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Psicologia Social
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Interação em Psicologia 2006 102 p 333344 333 O relacionamento entre mãe e filha adulta um estudo descritivo Kirlla Cristhine Almeida Dornelas Agnaldo Garcia Universidade Federal do Espírito Santo RESUMO O relacionamento entre mãe e filha adulta é um tema ainda pouco investigado especialmente no Brasil O objetivo deste trabalho foi investigar de forma exploratória e qualitativa algumas dimensões desta forma de relacionamento Participaram da pesquisa 18 mulheres residentes na Grande Vitória sendo quatro pares de mães e suas filhas casadas e cinco de mães e suas filhas solteiras Foram utilizadas entrevistas semiestruturadas individuais cujo conteúdo foi organizado e os dados foram classificados nas seguintes categorias a história do relacionamento separaçãoaproximação dependênciaindependência expectativas de mudanças na relação a influência da família do esposopai filhosirmãos e de outras pessoas da família o cotidiano do relacionamento atividades compartilhadas e comunicação influência social apoio e cooperação entre mãe filha a percepção do relacionamento acertosequívocos admiraçãocrítica algumas dimensões clássicas do relacionamento similaridades e diferenças reciprocidade e complementaridade conflito interpessoal autorevelação e privacidade O casamento foi apontado como um ponto de separação gerando um novo papel social para a filha o que afeta a relação com a mãe ora afastando ora reaproximando as duas De forma geral o relacionamento entre mãe e filha adulta é marcado por sua natureza dialética integrando separação e aproximação busca de diferenciação e descoberta de similaridades encontros e desencontros Palavraschave relacionamento interpessoal família relacionamento mãefilha adulta ABSTRACT The motheradult daughter relationship a descriptive study The motheradult daughter relationship is still a seldom investigated topic especially in Brazil This work aimed at investigating some dimensions of this kind of relationship in an exploratory and qualitative way Eighteen women participated in the investigation all living in the Metropolitan Area of Vitoria including four pairs of mothers and their married daughters and five pairs of mothers and their single daughters Individual semistructured interviews have been employed The content has been organized and data have been classified in the following categories the relationship history separationapproximation dependenceindependence expectations of relationship changes family influence from spousefather childrensiblings and from other family members the relationship daily routines shared activities and communication social influence support and cooperation between mother and daughter relationship perception rightwrong admirationcriticism some classic relationship dimensions similarities and differences reciprocity and complementarity interpersonal conflict selfrevelation and privacy Marriage has been pointed as a separation point giving rise to a new social role to the daughter which affects her relationship with the mother sometimes getting apart sometimes getting closer In general the motheradult daughter relationship is marked by its dialectical nature integrating separation and approximation a quest for differentiation and the discovery of similarities getting together and breaking apart Keywords personal relationships family motheradult daughter relationship O relacionamento entre pais e filhos adultos repre senta uma área de pesquisa recente e ainda pouco investigada especialmente em território nacional Contudo frente ao aumento na expectativa de vida de pais e filhos tornase cada vez mais relevante conhe cer melhor essa relação Luscher Pillemer 1998 De modo particular o relacionamento entre mãe e filha adulta tem despertado o interesse da comunidade científica internacional sob diferentes perspectivas A relação entre mãe e filha se estende por toda a vida da mãe sofrendo mudanças com o casamento e a mater nidade da filha e a velhice e a enfermidade da mãe Kirlla Cristhine Almeida Dornelas Agnaldo Garcia Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 334 Yoo 2004 Quatro áreas principais de investigação podem ser identificadas na literatura sobre o tema a a influência do relacionamento mãefilha para a for mação da identidade feminina b o cuidado das filhas com mães idosas c os efeitos do casamento e da maternidade da filha no relacionamento com a mãe e d a ambivalência da relação mãefilha A seguir apresentamos uma visão geral desses trabalhos O relacionamento entre mãe e filha é fundamental para o desenvolvimento da identidade feminina de ambas Tal identidade por sua vez também interfere e modula o relacionamento entre elas As mulheres mantêm a identificação com a mãe ao longo da vida e no relacionamento entre elas constroem o que é ser mulher Chodorow 1979 2002 Por outro lado a mãe também se identifica com a filha e projeta seus sentimentos nela em busca de sua realização Einchenbaum Orbach 1983 Historicamente as mulheres são responsáveis pelo campo privado os cuidados com a família e a perpetuação destes laços Isto permite que a relação entre mãe e filha promova uma identificação emocional e de papéis Mottram Hortaçsu 2005 A proximidade ajuda as mulheres a compreenderse conhecer seus papéis sociais e a pró pria feminilidade de acordo com sua cultura O pro cesso de identificação promove a similaridade entre mãe e filha Do ponto de vista dos estudos sobre o relacionamento a similaridade tem sido considerada como um facilitador para uma relação mais próxima como ocorre nas amizades Hinde 1997 De certa forma os estudos privilegiam os efeitos do relaciona mento sobre a identidade Como a identificação afeta o relacionamento entre mãe e filha adulta merece um estudo mais aprofundado Os cuidados providos pela filha adulta à mãe idosa é outro foco de atenção Ajudar os pais idosos é con siderado uma obrigação e responsabilidade dos filhos adultos Cicirelli 1993 2003 Entretanto segundo o autor outros aspectos motivacionais entrariam em jogo como o sentimento de apego Bowlby 1984 1989 Segundo Walker Shin e Bird 1990 a maior parte das mães e filhas relata diferentes motivos para o cuidado provido como afeição proximidade e satis fação As responsabilidades da vida adulta da filha contudo são importantes para definir o tempo dispo nível para a atenção necessária à mãe Scharlach 1987 Por exemplo Lang e Brody 1983 indicam que as filhas casadas dispensam menos atenção e cui dados com a mãe do que as filhas sem trabalho ou solteiras A distância geográfica é algo que também interfere nesta atenção Dewit Wister Burch 1988 Mesmo com custos significativos os cuidados assumidos pela filha também apresentam aspectos positivos Donorfio Sheehan 2001 Para algumas mães e filhas a situação da filha como cuidadora ofe rece a oportunidade de modificar a relação Cantor Hirshorn 1989 Cuidar e ser cuidado representam aspectos de um relacionamento complementar Hinde 1997 Por outro lado pouco tem sido investigado sobre a reciprocidade no relacionamento entre mãe e filha adulta com ênfase em pontos de similaridade quando nenhuma apresenta uma relação de dependên cia da outra como em situações de enfermidade por exemplo Casarse e tornarse mãe são eventos na vida da mulher adulta que afetam sua relação com a mãe podendo fortalecêla ou enfraquecêla Suitor 1987 Estes acontecimentos dão lugar a novos papéis da mulher Apesar da diversidade de papéis da vida adulta das mulheres segundo a autora casar e ter filhos são os marcos mais importantes para o relacio namento entre mãe e filha adulta ampliando sua rede social sogros genros e filhos e criando novos papéis sociais como o de avó Estes fatos marcantes no rela cionamento entre mãe e filha evidenciam seu aspecto histórico e sua constante transformação Hinde 1997 Tais dados realçam a importância de considerar a situação familiar das filhas adultas solteiras ou casa das com ou sem filhos como afetando diretamente o relacionamento com suas mães Como em qualquer outro relacionamento esta re lação também apresenta aspectos negativos Os rela cionamentos em geral estão sujeitos a dificuldades entre elas o conflito e a agressividade Hinde 1997 A coexistência de sentimentos positivos e negativos é normal na relação entre mãe e filha mas as discussões entre elas sobre os sentimentos negativos para evitar o conflito não são comuns neste relacionamento Fingerman 1995 1996 Neste contexto as mães percebem mais os pontos de similaridades e aproxi mação com as filhas que valorizam mais a relação à medida que envelhecem buscando a proximidade materna argumentam Lefkowitz e Fingerman 2003 As quatro áreas indicam a diversidade dos estudos não apenas quanto ao foco da investigação mas tam bém em relação à orientação teórica A presente pes quisa se relaciona em parte com algumas das áreas acima ao descrever como o processo de identificação entre mãe e filha interfere na dinâmica do relaciona mento sem desconsiderar a ambigüidade emocional Em relação aos trabalhos acima citados este artigo apresenta dois pontos que o distinguem Do ponto de Relacionamento MãeFilha Adulta Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 335 vista teórico toma como referencial teórico a obra de Robert Hinde 1997 na qual o autor propõe alguns princípios para a organização de uma ciência do rela cionamento interpessoal princípios estes que orien tam a presente investigação particularmente quanto à importância dada aos aspectos descritivos e a integra ção ou síntese de vários aspectos da relação entre mãe e filha adulta Do ponto de vista do foco da investiga ção o presente artigo procura discutir o relaciona mento entre mãe e filha adulta enfatizando a similari dade entre ambas como mulheres adultas sem rela ções de dependência ou cuidado devido a enfermidade ou idade avançada contrastando com a ênfase na literatura sobre a dependência da mãe idosa em rela ção à filha adulta A melhoria das condições de saúde da população relacionada ao desenvolvimento social econômico e tecnológico mostra reflexos no aumento da longevi dade o que afeta também as relações familiares Uma conseqüência direta do aumento de longevidade e das condições gerais de saúde é a possibilidade de um maior período de convivência entre mãe e filha adulta sem que a filha assuma o papel de cuidadora da mãe Assim um conhecimento mais profundo das relações entre mãe e filha adulta nessas condições pode contri buir para a melhoria da qualidade de vida tanto das mães quanto das filhas Este trabalho teve como objetivo investigar des crever e analisar o relacionamento entre mães e suas filhas adultas em uma fase intermediária da vida quando mães e filhas não dispensam cuidados especi ais à outra Cinco aspectos mais amplos foram inves tigados nesta pesquisa qualitativa a a história do relacionamento entre mãe e filha b a influência da família no relacionamento c o cotidiano do relacio namento d a percepção do relacionamento e e al gumas dimensões básicas do relacionamento seme lhanças e diferenças reciprocidade e complementari dade conflitos e autorevelação e privacidade Bus couse ainda verificar indícios de efeitos do casa mento das filhas sobre essas propriedades de relacio namento MÉTODO A pesquisa foi realizada com a participação de nove filhas adultas com suas respectivas mães O contato foi feito inicialmente com as filhas Neste caso todas tinham entre 25 e 35 anos de idade haviam concluído um curso superior exerciam atividade re munerada e não tinham filhos Por outro lado as mães participantes tinham entre 45 e 65 anos e eram todas alfabetizadas com a escolaridade variando entre ensi no fundamental e curso superior No caso das mães algumas exerciam atividade profissional remunerada As participantes foram divididas em dois grupos mães e suas filhas casadas há pelo menos um ano quatro duplas e mães e suas filhas solteiras cinco duplas Todas as filhas casadas residiam em residên cias separadas sendo que mães e filhas residiam na Grande Vitória As filhas solteiras residiam junta mente com suas mães convivendo diariamente Os participantes foram indicados por pessoas ligadas ao Programa de Pósgraduação em Psicologia da Univer sidade Federal do Espírito Santo Foram excluídas mães e filhas adultas que necessitavam de cuidados especiais As filhas e suas respectivas mães pertenciam a nove famílias As cinco famílias de origem das filhas solteiras apresentavam a seguinte configuração a pai mãe a filha mais velha e seu irmão b mãe viúva e seu novo companheiro a filha mais velha e seu ir mão c pai mãe e a filha d pai trabalha em outros estados mãe um irmão mais velho a filha segundo filho e dois irmãos mais novos e pai mãe a filha mais velha e um irmão além da avó que mora no andar de baixo da casa As quatro famílias de origem das filhas casadas apresentavam a seguinte configura ção a pai mãe a filha mais velha e sua irmã mais jovem b mãe viúva a filha mais velha duas irmãs e dois irmãos c pai mãe a filha uma irmã mais velha casada e um irmão mais jovem d pai mãe a filha mais velha duas irmãs e um irmão adotivo da mesma idade da filha participante Das nove mães que participaram da pesquisa sete ainda estavam casadas com os pais de suas filhas Duas haviam ficado viú vas sendo que uma delas residia com um novo com panheiro As filhas solteiras além de trabalharem também estudavam cursos de pósgraduação ou de idiomas entre outros e apenas uma delas estava na morando na época da entrevista O instrumento utilizado para a coleta de dados foi uma entrevista semiestruturada seguindo um roteiro preestabelecido abordando diferentes aspectos do relacionamento entre mãe e filha adulta histórico e o cotidiano da relação contexto familiar percepção do relacionamento e algumas dimensões como influência cooperação e conflito indicadas por Hinde 1997 As entrevistas foram realizadas individualmente na casa ou no ambiente de trabalho das participantes de acor do com sua preferência e duraram entre quarenta minutos e uma hora e meia Estas foram gravadas e transcritas na íntegra Kirlla Cristhine Almeida Dornelas Agnaldo Garcia Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 336 Os dados foram analisados de forma qualitativa tendo o conteúdo das respostas sido organizado de acordo com categorias préestabelecidas indicadas abaixo Dentro de cada uma destas categorias foram propostas subcategorias definidas de modo indutivo a partir do seu conteúdo As categorias préestabeleci das ou os aspectos investigados foram os seguintes a história do relacionamento entre mãe e filha da infân cia aos momentos marcantes da vida adulta e expecta tivas quanto ao relacionamento futuro b família como os demais familiares influenciam o relaciona mento c o cotidiano do relacionamento aspectos da convivência incluindo as atividades em comum e a comunicação d influência social e cooperação o apoio a relação de ajuda as influências e suas difi culdades e a percepção do relacionamento os lados positivo e negativo da relação f categorias básicas do relacionamento semelhanças e diferenças recipro cidade e complementaridade conflitos e estratégias de resolução RESULTADOS 1 A história do relacionamento A partir da organização do conteúdo das respostas às questões sobre a história do relacionamento foram propostas três subcategorias de acordo com a seme lhança de conteúdo uma dimensão incluindo aproxi mação e separação outra sobre dependência e inde pendência e uma terceira sobre mudanças no relacio namento Separação e Aproximação Mães e filhas apre sentam movimentos de distanciamento e aproximação ao longo do tempo Shaw Magnuson 2004 Sete mães quatro de filhas casadas e três de filhas soltei ras citaram a separação ao falar da história de seu relacionamento com a filha Essa separação estava associada ao primeiro namorado à perda da virginda de à entrada das filhas no mercado de trabalho à resolução dos próprios problemas por parte das filhas e ao seu casamento Separação e aproximação contu do estavam mescladas nesses eventos cruciais como o casamento Com relação à manutenção da proximi dade três mães com filhas casadas relataram que as filhas sempre a visitavam principalmente em eventos familiares como aniversários e o almoço de domingo Além disto a pequena distância física da casa das filhas foi um fator de aproximação facilitando visitas e encontros casuais As filhas solteiras contudo estão mais próximas Três mães e suas filhas solteiras com partilhavam atividades como lanchar e sair juntas Quando as filhas eram casadas estas buscavam mais a aproximação Por outro lado quando as filhas eram solteiras foram as mães que buscaram se aproximar Desta forma mesmo com a separação imposta pelo casamento novas formas de aproximação são criadas As filhas também indicaram a separação e a reapro ximação como fazendo parte do histórico da relação com suas mães Os fatores de separação mencionados pelas filhas quatro solteiras e três casadas incluíam a mudança de postura materna ir estudar em outro esta do a vida universitária ter condições financeiras de se sustentar a separação dos problemas de cada uma não mais necessitar de aprovação contínua a desco berta da vida sexual da filha pela mãe e o casamento O casamento foi indicado como um evento marcante pelas filhas casadas contudo com efeitos positivos sobre o relacionamento com as mães possivelmente pelo desenvolvimento de novos de pontos de similari dade O período póscasamento foi doloroso para mães e filhas gerando o sentimento de solidão e o desejo em ambas de estarem mais próximas Para três filhas casadas partilhar aspectos similares como a vida de casada facilitou a comunicação e a compreen são entre elas As filhas solteiras quatro ressaltaram a separação e as diferenças com a mãe mas ainda assim se sentiam próximas delas Dependência e Independência A dependência pode ocorrer entre outros motivos pelas mães deseja rem continuar como a principal fonte de apoio emocio nal das filhas Kabat 1998 e pelo desejo das filhas em se manterem sob esta proteção A dependência foi comentada por três mães duas com filhas solteiras e uma com filha casada que se consideraram depen dentes da filha Somente uma mãe considerou a pró pria filha solteira como dependente sempre procu rando sua orientação A