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Capítulo 1 As estruturas demográficas O surgimento da Demografia Histórica há menos de cinco décadas enriqueceu consideravelmente o arsenal do historiador na sua tarefa de compreensão do passado e os medievalistas não poderiam é claro ficar indiferentes a ela Apareceram assim vários trabalhos metodológicos sobre as especificidades da demografia medieval e inúmeras monografias sobre as condições populacionais de mosteiros senhorios cidades e mesmo regiões mais amplas A partir de tais estudos esboçaramse sínteses parciais e hoje já vemos com certa clareza as estruturas demográficas medievais Sem dúvida a Idade Média estava na etapa que os especialistas chamam de Antigo Regime Demográfico típico das sociedades agrárias préindustriais alta taxa de natalidade e alta taxa de mortalidade Em razão disso a conjugação de certos fatores estiagens enchentes epidemias etc por poucos anos seguidos alterava o quadro demográfico ao elevar ainda mais a mortalidade Ou pelo contrário a ausência de eventos daquele tipo rapidamente produzia um saldo populacional positivo Como Roberto Lopez acertadamente chamou a atenção 70 120 toda espécie inclusive a humana tem tendência natural a se multiplicar desde que não haja obstáculos externos para isso Ora a história demográfica medieval é exatamente a história da presença e da remoção desses obstáculos A retração da Primeira Idade Média Do ponto de vista demográfico a primeira fase medieval foi um prolongamento da situação do Império Romano cuja população conhecera um claro recuo desde o século II Com a crescente desorganização do aparelho estatal romano foram rareando as importações de gêneros alimentícios que tinham por séculos permitido a existência de uma grande população urbana As cidades começaram a se esvaziar cada região tentou passar a produzir tudo aquilo de que necessitasse Tal fenômeno paradoxalmente aumentou a insegurança pois bastava uma má colheita para que a mortalidade naquele local rapidamente se elevasse devido às dificuldades em obter alimentos em outras regiões Não por acaso a hagiografia da época freqüentemente relata milagres alimentares santo era sobretudo o homem que conseguia alimentos para seus concidadãos Entravase num círculo vicioso pois a fraqueza demográfica engendrava a fraqueza dos rendimentos e esta por sua vez engendrava a fraqueza demográfica reforçando assim a causa da pobreza 42138 Contra esta situação no século V um imperador romano proibiu as moças menores de 14 anos de entrar para o clero além de pressionar as viúvas a se casarem novamente em cinco anos sob pena de em caso contrário perderem metade dos seus bens Por seu lado a penetração e a fixação de germanos em território romano não alteraram significativa mente a situação Cada grupo invasor franco ostrogodo vândalo etc tinha em média apenas entre 50000 e 80000 pessoas computados guerreiros mulheres e crianças No conjunto uma estimativa antiga mas de forma geral ainda aceita calcula que o total de germanos que se fixaram no império representava somente uns 5 da população romana Desta forma não houve um reforço populacional germânico porque a chegada de algumas poucas dezenas de milhares de bárbaros teve como contrapartida o despovoamento de regiões inteiras diante de seu avanço Acima de tudo porém o recuo demográfico foi produto do recrudescimento de epidemias Do século III ao V de malária Do século VI ao VIII de varíola conjugada com a mortífera peste Como a difusão das doenças era acelerada pelo deslocamento de comerciantes e soldados elas fizeramse mais presentes no litoral mediterrâneo do que no interior europeu já então mais isolado em razão da debilidade e depois do desaparecimento do Estado romano O sul da França e da Itália foi atingido por quinze vagas de peste entre meados do século VI e meados do século VIII cada uma delas geralmente com alguns anos de duração Por esse motivo a população no Ocidente e talvez mesmo no Oriente atingiu nos séculos VII e VIII seu ponto mais baixo desde o Alto Império Romano BIRABEN I 44 A relativa recuperação da Alta Idade Média Foi possivelmente esse completo despovoamento de certas regiões que permitiu a recuperação de outras ao criar bolsões os locais desertos que dificultavam a difusão da peste De qualquer forma o que se percebe por meio de indícios esparsos na documentação de interpretação problemática indica uma certa retomada demográfica na segunda metade do século VIII Esse fato talvez esteja ligado à reorganização promovida pelos Carolíngíos e talvez ajude mesmo a explicar a expansão territorial realizada por Carlos Magno Contudo essa recuperação foi desigual no tempo e no espaço Em muitos locais em muitos momentos a fome e a mortalidade continuavam acentuadas Uma crônica da região do Mosela afirma em fins do século VIII que os homens comiam os excrementos uns dos outros homens comiam homens irmãos comiam seus irmãos as mães comiam seus filhos Buscando um certo equilíbrio entre o contingente populacional e os recursos existentes a sociedade altomedieval lançava mão de vários expedientes de controle de natalidade Daí o pequeno número de crianças apenas 2 da população camponesa Em parte isso se devia às práticas anticonceptivas e abortivas apesar de duramente punidas pela Igreja Em parte era resultado da elevada proporção de viúvos e celibatários naquela sociedade Em parte decorria do infanticídio especialmente o feminino estudado por Emily Coleman 19 1974 315335 para ter menos bocas para alimentar sacrificavamse muitos recémnascidos do sexo feminino que quando adultos seriam menos produtivos que os masculinos Apesar de a mortalidade infantil masculina ser maior que a feminina a taxa de masculinidade isto é a proporção homensmulheres era alta em muitas explorações agrárias indicando a eliminação de crianças do sexo feminino Por outro lado nas grandes propriedades agrícolas com melhores condições de sustentar um maior número de pessoas a taxa de masculinidade era menor pois aqueles sacrifícios eram menos necessários Em suma a recuperação populacional da Alta Idade Média parece ter sido tímida e logo absorvida pelos problemas decorrentes do fracasso do Império Carolíngio e das invasões de muçulmanos magiares e sobretudo vikings Provenientes da Escandinávia estes últimos aproveitavamse da grande navegabilidade dos rios europeus para penetrar profundamente em território cristão Ainda que seja impossível avaliar o impacto demográfico de todas aquelas invasões parece que não foi desprezível Além das mortes diretamente provocadas pelos invasores havia as mortes indiretas resultantes da destruição das aldeias e campos e a perda populacional ocasionada pela escravização de cristãos vendidos em regiões distantes Os poucos dados numéricos fornecidos pelas fontes não são confiáveis mas as descrições dos cronistas indicam o alcance dos estragos resultantes das incursões vikings Um monge da região do Loire afirmava em meados do século IX que a multidão inumerável de normandos não pára de crescer De todos os lados os cristãos são vítimas de massacres de pilhagens de devastações de incêndios Escrevendo meio século depois um monge parisiense lamentava a aproximação dos cruéis pagãos que devastam o país massacram os habitantes capturam os camponeses acorrentamnos e enviamnos alémmar A expansão da Idade Média Central De toda forma a recuperação demográfica carolíngia mesmo pequena apontava para a expansão que começaria em meados do século X Apesar da inexistência de uma documentação quantitativa é inquestionável aquele crescimento na Idade Média Central como se percebe por cinco claros indícios O primeiro deles um acentuado movimento migratório Ao contrário da imagem tradicional que vê o homem medieval fortemente ligado à sua região enraizado sabese hoje que mesmo na Alta Idade Média ele se deslocava ocasionalmente conforme as necessidades impostas pela agricultura ou pela guerra Jacques Le Goff observou que a propriedade era quase desconhecida na Idade Média como realidade material ou psicológica não estabelecendo seja para o nobre seja para o camponês uma ligação afetiva com a terra habitada e trabalhada por isso a mobilidade dos homens da Idade Média foi extrema e desconcertante 64I172 De fato podemos constatar para aquela fase a ocorrência de quatro grandes tipos de migração 1 migrações habituais ou seja deslocamentos de população por exemplo para arrotear novas áreas migrações sazonais como no inverno a busca de pastos ainda verdes migrações temporárias vassalos indo prestar o consilium na corte do seu senhor feudal clérigos dirigindose a um concilio ou sínodo atração dos centros urbanos que exerceram forte sedução nos séculos XII XIII ao possibilitar aos camponeses uma nova condição social e econômica mobilidade militar como a conquista da Inglaterra pelos normandos ou as Cruzadas 2 migrações coloniais como as que levaram à formação de entrepostos comerciais italianos no Oriente a fixação de franceses nas áreas reconquistadas aos muçulmanos na Espanha de alemães nas regiões arrancadas aos eslavos na Europa Oriental de católicos nos territórios tirados aos islamitas no Oriente Médio Cruzadas ou aos hereges cátaros no sul da França 3 migrações extraordinárias como o êxodo de mouros empurrados para o sul da Península Ibérica com o avanço da Reconquista Cristã e de judeus perseguidos pelas primeiras Cruzadas e expulsos da Inglaterra em 1290 e da França em 1306 E também todo tipo de migrações forçadas caso dos escravos vendidos por mercadores italianos nas regiões islâmicas do Oriente 4 migrações sem instalação como os movimentos de errantes marginais aventureiros clérigos sem domicílio fixo como os célebres goliardos e de peregrinos tanto em direção a centros regionais de peregrinação quanto a Jerusalém Roma e Compostela Um segundo indício da expansão demográfica da Idade Média Central é o movimento de arroteamentos que fazia recuar as florestas os terrenos baldios as zonas pantanosas Iniciados no século VIII com os primeiros sinais de recuperação demográfica os arroteamentos foram intensificados no século X e ganharam grande impulso no século XII quando o ritmo de crescimento populacional tornouse mais rápido Esse fenômeno revelava a necessidade de se criar novas áreas cultiváveis de se formar novas unidades produtivas no setor básico da economia a agricultura Assim paralelamente à expansão territorial por meio de conquista militar a Cristandade latina expandiase também no seu próprio interior De acordo com a tipologia dos arroteamentos estabelecida por Georges Duby 43I149169 havia três espécies deles O primeiro deuse pelo alargamento dos terrenos cultivados há muito tempo com a ocupação das terras virgens limítrofes Tais empreendimentos não foram realizados por monges como se acreditava até recentemente mas por nobres desejosos de estender seus senhorios e principalmente por camponeses que formavam propriedades à custa dos bosques senhoriais O segundo tipo de arroteamento davase pela fundação de novas aldeias às vezes erguidas por razões de segurança nas fronteiras de um principado ou às margens de uma rota importante Outras vezes o objetivo era econômico para os bispos levantar dízimos para os senhores laicos obter rendimentos provenientes do exercício de seus direitos de ban O último tipo de arroteamento era o povoamento intercalado realização de iniciativas individuais de pioneiros que agiam isoladamente na busca mais de pastos que de terras cultiváveis Terceiro indício aumento do preço da terra e do trigo Apesar da migração dos excedentes populacionais de uma região para outra e apesar ainda do alargamento da área produtiva graças aos arroteamentos a Europa católica não conseguia reequilibrar a oferta e a demanda pelo principal meio de produção a terra e conseqüentemente pelos bens de consumo vitais sobretudo o trigo Na Inglaterra por exemplo entre 1160 e 1300 ele teve seu valor quase triplicado Na tentativa de superar esse problema maiores extensões de terra foram entregues à triticultura reduzindo as áreas de pastagem em razão disso na década de 1210 o preço da ovelha era 132 e o da vaca 155 maior do que meio século antes Em alguns locais da Normandia no norte francês como em vários outros da Europa ocidental cristã a densidade demográfica era em 1313 maior que a atual Não surpreende portanto que entre 1200 e 1300 o preço da terra na Normandia tenha aumentado de sete a dez vezes Outra indicação da expansão demográfica do Ocidente cristão está no acentuado crescimento da população urbana naquele período Enquanto por volta do ano 1000 talvez não existisse na Europa católica nenhuma cidade com uma população de 10000 habitantes 70 263 no século XIII havia 55 cidades com um número de habitantes superior àquele duas na Inglaterra seis na Península Ibérica oito na Alemanha 18 na França e Países Baixos 21 na Itália 56 247 Esta última era não apenas a região mais urbanizada do Ocidente como também a que possuía as maiores cidades Ainda que as cifras sejam sempre discutíveis sem haver consenso entre os especialistas Milão Florença Veneza e Gênova devem ter ultrapassado os 100000 habitantes No restante da Europa Ocidental apenas Paris parece ter alcançado tal população Contudo é importante lembrar a Cristandade ocidental continuava a ser essencialmente rural já que no século XIII não mais de 20 de sua população total vivia em centros urbanos 56 158 Se em fins da Idade Média pôde surgir na Toscana Itália central um provérbio segundo o qual o campo produz animais a cidade produz homens é porque se tratava da região européia mais fortemente urbanizada Na verdade o crescimento populacional das cidades faziase em grande parte graças ao capital demográfico recebido do campo Nos locais onde o campo não podia fornecer grandes contingentes como na Península Ibérica a população urbana crescia por si mesma porém de forma menos intensa Um quinto indício de que a população européia ocidental crescia bastante entre os séculos XI e XIII é proporcionado pelas transformações sofridas pela arquitetura religiosa A própria passagem do românico para o gótico deixando de lado por ora todas as suas implicações estéticas filosóficas mentais Apêndice 3 reflete a necessidade de áreas internas maiores capazes de abrigar um número crescente de fiéis Em vários casos a construção de grandes igrejas deviase à busca de prestígio por parte de uma cidade ou de um importante personagem e mesmo a um revigorar da espiritualidade mas deviase sobretudo ao desejo de abrigar todo o rebanho de Cristo cada vez maior nas casas de Deus Mesmo as igrejas rurais necessitaram de reformas no século XIII com a reconstrução de suas naves que se haviam tornado muito pequenas Significativamente foram sobretudo as catedrais localizadas nas cidades que tiveram de ser alargadas Muitas das que foram então construídas cobriam amplas áreas 7700 metros quadrados no caso de Amiens 6166 no de Colônia 3000 no de Burgos podendo abrigar milhares de pessoas As igrejas de peregrinação por sua vez não só passaram desde o século XI a ser maiores como a apresentar uma planta que comprova o crescente afluxo de peregrinos Surgiu assim o deambulatório corredor curvo que saindo de uma nave lateral passa pelas capelas na cabeceira da igreja e desemboca na outra nave lateral organizando desta forma a passagem das multidões de fiéis diante das relíquias sagradas colocadas nas capelas Todos esses testemunhos apontam portanto para um forte crescimento demográfico entre os séculos XI e XIII mas é extremamente difícil quantificálo De maneira geral a documentação medieval fornece poucos dados populacionais que permitem um tratamento estatístico Apenas as fontes inglesas são suficientemente ricas para tanto Contudo apesar de suas óbvias limitações as estimativas da Tabela 1 podem dar uma idéia da evolução populacional medieval Países Anos 200 400 600 800 1000 1100 1200 1300 1400 1500 Alemanha 35 35 30 325 35 40 60 90 65 90 Bélgica e Luxemburgo 04 03 03 03 04 06 09 125 08 125 Espanha 50 45 35 375 40 45 55 75 55 65 França 65 50 45 50 65 775 105 160 110 150 Países Baixos 02 02 02 02 03 04 06 08 06 09 Inglaterra e Gales 07 08 06 08 15 175 25 375 25 375 Itália 70 50 35 40 50 575 725 100 70 100 Portugal 05 05 04 04 06 07 09 125 09 125 Suíça 03 03 03 03 03 04 05 08 06 08 Totais 241 201 163 180 221 2585 3465 5035 354 4845 Tabela 1 Evolução demográfica da Cristandade ocidental segundo fronteiras atuais em milhões de habitantes McEVEDY e JONES pp 43 57 63 65 69 87 101 103 107 Verificase por esses números o aceleramento do ritmo de crescimento demográfico 1042 nos séculos VIIVIII 1138 nos séculos IXX 1696 no século XI 3404 no século XII 4531 no século XIII Como se percebe a taxa de crescimento do século XII foi apenas um pouco inferior à dos séculos VII a XI somadas E a do século XIII foi superior a essa soma Isso implicava é claro alteração na densidade populacional Enquanto na Alta Idade Média o nível mais freqüente tinha sido de 9 a 12 habitantes c o mais baixo de 45 habitantes por quilômetro quadrado 52 68 no fim do século XIII a densidade média era de 20 habitantes por quilômetro quadrado Mapa 1 Densidades populacionais européias em 1300 reproduzido de McEVEDY e JONES p 23 Mapa 2 Aumentos porcentuais na população européia entre os anos 200 e 1300 reproduzido de McEVEDY e JONES p 23 Portanto mesmo sem se poder quantificar com maior rigor e precisão a expansão demográfica da Idade Média Central ela é inegável Assim é preciso pensar nas razões desse fenômeno De início devemos lembrar que naquele período dois fatores que anteriormente elevavam a mortalidade tiveram seu alcance reduzido O primeiro deles ainda insuficientemente esclarecido foi a ausência de epidemias com o recuo da peste e da malária continuando apenas a lepra a ter certa intensidade Talvez como já vimos a fraca densidade populacional anterior tenha funcionado como um diluidor e amenizador dos deslocamentos de bactérias O segundo fator a considerar é o tipo de guerra que não envolvia grandes tropas de combatentes anônimos como nas legiões romanas ou nos exércitos nacionais modernos a guerra feudal era feita por pequenos bandos de guerreiros de elite os cavaleiros As batalhas propriamente ditas eram raras Prevaleciam as ações individuais dos guerreiros e não uma ação coletiva coordenada Apesar dos laços de vassalagem e de parentesco uma luta entre dois grupos de nobres feudais envolvia geralmente poucas dezenas de guerreiros raramente algumas centenas Quando da invasão da Inglaterra em 1066 Guilherme da Normandia contava com 4000 cavaleiros comandados por 200 barões Na importante batalha de Bouvines em 1214 na qual se jogou a sorte da França capetíngia do Império Angevino e do Santo Império Filipe Augusto contou com apenas 900 cavaleiros e 5000 infantes E claro que durante essas lutas alguns senhorios eram devastados porém o efeito destruidor da guerra geralmente faziase sentir apenas de forma local O raio de ação de um grupo de cavaleiros era bastante reduzido em virtude das dificuldades de deslocamento e de aprovisionamento Aqueles guerreiros irrequietos e pouco disciplinados não se mantinham muito tempo em campanha O contrato feudovassálico estipulava quase sempre um serviço militar de 40 dias anuais sendo problemático mesmo para um senhor feudal poderoso reunir seus vassalos por um prazo superior Em razão disso sempre que possível os reis tentavam contratar guerreiros mercenários alternativa possibilitada pelo próprio crescimento demográfico Acima de tudo a guerra feudal não objetivava a morte do adversário apenas sua captura Como uma das obrigações vassálicas era pagar o resgate do senhor aprisionado c como na pirâmide hierárquica feudal quase todo nobre além de ser vassalo de outros tinha seus próprios vassalos capturar um inimigo na guerra era obter um rendimento proporcional à importância do prisioneiro Por isso os cronistas lamentavam as batalhas mais violentas nas quais a morte de alguns cavalei ros representava a perda de polpudos resgates Além disso o instrumental bélico era mais defensivo que destruidor É significativo que as bestas dotadas de molas metálicas e portanto de poderoso arremesso que penetrava uma armadura a até 270 metros de distância tenham sido proibidas no II Concilio de Latrão em 1139 por serem consideradas mortíferas Mas a remoção de fatores obstaculizadores do crescimento populacional não explica tudo É preciso considerar a ocorrência de fatores facilitadores daquele fenômeno O primeiro deles era a abundância de recursos naturais Já observamos que com o recuo demográfico dos séculos IIVIII extensas áreas anteriormente cultivadas foram abandonadas permitindo a recuperação das florestas