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Capitalismo acadêmico As tábuas do palco representam o mundo1 Primeiro gostaria de dizer o seguinte a Sílvia me pediu um título e eu chutei capitalismo acadêmico mas não eu não tenho a menor ideia do que isso seja Mas já vou explicar vou tentar preencher um pouquinho isso Esse é o título de um livro que eu soube outro dia conversando num exame de qualificação Alguém me falou desse livro inglês ou americano assim chamado do fim dos anos noventa cujo autor tem um nome como Leslie2 De fato o livro existe eu o encomendei mas ainda não o recebi Portanto não sei ainda o que esse sujeito chamado Leslie entende por Academic Capitalism Mas eu acredito que intuitivamente todos nós sabemos Então vamos mandar brasa nessa direção 1 Primeiro lugar eu gostaria de fazer um pouco de história de vovozinho Como eu tenho 50 anos de USP quatro como estudante 30 como professor 16 como inativo como se diz eu já vi muita coisa então posso falar alguma coisa de memória Mas não sou pesquisador da história da USP o que é uma coisa importante e uma disciplina que está engatinhando há uma década mais ou menos Eu poderia citar que conheço pessoalmente jovens pesquisadores que vale a pena ler Por exemplo a Maria Carlotto terminou agora um doutorado agora sobre história da USP3 e tem dois estudos com a Sylvia Garcia sobre a implantação da EACH da USP Leste justamente o conflito entre instituição e organização por que motivo que lá as coisas foram para o vinagre Os textos conhecidos do professor da EACH que é o Pablo Ortellado que está estudando isso Estou falando porque são amigos meus sou leigo nesse assunto que é estudar a USP estudar a Universidade Professor Marcos Barbosa professor do Instituto de Educação Ele é filósofo de formação fez doutorado na Inglaterra uns vinte e poucos anos atrás mas começou a estudar propriedade intelectual e agora está estudando patente Junto com o Pablo estão estudando a fraude na pesquisa e como é que o sistema atual leva à fraude O que mais que poderia comentar Bom o Franklin O Franklin é digamos assim o nosso arquivo 1 A frase é de Schiller lembrou Paulo Arantes que dela se serviu para abrir a conferência realizada no Teatro Laboratório da ECAUSP em 15 de agosto de 2014 a convite do Departamento de Artes Cênicas O debate que contou com a participação do prof Tercio Loureiro Redondo era parte de uma programação de discussões sobre a o atual estado da Universidade de São Paulo organizada pelo movimento de greve dos docentes dessa universidade A fala de Paulo Arantes em que consiste o presente texto foi transcrita por Lucas Souza e Mateus Castilha que acrescentaram também as notas 2 Sheila Slaughter e Larry L Leslie Academic Capitalism Johns Hopkins UP 1997 3 Maria Caramez Carlotto A burocratização da universidade e seus efeitos sobre a dinâmica de incorporação de demandas sociais e sobre as atividades de ensino e pesquisa Tese de doutorado em Sociologia FFLCHUSP 2010 ambulante vivo porque também tem quase tanto um pouco menos do que eu de USP Como ele participou de vários colegiados pesquisou estudou e viveu tudo isso está aposentado hoje e tem um ensaio extraordinário publicado no fim dos anos 90 na Revista da USP cujo título é A experiência universitária entre dois liberalismos4 Lá está toda história do que nós estamos vivendo hoje a préhistória está contada Inclusive todos os argumentos desse reitor essa fraseologia toda nasceu já no fim dos anos 70 e é esse período que o Franklin conta Tenho muita coisa para contar muita coisa para falar mas eu vou me concentrar em uma coisa só que são esses dois períodos o fim dos anos 70 e hoje Não vou falar de todas as greves da USP são períodos históricos bem distintos A primeira que participei eu era estudante foi em 62 a greve chamada greve do um terço por representação de um terçodos estudantes nos colegiados nos colegiados universitários Ela durou dois meses não ganhou nada mas fazia parte de um movimento geral do Brasil das Reformas de Base Reforma Universitária Dois anos depois veio o Golpe Nós ocupamos a faculdade que era lá na Maria Antônia onde eu estudava física naquela época mas não ganhamos Perdemos mas foi uma mobilização espantosa no Brasil inteiro E depois a ditadura fez a Reforma em 69 e 70 a reforma que nós imaginávamos não exatamente a que nós imaginávamos porque eles fizeram com modernização Bom a outra grande greve na USP foi em 79 nessa eu participei já como professor diretamente contra o governador No caso era o Maluf governador biônico nomeado pela ditadura e era também contra o arrocho O arrocho com o fim do milagre já a inflação começando a ascender os céus em plena ditadura do ponto de vista salarial os docentes e os funcionários começaram a viver uma situação de penúria grave E a mobilização foi geral a primeira vez na história da USP diziam os mais velhos que funcionários estudantes e professores ao mesmo tempo entraram em greve Foi uma mobilização realmente espantosa durou quase três meses e não se ganhou absolutamente nada a não ser experiência política Havia um banco de greve para os que o ponto foi cortado para os que estavam passando necessidade como se dizia em cima Bom um dos argumentos naquela época era o seguinte Quer dizer uma coisa curiosa um pouco história política das ideias nós no fim dos anos 70 primeiro ano depois do fim do AI5 portanto algumas coisas eram possíveis ser ditas e organizadas de maneira pública é um período que o Franklin está no ensaio está focalizando que é a transição de instituição para organização nós vimos ali a coisa começar a mudar Nós ainda éramos uma instituição que estava se desintegrando e uma organização que estava se formando mas nós ainda não tínhamos muita noção disso ainda nos considerávamos uma instituição uma universidade nos velhos moldes acadêmicos E nas assembleias gerais como as coisas estavam girando em falso como não conseguíamos nada a mobilização era gigantesca5 e os resultados eram 4 Franklin Leopoldo e Silva A experiência universitária entre dois liberalismos Revista Tempo Social USP n11 1999 5 Digressão Tinha debate na televisão debate no rádio quem defendia o Maluf era o Celso Pastor não sei está aí do lado ainda E sabe quem era o nosso porta voz Quem discutia planilhas com o Pastor e o Orlando Era um economista também recémchegado do exílio com o fim do AI5 podia voltar virou deputado e alguns anos depois secretário de planejamento do governo Montoro que foi eleito economista José Serra Algumas coisas curiosas a história do Brasil quando você vê com 50 anos de distância as coisas as peças são as mesmas nas várias posições Então bem e mal nunca são muito definidos Existe uma zona cinzenta em que todos transitamos nulos diante do impasse as pessoas começam a especular demais a teorizar dizer por que as coisas dão errado e fazer teoria quem achava que a nossa greve era um despropósito eram