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Ciências Políticas

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Teoria das Relações Internacionais Correntes e Debates o estruturalismo marxista de Wallerstein Conclusao Recomenda6es de leitura Notas Capitulo 5 A Teoria Crftica A Teoria Critica e as Rela6es Internacionais antecedentes Robert Cox e a critica as teorias dominantes nas Rela6es Internacionais Etica soberania e a cosmopolitismo critico de Linklater Conclusao Recomenda6es de leitura Notas Capitulo 6 0 construtivismo Definindo 0 construtivismo Evoluao do construtivismo nas duas ultimas decadas o construtivismo depois de 1999 Conclusao Notas Capitulo 7 Os posmodernosposestruturalistas A virada posmoderna Poder e conhecimento nas Rela6es Internacionais Realidade e discurso na polftica mundial Identidade exclusao e soberania Recomenda6es de leitura Notas Capitulo 8 Perspectivas alternativas feminismo e poscolonialismo Por que este capitulo A contribuiaofeminista ao estudo das RelaoesInternacionais A contribuiao do poscolonialismo ao estudo das Rela6esInternacionais Conclusao Notas Capitulo 9 Conclusao Notas 123 128 130 130 132 132 139 148 158 160 161 INTRODUAO 162 163 169 181 184 185 Para que uma teoria das Rela6es Internacionais Hoje em dia ouvimos dizer com frequencia que 0 mundo esta cada vez mais internacionalizado integrado e globalizado Mas 0 que se quer dizer exatamente com isso sera que nossas vidas quo tidianas 0 andar da nossa economia os altos e baixos da polftica ou a maneira como se enfrentam os problemas sociais sao realmente afetados por acontecimentos que ocorrem longe daqui e por deci soes tomadas por outros governos Acreditamos que sim e que 0 estudo das relaoesinternacionais e fundamental para compreen dermos 0 mundo em que vivemos Nem sempre foi assim Durante muitos anos os assuntos internacionais ocuparam muito pouco espaono noticiario no meio academico e menos ainda em nossas preocupaoes do diaadia Questoes de polftica exterior eram da aladaexclusiva dos diplomatas uma elite profissional bemedu cada mas pouco conhecida da sociedade Se houvesse alguma guerra ou conflito que causasse incerteza quanto a segurana do pais ou de algum vizinho 0 assunto certamente seria discutido nas esferas militares sem que muito fosse revelado a opiniao publica as tempos mudaram e hoje dificilmente passamos urn dia sem ouvir uma notfcia internacional que provavelmente tenha algum impacto ainda que indireto sobre nosso mundo imediato Mesmo assim 0 ensino e a pesquisa dos assuntos internacionais 187 187 193 204 210 218 218 221 221 223 228 230 230 232 239 Teoria das Relações Internacionais ainda sao pouco desenvolvidos em nosso pais apesar de existir urna disciplina dedicada ao estudo das Relacoes Intemacionais ha quase urn seculo na Inglaterra e ha pouco men os do que isso nos Estados Unidos As teorias das RelaoesInternacionais tern a finalidade de formular metodos e conceitos que permitam compreender a natu reza e 0 funcionamento do sistema intemacional bem como expli car os fenomenos mais importantes que moldam a politic a mundial Precisamos de urn corpo particular de teorias para entender urn uni verso espedfico da atividade human a cuja caracteristiea e desen volverse para alem das fronteiras nacionais no espaopouco conhe cido em que as aoesintera6es conflitos e negociaoes tern lugar nas margens da jurisdiao dos Estados 0 espaointemacional Os estudiosos das quest6es internacionais argumentam que elas pos suem uma qualidade distinta dos problemas investigados pelas cien cias sociais que se ocupam dos processos que ocorrem no espao domestico Por isso precisamos de uma teoria que de conta dessa especificidade e de uma disciplina academica que congregue os es tudos e retina os pesquisadores dedicados as relaoesintemacionais Neste livro apresentamos e discutimos as principais correntes de pensamento na teoria das RelaoesIntemacionais e os debates que frequentemente contrapoem seus expoentes Nossa intenao foi elaborar urn texto introdutorio que possa ser utilizado por alu nos dos cursos de graduaao em RelaoesIntemacionais e tambem como material de apoio aos estudantes de posgraduaao Para tanto procuramos combinar a apresentaao dos conceitos funda mentais de cada corrente de pensamento com uma abordagem crHiea das limita6es e contradi6es evidenciadas nos diferentes debates teoricos Nesta introduao queremos situar este trabalho diante da va riedade de textos e manuais de teoria das Rela6esInternacionais Nao reivindicamos nenhuma originalidade em especial mas gos tariamos que 0 leitor tivesse clareza quanto a nossas intenoes e posioes uma vez que diferem urn pouco das narrativas conven cionais inclusive daquela que acabamos de resumir anteriormente Nas pr6ximas secoes deste capitulo fazemos urn breve apanhado da evoluaoda disciplina de Relacoes Intemacionais considerando a historia mais conhecida dos seus grandes debates teoricos Em seguida situamos a proposta deste livro diante dessa hist6ria suge rindo uma visao diferente das teorias de Rela6esInternacionais considerando a 0 lugar de onde estamos escrevendo urn pai do mundo em desenvolvimento b a pluralidade de perspectivas existentes na area incluindo 0 impacto da contribuiao de outras disciplinas c nossa convicaode que 0 sistema de Estados nao e o tinico objeto interessante e importante a ser estudado nas rela oesintemacionais e d urn questionamento sobre a conveniencia da narrativa tradicional dos grandes debates para a riqueza e 0 de senvolvimento das pesquisas na area Finalmente apresentamos 0 esquema geral do livro e a divisao dos capftulos A evolUlaoda disciplina por meio dos debates teoricos a visao convencional A apresentaao convencional da origem e da evolucao da dis ciplina de Rela6esIntemacionais situa os primeiros passos para a formaao da disciplina no periodo imediatamente posterior a tragediada Primeira Guerra Mundial e nos rastros de destruiao que ela havia deixado 0 primeiro departamento de RelaoesInter nacionais foi criado em 1917 na universidade escocesa de Aberys twyth com uma preocupaao normativa os academicos que se reuniram naquele departamento tinham como objetivo organizar uma disciplina em torno do estudo da questao da guerra e mais precisamente com a finalidade de livrar a humanidade de suas consequencias nefastas Era preciso enta estudar 0 fen orne no da guerra e suas causas para poder evitar a repetiao de tragedias similares as acontecidas na enta chamada Grande Guerra Edward Hallett Carr urn diplomata britinico aposentado escreveu urn livro ao qual deu 0 titulo de Vinte anos de crise publi cado em 1939 poucos meses antes do infcio da Segunda Guerra Mundial No livro afirmou que a preocupaao normativa dos pri meirosacademicos da area de RlaoesIntemacionais acabou por cegalos Segundo Carr foi tal preocupaao que obrigou esses pri meiros academicos a pensarem em termos do dever ser do mundo em vez de estudar como 0 mundo realmente funcionava A concen tracao desses primeiros academicos a quem Carr chamou de uto Para Tatiana Angela e Laila picos ou idealistas em problemas eticomorais impediuos de ela borar instrumentos analiticos que permitissem perceber os sinais anunciadores da proximidade da Segunda Guerra Mundial Ao contrario desses idealistas Carr definiu urn segundo gnJpo que chamou de realistas que estudava como 0 mundo realmente era e que defendia uma visao menos ut6pica e mais sintonizada com as dimensoes do poder e do interesse que permeiam a politica internacional A caracterizaao feita por Carr desse debate como urn confronto entre idealistas e realistas ficou conhecida na area academica de RelaoesInternacionais como 0 primeiro grande debate da teoria das Rela6esInternacionais Era urn debate ontol6gico sobre uma disciplina recemcriada em que as partes eram 0 dever serdos idealistas e 0 serdos realistas 0 primeiro grupo queria estu dar como mudar 0 mundo para tornaIo mais pacifico enquanto 0 segundo grupo que ria estudar os meios a disposiao dos Estados para que pudessem garantir sua sobrevivencia o infcio da Segunda Guerra Mundial que enfatizou a vit6ria da 16gica da sobrevivencia acabou dando razao aos realistas e en terrando os idealistas 0 pensamento normativo dos Ultimos revelou se perigoso porque subestimava as ameaasa sobrevivencia dos Es tados 0 realismo saiu enta desse primeiro grande debate como o grande vencedor e a publicaao do livro de Hans Morgenthau em 1948 A politica entre as naoes e sua enorme influencia nas deca das seguintes vieram confirmar essa supremacia1 Com a chamada revolwaobehaviorista nas ciencias sociais em geral a crftica que passou a ser feita a area de Rela6esInternacio nais deixou de ser ontol6gica e tornouse metodol6gica 0 segundo grande debate na area nao foi mais urn debate sobre 0 que estudar mas como estudaIo Os realistas cientfficos defendiam maior rigor cientifico e maior influencia dos metodos das ciencias exatas Criti cavam tambem a falta de dialogo com outras areas de conheci mento cientifico nas quais avanosexpressivos na formulaao de metodos empiricos de observaao e analise da realidade objetiva haviam sido feitos Portanto esses realistas cientificos defendiam a importaao de metodos e conceitos de outras areas das ciencias exatas em particular como a cibernetica e a biologia assim como urn uso mais intensivo de metodos quantitativos para 0 estudo Rela6esInternacionais Segundo eles 0 realismo classico pecava por sua falta de rigor e sua metodologia subjetiva demais A Guerra Fria que exigiu dos tomadores de decisao urn maior grau de previsibilidade no cenario internacional deu impulso 3 critica cientifica A disciplina de Rela6esInternacionais passou a aceitar urn maior rigor cientifico assim como a adotar metodo logias transparentes e falsificaveis sem abrir mao dos avanos ocorridos dentro da area a partir dos estudos mais tradicionais do realismo classico No final da decada de 1960 e no decorrer da decada de 1970 varios desafios se impuseram ao realismo como teoria dominante das Rela6esInternacionais Esses desafios tinham duas origens a evoluaoda politic a internacional e a evoluao da pr6pria disci plina Do lado da evoluao da politica mundial podemos citar a confirmaao da Uniao Sovietica como superpotencia competidora com os Estados Unidos no cenario internacional assim como 0 surgimento de novos Estados ap6s as descoloniza6es das decadas de 1950 e1960 Esses Estados recemindependentes apresentavam uma agenda politica diferente da agenda das superpotencias rei vindicavam 0 acesso ao desenvolvimento como prioridade da poli tica mundial no lugar das quest6es politicomilitares que domina yam ate enta Na area academic a 0 surgimento de novos atores naoestatais na politica internacional como empresas multinacionais e organi za6esinternacionais governamentais e naogovernamentais levou ao questionamento de premissas basicas do realismo Assim surgi ram criticas a separaao entre politica domestic a e politica interna cional bem como a divisao enrte high e low politics alta politica re lativa a segurana e baixa politica referente a temas econ6micos tecnol6gicos ete e a primazia da primeira em relaaoa segunda Esses ataques levaram 0 realismo a uma crise aguda que necessitava de uma resposta vigorosa capaz de superar suas insuficiencias Co meoua se falar da exagerada enfase dos realistas na questao da guerra em detrimento de outras quest6es de politica internacional e surgiram criticas ao excesso de enfase no conflito em detrimento da cooperaao e da interdependencia 0 livro de Joseh Nye e de estruturaao de Anthony Giddens que nega precedencia onto logica tanto aos agentes quanto a estIutura Com isso 0 debate con temporaneo nas Re1acoesInternacionais seria urn debate entre 0 realismo 0 liberalismo e 0 constIutivismoe suasrespectivasvariantes neste livro 0 lugar de onde escrevemosacreditando que issoreflete nossas necessidades teoricas Procuramos evitar privilegiar perspec tivas etnocentricas assim como perspectivas estadocentricas de maneira a abrir 0 leque de possibilidades teoricas disponiveis ao aluno e ao especialista na disciplina de Re1acoesIntemacionais em urn pais como 0 BrasilDe fato reproduzir e limitarseas dimensoes de urn suposto debate entre 0 realismo e 0 liberalismo empobrece e reduz as opcoesteoricas disponiveis para a analise das Relacoes Internacionais a partir de urn pais do SuINo entanto isso nao sig nifica que ignoremos a importancia dessas duas teorias realismo e liberalismo mas que consideramos ambas como duas entre varias outras possibilidades teoricas oferecidas pela disciplina e quica nao as mais adaptadas as necessidades do lugar de anrie escrevemos Isso nos levou a uma apresentacao mais plural das teorias das RelacoesInternacionais Neste livro nao apresentamos uma teoria como dominante e as demais teorias como meras derivacoesou no melhor 40s casoscontribuicoes que precisam amadurecer e tomar densidade Caso tivessemos agido dessa maneira estariamos di zendo que uma teoria evoluiu amadureceu e conseguiu avancos tais que se tornou urn mode1o a ser imitado pelas demais Esse nao e nosso proposito Apresentamos varias teorias as mais rele vantes do nosso ponto de vista de maneira autonoma e sem refe rencia as demais teorias de maneira a cobrir urn amplo leque de possibilidades conceitos e contribuicoesna disciplina de Relacoes Internacionais Procuramos tambem possibilitar a inclusao das mais diversas agendas e reivindicacoes para refletir a riqueza e a diversidade da disciplina de Relacoes Internacionais Evitamos apresentar cada urna dessas contribuicoes teoricas de maneira monolftica e enfatizamos a multiplicidade de perspectivas dentro de cada uma delas Assim procuramos tanto a pluralidade de pers pectivasteoricas uma pluralidade horizontal quanto a pluralidade dentro de cada uma dessas perspectivas te6ricas uma pluralidade vertical Em outras palavras nao existe apenas uma versao do rea lismo ou do liberalismo nem 0 realismo e 0 liberalismo sao as uni cas possibilidades teoricas na disciplina de RelacoesInternacionais A proposta deste livro uma visao diferente Neste livro afirmamos a necessidade de estudar e ensinar as RelacoesInternacionais de maneira distinta do que acabamos de apresentar nas paginas anteriores Prevalece na apresentacao con vencional uma perspectiva anglosaxonica que reflete 0 argu mento de StanleyHoffmann em seu artigode 1977 na revistaDaedalus An American Social Science International Relations ou ainda 0 argumento formulado por Steve Smith em urn livro de 1985 que organizou sob 0 titulo International Relations British and American Perspectives10 Hoffmann afirma em seu artigo que a area de estudo de RelacoesIntemacionais seguiu e foi influenciada pelo desenvol vimento das ciencias sociais norteamerican as e refletiu a visao de mundo e as orientacoes metodologicas e epistemologicas da comunidade cientffica norteamericana Por seu lado Smith afirma que 0 desenvolvimento da area no decorrer do seculo XX acompa nhou as potencias hegemonicas do momento Assima area foi cria da no Reino Unido no imediato p6sPrimeira Guerra