que tinham sido fortemente exploradas pelos antigos Dessa forma no início da Idade Média Central o espaço cultivado era muito restrito predominando a natureza virgem da qual homens tiravam importantes complementos à alimentação A abundância de terras cultiváveis fica atestada pelos arroteamentos empreendidos durante a Idade Média Central possíveis graças à existência de largos espaços a serem conquistados à natureza Diante disso é possível pensar que o aumento da produtividade agrícola nos séculos XIXII deveuse pelo menos em parte ao fato de se cultivarem terras virgens ou praticamente isso por terem ficado inexploradas por longo tempo e portanto de maior fertilidade Outro fator que contribuiu para a expansão demográfica medieval foi a suavização do clima Ainda que insuficientemente explicado o fenômeno parece indiscutível e de alcance mundial tendo ocorrido então por exemplo um recuo do gelo nos mares e montanhas do norte e abundância de água nas regiões saarianas que depois o deserto reconquistaria Na Europa ocidental o clima tornouse mais seco e temperado do que atualmente sobretudo entre 750 e 1215 A viticultura pôde então expandirse em regiões anteriormente impróprias como a Inglaterra A paisagem de alguns locais foi alterada e humanizada como a Groenlândia que fazia jus a seu nome literalmente terra verde e apenas no século XIII em virtude de novas mudanças climáticas passou a ter icebergs em sua direção tornandose inóspita O período mais quente e seco não apenas transformou determinadas áreas em cultiváveis e habitáveis como contribuiu para dificultar a difusão da peste De fato na forma bubônica seu vetor é a pulga que vive sob uma temperatura de 15 a 20 graus e sob uma umidade relativa do ar de 90 a 95 Na forma pneumônica a peste é transmitida pelas gotículas de saliva do homem infectado as quais em regiões frias e úmidas ficam em suspensão na atmosfera e penetram no organismo pela respiração Ou seja a pluviometria condiciona o ritmo sazonal da peste com a umidade do ar estimulando a epidemia se ela estiver presente na região Daí nas zonas atlânticas devido à umidade a peste terse instalado e persistido por anos sob uma forma atenuada antes de eclodir em vagas violentas Por último ajuda a explicar o crescimento populacional dos séculos XXIII o surgimento ou difusão de uma série de inovações nas técnicas agrícolas Na verdade discutese qual teria sido o elemento a desencadear o processo o crescimento populacional pressionando por maior produção levou ao progresso técnico ou ao contrário foi o progresso técnico que possibilitou a expansão demográfica A primeira tese foi defendida dentre outros por David Herlihy 22 1958 23 e a segunda por estudiosos como Georges Duby 431 211 De qualquer forma dentre os aperfeiçoamentos técnicos da época três exerceram uma ação direta sobre a elevação da produtividade agrícola a nova atrelagem dos animais a charrua pesada e o sistema trienal O primeiro deles teve efeitos importantes pois na Antigüidade a força motriz do cavalo era fraca nunca sendo usada nos trabalhos agrícolas porque uma parelha deslocava menos de 500 quilos enquanto a partir da Idade Média Central passou a deslocar até mais de 5 toneladas 57 63 A nova atrelagem substituiu as correias colocadas no pescoço do animal que pressionavam a jugular e a traquéia por uma espécie de coleira rígida que não estrangulava Assim o cavalo pôde desde então ser utilizado nos serviços agrícolas o que representou um grande ganho de energia boi e cavalo têm a mesma força de tração porém este último deslocase uma vez e meia mais rápido e pode trabalhar uma ou duas horas a mais por dia 96 62 Viabilizouse dessa forma a utilização da charrua que talvez tenha sido introduzida na Europa ocidental pelos germanos na Primeira Idade Média mas que era muito pesada e requeria força motriz animal Assim durante os primeiros sete ou oito séculos medievais continuouse a empregar o velho arado romano eficiente apenas nos solos ligeiros das regiões mediterrâneas A expansão agrícola para regiões de solos mais profundos e duros tornou a charrua indispensável pois ela não se limita a arranhar a camada superior do solo revolvendo a terra e trazendo para cima os nutrientes acumulados nas camadas inferiores Além disso ela economiza mãodeobra ao dispensar a tarefa de cavar o solo com enxada antes de semeálo De especial importância no entanto foi o sistema trienal possivelmente a mais influente inovação agrícola da época De um lado porque a divisão da terra cultivável em três partes aumentou a extensão da área produtiva deixando apenas um terço em pousio contra metade no sistema bienal dos séculos anteriores De outro lado porque o sistema trienal alterou os próprios hábitos alimentares uma parte da terra era semeada com cereais de inverno trigo e centeio e outra com cereais de primavera cevada e aveia esta principalmente para cavalos daí a estreita relação entre sistema trienal e uso daquele animal A sementeira de primavera além dos cereais compreendia quase sempre leguminosas ervilhas lentilhas favas que nitrogenando o solo mantêm sua fertilidade além de fornecer proteínas para a alimentação humana Este é um ponto fundamental As inovações tecnológicas não apenas produziram uma maior quantidade de alimentos como sobretudo uma melhor qualidade Até aquela época a dieta era mal balanceada porque baseada em cereais fornecia muitas calorias e hidrato de carbono e poucas proteínas e vitaminas A alteração então ocorrida na dieta talvez explique a mudança na proporção entre população masculina e feminina favorável à primeira na Alta Idade Média e à segunda posteriormente Como mostrou o estudo de Bullough e Campbell 22 1980 317 325 até o século X ou XI a mulher ingeria pequena quantidade de ferro que seu organismo necessita em proporção maior do que o do homem devido à menstruação à gravidez e à lactação Portanto a anemia feminina era generalizada na Alta Idade Média daí a maior propensão das mulheres a certas doenças Com a introdução de leguminosas na dieta e uma presença mais assídua de carne peixe ovos e queijo a mortalidade feminina diminuiu Tal fato teve ampla repercussão contribuindo até mesmo para a valorização social da mulher O ressurgimento da peste na Baixa Idade Média O crescimento populacional acabou por se revelar excessivamente elevado para as condições européias de então Durante o auge daquele fenômeno tinham sido ocupadas terras marginais de menor fertilidade que se esgotavam em poucos anos baixando a produtividade média e desestabilizando o frágil equilíbrio produçãoconsumo No mesmo momento em que essa contradição se revelava mais claramente no século XIII ocorria uma alteração que acentuava as dificuldades E tal alteração por sua vez era ao menos em parte produto daquela própria condição O aumento populacional tinha implicado a derrubada de grandes extensões florestais já que a madeira era o principal combustível e material de construção em 1300 as florestas da França cobriam 1 milhão de hectares a menos que hoje 57 80 Dessa forma comprometiase o equilíbrio ecológico provocando mudanças no regime pluvial e portanto no clima elemento fundamental para uma sociedade agrária como aquela Isso ajuda a explicar as chuvas torrenciais que em 13151317 atingiram a maior parte da Europa ao norte dos Alpes exatamente nos locais de grande devastação florestal O clássico estudo de Henry Lucas 221930 343377 mostra que as chuvas constantes e a queda de temperatura prejudicavam as vinhas a produção do sal que se dava por evaporação e sobretudo a produção dos cereais cujos grãos não cresciam nem amadureciam Na Inglaterra o preço de uma medida de trigo que era de 5 shillings em 1313 pulou para 20 em princípios de 1315 e para 40 em meados do ano Em Antuérpia importante centro distribuidor de cereais o trigo subiu 320 em sete meses A fome fazia grande quantidade de vítimas O canibalismo tornouse comum Diferentes epidemias agravavam a situação Impulsionada pela fome muita gente vagava em busca do que comer levando consigo as epidemias e a desordem Em Ypres importante cidade do norte europeu cerca de 10 da população morreu em 1316 Na verdade este foi apenas um ensaio da crise demográfica da Baixa Idade Média que teve seu ponto crucial no ressurgimento da peste então conhecida por peste negra Ela apresentavase de duas formas A bubônica assim chamada por provocar um bubão um inchaço tinha uma letalidade relação entre os atingidos pela doença e os que morrem dela de 60 a 80 com a maioria falecendo após três ou quatro semanas A peste pneumônica transmitida de homem a homem tinha uma letalidade de 100 fazendo suas vítimas depois de apenas dois ou três dias de contraída a doença Também a peste de certa forma resultava da desmedida expansão do período anterior Sempre presente no Oriente ela atingiu a colônia genovesa de Caffa na Criméia expressão da expansão territorial e comercial do Ocidente Contra essa presença ocidental os tártaros cercavam a colônia italiana quando a peste se manifestou em seu exército Recorrendo àquilo que JeanNoël Biraben chamou de inovação na guerra bacteriológica BIRABEN I 53 eles arremessaram cadáveres infectados por cima das muralhas genovesas Abandonando o local os genoveses levaram a peste para Constantinopla Messina Gênova e Marselha Destes portos ela difundiuse pelo restante da Europa Grosso modo a peste propagouse de sul para norte quase sempre do litoral para o interior Ela caminhava mais rapidamente pelas principais vias de comunicação e penetrava mais facilmente em regiões de alta densidade demográfica produto da Idade Média Central Democrática e igualitária a peste atingia indiferentemente a todos Ao contrário do que os historiadores sem conhecimento médico sempre afirmaram a má nutrição não era condição agravante Ricos e pobres organismos bem e mal alimentados eram igualmente suscetíveis à peste A diferença residia no fato de se estar mais ou menos exposto ao contágio Grupos como coveiros médicos e padres eram mais atingidos por razões profissionais As zonas rurais de população mais esparsa eram mais poupadas que as cidades A única possibilidade de salvação estava em manterse afastado dos locais tocados pela peste Foi o que fizeram por exemplo os personagens do Decameron de Giovanni Boccaccio que abandonaram Florença e foram viver isolados nos arredores da cidade enquanto a peste maltratava seus concidadãos que não tinham recursos para fugir Fig 1 A dança macabra Xilogravura italiana de 1486 Até por volta de 1350 raramente a morte era retratada e quando o era tratavase de uma mensageira do mundo divino A partir de então a morte tornouse um tema recorrente na arte e na literatura representada como uma força impessoal com iniciativa própria que atinge a todos poderosos e humildes clérigos e leigos jovens e velhos virtuosos e pecadores O significado da morte alterouse e com ele toda uma sensibilidade perdendo qualquer conotação ética atingindo a todos indistintamente na presente figura um bispo e um homem rico a morte deixou de ter natureza cristã Caminhavase para uma nova espiritualidade questionavase o poder de intercessão da Igreja preparavase terreno para o Protestantismo Até 1670 a Europa foi atingida todo ano No período crítico o da chamada peste negra em 13481350 as perdas humanas variaram conforme a região de dois terços a um oitavo da população No conjunto estimase a Europa ocidental perdeu cerca de 30 de seus habitantes naquela ocasião e só retomaria o nível populacional prépeste 200 anos depois em meados do século XVI A peste negra foi a maior catástrofe populacional da história ocidental num intervalo de tempo bem menor matou em termos absolutos mais do que a Primeira Grande Guerra Mundial e em termos relativos considerandose a população européia nos dois momentos mais do que a Segunda Guerra Mundial Bibliografia básica 41 42 43 50 52 56 63 64 70 84 Bibliografia complementar R ALEXANDRE Le climat en Europe au Moyen Âge Contribution à lhistoire des variations climatiques de 1000 à 1425 daprès les sources narratives de lEurope occidentale Paris EHESS 1987 J N BIRABEN Lês hommes et Ia peste en France et dans les pays européens en mèditerranéens ParisLa Haye Mouton 19751976 2 vols O GUYOTJEANNIN dir Population et démographie au Moyen Âge Pau CTHS 1995 J HEERS Les limites des méthodes statistiques pour les recherches de démographie médiévale Annales de Démographie Historique 1968 pp 4372 C McEVEDY e R JONES Atlas of World Population History Harmondsworth Penguin 1980 Capítulo 9 O significado da Idade Média Após os exageros denegridores dos séculos XVIXVII e os exaltadores do século XIX hoje temos uma visão mais equilibrada sobre a Idade Média E verdade que a divulgação que ela conheceu em fins do século XX fora dos meios acadêmicos inúmeras publicações científicas e ficcionais filmes discos exposições turismo etc nem sempre implicou uma melhor compreensão daquele período Mas reflete um dado essencial a percepção que se tem da Idade Média como matriz da civilização ocidental cristã Diante da crise atual dessa civilização cresce a necessidade de se voltar às origens de refazer o caminho de identificar os problemas Enfim de conhecer a Idade Média para conhecer melhor os séculos XXXXI Ora para tanto é preciso acompanhar a presença medieval ao longo dos tempos E portanto recolocar a velha questão continuidade ou ruptura Sobre a passagem da Antigüidade para a Idade Média boa parte da historiografia prefere enfatizar os pontos comuns os prolongamentos Mas entre Idade Média e Idade Moderna por muito tempo não se hesitou em aceitar quase unanimemente a segunda resposta Isso esteve ligado como vimos na Introdução ao próprio conceito de Idade Média Só mais recentemente se passou a negar a pretensa oposição Medievalidade Modernidade No entanto isso ainda é feito de forma tímida mais em relação ao Renascimento do que aos outros movimentos históricos ditos modernos Hesitase ainda em admitir que as estruturas modernas são no fundamental medievais A longa Idade Média Assim é importante reequacionar a questão no seu todo ainda que aqui só possamos indicar alguns pontos De início notemos que na verdade as especificidades modernas são apenas quantitativamente diferentes das medievais Contudo como no período 14501550 as mudanças sucederam com uma rapidez espantosa para seus contemporâneos essa impressão acabaria por marcar a historiografia por muitos séculos Foi o caso de um observador da época falando que a arte da guerra é agora tal que é preciso aprendêla de novo de dois em dois anos Ou ainda de outro testemunho do século XV incitando os homens de então a exaltar a Deus por permitirlhes ter nascido nessa nova era tão cheia de esperança e promessa Não se percebia que apesar de o ritmo histórico terse acelerado a essência era a mesma Se não vejamos Os quatro movimentos que se convencionou considerar inauguradores da Modernidade Renascimento Protestantismo Descobrimentos Centralização são em grande parte medievais O primeiro deles o Renascimento dos séculos XVXVI recorreu a modelos culturais clássicos que a Idade Média também conhecera e amara Aliás foi em grande parte por meio dela que os renascentistas tomaram contato com a Antigüidade As características bási cas do movimento individualismo racionalismo empirismo neoplatonismo humanismo estavam presentes na cultura ocidental pelo menos desde princípios do século XII Ou seja como já se disse muito bem embora o Renascimento só invoque a Antigüidade é realmente o filho ingrato da Idade Média 28 163 O Protestantismo do seu lado foi em última análise apenas uma heresia que deu certo Isto é foi o resultado de um processo bem anterior que na Idade Média tinha gerado diversas heresias várias práticas religiosas laicas algumas críticas a um certo formalismo católico Nesse clima a crise religiosa do século XIV comprovou ser inviável para a Igreja satisfazer aquela espiritualidade mais ardente mais angustiada mais interiorizada Foi exatamente nesse espaço que se colocaria o Protestantismo E sem possibilidade de ser sufocado pela ortodoxia católica ao contrário do que ocorrera com as heresias medievais por ele atender às necessidades profundas decorrentes das transformações socioculturais verificadas desde os últimos tempos da Idade Média Os Descobrimentos por sua vez também se assentavam em bases medievais nas técnicas náuticas construção naval bússola astrolábio mapas na motivação trigo ouro evangelização e nas metas Índias Império de Preste João Também existiam antecedentes medievais nas viagens normandas ao Oriente e à América esta comprovadamente atingida pelos noruegueses por volta do ano 1000 italianas à China Marco Polo por exemplo e ibéricas à África Colombo para nos limitarmos ao navegadordescobridor mais famoso era em todos os sentidos um homem muito mais medieval que moderno objetivava mais a difusão do cristianismo do que o ouro desejava este apenas para realizar uma Cruzada a Jerusalém atraíao ao Oriente acima de tudo a crença de que lá se localizava o Paraíso Terrestre A Centralização Política por fim era a conclusão lógica de um objetivo perseguido por inúmeros monarcas medievais O Estado moderno unificado caracterizavase pelo fato de o soberano ter jurisdição sobre todo o país poder de tributação sobre todos os seus habitantes monopólio da força exercito marinha polícia Esta tinha sido a tripla meta de reis como Henrique II da Inglaterra 11541189 ou Luís IX da França 1226 1270 O sentimento nacionalista que fornecia o substrato psicológico necessário à concretização do poder monárquico centralizado também era como já vimos de origem medieval Na contraprova temos os casos da Alemanha e da Itália que só nasceriam como Estados nacionais centrali zados no século XIX devido ao fracasso de suas tentativas no período medieval De maneira bastante ampla perigosamente generalizadora talvez possamos dizer que aquilo que não se fez na Idade Média não se poderia fazer na Idade Moderna Aquela gerava esta desenvolvia Tanto que superado o momento da transição e já dentro da Idade Moderna clássica séculos XVIIXVIII o chamado Antigo Regime é ainda essencialmente a Idade Média que encontramos Os três elementos que constituem o Antigo Regime monarquia absolutista sociedade estamental capitalismo comercial tinham fundas raízes nos séculos anteriores Mais uma vez a essência é medieval a roupagem moderna O rei vinha desde a Idade Média tendo seu caráter de soberano superando o de suserano o aspecto propriamente monárquico poder único sobrepujando o feudal contratual os vassalos tornandose súditos A crise geral do século XIV reforçara essa tendência ao desestabilizar a sociedade ao transferir para o Estado a responsabilidade pelo restabelecimento da ordem O rei ganhava poderes totais absolutos De outro lado a sociedade estamental moderna prolongava a medieval diferenciadose dela apenas pelo maior peso relativo do Terceiro Estado Por fim o assim chamado capitalismo comercial representava apenas uma intensificação das atividades mercantis medievais ampliadas no espaço América África na diversidade de bens produtos tropicais escravos negros e na parcela da população envolvida crescimento da burguesia Nos demais setores econômicos o quadro permaneceu ainda mais medieval tanto a agricultura técnicas métodos produtividade quanto o artesanato produtores independentes corporações de ofício não conheceram alterações expressivas em relação aos séculos anteriores Mesmo a articulação entre aqueles três elementos que caracteriza o todo histórico conhecido por Antigo Regime não era nova Cada vez mais a partir do século XIII tínhamos a realeza intervindo na economia o mercantilismo ainda que incompleto é produto do século XIV 52 308 Assim compensavase em parte o bloqueio que a sociedade estamental aristocrática suntuária pouco produtiva representava ao pleno desenvolvimento das atividades econômicas Para poder desempenhar esse papel a monarquia aproximavase da burguesia mas taxandoa e redistribuindo parte dessas riquezas à nobreza decadente como fiel da balança a realeza mantinha o equilíbrio entre os estamentos Em suma a mecânica do Antigo Regime já se encontrava esboçada em fins da Idade Média Como pensa Jacques Le Goff não seria absurdo estender os séculos medievais até as transformações estas sim novas modernas provocadas pela Revolução Francesa e pela Revolução Industrial LE GOFF 713 A herança medieval no século XX Se olharmos para o esqueleto e não apenas para a nova face e as novas roupagens do Ocidente no século XX outra vez encontraremos muito da Idade Média Ainda que popularmente pouco entendida e percebida ela está presente no cotidiano dos povos ocidentais mesmo daqueles que como nós na América não