militantes de formação marxista e que mais adiante foram fundadores do PT Porque diziam o seguinte a nossa greve não eram furadores de greve diziam portanto nós estamos de greve paralisados mas é um disparate não vai dar certo nunca Nós não conseguimos civilizar ninguém a população de maneira geral Porque nós nem trabalhadores somos somos futuros profissionais liberais e os funcionários são assalariados públicos Nós somos trabalhadores improdutivos como manda o figurino nós não produzimos valor Portanto greve é um contrassenso na universidade E isso por mais que existisse tradição de luta na universidade desde o Cordobazo em 1918 em Córdoba na Argentina pela primeira grande reforma universitária os argentinos começaram na nossa frente Em compensação nós éramos uma instituição estávamos mobilizados como se fôssemos um grande coletivo político enfrentando em pé de guerra aquela coisa chamada Maluf e a ditadura e a esquerda dos presentes a nova esquerda que ia fundar um novo partido de esquerda dizia que era um contrassenso porque uma instituição não pode fazer greve Não faz sentido fazse greve numa empresa numa fábrica no sistema produtivo mas nós não Eles diziam você estão brincando vocês são esquerdistas estão brincando de fazer greve isso aqui é uma ficção um makebelieve Estão fazendo um show para vocês mesmos Isto é os caras estavam fundando um partido e diziam sai daqui e vamos para a luta que o espaço é outro não aqui Quando havia veja só a cegueira política total três mil pessoas inteiras mobilizadas durante três meses em assembleia geral e os funcionários parados mesmo Bom isso é uma primeira observação O termo de comparação é o seguinte 35 anos depois nós não somos mais uma instituição isso é a constatação que eu estou apenas repercutindo são bobagens que dizem Nós não somos mais uma instituição somos uma organização isso é o que estava surgindo de assalariados Pouco importa a ortodoxia se produzem ou se não produzem valor está trabalhando para alguma coisa fazendo alguma coisa uma população que está trabalhando para o setor digamos de serviços Portanto funcionamos hoje como uma empresa e somos avaliados como são avaliados os funcionários de uma empresa Os aposentados também somos avaliados quando vamos morrer porque somos um ônus Se bem que é demagogia não é mais a universidade quem paga nossa aposentadoria é o Ipesp Bom finalmente somos uma empresa uma organização empresarial avaliados como tal e não conseguimos fazer greve Quando éramos instituição fazíamos devidamente agora que deveríamos fazer que somos uma organização empresarial não conseguimos Nós somos 92 mil estudantes 6 mil professores 18 mil funcionários Quantos estão parados hoje Mil talvez 2 Aí que temos de pensar um pouquinho a respeito disso Não que eu tenha a chave de tudo isso mas digo que estamos tendo as mesmas dificuldades de paralização que tem um empresa hoje Mudou o registro mudou o modus operandi daquilo que podemos começar a chamar de capitalismo acadêmico Bom o que poderia ser esse capitalismo acadêmico O funcionamento dessa organização universitária está enfrentando as mesmas dificuldades que uma grande empresa contemporânea tem para paralisar E quando elas paralisam elas paralisam de maneira selvagem sobretudo na Europa com grandes sindicatos aqui nós não temos nesse nível Quando digo que nos transformamos em organização eu não estou pensando apenas em uma empresa dizendo é uma coisa que funciona como se fosse uma entidade do setor privado do mercado não é bem isso não estou entendendo uma redução a esse ponto Por mais que tenha vazado um plano de demissões voluntárias transferência de hospitais 25 de redução da carga horária e assim por diante que são medidas corriqueiras demissão voluntária é o que se faz o que se fazia nas empresas nas estatais no momento em que elas começaram a ser privatizadas Não se trata de privatização privatização é um falso problema porque está ultrapassado A privatização da USP se é que isso faz algum sentido já aconteceu faz um bom tempo Existe e nós sabemos isso é um segredo de polichinelo um acelerado empreendedorismo acadêmico sobretudo nas unidades que se podem dar ao luxo que são as que profissionalizam nas áreas de comando econômico principalmente nas engenharias É como se cada professor titular fosse como um político cada mandato é uma empresa cada professor titular é uma pequena empresa de investimento de captação de recursos de lobby em ranqueamentos de modo que tanto faz se isso está sob a tutela do Estado se é público se faz parte do ICMS ou não porque ele já não depende mais do ICMS tem fontes próprias de financiamento tem vínculos com fundações e essas fundações têm empresas Então esse lado empreendedor já está realizado acontece que esses empreendedores são patrões eles dirigem laboratórios O problema básico nosso que somos da zona de sombra das faculdades somos a ralé acadêmica FFLCH ECA Educação isso aí é lixo Daí porque se fecharmos isso aqui o Estadão não vai talvez estrilar em nome da cultura Os últimos a nos defender seria o Estadão a família Mesquita porque afinal eles montaram aquela coisa bonita com cultura europeia teatro cinema filosofia sociologia mas se fechar tanto faz como não fez Para nós é do maior interesse porque é aqui que nós fabricamos a ralé politizada e é isso que os incomoda Então essa ralé tem que ser administrada gerida é isso que nós temos de entender porque é isso que acontece com a universidade Então a ideia é essa o argumento está pipocando nos artigos desses jovens pesquisadores que eu mencionei A fonte de alguns destes argumentos são autores franceses6 sociólogos que estão redefinindo teorizando de uma outra maneira que eu acho muito interessante aquilo que se entende vulgarmente na jornalística por neoliberalismo fora do marxismo tradicional e fora do que movimentos e esquerda em geral falam uma espécie de receituário privatizar abertura comercial superávit fiscal Estado mínimo tudo isso é uma monteira de asneira que não diz absolutamente nada sobre o que estão fazendo Nem é o neoliberalismo uma espécie de versão tóxica do capitalismo velho de guerra Eles estão dizendo é uma coisa nova e é um sistema de governo do poder capitalista perdoem o jargão mas é mais ou menos isso uma razão governamental um tipo de governo de populações E governo é o seguinte nós governamos através de instrumentos econômicos entre outras coisas o objeto desse 6 Digressão É uma geração de teóricos e militantes que eu conheço de nome e que são franceses Dois deles virão ao Brasil no ano que vem e eu estou tentando publicar um livro deles naquela coleção Estado de Sítio Pierre Dardot e Christian Laval La nouvelle raison du monde Paris La Découverte 2010 governo é uma população e o objetivo desse governo é a segurança O neoliberalismo é uma tecnologia assim como foi o liberalismo clássico mas o neoliberalismo não tem absolutamente nada a ver