Mundial e se desenvolveu e se estabeleceu nos Estados Unidos no posSegunda Guerra Mundial JuntarIdo esses dois argumentos a hoje bastante famosa frase de Robert Cox segundo a qual uma teoria e feita por alguem para 0 beneficio de alguem concluise que 0 estudo 0 en sino e a apresentacao da disciplina em seus moldes convencionais apenas reforcariam uma via em detrimento de outras nao explora das Neste livro procuramos explorar essasoutras vias e em parti cular a riqueza e a diversidade da disciplina quando se foge do de bate exclusivamente norteamericano Escrevemos este livro no Brasil urn pais do SuI ou da peri feria que tern consumido mais do que produzido a teoria das Rela coesInternacionais A unica excecaoa esse respeito e a teoria da Dependencia produzida e desenvolvida em boa parte no SuIe que refletiu a agenda e os interesses locais Procuramos entiio refletir Robert O Keohane de 1977 Power and Interdependence WorldPolitic5 in Transition foi emblematico a esse respeito2 Foi nesse contexto que Kenneth Waltz publicou Theory of International Politics urn livro que trouxe novamente 0 realismo a uma posiaode supremacia na teoria das RelaoesIntemacionais3 Waltz trouxe 0 debate agenteestrutura assim como a influencia da microeconomia a teoria das Relaoes Internacionais provocando urn grande impacto na disciplina e tomandose objeto de inumeros debates Destaque particular merece 0 livro organizado por Robert O Keohane em 1986 Neorealism and Its Critics no qual autores de vanas linhas debateram a contribuiao de Waltz Foi uma das pou cas ocasioes nas quais autores como Robert Gilpin assim como os proprios Waltz e Keohane estiveramjuntos com crfticos como John Gerard Ruggie Robert Cox e Richard Ashley4 Na mesma epoca Michael Banks publicou urn capitulo em uma colemnea na qual aponta para 0 surgimento de urn debate na disciplina de Relaoes Internacionais como urn debate entre tres paradigmas 0 realismo 0 liberalismo e a herana Marxista5 Ao dis cutir 0 problema da incomensurabilidade entre paradigmas Banks deu legitimidade e justificou a estrutura do debate em tomo dos tres paradigmas em competiao6 Inspirado em Kuhn Banks afir mou que a evoluao de urn paradigma ao outro passa por rupturas e saltos de descontinuidade e nao necessariamente por debates e evoluoes concatenadas entre os diferentes paradigmas Com isso podese classificar 0 debate interparadigmatico como urn debate de natureza epistemologica e nao metodol6gica que criou a impres saGde que a disciplina havia chegado a urn ponto no qual varias pers pectivas competiam entre si sem que se vislumbrasse a possibilidade de consenso ou de sfntese entre as tres Em sum a esse debate deu lugar a uma certa estagnaao no dialogo entre pesquisadores de orientaoes diferentes Em 1988 em seu discurso de posse como presidente da International Studies Association ISA Keohane procurou redefi nir os termos do debate distinguindo entre duas grandes correntes racionalistas e reflexivistas7 Para ele os racionalistas represen tados pelos realistas e os liberais possuiam urn claro programa de pesquisa com hip6teses metodologia e criterios de indusao e ex dusao precisos e transparentes No entanto esses instnJmentos ie analisenao permitiam a eles lidar com assuntos empolgantes tais como os conceitos de identidade e cultura Keohane afirmou tarn bern que os reflexivistas entre os quais incluiu as feministas a teo ria crftica os posmodemos e posestruturalistas conseguiam estudar questoes e cnceitos muita importantes e empolgantes mas lhes faltavam rigor e dados empfricos para apoiar suas ideias Keohane concluiu que era necessario chegar a urn consenso entre raciona listas e reflexivistas No ana seguinte Yossef Lapid publicou urn artigo no qual falava da existencia de urn terceiro debate que chamou de pos positivista e que estava ocorrendo entre grupos similares aos grupos definidos por Keohane8 A diferena e que 0 grupo chamado por Keohane de racionalista foi chamado por Lapid de positivista en quanto 0 grupo chamado por Keohane de reflexivista foi chamado por Lapid de pospositivista A diferena nos nomes ilao era mera coincidencia e revelava uma diferena de percepao significativa Lapid du nome a origem do racionalismo de Keohane que e 0 positivismo e definiu os reflexivistas nao em re1aaoaos raciona listas mas em relaaoa como e1esveem 0 mundo Lapid definiu 0 terceiro debate em termos ontalogicos Estavamos de volta aos termos do primeiro debate Ole Waever bem que tentou em 1995 apresentar a evoluaoda area em termos menos confusos para os alunos de RelaoesInternacionais mas nao conseguiu ouvidos atentos9 No entanto Waever foi feliz em apontar que 0 debate atual pode ser dividido em duas partes Por urn lado 0 debate entre realistas e liberais e de outro lado 0 debate entre positivistas e pos positivistas Tratando do debate entre realistas e liberais e mais es pecificamente de seus herdeiros neorealistas e neoliberais Waever foi ironico ao falar de urn debate proximo do limite do aborreCl mento e ao referirse ao debate como sendo urn debate neoneo No final da decada de 1980 tambem surgiu 0 construtivismo uma contribuiao que acabou sendo reconhecida como impor tante no decorrer da decada de 1990 e que trouxe a influencia de debates que estavam ocorrendo em outras ciencias sociais para as Relaoes Intemacionais Referimonos aqui em particular a tea ria Ressaltamos e defendemos tam bern a necessidade do pensa mento normativo Ao evitar privilegiar a apresentacao de certas areas em detrimento de outras nos nos permitimos abordar as teorias ditas normativas como contribuicoes legitimas Teorias nor mativas haviam sido desprezadas nas RelaoesInternacionais desde que Carr as dec1arou caducas Na evoluaoconvencional da disci plina 0 chamado primeiro grande debate conc1uiuse com uma suposta vitori a do realismo Conseqiientemente a derrota do idea lismo relegou 0 pensamento normativo ao esquecimento da his toria Contudo neste livro mostramos nao apenas que vanas teorias nunca abriram mao de serem normativas como existem argu mentos que afirmam que todas as teorias sac normativas por defi nicaoou seja todas as teorias tratam de urn dever ser inclusive os realistas e os liberais que afirmam lidar exclusivamente com 0 ser Procuramos entao afirmar que ser normativo nao apenas e legi timo mas recomendave1 principalmente de on de estamos escre vendo Desse ponto de vista todos os capitulos deste livro lidam com pontos de vista normativos Por fim a riqueza do debate atual e que tentamos ressaltar ao longo do livro e que a produao teorica nas Re1aoesIntema cionais passou a levar em consideraao influencias e a entrar em debate com outras areas de conhecimento Assim abriuse 0 Ieque muito reduzido das influencias recebidas pela disciplina e que eram exclusivas das disciplinas de Historia e de Economia para abarcar areas como a sociologia a literatura a filosofia polftica e a geo grafia Autores tao diversos como Adorno e Horkheimer os funda dores da Escola de Frankfurt ou 0 principal nome da teoria cntica hoje Habermas tornaramse citaoescomuns nas RelaoesInterna cionais Outros como Levinas Todorav Foucault Derrida Giddens e Wittgenstein passaram tambem a ser citados de maneira corri queira na disciplina A logica por tras desse movimento de abertura nas Relaoes Internacionais e que reproduzimos aqui era a se guinte os dilemas e os desafios analfticos e conceituais colocados para a disciplina nao eram de natureza diferente nem obedeciam a logicas diferentes dos dilemas e desafios encontrados por outras areas do conhecimento Conseqiientemente nao era preciso rein ventar a roda A adaptaao e 0 usa desses conceitos nas Re1acoes Internacionais serviram para enriquecer e diversificar a aparelha gem teorica da disciplina Urn dos exemplos mais ilustrativos a esse respeito e 0 uso do debate agenteestrutura No final da decada de 1980 e no decorrer da decada de 1990 os termos do debate em outras areas do conhe cimento foram reconhecidos nas RelaoesInternacionais e tiveram urn impacto conceitual consideravel na area E esse diaIogo entre a disciplina de RelacoesInternacionais e as demais disciplinas das ciencias humanas e sociais que refletimos neste livro Identificamos a disciplina como parte de urn conjunto de outras disciplinas que tern sua especificidade mas que pode dialogar influenciar e ser influenciada pelas outras Nossa selecaode uma gama mais ampla de teorias e tambem urn esforcopara transmitir aos estudantes brasileiros uma visao da disciplina mais aberta a inovacao ao desenvolvimento de novas linhas de pesquisa Vma das principais limitacoes das teorias con vencionais e sua definiaodo objeto de estudo das RelaoesInter nacionais 0 comportamento dos Estados soberanos em urn am biente anarquico Essa concepcao esta fortemente enraizada na cultura da area refletindose em seu proprio nome que indica 0 re1acionamento entre nacoesentendidas como Estados como sua razao de ser Essa definicao se explica a partir de uma concepao da polftica como uma atividade na qual 0 choque de interesses en volve por natureza a possibilidade do uso da violencia Ao mo nopolizar a atribuiaolegitima de usar a forca0 Estado se tomaria o objeto e 0 terreno privilegiado de toda acaopoHtica Na esfera intemacional 0 Estado adquirira uma imporrancia ainda maior porque 0 tal monopolio nao existe uma vez que impera a anarquia Temos enta que a combinaao de uma concepao do Estado como esfera autonoma da polftica com a divisao do mundo social em do is ambitos distintos 0 domestico e 0 internacional constitui uma disciplina em que 0 objeto de interesse e necessariamente como os Estados podem realizar seus interesses em urn mundo sem govemo on de a ocorrencia da guerra e uma possibilidade sempre presente Nesse sentido 0 pesquisador treinado de acordo com as teorias convencionais encontrase diante da necessidade de orientar o foco de seus estudos para a compreensao do que os Estados atores principais fazem para assegurar sua sobrevivencia seu principal interesse em urn ambiente altamente perigoso Esse ambiente normalmente denominado pelo conceito de sistema internacional ocupa 0 lugar central nodelimitaao das Relaoes Internacionais como disciplina autonoma no mundo academico Essa visao do disciplina apesar de canonico e por muito tempo dominante nos meios academicos e no senso comum do universo dopoliticoexterna deixou de ser consensual a medida que perspectivas altemativas ocuparam urn espacocada vez maior nos debates doarea Muitas das correntes abordadas neste livro definem de maneira bastante diversa seu objeto de estudo deslo cando como no caso de alguns expoentes do marxismo 0 foco do Estado para 0 sistema capitalista mundial 0 proprio Marx que teve atuaao importante noPrimeira Intemacional nao tinha in teresse particular em suas analises nodiferenciaao entre 0 do mestico e 0 internacional preferindo investigar 0 movimento do capital por meio das fronteiras e em escala mundial Nao acredita mos que por issodevamos dizercomo querem os teoricos conven cionais que as teorias marxistas nao saGteorias de Relaoes Inter nacionais A riqueza dos debates que procuramos abordar neste livro esta em grande parte no questionamento do proprio objeto de disciplina e notentativa de discutir os iniimeros temas e incluir os diversos atores sistematicamente exclufdos do universo das RI como se nao existissemno mundo real das re1aoesintemacionais Por isso inclufmos e fazemos questao de destacar a contribuiao das correntes criticas que tentam ir alem doteoria de RI e refletir sobre a politicomundial considerando a complexidade que carac teriza hoje os processos contradioes e conflitos nos quais uma miriade de atores e forasestao envolvidosNesse sentido a discus saGdo pape1 da teoria critica noreformulaao doteoria de RI re cebe atenaouma vezque nos yuda a questionar 0 estadocentrismo dos enfoques tradicionais chamando a atencaopara foras sociais cada vez mais presentes no cenario mundial Tambem nos alerta para a propria transformaao doforma estatal no bojo da intensifi caao do processo de internacionalizacao dopoliticoe doecono mia Por outro lado outras perspectivas teoricas discutidas aqui sugerem que e cada vez mais diffcil excluir dos estudos intemacio nais questoes como a natureza contestada dosoberania a margina lizaao das mulheres a negaao dos direitos dos refugiados a re definiao das identidades culturais em chave etnica entre tantos outros novos temas surgidos a partir do movimento intelectual gerado pelas correntes crfticas e pospositivistas A estrutura doobra tambem reflete nossa intenao de evitar a classificaaotradicional doevoluao doteoria de RelaoesInterna cionais em tomo dos chamados grandes debatesEssaclassificaao vem sendo utilizada historicamente noformaao dos estudantes do disciplina tomandose tambem uma referencia constante nolite ratura teorica A influencia dessa forma de organizar a trajetoria intelectual das RI se deve a sua eficacia em produzir uma narrativa que ilustra 0 progresso doarea na direao de teorias cada vez mais rigorosas e em conformidade com os padroes do pensamento cientifico Essahistoria oficial nos conta como 0 realismo conse guiu superar a ingenuidade e a inconsistencia do idealismo uto pico responsabilizado pela trigica decisao dos governos europeus ocidentais de subestimar a ameaa nazista Essa luta heroica nar rada pelapena e10quente do mentor do Primeiro Debate EH Carr culmina com urn triunfo intelectual que coincide com a vitO ria aliada noSegundoGuerra Mundial e se reflete noocupaaopor expoentes do realismo de posioes importantes no govemo e no academia norteamericanos A marcha dodisciplina agora susten tada pelo passofirme de urn realismo que tem ospes no chao solido das realidades do poder continua em sua busca de uma formulaao clara das leis de funcionamento dopoliticointemacional NessabuscaSaGdeixadas para tcis as teorias tradicionais que carecem de fundamentaao cientifica para suas anaIisesdo sistema intemacional uma vez que recorrem a subjetividade dointerpre taaohistorica e a uma enfase inadequada no pape1dos individuos noconduao dopoliticoextema A reformulaao do realismo em chave behaviorista assinala 0 triunfo do paradigma dominante no Segundo Debate e marco 0 inicio de um perfodo de hegemonia inconteste e de aparente alcance de um status de ciencia nom1al em uma disciplinafinalmente pronta para a maturidade Os deba tes seguintes nao mereceram a qualificaaode grandes provavel mente por nao refletirem urn embate que reafirmasse a grandeza da teoria dominante Na verdade 0 Terceiro Debate nao existe como urn debate circunscrito e situado no tempo contrapondo urn conjunto bem definido de correntes Podemos falar no Terceiro Debate como uma seqiiencia de movimentos de questionamento e cdtica as teorias estabelecidas na area com 0 intuito de abrir 0 campo para novas perspectivas Tratouse dirfamos em linguagem gramsciana de uma crise de hegemonia do neorealismo e suas vertentes auxiliares como 0 neoliberalismo Em suma nossa rejeiao a narrativa dos grandes debates reflete nossa convicao de que a reformulaao da teoria