumento da renda das populações da Europa Ocidental e América do Norte foi criando uma demanda maciça por muitos produtos que um país como a Guatemala tinha potencial para fornecer No começo do século dois corantes naturais índigo e cochonilha chegaram a ser produzidos em alguma quantidade para exportação todavia a oportunidade mais rentável viria do café para cuja produção a Guatemala dispunha de muita terra adequada e o cultivo começou a se difundir sem nenhuma assistência do Consulado À medida que o preço mundial do produto subia e o comércio internacional se expandia surgiam oportunidades de lucros gigantescos despertando o interesse da elite guatemalteca Em 1871 o duradouro regime do ditador Carrera foi finalmente derrubado por um grupo de autointitulados Liberais após a disseminação desse título pelo mundo O significado de liberalismo vem mudando ao longo do tempo mas no século XIX nos Estados Unidos e Europa era similar ao que hoje se chama de libertarismo saindo em defesa da liberdade dos indivíduos do governo limitado e do livre comércio Não foi bem o que se passou na Guatemala Liderados a princípio por Miguel García Granados e depois de 1873 por Justo Rufino Barrios os liberais guatemaltecos não eram em sua maioria homens novos com ideais liberais Basicamente as mesmas famílias permaneceram no poder mantendo as instituições políticas extrativistas e implementando uma reorganização em vasta escala da economia voltada para a exploração do café De fato o Consulado foi abolido em 1871 mas as circunstâncias econômicas haviam mudado O foco das instituições econômicas extrativistas passaria a ser a produção e a exportação de café A produção cafeeira requeria terra e mão de obra Para proporcionar a primeira para as fazendas de café os liberais impuseram uma política de privatização na realidade um processo de grilagem que lhes permitiu apropriarse de terras até então pertencentes ao governo ou de propriedade comunitária Embora sua iniciativa enfrentasse ferrenha oposição dadas as instituições políticas altamente extrativistas e a concentração de poder político no país a elite acabou logrando êxito entre 1871 e 1883 apoderouse de quase um milhão de acres em sua maioria territórios de fronteira ou terras comunitárias indígenas e só então o café iniciou seu rápido desenvolvimento O objetivo era a formação de latifúndios As terras privatizadas normalmente eram leiloadas entre os membros da elite tradicional ou pessoas a eles ligadas Em seguida o poder de coação do Estado liberal foi empregado para conferir aos latifundiários acesso à mão de obra mediante a adaptação e intensificação de diversos sistemas de trabalhos forçados Em novembro de 1876 o Presidente Barrios escreveu a todos os governadores do país salientando que uma vez que o país dispõe de vastas extensões de terra que é preciso explorar agricolamente lançando mão para tanto da multidão de trabalhadores que hoje se encontram ainda fora do movimento de desenvolvimento dos elementos produtivos da nação os senhores devem fornecer todo o apoio necessário para exportar a agricultura 1 Das aldeias indígenas de sua jurisdição de modo a fornecer aos proprietários das fincas fazendas do respectivo departamento que solicitarem mão de obra o número necessário de trabalhadores sejam 50 ou uma centena O repartimiento recrutamento para o trabalho compulsório não havia chegado a ser abolido após a independência mas dessa vez teve seu escopo e duração ampliados Foi institucionalizado em 1877 pelo Decreto 177 que determinou que os empregadores poderiam solicitar e receber do governo até 60 trabalhadores para 15 dias de trabalho caso a propriedade se localizasse no mesmo departamento e por 30 dias caso se situasse fora O pedido poderia ser renovado se o empregador assim desejasse Os trabalhadores seriam recrutados compulsoriamente a menos que pudessem demonstrar com base em sua carteira de trabalho que haviam recentemente prestado serviços do gênero de maneira satisfatória Todos os trabalhadores rurais ficaram obrigados também a portar uma libreta a tal carteira de trabalho em que se registravam detalhes como para quem estavam empregados e eventuais dívidas muitos trabalhadores rurais deviam a seus empregadores e os endividados não podiam abandonar o empregador atual sem autorização O Decreto 177 estipulava ainda que a única maneira de alguém evitar o recrutamento para o repartimiento era mostrando que se encontrava em dívida para como algum empregador Os trabalhadores estavam em um beco sem saída Além dessa legislação promulgouse uma série de leis referentes à vadiagem de modo que quem não conseguisse provar que estava empregado seria imediatamente arrolado para o repartimiento ou outros tipos de trabalhos forçados nas estradas ou seria obrigado a aceitar emprego em alguma fazenda Como na África do Sul dos séculos XIX e XX a partir de 1871 as políticas fundiárias também tinham por objetivo solapar a economia de subsistência das populações indígenas impingindolhes o trabalho compulsório por baixos salários O repartimiento perduraria até a década de 1920 o sistema de libreta e toda a gama de leis contra a vadiagem permaneceram em vigor até 1945 quando a Guatemala conheceu seu primeiro e breve despertar da democracia Como ocorrera até 1871 a elite guatemalteca governava por intermédio de homens fortes militares e o esquema foi mantido após o início do boom do café Jorge Ubico presidente de 1931 a 1944 foi quem permaneceu por mais tempo no poder Ubico venceu as eleições presidenciais de 1931 sem adversários já que ninguém seria tolo o bastante para concorrer com ele Como o Consulado ele não aprovava nada que pudesse induzir à destruição criativa e pusesse em risco tanto seu poder político quanto seus lucros pessoais e os da elite que representava Assim sendo opôsse à implementação da indústria pelo mesmo motivo de Francisco I no Império Austro Húngaro e Nicolau I na Rússia os operários lhe teriam causado problemas Em uma legislação sem paralelo em sua repressão paranoica Ubico proibiu o uso de palavras como obreros operários sindicatos e huelgas greves Quem usasse alguma delas poderia ser preso Ubico detinha grande poder mas era a elite que ditava as regras A oposição ao seu regime estourou em 1944 encabeçada por universitários rebeldes que começaram a organizar manifestações Com o recrudescimento da insatisfação popular em 24 de junho 311 pessoas muitas delas pertencentes à elite assinaram o Memorial de los 311 uma carta aberta denunciando o regime Ubico renunciou em 1o de julho Embora um regime democrático o sucedesse em 1945 seria derrubado por um golpe em 1954 que desencadeou violenta guerra civil A Guatemala só voltaria a se democratizar em 1986 Os conquistadores espanhóis não tiveram o menor escrúpulo em estabelecer um sistema político e econômico extrativista Foi exatamente para isso que vieram até o Novo Mundo Todavia a maioria das instituições por eles criadas pretendia ser temporária A encomienda por exemplo era uma concessão temporária de direitos sobre a mão de obra Não foi elaborado um plano para estabelecer um sistema capaz de sobreviver por 400 anos Com efeito as instituições então estabelecidas sofreram mudanças significativas ao longo do tempo exceto sob um aspecto sua natureza extrativista fruto do círculo vicioso O extrativismo mudou em sua forma mas não na natureza das instituições nem da identidade da elite Na Guatemala a encomienda o repartimiento e o monopólio do comércio deram lugar à libreta e à grilagem de terras Contudo a maioria dos maias nativos continuou a trabalhar como mão de obra mal remunerada com pouco acesso à educação destituída de direitos e sem serviços públicos Na Guatemala como na maior parte da América Central em um típico padrão de círculo vicioso as instituições políticas extrativistas deram sustentação às suas contrapartes econômicas que por sua vez vieram servir de base para as primeiras e para a manutenção da mesma elite no poder DA ESCRAVIDÃO A JIM CROWu Na Guatemala as instituições extrativistas subsistiram dos tempos coloniais aos modernos sob o firme controle de uma mesma elite Eventuais mudanças institucionais resultavam de adaptações a ambientes em transformação como no caso da grilagem de terras pela elite em decorrência do boom do café As instituições no Sul dos Estados Unidos apresentaram até a Guerra de Secessão um perfil extrativista análogo A economia e a política eram dominadas pela elite sulista latifundiários com vastas propriedades e alto número de escravos Estes eram desprovidos de todo e qualquer direito político e econômico com efeito praticamente não possuíam direito nenhum Em meados do século XIX as instituições políticas e econômicas extrativistas do Sul haviam tornado a região significativamente mais pobre do que o Norte Não havia indústria e os investimentos em infraestrutura eram relativamente pequenos Em 1860 sua produção manufatureira total era inferior à da Pensilvânia Nova York ou Massachusetts Apenas 9 da população viviam em áreas urbanas comparados a 35 no Nordeste americano A densidade de linhas férreas isto é quilômetros de trilhos divididos por área era três vezes maior no Norte do que nos estados do Sul A razão de quilometragem de canais era similar O Mapa 18 mostra a extensão da escravidão representando a porcentagem da população que era escrava nos condados americanos em 1840 Fica evidente que a escravidão era predominante no Sul onde os escravos em alguns condados ao longo do Rio Mississippi por exemplo chegavam a 95 da população O Mapa 19 mostra em seguida uma das consequências desse fato a proporção de mão de obra empregada na manufatura em 1880 Embora pelos padrões do século XX esta não fosse alta em lugar nenhum notase uma diferença gritante entre o Norte e o Sul Em boa parte do Nordeste americano mais de 10 da força de trabalho estavam na manufatura Em contrapartida na maior parte do Sul sobretudo nas áreas com elevada concentração de escravos essa medida caía praticamente para zero O Sul não se mostrava inovador nem mesmo nos setores de sua especialidade de 1837 a 1859 o número de patentes emitidas por ano para inovações relacionadas a milho e trigo foi em média 12 e 10 respectivamente e houve apenas uma por ano para o mais importante produto do Sul o algodão Não há nenhum indício de que a industrialização e o crescimento econômico estivessem para começar tão cedo Por outro lado à derrota na Guerra de Secessão seguiramse reformas econômicas e políticas fundamentais à ponta de baioneta A escravidão foi abolida e os homens negros ganharam direito ao voto Mapa 18 A escravidão nos condados americanos em 1840 Mudanças tão significativas deveriam ter aberto caminho para uma transformação radical das instituições extrativistas do sul revestindoas de um caráter inclusivo e colocado a região no caminho da prosperidade econômica Em mais uma manifestação do círculo vicioso porém nada disso aconteceu As instituições extrativistas do Sul ganharam continuidade sob a forma das leis de Jim Crow no lugar da escravidão A expressão supostamente originária de Jump Jim Crow Pule Jim Crow uma sátira dos negros datada do século XIX e realizada por brancos de rosto pintado de preto passou a ser usada em referência ao conjunto de leis segregacionistas promulgadas no Sul a partir de 1865 e que perdurariam por quase um século inteiro até o advento de outra convulsão social o movimento pelos direitos civis Nesse ínterim os negros continuaram reprimidos e excluídos do poder A agricultura baseada em plantations usando mão de obra mal remunerada e sem acesso à educação se manteve e a renda do Sul caiu ainda mais em relação à média nacional O círculo vicioso de instituições extrativistas mostrouse mais forte do que muitos na época poderiam esperar Mapa 19 Emprego na manufatura nos condados americanos em 1880 A razão por que a trajetória econômica e política do Sul se manteve inalterada apesar da abolição da escravatura e da concessão do direito ao voto aos homens negros foi a debilidade do poder político e da independência econômica dessa parcela da população Os grandes proprietários rurais sulistas podiam ter perdido a guerra mas venceriam na paz Continuavam organizados e a terra permanecia em suas mãos Durante a guerra acenouse aos escravos libertos com a promessa de 40 acres de terreno e uma mula quando a escravidão fosse abolida e alguns de fato foram assim agraciados durante as célebres campanhas do General William T Sherman Em 1865 todavia o Presidente Andrew Johnson revogou as ordens de Sherman e a tão ansiada redistribuição fundiária jamais se deu Em um debate a respeito no Congresso o congressista George Washington Julian comentou com presciência Que serventia terá um decreto legislativo determinando a total remissão da escravidão se as velhas bases agrícolas do poder aristocrático permanecerem Foi o começo da redenção do velho Sul e da persistência da elite rural sulista de sempre O sociólogo Jonathan Wiener estudou a perseverança da elite latifundiária em cinco condados do Cinturão Negro região produtora de algodão no sul do Alabama Monitorando as famílias por meio de dados censitários e considerando aquelas com no mínimo US10 mil em bens imóveis ele constatou que dos 236 membros da elite rural de 1850 101 mantinham sua posição em 1870 curiosamente uma proporção muito similar à experimentada no período anterior à Guerra de Secessão das 236 famílias rurais mais ricas em 1850 apenas 110 assim permaneceram uma década mais tarde Não obstante das 25 famílias latifundiárias detentoras das maiores propriedades em 1870 18 72 figuravam na elite em 1860 e 16 na de 1850 Embora o número de mortos na guerra passasse dos 600 mil as elites rurais sofreram poucas baixas A lei criada pelos grandes donos de terras e para os grandes donos de terras isentava do serviço militar o proprietário para cada 20 escravos que possuísse Enquanto centenas de milhares de homens caíam para preservar a economia de plantations do Sul muitos grandes senhores de escravos e seus filhos assistiam à guerra de suas varandas o que lhes permitiu assegurar assim a sobrevivência da economia latifundiária Com o fim do conflito a elite rural retomou o controle sobre a força de trabalho Ainda que a escravidão como instituição econômica houvesse sido abolida as evidências apontam para uma clara persistência no sistema econômico da região baseado na combinação de agricultura latifundiária e mão de obra barata O sistema econômico foi mantido através de uma variedade de canais inclusive pelo controle da política local e pelo exercício da violência Em consequência nas palavras do estudioso afroamericano WEB Du Bois o Sul converteuse em mero campo de batalha para intimidação do povo negro Em 1865 a Assembleia Legislativa do Alabama aprovou o Black Code Código Negro um marco significativo na repressão à mão de obra negra Similar ao Decreto 177 na Guatemala o Código Negro do Alabama consistia em uma lei contra a vadiagem e outra contra a incitação dos trabalhadores à agitação que tinham por objetivo restringir a mobilidade da força de trabalho e reduzir a concorrência no mercado de trabalho bem como assegurar aos latifundiários sulistas uma reserva de mão de obra confiável e de baixo custo Após a Guerra de Secessão o período denominado Reconstrução estendeuse de 1865 a 1877 Os políticos do Norte com ajuda do Exército da União promoveram algumas transformações sociais no Sul Entretanto a reação sistemática da elite sulista à guisa de apoio aos chamados Redentoristas que buscavam a redenção do Sul lograria recriar o antigo sistema Nas eleições presidenciais de 1877 Rutherford Hayes precisou do apoio do Sul no colégio eleitoral Este em vigor ainda hoje era o cerne da eleição indireta para presidente criada pela Constituição norteamericana e na qual os votos dos cidadãos não indicam diretamente o presidente mas eleitores que por sua vez compõem o colégio eleitoral que escolherá o presidente Em troca de seu apoio no colégio eleitoral os sulistas exigiram que os soldados da União se retirassem do Sul e que a região reconquistasse sua autonomia Hayes consentiu Com o apoio sulista tornouse presidente e recolheu as tropas O período pós1877 foi marcado assim pelo efetivo ressurgimento da elite agrária de antes da Guerra de Secessão A redenção do Sul envolveu a introdução de novas capitações e provas de alfabetização para os eleitores privando sistematicamente de seus direitos não só os negros mas também os brancos pobres Tais iniciativas lograram criar um regime unipartidário democrata no qual a maior parte do poder político encontravase nas mãos da elite rural As leis de Jim Crow criaram escolas separadas e como seria de prever inferiores O Alabama por exemplo reescreveu para tanto sua magna carta em 1901 e é chocante que ainda hoje na Seção 256 da Constituição Estadual embora não mais aplicada ainda se leia Dever da legislatura de estabelecer e manter o sistema público de educação dotação do fundo de educação pública escolas separadas para crianças brancas e de cor A legislatura deverá estabelecer organizar e manter uma rede liberal de escolas públicas em todo o estado para benefício das crianças e jovens locais entre as idades de 7 e 21 anos O fundo de educação pública deverá ser alocado para os diferentes condados em proporção ao número de alunos em idade escolar que aí se encontrem sendo do mesmo modo distribuído entre as escolas nos distritos e municipalidades de cada condado de modo a assegurar da forma mais exata possível períodos letivos de igual duração em tais distritos ou municipalidades Serão oferecidas escolas separadas para crianças brancas e de cor e a nenhuma criança de qualquer das duas raças será permitido frequentar a instituição de ensino reservada à raça oposta Uma emenda que pretendia revogar a Seção 256 da Constituição foi derrotada na Assembleia Legislativa do Estado por estreita margem de votos em 2004 A privação de direitos políticos leis contra a vadiagem como o Código Negro do Alabama diversas leis de Jim Crow e as ações da Ku Klux Klan em geral com financiamento e apoio da elite transformaram o Sul dos Estados Unidos no período pósGuerra de Secessão em uma sociedade de apartheid de fato em que negros e brancos levavam vidas opostas Como na África do Sul tais leis e práticas tinham em vista o controle da população e da mão de obra negras A atuação dos políticos sulistas em Washington também tinha como finalidade assegurar a sobrevivência das instituições extrativistas do Sul Assim trataram de bloquear a aprovação por exemplo de todo e qualquer projeto ou obra pública federal capaz de pôr em risco o controle exercido pela elite sulista sobre a força de trabalho negra Por conseguinte o Sul adentrou o século XX como uma sociedade basicamente rural com baixíssimos níveis educacionais e tecnologia retrógrada que ainda se valia do trabalho manual e da tração animal praticamente sem apetrechos mecânicos Ainda que a proporção de população urbana tenha aumentado era ainda muito menor que a do Norte Em 1900 por exemplo 135 da população do Sul eram urbanizados em comparação com 60 no Nordeste Ao fim e ao cabo as instituições extrativistas do Sul dos Estados Unidos baseadas no poder da elite agrária da agricultura em plantations e na mão de obra mal remunerada e de baixo nível educacional sobreviveram até o século XX estar já bem adiantado Só começariam a ruir após a Segunda Guerra Mundial e entrariam em franca decadência apenas depois de o movimento dos direitos civis destruir os fundamentos políticos do sistema Foi somente após a derrocada dessas instituições nos anos 1950 e 1960 que o Sul desencadeou seu processo de acelerada convergência em relação ao Norte O Sul dos Estados Unidos revela outro aspecto mais resiliente do círculo vicioso como na Guatemala a elite latifundiária da região permaneceu no comando e estruturou as instituições econômicas e políticas locais de modo a assegurar a continuidade de seu poder À diferença dos guatemaltecos porém viuse confrontada com desafios significativos após sua derrota na Guerra de Secessão que veio a abolir a escravatura e reverter a total exclusão dos negros da vida política até então assegurada constitucionalmente Mas quem não tem cão caça com gato enquanto a elite agrária permanecesse no controle de seus vastos latifúndios e se mantivesse organizada sempre poderia estruturar um novo conjunto de instituições as leis de Jim Crow em lugar da escravidão para atingir o mesmo objetivo O círculo vicioso revelouse mais forte do que muitos inclusive Abraham Lincoln haviam imaginado Baseiase em instituições políticas extrativistas que criam instituições econômicas igualmente extrativistas as quais por sua vez vêm dar sustentação às primeiras à medida que riqueza e poder econômicos compram poder político Uma vez afastada a hipótese de concessão de 40 acres de terra e uma mula para cada escravo liberto o poder econômico da elite rural sulista mantevese intacto E como seria tristemente de esperar as implicações tanto para a população negra do Sul quanto para o desenvolvimento econômico da região foram as mesmas A LEI DE FERRO DA OLIGARQUIA A dinastia salomônica na Etiópia perdurou até ser derrubada por um golpe militar em 1974 liderado pelo Derg um grupo de oficiais militares marxistas O regime destronado era um anacronismo histórico que parecia congelado em algum século anterior O dia do imperador Hailé Selassié começava com sua chegada ao Grande Palácio erguido pelo Imperador Menelik II em fins do século XIX diante do edifício havia sempre uma multidão de dignitários aguardando a sua chegada desfazendose em mesuras e tentativas desesperadas de chamarlhe a atenção O imperador recebia a corte na Sala de Audiências sentado no trono imperial Selassié era baixo para que suas pernas não ficassem balançando no ar era função de um segurador de almofadas especial acompanhálo aonde quer que fosse e certificarse de que houvesse sempre uma almofada adequada para acomodarlhe os pés Para tanto esse funcionário dispunha de um estoque de 52 almofadas que lhe permitiria lidar com qualquer tipo de situação Selassié presidia um conjunto de instituições extremamente extrativistas governando o país como se fosse propriedade particular sua distribuindo favores e patrocínios e punindo de forma implacável qualquer falta de lealdade Sob a dinastia salomônica não se verificou na Etiópia nenhum desenvolvimento econômico digno de nota Inicialmente o Derg era composto por 108 representantes de diferentes unidades militares de todo o país O representante da Terceira Divisão da província de Harar era um major chamado Mengistu Hailé Mariam Embora em sua declaração inicial de 4 de julho de 1974 os oficiais do Derg tenham reafirmado sua lealdade ao imperador logo começaram a prender membros do governo a fim de testar o quanto de oposição encontrariam Tendo ganhado mais confiança com relação ao esvaziamento do apoio ao regime de Selassié investiram contra o próprio prendendoo em 12 de setembro Então começaram as execuções Muitos políticos do núcleo do antigo regime foram prontamente mortos Em dezembro o Derg declarou que a Etiópia era um Estado socialista Selassié morreu provavelmente assassinado em 27 de agosto de 1975 Nesse mesmo ano o Derg começou a nacionalizar as propriedades inclusive todas as terras urbanas e rurais e a maior parte das propriedades privadas O comportamento cada vez mais autoritário do regime inflamou a oposição por todo o país Vastas regiões da Etiópia haviam sido agregadas durante a expansão colonial europeia no fim do século XIX e começo do XX graças às políticas do Imperador Menelik II vencedor da Batalha de Adowa que já encontramos antes página 184 Aí se incluíam Eritreia e Tigré no norte e Ogaden no leste Em resposta à inclemência do regime do Derg despontaram movimentos de independência na Eritreia e em Tigré ao passo que o exército da vizinha Somália invadia o território de Ogaden de idioma somali O próprio Derg começou a desintegrarse e fragmentarse em facções O Major Mengistu revelouse o mais atroz e inteligente deles Em meados de 1977 havia eliminado seus principais adversários e praticamente assumira o controle do governo que só se salvou do colapso graças a um considerável influxo de armas e tropas da União Soviética e Cuba em novembro daquele ano Em 1978 o regime organizou uma celebração nacional para assinalar o quarto aniversário do destronamento de Hailé Selassié A essa altura Mengistu era o líder inequívoco do Derg Como residência o lugar de onde governaria a Etiópia ele havia escolhido o Grande Palácio de Selassié que havia ficado desocupado desde a abolição da monarquia Na celebração ele se acomodou em uma poltrona dourada como os imperadores de antigamente para assistir à parada O Grande Palácio voltou a sediar o governo e o antigo trono de Hailé Selassié passou a ser ocupado por Mengistu que começou a compararse ao Imperador Tewodros que havia reinaugurado a Dinastia Salomônica em meados do século XIX após um período de declínio Um de seus ministros Dawit Wolde Giorgis registra em suas memórias No começo da revolução todos havíamos rejeitado fervorosamente tudo o que guardasse qualquer relação com o passado Recusávamonos a dirigir automóveis ou usar ternos e considerávamos criminosas as gravatas Tudo o que nos conferisse um aspecto abastado ou burguês tudo que tivesse laivos de opulência ou sofisticação era desprezado como parte da velha ordem Todavia por volta de 1978 isso começou a mudar Pouco a pouco o materialismo passou a ser não só aceito mas necessário Trajes assinados pelos melhores alfaiates europeus tornaramse os uniformes de todos os mais altos funcionários do governo e membros do Conselho Militar Tínhamos o melhor de tudo as melhores moradias os melhores carros o melhor uísque champanhe comida Uma total inversão dos ideais da revolução Giorgis recorda também vividamente como Mengistu mudou após transformarse no único governante Mengistu revelou sua verdadeira face vingativo cruel e autoritário Muitos de nós que conversávamos com ele de igual para igual com as mãos nos bolsos começamos a nos pegar em posição de sentido adotando uma atitude cautelosamente respeitosa em sua presença Ao dirigirmonos à sua pessoa sempre havíamos usado a forma familiar você ante agora preferíamos o mais formal senhor ersiwo Ele se mudou para uma sala maior e mais suntuosa no Palácio de Menelik Começou a usar os automóveis do imperador Onde originalmente se supunha que houvesse uma revolução de igualdade ele agora se tinha convertido no novo imperador O padrão do círculo vicioso retratado pela transição de Hailé Selassié para Mengistu ou dos governadores coloniais britânicos de Serra Leoa para Siaka Stevens é tão extremo e sob determinados aspectos tão estranho que merece um nome especial Como já mencionamos no Capítulo 4 é o que o sociólogo alemão Robert Michels chama de lei de ferro da oligarquia A lógica interna das oligarquias e a rigor de todas as organizações hierárquicas consiste segundo Michels na tendência a se reproduzirem não só quando o mesmo grupo está no poder mas quando um grupo inteiramente novo assume o controle O que passou despercebido de Michels talvez foi um eco da afirmação de Karl Marx de que a história se repete na primeira vez como tragédia na segunda como farsa Os líderes da África pósindependência não se limitaram a ocupar as mesmas residências utilizar as mesmas redes de patronagem e lançar mão dos mesmos recursos para manipular mercados e extrair recursos empregados pelos regimes coloniais e imperadores que vieram substituir mais que isso eles efetivamente pioraram a situação Com efeito o fato de que o ferrenho anticolonialista Stevens tratou de submeter o mesmo povo os mendes que os britânicos tanto se empenharam em controlar não pode ser descrito senão como farsesco o mesmo se pode dizer de sua opção por valerse dos mesmos chefes aos quais os britânicos haviam conferido poder e usado para controlar o interior do país bem como de sua decisão de administrar a economia do mesmo modo expropriando os fazendeiros por intermédio das mesmas juntas comerciais e submetendo a exploração de diamantes a um monopólio similar Foi de fato uma farsa e muito triste o fato de Laurent Kabila que logrou mobilizar um exército contra a ditadura de Mobutu acenando com a promessa de libertar o povo e pôr fim à corrupção e repressão sufocantes e depauperantes que grassavam no Zaire ter ascendido ao poder apenas para implementar um regime tão corrupto quanto o anterior e talvez ainda mais desastroso Foi por certo farsesca sua tentativa de instaurar um culto mobutesco à sua personalidade auxiliado e instigado por Dominique Sakombi Inongo exministro da Informação de Mobutu e que o governo do próprio Mobutu tenha seguido padrões de exploração das massas iniciados mais de um século antes com o Estado Livre do Congo do Rei Leopoldo Sem a menor sombra de dúvida foi uma farsa o fato de o oficial marxista Mengistu ter ido morar em um palácio considerandose um imperador e locupletandose e ao seu entourage do mesmíssimo modo como Hailé Selassié e outros imperadores antes dele Tudo não passou de uma farsa mas também ainda mais trágica que a tragédia original e não só para as esperanças então esmagadas Stevens e Kabila como tantos outros governantes da África começaram assassinando seus rivais e depois cidadãos inocentes Mengistu e as forças policiais do Derg fariam cair sobre as férteis terras etíopes fomes recorrentes A história se repetia mas de maneira muito distorcida Foi uma fome na província de Wollo em 1973 à qual Hailé Selassié reagiu com aparente indiferença que finalmente consolidou a oposição ao seu regime No entanto Selassié ao menos havia se mostrado apenas indiferente Mengistu por sua vez usava a fome como ferramenta política a fim de solapar a força dos adversários A história não mostrou somente uma face farsesca e trágica para os cidadãos da Etiópia e da África subsaariana mas também cruel É justamente da essência da lei de ferro da oligarquia essa faceta específica do círculo vicioso que os novos líderes que vêm derrubar os antigos com promessas de mudança radical nada tragam de novo além de mais do mesmo Sob certos aspectos é mais difícil entendêla do que às demais características do círculo vicioso Há uma lógica clara na persistência das instituições extrativistas no Sul dos Estados Unidos e na Guatemala os mesmos grupos conservaramse no controle da economia e da política por séculos Apesar dos empecilhos como no caso dos latifundiários sulistas após a Guerra de Secessão americana seu poder permaneceu intacto o que lhes permitiu manter e recriar um conjunto similar de instituições extrativistas de que continuar beneficiandose Todavia como podemos compreender os que se alçaram ao poder em nome de mudanças radicais apenas para recriar o mesmo sistema A resposta a essa pergunta demonstra mais uma vez que o círculo vicioso é mais forte do que pode parecer à primeira vista Nem todas as mudanças radicais estão fadadas ao fracasso A Revolução Gloriosa foi radical e levou àquela que talvez tenha sido a mais importante revolução política dos últimos dois milênios A Revolução Francesa foi ainda mais radical com todo o caos e excessiva violência que fomentou até a ascensão de Napoleão Bonaparte mas não retomou o Ancien Régime Três fatores facilitaram enormemente a emergência de instituições políticas mais inclusivas após as Revoluções Gloriosa e Francesa O primeiro foi o desejo dos novos mercadores e homens de negócios de deflagrar a destruição criativa em toda a sua potência que lhes teria enorme serventia esses novos homens estavam entre os protagonistas das coalizões revolucionárias e não pretendiam assistir ao desenvolvimento de um novo conjunto de instituições extrativistas que apenas continuaria a explorálos O segundo foi a natureza da ampla coalizão que se formou em ambos os casos Por exemplo a Revolução Gloriosa não foi um golpe levado a cabo por um grupo restrito ou interesses muito específicos mas um vasto movimento que contava com o apoio de mercadores industriais fidalgos e facções políticas diversas O mesmo se pode dizer em termos gerais da Revolução Francesa O terceiro fator diz respeito à história das instituições políticas inglesas e francesas que criou um contexto em que regimes novos e mais inclusivos puderam se desenvolver Nos dois países havia uma tradição parlamentar e de divisão de poder que remontava à Magna Carta na Inglaterra e à Assembleia de Notáveis na França Ademais ambas as revoluções deramse em meio a um processo que já havia enfraquecido o poder dos regimes absolutistas ou aspirantes a absolutistas Nos dois casos as instituições políticas existentes tornariam difícil que novos governantes ou grupos estritos tomassem o poder do Estado e usurpassem a riqueza econômica angariando um poder político irrestrito e duradouro De fato no rastro da Revolução Francesa um pequeno grupo encabeçado por Robespierre e SaintJust chegou a assumir o comando com consequências desastrosas mas foi um domínio temporário que não chegou a desviar o curso dos acontecimentos rumo a instituições mais inclusivas Tudo isso contrasta com a situação de sociedades com longo histórico de instituições econômicas e políticas extremamente extrativistas em que o poder dos governantes não encontra limites Nessas sociedades não haveria uma nova classe de mercadores ou homens de negócios fortes capazes de dar suporte material e financeiro à resistência ao regime existente em parte a fim de obter instituições econômicas mais inclusivas nem coalizões amplas que pudessem introduzir restrições ao poder de cada um de seus membros nem instituições políticas que dissuadissem os novos governantes de eventuais intenções de usurpação e exploração do poder Por conseguinte em Serra Leoa na Etiópia e no Congo seria muito mais difícil resistir ao círculo vicioso e muito mais improvável que iniciativas na direção de instituições inclusivas chegassem a se concretizar Tampouco havia instituições tradicionais ou históricas capazes de restringir o poder de quem pretendesse assumir o controle do Estado Em determinadas regiões da África houve algumas dessas às vezes como em Botsuana chegando a sobreviver à era colonial Entretanto ao longo da história de Serra Leoa por exemplo foram muito menos proeminentes e quando chegaram a estar presentes acabaram curvandose ao governo indireto O mesmo vale para outras colônias britânicas na África como Quênia e Nigéria Já no reino absolutista da Etiópia elas nunca existiram No Congo as instituições nativas foram emasculadas pelo colonialismo belga e pelas políticas autocráticas de Mobutu Em todas essas sociedades tampouco havia novos mercadores homens de negócios ou empreendedores que pudessem oferecer suporte aos novos regimes e reivindicar direitos de propriedade seguros e o fim das instituições extrativistas anteriores Com efeito graças às instituições econômicas extrativistas do período colonial não restaram grandes negócios nem empreendedorismo para contar história afinal A comunidade internacional acreditava que a independência africana póscolonial acarretaria crescimento econômico por meio de um processo de planejamento estatal e incentivo ao setor privado Contudo não havia nem sombra de setor privado exceto nas áreas rurais que por não terem representação nos novos governos seriam justamente as suas primeiras vítimas O mais importante talvez é que na maioria desses casos os benefícios de agarrarse ao poder eram imensos benefícios que não só atraíam os homens mais inescrupulosos como Stevens em sua ambição de monopolizar o poder como ao mesmo tempo despertavam o pior deles uma vez alcançado o predomínio Não havia nada capaz de romper o círculo vicioso FEEDBACK NEGATIVO E CÍRCULOS VICIOSOS Os países ricos devem sua prosperidade basicamente ao fato de terem conseguido desenvolver em algum momento dos últimos 300 anos instituições inclusivas que persistiram por meio de um processo de círculos virtuosos Ainda que a princípio fossem inclusivas em sentido ainda muito limitado e às vezes frágil elas puderam engendrar uma dinâmica que acarretaria um processo de feedback positivo aumentando gradualmente sua capacidade de inclusão A Inglaterra não se tornou uma democracia após a Revolução Gloriosa de 1688 Muito pelo contrário apenas uma pequena parcela da população foi contemplada com representação formal O elemento crucial nesse caso contudo foi o pluralismo uma vez consagrado instalouse a tendência das instituições a se tornarem cada vez mais inclusivas ao longo do tempo por maiores que fossem os percalços e incertezas encontrados no processo Sob esse aspecto a Inglaterra é um exemplo de círculo virtuoso instituições políticas inclusivas impõem restrições ao exercício e usurpação do poder além de tenderem a criar instituições econômicas inclusivas que por sua vez aumentam as chances de continuidade das instituições políticas inclusivas Sob instituições econômicas inclusivas a riqueza não se concentra nas mãos de um pequeno grupo que pode então valerse de seu poderio econômico para ampliar desproporcionadamente seu poder político Ademais sob instituições econômicas inclusivas os ganhos decorrentes da detenção do poder político são mais limitados reduzindo os incentivos para grupos e aventureiros individuais ambiciosos tentarem assumir o controle do Estado Em geral uma confluência de fatores em uma circunstância crítica entre eles as interrelações entre as instituições existentes e as oportunidades e desafios produzidos pela própria circunstância crítica é responsável pelo despontar de instituições inclusivas como demonstra o caso inglês Uma vez instaladas essas instituições inclusivas porém já não precisamos mais da mesma confluência de fatores para assegurarlhes a sobrevivência Os círculos virtuosos embora continuem sujeitos a contingências significativas possibilitam a continuidade das instituições e com frequência chegam mesmo a desencadear uma dinâmica que conduz a sociedade a uma inclusão crescente Do mesmo modo como os círculos virtuosos fazem as instituições inclusivas persistirem os viciosos criam forças poderosas em direção à manutenção das