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Direito Internacional

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JACOB DOLINGER Universidade do Estado do Rio de Janeiro DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO Parte Especial DIREITO CIVIL INTERNACIONAL Volume II CONTRATOS E OBRIGAÇÕES NO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO RENOVAR Rio de Janeiro São Paulo Recife 2007 noldo Wald e Luiz Gastão Paes de Barros Leães aceitam a autonomia no âmbito das normas supletivas dispositivas rejeitandoa no campo das leis imperativas ou obrigatórias83 A Moderna Doutrina Brasileira 19862006 O professor João Grandino Rodas relatou em várias ocasiões no Brasil e no exterior a posição doutrinária brasileira em matéria de contratos84 deixando assinalado o entendimento sobre a posição contrária à autonomia na LICC85 Este ilustre jusinternacionalista brasileiro tem se batido em vários foros pela modernização de nosso direito internacional privado com sua pena de mestre por sua atuação quando Consultor Jurídico do Ministério das Relações Exteriores e depois de cumprido este honroso cargo ao continuar instando as autoridades competentes em Brasília e como chefe da delegação brasileira à CIDIP V quando defendeu e assinou em nome do Brasil a Convenção InterAmericana so 83 O Professor Osíris Rocha em seu Curso de Direito Internacional Privado p 141 diz laconicamente A referência à autonomia da vontade é uma impropriedade jurídica ainda que muito divulgada Agenor Pereira de Andrade Manual de Direito Internacional Privado p 267 manifestase a favor da autonomia da vontade excetuada a aplicação de uma lei que ofenda a ordem pública ou que envolve questões de fraude à lei brasileira ou de abuso de direito Gleno de Paiva em O Negócio Jurídico em Direito Internacional Privado p 24 aceita a escolha da lei a ser aplicada desde que não seja uma escolha arbitrária sem ligação com o negócio jurídico e com as ressalvas da ordem pública e da norma imperativa 84 João Grandino Rodas Contratos Internacionais 3a ed pp 1965 especialmente pp 4363 e Choice of Law Rules and the Major Principles of Brazilian Private International Law Panorama of Brazilian Law de Dolinger e Rosenn pp 309347 especialmente pp 323331 Na primeira obra encontrase estudo de José Inácio Gonzaga Franceschini que adota posição radicalmente contrária a qualquer possibilidade de escolha de lei estrangeira em contrato firmado no Brasil Id pp 71 74 e 114 85 Em seu artigo no Panorama of Brazilian Law escreveu à p 320 Because of the absolute language of the caput of Article 9 of the present Law of Introduction one cannot say that the doctrine of freedom of choice exists as an indication of the applicable rule under Brazilian Private International Law The parties are left exclusively with the exercise of contractual liberty in the sphere of supplementary provisions of applicable law as determined by the lex loci contractus E na obra brasileira escreveu Perante o caput do art 9o da Lei de Introdução vigente não se pode afirmar a existência da autonomia da vontade para a indicação da norma aplicável no Direito Internacional Privado brasileiro 450 bre a Lei Aplicável aos Contratos Internacionais Foi sua a iniciativa que resultou no Projeto 490595 enviado pela Presidência da República ao Congresso Nacional visando a promulgação de uma Lei Geral de Aplicação das Normas Jurídicas contendo reforma de nosso direito intertemporal e de nosso direito internacional privado infelizmente retirado posteriormente do Congresso Assim escreve o Professor Grandino Rodas Dessa maneira poderseiam a final exorcizar o primitivismo e a inadequação de nossas regras de direito internacional privado e por via de consequência de suas regras obrigacionais que são incompatíveis com o fato de o Brasil ser o condottiere do processo integrativo regional buscar papel destacado no processo de integração hemisférico e estar entre as dez maiores economias do globo Em seguida faz uma advertência da mais alta importância Lembrese finalmente que o contratante estrangeiro ao sopesar o custo Brasil leva em conta também a certeza jurídica propiciada ou não