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Direito ·

Direito Processual Penal

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567 Investigação criminal reconhecimento de pessoas e erros judiciais considerações em torno da nova jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Criminal investigation recognition of persons and miscarriage of justice considerations around the new jurisprudence of Superior Court of Justice Rogerio Schietti Cruz1 Universidade Nove de Julho São Paulo SP Brasil rschiettigmailcom httplattescnpqbr3811845068168892 httpsorcidorg0000000247342548 Resumo A investigação criminal deve ser eficiente na tarefa de iden tificar autores de crimes e fornecer elementos para o início da ação penal sem todavia violar os direitos dos suspeitos Os procedimentos policiais adotados atualmente em inquéritos policiais são simplistas sobretudo em investigações relativas à criminalidade de rua geral mente direcionadas a obter confissões dos suspeitos e depoimentos de testemunhas As falhas de procedimento em geral surgem com a Polícia se mantém com o Ministério Público e produzem seus efeitos mais dramáticos com a decisão judicial especialmente nos casos em que a vítima é convidada para um ato de reconhecimento formal do suspeito Essa realidade motivou no Brasil a mudança do entendi mento do Superior Tribunal de Justiça que passou a exigir o cumpri mento fiel das disposições do Código de Processo Penal O próximo passo na correção de tais erros depende de uma transformação da rotina policial com a fiscalização do Ministério Público e a rejeição da prova ilícita pelo juiz por meio da adoção de critérios que imprimam 1 Doutor e Mestre em Direito Processual pela Faculdade de Direito da Universida de de São Paulo Largo do São Francisco Professor dos cursos de Doutorado e Mestrado da UniNove Professor de Direito Penal e Processual na PósGraduação do Damásio Educacional Ministro do Superior Tribunal de Justiça 568 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 racionalidade ao procedimento policial por meio da apropriação do conhecimento científico acumulado sobre a dinâmica dos re conhecimentos equivocados PalavRaschave investigação criminal Falhas reconhecimento formal Superior Tribunal de Justiça Mudança de jurisprudência Novas rotinas policiais Presunção de inocência Polícia Ministério Público Judiciário abstRact The criminal investigation must be efficient in the task of identifying criminal offenders and providing elements for the prosecution without however violating the rights of those suspects The police procedures currently adopted in police investigations are oversimplified especially in investigations related to street crime which usually focused on obtaining confessions of suspects and witness statements Failures of police procedure are endorsed by the criminal prosecutor and produce their most dramatic effects with a judicial decision mainly in the cases in which the victim of the crime is invited to a formal identification of the suspect This framework motivated in Brazil the Superior Court of Justice to overrule an old precedent in order to from then on demand the faithful fulfillment of the rules of the Criminal Procedure Code The following steps in correcting such errors depend however on a transformation of the police procedures on prosecutors overseeing this police work and on the adoption of exclusionary rules by the judges Furthermore they must rely on scientific knowledge of the dynamics of mistaken identifications KeywoRds Criminal investigation failures formal identification of suspects jurisprudence overruling Superior Court of Justice new procedures by police officers presumption of innocence prosecutor judiciary I INTRODUÇÃO No contexto da atividade estatal de punir culpados e absolver inocentes esperase que as instituições e seus agentes funcionem de tal modo a ensejar um grau de eficiência que corresponda às justas ex pectativas da população cuja satisfação permite a coesão e a ordem social sem todavia desatender aos legítimos direitos daqueles que são acusados de violar as leis penais 569 Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 A Lei Fundamental de 1988 cuja viga mestra é a dignidade da pessoa humana art 1º III que dá ao Estado Democrático de Direito uma dimensão antropocêntrica em que o homem é um ser com digni dade um fim e não um meio um sujeito e não um objeto2 consagrou um processo penal de cariz democrático o qual assegura ao acusado o respeito às regras do jogo mediante o devido processo legal E para além da ótica exclusivamente processual do due process of law e tendo em vista a instrumentalidade do processo o direito deve ser compreendido como um sistema de garantias que realize dupla função de um lado tornar viável a aplicação da pena e de outro servir como efetivo instru mento de garantia dos direitos e liberdades individuais assegurando os indivíduos contra os atos abusivos do Estado3 Assim também pensava o saudoso Prof Rogério Tucci quando ressaltava já na primeira edição de sua mais festejada publicação que o processo penal objetiva dupla finalidade por um lado a tutela da li berdade jurídica do indivíduo membro da comunidade e por outro o de garantia da sociedade contra a prática de atos penalmente relevantes praticados pelo ser humano em detrimento de sua estrutura4 Sob essa matriz teleoaxiológica o Poder Público para tanto utiliza seu aparato oficial à procura de um resultado que traduza a realização do direito objetivo a segunda das funções acima referidas E essa rea lização do direito objetivo dáse concretamente pela busca da verdade processual e constitucionalmente válida5 a partir da qual se possa ao acusado ou aplicar uma sanção se considerado culpado e responsável pela prática de um delito ou declarar sua inocência quando as evidências não autorizarem o julgamento favorável à pretensão punitiva Em diversas palavras o fim do processo só pode ser a descoberta da verdade e a realização da justiça por meio de uma decisão obtida de 2 FRANCO Alberto Silva Crimes hediondos anotações sistemáticas à lei 807290 São Paulo RT 2000 p 49 3 LOPES JR Aury Sistemas de investigação preliminar no processo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2001 p 20 4 TUCCI Rogerio Lauria Direitos e garantias individuais no processo penal bra sileiro São Paulo Saraiva 1993 p 23 5 GRINOVER Ada A iniciativa instrutória do juiz no processo penal acusató rio Revista Brasileira de Ciências Criminais n 27 ano 7 julset1999 p 75 570 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 modo processualmente admissível e válido6 Ainda que com algum sacrifício epistemológico há de ser feita a escolha posto que nem sem pre compreendida pelo público entre o possível no mundo dos fatos e o aceitável no mundo do Direito Deveras a investigação e a luta contra a criminalidade devem ser conduzidas de uma certa maneira de acordo com um rito determinado com observância de certas regras A dignidade e a moralidade do instrumento utilizado constituem de per si um valor a ser perseguido e que se colocam como limite à liberdade do investigador7 O modo de ser do processo portanto é que legitima o resultado alcançado a efetiva prestação jurisdicional aos olhos de quem sofre o peso do braço punitivo estatal e aos olhos também da comunidade Uma condenação pode ser materialmente justa porque de um modo ou de outro se reuniram provas suficientes para revelar a culpabilidade do autor em relação ao fato criminoso Mas poderá se deslegitimar e então não cumprir aquilo a que se propõe um Estado Democrático de Direito se não decorreu de um devido processo legal sob sua ótica procedimental com a observância estrita das formas e das normas pertinentes Disso já falava em meados do século XIX Francesco Carrara Não basta que o juízo tenha atingido efetivamente seu fim jurí dico isto é de conduzir à exata cognição da verdade enquanto seja propriamente condenado o verdadeiro culpado e condenado somente na medida de seu merecimento É necessário que o povo creia nisso Eis o fim político das formas processuais Quando as formas não forem observadas a confiança pública na justiça do julgado não é senão a confiança na sapiência e na integridade do homem que julgou e nem todos podem têla mas quando as for mas forem observadas a confiança pública se apoia racionalmente nessa observância8 6 FIGUEIREDO DIAS Jorge Direito processual penal v 1 Coimbra Coimbra Editora 1984 p 43 49 7 MASSIMO NOBILI Il principio del libero convencimento del giudice Mila no Giuffrè 1974 p 24 apud BADARÓ G Epistemologia judiciária e prova penal São Paulo Revista dos Tribunais 2019 p 176 8 CARRARA Francesco Programma par 819 p 281282 apud FERRAJOLI Luigi Direito e Razão São Paulo RT 2002 nota 357 p 552 571 Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 Interessa ou deveria interessar à comunidade saber não apenas que o culpado por uma infração penal foi punido mas que a inflição da pena na medida da culpabilidade do sancionado decorreu de um processo no qual hajam sido observadas as regras do jogo sem favorecimentos indevidos sem atropelos sem excessos nem arbitrariedades E que as provas sobre as quais se assentou o juízo de condenação foram episte mologicamente idôneas suficientes e devidamente valoradas mediante justificativa racional pelo juiz competente É preciso para tanto que não só a atividade jurisdicional se revista de tal legitimação procedimental calha lembrar Calamandrei quando diz que a justiça necessita não somente de ser mas de parecer justa9 é mandatório que todos os demais órgãos que integram o sistema de justiça criminal assim se pautem no desempenho de suas funções Dito isso a pergunta que motiva o centro dos argumentos des te escrito é Como devem policiais promotores de justiça e juízes no desempenho de suas funções agir para que a investigação criminal possa se desenvolver de modo a respeitar as garantias fundamentais do indivíduo e ao mesmo tempo fornecer prova idônea e válida para a futura ação penal Este é cabe a ênfase o ponto a ser desenvolvido neste estudo a percepção de que toda a atividade persecutória e judicial do Estado em qualquer esfera jurisdicional ou administrativa e em qualquer dimen são temporal ou espacial deve revestirse da preocupação de expressar o ponto ótimo da qualidade do serviço público nesse doloroso campo de limitação ou de supressão da liberdade humana10 9 CALAMANDREI Piero Proceso y democracia Trad Hector Zamudio Buenos Aires EJEA 1960 p 37 10 Jens David Ohlin diretor da Cornell Law School salienta que justamente por sua potência em submeter o indivíduo ao poder coercitivo do Estado há que se conter o processo penal por meio de controles que o impeçam de operar em desconformidade com as liberdades democráticas OHLIN Jens David Adjudicative Criminal Procedure Doctrine Application and Practice Amsterdam Wolters Kluwer 2019 p 44 tradução livre 572 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 II A DINÂMICA DAS INVESTIGAÇÕES POLICIAIS Sobre a atividade instrutória em juízo muito já se falou e escreveu O mesmo não se pode dizer do que se realiza em nome do Estado no âm bito da investigação policial ou