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INSTITUTO LATINOAMERICANO DE ARTE CULTURA E HISTÓRIA ILAACH HISTÓRIA AMÉRICA LATINA ITAIPU BINACIONAL ALVORADA DO IGUAÇU E VILA BANANAL DESLOCAMENTO E ISOLAMENTO SOCIAL EDSON ALENCAR FARIAS Foz do Iguaçu 2017 INSTITUTO LATINOAMERICANO DE ARTE CULTURA E HISTÓRIA ILAACH HISTÓRIA AMÉRICA LATINA ITAIPU BINACIONAL ALVORADA DO IGUAÇU E VILA BANANAL DESLOCAMENTO E ISOLAMENTO SOCIAL EDSON ALENCAR FARIAS Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto LatinoAmericano de Arte Cultura e História da Universidade Federal da Integração LatinoAmericana como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em História da América Latina Orientador Prof Dr Gerson Galo Ledezma Meneses Foz do Iguaçu 2017 EDSON ALENCAR FARIAS ITAIPU BINACIONAL ALVORADA DO IGUAÇU E VILA BANANAL DESLOCAMENTO E ISOLAMENTO SOCIAL Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto LatinoAmericano de Arte Cultura e História da Universidade Federal da Integração LatinoAmericana como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em História da AméricaLatina BANCA EXAMINADORA Orientador Prof DrGerson Galo Ledezma Meneses UNILA Profa MestreCleusa Gomes da Silva UNILA Profa Doutora Senilde Alcântara Guanaes UNILA Foz do Iguaçu de de Dedico este trabalho a Deus o Pai a Deus o Filho a Deus o Espírito Santo pela graça e dom da vida AGRADECIMENTOS Em primeiro lugar agradeço ao meu professor orientador por sua paciência para comigo e pela orientação desde o préprojeto até o trabalho final Sua trajetória acadêmica é uma inspiração para mim Muito obrigado Às professoras da banca Cleusa Gomes e Senilde A Guanaes pelas orientações e sugestões pertinentes e pontuais que certamente enriqueceram muito este trabalho Agradeço por terem aceito o desafio de compor esta banca Muito obrigado Aos colegas de curso que partilharam as mesmas angústias e inquietações ao longo da nossa jornada Cada um seguirá seu caminho mas compor a primeira turma do curso de História nos ligará para sempre Em especial agradeço ao Anderson de Oliveira que foi mais do que um colega de curso se tornou um amigo desde o primeiro semestre Esta amizade certamente seguirá para o resto da vida Obrigado por partilhar os momentos bons e maus ao longo do curso sobre o curso e sobre a vida Agradeço o incentivo e se não desisti muitas vezes foi porque você insistiu Obrigado meu amigo Agradeço ao meu irmão Edglay que durante os quatro anos de curso me liberou para estudar fazer os trabalhos sair para compromissos durante o horário de expediente sem nunca cobrar nada por isto Você foi muito importante na minha formação Obrigado meu irmão Agradeço aos meus pais que mesmo à distância me apoiaram e foram fonte de inspiração para minha caminhada Sempre serão meus exemplos para exercer a paciência e a perseverança Obrigado pai e mãe O agradecimento mais que especial vai para minha esposa Natércia meus filhos Vitória e Davi Obrigado por me apoiar durante os anos de estudo durante as horas para os trabalhos e pesquisas Obrigado por estarem ao meu lado e serem minha motivação para querer continuar crescendo Vocês são a razão de tudo isto Muito obrigado O que chamamos de poder do homem sobre a Natureza acaba por ser um poder exercido por alguns homens sobre outros tendo a Natureza como instrumento C S Lewis FARIAS Edson Alencar Itaipu Binacional Alvorada do Iguaçu e Vila Bananal deslocamento e isolamento social 2017 107 páginas Trabalho de Conclusão de Curso História da AméricaLatina Universidade Federal da Integração Latino Americana Foz do Iguaçu 2017 RESUMO A instalação da Usina Hidrelétrica de Itaipu no extremo Oeste do Paraná trouxe uma série de consequências para a região que estava em processo de desenvolvimentoA ocupação da região se deu com base num projeto de nacionalização das regiões fronteiriças e mais efetivamente a partir do movimento que ficou conhecido como a Marcha para o Oeste empreendido pelo presidente Vargas quando diversas empresas colonizadoras atraíram um contingente de colonos gaúchos catarinenses e paranaenses muitos deles de origem europeia para ocupar os espaços considerados vazios Neste trabalho analisamos este processo Apontamos os elementos mais marcantes na formação da região para entender o surgimento do Distrito de Alvorada do Iguaçu na década de 1960 e a sua extinção na década seguinte quando Itaipu foi instalada na região Para isto discutimos os efeitos de Itaipu sobre a região para entender o consequente surgimento da Vila Bananal comunidadeformada a partir do represamento do rio Paraná para a formação do lago de Itaipu que era parte integrante do território de Alvorada do Iguaçu e que acabou deslocada e isolada socialmente Trabalhamos ainda o conceito de Memória e Identidade Cultural para entender como estes sujeitos atuaram nestes processos e como Itaipu tenta apropriarse das memórias individuais e coletivas para escrever a história segundo sua perspectiva Palavraschave ItaipuAlvorada do IguaçuVila Bananal Memória FARIAS Edson Alencar Itaipu Binacional Alvorada do Iguaçu e Vila Bananal deslocamento e isolamento social 2017 107 páginas Trabalho de Conclusão de Curso História da AméricaLatina Universidade Federal da Integração Latino Americana Foz do Iguaçu 2017 RESUMO La instalación de la Usina Hidroeléctrica de Itaipú enel extremo Oeste de Paraná trajo una serie de consecuencias para laregión que estaba en proceso de desarrollo La ocupación de la región se dio con base en un proyecto de nacionalización de las regiones fronterizas y más efectivamente a parir del movimiento que se conoció como la Marcha hacia el Oeste emprendido por el presidente Vargas cuando diversas empresas colonizadoras atrajeron un contingente de colonos gaúchos catarinenses y paranaensesmuchos de ellos de origene uropeo para ocupar los espacios considerados vacíos En este trabajo analizamos este proceso Mencionamos los elementos más importantes en la formación de la región para entender el surgimiento del Distrito de Alvorada del Iguazú en la década de 1960 y su extinción en la década siguiente cuando Itaipú fue instalada en la región Para esto discutimos los efectos de Itaipú sobre la región para entender el consiguiente surgimiento de la Vila Bananal comunidad formado a partir del represamiento del río Paraná para la formación del lago de Itaipú que era parte integrante del territorio de Alvorada do Iguaçu y que acabó desplazada y aislada socialmente Trabajamos todavíael concepto de Memoria e Identidad Cultural para entender cómo estos sujetos actuaron en estos procesos y cómo Itaipú intenta apropiarse de las memorias individuales y colectivas para escribir la historia según su perspectiva Palavraschave Itaipú Alvorada delIguazú Vila Bananal Memoria SUMÁRIO INTRODUÇÃO 10 1ITAIPU EM NOME DO PROGRESSO 16 11 PROBLEMAS SOCIAIS 23 12 DESAPROPIAÇÕES 24 13 O DESASTRE AMBIENTAL E OS INDÍGENAS 30 2ALVORADA DO IGUAÇU CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE 38 21 ENTENDENDO OS PROCESSOS HISTÓRICOS 38 22 MEMÓRIA NA CONSTRUÇÃO DOS SUJEITOS 49 23 ALVORADA DO IGUAÇU VIDA E MORTE 57 3VILA BANANAL DESLOCAMENTO E ISOLAMENTO SOCIAL 72 CONSIDERAÇÕES FINAIS 82 REFERÊNCIAS 86 ANEXOS 88 ANEXO A ENTREVISTA COM MARIO BATISTELLI 88 10 INTRODUÇÃO A construção de uma usina hidrelétrica seja onde for é sempre um processo traumáticoe quanto maior o tamanho da obra tanto maior será o impacto produzido por elaPor isto toda e qualquer resistência ou discurso contrário precisa ser silenciado e toda barreira tirada do caminho Quem visita Itaipu Binacional se impressiona com sua grandiosidade e imponência A imagem que ela vende para o país e para o mundo é de ser uma empresa com profundo compromisso socioambiental Seu slogan A maior geradora de energia limpa e renovável do planeta estampa suas campanhas mas basta um olhar um pouco mais atento ao seu passado e as fissuras no seu concreto começam a aparecer As vozes que se pretendiam silenciadas ainda ecoam e reverberam nos anseios de uma comunidade que foi esquecida mas que resiste deslocada do seu local original por causa da construção da barragem e isolada o bastante para ser ignorada pelo poder público desde então a despeito de sua importância econômica para o município que integra Vila Bananal um pedaço de terra às margens do Lago de Itaipu que pela distância e isolamento a que foi submetida mais parece um braço amputado do município de Foz do Iguaçu Esta comunidade localizada a 50 km de seu domicílio eleitoral é o remanescente do que um dia foi o distrito de Alvorada do Iguaçu que era parte integrante de Foz do Iguaçu Na década de 1970 quando o local fora definido para a instalação de Itaipu Alvorada do Iguaçu já contava com uma infraestrutura em franco desenvolvimento Porém seu crescimento foi interrompido bruscamente com a instalação da hidrelétrica na região Oeste do Paraná A formação posterior do lago da barragem deixaria Alvorada do Iguaçu e outras comunidades debaixo dágua bem como uma vasta área da flora e a fauna local Todo esforço em tentar manter este processo no esquecimento no entanto se desfaz quando a própria natureza resolve falar Em alguns períodos a estiagem na região se acentua causando um esvaziamento no lago de Itaipu revelando aos que desconheciam e recordando aos que se haviam esquecido que outrora uma comunidade fora expulsa de suas terras e que toda uma biodiversidade animal e vegetal ficou debaixo dágua fazendo imergir memórias questionamentos e revelando este processo doloroso para aqueles que vivenciaram tais eventos 11 Foi num destes momentos que pudemos andar por aquelas terras e presenciar in loco as ruínas da antiga Alvorada do Iguaçu Pudemos ver restos de casas objetos de uso pessoal e doméstico e até mesmo o antigo cemitério local expondo este processo recente da história da região Mesmo para quem não vivenciou uma situação semelhante é possível conjecturar enquanto se caminha por entre aqueles resquícios o que pôde ter significado para aquelas pessoas deixar para traz suas casas suas terras seu modo de vida Esforço desnecessário para os que viveram tais processos na pele e que podem vez ou outra pisar novamente aquele chão Para eles adentrar aquelas terras novamente é andar em território estranho e ao mesmo tempo íntimo fazendo vir à tona memórias lembranças dores e sonhos não realizados É nestes sujeitos que este trabalho se fundamenta e encontra sua razão de ser Pois foram eles os primeiros a pagarem o preço do progresso trazido por Itaipu ao Brasil e Paraguai e são eles os últimos a serem beneficiados por este progresso Retirados do seu lugar de origem isolados em um local de difícil acesso e só lembrados quando se faz necessário legitimar a posse das terras ao poder público com vistas no valor econômico que estas trazem ao municípioAs transformações que se observam na paisagem são tão profundas quanto as que se percebem nas relações sociais e econômicas vivenciadas por estes sujeitos Vila Bananal está localizada entre os Municípios de Santa Terezinha de Itaipu e São Miguel do Iguaçu e conta hoje com aproximadamente 150 habitantes A região em questão compõe parte considerável da área rural de Foz do Iguaçu e é responsável por grande parcela dos royalties1 pagos ao Município por Itaipu Dos municípios indenizados por Itaipu Foz do Iguaçu está entre os que mais recebem royalties O curioso é que desse valor pouco para não dizer nadaretorna para a comunidade de Vila Bananal em forma de investimento Este trabalho foi motivado por uma inquietação gerada ao tomarmos conhecimento da situação que estas famílias vivenciam na comunidade cuja rotina diária foi e é afetada diretamente pela construção da usina hidrelétrica de Itaipu A 1Valor pago como indenizaçãoaos municípios que tiveram perda de área produtiva devido à formação da represa de uma hidrelétrica Santa Helena é o município que mais recebe royalties de Itaipu seguida por Foz do Iguaçu São Miguel e outros treze municípios conforme o tamanho da área afetada 12 formação do lago legou estes moradores a um isolamento tão contundente quanto constrangedor As bananas que dão nome à comunidade ocupam uma área cada vez mais reduzida O que se observa então são grandes propriedades rurais espalhadas e um aglomerado de casas próximas umas às outras que corre o risco de desaparecer em um futuro próximo Este trabalho pretende analisar como uma região que sofreu tantos processos traumáticos em um curto período histórico que chegou a estar no centro de uma disputa territorial devido a sua importância econômica acabou esquecida pelo poder público que dela se beneficia O objetivo desta pesquisa é portanto problematizar os efeitos de uma hidrelétrica na vida de pessoas que são subitamente atingidas por elas e que por conta disto precisam deixar seu habitatde forma súbita e arbitrária Neste sentido nos propomos a analisar como se deu o alagamento deslocamento e isolamento de uma comunidade inteira tendo como fonte a narrativa oral de alguns destes sujeitos que viram suas vidas mudarem por conta da chegada de hidrelétrica de Itaipu além da bibliografia sobre a história local Vila Bananal como é chamada atualmente ainda sofre as consequências deste processo por isto a escolha desta comunidade como objeto de estudo Na tentativa de compreender como estas pessoas foram afetadas diretamente faço uso de dois conceitos importantes para a compreensão da história principalmente quando há carência de fontes documentais ou o acesso a elas é restrito como é o caso das comunidades deslocadas em virtude da instalação de uma hidrelétrica embora já existam campos de pesquisas para esta temática O primeiro é a relação História e Memória já que metodologicamente esta pesquisa se fundamenta no campo da História Oral sendo que na coleta da entrevista a memória é o mecanismo com o qual o sujeito se constrói em relação a si mesmo e em relação ao outro O esforço é de perceber o que este passado tem a dizer a estes sujeitos e sobre eles à medida que trazem os elementos que marcaram suas vidas em relação a estes processos Diversos autores respaldam e fundamentam os estudos de Memória no campo historiográfico porém aqui faço uso de dois importantes historiadores Jacques Le Goff com História e Memória e Pierre Nora com Lugares de Memória Com eles pretendo discutir a Memória relacionada ao 13 passado e os lugares como canalizadores desta memória além de tratar a relação entre lembrança e esquecimento na construção do sujeito O segundo conceito trabalhado é a relação entre Identidade e Cultura Esta relação reflete a forma como estes indivíduos se definem na sua subjetividade e em relação ao outro e como o lugar interfere diretamente na formação e compreensão de si mesmoEntender tais conceitos é importante porque estes sujeitos foram deslocados do seu lugar e precisaram estabelecer novas relações com seu passado e com seu presente O fato de estarem tão distantes em relação ao seu local de domicílio e tão próximas a outra localidade permite que estes sujeitos se utilizem de mecanismos onde a identidade se constrói de acordo com a necessidade do momento visando terem suas demandas atendidas pelo poder público Este fenômeno é observável porque a proximidade com o município de São Miguel do Iguaçu força a que as necessidades mais emergenciais sejam supridas ali enquanto que outras mais complexas ou que demandem menos urgência sejam reivindicadas politicamente de seu domicílio eleitoral de onde se pode utilizar do voto entre outros elementos como forma de chamar a atenção para o local Para compreender um pouco da realidade na Vila Bananal foram realizadas visitas em três ocasiões distintas Na primeira oportunidade percorremos a região pelas estradas que cortam as plantações em várias direções e por fim chegamos a um aglomerado de casas que seria o local que concentra a maior quantidade de pessoas da comunidade Ali fomos apresentados a algumas famílias e expomos a intenção de realizar a pesquisa tendo como objeto de estudo a população local Neste dia tomamos conhecimento de quem seria a pessoa mais indicada para a realização da entrevista pois como o morador mais antigo poderia dar bastante detalhes da história da região Esta pessoa seria o Sr Mario Batistelli 80 anos morador na região desde o ano de 1973 Na segunda visita ao local conhecemos pessoalmente o Sr Mario e conversamos com ele brevemente Ele nos recebeu no seu portão e quando dissemos do que se tratava nossa minha visita logo se mostrou prestativo em colaborar De fato ali mesmo ele já narrou algumas histórias do seu cotidiano mas 14 como nossa intenção naquele momento era apenas fazer o primeiro contato e agendar para outro dia não fomos preparados para colher a entrevistaEntão não anotamos nada apenas o ouvimos e solicitamos uma entrevista formal no que ele prontamente atendeu Na terceira visita sim fomos preparados para ouvilo Sem ter ideia de como seria e nem de quanto tempo levaria a entrevista preparamos um roteiro para não nos perdermos e tentarmos tirar do nosso interlocutor aquilo que fosse útil para a pesquisa Porém este roteiro foi logo deixado de lado pois estávamos diante de uma pessoa com muita história para contar e com muita disposição para contálas A entrevista durou quase 2 horas e neste período ele falou dos vários processos que vivenciou dentre os quais sua vinda para a região oeste do Paraná e sua experiência na Vila Bananal onde vive desde que chegou ao local A entrevista consistiu num importante instrumento para entender a realidade local tanto atual quanto histórica e foi utilizada na construção dos argumentos tanto para apoiar outras fontes quanto para criticálas Outro recurso que lançamos mão foi o uso das imagens Elas não estão no trabalho apenas para ilustrar mas como um instrumento para argumentar e contraargumentar os discursos A maioria dos recortes de jornal foram coletados por Cley Scholz e está disponível pelo site httpsbrpinterestcomcleyscholzadeus setequedas São recortes da época em que Itaipu estava em construção especialmente no período final e abordam as questõeschave no processo de construção da usina as expropriações o alagamento o fim de Sete Quedas e seus efeitos sociais e ambientais Algumas foram tiradas do Jornal Nosso Tempo que também acompanhou de perto esta problemática e fez um trabalho de denúncia das práticas abusivas praticadas pela empresa e em nome dela Há também fotografias do nosso acervo pessoal tiradas do que restou de Alvorada do Iguaçu quando o lago de Itaipu baixou seu nível e revelou os escombros que ainda permanecem no local e também da Vila Bananal atualmente Além destas há também algumas ilustrações que mostram a transformação da região antes e depois de Itaipu Por fim algumas imagens atuais do setor policial que mostram como o isolamento tem causados danos à imagem da Vila Bananal 15 No primeiro capítulo trabalhamos a Hidrelétrica de Itaipu Procuramos mostrar os argumentos para sua implantação e seu contexto histórico trazendo a discussão presente na sua própria história narrada em sua página da internet na forma como as palavras Desafio e Progresso definem momentos distintos da empresa e reafirmam sua posição junto à sociedade Procuramos mostrar os efeitos que o empreendimento trouxe para a região no que tange aspectos sociais ambientais e econômicos de como afetou a vida daqueles que tiveram que deixar suas propriedades para dar lugar ao lago da represa Falamos também das lutas do expropriados por melhores preços em suas propriedades e das consequências para as populações indígenas e para a fauna e flora local No segundo capítulo abordamos os processos de ocupação do território e a construção da identidade cultural na região Oeste do Paraná Optamos em fazer um retrospecto histórico mostrando as transformações que a região sofreu com seus fluxos migratórios a construção da relação entre os sujeitos a conformação do outro e a afirmação do protagonismo pioneiro em torno dos colonos atraídos pelas Empresas Colonizadoras Fazemos também uma discussão em torno do uso da memória na construção das identidades e do lugar como catalisador desta memória e como Itaipu tenta apropriarse das memórias individuais e coletivas para calar a voz dos sujeitos ou permitir que estes falem de acordo com sua própria lógica Em seguida tratamos de mostrar como a partir destes processos surge o Distrito de Alvorada do Iguaçu seu contexto social suas lutas no processo de desapropriação e sua extinção com a chegada de Itaipu à região No terceiro e últimos capítulo tratamos sobre a questão da Vila Bananal comunidade cuja origem se dá deste processo de deslocamento e isolamento que Itaipu acabou trazendo para a região Falamos da importância econômicada região para o município de Foz do Iguaçu por conta dos royalties pagos por Itaipu e do fato de ser uma importante área agrícola e pecuária para o município Abordamos também os problemas enfrentados por esta população para ter suas demandas atendidas valendose do Município de Foz do Iguaçu e de São Miguel do Iguaçu além de outras problemáticas ocasionadas por conta do isolamento 16 1 ITAIPU EM NOME DO PROGRESSO Aí está Itaipu a maior hidrelétrica do mundo causadora da maior catástrofe ecológica provocada pelo homem em todos os tempos O Paraná nada ganhou com esse gigante A energia está sobrando os lucros não são nossos Só os prejuízos MAZZAROLLO p31 Foto 1 Anúncio da Eletrobrás publicado dia 5 de novembro de 1982 O Estado do Paraná Fontebrpinterestcomcleyscholzadeussetequedas O Brasil orgulhase do seu potencial energético já instalado e do grande potencial a ser explorado devido a fartura hidrográfica que o país possui Porém o processo de instalação de uma Usina Hidrelétrica é sempre traumático por mais ermo que seja o local escolhido para sua construção Isto porque inevitavelmente este local sofrerá com modificações no meio ambiente que serão irreversíveis Uma parte significativa da flora acabará submersa após o represamento animais serão pegos de surpresa sendo que boa parte deles não terá tempo suficiente para encontrar abrigo O território sofrerá transformações também no que diz respeito a sua paisagem que será modificada drasticamente No entanto quando o local escolhido para uma barragem fica próximo a comunidades já estabelecidas sejam elas urbanas rurais ribeirinhas ou indígenas o impacto gerado se dimensiona 17 sobremaneira trazendo consequências não apenas ambientais mas também socioeconômicas e culturais No Brasil até o ano de 2003 existiam 517 centrais hidrelétricas em operação Este total estava dividido em 139 Usinas Hidrelétrica UHE 230 Pequenas Centrais Hidrelétricas PCH e 148 Centrais Geradoras Hidrelétricas CGH Com esses dados podemos ter uma ideia de quantos rios foram represados para dar conta da demanda destas centrais hidrelétricas Sendo assim muitos territórios por onde serpenteavam rios margeados ora por florestas ora por cidades e campos agropastoris deram lugar a outro tipo de território os Lagos Artificiais KARPINSK 2007 Atualmente de acordo com informações divulgadas pela Rede de Obras2existem 86 projetos de novas hidrelétricas em andamento no Brasil sendo que 17 estão em obras Entre as demais 30 aguardam licenciamento 24 estão em estudos 13 ainda na fase de projeto e duas negociam financiamento Essas iniciativas representam investimentos da ordem de US 25 bilhões Destas a de maior impacto no momento é sem dúvida a de Belo Monte no Pará na região do alto Xingu O projeto arrojado que quando terminado será a quarta maior do mundo em capacidade instalada na verdade não é atual seus primeiros estudos foram iniciados ainda na década de 1960 em paralelo com Itaipu Passou por vários governos e estava engavetado até ser retomado pelo expresidente Luiz Inácio Lula da Silva O impasse atravessou os oito anos de seu governo mas foi sua sucessora Dilma Rousseff quem acabou autorizando o início dos trabalhos no canteiro de obras abaixo de protestos e manifestações dos indígenas e ribeirinhos principais afetados pela obra além de ambientalistas e ONGs Organizações não governamentais das mais diversas vertentes Há um histórico comum a praticamente todas as usinas hidrelétricas construídas eou em construção no país Os problemas são diversos e abarcam questões principalmente ambientais e sociais uma vez que os que sofrem com as hidrelétricas geralmente são os menos favorecidos cuja voz não é ouvida ou é silenciada O caso de Itaipu foi emblemático devido a sua grandeza e contexto histórico em que foi construída A partir de Itaipu inúmeros pesquisadores têm se debruçado e desenvolvido trabalhos científicos com a temática Atingidos por 2A Rede de obras é o mais abrangente e confiável sistema de informações sobre projetos e obras residenciais industriais de edificação e infraestrutura em andamento no Brasil e pode ser acessado pelo site wwwrededeobrascombr 18 Barragens analisando tanto Itaipu e suas problemáticas quanto outras hidrelétricas espalhadas pelo país Para entender o processo que culminou com a construção de Itaipu e que por consequência resultou na remoção das comunidades que estavam no seu caminho contribuindo para o surgimento de Vila Bananal e seu isolamento até chegar a condição em que se encontra atualmente é necessário ter em mente o período histórico em que a mesma foi projetada bem como o processo de formação da região onde ela foi instalada além de entender como a região se inseriu no projeto nacional Isto é importante para perceber quais forças trabalharam a favor de Itaipu e quais agentes se mobilizaram para fazerlhe resistência Na década de 1970 o discurso do progresso era o motor que movia as ações dos governos sulamericanos No caso brasileiro megaprojetos prometiam mudar para sempre o panorama do país A indústria estava aquecida e precisava de fontes energéticas para que o ritmo se mantivesse acelerado Comandado por governos militares e em meio ao clima de otimismo proporcionado pelo tricampeonato conquistado pela seleção brasileira de futebol o país experimentava um notável crescimento econômico e viu na sua abundância hidráulica a opção ideal para fazer frente à escassez de outras fontes energéticas como petróleo ou gás natural Todas estas obras transformaram o Brasil em um grande canteiro de obras em busca do seu desenvolvimento e produção de energia Neste período imensas áreas naturalmente preservadas foram destruídas para a implantação destas obras causando grandes impactos ambientais e sociais Não haviam audiências públicas para a apresentação do empreendimento junto à comunidade e nem incluíam discussões junto à sociedade para mostrar os planos do setor elétrico plano de ação que contemplasse a população afetada e as questões ambientais o que permitiu com total liberdade a construção de grandes obras hidrelétricas como por exemplo Tucuruí Pará NERES 2008 e Itaipu Paraná LIMA 2004 e a partir daí surgiram pressões sociais em vários pontos do Brasil3 Foi com base neste panorama e com o propósito de colocar o país nos trilhos da modernidade que nasce Itaipu empreendimento que desde o início destacavase por tratarse de um projeto audacioso em todos os sentidos Se a história da região oeste do Paraná é marcada por ciclos de desenvolvimento Itaipu 3THAUMATURGO Leila Regina Youssef SIMÕES Silvio Jorge Coelho TRANNIN Isabel Cristina de Barros A construção da usina hidrelétrica de Itaipu e seu impacto sobre a urbanização de Foz do Iguaçu Universidade Estadual Paulista UNESP 19 certamente constituise um marco importante da história recente Porém o mesmo desenvolvimento produziu uma série de mazelas que ainda hoje se fazem sentir A obra teve seu início em 1973 com a assinatura do Tratado de Itaipu pelos então presidentes Emilio Garrastazu Médici Brasil e Alfredo Stroessner Paraguai mas já vinha sendo discutida já na década de 1960 Por este tratado segundo MAZAROLO criavase aempresa Itaipu dandolhe a concessão para explorar durante 50 anos o potencial hidrelétrico do Rio Paraná pertencente aos dois países em forma de condomínio desde e inclusive o Salto de Sete Quedas de Guaíra até a Foz do Rio Iguaçu Pelo Tratado também ficava acordado que a produção da energia seria dividia de forma igual entre os dois países e garantia ao Brasil a preferência pela compra do excedente não utilizado pelo Paraguai a preços competitivos Na página da empresa na internet a história da sua construção é narrada com base em 3 pilares Desafio Humano Desafio Energético e Desafio Diplomático4 Em cada um dos tópicos são mencionados de maneira superficial os Desafios enfrentados e como foram vencidos A história é contada de forma a gerar no visitante virtual o mesmo deslumbramento que se tem quando se visita a obra pessoalmente destacando sua grandeza seus números e o esforço descomunal daqueles que a construíram ao mesmo tempo em que desvia o olhar dos problemas reais que ocorreram e digase de passagem ainda não foram de todo solucionados O termo Desafio muito bem utilizado pelo marketing da empresa mexe com o ímpeto do ser humano de superar barreiras e ir além das próprias forças e neste caso de ir além das forças da natureza já que para que a barragem pudesse ser construída o próprio leito do rio Paraná precisou ser alterado através de um canal de desvio Denota também a necessidade de envolvimento e de união de forças no sentido de buscar soluções Neste sentido toda oposição ou pensamento contrário passa a ser visto com maus olhos especialmente quando anualmente a empresa mostra os números e comemora os recordes de produção de energia Porém a ideia deque não houve oposição ao projeto Itaipu ou que sua relação com os atingidos por ela foi sempre pacífica é um tanto quanto equivocada Houveram sim embates discordâncias e desmandos o que a história oficial tenta suprimir ou tratar como casos isolados e superados 4wwwitaipugovbrnossahistoria 20 Se atualmente a palavra que define a obra é Desafio na época da construção a palavra de ordem era o Progresso A empresa na verdade era o próprio símbolo do progresso o motor que levaria o país a sair do atraso econômico e manteria o país nos trilhos do desenvolvimento tecnológico colocandoo na vanguarda da produção de energia limpa e renovável Porém se Desafio tem a intenção de incluir os sujeitos neste processo de desenvolvimento colocandoos como parte ativa da narrativa já o Progresso por outro lado é avassalador e excludente colocando os sujeitos em situação passiva e sem ação cabendolhes apenas aceitar tal movimento passando por cima de todos os que se encontram em seu caminho pois ele pressupõe um destino inevitável para a nação que não quer ficar no atraso sendo que aqueles que se colocam em oposição estão na verdade indo contra o futuro da própria nação O ano de 1964 marcou no Brasil a ascensão ao poder através de um golpe de Estado de um governo militar no Brasil Estava instalada no país uma ditadura que tinha como uma das suas metas políticas e propagandistas um ideal de progresso desenvolvimento nacional ideais que estavam longe de serem novidades no país mas que nesse período vai se transformar na principal bandeira do regime militar MUCHIUTI ARANHA 2012 Por ser uma empresa binacional e de caráter governamental desde o início Itaipu foi regida com mãos de ferro tanto do lado brasileiro quanto do lado paraguaio tendo à frente militares ou civis indicados por estes já que os dois países viviam debaixo de ditaduras militares O autoritarismo exercido por Itaipu através do Governo Federal e daqueles responsáveis pelas negociações em nome dela era tamanho que nem mesmo Sete Quedas foram poupadas Sete Quedas era um conjunto de cachoeiras localizada na cidade de Guaíra no Oeste do Estado e disputava a atenção turística com as Cataratas do Iguaçu Elas desapareceram durante a formação do lago de Itaipu Tal poder pode ser percebido nas declarações do então DiretorGeral de Itaipu no lado brasileiro o general José Costa Cavalcante que mesmo antes de morrer deu seu nome ao Hospital de Itaipu Hospital Ministro Costa Cavalcante e ao Ginásio de Esportes da cidade Ginásio de Esportes Costa Cavalcante A reportagem intitulada DE ITAIPU À PRESIDÊNCIA que revelava sua intenção em concorrer ao cargo de presidente da república mostra também sua postura politicamente arrogante frente aos acontecimentos e o poder que aquele cargo naquela empresa naquela conjuntura significava MENDONÇA Jornal Ilha Grande O senhor falou que é Itaipu e não o governo que está procedendo às indenizações das benfeitorias que serão 21 alagadas O agricultor terá então a indenização de seus bens Sete Quedas é para o povo de Guaíra um bem econômico que deixará de render no momento em que Itaipu fechar as comportas Que providências estão sendo tomadas para indenizar o povo de Guaíra CAVALCANTI Eu poderia responder mas vamos deixar para Paulo Cunha responder essa pergunta Ele que cuida disso Eu acrescentaria que Sete Quedas existem como uma grande obra de Deus mas que pouco está produzindo Apenas um turismo muito rudimentar Nem de longe comparado ao turismo de Foz do Iguaçu que as Cataratas proporcionam Agora por obra do homem esse recurso de Deus que pouco está rendendo passará a render muito mais para os donos das Sete Quedas que são a União Brasileira e a União Paraguaia Não é Guaíra nem o estado do Paraná o dono de Sete Quedas NOSSO TEMPO Foz do Iguaçu 19815 Foto 2 3 de setembro de 1982 General Figueiredo presidente da República visita Sete Quedas Fonte brpinterestcomcleyscholzadeussetequedas Nas palavras do então presidente João Figueiredo nada mais poderia ser feito para evitar o encobrimento das Sete Quedas Trinta e cinco anos após o seu desaparecimento Itaipu não se reconhece como aquela que causou o fim de uma beleza natural que gerava renda para toda uma região e que era o orgulho de uma 5httpwwwnossotempodigitalcombredicao35pagina9 acessado em 03042017 22 cidade que se desenvolvia com base na sua vocação turística A empresa se coloca na verdade como aquela que deu fim a um litígio entre o Brasil e o Paraguai que disputavam o território onde as quedas se encontravam simplificando a questão da seguinte forma não se pode brigar por algo que não existe mais Lago encobre a área em litígio Oentendimento diplomático abriu caminho para o início dos estudos técnicos A solução proposta por um consórcio de empresas estrangeiras que previa o alagamento de grande parte da área em litígio encerrou a disputa por terras na fronteira Procurase desta forma amenizar a responsabilidade da empresa frente aos problemas gerados a partir da sua imposição para a região ADEUS ÀS SETE QUEDAS BEMVINDA A LUZ O enchimento do reservatório interfere na vida de milhares de pessoas que habitam nas margens do Rio Paraná entre Foz do Iguaçu e Guaíra Os moradores de Foz veem o rio esvaziar a jusante da barragem por causa do fechamento das comportas enquanto Guaíra lamenta o alagamento das Sete Quedas Moradores de Guaíra realizam protestos e artistas prestam homenagem aos saltos que acabam encobertos pelo reservatório Ansiosos por se despedir das Sete Quedas 32 turistas morrem em janeiro de 1982 com a queda de uma passarela sobre o rio Ao longo da faixa de 170 quilômetros submersos entre Foz do Iguaçu e Guaíra 8519 propriedades urbanas e rurais são alagadas na margem brasileira e os donos indenizados O município de Guaíra passa a receber royalties da Itaipu pelo alagamento6 Itaipu constituise na verdade como a imposição de um projeto nacional onde os fins justificam os meios Especialmente na década de 1970 quando o país vivia debaixo de um regime ditatorial essa prática se tornou corriqueira uma vez que a política do medo da censura e da repressão imperava no país Sabendo que até então a região experimentava um crescimento gradativo e sem sobressaltos a chegada de Itaipu representa uma mudança drástica neste sentido onde uma leva de trabalhadoras chegava a todo o momento mudando completamente o panorama da cidade que a recebeu bem como de todo entorno ao rio Paraná tanto do lado brasileiro quanto do lado paraguaio Vale lembrar que a colonização do oeste paranaense já era fruto de outro projeto de desenvolvimento nacional que trouxe para a região grupos de pessoas dispostas a fincar raízes e povoar o local No entanto o primeiro projeto foi pautado muito mais por aspectos culturais e de soberania nacional nacionalizar as regiões fronteiriças que veremos mais detalhadamente à frente enquanto que para o segundo Itaipu estava em jogo questões econômicas dentro de um projeto de poder e desenvolvimento Porém a 6Retirado do site httpswwwitaipugovbrnossahistoria acessado em 05032017 23 empresa acabou contribuindo para gerar transformações tanto culturais quanto territoriais compondo um cenário diverso do que estava se desenhando antes da sua chegada a região A uma população composta na sua maioria por pessoas oriundas dos Estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina entre estes muitos de origem europeia e asiática fluxo migratório experimentado pela região anteriormente agora se unia gentes de diversas regiões do país A colonização anterior explica de certa forma a predominância branca na região que só foi quebrada em partes com o início da construção da usina que trouxe no seu bojo uma leva de gente de pele escura para compor o seu quadro de funcionários Estes por sua vez acabaram ocupando cargos de menor critério técnico e juntamente com os demais funcionários de menor grau de instrução acabaram ficando com o trabalho braçal e pesado e consequentemente de menor remuneração ocupando também na hierarquia habitacional espaços de qualidade inferior Esta hierarquização acabou afetando as relações entre os próprios trabalhadores e também com a sociedade local gerando rivalidade sendo que os níveis eram definidos diretamente pelo bairro em que os funcionários habitavam 11 PROBLEMAS SOCIAIS Foram inúmeros os problemas socais que Itaipu deixou como herança A cidade de Foz do Iguaçu era apenas uma pequena cidade na época com suas peculiaridades e cotidiano definidos de acordo com uma lógica extrativista e agrícola É certo que mais dia menos dia a cidade acabaria tomando forma de cidade desenvolvida com todas as características que uma cidade grande possui haja vista sua vocação turística e o fato de fazer parte de uma região de fronteira No entanto o que se viu com o início das obras de Itaipu foi um crescimento vertiginoso em todos os sentidos e com a mesma velocidade que o progresso chega a essa região inóspita do Brasil chegam também todas as mazelas que o acompanham A violência a miséria favelas desemprego em larga escala especulação imobiliária diferenças sociais acirradas subempregos mercado ilegal o contrabando e as drogas Em contraposição até 1973 quando da instalação do projeto Itaipu havia uma menor discrepância entre as classes sociais da cidade e um maior 24 intercâmbio entre elas provavelmente em função do isolamento em que se encontrava Foz do Iguaçu e devido ao processo de conquista e ocupação daquela região que trouxe em seu bojo culturas distintas que ali foram se plasmar caracterizando assim a economia local Acreditamos que esse contexto contribuiu para que aquelas estruturas subsistissem inalteradas até a instalação da nova ordem representada por Itaipu que será responsável por um redimensionamento das classes sociais da cidade bem como por estabelecer os abismos que detectamos entre elas PENA CATTA P 31 Foz do Iguaçu não estava preparada para absorver tamanho contingente de pessoas que chegavam em busca de fazer a vida à sombra de Itaipu Ainda que Itaipu dispusesse a seus funcionários toda uma estrutura de apoio como habitação escola e saúde o mesmo não acontecia ao restante da população Havia ainda um sem número de pessoas que vinham tentar a sorte e tendo sua entrada em Itaipu negada acabavam perambulando pela cidade ou indo morar em barracos nos arredores da cidade no que viriam a se tornar bairros populares ou até mesmo as futuras favelas tudo isto na esperança de um dia serem absorvidos ao quadro de funcionários de Itaipu Os cortes de funcionários em massa ao final de cada etapa da construção contribuíam para gerar um clima de incertezas entre os funcionários Muitos por haver gastado tudo o que tinham já não contavam com meios de voltar ao seu local de origem depois de serem dispensados pela empresa outros por terem estabelecido vínculos com a cidade e com pessoas uma vez dispensados não queriam deixar a região e preferiram tentar a sorte atuando na construção civil ou migrando para outro ramo profissional Para sobreviver tentavam um emprego na pequena estrutura comercial da cidade que não conseguia absorver tão grande contingente de desempregados que só aumentaria com o passar dos anos Alguns faziam pequenos bicos outros ainda acabavam empurrados para o comercio ilegal ou ainda para a marginalidade E outros acabavam mendigando nas ruas da cidade o que se tornou um problema social e de segurança pública 12 DESAPROPIAÇÕES Quando em novembro de 1982 Itaipu fechou as comportas para a formação do lago da barragem era o ultimato para que todos que estivessem no raio de alcance das águas saíssem Muitos ficaram até o último momento para ver as águas subirem e despedirse de suas propriedades que agora já pertenciam à Itaipu O processo de desapropriações iniciouse no mesmo momento em que as 25 máquinas chegaram ao canteiro de obras com os estudos técnicos as medições de abrangência do futuro lago a catalogação dos imóveis a serem desapropriados e a comunicação aos proprietários A partir daí medo e incertezas se instalaram na região principalmente entre os que seriam atingidos A obra levou sete anos para ser concluída e neste período Itaipu precisou adotar diversas estratégias para consumar as desapropriações Nas terras haviam casos distintos proprietários com escritura em mãos terras com registro em duplicidade posseiros arrendatários e meeiros A propaganda de Itaipu tentava acalmar os ânimos dizendo que todos os casos seriam analisados um a um e que todos seriam indenizados o que na prática foi bem diferente Para tentar amenizar o impacto Itaipu não mediu esforços chegando a utilizar a figura de artistas que contavam com a simpatia do grande público na ocasião como Teixeirinha cantor gaúcho e Lima Duarte ator global Foto 3 Propaganda de Itaipu para acalmar os agricultores expropriados Fonte Arquivo da Prefeitura Municipal de Marechal Cândido Rondon Adaptado de BENTO RIBEIRO Maria de Fátima 2002 26 Na imagem a frieza do concreto ao centro é amenizada pela simpatia do ator que representa um funcionário de Itaipu responsável por fazer a abordagem junto aos donos das propriedadesesquerda e pelo ator Lima Duarte direita No entanto a prática foi bem diferente e logo este discurso se desfez diante da luta que a empresa teria de travar com os expropriados e seus aliados ao longo de toda a construção da mesma Este tipo de discurso denuncia uma estratégia bem articulada onde para a opinião pública se apresenta de forma amigável comprometida com os direitos dos expropriados trazendoos para perto a fim de que se sintam parte integrante do processo de construção não apenas de uma usina hidrelétrica mas do progresso e do futuro da nação e para os expropriados fica a intransigência e as promessas não cumpridasNa verdade a necessidade da campanha já sinaliza que a situação estava fugindo do controle e os focos de levante dos expropriados precisavam ser contidos Você também vai ajudar a construir a Itaipu a maior usina Hidrelétrica do mundo Itaipu vai adquirir as terras por preço justo isto é a indenização vai corresponder não só ao valor da terra nua como também aos dos benefícios que foram agregados a terra como destoca todo o trabalho para tornar a terra mecanizável e todas as benfeitorias existentes Apud MAZZAROLLO p50 A estratégia de Itaipu de isolar os proprietários e fazer negociações individuais e não em grupo para evitar que estes se mobilizassem contra os desmandos da empresa parece demonstrar claramente sua intenção de desarticular qualquer possibilidade de reação Este foi o primeiro de muitos processos pelos quais tiveram que passar os moradores de Alvorada do Iguaçu e das demais comunidades atingidas pela barragem Muitos migraram para outras regiões para outros Estados ou até mesmo para o Paraguai na tentativa de adquirir terras mais baratas já que a especulação imobiliária e agrária levava os preços de terras e de casas às alturas além de que o preço oferecido por Itaipu na compra das propriedades impossibilitava que muitos adquirissem terras ou propriedades na região Aqueles que conseguiram comprar terras nas proximidades ou que não tiveram suas propriedades atingidas diretamente pelo lago se viram isolados e com suas propriedades desvalorizadas pelo esvaziamento da região e pela falta de estrutura necessária para garantir a sustentabilidade econômica e social Antes das terras desaparecerem a região foi tomada por protestos festas de despedidas e eventos religiosos Algumas famílias transportavam além de roupas e utensílios casas inteiras de madeira 27 Lenir Spada 69 anos foi uma das moradoras que teve a vida transformada pelas águas Ela vivia com a família em Alvorada do Iguaçu distrito de Foz do Iguaçu que desapareceu após a criação do reservatório Deixou para trás 11 alqueires de terra um mercado e uma loja Daquela época ela se lembra das pessoas que relutavam sair das casas e dos amigos que partiram para o Mato Grosso A família que foi morar em Santa Terezinha de Itaipu recebeu indenização pelos 11 alqueires de terra Foi difícil Tinha gente que não queria sair lembra7 Outra tática adotada para expulsar os habitantes da área pretendida por Itaipu era espalhar o medo ao declarar que caso a pessoa não aceitasse tal proposta a decisão seria feita via judicial o que acarretaria em custos para o agricultor e a desvalorização de sua propriedade Estas e outras estratégias funcionaram em boa medida o que não quer dizer que não tenha havido resistência por parte dos proprietários Esta resistência se deu muito porque os expropriados se uniram para lutar por seus direitos Auxiliados pela CPT Comissão Pastoral da Terra formada por alguns padres e pastores que de certa forma deram voz aos donos de terras já que Itaipu se recusava a tratar com estes por considerálos incapacitados no tocante a assuntos burocráticos propondo que fossem intermediados por advogados na sua maioria sem escrúpulos e movidos pela ganância Por conta disto muitos expropriados acabaram assinando acordos injustos e se viram completamente sem condições de começar vida nova de forma digna A CPT passou a intermediar os interesses dos afetados juntamente com representantes de cada região tornandose uma pedra no sapato da grande empresa Foi o que de certa forma garantiu algum ganho para os expropriados mas nada que pudesse reparar os prejuízos causados pela obra que iam muito além das terras vendidas a preços baixos Pensa bem com o que vamos receber só poderemos comprar terra no Mato Grosso em Rondônia no Pará ou no Paraguai tudo terra de mato coisa que nós não temos mais condições de enfrentar porque já gastamos nossa vida aqui colonizando esta região E depois uma terra de mato leva anos para ser mecanizada Como faremos então para construir casa E o tempo até produzir a primeira safra Itaipu não conversa não vem discutir conosco só quer impor mas nós vamos fazer reuniões e estudar o problema Se o progresso e o orgulho brasileiro exigem a construção dessa obra nós exigimos justiça Armindo Berger em MAZZAROLLO 2003 p 57 Para ter uma ideia no início do processo de desapropriação Itaipu oferecia Cr16 mil dezesseis mil cruzeiros por alqueire de terra valor ínfimo e questionado desde o início A especulação que se gerou e a falta de escrúpulos de 7httpwwwgazetadopovocombreconomiaespeciaisitaipu30anosusinarefezomapadaregiaooeste 8tbwwaaiyoig2mbijrefca2j2 acessado em 260520107 28 muitos donos de terra da região faziam com que este valor se tornasse ainda mais insignificanteNo entanto a luta dos proprietários e da CPT fez com que este valor fosse aumentado várias vezes Diversas mobilizações acabaram pressionando a empresa a recalcular o valor do alqueire e reajustar No entanto a inflação da economia também fazia com que o preço pago pelas terras perdesse seu valor rapidamente No dia 17 de março de 1881 uma comitiva de expropriados resolveu marchar até o escritório da Itaipu em Foz do Iguaçu Esta primeira marcha dos expropriados ficou conhecida como Trevo da Vergonha e culminou com um acampamento que durou 54 dias no trevo entre a BR 277 e a Avenida Paraná que dava acessoao escritório da empresa em Foz do Iguaçu Nesta ocasião os manifestantes foram recebidos pela polícia militar armada com fuzis baionetas metralhadoras e armas químicas Estes ficaram de prontidão durante todo acampamento dos agricultores Foto 4 Comitiva de expropriados em mobilização recebidos pela Polícia Militar Fonte Jornal Nosso Tempo de 18 a 25031981 Após esta mobilização o preço do alqueire fora ajustado para Cr 650 mil seiscentos e cinquenta mil cruzeiros por alqueire a serem pagos em um prazo de 15 dias após assinado o acordo No entanto as promessas não foram cumpridas e o processo se arrastou por mais um ano o que levou a uma nova mobilização com passeata e acampamento no Trevo da Vergonha Desta vez os agricultores que 29 ainda não haviam recebido a indenização exigiam o pagamento de Cr 1 milhão hum milhão de cruzeiros por alqueire a serem pagos também em um prazo de 15 dias após este novo acordo ser assinado Porém a compensação financeira não era tudo Para muito além da questão da terra de bens móveis ou imóveis estava o apego ao lugar no sentido de pertencimento a uma terra a um povo a uma comunidade Estava presente também toda uma rede de relações culturais afetivas e emocionais estabelecidas com o local de um ideal de comunidade construído entre os colonos que ao chegarem a estas terras precisaram estabelecer entre si aos quais uma indenização financeira não tem o poder de restituir Isto não foi levado em conta por Itaipu Estes colonos chegaram à região com sonhos promessas e expectativas e aqui encontraram outros que partilhavam do mesmo ideal Embora vindos de lugares diferentes estes colonos conseguiam identificarse culturalmente No entanto acabaram encontrando a intransigência e a frieza de Itaipu Os indenizadores e construtores da Itaipu de restos feitos à imagem e semelhança do sistema materialista e do regime despótico a que serviram no Brasil e no Paraguai não eram capazes de ver algo mais além de números cálculos projetos de engenharia pesos e medidas A eles não ocorria que a matemática e a técnica não têm resposta para tudo nem que a ciência e a tecnologia podem ferir o ser humano Às vezes reconheciam o sacrifício que exigiam da população e até admitiam ser impossível um ressarcimento justo que compensasse realmente as perdas impostas A terra a casa o estabelecimento a propriedade organizada para a produção tem um preço relativamente fácil de ser estipulado Mas como dar o preço de valores culturais sociais e afetivos construídos por pessoas famílias e comunidades durante décadas MAZZAROLLO 2003 p 41 O prazo para a retirada das pessoas da área alagada chegava ao fim mas os conflitos estavam longe de se esgotar O quadro era desolador para as famílias ou indivíduos que ainda não haviam tido uma resposta satisfatória para suas reivindicações Entre estes estavam principalmente posseiros e meeiros conforme reportagem do Jornal O Estado do Paraná de 3 de agosto de 1982 O fechamento das comportas para a formação da represa estava prevista para o mês de outubro do mesmo ano Segundo a reportagem estas famílias se recusavam a deixar a região e rumar para o Acre para onde estavam sendo enviados alguns desapropriados A situação nos locais de abrangência do lago era caótica conforme descrito na reportagem 30 A paisagem na área do futuro reservatório lembra o cenário de um filme de terror casas destruídas vilas inteiras abandonadas e cobertas pelo mato Com a aproximação da data prevista para o alagamento tornase cada vez mais comuns na região o trânsito de caminhões de mudança às vezes em cenas absurdas como a do caminhão que leva na carroceria uma casa inteira para um local mais seguro Por fim as águas começaram a subir e não havia mais o que ser feito além de lamentar e ver a paisagem ser transformada da noite para o dia Com ou sem acordo a população precisou deixar o local A recomendação era que todos fossem retirados sob o risco de ficarem ilhados devido a subida rápida das águas A população acompanhou através da imprensa o fechamento das comportas De Itaipu abaixo o rio secou enquanto que de Itaipu acima as águas subiam e aumentavam seu volume a cada dia Levaram 14 dias para que todo o vale do rio Paraná fosse coberto e toda a vegetação se encontrasse debaixo de vários kilômetros de água Começa a corrida para salvar os animais da inundação Foto 514 de outubro de 1982 Rio Paraná começa a sair do seu leito O Estado do Paraná Fonte brpinterestcomcleyscholzadeussetequedas 13 O DESASTRE AMBIENTAL E OS INDÍGENAS Se Itaipu não ouviu e nem atendeu ao apelo das populações locais que tiveram suas vidas alteradas para sempre o que dizer da fauna que foi coberta por densas águas e das inúmeras espécies animais que tiveram seu hábitat inundado do dia para a noite O tratamento dado aos indígenas já acuados pelos processos coloniais anteriores mas que mantinham ainda alguns focos habitacionais na região foi outro ponto problemático já que mais uma vez foram expulsos eacabaram alguns 31 sendo dispersos para outras regiões ou ilhados em uma pequena reserva às margens do lago de Itapu Fotos 6 População recolhendo peixes que tentam escapar do Lago Fonte brpinterestcomcleyscholzadeussetequedas O desequilíbrio causado pela represa deu a sua cara logo de início Na imagem acima vemos os peixes que tentavam escapar do lago e acabaram presos em lagoas formadas pelo relevo o que fez a alegria das comunidades que os pescavam com as próprias mãos Já os que ficaram abaixo da Itaipu acabaram encontrando uma enorme e intransponível barreira de concreto na hora de subir o rio no período da Piracema período em que estes precisam vencer as corredeiras para fazer a desova e garantir a manutenção da espécie Este problema só foi solucionado em partes anos mais tarde quando Itaipu criou o canal da Piracema um canal com corredeiras artificiais fazendo a ligação do Rio Paraná ao Lago de Itaipu através do rio Bela Vista que corta a área da usina Estimase que 80 dos animais foram massacrados e tiveram sua população reduzida drasticamente O período escolhido para o represamento foi 32 totalmente inadequado já que na primavera uma grande quantidade de animais está se reproduzindo Segundo noticiado na época era possível encontrar muitos animais mortos outros sobrevivendo agarradas nos topos das árvores sofrendo de inanição muitas fêmeas grávidas não conseguiram abrigo e uma infinidade de ninhos com ovos ou filhotes indefesos Isto sem contar a quantidade de árvores e vegetação nativa que simplesmente se perdeu para sempre É o que se constata através das declarações do Biólogo Cláudio Araújo do Rio de Janeiro que se ofereceu como voluntário para tentar salvar parte dessa biodiversidade O biólogo carioca Cláudio Araújo esteve na região e ficou estarrecido com os trabalhos da operação MymbaKuera ou seja pegabicho levada em efeito pela Itaipu Binacional durante o enchimento do lago ele constatou que não há condições humanas nem materiais para resgatar com vida a grande maioria dos bichos Muitos passam vários dias agarrados nas copas das árvores vivendo à base dágua que em muitas áreas está contaminada Os que são salvos não são encaminhados para um local adequado e não raro matamse entre si Poucas lanchas poucos homens especializados para coordenar a operação Eles não tomaram conta da loucura que é uma obra colossal como essa Cláudio fez um apelo para os faraós de Itaipu para prolongarem a operação que teve seu encerramento no dia 25 novembro de 1982 mas como sempre eles foram insensíveis como insensíveis foram com os colonos expropriados Colonos que em sua maioria tiveram que morar no Paraguai outros em favelas e outros ainda migraram para o Mato Grosso NOSSO TEMPO 82 56 Os poucos animais que foram recolhidos pelos biólogos e voluntários foram levados para refúgios biológicos tanto do lado brasileiro quanto do lado paraguaio da barragem sendo mantidos ali até estarem em condições de serem devolvidos à natureza mas o desastre natural a que a região foi submetida não tem precedente Quando o governo negociou com Fernando Martinez cacique que representou as tribos na negociação pelas terras que seriam inundadas não levou em conta as necessidades particulares dos indígenas somente ofereceram terras 253 hectares em tese mais que o dobro das que possuíam e um valor em dinheiroMas as questões indígenas implicam outros aspectos muito mais importantes que a terra e o dinheiro Sua tradição com a terra e a natureza que os cerca com o rio com as matas e os animais são mais profundas dos que as que o homem branco estabelece Estava em perigo ali sua percepção com o local e sua identidade enquanto herdeiros desta região remanescentes dos povos originários que já povoaram esta vasta região no passado Seus antepassados estavam 33 enterrados alie muitos dos cemitérios indígenas acabaram submersos pelo lago É possível observar como afirma o Jornal Nosso Tempo as dificuldades enfrentadas pelos indígenas As preocupações com a situação crítica que Itaipu impôs à tribo nos últimos anos somadas as antigas e atual invasão dos brancos perturbam visivelmente a vida do cacique e de sua aldeia NOSSO TEMPO ed 48 p3 O índio continua sofrendo com o passar do tempo com as mudanças que o homem branco impõe e as mudanças vão mutilando e extinguindo a cultura dos indígenas de forma violenta e desordenada A FUNAI como órgão que se intitula protetora do índio pouco fez no início do processo de realocação dos indígenas como afirma MAZZAROLLO De início a FUNAI tentou simplificar as coisas mostrandose mais preocupada em evitar atritos com a Itaipu do que em amparar os índios MAZZAROLLO 2003 p 123 Foto 7 Índios despejados por Itaipu O Estado do Paraná Fonte brpinterestcomcleyscholzadeussetequedas 34 Um laudo realizado por Celio Horst concluiu que as famílias deveriam ser reintegradas a outras tribos a livre escolha dos envolvidos e que a FUNAI acompanhasse o processo de indenização e que o dinheiro fosse utilizado em benefício das famílias A ideologia utilizada pela FUNAI pode ser representada nas palavras de um expresidente da instituição coronel Nobre da Veiga Os índios não têm nada que reagir A terra que possuem é suficiente e vamos convencêlos disso O governo decidiu que não quer mais ampliações de áreas indígenasMAZZAROLLO 2003 p 125 Era esse o pensamento do governo da época e o mesmo se