dedicação às filhas solteiras é uma maneira das mães dependentes tentar cativálas a manter o relacionamento Consideraram que a entrada de novas pessoas na vida das filhas como namorado ou marido causa mudanças que não as agradam As filhas casadas não se referiram à dependência entre elas e suas mães talvez por estarem mais voltadas para as suas próprias vidas conciliando casamento e carreira Dentre as filhas solteiras apenas uma enfati zou sua dependência da mãe A relação se altera pelo crescimento da filha que passa a estudar longe de casa estar mais com as amigas ou namorado e a apre sentar opiniões próprias Como as mães disseram foram diminuindo os cuidados maternos porque as filhas passaram a cuidar de si mesmas Relacionamento MãeFilha Adulta Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 337 Expectativas de Mudanças na Relação Os relacio namentos mudam progressivamente ou variam dentro de alguns limites desde coisas triviais até grandes transformações Hinde 1997 Apesar de se declara rem satisfeitas com o relacionamento atual mães quatro com filhas casadas e quatro com filhas soltei ras e filhas almejam mudanças As mães de filhas casadas desejavam morar mais perto das filhas ser avós ver o sucesso profissional das filhas aliado a seu bemestar e não incomodar quando idosas As mães de filhas solteiras gostariam que as filhas fossem mais abertas que pudessem cuidar mais delas que conquistassem sucesso e independência profissional e financeira Consideraram o casamento e a maternida de das filhas como não obrigatórios apesar de deseja rem ser avós Oito filhas apontaram expectativas quanto a mudanças no relacionamento As casadas quatro gostariam de mudar seus comportamentos e atitudes no tratamento com as mães Esperam que a futura gravidez ajude na compreensão do que é ser mãe e aumente a união entre elas As solteiras quatro também esperam se tornar mais abertas e pacientes com as mães Somente uma considerou que a mãe deveria aceitar mais suas opiniões Quanto ao casa mento elas têm opiniões diferentes do impacto no relacionamento com as mães ora como causa de afastamento devido aos cuidados com a própria fa mília ora como causa de aproximação pela similari dade de papéis na constituição da própria família 2 A família O relacionamento entre mãe e filha adulta não é algo isolado e nem está limitado ao contexto familiar MensVerhulst 1995 A compreensão da relação deve considerar estas participações na dinâmica da díade e sua influência sobre o relacionamento como é o caso dos pais ou esposos e dos irmãos ou filhos OConnor 1990 Esposo Pai Para três mães de filhas casadas o esposopai percebe a relação entre mãe e filha positi vamente Para estas mães os maridos adulam as fi lhas Quatro mães de filhas solteiras comentaram que suas filhas são filhas do pai considerandoas muito parecidas com eles e diferentes delas próprias o que facilitaria a compreensão do comportamento das fi lhas Quando há outros filhos do sexo masculino as mães demonstraram se identificar mais com os filhos mesmo negando a existência de preferências no rela cionamento entre mãe e filhos Apesar disto estas mães também observaram que os pais sentem ciúmes do relacionamento entre elas e suas filhas pois se sentem à parte nesta relação Somente uma mãe disse que pai e filha são mais ligados entre si do que ela e sua filha Para as filhas casadas três os pais são protetores e aduladores as vêem como autoritárias e influenciando as mães Três filhas solteiras relataram que as mães as vêem como semelhantes ao pai Po rém não se vêem mais próximas dele porque é com a mãe que as coisas acontecem Isto é o relacionamento com o pai parece ser uma relação em grande parte intermediada pela mãe FilhosIrmãos A relação entre mãe e filha adulta sofre a interferência dos outros filhos ou irmãos Todas as mães de filhas casadas falaram de todos os filhos em várias ocasiões indicando a presença de ciúmes dos filhos em relação ao vínculo existente com a filha considerandoas mais próximas Três mães de filhas solteiras consideraram que as filhas sentem ciúmes dos irmãos mas ressaltaram não haver dife rença de tratamento Para três filhas casadas os ir mãos ajudam a minimizar as dificuldades fortalecem os laços familiares são confidentes e ajudam a filtrar o que deve chegar ao conhecimento das mães Três filhas solteiras avaliaram que os irmãos são as pessoas com quem dividem a atenção das mães o que muitas vezes provoca ciúmes Outras Pessoas da Família Três mães de filhas casadas comentaram que os genros são muito queridos e presentes nas atividades da família participando do almoço de domingo de viagens à casa de praia no verão e de festas de aniversários Contudo uma mãe reclamou do fato de a filha incluir o marido em tudo o que faz o que a incomoda As mães apreciam os gen ros todavia valorizam o tempo que podem comparti lhar com as filhas sem a presença deles As mães tam bém relataram que amigos próximos elogiam a rela ção reforçando a maneira de conduzirem o relacio namento entre elas e suas filhas 3 O cotidiano do relacionamento Dois aspectos se destacam no cotidiano do relacio namento as atividades compartilhadas e a comunica ção considerados aspectos importantes da relação parental adulta Lawton Silverstein Bengston 1994 As atividades compartilhadas por mãe e filha adulta trazem satisfação com a convivência Todas as mães e filhas compartilham atividades principalmente no ambiente doméstico e reclamaram do pouco tempo disponível para a relação Três das quatro mães de filhas casadas relataram atividades em comum não Kirlla Cristhine Almeida Dornelas Agnaldo Garcia Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 338 exclusivamente delas pois envolvem a família sem pre buscando incluir as filhas nas atividades sociais e mesmo em situações profissionais As atividades ocorrem geralmente na casa materna e as mães ha bitualmente não freqüentam a casa de suas filhas mesmo apreciando as filhas como donas de casa Como atividades independentes foram citadas a rotina das atividades domésticas e atividades físicas como caminhar Todas as mães de filhas solteiras disseram que passam algum tempo juntas seja vendo televisão ou lanchando embora os horários sejam incompatí veis devido ao trabalho e estudos das filhas Por isso atividades fora de casa são eventuais quando as filhas as acompanham ao supermercado ou ao shopping As mães ainda relataram que não há empecilhos quanto a irem juntas a festas praia ou mesmo barzinhos embo ra estas sejam atividades que as filhas costumam compartilhar mais com os amigos Para as filhas casa das o domingo é um dia importante para as atividades sociais familiares O casamento limita ainda mais o tempo dedicado especificamente às mães No caso das filhas solteiras atividades em comum incluíam ver televisão novelas e filmes cozinhar lanchar fazer compras pessoais ir ao supermercado ou ao salão de beleza As filhas solteiras perceberam que as mães procuram adaptarse aos horários delas para que pos sam estar mais juntas A comunicação é essencial para a construção e a manutenção do relacionamento Assuntos cotidianos como casa e família foram citados por todas as mães As filhas casadas citaram vida profissional o ambiente familiar e assuntos relacionados a casamen to ressaltando que o status de casadas fez com que as mães falassem mais da vida pessoal Três filhas soltei ras relataram que as conversas com suas mães costu mam ser sobre trabalho estudo e amigos Por outro lado também foram mencionadas dificuldades de comunicação Conforme Lefkowitz e Fingerman 2003 mãe e filha não costumam discutir sentimen tos negativos e problemas da relação As dificuldades identificadas se referiam a assuntos não discutidos Todas as mães de filhas casadas avaliaram que a pos tura das filhas as inibe quanto a conversar sobre as suntos mais íntimos fazer uma crítica ou mesmo pedir algo Mesmo assim algumas chegam a expor seus problemas conjugais Para quatro mães de filhas solteiras as conversas sobre vida pessoal namoro e sexo são superficiais Oito filhas comentaram sobre dificuldades de conversar sobre a vida pessoal Todas as filhas casadas disseram não haver assuntos tabus mas não conversam abertamente com as mães sobre suas vidas íntimas e não apreciam quando as mães o fazem A diferença no nível de escolaridade entre elas também dificulta o entendimento Quatro filhas soltei ras omitem ou evitam alguns assuntos para não preo cuparem suas mães Conversam superficialmente so bre relacionamentos afetivos e não conversam sobre sexo Todas as filhas preservam os aspectos afetivo sexuais nas conversas com suas mães uma das filhas solteiras explicou que mãe é como um ser superior não devendo ser exposta à intimidade das filhas 4 Influência social e cooperação A influência social o apoio e cooperação estão presentes em diferentes tipos de relacionamento A influência social diz respeito a quanto o comporta mento ou opiniões de uma pessoa afetam o compor tamento e as opiniões de outra À medida que o relacionamento se desenvolve mãe e filha se adaptam uma à outra de diferentes formas e muitas vezes a influência se confunde com obrigação social Stein 1993 Algumas mães duas associaram influência social à manipulação ressaltan do que não interferem na vida das filhas Apesar disto três mães de filhas casadas comentaram a influência das filhas em suas vidas associando influência à aprendizagem Três mães de filhas solteiras se preo cupavam em serem aceitas considerando as opiniões das filhas como referência ou um impedimento de conduta As mães disseram que as filhas adultas influ enciam na mudança de hábitos no compromisso com os outros na valorização da própria vida além de mostrarem o que é moderno em termos de conduta pessoal e familiar Seis filhas três casadas e três sol teiras ressaltaram que sofrem a influência de suas mães na vivência da fé na maneira como se compor tavam e nas escolhas que faziam Três filhas casadas têm o modo de vida das mães e o seu casamento como referência O casamento da filha parece aumentar a influência mútua As mães declararam que as filhas cobram mais delas chamando a atenção quanto a ati tudes e comportamentos Segundo três mães de filhas casadas embora receiem fazer solicitações para as filhas pode se pedir tudo Duas mães de filhas soltei ras consideraram que a dedicação à criação das filhas merece retorno delas agora Segundo as mães de filhas casadas suas filhas são muito exigentes e estão sem pre corrigindo seu modo de falar ou agir em determi nada situação o que as aborrece Por outro lado três filhas casadas relataram que suas mães exigem certas formas de comportamento delas em relação ao marido e à sogra Muitas vezes as filhas têm dificuldades em Relacionamento MãeFilha Adulta Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 339 compreender o ponto de vista materno Martini Grusec Bernardini 2001 reconhecendo que são mais exigentes e menos tolerantes com o comporta mento das mães do que o contrário Quatro filhas sol teiras disseram não fazer exigências para as mães e que as reclamações maternas são sobre o tempo fora de casa nos fins de semana na casa do namorado ou de amigas e ser muito bagunceira A influência social no relacionamento entre mãe e filha adulta parece estar associada às exigências impostas uma à outra muitas vezes gerando conflito entre elas Apoio e Cooperação De acordo com Umberson 1992 a ajuda entre pais e seus filhos adultos traz conseqüências emocionais para ambos A troca de opiniões ajuda e cumplicidade foram relatados pelas participantes Oito mães e todas as nove filhas citaram o apoio como importante Três mães de filhas casadas informaram que a ajuda acontece quando uma precisa da outra sendo que precisam mais das filhas do que o contrário exceto quando as filhas adoecem As mães disseram que as filhas casadas ajudam com suas opi niões sobre roupas e compra de presentes e assuntos cotidianos Financeiramente algumas mães ajudaram suas filhas no início do casamento e uma das mães recebe o auxílio da filha casada eventualmente A vida financeira é mais partilhada quando as filhas são solteiras As mães de filhas solteiras consultam as filhas sobre compras pessoais roupas e da casa e sobre dificuldades da família Todas as mães de filhas solteiras indicaram a ajuda nas atividades domésticas As mães destacaram a gratidão e o constrangimento pelo fato das filhas solteiras pararem suas vidas para ajudálas Todas as filhas consideraram as mães como fundamentais quando em dificuldade e viceversa Valorizaram a disponibilidade materna em ajudar e tentar compreender as diversas situações Mas consi deraram que as mães buscam mais ajuda e opiniões sobre o que fazer No caso das filhas casadas elas ajudam em questões ligadas à saúde situações do mésticas e à orientação sobre como lidar com os ir mãos Disseram gostar de saber o que as mães pensam sobre diversas situações da vida pessoal ou profissio nal Entretanto o fato de não morarem mais na mesma casa diminui a obrigatoriedade da ajuda das filhas casadas A maioria das filhas solteiras oito solicita ajuda materna devido à sua capacidade de análise desde assuntos práticos até situações mais complexas como na tomada de decisão dicas para melhorar no trabalho e como se comportar em determinada situa ção Em contrapartida elas ajudam suas mães nas decisões ligadas à casa problemas financeiros e com pras domésticas e ao trabalho materno Segundo as filhas solteiras as mães as incentivam a realizar pro jetos e gastar menos dinheiro Este apoio contribui para melhorar a autoestima pois por saberem que elas estão por perto as ajuda a se arriscarem A coope ração busca facilitar a vida da outra Mães e filhas casadas se percebem como cúmplices e duas mães de filhas casadas acharam que a cumplicidade é o dife rencial deste relacionamento da relação da filha com o pai Duas mães consideraram haver problemas de coo peração especialmente pela falta de tempo das filhas Duas mães de filhas casadas se preocupavam com a necessidade de cuidados especiais na velhice interfe rindo na vida das filhas Para três filhas casadas um dos problemas em ajudar as mães é que estas não pe dem as coisas diretamente e ficam aborrecidas quando as mães não compreendem os motivos que impedem a ajuda entendendo a cooperação como obrigação Se gundo uma filha solteira as mães são esquecidas e as opiniões diferentes prejudicam a cooperação Curio samente a influência social e a cooperação são vistas de forma ambígua por mães e filhas A influência é vista como intromissão ao mesmo tempo em que é algo positivo A falta de cooperação está ligada a fato res como falta de tempo dificuldade de comunicação e competição Mães e filhas reconheceram sofrer a influência da outra muitas vezes na forma de exigên cias relacionadas ao seu comportamento 5 A percepção do relacionamento Ao se manifestarem sobre a forma como percebem o relacionamento com a outra três dimensões se des tacaram para mães e filhas a amizade admiração e crítica e acertos e equívocos A literatura trata das diferenças entre as expectativas e a descrição que cada uma apresenta do papel da outra CotttenHuston Johnson 1998 além da interferência do contexto na percepção do relacionamento entre mãe e filha adulta para cada uma delas Rastogi 2002 Duas mães de filhas casadas consideraram a possi bilidade de conversarem de igual para igual tendo em vista que ambas são adultas como amizade Três mães de filhas solteiras relataram haver amizade entre elas pois se conhecem bem Tal amizade não pode ser considerada típica por não ser voluntária e por não conversarem sobre as mesmas coisas que conversam com outros amigos Conforme uma das mães união é diferente de amizade no relacionamento entre mãe e filha existe mais o primeiro caso Duas filhas casadas indicaram a falta de hierarquia pelo fato de serem Kirlla Cristhine Almeida Dornelas Agnaldo Garcia Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 340 adultas e casadas como amizade Duas filhas solteiras associaram a ligação forte entre elas com amizade também por conversarem sobre tudo exceto sobre sexo e por não falarem palavrão perto dela o que fa ziam com outras amigas O que prejudica a amizade segundo duas mães com filhas casadas é o autorita rismo das filhas Para quatro mães de filhas solteiras suas filhas são reservadas demais voluntariosas tei mosas desorganizadas e costumam se isolar Todas as filhas casadas indicaram dificuldades para a amizade como as diferenças de contexto de vida e de nível de escolaridade infantilidade materna tendências de pressivas ou de expansividade das mães ou seja diferenças de personalidade Aparentes diferenças com uma amizade típica foram relatadas Neste caso a amizade entre mãe e filha pode ser entendida como reciprocidade de afeto e comportamento Quando mãe e filha se percebem como iguais com atitudes mais simétricas elas se consideram amigas Outra dimensão que surgiu na percepção do relacio namento foram manifestações de admiração e crítica Duas mães com filhas casadas relataram admiração pela própria relação Três mães com filhas solteiras comentaram a admiração que sentem por suas filhas adultas serem mulheres maduras equilibradas segu ras na atuação profissional e que sabem o que querem Três mães com filhas casadas criticaram o hábito das filhas de chamarem sua atenção em público como apontar erros ou corrigilas As mães de filhas soltei ras indicaram que as filhas criticam o tratamento dado aos outros irmãos e certos hábitos da mãe como fu mar As mães reclamaram do consumismo das filhas e do excesso de independência Cinco filhas duas casadas e três solteiras demonstraram admiração pelas mães considerandoas mulheres fortes guerrei ras dedicadas sensíveis carinhosas compreensivas mesmo quando as filhas são hostis e com um casa mento bemsucedido Sete participantes quatro casa das e três solteiras também criticaram as mães por falarem demais em momentos inoportunos e quando não solicitadas pela aparência rigidez e impaciência Outra dimensão englobando duas tendências opostas diz respeito aos acertos e equívocos apontados pelo outro Como acertos três mães de filhas casadas mencionaram a educação Três mães de filhas soltei ras citaram os valores familiares como o respeito aos outros e a não intromissão na vida das filhas abrindo mão de interesses pessoais Em geral as mães consi deraram não