com isso assim como foi governada a economia e a sociedade no pósguerra nos 30 anos de prosperidade do capitalismo em que havia pleno emprego industrialização das periferias descolonização e coisa que o valha por aí É uma construção política O neoliberalismo não é uma política econômica não é um desvio com relação à bemaventurança do Estado regulador keynesiano fordista com proteção social Portanto quando dizem nós temos de reestabelecer aquele estado de coisas anterior isso é um nonsense do ponto de vista econômico político social não existe volta atrás É uma coisa nova que nós temos de encarar de frente na sua especificidade Em segundo lugar é um mito a ideia de que se trata de um Estado mínimo o Estado nunca foi tão articulado tão central e tão gerenciado como ele é hoje e a função dele ao contrário do que acontecia no tempo do grande consenso keynesiano é garantir que haja mercado e que esse mercado se expanda Eles dizem o seguinte a forma hoje do capitalismo não é mais a troca de equivalentes nem mais a sociedade de consumo é um sistema de concorrência generalizado em que todos os atores como se diz todas as unidades todos os sujeitos tudo entre aspas funcionam como empresas É um mercado geral em que essas empresas concorrem Mas qual a novidade Como generalização da forma mercadoria para todos os setores da vida é verdade que o capitalismo sempre progrediu assim avança sobre territórios inóspitos desde a periferia no século XVII sobre terras inexploradas do ponto de vista do mercado transforma em mercadoria todos os produtos da atividade humana e fecha o acesso a essas mercadorias ele sempre funcionou assim Sim mas tem uma novidade A novidade é que essa generalização da forma mercado da forma empresa concorrencial é uma construção política e essa construção política portanto tem um lastro de coerção e é feita contra alguma coisa contra nós obviamente Bom essa construção política faz com que essa forma concorrencial se estenda para além do mercado além do funcionamento dos mercados Dito de outro modo o que eles estão dizendo por aí e é o que nós cabe como universidade é o seguinte o neoliberalismo constrói politicamente situações de mercado em âmbitos sociais em que não são produzidas mercadorias nem serão produzidas mercadorias Mas é um mercado por exemplo o de semente mercado internacional cotado em Chicago e isso não tem nada demais é o ABC o padre nosso do capitalismo Agora fazer com que funcionem como mercados esferas sociais entidades sistemas que não produzem mercadorias é uma coisa completamente diferente Onde é que se entra para fazer essa construção Não é à toa que essa nova peste essa nova configuração essa nova racionalidade política e econômica que nós chamamos de neoliberalismo começou nos países centrais onde havia uma forte regulação social isto é na Inglaterra e na Europa Continental antes de chegar nos Estados Unidos nos Estados Unidos a conversa é um pouquinho diferente e eu não vou entrar lá Começa na Inglaterra na França e na Alemanha isto é onde havia uma forte regulação social portanto onde havia um Estado administrativo e regulador muito poderoso sobretudo regulador não só das empresas públicas estatais mas também dos serviços públicos Era uma regulação que esses neoliberais que são em certo sentido revolucionários tratase de revigorar o capitalismo é uma revanche do capitalismo que estava perdendo fôlego e força com esses trinta anos de acomodação do pósguerra porque havia uma espécie de jogo de soma zero eles consideram as populações muitos passivas e dependentes de uma administração estritamente jurídicoburocrática que é a racionalidade burocrática propriamente dita Então é preciso dar uma chacoalhada nisso isso quer dizer botar um pouquinho de medo nas pessoas para que elas se sintam inseguras dentro desses sistemas de segurança de proteção social que estava muito confortável É mais ou menos essa a ideia Então eles entram por aí e a alegação ideológica é retirar as populações ou as classes sociais dessa acomodação dessa letargia Por isso que o nosso amigo Zago estava falando as pessoas se acomodam As classes sociais e sobretudo as classes trabalhadoras estão muito bem acomodadas Não estavam já estavam protestando desde 1968 estavam perturbando a circulação Bom então o que se faz As grandes privatizações que são formas contemporâneas de acumulação primitiva são triviais uma hora uma empresa é estatal outra hora é privatizada depois ela é reestatizada depois ela é reprivatizada isso para cá e para lá de acordo com a conjuntura econômica o que não é trivial é botar todo mundo no mercado quando nós sabemos que mercado é uma coisa específica de âmbitos sociais que produzem mercadorias Mercado de automóvel é uma coisa mercado de papers não existe que é o nosso ponto Então como é que você constrói isso Essa construção política já é uma violência É assim na universidade que foi uma instituição é assim em outras instituições similares como hospitais como as escolas em geral que começam a funcionar como se fossem empresas que têm um input e um output não têm mas precisam ter Então se cria situações de quase mercado a universidade é uma organização que atua num âmbito geral que é um quase mercado não é um mercado a universidade continua como diziam nossos amigo em 79 a não produzir coisíssima nenhuma Nós não produzimos nada Vamos começar a especificar existe uma ficção que é a de produção o fantasma dos anos 70 que era a crítica de esquerda de mãodeobra para o mercado mãodeobra barata qualificada É mito o mercado não precisa de mãodeobra da universidade As empresas recolhem mãodeobra onde existe e formam sua própria mão de obra esse era o debate dos anos 70 e a gente precisa corrigir isso A universidade não está sendo funcionalizada ela serve para uma outra coisa O mito de hoje é o da inovação que não leva a inovação nenhuma porque é fraude É um makebelieve é um fingimento é um teatro é uma simulação Isso eu estou falando não porque eu estudei mas é lendo teses acadêmicas feitas por pessoas que estão pesquisando isso tecnologia tecnociência inovação o que são essas universidades que inovam elas não inovam nada A invenção a patente o licenciamento isso é tudo um teatro montado pelas burocracias dessas grandes organizações chamadas universidades para as agências nacionais e internacionais daí o ranqueamento é fundamental para conseguir o quê Grana Grana para dizer aqui nós inovamos então pela lei de inovação pelo ranqueamento por isso e aquilo Então você faz adoidado nimporte quoi é fácil patentear E depois se queixam que as empresas não se interessam As empresas do ponto de vista da tecnologia contemporânea elas compram o pacote no mercado internacional não encomendam A parceria universidadeempresa é conversa de campanha eleitoral para eleger burocracias partidárias burocracias universitárias burocracias propriamente ditas estatais Isso é um mito Um