tiveram um período medieval E verdade que há tendência a se creditar muitas dessas características a outros momentos históricos Grécia clássica Modernidade mas isso se deve ao enraizamento do preconceito em relação à Idade Média Ainda agora na passagem do século XX ao XXI vivemos no Ocidente muito ligados à herança medieval O patrimônio lingüístico ocidental é quase todo medieval já que com exceção do basco idioma cujas origens continuam desconhecidas para os especialistas as demais línguas formaramse na Idade Média Uma terça parte da população mundial atual isto é 2 bilhões de pessoas pensa e se exprime com instrumentos lingüísticos forjados na Idade Média De fato ao lado do latim legado pela Antigüidade e durante a Idade Média empregado nos ofícios religiosos nas atividades intelectuais e na administração mas língua morta no sentido de não ser mais língua materna de ninguém no século VIII nasceram os idiomas chamados de vulgares falados cotidianamente por todos mesmo pelos clérigos Correndo o risco de simplificar em demasia um processo longo e complexo podemos dizer que aqueles idiomas se formaram da interpenetração em proporção diferente a cada caso do celta do latim e do germânico Nesse processo plurissecular o substrato celta tendeu ao longo dos séculos III aC e II dC a ser substituído pelo latim língua dos conquistadores romanos e sobretudo língua mais apropriada a manifestações mais sofisticadas do pensamento No entanto traços celtas participaram na formação do latim popular falado na época romana nos territórios das atuais Espanha França e Inglaterra Em regiões não ocupadas por Roma o celta permanece dominante Irlanda irlandês Escócia gaélico e Gales galês A chegada dos bárbaros germânicos não destituiu o latim da sua posição mas acelerou e redirecionou sua transformação naquilo que seriam os idiomas neolatinos francês provençal italiano castelhano catalão galego português A intensidade dessa influência dependeu do enraizamento anterior do latim em cada local De forma geral podese dizer que quanto mais ao norte dos territórios romanos maior seria o peso relativo exercido pelos dialetos germânicos Nas regiões de onde os germanos eram originários as línguas seguiram sua evolução natural pouco sentindo a ação do latim como se vê no alemão flamengo sueco dinamarquês norueguês Ainda assim mesmo antes de as tribos bárbaras germânicas terem penetrado em território romano adotaram termos latinos que designavam coisas desconhecidas ou pouco importantes em sua sociedade Por exemplo Kaufmann mercador no moderno alemão deriva de Kanfo no alemão medieval vindo do latim caupo taverneiro Um pouco mais ao sul a tribo dos francos por exemplo deu 520 palavras à futura língua francesa especialmente no campo da administração da guerra e da vida agrária Mais ainda ao sul os lombardos deram 280 palavras ao italiano então em formação Bem mais ao sul pegando o exemplo que mais diretamente nos concerne os visigodos deram à língua portuguesa 90 léxicos dentre eles agasalhar aleive bando banir bradar escanção escaramuça esgrimir espeto espia espora franco galope gastar luva orgulho roca roubar ufano etc Outra tribo germânica dos suevos forneceu muito poucos vocábulos caso de britar quebrar aparentado ao inglês to break Mas além do substrato latino e das contribuições celta por exemplo bizarro cama esquerdo modorra e germânica devese lembrar da importante participação vocabular árabe na constituição do português com cerca de 4000 palavras como alcaide aldeia algarismo almoxarife alqueire armazém arroba azeite azul cetim chafariz cifra fardo fatia garrafa marfim mesquinho recife sofá xarope e outras O caso do inglês é interessante por sua posição intermediária O latim pouco penetrara nas ilhas britânicas pois Irlanda e Escócia jamais foram integradas ao império e a Inglaterra foi conquistada tardiamente meados do século I aC ocupada apenas 100 anos depois e jamais de forma total Nesse contexto é fácil entender que a chegada dos anglo saxões tenha significado um aporte lingüístico germânico importante e que provocou grande recuo do latim e mesmo do celta A invasão dos vikings dinamarqueses reforçou essa situação fornecendo cerca de 900 palavras como to die morrer knife faca law lei to take pegar Assim nos séculos VIIIIX o inglês era uma língua puramente germânica que lembrava em diversos aspectos o alemão Uma reintrodução indireta do latim ocorreria no século XI quando a Inglaterra foi conquistada por um senhor feudal francês Guilherme da Normandia cujos homens falavam um dialeto neolatino aparentado ao francês que estava em pleno processo de formação Aliás até 1413 o francês foi o idioma oficial da corte inglesa Apesar desse trilingüismo latim na Igreja francês na corte anglosaxão nos campos e ruas a estrutura da língua inglesa continuou germânica mas o vocabulário recebeu muitas contribuições de fundo latino Surgiram dualidades vocabulares curiosas expressão da situação políticosocial O boi vivo única forma conhecida pelos camponeses continuou a ser designado em anglosaxão ox enquanto o boi como carne consumida pelos conquistadores recebeu uma palavra de origem francesa beef vindo de boeuf boi por sua vez derivada do latim bos O mesmo se deu com sheep carneiro vivo e mutton carne de carneiro vindo do francês mouton formado por sua vez do gaulês isto é celta local multo Os dominadores forneceram compreensivelmente muitos termos militares caso de castle de château do latim castellum e tower de tour do latim turris Em vários casos há no vocabulário inglês moderno duas palavras uma de origem latina e outra de origem germânica ambas com a mesma significação ainda que com o tempo a primeira viesse a ganhar um tom mais erudito mais literário e a segunda mais popular mais cotidiano E o caso a título de exemplo de liberty de liberté e esta de libertas freedom Esse processo fez com que a língua inglesa tenha cerca da metade de seu vocabulário proveniente do latim o que um conhecedor mais desavisado não percebe já que o inglês atual falado popular privilegia pelas razões históricas de sua formação as raízes germânicas Entretanto quanto mais formal mais erudito e mais tradicional for o inglês lido ou falado mais ele recorrerá ao seu amplo léxico de procedência latina Por isso a língua inglesa acabou por ter um vocabulário bem maior que o dos idiomas neolatinos O patrimônio político do Ocidente atual também é em boa parte medieval Diferentemente do que quase sempre se pensa a democracia ocidental c muito mais medieval que grega Esta era produto de pequenas cidadesEstado de reduzida população no exercício da cidadania o que permitia uma participação direta no processo político decisório Os Estados nacionais contemporâneos de área e população cidadã muito maiores baseiamse no esquema contratual e representativo nascido nas monarquias feudais Sabemos que o rei feudal tinha duplo caráter de soberano e de suserano O primeiro de origens antiqüíssimas atribuíalhe poderes sagrados imensos O segundo de origem germânica implicava uma relação bilateral com o rei estando subordinado ao direito consuetudinário do seu povo e com os vassalos tendo o direito de resistência no caso de ele desrespeitar aquela relação Um dos aspectos mais importantes das limitações contratuais dos poderes do rei feudal dizia respeito à cobrança de impostos Nenhuma taxa além das estabelecidas pela tradição poderia ser cobrada sem concordância dos vassalos Quando o contexto de fins do século XIII e de todo o século XIV gerou forte necessidade de recursos o rei viuse obrigado a criar assembléias representativas para nelas tentar obter consentimento para cobrar novos tributos E assim reforçouse o contratualismo político Sc de forma geral os séculos XVXVII com suas constantes guerras nacionais reforçaram o poder real resgatando seu caráter soberano passadas aquelas circunstâncias o contratualismo político ressurgiu com toda a força A resistência ao poder monárquico absolutista centralizouse nas assembléias representativas assim foi na Revolução Inglesa de 1688 e na Revolução Francesa de 1789 Desde então o poder do monarca e por extensão de seus substitutos nos regimes republicanos viuse limitado prevalecendo a idéia de que ele governa em nome do povo Portanto como é fácil identificar tratase da concepção dos bárbaros germânicos Influenciados por ela os juristas medievais ao recuperar e interpretar o Direito Romano a partir do século XII destacaram dele o princípio da época republicana de Roma segundo o qual o povo é a fonte da autoridade pública Em razão desse quadro João de Salisbury 11151180 depois de exaltar a figura do rei lembrava que matar um tirano é não só lícito como também um direito e um dever Por tudo isso países de fortes raízes germânicas puderam manterse monárquicos e altamente democráticos até hoje Dos 15 países que formam atualmente a União Européia quase a metade mais precisamente sete ainda são monarquias Inglaterra Holanda Bélgica Suécia Dinamarca Noruega Espanha Dos demais sete deixaram de ser monarquias apenas no século XX Como contraprova do caráter monárquico e democrático dos países germânicos temos os países de acentuada formação latina e menos intensa feudalização cuja interpretação medieval do Direito Romano baseavase no princípio da época imperial de Roma de o desejo do príncipe tem força de lei Entendese assim o terreno por longo tempo favorável ao autoritarismo e que no século XX desembocou no fascismo no salazarismo e no franquismo Um caso oriental esclarece mais a questão o Japão dos séculos XIVXV apresentava diversas semelhanças com o Ocidente feudal mas ali a monarquia não entrou no jogo das relações feudovassálicas Ou seja não se submeteu a uma política contratualista bilateral Assim o isolamento do imperador exclui a possibilidade do gênero de legado constitucionalista que o feudalismo europeu transmitiu ao Ocidente 76 149 E só após a derrota na Segunda Guerra Mundial o imperador japonês foi obrigado a negar seu caráter divino É interessante observar como a União Européia atualmente em processo de constituição baseiase conscientemente ou não no modelo da Cristandade medieval Isto é no reconhecimento de uma identidade européia profunda apesar das especificidades locais Tanto no século X quanto no século XX buscase uma harmonia entre o nacionalismo e o europeísmo Percebese que a unidade supranacional permitida por uma história e por valores culturais comuns pode fortalecer a Europa diante de outras sociedades sejam elas Bizâncio e o Islã na Idade Média os Estados Unidos e o Japão atualmente Significativamente a Comunidade Européia vê nas peregrinações medievais a Santiago de Compostela um primeiro ensaio daquilo que ela própria hoje deseja todos os europeus de diferentes idiomas e categorias sociais dirigindose a um mesmo objetivo O patrimônio de valores sociais também tem muito de medieval como podemos ver por dois exemplos propositadamente extremados O primeiro elemento central no Ocidente de hoje é o individualismo a valorização da pessoa em si independentemente de sua colocação nas hierarquias social política econômica e cultural Indivíduo que apesar de obviamente fazer parte de diversas coletividades família empresa clube Estado etc não se reduz a esses papéis mesmo neles mantém sua personalidade conserva os direitos pessoais reconhecidos pela sociedade O segundo exemplo de uma prática cotidiana é o cumprimento feito com a mão direita mesmo para os canhotos estendida apertando outra mão direita gesto tão mecânico tão automático que poucos percebem estar repetindo o gesto de paz social da época feudal quando ele demonstrava ao interlocutor a ausência de armas e assim a boa vontade no estabelecimento de uma relação sociável Fig 18 O individualismo Guidoriccio de Fogliano afresco pintado por Simone Martini em 1328 no Palazzo Pubblico de Siena A figura desse chefe militar sienês cavalgando sozinho em primeiro plano com cidades ao fundo talvez seja a primeira representação artística do individualismo indício da valorização daquele sentimento social Mapa 8 A Europa atual monárquica e republicana O patrimônio das práticas econômicas deriva muito dos fatores anteriores O crescente domínio sobre a natureza e a colocação dela a serviço do homem gerou uma postura de busca de riqueza que a partir do século XI foi caracterizando cada vez mais a civilização ocidental Tal visão materialista ao desvirtuar os princípios da sociedade cristã deu origem a reações tão diversas quanto a exaltação da pobreza São Francisco e da igualdade Marx De qualquer forma para uma ou outra dessas opções de vida o pressuposto é a existência de um livrearbítrio E este aliás que viabiliza a democracia vista como o único regime no qual se pode dar o exercício social da razão E significativo que a negação da democracia implique a negação da razão e a exaltação dos sentimentos e da violência para grandeza da pátria do chefe ou de um grupo social Para os fascistas italianos a solução dos problemas nacionais estava na aplicação do lema crer obedecer combater Para Hitler não é a inteligência que tirou a Alemanha da situação angustiosa em que se encontrava mas nossa fé Para Stalin a ditadura do proletariado é um poder revolucionário que se apóia na violência contra a burguesia Foi a mentalidade materialista justificada religiosamente que desde fins da Idade Média levou o Ocidente à conquista do mundo Tanto as Cruzadas contra os muçulmanos quanto a conquista da América aos indígenas tiveram caráter de guerra santa e de obtenção de riquezas No século XIX a colonização da África e da Ásia era considerada o fardo do homem branco ou seja o dever dos ocidentais de levar a civilização para povos inferiores Era o homem ocidental cumprindo seu destino histórico Para tanto ele sempre contou com a força das máquinas desde a Idade Média Central utilizadas mais do que em qualquer outra civilização este é um dos fatores determinantes da preponderância do hemisfério ocidental sobre o resto do mundo 57 9 O patrimônio intelectual de origem medieval é impressionante Dele fazem parte as universidades que até hoje preservam de suas origens no século XII a pedagogia aulas expositivas e debate de textos a concessão de título tese submetida a uma banca examinadora a concessão do direito de exercício profissional licentia docendi a estrutura administrativa reitor divisão em faculdades o auxílio aos membros necessitados concessão de bolsas aos estudantes carentes Também fazem parte desse patrimônio inúmeras técnicas intelectuais É o caso da minúscula carolina século VIII base da caligrafia moderna e dos caracteres de imprensa Dos algarismos arábicos século X precondição para a matemática moderna e assim para as demais ciências exatas Do livro bem mais manejável que os rolos de pergaminho da Antigüidade e provido de melhores meios de utilização como os índices século XII possibilitadores dos dicionários e enciclopédias Da contabilidade de partida dobrada isto é de débito e crédito criada em Gênova cm 1340 e difundida em 1494 com a obra de Luca Pacioli O patrimônio científico estreitamente associado ao anterior explica a superioridade tecnológica e econômica que o mundo ocidental ostenta crescentemente desde o século XII Na base está a visão racionalista do universo produto da concepção cristã de Deus Aceitando a existência de uma Unidade cosmológica o homem medieval via todas as coisas ligadas entre si Essa conexão que era percebida por meio de símbolos por todos os indivíduos independentemente de nível cultural passou desde o século XIII a ser estabelecida intelectualmente ao menos nos restritos círculos cultos Nestes procuravase harmonizar fontes à primeira vista antagônicas Foi o que ocorreu na literatura por exemplo com a cristianização de temas folclóricos como o do Graal Ou no Direito Canônico com a importante compilação de Graciano de meados do século XII como transparece no próprio nome da obra Concordantia Discordantium Canonum Ou na filosofia e teologia escolásticas em especial com Tomás de Aquino 12281274 Mais precisamente a visão racional de mundo vinha desde a Antigüidade com as tentativas de harmonização entre a filosofia grega e o cristianismo A religião cristã ao dessacralizar a natureza não mais vista como um conjunto de divindades traz em si certa atitude racionalista A regularidade dos fenômenos naturais estações cheiasvazantes dianoite ciclos de gestação etc faz deles janelas de acesso ao divino O homem feito à imagem e semelhança de Deus identificase com a natureza também ela imagem do Criador Daí porque São Francisco dizia ser irmão dos animais das plantas dos astros O texto bíblico ao falar que a realidade invisível de Deus tornouse inteligível desde a criação do mundo através das criaturas Romanos 120 permite o exercício da razão filosófica como uma revelação natural da Divindade Divindade essa que é participante criadora ao contrário do Demiurgo de Platão que apenas modela o mundo com a matéria preexistente e ao contrário do Princípio Primeiro de Aristóteles transcendente mas também imanente ao universo que é eterno Assim o Deus cristão é racional e cognoscível Entendese dessa forma por que o mundo muçulmano medieval apesar de ter conhecido profundamente a filosofia e a ciência gregas não desenvolveu uma postura racionalista e cientificista como o Ocidente cristão Francis Oakley chamou a atenção com razão para o fato de que no islamismo há uma imensa carga religiosa com o Corão comparativamente ocupando nele quase o lugar que a figura de Cristo ocupa no cristianismo Daí o texto sagrado muçulmano não ser submetível a uma análise filosófica Caso o Novo Testamento tivesse para a sociedade cristã o mesmo significado que o Corão para a sociedade islâmica é pouco provável por exemplo que o Direito Romano viesse a ter no mundo ocidental o papel que teve Mais ainda é pouco provável que tivesse podido se produzir o encontro decisivo entre o pensamento filosófico grego e o ensinamento bíblico que tanto contribuiu para dar forma à tradição do Ocidente 76 182183 Foi graças a esse encontro que Tomás de Aquino pôde aceitar em Deus a primazia da razão sobre a vontade vendo na Criação não apenas uma manifestação da liberdade e da onipotência divinas mas sobretudo um ato racional Por isso todas as coisas criadas participam da ordem inteligível do universo Por isso o homem tem livrearbítrio capacidade para forjar seu destino de acordo com o valor possuído o esforço despendido e o respeito dedicado às leis universais Enquanto as civilizações asiáticas tão desenvolvidas em vários aspectos concebem Deus como um ser arbitrário e irracional de cuja conduta não se podem extrair princípios gerais o Ocidente aceita a possibilidade de encontrar Deus através da sua Criação Observar e questionar a natureza é um exercício religioso e intelectual gerador de um racionalismo medieval anterior mesmo à redescoberta de Aristóteles no século XII Fig 19 O Criador geômetra iluminura da chamada Bíblia de São Luís atualmente na catedral de Toledo E muito significativo que no século XIII tenham surgido representações da Criação nas quais Deus trabalha cientificamente com um compasso nas mãos demonstrando que Nele prevalece a Razão sobre a Vontade ou o Poder Por este motivo a natureza é mãe da geometria fabricante de círculos esferas hexágonos espirais perfeitos em astros flores colméias Por isso a natureza diríamos hoje segue as leis da busca pela máxima eficiência isto é busca os melhores resultados com o menor dispêndio possível de energia Em razão disso a partir da Idade Média Central não se praticou um racionalismo apenas teórico como também se começou a perceber a necessidade da experimentação Em fins do século XIII o franciscano Roger Bacon professor nas universidades de Paris e Oxford criticava a excessiva subserviência de alguns contemporâneos seus a Aristóteles e propunha enriquecer o racionalismo com o empirismo Ah se os homens procurassem estudar o mundo ao seu redor em vez de mergulhar nos trabalhos da Antigüidade a ciência ultrapassaria as maravilhas da arte mágica Poderiam ser construídas máquinas por meio das quais os maiores navios com um único homem a dirigilos vogariam mais rápido do que se estivessem cheios de remadores poderiam ser construídos carros capazes de correr com incrível velocidade e sem auxílio de animais máquinas voadoras poderiam ser fabricadas máquinas tornariam possível ir ao fundo dos rios e dos mares Em suma a cientificidade observação matematização experimentação conceituação resulta segundo Alexandre Kojève do único dogma cristão que é exclusivo dessa religião a Encarnação Especificidade reconhecida por Santo Agostinho uma das maiores autoridades medievais ao ver na