ter cometido erros na relação exceto no caso de uma mãe com filha casada ao reconhecer a pouca atenção que deu à filha Três filhas casadas citaram como acertos a educação a importância do trabalho sair de casa via casamento e estabelecer limites claros Duas solteiras citaram como acertos a liberdade o cuidado materno e a presença materna constante em suas vidas para apoiálas e orientálas Três filhas lamentaram a maneira como tratam suas mães considerandose egoístas e com dificuldade para ouvir as mães Duas filhas solteiras sentiam re morso por perceber que as mães estavam certas em diversas situações de conflito além de criticálas em virtude do estresse profissional As filhas considera ram os acertos como uma responsabilidade materna e os equívocos como ações isoladas 6 Dimensões do relacionamento As entrevistas também procuraram obter dados a respeito de algumas dimensões do relacionamento enumeradas por Hinde 1997 como similaridades e diferenças reciprocidade e complementaridade con flito interpessoal autorevelação e privacidade A percepção de similaridades e diferenças apare ceu nos relatos das díades As mães de filhas solteiras embora tenham identificado similaridades como va lores e expectativas em relação a outras pessoas en fatizaram as diferenças que não consideraram como um problema Mães e filhas casadas tinham mais pontos em comum como a saudade e a tristeza com a separação um menor grau de dependência da filha e a preocupação com mudanças na relação em virtude do declínio da saúde com a idade As filhas casadas tam bém reconheceram mais aspectos de similaridade no relacionamento considerando que a separação foi importante para valorizarem as semelhanças e reco nhecerem em si mesmas atitudes parecidas com as das mães Apesar de melhorar a compreensão elas destacaram que as similaridades também podem ser fontes de conflitos ao buscarem as mesmas coisas As semelhanças são motivos de proximidade e orgulho fazendo com que tenham dificuldades em perceber diferenças ou minimizem a interferência delas no re lacionamento no caso das mães de filhas casadas Outras diferenças apontadas pelas filhas incluem a diferença de escolaridade Hipoteticamente as simila ridades de gênero e idade facilitam a identificação e a compreensão Por outro lado as filhas se tornam mais autônomas apóiamse em outras relações e têm inte resses próprios representando diferenças importantes entre elas A similaridade facilita a manutenção da relação pois atitudes similares confirmam o que so mos e pensamos Já as diferenças são atrativas mas podem gerar situações inconciliáveis para o relacio namento em longo prazo Hinde 1997 Relacionamento MãeFilha Adulta Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 341 Reciprocidade e complementaridade foram obser vadas nos relacionamentos investigados A reciproci dade esteve associada a interesses similares e à per cepção da outra como adulta e o respeito por suas particularidades A complementaridade esteve pre sente na orientação como no caso da mãe aconselhar a filha no casamento Por vezes as mães de filhas solteiras indicaram um interesse de que as filhas ainda fossem crianças As mudanças na família promoveram uma valorização da reciprocidade nas relações consi derado como fator de satisfação que é importante para o bemestar psicológico do indivíduo adulto Neff Harter 2003 Segundo Falicov 1991 a reciprocidade entre mãe e filha é um sinal de proximi dade emocional Quanto ao conflito interpessoal mães e filhas ten dem a não discutilos tendo em vista a manutenção do bemestar entre elas Assim as mães costumam mi nimizar os problemas considerando coisa de mo mento devido às atribulações da vida Já as filhas preferem ignorar situações potencialmente conflituo sas em vez de transformála em um conflito Segundo elas o melhor para os conflitos é sair da situação pedir desculpas e agir como se nada tivesse aconteci do Isto é mais fácil para as filhas casadas por causa da distância física A existência de conflito em algum momento é praticamente inevitável em relaciona mentos íntimos Hinde 1997 Em sociedades coleti vas alguns estudos apontaram o mesmo ou seja mãe e filha adulta apresentam desentendimentos eventuais mas geralmente por um tempo breve devido à impor tância dada ao relacionamento Gilani 1999 Proximidade e contatos freqüentes não significam necessariamente intimidade ou autorevelação Fingerman 2001 De modo geral o diálogo refere se a acontecimentos externos ao relacionamento As mães consideraram seu relacionamento com as filhas aberto e sem segredos Contudo gostariam que as filhas se revelassem mais Para as mães e filhas seu relacionamento é de natureza privada reservada es pecialmente quanto à participação do pai As filhas valorizaram o contato com as mães porém preocupam se com a sua privacidade e a das mães assim direcio nam os temas das conversas Morgan Hummert 2000 Em geral mães e filhas parecem dispor so mente de algumas idéias sobre o que se passa no ínti mo da outra Os medos e os sonhos por exemplo mantêmse como algo privado DISCUSSÃO Várias dimensões do relacionamento entre mãe e filha adulta foram analisadas Alguns pontos podem ser destacados nessa relação Na história do relacio namento os relatos apontam para três focos de aten ção Separação e aproximação são vistas como partes integrantes do relacionamento Paralelamente a de pendência e a independência também se dão de forma dialética As expectativas de mudança também apon tam para um movimento dialético ora promovendo a diferenciação entre mãe e filha ora provocando uma maior identificação entre elas Chodorow 2002 A história de vida é marcada pela ambivalência ou por tendências dialéticas Hinde 1997 Mãe e filha compartilham uma relação particular Walker Thompson 1983 Esse relacionamento contudo dáse no interior de um grupo social mais amplo a família O paiesposo e os irmãosfilhos são os agentes sociais mais importantes no caso das filhas solteiras devendo ser acrescido o esposogenro no caso das filhas casadas Pai irmãos e esposo interfe rem ora aproximando mãe e filha ora provocando seu afastamento pela disputa da atenção da mãe ou da filha O cotidiano é pautado por atividades compartilha das e não compartilhadas que dimensionam a impor tância da relação para ambas e auxiliam no processo de comunicação A busca de manutenção do relacio namento influencia de maneira ambígua a comunica ção pois querem compartilhar suas vidas sem exposi ção de suas intimidades e criar conflitos Fingerman 1995 1996 A percepção do relacionamento também é marcada pela presença concomitante de opostos acertos são percebidos ao lado de equívocos A admiração convi ve com a crítica ao outro Pillemer Suitor 2002 Relatam haver amizade mas não como uma amizade típica As dimensões básicas do relacionamento se mos tram em sua dialética Semelhanças e diferenças são percebidas entre mãe e filha Reciprocidade e com plementaridade se alternam na relação Conflitos existem mas são negados ou minimizados A estraté gia preferencial do enfrentamento é a negação a evi tação e a minimização Autorevelação e privacidade têm seu lugar mas com restrições Uma comparação das respostas dadas pelas filhas casadas e pelas solteiras na mesma faixa etária indica diferenças relativas a diversos pontos que interferem no relacionamento No caso das filhas casadas o rela Kirlla Cristhine Almeida Dornelas Agnaldo Garcia Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 342 cionamento é influenciado pela mudança de domicí lio por uma nova situação social por parte da filha uma nova rede social com esposo e seus familiares uma nova posição social com novas responsabilida des As mudanças físicas e sociais trazidas pelo ca samento e os fatos associados interferem no relacio namento mãefilha A cerimônia do casamento é um marco emocional na história delas Nas três dimensões citadas nesta categoria o casamento provoca separa ção Por outro lado o fato de a filha passar a ocupar o papel social de esposa permite uma maior identifica ção com sua mãe o que é percebido como uma apro ximação pelo compartilhamento de experiências e de uma situação social semelhante Na segunda dimen são referente à dependência o casamento reflete em uma maior independência por parte das filhas Final mente quanto às expectativas de mudanças o casa mento é visto por filhas casadas e por suas mães como responsável por mudanças importantes no meio social dentro do qual mãe e filha se relacionam Dewit Wister Burch 1988 O relacionamento fica imerso numa rede mais complexa de relacionamentos em que a filha também passa a encabeçar uma família e o esposogenro é um agente social importante O pai e os irmãos contudo continuam a exercer influência O casamento também afeta o cotidiano da relação quanto às atividades realizadas e às possibilidades de comunicação A maternidade vista como decorrência do casamento também gera a expectativa de maior compreensão entre mãe e filha em decorrência do aumento de similaridade entre elas Na percepção do relacionamento e do outro as semelhanças e diferen ças entre as duas os conflitos e suas estratégias de resolução são permeados pela ambivalência Aspec tos positivos e negativos ultrapassam os sentimentos e permeiam toda a vida social entre mãe e filha na busca de perpetuarem a relação mantendo e transformando seus comportamentos Spitze Gallant 2004 CONSIDERAÇÕES FINAIS De forma geral o relacionamento entre mãe e filha é marcado por sua natureza dialética no sentido de haver um constante movimento de separação e de aproximação de busca de diferenciação e descoberta de similaridades de encontros e desencontros Essa dinâmica parece seguirse a um período de dependên cia maior por parte da filha criança e adolescente e antecede um período de dependência maior da mãe idosa Baruch Barnett 1983 Isto pode ser perce bido nas dimensões investigadas Na história do rela cionamento as respostas apontaram para a dialética da separação e da aproximação da dependência e da independência e das mudanças no relacionamento que em última instância levam a uma maior identifi cação entre mãe e filha esta muda para tornarse mais parecida com a mãe A influência da família no rela cionamento também é pautada ora pelo fortalecimento dessa relação ora pela competição ou pela busca da atenção da mãe ou da filha por outros membros da família O cotidiano é pautado por atividades compar tilhadas e não compartilhadas e a comunicação ao mesmo tempo em que mantém o relacionamento tam bém causa percalços revela e esconde Essa dialética também é percebida quando mãe e filha apontam acertos e equívocos admiração e crítica para descre ver como percebem o relacionamento Boyd 1989 ou falam de uma relação de amizade que contudo se distingue das amizades típicas As próprias dimensões básicas do relacionamento refletem este dinamismo Semelhanças e diferenças são percebidas entre elas ao mesmo tempo em que reciprocidade e complementa ridade Privacidade e autorevelação se alternam na relação Conflitos existem mas são negados ou mini mizados em prol da manutenção do relacionamento O estado civil da filha adulta solteira ou casada influen cia a relação com a mãe contudo em ambos os casos permanece a ambigüidade subjacente ao relacionamen to Assim o casamento ao mesmo tempo em que afasta mãe e filha que assume uma nova posição so cial abre novas possibilidades de relacionamento ao permitir o compartilhar da condição de casada com a mãe o que representa um novo ponto de similaridade REFERÊNCIAS Baruch G Barnett R C 1983 Adult daughters relationships with their mothers Journal of Marriage and the Family 45 601606 Boyd C J 1989 Mothers and daughters a discussion of theory and research Journal of Marriage and the Family 51 291 301 Bowlby J 1984 Apego São Paulo Martins Fontes Bowlby J 1989 Uma base segura aplicações clínicas da teoria do apego Porto Alegre Artes Médicas Cantor M H Hirshorn B 1989 Intergeneracional transfers within the family contextmotivation factors and their implica tions for caregiving Women and Health 14 34 3951 Chodorow N 1979 Estrutura familiar e personalidade feminina Em M Z Rosaldo L Lamphere Orgs A mulher a cultura e a sociedade pp 198226 Rio de Janeiro Paz e Terra Chodorow N 2002 Psicanálise da maternidade uma crítica a Freud a partir da mulher 2ª ed Rio de Janeiro RecordRosa dos Tempos Relacionamento MãeFilha Adulta Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 343 Cicirelli V 1993 Mothers and daughters paternalism beliefs and caregiving decision making Research on Aging 25 1 3 21 Cicirelli V 2003 Attachment and obligation as daughters motives for caregiving behavior and subsequent effect on sub jective burden Psychology and Aging 8 2 144155 CotttenHuston A Johnson D 1998 Daughters and mothers age differences in relationship descriptions and communicative desires Journal of Adult Development 5 2 117123 Dewit D J Wister A V Burch T K 1988 Physical dis tance and social contact between elders and their adult chil dren Research on Aging 10 1 5680 Donorfio L M Sheehan N W 2001 Relationships dyna mics between aging mothers and caregiving daughters Filial expectations and responsabilities Journal of Adult Develop ment 8 1 3949 Einchenbaum L Orbach S 1983 Understanding women NY Basic Books Falicov C J 1991 Family 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eletrônico agnaldogarciauolcombr Revista da Abordagem Gestáltica Phenomenological Studies ISSN 18096867 revistaitgtcombr Instituto de Treinamento e Pesquisa em Gestalt Terapia de Goiânia Brasil BRITO PINTO ÊNIO ANSIEDADE NA ADOLESCÊNCIA Revista da Abordagem Gestáltica Phenomenological Studies vol XII núm 2 diciembre 2006 pp 59 66 Instituto de Treinamento e Pesquisa em Gestalt Terapia de Goiânia Goiânia Brasil Disponível em httpwwwredalycorgarticulooaid357735505004 Como citar este artigo Número completo Mais artigos Home da revista no Redalyc Sistema de Informação Científica Rede de Revistas Científicas da América Latina Caribe Espanha e Portugal Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto Ansiedade na Adolescência 59 Revista da Abordagem Gestáltica XII2 5966 juldez 2006 A r t i g o ANSIEDADE NA ADOLESCÊNCIA1 ÊNIO BRITO PINTO Resumo Discutese a ansiedade na adolescência a partir de três pontos a ansiedade ontológica a ansiedade normal e a ansiedade patológica Estudase a correlação entre ansiedade e liberdade e entre ansiedade e liberdade e valores na adolescência para propor possíveis horizontes para facilitar ao adolescente de nossos tempos a lida com essas questões Palavraschave Ansiedade Adolescência Liberdade Valores Globalização Neste mundo globalizado a competitividade o consumo a confusão dos espíritos constituem os baluartes do presente estado de coisas A competitividade comanda nossas formas de ação O consumo comanda nossa formas de inação E a confusão dos espíritos impede o nosso entendimento do mundo do país do lugar da sociedade e de cada um de nós mesmos Milton Santos São muitos os caminhos possíveis quando pretendemos refletir sobre a ansie dade na adolescência pois essa temática tem diversas possibilidades de abordagem já que se trata de um tema amplo e muito relevante De maneira geral mais do que em qualquer outra época da vida é na adolescência que a ansiedade aparece com mais intensidade Refirome aqui tanto à ansiedade ontológica quanto à ansiedade normal e também à patológica Outro tema relevante e estreitamente ligado à ansiedade que também aparece vigorosamente na consciência do adolescente é o tema dos valores Especialmente nos dias de hoje essa questão toma contornos ainda mais importantes e mais graves para os adolescentes de modo que o caminho que seguirei nessas bre ves reflexões pretende passar pelas três questões adolescência valores e ansiedade Quero refletir um pouco sobre a importância dos valores na gênese e na manutenção da ansiedade na adolescência Vou discutir a partir de um ponto de vista de certa forma polêmico para o adolescente de hoje é muito mais difícil eleger seus valores principalmente porque ele se depara com uma sociedade que ainda não sabe como lidar com a liberdade 1 Mesa redonda apresentada no XV Encontro de Abordagens Humanistas e Fenomenológicas Marília 2006 Revista ITGT122indd 59 Revista ITGT122indd 59 1152007 123520 1152007 123520 Ênio B Pinto 60 Revista da Abordagem Gestáltica XII2 5966 juldez 2006 A r t i g o A Ansiedade e a Liberdade Começo falando da ansiedade e já delimito de onde falo minha compreensão da ansiedade neste texto está ancorada na Psicologia Fenomenológicoexistencial com especial influência dos trabalhos de Rollo May completados pela compreensão gestáltica E nesse nosso começo de conversa sobre a ansiedade já coloco o ponto básico para a visão fenomenológicoexistencial desse tema a ansiedade é inerente ao homem ou dizendo de outro modo ela é ontológica Não dá para imaginar o ser humano sem ansiedade Como serparaamorte ao homem ameaça constantemente o nãoser de modo que a ansiedade está inevitavelmente posta diante dele por toda a sua existência Desde sempre e para sempre Com esse entendimento da ansiedade já a estamos diferenciando do medo uma diferença que não é apenas de grau a ansiedade tem uma densidade que o medo não tem Ou dizendo de outro jeito a ansiedade é central e ontológica o medo é periférico e circunstancial Mas há um outro fator com relação à ansiedade que é extremamente importante para o nosso tema de hoje ansie dade e liberdade estão sempre tão próximas que Kierkegaard descreveu a ansiedade como a vertigem da liberdade citado por May 1987 p 225 O que será que Kierkegaard quis dizer com isso Por que a ansiedade é a vertigem da liberdade Porque liberdade implica em escolha em possibilidade de mudança Uma pessoa sem liberdade também não teria ansiedade Uma vida de mes mices muito muito segura é uma vida sem ansiedade e sem liberdade Por seu turno uma vida em que há liberdade quer dizer em que há possibilidades de escolhas é uma vida em contato com riscos dentre eles o maior deles o risco de nãoser Na verdade a cada vez que escolhemos alguma coisa importante a cada vez que temos um ganho escolhemos também uma perda A cada ser que afirmamos afirmamos também um nãoser A diferença é que nas escolhas importantes da vida a escolha pelo ser é uma aposta ao passo em que a escolha pelo não ser é uma certeza Um exemplo simples a cada passo que