instituições extrativistas História não é destino e os círculos viciosos não são inquebráveis como veremos mais adiante no Capítulo 14 mas são resistentes Podem criar um poderoso processo de feedback negativo em que as instituições políticas extrativistas forjem suas contrapartes econômicas as quais por sua vez fornecem a base para a persistência das primeiras Foi o que vimos com muita clareza no caso da Guatemala onde a mesma elite permaneceu no poder primeiro no período colonial depois no país independente por mais de quatro séculos as instituições extrativistas enriquecem a elite e tal riqueza constitui a base para a continuidade de seu domínio O mesmo processo do círculo vicioso fica evidente também na sobrevivência da economia de plantation no Sul dos Estados Unidos cuja trajetória demonstra também a enorme resiliência desse mecanismo vicioso frente a desafios Com a derrota na Guerra de Secessão os latifundiários sulistas perderam o controle formal das instituições econômicas e políticas a escravidão base da economia de plantation foi abolida e concederamse aos negros direitos políticos e econômicos iguais Não obstante a guerra não destruiu o poder político da elite rural nem seus fundamentos econômicos o que lhe permitiu reestruturar o sistema agora com nova roupagem mas ainda sob seu controle político local conquistando assim o mesmo objetivo a abundância de mão de obra barata para os latifúndios Essa modalidade de círculo vicioso em que as instituições extrativistas perduram porque persiste também a elite que as controla e delas se beneficia não é a única A princípio uma forma de feedback negativo mais intrigante mas não menos real e não menos daninha moldou o desenvolvimento político e econômico de diversos países sendo exemplificada pelas experiências encontradas em boa parte da África subsaariana sobretudo em Serra Leoa e na Etiópia Em um esquema que o sociólogo Robert Michels reconheceria como a lei de ferro da oligarquia a derrubada de um regime que preside instituições extrativistas precede o advento de um novo grupo de senhores para explorar o mesmo conjunto de perniciosas instituições extrativistas A lógica desse tipo de círculo vicioso em retrospecto é também de fácil entendimento instituições políticas extrativistas impõem poucas restrições ao exercício do poder de modo que praticamente inexistem instituições capazes de cercear o uso e o abuso do poder por parte de quem derruba os ditadores preexistentes e assume o controle do Estado por outro lado o extrativismo das instituições econômicas implica que o mero controle do poder assegura grandes lucros e riqueza graças à expropriação dos ativos alheios e ao estabelecimento de monopólios Naturalmente a lei de ferro da oligarquia não é uma lei de verdade no mesmo sentido das leis da física Ou seja não estabelece um caminho inevitável como bem ilustram a Revolução Gloriosa na Inglaterra ou a Restauração Meiji no Japão Um fator crucial nesses episódios que envolveram uma reviravolta crucial em direção a instituições inclusivas foi o empoderamento de ampla coalizão capaz de fazer frente ao absolutismo e substituir as instituições absolutistas por outras mais inclusivas e pluralistas Uma revolução encabeçada por uma coalizão ampla aumenta muito a probabilidade de emergência de instituições políticas pluralistas Em Serra Leoa e na Etiópia a lei de ferro da oligarquia mostrouse mais provável não só devido ao alto grau de extrativismo das instituições existentes mas também porque nem o movimento de independência na primeira nem o golpe do Derg na segunda foram revoluções realizadas por coalizões com essa característica mas por indivíduos e grupos ávidos por poder e por apropriarse eles mesmos das ferramentas de extração Existe outra faceta do círculo vicioso ainda mais destrutiva antecipada por nossa discussão do caso das cidadesestados maias no Capítulo 5 Quando as instituições extrativistas produzem imensas desigualdades na sociedade e conferem grande riqueza e poder irrestrito para quem estiver no comando muitos se disporão a lutar para assumir o controle do Estado e das instituições Assim as instituições extrativistas não só preparam o terreno para o próximo regime que será então ainda mais extrativista como também acarretam disputas internas e guerras civis ininterruptas conflitos civis que não só causam mais sofrimento humano como destroem qualquer eventual centralização do Estado que essas sociedades possam ter alcançado Assim em geral se deflagra por sua vez uma espiral descendente rumo à ilegalidade à falência do Estado e ao caos político esmagando toda e qualquer esperança de prosperidade econômica como ilustrará o próximo capítulo E 13 POR QUE AS NAÇÕES FRACASSAM HOJE COMO GANHAR A LOTERIA NO ZIMBÁBUE RA JANEIRO DE 2000 em Harare Zimbábue O mestre de cerimônias Fallot Chawawa estava encarregado de sortear o bilhete vencedor da loteria nacional organizada por um banco parcialmente estatal o Zimbabwe Banking Corporation Zimbank A loteria fora aberta a todos os clientes que houvessem mantido US5 mil ou mais do Zimbábue em suas contas durante o mês de dezembro de 1999 Quando Chawawa retirou o bilhete ficou perplexo Nas palavras da declaração pública do Zimbank o mestre de cerimônias Fallot Chawawa mal pôde crer no que seus olhos viam quando o bilhete sorteado para o prêmio de Z100000 lhe foi entregue e ele leu o nome de Sua Excelência RG Mugabe O Presidente Robert Mugabe que desde 1980 governava o Zimbábue por bem ou por mal geralmente com pulso de ferro ganhou o prêmio da loteria no valor de US100 mil do Zimbábue cerca de cinco vezes a renda anual per capita do país Segundo o Zimbank o nome de Mugabe fora sorteado dentre milhares de clientes possíveis Que homem de sorte Desnecessário dizer que a rigor ele não precisava do dinheiro Com efeito Mugabe recentemente concedera a si mesmo e ao seu gabinete aumentos salariais de até 200 O bilhete de loteria não passou de mais um indício das instituições extrativistas do Zimbábue Poderíamos qualificar o ocorrido como corrupção mas isso não passa de um sintoma do malestar institucional no Zimbábue O fato de Mugabe poder até ganhar na loteria se quisesse mostrou o grau de controle por ele exercido sobre o país e deu ao mundo um vislumbre da dimensão das instituições extrativistas do Zimbábue O motivo mais comum por que as nações fracassam hoje é o fato de suas instituições serem extrativistas Zimbábue sob o regime de Mugabe é um exemplo vívido das consequências econômicas e sociais Embora as estatísticas nacionais no país sejam muito pouco dignas de confiança a melhor estimativa é que em 2008 sua renda per capita caíra para cerca da metade da época da conquista da independência em 1980 Por mais dramático que esse dado possa parecer ele nem começa a descrever o grau de deterioração dos padrões de vida no Zimbábue O Estado ruiu e mais ou menos parou de prestar qualquer serviço público básico Em 20082009 a degeneração do sistema de saúde levou a um surto de cólera no país Em 10 de janeiro de 2010 havia 98741 casos relatados e 4293 mortos fazendo daquele o mais mortal surto de cólera na África dos últimos 15 anos Nesse ínterim o desemprego em massa também alcançou níveis sem precedentes No começo de 2009 o Gabinete de Coordenação de Assuntos Humanitários da ONU declarou que o índice de desemprego havia atingido o incrível patamar de 94 As origens de muitas instituições econômicas e políticas no Zimbábue como no caso da maior parte da África subsaariana remontam ao período colonial Em 1890 a Companhia Britânica da África do Sul comandada por Cecil Rhodes enviou uma expedição militar para o então reino dos ndebele sediado em Matabeleland e também para a vizinha Mashonaland A superioridade de seus armamentos assegurou sem dificuldade a supressão da resistência africana e em 1901 foi fundada a colônia de Rodésia do Sul nome em homenagem a Rhodes na área do atual Zimbábue Tendo convertido a região em uma concessão privada pertencente à Companhia Britânica da África do Sul Rhodes esperava ganhar dinheiro prospectando e garimpando minerais preciosos Seus planos não chegaram a decolar mas as riquíssimas terras agrícolas começaram a atrair imigrantes brancos Esses colonos não tardaram a apropriarse de boa parte do território Em 1923 haviam se libertado do controle da Companhia Britânica da África do Sul e persuadido o governo britânico a concederlhes autonomia parcial de governo O que se passou então é muito similar ao que ocorrido na África do Sul cerca de uma década antes Em 1913 a Lei das Terras Nativas páginas 205206 fundou uma economia dupla na África do Sul A Rodésia aprovou uma legislação muito similar e com inspiração no modelo sulafricano pouco depois de 1923 emergiu um estado de apartheid só para brancos Com o colapso dos impérios coloniais europeus em fins da década de 1950 e começo da de 1960 em 1965 a elite branca da Rodésia liderada por Ian Smith e compreendendo talvez 5 da população declarou independência da Inglaterra Poucos governos internacionais a reconheceram e a ONU decretou sanções econômicas e políticas contra a Rodésia Os cidadãos negros organizaram uma guerrilha com bases nos países vizinhos de Moçambique e Zâmbia As pressões internacionais e a rebelião encetada pelos dois grupos principais ZANU Zimbabwe African National Union União Nacional Africana do Zimbábue de Mugabe e ZAPU Zimbabwe African Peoples Union União do Povo Africano do Zimbábue encabeçado por Joshua Nkomo resultaram no fim negociado do domínio branco O Estado do Zimbábue foi criado em 1980 Após a independência Mugabe rapidamente estabeleceu seu controle pessoal ora eliminando violentamente seus opositores ora cooptandoos Os atos de violência mais egrégios ocorreram em Matabeleland principal fonte de apoio do ZAPU onde cerca de 20 mil pessoas foram mortas no começo dos anos 1980 Em 1987 o ZAPU havia se fundido com o ZANU criando o ZANUPF e Joshua Nkomo fora anulado politicamente Mugabe conseguiu reescrever a Constituição que herdara como parte da negociação da independência tornandose presidente havia começado como primeiro ministro e abolindo os títulos dos eleitores brancos parte integrante do acordo de independência até que em 1990 conseguiu livrarse em definitivo do Senado e introduzir cargos no Legislativo cujos ocupantes cabia a ele nomear O resultado foi um Estado de fato unipartidário encabeçado por Mugabe Por ocasião da independência Mugabe assumiu o controle de um conjunto de instituições econômicas extrativistas criadas pelo regime branco Aí figuravam uma variedade de regulamentações de preço e do comércio internacional indústrias estatizadas e as obrigatórias juntas comerciais agrícolas O funcionalismo público expandiuse rapidamente com a distribuição de cargos entre os partidários do ZANU PF O rígido controle da economia pelo governo interessava às elites do ZANUPF por dificultar o surgimento de uma classe independente de homens de negócios africanos que poderiam vir a desafiar o monopólio político então vigente situação muito similar àquela de Gana na década de 1960 como vimos no Capítulo 2 páginas 5053 Por ironia claro isso destinou aos brancos o papel de principal classe de negócios Durante esse período os pontos mais fortes da economia branca especialmente o setor altamente produtivo de agricultura de exportação permaneceu incólume Contudo essa situação duraria somente até Mugabe perder a popularidade O modelo de regulamentação e intervenção do mercado foi pouco a pouco se mostrando insustentável após uma grave crise fiscal teve início em 1991 um processo de reforma institucional com apoio do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional A deterioração do desempenho econômico levou por fim à emergência de uma séria oposição política ao governo unipartidário do ZANUPF o Movimento pela Mudança Democrática MDC As eleições parlamentares de 1995 nada tiveram de competitivas porém O ZANUPF obteve 81 dos votos conquistando 118 dos 120 assentos Desses membros do Parlamento 55 foram eleitos sem adversários As eleições presidenciais no ano seguinte apresentaram ainda mais indícios de irregularidades e fraude Mugabe recebeu 93 dos votos mas seus dois rivais Abel Muzorewa e Ndabaningi Sithole já haviam retirado suas candidaturas antes das eleições acusando o governo de coação e fraude Depois do ano 2000 apesar de toda a corrupção o domínio do ZANUPF começou a fraquejar Conseguiu apenas 49 dos votos populares e somente 63 assentos no Parlamento Todos foram contestados pelo MDC que conquistou todos os votos da capital Harare Nas eleições presidenciais de 2002 Mugabe venceu por pouco com apenas 56 do total de votos Nas duas votações o ZANUPF saiu vitorioso somente graças à violência e intimidação aliadas a fraude eleitoral Em resposta à perda de poder político Mugabe tratou de intensificar tanto a repressão quanto o uso da máquina estatal para angariar apoio Partindo para o ataque frontal aos proprietários de terras brancos começou a incentivar e apoiar a partir do ano 2000 uma ampla série de ocupações e expropriações de terras em geral conduzidas por associações de veteranos de guerra grupos supostamente compostos por antigos combatentes da guerra de independência Parte das terras expropriadas foi entregue a esses grupos mas boa parte delas foi parar também nas mãos das elites do ZANUPF A insegurança dos direitos de propriedade promovida por Mugabe e pelo ZANUPF levou a um colapso da produção e da produtividade agrícolas Com a falência da economia a única saída que restava era imprimir dinheiro para comprar apoio o que acarretou uma hiperinflação galopante Em janeiro de 2009 tornouse legal usar outras moedas como o rand sulafricano e o dólar do Zimbábue papel sem valor desapareceu de circulação O que se passou no Zimbábue a partir de 1980 foi lugarcomum na África subsaariana após a independência Em 1980 o Zimbábue herdou uma série de instituições econômicas e políticas altamente extrativistas mantidas relativamente intactas na primeira década e meia Por ocasião das eleições as instituições políticas eram tudo menos inclusivas Já as instituições econômicas mudaram um pouco a discriminação explícita dos negros por exemplo foi abolida Em seu conjunto porém permaneceram extrativistas com a única diferença de que em vez de o extrativismo ser promovido por Ian Smith e demais brancos agora eram Robert Mugabe e as elites do ZANUPF a encher seus bolsos Com o passar do tempo as instituições foram se tornando cada vez mais extrativistas e as fontes de renda do país entraram em colapso A falência econômica e política do Zimbábue é mais uma manifestação da lei de ferro da oligarquia nesse caso com o regime extrativista e repressor de Ian Smith sendo substituído pelo regime extrativista corrupto e repressor de Robert Mugabe A vitória forjada de Mugabe na loteria de 2000 não passou portanto da ponta de um iceberg de enorme corrupção ao longo da história AS NAÇÕES FRACASSAM HOJE porque suas instituições econômicas extrativistas são incapazes de engendrar os incentivos necessários para que as pessoas poupem invistam e inovem e suas contrapartes políticas lhes dão suporte à medida que consolidam o poder dos beneficiários do extrativismo As instituições econômicas e políticas extrativistas ainda que seus pormenores variem sob diferentes circunstâncias encontramse sempre na origem do fracasso Este muitas vezes como veremos nos casos da Argentina Colômbia e Egito assume a forma de insuficiência da atividade econômica em virtude da exploração dos recursos promovida pelos políticos que tratam de esmagar todo e qualquer tipo de atividade econômica independente que possa vir a ameaçálos e às elites econômicas Em certos casos extremos como no Zimbábue e em Serra Leoa que discutiremos a seguir as instituições extrativistas preparam o terreno para a total falência do Estado pondo não só a lei e a ordem a perder mas também mesmo os mais básicos incentivos econômicos O resultado é a estagnação econômica e como comprovam as histórias recentes de Angola Camarões Chade República Democrática do Congo Haiti Libéria Nepal Serra Leoa Sudão e Zimbábue conflitos civis migrações em massa fomes e epidemias tornando muitos desses países mais pobres hoje do que eram nos anos 1960 UMA CRUZADA DE CRIANÇAS Em 23 de março de 1991 um grupo de homens armados liderados por Foday Sankoh cruzou o limite entre Libéria e Serra Leoa e atacou a cidade fronteiriça serraleonense de Kailahun Sankoh excabo do Exército deste país fora feito prisioneiro após tomar parte de um golpe contra o governo de Siaka Stevens em 1971 Depois de libertado acabou indo parar na Líbia onde ingressou em um campo de treinamento mantido pelo ditador líbio Coronel Kaddafi para revolucionários africanos Lá conheceu Charles Taylor que planejava derrubar o governo liberiano Quando Taylor invadiu a Libéria na véspera de Natal de 1989 Sankoh estava ao seu lado e foi com um grupo de homens de Taylor em sua maioria liberianos e burquinabeses cidadãos de Burquina Faso que Sankoh invadiu Serra Leoa Autointitulavamse RUF sigla em inglês para Frente Unida Revolucionária Revolutionary United Front e anunciaram sua intenção de derrubar o governo corrupto e tirânico do APC Como vimos no capítulo anterior Siaka Stevens e seu All Peoples Congress o APC assumiram o controle das instituições coloniais de Serra Leoa e intensificaram seu extrativismo do mesmo modo como Mugabe e o ZANUPF fizeram no Zimbábue Em 1985 quando Stevens já com câncer colocou Joseph Momoh em seu lugar a economia estava em franco colapso Stevens aparentemente sem ironia gostava de citar o aforismo a vaca pasta onde a amarram Onde Stevens havia pastado então Momoh refestelouse As estradas se desintegraram as escolas ruíram A programação da televisão nacional foi encerrada em 1987 quando o transmissor foi vendido pelo ministro de Informações e em 1989 uma torre de rádio que repetia os sinais para fora de Freetown veio abaixo pondo fim às transmissões fora da capital Uma análise publicada em 1995 em um jornal da capital Freetown mostrouse muito acurada No fim de seu governo Momoh havia deixado de pagar os funcionários públicos professores e mesmo os Chefes Supremos O governo central havia se desagregado e como consequência inevitável havia incursões nas fronteiras rebeldes e armas automáticas afluindo pela fronteira com a Libéria O NPRC rebeldes e sobeldes soldados transformados em rebeldes contribuem para o caos que se espera encontrar quando o governo desaparece Nada disso é causa dos nossos problemas mas sintoma O colapso do Estado sob Momoh mais uma vez consequência do círculo vicioso desencadeado pelas instituições extremamente extrativistas de Stevens significava que não havia nada que impedisse a RUF de atravessar a fronteira em 1991 O Estado não dispunha de recursos para evitar a invasão Stevens já havia emasculado as Forças Armadas por receio de que elas tentassem derrubálo Assim foi fácil para um número relativamente pequeno de homens armados espalhar o caos pelo país Divulgaram até um manifesto intitulado Passos para a Democracia que começava com uma citação do intelectual negro Frantz Fanon Cada geração deve a partir da relativa obscuridade descobrir sua missão para então cumprila ou traíla A seção Pelo que estamos lutando principia da seguinte maneira Seguimos lutando por estarmos cansados de ser as eternas vítimas da pobreza patrocinada pelo Estado e da degradação humana que sobre nós se abate em decorrência de anos de militarismo e governo autocrático Contudo exercitaremos a continência e continuaremos aguardando com paciência nosso encontro com a paz onde seremos todos vitoriosos Nosso compromisso é com a paz imprescindível a todo custo mas não temos a menor intenção de nos tornarmos vítimas dela Sabemos que nossa causa é justa e DeusAlá jamais nos abandonará em nossa luta por reconstruir uma nova Serra Leoa Ainda que Sankoh e outras lideranças da RUF pudessem ter partido de reivindicações políticas e por mais que as necessidades do povo que sofria sob o jugo das instituições extrativistas do APC pudessem havêlos estimulado a princípio a ingressar no movimento a situação não tardou a mudar e escaparlhes ao controle A missão da RUF mergulhou Serra Leoa em agonia como revela o testemunho de um adolescente de Geoma no sul do país Eles reuniram um grupo Escolheram alguns dos nossos amigos e os mataram dois deles Eram filhos dos chefes tinham botas de soldados e bens em suas casas Atiraram neles sem nenhum outro motivo além da suspeita de estarem escondendo soldados Os chefes também foram mortos por serem membros do governo Indicaram um novo chefe Ainda insistiam em dizer que tinham vindo nos libertar do APC Depois de um tempo já não escolhiam mais pessoas para matar atiravam em qualquer um No primeiro ano da invasão todo e qualquer laivo intelectual que a RUF pudesse ter extinguiuse por completo Sankoh executava todos os que criticassem o recrudescimento das atrocidades Não tardou para que fossem poucos os que se juntavam voluntariamente à RUF que precisou recorrer então ao recrutamento compulsório sobretudo de crianças Com efeito era o que faziam todos os lados envolvidos inclusive o Exército Se a guerra civil serraleonense foi uma cruzada pela construção de uma sociedade melhor no fim das contas foi uma cruzada de crianças O conflito intensificouse com massacres e a violação generalizada dos direitos humanos incluindo estupros coletivos e amputação de mãos e orelhas Quando a RUF assumia o controle de determinada área entregavase também à exploração econômica prática mais evidente na mineração de diamantes onde a população era coagida a trabalhar no garimpo mas disseminada também em outros setores A RUF não era a única a perpetrar atrocidades massacres e trabalhos forçados organizados O governo fazia o mesmo Era de tal magnitude o colapso da lei e da ordem que era difícil para as pessoas distinguir os soldados dos rebeldes A disciplina militar desapareceu por completo Ao final da guerra em 2001 o saldo era provavelmente de 80 mil mortos além de um país devastado Estradas casas e edifícios foram completamente destruídos Até hoje quem chega a Koidu grande região diamantífera no leste do país avista filas de casas queimadas e cobertas de buracos de bala Em 1991 o Estado em Serra Leoa havia se desintegrado por completo Recordemos a prática inaugurada pelo Rei Shyaam com os bushong páginas 105106 ao estabelecer instituições extrativistas que consolidaram seu poder e lhe permitiram extrair os frutos produzidos pelo resto da sociedade Mesmo instituições extrativistas concentradas nas mãos de uma autoridade central representavam um avanço em relação à ausência de lei e ordem autoridade central e direitos de propriedade que caracterizava a sociedade lele do outro lado do Rio Cassai Tamanha falta de ordem e autoridade central tem sido o destino de um semnúmero de países africanos nas últimas décadas parcialmente porque o processo de centralização política sofreu um atraso histórico em grande parte da África subsaariana mas também porque o círculo vicioso de instituições extrativistas tratou de reverter qualquer centralização do Estado porventura existente abrindo caminho para a falência do Estado Durante os 10 anos de sua sangrenta Guerra Civil entre 1991 e 2001 Serra Leoa foi um caso típico de falência do Estado O processo teve início como qualquer outro país tolhido por instituições extrativistas ainda que de um tipo particularmente nocivo e ineficiente Os países tornamse Estados falidos não em virtude de sua geografia ou cultura mas em função do legado de instituições extrativistas que concentram o poder e a riqueza nas mãos de quem detém o controle do Estado preparando o terreno para agitação social conflitos e guerra civil As instituições extrativistas também contribuem diretamente para a gradual falência do Estado à medida que negligenciam os investimentos nos serviços públicos mais fundamentais exatamente o que aconteceu em Serra Leoa As instituições extrativistas que expropriam e empobrecem o povo e bloqueiam o desenvolvimento econômico são bastante comuns na África Ásia e América do Sul Charles Taylor ajudou a deflagrar a Guerra Civil em Serra Leoa ao mesmo tempo em que iniciava um conflito selvagem na Libéria que levou à falência do Estado também nesse país Encontrase esse mesmo padrão de colapso das instituições extrativistas degenerando em guerra civil e falência do Estado em outras regiões da África como em Angola Costa do Marfim República Democrática do Congo Moçambique República do Congo Somália Sudão e Uganda O extrativismo prepara o terreno para o conflito de modo semelhante às disputas geradas pelas instituições altamente extrativistas das cidadesestados maias quase mil anos atrás O conflito por sua vez precipita a falência do Estado Portanto outra causa do fracasso das nações hoje é a falência de seus respectivos Estados o que por sua vez é uma consequência de décadas de governo sob instituições econômicas e políticas extrativistas QUEM É O ESTADO Os casos do Zimbábue Somália e Serra Leoa ainda que típicos dos países pobres da África e talvez mesmo de alguns da Ásia parecem bastante extremos Dificilmente na América Latina encontraríamos países com Estados falidos onde seus presidentes teriam o atrevimento de ganhar a loteria não é Na Colômbia a Cordilheira dos Andes dissolvese gradualmente ao norte com uma vasta planície litorânea banhada pelo Mar do Caribe Os colombianos chamam essa área de tierra caliente terra quente em oposição à região andina da tierra fria terra fria Durante os últimos 50 anos a Colômbia foi considerada uma democracia pela maior parte dos cientistas políticos e governos Os Estados Unidos de bom grado negociam um potencial acordo de livre comércio com o país e despejam sobre ele todo tipo de assistência sobretudo de cunho militar Desde o encerramento em 1958 de um breve governo militar vêm sendo realizadas eleições regulares embora até 1974 um pacto assegurasse o revezamento no poder político e na presidência dos dois partidos políticos tradicionais os conservadores e os liberais Ademais tal pacto chamado de Frente Nacional foi ratificado pelo próprio povo colombiano por meio de um plebiscito o que confere ao país suficiente aparência democrática Apesar do longo histórico de eleições democráticas no país porém suas instituições não são inclusivas Pelo contrário sua trajetória ao longo do tempo vem sendo tolhida por violações das liberdades civis execuções extrajudiciais violência contra civis e guerra civil Nada mais longe do cenário que se espera de uma democracia A Guerra Civil na Colômbia é diferente da de Serra Leoa onde Estado e sociedade entraram em colapso e o caos se instaurou Mas não deixa de ser um conflito civil que já causou um número de mortes bem maior que o serraleonense Em parte aliás o governo militar dos anos 1950 foi uma resposta a uma guerra civil conhecida em espanhol como La Violencia A Violência Desde então uma variedade de grupos insurgentes em sua maioria revolucionários comunistas vem assolando o interior promovendo sequestros e assassinatos Na Colômbia rural para evitar uma dessas opções desagradáveis é preciso pagar a vacuna literalmente vacina isto é é preciso inocularse contra assassinatos ou sequestros mediante pagamentos mensais a determinado grupo de facínoras armados Nem todos os grupos armados na Colômbia são comunistas em 1981 membros da principal guerrilha comunista colombiana as Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia FARC Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia sequestraram um fabricante de laticínios Jesus Castaño morador de uma aldeia chamada Amalfi na terra quente região nordeste do departamento de Antioquia Foi pedido um resgate de US75 mil uma pequena fortuna na Colômbia rural Para levantar o dinheiro a família hipotecou a fazenda mas o pai foi encontrado morto do mesmo modo acorrentado a uma árvore Para três dos filhos de Castaño Carlos Fidel e Vicente foi a gota dágua Fundaram um grupo paramilitar Los Tangueros a fim de caçar membros das FARC e vingar o assassinato do pai Os irmãos revelaramse bons organizadores e seu bando não demorou a crescer e começar a encontrar interesses comuns com outros grupos paramilitares semelhantes que haviam surgido por motivos parecidos Em muitas regiões onde os colombianos sofriam nas mãos das guerrilhas de esquerda começaram a se formar milícias de direita Os paramilitares foram adotados pelos proprietários rurais para se defender das guerrilhas mas envolviamse também em tráfico de drogas extorsões sequestro e assassinato de cidadãos Em 1997 os paramilitares encabeçados pelos irmãos Castaño haviam conseguido compor uma milícia nacional batizada de Autodefensas Unidas de Colombia AUC Forças de Autodefesa Unidas da Colômbia que se expandiram por vastas áreas do país sobretudo pelas terras quentes nos departamentos de Córdoba Sucre Magdalena e César Em 2001 as AUC contavam talvez com 30 mil homens armados à sua disposição organizados em diferentes blocos paramilitares Em Córdoba havia o Bloque Catatumbo liderado por Salvatore Mancuso Com a ampliação de seu poder as AUC tomaram a decisão estratégica de imiscuirse na política Milicianos e políticos começaram a cortejarse Organizouse na cidade de Santa Fé de Ralito em Córdoba um encontro entre as lideranças das AUC e políticos proeminentes Foi emitido um documento conjunto um pacto reivindicando uma nova fundação do país assinado por membros de destaque das AUC como Jorge 40 alcunha de Rodrigo Tovar Pupo Adolfo Paz codinome de Diego Fernando Don Berna Murillo e Diego Vecino nome verdadeiro Edwar Cobo Téllez junto com políticos entre eles os senadores William Montes e Miguel de la Espriella A essa altura as AUC tinham sob seu controle vastas fatias do território colombiano sendo fácil para elas determinar os vencedores das eleições de 2002 para o Congresso e o Senado Por exemplo no município de San Onofre em Sucre a eleição foi encomendada pelo líder miliciano Cadena Corrente Uma testemunha ocular descreveu nos seguintes termos o que se passou Os caminhões enviados por Cadena percorreram os bairros corregimientos e regiões rurais de San Onofre recolhendo as pessoas Segundo alguns habitantes nas eleições de 2002 centenas de camponeses foram levados ao corregimiento Plan Parejo a fim de verem os rostos dos candidatos em quem teriam de votar nas eleições parlamentares Jairo Merlano para o Senado e Muriel Benito Rebollo para o Congresso Cadena pôs em uma bolsa os nomes dos membros do conselho municipal sorteou dois e disse que os mataria além de outras pessoas escolhidas ao acaso caso Muriel não vencesse Ao que parece a ameaça funcionou cada candidato obteve 40 mil votos em todo o departamento de Sucre Não admira que o prefeito de San Onofre tenha assinado o pacto de Santa Fé de Ralito Provavelmente um terço dos congressistas e senadores deveu sua eleição em 2002 ao apoio paramilitar e o Mapa 20 que mostra as áreas da Colômbia sob controle paramilitar demonstra o quanto seu poder era difundido O próprio Salvatore Mancuso expressouse do seguinte modo em uma entrevista Mapa 20 Presença paramilitar na Colômbia 19972005 Trinta e cinco por cento do Congresso foram eleitos em áreas dos estados dos grupos de autodefesa nos quais éramos nós que arrecadávamos impostos promovíamos a justiça dispúnhamos de suficiente controle militar e territorial da região e todos os que quisessem entrar na política tinham de lidar com os representantes políticos que havíamos reunido ali Não é difícil inferir os efeitos para a política e a sociedade do exercício de um controle paramilitar dessa magnitude sobre as instituições econômicas e as políticas públicas A expansão das AUC não foi um processo pacífico O grupo não só combatia as FARC mas também assassinava civis inocentes e aterrorizava e desalojava de suas casas centenas de milhares de pessoas Segundo o Internal Displacement Monitoring Centre IDMC Centro de Monitoramento de Refugiados Internos do Norwegian Refugee Council Conselho Norueguês para Refugiados no começo de 2010 cerca de 10 da população da Colômbia quase 45 milhões de pessoas eram compostos de refugiados internos Os milicianos também assumiram o governo e todas as suas funções exceto pelo fato de que as tarifas que arrecadavam não passavam de mera extorsão para seus próprios bolsos Um pacto extraordinário entre o líder paramilitar Martín Llanos nome verdadeiro Héctor Germán Buitrago e os prefeitos dos municípios de Tauramena Aguazul Maní Villanueva Monterrey e Sabanalarga no departamento de Casanare leste da Colômbia enumera as seguintes normas às quais os prefeitos deveriam aderir por determinação dos Camponeses Paramilitares de Casanare 1 Ceder 50 do orçamento municipal para ser administrado pelos Camponeses aramilitares de Casanare 2 10 de cada contrato municipal destinados aos Camponeses Paramilitares de Casanare 3 Comparecimento obrigatório a todos os encontros convocados pelos Camponeses Paramilitares de Casanare 4 Inclusão dos Camponeses Paramilitares de Casanare em todos os projetos de infraestrutura 5 Afiliação ao novo partido político formado pelos Camponeses Paramilitares de Casanare 6 Cumprimento de seu programa de governo Casanare não é um departamento pobre Pelo contrário é o departamento de maior receita per capita da Colômbia graças às suas consideráveis reservas de petróleo exatamente o tipo de recurso natural que enche os olhos dos milicianos Com efeito uma vez reforçado o seu poder eles trataram de intensificar a expropriação sistemática de bens alheios O próprio Mancuso teria acumulado US25 milhões em imóveis rurais e urbanos Estimase que as terras expropriadas na Colômbia por paramilitares cheguem a 10 do total de terras agrárias A Colômbia não é um Estado falido à beira do colapso mas é um Estado desprovido de suficiente centralização cuja autoridade sobre seu próprio território está longe de ser completa Embora seja capaz de proporcionar segurança e prestar serviços públicos em grandes áreas urbanas como Bogotá e Barranquilla há significativas áreas do país em que os serviços públicos são escassos e a lei e ordem parcas Aí grupos e indivíduos alternativos como Mancuso controlam a política e os recursos Há partes do país em que as instituições econômicas funcionam bastante bem e há elevados níveis de capital humano e competência empresarial em outras regiões as instituições altamente extrativistas são incapazes de oferecer sequer um grau mínimo de autoridade estatal Pode ser difícil compreender como uma situação assim chega a se sustentar por décadas ou mesmo séculos De fato porém verificase aí uma lógica própria como uma espécie de círculo vicioso A violência e a ausência de instituições estatais centralizadas constituem uma relação simbiótica em que os políticos gerenciam os aspectos funcionais da sociedade A simbiose decorre da exploração pelos políticos da falta de lei nas regiões periféricas do país enquanto o governo nacional deixa os grupos paramilitares à vontade para fazer o que bem entendem Esse padrão ficou particularmente evidente nos anos 2000 Em 2002 as eleições para presidente foram vencidas por Álvaro Uribe Uribe tinha algo em comum com os irmãos Castaño seu pai fora morto pelas FARC e sua campanha baseouse no repúdio às tentativas da administração anterior de fazer as pazes com elas Em 2002 sua votação foi 3 pontos percentuais maior nas áreas controladas por paramilitares do que naquelas sem milicianos Em 2006 quando foi reeleito obteve uma votação 11 pontos percentuais maior nessas mesmas regiões Se Mancuso e seus comparsas conseguiam comandar as votações para o Congresso e o Senado podiam repetir a façanha também nas eleições presidenciais sobretudo em se tratando de um candidato em íntima consonância com sua visão de mundo e grande probabilidade de mostrarse leniente com sua atuação Como declarou em setembro de 2005 Jairo Angarita representante de Salvatore Mancuso e exlíder dos blocos de Sinú e San Jorge das AUC ele tinha orgulho em trabalhar pela reeleição do melhor presidente que já tivemos Uma vez eleitos os senadores e deputados milicianos votaram de acordo com os interesses de Uribe especialmente no sentido de mudar a constituição de modo a permitir sua reeleição em 2006 o que não fora possível em 2002 Em troca o Presidente Uribe promulgou uma lei extremamente indulgente permitindo a desmobilização das milícias Desmobilização bem entendido significando não o fim do paramilitarismo mas tão somente sua institucionalização em grandes partes da Colômbia e do Estado colombiano que os milicianos haviam assumido e receberam permissão para manter Na Colômbia diversos aspectos das instituições econômicas e políticas foram se tornando mais inclusivos ao longo do tempo Todavia determinados elementos extrativistas significativos permanecem A ilegalidade e a insegurança dos direitos de propriedade são endêmicas em vastas parcelas do país consequência da falta de controle por parte do Estado nacional de muitas regiões bem como do formato específico assumido pela falta de centralização do Estado na Colômbia Todavia esse não é um cenário inevitável tratase da consequência de uma dinâmica que reflete o círculo vicioso as instituições políticas colombianas não geram incentivos para que os políticos prestem serviços públicos e promovam a lei e a ordem na maior parte do país nem impõem restrições suficientes aos seus atos para impedi los de firmar acordos implícitos ou explícitos com milicianos e facínoras EL CORRALITO No final de 2001 a Argentina encontravase em plena crise econômica Havia três anos que as receitas despencavam o desemprego disparava e o país havia acumulado uma dívida internacional estratosférica As políticas que haviam acarretado essa situação foram adotadas a partir de 1989 pelo governo de Carlos Menem na tentativa de conter a hiperinflação e estabilizar a economia Por algum tempo haviam logrado êxito Em 1991 Menem atrelou o peso argentino ao dólar americano Por lei um peso passou a ser equivalente a US1 e o câmbio permaneceria inalterado Ponto final Bem quase final A fim de convencer a população de que o governo pretendia de fato cumprir a lei as pessoas