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O Príncipe Nicolau Maquiavel Coleção Clássicos Política Martins Fontes O PRÍNCIPE O PRÍNCIPE Nicolau Maquiavel Tradução MARIA JÚLIA GOLDWASSER Revisão ROBERTO LEAL FERREIRA Martins Fontes São Paulo 2001 Índice IX Do princípio civil 43 X De que forma se devem avaliar as forças de todos os principados 49 XI Dos principados eclesiásticos 53 XII De quantos gêneros há de milícias e de soldados mercenários 57 XIII Dos exércitos auxiliares mistos e próprios 63 XIV Do que compete a um príncipe acerca da milícia 69 XV Das coisas pelas quais os homens e especialmente os príncipes são louvados ou viltuperados 73 XVI Da liberalidade e da parcimônia 75 XVII Da crueldade e da piedade e se é melhor ser amado que temido ou melhor ser temido que amado 79 XVIII De que modo devem os príncipes manter a palavra dada 83 XIX Como se deve evitar ser desprezado e odiado 87 XX Se as fortalezas e muitas outras coisas que os príncipes fazem diariamente são úteis ou não 99 XXI O que convém a um príncipe para ser estimado 105 XXII Dos secretários que os príncipes mantém junto de si 111 XXIII Como evitar os aduladores 113 XXIV Por que razões os príncipes da Itália perderam seus Estados 117 XXV De quanto pode a fortuna com coisas humanas e de que modo se pode resistirlhe 119 XXVI Exortação a tomar a Itália e libertála das mãos dos bárbaros 123 Ao magnífico Lorenzo de Medici 129 Apêndice Maquiavel e Marx 131 Notas 157 Prefácio Dentre os textos que são tidos como imortais este livrinho ocupa um lugar à parte e acredito que único Nada impede que seja repelido como um ensaio mau inspirado por um espírito de cinismo ou de escândalo Nada obriga a ver nele um dos textos maiores da literatura política O que é impossível tanto hoje quanto no primeiro dia é largálo antes de têlo lido até o fim é pôlo de lado com indiferença O príncipe não conservou sua juventude muitas obras mereceriam este elogio banal O príncipe conservou seu poder de fascínio Sei disso mas não estou certo de saber por quê Ocorreme uma primeira resposta O príncipe é um livro cuja aparente clareza deslumbra e cujo mistério os eruditos e os simples leitores tentam em vão esclarecer Que queria dizer Maquiavel A quem queria dar aulas aos reis ou aos povos De que lado se colocava Do lado dos tiranos ou do lado dos republicanos Ou de nenhum dos dois Hoje não estamos em situação de conservar a interpretação fascinante original de JeanJacques Rousseau Numa nota de O contrato social ele diz que Maquiavel era um homem honesto e um bom cidadão mas estanz do ligado a casa dos Medici era obrigado em meio à opressão de sua pátria a disfarçar o seu amor à liberdade Só a escolha de seu execrável rei Cesare Borgia já é suficiente para mostrar sua secreta intenção e a oposição das máximas de seu livro sobre O príncipe às de seu Discurso sobre Tito Lívio e da História de Florença demonstra que este profundo político só veio até agora leitores superficiais e corrompidos A corte de Roma proibia severamente o livro entendese já que é ela que o livro descreve mais claramente Mas não é isso Não há contradição entre O príncipe e o Discurso Maquiavel amava a liberdade e nem mesmo disfarçava seu amor Mas para fundar um principado novo ou livrar a Itália dos bárbaros a liberdade de um povo corrompido teria sido impotente Quem analisa à maneira de Aristóteles os meios necessários para manter a tirania nem por isso a aprova e menos ainda aprova a degradação dos costumes que a tornou possível ou inevitável Essa busca da verdadeira significação de O príncipe ou da intenção última de Maquiavel não se detém tão rapidamente Ela é propriamente dialética Toda resposta a uma questão suscita novas questões e talvez não pode deixar de ter feito inimizados de modo que a lição deste relato Não hesitemos sob o risco de perdição em traduzila para linguagem abstrata Para trazer de volta a paz e fundar uma ordem numa região entregue ao bandidismo o chefe cruel e eficaz satisfaz às necessidades Mas faça posterior com a paz já de volta o sábio presidente de um Tribunal civil substitui com vantagem o homem cruel e eficaz E como este último não pode ter deixado de ter feito inimizados o melhor é sacrificálo a cólera do povo ingratido de modo que o príncipe Cesare Borgia no caso pareça inocente das crueldades cometidas em seu nome Como se opor a razões tão convincentes Talvez de fato seja impossível oporse a elas Mas tampouco é fácil subscrevêlas A técnica do bode expiatório não é desconhecida nas sociedades arcaicas Incontestavelmente ela pode ser vantajosa para os príncipes Basta que ela tenha feito sucesso na maior parte dos casos para que o médico do corpo social tenha o direito de recomendála Afirmo portanto que os estados que depois de conquistados são anexados a um antigo estado de que um conquistou ou não é Se forem será fácil conserválos principalmente se não estiverem habituados a viver livres Para possuílos com segurança basta extinguir a dinastia do príncipe que os dominava Chamaremos de preceito operacional o conselho dado ao príncipe novo de não mandar matar todos os membros da antiga família reinante O conselho é tão bom a curto prazo e no plano da eficácia quanto o de mandar matar ao servidor que ao mesmo tempo restabelece a ordem por meios eficazes e sutis dós Sendo os homens o que são os preceitos que a experiência do mundo sugere não coincidem com os que os moralistas ensinam Imediatamente a interrogação surge Maquiavel não se comprometer em sugerir que os meios politicamente eficazes contradizem o ensinamento da Igreja Pela escolha de seu herói não era uma adesão mesmo hesitante do que seria de desejar ao que foi chamado de governo à florentina É bem verdade que todos os Estados nasceram da violência e por conseguinte os fundadores de Estados os que ergueram ou reergueram esses frágeis monumentos as cidades humanas estão condenados à violência Mas pela maneira com que defende e ilustra esses arquitetos da história Maquiavel incita ao vício ou à virtude ao maquiavelismo ou à República Referese de quando em quando à Igreja para camuflar o cinismo de seu ensinamento ou para dar livre curso a seus sentimentos recalcados pelas obrigações da verdadeira científica Enfim Maquiavel tinha intenções maquiavélicas dissimulando pela metade uma política decididamente imoral apresentandoa às vezes como baseada em constatações objetivas às vezes como culpa das inevitáveis Afinal de contas os observadores podem interpretar a experiência histórica de modo totalmente diferente de Maquiavel sem no entanto estarem cegos ao êxito da crueldade e do crime Jacques Maritain utiliza contra o maquiavelismo a consideração da duração histórica O bem temporal em que frutifica a justiça do estado o mal temporal em que frutifica sua iniquidade podem ser e na verdade são inteiramente diferentes dos resultados imediatos que o espírito humano podia prever e que os olhos humanos contemplam É tão difícil destrinçar as ações causais afastadas quanto discernir na embocadura de um rio de que geleiras ou de que afluentes provêm esta ou aquela porção de suas águas Maritain também não me convence Apenas me faz lembrar que a leitura maquiavélica da história não é a única possível e que essa leitura deriva de certa intenção Qual Eisnos numa encruzilhada pois várias respostas são possíveis A leitura era imposta pelas circunstâncias pelo projeto científico pelas buscas das origens ou pela atenção às situações extremas pelo pessimismo quanto à natureza humana pelo ardor republicano e pela vontade de uma nova Itália livre dos bárbaros Todas estas respostas foram dadas por um ou outro crítico E qualquer que seja a resposta o debate continua banal e indefinido a política é ação e a ação tende ao êxito Se é tão difícil o príncipe renunciar ao sucesso Sujar as mãos Sacrificar a salvação de sua alma pela salvação da cidade Onde se detém no caminho que não pode deixar de tomar Que mentira recuará se precipita sua coragem confessando a verdade Escrevo no mês de março de 1962 Há três anos e meio uma República caía porque era incapaz de conservar a Argélia para a França Os fundadores da República seguinte prosseguiram obstinadamente a política cuja veleidade acusavam aos antigos dirigentes de alimentarem Mas se era preciso gritar Argélia francesa para trazer de volta o general De Gaulle ao poder e se este retorno ao Élysée do solitário de Colombey era indispensável para o bem público aqueles que engenharam seus fiéis e o povo sobre seus objetivos não desonraram enfim seu nome e serviram o Estado Ou devemos dizer que os príncipes que nos governam não podem servir o Estado se faltam com sua honra Mas quem será juiz de sua honra E o povo os acusará de enganação no dia em que esta tiver sido bemsucedida Maquiavel teve a coragem de ir até o fim de uma lógica de ação contra a qual o leitor procura abrigo em interrogações sem resposta Raymond Aron Cronologia Vida e Obra de Maquiavel 1469 3 de maio Nasce em Florença Niccolò Machiavelli Nicolau Maquiavel filho de Bernardo advogado e de Bartolomeo de Nelli poeta amo rador Terceiro de quatro filhos Niccolò é educado em ambiente culto e relativamente abastado Herdou do pai uma vocação para os estudos históricos e jurídicos que viriam a desempenhar um papel essencial em seus futuros interesses políticos 1469 Morre Pietro de Medici sendo sucedido por seu filho Lorenzo o Magnífico 1476 Maquiavel iniciase no estudo da matemática e do latim 1477 Por suas qualidades precoces Maquiavel é confiado à escola de Battista da Poppi na igreja de San Benedetto 1478 Por ocasião da Congiura de Pazzi morre Giuliano de Medici irmão de Lorenzo 1481 Maquiavel passa para a escola de um conhecido latinista Paolo de Ronciglione como ao qual estud nos aprofundamentos sobre latinos não há informações de que tivesse estudado o grego 1490 O frade dominicano Gerolamo Savonarola já ativo em Florença de 1482 a 1487 volta para a cidade e retoma suas pregações provocando amplas adesões populares 1492 Morre Lorenzo de Medici sendo sucedido por seu filho Piero 14711503 Com a morte de Inocêncio III é eleito papa Alexandre VI Borgia 1494 setembrodezembro Avançando suas pretensões sobre o reino de Nápoles Carlos VIII rei da França chega à Itália e entra também em Florença Piero de Medici é expulso da cidade sob a acusação de ter aceito sem nenhuma hesitação as onerosas exigências do soberano francês e os habitantes de Florença proclamam a República Gerolamo Savonarola aproveitase da situação para tornarse árbitro da vida florentina 1495 É provável que seja deste ano ou dos anos imediatamente posteriores a transcrição que Maquiavel fez de próprio punho do De rerum natura de Lucrécio encontrada há pouco tempo num código vaticano O documento revela uma visão materialista do mundo oposto ao espiritualismo de Savonarola Outubro Os senhores da cidade da Romanha formam uma coalizão contra o duque Valentino Dietta della Maggione e Maquiavel é enviado para Senigalla a fim de acompanhar os movimentos de Borgia As cartas enviadas aos Dez mostram a perspicácia com que Maquiavel procura penetrar os propósitos do duque e seu ceticismo em relação à intenção de paz atribuída a Borgia 1503 janeiro Cesare Borgia depois de atrair em emboscada na cidade de Senigalia os exconspiradores da Maggione mataos sem nenhuma piedade Maquiavel presencia o fato e ao voltar de sua missão elaborou a impassível Descrizione del modo tenuto dal Duca Valentino nello ammazzare Vitellozzo Vitelli Olivertotto da Fermo il signor Paolo e il duca de Gravina Orsini Descrição do comportamento do duque Valentino ao matar Vitellozzo Vitelli Olivertotto da Fermo o senhor Paolo e o duque de Gravina Orsini Junho Encarrregado por Pier Soderini de organizar as forças militares para colocar um fim à guerra contra Pisa e para dominar as insurreições de Arezzo e da Valdichiana Maquiavel resume seu pensamento em dois relatórios Parole da dire sopra la proïvitione del denaio e Del modo di trattare i popoli della Valdichiana ribellati Palavras que quero dizerlhe a respeito da provisão do dinheiro e Do modo de tratar os povos rebeldes da Valdichiana No primeiro relatório destacase o desenvolvimento de um conceito que se tornará fundamental em sua especulação política a necessidade da força as armas e ao mesmo tempo da pruden cia uma inteligente estratégia política para levar a bom termo toda e qualquer ação de governo No segundo há uma importante menção à teoria da história como magistra vitae Agosto Morre o papa Alexandre VI o pai do duque Valentino e apenas dois meses mais tarde 18 de outubro o seu sucessor Pio III Outubro Maquiavel é enviado a Roma para acompanhar o novo conselho Desfazse o mito de Cesare Borgia que atormentado por uma grave doença não consegue se opor à eleição de Giuliano della Rovere ao qual confiando em fingidas promessas termina concedendo também o próprio apoio Eleito papa e já com o nome de Júlio II Giuliano retira de Borgia a sustentação da Igreja No relatório enviado a Florença Maquiavel julga com palavras duras o incerto comportamento de Cesare Borgia mas a experiência borgiana se transforma numa etapa fundamental no desenvolvimento de suas concepções políticas 1504 janeiro Maquiavel é enviado à França para definir os termos da aliança com Luís XII Outono Escreve o Decennale primo uma crônica em versos dos acontecimentos italianos entre 1494 chegada de Carlos VIII na Itália e 1504 queda de Cesare Borgia 1505 março Maquiavel completa duas missões exploratórias a procura de novas alianças em Mantua junto aos Gonzaga e em Siena junto a Pandolfo Petrucci 12 de setembro Florença será doravante sob as fortificações da cidade de Pisa devido à força 1507 dezembro Maquiavel é enviado em sinal de apoio a Francesco Vettori como observador na região de Tirolo junto a Maximiliano de Habsburgo reivindicando Trieste e Fiume ocupadas pelos venezianos tencionava vir para a Itália confiando no apoio do papa Por sua vez Júlio II estava empenhando em organizar a coalizão de Estados europeus contra Veneza Liga de Cambrai que se recusava a deixar alguns territórios do Estado pontifício O dever do chanceler é negociar um tributo a ser oferecido ao imperador para que seja assegurada a integridade do domínio florentino 1508 junho De volta a Florença escreve Rapporto delle cose della Magna Relatório das coisas da Alemanha condensando em 1509 o Discorso sopra le cose dellAlemagna e sopra limperatore Discurso a respeito das coisas da Alemanha e do imperador e remajenado em 1512 no Ritratto delle cose della Magna Retrato das coisas da Alemanha 10 de dezembro É firmada a Liga de Cambrai Florença que figura entre os signatários obtém forças suficientes para debar a resistência de Pisa Como organizador das forças militares Maquiavel participa ativamente do empreendimento um trabalho de pacificação urbanan enviando um apelo ao partido dos Medici Ricordo ai Palleschi para que não exceda em crueldade contra o gonfaloneiro derrotado 16 de setembro O governo republicano é desfeito e com o apoio do papa os Medici voltam para a cidade Maquiavel não consegue escapar ao expurgo da organização estatal 7 de novembro Dispensado de todos os seus encargos Maquiavel é condenado a pagar uma fiança de 1000 florins de ouro além disso por doze meses se vê proibido de entrar no Palazzo Vecchio 1513 fevereiro Sob suspeita de participar de um complô contra os Medici Maquiavel é preso e torturado Reconhecido inocente e colocado em liberdade retirase para SantAndrea in Percussina na villa conhecida como LAlbergaccio Morre Júlio II Seu sucessor é o cardeal Giovanni Medici sob o nome de Leão X Ao deixar Florença este deixa em seu lugar o sobrinho Lorenzo II 14921519 filho de Piero 10 de dezembro Numa carta ao embaixador florentino Francesco Vettori Maquiavel anuncia Escrevi um livro De principatibus O príncipe onde me aprofundo o mais que posso nos argumentos do assunto acima investigando o que é principado o que especifei como se conquistam como se mantêm por que se perdem A obra é dedicada a Lorenzo II de Medici 1º de dezembro Morre Adriano VI sendo sucedido por Leão X 1523 Com a morte de Adriano VI Giulio de Medici é eleito papa assumindo o nome de Clemente VII 1524 O cardeal Ippolito de Medici filho natural de Giuliano de Nemours é senhor de Florença 1525 janeirofevereiro Maquiavel escreve uma segunda comédia Clizia 24 de fevereiro Francisco I rei da França é derrotado em Pavia pelas tropas imperiais de Carlos V Fim de maio Encontrase em Roma para oferecer a Clemente VII as Histoire