dou em uma caminhada perco a paisagem ante rior perco o ponto de vista anterior Um passo à frente e a paisagem é outra E não adianta eu querer voltar um passo atrás ainda que eu consiga voltar para a mesma paisagem meu olhar já é diferente o fenômeno observado a paisagem anterior já é outro Um exemplo mais complicado termino ou não um casamento Se eu disser à minha companheira ou ao meu companheiro acabou não quero mais a relação nunca mais será a mesma pode até vir a ser melhor mas nunca mais será a mesma Mesmo que eu resolva querer mais Então posso afirmar que uma vida sem ansiedade é impossível Mas ainda é pouco para entendermos o conceito de ansiedade há outra observação que precisamos ter em mente nessa conversa há ansiedade normal e ansiedade patológica A ansieda de normal é essa de que falei a inevitável diante da possibilidade de nãoser É essa ansiedade que usamos para nos proteger ao atravessar uma rua para escolher um traje para uma reunião importante para explorar os nossos valores existenciais Há também Revista ITGT122indd 60 Revista ITGT122indd 60 1152007 123520 1152007 123520 Ansiedade na Adolescência 61 Revista da Abordagem Gestáltica XII2 5966 juldez 2006 A r t i g o uma ansiedade patológica que grosso modo pode ser definida como aquela ansiedade desproporcional à ameaça presente Ela aparece principalmente de duas formas na impossibilidade das escolhas e na impulsividade das escolhas A primeira pode ter um exemplo extremo naquela pessoa tão deprimida que sequer é capaz de escolher sair da cama pela manhã a segunda pode ser exemplificada também extremamente por aquela pessoa que busca as drogas na esperança de se sentir mais viva A Liberdade e os Valores Continuo minhas reflexões com um ligeiro correr de olhos pela história da humanidade de modo a verificarmos que o nascimento da sociedade capitalista trouxe uma grande mudança no posicionamento humano diante do mundo e da vida antes do capitalismo havia uma certa predeterminação à espera do homem quando ele nascesse ou seja nas comunidades anteriores ao capitalismo a pessoa já nascia com um lugar social determinado e com um destino de certa forma já traçado de modo que por exemplo quem nascesse camponês camponês morreria A partir do advento do capitalismo o ser humano já não está mais inserido de maneira natural e imutável numa situação social Pelo menos em tese o ser humano já pode escolher seu lugar no mundo já pode escolher seus valores o que acabou por enfraquecer uma ética baseada nos costumes na repetição de geração a geração dos valores e compor tamentos Dessa maneira a liberdade enquanto categoria ética acaba por viver um crescimento perante os outros valores substituindo de certa forma a antiga busca da felicidade como valor supremo Se antes a liberdade sequer era pensada como valor agora a felicidade depende da liberdade Heller 1985 p 7 É óbvio que essa construção não se faz de uma hora para outra de uma geração para outra são necessárias gerações e mais gerações para que se consolide uma mudança deste porte nos valores humanos Mas não há dúvidas de que hoje se o desejo humano ainda é pela felicidade essa felicidade tem que vir através da liberdade Chegamos a tal ponto que o ideal de ser livre e ser feliz acabou por evoluir nos dias de hoje para ser livre é ser feliz Assim está adubado o terreno para que floresça a ansiedade es pecialmente a ansiedade patológica Tratase de um paradoxo A ansiedade ontológica fundamentase na liberdade e é propulsora de desenvolvimento e de crescimento de cuidado e de bons suportes existenciais No entanto se não há suficiente amadureci mento a ansiedade que se faz presente diante da liberdade não é a ansiedade ontológica mas a ansiedade patológica E esse é um dos mais sérios problemas para o adolescente ocidental nesse início de século XXI sua liberdade é muito maior que sua maturidade o que causa ansiedade muita ansiedade Em outros termos o adolescente de hoje é chamado a fazer escolhas cedo demais quando ainda não está suficientemente ama durecido para dar conta de tão importante empreitada Dessa forma o que deveria ser liberdade transformase em desamparo ou seja em liberdade sem continência Revista ITGT122indd 61 Revista ITGT122indd 61 1152007 123520 1152007 123520 Ênio B Pinto 62 Revista da Abordagem Gestáltica XII2 5966 juldez 2006 A r t i g o O problema não está na maturidade do adolescente mas na liberdade que lhe é concedida de maneira atabalhoada e precoce sem que se dê tempo para que ele con quiste sua capacidade de escolha a pouco e pouco par a par com o amadurecimento O amadurecimento humano é coisa que se dá passo a passo que tem funda mento no desenvolvimento psicológico nas relações sociais e no corpo vale dizer no vivido Há um ritmo de amadurecimento humano que praticamente não pode ser acelerado a não ser sob duras penas posteriores O amadurecimento que é a passagem da preponderância do suporte ambiental para a preponderância do autosuporte se dá ao longo do tempo De igual modo acontece com a assimilação dos valores recebidos da família e da sociedade a transformação desses valores heterônomos em valores autô nomos também se dá ao longo de um amplo e necessário transcurso de tempo Quando se exige o apressamento dessa travessia abremse as portas para a ansiedade É óbvio que não é apenas a passagem do tempo que produz o amadurecimen to tão importante quanto o tempo são o suporte ambiental e o suporte pessoal que a criança e posteriormente o jovem terão para consolidar seu desenvolvimento O apoio e o exemplo de familiares eou pessoas afetivamente importantes é fator imprescindível A colocação clara por parte das figuras de autoridade de limites e de responsabilidades afinados com o estágio de desenvolvimento facilita o amadu recimento da criança e do adolescente Por seu turno o excesso ou a falta extremada de limites inibem o desenvolvimento Assim sofrem do mesmo mal de imaturidade aquele jovem que é impedido de experimentar ampliações em suas fronteiras e aquele jovem de quem nada lhe é exigido tudo lhe é perdoado O jovem sem liberdade tem seu desenvolvimento tão prejudicado quanto o jovem com liberdade ampla demais e os dois porque desamparados são vítimas fáceis da ansiedade patológica Este é um dos mais importantes problemas que está posto para o adolescente de hoje essa é uma das mais importantes causas de sua ansiedade um desamparo que acarreta paradoxalmente uma exigência exagerada perante os jovens Eles têm que fazer escolhas e tomar atitudes para as quais ainda não estão suficientemente amadurecidos Eles não têm o necessário suporte ambiental que lhes propicie fazer escolhas com a necessária tranqüilidade dentro do necessário tempo Escolher o ato supremo de liberdade é capacidade cuja maestria construímos com paciência ao longo do tempo e apoiados por um adequado suporte ambiental O mundo pósmoderno o mundo globalizado ocidental rouba dos jovens a possibilidade da paciência da construção de si com tempo necessário e suficiente Nossa cultura impõe rapidez e agilidade privilegia excessivamente a novidade quer a mudança sem a estabilidade que a sustente a competitividade2 no lugar da competição insistentemente confunde desejo com necessidade quer reduzir a história ao futuro provoca a ilusão de que se pode ganhar sem perder a vã ilusão de que não são necessários sacrifícios para que se tenha felicidade Mais que tudo isso a ideologia vigente no mundo oci dental globalizado pretende fazer crer que a independência é possível que a liberdade 2 Entendo aqui a competitividade como a competição sem limite e sem compaixão Santos 2000 p 31 Revista ITGT122indd 62 Revista ITGT122indd 62 1152007 123520 1152007 123520 Ansiedade na Adolescência 63 Revista da Abordagem Gestáltica XII2 5966 juldez 2006 A r t i g o absoluta é meta legítima que somente o mais próximo e imediato é problema meu Comprovando esse último aspecto recente pesquisa realizada nos EUA constatou que apesar da constante cobertura da imprensa desde a invasão do Iraque em 2003 63 dos entrevistados jovens de 18 a 24 anos não foram capazes de localizálo no mapa e 75 não conseguiram encontrar Israel ou o Irã Nove em cada dez também foram incapazes de achar o Afeganistão no mapa asiático 75 não acharam a Indonésia e 70 não localizaram a Coréia do Norte FSP 03052006 p A 16 O tempo hoje é o tempo do já É aqui e agora Liberdade sem limites e sem responsabilidades Vida sem frustrações Amor líquido Tolerância passional Saúde só corporal Responsabilidade social só com os iguais Honestidade relativa Beleza narcísica Conhecimento especializadíssimo Solidariedade estratificada Urgência Fast food fast existence fast death Dizendo de outra maneira vivemos em um mundo em que a liberdade se tornou de tal maneira o valor fundamental que é quase como se ela fosse o único valor pelo qual as pessoas devessem guiar suas vidas Isso faz com que a liberdade se transforme em desamparo Além disso muito facilmente a liberdade é confundida com açoda mento E passase a exigir do jovem que ele saiba o que não pode ainda saber passase a exigir do jovem que ele faça o que ainda não pode fazer sozinho passase a exigir do jovem que ele escolha o que ainda não pode escolher sozinho Assim a liberdade passa de valor básico e legítimo para valor único e soberano melhor diria tirano Como a comida na bulimia há comida demais ou de menos mas não há alimentação sustentadora ou mesmo prazerosa A maneira que me parece a melhor para lidar com esses excessos da liberdade é trazêla para seu devido lugar um valor dentre valores ou seja desinflacionar a liber dade de modo a que ela possa ser vivida de modo pleno e enriquecedor A ansiedade do jovem de nossos tempos pode ser significativamente diminuída se o ajudarmos a discutir valores e a encontrar os seus próprios valores no seu próprio tempo Os Valores e a Ansiedade Procurando no dicionário Houaiss encontrei 24 acepções da palavra valor a maioria delas ligadas à economia A acepção importante para nós aqui é aquela que define que valor é no pensamento moderno de tendência relativista cada um dos preceitos ou princípios igualmente passíveis de guiar a ação humana na suposição da existência de uma pluralidade incontornável de padrões éticos e da ausência de um Bem absoluto ou universalmente válido Se é fato que hoje não temos mais no mundo ocidental um valor absoluto ou universalmente válido também é fato que há alguns valores que alcançam quase que uma unanimidade em nossa cultura ao menos como ideais o amor a honestidade a justiça a solidariedade a beleza a saúde a responsabilidade social a paz a tole rância e o conhecimento são alguns exemplos de valores que norteiam as escolhas Revista ITGT122indd 63 Revista ITGT122indd 63 1152007 123520 1152007 123520 Ênio B Pinto 64 Revista da Abordagem Gestáltica XII2 5966 juldez 2006 A r t i g o da maioria das pessoas hoje em dia A todos eles a liberdade permeia Na ideologia globalizante ela o faz de tal forma que corre o risco de se tornar um valor absoluto diluindo todos os outros e gerando ansiedade insuportável ansiedade porque se a liberdade é um rio os outros valores são suas margens Uma vez retiradas as mar gens o rio se espalha e desaparece na areia gerando uma ansiedade seca matriz de violência e de desespero A ansiedade que percebemos em muitos dos jovens de hoje tem dentre ou tros um fundamento bastante claro grande parte dos valores que lhes são ensinadas principalmente através de exemplos não tem ressonância em seu íntimo Aliarse à ideologia dominante no mundo globalizado é para a maioria dos jovens quase como que cometer um ato de traição à própria sensibilidade aos próprios sentimentos à própria responsabilidade diante da existência O jovem quer crescer quer deixar sua marca na vida quer conhecer sua importância quer contribuir mas deparase com uma ideologia que lhe fecha as portas para esse tipo de desenvolvimento e lhe propõe a saída do prazer imediato do consumo compulsivo e da liberdade sem limites para não falar da ainda vigente lei de Gerson Faz lembrar a fábula do Pinóquio As orelhas de burro que começam a aparecer em Pinóquio quando ele se encontra com o lobo e o gato e é vendido ao circo representam a ansiedade que assola o jovem quando ele não busca a autonomia a assimilação dos valores sociais de modo a que sejam modificados e incorporados como valores próprios no seu devido tempo Como bem lembra Dulce Critelli 2006 como pertence à nossa condição de hu manidade a consciência moral não é algo que se pode jogar fora e não depende da nossa vontade Embora nos desviemos ela sempre nos convoca e nos apanha em toda curva do caminho Não se pode calar sua voz no máximo é possível baixar seu volume A ansiedade patológica é uma das maneiras de se baixar o volume da consci ência moral Ansioso o jovem não pára para perguntarse acerca do que considera um bem e do que considera um mal Não questiona as regras que lhe são impostas principalmente pela mídia e pela publicidade não questiona a coerência e a congru ência de seus pais de seus pares e de sua sociedade Não se dá conta de quais valores orientam sua vida e suas escolhas Escolhe compulsivamente mais apoiado em desejos aprendidos que em desejos sentidos Em vez de buscar ajustamentos criativos perde se em apressadas adaptações narcísicas Acaba por pensar sentir e agir de maneira desintegrada não se apossando de seus pensamentos desprezando seus sentimentos e agindo de maneira impulsiva embora com boas intenções Os Horizontes Para ajudar esses jovens na lida com seus valores e com sua ansiedade penso que é papel do psicoterapeuta e do educador facilitar para que seus questionamentos se ampliem principalmente em cinco pontos Piccino 1987 Revista ITGT122indd 64 Revista ITGT122indd 64 1152007 123520 1152007 123520 Ansiedade na Adolescência 65 Revista da Abordagem Gestáltica XII2 5966 juldez 2006 A r t i g o Tomar consciência de quais regras norteiam sua postura diante da vida Tomar consciência de como age no seu cotidiano Questionar e assumir como seus ou não os critérios pelos quais se norteia Verificar o grau de proatividade3 nessas escolhas Verificar a congruência e a coerência das atitudes e das escolhas É importante salientar que esse é um trabalho que se faz com o jovem respei tando seus limites Um jovem de 13 anos tem direito a mais incoerências que um jovem de 18 anos um jovem de 15 anos é capaz de discriminar e escolher seus valores de maneira menos emocional e mais abrangente que um jovem de 12 anos rapazes e moças têm necessidades e velocidades diferentes na conquista de seus valores pessoais A função dessas discussões é facilitar ao jovem a lida com seus horizontes principalmente em dois sentidos primeiro o horizonte enquanto meta enquanto destino e utopia segundo o horizonte enquanto roteiro enquanto referência Os valores enquanto horizontereferência aliviam a ansiedade Quando assumo um valor autonomamente tenho mais claro alguns para quê de minha existência e um sentido mais relevante para os acontecimentos da vida Minha intencionalidade fica mais próxima de minha consciência Por exemplo se tenho como valor importante o conhecimento ele me levará em buscas que têm sentido por si mesmas e por aquilo que provocam no futuro quando os conhecimentos de agora alicerçarão os conhecimentos de depois Conhecer dará um sentido para meu agora e para meu porvir O horizonte tem uma peculiaridade fantástica ele é inalcançável é infinito Quando chegamos onde era o horizonte ali já não é mais horizonte o horizonte é mais além E assim infinitamente Então os valoresutopia descortinam uma deliciosa impossibilidade quando o que procuramos é infinito e inalcançável estamos menos sujeitos a nos fazermos ansiosos diante dessa busca Por exemplo se tenho como valor ser tolerante nunca serei completamente tolerante mas quanto mais estimulo minha capacidade de ser tolerante mais tolerante me torno Ou em outros termos no que diz respeito aos valores não é necessário que estejamos prontos pois o bom é estarmos sempre em busca de crescimento cf Dalai Lama 2000 p 180 Então para concluir quero dizer que a boa liberdade a liberdade livre da ansiedade patológica é um rio que margeado por bons e autônomos valores corre em direção a um horizonte plausível e inalcançável Referências Bibliográficas Critelli DM 2006 De Volta à Barbárie Folha de São Paulo online Caderno Equilíbrio 30032006 citado 05 Abril 2006 Disponível na World Wide Web httpwww1folha uolcombrfspequilíbrioeq3003200601htm 3 Proativo adj que visa antecipar futuros problemas necessidades ou mudanças antecipatório Revista ITGT122indd 65 Revista ITGT122indd 65 1152007 123520 1152007 123520 Ênio B Pinto 66 Revista da Abordagem Gestáltica XII2 5966 juldez 2006 A r t i g o Dalai Lama 2000 Uma ética para o novo milênio Rio de Janeiro Sextante Heller A 1985 O Cotidiano e a História Rio de Janeiro Paz e Terra Houaiss A Villar MS 2001 Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa Rio de Janeiro Objetiva May R 1977 Psicologia e Dilema Humano Rio de Janeiro Zahar May R 1978 O Homem à Procura de Si Mesmo Petrópolis Vozes May R 1987 Liberdade e Destino Porto Alegre Rocco May R 1988 A Descoberta do Ser Rio de Janeiro Rocco May R 1992 A Procura do Mito São Paulo Manole Piccino JD 1987 Valores Humanos e Psicoterapia Antropos Psicologia e Vida Revista de Psicologia Humanista N 2 São Paulo Sociedade Brasileira de Psicologia Humanista Santos M 2000 Por uma Outra Globalização do pensamento único à consciência universal Rio de Janeiro Record Abstract The adolescence anxiety is discussed from three points the ontologic anxiety the normal anxiety and the pathological anxiety The correlation between anxiety and freedom and among anxiety and freedom and values in the adolescence is studied to propose possible horizons to facilitate to the adolescent of our times the work with those subjects Keywords Anxiety Adolescence Freedom Values Globalization Resumen La ansiedad en la adolescencia es discutida a partir de tres puntos la ansiedad ontologica la ansiedad normal y la ansiedad patológica Se estudia la correlación entre ansiedad y libertad y valores en la adolecencia para proponer posibles horizontes para facilitar a el adolescente de nuestros tiempos a trabajar con estas cuestiones Palabrasclave Ansiedad Adolescencia Libertad Valores Globalización Ênio Brito Pinto Psicólogo CRP 0614675 Gestaltterapeuta Psicopedagogo Mestre e Doutorando em Ciências da Religião pela PUCSP Professor do Instituto de Gestalt de São Paulo Professor do Curso de Musicoterapia do UniFMU Professor do Curso de Especialização em Terapia e em Educação Sexual do IPSEX e da Faculdade de Medicina do ABC autor de artigos capítulos e livros nas áreas de psicoterapia educação sexualidade e religião Email eniobritouolcombr Recebido em 10072006 Aceito em 18102006 Revista ITGT122indd 66 Revista ITGT122indd 66 1152007 123520 1152007 123520