de Rela oes Internacionais deve comear pela desmistificaao de seus mitos fundadores e da tradiao inventada pelas teorias dominantes de modo a conferirIhes uma linhagem nobre conquistada em sucessivas batalhas contra paradigmas adversarios tradicionais fracassam ao ignorar temas cruciais que por nao se adequarem aos pressupostos epistemologicos e metodlogicos do positivismo cientifico sac excluidos de seus programas de pesquisa Par isso resolvemos dedicar dois teros do presente trabalho as teorias criticas ao mainstream por serem elas as que abriram as portas do diilogo interdisciplinar e introduziram as novos temas que hoje animam as pesquisas da area Ao estruturar os capitulos a partir de grandes correntes de pensamento privilegiamos as contribuioes e as debates de autores que se inspiram nas referencias intelectuais de cada tradiao ou movimento 0 objetivo dessa abordagem e situar as teorias de Rl nos debates das ciencias sociais e humanas sublinhando sua dfvida para com elas e de certo modo contextualizando sua pretensao ao status de ciencia normal no quadro mais geral dos questionamentos hodiernos sobre os fundamentos do discurso cientifico Com isso buscamos oferecer ao leitor uma visao abrangente dos debates teoricos da area dandoIhe elementos para aprofundar seus es tudos segundo suas afinidades intelectuais Por outro lade e nossa intenaocolocar as diversas correntes de pensamento em urn patamar equivalente de relevancia para 0 estudo das relaoes inter nacions evitando consagrar esta ou aquela corrente como her deira de uma suposta grande tradiao da disciplina Acreditamos que tradioessao normalmente fruto de narrativas dominantes que buscam legitimar seu poder em uma area de conhecimento Nao e diferente nas RI por isso preferimos que 0 leitor tivesse acesso a urn quadro amplo e equilibrado da riqueza de abordagens existentes sobre as questoes internacionais sem que suas respec tivas marcas de nascena determinassem a priori seu valor Os Capftulos 2 e 3 tratam das duas grandes tradioes da teoria internacional 0 realismo e 0 liberalismo respectivamente Cada uma delas con tern uma diversidade de perspectivas sobre as rela oesinternacionais muitas conflitantes entre si Acreditamos con tudo que suas raizes no pensamento politico modemo sac suficien temente profundas para que possamos identificar urn elo comum entre as varias teorias abrigadas em cada tradiao Em ambos os capftulos tivemos a preocupaao de salientar os conceitos e temas que perduram nas varias reformulaoes das teorias liberais e rea Plano do livro o livro esta estruturado em torno das gran des correntes de pensamento que inspiram a maior parte da produao teorica de Relaoes Internacionais ate os dias de hoje A seleao nao pretende ser exaustiva e certamente abordagens e teorias consideradas importantes por muitos ficarao fora de nossa seleao Nosso criterio se baseou na representatividade de cada corrente para os estudos da area bem como em nossa propria perspectiva acerca da rele vancia de cada uma No conjunto decidimos privilegiar como ja dissemos a pluralidade de perspectivas em contraposiao ao que convencionamos chamar de teorias dominantes Apesar de rea lismo e liberalismo ainda exercerem uma influencia incontestavel sobre a maioria dos estudiosos de RI os avanos realizados nos ultimos 25 anos tanto em termo de originalidade quanta de sofis ticaaosituamse principalmente entre as teorias nao convencio nais ou pospositivistas Na verdade nossa analise da situaao atual dos debates na area nos leva a concluir que os paradigmas domi nantes tern desempenhado urn pape cadavez mais conservador e ate mesmo retrogrado diante dos desafios e das complexidades da polftica mundial contemporanea Resistentes a mudana e ciosos da defesa de sua posiao dominante na disciplina as correntes listas procurando identificar os elementos que permitem classificl las ainda hoje de acordo com suas respectivas herancas intelec tuais Realismo e liberalismo continuam a ser correntes dominantes nas RI apesar do relativo declinio de sua influencia nas ultimas duas decadas Nesses capitulos discutimos as novas tentativas de atualizacao dessas teorias que visam a adequarse a clara insufi ciencia explicativa de seus pressupostos no contexto do posGuerra FrioDas duas grandes tradicoes 0 liberalismo tern sido a mais bem sucedida nesse esforcoainda que no mundo posII de setembro algumas vertentes do realismo tenham recobrado algum folego No Capitulo 4 discutimos a importante contribuicao do mar xismo muitas vezes desconsiderado pe10s manuais convencionais do disciplina por nao desenvolver uma teoria de RI propriamente dita Em nosso entendimento a heranca marxista que enseja a analise das relaoessociais em sua totalidade rejeitando a sepa racao entre economia e politico produziu enfoques que procuram integrar a dinamica do capitalismo mundial 00estudo do funcio namento do sistema internacional A contribuicao das teorias do imperialismo do dependencia e do sistemamundo para a inves tigacao sobre as causas dodesigualdade e das assimetrias de poder nas re1acoes internacionais e inegavel e deveria merecer maior atencao dos estudiosos de RI tanto nos cursos de graduaao e pos graduacao quanto nos debates academicos A tradicaomarxista tambem esta presente em nossa discussao sobre a teoria critica nas Rela6esInternacionais no Capitulo 5 Fruto do influencia do marxismo ocidental na reflexao do area a teoria critica incorporou as analises do carater conservador das ciencias positivas formuladas pelos pensadores da Escola de Frankfurt para fundamentar seu ataque a epistemologia objetivista dos paradigm as dominantes do disciplina Ao fazelo introduziu urn debate intenso em torno dos fundamentos epistemologicos dos paradigmas teoricos das Re1acoesInternacionais que marcou 0 ambiente intelectual do disciplina 00longo dos anos 80 e criou as condicoes para 0 desenvolvimento de urn ethos mais pluralista entre nos Domesma forma a teoria crftica foi responsave1 por reintro duzir questoes ha muito esquecidas no area mas nao por isso irre ievantes como os temas do hegemonia do forma estatal do rela tividade historica dos conceitos da soberania doetica nas relacoes intemacionais entre outros o construtivismo que talvez seja hoje a corrente cuja influen cia mais cresce no area e 0 objeto do Capitulo 6 Fruto do impor tacao de abordagens do teoria social para as Relac6es Intemacio nais 0 construtivismo se destacou por introduzir em suas analises o papel das ideias das regras e das instituic6es como fatores de terminantes para a compreensao do natureza do anarquia e do comportamento dos Estados e demais agentes dopolitico mundial Por meio de uma concepao intersubjetiva do realidade social 0 construtivismo devolve aos atores a capacidade de definir os con tor nos do mundo que os cerca rejeitando 0 determinismo dos enfo ques estruturalistas sem recair contudo no idealismo do velha escola liberal Nesse capitulo discutimos as tres vertentes mais importantes do construtivismo nas Re1acoesIntemacionais repre sentadas por seus formuladores originais Nicholas Onuf Friedrich Kratochwil e Alexander Wendt A questao polemica sobre se 0 construtiismo representa uma via media ou uma terceira via entre teorias convencionais e teorias pospositivistas mereceu nossa especial atencao No Capitulo 7 discutimos a influencia do pensamento p6s modemo no debate teorico das Relacoes Intemacionais Nao po demos falar de uma corrente posmoderna propriamente dita uma vez que os autores dessa orientacao rejeitam ser agregados sob urn mesmo rotulo porque consideram tais classificac6es uma sim plificaaoreducionista e autoritaria 0 posmodemismo foi respon savel por trazer para a disciplina debates que ha muito mobilizavam a filosofia os estudos culturais a lingiiistica e a teoria liteciria em tomo do estatuto do razao no Ocidente Nas RI os autores pos modernos se voltaram para a investigacao do nexo entre poder e conhecimento nodisciplina problematizando a relacaoentre epis temologias positivistas e a legitimacao doviolen cia e do guerra no mundo modemo Do ponto de vista metodologico esses autores adotaram estrategias de desconstruao dos discursos dominantes no politico intemacional para criticar as dicotomias estruturantes deste universo como anarquia soberania identidade diferena autonomia dependencia ete Devido ao vigor de seus ataques aos paradigmas dominantes e a radicalidade de sua critica da racio nalidade modema e dos fundamentos do pensamento cientifico 0 posmodemismo tern sido marginalizado hostilizado e menospre zado nos meios academicos Nesse capitulo procuramos demons trar por que esses pensadores incomodam tanto aos cfrculos bem pensantes da disciplina Finalmente no Capitulo 8 abordamos de modo resumido um conjunto de aportes teoricos alternativos que vem adquirindo maior relevancia recentemente e que contribuem para enriquecer o debate contemporaneo em teoria de RI e enfatizar 0 elemento de diversidade como uma das principais caracterfsticas da area Discu timos a produaode autoras feministas que introduzem a reflexao sobre a quesrao do genero na teoria de RI e apresentamos 0 aporte dos estudos poscoloniais chamando a atenaopara suas crfticasao posmodernismo e as teorias dominantes bem como para a importlnciade sua visao original sobre 0 lugar da periferia na polf tica mundial Finalmente esperamos que este livro contribua para uma di vulgaaomais ampla no universo cada vez maior de estudantes de RelaoesIntemacionais no Brasilde correntes e debates nem sempre presentes nos currfculos dos cursos de graduaaoe posgraduaao Ha pouco mais de uma decada quando concluimos 0 mestrado na PUGRio nossa percepaodos debates teoricos da area nao ultra passavaalgumas crfticas ao neorealismo de Waltz 0 acesso ao rico debate interparadigmatico em curso desde os anos 80 era inexis tente Da mesma forma preocupanos encontrar ainda hoje uma prevalencia no ensino de RI no pais de currfculos que se limitam a apresentar 0ja velho embate entre realismo e liberalismo como o eixo estruturante das reflexoes na area Por outro lado 0 desen volvimento da disciplina no pais se deu sob a egide da Ciencia Politica uma area de conhecimento hegemonizada Pelo positi vismo e pela escolha racional Essainfluencia certamente inibiu e retardou a abertura do ensino de teoria de RI para as correntes crf ticas e pospositivistas0 cenario atual vem mudando rapidamente com a multiplicaaode cursos de graduaaoe com a criaaode novOsprogram as de posgraduaaoEsperamos com este livro contribuir para 0 esforode sintonizar 0 desenvolvimento dos estudos internacionais no Brasil ao debate contemporaneo bem como estimular a recepaoentre os pesquisadores e estudantes da area de visoes mais crfticas da polftica mundial Notas 1 Morgenthau H J A politica entre as nai5esa luta pelo poder epela paz Bra silia UnB 2003 2 Keohane R 0 Nye j Power and Interdependence World Politics in Tran sition Boston Little Brown and Company 1977 3 Waltz K N Theory of International Politics Reading Mass Addison Wesley 1979 4 Keohane R O Ed Neorealism and its Critics New Directions in World Politics New York Columbia University Press 1986 5 Banks M The interparadigm debate In International Relations A Handhook of Current Theory Light M Groom A J R Londres Frances Pinter 1985 6 Michad Banks adotou 0 conceito de paradigmas da obra de Thomas Kuhn A Estrutura das Revolui5es Cientificas 7 ed Sao Paulo Perspectiva 20q3 na qual Kuhn argumenta que a evolmao do conhecimento cien tffico ocorre em terrnos de revolwoes e rupturas que trazem a tona urn novo conhecimento sobre uma dada area 7 Keohane R O International Institutions Two Approaches Internatio nal Studies Quarterly v 32 n 4 p 379396 1988 8 Lapid Y The Third Debate On the Prospects ofIntemational Theory in a PostPositivist Era International Studies Quarterly v 33 n 3 p 235254 1989 9 Waever O The rise and fall of the interparadigm debate In Internatio nal Theory postivism beyond Smith S Booth K Zalewski M Cam bridge Cambridge University Press 1996 p 149187 Waever sugeriu chamar 0 debate interparadigmatico de terceiro debate e 0 debate p6s positivista de quarto debate 0 que teria sido 16gico Mas a area continua insistindo na sua esquizofrenia de falar de urn primeiro grande debate de urn segundo grande debate de urn debate interparadigmatico e de urn terceiro debate 10 Hoffmann S AnAmerican Social Science Daedalusv 106 n 3 p 4160 1977 Smith S Ed International Relations British and American Perspec tives Oxford Basil Blackwell 1985 Sumário Capítulo 1 Introdução Para que uma teoria das Relações Internacionais picos ou idealistas em problemas éticomorais impediuos de elaborar instrumentos analíticos que permitissem perceber os sinais antinacríssicos da proximidade da Segunda Guerra Mundial Ao contrário desses idealistas Carr definiu um segundo grupo que chamou de realistas que estudava como o mundo realmente era e que defendia uma visão menos utópica e mais sintonizada com as dimensões do poder e do interesse que permeiam a política internacional A caracterização feita por Carr desse debate como um confronto entre idealistas e realistas ficou conhecida na área acadêmica de Relações Internacionais como o primeiro grande debate da teoria das Relações Internacionais Era um debate ontológico sobre um deslinde Recémcriada em que as partes eram o dever ser dos idealistas e o ser dos realistas O primeiro grupo queria estudálo como mundo para tornálo mais pacífico enquanto o segundo grupo queria estudar os meios à disposição dos Estados para que pudessem garantir sua sobrevivência O início da Segunda Guerra Mundial que enfatizou a vitória da lógica da sobrevivência acabou dando razão aos realistas e encerrando os idealistas o pensamento normativo dos últimos revolucionários porque subestimava as ameaças à sobrevivência dos Estados O realismo foi então desse primeiro grande debate como o grande vencedor e a publicação do livro de Hans Morgenthau em 1948 A política entre as nações e sua enorme influência nas décadas seguintes vieram confirmar essa supremacia A chamada revolução behaviorista nas ciências sociais em geral a crítica que passou a ser feita à área de Relações Internacionais deixou de ser ontológica e tornouse metodológica O segundo grande debate da área não foi mais um debate sobre o que estudar mas como estudálo Os realistas críticos defendiam maior rigor científico e maior influência dos métodos das ciências exatas Criticavam também a falta de diálogo com outras áreas de conhecimento científico nas quais avanços expressivos na formulação de métodos empíricos de observação e análise de realidade objetiva haviam sido feitos Portanto esses realistas críticos defendiam a importância da metodologia em outras áreas das ciências exatas em particular como a cibernética e a biologia assim como um uso mais intensivo de métodos quantitativos para o estudo das Relações Internacionais Segundo eles o realismo clássico pecava por sua falta de rigor e sua metodologia subjetiva demais A Guerra Fria que exigiu dos tomadores de decisão um maior grau de