pelas regras jurídicas internas relativas à contratação internacional Sendo tais regras obsoletas ou não possibilitando a necessária certeza a curva estatística representativa dos contratos internacionais entre os quais figuram os de exportação tenderá a declinar86 O ilustre Professor Luiz Olavo Baptista em obra dedicada aos contratos internacionais com a qual conquistou a cadeira de Direito do Comércio Internacional da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo expõe as diversas opiniões e as tendências jurisprudenciais de vários países sobre a questão de permitir ou não a autonomia da vontade e conclui Entretanto a indicação de lei estrangeira à do foro seria acolhida com reservas e provavelmente só será admissível nessa fase naquelas jurisdições fortemente apegadas à regra da autonomia da vontade O que não é o caso do Brasil por exemplo87 86 João Grandino Rodas Coord Contratos Internacionais 3a ed pp 634 87 Luiz Olavo Baptista Dos Contratos Internacionais Uma Visão Teórica e Prática p 52 451 Influenciados pelas preocupações da doutrina clássica com as normas imperativas e em certos casos indo além deste patamar continuando impressionados com a mudança ocorrida da redação do artigo 13 da Introdução de 1916 para o artigo 9º da Lei de Introdução de 194288 os modernos autores brasileiros vêm desempenhando nos últimos vinte anos um papel equivocado no plano teórico e prático indo contra tudo que se tem produzido no direito estrangeiro e no direito convencional prejudicando a imagem do nosso país no exterior nos mercados estrangeiros em matéria de contratação internacional desatentos às opiniões daqueles que mostraram como se pode e deve interpretar o artigo 9º e seus parágrafos da LICC de maneira favorável à escolha da lei aplicável pelas partes Certos autores partiram em busca de argumentos estranhos à disciplina contratual invocando aspectos que classificaram como pertencentes ao direito internacional público como o controle da exportação de produtos que possam ser utilizados para fins nucleares89 questão atinente à fase de execução do contrato submetido ao controle governamental mas sem qualquer reflexo no direito de as partes escolherem a lei aplicável aos aspectos privados de sua transação inclusive para definir a responsabilidade de um exportador que se tenha comprometido a exportar produtos cuja saída do país seja vedada pelas autoridades A escolha pelas partes de uma lei estrangeira numa hipótese desta natureza desde que aceita como válida submeterá o exportador à responsabilidade civil conforme definido na lei escolhida eis que a escolha da lei aplicável se dirige aos aspectos privados da transação O fato que poderão ocorrer acidentes no percurso disciplinados pelo direito público forçosamente submetidos à lei local em nada afeta a liberdade original de escolher a lei aplicável à parte privada da relação entre as partes É um tanto estranho que autores contemporâneos tenham simplesmente decidido que a autonomia da vontade para escolha de lei aplicável está vedada pelo artigo 9º da LICC não se dando sequer ao 88 José Maria Rossani Garcez Curso de Direito Internacional Privado p 188 escreve Assim tão logo seja esta Convenção referese à Convenção do México que foi firmada pelo Brasil ratificada internamente será modificado o critério desnecessariamente restritivo previsto no art 9º da LICC 89 Beat Walter Rechsteiner Direito Internacional Privado Teoria e Prática 6ª ed p 138 De lege ferenda o autor defende a ratificação da Convenção do México bem como a adoção na legislação interna da liberdade de escolha pelas partes da lei aplicável 452 trabalho de debater as razões expostas pela doutrina favorável à liberdade contratual de escolha principalmente encontrada na obra de Valladão90 91 90 Nadia de Araújo em vários trabalhos colocouse ardorosamente contra a possibilidade de se exercer no Brasil a autonomia da vontade escrevendo categoricamente No Brasil a regra de conexão utilizada para os contratos internacionais é a lex loci contractus na forma estabelecida pelo art 9º da Lei de Introdução ao Código Civil de cuja exegese não se extrai a permissão à teoria da autonomia