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Interação em Psicologia 2006 102 p 333344 333 O relacionamento entre mãe e filha adulta um estudo descritivo Kirlla Cristhine Almeida Dornelas Agnaldo Garcia Universidade Federal do Espírito Santo RESUMO O relacionamento entre mãe e filha adulta é um tema ainda pouco investigado especialmente no Brasil O objetivo deste trabalho foi investigar de forma exploratória e qualitativa algumas dimensões desta forma de relacionamento Participaram da pesquisa 18 mulheres residentes na Grande Vitória sendo quatro pares de mães e suas filhas casadas e cinco de mães e suas filhas solteiras Foram utilizadas entrevistas semiestruturadas individuais cujo conteúdo foi organizado e os dados foram classificados nas seguintes categorias a história do relacionamento separaçãoaproximação dependênciaindependência expectativas de mudanças na relação a influência da família do esposopai filhosirmãos e de outras pessoas da família o cotidiano do relacionamento atividades compartilhadas e comunicação influência social apoio e cooperação entre mãe filha a percepção do relacionamento acertosequívocos admiraçãocrítica algumas dimensões clássicas do relacionamento similaridades e diferenças reciprocidade e complementaridade conflito interpessoal autorevelação e privacidade O casamento foi apontado como um ponto de separação gerando um novo papel social para a filha o que afeta a relação com a mãe ora afastando ora reaproximando as duas De forma geral o relacionamento entre mãe e filha adulta é marcado por sua natureza dialética integrando separação e aproximação busca de diferenciação e descoberta de similaridades encontros e desencontros Palavraschave relacionamento interpessoal família relacionamento mãefilha adulta ABSTRACT The motheradult daughter relationship a descriptive study The motheradult daughter relationship is still a seldom investigated topic especially in Brazil This work aimed at investigating some dimensions of this kind of relationship in an exploratory and qualitative way Eighteen women participated in the investigation all living in the Metropolitan Area of Vitoria including four pairs of mothers and their married daughters and five pairs of mothers and their single daughters Individual semistructured interviews have been employed The content has been organized and data have been classified in the following categories the relationship history separationapproximation dependenceindependence expectations of relationship changes family influence from spousefather childrensiblings and from other family members the relationship daily routines shared activities and communication social influence support and cooperation between mother and daughter relationship perception rightwrong admirationcriticism some classic relationship dimensions similarities and differences reciprocity and complementarity interpersonal conflict selfrevelation and privacy Marriage has been pointed as a separation point giving rise to a new social role to the daughter which affects her relationship with the mother sometimes getting apart sometimes getting closer In general the motheradult daughter relationship is marked by its dialectical nature integrating separation and approximation a quest for differentiation and the discovery of similarities getting together and breaking apart Keywords personal relationships family motheradult daughter relationship O relacionamento entre pais e filhos adultos repre senta uma área de pesquisa recente e ainda pouco investigada especialmente em território nacional Contudo frente ao aumento na expectativa de vida de pais e filhos tornase cada vez mais relevante conhe cer melhor essa relação Luscher Pillemer 1998 De modo particular o relacionamento entre mãe e filha adulta tem despertado o interesse da comunidade científica internacional sob diferentes perspectivas A relação entre mãe e filha se estende por toda a vida da mãe sofrendo mudanças com o casamento e a mater nidade da filha e a velhice e a enfermidade da mãe Kirlla Cristhine Almeida Dornelas Agnaldo Garcia Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 334 Yoo 2004 Quatro áreas principais de investigação podem ser identificadas na literatura sobre o tema a a influência do relacionamento mãefilha para a for mação da identidade feminina b o cuidado das filhas com mães idosas c os efeitos do casamento e da maternidade da filha no relacionamento com a mãe e d a ambivalência da relação mãefilha A seguir apresentamos uma visão geral desses trabalhos O relacionamento entre mãe e filha é fundamental para o desenvolvimento da identidade feminina de ambas Tal identidade por sua vez também interfere e modula o relacionamento entre elas As mulheres mantêm a identificação com a mãe ao longo da vida e no relacionamento entre elas constroem o que é ser mulher Chodorow 1979 2002 Por outro lado a mãe também se identifica com a filha e projeta seus sentimentos nela em busca de sua realização Einchenbaum Orbach 1983 Historicamente as mulheres são responsáveis pelo campo privado os cuidados com a família e a perpetuação destes laços Isto permite que a relação entre mãe e filha promova uma identificação emocional e de papéis Mottram Hortaçsu 2005 A proximidade ajuda as mulheres a compreenderse conhecer seus papéis sociais e a pró pria feminilidade de acordo com sua cultura O pro cesso de identificação promove a similaridade entre mãe e filha Do ponto de vista dos estudos sobre o relacionamento a similaridade tem sido considerada como um facilitador para uma relação mais próxima como ocorre nas amizades Hinde 1997 De certa forma os estudos privilegiam os efeitos do relaciona mento sobre a identidade Como a identificação afeta o relacionamento entre mãe e filha adulta merece um estudo mais aprofundado Os cuidados providos pela filha adulta à mãe idosa é outro foco de atenção Ajudar os pais idosos é con siderado uma obrigação e responsabilidade dos filhos adultos Cicirelli 1993 2003 Entretanto segundo o autor outros aspectos motivacionais entrariam em jogo como o sentimento de apego Bowlby 1984 1989 Segundo Walker Shin e Bird 1990 a maior parte das mães e filhas relata diferentes motivos para o cuidado provido como afeição proximidade e satis fação As responsabilidades da vida adulta da filha contudo são importantes para definir o tempo dispo nível para a atenção necessária à mãe Scharlach 1987 Por exemplo Lang e Brody 1983 indicam que as filhas casadas dispensam menos atenção e cui dados com a mãe do que as filhas sem trabalho ou solteiras A distância geográfica é algo que também interfere nesta atenção Dewit Wister Burch 1988 Mesmo com custos significativos os cuidados assumidos pela filha também apresentam aspectos positivos Donorfio Sheehan 2001 Para algumas mães e filhas a situação da filha como cuidadora ofe rece a oportunidade de modificar a relação Cantor Hirshorn 1989 Cuidar e ser cuidado representam aspectos de um relacionamento complementar Hinde 1997 Por outro lado pouco tem sido investigado sobre a reciprocidade no relacionamento entre mãe e filha adulta com ênfase em pontos de similaridade quando nenhuma apresenta uma relação de dependên cia da outra como em situações de enfermidade por exemplo Casarse e tornarse mãe são eventos na vida da mulher adulta que afetam sua relação com a mãe podendo fortalecêla ou enfraquecêla Suitor 1987 Estes acontecimentos dão lugar a novos papéis da mulher Apesar da diversidade de papéis da vida adulta das mulheres segundo a autora casar e ter filhos são os marcos mais importantes para o relacio namento entre mãe e filha adulta ampliando sua rede social sogros genros e filhos e criando novos papéis sociais como o de avó Estes fatos marcantes no rela cionamento entre mãe e filha evidenciam seu aspecto histórico e sua constante transformação Hinde 1997 Tais dados realçam a importância de considerar a situação familiar das filhas adultas solteiras ou casa das com ou sem filhos como afetando diretamente o relacionamento com suas mães Como em qualquer outro relacionamento esta re lação também apresenta aspectos negativos Os rela cionamentos em geral estão sujeitos a dificuldades entre elas o conflito e a agressividade Hinde 1997 A coexistência de sentimentos positivos e negativos é normal na relação entre mãe e filha mas as discussões entre elas sobre os sentimentos negativos para evitar o conflito não são comuns neste relacionamento Fingerman 1995 1996 Neste contexto as mães percebem mais os pontos de similaridades e aproxi mação com as filhas que valorizam mais a relação à medida que envelhecem buscando a proximidade materna argumentam Lefkowitz e Fingerman 2003 As quatro áreas indicam a diversidade dos estudos não apenas quanto ao foco da investigação mas tam bém em relação à orientação teórica A presente pes quisa se relaciona em parte com algumas das áreas acima ao descrever como o processo de identificação entre mãe e filha interfere na dinâmica do relaciona mento sem desconsiderar a ambigüidade emocional Em relação aos trabalhos acima citados este artigo apresenta dois pontos que o distinguem Do ponto de Relacionamento MãeFilha Adulta Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 335 vista teórico toma como referencial teórico a obra de Robert Hinde 1997 na qual o autor propõe alguns princípios para a organização de uma ciência do rela cionamento interpessoal princípios estes que orien tam a presente investigação particularmente quanto à importância dada aos aspectos descritivos e a integra ção ou síntese de vários aspectos da relação entre mãe e filha adulta Do ponto de vista do foco da investiga ção o presente artigo procura discutir o relaciona mento entre mãe e filha adulta enfatizando a similari dade entre ambas como mulheres adultas sem rela ções de dependência ou cuidado devido a enfermidade ou idade avançada contrastando com a ênfase na literatura sobre a dependência da mãe idosa em rela ção à filha adulta A melhoria das condições de saúde da população relacionada ao desenvolvimento social econômico e tecnológico mostra reflexos no aumento da longevi dade o que afeta também as relações familiares Uma conseqüência direta do aumento de longevidade e das condições gerais de saúde é a possibilidade de um maior período de convivência entre mãe e filha adulta sem que a filha assuma o papel de cuidadora da mãe Assim um conhecimento mais profundo das relações entre mãe e filha adulta nessas condições pode contri buir para a melhoria da qualidade de vida tanto das mães quanto das filhas Este trabalho teve como objetivo investigar des crever e analisar o relacionamento entre mães e suas filhas adultas em uma fase intermediária da vida quando mães e filhas não dispensam cuidados especi ais à outra Cinco aspectos mais amplos foram inves tigados nesta pesquisa qualitativa a a história do relacionamento entre mãe e filha b a influência da família no relacionamento c o cotidiano do relacio namento d a percepção do relacionamento e e al gumas dimensões básicas do relacionamento seme lhanças e diferenças reciprocidade e complementari dade conflitos e autorevelação e privacidade Bus couse ainda verificar indícios de efeitos do casa mento das filhas sobre essas propriedades de relacio namento MÉTODO A pesquisa foi realizada com a participação de nove filhas adultas com suas respectivas mães O contato foi feito inicialmente com as filhas Neste caso todas tinham entre 25 e 35 anos de idade haviam concluído um curso superior exerciam atividade re munerada e não tinham filhos Por outro lado as mães participantes tinham entre 45 e 65 anos e eram todas alfabetizadas com a escolaridade variando entre ensi no fundamental e curso superior No caso das mães algumas exerciam atividade profissional remunerada As participantes foram divididas em dois grupos mães e suas filhas casadas há pelo menos um ano quatro duplas e mães e suas filhas solteiras cinco duplas Todas as filhas casadas residiam em residên cias separadas sendo que mães e filhas residiam na Grande Vitória As filhas solteiras residiam junta mente com suas mães convivendo diariamente Os participantes foram indicados por pessoas ligadas ao Programa de Pósgraduação em Psicologia da Univer sidade Federal do Espírito Santo Foram excluídas mães e filhas adultas que necessitavam de cuidados especiais As filhas e suas respectivas mães pertenciam a nove famílias As cinco famílias de origem das filhas solteiras apresentavam a seguinte configuração a pai mãe a filha mais velha e seu irmão b mãe viúva e seu novo companheiro a filha mais velha e seu ir mão c pai mãe e a filha d pai trabalha em outros estados mãe um irmão mais velho a filha segundo filho e dois irmãos mais novos e pai mãe a filha mais velha e um irmão além da avó que mora no andar de baixo da casa As quatro famílias de origem das filhas casadas apresentavam a seguinte configura ção a pai mãe a filha mais velha e sua irmã mais jovem b mãe viúva a filha mais velha duas irmãs e dois irmãos c pai mãe a filha uma irmã mais velha casada e um irmão mais jovem d pai mãe a filha mais velha duas irmãs e um irmão adotivo da mesma idade da filha participante Das nove mães que participaram da pesquisa sete ainda estavam casadas com os pais de suas filhas Duas haviam ficado viú vas sendo que uma delas residia com um novo com panheiro As filhas solteiras além de trabalharem também estudavam cursos de pósgraduação ou de idiomas entre outros e apenas uma delas estava na morando na época da entrevista O instrumento utilizado para a coleta de dados foi uma entrevista semiestruturada seguindo um roteiro preestabelecido abordando diferentes aspectos do relacionamento entre mãe e filha adulta histórico e o cotidiano da relação contexto familiar percepção do relacionamento e algumas dimensões como influência cooperação e conflito indicadas por Hinde 1997 As entrevistas foram realizadas individualmente na casa ou no ambiente de trabalho das participantes de acor do com sua preferência e duraram entre quarenta minutos e uma hora e meia Estas foram gravadas e transcritas na íntegra Kirlla Cristhine Almeida Dornelas Agnaldo Garcia Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 336 Os dados foram analisados de forma qualitativa tendo o conteúdo das respostas sido organizado de acordo com categorias préestabelecidas indicadas abaixo Dentro de cada uma destas categorias foram propostas subcategorias definidas de modo indutivo a partir do seu conteúdo As categorias préestabeleci das ou os aspectos investigados foram os seguintes a história do relacionamento entre mãe e filha da infân cia aos momentos marcantes da vida adulta e expecta tivas quanto ao relacionamento futuro b família como os demais familiares influenciam o relaciona mento c o cotidiano do relacionamento aspectos da convivência incluindo as atividades em comum e a comunicação d influência social e cooperação o apoio a relação de ajuda as influências e suas difi culdades e a percepção do relacionamento os lados positivo e negativo da relação f categorias básicas do relacionamento semelhanças e diferenças recipro cidade e complementaridade conflitos e estratégias de resolução RESULTADOS 1 A história do relacionamento A partir da organização do conteúdo das respostas às questões sobre a história do relacionamento foram propostas três subcategorias de acordo com a seme lhança de conteúdo uma dimensão incluindo aproxi mação e separação outra sobre dependência e inde pendência e uma terceira sobre mudanças no relacio namento Separação e Aproximação Mães e filhas apre sentam movimentos de distanciamento e aproximação ao longo do tempo Shaw Magnuson 2004 Sete mães quatro de filhas casadas e três de filhas soltei ras citaram a separação ao falar da história de seu relacionamento com a filha Essa separação estava associada ao primeiro namorado à perda da virginda de à entrada das filhas no mercado de trabalho à resolução dos próprios problemas por parte das filhas e ao seu casamento Separação e aproximação contu do estavam mescladas nesses eventos cruciais como o casamento Com relação à manutenção da proximi dade três mães com filhas casadas relataram que as filhas sempre a visitavam principalmente em eventos familiares como aniversários e o almoço de domingo Além disto a pequena distância física da casa das filhas foi um fator de aproximação facilitando visitas e encontros casuais As filhas solteiras contudo estão mais próximas Três mães e suas filhas solteiras com partilhavam atividades como lanchar e sair juntas Quando as filhas eram casadas estas buscavam mais a aproximação Por outro lado quando as filhas eram solteiras foram as mães que buscaram se aproximar Desta forma mesmo com a separação imposta pelo casamento novas formas de aproximação são criadas As filhas também indicaram a separação e a reapro ximação como fazendo parte do histórico da relação com suas mães Os fatores de separação mencionados pelas filhas quatro solteiras e três casadas incluíam a mudança de postura materna ir estudar em outro esta do a vida universitária ter condições financeiras de se sustentar a separação dos problemas de cada uma não mais necessitar de aprovação contínua a desco berta da vida sexual da filha pela mãe e o casamento O casamento foi indicado como um evento marcante pelas filhas casadas contudo com efeitos positivos sobre o relacionamento com as mães possivelmente pelo desenvolvimento de novos de pontos de similari dade O período póscasamento foi doloroso para mães e filhas gerando o sentimento de solidão e o desejo em ambas de estarem mais próximas Para três filhas casadas partilhar aspectos similares como a vida de casada facilitou a comunicação e a compreen são entre elas As filhas solteiras quatro ressaltaram a separação e as diferenças com a mãe mas ainda assim se sentiam próximas delas Dependência