florentine Expõe ao papa um novo projeto de tropas nacionais mostrando a necessidade de contrapor uma forte milícia italiana aos exércitos estrangeiros acampados na planície padana norte da Itália Três meses antes em 24 de fevereiro Francisco I rei da França havia sido derrotado em Pavia pelas tropas imperiais de Carlos V Agosto De volta a Florença Maquiavel obtém a reabilitação completa de seus cargos políticos É enviado em missão a Veneza Liga de Cognac contra Carlos V que congrega papa França Veneza e Milão Em abrilmaio o papa enviando o Conde Pietro de Navarra a inspecionar as fortificações florentinas coloca a seu lado Maquiavel Após um primeiro relatório sobre a situação das fortificações Maquiavel viaja para Roma onde recebe o encargo de adotar todas as medidas necessárias para a segurança da cidade Junho Maquiavel colabora em Florença para a constituição de um conselho de defesa os Cinco 21 de junho Despojado de todos os seus cargos da nova República morre pobre em Florença chorado apenas por poucos amigos do cenáculo dos Orti Oricellari No dia seguinte é enterrado em Santa Croce Nota desta Edição A presente edição baseiase no texto e no aparelho crítico estabelecidos por Bruna Cordati para a Ed Loescher Torino As notas foram selecionadas e traduzidas por Maria Júlia Goldwasser e Roberto Leal Ferreira O Editor O PRÍNCIPE CAPÍTULO I De Quantos Tipos São os Principados e de que Modo se Adquirem Todos os estados todos os domínios que tiveram e têm poder sobre os homens foram e são ou repúblicas ou principados Os principados ou são hereditários nos quais o sangue de seu senhor vem governando há longo tempo ou são novos Os novos ou são inteiramente novos como Milão sob Francesco Sforza ou são como membros anexos ao estado hereditário do príncipe que se adquire como é o caso do reino de Nápoles em relação ao rei da Espanha Os domínios assim formados estão habitados ou a viver sob um príncipe ou a ser livres E se adquirem ou com armas de outrem ou com as próprias graças a fortuna ou à virtude Não tratarei aqui das repúblicas porque em outra ocasião discorri longamente sobre o assunto Ocupareimeei somente dos principados e retomando o raciocínio anterior discutirei de que forma podem ser governados e mantidos pelos seus Com a antiguidade e a continuidade do poder apagamse as lembranças e as razões das alterações pois sempre uma mudança deixa preparadas as fundações da outra É bem verdade que adquiridos pela segunda vez os países rebelados se perdem com mais dificuldade pois diante de uma rebelião o senhor agirá com menos timidez para determinar a punição dos traidores identificar os suspeitos e reforçar seus pontos mais fracos porque é necessário ou fazer isto ou manter bastante gente em armas e infantaria Nas colônias não se gasta muito com pouca ou nenhuma despesa elas são enviadas ou mantidas prejudicando somente a minoria cujos campos e casas são confiscados para serem dados aos novos habitantes Como os preconceitos ficam dispersos e pobres não podem incomodar e todos os demais não ofendidos devem com isso inquietarse além de temer que les aconteça o mesmo que se deu com os que foram espoliados Concluo enfim que essas colônias nada custam são mais fies e menos ofensivas e os espoliados não podem fazer nada visto que estão pobres e dispersos como foi dito Dai se há de observar que os homens devem ou ser mimados ou aniquilados porque se é verdade que podem vingarse das ofensas leves das grandes não o podem por isso a ofensa que se fizer a um homem deverá ser de tal ordem que não se tema a vingança Mantendose tropas em vez de colônias despendese muito mais gastandose com elas todas as receitas do estado e a conquista se transforma em prejuízo Além do mais isso desconta muito mais os habitantes porque a transferência do exercício com os alojamentos causa danos a todo o estado Todos se ressentem desse incômodo tornandose cada qual um inimigo e são inimigos que podem incomodar pois embora derrotados permanecem em sua casa De todas as maneiras portanto essa milícia é tão inútil quanto são proveitosas as colônias quem domina uma província diferente como disse por língua costumes e leis deve ainda fazerse chefe e defensor dos vizinhos mais fracos empenharse em enfraquecer os poderosos de sua província e cuidar coisas e pode trazer consigo tanto o bem como o mal e tanto o mal como o bem Nas províncias conquistadas os romanos observaram perfeitamente esses aspectos formaram colônias apoiaram os menos poderosos sem aumentar seu poder rebaixaram os poderosos e não deixaram que estrangeiros fortes alcançassem reputação Quero citar apenas um exemplo da província da Grécia os venezianos apoiaram os aqueus e os etíolos abateram o reino dos macedônios rechaçaram Antíoco jamais os ajudaram dos aqueles ou dos etíolos fizeram com que lhes permitissem obter qualquer estado nem tampouco os argumentos de Felipe os induziram a serem seus amigos em so enfraquecer e lamente Cesare Borgia filho do papa Alexandre ocupava a Romana Dizendome o cardeal que os italianos não entendiam de guerra respondilhe que os franceses não entendiam de estado porque se entendessem não teriam permitido que a Igreja alcançasse tanta grandeza Por experiência viuse que o fortalecimento da Igreja e da Espanha na Itália foi causado pela França e que a ruína da França foi causado por elas De onde se extrai uma regra que nunca o romano erra arruinouse porque esse poder é dado ou pela astúcia ou pela força e ambas são suspeitas a quem se torna poderoso Exemplos destas duas modalidades de governo são em nossos tempos o grãoturco e o rei de França A monarquia turca inteira é governada por um só senhor sendo os demais seus vassalos e esse senhor dividindo o seu reino em sandjaques para lá envia administradores diversos que substitui ou demite como bem lhe apraz O rei de França ao contrário está cercado de uma quantia cide antigas famílias de senhores reconhecidas e amadas por seus súditos em seus próprios estados e detentores de privilégios que o rei não lhes pode arrebatar sem perigo Assim quem considerar esses dois estados encontrará dificuldade em conquistar o estado do grãoturco porém vencendoo terá grande facilidade em conserválo Ao contrário sob todos os aspectos encontrará também maior facilidade em ocupar a França porém grande dificuldade em mantêla eles foram esquecidos graças à potência e continuidade do império é que se tornaram proprietários seguros E depois conseguiram ainda combatendo entre si tomar cada qual uma parte daquelas províncias segundo a autoridade que tivessem alcançando dentro delas pois desaparecido o sangue de seus antigos senhores as províncias só reconheciam a autoridade dos romanos Consideradas portanto todas essas coisas não é de surpreender a facilidade com que Alexandre conquistou a Ásia nem as dificuldades que tiveram outros para manter suas conquistas como Pirro e muitos mais o que não nasce da muita ou pouca virtù do vencedor mas da diversidade do sujeito possulas exceto a ruína Quem se torna senhor de uma cidade habitada a viver livre e não a destruir será destruído por ela porque ela sempre lembrará na rebelião o nome de sua liberdade e de sua antiga ordem as quais nem o passar do tempo nem os benefícios jamais farão esquecer Não importa o que se fez ou as precauções que se tomarem se não se dispersarem os habitantes eles não esquecerão aquele nome e a ordem ao menor incidente os recordarão como aconteceu em Pisa após cem anos de submissão aos forasteiros Mas quando as cidades ou as províncias estão habituadas a viver sob o governo de um príncipe e seu sangue desaparece estando de um lado acostumados a obedecer e de outro não tendo mais esse antigo príncipe não chegam a um acordo para eleger outro e não sabem viver em liberdade por isso são mais lentos em tomar armas e com mais facilidade poderá um príncipe conquistálas e conserválas em seu poder Nas repúblicas há mais vida mais ódio mais desejo de vingança Ali a recordação da antiga liberdade não as deixa não as pode deixar em paz e por isso o meio seguro para possuílas é ou destruílas ou as habitarlas Que ninguém se espante se ao falar dos principados inteiramente novos quanto ao príncipe e ao governo eu recorrer a exemplos muito grandes Os homens trilham quase sempre caminhos abertos por outros e pautam suas ações sobre essas imitações embora não possam repetir tudo na vida dos imitados nem igualar sua virtù Um homem prudente deve sempre seguir os caminhos abertos pelos grandes homens e espelharse nos que foram excelentes Mesmo não alcançando sua virtù deve pelo menos mostrar algum indício dela e fazer como os arqueiros prudentes que julgando muito distantes os alvos que pretendem alcançar e conhecendo bem o grau de exatidão de seu arco orientam a mira para bem mais alto que o lugar destinado não por medo da altura com flechas mas por meio de mira tão elevada alcançar o objetivo organizado de modo que quando não acreditarem mais seja possível fazêlos ceder a força Moisés Ciro Teseu e Rômulo não teriam conseguido que suas constituições fossem obedecidas por tanto tempo se estivessem desarmados Em nossos tempos foi o que aconteceu ao frei Girolamo Savonarola¹ que se arruinou com sua derrocada nova a partir do momento em que a multidão começou a não acreditar nela pois ele não dispunha de meios nem para manter firmes os que haviam acreditado nem para fazer crer os descrentes Homens assim enfrentam grandes dificuldades defrontandose em seu caminho com perigos que precisam ser superados com a virtù Depois de vencerem esses perigos e passarem a ser venerados tendo aniquilado o que tinham inveja de suas qualidades tornamse poderosos seguros honrados e felizes raizes e ramificações de modo que sucumbem na primeira tempestade A menos que como já disse aqueles que realmente se tornaram príncipes sejam de tanta virtù que saibam rapidamente se preparar para conservar aquilo que a fortuna lhes colocou nos braços e estabeleçam depois os fundamentos que outros estabeleceram antes de se tornarem príncipes Quero a cada um desses modos citados de tornarse príncipe por virtù ou por fortuna aduzir dois exemplos ainda em nossa memória que são Francesco Sforza e Cesare Borgia Francesco pelos devidos meios e uma grande virtù passou de cidadão privado a duque de Milão e o que havia conquistado com enorme empenho em pouco esforço manteve Por outro lado Cesare Borgia vulgamente chamado que Valentino conquistou o estado com a fortuna do pai e com ela o perdeu apesar de ter usado de todos os atos e de ter realizado todas as coisas que um homem prudente e valoroso deveria ter feito para deixar raízes em um estado que as armas e a fortuna de outros lhe haviam proporcionado Como disse acima quem não constrói os fundamentos antes poderá fazêlo depois se tiver grande virtù mas com maior dificuldade para o arquiteto e perigo para a construção Portanto se considerarmos todos os procedimentos do duque veremos que ele preparou amplos fundamentos para seu futuro poder sobre os quais não julgo superfluo discorrer visto que desconheço preceitos melhores para dar a um príncipe novo do que os exemplos de sua atuação Se o seu regime não frutificou não foi por sua culpa mas por uma extraordinária e extrema maldade da fortuna Alexandre VI tinha grandes dificuldades presentes e futuras para fazer a grandeza de seu filho duque Em pri quando conquistado o ducado de Urbino invadiu a Toscana empresa da qual o rei o fez desistir Daí ter o duque deliberado não depender mais das armas e da fortuna alheia A primeira coisa que fez foi debilitar as facções Orsini e Colonna em Roma atraindo todos os seus partidários fidalgos tornandoos seus gentishomens dandolhes grandes somas e honrados segundo suas qualidades com comandos de tropas e cargos de governo assim em poucos meses a afeição deles por seus antigos partidos apagouse em seus ânimos voltandose inteiramente para o duque Apesar disso aguardou a ocasião de eliminar os chefes dos Orsini tendo já dispersado os da casa Colonna ocasião esta que se bem lhe chegou melhor ele a usou Isto porque os Orsini tendo tardiamente percebido que a grandeza do duque e da Igreja significavam sua própria ruína promoveram uma dieta em Magione próximo a Perugia de que resultou a rebelião de Urbino os tumultos da Romanha e infinitos perigos para o duque que ele superou com a ajuda dos franceses Recuperando sua reputação e não confiando nem na França nem em outras forças externas para não as provocar abertamente recorreu à astúcia E tão bem soube dissimular seu ânimo que os próprios Orsini por intermédio do senhor Paulo reconciliarme com ele O duque para tranquilizálos cumulouos de favores dandolhes dinheiro roupas e cavalos tanto assim que a ingratidão dos Orsini os levou a se colocarem à sua mercê em Sengiallia Aniquilados portanto esses chefes e convertidos os seus partidários em amigos do duque havia sete lançado excelentes fundamentos para seu poder uma vez que detinha toda a Romanha e mais o ducado de Urbino além de ter conquistado a amizade da Romanha e atraído para si todo o povo que começava a gozar de bemestar Sendo este ponto digno de comentários e de ser imitado por outros não quero deixálo passar por alto Tendose apoderado da Romanha e encontradoa sob o comando de senhores sem poder que mais espoliavam os seus súditos do que governavam e lhes davam motivos mais para desunião do que para união tanto que a província estava coberta de latrocínios tumultos e todas as formas possíveis de insolência julgou o duque necessário para pacificála e reduzila à obediência ao braço régio darlhe um bom governo Colocou ali então messer Remirro de Orco homem cruel e expedito a quem conferiu plenos poderes Em pouco tempo Orco a pacificou e uniu granjeando grande reputação A seguir o duque julgou desnecessário tanta autoridade pois temia que ela se tornasse odiosa e propôs a instalação de um tribunal civil na província com um excelentíssimo presidente onde todas as cidades teriam um advogado próprio Como sabia que os rigores passados haviam gerado um certo ódio contra ele quis mostrar que se ocorrera alguma crueldade ela não se originava dele mas da natureza dura do ministro para apaziguar os ânimos do povo a atrailo para si Aproveitandose da ocasião uma certa manha mandou que o cortassem ao meio em praça pública tendo ao lado um bastão de madeira e uma faca ensanguentada A ferocidade duquesa e espetacular fez o povo frio ao mesmo tempo satisfez e estarecido Recapitulando portanto todas as ações do duque eu não saberia em que censurálo Pelo contrário pareceme como aliás o fiz dever propôlo como exemplo a todos aqueles que com a fortuna e as armas de outrem ascendem ao poder Tendo de ânimo forte e intenção elevada não poderia ter agido de outra maneira Contraririam os seus desígnios somente a brevidade da vida de Alexandre e sua própria enfermidade Quem portanto num principado novo julgar necessário garantirse contra os inimigos conquistar amigos vencer pela força ou pela fraude fazerse amado e temido pelo povo ser obedecido e reverenciado pelos soldados eliminar aqueles que podem ou devem prejudicálo introduzir mudanças na antiga ordem ser severo e grato magnânimo e liberal eliminar as milícias ínfias ciri outras novas manter as amizades do rei e dos príncipes de modo que o beneficiem com solicitude e temam ofendêlo não pode encontrar melhor exemplo que as ações deste duque Somente se lhe pode censurar a eleição do papa Júlio na qual fez uma má escolha porque como disse se não podia fazer um papa a seu modo podia impedir que outro fosse papa não deveria jamais ter consentido que ascendesse ao papado cardeais que ele próprio tivesse prejudicado ou que tornandose pápas pudessem temêlo Porque os homens fizeram por medo ou por ódio Dentro os que ele havia ofendido estavam entre outros os cardeais de San Pietro in Vincoli Colonna San Giorgio Ascânio todos os outros caso se tornassem papas teriam motivos para temêlo exceto o Ruão e os espanhóis estes últimos por união e obrigações pelo poder tendo à sua lado o reino de França Portanto o duque antes de qualquer CAPÍTULO VII Dos que Chegaram ao Principado por Atos Criminosos Como ainda existem dois modos de se passar de simples particular a príncipe que não se devem apenas na fortuna nem à virtù pareceme que não se deve deixar de abordálos embora um deles possa ser discutido mais amplamente onde se tratar de repúblicas Estes dois modos são ou ascender ao principado por via acelerada e nefanda ou um cidadão particular tornarse príncipe de sua pátria com