foram persuadidas a abrir contas bancárias em dólares Estes seriam usados nas lojas da capital Buenos Aires e sacados nos caixas eletrônicos de toda a cidade Tal medida talvez tivesse ajudado a estabilizar a economia se não fosse uma grande desvantagem as exportações argentinas encareceram demais e as importações estrangeiras baratearam Com isso as primeiras foram estancando até parar ao passo que as segundas jorravam A única maneira de pagar pelas importações era endividandose uma situação insustentável Cada vez mais preocupados com a sustentabilidade do peso os argentinos trataram de converter seu patrimônio em dólares depositados em suas contas correntes Afinal se o governo derrubasse a lei e desvalorizasse o peso todos estariam seguros com suas contas em dólares certo E tinham toda razão em preocuparse com o peso Porém foram demasiado otimistas com relação aos seus dólares Em 1o de dezembro de 2001 o governo congelou todas as contas bancárias em princípio por 90 dias Apenas uma pequena soma em dinheiro poderia ser sacada a cada semana No começo eram 250 pesos ainda equivalentes a US250 depois 300 pesos O saque contudo só podia ser efetuado de contas em pesos Não era permitido sacar de contas em dólares a menos que estes fossem convertidos em pesos o que ninguém queria fazer Os argentinos batizaram a situação de el Corralito curralzinho os depositantes viramse confinados em um curral como gado sem ter para onde ir Em janeiro ocorreu finalmente a desvalorização agora em vez de um peso para cada dólar logo eram quatro pesos por dólar Os defensores da poupança em dólares deviam ter se sentido justificados mas não pois o governo então converteu compulsoriamente em pesos todas as contascorrentes que estavam em dólar só que ao câmbio antigo de um para um Quem tivesse economizado US1 mil de repente viuse com apenas US250 O governo havia expropriado três quartos da poupança dos cidadãos A Argentina deixa os economistas perplexos Para ilustrar a dificuldade de se compreender o país o vencedor do Prêmio Nobel de Economia Simon Kuznets certa vez afirmou numa frase que ficaria célebre que havia quatro tipos de países os desenvolvidos os subdesenvolvidos o Japão e a Argentina Afinal na época da Primeira Guerra Mundial o país era um dos mais ricos do mundo iniciou então um declínio contínuo em relação aos demais países ricos da Europa Ocidental e da América do Norte que nas décadas de 1970 e 1980 tornouse um declínio absoluto Aparentemente o desempenho econômico argentino é intrigante mas as razões de sua decadência ficam mais claras quando examinadas sob a ótica das instituições inclusivas e extrativistas É verdade que antes de 1914 a Argentina experimentou cerca de 50 anos de crescimento econômico mas foi um caso clássico de crescimento sob instituições extrativistas Na época o país era governado por uma pequena elite com pesados investimentos na economia agrícola de exportação O crescimento econômico se deu graças à exportação de carne couro e grãos em um período de boom dos preços mundiais dessas commodities Como todas as experiências similares de crescimento sob instituições extrativistas não havia destruição criativa nem inovação envolvidas nem era uma situação sustentável Por volta da Primeira Guerra Mundial a crescente instabilidade política e uma sucessão de revoltas armadas levaram as elites argentinas a tentar abrir o sistema político com o efeito porém de mobilizar forças que elas não tinham condições de controlar Assim em 1930 ocorreu o primeiro golpe militar Entre esse ano e 1983 o país oscilou repetidamente entre o totalitarismo e a democracia bem como entre diversas instituições extrativistas Houve repressão em massa sob o regime militar que chegou ao seu auge na década de 1970 quando pelo menos nove mil pessoas provavelmente muito mais que isso foram ilegalmente executadas Centenas de milhares foram presos e torturados Nos períodos de governo civil havia eleições uma democracia entre aspas por assim dizer pois o sistema político estava longe de ser inclusivo A partir da ascensão de Perón nos anos 1940 a democracia argentina esteve dominada pelo partido político fundado por ele o Partido Justicialista em geral chamado apenas de Peronista Os peronistas venciam as eleições graças a uma portentosa máquina política que lhes angariava a vitória por meio da compra de votos da patronagem e da corrupção generalizada incluindose a concessão de contratos e cargos no governo em troca de apoio político Em certo sentido era uma democracia ainda que nada pluralista O poder estava altamente concentrado nas mãos do Partido Peronista que não era submetido a praticamente nenhuma restrição ao menos quando os militares não se davam ao trabalho de derrubálo do poder Como já vimos páginas 256258 se a Suprema Corte se pusesse no caminho de determinada medida pior para ela Na década de 1940 Perón havia cultivado o movimento trabalhista como base política Ao verse enfraquecido pela repressão militar nos anos 1970 e 1980 seu partido optou por comprar outros votos As políticas e instituições econômicas tinham por objetivo assegurar a receita de seus aliados não garantir igualdade de condições para todos Quando nos anos 1990 o Presidente Menem deparouse com uma limitação no número de mandatos que o impediria de concorrer à reeleição aplicou o mesmo princípio reescreveu a constituição e livrouse do inconveniente Como demonstra o caso de el Corralito mesmo contando com eleições e governos eleitos pelo voto popular estes são perfeitamente capazes de ignorar os direitos de propriedade e expropriar impunemente os próprios cidadãos Os presidentes argentinos e suas elites políticas praticamente não estão submetidos a nenhuma restrição e sem dúvida a nenhum pluralismo O que intrigava Kuznets e decerto tantos outros que visitam Buenos Aires é o fato de a cidade parecer tão diferente de Lima Cidade da Guatemala ou mesmo Cidade do México Não se veem indígenas nem descendentes dos antigos escravos O que salta aos olhos é a arquitetura gloriosa e os prédios erguidos durante a Belle Époque os anos de crescimento sob instituições extrativistas Todavia em Buenos Aires vêse apenas parte da Argentina Menem por exemplo não era da capital Nasceu em Anillaco na província de La Rioja nas montanhas a noroeste da capital e cumpriu três mandatos como governador provincial Na época da conquista das Américas pelos espanhóis essa região do país era uma parte remota do Império Inca e apresentava densa população indígena ver o Mapa 1 Os espanhóis trataram de ali estabelecer encomiendas levando ao florescimento de uma economia altamente extrativista baseada na produção de alimentos e na criação de mulas para os mineiros de Potosí ao norte De fato La Rioja era muito mais próxima de Potosí no Peru e na Bolívia do que de Buenos Aires No século XIX a região produziu o célebre líder militar Facundo Quiroga que governou a região com mão de ferro e marchou com seu exército sobre a capital A história do desenvolvimento das instituições políticas argentinas é a história de como as províncias interioranas como La Rioja foram firmando acordos com Buenos Aires os quais na verdade eram tréguas os senhores da guerra de La Rioja concordaram em deixar Buenos Aires em paz para que suas elites pudessem ganhar dinheiro em troca estas desistiram de reformar as instituições do interior Assim embora a princípio os argentinos pareçam habitar um mundo muito distinto daquele dos peruanos e bolivianos as diferenças se desvanecem quando se deixa as elegantes avenidas de Buenos Aires para trás É a incorporação das preferências e da política do interior às instituições do país que explica o fato de a Argentina apresentar uma trajetória institucional tão semelhante às de outros países latinoamericanos extrativistas Essa incapacidade de fomentar instituições políticas ou econômicas inclusivas por meio do processo eleitoral é típica da América Latina Na Colômbia os paramilitares conseguem definir um terço dos resultados das eleições nacionais Na Venezuela de hoje como na Argentina o governo democraticamente eleito de Hugo Chávez investe contra seus opositores demiteos de cargos no setor público fecha jornais cujos editoriais contrariem seus interesses e expropria propriedades Chávez é muito mais poderoso e encontra muito menos empecilhos do que Sir Robert Walpole com sua tentativa malograda de condenar John Huntridge sob a Lei Negra páginas 235239 na GrãBretanha da década de 1720 Huntridge não teria se dado tão bem na Venezuela ou na Argentina de hoje Por mais que a democracia que emerge na América Latina seja em princípio diametralmente oposta ao predomínio das elites e tanto em sua retórica quanto em seus atos procure promover uma redistribuição dos direitos e oportunidades detidos por pelo menos um segmento da elite seus fundamentos encontramse firmemente arraigados em regimes extrativistas em dois sentidos Em primeiro lugar a persistência por séculos das desigualdades sob regimes extrativistas leva os eleitores nas democracias emergentes a votar em favor de políticos com programas radicais Não que os argentinos não passem de uns ingênuos que acreditam piamente que Juan Perón ou os políticos peronistas mais recentes como Menem ou os Kirchners sejam altruístas preocupados tão somente com os interesses do país ou que os venezuelanos vejam em Chávez a sua salvação Pelo contrário não poucos argentinos e venezuelanos reconhecem que todos os demais políticos e partidos mostraramse por muito tempo incapazes de lhes dar voz proporcionarlhes os serviços públicos mais básicos como estradas e educação e protegêlos da exploração por parte das elites locais Muitos venezuelanos hoje apoiam as políticas adotadas por Chávez ainda que venham acompanhadas de corrupção e desperdício do mesmo modo como muitos argentinos apoiaram as políticas de Perón nas décadas de 1940 e 1970 Em segundo lugar mais uma vez são as instituições extrativistas subjacentes que tornam a política tão favorável e proveitosa para homens fortes como Perón e Chávez em vez de constituir um sistema partidário eficaz na produção de alternativas desejáveis em termos sociais Perón Chávez e dezenas de outros homens fortes latinoamericanos não passam de mais um aspecto da lei de ferro da oligarquia e como o nome indica as raízes dessa lei encontramse no controle subliminar do regime pelas elites O NOVO ABSOLUTISMO Em novembro de 2009 o governo da Coreia do Norte implementou o que os economistas chamam de reforma monetária Em geral esse tipo de iniciativa é causado por surtos inflacionários Na França em janeiro de 1960 uma reforma monetária introduziu um novo franco equivalente a 100 dos francos anteriores Os velhos francos continuaram em circulação e as pessoas continuaram cotando os preços na moeda antiga enquanto a transição paulatina para os novos francos ainda se dava Por fim os velhos francos perderam a validade em janeiro de 2002 quando a França introduziu o euro A reforma nortecoreana à primeira vista pareceu similar Como os franceses em 1960 o governo nortecoreano decidiu tirar dois zeros da moeda Cem dos velhos wons a moeda do país passariam a valer um won novo Os indivíduos poderiam trocar a moeda antiga pela nova mas teriam apenas uma semana para tanto não 42 anos como no caso francês Aí vinha a pegadinha o governo anunciou que ninguém poderia converter mais de 100 mil wons embora o valor posteriormente fosse ampliado para 500 mil Cem mil wons correspondiam a cerca de US40 no câmbio negro De um só golpe o governo varreu do mapa uma enorme fração da riqueza privada dos cidadãos nortecoreanos não se sabe exatamente quanto mas o valor é provavelmente maior do que o total expropriado pelo governo argentino em 2002 O governo da Coreia do Norte é uma ditadura comunista que se opõe à propriedade privada e aos mercados Entretanto é difícil controlar o mercado negro e nele as transações se dão em dinheiro vivo Claro há sempre alguma moeda estrangeira em jogo sobretudo chinesa mas muitas vezes é o won que circula A reforma monetária pretendia punir os usuários desse mercado paralelo e mais especificamente certificarse de que eles não acumulassem fortuna ou poder suficientes para representar uma ameaça ao regime Era mais seguro mantêlos pobres Mas a questão não era só o mercado negro Os nortecoreanos também mantêm suas economias em wons porque há poucos bancos no país todos pertencentes ao governo Na verdade a reforma serviu para expropriar boa parte da poupança da população Por mais que o governo diga que considera o mercado um mal a verdade é que a elite nortecoreana aprecia bastante o que ele pode lhe proporcionar O líder Kim Jong Il falecido em dezembro de 2011 e sucedido pelo filho Kim Jongun usufruia de um palácio de sete andares equipado com bar aparelho de karaokê e um pequeno movie theater No térreo há uma piscina imensa com uma máquina de ondas onde Kim gostava de usar uma prancha munida de um motorzinho Quando em 2006 os Estados Unidos impuseram sanções à Coreia do Norte sabiam exatamente como atingir o regime onde mais doeria Assim proibiram a exportação de mais de 60 artigos de luxo para o país dentre os quais iates jet skis carros de corrida motocicletas aparelhos de DVD e televisões de mais de 29 polegadas Nada mais de echarpes de seda canetas tinteiro assinadas peles nem malas de couro exatamente os itens colecionados por Kim e as elites do Partido Comunista Um estudioso com base nas vendas da empresa francesa Hennessy estimou em US800 mil o orçamento anual de Kim para conhaque antes das sanções É impossível compreender muitas das mais pobres regiões do mundo no fim do século XX sem um entendimento do novo absolutismo do século XX o comunismo Marx vislumbrou um sistema capaz de gerar prosperidade sob condições mais humanas e sem desigualdade Lênin e seu Partido Comunista foram inspirados por ele mas a prática não podia estar mais distante da teoria A Revolução Bolchevique de 1917 foi um evento sangrento que nada teve de humano A igualdade não entrou na equação tampouco já que a primeira coisa que Lênin e seu séquito fizeram foi instalar uma nova elite eles mesmos à frente do Partido Bolchevique Para levar a cabo seus planos trataram de expurgar e assassinar não só elementos não comunistas mas também outros comunistas que pudessem vir a representar uma ameaça ao seu poder No entanto as verdadeiras tragédias ainda estavam por vir primeiro a Guerra Civil depois a coletivização e os recorrentes expurgos de Stálin em que talvez 40 milhões tenham perecido O comunismo russo foi brutal repressivo e sangrento mas não foi um caso isolado As consequências econômicas e o sofrimento humano foram análogos aos de outros exemplos como por exemplo o Camboja da década de 1970 sob o Khmer Vermelho a China e a própria Coreia do Norte Em todos esses casos o comunismo acarretou regimes totalitaristas viciosos e abusos generalizados dos direitos humanos Além da carnificina e do sofrimento humano todos os regimes comunistas estabeleceram vários tipos de instituições extrativistas As de ordem econômica houvesse ou não mercados eram elaboradas especificamente com vistas à extração de recursos da população e em seu absoluto repúdio aos direitos de propriedade em geral acarretavam pobreza em vez de prosperidade No caso soviético como vimos no Capítulo 5 o sistema comunista a princípio engendrou um crescimento acelerado mas depois tropeçou e produziu estagnação As consequências foram muito mais devastadoras na China de Mao no Camboja do Khmer Vermelho e na Coreia do Norte onde as instituições econômicas comunistas conduziram ao colapso econômico e à fome As instituições econômicas comunistas eram por sua vez sustentadas por instituições políticas extrativistas que concentravam todo o poder nas mãos dos partidos comunistas sem impor qualquer restrição ao seu exercício Por mais diversas que essas instituições pudessem parecer em sua forma seus efeitos sobre os meios de vida da população eram análogos aos das instituições extrativistas do Zimbábue e de Serra Leoa ONDE O ALGODÃO É REI O algodão responde por cerca de 45 das exportações do Uzbequistão o que faz dele o produto agrícola mais importante do país desde o estabelecimento da independência a partir do desmanche da União Soviética em 1991 Na vigência do comunismo soviético todas as terras aráveis do Uzbequistão encontravamse sob o controle de 2048 fazendas estatais que após 1991 foram dissolvidas e a terra distribuída Contudo isso não significava que os fazendeiros tivessem autonomia para agir O algodão era demasiado valioso para o novo governo do primeiro e até agora único presidente do Uzbequistão Ismail Karimov Assim foram introduzidas regulamentações determinando o que os produtores poderiam plantar e exatamente por quanto poderiam vendêlo O algodão é uma exportação valiosa e os agricultores recebem uma fração ínfima dos valores praticados no mercado mundial o restante fica com o governo Como ninguém plantaria algodão por esses preços o governo os obriga Hoje cada fazendeiro tem de reservar 35 de suas terras ao algodão o que causou muitos problemas sendo um deles as dificuldades com o maquinário Na época da independência cerca de 40 da safra era colhida por colheitadeiras Após 1991 não surpreende em vista dos incentivos criados pelo regime do Presidente Karimov para os agricultores que estes não se mostrassem nem um pouco dispostos nem a adquirilas nem a cuidar de sua manutenção Reconhecendo o problema Karimov saiu se com uma solução na realidade uma opção mais barata que as colheitadeiras crianças em idade escolar As cápsulas de algodão começam a amadurecer e estão no ponto para a colheita no começo de setembro mais ou menos na altura da volta às aulas Karimov determinou que os governadores locais enviassem cotas de entrega de algodão às escolas No começo de setembro os bancos escolares perdem 27 milhões de alunos dados de 2006 Os professores em vez de instrutores tornamse recrutadores de mão de obra Gulnaz mãe de duas dessas crianças explicou o que acontece No começo de cada ano letivo aproximadamente no princípio de setembro as aulas são suspensas e em vez de irem para a escola as crianças vão para a colheita do algodão Ninguém pede autorização dos pais Não há descanso no fim de semana durante a colheita Se por algum motivo uma criança fica em casa seu professor ou o tutor da turma aparece para denunciar os pais É feito um planejamento para cada uma de 2060 kg diários dependendo da idade Se alguma delas deixa de atingir sua meta na manhã seguinte é repreendida na frente de toda a classe A colheita se estende por dois meses As crianças da região rural que têm a sorte de ser designadas para fazendas perto de casa podem ir andando ou são levadas de ônibus para o trabalho As que moram mais longe ou vêm das cidades têm de dormir nos telheiros ou currais junto com as máquinas e o gado Não há banheiros nem cozinhas As crianças têm de levar sua própria comida para o almoço Os principais beneficiários de todo esse trabalho forçado são as elites políticas encabeçadas pelo Presidente Karimov o rei de fato de todo o algodão uzbeque Em tese os estudantes são pagos pelo trabalho mas só em tese Em 2006 quando o preço mundial do algodão girava em torno de US140 por quilo as crianças recebiam cerca de US003 por sua cota diária de 2060 kg Provavelmente 75 do algodão são hoje colhidos por crianças Na primavera as escolas fecham as portas para a capina do solo e transplante de mudas Como se chegou a esse ponto Supunhase que o Uzbequistão como as demais repúblicas socialistas soviéticas conquistasse a independência após o colapso da União Soviética e desenvolvesse uma democracia e uma economia de mercado Todavia como em muitas outras repúblicas soviéticas não foi o que aconteceu O Presidente Karimov que iniciou sua carreira política no Partido Comunista da antiga União Soviética e ascendeu ao cargo de primeiro secretário do Uzbequistão no oportuno momento de 1989 exatamente quando o Muro de Berlim vinha abaixo conseguiu reinventarse como nacionalista Contando com o crucial apoio das forças de segurança em dezembro de 1991 venceu a primeira eleição presidencial da história do Uzbequistão Uma vez no poder abateuse sobre a oposição independente Hoje seus adversários políticos estão presos ou exilados Não existe imprensa livre no país e não são permitidas organizações não governamentais O auge da repressão crescente ocorreu em 2005 quando possivelmente 750 manifestantes talvez mais foram assassinados pela polícia e pelo exército em Andijon Valendose de seu controle das forças de segurança e domínio absoluto da mídia Karimov primeiro estendeu seu mandato presidencial por cinco anos mediante um referendo para em seguida conquistar a reeleição em 2000 para um novo mandato de sete anos com 912 dos votos Seu único oponente declarou ter votado em Karimov Em sua reeleição de 2007 amplamente considerada fraudulenta obteve 88 dos votos As eleições no Uzbequistão são semelhantes àquelas organizadas por Joseph Stálin no apogeu da União Soviética Uma delas em 1937 celebrizouse pela cobertura de Harold Denny correspondente do New York Times que reproduziu uma tradução do Pravda o jornal do Partido Comunista a fim de transmitir a tensão e excitação das eleições soviéticas Soa a meianoite O dia 12 de dezembro data das primeiras eleições gerais igualitárias e diretas para o Soviete Supremo chega ao fim O resultado da votação logo será anunciado A comissão permanece só em sua sala O silêncio é total e as luzes refulgem com brilho solene Em meio à profunda e expectante atenção de todos o presidente da mesa desincumbese de todas as formalidades necessárias antes de proceder à contagem das cédulas confere na lista quantos eram os votantes e quantos efetivamente votaram e o resultado é 100 100 Que eleição em que país para que candidato contou com 100 de resposta A tarefa maior tem início agora Alvoroçado o presidente inspeciona os selos das urnas Estes são em seguida verificados também pelos membros do comitê intactos São cortados e as urnas abertas O silêncio impera Inspetores e agentes eleitorais permanecem circunspectos e graves em seus assentos É chegado o momento de abrir os envelopes Três membros do comitê empunham suas tesouras O presidente põese de pé Os escrivães têm seus livros abertos O primeiro envelope é aberto Todos os olhos estão voltados em sua direção O presidente retira duas cédulas uma branca para um candidato ao Soviete da União e outra azul para um candidato ao Soviete das Nacionalidades e lê alto Camarada Stálin De imediato a solenidade é quebrada Todos os presentes de um salto aplaudem cheios de alegria e paixão o primeiro voto da primeira eleição geral secreta sob a constituição stalinista um voto no nome do autor da Constituição Esse mesmo clima teria capturado também o suspense em torno das reeleições de Karimov que vem se revelando um digno pupilo de Stálin no tocante à repressão e controle político e parece organizar eleições que rivalizam com as do mestre em seu surrealismo As instituições econômicas e políticas do Uzbequistão de Karimov são extremamente extrativistas É um país pobre Provavelmente um terço da população vive na pobreza com renda anual média em torno de US1 mil Nem todos os indicadores de desenvolvimento são ruins Segundo dados do Banco Mundial a taxa de matrículas escolares é de 100 com a possível exceção da temporada de colheita do algodão Os índices de alfabetização são também bastante altos muito embora além de controlar todos os meios de comunicação o governo também proíba livros e censure a internet Enquanto a maioria dos trabalhadores recebe apenas uns míseros centavos por dia na colheita do algodão a família Karimov e antigos quadros comunistas que se reinventaram após 1989 como as novas elites econômicas e políticas uzbeques vêm amealhando uma fabulosa riqueza Os interesses econômicos familiares são administrados pela filha de Karimov Gulnora que deve suceder o pai na presidência Em um país tão pouco transparente e cheio de segredos ninguém sabe ao certo o que a família Karimov controla nem quanto dinheiro ganha mas a experiência da empresa americana Interspan é sugestiva do que se passou na economia do país nas últimas duas décadas O algodão não é o único produto agrícola determinadas regiões do país são ideais para o cultivo do chá e a Interspan decidiu investir nessas áreas Em 2005 tinha se apoderado de mais de 30 do mercado local quando então começaram os problemas Gulnora chegou à conclusão de que a indústria do chá parecia bastante promissora economicamente Não demorou para que os funcionários locais da Interspan começassem a ser sistematicamente presos surrados e torturados As operações tornaramse inviáveis e em agosto de 2006 a empresa deixou o país Seus negócios passaram para as mãos da família Karimov cujas atividades no setor expandiamse rapidamente e na época representavam 67 do mercado em contraste com os 2 de poucos anos antes Sob muitos aspectos o Uzbequistão parece uma relíquia do passado de uma era esquecida que está definhando sob o absolutismo de uma única família e seus comparsas com uma economia baseada em trabalhos forçados especificamente trabalhos forçados de crianças Contudo não se trata de um caso isolado O país é mais uma peça do atual mosaico de sociedades que estão indo à falência sob instituições extrativistas e infelizmente tem muito em comum com outras exrepúblicas socialistas soviéticas que compreendem desde a Armênia e o Azerbaijão até o Quirguistão o Tadjiquistão e o Turcomenistão Esses casos nos lembram que mesmo no século XXI as instituições econômicas e políticas extrativistas podem assumir uma forma atroz e despudoradamente extrativista GARANTINDO CONDIÇÕES DESIGUAIS PARA TODOS A década de 1990 foi um período de reforma no Egito Desde o golpe militar que destronou a monarquia em 1954 o Egito vinha sendo governado como uma sociedade semissocialista em cuja economia o governo desempenhava papel central Muitos setores eram dominados por empresas estatais Ao longo dos anos a retórica socialista entrou em declínio os mercados se abriram e o setor privado se desenvolveu Não eram porém mercados inclusivos uma vez que se encontravam sob o controle do Estado e de um punhado de empresários aliados ao Partido Nacional Democrático PND fundado pelo Presidente Anwar Sadat em 1978 O envolvimento dos empresários com o partido e viceversa só fez aumentar durante o governo de Hosni Mubarak Este que se tornou presidente em 1981 após o assassinato de Anwar Sadat governou com o PND até ser forçado a renunciar por uma série de protestos populares e pelos militares em fevereiro de 2011 como discutimos no Prefácio página 1 Grandes empresários foram nomeados para cargos centrais no governo em áreas intimamente relacionadas aos seus interesses econômicos Rasheed Mohamed Rasheed expresidente da Unilever AMET África Oriente Médio e Turquia tornouse ministro da Indústria e Comércio Exterior Mohamed Zoheir Wahid Garana proprietário e gerentegeral da Garana Travel Company uma das maiores do Egito foi designado para o Ministério do Turismo Amin Ahmed Mohamed Osman Abaza fundador da Nile Cotton Trade Company maior exportadora de algodão do país tornouse ministro da Agricultura Em diversos setores da economia os empresários persuadiram o governo a erguer barreiras protecionistas entre eles as indústrias de comunicação metalurgia e siderurgia automobilística de bebidas alcoólicas e cimento Cada qual se tornou muito concentrado com medidas que protegiam empresários e firmas todos politicamente interligados Grandes empresários próximos ao regime como Ahmed Ezz metalurgia e siderurgia a família Sawiris multimídia bebidas e telecomunicações e Mohamed Nosseir bebidas e telecomunicações eram agraciados não só com a proteção do Estado mas também venciam concorrências públicas e obtinham grandes empréstimos bancários sem precisar apresentar garantias Ahmed Ezz era ao mesmo tempo presidente do Conselho da Ezz Steel maior siderúrgica da indústria egípcia que respondia por 70 do aço do país e alto dignitário do PND presidente do Comitê de Planejamento e Orçamento da Assembleia do Povo e colaborador próximo de Gamal Mubarak um dos filhos do Presidente Mubarak As reformas econômicas da década de 1990 conduzidas por economistas e instituições financeiras internacionais visavam à libertação dos mercados e redução do papel do Estado na economia Um dos pilares centrais dessas reformas é sempre a privatização de bens estatais No México o processo de privatização páginas 2930 em vez de aumentar a concorrência limitouse a converter os monopólios estatais em privados promovendo o enriquecimento de empresários com boas conexões políticas como Carlos Slim Ocorreu exatamente o mesmo no Egito Empresários ligados ao regime exerceram forte influência sobre a implementação do programa de privatização egípcio induzindoo a favorecer a próspera elite empresarial as baleias como são conhecidos por lá Na época em que as privatizações começaram a economia do país era dominada por 32 dessas baleias Uma deles era Ahmed Zayat que estava à frente do Luxor Group Em 1996 o governo decidiu privatizar a Al Ahram Beverages ABC detentora do monopólio da fabricação de cerveja no Egito Um consórcio da Egyptian Finance Company comandada pelo incorporador imobiliário Farid Saad com a primeira empresa de capital de risco constituída no Egito em 1995 apresentou uma proposta O consórcio incluía Fouad Sultan exministro do Turismo Mohamed Nosseir e Mohamed Ragab outro empresário da elite Era um grupo bem relacionado mas não bem relacionado o bastante Seu lance de 400 milhões de libras egípcias foi recusado por ser demasiado baixo Zayat tinha conexões melhores Na falta do capital necessário para a compra da ABC saiuse com um plano de uma engenhosidade digna de um Carlos Slim Ao ser negociado pela primeira vez na Bolsa de Valores de Londres o Luxor Group adquiriu 749 das ações da ABC a 685 libras egípcias cada Três meses depois as ações foram duplicadas e o Luxor Group vendeuas todas a 525 libras cada obtendo um lucro líquido de 36 com o qual Zayat conseguiu custear a aquisição da ABC no mês seguinte por 231 milhões de libras Na época a ABC contava com lucro anual em torno de 413 milhões de libras egípcias e dispunha de reservas orçamentárias de 93 milhões de libras egípcias Uma pechincha Em 1999 a recémprivatizada ABC ampliou seu monopólio da cerveja para o vinho ao adquirir o monopólio nacional privatizado também deste a Gianaclis uma empresa altamente rentável protegida por uma tarifa alfandegária de 3000 sobre os vinhos importados e com margem de lucro de 70 sobre suas vendas Em 2002 o monopólio mais uma vez mudou de mãos quando Zayat vendeu a ABC para a Heineken por 13 bilhão de libras egípcias um lucro de 563 em cinco anos Mohamed Nosseir nem sempre ficou do lado dos perdedores Em 1993 comprou a privatizada El Nasr Bottling Company detentora do monopólio do engarrafamento e venda da CocaCola no Egito As relações de Nosseir com o então primeiroministro do setor de empresas públicas Atef Ebeid permitiramlhe efetuar a compra sem grande concorrência Dois anos depois Nosseir venderia a empresa por um valor correspondente a mais de três vezes o preço de aquisição Outro exemplo foi a medida em fins dos anos 1990 de envolver a iniciativa privada na indústria cinematográfica estatal Mais uma vez as ligações políticas fizeram com que apenas duas famílias tivessem autorização para entrar na concorrência e operar os cinemas uma delas a família Sawiris O Egito hoje é um país pobre não tão pobre quanto a maioria dos países ao sul na África subsaariana mas onde cerca de 40 da população ainda se encontra em grande pobreza e sobrevive com menos de US2 por dia Ironicamente como já vimos páginas 4849 no século XIX o país sediou sob Muhammad Ali uma tentativa a princípio bemsucedida de transformação institucional e modernização econômica o que de fato acarretou um período de crescimento econômico extrativista antes de sua anexação definitiva ao Império Britânico Do período colonial britânico emergiu um conjunto de instituições extrativistas ao qual as Forças Armadas a partir de 1954 dariam continuidade Verificouse algum crescimento econômico e investimento em educação mas a maioria da população contava com escassas oportunidades econômicas ao passo que a nova elite podia beneficiarse de suas conexões com o governo Mais uma vez essas instituições econômicas extrativistas tiveram suas contrapartes políticas como esteio O Presidente Mubarak pretendia dar início a uma dinastia política e preparava seu filho Gamal para substituílo Seus planos só foram abreviados pelo colapso de seu regime extrativista no começo de 2011 perante a agitação social generalizada e as manifestações da chamada Primavera Árabe Durante o período em que Nasser ocupou a presidência despontaram alguns aspectos inclusivos das instituições econômicas o Estado de fato abriu o sistema educacional e surgiram determinadas oportunidades que o regime anterior do Rei Farouk nunca havia oferecido Contudo foi um exemplo de combinação instável de instituições políticas extrativistas com algum grau de inclusão por parte das instituições econômicas O resultado inevitável advindo durante o mandato de Mubarak foi que as instituições econômicas tornaramse mais extrativistas refletindo a distribuição de poder político na sociedade Em certo sentido a Primavera Árabe foi uma reação a tudo isso tanto no caso do Egito quanto no da Tunísia onde três décadas de crescimento sob instituições políticas extrativistas começaram a entrar em reversão à medida que o Presidente Ben Ali e sua família vampirizavam a economia cada vez mais POR QUE AS NAÇÕES FRACASSAM As nações fracassam economicamente devido ao extrativismo de suas instituições São elas que mantêm os países pobres na pobreza e os impedem de enveredar por um caminho de crescimento econômico É o caso hoje na África de lugares como Zimbábue e Serra Leoa na América do Sul de países como Colômbia e Argentina na Ásia de lugares como Coreia do Norte e Uzbequistão e no Oriente Médio de nações como o Egito As diferenças entre esses países são evidentes Alguns são de clima tropical outros se encontram em latitudes temperadas Alguns foram colônias britânicas outros do Japão da Espanha e da Rússia Apresentam as mais diversas histórias idiomas e culturas O que todos têm em comum são as instituições extrativistas Em todos esses casos a base dessas instituições é uma elite que estrutura as instituições econômicas de modo a locupletarse e perpetuar o próprio poder em detrimento da vasta maioria da população As diferentes histórias e estruturas sociais desses países produzem peculiaridades na natureza das elites e nos detalhes das instituições extrativistas entretanto a razão da persistência dessas instituições extrativistas está sempre relacionada ao círculo vicioso e as consequências dessas instituições em termos do empobrecimento de seus cidadãos são similares por mais distintas que sejam em sua intensidade No Zimbábue por exemplo a elite compreende Robert Mugabe e o núcleo do ZANUPF que encabeçou a luta anticolonial na década de 1970 Na Coreia do Norte corresponde à corriola do já falecido Kim JongIl e do Partido Comunista No Uzbequistão é composta pelo Presidente Ismail Karimov sua família e seus comparsas reciclados da era soviética São grupos obviamente muito distintos entre si e são justamente essas diferenças junto com a diversidade das entidades políticas e economias por eles governados que tornam tão variáveis as formas específicas assumidas por suas respectivas instituições extrativistas Por exemplo por ter sido criada a partir de uma revolução comunista a Coreia do Norte toma como modelo político o modelo unipartidário do Partido Comunista Ainda que Mugabe tenha convidado as Forças Armadas nortecoreanas nos anos 1980 a ajudálo a massacrar seus oponentes em Matabeleland esse modelo de instituição política extrativista não seria aplicável ao Zimbábue Pelo contrário pelo fato de ter ascendido ao poder no contexto da luta anticolonial Mugabe precisou disfarçar seu regime com eleições ainda que por algum tempo ele tenha logrado de fato arquitetar um Estado unipartidário consagrado por vias constitucionais Em contrapartida a Colômbia possui um longo histórico de eleições que despontaram após a independência da Espanha como método de partilha do poder entre os Partidos Liberal e Conservador E não é só em sua natureza que as elites podem diferir mas também em número No Uzbequistão Karimov pôde sequestrar os remanescentes do Estado soviético o que lhe conferiu um forte aparato para suprimir e assassinar eventuais elites alternativas Na Colômbia a falta de autoridade do Estado central em determinadas regiões do país produziu naturalmente elites mais fragmentárias tanto com efeito que seus integrantes por vezes matamse uns aos outros Não obstante apesar de tamanha variação encontradas nas elites e instituições políticas estas em geral conseguem consolidar e reproduzir o poder do grupo que as criou embora haja casos em que as disputas internas por elas produzidas levem o Estado ao colapso como em Serra Leoa Se diferentes histórias e estruturas implicam diferenças tanto na identidade das elites quanto nos pormenores das instituições políticas extrativistas o mesmo vale para as especificidades das instituições econômicas extrativistas criadas nesse contexto Na Coreia do Norte as ferramentas do extrativismo foram igualmente um legado do kit básico do comunismo abolição da propriedade privada fazendas e indústria estatais No Egito sob o regime militar alegadamente socialista estabelecido pelo Coronel Nasser a partir de 1952 a situação era bastante similar Nasser alinhouse com a União Soviética durante a Guerra Fria expropriando investimentos estrangeiros como o Canal de Suez propriedade britânica e estatizou boa parte da economia Entretanto a situação no Egito nas décadas de 1950 e 1960 era bem distinta daquela da Coreia do Norte nos anos 1940 Era muito mais fácil para os nortecoreanos criar uma economia mais radicalmente ao estilo comunista visto que podiam expropriar os antigos bens japoneses e basearse no