utilizava da máquina ditatorial para fazer valer sua palavra observando que a maioria dos órgãos e instituições públicas era dirigida por militares como no caso aqui a FUNAI e Itaipu A Comissão de Justiça e Paz do Paraná revoltada com o laudo de Celio Horst solicitou um laudo antropológico ao antropólogo Edgar de Assis de Carvalho que concluiu Com mais este ato de vandalismo cultural ferese frontalmente a lei 600173 Estatuto do Índio rompese com os direitos constitucionais nega se o exercício da diversidade a um grupo indígena que se configurou como habitante imemorial da área Que se respeite a história cultural de cada grupo indígena que se imprima significado positivo à auto identificação étnica esses serão os requisitos mínimos senão indispensáveis para que as culturas indígenas em seu conjunto possam exercer suas diversidades no corpo da nação brasileira CARVALHO apud MAZZAROLLO 2003 p125 Não é possível pegar um integrante de uma tribo de um determinado local e colocar em outra tribo e acreditar que o problema estará resolvido pois os costumes podem variar conforme a localização da tribo que podem ter comida língua costumes e organização interna diferente Este é um tipo de categorização equivocada que segue olhar ocidental do indígena desde a invasão ibérica e permanece como se percebe É ingenuidade pensar que por serem índios são todos iguais é generalizar de forma demasiadamente perigosa os costumes e maneiras de viver de um povo 35 Desenho 1 Mapa mostra a presença indígena no passado laranja e na atualidade vermelho Fonte httpapublicaorgosecosdeitaipu Na imagem vemos os locais da região onde já houveram aldeamentos indígenas no passado marcados com a cor laranja e onde atualmente se encontram os aldeamentos Revela como era vasta a presença indígena e como os processos de colonização acabaram por reduzir quase que por completo sua presença no oeste paranaense Itaipu levou os municípios diretamente afetados pelo lago a perderam cerca de 1390 do seu território Como forma de compensação passou a pagar royalties a estes municípios o que não encobre as injustiças cometidas ao longo da sua construção quando o progresso passava por cima dos direitos de qualquer cidadão pouco importava se alguém iria perder suas terras e uma vida toda de trabalho e esforço para deixar suas terras produtivas se os indígenas seriam novamente deslocados e teriam sua área reduzida ou ainda se toda uma biodiversidade animal e vegetal se perderia debaixo dágua Itaipu entrou em operação comercial venda de energia em 1985 mas só em 1991 os municípios e os governos estaduais passaram a ter direito ao benefício graças a criação da Lei dos Royalties que regulamenta o dispositivo constitucional Mensalmente Itaipu deposita no cofre do Tesouro Nacional os royalties para serem distribuídos às partes que a eles tem direito o Estado do Paraná os municípios afetados a Agência Nacional de Energia Elétrica Aneel o Ministério do Meio Ambiente e Amazônia Legal o Ministério de Ciência e Tecnologia o Ministério de Minas e Energia e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico MAZZAROLLO 2003 p 35 36 Acontece que a fome por energia é insaciável e o mesmo discurso continua sendo utilizado com o propósito de justificar a construção de usinas hidrelétricas nos quatro cantos do país Mesmo com leis ambientais mais severas e uma população mais esclarecida e articulada utilizando as redes sociais para denunciar expor desmandos e imposições onde eles acontecem quase que em tempo real estas obras ainda prosperam e têm produzido os mesmos resultados nocivos Para a opinião pública Itaipu era o símbolo do progresso e empreendimento modelo em todos os aspectos Os desvios de conduta os maus tratos as jornadas de trabalho estafantes as indenizações injustas e outras situações nada exemplares ficavam mais a nível local denunciados por aqueles que estavam sentindo na pele tais práticas Vale destacar o papel do Jornal Nosso Tempo8 que em tempos de torturas generalizada foi uma voz a denunciar as práticas abusivas relacionadas à Itaipu e os abusos cometidos pela ditadura militar na região oeste do Paraná especialmente na tríplice fronteira Destacamos os fascículos que compreendem os anos de 1981 a 1982 período crítico e essencial para entender o processo de desapropriação e indenização dos povos prejudicados pela formação do lago de Itaipu e o efeito devastador causado pelos frequentes cortes em massa de pessoal do rol de funcionários de Itaipu O Jornal Nosso Tempo foi um crítico ferrenho de Itaipu e toda sua problemática Em praticamente todas as edições deste período a empresa estava na pauta das discussões na grande maioria das vezes como vilã A empresa representa ainda hoje um marco da engenharia civil sendo reconhecida internacionalmente como uma das 7 Maravilhas da Engenharia Moderna Mas a despeito de toda propaganda positiva que se promova sobre o projeto Itaipu a obra foi responsável direta e indiretamente pelas diversas transformações sociais e ambientais vistas acima sendo que seus efeitos ainda se fazem sentir passados 35 anos desde a formação do seu reservatório no final de 1982 A realidade local jamais foi a mesma após Itaipu e apesar dos inúmeros projetos ambientais e sociais que a empresa desenvolve na região tais como o 8O Jornal Nosso Tempo está quase todo digitalizado e disponível para leitura e análise através do site wwwnossotempodigitalcombr 37 Cultivando Água Boa9 o Canal da Piracema10 além do apoio a eventos e projetos de desenvolvimento social que presta aos municípios que foram atingidas por ela com o intuito de amenizar os problemas que causou Além de todas estas transformações que tratamos acima de forma mais direta Itaipu ocasionou o encobrimento do Distrito de Alvorada do Iguaçu e a sua extinção bem como o surgimento da Vila Bananal processos que abordaremos nos capítulos seguintes de forma mais detalhada 9O Cultivando Água Boa é um programa fundamentado em documentos nacionais e planetários que contempla diversas ações socioambientais relacionadas com a conservação dos recursos naturais e da biodiversidade e com a promoção da qualidade de vida nas comunidades da Bacia Hidrográfica do Paraná 3 região conectada pelos rios e córregos com o reservatório da usina de ItaipuA denominação Cultivando Água Boa com o verbo no gerúndio para denotar um processo contínuo realça a necessidade de que assim como se cultiva o solo para que dê bons frutos a água também precisa de cultivo ou cuidado para se manter abundante e com qualidade httpswwwitaipugovbrmeioambientecultivandoaguaboa 10Canal da Piracema Com 10 km de extensão o Canal da Piracema permite aos peixes migradores chegar às áreas de reprodução e berçários acima da usina no período da piracema a migração reprodutiva e seu retorno no período de outono e inverno quando ocorre a migração trófica para áreas de alimentação A ligação é fundamental para a conservação da biodiversidadeO Canal da Piracema usa um trecho do leito do Rio Bela Vista para vencer o desnível médio de 120 metros existente entre o Rio Paraná e a superfície do reservatório A foz do Rio Bela Vista está a 25 km abaixo da barragemAs corredeiras são intercaladas por lagoas de forma a propiciar um remanso para os peixes que estão subindo em direção ao reservatório Nas lagoas as espécies migradoras ou não podem eventualmente se alimentar e descansar httpswwwitaipugovbrmeioambientecanaldapiracema 38 2ALVORADA DO IGUAÇU CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE Alvorada do Iguaçu foi um pequeno Distrito no extremo Oeste do Paraná fruto de um processo semelhante a muitos outros que se desenvolveram na região a partir da política nacional de ocupação das regiões fronteiriças e os sertõesdo país11 projeto que ficou conhecido como Marcha para o Oeste Porém diferentemente dos demais Distritos que surgiram na mesma época Alvorada do Iguaçu tevecurtaduração sendo sobrepujada por outro projeto de desenvolvimento nacional que trouxe a Hidrelétrica de Itaipupara a região Itaipu foi responsável não apenas pelo fim de Alvorada do Iguaçu mas também por uma série de transformações sociais territoriais e econômicas na região do oeste paranaense A consequência mais direta que liga Itaipu à Alvorada do Iguaçu é a Vila Bananal localizada próximo a São Miguel do Iguaçu e que se constitui nosso objeto de estudo 21 ENTENDENDO OS PROCESSOS HISTÓRICOS Para compreender como a região oeste do Paraná se desenvolveu fazse necessário um breve levantamento dos processos pelos quais a mesma passou A pouca bibliografia que trata da história local acaba de certa forma por sedimentar o senso comum em relação aos fatos e temporalidades que a região sofreu ao longo dos anos Embora haja espaço e seja necessária a intenção deste trabalho não é fazer a crítica a esta bibliografia já escassa mas apenas retirar dela o que for útil para a compreensão dos processos que contribuíram para a formação da região para então entender como Alvorada do Iguaçu Itaipu Binacional e Vila Bananal se inserem dentro destes processos Com base nesta bibliografia a região desenvolveuse a partir de ciclos bem definidos Seu povoamento recente tem relação direta com estes ciclos Segundo relatado em HISTÓRIA DO PARANÁ Séculos XIX e XX de 2012 a região 11Neste sentido sertão foi uma categoria construída primeiramente pelos colonizadores portugueses ao longo do processo de colonização Uma categoria carregada de sentidos negativos que absorveu o significado original conhecido dos lusitanos desde antes de sua chegada ao Brasil espaços vastos desconhecidos longínquos e pouco habitados acrescentandolhe outros semelhantes aos primeiros e derivados destes porém específicos adequados a uma situação histórica particular e única a da conquista e consolidação da colônia brasileira AMADO Rio de Janeiro 1995p 148 39 passou por quatro fases bem distintas antes de Itaipu que contribuíram para o desenvolvimento da região conforme apontado abaixo Podemos dizer que o processo da ocupação da região Oeste ocorreu em quatro etapas A primeira e mais antiga decorre da ocupação pelos índios que se espalhavam também por todo o território do continente sul americano A presença desses grupos indígenas como Xetá Kaingangue Guarani foi notada no processo mais recente da colonização fazendo com que essa população fosse mais uma vez reprimida A segunda fase corresponde à atuação e presença dos padres jesuítas espanhóis que desenvolveram várias reduções missões pelo território Esses aldeamentos indígenas apesar de destruídos na primeira metade do século XVII pelos bandeirantes paulistas conservaram forte a presença espanhola na região A terceira etapa data do período entre 1881 e 1930 que corresponde à introdução do sistema das Obrages entre Foz do Iguaçu e Guaíra cujo objetivo principal era a exploração extrativista da ervamate e da madeira Por último a quarta fase ou a etapa recente aconteceu principalmente pela atuação das empresas colonizadoras que efetivaram a colonização moderna do Oeste paranaense PRIORI Angelo 2012 p 76 As duas últimas etapas vão estar no cerne do povoamento mais expressivo da região responsáveis por trazer um contingente de exploradores argentinos e paraguaios no primeiro momento e no segundo momento colonos oriundos tanto do próprio Estado do Paraná quanto dos Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul principalmente Vale salientar que essa narrativa está presente nos relatos fundadores de boa parte dos municípios circunvizinhos a Foz do Iguaçu já que estes eram parte integrante do mesmo vindo a emanciparse politicamente em processos recentes partilhando portanto de uma história comum até meados do século XX Tornouse município no ano de 1951 tendo desmembrado de seu território inicial os atuais municípios de Matelândia 1960 Medianeira 1960 São Miguel do Iguaçu 1961 e que depois desmembrou de seu território o município de Itaipulândia e Santa Terezinha de Itaipu 1982 Sendo que no ano de 1988 o município era constituído por dois distritos ainda Foz do Iguaçu e Alvorada do Iguaçu permanecendo esta divisão territorial segundo o IBGE até o ano 2001 IBGE 2012Apud RIBEIRO CASSULI FRASSÃO 201212 Nestes relatos ainda é muito presente a ideia de um vazio demográfico na região o que é reafirmado por boa parte da bibliografia e também disseminado nos livros didáticos conforme afirma PRIORI Muito desta construção se deu pela ausência de um projeto de ocupação efetiva em relação às regiões a oeste da 12RIBEIRO Vitor Hugo CASSULI Danieli Cristina FRASSÃO Adair José Frason Território e Conflito Breve histórico sobre a implantação da Usina Hidroelétrica Itaipu Binacional e seus reflexos na produção do espaço 2012 40 Nação Outro fator que corrobora a ideia de vazio segundo o mesmo autor é o não reconhecimento da presença das populações indígenas já que estes não são contados como povo nos projetos civilizatórios e colonizadores Construiuse a concepção de vazio demográfico quase despovoado que deveria ser ocupado pela colonização pioneira Essa ideia teve grandes repercussões entre pesquisadores que analisaram a história da região Historiadores geógrafos sociólogos representantes políticos integrantes de órgãos de colonização eternizaram a visão do vazio demográfico em livros e materiais de divulgação Essa versão repetiuse nos livros didáticos importantes mecanismos de normatização de ideias na época utilizando principalmente termos como sertão terras devolutas mata virgem ou boca do sertão MOTA 2005 Apud PRIORI 2012 p 77 Este não foi um problema local e nem isolado mas uma prática recorrente na bibliografia brasileira e latinoamericana do século passado que coloca os demarcadores da colonização do continente a partir da presença espanhola e portuguesa em 1492 e 1522 respectivamente No caso do Brasil sua expansão é dada aos bandeirantes paulistas que percorreram o país em busca de riquezas levando ao extermínio e a expulsão dos povos indígenas Apesar de aos poucos estar sendo feita a revisão desta bibliografia questionando o enfoque eurocentrado presente na historiografia local estes demarcadores ainda se mostram recorrentes La colonización del Oeste del Paraná entonces no escapa a esa visión eurocentrada del mundo y por lo tanto las comunidades indígenas y negras no serán visibilizadas o entonces solo usadas como trabajadores semiesclavos Hoy em día esos dos segmentos de la sociedade fueron despojados casi todas sus tierras y de sus derechos aqui em el Oeste del Paraná Creemos que el modelo patriarcal se ratifica em esta región com la llegada de colonos viajeros y militares venidos casi que directamente de Europa Estos verán a los nativos como inferiores y serán excluídos por no encontrarse dentro de la categoría de modelo de sociedade judeocristiano Suvisión de mundo será casi idéntica a la de los europeos la percepción de tiempo de historia relacionada al pasado al presente y al futuro pues todos desde 1492 y en la misma región europea percibirán esas categorías por medio de lavisión bíblica de la idea de progreso de la era industrial y de las visiones ligadas al darwinismo al positivismo entre otras corrientes base de la percepción evolutiva de la raza y de la cultura LEDEZMA MENESES G G 2014 Seguindo esta lógica a colonização do Oeste paranaense é contada a partir da passagem do espanhol Alvar Nuñes Cabeza de Vaca e sua comitiva com uma breve passagem pela região e o registro da sua visão das Cataratas do Iguaçu Depois disto um salto para 1889 quando foi fundada a primeira colônia Militar na foz do rio Iguaçu dando início ao povoamento da região Porém o vazio sugerido por esta lacuna não existiu de fato A presença humana foi frequente e intensa na 41 região fosse pela presença indígena argentina ou paraguaia Vale lembrar que a anexação do território que hoje compõe o Estado do Paraná sobretudo a região oeste permaneceu sob o domínio espanhol durante muito tempo e mesmo depois de anexada ao Brasil havia muita dificuldade para que a língua portuguesa se tornasse a língua falada na região e assim o território passou longos anos já sob o domínio brasileiro mas com predominância espanhola e guarani O Brasil já tinha o domínio de sua fronteira mas não da língua O historiador paranaense Ruy Wachowicz revela em seu livro A história do Paraná intrigante depoimento de uma cozinheira na década de 1930 Recenseada na época a cozinheira não pensou duas vezes e tascou um Soy brasileña graças a Dios aos pesquisadores MACIEL 2013 Isto fez com que a ocupação brasileira de fato demorasse a chegar a estas terras deixandoas livre para a exploração estrangeira o que durou até as primeiras décadas do século XX especialmente com a exploração de ervamate e extração de madeira por empresas estrangeiras algumas por concessão outras de forma clandestina Durante este período o sistema de trabalho empregado na região era através das obrages13 onde empresas que exploravam a região de Santa Catarina até o Mato Grosso do Sul utilizavam como mão de obra os mensus14 indígenas civilizados e paraguaios que conheciam bem a região e a vegetação local de interesse comercial Segundo RUI WHACHOWICZ que trabalha esta temática no livro Obrageros mensus e colonos história do oeste paranaense tais empreendimentos funcionaramcomo dupla via de colonização em primeiro lugar porque trouxeram pessoas dispostas a trabalhar e a desbravar a região explorando a madeira e a ervamate segundo porque este movimento atraiu o olhar da Nação para o que estava acontecendo na ausência de um projeto de colonização mais efetivo que deixava as fronteiras à mercê de interesses estrangeiros um risco para o futuro do país Darcy Ribeiro constata que após a destruição das missões jesuíticas no século XVII pelos bandeirantes paulistas uma parte das tribos guarani que 13O desenvolvimento das Obrages foi facilitado porque o governoimperial em meados do século XVIII havia assinado um acordo de navegação com a Argentina e com o Paraguai Esse documentogarantiu o acesso à província do Mato Grosso com entrada pela foz do rio da Prata até o rio Paraná Na outra parte do acordo a Argentinatinha assegurado o direito de navegar pelo rio da Prata desde o Iguaçuaté a distância das Sete Quedas Essas resoluções tornaram propícia à atividade de contrabando da ervamate muito consumida pelapopulação platina e da madeira que além de utilizada pelos argentinosera também exportada para o Canadá e Estados Unidos COLODEL2008 Apud PRIORI Angelo 2012 14geralmente paraguaios argentinos e guaranis modernos termo empregado aos índios guaranis miscigenadosno Paraguai PRIORI Angelo 2012 p 79 42 estavam aldeadas nas missões miscigenaramse com a população rural do Paraguai Seus descendentes são os guaranis modernos É esse guarani moderno que os produtores de erva mate argentinos utilizavam a partir de meados do século XIX para penetrar cada vez mais a fundo em território brasileiro no vale do Uruguai em demanda da erva mate negócio rendoso naquelas paragens WACHOWICZ 1987 p 17 Neste processo de colonização que a região já vinha sofrendo desde o final do século XIX com a criação da Colônia Militar na foz do rio Iguaçu a região esboçou poucas mudanças significativas durante os primeiros anos Seu crescimento se dava lentamente sendo que somente em 1914 aaté então Vila Iguaçu passa a ser município recebendo o nome de Foz do Iguaçu Seu desenvolvimento a partir daí seguiu ritmo ascendente e gradativo O isolamento gerado pela dificuldade de acesso por via terrestre era contornado pelo uso do rio Paraná que fazia a ligação com outras localidades tanto rio acima quanto rio abaixo Por conta deste isolamento com o restante do estado e consequentemente do país a região se tornou um mundo à parte De fato era como se esta região não pertencesse à nação Mesmo com a instalação da colônia e a abertura da estrada entre Foz do Iguaçu e Guarapuava e a partir desta com outras regiões uma viagem da capital Curitiba para a fronteira era uma verdadeira aventura tão cara dispendiosa e demorada quanto perigosa As vias de acesso em dias chuvosos ficavam intransitáveis Isto fez com que segundo WACHOWICZ a região ficasse de costas para o restante do país Neste sentido o rio Paraná permaneceu por muito tempo com a principal via para o transporte de pessoas bem como para o escoamento de mercadorias e a aquisição de bens de consumo O mesmo rio que mais tarde abrigaria a hidrelétrica de Itaipu já mostrava ali a sua importância Era muito mais prático transitar pelo rio Paraná e descer até Buenos Aires e Montevidéu e por ali contornar a costa brasileira para chegar aos grandes centros do que ariscarse atravessando o estado por estradas pouco transitáveis O caminho inverso também era o escolhido pela grande maioria que queria chegar à região oeste ou mesmo para subir rumo à região norte do país As Cataratas do Iguaçu já começavam e ficar conhecidas através de turistas estrangeiros que chegavam pela Argentina e mencionavam em seus relatos a exuberância da natureza por estas bandas ea partir daí o rio Iguaçu também começa a ganhar importância econômica no cenário local De forma incontestável os rios Paraná e Iguaçu contribuíram para atrair a atenção e interesse nacional para 43 esta região Claro não podemos negar o fato de que o interesse em guardar suas fronteiras especialmente em uma área onde três países se encontram teve também papel importante nas decisões governamentais em expandir sua área de influência e ocupação territorial Mas também não podemos negar que a entrada indiscriminada de estrangeiros fazendo uso comercial dos recursos naturais da União tenha exercido forte influência nesta decisão Desta forma impedir que o outro tomasse posse destas terras era tão importante quanto ocupálas Sendo assim não fosse pela intromissão estrangeira talvez ainda demorasse um pouco mais até que a nação estendesse seus braços nesta direção Mas foi somente em 1943 que um projeto de ocupação mais direto foi implementado A iniciativa partiu do então presidente Getúlio Vargas através do DecretoLei nº 5812 de 13 de setembro de 1943 que criava o Território Nacional do Iguaçu entre outros territórios nas demais regiões de fronteira dentro da política de nacionalização das fronteiras O Território do Iguaçu compreendia as regiões oeste e sudoeste do Paraná e oeste de Santa Catarina LOPES 2004 O projeto ficou conhecido como Marcha para o Oeste numa clara alusão à iniciativa norte americana que motivou a ocupação do oeste do continente Desta forma abriuse espaço para que empresas colonizadoras atuassem na região comercializando lotes e propriedades com objetivo de fomentar a pequena propriedade Para Sérgio Lopes15 estudioso do assunto a Marcha para o Oeste consistiu na tentativa de despertar no povo o sentimento de brasilidade e de disposição para ocupar os espaços considerados vazios do território brasileiro O papel das Colonizadoras foi determinante para conformação dos espaços geográficos tal como vemos atualmente Dentre as empresas colonizadoras a que talvez tenha desempenhado papel mais relevante tenha sido a Colônia Agrícola Nacional General Osório CANGO de caráter governamental Foi criada por Vargas em 1943 momentos antes da criação do Território do Iguaçu16 o 15LOPES Sérgio O Território do Iguaçu no contexto da Marcha para oeste CascavelEdunioeste 2002 16O escasso povoamento de algumas regiões fronteiriças representa de longo tempo motivo de preocupação para os brasileiros Daí a ideia de transformálas em Territórios Nacionais sob a direta administração do Governo Federal Era essa uma antiga aspiração política de evidente alcance patriótico principalmente dos militares que possuem aguda sensibilidade em relação aos assuntos capazes de afetar a integridade da Pátria e o sentido mais objetivo dos problemas atinentes à defesa nacional A criação dos territórios fronteiriços nas zonas colindantes sic e de população esparsa 44 que demonstra que as ações eram bem articuladas Além desta outros empreendimentos colonizadores se instalaram na região com o propósito de povoar e explorar suas potencialidades como a Industrial Madeireira Colonizadora Rio Paraná SA MARIPÁ criada em 1946 Foi a partir da implantação desta política e com o trabalho desempenhado pelas Colonizadoras que a região começou a mudar de forma mais expressiva Mesmo em meio às dificuldades de acesso um grande contingente de pessoas oriundas do Rio Grande do Sul Santa Catarina e Paraná começaram a chegar à região atraídas pelas empresas colonizadoras com propostas de terras baratas e produtivas e a possibilidade de iniciar nova vida Boa parte desta imigração era proveniente do Rio Grande do SulEstado de origem do próprio Getúlio Vargas e dentre eles estavam também imigrantes alemães italianos poloneses entre outros Às famílias que se tornariam migrantes chegavam informações estimulantes sobre as terras do Oeste do Paraná Cartas de parentes propagandas de venda de terra e relatos de viajantes contribuíram para a elaboração de um imaginário em relação à região Expressões como paraíso terrestre uma nova pátria e terra prometida fascinaram e mobilizaram as pessoas para que empreendessem mudança por um pedaço de chão SCHREINER 2013 Muitos dos que subiram para a região eram imigrantes estrangeiros que já estavam no Brasil Estranhamente estes foram os mais bem cotados para fazer parte do projeto de nacionalização das fronteiras Ora se a ideia segundo próprio Vargas era fomentar o nacionalismo através da ocupação dos espaços por parte de brasileiros ter um grande contingente de estrangeiros entre os colonos parece apontar para outra direção O que se percebe é uma clara distinção e criteriosa escolha de um padrão cultural para desenvolver a região com traços comuns de forma que o Oeste do Paraná pudesse compor juntamente como as demais regiões do Paraná Santa Catarina e Rio Grande do Sul uma mesma identidade étnica e cultural deve ser considerada por isso medida elementar de fortalecimento político e econômico O programa de organização e desenvolvimento desses Territórios resumese em poucas palavras sanear educar povoar Eis a finalidade da criação dos Territórios Nacionais A história dos povos está ligada à sua geografia Segundo a distinção dos sociólogos a geografia estuda a organização dos povos em sua forma estática e a geopolítica a dinâmica de sua evolução É o destino dos povos plasmado pela energia criadora dos homens E a nossa Marcha para Oeste significa precisamente uma das formas de manifestação desse destino VARGAS sd Apud LOPES Sérgio 2002 45 No processo de se construir uma identidade para uma região estado ou nação fazse necessário delimitar quem são os sujeitos a quem se quer dar o protagonismo na narrativa da história ou seja quem serão os colonos ou pioneiros no processo civilizatório Naturalmente à medida que se delimita quem são os detentores da narrativa determinase também quem são os outros que pela lógica estariam de fora deste projeto ou serviriam apenas como coadjuvantes nesta narrativa Neste sentido quando vemos as empresas colonizadoras dando preferência para colonos provenientes do Rio Grande do Sul e Santa Catarina em outras palavras se está afirmando que os protagonistas da colonização seriam pessoas de cor branca oriundas da região sul e de preferência de origem ou descendência europeia que traziam no seu bojo a capacidade civilizatória e colonizadora Nesta perspectiva priorizaram a venda dos lotes para colonos descendentes de europeus imigrantes do século XIX do Rio Grande do Sul de Santa Catarina e do Paraná A Colonizadora Maripá em seu plano de colonização manifesta claramente qual o tipo humano escolhido para a comercialização das terras e constituição de comunidades o descendente de imigrantes italianos e alemães de mão de obra esmerada de maior valor produtivo primado pela sua operosidade e pelo seu amor à terra em que trabalha SCHREINER 2013 Ora se este lugar já era habitado e possuía portanto seu mitofundador seria necessário apagar esta história anterior para escrever uma nova Assim como se anulou a presença indígena na história do descobrimento do Brasil colocando seu mitofundador com a chegada de Cabral assim também foi feito com os indígenas que habitavam a região Tal qual aconteceu na Marcha para o Oeste norteamericano que aniquilou a história indígena e criou seus próprios mitos a Marcha para o Oeste empreendida por Vargas também aniquilou o passado indígena reduzindoo a mitos como a Lenda das Cataratas por exemplo Esse é o lugar do indígena na história regional romantizada no passado ou como mão de obra para as obragens e sem ação no presente Los colonos llegados al Oeste del Paraná fueron atraídos por una nueva vida donde recrearían sus costumbres e implantaría nun tipo de sociedad atrapada en la idea de historia ligada al futuro y al progreso Generalmente su comportamiento llevó a estas comunidades a ejercer prácticas sociales y económicas al estilo puritano como en la región Norte de los Estados Unidos en época colonial lugar donde no quisieron por sus creencias religiosas y prejuicios étnicos y sociales mezclarse con grupos afrodescendientes o aborígenes los cuales fueron negados expropiados masacrados o usados como mano de obra esclavaLEDEZMA MENESES G G 2014 46 Ao delimitar as fronteiras tanto territoriais quanto linguísticas se destrói toda uma rede das relações que se tinha até então onde o guarani indígena se misturava ao castelhano falado em toda a região mais o português falado por alguns poucos mas que também estava presente Os Argentinos que se faziam economicamente presentes em toda a região também ficaram de fora A presença negra pouco é mencionada nos estudos sobre estes processos no entanto o fato de encontrarmos comunidades Quilombolas em algumas regiões como é o caso da Comunidade Apepu em São Miguel do Iguaçu demonstra que sua presença foi também ignorada no momento de se montar a história do território Os pioneiros geralmente sulinos descendentes de europeus principalmente de italianos e alemães pequenos agricultores são vistos como heróis que desbravaram a floresta e os responsáveis pelo desenvolvimento da região Essa mesma elite que se coloca como guardiã da civilização remontando suas origens europeias acaba por silenciar as indígenas que também contribuíram para o povoamento e a história desse lugar Lembram a luta contra a ameaça estrangeira se colocando como defensor da fronteira nacional e como único pioneiro do desenvolvimento BURRILE 2010 Se por um lado algumas colônias se fecharam em suas próprias tradições festas comidas e religião num esforço natural de não perder sua cultura de origem por outro lado outros experimentaram uma espécie de apropriação cultural resignificando sua própria cultura em relação à do outro que no caso pode ser brasileira ou alguma outra cultura estrangeira Sendo assim as trocas culturais foram inevitáveis e o abrasileiramento em muitos casos uma questão de sobrevivência A língua é um bom exemplo já que precisavam se comunicar entre si mas também com pessoas de língua diversa da sua Neste caso observase o seguinte fenômeno em casa falavam em sua língua natal ou de origem étnica mas em contato com os outros falavam o português Um português modificado pelo sotaque e pela fonética misturado com o português dos gaúchos de quem recebem forte influência Assim a região ganha uma linguagem muito própria e diferenciada das demais regiões do país Tratase de um espaço diverso multifacetado constituído por sujeitos de diferentes origens culturas classes sociais e etnias descendentes de alemães italianos ucranianos poloneses japoneses entre outros Expressões como celeiro agrícola polo do agrobussines colonização de gaúchos e catarinenses utilizadas não raras vezes para designar o Oeste são dimensões importantes mas não abarcam a riqueza e diversidade da formação sociocultural da região Seu tecido históricocultural é permeado por experiências que se entrecruzam permanências e excepcionais transformações que nos fazem olhar para as múltiplas temporalidades e 47 para as ações dos personagens sociais na formação desse espaço social A formação da região se fez por mudanças impressionantes ocorridas na velocidade e no ritmo da contemporaneidade SCHREINER 2013 A consequência disto é visível ainda hoje quando boa parte da população nesta região do país é composta por gaúchos e catarinenses netos destes ou de alguma descendência europeia que preservam ainda muito da sua cultura e tradição da qual são oriundos No entanto a estes juntaramse mais tarde brasileiros das mais diversas regiões estrangeiros de outras partes do mundo que hoje compõem um cenário bem diversificado E a região que se pretendia brasileiríssima por Getúlio Vargas e que se afirmava hegemonicamente branca de descendência gaúcha e europeia acabou por conformarse em uma região com uma diversidade étnica e cultural bastante acentuada Por ocasião da comemoração do aniversário de 96 do município de Foz do Iguaçu em 2010 o Jornal O Pioneiro publicou uma lista com os sobrenomes das personagens que marcaram a história da cidade É notória a presença de nomes de origem estrangeira nesta lista que considerou pioneiro todo aquele que vive na cidade há pelo menos 45 anos Desta forma já aparecem também nomes oriundos de outros fluxos migratórios como as colônias árabelibanesas japoneses e brasileiros de outras regiões Já em comemoração ao Centenário do município a prefeitura de Foz do Iguaçu através da Fundação Cultural gravou uma série de entrevistas em vídeo que compõem um documentário dos pioneiros falando sobre suas trajetórias e relações com a história da cidade Mais uma vez se percebe a presença europeia e sulista entre os entrevistados confirmandoos como protagonistas da história local e reafirmando que assim será contada a origem do oeste paranaense até que um trabalho mais profundo de resgate da história local seja realizado e possa agregar novos elementos a esta construção Com a queda de Getúlio Vargas porém em 1946 o Território do Iguaçu se desfez Mas o interesse em que esta região permanecesse unificada tornouse o objetivo de algumas camadas da sociedade que levantaram a bandeira do Estado do Iguaçu Se o Território do Iguaçu teoricamente negava a diversidade étnica para compor o quadro populacional para a região e buscava a unidade em torno da brasilidade e da supremacia da língua portuguesa sobre as demais já o Estado do Iguaçu reconhecia a diversidade étnica e cultural que a região atraiu ao longo do seu 48 processo histórico No entanto firmava suas raízes também numa hegemonia branca e europeia com características civilizatórias bem marcantes Isto se observa claramente na opção que o grupo faz ao deixar de fora da área pretendida para o novo Estado a região mais ao norte que havia sido incluída na divisão anterior no momento em que compreendia o Território Federal conforme se observa na figura abaixo Desenho 2 Mapa Território Federal do Iguaçu e Estado do Iguaçu Fonte httpestadodoiguacuagorablogspotcombr A explicação segundo seus idealizadoresé cultural já que esta região teria sido colonizada por nordestinos e paulistanos Esta iniciativa não teve êxito mas demonstra que a região é fruto de múltiplos projetos culturais e econômicos de inclusão e exclusão sociais e étnicas Cada projeto com suas próprias justificativas porém todos eles firmados na exclusão indígena e afrodescendente e na construção de uma sociedade de modelo europeu Estes foram alguns dos fatores que motivaram um olhar mais atento para as fronteiras e que culminaram com uma ação de povoamento mais eficaz para a região 22 MEMÓRIA NA CONSTRUÇÃO DOS SUJEITOS 49 As memórias individuais ou coletivas constituemse numa importante fonte para a escrita da história Quando entramos em contato com a narrativa de determinado sujeito ou grupo social podemos acessar muito mais do que a história presente nestes relatos é possível também acessar estruturas e mentalidades que estão presentes nas entrelinhas A história portanto trabalha para fazer a leitura e a interpretação destas narrativas tendo em mente quem é o interlocutor da onde ele fala e a quem deseja comunicar a fim dedar conta de preencher as lacunas deixadas pelas ausências da memória ou por um documento que mesmo existente não responde a tudo sozinho Neste sentido a História Oral surge como uma importante contribuição nos estudos históricos especialmente nos processos mais recentes dando visibilidade a setores da sociedade que dificilmente seriam incluídos no rol da história tradicional Visto que Alvorada do Iguaçu teve curtíssima duração com apenas 16 anos de existência é possível que não fosse sua importância em um contexto mais amplo desaparecesse por completo com o alagamento do seu território e a dispersão da sua população No entanto o fato de muitos destes antigos moradores terem permanecido na região aliado aos estudos referente a Itaipu e seus efeitos tem contribuído para que estes sujeitos apareçam e deem sua versão dos acontecimentosA maioria das pesquisas no campo dos atingidos por barragens trabalha nesta perspectiva Desta forma a História Oral constituise num importante instrumento na construção destes sujeitos frente aos processos que vivenciaram dando a eles o protagonismo da ação e não a passividade imposta pela história oficial Muitos deles que seriam sequer mencionados na historiografia agora podem ter suas narrativas presentes nos mais diversos estudos sobre a história local A história oral não é necessariamente um instrumento de mudança isso depende do espírito com que seja utilizada Não obstante a história oral pode certamente ser um meio de transformar o conteúdo e a finalidade da história Pode ser utilizada para alterar o enfoque da própria história e revelar novos campos de investigação pode derrubar barreiras que existam entre professores e alunos entre geração entre instituições educacionais e o mundo exterior e na produção da história sejam em livros museus rádios ou cinema pode devolver às pessoas que fizeram e vivenciaram a história um lugar fundamental mediante suas próprias palavras THOMPSON 1988 p 23 Quando da nossa primeira visita à Vila Bananal nos foi indicado quem seria a pessoa mais apropriada para fornecer as informações sobre o local e sobre 50 sua história Através do olhar do Sr Mario portanto podemos revisitar os processos que culminaram com a criação de Alvorada do Iguaçu bem como sua desapropriação e extinção além do surgimento da Vila Bananal e seu isolamento Podemos também visualizar processos mais amplos que abarcam questões sociaise culturais que extrapolam a história local e que alcançam outras temporalidades onde passado e presente dialogam através da sua narrativa Sr Mario é um homem simples de 80 anos de idade com uma experiência de vida extensa dedicada à família e ao trabalho com a terra Em duas horas de conversa falou quase sem interrupções das suas andanças entre Rio Grande do Sul Santa Catarina e Paraná Com a memória vívida e uma linguagem simples típica de uma pessoa com pouca instrução falou de pessoas lembrouse de nomes lugares e situações com riqueza de detalhes Falou também da vida sofrida na infância de como teve que sair de casa com oito anos de idade por causa do irmão mais velho que após a morte do pai ficou de tutor dos menorescom apenas uma muda de roupa e um chinelo de dedo devido aos maus tratos sofridos nas mãos deste De como perambulou na casa de um e de outro mas sem nunca depender de ninguém Falou ainda de atualidades das dificuldades enfrentadas no seu cotidiano como morador da Vila Bananal e de como Foz do Iguaçu São Miguel do Iguaçu e Itaipu interagem com a localidade Sr Mario Então foi uma barbaridade um absurdo Pra mim foi umas bordoadas mesmo pra acabar de matar Se não fosse isto se não fosse tanta eu pra mim olha eu não sei nem como lhe dizer que a gente bem dizer de casa e era traiçoeiro Um irmão meu quando morreu pai e minha mãe eu tinha oito anos e ele ficou de tutor dos órfãos mas aquele homem aquele meu irmão justamente ele devia de ter morrido antes de nascer Daí saí da casa dele com um par de chinelos e duas mudinhas de roupa dentro de uma mochila Ele não me deu um centavo pra eu comprar um caramelo pra comer na estrada Nem adeus ele não disse A memória segundo Le Goff é um mecanismo de dominação Aqueles que se apoderam da memória seja ela individual ou coletiva podem conduzir os rumos de um determinado grupo ou nação Desta forma tanto a memória quanto o esquecimento possuem igual valor Aquilo que está sempre sendo lembrado pode ser usado para forjar um sentimento coletivo ou até mesmo para encobrir outros interesses De igual modo evitar determinadas lembranças pode ter o mesmo efeito e impede que reflexões mais profundas produzam as mudanças necessárias trabalhando também para a manutenção de estruturas e paradigmas Aqueles que 51 conhecem estes mecanismos podem aproveitarse deles em detrimento daqueles que ignoram seus efeitos Tornaremse senhores da memória e do esquecimento é uma das grandes preocupações das classes dos grupos dos indivíduos que dominaram e dominam as sociedades históricas Os esquecimentos e os silêncios da história são reveladores desses mecanismos de manipulação da memória coletiva LE GOFF 1990 p 426 Neste sentido Itaipu procura apoderarse das memórias individuais e coletivas utilizandose de diversos meios para escrever uma história onde ela a empresa seja protagonista e o progresso seja o seu discurso A começar pela história narrada aos visitantes in loco e virtuais onde o progresso e a superação de desafios fazem calar as vozes dos que foram por ela subjugados e prejudicados das lutas perdas e ganhos de sujeitos ou grupos que foram por ela afetados Outra estratégia consistiu na criação do Ecomuseu de Itaipu cuja ideia inicial era manter um registro da biodiversidade e dos elementos arqueológicos encontrados na região Porém com a construção de uma narrativa histórica linear leva seus visitantes a entender a história local como uma trajetória ascendente passado presente e futuro onde a presença indígena representa o atraso marcado pelo obscurantismo O processo de civilização tem início com a presença dos padres Jesuítas e segue com a colonização desencadeada no início do século passado atingindo seu ápice com Itaipu que representa o progresso e o avanço tecnológico trazendo desenvolvimento não só para a região mas para as duas nações que a construíramA outra estratégia é o Espaço do Barrageiro uma espécie de memorial que se propõe a contar um pouco da vida no canteiro de obras e nos alojamentos dos barrageiros com espaços recriados à imagem e semelhança dos existentes na época Fotos vídeos e áudios que podem ser acessados pelos visitantes ajudam a contar a história de Itaipu a partir do olhar dos próprios trabalhadores que a construíram Claro que os relatos são selecionados e vão de encontro aos interesses da empresaSendo assim o que parece uma iniciativa positiva por parte da empresa na verdade acaba contribuindo para consolidar a história do vencedor ou seja de Itaipu Da mesma forma os sujeitos também fazem escolhas consciente ou inconscientemente quando se trata de construir sua própria identidade ou de narrarsua história A mesma memória que trabalha com as lembranças trabalha 52 também para o esquecimento Para ter um entendimento mais complexo deste sujeito a partir da sua memória é necessário ter uma leitura dos processos históricos que ele atravessa das mentalidades que permeiam sua fala e das expressões culturais e identitárias presentes na sua narrativa Cada atingido por Itaipu tem sua própria narrativa acerca deste processo e das implicações sobre suas trajetórias Aqueles que trabalharam na construção da usina geralmente trazem um discurso positivo acerca da mesma pois se beneficiaram dela em alguma medida enquanto aqueles que foram desalojados dos seus lugares falam a partir do ponto de vista do oprimido Essas construções são políticas pois falam a partir de um lugar onde o sujeito se coloca como agente da história e não apenas objetos passivos diante dos fatos Assim também nosso entrevistado vai se construindo através de cada argumento apresentado É interessante notar que sendo o mais antigo morador ele se tornou uma espécie de guardião da memória local e também uma voz na defesa dos interesses da comunidade de tal forma que nos foi dito vai logo porque ele pode morrer a qualquer momento como se a memória do local fosse morrer juntamente com ele Sua história apesar de ser individual e particular assume um caráter coletivo no momento que é reivindicada por um grupo social que labuta na mesma causa ainda que estes sequer se conheçam como é o caso dos atingidos por barragens Assumir o protagonismo da sua própria história é portanto o que a história oral oferece como possibilidade A passagem da memória para a história obrigou cada grupo a definir sua identidade pela revitalização de sua própria história O dever de memória faz de cada um o historiador de si mesmo O imperativo da história ultrapassou muito assim o círculo dos historiadores profissionais Não são somente os antigos marginalizados da história oficial que são obcecados pela necessidade de recuperar seu passado enterrado Tosos os corpos constituídos intelectuais ou não sábios ou não apesar das etnias e das minorias sociais sentem a necessidade de ir a busca de sua própria constituição de encontrar suas origens NORA 1992 p 28 Ecléa Bosi traz uma importante contribuição neste sentido com seu trabalho Memórias de velhos ao entrevistar pessoas idosas que haviam trabalhado em uma fábrica na cidade de São Paulo no início do processo de industrialização Através de cada entrevista ela extraiu mais do que simplesmente a vida de cada idoso ela pôde contemplar também todo o contexto social que eles vivenciaram daquilo que está vivo em suas memórias e do que já não se lembram ou não querem lembrarse 53 Um verdadeiro teste para a hipótese psicossocial da memória encontrase no estudo das lembranças das pessoas idosas Nelas é possível verificar uma história social bem desenvolvida elas já atravessaram um determinado tipo de sociedade com características bem marcantes e conhecidas elas já viveram quadros de referência familiar e cultural igualmente reconhecíveis enfim sua memória atual pode ser desenhada sobre um plano de fundo mais definido do que a memória de uma pessoa jovem ou mesmo adulta que de algum modo ainda está absorvida nas lutas e contradições de um presente que a solicita muito mais intensamente do que a uma pessoa de idade BOSI 1994 p 60 Segundo Le Goff os idosos já eram venerados na idade média justamente por seu vasto conhecimento e experiência Eles eram tidos como homensmemória A memória poderia ser mantida intacta por até cem anos e o conhecimento era passado a outra geração através da oralidade sendo que a escrita servia para prolongar esta memória e funcionava apenas como suporte Pierre Nora também faz um tratado interessante sobre a questão da memória Em sua obra Lugares de Memória ele procura desvincular Memória de História Para ele história e memória são irreconciliáveis embora reconheça que ambas tenham relação com o passado A diferença está na própria maneira de lidar com este passado Enquanto a memória trata com a vida com as lembranças com as amnésias já a história lida com coisas muitas vezes estáticas com as representações que estas manifestam com a ressignificação do que já não existe ou existe através da relativização A memória não tem a obrigação de lidar com o real e nem de ser exata Pelo contrário ela trabalha com o simbólico Portanto seus mecanismos são mais maleáveis podendo adaptarse a realidades múltiplas enquanto que a história mesmo adquirindo maior liberdade precisa cercarse da falsa impressão da verdade ainda que saiba não poderá atingila No coração da história trabalha um criticismo destrutor de memória espontânea A memória sempre é suspeita para a história cuja missão verdadeira é destruila e reprimila A história é deslegitimização do passado vivido No horizonte das sociedades de história nos limites de um mundo completamente historicizado haveria dessacralização última e definitiva NORA 1992 p 21 Durval Muniz17entende a história como uma constante construção Para ele a história pode ser inventada e reinventada a todo o momento Por isso é quase impossível se conhecer o passado tal como ele foi Sendo assim não está a serviço 17ALBUQUERQUE JÚNIOR Durval Muniz de História a arte de inventar o passado Ensaios de teoria da história Bauru Edusc 2007 256 p 54 da memória e sim do esquecimento uma vez que quanto mais tentamos nos aproximar dele mais o afastamos cada vez que esta história é recontada novos elementos são anexados paradigmas são questionados e alguns substituídos destróise assim um passado já construído o que acaba distanciando ainda mais o historiador deste passado Historicamente as ruínas de alguns lugares constituemse em elementos catalizadores da memória e da reflexão historiográfica Geralmente as pessoas acabam interessandose mais pelo contexto histórico que envolvem determinados sítios arqueológicos depois de uma experiência de visitação Da mesma forma quando Alvorada do Iguaçu volta a ficar à mostra depois de anos submersa a possibilidade de visitar o local despertou em muitos o interesse por conhecer os processos que levaram aquela localidade a chegar àquela condição Assim a memória que antes pertencia a um grupo social daqueles que vivenciaram o processo de deslocamento tornase agora uma memória compartilhada com estranhos que se sentem incluídos pela identificação com este passado Para quem não vivenciou os processos esta memória é apenas conhecimento mas para os que vivenciaram é provocação das lembranças terreno menos rígido mas também muito mais delicado que trilhamos na obtenção das percepções desses lugares onde a memória está alojada Na época em que a baixa do lago expôs as ruínas de Alvorada do Iguaçu nós já havíamos iniciado o projeto de pesquisa para este trabalho e ficamos sabendo através de uma reportagem de TV que Alvorada estava à mostra novamente Este fato foi para nós como um presente Ter a possibilidade de ver estas ruínas com nossos próprios olhos pisar sobre este chão caminhar por entre restos de construções que silenciosas dizem muito sobre o passado sobre os processos sobre pessoas sobre Itaipu e sua imposição do progresso Tivemos a oportunidade de visitar o local e presenciar o que restou das casas construções e objetos que pertenceram àquelas famílias Andar por aquelas terras que há temposestavam inacessíveis ver as ruínas das casas dos poços imaginar como era a vida antes de Itaipu os laços de amizade os sonhos e esperanças de pessoas que não conhecemos foi uma experiência única A sensação é estranha já que não eram nossas lembranças que estavam ali No entanto nos sentimos profundamente tocados pelo desalento que o local apresenta Tudo foi registrado na memória e 55 também em fotografias Mas o momento mais emblemático foi visitar o antigo cemitério da comunidade Ver aqueles túmulos as lápides ler alguns nomes datas de nascimento e morte de algumas pessoas foi extremamente revelador já que ali não eram anônimos mas pessoas com nome sobrenome tempo de vida Mesmo sabendo que os corpos foram removidos para outro local antes do cemitério ficar debaixo dágua fica a sensação de um local sagrado do descanso final daqueles que de alguma forma trabalharam para que aquela comunidade viesse a existir As bases das construções continuavam lá denunciando que já houve vida que há memória que há histórias incompletas à espera de serem trazidas à tona assim como aquelas ruínas Este é o papel do historiador através dos fragmentos do passado dos escombros dos vestígios permitir que estes falem A partir desta experiência estudar a história do local e as narrativas que se construiu sobre este passado se tornou muito mais pertinente e estimulante Fotos 8 Ruínas de Alvorada do Iguaçu com a baixa do Lago de Itaipu em 2014 Fonte Acervo pessoal 56 Fotos 9 Ruínas de Alvorada do Iguaçu com a baixa do Lago de Itaipu em 2014 Fonte Acervo pessoal Estas ruínas ficarão ali ainda por muitos anos como um memorial silencioso contra Itaipu e as demais hidrelétricas que têm provocado a retirada de populações do seu caminho De tempos em tempos a natureza se encarregará de trazer à tona estas memórias submersas Lembranças de um passado esquecido por muitos à medida que os anos avançam ou propositadamente deixadas ao esquecimento Forçadamente se terá de falar que uma comunidade inteira precisou deixar para traz suas casas e sua história vivida com aquele local por causa da Itaipu Alvorada do Iguaçu no contexto da história em sua longa duração não passou de um lance um momento uma vírgula na escrita da história da região Porém para quem a conheceu e fez dela um lugar de ancoragem das suas lembranças de memórias tão vívidas quanto o dia de hoje ela está carregada de simbolismos de significados diversos que trazem sentido à sua própria existência como indivíduo ou como grupo social Por isto o fato de saber que mesmo submersa ainda existe um pouco do lugar dos resquícios que podem ser apreciados de alguma forma mesmo que para isto tenha que depender dos caprichos da natureza para trazêla à tona transmite a ideia de que ela permanece viva ao menos na sua memória 57 23 ALVORADA DO IGUAÇU VIDA E MORTE O Distrito de Alvorada do Iguaçu foi criado através da Lei 43164 de 18 de dezembro de 1965 e sancionado pelo então prefeito municipal de Foz do Iguaçu Ozires Santos com a seguinte limitação geográfica Fica criado o Distrito de Alvorada do Iguaçu com sede em Cidade Alvorada neste Município com as seguintes confrontações ao Norte com o Município de São Miguel do Iguaçu pelo rio Ocoy partindo da divisa do distrito de Santa Terezinha nesse rio e por ele abaixo até a sua foz no rio Paraná a Oeste com a República do Paraguai pelo rio Paraná deste a foz do Rio Ocoy até a foz do rio Bela Vista ao Sul com o 2º Distrito deste Município pelo Rio Bela Vista desde a sua foz e por ele acima até encontrar a divisa do distrito de Santa Terezinha pela linha divisória do mesmo desde o rio Bela Vista até o rio Ocoy18 Os espaços geográficos se definem com base em marcadores definidos sejam eles visíveis ou invisíveis que venham a estabelecer limites compondo assim a área de determinado lugar No caso de Alvorada do Iguaçu seus limites foram facilitados pela existência de diversos rios presentes na região que acabaram sendo utilizados como marcadores geográficos Porém as relações que se estabelece com esse lugar abarcam outros aspectos cuja geografia não é capaz de limitar ou compreender e neste caso as fronteiras são menos claras Tem a ver com sentimentos com ganhos e perdas com aspectos culturais e identitários com toda uma bagagem histórica que se traz e se transmite de saberes de costumes e tradições capazes de dar sentido e pertencimento aos sujeitos uma vez que as relações interpessoais pressupõem trocas culturais Alvorada do Iguaçu foi colonizada basicamente por migrantes do Rio Grande do Sul que tiveram conhecimento do local através de notícias de parentes ou através da propaganda feita pelas Colonizadoras O Distrito que geograficamente estava definido de acordo com a Lei acima ainda estava contudo em processo de estabelecer os marcadores culturais embora já houvesse diversos indicadores comuns entre os sujeitos que ali foram morar tais como a origem a língua a religião entre outros Um dos aspectos que proporciona um forte elo entre estes moradores é sem dúvida o fato de serem pioneiros no lugar Especialmente para aqueles que vieram de mais longe como tantos que já haviam cruzado o Oceano Atlântico para 18Retirado do site da Câmara Municipal de Foz do Iguaçu httpsleismunicipaiscombr acessado em 02032017 58 buscar novas oportunidades no Brasil e que puderam ali estabelecerse com suas famílias e construir uma nova história ou um novo começo Mesmo para os que vieram de mais perto como gaúchos e catarinenses ou até mesmo paranaenses chegar a um lugar e desbravar com todas as ressalvas que esta palavra necessita ao utilizála especialmente por transmitir um conceito essencialmente colonialista é sem dúvida uma importante característica que vai unir estes indivíduos não apenas no desenvolvimento social e econômico do lugar como também nas lutas que estes teriam que enfrentar mais adiante quando da perda das suas propriedades para Itaipu O Distrito já se desenhava como uma localidade bem organizada com perspectiva de crescimento e possivelmente num futuro próximo a exemplo de Santa Terezinha e São Miguel do Iguaçu também Distritos à época se desmembraria e se tornaria um município autônomo ou no mínimo poderia juntar se a estes para conformar um município maior devido a sua proximidade e características similares De acordo MELCHIOR o loteamento de Alvorada teve sua organização a cargo da Colônia de Nacionais PassoCuê que havia projetado o espaço prevendo uma série de estruturas com vistas no crescimento e desenvolvimento do lugar Alvorada do Iguaçu tinha o perímetro originalmente integrante da antiga Colônia de Nacionais PassoCuê esta com um território de 36250 hectares que foram subdivididos em 1788 lotes 107 quadras No projeto da colonizadora foram reservados lotes para praças escolas indústrias e até um aeroporto MELCHIOR 2012 Foto10Alvorada do Iguaçu antes de Itaipu Foto11 Posto de combustível Fonte extraído da reportagem no Jornal do SBT 59 Porém como foi dito acima seu desenvolvimento foi interrompido pela construção da Hidrelétrica de Itaipu que ao represar o Rio Paraná para a formação do Lago da barragem condenou o Distrito ao desaparecimento embaixo dágua Em 2014 a região oeste passou por uma forte estiagem e o reservatório do Lago de Itaipu baixou o seu nível de forma drástica Isto permitiu que as ruínas de Alvorada do Iguaçu viessem à tona Este fato chamou a atenção de muitas pessoas especialmente daqueles que conheceram a história do lugar que puderam revisitar o que ficou do seu passado Sua localização fica a poucos metros de onde hoje é a praia artificial de Santa Terezinha de Itaipu que recebeu o nome de Terminal Turístico Alvorada do Iguaçu19 Foto 12 Terminal Turístico Alvorada do Iguaçu na área onde se localizava Alvorada do Iguaçu Fonte Acervo pessoal Um dos colonos que veio para a região foi o Sr Mario 81 anos a quem entrevistamos Ele veio de Passo Fundo Rio Grande do Sul através do convite de um parente que já estava morando no Distrito de Santa Terezinha em 1973 Atualmente vive com sua esposa Nair na comunidade Vila Bananal os filhos já casados moram em São Miguel do Iguaçu Sr Mario foi um homem que lidou a vida toda com a terra chegou à região e encantouse com as lavouras de hortelã Veio sondar a terra gostou do que viu comprou alguns alqueires e voltou para vender o que tinha construído para então mudarse definitivamente com