obra de Platão toda a doutrina cristã menos a Encarnação A riqueza científica dessa idéia está no fato de representar o ponto de encontro homemDeus particulargeral empíricoabstrato históricoeterno A essa constatação fundamental de Kojève poderseia acrescentar que a modalidade ocidental de cristianismo deve ser levada em conta os cristãos bizantinos mais inclinados ao misticismo e à contemplação da Encarnação do que à observação objetiva dela não tiraram desse conceito todas as suas implicações científicas O patrimônio psicológico ocidental também deve muito à Idade Média E do século V com Santo Agostinho o conceito de um tempo pessoal íntimo de ritmo variável conforme as emoções sentidas pelo indivíduo em determinadas circunstâncias da vida E do século VI o conceito de tempo irreversível contabilizado pelo número de anos que se seguem ao nascimento de Cristo É do século XII o conceito de amor enquanto relação igualitária física e espiritual entre duas pessoas É do século XIII com a confissão individual e renovável corolário de uma longa formação anterior o estabelecimento da prática cotidiana da interiorização da autoanálise verdadeira préhistória da psicanálise Não há contradição no fato de esta técnica ter sido formulada por um judeu Sigmund Freud 18561939 pois se tratava de um grande conhecedor da Bíblia inclusive do Novo Testamento e enquanto cientista do mundo ocidental de alguém inconscientemente embebido naquele comportamento introspectivo vindo da Idade Média O patrimônio imaginário também é tributário da Idade Média com a memória coletiva adaptando os dados medievais aos momentos de sua manifestação No século XIII as cores do esquema trifuncional dos indo europeus branco preto vermelho foram substituídas na preferência ocidental pelo azul a mais usada até hoje e a cor oficial da União Européia Em diversas manifestações culturais encontramos elementos medievais tão incorporados à nossa cultura atual que nem sequer lembramos que são de inspiração medieval No entanto em certos momen tos e certas obras essa influência é fácil de ser percebida Tal é o caso na literatura de Argila e cinzas Oldenbourg 1946 0 senhor dos anéis Tolkien 19541956 Os reis malditos Druon 1955 1957 A obra em negro Yourcenar 1968 A pedra do reino Suassuna 1971 0 quarto das senhoras Bourin 1979 O nome da rosa Eco 1980 As brumas de Avalon Bradley 1982 Tal é o caso no cinema de O sétimo selo Bergman 1956 Vikings os conquistadores Cardiff 1958 Camelot Logan 1967 Perceval o galês Rohmer 1978 Excalibur Boorman 1981 O incrível exército de Brancaleone Monicelli 1985 Feitiço de Aquila Donner 1985 Em nome de Deus Donner 1988 Rob Roy a saga de uma paixão Caton 1994 Coração valente Gibson 1995 Tal é o caso nas histórias em quadrinhos de Hagar o horrível Browne 1973 ss Outras vezes a influência medieval é menos evidente mas não menos verdadeira E o que vemos na escultura de Auguste Rodin 18401917 na pintura impressionista de Paul Cézanne 18391906 e Paul Gauguin 18481903 na expressionista de Max Beckmann 18841950 e James Ensor 18601949 Na literatura é o que mostra O Golem Meyrink 1915 Viagem a São Saruê Santos 1947 Crônicas marcianas Bradbury 1951 Grande sertão veredas Guimarães Rosa 1956 No cinema A ameaça veio do espaço Arnold 1953 A noite do lobisomem Fisher 1961 2001 uma odisséia no espaço Kubrick 1968 O fantasma do Paraíso DePalma 1974 Guerra nas estrelas Lucas 1977 Os caçadores da arca perdida Spielberg 1981 O padre Bird 1994 Highlander3 O feiticeiro Morahan 1994 O patrimônio míticoutópico do Ocidente está igualmente ancorado na Idade Média Ontem e hoje sonhamos e lutamos pelas mesmas coisas apesar de elas terem assumido formas historicamente diferentes A abundância está presente nas quimeras das Cruzadas do Graal do colonialismo medieval e moderno do dirigismo estatal do mercado livre A justiça social legitima as esperanças depositadas no Milênio no Império de Preste João na democracia no socialismo no anarquismo em chefes messiânicos de direita Frederico II ou Hitler ou de esquerda Tanchelm de Antuérpia ou Lênin A liberdade gera uma forte tradição revolucionária presente na revolta dos servos de Orly em 12501251 na Jacquerie de 1358 na rebelião dos camponeses ingleses de 1381 na Revolução Francesa na Revolução Bolchevista no movimento estudantil de maio de 1968 A juventude é sempre tão desejada que se imagina encontrála em fontes sagradas em ritos mágicos em elixires alquímicos em pomadas e pílulas milagrosas em cirurgias plásticas A ociosidade é procurada nos saques no trabalho compulsório dos outros na mecanização no descanso remunerado na redução da jornada de trabalho Sob roupagens cristãs ou agnósticas o Paraíso continua a grande matriz utópica ocidental 54 113 139 A herança medieval no Brasil Mesmo no Brasil que vivia na PréHistória enquanto a Europa estava na chamada Idade Média muitos elementos medievais continuam presentes A colonização portuguesa introduziu práticas que apesar de já então superadas na metrópole foram aqui aplicadas com vigor inaugurando o clima de arcaísmo que marca muitos séculos e muitos aspectos da história brasileira Luís Weckmann detectou com pertinência a existência de uma herança medieval no Brasil porém limitou sua presença apenas até o século XVII E na realidade ela continua viva ainda hoje nos nossos traços essenciais Os dois elementos culturais que enquadram a consciência de nacionalidade são de origem medieval O nome de nosso país vem da ilha afortunada OBrazil identificada nos séculos XIVXV com as Canárias antes de sêlo com a América A tradicional associação da terra descoberta por Cabral com a madeira tintorial aí encontrada o paubrasil desconsidera que a própria madeira tirara seu nome da mítica ilha medieval O idioma obviamente c aquele introduzido e imposto pelos colonizadores idioma que como todos os do mundo ocidental nascera na Idade Média Na vida política a duplicidade de um poder central teoricamente forte e a realidade dos poderes locais atuantes permanece O ponto de partida que deixou fundas raízes foi o sistema de capitanias Isto é o sistema usado pelas comunas italianas medievais nas suas colônias do Oriente Médio e das ilhas mediterrâneas mais especificamente por Gênova que nos séculos XIVXV mantinha estreitas relações com Portugal As primeiras capitanias portuguesas nas Ilhas Canárias foram entregues em 1370 a um capitão genovês O funcionamento do sistema foi o mesmo na Idade Média e nos séculos XVIXVII cada donatário tinha o usufruto das terras e nelas poderes regalianos como arrecadar impostos aplicar justiça convocar milícias Intermediária privilegiada entre o poder monárquico e os colonos a figura do donatário gerou no Brasil o personalismo típico das relações medievais responsável pela fraqueza das instituições políticas brasileiras dos séculos seguintes Na vida social por muito tempo e ainda hoje em certas regiões prevaleceu a família patriarcal que dificulta a transformação do indivíduo em cidadão dos interesses particulares em interesses gerais e por conseqüência a consolidação do Estado O patriarca termo correspondente lingüística e funcionalmente ao senior o mais velho feudal constituía em suas amplas terras uma espécie de microEstado que produzia quase todo o necessário para a vida de sua população O patriarca detinha ali poder de vida e morte sobre seus familiares Dependentes das riquezas e da proteção fornecidas pelo patriarca os demais habitantes daquela terra também estavam submetidos ao seu poder Essa organização colonial e imperial transferiuse para a República por longo tempo dominada por aquelas aristocracias regionais Mesmo a democratização recente do país não eliminou ainda o clientelismo e seu pressuposto a prática do dando é que se recebe No plano jurídico as normas formalmente derivadas do Direito Romano não escondem a força de um direito consuetudinário informal paralelo de um conjunto de ilegalidades socialmente aceitas Estas quase sempre são praticadas em detrimento do Estado cotidianamente assaltado nas suas prerrogativas muitas vezes por dentro por parte de altos funcionários e dos próprios governantes Como na época feudal o Estado brasileiro não é uma coisa pública res publica é propriedade dos mais fortes e espertos Ao longo de nossa história pouco se distinguiram as noções de público e privado da mesma forma que ocorria na sociedade feudal na qual tudo é privado e ao mesmo tempo tudo se torna público 45 1925 No plano econômico a situação brasileira fundamentalmente agrária até meados do século XX denuncia o passado medieval transplantado pelos portugueses e prolongado pelo sistema colonial mercantilista e pelo neocolonialismo industrial Da mesma forma que o sistema de valores medieval exaltava a aventura do cavaleiro andante o destemor religioso do cruzado o espírito de risco do mercador que partia para locais distantes por muito se desprezou no Brasil o trabalho cotidiano e rotineiro A ocupação do solo e a exploração das riquezas naturais deram se no Brasil modernoc contemporâneo de forma predatória semelhante à praticada na Europa medieval Associada ao caráter agrário da sociedade a urbanização européia fora fraca até o século XI a brasileira até fins do século XIX No plano cultural apesar da globalização neste início de milênio alguns elementos medievais ainda são visíveis Artur e Carlos Magno estão presentes com freqüência na literatura nordestina de cordel cujo espírito temática transmissão e recepção essencialmente orais prolongam a poesia européia da Idade Média no Brasil do século XX Mesmo certas criações eruditas do Nordeste como os textos de Ariano Suassuna e as músicas de Elomar bebem fundamentalmente de fontes medievais O calendário brasileiro atual tem 14 feriados oficiais dos quais 11 são de origem medieval Festas como o Carnaval no Rio de Janeiro e no Nordeste o Bumbameuboi em São Luís do Maranhão a Procissão do Círio em Belém do Pará têm inegáveis raízes medievais A religiosidade nacional sincrética exacerbada informal traz em si diversos traços medievais as irmandades o culto a santos não canonizados caso de Padinho o padre Cícero a visão mágica de sacramentos roubar hóstias consagradas para fazer amuletos foi comum na Europa medieval e no Brasil colonial o sentimento messiânico milenarista como mostram o sebastianismo Canudos certos eventos políticos recentes várias superstições espelho quebrado saliva cura e mata pé direito etc O processo de formação do catolicismo brasileiro também lembra o fenômeno na Idade Média Nesta ocorreu uma cristianização do paganismo e uma paganização do cristianismo no Brasil uma cristianização do culto africano e uma africanização do cristianismo A sensibilidade coletiva brasileira é de forte instabilidade emocional oscilando do pessimismo mais negro ao otimismo mais eufórico semelhante ao constatado por Marc Bloch na Europa feudal 30 9497 Bibliografia básica 36 40 54 59 64 65 70 74 89 97 Bibliografia complementar M D CHENU Lèveil de la conscience dans la civilisation médiévale MontrealParis Institui détudes médiévales Vrin 1969 C G CRUMP e E F JACOB El legado de Ia Edad Media Madri Pégaso 1944 J LE GOFF Pour un long Moyen Áge em IDEM Limaginaire médiéval Paris Gallimard 1985 pp 713 A KOJÈVE Lorigine chrétienne de la science moderne em Mélanges offerts à Alexandre Koyré Paris Hermann 1964 vol II pp 295306 L WECKMANN La herencia medieval del Brasil México Fondo de Cultura Económica 1993 RESENHA No livro A Idade Média Nascimento do Ocidente do historiador medievalista brasileiro Hilário Franco Júnior analisa o período medieval por estruturas no qual discute política cultura economia entre outros aspectos que caracterizam a sociedade ocidental da Idade Média Nos atentaremos ao primeiro capítulo cujo o título As estruturas demográficas que por uma perspectiva cronológica apresenta o processo de oscilação na extensão demográfica medieval especificamente o período da Idade Média Central Alta Idade Média e Baixa Idade central Ou capitulo destacado o nove sobre O significado da Idade Média Diante a retratação da Primeira Idade Média que foi marcada por esvaziamento pelo ponto de vista demográfico das áreas urbanas que alguns fatores permitiram esse acontecimento como a fome e as doenças O autor destaca esse período como um prolongamento da situação do Império Romano cujo população conhecerá um claro recuo desde o século II FRANCO JÚNIOR 2001 p 1 Apesar que não faz referência de maneira direta ao declínio do Império Romano sabemos que assim como ele coloca nesse capítulo foi um período marcado pela desorganização do aparelho romano Essa desorganização contribuiu para o esvaziamento urbano e a crise populacional assim como pela falta de alimentos de alimentos que com a queda do comércio a importação dos alimentos ficando difícil não conseguia sustentar a população urbana Em consequência disso mesmo com a produção do que necessitasse a colheita que não tivesse sucesso seria um grande motivo para que a taxa de moralidade aumentasse Ao tentar inverter o declínio demográfico da região o imperador buscou alternativas tais como a proibição de meninas para o clero ou limitavam um período para que a viúvas tornassem a casar bem como como a vinda de germanos para território tomando mas que estes não surtiram efeitos Além da falta de alimentos as doenças como a malária e a varíola causaram epidemias que causaram impacto na população e o recuo demográfico Entretanto Franco Júnior 2001 aponta que possivelmente houve uma retomada demográfica na metade do século VIII e que esse fato possa ter ligação com os Carolíngios apesar que a desigualdade continuava seguidos pela fome e morte Por conseguinte a fim de controlar a taxa de natalidade e as condições existentes as práticas de controle bruscas continuava como o infanticídio sobretudo de crianças do sexo feminino No entanto o texto ressalva que essa esses sacrifícios eram menos praticados em grandes propriedades agrícolas Entre outros problemas para a recuperação demográfica da Alta Idade Média teve relação com as invasões contudo apesar das fontes que liga uma pequena recuperação demográfica pelos Carolíngios o autor apresenta cinco indícios O primeiro marcado pela migração que foi imposta pela agricultura e guerra Essa migrações são divididas em 4 tipos 1 migrações habituais deslocamento 2 migrações coloniais comércio 3 migrações extraordinárias êxodo de mouros e judeus 4 migração sem instalação errantes e peregrino No segundo indício entre os séculos VIII e XII a recuperação se deu pelo arroteamentos aumentando os terrenos para cultivação fundação de novas aldeias e a subida de preços das terras e do trigo Ao que o texto apresenta outro fator importante para o crescimento demográfico especificamente nas áreas urbanas foi a religiosidade equivalendo ao ter sido indício o que realmente faz sentido quando concordamos quanto a arquitetura religiosa na transição da estética românica para a gótica É nítido no texto as colocações sobre as limitações dos dados demográficos medievais mas assim como a construções de igrejas urbanas com uma planta extensa já que por ser uma região cristãs acomodava muitos peregrinos o que resulta também no crescimento demográfico Portanto para demonstrar esse crescimento demográfico da Idade Média Central o autor utiliza de tabelas e mapas Nesse mesmo período a redução das epidemias já tinha reduzido e as guerras menos frequentes o que favoreciam a redução da mortalidade A mudança de clima quarto indício também foi fator que favoreceu a expansão demográfica uma vez que mais quente e soco além de facilitar a agricultura também ajudou a reduzir a propagação da peste Por último as inovações das técnicas agrícolas o último indício poderia ter facilitado o crescimento populacional ou contrário IDIB 2001 Mas ao que é relevante é que esse inovações facilitaram o aumento da produção de alimentos bem como a sua qualidade As práticas que favoreceu a Alta Idade Média como a exploração das áreas florestais para a produção agrícola e consequentemente o crescimento populacional ao que até então foi uma solução para os problemas da população no período medieval passou a ser um problema quando na Baixa Idade Média a fertilidade das terras são comprometidas as alterações climáticas que antes foi uma solução para a agricultura e comércio voltou a ser um problema elevando o preço dos alimentos Por consequência a fome ressurge e as epidemias tornaramse para a sociedade De acordo com Franco Júnior 2001 foi apenas uma crise demográfica da Baixa Idade Média teve com seu pior momento com o ressurgimento da peste então chamada peste negra que se manifestava como a bubônica e pneumonia As migrações que está entre os indícios da expansão demográfica tornou um problema nesse período quando facilitou a propagação da peste negra em toda a Europa Na contemporaneidade sabemos o quanto é fatal uma pandemia que entre pobres e ricos não escolhia quem iria afetar e que a única diferença está na exposição o texto relata que a peste negra foi um dos maiores catástrofes da história ocidental Por fim nas estruturas demográficas o autor apresenta a partir de fontes não tão certas quais fatores favoreceram para aumento demográfico assim como para o recuo que chegaram a ser como resposto do que antes era a salvação passou a ser problemas maiores como a peste negra No capítulo nove O significado da Idade Média apresenta uma visão contemporânea sobre essa época refletindo a influência da Idade Média no crescimento da civilização cristã e na sociedade como o todo Assim como relação entre o Medieval e a Modernidade No texto o autor coloca uma frase de um testemunho do século XV em que exalta a Modernidade cheia de esperança mas que crítica ao enfatizar que apesar da rápida transição na sociedade a época era a mesma IDIB 2001 Para isso ressalta os quatro movimentos que marcaram a Modernidade Renascimento Protestantismo Descobrimentos e Centralização O Renascimento entre os séculos XVXVI se aproxima a Idade Média por seus modelos clássicos e influenciados pela cultura da Antiguidade O Protestantismo resultante de um movimento que antecede a Idade Média mas que se concretiza no Modernismo foi uma grande crítica ao catolicismo Enquanto os Descobrimentos também teve influência quando utilizava em suas técnicas náuticas bases medievais Por sua vez A Centralização Política que pela ideia centralizada do poder monárquico também de origem medieval Dessa maneira possamos dizer que aquilo que não se fez na Idade Média não se poderia fazer na Idade Moderna Aquela gerava está desenvolvia FRANCO JUNIOR 2001 p 21 O Antigo Regime e a crise no século XIV reforçava a Centralização do poder ao monarca enquanto a sociedade estamental moderna prolongava o período medieval A migração colonial citada no primeiro capítulo pelo autor nesse período ela se intensifica na América pela exploração escravização e crescimento da burguesia juntamente com a realeza intervindo diretamente na economia O autor portanto apresenta nesse capítulo alguns aspectos que estão na sociedade do século XX e para nós no século XIV essas mesmas características perpetuam A princípios discute a influência linguística ocidental que apesar das transformações do tempo são quase todas de origem medieval O que não se limita apenas a palavras ou suas variações também se enquadram os novos idiomas oriundo dos idiomas vulgares por exemplo Mas que sobretudo ao enraizamento do latim Ao exercício da cidadania e participação democrática o autor historiador enfatiza sua referência bem mais medieval do que grega É colocado outros fatores que também tiveram precedentes do período medieval O processo de colonização das Américas especificamente do Brasil por Portugal este que não teve Idade Média também teve influências trazidas por Portugal como a consciência de nacionalidade patriarcalismo que até hoje é uma catástrofe para o desenvolvimento da sociedade no Direito economia cultura religião Não colocado pelo autor acredito que poderíamos incluir a influência linguística uma vez que o Brasil é constituído pela diversidade como o todo e ainda influente pelo seu período de colonização Por fim entre esses dois capítulos podemos analisar pedidos marcantes do pedido medieval e toda sua influência até mesmo na Modernidade É claro as limitações para o medievalista visto que suas fontes são baseadas em evidências fragmentadas sobre a estrutura demográfica da Idade Media Mas que objetivo em apresentar sobre perspectivas medievais em busca do desenvolvimento tanto que suas heranças se mentem até a atualidade fornecendo como base para constituir a sociedade até mesmo para aquelas que são consideradas como um país que não teve Idade Média haja vista o Brasil