modelo econômico da Revolução Chinesa Em contrapartida a Revolução Egípcia foi mais um golpe empreendido por um grupo de oficiais militares Quando o Egito virou a casaca na Guerra Fria e bandeouse para o lado ocidental foi relativamente fácil e conveniente para os militares egípcios substituir o comando central da economia por um capitalismo de fachada como método de extrativismo Ainda assim a superioridade do desempenho econômico do Egito quando comparado ao da Coreia do Norte foi consequência do extrativismo mais restrito das instituições egípcias Por um lado na ausência do controle asfixiante imposto pelo Partido Comunista nortecoreano o regime egípcio viuse obrigado a aplacar seus cidadãos de uma maneira que os nortecoreanos estavam isentos Por outro mesmo o capitalismo de fachada gera alguns incentivos para o investimento pelo menos entre aqueles favorecidos pelo regime que na Coreia do Norte são inteiramente inexistentes Embora todas essas minúcias sejam importantes e interessantes as lições mais cruciais encontramse na situação mais geral a qual revela que em cada um desses casos as instituições políticas extrativistas produziram instituições econômicas igualmente extrativistas transferindo riqueza e poder para a elite A intensidade do extrativismo em cada um desses países varia evidentemente o que tem consequências consideráveis em termos da prosperidade geral Na Argentina por exemplo a Constituição e as eleições democráticas não são muito eficazes na promoção do pluralismo mas ainda funcionam muito melhor do que na Colômbia pelo menos o Estado argentino pode reivindicar o monopólio da violência Em parte como consequência a renda per capita argentina é o dobro da colombiana Por outro lado as instituições políticas desses dois países cumprem muito melhor a função de restringir as elites do que as do Zimbábue e Serra Leoa por conseguinte estes são muito mais pobres do que os primeiros Ainda de acordo com a lógica de funcionamento do círculo vicioso mesmo quando as instituições extrativistas acarretam o colapso do Estado como em Serra Leoa e no Zimbábue isso não significa o fim do predomínio dessas instituições Já vimos que guerras civis e revoluções embora possam se dar durante circunstâncias críticas não promovem necessariamente mudanças institucionais Os acontecimentos em Serra Leoa desde o conflito civil encerrado em 2002 são uma vívida ilustração dessa possibilidade Em 2007 em uma eleição democrática o velho partido de Siaka Stevens o APC voltou ao poder Embora o candidato vencedor à presidência Ernest Bai Koroma não tivesse nenhuma relação com os antigos governos do APC muitos integrantes de seu gabinete tinham Dois dos filhos de Stevens Bockarie e Jengo chegaram a ser nomeados embaixadores do país nos Estados Unidos e na Alemanha De certo modo é uma versão mais volátil do que aquilo que vimos acontecer na Colômbia onde a falta de autoridade do Estado em várias regiões do país persiste ao longo do tempo por ser do interesse de parte da elite política nacional permitir que isso aconteça ao mesmo tempo que as principais instituições estatais mostramse também fortes o bastante para evitar que a desordem degenere no caos total Em Serra Leoa em parte devido à natureza mais extrativista das instituições econômicas e em parte em virtude da tradição altamente extrativista das instituições políticas do país a sociedade não só sofre economicamente como oscila entre a mais rematada desordem e um princípio de ordem Não obstante o efeito a longo prazo é o mesmo o Estado permanece ausente e as instituições seguem extrativistas Em todos os casos citados encontrase uma longa história de instituições extrativistas desde pelo menos o século XIX Cada um desses países encontrase aprisionado em um círculo vicioso Colômbia e Argentina têm suas origens nas instituições do governo colonial espanhol páginas 714 Zimbábue e Serra Leoa nasceram do regime colonial britânico instaurado no final do século XIX Em Serra Leoa na ausência de colonizadores brancos o regime tirou amplo proveito das estruturas políticas extrativistas précoloniais e as intensificou Estas por sua vez eram fruto de um longo círculo vicioso caracterizado por falta de centralização política e os efeitos desastrosos do tráfico de escravos No Zimbábue deuse em medida bem maior a construção de instituições extrativistas inéditas já que a Companhia Britânica da África do Sul implementou uma economia dupla Já o Uzbequistão pôde aproveitar as instituições extrativistas da União Soviética e como o Egito transformálas em um capitalismo de fachada As instituições extrativistas da própria URRS eram sob muitos aspectos continuação daquelas do regime czarista mais uma vez em um padrão previsto pela lei de ferro da oligarquia À medida que cada um desses círculos viciosos se desenrolava em diferentes partes do mundo ao longo dos últimos 250 anos as desigualdades mundiais foram surgindo e persistem até hoje A solução para o fracasso econômico e político das nações hoje é transformar suas instituições extrativistas em inclusivas O fenômeno do círculo vicioso dificulta bastante essa tarefa mas não é impossível e a lei de ferro da oligarquia não é inescapável Bastam alguns elementos inclusivos já presentes nas instituições ou a existência de coalizões amplas que encabecem a resistência ao regime vigente ou a mera natureza contingente da história para romper círculos viciosos Assim como a Guerra Civil em Serra Leoa a Revolução Gloriosa de 1688 também foi uma luta por poder Todavia foi um embate de natureza muito diferente daquela do conflito serra leonense É provável que alguns integrantes do Parlamento que lutaram para destronar Jaime II no rastro da Revolução Gloriosa até se imaginassem no papel de novos absolutistas como fez Oliver Cromwell após a Guerra Civil inglesa Contudo o fato de o Parlamento já possuir bastante poder e consistir em ampla coalizão composta por interesses econômicos variados e diferentes pontos de vista tornou mais improvável a aplicação da lei de ferro da oligarquia em 1688 Ajudou também o fato de a sorte estar do lado do Parlamento e contra Jaime II No próximo capítulo veremos outros exemplos de países que conseguiram romper o padrão e mudar suas instituições para melhor mesmo após uma longa tradição de instituições extrativistas E 14 ROMPENDO O PADRÃO TRÊS CHEFES AFRICANOS M 6 DE SETEMBRO DE 1895 o transatlântico Tantallon Castle ancorou em Plymouth litoral sul da Inglaterra Três chefes africanos Khama dos ngwato Bathoen dos ngwaketse e Sebele dos kwena desembarcaram e tomaram o expresso de 8h10 para a Estação Paddington Londres Os três foram à GrãBretanha com uma missão salvar seus domínios mais cinco outros Estados tswana de Cecil Rhodes Os ngwato ngwaketse e kwena eram três dos cinco Estados tswana que compreendiam a região então conhecida como Bechuanaland que viria a ser Botsuana após a independência em 1966 As tribos haviam mantido relações comerciais com os europeus durante a maior parte do século XIX Na década de 1840 o célebre missionário escocês David Livingstone percorrera toda a Bechuanaland e convertera o Rei Sechele dos kwena ao cristianismo A primeira tradução da Bíblia para um idioma africano foi para o setswana língua dos twana Em 1885 Bechuanaland foi declarada protetorado inglês Os tswana ficaram satisfeitos pois acharam que assim estariam protegidos de novas invasões europeias sobretudo dos bôeres com quem vinham se confrontando desde a Grande Caminhada de 1835 uma migração de milhares de bôeres para o interior na tentativa de escapar do colonialismo britânico Os britânicos por sua vez almejavam o controle da região a fim de bloquear novas tentativas de expansão dos bôeres páginas 202203 e possíveis incursões dos alemães que haviam anexado a região do sudoeste da África correspondente à atual Namíbia Os britânicos não acreditavam que uma empreitada colonizadora em larga escala valesse a pena Em 1885 o alto comissário Rey sintetizou com clareza a posição do governo britânico Não temos outro interesse nas terras ao norte do Molope o protetorado de Bechuanaland além de como via de passagem para o interior assim sendo por ora trataremos de nos ater à prevenção da ocupação daquela parte do protetorado por flibusteiros ou potências estrangeiras restringindonos ao mínimo possível em termos de administração ou colonização Contudo a situação dos tswana mudou em 1889 quando a Companhia Britânica da África do Sul de Cecil Rhodes iniciou sua expansão rumo ao norte partindo da África do Sul e expropriando vastas extensões da terra que viriam a constituir as Rodésias do Norte e do Sul atuais Zâmbia e Zimbábue Em 1895 ano da visita dos três chefes a Londres Rhodes estava de olho no território a sudoeste da Rodésia Bechuanaland Os chefes sabiam que as terras que caíssem sob o controle de Rhodes estariam fadadas ao desastre e à exploração Embora lhes fosse impossível vencêlo militarmente estavam determinados a combater Rhodes por todos os meios que estivessem ao seu alcance Assim decidiram optar pelo menor de dois males antes a ampliação do controle por parte dos britânicos que a anexação por Rhodes Com a ajuda da London Missionary Society viajaram até Londres a fim de tentar persuadir a Rainha Vitória e Joseph Chamberlain então secretário colonial a intensificar seu controle de Bechuanaland e protegêla de Rhodes Em 11 de setembro de 1895 tiveram seu primeiro encontro com Chamberlain Sebele foi o primeiro a falar seguido de Bathoen e por último Khama Chamberlain declarou que consideraria a possibilidade de impor o controle britânico a fim de proteger as tribos de Rhodes Nesse ínterim os chefes trataram de embarcar em uma série de palestras por todo o país a fim de angariar apoio popular para sua causa Visitaram e falaram em Windsor e Reading nos arredores de Londres em Southampton no litoral sul e em Leicester e Birmingham na base política de Chamberlain as Midlands Dirigiramse ao norte à industrial Yorkshire a Sheffield Leeds Halifax e Bradford foram também para oeste a Bristol subindo em seguida até Manchester e Liverpool Enquanto isso na África do Sul Cecil Rhodes cuidava dos preparativos do que seria a desastrosa incursão de Jameson um ataque armado à República Bôer do Transvaal a despeito das fortes objeções de Chamberlain Essa sequência de acontecimentos provavelmente tornou Chamberlain bem mais simpático à súplica dos chefes do que ele seria em circunstâncias normais Em 6 de novembro encontraramse novamente com ele em Londres Os chefes falaram por meio de um intérprete Chamberlain Falarei sobre as terras dos chefes sobre a ferrovia e sobre a lei que deverá ser observada no território dos chefes Vejamos o mapa Tomaremos a terra necessária para a estrada de ferro e nada além Khama Eu digo que se o Senhor Chamberlain tomar a terra para si ficarei satisfeito Chamberlain Digalhe então que cuidarei eu mesmo de construir a ferrovia pelos olhos de um enviado meu e tomarei tão somente aquilo de que eu necessitar oferecendo compensações caso me aproprie de algo de valor Khama Gostaria de saber como isto é por onde o trem vai passar Chamberlain Atravessarei o seu território mas delimitados por uma cerca e não tomaremos terra alguma Khama Acredito que o senhor cuidará dos trabalhos como se fosse para mim mesmo e farmeá justiça nessa questão Chamberlain Zelarei por seus interesses No dia seguinte Edward Fairfield da Secretaria Colonial explicou o acordo firmado com Chamberlain em mais detalhes Cada um dos três chefes Khama Sebele e Bathoen disporá de um território dentro do qual viverá sob a proteção da rainha tal como viveu até aqui A rainha indicará um funcionário graduado para residir com eles Os chefes seguirão governando seu próprio povo tal como foi feito até hoje A reação de Rhodes ao se descobrir superado pela astúcia dos três chefes africanos foi previsível Em um telegrama que enviou a um de seus funcionários protestou Recusome a reconhecerme vencido por três nativos lamurientos Os chefes na verdade eram detentores de um bem precioso que haviam protegido de Rhodes como posteriormente protegeriam do governo indireto britânico No século XIX os Estados tswana haviam desenvolvido um núcleo central de instituições políticas que envolviam um grau incomum pelos padrões da África subsaariana tanto de centralização política quanto de procedimentos decisórios coletivos e que podem ser entendidas como uma forma incipiente e primitiva de pluralismo Do mesmo modo como a Magna Carta possibilitou a participação dos barões no processo político de tomada de decisões e impôs algumas restrições aos atos dos monarcas ingleses as instituições políticas dos tswana sobretudo os kgotla também incentivavam a participação política e delimitavam o poder dos chefes O antropólogo sulafricano Isaac Schapera descreve nos seguintes termos o modus operandi dos kgotla Todas as questões da política tribal são abordadas por fim por uma assembleia geral dos homens adultos no kgotla local do conselho do chefe Essas reuniões se dão com grande frequência e entre os tópicos discutidos figuram as disputas tribais querelas entre o chefe e seus parentes a imposição de novos tributos a realização de novas obras públicas a promulgação de novos decretos pelo chefe Não é incomum que a assembleia tribal vá de encontro aos desejos do monarca Uma vez que todos podem falar esses encontros permitem que ele se mantenha a par dos sentimentos de seus súditos de maneira geral proporcionando lhes por sua vez uma oportunidade de dar voz às suas insatisfações Caso a ocasião assim exija ele e seus conselheiros podem verse severamente repreendidos uma vez que as pessoas não costumam mostrar escrúpulos para falar de maneira aberta e franca Além dos kgotla o cargo de chefe entre os tswana não era estritamente hereditário mas encontravase aberto a qualquer homem que demonstrasse talento e habilidade para tanto O antropólogo John Comaroff estudou em detalhes a história política de outro Estado tswana os rolong e demonstrou que embora aparentemente os tswana dispusessem de regras claras que estipulavam como a posição de chefe seria herdada na prática essas normas eram interpretadas de modo a remover maus governantes e permitir que candidatos promissores ocupassem a chefia Sua pesquisa revelou que a ascensão ao trono era na realidade fruto de uma conquista embora recebesse em seguida uma interpretação elaborada de modo que o concorrente vencedor parecesse ser o herdeiro legítimo Os tswana traduziam essa ideia com um provérbio que tinha um quê de monarquia constitucional kgosi ke kgosi ka morafe o rei é rei pela graça do povo Após a viagem a Londres os chefes tswana continuaram empenhados em seu objetivo de manter a independência da Inglaterra e preservar suas instituições nativas Aceitaram a construção de ferrovias em Bechuanaland mas limitaram a intervenção dos britânicos em outros aspectos de sua vida econômica e política Não se opuseram à construção de estradas de ferro embora decerto não pelos mesmos motivos por que os monarcas austrohúngaros e russos as vetaram apenas se deram conta de que os trens como as demais políticas inglesas não promoveriam o desenvolvimento de Bechuanaland enquanto esta permanecesse sob controle colonial A experiência inicial de Quett Masire presidente da Botsuana independente de 1980 a 1998 explica por quê Masire foi um fazendeiro empreendedor nos anos 1950 desenvolveu novas técnicas de cultivo de sorgo e detectou um potencial cliente na Vryburg Milling empresa localizada do outro lado da fronteira com a África do Sul Procurou o agente da estação ferroviária de Lobatse em Bechuanaland e solicitou permissão para alugar dois vagões de trem a fim de transportar seus produtos até Vryburg O agente recusou Pediu então a um amigo branco que interviesse Com relutância o agente concordou mas cobrou de Masire um valor quatro vezes superior à tarifa paga pelos brancos Masire desistiu e concluiu que era a prática dos brancos e não só as leis que proibiam os africanos de possuir suas próprias terras ou adquirir licenças comerciais que impedia os negros de ser empreendedores em Bechuanaland Ao fim e ao cabo os chefes e o povo tswana tiveram sorte Contrariando todas as expectativas conseguiram impedir a investida de Rhodes Uma vez que os interesses dos britânicos em Bechuanaland eram ainda secundários o estabelecimento do governo indireto na região não criou o tipo de círculo vicioso desenvolvido em Serra Leoa páginas 260267 Evitaram também o mesmo tipo de expansão colonial ocorrido no interior da África do Sul que acabou convertendo a região em uma reserva de mão de obra barata para os fazendeiros ou garimpeiros brancos Os estágios iniciais do processo de colonização constituem uma circunstância crítica para a maioria das sociedades um período crucial durante o qual transpiram os eventos que terão consideráveis consequências a longo prazo para seu desenvolvimento econômico e político Como discutimos no Capítulo 9 a maioria das sociedades na África subsaariana do mesmo modo como as da América do Sul e as do Sul da Ásia assistiu durante a colonização ao estabelecimento ou intensificação de instituições extrativistas Os tswana pelo contrário lograram esquivarse tanto do governo indireto intensivo quanto do destino muito pior que se teria abatido sobre eles caso Rhodes houvesse conseguido anexar suas terras Não se tratou porém de mero golpe de sorte Mais uma vez sua trajetória foi resultado da interrelação entre as instituições já existentes moldadas pelo processo de diferenciação institucional específico dos tswana e a circunstância crítica produzida pelo colonialismo Os três chefes tomaram nas mãos as rédeas do próprio destino quando tiveram a iniciativa de viajar para Londres o que lhes possibilitou tal atitude foi o grau de autoridade de que dispunham extraordinário quando comparado a outros líderes tribais da África subsaariana graças à centralização política atingida pelas tribos tswana Talvez contassem também com um grau incomum de legitimidade em virtude do incipiente pluralismo presente em suas instituições tribais Outra circunstância crítica no fim do período colonial seria mais central para o sucesso de Botsuana permitindolhe desenvolver instituições inclusivas Quando Bechuanaland tornouse independente em 1966 com o nome de Botsuana o bom êxito dos chefes Sebele Bathoen e Khama já eram águas passadas Nesse ínterim os ingleses pouco haviam investido em Bechuanaland Por ocasião de sua independência era um dos países mais pobres do mundo contava com um total de 12 quilômetros de estradas pavimentadas 22 cidadãos com diploma universitário e 100 que haviam concluído a escola secundária Para piorar encontravase quase inteiramente rodeada pelos regimes brancos da África do Sul Namíbia e Rodésia todos os três hostis a países africanos independentes governados por negros Dificilmente seria incluída em muitas listas de nações com boas chances de sucesso Não obstante nos 45 anos seguintes Botsuana se tornaria um dos países de crescimento mais acelerado no mundo Hoje possui a mais alta renda per capita da África subsaariana e encontrase no mesmo patamar de países bemsucedidos do Leste Europeu como Estônia e Hungria e das nações latinoamericanas de maior êxito como Costa Rica Como Botsuana conseguiu romper o padrão Tratando de desenvolver rapidamente após a independência instituições políticas e econômicas inclusivas Desde então permaneceu democrática realiza eleições periódicas e competitivas e nunca conheceu guerra civil ou intervenção militar O governo estabeleceu instituições econômicas que fazem valer os direitos de propriedade assegurando a estabilidade macroeconômica e incentivando o desenvolvimento de uma economia de mercado inclusiva Evidentemente porém a questão mais desafiadora é como foi que Botsuana conseguiu estabelecer uma democracia estável e instituições pluralistas e optar por instituições econômicas inclusivas enquanto a maioria dos demais países africanos fazia o contrário Para responder a essa pergunta será preciso compreender como uma circunstância crítica aqui o fim do domínio colonial interagiu com as instituições já existentes no país Na maior parte da África subsaariana por exemplo em Serra Leoa e no Zimbábue a independência foi uma oportunidade perdida seguida da recriação de instituições extrativistas do mesmo tipo existente durante o período colonial Os estágios iniciais da independência se desenrolariam de maneira muito distinta em Botsuana mais uma vez graças em grande parte ao cenário estabelecido pelas instituições históricas tswana Sob esse aspecto Botsuana apresentava um série de semelhanças com a Inglaterra na iminência da Revolução Gloriosa Esta havia alcançado rápida centralização política sob os Tudor além de dispor da Magna Carta e da tradição do Parlamento que podia ao menos aspirar a conter os monarcas e garantir algum grau de pluralismo Botsuana também contava com algum grau de centralização do Estado e instituições tribais relativamente pluralistas que sobreviveram ao colonialismo Na Inglaterra havia uma coalizão ampla em formação composta por comerciantes transatlânticos industriais e fidalgos empreendedores que era partidária de direitos de propriedade consolidados Em Botsuana também havia uma aliança em favor de sólidos direitos de procedimentos os chefes tswana e elites detentoras do principal ativo da economia o gado Muito embora a terra fosse de propriedade comum o gado era um bem privado nos Estados tswana e as elites eram também defensoras de direitos de propriedade bem assegurados Nada disso claro nega o curso contingente da história As coisas teriam transcorrido de modo muito diferente na Inglaterra caso as lideranças parlamentares e o novo monarca tivessem tentado valerse da Revolução Gloriosa para usurpar o poder Analogamente a história em Botsuana poderia ter sido outra especialmente se o país não tivesse tido a sorte de encontrar líderes como Seretse Khama ou Quett Masire que preferiram disputar o poder por meio de eleições em vez de subverter o sistema eleitoral como fizeram tantos líderes pósindependência na África subsaariana Os tswana emergiram de sua independência com uma tradição de instituições que delimitavam os poderes dos chefes e estabeleciam algum grau de responsabilidade destes perante o povo É claro que os tswana não eram os únicos da África a disporem de instituições assim mas só no caso deles tais instituições sobreviveram ilesas em tão larga medida ao período colonial O governo britânico mantiverase ausente Bechuanaland fora administrada de Mafeking na África do Sul e foi só durante a transição para a independência na década de 1960 que foram elaborados planos para a capital Gaborone As novas estruturas lá instaladas não pretendiam eliminar as instituições nativas mas tirar proveito delas assim durante a construção de Gaborone novos kgotlas foram sendo planejados A independência deuse também de maneira relativamente ordenada O movimento nesse sentido foi encabeçado pelo Partido Democrático de Botsuana BDP Botswana Democratic Party fundado em 1960 por Quett Masire e Seretse Khama Khama era neto do Rei Khama III seu primeiro nome Seretse significa a argila que une e não poderia ser mais adequado Khama era o chefe hereditário dos ngwato e a maioria dos chefes e as elites tswana aderiram ao BDP Botsuana não possuía junta de comércio devido ao desinteresse dos britânicos na colônia Em 1967 o partido tratou de fundar uma a Comissão da Carne de Botsuana que em lugar de expropriar rancheiros e proprietários de gado desempenhou papel central no desenvolvimento da economia pecuária ergueu cercas a fim de controlar a febre aftosa e promoveu as exportações o que contribuiria tanto para o desenvolvimento econômico quanto para a sustentação das instituições econômicas inclusivas Embora o crescimento inicial de Botsuana dependesse da exportação de carne a situação mudou drasticamente com a descoberta de diamantes O gerenciamento dos recursos naturais do país também foi nitidamente diferente de outras nações africanas Durante o período colonial os chefes tswana haviam se empenhado ao máximo para impedir a prospecção de minérios em Bechuanaland por saberem que se os europeus encontrassem pedras ou metais preciosos sua autonomia estaria acabada A primeira grande descoberta de diamantes deuse em território ngwato terra natal de Seretse Khama Antes do anúncio da descoberta Khama incentivou uma mudança na lei a fim de que todos os direitos sobre a exploração mineral do subsolo pertencessem ao país não à tribo garantindo assim que a riqueza proveniente das pedras não criasse profundas desigualdades em Botsuana A decisão deu impulso também ao processo de centralização do Estado à medida que a receita gerada pelos diamantes pôde ser aplicada na construção de uma infraestrutura e burocracia estatais e investida na educação Em Serra Leoa como em muitas outras nações da África subsaariana os diamantes serviram de combustível para o conflito entre diferentes grupos e ajudou a perpetuar as guerras civis o que lhes valeu a alcunha de Diamantes de Sangue em vista da carnificina promovida pelas guerras que foram travadas pelo seu controle Em Botsuana a receita oriunda das pedras foi administrada tendo em vista o bem da nação A alteração nos direitos sobre os minerais do subsolo não foi a única política visando à estruturação do Estado implementada pelo governo de Seretse Khama Em última instância a Lei da Chefia de 1965 promulgada pela assembleia legislativa antes da independência bem como sua emenda de 1970 dariam continuidade ao processo de centralização política consolidando o poder do Estado e do presidente eleito mediante a remoção do direito dos chefes de distribuir terras e permitindo ao presidente depor caso necessário um chefe do cargo Outro aspecto da centralização política foi o empenho em consolidar a unificação do país por meio por exemplo de uma legislação determinando que o setswana e o inglês fossem as únicas línguas ensinadas na escola Hoje Botsuana parece um país homogêneo sem a fragmentação étnica e linguística associada com tantas outras nações africanas Todavia isso é fruto da política de adoção nas escolas apenas do inglês e de um único idioma nacional o setswana a fim de minimizar os conflitos entre diferentes tribos e grupos dentro da sociedade O último censo que incluiu perguntas sobre etnicidade foi o de 1946 que revelou considerável heterogeneidade no país Na reserva ngwato por exemplo apenas 20 da população identificavamse como ngwato puros embora houvesse outras tribos tswana havia também diversos grupos que não eram tswana e que não tinham o setswana como primeiro idioma Tamanha heterogeneidade subliminar vem sendo mitigada tanto pelas políticas do governo pósindependência quanto pelas instituições relativamente inclusivas das tribos tswana do mesmo modo como a heterogeneidade na GrãBretanha por exemplo entre ingleses e galeses tem sido abrandada pelo Estado britânico O Estado botsuano fez o mesmo Desde a independência o censo em Botsuana não inclui perguntas sobre a heterogeneidade étnica porque lá todos são tswana Botsuana atingiu índices de crescimento notáveis após a independência porque Seretse Khama Quett Masire e o Partido Democrático de Botsuana conduziram o país rumo a instituições políticas e econômicas inclusivas Quando os diamantes começaram a jorrar na década de 1970 em vez de levar à guerra civil lançaram uma base fiscal sólida para o governo que usaria a receita para investir em serviços públicos Havia muito menos incentivos para desafiar ou derrubar o governo e controlar o Estado Instituições políticas inclusivas fomentavam a estabilidade política e sustentavam instituições econômicas inclusivas Em um padrão que já conhecemos do círculo virtuoso descrito no Capítulo 11 as instituições econômicas inclusivas aumentaram a viabilidade e a durabilidade das instituições políticas inclusivas Botsuana rompeu o padrão por ter sido capaz de beneficiarse de uma circunstância crítica a independência póscolonial e estabelecer instituições inclusivas O Partido Democrático de Botsuana e as elites tradicionais inclusive o próprio Khama não tentaram forjar um regime ditatorial nem implementar instituições extrativistas que pudessem enriquecêlos em detrimento da sociedade outro fruto da interrelação entre uma circunstância crítica e as instituições já existentes Como vimos ao contrário de quase todos os demais países da África subsaariana Botsuana já possuía instituições tribais que haviam atingido algum grau de autoridade centralizada e apresentavam características notoriamente pluralistas Ademais o país contava com elites econômicas que por sua vez tinham muito a ganhar com direitos de propriedade seguros Não menos importante o percurso contingente da história trabalhou em favor de Botsuana O país teve sorte especialmente por Seretse Khama e Quett Masire não serem Siaka Stevens e Robert Mugabe O primeiro dedicouse honestamente à construção de instituições inclusivas a partir da base das instituições tribais dos tswanas Esse conjunto de fatores aumentou as chances de Botsuana conseguir desenvolver instituições inclusivas enquanto a maior parte do resto da África subsaariana nem ao menos tentava ou fracassava logo de saída O FIM DO EXTRATIVISMO NO SUL A data era 1o de dezembro de 1955 A cidade de Montgomery Alabama tem registrado o horário de ocorrência do delito como sendo 18h06 James Blake motorista de ônibus estava enfrentando problemas chamou a polícia e os oficiais Day e Mixon dirigiram se ao local Em seu relatório assinalaram Recebemos uma chamada e ao chegarmos o motorista do ônibus informounos de que havia uma mulher de cor sentada no setor branco a qual se recusava a dirigir se para os fundos do veículo Nós também a vimos O motorista assinou um testemunho contra ela Rosa Parks cf foi acusada de acordo com o Capítulo 6 seção 11 do Código Municipal de Montgomery O delito cometido por Rosa Parks foi sentarse em uma parte do ônibus da Cleveland Avenue reservada para brancos um crime segundo as leis de Jim Crow do Alabama Parks foi multada em US10 mais US4 de custas judiciais Mas Rosa Parks não era qualquer uma Já era secretária da seção de Montgomery da NAACP National Association for the Advancement of Colored People Associação Nacional para o Progresso das Pessoas de Cor que lutava havia muito para mudar as instituições no Sul dos Estados Unidos Sua prisão desencadeou um movimento de massa o Boicote aos Ônibus de Montgomery idealizada por Martin Luther King Jr Em 3 de dezembro King e outros líderes negros haviam organizado um boicote coordenado aos ônibus convencendo todos os negros a não andarem de ônibus na cidade O boicote bem sucedido estendeuse até 20 de dezembro de 1956 pondo em movimento um processo que culminou na determinação pela Suprema Corte americana da inconstitucionalidade das leis que segregavam o transporte público no Alabama e em sua capital O Boicote aos Ônibus de Montgomery foi um momento crucial do movimento pelos direitos civis no Sul dos Estados Unidos O movimento foi parte de uma série de eventos e mudanças que finalmente rompeu o padrão nos estados sulistas e provocou uma mudança institucional fundamental Como vimos no Capítulo 12 após a Guerra Civil as elites latifundiárias locais conseguiram recriar as instituições políticas e econômicas extrativistas que haviam predominado na região até a Guerra de Secessão Por mais que os detalhes dessas instituições mudassem a escravidão por exemplo já não era mais possível seu impacto negativo sobre a prosperidade geral e os incentivos econômicos na região permaneceram os mesmos O Sul continuou sendo notavelmente mais pobre do que o resto do país A partir dos anos 1950 as instituições sulistas conduziriam a região por uma trajetória de crescimento muito mais acelerado As instituições extrativistas que acabaram sendo eliminadas do sul dos Estados Unidos eram diferentes das instituições coloniais da Botsuana préindependência O tipo de circunstância crítica que iniciou seu processo de abandono foi igualmente distinto apesar de várias características comuns Desde a década de 1940 os que arcavam com o ônus da discriminação e das instituições extrativistas do sul pessoas como Rosa Parks vinham se organizando bem melhor para fazerlhes frente Ao mesmo tempo a Suprema Corte americana e o governo federal finalmente começaram a interferir sistematicamente no sentido de reformar as instituições extrativistas locais Assim um dos fatores centrais na criação de uma circunstância crítica para a mudança no sul foi o empoderamento dos americanos negros da região e o fim do domínio irrestrito das elites sulistas As instituições políticas do sul tanto antes quanto depois da Guerra de Secessão seguiam uma lógica econômica clara não muito distinta do regime sulafricano do apartheid e com o mesmo objetivo de assegurar mão de obra barata para as plantations Na década de 1950 porém tal propósito estava perdendo a força Por um lado em decorrência tanto da Grande Depressão quanto da Segunda Guerra Mundial vinha ocorrendo significativo êxodo negro que nas décadas de 1940 e 1950 alcançou uma média de cem mil pessoas por ano Nesse ínterim as inovações tecnológicas na agricultura ainda que adotadas muito lentamente iam reduzindo a dependência que os latifundiários tinham de mão de obra barata A maior parte dos trabalhadores nas plantações era usada na colheita do algodão Em 1950 quase todo o algodão do Sul ainda era colhido à mão Contudo a mecanização da colheita do algodão vinha reduzindo a demanda por esse tipo de mão de obra Em 1960 nos estados cruciais do Alabama Louisiana e Mississippi quase metade da produção fora mecanizada Assim ao mesmo tempo em que ficava mais difícil encurralar os negros eles iam deixando de ser indispensáveis para os latifundiários Havia menos motivos pois para que as elites continuassem lutando com o mesmo vigor para manter as velhas instituições econômicas extrativistas o que não significava porém que estivessem dispostas a aceitar de boa vontade as mudanças institucionais Assim estourou um conflito havia muito protelado Uma coalizão incomum entre os negros do sul e as instituições federais inclusivas dos Estados Unidos produziu uma força poderosa no sentido de repudiar o extrativismo sulista e ir ao encontro de direitos civis e políticos igualitários para os negros do sul o que por fim eliminaria os significativos empecilhos ao crescimento econômico no Sul dos Estados Unidos O mais importante impulso para a mudança veio do movimento pelos direitos civis A ponta de lança do processo foi o empoderamento dos negros no Sul como em Montgomery desafiando as instituições extrativistas ao seu redor exigindo seus direitos e manifestandose e mobilizandose a fim de obtêlos Todavia eles não estavam sozinhos porque o Sul dos Estados Unidos não constitui um país à parte e as elites locais não eram autônomas como as da Guatemala por exemplo Sendo parte integrante dos Estados Unidos da América o Sul do país estava sujeito à Constituição e demais legislações federais A causa das reformas fundamentais na região receberia finalmente o apoio dos poderes executivo legislativo e judiciário americanos em parte porque o movimento pelos direitos civis conseguiu fazerse ouvir fora do Sul mobilizando assim a esfera federal do governo A intervenção federal no sentido de modificar as instituições sulistas teve início em 1944 quando a Suprema Corte determinou a inconstitucionalidade de eleições primárias às quais somente os brancos tinham acesso Como vimos os negros viramse destituídos de seus direitos políticos na década de 1890 graças ao uso de capitações e testes de alfabetização páginas 272277 os quais costumavam ser manipulados a fim de discriminar os negros ao mesmo tempo em que asseguravam o voto de brancos pobres e analfabetos Em um exemplo célebre ocorrido na Louisiana no começo dos anos 1960 um candidato branco foi considerado apto após dar a resposta FRDUM FOOF SPETGH a uma pergunta sobre a constituição estadual A decisão da Suprema Corte em 1944 quando reconheceu a importância de afrouxar o controle exercido pelos brancos sobre os partidos políticos foi a salva de abertura da longa batalha pela abertura do sistema político aos negros A essa decisão seguiuse o caso Brown versus Board of Education em 1954 em que a Suprema Corte determinou que a segregação patrocinada pelo Estado nas escolas e outros locais públicos era inconstitucional Em 1962 o tribunal pôs abaixo outro pilar da dominação política das elites brancas a desproporcionalidade na representação legislativa Quando uma legislatura é desproporcional como no caso dos burgos podres na Inglaterra antes da Primeira Lei da Reforma determinadas áreas ou regiões têm uma representação muito maior do que deveriam considerandose sua participação na população relevante No Sul dos Estados Unidos isso significava que as áreas rurais coração da elite agrária da região contavam com uma representação excessiva em relação às áreas urbanas A Suprema Corte eliminou esse problema em 1962 com sua decisão no caso Baker versus Carr que introduziu o padrão cada pessoa um voto As decisões da Suprema Corte não fariam grande diferença contudo se não fossem postas efetivamente em vigor De fato na década de 1890 a legislação federal que assegurava os direitos políticos dos negros não chegou a ser implementada porque quem controlava o cumprimento das leis no Sul dos Estados Unidos eram a elite local e o Partido Democrata e o governo federal por sua vez de muito bom grado consentiu em tal estado de coisas A partir do momento em que os negros começaram a se insurgir contra a elite sulista porém esse bastião do apoio a Jim Crow desmoronou e o Partido Democrata liderado por seus membros de fora do Sul voltouse contra a segregação racial Os democratas sulistas renegados então reagruparamse sob a bandeira do Partido Democrata pelos Direitos dos Estados States Rights Democratic Party e disputaram as eleições presidenciais de 1948 Seu candidato Strom Thurmond liderou em quatro estados e conquistou 39 votos no Colégio Eleitoral um eco muito distante contudo do poder do Partido Democrata unificado na