para ser mais abrangente da investigação criminal em que se investiga o cometimento de um crime para identificar seu autor e fornecer ao titular da ação penal os elementos informativos suficientes e necessários para se assim entender propor a ação penal Essa atividade inicial se dá quase sempre no Brasil em uma de legacia espaço próprio da Polícia Civil visto que ao contrário do que se verifica em outros países o Ministério Público brasileiro como órgão a quem se incumbe com exclusividade o exercício da ação penal pública opera de modo burocrático e passivo ainda que eventualmente possa acompanhar ou ele próprio empreender o trabalho investigativo o que geralmente se nota ocorrer em casos de macrocriminalidade nos quais há empenho institucional mais nítido mercê inclusive da criação de grupos especializados que recebem o nome de Gaeco Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado Certo é que no tocante ao grosso da criminalidade de rua cri mes violentos patrimoniais ou contra a vida e os relacionados ao tráfico de drogas o trabalho investigativo é invariavelmente feito pela Polícia Civil com a particularidade de que nos delitos de mercancia ilícita de drogas as provas que selam o destino do inquérito policial e da futura ação penal costumam ser os depoimentos prestados por policiais milita res que quase sempre foram os agentes públicos a efetuar a prisão em flagrantedelito dos suspeitos11 11 Ademar Borges em diagnóstico do sistema de justiça criminal aponta que A atividade policial brasileira se baseia fundamentalmente na gestão bu rocrática da prisão em flagrante A partir de ampla pesquisa realizada pelo IPEA em parceria com o Ministério da Justiça entre os anos de 2011 a 2013 foi possível concluir que a atividade da política judiciária no Brasil se con centra na espera passiva da realização de prisões em flagrante com baixa realização de atividades ligadas à inteligência policial Depois de analisar a origem dos processos criminais casos em que houve apresentação de denúncia pelo Ministério Púbico em nove Estados da federação o estudo mostrou que mais da metade 576 dos inquéritos policiais instaurados se iniciaram a partir de prisões em flagrante A quase totalidade desses in quéritos 89 indiciaram apenas uma pessoa aquela presa em flagrante 573 Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 Dito de outro modo à parte os crimes relacionados ao tráfico de drogas em que pequenos traficantes e usuários de substâncias psicoativas são presos em operações de rotina das guarnições da Polícia Militar quase tudo que se produz em nível de formação de provas dos crimes em geral para futuro uso na ação penal sai do interior de uma unidade da Polícia Civil E sendo ainda mais específico até porque é disso que iremos tratar doravante a prova do crime de roubo nas hipóteses em que não se haja flagrado e prendido o seu autor consiste eminentemente em um ato a que o Código de Processo Penal denomina reconhecimento formal de pessoa tal qual positivado no art 226 daquele diploma legal Isso ocorre porque quando ao crime não sucede uma prisão em flagrante o trabalho de investigação se direciona a tentar identificar o autor da ação contando com o auxílio da vítima quer por declarações quer por descrição do assaltante para elaboração de um retrato falado quer ainda por identificação de um suspeito que a Polícia lhe apresente como tal Por vezes logo após o evento a vítima descreve o assaltante para a guarnição da PM e esta em diligências nas imediações logra prender alguém com características supostamente similares sendo o suspeito imediatamente trazido ao local onde se encontra a vítima quando esta própria não acompanha os policiais para que confirme tratarse da pessoa que a abordou Quando isso ocorre e o produto do roubo ou algo que ligue o suspeito ao delito é encontrado em seu poder dificilmente se colocará em dúvida o ato de reconhecimento informal salientese realizado Além disso na imensa maioria dos casos 738 a polícia não realizou qualquer outra diligência após a prisão em flagrante A grande maioria das detenções no Brasil decorrem de prisões em flagrante que fazem instaurar inquéritos policiais que contam em cerca de dois terços dos casos com a palavra do policial que efetuou a prisão como única fonte de prova Além disso no caso dos delitos envolvendo o tráfico de entorpecentes 91 das prisões são realizadas com a entrada dos policiais nas residências sem au torização judicial E mais a confissão tem um papel central nas investiga ções policiais o que está na base da institucionalização da tortura como usual técnica de investigação BORGES DE SOUSA FILHO Ademar O controle de constitucionalidade de leis penais no Brasil Belo Horizonte Fo rum 2019 p 46 574 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 pela vítima Em situações assim nem seria necessário um ato formal na delegacia porque já se deu o apontamento direto do autor do crime logo após sua ocorrência pela pessoa lesada o que se amolda talvez com algum esforço argumentativo ao que dispõe o art 302 do CPP Decerto que se poderão levantar questionamentos sobre a confia bilidade de tal identificação insisto não se tratar de ato de reconhecimento formal mas pela experiência de foro dificilmente se desacreditará a versão acusatória apoiada em uma situação assim máxime quando flagra do o suspeito na posse de instrumento ou produto do roubo ou quando confessa seu cometimento Bem diversa será a situação em que não identificado o autor do roubo logo após sua ocorrência a Polícia Civil convida a vítima para horas dias semanas ou meses depois do crime realizar um ato de reco nhecimento formal do suposto autor do crime Nesse caso a crônica judiciária alimentada por relatos repro duzidos em ações penais e em habeas corpus exibe uma riqueza de situações das mais imponderáveis e absurdas para dizer o mínimo de violação frontal ao determinado na lei processual no que diz respeito a esse meio de prova A lei em questão é o Código de Processo Penal que dedica três sucintos artigos ao ato do reconhecimento de pessoas e coisas arts 226 227 e 228 Em relação ao reconhecimento de pessoas o art 226 estabelece que o ato deverá ocorrer da seguinte forma a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever o indivíduo que deva ser reconhecido art 226 I a pessoa cujo reconhecimento se pretender será colocada se possível ao lado de outras que com ela tiverem seme lhança convidandose quem tiver de fazer o reconhecimento a apontála art 226 II se houver razão para recear que a pessoa chamada para realizar o ato por intimidação ou outra influência não diga a verdade em face da pessoa a ser reconhecida a autoridade providenciará para que esta não veja aquela art 226 III do ato de reconhecimento lavrarseá termo pormenorizado subscrito pela autoridade pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais art 226 IV 575 Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 III ALGUNS CASOS DE ERROS JUDICIÁRIOS RELACIONADOS À PROVA DE RECONHECIMENTO FORMAL A despeito da clareza do que preceitua tal comando normativo especialmente quanto à exigência de que a vítima deva antes de iniciar o ato fornecer as características da pessoa a ser reconhecida bem como quanto à previsão de que sejam alinhados ao lado do suspeito outras pessoas a ele semelhantes são frequentes os casos de realização do ato sem a observância de tais formalidades12 De fato motivado pela mudança de jurisprudência no Superior Tribunal de Justiça a partir da decisão proferida pela Sexta Turma no julgamento do Habeas Corpus n 598886SC Rel Ministro Rogerio Schietti Cruz Sexta Turma julgado em 27102020 DJe 18122020 realizouse levantamento com os dados oficiais dos processos espe cialmente os de habeas corpus e de recursos em habeas corpus que tramitaram no Superior Tribunal de Justiça no período de 27102020 a 19122021 entre decisões colegiadas e monocráticas dos dez ministros que integram as duas turmas criminais da Terceira Seção do que resultou a identificação de 89 concessões da ordem postulada tendo como base 12 Em 2011 o professor Brandon Garrett da Universidade de Duke ao publicar pesquisa em que investigou 250 casos de condenados posteriormente ino centados pelo teste de DNA concluiu que os testemunhos oculares são ex pressivamente menos confiáveis do que poderíamos supor Em muitos casos por erros na condução do procedimento policial de identificação do suspeito Muitas dessas testemunhas oculares foram solicitadas a escolher o suspeito usando métodos sugestivos há muito conhecidos por aumentar as chances de um erro A polícia fez comentários que indicavam à testemunha ocular quem deveria ser selecionado durante uma formação usou apresentações em que a testemunha ocular foi perguntada se uma única pessoa era o agressor ou usou alinhamentos de maneira que tornasse óbvio quem a testemunha ocular deveria escolher porque o réu se destacou A sugestão está relacionada ao segundo problema a falsa certeza Embora essas testemunhas estivessem confiantes no julgamento sua falsa confiança pode ter sido criada pelo que veio antes Não apenas as testemunhas oculares estavam de fato erradas ten do identificado uma pessoa inocente mas no julgamento as falhas em sua me mória eram muitas vezes bastante evidentes GARRETT B L Convicting the innocent Where criminal prosecutions go wrong Cambridge Harvard University Press 2011 p 4849 tradução livre 576 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 a constatação de falha vício ou inexistência do ato de reconhecimento formal do acusado13 Nesse universo houve casos de reconhecimentos feitos presen cialmente é dizer com o suspeito detido na delegacia e apontado pela vítima do roubo no levantamento em apenas 13 casos dos 89 catalogados o reconhecimento foi feito presencialmente ou a partir de fotografias do suspeito estampadas em álbum de suspeitos da própria unidade policial ou simplesmente extraídas de redes sociais e exibidas à vítima Cito a título de exemplo alguns casos reproduzidos nes se levantamento No RHC n 133408SC DJe 18122020 de relatoria do Minis tro Sebastião Reis Júnior não ficou demonstrado que o reconhecimento fotográfico realizado na fase do inquérito policial fora corroborado por outros elementos de prova amealhados no feito Os acusados estavam com rostos parcialmente cobertos sem que fosse possível ver totalmente suas faces apenas detalhes de cor de pele olhos compleição física No HC n 630949SP DJe 2932021 de minha relatoria identificaramse diversas irregularidades no auto de reconhecimento Além disso o ofendido deixou claro que foram apresentados outros indivíduos por foto mas para o reconhecimento pessoal o acusado foi exibido sozinho Previamente ao reconhecimento pessoal foram mos tradas à vítima várias fotos entre as quais estaria segundo a autoridade policial a do indivíduo envolvido no roubo sugestionando portanto que ao menos uma pessoa deveria ser reconhecida como indivíduo que participou do delito e buscando na verdade já uma préidentificação do autor do fato Ou seja a vítima não recebeu expressamente a opção de não apontar ninguém no reconhecimento pessoal que foi realizado depois da exibição das