previsibilidade no cenário internacional deu impulso à crítica científica A disciplina de Relações Internacionais passou a aceitar um maior rigor científico assim como a adotar métodos Robert O Keohane de 1977 Power and Interdependence World Politics in Transition foi emblemático a esse respeito Foi nesse contexto que Kenneth Waltz publicou Theory of International Politics um livro que trouxe novamente o realismo a uma posição de supremacia na teoria das Relações Internacionais Waltz trouxe o debate agenteestrutura assim como a influência da microeconomia à teoria das Relações Internacionais provocando um grande impacto na disciplina e tornandose objeto de inúmeros debates Destacou particularmente o livro organizado por Robert O Keohane em 1986 Neorealism and Its Critics no qual autores de várias linhas debateram a contribuição de Waltz Foi uma das poucas ocasiões nas quais autores como Robert Gilpin assim como os críticos Waltz e Keohane estiveram juntos com críticos como John Gerard Ruggie Robert Cox e Richard Ashley Na mesma época Michael Banks publicou um capítulo em uma coletânea na qual apontou para o surgimento de um debate entre três paradigmas o realismo o liberalismo e a herança Marxista Ressaltamos e defendemos também a necessidade do pensamento normativo No evitar privilegiar a apresentação de certas áreas em detrimento de outras nós não permitimos abordar as teorias das normas como contribuições legítimas Teorias normativas haviam sido desprezadas nas Relações Internacionais desde que Carr as declarou caladas Na evolução convencional da disciplina o chamado primeiro grande debate concluiuse com uma suposta vitória do realismo Consequentemente a derrota do idealismo relegou o pensamento normativo ao esquecimento da história Contudo neste livro mostramos não apenas que várias teorias normativas abriam mão de serem normativas como existem argumentos que afirmam que todas as teorias são normativas por definição ou seja todas as teorias tratam de um dever ser inclusive os realistas ou os liberais que afirmam lidar exclusivamente com o ser Procuramos então afirmar que normativo não apenas é legítimo mas recomendável principalmente de onde estamos escrevendo Desse ponto de vista dos capítulos deste livro lidam com ponto de vista normativos Por fim a riqueza do debate atual e que tentamos ressaltar ao longo do livro é que a produção teórica nas Relações Internacionais passou a levar em consideração influências a entrar em debate com outras áreas de conhecimento Assim abriuse o leque e houve muito redivido das influências recebidas pela disciplina e que eram evidências das disciplinas de História e de Economia para abarcar áreas como a sociologia a literatura a filosofia política e a geografia Outros dois diretores como Adorno e Horkheimer os fundadores da Escola de Frankfurt ou o principal nome da teoria crítica hoje Habermas tornaramse citações comuns nas Relações Internacionais Outros como Levinas Todorov Foucault Derrida Giddens e Wittgenstein passaram também a ser citados de maneira correta pela disciplina A possibilidade de traçar esse movimento de abertura nas Relações Internacionais e que reproduzimos aqui era a seguinte os dilemas e os desafios e conexões colocados para a disciplina não eram de natureza nem obedeciam a lógicas diferentes dos dilemas e desafios encontrados por outras ciências do conhecimento Consequentemente não era preciso reinventar a roda A adaptação e o uso desses conceitos nas Relações Atores principais fazem para assegurar sua sobrevivência seu principal interesse em um ambiente altamente perigoso Esse ambiente normalmente denominado pelo contato do sistema internacional ocupa o lugar central na delimitação das Relações Internacionais como disciplina autônoma no mundo acadêmico Essa visão da disciplina apesar de cânon e por muito tempo dominante nos meios acadêmicos e no senso comum do universo da política externa deviase ser consensual à medida que perspectivas alternativas ocupavam um espaço vez maior nos debates da área Muitas das correntes abordadas neste livro definem de maneira bastante divergente seu objeto de estudo deslocando como no caso de alguns expoentes do marxismo o foco do Estado para o sistema capitalista mundial O próprio Marx que teve atuação importante na Primeira Internacional não tinha interesse particular em suas análises na diferenciação entre o doméstico e o internacional preferindo investigar o movimento do capital por meio das fronteiras e em escala mundial Não acreditamos por isso devemos dizer como querem os teóricos convencionais que os teóricos marxistas não são teorias de Relações Internacionais A riqueza dos debates que procuramos abordar neste livro em grande parte no questionamento do próprio objeto de disciplina e na tentativa de discutir os inúmeros temas e incluir os diversos atores sistematicamente excluídos do universo das RI como se não existissem no mundo real das relações internacionais Por isso incluímos e fazemos questão de destacar a contribuição das correntes críticas que têm além da teoria de RI e refletir sobre a política mundial considerando a complexidade que caracteriza hoje os processos conflitos nos quais uma miríade de atores é frequentemente excluída Nesse sentido a discussão do papel da teoria crítica na reformulação da teoria de RI recebeu atenção uma vez que nos ajudou a questionar o estado derosos enfoques tradicionais chamando a atenção para forças sociais cada vez mais presentes no cenário mundial Também nos alerta para a própria transformação do fato estatal no âmbito da intensificação do processo de internacionalização da política e da economia Por outro lado outras perspectivas teóricas discutidas aqui sugerem que é cada vez mais difícil construir os estudos internacionais listas procurando identificar os elementos que permitem classificações Realismo e liberalismo continuam a ser correntes dominantes nas RI apesar do relativo declínio de sua influência nas últimas duas décadas Nesse capítulos discutimos as novas tentativas de atualização dessas teorias que visam a adequarse à clara insuficiência explicativa de suas pressupostos no contexto do pósGuerra Fria Das duas grandes tradições o liberalismo tem sido a mais bemsucedida nesse esforço ainda que no mundo pós11 de setembro algumas vertentes do realismo tenham reobrado algum fôlego No Capítulo 4 discutimos a importante contribuição do marxismo muitas vezes considerado pelos manuais convencionais da disciplina por não desenvolver uma teoria de RI propriamente dita Em nosso entendimento a herança marxista que enseja a análise das relações sociais em sua totalidade rejeitando a separação entre economia e política produz enfoques que procuram integrar a dinâmica do capitalismo mundial ao estudo do funcionamento do sistema internacional A contribuição das teorias do imperialismo da dependência e do sistemamundo para a investigação sobre as causas da desigualdade e das assimetrias de poder nas relações internacionais é invejável e deveria merecer maior atenção dos estudiosa de RI tanto nos cursos de graduação e pósgraduação quanto nos debates acadêmicos A tradição marxista também está presente em nossa discussão sobre a teoria crítica nas Relações Internacionais no Capítulo 5 Fruto da influência do marxismo ocidental na reflexão da área a teoria crítica incorporou as análises de caráter conservador das teorias positivas formuladas pelos pensadores da Escola de Frankfurt para fundamentar seu apelo à epistemologia objectivista dos paradigmas dominantes da disciplina Ao fazêlo introduziu um debate intenso em torno dos fundamentos epistemológicos das teorias das Relações Internacionais que marcou o ambiente intelectual da disciplina ao longo dos anos 80 e criou as condições para o desenvolvimento de uma reflexão mais pluralista entre nos Desse forma a teoria crítica responsável por reintroduzir novos programas de pósgraduação Esperamos com este livro contribuir para o esforço de estimular a recepção entre pesquisadores e estudantes da área de visões mais críticas da política mundial autonomiadepêndencia etc Devido ao vigor de suas ataques aos paradigmas dominantes e à radicalidade da crítica da racialidade moderna dos fundamentos do pensamento científico o pósmodernismo tem sido marginalizado hostilizado e menosprezado nos meios acadêmicos Nesse capítulo procuramos demonstrar por que esses pensadores incomodam tanto os círculos bem pensantes da disciplina Finalmente no Capítulo 8 abordamos de modo resumido um conjunto de aportes teóricos alternativos que vêm adquirindo maior relevância recentemente e que contribuem para enriquecer o debate contemporâneo em teoria de RI e enfatizar o elemento de diversidade como uma das principais características da área Discutimos a produção de autoras feministas que introduzem a reflexão sobre a questão de gênero na teoria de RI e apresentamos o aporte dos estudos póscoloniais chamando atenção para suas críticas ao pósmodernismo e às teorias dominantes bem como para a importância de sua visão original sobre o lugar da periferia na política mundial Finalmente esperamos que este livro contribua para uma divulgação mais ampla no universo cada vez maior de estudantes de Relações Internacionais no Brasil de correntes e debates sempre presentes nos currículos dos cursos de graduação e pósgraduação Há pouco mais de uma década quando concluímos o mestrado na PUCRio nossa percepção dos debates teóricos da área não ultrapassava algumas críticas ao neorealismo de Waltz O acesso ao rico debate interparadigmático desde os anos 80 era incipiente Da mesma forma preocupações nãocorrentes ainda hoje uma prevalência não somente de RI no país de currículos que se limitam a apresentar o já mencionado realismo e liberalismo como eixo estruturante das reflexões na área Capítulo 2 O REALISMO No estudo das Relações Internacionais o realismo se impõe como a visão de mundo dominante entre analistas e tomadores de decisões No entanto quando se quer definir a razão desse aparente domínio deparase com uma diversidade e uma riqueza de percursos históricos e de princípios básicos assim como de pensadores originais Portanto o realismo não é um só e reduzir sua expressão a três ou quatro elementos equivalente a ignorar essa diversidade que faz sua força Nosso objetivo neste capítulo é discutir o realismo enfatizando a força das suas interpretações e destacando diferentes variantes realistas mas sem perder de vista a riqueza e a diversidade do pensamento realista nas Relações Internacionais Nossa abordagem mistura apresentações de vertentes do realismo com referências específicas a realistas que representam sua na sua evolução desde quando se pensa suas raízes no século XVII Ao longo do século XX a área acadêmica de Relações Internacionais foi adquirindo contornos e características teóricas e conceituais independentes em relação às demais Ciências Sociais Na busca por autonomia e legitimidade os estudiosos das relações internacionais procuraram raízes e estabeleceram linhagens intelectuais para confirmar que o estudo do internacional não é recente e portanto menos ainda passageiro Com isso vários autores desassociaram o internacional em autores como Maquiavel e Hobbes Alguns foram buscar se havia algo parecido com o que se chama hoje de international entre os filósofos da Grécia Antiga e sequer entre todos os terráqueos como Tucídides Para os realistas a consequência da existência da anarquia nas relações internacionais é a mesma que a consequência da existência do estado de natureza para Hobbes desconfiança permanentemente editado em relação a qualquer outro ator Esse estado de natureza a sobrevivência como único objetivo possível ou no mínimo como o objetivo que deve guiar todos os demais a segurança como bem de som zero isto é a segurança de um pode ser atingida em detrimento da fala de segurança dos outros e viceversa Existe dois dissensos nesta posição dominante Em um famoso artigo intitulado Cooperation Under the Security Dilemma 1978 Robert Jervis por exemplo afirma que o realismo tem de lidar com um desafio central apesar da ingénua existência da anarquia internacional existe cooperação nas relações internacionais inclusive e principalmente na área de segurança Usando o termo dos jogos Jervis afirma que a apresentação do dilema de segurança das relações internacionais em termos do dilema do prisioneiro é uma descaracterização do primeiro Segundo Jervis o dilema do prisioneiro não abre nenhuma oportunidade para a cooperação na área de segurança o que contradiz o fato de que ela existe Jervis afirma então que é o jogo do stag hunt ou caça ao veado já existentes O jogo do stag hunt é o seguinte dois caçadores saem para caçar Têm duas opções cooperarem juntos e caçar um veado um grande animal que pode render muito ou não cooperarem juntos e cada um caçar um coelho um animal menor Cooperar tem um custo pode ser difícil mas ganho pode ser muito maior Em contrapartida não cooperar reduz o custo mas também reduz o ganho Consequentemente tanto a cooperação quanto a ação solitária são possíveis e refletem opções particulares preferências dos atores assim como as circunstâncias nas quais a escolha tem de ser feita O estado de natureza tem um destaque particular na leitura que os realistas fazem desses pensadores clássicos Dentro dessa lógica Tucídides por exemplo é considerado o princípio autor a tratar de um assunto central do estudo das Relações Internacionais a guerra Tucídides que após uma carreira militar se tornou um estudioso das estratégias militares apresentou a guerra do Peloponeso como instância ilustrativa do seu tópico de estudo isto é a guerra Os realistas consideram que duas principais heranças de Tucídides é que em um mundo onde os poderosos fazem o que têm o poder de fazer e os fracos aceitam o que sobreviver o medo de deixar de existir leva os Estados a iniciarem e se engajarem em guerras Com esse tipo de leitura de Tucídides os realistas destacam dois conceitos o que veio a se chamar mais tarde de anarquia internacional devido à falta de uma autoridade legítima e soberana no nível internacional que garante o direito à sobrevivência de todos os atores e o correlato do medo de não sobreviver A leitura realista de Tucídides destaca também esse louco apreço pelos valores morais e pela justiça nas relações entre os Estados Maquiavel por sua parte deixou como herança para os realistas a ideia de uma soberania do Estado como ator O princípio em sugerir um Estado perde toda a sua relevância Para sobreviver o poder se faz necessário e o uso da balança de poder assim como de alianças é crucial para lidar com o desafio da segurança A leitura realista também destaca o realismo de Maquiavel segundo os realistas Maquiavel queria lidar com o mundo real e não o mundo como deveria ser Por fim os realistas caracterizam a visão do Maquiavel sobre relações entre os estados como desprovida de qualquer caráter moral ou ético Anarquia e anarquia é o conceito definido por realismo nas relações internacionais O que se entende por anarquia não é propriamente