a família Sua relação 19Ao longo da costa do Lago de Itaipu diversas praias artificiais se formaram e compõem a paisagem da região que ficou conhecida como Costa Oeste Esta foi uma das formas que Itaipu encontrou para compensar os transtornos e perdas que causou à região fazendo o aproveitamento do lago Para isto criou diversos terminais turísticos dotados de praias artificiais área de camping com quiosques e churrasqueiras visando o lazer da população local e a atração de turistas para a região Estas estruturas foram entregues aos respectivos municípios que ficaram responsáveis por administrar e manter o local em condições de uso 60 com Alvorada do Iguaçu foi muito próxima e pautada pela necessidade uma vez que Alvorada já possuía uma estrutura comercial mais desenvolvida e a distância com Foz do Iguaçu acabava favorecendo esta relação Foi lá que ele diz ter comprado a madeira com a qual construiu a casa em que vive até o dia de hoje Sr Mario A Alvorada do Iguaçu ela justamente era uma vila muito boa Tinha uma serraria lá onde eu comprei essa madeira que até hoje está aqui na minha casa Isto já tem cinquenta anos para lá Ele se perde um pouco nas datas Comprei Paguei cinco mil reaise também nas moedas pela madeira naquele tempo Então eu sei dizer que a Alvorada eu achava até bom Uma vilinha boa Uma vilinha que dava para a gente ir lá É onde a gente tinha a farmácia para a gente buscar o remédio quando tinha uma criança doente uma coisa eu corria lá Encontrou um lugar promissor e ainda com muitas áreas de mata preservada que aos poucos iam sendo derrubadas para dar lugar a lavouras áreas para criação de animais e espaços residenciais O período predatório da madeira e da ervamate já havia cessado e agora a região já esboçava uma forte vocação agrária que se intensificaria nos anos seguintes favorecido pela qualidade da terra de grande valor econômico propícia para diversas culturas e pelo clima agradável Este foi um ponto que ocasionou bastante embate quando as terras começaram a ser desapropriadas por Itaipu uma vez que no Paraná as terras férteis estavam extremamente valorizadas e nas demais regiões oferecidas por Itaipu a qualidade da terra não era equivalente e o esforço para tornálas produtivas seria muito maior Assim Sr Mario relata sua vinda para o Oeste Paranaense Sr Mario na mesma hora arrumei o caminhão para a mudança para vim pra cá Porque eu já tinha vindo antes meus cunhados moravam aqui em Santa Terezinha eu vim antes olhei o lugar e olhei a plantação de hortelã Então a hortelã tinha uma influência meu Deus do Céu olha a planta de hortelã era o mesmo que jogar dinheiro na terra aquilo ali estava juntando dinheiro todo dia Cheguei ali e comprei 3 alqueires de hortelã e paguei Comprei e paguei e fiz um contrato assim com o cara Óh se até tal tempo eu vier aqui você desocupa a casa e se eu não vier fique com o dinheiro e a roça Aí quando eu vendi minha terra já mandei avisar pra desocupar a casa porque até tal tempo eu ia chegar com a mudança e ele desocupou Cheguei ali e toquei aquela lavoura de hortelã 3 anos Rapaz mas me deu dinheiro igual água Nunca tinha pegado tanto dinheiro quanto eu fiz com aquela roça de hortelã Eu vendia lambicava a lavoura de hortelã me dava 200 litros de óleo eu vendia por 18 mil aquele óleo de hortelã E foi aonde que de lá comprei aqui pagando muito caro paguei 14 mil Ora vendi lá no Rio Grande a terra nestas condições me deram 3 mil na hora e 5 mil com prazo de um ano sem juros foi como jogar fora De acordo com o relato do Sr Mario Alvorada do Iguaçu era uma localidade que fornecia bens de consumo materiais de construção medicamentos 61 alimentícios e policiamento De acordo com MELCHIOR 2012 o Distrito tinha como atividade primária a agricultura mas havia também casa de comércio armazéns postos de combustível bares e bazares setores de prestação de serviços como contabilidade e construção civil além de setor de transportes O policiamento de acordo com o relato do Sr Mario ficava por conta do farmacêutico e seu filho já que além de ser o dono da farmácia era também o delegado local uma espécie de Xerife que atendia as ocorrências policiais na região Era um homem admirado e temido com a mesma intensidade Se por um lado abastecia a região com medicamentos e auxiliava a comunidade com atendimento farmacêutico por outro fazia cumprir a lei à bala Resolvia desde uma discussão familiar ou entre vizinhos até casos mais sérios como a captura de bandidos e foragidos O próprio Sr Mario teve vários conflitos seus com vizinhos intermediados por esta figura policial mas afirma ter tido com ele um bom relacionamento Sr Mario E tinha um tal de Bianco que era o dono da farmácia Um homem muito bom mas muito brabo Ele era delegado do lugar Esse Bianco pra mim foi um homem muito bom Muita gente falava de vir que aqui tinha bodega tinha três a quatro bodegas e matavam gente aí pra ver morrer E essa farmácia do Bianco era onde a gente se servia de remédio E o Bianco era o delegado do lugar Mas o Bianco aqui tinha gente que tinha bolsa de sal destas bolsinhas de sal e tem até hoje cheia de revolver e pistola e tanta arma escondia ai nos mato embaixo das madeiras e fazia travesseiro daquela bolsinha O Bianco vinha aqui de noite e dizia Você conhece fulano Sei Sabe onde que ele dorme Sei Então vamos lá comigo que eu vou prender ele Ele ia lá prendia o homem só que aquele não voltava mais Sabendo que a região se desenvolveu a partir da implantação da Colônia Militar é de se esperar que estes tenham exercido forte influência em toda sua extensão Sendo assim Foz do Iguaçu foi administrada diversas vezes por militares ou civis indicados por estes fator apontado pelo exprefeito Perci Lima em seu livro A História de Foz do Iguaçu de 2001 Para ele este fator foi determinante para o desenvolvimento lento que a cidade experimentou antes de Itaipu uma vez que segundo ele estes militares vinham de fora não estabeleciam nenhum vínculo com a região e logo retornavam para seus locais de origem salvo raras exceções Por conta disto a cidade chegou a ter até três administradores em um único ano Além de que com o desencadeamento do golpe militar em 1964 a região se tornou ainda mais estratégica militarmente A partir da deflagração da Operação Condor onde as ditaduras do cone Sul atuaram em conjunto para reprimir todo e qualquer foco de 62 subversão a tríplice fronteira se tornou em um local vigiado Por situarse nesta região estratégica para o país Alvorada do Iguaçu também recebia a visitados militares de vez em quando O lugar era movimentado e se tornava cada dia mais conhecido Nos finais de semana atraía gente dos arredores que em busca de diversão frequentavam as várias bodegas e as áreas de lazer onde por vezes a situação fugia do controle Nesta época a fronteira já se consistia num fator que facilitava a compra de armas ilegais conforme relata o Sr Mario e apesar de todo policiamento as coisas se resolviam mesmo era à bala Sr Mario Então aconteceu olha aconteceu tanta coisa aqui que nem é bom lembrar Barbaridade coisa séria Aqui existia muita gente ruim aqui Tinha um pessoal aí eu acho que tinha umas 600 pessoas mais ou menos frequentavam essas bodegas ai Dia de festa dia de domingo aquele vai e vem aquele alvoroço Jogo de futebol ali na frente que o seu Flávio deu o terreno pra eles fazerem um campo bem grande de futebol mas no fim pra arremata o caso teve que vir o Batalhão de Foz desarmar todo esse pessoal porque era demais Você imagine de vir o Batalhão não era pouca coisa né Se fosse um ou dois ou três a polícia podia dar conta A vida religiosa na comunidade estava representada pelas igrejas Católica Apostólica Romana que concentrava boa parte dos habitantes em torno de suas atividades Mas também já contava com a presença da igreja Evangélica representada pela Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil IECLB MELCHIOR 2012 Não se sabe a proporção de membros entre uma e outra mas especialmente naquela época o país era majoritariamente católico Por esta razão não seria exagero concluir que o catolicismo romano predominava no cenário religioso em Alvorada do Iguaçu Como um reflexo da experiência colonial espanhola e portuguesa que marcaram sua presença no continente americano com a cruz e a missa assim também aconteceu e acontece nas diversas localidades aonde o homem branco chega para povoar A presença da igreja Católica acaba sendo quase que onipresente por onde quer que se ande pelo país por mais ermo que seja o lugar lá está a religiosidade católica na cultura nos templos nas práticas cotidianas e nos simbolismos Embora haja movimentos outros que se pode presenciar nos grandes centros onde as igrejas evangélicas e outras religiões começam a ocupar espaços antes exclusivos do catolicismo no interior contudo ainda é muito presente a força da igreja Católica É interessante notar que a igreja evangélica que marcou presença em Alvorada do Iguaçu tenha sido justamente a Igreja Luterana 63 originalmente fruto da Reforma Protestante desencadeada na Alemanha no século XVI através de um dissidente da Igreja Católica Esta provavelmente tenha chegado à região juntamente com este movimento migratório experimentado pelos colonos de origem alemã As igrejas porém não foram poupadas no processo de desapropriação efetuado por Itaipu A IECLB por exemplo precisou recorrer ao poder público solicitando a doação de um terreno no Distrito de Santa Terezinha para que pudesse construir sua nova sede A justificativa é simples assim como as demais propriedades expropriadas por Itaipu os valores pagos acabavam sendo insuficientes para comprar e reconstruir a estrutura que se dispunha antes da inundação devido à inflação e exploração comercial A igreja recebeu um terreno como doação da prefeitura de Foz do Iguaçu conforme a Lei assinada pelo então prefeito municipal Clóvis Viana LEI Nº 1048 DE 30 DE JUNHO DE 1980 AUTORIZA A DOAÇÃO DE UMA ÁREA DE TERRAS PARA A CONSTRUÇÃO DO TEMPLO DA IGREJA EVANGÉLICA DE CONFISSÃO LUTERANA DO BRASIL NA FORMA QUE ESPECIFICA A Câmara Municipal de Foz do Iguaçu Estado do Paraná Decretou e eu Prefeito Municipal sanciono a seguinte Lei Art 1º Fica o Sr Chefe do Executivo Municipal autorizado a doar à IGREJA EVANGÉLICA DE CONFISSÃO LUTERANA DO BRASIL Paróquia do ex Distrito de Alvorada do Iguaçu uma área de terras denominada lote nº 01um da quadra nº 92 noventa e dois localizada no Distrito de Santa Terezinha neste Município com a área total de 150000m2 hum mil e quinhentos metros quadrados destinada a construção de Utilidade Pública Praça e Igreja para ali ser construído o seu templo Art 2º A doação de que trata a presente Lei farseá mediante a condição de que a área doada seja utilizada exclusivamente no atendimento dos objetivos da IGREJA EVANGÉLICA DE CONFISSÃO LUTERANA DO BRASIL Art 3º O imóvel objeto da presente Lei reverterá ao domínio do Município por anulação pura e simples do documento de doação caso a Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil não inicie a construção no prazo de 1 um ano ou não a conclua no prazo de 2 dois anos tudo a contar da data da escritura de doação Art 4º Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação revogadas as disposições em contrário Edifício da Prefeitura Municipal de Foz do Iguaçu em 30 de junho de 1980 CLÓVIS CUNHA VIANA 64 Prefeito Municipal 20 Foto 13 Posto de combustível Foto14Antigos moradores de Alvorada do Iguaçu Fonte extraído da reportagem no Jornal do SBT Apesar de ter exercido um importante papel para a região em sua curta existência Alvorada não resistiu diante do forte apelo do progresso imposto por Itaipu O Distrito foi o primeiro a ser desapropriado já que a intenção inicial de Itaipu era começar as desapropriações pelas proximidades do canteiro de obras e seguir subindo as margens do rio Paraná até alcançar o município de Guaíra Este projeto inicial foi frustrado quando os primeiros sinais de resistência por parte de alguns proprietários começaram a aparecer Vale ressaltar a maneira arbitrária como foram realizadas estas desapropriações Segundo retratado por Juvêncio Mazzarollo em A Taipa da Injustiça a estratégia de Itaipu para forçar as famílias na sua maioria produtores rurais a deixar suas terras e a aceitar os preços bem abaixo de mercado oferecidos pela empresa era iniciar pelas infraestruturas urbanas como hospitais postos de combustíveis mercados e escolas das quais esses pequenos produtores dependiam Desta forma isolados e sem a estrutura de que necessitavam para manterse no local vendo suas terras se desvalorizarem o produtor não tinha outra escolha senão aceitar as propostas de Itaipu Esta estratégia também é destacada por Maria de Fátima Bento Ribeiro em seu trabalho MEMÓRIAS DO CONCRETO onde ela relata da seguinte forma A primeira desapropriação que ocorreu foi em Sede Alvorada do Iguaçu Em primeiro lugar desapropriaram na sede do distrito as casas comerciais os postos de combustíveis as farmácias e uma vez desapropriada com a infraestrutura os agricultores que permaneceram tinham que percorrer mais de 70 quilômetros para comprar combustíveis e outros produtos que 20Retirado do site da Câmara Municipal de Foz do Iguaçu httpsleismunicipaiscombr acessado em 05042017 65 precisavam Com isso suas propriedades desvalorizavam RIBEIRO 2002 p 23 Foi o que aconteceu A região contava já com uma população bastante expressiva na época da desapropriação conforme aponta Mazzarollo Centros urbanos também foram seriamente afetados Alguns simplesmente desapareceram como Alvorada do Iguaçu próspero distrito de Foz do Iguaçu com cerca de 5000 habitantes MAZAROLLO 2003 p 33 Segundo MELCHIOR este número chegou a 7000 habitantes no seu auge Na reportagem exibida na época da baixa do lago o antigo morador Wilson Datsch afirmou que a princípio os moradores acharam que estavam fora do alcance do futuro lago que as águas não chegariam a atingir a área residencial e isto fez com que alguns relutassem em deixar o local Se entre Itaipu e os proprietários a relação já era de lutas por conta das desapropriações entre Itaipu e o município de Foz do Iguaçu as decisões se davam de forma mais facilitada uma vez que tanto Itaipu quanto o município eram administrados por subordinados ao governo militar Por conta disto as negociações avançavam e já em 1979 a prefeitura assina Lei nº 1014 que entregava a área do Distrito à Itaipu Binacional incluindo cemitério ruas avenidas e praças com área e valores21 pagos pela mesma conforme demonstrado abaixo Estas decisões foram tomadas em instâncias governamentais sem que houvesse discussão com as pessoas que seriam atingidas Embora Alvorada do 21Valores em Cruzeiro moeda vigente no ano da transação 66 Iguaçu tivesse representante político na Câmara de Vereadores o então vereador Sergio Spada morador da comunidade que havia sido eleito em 1978 com uma expressiva quantidade de votos pelo extinto Movimento Democrático Brasileiro MDB sendo o mais jovem vereador eleito em Foz do Iguaçu com apenas 20 anos de idade MELCHIOR2012 Este além de reivindicar questões de interesse geral para o Distrito procurou fazer oposição à Itaipu e seus desmandos porém não foi páreo para a máquina que representava Itaipu no cenário nacional e local Em 1980 foi emitido um Decreto anunciando a extinção do Distrito conforme abaixo APROVA A REPRESENTAÇÃO Nº 0180 DO PREFEITO MUNICIPAL DE EXTINÇÃO DO DISTRITO DE ALVORADA DO IGUAÇU O Presidente da Câmara Municipal de Foz do Iguaçu Estado do Paraná faço saber que o Poder Legislativo Decreta e eu promulgo o seguinte DECRETO LEGISLATIVO Art 1º Fica aprovada a Representação nº 0180 do Sr Chefe do Executivo Municipal de extinção do Distrito de Alvorada do Iguaçu cuja sede será inundada pela represa de Itaipu Art 2º Este Decreto entrará em vigor na data de sua publicação revogadas as disposições em contrário Sala das Sessões da Câmara Municipal em 13 de junho de 1980 Aguinello Fávero Haus Presidente22 Os expropriados muitos deles pioneiros na cidade viram anos de luta ser perdidos com a invasão autoritária da Itaipu Foram muitas as lutas por parte dos expropriados para conseguir melhores valores reivindicando reajustes reais nos valores praticados por Itaipu Pediam também que fossem indenizadas as terras com plantações produzindo os materiais e benfeitorias que por ventura no local estivessem Mas Itaipu utilizou de todas as formas possíveis para enganar ludibriar e conseguir comprar as terras que queria por valores abaixo do mercado Uma delas era que ao comprar uma determinada terra se a medida que Itaipu tivesse fosse menor que a do proprietário prevaleceria a da Itaipu mas se a medida que o proprietário tivesse fosse menor que a de Itaipu então prevaleceria a do dono Utilizavam de ameaças dizendo que caso o dono da terra não vendesse naquele momento as águas viriam e inundariam as terras e o dono somente iria receber o 22Retirado do site da Câmara Municipal de Foz do Iguaçu httpsleismunicipaiscombr acessado em 05042017 67 dinheiro na justiça o que demoraria e geraria a desvalorização do dinheiro e consequentes perdas Aos poucos a situação foi se tornando insustentável como o esvaziamento do local e falta de estrutura para permanecer A reportagem feita na época 1982 pelo jornalista Francisco de Alencar do Jornal O Estado do Paraná mostra que já não havia mais condição de permanecer no local A pressão começa a fazer efeito e muitos vão cedendo e fazendo acordo com Itaipu outros porém se unem e saem à luta por melhores preços e terras em local de qualidade compatível Com as estruturas comerciais já inoperantes agora era vez de o cemitério local ser removido Aliás segundo a reportagem eram vários cemitérios espalhados pela região já que segundo OlivioMagagnin afirmou na época à reportagem Cemitério aqui tem em quantidade Esses paraguaios enterram os mortos por aí mesmo porque antigamente nem tinha estrada por aqui Ele dizia conhecer a existência de pelo menos 30 cemitérios próximos da sua propriedade A responsabilidade pela exumação e transferência das ossadas era de Itaipu mas segundo Magagnin alguns familiares não esperaram e preferiram eles mesmos fazer a retirada dos seus entes Parte da estrutura do cemitério principal continua lá e também veio à tona quando o lago baixou seu nível Foto 15Escombros do cemitério em 2014 Fonte Acervo pessoal 68 Foto 16Outubro de 1982 O Estado do Paraná Fonte brpinterestcomcleyscholzadeussetequedas O Isolamento foi inevitável isolamento dos parentes já que muitas famílias foram separadas neste processo isolamento dos amigos que haviam feito na região isolamento social e também econômico tendo em vista que todo trabalho que haviam tido para tornar as terras produtivas estariam agora debaixo dágua além de estabelecimentos comerciais edificações de uso comum como clubes sociais igrejas hospitais e escolas Sendo assim todos se viram deslocados não apenas de suas terras mas também da vida ao qual estavam habituados do convívio que tinham com outras famílias de um passado comum que acabou submerso pelas águas do lago 69 Aqueles que não conseguiram se estabelecer na região precisaram buscar outro lugar para recomeçar Neste período a região Norte do país também estava em processo de povoamento e era uma das opções oferecidas pela Itaipu Na época o Sr Mario nosso entrevistado recebeu proposta de parentes para ir até Rondônia pois o local estaria oferecendo terras baratas para quem queria recomeçar a vida lá Porém o cenário que ele encontrou ao chegar era desolador De acordo com suas palavras o lugar era terra sem lei de pessoas mal intencionadas aproveitadores e ladrões como se lê abaixo Sr Mario Aí veio meu cunhado e disse vamos embora daqui porque lá em Rondônia dão terra de graça que não sei o que Dei o dinheiro pra ele pagar a passagem pra ir lá ver e ele vem de lá com mentira que era um lugar bom que não sei o que que não seio que Eu peguei e fui lá ver lá só tem bandido só tem bandido só tem bandido Lá os coitadinhos que iam daqui abençoado do céu que vendiam tudo e levavam o dinheiro ficavam lá na beira da rua debaixo de uma lona esperando Lá tinha os vigaristas então eles combinavam ó você é dono dessa propriedade vamos fazer assim eu vou lá e ofereço tua propriedade pra ele que é uma propriedade boa que assim e assim e faço que eu que sou o dono e vou vender a terra pro cara a gente pega o dinheiro e reparte e você não deixa ele entrar aí e ele se lasca Assim meu pai do céu eu vi tanta mulher chorar lá por causa disso É viemos pra cá acabamos debaixo de uma lona serviço não tem dinheiro acabou terra não tem não dão pra ninguém e bandido na rua ia caminhando e um puxava o revolver e matava outro ali a troco de nada Se encontrou atirou matou Eu vi lá com meus olhos daí disseram lá fulano você quer saber bem como é que é Rondônia você vai na missa que eles vão contar e você vai saber muita coisa lá E eu fui Daí chegou a hora da confissão e cada um contava os pecados dele gritado lá mais de cem pessoas Aí era só mulher que falava é mataram meu marido e agora eu estou aqui sofrida com tantos filhos pra dar de comer sem recurso sem ter pra onde ir Mas olha meu Deus do Céu daí que eu acabei de crer como era o negócio não não pelo amor de Deus vou ficar por aqui mesmo aqui ao menos o que comer nós temos Vamos ficar aqui porque lá o que tinha mais que tudo que é bandido que tinha em Foz e Mato Grosso Esta realidade aumentava o drama daqueles que já haviam perdido o pouco que tinham Mesmo aqueles que na época conseguiram fazer um acordo satisfatório precisavam enfrentar a falta de escrúpulos dos aproveitadores que digase de passagem não estavam apenas no Norte do país mas também na própria região Muitos ficaram sem rumo pois os valores pagos eram abaixo do mercado e a inflação e a especulação desvalorizavam totalmente o dinheiro de um mês para outro A especulação era por parte de pessoas que sabendo dos valores que Itaipu estava pagando sempre exigia um valor maior do que a terra valia tornando o mercado imobiliário da região inflacionado O valor que recebiam por suas terras não era suficiente para comprar nem metade em outros lugares isso 70 sem levar em conta que a terra não era tão produtiva como as que se possuíam Por conta disto o período foi marcado por cenas inusitadas como mostrado na imagem abaixo onde casas inteiras eram transportadas na carroceria de caminhões Valia tudo para minimizar as perdas agora que a saída do local era inevitável e iminente Foto 17Para salvar a casa das águas valia qualquer coisa Foto João Luiz Thomazi Fonte wwwjiegovbr As obras em Itaipu estavam concluídas e águas começaram a subir rapidamente Alvorada do Iguaçu em pouco tempo estaria submersa e a partir de então só existiria na memória dos seus antigos moradores esperando que uma seca na região a revelasse às novas gerações Porém uma parte dela não foi atingida e permanece como uma espécie de elo entre presente e passado Se por um ladoAlvorada do Iguaçu desapareceu de baixo dágua por outro surge Vila Bananal Enquanto Alvorada do Iguaçu espera que o lago baixe seu nível para ser vista e lembrada sem que haja necessidade de qualquer esforço para isto já Vila Bananal está exposta e pode ser vista por todos que desejam conhecêla No entanto Vila Bananal passa despercebida da maioria da população de Foz do Iguaçu Sua invisibilidade em face de sua importância é intrigante como veremos a partir de agora 71 Foto 18 A água sobe rapidamente trazendo mudanças e progresso Foto ValdenorFranzen Fonte wwwjiegovbr 72 3 VILA BANANAL DESLOCAMENTO E ISOLAMENTO SOCIAL Ao ouvir falarem Vila Bananal a primeira imagem que vem à mente é de bananas ou seja uma localidade que tem ou teve a banana como um importante elemento na construção de sua identidade social e econômica Vila Bananal já ocupou uma posição de destaque na produção de bananas para o Estado do Paraná Atualmente mesmo sendo ainda um importante centro de abastecimento do produto para o município e região nem de longe se assemelha ao que um dia já foi É notória que esta não é mais sua principal vocação já que a banana praticamente desaparece diante de uma vasta área agrícola e pecuária ficando restrita a poucos e pequenos produtores que ainda resistem Foto 19À esquerda a placa que dá boas vindas ao Município de Foz do Iguaçu indica o início da Vila Bananal Ao centro a cerca que marca a divisão entre Foz do Iguaçu e São Miguel do Iguaçu Fonte Arquivo pessoal Sr Mario Não de primeiro aqui eu digo pro senhor que virou Vila Bananal porque tinha uns 300 alqueires de banana Porque o Luiz Salasi ele plantava essas terras tudo o que senhor vê aqui era quase tudo cheio de banana que era dele Ele tinha 14 peões fichados aonde que meu filho tocou quase vinte anos trabalhando junto com o Luiz 73 Vila Bananal nem chega a ser uma vila propriamente dita podemos chamála de comunidade Nela vivem aproximadamente 60 famílias com cerca de 150 pessoas na maioria produtores rurais e pescadores Representa uma parte importante da área rural de Foz do Iguaçu responsável por uma parcela considerável da produção agrícola e pecuária do município Não é raro ao transitar pela única estrada que dá acesso ao lugar ter de sair da pista ou aguardar até que as grandes máquinas agrícolas passem para então prosseguir caminho Surgiu dos processos mencionados acima e sua principal causadora é sem dúvidas Itaipu Binacional Quando o lago da usina foi formado Alvorada do Iguaçu cuja área ocupava uma grande extensão desde próximo à barragem até o município de São Miguel do Iguaçu perdeu boa parte das suas terras A parte que não foi alaga porém ficou isolada do restante do município que a abrigava Sem acesso senão pela rodovia BR277 ou pelo lago a região ainda é quase que desconhecida da maior parte da população e com quase nenhuma atenção do poder público Isto faz com que a comunidade assuma uma identidade flutuante a fim de ter suas demandas atendidas sendo que Foz do Iguaçu é seu município domiciliar mas é de São Miguel do Iguaçu que estes sujeitos utilizam serviços básicos como saúde educação e suprimentos diversos Serviços que nem sempre são satisfatórios Somos de Foz mas estamos jogados entre os municípios observa o pescador Leocir de Oliveira Boes Moramos em Foz mas quando precisamos de serviços temos de ir a Foz brinca o pescador23 A ironia revela a dura realidade e mostra a condição destes moradores em relação ao poder público e como eles mesmos se veem No entanto ao que parece estes moradores não abrem mão de pertencer a Foz do Iguaçu Talvez porque estar ligado a uma cidade que se insere no cenário nacional e internacional com certo destaque possa proporcionar um que de status social de tal forma que acaba compensando a falta de atenção e o isolamento a que são submetidos Eles são iguaçuenses por imposição dos processos históricos não foram ouvidos quando a região foi alagada e tampouco quando Foz do Iguaçu e São Miguel disputavam a posse destas terras Porém um certo conformismo pode ser 23RIBEIRO Vitor Hugo CASSULI Danieli Cristina FRASSÃO Adair José Frason Território e Conflito Breve histórico sobre a implantação da Usina Hidroelétrica Itaipu Binacional e seus reflexos na produção do espaço 2012 FONTE GAZETA DO IGUAÇU httpwwwideallcombrcostaoestefmnoticiasdetaspcodnot17236 acessado em 19112011 74 percebido no discurso dos seus moradores nas diversas entrevistas concedias de forma quecaso fosse oferecida a possibilidade de escolha entre Foz do Iguaçu e São Miguel do Iguaçu como definição para uma identidade local é bem provável que estes moradores fariam a escolha por pertencer a Foz do Iguaçu Neste sentido os sujeitos são autônomos na escolha da sua identidade São capazes de avaliar aquilo que lhes é mais conveniente e assumir então os riscos que esta escolha lhes confere até mesmo viver deslocados e isolados entre duas cidades que não são a sua ou pertencer a um município que não supre suas necessidades básicas no que tange a serviços públicos mas que lhes oferece outras vantagens sejam elas culturais ou sociais Por deslocamento entendese um movimento voluntário ou involuntário em direção a outro lugar que pode ser territorial ou não pois há também deslocamentos socioeconômicos quando determinado indivíduo ou grupo social ascende ou descente sua categoria econômica ou dentro do grupo social a que pertence Os moradores de Alvorada do Iguaçu alguns experimentaram ambas as categorias pois precisaram deslocarse do seu território de maneira forçada sendo que não lhes foi oferecida a oportunidade de ficar No máximo poderiam escolher ficar próximos e neste caso pagar o preço alto que a especulação de terras estava cobrando Neste afã muitos acabaram sem seus recursos precisaram recomeçar do zero sendo assim deslocados de seus antigos padrões socioeconômicos relativamente confortáveis Outros ainda que optaram em recomeçar a vida noutras regiões especialmente no Norte e CentroOeste do país se viram tendo que lutar com terras em condições brutas e amargaram anos até que as mesmas estivessem em condições de produzir sem contar aqueles que foram enganados e roubados tanto no processo de expropriação quanto na aquisição de novas propriedades E houve também aqueles que optaram por deixar o campo e foram tentar a sorte nos centros urbanos Neste caso deslocados territorialmente socialmente e economicamente pois precisaram adquirir um novo modo de vida ao qual não estavam habituados Vila Bananal é o resultado de um destes movimentos de deslocamento Na Figura vemos como era região antes de 1981 quando Itaipu ainda estava na fase final de construção e o Lago ainda não havia sido formado como se observa no lado esquerdo da imagem Para maior compreensão delimitamos a área que 75 correspondia a Alvorada do Iguaçu com base nas informações da Lei que criou o Distrito Do lado direito da imagem vemos o Lago já formado Deixamos a área da antiga Alvorada do Iguaçu para melhor visualização e indicamos a localização da Vila Bananal conforme se lê na legenda Desenho3 Comparativo da antes de Itaipu 1981 com a limitação de Alvorada do Iguaçu e depois de Itaipu 2014indicandoa localização da Vila Bananal e área alagada Fonte Adaptado de httpapublicaorgosecosdeitaipu Legenda 01 Foz do Iguaçu 02 Alvorada do Iguaçu 03 Vila Bananal 04 Santa Terezinha de Itaipu 05 São Miguel do Iguaçu Como se observa a região que compreendia Alvorada do Iguaçu teve boa parte de suas terras coberta pelas águas Na imagem à direita Vila Bananal corresponde apenas à área delimitada com um círculo A parte indicada com número 02 que era parte integrante de Alvorada após Itaipu acabou sendo anexado ao território de Santa Terezinha de Itaipu Nada mais lógico que acontecesse o mesmo com a Vila Bananal ou seja que ela viesse a compor o território de São Miguel do Iguaçu devido à sua proximidade o que não aconteceu De fato a área chegou a ser disputada na época entre Foz do Iguaçu e São Miguel do Iguaçu Isto fez com que comunidade recebesse o apelido de Vila Malvinas numa clara alusão à guerra das Malvinas quando Argentina e Inglaterra entraram em disputa pelas Ilhas Malvinas no ano de 1982 mesmoano da formação do Lago de Itaipu O nome já revela o motivo A disputa não era por outra razão que não econômica uma vez que a região seria responsável por uma parcela significativa dos royalties pagos por Itaipu aos municípios lindeiros ao lago em 76 virtude da perda das terras produtivas sendo que depois de Santa Helena a maior área alagada compreendia exatamente a extinta Alvorada do Iguaçu Este pedaço de terra encravado entre os municípios de Santa Terezinha de Itaipu e São Miguel do Iguaçu já foi disputado no passado acarretando no apelido de Malvinas brasileiras uma menção à guerra entre a Argentina e a Inglaterra pelas Ilhas Malvinas A disputa tem forte motivação econômica Sem a Vila Bananal Foz perderia aproximadamente 60 do valor recebido em royalties pela Itaipu A distribuição dos royalties é proporcional à área alagada dos municípios com percentuais definidos pela Agência Nacional de Energia Elétrica Aneel GAZETA DO IGUAÇU Embora isolada porém a região continua desempenhando um papel importante na economia de Foz do Iguaçu Sua relevância se dá por pelo menos dois motivos aos quais vale à pena serem destacados primeiro porque a região é responsável por mais da metade do valor dos royalties pagos ao município o que não é pouco De acordo com informações obtidas no site de Itaipu o município recebeu até 2017 aproximadamente 3541 milhões de dólares sendo que 60 deste valor são atribuídos à perda da área correspondente a Alvorada do Iguaçu 20184 km2 de área alagada segundo porque ainda que reduzida em relação ao tamanho original as terras que restaram se constituem nas mais férteis da região e representam um bom percentual da área produtiva do município tanto de produtos agrícolas quanto da pecuária Em visita ao local a prefeitura de Foz do Iguaçu através do Gabinete Aberto detectou as seguintes demandas da comunidade que na verdade são reivindicações antigas que se arrastam a cada administração desde o seu surgimento A população quer se regularizar e isso é importante porque estamos falando de 8 mil hectares de área que pertencem a Foz sendo que 4500 hectares são produtivos Várias são as demandas como o poço artesiano a construção de um barracão comunitário que irá servir também como um posto de saúde clube de mães e um local de encontro para os moradores pois eles ainda não têm nenhuma estrutura pública em funcionamento PEREIRA Reni Prefeito Municipal São questões relativamente simples de se resolver ao menos na teoria porque na prática a realidade é outra A comunidade vive das promessas dos seus governantes quando estes aparecem para legitimar a posse do local para em seguidasuas necessidades caírem no esquecimento até que nova administração apareça com novas promessas Vale lembrar que estes moradores são domiciliados em Foz do Iguaçu no entanto seu cotidiano está muito mais relacionado a São Miguel do Iguaçu por conta da proximidade É em São Miguel que as crianças estudam e para isto contam com um ônibus cedido pela prefeitura de Foz do Iguaçu 77 que faz o transporte até São Miguel Quando chove porém é um problema pois a única estrada que é pavimentada é a principal sendo que as vicinais são de terra ficando intransitáveis em tempos chuvosos O transporte de alunos acaba sendo também a única opção para aqueles moradores que não tem veículo próprio e que se utilizam deste serviço para se locomoverem ao município vizinho Em relação à saúde os casos mais simples são tratados em São Miguel já os que precisam de uma maior atenção são tratados em Foz do Iguaçu Quando a população se mobiliza e reivindica mais atenção especialmente utilizandose algum veículo de comunicação a prefeitura de Foz faz um mutirão para atender a população mas por não haver prosseguimento acaba não tendo o efeito desejadoAo ser entrevistada a moradora Adriana de Melo que vive a mais de 20 anos no local fez a seguinte declaração na Vila Bananal é muito bom viver tem muita paz Nossa maior dificuldade é quando alguém fica doente pois não temos nenhum posto de saúde por aqui quando precisamos temos que recorrer ao vizinho que tem carro e corremos para a cidade de São Miguel pois é a mais próxima Todas as 37 famílias que vivem aqui se conhecem e ajudamos um ao outro em tudo nascemos e fomos criados aqui e não queremos sair da Vila Bananal declarou Adriana na época grifo nosso Este mesmo argumento aparece também no discurso do nosso entrevistado Segundo ele relata o descaso e o abandono são o grande problema que os habitantes do lugar enfrentam diariamente Questões simples como a substituição de uma lâmpada queimada em um poste se transforma em uma grande batalha uma vez que em Foz do Iguaçu os responsáveis não vêm por causa da distância e em São Miguel do Iguaçu não vêm porque alegam não ser da competência deles e assim os moradores ficam no escuro por meses Neste sentido o que poderia ser uma conveniência poder contar com a estrutura de dois municípios acaba se tornando um problema uma vez que como iguaçuenses precisam contar com a solidariedade do município vizinho sendo queum empurra a responsabilidade para o outro Sr Mario Olha eu digo até a verdade São Miguel eu até sinto eu até sinto morar longe de Foz do Iguaçu sinto Agora aqui em São Miguel pra nós nós estamos aqui obrigados obrigados porque neste canto aqui olha eu precisei eu fui lá na farmácia pegar um remédio esta semana aí por um descuido de nada o ônibus não tinha aluno porque nós sempre ocupamos o ônibus que puxa os alunos é o único transporte que tem Aí o ônibus veio embora e eu precisei pagar setenta reais para o rapaz me trazer aqui 78 O município de Foz do Iguaçu que tem toda a responsabilidade administrativa e social com a Vila Bananal não se vê capaz de suprir suas demandas e acaba jogando a responsabilidade ou apoiando sua falta de ação a uma decisão de Itaipu No entanto o município já recebe os royalties referentes àquela área cabendo ao governo municipal direcionar uma parcela destes recursos em direção aos anseios da comunidade Vila Bananal Com isto não estamos negando a responsabilidade social que Itaipu deveria ter com o local por ser a responsável por sua existência mas apenas apontando que a inércia tanto de uma quanto de outra acaba agravando a situação desta população Existe a possibilidade de uma parceria com a Itaipu para a construção de uma barracão comunitário somente depois disso podemos deslocar uma equipe seja a cada 15 dias ou a cada semana regularmente para fazer o atendimento médico as famílias porque hoje não adianta nós mandarmos uma enfermeira porque não tem onde atenderPEREIRA Reni Prefeito Municipal A parceria ainda está à espera de se concretizar O barracão existe mas permanece inacabado ao lado da Igreja que os próprios moradores construíram com recursos arrecadados entre eles através de festas rifas e doações Esforço que chegou a ser usurpado por pessoas que se utilizaram da oportunidade para benefício próprio desviando recursos e doações que deveriam ser revertidos para a construção da igreja e do barracão como relata com ressentimento o Sr Mario É no salão da igreja que a comunidade se reúne seja para a missa quando é deslocado um sacerdote para oficiar a cerimônia para reuniões comunitárias ou até mesmo as ações da prefeitura quando esta desloca médicos dentistas ou outros profissionais para atender a comunidade A parceria de Itaipu só existe na teoria Ela interferiu e interfere diretamente no cotidiano da Vila Bananal mas não da forma como deveria trazendo recursos oferecendo desenvolvimento e condições de sustentabilidade para a comunidade Sua presença na região tem consequência direta na existência da Vila Bananal e ainda a mantém isolada naquele pedaço de terra Perguntado se Itaipu contribui de alguma forma com a comunidade assim responde o Sr Mario Nada nada nada Digo a verdade pro senhor a Itaipu nem é lembrada aqui Eles não vêm aqui A Itaipu não Nunca deu nada nunca fez nada nunca ajudou com nada nunca se lembrou do lugar só se lembra eu falo bem a verdade pro senhor e adoro que seja bem gravado que nunca ajudou e nunca lembrou Só se lembram do lugar quando tem que levar o dinheiro para lá mas ajudar com alguma coisa não 79 Esta declaração é reveladora e ao mesmo tempo intrigante tendo em vista que a empresa desenvolve diversos projetos de desenvolvimento ambiental e agrícola em parceria com os municípios afetados pelo lago Outro fator que causa estranheza é a presença de uma família ilustre no local Em entrevista concedida em 1997 João Samek pai de Jorge Samek que foi presidente brasileiro de Itaipu de 2012 a 2017 um dos proprietários de terras na Vila Bananal fez a seguinte declaração quando indagado sobre ser um latifundiário da região Comprei minha terra mas não creio que seja latifundiário Tinha cerca de 500 alqueires dos quais perdi cerca de 150 para o lago de Itaipu Com o que sobrou formei a fazenda Cacique Localizada perto de São Miguel do Iguaçu naquela área de Foz do Iguaçu seccionada pelo lago de Itaipu as chamadas Malvinas CAMPANA ALENCAR 199724 Segundo o Sr Mario um de seus filhos chegou a trabalhar muitos anos para João Samek A Fazenda cobre uma vasta área na região bem próxima ao lago Fica então a pergunta Itaipu realmente mantémse inerte em relação à Vila Bananal ou sua presença beneficia alguns em detrimento de outros Não encontramos dados suficientes para dar a resposta Através do cruzamento fontes podemos detectar outras questões que não aparecem nas entrevistas e nem nos trabalhos já realizados mas que merecem uma atenção devido à gravidade e os desdobramentos que acabam acarretando Uma busca na internet pelo portal de pesquisas Googlecombr usando a referência Vila Bananal denuncia que o lugar se transformou em ponto estratégico para o contrabando e descaminho Não são poucas as matérias divulgadas pelos meios de comunicação local dando conta de apreensões perseguições e outras ações do gênero efetuadas na região Quando da nossa primeira visita ao local nos foi sugerido evitar aproximarnos da mata ciliar pois a aproximação de estranhos é tida como ameaça por parte daqueles que utilizam o local como ponto estratégico para o escoamento de produtos contrabandeados do país vizinho Até mesmo o Sr Mario aponta que às vezes o lugar se enche de policiais tanto federais quanto militares que fazem ações no local para coibir a marginalidade mas que segundo ele não afeta a vida no local 24Trecho retirado da entrevista concedida por João Samek publicada no livro Foz do Iguaçu Retratos produzido pela Campana Alencar Ltda antiga editora dos jornalistas Silvio Campana e Chico de Alencar em 1997 e publicada pelo blog httph2fozcombr acessado em 22032017 80 Foto 20Porto clandestino na Vila Bananal Fonte httppontodanoticiacom Foto 21Um veículo Duster roubado em São Paulo na Vila Bananal Fonte httpwwwradioculturafozcombr 81 Foto 22 Caminhão carregado com cigarros na região da Vila Bananal Fonte httpwwwjtribunapopularcombr Foto 23Uma embarcação com 250 caixas de cigarro apreendida na Vila Bananal Fonte httpg1globocomprparananoticia Sendo assim temos um território de aproximadamente 8 mil hectares sendo que destes 4500 são produtivos Área que pertence ao município e que é responsável por 60 do valor que a cidade recebe mensalmente como compensação pela perda de território inundado por Itaipu mas cujo benefício direto desta indenização não chega de fato a esta comunidade Um município que não responde aos anseios desta comunidade mas que também não abre mão dela porque se beneficia diretamente dos recursos advindos dela seja pelos royalties ou pela produção agrícola e pecuária que de lá provém Ao que parece ainda demorará até que esta comunidade se veja representada e com o devido valor reconhecido 82 CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta pesquisa trouxe importantes reflexões sobre a realidade no Oeste do Paraná especialmente no que diz respeito à sua formação e processos sofridos ao longo dos anos mas principalmente nos últimos cem anos quando transformações mais profundas ocorreram Ficou claro que o desenvolvimento da região seguiria um outro caminho não fosse a imposição de projetos nacionais que se sobrepuseram sobre processos anteriores Uma região de fronteiras onde essas eram menos rígidas e excludentes onde a presença indígena ainda se podia notar e que pelo isolamento sentia menos a interferência do nacionalismo que mais tarde traria um contingente de pessoas para ocupar os espaços que se julgavam vazios Este vazio apontado pela historiografia localdeu margem para que o governo brasileiro lançasse seu olhar para esta região Vazio que na verdade nunca existiu Um olhar eurocentrado e de cunho colonial O mesmo olhar que Europa lançou sobre as Américas portuguesa e espanhola reconhecendo nelas espaços que precisavam ser desbravados ocupados e dominados Para isto era necessário apagar um passado de ocupações indígenas e estrangeiras que já faziam desta região um lugar de intensas relações Por isto a história da região é contada de forma a não levar em conta séculos da presença indígena e espanhola muito menos afrodescendente Este nacionalismo se manifestou primeiro pela instalação da Colônia Militar e a abertura da estrada entre Guarapuava e a Foz do Iguaçu Em seguida a colonização se daria a partir Marcha para o Oeste com a presença das Empresas Colonizadoras que seriam responsáveis por todo um fluxo de imigrantes gaúchos catarinenses e paranaenses sendo muitos deles de origem estrangeira principalmente alemães italianos e poloneses A intenção real era expulsar os que aqui já se faziam presentes e através desta nova classe de pessoas reescrever a história da região entregando a estes o pioneirismo regional Este é um ponto que causa estranheza já que a intenção era nacionalizar as regiões de fronteira e dominála através da língua portuguesa o que na prática não se via tendo em vista que a quantidade de pessoas de língua estrangeira presentes na região trazidas justamente por estes fluxosmigratórios era grande 83 A identidades são construídas pelos sujeitos a partir de suas próprias lógicas e necessidades e elas são autônomas neste sentido para fazer uso da forma como acharem mais conveniente Por isto uma vez estabelecidas na região estes sujeitos estabeleceram entre seus pares e com os outros relações que permitissem conectarse socialmente mas guardando suas próprias tradições e elementos culturais Desta é forma ainda é comum que em algumas regiões se perceba a presença decolônias bem definidas com predominância de pessoas de origem estrangeira alemã italiana polonesa etc onde as tradições estão presentes na fala na comida na cor da pele na religiosidade Em Foz do Iguaçu observase uma realidade um pouco diferente por conta de outros fluxos tais comoItaipu Turismo e o comércio com as nações vizinhas Por conta disto vemos um panorama multicultural na região atualmente mas ainda assim com pouca mistura entres as diversas etnias Quando em meados da década de 1960 a necessidade da construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu estava em discussão o Distrito de Alvorada do Iguaçu estava sendo criado Quando em 1976 as obras se iniciaram no canteiro de obras Alvorada já estava em franco desenvolvimento e consistiase numa comunidade bem organizada socialmente economicamente e politicamente Sua população com cerca de 5 a 7 mil habitantes era proveniente dos fluxos migratórios impulsionados pelas colonizadoras Porém a imposição de outro projeto de desenvolvimento acabou impedindo que este fosse adiante É interessante notar que o projeto econômico se sobrepôs ao projeto cultural e identitário que já estava em desenvolvimento com a ocupação da região Alvorada foi a primeira vítima que estava no caminho da grande Itaipu Binacional Itaipu enquanto uma obra construída em nome do progresso não levou em consideração as comunidades que estavam em seu caminho fossem elas rurais urbanas indígenas e nem tampouco a flora e fauna que se perderia Uma vez consolidada e colecionando a cada ano recordes na geração de energia Itaipu pode colocarse como um Desafio superado Esta é a palavra que define a empresa atualmente em sua página na internet Mas na época da construção o Progressoera a palavra de ordem que passava por cima de tudo e de todos Itaipu é o reflexo de uma época marcada pelo autoritarismo e pela imposição governamental aparelhada pelo militarismo Talvez por conta disto não 84 esperava que houvesse resistência por parte dos expropriados e nem que estes pudessem se organizar em torno dos seus direitos como de fato aconteceu especialmente numa região que teve sua origem a partir de uma Colônia Militar e com governos indicados por estes Os estudos sobre os atingidos por barragens têm mostrado que os sujeitos tanto em relação à Itaipu quanto em outras barragens sabem sim organizaremse e buscarem seus direitos sejaem grupo ou individualmente Está provado também que a construção de uma hidroelétrica traz como consequência transformações diretas na vida das comunidades por ela afetadas e seus efeitos negativos são proporcionais ao tamanho da obra Neste exato momento em que este trabalho está sendo escrito está em andamento a Usina Hidrelétrica de Belo Monte no Pará Uma obra que se arrastou por décadas e que sai do papel passando por cima de comunidades ribeirinhas e terras indígenas trazendo uma série de consequências para a biodiversidade animal e vegetal Já Itaipu trouxe além destas questões um desequilíbrio sociocultural para Foz do Iguaçu e região sendo responsável pela extinção do Distrito de Alvorada do Iguaçu bem como no êxodo de cerca de 40 mil pessoas no seu caminho somente do lado brasileiro Uma família que é deslocada de seu lugar de origem de forma traumática como foi o caso dos expropriados de Itaipu deixam para traz bem mais do que sua terra ou propriedade mas também sua história relações sociais e econômicas estabelecidas com outras famílias e com a região da qual está sendo removida Esta foi a realidade vivida por estas famílias que tiveram que amargar sair do seu local e buscar outra forma de vidafosse na região ou em outros locais afastados No processo de deslocamento muitas famílias acabaram sendo separadas tendo em vista que para começar nova vidaalguns escolheram permanecer na região enquanto outros optaram por refazer a vida em lugares distantes onde pensavam haver melhores condições Muitos dos que partiram decepcionaramse e se viram expropriados duas vezes uma por Itaipu outra por exploradores malintencionados Outra consequência direta de Itaipu na região foio surgimento da Vila Bananal já que esta originouse a partir da formação do lago de Itaipu Estando próxima a São Miguel do Iguaçu as terras poderiam facilmente ter sido incorporadas ao território deste Porém seu valor econômico para o município de Foz do Iguaçu 85 fez com que esta não abrisse mão da área mesmo sabendo do isolamento a que as famílias que ali viviam teriam de amargar Dos royalties pagos por Itapu referente a área inundada de Foz do Iguaçu 60 eram provenientes desta área além de Vila Bananal compor parte expressiva da área rural do município Economicamente Vila Bananal é extremamente valiosa mas socialmente chama pouco a atenção a não ser pelas manchetes no setor policial que têm dado destaque à diversas apreensões de produtos ilegais no local Do lucro que ela traz ao município nada retorna de fato Itaipu também pouco interfere na região a não ser pelo lago que mantém a comunidade incomunicável com restante do município Se Vila Bananal praticamente não é lembrada Alvorada do Iguaçu não será esquecida A natureza tratará de nos lembrar em alguma época expondo novamente suas ruínas e trazendo à tona a discussão em torno dos efeitos de Itaipu na região Oeste do Paraná Além disto a história da região está sendo contada e recontada a cada novo trabalho Esperamos ter contribuído um pouco para ampliar o conhecimento a cerca destes processos recentes que ainda estão sendo construídos 86 REFERÊNCIAS ALBUQUERQUE JÚNIOR Durval Muniz de História A arte de inventar o passado Ensaios de teoria da história Bauru Edusc 2007 AMADO Janaína Região sertão nação Em Estudos histórico Rio de Janeiro Vol8 nº 15 1995 pp 145 a 151 BOSI Ecléa Memória e sociedade Lembranças de velhos 3ª ed São PauloCompanhia das Letras 1994 BURILLE Celma Faria de Souza Nas tramas da separação o caso do Estado do Iguaçu nas décadas de 1960 e 1990 Curitiba 2010 122f GERMANI Guiomar Inez Expropriados terra e água o conflito de Itaipu Salvador Edufba ULBRA 2003 HALL Stuart A identidade cultural na pós modernidade tradução Tomaz Tadeu da Silva Guacira Lopes Louro11 Ed Rio de janeiro DPA 2006 KARPINSKI Cezar Sobre as águas a memória a usina hidrelétrica de Salto Caxias e a história dos que ficaram Marechal Cândido Rondon 2004 LEDEZMA MENESES Gerson Galo Del descubrimiento y laconquistadel oeste del paraná1 hasta laconstrucción de itaipu La visión de tiempo de una sociedadeurocéntrica Revsita SURES 2014 nº4 p 1341 LE GOFF Jacques História e memória tradução Bernardo Leitão et al Campinas SP Editora da UNICAMP 1990 LIMA Perci Foz do Iguaçu e sua história Foz do Iguaçu SE 2001 LOPES Sérgio O Território do Iguaçu no contexto da Marcha para oeste CascavelEdunioeste 2002 MASCARENHAS Milena Costa Poeira X Unicon confrontos e contrapontos entre atingidos e itaipu 2009 Maringá PR MATIELLO Catiane Narrativas tecnológicas desenraizamento e cultura de resistência história oral de vida de famílias desapropriadas pela construção da Usina Hidrelétrica de itaipu CuritibaPR 2011 MAZZAROLLO Juvêncio A taipa da injustiça esbanjamento econômico drama social e holocausto ecológico em Itaipu Edições Loyola São Paulo 2003 MELCHIOR Kleber Dreicy A migração dos mortos Remanejamento de cemitérios na região do Lago de Itaipu Universidade Estadual do Oeste do Paraná Foz do Iguaçu 2012 NORA Pierre Lugares de memória Entre memória e história a problemática dos lugares Tradução Yara AunKhoury Projeto História São Paulo PUCSP 1993 p 7 22 87 PENA CATTA Luiz Eduardo O cotidiano de uma fronteira A perversidade da modernidade Cascavel Unioeste 2003 PRIORI A et al História do Paraná séculos XIX e XX online Maringá Eduem 2012 234 p RIBEIRO Maria de Fátima Bento Itaipu a dança das águas histórias e memórias de 1966 a 1984 Campinas SP s n 2006 RIBEIRO Maria de Fátima Bento Memórias do concreto vozes na construção de Itaipu Edunioeste CascavelPR 2002 RIBEIRO Vitor Hugo CASSULI Danieli Cristina FRASSÃO Adair José Frason Território e Conflito Breve histórico sobre a implantação da Usina Hidroelétrica Itaipu Binacional e seus reflexos na produção do espaço 2012 SANTOS Ana Paula dosLago de memórias a submersão das Sete QuedasAna Paula dos Santos Maringá 2006 133 p SCHREINER Davi F Memórias da Terra em Revista Helena Ano 1 nº2 Secretaria de Estado e Cultura Curitiba 2013 SCHIMMELPFENG Otila Retrospectos iguaçuenses Narrativas Históricas de Foz do Iguaçu Editora Tezza Ltda Foz do IguaçuPR 1991 SCHMITT Judite Veranisa Os atingidos por Itaipu história e memória Oeste do Paraná décadas de 1970 a 2000 UNIOESTE 2008 THAUMATURGO Leila Regina Youssef SIMÕES Silvio Jorge Coelho TRANNIN Isabel Cristina de Barros A construção da usina hidrelétrica de Itaipu e seu impacto sobre aurbanização de Foz do Iguaçu Universidade Estadual Paulista UNESP 2013 THOMPSON Paul A voz do Passado História Oral São Paulo SP Paz Terra 1992 WACHOWICZ Ruy Cristovam Obrageros mensus e colonos história do oeste paranaense 2º Edição Curitiba Ed Vicentina 1987 218 p REFERÊNCIAS DA INTERNET Jornal NOSSO TEMPO Informativo Digital Edições de1980 a1982 disponível em httpwwwnossotempodigitalcombr acessado em outubro 2016 Governo investe na construção de 86 hidrelétricas e tem centenas no papel Disponível em httpswwwaecwebcombrcontmrdogovernoinvestena construcaode86hidreletricasetemcentenasnopapel7037 acessado em abril de 2017 88 Itaipu BinacionalNossa História disponível em wwwitaipugovbracessado em novembro de 2016 Usina refez o mapa da região Oeste disponível emhttpwwwgazetadopovocombreconomiaespeciaisitaipu30anosusinarefez omapadaregiaooeste8tbwwaaiyoig2mbijrefca2j2 acessado em 260520107 Adeus Sete Quedas disponível em brpinterestcomcleyscholzadeussete quedasacessado em maio de 2017 Os ecos de Itaipu Agência de Reportagem e Jornalismo Investigativo disponível em httpapublicaorgosecosdeitaipu acessado em fevereiro 2017 Quas seriam as fronteiras do Estado Disponível em httpestadodoiguacuagorablogspotcombr acessado em outubro de 2016 Leis Municipais da Câmara Municipal de Foz do Iguaçu disponível em httpsleismunicipaiscombr acessado em março de 2017 O grande capítulo dos 100 anos disponível em httpjieitaipugovbrnode55921 acessado em abril de 2017 Polícia Federal apreende quase 2 toneladas de maconha em porto clandestino no Lago de Itaipu disponível em httppontodanoticiacomver noticiaphpuid10607 acessado em abril de 2017 Policiais encontram mais de 700 kg de maconha em carro clonado disponível em httpwwwradioculturafozcombrpoliciaisencontrammaisde700kgde maconhaemcarroclonadoWWTDFYTyuUk acessado em abril de 2017 PF aprende caminhão carregado com cigarros na região da vila bananal disponível em httpwwwjtribunapopularcombrartigopfaprendecaminhao carregadocomcigarrosnaregiaodavilabananalWWS9woTyuUk acessado em abril de 2017 Barco com caixas de cigarro é abandonado no Lago de Itaipu no PR disponível emhttpg1globocomprparananoticia201104barcocomcaixasdecigarroe abandonadonolagodeitaipunoprhtml acessado em abril de 2017 89 ANEXOS Entrevista com Sr Mario Batistelli realizada em 12 de março de 2017 Duração14300 Edson O Sr Chegou aqui em que ano seu Mario Sr Mario Eu cheguei aqui em 73 Edson O ano que eu nasci eu estou com43 Sr Mario É Em 73 o srvê que faz tempo Eu tenho filho também que logo que nós chagamos aqui eleeu cheguei no mês de junho e ele nasceu em setembro Ele deve ta com 43 também Edson Eu sou de agosto pertinho Sr Mario É ele é do dia 30 de setembro Edson O Sr Veio da onde Sr Mario Eu vim do Rio Grande do Sul Eu sou natural de Passo Fundo Edson Veio com a família Sr Mario Vim vim Eu morei muito tempo em Santa Catarina que lá morava um irmão meu nós trabalhamos muito numa cerraria pra um tal de Dionísio Monfrede lá do Rio Grande que era o patrão e depois eu vim pro Rio Grande pra ir servir Eu tinha que servir em Passo Fundo que naquele tempo a gente era alistado era onde tinha que ir servir né Então eu vim de lá com dezessete anos e meio eu vim de Santa Catarina parei na casa dos meus cunhado e esperando a hora de ir servir mas daí no fim do remate me julgaram incapaz daí eu tirei a Terceira todo o documento e não fui servir é Edson O sr Era solteiro ainda naquela época ele não entende a pergunta eachar que estou perguntando sobre o documento de reservista Sr Mario Tenho tenho os documentos tudo guardado Então daquele tempo faz muitos anos mas a gente o documento que a gente pega a gente tem que guardar porque um dia pode precisar dele Edson Sim com certeza Eu insisto na pergunta O sr Era solteiro nessa época Sr Mario Era eu era solteiro Edson E casou aqui Sr Mario Eu casei lá no Rio Grande Até que antes de servir antes de servir eu casei Então foi assim Eu parava na casa dos meus cunhados mas eu já me criei sem pai e sem mãe e justamente foi muito sofrido E trabalhava muito e naquele tempo ninguém queria pagar nada o muito que davam era uma mudinha de roupa e comida e aquilo foi me enfadando dando uma coisa ruim porque eu dizia trabalhar tanto pra não ganhar nada o que era feito da minha vida Eu vou ter que me virar e fazer pra mim Daí foi a hora que achei com quem casar achei que era uma família de gente muito boa Então eu digo eu sou novo mas eu vou casar e ainda o meu 90 sogro falou não se você tiver que servir não tem problema a filha fica aqui em casa porque nós necessitamos