da vontade antes consagrada na Introdução ao Código Civil de 1917 Contratos Internacionais e a Jurisprudência Brasileira Lei Aplicável Ordem Pública e Cláusula de eleição de foro in João Grandino Rodas coord Contratos Internacionais op cit pp 199 e 200 Em seguida diz a mesma autora A seguir cuidaremos da jurisprudência a respeito mas desde já adiantamos nossa conclusão a respeito do tema a discussão acerca da possibilidade de utilização da autonomia da vontade ocorreu poucas vezes e foi decidida sempre em prol da interpretação literal do art 9º ou seja pela sua não utilização Id pp 2012 Acontece que na cuidadosa pesquisa realizada pela autora na jurisprudência pátria por ela relatada no mesmo trabalho não se encontra um acórdão sequer em que uma cláusula de escolha de lei estrangeira em contrato firmado no Brasil tenha sido rejeitada por corte brasileira com fundamento no artigo 9º ou com qualquer outro fundamento o que aliás a autora reconhece mais adiante em seu trabalho ao dizer à p 212 pois os tribunais brasileiros não enfrentaram a questão diretamente Em outra obra Contratos Internacionais Autonomia da Vontade Mercosul e Convenções Internacionais escreve à ps 119 120 A jurisprudência pátria tem aplicado aos litígios envolvendo contratos internacionais nos poucos casos que pudemos colher a clássica regra de conexão do artigo 9º Por isso a questão sobre a permissão da autonomia da vontade através da interpretação do artigo 9º em conjunção com o antigo art 13 ou a tese de Valladão já esposada neste capítulo não tem sido levada em consideração pelos tribunais brasileiros Repito os tribunais brasileiros não tiveram oportunidade de discutir a questão da escolha de lei estrangeira em contrato firmado no Brasil e a exegese de Valladão lógica e teleologicamente sólidas não foi contraargumentada pela autora A reação à cuidadosa argumentação de Valladão pela nova geração de especialistas do direito internacional é realmente espantosa Escreve Lauro da Gama e Souza Autonomia da vontade nos contratos internacionais no Direito Internacional Privado brasileiro Uma leitura constitucional do artigo 9º da Lei de Introdução ao Código Civil em favor da liberdade de escolha do direito aplicável em Carmen Tiburcio e Luis Roberto Barroso Direito Internacional Contemporâneo Estudos em Homenagem ao Professor Jacob Dolinger p 608 o seguinte pareceme que os argumentos de Valladão não são irresponsíveis mormente à luz do contexto jurídico em que foi editada a LICC e tampouco oferecem a segurança jurídica de que necessitam os agentes do comércio internacional Com efeito num sistema marcado pelo fetichismo da lei parece difícil extrair da eloquente e deliberada omissão do legislador uma autorização para a escolha do 453 direito aplicável ao contrato internacional os destaques são do texto original Acontece que Valladão esclareceu perfeitamente que a liberdade individual não era o forte do regime ditatorial reinante quando o governo federal por meio do Poder Executivo baixava leis e regulamentos a seu belprazer e assim entenderam os ilustres juristas que prepararam o decretolei que aprovou a LICC camuflar ao máximo possível a liberdade contratual como aliás já acontecera com o código processual de 1939 cujo artigo 133 não previu o foro de eleição o foro do contrato admitido há mais de um século em nossos Códigos e Leis processuais como se lê no artigo publicado na Revista Forense já referido Estas omissões foram deliberadas sim mas por outro motivo como bem esclarecido por Valladão e certamente com o intuito de conseguir fazer com que o Ministro Francisco Campos encaminhasse o diploma para aprovação do imperial ditador da época Por outro lado Valladão esclarece muito bem que não havia necessidade de nova autorização do legislador para escolha da lei aplicável à vista do artigo 42 do Código Civil ao qual a LICC iria ser acoplada artigo este que dispunha que nos contratos escritos poderão os contraentes especificar domicílio onde se exercitem e cumpram os direitos e obrigações deles resultantes disposição que se casa com a idéia de escolha da lei aplicável Toda norma jurídica emanada de um poder