mito correspondente é um mito de esquerda segundo o qual as universidades existem para formular políticas sociais públicas e para contribuir para a resolução ou para o encaminhamento da questão social aí tem uma coisa a ser especificada que mais adiante nós podemos discutir Essa é a justificação de esquerda popular e atualmente governamental para a existência de campus aqui e campus acolá que é para a contribuição que nós devemos àqueles que pagam impostos e para a classe trabalhadora em geral para o desenvolvimento social Só que essas coisas precisam prestar contas pois há investimento político ideológico e investimento propriamente dito nisso Então qual a maneira de prestar contas É a avaliação E o que é a avaliação Atualmente a avaliação é justamente a principal engrenagem7A ideia de avaliação é um dispositivo de mobilização da vontade da disposição dos trabalhadores nessas grandes empresas nas empresas em geral para que eles trabalhem funcionem e vistam a camisa como se diz no jargão O mecanismo de avaliação que é mais ou menos compreensível embora seja socialmente aniquilador em um organização capitalista propriamente dita hoje cuja performance é medida pela concorrência concorrência se faz pela inovação sim e por preços quando essa avaliação chega nos âmbitos que não produzem mercadorias que são serviços ou que é a universidade ou que é o serviço postal O correio na Inglaterra não funciona e não é por outras razões tem muita burocracia interna e por que tem muita burocracia interna Tem muita organização como são as nossas OSs aqui concorrendo entre elas Então a ideia fundamental é essa você não precisa privatizar vender um ativo para a iniciativa privada o que é que a iniciativa privada vai fazer com um correio nada não acrescenta nada mas o capitalismo se expande quando ele irradia um sistema de normas práticas de ação que contaminam o conjunto da sociedade esteja dentro do mercado propriamente dito ou não esteja dentro do mercado Isto é a violência contemporânea é que você vai funcionar como se estivesse dentro de um mercado quando você não é nem uma empresa nem está concorrendo a nenhuma empresa similar a você mesmo Isso é uma violência E isso acontece na universidade Como Pela transposição desse pequeno dispositivo chamado avaliação que é um dispositivo de poder de sanção e um dispositivo punitivo cujo principal objetivo não é avaliar avaliar no sentido de verificar se um investimento está dando retorno se nós como 96 de ICMS estamos dando retorno isso é um nonsense econômico não tem como avaliar avaliar é simplesmente governar a conduta das pessoas dentro dessa organização Ora a conduta dessas pessoas dentro de uma organização que são regidas por um dispositivo chamado avaliação é a de total mobilização psíquica intelectual nesse trabalho e a total desmobilização nisso que nos interessa que é a política Então você transpõe esse mecanismo de avaliação de uma empresa que produz por exemplo moléculas para uma indústria farmacêutica introduzindo numa universidade que não está produzindo nada Então as pessoas são avaliadas como se fossem trabalhadoras produtivas quando elas não são e como elas são avaliadas Por um índice numérico por quantidade A crítica a ser feita não é de que é um absurdo a cifra cifrar em quantidade uma atividade que é pura qualidade como é a atividade de pesquisar dar aula falar escrever conversar fazer 7 Digressão Existe uma literatura enorme a respeito disso sobre teoria das organizações das grandes corporações capitalistas contemporâneas sobre o que significa o benchmarking o regime de metas por assim dizer ou de referências pois não são metas fixas mas metas flutuantes de desempenho de qualquer trabalhador funcionário assalariado nas grandes corporações multinacionais e nem tão multinacionais ou qualquer boteco de esquina tem isso música fazer teatro e assim por diante o absurdo não é esse todo mundo sabe que isso é um absurdo até eles sabem que isso é um absurdo o absurdo é fazer você se comportar como se estivesse prestando contas de sua atividade produtiva numa empresa que não é uma empresa Daí a violência as pessoas adoecem enlouquecem ficam inseguras com medo elas se autocontrolam se autocontrolam pelo medo e vem aí o que nós sabemos que é uma coisa trivial epidêmica que é a depressão o suicídio vidas arrebentadas e assim por diante Porque você institui um sistema de mercado um falso mercado onde não existe mercado Então para que esse teatro seja completo se institui a avaliação a avaliação numérica isto é com indexadores com indicadores Você precisa de informações quando se trata de governar pessoas Afinal o que significa do ponto de vista do crescimento econômico da acumulação a fração do PIB ou a merrequinha que nós mobilizamos como universidade Nada é insignificante Tratase simplesmente de conduzir condutas de pessoas que se comportam dessa maneira que nós ficamos estarrecidos de ver que são os nossos colegas No meu caso eu que sou um pouco veterano que tenho outro tipo de patologias que não são as contemporâneas comparo patologias No meu tempo a patologia era diferente Como era instituição de modelo patriarcal e oligárquico eu nunca prestei concurso fui cooptado se quiserem eu posso esclarecer como funcionava esse mecanismo a patologia da minha geração não é a depressão é a neurose Também leva ao suicídio mas por outros caminhos é mais romântica dá literatura dá teatro depressão também dá teatro mas em geral as pessoas ficam inibidas porque é um mecanismo bem edipiano bem freudiano É claro avaliação sempre houve avaliação tem a ver com juízo com discernimento eu estou falando da sua degradação da sua forma bastarda contemporânea Como a avaliação era a reputação entre pares era um caminho direto para a esterilidade para o suicídio para a neurose crônica para os tiques todos que você pode imaginar Era uma grande família então você tinha sempre um grande pai que era o catedrático com seus amigos Você não tinha de prestar contas porque ninguém te cobrava mas você sabia que a opinião contava então se alguém fizesse assim gesto negativo com a cabeça era como um gladiador você era morto ia para os leões E o pavor disso tirava o sono as pessoas adoeciam também 3 O que é o sistema de avaliação contemporâneo o sistema CAPES do qual eu escapei porque me aposentei no ano em que o sistema foi implantado é claro que eu não iria me adaptar meu DNA é sistema Édipo papai mamãe casamento carreira sucesso literário É uma imitação do sistema de preços de mercado Os preços são sempre relativos para você ter informações do funcionamento daquele mercado portanto como dizem esses autores franceses o sistema de preços é sempre autorreferido ele não diz nada sobre a realidade não diz nada sobre o valor intrínseco das coisas ele diz que quantidade você deve produzir em determinada conjuntura e pronto ponto acabou Como não há possibilidade como havia antigamente