fotografias O AgRg no AREsp n 1722914DF DJe 2842021 de relatoria da Ministra Laurita Vaz trouxe hipótese na qual a vítima reconheceu o agravante apenas na fase investigativa depois de lhe serem mostradas as fotos constantes de álbum fotográfico e porque o conheceria das redes 13 Disponível em httpswwwstjjusbrsitesportalpPaginasComunicacao Noticias06022022Reconhecimentodepessoasumcampofertilparaoer rojudicialaspx Acesso em 25 abr 2022 577 Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 sociais O ofendido disse que reconheceu o acusado pela touca que usava no dia do delito inclusive porque teria ele uma foto nas redes sociais em que portava a mesma peça de vestuário Contudo a vítima afirmou haver se lembrado do agravante em razão das características de seu rosto que seriam bem peculiares rosto seco e nariz achatado Disse ainda que o reconheceu pelas tatuagens no braço entretanto ao mesmo tempo afirmou que este estava com blusa de mangas compridas no momento da prática delitiva o que se mostra incompatível a menos que as instâncias ordinárias houvessem explicitado o motivo pelo qual seria possível esse reconhecimento o que não ocorreu No HC n 648232SP DJe 2152021 de relatoria do Ministro Olindo Menezes Desembargador convocado do TRF1 o réu foi reconhe cido através de uma viseira aberta de seu capacete acessório que usava no momento do fato Destacase da sentença absolutória que a vítima certamente dificultada pela visibilidade e pelo uso de capacete não foi nada assertiva no reconhecimento pessoal em juízo No julgamento do HC n 652284SC DJe 352021 o Ministro Reynaldo Soares da Fonseca registrou que o reconhecimento fotográfico serve como prova apenas inicial e deve ser ratificado por reconhecimento presencial assim que possível A esses casos somamse os já mencionados no HC n 598886SC relativamente a processos em que se ilustrou algo presente com relativa frequência na crônica judiciária conforme breve narrativa ali feita do que ocorreu com os acusados Vinícius Romão de Souza André Luiz Medeiros Biazucci Cardoso Luiz Carlos Justino Douglas Moreira Antonio Claudio Barbosa de Castro e Lucas Moreira de Souza14 Em arremate faço menção a evento que se poderia chamar de a mais clara amostra do tipo de investigação que se tem produzido com base em prova como tal no Ceará em inquérito no qual investiga a Cha cina da Sapiranga que deixou cinco mortos em Fortaleza CE a Polícia 14 Para um extenso exame de casos de reconhecimentos pessoais viciados e de pesquisas desenvolvidas sobre o tema consultar também GARRETT B L Convicting the innocent Where criminal prosecutions go wrong Cambridge Harvard University Press 2011 e MARMELSTEIN George Testemunhando a injustiça A ciência da prova testemunhal e das injustiças inconscientes Sal vador Juspodium 2022 578 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 Civil incluiu em reconhecimento fotográfico uma foto do ator americano Michael B Jordan Como dito por Janaina Matida e William Cecconello O fato de que uma foto de um ator hollywoodiano tenha tido sua imagem exibida em investigação no Ceará escancara a total ausência de critérios para a inclusãoexclusão da fotografia de alguém em álbum de suspeitos bem como a falta de transparência quanto à procedênciaorigem delas pois é inegável que a imagem foi conseguida na internet sem que se impusesse qualquer freio à utilização da imagem daquela pessoa15 Ainda sobre o levantamento realizado com dados da Seção Crimi nal do Superior Tribunal de Justiça a data do crime relativo a cada processo examinado permite concluir considerando que o ato de reconhecimento não tenha ocorrido muito tempo depois que a quase totalidade dos casos julgados no sentido da desconformidade do ato com o modelo normativo referese a fatos acontecidos antes da decisão proferida no HC n 598886 SC Isso leva à ilação de que após a mudança da orientação jurisprudencial ocorrida com o julgamento desse habeas corpus acórdão publicado em 27102020 não foi significativo o número de impetrações em que se reconheceu tal ilegalidade O dado pode ser animador se pudermos extrair a conclusão de que tem havido alguma ressonância nas instâncias ordinárias como se deveria esperar que houvesse da nova diretriz do STJ mesmo que se tenha notícia de um caso ou outro em que a autoridade judicial ainda decreta prisão ou até condena o acusado diante de um conjunto probatório que se resume tão somente ao ato de reconhecimento formal viciado Digna de registro a propósito foi a expedição em 7 de janeiro de 2022 pela VicePresidência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro do Aviso 2ªVP 012022 por meio do qual o Desembargador Marcus Basílio recomenda aos magistrados fluminenses que reavaliem com urgência as decisões em que a prisão preventiva do acusado foi decretada tão somente com base no reconhecimento fotográfico operado 15 Disponível em O que há de errado no reconhecimento fotográfico de Michael B Jordan Disponível em httpswwwconjurcombr2022jan08opiniao erradoreconhecimentofotograficomichaeljordan Acesso em fev 2022 579 Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 sem a observância do disposto no art 266 do CPP medida alvissareira e indicativa de uma compreensão por parte da cúpula daquele impor tante tribunal acerca da necessidade de mudança da orientação que até então prevalecia16 Cabe aqui importante registro como já dito os tribunais in clusive o Superior Tribunal de Justiça mantinham uma linha de deci são invariavelmente tolerante com os vícios do ato de reconhecimento de que resultavam prisões e condenações de réus acusados do come timento de roubo No voto proferido na relatoria do HC n 598886SC fezse questão de destacar esse detalhe Por sua vez precedentes dos Tribunais inclusive desta Corte Superior e também de minha relatoria tem tolerado essas irre gularidades sob o argumento de que o art 226 do CPP constitui mera recomendação não ensejando nulidade da prova eventual descumprimento dos requisitos formais ali previstos Não obs tante essa orientação jurisprudencial proponho sejamos capazes de abandonar essa interpretação mercê da qual se convalida de algum modo o reconhecimento tanto pessoal quanto fotográfico feito em desacordo com o modelo legal ainda que sem valor probante pleno e que pode estar dando lastro a condenações temerárias É assustador e constrangedor imaginar quantas pessoas podem ter sido presas e cumprido pena no passado em razão dessa tolerância cômoda à admissão de tal tipo de procedimento policial cujos vícios eram considerados irrelevantes pois afinal dizíamos que o art 226 do CPP constituía apenas uma recomendação Por isso é de fundamental importância que se consolide essa nova jurisprudência em todos os graus de jurisdição mais do que isso urge que as próprias corporações policiais se conscientizem da necessidade de modificar suas rotinas para evitar novos erros judiciários Nesse sentido se empenha Grupo de Trabalho no âmbito do Conselho Nacional de Justiça integrado por mais de 40 profissionais 16 A recomendação foi objeto de Nota Pública de apoio por parte da Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais APCF 580 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 acadêmicos e pesquisadores de diversas origens do qual se esperam alguns produtos que irão contribuir para a minimização dos riscos de erros judi ciários causados por falhas no processo de reconhecimento de pessoas17 IV A NECESSIDADE DE MELHORIA DA QUALIDADE DA ATIVIDADE INVESTIGATIVA Nosso Código de Processo Penal acaba de completar 80 anos de existência e não obstante as reformas legislativas que lhe foram modi ficando os institutos e os procedimentos visando à sua modernização conserva ainda o ranço inquisitorial e autoritário de sua origem Como tive ocasião de anotar em apresentação a obra coletiva Certo é que vivíamos no primeiro quartel do século XX sob a influência de governos e líderes políticos de viés autoritário de que resultava a sedimentação de ideias centradas no predomínio do Estado com a anulação do indivíduo em prol do bemestar social a Era de Extremos referida por HOBSBAWM e estereotipada no Brasil especialmente pela bipolarização política que marcou a década de 30 do Século XX tendo de um lado a Ação Integralista Brasileira de influência fascista e de outro a Aliança Nacional Libertadora vinculada aos ideias do comunismo Na trilha do movimento europeu a ditadura de Getúlio Vargas cons truiu um Estado corporativo baseado numa concepção hierárquica e orgânica da sociedade Nessa ambiência política infensa a ares democráticos é outorgado o Código de Processo Penal de 1941 que bebeu na fonte do homólogo código italiano declaradamente voltado para a conservação e defesa do Estado característica do então regime fascista ali vigente Daí soar natural a assertiva do fautor do Código de Processo Penal de 1941 o Ministro da Justiça Francisco Campos para quem o interesse da administração da justiça não pode continuar a ser sacrificado por obsoletos escrúpulos formalísticos sendo mister forjarse um procedimento apto a permitir maior eficiência 17 Cfe Portaria nº 209 de 31 de agosto de 2021 da lavra do Presidente do CNJ e do STF Ministro Luiz Fux 581 Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 e energia da ação repressiva do Estado contra os que delinquem Exposição de Motivos Semelhante carga ideológica e estatizante da versão original do nosso atual Código começa a ruir com a democratização do Brasil nomeadamente com a promulgação da Carta Política de 1988 momento em que definitivamente e com um século de atraso o nacional deixa de ser súdito e passa a ostentar o título de cidadão com uma miríade de direitos individuais reconhecidos no Bill of Rights art 5º da Carta de 1988 não por acaso conhecida desde a referência feita por um de seus próceres o Deputado Constituinte Ulisses Guimarães como a Constituição Cidadã18 Pois bem já se vão mais de três décadas desde a implantação da nova ordem constitucional e parece ainda estarmos em alguns segmentos impregnados de certos hábitos e visões de mundo que grassavam nesse modelo que forjou nossa cultura jurídica nos séculos passados Como também já anotei O pensamento jurídico dominante na Justiça Criminal brasileira tanto no mundo das normas e da Academia law on the books quanto no mundo dos fatos e do Fórum law in action ainda se prende a valores costumes rotinas e normas características de uma formação jurídica de origem lusitana Estamos a falar portanto de permanências históricoculturais do direito ibérico de um modo geral e do direito português de modo particular NEDER 2000 13 as quais deixaram muitas marcas em nosso Código de Processo Penal principalmente na divisão dos papéis desempenhados pelos sujeitos processuais responsáveis pela persecução penal ao longo dos 300 anos de regime colonial quase 70 de regime monárquico imperial e 100 anos de regime republicano até o advento da Constituição de 1988 Em verdade do Brasil por tudo o que ocorreu em seus três sécu los de domínio português pouco se podia esperar Colonização predatória ausência de brasilidade dos que transitaram ou se instalaram em nosso território aversão ao trabalho por parte dos 