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Capítulo 1 As estruturas demográficas O surgimento da Demografia Histórica há menos de cinco décadas enriqueceu consideravelmente o arsenal do historiador na sua tarefa de compreensão do passado e os medievalistas não poderiam é claro ficar indiferentes a ela Apareceram assim vários trabalhos metodológicos sobre as especificidades da demografia medieval e inúmeras monografias sobre as condições populacionais de mosteiros senhorios cidades e mesmo regiões mais amplas A partir de tais estudos esboçaramse sínteses parciais e hoje já vemos com certa clareza as estruturas demográficas medievais Sem dúvida a Idade Média estava na etapa que os especialistas chamam de Antigo Regime Demográfico típico das sociedades agrárias préindustriais alta taxa de natalidade e alta taxa de mortalidade Em razão disso a conjugação de certos fatores estiagens enchentes epidemias etc por poucos anos seguidos alterava o quadro demográfico ao elevar ainda mais a mortalidade Ou pelo contrário a ausência de eventos daquele tipo rapidamente produzia um saldo populacional positivo Como Roberto Lopez acertadamente chamou a atenção 70 120 toda espécie inclusive a humana tem tendência natural a se multiplicar desde que não haja obstáculos externos para isso Ora a história demográfica medieval é exatamente a história da presença e da remoção desses obstáculos A retração da Primeira Idade Média Do ponto de vista demográfico a primeira fase medieval foi um prolongamento da situação do Império Romano cuja população conhecera um claro recuo desde o século II Com a crescente desorganização do aparelho estatal romano foram rareando as importações de gêneros alimentícios que tinham por séculos permitido a existência de uma grande população urbana As cidades começaram a se esvaziar cada região tentou passar a produzir tudo aquilo de que necessitasse Tal fenômeno paradoxalmente aumentou a insegurança pois bastava uma má colheita para que a mortalidade naquele local rapidamente se elevasse devido às dificuldades em obter alimentos em outras regiões Não por acaso a hagiografia da época freqüentemente relata milagres alimentares santo era sobretudo o homem que conseguia alimentos para seus concidadãos Entravase num círculo vicioso pois a fraqueza demográfica engendrava a fraqueza dos rendimentos e esta por sua vez engendrava a fraqueza demográfica reforçando assim a causa da pobreza 42138 Contra esta situação no século V um imperador romano proibiu as moças menores de 14 anos de entrar para o clero além de pressionar as viúvas a se casarem novamente em cinco anos sob pena de em caso contrário perderem metade dos seus bens Por seu lado a penetração e a fixação de germanos em território romano não alteraram significativa mente a situação Cada grupo invasor franco ostrogodo vândalo etc tinha em média apenas entre 50000 e 80000 pessoas computados guerreiros mulheres e crianças No conjunto uma estimativa antiga mas de forma geral ainda aceita calcula que o total de germanos que se fixaram no império representava somente uns 5 da população romana Desta forma não houve um reforço populacional germânico porque a chegada de algumas poucas dezenas de milhares de bárbaros teve como contrapartida o despovoamento de regiões inteiras diante de seu avanço Acima de tudo porém o recuo demográfico foi produto do recrudescimento de epidemias Do século III ao V de malária Do século VI ao VIII de varíola conjugada com a mortífera peste Como a difusão das doenças era acelerada pelo deslocamento de comerciantes e soldados elas fizeramse mais presentes no litoral mediterrâneo do que no interior europeu já então mais isolado em razão da debilidade e depois do desaparecimento do Estado romano O sul da França e da Itália foi atingido por quinze vagas de peste entre meados do século VI e meados do século VIII cada uma delas geralmente com alguns anos de duração Por esse motivo a população no Ocidente e talvez mesmo no Oriente atingiu nos séculos VII e VIII seu ponto mais baixo desde o Alto Império Romano BIRABEN I 44 A relativa recuperação da Alta Idade Média Foi possivelmente esse completo despovoamento de certas regiões que permitiu a recuperação de outras ao criar bolsões os locais desertos que dificultavam a difusão da peste De qualquer forma o que se percebe por meio de indícios esparsos na documentação de interpretação problemática indica uma certa retomada demográfica na segunda metade do século VIII Esse fato talvez esteja ligado à reorganização promovida pelos Carolíngíos e talvez ajude mesmo a explicar a expansão territorial realizada por Carlos Magno Contudo essa recuperação foi desigual no tempo e no espaço Em muitos locais em muitos momentos a fome e a mortalidade continuavam acentuadas Uma crônica da região do Mosela afirma em fins do século VIII que os homens comiam os excrementos uns dos outros homens comiam homens irmãos comiam seus irmãos as mães comiam seus filhos Buscando um certo equilíbrio entre o contingente populacional e os recursos existentes a sociedade altomedieval lançava mão de vários expedientes de controle de natalidade Daí o pequeno número de crianças apenas 2 da população camponesa Em parte isso se devia às práticas anticonceptivas e abortivas apesar de duramente punidas pela Igreja Em parte era resultado da elevada proporção de viúvos e celibatários naquela sociedade Em parte decorria do infanticídio especialmente o feminino estudado por Emily Coleman 19 1974 315335 para ter menos bocas para alimentar sacrificavamse muitos recémnascidos do sexo feminino que quando adultos seriam menos produtivos que os masculinos Apesar de a mortalidade infantil masculina ser maior que a feminina a taxa de masculinidade isto é a proporção homensmulheres era alta em muitas explorações agrárias indicando a eliminação de crianças do sexo feminino Por outro lado nas grandes propriedades agrícolas com melhores condições de sustentar um maior número de pessoas a taxa de masculinidade era menor pois aqueles sacrifícios eram menos necessários Em suma a recuperação populacional da Alta Idade Média parece ter sido tímida e logo absorvida pelos problemas decorrentes do fracasso do Império Carolíngio e das invasões de muçulmanos magiares e sobretudo vikings Provenientes da Escandinávia estes últimos aproveitavamse da grande navegabilidade dos rios europeus para penetrar profundamente em território cristão Ainda que seja impossível avaliar o impacto demográfico de todas aquelas invasões parece que não foi desprezível Além das mortes diretamente provocadas pelos invasores havia as mortes indiretas resultantes da destruição das aldeias e campos e a perda populacional ocasionada pela escravização de cristãos vendidos em regiões distantes Os poucos dados numéricos fornecidos pelas fontes não são confiáveis mas as descrições dos cronistas indicam o alcance dos estragos resultantes das incursões vikings Um monge da região do Loire afirmava em meados do século IX que a multidão inumerável de normandos não pára de crescer De todos os lados os cristãos são vítimas de massacres de pilhagens de devastações de incêndios Escrevendo meio século depois um monge parisiense lamentava a aproximação dos cruéis pagãos que devastam o país massacram os habitantes capturam os camponeses acorrentamnos e enviamnos alémmar A expansão da Idade Média Central De toda forma a recuperação demográfica carolíngia mesmo pequena apontava para a expansão que começaria em meados do século X Apesar da inexistência de uma documentação quantitativa é inquestionável aquele crescimento na Idade Média Central como se percebe por cinco claros indícios O primeiro deles um acentuado movimento migratório Ao contrário da imagem tradicional que vê o homem medieval fortemente ligado à sua região enraizado sabese hoje que mesmo na Alta Idade Média ele se deslocava ocasionalmente conforme as necessidades impostas pela agricultura ou pela guerra Jacques Le Goff observou que a propriedade era quase desconhecida na Idade Média como realidade material ou psicológica não estabelecendo seja para o nobre seja para o camponês uma ligação afetiva com a terra habitada e trabalhada por isso a mobilidade dos homens da Idade Média foi extrema e desconcertante 64I172 De fato podemos constatar para aquela fase a ocorrência de quatro grandes tipos de migração 1 migrações habituais ou seja deslocamentos de população por exemplo para arrotear novas áreas migrações sazonais como no inverno a busca de pastos ainda verdes migrações temporárias vassalos indo prestar o consilium na corte do seu senhor feudal clérigos dirigindose a um concilio ou sínodo atração dos centros urbanos que exerceram forte sedução nos séculos XII XIII ao possibilitar aos camponeses uma nova condição social e econômica mobilidade militar como a conquista da Inglaterra pelos normandos ou as Cruzadas 2 migrações coloniais como as que levaram à formação de entrepostos comerciais italianos no Oriente a fixação de franceses nas áreas reconquistadas aos muçulmanos na Espanha de alemães nas regiões arrancadas aos eslavos na Europa Oriental de católicos nos territórios tirados aos islamitas no Oriente Médio Cruzadas ou aos hereges cátaros no sul da França 3 migrações extraordinárias como o êxodo de mouros empurrados para o sul da Península Ibérica com o avanço da Reconquista Cristã e de judeus perseguidos pelas primeiras Cruzadas e expulsos da Inglaterra em 1290 e da França em 1306 E também todo tipo de migrações forçadas caso dos escravos vendidos por mercadores italianos nas regiões islâmicas do Oriente 4 migrações sem instalação como os movimentos de errantes marginais aventureiros clérigos sem domicílio fixo como os célebres goliardos e de peregrinos tanto em direção a centros regionais de peregrinação quanto a Jerusalém Roma e Compostela Um segundo indício da expansão demográfica da Idade Média Central é o movimento de arroteamentos que fazia recuar as florestas os terrenos baldios as zonas pantanosas Iniciados no século VIII com os primeiros sinais de recuperação demográfica os arroteamentos foram intensificados no século X e ganharam grande impulso no século XII quando o ritmo de crescimento populacional tornouse mais rápido Esse fenômeno revelava a necessidade de se criar novas áreas cultiváveis de se formar novas unidades produtivas no setor básico da economia a agricultura Assim paralelamente à expansão territorial por meio de conquista militar a Cristandade latina expandiase também no seu próprio interior De acordo com a tipologia dos arroteamentos estabelecida por Georges Duby 43I149169 havia três espécies deles O primeiro deuse pelo alargamento dos terrenos cultivados há muito tempo com a ocupação das terras virgens limítrofes Tais empreendimentos não foram realizados por monges como se acreditava até recentemente mas por nobres desejosos de estender seus senhorios e principalmente por camponeses que formavam propriedades à custa dos bosques senhoriais O segundo tipo de arroteamento davase pela fundação de novas aldeias às vezes erguidas por razões de segurança nas fronteiras de um principado ou às margens de uma rota importante Outras vezes o objetivo era econômico para os bispos levantar dízimos para os senhores laicos obter rendimentos provenientes do exercício de seus direitos de ban O último tipo de arroteamento era o povoamento intercalado realização de iniciativas individuais de pioneiros que agiam isoladamente na busca mais de pastos que de terras cultiváveis Terceiro indício aumento do preço da terra e do trigo Apesar da migração dos excedentes populacionais de uma região para outra e apesar ainda do alargamento da área produtiva graças aos arroteamentos a Europa católica não conseguia reequilibrar a oferta e a demanda pelo principal meio de produção a terra e conseqüentemente pelos bens de consumo vitais sobretudo o trigo Na Inglaterra por exemplo entre 1160 e 1300 ele teve seu valor quase triplicado Na tentativa de superar esse problema maiores extensões de terra foram entregues à triticultura reduzindo as áreas de pastagem em razão disso na década de 1210 o preço da ovelha era 132 e o da vaca 155 maior do que meio século antes Em alguns locais da Normandia no norte francês como em vários outros da Europa ocidental cristã a densidade demográfica era em 1313 maior que a atual Não surpreende portanto que entre 1200 e 1300 o preço da terra na Normandia tenha aumentado de sete a dez vezes Outra indicação da expansão demográfica do Ocidente cristão está no acentuado crescimento da população urbana naquele período Enquanto por volta do ano 1000 talvez não existisse na Europa católica nenhuma cidade com uma população de 10000 habitantes 70 263 no século XIII havia 55 cidades com um número de habitantes superior àquele duas na Inglaterra seis na Península Ibérica oito na Alemanha 18 na França e Países Baixos 21 na Itália 56 247 Esta última era não apenas a região mais urbanizada do Ocidente como também a que possuía as maiores cidades Ainda que as cifras sejam sempre discutíveis sem haver consenso entre os especialistas Milão Florença Veneza e Gênova devem ter ultrapassado os 100000 habitantes No restante da Europa Ocidental apenas Paris parece ter alcançado tal população Contudo é importante lembrar a Cristandade ocidental continuava a ser essencialmente rural já que no século XIII não mais de 20 de sua população total vivia em centros urbanos 56 158 Se em fins da Idade Média pôde surgir na Toscana Itália central um provérbio segundo o qual o campo produz animais a cidade produz homens é porque se tratava da região européia mais fortemente urbanizada Na verdade o crescimento populacional das cidades faziase em grande parte graças ao capital demográfico recebido do campo Nos locais onde o campo não podia fornecer grandes contingentes como na Península Ibérica a população urbana crescia por si mesma porém de forma menos intensa Um quinto indício de que a população européia ocidental crescia bastante entre os séculos XI e XIII é proporcionado pelas transformações sofridas pela arquitetura religiosa A própria passagem do românico para o gótico deixando de lado por ora todas as suas implicações estéticas filosóficas mentais Apêndice 3 reflete a necessidade de áreas internas maiores capazes de abrigar um número crescente de fiéis Em vários casos a construção de grandes igrejas deviase à busca de prestígio por parte de uma cidade ou de um importante personagem e mesmo a um revigorar da espiritualidade mas deviase sobretudo ao desejo de abrigar todo o rebanho de Cristo cada vez maior nas casas de Deus Mesmo as igrejas rurais necessitaram de reformas no século XIII com a reconstrução de suas naves que se haviam tornado muito pequenas Significativamente foram sobretudo as catedrais localizadas nas cidades que tiveram de ser alargadas Muitas das que foram então construídas cobriam amplas áreas 7700 metros quadrados no caso de Amiens 6166 no de Colônia 3000 no de Burgos podendo abrigar milhares de pessoas As igrejas de peregrinação por sua vez não só passaram desde o século XI a ser maiores como a apresentar uma planta que comprova o crescente afluxo de peregrinos Surgiu assim o deambulatório corredor curvo que saindo de uma nave lateral passa pelas capelas na cabeceira da igreja e desemboca na outra nave lateral organizando desta forma a passagem das multidões de fiéis diante das relíquias sagradas colocadas nas capelas Todos esses testemunhos apontam portanto para um forte crescimento demográfico entre os séculos XI e XIII mas é extremamente difícil quantificálo De maneira geral a documentação medieval fornece poucos dados populacionais que permitem um tratamento estatístico Apenas as fontes inglesas são suficientemente ricas para tanto Contudo apesar de suas óbvias limitações as estimativas da Tabela 1 podem dar uma idéia da evolução populacional medieval Países Anos 200 400 600 800 1000 1100 1200 1300 1400 1500 Alemanha 35 35 30 325 35 40 60 90 65 90 Bélgica e Luxemburgo 04 03 03 03 04 06 09 125 08 125 Espanha 50 45 35 375 40 45 55 75 55 65 França 65 50 45 50 65 775 105 160 110 150 Países Baixos 02 02 02 02 03 04 06 08 06 09 Inglaterra e Gales 07 08 06 08 15 175 25 375 25 375 Itália 70 50 35 40 50 575 725 100 70 100 Portugal 05 05 04 04 06 07 09 125 09 125 Suíça 03 03 03 03 03 04 05 08 06 08 Totais 241 201 163 180 221 2585 3465 5035 354 4845 Tabela 1 Evolução demográfica da Cristandade ocidental segundo fronteiras atuais em milhões de habitantes McEVEDY e JONES pp 43 57 63 65 69 87 101 103 107 Verificase por esses números o aceleramento do ritmo de crescimento demográfico 1042 nos séculos VIIVIII 1138 nos séculos IXX 1696 no século XI 3404 no século XII 4531 no século XIII Como se percebe a taxa de crescimento do século XII foi apenas um pouco inferior à dos séculos VII a XI somadas E a do século XIII foi superior a essa soma Isso implicava é claro alteração na densidade populacional Enquanto na Alta Idade Média o nível mais freqüente tinha sido de 9 a 12 habitantes c o mais baixo de 45 habitantes por quilômetro quadrado 52 68 no fim do século XIII a densidade média era de 20 habitantes por quilômetro quadrado Mapa 1 Densidades populacionais européias em 1300 reproduzido de McEVEDY e JONES p 23 Mapa 2 Aumentos porcentuais na população européia entre os anos 200 e 1300 reproduzido de McEVEDY e JONES p 23 Portanto mesmo sem se poder quantificar com maior rigor e precisão a expansão demográfica da Idade Média Central ela é inegável Assim é preciso pensar nas razões desse fenômeno De início devemos lembrar que naquele período dois fatores que anteriormente elevavam a mortalidade tiveram seu alcance reduzido O primeiro deles ainda insuficientemente esclarecido foi a ausência de epidemias com o recuo da peste e da malária continuando apenas a lepra a ter certa intensidade Talvez como já vimos a fraca densidade populacional anterior tenha funcionado como um diluidor e amenizador dos deslocamentos de bactérias O segundo fator a considerar é o tipo de guerra que não envolvia grandes tropas de combatentes anônimos como nas legiões romanas ou nos exércitos nacionais modernos a guerra feudal era feita por pequenos bandos de guerreiros de elite os cavaleiros As batalhas propriamente ditas eram raras Prevaleciam as ações individuais dos guerreiros e não uma ação coletiva coordenada Apesar dos laços de vassalagem e de parentesco uma luta entre dois grupos de nobres feudais envolvia geralmente poucas dezenas de guerreiros raramente algumas centenas Quando da invasão da Inglaterra em 1066 Guilherme da Normandia contava com 4000 cavaleiros comandados por 200 barões Na importante batalha de Bouvines em 1214 na qual se jogou a sorte da França capetíngia do Império Angevino e do Santo Império Filipe Augusto contou com apenas 900 cavaleiros e 5000 infantes E claro que durante essas lutas alguns senhorios eram devastados porém o efeito destruidor da guerra geralmente faziase sentir apenas de forma local O raio de ação de um grupo de cavaleiros era bastante reduzido em virtude das dificuldades de deslocamento e de aprovisionamento Aqueles guerreiros irrequietos e pouco disciplinados não se mantinham muito tempo em campanha O contrato feudovassálico estipulava quase sempre um serviço militar de 40 dias anuais sendo problemático mesmo para um senhor feudal poderoso reunir seus vassalos por um prazo superior Em razão disso sempre que possível os reis tentavam contratar guerreiros mercenários alternativa possibilitada pelo próprio crescimento demográfico Acima de tudo a guerra feudal não objetivava a morte do adversário apenas sua captura Como uma das obrigações vassálicas era pagar o resgate do senhor aprisionado c como na pirâmide hierárquica feudal quase todo nobre além de ser vassalo de outros tinha seus próprios vassalos capturar um inimigo na guerra era obter um rendimento proporcional à importância do prisioneiro Por isso os cronistas lamentavam as batalhas mais violentas nas quais a morte de alguns cavalei ros representava a perda de polpudos resgates Além disso o instrumental bélico era mais defensivo que destruidor É significativo que as bestas dotadas de molas metálicas e portanto de poderoso arremesso que penetrava uma armadura a até 270 metros de distância tenham sido proibidas no II Concilio de Latrão em 1139 por serem consideradas mortíferas Mas a remoção de fatores obstaculizadores do crescimento populacional não explica tudo É preciso considerar a ocorrência de fatores facilitadores daquele fenômeno O primeiro deles era a abundância de recursos naturais Já observamos que com o recuo demográfico dos séculos IIVIII extensas áreas anteriormente cultivadas foram abandonadas permitindo a recuperação das florestas