era pequeno oligárquico justamente agora é de massas você tem que controlar uma enorme população esse que é o problema como gerir isso Gestão gestão de recursos humanos não há possibilidade de avaliação qualitativa você é obrigado a ter indicadores saber onde é que eu coloco aqui ali no meio em cima em baixo sete vírgula dois sete vírgula três é tão arbitrário quanto qualquer outro sistema Daí como não é mensurável como são mensuráveis as quantidades econômicas é um ato de violência É uma ficção Você não está medindo nada Essa avaliação portanto ela produz o que Ela produz aquilo que o Pablo Ortellado diz no artigo A fábrica de papers8 ela produz justamente operários fábrica entre aspas dóceis Porque eles estão com o pescoço nessa guilhotina permanentemente sem que seja feita nenhuma violência externa a violência é sempre interna a pessoa está sempre se controlando está sempre atualizando o seu Lattes está sempre procurando se conformar a esses critérios que são inteiramente fictícios Portanto você está simplesmente colaborando e colaborando de maneira fanática e atroz para sua própria devastação pessoal por isso que as pessoas estão mobilizadas até a extenuação nesse campo e portanto desmobilizadas nos outros Não há força humana que faça alguém aterrorizado nesse momento a mudar o rumo e encarar a besta fera de frente Ela está lá simplesmente se desdobrando para pontuar Pontuar sabendo que essa pontuação lá em cima todo mundo sabe tende a fraude que ela não significa nada ela é apenas uma maneira de classificar de ordenar um conjunto de pessoas participantes de uma instituição que não dá pra abolir chamada Universidade Mas na verdade estão gerindo gerindo o que Um cadastro Todo mundo prestando informações atualizando o seu Lattes sabendo como elas serão cadastradas e portanto sabendo como elas serão credenciadas descredenciadas e credenciadas tem a ver com crédito portanto qual é o seu crédito Não passa por nenhum tipo de avaliação qualitativa porque ela é impossível não dá não há meios digamos instrumentais de fazer avaliações qualitativas É uma roubada a oposição de esquerda nova ativista o que você quiser resistência e assim por diante reclamar da ideia de quantificação Não é quantificação Eles sabem que a quantificação não diz nada eles não estão interessados em saber se a pesquisa A é melhor ou se tem mais valor que a pesquisa B se tiver e quanto e tem a pesquisa C no meio que eu tenho que colocar porque se tem preço eu posso fazer isso mas se é qualidade eu não posso fazer nada Eles estão interessados apenas em fazer com que essa massa se comporte desse jeito E não é uma massa massa é uma expressão inadequada são pequenas empresas concorrentes que concorrem através desses indicadores Eu li outro dia um artigo muito bom de uma jovem socióloga e pesquisadora chamada Geórgia Salles Num determinado momento ela não desenvolveu ela tem uma ideia que me parece muito boa formidável Essa avaliação está começando ela não diz exatamente nesses termos está começando a se replicar a si mesma As agências que conferem o crédito dão ou não dão crédito como dizia o Schumpeter no capitalismo o fundamental é o crédito você precisa ser inovador e ter crédito e pra ter crédito você precisa inovar Schumpeter básico se não tem crédito é a morte no capitalismo é a morte Essas agências avaliam se elas concedem ou não concedem o crédito mas elas estão avaliando o quê O que esses empreendedores avaliados e cadastrados estão produzindo Estão produzindo indicadores para novas avaliações É isso Então um pesquisador numa linha de pesquisa num departamento X numa pós graduação ele é um produtor de indicadores Está bem ou mal produzindo mais ou menos melhores ou bons indicadores para que aquela linha aquele departamento seja avaliada por uma agência que é um 8 Disponível em httpstoauspbrpoliticaweblog99841html banco de crédito dar uma nota Bem não é creditícia é de financiamento Aí a Geórgia diz o seguinte mas no fundo o que é que se está produzindo Quando se pega as ciências humanas o que elas estão produzindo Esses indicadores refletem alguma coisa mesmo que seja tudo fatiado feito salame as pesquisas e assim por diante Aí a fraude é obrigatória Ela diz o seguinte as assim chamadas pesquisas sobretudo as pesquisas em ciências humanas o que elas são Elas são avaliações E são avaliações do que De programas sociais O que faz um pesquisador que estuda a violência no Brasil a não ser que ele estude a metafísica da violência Sociólogo antropólogo cientista político ele vai encaminhando suas investigações os indicadores que ele vai produzindo para um centro de excelência em que se produz o melhor a respeito de violência social violência urbana Portanto ele vai no limite quando ele for um craque não a pedra ele vai ser o que Um bom avaliador do impacto outra palavra do jargão de políticas públicas de segurança portanto ele está a um passo de ser policial A sociologia é um ramo das ciências criminológicas não crítica tem criminologia crítica Ele está avaliando o impacto de políticas de saúde segurança pública recursos hídricos e assim por diante Passou a ser um avaliador de governos ou de empresas Então você vê que a exigência de que tenha a avaliação do impacto social sem o que você não abre um campus estadual nem federal9 Inovação portanto é apenas uma maneira de você alimentar retroalimentar as burocracias de todos os níveis das agências dos estados das administrações das universidades a ficção de que você está inovando fazendo tecnologia para ser apropriada pelas indústrias grandes empresas A tecnologia não funciona mais assim É incremental e vem em pacotes você compra o pacote inteiro A única que funciona assim é a EMBRAPA e a EMBRAPA não é uma universidade Podemos falar de políticas da FAPESP que vão nessa direção Impactos sociais é isso você vai produzir cientistas sociais entre aspas capazes de avaliar o impacto ambiental social de programas X Y Z de governos ou de empresas então o impacto social de uma universidade é a mesma coisa e a sua responsabilidade social diante do contribuinte é a mesma conversa da responsabilidade social por exemplo do banco Itaú que tem n programas de responsabilidade social ambiental tudo que você possa imaginar Eficientes e que avaliam constantemente o impacto desses programas Se eles não estão funcionando mudase E quem é que está avaliando os programas Gente que a gente forma estão lá O circulo se fecha E isso explica em parte essa engrenagem do Capitalismo Acadêmico Portanto capitalismo acadêmico independe de privatização de dizer que o reitor quer sucatear quer privatizar vai passar pra iniciativa privada simplesmente isso não faz sentido E se passar vai do mesmo para o mesmo Para a gente não interessa Interessa por exemplo a transferência dos hospitais universitários por razões orçamentárias Aí não aí é digamos assim uma ação criminosa criminosa no sentido de