18 Apresentação In BADARÓ Gustavo MADEIRA Guilherme SCHIETTI Rogerio Código de Processo Penal Estudos comemorativos aos 80 anos de vigência São Paulo Revista dos Tribunais 2021 582 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 detentores do capital e das terras sacralização da educação dos habitantes inexistência de investimento na cultura e nas ciências são alguns dos fatores que atrasaram a inclusão do país no concerto das nações contemporâneas19 Sobre o tema Luiz Eduardo Soares observa que a arquitetura institucional da segurança pública que a sociedade brasileira herdou da ditadura e permaneceu intocada nesses trinta anos de vigência da Cons tituição Cidadã impediu a democratização da área e sua modernização o que contrasta com o dinamismo acelerado que vem caracterizando o país no último quarto de século Conclui assim que a transição demo crática não se estendeu ao campo da segurança pública20 De fato se examinarmos os procedimentos adotados em inquéritos policiais não iremos notar nada de substancialmente diferente em relação ao que sempre se fez nomeadamente em investigações por crimes de rua É dizer a lógica que prevalece nas investigações é a usual direcio nada a obter confissões e depoimentos de testemunhas E especialmente no caso dos crimes de roubo a diligência fundamental que assegura a tranquilidade à autoridade policial desvendei a autoria é o ato de reconhecimento do investigado No sistema das provas legais vigente em boa parte da Idade Média estabeleciamse prévia e abstratamente algumas regras para a avaliação da prova Havia tabelas em que se atribuía uma espécie de valor ou 19 CRUZ Rogerio Schietti M Rumo a um processo penal democrático In Jus tiça Criminal e Democracia Coord Bruno A Machado São Paulo Marcial Pons 2013 p 2358 Somese a esses ingredientes a questão racial que está impregnada em muitos comportamentos subjetivos e institucionais no apa rato repressivo brasileiro Um bom indicativo desse racismo impregnado em nossas práticas institucionais deflui do resultado do levantamento feito pela Comissão Criminal do CONDEGE Colégio Nacional dos Defensores Públicos Gerais Disponível em httpswwwdefensoriarjdefbruploadsarqui vos92d976d0d7b44b338a660ec06af008fapdf Acesso em 12 maio 2022 a respeito de pessoas absolvidas em processos iniciados por reconhecimento fotográfico não confirmado em juízo A partir de relatos de 75 processos por todo o país entre junho de 2019 e dezembro de 2020 de um total de 85 pessoas em 77 dos casos foi decretada a prisão preventiva com média de tempo de prisão de aproximadamente 9 meses Além disso verificouse que em 81 dos casos os acusados são pessoas negras 20 SOARES Luiz Eduardo Desmilitarizar São Paulo Boitempo 2019 p 25 583 Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 tarifa a cada meio de prova daí também ser conhecido como sistema das provas tarifadas Dessa época vêm aforismos ainda influentes em seus desdobramentos práticos como é o caso da antiga regra segundo a qual confessio est regina probationum a confissão é a rainha das provas E em nome dessa regra probatória os maiores abusos e crimes foram cometi dos e justificados sem considerar os prejuízos causados à qualidade das investigações em geral visto que se deixava de buscar outras fontes de prova mais idôneas e seguras quando se obtinha a confissão do suspeito O reconhecimento formal do suspeito tem mutatis mutandis a mesma função da confissão permitir à autoridade policial considerar encerrada a tarefa de investigar a autoria delitiva e por conseguinte considerar provado o crime em seus aspectos objetivo e subjetivo É o que ele precisa para concluir o inquérito e enviálo ao representante do Ministério Público Este por sua vez não se constrange em boa parte dos casos de acusar alguém com base tão somente em um reconhecimento formal quase sempre levado a cabo sem a mínima observância do que determina a lei A denúncia é oferecida o acusado provavelmente já estará preso com base também nessa prova isolada e o processo ca minhará até a instrução na qual mesmo com a ausência de confissão do réu e sem que se perquira sobre o procedimento adotado no momento do reconhecimento na delegacia o juiz à luz da confirmação pela vítima de que reconheceu mesmo o imputado na fase inquisitorial o condena às penas do crime de roubo Esse é o usual script retratado nos muitos processos que têm chegado ao Superior Tribunal de Justiça em habeas corpus impetrados muitas vezes anos depois da condenação animados pela mudança de rumos da jurisprudência dessa Corte Notase como assere Janaína Ma tida que sob a retórica do combate à criminalidade e à impunidade o reconhecimento sem apreço às formalidades se consolidou como rotina nas delegacias de polícia Brasil afora logo chanceladas por promotores e magistrados nas etapas que se seguem ao inquérito criminal21 21 MATIDA Janaína Considerações epistêmicas sobre o reconhecimento de pessoas produção valoração e insatisfação do standard probatório penal In MADEIRA Guilherme BADARÓ Gustavo SCHIETTI CRUZ Rogerio Código de Processo Penal estudos comemorativos aos 80 anos de vigência v 2 São Paulo RT 2021 p 141155 584 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 Em outro texto a mesma autora na companhia de William Cecconello foi mais enfática condenações injustas são produto de uma cadeia de irregularida des cometidas por uns aproveitadas e chanceladas por outros Cuidar seriamente de evitar condenações injustas demandará um giro comportamental que entre outras coisas deverá conduzir ao abandono da lógica das investigações a jato que se contentam com verdadeiros vazios probatórios É preciso rumar para o de senvolvimento de uma investigação epistemicamente orientada que não ofereça injustificado protagonismo a uma única prova muito menos quando é irregularmente produzida22 Insta reforçar que conquanto a responsabilidade maior seja do magistrado que chancela essa prova e a considera idônea e suficiente para a condenação ou para a prisão cautelar mesmo à falta de outras que robusteçam a versão acusatória a falha se dá porque a autoridade policial que produziu a prova e o Ministério Público que a usou como lastro para acusar o réu eou requerer sua prisão e condenação deixa ram de seguir o comando normativo Ou seja o erro não é meramente judicial ou judiciário é um erro que nasce com o delegado de polícia ou eventualmente antes com os policiais militares se mantém com o promotor de justiça e se densifica e produz seus efeitos mais duradouros e dramáticos com a pena do magistrado23 22 MATIDA Janaina CECCONELLO William Outra vez sobre o reconhecimento fotográfico i102021 Conjur Disponível em httpswwwconjurcom br2021out01limitepenaloutravezreconhecimentofotograficoftn4 Acesso em 19 jan 2022 23 Em obra com título provocativo Chemerinsky anota Os magistrados prova velmente minimizam as chances de que uma testemunha identifique a pessoa errada ignorando todos os estudos que mostram que os reconhecimentos são frequentemente falsos e ainda assim persuasivos para os jurados A Suprema Corte confia nos policiais para prender e processar a pessoa certa e está dis posta a presumir que aquela pessoa é culpada Mesmo que a polícia às vezes cometa erros a Corte assume testemunhas geralmente são acuradas e se não são o exame cruzado delas é suficiente para proteger os inocentes Eu temo que a premissa não explícita da Corte é de que é mais importante condenar alguém ainda que seja a pessoa errada do que deixar um crime sem solução CHEMERINSK Erwin Presumed Guilty How the Supreme Court Empowered the Police and Subverted Civil Rights Liveright 2021 p 183 tradução livre 585 Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 Esse erro sistêmico depende para ser extirpado ou ao menos minimizado de uma mudança da rotina policial mediante a forte atua ção fiscalizadora do Ministério Público de quem se espera não apenas a função de receber passivamente as provas produzidas pela Polícia o que vou explorar adiante e a rejeição da prova pelo juiz competente Em uma palavra é preciso rever os costumes persecutórios e o automatismo com que se tratam esta e outras questões relativas à investigação criminal inclusive se for o caso abandonandose o conforto dos entendimentos pacificados no âmbito jurisprudencial24 V NOVAS ROTINAS INVESTIGATIVAS PELA POLÍCIA CIVIL No voto proferido no já referido Habeas Corpus n 598886 SC destacouse um item para exortar os órgãos de persecução penal e o próprio Poder Judiciário a imprimirem racionalidade a esse proce dimento policial de sorte a se apropriarem de técnicas pautadas nos avanços científicos para que se promovam os ajustes necessários a evitar que os reconhecimentos equivocados sigam produzindo condenações de inocentes Innocence Project Brasil Prova de reconhecimento e erro judiciário São Paulo 1 ed jun2020 p 3 Fezse alusão inter alia a Machado e Barilli que asseriram A academia já foi capaz de produzir inúmeras pesquisas sobre as mazelas do sistema de persecução penal inclusive das nefastas práticas policiais quanto às falsas identificações pessoais Faltam agora estratégias concretas que acolhidas pelo poder público possibilitem a devida instrução e correta implementação de proto colos técnicos de reconhecimento pessoal nos diferentes âmbitos da Justiça criminal brasileira25 24 RAPHAELLI Rafael Domingos Barroso da Costa MELO Andrey Régis de O Brasil que se revela pelo reconhecimento fotográfico o inconsciente de nossas práticas em persecução penal In MADEIRA Guilherme BADARÓ Gustavo SCHIETTI CRUZ Rogerio Código de Processo Penal estudos come morativos aos 80 anos de vigência v 2 São Paulo RT 2021 p 239254 25 MACHADO Leonardo Marcondes BARILLI Raphael Jorge de Castilho O reconhecimento de pessoas como fonte de injustiças criminais Disponível em 586 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 A observação de ambos os professores é correta e precisa é farta hoje a literatura sobre a exigência de se imprimir racionalidade à atividade probatória com a criação de standards que seguidos poderão conferir mais idoneidade e segurança às provas produzidas em ações penais Reclamase uma dimensão epistêmica na produção dos elemen tos de conhecimento sobre os fatos em torno dos quais gira a atividade probatória de tal sorte a assegurar que se obtenham todos os meios lícitos relevantes e razoavelmente disponíveis aos sujeitos processuais quanto à melhor prova razoavelmente disponível sobre os pontos fáticos controvertidos26 Cabe avançar para a concretização do discurso acadêmico E a iniciativa para a devida conformidade dessa prova ao modelo legal deve partir também das próprias Polícias civil e federal Em 2014 a Academia Nacional de Ciências norteamericana convocou um painel de especialistas para investigar o problema da iden tificação de testemunhas oculares a partir de evidências crescentes de registros científicos baseados em testes de DNA de condenações de inocentes Concluíram que tais disfuncionalidades decorrem de uma ple tora de erros que vão desde a ingenuidade científica e o viés investigativo até o desrespeito do Ministério Público e a ignorância judicial bem como uma tendência humana natural de