que tinham sido fortemente exploradas pelos antigos Dessa forma no início da Idade Média Central o espaço cultivado era muito restrito predominando a natureza virgem da qual homens tiravam importantes complementos à alimentação A abundância de terras cultiváveis fica atestada pelos arroteamentos empreendidos durante a Idade Média Central possíveis graças à existência de largos espaços a serem conquistados à natureza Diante disso é possível pensar que o aumento da produtividade agrícola nos séculos XIXII deveuse pelo menos em parte ao fato de se cultivarem terras virgens ou praticamente isso por terem ficado inexploradas por longo tempo e portanto de maior fertilidade Outro fator que contribuiu para a expansão demográfica medieval foi a suavização do clima Ainda que insuficientemente explicado o fenômeno parece indiscutível e de alcance mundial tendo ocorrido então por exemplo um recuo do gelo nos mares e montanhas do norte e abundância de água nas regiões saarianas que depois o deserto reconquistaria Na Europa ocidental o clima tornouse mais seco e temperado do que atualmente sobretudo entre 750 e 1215 A viticultura pôde então expandirse em regiões anteriormente impróprias como a Inglaterra A paisagem de alguns locais foi alterada e humanizada como a Groenlândia que fazia jus a seu nome literalmente terra verde e apenas no século XIII em virtude de novas mudanças climáticas passou a ter icebergs em sua direção tornandose inóspita O período mais quente e seco não apenas transformou determinadas áreas em cultiváveis e habitáveis como contribuiu para dificultar a difusão da peste De fato na forma bubônica seu vetor é a pulga que vive sob uma temperatura de 15 a 20 graus e sob uma umidade relativa do ar de 90 a 95 Na forma pneumônica a peste é transmitida pelas gotículas de saliva do homem infectado as quais em regiões frias e úmidas ficam em suspensão na atmosfera e penetram no organismo pela respiração Ou seja a pluviometria condiciona o ritmo sazonal da peste com a umidade do ar estimulando a epidemia se ela estiver presente na região Daí nas zonas atlânticas devido à umidade a peste terse instalado e persistido por anos sob uma forma atenuada antes de eclodir em vagas violentas Por último ajuda a explicar o crescimento populacional dos séculos XXIII o surgimento ou difusão de uma série de inovações nas técnicas agrícolas Na verdade discutese qual teria sido o elemento a desencadear o processo o crescimento populacional pressionando por maior produção levou ao progresso técnico ou ao contrário foi o progresso técnico que possibilitou a expansão demográfica A primeira tese foi defendida dentre outros por David Herlihy 22 1958 23 e a segunda por estudiosos como Georges Duby 431 211 De qualquer forma dentre os aperfeiçoamentos técnicos da época três exerceram uma ação direta sobre a elevação da produtividade agrícola a nova atrelagem dos animais a charrua pesada e o sistema trienal O primeiro deles teve efeitos importantes pois na Antigüidade a força motriz do cavalo era fraca nunca sendo usada nos trabalhos agrícolas porque uma parelha deslocava menos de 500 quilos enquanto a partir da Idade Média Central passou a deslocar até mais de 5 toneladas 57 63 A nova atrelagem substituiu as correias colocadas no pescoço do animal que pressionavam a jugular e a traquéia por uma espécie de coleira rígida que não estrangulava Assim o cavalo pôde desde então ser utilizado nos serviços agrícolas o que representou um grande ganho de energia boi e cavalo têm a mesma força de tração porém este último deslocase uma vez e meia mais rápido e pode trabalhar uma ou duas horas a mais por dia 96 62 Viabilizouse dessa forma a utilização da charrua que talvez tenha sido introduzida na Europa ocidental pelos germanos na Primeira Idade Média mas que era muito pesada e requeria força motriz animal Assim durante os primeiros sete ou oito séculos medievais continuouse a empregar o velho arado romano eficiente apenas nos solos ligeiros das regiões mediterrâneas A expansão agrícola para regiões de solos mais profundos e duros tornou a charrua indispensável pois ela não se limita a arranhar a camada superior do solo revolvendo a terra e trazendo para cima os nutrientes acumulados nas camadas inferiores Além disso ela economiza mãodeobra ao dispensar a tarefa de cavar o solo com enxada antes de semeálo De especial importância no entanto foi o sistema trienal possivelmente a mais influente inovação agrícola da época De um lado porque a divisão da terra cultivável em três partes aumentou a extensão da área produtiva deixando apenas um terço em pousio contra metade no sistema bienal dos séculos anteriores De outro lado porque o sistema trienal alterou os próprios hábitos alimentares uma parte da terra era semeada com cereais de inverno trigo e centeio e outra com cereais de primavera cevada e aveia esta principalmente para cavalos daí a estreita relação entre sistema trienal e uso daquele animal A sementeira de primavera além dos cereais compreendia quase sempre leguminosas ervilhas lentilhas favas que nitrogenando o solo mantêm sua fertilidade além de fornecer proteínas para a alimentação humana Este é um ponto fundamental As inovações tecnológicas não apenas produziram uma maior quantidade de alimentos como sobretudo uma melhor qualidade Até aquela época a dieta era mal balanceada porque baseada em cereais fornecia muitas calorias e hidrato de carbono e poucas proteínas e vitaminas A alteração então ocorrida na dieta talvez explique a mudança na proporção entre população masculina e feminina favorável à primeira na Alta Idade Média e à segunda posteriormente Como mostrou o estudo de Bullough e Campbell 22 1980 317 325 até o século X ou XI a mulher ingeria pequena quantidade de ferro que seu organismo necessita em proporção maior do que o do homem devido à menstruação à gravidez e à lactação Portanto a anemia feminina era generalizada na Alta Idade Média daí a maior propensão das mulheres a certas doenças Com a introdução de leguminosas na dieta e uma presença mais assídua de carne peixe ovos e queijo a mortalidade feminina diminuiu Tal fato teve ampla repercussão contribuindo até mesmo para a valorização social da mulher O ressurgimento da peste na Baixa Idade Média O crescimento populacional acabou por se revelar excessivamente elevado para as condições européias de então Durante o auge daquele fenômeno tinham sido ocupadas terras marginais de menor fertilidade que se esgotavam em poucos anos baixando a produtividade média e desestabilizando o frágil equilíbrio produçãoconsumo No mesmo momento em que essa contradição se revelava mais claramente no século XIII ocorria uma alteração que acentuava as dificuldades E tal alteração por sua vez era ao menos em parte produto daquela própria condição O aumento populacional tinha implicado a derrubada de grandes extensões florestais já que a madeira era o principal combustível e material de construção em 1300 as florestas da França cobriam 1 milhão de hectares a menos que hoje 57 80 Dessa forma comprometiase o equilíbrio ecológico provocando mudanças no regime pluvial e portanto no clima elemento fundamental para uma sociedade agrária como aquela Isso ajuda a explicar as chuvas torrenciais que em 13151317 atingiram a maior parte da Europa ao norte dos Alpes exatamente nos locais de grande devastação florestal O clássico estudo de Henry Lucas 221930 343377 mostra que as chuvas constantes e a queda de temperatura prejudicavam as vinhas a produção do sal que se dava por evaporação e sobretudo a produção dos cereais cujos grãos não cresciam nem amadureciam Na Inglaterra o preço de uma medida de trigo que era de 5 shillings em 1313 pulou para 20 em princípios de 1315 e para 40 em meados do ano Em Antuérpia importante centro distribuidor de cereais o trigo subiu 320 em sete meses A fome fazia grande quantidade de vítimas O canibalismo tornouse comum Diferentes epidemias agravavam a situação Impulsionada pela fome muita gente vagava em busca do que comer levando consigo as epidemias e a desordem Em Ypres importante cidade do norte europeu cerca de 10 da população morreu em 1316 Na verdade este foi apenas um ensaio da crise demográfica da Baixa Idade Média que teve seu ponto crucial no ressurgimento da peste então conhecida por peste negra Ela apresentavase de duas formas A bubônica assim chamada por provocar um bubão um inchaço tinha uma letalidade relação entre os atingidos pela doença e os que morrem dela de 60 a 80 com a maioria falecendo após três ou quatro semanas A peste pneumônica transmitida de homem a homem tinha uma letalidade de 100 fazendo suas vítimas depois de apenas dois ou três dias de contraída a doença Também a peste de certa forma resultava da desmedida expansão do período anterior Sempre presente no Oriente ela atingiu a colônia genovesa de Caffa na Criméia expressão da expansão territorial e comercial do Ocidente Contra essa presença ocidental os tártaros cercavam a colônia italiana quando a peste se manifestou em seu exército Recorrendo àquilo que JeanNoël Biraben chamou de inovação na guerra bacteriológica BIRABEN I 53 eles arremessaram cadáveres infectados por cima das muralhas genovesas Abandonando o local os genoveses levaram a peste para Constantinopla Messina Gênova e Marselha Destes portos ela difundiuse pelo restante da Europa Grosso modo a peste propagouse de sul para norte quase sempre do litoral para o interior Ela caminhava mais rapidamente pelas principais vias de comunicação e penetrava mais facilmente em regiões de alta densidade demográfica produto da Idade Média Central Democrática e igualitária a peste atingia indiferentemente a todos Ao contrário do que os historiadores sem conhecimento médico sempre afirmaram a má nutrição não era condição agravante Ricos e pobres organismos bem e mal alimentados eram igualmente suscetíveis à peste A diferença residia no fato de se estar mais ou menos exposto ao contágio Grupos como coveiros médicos e padres eram mais atingidos por razões profissionais As zonas rurais de população mais esparsa eram mais poupadas que as cidades A única possibilidade de salvação estava em manterse afastado dos locais tocados pela peste Foi o que fizeram por exemplo os personagens do Decameron de Giovanni Boccaccio que abandonaram Florença e foram viver isolados nos arredores da cidade enquanto a peste maltratava seus concidadãos que não tinham recursos para fugir Fig 1 A dança macabra Xilogravura italiana de 1486 Até por volta de 1350 raramente a morte era retratada e quando o era tratavase de uma mensageira do mundo divino A partir de então a morte tornouse um tema recorrente na arte e na literatura representada como uma força impessoal com iniciativa própria que atinge a todos poderosos e humildes clérigos e leigos jovens e velhos virtuosos e pecadores O significado da morte alterouse e com ele toda uma sensibilidade perdendo qualquer conotação ética atingindo a todos indistintamente na presente figura um bispo e um homem rico a morte deixou de ter natureza cristã Caminhavase para uma nova espiritualidade questionavase o poder de intercessão da Igreja preparavase terreno para o Protestantismo Até 1670 a Europa foi atingida todo ano No período crítico o da chamada peste negra em 13481350 as perdas humanas variaram conforme a região de dois terços a um oitavo da população No conjunto estimase a Europa ocidental perdeu cerca de 30 de seus habitantes naquela ocasião e só retomaria o nível populacional prépeste 200 anos depois em meados do século XVI A peste negra foi a maior catástrofe populacional da história ocidental num intervalo de tempo bem menor matou em termos absolutos mais do que a Primeira Grande Guerra Mundial e em termos relativos considerandose a população européia nos dois momentos mais do que a Segunda Guerra Mundial Bibliografia básica 41 42 43 50 52 56 63 64 70 84 Bibliografia complementar R ALEXANDRE Le climat en Europe au Moyen Âge Contribution à lhistoire des variations climatiques de 1000 à 1425 daprès les sources narratives de lEurope occidentale Paris EHESS 1987 J N BIRABEN Lês hommes et Ia peste en France et dans les pays européens en mèditerranéens ParisLa Haye Mouton 19751976 2 vols O GUYOTJEANNIN dir Population et démographie au Moyen Âge Pau CTHS 1995 J HEERS Les limites des méthodes statistiques pour les recherches de démographie médiévale Annales de Démographie Historique 1968 pp 4372 C McEVEDY e R JONES Atlas of World Population History Harmondsworth Penguin 1980 Capítulo 9 O significado da Idade Média Após os exageros denegridores dos séculos XVIXVII e os exaltadores do século XIX hoje temos uma visão mais equilibrada sobre a Idade Média E verdade que a divulgação que ela conheceu em fins do século XX fora dos meios acadêmicos inúmeras publicações científicas e ficcionais filmes discos exposições turismo etc nem sempre implicou uma melhor compreensão daquele período Mas reflete um dado essencial a percepção que se tem da Idade Média como matriz da civilização ocidental cristã Diante da crise atual dessa civilização cresce a necessidade de se voltar às origens de refazer o caminho de identificar os problemas Enfim de conhecer a Idade Média para conhecer melhor os séculos XXXXI Ora para tanto é preciso acompanhar a presença medieval ao longo dos tempos E portanto recolocar a velha questão continuidade ou ruptura Sobre a passagem da Antigüidade para a Idade Média boa parte da historiografia prefere enfatizar os pontos comuns os prolongamentos Mas entre Idade Média e Idade Moderna por muito tempo não se hesitou em aceitar quase unanimemente a segunda resposta Isso esteve ligado como vimos na Introdução ao próprio conceito de Idade Média Só mais recentemente se passou a negar a pretensa oposição Medievalidade Modernidade No entanto isso ainda é feito de forma tímida mais em relação ao Renascimento do que aos outros movimentos históricos ditos modernos Hesitase ainda em admitir que as estruturas modernas são no fundamental medievais A longa Idade Média Assim é importante reequacionar a questão no seu todo ainda que aqui só possamos indicar alguns pontos De início notemos que na verdade as especificidades modernas são apenas quantitativamente diferentes das medievais Contudo como no período 14501550 as mudanças sucederam com uma rapidez espantosa para seus contemporâneos essa impressão acabaria por marcar a historiografia por muitos séculos Foi o caso de um observador da época falando que a arte da guerra é agora tal que é preciso aprendêla de novo de dois em dois anos Ou ainda de outro testemunho do século XV incitando os homens de então a exaltar a Deus por permitirlhes ter nascido nessa nova era tão cheia de esperança e promessa Não se percebia que apesar de o ritmo histórico terse acelerado a essência era a mesma Se não vejamos Os quatro movimentos que se convencionou considerar inauguradores da Modernidade Renascimento Protestantismo Descobrimentos Centralização são em grande parte medievais O primeiro deles o Renascimento dos séculos XVXVI recorreu a modelos culturais clássicos que a Idade Média também conhecera e amara Aliás foi em grande parte por meio dela que os renascentistas tomaram contato com a Antigüidade As características bási cas do movimento individualismo racionalismo empirismo neoplatonismo humanismo estavam presentes na cultura ocidental pelo menos desde princípios do século XII Ou seja como já se disse muito bem embora o Renascimento só invoque a Antigüidade é realmente o filho ingrato da Idade Média 28 163 O Protestantismo do seu lado foi em última análise apenas uma heresia que deu certo Isto é foi o resultado de um processo bem anterior que na Idade Média tinha gerado diversas heresias várias práticas religiosas laicas algumas críticas a um certo formalismo católico Nesse clima a crise religiosa do século XIV comprovou ser inviável para a Igreja satisfazer aquela espiritualidade mais ardente mais angustiada mais interiorizada Foi exatamente nesse espaço que se colocaria o Protestantismo E sem possibilidade de ser sufocado pela ortodoxia católica ao contrário do que ocorrera com as heresias medievais por ele atender às necessidades profundas decorrentes das transformações socioculturais verificadas desde os últimos tempos da Idade Média Os Descobrimentos por sua vez também se assentavam em bases medievais nas técnicas náuticas construção naval bússola astrolábio mapas na motivação trigo ouro evangelização e nas metas Índias Império de Preste João Também existiam antecedentes medievais nas viagens normandas ao Oriente e à América esta comprovadamente atingida pelos noruegueses por volta do ano 1000 italianas à China Marco Polo por exemplo e ibéricas à África Colombo para nos limitarmos ao navegadordescobridor mais famoso era em todos os sentidos um homem muito mais medieval que moderno objetivava mais a difusão do cristianismo do que o ouro desejava este apenas para realizar uma Cruzada a Jerusalém atraíao ao Oriente acima de tudo a crença de que lá se localizava o Paraíso Terrestre A Centralização Política por fim era a conclusão lógica de um objetivo perseguido por inúmeros monarcas medievais O Estado moderno unificado caracterizavase pelo fato de o soberano ter jurisdição sobre todo o país poder de tributação sobre todos os seus habitantes monopólio da força exercito marinha polícia Esta tinha sido a tripla meta de reis como Henrique II da Inglaterra 11541189 ou Luís IX da França 1226 1270 O sentimento nacionalista que fornecia o substrato psicológico necessário à concretização do poder monárquico centralizado também era como já vimos de origem medieval Na contraprova temos os casos da Alemanha e da Itália que só nasceriam como Estados nacionais centrali zados no século XIX devido ao fracasso de suas tentativas no período medieval De maneira bastante ampla perigosamente generalizadora talvez possamos dizer que aquilo que não se fez na Idade Média não se poderia fazer na Idade Moderna Aquela gerava esta desenvolvia Tanto que superado o momento da transição e já dentro da Idade Moderna clássica séculos XVIIXVIII o chamado Antigo Regime é ainda essencialmente a Idade Média que encontramos Os três elementos que constituem o Antigo Regime monarquia absolutista sociedade estamental capitalismo comercial tinham fundas raízes nos séculos anteriores Mais uma vez a essência é medieval a roupagem moderna O rei vinha desde a Idade Média tendo seu caráter de soberano superando o de suserano o aspecto propriamente monárquico poder único sobrepujando o feudal contratual os vassalos tornandose súditos A crise geral do século XIV reforçara essa tendência ao desestabilizar a sociedade ao transferir para o Estado a responsabilidade pelo restabelecimento da ordem O rei ganhava poderes totais absolutos De outro lado a sociedade estamental moderna prolongava a medieval diferenciadose dela apenas pelo maior peso relativo do Terceiro Estado Por fim o assim chamado capitalismo comercial representava apenas uma intensificação das atividades mercantis medievais ampliadas no espaço América África na diversidade de bens produtos tropicais escravos negros e na parcela da população envolvida crescimento da burguesia Nos demais setores econômicos o quadro permaneceu ainda mais medieval tanto a agricultura técnicas métodos produtividade quanto o artesanato produtores independentes corporações de ofício não conheceram alterações expressivas em relação aos séculos anteriores Mesmo a articulação entre aqueles três elementos que caracteriza o todo histórico conhecido por Antigo Regime não era nova Cada vez mais a partir do século XIII tínhamos a realeza intervindo na economia o mercantilismo ainda que incompleto é produto do século XIV 52 308 Assim compensavase em parte o bloqueio que a sociedade estamental aristocrática suntuária pouco produtiva representava ao pleno desenvolvimento das atividades econômicas Para poder desempenhar esse papel a monarquia aproximavase da burguesia mas taxandoa e redistribuindo parte dessas riquezas à nobreza decadente como fiel da balança a realeza mantinha o equilíbrio entre os estamentos Em suma a mecânica do Antigo Regime já se encontrava esboçada em fins da Idade Média Como pensa Jacques Le Goff não seria absurdo estender os séculos medievais até as transformações estas sim novas modernas provocadas pela Revolução Francesa e pela Revolução Industrial LE GOFF 713 A herança medieval no século XX Se olharmos para o esqueleto e não apenas para a nova face e as novas roupagens do Ocidente no século XX outra vez encontraremos muito da Idade Média Ainda que popularmente pouco entendida e percebida ela está presente no cotidiano dos povos ocidentais mesmo daqueles que como nós na América não