o favor de seus concidadãos Falando sobre o primeiro modo mostraremos dois exemplos um antigo e outro moderno sem entrar porém no mérito desta questão considerandoos suficientes a quem precisar imitálos Agátocles Siciliano não só simples particular mas de ínfima e abjeta condição tornouse rei de Siracusa Filho de oleiro teve sempre uma conduta criminosa durante toda a vida Contudo praticava várias vilanias com tanta força e dignidade de corpo que ingressando na milícia conseguiu promoverse até chegar a ser pretor de Siracusa Investido nesse cargo decidiu tornarse príncipe e pela violência e sem obrigações para com outros que só por consentimento lhe havia sido concedido Tendo travado entendimentos a respeito destes seus desígnios com Amílcar o Cartaginês cujos exércitos acamparam na Sicília reuniu certa manha o povo e o Senado de Siracusa como se tivesse deliberado coisas pertinentes à república e a um sinal combinado fez seus soldados assassinarem todos os senadores e as pessoas mais ricas do povo Mortos estes ocupou e manteve o principado daquela cidade sem qualquer controvérsia civil Embora os cartagineses o derrotassem duas vezes e por fim os sitiássem não apenas pôde defender sua cidade mas ainda deixando parte de suas tropas na defesa contra o cerco atacou com o restante a África e em breve tempo liberou Siracusa do cerco levando os cartagineses à extrema miséria Estes tiveram que entrar em acordo com ele e contentarse com suas possessões na África deixando a Sicília para Agátocles Quem considerar portanto suas ações e sua vida não verá coisa alguma ou pouca que se possa atribuir à fortuna como se disse acima não pela favor de alguém mas passando por todos os postos da milícia através de mil perigos e desastres chegou ao principado que depois conservou em meio a tantas animosidades e perigos Não se pode propriamente chamar de virtù o fato de assassinar seus concidadãos trailos amigos não ter piedade nem religiosidade Deste modo podese adquirir poder mas não a glória Mas se consideramos a virtù com que Agátocles enfrentou e saiu dos perigos e a força de seu ânimo ao suportar e superar as adversidades não vemos por que ele deve ser julgado como inferior à qualquer excelente capitão Contudo essa feroz crueldade e desumanidade mais a sua infinita malvadez não permitem que seja celebrado entre os homens excelentes Não se pode portanto atribuir a fortuna ou a virtù o que sem uma nem outra foi conseguido entrenamentos de praxe Livretto de caso pensado pôsse a discutir certos assuntos graves falando da grandeza do papa Alexandre de Cesare seu filho assim como de suas campanhas Quando Giovanni e outros responderam ele subitamente se ergueu dizendo que aquilo era assunto para se falar em um lugar mais reservado e retirouse para um quarto onde Giovanni e todos os demais o seguiram Mal se haviam sentado quando saíram de um esconderijo alguns soldados que assassinaram Giovanni e todos os outros Depois do homicídio Livretto montou a cavalo e percorreu a cidade Atacou o governo no palácio o qual com medo foi forçado a obedecêlo e a nomeálo príncipe Depois de assassinar todos os que por estarem descontentes poderiam atacálo consolidouse com novas leis civis e militares de modo que ao fim de um ano durante o qual manteve o principado não somente estava seguro na cidade de Fermo como ainda se tinha tornado temido por todos os vizinhos Sua derrota teria sido difícil como a de Agátocles caso não se tivesse deixado enganar por Cesare Borgia quando este como disse antes capturou Orsini e os Vitelli em Senigallia onde juntamente com Vitellozzo que havia sido seu mestre de virtù e malvadezas foi também preso e estrangulado Olivertotto um ano depois de haver cometido parricídio Poderia alguém perguntarse de que forma Agátocles e outros semelhantes após infinitas traições e crueldades puderam viver seguros em sua pátria não por atos criminosos nem outras violências intoleráveis tá da crueldade mal empregada ou bem empregada São bem empregadas as crueldades e é legítimo falar bem do mal que se fazem de uma só vez pela necessidade de garantirse e depois não se insiste mais em fazêlas mas rendem o máximo possível de utilidade para os súditos Mal empregadas são aquelas que ainda que de início sejam poucas crescem com o tempo ao invés de se extinguirem Aqueles que observam o primeiro modo podem encontrar algum remédio para seu estado diante de Deus e dos homens como aconteceu com Agátocles os outros é impossível que se mantenham Daí ser preciso sublinhar que ao tomar um estado o conquistador deve examinar todas as ofensas que precisa fazer para perpetuálas todas de uma só vez e não ter de renoválas todos os dias Não as repetindo pode incutir confiança nos homens e ganhar seu apoio através de benefícios Quem age de outro modo por timidez ou mau conselho precisa estar sempre com a faca na mão nada podendo jamais confiar em seus súditos como tampouco podem eles confiar no príncipe devido às suas contínuas e renovadas injúrias As injúrias devem ser feitas a fim de que tornandose menos o seu gosto ofendam menos enquanto os benefícios devem ser feitos pouco a pouco para serem melhor apreciados E acima de tudo deve um príncipe viver com seus súditos de forma que nenhum incidente mau ou bom faça variar seu comportamento porque vindo as vicissitudes em tempos adversos não terás tempo para o mal e o bem que fizeres não te será creditado porque julgarão que o fizeste forçado e não receberás então a gratidão de ninguém chega ao principado com a ajuda dos grandes mantémse com mais dificuldade do que o que se torna príncipe com a ajuda do povo porque o primeiro se vê cercado de muitos que parecem ser seus iguais não podendo por isso comandálos nem manejálos a seu modo Mas quem chega ao principado com o favor popular encontrase sozinho e não tem em torno de si ninguém ou pouquíssimos que não estejam prontos a obedecêlo Além disso não se pode satisfazer honestamente aos grandes sem injúrias aos outros mas ao povo sim porque seus fins são mais honestos que os dos grandes visto que estes querem oprimir enquanto aqueles querem não ser oprimidos Além disso um príncipe não pode jamais protegerse contra a inimizade do povo porque são muitos no entanto podese garantir contra os grandes porque são poucos O pior que um príncipe pode esperar de um povo hostil é ser abandonado por ele mas dos grandes quando inimigos deve temer não só ser abandonado como também que o ataquem porque tendo mais visão e astúcia precaverseão sempre a tempo de se salvar e procuram aproximarse daquilo que em revancha vencêlos Ainda o príncipe tem sempre de viver com o mesmo povo mas lhe é perfeitamente possível prescindir dos mesmos grandes pois pode a cada dia fazêlos e desfazêlos darlhes e tirálos a prerrogativa a seu gosto quando o estado tem necessidade dos cidadãos encontramse poucos Esta experiência é ainda mais perigosa por se poder tentarna uma só vez Por isso um príncipe sábio deve encontrar um modo pelo qual seus cidadãos sempre e em qualquer tempo tenham necessidade do estado e daí assim eles sempre lhe serão fiéis CAPÍTULO X De que Forma se Devem Avaliar as Forças de todos os Príncipes Ao avaliar as qualidades destes principados convém observar uma outra questão um príncipe dispõe de território suficiente para poder governar por si mesmo ou se precisa sempre ser defendido por outros Para melhor esclarecer este ponto direi que defino os princípios que podem governarse por si mesmos como os que por abundância de homens ou de dinheiro são capazes de formar um exercício bem proporcionado e travar batalha com quem quer que os ataque Eu defino os que têm sempre necessidade de outrem como os que não podem enfrentar o inimigo em campanha mas precisam refugiarse atrás dos muros e defenderlos Do primeiro caso já falamos e futuramente mostraremos o que mais for necessário Sobre o segundo caso nada se pode dizer além de extrair esses princípios a fortificarem e armarem suas próprias cidades sem se preocuparem com o resto do território Que fortificar bem a sua cidade e se comportar em relação aos seus súditos do modo como dito acima é como mais de direita seguir somento como temor a qualidade do inimigo precavendose com destreza contra os que parecerem exageradamente ousados Além disso o inimigo deve presumivelmente incendiar guém que tenha suas terras fortificadas e não seja odiado pelo povo As cidades da Alemanha são muito livres tem território pequeno obedecendo quando operam em perto com medo em ele nem a outros poderosos que estejam ao redor pois são de tal maneira fortificadas que todos percebem como deve ser exaustivo e difícil expulnálas Todas possuem fosso e muros adequados têm artilharia suficiente têm sempre bebidas alimentos e combustíveis nos depósitos públicos para o prazo de um ano Além disso para manter a plebe alimentada sem prejuízo para a coletividade têm sempre na comuna trabalhos para lhe dar durante um ano naquelas atividades que são o nervo e a vida da cidade e com os quais a plebe subsiste Mantêm ainda em grande conta os exercícios militares havendo vários ordenamentos sobre a sua prática Um príncipe portanto que tem uma cidade forte e não se faz alterar não pode ser atacado Contudo se alguém o atacar terá de partir com vergonha pois as coisas do mundo são tão mutáveis que é quase impossível que alguém possa ficar ocioso durante um ano com seus exercícios a assediálo A quem replicar que caso o povo tenha propriedades do lado de fora e as veja incendiandose perderá a paciência e que o longo assédio somado ao amor próprio farão com que esqueça do príncipe respondo que um príncipe forte e corajoso sempre superará todas essas dificuldades dando a seus súditos a esperança de que o mal não será longo ora o temor a qualidade do inimigo precavendose com destreza contra os que parecerem exageradamente ousados Além disso o inimigo deve presumivelmente incende conseguiu expulsála da Itália e arruinar os venetianos não me pareceria supérfluo recordar estas coisas embora sejam conhecidas CAPÍTULO XII De Quantos Gêneros Há de Milícias e de Soldados Mercenários Tendo discorrido especificamente acerca de todas as características daqueles principados sobre os quais me propus de início a refletir e tendo considerado as razões da sua prosperidade ou ruína e depois mostrado os modos através dos quais procuraram conquistálos e conserválos restame agora falar de uma maneira geral sobre os meios ofensivos e defensivos que possan CAPÍTULO XI Dos Principados Eclesiásticos Agora restanos somente discorrer sobre os principados eclesiásticos cujas dificuldades são todas anteriores à sua posse porque se conquistam ou por virtù ou por fortuna e sem uma nem outra se mantêm pois têm por base antigas instituições religiosas de tamanho poder de natureza tal que conservam seus príncipes no poder qualquer que seja o modo como procedam e vivam sem temor a Deus nem probidade para com os homens O príncipe apenas terá adiada a sua derrota pelo tempo que for adiado o ataque sendo esfoliado por ele na paz e pelos inimigos na guerra A razão disto é que não têm outro paixão nem razão que os mantenha em campo senão um pequeno soldo que ainda não é suficiente para motiválos a morrer por ti Querem muito ser teus soldados enquanto não há guerra mas durante a guerra querem fugir ou ir embora Issoetri pouca dificuldade para demonstrar visto que a ruína atual da Itália não tem outra razão senão estar há muitos anos apoiada em armas mercenárias Estas já prestaram alguns bons serviços a alguns e parecem valentes quando comparadas umas às outras mas diante do forasteiro mostraram aquilo que são daí ter sido possível a Carlos rei de França tomar a Itália com um giz Quem disse que a razão disso eram os nossos pecados disse a verdade porém não aqueles que imaginava mas os que acabou de expor E visto serem pecados dos príncipes também foram eles que sofreram a punição Quero demonstrar melhor a ineficácia destas armas Os capitães mercenários ou são homens excelentes nas armas ou não o são E so forem não poderás confiar neles porque sempre aspirarão a uma grandeza própria arruinando a ti seu patrão quer oprimindo a outros contra a tua vontade e se não forem capitães valorosos por isso te mesmo te arruinarão Se alguém arruinará a ti quanto tenha um exército nas farras ou se mesmo sendo ou não mercenário respondendo àquele que vem sendo como um príncipe ou por uma república O príncipe deve de especialmente em pessoa a função de capitão A república da voltaram suas ambições para outros lugares O que não venceu foi Giovanni Acuuti cuja disposição não se pode conhecer visto não ter vencido Devese reconhecer porém que se tivesse sido vitorioso os florentinos teriam ficado à sua mercê Sforza teve sempre contra si os partidários de Braccci controlandose mutuamente Francesco canalizou sua ambição para a Lombardia e Braccio contra a Igreja e o reino de Nápoles Mas voltamos ao que aconteceu há pouco Os florentinos nomearam Paolo Vitelli seu capitão um homem muito prudente que como cidadão particular havia alcançado imensa reputação Se ele tivesse derrotado Pisa não há dúvida de que os florentinos teriam de conserválo pois se ele passasse para o lado de seus inimigos estariam perdidos conservandoo porém teriam que lhe obedecer Quanto aos venezianos se examinarmos seus avanços veremos que se portaram segura e gloriosamente enquanto fizeram a guerra por si próprios isto é antes de orientarem seus empreendimentos para a terra firme quando agiram muito valorosamente como o auxílio dos gentishomens e da plebe Porém quando começaram a combater em terra perderam esta virtude e seguiram os costumes bélicos da Itália No início de sua expansão não tendo muito território era uma grande reputação pouco tinham a temer de seus capitães Porém quando se expandiram o que ocorreu sob Carmignuola tiveram uma prova desse erro porque sabendo que ele era valoroso já sob seu comando tinham derrotado o duque de Milão mas vendo por outro lado como ele havia se tornado frio em relação à guerra julgaram não poder mais vencer com ele pois lhe faltava ânimo Mas também não podiam dispensálo sob pena de tornarem a perder o que haviam conquistado por isso tiveram de matálo para se garantirem Tiveram depois como capitão Bartolomeo di Bergamo Ruberto da San Severino conde di Pitigliano e outros similares dos quais tinham que temer as derrotas e não as vitórias como aconteceu mais tarde em Valia onde perderam o que em dezoito anos e com tanta fadiga haviam conquistado Porque dessas armas nascem algumas conquistas lentas tardias e débeis e perdas súbitas e miraculosas E como cheguei com estes exemplos à Itália que durante muitos anos foi governada pelas armas mercenárias quero discorrer mais genericamente sobre o assunto para que conhecendo suas origens e desenvolvimento melhor se possa corrigir o erro de usálas Temos de entender portanto como nestes últimos tempos desde que o Império começou a ser repelido da Itália e o papa adquirir mau reputação na esfera temporal dividiuse a Itália em maior número de estados Isto ocorreu porque muitas das grandes cidades tomaram armas contra seus nobres os quais favorecidos pelos imperadores antes as mantinham oprimidas a Igreja as ajudava para aumentar sua reputação na esfera temporal ao mesmo tempo em muitas outras cidades certos cidadãos se fizeram príncipes A partir daí tendo a Itália caído quase inteiramente em mãos da Igreja e de algumas repúblicas e sendo os padres e aqueles outros cidadãos pouco habituados ao manejo de armas começouse a contratar estrangeiros a soldo O primeiro que granjeou reputação nessas milícias foi Alberigo da Coni de Romana Da sua disciplina descendem entre outros Braccio e Sforza que no seu tempo foram árbritos da Itália Depois destes viram todos os outros que forças que não são destes Os florentinos estando inteiramente desarmados levaram dez mil francesas a Pisa para tomála decisão pela qual enfrentaram mais perigos do que em qualquer época de adversidade O imperador de Constantino para se contrapor aos seus vizinhos pôs na Grécia dez mil turcos os quais finda a guerra não quiseram sair este foi o início da servidão da Grécia aos infiéis Logo quem quiser não poder vencer deverá valerse desses exercícios porque são muito mais perigosos do que os mercenários No caso dos auxiliares a ruína é inevitável pois são todos unidos e voltados à obediência a outrem enquanto os mercenários para te molestar mesmo tendo sido vencedores precisariam de mais tempo e melhores ocasiões pois não formam