ditatorial deve ser examinada e interpretada com cuidado mediante interpretação histórica lógica e teleológica sem preocupações com o fetichismo da lei que existia e se foi e se voltou se foi novamente para nunca voltar esperamos Observese que o novo código civil reproduziu no artigo 78 os exatos termos do artigo 42 do código de 1916 apenas substituindo o termo contraentes por contratantes A professora Claudia Lima Marques também segue a orientação contrária à autonomia ao escrever em A insuficiente proteção do consumidor nas normas de Direito Internacional Privado Da necessidade de uma convenção interamericana CIDIP sobre a lei aplicável a alguns contratos e relações de consumo in Marques e Araújo O novo direito internacional estudos em homenagem a Erik Jayme p 171 Em matéria contratual apesar dos esforços da doutrina as normas atuais praticamente impossibilitam a autonomia de vontade em matéria de contratos Outrossim à p181 afirma que a regra do artigo 9º da Convenção do México mandando aplicar a lei mais próxima tem dificultado a ratificação da convenção pelo Brasil atribuindo esta informação a Nadia de Araújo p 188 de sua obra sobre os Contratos Internacionais o que não parece constar no texto referido 91 O professor Hermes Marcelo Huck Contratos Internacionais de Financiamento A Lei Aplicável Revista de Direito Mercantil Industrial Econômico e Financeiro volume 53 p 86 referindose ao artigo 9º diz que o dispositivo claramente exclui a autonomia da vontade das partes contratantes para a escolha da lei aplicável ao contrato O sistema brasileiro parece não permitir alternativa a lei do contrato é a do local em que se constitui a obrigação E à p 87 afirma Entretanto a prática do contrato internacional no Brasil tem mostrado freqüentemente a adoção da cláusula de escolha de lei em flagrante oposição à determinação legal Esse direito vivo fruto da negociação das partes chocase com a disposição normativa Há nesse aspecto um conflito maior surgido entre o direito em ação e o Direito Positivo 454 Nadia de Araujo vai a ponto de dizer que como a LICC em seu artigo 9º não menciona o princípio da autonomia da vontade e embora muitos juristas sejam a favor o princípio é proibido92 Ora um prin O professor Fabio Konder Comparato O Repasse Bancário de Recursos Externos Revista de Direito Mercantil Industrial Econômico e Financeiro vol 76 p 52 oferece argumentação contra o entendimento de que o artigo 13 da anterior introdução teria sido revogado pela LICC mas conclui seu raciocínio centrado na hipótese de contrato realizado no exterior Já Luiz Antonio Soarez Hentz juiz paulista em curta nota sob título A lei aplicável e a norma de direito interno nas relações de Direito Internacional Privado A Convenção de Viena de 1980 Revista de Informação Legislativa vol 124 pp 756 depois de admitir que o princípio da autonomia da vontade teria sofrido certo abalo depois de 1942 quando o caput do art 13 da lei de 1917 não foi repetido e que a nova Lei de Introdução aparentemente retirou das partes contratantes o direito de dispor sobre a lei a regular as obrigações estipuladas acaba por referirse ao pronunciamento do Supremo Tribunal Federal no sentido de que princípios básicos de nosso direito não podem desaparecer por sua simples omissão num código ou numa lei e referese à interpretação que Haroldo Valladão deu ao artigo 9º na sua íntegra ou seja incluído o texto e o sentido de seu parágrafo 2º Em longa abrangente e cuidadosa dissertação de mestrado para o curso de pósgraduação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Fabiane Verçosa Figueiredo Azevedo Autonomia da Vontade nos contratos internacionais Eleição da Lei Aplicável no direito convencional e no direito internacional privado brasileiro em que cuidou do direito positivo do direito convencional da doutrina estrangeira e nacional anota nas suas conclusões à p 219 dentre os diversos posicionamentos doutrinários apresentados perfilhamonos ao entendimento do Prof Haroldo Valladão por considerálo o mais bem fundamentado e também por acreditarmos que para se suprimir um princípio basilar para o DIP como é o caso do princípio da autonomia da