tiveram um período medieval E verdade que há tendência a se creditar muitas dessas características a outros momentos históricos Grécia clássica Modernidade mas isso se deve ao enraizamento do preconceito em relação à Idade Média Ainda agora na passagem do século XX ao XXI vivemos no Ocidente muito ligados à herança medieval O patrimônio lingüístico ocidental é quase todo medieval já que com exceção do basco idioma cujas origens continuam desconhecidas para os especialistas as demais línguas formaramse na Idade Média Uma terça parte da população mundial atual isto é 2 bilhões de pessoas pensa e se exprime com instrumentos lingüísticos forjados na Idade Média De fato ao lado do latim legado pela Antigüidade e durante a Idade Média empregado nos ofícios religiosos nas atividades intelectuais e na administração mas língua morta no sentido de não ser mais língua materna de ninguém no século VIII nasceram os idiomas chamados de vulgares falados cotidianamente por todos mesmo pelos clérigos Correndo o risco de simplificar em demasia um processo longo e complexo podemos dizer que aqueles idiomas se formaram da interpenetração em proporção diferente a cada caso do celta do latim e do germânico Nesse processo plurissecular o substrato celta tendeu ao longo dos séculos III aC e II dC a ser substituído pelo latim língua dos conquistadores romanos e sobretudo língua mais apropriada a manifestações mais sofisticadas do pensamento No entanto traços celtas participaram na formação do latim popular falado na época romana nos territórios das atuais Espanha França e Inglaterra Em regiões não ocupadas por Roma o celta permanece dominante Irlanda irlandês Escócia gaélico e Gales galês A chegada dos bárbaros germânicos não destituiu o latim da sua posição mas acelerou e redirecionou sua transformação naquilo que seriam os idiomas neolatinos francês provençal italiano castelhano catalão galego português A intensidade dessa influência dependeu do enraizamento anterior do latim em cada local De forma geral podese dizer que quanto mais ao norte dos territórios romanos maior seria o peso relativo exercido pelos dialetos germânicos Nas regiões de onde os germanos eram originários as línguas seguiram sua evolução natural pouco sentindo a ação do latim como se vê no alemão flamengo sueco dinamarquês norueguês Ainda assim mesmo antes de as tribos bárbaras germânicas terem penetrado em território romano adotaram termos latinos que designavam coisas desconhecidas ou pouco importantes em sua sociedade Por exemplo Kaufmann mercador no moderno alemão deriva de Kanfo no alemão medieval vindo do latim caupo taverneiro Um pouco mais ao sul a tribo dos francos por exemplo deu 520 palavras à futura língua francesa especialmente no campo da administração da guerra e da vida agrária Mais ainda ao sul os lombardos deram 280 palavras ao italiano então em formação Bem mais ao sul pegando o exemplo que mais diretamente nos concerne os visigodos deram à língua portuguesa 90 léxicos dentre eles agasalhar aleive bando banir bradar escanção escaramuça esgrimir espeto espia espora franco galope gastar luva orgulho roca roubar ufano etc Outra tribo germânica dos suevos forneceu muito poucos vocábulos caso de britar quebrar aparentado ao inglês to break Mas além do substrato latino e das contribuições celta por exemplo bizarro cama esquerdo modorra e germânica devese lembrar da importante participação vocabular árabe na constituição do português com cerca de 4000 palavras como alcaide aldeia algarismo almoxarife alqueire armazém arroba azeite azul cetim chafariz cifra fardo fatia garrafa marfim mesquinho recife sofá xarope e outras O caso do inglês é interessante por sua posição intermediária O latim pouco penetrara nas ilhas britânicas pois Irlanda e Escócia jamais foram integradas ao império e a Inglaterra foi conquistada tardiamente meados do século I aC ocupada apenas 100 anos depois e jamais de forma total Nesse contexto é fácil entender que a chegada dos anglo saxões tenha significado um aporte lingüístico germânico importante e que provocou grande recuo do latim e mesmo do celta A invasão dos vikings dinamarqueses reforçou essa situação fornecendo cerca de 900 palavras como to die morrer knife faca law lei to take pegar Assim nos séculos VIIIIX o inglês era uma língua puramente germânica que lembrava em diversos aspectos o alemão Uma reintrodução indireta do latim ocorreria no século XI quando a Inglaterra foi conquistada por um senhor feudal francês Guilherme da Normandia cujos homens falavam um dialeto neolatino aparentado ao francês que estava em pleno processo de formação Aliás até 1413 o francês foi o idioma oficial da corte inglesa Apesar desse trilingüismo latim na Igreja francês na corte anglosaxão nos campos e ruas a estrutura da língua inglesa continuou germânica mas o vocabulário recebeu muitas contribuições de fundo latino Surgiram dualidades vocabulares curiosas expressão da situação políticosocial O boi vivo única forma conhecida pelos camponeses continuou a ser designado em anglosaxão ox enquanto o boi como carne consumida pelos conquistadores recebeu uma palavra de origem francesa beef vindo de boeuf boi por sua vez derivada do latim bos O mesmo se deu com sheep carneiro vivo e mutton carne de carneiro vindo do francês mouton formado por sua vez do gaulês isto é celta local multo Os dominadores forneceram compreensivelmente muitos termos militares caso de castle de château do latim castellum e tower de tour do latim turris Em vários casos há no vocabulário inglês moderno duas palavras uma de origem latina e outra de origem germânica ambas com a mesma significação ainda que com o tempo a primeira viesse a ganhar um tom mais erudito mais literário e a segunda mais popular mais cotidiano E o caso a título de exemplo de liberty de liberté e esta de libertas freedom Esse processo fez com que a língua inglesa tenha cerca da metade de seu vocabulário proveniente do latim o que um conhecedor mais desavisado não percebe já que o inglês atual falado popular privilegia pelas razões históricas de sua formação as raízes germânicas Entretanto quanto mais formal mais erudito e mais tradicional for o inglês lido ou falado mais ele recorrerá ao seu amplo léxico de procedência latina Por isso a língua inglesa acabou por ter um vocabulário bem maior que o dos idiomas neolatinos O patrimônio político do Ocidente atual também é em boa parte medieval Diferentemente do que quase sempre se pensa a democracia ocidental c muito mais medieval que grega Esta era produto de pequenas cidadesEstado de reduzida população no exercício da cidadania o que permitia uma participação direta no processo político decisório Os Estados nacionais contemporâneos de área e população cidadã muito maiores baseiamse no esquema contratual e representativo nascido nas monarquias feudais Sabemos que o rei feudal tinha duplo caráter de soberano e de suserano O primeiro de origens antiqüíssimas atribuíalhe poderes sagrados imensos O segundo de origem germânica implicava uma relação bilateral com o rei estando subordinado ao direito consuetudinário do seu povo e com os vassalos tendo o direito de resistência no caso de ele desrespeitar aquela relação Um dos aspectos mais importantes das limitações contratuais dos poderes do rei feudal dizia respeito à cobrança de impostos Nenhuma taxa além das estabelecidas pela tradição poderia ser cobrada sem concordância dos vassalos Quando o contexto de fins do século XIII e de todo o século XIV gerou forte necessidade de recursos o rei viuse obrigado a criar assembléias representativas para nelas tentar obter consentimento para cobrar novos tributos E assim reforçouse o contratualismo político Sc de forma geral os séculos XVXVII com suas constantes guerras nacionais reforçaram o poder real resgatando seu caráter soberano passadas aquelas circunstâncias o contratualismo político ressurgiu com toda a força A resistência ao poder monárquico absolutista centralizouse nas assembléias representativas assim foi na Revolução Inglesa de 1688 e na Revolução Francesa de 1789 Desde então o poder do monarca e por extensão de seus substitutos nos regimes republicanos viuse limitado prevalecendo a idéia de que ele governa em nome do povo Portanto como é fácil identificar tratase da concepção dos bárbaros germânicos Influenciados por ela os juristas medievais ao recuperar e interpretar o Direito Romano a partir do século XII destacaram dele o princípio da época republicana de Roma segundo o qual o povo é a fonte da autoridade pública Em razão desse quadro João de Salisbury 11151180 depois de exaltar a figura do rei lembrava que matar um tirano é não só lícito como também um direito e um dever Por tudo isso países de fortes raízes germânicas puderam manterse monárquicos e altamente democráticos até hoje Dos 15 países que formam atualmente a União Européia quase a metade mais precisamente sete ainda são monarquias Inglaterra Holanda Bélgica Suécia Dinamarca Noruega Espanha Dos demais sete deixaram de ser monarquias apenas no século XX Como contraprova do caráter monárquico e democrático dos países germânicos temos os países de acentuada formação latina e menos intensa feudalização cuja interpretação medieval do Direito Romano baseavase no princípio da época imperial de Roma de o desejo do príncipe tem força de lei Entendese assim o terreno por longo tempo favorável ao autoritarismo e que no século XX desembocou no fascismo no salazarismo e no franquismo Um caso oriental esclarece mais a questão o Japão dos séculos XIVXV apresentava diversas semelhanças com o Ocidente feudal mas ali a monarquia não entrou no jogo das relações feudovassálicas Ou seja não se submeteu a uma política contratualista bilateral Assim o isolamento do imperador exclui a possibilidade do gênero de legado constitucionalista que o feudalismo europeu transmitiu ao Ocidente 76 149 E só após a derrota na Segunda Guerra Mundial o imperador japonês foi obrigado a negar seu caráter divino É interessante observar como a União Européia atualmente em processo de constituição baseiase conscientemente ou não no modelo da Cristandade medieval Isto é no reconhecimento de uma identidade européia profunda apesar das especificidades locais Tanto no século X quanto no século XX buscase uma harmonia entre o nacionalismo e o europeísmo Percebese que a unidade supranacional permitida por uma história e por valores culturais comuns pode fortalecer a Europa diante de outras sociedades sejam elas Bizâncio e o Islã na Idade Média os Estados Unidos e o Japão atualmente Significativamente a Comunidade Européia vê nas peregrinações medievais a Santiago de Compostela um primeiro ensaio daquilo que ela própria hoje deseja todos os europeus de diferentes idiomas e categorias sociais dirigindose a um mesmo objetivo O patrimônio de valores sociais também tem muito de medieval como podemos ver por dois exemplos propositadamente extremados O primeiro elemento central no Ocidente de hoje é o individualismo a valorização da pessoa em si independentemente de sua colocação nas hierarquias social política econômica e cultural Indivíduo que apesar de obviamente fazer parte de diversas coletividades família empresa clube Estado etc não se reduz a esses papéis mesmo neles mantém sua personalidade conserva os direitos pessoais reconhecidos pela sociedade O segundo exemplo de uma prática cotidiana é o cumprimento feito com a mão direita mesmo para os canhotos estendida apertando outra mão direita gesto tão mecânico tão automático que poucos percebem estar repetindo o gesto de paz social da época feudal quando ele demonstrava ao interlocutor a ausência de armas e assim a boa vontade no estabelecimento de uma relação sociável Fig 18 O individualismo Guidoriccio de Fogliano afresco pintado por Simone Martini em 1328 no Palazzo Pubblico de Siena A figura desse chefe militar sienês cavalgando sozinho em primeiro plano com cidades ao fundo talvez seja a primeira representação artística do individualismo indício da valorização daquele sentimento social Mapa 8 A Europa atual monárquica e republicana O patrimônio das práticas econômicas deriva muito dos fatores anteriores O crescente domínio sobre a natureza e a colocação dela a serviço do homem gerou uma postura de busca de riqueza que a partir do século XI foi caracterizando cada vez mais a civilização ocidental Tal visão materialista ao desvirtuar os princípios da sociedade cristã deu origem a reações tão diversas quanto a exaltação da pobreza São Francisco e da igualdade Marx De qualquer forma para uma ou outra dessas opções de vida o pressuposto é a existência de um livrearbítrio E este aliás que viabiliza a democracia vista como o único regime no qual se pode dar o exercício social da razão E significativo que a negação da democracia implique a negação da razão e a exaltação dos sentimentos e da violência para grandeza da pátria do chefe ou de um grupo social Para os fascistas italianos a solução dos problemas nacionais estava na aplicação do lema crer obedecer combater Para Hitler não é a inteligência que tirou a Alemanha da situação angustiosa em que se encontrava mas nossa fé Para Stalin a ditadura do proletariado é um poder revolucionário que se apóia na violência contra a burguesia Foi a mentalidade materialista justificada religiosamente que desde fins da Idade Média levou o Ocidente à conquista do mundo Tanto as Cruzadas contra os muçulmanos quanto a conquista da América aos indígenas tiveram caráter de guerra santa e de obtenção de riquezas No século XIX a colonização da África e da Ásia era considerada o fardo do homem branco ou seja o dever dos ocidentais de levar a civilização para povos inferiores Era o homem ocidental cumprindo seu destino histórico Para tanto ele sempre contou com a força das máquinas desde a Idade Média Central utilizadas mais do que em qualquer outra civilização este é um dos fatores determinantes da preponderância do hemisfério ocidental sobre o resto do mundo 57 9 O patrimônio intelectual de origem medieval é impressionante Dele fazem parte as universidades que até hoje preservam de suas origens no século XII a pedagogia aulas expositivas e debate de textos a concessão de título tese submetida a uma banca examinadora a concessão do direito de exercício profissional licentia docendi a estrutura administrativa reitor divisão em faculdades o auxílio aos membros necessitados concessão de bolsas aos estudantes carentes Também fazem parte desse patrimônio inúmeras técnicas intelectuais É o caso da minúscula carolina século VIII base da caligrafia moderna e dos caracteres de imprensa Dos algarismos arábicos século X precondição para a matemática moderna e assim para as demais ciências exatas Do livro bem mais manejável que os rolos de pergaminho da Antigüidade e provido de melhores meios de utilização como os índices século XII possibilitadores dos dicionários e enciclopédias Da contabilidade de partida dobrada isto é de débito e crédito criada em Gênova cm 1340 e difundida em 1494 com a obra de Luca Pacioli O patrimônio científico estreitamente associado ao anterior explica a superioridade tecnológica e econômica que o mundo ocidental ostenta crescentemente desde o século XII Na base está a visão racionalista do universo produto da concepção cristã de Deus Aceitando a existência de uma Unidade cosmológica o homem medieval via todas as coisas ligadas entre si Essa conexão que era percebida por meio de símbolos por todos os indivíduos independentemente de nível cultural passou desde o século XIII a ser estabelecida intelectualmente ao menos nos restritos círculos cultos Nestes procuravase harmonizar fontes à primeira vista antagônicas Foi o que ocorreu na literatura por exemplo com a cristianização de temas folclóricos como o do Graal Ou no Direito Canônico com a importante compilação de Graciano de meados do século XII como transparece no próprio nome da obra Concordantia Discordantium Canonum Ou na filosofia e teologia escolásticas em especial com Tomás de Aquino 12281274 Mais precisamente a visão racional de mundo vinha desde a Antigüidade com as tentativas de harmonização entre a filosofia grega e o cristianismo A religião cristã ao dessacralizar a natureza não mais vista como um conjunto de divindades traz em si certa atitude racionalista A regularidade dos fenômenos naturais estações cheiasvazantes dianoite ciclos de gestação etc faz deles janelas de acesso ao divino O homem feito à imagem e semelhança de Deus identificase com a natureza também ela imagem do Criador Daí porque São Francisco dizia ser irmão dos animais das plantas dos astros O texto bíblico ao falar que a realidade invisível de Deus tornouse inteligível desde a criação do mundo através das criaturas Romanos 120 permite o exercício da razão filosófica como uma revelação natural da Divindade Divindade essa que é participante criadora ao contrário do Demiurgo de Platão que apenas modela o mundo com a matéria preexistente e ao contrário do Princípio Primeiro de Aristóteles transcendente mas também imanente ao universo que é eterno Assim o Deus cristão é racional e cognoscível Entendese dessa forma por que o mundo muçulmano medieval apesar de ter conhecido profundamente a filosofia e a ciência gregas não desenvolveu uma postura racionalista e cientificista como o Ocidente cristão Francis Oakley chamou a atenção com razão para o fato de que no islamismo há uma imensa carga religiosa com o Corão comparativamente ocupando nele quase o lugar que a figura de Cristo ocupa no cristianismo Daí o texto sagrado muçulmano não ser submetível a uma análise filosófica Caso o Novo Testamento tivesse para a sociedade cristã o mesmo significado que o Corão para a sociedade islâmica é pouco provável por exemplo que o Direito Romano viesse a ter no mundo ocidental o papel que teve Mais ainda é pouco provável que tivesse podido se produzir o encontro decisivo entre o pensamento filosófico grego e o ensinamento bíblico que tanto contribuiu para dar forma à tradição do Ocidente 76 182183 Foi graças a esse encontro que Tomás de Aquino pôde aceitar em Deus a primazia da razão sobre a vontade vendo na Criação não apenas uma manifestação da liberdade e da onipotência divinas mas sobretudo um ato racional Por isso todas as coisas criadas participam da ordem inteligível do universo Por isso o homem tem livrearbítrio capacidade para forjar seu destino de acordo com o valor possuído o esforço despendido e o respeito dedicado às leis universais Enquanto as civilizações asiáticas tão desenvolvidas em vários aspectos concebem Deus como um ser arbitrário e irracional de cuja conduta não se podem extrair princípios gerais o Ocidente aceita a possibilidade de encontrar Deus através da sua Criação Observar e questionar a natureza é um exercício religioso e intelectual gerador de um racionalismo medieval anterior mesmo à redescoberta de Aristóteles no século XII Fig 19 O Criador geômetra iluminura da chamada Bíblia de São Luís atualmente na catedral de Toledo E muito significativo que no século XIII tenham surgido representações da Criação nas quais Deus trabalha cientificamente com um compasso nas mãos demonstrando que Nele prevalece a Razão sobre a Vontade ou o Poder Por este motivo a natureza é mãe da geometria fabricante de círculos esferas hexágonos espirais perfeitos em astros flores colméias Por isso a natureza diríamos hoje segue as leis da busca pela máxima eficiência isto é busca os melhores resultados com o menor dispêndio possível de energia Em razão disso a partir da Idade Média Central não se praticou um racionalismo apenas teórico como também se começou a perceber a necessidade da experimentação Em fins do século XIII o franciscano Roger Bacon professor nas universidades de Paris e Oxford criticava a excessiva subserviência de alguns contemporâneos seus a Aristóteles e propunha enriquecer o racionalismo com o empirismo Ah se os homens procurassem estudar o mundo ao seu redor em vez de mergulhar nos trabalhos da Antigüidade a ciência ultrapassaria as maravilhas da arte mágica Poderiam ser construídas máquinas por meio das quais os maiores navios com um único homem a dirigilos vogariam mais rápido do que se estivessem cheios de remadores poderiam ser construídos carros capazes de correr com incrível velocidade e sem auxílio de animais máquinas voadoras poderiam ser fabricadas máquinas tornariam possível ir ao fundo dos rios e dos mares Em suma a cientificidade observação matematização experimentação conceituação resulta segundo Alexandre Kojève do único dogma cristão que é exclusivo dessa religião a Encarnação Especificidade reconhecida por Santo Agostinho uma das maiores autoridades medievais ao ver na