um corpo e são organizados e pagos por ti Assim ainda que um terceiro venha a ser nomeado chefe por ti não poderá de repente alcançar tanta autoridade a ponto de aborrecerem Em resumo nos exercícios mercenários o mais perigoso é a covardia nos auxiliares a virtude Logo um príncipe sábio sempre evitará estes exercícios valendose dos seus próprios e preferindo até perder com suas tropas a vencer com tropas alheias por não considerar verdadeira a vitória alcançada com armas alheias Não hesitarei em citar Cesare Borgia e suas ações Este duque entrou na Romanha com exercícios auxiliares compostos inteiramente de franceses e com eles tomou Faênza e Furli Mais tarde não lhe parecendo seguros esses exercícios tentou os tratos mercenários julgandoos menos perigosos e atreveuse a soldo Orsini e Vitelli que mais tarde desempenhou e percebeu na prática que eram de início inúteis Voltouse então para um exercício próprio Podese facilmente verificar a diferença entre um tipo de exército e outro considerando a diferença que ocorreu na reputação do duque quando disputinha só dos franceses para quando tinha Osini e Vitelli e finalmente quando passou a ter próprios soldados e se senhor de si mesmo Sua reputação foi crescendo e nunca foi tão elevada como no momento em que todos viram que ele era o senhor absoluto de seus exercícios Não queria afastarme dos exemplos italianos recentes mas também não posso deixar de falar em Hierão de Siracusa anteriormente citado por mim Como eu disse colocado pelos siracusanos à frente dos exercícios este logo percebeu que eram inúteis as milícias mercenárias por serem os seus chefes do mesmo tipo dos nossos italianos Julgando não poder conserválas nem afastálas fezlas em pedaços guerreadas a partir dai com exercícios próprios e não com alheios Quero ainda evocar a memória de uma figura do Velho Testamento a este propósito Oferecendose Davi a Saul para combater Golias agitador filisteu Saul equipouo com suas armas para darlhe ânimo Ao experimentálas porém Davi as recusou dizendo que com elas não poderia bem valerse de si mesmo em vez disso queria enfrentar o inimigo com sua funda e seu punhal Enfim os exercícios dos outros ou te caem pelas costas ou te pesam ou te apertam Carlos VII pai do rei Luís XI tendo com sua fortuna e virtude liberado a França dos ingleses sentiu necessidade de armáse de exercícios próprios e não de um seu reino e ordem de guardar as infantes Mais tarde o rei Luís seu filho extinguiu a infantaria e começou a contratar suiços a soldo erro Um dos louvores que os escritores fazem a Filipêmnes príncipe dos aqueus é que nos tempos de paz não pensava senão nos métodos de guerra quando estava nos campos com os amigos muitas vezes parava a lhes perguntar Se os inimigos estivessem em cima daquele monte e nós aqui embaixo qual de nós estaria em vantagem Como se poderia atacálos conservando a nossa formação Se quiséssemos bater em retirada como teríamos de fazer Se eles batessem em retirada como faríamos para perseguílos E caminhando apresentavalhes todos os casos que poderiam acontecer a um exército ouvia a opinião deles expunha a sua corroboravaa com razões de tal modo que através destas contínuas reflexões não pudesse jamais surgirlhe no comando do exército imprevisto algum para o qual não tivesse uma solução Um príncipe sábio deve observar comportamento semelhante e jamais permanecer ocioso nos tempos de paz e sim com engenho fazer deles um cabedal para dele se valer na adversidade a fim de que quando mudar a fortuna esteja sempre pronto a lhe resistir CAPÍTULO XV Das Coisas pelas quais os Homens e Especialmente os Príncipes São Louvados ou Vituperados Resta agora ver como deve comportarse um príncipe para com seus súditos ou seus amigos Como sei que muitos já escreveram sobre este assunto temo que escrevendo eu também seja considerado presunçoso sobretudo porque ao discutir esta matéria me afastarei das linhas traçadas pelos outros Porém sendo meu intento escrever algo útil para quem me ler pareceme mais conveniente procurar a verdade efetiva do que uma imaginação sobre ela Muitos imaginaram repúblicas e principados que jamais foram vistos e que nem se soube se existiram na verdade porque há tamanha distância entre como se vive e como se deveria viver que aquele que trocar o que se faz por aquilo que se deveria fazer aprende antes sua ruína do que sua preservação pois um homem que queria fazer bem das coisas precisa de bondade deve arruinarse entre tantos que não são bons Daí ser necessário a um príncipe se quiser manterse aprender a poder não ser bom e a e valer ou não isto segundo a necessidade CAPÍTULO XVI Da Liberalidade e da Parcimônia Assim começando pelas primeiras das qualidades anteriormente citadas afirmo que seria bom ser considerado liberal No entanto a liberalidade usada de maneira ostensiva e prejuízo mas usada com virtude como deve ser não se torna notória e não livra da infâmia de ser tido como o contrário Contudo desejando manter diante dos homens a reputação de liberal precisará não dispensar nenhuma espécie de suntuosidade de tal modo que nessas condições um príncipe sempre gastará nessas obras todas as suas disponibilidades necessitando ao fim se quiser manter o conceito de liberal onerar violentamente o povo ser cruel nos impostos e fazer tudo o que for necessário para obter dinheiro Isto começará a tornálo odioso diante dos hipócritas e malquistos por todos tornandose pobre assim tendo sua liberalidade ofendido a muitos e premido a poucos será odiado pelo primeiro revés e alçado pelo último E tornarse conhecendo disto e quiser voltar atrás logo incorrerá na fama de miserável O Príncipe Capítulo XVI CAPÍTULO XVII Da Crueldade e da Piedade e se É Melbor Ser Amado que Temido ou Melbor Ser Temido que Amado Res dura et regninoitas me talia cogunt Moliri et late fines custode tueri Tanto é verdade que suas outras virtù não lhe seriam suficientes que basta tomar o exemplo de Capião homem raríssimo não somente em sua época mas também na memória das coisas que se sabem Quando seus exercícios se revoltaram na Espanha não foi por outra causa senão sua excessiva clemência que havia concedido aos seus soldados maior permissividade do que convém à disciplina militar Este procedimento foi censurado no Senado por Fábio Massimo que o chamou de corruptor da milícia romana Os lícros que tinham sido destruídos por um subordinado de Capião não foram vingados por ele nem foi punida a insolência daquele comando tudo isso em decorrência de sua natureza tão complacente Querendo justificálo alguém disse que como ele havia muitos homens que mais sabiam não errar do que corrigir os erros alheios Esta natureza teria com o tempo deteriorado a fama e a glória de Capião caso ele tivesse continuado com ela no comando Mas subordinandose à direção do Senado não só encobriu esta sua característica prejudicial como também esta lhe acresceu a glória Assim voltando à questão sobre ser temido e amado concludo que como os homens amam segundo sua vontade e temem segundo a vontade do príncipe deve este contar com o que é seu e não com o que é de outros empenhandose apenas em evitar o ódio como dissemos Visto que um príncipe se necessitar precisa saber usar bem a natureza animal deve escolher a raposa e o leão porque o leão não tem defesa contra os laços nem a raposa contra os lobos Precisa portanto ser raposa para conhecer os laços e leão para aterrorizar os lobos Os que fizerem simplesmente a parte do leão não serão bemsucedidos Assim um príncipe prudente não pode nem deve guardar a palavra dada quando isso se torna prejudicial ou quando deixa de existir as razões que o haviam levado a prometêla Se os homens fossem todos bons este preceito não seria bom mas como são maus e não têm sua palavra consigo não tens também que cumprir a tua Também faltam ao príncipe razões legítimas para descumprir sua falta de palavra Sobre isto poderíamos dar infinitos exemplos modernos e mostrar quantos pactos e quantas promessas se tornaram inúteis e vãs por causa da infidelidade dos príncipes Quem melhor se sai é quem melhor sabe valerse das qualidades da raposa Mas é necessário saber disfarçar bem essa natureza e ser grande simulado e dissimulador pois os homens são tão simples e obedecem tanto às necessidades presentes que o enganador encontrará sempre que se deixe enganar Tendo discordado sobre as qualidades mais importantes entre as enunciadas anteriormente das outras quero falar brevemente sobre a generalidade em parte já mencionada de que um príncipe deve procurar evitar as coisas que o tornam odioso e desprezível com o que terá cumprido a sua parte e não correrá perigo algum de outras infâmias Como afirmei antes tornao odioso sobretudo ser rapace e usurpador das coisas e das mulheres dos súditos do que se deve abster pois os homens em geral vivem contentes enquanto deles não se toma o patrimônio nem a honra restando ao príncipe apenas ter que combater a ambição de uns poucos a qual pode ser refeita de muitas maneiras e com facilidade Tornao desprezível ser muito inconstante leviano efeminado pusilânime e irresoluto coisa que um príncipe deve evitar como os escolhos devendo empenharse para que em suas ações reconheça grandeza ânimo ponderação e energia Em sua atuação junto às intrigas privadas dos súditos o que conta por fim são os resultados Cuide pois o príncipe de vencer e manter o estado os meios serão sempre julgados honrosos e louvados por todos porque o vulgo está O príncipe que infunde esta ideia de si mesmo é altamente reputado e dificilmente se conspira contra as pessoas bem reputadas como também dificilmente é atacado visto que todos sabem ser ele estimado e reverenciado pelos seus governo daquela cidade que foi governada por ele até que messer Giovanni chegasse à idade apropriada ao governo Novamente concluo que um príncipe deve valorizar os grandes mais não se fazer odiar pelo povo Para manter com segurança o seu estado alguns príncipes desarmaram seus súditos outros mantiveram os territórios divididos alguns fomentaram inimizades contra si mesmos outros procuraram conquistar os que lhes pareciam suspeitos no início de seu governo alguns construíram fortalezas outros as arruinaram e destruíram No entanto ainda que todas essas coisas não possam ser julgadas em definitivo sem se conhecerem as particularidades dos estados onde é necessário tomar tais decisões falarei delas de maneira genérica como requer o assunto Jamais existiu um príncipe novo que desarmasse os seus súditos pelo contrário encontrandoos desarmados sempre os arma porque ao lhes dar armas estes armamse suas tornamse fiéis do que em seus peitos conservamse leais os que já e transformamse os súditos em teus partidários Como não se podem armar todos os súditos ao beneficiar alguns com suas armas podes estar mais seguro diante de demais A diversidade de tratamento em relação aos primeiros tornaos reconhecidos a ti e os demais te desclupam julgando necessitar ter maiores privilégios quem enfrentou Pertinax morto pelos soldados pretorianos Com esse pretexto e sem mostrar que aspirava ao governo deslou seu exército contra Roma chegando à Itália antes mesmo que se soubesse de sua partida Entrando em Roma foi eleito Imperador pelo Senado intimidade e Julião foi morto Depois desse início restavam a Severo dois obstáculos até se apoderar de todo o estado um na Ásia onde Pecêncio Negro chefe dos exercícios asiáticos se havia proclamado imperador e outro no ocidente onde estava Albinos que também pretendia o Império Considerando perigoso demonstrar inimizade a ambos deliberou atacar Negro e enganar Albino Escreveu a este último que tendo sido eleito imperador pelo Senado desejava partilhar com ele esta dignidade envioulhe o título de César e por deliberação do Senado tomouo como colega coisas que Albino aceitou como verdadeiras Mas depois que Severo venceu e matou Negro e consolidou sua situação no oriente retornou a Roma queixandose ao Senado de que Albino mal reconhecido pelos benefícios que dele havia recebido tinha dolosamente procurado assassinálo e por este motivo faziase necessário punir sua ingratidão Foi em seguida à sua procura na França onde o tirou o estado e a vida Logo quem examinar minuciosamente seus atos reconhecerá nele um ferocíssimo leão e uma astúcia raposa e verá que foi temido e reverenciado por todos e não odiado pelo exército não sendo surpresa que de origem modesta tenha conseguido conquistar tamanho império porque sua altíssima reputação sempre o protegeu contra o ódio que sua rapidez poderia ter acendido no povo a razão da ruína dos imperadores citados compreendese também o motivo por que procedendo uma parte deles de um modo e outra parte do modo inverso alguns deles tiveram um fim feliz e outros um fim infeliz Compreendese também por que para Pertinax e Alexandre sendo príncipes novos foi inútil e danoso querer imitar Marco que estava ao princípio jure hereditario da mesma forma por que Caracalla Cómodo e Massimino foi pernicioso imitaram Severo por não terem virtù suficiente para reproduzir suas pegadas Portanto um príncipe novo em um principado novo não pode imitar as ações de Marco nem lhe é necessário seguir as de Severo mas deve tomar de Severo aqueles aspectos que lhe sejam necessários para fundar o seu estado e de Marco os que forem convenientes para conservar com glória um estado que já esteja estabilizado e seguro maiores perigos e tem mais obrigações Mas quando os desarmas comes a ofendêlos mostrando desconfiar deles por vileza ou máfé e uma outra dessas opiniões faz com que se acenda o ódio contra ti Como não podes ficar desarmado precisas valerte dos exercícios mercenários que são do tipo que descrevi acima e mesmo que fossem bons não o seriam suficientemente para defenderte dos inimigos poderosos e dos súditos suspeitos Por isso como afirmei um príncipe novo em um principado novo sempre cria exercícios as histórias estão repletas de exemplos disso Quando um príncipe porém conquista um estado novo que é anexado ao seu estado antigo fazse necessário desarmar aquele estado exceto os que te apoiaram na conquista mesmo estes com o tempo e ocasionalmente será preciso tornálos fracos e efeminados de modo que todos os exercícios naquele estado inteiro sejam compostos dos teus próprios soldados que viviam próximos de ti no teu estado antigo Costumavam os nossos antepassados e os que eram considerados sábios dizer que era necessário manter Pistóia com as lutas de facções e Pisa com as fortalezas Por isso suas cidades alimentavam os conflitos entre suas cidades súditas para dominaras mais facilmente Nos tempos em que a Itália era de certo modo equilibrada este devia ser um bom meio mas não acredito que atualmente se possa fazer disso uma norma porque não creio que as divisões tragam jamais algum bem Aliás quando o inimigo se aproxima as cidades dividiamse costumam renderse logo porque sempre a parte mais fraca se alia às forças externas e a outra não pode governar Movidos como creio pelas razões acima os venetianos favoreceram os partidos guelfos e gibelinos em suas cidades súditas Ainda não deixavam jamais chegar ao derramamento de sangue alimentavam os conflitos entre elas a fim de que ocupados com suas diferenças seus cidadãos não se unissem contra eles O que como se viu mais tarde não atendeu a seu propósito pois sendo derrotados em Vailà logo uma parte delas animouse e lhes tomou tudo Demonstraram tais políticas portanto a fraqueza do príncipe pois num principado poderoso não se permitem jamais tais divisões já que são previstos apenas em tempos de paz podendose por meio delas manipular mais facilmente os súditos mas quando vem a guerra esta política mostra a sua falácia Sem dúvida os príncipes se tornam grandes quando superam as dificuldades e oposições que lhes são feitas Por isso a fortuna sobretudo quando quer enaltecer um príncipe novo que tem maior necessidade de elevar sua reputação do que um príncipe hereditário crialhe inimigos e movimentos de oposição para que ele tenha oportunidade de superarlós e possa por meio da escada colocada por seus inimigos subir mais alto Muitos acreditam que um príncipe sábio deva apresentandose à ocasião fomentar com astúcia alianças inimizadas para que vencendoas obtenha consequentemente maior grandeza Têm os príncipes e sobretudo os novos encontrado maior fidelidade e serventia nos homens que ao início de seu principado lhes eram suspeitos do que naqueles que no começo lhes inspiravam confiança Pandolfo Petrucci príncipe de Siena governou seu estado mais com