irresponsabilidade administrativa Passa para o Estado E passando para o Estado o que vai acontecer o Estado entrega pra quem Não vai privatizar não vai vender Entrega para as organizações sociais que administram a saúde que são pequenas organizações não vou dizer que tudo é máfia que administram o sistema de saúde no estado de São Paulo Tanto faz se é público ou privado está inteiramente controlado gerido por pequenas 9 Digressão As particulares são um negócio à parte não é que seja um negócio uma coisa a parte tem diretamente a ver com o mundo do trabalho Eles estão lá são trabalhadores que estão nas particulares organizações sociais de interesse da sociedade civil E que funcionam como Funcionam num sistema de Benchmarker de avaliações internas dos seus próprios funcionários que entre outros são também terceirizados O problema não é o HU dentro da USP ou o HU fora da USP O problema é que o acontece dentro de um hospital no Brasil e no mundo inteiro Está acontecendo assim na França na Inglaterra a França não privatizou quase nada ao contrário da Inglaterra que privatizou tudo e funcionam mal do mesmo jeito através dessas organizações O que é que se faz Essas organizações dentro da universidade e que são os empreendedores pesquisadores entre aspas individuais e dentro de hospitais que é o exemplo que eu comecei e termino com ele elas são obrigadas a concorrer entre elas há um mercado de organizações elas são empresas mesmo que não sejam empresas no sentido estrito que concorrem no mercado de licitações de hospitais Então começa licitação vem o editalvai no CNPq tem o edital tal você forma um grupo e entra Pronto você está no mercado É um falso mercado você vai se ferrar de qualquer jeito Mas você entrou no mercado das licitações onde estão também os Movimentos Sociais Então nós começamos a ver que nós estamos diante de uma sociedade organizada capitalista num sistema de poder em que você está gerindo classes sociais todas confundidas num certo momento Tem movimentos sociais de sem teto aqui de um lado e tem organizações sociais dentro de uma universidade do outro como um cadastro Uma população cadastrada que está sendo gerida através de vários mecanismos o principal deles é a avaliação que passa por outra coisa chamada edital Cultura é isso O Ministério da Cultura ele perde pra uma outra organização maior é apenas e simplesmente uma central de editais Política pública é a política de editais A esses editais você concorre pessoalmente você se organiza faz isso faz aquilo e pronto Depois você é avaliado A sua atividade social passa a ser produzir indicadores pra dizer que você está conforme os termos do edital para poder renovar o edital Assim se reproduz a sociedade brasileira risos Maior que o Ministério da Cultura é por exemplo o sistema SESC em São Paulo mais que a Secretaria de Cultura mais que o Ministério da Cultura em São Paulo mais que a Secretaria da Cultura da prefeitura é o SESC O SESC é o Ministério da Cultura de São Paulo risos Funciona nessa base totalmente privado e ao mesmo tempo sendo público você não sabe se ele é público ou se ele é privado de onde é que vem o dinheiro Mas você sabe que ele funciona Ele funciona nessa base abre o edital do SESC e pum Não dá outra O sistema se reproduz se fortalece se legitima e por aí vai Ponto Acho que falei demais 4 Professora Maria Helena Queria abrir se alguém quiser perguntar alguma coisa Tem questões muito pontuais que vocês trazem Paulo e Téssio Redondo Eu só quero fazer um comentário em cima do que você acabou de falar Eu organizo dança e essa questão dos editais a gente vem conversando muito sobre isso que na verdade o governo essa política dos editais vai proliferando um jeito de lidar com a criação que vai categorizando esses grupos e vai modificando cada vez mais a ideia de pesquisa que a gente tem A ideia de pesquisa a principio é lidar com algo que você não conhece por isso que esse tempo precisaria ser mais estendido E a cultura dos editais seja de teatro de dança vem de alguma forma modificando o panorama de como o teatro e a dança vão se organizando e como cognitivamente as pessoas começam a entender o que é produção de conhecimento em teatro e dança via esses editais Eu só queria fazer esse comentário Alice Qual o lugar ou o papel do ensino nessa construção neoliberal dos dias de hoje Paulo Arantes Bom eu não saberia te dizer Não tenho informação de primeira mão Tem coisas que eu li a respeito Vou dar autores para você que eu tenho lido a respeito de ensino não é muita coisa mas o suficiente recomendo que se leia uma socióloga chamada Regina Magalhães de Souza O mestrado dela é sobre escola ela foi professora no ensino secundário da rede estadual durante muitos anos sendo também funcionária da prefeitura Ela fez o mestrado dela em cima disso e o doutorado um livro extraordinário chamado O discurso do protagonismo juvenil10 No que diz respeito ao ensino ela faz constatações estou contanto o que eu li nunca passei pela rede estadual converso com muita gente que trabalha que atua que é militante que é professor me conta coisas conta casos ela procura mostrar como a escola é uma instituição digamos sem fazer jogo de palavras que está dando certo porque ela é um fracasso continuado E ela é pra ser um fracasso continuado então ela é aperfeiçoada nesse tipo de fracasso E em última instância agora eu estou simplificando ela não diz essa barbaridade a escola hoje funciona perfeitamente bem ela não é um fracasso ela é um fracasso pra nós no sentido convencional nós que achamos ainda que ensinar é uma coisa substantiva que tem a ver com cultura e humanidade ela ensina aos pobres infelizes ela está falando do sistema público ela ensina aos que passam por lá a se virar entre aspas Se virar significa e é o que eles querem é o que a meninada quer como é que eu me viro por exemplo o que eu devo saber como é que eu devo proceder como é que eu me viro por exemplo numa entrevista para ser entregador de pizza Para ser recrutado Como é que eu me viro pra ser chapeiro do MacDonalds Como é que eu me viro num cargo qualquer no setor de serviços Como é que eu me viro pra trabalhar usar a informática Qualquer coisa assim Então na escola o jargão é assim aprender a aprender Aprender a aprender é aprender a não se dar mal a não sucumbir não se afogar no mercado Ponto A escola é isso E quando a moçada pergunta professor pra que é que isso serve ela não está querendo saber o que é que foi o Brasil colonial isso não serve pra nada e ela não está desqualificando Pra que é que isso serve para aquilo que todos nós sabemos que estamos aqui para o que Estamos todos ferrados nossa perspectiva são empregos podres e nós queremos saber o tempo que nós estamos perdendo aqui poderíamos estar fazendo outras coisas o que vai nos contribuir pra gente se virar lá fora E os professores são de alguma maneira um caminho pra isso Você cria trabalhadores