que ela fique aqui mesmo que a mãe dela é paralítica não tem importância esse negócio se tiver que servir vai servir e se não melhor porque dai já pega trabalhar pra sim né Aí foi o jeito que eu casei eu casei no dia 28 de outubro de 1955 e era pra mim servir no dia 15 de novembro dai eu fui Mas ai julgaram incapaz eu me apresentei pro sargento o registro de casamento e acho que foi por isto que ele me dispensou Edson Daí vieram pra cá Sr Mario Daí fiquei lá fiquei trabalhando Aí eu pedi o meu sogro tinha muita terra mas ele era um homem engraçado ele pouco trabalhava a terra dele não arrendava e não deixava ninguém plantar na terra dele Então eu fui lá na casa dum compadre meu e pedi ele tinha bastante terra uns 30 alqueire de terra e eu disse compadre eu queria mudar de casa e queria trabalhar mas trabalhar junto eu pago renda da terra e deu um lugar de casa eu comprei uma madeira e fizemos um ranchinho e comecei a trabalhar No primeiro ano eu plantei eu fiz 8 mil de milho plantei em sociedade pagando renda e ainda deu um bom ano pra mim e foi muito bom aquele dinheiro Mas pra mim o sr Imagine que pra mim poder casar eu tive que vender uma terra que meu pai deixou de herança Eu tive que vender aquela minha terra porque outro jeito não tinha Então até tinha gente que falava mas fulano tem que vender a terra dele meu Deus do céu no tempo de comprar mais vai vender a que tem Outro jeito não tinha E aí eu fiquei trabalhando com meu compadre lá uns dois anos e daí o meu sogro mudou de lá desse lugar e veio aqui pra perto duma capela chamada São Luiz na beira do asfalto E era tinha mais ou menos uns 20 quilômetros de distância Então ele comprou uma moradia muito boa menos terra mas a casa muito boa Mas ai eu cheguei por ali e eu pedi pra um parente dele que também tinha bastante terra e parente da minha mulher pra me arrendar um pedacinho de terra pra mim plantar e que tivesse um rancho pra mim morar e ele foi muito pronto e disse tem uma casinha ali o terreno era grande vamos lá olhar as casinha se te servir pode vir que terra pra plantar aqui tem bastante Daí então mudamos pra lá mais pra perto de onde estava o sogro Daí naquele ano no que deu 8 mil de milho já deu pra comprar muita coisa pra casa Deu um dinheirinho deu pra comprar garfo colher faca muita coisa E a mulher tinha um pouquinho de gado vaca de leite já criamos um bocado de porco e galinha e já foi melhorando a vida né E daí trabalhei mais 2 anos com esse homem e daí eu comprei um pedaço de terra na divisa da terra do meu sogro Eu achei melhor fazer outro rancho ali e morar no que era meu Então dali pra frente toda a vida fiquei morando sempre no que era meu Não dependi mais de pedir lugar pra outras pessoas Eu fui comprando era uns órfãos eles tinham uma parte de terra de 11 hectares então eu fui comprando de um em um aquela parte de terra e pagando escriturando e depois chegou num ponto que o homem lá tinha o meu sogro trabalhou muito pra esse homem era peão desse homem esse homem era fazendeiro um homem muito bom chamava Franklin Lisboa de Souza Aí chegou seu Franklin e falou olha eu tenho um criado meu que mora ali que até é meu compadre e ele tinha 125 hectares de terra O fazendeiro deu pro criado que era criado desse fazendeiro esse homem que eu falo que era meu compadre Aí eu sei que seu Frankilin trocou com o criado Ele tinha um campo lá mais retirado e tinha um gado lá e ele precisava de quem cuidasse daquele gado Então ele disse fulano 91 eu te dou uma tem 125 eu te dou 25 hectares lá pra você me cuidar aquele gado que eu já estou de idade já tenho gado aqui eu não posso estar lá cuidando e preciso de uma pessoa pra cuidar lá Então se você for pra lá tem tudo tem mangueira tem três casas tem tudo mangueirão muito grande pra fechar porco uma moradia muito boa Aí o criado aceitou E daí então o seu Frankilineu estava meio pobre ainda não tinha muita coisa ai o seu Frankilin ofereceu aquela terra pra vizinhança ali onde tinha o Angelin Lira que já tinha comprado 85 hectare do seu Frankilin na divisa dessa que eu comprei E essa que eu comprei pra esse homem era o principal porque pra ele sair tinha que passar dentro do que era meu Então seu Franklin ofereceu ofereceu 80 mil por 100 mil aquelas 125 hectares de terra e ninguém quis comprar Daí não sei se por intermédio do outro compadre meu chamado Natalino que morava mais adiante ele me indicou Disse ó aí tem um homem muito trabalhador e ele é capaz de lhe comprar essa terra Aí o seu Frankilin veio atrás de mim e falou o fulano quer me comprar esses 125 hectares de terra Eu disse mas eu não posso comprar porque não tenho com o que pagar Eu tenho terra aqui mas é pouca Se eu vender não da a metade do que o sr me pediu Ele me pediu 160 mil Pros outros dava até por cento e pouco pra mim já quase dobrou o preço Mas eu não tenho como comprar eu não posso Não eu te vendo a terra com condição você me paga a terça parte do que você colhe e me dá 80 mil de entrada e o resto eu te dou prazo de um ano Quando você fizer as colheitas daí você me paga Daí fizemos negócio Dai eu vendi aquelas hectares que eu tinha comprado e escriturado pra um cunhado meu por 60 mil e fomos reunindo mais um dinheirinho pra dar os 80 mil e ainda tinha completar 100 mil porque pagava 20 mil de escritura Aí eu fui me virando pegando dinheiro emprestado pra um pra outro e eu tinha mais dinheiro pra receber com letra assinada mas era em mês de julho que ia receber esse dinheiro e ali naquele tempo era o mês de março ou abril que foi feito esse negócio Aí fui lá na casa de um compadre meu que ele sempre tirava bastante dinheiro no banco aonde que eu tinha plantado todos esses anos junto com ele e disse compadre eu queria 20 mil emprestado que eu precisava comprar essa terra comprei essa terra e estou apurado Mas olha compadre eu não tenho Eu tirei na verdade um dinheiro no banco mas tive que comprar 2 pareias de gado e gastei o dinheiro Aí me virei cheguei na casa de um outro compadre meu e falei o fulano eu vou te fazer uma proposta você me arruma 20 conto hoje e te dou 50 daqui trinta dias Edson Nossa bastante Sr Mario Bastante bastante Porque ele era pão duro Ele tinha o dinheiro mas era pão duro Eu te dou a letra assinada aqui eu te dou 50 por 20 Ah ele me arrumou o dinheiro na hora Aí completei um pouco daqui um pouco dali completei os 100 mil Daí esse fazendeiro esse vizinho que tinha par eu trabalhando pra ele minha mulher ajudando bem dizer na casa dele porque a mulher dele era muito doente ele vivia com a mulher no hospital e minha mulher tinha cuidar das crianças nossas e as dele E ele me atraiçoando pra comprar essa terra Quando ele viu que eu ia comprar ele foi e ofereceu 200 mil Ofereceu 200 mil eu digo o meu Deus do céu Aí o fazendeiro ele tinha uma mulher muito danada e a mulher danou brigar com o fazendeiro porque aonde é que se viu perder de vender por esse dinheiro pra vender a terra mal vendida barbaridade e tem que sair fora de vender a terra pra esse homem e vender pro 92 Angelin Lira porque ele tem o dinheiro já comprou um milhão de campo nosso comprou 85 hectares vizinho dele e não pode perder esse negócio Aí o fazendeiro enlocou e daí ele mandou me chamar Mandou me chamar e era um dia de chuva mas chuva rapaz Encilhei o cavalo botei minha capa de chuva mais ou menos duas horas de viagem fui lá na casa dele saber o que ele queria comigo Eh barbaridade agora eu quero tanto de dinheiro senãonão falou que ia desistir do negócio mas ele falou assim ele sustentava o negócio se eu arrumasse todo esse dinheiro dentro de quatro dias Se eu não arrumasse o dinheiro dentro de quatro dias tava desfeito nosso negócio porque nós não tínhamos papel não tínhamos testemunha nem nada Foi feito negócio só nós dois Eu falei tá bom seu Frankilin tá bom Aí chegou na quartafeira eu arrumei o dinheiro e cheguei lá e disse o seu Franklin Eh barbaridade Ele era um homem muito bom Aí eu sei dizer que eu falei Seu Frankilin eu vim aqui lhe falar pro senhor que amanhã vamos fazer a escritura porque o dinheiro está aqui Eh barbaridade onde é que arrumou todo esse dinheiro Você tinha dinheiro guardado Eu disse eu não tinha nada eu não tinha um centavo em casa seu Frankilin Esse dinheiro sabe como eu consegui Eu vendi a minha terra o rapaz ainda foi no banco fez um financiamento no nome do pai dele e tirou o financiamento e me pagou a terra e daí ele pagou o pai dele E uma parte eu me virei e arrumei o dinheiro e ta aqui eu tenho cem conto É 80 da primeira prestação e 20 da escritura Fomos lá na Lagoa Vermelha fazer a escritura o homem pega tinha uma bruaca cheia de escritura ele pegou uma escritura sei lá da onde perdemos viagem o escrivão disse mas essa escritura não é da terra que o senhor vendeu A terra que o senhor vendeu é lá em tal lugar E o polícia era genro dele do fazendeiro e era quem dirigia o jipe do fazendeiro E eu tinha que ir de Ônibus Aí então fica pra semana que vem Eu já desconfiado esse velho está de mancada Mas não tem como agora eu arrumei o dinheiro tudo o que ele pediu está aqui e pra ele sair fora fica ruim E ele me falou depois que ele só não caiu fora do negócio comigo só porque ele tinha contado pros outros fazendeiros que tinha me vendido esta terra Ele falou pra mim senão eu caia fora do negócio Eu não ia deixar de pegar 200 pra vender por 160 Com tudo que era fazendeiro e além de tudo era um homem de idade quem morava com ele era um irmão dele mudo ainda estava com 70 anos de idade naquela época E a mulher dele logo que ele casou ele se separou a mulher era muito ligeira né muito vagabunda e daí se separaram e ele pegou esta outra e esta outra era muito danada muito é por isto que povo fala não confia em ninguém não porque confiou está roubado Porque ele pegou esta mulher esta mulher bebia muita pinga Ela vivia com um barril de pinga no porão da casa e bebia muita pinga e caía e se machucava e ficava mastigando fumo o dia inteiro Nunca vi uma coisa assim Aí o seu Franklin falava seu Mario vem aqui Eu tenho ai uns dois quilômetros de cerca pra arrumar Vem arrumar a cerca pra mim Eu ia lá trabalhava quinze dias e não cobrava nada Arrumando cerca pra ele lavrando a lavoura dele pra plantar com boi ele me dava boi pra amansar pra trabalhar e daí eu trabalhava pra ele de graça porque ele também me ajudava Aí eu sei dizer que vira pra cá vira pra lá essa mulher ficou junto com o Frankilin sempre consultando advogado escondido do seu Frankilin E quando completasse quatorze anos que ela morava junto ela era dona da metade do capital que o fazendeiro tinha No dia que completasse os quatorze anos poderia ir lá no 93 advogado e falar hoje está completando quatorze anos então daí poderia dividir a fazenda e o dinheiro e o gado que ele tem Aí o fazendeiro meu Pai do Céu quando aconteceu isto caiu os braços dele Ele ficou muito triste O que ele falava pra mim assim que aquela fazenda nem por uma bola de ouro ele não dava Aquela fazenda dele ele não vendia de jeito nenhum Tinha outro fazendeiro a par ele lutou pra ver se empurrava uma filha pra esse velho pra ver se matava o velho e ficar com a fazenda Mas o Frankilin não era muito bobo e não quis Foi pegar outra pegou uma cobra Viviam brigando a vida inteira porque ela bebia muito caia ai virava aquela rezinga eu trabalhava chegava lá e estava aquela rezinga entre eles Edson Isto tudo foi lá no Rio Grande do Sul né seu Mario Sr Mario É Edson E quando o senhor veio pra cá Como o senhor achou o lugar aqui Sr Mario Ah quando eu cheguei aqui no Paraná eu vendi esse 5 alqueire de terra e comprei 10 alqueires desse meu compadre que foi o primeiro homem que eu comecei trabalhar depois que eu casei porque nós dividíamos o produto Aí comprei 10 alqueires lá aí fui pra lá Daí de lá que eu vendi e vim pra cá Daí lá pra mim foi muito ruim muito ruim Foi o pior azar que eu tive na minha vida foi comprar aqueles 10 alqueires de terra lá Eu paguei 4 mil por 10 alqueires e vendi aqueles 5 alqueires de terra eu vendi pra um cara lá esse mesmo que estava me atraiçoando eu vendi pra ele por 3 mil Sai de uma de 5 comprando 10 está aumentando vou arriscar ir pra frente né E foi meu erro Comprei esses 10 alqueires de terra mas rapaz eu entrei num monte de cobra desgraçada Desgraçada mesmo e desgraço até hoje Entrei no meio de irmão e irmã e cunhado e conhecido e compadre Ali parece que entrou o capeta no meio Acho que eles lidavam o livro do São Cipriano mas rapaz do céu pelo amor de Deus Eu tinha criação boa eu tinha meu dinheiro que dava pra fazer tudo e sobrar dinheiro mas foi indo e foi o mesmo que bater o sol em cima de uma geada foi derretendo aquilo que sumiu Os meus bois que eu não dava por uma panela de ouro boi tratado no galpão rapaz tratado 2 a 3 anos uma pareia de boi no capricho manso barbaridade e bom e gordo porque eu botava milho no coxo pra aqueles bois de sobrar e depois largava no meio de um aveial e lá eles comiam o tanto que eles queriam E quando ia trabalhar também eu pegava de manhã e chegava em casa meio dia e a tarde tornava trabalhar voltava quando anoitecia e os meus bois eram demais mas de repente morria um boi de repente morria outro de repente morria uma vaca de leite Rejeitando mil reais por uma vaca boa de leite e daqui pra li ela morria Mas olha foi num ponto que eu me desgostei tanto que eu não sabia o que fazia daquela terra pra eu sair de lá E outra coisa atrás desta eu ofereci aquela terra por 8 mil Tinha tudo fiz casa fiz galpão água encanada horta potreiro pra criação galpão pra botar 6 cabeças de gado Oferecia por 8 mil e ninguém comprava Os compradores vinham até uma altura da estrada e voltavam pra trás Lá não sei que capeta que tinha que ali não chegava não dava jeito Eu tive que procurar o centro pra tirar aquele inferno dali pra poder vender Aí quando foi um dia um homem chegou e disse hoje vai vender a terra Óh hoje você vende boi vende vaca vende terra vende porco galinha vende tudo que você quiser Dito e feito De repente chegaram dois homens lá e compraram o paiol cheio 94 de milho Também na mesma hora arrumei o caminhão para a mudança para vim pra cá Porque eu já tinha vindo antes o meus cunhados moravam aqui em Santa Terezinha eu vim antes olhei o lugar e olhei a plantação de hortelã Então a hortelã tinha uma influência meu Deus do Céu olha a planta de hortelã era o mesmo que jogar dinheiro na terra aquilo ali estava juntando dinheiro todo dia Cheguei ali e comprei 3 alqueires de hortelã e paguei Comprei e paguei e fiz um contrato assim com o cara Óh se até tal tempo eu vier aqui você desocupa a casa e se eu não vier fique com odinheiro e a roça Aí quando eu vendi minha terra já mandei avisar pra desocupar a casa porque até tal tempo eu ia chegar com a mudança e ele desocupou Cheguei ali e toquei aquela lavoura de hortelã 3 anos Rapaz mas me deu dinheiro igual água Nunca tinha pegado tanto dinheiro quanto eu fiz com aquela roça de hortelã Eu vendia lambicava a lavoura de hortelã me dava 200 litros de óleo eu vendia por 18 mil aquele óleo de hortelã E foi aonde que de lá comprei aqui pagando muito caro paguei 14 mil Ora vendi lá no Rio Grande a terra nestas condições me deram 3 mil na hora e 5 mil com prazo de um ano sem juros foi como jogar fora Edson Isto foi na década de 1970 Sr Mario Isto mesmo isto mesmo Então foi uma barbaridade um absurdo Pra mim foi umas bordoadas mesmo pra acabar de matar Se não fosse isto se não fosse tanta eu pra mim olha eu não sei nem como lhe dizer que a gente bem dizer de casa e era traiçoeiro Um irmão meu quando morreu pai e minha mãe eu tinha 8 anos e ele ficou de tutor dos órfãos mas aquele homem aquele meu irmão justamente ele devia de ter morrido antes de nascer Edson Ele era muito ruim Sr Mario Não eu ia matar ele Na verdade eu falei que eu ia matar ele eu ia matar ele Mas dai saí da casa dele e nunca mais nem quis saber Até hoje eu me lembro dele e eu tenho raiva dele Porque se eu acho eu que se por exemplo aqui mora o meu pai e ele morreu eu tinha minha casa larguei lá e vim aqui tomei conta Mas eu sou tutor ele ficou de tutor dos órfãos mas ele tomou tudo o que os órfãos tinham e vendeu Vendeu Ele me tirou tudo o que eu tinha ele vendeu Além de eu trabalhar tantos anos pra ele e não ganhar se não um feijão bebido pra me alimentar ele me tomou tudo o que eu tinha ele vendeu Vendeu minhas vacas tudo tudo Ele não vendeu a terra porque também ai era muita coisa Mas carroça tudo o que eu ganhei de herança tudo ele pegou e vendeu tudo E daí teve mais esta As casas onde morava o meu pai aquelas lá eram minhas porque eu era o de menor e era o último da família e aquelas pertenciam pra mim E ele pegou e vendeu tudo Vendeu 5 alqueires de terra e vendeu minhas casa junto pra poder vender melhor as dele ele pegou 10 mil Ele pegou aqueles 10 mil e não deu um centavo pra nós Edson Quantos irmãos o senhor era Sr Mario Oito Edson Tinha que ser divido igual pra todos Sr Mario É Sete e comigo oito Mas quer dizer os outros que era de maior sabiam como era a lei Mas eu com 8 anos vou saber o que E daí eu sei dizer que ele vendeu tudo Na hora de eu sair de Santa Catarina pra vir pro Rio Grande pra ir 95 servir eu tinha uma vaca lá muito boa e ele já tinha vendido aquela também Daí veio os homens procurar a vaca daí o dono da serraria foi delegado muito tempo ele disse não senhor esta vaca é de fulano ninguém leva daqui essa vaca eu dou dinheiro pra ele e essa vaca fica aqui ninguém leva Daí saí da casa dele com um par de chinelos e duas mudinhas de roupa dentro de uma mochila Ele não me deu um centavo pra eu comprar um caramelo pra comer na estrada Nem adeus ele não disse Então esse homem pra mim olhae outra coisa ainda se fosse só isto não era nada Mas e os desaforos que ele fazia pra gente em casa A pessoa estava ali quieta e ele chegava com a tesoura e cortava o cabelo e morria de dar risada Você estava almoçando e de repente ele vinha peidar dentro do prato Mas olha pelo amor de Deus pelo amor de Deus Um homem desse não era pra existir no mundo Mas tanto foi que Deus ajudou que deu câncer na próstata e ele morreu Todos eles éramos em 8 irmãos tem só uma irmã viva Ela já tem 84 anos Edson Mora aqui Sr Mario Mora no Rio Grande Eles vieram passear aqui tudo bem tudo bom mas aquele cunhado pra mim eu também morei na casa dele trabalhei 2 anos e o que ele me deu foi um pano pra uma camisa por 2 anos de serviço Então da minha gente eu sei dizer pro senhor que eu nunca vi na minha vida não pode existir gente de um coração tão desgraçado do jeito que foi pra mim eu nunca vi na minha vida e não quero ver Aí eu fui me virando como eu pude como eu pude como eu pude mas sempre me cuidando porque quando podem me pegar alguma coisa eles pegam mesmo É tinha que me cuidar muito Mas no nome do Nosso Senhor Jesus que tanto me ajudouhoje sinto eu podia estar bem melhor podia estar muito muito muito bem com tudo o que eu trabalhei que segurei era pra ter muita coisa mas não deu porque quando eu queria arrumar uma coisa um ou outro tirava Então aqui ainda comprei 10 hectares paguei 14 milhãoa vista Edson O senhor sempre lidou com a terra Sr Mario Sempre sempre A minha vida foi mexer com terra com as vaquinhas Gosto muito tenho minhas vacas ai Estou comprando milho e tratando das minhas vacas por causa da seca A grama estava ruim comprei bastante adubo e semeei o adubo no pasto pras vacas se alimentarem Edson A terra do senhor aqui é pra onde Sr Mario A minha terra pega esta parte de cima até a parte daqui ela de lá da rua vai lá na casa do alemão lá Aqui ele mediu agora aqui eu não sei se está bem medido porque o cara que me media aqui cada vez que ele media ele tirava um pedaço Era o Ivo que era o dono aqui um tal de Ivo Quadriotto aquele homem roubava até não sei de quem Até o genro dele media junto então media com arame de 10 metros media as datas eu ia na frente e marcava onde dava o arame e daí um metro ou dois antes de chegar ali ele já marcava O genro dele falava fulano você vendeu a terra cara não roube do homem O genro dele mesmo falava pra ele não roube Você vendeu a terra cara pra esse homem está vendida você recebeu foi com o que você se alimentou comprou carro com o dinheiro dele mas não roube do homem Então eu não sei se está certa esta medição Foi marcado por ele Coisa do outro mundo né fazer o que 96 Edson Tem gente que gosta sempre de levar vantagem né A não desvantagem ninguém gosta de levar Mas eu sou uma pessoa feito assim sou pobre não tenho quase nada mas não peço também nada pra ninguém por nada Se eu dever um tostão nem que seja um filho um filho vem aqui trabalha uma hora eu pago Eu quero ver dizer teve isto aí porque eu fui lá e fiz Não senhor tudo eu pago Vivocom o que é meu Eu sou uma pessoa que não devo pecado a Deus de dizer eu logrei esse eu logrei aquele eu tirei um centavo de um ou de outro Me sinto feliz porque não tem ninguém que chegue aqui no Rio Grande ou em Santa Catarina ou lá no Mato Grosso onde eu andei que diga fulano ficou me devendo um real Edson Seu Mario o que o senhor lembra lá da Alvorada do Iguaçu Sr Mario A Alvorada do Iguaçu ela justamente ela era uma vila muito boa Tinha uma serraria lá onde eu comprei essa madeira que até hoje está aqui na minha casa Isto já tem cinquenta anos pra lá Comprei Paguei cinco mil reais pela madeira naquele tempo Então eu sei dizer que a Alvorada eu achava até bom Uma vilinha boa Uma vilinha que dava pra gente ir lá É onde a gente tinha a farmácia pra gente buscar o remédio quando tinha uma criança doente uma coisa eu corria lá E tinha um tal de Bianco que era o dono da farmácia Um homem muito bom mas muito brabo Ele era delegado do lugar Esse Bianco esse Bianco pra mim foi um homem muito bom Muita gente falava de vir que aqui tinha bodega tinha três a quatro bodegas e matavam gente aí pra ver morrer E um homem muito brabo morava bem aqui um tal de baiano todo mundo tinha medo dele Pra mim era meu amigo ele tinha uma loja ali e dizia o seu Mario vem cá olha se precisar de alguma coisa que você não tiver dinheiro já deixo a ordem pra minha mulher que a hora que você precisar é só vir aqui buscar Pra mim foi muito bom Ele foi morto ali com uma punhalada no peito só porque deu um tapa na cara do irmão dum capixaba o capixaba viu o irmão dele muito brabo e matou Cheguei lá ele estava morto Eu falei Cleo era filho do baiano você não viu eles matarem teu pai ali Não eles estavam brincando digo olha ali teu pai morto ali pra fora da escada ali rapaz Ele foi ver ai pegaram ele levaram pra São Miguel foram ver como é que estava mas já fazia meia hora que ele tinha morrido Uma punhalada em cima do coração que ele nem viu como que ele morreu E o cara garrou ali pra baixo foi parar lá pra baixo onde a gente plantava arroz na fazenda num banhadão assim Aí a polícia veio e ter com a outra mulher que ele tinha na paulistana ta lá ainda a mulher desse baiano ainda mora lá na paulistana ela é viva ainda a mulher legítima dele A mulher falou não mataram ele peguem ele e joguem não sei pra onde porque eu não quero que venha velar aqui Ele batia muito nela E pegou outra nova que ele tinha aqui Então a mulher não quis nem saber Desse homem não quero nem saber E falou tanta coisa lá que a polícia falou pro cara que matou ele que se ele tivesse escondido falou pro administrador da fazenda fala pro cara que matou o Baiano que ele venha embora cuidar da família dele que de nós ele está livre Sepultaram o Baiano e ninguém fez nada Edson O homem era ruim então Sr Mario Ele era brabo e o povo tinha medo dele Ele ajustava peão trabalhava pra ele nas lavouras de hortelã de arroz ele tinha um capitalzinho E aí quando era de pagar ele pagava batendo nas pessoas não pagava 97 E essa farmácia do Bianco era onde nós nos servíamos de remédio E o Bianco era o delegado do lugar Edson Eu acho que ele era pai o filho dele também chama Bianco né Sr Mario Sim acho que sim Edson Porque tinha uma farmácia lá na Vila C onde eu morava que ele tomava conta Sr Mario Isso isso ele foi pra Foz Edson Ele tinha uma churrascaria depois Sr Mario Sim eu não sei se o Bianco ainda é vivo Edson Não morreu Mataram ele também esses tempos atrás o filho Sr Mario Mataram Nossa Senhora Porque quando ele morava aqui na Alvorada eu não sei ele tinha encrenca com um paraguaio E daí o paraguaio era dos tal que não tinha medo e veio ali e fizeram um tiroteio pra matar o paraguaio e o paraguaio baleou o filho dele Baleou parece que o Bianco e o filho dele Mas eles mataram o paraguaio Mas o Bianco aqui tinha gente que tinha bolsa de sal destas bolsinhas de sal e tem até hoje cheia de revolver e pistola e tanta arma escondia ai nos mato embaixo das madeiras e fazia travesseiro daquela bolsinha O Bianco vinha aqui de noite e dizia Você conhece fulanoSeiSabe onde que ele dormeSeiEntão vamos lá comigo que eu vou prender ele Ele ia lá prendia o homem só que aquele não voltava mais Mas pra mim então tinha muita gente que me incomodou muito aqui e não sei se eles falavam pro Bianco ou o que O Bianco nuca me incomodou O Bianco falava ó gentetinha um cara aqui o véio o pai e o filho Então eu plantava da rua pra lá 3 alqueire de terra que eu arrendei do dono da terra por quatro anos pagando 30 livre Daí trazia ele vinha morar ali trazia uma galinhada cinquenta a cem galinhas quando meu milho tava crescendo ele soltava aquele bando de galinhas arrasando a roça Aí eu falava pra eles e não adiantava Ele saía puxar madeira com o caminhão e a mulher soltava aquela galinhada morta de fome nossa Senhora Aí eu falava lá com o dono da terra ele vinha ali e dizia eu vendi lote mas eu justamente não vendi pra criar galinha O homem tem a família pra tratar ele trabalhou ele quer colher as plantas dele E daí o filho e o velho que era o sogro desse cara que morava aqui eles começaram a me perseguir Pegaram raiva de mim O velho vinha ali na bodega bebia uns trago e arrancava da faca e ficava bem louco Eu fui lá no Paraguai Tinha uma mulherzinha morena ela vendia arma Eu digo o abençoada quanto é que vale um revolver aíVale seiscentos reais Então me dá um pra cá me dá uma caixa de bala Aí meu cunhado era inspetor entreguei o revolver pro meu cunhado pra outro entreguei a caixa de bala se a polícia me revistar eu não tenho nadaTrouxemos Botei o revolver na minha cintura e disse agora o negócio é comigo mesmo Vamos ver o que é que nós vamos fazer E foi aquelas galinhas barbaridade Meu Deus do céu Nossa Senhora dava uma chuva a mulher soltava aquelas galinhas O jeito que tem é eu vou armar arapuca Vou armar arapuca com umas tábuas ali com uns tocos pode ser que ela segure Eu ia lá montava quatro a cinco tábuas botava 98 quirera embaixo da arapuca mas olha matava galinha que não era mole Botava em cima dos tocos Ele foi lá e trouxe o Bianco O Bianco chegou bem macho aqui Quem é que tinha matado aquelas galinhas O Bianco não me levou pra cadeia aquele dia porque veio o Ivo de lá disse não senhor aqui eu vendi lote aqui mas aqui a terra é minha e eu arrendei o homem tem a família dele pra tratar e o negócio é que essas galinhas eu não vendi lote aqui pra criar galinha Eu também tenho parte nesta plantaMas o Bianco já tinham enchido a cuca dele barbaridade ele veio com espírito de porco E nós íamos nos estranhar com ele Eu também não arredo o pé pra qualquer um não Aí os caras ficaram me perseguindo eu digo eu vou matar vou matar todos os dois Enchi meu revolver de bala botei na cinta e ia trabalhar lá na fazenda do Flávio lá na Santa Luz e passava todos os dias na estrada todo dia pra lá e pra cá eu e a minha família Daí ele é não sei o que não sei o que Eu disse fulano eu não quero briga eu não quero briga Mas o meu suor eu não estou pra derramar suor debalde Tenho minha família pra tratar Eu peço por favor de Deus que segure essas criação tua E veio o Bianco de lá e me perguntou que é que tinha matado as galinhas Eu disse Foi a arapuca e quem é que armou as arapucas eu que armei as arapucas fui eu é porque não sei o queo cara lá arrancou da faca e veio pra cima de mim Eu digo rapaz deixa pra lá que eu te arrumo uma viola Você é bom você e o capeta do teu pai Me ataque na estrada toda hora eu estou pra lá e pra cá me ataca na estrada Aqui não vamos brigar na frente do delegado Me acerte na estrada meu Deus do Céu que nós vamos medir os passos é ali Quando foi um dia de manhã cedo tinha um rapaz que morava aqui Nós trabalhávamos a terra lá em baixo Ele plantava meio alqueire de terra de arroz e eu meio alqueire Então nós fazíamos a terra meio junto com ele porque ele ajudava eu plantar eu ajudava plantar o arroz dele e daquele jeito a gente estava levando E quando foi um dia de manhã eu sai daqui e cheguei ali aonde mora onde hoje é do Carlinho Cereno ali era terra dele eles estavam carpindo mas eles carpiam assim numa rodinha na barranca da estrada O velho com um punhal assim enfiado na frente e o cara aquele com um revolver Eu digo hoje eu vou matar os dois Eu disse pro meu companheiro ó você por favor de Deuseu estava desse ladovocê não chegue pra frente não chegue pra frente que eu vou matar os dois é hoje Já fiquei com meu revolver prevenido Aí quando eu fui chegando como olha como daqui ali que eles fizeram menção de descer a barranca da estrada que eu já levei a mão no revolver pra sapecar um pra não descer a barranca Um eu mato no descer a barranca o outro se correr eu mato ele antes de chegar na casa Aí foi onde que chegou o administrador da fazenda com o carro freou o carro ali e disse seu Mario monte aqui no carro monte aqui Daí eles pegaram a ferramenta e foram embora Daí o Bianco desceu ó o seu Librio e seu Adão eu tenho uma coisa pra falar pra vocês curta e certa o dia que o Mario matar vocês dois eu vou apear pra levar vocês dois mortos mas prender ele eu não vou porque lá na bodega todo domingo vocês estão lá brigando e enchendo a cuca de pinga e o Mario mora lá encostado e eu nunca vi ele lá na bodega ele está em casa cuidando da família dele Nunca vi este homem chegar na bodega todo domingo eu estou lá na bodega lá E faz anos que ele mora ali e justamente nunca vi este homem chegar na bodega nunca vi pedir um trago nunca vi nada Ele está lá na casa dele cuidando da família dele agora vocês vivem fuçando ele O dia que ele matar vocês eu posso ir lá pra juntar vocês mortos mas pra prender ele negativo o Bianco falou E daí 99 tiveram que parar né tiveram que parar porque eles viram que a coisa não ia pra frente né mas razão também não tinha Então aconteceu olha aconteceu tanta coisa aqui que nem é bom lembrar Barbaridade coisa séria Aqui existia muita gente ruim aqui Tinha um pessoal aí Eu acho que tinha umas 600 pessoas mais ou menos frequentavam essas bodegas ai Dia de festa dia de domingo aquele vai e vem aquele alvoroço Jogo de futebol ali na frente que o seu Flávio deu o terreno pra eles fazerem um campo bem grande de futebol mas no fim pra arremata o caso teve que vi o Batalhão de Foz desarmar todo esse pessoal porque era demais Você imagine de vir o Batalhão não era pouca coisa né Se fosse um ou dois ou três a polícia podia dar conta Edson Então morava bastante gente pra cá Sr Mario Muita muita Aí era tudo mato tudo mato tudo mato Aí derrubaram aí Engraçado eles roçaram o mato e botaram fogo E daí o facho não queimou bem o miúdo por causa da sombra da copa das árvores e aí foram derrubar as árvores grandes e daí não queimou e ficou aquela galhada barbaridade Foram plantar hortelã não deu nada Não deu nada porque não tinha como dar Eu plantei hortelã e deu muito mas a minha roça era limpa era limpa tinha só a hortelã e os tocos As madeiras grossas eu mandava cortar e amontoar A galhada eu tirava tudo A lenha que aqui tinha muito Angico eu mandava cortar de motosserra e nós com a família ia juntando e botando em pé a par dos tocos pra depois quando fosse lambicar a hortelã tinha lenha pronta Então o patrão morava lá em Foz ele dizia não esse homem aí eu nunca vi um homem de sorte igual a esse trabalhador porque a hortelã dele toda a vida é o que dá mais Eu deixava madurar a hortelã e os outros cortavam a hortelã verde pra gastar o dinheiro meu Deus do Céu Saíram de lá não tinham dinheiro pra pagar a mudança Todos tinham a lavourinha de hortelã mas ele só viviam dormindo com a cuca cheia de pinga e botavam peão lá na lavoura Eu não botava peão na lavoura eu botava meus filhos minha mulher eu minhas meninas Vamos cortar a hortelã vamos botar peão se vê que precisa eu boto peão eu tenho dinheiro pago pra cortar Tenho meus cunhado a gente troca serviço Então assim nós dávamos conta né E guardando um dinheiro né porque digo uma hora nós saímos daqui e a hora que a gente sair daqui nós temos com o que nos valer pra viver em outro lugar Se não a gente vai sofrer Toda a vida eu pensei foi isso Meus cunhados teve um que hoje está morre e não morre lá no Mato Grosso ele me botou no mato porque ele me falou vamos fez eu vender a lavoura de hortelã vender meu gado que eu tinha bastante gado na fazenda porque o doutor Rubem era o maior amigo meu eu arrumava as cercas lá do pasto e ele dizia ó fulano você pode comprar gado e botar aí no pasto e não tem que pagar pode botar você está cuidando da cerca e gostei de você e gostei do teu serviço Porque eu fincava os palanques desta fundura Os mineiros iam lá com o enxadão davam três enxadãozadae botava o palanque alí e granpeava e a cerca já caía Aí o doutor disse ó te dou terra pra você plantar de graça também Pode roçar aí a quiçaça e plantar milho não te cobro nada Então foi aonde que ele me ajudou Quando eu estava lá com doença também ele não cobrava tão caro Alí o doutor me ajudou demais Aí veio meu cunhado e disse vamos embora daqui porque lá em Rondônia dão terra de graça que não sei o que Dei o dinheiro pra ele pagar a passagem pra ir lá ver e ele vem de lá com mentira que era um lugar bom que não sei o que que não seio que Eu peguei e fui lá ver lá só tem bandido só tem bandido só tem bandido Lá 100 os coitadinhos que iam daqui abençoado do céu que vendiam tudo e levavam o dinheiro ficavam lá na beira da rua debaixo de uma lona esperando Lá tinha os vigaristas então eles combinava ó você é dono dessa propriedade vamos fazer assim eu vou lá e ofereço tua propriedade pra ele que é uma propriedade boa que assim e assim e faço que eu que sou o dono e vou vender a terra pro cara a gente pega o dinheiro e reparte e você não deixa ele entrar aí e ele se lasca Assim meu pai do céu eu vi tanta mulher chorar lá por causa disso É viemos pra cá acabamos debaixo de uma lona serviço não tem dinheiro acabou terra não tem não dão pra ninguém e bandido na rua ia caminhando e um puxava o revolver e matava outro ali a troco de nada Se encontrou atirou matou Eu vi lá com meus olhos daí disseram lá fulano você quer saber bem como é que é Rondônia você vai na missa Você vai numa missa que vem o padre rezar a missa e lá na igreja eles vão contar e você vai saber muita coisa lá E eu fui Cheguei lá rapaz e eles diziam bom dia boa tarde pro padre assim como nós não respeitavam muito o padre também não Daí chegou a hora da confissão rezando a missa chegou a hora da confissão e cada um contava os pecados dele gritado lá mais de cem pessoas Aí era só mulher que falava é mataram meu marido e agora eu estou aqui sofrida com tantos filhos pra dar de comer sem recurso sem ter pra onde ir Mas olha meu Deus do Céu daí que eu acabei de crer como era o negócio não não pelo amor de Deus vou ficar por aqui mesmo aqui ao menos o que comer nós temos Vamos ficar aqui porque lá o que tinha mais que tudo que é bandido que tinha em Foz e Mato Grosso Estavam uma semana telefonando pro Zé que era o motorista do ônibus que vinha de São Miguel aqui então ele morava ali naquela casa ali e ele foi pra Rondônia O Zé falava seu Mario do céu pelo amor de Deus esse é o lugar que o filho chora e mãe não ouve Lá até os irmãos desse Zé mataram Coitado a mulher foi embora com outro e acabaram matando até ele A coisa mais triste do mundo não não não não não pelo amor de Deus Fiquei lá trinta dias eu vi e vim embora e disse mulher pelo amor de Deus o tio Zé ia botar nós na pior do mundo Os parentes me ajudaram desse tipo aí Edson Aí o senhor resolveu ficar então Sr Mario É eu vou dizer que eu não nunca vi nunca vi nunca vi nunca vi nunca vi uma coisa igual uma barbaridade dessa É esses meus cunhados bendizer eu criei eles dentro da minha casa tratando deles O pai de lugar deixou a terra lá eles iam plantar na terra e era dentro da minha casa que eles almoçavam posavam plantavam aquela terra e toda vida ajudei e pra mim ninguém me ajudou nada Ajudou devorar minha vida Edson E a Vila Bananal aqui tinha muita banana ali né Como é que virou Vila Bananal Sr Mario Não de primeiro aqui eu digo pro senhor que virou Vila Bananal porque tinha uns 300 alqueires de banana Porque o Luiz Salasi ele plantava essas terras tudo o que senhor vê aqui era quase tudo cheio de banana que era dele Ele tinha 14 peão fichado aonde que meu filho tocou quase vinte anos trabalhando junto com o Luiz Quando ele saiu ele deu mil reais de acerto E o Luiz está com 80 a 90 alqueires de terra ceifa nova 2 tratores novos morando num prédio lá na frente do Itaipu em São Miguel caminhão diabo a quatro e quem trabalhou pra ele está aqui pobre do mesmo jeito que estava antes 101 Agora esse meu filho que trabalhou ali pra ele lutou muito aqui e o Luiz prometendo não a hora que você sair eu te dou 2 alqueires de terra e não deu nada não deu nada nada nada nada Aí o meu rapaz chegou aqui um dia desanimado disse mãe eu vim avisar vocês que eu estou indo embora Estou indo lá pra Chapesal Vou embora pro Mato Grosso vou experimentar a vida lá Os Maggi pagam bem e eu vou pra lá El botou as mudanças numa bolsinha e pegou a família e botou no ônibus e se mandou Trabalhou mais de 10 anos lá com os Maggi sofreu o que os cachorros deixaram de sofrer mas comprou 2 datas lá na cidade e construiu as casas Estão lá as casas e as datas hoje estão valendo acho que uns 300 mil Mas ele não quer vender E tem 2 datas ali em São Miguel que ele mora ali e tem só um casal de filhos que já são casados Estão bem Mas ele o serviço dele é fazer casa de material Ele tem mais de 100 mil em ferramenta O que tinha lá no Mato Grosso que ele trabalhou lá está lá guardado está lá nas casas dele E as casas estão alugadas ele ganha lá uns 3 mil por mês de aluguel E aqui ele está fazendo uma casa pra um rapaz que ele empreitou pra fazer por 50 mil E ele trabalhou lá na fazenda Lar e lá mesmo meu DeusNossa Senhora do Céu o tanto de galpão que esse homem fez eu acho que dá quase mil metros de galpão que esse homem fez porque lá tem muita tem mais de 2500 cabeças de gado tratadas com a ração E ele quem fez os galpões e fez os tratos pras criação Ele fez de 4 metros de largura e 3 de altura tudo feito de matéria Ele trabalhou muito lá Ele ganhou bastante dinheiro mas é como ele disse eu ganho na verdade bem não posso me queixar mas a ferramenta também que estraga tem que comprar outra não é fácil Então está lutando lutando Todos eles os meus filhos todos eles não tem nenhum mal de vida A mais pobre ainda tem uma casa muito boa em São Miguel Edson Como é que é a relação de vocês aqui com São Miguel e Foz do Iguaçu seu Mario Sr Mario Olha eu digo até a verdade São Miguel eu até sinto eu até sinto morar longe de Foz do Iguaçu sinto Agora aqui em São Miguel pra nós nós estamos aqui obrigados obrigados porque neste canto aqui olha eu precisei eu fui lá na farmácia pegar um remédio esta semana aí por um descuido de nada o ônibus não tinha aluno porque nós sempre ocupamos o ônibus que puxa os alunos é o único transporte que tem Aí o ônibus veio embora e eu tive que pagar setenta reais pro rapaz me trazer aqui O ônibus veio embora e eu me perdi porque fui lá na farmácia atrás de remédio eu fui no posto e tanta coisa e com uma correria danada e a gente corre tanto e arruma tão pouca coisa Olha homem uma coisa que eu reclamo toda a vida venho reclamando e olha eu não sei pra qual santo chamar porque esses bicos de luz da iluminação pública passa três a quatro meses que queima o bico e vira uma escuridão desgraçado e ninguém arruma Vou lá em São Miguel lá na Copel ah não tem que ir lá na prefeitura vai lá na prefeitura e eles dizem que tem que ir lá na Copel e ninguém arruma Eles falam assim nós não podemos arrumar porque lá é município de Foz e nós aqui somos de São Miguel então Foz que tem que vir arrumar Agora nem vem de Foz e nem vem de São Miguel e nós estamos aqui pagando e castigados a vida inteira A vida aqui é desse tipo Edson Um empurra para o outro Sr Mario O povo de lá de Foz a cada dez anos aparece um E de São Miguel nenhum porque falam lá é município deles eles que se arrumem O fulano mas 102 olha aqui ó na hora de pagar pois o meu dinheirinho cai aqui Nunca fica um dia atrasado o pagamento da luz que é gastada mas olha arrume eu estou pagando o que não tenho Não vem não adianta Vai se queixar pra quem que não tem ainda viram a cara e dão risada Meu Deus poderoso nós aqui estamos perdidos Na verdade Foz do Iguaçu é uma cidade boa uma cidade de muito recurso não tenho o que queixar de Foz O povo quando vem e faz as coisas mas olha é duro porque não vem ninguém e a gente cansa de pedir e não tem jeito Aqui se torna assim é bem desse jeitinho Edson Uma coisa que eu observei não sei se é assim na última vez que eu vim aqui ainda tinha as bananas tinha mais casas O pessoal ainda está indo embora daqui Sr Mario Não tá chegando mais gente No tempo de ir embora daqui tá chegando mais gente Porque tem um rapaz ali que cuida mas o povo que chega vai lá e corta os cachos e leva o dono acha ruim e ai ele cortou por isso que ele mandou devorar O dono é bravo é bravo Ele é um homem bom é um homem muito bom é 100 não tenho queixa dele Ele é um homem que quando ele pode ajudar alguém ele ajuda mas ele tem Deus o livre se ele ver botar a mão numa banana que seja ele vai em cima da pessoa Esses tempos vieram uns caras ali e cortaram uns cachos e botaram no carro ele correu atrás até lá perto da paulistana pra alcançar eles fez eles pararem e pagarem pela banana Lá é meu quem manda lá sou eu se vocês tivessem me pedido a banana eu dava mas chegaram e me roubaram Ele teve a coragem de correr e cercar eles na estrada pra cobrar Agora aqui aqui aquiaqui eu vou dizer pro senhor aqui eu vou dizer pro senhor um problema muito brabo Porque aqui eu moro aqui porque eu tenho o meu jaguar ali tá ali atado tá ali eu trato deles tenho bolsa de ração tem tudo ali tem colheita feita eu jogo ali cachorro novo eu trato trato cresce e não engorda mas não é de fome que ele tá assim Eu seguro tudo as minhas criação e dos vizinhos a criação me invade todo dia O Alemão ali tinha dois boizinhos um até foi uma vaca minha que criou que era dele eu comprei dele a vaca tenho aqui tava morrendo também coloca três cabeças de vaca dentro de um piquetinho um cercadinho de nada não tem nem o que comer não dão nada pra comer Aí ele pegou a vaca e levou lá no Calinho a vaca muito boa de leite Deus o livre uma vaca boa eu comprei e digo o Alemão quer vender a vaca eu tenho muita dó dessa vaca ele colocava na soga os carros pegavam na corda da vaca e arrancava os couros tudo assim da vaca quase matava ali na estrada Coitada a vaca amarrada na soga mas ela quer passar para o outro lado da estrada os carros vinham e Nossa Senhora Comprei dele dei uma moto me custava cinco mil a moto dei a moto A vaca tenho aí Ela criou dois bezerros ele solta os bezerros não tem o que comer eles vem aqui e me comem todo o milho que planto pra tratar das minhas eles vem e comem meu pasto pisou a terra eu aviso e ele não faz conta Dei parte na delegacia o delegado puxa o saco dele Fui lá dar parte de novo nem na minha cara não olhou porque ele veio de lá dando tiro com a frobé pegou dentro do meu pasto ali e descarregou a frobé ali E eu passei a mão na minha frobé e digo vou matar ele é agora Quando eu passei a mão na minha frobé que eu corri ali pra matar ele ali ele sumiu Ele sumiu eu digo eu vou matar ele vou matar ele eu mato mesmo agora eu resolvi de matar porque galinha eu planto milho e elas comem tudo então não adianta os bois ele solta e toda hora desaforo e toda hora é esse inferno brabo ia indo pra um ponto que eu não aguento mais então nós vamos dividir na bala Aí eu chamei o fulano você é o bom da boca vem cá vamos 103 disputar o tiro no meio da estrada aqui Você é macho mesmo você vem pra cá que eu quero te dar um tiro no meio da testa Chamei ele ali mas você pensa que ele veio Você tem 50 capangas eu sou sozinho Mas sou homem não vai atirar atrás do toco não se quer matar um chega de cara a cara seja como eu seja honesto e certo Eu não vou me esconder pra te dar um tiro eu não vou me esconder não e não te dou um só te dou até 50 se for preciso Aí ele tira com as boas não fulano não nãoé rapaz quando eu dei parte dele tive que dar parte dele lá na delegacia em São Miguel porque ele faz todas essas coisas comigo aqui e vai brigar comigo lá na casa do vizinho que não tem nada a ver Ele chegou lá com a caminhoneta e foi brigar comigo O dono da casa ficou com raiva até dele E fulano como é que fulano vem brigar com fulano aqui na minha casa não tenho nada com isso Eu disse Alemão eu não tenho medo de homem eu não tenho medo de você Você tá enganado comigo já vi muita gente morrer nos meus pés não é o primeiro Não tenho medo de homem não sou mais que ninguém mas não menos que ninguém E não estou fuçando briga com ninguém Quando eu falo é porque tenho 50 mil razões Agora se a pessoa quer desfazer e fazer e desfazer e pintar e bordar comigo não vai Comigo a disputa é na bala Aí ele é fulano não tenho nada com você tudo bem tudo bem e vem aqui me pedir favor e podia me emprestar tal coisa essas coisas tudo né A mulher falou olha é melhor parar com isso pelo amor de Deus do céu chega gente aqui faz até vergonha Mas é vergonha mesmo é vergonha e acho que não é só vergonha isto aí é uma coisa muito séria que tá loco entre vizinho vai ficar se matando entre vizinho Um vizinho é pra servir o outro Mas quando pega demais demais demais demais e avisa avisa avisa e o cara não conta não quer saber de nada e quer ser ele o mandão digo ó ali tava um coitado de um velhinho ali morou 30 anos ali então veio a prefeitura de Foz e fez uma meia água pra ele pra ele morar ali e ele ficou doente ele tá lá no asilo lá em Foz Pois agora eles tomaram conta da data fizeram duas casa em cima o velhinho tavivo mas não sabe disto o velhinho tinha mudança e deram fim máquina de lavar roupa ferramenta cachorro bom de caça o velho tinha ele não ia caçar sem os cachorros saiam todo dia A cama dele a prefeitura deu até a cama as coisas dele jogaram tudo na beira da rua lá Tomaram conta de tudo ali e plantaram a data e na frente fizeram duas casas e tem gente morando aí que veio lá do Paraguai Não estou denunciando ninguém mas o que é verdade é verdade Edson Neste momento Seu Mario foi buscar um suco pra me oferecer Deixa eu fazer um pergunta Seu Mario a Itaipu interfere alguma coisa aqui ou não Sr Mario Não Nada nada nada Edson Eles não vem fazer nenhum trabalho assim de acompanhamento pra ver como é que está Sr Mario Nada Nada nada Digo a verdade pro senhor a Itaipu nem é lembrada aqui Eles não vem aqui A itaipunão nunca deu nada nunca fez nada nunca ajudou com nada nunca lembrou do lugar só lembra do lugar eu falo bem a verdade pro senhor e adoro que seja bem gravado que nunca ajudou e nunca lembrou Só lembra do lugar quando tem que levar o dinheiro para lá mas ajudar com alguma coisa não Edson Eu pergunto porque aqui ficou isolado por causa do lago né ficou separado de Foz do Iguaçu 104 Sr Mario É é Edson E Foz do Iguaçu recebe um dinheiro todo mês da Itaipu por causa do lago Sr Mario Meu Deus do céu Nossa Senhora EdsonEntão não vem nada pra cá desse dinheiro Sr Mario Nada nada nada Nem um centavo Agora tem uma vinha muita gente aqui muita gente vinha aqui que nunca ajudou com nada Mas de repente a comunidade que tinha aqui resolveu de fazer essa igreja Vamos fazer a igreja vamos fazer a igreja mas daí naquele tempo uma tal de Tania era uma dona que ela ia lá em Foz e queria ser tudo lá com o prefeito e mandou fazer a igreja muito grande Foi muito material mas no final aconteceu que abandonaram a igreja descoberta estava acabada estava acabada Aí eu falei não vamos tocar isto pra frente e vamos arrumar E ajudando e ajudando Até televisão demos pra botar na rifa pra bem de arrumar um dinheiro pra arrumar a igreja O que nós podíamos fazer nós fizemos Aí foi indo pra um ponto que juntamos os vizinhos um ajudou um pouquinho outro ajudou um pouquinho porque a Tania ela foi uma mulher assim ela saía pedir arrecadação pra ajudar a igreja mas a arrecadação ficava toda pra ela e pra igreja ela não dava nada nada ficava tudo pra ela Até teve um padre missionário que esteve aqui teve as missões não lembro quantos dias ficou parando até na casa da Tania Mas eu sei dizer pro senhor que até o padre se desconjurou Disse essa Tania vai morrer de uma morte muito triste disse ela vai pagar o que faz ela estava brigando com as outras vizinhas ali por causa disto por causa daquilo ela queria saber mais do que todos e queria mandar em tudo A mandona aqui era ela Até o marido dela veio aqui pra me matar o tal de Divo Rossi juntou a cambada de peão dele de bandido dele lá porque ela estava sentada aqui e nós proseando aí ela tinha ido arrecada até o sacrário da igreja deram e ela não deu ficou lá na casa dela não botou na igreja vai daqui vai dali e arrecada tanta coisa mas não aparece nada pra igreja E não sei oque anoiteceu e eu sentado ali onde o senhor está e ela aqui Falei fulana me dá licença mas eu tenho umas criação pra tratar que agora já é noite né então você pode ficar ai à vontade A mulher também estava lidando com a janta mas você pode ficar aí que eu só trato da criação e não tem problema E daí ela foi embora eu não sei o que foi que ela falou pro macho dela e o marido dela não se dá com o irmão que mora ali não estavam se dando Então quando foi umas horas da noite eu ouvi aquele tiroteio de lá e vem dando tiro em frente a igreja e vem dando tiro até aqui e chegou aqui encostou não tinha cerca encostou o carro ali perto da áreaali e arrancava a grama com os pneus do carro e saltou 3 dando tiro ali fora eu ia sair e eu ira morrer que nem um passarinho sem saber porque Daí eu sei dizer que a mulher falou não não vai lá fora que eles te matam Eu podia pegar minha espingardona ali e dar um tiro nele e matar também Mas ficamos nessa Aí ele deu tiro ali e foi ali tinha ali uma bodega ali adiante foram lá e beberam e voltaram e fizeram do mesmo jeito Aí eu não importei Aí tinha o casamento de uma neta minha e a festa era lá no CTG lá em São Miguel Então eu fui na festa lá e um amigo meu me falou eu contei pra ele esse caso não devo nada o pai do Divo é meu maior amigo meu Deus do Céu vizinhamos 30 anos aqui um homem de bom coração um homem bom barbaridade E o Divo fazendo serviço de homem eu não tinha raiva do Divo não briguei com ele não fiz nada pra ele e ele veio pra quere me matar na minha casa Daí o rapaz falou mas pelo amor de Deus você vai e faça queixa no delegado que isso aí é perigoso Eu fui lá e contei 105 pra o delegado e fizeram um papel e me entregaraMas nem atrás de tirar uma arma não vão não vão não se importam não vão E ficou por isto mesmo tenho o papel ai guardado tanto dele quanto do Alemão Daí fui falar com o Monir irmão odisse não tinha muito é um dava 100 outro dava 200 outro dava mais outro dava menos na folha da data o livro da igreja mas daí o marido dela arrancou aquela folha embrulhou assim e disse proMonir jogar fora porque isso aqui não vale nada Aí o Monir como não se adaptava com o irmão ele jogou na lata de lixo né ele pegou aquela folha arrumou bem passou o vapor em cima e guardou um dia se for preciso está aqui A prova como é que está E o resto tenho ali Edson Já viveu muita coisa em seu Mario Sr Mario É dois já vieram pra me matar aqui Ainda não me mataram Agora se completar os 3 eu não sei Edson Espero que não Sr Mario É Edson O senhor está com que idade seu Mario Sr Mario 81 anos vou completar ainda Eu completei 80 anos no dia 06 de novembro Tinha um homem aqui muito meu amigo Até a mulher dele mora lá na segunda casa Então é eu falava pra ele ele estava com 80 anos 83 anos E vinha aqui naquele tempo eu tive venda aqui 14 anos e vinha aqui e dançavam farreavam tomavam cerveja a noite inteira Ele dizia eu não sei como é que pode a pessoa cada uma moda que ele dançava ele tomava uma cerveja e não se embebedava Ele e o filho dele tomavam 5 caixas de cerveja numa noite Nunca vi não sei onde é que cabe essa barbaridade Eu não sei como é que pode uma coisa dessas E ele e a mulher dele vinham aqui os dois tinha que medir assim no copo igual a cerveja porque um não podia tomar parece que uma gota a mais que o outro E bebiam Então daí eu dizia mas seu João meu Deus do céu o senhor com 83 anos com uma natureza dessas o senhor dança o senhor farreia o senhor parece que tem 15 anos Às vezes ele reclamava que sentia uma hérnia reclamava que às ele ia catar milho na roça pra tratar as galinhas os filhos não ajudavam ele tinha buscar uma bolsa de milho lá e trazer aquilo nas costas e aquilo prejudicava muito ele Aí eu dizia é seu fulano você viver 83 anos eu acho eu não chego mas nem pero disso aí você pode agradecer a Deus Uma pessoa com toda essa idade aí e do jeito que o senhor anda está tudo bem e se alimenta também bem isso aí é só por Deus mesmo Agora eu estou com 80 anos e vivo até não bem mas pro tanto que a gente sofreu na vida eu me lembro de tudo que a gente sofreu na vida chega uma hora que o peso vai e acarca Edson Mas o senhor está forte ainda Sr Mario Mas não o que me judia demais e não estou achando remédio é o que eu luto eu gastei 2 mil reais eu estava carpindo ali e o sol estava brabo do jeito que está E eu tomei café tratei das criação fui carpindo o sol foi esquentando e eu fui carpindo e a quiçaça estava alta e eu não me importava não mas de repente eu vi que me senti ruim Me senti ruim cada vez mais cada vez mais eu digo eu vou morrer E vim aqui bem aí Aí eu fui ficando ruim fui ficando ruim até que eu me lembro de dizer mas eu vou morrer é aqui Dali a pouco eu caí faltou isso aqui pra eu bater a cabeça naqueles tijolos ali e tinha chovido estava molhado até ficou o 106 lugar da minha cabeça ali no barro Não vi mais nada a mulher estava lavando roupa lá pra trás dali a pouco eu dei um gemido dei um gemido eu viu que eu não estava carpindo mais lá veio aqui disse alguma coisa aconteceu Quando ela veio aqui eu estava caído ali Daí ela chamou a tia que estava ali na casa chamou a outra lá que estava ali na fazenda do Samek ela veio com o carro e quando eu vi estava lá no hospital mas graças a Deus não foi nada Daí foi feito tudo que é exame foi tirado 9 seringas de sangue cada seringada fazia um exame Daí eu fui num médico lá em Medianeira aquele médico muito bom muito bom Ele disse seu Mario o que está lhe matando é o sol o senhor não pode pegar sol Edson O senhor teve uma insolação Sr Mario ÉEu tenho uma alergia assim nas costas que judia muito me coça muito me arde Alergia do sol já falei com três médicos falei com farmacêutico ali tem o seu Roque em São Miguel que pra mim é o melhor farmacêutico que tem Ele disse seu Mario é alergia alergia Seu eu não for no sol que eu fico meio na sombra ela não me incomoda mas se for no sol de noite eu não durmo Mas começa a incomodar que parece formiga correndo assim que barbaridade é ruim O senhor quer tomar uma coca nós temos aí Edson Não não seu Mario não se preocupa não A gente já está encerrando aí que já consegui bastante coisa Neste momento ele ri abertamente Edson O senhor é uma figura tem muita história pra contar Eu sei que se eu ficar aqui a gente vara a noite Sr Mario Aqui não tem problema aqui nós temos carne tem carne no congelador nós assamos carne nós comemos Aí nós temos de tudo um pouco Edson Que bom Não falta nada Sr Mario É graças a Deus Edson Neste momento ele sai de perto do microfone e fica incompreensível o que ele diz Ele traz uma cuca e me oferece Sr MarioDaí eu peguei e disse pro meu filho o se você trouxer ração ai eu vou tratar da novilha e te dou pra você Eu não quero não quero não quero Daí você vende ou carneia faz lá o que você quiser Daí ele traz a ração e eu estou tratando dela se ele vai vender ou vai carnear eu não sei Edson Até o final do ano então tem um churrasco Sr Mario É A não pode demorar muito porque tem outra vaca que cria né A velha fez muito muito queijo Lá de Medianeira eles vem de lá comprar queijo aqui Compram até o queijo que é feito no dia Essa minha vaca que eu tenho ali ela dá um balde de leite por tirada E ainda criou 2 bezerros ali Essa vaca vale 5 mil reais Edson É bem cuidada então Sr Mario Mas engraçado nós compramos leite Nós temos a vaca de leite e nós compramos leite porque o leite da vaca é muito gordo e me faz mal A gordura do leite que faz mal Então nós compramos leite no mercado e fazemos queijo do leite da vaca Eu pra mim eu estava tirando o leite e tratando dos cachorros Eu misturo 107 na ração o leite ração dos cachorros mas daí não sei diz o meu genro que não era bom que começa a fazer mal pra barriga deles ai eu parei de dar Então deixo ali bonito Chamei o meu filho ali e arrumou que tem os coxo mas tem as borda O coxo tem que estar sempre cheio de água A vaca bebe essa água da caixa ali vai e o coxo está sempre com água Eu trato e corto o pasto e planto o pasto e compro milho e trato das vacas Mas estão gordas uma é gorda mas a que dá de mamar está mais magra Diz o meu genro a vaca que dá de mamar ela não pode engordar muito mesmo acho que devido ao leite que ela dá enfraquece ela Ali eu dou milho pra ela comer Edson Seu Mario eu posso tirar umas fotos Sr Mario Pode pode pode Pode tirar foto Edson Vou tirar uma do senhor inclusive Seu Mario é só o senhor e a sua esposa aqui agora na casa Sr Mario Sim Edson Os filhos estão todos fora Sr Mario É Pode entrar aqui pode tirar foto Neste momento eu entro na casa e seu Mario vai mostrar os cômodos Ele mostra a cozinha os quartos onde ele e sua esposa dormem Estranhamente cada um dorme em um quarto No seu quarto um altar com vários santos católicos a quem ele disse que faz suas orações Na sala uma estante onde apresenta fotos dos filhos e netos No final a esposa chega e participa um pouco da conversa O senhor foi ver a bagunça da criançada aí Edson Não tem bagunça não Está tudo bem ajeitadinho nem tem criançada mais né Sr Mario Não No tempo que tinha criança eu gostava eu gostava Porque meus filhos a gente podia largar qualquer coisa que quisesse e dizer isso aqui você não pega e ficava sossegado porque nada ia mexer Mas os de hoje vou falar a verdade
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Águas para Vida Não para Morte - História dos Movimentos de Atingidos por Barragens