confiar no que as pessoas dizem Por fim ofereceram algumas sugestões de reforma de tais procedimentos Essas recomendações foram 1 treinar todos os policiais sobre as variáveis que podem afetar a identificação de testemunhas oculares 2 adotar procedimentos cegos de alinhamento e matriz de fotos como ter o procedimento administrado por um policial que não está envolvido na investigação subjacente 3 fornecer aos oficiais que administram os procedimentos instruções padronizadas httpswwwconjurcombr2019jul16academiapoliciareconhecimen topessoasfonteinjusticascriminais Acesso em 1042002 26 WANDERLEY Gisela A Entre a probabilidade e a segurança do juízo de fato a completude do conjunto probatório evidencial completeness e a melhor prova best evidence como princípios de valoração probatória In MADEI RA Guilherme BADARÓ Gustavo SCHIETTI CRUZ Rogerio Código de Processo Penal estudos comemorativos aos 80 anos de vigência v 2 São Pau lo RT 2021 p 4767 587 Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 para oitiva de testemunhas destinadas a evitar sugestividade e contaminação 4 documentar o nível de confiança declarado da testemunha no momento da identificação e 5 filmar processo de identificação de testemunhas27 Até que essas mudanças não ocorram voluntariamente no âmbito das próprias polícias cumpre ao Ministério Público exercer efetivamente a função de controle externo da atividade policial dada sua ínsita função de custos iuris a qual deflui do desenho constitucional de suas missões com destaque para a defesa da ordem jurídica do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis art 127 caput bem assim da sua específica função de zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos inclusive é claro dos que ele próprio exerce promovendo as medidas necessárias a sua garantia art 129 II Não é desnecessário lembrar outrossim como bem frisa Fi gueiredo Dias que interessando à comunidade jurídica não só a punição de todos os culpados mas também sobretudo dentro de um verdadeiro Estado de Direito a punição só dos que sejam culpados seguese daí que ao Ministério Público como órgão de administração de justiça há de competir trazer à luz não só tudo aquilo que possa demonstrar a culpa do arguido mas também todos os indícios de sua inocência ou da sua menor culpa28 Arremata o mestre lusitano que mesmo sob o ponto de vista prático não faz sentido extirpar do Parquet esse dever de objetividade pois graças a ele resulta um muito menor número de processos penais in fundados ou mal fundados com os quais os tribunais terão de ocuparse29 27 ALBRIGHT T D RAKOFF J S The impact of the national academy of scien ces report on eyewitness identification Proceedings of the National Academy of Sciences PNAS 2017 p 26 tradução livre 28 FIGUEIREDO DIAS Jorge de Direito processual penal Coimbra Coimbra Editora 1984 v 1 p 369 29 Ibid 588 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 O Poder Judiciário a seu turno tem a responsabilidade de pro teger os direitos do acusado contra incursões arbitrárias ou ilegais por parte dos órgãos de persecução Mais ainda é preciso que se tenha a coragem de doravante não mais validar qualquer reconhecimento pessoal ou fotográfico em desconformidade com o art 226 do CPP Na precisa assertiva de Antônio Vieira a prevenção de erros e especialmente de condenações errôneas passa por uma im portante mudança de atitude em relação ao reconhecimento de pessoas passando da postura comum até então de confiança exagerada e percepção de suficiência na prova de identificação para uma atitude de ceticismo epistêmico30 Nessa perspectiva ao julgar o Habeas Corpus n 712781 Rel Ministro Rogerio Schietti Cruz Sexta Turma julgado em 1532022 DJe 2232022 fezse o seguinte registro em voto acolhido à unanimidade perante a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça Sob outra perspectiva devem as agências estatais de investiga ção e persecução penal envidar esforços para rever hábitos e acomodações funcionais de sorte a utilizar instrumentos para maximizar as probabilidades de acerto na decisão probatória em particular aqueles que visam a promover a formação de um conjunto probatório o mais rico possível quantitativa e qualitativamente FerrerBeltrán op cit p 255 Impõe compreenderse que a atuação dos agentes públicos res ponsáveis pela preservação da ordem e pela apuração de crimes deve se dar em um marco de respeito às instituições às leis e aos direitos fundamentais Ou seja quando se fala de segurança pú blica esta não se pode limitar à luta contra a criminalidade deve incluir também a criação de um ambiente propício e adequado para a convivência pacífica das pessoas e respeito institucional a quem se vê na situação de acusado e antes disso de suspeito 30 VIEIRA Antônio Riscos Epistêmicos no Reconhecimento de Pessoas con tribuições a partir da neurociência e da psicologia do testemunho Boletim Revista do Instituto Baiano de Direito Processual Penal Ano 2 n 3 2019 Sal vador IBADPP p 1516 589 Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 Convém lembrar que as prescrições legais relativas às provas cum prem não apenas uma função epistêmica ie de conferir fiabilidade e segurança ao conteúdo da prova produzida mas também uma função de limitar o exercício do poder dos órgãos encarregados de obter a prova para uso em processo criminal visàvis os direitos inerentes à condição de suspeito investigado ou acusado Nesse sentido é sempre oportuna a lição de Perfécto Ibañez que divisa na exigência de cumprimento das prescrições legais relativas à prova uma função implícita que é a de induzir os agentes estatais à observância dessas normas o que se perfaz com a declaração de nulidade dos atos praticados de forma ilegal E acrescenta De que esto se haga con rigor depende en buena parte la regularidad de ulteriores actuationes como la irregu laridad endémica de muchas de las que habitualmente se producen entre nosotros depende de la escasa relevancia y alcance que en general por razones defensistas que no acostumbran a explicitarse suele atribuirse a algún género de incumplimientos IBÁÑEZ Perfecto Andrés La función de las garantías en la actividad probatoria In La restricción de los derechos fundamentales de la persona en el proceso penal Madri 1993 p 242242 Essa nova linha jurisprudencial implica certamente desconsti tuição de decisões e anulação de processos com possível incremento do número de culpados beneficiados nos casos em que tendo sido efetiva mente autores de um roubo forem beneficiados pelo reconhecimento da invalidade da prova formada em seu desfavor Mas implica em direção contrária a soltura e a absolvição de pessoas injustamente processadas porque inocentes e a evitação de novos erros judiciários minimizando assim o percentual de casos de condenações injustas e ilegais É a opção pela diretriz de que nenhum inocente pode ser punido mesmo que isso implique a não punição de alguns culpados 31 31 FERRAJOLI Luigi Direito e Razão Teoria do garantismo penal São Paulo Re vista dos Tribunais 2002 p 85 590 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 VI A PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA JÁ NA FASE INVESTIGATIVA COMO PREMISSA PARA O APERFEIÇOAMENTO DA PROVA PRODUZIDA Na compreensão do significado e do alcance da presunção de inocência quer como princípiomotriz quer como derivação do favor rei sobreleva reconhecer que sua mais forte injunção se verifica na vertente de regra de tratamento Sob tal angulação o princípio da presunção de inocência exige que o investigado ou acusado seja tratado com respeito à sua pessoa e à sua dignidade e que não seja equiparado àquele sobre quem já pesa uma condenação definitiva Mais ainda o estado de inocência assegura ao investigado ou réu a lealdade do procedimento penal desde seu nasce douro Assim todos os que de algum modo intervêm no inquérito e no processo juízes membros do Ministério Público policiais servidores se obrigam a ter uma correção de comportamento vinculados aos limites e à forma da lei relativamente ao sujeito passivo da persecução penal32 de sorte a impedir o Poder Público de agir e de se comportar em relação ao suspeito ao indiciado ao denunciado ou ao réu como se estes já houvessem sido condenados definitivamente por sentença do Poder Judiciário HC n 115613 Relator Ministro Celso de Mello Segunda Turma julgado em 2562013 DJe155 1382014 Ainda há muito a caminhar não apenas em países sem tradi ção democrática mas também em nações centrais onde são férteis os exemplos de anacronismos punitivos autoritarismos de agentes públicos desumanidades no cumprimento de penas e uma ainda surpreendente falta de claro repúdio social a práticas não mais compatíveis com uma sociedade que se pretende fraterna pluralista e sem preconceitos fundada na harmonia social e comprometida na ordem interna e internacional com a solução pacífica das controvérsias Preâmbulo da Constituição do Brasil de 1988 Decerto que a postura da sociedade em relação ao modo de ser do processo penal tem a ver com a maneira autoritária ou respeitosa 32 DALIA Andrea Antonio FERRAIOLI Marzia Manuale di diritto processuale penale Milão Cedam 2003 p 256 591 Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 com que o Estado por suas agências punitivas e seu Poder Judiciário conduz a relação processual no que concerne ao tratamento dispensado ao acusado Dizme como tratas o arguido dirteei o processo penal que tens e o Estado que o instituiu como alerta Figueiredo Dias33 bem expressa essa dupla possibilidade Nessa perspectiva e ante a percepção de que a porta de entrada do sistema de justiça criminal é a unidade policial é preciso que os Estados democráticos hodiernos se deem conta de que a proteção dos cidadãos por parte dos agentes da ordem deve se dar em um marco de respeito às instituições às leis e também aos direitos fundamentais Ou seja quan do se fala de segurança pública esta não se pode limitar à luta contra a criminalidade deve incluir também a criação de um ambiente propício e adequado para a convivência pacífica das pessoas e respeito institucional a quem se vê na situação de acusado e antes disso de suspeito34 Carnelutti em uma de suas fecundas lições expressou a com preensão de que o castigo infelizmente não começa com a condenação senão que começou muito antes com o debate a instrução os atos preli minares inclusive com a primeira suspeita que recai sobre o imputado35 Assim o zelo com que se houver a autoridade policial ao con duzir as investigações determinará não apenas a validade da prova ob tida afinal como metaforicamente lembra Jordi FerrerBeltrán sem bons ingredientes não haverá forma de fazer um bom prato36 mas a 33 FIGUEIREDO DIAS Jorge de Direito processual penal Coimbra Coimbra Editora 1984 v 1 p 428 34 No final de uma pesquisa sobre abordagem policial e relações entre polícia e população fazse necessário ter em mente que a polícia é apenas a parte mais visível da engrenagem do sistema de justiça criminal Ele é formado por polí cias defensoria ministério público justiça e sistema penitenciário A polícia é a ponta visível e externa do sistema quem está nas ruas e exerce a prática fardada e armada