vontade a lei deveria fazêlo de forma expressa devido à sua imanência em nosso ordenamento jurídico A mera eliminação da expressão salvo estipulação em contrário não tem o condão de suprimirlo de nosso ordenamento jurídico 92 Nadia de Araujo Direito Internacional Privado Teoria e Prática Brasileira 2003 p 323 Acontece que em O Direito Internacional Privado e a Proteção da Pessoa Humana Evolução do Método Conflitual e a Observância dos Direitos Fundamentais Comitê Jurídico Interamericano XXVIII 2001 p 518 a mesma autora escreveu Aliás a autonomia da vontade nos contratos internacionais tem sido considerada nas palavras abalizadas de Ole Lando como um princípio geral do direito reconhecido pelos países civilizados mostrandose portanto o alinhamento do MERCOSUL às modernas tendências em vigor no resto do mundo acerca dos contratos internacionais Como o Brasil é um país civilizado e como ele tem se alinhado às iniciativas promovidas pelo Mercosul seria de esperar que a ilustre autora aceitasse que no Brasil como no resto do mundo civilizado a autonomia da vontade nos contratos internacionais deva ser tranquilamente admitida 455 cípio é um princípio e como tal está acima do direito positivo e de suas regras e ninguém tem autoridade para proibir um princípio baseado no silêncio da lei93 ou em qualquer outro fator Um princípio pode se esvair com o tempo devido a mudanças sociais eou políticas pode também ser superado total ou parcialmente por um princípio mais elevado mas jamais se deve falar em proibir um princípio A doutrina brasileira que se prende a uma leitura literal do artigo 9º da LICC comparao com a redação do artigo 13 da Introdução anterior e com base nestes fatores opina pela inexistência do direito dos contratantes de escolher a lei a ser aplicada em pacto internacional assinado no Brasil peca por uma falha de perspectiva fundamental de como funciona o direito internacional privado Já tivemos oportunidade de escrever Em nenhum campo do direito a Doutrina tem tanta desenvoltura como no DIP em razão da parcimônia do legislador Como escrevem autores franceses a Doutrina interpreta as decisões judiciais em matéria de direito internacional privado e com base nas mesmas elabora os princípios da matéria inversamente a Doutrina serve de orientação para os tribunais que muito mais do que nas outras áreas recorrem à lição dos doutrinadores para decidir questões de direito internacional privado Assim a Doutrina desempenha o duplo papel de intérprete da Jurisprudência e de sua guia e orientadora Daí o amplo campo de ação e a relevância da obra do jurisconsulto que tem liberdade para criar onde o legislador silenciou94 Portanto todos aqueles que estudam e se dedicam à nossa disciplina e sobre ela escrevem e publicam incorporandose à sociedade dos doutrinadores do DIP devem se conscientizar de sua responsabilidade de condutores e orientadores desta área do direito em nosso País e no caso presente se capacitar que o interesse de nossa economia de nossas relações comerciais internacionais de nosso prestígio e da confiabilidade de nossas empresas no plano internacional dependem em considerável medida de nos apresentarmos com abertura 93 Vide Jacob Dolinger Evolution of Principles for resolving conflicts of law in the fields of contracts and torts Recueil des Cours volume 283 pp 191512 em que estudo a relação entre princípios e regras principalmente no capítulo I 94 Jacob Dolinger Direito Internacional Privado Parte Geral capítulo V seção A Doutrina 8a ed p 66 Vide Andréas Lowenfeld Conflict of Laws English Style Review Essay AJCL 1989 pp 3534 456 para o cenário internacional admitindo claramente o direito dos contratantes brasileiros assinarem um pacto no Brasil em que determinam voluntariamente a aplicação de lei de outro sistema jurídico Acrescentese que como também tivemos ocasião de demonstrar as resoluções das entidades internacionais e as convenções aprovadas pelas organizações especializadas em matéria de direito internacional privado têm valor doutrinário de especial importância95 Invocamos as lições de Henri Batiffol e de Willis L M Reese líderes do DIP na França e nos Estados Unidos