e Independência A dependência pode ocorrer entre outros motivos pelas mães deseja rem continuar como a principal fonte de apoio emocio nal das filhas Kabat 1998 e pelo desejo das filhas em se manterem sob esta proteção A dependência foi comentada por três mães duas com filhas solteiras e uma com filha casada que se consideraram depen dentes da filha Somente uma mãe considerou a pró pria filha solteira como dependente sempre procu rando sua orientação A dedicação às filhas solteiras é uma maneira das mães dependentes tentar cativálas a manter o relacionamento Consideraram que a entrada de novas pessoas na vida das filhas como namorado ou marido causa mudanças que não as agradam As filhas casadas não se referiram à dependência entre elas e suas mães talvez por estarem mais voltadas para as suas próprias vidas conciliando casamento e carreira Dentre as filhas solteiras apenas uma enfati zou sua dependência da mãe A relação se altera pelo crescimento da filha que passa a estudar longe de casa estar mais com as amigas ou namorado e a apre sentar opiniões próprias Como as mães disseram foram diminuindo os cuidados maternos porque as filhas passaram a cuidar de si mesmas Relacionamento MãeFilha Adulta Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 337 Expectativas de Mudanças na Relação Os relacio namentos mudam progressivamente ou variam dentro de alguns limites desde coisas triviais até grandes transformações Hinde 1997 Apesar de se declara rem satisfeitas com o relacionamento atual mães quatro com filhas casadas e quatro com filhas soltei ras e filhas almejam mudanças As mães de filhas casadas desejavam morar mais perto das filhas ser avós ver o sucesso profissional das filhas aliado a seu bemestar e não incomodar quando idosas As mães de filhas solteiras gostariam que as filhas fossem mais abertas que pudessem cuidar mais delas que conquistassem sucesso e independência profissional e financeira Consideraram o casamento e a maternida de das filhas como não obrigatórios apesar de deseja rem ser avós Oito filhas apontaram expectativas quanto a mudanças no relacionamento As casadas quatro gostariam de mudar seus comportamentos e atitudes no tratamento com as mães Esperam que a futura gravidez ajude na compreensão do que é ser mãe e aumente a união entre elas As solteiras quatro também esperam se tornar mais abertas e pacientes com as mães Somente uma considerou que a mãe deveria aceitar mais suas opiniões Quanto ao casa mento elas têm opiniões diferentes do impacto no relacionamento com as mães ora como causa de afastamento devido aos cuidados com a própria fa mília ora como causa de aproximação pela similari dade de papéis na constituição da própria família 2 A família O relacionamento entre mãe e filha adulta não é algo isolado e nem está limitado ao contexto familiar MensVerhulst 1995 A compreensão da relação deve considerar estas participações na dinâmica da díade e sua influência sobre o relacionamento como é o caso dos pais ou esposos e dos irmãos ou filhos OConnor 1990 Esposo Pai Para três mães de filhas casadas o esposopai percebe a relação entre mãe e filha positi vamente Para estas mães os maridos adulam as fi lhas Quatro mães de filhas solteiras comentaram que suas filhas são filhas do pai considerandoas muito parecidas com eles e diferentes delas próprias o que facilitaria a compreensão do comportamento das fi lhas Quando há outros filhos do sexo masculino as mães demonstraram se identificar mais com os filhos mesmo negando a existência de preferências no rela cionamento entre mãe e filhos Apesar disto estas mães também observaram que os pais sentem ciúmes do relacionamento entre elas e suas filhas pois se sentem à parte nesta relação Somente uma mãe disse que pai e filha são mais ligados entre si do que ela e sua filha Para as filhas casadas três os pais são protetores e aduladores as vêem como autoritárias e influenciando as mães Três filhas solteiras relataram que as mães as vêem como semelhantes ao pai Po rém não se vêem mais próximas dele porque é com a mãe que as coisas acontecem Isto é o relacionamento com o pai parece ser uma relação em grande parte intermediada pela mãe FilhosIrmãos A relação entre mãe e filha adulta sofre a interferência dos outros filhos ou irmãos Todas as mães de filhas casadas falaram de todos os filhos em várias ocasiões indicando a presença de ciúmes dos filhos em relação ao vínculo existente com a filha considerandoas mais próximas Três mães de filhas solteiras consideraram que as filhas sentem ciúmes dos irmãos mas ressaltaram não haver dife rença de tratamento Para três filhas casadas os ir mãos ajudam a minimizar as dificuldades fortalecem os laços familiares são confidentes e ajudam a filtrar o que deve chegar ao conhecimento das mães Três filhas solteiras avaliaram que os irmãos são as pessoas com quem dividem a atenção das mães o que muitas vezes provoca ciúmes Outras Pessoas da Família Três mães de filhas casadas comentaram que os genros são muito queridos e presentes nas atividades da família participando do almoço de domingo de viagens à casa de praia no verão e de festas de aniversários Contudo uma mãe reclamou do fato de a filha incluir o marido em tudo o que faz o que a incomoda As mães apreciam os gen ros todavia valorizam o tempo que podem comparti lhar com as filhas sem a presença deles As mães tam bém relataram que amigos próximos elogiam a rela ção reforçando a maneira de conduzirem o relacio namento entre elas e suas filhas 3 O cotidiano do relacionamento Dois aspectos se destacam no cotidiano do relacio namento as atividades compartilhadas e a comunica ção considerados aspectos importantes da relação parental adulta Lawton Silverstein Bengston 1994 As atividades compartilhadas por mãe e filha adulta trazem satisfação com a convivência Todas as mães e filhas compartilham atividades principalmente no ambiente doméstico e reclamaram do pouco tempo disponível para a relação Três das quatro mães de filhas casadas relataram atividades em comum não Kirlla Cristhine Almeida Dornelas Agnaldo Garcia Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 338 exclusivamente delas pois envolvem a família sem pre buscando incluir as filhas nas atividades sociais e mesmo em situações profissionais As atividades ocorrem geralmente na casa materna e as mães ha bitualmente não freqüentam a casa de suas filhas mesmo apreciando as filhas como donas de casa Como atividades independentes foram citadas a rotina das atividades domésticas e atividades físicas como caminhar Todas as mães de filhas solteiras disseram que passam algum tempo juntas seja vendo televisão ou lanchando embora os horários sejam incompatí veis devido ao trabalho e estudos das filhas Por isso atividades fora de casa são eventuais quando as filhas as acompanham ao supermercado ou ao shopping As mães ainda relataram que não há empecilhos quanto a irem juntas a festas praia ou mesmo barzinhos embo ra estas sejam atividades que as filhas costumam compartilhar mais com os amigos Para as filhas casa das o domingo é um dia importante para as atividades sociais familiares O casamento limita ainda mais o tempo dedicado especificamente às mães No caso das filhas solteiras atividades em comum incluíam ver televisão novelas e filmes cozinhar lanchar fazer compras pessoais ir ao supermercado ou ao salão de beleza As filhas solteiras perceberam que as mães procuram adaptarse aos horários delas para que pos sam estar mais juntas A comunicação é essencial para a construção e a manutenção do relacionamento Assuntos cotidianos como casa e família foram citados por todas as mães As filhas casadas citaram vida profissional o ambiente familiar e assuntos relacionados a casamen to ressaltando que o status de casadas fez com que as mães falassem mais da vida pessoal Três filhas soltei ras relataram que as conversas com suas mães costu mam ser sobre trabalho estudo e amigos Por outro lado também foram mencionadas dificuldades de comunicação Conforme Lefkowitz e Fingerman 2003 mãe e filha não costumam discutir sentimen tos negativos e problemas da relação As dificuldades identificadas se referiam a assuntos não discutidos Todas as mães de filhas casadas avaliaram que a pos tura das filhas as inibe quanto a conversar sobre as suntos mais íntimos fazer uma crítica ou mesmo pedir algo Mesmo assim algumas chegam a expor seus problemas conjugais Para quatro mães de filhas solteiras as conversas sobre vida pessoal namoro e sexo são superficiais Oito filhas comentaram sobre dificuldades de conversar sobre a vida pessoal Todas as filhas casadas disseram não haver assuntos tabus mas não conversam abertamente com as mães sobre suas vidas íntimas e não apreciam quando as mães o fazem A diferença no nível de escolaridade entre elas também dificulta o entendimento Quatro filhas soltei ras omitem ou evitam alguns assuntos para não preo cuparem suas mães Conversam superficialmente so bre relacionamentos afetivos e não conversam sobre sexo Todas as filhas preservam os aspectos afetivo sexuais nas conversas com suas mães uma das filhas solteiras explicou que mãe é como um ser superior não devendo ser exposta à intimidade das filhas 4 Influência social e cooperação A influência social o apoio e cooperação estão presentes em diferentes tipos de relacionamento A influência social diz respeito a quanto o comporta mento ou opiniões de uma pessoa afetam o compor tamento e as opiniões de outra À medida que o relacionamento se desenvolve mãe e filha se adaptam uma à outra de diferentes formas e muitas vezes a influência se confunde com obrigação social Stein 1993 Algumas mães duas associaram influência social à manipulação ressaltan do que não interferem na vida das filhas Apesar disto três mães de filhas casadas comentaram a influência das filhas em suas vidas associando influência à aprendizagem Três mães de filhas solteiras se preo cupavam em serem aceitas considerando as opiniões das filhas como referência ou um impedimento de conduta As mães disseram que as filhas adultas influ enciam na mudança de hábitos no compromisso com os outros na valorização da própria vida além de mostrarem o que é moderno em termos de conduta pessoal e familiar Seis filhas três casadas e três sol teiras ressaltaram que sofrem a influência de suas mães na vivência da fé na maneira como se compor tavam e nas escolhas que faziam Três filhas casadas têm o modo de vida das mães e o seu casamento como referência O casamento da filha parece aumentar a influência mútua As mães declararam que as filhas cobram mais delas chamando a atenção quanto a ati tudes e comportamentos Segundo três mães de filhas casadas embora receiem fazer solicitações para as filhas pode se pedir tudo Duas mães de filhas soltei ras consideraram que a dedicação à criação das filhas merece retorno delas agora Segundo as mães de filhas casadas suas filhas são muito exigentes e estão sem pre corrigindo seu modo de falar ou agir em determi nada situação o que as aborrece Por outro lado três filhas casadas relataram que suas mães exigem certas formas de comportamento delas em relação ao marido e à sogra Muitas vezes as filhas têm dificuldades em Relacionamento MãeFilha Adulta Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 339 compreender o ponto de vista materno Martini Grusec Bernardini 2001 reconhecendo que são mais exigentes e menos tolerantes com o comporta mento das mães do que o contrário Quatro filhas sol teiras disseram não fazer exigências para as mães e que as reclamações maternas são sobre o tempo fora de casa nos fins de semana na casa do namorado ou de amigas e ser muito bagunceira A influência social no relacionamento entre mãe e filha adulta parece estar associada às exigências impostas uma à outra muitas vezes gerando conflito entre elas Apoio e Cooperação De acordo com Umberson 1992 a ajuda entre pais e seus filhos adultos traz conseqüências emocionais para ambos A troca de opiniões ajuda e cumplicidade foram relatados pelas participantes Oito mães e todas as nove filhas citaram o apoio como importante Três mães de filhas casadas informaram que a ajuda acontece quando uma precisa da outra sendo que precisam mais das filhas do que o contrário exceto quando as filhas adoecem As mães disseram que as filhas casadas ajudam com suas opi niões sobre roupas e compra de presentes e assuntos cotidianos Financeiramente algumas mães ajudaram suas filhas no início do casamento e uma das mães recebe o auxílio da filha casada eventualmente A vida financeira é mais partilhada quando as filhas são solteiras As mães de filhas solteiras consultam as filhas sobre compras pessoais roupas e da casa e sobre dificuldades da família Todas as mães de filhas solteiras indicaram a ajuda nas atividades domésticas As mães destacaram a gratidão e o constrangimento pelo fato das filhas solteiras pararem suas vidas para ajudálas Todas as filhas consideraram as mães como fundamentais quando em dificuldade e viceversa Valorizaram a disponibilidade materna em ajudar e tentar compreender as diversas situações Mas consi deraram que as mães buscam mais ajuda e opiniões sobre o que fazer No caso das filhas casadas elas ajudam em questões ligadas à saúde situações do mésticas e à orientação sobre como lidar com os ir mãos Disseram gostar de saber o que as mães pensam sobre diversas situações da vida pessoal ou profissio nal Entretanto o fato de não morarem mais na mesma casa diminui a obrigatoriedade da ajuda das filhas casadas A maioria das filhas solteiras oito solicita ajuda materna devido à sua capacidade de análise desde assuntos práticos até situações mais complexas como na tomada de decisão dicas para melhorar no trabalho e como se comportar em determinada situa ção Em contrapartida elas ajudam suas mães nas decisões ligadas à casa problemas financeiros e com pras domésticas e ao trabalho materno Segundo as filhas solteiras as mães as incentivam a realizar pro jetos e gastar menos dinheiro Este apoio contribui para melhorar a autoestima pois por saberem que elas estão por perto as ajuda a se arriscarem A coope ração busca facilitar a vida da outra Mães e filhas casadas se percebem como cúmplices e duas mães de filhas casadas acharam que a cumplicidade é o dife rencial deste relacionamento da relação da filha com o pai Duas mães consideraram haver problemas de coo peração especialmente pela falta de tempo das filhas Duas mães de filhas casadas se preocupavam com a necessidade de cuidados especiais na velhice interfe rindo na vida das filhas Para três filhas casadas um dos problemas em ajudar as mães é que estas não pe dem as coisas diretamente e ficam aborrecidas quando as mães não compreendem os motivos que impedem a ajuda entendendo a cooperação como obrigação Se gundo uma filha solteira as mães são esquecidas e as opiniões diferentes prejudicam a cooperação Curio samente a influência social e a cooperação são vistas de forma ambígua por mães e filhas A influência é vista como intromissão ao mesmo tempo em que é algo positivo A falta de cooperação está ligada a fato res como falta de tempo dificuldade de comunicação e competição Mães e filhas reconheceram sofrer a influência da outra muitas vezes na forma de exigên cias relacionadas ao seu comportamento 5 A percepção do relacionamento Ao se manifestarem sobre a forma como percebem o relacionamento com a outra três dimensões se des tacaram para mães e filhas a amizade admiração e crítica e acertos e equívocos A literatura trata das diferenças entre as expectativas e a descrição que cada uma apresenta do papel da outra CotttenHuston Johnson 1998 além da interferência do contexto na percepção do relacionamento entre mãe e filha adulta para cada uma delas Rastogi 2002 Duas mães de filhas casadas consideraram a possi bilidade de conversarem de igual para igual tendo em vista que ambas são adultas como amizade Três mães de filhas solteiras relataram haver amizade entre elas pois se conhecem bem Tal amizade não pode ser considerada típica por não ser voluntária e por não conversarem sobre as mesmas coisas que conversam com outros amigos Conforme uma das mães união é diferente de amizade no relacionamento entre mãe e filha existe mais o primeiro caso Duas filhas casadas indicaram a falta de hierarquia pelo fato de serem Kirlla Cristhine Almeida Dornelas Agnaldo Garcia Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 340 adultas e casadas como amizade Duas filhas solteiras associaram a ligação forte entre elas com amizade também por conversarem sobre tudo exceto sobre sexo e por não falarem palavrão perto dela o que fa ziam com outras amigas O que prejudica a amizade segundo duas mães com filhas casadas é o autorita rismo das filhas Para quatro mães de filhas solteiras suas filhas são reservadas demais voluntariosas tei mosas desorganizadas e costumam se isolar Todas as filhas casadas indicaram dificuldades para a amizade como as diferenças de contexto de vida e de nível de escolaridade infantilidade materna tendências de pressivas ou de expansividade das mães ou seja diferenças de personalidade Aparentes diferenças com uma amizade típica foram relatadas Neste caso a amizade entre mãe e filha pode ser entendida como reciprocidade de afeto e comportamento Quando mãe e filha se percebem como iguais com atitudes mais simétricas elas se consideram amigas Outra dimensão que surgiu na percepção do relacio namento foram manifestações de admiração e crítica Duas mães com filhas casadas relataram admiração pela própria relação Três mães com filhas solteiras comentaram a admiração que sentem por suas filhas adultas serem mulheres maduras equilibradas segu ras na atuação profissional e que sabem o que querem Três mães com filhas casadas criticaram o hábito das filhas de chamarem sua atenção em público como apontar erros ou corrigilas As mães de filhas soltei ras indicaram que as filhas criticam o tratamento dado aos outros irmãos e certos hábitos da mãe como fu mar As mães reclamaram do consumismo das filhas e do excesso de independência Cinco filhas duas casadas e três solteiras demonstraram admiração pelas mães considerandoas mulheres fortes guerrei ras dedicadas sensíveis carinhosas compreensivas mesmo quando as filhas são hostis e com um casa mento bemsucedido Sete participantes quatro casa das e três solteiras também criticaram as mães por falarem