o caos mas sim a ausência de uma autoridade suprema legítima e indiscutível que possa ditar as regras interpretálas implementálas e castigar quem não as obedece Em oposição ao que ocorre no plano doméstico os realistas consideram que não existe nas relações internacionais um único soberano que tenha o monopólio do uso legítimo da força O que existe nas relações internacionais é a coexistência entre múltiplos soberanos que por serem soberanos sobre seus próprios cidadãos não podem abdicar do uso legítimo da força em favor de nenhuma terceira parte Reproduzse assim as relações internacionais como o estado da natureza a existência simultânea de vários atores exclusivamente responsáveis por sua própria sobrevivência Como no estado da natureza hobbesiano na anarquia internacional os Estados lutam permanentemente por sua sobrevivência e desconfiam uns dos outros No entanto ao contrário do estado de natureza hobbesiana os realistas afirmam que a criação de um soberano no nível internacional é impossível porque o mandamento de cada soberano é precisamente o manter o monopólio do uso da força nem que seja em seu espaço restrito Portanto a maneira pela qual foi consagrado o estado de natureza no plano doméstico isto é o estabelecimento do Leviatã não pode ser reproduzida nas relações internacionais Nelas os realistas veem o estado de natureza como uma realidade permanente que vai permanecer as relações internacionais para sempre a segurança dos indivíduos só é mantida uma vez que a segurança do Estado do qual faz parte é mantida Com isso as duas funções fundamentais e o mesmo tempo básicos do Estado isto é a paz doméstica e a segurança no plano internacional são preenchidas ao se garantir a sobrevivência do Estado Essa fórmula continua válida no sentido oposto também Ao se garantir a sobrevivência do Estado se garante também a sobrevivência do indivíduo Isso decorre do direito realista para escolher o Estado como ator e unidade de análise Com isso a obrigação dos líderes políticos e tomadores de decisões é lutar pela sobrevivência do Estado nas relações internacionais Poder Podese afirmar que os realistas consideram o poder como o elemento central da sua análise das relações internacionais Uma das denominações como já foi mencionado aqui da visão realista é precisamente realismo de poder Várias definições de poder coexistem nas Relações Internacionais Enquanto alguns autores definem o poder como a soma das capacidades do Estado em termos políticos militares econômicos e tecnológicos outros Os realistas que marcaram a evolução das Relações Internacionais A presente seção não tem por objetivo apresentar todos os teóricos realistas nas Relações Internacionais Além de necessariamente ser incompleta tal tarefa seria impraticável nesse espaço reduzido No entanto pretendemos apresentar algumas das contribuições que representaram momentoschave na evolução da disciplina de Relações Internacionais Os autores aqui presentes apresentaram contribuições que até hoje continuam sendo citadas provocam debates e constituem objeto de citação nos debates sobre as Relações Internacionais do estatista Segundo ele o segundo princípio protege o realismo de falsas falácias a preocupação com as motivações e com as preferências ideológicas já que bons motivos não necessariamente levam ao sucesso das políticas Para contornar tais falácias Morgenthau afirmou que todos os Estados têm o mesmo objetivo o poder Com este princípio Morgenthau começa a afirmar a autonomia da esfera política em relação a demais esferas sociais e elevou a racionalidade ao instrumento central do processo político Para Morgenthau o uso do razo é característica da esfera política O terceiro princípio enunciado por Morgenthau destaca o poder como um conceito universalmente definido mas cuja expressão varia no tempo e no espaço Isto é a expressão do poder varia com o contexto e o lugar nos quais este poder é exercido No quarto princípio Morgenthau estabelece a importância dos princípios morais como guia da ação política mas afirma que os princípios morais devem ser subordinados aos interesses da ação política Em outros termos o limite dos princípios morais é a prudência ao observar princípios morais o estatista tem de ter claro que a segurança e os interesses do Estado que governa não estão ameaçados nacional e que decorre da ausência de uma autoridade superior aos Estados que possa garantir sua segurança Para ele as incertezas do sistema internacional tornam o Dilema de Segurança uma situação incontrolável deste mesmo sistema O conceito de Dilema de Segurança tem sido amplamente usado nas Relações Internacionais e tem tido recentemente uma aplicação que pode parecer paradoxal às ideias de Herz Nos referimos aqui ao conceito de Dilema de Segurança para descrever as regiões marcadas por conflitos intraestatais nas quais de fato está assumida uma autoridade superior que garante a segurança de indivíduos e grupos caracterizando assim um estado de natureza marcado pelas características destacadas por Herz no sistema internacional A revolução behaviorista que varreu o desenvolvimento das ciências sociais nos Estados Unidos no decorrer da década de 1970 atingiu também a disciplina de relações internacionais Autores como Talcott Parsons sociólogo e autor da teoria das ciências sociais e Morton Kaplan impulsionaram essa revolução behaviorista nas ciências sociais em geral e nas relações internacionais em particular As premissas para a elaboração desse tipo de conhecimento nas relações internacionais eram estabelecer teorias ao mesmo tempo falsificáveis e que fossem capazes de permitir aos observadores formular previsões genéricas sobre a evolução da política internacional A terceira consequência é no entanto a principal marca do debate estabelecido nas Relações Internacionais Tratase do debate sobre níveis de análise cujo marco inicial foi a tese do doutorando Kenneth Waltz transformada em livro em 1959 Men The State and War Waltz afirmou que todas as explicações sobre as causas da guerra podiam ser encaixadas como parte da primeira imagem a imagem do indivíduo da segunda imagem a imagem do Estado ou da terceira imagem a imagem do sistema internacional Segundo ele todos os autores e grandes filósofos cabem em uma dessas três imagens Assim tanto Hobbes quanto Morgenthau acreditam não ser possível apresentar nenhuma explicação do fenômeno da guerra em um nível que não leve em conta o Estado Para ele há dois níveis de análise nas relações internacionais o sistema internacional e o subnível do Estado caracterizando claramente com isso o debate na área de Relações Internacionais dentro do debate proposto por Parsons nas ciências sociais Cada nível possui vantagens e desvantagens A análise no nível do sistema permite um entendimento geral e abrangente e com isso o nível de previsão é grande A análise no nível do subsistema permite a produção de um conhecimento mais detalhado mas perdese com isso a perspectiva abrangente e o nível de previsão fica dessa maneira reduzido Por isso mesmo têm um fim que é quando esse objetivo é atingido Aron afirma então que a porta para a diplomacia pode ficar aberta nesse tipo de guerra porque os objetivos podem ser atingidos com custos menores que exterminar os inimigos Guerras travadas por ideias e glória não têm um fim objetivo a única saída aceitável é o triunfo Isso torna a paz negociação virtualmente impossível de ser atingida Nessa mesma época Martin Wight demonstrou o mesmo inconformismo que Aron em relação aos rumos demasiadamente behavioristas que o estudo das relações internacionais estava seguindo nos Estados Unidos Para ele nenhuma teoria das relações internacionais poderia ser elaborada sem ser ancorada no estudo da história e da evolução do pensamento filosófico ocidental Teorias que privilegiam a elaboração de modelos racionais em detrimento do estudo da história e suas complexidades correm o risco segundo Wight de refletir sobre assuntos que não existem permanecendo portanto defasados em relação ao mundo da política Da mesma forma teorias que não levam em consideração a evolução do pensamento filosófico ocidental descartam a riqueza e a complexidade deste e não aproveitam o seu acompanhamento nem as soluções elaboradas para os mesmos problemas que o pensamento teórico sobre as relações internacionais inevitavelmente proporcionaria Por isso Wight sugere que todo o pensamento teórico nas relações internacionais decorre de três tradições fundadas por Maquiavel Grotius e Kant que Wight denominou respectivamente de realismo racionalismo e revolucionarismo Para ele como alguns anos mais tarde se tornou seu principal discípulo Hedley Bull o realista entende as relações internacionais como uma luta permanente de todos contra todos O que caracterizaria as relações internacionais para o realista é a desconfiança generalizada e permanente onde decorre a permanente luta por sobrevivência por parte de todos os Estados Com isso cada Estado só pode contar com suas próprias capacidades para garantir sua sobrevivência e as amizades nas relações internacionais só podem ser passageiras e relativas a interesses comuns específicos Na outra ponta Wight define os revolucionários como os herdeiros do pensamento kantiano nas relações internacionais Para eles ao passo que a desconfiança e a luta pela sobrevivência caracterizam as relações internacionais existe um imperativo em transformar nas relações internacionais que é a paz Para se estabelecer essa segurança Kant e seus herdeiros consideram que não é possível garantir a segurança de alguns em detrimento dos demais e que só é garantida Os herdeiros do pensamento kantiano destacamse portanto por duas características vislumbram um objetivo ético a ser alcançado e indicam o caminho que deve ser trilhado para se atingir tal objetivo Entre esses dois extremos Wight definiu Hugo Grotius e seus herdeiros nas relações internacionais como uma tradição intermediária um compromisso entre o realismo e os ideais do porvir Tal compromisso seria atingido pelos racionalistas ao perceberem a existência de regras e normas que orientam e organizam as relações internacionais e que permitem a convivência entre Estados que não partilham necessariamente os mesmos objetivos e interesses A existência de um conjunto de regras organizadas na forma do Direito Internacional é o que permite aos Estados conviverem sem alcançar a paz mas também sem se encontrarem em um estado permanente de desconfiança e de guerra Portanto de acordo com Waltz a pergunta central a ser respondida pelas relações internacionais é por que sempre houve guerra seja na Grécia Antiga de Tucídides nas cidadesEstado brasileiras de Maquiavel ou no sistema herdado da paz de Vestfália que existe até hoje Waltz responde que a existência da anarquia internacional é a causa da permanente recorrência da guerra no sistema internacional Essa é uma resposta estrutural para o fenômeno recorrente de guerra Com essa resposta situada no nível do sistema internacional Waltz reduzia ainda o leque definindo ele mesmo em seu livro de 1959 ou seja 20 anos antes em três imagens Enquanto em seu livro de 1959 havia estabelecido três imagens o homem o Estado e o sistema para estudar as causas da guerra em 1979 Waltz destacou que a busca da causa da guerra só tinha sentido no nível do sistema internacional Para ele qualquer explicação no nível do Estado seria uma resposta reducionista Waltz não procura menosprezar as teorias produzidas no nível das unidades unidades que no caso do sistema internacional são os Estados ao afirmar que elas possuem escopo limitado pois são necessárias para compreender o nível da estrutura Em seu livro afirma estar apresentando uma teoria da relação sistêmica das relações internacionais Situando sua teoria à parte das premissas e influências realistas mas ainda assim mais vigorosa mais eficaz e mais elegante Além dissoProcura providenciar uma análise estrutural da política internacional Waltz diz também que seu realismo é uma visão estrutural A teoria estrutural de Waltz representa uma revolução nas relações internacionais Sua preocupação era em proporcionar explicações para a continuidade e para as repetições e não para a exceção Contudo argumentos estruturais procuram explicar a mudança e até a inevitabilidade da mudança Quando com seu realismo estrutural Waltz procura explicar a continuidade está fazendo uso oposto do que o pensamento estrutural geralmente se propõe a fazer ele usa um modo de pensar que se propõe a explicar a inevitabilidade da mudança para explicar a continuidade Desse ponto de vista o que havia permanentemente existido isto é o fenômeno recorrente das relações internacionais era o fenômeno de guerra Portanto de acordo com Waltz a pergunta central a ser respondida pelas relações internacionais é por que sempre houve guerra seja na Grécia Antiga de Tucídides nas cidadesEstado brasileiras de Maquiavel ou no sistema herdado da paz de Vestfália que existe até hoje Waltz responde que a existência da anarquia internacional é a causa da permanente recorrência da guerra no sistema internacional sistema multipolar não bipolar há um espaço reduzido para o jogo duplo e as alianças não declaradas o que implica uma transparência maior e portanto uma estabilidade maior do sistema O grau de incertezas também é maior no sistema multipolar devido à existência de múltiplos polos ao passo que no sistema bipolar o monitoramento do outro polo reduz o grau de incertezas O realismo e as Relações Internacionais e o debate contemporâneo A década de 1990 foi de amplos debates na teoria das Relações Internacionais Críticas ao realismo se multiplicaram A maioria dessas críticas destacava a incapacidade do realismo de prever e explicar a queda da União Soviética e sua inadequação para lidar com o mundo pósGuerra Fria Em seu livro The Logic of Anarchy Neorealism to Structural Realism Buzan Little e Jones alegam que Waltz não se preocupou em distinguir os dados estruturais o que impede de produzir uma teoria verdadeiramente estrutural Segundo eles ao confundir sistema e estrutura Waltz não percebeu que a estrutura é composta por um sistema e suas unidades e que por isso é possível produzir uma teoria tanto no nível do sistema quanto no nível das suas unidades Teoria das Relações Internacionais ELSEVIER Teoria das Relações Internacionais ELSEVIER Capítulo 3 O LIBERALISMO Capítulo 3 O LIBERALISMO O liberalismo é um dos paradigmas dominantes na teoria das Relações Internacionais e sua influência cresceu muito após o fim da Guerra Fria Durante muito tempo contudo teorias liberais foram objeto de crítica e posteriormente de descaso pela maioria dos pensadores mais influentes da disciplina No capítulo anterior vimos como o realismo escolhe a visão de mundo liberal como seu principal e dedica um enorme esforço para desacreditála Ainda assim o liberalismo é um componente essencial de todo o edificação conceitual das Relações Internacionais Neste capítulo veremos por que o estudo das teorias liberais é indispensável para compreender os fundamentos da disciplina