na segunda parte do século XX que estabeleceram a importância e a utilidade prática de convenções aprovadas mas ainda não ratificadas Também trouxemos a lição do embaixador e jusinternacionalista brasileiro Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva a respeito desta matéria96 É verdade que este eminente diplomata e jurista fala na perda de influência da convenção que permanece por longo tempo com número reduzido de ratificações hipótese em que se enquadra a Convenção do México sobre Lei Aplicável aos Contratos Internacionais mas por outro lado a Convenção da Haia sobre a Lei Aplicável às Vendas de Caráter Internacional de Objetos Móveis Corpóreos de 1955 a Convenção de Roma sobre a Lei Aplicável às Obrigações Internacionais de 1980 bem como a Convenção de Viena de 1980 sobre contratos de compra e venda internacional de mercadorias foram aprovadas por número substancial de países Temos de considerar que nosso comércio internacional é voltado principalmente para a Europa e para os Estados Unidos e que em ambos estes mercados tanto por força de leis internas como em decorrência de convenções internacionais a liberdade de escolha da lei aplicável é princípio consolidado cabendo portanto à doutrina brasileira proclamar alto e bom som que não será a lentidão burocrática em remeter ao Congresso para aprovação a Convenção do México por nós assinada nem o desinteresse do Legislativo em formular e aprovar uma nova lei sobre o direito internacional privado que irão manternos em posição diametralmente oposta a todo o mundo civilizado mormente quando a lei que temos de 1942 em seu artigo 9º combinado com seu segundo parágrafo faculta a autonomia da vontade como tão bem argumentado por aquele a quem o Brasil mais deve no campo da nossa disciplina A doutrina deve capacitarse de sua autori 95 Id pp 6667 96 Id 7073 457 dade afirmar sua total concordância e absoluto respeito pela autonomia da vontade no plano internacional e isto refletirá e expressará o autêntico direito internacional privado brasileiro dos contratos internacionais os tribunais brasileiros quando chamados a decidir seguirão a lição dos doutos e finalmente os consultores e advogados saberão orientar os agentes da economia brasileira nas suas relações com o mundo exterior Outrossim o direito brasileiro sempre admitiu a interpretação teleológica da lei e segundo esta é indubitável que considerada a realidade das relações jurídicas internacionais da atualidade considerado o panorama do direito internacional privado contemporâneo considerados os interesses da economia brasileira em crescente internacionalização que o artigo 9o da LICC não impõe qualquer óbice à escolha de outra lei que a lex contractus Existe ainda o princípio da continuidade das leis pelo qual não se considera revogada norma anterior se não expressamente revogada pela posterior e nada consta na LICC de 1942 que tenha modificado o contido na ICC de 1916 Por todas estas razões lamentamos o conselho dado pela ilustre doutrinadora no sentido de que As partes precisam ser cautelosas quando da redação de uma cláusula deste tipo no contrato internacional pois os tribunais brasileiros não enfrentaram a questão diretamente nem parecem ter abraçado as teses próautonomia defendidas mais recentemente na esteira das modificações da legislação no plano internacional Só quando a LICC for modificada ou for adotada a Convenção Interamericana sobre o Direito Aplicável aos Contratos Internacionais México 1994 a incorporação do princípio da autonomia da vontade ao direito brasileiro estará garantida 97 É verdade que os tribunais brasileiros não enfrentaram a questão mas isto porque nunca tiveram que enfrentála porque até hoje não se conhece um contrato firmado no Brasil contendo cláusula de aplicação de lei estrangeira que algum tribunal brasileiro tenha desrespeitado E por outro lado é sabido que nossos tribunais têm atuado com cuidadosa atenção para as manifestações doutrinárias principalmente no campo do direito internacional privado De maneira que cabe à 97 Nadia de Araujo Contratos Internacionais p 212 doutrina abordar a questão por um prisma universalista com a