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O Príncipe Nicolau Maquiavel Coleção Clássicos Política Martins Fontes O PRÍNCIPE O PRÍNCIPE Nicolau Maquiavel Tradução MARIA JÚLIA GOLDWASSER Revisão ROBERTO LEAL FERREIRA Martins Fontes São Paulo 2001 Índice IX Do princípio civil 43 X De que forma se devem avaliar as forças de todos os principados 49 XI Dos principados eclesiásticos 53 XII De quantos gêneros há de milícias e de soldados mercenários 57 XIII Dos exércitos auxiliares mistos e próprios 63 XIV Do que compete a um príncipe acerca da milícia 69 XV Das coisas pelas quais os homens e especialmente os príncipes são louvados ou viltuperados 73 XVI Da liberalidade e da parcimônia 75 XVII Da crueldade e da piedade e se é melhor ser amado que temido ou melhor ser temido que amado 79 XVIII De que modo devem os príncipes manter a palavra dada 83 XIX Como se deve evitar ser desprezado e odiado 87 XX Se as fortalezas e muitas outras coisas que os príncipes fazem diariamente são úteis ou não 99 XXI O que convém a um príncipe para ser estimado 105 XXII Dos secretários que os príncipes mantém junto de si 111 XXIII Como evitar os aduladores 113 XXIV Por que razões os príncipes da Itália perderam seus Estados 117 XXV De quanto pode a fortuna com coisas humanas e de que modo se pode resistirlhe 119 XXVI Exortação a tomar a Itália e libertála das mãos dos bárbaros 123 Ao magnífico Lorenzo de Medici 129 Apêndice Maquiavel e Marx 131 Notas 157 Prefácio Dentre os textos que são tidos como imortais este livrinho ocupa um lugar à parte e acredito que único Nada impede que seja repelido como um ensaio mau inspirado por um espírito de cinismo ou de escândalo Nada obriga a ver nele um dos textos maiores da literatura política O que é impossível tanto hoje quanto no primeiro dia é largálo antes de têlo lido até o fim é pôlo de lado com indiferença O príncipe não conservou sua juventude muitas obras mereceriam este elogio banal O príncipe conservou seu poder de fascínio Sei disso mas não estou certo de saber por quê Ocorreme uma primeira resposta O príncipe é um livro cuja aparente clareza deslumbra e cujo mistério os eruditos e os simples leitores tentam em vão esclarecer Que queria dizer Maquiavel A quem queria dar aulas aos reis ou aos povos De que lado se colocava Do lado dos tiranos ou do lado dos republicanos Ou de nenhum dos dois Hoje não estamos em situação de conservar a interpretação fascinante original de JeanJacques Rousseau Numa nota de O contrato social ele diz que Maquiavel era um homem honesto e um bom cidadão mas estanz do ligado a casa dos Medici era obrigado em meio à opressão de sua pátria a disfarçar o seu amor à liberdade Só a escolha de seu execrável rei Cesare Borgia já é suficiente para mostrar sua secreta intenção e a oposição das máximas de seu livro sobre O príncipe às de seu Discurso sobre Tito Lívio e da História de Florença demonstra que este profundo político só veio até agora leitores superficiais e corrompidos A corte de Roma proibia severamente o livro entendese já que é ela que o livro descreve mais claramente Mas não é isso Não há contradição entre O príncipe e o Discurso Maquiavel amava a liberdade e nem mesmo disfarçava seu amor Mas para fundar um principado novo ou livrar a Itália dos bárbaros a liberdade de um povo corrompido teria sido impotente Quem analisa à maneira de Aristóteles os meios necessários para manter a tirania nem por isso a aprova e menos ainda aprova a degradação dos costumes que a tornou possível ou inevitável Essa busca da verdadeira significação de O príncipe ou da intenção última de Maquiavel não se detém tão rapidamente Ela é propriamente dialética Toda resposta a uma questão suscita novas questões e talvez não pode deixar de ter feito inimizados de modo que a lição deste relato Não hesitemos sob o risco de perdição em traduzila para linguagem abstrata Para trazer de volta a paz e fundar uma ordem numa região entregue ao bandidismo o chefe cruel e eficaz satisfaz às necessidades Mas faça posterior com a paz já de volta o sábio presidente de um Tribunal civil substitui com vantagem o homem cruel e eficaz E como este último não pode ter deixado de ter feito inimizados o melhor é sacrificálo a cólera do povo ingratido de modo que o príncipe Cesare Borgia no caso pareça inocente das crueldades cometidas em seu nome Como se opor a razões tão convincentes Talvez de fato seja impossível oporse a elas Mas tampouco é fácil subscrevêlas A técnica do bode expiatório não é desconhecida nas sociedades arcaicas Incontestavelmente ela pode ser vantajosa para os príncipes Basta que ela tenha feito sucesso na maior parte dos casos para que o médico do corpo social tenha o direito de recomendála Afirmo portanto que os estados que depois de conquistados são anexados a um antigo estado de que um conquistou ou não é Se forem será fácil conserválos principalmente se não estiverem habituados a viver livres Para possuílos com segurança basta extinguir a dinastia do príncipe que os dominava Chamaremos de preceito operacional o conselho dado ao príncipe novo de não mandar matar todos os membros da antiga família reinante O conselho é tão bom a curto prazo e no plano da eficácia quanto o de mandar matar ao servidor que ao mesmo tempo restabelece a ordem por meios eficazes e sutis dós Sendo os homens o que são os preceitos que a experiência do mundo sugere não coincidem com os que os moralistas ensinam Imediatamente a interrogação surge Maquiavel não se comprometer em sugerir que os meios politicamente eficazes contradizem o ensinamento da Igreja Pela escolha de seu herói não era uma adesão mesmo hesitante do que seria de desejar ao que foi chamado de governo à florentina É bem verdade que todos os Estados nasceram da violência e por conseguinte os fundadores de Estados os que ergueram ou reergueram esses frágeis monumentos as cidades humanas estão condenados à violência Mas pela maneira com que defende e ilustra esses arquitetos da história Maquiavel incita ao vício ou à virtude ao maquiavelismo ou à República Referese de quando em quando à Igreja para camuflar o cinismo de seu ensinamento ou para dar livre curso a seus sentimentos recalcados pelas obrigações da verdadeira científica Enfim Maquiavel tinha intenções maquiavélicas dissimulando pela metade uma política decididamente imoral apresentandoa às vezes como baseada em constatações objetivas às vezes como culpa das inevitáveis Afinal de contas os observadores podem interpretar a experiência histórica de modo totalmente diferente de Maquiavel sem no entanto estarem cegos ao êxito da crueldade e do crime Jacques Maritain utiliza contra o maquiavelismo a consideração da duração histórica O bem temporal em que frutifica a justiça do estado o mal temporal em que frutifica sua iniquidade podem ser e na verdade são inteiramente diferentes dos resultados imediatos que o espírito humano podia prever e que os olhos humanos contemplam É tão difícil destrinçar as ações causais afastadas quanto discernir na embocadura de um rio de que geleiras ou de que afluentes provêm esta ou aquela porção de suas águas Maritain também não me convence Apenas me faz lembrar que a leitura maquiavélica da história não é a única possível e que essa leitura deriva de certa intenção Qual Eisnos numa encruzilhada pois várias respostas são possíveis A leitura era imposta pelas circunstâncias pelo projeto científico pelas buscas das origens ou pela atenção às situações extremas pelo pessimismo quanto à natureza humana pelo ardor republicano e pela vontade de uma nova Itália livre dos bárbaros Todas estas respostas foram dadas por um ou outro crítico E qualquer que seja a resposta o debate continua banal e indefinido a política é ação e a ação tende ao êxito Se é tão difícil o príncipe renunciar ao sucesso Sujar as mãos Sacrificar a salvação de sua alma pela salvação da cidade Onde se detém no caminho que não pode deixar de tomar Que mentira recuará se precipita sua coragem confessando a verdade Escrevo no mês de março de 1962 Há três anos e meio uma República caía porque era incapaz de conservar a Argélia para a França Os fundadores da República seguinte prosseguiram obstinadamente a política cuja veleidade acusavam aos antigos dirigentes de alimentarem Mas se era preciso gritar Argélia francesa para trazer de volta o general De Gaulle ao poder e se este retorno ao Élysée do solitário de Colombey era indispensável para o bem público aqueles que engenharam seus fiéis e o povo sobre seus objetivos não desonraram enfim seu nome e serviram o Estado Ou devemos dizer que os príncipes que nos governam não podem servir o Estado se faltam com sua honra Mas quem será juiz de sua honra E o povo os acusará de enganação no dia em que esta tiver sido bemsucedida Maquiavel teve a coragem de ir até o fim de uma lógica de ação contra a qual o leitor procura abrigo em interrogações sem resposta Raymond Aron Cronologia Vida e Obra de Maquiavel 1469 3 de maio Nasce em Florença Niccolò Machiavelli Nicolau Maquiavel filho de Bernardo advogado e de Bartolomeo de Nelli poeta amo rador Terceiro de quatro filhos Niccolò é educado em ambiente culto e relativamente abastado Herdou do pai uma vocação para os estudos históricos e jurídicos que viriam a desempenhar um papel essencial em seus futuros interesses políticos 1469 Morre Pietro de Medici sendo sucedido por seu filho Lorenzo o Magnífico 1476 Maquiavel iniciase no estudo da matemática e do latim 1477 Por suas qualidades precoces Maquiavel é confiado à escola de Battista da Poppi na igreja de San Benedetto 1478 Por ocasião da Congiura de Pazzi morre Giuliano de Medici irmão de Lorenzo 1481 Maquiavel passa para a escola de um conhecido latinista Paolo de Ronciglione como ao qual estud nos aprofundamentos sobre latinos não há informações de que tivesse estudado o grego 1490 O frade dominicano Gerolamo Savonarola já ativo em Florença de 1482 a 1487 volta para a cidade e retoma suas pregações provocando amplas adesões populares 1492 Morre Lorenzo de Medici sendo sucedido por seu filho Piero 14711503 Com a morte de Inocêncio III é eleito papa Alexandre VI Borgia 1494 setembrodezembro Avançando suas pretensões sobre o reino de Nápoles Carlos VIII rei da França chega à Itália e entra também em Florença Piero de Medici é expulso da cidade sob a acusação de ter aceito sem nenhuma hesitação as onerosas exigências do soberano francês e os habitantes de Florença proclamam a República Gerolamo Savonarola aproveitase da situação para tornarse árbitro da vida florentina 1495 É provável que seja deste ano ou dos anos imediatamente posteriores a transcrição que Maquiavel fez de próprio punho do De rerum natura de Lucrécio encontrada há pouco tempo num código vaticano O documento revela uma visão materialista do mundo oposto ao espiritualismo de Savonarola Outubro Os senhores da cidade da Romanha formam uma coalizão contra o duque Valentino Dietta della Maggione e Maquiavel é enviado para Senigalla a fim de acompanhar os movimentos de Borgia As cartas enviadas aos Dez mostram a perspicácia com que Maquiavel procura penetrar os propósitos do duque e seu ceticismo em relação à intenção de paz atribuída a Borgia 1503 janeiro Cesare Borgia depois de atrair em emboscada na cidade de Senigalia os exconspiradores da Maggione mataos sem nenhuma piedade Maquiavel presencia o fato e ao voltar de sua missão elaborou a impassível Descrizione del modo tenuto dal Duca Valentino nello ammazzare Vitellozzo Vitelli Olivertotto da Fermo il signor Paolo e il duca de Gravina Orsini Descrição do comportamento do duque Valentino ao matar Vitellozzo Vitelli Olivertotto da Fermo o senhor Paolo e o duque de Gravina Orsini Junho Encarrregado por Pier Soderini de organizar as forças militares para colocar um fim à guerra contra Pisa e para dominar as insurreições de Arezzo e da Valdichiana Maquiavel resume seu pensamento em dois relatórios Parole da dire sopra la proïvitione del denaio e Del modo di trattare i popoli della Valdichiana ribellati Palavras que quero dizerlhe a respeito da provisão do dinheiro e Do modo de tratar os povos rebeldes da Valdichiana No primeiro relatório destacase o desenvolvimento de um conceito que se tornará fundamental em sua especulação política a necessidade da força as armas e ao mesmo tempo da pruden cia uma inteligente estratégia política para levar a bom termo toda e qualquer ação de governo No segundo há uma importante menção à teoria da história como magistra vitae Agosto Morre o papa Alexandre VI o pai do duque Valentino e apenas dois meses mais tarde 18 de outubro o seu sucessor Pio III Outubro Maquiavel é enviado a Roma para acompanhar o novo conselho Desfazse o mito de Cesare Borgia que atormentado por uma grave doença não consegue se opor à eleição de Giuliano della Rovere ao qual confiando em fingidas promessas termina concedendo também o próprio apoio Eleito papa e já com o nome de Júlio II Giuliano retira de Borgia a sustentação da Igreja No relatório enviado a Florença Maquiavel julga com palavras duras o incerto comportamento de Cesare Borgia mas a experiência borgiana se transforma numa etapa fundamental no desenvolvimento de suas concepções políticas 1504 janeiro Maquiavel é enviado à França para definir os termos da aliança com Luís XII Outono Escreve o Decennale primo uma crônica em versos dos acontecimentos italianos entre 1494 chegada de Carlos VIII na Itália e 1504 queda de Cesare Borgia 1505 março Maquiavel completa duas missões exploratórias a procura de novas alianças em Mantua junto aos Gonzaga e em Siena junto a Pandolfo Petrucci 12 de setembro Florença será doravante sob as fortificações da cidade de Pisa devido à força 1507 dezembro Maquiavel é enviado em sinal de apoio a Francesco Vettori como observador na região de Tirolo junto a Maximiliano de Habsburgo reivindicando Trieste e Fiume ocupadas pelos venezianos tencionava vir para a Itália confiando no apoio do papa Por sua vez Júlio II estava empenhando em organizar a coalizão de Estados europeus contra Veneza Liga de Cambrai que se recusava a deixar alguns territórios do Estado pontifício O dever do chanceler é negociar um tributo a ser oferecido ao imperador para que seja assegurada a integridade do domínio florentino 1508 junho De volta a Florença escreve Rapporto delle cose della Magna Relatório das coisas da Alemanha condensando em 1509 o Discorso sopra le cose dellAlemagna e sopra limperatore Discurso a respeito das coisas da Alemanha e do imperador e remajenado em 1512 no Ritratto delle cose della Magna Retrato das coisas da Alemanha 10 de dezembro É firmada a Liga de Cambrai Florença que figura entre os signatários obtém forças suficientes para debar a resistência de Pisa Como organizador das forças militares Maquiavel participa ativamente do empreendimento um trabalho de pacificação urbanan enviando um apelo ao partido dos Medici Ricordo ai Palleschi para que não exceda em crueldade contra o gonfaloneiro derrotado 16 de setembro O governo republicano é desfeito e com o apoio do papa os Medici voltam para a cidade Maquiavel não consegue escapar ao expurgo da organização estatal 7 de novembro Dispensado de todos os seus encargos Maquiavel é condenado a pagar uma fiança de 1000 florins de ouro além disso por doze meses se vê proibido de entrar no Palazzo Vecchio 1513 fevereiro Sob suspeita de participar de um complô contra os Medici Maquiavel é preso e torturado Reconhecido inocente e colocado em liberdade retirase para SantAndrea in Percussina na villa conhecida como LAlbergaccio Morre Júlio II Seu sucessor é o cardeal Giovanni Medici sob o nome de Leão X Ao deixar Florença este deixa em seu lugar o sobrinho Lorenzo II 14921519 filho de Piero 10 de dezembro Numa carta ao embaixador florentino Francesco Vettori Maquiavel anuncia Escrevi um livro De principatibus O príncipe onde me aprofundo o mais que posso nos argumentos do assunto acima investigando o que é principado o que especifei como se conquistam como se mantêm por que se perdem A obra é dedicada a Lorenzo II de Medici 1º de dezembro Morre Adriano VI sendo sucedido por Leão X 1523 Com a morte de Adriano VI Giulio de Medici é eleito papa assumindo o nome de Clemente VII 1524 O cardeal Ippolito de Medici filho natural de Giuliano de Nemours é senhor de Florença 1525 janeirofevereiro Maquiavel escreve uma segunda comédia Clizia 24 de fevereiro Francisco I rei da França é derrotado em Pavia pelas tropas imperiais de Carlos V Fim de maio Encontrase em Roma para oferecer a Clemente VII as Histoire