política nacional e de sua captura pelas elites sulistas A campanha de Strom Thurmond girou em torno do questionamento do direito do governo federal de interferir nas instituições do Sul e ele defendia sua posição com palavras fortes Quero dizerlhes senhoras e senhores que não há homens suficientes no Exército para obrigar o povo do Sul a acabar com a segregação e admitir a raça dos pretos em nossos cinemas piscinas lares e igrejas A história mostraria que ele estava errado As determinações da Suprema Corte significavam que as instituições educativas sulistas entre elas a Universidade do Mississippi em Oxford teriam de ser dessegregadas Em 1962 após uma longa batalha jurídica tribunais federais decidiram que James Meredith jovem veterano negro da Força Aérea americana teria de ser admitido na Ole Missv A oposição ao cumprimento dessa determinação foi orquestrada pelos chamados Conselhos de Cidadãos o primeiro dos quais surgira em 1954 em Indianola Mississippi com o objetivo de combater o processo de dessegregação no Sul O governador do estado Ross Barnett foi a público repudiar em fala televisionada em 13 de setembro a dessegregação determinada pela Justiça anunciando que as universidades estaduais fechariam as portas antes de consentir com o fim da segregação Por fim após uma interminável negociação entre Barnett o Presidente John Kennedy e o secretário de Justiça Robert Kennedy em Washington o governo federal interveio à força no sentido de fazer valer a decisão Foi marcada uma data para os oficiais de justiçax levarem Meredith a Oxford imediatamente os defensores da supremacia branca começaram a se organizar Em 30 de setembro véspera da chegada de Meredith oficiais de justiça federais entraram no campus e cercaram a reitoria Uma multidão de cerca de 2500 pessoas apareceu para protestar e logo irrompeu um tumulto Os oficiais usaram gás lacrimogêneo para dispersar os baderneiros mas logo se viram acuados Às 22 horas forças federais chegaram a Oxford para restaurar a ordem Logo havia 20 mil militares e 11 mil homens da Guarda Nacional na cidade No total 300 pessoas seriam presas Meredith decidiu permanecer no campus onde protegido das ameaças de morte por uma escolta de oficiais de justiça e 300 soldados acabaria conseguindo se formar A atuação do Poder Legislativo em âmbito federal foi uma das pedras angulares do processo de reforma institucional no Sul dos Estados Unidos Na votação do projeto da primeira Lei dos Direitos Civis em 1957 o então senador Strom Thurmond falou ininterruptamente por 24 horas e 18 minutos a fim de impedir ou ao menos retardar a promulgação da lei Em sua fala ele leu de tudo da Declaração da Independência a diversas listas telefônicas em vão A lei de 1957 culminaria na Lei dos Direitos Civis de 1964 que declarou ilegal um vasto espectro de práticas e legislações segregacionistas estaduais A Lei dos Direitos Eleitorais de 1965 determinou a ilegalidade de testes de alfabetização captações e outros métodos usados para anular os direitos políticos dos negros do Sul além de ampliar a supervisão federal das eleições nos estados O efeito de todos esses acontecimentos foi uma mudança significativa nas instituições econômicas e jurídicas do Sul No Mississippi por exemplo apenas cerca de 5 dos negros elegíveis votavam em 1960 Em 1970 esse número saltara para 50 No Alabama e na Carolina do Sul passou de cerca de 10 em 1960 para 50 em 1970 Esses padrões mudaram a natureza das eleições tanto para os cargos locais quanto para os nacionais Mais importante erodiuse o apoio político do Partido Democrata dominante às instituições extrativistas que discriminavam os negros Estava aberto o caminho assim para uma sucessão de mudanças nas instituições econômicas Até as reformas institucionais da década de 1960 os negros haviam permanecido quase inteiramente excluídos do emprego nos moinhos de algodão Em 1960 apenas 5 dos empregados nos moinhos aproximadamente eram negros A legislação dos direitos civis reverteu essa discriminação Em 1970 tal proporção havia aumentado para 15 em 1990 havia chegado a 25 A discriminação econômica contra os negros começou a cair as oportunidades educacionais para essa parcela da população expandiramse significativamente e o mercado de trabalho sulista tornouse mais competitivo As instituições inclusivas foram acompanhadas de melhorias econômicas mais aceleradas na região Em 1940 os estados sulistas alcançavam apenas cerca de 50 do nível da renda per capita dos Estados Unidos Esse quadro começou a mudar no final da década de 1940 e durante os anos 1950 Em 1990 essa distância foi praticamente eliminada Como em Botsuana o elementochave no Sul dos Estados Unidos foi o desenvolvimento de instituições econômicas e políticas inclusivas que ocorreu a partir da justaposição do crescente descontentamento entre os negros esmagados sob as instituições extrativistas do Sul e a dissolução do domínio unipartidário do Partido Democrata no Sul Mais uma vez as instituições conformaram os rumos da mudança Nesse caso foi fundamental que as instituições sulistas estivessem situadas no contexto das instituições federais inclusivas americanas o que permitiu aos negros do Sul dos Estados Unidos finalmente mobilizarem o governo e as instituições federais em prol da sua causa O processo como um todo foi facilitado também pelo fato de com o êxodo maciço de negros do Sul e a mecanização da produção de algodão também as condições econômicas haviam mudado fazendo as elites locais terem menos motivos para resistir RENASCIMENTO NA CHINA O Partido Comunista sob a liderança de Mao TséTung finalmente derrubou os nacionalistas liderados por Chiang Kaishek em 1949 A República Popular da China foi proclamada em 1o de outubro As instituições políticas e econômicas criadas após 1949 eram altamente extrativistas No âmbito político compreendiam o regime totalitarista do Partido Comunista Chinês e nenhuma outra organização é permitida na China desde então Até sua morte em 1976 Mao dominou inteiramente o partido e o governo Tais instituições políticas autoritárias e extrativistas foram acompanhadas de instituições econômicas igualmente radicais em seu extrativismo Mao nacionalizou de imediato a terra e aboliu todos os direitos de propriedade de um só golpe Mandou executar os proprietários rurais bem como outros segmentos que considerasse contrários ao regime A economia de mercado foi essencialmente eliminada Pouco a pouco a população rural foi organizada em fazendas comunitárias Dinheiro e salários foram substituídos por pontos de trabalho que podiam ser trocados por bens Os passaportes internos foram introduzidos em 1956 proibindo deslocamentos sem a devida autorização a fim de aumentar o controle político e econômico Analogamente toda a indústria foi nacionalizada e Mao lançou uma tentativa ambiciosa de promover o desenvolvimento acelerado da indústria por meio de planos quinquenais baseados no modelo soviético Como ocorre com todas as instituições extrativistas o governo Mao empenhouse em extrair recursos do vasto país que tinha agora em mãos Como no caso do governo de Serra Leoa com sua junta comercial o Partido Comunista Chinês detinha o monopólio da venda de determinados produtos como arroz e grãos e o usava para impor pesados tributos aos fazendeiros As tentativas de industrialização resultaram a partir de 1958 no infame Grande Salto Adiante com o desenrolar do segundo plano quinquenal Mao anunciou que a produção de aço seria duplicada em um ano com base em altosfornos de fundo de quintal de pequena escala Declarou que em 15 anos a produção chinesa igualaria a britânica O único problema é que não havia maneira viável de cumprir essas metas Para atingilas era preciso usar sucata derreter potes e panelas e até ferramentas agrícolas como enxadas e arados Os trabalhadores que deveriam cultivar os campos estavam produzindo aço a partir da destruição de seus arados e portanto de sua futura capacidade de alimentarse e ao país O resultado foi uma fome catastrófica no campo Embora os estudiosos hoje debatam a participação das políticas de Mao em comparação com o impacto das secas nessa mesma época ninguém questiona a contribuição central do Grande Salto Adiante para a morte de 20 40 milhões de pessoas Não sabemos exatamente quantas foram as baixas pois a China de Mao não efetuou um levantamento dos números que teriam documentado as atrocidades A renda per capita despencou por volta de um quarto Um dos resultados do Grande Salto Adiante foi fazer um alto dignitário do Partido Comunista Deng Xiaoping general extremamente bemsucedido no período revolucionário realizador de uma campanha antidireitista que promovera a execução de muitos inimigos da revolução mudar de ideia Em uma conferência realizada na cidade de Cantão no sul da China em 1961 Deng defendeu a ideia de que não importa se o gato é preto ou branco se pegar ratos é um bom gato Ou seja não importava se as políticas pareciam ou não comunistas a China precisava era de políticas que estimulassem a produção de modo a continuar alimentando sua gente Todavia Deng não tardaria a sofrer as consequências de seu recémdescoberto pragmatismo Em 16 de maio de 1966 Mao anunciou que a revolução encontravase sob a ameaça de interesses burgueses que estavam solapando a sociedade comunista chinesa e pretendiam recriar o capitalismo Em resposta anunciou a Grande Revolução Cultural do Proletariado em geral conhecida como Revolução Cultural e baseada em 16 pontos O primeiro começava da seguinte forma Embora tenha sido derrubada a burguesia insiste em tentar usar as velhas ideias cultura costumes e hábitos das classes exploradoras para corromper as massas manipulálas e ensaiar um retorno O proletariado deve fazer o exato oposto encarar de frente todos os desafios burgueses no campo ideológico e utilizar as novas ideias cultura costumes e hábitos do proletariado para mudar a perspectiva mental da sociedade como um todo No momento nosso objetivo é combater e esmagar aqueles membros do governo que estejam enveredando pela senda capitalista criticar e repudiar as autoridades acadêmicas burguesas reacionárias e a ideologia da burguesia e de todas as demais classes exploradoras e transformar a educação a literatura a arte e todos os demais aspectos da superestrutura que não correspondam à base econômica socialista de modo a propiciar a consolidação e o desenvolvimento do sistema socialista Logo a Revolução Cultural do mesmo modo como o Grande Salto Adiante começaria a despedaçar tanto a economia quanto um semnúmero de vidas humanas Formaramse unidades da Guarda Vermelha por todo o país jovens e entusiásticos membros do Partido Comunista que foram usados para promover o expurgo dos opositores do regime Muitos foram os mortos presos ou mandados para o exílio interno O próprio Mao replicou frente à preocupação quanto à extensão da violência O tal Hitler foi ainda mais feroz Quanto mais feroz melhor não é mesmo Quanto mais gente se mata mais revolucionário se é Deng foi considerado desertor capitalista número dois sendo preso em 1967 e exilado na província de Jiangxi em 1969 condenado a trabalhar em uma fábrica rural de tratores Acabaria sendo reabilitado em 1974 e Mao foi persuadido pelo primeiro ministro Chu EnLai a nomear Deng primeiro viceprimeiroministro Já em 1975 Deng supervisionou a composição de três documentos do partido que teriam colocado a China em uma nova direção caso tivessem sido aprovados demandavam a revitalização da educação superior a retomada dos incentivos materiais na indústria e na agricultura e a remoção dos esquerdistas do partido Nessa época a saúde de Mao estava se deteriorando e o poder ia se concentrando cada vez mais nas mãos dos mesmos esquerdistas que Deng Xiaoping queria afastar do poder A esposa de Mao Chiang Ching e três de seus associados mais próximos conhecidos coletivamente como o Bando dos Quatro haviam sido grandes defensores da Revolução Cultural e da repressão resultante Sua intenção era manter esse projeto de administração do país sob a ditadura do Partido Comunista Em 5 de abril uma celebração espontânea da vida de Chu EnLai na Praça da Paz Celestial converteuse em um protesto contra o governo O Bando dos Quatro atribuiu a Deng a culpa pelas manifestações e ele se viu novamente despojado de todos os cargos e demitido Assim em vez de conseguir a remoção dos esquerdistas Deng viuse removido por eles Após a morte de Chu EnLai Mao havia designado Hua Guofeng para a posição de primeiroministro em lugar de Deng No relativo vácuo de poder de 1976 Hua conseguiu acumular enorme dose de poder pessoal Em setembro ocorreu uma circunstância crítica a morte de Mao O Partido Comunista chinês estivera até então sob seu domínio e o Grande Salto Adiante e a Revolução Cultural foram em grande parte iniciativas suas Com seu desaparecimento instaurouse um verdadeiro vácuo de poder que resultou em uma disputa entre os defensores de pontos de vista e crenças distintos acerca das consequências da mudança O Bando dos Quatro pretendia dar continuidade às políticas da Revolução Cultural única maneira de consolidar seu próprio poder e o do Partido Comunista Hua Guofeng queria abandonar a Revolução Cultural mas não podia afastarse demasiadamente dela por dever sua própria ascensão dentro do partido aos seus efeitos Em vez disso postulou o retorno a uma versão mais equilibrada da visão de Mao que resumiu nos Dois Quaisquer como chamou o Diário do Povo jornal do Partido Comunista chinês em 1977 Hua declarou Manteremos com resolução quaisquer decisões políticas tomadas pelo Presidente Mao e seguiremos inabaláveis quaisquer instruções que ele nos tenha deixado Deng Xiaoping não pretendia mais do que Hua abolir o regime comunista e substituílo por mercados inclusivos Também ele fazia parte do mesmo grupo de pessoas que a revolução comunista havia guindado ao poder Todavia ele e seus correligionários acreditavam na possibilidade de obter significativo crescimento econômico sem pôr em perigo seu controle político para o que dispunham de um modelo de crescimento sob instituições políticas extrativistas que não poria seu poder em risco porque o povo chinês encontravase na mais absoluta necessidade de melhorar seus padrões de vida e porque toda oposição significativa ao Partido Comunista fora obliterada durante o governo de Mao e a Revolução Cultural Assim pretendiam repudiar não só a Revolução Cultural como também boa parte do legado institucional maoísta Perceberam que o crescimento econômico só seria viabilizado por medidas significativas rumo a instituições econômicas inclusivas por isso desejavam reformar a economia e injetar ânimo novo no papel dos incentivos e forças de mercado Queriam também expandir o escopo da propriedade privada e reduzir o papel do Partido Comunista na sociedade e na administração livrandose de conceitos como luta de classes O grupo de Deng também estava aberto a investimentos estrangeiros e ao comércio internacional e tencionava adotar uma política muito mais agressiva de integração com a economia internacional Contudo havia limites e construir instituições econômicas verdadeiramente inclusivas e afrouxar de modo considerável o controle exercido pelo Partido Comunista sobre a economia não eram sequer opções A reviravolta chinesa sobreveio com a ascensão de Hua Guofeng ao poder e sua determinação a usálo contra o Bando dos Quatro Um mês após a morte de Mao Hua tramou um golpe contra os Quatro que foram todos presos Em março de 1977 reinstalou Deng Nada houve de inevitável nesse curso de acontecimentos nem nos significativos passos seguintes que resultaram na derrocada política do próprio Hua orquestrada por sua vez por Deng Xiaoping Deng estimulou a crítica pública da Revolução Cultural e começou a preencher cargos em todos os níveis do Partido Comunista com pessoas que como ele haviam sofrido durante esse período Hua não podia repudiar a Revolução Cultural o que o enfraqueceu ademais era relativamente recémchegado aos centros do poder e faltavalhe a rede de conexões e relações informais que Deng havia construído ao longo de muitos anos Em uma série de discursos Deng começou a criticar as políticas de Hua Em setembro de 1978 atacou explicitamente os Dois Quaisquer defendendo que em vez de permitir que qualquer coisa que Mao tivesse dito determinasse as políticas adotadas a abordagem correta seria buscar a verdade dos fatos Deng de maneira brilhante começou também a instigar a pressão popular contra Hua o que se manifestou de forma mais intensa no movimento do Muro da Democracia em 1978 em que as pessoas afixavam cartazes com queixas sobre o país em um muro em Pequim Em julho daquele mesmo ano um aliado de Deng Hu Qiaomu apresentou alguns princípios básicos de reforma econômica que incluíam a proposta de que as empresas dispusessem de maior iniciativa e autoridade para que tomassem suas próprias decisões com relação à produção Os preços deveriam ser um reflexo da oferta e da procura não estabelecidos pelo governo e o controle estatal da economia deveria de modo geral sofrer uma redução Eram sugestões radicais mas Deng vinha ganhando influência Em novembro e dezembro de 1978 a III Sessão Plenária do XI Comitê Central do Partido gerou uma inovação Sob os protestos de Hua decidiuse que dali por diante o foco do partido seria não mais a luta de classes mas a modernização econômica A plenária anunciou alguns experimentos iniciais com um sistema de responsabilidade familiar em determinadas províncias numa tentativa de reduzir a extensão da agricultura coletiva e introduzir incentivos econômicos no setor agrícola No ano seguinte o Comitê Central reconheceria a centralidade do conceito de verdade dos fatos e declararia que a Revolução Cultural fora uma grande calamidade para o povo chinês Durante esse período Deng tratou de assegurar a nomeação de seus próprios simpatizantes para cargoschave no partido exército e governo Embora precisasse de cautela em suas investidas contra os defensores de Hua no Comitê Central foi criando bases paralelas de poder Em 1980 Hua foi forçado a deixar o cargo de primeiroministro sendo substituído por Zhao Ziyang Em 1982 Hua foi afastado do Comitê Central Todavia Deng não parou por aí No XII Congresso do Partido em 1982 e depois na Conferência Nacional do Partido em setembro de 1985 conseguiu promover uma reorganização quase total dos quadros de liderança do partido agora ocupados por pessoas mais jovens e de mentalidade reformista Assim em 1985 haviam sido substituídos 21 dos 26 membros do politburo 8 dos 11 membros do secretariado do Partido Comunista e 10 dos 18 viceprimeirosministros que ocupavam os respectivos cargos em 1980 Uma vez consumada a revolução política de Deng e seus reformistas que detinham agora o controle do Estado foi lançada uma série de mudanças nas instituições econômicas começando pela agricultura em 1983 seguindo as ideias de Hu Qiaomu o sistema de responsabilidade familiar que forneceria incentivos econômicos aos agricultores foi adotado universalmente Em 1985 a compra compulsória de grãos pelo Estado foi abandonada e substituída por um sistema de contratos mais voluntários e o controle administrativo dos preços agrícolas foi muito relaxado Na economia urbana as empresas estatais ganharam mais autonomia e 14 cidades foram qualificadas como abertas passando a poder atrair investimentos estrangeiros A economia rural foi a primeira a deslanchar A introdução de incentivos levou a aumento drástico da produtividade agrícola Em 1984 a produção de grãos foi um terço maior do que em 1978 embora houvesse menos gente trabalhando no setor Muitos tinham passado a trabalhar nas novas indústrias rurais as chamadas Empresas de Cantão e Povoado Township and Village Enterprises autorizadas a expandirse fora do sistema de planejamento estatal da indústria desde 1979 quando passou a ser aceita a entrada em atividade de novas empresas e sua concorrência com as estatais Paulatinamente foram introduzidos também incentivos econômicos no setor industrial sobretudo na operação das empresas estatais embora nesse estágio não houvesse ainda o menor indício de privatização que teria de esperar até meados dos anos 1990 O renascimento da China acompanhou um significativo repúdio a um dos mais extrativistas conjuntos de instituições econômicas do mundo e sua substituição por outras mais inclusivas Os incentivos de mercado na agricultura e na indústria seguidos de tecnologia e investimentos estrangeiros colocariam a China num caminho de crescimento econômico acelerado Como discutiremos em mais detalhes no próximo capítulo tal crescimento se deu sob instituições políticas extrativistas ainda que não tão repressivas quanto na época da Revolução Cultural e apesar de as instituições econômicas terem se tornado parcialmente inclusivas nada disso porém diminui o grau de radicalismo das mudanças sofridas pelas instituições econômicas chinesas A China rompeu o padrão mesmo não transformando suas instituições políticas Como em Botsuana e no Sul dos Estados Unidos as mudanças cruciais ocorreram durante uma circunstância crítica no caso da China após a morte de Mao Foram também contingentes na verdade extremamente fortuitas já que nada havia de inevitável no fato de o Bando dos Quatro ter sido derrotado na luta pelo poder e se não houvesse sido assim a China não teria conhecido o crescimento econômico sustentado que testemunhou nos últimos 30 anos Entretanto o nível de devastação e sofrimento humano provocados pelo Grande Salto Adiante e pela Revolução Cultural engendrou suficiente demanda por mudança para que Deng Xiaoping e seus aliados conseguissem vencer a batalha política BOTSUANA CHINA e o Sul dos Estados Unidos do mesmo modo como a Revolução Gloriosa na Inglaterra a Revolução Francesa e a Restauração Meiji no Japão são ilustrações vívidas de que história não é destino Apesar do círculo vicioso as instituições extrativistas podem ser substituídas por outras inclusivas o que não se dá de maneira automática contudo nem com facilidade Em geral é necessária uma confluência de fatores especialmente uma circunstância crítica aliada a ampla coalizão entre os que pressionam por reformas ou outras instituições existentes que sejam propícias para que um país avance ao encontro de instituições mais inclusivas Além disso um toque de sorte é sempre fundamental porque a história sempre se desenrola de forma contingente E 15 COMPREENDENDO A PROSPERIDADE E A POBREZA ORIGENS HISTÓRICAS XISTEM DIFERENÇAS GIGANTESCAS de padrão de vida ao redor do mundo Mesmo os mais pobres cidadãos dos Estados Unidos possuem renda e acesso à saúde educação serviços públicos e oportunidades econômicas e sociais muito superiores àqueles disponíveis para a vasta massa de habitantes da África subsaariana Sul da Ásia e América Central O contraste entre as Coreias do Sul e do Norte as duas Nogales e Estados Unidos e México recordanos que se trata de um fenômeno relativamente recente Há 500 anos o México sede do Estado asteca era definitivamente mais rico que as regiões mais ao norte e só seria ultrapassado pelos Estados Unidos no século XIX A lacuna entre as duas Nogales é ainda mais recente Já as Coreias do Sul e do Norte eram indiscerníveis em termos econômicos sociais e culturais até o país ser dividido após a Segunda Guerra Mundial na altura do paralelo 38 Analogamente a maioria das abissais diferenças econômicas que observamos hoje à nossa volta surgiu no decorrer dos últimos 200 anos Era mesmo necessário que fosse assim Haveria alguma predeterminação histórica ou geográfica ou cultural ou étnica no sentido de que Europa Ocidental Estados Unidos e Japão se tornassem tão mais ricos do que a África subsaariana América Latina e China no decorrer de cerca dos últimos 200 anos Seria inevitável que a Revolução Industrial tivesse início no século XVIII na GrãBretanha e em seguida se disseminasse pela Europa Ocidental e por seus desdobramentos na América do Norte e Australásia Seria possível outro mundo em que as Revoluções Gloriosa e Industrial ocorressem no Peru que então colonizaria a Europa Ocidental e escravizaria os brancos Ou essa alternativa não passa de uma espécie de ficção científica histórica Para responder a essas perguntas e na verdade até para poder pensar a respeito necessitamos de uma teoria acerca do porquê de algumas nações serem prósperas ao passo que outras fracassam e caem na pobreza Tal teoria precisa delinear tanto os fatores que criam e retardam a prosperidade quanto suas raízes históricas É o que este livro se propôs a fazer Qualquer fenômeno social complexo tal como as origens das diferentes trajetórias econômicas e políticas de centenas de Estados em todo o mundo provavelmente terá uma miríade de causas o que leva a maioria dos cientistas sociais a repudiar teorias simples de aplicação ampla e que identifiquem uma única causa para os acontecimentos por isso tendem a preferir uma série de explicações diferentes para resultados aparentemente similares que ocorram em locais e tempos distintos O que fizemos em vez disso foi oferecer uma teoria simples usandoa para explicar os principais contornos do desenvolvimento econômico e político ao redor do mundo desde a Revolução Neolítica Nossa escolha foi motivada não por uma crença ingênua de que tal teoria poderia fornecer explicações para tudo mas pela convicção de que a teoria deve nos permitir abordar os paralelismos ainda que por vezes à custa da abstração de não poucas minúcias interessantes Uma teoria bemsucedida portanto não procura reproduzir detalhes com fidelidade mas proporciona uma justificativa útil e empiricamente bem fundamentada para uma gama de processos ao mesmo tempo em que joga luz sobre as principais forças em ação Nossa teoria procurou alcançar esse objetivo atuando em dois níveis O primeiro é a distinção entre instituições econômicas e políticas extrativistas e inclusivas O segundo é nossa explicação de por que as instituições inclusivas surgiram em determinadas regiões do mundo mas não em outras Enquanto o primeiro nível de nossa teoria trata de uma interpretação institucional da história o segundo trata de como esta molda os percursos institucionais das nações Um elemento central de nossa teoria é a ligação entre instituições econômicas e políticas inclusivas e prosperidade Instituições econômicas inclusivas que asseguram os direitos de propriedade criam condições igualitárias para todos e incentivam os investimentos em novas tecnologias e competências têm maiores chances de conduzir ao crescimento econômico do que as extrativistas que são estruturadas de modo que poucos possam extrair recursos de muitos e mostramse incapazes de proteger os direitos de propriedade ou fornecer incentivos para a atividade econômica As instituições econômicas inclusivas são sustentadas por suas contrapartes políticas isto é aquelas que promovem ampla distribuição do poder político de maneira pluralista e conseguem alcançar algum grau de centralização política de modo a estabelecer a lei e a ordem que são os fundamentos de direitos de propriedade seguros e de uma economia de mercado inclusiva ao mesmo tempo em que lhes dão sustentação Analogamente as instituições econômicas extrativistas são sinergicamente ligadas às suas equivalentes políticas que concentram poder nas mãos de uns poucos os quais são incentivados assim a manter e desenvolver instituições econômicas extrativistas em benefício próprio usando os recursos obtidos para consolidar seu controle do poder político Essas tendências não significam que o extrativismo das instituições econômicas e políticas seja inconsistente com o crescimento econômico Pelo contrário é do maior interesse de toda e qualquer elite estimular ao máximo o crescimento de modo a ter mais a extrair As instituições extrativistas que alcançam um grau mínimo de centralização política em geral conseguem gerar algum crescimento O crucial porém é que o crescimento sob instituições extrativistas não será sustentado por duas razões principais Primeiro para ser sustentado o crescimento econômico requer inovação esta por sua vez não pode ser dissociada da destruição criativa que não só vem substituir o velho pelo novo no âmbito econômico como também desestabiliza as relações estabelecidas de poder na esfera política Dado o temor que as elites que dominam as instituições extrativistas têm da destruição criativa elas vão resistir e qualquer crescimento que eventualmente venha a ocorrer sob instituições extrativistas está fadado a ter vida curta Em segundo lugar a capacidade que têm aqueles que dominam as instituições extrativistas de beneficiarse imensamente em detrimento do resto da sociedade implica que o poder político sob instituições extrativistas é um bem cobiçado o que leva inúmeros grupos e indivíduos a disputálo Por conseguinte emergem forças poderosas que empurram as sociedades sob instituições extrativistas para a instabilidade política As sinergias entre instituições econômicas e políticas extrativistas criam um círculo vicioso no qual as instituições extrativistas uma vez instauradas tendem a persistir Analogamente há um círculo virtuoso associado a instituições econômicas e políticas inclusivas Vicioso ou virtuoso porém nenhum dos dois tipos de círculo é absoluto Com efeito algumas nações vivem hoje sob instituições inclusivas porque embora as instituições extrativistas tenham sido a norma ao longo da história certas sociedades conseguiram romper o padrão e efetuar a transição rumo a instituições inclusivas Nossa explicação para essas transições é de caráter histórico mas não historicamente predeterminada Mudanças institucionais significativas que são prérequisitos para mudanças econômicas significativas são resultados da interação entre as instituições existentes e circunstâncias críticas isto é eventos de magnitude considerável que rompem o equilíbrio político e econômico existente em uma ou mais sociedades Foi o caso da peste negra por exemplo que talvez tenha eliminado até metade da população da maioria das regiões europeias no século XIV da abertura das rotas comerciais atlânticas que engendrou enormes oportunidades de lucro para muitos na Europa Ocidental e da Revolução Industrial que gerou potencial para mudanças aceleradas mas desagregadoras na estrutura das economias de todo o mundo As diferenças institucionais entre as próprias sociedades são fruto de mudanças institucionais passadas Por que o caminho da mudança institucional varia de uma sociedade para outra A resposta a essa pergunta está na diferenciação institucional Do mesmo modo como os genes de duas populações isoladas de organismos vão se diferenciar pouco a pouco em virtude de mutações aleatórias no chamado processo de diferenciação evolutiva ou genética duas sociedades que sob outros aspectos são similares também se diferenciam em termos institucionais ainda que também aqui devagar Conflitos com relação a receita e poder e indiretamente instituições são uma constante em todas as sociedades Em geral seu resultado é contingente mesmo que as condições de disputa para cada parte envolvida não sejam igualitárias É a resolução do conflito que promove a diferenciação institucional Todavia não se trata de um processo necessariamente cumulativo ele não implica que as pequenas diferenças que emergem em algum ponto vão obrigatoriamente se ampliar com o tempo Pelo contrário conforme ilustrado por nossa discussão da Britânia romana no Capítulo 6 pequenas diferenças vêm à tona desaparecem e voltam a surgir Entretanto quando ocorre uma circunstância crítica essas pequenas diferenças decorrentes da diferenciação institucional podem ser aquelas que fazem a diferença levando sociedades que sob outros aspectos são similares a divergir radicalmente Vimos nos Capítulos 7 e 8 que apesar das diversas semelhanças entre Inglaterra França e Espanha foi na primeira que a circunstância crítica do comércio atlântico exerceu impacto mais transformador devido às pequenas diferenças a que nos referimos como o fato de que em função do desenrolar dos acontecimentos durante os séculos XV e XVI a Coroa inglesa não podia controlar todo o comércio ultramarino enquanto na França e na Espanha este se encontrava basicamente sob o monopólio da Coroa Por conseguinte nesses dois países a monarquia e os grupos a ela aliados foram os principais beneficiários dos grandes lucros criados pelo comércio atlântico e pela expansão colonial enquanto na Inglaterra foram grupos que se opunham ferrenhamente à Coroa os beneficiários das oportunidades econômicas escancaradas por essa circunstância crítica Embora a diferenciação institucional produza diferenças pequenas sua interrelação com as circunstâncias críticas acarreta divergências institucionais que por sua vez geram as diferenças mais consideráveis que a circunstância crítica seguinte afetará A história é crucial pois são os processos históricos que via diferenciação institucional criam as peculiaridades que podem fazer toda a diferença durante as circunstâncias críticas Estas constituem momentos de reviravolta histórica e os círculos viciosos e virtuosos significam que temos de estudar a história para compreender a natureza das diferenças institucionais estruturadas historicamente Todavia nossa teoria não implica determinismo histórico nem de nenhum outro tipo É por essa razão que a resposta à pergunta com que abrimos este capítulo é não não havia nenhuma necessidade histórica de que o Peru acabasse se tornando tão mais pobre do que a Europa Ocidental ou os Estados Unidos Para começar em contraste com as hipóteses geográfica e cultural o Peru não está fadado à pobreza em virtude de sua geografia ou cultura Segundo a nossa teoria o Peru hoje é tão mais pobre que a Europa Ocidental e os Estados Unidos devido às suas instituições e para compreender as razões disso precisamos entender seu processo histórico de desenvolvimento institucional Como vimos no segundo capítulo 500 anos atrás o Império Inca que ocupou o território atual do país era mais rico mais sofisticado tecnologicamente e mais centralizado em termos políticos do que os Estados menores que ocupavam a América do Norte A chave foi o modo como essa região foi colonizada e como isso contrastou com a colonização da América do Norte ou seja não se tratou do fruto de um processo historicamente predeterminado mas do resultado contingente de uma série de desdobramentos institucionais cruciais ao longo de diversas circunstâncias críticas Ao menos três fatores poderiam ter mudado essa trajetória e produzido padrões muito diferentes a longo prazo Primeiro as diferenças institucionais nas Américas durante o século XV moldaram a forma como essas áreas foram colonizadas A América do Norte seguiu uma trajetória institucional diferente da peruana não só devido à sua baixa densidade demográfica antes da colonização mas também por ter atraído colonos europeus que mais tarde lograriam êxito em sua sublevação contra a elite que entidades como a Virginia Company e a Coroa britânica tentaram criar Em contrapartida os conquistadores espanhóis encontraram no Peru um Estado centralizado e extrativista de que se apropriar bem como uma vasta população que puderam pôr para trabalhar em minas e plantations Também não havia nada de geograficamente predeterminado na situação das Américas na época da chegada dos europeus Do mesmo modo como a emergência entre os bushong de um Estado centralizado liderado pelo Rei Shyaam foi fruto de uma inovação institucional considerável ou talvez mesmo de uma revolução política como vimos no Capítulo 5 a civilização inca no Peru e a grande população da região surgiram em decorrência de significativas inovações institucionais Estas poderiam muito bem ter se dado na América do Norte em lugares como o Vale do Mississippi ou mesmo o nordeste dos Estados Unidos Nesse caso os europeus talvez tivessem encontrado terras vazias nos Andes e Estados centralizados na América do Norte e os papéis do Peru e dos Estados Unidos seriam invertidos Os europeus teriam então se estabelecido em território peruano e o conflito entre a maioria dos colonos e a elite teria levado à criação de instituições inclusivas lá em vez de na América do Norte Os rumos posteriores do desenvolvimento econômico seriam provavelmente outros então Em segundo lugar o Império Inca poderia ter resistido ao colonialismo europeu como fez o Japão por ocasião da chegada da esquadra do Comodoro Perry na Baía de Edo Embora o maior extrativismo do Império Inca em relação ao de Tokugawa Japão sem dúvida diminuísse a probabilidade de ocorrência no Peru de uma revolução política nos moldes da Restauração Meiji não havia nenhuma necessidade histórica de que os incas sucumbissem de maneira tão cabal à dominação europeia Se tivessem conseguido resistir ou mesmo modernizar suas instituições em resposta às ameaças externas todo o percurso histórico do Novo Mundo e com ele toda a história mundial poderia ser diferente Terceiro agora radicalizando nosso raciocínio não havia nenhum determinismo histórico geográfico ou cultural que ditasse que fossem os europeus a colonizar a Terra Poderiam ter sido os chineses por exemplo ou mesmo os incas Naturalmente tal desdobramento seria impossível quando olhamos o mundo do ponto de vista do século XV quando a Europa Ocidental já havia saltado à frente das Américas e a China já tinha se fechado em sua concha Contudo a Europa Ocidental do século XV foi ela mesma fruto de um processo contingente de diferenciação institucional pontuado por circunstâncias críticas que nada teve de inevitável As potências do Oeste Europeu não teriam conseguido assumir a dianteira e conquistar o mundo sem uma sucessão de reviravoltas históricas entre elas os rumos específicos tomados pelo feudalismo substituindo a escravidão e diminuindo o poder dos monarcas no caminho o fato de que os primeiros séculos após a virada do primeiro milênio na Europa assistiram ao desenvolvimento de cidades independentes e autônomas em termos comerciais o fato de que os monarcas europeus não se sentiram tão ameaçados pelo comércio ultramarino e portanto não procuraram desestimulálo como fizeram os imperadores chineses durante a dinastia Ming e o advento da peste