demais em momentos inoportunos e quando não solicitadas pela aparência rigidez e impaciência Outra dimensão englobando duas tendências opostas diz respeito aos acertos e equívocos apontados pelo outro Como acertos três mães de filhas casadas mencionaram a educação Três mães de filhas soltei ras citaram os valores familiares como o respeito aos outros e a não intromissão na vida das filhas abrindo mão de interesses pessoais Em geral as mães consi deraram não ter cometido erros na relação exceto no caso de uma mãe com filha casada ao reconhecer a pouca atenção que deu à filha Três filhas casadas citaram como acertos a educação a importância do trabalho sair de casa via casamento e estabelecer limites claros Duas solteiras citaram como acertos a liberdade o cuidado materno e a presença materna constante em suas vidas para apoiálas e orientálas Três filhas lamentaram a maneira como tratam suas mães considerandose egoístas e com dificuldade para ouvir as mães Duas filhas solteiras sentiam re morso por perceber que as mães estavam certas em diversas situações de conflito além de criticálas em virtude do estresse profissional As filhas considera ram os acertos como uma responsabilidade materna e os equívocos como ações isoladas 6 Dimensões do relacionamento As entrevistas também procuraram obter dados a respeito de algumas dimensões do relacionamento enumeradas por Hinde 1997 como similaridades e diferenças reciprocidade e complementaridade con flito interpessoal autorevelação e privacidade A percepção de similaridades e diferenças apare ceu nos relatos das díades As mães de filhas solteiras embora tenham identificado similaridades como va lores e expectativas em relação a outras pessoas en fatizaram as diferenças que não consideraram como um problema Mães e filhas casadas tinham mais pontos em comum como a saudade e a tristeza com a separação um menor grau de dependência da filha e a preocupação com mudanças na relação em virtude do declínio da saúde com a idade As filhas casadas tam bém reconheceram mais aspectos de similaridade no relacionamento considerando que a separação foi importante para valorizarem as semelhanças e reco nhecerem em si mesmas atitudes parecidas com as das mães Apesar de melhorar a compreensão elas destacaram que as similaridades também podem ser fontes de conflitos ao buscarem as mesmas coisas As semelhanças são motivos de proximidade e orgulho fazendo com que tenham dificuldades em perceber diferenças ou minimizem a interferência delas no re lacionamento no caso das mães de filhas casadas Outras diferenças apontadas pelas filhas incluem a diferença de escolaridade Hipoteticamente as simila ridades de gênero e idade facilitam a identificação e a compreensão Por outro lado as filhas se tornam mais autônomas apóiamse em outras relações e têm inte resses próprios representando diferenças importantes entre elas A similaridade facilita a manutenção da relação pois atitudes similares confirmam o que so mos e pensamos Já as diferenças são atrativas mas podem gerar situações inconciliáveis para o relacio namento em longo prazo Hinde 1997 Relacionamento MãeFilha Adulta Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 341 Reciprocidade e complementaridade foram obser vadas nos relacionamentos investigados A reciproci dade esteve associada a interesses similares e à per cepção da outra como adulta e o respeito por suas particularidades A complementaridade esteve pre sente na orientação como no caso da mãe aconselhar a filha no casamento Por vezes as mães de filhas solteiras indicaram um interesse de que as filhas ainda fossem crianças As mudanças na família promoveram uma valorização da reciprocidade nas relações consi derado como fator de satisfação que é importante para o bemestar psicológico do indivíduo adulto Neff Harter 2003 Segundo Falicov 1991 a reciprocidade entre mãe e filha é um sinal de proximi dade emocional Quanto ao conflito interpessoal mães e filhas ten dem a não discutilos tendo em vista a manutenção do bemestar entre elas Assim as mães costumam mi nimizar os problemas considerando coisa de mo mento devido às atribulações da vida Já as filhas preferem ignorar situações potencialmente conflituo sas em vez de transformála em um conflito Segundo elas o melhor para os conflitos é sair da situação pedir desculpas e agir como se nada tivesse aconteci do Isto é mais fácil para as filhas casadas por causa da distância física A existência de conflito em algum momento é praticamente inevitável em relaciona mentos íntimos Hinde 1997 Em sociedades coleti vas alguns estudos apontaram o mesmo ou seja mãe e filha adulta apresentam desentendimentos eventuais mas geralmente por um tempo breve devido à impor tância dada ao relacionamento Gilani 1999 Proximidade e contatos freqüentes não significam necessariamente intimidade ou autorevelação Fingerman 2001 De modo geral o diálogo refere se a acontecimentos externos ao relacionamento As mães consideraram seu relacionamento com as filhas aberto e sem segredos Contudo gostariam que as filhas se revelassem mais Para as mães e filhas seu relacionamento é de natureza privada reservada es pecialmente quanto à participação do pai As filhas valorizaram o contato com as mães porém preocupam se com a sua privacidade e a das mães assim direcio nam os temas das conversas Morgan Hummert 2000 Em geral mães e filhas parecem dispor so mente de algumas idéias sobre o que se passa no ínti mo da outra Os medos e os sonhos por exemplo mantêmse como algo privado DISCUSSÃO Várias dimensões do relacionamento entre mãe e filha adulta foram analisadas Alguns pontos podem ser destacados nessa relação Na história do relacio namento os relatos apontam para três focos de aten ção Separação e aproximação são vistas como partes integrantes do relacionamento Paralelamente a de pendência e a independência também se dão de forma dialética As expectativas de mudança também apon tam para um movimento dialético ora promovendo a diferenciação entre mãe e filha ora provocando uma maior identificação entre elas Chodorow 2002 A história de vida é marcada pela ambivalência ou por tendências dialéticas Hinde 1997 Mãe e filha compartilham uma relação particular Walker Thompson 1983 Esse relacionamento contudo dáse no interior de um grupo social mais amplo a família O paiesposo e os irmãosfilhos são os agentes sociais mais importantes no caso das filhas solteiras devendo ser acrescido o esposogenro no caso das filhas casadas Pai irmãos e esposo interfe rem ora aproximando mãe e filha ora provocando seu afastamento pela disputa da atenção da mãe ou da filha O cotidiano é pautado por atividades compartilha das e não compartilhadas que dimensionam a impor tância da relação para ambas e auxiliam no processo de comunicação A busca de manutenção do relacio namento influencia de maneira ambígua a comunica ção pois querem compartilhar suas vidas sem exposi ção de suas intimidades e criar conflitos Fingerman 1995 1996 A percepção do relacionamento também é marcada pela presença concomitante de opostos acertos são percebidos ao lado de equívocos A admiração convi ve com a crítica ao outro Pillemer Suitor 2002 Relatam haver amizade mas não como uma amizade típica As dimensões básicas do relacionamento se mos tram em sua dialética Semelhanças e diferenças são percebidas entre mãe e filha Reciprocidade e com plementaridade se alternam na relação Conflitos existem mas são negados ou minimizados A estraté gia preferencial do enfrentamento é a negação a evi tação e a minimização Autorevelação e privacidade têm seu lugar mas com restrições Uma comparação das respostas dadas pelas filhas casadas e pelas solteiras na mesma faixa etária indica diferenças relativas a diversos pontos que interferem no relacionamento No caso das filhas casadas o rela Kirlla Cristhine Almeida Dornelas Agnaldo Garcia Interação em Psicologia Curitiba juldez 2006 102 p 333344 342 cionamento é influenciado pela mudança de domicí lio por uma nova situação social por parte da filha uma nova rede social com esposo e seus familiares uma nova posição social com novas responsabilida des As mudanças físicas e sociais trazidas pelo ca samento e os fatos associados interferem no relacio namento mãefilha A cerimônia do casamento é um marco emocional na história delas Nas três dimensões citadas nesta categoria o casamento provoca separa ção Por outro lado o fato de a filha passar a ocupar o papel social de esposa permite uma maior identifica ção com sua mãe o que é percebido como uma apro ximação pelo compartilhamento de experiências e de uma situação social semelhante Na segunda dimen são referente à dependência o casamento reflete em uma maior independência por parte das filhas Final mente quanto às expectativas de mudanças o casa mento é visto por filhas casadas e por suas mães como responsável por mudanças importantes no meio social dentro do qual mãe e filha se relacionam Dewit Wister Burch 1988 O relacionamento fica imerso numa rede mais complexa de relacionamentos em que a filha também passa a encabeçar uma família e o esposogenro é um agente social importante O pai e os irmãos contudo continuam a exercer influência O casamento também afeta o cotidiano da relação quanto às atividades realizadas e às possibilidades de comunicação A maternidade vista como decorrência do casamento também gera a expectativa de maior compreensão entre mãe e filha em decorrência do aumento de similaridade entre elas Na percepção do relacionamento e do outro as semelhanças e diferen ças entre as duas os conflitos e suas estratégias de resolução são permeados pela ambivalência Aspec tos positivos e negativos ultrapassam os sentimentos e permeiam toda a vida social entre mãe e filha na busca de perpetuarem a relação mantendo e transformando seus comportamentos Spitze Gallant 2004 CONSIDERAÇÕES FINAIS De forma geral o relacionamento entre mãe e filha é marcado por sua natureza dialética no sentido de haver um constante movimento de separação e de aproximação de busca de diferenciação e descoberta de similaridades de encontros e desencontros Essa dinâmica parece seguirse a um período de dependên cia maior por parte da filha criança e adolescente e antecede um período de dependência maior da mãe idosa Baruch Barnett 1983 Isto pode ser perce bido nas dimensões investigadas Na história do rela cionamento as respostas apontaram para a dialética da separação e da aproximação da dependência e da independência e das mudanças no relacionamento que em última instância levam a uma maior identifi cação entre mãe e filha esta muda para tornarse mais parecida com a mãe A influência da família no rela cionamento também é pautada ora pelo fortalecimento dessa relação ora pela competição ou pela busca da atenção da mãe ou da filha por outros membros da família O cotidiano é pautado por atividades compar tilhadas e não compartilhadas e a comunicação ao mesmo tempo em que mantém o relacionamento tam bém causa percalços revela e esconde Essa dialética também é percebida quando mãe e filha apontam acertos e equívocos admiração e crítica para descre ver como percebem o relacionamento Boyd 1989 ou falam de uma relação de amizade que contudo se distingue das amizades típicas As próprias dimensões básicas do relacionamento refletem este dinamismo Semelhanças e diferenças são percebidas entre elas ao mesmo tempo em que reciprocidade e complementa ridade Privacidade e autorevelação se alternam na relação Conflitos existem mas são negados ou mini mizados em prol da manutenção do relacionamento O estado civil da filha adulta solteira ou casada influen cia a relação com a mãe contudo em ambos os casos permanece a ambigüidade subjacente ao relacionamen to Assim o casamento ao mesmo tempo em que afasta mãe e filha que assume uma nova posição so cial abre novas possibilidades de relacionamento ao permitir o compartilhar da condição de casada com a mãe o que representa um novo ponto de similaridade REFERÊNCIAS Baruch G Barnett R C 1983 Adult daughters relationships with their mothers Journal of Marriage and the Family 45 601606 Boyd C J 1989 Mothers and daughters a discussion of theory and research Journal of Marriage and the Family 51 291 301 Bowlby J 1984 Apego São Paulo Martins Fontes Bowlby J 1989 Uma base segura aplicações clínicas da teoria do apego Porto Alegre Artes Médicas Cantor M H Hirshorn B 1989 Intergeneracional transfers within the family contextmotivation factors and their implica tions for caregiving Women and Health 14 34 3951 Chodorow N 1979 Estrutura familiar e personalidade feminina Em M Z Rosaldo L Lamphere Orgs A mulher a cultura e a sociedade pp 198226 Rio de Janeiro Paz e Terra Chodorow N 2002 Psicanálise da maternidade uma crítica a Freud a partir da 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eletrônico agnaldogarciauolcombr Revista da Abordagem Gestáltica Phenomenological Studies ISSN 18096867 revistaitgtcombr Instituto de Treinamento e Pesquisa em Gestalt Terapia de Goiânia Brasil BRITO PINTO ÊNIO ANSIEDADE NA ADOLESCÊNCIA Revista da Abordagem Gestáltica Phenomenological Studies vol XII núm 2 diciembre 2006 pp 59 66 Instituto de Treinamento e Pesquisa em Gestalt Terapia de Goiânia Goiânia Brasil Disponível em httpwwwredalycorgarticulooaid357735505004 Como citar este artigo Número completo Mais artigos Home da revista no Redalyc Sistema de Informação Científica Rede de Revistas Científicas da América Latina Caribe Espanha e Portugal Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto Ansiedade na Adolescência 59 Revista da Abordagem Gestáltica XII2 5966 juldez 2006 A r t i g o ANSIEDADE NA ADOLESCÊNCIA1 ÊNIO BRITO PINTO Resumo Discutese a ansiedade na adolescência a partir de três pontos a ansiedade ontológica a ansiedade normal e a ansiedade patológica Estudase a correlação entre ansiedade e liberdade e entre ansiedade e liberdade e valores na adolescência para propor possíveis horizontes para facilitar ao adolescente de nossos tempos a lida com essas questões Palavraschave Ansiedade Adolescência Liberdade Valores Globalização Neste mundo globalizado a competitividade o consumo a confusão dos espíritos constituem os baluartes do presente estado de coisas A competitividade comanda nossas formas de ação O consumo comanda nossa formas de inação E a confusão dos espíritos impede o nosso entendimento do mundo do país do lugar da sociedade e de cada um de nós mesmos Milton Santos São muitos os caminhos possíveis quando pretendemos refletir sobre a ansie dade na adolescência pois essa temática tem diversas possibilidades de abordagem já que se trata de um tema amplo e muito relevante De maneira geral mais do que em qualquer outra época da vida é na adolescência que a ansiedade aparece com mais intensidade Refirome aqui tanto à ansiedade ontológica quanto à ansiedade normal e também à patológica Outro tema relevante e estreitamente ligado à ansiedade que também aparece vigorosamente na consciência do adolescente é o tema dos valores Especialmente nos dias de hoje essa questão toma contornos ainda mais importantes e mais graves para os adolescentes de modo que o caminho que seguirei nessas bre ves reflexões pretende passar pelas três questões adolescência valores e ansiedade Quero refletir um pouco sobre a importância dos valores na gênese e na manutenção da ansiedade na adolescência Vou discutir a partir de um ponto de vista de certa forma polêmico para o adolescente de hoje é muito mais difícil eleger seus valores principalmente porque ele se depara com uma sociedade que ainda não sabe como lidar com a liberdade 1 Mesa redonda apresentada no XV Encontro de Abordagens Humanistas e Fenomenológicas Marília 2006 Revista ITGT122indd 59 Revista ITGT122indd 59 1152007 123520 1152007 123520 Ênio B Pinto 60 Revista da Abordagem Gestáltica XII2 5966 juldez 2006 A r t i g o A Ansiedade e a Liberdade Começo falando da ansiedade e já delimito de onde falo minha compreensão da ansiedade neste texto está ancorada na Psicologia Fenomenológicoexistencial com especial influência dos trabalhos de Rollo May completados pela compreensão gestáltica E nesse nosso começo de conversa sobre a ansiedade já coloco o ponto básico para a visão fenomenológicoexistencial desse tema a ansiedade é inerente ao homem ou dizendo de outro modo ela é ontológica Não dá para imaginar o ser humano sem ansiedade Como serparaamorte ao homem ameaça constantemente o nãoser de modo que a ansiedade está inevitavelmente posta diante dele por toda a sua existência Desde sempre e para sempre Com esse entendimento da ansiedade já a estamos diferenciando do medo uma diferença que não é apenas de grau a ansiedade tem uma densidade que o medo não tem Ou dizendo de outro jeito a ansiedade é central e ontológica o medo é periférico e circunstancial Mas há um outro fator com relação à ansiedade que é extremamente importante para o nosso tema de hoje ansie dade e liberdade estão sempre tão próximas que Kierkegaard descreveu a ansiedade como a vertigem da liberdade citado por May 1987 p 225 O que será que Kierkegaard quis dizer com isso Por que a ansiedade é a vertigem da liberdade Porque liberdade implica em escolha em possibilidade de mudança Uma pessoa sem liberdade também não teria ansiedade Uma vida de mes mices muito muito segura é uma vida sem ansiedade e sem liberdade Por seu turno uma vida em que há liberdade quer dizer em que há possibilidades de escolhas é uma vida em contato com riscos dentre eles o maior deles o risco de nãoser Na verdade a cada vez que escolhemos alguma coisa importante a cada vez que temos um ganho escolhemos também uma perda A cada ser que afirmamos afirmamos também um nãoser A diferença é que nas escolhas importantes da vida a escolha pelo ser é uma aposta ao passo em que a escolha pelo não ser é uma certeza Um exemplo simples a cada passo que dou em uma caminhada perco a paisagem ante rior perco o ponto de vista anterior Um passo à frente e a paisagem é outra E não adianta eu querer voltar um passo atrás ainda que eu consiga voltar para a mesma paisagem meu olhar já é diferente o fenômeno observado a paisagem anterior já é outro Um exemplo mais complicado termino ou não um casamento Se eu disser à minha companheira ou ao meu companheiro acabou não quero mais a relação nunca mais será a mesma pode até vir a ser melhor mas nunca mais será a mesma Mesmo que eu resolva