preocupação voltada para o interesse do Brasil no plano do comércio internacional Os tribunais saberão acompanhar uma doutrina inteligente coerente e ainda por cima patriótica Temos nos manifestado reiteradamente de maneira crítica sobre a situação reinante em matéria de contratos internacionais em nosso país Em conferência pronunciada em Congresso de Direito Internacional em Curitiba assim dissemosPerguntome se não haveria uma certa retração de negócios internacionais com o mercado brasileiro uma certa reserva quanto a determinados investimentos de longo prazo em nosso País diante de pareceres de advogados brasileiros corretamente cautelosos que informam a seus clientes estrangeiros que no Brasil não se deve assinar contratos que determinem a aplicação de lei estrangeira e que se assinados eventuais sentenças estrangeiras que tenham aplicado direito alienígena com base nestes contratos correm o risco de não ser homologados por nossa Suprema Corte A doutrina de jovens juristas estaria iludindo os advogados que por sua vez estariam desestimulando os clientes estrangeiros e a economia brasileira estaria sendo prejudicada Nada há de errado de pecaminoso de contrário aos interesses nacionais na submissão à lei estrangeira assim como nossos tribunais admitem a submissão à jurisdição estrangeira 98 98 Jacob Dolinger Da Dignidade da Diferença ao Moderno Direito Internacional Privado Revista Forense volume 373 p118 Em janeiro de 2004 a Valor publicou artigo intitulado A lei aplicável às operações bancárias internacionais do advogado paulista Eduardo Salomão Neto em que discorre sobre esta questão discutindo o sentido do artigo 9o e seu segundo parágrafo dizendo o seguinte Seriam tais regras cogentes ou afastáveis por acordo das partes A despeito de respeitáveis opiniões em contrário e reconhecendo incerteza no assunto devido à escassez de jurisprudência parecenos que o conservadorismo e a pouca exposição internacional do Judiciário brasileiro tenderão a recusar a possibilidade de escolha de lei aplicável E o ilustre e experiente advogado foi mais longe e assim escreveu A eventual assinatura da documentação no Brasil não interferirá com a aplicabilidade da lei estrangeira escolhida por tribunais estrangeiros que aceitem a autonomia da vontade Entretanto isso pouco conforto significará se for necessário finalmente homologar a decisão do tribunal estrangeiro no Brasil para cobrança executiva do devedor Em tal caso poderia a homologação ser negada com base em tese de que a ordem pública ou soberania brasileiras foram ofendidas em virtude do julgamento da causa segundo lei contrária às regras de direito internacional privado locais Esta é uma advertência que reflete lamentável mas clarividentemente a posição de considerável parte senão a maioria dos membros do nosso judiciário Em 2003 os então mestrandos Bruna Garcia Benevides Izabel de Albuquerque Pereira Suzana Medeiros Eduardo Klausner e Carolina Martins de Oliveira da Faculdade de Direito da UERJ realizaram uma pesquisa junto a advogados e magistrados no Rio de Janeiro sobre esta matéria tendo ouvido de alguns considerações no sentido de que a falta de liberdade para escolha da lei aplicável em contratos internacionais realizados no Brasil se constitui em um problema para o comércio exterior brasileiro Das conclusões destes mestrandos retiro o seguinte trecho A maior parte dos advogados entrevistados entendeu ser possível a escolha de lei estrangeira nos contratos internacionais celebrados no Brasil e registrou que essa escolha é feita normalmente de maneira expressa Alguns advogados entrevistados demonstraram preocupação com a regra contida no art 9o da LICC A caracterização do local da constituição do contrato e da figura do proponente nem sempre é fácil As negociações se dão em sua maior parte por email fax e conference call Apenas as grandes operações demandam reuniões com a presença física das partes A escolha da lei aplicável muitas vezes está atrelada à escolha do foro As leisforos normalmente escolhidos são NY e Londres Apesar da maioria dos advogados entender que não ocorre retração do comércio internacional em virtude da atual