negra que abalou as fundações da ordem feudal Caso esses acontecimentos tivessem se dado de outra forma poderíamos viver hoje em um mundo muito diferente em que o Peru talvez fosse mais rico que a Europa Ocidental ou os Estados Unidos NATURALMENTE A CAPACIDADE PREDITIVA de uma teoria em que a contingência e as pequenas diferenças desempenham papéis centrais será restrita Poucos teriam antevisto no século XV ou mesmo no XVI e muito menos nos muitos séculos que se seguiram à queda do Império Romano que a maior guinada rumo a instituições inclusivas ocorreria na GrãBretanha O processo específico de diferenciação institucional e a natureza da circunstância crítica criada pela abertura do comércio atlântico é que criaram essa possibilidade Do mesmo modo poucos poderiam imaginar em plena Revolução Cultural na década de 1970 que a China logo estaria a caminho de mudanças radicais em suas instituições econômicas e em seguida em uma trajetória de crescimento vertiginoso Analogamente é impossível prever com qualquer grau de certeza qual será o estado de coisas daqui a 500 anos o que não chega a caracterizar um ponto fraco da nossa teoria O relato histórico que apresentamos até aqui indica que toda abordagem baseada no determinismo histórico a partir da geografia cultura ou mesmo outros fatores históricos é inadequada As pequenas diferenças e a contingência não fazem parte apenas da nossa teoria fazem parte do desenrolar da história Por mais difícil que seja fazer previsões acuradas acerca de que sociedades vão prosperar em relação às outras vimos no decorrer de todo este livro que nossa teoria explica bastante bem as vastas diferenças na prosperidade e pobreza das nações do mundo Veremos no resto deste capítulo que ela também fornece algumas diretrizes com relação aos tipos de sociedades com maiores chances de alcançar crescimento econômico nas próximas décadas Em primeiro lugar os círculos virtuosos e viciosos geram muita persistência e inércia Não há muita dúvida de que daqui a 50 ou mesmo 100 anos Estados Unidos e Europa Ocidental com base em suas instituições econômicas e políticas inclusivas serão mais ricos e é provável que consideravelmente mais ricos do que a África subsaariana o Oriente Médio a América Central ou o Sudeste Asiático Entretanto dentro desses padrões gerais haverá consideráveis mudanças institucionais ao longo do próximo século com alguns países rompendo o padrão e fazendo a transição da pobreza para a riqueza Países praticamente desprovidos de qualquer centralização política como Somália e Afeganistão ou aqueles que atravessaram um colapso do Estado como o Haiti nas últimas décadas muito antes do violento terremoto de 2010 que devastou a infraestrutura do país dificilmente atingirão algum crescimento sob instituições políticas extrativistas ou produzirão mudanças consideráveis rumo a instituições inclusivas Pelo contrário as nações com maiores possibilidades de crescimento nas próximas décadas ainda que provavelmente sob instituições extrativistas são aquelas com algum grau de centralização política Na África subsaariana enquadramse nessa descrição Burundi Etiópia Ruanda países com longo histórico de centralização do Estado e a Tanzânia que desde a independência conseguiu promover certa centralização ou ao menos implementar alguns dos prérequisitos para tanto Na América Latina incluemse Brasil Chile e México que não só atingiram a centralização política como também vêm dando passos significativos em direção a um pluralismo nascente Por outro lado nossa teoria sugere que o crescimento econômico sustentado é muito improvável na Colômbia A teoria sugere ainda que o crescimento sob instituições políticas extrativistas como na China não será sustentado e provavelmente perderá o ímpeto Para além desses casos prevalece a incerteza Cuba por exemplo pode efetuar a transição para instituições inclusivas e experimentar uma profunda transformação econômica ou pode permanecer sob instituições políticas e econômicas extrativistas O mesmo pode ser dito da Coreia do Norte e Mianmar na Ásia Assim embora nossa teoria forneça ferramentas para pensar sobre como as instituições mudam e as consequências de tais mudanças a sua natureza o papel das pequenas diferenças e da contingência dificulta uma precisão maior Cautela ainda maior se faz necessária ao elaborar recomendações de políticas a partir desse relato genérico das origens da prosperidade e da pobreza Do mesmo modo como o impacto das circunstâncias críticas depende das instituições existentes o modo como cada sociedade responderá à mesma intervenção depende das instituições em jogo Claro está que nossa teoria trata de como os países podem caminhar ao encontro da prosperidade transformando suas instituições extrativistas em inclusivas Por outro lado a teoria também deixa claro desde o começo que não há receitas fáceis para efetuar tal transição Primeiro o mecanismo do círculo vicioso implica uma dificuldade muito maior para mudar instituições do que a princípio pode parecer O que é particularmente insidioso é que as instituições extrativistas têm a capacidade de se recriar sob os mais diferentes disfarces como vimos com a lei de ferro da oligarquia no Capítulo 12 Assim o fato de o regime extrativista do Presidente Mubarak ter sido derrubado por manifestações populares em fevereiro de 2011 não constitui garantia de que o Egito vá enveredar por um caminho que o leve a instituições mais inclusivas Pelo contrário as instituições extrativistas mostramse capazes de se recriar apesar do vibrante e esperançoso movimento em prol da democracia Segundo já que o caminho contingente da história torna difícil saber se determinada interação entre as circunstâncias críticas e as diferenças institucionais existentes levará a instituições mais inclusivas ou mais extrativistas seria arrojado formular recomendações gerais com o objetivo de instigar a mudança rumo a instituições inclusivas Não obstante nossa teoria mantém sua utilidade para a análise política assim como nos permite reconhecer recomendações equivocadas para as políticas públicas baseadas ou em hipóteses incorretas ou em um entendimento inadequado de como as instituições podem mudar Aqui como em geral acontece evitar os piores erros é tão importante quanto tentar encontrar soluções simples e mais realista o que fica mais claramente visível ao considerarmos as atuais recomendações que estimulam o crescimento autoritário com base na bemsucedida experiência chinesa de crescimento das últimas décadas Em seguida explicaremos por que essas recomendações são equivocadas e por que o crescimento chinês tal como ocorreu até aqui não passa de mais uma forma de crescimento sob instituições políticas extrativistas que dificilmente se traduzirá em desenvolvimento econômico sustentado O IRRESISTÍVEL CHARME DO CRESCIMENTO AUTORITÁRIO Dai Guofang farejou logo no começo o iminente boom urbano na China Nos anos 1990 novos centros comerciais autoestradas residências e arranhacéus espalhavamse por toda parte no país e Dai imaginou que o crescimento só se aceleraria na década seguinte Na expectativa de que sua empresa a Jingsu Tieben Iron and Steel poderia capturar um vasto mercado como produtora de baixo custo sobretudo quando comparada às ineficientes siderúrgicas estatais planejou tornarse um verdadeiro gigante do aço Com o apoio das lideranças do partido em Changzhou começou a construir em 2003 Em março de 2004 porém o projeto fora interrompido por determinação do Partido Comunista chinês em Pequim e Dai acabou sendo preso por motivos que não chegaram a ser explicados com clareza As autoridades devem ter presumido que encontrariam algo de incriminador em sua contabilidade No processo ele passou os cinco anos seguintes entre a cadeia e a prisão domiciliar até ser julgado culpado em 2009 de uma acusação menor Seu verdadeiro delito foi dar início a um grande projeto que concorreria com empresas estatais e pior sem aprovação dos chefões do partido Sem dúvida foi essa a lição que outros tiraram do caso A reação do Partido Comunista a empreendedores como Dai não surpreende Chen Yun um dos mais próximos colaboradores de Deng Xiaoping e indiscutivelmente o principal articulador das reformas de mercado em seus estágios iniciais sintetizou o ponto de vista da maioria dos quadros do partido ao traçar uma analogia entre a economia chinesa e um pássaro na gaiola a economia era o pássaro o controle pelo partido a gaiola que precisava ganhar espaço para que a ave se tornasse mais saudável e dinâmica mas sem jamais ser destrancada ou eliminada para que o pássaro não escapasse Jiang Zemin logo após tornarse secretáriogeral do Partido Comunista o cargo mais poderoso do país em 1989 foi ainda mais longe e resumiu a desconfiança do partido em relação a empreendedores ao caracterizálos como mercadores e mascates autônomos que se dedicam a promover fraudes desvio de recursos subornos e evasão fiscal No decorrer dos anos 1990 enquanto choviam investimentos estrangeiros na China e as estatais eram incentivadas a expandir a iniciativa privada era encarada com desconfiança e muitos empreendedores eram expropriados ou mesmo presos A opinião de Jiang Zemin sobre empresários embora venha sofrendo um relativo declínio segue ainda muito em voga na China Nas palavras de um economista chinês as grandes estatais podem envolverse em projetos gigantescos Quando porém a iniciativa privada faz o mesmo sobretudo concorrendo com o Estado surgem problemas de todo lados sic Embora já se encontre hoje um semnúmero de empresas privadas operando com lucro no país muitos elementos da economia continuam sob o comando e a proteção do Estado O jornalista Richard McGregor conta que na mesa do presidente de cada uma das maiores estatais chinesas há um telefone vermelho Quando ele toca é o partido ligando para dar ordens acerca do que a empresa deve fazer onde deve investir e quais serão as suas metas Esses titãs seguem sob o comando do partido fato de que somos lembrados sempre que o partido decide trocar seus principais executivos demitilos ou promovêlos sem mais explicações Nenhuma dessas histórias pretende negar é evidente que a China realizou grandes progressos em direção a instituições econômicas inclusivas e são esses avanços que estão por trás dos extraordinários índices de crescimento do país nos últimos 30 anos A maioria dos empresários dispõe de alguma segurança e não menos por cultivar o apoio dos quadros locais e das elites do Partido Comunista em Pequim A maior parte das estatais visa ao lucro e compete nos mercados internacionais o que representa uma mudança radical em relação à China de Mao Como vimos no capítulo anterior a China só pôde começar a crescer porque sob Deng Xiaoping houve reformas radicais que substituíram as instituições econômicas mais extrativistas por outras inclusivas O crescimento prosseguiu com as instituições econômicas chinesas expandindo seu grau de inclusão ainda que em ritmo lento A China também se beneficia enormemente de sua vasta oferta de mão de obra barata e do acesso às tecnologias capital e mercados estrangeiros Por mais que as instituições econômicas do país sejam incomparavelmente mais inclusivas hoje que três décadas atrás a experiência chinesa é um rematado exemplo de crescimento sob instituições políticas extrativistas Apesar da recente ênfase em inovação e tecnologia o crescimento chinês baseiase na adoção das tecnologias existentes e na rapidez do investimento não na destruição criativa Um aspecto importante dessa realidade é que os direitos de propriedade não são inteiramente seguros na China Vez por outra como no caso de Dai alguns empreendedores são expropriados A mobilidade da mão de obra é estritamente controlada e o mais básico dos direitos de propriedade o direito de cada um vender o próprio trabalho do modo como bem entender é ainda muito precário A distância que ainda separa as instituições econômicas de serem verdadeiramente inclusivas é ilustrada pelo fato de que apenas uns poucos homens e mulheres de negócios se arriscariam a dedicarse a qualquer atividade sem assegurar o apoio do quadro local do partido ou ainda mais importante de Pequim A ligação entre o empresariado e o partido é altamente rentável para ambos os lados As empresas que contam com o apoio do partido recebem contratos em termos favoráveis desapropriam pessoas comuns de suas terras e transgridem impunemente leis e regulamentações Os que atravessarem o caminho de seus planos de negócios serão esmagados podendo até acabar presos ou assassinados A mão onipresente do Partido Comunista e das instituições extrativistas na China lembra as inúmeras semelhanças entre o crescimento soviético nas décadas de 1950 e 1960 e o crescimento chinês atual embora haja também diferenças notórias A União Soviética pôde crescer sob instituições econômicas e políticas extrativistas por ter alocado recursos à força para a indústria sob uma estrutura de comando centralizada sobretudo para o setor de armamentos e a indústria pesada Tal crescimento tornouse viável em parte por haver muito atraso a tirar o crescimento sob instituições extrativistas é mais fácil quando a destruição criativa não é uma necessidade As instituições econômicas chinesas são sem dúvida mais inclusivas que as soviéticas mas as instituições políticas do país continuam extrativistas O Partido Comunista chinês é todopoderoso e controla toda a burocracia estatal as forças armadas a mídia e vastos segmentos da economia O povo chinês dispõe de liberdades políticas restritas e de muito pouca participação no processo político São muitos os que há tempos acreditam que o crescimento na China conduziria à democracia e a maior pluralismo Houve um sentimento generalizado em 1989 de que as manifestações na Praça da Paz Celestial promoveriam maior abertura e talvez até levassem ao colapso do regime comunista Entretanto os tanques foram enviados contra os manifestantes e em vez de uma revolução pacífica os livros de história hoje se referem ao Massacre da Praça da Paz Celestial Em muitos sentidos as instituições políticas chinesas tornaramse mais extrativistas após esses acontecimentos reformadores como Zhao Ziyang que como secretáriogeral do Partido Comunista expressou seu apoio aos estudantes da Praça foram expurgados e o partido redobrou o zelo no aniquilamento das liberdades civis e de imprensa Zhao Ziyang permaneceria em prisão domiciliar por mais de 15 anos e sua figura pública seria paulatinamente apagada de modo que ele não se tornasse sequer um símbolo para os defensores de mudanças políticas Atualmente o partido exerce sobre os meios de comunicação inclusive a internet um nível de controle sem precedentes do qual boa parte se dá por meio da autocensura os veículos de comunicação sabem que não devem mencionar Zhao Ziyang nem Liu Xiaobo o crítico do governo que reivindica maior democratização e que segue apodrecendo na prisão mesmo depois de agraciado com o Prêmio Nobel da Paz A autocensura é complementada por um aparato orwelliano capaz de monitorar conversas e comunicações fechar jornais e sites até bloquear o acesso especificamente a determinadas notícias na internet Todo esse sistema foi acionado em 2009 quando estouraram acusações de corrupção contra o filho do secretáriogeral do partido desde 2002 Hu Jintao O aparelho governamental entrou em ação e não só conseguiu impedir a mídia chinesa de cobrir o caso como também foi capaz de bloquear as matérias sobre o caso nos sites do New York Times e do Financial Times Devido ao controle do partido sobre as instituições econômicas a destruição criativa é muito restrita e assim permanecerá até que haja reformas radicais nas instituições políticas Assim como na União Soviética a experiência chinesa de crescimento sob instituições políticas extrativistas é muito facilitada pelo fato de haver um enorme atraso a tirar A renda per capita na China ainda é uma fração daquela dos Estados Unidos e Europa Ocidental Sem dúvida o crescimento chinês é consideravelmente mais diversificado que o soviético não é função somente das indústrias pesada ou de armamentos e os empresários chineses vêm se mostrando bem mais engenhosos De todo modo esse crescimento está fadado a se esgotar a menos que o extrativismo das instituições políticas dê lugar a maior inclusão Enquanto as instituições políticas permanecerem extrativistas o crescimento será intrinsecamente limitado como em todos os casos similares A experiência da China levanta uma série de questões interessantes acerca do futuro do seu crescimento e sobretudo do quanto o crescimento autoritário é desejável e viável Esse tipo de crescimento vem se tornando uma alternativa popular ao consenso de Washington que salienta a importância da liberalização do mercado e do comércio bem como de determinadas formas de reforma institucional para impulsionar o crescimento econômico em muitas regiões menos desenvolvidas do mundo Embora parte do apelo da opção autoritária consista justamente na reação ao consenso de Washington talvez seu maior charme sem dúvida para os governantes que controlam instituições extrativistas resida na liberdade concedida para manter e até reforçar seu poder além de legitimar seu extrativismo Como destaca a nossa teoria sobretudo nas sociedades que passaram por algum grau de centralização do Estado esse tipo de crescimento sob instituições extrativistas é possível e pode até constituir o cenário mais provável para muitas nações indo do Camboja e do Vietnã ao Burundi Etiópia e Ruanda A teoria sugere também contudo que como todos os casos de crescimento sob instituições políticas extrativistas ele não será sustentado No caso da China o processo de crescimento baseado na compensação do atraso importação de tecnologia estrangeira e exportação de produtos manufaturados de baixa qualidade deve prosseguir por algum tempo Não obstante o crescimento chinês também deve esgotarse especialmente depois que a China alcançar o padrão de vida de um país de renda mediana O cenário mais provável é que o Partido Comunista e as cada vez mais poderosas elites econômicas do país consigam manter seu altíssimo grau de domínio nas próximas décadas Nesse caso a história e nossa teoria sugerem que o crescimento com destruição criativa e verdadeira inovação não se dará e os espetaculares índices de crescimento na China vão acabar se esvanecendo Tal resultado porém está longe de ser predeterminado pode ser evitado caso a China adote instituições políticas inclusivas antes que suas possibilidades de crescimento sob instituições extrativistas se esvaiam Não obstante como veremos em seguida há poucos motivos para supor que uma transição rumo a instituições políticas mais inclusivas seja provável na China ou que possa ocorrer de maneira automática e indolor Mesmo algumas vozes dentro do Partido Comunista chinês vêm reconhecendo os perigos à frente e disseminando a ideia de que uma reforma política isto é uma transição para instituições políticas mais inclusivas para usar a nossa terminologia se faz necessária O poderoso primeiroministro Wen Jiabao recentemente alertou para o perigo de que o crescimento econômico venha a ser prejudicado caso não se realizem reformas na esfera política A nosso ver a análise de Wen é presciente ainda que haja quem duvide de sua sinceridade No entanto muitos no Ocidente discordam dos pronunciamentos de Wen para eles a China revela um caminho alternativo ao crescimento econômico sustentado que se dá sob a égide do autoritarismo em vez de sob instituições políticas e econômicas inclusivas Mas estão errados Já detectamos as razões do êxito chinês uma transformação radical das instituições econômicas com a substituição daquelas rigidamente comunistas por outras que fornecem incentivos ao incremento da produtividade e do comércio Visto dessa perspectiva não há nada de fundamentalmente diferente na experiência chinesa em relação à de países que conseguiram afastarse um pouco de instituições econômicas extrativistas e aproximar se das inclusivas mesmo que isso se dê sob instituições políticas extrativistas como no caso chinês A China alcançou o crescimento econômico portanto não graças às suas instituições políticas extrativistas mas apesar delas sua bemsucedida experiência de crescimento no decorrer das três últimas décadas devese a um afastamento radical das instituições econômicas extrativistas e a uma convergência para outras mais inclusivas tarefa que se torna mais difícil não mais fácil pela presença de instituições políticas extrativistas altamente autoritárias OUTRO TIPO DE ENDOSSO dado ao crescimento autoritário reconhece sua natureza nada atraente mas entende que o autoritarismo é apenas uma fase transitória É uma ideia que remonta a uma das teorias clássicas da sociologia política a teoria da modernização formulada por Seymour Martin Lipset e segundo a qual todas as sociedades ao crescerem encaminhamse para uma forma de existência mais moderna desenvolvida e civilizada e principalmente rumo à democracia Muitos defensores da teoria da modernização alegam também que assim como a democracia as instituições inclusivas emergirão como subproduto do processo de crescimento Ademais por mais que democracia não seja sinônimo de instituições políticas inclusivas o desenvolvimento destas tende a ser fomentado pela realização de eleições regulares e pela livre concorrência política Diferentes versões da teoria da modernização também afirmam que o acesso da força de trabalho à educação naturalmente leva à democracia e a instituições melhores Em uma versão meio pósmoderna da referida teoria Thomas Friedman colunista do New York Times chegou a sugerir que quando o país atinge um número suficiente de restaurantes do McDonalds a democracia e as instituições fatalmente se seguem É um quadro otimista Ao longo dos últimos 60 anos a maioria dos países mesmo muitos daqueles com instituições extrativistas experimentou algum grau de crescimento e muitos assistiram a um aumento notável no grau de escolaridade de suas forças de trabalho Assim à medida que os níveis de renda e escolaridade forem aumentando de todo modo todos os outros fatores positivos como democracia direitos humanos liberdades civis e segurança dos direitos de propriedade devem seguirse automaticamente A teoria da modernização conta com grande número de adeptos tanto dentro quanto fora da academia Foi por suas hipóteses por exemplo que se pautaram as recentes atitudes dos Estados Unidos para com a China por exemplo George H W Bush resumiu a política americana em relação à democracia chinesa com as palavras pratiquemos o livre comércio com a China e o tempo estará a nosso favor A ideia era que havendo livre comércio entre a China e o Ocidente o país cresceria o crescimento por sua vez se encarregaria de promover a democracia e instituições melhores no país conforme previsto pela teoria da modernização No entanto a rápida intensificação das relações comerciais entre China e Estados Unidos desde meados da década de 1980 pouco contribuiu para a democracia chinesa e a integração cada vez mais estreita aguardada para a próxima década dará resultados igualmente pífios As expectativas de muitos com relação ao futuro da sociedade e da democracia iraquianas após a invasão liderada pelos Estados Unidos mostraramse igualmente otimistas em virtude dessas mesmas teses Apesar de seu desempenho econômico desastroso sob o regime de Saddam Hussein em 2002 o Iraque não era tão pobre quanto muitos países da África subsaariana e contava com uma população de razoável escolaridade em termos comparativos daí a crença de que seria terreno fértil para o desenvolvimento da democracia e das liberdades civis e talvez até para o que poderíamos chamar de pluralismo Tais esperanças viramse rapidamente esmagadas quando o caos e a guerra civil abateramse sobre a sociedade iraquiana A teoria da modernização não só é incorreta como também não contribui para a reflexão a respeito do enfrentamento dos principais problemas das instituições extrativistas A melhor evidência em seu favor é o fato de que as nações ricas são aquelas que contam com regimes democráticos respeitam os direitos humanos e civis e apresentam mercados funcionais e de modo geral instituições econômicas inclusivas Ainda assim interpretar tal associação como comprovação dessa teoria significa ignorar os efeitos consideráveis das instituições políticas e econômicas inclusivas sobre o crescimento econômico Como defendemos ao longo de todo este livro foram as sociedades dotadas de instituições inclusivas que cresceram no decorrer dos últimos 300 anos e tornaramse relativamente ricas hoje o que justifica o atual estado de coisas no mundo como fica evidente se encararmos os fatos de uma perspectiva ligeiramente distinta enquanto as nações que construíram instituições políticas e econômicas inclusivas ao longo dos últimos séculos alcançaram um crescimento econômico sustentado os regimes autoritários que cresceram mais rapidamente nos últimos 60 ou 100 anos ao contrário do que a teoria da modernização de Lipset nos levaria a crer não se tornaram mais democráticas Não admira o crescimento sob instituições extrativistas é possível exatamente por não implicar necessária ou automaticamente a derrocada dessas mesmas instituições pelo contrário costuma ocorrer porque quem controla as instituições extrativistas encara o crescimento econômico não como uma ameaça mas como um sustentáculo do regime como tem feito o Partido Comunista chinês desde a década de 1980 Tampouco surpreende que o crescimento engendrado por um aumento do valor dos recursos naturais de um país como ocorreu no Gabão Rússia Arábia Saudita e Venezuela dificilmente acarrete uma transformação fundamental desses regimes autoritários rumo a instituições inclusivas O registro histórico é ainda menos generoso com a teoria da modernização Muitos países relativamente prósperos sucumbiram a ditaduras repressivas e mantiveram instituições extrativistas Tanto a Alemanha quanto o Japão figuravam entre as nações mais ricas e industrializadas do mundo na primeira metade do século XX e seus cidadãos apresentavam níveis de escolaridade relativamente altos Nada disso impediu a ascensão do Partido NacionalSocialista na Alemanha nem a de um regime militarista voltado para a expansão territorial por meios bélicos no Japão o que levou as instituições econômicas e políticas de ambos a dar uma guinada radical rumo a instituições extrativistas A Argentina também era um dos países mais ricos do mundo no século XIX tanto quanto a GrãBretanha ou talvez até mais por ter se beneficiado d o boom mundial de recursos sua população era também a de mais alto grau de escolaridade da América Latina Contudo a democracia e o pluralismo não eram mais bemsucedidos no país do que no resto da América Latina pelo contrário mostraram se indiscutivelmente mais frágeis Os golpes se sucederam e como vimos no Capítulo 11 até os líderes eleitos pela via democrática comportaramse como ditadores rapaces Mesmo recentemente muito pouco se avançou no sentido do desenvolvimento de instituições econômicas inclusivas como vimos no Capítulo 13 os governos argentinos em pleno século XXI ainda conseguem expropriar impunemente a riqueza de seus cidadãos De todas essas considerações podemos deduzir uma série de conclusões significativas Primeiro o crescimento sob instituições políticas extrativistas autoritárias na China embora provavelmente ainda vá prosseguir por algum tempo não se traduzirá em crescimento sustentado apoiado em instituições econômicas verdadeiramente inclusivas e na destruição criativa Em segundo lugar contrariando as teses da teoria da modernização não contaríamos com a criação de democracia nem de instituições políticas inclusivas com base no crescimento autoritário China Rússia e diversos outros regimes autoritários que hoje apresentam algum grau de expansão devem atingir os limites do crescimento extrativista antes de aumentar o grau de inclusão de suas instituições políticas e de fato provavelmente antes do surgimento de qualquer desejo de mudança nesse sentido por parte das elites ou de uma oposição forte que as obrigue a mudar Terceiro o crescimento autoritário não é nem desejável nem viável a longo prazo e portanto não deve contar com o endosso da comunidade internacional como modelo para países da América Latina Ásia e África subsaariana mesmo sendo um caminho que muitos deles escolherão exatamente por estar às vezes de acordo com os interesses das elites políticas e econômicas que os dominam PROSPERIDADE NÃO SE ARQUITETA Ao contrário da teoria que desenvolvemos neste livro a hipótese da ignorância implica prontamente uma sugestão acerca de como solucionar o problema da pobreza se foi a ignorância que nos colocou nesta situação são o fornecimento de informações e o esclarecimento dos governantes e autoridades que podem nos tirar dela e deveríamos conseguir arquitetar prosperidade pelo mundo dando instruções adequadas e convencendo os políticos de quais são os bons princípios econômicos No Capítulo 2 quando discutimos essa hipótese mostramos como a experiência de Kofi Busia primeiroministro de Gana no começo da década de 1970 veio demonstrar que o principal obstáculo à adoção de políticas públicas capazes de reduzir a falência dos mercados e estimular o crescimento econômico não é a ignorância dos políticos mas os incentivos e restrições que lhes são impostos pelas instituições econômicas e políticas de suas sociedades Não obstante a hipótese da ignorância continua reinando soberana entre as autoridades ocidentais que praticamente em detrimento de toda e qualquer outra possibilidade têm como foco a criação da prosperidade Essas tentativas de criação seguem dois modelos básicos O primeiro que costuma ser defendido por órgãos internacionais como o Fundo Monetário Internacional parte da premissa de que o desenvolvimento incompleto é fruto de instituições e políticas econômicas de má qualidade propondo então uma lista de melhorias que esses órgãos internacionais empenhamse em induzir os países pobres a adotar o próprio consenso de Washington compõe uma lista dessas Essas melhorias giram em torno de objetivos sensatos como estabilidade macroeconômica e metas macroeconômicas aparentemente interessantes como a redução do tamanho do setor governamental câmbio flexível e liberalização das contas de capital Incluem também metas de ordem mais microeconômica como privatização aumento de eficiência na prestação de serviços públicos e talvez também sugestões quanto a como incrementar o funcionamento do próprio Estado com ênfase em medidas anticorrupção Por mais sensatas que muitas dessas reformas possam ser por si sós a abordagem de organizações internacionais em Washington Londres Paris e alhures continua embebida de uma perspectiva equivocada que se mostra incapaz de reconhecer o papel das instituições políticas e das restrições por elas impostas à formulação de políticas públicas Toda tentativa por parte dos organismos internacionais no sentido de fomentar o crescimento econômico mediante a intimidação dos países pobres obrigandoos a adotar instituições e políticas de melhor qualidade fracassa por não identificar outra causa para as más políticas e instituições além da ignorância dos líderes dos países pobres A consequência é que tais políticas não são adotadas ou implementadas ou são instauradas apenas de forma nominal Por exemplo diversas economias de todo o mundo que adotaram ostensivamente tais reformas sobretudo na América Latina ficaram estagnadas durante toda as décadas de 1980 e 1990 Na realidade tais medidas foram impingidas a esses países em contextos políticos que de resto permaneceram intocados Assim mesmo onde se realizaram reformas estas tiveram sua intenção subvertida ou os políticos lançaram mão de outros meios para suavizar seu impacto Tudo isso é ilustrado pela implementação de uma das principais recomendações dos órgãos internacionais com vistas à conquista da estabilidade macroeconômica a independência do banco central Tal orientação costuma ser implementada na teoria mas não na prática ou solapada pelo uso de outras ferramentas políticas Em princípio é muito razoável Muitos políticos de todo o mundo que gastavam mais do que arrecadavam com os impostos forçavam seus bancos centrais a compensar a diferença mediante a impressão de papel moeda A inflação resultante criava instabilidade e incerteza A teoria era que bancos centrais independentes como o Bundesbank alemão resistiriam à pressão política e poriam um freio na inflação O Presidente Mugabe do Zimbábue decidido a seguir os conselhos internacionais declarou o Banco Central de seu país independente em 1995 Até então os índices de inflação zimbabuanos oscilavam em torno de 20 Em 2002 haviam chegado a 140 em 2003 a quase 600 em 2007 a 66000 e em 2008 a 230000000 Evidentemente em um país cujo presidente ganha na loteria páginas 286290 não deveria surpreender ninguém que a promulgação de uma lei declarando o Banco Central independente nada queira dizer Deve ter chegado ao conhecimento do presidente do banco central zimbabuano o modo como seu colega de Serra Leoa havia caído do último andar do edifício do banco central quando discordara de Siaka Stevens página 267 Independente ou não cumprir as exigências do presidente ainda era a escolha mais prudente para sua saúde pessoal ainda que não para a da economia Por outro lado nem todos os países são como o Zimbábue Na Argentina e na Colômbia os Bancos Centrais também se tornaram independentes na década de 1990 e efetivamente se desincumbiram da missão de conter a inflação Contudo uma vez que em nenhuma das duas houve transformação política as elites políticas encontraram outras maneiras de comprar votos manter seus interesses e recompensar a si mesmas e aos seus seguidores Como já não podiam fazêlo por meio da emissão de papelmoeda tiveram de encontrar outros meios Nos dois países a introdução da independência do Banco Central coincidiu com uma grande expansão dos gastos governamentais financiada em grande parte mediante empréstimos O segundo método de criação da prosperidade encontrase muito mais em voga hoje em dia reconhece que não existem soluções fáceis para erguer uma nação da pobreza à prosperidade do dia para a noite ou mesmo no decorrer de algumas décadas e em vez disso defende que há uma série de microfalhas de mercado que podem ser compensadas por boas orientações Assim a prosperidade será alcançada caso as autoridades tirem proveito de tais oportunidades o que mais uma vez podese conseguir com a ajuda e visão de economistas e congêneres Segundo essa abordagem as pequenas falhas de mercado pululam nos países pobres em seus sistemas educacionais por exemplo ou serviços de saúde bem como no modo como seus mercados são organizados o que sem dúvida é verdade Todavia o problema é que essas pequenas falhas podem ser apenas a ponta do iceberg sintomas de problemas mais arraigados nas sociedades que funcionam sob instituições extrativistas Assim como não é coincidência o fato de os países pobres terem péssimas políticas macroeconômicas tampouco é coincidência que seus sistemas educacionais não funcionem bem Talvez essas falhas de mercado não se devam exclusivamente à ignorância As autoridades e burocratas que deveriam seguir tão bemintencionadas orientações podem fazer também parte do problema e as diversas tentativas de retificar as ineficiências podem acabar saindo pela culatra justamente porque os encarregados da máquina pública deixam de atacar as causas institucionais da pobreza em primeiro lugar Essas dificuldades são ilustradas pela intervenção idealizada pela organização não governamental ONG Seva Mandir com vistas à melhoria dos serviços de saúde prestados no estado do Rajastão na Índia Os serviços de saúde indianos têm um longo histórico de ineficiência e fracasso A saúde proporcionada pelo governo é pelo menos em tese amplamente disponível e barata e os profissionais são de modo geral qualificados Nem os indianos mais pobres entretanto usam as instalações de saúde governamentais preferindo em vez disso os prestadores privados bem mais caros irregulares e às vezes até deficientes Isso se deve não a algum tipo de irracionalidade ocorre que nos estabelecimentos governamentais assolados pelo absenteísmo a população não consegue acesso aos serviços oferecidos O indiano que se dirige a uma instituição pública não só não encontra enfermeiros que o atendam como provavelmente sequer consegue entrar no edifício já que as organizações de saúde passam a maior parte do tempo de portas fechadas Em 2006 a Seva Mandir associouse a um grupo de economistas para elaborar um esquema de incentivos que incentivasse a equipe de enfermagem a comparecer ao trabalho do distrito de Udaipur no Rajastão A ideia era simples a Seva Mandir introduziu relógios de ponto que assinalariam a data e a hora de entrada de cada profissional no respectivo local de trabalho Os cartões deveriam ser marcados três vezes ao dia a fim de assegurar sua chegada e saída no horário e permanência no local Se tudo corresse como planejado e a qualidade e a quantidade de serviços de saúde prestados aumentasse seria uma demonstração cabal da teoria de que problemas graves podem ter soluções fáceis Na prática contudo a intervenção revelou algo diferente Logo após a implementação do programa a assiduidade dos enfermeiros disparou mas foi um fenômeno efêmero Em pouco mais de um ano a administração de saúde local boicotou deliberadamente o esquema de incentivos introduzido pela Seva Mandir O absenteísmo retornou aos níveis de sempre mas houve uma multiplicação dos dias de isenção nos quais a ausência da equipe de enfermagem contava com a sanção oficial da secretaria de saúde local Proliferaram também os problemas de manutenção à medida que os relógios de ponto começaram a aparecer quebrados e a Seva Mandir não conseguiu substituílos porque os secretários de saúde recusavamse a cooperar Obrigar enfermeiros a bater ponto três vezes por dia não parece uma ideia lá muito inovadora Com efeito tratase de uma prática amplamente difundida na indústria mesmo a indiana e deve ter ocorrido às autoridades de saúde como uma