florentine Expõe ao papa um novo projeto de tropas nacionais mostrando a necessidade de contrapor uma forte milícia italiana aos exércitos estrangeiros acampados na planície padana norte da Itália Três meses antes em 24 de fevereiro Francisco I rei da França havia sido derrotado em Pavia pelas tropas imperiais de Carlos V Agosto De volta a Florença Maquiavel obtém a reabilitação completa de seus cargos políticos É enviado em missão a Veneza Liga de Cognac contra Carlos V que congrega papa França Veneza e Milão Em abrilmaio o papa enviando o Conde Pietro de Navarra a inspecionar as fortificações florentinas coloca a seu lado Maquiavel Após um primeiro relatório sobre a situação das fortificações Maquiavel viaja para Roma onde recebe o encargo de adotar todas as medidas necessárias para a segurança da cidade Junho Maquiavel colabora em Florença para a constituição de um conselho de defesa os Cinco 21 de junho Despojado de todos os seus cargos da nova República morre pobre em Florença chorado apenas por poucos amigos do cenáculo dos Orti Oricellari No dia seguinte é enterrado em Santa Croce Nota desta Edição A presente edição baseiase no texto e no aparelho crítico estabelecidos por Bruna Cordati para a Ed Loescher Torino As notas foram selecionadas e traduzidas por Maria Júlia Goldwasser e Roberto Leal Ferreira O Editor O PRÍNCIPE CAPÍTULO I De Quantos Tipos São os Principados e de que Modo se Adquirem Todos os estados todos os domínios que tiveram e têm poder sobre os homens foram e são ou repúblicas ou principados Os principados ou são hereditários nos quais o sangue de seu senhor vem governando há longo tempo ou são novos Os novos ou são inteiramente novos como Milão sob Francesco Sforza ou são como membros anexos ao estado hereditário do príncipe que se adquire como é o caso do reino de Nápoles em relação ao rei da Espanha Os domínios assim formados estão habitados ou a viver sob um príncipe ou a ser livres E se adquirem ou com armas de outrem ou com as próprias graças a fortuna ou à virtude Não tratarei aqui das repúblicas porque em outra ocasião discorri longamente sobre o assunto Ocupareimeei somente dos principados e retomando o raciocínio anterior discutirei de que forma podem ser governados e mantidos pelos seus Com a antiguidade e a continuidade do poder apagamse as lembranças e as razões das alterações pois sempre uma mudança deixa preparadas as fundações da outra É bem verdade que adquiridos pela segunda vez os países rebelados se perdem com mais dificuldade pois diante de uma rebelião o senhor agirá com menos timidez para determinar a punição dos traidores identificar os suspeitos e reforçar seus pontos mais fracos porque é necessário ou fazer isto ou manter bastante gente em armas e infantaria Nas colônias não se gasta muito com pouca ou nenhuma despesa elas são enviadas ou mantidas prejudicando somente a minoria cujos campos e casas são confiscados para serem dados aos novos habitantes Como os preconceitos ficam dispersos e pobres não podem incomodar e todos os demais não ofendidos devem com isso inquietarse além de temer que les aconteça o mesmo que se deu com os que foram espoliados Concluo enfim que essas colônias nada custam são mais fies e menos ofensivas e os espoliados não podem fazer nada visto que estão pobres e dispersos como foi dito Dai se há de observar que os homens devem ou ser mimados ou aniquilados porque se é verdade que podem vingarse das ofensas leves das grandes não o podem por isso a ofensa que se fizer a um homem deverá ser de tal ordem que não se tema a vingança Mantendose tropas em vez de colônias despendese muito mais gastandose com elas todas as receitas do estado e a conquista se transforma em prejuízo Além do mais isso desconta muito mais os habitantes porque a transferência do exercício com os alojamentos causa danos a todo o estado Todos se ressentem desse incômodo tornandose cada qual um inimigo e são inimigos que podem incomodar pois embora derrotados permanecem em sua casa De todas as maneiras portanto essa milícia é tão inútil quanto são proveitosas as colônias quem domina uma província diferente como disse por língua costumes e leis deve ainda fazerse chefe e defensor dos vizinhos mais fracos empenharse em enfraquecer os poderosos de sua província e cuidar coisas e pode trazer consigo tanto o bem como o mal e tanto o mal como o bem Nas províncias conquistadas os romanos observaram perfeitamente esses aspectos formaram colônias apoiaram os menos poderosos sem aumentar seu poder rebaixaram os poderosos e não deixaram que estrangeiros fortes alcançassem reputação Quero citar apenas um exemplo da província da Grécia os venezianos apoiaram os aqueus e os etíolos abateram o reino dos macedônios rechaçaram Antíoco jamais os ajudaram dos aqueles ou dos etíolos fizeram com que lhes permitissem obter qualquer estado nem tampouco os argumentos de Felipe os induziram a serem seus amigos em so enfraquecer e lamente Cesare Borgia filho do papa Alexandre ocupava a Romana Dizendome o cardeal que os italianos não entendiam de guerra respondilhe que os franceses não entendiam de estado porque se entendessem não teriam permitido que a Igreja alcançasse tanta grandeza Por experiência viuse que o fortalecimento da Igreja e da Espanha na Itália foi causado pela França e que a ruína da França foi causado por elas De onde se extrai uma regra que nunca o romano erra arruinouse porque esse poder é dado ou pela astúcia ou pela força e ambas são suspeitas a quem se torna poderoso Exemplos destas duas modalidades de governo são em nossos tempos o grãoturco e o rei de França A monarquia turca inteira é governada por um só senhor sendo os demais seus vassalos e esse senhor dividindo o seu reino em sandjaques para lá envia administradores diversos que substitui ou demite como bem lhe apraz O rei de França ao contrário está cercado de uma quantia cide antigas famílias de senhores reconhecidas e amadas por seus súditos em seus próprios estados e detentores de privilégios que o rei não lhes pode arrebatar sem perigo Assim quem considerar esses dois estados encontrará dificuldade em conquistar o estado do grãoturco porém vencendoo terá grande facilidade em conserválo Ao contrário sob todos os aspectos encontrará também maior facilidade em ocupar a França porém grande dificuldade em mantêla eles foram esquecidos graças à potência e continuidade do império é que se tornaram proprietários seguros E depois conseguiram ainda combatendo entre si tomar cada qual uma parte daquelas províncias segundo a autoridade que tivessem alcançando dentro delas pois desaparecido o sangue de seus antigos senhores as províncias só reconheciam a autoridade dos romanos Consideradas portanto todas essas coisas não é de surpreender a facilidade com que Alexandre conquistou a Ásia nem as dificuldades que tiveram outros para manter suas conquistas como Pirro e muitos mais o que não nasce da muita ou pouca virtù do vencedor mas da diversidade do sujeito possulas exceto a ruína Quem se torna senhor de uma cidade habitada a viver livre e não a destruir será destruído por ela porque ela sempre lembrará na rebelião o nome de sua liberdade e de sua antiga ordem as quais nem o passar do tempo nem os benefícios jamais farão esquecer Não importa o que se fez ou as precauções que se tomarem se não se dispersarem os habitantes eles não esquecerão aquele nome e a ordem ao menor incidente os recordarão como aconteceu em Pisa após cem anos de submissão aos forasteiros Mas quando as cidades ou as províncias estão habituadas a viver sob o governo de um príncipe e seu sangue desaparece estando de um lado acostumados a obedecer e de outro não tendo mais esse antigo príncipe não chegam a um acordo para eleger outro e não sabem viver em liberdade por isso são mais lentos em tomar armas e com mais facilidade poderá um príncipe conquistálas e conserválas em seu poder Nas repúblicas há mais vida mais ódio mais desejo de vingança Ali a recordação da antiga liberdade não as deixa não as pode deixar em paz e por isso o meio seguro para possuílas é ou destruílas ou as habitarlas Que ninguém se espante se ao falar dos principados inteiramente novos quanto ao príncipe e ao governo eu recorrer a exemplos muito grandes Os homens trilham quase sempre caminhos abertos por outros e pautam suas ações sobre essas imitações embora não possam repetir tudo na vida dos imitados nem igualar sua virtù Um homem prudente deve sempre seguir os caminhos abertos pelos grandes homens e espelharse nos que foram excelentes Mesmo não alcançando sua virtù deve pelo menos mostrar algum indício dela e fazer como os arqueiros prudentes que julgando muito distantes os alvos que pretendem alcançar e conhecendo bem o grau de exatidão de seu arco orientam a mira para bem mais alto que o lugar destinado não por medo da altura com flechas mas por meio de mira tão elevada alcançar o objetivo organizado de modo que quando não acreditarem mais seja possível fazêlos ceder a força Moisés Ciro Teseu e Rômulo não teriam conseguido que suas constituições fossem obedecidas por tanto tempo se estivessem desarmados Em nossos tempos foi o que aconteceu ao frei Girolamo Savonarola¹ que se arruinou com sua derrocada nova a partir do momento em que a multidão começou a não acreditar nela pois ele não dispunha de meios nem para manter firmes os que haviam acreditado nem para fazer crer os descrentes Homens assim enfrentam grandes dificuldades defrontandose em seu caminho com perigos que precisam ser superados com a virtù Depois de vencerem esses perigos e passarem a ser venerados tendo aniquilado o que tinham inveja de suas qualidades tornamse poderosos seguros honrados e felizes raizes e ramificações de modo que sucumbem na primeira tempestade A menos que como já disse aqueles que realmente se tornaram príncipes sejam de tanta virtù que saibam rapidamente se preparar para conservar aquilo que a fortuna lhes colocou nos braços e estabeleçam depois os fundamentos que outros estabeleceram antes de se tornarem príncipes Quero a cada um desses modos citados de tornarse príncipe por virtù ou por fortuna aduzir dois exemplos ainda em nossa memória que são Francesco Sforza e Cesare Borgia Francesco pelos devidos meios e uma grande virtù passou de cidadão privado a duque de Milão e o que havia conquistado com enorme empenho em pouco esforço manteve Por outro lado Cesare Borgia vulgamente chamado que Valentino conquistou o estado com a fortuna do pai e com ela o perdeu apesar de ter usado de todos os atos e de ter realizado todas as coisas que um homem prudente e valoroso deveria ter feito para deixar raízes em um estado que as armas e a fortuna de outros lhe haviam proporcionado Como disse acima quem não constrói os fundamentos antes poderá fazêlo depois se tiver grande virtù mas com maior dificuldade para o arquiteto e perigo para a construção Portanto se considerarmos todos os procedimentos do duque veremos que ele preparou amplos fundamentos para seu futuro poder sobre os quais não julgo superfluo discorrer visto que desconheço preceitos melhores para dar a um príncipe novo do que os exemplos de sua atuação Se o seu regime não frutificou não foi por sua culpa mas por uma extraordinária e extrema maldade da fortuna Alexandre VI tinha grandes dificuldades presentes e futuras para fazer a grandeza de seu filho duque Em pri quando conquistado o ducado de Urbino invadiu a Toscana empresa da qual o rei o fez desistir Daí ter o duque deliberado não depender mais das armas e da fortuna alheia A primeira coisa que fez foi debilitar as facções Orsini e Colonna em Roma atraindo todos os seus partidários fidalgos tornandoos seus gentishomens dandolhes grandes somas e honrados segundo suas qualidades com comandos de tropas e cargos de governo assim em poucos meses a afeição deles por seus antigos partidos apagouse em seus ânimos voltandose inteiramente para o duque Apesar disso aguardou a ocasião de eliminar os chefes dos Orsini tendo já dispersado os da casa Colonna ocasião esta que se bem lhe chegou melhor ele a usou Isto porque os Orsini tendo tardiamente percebido que a grandeza do duque e da Igreja significavam sua própria ruína promoveram uma dieta em Magione próximo a Perugia de que resultou a rebelião de Urbino os tumultos da Romanha e infinitos perigos para o duque que ele superou com a ajuda dos franceses Recuperando sua reputação e não confiando nem na França nem em outras forças externas para não as provocar abertamente recorreu à astúcia E tão bem soube dissimular seu ânimo que os próprios Orsini por intermédio do senhor Paulo reconciliarme com ele O duque para tranquilizálos cumulouos de favores dandolhes dinheiro roupas e cavalos tanto assim que a ingratidão dos Orsini os levou a se colocarem à sua mercê em Sengiallia Aniquilados portanto esses chefes e convertidos os seus partidários em amigos do duque havia sete lançado excelentes fundamentos para seu poder uma vez que detinha toda a Romanha e mais o ducado de Urbino além de ter conquistado a amizade da Romanha e atraído para si todo o povo que começava a gozar de bemestar Sendo este ponto digno de comentários e de ser imitado por outros não quero deixálo passar por alto Tendose apoderado da Romanha e encontradoa sob o comando de senhores sem poder que mais espoliavam os seus súditos do que governavam e lhes davam motivos mais para desunião do que para união tanto que a província estava coberta de latrocínios tumultos e todas as formas possíveis de insolência julgou o duque necessário para pacificála e reduzila à obediência ao braço régio darlhe um bom governo Colocou ali então messer Remirro de Orco homem cruel e expedito a quem conferiu plenos poderes Em pouco tempo Orco a pacificou e uniu granjeando grande reputação A seguir o duque julgou desnecessário tanta autoridade pois temia que ela se tornasse odiosa e propôs a instalação de um tribunal civil na província com um excelentíssimo presidente onde todas as cidades teriam um advogado próprio Como sabia que os rigores passados haviam gerado um certo ódio contra ele quis mostrar que se ocorrera alguma crueldade ela não se originava dele mas da natureza dura do ministro para apaziguar os ânimos do povo a atrailo para si Aproveitandose da ocasião uma certa manha mandou que o cortassem ao meio em praça pública tendo ao lado um bastão de madeira e uma faca ensanguentada A ferocidade duquesa e espetacular fez o povo frio ao mesmo tempo satisfez e estarecido Recapitulando portanto todas as ações do duque eu não saberia em que censurálo Pelo contrário pareceme como aliás o fiz dever propôlo como exemplo a todos aqueles que com a fortuna e as armas de outrem ascendem ao poder Tendo de ânimo forte e intenção elevada não poderia ter agido de outra maneira Contraririam os seus desígnios somente a brevidade da vida de Alexandre e sua própria enfermidade Quem portanto num principado novo julgar necessário garantirse contra os inimigos conquistar amigos vencer pela força ou pela fraude fazerse amado e temido pelo povo ser obedecido e reverenciado pelos soldados eliminar aqueles que podem ou devem prejudicálo introduzir mudanças na antiga ordem ser severo e grato magnânimo e liberal eliminar as milícias ínfias ciri outras novas manter as amizades do rei e dos príncipes de modo que o beneficiem com solicitude e temam ofendêlo não pode encontrar melhor exemplo que as ações deste duque Somente se lhe pode censurar a eleição do papa Júlio na qual fez uma má escolha porque como disse se não podia fazer um papa a seu modo podia impedir que outro fosse papa não deveria jamais ter consentido que ascendesse ao papado cardeais que ele próprio tivesse prejudicado ou que tornandose pápas pudessem temêlo Porque os homens fizeram por medo ou por ódio Dentro os que ele havia ofendido estavam entre outros os cardeais de San Pietro in Vincoli Colonna San Giorgio Ascânio todos os outros caso se tornassem papas teriam motivos para temêlo exceto o Ruão e os espanhóis estes últimos por união e obrigações pelo poder tendo à sua lado o reino de França Portanto o duque antes de qualquer CAPÍTULO VII Dos que Chegaram ao Principado por Atos Criminosos Como ainda existem dois modos de se passar de simples particular a príncipe que não se devem apenas na fortuna nem à virtù pareceme que não se deve deixar de abordálos embora um deles possa ser discutido mais amplamente onde se tratar de repúblicas Estes dois modos são ou ascender ao principado por via acelerada e nefanda ou um cidadão particular tornarse príncipe de sua pátria com