para essa desqualificação social A escola é isso Do outro lado que eu leio não tenho nenhuma experiência de pesquisa depoimentos enfim coisas que eu converso como eu disse a escola passa a ser uma fonte básica de um lado você normaliza essa situação de viração sem perspectiva absolutamente nenhuma É por isso que a molecada não pára quieta ela sabe que aquilo ali é enganação que é apenas uma antecâmara para se virar mais a diante Do outro lado passa a ser uma espécie de fábrica de desconforto ou de infelicidade ou como se diz na 10Regina Magalhães de Souza O discurso do protagonismo juvenil Tese de Doutorado em Sociologia FFLCHUSP 2010 nova sociologia da alienação do trabalho do sofrimento social E no caso do Ensino o sofrimento é muito maior do que alguém que está fazendo um trabalho digamos mais redundante num setor produtivo qualquer porque o ensino em princípio não é nunca foi não é pra ser isso que ele é atualmente É uma coisa substantiva tem que ver com a humanidade com as pessoas enfim As pessoas estão lá ensinando não é porque não encontraram trabalho num banco e fazem um concurso para ser professor de matemática de geografia por um lado porque acham que ensinar matemática e geografia é uma coisa boa para quem ensina para quem vai aprender matemática e geografia para o mundo em geral para a vida para a civilização para a sociedade portanto está lá porque gosta Chamavase antigamente de vocação fazer o que gosta trabalhar no que gosta E é um trabalho lato sensu Nesse sistema infernal alguém que vai lá quer isso vai ser mal remunerado vai ser arrebentado vai ser humilhado socialmente humilhado não só pelas hierarquias do sistema e da rede mas vai ser humilhado socialmente porque vai ser desconsiderado e desclassificado socialmente como professor secundário da rede estadual11Então você imagina o sofrimento de alguém que faz aquilo quer ensinar mas não consegue Não pode pelas condições ambientes ecológicas da localização da classe até uma questão propriamente profissional Então é uma espécie de guerra entre classe e professor entre duas infelicidades permanentes Isso eu não li em nenhum lugar mas eu vi não é o filme brasileiro Pro o dia nascer feliz12 embora esteja também lá isso Mas também está num lugar em que não se imaginava que isso pudesse acontecer tal digamos o bom azeitamento o funcionamento do Estado social revelador que era o francês Eles inventaram isso fizeram uma Revolução muita cabeça precisou ser cortada para que isso acontecesse isso não cai do céu Estado social não cai do céu inventaram a escola É neste filme Entre os muros da escola13 É um filme fantástico porque percebeu um lugar que é o paraíso disso onde foi inventado o ensino público onde o preceptor o professor do ensino primário era valorizado na terceira república francesa em qualquer cidade da província ele entra na pequena cidadezinha ele era a principal autoridade moral e intelectual junto com o prefeito o bispo o padre o médico o chefe de polícia era o centro E deu naquilo que aparece no filme Perto das nossas condições parece Princeton risos Mas não é Você vê que as pessoas ele o professor os alunos estão ali para se tornarem a vida do outro a mais chata impossível À revelia deles é claro Eu vi o filme duas vezes mas já faz anos mesmo assim há uma cena que você não esquece aquela confissão final o que você aprendeu esse ano antes das férias você já sente o verão verão europeu é uma coisa muito séria o verão chegando um ar de felicidade chegando à escola ele diz nada Agora você multiplica por n exponencialmente isso põe esse nada lá no fundo com bastante violência e sofrimento é o Brasil isso Falar em ensino no Brasil É só ver a greve 11 Digressão Esse professor não sabe o que era ser professor a 60 70 anos atrás quando eu fui aluno na rede estadual pública em São Paulo e as cadeiras eram providas por concursos que naquela época já eram preenchidas por professores formados na FFLCH portanto havia uma coisa fundamental que é chamada o reconhecimento social Ser professor de português numa escola pública em São Paulo era uma coisa importante A pessoa era reconhecida socialmente Hoje é lixo É entulho É refugo 12 Pro dia nascer feliz Direção de João Jardim DVD 2006 13 Entre les murs Direção de Laurent Cantet DVD 2008 dos professores por aí E eu imagino depois de Junho espero que elas se tornem cada vez mais fortes Junho foi o ano passado não esse ano E a USP é essa pasmaceira Confirmando Junho não chegou à USP isso é que é o mais espantoso Chegou onde tinha que chegar no de sempre O pessoal que foi lá engaiolado boa parte saiu daqui Ficamos no círculo vicioso De fato não chegou não chegou porque fomos repetindo pela enésima vez criouse uma organização cujo principal produto é a docilização social Docilização social recompensada regiamente dependendo da unidade ou mal noutras e nessas outras que é mal recompensada você não tem alternativa sofram Sofram leiam e escrevem nas horas vagas aquilo que você acha interessante escrever O edital é uma coisa das agencias de fomento Eu venho aqui faço todo esse discurso de esquerdista e continuo orientando Embora aposentado só não dou aula faço tudo Vem os meus orientandos pedir bolsa pra agência ou para o seu próprio departamento filtrados pelo departamento CAPES CNPq FAPESP fazem o projeto É verdade Eu ponho a gente põe o combustível na máquina Então a gente já está editalizado já está dentro da planilha O problema é como é que sai disso É difícil Pergunta Sobre essa questão dos editais eu comecei a participar de edital nos anos 80 Eram tempos de terra arrasada não existia para o teatro nada não tinha nada O teatro era o teatro amador teatro de pesquisa atores às vezes muito bons mas amador do ponto de vista da estrutura Quando entrou o governo Fernando Henrique ele jogou a decisão política cultural no pior lugar da Lei Rouanet que é um gerente de marketing de uma empresa de energia para gerir o dinheiro público destinado à cultura Digamos que nos anos 90 fazíamos pesquisa de vez em quando A lei de fomento que é o edital hoje na minha memória é uma coisa que a gente tinha conquistado já que não existia nada Não era uma decisão de balcão nem do gerente de marketing da Petrobras Existia um lugar onde a gente podia propor um projeto com mais tempo e tal Dez anos depois virou uma espécie de máquina de moer a gente faz projeto atrás de projeto de fato nos moem a gente nunca pode parar A gente se viu num moedor de carne quase tão grande quanto o teatro comercial A gente pesquisa lógico mas a que preço Minha pergunta seria batalhar pelo que Já que o edital a gente percebeu 10 anos depois que ele também está nos moendo porque com a Lei Rouanet não há dinheiro para teatro de pesquisa e a gente precisa dele para se manter Não há dinheiro para se manter mesmo que se faça um teatro de pesquisa mesmo que se viaje o mundo mesmo que tenha público e assim por diante não