da produção de suspeição acusação e condenação O papel dos agentes policiais camufla os papéis igualmente decisivos de delegados promotores juízes e agentes penais na manutenção e na reprodução cotidia na do racismo RAMOS Silvia et al Negro trauma racismo e abordagem po licial no Rio de Janeiro Rio de Janeiro CESeC 2022 p 46 e 50 35 CARNELUTTI Francesco Lições sobre o Processo Penal Tomo I Trad Fran cisco José Galvão Bruno Campinas Bookseller 2004 p 36 36 FERRERBELTRÁN Jordi Valoração racional da prova Trad Vitor de Paula Ramos Salvador Juspodium 2021 Introdução 592 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 própria legitimidade da atuação policial e sua conformidade ao modelo constitucional assentado em valores e princípios como o da dignidade da pessoa humana e o da presunção de não culpabilidade malferidos quando o suspeito já é tratado como um culpado e se lhe subtrai o direito a que toda prova eventualmente produzida em seu desfavor passe pelo teste da racionalidade e da idoneidade epistêmica A propósito Thiago R Oliveira André Zanetic e Ariadne Natal anotam que as instituições de segurança e justiça costumam adotar uma estratégia de impor o respeito à lei por meio da dissuasão maximizando a certeza e a severidade da pena pelos crimes praticados Nesses siste mas em que se inclui o modelo brasileiro o policiamento valoriza indicadores da eficácia policial apresentados como números de apreen sões e prisões em detrimento de questões como vitimização percepção da população a respeito de medo insegurança ou mesmo a qualidade do tratamento dos policiais Por certo afirmam os pesquisadores que os países assim confi gurados conseguem alguma eficácia no papel de estimular o respeito à lei mas outros caminhos poderiam levar a um resultado melhor Apoiados na teoria da justiça procedimental desenvolvida originalmente por Tom Tyler e testada por uma série de pesquisas realizadas em diversos países o que melhor estimula a obediência da população às normas relacionase à legitimidade da autoridade ou seja envolve o modo como seus agentes se comportam durante os encontros com os cidadãos sendo tratados com respeito e imparcialidade e reconhecendo decisões tomadas com alta qualidade os indivíduos tendem a perceber a autoridade como legítima Vale a menção a alguns segmentos do texto Outrossim Tyler argumenta que o julgamento que as pessoas fazem a respeito da forma como as leis são aplicadas e como a autoridade age no cotidiano são elementos fundamentais para assegurar a legi timidade É o que ele chama de justeza procedimental procedural justice no original um conceito que faz referência à qualidade do processo decisório e do tratamento interpessoal levando em conta a existência dos seguintes elementos a participação nas decisões ou seja se as pessoas envolvidas são ouvidas e seus pon tos de vista considerados b neutralidade que envolve decisões objetivas baseadas em fatos sem viés pessoal discriminação ou 593 Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 favorecimento de grupos específicos c transparência com relação aos procedimentos e decisões tomadas d qualidade do tratamento interpessoal o que envolve educação dignidade respeito e corte sia e confiança nas intenções das autoridades e que suas decisões levam em consideração o bemestar e a necessidade daqueles que são afetados Sunshine e Tyler 2003 Tyler 2004 2009 O modelo de Tyler contrapõe essencialmente os meios e os fins do trabalho policial De acordo com esse autor o que faz com que a população confira legitimidade à instituição policial não é uma avaliação positiva do trabalho realizado pelos policiais isto é não é a eficácia policial mas a avaliação positiva do tratamen to recebido pelos oficiais Havendo justeza nos procedimentos cotidianos e nas interações entre cidadãos e policiais maior a percepção de legitimidade37 De fato sem que haja uma postura de respeito ao indivíduo inclusive o que se apresenta como suspeito de um crime não há avanços a assinalar na área da segurança pública e do sistema de justiça crimi nal como um todo Isso não significa desconsiderar os indícios que levem à possível responsabilização penal do suspeito muito menos significa negligenciar os meios probatórios e investigativos postos à disposição da polícia para o esclarecimento da autoria delitiva Em verdade o que se espera de todo e qualquer agente público que potencial ou atualmente interfere na liberdade de alguém é um comportamento de respeito às normas e acima de tudo civilidade no trato com os envolvidos em um fato criminoso nada mais do que isso38 37 OLIVEIRA Thiago R ZANETIC André NATAL Ariadne L Preditores e im pactos da legitimidade policial testando a teoria da justeza procedimental em São Paulo Dados Revista de Ciências Sociais 2019 38 Merece menção entre tantas outras a orientação constante dos Princípios sobre Entrevistas Eficazes para Investigação e Coleta de Informações co nhecidos como Princípios de Méndez de que 47 As autoridades devem assegurar que todas as pessoas entrevistadas gozem de seus direitos humanos sem qualquer distinção adversa e que sejam tratadas sem discriminação A implementação efetiva da isenção de discriminação garante que todas as pes soas entrevistadas sejam iguais perante a lei e sejam tratadas com respeito e com a devida consideração e proteção específica de quaisquer situações 594 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 Sublinhese ainda que a tão apregoada presunção de inocência não diz respeito apenas à atividade judicial ou processual pois incide em qualquer dimensão funcional do Estado quando um de seus agentes se depara com a atribuição de uma possível acusação contra alguém Desde o policial militar passando pelas autoridades policiais e pelo representante do Ministério Público todos sem exceção devem tratar o suspeito ou acusado até que se prove o contrário como inocente Perfecto Ibáñez obtempera que a vigência do princípio da pre sunção de inocência com todas as suas implicações é o que impede que o processo penal seja um mero rito formal de castigo tanto sob a vertente da regra de tratamento do acusado primeiramente assumida como reação às atrocidades da justiça do ancien régime com a massiva utilização da tortura como sobretudo em sua qualidade de regra de julgamento caracterizada à necessidade de que a aplicação do ius puniendi seja associada à prévia determinação de uma verdade fáctica de qualidade seguindo um curso processual que inescusavelmente deverá decorrer dentro de um exigente marco de garantias jurídicas E esse direito a que se presuma sua inocência unicamente poderá decair na presença de prova condenatória suficiente para superála mas se e apenas se lícita ou regularmente adquirida Portanto depois de que isso já tenha sido produzido Nunca antes39 Mesmo para quem como Jordi Nieva Fenoll considera não in cidir a presunção de inocência na atividade préprocessual porque la policia no parte de la presunción de inocência en sus investigaciones e assim tiene de utilizar la sospecha como motor de sus actuaciones porque de lo contrario no las realizaria e ainda que em compensação sustente a ausência de valor probatório para um juízo de condenação do material investigativo e até pericial feito na fase anterior ao processo de vulnerabilidade que possam enfrentar Disponível em httpswwwapt chsitesdefaultfilespublicationsaptPoEIPOR03pdf 39 ANDRÉS IBÁÑEZ Perfecto Princípio de presunção de inocência e princípio de vitimização uma convivência possível Trad Janaina Matida e Aury Lopes Jr Revista Brasileira de Ciências Criminais Ano 29 v 185 nov 2021 p 85100 595 Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 judicial não admite por óbvio tratamento divorciado do modelo nor mativo e desrespeitoso aos direitos de quem ainda não é culpado40 Isso violaria não apenas a presunção de não culpabilidade sob a vertente ao menos da regra de tratamento como antes a própria dignidade da pessoa humana que entre nós não custa rememorar é fun damento da República art 1º III da Constituição de 1988 e princípio fundante de toda a atividade estatal mormente a persecutória Nessa perspectiva o processo penal conforme lição da saudosa professora Ada P Grinover não pode ser entendido apenas como instrumento de persecução do réu O processo penal se faz também e até primacialmen te para a garantia do acusado Por isso é que no Estado de direito o processo penal não pode deixar de representar tutela da liberdade pessoal e no tocante à persecução criminal deve constituirse na antítese do despotismo abandonando todo e qualquer aviltamento da personalidade humana O processo é uma expressão de civilização e de cultura e consequentemente se submete aos limites impostos pelo reconhecimento dos valores da dignidade do homem41 VII CONCLUSÃO Urge portanto que as polícias modifiquem seus procedimentos investigatórios de sorte a conferir maior confiabilidade epistêmica aos elementos informativos e provas produzidas na fase do inquérito policial e que o Ministério Público cumpra seu papel de fiscal do direito exercendo maior controle sobre a qualidade da investigação policial Mas não é só A mudança de rumos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça produziu uma nova orientação para toda a investiga ção criminal assentada na prova do reconhecimento formal de pessoas 40 NIEVA FENOLL Jordi La duda en el proceso penal Madri Marcel Pons 2013 p 97 41 GRINOVER Ada P Liberdades Públicas e Processo Penal São Paulo Editora Revista dos Tribunais 2 ed 1982 p 20 e 52 596 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 suspeitas de crimes mas os efeitos desse overruling somente se tornarão reais e irreversíveis se os juízes e tribunais do país forem mais rigorosos na avaliação dessa prova repudiando o material probatório que não esteja em conformidade com o modelo normativo Somente assim se evitará a reedição de casos como os menciona dos ao longo do texto que certamente representam uma ínfima parte do que já ocorreu e continua a ocorrer com um universo de pessoas subme tidas a esse tipo de procedimento investigatório É premente portanto a cessação desses abusos quotidianamente noticiados nas mídias e na crônica judiciária A dor o desespero as privações as perdas materiais e morais causadas por uma prisão injusta são irreparáveis42 O exemplo de Ângelo Gustavo Pereira Nobre produtor cultural que ficou preso por um ano acusado da prática de um crime de roubo ocorrido em 2014 reproduz a situação de tantas outras vítimas do falho reconhecimento fotográfico Após ser solto soltou um desabafo que representa o sofrimento de todos os que passaram por similar situação43 Depois desse tempo todo que passei lá dentro e vendo o que está acontecendo com esses outros jovens como João Jeferson Raoni e Alberto me dá um nó na garganta e questiono isso nunca vai acabar Nós jovens negros estaremos sempre cor rendo o risco de sermos privados da nossa liberdade a qualquer momento De qualquer jeito Isso nunca vai acabar Somos nós que temos que criar provas para provar nossa inocência e não o Estado Por quê 42 É muito oportuna a observação de Erwin Chemerinsky Os direitos não têm sentido sem remédios A polícia