o favor de seus concidadãos Falando sobre o primeiro modo mostraremos dois exemplos um antigo e outro moderno sem entrar porém no mérito desta questão considerandoos suficientes a quem precisar imitálos Agátocles Siciliano não só simples particular mas de ínfima e abjeta condição tornouse rei de Siracusa Filho de oleiro teve sempre uma conduta criminosa durante toda a vida Contudo praticava várias vilanias com tanta força e dignidade de corpo que ingressando na milícia conseguiu promoverse até chegar a ser pretor de Siracusa Investido nesse cargo decidiu tornarse príncipe e pela violência e sem obrigações para com outros que só por consentimento lhe havia sido concedido Tendo travado entendimentos a respeito destes seus desígnios com Amílcar o Cartaginês cujos exércitos acamparam na Sicília reuniu certa manha o povo e o Senado de Siracusa como se tivesse deliberado coisas pertinentes à república e a um sinal combinado fez seus soldados assassinarem todos os senadores e as pessoas mais ricas do povo Mortos estes ocupou e manteve o principado daquela cidade sem qualquer controvérsia civil Embora os cartagineses o derrotassem duas vezes e por fim os sitiássem não apenas pôde defender sua cidade mas ainda deixando parte de suas tropas na defesa contra o cerco atacou com o restante a África e em breve tempo liberou Siracusa do cerco levando os cartagineses à extrema miséria Estes tiveram que entrar em acordo com ele e contentarse com suas possessões na África deixando a Sicília para Agátocles Quem considerar portanto suas ações e sua vida não verá coisa alguma ou pouca que se possa atribuir à fortuna como se disse acima não pela favor de alguém mas passando por todos os postos da milícia através de mil perigos e desastres chegou ao principado que depois conservou em meio a tantas animosidades e perigos Não se pode propriamente chamar de virtù o fato de assassinar seus concidadãos trailos amigos não ter piedade nem religiosidade Deste modo podese adquirir poder mas não a glória Mas se consideramos a virtù com que Agátocles enfrentou e saiu dos perigos e a força de seu ânimo ao suportar e superar as adversidades não vemos por que ele deve ser julgado como inferior à qualquer excelente capitão Contudo essa feroz crueldade e desumanidade mais a sua infinita malvadez não permitem que seja celebrado entre os homens excelentes Não se pode portanto atribuir a fortuna ou a virtù o que sem uma nem outra foi conseguido entrenamentos de praxe Livretto de caso pensado pôsse a discutir certos assuntos graves falando da grandeza do papa Alexandre de Cesare seu filho assim como de suas campanhas Quando Giovanni e outros responderam ele subitamente se ergueu dizendo que aquilo era assunto para se falar em um lugar mais reservado e retirouse para um quarto onde Giovanni e todos os demais o seguiram Mal se haviam sentado quando saíram de um esconderijo alguns soldados que assassinaram Giovanni e todos os outros Depois do homicídio Livretto montou a cavalo e percorreu a cidade Atacou o governo no palácio o qual com medo foi forçado a obedecêlo e a nomeálo príncipe Depois de assassinar todos os que por estarem descontentes poderiam atacálo consolidouse com novas leis civis e militares de modo que ao fim de um ano durante o qual manteve o principado não somente estava seguro na cidade de Fermo como ainda se tinha tornado temido por todos os vizinhos Sua derrota teria sido difícil como a de Agátocles caso não se tivesse deixado enganar por Cesare Borgia quando este como disse antes capturou Orsini e os Vitelli em Senigallia onde juntamente com Vitellozzo que havia sido seu mestre de virtù e malvadezas foi também preso e estrangulado Olivertotto um ano depois de haver cometido parricídio Poderia alguém perguntarse de que forma Agátocles e outros semelhantes após infinitas traições e crueldades puderam viver seguros em sua pátria não por atos criminosos nem outras violências intoleráveis tá da crueldade mal empregada ou bem empregada São bem empregadas as crueldades e é legítimo falar bem do mal que se fazem de uma só vez pela necessidade de garantirse e depois não se insiste mais em fazêlas mas rendem o máximo possível de utilidade para os súditos Mal empregadas são aquelas que ainda que de início sejam poucas crescem com o tempo ao invés de se extinguirem Aqueles que observam o primeiro modo podem encontrar algum remédio para seu estado diante de Deus e dos homens como aconteceu com Agátocles os outros é impossível que se mantenham Daí ser preciso sublinhar que ao tomar um estado o conquistador deve examinar todas as ofensas que precisa fazer para perpetuálas todas de uma só vez e não ter de renoválas todos os dias Não as repetindo pode incutir confiança nos homens e ganhar seu apoio através de benefícios Quem age de outro modo por timidez ou mau conselho precisa estar sempre com a faca na mão nada podendo jamais confiar em seus súditos como tampouco podem eles confiar no príncipe devido às suas contínuas e renovadas injúrias As injúrias devem ser feitas a fim de que tornandose menos o seu gosto ofendam menos enquanto os benefícios devem ser feitos pouco a pouco para serem melhor apreciados E acima de tudo deve um príncipe viver com seus súditos de forma que nenhum incidente mau ou bom faça variar seu comportamento porque vindo as vicissitudes em tempos adversos não terás tempo para o mal e o bem que fizeres não te será creditado porque julgarão que o fizeste forçado e não receberás então a gratidão de ninguém chega ao principado com a ajuda dos grandes mantémse com mais dificuldade do que o que se torna príncipe com a ajuda do povo porque o primeiro se vê cercado de muitos que parecem ser seus iguais não podendo por isso comandálos nem manejálos a seu modo Mas quem chega ao principado com o favor popular encontrase sozinho e não tem em torno de si ninguém ou pouquíssimos que não estejam prontos a obedecêlo Além disso não se pode satisfazer honestamente aos grandes sem injúrias aos outros mas ao povo sim porque seus fins são mais honestos que os dos grandes visto que estes querem oprimir enquanto aqueles querem não ser oprimidos Além disso um príncipe não pode jamais protegerse contra a inimizade do povo porque são muitos no entanto podese garantir contra os grandes porque são poucos O pior que um príncipe pode esperar de um povo hostil é ser abandonado por ele mas dos grandes quando inimigos deve temer não só ser abandonado como também que o ataquem porque tendo mais visão e astúcia precaverseão sempre a tempo de se salvar e procuram aproximarse daquilo que em revancha vencêlos Ainda o príncipe tem sempre de viver com o mesmo povo mas lhe é perfeitamente possível prescindir dos mesmos grandes pois pode a cada dia fazêlos e desfazêlos darlhes e tirálos a prerrogativa a seu gosto quando o estado tem necessidade dos cidadãos encontramse poucos Esta experiência é ainda mais perigosa por se poder tentarna uma só vez Por isso um príncipe sábio deve encontrar um modo pelo qual seus cidadãos sempre e em qualquer tempo tenham necessidade do estado e daí assim eles sempre lhe serão fiéis CAPÍTULO X De que Forma se Devem Avaliar as Forças de todos os Príncipes Ao avaliar as qualidades destes principados convém observar uma outra questão um príncipe dispõe de território suficiente para poder governar por si mesmo ou se precisa sempre ser defendido por outros Para melhor esclarecer este ponto direi que defino os princípios que podem governarse por si mesmos como os que por abundância de homens ou de dinheiro são capazes de formar um exercício bem proporcionado e travar batalha com quem quer que os ataque Eu defino os que têm sempre necessidade de outrem como os que não podem enfrentar o inimigo em campanha mas precisam refugiarse atrás dos muros e defenderlos Do primeiro caso já falamos e futuramente mostraremos o que mais for necessário Sobre o segundo caso nada se pode dizer além de extrair esses princípios a fortificarem e armarem suas próprias cidades sem se preocuparem com o resto do território Que fortificar bem a sua cidade e se comportar em relação aos seus súditos do modo como dito acima é como mais de direita seguir somento como temor a qualidade do inimigo precavendose com destreza contra os que parecerem exageradamente ousados Além disso o inimigo deve presumivelmente incendiar guém que tenha suas terras fortificadas e não seja odiado pelo povo As cidades da Alemanha são muito livres tem território pequeno obedecendo quando operam em perto com medo em ele nem a outros poderosos que estejam ao redor pois são de tal maneira fortificadas que todos percebem como deve ser exaustivo e difícil expulnálas Todas possuem fosso e muros adequados têm artilharia suficiente têm sempre bebidas alimentos e combustíveis nos depósitos públicos para o prazo de um ano Além disso para manter a plebe alimentada sem prejuízo para a coletividade têm sempre na comuna trabalhos para lhe dar durante um ano naquelas atividades que são o nervo e a vida da cidade e com os quais a plebe subsiste Mantêm ainda em grande conta os exercícios militares havendo vários ordenamentos sobre a sua prática Um príncipe portanto que tem uma cidade forte e não se faz alterar não pode ser atacado Contudo se alguém o atacar terá de partir com vergonha pois as coisas do mundo são tão mutáveis que é quase impossível que alguém possa ficar ocioso durante um ano com seus exercícios a assediálo A quem replicar que caso o povo tenha propriedades do lado de fora e as veja incendiandose perderá a paciência e que o longo assédio somado ao amor próprio farão com que esqueça do príncipe respondo que um príncipe forte e corajoso sempre superará todas essas dificuldades dando a seus súditos a esperança de que o mal não será longo ora o temor a qualidade do inimigo precavendose com destreza contra os que parecerem exageradamente ousados Além disso o inimigo deve presumivelmente incende conseguiu expulsála da Itália e arruinar os venetianos não me pareceria supérfluo recordar estas coisas embora sejam conhecidas CAPÍTULO XII De Quantos Gêneros Há de Milícias e de Soldados Mercenários Tendo discorrido especificamente acerca de todas as características daqueles principados sobre os quais me propus de início a refletir e tendo considerado as razões da sua prosperidade ou ruína e depois mostrado os modos através dos quais procuraram conquistálos e conserválos restame agora falar de uma maneira geral sobre os meios ofensivos e defensivos que possan CAPÍTULO XI Dos Principados Eclesiásticos Agora restanos somente discorrer sobre os principados eclesiásticos cujas dificuldades são todas anteriores à sua posse porque se conquistam ou por virtù ou por fortuna e sem uma nem outra se mantêm pois têm por base antigas instituições religiosas de tamanho poder de natureza tal que conservam seus príncipes no poder qualquer que seja o modo como procedam e vivam sem temor a Deus nem probidade para com os homens O príncipe apenas terá adiada a sua derrota pelo tempo que for adiado o ataque sendo esfoliado por ele na paz e pelos inimigos na guerra A razão disto é que não têm outro paixão nem razão que os mantenha em campo senão um pequeno soldo que ainda não é suficiente para motiválos a morrer por ti Querem muito ser teus soldados enquanto não há guerra mas durante a guerra querem fugir ou ir embora Issoetri pouca dificuldade para demonstrar visto que a ruína atual da Itália não tem outra razão senão estar há muitos anos apoiada em armas mercenárias Estas já prestaram alguns bons serviços a alguns e parecem valentes quando comparadas umas às outras mas diante do forasteiro mostraram aquilo que são daí ter sido possível a Carlos rei de França tomar a Itália com um giz Quem disse que a razão disso eram os nossos pecados disse a verdade porém não aqueles que imaginava mas os que acabou de expor E visto serem pecados dos príncipes também foram eles que sofreram a punição Quero demonstrar melhor a ineficácia destas armas Os capitães mercenários ou são homens excelentes nas armas ou não o são E so forem não poderás confiar neles porque sempre aspirarão a uma grandeza própria arruinando a ti seu patrão quer oprimindo a outros contra a tua vontade e se não forem capitães valorosos por isso te mesmo te arruinarão Se alguém arruinará a ti quanto tenha um exército nas farras ou se mesmo sendo ou não mercenário respondendo àquele que vem sendo como um príncipe ou por uma república O príncipe deve de especialmente em pessoa a função de capitão A república da voltaram suas ambições para outros lugares O que não venceu foi Giovanni Acuuti cuja disposição não se pode conhecer visto não ter vencido Devese reconhecer porém que se tivesse sido vitorioso os florentinos teriam ficado à sua mercê Sforza teve sempre contra si os partidários de Braccci controlandose mutuamente Francesco canalizou sua ambição para a Lombardia e Braccio contra a Igreja e o reino de Nápoles Mas voltamos ao que aconteceu há pouco Os florentinos nomearam Paolo Vitelli seu capitão um homem muito prudente que como cidadão particular havia alcançado imensa reputação Se ele tivesse derrotado Pisa não há dúvida de que os florentinos teriam de conserválo pois se ele passasse para o lado de seus inimigos estariam perdidos conservandoo porém teriam que lhe obedecer Quanto aos venezianos se examinarmos seus avanços veremos que se portaram segura e gloriosamente enquanto fizeram a guerra por si próprios isto é antes de orientarem seus empreendimentos para a terra firme quando agiram muito valorosamente como o auxílio dos gentishomens e da plebe Porém quando começaram a combater em terra perderam esta virtude e seguiram os costumes bélicos da Itália No início de sua expansão não tendo muito território era uma grande reputação pouco tinham a temer de seus capitães Porém quando se expandiram o que ocorreu sob Carmignuola tiveram uma prova desse erro porque sabendo que ele era valoroso já sob seu comando tinham derrotado o duque de Milão mas vendo por outro lado como ele havia se tornado frio em relação à guerra julgaram não poder mais vencer com ele pois lhe faltava ânimo Mas também não podiam dispensálo sob pena de tornarem a perder o que haviam conquistado por isso tiveram de matálo para se garantirem Tiveram depois como capitão Bartolomeo di Bergamo Ruberto da San Severino conde di Pitigliano e outros similares dos quais tinham que temer as derrotas e não as vitórias como aconteceu mais tarde em Valia onde perderam o que em dezoito anos e com tanta fadiga haviam conquistado Porque dessas armas nascem algumas conquistas lentas tardias e débeis e perdas súbitas e miraculosas E como cheguei com estes exemplos à Itália que durante muitos anos foi governada pelas armas mercenárias quero discorrer mais genericamente sobre o assunto para que conhecendo suas origens e desenvolvimento melhor se possa corrigir o erro de usálas Temos de entender portanto como nestes últimos tempos desde que o Império começou a ser repelido da Itália e o papa adquirir mau reputação na esfera temporal dividiuse a Itália em maior número de estados Isto ocorreu porque muitas das grandes cidades tomaram armas contra seus nobres os quais favorecidos pelos imperadores antes as mantinham oprimidas a Igreja as ajudava para aumentar sua reputação na esfera temporal ao mesmo tempo em muitas outras cidades certos cidadãos se fizeram príncipes A partir daí tendo a Itália caído quase inteiramente em mãos da Igreja e de algumas repúblicas e sendo os padres e aqueles outros cidadãos pouco habituados ao manejo de armas começouse a contratar estrangeiros a soldo O primeiro que granjeou reputação nessas milícias foi Alberigo da Coni de Romana Da sua disciplina descendem entre outros Braccio e Sforza que no seu tempo foram árbritos da Itália Depois destes viram todos os outros que forças que não são destes Os florentinos estando inteiramente desarmados levaram dez mil francesas a Pisa para tomála decisão pela qual enfrentaram mais perigos do que em qualquer época de adversidade O imperador de Constantino para se contrapor aos seus vizinhos pôs na Grécia dez mil turcos os quais finda a guerra não quiseram sair este foi o início da servidão da Grécia aos infiéis Logo quem quiser não poder vencer deverá valerse desses exercícios porque são muito mais perigosos do que os mercenários No caso dos auxiliares a ruína é inevitável pois são todos unidos e voltados à obediência a outrem enquanto os mercenários para te molestar mesmo tendo sido vencedores precisariam de mais tempo e melhores ocasiões pois não formam