existe dinheiro A nossa única saída têm sido os editais a lei de fomento Por fim reitero minha pergunta sabendo dessa situação batalhar pelo que Que forma outra seria possível Paulo Arantes Se eu tivesse uma resposta eu seria milionário e os teatros de grupo fariam para mim uma estátua na praça Roosevelt fazendo banana para eles Se eu fosse contar as reuniões de que eu participei em que foi discutido lei de fomento fazer o que agora que nós sabemos disso que são nossas conquistas nos últimos 8 anos teria 10 mil horas de debate Não tem o que fazer Não há resposta possível A gente vira involuntariamente filósofo hegeliano amador filosofo hegeliano é o seguinte a gente analisa um processo até ele chegar ao seu término e quando ele chega ao seu término a gente olha pra trás e diz foi assim pronto risos Todo mundo acha que o Hegel é um negócio dialética revolução Não tem política hegeliana política hegeliana é o Estado política no nosso sentido de esquerda não existe no Hegel porque você sempre olha para trás descreve processos que já se consumaram e no caso da lei de fomento já faz uns 2 anos que eu não discuto felizmente leis de fomento a gente olha pra trás vê o vôo da coruja diz olha foi assim terminou mas valeu a pena ponto Ganhamos Quanta coisa boa não foi feita Mas não dá pra continuar nós batemos no teto não sabemos o que fazer é isso Constatamos não é que se soubéssemos de antemão que seria assim não faríamos nada fizemos a coisa certa na hora certa claro Participei dos atos contra a barbárie falei disse tudo que pensava vamos lá pessoal ganhamos fizemos e tal E deu Deu deu 10 anos de vida para n grupos de teatro importantes que estão na história do teatro brasileiro já Mas e aí Não vivemos de memória Aonde é que nós esbarramos Nós entramos numa outra engrenagem que tem um outro dispositivo de governo irmão gêmeo da avaliação que se chama participação Não tem como ser contra Agora que as coisas se encerraram que o ciclo participativo terminou então é fácil dizer não é mais esse o caminho ele se esgotou nós olhamos para trás e dizemos funcionou E a participação foi essa Nós criamos nossa própria lei saímos da caça selvagem ao edital cada um por si legalizamos isso fizemos um edital só para todo mundo mais ainda constituímos a comissão que avalia de maneira participativa Ou seja somos os pares tem um ou outro legado das instâncias de fomento que avaliam seus pares portanto não há melhor Fazemos com que as pessoas implicadas por aquela disfunção social participem da gestão da sua própria disfunção Nem porque existam leis de fomento nós passamos a ser alguma coisa necessária para os assuntos culturais da república de jeito nenhum continuamos a ser marginais obviamente mas conseguimos ser marginais que organizam participativamente da sua própria marginalidade e tem lá sua merrequinha sobrando dos editais que afunilou e encerrou Não dá mais para o gasto politicamente tirou também o fôlego do movimento Havia um objetivo todo mundo junto Chegou lá e se esgotou Aí você inventa uma outra alternativa que é puramente ideológica você chega a um impasse e diz nós somos todos trabalhadores da cultura os grupos teatrais são movimentos sociais Vão rodar e vão chegar no mesmo lugar Onde estão os movimentos sociais no Brasil Os movimentos sociais no Brasil entraram também pela porta aberta pelo alçapão pela armadilha da participação Eles participam da sua própria condição subalterna de gente ou população cadastrada Vou dar um exemplo patente que está nas ruas no qual eu estou acompanhando o movimento de moradia O último dos moicanos é o MTST está lá fora e estava fora do grande bojo dos movimentos de moradia que estão sob o guardachuva dos programas governamentais Eles não tinham vez eles eram muito radicais não se subordinavam não estavam na engrenagem pública e assim por diante não estavam dentro do hall oficial o que é o caso da maioria dos movimentos de moradia e não tem outra eles dependem do financiamento público não tem como Bom aí eles encontraram uma brecha a brecha foi Junho mobilizaramse é muita gente é fácil reprimir 50 pessoas mas 10 mil é muito difícil E arrancaram algumas coisas E o que eles arrancaram Arrancaram a própria sepultura sinto muito E eu digo isso pra eles estou do lado deles E é o seguinte diz a mídia que eles estão furando a fila das famílias cadastradas para chegar a casa própria nos vários programas municipais estaduais ou federais é falso isso Eles entraram por uma outra porta que eles bateram a força e conseguiram que é o Minha Casa Minha Vida o último patamar do Minha Casa Minha Vida que é o Minha Casa Minha Vida Entidades que é a merreca da merreca do Minha Casa Minha Vida reservaram uma faixa para os movimentos de moradia Eles vão ter que concorrer com os movimentos de moradia oficias oficiais entre aspas no sentido que estão alinhados com o governo e se mobilizam de dois em dois anos por causa das eleições eles vão entrar já como ovelha negra nisso aí Entram como ovelha negra e o que é que faz nesse setor Entidades do Minha Casa Minha Vida com gestão participativa autônoma e assim por diante Eles vão procurar primeiro o terreno isso é a coisa mais fácil o terreno se consegue porque eles tem um mapa dos imóveis ociosos dos terrenos vagos e inadimplentes que não estão devendo IPTU Eles vão lá ocupam e fazem isso muito bem Essa é a estratégia que funciona dinâmica de impacto Conquistado isso o ministério já quer caçar diz que é inconstitucional mas faz parte da luta Mas digamos que cheguem na próxima etapa Na próxima etapa é que começa a agonia a agonia dos movimentos sociais reais o que foi o movimento de grupo de há 15 anos atrás A agonia é o seguinte agora vocês vão ter que gerir a si mesmos o que vocês vão ter que fazer Conseguido o terreno ocupou não vão mais desalojar porque a remoção agora na vitrine pega mal vocês vão ter que conseguir um escritório de arquitetura engenheiros pareceres técnicos laudo disso laudo daquilo vocês vão distribuir os lotes vocês vão portanto lotear os terrenos abreviando vocês vão se transformar numa imobiliária Uma imobiliária de pobres e para pobres mas uma imobiliária Portanto o movimento mais aguerrido de moradia em São Paulo lutador combativo vai se transformar é obrigado a se transformar numa imobiliária para conseguir fazer a moradia para as não sei quantas mil famílias que estão envolvidas nisso Então a engrenagem é essa Você amplifica você tem uma ideia de por que o Brasil se transformou numa imensa fábrica de consenso em torno dessas coisas Portanto você faz um botão faz uma planilha faz um movimento de entidade e as pessoas participam e gerem O que aconteceu com os movimentos sociais no Brasil A USP portanto é um caso apenas um caso disso Um caso patológico grandioso com 6 mil empreendedores nem todos são empreendedores tem a raia olímpica a ECA a FFLCH esses não conseguem nada eles passam perdi o fio da meada