redação do art 9o da LICC quase todos os entrevistados reconheceram que seria desejável uma norma expressa no direito brasileiro contemplando a autonomia da vontade na escolha da lei aplicável aos contratos internacionais pois traria maior segurança jurídica Importa ouvir as manifestações de alguns advogados mais pessimistas ou talvez mais realistas Um dos advogados ressaltou que as incertezas em relação à aceitação do princípio da autonomia da vontade nos contratos internacionais traz uma insegurança jurídica aos negócios e que portanto sua aceitação por legislação expressa seria uma adequação à tendência internacional e uma eliminação dos entraves e barreiras ao aumento do fluxo do comércio internacional o que traria benefícios ao empresariado nacional que já é suficientemente maduro para negociar em condições vantajosas para o Brasil sem que seja preciso a intervenção estatal Outro advogado membro de um dos mais tradicionais escritórios de advocacia no Brasil atuando na área internacional assim se expressou Entendo ser possível a inclusão de cláusula elegendo a lei aplicável em um contrato internacional mas as partes devem estar cientes de que caso o contrato seja celebrado entre presentes e executado no Brasil a lei estipulada seja a estrangeira e este contrato seja levado ao judiciário brasileiro este terá plenas razões para desconsiderar a referida cláusula de lei aplicável se fizer parte da corrente contrária à autonomia da vontade O então mestrando Eduardo Klausner membro da magistratura do Estado do Rio de Janeiro entrevistou alguns desembargadores do Tribunal de Justiça relatando o seguinte Cinco desembargadores consagraram o princípio da autonomia da vontade desde que não haja abuso da parte economicamente mais forte Desses dois dos A mais recente manifestação doutrinária neste tema é a de Lauro da Gama e Souza que advoga a autonomia da vontade nos contratos internacionais com fundamento constitucional99 A interpretação do artigo 9º da LICC no sentido de restringir a liberdade das partes escolherem o sistema jurídico ao qual desejam se submeter representaria afronta ao princípio fundamental da autonomia privada assegurada pela Constituição brasileira no artigo 5º II de que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei O argumento é bemvindo desde que se entenda que não se trata de uma novidade da Constituição de 1988 pois que o dispositivo está presente em todas as Cartas brasileiras desde a de 1824 excetuada naturalmente a de 1937 daí a explanação de Valladão de que foi justamente devido a esta que se teve de camuflar o direito de escolha que sempre esteve presente no direito constitucional brasileiro e conseqüentemente em todo o sistema jurídico nacional inclusive no direito internacional privado100 Uma cabal demonstração de que a tese constitucional estava ínsita na escola de Valladão encontrase nas palavras de seu discípulo assistente colega e sucessor na cátedra da Universidade Federal do Rio de Janeiro Professor Agustinho Fernandes Dias da Silva acima reproduzidas ao dizer clara e expressamente que o princípio nesta matéria é de que tudo que não for expressamente proibido às pessoas lhes é permitido salvo a fraude à lei Não há nenhuma norma proibindo a escolha da lei competente e segundo a Constituição ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei O ilustre professor publicou estas palavras dez anos antes da promulgação da Constituição de 1988 entrevistados fazem ressalva ao artigo 9º da LICC pois entendem que impede a autonomia da vontade caso a lide seja julgada pelo Judiciário brasileiro embora admitam a escolha da lei pelas partes em caso de solução do conflito pela via da arbitragem 99 No estudo já acima referido às pp 6123 6167 620 e ss e também na rica tese com a qual conquistou o doutorado em direito internacional pela Universidade de São Paulo Contratos Internacionais à luz dos Princípios do UNIDROIT 2004 Renovar RJ 2006 pp 436 e 438 100 Assim o autor que considera que os argumentos de Valladão não são irrespondíveis vide nota 90 supra acaba fortalecendo a argumentação daquele ilustre mestre de nosso direito internacional privado 461