um corpo e são organizados e pagos por ti Assim ainda que um terceiro venha a ser nomeado chefe por ti não poderá de repente alcançar tanta autoridade a ponto de aborrecerem Em resumo nos exercícios mercenários o mais perigoso é a covardia nos auxiliares a virtude Logo um príncipe sábio sempre evitará estes exercícios valendose dos seus próprios e preferindo até perder com suas tropas a vencer com tropas alheias por não considerar verdadeira a vitória alcançada com armas alheias Não hesitarei em citar Cesare Borgia e suas ações Este duque entrou na Romanha com exercícios auxiliares compostos inteiramente de franceses e com eles tomou Faênza e Furli Mais tarde não lhe parecendo seguros esses exercícios tentou os tratos mercenários julgandoos menos perigosos e atreveuse a soldo Orsini e Vitelli que mais tarde desempenhou e percebeu na prática que eram de início inúteis Voltouse então para um exercício próprio Podese facilmente verificar a diferença entre um tipo de exército e outro considerando a diferença que ocorreu na reputação do duque quando disputinha só dos franceses para quando tinha Osini e Vitelli e finalmente quando passou a ter próprios soldados e se senhor de si mesmo Sua reputação foi crescendo e nunca foi tão elevada como no momento em que todos viram que ele era o senhor absoluto de seus exercícios Não queria afastarme dos exemplos italianos recentes mas também não posso deixar de falar em Hierão de Siracusa anteriormente citado por mim Como eu disse colocado pelos siracusanos à frente dos exercícios este logo percebeu que eram inúteis as milícias mercenárias por serem os seus chefes do mesmo tipo dos nossos italianos Julgando não poder conserválas nem afastálas fezlas em pedaços guerreadas a partir dai com exercícios próprios e não com alheios Quero ainda evocar a memória de uma figura do Velho Testamento a este propósito Oferecendose Davi a Saul para combater Golias agitador filisteu Saul equipouo com suas armas para darlhe ânimo Ao experimentálas porém Davi as recusou dizendo que com elas não poderia bem valerse de si mesmo em vez disso queria enfrentar o inimigo com sua funda e seu punhal Enfim os exercícios dos outros ou te caem pelas costas ou te pesam ou te apertam Carlos VII pai do rei Luís XI tendo com sua fortuna e virtude liberado a França dos ingleses sentiu necessidade de armáse de exercícios próprios e não de um seu reino e ordem de guardar as infantes Mais tarde o rei Luís seu filho extinguiu a infantaria e começou a contratar suiços a soldo erro Um dos louvores que os escritores fazem a Filipêmnes príncipe dos aqueus é que nos tempos de paz não pensava senão nos métodos de guerra quando estava nos campos com os amigos muitas vezes parava a lhes perguntar Se os inimigos estivessem em cima daquele monte e nós aqui embaixo qual de nós estaria em vantagem Como se poderia atacálos conservando a nossa formação Se quiséssemos bater em retirada como teríamos de fazer Se eles batessem em retirada como faríamos para perseguílos E caminhando apresentavalhes todos os casos que poderiam acontecer a um exército ouvia a opinião deles expunha a sua corroboravaa com razões de tal modo que através destas contínuas reflexões não pudesse jamais surgirlhe no comando do exército imprevisto algum para o qual não tivesse uma solução Um príncipe sábio deve observar comportamento semelhante e jamais permanecer ocioso nos tempos de paz e sim com engenho fazer deles um cabedal para dele se valer na adversidade a fim de que quando mudar a fortuna esteja sempre pronto a lhe resistir CAPÍTULO XV Das Coisas pelas quais os Homens e Especialmente os Príncipes São Louvados ou Vituperados Resta agora ver como deve comportarse um príncipe para com seus súditos ou seus amigos Como sei que muitos já escreveram sobre este assunto temo que escrevendo eu também seja considerado presunçoso sobretudo porque ao discutir esta matéria me afastarei das linhas traçadas pelos outros Porém sendo meu intento escrever algo útil para quem me ler pareceme mais conveniente procurar a verdade efetiva do que uma imaginação sobre ela Muitos imaginaram repúblicas e principados que jamais foram vistos e que nem se soube se existiram na verdade porque há tamanha distância entre como se vive e como se deveria viver que aquele que trocar o que se faz por aquilo que se deveria fazer aprende antes sua ruína do que sua preservação pois um homem que queria fazer bem das coisas precisa de bondade deve arruinarse entre tantos que não são bons Daí ser necessário a um príncipe se quiser manterse aprender a poder não ser bom e a e valer ou não isto segundo a necessidade CAPÍTULO XVI Da Liberalidade e da Parcimônia Assim começando pelas primeiras das qualidades anteriormente citadas afirmo que seria bom ser considerado liberal No entanto a liberalidade usada de maneira ostensiva e prejuízo mas usada com virtude como deve ser não se torna notória e não livra da infâmia de ser tido como o contrário Contudo desejando manter diante dos homens a reputação de liberal precisará não dispensar nenhuma espécie de suntuosidade de tal modo que nessas condições um príncipe sempre gastará nessas obras todas as suas disponibilidades necessitando ao fim se quiser manter o conceito de liberal onerar violentamente o povo ser cruel nos impostos e fazer tudo o que for necessário para obter dinheiro Isto começará a tornálo odioso diante dos hipócritas e malquistos por todos tornandose pobre assim tendo sua liberalidade ofendido a muitos e premido a poucos será odiado pelo primeiro revés e alçado pelo último E tornarse conhecendo disto e quiser voltar atrás logo incorrerá na fama de miserável O Príncipe Capítulo XVI CAPÍTULO XVII Da Crueldade e da Piedade e se É Melbor Ser Amado que Temido ou Melbor Ser Temido que Amado Res dura et regninoitas me talia cogunt Moliri et late fines custode tueri Tanto é verdade que suas outras virtù não lhe seriam suficientes que basta tomar o exemplo de Capião homem raríssimo não somente em sua época mas também na memória das coisas que se sabem Quando seus exercícios se revoltaram na Espanha não foi por outra causa senão sua excessiva clemência que havia concedido aos seus soldados maior permissividade do que convém à disciplina militar Este procedimento foi censurado no Senado por Fábio Massimo que o chamou de corruptor da milícia romana Os lícros que tinham sido destruídos por um subordinado de Capião não foram vingados por ele nem foi punida a insolência daquele comando tudo isso em decorrência de sua natureza tão complacente Querendo justificálo alguém disse que como ele havia muitos homens que mais sabiam não errar do que corrigir os erros alheios Esta natureza teria com o tempo deteriorado a fama e a glória de Capião caso ele tivesse continuado com ela no comando Mas subordinandose à direção do Senado não só encobriu esta sua característica prejudicial como também esta lhe acresceu a glória Assim voltando à questão sobre ser temido e amado concludo que como os homens amam segundo sua vontade e temem segundo a vontade do príncipe deve este contar com o que é seu e não com o que é de outros empenhandose apenas em evitar o ódio como dissemos Visto que um príncipe se necessitar precisa saber usar bem a natureza animal deve escolher a raposa e o leão porque o leão não tem defesa contra os laços nem a raposa contra os lobos Precisa portanto ser raposa para conhecer os laços e leão para aterrorizar os lobos Os que fizerem simplesmente a parte do leão não serão bemsucedidos Assim um príncipe prudente não pode nem deve guardar a palavra dada quando isso se torna prejudicial ou quando deixa de existir as razões que o haviam levado a prometêla Se os homens fossem todos bons este preceito não seria bom mas como são maus e não têm sua palavra consigo não tens também que cumprir a tua Também faltam ao príncipe razões legítimas para descumprir sua falta de palavra Sobre isto poderíamos dar infinitos exemplos modernos e mostrar quantos pactos e quantas promessas se tornaram inúteis e vãs por causa da infidelidade dos príncipes Quem melhor se sai é quem melhor sabe valerse das qualidades da raposa Mas é necessário saber disfarçar bem essa natureza e ser grande simulado e dissimulador pois os homens são tão simples e obedecem tanto às necessidades presentes que o enganador encontrará sempre que se deixe enganar Tendo discordado sobre as qualidades mais importantes entre as enunciadas anteriormente das outras quero falar brevemente sobre a generalidade em parte já mencionada de que um príncipe deve procurar evitar as coisas que o tornam odioso e desprezível com o que terá cumprido a sua parte e não correrá perigo algum de outras infâmias Como afirmei antes tornao odioso sobretudo ser rapace e usurpador das coisas e das mulheres dos súditos do que se deve abster pois os homens em geral vivem contentes enquanto deles não se toma o patrimônio nem a honra restando ao príncipe apenas ter que combater a ambição de uns poucos a qual pode ser refeita de muitas maneiras e com facilidade Tornao desprezível ser muito inconstante leviano efeminado pusilânime e irresoluto coisa que um príncipe deve evitar como os escolhos devendo empenharse para que em suas ações reconheça grandeza ânimo ponderação e energia Em sua atuação junto às intrigas privadas dos súditos o que conta por fim são os resultados Cuide pois o príncipe de vencer e manter o estado os meios serão sempre julgados honrosos e louvados por todos porque o vulgo está O príncipe que infunde esta ideia de si mesmo é altamente reputado e dificilmente se conspira contra as pessoas bem reputadas como também dificilmente é atacado visto que todos sabem ser ele estimado e reverenciado pelos seus governo daquela cidade que foi governada por ele até que messer Giovanni chegasse à idade apropriada ao governo Novamente concluo que um príncipe deve valorizar os grandes mais não se fazer odiar pelo povo Para manter com segurança o seu estado alguns príncipes desarmaram seus súditos outros mantiveram os territórios divididos alguns fomentaram inimizades contra si mesmos outros procuraram conquistar os que lhes pareciam suspeitos no início de seu governo alguns construíram fortalezas outros as arruinaram e destruíram No entanto ainda que todas essas coisas não possam ser julgadas em definitivo sem se conhecerem as particularidades dos estados onde é necessário tomar tais decisões falarei delas de maneira genérica como requer o assunto Jamais existiu um príncipe novo que desarmasse os seus súditos pelo contrário encontrandoos desarmados sempre os arma porque ao lhes dar armas estes armamse suas tornamse fiéis do que em seus peitos conservamse leais os que já e transformamse os súditos em teus partidários Como não se podem armar todos os súditos ao beneficiar alguns com suas armas podes estar mais seguro diante de demais A diversidade de tratamento em relação aos primeiros tornaos reconhecidos a ti e os demais te desclupam julgando necessitar ter maiores privilégios quem enfrentou Pertinax morto pelos soldados pretorianos Com esse pretexto e sem mostrar que aspirava ao governo deslou seu exército contra Roma chegando à Itália antes mesmo que se soubesse de sua partida Entrando em Roma foi eleito Imperador pelo Senado intimidade e Julião foi morto Depois desse início restavam a Severo dois obstáculos até se apoderar de todo o estado um na Ásia onde Pecêncio Negro chefe dos exercícios asiáticos se havia proclamado imperador e outro no ocidente onde estava Albinos que também pretendia o Império Considerando perigoso demonstrar inimizade a ambos deliberou atacar Negro e enganar Albino Escreveu a este último que tendo sido eleito imperador pelo Senado desejava partilhar com ele esta dignidade envioulhe o título de César e por deliberação do Senado tomouo como colega coisas que Albino aceitou como verdadeiras Mas depois que Severo venceu e matou Negro e consolidou sua situação no oriente retornou a Roma queixandose ao Senado de que Albino mal reconhecido pelos benefícios que dele havia recebido tinha dolosamente procurado assassinálo e por este motivo faziase necessário punir sua ingratidão Foi em seguida à sua procura na França onde o tirou o estado e a vida Logo quem examinar minuciosamente seus atos reconhecerá nele um ferocíssimo leão e uma astúcia raposa e verá que foi temido e reverenciado por todos e não odiado pelo exército não sendo surpresa que de origem modesta tenha conseguido conquistar tamanho império porque sua altíssima reputação sempre o protegeu contra o ódio que sua rapidez poderia ter acendido no povo a razão da ruína dos imperadores citados compreendese também o motivo por que procedendo uma parte deles de um modo e outra parte do modo inverso alguns deles tiveram um fim feliz e outros um fim infeliz Compreendese também por que para Pertinax e Alexandre sendo príncipes novos foi inútil e danoso querer imitar Marco que estava ao princípio jure hereditario da mesma forma por que Caracalla Cómodo e Massimino foi pernicioso imitaram Severo por não terem virtù suficiente para reproduzir suas pegadas Portanto um príncipe novo em um principado novo não pode imitar as ações de Marco nem lhe é necessário seguir as de Severo mas deve tomar de Severo aqueles aspectos que lhe sejam necessários para fundar o seu estado e de Marco os que forem convenientes para conservar com glória um estado que já esteja estabilizado e seguro maiores perigos e tem mais obrigações Mas quando os desarmas comes a ofendêlos mostrando desconfiar deles por vileza ou máfé e uma outra dessas opiniões faz com que se acenda o ódio contra ti Como não podes ficar desarmado precisas valerte dos exercícios mercenários que são do tipo que descrevi acima e mesmo que fossem bons não o seriam suficientemente para defenderte dos inimigos poderosos e dos súditos suspeitos Por isso como afirmei um príncipe novo em um principado novo sempre cria exercícios as histórias estão repletas de exemplos disso Quando um príncipe porém conquista um estado novo que é anexado ao seu estado antigo fazse necessário desarmar aquele estado exceto os que te apoiaram na conquista mesmo estes com o tempo e ocasionalmente será preciso tornálos fracos e efeminados de modo que todos os exercícios naquele estado inteiro sejam compostos dos teus próprios soldados que viviam próximos de ti no teu estado antigo Costumavam os nossos antepassados e os que eram considerados sábios dizer que era necessário manter Pistóia com as lutas de facções e Pisa com as fortalezas Por isso suas cidades alimentavam os conflitos entre suas cidades súditas para dominaras mais facilmente Nos tempos em que a Itália era de certo modo equilibrada este devia ser um bom meio mas não acredito que atualmente se possa fazer disso uma norma porque não creio que as divisões tragam jamais algum bem Aliás quando o inimigo se aproxima as cidades dividiamse costumam renderse logo porque sempre a parte mais fraca se alia às forças externas e a outra não pode governar Movidos como creio pelas razões acima os venetianos favoreceram os partidos guelfos e gibelinos em suas cidades súditas Ainda não deixavam jamais chegar ao derramamento de sangue alimentavam os conflitos entre elas a fim de que ocupados com suas diferenças seus cidadãos não se unissem contra eles O que como se viu mais tarde não atendeu a seu propósito pois sendo derrotados em Vailà logo uma parte delas animouse e lhes tomou tudo Demonstraram tais políticas portanto a fraqueza do príncipe pois num principado poderoso não se permitem jamais tais divisões já que são previstos apenas em tempos de paz podendose por meio delas manipular mais facilmente os súditos mas quando vem a guerra esta política mostra a sua falácia Sem dúvida os príncipes se tornam grandes quando superam as dificuldades e oposições que lhes são feitas Por isso a fortuna sobretudo quando quer enaltecer um príncipe novo que tem maior necessidade de elevar sua reputação do que um príncipe hereditário crialhe inimigos e movimentos de oposição para que ele tenha oportunidade de superarlós e possa por meio da escada colocada por seus inimigos subir mais alto Muitos acreditam que um príncipe sábio deva apresentandose à ocasião fomentar com astúcia alianças inimizadas para que vencendoas obtenha consequentemente maior grandeza Têm os príncipes e sobretudo os novos encontrado maior fidelidade e serventia nos homens que ao início de seu principado lhes eram suspeitos do que naqueles que no começo lhes inspiravam confiança Pandolfo Petrucci príncipe de Siena governou seu estado mais com