sabe quando pode agir com impunidade pois suas ações não terão consequências CHEMERINSKY E Presumed Guilty How the Supreme Court Empowered the Police and Subverted Civil Rights New York Liveright 2021 p 243 tradução livre 43 MATIDA Janaina CECCONELLO William Outra vez sobre o reconheci mento fotográfico Conjur Disponível em httpswwwconjurcombr 2021out01limitepenaloutravezreconhecimentofotograficoftn4 Acesso em 19 jan 2022 597 Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 REFERÊNCIAS ANDRÉS IBÁÑEZ Perfecto Princípio de presunção de inocência e princípio de vitimização uma convivência possível Trad Janaina Matida e Aury Lopes Jr Revista Brasileira de Ciências Criminais Ano 29 v 185 nov 2021 p 85100 ASSOCIATION FOR THE PREVENTIOS OF TORTURE Princípios sobre Entrevistas Eficazes para Investigação e Coleta de Informações Disponível em httpswww aptchsitesdefaultfilespublicationsaptPoEIPOR03pdf BADARÓ G Epistemologia judiciária e prova penal São Paulo Revista dos Tri bunais 2019 BADARÓ Gustavo MADEIRA Guilherme SCHIETTI Rogerio Código de Pro cesso Penal Estudos comemorativos aos 80 anos de vigência São Paulo Revista dos Tribunais 2021 BORGES DE SOUSA FILHO Ademar O controle de constitucionalidade de leis penais no Brasil Belo Horizonte Forum 2019 CALAMANDREI Piero Proceso y democracia Trad Hector Zamudio Buenos Aires EJEA 1960 CARNELUTTI Francesco Lições sobre o Processo Penal Tomo I Trad Francisco José Galvão Bruno Campinas Bookseller 2004 CHEMERINSK Erwin Presumed Guilty How the Supreme Court Empowered the Police and Subverted Civil Rights Liveright 2021 DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Relatório consolidado sobre reconhecimento fotográfico em sede policial Disponível em httpswww defensoriarjdefbruploadsarquivos92d976d0d7b44b338a660ec06af008fa pdf Acesso em 12 maio 2022 DALIA Andrea Antonio FERRAIOLI Marzia Manuale di diritto processuale penale Milão Cedam 2003 FERRAJOLI Luigi Direito e Razão Teoria do garantismo penal São Paulo Revista dos Tribunais 2002 FERRERBELTRÁN Jordi Valoração racional da prova Trad Vitor de Paula Ramos Salvador Juspodium 2021 FIGUEIREDO DIAS Jorge Direito processual penal v 1 Coimbra Coimbra Edi tora 1984 FRANCO Alberto Silva Crimes hediondos anotações sistemáticas à lei 807290 São Paulo RT 2000 GARRETT B L Convicting the innocent Where criminal prosecutions go wrong Cambridge Harvard University Press 2011 598 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 GRINOVER Ada P A iniciativa instrutória do juiz no processo penal acusatório Revista Brasileira de Ciências Criminais n 27 ano 7 julset1999 GRINOVER Ada P Liberdades Públicas e Processo Penal São Paulo Revista dos Tribunais 2 ed 1982 LOPES JR Aury Sistemas de investigação preliminar no processo penal Rio de Janeiro Lumen Juris 2001 MARMELSTEIN George Testemunhando a injustiça A ciência da prova testemu nhal e das injustiças inconscientes Salvador Juspodium 2022 MATIDA Janaína Considerações epistêmicas sobre o reconhecimento de pessoas produção valoração e insatisfação do standard probatório penal In MADEIRA Guilherme BADARÓ Gustavo SCHIETTI CRUZ Rogerio Coords Código de Processo Penal estudos comemorativos aos 80 anos de vigência v 2 São Paulo RT 2021 p 141155 MATIDA Janaína CECCONELLO William Outra vez sobre o reconhecimento fotográfico i102021 Conjur Disponível em httpswwwconjurcombr 2021out01limitepenaloutravezreconhecimentofotograficoftn4 Acesso em 19 jan 2022 NIEVA FENOLL Jordi La duda en el proceso penal Madri Marcel Pons 2013 OHLIN Jens David Adjudicative Criminal Procedure Doctrine Application and Practice Amsterdam Wolters Kluwer 2019 OLIVEIRA Thiago R ZANETIC André NATAL Ariadne L Preditores e impactos da legitimidade policial testando a teoria da justeza procedimental em São Paulo Dados Revista de Ciências Sociais 2019 RAMOS Silvia et al Negro trauma racismo e abordagem policial no Rio de Janeiro Rio de Janeiro CESeC 2022 RAPHAELLI Rafael Domingos Barroso da Costa MELO Andrey Régis de O Brasil que se revela pelo reconhecimento fotográfico o inconsciente de nossas práticas em persecução penal In MADEIRA Guilherme BADARÓ Gustavo SCHIETTI CRUZ Rogerio Coords Código de Processo Penal estudos comemorativos aos 80 anos de vigência v 2 São Paulo RT 2021 p 239254 SCHIETTI CRUZ Rogerio M Rumo a um processo penal democrático In Justiça Criminal e Democracia Bruno A Machado Coord São Paulo Marcial Pons 2013 p 2358 SOARES Luiz Eduardo Desmilitarizar São Paulo Boitempo 2019 STJ Disponível em httpswwwstjjusbrsitesportalpPaginasComunicacao Noticias06022022Reconhecimentodepessoasumcampofertilparaoerro judicialaspx Acesso em 25 abr 2022 599 Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 TUCCI Rogerio Lauria Direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro São Paulo Saraiva 1993 VIEIRA Antônio Riscos Epistêmicos no Reconhecimento de Pessoas contribui ções a partir da neurociência e da psicologia do testemunho Boletim Revista do Instituto Baiano de Direito Processual Penal Ano 2 n 3 2019 WANDERLEY Gisela A Entre a probabilidade e a segurança do juízo de fato a completude do conjunto probatório evidencial completeness e a melhor prova best evidence como princípios de valoração probatória In MADEIRA Guilherme BADARÓ Gustavo SCHIETTI CRUZ Rogerio Coords Código de Processo Penal estudos comemorativos aos 80 anos de vigência v 2 São Paulo RT 2021 p 4767 Authorship information Rogerio Schietti Cruz Doutor e Mestre em Direito Processual pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo Largo do São Francisco Professor dos cursos de Doutorado e Mestrado da UniNove Professor de Direito Penal e Processual na PósGraduação do Damásio Educacional Ministro do Superior Tribunal de Justiça rschiettigmailcom Additional information and authors declarations scientific integrity Conflict of interest declaration the author confirms that there are no conflicts of interest in conducting this research and writing this article Declaration of authorship all and only researchers who comply with the authorship requirements of this article are listed as authors all coauthors are fully responsible for this work in its entirety Declaration of originality the author assures that the text here published has not been previously published in any other resource and that future republication will only take place with the express indication of the reference of this original publication he also attests that there is no third party plagiarism or selfplagiarism 600 SChiETTi Cruz rogerio Rev Bras de Direito Processual Penal Porto Alegre v 8 n 2 p 567600 maiago 2022 Editorial process dates httpwwwibrasppcombrrevistaindexphprBDPPabouteditorialPolicies Submission 13052022 Desk review and plagiarism check 13052022 review 1 16052022 review 2 21052022 Preliminary editorial decision 17062022 Correction round return 13072022 Final editorial decision 20072022 Editorial team Editorinchief 1 VGV Associatededitor 2 MD e KF reviewers 2 License Creative Commons Attribution 40 International how to cite abNt bRazil SChiETTi Cruz rogerio investigação criminal reconhecimento de pessoas e erros judiciais considerações em torno da nova jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Revista Brasileira de Direito Processual Penal vol 8 n 2 p 567600 maiago 2022 httpsdoiorg1022197rbdppv8i2717 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍUNIVALI CURSO DE DIREITO DISCIPLINA DIREITOS PROCESSUAL PENAL II PROFESSOR Jonathan Cardoso Régis Dr joniregisunivalibr ALUNO ALUNO RESENHA CRÍTICA1 RECONHECIMENTO DE PESSOAS E MEIO DE PROVA Resenha Crítica referente ao artigo de autoria do Prof Rogério Schietti Cruz intitulado Investigação criminal reconhecimento de pessoas e erros judiciais considerações em torno da nova jurisrpudência do Superior Tribunal de Justiça 1 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA CRUZ Rogério Schietti Investigação criminal reconhecimento de pessoas e erros judiciais considerações em torno da nova jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Revista Brasileira De Direito Processual Penal 8 Rev Bras Direito Processual Penal 2022 82 567600 Disponível em httpswwwscielobrjrbdppawhtycHSmTnRcbKMDRCbmZpG Acesso em 03 mar 2024 2 CREDENCIAIS DO AUTOR DA REFERÊNCIA Nome Acadêmico de Direito Universidade do Vale do Itajaí 5º período 3 INTRODUÇÃO 1 Modelo criado com base nas informações da seguinte obra UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ Elaboração de trabalhos acadêmicos científicos Itajaí Universidade do Vale do Itajaí 2011 A resenha crítica apresentada aborda o artigo Investigação Criminal Reconhecimento de Pessoas e Erros Judiciais Considerações em Torno da Nova Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça de autoria de Rogerio Schietti Cruz Este trabalho se debruça sobre as problemáticas inerentes aos procedimentos de reconhecimento de suspeitos em investigações criminais no Brasil e como tais práticas têm conduzido a erros judiciais significativos culminando na injusta condenação de inocentes Através de uma análise detalhada e crítica a resenha visa destacar os principais argumentos do autor bem como sua proposta para uma reforma nas práticas investigativas alinhandoas com avanços científicos e técnicos para assegurar a justiça e a eficácia do sistema penal brasileiro 4 DESENVOLVIMENTO A obra Investigação Criminal Reconhecimento de Pessoas e Erros Judiciais Considerações em Torno da Nova Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça de Rogerio Schietti Cruz mergulha em uma das facetas mais problemáticas do sistema de justiça criminal brasileiro os erros judiciais decorrentes de procedimentos falhos de reconhecimento de pessoas Este tema de relevância inquestionável é tratado pelo autor com a profundidade e a acuidade que a questão demanda trazendo à tona uma discussão crítica sobre as práticas investigativas e suas implicações na vida de indivíduos inocentes Um dos pontos fortes da obra é a maneira como Schietti Cruz contextualiza a problemática dentro do sistema de justiça criminal evidenciando não apenas as falhas no processo de reconhecimento mas também a cadeia de decisões e ações muitas vezes automatizadas e desprovidas de crítica que levam à condenação de inocentes o autor argumenta convincentemente que tais práticas não apenas violam princípios fundamentais do direito como a presunção de inocência e o direito a um processo justo mas também minam a confiança pública no sistema de justiça como um todo Ao discutir a nova jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema Schietti Cruz traz um sopro de esperança para a reforma dessas práticas expondo a necessidade de aderência estrita às disposições do Código de Processo Penal especialmente no que tange ao reconhecimento formal de suspeitos e destaca a importância de uma mudança de paradigma na rotina policial e na fiscalização por parte do Ministério Público Este ponto é essencial pois aponta para a necessidade de uma abordagem mais científica e menos intuitiva na investigação criminal algo que poderia de fato reduzir significativamente o número de erros judiciais Contudo a obra não se limita a apontar problemas e sugerir mudanças normativas Schietti