potencial solução de seus problemas Parece improvável portanto que tenha sido a ignorância de tão simples mecanismo de incentivo que impediu seu uso em primeiro lugar O que se passou durante o programa apenas confirmou isso As autoridades de saúde sabotaram o programa por estarem mancomunadas com a equipe de enfermagem e por serem cúmplices dos problemas endêmicos de absenteísmo O que esse episódio ilustra é uma microversão da dificuldade de se implementar mudanças significativas quando a causa primeira dos problemas reside nas instituições Nesse caso não foram políticos corruptos ou empresas poderosas os responsáveis por solapar a reforma institucional mas pelo contrário as autoridades locais de saúde e os enfermeiros que conseguiram sabotar o esquema de incentivos da Seva Mandir e dos economistas do desenvolvimento Isso sugere que muitas das microfalhas de mercado aparentemente fáceis de reparar podem ser ilusórias a estrutura institucional que acarreta falhas de mercado também acaba impedindo a implementação de intervenções que aprimorem os inventivos em nível micro Insistir em tentar arquitetar prosperidade sem confrontar as causas originais dos problemas instituições extrativistas e a política que as sustenta dificilmente dará bons frutos O FRACASSO DA AJUDA EXTERNA Logo após os ataques de 11 de setembro de 2001 forças militares lideradas pelos Estados Unidos trataram de derrubar o regime repressivo do Talibã no Afeganistão que estava dando abrigo a membros centrais da Al Qaeda e recusavase a entregálos O Acordo de Bonn firmado em dezembro de 2001 entre líderes dos antigos mujahedin afegãos que haviam colaborado com as forças americanas e alguns dos principais membros da diáspora afegã entre eles Hamid Karzai definiu um plano para o estabelecimento de um regime democrático O primeiro passo seria a grande assembleia nacional a Loya Jirga que elegeu Karzai para o comando do governo interino As perspectivas do país estavam melhorando A maioria do povo afegão ansiava por deixar o Talibã para trás A comunidade internacional acreditava que tudo de que o Afeganistão precisava agora era uma grande injeção de ajuda externa Representantes da ONU e várias ONGs de renome logo desembarcavam na capital Kabul O que se seguiu não deveria espantar ninguém especialmente em vista do recorrente fracasso das iniciativas de ajuda externa a países pobres e Estados falidos ao longo das últimas cinco décadas Surpresa ou não repetiuse o ritual de sempre Uma multidão de funcionários de organizações de ajuda humanitária e suas respectivas comitivas afluiu para a cidade em seus jatinhos particulares ONGs de todo tipo chegaram para cumprir seus próprios objetivos e tiveram início elaboradas negociações entre governos e delegações da comunidade internacional Bilhões de dólares eram agora despejados sobre o Afeganistão Apenas uma parcela ínfima desse montante porém chegou a ser aplicada na construção de infraestrutura escolas ou outros serviços públicos essenciais para o desenvolvimento de instituições inclusivas ou mesmo para a restauração da lei e da ordem Embora boa parte da infraestrutura se encontrasse em petição de miséria a primeira parcela dos recursos foi usada para contratar uma companhia aérea para o transporte do pessoal da ONU e outras autoridades internacionais que em seguida precisariam de motoristas e intérpretes Assim contrataram os poucos burocratas com conhecimento de inglês e os professores que ainda restavam nas escolas para dirigir seus veículos e ciceroneálos pagandolhes valores muito acima dos salários afegãos da época À medida que os poucos burocratas qualificados eram desviados para a prestação de serviços para a comunidade de ajuda humanitária os recursos externos em vez de contribuir para a construção de infraestrutura no Afeganistão ajudaram a solapar ainda mais o Estado que deveriam estruturar e fortalecer Os aldeões de um distrito remoto no vale central do Afeganistão ouviram pelo rádio um comunicado sobre um novo programa multimilionário para a construção de abrigos na região Muito tempo depois foram entregues algumas traves de madeira trazidas pelo cartel de transporte de carga de Ismail Khan conhecido exlíder militar e membro do governo afegão Como porém eram demasiado grandes para ter qualquer utilidade no distrito os aldeões deramlhe o único uso possível lenha Sendo assim que fim tiveram os milhões de dólares prometidos à população Dos recursos prometidos 20 foram destinados aos custos administrativos da ONU em Genebra O resto foi terceirizado para uma ONG que abateu mais 20 para cobrir seus próprios custos administrativos em Bruxelas e assim por diante por mais três camadas nas quais cada parte se apropriava de mais 20 do restante que lhe chegava às mãos A pequena quantia que chegou ao Afeganistão foi usada para comprar madeira no oeste do Irã e em grande parte para contratar o cartel de Ismail Khan arcando com preços de transporte inflacionados Foi quase um milagre que aquelas traves de madeira gigantes tivessem sequer alcançado a aldeia O que aconteceu no vale central do Afeganistão não foi um incidente isolado Vários estudos estimam que apenas 10 ou no máximo 20 dos recursos humanitários chegam ao seu destino Há dezenas de investigações em curso referentes a denúncias de fraude por parte de autoridades locais e funcionários da ONU acusados de desvio de verbas Todavia a maior parte do desperdício no âmbito da ajuda externa não é fraude mas apenas incompetência ou ainda pior tratase apenas dos procedimentos habituais das organizações de ajuda Na verdade a experiência afegã em comparação com outras constituiu um êxito retumbante No decorrer das últimas cinco décadas centenas de bilhões de dólares foram destinados a governos de todo o mundo a título de fomento do desenvolvimento A maioria desses recursos foi desperdiçada nos meandros da burocracia e da corrupção como no Afeganistão Pior boa parte deles foi parar nas mãos de ditadores como Mobutu que dependiam da ajuda externa de seus patronos ocidentais tanto para comprar o apoio de seus clientes fortalecendo o regime quanto para locupletarse Em quase todo o resto da África subsaariana encontravase situação similar Já a ajuda humanitária concedida como auxílio temporário para tempos de crise de que os exemplos mais recentes foram o do Haiti e Paquistão sem dúvida teve maior utilidade ainda que sua entrega também tenha sido prejudicada por dificuldades similares Apesar desse nada lisonjeiro histórico de auxílio para o desenvolvimento a ajuda externa constitui uma das políticas mais populares recomendadas por governos ocidentais organizações internacionais como a ONU e as mais variadas ONGs como método de combate à pobreza ao redor do mundo E claro o ciclo de fracasso da ajuda externa repetese vezes sem conta A ideia de que os ricos países ocidentais deveriam despejar consideráveis quantias de auxílio para o desenvolvimento sobre a África subsaariana Caribe América Central e Sul da Ásia a fim de erradicar o problema da pobreza nessas regiões baseiase em um entendimento equivocado de suas causas Países como o Afeganistão são pobres em virtude de suas instituições extrativistas resultantes por sua vez da falta de direitos de propriedade lei e ordem e sistemas jurídicos de funcionamento adequado bem como da sufocante presença das elites nacionais e com mais frequência locais na vida política e econômica Os mesmos problemas institucionais significam que a ajuda externa será ineficaz pois será saqueada e dificilmente chegará às mãos de seus reais destinatários Na pior das hipóteses acabarão realimentando os próprios regimes que estão na origem das dificuldades dessas sociedades Se o crescimento econômico sustentado depende de instituições inclusivas fornecer auxílio aos regimes que presidem instituições extrativistas não pode ser a solução Isso não implica negar que para além mesmo de qualquer ajuda humanitária um bem considerável decorre de programas específicos de auxílio que erguem escolas em áreas onde antes não havia nenhuma e pagam professores que do contrário não receberiam um tostão sequer Embora grande parte do pessoal das organizações humanitárias que invadiu Kabul tenha feito muito pouco pela melhoria das condições de vida dos afegãos comuns houve também êxitos notórios na construção de escolas sobretudo para meninas que eram inteiramente excluídas da educação não só sob o Talibã mas mesmo antes Uma solução que vem ganhando popularidade em parte com base no reconhecimento de que as instituições têm alguma coisa a ver com a prosperidade e até com a entrega dos recursos humanitários constitui em tornar o auxílio condicional Segundo esse ponto de vista a continuidade da ajuda deveria depender do cumprimento de determinadas metas por parte dos governos destinatários por exemplo a liberalização dos mercados ou o deslocamento do Estado em direção à democracia A administração George W Bush deu o maior passo rumo a esse tipo de auxílio condicional ao lançar o programa Millennium Challenge Accounts tornando os futuros pagamentos de auxílio dependentes de aprimoramentos quantitativos em uma série de dimensões do desenvolvimento econômico e político No entanto a eficácia da ajuda condicionada não parece maior que a da não condicionada Os países que se mostram incapazes de satisfazer essas condições em geral recebem tanta ajuda quanto os capazes O motivo é simples eles têm maior necessidade de ajuda seja em termos de fomento ou do tipo humanitário Previsivelmente o auxílio condicional parece exercer pouco impacto sobre as instituições de cada país Afinal seria assombroso se alguém como Siaka Stevens de Serra Leoa ou Mobutu do Congo de repente começasse a desmontar as instituições extrativistas de que dependem para obter um pouco mais de ajuda externa Mesmo na África subsaariana onde a ajuda externa constitui uma fração significativa do orçamento total de muitos governos e mesmo depois das Millennium Challenge Accounts que aumentaram o grau de condicionalidade o volume de ajuda externa que um ditador pode obter abdicando de seu próprio poder é ínfimo e não compensa o risco que representa para a continuidade de seu domínio do país nem para sua própria vida Nada disso significa porém que a ajuda externa com exceção do tipo humanitário deveria deixar de existir Além de provavelmente acarretar mais sofrimento humano seria impraticável eliminála devido aos sentimentos de culpa e desconforto com que os cidadãos de muitos países ocidentais encaram os desastres econômicos e humanitários de todo o mundo e a ajuda externa os leva a crer que algo está sendo feito para combater os problemas Por menos eficiente que seja essa alternativa o impulso nesse sentido continuará existindo e a ajuda externa também O gigantesco complexo de organizações internacionais e ONGs tampouco cessará de demandar e mobilizar recursos para assegurar a manutenção do status quo Ademais seria de uma insensibilidade ímpar cortar o auxílio dado aos países mais necessitados Sim boa parte dos recursos se perde em desperdício Ainda assim se de cada dólar distribuído a título de ajuda US010 conseguirem chegar às mãos das pessoas mais pobres do mundo serão US010 a mais do que elas tinham antes para aliviar sua mais abjeta pobreza e talvez isso ainda seja melhor do que nada Há aqui duas importantes lições Primeiro a ajuda externa não é um meio muito eficaz de lidar com o fracasso das nações do mundo muito pelo contrário Os países necessitam de instituições políticas e econômicas inclusivas a fim de romper o ciclo da pobreza A ajuda externa normalmente pouco pode fazer quanto a isso e sem dúvida não no seu formato atual É fundamental reconhecer as origens da desigualdade e da pobreza mundiais exatamente para que não atrelemos nossas esperanças a falsas promessas À medida que suas origens estão nas instituições a ajuda externa promovida no contexto dessas mesmas instituições nas nações destinatárias pouco poderá fazer no sentido de incentivar o crescimento sustentado Segundo se o desenvolvimento de instituições políticas e econômicas é crucial poderia ser útil usar os fluxos existentes de ajuda externa ao menos em parte para facilitar esse desenvolvimento Como vimos a resposta não está na condicionalidade já que esta requer que os atuais governantes façam concessões pelo contrário uma perspectiva mais positiva talvez consistisse na estruturação da ajuda externa de modo que seu emprego e administração insiram no processo decisório grupos e lideranças de resto excluídos do poder empoderando assim um amplo segmento da população EMPONDERAMENTO Tudo indicava que o dia 12 de maio de 1978 seria mais um dia normal na fábrica de caminhões da Scania na cidade de São Bernardo do Campo São Paulo Contudo os operários estavam agitados As greves estavam proibidas no país desde 1964 quando os militares derrubaram o governo democrático do Presidente João Goulart Acabara de se espalhar a notícia porém de que as autoridades vinham fixando os números da inflação nacional de modo que o aumento do custo de vida fora subestimado Quando teve início o turno das 7 horas os trabalhadores largaram suas ferramentas Às 8 horas Gilson Menezes sindicalista que trabalhava na fábrica mandou chamar o sindicato O presidente dos metalúrgicos de São Bernardo era um ativista de 33 anos chamado Luiz Inácio Lula da Silva Lula Ao meiodia Lula chegou à fábrica Quando a empresa lhe solicitou que convencesse os empregados a voltar para o trabalho ele se recusou A greve da Scânia foi a primeira de uma onda que varreu o Brasil Embora aparentemente elas girassem em torno da questão salarial Lula mais tarde comentaria Acho que não podemos separar os fatores econômicos dos políticos A luta era por salários mas ao lutar por salários a classe trabalhadora conquistou uma vitória política O ressurgimento do movimento trabalhista brasileiro foi apenas uma faceta de uma reação social muito mais ampla a uma década e meia de governo militar O intelectual de esquerda Fernando Henrique Cardoso que como Lula se tornaria presidente do país após a retomada da democracia defendia em 1973 que o regime democrático seria restaurado no Brasil pela união dos vários grupos sociais que faziam oposição aos militares Segundo ele havia necessidade de uma reativação da sociedade civil as associações profissionais sindicatos igrejas organizações estudantis grupos de estudo e círculos de debates os movimentos sociais em outras palavras uma coalizão ampla que tivesse em vista a recriação da democracia e a transformação da sociedade brasileira A fábrica da Scânia foi o prenúncio da formação dessa coalizão No final de 1978 Lula cogitava a possibilidade de criar um novo partido político o Partido dos Trabalhadores PT que não ficaria porém restrito aos sindicalistas Lula insistia em que aquele fosse o partido de todos os assalariados e pobres em geral Aqui as tentativas dos líderes sindicais de organizar uma plataforma política começaram a convergir com os inúmeros movimentos sociais que iam surgindo Em 18 de agosto de 1979 houve um encontro em São Paulo para discutir a formação do Partido dos Trabalhadores que agregaria antigos políticos da oposição lideranças sindicais estudantes intelectuais e representantes de uma centena dos mais diversos movimentos sociais que haviam começado a se organizar ao longo da década de 1970 por todo o Brasil Em 13 de outubro de 1979 no salão de festas do restaurante São Judas Tadeu em São Bernardo do Campo é lançado oficialmente o Movimento pelo Partido dos Trabalhadores que viria a representar todos esses grupos distintos O partido logo começou a tirar proveito da abertura política que os militares com relutância organizavam Nas eleições locais de 1982 candidatos do PT concorreram pela primeira vez e venceram as eleições para duas prefeituras Ao longo dos anos 1980 à medida que a democracia ia sendo gradualmente recriada no Brasil o Partido dos Trabalhadores foi assumindo um número crescente de governos locais Em 1988 controlava os governos de 36 municípios inclusive cidades grandes como São Paulo e Porto Alegre Em 1989 por ocasião das primeiras eleições presidenciais livres desde o golpe militar Lula obteve 16 dos votos no primeiro turno como candidato do PT No segundo turno contra Fernando Collor conquistou 44 dos votos Ao assumir o comando de vários governos regionais processo que se intensificou nos anos 1990 o Partido dos Trabalhadores começou a desenvolver uma relação simbiótica com diversos movimentos sociais locais Em Porto Alegre a primeira administração do PT após 1988 introduziu o chamado orçamento participativo um mecanismo para envolver os cidadãos comuns na formulação das prioridades de gastos para a cidade Estabeleceuse assim um sistema que se tornou um modelo mundial de prestação de contas e responsividade governamental acompanhado de enormes melhorias na prestação de serviços públicos e na qualidade de vida na cidade A bem sucedida estrutura de governança do partido em âmbito local traduziuse em maior mobilização política e sucesso no âmbito nacional Embora Lula tenha sido derrotado por Fernando Henrique Cardoso nas eleições presidenciais de 1994 e 1998 acabou sendo eleito presidente do Brasil em 2002 e o Partido dos Trabalhadores permanece no poder desde então A formação de uma ampla coalizão no Brasil fruto da convergência de diversos movimentos sociais e do sindicalismo exerceu um profundo impacto na economia do país De 1990 para cá o crescimento econômico vem sendo rápido com a redução da proporção da população vivendo na pobreza de 45 para 30 em 2006 A desigualdade que havia disparado no regime militar despencou sobretudo desde que o Partido dos Trabalhadores assumiu o poder e promoveu enorme expansão do acesso à educação com o número médio de anos passados na escola saltando de seis em 1995 para oito em 2006 O Brasil hoje faz parte do BRIC grupo que compreende Brasil Rússia Índia e China e é o primeiro país latinoamericano a adquirir peso de fato nos círculos diplomáticos internacionais A ASCENSÃO BRASILEIRA desde a década de 1970 não foi arquitetada por economistas de instituições internacionais que instruíram as autoridades brasileiras com relação à melhor maneira de criar políticas ou evitar a falência dos mercados Não se deu tampouco mediante injeções de ajuda externa Também não foi o resultado natural da modernização Pelo contrário foi consequência da construção corajosa de instituições inclusivas por diversos grupos que acabariam produzindo instituições econômicas mais inclusivas A transformação brasileira como a da Inglaterra no século XVII começou pela criação de instituições políticas inclusivas mas como uma sociedade pode construir instituições desse tipo A história como vimos está repleta de exemplos de movimentos de reforma que sucumbiram à lei de ferro da oligarquia e substituíram um conjunto de instituições extrativistas por outras ainda mais perniciosas Vimos que nos casos da Inglaterra de 1688 da França de 1789 e do Japão durante a Restauração Meiji de 1868 o processo de estabelecimento de instituições políticas inclusivas foi desencadeado por uma revolução Contudo tais revoluções políticas em geral produzem muita destruição e penúria e seu êxito está longe de ser certo A Revolução Bolchevique propagandeava seu objetivo como sendo a substituição do sistema econômico de exploração da Rússia czarista por outro mais justo e eficiente que proporcionasse liberdade e prosperidade a milhões de russos Infelizmente o resultado seriam as instituições extrativistas opostas e muito mais repressoras do que aquelas do governo derrubado pelos bolcheviques As experiências da China Cuba e Vietnã foram similares Muitas reformas não comunistas impostas de cima para baixo tampouco deram melhores resultados Nasser jurou construir uma sociedade igualitária e moderna no Egito o que apenas levou ao regime corrupto de Hosni Mubarak como vimos no Capítulo 13 Robert Mugabe era considerado por muitos um paladino da liberdade que derrubaria por terra o regime racista e altamente extrativista de Ian Smith em vigor na Rodésia desde então Não obstante as instituições do Zimbábue não se tornaram menos extrativistas e seu desempenho econômico chegou mesmo a piorar em relação a antes da independência O que há em comum entre as revoluções políticas que lograram abrir caminho para instituições mais inclusivas e as graduais mudanças institucionais na América do Norte na Inglaterra do século XIX e em Botsuana após a independência e que também promoveu significativo fortalecimento das instituições políticas inclusivas é o fato de terem conseguido empoderar um segmento transversal bastante amplo da sociedade O pluralismo pedra angular das instituições políticas inclusivas requer que o poder político tenha ampla distribuição pela sociedade o que começando pelas instituições extrativistas que concentram o poder nas mãos de uma elite estrita exige por sua vez um processo de empoderamento Foi isso como enfatizamos no Capítulo 7 que distinguiu a Revolução Gloriosa da mera derrubada de uma elite por outra Nesse caso o pluralismo nasceu da derrubada de Jaime II por uma rebelião política liderada por uma ampla coalizão de mercadores industriais fidalgos e muitos membros da aristocracia inglesa que não eram aliados da Coroa Como vimos a Revolução Gloriosa foi facilitada pela mobilização e empoderamento anteriores dessa coalizão ampla e mais importante levou por sua vez ao empoderamento de um segmento da sociedade ainda mais extenso do que antes ainda que claramente muito menos extenso do que a sociedade como um todo e a Inglaterra fosse se manter ao largo de uma verdadeira democracia por mais de 200 anos ainda Os fatores que levaram à emergência de instituições inclusivas nas colônias da América do Norte também foram similares como vimos no primeiro capítulo Mais uma vez o caminho iniciado em Virginia Carolina Maryland e Massachusetts que levaria à Declaração de Independência e à consolidação de instituições políticas inclusivas nos Estados Unidos deuse no sentido do empoderamento de segmentos cada vez mais amplos da sociedade Também a Revolução Francesa constitui um exemplo de empoderamento de um segmento mais amplo da sociedade que se sublevou contra o Ancien Régime na França e conseguiu preparar o terreno para um sistema político mais pluralista Todavia a Revolução Francesa especialmente o interlúdio do Terror sob Robespierre um regime repressivo e homicida ilustra também como o processo de empoderamento tampouco está livre de suas ciladas Em última instância porém Robespierre e seus companheiros jacobinos foram postos de lado fazendo com que o legado mais importante da Revolução Francesa fosse não a guilhotina mas as reformas de longo alcance por ela implementadas na França e em outras regiões da Europa São muitos os paralelos entre esses processos históricos de empoderamento e o que ocorreu no Brasil nos anos 1970 Embora uma das raízes do Partido dos Trabalhadores seja o movimento sindicalista desde o princípio líderes como Lula junto com os muitos intelectuais e políticos de oposição que deram seu apoio ao partido empenharamse em convertêlo em uma coalizão ampla fundindose com movimentos sociais locais por todo o país à medida que o partido assumia governos regionais estimulando a participação cívica e promovendo uma espécie de revolução da governança no país inteiro No Brasil em contraste com a Inglaterra no século XVII ou a França da virada do século XVIII não houve uma revolução radical que desencadeasse o processo de transformação das instituições políticas de um só golpe No entanto o processo de empoderamento iniciado nas fábricas de São Bernardo foi eficaz em parte por traduzirse em mudanças políticas fundamentais em âmbito nacional como por exemplo a transição do governo militar para a democracia Mais importante o empoderamento das camadas mais populares no Brasil assegurou que a transição para a democracia correspondesse a um movimento em direção a instituições políticas inclusivas constituindose portanto em elemento central na emergência de um governo comprometido com a prestação de serviços públicos expansão educacional e condições de fato igualitárias Como vimos a democracia não é garantia de que haja pluralismo O contraste entre o desenvolvimento das instituições pluralistas no Brasil e a experiência venezuelana é nesse contexto revelador A Venezuela também efetuou a transição para a democracia após 1958 mas sem um empoderamento das bases da sociedade nem a criação de uma distribuição pluralista do poder político Pelo contrário a corrupção na política as redes de apadrinhamento e os conflitos persistiram no país e em parte em decorrência disso quando os eleitores foram às urnas mostraramse dispostos a apoiar até mesmo déspotas em potencial como Hugo Chávez muito provavelmente por acreditarem que somente ele seria capaz de erguerse contra as elites estabelecidas na Venezuela Assim ela prossegue sob instituições extrativistas ao passo que o Brasil rompeu o padrão O QUE SE PODE FAZER PARA desencadear ou talvez apenas facilitar o processo de empoderamento e assim o desenvolvimento de instituições políticas inclusivas A resposta honesta naturalmente é que não existe receita para a criação dessas instituições É evidente que há alguns fatores óbvios que podem ajudar a fazer o processo de empoderamento decolar Aí se incluem a presença de alguma medida de ordem centralizada de modo que os movimentos sociais que venham a desafiar os regimes existentes não mergulhem de imediato no total desregramento algumas instituições políticas preexistentes que introduzam certa dose de pluralismo como as instituições políticas tradicionais de Botsuana de modo que coalizões amplas possam se constituir e perdurar e a presença de instituições da sociedade civil capazes de coordenar as demandas da população de modo que movimentos oposicionistas não possam nem ser facilmente esmagados pelas elites vigentes nem inevitavelmente se convertam em veículos para que outro grupo assuma o controle das instituições extrativistas existentes Entretanto muitos desses fatores são historicamente predeterminados e só se transformam muito lentamente O caso brasileiro mostra como as instituições da sociedade civil e organizações partidárias associadas podem ser erguidas de baixo para cima ainda que seja um processo demorado e suas possibilidades de êxito sob diferentes circunstâncias não são ainda bem entendidas Há outro participante ou conjunto de participantes capaz de desempenhar um papel transformador no processo de empoderamento a imprensa Seria difícil coordenar e sustentar o empoderamento da sociedade como um todo sem a disseminação de informações acerca de eventuais abusos econômicos e políticos por parte dos ocupantes do poder Vimos no Capítulo 11 o impacto exercido pela mídia em termos da informação do público e coordenação de suas demandas contra forças que solapavam as instituições inclusivas americanas Os meios de comunicação podem também exercer a importante função de canalizar o empoderamento de um amplo segmento da sociedade para reformas políticas mais duradouras tal como ilustrado mais uma vez em nossa discussão no Capítulo 11 sobretudo no contexto da democratização britânica Panfletos e livros informando e catalisando a opinião pública tiveram participação importante durante a Revolução Gloriosa na Inglaterra a Revolução Francesa e a trajetória britânica rumo à democracia no século XIX Analogamente os veículos de comunicação sobretudo as novas modalidades baseadas nos avanços da tecnologia da informação e das comunicações como blogs serviços de batepapo entre anônimos Facebook e Twitter desempenharam papel central na oposição iraniana à eleição fraudulenta de Ahmadinejad em 2009 e sua posterior repressão e parecem estar protagonizando analogamente os protestos da Primavera Árabe em andamento enquanto este manuscrito encontrase em fase de conclusão Regimes autoritários costumam ter consciência da importância de uma imprensa livre e empenhamse ao máximo para combatêla Um exemplo extremo foi o do governo Alberto Fujimori no Peru Embora originalmente tenha sido eleito de forma democrática Fujimori não demorou a instituir um regime ditatorial no Peru promovendo um golpe enquanto ocupava o cargo em 1992 A partir de então embora as eleições prosseguissem Fujimori construiu um regime corrupto baseado na repressão e em subornos Uma peçachave para tanto era seu braço direito Valdimiro Montesinos que encabeçava o poderoso serviço de inteligência peruano Montesinos homem organizado manteve registros completos de quanto a administração pagava a cada indivíduo para comprar sua lealdade chegando a gravar em vídeo várias situações de suborno Havia uma lógica em sua atitude Além do mero histórico tais evidências lhe garantiam o registro dos atos de seus cúmplices que seriam assim considerados tão culpados quanto Fujimori e Montesinos Com a queda do regime essas gravações caíram nas mãos de jornalistas e autoridades Os montantes negociados são indicativos do valor da imprensa para uma ditadura Um juiz da Suprema Corte foi avaliado entre US5 mil e US10 mil mensais e políticos de qualquer partido recebiam quantias similares Quando se tratava de jornais ou emissoras de televisão no entanto as somas iam para a casa dos milhões Fujimori e Montesinos desembolsaram US9 milhões em certa ocasião e mais US10 milhões em outra a fim de controlar as emissoras de televisão Pagaram mais de US1 milhão a um dos principais jornais e a outros menores pagavam algo entre US3 mil e US8 mil por manchete Para Fujimori e Montesinos o controle da imprensa era muito mais importante do que o de políticos e juízes Um dos homens de confiança de Montesinos General Bello sintetizou a questão em um dos vídeos ao afirmar Se não controlarmos a televisão não fazemos nada As atuais instituições extrativistas na China dependem também essencialmente do controle exercido pelas autoridades sobre os meios de comunicação que como vimos adquiriu grau assustador de sofisticação Como resumiu um comentarista chinês Para manter a liderança do partido nas reformas políticas três princípios devem ser seguidos que o partido controle as Forças Armadas que o partido controle os quadros e que o partido controle as notícias Todavia é evidente que a liberdade de imprensa e as novas tecnologias de comunicação só podem ajudar nas margens fornecendo informações e coordenando as demandas e iniciativas dos que reivindicam instituições mais inclusivas Sua utilidade só se traduzirá em mudanças efetivas quando um amplo segmento da sociedade se mobilizar e se organizar no intuito de levar a cabo mudanças políticas e o faça não por sectarismo ou para assumir o controle das instituições extrativistas mas para transformálas em outras mais inclusivas Se tal processo se porá em movimento e abrirá a porta para um empoderamento crescente e por fim para a reforma política duradoura vai depender como vimos em tantos exemplos distintos da história das instituições políticas e econômicas das muitas pequenas diferenças que fazem a diferença e dos tão contingentes rumos da história ENSAIOS E FONTES BIBLIOGRÁFICAS Prefácio As opiniões de Mohamed El Baradei podem ser encontradas em twittercomElBaradei As citações de Mosaab El Shami e Noha Hamed foram extraídas de Yahoo news 262011 em news yahoocomsyblogexclusive20110206tsyblogexclusiveegyptianvoicesfromtahrirsquare Sobre as 12 reivindicações imediatas publicadas no blog de Wael Khalil ver alethonews wordpresscom20110227egyptreviewingthedemands Reda Metwaly is quoted on Al Jazeera 212011 em englishaljazeeranetnewsmiddleeas t2011022011212597913527html Capítulo 1 Uma boa discussão sobre a exploração do Rio de La Plata pelos espanhóis encontrase em Rock 1992 cap 1 Sobre a descoberta e colonização dos guaranis ver Ganson 2003 As citações de Sahagún são de Sahagún 1975 pp 4749 Gibson 1963 é fundamental sobre a conquista espanhola do México e as instituições por eles estruturadas As citações de De las Casas são de De las Casas 1992 pp 39 11718 e 107 respectivamente Sobre Pizarro no Peru ver Hemming 1983 Os caps 16 tratam do encontro em Cajamarca a marcha para o sul e a captura da capital inca Cuzco Ver Hemming 1983 cap 20 sobre de Toledo Bakewell 1984 oferece uma visão geral sobre o funcionamento da mita de Potosí e Dell 2010 fornece evidências estatísticas que demonstram a persistência de seus efeitos ao longo do tempo A citação de Arthur Young é reproduzida de Sheridan 1973 p 8 Há diversos bons livros que descrevem a história de Jamestown em seus primórdios por exemplo Price 2003 e Kupperman 2007 Nossa abordagem tem forte influência de Morgan 1975 e Galenson 1996 A citação de Anas Todkill vem da p 38 de Todkill 1885 As citações de John Smith são de Price 2003 p 77 Víveres p 93 Se seu rei e p 96 Ao nos enviarem A Carta de Maryland as Constituições Fundamentais da Carolina e outras constituições coloniais foram disponibilizadas na internet pelo Avalon Project da Universidade de Yale em avalonlawyale edu17thcentury Bakewell 2009 cap 14 discute a independência do México e a constituição Ver Stevens 1991 e Knight 2011 sobre os presidentes e a instabilidade política pósindependência Coatsworth 1978 é o trabalho seminal acerca das evidências sobre o declínio econômico no México após a independência Haber 2010 apresenta a comparação entre o desenvolvimento do sistema bancário no México e nos Estados Unidos Sokoloff 1988 e Sokoloff e Khan 1990 fornecem evidências sobre o contexto social dos inovadores nos Estados Unidos que registraram patentes Ver Israel 2000 para uma biografia de Thomas Edison Haber Maurer e Razo 2003 propõem uma interpretação da economia política do regime de Porfirio Díaz muito em consonância com a nossa discussão Haber Klein Maurer e Middlebrook 2008 estendem essa abordagem da economia política mexicana até o século XX Sobre a alocação diferencial de terras de fronteira nas Américas do Norte e Latina ver Nugent e Robinson 2010 e GarcíaJimeno e Robinson 2011 HuDeHart 1984 discute a deportação do povo yaqui no cap 6 Sobre a fortuna de Carlos Slim e como ela foi amealhada ver Relea 2007 e Martinez 2002 Nossa interpretação do desenvolvimento econômico comparativo das Américas baseiase em nossas pesquisas anteriores com Simon Johnson sobretudo Acemoglu Johnson e Robinson 2001 2002 tendo sofrido também forte influência de Coatsworth 1978 2008 e Engerman e Sokoloff 1997 Capítulo 2 Os pontos de vista de Jared Diamond sobre as desigualdades no mundo estão expostos em seu livro Guns Germs and Steel 1997 Sachs 2006 estabelece sua própria versão do determinismo geográfico Os pontos de vista sobre a teoria cultural estão amplamente disseminados pela literatura acadêmica mas não chegaram a ser reunidos em uma só obra Weber 2002 defende que a Reforma Protestante explica por que a Europa realizou a Revolução Industrial Landes 1999 propõe que os europeus do norte desenvolveram um conjunto único de atitudes culturais que os levam a dedicarse ao trabalho poupar e ser inovadores Harrison e Huntington orgs 2000 é uma vigorosa defesa da importância da cultura para o desenvolvimento econômico comparativo A ideia de que há alguma espécie de superioridade cultural ou institucional britânica é disseminada sendo usada para explicar o excepcionalismo dos Estados Unidos Fisher 1989 bem como padrões de desenvolvimento comparativo em geral La Porta Lopezde Silanes e Shleifer 2008 As obras de Banfield 1958 e Putnam Leonardi e Nanetti 1994 constituem interpretações culturais muito influentes de como determinado aspecto da cultura ou capital social como a chamam contribui para a pobreza do sul da Itália Para um levantamento do uso feito por economistas da noção de cultura ver Guiso Sapienza e Zingales 2006 Tabellini 2010 examina a correlação entre a medida em que as pessoas confiam umas nas outras na Europa Ocidental e os níveis de renda anual per capita Nunn e Wantchekon 2010 mostram como a falta de confiança e o capital social na África estão correlacionados com a intensidade histórica do tráfico de escravos A história do Reino do Congo relacionada a esse tema é apresentada em Hilton 1985 e Thornton 1983 Sobre o atraso histórico da tecnologia africana ver as obras de Goody 1971 Law 1980 e Austen e Headrick 1983 A definição de economia proposta por Robbins foi retirada de Robbins 1935 p 16 A citação de Abba Lerner encontrase em Lerner 1972 p 259 A ideia de que a ignorância explica o desenvolvimento comparativo está implícita na maioria das análises econômicas do desenvolvimento econômico e reforma política por exemplo Williamson 1990 Perkins Radelet e Lindauer 2006 e Aghion e Howitt 2009 Uma versão recente e vigorosa dessa perspectiva é desenvolvida em Banerjee e Duflo 2011 Acemoglu Johnson e Robinson 2001 2002 fornecem uma análise estatística do papel relativo das instituições geografia e cultura mostrando que as primeiras superam os outros dois tipos de explicações na justificativa das diferenças de renda per capita hoje Capítulo 3 A reconstrução do encontro entre Hwang PyŏngWŏn e seu irmão foi extraída da entrevista de Hwang por James A Foley transcrita em Foley 2003 pp 197203 O conceito de instituições extrativistas é derivado de Acemoglu Johnson e Robinson 2001 A terminologia instituições inclusivas nos foi sugerida por Tim Besley A terminologia de derrota econômica e a distinção entre esta e a derrota política vem de Acemoglu e Robinson 2000b Os dados sobre Barbados vêm de Dunn 1969 Nossa abordagem sobre a economia soviética baseiase em Nove 1992 e Davies 1998 Allen 2003 apresenta outra interpretação mais positiva da história econômica soviética Na literatura de ciência social há um grande volume de pesquisas relacionadas às nossas teses e argumentos Ver Acemoglu Johnson e Robinson 2005b para uma visão geral dessa literatura e nossa contribuição a ela A perspectiva institucional do desenvolvimento comparativo baseiase em uma série de obras importantes Particularmente notável é o trabalho de North ver North e Thomas 1973 North 1982 North e Weingast 1989 e North Wallis e Weingast 2009 Olson 1984 também faz uma apresentação muito influente da economia política do crescimento econômico