querer mais Então posso afirmar que uma vida sem ansiedade é impossível Mas ainda é pouco para entendermos o conceito de ansiedade há outra observação que precisamos ter em mente nessa conversa há ansiedade normal e ansiedade patológica A ansieda de normal é essa de que falei a inevitável diante da possibilidade de nãoser É essa ansiedade que usamos para nos proteger ao atravessar uma rua para escolher um traje para uma reunião importante para explorar os nossos valores existenciais Há também Revista ITGT122indd 60 Revista ITGT122indd 60 1152007 123520 1152007 123520 Ansiedade na Adolescência 61 Revista da Abordagem Gestáltica XII2 5966 juldez 2006 A r t i g o uma ansiedade patológica que grosso modo pode ser definida como aquela ansiedade desproporcional à ameaça presente Ela aparece principalmente de duas formas na impossibilidade das escolhas e na impulsividade das escolhas A primeira pode ter um exemplo extremo naquela pessoa tão deprimida que sequer é capaz de escolher sair da cama pela manhã a segunda pode ser exemplificada também extremamente por aquela pessoa que busca as drogas na esperança de se sentir mais viva A Liberdade e os Valores Continuo minhas reflexões com um ligeiro correr de olhos pela história da humanidade de modo a verificarmos que o nascimento da sociedade capitalista trouxe uma grande mudança no posicionamento humano diante do mundo e da vida antes do capitalismo havia uma certa predeterminação à espera do homem quando ele nascesse ou seja nas comunidades anteriores ao capitalismo a pessoa já nascia com um lugar social determinado e com um destino de certa forma já traçado de modo que por exemplo quem nascesse camponês camponês morreria A partir do advento do capitalismo o ser humano já não está mais inserido de maneira natural e imutável numa situação social Pelo menos em tese o ser humano já pode escolher seu lugar no mundo já pode escolher seus valores o que acabou por enfraquecer uma ética baseada nos costumes na repetição de geração a geração dos valores e compor tamentos Dessa maneira a liberdade enquanto categoria ética acaba por viver um crescimento perante os outros valores substituindo de certa forma a antiga busca da felicidade como valor supremo Se antes a liberdade sequer era pensada como valor agora a felicidade depende da liberdade Heller 1985 p 7 É óbvio que essa construção não se faz de uma hora para outra de uma geração para outra são necessárias gerações e mais gerações para que se consolide uma mudança deste porte nos valores humanos Mas não há dúvidas de que hoje se o desejo humano ainda é pela felicidade essa felicidade tem que vir através da liberdade Chegamos a tal ponto que o ideal de ser livre e ser feliz acabou por evoluir nos dias de hoje para ser livre é ser feliz Assim está adubado o terreno para que floresça a ansiedade es pecialmente a ansiedade patológica Tratase de um paradoxo A ansiedade ontológica fundamentase na liberdade e é propulsora de desenvolvimento e de crescimento de cuidado e de bons suportes existenciais No entanto se não há suficiente amadureci mento a ansiedade que se faz presente diante da liberdade não é a ansiedade ontológica mas a ansiedade patológica E esse é um dos mais sérios problemas para o adolescente ocidental nesse início de século XXI sua liberdade é muito maior que sua maturidade o que causa ansiedade muita ansiedade Em outros termos o adolescente de hoje é chamado a fazer escolhas cedo demais quando ainda não está suficientemente ama durecido para dar conta de tão importante empreitada Dessa forma o que deveria ser liberdade transformase em desamparo ou seja em liberdade sem continência Revista ITGT122indd 61 Revista ITGT122indd 61 1152007 123520 1152007 123520 Ênio B Pinto 62 Revista da Abordagem Gestáltica XII2 5966 juldez 2006 A r t i g o O problema não está na maturidade do adolescente mas na liberdade que lhe é concedida de maneira atabalhoada e precoce sem que se dê tempo para que ele con quiste sua capacidade de escolha a pouco e pouco par a par com o amadurecimento O amadurecimento humano é coisa que se dá passo a passo que tem funda mento no desenvolvimento psicológico nas relações sociais e no corpo vale dizer no vivido Há um ritmo de amadurecimento humano que praticamente não pode ser acelerado a não ser sob duras penas posteriores O amadurecimento que é a passagem da preponderância do suporte ambiental para a preponderância do autosuporte se dá ao longo do tempo De igual modo acontece com a assimilação dos valores recebidos da família e da sociedade a transformação desses valores heterônomos em valores autô nomos também se dá ao longo de um amplo e necessário transcurso de tempo Quando se exige o apressamento dessa travessia abremse as portas para a ansiedade É óbvio que não é apenas a passagem do tempo que produz o amadurecimen to tão importante quanto o tempo são o suporte ambiental e o suporte pessoal que a criança e posteriormente o jovem terão para consolidar seu desenvolvimento O apoio e o exemplo de familiares eou pessoas afetivamente importantes é fator imprescindível A colocação clara por parte das figuras de autoridade de limites e de responsabilidades afinados com o estágio de desenvolvimento facilita o amadu recimento da criança e do adolescente Por seu turno o excesso ou a falta extremada de limites inibem o desenvolvimento Assim sofrem do mesmo mal de imaturidade aquele jovem que é impedido de experimentar ampliações em suas fronteiras e aquele jovem de quem nada lhe é exigido tudo lhe é perdoado O jovem sem liberdade tem seu desenvolvimento tão prejudicado quanto o jovem com liberdade ampla demais e os dois porque desamparados são vítimas fáceis da ansiedade patológica Este é um dos mais importantes problemas que está posto para o adolescente de hoje essa é uma das mais importantes causas de sua ansiedade um desamparo que acarreta paradoxalmente uma exigência exagerada perante os jovens Eles têm que fazer escolhas e tomar atitudes para as quais ainda não estão suficientemente amadurecidos Eles não têm o necessário suporte ambiental que lhes propicie fazer escolhas com a necessária tranqüilidade dentro do necessário tempo Escolher o ato supremo de liberdade é capacidade cuja maestria construímos com paciência ao longo do tempo e apoiados por um adequado suporte ambiental O mundo pósmoderno o mundo globalizado ocidental rouba dos jovens a possibilidade da paciência da construção de si com tempo necessário e suficiente Nossa cultura impõe rapidez e agilidade privilegia excessivamente a novidade quer a mudança sem a estabilidade que a sustente a competitividade2 no lugar da competição insistentemente confunde desejo com necessidade quer reduzir a história ao futuro provoca a ilusão de que se pode ganhar sem perder a vã ilusão de que não são necessários sacrifícios para que se tenha felicidade Mais que tudo isso a ideologia vigente no mundo oci dental globalizado pretende fazer crer que a independência é possível que a liberdade 2 Entendo aqui a competitividade como a competição sem limite e sem compaixão Santos 2000 p 31 Revista ITGT122indd 62 Revista ITGT122indd 62 1152007 123520 1152007 123520 Ansiedade na Adolescência 63 Revista da Abordagem Gestáltica XII2 5966 juldez 2006 A r t i g o absoluta é meta legítima que somente o mais próximo e imediato é problema meu Comprovando esse último aspecto recente pesquisa realizada nos EUA constatou que apesar da constante cobertura da imprensa desde a invasão do Iraque em 2003 63 dos entrevistados jovens de 18 a 24 anos não foram capazes de localizálo no mapa e 75 não conseguiram encontrar Israel ou o Irã Nove em cada dez também foram incapazes de achar o Afeganistão no mapa asiático 75 não acharam a Indonésia e 70 não localizaram a Coréia do Norte FSP 03052006 p A 16 O tempo hoje é o tempo do já É aqui e agora Liberdade sem limites e sem responsabilidades Vida sem frustrações Amor líquido Tolerância passional Saúde só corporal Responsabilidade social só com os iguais Honestidade relativa Beleza narcísica Conhecimento especializadíssimo Solidariedade estratificada Urgência Fast food fast existence fast death Dizendo de outra maneira vivemos em um mundo em que a liberdade se tornou de tal maneira o valor fundamental que é quase como se ela fosse o único valor pelo qual as pessoas devessem guiar suas vidas Isso faz com que a liberdade se transforme em desamparo Além disso muito facilmente a liberdade é confundida com açoda mento E passase a exigir do jovem que ele saiba o que não pode ainda saber passase a exigir do jovem que ele faça o que ainda não pode fazer sozinho passase a exigir do jovem que ele escolha o que ainda não pode escolher sozinho Assim a liberdade passa de valor básico e legítimo para valor único e soberano melhor diria tirano Como a comida na bulimia há comida demais ou de menos mas não há alimentação sustentadora ou mesmo prazerosa A maneira que me parece a melhor para lidar com esses excessos da liberdade é trazêla para seu devido lugar um valor dentre valores ou seja desinflacionar a liber dade de modo a que ela possa ser vivida de modo pleno e enriquecedor A ansiedade do jovem de nossos tempos pode ser significativamente diminuída se o ajudarmos a discutir valores e a encontrar os seus próprios valores no seu próprio tempo Os Valores e a Ansiedade Procurando no dicionário Houaiss encontrei 24 acepções da palavra valor a maioria delas ligadas à economia A acepção importante para nós aqui é aquela que define que valor é no pensamento moderno de tendência relativista cada um dos preceitos ou princípios igualmente passíveis de guiar a ação humana na suposição da existência de uma pluralidade incontornável de padrões éticos e da ausência de um Bem absoluto ou universalmente válido Se é fato que hoje não temos mais no mundo ocidental um valor absoluto ou universalmente válido também é fato que há alguns valores que alcançam quase que uma unanimidade em nossa cultura ao menos como ideais o amor a honestidade a justiça a solidariedade a beleza a saúde a responsabilidade social a paz a tole rância e o conhecimento são alguns exemplos de valores que norteiam as escolhas Revista ITGT122indd 63 Revista ITGT122indd 63 1152007 123520 1152007 123520 Ênio B Pinto 64 Revista da Abordagem Gestáltica XII2 5966 juldez 2006 A r t i g o da maioria das pessoas hoje em dia A todos eles a liberdade permeia Na ideologia globalizante ela o faz de tal forma que corre o risco de se tornar um valor absoluto diluindo todos os outros e gerando ansiedade insuportável ansiedade porque se a liberdade é um rio os outros valores são suas margens Uma vez retiradas as mar gens o rio se espalha e desaparece na areia gerando uma ansiedade seca matriz de violência e de desespero A ansiedade que percebemos em muitos dos jovens de hoje tem dentre ou tros um fundamento bastante claro grande parte dos valores que lhes são ensinadas principalmente através de exemplos não tem ressonância em seu íntimo Aliarse à ideologia dominante no mundo globalizado é para a maioria dos jovens quase como que cometer um ato de traição à própria sensibilidade aos próprios sentimentos à própria responsabilidade diante da existência O jovem quer crescer quer deixar sua marca na vida quer conhecer sua importância quer contribuir mas deparase com uma ideologia que lhe fecha as portas para esse tipo de desenvolvimento e lhe propõe a saída do prazer imediato do consumo compulsivo e da liberdade sem limites para não falar da ainda vigente lei de Gerson Faz lembrar a fábula do Pinóquio As orelhas de burro que começam a aparecer em Pinóquio quando ele se encontra com o lobo e o gato e é vendido ao circo representam a ansiedade que assola o jovem quando ele não busca a autonomia a assimilação dos valores sociais de modo a que sejam modificados e incorporados como valores próprios no seu devido tempo Como bem lembra Dulce Critelli 2006 como pertence à nossa condição de hu manidade a consciência moral não é algo que se pode jogar fora e não depende da nossa vontade Embora nos desviemos ela sempre nos convoca e nos apanha em toda curva do caminho Não se pode calar sua voz no máximo é possível baixar seu volume A ansiedade patológica é uma das maneiras de se baixar o volume da consci ência moral Ansioso o jovem não pára para perguntarse acerca do que considera um bem e do que considera um mal Não questiona as regras que lhe são impostas principalmente pela mídia e pela publicidade não questiona a coerência e a congru ência de seus pais de seus pares e de sua sociedade Não se dá conta de quais valores orientam sua vida e suas escolhas Escolhe compulsivamente mais apoiado em desejos aprendidos que em desejos sentidos Em vez de buscar ajustamentos criativos perde se em apressadas adaptações narcísicas Acaba por pensar sentir e agir de maneira desintegrada não se apossando de seus pensamentos desprezando seus sentimentos e agindo de maneira impulsiva embora com boas intenções Os Horizontes Para ajudar esses jovens na lida com seus valores e com sua ansiedade penso que é papel do psicoterapeuta e do educador facilitar para que seus questionamentos se ampliem principalmente em cinco pontos Piccino 1987 Revista ITGT122indd 64 Revista ITGT122indd 64 1152007 123520 1152007 123520 Ansiedade na Adolescência 65 Revista da Abordagem Gestáltica XII2 5966 juldez 2006 A r t i g o Tomar consciência de quais regras norteiam sua postura diante da vida Tomar consciência de como age no seu cotidiano Questionar e assumir como seus ou não os critérios pelos quais se norteia Verificar o grau de proatividade3 nessas escolhas Verificar a congruência e a coerência das atitudes e das escolhas É importante salientar que esse é um trabalho que se faz com o jovem respei tando seus limites Um jovem de 13 anos tem direito a mais incoerências que um jovem de 18 anos um jovem de 15 anos é capaz de discriminar e escolher seus valores de maneira menos emocional e mais abrangente que um jovem de 12 anos rapazes e moças têm necessidades e velocidades diferentes na conquista de seus valores pessoais A função dessas discussões é facilitar ao jovem a lida com seus horizontes principalmente em dois sentidos primeiro o horizonte enquanto meta enquanto destino e utopia segundo o horizonte enquanto roteiro enquanto referência Os valores enquanto horizontereferência aliviam a ansiedade Quando assumo um valor autonomamente tenho mais claro alguns para quê de minha existência e um sentido mais relevante para os acontecimentos da vida Minha intencionalidade fica mais próxima de minha consciência Por exemplo se tenho como valor importante o conhecimento ele me levará em buscas que têm sentido por si mesmas e por aquilo que provocam no futuro quando os conhecimentos de agora alicerçarão os conhecimentos de depois Conhecer dará um sentido para meu agora e para meu porvir O horizonte tem uma peculiaridade fantástica ele é inalcançável é infinito Quando chegamos onde era o horizonte ali já não é mais horizonte o horizonte é mais além E assim infinitamente Então os valoresutopia descortinam uma deliciosa impossibilidade quando o que procuramos é infinito e inalcançável estamos menos sujeitos a nos fazermos ansiosos diante dessa busca Por exemplo se tenho como valor ser tolerante nunca serei completamente tolerante mas quanto mais estimulo minha capacidade de ser tolerante mais tolerante me torno Ou em outros termos no que diz respeito aos valores não é necessário que estejamos prontos pois o bom é estarmos sempre em busca de crescimento cf Dalai Lama 2000 p 180 Então para concluir quero dizer que a boa liberdade a liberdade livre da ansiedade patológica é um rio que margeado por bons e autônomos valores corre em direção a um horizonte plausível e inalcançável Referências Bibliográficas Critelli DM 2006 De Volta à Barbárie Folha de São Paulo online Caderno Equilíbrio 30032006 citado 05 Abril 2006 Disponível na World Wide Web httpwww1folha uolcombrfspequilíbrioeq3003200601htm 3 Proativo adj que visa antecipar futuros problemas necessidades ou mudanças antecipatório Revista ITGT122indd 65 Revista ITGT122indd 65 1152007 123520 1152007 123520 Ênio B Pinto 66 Revista da Abordagem Gestáltica XII2 5966 juldez 2006 A r t i g o Dalai Lama 2000 Uma ética para o novo milênio Rio de Janeiro Sextante Heller A 1985 O Cotidiano e a História Rio de Janeiro Paz e Terra Houaiss A Villar MS 2001 Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa Rio de Janeiro Objetiva May R 1977 Psicologia e Dilema Humano Rio de Janeiro Zahar May R 1978 O Homem à Procura de Si Mesmo Petrópolis Vozes May R 1987 Liberdade e Destino Porto Alegre Rocco May R 1988 A Descoberta do Ser Rio de Janeiro Rocco May R 1992 A Procura do Mito São Paulo Manole Piccino JD 1987 Valores Humanos e Psicoterapia Antropos Psicologia e Vida Revista de Psicologia Humanista N 2 São Paulo Sociedade Brasileira de Psicologia Humanista Santos M 2000 Por uma Outra Globalização do pensamento único à consciência universal Rio de Janeiro Record Abstract The adolescence anxiety is discussed from three points the ontologic anxiety the normal anxiety and the pathological anxiety The correlation between anxiety and freedom and among anxiety and freedom and values in the adolescence is studied to propose possible horizons to facilitate to the adolescent of our times the work with those subjects Keywords Anxiety Adolescence Freedom Values Globalization Resumen La ansiedad en la adolescencia es discutida a partir de tres puntos la ansiedad ontologica la ansiedad normal y la ansiedad patológica Se estudia la correlación entre ansiedad y libertad y valores en la adolecencia para proponer posibles horizontes para facilitar a el adolescente de nuestros tiempos a trabajar con estas cuestiones Palabrasclave Ansiedad Adolescencia Libertad Valores Globalización Ênio Brito Pinto Psicólogo CRP 0614675 Gestaltterapeuta Psicopedagogo Mestre e Doutorando em Ciências da Religião pela PUCSP Professor do Instituto de Gestalt de São Paulo Professor do Curso de Musicoterapia do UniFMU Professor do Curso de Especialização em Terapia e em Educação Sexual do IPSEX e da Faculdade de Medicina do ABC autor de artigos capítulos e livros nas áreas de psicoterapia educação sexualidade e religião Email eniobritouolcombr Recebido em 10072006 Aceito em 18102006 Revista ITGT122indd 66 Revista ITGT122indd 66 1152007 123520 1152007 123520