obra de Platão toda a doutrina cristã menos a Encarnação A riqueza científica dessa idéia está no fato de representar o ponto de encontro homemDeus particulargeral empíricoabstrato históricoeterno A essa constatação fundamental de Kojève poderseia acrescentar que a modalidade ocidental de cristianismo deve ser levada em conta os cristãos bizantinos mais inclinados ao misticismo e à contemplação da Encarnação do que à observação objetiva dela não tiraram desse conceito todas as suas implicações científicas O patrimônio psicológico ocidental também deve muito à Idade Média E do século V com Santo Agostinho o conceito de um tempo pessoal íntimo de ritmo variável conforme as emoções sentidas pelo indivíduo em determinadas circunstâncias da vida E do século VI o conceito de tempo irreversível contabilizado pelo número de anos que se seguem ao nascimento de Cristo É do século XII o conceito de amor enquanto relação igualitária física e espiritual entre duas pessoas É do século XIII com a confissão individual e renovável corolário de uma longa formação anterior o estabelecimento da prática cotidiana da interiorização da autoanálise verdadeira préhistória da psicanálise Não há contradição no fato de esta técnica ter sido formulada por um judeu Sigmund Freud 18561939 pois se tratava de um grande conhecedor da Bíblia inclusive do Novo Testamento e enquanto cientista do mundo ocidental de alguém inconscientemente embebido naquele comportamento introspectivo vindo da Idade Média O patrimônio imaginário também é tributário da Idade Média com a memória coletiva adaptando os dados medievais aos momentos de sua manifestação No século XIII as cores do esquema trifuncional dos indo europeus branco preto vermelho foram substituídas na preferência ocidental pelo azul a mais usada até hoje e a cor oficial da União Européia Em diversas manifestações culturais encontramos elementos medievais tão incorporados à nossa cultura atual que nem sequer lembramos que são de inspiração medieval No entanto em certos momen tos e certas obras essa influência é fácil de ser percebida Tal é o caso na literatura de Argila e cinzas Oldenbourg 1946 0 senhor dos anéis Tolkien 19541956 Os reis malditos Druon 1955 1957 A obra em negro Yourcenar 1968 A pedra do reino Suassuna 1971 0 quarto das senhoras Bourin 1979 O nome da rosa Eco 1980 As brumas de Avalon Bradley 1982 Tal é o caso no cinema de O sétimo selo Bergman 1956 Vikings os conquistadores Cardiff 1958 Camelot Logan 1967 Perceval o galês Rohmer 1978 Excalibur Boorman 1981 O incrível exército de Brancaleone Monicelli 1985 Feitiço de Aquila Donner 1985 Em nome de Deus Donner 1988 Rob Roy a saga de uma paixão Caton 1994 Coração valente Gibson 1995 Tal é o caso nas histórias em quadrinhos de Hagar o horrível Browne 1973 ss Outras vezes a influência medieval é menos evidente mas não menos verdadeira E o que vemos na escultura de Auguste Rodin 18401917 na pintura impressionista de Paul Cézanne 18391906 e Paul Gauguin 18481903 na expressionista de Max Beckmann 18841950 e James Ensor 18601949 Na literatura é o que mostra O Golem Meyrink 1915 Viagem a São Saruê Santos 1947 Crônicas marcianas Bradbury 1951 Grande sertão veredas Guimarães Rosa 1956 No cinema A ameaça veio do espaço Arnold 1953 A noite do lobisomem Fisher 1961 2001 uma odisséia no espaço Kubrick 1968 O fantasma do Paraíso DePalma 1974 Guerra nas estrelas Lucas 1977 Os caçadores da arca perdida Spielberg 1981 O padre Bird 1994 Highlander3 O feiticeiro Morahan 1994 O patrimônio míticoutópico do Ocidente está igualmente ancorado na Idade Média Ontem e hoje sonhamos e lutamos pelas mesmas coisas apesar de elas terem assumido formas historicamente diferentes A abundância está presente nas quimeras das Cruzadas do Graal do colonialismo medieval e moderno do dirigismo estatal do mercado livre A justiça social legitima as esperanças depositadas no Milênio no Império de Preste João na democracia no socialismo no anarquismo em chefes messiânicos de direita Frederico II ou Hitler ou de esquerda Tanchelm de Antuérpia ou Lênin A liberdade gera uma forte tradição revolucionária presente na revolta dos servos de Orly em 12501251 na Jacquerie de 1358 na rebelião dos camponeses ingleses de 1381 na Revolução Francesa na Revolução Bolchevista no movimento estudantil de maio de 1968 A juventude é sempre tão desejada que se imagina encontrála em fontes sagradas em ritos mágicos em elixires alquímicos em pomadas e pílulas milagrosas em cirurgias plásticas A ociosidade é procurada nos saques no trabalho compulsório dos outros na mecanização no descanso remunerado na redução da jornada de trabalho Sob roupagens cristãs ou agnósticas o Paraíso continua a grande matriz utópica ocidental 54 113 139 A herança medieval no Brasil Mesmo no Brasil que vivia na PréHistória enquanto a Europa estava na chamada Idade Média muitos elementos medievais continuam presentes A colonização portuguesa introduziu práticas que apesar de já então superadas na metrópole foram aqui aplicadas com vigor inaugurando o clima de arcaísmo que marca muitos séculos e muitos aspectos da história brasileira Luís Weckmann detectou com pertinência a existência de uma herança medieval no Brasil porém limitou sua presença apenas até o século XVII E na realidade ela continua viva ainda hoje nos nossos traços essenciais Os dois elementos culturais que enquadram a consciência de nacionalidade são de origem medieval O nome de nosso país vem da ilha afortunada OBrazil identificada nos séculos XIVXV com as Canárias antes de sêlo com a América A tradicional associação da terra descoberta por Cabral com a madeira tintorial aí encontrada o paubrasil desconsidera que a própria madeira tirara seu nome da mítica ilha medieval O idioma obviamente c aquele introduzido e imposto pelos colonizadores idioma que como todos os do mundo ocidental nascera na Idade Média Na vida política a duplicidade de um poder central teoricamente forte e a realidade dos poderes locais atuantes permanece O ponto de partida que deixou fundas raízes foi o sistema de capitanias Isto é o sistema usado pelas comunas italianas medievais nas suas colônias do Oriente Médio e das ilhas mediterrâneas mais especificamente por Gênova que nos séculos XIVXV mantinha estreitas relações com Portugal As primeiras capitanias portuguesas nas Ilhas Canárias foram entregues em 1370 a um capitão genovês O funcionamento do sistema foi o mesmo na Idade Média e nos séculos XVIXVII cada donatário tinha o usufruto das terras e nelas poderes regalianos como arrecadar impostos aplicar justiça convocar milícias Intermediária privilegiada entre o poder monárquico e os colonos a figura do donatário gerou no Brasil o personalismo típico das relações medievais responsável pela fraqueza das instituições políticas brasileiras dos séculos seguintes Na vida social por muito tempo e ainda hoje em certas regiões prevaleceu a família patriarcal que dificulta a transformação do indivíduo em cidadão dos interesses particulares em interesses gerais e por conseqüência a consolidação do Estado O patriarca termo correspondente lingüística e funcionalmente ao senior o mais velho feudal constituía em suas amplas terras uma espécie de microEstado que produzia quase todo o necessário para a vida de sua população O patriarca detinha ali poder de vida e morte sobre seus familiares Dependentes das riquezas e da proteção fornecidas pelo patriarca os demais habitantes daquela terra também estavam submetidos ao seu poder Essa organização colonial e imperial transferiuse para a República por longo tempo dominada por aquelas aristocracias regionais Mesmo a democratização recente do país não eliminou ainda o clientelismo e seu pressuposto a prática do dando é que se recebe No plano jurídico as normas formalmente derivadas do Direito Romano não escondem a força de um direito consuetudinário informal paralelo de um conjunto de ilegalidades socialmente aceitas Estas quase sempre são praticadas em detrimento do Estado cotidianamente assaltado nas suas prerrogativas muitas vezes por dentro por parte de altos funcionários e dos próprios governantes Como na época feudal o Estado brasileiro não é uma coisa pública res publica é propriedade dos mais fortes e espertos Ao longo de nossa história pouco se distinguiram as noções de público e privado da mesma forma que ocorria na sociedade feudal na qual tudo é privado e ao mesmo tempo tudo se torna público 45 1925 No plano econômico a situação brasileira fundamentalmente agrária até meados do século XX denuncia o passado medieval transplantado pelos portugueses e prolongado pelo sistema colonial mercantilista e pelo neocolonialismo industrial Da mesma forma que o sistema de valores medieval exaltava a aventura do cavaleiro andante o destemor religioso do cruzado o espírito de risco do mercador que partia para locais distantes por muito se desprezou no Brasil o trabalho cotidiano e rotineiro A ocupação do solo e a exploração das riquezas naturais deram se no Brasil modernoc contemporâneo de forma predatória semelhante à praticada na Europa medieval Associada ao caráter agrário da sociedade a urbanização européia fora fraca até o século XI a brasileira até fins do século XIX No plano cultural apesar da globalização neste início de milênio alguns elementos medievais ainda são visíveis Artur e Carlos Magno estão presentes com freqüência na literatura nordestina de cordel cujo espírito temática transmissão e recepção essencialmente orais prolongam a poesia européia da Idade Média no Brasil do século XX Mesmo certas criações eruditas do Nordeste como os textos de Ariano Suassuna e as músicas de Elomar bebem fundamentalmente de fontes medievais O calendário brasileiro atual tem 14 feriados oficiais dos quais 11 são de origem medieval Festas como o Carnaval no Rio de Janeiro e no Nordeste o Bumbameuboi em São Luís do Maranhão a Procissão do Círio em Belém do Pará têm inegáveis raízes medievais A religiosidade nacional sincrética exacerbada informal traz em si diversos traços medievais as irmandades o culto a santos não canonizados caso de Padinho o padre Cícero a visão mágica de sacramentos roubar hóstias consagradas para fazer amuletos foi comum na Europa medieval e no Brasil colonial o sentimento messiânico milenarista como mostram o sebastianismo Canudos certos eventos políticos recentes várias superstições espelho quebrado saliva cura e mata pé direito etc O processo de formação do catolicismo brasileiro também lembra o fenômeno na Idade Média Nesta ocorreu uma cristianização do paganismo e uma paganização do cristianismo no Brasil uma cristianização do culto africano e uma africanização do cristianismo A sensibilidade coletiva brasileira é de forte instabilidade emocional oscilando do pessimismo mais negro ao otimismo mais eufórico semelhante ao constatado por Marc Bloch na Europa feudal 30 9497 Bibliografia básica 36 40 54 59 64 65 70 74 89 97 Bibliografia complementar M D CHENU Lèveil de la conscience dans la civilisation médiévale MontrealParis Institui détudes médiévales Vrin 1969 C G CRUMP e E F JACOB El legado de Ia Edad Media Madri Pégaso 1944 J LE GOFF Pour un long Moyen Áge em IDEM Limaginaire médiéval Paris Gallimard 1985 pp 713 A KOJÈVE Lorigine chrétienne de la science moderne em Mélanges offerts à Alexandre Koyré Paris Hermann 1964 vol II pp 295306 L WECKMANN La herencia medieval del Brasil México Fondo de Cultura Económica 1993 RESENHA No livro A Idade Média Nascimento do Ocidente do historiador medievalista brasileiro Hilário Franco Júnior analisa o período medieval por estruturas no qual discute política cultura economia entre outros aspectos que caracterizam a sociedade ocidental da Idade Média Nos atentaremos ao primeiro capítulo cujo o título As estruturas demográficas que por uma perspectiva cronológica apresenta o processo de oscilação na extensão demográfica medieval especificamente o período da Idade Média Central Alta Idade Média e Baixa Idade central Ou capitulo destacado o nove sobre O significado da Idade Média Diante a retratação da Primeira Idade Média que foi marcada por esvaziamento pelo ponto de vista demográfico das áreas urbanas que alguns fatores permitiram esse acontecimento como a fome e as doenças O autor destaca esse período como um prolongamento da situação do Império Romano cujo população conhecerá um claro recuo desde o século II FRANCO JÚNIOR 2001 p 1 Apesar que não faz referência de maneira direta ao declínio do Império Romano sabemos que assim como ele coloca nesse capítulo foi um período marcado pela desorganização do aparelho romano Essa desorganização contribuiu para o esvaziamento urbano e a crise populacional assim como pela falta de alimentos de alimentos que com a queda do comércio a importação dos alimentos ficando difícil não conseguia sustentar a população urbana Em consequência disso mesmo com a produção do que necessitasse a colheita que não tivesse sucesso seria um grande motivo para que a taxa de moralidade aumentasse Ao tentar inverter o declínio demográfico da região o imperador buscou alternativas tais como a proibição de meninas para o clero ou limitavam um período para que a viúvas tornassem a casar bem como como a vinda de germanos para território tomando mas que estes não surtiram efeitos Além da falta de alimentos as doenças como a malária e a varíola causaram epidemias que causaram impacto na população e o recuo demográfico Entretanto Franco Júnior 2001 aponta que possivelmente houve uma retomada demográfica na metade do século VIII e que esse fato possa ter ligação com os Carolíngios apesar que a desigualdade continuava seguidos pela fome e morte Por conseguinte a fim de controlar a taxa de natalidade e as condições existentes as práticas de controle bruscas continuava como o infanticídio sobretudo de crianças do sexo feminino No entanto o texto ressalva que essa esses sacrifícios eram menos praticados em grandes propriedades agrícolas Entre outros problemas para a recuperação demográfica da Alta Idade Média teve relação com as invasões contudo apesar das fontes que liga uma pequena recuperação demográfica pelos Carolíngios o autor apresenta cinco indícios O primeiro marcado pela migração que foi imposta pela agricultura e guerra Essa migrações são divididas em 4 tipos 1 migrações habituais deslocamento 2 migrações coloniais comércio 3 migrações extraordinárias êxodo de mouros e judeus 4 migração sem instalação errantes e peregrino No segundo indício entre os séculos VIII e XII a recuperação se deu pelo arroteamentos aumentando os terrenos para cultivação fundação de novas aldeias e a subida de preços das terras e do trigo Ao que o texto apresenta outro fator importante para o crescimento demográfico especificamente nas áreas urbanas foi a religiosidade equivalendo ao ter sido indício o que realmente faz sentido quando concordamos quanto a arquitetura religiosa na transição da estética românica para a gótica É nítido no texto as colocações sobre as limitações dos dados demográficos medievais mas assim como a construções de igrejas urbanas com uma planta extensa já que por ser uma região cristãs acomodava muitos peregrinos o que resulta também no crescimento demográfico Portanto para demonstrar esse crescimento demográfico da Idade Média Central o autor utiliza de tabelas e mapas Nesse mesmo período a redução das epidemias já tinha reduzido e as guerras menos frequentes o que favoreciam a redução da mortalidade A mudança de clima quarto indício também foi fator que favoreceu a expansão demográfica uma vez que mais quente e soco além de facilitar a agricultura também ajudou a reduzir a propagação da peste Por último as inovações das técnicas agrícolas o último indício poderia ter facilitado o crescimento populacional ou contrário IDIB 2001 Mas ao que é relevante é que esse inovações facilitaram o aumento da produção de alimentos bem como a sua qualidade As práticas que favoreceu a Alta Idade Média como a exploração das áreas florestais para a produção agrícola e consequentemente o crescimento populacional ao que até então foi uma solução para os problemas da população no período medieval passou a ser um problema quando na Baixa Idade Média a fertilidade das terras são comprometidas as alterações climáticas que antes foi uma solução para a agricultura e comércio voltou a ser um problema elevando o preço dos alimentos Por consequência a fome ressurge e as epidemias tornaramse para a sociedade De acordo com Franco Júnior 2001 foi apenas uma crise demográfica da Baixa Idade Média teve com seu pior momento com o ressurgimento da peste então chamada peste negra que se manifestava como a bubônica e pneumonia As migrações que está entre os indícios da expansão demográfica tornou um problema nesse período quando facilitou a propagação da peste negra em toda a Europa Na contemporaneidade sabemos o quanto é fatal uma pandemia que entre pobres e ricos não escolhia quem iria afetar e que a única diferença está na exposição o texto relata que a peste negra foi um dos maiores catástrofes da história ocidental Por fim nas estruturas demográficas o autor apresenta a partir de fontes não tão certas quais fatores favoreceram para aumento demográfico assim como para o recuo que chegaram a ser como resposto do que antes era a salvação passou a ser problemas maiores como a peste negra No capítulo nove O significado da Idade Média apresenta uma visão contemporânea sobre essa época refletindo a influência da Idade Média no crescimento da civilização cristã e na sociedade como o todo Assim como relação entre o Medieval e a Modernidade No texto o autor coloca uma frase de um testemunho do século XV em que exalta a Modernidade cheia de esperança mas que crítica ao enfatizar que apesar da rápida transição na sociedade a época era a mesma IDIB 2001 Para isso ressalta os quatro movimentos que marcaram a Modernidade Renascimento Protestantismo Descobrimentos e Centralização O Renascimento entre os séculos XVXVI se aproxima a Idade Média por seus modelos clássicos e influenciados pela cultura da Antiguidade O Protestantismo resultante de um movimento que antecede a Idade Média mas que se concretiza no Modernismo foi uma grande crítica ao catolicismo Enquanto os Descobrimentos também teve influência quando utilizava em suas técnicas náuticas bases medievais Por sua vez A Centralização Política que pela ideia centralizada do poder monárquico também de origem medieval Dessa maneira possamos dizer que aquilo que não se fez na Idade Média não se poderia fazer na Idade Moderna Aquela gerava está desenvolvia FRANCO JUNIOR 2001 p 21 O Antigo Regime e a crise no século XIV reforçava a Centralização do poder ao monarca enquanto a sociedade estamental moderna prolongava o período medieval A migração colonial citada no primeiro capítulo pelo autor nesse período ela se intensifica na América pela exploração escravização e crescimento da burguesia juntamente com a realeza intervindo diretamente na economia O autor portanto apresenta nesse capítulo alguns aspectos que estão na sociedade do século XX e para nós no século XIV essas mesmas características perpetuam A princípios discute a influência linguística ocidental que apesar das transformações do tempo são quase todas de origem medieval O que não se limita apenas a palavras ou suas variações também se enquadram os novos idiomas oriundo dos idiomas vulgares por exemplo Mas que sobretudo ao enraizamento do latim Ao exercício da cidadania e participação democrática o autor historiador enfatiza sua referência bem mais medieval do que grega É colocado outros fatores que também tiveram precedentes do período medieval O processo de colonização das Américas especificamente do Brasil por Portugal este que não teve Idade Média também teve influências trazidas por Portugal como a consciência de nacionalidade patriarcalismo que até hoje é uma catástrofe para o desenvolvimento da sociedade no Direito economia cultura religião Não colocado pelo autor acredito que poderíamos incluir a influência linguística uma vez que o Brasil é constituído pela diversidade como o todo e ainda influente pelo seu período de colonização Por fim entre esses dois capítulos podemos analisar pedidos marcantes do pedido medieval e toda sua influência até mesmo na Modernidade É claro as limitações para o medievalista visto que suas fontes são baseadas em evidências fragmentadas sobre a estrutura demográfica da Idade Media Mas que objetivo em apresentar sobre perspectivas medievais em busca do desenvolvimento tanto que suas heranças se mentem até a atualidade fornecendo como base para constituir a sociedade até mesmo para aquelas que são consideradas como um país que não teve Idade Média haja vista o Brasil