Cruz vai além ao enfatizar a importância da adoção de práticas investigativas baseadas em evidências científicas como forma de assegurar procedimentos de reconhecimento mais confiáveis Esta é sem dúvida uma das contribuições mais valiosas do texto pois coloca em discussão não apenas a legalidade mas a legitimidade das práticas investigativas e sua conformidade com o conhecimento científico atual Por outro lado a obra poderia se beneficiar de uma discussão mais aprofundada sobre as dificuldades práticas de implementação dessas mudanças bem como sobre as resistências institucionais que tais propostas podem enfrentar Além disso seria enriquecedor explorar mais detidamente as implicações dessas práticas para grupos vulneráveis especialmente considerando as dinâmicas de poder e desigualdade que permeiam o sistema de justiça criminal Em suma a obra de Rogerio Schietti Cruz é uma contribuição indispensável para o debate sobre a reforma do sistema de justiça criminal brasileiro Por meio de uma análise crítica e bem fundamentada o autor não apenas expõe as falhas do sistema mas também oferece caminhos concretos para sua superação Resta esperar que tais propostas sejam acolhidas e implementadas para que o direito à justiça e à liberdade não continue sendo negado a inocentes vítimas de um sistema falho 5 CONCLUSÃO A obra de Rogerio Schietti Cruz Investigação Criminal Reconhecimento de Pessoas e Erros Judiciais Considerações em Torno da Nova Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça representa uma contribuição significativa para o debate sobre a reforma do sistema de justiça criminal no Brasil Através de uma análise crítica e aprofundada o autor não apenas destaca as falhas intrínsecas aos procedimentos de reconhecimento de pessoas em investigações criminais mas também aponta para a necessidade urgente de uma mudança de paradigma que privilegie a ciência e a justiça sobre a conveniência e a pressa A discussão sobre a nova jurisprudência do STJ que exige o cumprimento fiel das disposições do Código de Processo Penal é um marco importante nesse debate apontando para a possibilidade de um sistema de justiça criminal mais justo e eficaz No entanto como bem salientado na obra a implementação dessas mudanças demanda não apenas uma revisão legislativa ou jurisprudencial mas uma transformação cultural nas práticas policiais e no Ministério Público além de uma postura mais crítica e rigorosa por parte do Poder Judiciário A ênfase na adoção de práticas investigativas baseadas em evidências científicas é sem dúvida um dos pontos mais louváveis da obra pois reconhece a importância da precisão e da confiabilidade na produção de provas Ainda assim a resenha destaca a necessidade de uma discussão mais ampla sobre os desafios práticos e as resistências institucionais à implementação dessas mudanças bem como suas implicações para grupos vulneráveis aspectos que poderiam enriquecer ainda mais o debate proposto pelo autor Em conclusão a obra de Schietti Cruz é um chamado urgente à reflexão e à ação para todos aqueles envolvidos no sistema de justiça criminal brasileiro Ao expor as falhas do sistema e propor soluções baseadas na ciência e no respeito aos direitos fundamentais o autor contribui de maneira significativa para a construção de um sistema de justiça mais justo eficiente e humano Resta esperar que sua mensagem seja ouvida e que as mudanças necessárias sejam efetivamente implementadas para que o direito à justiça e à liberdade seja uma realidade acessível a todos sem o risco de condenações injustas que mancham a integridade do sistema jurídico e a confiança da sociedade em suas instituições UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍUNIVALI CURSO DE DIREITO DISCIPLINA DIREITOS PROCESSUAL PENAL II PROFESSOR Jonathan Cardoso Régis Dr joniregisunivalibr ALUNO ALUNO RESENHA CRÍTICA1 RECONHECIMENTO DE PESSOAS E MEIO DE PROVA Resenha Crítica referente ao artigo de autoria do Prof Rogério Schietti Cruz intitulado Investigação criminal reconhecimento de pessoas e erros judiciais considerações em torno da nova jurisrpudência do Superior Tribunal de Justiça 1 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA CRUZ Rogério Schietti Investigação criminal reconhecimento de pessoas e erros judiciais considerações em torno da nova jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Revista Brasileira De Direito Processual Penal 8 Rev Bras Direito Processual Penal 2022 82 567600 Disponível em httpswwwscielobrjrbdppawhtycHSmTnRcbKMDRCbmZpG Acesso em 03 mar 2024 2 CREDENCIAIS DO AUTOR DA REFERÊNCIA Nome Acadêmico de Direito Universidade do Vale do Itajaí 5º período 1 Modelo criado com base nas informações da seguinte obra UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ Elaboração de trabalhos acadêmicos científicos Itajaí Universidade do Vale do Itajaí 2011 3 INTRODUÇÃO A resenha crítica apresentada aborda o artigo Investigação Criminal Reconhecimento de Pessoas e Erros Judiciais Considerações em Torno da Nova Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça de autoria de Rogerio Schietti Cruz Este trabalho se debruça sobre as problemáticas inerentes aos procedimentos de reconhecimento de suspeitos em investigações criminais no Brasil e como tais práticas têm conduzido a erros judiciais significativos culminando na injusta condenação de inocentes Através de uma análise detalhada e crítica a resenha visa destacar os principais argumentos do autor bem como sua proposta para uma reforma nas práticas investigativas alinhandoas com avanços científicos e técnicos para assegurar a justiça e a eficácia do sistema penal brasileiro 4 DESENVOLVIMENTO A obra Investigação Criminal Reconhecimento de Pessoas e Erros Judiciais Considerações em Torno da Nova Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça de Rogerio Schietti Cruz mergulha em uma das facetas mais problemáticas do sistema de justiça criminal brasileiro os erros judiciais decorrentes de procedimentos falhos de reconhecimento de pessoas Este tema de relevância inquestionável é tratado pelo autor com a profundidade e a acuidade que a questão demanda trazendo à tona uma discussão crítica sobre as práticas investigativas e suas implicações na vida de indivíduos inocentes Um dos pontos fortes da obra é a maneira como Schietti Cruz contextualiza a problemática dentro do sistema de justiça criminal evidenciando não apenas as falhas no processo de reconhecimento mas também a cadeia de decisões e ações muitas vezes automatizadas e desprovidas de crítica que levam à condenação de inocentes o autor argumenta convincentemente que tais práticas não apenas violam princípios fundamentais do direito como a presunção de inocência e o direito a um processo justo mas também minam a confiança pública no sistema de justiça como um todo Ao discutir a nova jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema Schietti Cruz traz um sopro de esperança para a reforma dessas práticas expondo a necessidade de aderência estrita às disposições do Código de Processo Penal especialmente no que tange ao reconhecimento formal de suspeitos e destaca a importância de uma mudança de paradigma na rotina policial e na fiscalização por parte do Ministério Público Este ponto é essencial pois aponta para a necessidade de uma abordagem mais científica e menos intuitiva na investigação criminal algo que poderia de fato reduzir significativamente o número de erros judiciais Contudo a obra não se limita a apontar problemas e sugerir mudanças normativas Schietti Cruz vai além ao enfatizar a importância da adoção de práticas investigativas baseadas em evidências científicas como forma de assegurar procedimentos de reconhecimento mais confiáveis Esta é sem dúvida uma das contribuições mais valiosas do texto pois coloca em discussão não apenas a legalidade mas a legitimidade das práticas investigativas e sua conformidade com o conhecimento científico atual Por outro lado a obra poderia se beneficiar de uma discussão mais aprofundada sobre as dificuldades práticas de implementação dessas mudanças bem como sobre as resistências institucionais que tais propostas podem enfrentar Além disso seria enriquecedor explorar mais detidamente as implicações dessas práticas para grupos vulneráveis especialmente considerando as dinâmicas de poder e desigualdade que permeiam o sistema de justiça criminal Em suma a obra de Rogerio Schietti Cruz é uma contribuição indispensável para o debate sobre a reforma do sistema de justiça criminal brasileiro Por meio de uma análise crítica e bem fundamentada o autor não apenas expõe as falhas do sistema mas também oferece caminhos concretos para sua superação Resta esperar que tais propostas sejam acolhidas e implementadas para que o direito à justiça e à liberdade não continue sendo negado a inocentes vítimas de um sistema falho 5 CONCLUSÃO A obra de Rogerio Schietti Cruz Investigação Criminal Reconhecimento de Pessoas e Erros Judiciais Considerações em Torno da Nova Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça representa uma contribuição significativa para o debate sobre a reforma do sistema de justiça criminal no Brasil Através de uma análise crítica e aprofundada o autor não apenas destaca as falhas intrínsecas aos procedimentos de reconhecimento de pessoas em investigações criminais mas também aponta para a necessidade urgente de uma mudança de paradigma que privilegie a ciência e a justiça sobre a conveniência e a pressa A discussão sobre a nova jurisprudência do STJ que exige o cumprimento fiel das disposições do Código de Processo Penal é um marco importante nesse debate apontando para a possibilidade de um sistema de justiça criminal mais justo e eficaz No entanto como bem salientado na obra a implementação dessas mudanças demanda não apenas uma revisão legislativa ou jurisprudencial mas uma transformação cultural nas práticas policiais e no Ministério Público além de uma postura mais crítica e rigorosa por parte do Poder Judiciário A ênfase na adoção de práticas investigativas baseadas em evidências científicas é sem dúvida um dos pontos mais louváveis da obra pois reconhece a importância da precisão e da confiabilidade na produção de provas Ainda assim a resenha destaca a necessidade de uma discussão mais ampla sobre os desafios práticos e as resistências institucionais à implementação dessas mudanças bem como suas implicações para grupos vulneráveis aspectos que poderiam enriquecer ainda mais o debate proposto pelo autor Em conclusão a obra de Schietti Cruz é um chamado urgente à reflexão e à ação para todos aqueles envolvidos no sistema de justiça criminal brasileiro Ao expor as falhas do sistema e propor soluções baseadas na ciência e no respeito aos direitos fundamentais o autor contribui de maneira significativa para a construção de um sistema de justiça mais justo eficiente e humano Resta esperar que sua mensagem seja ouvida e que as mudanças necessárias sejam efetivamente implementadas para que o direito à justiça e à liberdade seja uma realidade acessível a todos sem o risco de condenações injustas que mancham a integridade do sistema jurídico e a confiança da sociedade em suas instituições