História
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INSTITUTO LATINOAMERICANO DE ARTE CULTURA E HISTÓRIA ILAACH HISTÓRIA AMÉRICA LATINA ITAIPU BINACIONAL ALVORADA DO IGUAÇU E VILA BANANAL DESLOCAMENTO E ISOLAMENTO SOCIAL EDSON ALENCAR FARIAS Foz do Iguaçu 2017 INSTITUTO LATINOAMERICANO DE ARTE CULTURA E HISTÓRIA ILAACH HISTÓRIA AMÉRICA LATINA ITAIPU BINACIONAL ALVORADA DO IGUAÇU E VILA BANANAL DESLOCAMENTO E ISOLAMENTO SOCIAL EDSON ALENCAR FARIAS Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto LatinoAmericano de Arte Cultura e História da Universidade Federal da Integração LatinoAmericana como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em História da América Latina Orientador Prof Dr Gerson Galo Ledezma Meneses Foz do Iguaçu 2017 EDSON ALENCAR FARIAS ITAIPU BINACIONAL ALVORADA DO IGUAÇU E VILA BANANAL DESLOCAMENTO E ISOLAMENTO SOCIAL Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto LatinoAmericano de Arte Cultura e História da Universidade Federal da Integração LatinoAmericana como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em História da AméricaLatina BANCA EXAMINADORA Orientador Prof DrGerson Galo Ledezma Meneses UNILA Profa MestreCleusa Gomes da Silva UNILA Profa Doutora Senilde Alcântara Guanaes UNILA Foz do Iguaçu de de Dedico este trabalho a Deus o Pai a Deus o Filho a Deus o Espírito Santo pela graça e dom da vida AGRADECIMENTOS Em primeiro lugar agradeço ao meu professor orientador por sua paciência para comigo e pela orientação desde o préprojeto até o trabalho final Sua trajetória acadêmica é uma inspiração para mim Muito obrigado Às professoras da banca Cleusa Gomes e Senilde A Guanaes pelas orientações e sugestões pertinentes e pontuais que certamente enriqueceram muito este trabalho Agradeço por terem aceito o desafio de compor esta banca Muito obrigado Aos colegas de curso que partilharam as mesmas angústias e inquietações ao longo da nossa jornada Cada um seguirá seu caminho mas compor a primeira turma do curso de História nos ligará para sempre Em especial agradeço ao Anderson de Oliveira que foi mais do que um colega de curso se tornou um amigo desde o primeiro semestre Esta amizade certamente seguirá para o resto da vida Obrigado por partilhar os momentos bons e maus ao longo do curso sobre o curso e sobre a vida Agradeço o incentivo e se não desisti muitas vezes foi porque você insistiu Obrigado meu amigo Agradeço ao meu irmão Edglay que durante os quatro anos de curso me liberou para estudar fazer os trabalhos sair para compromissos durante o horário de expediente sem nunca cobrar nada por isto Você foi muito importante na minha formação Obrigado meu irmão Agradeço aos meus pais que mesmo à distância me apoiaram e foram fonte de inspiração para minha caminhada Sempre serão meus exemplos para exercer a paciência e a perseverança Obrigado pai e mãe O agradecimento mais que especial vai para minha esposa Natércia meus filhos Vitória e Davi Obrigado por me apoiar durante os anos de estudo durante as horas para os trabalhos e pesquisas Obrigado por estarem ao meu lado e serem minha motivação para querer continuar crescendo Vocês são a razão de tudo isto Muito obrigado O que chamamos de poder do homem sobre a Natureza acaba por ser um poder exercido por alguns homens sobre outros tendo a Natureza como instrumento C S Lewis FARIAS Edson Alencar Itaipu Binacional Alvorada do Iguaçu e Vila Bananal deslocamento e isolamento social 2017 107 páginas Trabalho de Conclusão de Curso História da AméricaLatina Universidade Federal da Integração Latino Americana Foz do Iguaçu 2017 RESUMO A instalação da Usina Hidrelétrica de Itaipu no extremo Oeste do Paraná trouxe uma série de consequências para a região que estava em processo de desenvolvimentoA ocupação da região se deu com base num projeto de nacionalização das regiões fronteiriças e mais efetivamente a partir do movimento que ficou conhecido como a Marcha para o Oeste empreendido pelo presidente Vargas quando diversas empresas colonizadoras atraíram um contingente de colonos gaúchos catarinenses e paranaenses muitos deles de origem europeia para ocupar os espaços considerados vazios Neste trabalho analisamos este processo Apontamos os elementos mais marcantes na formação da região para entender o surgimento do Distrito de Alvorada do Iguaçu na década de 1960 e a sua extinção na década seguinte quando Itaipu foi instalada na região Para isto discutimos os efeitos de Itaipu sobre a região para entender o consequente surgimento da Vila Bananal comunidadeformada a partir do represamento do rio Paraná para a formação do lago de Itaipu que era parte integrante do território de Alvorada do Iguaçu e que acabou deslocada e isolada socialmente Trabalhamos ainda o conceito de Memória e Identidade Cultural para entender como estes sujeitos atuaram nestes processos e como Itaipu tenta apropriarse das memórias individuais e coletivas para escrever a história segundo sua perspectiva Palavraschave ItaipuAlvorada do IguaçuVila Bananal Memória FARIAS Edson Alencar Itaipu Binacional Alvorada do Iguaçu e Vila Bananal deslocamento e isolamento social 2017 107 páginas Trabalho de Conclusão de Curso História da AméricaLatina Universidade Federal da Integração Latino Americana Foz do Iguaçu 2017 RESUMO La instalación de la Usina Hidroeléctrica de Itaipú enel extremo Oeste de Paraná trajo una serie de consecuencias para laregión que estaba en proceso de desarrollo La ocupación de la región se dio con base en un proyecto de nacionalización de las regiones fronterizas y más efectivamente a parir del movimiento que se conoció como la Marcha hacia el Oeste emprendido por el presidente Vargas cuando diversas empresas colonizadoras atrajeron un contingente de colonos gaúchos catarinenses y paranaensesmuchos de ellos de origene uropeo para ocupar los espacios considerados vacíos En este trabajo analizamos este proceso Mencionamos los elementos más importantes en la formación de la región para entender el surgimiento del Distrito de Alvorada del Iguazú en la década de 1960 y su extinción en la década siguiente cuando Itaipú fue instalada en la región Para esto discutimos los efectos de Itaipú sobre la región para entender el consiguiente surgimiento de la Vila Bananal comunidad formado a partir del represamiento del río Paraná para la formación del lago de Itaipú que era parte integrante del territorio de Alvorada do Iguaçu y que acabó desplazada y aislada socialmente Trabajamos todavíael concepto de Memoria e Identidad Cultural para entender cómo estos sujetos actuaron en estos procesos y cómo Itaipú intenta apropiarse de las memorias individuales y colectivas para escribir la historia según su perspectiva Palavraschave Itaipú Alvorada delIguazú Vila Bananal Memoria SUMÁRIO INTRODUÇÃO 10 1ITAIPU EM NOME DO PROGRESSO 16 11 PROBLEMAS SOCIAIS 23 12 DESAPROPIAÇÕES 24 13 O DESASTRE AMBIENTAL E OS INDÍGENAS 30 2ALVORADA DO IGUAÇU CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE 38 21 ENTENDENDO OS PROCESSOS HISTÓRICOS 38 22 MEMÓRIA NA CONSTRUÇÃO DOS SUJEITOS 49 23 ALVORADA DO IGUAÇU VIDA E MORTE 57 3VILA BANANAL DESLOCAMENTO E ISOLAMENTO SOCIAL 72 CONSIDERAÇÕES FINAIS 82 REFERÊNCIAS 86 ANEXOS 88 ANEXO A ENTREVISTA COM MARIO BATISTELLI 88 10 INTRODUÇÃO A construção de uma usina hidrelétrica seja onde for é sempre um processo traumáticoe quanto maior o tamanho da obra tanto maior será o impacto produzido por elaPor isto toda e qualquer resistência ou discurso contrário precisa ser silenciado e toda barreira tirada do caminho Quem visita Itaipu Binacional se impressiona com sua grandiosidade e imponência A imagem que ela vende para o país e para o mundo é de ser uma empresa com profundo compromisso socioambiental Seu slogan A maior geradora de energia limpa e renovável do planeta estampa suas campanhas mas basta um olhar um pouco mais atento ao seu passado e as fissuras no seu concreto começam a aparecer As vozes que se pretendiam silenciadas ainda ecoam e reverberam nos anseios de uma comunidade que foi esquecida mas que resiste deslocada do seu local original por causa da construção da barragem e isolada o bastante para ser ignorada pelo poder público desde então a despeito de sua importância econômica para o município que integra Vila Bananal um pedaço de terra às margens do Lago de Itaipu que pela distância e isolamento a que foi submetida mais parece um braço amputado do município de Foz do Iguaçu Esta comunidade localizada a 50 km de seu domicílio eleitoral é o remanescente do que um dia foi o distrito de Alvorada do Iguaçu que era parte integrante de Foz do Iguaçu Na década de 1970 quando o local fora definido para a instalação de Itaipu Alvorada do Iguaçu já contava com uma infraestrutura em franco desenvolvimento Porém seu crescimento foi interrompido bruscamente com a instalação da hidrelétrica na região Oeste do Paraná A formação posterior do lago da barragem deixaria Alvorada do Iguaçu e outras comunidades debaixo dágua bem como uma vasta área da flora e a fauna local Todo esforço em tentar manter este processo no esquecimento no entanto se desfaz quando a própria natureza resolve falar Em alguns períodos a estiagem na região se acentua causando um esvaziamento no lago de Itaipu revelando aos que desconheciam e recordando aos que se haviam esquecido que outrora uma comunidade fora expulsa de suas terras e que toda uma biodiversidade animal e vegetal ficou debaixo dágua fazendo imergir memórias questionamentos e revelando este processo doloroso para aqueles que vivenciaram tais eventos 11 Foi num destes momentos que pudemos andar por aquelas terras e presenciar in loco as ruínas da antiga Alvorada do Iguaçu Pudemos ver restos de casas objetos de uso pessoal e doméstico e até mesmo o antigo cemitério local expondo este processo recente da história da região Mesmo para quem não vivenciou uma situação semelhante é possível conjecturar enquanto se caminha por entre aqueles resquícios o que pôde ter significado para aquelas pessoas deixar para traz suas casas suas terras seu modo de vida Esforço desnecessário para os que viveram tais processos na pele e que podem vez ou outra pisar novamente aquele chão Para eles adentrar aquelas terras novamente é andar em território estranho e ao mesmo tempo íntimo fazendo vir à tona memórias lembranças dores e sonhos não realizados É nestes sujeitos que este trabalho se fundamenta e encontra sua razão de ser Pois foram eles os primeiros a pagarem o preço do progresso trazido por Itaipu ao Brasil e Paraguai e são eles os últimos a serem beneficiados por este progresso Retirados do seu lugar de origem isolados em um local de difícil acesso e só lembrados quando se faz necessário legitimar a posse das terras ao poder público com vistas no valor econômico que estas trazem ao municípioAs transformações que se observam na paisagem são tão profundas quanto as que se percebem nas relações sociais e econômicas vivenciadas por estes sujeitos Vila Bananal está localizada entre os Municípios de Santa Terezinha de Itaipu e São Miguel do Iguaçu e conta hoje com aproximadamente 150 habitantes A região em questão compõe parte considerável da área rural de Foz do Iguaçu e é responsável por grande parcela dos royalties1 pagos ao Município por Itaipu Dos municípios indenizados por Itaipu Foz do Iguaçu está entre os que mais recebem royalties O curioso é que desse valor pouco para não dizer nadaretorna para a comunidade de Vila Bananal em forma de investimento Este trabalho foi motivado por uma inquietação gerada ao tomarmos conhecimento da situação que estas famílias vivenciam na comunidade cuja rotina diária foi e é afetada diretamente pela construção da usina hidrelétrica de Itaipu A 1Valor pago como indenizaçãoaos municípios que tiveram perda de área produtiva devido à formação da represa de uma hidrelétrica Santa Helena é o município que mais recebe royalties de Itaipu seguida por Foz do Iguaçu São Miguel e outros treze municípios conforme o tamanho da área afetada 12 formação do lago legou estes moradores a um isolamento tão contundente quanto constrangedor As bananas que dão nome à comunidade ocupam uma área cada vez mais reduzida O que se observa então são grandes propriedades rurais espalhadas e um aglomerado de casas próximas umas às outras que corre o risco de desaparecer em um futuro próximo Este trabalho pretende analisar como uma região que sofreu tantos processos traumáticos em um curto período histórico que chegou a estar no centro de uma disputa territorial devido a sua importância econômica acabou esquecida pelo poder público que dela se beneficia O objetivo desta pesquisa é portanto problematizar os efeitos de uma hidrelétrica na vida de pessoas que são subitamente atingidas por elas e que por conta disto precisam deixar seu habitatde forma súbita e arbitrária Neste sentido nos propomos a analisar como se deu o alagamento deslocamento e isolamento de uma comunidade inteira tendo como fonte a narrativa oral de alguns destes sujeitos que viram suas vidas mudarem por conta da chegada de hidrelétrica de Itaipu além da bibliografia sobre a história local Vila Bananal como é chamada atualmente ainda sofre as consequências deste processo por isto a escolha desta comunidade como objeto de estudo Na tentativa de compreender como estas pessoas foram afetadas diretamente faço uso de dois conceitos importantes para a compreensão da história principalmente quando há carência de fontes documentais ou o acesso a elas é restrito como é o caso das comunidades deslocadas em virtude da instalação de uma hidrelétrica embora já existam campos de pesquisas para esta temática O primeiro é a relação História e Memória já que metodologicamente esta pesquisa se fundamenta no campo da História Oral sendo que na coleta da entrevista a memória é o mecanismo com o qual o sujeito se constrói em relação a si mesmo e em relação ao outro O esforço é de perceber o que este passado tem a dizer a estes sujeitos e sobre eles à medida que trazem os elementos que marcaram suas vidas em relação a estes processos Diversos autores respaldam e fundamentam os estudos de Memória no campo historiográfico porém aqui faço uso de dois importantes historiadores Jacques Le Goff com História e Memória e Pierre Nora com Lugares de Memória Com eles pretendo discutir a Memória relacionada ao 13 passado e os lugares como canalizadores desta memória além de tratar a relação entre lembrança e esquecimento na construção do sujeito O segundo conceito trabalhado é a relação entre Identidade e Cultura Esta relação reflete a forma como estes indivíduos se definem na sua subjetividade e em relação ao outro e como o lugar interfere diretamente na formação e compreensão de si mesmoEntender tais conceitos é importante porque estes sujeitos foram deslocados do seu lugar e precisaram estabelecer novas relações com seu passado e com seu presente O fato de estarem tão distantes em relação ao seu local de domicílio e tão próximas a outra localidade permite que estes sujeitos se utilizem de mecanismos onde a identidade se constrói de acordo com a necessidade do momento visando terem suas demandas atendidas pelo poder público Este fenômeno é observável porque a proximidade com o município de São Miguel do Iguaçu força a que as necessidades mais emergenciais sejam supridas ali enquanto que outras mais complexas ou que demandem menos urgência sejam reivindicadas politicamente de seu domicílio eleitoral de onde se pode utilizar do voto entre outros elementos como forma de chamar a atenção para o local Para compreender um pouco da realidade na Vila Bananal foram realizadas visitas em três ocasiões distintas Na primeira oportunidade percorremos a região pelas estradas que cortam as plantações em várias direções e por fim chegamos a um aglomerado de casas que seria o local que concentra a maior quantidade de pessoas da comunidade Ali fomos apresentados a algumas famílias e expomos a intenção de realizar a pesquisa tendo como objeto de estudo a população local Neste dia tomamos conhecimento de quem seria a pessoa mais indicada para a realização da entrevista pois como o morador mais antigo poderia dar bastante detalhes da história da região Esta pessoa seria o Sr Mario Batistelli 80 anos morador na região desde o ano de 1973 Na segunda visita ao local conhecemos pessoalmente o Sr Mario e conversamos com ele brevemente Ele nos recebeu no seu portão e quando dissemos do que se tratava nossa minha visita logo se mostrou prestativo em colaborar De fato ali mesmo ele já narrou algumas histórias do seu cotidiano mas 14 como nossa intenção naquele momento era apenas fazer o primeiro contato e agendar para outro dia não fomos preparados para colher a entrevistaEntão não anotamos nada apenas o ouvimos e solicitamos uma entrevista formal no que ele prontamente atendeu Na terceira visita sim fomos preparados para ouvilo Sem ter ideia de como seria e nem de quanto tempo levaria a entrevista preparamos um roteiro para não nos perdermos e tentarmos tirar do nosso interlocutor aquilo que fosse útil para a pesquisa Porém este roteiro foi logo deixado de lado pois estávamos diante de uma pessoa com muita história para contar e com muita disposição para contálas A entrevista durou quase 2 horas e neste período ele falou dos vários processos que vivenciou dentre os quais sua vinda para a região oeste do Paraná e sua experiência na Vila Bananal onde vive desde que chegou ao local A entrevista consistiu num importante instrumento para entender a realidade local tanto atual quanto histórica e foi utilizada na construção dos argumentos tanto para apoiar outras fontes quanto para criticálas Outro recurso que lançamos mão foi o uso das imagens Elas não estão no trabalho apenas para ilustrar mas como um instrumento para argumentar e contraargumentar os discursos A maioria dos recortes de jornal foram coletados por Cley Scholz e está disponível pelo site httpsbrpinterestcomcleyscholzadeus setequedas São recortes da época em que Itaipu estava em construção especialmente no período final e abordam as questõeschave no processo de construção da usina as expropriações o alagamento o fim de Sete Quedas e seus efeitos sociais e ambientais Algumas foram tiradas do Jornal Nosso Tempo que também acompanhou de perto esta problemática e fez um trabalho de denúncia das práticas abusivas praticadas pela empresa e em nome dela Há também fotografias do nosso acervo pessoal tiradas do que restou de Alvorada do Iguaçu quando o lago de Itaipu baixou seu nível e revelou os escombros que ainda permanecem no local e também da Vila Bananal atualmente Além destas há também algumas ilustrações que mostram a transformação da região antes e depois de Itaipu Por fim algumas imagens atuais do setor policial que mostram como o isolamento tem causados danos à imagem da Vila Bananal 15 No primeiro capítulo trabalhamos a Hidrelétrica de Itaipu Procuramos mostrar os argumentos para sua implantação e seu contexto histórico trazendo a discussão presente na sua própria história narrada em sua página da internet na forma como as palavras Desafio e Progresso definem momentos distintos da empresa e reafirmam sua posição junto à sociedade Procuramos mostrar os efeitos que o empreendimento trouxe para a região no que tange aspectos sociais ambientais e econômicos de como afetou a vida daqueles que tiveram que deixar suas propriedades para dar lugar ao lago da represa Falamos também das lutas do expropriados por melhores preços em suas propriedades e das consequências para as populações indígenas e para a fauna e flora local No segundo capítulo abordamos os processos de ocupação do território e a construção da identidade cultural na região Oeste do Paraná Optamos em fazer um retrospecto histórico mostrando as transformações que a região sofreu com seus fluxos migratórios a construção da relação entre os sujeitos a conformação do outro e a afirmação do protagonismo pioneiro em torno dos colonos atraídos pelas Empresas Colonizadoras Fazemos também uma discussão em torno do uso da memória na construção das identidades e do lugar como catalisador desta memória e como Itaipu tenta apropriarse das memórias individuais e coletivas para calar a voz dos sujeitos ou permitir que estes falem de acordo com sua própria lógica Em seguida tratamos de mostrar como a partir destes processos surge o Distrito de Alvorada do Iguaçu seu contexto social suas lutas no processo de desapropriação e sua extinção com a chegada de Itaipu à região No terceiro e últimos capítulo tratamos sobre a questão da Vila Bananal comunidade cuja origem se dá deste processo de deslocamento e isolamento que Itaipu acabou trazendo para a região Falamos da importância econômicada região para o município de Foz do Iguaçu por conta dos royalties pagos por Itaipu e do fato de ser uma importante área agrícola e pecuária para o município Abordamos também os problemas enfrentados por esta população para ter suas demandas atendidas valendose do Município de Foz do Iguaçu e de São Miguel do Iguaçu além de outras problemáticas ocasionadas por conta do isolamento 16 1 ITAIPU EM NOME DO PROGRESSO Aí está Itaipu a maior hidrelétrica do mundo causadora da maior catástrofe ecológica provocada pelo homem em todos os tempos O Paraná nada ganhou com esse gigante A energia está sobrando os lucros não são nossos Só os prejuízos MAZZAROLLO p31 Foto 1 Anúncio da Eletrobrás publicado dia 5 de novembro de 1982 O Estado do Paraná Fontebrpinterestcomcleyscholzadeussetequedas O Brasil orgulhase do seu potencial energético já instalado e do grande potencial a ser explorado devido a fartura hidrográfica que o país possui Porém o processo de instalação de uma Usina Hidrelétrica é sempre traumático por mais ermo que seja o local escolhido para sua construção Isto porque inevitavelmente este local sofrerá com modificações no meio ambiente que serão irreversíveis Uma parte significativa da flora acabará submersa após o represamento animais serão pegos de surpresa sendo que boa parte deles não terá tempo suficiente para encontrar abrigo O território sofrerá transformações também no que diz respeito a sua paisagem que será modificada drasticamente No entanto quando o local escolhido para uma barragem fica próximo a comunidades já estabelecidas sejam elas urbanas rurais ribeirinhas ou indígenas o impacto gerado se dimensiona 17 sobremaneira trazendo consequências não apenas ambientais mas também socioeconômicas e culturais No Brasil até o ano de 2003 existiam 517 centrais hidrelétricas em operação Este total estava dividido em 139 Usinas Hidrelétrica UHE 230 Pequenas Centrais Hidrelétricas PCH e 148 Centrais Geradoras Hidrelétricas CGH Com esses dados podemos ter uma ideia de quantos rios foram represados para dar conta da demanda destas centrais hidrelétricas Sendo assim muitos territórios por onde serpenteavam rios margeados ora por florestas ora por cidades e campos agropastoris deram lugar a outro tipo de território os Lagos Artificiais KARPINSK 2007 Atualmente de acordo com informações divulgadas pela Rede de Obras2existem 86 projetos de novas hidrelétricas em andamento no Brasil sendo que 17 estão em obras Entre as demais 30 aguardam licenciamento 24 estão em estudos 13 ainda na fase de projeto e duas negociam financiamento Essas iniciativas representam investimentos da ordem de US 25 bilhões Destas a de maior impacto no momento é sem dúvida a de Belo Monte no Pará na região do alto Xingu O projeto arrojado que quando terminado será a quarta maior do mundo em capacidade instalada na verdade não é atual seus primeiros estudos foram iniciados ainda na década de 1960 em paralelo com Itaipu Passou por vários governos e estava engavetado até ser retomado pelo expresidente Luiz Inácio Lula da Silva O impasse atravessou os oito anos de seu governo mas foi sua sucessora Dilma Rousseff quem acabou autorizando o início dos trabalhos no canteiro de obras abaixo de protestos e manifestações dos indígenas e ribeirinhos principais afetados pela obra além de ambientalistas e ONGs Organizações não governamentais das mais diversas vertentes Há um histórico comum a praticamente todas as usinas hidrelétricas construídas eou em construção no país Os problemas são diversos e abarcam questões principalmente ambientais e sociais uma vez que os que sofrem com as hidrelétricas geralmente são os menos favorecidos cuja voz não é ouvida ou é silenciada O caso de Itaipu foi emblemático devido a sua grandeza e contexto histórico em que foi construída A partir de Itaipu inúmeros pesquisadores têm se debruçado e desenvolvido trabalhos científicos com a temática Atingidos por 2A Rede de obras é o mais abrangente e confiável sistema de informações sobre projetos e obras residenciais industriais de edificação e infraestrutura em andamento no Brasil e pode ser acessado pelo site wwwrededeobrascombr 18 Barragens analisando tanto Itaipu e suas problemáticas quanto outras hidrelétricas espalhadas pelo país Para entender o processo que culminou com a construção de Itaipu e que por consequência resultou na remoção das comunidades que estavam no seu caminho contribuindo para o surgimento de Vila Bananal e seu isolamento até chegar a condição em que se encontra atualmente é necessário ter em mente o período histórico em que a mesma foi projetada bem como o processo de formação da região onde ela foi instalada além de entender como a região se inseriu no projeto nacional Isto é importante para perceber quais forças trabalharam a favor de Itaipu e quais agentes se mobilizaram para fazerlhe resistência Na década de 1970 o discurso do progresso era o motor que movia as ações dos governos sulamericanos No caso brasileiro megaprojetos prometiam mudar para sempre o panorama do país A indústria estava aquecida e precisava de fontes energéticas para que o ritmo se mantivesse acelerado Comandado por governos militares e em meio ao clima de otimismo proporcionado pelo tricampeonato conquistado pela seleção brasileira de futebol o país experimentava um notável crescimento econômico e viu na sua abundância hidráulica a opção ideal para fazer frente à escassez de outras fontes energéticas como petróleo ou gás natural Todas estas obras transformaram o Brasil em um grande canteiro de obras em busca do seu desenvolvimento e produção de energia Neste período imensas áreas naturalmente preservadas foram destruídas para a implantação destas obras causando grandes impactos ambientais e sociais Não haviam audiências públicas para a apresentação do empreendimento junto à comunidade e nem incluíam discussões junto à sociedade para mostrar os planos do setor elétrico plano de ação que contemplasse a população afetada e as questões ambientais o que permitiu com total liberdade a construção de grandes obras hidrelétricas como por exemplo Tucuruí Pará NERES 2008 e Itaipu Paraná LIMA 2004 e a partir daí surgiram pressões sociais em vários pontos do Brasil3 Foi com base neste panorama e com o propósito de colocar o país nos trilhos da modernidade que nasce Itaipu empreendimento que desde o início destacavase por tratarse de um projeto audacioso em todos os sentidos Se a história da região oeste do Paraná é marcada por ciclos de desenvolvimento Itaipu 3THAUMATURGO Leila Regina Youssef SIMÕES Silvio Jorge Coelho TRANNIN Isabel Cristina de Barros A construção da usina hidrelétrica de Itaipu e seu impacto sobre a urbanização de Foz do Iguaçu Universidade Estadual Paulista UNESP 19 certamente constituise um marco importante da história recente Porém o mesmo desenvolvimento produziu uma série de mazelas que ainda hoje se fazem sentir A obra teve seu início em 1973 com a assinatura do Tratado de Itaipu pelos então presidentes Emilio Garrastazu Médici Brasil e Alfredo Stroessner Paraguai mas já vinha sendo discutida já na década de 1960 Por este tratado segundo MAZAROLO criavase aempresa Itaipu dandolhe a concessão para explorar durante 50 anos o potencial hidrelétrico do Rio Paraná pertencente aos dois países em forma de condomínio desde e inclusive o Salto de Sete Quedas de Guaíra até a Foz do Rio Iguaçu Pelo Tratado também ficava acordado que a produção da energia seria dividia de forma igual entre os dois países e garantia ao Brasil a preferência pela compra do excedente não utilizado pelo Paraguai a preços competitivos Na página da empresa na internet a história da sua construção é narrada com base em 3 pilares Desafio Humano Desafio Energético e Desafio Diplomático4 Em cada um dos tópicos são mencionados de maneira superficial os Desafios enfrentados e como foram vencidos A história é contada de forma a gerar no visitante virtual o mesmo deslumbramento que se tem quando se visita a obra pessoalmente destacando sua grandeza seus números e o esforço descomunal daqueles que a construíram ao mesmo tempo em que desvia o olhar dos problemas reais que ocorreram e digase de passagem ainda não foram de todo solucionados O termo Desafio muito bem utilizado pelo marketing da empresa mexe com o ímpeto do ser humano de superar barreiras e ir além das próprias forças e neste caso de ir além das forças da natureza já que para que a barragem pudesse ser construída o próprio leito do rio Paraná precisou ser alterado através de um canal de desvio Denota também a necessidade de envolvimento e de união de forças no sentido de buscar soluções Neste sentido toda oposição ou pensamento contrário passa a ser visto com maus olhos especialmente quando anualmente a empresa mostra os números e comemora os recordes de produção de energia Porém a ideia deque não houve oposição ao projeto Itaipu ou que sua relação com os atingidos por ela foi sempre pacífica é um tanto quanto equivocada Houveram sim embates discordâncias e desmandos o que a história oficial tenta suprimir ou tratar como casos isolados e superados 4wwwitaipugovbrnossahistoria 20 Se atualmente a palavra que define a obra é Desafio na época da construção a palavra de ordem era o Progresso A empresa na verdade era o próprio símbolo do progresso o motor que levaria o país a sair do atraso econômico e manteria o país nos trilhos do desenvolvimento tecnológico colocandoo na vanguarda da produção de energia limpa e renovável Porém se Desafio tem a intenção de incluir os sujeitos neste processo de desenvolvimento colocandoos como parte ativa da narrativa já o Progresso por outro lado é avassalador e excludente colocando os sujeitos em situação passiva e sem ação cabendolhes apenas aceitar tal movimento passando por cima de todos os que se encontram em seu caminho pois ele pressupõe um destino inevitável para a nação que não quer ficar no atraso sendo que aqueles que se colocam em oposição estão na verdade indo contra o futuro da própria nação O ano de 1964 marcou no Brasil a ascensão ao poder através de um golpe de Estado de um governo militar no Brasil Estava instalada no país uma ditadura que tinha como uma das suas metas políticas e propagandistas um ideal de progresso desenvolvimento nacional ideais que estavam longe de serem novidades no país mas que nesse período vai se transformar na principal bandeira do regime militar MUCHIUTI ARANHA 2012 Por ser uma empresa binacional e de caráter governamental desde o início Itaipu foi regida com mãos de ferro tanto do lado brasileiro quanto do lado paraguaio tendo à frente militares ou civis indicados por estes já que os dois países viviam debaixo de ditaduras militares O autoritarismo exercido por Itaipu através do Governo Federal e daqueles responsáveis pelas negociações em nome dela era tamanho que nem mesmo Sete Quedas foram poupadas Sete Quedas era um conjunto de cachoeiras localizada na cidade de Guaíra no Oeste do Estado e disputava a atenção turística com as Cataratas do Iguaçu Elas desapareceram durante a formação do lago de Itaipu Tal poder pode ser percebido nas declarações do então DiretorGeral de Itaipu no lado brasileiro o general José Costa Cavalcante que mesmo antes de morrer deu seu nome ao Hospital de Itaipu Hospital Ministro Costa Cavalcante e ao Ginásio de Esportes da cidade Ginásio de Esportes Costa Cavalcante A reportagem intitulada DE ITAIPU À PRESIDÊNCIA que revelava sua intenção em concorrer ao cargo de presidente da república mostra também sua postura politicamente arrogante frente aos acontecimentos e o poder que aquele cargo naquela empresa naquela conjuntura significava MENDONÇA Jornal Ilha Grande O senhor falou que é Itaipu e não o governo que está procedendo às indenizações das benfeitorias que serão 21 alagadas O agricultor terá então a indenização de seus bens Sete Quedas é para o povo de Guaíra um bem econômico que deixará de render no momento em que Itaipu fechar as comportas Que providências estão sendo tomadas para indenizar o povo de Guaíra CAVALCANTI Eu poderia responder mas vamos deixar para Paulo Cunha responder essa pergunta Ele que cuida disso Eu acrescentaria que Sete Quedas existem como uma grande obra de Deus mas que pouco está produzindo Apenas um turismo muito rudimentar Nem de longe comparado ao turismo de Foz do Iguaçu que as Cataratas proporcionam Agora por obra do homem esse recurso de Deus que pouco está rendendo passará a render muito mais para os donos das Sete Quedas que são a União Brasileira e a União Paraguaia Não é Guaíra nem o estado do Paraná o dono de Sete Quedas NOSSO TEMPO Foz do Iguaçu 19815 Foto 2 3 de setembro de 1982 General Figueiredo presidente da República visita Sete Quedas Fonte brpinterestcomcleyscholzadeussetequedas Nas palavras do então presidente João Figueiredo nada mais poderia ser feito para evitar o encobrimento das Sete Quedas Trinta e cinco anos após o seu desaparecimento Itaipu não se reconhece como aquela que causou o fim de uma beleza natural que gerava renda para toda uma região e que era o orgulho de uma 5httpwwwnossotempodigitalcombredicao35pagina9 acessado em 03042017 22 cidade que se desenvolvia com base na sua vocação turística A empresa se coloca na verdade como aquela que deu fim a um litígio entre o Brasil e o Paraguai que disputavam o território onde as quedas se encontravam simplificando a questão da seguinte forma não se pode brigar por algo que não existe mais Lago encobre a área em litígio Oentendimento diplomático abriu caminho para o início dos estudos técnicos A solução proposta por um consórcio de empresas estrangeiras que previa o alagamento de grande parte da área em litígio encerrou a disputa por terras na fronteira Procurase desta forma amenizar a responsabilidade da empresa frente aos problemas gerados a partir da sua imposição para a região ADEUS ÀS SETE QUEDAS BEMVINDA A LUZ O enchimento do reservatório interfere na vida de milhares de pessoas que habitam nas margens do Rio Paraná entre Foz do Iguaçu e Guaíra Os moradores de Foz veem o rio esvaziar a jusante da barragem por causa do fechamento das comportas enquanto Guaíra lamenta o alagamento das Sete Quedas Moradores de Guaíra realizam protestos e artistas prestam homenagem aos saltos que acabam encobertos pelo reservatório Ansiosos por se despedir das Sete Quedas 32 turistas morrem em janeiro de 1982 com a queda de uma passarela sobre o rio Ao longo da faixa de 170 quilômetros submersos entre Foz do Iguaçu e Guaíra 8519 propriedades urbanas e rurais são alagadas na margem brasileira e os donos indenizados O município de Guaíra passa a receber royalties da Itaipu pelo alagamento6 Itaipu constituise na verdade como a imposição de um projeto nacional onde os fins justificam os meios Especialmente na década de 1970 quando o país vivia debaixo de um regime ditatorial essa prática se tornou corriqueira uma vez que a política do medo da censura e da repressão imperava no país Sabendo que até então a região experimentava um crescimento gradativo e sem sobressaltos a chegada de Itaipu representa uma mudança drástica neste sentido onde uma leva de trabalhadoras chegava a todo o momento mudando completamente o panorama da cidade que a recebeu bem como de todo entorno ao rio Paraná tanto do lado brasileiro quanto do lado paraguaio Vale lembrar que a colonização do oeste paranaense já era fruto de outro projeto de desenvolvimento nacional que trouxe para a região grupos de pessoas dispostas a fincar raízes e povoar o local No entanto o primeiro projeto foi pautado muito mais por aspectos culturais e de soberania nacional nacionalizar as regiões fronteiriças que veremos mais detalhadamente à frente enquanto que para o segundo Itaipu estava em jogo questões econômicas dentro de um projeto de poder e desenvolvimento Porém a 6Retirado do site httpswwwitaipugovbrnossahistoria acessado em 05032017 23 empresa acabou contribuindo para gerar transformações tanto culturais quanto territoriais compondo um cenário diverso do que estava se desenhando antes da sua chegada a região A uma população composta na sua maioria por pessoas oriundas dos Estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina entre estes muitos de origem europeia e asiática fluxo migratório experimentado pela região anteriormente agora se unia gentes de diversas regiões do país A colonização anterior explica de certa forma a predominância branca na região que só foi quebrada em partes com o início da construção da usina que trouxe no seu bojo uma leva de gente de pele escura para compor o seu quadro de funcionários Estes por sua vez acabaram ocupando cargos de menor critério técnico e juntamente com os demais funcionários de menor grau de instrução acabaram ficando com o trabalho braçal e pesado e consequentemente de menor remuneração ocupando também na hierarquia habitacional espaços de qualidade inferior Esta hierarquização acabou afetando as relações entre os próprios trabalhadores e também com a sociedade local gerando rivalidade sendo que os níveis eram definidos diretamente pelo bairro em que os funcionários habitavam 11 PROBLEMAS SOCIAIS Foram inúmeros os problemas socais que Itaipu deixou como herança A cidade de Foz do Iguaçu era apenas uma pequena cidade na época com suas peculiaridades e cotidiano definidos de acordo com uma lógica extrativista e agrícola É certo que mais dia menos dia a cidade acabaria tomando forma de cidade desenvolvida com todas as características que uma cidade grande possui haja vista sua vocação turística e o fato de fazer parte de uma região de fronteira No entanto o que se viu com o início das obras de Itaipu foi um crescimento vertiginoso em todos os sentidos e com a mesma velocidade que o progresso chega a essa região inóspita do Brasil chegam também todas as mazelas que o acompanham A violência a miséria favelas desemprego em larga escala especulação imobiliária diferenças sociais acirradas subempregos mercado ilegal o contrabando e as drogas Em contraposição até 1973 quando da instalação do projeto Itaipu havia uma menor discrepância entre as classes sociais da cidade e um maior 24 intercâmbio entre elas provavelmente em função do isolamento em que se encontrava Foz do Iguaçu e devido ao processo de conquista e ocupação daquela região que trouxe em seu bojo culturas distintas que ali foram se plasmar caracterizando assim a economia local Acreditamos que esse contexto contribuiu para que aquelas estruturas subsistissem inalteradas até a instalação da nova ordem representada por Itaipu que será responsável por um redimensionamento das classes sociais da cidade bem como por estabelecer os abismos que detectamos entre elas PENA CATTA P 31 Foz do Iguaçu não estava preparada para absorver tamanho contingente de pessoas que chegavam em busca de fazer a vida à sombra de Itaipu Ainda que Itaipu dispusesse a seus funcionários toda uma estrutura de apoio como habitação escola e saúde o mesmo não acontecia ao restante da população Havia ainda um sem número de pessoas que vinham tentar a sorte e tendo sua entrada em Itaipu negada acabavam perambulando pela cidade ou indo morar em barracos nos arredores da cidade no que viriam a se tornar bairros populares ou até mesmo as futuras favelas tudo isto na esperança de um dia serem absorvidos ao quadro de funcionários de Itaipu Os cortes de funcionários em massa ao final de cada etapa da construção contribuíam para gerar um clima de incertezas entre os funcionários Muitos por haver gastado tudo o que tinham já não contavam com meios de voltar ao seu local de origem depois de serem dispensados pela empresa outros por terem estabelecido vínculos com a cidade e com pessoas uma vez dispensados não queriam deixar a região e preferiram tentar a sorte atuando na construção civil ou migrando para outro ramo profissional Para sobreviver tentavam um emprego na pequena estrutura comercial da cidade que não conseguia absorver tão grande contingente de desempregados que só aumentaria com o passar dos anos Alguns faziam pequenos bicos outros ainda acabavam empurrados para o comercio ilegal ou ainda para a marginalidade E outros acabavam mendigando nas ruas da cidade o que se tornou um problema social e de segurança pública 12 DESAPROPIAÇÕES Quando em novembro de 1982 Itaipu fechou as comportas para a formação do lago da barragem era o ultimato para que todos que estivessem no raio de alcance das águas saíssem Muitos ficaram até o último momento para ver as águas subirem e despedirse de suas propriedades que agora já pertenciam à Itaipu O processo de desapropriações iniciouse no mesmo momento em que as 25 máquinas chegaram ao canteiro de obras com os estudos técnicos as medições de abrangência do futuro lago a catalogação dos imóveis a serem desapropriados e a comunicação aos proprietários A partir daí medo e incertezas se instalaram na região principalmente entre os que seriam atingidos A obra levou sete anos para ser concluída e neste período Itaipu precisou adotar diversas estratégias para consumar as desapropriações Nas terras haviam casos distintos proprietários com escritura em mãos terras com registro em duplicidade posseiros arrendatários e meeiros A propaganda de Itaipu tentava acalmar os ânimos dizendo que todos os casos seriam analisados um a um e que todos seriam indenizados o que na prática foi bem diferente Para tentar amenizar o impacto Itaipu não mediu esforços chegando a utilizar a figura de artistas que contavam com a simpatia do grande público na ocasião como Teixeirinha cantor gaúcho e Lima Duarte ator global Foto 3 Propaganda de Itaipu para acalmar os agricultores expropriados Fonte Arquivo da Prefeitura Municipal de Marechal Cândido Rondon Adaptado de BENTO RIBEIRO Maria de Fátima 2002 26 Na imagem a frieza do concreto ao centro é amenizada pela simpatia do ator que representa um funcionário de Itaipu responsável por fazer a abordagem junto aos donos das propriedadesesquerda e pelo ator Lima Duarte direita No entanto a prática foi bem diferente e logo este discurso se desfez diante da luta que a empresa teria de travar com os expropriados e seus aliados ao longo de toda a construção da mesma Este tipo de discurso denuncia uma estratégia bem articulada onde para a opinião pública se apresenta de forma amigável comprometida com os direitos dos expropriados trazendoos para perto a fim de que se sintam parte integrante do processo de construção não apenas de uma usina hidrelétrica mas do progresso e do futuro da nação e para os expropriados fica a intransigência e as promessas não cumpridasNa verdade a necessidade da campanha já sinaliza que a situação estava fugindo do controle e os focos de levante dos expropriados precisavam ser contidos Você também vai ajudar a construir a Itaipu a maior usina Hidrelétrica do mundo Itaipu vai adquirir as terras por preço justo isto é a indenização vai corresponder não só ao valor da terra nua como também aos dos benefícios que foram agregados a terra como destoca todo o trabalho para tornar a terra mecanizável e todas as benfeitorias existentes Apud MAZZAROLLO p50 A estratégia de Itaipu de isolar os proprietários e fazer negociações individuais e não em grupo para evitar que estes se mobilizassem contra os desmandos da empresa parece demonstrar claramente sua intenção de desarticular qualquer possibilidade de reação Este foi o primeiro de muitos processos pelos quais tiveram que passar os moradores de Alvorada do Iguaçu e das demais comunidades atingidas pela barragem Muitos migraram para outras regiões para outros Estados ou até mesmo para o Paraguai na tentativa de adquirir terras mais baratas já que a especulação imobiliária e agrária levava os preços de terras e de casas às alturas além de que o preço oferecido por Itaipu na compra das propriedades impossibilitava que muitos adquirissem terras ou propriedades na região Aqueles que conseguiram comprar terras nas proximidades ou que não tiveram suas propriedades atingidas diretamente pelo lago se viram isolados e com suas propriedades desvalorizadas pelo esvaziamento da região e pela falta de estrutura necessária para garantir a sustentabilidade econômica e social Antes das terras desaparecerem a região foi tomada por protestos festas de despedidas e eventos religiosos Algumas famílias transportavam além de roupas e utensílios casas inteiras de madeira 27 Lenir Spada 69 anos foi uma das moradoras que teve a vida transformada pelas águas Ela vivia com a família em Alvorada do Iguaçu distrito de Foz do Iguaçu que desapareceu após a criação do reservatório Deixou para trás 11 alqueires de terra um mercado e uma loja Daquela época ela se lembra das pessoas que relutavam sair das casas e dos amigos que partiram para o Mato Grosso A família que foi morar em Santa Terezinha de Itaipu recebeu indenização pelos 11 alqueires de terra Foi difícil Tinha gente que não queria sair lembra7 Outra tática adotada para expulsar os habitantes da área pretendida por Itaipu era espalhar o medo ao declarar que caso a pessoa não aceitasse tal proposta a decisão seria feita via judicial o que acarretaria em custos para o agricultor e a desvalorização de sua propriedade Estas e outras estratégias funcionaram em boa medida o que não quer dizer que não tenha havido resistência por parte dos proprietários Esta resistência se deu muito porque os expropriados se uniram para lutar por seus direitos Auxiliados pela CPT Comissão Pastoral da Terra formada por alguns padres e pastores que de certa forma deram voz aos donos de terras já que Itaipu se recusava a tratar com estes por considerálos incapacitados no tocante a assuntos burocráticos propondo que fossem intermediados por advogados na sua maioria sem escrúpulos e movidos pela ganância Por conta disto muitos expropriados acabaram assinando acordos injustos e se viram completamente sem condições de começar vida nova de forma digna A CPT passou a intermediar os interesses dos afetados juntamente com representantes de cada região tornandose uma pedra no sapato da grande empresa Foi o que de certa forma garantiu algum ganho para os expropriados mas nada que pudesse reparar os prejuízos causados pela obra que iam muito além das terras vendidas a preços baixos Pensa bem com o que vamos receber só poderemos comprar terra no Mato Grosso em Rondônia no Pará ou no Paraguai tudo terra de mato coisa que nós não temos mais condições de enfrentar porque já gastamos nossa vida aqui colonizando esta região E depois uma terra de mato leva anos para ser mecanizada Como faremos então para construir casa E o tempo até produzir a primeira safra Itaipu não conversa não vem discutir conosco só quer impor mas nós vamos fazer reuniões e estudar o problema Se o progresso e o orgulho brasileiro exigem a construção dessa obra nós exigimos justiça Armindo Berger em MAZZAROLLO 2003 p 57 Para ter uma ideia no início do processo de desapropriação Itaipu oferecia Cr16 mil dezesseis mil cruzeiros por alqueire de terra valor ínfimo e questionado desde o início A especulação que se gerou e a falta de escrúpulos de 7httpwwwgazetadopovocombreconomiaespeciaisitaipu30anosusinarefezomapadaregiaooeste 8tbwwaaiyoig2mbijrefca2j2 acessado em 260520107 28 muitos donos de terra da região faziam com que este valor se tornasse ainda mais insignificanteNo entanto a luta dos proprietários e da CPT fez com que este valor fosse aumentado várias vezes Diversas mobilizações acabaram pressionando a empresa a recalcular o valor do alqueire e reajustar No entanto a inflação da economia também fazia com que o preço pago pelas terras perdesse seu valor rapidamente No dia 17 de março de 1881 uma comitiva de expropriados resolveu marchar até o escritório da Itaipu em Foz do Iguaçu Esta primeira marcha dos expropriados ficou conhecida como Trevo da Vergonha e culminou com um acampamento que durou 54 dias no trevo entre a BR 277 e a Avenida Paraná que dava acessoao escritório da empresa em Foz do Iguaçu Nesta ocasião os manifestantes foram recebidos pela polícia militar armada com fuzis baionetas metralhadoras e armas químicas Estes ficaram de prontidão durante todo acampamento dos agricultores Foto 4 Comitiva de expropriados em mobilização recebidos pela Polícia Militar Fonte Jornal Nosso Tempo de 18 a 25031981 Após esta mobilização o preço do alqueire fora ajustado para Cr 650 mil seiscentos e cinquenta mil cruzeiros por alqueire a serem pagos em um prazo de 15 dias após assinado o acordo No entanto as promessas não foram cumpridas e o processo se arrastou por mais um ano o que levou a uma nova mobilização com passeata e acampamento no Trevo da Vergonha Desta vez os agricultores que 29 ainda não haviam recebido a indenização exigiam o pagamento de Cr 1 milhão hum milhão de cruzeiros por alqueire a serem pagos também em um prazo de 15 dias após este novo acordo ser assinado Porém a compensação financeira não era tudo Para muito além da questão da terra de bens móveis ou imóveis estava o apego ao lugar no sentido de pertencimento a uma terra a um povo a uma comunidade Estava presente também toda uma rede de relações culturais afetivas e emocionais estabelecidas com o local de um ideal de comunidade construído entre os colonos que ao chegarem a estas terras precisaram estabelecer entre si aos quais uma indenização financeira não tem o poder de restituir Isto não foi levado em conta por Itaipu Estes colonos chegaram à região com sonhos promessas e expectativas e aqui encontraram outros que partilhavam do mesmo ideal Embora vindos de lugares diferentes estes colonos conseguiam identificarse culturalmente No entanto acabaram encontrando a intransigência e a frieza de Itaipu Os indenizadores e construtores da Itaipu de restos feitos à imagem e semelhança do sistema materialista e do regime despótico a que serviram no Brasil e no Paraguai não eram capazes de ver algo mais além de números cálculos projetos de engenharia pesos e medidas A eles não ocorria que a matemática e a técnica não têm resposta para tudo nem que a ciência e a tecnologia podem ferir o ser humano Às vezes reconheciam o sacrifício que exigiam da população e até admitiam ser impossível um ressarcimento justo que compensasse realmente as perdas impostas A terra a casa o estabelecimento a propriedade organizada para a produção tem um preço relativamente fácil de ser estipulado Mas como dar o preço de valores culturais sociais e afetivos construídos por pessoas famílias e comunidades durante décadas MAZZAROLLO 2003 p 41 O prazo para a retirada das pessoas da área alagada chegava ao fim mas os conflitos estavam longe de se esgotar O quadro era desolador para as famílias ou indivíduos que ainda não haviam tido uma resposta satisfatória para suas reivindicações Entre estes estavam principalmente posseiros e meeiros conforme reportagem do Jornal O Estado do Paraná de 3 de agosto de 1982 O fechamento das comportas para a formação da represa estava prevista para o mês de outubro do mesmo ano Segundo a reportagem estas famílias se recusavam a deixar a região e rumar para o Acre para onde estavam sendo enviados alguns desapropriados A situação nos locais de abrangência do lago era caótica conforme descrito na reportagem 30 A paisagem na área do futuro reservatório lembra o cenário de um filme de terror casas destruídas vilas inteiras abandonadas e cobertas pelo mato Com a aproximação da data prevista para o alagamento tornase cada vez mais comuns na região o trânsito de caminhões de mudança às vezes em cenas absurdas como a do caminhão que leva na carroceria uma casa inteira para um local mais seguro Por fim as águas começaram a subir e não havia mais o que ser feito além de lamentar e ver a paisagem ser transformada da noite para o dia Com ou sem acordo a população precisou deixar o local A recomendação era que todos fossem retirados sob o risco de ficarem ilhados devido a subida rápida das águas A população acompanhou através da imprensa o fechamento das comportas De Itaipu abaixo o rio secou enquanto que de Itaipu acima as águas subiam e aumentavam seu volume a cada dia Levaram 14 dias para que todo o vale do rio Paraná fosse coberto e toda a vegetação se encontrasse debaixo de vários kilômetros de água Começa a corrida para salvar os animais da inundação Foto 514 de outubro de 1982 Rio Paraná começa a sair do seu leito O Estado do Paraná Fonte brpinterestcomcleyscholzadeussetequedas 13 O DESASTRE AMBIENTAL E OS INDÍGENAS Se Itaipu não ouviu e nem atendeu ao apelo das populações locais que tiveram suas vidas alteradas para sempre o que dizer da fauna que foi coberta por densas águas e das inúmeras espécies animais que tiveram seu hábitat inundado do dia para a noite O tratamento dado aos indígenas já acuados pelos processos coloniais anteriores mas que mantinham ainda alguns focos habitacionais na região foi outro ponto problemático já que mais uma vez foram expulsos eacabaram alguns 31 sendo dispersos para outras regiões ou ilhados em uma pequena reserva às margens do lago de Itapu Fotos 6 População recolhendo peixes que tentam escapar do Lago Fonte brpinterestcomcleyscholzadeussetequedas O desequilíbrio causado pela represa deu a sua cara logo de início Na imagem acima vemos os peixes que tentavam escapar do lago e acabaram presos em lagoas formadas pelo relevo o que fez a alegria das comunidades que os pescavam com as próprias mãos Já os que ficaram abaixo da Itaipu acabaram encontrando uma enorme e intransponível barreira de concreto na hora de subir o rio no período da Piracema período em que estes precisam vencer as corredeiras para fazer a desova e garantir a manutenção da espécie Este problema só foi solucionado em partes anos mais tarde quando Itaipu criou o canal da Piracema um canal com corredeiras artificiais fazendo a ligação do Rio Paraná ao Lago de Itaipu através do rio Bela Vista que corta a área da usina Estimase que 80 dos animais foram massacrados e tiveram sua população reduzida drasticamente O período escolhido para o represamento foi 32 totalmente inadequado já que na primavera uma grande quantidade de animais está se reproduzindo Segundo noticiado na época era possível encontrar muitos animais mortos outros sobrevivendo agarradas nos topos das árvores sofrendo de inanição muitas fêmeas grávidas não conseguiram abrigo e uma infinidade de ninhos com ovos ou filhotes indefesos Isto sem contar a quantidade de árvores e vegetação nativa que simplesmente se perdeu para sempre É o que se constata através das declarações do Biólogo Cláudio Araújo do Rio de Janeiro que se ofereceu como voluntário para tentar salvar parte dessa biodiversidade O biólogo carioca Cláudio Araújo esteve na região e ficou estarrecido com os trabalhos da operação MymbaKuera ou seja pegabicho levada em efeito pela Itaipu Binacional durante o enchimento do lago ele constatou que não há condições humanas nem materiais para resgatar com vida a grande maioria dos bichos Muitos passam vários dias agarrados nas copas das árvores vivendo à base dágua que em muitas áreas está contaminada Os que são salvos não são encaminhados para um local adequado e não raro matamse entre si Poucas lanchas poucos homens especializados para coordenar a operação Eles não tomaram conta da loucura que é uma obra colossal como essa Cláudio fez um apelo para os faraós de Itaipu para prolongarem a operação que teve seu encerramento no dia 25 novembro de 1982 mas como sempre eles foram insensíveis como insensíveis foram com os colonos expropriados Colonos que em sua maioria tiveram que morar no Paraguai outros em favelas e outros ainda migraram para o Mato Grosso NOSSO TEMPO 82 56 Os poucos animais que foram recolhidos pelos biólogos e voluntários foram levados para refúgios biológicos tanto do lado brasileiro quanto do lado paraguaio da barragem sendo mantidos ali até estarem em condições de serem devolvidos à natureza mas o desastre natural a que a região foi submetida não tem precedente Quando o governo negociou com Fernando Martinez cacique que representou as tribos na negociação pelas terras que seriam inundadas não levou em conta as necessidades particulares dos indígenas somente ofereceram terras 253 hectares em tese mais que o dobro das que possuíam e um valor em dinheiroMas as questões indígenas implicam outros aspectos muito mais importantes que a terra e o dinheiro Sua tradição com a terra e a natureza que os cerca com o rio com as matas e os animais são mais profundas dos que as que o homem branco estabelece Estava em perigo ali sua percepção com o local e sua identidade enquanto herdeiros desta região remanescentes dos povos originários que já povoaram esta vasta região no passado Seus antepassados estavam 33 enterrados alie muitos dos cemitérios indígenas acabaram submersos pelo lago É possível observar como afirma o Jornal Nosso Tempo as dificuldades enfrentadas pelos indígenas As preocupações com a situação crítica que Itaipu impôs à tribo nos últimos anos somadas as antigas e atual invasão dos brancos perturbam visivelmente a vida do cacique e de sua aldeia NOSSO TEMPO ed 48 p3 O índio continua sofrendo com o passar do tempo com as mudanças que o homem branco impõe e as mudanças vão mutilando e extinguindo a cultura dos indígenas de forma violenta e desordenada A FUNAI como órgão que se intitula protetora do índio pouco fez no início do processo de realocação dos indígenas como afirma MAZZAROLLO De início a FUNAI tentou simplificar as coisas mostrandose mais preocupada em evitar atritos com a Itaipu do que em amparar os índios MAZZAROLLO 2003 p 123 Foto 7 Índios despejados por Itaipu O Estado do Paraná Fonte brpinterestcomcleyscholzadeussetequedas 34 Um laudo realizado por Celio Horst concluiu que as famílias deveriam ser reintegradas a outras tribos a livre escolha dos envolvidos e que a FUNAI acompanhasse o processo de indenização e que o dinheiro fosse utilizado em benefício das famílias A ideologia utilizada pela FUNAI pode ser representada nas palavras de um expresidente da instituição coronel Nobre da Veiga Os índios não têm nada que reagir A terra que possuem é suficiente e vamos convencêlos disso O governo decidiu que não quer mais ampliações de áreas indígenasMAZZAROLLO 