e seus principais debates Discutimos também a trajetória intelectual do liberalismo procurando mostrar como suas ideias sobre política internacional vieram a se tornar tão influentes nos dias de hoje Para isso analisamos a contribuição de alguns autores mais representativos dessa corrente de pensamento no campo de RI destacando os temas centrais e mais influentes de suas obras Para melhor situar o trabalho desses autores no contexto da tradição liberal iniciamos o capítulo com uma breve exposição sobre os antecedentes do pensamento liberal clássico na teoria internacional Concluímos indicando os principais pontos e debates suscitados pelo legado do liberalismo pelas teorias contemporâneas de relações internacionais A tradição liberal na teoria política internacional paz comércio republicanismo instituições O liberalismo é uma grande tradição do pensamento ocidental que é origem a teorias sobre o lugar do indivíduo na sociedade sobre a natureza do Estado e sobre a legitimidade das instituições de governo O pensamento liberal também produziu teorias sobre a organização da economia em particular sobre a operação de mercados em que produtores individuais atuam livremente na busca de lucro Nossa preocupação aqui se concentra nas concepções liberais acerca da natureza e do funcionamento do sistema ou se quisermos empregar um termo propriamente liberal da sociedade internacional Nesse sentido não falaremos nesta seção de teorias de relações internacionais propriamente ditas mas de abordagens liberais sobre problemas internacionais formuladas por pensadores da tradição liberal moderna desde o Iluminismo até o fim do século XIX Do ponto de vista deste trabalho só podemos falar em teorias liberais de RI a partir do século XX mais especificamente após a Primeira Guerra Mundial A tradição liberal caracterizavase principalmente por sua preocupação com as relações entre indivíduo sociedade e governo no âmbito doméstico Apenas alguns pensadores liberais dedicaramse ao estudo dos problemas internacionais Contudo como são autores de grande expressão suas contribuições às teorias internacionais influenciam os debates em nossa disciplina até os dias de hoje Não podemos falar em uma tradição liberal coerente e unificada Há na vastíssima gama de autores que a compõem uma diversidade que resiste a qualquer tentativa de síntese Mesmo assim podemos indicar algumas varieties e conceitos centrais que definem uma perspectiva comum para a grande maioria dos pensadores liberais bem como para os autores que refletem sobre as relações internacionais A ideia central aqui é de que as sociedades bemorganizadas tendem a ser antireguladas ou seja são capazes de corrigir desempenho de instituições e processos inerentes a sua organização desequilíbrios ineficiências e crises que ameaçam sua existência e produtividade Os liberais acreditam que a razão humana pode formular princípios filosóficos morais e políticos que façam com que as instituições de uma sociedade atuem sempre no sentido do equilíbrio de autoregulação Mais ainda as sociedades bemorganizadas são capazes de fazer com que os vícios individuais cobiça avareza ambição etc sejam transformados em bensestar coletivo O segundo ponto que queremos destacar aqui está intimamente ligado à crença no potencial da razão os liberais afirmam que as organizações políticas modernas fundadas pela tradição liberal asseguram condições para o progresso contínuo e inevitável das sociedades humanas Livres das amarras de velhas tradições e organizações sociais que cerceavam sua autonomia e liberdade os seres humanos podem desenvolver suas capacidades praticamente ilimitadas na busca do bem comum Livres do tanto sagrado que encobria a relação dos homens com o universo e o mundo que os cerca as sociedades modernas desenvolveram processos de transformação como controle e domínio da natureza colocandoa como nunca antes na história da humanidade a serviço do progresso econômico Essa visão radicalmente otimista quanto ao futuro e à capacidade humana de determinar sua direção marcará a perspectiva liberal das Relações Internacionais como veremos adiante A pergunta que vem à mente neste ponto é como o sistema internacional pode ser mudado de forma a se tornar menos conflituoso e mais cooperativo Os diferentes pensadores liberais oferecem uma grande variedade de respostas a essa pergunta mas acreditamos que três delas são as mais representativas do liberalismo na teoria das relações internacionais o livrecomércio a democracia e as instituições internacionais Podemos dizer resumidamente que a ideia básica é que Estados democráticos tendem a manter relações pacíficas entre si e que à medida que o número de países governados de forma democrática cresce uma espécie de zona estável de paz e prosperidade se forja A origem dessa ideia está na obra de Kant em particular em seu ensaio sobre A paz perpétua na qual formula o conceito de federação pacífica para se referir ao conjunto de Estados que compartilham uma forma republicana de governo A confiança no papel da opinião pública internacional estava presente nos princípios que inspiraram a criação da Liga das Nações como exemplo claro da concepção liberal acerca do papel das instituições internacionais na redução dos conflitos e na mudança da natureza da política mundial O jurista holandês Hugo Grotius 15831645 cujo tratado Sobre o direito da guerra e da paz é considerado a primeira grande obra do direito internacional exerce grande influência sobre a teoria de relações internacionais em função de sua defesa do conceito de sociedade internacional Grotius sustentava que todo Estado estava sujeito ao Direito Natural sobre o qual por sua vez estava assentado o Direito das Nações Para ele o Direito Natural consistia em princípios morais gerais acessíveis a todo ser humano por meio da razão e do senso comum Todas as pessoas eram portadoras do razo de e dos mesmos direitos naturais que basicamente garantiam a vida a propriedade e o direito à autodefesa Em outras palavras o Direito Natural permitia aos seres humanos distinguir entre o justo e o injusto entre o bem e o mal O Direito das Nações por outro lado é necessariamente baseado no Direito Natural mas resulta essencialmente da vontade dos Estados em estabelecer regras de convivência baseadas no consenso As leis da guerra e da paz deveriam assim refletir os postulados morais do Direito Natural Dali deriva por exemplo a teoria da guerra justa de Grotius que afirma que a guerra pode ser justa e legítima apenas quando um Estado é agredido ou ameaçado gravemente em sua sobrevivência Guerras religiosas não poderiam ser justas uma vez que eram reservadas a cada Estado a escolha de sua justa uma vez que os Estados concordam em estabelecer regras de comportamento tanto para assegurar seus interesses internacionais como também promover a estabilidade das interações internacionais É também no século XIX que surgem as primeiras organiz ações funcionais voltadas para a cooperação em áreas técnicas como saúde e comunicações a União Postal Internacional é um bom exemplo Essa é considerada igualmente a época de ouro do Direito Internacional Multiplicamse normas práticas e instrumentos jurídicos nas relações entre Estados consolidando a noção de que o direito positivo ou seja resultante da vontade e das decisões dos Estados e não o Direito Natural derivado da capacidade da razão apreender princípios morais transcendentais é de fato a base sobre a qual se deve regular o relacionamento entre soberanos Guerra Mundial em recitar a organização em novos modos com o claro propósito de dar continuidade à institucionalização da política mundial iniciada em 1919 Nesta seção procuramos apresentar em linhas gerais a herança intelectual da tradição liberal na teoria de Relações Internacionais Apesar de essa herança raramente ser mencionada na maior parte da produção contemporânea de orientação liberal a discussão mostrou que muitos dos princípios fundamentais do liberalismo continuam a influenciar a reflexão atual sobre relações internacionais O foco no indivíduo e em suas formas de organização na sociedade continua a ser um elemento central nas análises liberais contemporâneas em particular os modelos de política externa a da ação de grupos de interesse nas instituições de governo A defesa do livrecomércio vem assumindo no contexto da globalização um status de regra fundamental das relações econômicas internacionais ainda que seja intensamente criticada por Estados pobres e em desenvolvimento e por organizações da sociedade civil Como veremos adiante a crença na vocação pacífica das democracias recebeu um novo vigor nos últimos 20 anos para tornarse segundo alguns autores um elemento científico das relações internacionais O objetivo principal dos funcionalistas era estudar o funcionamento das organizações internacionais e analisar como a criação de agências especializadas no tratamento de questões específicas das relações entre Estados poderia conduzir gradualmente ao aprofundo da cooperação Com essa nova abordagem os liberais abandonaram na pretensão de criar uma organização de alcance global como a Liga que se encarregasse de defender os valores coletivos da paz e da solidariedade Ao contrário as possibilidades de criar uma comunidade internacional estariam na proliferação lenta mas firme de organizações formadas para cumprir uma função determinada O termo funcionalismo referese à visão segundo a qual forma segue a função ou seja a maneira como uma organização e sua estrutura depende da função específica que desempenha Ao privilegiar a função como parâmetro para a criação de organizações os funcionalistas pretendiam desvinculálas dos projetos políticos mais ambiciosos e restringilas ao cumprimento de tarefas técnicas Nesse sentido o processo de institucionalização das relações internacionais seria resultado do aumento progressivo da confiança e da colaboração entre funcionários atuando nas organizações e representantes dos Estados nacionais Os governos concordariam em administar em conjunto aspectos de suas funções soberanas pela transferência de parcelas de suas funções a uma estrutura supranacional Esse efeito se verifica quando o sucesso de uma determinação de realização eficiente de uma tarefa ou função se transfere para uma outra área incentivando a cooperação intergovernamental em outros setores ainda submissos à esfera do Estado nacional Em outras palavras o aprendizado com experiências bemsucedidas faria com que as soluções organizacionais transbordassem para diferentes setores da vida social Esse processo contudo não era governado por uma lógica política mas sim pela lógica da eficiência funcional Nesse sentido não dependia de decisões tomadas em algum centro de poder mas antes das trocas de experiências que circulam na base da rede transnacional de funcionários de organizações intergovernamentais e nãogovernamentais envolvidas na formulação e implementação das políticas setoriais Essa visão portanto defende a separação da política ou seja dos interesses nacionais dos Estados da técnica como caminho para a progressiva institucionalização das relações internacionais Na verdade tratase de uma concepção que enfrenta o progresso da técnica produz um resultado político desejável a cooperação e a paz não era mais possível estudar as relações internacionais olhando apenas para o comportamento dos Estados era imprescindível incorporar os novos atores nos modelos de análise Por outro lado era importante não cair na armadilha do idealismo e desconceber a dimensão do poder na política mundial como alguns estudiosos da interdependência pareciam fazer Em Power and Interdependence os dois autores se propõem a mostrar como a interdependência ao contrário de ser um fenômeno neutro ou benigno pode ser uma fonte de conflito e um recurso de poder Tratase na verdade da primeira tentativa importante de conciliar uma perspectiva liberal com o realismo Keohane e Nye afirmavam que o realismo não possibilitava a compreensão da política mundial em um mundo complexo e interdependente mas ao mesmo tempo defendiam que sua teoria complementar o realismo ao incorporar as mudanças nas formas em que o poder era exercido contemporaneamente Definição de interdependência Na política mundial a interdependência referese a situações caracterizadas por efeitos recíprocos entre países ou entre atores em diferentes países Keohane e Nye A interdependência é mais claramente percebida nas relações econômicas mas aplicase a outras esferas da política internacional Keohane e Nye situaram o caso do mercado de petróleo porque se tratava de um problema global da época e representava bem o impacto produzido pela interdependência Os países desenvolvidos cooperaram para criar um mecanismo de reservas de petróleo que poderia funcionar como proteção e desestabilizando quando houvesse uma crise É importante lembrar que nos anos 70 a Opep fez com que as economias centrais registrassem uma vulnerabilidade relativa ao comportamento de nações menos desenvolvidas E essas eram historicamente dependentes da tecnologia capital e bens industrializados produzidos no centro os países desenvolvidos se encontrariam diante de uma série de razões para a dependência no fornecimento de tanta energia essencial para suas sociedades bem como de uma capacidade reduzida para diversificar os produtos de modo a não depender de petróleo Vulnerabilidade mede o custo das alternativas disponíveis para fazer frente diante do impacto externo A vulnerabilidade de um país será tão alta quanto mais alto for o custo das iniciativas necessárias para fazer frente ao efeito gerado pela interdependência O exemplo da crise política na Bolívia em maio de 2005 é bastante ilustrativo a sensibilidade do Brasil aos acontecimentos no antigo país é alta porque importamos de lá 90 do gás natural consumido aqui Da mesma forma a vulnerabilidade brasileira a um crescimento de preços do boliviano ou a interrupção do fornecimento é alta porque é difícil encontrar fontes alternativas dentro ou fora do país no curto prazo ou seja o custo de substituição do gás boliviano é alto A questão da vulnerabilidade se agrava quando encontramos as assimetrias na interdependência o que ocorre na maioria dos casos Keohane e Nye afirmam que no contexto da interdependência as assimetrias assumem um caráter diferente da tradicional dependência as assimetrias assumem um caráter diferente da tradicional dependência as assimetrias assumem um caráter diferente da tradicional dependência as assimetrias assumem um caráter diferente da tradicional dependência a habilidade de um país em influenciar ou controlar os outros Por outro lado a relação entre os dois países que existem representa um grande espaço de visões complexas Neste sentido é necessário considerar que as assimetrias se tornam predicadas da interdependência Keohane e Nye definiram essa nova configuração da política mundial como Interdependência Complexa A interdependência complexa tem três características centrais 1 Existência de Múltiplos Canais de comunicação e negociação a Contatos