Mokyr 1990 é um livro fundamental que relaciona quem é derrotado economicamente à mudança tecnológica comparativa na história mundial O conceito de perdedores econômicos é muito difundido em ciência social como explicação da não ocorrência de resultados eficientes em termos institucionais e de políticas públicas Nossa interpretação baseada em Robinson 1998 e Acemoglu e Robinson 2000b 2006b distinguese por enfatizar a ideia de que o obstáculo mais importante à emergência de instituições inclusivas é o receio que as elites têm de perder seu poder político Jones 2003 apresenta uma rica história comparativa salientando temas similares e a importante obra de Engerman e Sokoloff 1997 sobre as Américas também sublinha as mesmas ideias Uma seminal interpretação em termos de economia política do subdesenvolvimento africano foi delineada por Bates 1981 1983 1989 cujo pensamento exerceu forte influência sobre o nosso Estudos fundamentais de Dalton 1965 e Killick 1978 enfatizam o papel da política no desenvolvimento africano e sobretudo como o medo da perda de poder político afeta as políticas econômicas A noção de perdedores políticos foi sugerida anteriormente em outras obras teóricas de economia política como Besley e Coate 1998 e Bourguignon e Verdier 2000 O papel da centralização política e das instituições estatais no desenvolvimento é sublinhado por sociólogos da história a partir da obra de Max Weber Destacamos os trabalhos de Mann 1986 1993 Migdal 1988 e Evans 1995 Na África a ligação entre Estado e desenvolvimento é salientada por Herbst 2000 e Bates 2001 Recentemente os economistas iniciaram sua contribuição para essa literatura por exemplo Acemoglu 2005 e Besley e Persson 2011 Por fim Johnson 1982 Haggard 1990 Wade 1990 e Amsden 1992 salientam como a economia política específica dos países do Leste Asiático lhes possibilitou lograr tamanho êxito econômico Finley 1965 defendeu a tese seminal de que a escravidão foi responsável pela falta de dinamismo tecnológico no mundo clássico A ideia de que o crescimento sob instituições extrativistas é possível mas também propenso a perder a força é enfatizada em Acemoglu 2008 Capítulo 4 Benedictow 2004 fornece uma visão geral definitiva da peste negra embora suas estimativas do número de mortos pela epidemia sejam controversas As citações de Boccaccio e Ralph de Shrewsbury são reproduzidas de Horrox 1994 Hatcher 2008 apresenta um relato instigante da expectativa e chegada da peste à Inglaterra O texto do Estatuto dos Trabalhadores está disponível online no Avalon Project em avalonlawyale edumedievalstatlabasp As obras fundamentais sobre o impacto da peste negra sobre a divergência entre oeste e leste da Europa são North e Thomas 1973 e principalmente Brenner 1976 cuja análise de como a distribuição inicial do poder político afetou as consequências da peste exerceu profunda influência sobre nossos pontos de vista Ver DuPlessis 1997 sobre a segunda servidão no Leste Europeu Conning 2010 e Acemoglu e Wolitzky 2011 desenvolvem formalizações da tese de Brenner A citação de James Watt é reproduzida a partir de Robinson 1964 pp 22324 Em Acemoglu Johnson e Robinson 2005a apresentamos pela primeira vez a tese de que foi a interação entre o comércio atlântico e as diferenças institucionais que levaram à diferencia ção das instituições inglesas e em última instância à Revolução Industrial Devemos o conceito de lei de ferro da oligarquia a Michels 1962 O conceito de circunstância crítica foi desenvolvido inicialmente por Lipset e Rokkan 1967 Sobre o papel das instituições no desenvolvimento a longo prazo do Império Otomano a pesquisa de Owen 1981 Owen e Pamuk 1999 e Pamuk 2006 é fundamental Capítulo 5 Sobre a missão de Steffens à Rússia e suas palavras a Baruch ver Steffens 1931 cap 18 pp 790802 Sobre o número de afetados pela fome na década de 1930 usamos os dados de Davies e Wheatcroft 2004 Sobre os números do recenseamento de 1937 ver Wheatcroft e Davies 1994a 1994b A natureza da inovação na economia soviética é estudada em Berliner 1976 Nossa discussão sobre o real funcionamento do stalinismo e principalmente a economia centralizada baseiase em Gregory e Harrison 2005 Sobre como os autores de livros didáticos americanos de economia interpretaram reiteradamente o crescimento econômico soviético de maneira equivocada ver Levy e Peart 2009 Nossa abordagem e interpretação dos lele e dos bushong baseiase na pesquisa de Douglas 1962 1963 e Vansina 1978 Sobre o conceito de Longo Verão ver Fagan 2003 Uma introdução acessível sobre os natufianos e os sítios arqueológicos por nós mencionados pode ser encontrada em Mithen 2006 e Barker 2006 A obra seminal sobre Abu Hureyra é Moore Hillman e Legge 2000 que documenta como o sedentarismo e a inovação institucional surgiram antes da agricultura Ver em Smith 1998 uma visão geral dos indícios de que a vida sedentária teria precedido a agricultura e ver BarYosef e BelferCohen 1992 sobre o caso dos natufianos Nossa abordagem da Revolução Neolítica é inspirada por Sahlins 1972 que também registra o caso dos Yir Yoront Nossa discussão da história maia baseiase em Martin e Grube 2000 e Webster 2002 A reconstrução da história demográfica de Copán vem de Webster Freter e Gonlin 2000 O número de monumentos datados foi extraído de Sidrys e Berger 1979 Capítulo 6 A discussão do caso veneziano segue Puga e Trefler 2010 bem como os caps 8 e 9 de Lane 1973 O material sobre Roma pode ser encontrado em qualquer livropadrão de história Nossa interpretação sobre as instituições econômicas romanas segue Finlay 1999 e Bang 2008 Nosso relato do declínio romano segue Ward Perkins 2006 e Goldsworthy 2009 Sobre as mudanças institucionais no Império Romano tardio ver Jones 1964 As histórias sobre Tibério e Adriano foram extraídas de Finley 1999 As evidências fornecidas pelos naufrágios foram usadas pela primeira vez por Hopkins 1980 Ver De Callataÿ 2005 e Jongman 2007 para uma visão geral desse tema e do Greenland Ice Core Project As tábulas de Vindolanda estão disponíveis online em vindolandacsadoxacuk A citação que usamos foi extraída de TVII Pub n 343 A discussão dos fatores que levaram ao declínio da Britânia segue Cleary 1989 cap 4 Faulkner 2000 cap 7 Dark 1994 cap 2 Sobre Axum ver MunroHay 1991 A obra seminal sobre o feudalismo europeu e suas origens é Bloch 1961 ver Crummey 2000 sobre o feudalismo etíope Phillipson 1998 faz a comparação entre o colapso de Axum e o colapso do Império Romano Capítulo 7 A história da máquina de Lee e seu encontro com a Rainha Elizabeth I está disponível em calvertonhomesteadcomwillleehtml Allen 2009b fornece os dados sobre os salários reais com base no Edito de Diocleciano sobre Preços Máximos Nossa tese acerca das causas da Revolução Industrial sofreu profunda influência das teses defendidas em North e Thomas 1973 North e Weingast 1989 Brenner 1993 Pincus 2009 e Pincus e Robinson 2010 Esses estudiosos por sua vez foram inspirados por interpretações marxistas anteriores das transformações institucionais britânicas e do nascimento do capitalismo ver Dobb 1963 e Hill 1961 1980 Ver também a tese de Tawney 1941 sobre como o projeto de construção de Estado de Henrique VIII mudou a estrutura social inglesa O texto da Magna Carta encontrase disponível online no Avalon Project em avalonlaw yaleedumedievalmagframeasp Elton 1953 é a obra seminal sobre o desenvolvimento das instituições estatais sob Henrique VIII e Neale 1971 as relaciona à evolução do Parlamento Sobre a Revolta dos Camponeses ver Hilton 2003 A citação de Hill sobre os monopólios foi extraída de Hill 1961 p 25 Sobre o período de governo pessoal de Carlos I seguimos Sharp 1992 Nossas evidências sobre como diferentes grupos e regiões aliaramse pró ou contra o Parlamento foram extraídas de Brunton e Pennington 1954 Hill 1961 e Stone 2001 Pincus 2009 é referência fundamental sobre a Revolução Gloriosa discutindo muitas das mudanças específicas nas instituições econômicas e políticas públicas por exemplo a abolição da fumagem e a criação do Banco da Inglaterra Ver também Pincus e Robinson 2010 Pettigrew 2007 2009 discute o ataque aos monopólios inclusive a Royal African Company e nossos dados sobre as petições foram extraídos de seus artigos Knights 2010 enfatiza a importância política das petições Nossas informações sobre o Hoares Bank foram extraídas de Temin e Voth 2008 Nossas informações sobre o Supervisor Cowperthwaite e a burocracia do imposto sobre produtos foram extraídas de Brewer 1988 Nossa visão geral da história econômica da Revolução Industrial baseiase em Mantoux 1961 Daunton 1995 Allen 2009a e Mokyr 1990 2009 que fornecem detalhes sobre os célebres inventores e invenções que discutimos A história da família Baldwyn foi extraída de Bogart e Richardson 2009 2011 que sublinham a ligação entre a Revolução Gloriosa a reorganização dos direitos de propriedade e a construção de estradas e canais Sobre as Leis do Madras e as Leis de Manchester ver OBrien Griffiths e Hunt 1991 que é a fonte das citações da legislação Sobre o predomínio de sangue novo na indústria ver Daunton 1995 cap 7 e Crouzet 1985 Nosso relato sobre por que as grandes mudanças institucionais ocorreram inicialmente na Inglaterra baseiase em Acemoglu Johnson e Robinson 2005a e Brenner 1976 Os dados sobre o número de mercadores independentes e suas preferências políticas foram extraídos de Zahedieh 2010 Capítulo 8 Sobre a oposição à prensa tipográfica no Império Otomano ver SavageSmith 2003 pp 65659 A comparação dos dados históricos sobre alfabetização foi extraída de Easterlin 1981 Nossa discussão sobre as instituições políticas espanholas seguem Thompson 1994a 1994b Para evidências sobre o declínio espanhol no decorrer desse período ver Nogal e Prados de la Escosura 2007 Nossa discussão sobre os impedimentos ao desenvolvimento econômico no Império AustroHúngaro segue Blum 1943 Freudenberger 1967 e Gross 1973 A citação de Maria Teresa foi extraída de Freudenberger p 495 Todas as demais citações do Conde Hartig e Francisco I foram extraídas de Blum A resposta de Francisco aos emissários do Tirol é citada em Jászi 1929 pp 8081 O comentário de Friedrich von Gentz a Robert Owen também é citado em Jászi 1929 p 80 A experiência dos Rothschilds na Áustria é discutida no cap 2 de Corti 1928 Nossa análise da Rússia segue Gerschenkron 1970 A citação de Kropotkin é da p 60 da edição de 2009 de seu livro O diálogo entre Nicolau e Mikhail é citado em Saunders 1992 p 117 A citação de Kankrin sobre as ferrovias encontrase em Owen 1991 pp 1516 O discurso de Nicolau aos manufaturadores é reproduzido de Pintner 1967 p 100 A citação de A A Zakrevskii foi extraída de Pintner 1967 p 235 Sobre o Almirante Zheng ver Dreyer 2007 A história econômica dos primórdios da China Moderna é coberta por Myers e Wang 2002 A citação de Tang Chen foi extraída de Myers e Wang pp 56465 Ver Zewde 2002 para obter uma visão geral da história etíope relacionada a esse tema Os dados sobre a história da Etiópia extrativista foram extraídos de Pankhurst 1961 assim como todas as citações aqui reproduzidas Nossa descrição das instituições e história somalis segue Lewis 1961 2002 O heer dos Hassan Ugaas é reproduzido na p177 de Lewis 1961 nossa descrição de uma vendeta foi derivada do cap 8 de Lewis 1961 em que ele fornece muitos outros exemplos Sobre o Reino de Tegali e a escrita ver Ewald 1988 Capítulo 9 Nossa discussão sobre a tomada de Ambon e Banda pela Companhia Holandesa das Índias Orientais e o impacto negativo da companhia sobre o desenvolvimento do Sudeste Asiático é baseado em Hanna 1978 e sobretudo Reid 1993 cap 5 As citações de Reid sobre Tomé Pires foram extraídas da p 271 a influência holandesa em Maguindanao p 299 o sultão de Maguindanao pp 299300 Os dados sobre o impacto da Companhia Holandesa das Índias Orientais sobre o preço das especiarias foram extraídos de ORourke e Williamson 2002 Uma visão geral definitiva da escravidão na sociedade africana e o impacto do tráfico de escravos é Lovejoy 2000 Lovejoy p 47 Quadro 31 fornece estimativas consensuais sobre a extensão do tráfico de escravos Nunn 2008 forneceu as primeiras estimativas quantitativas do impacto do tráfico de escravos sobre as instituições econômicas e o crescimento econômico africanos Os dados sobre as importações de armas de fogo e pólvora foram extraídos de Inikori 1977 O testemunho de Francis Moore foi extraído de Lovejoy 2000 pp 8990 Law 1977 é um estudo seminal da expansão do Estado oyo As estimativas do impacto do tráfico de escravos sobre a população africana são extraídas de Manning 1990 Lovejoy 2000 cap 8 os artigos em Law 1995 e o importante livro de Austin 2005 são as pedras angulares de nossa discussão da análise do período de comércio legítimo Os dados sobre a proporção de africanos que eram escravos na África foram extraídos de Lovejoy 2000 por exemplo p 192 Tabela 92 Os dados sobre a mão de obra na Libéria foram extraídos de Clower Dalton Harwitz e Walters 1966 O conceito de dualismo econômico foi desenvolvido por Lewis 1954 Fergusson 2010 desenvolve um modelo matemático do dualismo econômico A ideia de que este teria sido fruto do colonialismo foi proposta pela primeira vez na seminal coletânea de artigos editada por Palmer e Parsons 1977 Nosso relato sobre a África do Sul baseiase em Bundy 1979 e Feinstein 2005 O missionário morávio é citado em Bundy 1979 p 46 e John Hemming é citado em Bundy p 72 A disseminação da propriedade privada da terra em Griqualand East foi extraída de Bundy p 89 as façanhas de Stephen Sonjica de Bundy p 94 a citação de Matthew Blyth é da p 97 e a citação de um observador europeu em Fingoland 1884 de Bundy pp 100101 George Albu é citado em Feinstein 2005 p 63 o secretário de relações com os nativos é citado em Feinstein p 45 e Verwoerd é citado em Feinstein p 159 Os dados sobre os salários reais dos mineiros de ouro africanos foram extraídos da p 66 de Wilson 1972 G Findlay é citado por Bundy 1979 p 242 O conceito de que o desenvolvimento dos países ricos do Ocidente é a imagem invertida do subdesenvolvimento do resto do mundo foi desenvolvido originalmente por Wallertsein 19742011 embora ele dê ênfase a mecanismos muito diferentes dos destacados por nós Capítulo 10 Esse capítulo fundamentase basicamente em nossa pesquisa anterior com Simon Johnson e Davide Cantoni Acemoglu Johnson e Robinson 2002 e Acemoglu Cantoni Johnson e Robinson 2010 2011 Nossa discussão sobre o desenvolvimento das primeiras instituições na Austrália segue a obra seminal de Hirst 1983 1988 2003 e Neal 1991 O manuscrito original da petição ao Juiz Collins encontrase disponível graças à Macquarie University Law School in Australia em wwwlawmqeduau scnswhtmlCable20v20Sinclair201788htm A descrição dos correligionários de Wentworth por Macarthur foi extraída de Melbourne 1963 pp 13132 Nossa discussão sobre as origens dos Rothschilds segue Ferguson 1998 a declaração de Mayer Rothschild ao filho é reproduzida de Ferguson p 76 Nossa discussão sobre o impacto dos franceses sobre as instituições europeias foi extraída de Acemoglu Cantoni Johnson e Robinson 2010 2011 e das referências bibliográficas ali mencionadas Ver Doyle 2002 para uma visão geral padrão da Revolução Francesa As informações sobre as obrigações feudais em NassauUsingen foram extraídas de Lenger 2004 p 96 Ogilivie 2011 apresenta uma visão geral do impacto histórico das guildas sobre o desenvolvimento europeu Para um relato da vida de Ōkubo Toshimichi ver Iwata 1964 O plano de oito pontos de Sakamoto Ryūma é reproduzido de Jansen 2000 p 310 Capítulo 11 Nossa discussão da Lei Negra segue Thompson 1975 O relato de Baptist Nunn datado de 27 de junho foi extraído de Thompson 1975 pp 6566 As demais citações são da seção de Thompson sobre o respeito à lei pp 25869 que vale a pena ser lida na íntegra Nossa abordagem do processo de democratização da Inglaterra baseiase em Acemoglu e Robinson 2000a 2001 e 2006a O discurso do Conde Grey foi extraído de Evans 1996 p 223 O comentário de Stephens sobre a democracia é citado em Briggs 1959 p 34 A citação de Thompson foi extraída de Thompson 1975 p 269 O texto da Carta do Povo na íntegra pode ser encontrado em Cole e Filson 1951 e em webbhamacuk1848documentpeoplechhtm A citação de Burke foi extraída de Burke 17901969 p 152 Lindert 2004 2009 faz uma abordagem seminal da coevolução da democracia e políticas públicas nos últimos 200 anos Keyssar 2009 constitui uma introdução fundamental à evolução dos direitos políticos nos Estados Unidos Vanderbilt é citado em Josephson 1934 p 15 O texto do discurso de Roosevelt encontrase em wwwtheodore rooseveltcomsotu1html A citação de Woodrow Wilson foi extraída de Wilson 1913 p 286 O texto do pronunciamento do Presidente Roosevelt em seu Fireside Chat pode ser encontrado em miller centerorgscrippsarchivespeechesdetail3309 Dados sobre o poder relativo dos juízes da Suprema Corte na Argentina e nos Estados Unidos são apresentados em Iaryczower Spiller e Tommasi 2002 Helmke 2004 discute a história do aparelhamento da Suprema Corte na Argentina e cita o Juiz Carlos Fayt Capítulo 12 Esse capítulo baseiase fundamentalmente em nossa pesquisa teórica e empírica sobre persistência institucional sobretudo Acemoglu Johnson e Robinson 2005b e Acemoglu e Robinson 2008a Heath 1972 e Kelley e Klein 1980 fizeram uma seminal aplicação da lei de ferro da oligarquia à Revolução Boliviana de 1952 A citação dos documentos parlamentares britânicos é reproduzida da p 15 da Câmara dos Comuns 1904 Os primórdios da história política de Serra Leoa pósindependência são bem relatados por Cartwright 1970 Embora haja diferentes interpretações quanto ao porquê de Siaka Stevens ter desmontado a linha férrea a que mais se destaca é que ele pretendia isolar Mendeland Nesse ponto seguimos Abraham e Sesay 1993 p 120 Richards 1996 pp 42 43 e Davies 2007 pp 68485 Reno 1995 2003 tem as melhores descrições do regime de Stevens Os dados sobre as juntas comerciais agrícolas foram extraídos de Davies 2007 Sobre o assassinato de Sam Bangura por defenestração ver Reno 1995 pp 13741 Jackson 2004 p 63 e Keen 2005 p 17 discutem os acrônimos ISU e SSD Bates 1981 é a análise fundamental de como as juntas comerciais destruíram a produtividade agrícola na África após a independência ver Goldstein e Udry 2009 sobre como as ligações políticas com os chefes determinam os direitos de propriedade da terra em Gana Sobre a relação entre políticos em 1993 e os conquistadores ver Dosal 1995 cap 1 e Casaús Arzú 2007 Nossa discussão sobre a política do Consulado de Comércio segue Woodward 1966 A citação do Presidente Barrios foi extraída de McCreery 1994 pp 18788 Nossa discussão sobre o regime de Jorge Ubico segue Grieb 1979 Nossa discussão sobre o subdesenvolvimento do Sul dos Estados Unidos segue Acemoglu e Robinson 2008b Ver Wright 1978 sobre o desenvolvimento da economia escrava antes da Guerra de Secessão e Bateman e Weiss 1981 sobre a ausência de indústria Fogel e Engerman 1974 apresentam uma interpretação distinta e controversa Wright 1986 e Ransom e Sutch 2001 apresentam a medida em que a economia sulista efetivamente mudou após 1865 O deputado George Washington Julian é citado em Wiener 1978 p 6 O mesmo livro contém a análise da persistência da elite da terra no sul depois da guerra Naidu 2009 examina o impacto da introdução da captação e testes de alfabetização nos estados do Sul na década de 1890 A citação de WEB Du Bois encontrase no livro Du Bois 1903 p 88 A cláusula 256 da Constituição do Alabama pode ser encontrada em wwwlegislaturestatealus CodeOfAlabama Constitution1901CA245806htm Alston e Ferrie 1999 discutem como os políticos do sul bloqueavam as leis federais que acreditavam ser prejudiciais à economia do Sul Woodward 1955 oferece uma descrição seminal da criação do personagem Jim Crow Uma visão geral da revolução etíope pode ser encontrada em Halliday e Molyneux 1981 Sobre as almofadas do imperador ver Kapuściński 1983 As citações de Dawit Wolde Giorgis são de Dawit Wolde Giorgis 1989 pp 49 e 48 respectivamente Capítulo 13 Sobre a reportagem da BBC sobre a vitória de Mugabe na loteria inclusive a declaração pública do Zimbank ver newsbbccouk2hiafrica621895stm Nossa abordagem da instituição do domínio branco na Rodésia segue Palmer 1977 e Alexander 2006 Meredith 2007 oferece uma boa visão geral da política mais recente do Zimbábue Nosso relato da guerra civil em Serra Leoa segue Richards 1996 a Comissão de Verdade e Reconciliação 2004 e Keen 2005 A análise publicada em um jornal da capital Freetown em 1995 é citada por Keen 2005 p 34 O texto dos Passos Rumo à Democracia Footpaths to Democracy da FRU pode ser encontrado em wwwsierraleoneorgAFRCRUFfootpathshtml A citação de um adolescente de Geoma foi extraída de Keen 2005 p 42 Nossa discussão dos paramilitares colombianos segue Acemoglu Robinson e Santos 2010 e Chaves e Robinson 2010 que por sua vez baseiamse no amplo trabalho de estudiosos colombianos sobretudo Romero 2003 os artigos em Romero 2007 e López 2010 León 2009 faz um relato acessível e equilibrado da natureza dos conflitos atuais na Colômbia Igualmente fundamental é o site administrado pelo jornal semanal Semana wwwverdadabiertacom Todas as citações foram extraídas de Acemoglu Robinson e Santos 2010 O contrato entre Martín Llanos e os prefeitos em Casanare está disponível em espanhol em wwwverdadabiertacom victimarioslosjefes714perfil hectorgermanbuitragoaliasmartinllanos As origens e consequências de el Corralito são bem apresentadas em uma série de artigos na revista The economist disponível em wwweconomistcomsearchapachesolrsearchcorralito Sobre o papel do interior no desenvolvimento argentino ver Sawers 1996 Hassig e Oh 2009 oferecem um excelente e inestimável relato da vida na Coreia do Norte O cap 2 cobre o estilo de vida luxuoso das autoridades e os caps 3 e 4 as realidades econômicas enfrentadas pela maioria da população A cobertura da BBC da reforma monetária pode ser lida em newsbbccouk2hi8500017stm Sobre o palácio do prazer e o consumo de brandy ver cap 12 de Post 2004 Nossa discussão sobre o trabalho infantil e sua utilização na colheita do algodão no Uzbequistão segue Kandiyoti 2008 disponível em wwwsoasacukcccaceventscottonsectorincentralasia2005fi le49842pdf A citação de Gulnaz encontrase na p 20 de Kandiyoti Sobre o levante de Andijon ver International Crisis Group 2005 A descrição da eleição de Joseph Stálin na União Soviética é reproduzida de Denny 1937 Nossa análise do capitalismo clientelista no Egito segue Sfakianakis 2004 Capítulo 14 Nossa abordagem do caso de Botsuana segue Acemoglu Johnson e Robinson 2003 Robinson e Parsons 2006 e Leith 2005 Schapera 1970 e Parsons Henderson e Tlou 1995 são obras fundamentais O Alto Comissário Rey é citado em Acemoglu Johnson e Robinson 2003 p 96 A discussão sobre a visita dos três chefes à Inglaterra segue Parsons 1998 e todas as citações relacionadas a esse tema foram extraídas de seu livro Chamberlain pp 2067 Fairfield p 209 e Rhodes p 223 Schapera foi extraído de Schapera 1940 p 72 A citação de Quett Masire é de Masire 2006 p 43 Sobre a composição étnica das tribos tswana ver Schapera 1952 Nossa abordagem da mudança no Sul dos Estados Unidos segue Acemoglu e Robinson 2008b Sobre a emigração do Sul americano ver Wright 1999 sobre a mecanização da colheita de algodão Heinicke 1994 FRDUM FOOF SPETGH foi extraído de Mickey 2008 p 50 O pronunciamento de Thurmond em 1948 foi extraído de wwwslatecomid2075151 onde é possível também ouvir a gravação do áudio Sobre James Meredith e Oxford Mississippi ver Doyle 2001 Ver Wright 1999 sobre o impacto da legislação dos direitos civis sobre a votação negra no Sul Sobre a natureza e a política da transição política da China a partir da morte de Mao ver Harding 1987 e MacFarquhar e Schoenhals 2008 A citação de Deng sobre o gato foi extraída de Harding p 58 O primeiro ponto da Revolução Cultural foi extraído de Schoenhals 1996 p 33 a fala de Mao sobre Hitler foi extraída de MacFarquhar e Schoenhals p 102 Hua sobre os dois quaisquer que sejam foi extraída de Harding p 56 Capítulo 15 Sobre a história de Dai Guofang ver McGregor 2010 pp 21926 A história dos telefones vermelhos também foi extraída de McGregor cap 1 Sobre o controle exercido pelo partido sobre a mídia ver Pan 2008 cap 9 e McGregor 2010 pp 6469 e 23562 As citações sobre as atitudes do partido com relação aos empreendedores foram extraídas de McGregor 2010 pp 200201 e 223 Para os comentários de Wen Jiabao sobre as reformas políticas na China ver wwwguardiancoukworld2010aug29wenjiabaochinareform A hipótese da modernização é articulada com clareza em Lipset 1959 As evidências contra ela são discutidas em detalhes em Acemoglu Johnson Robinson e Yared 2008 2009 A citação de George H W Bush foi extraída de newsbbcco uk2hibusiness752224stm Nossa discussão da atividade da ONG e do auxílio estrangeiro no Afeganistão a partir de dezembro de 2001 foi baseada em Ghani e Lockhart 2008 Ver também Reinikka e Svensson 2004 e Easterly 2006 sobre os problemas do auxílio estrangeiro Nossa discussão sobre os problemas da reforma macroeconômica e inflação no Zimbábue foi baseada em Acemoglu Johnson Robinson e Querubín 2008 A discussão sobre a Seva Mandir foi extraída de Banerjee Duflo e Glennerster 2008 A formação do Partido dos Trabalhadores no Brasil é coberta por Keck 1992 sobre a greve na Scânia ver cap 4 A citação de Cardoso foi extraída de Keck pp 4445 a citação de Lula foi extraída de Keck p 65 A discussão sobre o empenho tanto de Fujimori quanto de Montesinos para controlar a mídia foi derivada de McMillan e Zoido 2004 e a citação sobre o controle por parte do Partido Comunista chinês é de McGregor 2010 p 69 Fontes dos mapas Mapa 1 O Império Inca e a malha rodoviária foram adaptados de John V Murra 1984 Andean Societies before 1532 in Leslie Bethell org The Cambridge History of Latin America vol 1 Nova York Cambridge University Press O mapa da área de captação da mita foi extraído de Melissa Dell 2010 The Persistent Effects of Perus Mining Mita econometrica 786 18631903 Mapa 2 Desenhado com base em dados de Miriam Bruhn e Francisco Gallego 2010 The Good the Bad e the Ugly Do They Matter for Economic Development a publicar na Review of economics and Statistics Mapa 3 Desenhado com base em dados sobre Indicadores de Desenvolvimento Mundial World Development Indicators 2008 do Banco Mundial Mapa 4 Mapa de porcos selvagens adaptado de W L R Oliver I L Brisbin Jr e S Takahashi 1993 The Eurasian Wild Pig Sus scrofa in W L R Oliver org Pigs Peccaries e Hippos Status Survey and Action Plan Gland Switzerland IUCN pp 11221 Bovinos selvagens adaptados do mapa de auroques de Cis van Vuure 2005 Retracing the Aurochs Sofia Pensoft Publishers p 41 Mapa 5 Adaptado de Daniel Zohary e Maria Hopf 2001 The Domestication of Plants in the Old World 3a edição Nova York Oxford University Press mapa 4 trigo p 56 mapa 5 cevada p 55 Mapa da distribuição de arroz adaptado de TeTzu Chang 1976 The Origin Evolution Cultivation Dissemination e Diversification of Asian and African Rices euphytica 25 42541 figura 2 p 433 Mapa 6 O Reino Bacuba baseiase em Jan Vansina 1978 The Children of Woot Madison University of Wisconsin Press mapa 2 p 8 O do Congo baseiase em Jan Vansina 1995 Equatorial Africa Before the Nineteenth Century in Philip Curtin Steven Feierman Leonard Thompson e Jan Vansina 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Europe e the Nile Valley Third Edition Nova York Oxford University Press a Nota da tradutora A Praça Tahrir árabe Midan alTahrir Praça da Libertação maior praça pública no centro do Cairo foi onde se concentraram os manifestantes egípcios que ali se reuniram aos milhares para protestar entre 25 de janeiro e 11 de fevereiro de 2011 data da renúncia de Mubarak b Nota da Tradutora Medicare é o sistema de seguros de saúde administrado pelo governo dos Estados Unidos e destinado às pessoas de idade igual ou maior que 65 anos ou que verifiquem certos critérios de rendimento c Nota da Tradutora As duas nogueiras d Nota da Tradutora Compra Gadsden designa a aquisição pelos Estados Unidos em 1853 de territórios mexicanos com área total de aproximadamente 77770km2 atualmente situados no sul dos estados norteameri canos do Arizona e Novo México definindo as fronteiras finais do território continental dos Estados Unidos e Nota da Tradutora Antiga forma de tortura que consistia em amarrar as mãos do punido pelas costas e ligálas a uma corda presa a um aparelho que o suspendia e soltava com violência para que seus membros superiores fossem deslocados pelo peso do corpo f Nota da Tradutora Foi a convicção de que a Lei do Chá Tea Act aprovada pelo Parlamento britânico em 1773 violava seu direito de serem tributados tão somente por seus próprios representantes eleitos que levou os colonos de Massachusetts em protesto a destruírem um carregamento de chá submetido ao novo imposto jogandoo ao mar no Porto de Boston no episódio que ficou conhecido como Festa do Chá de Boston Boston Tea Party em 16 de dezembro de 1773 um dos pontos de partida da Independência americana g Nota da Tradutora Em uma relação de dependência de trajetória path dependence as decisões tomadas em determinado momento dependem das circunstâncias ocorridas anteriormente h Nota da Tradutora Rio que marca a fronteira entre México e Estados Unidos i Nota da Tradutora Empresas maquiladoras são aquelas que importam materiais sem o pagamento de impostos com a garantia de que seus produtos não serão comercializados no país em que são fabricados j Nota da Tradutora O Witwatersrand é uma cadeia de montanhas que corre de leste a oeste através do território sulafricano O nome vem do africâner e significa cume das águas brancas Também conhecido como Rand ou recife é célebre por ser fonte de 40 do ouro explorado no mundo k Nota da Tradutora O nome se deve à planta da flora alpina e da tundra Dryas octopetala l Nota da tradutora No original em inglês os autores vão citando os itens em ordem alfabética amalgamator assayer banksman blacksmith boiler maker brass finisher brassmolder bricklayer até woodworking machinist a fim de dar uma boa ideia da extensão da lista m Nota da tradutora Tradução livre O texto original referese a flogged at a carts tail castigo corporal comum na Inglaterra em que o condenado era amarrado à parte traseira de uma carroça e açoitado n Nota da tradutora As tambourine girls eram moças que não gozavam de muito boa fama na sociedade da época o Nota da Tradutora Nome devido ao pseudônimo Capitão Swing hipotético líder do movimento que assinava cartas com ameaças a magistrados párocos fazendeiros e outros p Nota da Tradutora Clássico da língua inglesa escrito em duas partes pelo inglês John Bunyan e publicado em 1678 e 1684 respectivamente O peregrino The Pilgrims Progress é uma alegoria que descreve a jornada do cristão desde a Cidade da Destruição até a Cidade Celestial q Nota da Tradutora Complexo de três pontes na cidade de Nova York interligando Manhattan Queens e o Bronx r Nota da Tradutora Represa no Rio Columbia no estado de Washington Quando foi inaugurada apresentava a maior capacidade de geração de eletricidade do mundo ocupando hoje o terceiro lugar s Nota da Tradutora Os fireside chats batepapos ao pé da lareira expressão em inglês que designa uma conversa informal de cunho franco e pessoal foram uma série de 30 pronunciamentos radiofônicos feitos pelo Presidente Franklin Roosevelt entre 1933 e 1944 t Nota da Tradutora Em inglês exact a pound of flesh extrair meio quilo de carne expressão usada para referirse a cobradores gananciosos que se aproveitam do desespero do devedor Derivada da peça O mercador de Veneza de Shakespeare em que o judeu Shylock arrancará meio quilo de carne de Antonio caso este não quite sua dívida em três meses u Nota da Tradutora A alcunha Jim Crow era dada com frequência aos escravos negros norteamericanos tendo sido imortalizada por uma canção muito em voga no século XIX O nome leis de Jim Crow referese ao conjunto de leis estaduais e locais segregacionistas que vigoraram de 1876 a 1965 nos estados sulistas e limítrofes dos Estados Unidos afetando afroamericanos asiáticos e outros grupos Eram distintas dos Black Codes Códigos Negros 18001866 que visavam a restringir as liberdades e direitos civis dos afroamericanos v Nota da Tradutora Apelido da Universidade do Mississippi que significa algo como velha senhorita x Nota da Tradutora Os US Marshals United States Marshals Service USMS constituem uma agência federal americana de aplicação da lei pertencente ao Departamento de Justiça dos Estados Unidos Faz parte do ramo executivo do governo e é o braço fiscalizador dos tribunais federais responsável pelo bom funcionamento do sistema judicial O capítulo 6 do livro Por Que as Nações Fracassam discute como Veneza que era uma das cidades mais ricas do mundo na Idade Média transformouse em um destino turístico A cidade desenvolveu instituições econômicas inclusivas como a commenda uma forma primitiva de sociedade anônima que permitia mobilidade social e crescimento econômico O sistema político veneziano também evoluiu para ser mais inclusivo com a criação de conselhos e limitações ao poder do doge Entretanto esse sistema começou a se fechar com La Serrata O Fechamento em 1297 quando o Grão Conselho se tornou hereditário criando uma aristocracia fechada Isso levou à implementação de instituições econômicas extrativistas com a proibição da commenda e a nacionalização do comércio Como resultado Veneza entrou em declínio econômico O texto então expande a discussão para analisar o desenvolvimento histórico de instituições em diferentes partes do mundo focando especialmente no Império Romano Roma inicialmente prosperou com instituições parcialmente inclusivas durante a República mas tornouse mais extrativista durante o Império levando ao seu eventual declínio O texto destaca como o medo da destruição criativa e a prevalência da escravidão inibiram a inovação tecnológica em Roma A narrativa também aborda como diferentes regiões do mundo seguiram caminhos distintos de desenvolvimento institucional Por exemplo a Inglaterra que era relativamente atrasada durante o período romano acabaria se tornando o berço da Revolução Industrial devido a uma série de circunstâncias históricas específicas O texto enfatiza que o desenvolvimento institucional não é um processo linear ou predeterminado mas resultado de interações complexas entre pequenas diferenças institucionais e circunstâncias críticas ao longo do tempo Por fim o capítulo conclui que embora Roma tenha exercido influência duradoura na Europa através de suas instituições e leis foi a queda do império e o subsequente desenvolvimento do feudalismo que criaram as condições para o surgimento de instituições mais inclusivas na Europa diferenciandoa de outras regiões do mundo como África Ásia e Américas 6 D I F E R E N C I A Ç Ã O C O M O A S I N S T I T U I Ç Õ E S E V O L U E M A O L O N G O D O T E M P O E M G E R A L D I F E R E N C I A N D O S E L E N T A M E N T E U M A S D A S O U T R A S POR QUE AS NAÇÕES FRACASSAM CAPÍTULO 6 V E N E Z A N A I D A D E M É D I A Posição estratégica no Mediterrâneo Uma das cidades mais ricas do mundo População em crescimento 1050 45 mil habitantes 1200 70 mil habitantes 1330 110 mil habitantes Inovações contratuais inclusivas A C O M M E N D A E I N S T I T U I Ç Õ E S I N C L U S I V A S Commenda sociedade anônima primitiva Sócio sedentário capital Sócio viajante execução Mobilidade social significativa 6581 de nomes novos nos registros Sistema político Assembleia Geral Conselho Ducal Grão Conselho L A S E R R ATA O F E C H A M E N T O 1297 Início do fechamento político Principais mudanças Grão Conselho tornase hereditário Criação do Libro dOro registro da nobreza Repressão aos opositores Consequências econômicas Proibição da commenda Nacionalização do comércio Monopólio comercial da nobreza O D E C L Í N I O D E V E N E Z A Impactos do fechamento institucional Queda populacional Declínio comercial Perda de relevância econômica Transformação em destino turístico Foco em turismo e artesanato Musealização da cidade P A R A L E L O C O M R O M A Padrão similar de declínio República instituições parcialmente inclusivas Império instituições extrativistas Fatores de estagnação Medo da destruição criativa Prevalência da escravidão Resistência à inovação tecnológica L I Ç Õ E S P A R A O D E S E N V O L V I M E N T O I N S T I T U C I O N A L Pontoschave Desenvolvimento não é linear Pequenas diferenças podem ter grandes impactos Instituições inclusivas podem ser revertidas Importância do equilíbrio entre inclusão e inovação C O N C L U S Ã O O caso de Veneza oferece uma poderosa lição sobre como o desenvolvimento institucional não segue um caminho linear e predeterminado A cidadeestado que no auge de seu poder desenvolveu instituições econômicas e políticas notavelmente inclusivas para sua época demonstrou como a prosperidade pode ser construída através de inovações institucionais como a commenda e um sistema político que permitia checks and balances No entanto o mesmo caso também ilustra como esse progresso pode ser revertido quando as elites temendo a destruição criativa e a perda de seus privilégios optam por fechar o sistema político e econômico A transformação de Veneza de potência comercial em destino turístico serve como um alerta sobre as consequências de longo prazo da transição de instituições inclusivas para extrativistas O processo conhecido como La Serrata não apenas consolidou o poder nas mãos de uma aristocracia hereditária mas também sufocou as próprias inovações que haviam tornado Veneza próspera Este exemplo histórico demonstra que a manutenção de instituições inclusivas requer vigilância constante e que o desenvolvimento econômico sustentável depende fundamentalmente da capacidade de uma sociedade em resistir às tentações do exclusivismo político e econômico A história veneziana portanto continua relevante para compreendermos os desafios contemporâneos do desenvolvimento institucional e da distribuição de poder nas sociedades modernas

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