2003 p 125 Era esse o pensamento do governo da época e o mesmo se utilizava da máquina ditatorial para fazer valer sua palavra observando que a maioria dos órgãos e instituições públicas era dirigida por militares como no caso aqui a FUNAI e Itaipu A Comissão de Justiça e Paz do Paraná revoltada com o laudo de Celio Horst solicitou um laudo antropológico ao antropólogo Edgar de Assis de Carvalho que concluiu Com mais este ato de vandalismo cultural ferese frontalmente a lei 600173 Estatuto do Índio rompese com os direitos constitucionais nega se o exercício da diversidade a um grupo indígena que se configurou como habitante imemorial da área Que se respeite a história cultural de cada grupo indígena que se imprima significado positivo à auto identificação étnica esses serão os requisitos mínimos senão indispensáveis para que as culturas indígenas em seu conjunto possam exercer suas diversidades no corpo da nação brasileira CARVALHO apud MAZZAROLLO 2003 p125 Não é possível pegar um integrante de uma tribo de um determinado local e colocar em outra tribo e acreditar que o problema estará resolvido pois os costumes podem variar conforme a localização da tribo que podem ter comida língua costumes e organização interna diferente Este é um tipo de categorização equivocada que segue olhar ocidental do indígena desde a invasão ibérica e permanece como se percebe É ingenuidade pensar que por serem índios são todos iguais é generalizar de forma demasiadamente perigosa os costumes e maneiras de viver de um povo 35 Desenho 1 Mapa mostra a presença indígena no passado laranja e na atualidade vermelho Fonte httpapublicaorgosecosdeitaipu Na imagem vemos os locais da região onde já houveram aldeamentos indígenas no passado marcados com a cor laranja e onde atualmente se encontram os aldeamentos Revela como era vasta a presença indígena e como os processos de colonização acabaram por reduzir quase que por completo sua presença no oeste paranaense Itaipu levou os municípios diretamente afetados pelo lago a perderam cerca de 1390 do seu território Como forma de compensação passou a pagar royalties a estes municípios o que não encobre as injustiças cometidas ao longo da sua construção quando o progresso passava por cima dos direitos de qualquer cidadão pouco importava se alguém iria perder suas terras e uma vida toda de trabalho e esforço para deixar suas terras produtivas se os indígenas seriam novamente deslocados e teriam sua área reduzida ou ainda se toda uma biodiversidade animal e vegetal se perderia debaixo dágua Itaipu entrou em operação comercial venda de energia em 1985 mas só em 1991 os municípios e os governos estaduais passaram a ter direito ao benefício graças a criação da Lei dos Royalties que regulamenta o dispositivo constitucional Mensalmente Itaipu deposita no cofre do Tesouro Nacional os royalties para serem distribuídos às partes que a eles tem direito o Estado do Paraná os municípios afetados a Agência Nacional de Energia Elétrica Aneel o Ministério do Meio Ambiente e Amazônia Legal o Ministério de Ciência e Tecnologia o Ministério de Minas e Energia e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico MAZZAROLLO 2003 p 35 36 Acontece que a fome por energia é insaciável e o mesmo discurso continua sendo utilizado com o propósito de justificar a construção de usinas hidrelétricas nos quatro cantos do país Mesmo com leis ambientais mais severas e uma população mais esclarecida e articulada utilizando as redes sociais para denunciar expor desmandos e imposições onde eles acontecem quase que em tempo real estas obras ainda prosperam e têm produzido os mesmos resultados nocivos Para a opinião pública Itaipu era o símbolo do progresso e empreendimento modelo em todos os aspectos Os desvios de conduta os maus tratos as jornadas de trabalho estafantes as indenizações injustas e outras situações nada exemplares ficavam mais a nível local denunciados por aqueles que estavam sentindo na pele tais práticas Vale destacar o papel do Jornal Nosso Tempo8 que em tempos de torturas generalizada foi uma voz a denunciar as práticas abusivas relacionadas à Itaipu e os abusos cometidos pela ditadura militar na região oeste do Paraná especialmente na tríplice fronteira Destacamos os fascículos que compreendem os anos de 1981 a 1982 período crítico e essencial para entender o processo de desapropriação e indenização dos povos prejudicados pela formação do lago de Itaipu e o efeito devastador causado pelos frequentes cortes em massa de pessoal do rol de funcionários de Itaipu O Jornal Nosso Tempo foi um crítico ferrenho de Itaipu e toda sua problemática Em praticamente todas as edições deste período a empresa estava na pauta das discussões na grande maioria das vezes como vilã A empresa representa ainda hoje um marco da engenharia civil sendo reconhecida internacionalmente como uma das 7 Maravilhas da Engenharia Moderna Mas a despeito de toda propaganda positiva que se promova sobre o projeto Itaipu a obra foi responsável direta e indiretamente pelas diversas transformações sociais e ambientais vistas acima sendo que seus efeitos ainda se fazem sentir passados 35 anos desde a formação do seu reservatório no final de 1982 A realidade local jamais foi a mesma após Itaipu e apesar dos inúmeros projetos ambientais e sociais que a empresa desenvolve na região tais como o 8O Jornal Nosso Tempo está quase todo digitalizado e disponível para leitura e análise através do site wwwnossotempodigitalcombr 37 Cultivando Água Boa9 o Canal da Piracema10 além do apoio a eventos e projetos de desenvolvimento social que presta aos municípios que foram atingidas por ela com o intuito de amenizar os problemas que causou Além de todas estas transformações que tratamos acima de forma mais direta Itaipu ocasionou o encobrimento do Distrito de Alvorada do Iguaçu e a sua extinção bem como o surgimento da Vila Bananal processos que abordaremos nos capítulos seguintes de forma mais detalhada 9O Cultivando Água Boa é um programa fundamentado em documentos nacionais e planetários que contempla diversas ações socioambientais relacionadas com a conservação dos recursos naturais e da biodiversidade e com a promoção da qualidade de vida nas comunidades da Bacia Hidrográfica do Paraná 3 região conectada pelos rios e córregos com o reservatório da usina de ItaipuA denominação Cultivando Água Boa com o verbo no gerúndio para denotar um processo contínuo realça a necessidade de que assim como se cultiva o solo para que dê bons frutos a água também precisa de cultivo ou cuidado para se manter abundante e com qualidade httpswwwitaipugovbrmeioambientecultivandoaguaboa 10Canal da Piracema Com 10 km de extensão o Canal da Piracema permite aos peixes migradores chegar às áreas de reprodução e berçários acima da usina no período da piracema a migração reprodutiva e seu retorno no período de outono e inverno quando ocorre a migração trófica para áreas de alimentação A ligação é fundamental para a conservação da biodiversidadeO Canal da Piracema usa um trecho do leito do Rio Bela Vista para vencer o desnível médio de 120 metros existente entre o Rio Paraná e a superfície do reservatório A foz do Rio Bela Vista está a 25 km abaixo da barragemAs corredeiras são intercaladas por lagoas de forma a propiciar um remanso para os peixes que estão subindo em direção ao reservatório Nas lagoas as espécies migradoras ou não podem eventualmente se alimentar e descansar httpswwwitaipugovbrmeioambientecanaldapiracema 38 2ALVORADA DO IGUAÇU CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE Alvorada do Iguaçu foi um pequeno Distrito no extremo Oeste do Paraná fruto de um processo semelhante a muitos outros que se desenvolveram na região a partir da política nacional de ocupação das regiões fronteiriças e os sertõesdo país11 projeto que ficou conhecido como Marcha para o Oeste Porém diferentemente dos demais Distritos que surgiram na mesma época Alvorada do Iguaçu tevecurtaduração sendo sobrepujada por outro projeto de desenvolvimento nacional que trouxe a Hidrelétrica de Itaipupara a região Itaipu foi responsável não apenas pelo fim de Alvorada do Iguaçu mas também por uma série de transformações sociais territoriais e econômicas na região do oeste paranaense A consequência mais direta que liga Itaipu à Alvorada do Iguaçu é a Vila Bananal localizada próximo a São Miguel do Iguaçu e que se constitui nosso objeto de estudo 21 ENTENDENDO OS PROCESSOS HISTÓRICOS Para compreender como a região oeste do Paraná se desenvolveu fazse necessário um breve levantamento dos processos pelos quais a mesma passou A pouca bibliografia que trata da história local acaba de certa forma por sedimentar o senso comum em relação aos fatos e temporalidades que a região sofreu ao longo dos anos Embora haja espaço e seja necessária a intenção deste trabalho não é fazer a crítica a esta bibliografia já escassa mas apenas retirar dela o que for útil para a compreensão dos processos que contribuíram para a formação da região para então entender como Alvorada do Iguaçu Itaipu Binacional e Vila Bananal se inserem dentro destes processos Com base nesta bibliografia a região desenvolveuse a partir de ciclos bem definidos Seu povoamento recente tem relação direta com estes ciclos Segundo relatado em HISTÓRIA DO PARANÁ Séculos XIX e XX de 2012 a região 11Neste sentido sertão foi uma categoria construída primeiramente pelos colonizadores portugueses ao longo do processo de colonização Uma categoria carregada de sentidos negativos que absorveu o significado original conhecido dos lusitanos desde antes de sua chegada ao Brasil espaços vastos desconhecidos longínquos e pouco habitados acrescentandolhe outros semelhantes aos primeiros e derivados destes porém específicos adequados a uma situação histórica particular e única a da conquista e consolidação da colônia brasileira AMADO Rio de Janeiro 1995p 148 39 passou por quatro fases bem distintas antes de Itaipu que contribuíram para o desenvolvimento da região conforme apontado abaixo Podemos dizer que o processo da ocupação da região Oeste ocorreu em quatro etapas A primeira e mais antiga decorre da ocupação pelos índios que se espalhavam também por todo o território do continente sul americano A presença desses grupos indígenas como Xetá Kaingangue Guarani foi notada no processo mais recente da colonização fazendo com que essa população fosse mais uma vez reprimida A segunda fase corresponde à atuação e presença dos padres jesuítas espanhóis que desenvolveram várias reduções missões pelo território Esses aldeamentos indígenas apesar de destruídos na primeira metade do século XVII pelos bandeirantes paulistas conservaram forte a presença espanhola na região A terceira etapa data do período entre 1881 e 1930 que corresponde à introdução do sistema das Obrages entre Foz do Iguaçu e Guaíra cujo objetivo principal era a exploração extrativista da ervamate e da madeira Por último a quarta fase ou a etapa recente aconteceu principalmente pela atuação das empresas colonizadoras que efetivaram a colonização moderna do Oeste paranaense PRIORI Angelo 2012 p 76 As duas últimas etapas vão estar no cerne do povoamento mais expressivo da região responsáveis por trazer um contingente de exploradores argentinos e paraguaios no primeiro momento e no segundo momento colonos oriundos tanto do próprio Estado do Paraná quanto dos Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul principalmente Vale salientar que essa narrativa está presente nos relatos fundadores de boa parte dos municípios circunvizinhos a Foz do Iguaçu já que estes eram parte integrante do mesmo vindo a emanciparse politicamente em processos recentes partilhando portanto de uma história comum até meados do século XX Tornouse município no ano de 1951 tendo desmembrado de seu território inicial os atuais municípios de Matelândia 1960 Medianeira 1960 São Miguel do Iguaçu 1961 e que depois desmembrou de seu território o município de Itaipulândia e Santa Terezinha de Itaipu 1982 Sendo que no ano de 1988 o município era constituído por dois distritos ainda Foz do Iguaçu e Alvorada do Iguaçu permanecendo esta divisão territorial segundo o IBGE até o ano 2001 IBGE 2012Apud RIBEIRO CASSULI FRASSÃO 201212 Nestes relatos ainda é muito presente a ideia de um vazio demográfico na região o que é reafirmado por boa parte da bibliografia e também disseminado nos livros didáticos conforme afirma PRIORI Muito desta construção se deu pela ausência de um projeto de ocupação efetiva em relação às regiões a oeste da 12RIBEIRO Vitor Hugo CASSULI Danieli Cristina FRASSÃO Adair José Frason Território e Conflito Breve histórico sobre a implantação da Usina Hidroelétrica Itaipu Binacional e seus reflexos na produção do espaço 2012 40 Nação Outro fator que corrobora a ideia de vazio segundo o mesmo autor é o não reconhecimento da presença das populações indígenas já que estes não são contados como povo nos projetos civilizatórios e colonizadores Construiuse a concepção de vazio demográfico quase despovoado que deveria ser ocupado pela colonização pioneira Essa ideia teve grandes repercussões entre pesquisadores que analisaram a história da região Historiadores geógrafos sociólogos representantes políticos integrantes de órgãos de colonização eternizaram a visão do vazio demográfico em livros e materiais de divulgação Essa versão repetiuse nos livros didáticos importantes mecanismos de normatização de ideias na época utilizando principalmente termos como sertão terras devolutas mata virgem ou boca do sertão MOTA 2005 Apud PRIORI 2012 p 77 Este não foi um problema local e nem isolado mas uma prática recorrente na bibliografia brasileira e latinoamericana do século passado que coloca os demarcadores da colonização do continente a partir da presença espanhola e portuguesa em 1492 e 1522 respectivamente No caso do Brasil sua expansão é dada aos bandeirantes paulistas que percorreram o país em busca de riquezas levando ao extermínio e a expulsão dos povos indígenas Apesar de aos poucos estar sendo feita a revisão desta bibliografia questionando o enfoque eurocentrado presente na historiografia local estes demarcadores ainda se mostram recorrentes La colonización del Oeste del Paraná entonces no escapa a esa visión eurocentrada del mundo y por lo tanto las comunidades indígenas y negras no serán visibilizadas o entonces solo usadas como trabajadores semiesclavos Hoy em día esos dos segmentos de la sociedade fueron despojados casi todas sus tierras y de sus derechos aqui em el Oeste del Paraná Creemos que el modelo patriarcal se ratifica em esta región com la llegada de colonos viajeros y militares venidos casi que directamente de Europa Estos verán a los nativos como inferiores y serán excluídos por no encontrarse dentro de la categoría de modelo de sociedade judeocristiano Suvisión de mundo será casi idéntica a la de los europeos la percepción de tiempo de historia relacionada al pasado al presente y al futuro pues todos desde 1492 y en la misma región europea percibirán esas categorías por medio de lavisión bíblica de la idea de progreso de la era industrial y de las visiones ligadas al darwinismo al positivismo entre otras corrientes base de la percepción evolutiva de la raza y de la cultura LEDEZMA MENESES G G 2014 Seguindo esta lógica a colonização do Oeste paranaense é contada a partir da passagem do espanhol Alvar Nuñes Cabeza de Vaca e sua comitiva com uma breve passagem pela região e o registro da sua visão das Cataratas do Iguaçu Depois disto um salto para 1889 quando foi fundada a primeira colônia Militar na foz do rio Iguaçu dando início ao povoamento da região Porém o vazio sugerido por esta lacuna não existiu de fato A presença humana foi frequente e intensa na 41 região fosse pela presença indígena argentina ou paraguaia Vale lembrar que a anexação do território que hoje compõe o Estado do Paraná sobretudo a região oeste permaneceu sob o domínio espanhol durante muito tempo e mesmo depois de anexada ao Brasil havia muita dificuldade para que a língua portuguesa se tornasse a língua falada na região e assim o território passou longos anos já sob o domínio brasileiro mas com predominância espanhola e guarani O Brasil já tinha o domínio de sua fronteira mas não da língua O historiador paranaense Ruy Wachowicz revela em seu livro A história do Paraná intrigante depoimento de uma cozinheira na década de 1930 Recenseada na época a cozinheira não pensou duas vezes e tascou um Soy brasileña graças a Dios aos pesquisadores MACIEL 2013 Isto fez com que a ocupação brasileira de fato demorasse a chegar a estas terras deixandoas livre para a exploração estrangeira o que durou até as primeiras décadas do século XX especialmente com a exploração de ervamate e extração de madeira por empresas estrangeiras algumas por concessão outras de forma clandestina Durante este período o sistema de trabalho empregado na região era através das obrages13 onde empresas que exploravam a região de Santa Catarina até o Mato Grosso do Sul utilizavam como mão de obra os mensus14 indígenas civilizados e paraguaios que conheciam bem a região e a vegetação local de interesse comercial Segundo RUI WHACHOWICZ que trabalha esta temática no livro Obrageros mensus e colonos história do oeste paranaense tais empreendimentos funcionaramcomo dupla via de colonização em primeiro lugar porque trouxeram pessoas dispostas a trabalhar e a desbravar a região explorando a madeira e a ervamate segundo porque este movimento atraiu o olhar da Nação para o que estava acontecendo na ausência de um projeto de colonização mais efetivo que deixava as fronteiras à mercê de interesses estrangeiros um risco para o futuro do país Darcy Ribeiro constata que após a destruição das missões jesuíticas no século XVII pelos bandeirantes paulistas uma parte das tribos guarani que 13O desenvolvimento das Obrages foi facilitado porque o governoimperial em meados do século XVIII havia assinado um acordo de navegação com a Argentina e com o Paraguai Esse documentogarantiu o acesso à província do Mato Grosso com entrada pela foz do rio da Prata até o rio Paraná Na outra parte do acordo a Argentinatinha assegurado o direito de navegar pelo rio da Prata desde o Iguaçuaté a distância das Sete Quedas Essas resoluções tornaram propícia à atividade de contrabando da ervamate muito consumida pelapopulação platina e da madeira que além de utilizada pelos argentinosera também exportada para o Canadá e Estados Unidos COLODEL2008 Apud PRIORI Angelo 2012 14geralmente paraguaios argentinos e guaranis modernos termo empregado aos índios guaranis miscigenadosno Paraguai PRIORI Angelo 2012 p 79 42 estavam aldeadas nas missões miscigenaramse com a população rural do Paraguai Seus descendentes são os guaranis modernos É esse guarani moderno que os produtores de erva mate argentinos utilizavam a partir de meados do século XIX para penetrar cada vez mais a fundo em território brasileiro no vale do Uruguai em demanda da erva mate negócio rendoso naquelas paragens WACHOWICZ 1987 p 17 Neste processo de colonização que a região já vinha sofrendo desde o final do século XIX com a criação da Colônia Militar na foz do rio Iguaçu a região esboçou poucas mudanças significativas durante os primeiros anos Seu crescimento se dava lentamente sendo que somente em 1914 aaté então Vila Iguaçu passa a ser município recebendo o nome de Foz do Iguaçu Seu desenvolvimento a partir daí seguiu ritmo ascendente e gradativo O isolamento gerado pela dificuldade de acesso por via terrestre era contornado pelo uso do rio Paraná que fazia a ligação com outras localidades tanto rio acima quanto rio abaixo Por conta deste isolamento com o restante do estado e consequentemente do país a região se tornou um mundo à parte De fato era como se esta região não pertencesse à nação Mesmo com a instalação da colônia e a abertura da estrada entre Foz do Iguaçu e Guarapuava e a partir desta com outras regiões uma viagem da capital Curitiba para a fronteira era uma verdadeira aventura tão cara dispendiosa e demorada quanto perigosa As vias de acesso em dias chuvosos ficavam intransitáveis Isto fez com que segundo WACHOWICZ a região ficasse de costas para o restante do país Neste sentido o rio Paraná permaneceu por muito tempo com a principal via para o transporte de pessoas bem como para o escoamento de mercadorias e a aquisição de bens de consumo O mesmo rio que mais tarde abrigaria a hidrelétrica de Itaipu já mostrava ali a sua importância Era muito mais prático transitar pelo rio Paraná e descer até Buenos Aires e Montevidéu e por ali contornar a costa brasileira para chegar aos grandes centros do que ariscarse atravessando o estado por estradas pouco transitáveis O caminho inverso também era o escolhido pela grande maioria que queria chegar à região oeste ou mesmo para subir rumo à região norte do país As Cataratas do Iguaçu já começavam e ficar conhecidas através de turistas estrangeiros que chegavam pela Argentina e mencionavam em seus relatos a exuberância da natureza por estas bandas ea partir daí o rio Iguaçu também começa a ganhar importância econômica no cenário local De forma incontestável os rios Paraná e Iguaçu contribuíram para atrair a atenção e interesse nacional para 43 esta região Claro não podemos negar o fato de que o interesse em guardar suas fronteiras especialmente em uma área onde três países se encontram teve também papel importante nas decisões governamentais em expandir sua área de influência e ocupação territorial Mas também não podemos negar que a entrada indiscriminada de estrangeiros fazendo uso comercial dos recursos naturais da União tenha exercido forte influência nesta decisão Desta forma impedir que o outro tomasse posse destas terras era tão importante quanto ocupálas Sendo assim não fosse pela intromissão estrangeira talvez ainda demorasse um pouco mais até que a nação estendesse seus braços nesta direção Mas foi somente em 1943 que um projeto de ocupação mais direto foi implementado A iniciativa partiu do então presidente Getúlio Vargas através do DecretoLei nº 5812 de 13 de setembro de 1943 que criava o Território Nacional do Iguaçu entre outros territórios nas demais regiões de fronteira dentro da política de nacionalização das fronteiras O Território do Iguaçu compreendia as regiões oeste e sudoeste do Paraná e oeste de Santa Catarina LOPES 2004 O projeto ficou conhecido como Marcha para o Oeste numa clara alusão à iniciativa norte americana que motivou a ocupação do oeste do continente Desta forma abriuse espaço para que empresas colonizadoras atuassem na região comercializando lotes e propriedades com objetivo de fomentar a pequena propriedade Para Sérgio Lopes15 estudioso do assunto a Marcha para o Oeste consistiu na tentativa de despertar no povo o sentimento de brasilidade e de disposição para ocupar os espaços considerados vazios do território brasileiro O papel das Colonizadoras foi determinante para conformação dos espaços geográficos tal como vemos atualmente Dentre as empresas colonizadoras a que talvez tenha desempenhado papel mais relevante tenha sido a Colônia Agrícola Nacional General Osório CANGO de caráter governamental Foi criada por Vargas em 1943 momentos antes da criação do Território do Iguaçu16 o 15LOPES Sérgio O Território do Iguaçu no contexto da Marcha para oeste CascavelEdunioeste 2002 16O escasso povoamento de algumas regiões fronteiriças representa de longo tempo motivo de preocupação para os brasileiros Daí a ideia de transformálas em Territórios Nacionais sob a direta administração do Governo Federal Era essa uma antiga aspiração política de evidente alcance patriótico principalmente dos militares que possuem aguda sensibilidade em relação aos assuntos capazes de afetar a integridade da Pátria e o sentido mais objetivo dos problemas atinentes à defesa nacional A criação dos territórios fronteiriços nas zonas colindantes sic e de população esparsa 44 que demonstra que as ações eram bem articuladas Além desta outros empreendimentos colonizadores se instalaram na região com o propósito de povoar e explorar suas potencialidades como a Industrial Madeireira Colonizadora Rio Paraná SA MARIPÁ criada em 1946 Foi a partir da implantação desta política e com o trabalho desempenhado pelas Colonizadoras que a região começou a mudar de forma mais expressiva Mesmo em meio às dificuldades de acesso um grande contingente de pessoas oriundas do Rio Grande do Sul Santa Catarina e Paraná começaram a chegar à região atraídas pelas empresas colonizadoras com propostas de terras baratas e produtivas e a possibilidade de iniciar nova vida Boa parte desta imigração era proveniente do Rio Grande do SulEstado de origem do próprio Getúlio Vargas e dentre eles estavam também imigrantes alemães italianos poloneses entre outros Às famílias que se tornariam migrantes chegavam informações estimulantes sobre as terras do Oeste do Paraná Cartas de parentes propagandas de venda de terra e relatos de viajantes contribuíram para a elaboração de um imaginário em relação à região Expressões como paraíso terrestre uma nova pátria e terra prometida fascinaram e mobilizaram as pessoas para que empreendessem mudança por um pedaço de chão SCHREINER 2013 Muitos dos que subiram para a região eram imigrantes estrangeiros que já estavam no Brasil Estranhamente estes foram os mais bem cotados para fazer parte do projeto de nacionalização das fronteiras Ora se a ideia segundo próprio Vargas era fomentar o nacionalismo através da ocupação dos espaços por parte de brasileiros ter um grande contingente de estrangeiros entre os colonos parece apontar para outra direção O que se percebe é uma clara distinção e criteriosa escolha de um padrão cultural para desenvolver a região com traços comuns de forma que o Oeste do Paraná pudesse compor juntamente como as demais regiões do Paraná Santa Catarina e Rio Grande do Sul uma mesma identidade étnica e cultural deve ser considerada por isso medida elementar de fortalecimento político e econômico O programa de organização e desenvolvimento desses Territórios resumese em poucas palavras sanear educar povoar Eis a finalidade da criação dos Territórios Nacionais A história dos povos está ligada à sua geografia Segundo a distinção dos sociólogos a geografia estuda a organização dos povos em sua forma estática e a geopolítica a dinâmica de sua evolução É o destino dos povos plasmado pela energia criadora dos homens E a nossa Marcha para Oeste significa precisamente uma das formas de manifestação desse destino VARGAS sd Apud LOPES Sérgio 2002 45 No processo de se construir uma identidade para uma região estado ou nação fazse necessário delimitar quem são os sujeitos a quem se quer dar o protagonismo na narrativa da história ou seja quem serão os colonos ou pioneiros no processo civilizatório Naturalmente à medida que se delimita quem são os detentores da narrativa determinase também quem são os outros que pela lógica estariam de fora deste projeto ou serviriam apenas como coadjuvantes nesta narrativa Neste sentido quando vemos as empresas colonizadoras dando preferência para colonos provenientes do Rio Grande do Sul e Santa Catarina em outras palavras se está afirmando que os protagonistas da colonização seriam pessoas de cor branca oriundas da região sul e de preferência de origem ou descendência europeia que traziam no seu bojo a capacidade civilizatória e colonizadora Nesta perspectiva priorizaram a venda dos lotes para colonos descendentes de europeus imigrantes do século XIX do Rio Grande do Sul de Santa Catarina e do Paraná A Colonizadora Maripá em seu plano de colonização manifesta claramente qual o tipo humano escolhido para a comercialização das terras e constituição de comunidades o descendente de imigrantes italianos e alemães de mão de obra esmerada de maior valor produtivo primado pela sua operosidade e pelo seu amor à terra em que trabalha SCHREINER 2013 Ora se este lugar já era habitado e possuía portanto seu mitofundador seria necessário apagar esta história anterior para escrever uma nova Assim como se anulou a presença indígena na história do descobrimento do Brasil colocando seu mitofundador com a chegada de Cabral assim também foi feito com os indígenas que habitavam a região Tal qual aconteceu na Marcha para o Oeste norteamericano que aniquilou a história indígena e criou seus próprios mitos a Marcha para o Oeste empreendida por Vargas também aniquilou o passado indígena reduzindoo a mitos como a Lenda das Cataratas por exemplo Esse é o lugar do indígena na história regional romantizada no passado ou como mão de obra para as obragens e sem ação no presente Los colonos llegados al Oeste del Paraná fueron atraídos por una nueva vida donde recrearían sus costumbres e implantaría nun tipo de sociedad atrapada en la idea de historia ligada al futuro y al progreso Generalmente su comportamiento llevó a estas comunidades a ejercer prácticas sociales y económicas al estilo puritano como en la región Norte de los Estados Unidos en época colonial lugar donde no quisieron por sus creencias religiosas y prejuicios étnicos y sociales mezclarse con grupos afrodescendientes o aborígenes los cuales fueron negados expropiados masacrados o usados como mano de obra esclavaLEDEZMA MENESES G G 2014 46 Ao delimitar as fronteiras tanto territoriais quanto linguísticas se destrói toda uma rede das relações que se tinha até então onde o guarani indígena se misturava ao castelhano falado em toda a região mais o português falado por alguns poucos mas que também estava presente Os Argentinos que se faziam economicamente presentes em toda a região também ficaram de fora A presença negra pouco é mencionada nos estudos sobre estes processos no entanto o fato de encontrarmos comunidades Quilombolas em algumas regiões como é o caso da Comunidade Apepu em São Miguel do Iguaçu demonstra que sua presença foi também ignorada no momento de se montar a história do território Os pioneiros geralmente sulinos descendentes de europeus principalmente de italianos e alemães pequenos agricultores são vistos como heróis que desbravaram a floresta e os responsáveis pelo desenvolvimento da região Essa mesma elite que se coloca como guardiã da civilização remontando suas origens europeias acaba por silenciar as indígenas que também contribuíram para o povoamento e a história desse lugar Lembram a luta contra a ameaça estrangeira se colocando como defensor da fronteira nacional e como único pioneiro do desenvolvimento BURRILE 2010 Se por um lado algumas colônias se fecharam em suas próprias tradições festas comidas e religião num esforço natural de não perder sua cultura de origem por outro lado outros experimentaram uma espécie de apropriação cultural resignificando sua própria cultura em relação à do outro que no caso pode ser brasileira ou alguma outra cultura estrangeira Sendo assim as trocas culturais foram inevitáveis e o abrasileiramento em muitos casos uma questão de sobrevivência A língua é um bom exemplo já que precisavam se comunicar entre si mas também com pessoas de língua diversa da sua Neste caso observase o seguinte fenômeno em casa falavam em sua língua natal ou de origem étnica mas em contato com os outros falavam o português Um português modificado pelo sotaque e pela fonética misturado com o português dos gaúchos de quem recebem forte influência Assim a região ganha uma linguagem muito própria e diferenciada das demais regiões do país Tratase de um espaço diverso multifacetado constituído por sujeitos de diferentes origens culturas classes sociais e etnias descendentes de alemães italianos ucranianos poloneses japoneses entre outros Expressões como celeiro agrícola polo do agrobussines colonização de gaúchos e catarinenses utilizadas não raras vezes para designar o Oeste são dimensões importantes mas não abarcam a riqueza e diversidade da formação sociocultural da região Seu tecido históricocultural é permeado por experiências que se entrecruzam permanências e excepcionais transformações que nos fazem olhar para as múltiplas temporalidades e 47 para as ações dos personagens sociais na formação desse espaço social A formação da região se fez por mudanças impressionantes ocorridas na velocidade e no ritmo da contemporaneidade SCHREINER 2013 A consequência disto é visível ainda hoje quando boa parte da população nesta região do país é composta por gaúchos e catarinenses netos destes ou de alguma descendência europeia que preservam ainda muito da sua cultura e tradição da qual são oriundos No entanto a estes juntaramse mais tarde brasileiros das mais diversas regiões estrangeiros de outras partes do mundo que hoje compõem um cenário bem diversificado E a região que se pretendia brasileiríssima por Getúlio Vargas e que se afirmava hegemonicamente branca de descendência gaúcha e europeia acabou por conformarse em uma região com uma diversidade étnica e cultural bastante acentuada Por ocasião da comemoração do aniversário de 96 do município de Foz do Iguaçu em 2010 o Jornal O Pioneiro publicou uma lista com os sobrenomes das personagens que marcaram a história da cidade É notória a presença de nomes de origem estrangeira nesta lista que considerou pioneiro todo aquele que vive na cidade há pelo menos 45 anos Desta forma já aparecem também nomes oriundos de outros fluxos migratórios como as colônias árabelibanesas japoneses e brasileiros de outras regiões Já em comemoração ao Centenário do município a prefeitura de Foz do Iguaçu através da Fundação Cultural gravou uma série de entrevistas em vídeo que compõem um documentário dos pioneiros falando sobre suas trajetórias e relações com a história da cidade Mais uma vez se percebe a presença europeia e sulista entre os entrevistados confirmandoos como protagonistas da história local e reafirmando que assim será contada a origem do oeste paranaense até que um trabalho mais profundo de resgate da história local seja realizado e possa agregar novos elementos a esta construção Com a queda de Getúlio Vargas porém em 1946 o Território do Iguaçu se desfez Mas o interesse em que esta região permanecesse unificada tornouse o objetivo de algumas camadas da sociedade que levantaram a bandeira do Estado do Iguaçu Se o Território do Iguaçu teoricamente negava a diversidade étnica para compor o quadro populacional para a região e buscava a unidade em torno da brasilidade e da supremacia da língua portuguesa sobre as demais já o Estado do Iguaçu reconhecia a diversidade étnica e cultural que a região atraiu ao longo do seu 48 processo histórico No entanto firmava suas raízes também numa hegemonia branca e europeia com características civilizatórias bem marcantes Isto se observa claramente na opção que o grupo faz ao deixar de fora da área pretendida para o novo Estado a região mais ao norte que havia sido incluída na divisão anterior no momento em que compreendia o Território Federal conforme se observa na figura abaixo Desenho 2 Mapa Território Federal do Iguaçu e Estado do Iguaçu Fonte httpestadodoiguacuagorablogspotcombr A explicação segundo seus idealizadoresé cultural já que esta região teria sido colonizada por nordestinos e paulistanos Esta iniciativa não teve êxito mas demonstra que a região é fruto de múltiplos projetos culturais e econômicos de inclusão e exclusão sociais e étnicas Cada projeto com suas próprias justificativas porém todos eles firmados na exclusão indígena e afrodescendente e na construção de uma sociedade de modelo europeu Estes foram alguns dos fatores que motivaram um olhar mais atento para as fronteiras e que culminaram com uma ação de povoamento mais eficaz para a região 22 MEMÓRIA NA CONSTRUÇÃO DOS SUJEITOS 49 As memórias individuais ou coletivas constituemse numa importante fonte para a escrita da história Quando entramos em contato com a narrativa de determinado sujeito ou grupo social podemos acessar muito mais do que a história presente nestes relatos é possível também acessar estruturas e mentalidades que estão presentes nas entrelinhas A história portanto trabalha para fazer a leitura e a interpretação destas narrativas tendo em mente quem é o interlocutor da onde ele fala e a quem deseja comunicar a fim dedar conta de preencher as lacunas deixadas pelas ausências da memória ou por um documento que mesmo existente não responde a tudo sozinho Neste sentido a História Oral surge como uma importante contribuição nos estudos históricos especialmente nos processos mais recentes dando visibilidade a setores da sociedade que dificilmente seriam incluídos no rol da história tradicional Visto que Alvorada do Iguaçu teve curtíssima duração com apenas 16 anos de existência é possível que não fosse sua importância em um contexto mais amplo desaparecesse por completo com o alagamento do seu território e a dispersão da sua população No entanto o fato de muitos destes antigos moradores terem permanecido na região aliado aos estudos referente a Itaipu e seus efeitos tem contribuído para que estes sujeitos apareçam e deem sua versão dos acontecimentosA maioria das pesquisas no campo dos atingidos por barragens trabalha nesta perspectiva Desta forma a História Oral constituise num importante instrumento na construção destes sujeitos frente aos processos que vivenciaram dando a eles o protagonismo da ação e não a passividade imposta pela história oficial Muitos deles que seriam sequer mencionados na historiografia agora podem ter suas narrativas presentes nos mais diversos estudos sobre a história local A história oral não é necessariamente um instrumento de mudança isso depende do espírito com que seja utilizada Não obstante a história oral pode certamente ser um meio de transformar o conteúdo e a finalidade da história Pode ser utilizada para alterar o enfoque da própria história e revelar novos campos de investigação pode derrubar barreiras que existam entre professores e alunos entre geração entre instituições educacionais e o mundo exterior e na produção da história sejam em livros museus rádios ou cinema pode devolver às pessoas que fizeram e vivenciaram a história um lugar fundamental mediante suas próprias palavras THOMPSON 1988 p 23 Quando da nossa primeira visita à Vila Bananal nos foi indicado quem seria a pessoa mais apropriada para fornecer as informações sobre o local e sobre 50 sua história Através do olhar do Sr Mario portanto podemos revisitar os processos que culminaram com a criação de Alvorada do Iguaçu bem como sua desapropriação e extinção além do surgimento da Vila Bananal e seu isolamento Podemos também visualizar processos mais amplos que abarcam questões sociaise culturais que extrapolam a história local e que alcançam outras temporalidades onde passado e presente dialogam através da sua narrativa Sr Mario é um homem simples de 80 anos de idade com uma experiência de vida extensa dedicada à família e ao trabalho com a terra Em duas horas de conversa falou quase sem interrupções das suas andanças entre Rio Grande do Sul Santa Catarina e Paraná Com a memória vívida e uma linguagem simples típica de uma pessoa com pouca instrução falou de pessoas lembrouse de nomes lugares e situações com riqueza de detalhes Falou também da vida sofrida na infância de como teve que sair de casa com oito anos de idade por causa do irmão mais velho que após a morte do pai ficou de tutor dos menorescom apenas uma muda de roupa e um chinelo de dedo devido aos maus tratos sofridos nas mãos deste De como perambulou na casa de um e de outro mas sem nunca depender de ninguém Falou ainda de atualidades das dificuldades enfrentadas no seu cotidiano como morador da Vila Bananal e de como Foz do Iguaçu São Miguel do Iguaçu e Itaipu interagem com a localidade Sr Mario Então foi uma barbaridade um absurdo Pra mim foi umas bordoadas mesmo pra acabar de matar Se não fosse isto se não fosse tanta eu pra mim olha eu não sei nem como lhe dizer que a gente bem dizer de casa e era traiçoeiro Um irmão meu quando morreu pai e minha mãe eu tinha oito anos e ele ficou de tutor dos órfãos mas aquele homem aquele meu irmão justamente ele devia de ter morrido antes de nascer Daí saí da casa dele com um par de chinelos e duas mudinhas de roupa dentro de uma mochila Ele não me deu um centavo pra eu comprar um caramelo pra comer na estrada Nem adeus ele não disse A memória segundo Le Goff é um mecanismo de dominação Aqueles que se apoderam da memória seja ela individual ou coletiva podem conduzir os rumos de um determinado grupo ou nação Desta forma tanto a memória quanto o esquecimento possuem igual valor Aquilo que está sempre sendo lembrado pode ser usado para forjar um sentimento coletivo ou até mesmo para encobrir outros interesses De igual modo evitar determinadas lembranças pode ter o mesmo efeito e impede que reflexões mais profundas produzam as mudanças necessárias trabalhando também para a manutenção de estruturas e paradigmas Aqueles que 51 conhecem estes mecanismos podem aproveitarse deles em detrimento daqueles que ignoram seus efeitos Tornaremse senhores da memória e do esquecimento é uma das grandes preocupações das classes dos grupos dos indivíduos que dominaram e dominam as sociedades históricas Os esquecimentos e os silêncios da história são reveladores desses mecanismos de manipulação da memória coletiva LE GOFF 1990 p 426 Neste sentido Itaipu procura apoderarse das memórias individuais e coletivas utilizandose de diversos meios para escrever uma história onde ela a empresa seja protagonista e o progresso seja o seu discurso A começar pela história narrada aos visitantes in loco e virtuais onde o progresso e a superação de desafios fazem calar as vozes dos que foram por ela subjugados e prejudicados das lutas perdas e ganhos de sujeitos ou grupos que foram por ela afetados Outra estratégia consistiu na criação do Ecomuseu de Itaipu cuja ideia inicial era manter um registro da biodiversidade e dos elementos arqueológicos encontrados na região Porém com a construção de uma narrativa histórica linear leva seus visitantes a entender a história local como uma trajetória ascendente passado presente e futuro onde a presença indígena representa o atraso marcado pelo obscurantismo O processo de civilização tem início com a presença dos padres Jesuítas e segue com a colonização desencadeada no início do século passado atingindo seu ápice com Itaipu que representa o progresso e o avanço tecnológico trazendo desenvolvimento não só para a região mas para as duas nações que a construíramA outra estratégia é o Espaço do Barrageiro uma espécie de memorial que se propõe a contar um pouco da vida no canteiro de obras e nos alojamentos dos barrageiros com espaços recriados à imagem e semelhança dos existentes na época Fotos vídeos e áudios que podem ser acessados pelos visitantes ajudam a contar a história de Itaipu a partir do olhar dos próprios trabalhadores que a construíram Claro que os relatos são selecionados e vão de encontro aos interesses da empresaSendo assim o que parece uma iniciativa positiva por parte da empresa na verdade acaba contribuindo para consolidar a história do vencedor ou seja de Itaipu Da mesma forma os sujeitos também fazem escolhas consciente ou inconscientemente quando se trata de construir sua própria identidade ou de narrarsua história A mesma memória que trabalha com as lembranças trabalha 52 também para o esquecimento Para ter um entendimento mais complexo deste sujeito a partir da sua memória é necessário ter uma leitura dos processos históricos que ele atravessa das mentalidades que permeiam sua fala e das expressões culturais e identitárias presentes na sua narrativa Cada atingido por Itaipu tem sua própria narrativa acerca deste processo e das implicações sobre suas trajetórias Aqueles que trabalharam na construção da usina geralmente trazem um discurso positivo acerca da mesma pois se beneficiaram dela em alguma medida enquanto aqueles que foram desalojados dos seus lugares falam a partir do ponto de vista do oprimido Essas construções são políticas pois falam a partir de um lugar onde o sujeito se coloca como agente da história e não apenas objetos passivos diante dos fatos Assim também nosso entrevistado vai se construindo através de cada argumento apresentado É interessante notar que sendo o mais antigo morador ele se tornou uma espécie de guardião da memória local e também uma voz na defesa dos interesses da comunidade de tal forma que nos foi dito vai logo porque ele pode morrer a qualquer momento como se a memória do local fosse morrer juntamente com ele Sua história apesar de ser individual e particular assume um caráter coletivo no momento que é reivindicada por um grupo social que labuta na mesma causa ainda que estes sequer se conheçam como é o caso dos atingidos por barragens Assumir o protagonismo da sua própria história é portanto o que a história oral oferece como possibilidade A passagem da memória para a história obrigou cada grupo a definir sua identidade pela revitalização de sua própria história O dever de memória faz de cada um o historiador de si mesmo O imperativo da história ultrapassou muito assim o círculo dos historiadores profissionais Não são somente os antigos marginalizados da história oficial que são obcecados pela necessidade de recuperar seu passado enterrado Tosos os corpos constituídos intelectuais ou não sábios ou não apesar das etnias e das minorias sociais sentem a necessidade de ir a busca de sua própria constituição de encontrar suas origens NORA 1992 p 28 Ecléa Bosi traz uma importante contribuição neste sentido com seu trabalho Memórias de velhos ao entrevistar pessoas idosas que haviam trabalhado em uma fábrica na cidade de São Paulo no início do processo de industrialização Através de cada entrevista ela extraiu mais do que simplesmente a vida de cada idoso ela pôde contemplar também todo o contexto social que eles vivenciaram daquilo que está vivo em suas memórias e do que já não se lembram ou não querem lembrarse 53 Um verdadeiro teste para a hipótese psicossocial da memória encontrase no estudo das lembranças das pessoas idosas Nelas é possível verificar uma história social bem desenvolvida elas já atravessaram um determinado tipo de sociedade com características bem marcantes e conhecidas elas já viveram quadros de referência familiar e cultural igualmente reconhecíveis enfim sua memória atual pode ser desenhada sobre um plano de fundo mais definido do que a memória de uma pessoa jovem ou mesmo adulta que de algum modo ainda está absorvida nas lutas e contradições de um presente que a solicita muito mais intensamente do que a uma pessoa de idade BOSI 1994 p 60 Segundo Le Goff os idosos já eram venerados na idade média justamente por seu vasto conhecimento e experiência Eles eram tidos como homensmemória A memória poderia ser mantida intacta por até cem anos e o conhecimento era passado a outra geração através da oralidade sendo que a escrita servia para prolongar esta memória e funcionava apenas como suporte Pierre Nora também faz um tratado interessante sobre a questão da memória Em sua obra Lugares de Memória ele procura desvincular Memória de História Para ele história e memória são irreconciliáveis embora reconheça que ambas tenham relação com o passado A diferença está na própria maneira de lidar com este passado Enquanto a memória trata com a vida com as lembranças com as amnésias já a história lida com coisas muitas vezes estáticas com as representações que estas manifestam com a ressignificação do que já não existe ou existe através da relativização A memória não tem a obrigação de lidar com o real e nem de ser exata Pelo contrário ela trabalha com o simbólico Portanto seus mecanismos são mais maleáveis podendo adaptarse a realidades múltiplas enquanto que a história mesmo adquirindo maior liberdade precisa cercarse da falsa impressão da verdade ainda que saiba não poderá atingila No coração da história trabalha um criticismo destrutor de memória espontânea A memória sempre é suspeita para a história cuja missão verdadeira é destruila e reprimila A história é deslegitimização do passado vivido No horizonte das sociedades de história nos limites de um mundo completamente historicizado haveria dessacralização última e definitiva NORA 1992 p 21 Durval Muniz17entende a história como uma constante construção Para ele a história pode ser inventada e reinventada a todo o momento Por isso é quase impossível se conhecer o passado tal como ele foi Sendo assim não está a serviço 17ALBUQUERQUE JÚNIOR Durval Muniz de História a arte de inventar o passado Ensaios de teoria da história Bauru Edusc 2007 256 p 54 da memória e sim do esquecimento uma vez que quanto mais tentamos nos aproximar dele mais o afastamos cada vez que esta história é recontada novos elementos são anexados paradigmas são questionados e alguns substituídos destróise assim um passado já construído o que acaba distanciando ainda mais o historiador deste passado Historicamente as ruínas de alguns lugares constituemse em elementos catalizadores da memória e da reflexão historiográfica Geralmente as pessoas acabam interessandose mais pelo contexto histórico que envolvem determinados sítios arqueológicos depois de uma experiência de visitação Da mesma forma quando Alvorada do Iguaçu volta a ficar à mostra depois de anos submersa a possibilidade de visitar o local despertou em muitos o interesse por conhecer os processos que levaram aquela localidade a chegar àquela condição Assim a memória que antes pertencia a um grupo social daqueles que vivenciaram o processo de deslocamento tornase agora uma memória compartilhada com estranhos que se sentem incluídos pela identificação com este passado Para quem não vivenciou os processos esta memória é apenas conhecimento mas para os que vivenciaram é provocação das lembranças terreno menos rígido mas também muito mais delicado que trilhamos na obtenção das percepções desses lugares onde a memória está alojada Na época em que a baixa do lago expôs as ruínas de Alvorada do Iguaçu nós já havíamos iniciado o projeto de pesquisa para este trabalho e ficamos sabendo através de uma reportagem de TV que Alvorada estava à mostra novamente Este fato foi para nós como um presente Ter a possibilidade de ver estas ruínas com nossos próprios olhos pisar sobre este chão caminhar por entre restos de construções que silenciosas dizem muito sobre o passado sobre os processos sobre pessoas sobre Itaipu e sua imposição do progresso Tivemos a oportunidade de visitar o local e presenciar o que restou das casas construções e objetos que pertenceram àquelas famílias Andar por aquelas terras que há temposestavam inacessíveis ver as ruínas das casas dos poços imaginar como era a vida antes de Itaipu os laços de amizade os sonhos e esperanças de pessoas que não conhecemos foi uma experiência única A sensação é estranha já que não eram nossas lembranças que estavam ali No entanto nos sentimos profundamente tocados pelo desalento que o local apresenta Tudo foi registrado na memória e 55 também em fotografias Mas o momento mais emblemático foi visitar o antigo cemitério da comunidade Ver aqueles túmulos as lápides ler alguns nomes datas de nascimento e morte de algumas pessoas foi extremamente revelador já que ali não eram anônimos mas pessoas com nome sobrenome tempo de vida Mesmo sabendo que os corpos foram removidos para outro local antes do cemitério ficar debaixo dágua fica a sensação de um local sagrado do descanso final daqueles que de alguma forma trabalharam para que aquela comunidade viesse a existir As bases das construções continuavam lá denunciando que já houve vida que há memória que há histórias incompletas à espera de serem trazidas à tona assim como aquelas ruínas Este é o papel do historiador através dos fragmentos do passado dos escombros dos vestígios permitir que estes falem A partir desta experiência estudar a história do local e as narrativas que se construiu sobre este passado se tornou muito mais pertinente e estimulante Fotos 8 Ruínas de Alvorada do Iguaçu com a baixa do Lago de Itaipu em 2014 Fonte Acervo pessoal 56 Fotos 9 Ruínas de Alvorada do Iguaçu com a baixa do Lago de Itaipu em 2014 Fonte Acervo pessoal Estas ruínas ficarão ali ainda por muitos anos como um memorial silencioso contra Itaipu e as demais hidrelétricas que têm provocado a retirada de populações do seu caminho De tempos em tempos a natureza se encarregará de trazer à tona estas memórias submersas Lembranças de um passado esquecido por muitos à medida que os anos avançam ou propositadamente deixadas ao esquecimento Forçadamente se terá de falar que uma comunidade inteira precisou deixar para traz suas casas e sua história vivida com aquele local por causa da Itaipu Alvorada do Iguaçu no contexto da história em sua longa duração não passou de um lance um momento uma vírgula na escrita da história da região Porém para quem a conheceu e fez dela um lugar de ancoragem das suas lembranças de memórias tão vívidas quanto o dia de hoje ela está carregada de simbolismos de significados diversos que trazem sentido à sua própria existência como indivíduo ou como grupo social Por isto o fato de saber que mesmo submersa ainda existe um pouco do lugar dos resquícios que podem ser apreciados de alguma forma mesmo que para isto tenha que depender dos caprichos da natureza para trazêla à tona transmite a ideia de que ela permanece viva ao menos na sua memória 57 23 ALVORADA DO IGUAÇU VIDA E MORTE O Distrito de Alvorada do Iguaçu foi criado através da Lei 43164 de 18 de dezembro de 1965 e sancionado pelo então prefeito municipal de Foz do Iguaçu Ozires Santos com a seguinte limitação geográfica Fica criado o Distrito de Alvorada do Iguaçu com sede em Cidade Alvorada neste Município com as seguintes confrontações ao Norte com o Município de São Miguel do Iguaçu pelo rio Ocoy partindo da divisa do distrito de Santa Terezinha nesse rio e por ele abaixo até a sua foz no rio Paraná a Oeste com a República do Paraguai pelo rio Paraná deste a foz do Rio Ocoy até a foz do rio Bela Vista ao Sul com o 2º Distrito deste Município pelo Rio Bela Vista desde a sua foz e por ele acima até encontrar a divisa do distrito de Santa Terezinha pela linha divisória do mesmo desde o rio Bela Vista até o rio Ocoy18 Os espaços geográficos se definem com base em marcadores definidos sejam eles visíveis ou invisíveis que venham a estabelecer limites compondo assim a área de determinado lugar No caso de Alvorada do Iguaçu seus limites foram facilitados pela existência de diversos rios presentes na região que acabaram sendo utilizados como marcadores geográficos Porém as relações que se estabelece com esse lugar abarcam outros aspectos cuja geografia não é capaz de limitar ou compreender e neste caso as fronteiras são menos claras Tem a ver com sentimentos com ganhos e perdas com aspectos culturais e identitários com toda uma bagagem histórica que se traz e se transmite de saberes de costumes e tradições capazes de dar sentido e pertencimento aos sujeitos uma vez que as relações interpessoais pressupõem trocas culturais Alvorada do Iguaçu foi colonizada basicamente por migrantes do Rio Grande do Sul que tiveram conhecimento do local através de notícias de parentes ou através da propaganda feita pelas Colonizadoras O Distrito que geograficamente estava definido de acordo com a Lei acima ainda estava contudo em processo de estabelecer os marcadores culturais embora já houvesse diversos indicadores comuns entre os sujeitos que ali foram morar tais como a origem a língua a religião entre outros Um dos aspectos que proporciona um forte elo entre estes moradores é sem dúvida o fato de serem pioneiros no lugar Especialmente para aqueles que vieram de mais longe como tantos que já haviam cruzado o Oceano Atlântico para 18Retirado do site da Câmara Municipal de Foz do Iguaçu httpsleismunicipaiscombr acessado em 02032017 58 buscar novas oportunidades no Brasil e que puderam ali estabelecerse com suas famílias e construir uma nova história ou um novo começo Mesmo para os que vieram de mais perto como gaúchos e catarinenses ou até mesmo paranaenses chegar a um lugar e desbravar com todas as ressalvas que esta palavra necessita ao utilizála especialmente por transmitir um conceito essencialmente colonialista é sem dúvida uma importante característica que vai unir estes indivíduos não apenas no desenvolvimento social e econômico do lugar como também nas lutas que estes teriam que enfrentar mais adiante quando da perda das suas propriedades para Itaipu O Distrito já se desenhava como uma localidade bem organizada com perspectiva de crescimento e possivelmente num futuro próximo a exemplo de Santa Terezinha e São Miguel do Iguaçu também Distritos à época se desmembraria e se tornaria um município autônomo ou no mínimo poderia juntar se a estes para conformar um município maior devido a sua proximidade e características similares De acordo MELCHIOR o loteamento de Alvorada teve sua organização a cargo da Colônia de Nacionais PassoCuê que havia projetado o espaço prevendo uma série de estruturas com vistas no crescimento e desenvolvimento do lugar Alvorada do Iguaçu tinha o perímetro originalmente integrante da antiga Colônia de Nacionais PassoCuê esta com um território de 36250 hectares que foram subdivididos em 1788 lotes 107 quadras No projeto da colonizadora foram reservados lotes para praças escolas indústrias e até um aeroporto MELCHIOR 2012 Foto10Alvorada do Iguaçu antes de Itaipu Foto11 Posto de combustível Fonte extraído da reportagem no Jornal do SBT 59 Porém como foi dito acima seu desenvolvimento foi interrompido pela construção da Hidrelétrica de Itaipu que ao represar o Rio Paraná para a formação do Lago da barragem condenou o Distrito ao desaparecimento embaixo dágua Em 2014 a região oeste passou por uma forte estiagem e o reservatório do Lago de Itaipu baixou o seu nível de forma drástica Isto permitiu que as ruínas de Alvorada do Iguaçu viessem à tona Este fato chamou a atenção de muitas pessoas especialmente daqueles que conheceram a história do lugar que puderam revisitar o que ficou do seu passado Sua localização fica a poucos metros de onde hoje é a praia artificial de Santa Terezinha de Itaipu que recebeu o nome de Terminal Turístico Alvorada do Iguaçu19 Foto 12 Terminal Turístico Alvorada do Iguaçu na área onde se localizava Alvorada do Iguaçu Fonte Acervo pessoal Um dos colonos que veio para a região foi o Sr Mario 81 anos a quem entrevistamos Ele veio de Passo Fundo Rio Grande do Sul através do convite de um parente que já estava morando no Distrito de Santa Terezinha em 1973 Atualmente vive com sua esposa Nair na comunidade Vila Bananal os filhos já casados moram em São Miguel do Iguaçu Sr Mario foi um homem que lidou a vida toda com a terra chegou à região e encantouse com as lavouras de hortelã Veio sondar a terra gostou do que viu comprou alguns alqueires e voltou