informais entre membros de diferentes agências e órgãos dos governos e destes com atores privados b Diversidade de atores Não apenas funcionários ligados ao serviço exterior diplomatas participam e promovem relações externas mas também burocratas de diferentes áreas do governo empresas e organizações nãogovernamentais c As organizações internacionais têm um papel maior como arena de negociação e como mecanismo de estímulo à cooperação 2 Agenda Múltipla a Existe uma diversidade de questões na agenda dos Estados que vai desde as mais tradicionais como a segurança passando por uma ampla gama de temas econômicos financeiros e comerciais até os chamados novos temas como o meio ambiente a cultura o terrorismo etc b Verificase uma ausência de hierarquia entre os temas da agenda internacional Tradicionalmente dividiamse os temas entre questões de alta política segurança armamentos alianças etc e de baixa política basicamente econômica Na interdependência complexa não se verifica tal precedência cada questão deve ser pensada em termos próprios sem termos de ordem específica 3 Utilidade decrescente do uso da força a A interdependência complexa implica um envolvimento reciproco entre atores que o uso da força militar é virtualmente descartado para resolver divergências b É cada vez mais difícil vincular negociações sobre questões de baixa política a questões de segurança Em outras palavras uma superioridade militar dificilmente influenciará o resultado de uma disputa econômica c O poder militar não é fungível ou seja não é como o dinheiro cujo uso é indiscriminado em qualquer transação econômica O poder militar não pode ser empregado para definir o resultado de negociações sobre por exemplo o fornecimento de recursos naturais ou a redução de tarifas aduaneiras Nesse sentido a definição de poder tornase muito mais específica de acordo com a questão em jogo O quadro que se apresenta ao contrário do que os analistas mais otimistas podem pensar não é necessariamente o de um mundo mais cooperativo em função do aumento das interconexões globais Para Keohane e Nye a interdependência pode ser e frequentemente o é fonte de conflitos A questão que se coloca então é a de buscar meios para administrar tais conflitos de maneira a permitir que os Estados usufruam dos benefícios de um sistema internacional mais integrado A resposta a essa questão teve grande impacto e definiu o debate teórico central das Relações Internacionais ao longo da década de 1980 regimes O sistema internacional é anárquico descentralizado e as ações dos Estados são em grande parte explicadas a partir desse princípio organizador da estrutura do sistema As concessões dos teóricos da interdependência aos seus rivais neorealistas significaram um afastamento das análises de relações transnacionais em particular daquele protagonizadas por atores nãoestatais O foco agora recaía sobre o Estado concebido como um ator racional interessado em maximizar seu bemestar A segunda concessão importante implica o abandono da reivindicação mais ousada de que a interdependência complexa representaria uma mudança estrutural da política mundial impondo uma nova lógica a seu funcionamento distinta daquela característica do sistema anárquico variadas que não controla as decisões de outros atores Na anarquia esse cálculo é particularmente complicado uma vez que Estados soberanos tendem a proteger informações sobre suas políticas do olhar de estrangeiros potenciais competidores Nesse ambiente as intenções tendem a ser disfarçadas de modo a não permitir que os demais antecipem suas estratégias O Dilema de Segurança descrito pelos realistas emerge exatamente em um contexto de interação estratégica em que não há informação suficiente sobre as intenções do vizinho O resultado é o oposto do que cada ator individualmente deseja a deterioração da segurança e o início de uma escalada para a guerra Para os agentes esse resultado não é inevitável dada uma suposta lógica da anarquia que condena os Estados a uma situação de eterno conflito So o problema está no ambiente em que se dá a interação e considerando que os atores são racionais a solução para o dilema está na mudança desse ambiente de modo a permitir que os atores calculem melhor suas oportunidades e assim tomem decisões que atendam a melhorar seus interesses O problema da cooperação da anarquia é bem ilustrado pelo conhecido Dilema do Prisioneiro que por meio da aplicação da teoria dos jogos mostra como dois atores com interesses comuns podem atingir resultados piores porque não cooperaram O Dilema do Prisioneiro coloca os acusados de um crime em salas separadas sendo interrogados pelo promotor Este não dispõe de provas suficientes para incriminálos de modo a obter a pena máxima por isso tenta convencêlos a confessar e a incriminar seu cúmplice Quem confessar primeiro receberá uma pena muito menor do que se todos decidissem cooperar ou seja não denunciar um ao outro O Dilema do Prisioneiro desempenha um papel central nas teorias neoliberais de relações internacionais uma vez que passa a representar de forma emblemática a anarquia como um ambiente em que os Estados interagem Para os neorealistas lembremos o compromisso dos Estados se explica a partir da sua posição na distribuição de capacidades no sistema Mudar o posicionamento de um Estado é difícil porque depende de um aumento em suas capacidades que em um ambiente competitivo será normalmente compensado pelos esforços das demais unidades Na anarquia descrita pelos neoliberais o problema está na maioria das vezes em como mudar o contexto da interação entre os Estados de modo que possuam identificar interesses comuns A competição não é a única estratégia disponível como ilustra a situação dos dois prisioneiros Se ambos tivessem por exemplo a possibilidade de se comunicar durante o interrogatório escolheriam cooperar entre si e não com o promotor mesmo que tal escolha não produzisse o resultado individual máximo mas antes resultado conjunto O argumento neoliberal é que o contexto da interação estratégica muda por meio da formação de instituições que desempenham três funções básicas para a formação das preferências dos atores Aumento o fluxo de informações permitindo maior transparência acerca das intenções interesses e preferências dos Estados contribuindo para a redução da incerteza que caracteriza o ambiente anárquico A comunicação entre os atores cria condições para a coordenação de estratégias que aumentem o ganho conjunto das partes por meio da cooperação Permitem o controle do cumprimento dos compromissos As instituições estabelecem mecanismos de monitoramento e verificam se as partes de um regime estão de fato cumprindo acordos firmados Um dos maiores obstáculos à cooperação é o medo da trapaça Em outras palavras a preocupação com a distribuição dos ganhos entre os atores não cooperantes pode levar a um certo distanciamento entre as partes que interagem Para um ator essa pressão pode até mesmo ser um motivo para não agir cooperativamente pois a possibilidade de trair o outro é tentadora de modo que em um futuro próximo ameaçam a autonomia e até mesmo a segurança de um Estado Essa preocupação com a distribuição dos ganhos apresentados por Grice em que todas as interações internacionais o fazem de maneira que os interesses dos Estados sejam posicionados em relação ao povo dos interesses e das motivações dos Estados Em outras palavras as instituições importam não são meros instrumentos ou construções jurídicas superfluxas Novas direções no debate liberal A interdependência complexa e as teorias de regimes trouxeram nova vida para a tradição liberal nas Relações Internacionais e provocaram um intenso debate teórico com o realismo ao longo dos anos 80 e 90 Autores como Robert Keohane Oran Young Arthur Stein Joseph Grieco Stephen Krasner entre outros protagonizaram tais debates que tinham como ponto de referência principal divergência sobre o significado da anarquia Se como questionam os neoliberais o conflito não era inerente à condição de anarquia mas sim contingente segundo as circunstâncias de interação não era mais possível considerar a política internacional uma arena de conflito em que a ordem somente é possível por meio da formação de balanços de poder Nesse caso o enfoque realista perde sua relevância e acaba encontrandose na situação delicada de não possuir mais hipóteses explicativas abrangente do comportamento dos Estados nas relações internacionais Joseph Grieco por exemplo reconhecia que a cooperação ocorria com maior frequência do que admitiram os realistas mas continuava difícil porque os Estados em condição de anarquia ainda obedeciam a uma lógica de competição na qual ganhos relativos eram mais importantes do que ganhos absolutos Em outras palavras para Grieco o medo de uma possível agressão futura afetava não apenas os interesses dos Estados Mesmo que um determinado contexto seja possível cooperar com um grande número de Estados o resultado dessa cooperação significar mais proporções que poderão beneficiar os Estados que não o fizerem Por exemplo se um Estado tivesse interesse que o parceiro ganhe mais na relação não seríamos capazes de incluir essa situação sem décadas porque quereram ver a economia daquele importante fortalecido a priori os interesses dos Estados baseandose na premissa racionalista de que Estados são egoístas Nesse contexto as instituições proporcionam um ambiente mais favorável à realização de interesses ao gerar mais transparência e informação e assim mudar a estrutura de incentivos e consequentemente a ordem das preferências dos atores O papel das instituições nesse enfoque é limitado à concepção de falhas de mercado que impedem a cooperação Todavia os observadores afirmam que falhas de mercado mas também de fatores com assimetrias acentuadas problemas políticos domésticos dos Estados e como elas afetam os custos e a distribuição de ganhos O movimento neoliberal nas Relações Internacionais conseguiu transformar o institucionalismo na nova ortodoxia da disciplina fazendo com que até mesmo os velhos rivais realistas admitam com algumas exceções a importância do estudo das instituições no domínio internacional A vingança liberal teve sucesso graças justamente a capacidade das novas teorias de colocar a formação e o governo das instituições internacionais de novo no centro das preocupações do Estado A partir daí ficou mais fácil sustentar como faz por exemplo John Ikenberry que as ordens internacionais são legítimas necessariamente por meio de sua institucionalização Ou seja os novos enfoques permitem que os liberais voltem a afirmar a necessidade de construir instituições para melhorar ou endurecer a política mundial sem cair no idealismo dos anos de entreguerras Uma vez definido esse ponto crucial a questão teórica mais importante tornase como já mencionamos mostrar como as instituições aliam não só como instâncias de coordenação de estratégias para alcançar interesses comuns mas também como incidem na própria formatação e na mudança dos interesses dos Estados A visão neoliberal do problema da anarquia sugere que os interesses dos Estados não são primordialmente determinados pela preocupação com a segurança Estados são maximizadores de utility Buscam retornos crescentes em diversas áreas de sua atuação O debate sobre a paz democrática tornouse um dos debates centrais da tradição liberal tendo a combinação de três evoluções a redescoberta da herança kantiana por parte de alguns estudiosos das Relações Internacionais o amadurecimento de estudos estatísticos sobre o fenômeno da guerra e a evolução das relações entre os Estados Unidos e a União Soviética na segunda metade da década de 1980 que desembocou no fim da Guerra Fria A redescoberta de Kant por parte de acadêmicos liberais tem no artigo de Michael Doyle de 1983 uma data inicial simbólica Nesse artigo Doyle revisitou o Tratado sobre Paz Perpétua de Kant para explorar suas consequências quanto ao cenário político internacional do início da década de 1980 Para Kant a simultaneidade da existência de repúblicas sua consolidação em uma confederação mundial e de dever de hospitalidade perante o estrangeiro seriam as condições para o ser humano por meio do uso da racionalidade estabelecer as condições básicas para a paz Tal paz seria inicialmente separada entre Estadosmembros da confederação e converteria com uma relação conflituosa e de permanente agressão em relação aos nãomembros da confederação Entretanto essa confederação tenderia a expandir e a abarcar um número crescente de membros até se tornar uma confederação mundial Nesse momento a humanidade estaria chegando às condições de paz perpétua Doyle interpretou o conceito de repúblicas usado por Kant como democracias Para ele Kant se referia a sistemas de governo em que o governo era escolhido pelo povo o que dava a ele o privilégio da soberania Por isso Doyle intervindo no debate sobre a relação entre democracia e paz a partir de uma herança kantiana questionava qual das democracias não são mais pacificas do que os demais regimes mas eram pacificas entre si mesmas Foi nesse nível que interveio no segundo desenvolvimento que Kant mencionada hoje é difícil distinguir o paradigma dominante dos pressupostos fundamentais do institucionalismo neoliberal Por outro lado o neoliberalismo teve de fazer tantas concessões às liberdades após o fim da Guerra Fria que hoje os teóricos mais fiéis ao núcleo duro da velha ortodoxia aparecem em posições ligeiramente marginais no debate Nos últimos 20 anos fortaleceuse o senso comum de que o ordenamento do sistema internacional passa necessariamente pelo fortalecimento de instituições pelo crescimento do comércio internacional e pela difusão de valores liberais Da mesma forma é forte a convicção em torno da ideia de governança global ou seja de que é necessário construir estruturas de autoridade de alcance mundial mesmo que isso represente uma redução da autonomia dos Estados São ideias que guardam um parentesco muito próximo com os chamados idealistas defendiam no início do século XX Na verdade apesar da presença de ideiasforça da tradição o neoliberalismo institucional prefere reivindicar suas diferenças com o velho idealismo principalmente no que diz respeito às ideias Não encontraremos hoje a crença inabalável no progresso da humanidade a partir da evolução das relações internacionais não pode ser nada além da construção de instituições cada vez mais eficientes que viabilizem o crescimento do bemestar das sociedades A paz é um resultado eventual desse processo e não um valor a ser perseguido Por outro lado os novos liberais estão comprometidos com políticas de liberalização e internacionalização econômicas que enfraquecem o Estado Os velhos liberais acreditavam que uma comunidade mundial de seres humanos poderia florescer a partir de Estados afirmados em sua soberania por princípios como o da autodeterminação e da democracia Teriam os representantes atuais da tradição liberal nas Relações Internacionais se tornado tão céticos e pessimistas quanto seus rivais realistas Não A crença na possibilidade de mudança na política mundial ainda inspira os representantes da ovelha enquanto os neorealistas continuam a reafirmar que nas relações internacionais encontramos sempre a repetição dos mesmos padrões de comportamento pelo papel que em última instância o mundo permanece igual e possivelmente ainda mais realista ou moderado do que os estes ancestrais 14 Para uma discussão do Dilema de Segurança e seus constrangimentos à cooperação ver Jervis R Cooperation Under the Security Dilemma World Politics v 30 n 2 p 167214 1978 14 Para uma discussão do Dilema de Segurança e seus constrangimentos à cooperação ver Jervis R Cooperation Under the Security Dilemma World Politics v 30 n 2 p 167214 1978 forças ao proletariado dos países de capitalismo maduro Para Marx as tendências éstáticas a concentração do capital e a queda da taxa de lucro conduziram o capitalismo ao declínio como sistema econômico global 1 Apesar de não ter dedicado particular atenção aos temas da política internacional Marx presta uma contribuição fundamental para o desenvolvimento de uma visão crítica das relações internacionais e consideramos alguns dos pontos centrais de sua teoria considerarmos o sistema anárquico um dado da natureza estima a formulação de teorias que afirmam que ela não pode ser mudada Uma visão das relações internacionais baseadas nas leis dinâmicas do capitalismo tal como enunciadas por Marx nos levaria a um análise sobre o estado das forças produtivas capitalistas em seus centros mais desenvolvidos sobre suas crises cíclicas e seus reflexos sobre a luta de classes e sobre a hegemonia burguesa no plano flexos sobre a luta de classes os conflitos contradições e mudanças no sistema internacional deveriam ser vistos antes de tudo como conflitos inerentes ao desenvolvimento capitalista A transformação da ordem internacional seria resultado da superação do capitalismo pela via da revolução socialista que começaria nos países avançados Marx contudo tinha clara da importância de uma estratégia revolucionária que tivesse dimensão internacional e por isso apoiou a fundação e a organização Internacional dos Trabalhadores a Primeira Internacional Socialista em 1864 na cidade trabalhadores de Londres A nova organização apresentava enorme potencial para coordenar atividades revolucionárias em diferentes países de levar ao fracasso as revoluções de 1848 Na verdade a reação burguessa aqueles eventos thin demonstrado a solidariedade fraternal das classes dominantes em todo o continente europeu colocando sem evidente o caráter internacional da luta de classes Nesse sentido a organização internacional do proletariado era essencial ao sucesso das lutas nacionais para a conquista do poder As considerações de Marx sobre a internacional nos política permitem identificar três elementos importantes de sua teoria política A necessidade de organização dos classes trabalhadoras em escala nacional formando políticos possibilidades para conquistar o poder A centralidade do internacional para as lutas dos trabalhadores dada a dimensão internacional da contrarrevolução Para Marx portanto a destruição do Estado burguês era um passo necessário à construção de uma sociedade igualitária na qual a política com dominação desapareceria dando lugar a uma gestão radicalmente democrática da vida social Como consequência no socialismo seriam colocados em movimento processos que levariam ao desaparecimento do Estado Em um mundo onde não houvesse divisão de classes e que o Estado não existisse não haveria relações internacionais apenas relações entre comunidades livres unidas pelo mesmo sentimento solidário de pertencimento Nesse sentido Marx nega a possibilidade de tomada pura e simples do aparelho do Estado burguês pois ele seria incompatível com o governo dos trabalhadores e daria continuidade ao antagonismo entre as nações Lênin e o imperialismo uma visão marxista das relações internacionais Em Imperialismo fase superior do capitalismo Lênin formulou o que mais se aproxima de uma teoria marxista das relações internacionais Mesmo baseado nas ideias de movimento do capitalismo tais como descritas por Marx e mesmo localizado na dinâmica da acumulação e na luta de classes a fonte primária dos conflitos internacionais Lênin soube construir uma teoria política cujo objetivo era o de situar o processo revolucionário russo no contexto internacional principalmente o da Primeira Guerra Mundial que deveria ser internacional Ao contrário de Marx que enfatizava as contradições entre as forças sociais de produção e as relações de produção capitalistas como força de transformação histórica das sociedades nacionais e para quem as relações internacionais não tinham importância relevante no contexto dessas transformações Lênin aponta a combinação entre nações capitalistas imperialistas como determinantes para desencadear o processo revolucionário que levaria à queda do capitalismo demais que seria incompatível com a utopia comunista Para algumas as divisões nacionais inviabilizariam a superação do próprio capitalismo unindo o sistema de nações à permanência do modo de produção capitalista independente da estrutura interna dos Estados que o compõem Para Lênin a luta de classes assume uma nova forma manifestase por intermédio do conflito entre Estados nacionais que ele classifica como oprimidos e opressores A questão teórica relevante está justamente na necessidade de combinar o conteúdo de classe de um Estado com sua ação no sistema internacional sem que ambos os aspectos interno e externo da forma estatal estejam em contradição Para que a política internacional de um Estado fosse coerente com seu caráter de classe seria preciso conceberlo como instrumento de dominação e de projeção externa daquela classe A concepção instrumental do Estado é problemática e não dá conta da complexidade de ação estatal no plano internacional uma vez que requer que aceitemos uma estreita relação entre a classe dominante e os postos ocupados no aparato burocrático do Estado O próprio Lênin acaba enfrentando diferentes definições de Estado ao longo da sua obra sem resolver as contradições que surgem a partir de sua teoria do imperialismo Quando por exemplo Lênin emprega uma definição que confere alguma autonomia ao Estado para agir como ator unitário no plano externo encontramos relutância ao interesse nacional que necessariam ente à questão da luta de classes nos países envolvidos nessa luta Apesar do esforço teórico para combinar contradições verticais e horizontais em uma única perspectiva internacional os limites da teoria do imperialismo terminam por levar a uma separação entre as dinâmicas de classe e nacional na própria obra de Lênin e dos teóricos que o seguiram O debate sobre a chamada questão nacional sempre colocou em evidência algumas fragilidades importantes no pensamento marxista que se refletiram em divergências em torno das estratégias revolucionárias e de combate ao imperialismo O caso da China é emblemático a esse respeito Em consonância com sua análise teórica da política internacional Lênin deu importância considerável aos movimentos de afirmação nacional no contexto da revolução russa e do fim da Primeira Guerra Mundial Os bolcheviques acreditavam que esses nacionalismos enfraqueceriam tanto o tsarismo quanto as potências que ameaçavam a revolução Apesar de todos os problemas que os nacionalismos criariam para a União Soviética o leninismo afirmouse na história contemporânea como uma doutrina que defendia firmemente o direito de autodeterminação dos povos A relevância deste direito e das lutas nacionais aumentava decisivamente no momento em que a dinâmica revolucionária se desloca efetivamente para os países atrasados ou dependentes Foi o que aconteceu na China um Estado atrasado a luta de classes assume um padrão colonial pelas classes dominantes Assim a luta de classes assume a forma imperialista constituindo um exemplo concreto da teoria leninista desenvolvendose nesse contexto mas que para Mao TseTung as classes alegadas que o Estado chinês de Chiank Kai Shek representava também se viabilizaria através da revolução nacional Nesse sentido a teoria revolucionária do leninismo tornase uma teoria da revolução imperialista Visões da periferia as teorias da dependência As teorias da dependência não constituem como é sabido um corpo teórico homogêneo Autores como Raul Prebisch e Celso Furtado filiamse ao pensamento keynesiano Por outro lado muitos expoentes do dependentismo consideraram as teorias formuladas na Cepal Comissão Econômica da América Latina da ONU insuficientes para explicar o subdesenvolvimento e fizeram recurso ao marximsoleninismo assumindo uma posição mais radical ou revolucionária Entre estes estão para citar apenas alguns André GunderFrank Arghiri Emmanuel Theotônio dos Santos Samir Amin e Immanuel Wallerstein A assertiva mais importante dos dependentistas acerca da dinâmica do capitalismo mundial aponta o subdesenvolvimento como produto do desenvolvimento das forças produtivas globais ou melhor das economias dos países do centro capitalista É a condição de dependência dos países da periferia que perpetua e até mesmo acentua seu subdesenvolvimento O esforço de modernização por meio de industrialização substitutiva estratégia defendida por economistas como Celso Furtado é incapaz de tirar a periferia do atraso e da dependência O intercâmbio desigual a ação das multinacionais e a hegemonia dos países capitalistas centrais produziriam um efeito de dependência que se associaria à ação das grandes empresas multinacionais como subsidiária à ação dos grandes empresas multinacionais partir da relação entre ricos e pobres Lênin acreditava como Marx no efeito modernizador e civilizador do capitalismo sobre sociedades atrasadas e as economias tradicionais Por outro lado a centralidade dos processos econômicos para a determinação das relações de domínio entre centro e periferia se contrapõe ao caráter eminentemente político dessa relação contido na teoria do imperialismo Em função desse enfoque mais economicista os dependentistas devotam pouco empenho à pesquisa sobre as formas do Estado nos países do Terceiro Mundo preocupandose muito mais com a análise dos mecanismos de exploração dos países pobres pelas potenciais hegemônicas Por isso transpõese na obra dessas autores a aceitação da concepção instrumental do Estado cujos limites principalmente para a integração das relações internacionais discutimos anteriormente O Estado nas economias do Terceiro Mundo é um instrumento essencial para a administração do papel dependente dessas economias na divisão internacional do trabalho e no processo capitalista mundial de acumulação de capital O aumento das contradições do imperialismo tanto em nível interempresarial ou na relação com os Estados nacionais como no aspecto financeiro tem feições diversas sobre as economias e sociedades dependentes há dois agentes principais que disputam a hegemonia e a orientação dos destinos desses países a grande empresa internacional e o capitalismo do Estado sócios mediatas a grande empresa internacional e o capitalismo do Estado sócios mediatas e maior ou menor importância relativa de um ou outro setor determinando diferentes regimes políticos contribuem com ciclos de expansão e declínio econômico relacionados a fatores como comércio investimento e tecnologia Nesse sentido devemos entender as oscilações na distribuição do poder no sistema internacional como uma função da dinâmica do movimento do capital em nível global Os Estados desenvolvem sua ação política sob os condicionamentos do mercado mundial e segundo a posição que ocupam na divisão internacional do trabalho Com base nesse enfoque podemos analisar a formação e a expansão ao longo da história desde o século XV até os nossos dias a luta pelo poder entre mercadores e a globalização da produção capitalista A projeção colonial europeu o imperialismo do século XIX a internacionalização da economia pósSegunda Guerra e a globalização a partir dos anos 70 representam momentos diferentes de um mesmo processo de acumulação no que às variações da relação entre Estado e mercado obedecem às necessidades de coerção e regulação da evolução histórica do sistema capitalista malmente reduzido do ritmo de crescimento econômico e consequentemente declínio de hegemonia da potência dominante Os momentos de crise são próprios para que potências emergentes reconfigurem maiores espaços de poder nas relações internacionais e maior participação nos fluxos de investimentos Nesse sentido a competição internacional é essencial para corrigir desequilíbrios precificar mercados em que os custos de produção mãodeobra principalmente são menores e conter os avanços excessivos do Estado sobre os mercados O ciclo atual de expansão do capitalismo por exemplo será resultante das correções de rota impostas depois da crise mundial dos anos 70 que tiveram como eixos principais a redução das barreiras à mobilidade do capital de modo irromperou a globalização e o recuo do papel do Estado no direcionamento e regulação das atividades econômicas em setores estratégicos Tais mudanças se deram no contexto do questionamento da hegemonia norteamericana e da ascensão do Japão e da União Europeia como pólos de poder emergente na economia mundial confirmando o papel central da competição para o dinamismo e a expansão do sistema O enfoque de Wallerstein nos mostra um capitalismo atravessado por contradições mas ainda assim em constante expansão há cinco séculos Como Marx ele acredita que tais contradições levarão a crises cada vez mais profundas até o ponto em que não será mais possível retornar ao nível de acumulação fazendo com que o sistema entre em colapso Em outras palavras o capitalismo será vítima de seu próprio sucesso na medida em que a necessidade de se fazer crescer a rentabilidade do capital em função da competição crescente decidirá irreversivelmente A perda de dinâmica econômica terá como consequência o aumento das contradições sociais e a emergência de novos políticos de contestação no plano interno A teoria do sistemamundo nos permite combinar análises diferenciadas dos processos de capitalismo com uma consideração das dinâmicas políticas nas relações internacionais Wallerstein sugere uma explicação baseada na teoria de Marx formulando o conceito de troca desigual Nesse sentido o comércio em condições desiguais é o mecanismo de transferência de renda dos países pobres para os ricos como a forma de preservar a divisão internacional do trabalho reproduz a desigualdade O problema está é claro em uma percepção excessivamente funcional do Estado que acaba funcionando como uma esfera de transmissão dos interesses das classes dominantes e uma estrutura de regulação das necessidades de exaustão do capitalismo mundial Sabemos que teorias de Relações Internacionais desenvolvem sempre capazes de explicar a ação autônoma dos Estados em instâncias cruciais como a segurança internacional global Nesse sentido a teoria do sistemamundo é um avanço significativo nas abordagens marxistas acerca da dimensão global