para vender o que tinha construído para então mudarse definitivamente com a família Sua relação 19Ao longo da costa do Lago de Itaipu diversas praias artificiais se formaram e compõem a paisagem da região que ficou conhecida como Costa Oeste Esta foi uma das formas que Itaipu encontrou para compensar os transtornos e perdas que causou à região fazendo o aproveitamento do lago Para isto criou diversos terminais turísticos dotados de praias artificiais área de camping com quiosques e churrasqueiras visando o lazer da população local e a atração de turistas para a região Estas estruturas foram entregues aos respectivos municípios que ficaram responsáveis por administrar e manter o local em condições de uso 60 com Alvorada do Iguaçu foi muito próxima e pautada pela necessidade uma vez que Alvorada já possuía uma estrutura comercial mais desenvolvida e a distância com Foz do Iguaçu acabava favorecendo esta relação Foi lá que ele diz ter comprado a madeira com a qual construiu a casa em que vive até o dia de hoje Sr Mario A Alvorada do Iguaçu ela justamente era uma vila muito boa Tinha uma serraria lá onde eu comprei essa madeira que até hoje está aqui na minha casa Isto já tem cinquenta anos para lá Ele se perde um pouco nas datas Comprei Paguei cinco mil reaise também nas moedas pela madeira naquele tempo Então eu sei dizer que a Alvorada eu achava até bom Uma vilinha boa Uma vilinha que dava para a gente ir lá É onde a gente tinha a farmácia para a gente buscar o remédio quando tinha uma criança doente uma coisa eu corria lá Encontrou um lugar promissor e ainda com muitas áreas de mata preservada que aos poucos iam sendo derrubadas para dar lugar a lavouras áreas para criação de animais e espaços residenciais O período predatório da madeira e da ervamate já havia cessado e agora a região já esboçava uma forte vocação agrária que se intensificaria nos anos seguintes favorecido pela qualidade da terra de grande valor econômico propícia para diversas culturas e pelo clima agradável Este foi um ponto que ocasionou bastante embate quando as terras começaram a ser desapropriadas por Itaipu uma vez que no Paraná as terras férteis estavam extremamente valorizadas e nas demais regiões oferecidas por Itaipu a qualidade da terra não era equivalente e o esforço para tornálas produtivas seria muito maior Assim Sr Mario relata sua vinda para o Oeste Paranaense Sr Mario na mesma hora arrumei o caminhão para a mudança para vim pra cá Porque eu já tinha vindo antes meus cunhados moravam aqui em Santa Terezinha eu vim antes olhei o lugar e olhei a plantação de hortelã Então a hortelã tinha uma influência meu Deus do Céu olha a planta de hortelã era o mesmo que jogar dinheiro na terra aquilo ali estava juntando dinheiro todo dia Cheguei ali e comprei 3 alqueires de hortelã e paguei Comprei e paguei e fiz um contrato assim com o cara Óh se até tal tempo eu vier aqui você desocupa a casa e se eu não vier fique com o dinheiro e a roça Aí quando eu vendi minha terra já mandei avisar pra desocupar a casa porque até tal tempo eu ia chegar com a mudança e ele desocupou Cheguei ali e toquei aquela lavoura de hortelã 3 anos Rapaz mas me deu dinheiro igual água Nunca tinha pegado tanto dinheiro quanto eu fiz com aquela roça de hortelã Eu vendia lambicava a lavoura de hortelã me dava 200 litros de óleo eu vendia por 18 mil aquele óleo de hortelã E foi aonde que de lá comprei aqui pagando muito caro paguei 14 mil Ora vendi lá no Rio Grande a terra nestas condições me deram 3 mil na hora e 5 mil com prazo de um ano sem juros foi como jogar fora De acordo com o relato do Sr Mario Alvorada do Iguaçu era uma localidade que fornecia bens de consumo materiais de construção medicamentos 61 alimentícios e policiamento De acordo com MELCHIOR 2012 o Distrito tinha como atividade primária a agricultura mas havia também casa de comércio armazéns postos de combustível bares e bazares setores de prestação de serviços como contabilidade e construção civil além de setor de transportes O policiamento de acordo com o relato do Sr Mario ficava por conta do farmacêutico e seu filho já que além de ser o dono da farmácia era também o delegado local uma espécie de Xerife que atendia as ocorrências policiais na região Era um homem admirado e temido com a mesma intensidade Se por um lado abastecia a região com medicamentos e auxiliava a comunidade com atendimento farmacêutico por outro fazia cumprir a lei à bala Resolvia desde uma discussão familiar ou entre vizinhos até casos mais sérios como a captura de bandidos e foragidos O próprio Sr Mario teve vários conflitos seus com vizinhos intermediados por esta figura policial mas afirma ter tido com ele um bom relacionamento Sr Mario E tinha um tal de Bianco que era o dono da farmácia Um homem muito bom mas muito brabo Ele era delegado do lugar Esse Bianco pra mim foi um homem muito bom Muita gente falava de vir que aqui tinha bodega tinha três a quatro bodegas e matavam gente aí pra ver morrer E essa farmácia do Bianco era onde a gente se servia de remédio E o Bianco era o delegado do lugar Mas o Bianco aqui tinha gente que tinha bolsa de sal destas bolsinhas de sal e tem até hoje cheia de revolver e pistola e tanta arma escondia ai nos mato embaixo das madeiras e fazia travesseiro daquela bolsinha O Bianco vinha aqui de noite e dizia Você conhece fulano Sei Sabe onde que ele dorme Sei Então vamos lá comigo que eu vou prender ele Ele ia lá prendia o homem só que aquele não voltava mais Sabendo que a região se desenvolveu a partir da implantação da Colônia Militar é de se esperar que estes tenham exercido forte influência em toda sua extensão Sendo assim Foz do Iguaçu foi administrada diversas vezes por militares ou civis indicados por estes fator apontado pelo exprefeito Perci Lima em seu livro A História de Foz do Iguaçu de 2001 Para ele este fator foi determinante para o desenvolvimento lento que a cidade experimentou antes de Itaipu uma vez que segundo ele estes militares vinham de fora não estabeleciam nenhum vínculo com a região e logo retornavam para seus locais de origem salvo raras exceções Por conta disto a cidade chegou a ter até três administradores em um único ano Além de que com o desencadeamento do golpe militar em 1964 a região se tornou ainda mais estratégica militarmente A partir da deflagração da Operação Condor onde as ditaduras do cone Sul atuaram em conjunto para reprimir todo e qualquer foco de 62 subversão a tríplice fronteira se tornou em um local vigiado Por situarse nesta região estratégica para o país Alvorada do Iguaçu também recebia a visitados militares de vez em quando O lugar era movimentado e se tornava cada dia mais conhecido Nos finais de semana atraía gente dos arredores que em busca de diversão frequentavam as várias bodegas e as áreas de lazer onde por vezes a situação fugia do controle Nesta época a fronteira já se consistia num fator que facilitava a compra de armas ilegais conforme relata o Sr Mario e apesar de todo policiamento as coisas se resolviam mesmo era à bala Sr Mario Então aconteceu olha aconteceu tanta coisa aqui que nem é bom lembrar Barbaridade coisa séria Aqui existia muita gente ruim aqui Tinha um pessoal aí eu acho que tinha umas 600 pessoas mais ou menos frequentavam essas bodegas ai Dia de festa dia de domingo aquele vai e vem aquele alvoroço Jogo de futebol ali na frente que o seu Flávio deu o terreno pra eles fazerem um campo bem grande de futebol mas no fim pra arremata o caso teve que vir o Batalhão de Foz desarmar todo esse pessoal porque era demais Você imagine de vir o Batalhão não era pouca coisa né Se fosse um ou dois ou três a polícia podia dar conta A vida religiosa na comunidade estava representada pelas igrejas Católica Apostólica Romana que concentrava boa parte dos habitantes em torno de suas atividades Mas também já contava com a presença da igreja Evangélica representada pela Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil IECLB MELCHIOR 2012 Não se sabe a proporção de membros entre uma e outra mas especialmente naquela época o país era majoritariamente católico Por esta razão não seria exagero concluir que o catolicismo romano predominava no cenário religioso em Alvorada do Iguaçu Como um reflexo da experiência colonial espanhola e portuguesa que marcaram sua presença no continente americano com a cruz e a missa assim também aconteceu e acontece nas diversas localidades aonde o homem branco chega para povoar A presença da igreja Católica acaba sendo quase que onipresente por onde quer que se ande pelo país por mais ermo que seja o lugar lá está a religiosidade católica na cultura nos templos nas práticas cotidianas e nos simbolismos Embora haja movimentos outros que se pode presenciar nos grandes centros onde as igrejas evangélicas e outras religiões começam a ocupar espaços antes exclusivos do catolicismo no interior contudo ainda é muito presente a força da igreja Católica É interessante notar que a igreja evangélica que marcou presença em Alvorada do Iguaçu tenha sido justamente a Igreja Luterana 63 originalmente fruto da Reforma Protestante desencadeada na Alemanha no século XVI através de um dissidente da Igreja Católica Esta provavelmente tenha chegado à região juntamente com este movimento migratório experimentado pelos colonos de origem alemã As igrejas porém não foram poupadas no processo de desapropriação efetuado por Itaipu A IECLB por exemplo precisou recorrer ao poder público solicitando a doação de um terreno no Distrito de Santa Terezinha para que pudesse construir sua nova sede A justificativa é simples assim como as demais propriedades expropriadas por Itaipu os valores pagos acabavam sendo insuficientes para comprar e reconstruir a estrutura que se dispunha antes da inundação devido à inflação e exploração comercial A igreja recebeu um terreno como doação da prefeitura de Foz do Iguaçu conforme a Lei assinada pelo então prefeito municipal Clóvis Viana LEI Nº 1048 DE 30 DE JUNHO DE 1980 AUTORIZA A DOAÇÃO DE UMA ÁREA DE TERRAS PARA A CONSTRUÇÃO DO TEMPLO DA IGREJA EVANGÉLICA DE CONFISSÃO LUTERANA DO BRASIL NA FORMA QUE ESPECIFICA A Câmara Municipal de Foz do Iguaçu Estado do Paraná Decretou e eu Prefeito Municipal sanciono a seguinte Lei Art 1º Fica o Sr Chefe do Executivo Municipal autorizado a doar à IGREJA EVANGÉLICA DE CONFISSÃO LUTERANA DO BRASIL Paróquia do ex Distrito de Alvorada do Iguaçu uma área de terras denominada lote nº 01um da quadra nº 92 noventa e dois localizada no Distrito de Santa Terezinha neste Município com a área total de 150000m2 hum mil e quinhentos metros quadrados destinada a construção de Utilidade Pública Praça e Igreja para ali ser construído o seu templo Art 2º A doação de que trata a presente Lei farseá mediante a condição de que a área doada seja utilizada exclusivamente no atendimento dos objetivos da IGREJA EVANGÉLICA DE CONFISSÃO LUTERANA DO BRASIL Art 3º O imóvel objeto da presente Lei reverterá ao domínio do Município por anulação pura e simples do documento de doação caso a Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil não inicie a construção no prazo de 1 um ano ou não a conclua no prazo de 2 dois anos tudo a contar da data da escritura de doação Art 4º Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação revogadas as disposições em contrário Edifício da Prefeitura Municipal de Foz do Iguaçu em 30 de junho de 1980 CLÓVIS CUNHA VIANA 64 Prefeito Municipal 20 Foto 13 Posto de combustível Foto14Antigos moradores de Alvorada do Iguaçu Fonte extraído da reportagem no Jornal do SBT Apesar de ter exercido um importante papel para a região em sua curta existência Alvorada não resistiu diante do forte apelo do progresso imposto por Itaipu O Distrito foi o primeiro a ser desapropriado já que a intenção inicial de Itaipu era começar as desapropriações pelas proximidades do canteiro de obras e seguir subindo as margens do rio Paraná até alcançar o município de Guaíra Este projeto inicial foi frustrado quando os primeiros sinais de resistência por parte de alguns proprietários começaram a aparecer Vale ressaltar a maneira arbitrária como foram realizadas estas desapropriações Segundo retratado por Juvêncio Mazzarollo em A Taipa da Injustiça a estratégia de Itaipu para forçar as famílias na sua maioria produtores rurais a deixar suas terras e a aceitar os preços bem abaixo de mercado oferecidos pela empresa era iniciar pelas infraestruturas urbanas como hospitais postos de combustíveis mercados e escolas das quais esses pequenos produtores dependiam Desta forma isolados e sem a estrutura de que necessitavam para manterse no local vendo suas terras se desvalorizarem o produtor não tinha outra escolha senão aceitar as propostas de Itaipu Esta estratégia também é destacada por Maria de Fátima Bento Ribeiro em seu trabalho MEMÓRIAS DO CONCRETO onde ela relata da seguinte forma A primeira desapropriação que ocorreu foi em Sede Alvorada do Iguaçu Em primeiro lugar desapropriaram na sede do distrito as casas comerciais os postos de combustíveis as farmácias e uma vez desapropriada com a infraestrutura os agricultores que permaneceram tinham que percorrer mais de 70 quilômetros para comprar combustíveis e outros produtos que 20Retirado do site da Câmara Municipal de Foz do Iguaçu httpsleismunicipaiscombr acessado em 05042017 65 precisavam Com isso suas propriedades desvalorizavam RIBEIRO 2002 p 23 Foi o que aconteceu A região contava já com uma população bastante expressiva na época da desapropriação conforme aponta Mazzarollo Centros urbanos também foram seriamente afetados Alguns simplesmente desapareceram como Alvorada do Iguaçu próspero distrito de Foz do Iguaçu com cerca de 5000 habitantes MAZAROLLO 2003 p 33 Segundo MELCHIOR este número chegou a 7000 habitantes no seu auge Na reportagem exibida na época da baixa do lago o antigo morador Wilson Datsch afirmou que a princípio os moradores acharam que estavam fora do alcance do futuro lago que as águas não chegariam a atingir a área residencial e isto fez com que alguns relutassem em deixar o local Se entre Itaipu e os proprietários a relação já era de lutas por conta das desapropriações entre Itaipu e o município de Foz do Iguaçu as decisões se davam de forma mais facilitada uma vez que tanto Itaipu quanto o município eram administrados por subordinados ao governo militar Por conta disto as negociações avançavam e já em 1979 a prefeitura assina Lei nº 1014 que entregava a área do Distrito à Itaipu Binacional incluindo cemitério ruas avenidas e praças com área e valores21 pagos pela mesma conforme demonstrado abaixo Estas decisões foram tomadas em instâncias governamentais sem que houvesse discussão com as pessoas que seriam atingidas Embora Alvorada do 21Valores em Cruzeiro moeda vigente no ano da transação 66 Iguaçu tivesse representante político na Câmara de Vereadores o então vereador Sergio Spada morador da comunidade que havia sido eleito em 1978 com uma expressiva quantidade de votos pelo extinto Movimento Democrático Brasileiro MDB sendo o mais jovem vereador eleito em Foz do Iguaçu com apenas 20 anos de idade MELCHIOR2012 Este além de reivindicar questões de interesse geral para o Distrito procurou fazer oposição à Itaipu e seus desmandos porém não foi páreo para a máquina que representava Itaipu no cenário nacional e local Em 1980 foi emitido um Decreto anunciando a extinção do Distrito conforme abaixo APROVA A REPRESENTAÇÃO Nº 0180 DO PREFEITO MUNICIPAL DE EXTINÇÃO DO DISTRITO DE ALVORADA DO IGUAÇU O Presidente da Câmara Municipal de Foz do Iguaçu Estado do Paraná faço saber que o Poder Legislativo Decreta e eu promulgo o seguinte DECRETO LEGISLATIVO Art 1º Fica aprovada a Representação nº 0180 do Sr Chefe do Executivo Municipal de extinção do Distrito de Alvorada do Iguaçu cuja sede será inundada pela represa de Itaipu Art 2º Este Decreto entrará em vigor na data de sua publicação revogadas as disposições em contrário Sala das Sessões da Câmara Municipal em 13 de junho de 1980 Aguinello Fávero Haus Presidente22 Os expropriados muitos deles pioneiros na cidade viram anos de luta ser perdidos com a invasão autoritária da Itaipu Foram muitas as lutas por parte dos expropriados para conseguir melhores valores reivindicando reajustes reais nos valores praticados por Itaipu Pediam também que fossem indenizadas as terras com plantações produzindo os materiais e benfeitorias que por ventura no local estivessem Mas Itaipu utilizou de todas as formas possíveis para enganar ludibriar e conseguir comprar as terras que queria por valores abaixo do mercado Uma delas era que ao comprar uma determinada terra se a medida que Itaipu tivesse fosse menor que a do proprietário prevaleceria a da Itaipu mas se a medida que o proprietário tivesse fosse menor que a de Itaipu então prevaleceria a do dono Utilizavam de ameaças dizendo que caso o dono da terra não vendesse naquele momento as águas viriam e inundariam as terras e o dono somente iria receber o 22Retirado do site da Câmara Municipal de Foz do Iguaçu httpsleismunicipaiscombr acessado em 05042017 67 dinheiro na justiça o que demoraria e geraria a desvalorização do dinheiro e consequentes perdas Aos poucos a situação foi se tornando insustentável como o esvaziamento do local e falta de estrutura para permanecer A reportagem feita na época 1982 pelo jornalista Francisco de Alencar do Jornal O Estado do Paraná mostra que já não havia mais condição de permanecer no local A pressão começa a fazer efeito e muitos vão cedendo e fazendo acordo com Itaipu outros porém se unem e saem à luta por melhores preços e terras em local de qualidade compatível Com as estruturas comerciais já inoperantes agora era vez de o cemitério local ser removido Aliás segundo a reportagem eram vários cemitérios espalhados pela região já que segundo OlivioMagagnin afirmou na época à reportagem Cemitério aqui tem em quantidade Esses paraguaios enterram os mortos por aí mesmo porque antigamente nem tinha estrada por aqui Ele dizia conhecer a existência de pelo menos 30 cemitérios próximos da sua propriedade A responsabilidade pela exumação e transferência das ossadas era de Itaipu mas segundo Magagnin alguns familiares não esperaram e preferiram eles mesmos fazer a retirada dos seus entes Parte da estrutura do cemitério principal continua lá e também veio à tona quando o lago baixou seu nível Foto 15Escombros do cemitério em 2014 Fonte Acervo pessoal 68 Foto 16Outubro de 1982 O Estado do Paraná Fonte brpinterestcomcleyscholzadeussetequedas O Isolamento foi inevitável isolamento dos parentes já que muitas famílias foram separadas neste processo isolamento dos amigos que haviam feito na região isolamento social e também econômico tendo em vista que todo trabalho que haviam tido para tornar as terras produtivas estariam agora debaixo dágua além de estabelecimentos comerciais edificações de uso comum como clubes sociais igrejas hospitais e escolas Sendo assim todos se viram deslocados não apenas de suas terras mas também da vida ao qual estavam habituados do convívio que tinham com outras famílias de um passado comum que acabou submerso pelas águas do lago 69 Aqueles que não conseguiram se estabelecer na região precisaram buscar outro lugar para recomeçar Neste período a região Norte do país também estava em processo de povoamento e era uma das opções oferecidas pela Itaipu Na época o Sr Mario nosso entrevistado recebeu proposta de parentes para ir até Rondônia pois o local estaria oferecendo terras baratas para quem queria recomeçar a vida lá Porém o cenário que ele encontrou ao chegar era desolador De acordo com suas palavras o lugar era terra sem lei de pessoas mal intencionadas aproveitadores e ladrões como se lê abaixo Sr Mario Aí veio meu cunhado e disse vamos embora daqui porque lá em Rondônia dão terra de graça que não sei o que Dei o dinheiro pra ele pagar a passagem pra ir lá ver e ele vem de lá com mentira que era um lugar bom que não sei o que que não seio que Eu peguei e fui lá ver lá só tem bandido só tem bandido só tem bandido Lá os coitadinhos que iam daqui abençoado do céu que vendiam tudo e levavam o dinheiro ficavam lá na beira da rua debaixo de uma lona esperando Lá tinha os vigaristas então eles combinavam ó você é dono dessa propriedade vamos fazer assim eu vou lá e ofereço tua propriedade pra ele que é uma propriedade boa que assim e assim e faço que eu que sou o dono e vou vender a terra pro cara a gente pega o dinheiro e reparte e você não deixa ele entrar aí e ele se lasca Assim meu pai do céu eu vi tanta mulher chorar lá por causa disso É viemos pra cá acabamos debaixo de uma lona serviço não tem dinheiro acabou terra não tem não dão pra ninguém e bandido na rua ia caminhando e um puxava o revolver e matava outro ali a troco de nada Se encontrou atirou matou Eu vi lá com meus olhos daí disseram lá fulano você quer saber bem como é que é Rondônia você vai na missa que eles vão contar e você vai saber muita coisa lá E eu fui Daí chegou a hora da confissão e cada um contava os pecados dele gritado lá mais de cem pessoas Aí era só mulher que falava é mataram meu marido e agora eu estou aqui sofrida com tantos filhos pra dar de comer sem recurso sem ter pra onde ir Mas olha meu Deus do Céu daí que eu acabei de crer como era o negócio não não pelo amor de Deus vou ficar por aqui mesmo aqui ao menos o que comer nós temos Vamos ficar aqui porque lá o que tinha mais que tudo que é bandido que tinha em Foz e Mato Grosso Esta realidade aumentava o drama daqueles que já haviam perdido o pouco que tinham Mesmo aqueles que na época conseguiram fazer um acordo satisfatório precisavam enfrentar a falta de escrúpulos dos aproveitadores que digase de passagem não estavam apenas no Norte do país mas também na própria região Muitos ficaram sem rumo pois os valores pagos eram abaixo do mercado e a inflação e a especulação desvalorizavam totalmente o dinheiro de um mês para outro A especulação era por parte de pessoas que sabendo dos valores que Itaipu estava pagando sempre exigia um valor maior do que a terra valia tornando o mercado imobiliário da região inflacionado O valor que recebiam por suas terras não era suficiente para comprar nem metade em outros lugares isso 70 sem levar em conta que a terra não era tão produtiva como as que se possuíam Por conta disto o período foi marcado por cenas inusitadas como mostrado na imagem abaixo onde casas inteiras eram transportadas na carroceria de caminhões Valia tudo para minimizar as perdas agora que a saída do local era inevitável e iminente Foto 17Para salvar a casa das águas valia qualquer coisa Foto João Luiz Thomazi Fonte wwwjiegovbr As obras em Itaipu estavam concluídas e águas começaram a subir rapidamente Alvorada do Iguaçu em pouco tempo estaria submersa e a partir de então só existiria na memória dos seus antigos moradores esperando que uma seca na região a revelasse às novas gerações Porém uma parte dela não foi atingida e permanece como uma espécie de elo entre presente e passado Se por um ladoAlvorada do Iguaçu desapareceu de baixo dágua por outro surge Vila Bananal Enquanto Alvorada do Iguaçu espera que o lago baixe seu nível para ser vista e lembrada sem que haja necessidade de qualquer esforço para isto já Vila Bananal está exposta e pode ser vista por todos que desejam conhecêla No entanto Vila Bananal passa despercebida da maioria da população de Foz do Iguaçu Sua invisibilidade em face de sua importância é intrigante como veremos a partir de agora 71 Foto 18 A água sobe rapidamente trazendo mudanças e progresso Foto ValdenorFranzen Fonte wwwjiegovbr 72 3 VILA BANANAL DESLOCAMENTO E ISOLAMENTO SOCIAL Ao ouvir falarem Vila Bananal a primeira imagem que vem à mente é de bananas ou seja uma localidade que tem ou teve a banana como um importante elemento na construção de sua identidade social e econômica Vila Bananal já ocupou uma posição de destaque na produção de bananas para o Estado do Paraná Atualmente mesmo sendo ainda um importante centro de abastecimento do produto para o município e região nem de longe se assemelha ao que um dia já foi É notória que esta não é mais sua principal vocação já que a banana praticamente desaparece diante de uma vasta área agrícola e pecuária ficando restrita a poucos e pequenos produtores que ainda resistem Foto 19À esquerda a placa que dá boas vindas ao Município de Foz do Iguaçu indica o início da Vila Bananal Ao centro a cerca que marca a divisão entre Foz do Iguaçu e São Miguel do Iguaçu Fonte Arquivo pessoal Sr Mario Não de primeiro aqui eu digo pro senhor que virou Vila Bananal porque tinha uns 300 alqueires de banana Porque o Luiz Salasi ele plantava essas terras tudo o que senhor vê aqui era quase tudo cheio de banana que era dele Ele tinha 14 peões fichados aonde que meu filho tocou quase vinte anos trabalhando junto com o Luiz 73 Vila Bananal nem chega a ser uma vila propriamente dita podemos chamála de comunidade Nela vivem aproximadamente 60 famílias com cerca de 150 pessoas na maioria produtores rurais e pescadores Representa uma parte importante da área rural de Foz do Iguaçu responsável por uma parcela considerável da produção agrícola e pecuária do município Não é raro ao transitar pela única estrada que dá acesso ao lugar ter de sair da pista ou aguardar até que as grandes máquinas agrícolas passem para então prosseguir caminho Surgiu dos processos mencionados acima e sua principal causadora é sem dúvidas Itaipu Binacional Quando o lago da usina foi formado Alvorada do Iguaçu cuja área ocupava uma grande extensão desde próximo à barragem até o município de São Miguel do Iguaçu perdeu boa parte das suas terras A parte que não foi alaga porém ficou isolada do restante do município que a abrigava Sem acesso senão pela rodovia BR277 ou pelo lago a região ainda é quase que desconhecida da maior parte da população e com quase nenhuma atenção do poder público Isto faz com que a comunidade assuma uma identidade flutuante a fim de ter suas demandas atendidas sendo que Foz do Iguaçu é seu município domiciliar mas é de São Miguel do Iguaçu que estes sujeitos utilizam serviços básicos como saúde educação e suprimentos diversos Serviços que nem sempre são satisfatórios Somos de Foz mas estamos jogados entre os municípios observa o pescador Leocir de Oliveira Boes Moramos em Foz mas quando precisamos de serviços temos de ir a Foz brinca o pescador23 A ironia revela a dura realidade e mostra a condição destes moradores em relação ao poder público e como eles mesmos se veem No entanto ao que parece estes moradores não abrem mão de pertencer a Foz do Iguaçu Talvez porque estar ligado a uma cidade que se insere no cenário nacional e internacional com certo destaque possa proporcionar um que de status social de tal forma que acaba compensando a falta de atenção e o isolamento a que são submetidos Eles são iguaçuenses por imposição dos processos históricos não foram ouvidos quando a região foi alagada e tampouco quando Foz do Iguaçu e São Miguel disputavam a posse destas terras Porém um certo conformismo pode ser 23RIBEIRO Vitor Hugo CASSULI Danieli Cristina FRASSÃO Adair José Frason Território e Conflito Breve histórico sobre a implantação da Usina Hidroelétrica Itaipu Binacional e seus reflexos na produção do espaço 2012 FONTE GAZETA DO IGUAÇU httpwwwideallcombrcostaoestefmnoticiasdetaspcodnot17236 acessado em 19112011 74 percebido no discurso dos seus moradores nas diversas entrevistas concedias de forma quecaso fosse oferecida a possibilidade de escolha entre Foz do Iguaçu e São Miguel do Iguaçu como definição para uma identidade local é bem provável que estes moradores fariam a escolha por pertencer a Foz do Iguaçu Neste sentido os sujeitos são autônomos na escolha da sua identidade São capazes de avaliar aquilo que lhes é mais conveniente e assumir então os riscos que esta escolha lhes confere até mesmo viver deslocados e isolados entre duas cidades que não são a sua ou pertencer a um município que não supre suas necessidades básicas no que tange a serviços públicos mas que lhes oferece outras vantagens sejam elas culturais ou sociais Por deslocamento entendese um movimento voluntário ou involuntário em direção a outro lugar que pode ser territorial ou não pois há também deslocamentos socioeconômicos quando determinado indivíduo ou grupo social ascende ou descente sua categoria econômica ou dentro do grupo social a que pertence Os moradores de Alvorada do Iguaçu alguns experimentaram ambas as categorias pois precisaram deslocarse do seu território de maneira forçada sendo que não lhes foi oferecida a oportunidade de ficar No máximo poderiam escolher ficar próximos e neste caso pagar o preço alto que a especulação de terras estava cobrando Neste afã muitos acabaram sem seus recursos precisaram recomeçar do zero sendo assim deslocados de seus antigos padrões socioeconômicos relativamente confortáveis Outros ainda que optaram em recomeçar a vida noutras regiões especialmente no Norte e CentroOeste do país se viram tendo que lutar com terras em condições brutas e amargaram anos até que as mesmas estivessem em condições de produzir sem contar aqueles que foram enganados e roubados tanto no processo de expropriação quanto na aquisição de novas propriedades E houve também aqueles que optaram por deixar o campo e foram tentar a sorte nos centros urbanos Neste caso deslocados territorialmente socialmente e economicamente pois precisaram adquirir um novo modo de vida ao qual não estavam habituados Vila Bananal é o resultado de um destes movimentos de deslocamento Na Figura vemos como era região antes de 1981 quando Itaipu ainda estava na fase final de construção e o Lago ainda não havia sido formado como se observa no lado esquerdo da imagem Para maior compreensão delimitamos a área que 75 correspondia a Alvorada do Iguaçu com base nas informações da Lei que criou o Distrito Do lado direito da imagem vemos o Lago já formado Deixamos a área da antiga Alvorada do Iguaçu para melhor visualização e indicamos a localização da Vila Bananal conforme se lê na legenda Desenho3 Comparativo da antes de Itaipu 1981 com a limitação de Alvorada do Iguaçu e depois de Itaipu 2014indicandoa localização da Vila Bananal e área alagada Fonte Adaptado de httpapublicaorgosecosdeitaipu Legenda 01 Foz do Iguaçu 02 Alvorada do Iguaçu 03 Vila Bananal 04 Santa Terezinha de Itaipu 05 São Miguel do Iguaçu Como se observa a região que compreendia Alvorada do Iguaçu teve boa parte de suas terras coberta pelas águas Na imagem à direita Vila Bananal corresponde apenas à área delimitada com um círculo A parte indicada com número 02 que era parte integrante de Alvorada após Itaipu acabou sendo anexado ao território de Santa Terezinha de Itaipu Nada mais lógico que acontecesse o mesmo com a Vila Bananal ou seja que ela viesse a compor o território de São Miguel do Iguaçu devido à sua proximidade o que não aconteceu De fato a área chegou a ser disputada na época entre Foz do Iguaçu e São Miguel do Iguaçu Isto fez com que comunidade recebesse o apelido de Vila Malvinas numa clara alusão à guerra das Malvinas quando Argentina e Inglaterra entraram em disputa pelas Ilhas Malvinas no ano de 1982 mesmoano da formação do Lago de Itaipu O nome já revela o motivo A disputa não era por outra razão que não econômica uma vez que a região seria responsável por uma parcela significativa dos royalties pagos por Itaipu aos municípios lindeiros ao lago em 76 virtude da perda das terras produtivas sendo que depois de Santa Helena a maior área alagada compreendia exatamente a extinta Alvorada do Iguaçu Este pedaço de terra encravado entre os municípios de Santa Terezinha de Itaipu e São Miguel do Iguaçu já foi disputado no passado acarretando no apelido de Malvinas brasileiras uma menção à guerra entre a Argentina e a Inglaterra pelas Ilhas Malvinas A disputa tem forte motivação econômica Sem a Vila Bananal Foz perderia aproximadamente 60 do valor recebido em royalties pela Itaipu A distribuição dos royalties é proporcional à área alagada dos municípios com percentuais definidos pela Agência Nacional de Energia Elétrica Aneel GAZETA DO IGUAÇU Embora isolada porém a região continua desempenhando um papel importante na economia de Foz do Iguaçu Sua relevância se dá por pelo menos dois motivos aos quais vale à pena serem destacados primeiro porque a região é responsável por mais da metade do valor dos royalties pagos ao município o que não é pouco De acordo com informações obtidas no site de Itaipu o município recebeu até 2017 aproximadamente 3541 milhões de dólares sendo que 60 deste valor são atribuídos à perda da área correspondente a Alvorada do Iguaçu 20184 km2 de área alagada segundo porque ainda que reduzida em relação ao tamanho original as terras que restaram se constituem nas mais férteis da região e representam um bom percentual da área produtiva do município tanto de produtos agrícolas quanto da pecuária Em visita ao local a prefeitura de Foz do Iguaçu através do Gabinete Aberto detectou as seguintes demandas da comunidade que na verdade são reivindicações antigas que se arrastam a cada administração desde o seu surgimento A população quer se regularizar e isso é importante porque estamos falando de 8 mil hectares de área que pertencem a Foz sendo que 4500 hectares são produtivos Várias são as demandas como o poço artesiano a construção de um barracão comunitário que irá servir também como um posto de saúde clube de mães e um local de encontro para os moradores pois eles ainda não têm nenhuma estrutura pública em funcionamento PEREIRA Reni Prefeito Municipal São questões relativamente simples de se resolver ao menos na teoria porque na prática a realidade é outra A comunidade vive das promessas dos seus governantes quando estes aparecem para legitimar a posse do local para em seguidasuas necessidades caírem no esquecimento até que nova administração apareça com novas promessas Vale lembrar que estes moradores são domiciliados em Foz do Iguaçu no entanto seu cotidiano está muito mais relacionado a São Miguel do Iguaçu por conta da proximidade É em São Miguel que as crianças estudam e para isto contam com um ônibus cedido pela prefeitura de Foz do Iguaçu 77 que faz o transporte até São Miguel Quando chove porém é um problema pois a única estrada que é pavimentada é a principal sendo que as vicinais são de terra ficando intransitáveis em tempos chuvosos O transporte de alunos acaba sendo também a única opção para aqueles moradores que não tem veículo próprio e que se utilizam deste serviço para se locomoverem ao município vizinho Em relação à saúde os casos mais simples são tratados em São Miguel já os que precisam de uma maior atenção são tratados em Foz do Iguaçu Quando a população se mobiliza e reivindica mais atenção especialmente utilizandose algum veículo de comunicação a prefeitura de Foz faz um mutirão para atender a população mas por não haver prosseguimento acaba não tendo o efeito desejadoAo ser entrevistada a moradora Adriana de Melo que vive a mais de 20 anos no local fez a seguinte declaração na Vila Bananal é muito bom viver tem muita paz Nossa maior dificuldade é quando alguém fica doente pois não temos nenhum posto de saúde por aqui quando precisamos temos que recorrer ao vizinho que tem carro e corremos para a cidade de São Miguel pois é a mais próxima Todas as 37 famílias que vivem aqui se conhecem e ajudamos um ao outro em tudo nascemos e fomos criados aqui e não queremos sair da Vila Bananal declarou Adriana na época grifo nosso Este mesmo argumento aparece também no discurso do nosso entrevistado Segundo ele relata o descaso e o abandono são o grande problema que os habitantes do lugar enfrentam diariamente Questões simples como a substituição de uma lâmpada queimada em um poste se transforma em uma grande batalha uma vez que em Foz do Iguaçu os responsáveis não vêm por causa da distância e em São Miguel do Iguaçu não vêm porque alegam não ser da competência deles e assim os moradores ficam no escuro por meses Neste sentido o que poderia ser uma conveniência poder contar com a estrutura de dois municípios acaba se tornando um problema uma vez que como iguaçuenses precisam contar com a solidariedade do município vizinho sendo queum empurra a responsabilidade para o outro Sr Mario Olha eu digo até a verdade São Miguel eu até sinto eu até sinto morar longe de Foz do Iguaçu sinto Agora aqui em São Miguel pra nós nós estamos aqui obrigados obrigados porque neste canto aqui olha eu precisei eu fui lá na farmácia pegar um remédio esta semana aí por um descuido de nada o ônibus não tinha aluno porque nós sempre ocupamos o ônibus que puxa os alunos é o único transporte que tem Aí o ônibus veio embora e eu precisei pagar setenta reais para o rapaz me trazer aqui 78 O município de Foz do Iguaçu que tem toda a responsabilidade administrativa e social com a Vila Bananal não se vê capaz de suprir suas demandas e acaba jogando a responsabilidade ou apoiando sua falta de ação a uma decisão de Itaipu No entanto o município já recebe os royalties referentes àquela área cabendo ao governo municipal direcionar uma parcela destes recursos em direção aos anseios da comunidade Vila Bananal Com isto não estamos negando a responsabilidade social que Itaipu deveria ter com o local por ser a responsável por sua existência mas apenas apontando que a inércia tanto de uma quanto de outra acaba agravando a situação desta população Existe a possibilidade de uma parceria com a Itaipu para a construção de uma barracão comunitário somente depois disso podemos deslocar uma equipe seja a cada 15 dias ou a cada semana regularmente para fazer o atendimento médico as famílias porque hoje não adianta nós mandarmos uma enfermeira porque não tem onde atenderPEREIRA Reni Prefeito Municipal A parceria ainda está à espera de se concretizar O barracão existe mas permanece inacabado ao lado da Igreja que os próprios moradores construíram com recursos arrecadados entre eles através de festas rifas e doações Esforço que chegou a ser usurpado por pessoas que se utilizaram da oportunidade para benefício próprio desviando recursos e doações que deveriam ser revertidos para a construção da igreja e do barracão como relata com ressentimento o Sr Mario É no salão da igreja que a comunidade se reúne seja para a missa quando é deslocado um sacerdote para oficiar a cerimônia para reuniões comunitárias ou até mesmo as ações da prefeitura quando esta desloca médicos dentistas ou outros profissionais para atender a comunidade A parceria de Itaipu só existe na teoria Ela interferiu e interfere diretamente no cotidiano da Vila Bananal mas não da forma como deveria trazendo recursos oferecendo desenvolvimento e condições de sustentabilidade para a comunidade Sua presença na região tem consequência direta na existência da Vila Bananal e ainda a mantém isolada naquele pedaço de terra Perguntado se Itaipu contribui de alguma forma com a comunidade assim responde o Sr Mario Nada nada nada Digo a verdade pro senhor a Itaipu nem é lembrada aqui Eles não vêm aqui A Itaipu não Nunca deu nada nunca fez nada nunca ajudou com nada nunca se lembrou do lugar só se lembra eu falo bem a verdade pro senhor e adoro que seja bem gravado que nunca ajudou e nunca lembrou Só se lembram do lugar quando tem que levar o dinheiro para lá mas ajudar com alguma coisa não 79 Esta declaração é reveladora e ao mesmo tempo intrigante tendo em vista que a empresa desenvolve diversos projetos de desenvolvimento ambiental e agrícola em parceria com os municípios afetados pelo lago Outro fator que causa estranheza é a presença de uma família ilustre no local Em entrevista concedida em 1997 João Samek pai de Jorge Samek que foi presidente brasileiro de Itaipu de 2012 a 2017 um dos proprietários de terras na Vila Bananal fez a seguinte declaração quando indagado sobre ser um latifundiário da região Comprei minha terra mas não creio que seja latifundiário Tinha cerca de 500 alqueires dos quais perdi cerca de 150 para o lago de Itaipu Com o que sobrou formei a fazenda Cacique Localizada perto de São Miguel do Iguaçu naquela área de Foz do Iguaçu seccionada pelo lago de Itaipu as chamadas Malvinas CAMPANA ALENCAR 199724 Segundo o Sr Mario um de seus filhos chegou a trabalhar muitos anos para João Samek A Fazenda cobre uma vasta área na região bem próxima ao lago Fica então a pergunta Itaipu realmente mantémse inerte em relação à Vila Bananal ou sua presença beneficia alguns em detrimento de outros Não encontramos dados suficientes para dar a resposta Através do cruzamento fontes podemos detectar outras questões que não aparecem nas entrevistas e nem nos trabalhos já realizados mas que merecem uma atenção devido à gravidade e os desdobramentos que acabam acarretando Uma busca na internet pelo portal de pesquisas Googlecombr usando a referência Vila Bananal denuncia que o lugar se transformou em ponto estratégico para o contrabando e descaminho Não são poucas as matérias divulgadas pelos meios de comunicação local dando conta de apreensões perseguições e outras ações do gênero efetuadas na região Quando da nossa primeira visita ao local nos foi sugerido evitar aproximarnos da mata ciliar pois a aproximação de estranhos é tida como ameaça por parte daqueles que utilizam o local como ponto estratégico para o escoamento de produtos contrabandeados do país vizinho Até mesmo o Sr Mario aponta que às vezes o lugar se enche de policiais tanto federais quanto militares que fazem ações no local para coibir a marginalidade mas que segundo ele não afeta a vida no local 24Trecho retirado da entrevista concedida por João Samek publicada no livro Foz do Iguaçu Retratos produzido pela Campana Alencar Ltda antiga editora dos jornalistas Silvio Campana e Chico de Alencar em 1997 e publicada pelo blog httph2fozcombr acessado em 22032017 80 Foto 20Porto clandestino na Vila Bananal Fonte httppontodanoticiacom Foto 21Um veículo Duster roubado em São Paulo na Vila Bananal Fonte httpwwwradioculturafozcombr 81 Foto 22 Caminhão carregado com cigarros na região da Vila Bananal Fonte httpwwwjtribunapopularcombr Foto 23Uma embarcação com 250 caixas de cigarro apreendida na Vila Bananal Fonte httpg1globocomprparananoticia Sendo assim temos um território de aproximadamente 8 mil hectares sendo que destes 4500 são produtivos Área que pertence ao município e que é responsável por 60 do valor que a cidade recebe mensalmente como compensação pela perda de território inundado por Itaipu mas cujo benefício direto desta indenização não chega de fato a esta comunidade Um município que não responde aos anseios desta comunidade mas que também não abre mão dela porque se beneficia diretamente dos recursos advindos dela seja pelos royalties ou pela produção agrícola e pecuária que de lá provém Ao que parece ainda demorará até que esta comunidade se veja representada e com o devido valor reconhecido 82 CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta pesquisa trouxe importantes reflexões sobre a realidade no Oeste do Paraná especialmente no que diz respeito à sua formação e processos sofridos ao longo dos anos mas principalmente nos últimos cem anos quando transformações mais profundas ocorreram Ficou claro que o desenvolvimento da região seguiria um outro caminho não fosse a imposição de projetos nacionais que se sobrepuseram sobre processos anteriores Uma região de fronteiras onde essas eram menos rígidas e excludentes onde a presença indígena ainda se podia notar e que pelo isolamento sentia menos a interferência do nacionalismo que mais tarde traria um contingente de pessoas para ocupar os espaços que se julgavam vazios Este vazio apontado pela historiografia localdeu margem para que o governo brasileiro lançasse seu olhar para esta região Vazio que na verdade nunca existiu Um olhar eurocentrado e de cunho colonial O mesmo olhar que Europa lançou sobre as Américas portuguesa e espanhola reconhecendo nelas espaços que precisavam ser desbravados ocupados e dominados Para isto era necessário apagar um passado de ocupações indígenas e estrangeiras que já faziam desta região um lugar de intensas relações Por isto a história da região é contada de forma a não levar em conta séculos da presença indígena e espanhola muito menos afrodescendente Este nacionalismo se manifestou primeiro pela instalação da Colônia Militar e a abertura da estrada entre Guarapuava e a Foz do Iguaçu Em seguida a colonização se daria a partir Marcha para o Oeste com a presença das Empresas Colonizadoras que seriam responsáveis por todo um fluxo de imigrantes gaúchos catarinenses e paranaenses sendo muitos deles de origem estrangeira principalmente alemães italianos e poloneses A intenção real era expulsar os que aqui já se faziam presentes e através desta nova classe de pessoas reescrever a história da região entregando a estes o pioneirismo regional Este é um ponto que causa estranheza já que a intenção era nacionalizar as regiões de fronteira e dominála através da língua portuguesa o que na prática não se via tendo em vista que a quantidade de pessoas de língua estrangeira presentes na região trazidas justamente por estes fluxosmigratórios era grande 83 A identidades são construídas pelos sujeitos a partir de suas próprias lógicas e necessidades e elas são autônomas neste sentido para fazer uso da forma como acharem mais conveniente Por isto uma vez estabelecidas na região estes sujeitos estabeleceram entre seus pares e com os outros relações que permitissem conectarse socialmente mas guardando suas próprias tradições e elementos culturais Desta é forma ainda é comum que em algumas regiões se perceba a presença decolônias bem definidas com predominância de pessoas de origem estrangeira alemã italiana polonesa etc onde as tradições estão presentes na fala na comida na cor da pele na religiosidade Em Foz do Iguaçu observase uma realidade um pouco diferente por conta de outros fluxos tais comoItaipu Turismo e o comércio com as nações vizinhas Por conta disto vemos um panorama multicultural na região atualmente mas ainda assim com pouca mistura entres as diversas etnias Quando em meados da década de 1960 a necessidade da construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu estava em discussão o Distrito de Alvorada do Iguaçu estava sendo criado Quando em 1976 as obras se iniciaram no canteiro de obras Alvorada já estava em franco desenvolvimento e consistiase numa comunidade bem organizada socialmente economicamente e politicamente Sua população com cerca de 5 a 7 mil habitantes era proveniente dos fluxos migratórios impulsionados pelas colonizadoras Porém a imposição de outro projeto de desenvolvimento acabou impedindo que este fosse adiante É interessante notar que o projeto econômico se sobrepôs ao projeto cultural e identitário que já estava em desenvolvimento com a ocupação da região Alvorada foi a primeira vítima que estava no caminho da grande Itaipu Binacional Itaipu enquanto uma obra construída em nome do progresso não levou em consideração as comunidades que estavam em seu caminho fossem elas rurais urbanas indígenas e nem tampouco a flora e fauna que se perderia Uma vez consolidada e colecionando a cada ano recordes na geração de energia Itaipu pode colocarse como um Desafio superado Esta é a palavra que define a empresa atualmente em sua página na internet Mas na época da construção o Progressoera a palavra de ordem que passava por cima de tudo e de todos Itaipu é o reflexo de uma época marcada pelo autoritarismo e pela imposição governamental aparelhada pelo militarismo Talvez por conta disto não 84 esperava que houvesse resistência por parte dos expropriados e nem que estes pudessem se organizar em torno dos seus direitos como de fato aconteceu especialmente numa região que teve sua origem a partir de uma Colônia Militar e com governos indicados por estes Os estudos sobre os atingidos por barragens têm mostrado que os sujeitos tanto em relação à Itaipu quanto em outras barragens sabem sim organizaremse e buscarem seus direitos sejaem grupo ou individualmente Está provado também que a construção de uma hidroelétrica traz como consequência transformações diretas na vida das comunidades por ela afetadas e seus efeitos negativos são proporcionais ao tamanho da obra Neste exato momento em que este trabalho está sendo escrito está em andamento a Usina Hidrelétrica de Belo Monte no Pará Uma obra que se arrastou por décadas e que sai do papel passando por cima de comunidades ribeirinhas e terras indígenas trazendo uma série de consequências para a biodiversidade animal e vegetal Já Itaipu trouxe além destas questões um desequilíbrio sociocultural para Foz do Iguaçu e região sendo responsável pela extinção do Distrito de Alvorada do Iguaçu bem como no êxodo de cerca de 40 mil pessoas no seu caminho somente do lado brasileiro Uma família que é deslocada de seu lugar de origem de forma traumática como foi o caso dos expropriados de Itaipu deixam para traz bem mais do que sua terra ou propriedade mas também sua história relações sociais e econômicas estabelecidas com outras famílias e com a região da qual está sendo removida Esta foi a realidade vivida por estas famílias que tiveram que amargar sair do seu local e buscar outra forma de vidafosse na região ou em outros locais afastados No processo de deslocamento muitas famílias acabaram sendo separadas tendo em vista que para começar nova vidaalguns escolheram permanecer na região enquanto outros optaram por refazer a vida em lugares distantes onde pensavam haver melhores condições Muitos dos que partiram decepcionaramse e se viram expropriados duas vezes uma por Itaipu outra por exploradores malintencionados Outra consequência direta de Itaipu na região foio surgimento da Vila Bananal já que esta originouse a partir da formação do lago de Itaipu Estando próxima a São Miguel do Iguaçu as terras poderiam facilmente ter sido incorporadas ao território deste Porém seu valor econômico para o município de Foz do Iguaçu 85 fez com que esta não abrisse mão da área mesmo sabendo do isolamento a que as famílias que ali viviam teriam de amargar Dos royalties pagos por Itapu referente a área inundada de Foz do Iguaçu 60 eram provenientes desta área além de Vila Bananal compor parte expressiva da área rural do município Economicamente Vila Bananal é extremamente valiosa mas socialmente chama pouco a atenção a não ser pelas manchetes no setor policial que têm dado destaque à diversas apreensões de produtos ilegais no local Do lucro que ela traz ao município nada retorna de fato Itaipu também pouco interfere na região a não ser pelo lago que mantém a comunidade incomunicável com restante do município Se Vila Bananal praticamente não é lembrada Alvorada do Iguaçu não será esquecida A natureza tratará de nos lembrar em alguma época expondo novamente suas ruínas e trazendo à tona a discussão em torno dos efeitos de Itaipu na região Oeste do Paraná Além disto a história da região está sendo contada e recontada a cada novo trabalho Esperamos ter contribuído um pouco para ampliar o conhecimento a cerca destes processos recentes que ainda estão sendo construídos 86 REFERÊNCIAS ALBUQUERQUE JÚNIOR Durval Muniz de História A arte de inventar o passado Ensaios de teoria da história Bauru Edusc 2007 AMADO Janaína Região sertão nação Em Estudos histórico Rio de Janeiro Vol8 nº 15 1995 pp 145 a 151 BOSI Ecléa Memória e sociedade Lembranças de velhos 3ª ed São PauloCompanhia das Letras 1994 BURILLE Celma Faria de Souza Nas tramas da separação o caso do Estado do Iguaçu nas décadas de 1960 e 1990 Curitiba 2010 122f GERMANI Guiomar Inez Expropriados terra e água o conflito de Itaipu Salvador Edufba ULBRA 2003 HALL Stuart A identidade cultural na pós modernidade tradução Tomaz Tadeu da Silva Guacira Lopes Louro11 Ed Rio de janeiro DPA 2006 KARPINSKI Cezar Sobre as águas a memória a usina hidrelétrica de Salto Caxias e a história dos que ficaram Marechal Cândido Rondon 2004 LEDEZMA MENESES Gerson Galo Del descubrimiento y laconquistadel oeste del paraná1 hasta laconstrucción de itaipu La visión de tiempo de una sociedadeurocéntrica Revsita SURES 2014 nº4 p 1341 LE GOFF Jacques História e memória tradução Bernardo Leitão et al Campinas SP Editora da UNICAMP 1990 LIMA Perci Foz do Iguaçu e sua história Foz do Iguaçu SE 2001 LOPES Sérgio O Território do Iguaçu no contexto da Marcha para oeste CascavelEdunioeste 2002 MASCARENHAS Milena Costa Poeira X Unicon confrontos e contrapontos entre atingidos e itaipu 2009 Maringá PR MATIELLO Catiane Narrativas tecnológicas desenraizamento e cultura de resistência história oral de vida de famílias desapropriadas pela construção da Usina Hidrelétrica de itaipu CuritibaPR 2011 MAZZAROLLO Juvêncio A taipa da injustiça esbanjamento econômico drama social e holocausto ecológico em Itaipu Edições Loyola São Paulo 2003 MELCHIOR Kleber Dreicy A migração dos mortos Remanejamento de cemitérios na região do Lago de Itaipu Universidade Estadual do Oeste do Paraná Foz do Iguaçu 2012 NORA Pierre Lugares de memória Entre memória e história a problemática dos lugares Tradução Yara AunKhoury Projeto História São Paulo PUCSP 1993 p 7 22 87 PENA CATTA Luiz Eduardo O cotidiano de uma fronteira A perversidade da modernidade Cascavel Unioeste 2003 PRIORI A et al História do Paraná séculos XIX e XX online Maringá Eduem 2012 234 p RIBEIRO Maria de Fátima Bento Itaipu a dança das águas histórias e memórias de 1966 a 1984 Campinas SP s n 2006 RIBEIRO Maria de Fátima Bento Memórias do concreto vozes na construção de Itaipu Edunioeste CascavelPR 2002 RIBEIRO Vitor Hugo CASSULI Danieli Cristina FRASSÃO Adair José Frason Território e Conflito Breve histórico sobre a implantação da Usina Hidroelétrica Itaipu Binacional e seus reflexos na produção do espaço 2012 SANTOS Ana Paula dosLago de memórias a submersão das Sete QuedasAna Paula dos Santos Maringá 2006 133 p SCHREINER Davi F Memórias da Terra em Revista Helena Ano 1 nº2 Secretaria de Estado e Cultura Curitiba 2013 SCHIMMELPFENG Otila Retrospectos iguaçuenses Narrativas Históricas de Foz do Iguaçu Editora Tezza Ltda Foz do IguaçuPR 1991 SCHMITT Judite Veranisa Os atingidos por Itaipu história e memória Oeste do Paraná décadas de 1970 a 2000 UNIOESTE 2008 THAUMATURGO Leila Regina Youssef SIMÕES Silvio Jorge Coelho TRANNIN Isabel Cristina de Barros A construção da usina hidrelétrica de Itaipu e seu impacto sobre aurbanização de Foz do Iguaçu Universidade Estadual Paulista UNESP 2013 THOMPSON Paul A voz do Passado História Oral São Paulo SP Paz Terra 1992 WACHOWICZ Ruy Cristovam Obrageros mensus e colonos história do oeste paranaense 2º Edição Curitiba Ed Vicentina 1987 218 p REFERÊNCIAS DA INTERNET Jornal NOSSO TEMPO Informativo Digital Edições de1980 a1982 disponível em httpwwwnossotempodigitalcombr acessado em outubro 2016 Governo investe na construção de 86 hidrelétricas e tem centenas no papel Disponível em httpswwwaecwebcombrcontmrdogovernoinvestena construcaode86hidreletricasetemcentenasnopapel7037 acessado em abril de 2017 88 Itaipu BinacionalNossa História disponível em wwwitaipugovbracessado em novembro de 2016 Usina refez o mapa da região Oeste disponível emhttpwwwgazetadopovocombreconomiaespeciaisitaipu30anosusinarefez omapadaregiaooeste8tbwwaaiyoig2mbijrefca2j2 acessado em 260520107 Adeus Sete Quedas disponível em brpinterestcomcleyscholzadeussete quedasacessado em maio de 2017 Os ecos de Itaipu Agência de Reportagem e Jornalismo Investigativo disponível em httpapublicaorgosecosdeitaipu acessado em fevereiro 2017 Quas seriam as fronteiras do Estado Disponível em httpestadodoiguacuagorablogspotcombr acessado em outubro de 2016 Leis Municipais da Câmara Municipal de Foz do Iguaçu disponível em httpsleismunicipaiscombr acessado em março de 2017 O grande capítulo dos 100 anos disponível em httpjieitaipugovbrnode55921 acessado em abril de 2017 Polícia Federal apreende quase 2 toneladas de maconha em porto clandestino no Lago de Itaipu disponível em httppontodanoticiacomver noticiaphpuid10607 acessado em abril de 2017 Policiais encontram mais de 700 kg de maconha em carro clonado disponível em httpwwwradioculturafozcombrpoliciaisencontrammaisde700kgde maconhaemcarroclonadoWWTDFYTyuUk acessado em abril de 2017 PF aprende caminhão carregado com cigarros na região da vila bananal disponível em httpwwwjtribunapopularcombrartigopfaprendecaminhao carregadocomcigarrosnaregiaodavilabananalWWS9woTyuUk acessado em abril de 2017 Barco com caixas de cigarro é abandonado no Lago de Itaipu no PR disponível emhttpg1globocomprparananoticia201104barcocomcaixasdecigarroe abandonadonolagodeitaipunoprhtml acessado em abril de 2017 89 ANEXOS Entrevista com Sr Mario Batistelli realizada em 12 de março de 2017 Duração14300 Edson O Sr Chegou aqui em que ano seu Mario Sr Mario Eu cheguei aqui em 73 Edson O ano que eu nasci eu estou com43 Sr Mario É Em 73 o srvê que faz tempo Eu tenho filho também que logo que nós chagamos aqui eleeu cheguei no mês de junho e ele nasceu em setembro Ele deve ta com 43 também Edson Eu sou de agosto pertinho Sr Mario É ele é do dia 30 de setembro Edson O Sr Veio da onde Sr Mario Eu vim do Rio Grande do Sul Eu sou natural de Passo Fundo Edson Veio com a família Sr Mario Vim vim Eu morei muito tempo em Santa Catarina que lá morava um irmão meu nós trabalhamos muito numa cerraria pra um tal de Dionísio Monfrede lá do Rio Grande que era o patrão e depois eu vim pro Rio Grande pra ir servir Eu tinha que servir em Passo Fundo que naquele tempo a gente era alistado era onde tinha que ir servir né Então eu vim de lá com dezessete anos e meio eu vim de Santa Catarina parei na casa dos meus cunhado e esperando a hora de ir servir mas daí no fim do remate me julgaram incapaz daí eu tirei a Terceira todo o documento e não fui servir é Edson O sr Era solteiro ainda naquela época ele não entende a pergunta eachar que estou perguntando sobre o documento de reservista Sr Mario Tenho tenho os documentos tudo guardado Então daquele tempo faz muitos anos mas a gente o documento que a gente pega a gente tem que guardar porque um dia pode precisar dele Edson Sim com certeza Eu insisto na pergunta O sr Era solteiro nessa época Sr Mario Era eu era solteiro Edson E casou aqui Sr Mario Eu casei lá no Rio Grande Até que antes de servir antes de servir eu casei Então foi assim Eu parava na casa dos meus cunhados mas eu já me criei sem pai e sem mãe e justamente foi muito sofrido E trabalhava muito e naquele tempo ninguém queria pagar nada o muito que davam era uma mudinha de roupa e comida e aquilo foi me enfadando dando uma coisa ruim porque eu dizia trabalhar tanto pra não ganhar nada o que era feito da minha vida Eu vou ter que me virar e fazer pra mim Daí foi a hora que achei com quem casar achei que era uma família de gente muito boa Então eu digo eu sou novo mas eu vou casar e ainda o meu 90 sogro falou não se você tiver que servir não tem problema a filha fica aqui em casa porque nós necessitamos que ela fique aqui mesmo que a mãe dela é paralítica não tem importância esse negócio se tiver que servir vai servir e se não melhor porque dai já pega trabalhar pra sim né Aí foi o jeito que eu casei eu casei no dia 28 de outubro de 1955 e era pra mim servir no dia 15 de novembro dai eu fui Mas ai julgaram incapaz eu me apresentei pro sargento o registro de casamento e acho que foi por isto que ele me dispensou Edson Daí vieram pra cá Sr Mario Daí fiquei lá fiquei trabalhando Aí eu pedi o meu sogro tinha muita terra mas ele era um homem engraçado ele pouco trabalhava a terra dele não arrendava e não deixava ninguém plantar na terra dele Então eu fui lá na casa dum compadre meu e pedi ele tinha bastante terra uns 30 alqueire de terra e eu disse compadre eu queria mudar de casa e queria trabalhar mas trabalhar junto eu pago renda da terra e deu um lugar de casa eu comprei uma madeira e fizemos um ranchinho e comecei a trabalhar No primeiro ano eu plantei eu fiz 8 mil de milho plantei em sociedade pagando renda e ainda deu um bom ano pra mim e foi muito bom aquele dinheiro Mas pra mim o sr Imagine que pra mim poder casar eu tive que vender uma terra que meu pai deixou de herança Eu tive que vender aquela minha terra porque outro jeito não tinha Então até tinha gente que falava mas fulano tem que vender a terra dele meu Deus do céu no tempo de comprar mais vai vender a que tem Outro jeito não tinha E aí eu fiquei trabalhando com meu compadre lá uns dois anos e daí o meu sogro mudou de lá desse lugar e veio aqui pra perto duma capela chamada São Luiz na beira do asfalto E era tinha mais ou menos uns 20 quilômetros de distância Então ele comprou uma moradia muito boa menos terra mas a casa muito boa Mas ai eu cheguei por ali e eu pedi pra um parente dele que também tinha bastante terra e parente da minha mulher pra me arrendar um pedacinho de terra pra mim plantar e que tivesse um rancho pra mim morar e ele foi muito pronto e disse tem uma casinha ali o terreno era grande vamos lá olhar as casinha se te servir pode vir que terra pra plantar aqui tem bastante Daí então mudamos pra lá mais pra perto de onde estava o sogro Daí naquele ano no que deu 8 mil de milho já deu pra comprar muita coisa pra casa Deu um dinheirinho deu pra comprar garfo colher faca muita coisa E a mulher tinha um pouquinho de gado vaca de leite já criamos um bocado de porco e galinha e já foi melhorando a vida né E daí trabalhei mais 2 anos com esse homem e daí eu comprei um pedaço de terra na divisa da terra do meu sogro Eu achei melhor fazer outro rancho ali e morar no que era meu Então dali pra frente toda a vida fiquei morando sempre no que era meu Não dependi mais de pedir lugar pra outras pessoas Eu fui comprando era uns órfãos eles tinham uma parte de terra de 11 hectares então eu fui comprando de um em um aquela parte de terra e pagando escriturando e depois chegou num ponto que o homem lá tinha o meu sogro trabalhou muito pra esse homem era peão desse homem esse homem era fazendeiro um homem muito bom chamava Franklin Lisboa de Souza Aí chegou seu Franklin e falou olha eu tenho um criado meu que mora ali que até é meu compadre e ele tinha 125 hectares de terra O fazendeiro deu pro criado que era criado desse fazendeiro esse homem que eu falo que era meu compadre Aí eu sei que seu Frankilin trocou com o criado Ele tinha um campo lá mais retirado e tinha um gado lá e ele precisava de quem cuidasse daquele gado Então ele disse fulano 91 eu te dou uma tem 125 eu te dou 25 hectares lá pra você me cuidar aquele gado que eu já estou de idade já tenho gado aqui eu não posso estar lá cuidando e preciso de uma pessoa pra cuidar lá Então se você for pra lá tem tudo tem mangueira tem três casas tem tudo mangueirão muito grande pra fechar porco uma moradia muito boa Aí o criado aceitou E daí então o seu Frankilineu estava meio pobre ainda não tinha muita coisa ai o seu Frankilin ofereceu aquela terra pra vizinhança ali onde tinha o Angelin Lira que já tinha comprado 85 hectare do seu Frankilin na divisa dessa que eu comprei E essa que eu comprei pra esse homem era o principal porque pra ele sair tinha que passar dentro do que era meu Então seu Franklin ofereceu ofereceu 80 mil por 100 mil aquelas 125 hectares de terra e ninguém quis comprar Daí não sei se por intermédio do outro compadre meu chamado Natalino que morava mais adiante ele me indicou Disse ó aí tem um homem muito trabalhador e ele é capaz de lhe comprar essa terra Aí o seu Frankilin veio atrás de mim e falou o fulano quer me comprar esses 125 hectares de terra Eu disse mas eu não posso comprar porque não tenho com o que pagar Eu tenho terra aqui mas é pouca Se eu vender não da a metade do que o sr me pediu Ele me pediu 160 mil Pros outros dava até por cento e pouco pra mim já quase dobrou o preço Mas eu não tenho como comprar eu não posso Não eu te vendo a terra com condição você me paga a terça parte do que você colhe e me dá 80 mil de entrada e o resto eu te dou prazo de um ano Quando você fizer as colheitas daí você me paga Daí fizemos negócio Dai eu vendi aquelas hectares que eu tinha comprado e escriturado pra um cunhado meu por 60 mil e fomos reunindo mais um dinheirinho pra dar os 80 mil e ainda tinha completar 100 mil porque pagava 20 mil de escritura Aí eu fui me virando pegando dinheiro emprestado pra um pra outro e eu tinha mais dinheiro pra receber com letra assinada mas era em mês de julho que ia receber esse dinheiro e ali naquele tempo era o mês de março ou abril que foi feito esse negócio Aí fui lá na casa de um compadre meu que ele sempre tirava bastante dinheiro no banco aonde que eu tinha plantado todos esses anos junto com ele e disse compadre eu queria 20 mil emprestado que eu precisava comprar essa terra comprei essa terra e estou apurado Mas olha compadre eu não tenho Eu tirei na verdade um dinheiro no banco mas tive que comprar 2 pareias de gado e gastei o dinheiro Aí me virei cheguei na casa de um outro compadre meu e falei o fulano eu vou te fazer uma proposta você me arruma 20 conto hoje e te dou 50 daqui trinta dias Edson Nossa bastante Sr Mario Bastante bastante Porque ele era pão duro Ele tinha o dinheiro mas era pão duro Eu te dou a letra assinada aqui eu te dou 50 por 20 Ah ele me arrumou o dinheiro na hora Aí completei um pouco daqui um pouco dali completei os 100 mil Daí esse fazendeiro esse vizinho que tinha par eu trabalhando pra ele minha mulher ajudando bem dizer na casa dele porque a mulher dele era muito doente ele vivia com a mulher no hospital e minha mulher tinha cuidar das crianças nossas e as dele E ele me atraiçoando pra comprar essa terra Quando ele viu que eu ia comprar ele foi e ofereceu 200 mil Ofereceu 200 mil eu digo o meu Deus do céu Aí o fazendeiro ele tinha uma mulher muito danada e a mulher danou brigar com o fazendeiro porque aonde é que se viu perder de vender por esse dinheiro pra vender a terra mal vendida barbaridade e tem que sair fora de vender a terra pra esse homem e vender pro 92 Angelin Lira porque ele tem o dinheiro já comprou um milhão de campo nosso comprou 85 hectares vizinho dele e não pode perder esse negócio Aí o fazendeiro enlocou e daí ele mandou me chamar Mandou me chamar e era um dia de chuva mas chuva rapaz Encilhei o cavalo botei minha capa de chuva mais ou menos duas horas de viagem fui lá na casa dele saber o que ele queria comigo Eh barbaridade agora eu quero tanto de dinheiro senãonão falou que ia desistir do negócio mas ele falou assim ele sustentava o negócio se eu arrumasse todo esse dinheiro dentro de quatro dias Se eu não arrumasse o dinheiro dentro de quatro dias tava desfeito nosso negócio porque nós não tínhamos papel não tínhamos testemunha nem nada Foi feito negócio só nós dois Eu falei tá bom seu Frankilin tá bom Aí chegou na quartafeira eu arrumei o dinheiro e cheguei lá e disse o seu Franklin Eh barbaridade Ele era um homem muito bom Aí eu sei dizer que eu falei Seu Frankilin eu vim aqui lhe falar pro senhor que amanhã vamos fazer a escritura porque o dinheiro está aqui Eh barbaridade onde é que arrumou todo esse dinheiro Você tinha dinheiro guardado Eu disse eu não tinha nada eu não tinha um centavo em casa seu Frankilin Esse dinheiro sabe como eu consegui Eu vendi a minha terra o rapaz ainda foi no banco fez um financiamento no nome do pai dele e tirou o financiamento e me pagou a terra e daí ele pagou o pai dele E uma parte eu me virei e arrumei o dinheiro e ta aqui eu tenho cem conto É 80 da primeira prestação e 20 da escritura Fomos lá na Lagoa Vermelha fazer a escritura o homem pega tinha uma bruaca cheia de escritura ele pegou uma escritura sei lá da onde perdemos viagem o escrivão disse mas essa escritura não é da terra que o senhor vendeu A terra que o senhor vendeu é lá em tal lugar E o polícia era genro dele do fazendeiro e era quem dirigia o jipe do fazendeiro E eu tinha que ir de Ônibus Aí então fica pra semana que vem Eu já desconfiado esse velho está de mancada Mas não tem como agora eu arrumei o dinheiro tudo o que ele pediu está aqui e pra ele sair fora fica ruim E ele me falou depois que ele só não caiu fora do negócio comigo só porque ele tinha contado pros outros fazendeiros que tinha me vendido esta terra Ele falou pra mim senão eu caia fora do negócio Eu não ia deixar de pegar 200 pra vender por 160 Com tudo que era fazendeiro e além de tudo era um homem de idade quem morava com ele era um irmão dele mudo ainda estava com 70 anos de idade naquela época E a mulher dele logo que ele casou ele se separou a mulher era muito ligeira né muito vagabunda e daí se separaram e ele pegou esta outra e esta outra era muito danada muito é por isto que povo fala não confia em ninguém não porque confiou está roubado Porque ele pegou esta mulher esta mulher bebia muita pinga Ela vivia com um barril de pinga no porão da casa e bebia muita pinga e caía e se machucava e ficava mastigando fumo o dia inteiro Nunca vi uma coisa assim Aí o seu Franklin falava seu Mario vem aqui Eu tenho ai uns dois quilômetros de cerca pra arrumar Vem arrumar a cerca pra mim Eu ia lá trabalhava quinze dias e não cobrava nada Arrumando cerca pra ele lavrando a lavoura dele pra plantar com boi ele me dava boi pra amansar pra trabalhar e daí eu trabalhava pra ele de graça porque ele também me ajudava Aí eu sei dizer que vira pra cá vira pra lá essa mulher ficou junto com o Frankilin sempre consultando advogado escondido do seu Frankilin E quando completasse quatorze anos que ela morava junto ela era dona da metade do capital que o fazendeiro tinha No dia que completasse os quatorze anos poderia ir lá no 93 advogado e falar hoje está completando quatorze anos então daí poderia dividir a fazenda e o dinheiro e o gado que ele tem Aí o fazendeiro meu Pai do Céu quando aconteceu isto caiu os braços dele Ele ficou muito triste O que ele falava pra mim assim que aquela fazenda nem por uma bola de ouro ele não dava Aquela fazenda dele ele não vendia de jeito nenhum Tinha outro fazendeiro a par ele lutou pra ver se empurrava uma filha pra esse velho pra ver se matava o velho e ficar com a fazenda Mas o Frankilin não era muito bobo e não quis Foi pegar outra pegou uma cobra Viviam brigando a vida inteira porque ela bebia muito caia ai virava aquela rezinga eu trabalhava chegava lá e estava aquela rezinga entre eles Edson Isto tudo foi lá no Rio Grande do Sul né seu Mario Sr Mario É Edson E quando o senhor veio pra cá Como o senhor achou o lugar aqui Sr Mario Ah quando eu cheguei aqui no Paraná eu vendi esse 5 alqueire de terra e comprei 10 alqueires desse meu compadre que foi o primeiro homem que eu comecei trabalhar depois que eu casei porque nós dividíamos o produto Aí comprei 10 alqueires lá aí fui pra lá Daí de lá que eu vendi e vim pra cá Daí lá pra mim foi muito ruim muito ruim Foi o pior azar que eu tive na minha vida foi comprar aqueles 10 alqueires de terra lá Eu paguei 4 mil por 10 alqueires e vendi aqueles 5 alqueires de terra eu vendi pra um cara lá esse mesmo que estava me atraiçoando eu vendi pra ele por 3 mil Sai de uma de 5 comprando 10 está aumentando vou arriscar ir pra frente né E foi meu erro Comprei esses 10 alqueires de terra mas rapaz eu entrei num monte de cobra desgraçada Desgraçada mesmo e desgraço até hoje Entrei no meio de irmão e irmã e cunhado e conhecido e compadre Ali parece que entrou o capeta no meio Acho que eles lidavam o livro do São Cipriano mas rapaz do céu pelo amor de Deus Eu tinha criação boa eu tinha meu dinheiro que dava pra fazer tudo e sobrar dinheiro mas foi indo e foi o mesmo que bater o sol em cima de uma geada foi derretendo aquilo que sumiu Os meus bois que eu não dava por uma panela de ouro boi tratado no galpão rapaz tratado 2 a 3 anos uma pareia de boi no capricho manso barbaridade e bom e gordo porque eu botava milho no coxo pra aqueles bois de sobrar e depois largava no meio de um aveial e lá eles comiam o tanto que eles queriam E quando ia trabalhar também eu pegava de manhã e chegava em casa meio dia e a tarde tornava trabalhar voltava quando anoitecia e os meus bois eram demais mas de repente morria um boi de repente morria outro de repente morria uma vaca de leite Rejeitando mil reais por uma vaca boa de leite e daqui pra li ela morria Mas olha foi num ponto que eu me desgostei tanto que eu não sabia o que fazia daquela terra pra eu sair de lá E outra coisa atrás desta eu ofereci aquela terra por 8 mil Tinha tudo fiz casa fiz galpão água encanada horta potreiro pra criação galpão pra botar 6 cabeças de gado Oferecia por 8 mil e ninguém comprava Os compradores vinham até uma altura da estrada e voltavam pra trás Lá não sei que capeta que tinha que ali não chegava não dava jeito Eu tive que procurar o centro pra tirar aquele inferno dali pra poder vender Aí quando foi um dia um homem chegou e disse hoje vai vender a terra Óh hoje você vende boi vende vaca vende terra vende porco galinha vende tudo que você quiser Dito e feito De repente chegaram dois homens lá e compraram o paiol cheio 94 de milho Também na mesma hora arrumei o caminhão para a mudança para vim pra cá Porque eu já tinha vindo antes o meus cunhados moravam aqui em Santa Terezinha eu vim antes olhei o lugar e olhei a plantação de hortelã Então a hortelã tinha uma influência meu Deus do Céu olha a planta de hortelã era o mesmo que jogar dinheiro na terra aquilo ali estava juntando dinheiro todo dia Cheguei ali e comprei 3 alqueires de hortelã e paguei Comprei e paguei e fiz um contrato assim com o cara Óh se até tal tempo eu vier aqui você desocupa a casa e se eu não vier fique com odinheiro e a roça Aí quando eu vendi minha terra já mandei avisar pra desocupar a casa porque até tal tempo eu ia chegar com a mudança e ele desocupou Cheguei ali e toquei aquela lavoura de hortelã 3 anos Rapaz mas me deu dinheiro igual água Nunca tinha pegado tanto dinheiro quanto eu fiz com aquela roça de hortelã Eu vendia lambicava a lavoura de hortelã me dava 200 litros de óleo eu vendia por 18 mil aquele óleo de hortelã E foi aonde que de lá comprei aqui pagando muito caro paguei 14 mil Ora vendi lá no Rio Grande a terra nestas condições me deram 3 mil na hora e 5 mil com prazo de um ano sem juros foi como jogar fora Edson Isto foi na década de 1970 Sr Mario Isto mesmo isto mesmo Então foi uma barbaridade um absurdo Pra mim foi umas bordoadas mesmo pra acabar de matar Se não fosse isto se não fosse tanta eu pra mim olha eu não sei nem como lhe dizer que a gente bem dizer de casa e era traiçoeiro Um irmão meu quando morreu pai e minha mãe eu tinha 8 anos e ele ficou de tutor dos órfãos mas aquele homem aquele meu irmão justamente ele devia de ter morrido antes de nascer Edson Ele era muito ruim Sr Mario Não eu ia matar ele Na verdade eu falei que eu ia matar ele eu ia matar ele Mas dai saí da casa dele e nunca mais nem quis saber Até hoje eu me lembro dele e eu tenho raiva dele Porque se eu acho eu que se por exemplo aqui mora o meu pai e ele morreu eu tinha minha casa larguei lá e vim aqui tomei conta Mas eu sou tutor ele ficou de tutor dos órfãos mas ele tomou tudo o que os órfãos tinham e vendeu Vendeu Ele me tirou tudo o que eu tinha ele vendeu Além de eu trabalhar tantos anos pra ele e não ganhar se não um feijão bebido pra me alimentar ele me tomou tudo o que eu tinha ele vendeu Vendeu minhas vacas tudo tudo Ele não vendeu a terra porque também ai era muita coisa Mas carroça tudo o que eu ganhei de herança tudo ele pegou e vendeu tudo E daí teve mais esta As casas onde morava o meu pai aquelas lá eram minhas porque eu era o de menor e era o último da família e aquelas pertenciam pra mim E ele pegou e vendeu tudo Vendeu 5 alqueires de terra e vendeu minhas casa junto pra poder vender melhor as dele ele pegou 10 mil Ele pegou aqueles 10 mil e não deu um centavo pra nós Edson Quantos irmãos o senhor era Sr Mario Oito Edson Tinha que ser divido igual pra todos Sr Mario É Sete e comigo oito Mas quer dizer os outros que era de maior sabiam como era a lei Mas eu com 8 anos vou saber o que E daí eu sei dizer que ele vendeu tudo Na hora de eu sair de Santa Catarina pra vir pro Rio Grande pra ir 95 servir eu tinha uma vaca lá muito boa e ele já tinha vendido aquela também Daí veio os homens procurar a vaca daí o dono da serraria foi delegado muito tempo ele disse não senhor esta vaca é de fulano ninguém leva daqui essa vaca eu dou dinheiro pra ele e essa vaca fica aqui ninguém leva Daí saí da casa dele com um par de chinelos e duas mudinhas de roupa dentro de uma mochila Ele não me deu um centavo pra eu comprar um caramelo pra comer na estrada Nem adeus ele não disse Então esse homem pra mim olhae outra coisa ainda se fosse só isto não era nada Mas e os desaforos que ele fazia pra gente em casa A pessoa estava ali quieta e ele chegava com a tesoura e cortava o cabelo e morria de dar risada Você estava almoçando e de repente ele vinha peidar dentro do prato Mas olha pelo amor de Deus pelo amor de Deus Um homem desse não era pra existir no mundo Mas tanto foi que Deus ajudou que deu câncer na próstata e ele morreu Todos eles éramos em 8 irmãos tem só uma irmã viva Ela já tem 84 anos Edson Mora aqui Sr Mario Mora no Rio Grande Eles vieram passear aqui tudo bem tudo bom mas aquele cunhado pra mim eu também morei na casa dele trabalhei 2 anos e o que ele me deu foi um pano pra uma camisa por 2 anos de serviço Então da minha gente eu sei dizer pro senhor que eu nunca vi na minha vida não pode existir gente de um coração tão desgraçado do jeito que foi pra mim eu nunca vi na minha vida e não quero ver Aí eu fui me virando como eu pude como eu pude como eu pude mas sempre me cuidando porque quando podem me pegar alguma coisa eles pegam mesmo É tinha que me cuidar muito Mas no nome do Nosso Senhor Jesus que tanto me ajudouhoje sinto eu podia estar bem melhor podia estar muito muito muito bem com tudo o que eu trabalhei que segurei era pra ter muita coisa mas não deu porque quando eu queria arrumar uma coisa um ou outro tirava Então aqui ainda comprei 10 hectares paguei 14 milhãoa vista Edson O senhor sempre lidou com a terra Sr Mario Sempre sempre A minha vida foi mexer com terra com as vaquinhas Gosto muito tenho minhas vacas ai Estou comprando milho e tratando das minhas vacas por causa da seca A grama estava ruim comprei bastante adubo e semeei o adubo no pasto pras vacas se alimentarem Edson A terra do senhor aqui é pra onde Sr Mario A minha terra pega esta parte de cima até a parte daqui ela de lá da rua vai lá na casa do alemão lá Aqui ele mediu agora aqui eu não sei se está bem medido porque o cara que me media aqui cada vez que ele media ele tirava um pedaço Era o Ivo que era o dono aqui um tal de Ivo Quadriotto aquele homem roubava até não sei de quem Até o genro dele media junto então media com arame de 10 metros media as datas eu ia na frente e marcava onde dava o arame e daí um metro ou dois antes de chegar ali ele já marcava O genro dele falava fulano você vendeu a terra cara não roube do homem O genro dele mesmo falava pra ele não roube Você vendeu a terra cara pra esse homem está vendida você recebeu foi com o que você se alimentou comprou carro com o dinheiro dele mas não roube do homem Então eu não sei se está certa esta medição Foi marcado por ele Coisa do outro mundo né fazer o que 96 Edson Tem gente que gosta sempre de levar vantagem né A não desvantagem ninguém gosta de levar Mas eu sou uma pessoa feito assim sou pobre não tenho quase nada mas não peço também nada pra ninguém por nada Se eu dever um tostão nem que seja um filho um filho vem aqui trabalha uma hora eu pago Eu quero ver dizer teve isto aí porque eu fui lá e fiz Não senhor tudo eu pago Vivocom o que é meu Eu sou uma pessoa que não devo pecado a Deus de dizer eu logrei esse eu logrei aquele eu tirei um centavo de um ou de outro Me sinto feliz porque não tem ninguém que chegue aqui no Rio Grande ou em Santa Catarina ou lá no Mato Grosso onde eu andei que diga fulano ficou me devendo um real Edson Seu Mario o que o senhor lembra lá da Alvorada do Iguaçu Sr Mario A Alvorada do Iguaçu ela justamente ela era uma vila muito boa Tinha uma serraria lá onde eu comprei essa madeira que até hoje está aqui na minha casa Isto já tem cinquenta anos pra lá Comprei Paguei cinco mil reais pela madeira naquele tempo Então eu sei dizer que a Alvorada eu achava até bom Uma vilinha boa Uma vilinha que dava pra gente ir lá É onde a gente tinha a farmácia pra gente buscar o remédio quando tinha uma criança doente uma coisa eu corria lá E tinha um tal de Bianco que era o dono da farmácia Um homem muito bom mas muito brabo Ele era delegado do lugar Esse Bianco esse Bianco pra mim foi um homem muito bom Muita gente falava de vir que aqui tinha bodega tinha três a quatro bodegas e matavam gente aí pra ver morrer E um homem muito brabo morava bem aqui um tal de baiano todo mundo tinha medo dele Pra mim era meu amigo ele tinha uma loja ali e dizia o seu Mario vem cá olha se precisar de alguma coisa que você não tiver dinheiro já deixo a ordem pra minha mulher que a hora que você precisar é só vir aqui buscar Pra mim foi muito bom Ele foi morto ali com uma punhalada no peito só porque deu um tapa na cara do irmão dum capixaba o capixaba viu o irmão dele muito brabo e matou Cheguei lá ele estava morto Eu falei Cleo era filho do baiano você não viu eles matarem teu pai ali Não eles estavam brincando digo olha ali teu pai morto ali pra fora da escada ali rapaz Ele foi ver ai pegaram ele levaram pra São Miguel foram ver como é que estava mas já fazia meia hora que ele tinha morrido Uma punhalada em cima do coração que ele nem viu como que ele morreu E o cara garrou ali pra baixo foi parar lá pra baixo onde a gente plantava arroz na fazenda num banhadão assim Aí a polícia veio e ter com a outra mulher que ele tinha na paulistana ta lá ainda a mulher desse baiano ainda mora lá na paulistana ela é viva ainda a mulher legítima dele A mulher falou não mataram ele peguem ele e joguem não sei pra onde porque eu não quero que venha velar aqui Ele batia muito nela E pegou outra nova que ele tinha aqui Então a mulher não quis nem saber Desse homem não quero nem saber E falou tanta coisa lá que a polícia falou pro cara que matou ele que se ele tivesse escondido falou pro administrador da fazenda fala pro cara que matou o Baiano que ele venha embora cuidar da família dele que de nós ele está livre Sepultaram o Baiano e ninguém fez nada Edson O homem era ruim então Sr Mario Ele era brabo e o povo tinha medo dele Ele ajustava peão trabalhava pra ele nas lavouras de hortelã de arroz ele tinha um capitalzinho E aí quando era de pagar ele pagava batendo nas pessoas não pagava 97 E essa farmácia do Bianco era onde nós nos servíamos de remédio E o Bianco era o delegado do lugar Edson Eu acho que ele era pai o filho dele também chama Bianco né Sr Mario Sim acho que sim Edson Porque tinha uma farmácia lá na Vila C onde eu morava que ele tomava conta Sr Mario Isso isso ele foi pra Foz Edson Ele tinha uma churrascaria depois Sr Mario Sim eu não sei se o Bianco ainda é vivo Edson Não morreu Mataram ele também esses tempos atrás o filho Sr Mario Mataram Nossa Senhora Porque quando ele morava aqui na Alvorada eu não sei ele tinha encrenca com um paraguaio E daí o paraguaio era dos tal que não tinha medo e veio ali e fizeram um tiroteio pra matar o paraguaio e o paraguaio baleou o filho dele Baleou parece que o Bianco e o filho dele Mas eles mataram o paraguaio Mas o Bianco aqui tinha gente que tinha bolsa de sal destas bolsinhas de sal e tem até hoje cheia de revolver e pistola e tanta arma escondia ai nos mato embaixo das madeiras e fazia travesseiro daquela bolsinha O Bianco vinha aqui de noite e dizia Você conhece fulanoSeiSabe onde que ele dormeSeiEntão vamos lá comigo que eu vou prender ele Ele ia lá prendia o homem só que aquele não voltava mais Mas pra mim então tinha muita gente que me incomodou muito aqui e não sei se eles falavam pro Bianco ou o que O Bianco nuca me incomodou O Bianco falava ó gentetinha um cara aqui o véio o pai e o filho Então eu plantava da rua pra lá 3 alqueire de terra que eu arrendei do dono da terra por quatro anos pagando 30 livre Daí trazia ele vinha morar ali trazia uma galinhada cinquenta a cem galinhas quando meu milho tava crescendo ele soltava aquele bando de galinhas arrasando a roça Aí eu falava pra eles e não adiantava Ele saía puxar madeira com o caminhão e a mulher soltava aquela galinhada morta de fome nossa Senhora Aí eu falava lá com o dono da terra ele vinha ali e dizia eu vendi lote mas eu justamente não vendi pra criar galinha O homem tem a família pra tratar ele trabalhou ele quer colher as plantas dele E daí o filho e o velho que era o sogro desse cara que morava aqui eles começaram a me perseguir Pegaram raiva de mim O velho vinha ali na bodega bebia uns trago e arrancava da faca e ficava bem louco Eu fui lá no Paraguai Tinha uma mulherzinha morena ela vendia arma Eu digo o abençoada quanto é que vale um revolver aíVale seiscentos reais Então me dá um pra cá me dá uma caixa de bala Aí meu cunhado era inspetor entreguei o revolver pro meu cunhado pra outro entreguei a caixa de bala se a polícia me revistar eu não tenho nadaTrouxemos Botei o revolver na minha cintura e disse agora o negócio é comigo mesmo Vamos ver o que é que nós vamos fazer E foi aquelas galinhas barbaridade Meu Deus do céu Nossa Senhora dava uma chuva a mulher soltava aquelas galinhas O jeito que tem é eu vou armar arapuca Vou armar arapuca com umas tábuas ali com uns tocos pode ser que ela segure Eu ia lá montava quatro a cinco tábuas botava 98 quirera embaixo da arapuca mas olha matava galinha que não era mole Botava em cima dos tocos Ele foi lá e trouxe o Bianco O Bianco chegou bem macho aqui Quem é que tinha matado aquelas galinhas O Bianco não me levou pra cadeia aquele dia porque veio o Ivo de lá disse não senhor aqui eu vendi lote aqui mas aqui a terra é minha e eu arrendei o homem tem a família dele pra tratar e o negócio é que essas galinhas eu não vendi lote aqui pra criar galinha Eu também tenho parte nesta plantaMas o Bianco já tinham enchido a cuca dele barbaridade ele veio com espírito de porco E nós íamos nos estranhar com ele Eu também não arredo o pé pra qualquer um não Aí os caras ficaram me perseguindo eu digo eu vou matar vou matar todos os dois Enchi meu revolver de bala botei na cinta e ia trabalhar lá na fazenda do Flávio lá na Santa Luz e passava todos os dias na estrada todo dia pra lá e pra cá eu e a minha família Daí ele é não sei o que não sei o que Eu disse fulano eu não quero briga eu não quero briga Mas o meu suor eu não estou pra derramar suor debalde Tenho minha família pra tratar Eu peço por favor de Deus que segure essas criação tua E veio o Bianco de lá e me perguntou que é que tinha matado as galinhas Eu disse Foi a arapuca e quem é que armou as arapucas eu que armei as arapucas fui eu é porque não sei o queo cara lá arrancou da faca e veio pra cima de mim Eu digo rapaz deixa pra lá que eu te arrumo uma viola Você é bom você e o capeta do teu pai Me ataque na estrada toda hora eu estou pra lá e pra cá me ataca na estrada Aqui não vamos brigar na frente do delegado Me acerte na estrada meu Deus do Céu que nós vamos medir os passos é ali Quando foi um dia de manhã cedo tinha um rapaz que morava aqui Nós trabalhávamos a terra lá em baixo Ele plantava meio alqueire de terra de arroz e eu meio alqueire Então nós fazíamos a terra meio junto com ele porque ele ajudava eu plantar eu ajudava plantar o arroz dele e daquele jeito a gente estava levando E quando foi um dia de manhã eu sai daqui e cheguei ali aonde mora onde hoje é do Carlinho Cereno ali era terra dele eles estavam carpindo mas eles carpiam assim numa rodinha na barranca da estrada O velho com um punhal assim enfiado na frente e o cara aquele com um revolver Eu digo hoje eu vou matar os dois Eu disse pro meu companheiro ó você por favor de Deuseu estava desse ladovocê não chegue pra frente não chegue pra frente que eu vou matar os dois é hoje Já fiquei com meu revolver prevenido Aí quando eu fui chegando como olha como daqui ali que eles fizeram menção de descer a barranca da estrada que eu já levei a mão no revolver pra sapecar um pra não descer a barranca Um eu mato no descer a barranca o outro se correr eu mato ele antes de chegar na casa Aí foi onde que chegou o administrador da fazenda com o carro freou o carro ali e disse seu Mario monte aqui no carro monte aqui Daí eles pegaram a ferramenta e foram embora Daí o Bianco desceu ó o seu Librio e seu Adão eu tenho uma coisa pra falar pra vocês curta e certa o dia que o Mario matar vocês dois eu vou apear pra levar vocês dois mortos mas prender ele eu não vou porque lá na bodega todo domingo vocês estão lá brigando e enchendo a cuca de pinga e o Mario mora lá encostado e eu nunca vi ele lá na bodega ele está em casa cuidando da família dele Nunca vi este homem chegar na bodega todo domingo eu estou lá na bodega lá E faz anos que ele mora ali e justamente nunca vi este homem chegar na bodega nunca vi pedir um trago nunca vi nada Ele está lá na casa dele cuidando da família dele agora vocês vivem fuçando ele O dia que ele matar vocês eu posso ir lá pra juntar vocês mortos mas pra prender ele negativo o Bianco falou E daí 99 tiveram que parar né tiveram que parar porque eles viram que a coisa não ia pra frente né mas razão também não tinha Então aconteceu olha aconteceu tanta coisa aqui que nem é bom lembrar Barbaridade coisa séria Aqui existia muita gente ruim aqui Tinha um pessoal aí Eu acho que tinha umas 600 pessoas mais ou menos frequentavam essas bodegas ai Dia de festa dia de domingo aquele vai e vem aquele alvoroço Jogo de futebol ali na frente que o seu Flávio deu o terreno pra eles fazerem um campo bem grande de futebol mas no fim pra arremata o caso teve que vi o Batalhão de Foz desarmar todo esse pessoal porque era demais Você imagine de vir o Batalhão não era pouca coisa né Se fosse um ou dois ou três a polícia podia dar conta Edson Então morava bastante gente pra cá Sr Mario Muita muita Aí era tudo mato tudo mato tudo mato Aí derrubaram aí Engraçado eles roçaram o mato e botaram fogo E daí o facho não queimou bem o miúdo por causa da sombra da copa das árvores e aí foram derrubar as árvores grandes e daí não queimou e ficou aquela galhada barbaridade Foram plantar hortelã não deu nada Não deu nada porque não tinha como dar Eu plantei hortelã e deu muito mas a minha roça era limpa era limpa tinha só a hortelã e os tocos As madeiras grossas eu mandava cortar e amontoar A galhada eu tirava tudo A lenha que aqui tinha muito Angico eu mandava cortar de motosserra e nós com a família ia juntando e botando em pé a par dos tocos pra depois quando fosse lambicar a hortelã tinha lenha pronta Então o patrão morava lá em Foz ele dizia não esse homem aí eu nunca vi um homem de sorte igual a esse trabalhador porque a hortelã dele toda a vida é o que dá mais Eu deixava madurar a hortelã e os outros cortavam a hortelã verde pra gastar o dinheiro meu Deus do Céu Saíram de lá não tinham dinheiro pra pagar a mudança Todos tinham a lavourinha de hortelã mas ele só viviam dormindo com a cuca cheia de pinga e botavam peão lá na lavoura Eu não botava peão na lavoura eu botava meus filhos minha mulher eu minhas meninas Vamos cortar a hortelã vamos botar peão se vê que precisa eu boto peão eu tenho dinheiro pago pra cortar Tenho meus cunhado a gente troca serviço Então assim nós dávamos conta né E guardando um dinheiro né porque digo uma hora nós saímos daqui e a hora que a gente sair daqui nós temos com o que nos valer pra viver em outro lugar Se não a gente vai sofrer Toda a vida eu pensei foi isso Meus cunhados teve um que hoje está morre e não morre lá no Mato Grosso ele me botou no mato porque ele me falou vamos fez eu vender a lavoura de hortelã vender meu gado que eu tinha bastante gado na fazenda porque o doutor Rubem era o maior amigo meu eu arrumava as cercas lá do pasto e ele dizia ó fulano você pode comprar gado e botar aí no pasto e não tem que pagar pode botar você está cuidando da cerca e gostei de você e gostei do teu serviço Porque eu fincava os palanques desta fundura Os mineiros iam lá com o enxadão davam três enxadãozadae botava o palanque alí e granpeava e a cerca já caía Aí o doutor disse ó te dou terra pra você plantar de graça também Pode roçar aí a quiçaça e plantar milho não te cobro nada Então foi aonde que ele me ajudou Quando eu estava lá com doença também ele não cobrava tão caro Alí o doutor me ajudou demais Aí veio meu cunhado e disse vamos embora daqui porque lá em Rondônia dão terra de graça que não sei o que Dei o dinheiro pra ele pagar a passagem pra ir lá ver e ele vem de lá com mentira que era um lugar bom que não sei o que que não seio que Eu peguei e fui lá ver lá só tem bandido só tem bandido só tem bandido Lá 100 os coitadinhos que iam daqui abençoado do céu que vendiam tudo e levavam o dinheiro ficavam lá na beira da rua debaixo de uma lona esperando Lá tinha os vigaristas então eles combinava ó você é dono dessa propriedade vamos fazer assim eu vou lá e ofereço tua propriedade pra ele que é uma propriedade boa que assim e assim e faço que eu que sou o dono e vou vender a terra pro cara a gente pega o dinheiro e reparte e você não deixa ele entrar aí e ele se lasca Assim meu pai do céu eu vi tanta mulher chorar lá por causa disso É viemos pra cá acabamos debaixo de uma lona serviço não tem dinheiro acabou terra não tem não dão pra ninguém e bandido na rua ia caminhando e um puxava o revolver e matava outro ali a troco de nada Se encontrou atirou matou Eu vi lá com meus olhos daí disseram lá fulano você quer saber bem como é que é Rondônia você vai na missa Você vai numa missa que vem o padre rezar a missa e lá na igreja eles vão contar e você vai saber muita coisa lá E eu fui Cheguei lá rapaz e eles diziam bom dia boa tarde pro padre assim como nós não respeitavam muito o padre também não Daí chegou a hora da confissão rezando a missa chegou a hora da confissão e cada um contava os pecados dele gritado lá mais de cem pessoas Aí era só mulher que falava é mataram meu marido e agora eu estou aqui sofrida com tantos filhos pra dar de comer sem recurso sem ter pra onde ir Mas olha meu Deus do Céu daí que eu acabei de crer como era o negócio não não pelo amor de Deus vou ficar por aqui mesmo aqui ao menos o que comer nós temos Vamos ficar aqui porque lá o que tinha mais que tudo que é bandido que tinha em Foz e Mato Grosso Estavam uma semana telefonando pro Zé que era o motorista do ônibus que vinha de São Miguel aqui então ele morava ali naquela casa ali e ele foi pra Rondônia O Zé falava seu Mario do céu pelo amor de Deus esse é o lugar que o filho chora e mãe não ouve Lá até os irmãos desse Zé mataram Coitado a mulher foi embora com outro e acabaram matando até ele A coisa mais triste do mundo não não não não não pelo amor de Deus Fiquei lá trinta dias eu vi e vim embora e disse mulher pelo amor de Deus o tio Zé ia botar nós na pior do mundo Os parentes me ajudaram desse tipo aí Edson Aí o senhor resolveu ficar então Sr Mario É eu vou dizer que eu não nunca vi nunca vi nunca vi nunca vi nunca vi uma coisa igual uma barbaridade dessa É esses meus cunhados bendizer eu criei eles dentro da minha casa tratando deles O pai de lugar deixou a terra lá eles iam plantar na terra e era dentro da minha casa que eles almoçavam posavam plantavam aquela terra e toda vida ajudei e pra mim ninguém me ajudou nada Ajudou devorar minha vida Edson E a Vila Bananal aqui tinha muita banana ali né Como é que virou Vila Bananal Sr Mario Não de primeiro aqui eu digo pro senhor que virou Vila Bananal porque tinha uns 300 alqueires de banana Porque o Luiz Salasi ele plantava essas terras tudo o que senhor vê aqui era quase tudo cheio de banana que era dele Ele tinha 14 peão fichado aonde que meu filho tocou quase vinte anos trabalhando junto com o Luiz Quando ele saiu ele deu mil reais de acerto E o Luiz está com 80 a 90 alqueires de terra ceifa nova 2 tratores novos morando num prédio lá na frente do Itaipu em São Miguel caminhão diabo a quatro e quem trabalhou pra ele está aqui pobre do mesmo jeito que estava antes 101 Agora esse meu filho que trabalhou ali pra ele lutou muito aqui e o Luiz prometendo não a hora que você sair eu te dou 2 alqueires de terra e não deu nada não deu nada nada nada nada Aí o meu rapaz chegou aqui um dia desanimado disse mãe eu vim avisar vocês que eu estou indo embora Estou indo lá pra Chapesal Vou embora pro Mato Grosso vou experimentar a vida lá Os Maggi pagam bem e eu vou pra lá El botou as mudanças numa bolsinha e pegou a família e botou no ônibus e se mandou Trabalhou mais de 10 anos lá com os Maggi sofreu o que os cachorros deixaram de sofrer mas comprou 2 datas lá na cidade e construiu as casas Estão lá as casas e as datas hoje estão valendo acho que uns 300 mil Mas ele não quer vender E tem 2 datas ali em São Miguel que ele mora ali e tem só um casal de filhos que já são casados Estão bem Mas ele o serviço dele é fazer casa de material Ele tem mais de 100 mil em ferramenta O que tinha lá no Mato Grosso que ele trabalhou lá está lá guardado está lá nas casas dele E as casas estão alugadas ele ganha lá uns 3 mil por mês de aluguel E aqui ele está fazendo uma casa pra um rapaz que ele empreitou pra fazer por 50 mil E ele trabalhou lá na fazenda Lar e lá mesmo meu DeusNossa Senhora do Céu o tanto de galpão que esse homem fez eu acho que dá quase mil metros de galpão que esse homem fez porque lá tem muita tem mais de 2500 cabeças de gado tratadas com a ração E ele quem fez os galpões e fez os tratos pras criação Ele fez de 4 metros de largura e 3 de altura tudo feito de matéria Ele trabalhou muito lá Ele ganhou bastante dinheiro mas é como ele disse eu ganho na verdade bem não posso me queixar mas a ferramenta também que estraga tem que comprar outra não é fácil Então está lutando lutando Todos eles os meus filhos todos eles não tem nenhum mal de vida A mais pobre ainda tem uma casa muito boa em São Miguel Edson Como é que é a relação de vocês aqui com São Miguel e Foz do Iguaçu seu Mario Sr Mario Olha eu digo até a verdade São Miguel eu até sinto eu até sinto morar longe de Foz do Iguaçu sinto Agora aqui em São Miguel pra nós nós estamos aqui obrigados obrigados porque neste canto aqui olha eu precisei eu fui lá na farmácia pegar um remédio esta semana aí por um descuido de nada o ônibus não tinha aluno porque nós sempre ocupamos o ônibus que puxa os alunos é o único transporte que tem Aí o ônibus veio embora e eu tive que pagar setenta reais pro rapaz me trazer aqui O ônibus veio embora e eu me perdi porque fui lá na farmácia atrás de remédio eu fui no posto e tanta coisa e com uma correria danada e a gente corre tanto e arruma tão pouca coisa Olha homem uma coisa que eu reclamo toda a vida venho reclamando e olha eu não sei pra qual santo chamar porque esses bicos de luz da iluminação pública passa três a quatro meses que queima o bico e vira uma escuridão desgraçado e ninguém arruma Vou lá em São Miguel lá na Copel ah não tem que ir lá na prefeitura vai lá na prefeitura e eles dizem que tem que ir lá na Copel e ninguém arruma Eles falam assim nós não podemos arrumar porque lá é município de Foz e nós aqui somos de São Miguel então Foz que tem que vir arrumar Agora nem vem de Foz e nem vem de São Miguel e nós estamos aqui pagando e castigados a vida inteira A vida aqui é desse tipo Edson Um empurra para o outro Sr Mario O povo de lá de Foz a cada dez anos aparece um E de São Miguel nenhum porque falam lá é município deles eles que se arrumem O fulano mas 102 olha aqui ó na hora de pagar pois o meu dinheirinho cai aqui Nunca fica um dia atrasado o pagamento da luz que é gastada mas olha arrume eu estou pagando o que não tenho Não vem não adianta Vai se queixar pra quem que não tem ainda viram a cara e dão risada Meu Deus poderoso nós aqui estamos perdidos Na verdade Foz do Iguaçu é uma cidade boa uma cidade de muito recurso não tenho o que queixar de Foz O povo quando vem e faz as coisas mas olha é duro porque não vem ninguém e a gente cansa de pedir e não tem jeito Aqui se torna assim é bem desse jeitinho Edson Uma coisa que eu observei não sei se é assim na última vez que eu vim aqui ainda tinha as bananas tinha mais casas O pessoal ainda está indo embora daqui Sr Mario Não tá chegando mais gente No tempo de ir embora daqui tá chegando mais gente Porque tem um rapaz ali que cuida mas o povo que chega vai lá e corta os cachos e leva o dono acha ruim e ai ele cortou por isso que ele mandou devorar O dono é bravo é bravo Ele é um homem bom é um homem muito bom é 100 não tenho queixa dele Ele é um homem que quando ele pode ajudar alguém ele ajuda mas ele tem Deus o livre se ele ver botar a mão numa banana que seja ele vai em cima da pessoa Esses tempos vieram uns caras ali e cortaram uns cachos e botaram no carro ele correu atrás até lá perto da paulistana pra alcançar eles fez eles pararem e pagarem pela banana Lá é meu quem manda lá sou eu se vocês tivessem me pedido a banana eu dava mas chegaram e me roubaram Ele teve a coragem de correr e cercar eles na estrada pra cobrar Agora aqui aqui aquiaqui eu vou dizer pro senhor aqui eu vou dizer pro senhor um problema muito brabo Porque aqui eu moro aqui porque eu tenho o meu jaguar ali tá ali atado tá ali eu trato deles tenho bolsa de ração tem tudo ali tem colheita feita eu jogo ali cachorro novo eu trato trato cresce e não engorda mas não é de fome que ele tá assim Eu seguro tudo as minhas criação e dos vizinhos a criação me invade todo dia O Alemão ali tinha dois boizinhos um até foi uma vaca minha que criou que era dele eu comprei dele a vaca tenho aqui tava morrendo também coloca três cabeças de vaca dentro de um piquetinho um cercadinho de nada não tem nem o que comer não dão nada pra comer Aí ele pegou a vaca e levou lá no Calinho a vaca muito boa de leite Deus o livre uma vaca boa eu comprei e digo o Alemão quer vender a vaca eu tenho muita dó dessa vaca ele colocava na soga os carros pegavam na corda da vaca e arrancava os couros tudo assim da vaca quase matava ali na estrada Coitada a vaca amarrada na soga mas ela quer passar para o outro lado da estrada os carros vinham e Nossa Senhora Comprei dele dei uma moto me custava cinco mil a moto dei a moto A vaca tenho aí Ela criou dois bezerros ele solta os bezerros não tem o que comer eles vem aqui e me comem todo o milho que planto pra tratar das minhas eles vem e comem meu pasto pisou a terra eu aviso e ele não faz conta Dei parte na delegacia o delegado puxa o saco dele Fui lá dar parte de novo nem na minha cara não olhou porque ele veio de lá dando tiro com a frobé pegou dentro do meu pasto ali e descarregou a frobé ali E eu passei a mão na minha frobé e digo vou matar ele é agora Quando eu passei a mão na minha frobé que eu corri ali pra matar ele ali ele sumiu Ele sumiu eu digo eu vou matar ele vou matar ele eu mato mesmo agora eu resolvi de matar porque galinha eu planto milho e elas comem tudo então não adianta os bois ele solta e toda hora desaforo e toda hora é esse inferno brabo ia indo pra um ponto que eu não aguento mais então nós vamos dividir na bala Aí eu chamei o fulano você é o bom da boca vem cá vamos 103 disputar o tiro no meio da estrada aqui Você é macho mesmo você vem pra cá que eu quero te dar um tiro no meio da testa Chamei ele ali mas você pensa que ele veio Você tem 50 capangas eu sou sozinho Mas sou homem não vai atirar atrás do toco não se quer matar um chega de cara a cara seja como eu seja honesto e certo Eu não vou me esconder pra te dar um tiro eu não vou me esconder não e não te dou um só te dou até 50 se for preciso Aí ele tira com as boas não fulano não nãoé rapaz quando eu dei parte dele tive que dar parte dele lá na delegacia em São Miguel porque ele faz todas essas coisas comigo aqui e vai brigar comigo lá na casa do vizinho que não tem nada a ver Ele chegou lá com a caminhoneta e foi brigar comigo O dono da casa ficou com raiva até dele E fulano como é que fulano vem brigar com fulano aqui na minha casa não tenho nada com isso Eu disse Alemão eu não tenho medo de homem eu não tenho medo de você Você tá enganado comigo já vi muita gente morrer nos meus pés não é o primeiro Não tenho medo de homem não sou mais que ninguém mas não menos que ninguém E não estou fuçando briga com ninguém Quando eu falo é porque tenho 50 mil razões Agora se a pessoa quer desfazer e fazer e desfazer e pintar e bordar comigo não vai Comigo a disputa é na bala Aí ele é fulano não tenho nada com você tudo bem tudo bem e vem aqui me pedir favor e podia me emprestar tal coisa essas coisas tudo né A mulher falou olha é melhor parar com isso pelo amor de Deus do céu chega gente aqui faz até vergonha Mas é vergonha mesmo é vergonha e acho que não é só vergonha isto aí é uma coisa muito séria que tá loco entre vizinho vai ficar se matando entre vizinho Um vizinho é pra servir o outro Mas quando pega demais demais demais demais e avisa avisa avisa e o cara não conta não quer saber de nada e quer ser ele o mandão digo ó ali tava um coitado de um velhinho ali morou 30 anos ali então veio a prefeitura de Foz e fez uma meia água pra ele pra ele morar ali e ele ficou doente ele tá lá no asilo lá em Foz Pois agora eles tomaram conta da data fizeram duas casa em cima o velhinho tavivo mas não sabe disto o velhinho tinha mudança e deram fim máquina de lavar roupa ferramenta cachorro bom de caça o velho tinha ele não ia caçar sem os cachorros saiam todo dia A cama dele a prefeitura deu até a cama as coisas dele jogaram tudo na beira da rua lá Tomaram conta de tudo ali e plantaram a data e na frente fizeram duas casas e tem gente morando aí que veio lá do Paraguai Não estou denunciando ninguém mas o que é verdade é verdade Edson Neste momento Seu Mario foi buscar um suco pra me oferecer Deixa eu fazer um pergunta Seu Mario a Itaipu interfere alguma coisa aqui ou não Sr Mario Não Nada nada nada Edson Eles não vem fazer nenhum trabalho assim de acompanhamento pra ver como é que está Sr Mario Nada Nada nada Digo a verdade pro senhor a Itaipu nem é lembrada aqui Eles não vem aqui A itaipunão nunca deu nada nunca fez nada nunca ajudou com nada nunca lembrou do lugar só lembra do lugar eu falo bem a verdade pro senhor e adoro que seja bem gravado que nunca ajudou e nunca lembrou Só lembra do lugar quando tem que levar o dinheiro para lá mas ajudar com alguma coisa não Edson Eu pergunto porque aqui ficou isolado por causa do lago né ficou separado de Foz do Iguaçu 104 Sr Mario É é Edson E Foz do Iguaçu recebe um dinheiro todo mês da Itaipu por causa do lago Sr Mario Meu Deus do céu Nossa Senhora EdsonEntão não vem nada pra cá desse dinheiro Sr Mario Nada nada nada Nem um centavo Agora tem uma vinha muita gente aqui muita gente vinha aqui que nunca ajudou com nada Mas de repente a comunidade que tinha aqui resolveu de fazer essa igreja Vamos fazer a igreja vamos fazer a igreja mas daí naquele tempo uma tal de Tania era uma dona que ela ia lá em Foz e queria ser tudo lá com o prefeito e mandou fazer a igreja muito grande Foi muito material mas no final aconteceu que abandonaram a igreja descoberta estava acabada estava acabada Aí eu falei não vamos tocar isto pra frente e vamos arrumar E ajudando e ajudando Até televisão demos pra botar na rifa pra bem de arrumar um dinheiro pra arrumar a igreja O que nós podíamos fazer nós fizemos Aí foi indo pra um ponto que juntamos os vizinhos um ajudou um pouquinho outro ajudou um pouquinho porque a Tania ela foi uma mulher assim ela saía pedir arrecadação pra ajudar a igreja mas a arrecadação ficava toda pra ela e pra igreja ela não dava nada nada ficava tudo pra ela Até teve um padre missionário que esteve aqui teve as missões não lembro quantos dias ficou parando até na casa da Tania Mas eu sei dizer pro senhor que até o padre se desconjurou Disse essa Tania vai morrer de uma morte muito triste disse ela vai pagar o que faz ela estava brigando com as outras vizinhas ali por causa disto por causa daquilo ela queria saber mais do que todos e queria mandar em tudo A mandona aqui era ela Até o marido dela veio aqui pra me matar o tal de Divo Rossi juntou a cambada de peão dele de bandido dele lá porque ela estava sentada aqui e nós proseando aí ela tinha ido arrecada até o sacrário da igreja deram e ela não deu ficou lá na casa dela não botou na igreja vai daqui vai dali e arrecada tanta coisa mas não aparece nada pra igreja E não sei oque anoiteceu e eu sentado ali onde o senhor está e ela aqui Falei fulana me dá licença mas eu tenho umas criação pra tratar que agora já é noite né então você pode ficar ai à vontade A mulher também estava lidando com a janta mas você pode ficar aí que eu só trato da criação e não tem problema E daí ela foi embora eu não sei o que foi que ela falou pro macho dela e o marido dela não se dá com o irmão que mora ali não estavam se dando Então quando foi umas horas da noite eu ouvi aquele tiroteio de lá e vem dando tiro em frente a igreja e vem dando tiro até aqui e chegou aqui encostou não tinha cerca encostou o carro ali perto da áreaali e arrancava a grama com os pneus do carro e saltou 3 dando tiro ali fora eu ia sair e eu ira morrer que nem um passarinho sem saber porque Daí eu sei dizer que a mulher falou não não vai lá fora que eles te matam Eu podia pegar minha espingardona ali e dar um tiro nele e matar também Mas ficamos nessa Aí ele deu tiro ali e foi ali tinha ali uma bodega ali adiante foram lá e beberam e voltaram e fizeram do mesmo jeito Aí eu não importei Aí tinha o casamento de uma neta minha e a festa era lá no CTG lá em São Miguel Então eu fui na festa lá e um amigo meu me falou eu contei pra ele esse caso não devo nada o pai do Divo é meu maior amigo meu Deus do Céu vizinhamos 30 anos aqui um homem de bom coração um homem bom barbaridade E o Divo fazendo serviço de homem eu não tinha raiva do Divo não briguei com ele não fiz nada pra ele e ele veio pra quere me matar na minha casa Daí o rapaz falou mas pelo amor de Deus você vai e faça queixa no delegado que isso aí é perigoso Eu fui lá e contei 105 pra o delegado e fizeram um papel e me entregaraMas nem atrás de tirar uma arma não vão não vão não se importam não vão E ficou por isto mesmo tenho o papel ai guardado tanto dele quanto do Alemão Daí fui falar com o Monir irmão odisse não tinha muito é um dava 100 outro dava 200 outro dava mais outro dava menos na folha da data o livro da igreja mas daí o marido dela arrancou aquela folha embrulhou assim e disse proMonir jogar fora porque isso aqui não vale nada Aí o Monir como não se adaptava com o irmão ele jogou na lata de lixo né ele pegou aquela folha arrumou bem passou o vapor em cima e guardou um dia se for preciso está aqui A prova como é que está E o resto tenho ali Edson Já viveu muita coisa em seu Mario Sr Mario É dois já vieram pra me matar aqui Ainda não me mataram Agora se completar os 3 eu não sei Edson Espero que não Sr Mario É Edson O senhor está com que idade seu Mario Sr Mario 81 anos vou completar ainda Eu completei 80 anos no dia 06 de novembro Tinha um homem aqui muito meu amigo Até a mulher dele mora lá na segunda casa Então é eu falava pra ele ele estava com 80 anos 83 anos E vinha aqui naquele tempo eu tive venda aqui 14 anos e vinha aqui e dançavam farreavam tomavam cerveja a noite inteira Ele dizia eu não sei como é que pode a pessoa cada uma moda que ele dançava ele tomava uma cerveja e não se embebedava Ele e o filho dele tomavam 5 caixas de cerveja numa noite Nunca vi não sei onde é que cabe essa barbaridade Eu não sei como é que pode uma coisa dessas E ele e a mulher dele vinham aqui os dois tinha que medir assim no copo igual a cerveja porque um não podia tomar parece que uma gota a mais que o outro E bebiam Então daí eu dizia mas seu João meu Deus do céu o senhor com 83 anos com uma natureza dessas o senhor dança o senhor farreia o senhor parece que tem 15 anos Às vezes ele reclamava que sentia uma hérnia reclamava que às ele ia catar milho na roça pra tratar as galinhas os filhos não ajudavam ele tinha buscar uma bolsa de milho lá e trazer aquilo nas costas e aquilo prejudicava muito ele Aí eu dizia é seu fulano você viver 83 anos eu acho eu não chego mas nem pero disso aí você pode agradecer a Deus Uma pessoa com toda essa idade aí e do jeito que o senhor anda está tudo bem e se alimenta também bem isso aí é só por Deus mesmo Agora eu estou com 80 anos e vivo até não bem mas pro tanto que a gente sofreu na vida eu me lembro de tudo que a gente sofreu na vida chega uma hora que o peso vai e acarca Edson Mas o senhor está forte ainda Sr Mario Mas não o que me judia demais e não estou achando remédio é o que eu luto eu gastei 2 mil reais eu estava carpindo ali e o sol estava brabo do jeito que está E eu tomei café tratei das criação fui carpindo o sol foi esquentando e eu fui carpindo e a quiçaça estava alta e eu não me importava não mas de repente eu vi que me senti ruim Me senti ruim cada vez mais cada vez mais eu digo eu vou morrer E vim aqui bem aí Aí eu fui ficando ruim fui ficando ruim até que eu me lembro de dizer mas eu vou morrer é aqui Dali a pouco eu caí faltou isso aqui pra eu bater a cabeça naqueles tijolos ali e tinha chovido estava molhado até ficou o 106 lugar da minha cabeça ali no barro Não vi mais nada a mulher estava lavando roupa lá pra trás dali a pouco eu dei um gemido dei um gemido eu viu que eu não estava carpindo mais lá veio aqui disse alguma coisa aconteceu Quando ela veio aqui eu estava caído ali Daí ela chamou a tia que estava ali na casa chamou a outra lá que estava ali na fazenda do Samek ela veio com o carro e quando eu vi estava lá no hospital mas graças a Deus não foi nada Daí foi feito tudo que é exame foi tirado 9 seringas de sangue cada seringada fazia um exame Daí eu fui num médico lá em Medianeira aquele médico muito bom muito bom Ele disse seu Mario o que está lhe matando é o sol o senhor não pode pegar sol Edson O senhor teve uma insolação Sr Mario ÉEu tenho uma alergia assim nas costas que judia muito me coça muito me arde Alergia do sol já falei com três médicos falei com farmacêutico ali tem o seu Roque em São Miguel que pra mim é o melhor farmacêutico que tem Ele disse seu Mario é alergia alergia Seu eu não for no sol que eu fico meio na sombra ela não me incomoda mas se for no sol de noite eu não durmo Mas começa a incomodar que parece formiga correndo assim que barbaridade é ruim O senhor quer tomar uma coca nós temos aí Edson Não não seu Mario não se preocupa não A gente já está encerrando aí que já consegui bastante coisa Neste momento ele ri abertamente Edson O senhor é uma figura tem muita história pra contar Eu sei que se eu ficar aqui a gente vara a noite Sr Mario Aqui não tem problema aqui nós temos carne tem carne no congelador nós assamos carne nós comemos Aí nós temos de tudo um pouco Edson Que bom Não falta nada Sr Mario É graças a Deus Edson Neste momento ele sai de perto do microfone e fica incompreensível o que ele diz Ele traz uma cuca e me oferece Sr MarioDaí eu peguei e disse pro meu filho o se você trouxer ração ai eu vou tratar da novilha e te dou pra você Eu não quero não quero não quero Daí você vende ou carneia faz lá o que você quiser Daí ele traz a ração e eu estou tratando dela se ele vai vender ou vai carnear eu não sei Edson Até o final do ano então tem um churrasco Sr Mario É A não pode demorar muito porque tem outra vaca que cria né A velha fez muito muito queijo Lá de Medianeira eles vem de lá comprar queijo aqui Compram até o queijo que é feito no dia Essa minha vaca que eu tenho ali ela dá um balde de leite por tirada E ainda criou 2 bezerros ali Essa vaca vale 5 mil reais Edson É bem cuidada então Sr Mario Mas engraçado nós compramos leite Nós temos a vaca de leite e nós compramos leite porque o leite da vaca é muito gordo e me faz mal A gordura do leite que faz mal Então nós compramos leite no mercado e fazemos queijo do leite da vaca Eu pra mim eu estava tirando o leite e tratando dos cachorros Eu misturo 107 na ração o leite ração dos cachorros mas daí não sei diz o meu genro que não era bom que começa a fazer mal pra barriga deles ai eu parei de dar Então deixo ali bonito Chamei o meu filho ali e arrumou que tem os coxo mas tem as borda O coxo tem que estar sempre cheio de água A vaca bebe essa água da caixa ali vai e o coxo está sempre com água Eu trato e corto o pasto e planto o pasto e compro milho e trato das vacas Mas estão gordas uma é gorda mas a que dá de mamar está mais magra Diz o meu genro a vaca que dá de mamar ela não pode engordar muito mesmo acho que devido ao leite que ela dá enfraquece ela Ali eu dou milho pra ela comer Edson Seu Mario eu posso tirar umas fotos Sr Mario Pode pode pode Pode tirar foto Edson Vou tirar uma do senhor inclusive Seu Mario é só o senhor e a sua esposa aqui agora na casa Sr Mario Sim Edson Os filhos estão todos fora Sr Mario É Pode entrar aqui pode tirar foto Neste momento eu entro na casa e seu Mario vai mostrar os cômodos Ele mostra a cozinha os quartos onde ele e sua esposa dormem Estranhamente cada um dorme em um quarto No seu quarto um altar com vários santos católicos a quem ele disse que faz suas orações Na sala uma estante onde apresenta fotos dos filhos e netos No final a esposa chega e participa um pouco da conversa O senhor foi ver a bagunça da criançada aí Edson Não tem bagunça não Está tudo bem ajeitadinho nem tem criançada mais né Sr Mario Não No tempo que tinha criança eu gostava eu gostava Porque meus filhos a gente podia largar qualquer coisa que quisesse e dizer isso aqui você não pega e ficava sossegado porque nada ia mexer Mas os de hoje vou falar a verdade